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T. S. ELIOT
LUT REELLE. DIES IST DER KERN
lVJEINER PHILOSOPHIE.
JE POETISCHER, JE WAHRER.
NOVALIS
Tradução de
MARIA AMÉLIA NETO
( 2.ª Edição)
ATICA
LISBOA
Titulo da edição original
«THE WASTE LAND»
Copyright FABER AND FABER
Londres
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Eis a técnica tão soberbamente manejada em as metrópoles modernas. «É possível - observa -
The Waste Land. Afinal, a lógica da imaginação é que eu deva sobretudo a Baudelaire meia dúzia
a que está na base dos movimentos literários e ar- de versos das Flores do Mal, e que o seu signifi-
tísticos das segunda e terceira décadas deste sé- cado para mim se resuma em:
culo. E a justaposição ou colagem de imagens abso-
lutas, isto é, não subordinadas a qualquer ordem '
1'
Fourmillante Cité, cité pleine de rêves,
espacial ou temporal, constitui, como se sabe, uma Ou le spectre en plein jour raccroche le pas-
característica da aliás co- sarnt .. .» ( 5 )
mum ao surrealismo e ao imagismo. Pertence a
Ezra Pound, impulsionador desta última corrente, Londres, de The Waste Land, é bem o símbolo
a célebre definição de imagem como «O que apre- da «fourmillante Cité»:
senta instantaneamente um complexo intelectual e
emocional» (1). Sobre a autonomia da imagem na Cidade irreal,
poesta surrealista, afirma André Breton: «É mesmo Sob o nevoeiro castanho de uma madrugada de in-
permitido intitular POEMA o que se obtém pela verno,
associação tão gratuita quanto possível (observe- Uma multidão fluía sobre a Ponte de Londres ...
mos, se assim o quiserem, a sintaxe) de títulos e de
fragmentos de títulos recortados dos jomaisll (2). E esta passagem é enriquecida com a alusão àque-
Thomas Steairns Eliot, que nasceu no ano de les de quem Dante .diz no Inferno:
1888, nos Estados Unidos, e se naturalizou inglês
em 1927, entrou na Universidade de Harvard em si lunga tratta
1906. Byron, Shelley, Keats, Rossetti e Swinburne di gente, ch'io non avrei mai creduto
eram já seus conhecidos da adolescência. Em Har- che morte tanta n'avesse disfatta.
vard estudou Dante e Donne, que viriam a ter
grande importância na sua obra. Porém, para a A sombra de Dante, cuja poesia T. S. Eliot con-
aprendizagem de poeta, que iniciou em 1908, con- sidera a sua «mais persistente e profunda influên-
tribuiu especialmente a França. cia» ( 6 ), paira em toda a obra eliotiana, desde a
Jules Laiforgue foi o primeiro que o «ensinou a epígrafe de The Love Song of J. Alfred Prufrock,
folar» ( 3 ), isto é, a descobrir as potencialidades o primeiro dos Collected Poems, 'ª Little Gidding,
poétioas da sua própria língua. Com Baudelaire, o último dos Four Quartets. É que, para Eliot, «A
a fundir «o sordidamente realista e o DiDina tudo o que o homem é
fantasmagórico» ( 4 ), utilizando como pano de fundo capaz de experimentar como emoção, desde o de-
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sespero da depravação à visão beatífica. Recorda, Apenas pela forma, pelo molde,
portanto, consta:ntemente ao poeta a obrigação de Podem as palavras ou a música alcançar
explorar, de encontrar palavras para o inarticu- O repouso, tal como uma jarra chinesa ainda
lado, de capturar aqueles sentimentos que as pes- Se move perpetuamente no seu repouso ( 8 ).
soas mal podem até sentir, porque não têm pala-
vras para eles; e, ao mesmo tempo, recorda que Passando ao simbolismo de The Waste Land, em
o explorador para além das fronteiras da cons- parte extraído do livro de Jessie L. Weston, From
ciência comum só poderá regressar e contar o que Ritual to Romance, que analisa as diferentes ver-
viu aos seus semelhantes, se tiver sempre uma sões da lenda do Graal, lembraremos que a este-
completa percepção das realidades que eles já co- rfüdade da terra se deve à perda de vitali!dade do
nhecem» (7). Rei Pescador (por doença, feridas ou idade avan-
Depois da P·rimeira Guerra Mundtal, a Europa çada), cuja cura e o consequente regresso da ferti-
oferecia aos olhos do «filho do homem» apenas lidade do solo dependem de um Caivaleiro, que
«um monte de imagens quebradas». The Waste «libertará as águas». O nome do Rei parece ter a
Land transmite-nos a visão desse mundo fragmen- sua origem no facto de o peixe ser um símbolo de
tado, lendo-se no fim do poema, ao longo do qual vida e de o título de Pesca:dor se encontrar fre-
T. S. Eliot intercala citações de algumas grandes quentemente ligaido a divindades com ela relacio-
obras das civilizações ocidental e oriental: nadas.
O emprego de alguns importaintes símbolos de
From Ritual to Romance é bem evidente no poe-
Com estes fragmentos escorei as minhas ruínas.
ma: a viagem, a capela (a Capela Perigosa, onde
os cavaleiros do Graal tinham de ,lutar contra for-
Espectadores permanentes do esplendor do pas- ças demoníacas), o Ta:wt. Este baralho - elucida
sado e da desintegmção do presente, os olhos ce- Jessie L. Weston - possui ,setenta e oito cartas,
gos de Tirésias, que pulsa «entre duas vidas». das quais vinte e duas são designadas como as
O ritmo de The Waste Land, ·a sua subtil orques- «Chaves», e está dividido em quatro naipes, cor-
tração e o valor encantatório de determinadas pas- respondentes aos das cartas normais. Caído hoje
sagens permitem a comparação da obra com uma em descrédito, por ser principalmente utilizado na
peça de música, designadamente com uma sinfo- adivinhação, o seu uso original, contudo, «parece
nia. E os Four Quartets virão continuar, desenvol- ter sido não para profetizar o Futuro em geral,
vendo-a, a técnica musical já tão evidente neste mas para p11edizer a subida e .a descida das águas
poema de 1922: que traziam fertilidade à terra.»
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Se T. S. Eliot afirma a sua dívida para com o a dever a Virginia Woolf e seu marido, Leonard.
fascinante tr.abalho de antropologia de Prazer, The A versão portuguesa foi publicada em 1972, exac-
Golden Bough, também a autora de From Ritual tamente meio século depois do do
to Romance declara, no prefácio do livro, dever a poema.
Frazer a inspiração que a lançou na estrada para Se, em The Waste Land, a esterilidl:lde do
? ~astelo do Graal. Encontram-se, por conseguinte, por reacção sirnpatética, se transmite à
mt1mamente relacionadas estas duas obras de que parece ter tornado as vidas inúteis,
Eliot se serviu para delineação do simbolismo de afastadas do ritmo normal da natureza. Revelador
The W as te Land. de uma união tão ár}da quanto 'ª terra devastada
Ao dedicar o poema a Ezra Pound, chamando-lhe é o diálogo entre a senhora neurótica, no rico bou-
il miglior fabbro, T. S. Eliot quis demonstrar-lhe o doír, e o seu impassível interlocutor:
seu agradecimento pelas alterações sugeridas no
manuscrito original e que o levaram a publicar a «Os meus nervos estão mal esta noite. Sim, mal.
Obra na forma em que se encontra no presente Fica ao pé de mim.
volume. Durante muitos anos esse manuscrito «Fala comigo. Porque é que nunca falas? Fala.
oferecido por Eliot ao mecenas John Quinn, e~ «Em que estás a pensar? Em que pensas?
1922, foi considerndo perdtdo, até que em 1968 a Em quê?
Biblioteca Pública de Nova Iorque anunciou que «Nunca sei no que estás a pensar. Pensa.»
ele se encontr,ava em seu poder, integrado na Co-
lecção Berg. E, em 1971, V,alerie Eliot, viúva do Penso que estamos na viela dos ratos
Poeta, falecido em 1965, publicou o famoso docu- Onde os mortos perderam os seus ossos.
mento ( 9 ), possibilitando assim a compamção do
texto primitivo com o que veio a lume nos anos Logo a seg;uk, em contraponto, a conversa em
vinte, mais precisamente, em Outubro de 1922, em cockney, no pub, em que Lil, envelhecida aos trinta
Londres, na revista The Criterion, editada pelo e um anos:
próprio T. S. Eliot. Em Novembro, The Dial, re-
vista amertoana, também insere o poema, que, em Foram os comprimidos que tomei para o desman-
ambos os casos, aparece sem notas. No mês de cho, disse ela.
Dezembro é publicada em Nova Io11que, por Boni (Ela já teve cinco e quase morreu quando nasceu
and Liveright, a primeira edição, contendo já as o Jorginho.)
notas do autor. E ,só em Setembro de 1923 sai fi- O farmacêutico disse que não fazia mas
nalmente a primeirra edição inglesa, que se ficou voltei a ser a mesma,
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-
-se. A confirmá-1o, os ewertos Tristão _e Is~lda,
é e:x:ortada a pensar no pobre Alberto, que
um dos quais precede e o outro segue imediata-
Esteve na tropa quatro anos, quer divertir-se, mente 0 refeddo flashback:
E se não for contigo, será com outras, disse eu.
Frisch weht der Wínd
Der H eimat zu
de amor e desencantada sexuaUdade Mein Irisch Kind,
encontramos também no «romance» entre a dacti- wo weilest du?
lógrafa e o jovem carbunculoso: «Deste-me jacintos pela pdmeira vez há um ano;
«Chamavam-me a rapariga dos jacintos.» .
- Porém, quando voltámos, tarde, do Jardim dos ~acmt~~~
Ela volta-se e olha-se um momento ao espelho, Os teus braços cheios e o cabelo molh~do, eu nao po
Mal se dando conta do desaparecido amante; Falar e os meus olhos velaram-se, eu nao estava
O seu cérebro consente um pensamento semi-for- Vivo 'nem morto, e não sabia na~~' .
mado: Espreitava o coração da luz, o sllenc10.
«Ora, já está: e ainda bem que acabou.» Oed' und leer das Meer.
Madame Sosostris, que, ao servir-se do Tarot, o O sinistro iaviso de Madame Sosostris ( «Acau-
despoja da dignidade do seu primitivo uso («Se tele-se com a morte na água») dá lugar ao quarto
vir a querida Senhora Equitone, /Diga-lhe que eu andamento, de carácter elegíaco, sobre Phlebas, o
própria 1evo o horóscopo»); o Senhor Eugenides, Fenício, que:
o me11caJdor de Esmirna, com o seu duvidoso con-
vite ao narrador «para almoçar no Cannon Street . . . há quinze dias morto,
Hotel/ E passar o fim-de-semana no Metrópole»; Esqueceu o grito das gaivotas, a ressaca,
as Filhas do Tamisa (note-se a alusão às Filhas os ganhos e as perdas.
do Reno, do Crepúsculo dos Deuses), agora três
prostitutas (versos 292 a 306), eis outros exemplos Eliot move-se muitas veres em ma~s ~o que um
da degradação e da morte-vida em The Waste nível de significação, para iisso contnbumdo ~uso
Land. e faz da alusão e do contraste. Assim, depo~s da
Existe, todavia, uma passagem onde perpassam ~~nversa no pub, e depois de feitas as despedidas:
'IAlltos mais misteriosos, envoltos numa intensa e
intangível c1aridade: as personagens do flashback
B'noite Bill. B'noite Lou. B'noite May. B'noite.
no Jardim dos Jacintos, símbolos do amor abso-
luto e, como tal, perdido ou condenado a perder- Tá-tá. B'noite. B'noite,
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resulta infinitamente pungente e sugestiva a ime- Abril é o mais cruel dos meses, gerando
diata justaposição do verso que recorda a loucura Lilases na terra morta, misturando
de 'V'kvLA<h,
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