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Adolescência - Um fenômeno contraditório
Arnaldo Chagas
Problematizando o conceito
Atualmente se fala muito em adolescência, em crise adolescente. As tentativas de
lançar luz sobre o fenômeno trazem consigo uma infinidade de questões, atuais e
complexas, que envolvem, sobretudo, os jovens de nossa sociedade. É comum
relacionarmos adolescência com drogas, sexo, educação, problemas de imposição
de limites, violência, delinqüência, etc. Mas afinal! O que significa adolescência? É
possível uma determinação consensual a respeito desse conceito? Podemos
pensar a adolescência hoje como pensávamos tempos atrás?
O fato é que a preocupação com os filhos jovens, embora diferentes das de hoje, é
milenar, portanto, a adolescência, vista nesta perspectiva, não pode ser
considerada como um fenômeno exclusivamente moderno ou pós-moderno.
Outrora, a adolescência, embora não sendo apresentada enquanto processo de
mudança ou fase que a determinasse, alguns comportamentos eram
marcadamente e, até certo ponto, determinantes dos homens jovens. A crise na
adolescência como a entendemos hoje, naquele período, não era referenciada.
Voltando ao nosso tempo, uma primeira ressalva: claro está que as características
físicas e biológicas devem ser consideradas enquanto “marcas” de transição entre
a vida infantil e a adulta, o que não significa dizer que a determinação da fase
adolescente seja definitivamente e exclusivamente reconhecida por intermédio da
idade e pelas alterações orgânicas. Para se pensar em adolescência, é preciso
considerar, de modo especial, os aspectos psicológicos, fatores sócio-culturais,
cognitivos, etc. Outrossim, é preciso pensar no contexto, ou seja, refletir sobre o
mundo - o cenário - em que o jovem está inserido.
Adolescência e crise
O psicanalista francês Charles Melman (1996) nos lembra que a noção de crise
associada a esse período de transição se encontra essencialmente em nossa
cultura. Ele afirma que “não há nenhum sinal dela, enquanto crise psíquica, nos
textos das culturas gregas e latinas, onde seria um simples período de introdução a
vida social”. A crise psíquica - na adolescência - como um processo de transição
entre um mundo (infantil) e outro (adulto), pode ser assinalada como um fenômeno
característico das sociedades pós-industriais capitalistas. Nelas, não encontramos
ritos de passagem responsáveis pela demarcação de uma fase e outra. A ausência
de cerimônias reguladoras, verificadas em sociedades menos evoluídas do que a
nossa, certamente, favorece a crise psíquica que conhecemos na fase
adolescente.
Em última análise, num País como o nosso, em que muitas crianças ingressam
demasiadamente cedo no mundo do trabalho, essa questão merece ser
considerada. As referidas crianças das quais estou falando, diz respeito a uma
grande parcela de crianças brasileiras que vivem em condições precárias, miséria,
são elas, muitas vezes, que auxiliam na sobrevivência de suas famílias, são
pequenos trabalhadores braçais. Por todas as implicações, efeitos e
conseqüências que esta situação suscita, essas crianças não sofrem crise
psíquica, característica da adolescência. Portanto, levando em conta as questões
acima referidas, questiona-se: no mundo em que vivem essas crianças, existe
adolescência? Existe fase característica que determina a passagem do mundo
infantil para o mundo adulto? De qual adolescência a maioria das teorias tratam?
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Arnaldo Chagas - Psicólogo, mestre em Psicologia Social e Institucional- Ufrgs.
Coordenador do GERTA: Grupo de Estudo e Reflexão sobre Toxicomanias e Adolescência
(Ufsm). Prof. da Ulbra/SM e Uri/RS
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