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Homenagem

A todos os jangadeiros brasileiros, que enfrentam o mar em suas rústicas


embarcações.
A memória de Eric Hiscock, Bernard Moitessier , Éric Tabarly, Geraldo
Tollens Link e Sérgio Mirski.
A Aleixo Belov, maior velejador brasileiro de cruzeiro
A Robert Scheidt, maior velejador brasileiro de regatas.
A todos que dignificam o esporte da vela.

Rio de Janeiro, 04 de
Janeiro de 2001.
Dedicatória

À minha querida esposa Leda Ceres, a cujo amor, dedicação e paciência,


devo não estar até hoje molhando os pés numa jangada.

O Autor e esposa no
Annapolis Boat Show
(1988)
O Autor
Licio Maciel

Nasceu em Maceió, Alagoas, em


1930. Estudou em Recife e Rio
de Janeiro, onde se formou em
engenharia. Em sua infância e
juventude, sempre morou na
praia (Pajuçara e Olinda) e ve-
leja desde os 14 anos de idade.
Navega assiduamente em seu
veleiro “Krum II”, de cruzeiro,
projeto Bruce Roberts, de 27 pés de comprimento, em fibra de vidro (san-
duíche de Airex e de Belcobalsa).
Possuindo barco no Rio de Janeiro desde 1955, sempre buscou a
simplificação da vida a bordo em proveito do objetivo principal: velejar.
Em paralelo com as inúmeras atividades que exerceu ao longo de todos
esses anos (foi bancário; militar; engenheiro; professor; gerente indus-
trial; consultor de informática, sistemas de segurança e telecomunica-
ções), tendo inclusive a oportunidade de trabalhar em outros países, sem-
pre dedicou suas horas de folga ao esporte da vela.
Já navegou por quase todo o nosso litoral e ilhas oceânicas, parte do
litoral E dos EUA, golfo do México e golfo de Benguela. Realiza freqüentes
cruzeiros aos Abrolhos, Fernando de Noronha e litoral do NE, como tam-
bém entre Bertioga e Vitória do Espírito Santo, em particular às regiões
de Búzios, Cabo Frio, Arraial do Cabo, Ilha Grande e Angra dos Reis.
É autor de vários “livros digitais” sobre o esporte da vela, uma for-
ma que encontrou para difundir o esporte e, principalmente, demonstrar
com um exemplo concreto que velejar não é esporte exclusivo de rico:
• Ao Longo da Grande Barreira de Corais Brasileira (1996 – esgotado)
• Roteiro Costa Leste - de Bertioga a Noronha – incluindo Abrolhos, Rocas
e Noronha
• Navegação Programada - Sextante - GPS – Computador (com CD-Rom
encartado)
• Velejando Melhor - Teoria e Técnica de Vela
• Algoritmos (em elaboração). Apresentação
Os livros acima foram reunidos em um CD-Rom.

Lagoa Azul, Ilha


Grande, RJ

Mestre Rosalino,
pescador Beto

O Avoante nas águas cristalinas de Noronha

Este relato não segue o clássico diário de bordo, nem é um livro


técnico.
Mas o assunto é pura e simplesmente barco. Ele mostra a progres-
são e a lógica de preparação da “grande viagem” num veleiro, desde o pla-
nejamento e a construção do barco, passando por comentários de cruzei-

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ros, até a programação da navegação como uma das atividades normais certo, para mostrar o que realmente interessa.
do velejador. Aí entra em cogitação toda uma sucessão de assuntos necessários
A escolha do barco, suas características essenciais, as atividades que a lógica indica, começando pela escolha e preparação do barco, pelo
normais do velejador em ação, além de grande número de comentários sentido de orientação, navegação, logística, filosofia de vida, desde uma
sobre situações diversas no mar, demonstrando a simplicidade dos con- maneira simples de viver, trabalhando efetivamente no barco nas horas
ceitos básicos, para melhor compreensão e melhor domínio do barco. de folga, em todos os setores, velejando e praticando a técnica de vela,
Foi escrito e organizado nos intervalos entre cruzeiros de longa du- observando o tempo com olhos de meteorologista, identificando o céu,
ração, geralmente em períodos de manutenção do barco, ou aproveitando praticando e vivendo de forma simples, sadia e ativa.
dias de chuva; sempre em atividade, sempre com barco. Assim, o barco se transformará num ente fantástico, cheio de vida,
Procura ressaltar que não é suficiente o mero desejo de realizar a com suas manhas e características que devem ser bem conhecidas. É o
viagem, adquirir um veleiro e zarpar, após dotar o barco do que julgar nosso elo de ligação com o mar, origem da vida no planeta... é o barco
necessário: há uma longa jornada a pautar... e é justamente este caminho ideal.
que é ressaltado ao longo do livro. No final, é sugerido um currículo de curso, referente às partes mais
O leitor vai descobrindo o cabedal de coisas importantes que terá importantes para o velejador: navegação, vela e meteorologia. E a prática
de assimilar, além de tomar conhecimento da existência de locais mara- no barco será realizada mais conscientemente, com muito melhores re-
vilhosos bem ao alcance de uma velejada, ao longo do nosso vasto litoral. sultados. Desse modo, a progressão será muito mais rápida.
O barco ideal é aquele que a gente acredita que é: alia tudo o que A maioria das respostas do questionário “Tópicos Importantes”
desejamos ao que realmente podemos; é o barco no qual velejamos com está contida ao longo do livro e as perguntas servem para incentivar o
total confiança e completa satisfação, como hipnotizados pela beleza de leitor a repetir a leitura, a pesquisar, o que só lhe trará benefícios.
tudo que nos cerca..
É descobrindo a nossa “grande barreira de corais”, as ilhas, os abri-
gos fantásticos do nosso litoral, suas vilas de pescadores, os locais de
mergulho, que o livro vai despertando o interesse, incentivando, de forma
concisa e direta.
O sistema global de posicionamento vem propiciando um sempre
crescente número de barcos a se lançarem a grandes travessias, pela fa-
cilidade e rapidez da determinação da posição. A cada dia aumenta rapi-
damente a quantidade dos que o adotam, inclusive em cruzeiros relativa-
mente curtos e até mesmo em passeios de fim de semana.
Mas o bom senso indica que ele apenas, sozinho, não é suficiente
para um sistema consistente de navegação.
Além do equipamento obrigatório, alguns poucos instrumentos
colocarão o barco em condições de zarpar. O comandante e a tripulação
deverão estar na mesma situação. Cada um deve procurar responder in-
timamente esta questão. E a leitura deste pequeno resumo servirá, por Saída do porto da Aracruz Celulose (Barra do Riacho), rumo ao largo, para os Abrolhos

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Embora possa parecer, numa primeira vista, um livro para veleja- alguns artigos de revistas, algumas poucas traduções, muito pouco o que
dores iniciados, na realidade ele engloba desde os rudimentos até a parte ler sobre náutica.
avançada necessária ao mínimo desejável de conhecimentos. Principalmente da parte técnica...
Ninguém aprende sem dedicação e sem uma abordagem teórico-
prática adequada.
Por isso, é bem mais fácil formar a tripulação incluindo um bom na-
vegador, alguns experientes velejadores, uma equipe de timoneiros com
qualidades extras (mecânico, eletricista, rádio-operador, etc.) e um bom
cozinheiro.
Mas, aí, o barco deverá ser um quarenta pés, no mínimo. E é isso o
que é mais comum: barco não muito grande, com uma tripulação grande...
Em qualquer situação, porém, o comandante deverá estar em con-
dições de levar sozinho o barco ao destino. Este é o ponto principal, o
objetivo a atingir do esporte da vela de cruzeiro.
Em todo iate clube, é comum existir uma pequena turma que real-
mente sabe velejar; é ela que ganha as regatas e, portanto, eleva o nome
do clube, recebendo o devido reconhecimento através algumas pequenas
e merecidas regalias, como título de sócio atleta, etc.
Naturalmente, como parte da estratégia para manterem estas rega-
lias, eles procuram guardar determinados “segredos” da atividade a sete Com a família, em Angra dos Reis

chaves, principalmente aqueles que podem decidir o vencedor da regata.


São, assim, grupos fechados, frontalmente contrários à difusão normal
dos ensinamentos avançados para uma boa prática de vela.
E é bastante compreensível este procedimento.
Além destes, geralmente jovens, iniciantes ou veteranos, existe o
grupo dos antigos e experientes velejadores, que transmitem seus conhe-
cimentos quando solicitado, muitas vezes publicando artigos em revistas
náuticas, em palestras ou em simples conversa no clube. No entanto, só
eles sabem realmente como aprenderam, quanto tempo perderam, por
falta de uma fonte de referência, etc.
Conversando com outros velejadores e apanhando em treinamen-
tos improdutivos até chegar a alguma conclusão? Ao longo de vários anos
de regatas? Em algum curso? Em algum livro? Sem dúvida, mas os livros
de que se utilizaram eram estrangeiros, porque os existentes aqui são em
número irrisório, quase inexistentes. Além de alguns diários de bordo,

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Roteiro Costa Leste

Acredito mesmo que em solitário, em determinados trajetos, em


condições fantásticas de vento e de mar, ficamos hipnotizados por tudo
o que nos cerca.
As melhores praias, os melhores lugares que o progresso ainda não
conseguiu destruir, os mais belos passeios, estão em locais de difícil aces-
so, em ilhas distantes, protegidas naturalmente pelo mar. O barco repre-
Prefácio senta, então, a possibilidade de poder alcançá-los, poder usufruir toda a
sua pureza e tranqüilidade.
O nosso vasto litoral apresenta locais de grande beleza e que ofere-
cem abrigos seguros, ideais para longos cruzeiros. O extenso trecho entre
Bertioga e Natal, que vamos detalhar, passando pelos melhores abrigos,
corresponde a um exemplo de cruzeiro de grande duração, que deve ser
efetuado por etapas, sem pressa, conhecendo demoradamente todas as
baías, todas as vilas de pescadores e os atrativos de cada área. As nos-
sas ilhas oceânicas, que poucos conhecem, estão praticamente intocadas,
preservadas; são verdadeiros paraísos e merecem uma velejada até lá.
A partir da região dos Abrolhos para N, a costa é acompanhada por
extensa linha de recifes, com abrigos que podem ser alcançados por in-
termédio das “barretas”, aberturas entre eles. É a nossa “grande barreira
de corais”, que pode ser prolongada até o Atol das Rocas e Fernando de
Noronha, sob o aspecto meramente esportivo ou turístico, claro. Aí en-
contraremos uma infinidade de locais excelentes para velejar, mergulhar,
pescar, etc. A nossa grande barreira, ainda não tão grande e majestosa
como a correspondente australiana, se constitui numa atração semelhan-
te, com uma pujança de vida marinha comparável. Ela é bem mais jovem,
estimando-se o seu início em menos de dez mil anos.
Nela existe uma quantidade enorme de recifes de corais, com águas
No Mestre Rosalino, na Urca (Gb)
cristalinas, mornas e será necessário um largo período de tempo para
conhecê-la pelo menos em seus melhores e mais atraentes aspectos.
Realizar um longo percurso num veleiro, uma travessia de oceano ou
Em frente à Nova Viçosa, litoral Sul da Bahia, vamos encontrar gran-
mesmo uma volta ao mundo, é o sonho de todo velejador, o coroamento de
des formações de recifes de corais, como a Coroa Vermelha e o recife de
uma vida de dedicação ao esporte.
Viçosa. Trinta milhas mais para E, mar adentro, estão os extensos parcéis
O prazer de velejar livremente em contato íntimo com a natureza, em
e o arquipélago dos Abrolhos, de águas mornas, cristalinas e que será mo-
vários dias vendo apenas céu e mar, com o barco adernado, bem ajustado,
tivo de muitas outras referências ao longo do livro.
cortando as ondas num marulhar fantástico, é uma experiência inesquecível.
Em frente à ponta da Baleia, desenvolvem-se os recifes das Paredes,

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o das Areias, o Aranguera, o Timbebas e o de Guaratibas, em frente a Al- A baía de Tamandaré, rodeada de recifes, já no litoral pernambuca-
cobaça. no, um enorme viveiro de peixes...
Continuando para N, vamos encontrar os parcéis de Itacolomís, Pa- Recife, um lugar excepcionalmente bom para o esporte náutico:
tachos, Cumuruxatiba, o das Sororocas, o da Coroa Alta, Coroa Vermelha abrigo seguro, com três iate-clubes para o apoio do barco, clima ameno,
já em frente a Porto Seguro e Baía Cabrália. É uma área imensa com uma sem grande poluição, águas mornas, lugares ótimos bem próximos, Noro-
infinidade de pedras espalhadas por um mar de águas mornas e transpa- nha e Rocas bem ali a uma velejada de dois a três dias, etc.
rentes, em sua maior parte. Prosseguindo, o canal de Olinda, mais de quinze milhas de velejada
até a ilha de Itamaracá por águas abrigadas, com duas linhas de recifes
paralelas à praia, amortecendo a força do mar (mas é preciso conhecer
Porto Seguro, baía Cabrália, seus inúmeros recifes. bem este canal para velejá-lo com barco de bolina; quem não conhece
deve ir por fora, longe das pedras). Chega-se a Ilha de Itamaracá, que pode
Ilhéus, agora com um iate-clube. ser demandada pelo canal de Santa Cruz ou pela barreta de Catuama,
abertura entre os recifes, dando acesso ao pequeno porto de Itapessoca,
ainda litoral de Pernambuco.
A região de Camamu, com manguezais imensos, áreas de recifes de Os extensos recifes de Ponta de Pedras, Cabo Branco e Ponta Seixas,
corais, suas vilas de pescadores em cada ilha, região ainda sem grande uma área espetacular para o mergulho, com destaque para as pedras Ga-
nível de poluição. lés (as verdadeiras), em frente à praia de Carne de Vaca, quase no limite
Até Morro de São Paulo e ilha de Itaparica, vamos encontrar sempre entre Pernambuco e Paraíba, ainda em águas pernambucanas.
extensos cordões de recifes paralelos à praia. A entrada do rio Potengí, acesso ao Porto de Natal, capital do Rio
Salvador, baía de Todos os Santos, uma região fora de serie para Grande do Norte, entre os recifes. Já no rio, antes do Porto, vamos en-
ser velejada. A permanência lá é sempre grande; não se sente vontade de contrar o Iate Clube. O canal de São Roque, entre os recifes, até o cabo
prosseguir. Calcanhar.
De Salvador para o Norte, após uma interrupção até o início do lito- O Atol das Rocas e o Arquipélago de Fernando de Noronha, para
ral alagoano, vamos reencontrar as linhas de recifes; o Tacis, os recifes da finalizar...
barra de São Miguel (Gunga), os do Porto Francês. As enormes formações Quanto tempo poderemos destinar a esta enorme área? E ela está
de corais de Ponta Verde, incluindo os recifes de Pajuçara, já tão famosos aí mesmo, bem ao nosso alcance, um verdadeiro paraíso, difícil de encon-
entre os turistas que vão lá de jangada alugada na praia. trar em outros países; impossível, nas mesmas condições, uma vez que
O litoral NE é uma região de praias sem fim, praias de areias bran- estamos em nosso próprio país. Lá, somos apenas fornecedores de dóla-
cas acompanhadas por coqueirais em toda a sua extensão, onde o vento res...
sopra constantemente. Ela é, sem dúvida, uma das regiões mais interes- Viver perto do mar e não ter barco é pior que morar em cidade
santes do nosso litoral. Difícil achar semelhantes no exterior... grande e não ter carro.
No meio desse verdadeiro paraíso, vamos encontrar as cidades de Sem barco não podemos fazer quase nada, a não ser ficar na praia, o
Maceió e Recife, cujos nomes já dizem tudo... que é até bom, de certo modo, mas com o continuar vai ficando monótono.
As pedras Galés, em frente a Maragogí; os recifes de São Bento, Mar- Cumpre lembrar que barco é qualquer meio flutuante, desde uma
ceneiro, todos oferecendo bons abrigos. simples jangada até ao mais sofisticado iate.

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Licio Maciel

Preparação

Velejando com o amigo Newton Carvalho, o “Paiol”: dois jovens de 70 anos em plena forma (2001)

Descansando nos Abrolhos

Para realizar um longo cruzeiro, uma longa travessia num veleiro,


é necessário preparar um bom barco; poder manobrá-lo e mantê-lo com
a mais ampla auto-suficiência possível; poder efetuar uma navegação se-

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gura, bem planejada, precisa, cômoda e tranqüila, além de mais algumas Um dos problemas mais incômodos no barco é o enjôo; a forma fí-
características desejáveis (como por exemplo; boa forma física e saúde, sica e algumas regras simples facilitam a adaptação ao balanço do barco.
equilíbrio emocional, força de vontade, boa dose de rusticidade e de au- Quando estou destreinado, enjôo no começo dos cruzeiros, mas em pou-
dácia, desprendimento, paciência, espírito de aventura, inspiração, filo- cos dias estou acostumado.
sofia de vida adequada, gosto pelas coisas do mar e independência dos Entre os longos cruzeiros, quando estou velejando seguidamente
problemas de terra). nos fins de semana, ao iniciar o cruzeiro, já estou livre da readaptação.
Sobre cada um destes itens, poderíamos tecer muitos comentários, E isto acontece com a maioria dos cruzeirista, mesmo os mais fa-
mas vejamos apenas alguns, considerados de maior importância. mosos, como podemos ler em seus relatos. Não se deve desistir por causa
Preparar um bom barco pode significar um longo período, um ano deste problema.
ou dois de muita dedicação, desde a escolha do projeto até o lançamento Conheci poucas pessoas que não enjoam normalmente; mas é mui-
do barco n´água; um pouco mais, um pouco menos, não muito. to raro; cada um tem o seu limite, inicialmente, antes de acostumar. O
Também no caso de opção pela compra do barco, devemos efetuar comum é enjoar, pois é uma reação do organismo a uma condição diversa
antes um planejamento detalhado do que realmente é desejado. da que normalmente estamos habituados.
Poder manobrá-lo bem depende de muito empenho, muita prática, Certa vez conheci um operário de uma firma que construía no clube
muito treinamento, muitas horas velejando. E, naturalmente, tudo feito e que me viu no barco no píer; pelas perguntas ele revelava conhecer bem
com muita satisfação e alegria. o mar, o assunto barco, inclusive sobre o problema do enjôo; respondi-lhe
Velejar não é um mero passatempo, um simples esporte; é uma ati- exatamente tudo isto, acrescentando os procedimentos e remédios cada
vidade mental, envolvente, que exige muita dedicação, muita perseveran- vez melhores que iam surgindo. E ele me contou sua própria experiência:
ça. tendo perdido o emprego, foi levado a aceitar vaga no barco de pesca de
A auto-suficiência é uma questão de tempo, de experiência e de um tio; enjoava demais e não foi desembarcado porque era o barco do tio.
bom senso. A manutenção de um barco é trabalhosa, contínua. Temos de Sofreu o diabo, por força da necessidade, durante trinta dias seguidos no
poder executá-la pessoalmente, talvez até sem ajuda . Desde a parte elé- mar, mas terminou por acostumar e nunca mais teve problema. É claro
trica, a parte hidráulica, passando pela mecânica do motor, até à pintura. que este é um caso difícil de encontrar, uma exceção. O normal é acostu-
A navegação é de fundamental importância: uma navegação confiá- mar em bem menos tempo.
vel, bem planejada, com os detalhes que realmente melhoram a precisão Ele resolveu desembarcar após vários anos na profissão, por achar
sem complicações, a rapidez da determinação da posição com desemba- a vida no mar muito dura, sem perspectiva, sem férias nem folgas, sem o
raço, o que requer uma boa preparação para a operação dos instrumen- amparo de leis normais em vigor para outras categorias, etc.
tos, naturalmente muitas horas “queimando as pestanas” e que por isso é Conheci muitos candidatos a cruzeirista, bons velejadores, que
evitado por muitos. Aí entra o computador para descomplicar e auxiliar. desistiram dos longos cruzeiros, porque não quiseram sofrer na fase de
Boas forma física e saúde, correspondem a manter sempre hábi- adaptação. Hoje, estou propenso a acreditar que o melhor procedimento
tos saudáveis, atividade esportiva contínua, sem vícios, adotando uma é acostumar, sem tomar remédio, ou deixá-lo para os momentos de mui-
alimentação correta, racional. Ninguém alimenta atletas apenas com ar- to mar; mas isto fica a critério de cada um: se o sofrimento for grande,
roz (ou com alpiste, como diria o meu amigo Maya Pedrosa). Não adianta amenizar com algum remédio. Na realidade, o homem moderno tem que
ir saudável para um longo cruzeiro, relegar a alimentação a um regime sofrer uma real readaptação aos costumes naturais que abandonou, para
quebra-galho e adoecer. poder enfrentar a vida num pequeno veleiro, como veremos ao longo das

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páginas do livro. Mas, o inimigo número um é a bebida, seguida pelo ci- com vistas à adaptação à nova rotina, com a atenção redobrada, noites
garro; o organismo não é chaminé e impregnado de álcool está no limiar dormidas aos curtos períodos, com a alimentação alterada e o organismo
da resistência, prestes a se transformar em múmia... submetido a novas tensões e esforços.
Equilíbrio emocional, cultivado através métodos apropriados, já Isto é ainda mais importante para o solitário.
amplamente aperfeiçoados na psicologia esportiva (controle mental). O E o que limita tudo é a disponibilidade de tempo para velejar, temos
velejador é um atleta e deve estar preparado para o embate em pleno mar, de reconhecer.
para o que der e vier. Em conseqüência, deverá haver um planejamento a longo prazo,
Filosofia de vida adequada, eis o grande problema... Aí reside a razão muitas vezes um planejamento de uma vida, determinando-se os obje-
da grande maioria não conseguir realizar “a grande viagem”... E também a tivos racionalmente, inclusive na escolha da profissão. Mas aí teríamos
explicação da maioria das desistências, frustrações, etc. O cruzeirista tem panos pras mangas...
que adotar novos conceitos, nova forma de encarar a vida. Para muitos, Por que velejar em solitário, se tudo parece ficar mais difícil? Mui-
fica difícil renunciar às comodidades ou convenções da civilização, já que tas razões existem.
no barco a vida é forçosamente diferente. Mas todas as nossas realiza- Um barco bem preparado, bem equipado, é fácil de ser manobrado
ções, todas as nossas atividades, são frutos de uma filosofia de vida. por uma só pessoa. Velejar em solitário resulta numa grande satisfação,
Ninguém fará uma longa travessia num veleiro, desfrutando de sentindo-se a sensação de completa liberdade, não havendo interferência
todo o seu conteúdo, se não estiver convenientemente preparado física e da presença de ninguém.
psicologicamente. A dificuldade em conciliar as épocas disponíveis dos outros tripu-
Um cruzeiro à vela não é uma viagem, com hora de saída e hora lantes, etc., faz com que as velejadas em solitário fiquem cada vez mais
de chegada, com tudo certinho no decorrer dos dias; a gente sai quando freqüentes e daí ao “vício” é um pulo.
entra o vento e a chegada não tem dia nem hora marcada, depende do Mas o solitário jamais estará sozinho em seu mundo, com o seu bar-
vento. Entre a saída e a chegada, muita curtição, o mar, o barco cortando a co, com tudo que o cerca...
água, fazendo bigode, a navegação, com a progressão da posição na carta, O barco fica mais livre, mais leve, menos confuso. Mas, temos que
os peixes, a pescaria, as aves, o tempo, etc. A imensa satisfação de estar reconhecer, há desvantagens.
fazendo parte de uma natureza limpa. Isto é difícil de ser assimilado pelo O solitário deverá permanecer sempre de quarto, o que equivale
civilizado quase sempre apressadinho, ansioso, fanático pelo conforto e praticamente a não dormir; na realidade do dia a dia, ele dorme por perí-
por outras coisas irrelevantes ... odos curtos o dia inteiro... e está sempre cansado, ou melhor, nunca está
Quando não há nada urgente para fazer, como reforçar ou remen- descansado. Não há ninguém para ajudá-lo; ele tem de fazer tudo.
dar uma vela, verificar um vazamento ou uma goteira impertinente, fixar É por isso que em solitário temos que adotar procedimentos es-
alguma coisa que está incomodando, balangando, fazendo barulho, deve- peciais, que não são adotados normalmente com tripulação. Muitos des-
mos relaxar, meditar, pensar em novos planos, novos cruzeiros, etc. tes procedimentos podem parecer desvantajosos, como navegar sempre
Assim a chegada é encarada como uma desvantagem: temos que muito distante da costa, evitando a proximidade dos perigos do litoral e
recolher as linhas de pesca, recolher as velas, encarar os problemas de as rotas dos navios, o que aumenta muito as distâncias; marear as velas
reabastecimento, etc., embora a expectativa do novo porto seja sempre para uma velejada mais cômoda em certas circunstâncias, o que resulta
grande, novas amizades, novas surpresas. em menor rendimento, etc.
Para os cruzeiros realmente longos, devemos começar devagar, O objetivo do solitário é velejar em segurança e no final do percurso

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estar no destino pretendido, sem se importar com o tempo. Em 1955 foi fundada em Washington (Estado) a Slocum Society,
Nos ancoradouros, não podemos deixar algum tripulante tomando que publica uma revista quadrimestral : “The Spray” e mensalmente re-
conta do barco... mete uma carta a todos os seus membros espalhados pelo mundo inteiro,
A solidão acostuma; pensamos mais intensamente. De acordo com noticiando o movimento de veleiros, dando ênfase aos solitários. Qual-
Slocum, é necessário realizar uma longa velejada por alto mar, por vários quer um pode entrar para sócio, mediante uma quantia irrisória mensal,
dias, para sentir todo o prazer desta experiência. E uma boa parte deste mesmo que nunca tenha efetuado longos percursos pelo mar. Atualmente
prazer está no fato de realizá-la em solitário. ela está com cerca de quatro mil sócios em mais de 30 países. Anualmente
Quando Slocum partiu de Boston, no dia 24 de abril de 1895, para ela concede diplomas e medalhas aos mais destacados velejadores soli-
realizar a primeira volta ao mundo em um veleiro, em solitário, estava tários, de modo que acompanhar as atividades da Slocum Society é se
com 51 anos de idade. manter em dia com os grandes feitos dos cruzeiristas pelo mundo afora.
Em Fairhaven, do lado oposto de New Bedford, à sombra de uma Foi comemorado em 1995, em todo o mundo e principalmente nos
árvore, ele trabalhou firme durante dois anos na reconstrução do Spray, EUA, o centenário do início da circunavegação de Slocum, com o lança-
que lá estava abandonado há muitos anos. mento de um selo alusivo à data.
Depois de pronto, lançou-o n´água na baía de Buzzard, onde per- Em 1977, trabalhando nos EUA, aproveitei um período de férias e
maneceu vários meses apoitado em frente a Fairhaven, morando e tra- num percurso para o Canadá, desviei a rota rodoviária para passar um
balhando no barco, efetuando reparos em navios baleeiros e realizando dia em Fairhaven. Lá, perguntei a várias pessoas, de várias classes sociais,
biscates diversos . Após vários meses pescando e velejando, decidiu fazer inclusive em marinas, mas ninguém sabia ao menos quem era Joshua Slo-
a volta ao mundo e partiu, aproveitando os ventos girantes do hemisfério cum. Em New Bedford, alguns sabiam da existência de um local denomi-
norte, coisa que ele fez durante toda a vida. nado Slocum Corner, mas que constatei nada ter a ver com o nosso herói.
Naquela época, eram alguns poucos que acreditavam que o mundo Além do mais, o local ficava do mesmo lado de New Bedford. Retomei o
era realmente arredondado... Depois da fantástica façanha realizada, em roteiro da viagem um pouco decepcionado, mas satisfeito com a beleza
1902, Slocum tentou virar fazendeiro, como sempre sonhara. Mas a expe- da região.
riência durou pouco tempo, cerca de dois anos. E o Spray era mantido em Slocum navegou a vida inteira, era profissional do mar, comandante
águas tranqüilas. de navio à vela; depois que os veleiros foram substituídos pelos “vapores”,
Em 1905, Slocum partiu novamente com destino ao Caribe, voltan- com seus mastros cortados, reconstruiu o Spray, “presente de um amigo”.
do na primavera seguinte. E empreendeu várias vezes percursos longos, Sua volta ao mundo foi realizada normalmente, como se fosse a coisa mais
mas sempre voltava a Fairhaven. Até que em 14 de novembro de 1909, natural, sem luxos, sem dinheiro, sem praticamente nenhuma ajuda. Foi
aos 65 anos de idade, partiu para nunca mais ser visto. um verdadeiro passeio...
Ele pretendia navegar rio Orinoco acima e atingir o rio Negro para O mar é o último refúgio para as pessoas que pretendem uma mu-
depois prosseguir pelo Amazonas, por onde alcançaria novamente o mar. dança na forma de vida, livres de aglomerações, livres das maiores pres-
Nunca mais se teve notícia dele, nunca foi achado nenhum indício do sões da sociedade. Uma pessoa se lança aos cruzeiros oceânicos sem
Spray. grandes perdas para os outros, talvez alguns poucos favores pedidos. Só a
Cinqüenta anos depois, um jornal de Massachussets publicava um liberdade de sair por aí dono de seu próprio rumo. Ela realiza um sonho
artigo: de muitos, que apenas alguns poucos conseguem concretizar.
“Alguma notícia do Cap. Slocum?” Os oceanos são imensos - se alguém necessita de ajuda, é muito di-

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fícil, quase impossível, atendê-lo na imensidão das águas. Temos notícias em travessias e, quando foi considerada apta, partiu para realizar com
de centenas de pessoas que saíram em cruzeiros longos para se verem li- sucesso um percurso de cerca de seis mil milhas, sozinha.
vres das restrições de liberdade, grandes aglomerações, do ritmo absurdo O que teria ela estudado durante um ano inteiro para se considerar
e artificial de vida. Muitas voltaram com uma muito maior apreciação da apta e demonstrar, com a realização do percurso, que realmente estava?
vida como deve ser encarada. Dizem mesmo, que o indivíduo que conse- Embora nada tendo escrito sobre a façanha, limitando-se às en-
gue realizar uma volta ao mundo num veleiro, retorna mudado, com mui- trevistas dadas aos jornais, podemos avaliar o que teria feito durante o
to mais sensibilidade e tolerância para com os outros; mais observador, treinamento especial durante um ano, com o barco já pronto e já tendo
mais forte, e muito mais paciente. efetuado uma primeira tentativa, imaginando que estivesse senhora da
O mundo e as pequenas coisas que o cercam se tornaram mais im- situação.
portantes que antes. Algumas dessas pessoas nunca mais retornaram à Sem dúvida, ela teve que se habilitar, o que já a obrigaria a uma
forma de vida que levavam antes, mais porque optaram por permanece- grande dedicação para obter a aprovação nos exames oficiais. Depois, vi-
rem errantes pelo mundo do que por acidentes inesperados ou graves. riam as partes prática e a “pós - graduação” com um veterano em traves-
Vejamos um exemplo que foi muito comentado, sendo noticiado na sias, naturalmente com o objetivo de ganhar tempo.
imprensa mundial. E o currículo do curso por certo foi mais ou menos como este:
Em 1984, uma navegadora solitária realizou a travessia de São - manobras
Francisco, EUA, ao Japão, num pequeno veleiro de cerca de 30 pés: Alice - vela: teoria e prática
Otzuji Haeger, uma simples dona de casa, filha de japoneses, casada com - navegação
americano. - meteorologia
Ela e o marido tinham planejado por muitos anos o cruzeiro e esta- - conceitos fundamentais para enfrentar o mau tempo (amuras nos
vam preparando o “Gambari” (obstinação, em japonês); pretendiam, além diversos semicírculos)
da longa velejada e grande aventura, conhecer a terra e a família de seus - parte de conhecimentos gerais, noções de eletricidade, mecânica,
pais. Com a morte repentina do marido num acidente de trânsito, a Sra. primeiros socorros, nutrição, higiene, etc.
Otzuji, com 63 anos de idade, decidiu efetuar o percurso sozinha, já que - leitura (com a indicação de clássicos já consagrados)
seus dois filhos não poderiam dispor de tanto tempo livres das obriga- - parte vaga (cozinha prática, noções de eletricidade, comunicações,
ções na grande cidade. mecânica de motores, etc.).
Ela levaria as cinzas do marido para o Japão. Não se pode fugir de um planejamento bem feito, objetivo e deta-
Enfrentando tempestades, grandes ondas, ventos fortes, o enjôo e lhado para o “curso”; a profundidade de abordagem da matéria será uma
também períodos de calmarias enervantes, vencendo o cansaço, o frio, o função do tempo disponível e da capacidade de aprendizado do candidato
desconforto, a velejadora solitária terminou a travessia num porto japo- à travessia.
nês, setenta e oito dias depois de tê-la iniciado, tendo declarado à chega- Como em todos os setores, podemos dosar o estudo de maneira
da: “rezei muito, pedindo a Deus que me deixasse chegar ao Japão”. enormemente variada.
Mas ela depois revelou que aquela tinha sido a segunda tentativa Para estudar a teoria de vela, você não precisa se aprofundar nos
que fazia para realizar a travessia. Um ano antes, a iniciou, mas retornou a meandros da hidrodinâmica e da aerodinâmica (mecânica dos fluidos);
San Francisco, após dois dias, reconhecendo que não estava devidamente mas precisa compreender os conceitos fundamentais, se quiser ser um
preparada. Iniciou um treinamento durante um ano com um especialista velejador consciente, competente.

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

O barco é equivalente a um vetor; e é impulsionado por outro ve- dia a menos? E assim por diante, conforme a curiosidade do candidato a
tor, o vento real, que age sobre as velas, impulsionando o barco, criando astrônomo.
um outro vetor denominado “vento causado pela velocidade do barco”. A Para impor ao barco uma determinada amura na proa mais conve-
composição do vento real, com o vento causado pela velocidade do bar- niente durante o mau tempo, conhecimentos de meteorologia são neces-
co, resultará no vento aparente, que é o que sentimos quando estamos sários, com a compreensão do mecanismo dos ventos girantes e os desen-
velejando, barco em movimento: é a resultante dos dois vetores. O vento volvimentos de frentes nos dois hemisférios.
aparente criará, junto com o formato do barco (obras vivas), um vetor É claro que tudo isto não pode ser assimilado de supetão... princi-
denominado empuxo, que será decomposto em outros dois vetores: pro- palmente porque a prática é demorada, muitas horas tentando melhorar...
pulsão e adernada. Complicado? Vejamos. Lembrar sempre : prática sem teoria é cegueira e teoria sem prática
O barco, como um todo, reage ao vento criando um sistema de for- é diletantismo...
ças, cuja resultante, denominada força de empuxo, podemos decompor Na realidade, no nosso caso do barco, prática sem teoria é um gran-
segundo os sentidos longitudinal e transversal do barco: força de propul- de risco.
são e força de adernada, respectivamente, como será visto mais adiante. É preciso estudar e praticar, pois, embora você pense que compre-
E assim, sucessivamente, vai sendo desenvolvida a matéria, partindo do endeu, só terá certeza depois de experimentar; na prática a teoria é di-
mais simples. E não há nada difícil, não há nenhum bicho de sete cabeças; ferente... mas não existe prática sem teoria, como veremos ao longo do
é tudo lógico, mas é preciso estudar, ler, raciocinar e, principalmente, pra- texto.
ticar tudo no barco, “enxergando” cada coisa. Assim, ao olhar para as velas A auto-suficiência em navegação fornecerá uma grande confiança
bem mareadas, você na realidade estará vendo muito mais coisas... na condução do barco em qualquer situação, em qualquer mar; com auxí-
Aprender estudando e praticando, para não perder muito tempo, é lio do computador, você obterá facilmente a auto-suficiência e poderá se
a melhor maneira. tornar proficiente, dependendo do empenho com que se dispuser a en-
Se houver algum instrutor, melhor ainda: ganha-se tempo. Determi- carar o assunto. É como numa escalada, lance por lance, etapa por etapa,
nadas coisas a gente demora a atinar a melhor maneira de fazer correta- com a grande vantagem de ter o barco para praticar, o céu para observar,
mente após várias tentativas, achando até graça depois de muito apanhar. além de milhares de outras coisas que normalmente passam despercebi-
Muitos velejadores levam anos para se convencerem disso... das...
Para navegar pelos astros, você não necessita ser cobrão em trigo- No final do livro, é dada uma referência bibliográfica para quem de-
nometria esférica, mas os rudimentos de Astronomia de Posição contri- sejar maior profundidade de abordagem do que foi aqui apresentado de
buirão enormemente para a tranqüilidade da travessia, que será efetuada maneira concisa, resumida.
sem apreensões, sem angústia. Obtem-se, assim, a tão almejada auto-su-
ficiência em navegação. E esses rudimentos correspondem ao reconheci-
mento de alguns ângulos, alguns poucos conceitos e muita prática.
Depois, com a realização de longos cruzeiros, o velejador se tornará
um bom astrônomo- amador e a procura de novas respostas para velhas
dúvidas surgirá naturalmente. Por que o céu é azul? Por que, dentro de
alguns anos, a estrela Vega será estrela polar norte? Por que ao chegar ao
fim da circunavegação, o livro diário de bordo de Pigafeta continha um

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Roteiro Costa Leste

O Barco: de Guanabara de águas cristalinas, quantas saudades...


Desde a mais simples baleeira até ao inesquecível Krum (o primei-
ro), com o qual conheci, juntamente com a família (esposa e três filhos),
quase todas as baías do litoral de São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito San-
to, em períodos memoráveis, em férias ou feriados prolongados, fomos
sempre progredindo no barco à proporção que a família crescia...
Quando chegou a hora de decidir entre construir o barco ou uma
casa de veraneio na praia (para o que já tínhamos adquirido dois terre-
nos, um em Araruama e outro em Cabo Frio), a opção foi natural e por
unanimidade pelo barco.
Uma casa de veraneio traz muitos aborrecimentos, mais que ale-
grias, pois os problemas são multiplicados pelo quadrado da distância...
Na realidade, casas são barcos mal construídos...de acordo com Racundra.
Os esboços iniciais já davam ao Krum II a pinta de um trinta pés; de-
pois de devaneios por vários comprimentos maiores, os cálculos de custo
final resultavam no retorno ao trinta pés. E teria que ser de fibra de vidro,
claro.
Naquela época eu raciocinava com o comprimento de trinta e cinco
pés, no mínimo, uma vez que não via muita vantagem em sair de um 8
metros para um de 9; puro engano.
Manutenção periódica na Marina da Glória. O ajudante é o meu filho mais moço, Fred.
É melhor ter um barco menor velejando do que aquele barcão que
nunca termina... embora isto seja uma coisa lógica, é muito comum a gen-
Quando rebocava meu pequeno veleiro sobre carreta para as mais
te ver obras intermináveis, velejadores que ficam anos inteiros trabalhan-
diversas baías do nosso litoral, entre Bertioga e Vitória do Espírito Santo
do nos barcos, desistindo e optando por vendê-los, desiludidos.
(1956 – 1974) comecei a pensar seriamente em construir um barco de
Embora eu tenha optado pela construção em sanduíche - o que
oceano, o barco definitivo, o “barco ideal”.
equivale praticamente a construir dois cascos separados pelo miolo, ge-
Ele era denominado ideal porque teria que satisfazer a todos os re-
ralmente balsa ou Airex - e de pagar uma mão de obra especializada mais
quisitos importantes num barco, ou pelo menos aos principais: confiá-
cara (mas com garantia), o preço final não resultou em muito mais do que
vel, fácil de manobrar, de fácil manutenção, de grande autonomia (grande
fora planejado, uma vez que o casco nu representa aproximadamente um
raio de ação) e bom para todas (ou quase todas) as condições de vento e
terço do preço total do barco pronto, navegando. A construção em sanduí-
de mar...Embora eu já viesse pensando há muito nos planos de um barco
che oferece, dentre outras, a vantagem de um grande aproveitamento das
para longos percursos, foi mesmo a partir de 1968 que iniciei a esboçar
dimensões internas, uma vez que o sistema das duas camadas separadas
no papel a estampa do que viria a ser o Krum II, o meu barco definitivo.
pelo miolo fornece a rigidez desejada, ficando o cavername colocado nos
Após a fase das jangadas e barcaças no Nordeste, passei para barco
locais em que forçosamente irão anteparas divisórias.
cabinado em 1955, no Rio de Janeiro (Niterói - Iate Clube de Icaraí): baía

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Os isolamentos térmico e sonoro também são característicos desse Na Fastnet de 1979 morreram quinze regatistas e o veredicto sobre
processo. a maioria dos acidentes responsabilizava os fabricantes, a má qualidade
Um dos piores problemas num veleiro é o mofo, principalmente marinheira dos barcos, construídos de acordo com as regras da IOR, que
quando atinge a andaina: barco em sanduíche dificilmente tem mofo. incentivam a construção de barcos cada vez mais perigosos:
A vantagem da construção em sanduíche para obtenção de um bar- • deslocamento leve;
co leve não foi o meu objetivo principal, preferindo levar em consideração • grandes bocas;
outros fatores mais importantes para o cruzeirista, como maior aprovei- • fundo achatado;
tamento interno, resistência ao impacto (robustez), ausência de mofo no • pequenas áreas laterais do convés;
barco e preferência pessoal. • centro de gravidade alto;
Uma construção sólida permite encostar em praias abrigadas du- • borda livre alta.
rante a maré alta para carenar (raspar e pintar o casco) durante a maré Todos estes fatores beneficiam a velocidade, mas reduzem drasti-
baixa; esta característica, para mim, é muito boa; em cruzeiro longo, não camente as qualidades marinheiras do barco, penalizando a segurança,
ficamos dependendo de vaga para subir o barco, principalmente se a gra- principalmente.
na está curta. De acordo com Marchaj, “não há um só item das regras da IOR que
Para oferecer um grande raio de ação, com total autonomia, teria seja favorável à qualidade marinheira do barco”.
que ser de deslocamento médio ou pesado. Embora saibamos que o barco O inquérito sobre a Fastnet de 1979 concluiu que certas falhas de
ideal é utópico, devemos aceitar algumas características já bem definidas, projeto contribuíram para o grande número de capotagens de 360º, mas
já consagradas. Por isso, decidi construir o barco para cruzeiro, não le- Marchaj diz que não foi dada a devida ênfase ao fato, por motivos que são
vando em consideração as características de barco para regatas, ou misto. óbvios...
Fiz uma tabela comparativa das características dos melhores bar- Mas o problema mais grave é que as fábricas vão reduzindo a es-
cos de cruzeiro, e a conclusão foi lógica, fugindo da tendência do mercado. pessura do casco sem acrescentar os reforços necessários, por medida
Resolvi construir o casco sob encomenda e terminá-lo eu mesmo; de economia, resultando que hoje os barcos são verdadeiras casquinhas
comprei o projeto completo, fiz uma tomada de preço e estabeleci o con- de ovo, velozes, mas perigosos; não agüentam mar e no mar você nunca
trato com um estaleiro de reconhecida competência e que deu garantias sabe o que vai encontrar pela frente... embora a maioria das vezes seja de
na construção em sanduíche e quase tudo saiu como esperado. maré mansa...
Laminar grandes áreas de fibra de vidro num casco de cerca de Antes de decidir comprar o barco, converse com o projetista.
trinta pés (9 metros), não é tão fácil como muitos imaginam; além das A resina epóxi ou poliéster reforçada com fibra de vidro, ou sim-
atenções necessárias durante a laminação, os pesos em jogo, com o casco plesmente, fibra de vidro, é realmente um material fantástico, sob todos
pronto, não são muito fáceis de administrar. os aspectos; é o melhor material que surgiu até hoje e o boom da indús-
Mesmo entregando a parte principal da construção para um esta- tria náutica se deveu à facilidade de construção dos barcos de fibra, da
leiro, sai mais barato e muito melhor que comprar pronto. sua durabilidade (praticamente, como o vidro, de duração ilimitada), de
No livro mais recente de Marchaj: “Seaworthiness - The Forgoten Fac- suas qualidades mecânicas e da facilidade de manutenção. Principalmen-
tor” (International Marine Publishing), primeira edição em 1987, são tecidas te agora, com reforços de fibra de carbono, etc.
considerações sobre barcos “modernos”, coisas muito importantes, mas que Todos os exércitos do mundo usam capacetes de aço, que são de
são escondidas pela maioria dos construtores de “máquinas de regata”. fibra de vidro; os famosos coletes de aço, à prova de bala, são de fibra de

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vidro reforçados com fibra de carbono; e assim vamos por aí afora, num eu consultaria a todos os projetistas possíveis e faria um estudo detalha-
sem número de aplicações: todos os barcos de outros materiais, são aca- do das características dos melhores barcos de cruzeiro existentes hoje
bados com fibra de vidro, principalmente como proteção das obras vivas: no mercado . Porém, não resta a menor dúvida que escolheria a fibra de
de tanto usar a fibra, esses barcos terminarão sendo de fibra... vidro... E mais, o comprimento seria em torno de trinta pés, seguramente:
É claro que outros materiais irão surgindo, mas até hoje nenhum se entre 8 e 10 metros.
igualou à fibra de vidro em qualidades gerais e principalmente em facili- Coloque um Arpège (barco antigo, projetado por Michel Dufour,
dade de manuseio. que fez época no mundo) e um Cal 9.2, projeto mais moderno, ou melhor,
A fibra de vidro sob a forma de C-Flex, uma espécie de espartilho de não tão antigo, ao lado de um Aladim e tire suas conclusões. Tanto o Arpè-
mulher, em rolos de 250 pés contínuos, permite a construção mais rápida ge como o Cal 9.2, não têm autonomia, não têm capacidade de carga sufi-
de um barco: é só fazer a gaiola em ripas de madeira de segunda; cobrir ciente para longas travessias, ou fica muito difícil. E capacidade de carga
com o C-Flex e resinar. Está pronto o casco. está intimamente ligada à robustez.
A fibra de vidro atualmente está mais cara, ou melhor, não é o mais É claro que não podemos comparar um barco de trinta pés com um
barato material; mas esta desvantagem inicial de construção em fibra é de quarenta; a comparação deve ser feita por faixas, mas garanto que tudo
amplamente compensada pelo baixo custo da manutenção ao longo dos o que fizerem com um de 40 pés, poderá ser feito comodamente com um
anos, décadas e mais décadas. bom barco de trinta pés, tripulado por um casal e sem necessidade de
Atualmente, estão construindo barcos de plástico ABS como sendo incluir marinheiro, guincho, roda de leme, etc.
de fibra, uma vez que ao leigo é difícil distinguir. Muito cuidado, portan- O inglês classifica os velejadores em três categorias:
to: exigir a especificação da laminação, conversar com o projetista; afinal, • o de regata (racer saylor);
você está comprando e deve saber o que, principalmente porque irá para • o de cruzeiro (cruizer saylor);
o mar. • o day-sailor, o que pratica o esporte, a arte de velejar, por curtos
Bem construído, um barco de fibra é indestrutível. períodos, sem se afastar muito do local onde tem o barco.
No entanto, o que importa é estar n´água, não interessa o material E dentro de cada categoria há inúmeras e variadas modalidades,
de que é feito o barco: é melhor estar velejando numa jangada do que ficar onde se encontram excelentes velejadores, que acharam as maneiras de
em terra esperando a oportunidade daquele barco maravilhoso chegar... conciliar o esporte com suas obrigações diárias, suas formas de vida; uma
Experimente fazer um quadro resumo com as características dos vasta gama de atividades.
barcos mais vendidos no mundo (e anunciados nas revistas), numa faixa Em conseqüência, pelo menos três principais espécies diferentes
larga de comprimento que deseja: material, comprimento, boca, calado, de barcos sobressaem, cada um com suas características, seus aficiona-
deslocamento, autonomia, preço. dos, admiradores.
Consulte projetistas, analise seus projetos, argumente, tire dúvidas. Apenas os barcos de cruzeiro não são muito fáceis de achar; a maio-
Roberto Barros (o Cabinho) fornece um folheto detalhado dos projetos ria dos barcos de fábrica são das outras categorias, devido principalmen-
disponíveis. Bruce Roberts, Glen-L, Bruce Bingham, idem; todos anun- te à maior procura.
ciam nas revistas náuticas. Na Internet, são encontrados portais com óti- Você ou terá sorte de achar um bom barco de cruzeiro ou terá que
mas informações sobre construção de veleiros. construí-lo.
Muitos candidatos à construção particular do barco me perguntam Vejamos um pouco mais sobre o que o “barco ideal” deve ser, ou o
se hoje eu fosse construir que projeto e material escolheria. Seguramente mais próximo do ideal: aquele que, com persistência e planejamento ade-

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quado, qualquer um pode conseguir, construindo ou comprando. Mas isto não acontece só por aqui; nos EUA, numa regata na baía
Primeiro, ele deve ter qualidades náuticas: conjunto de requisitos de Cheasapeak, vários barcos novos foram a pique porque os parafusos
que o barco deve ter como garantia de uma navegação segura e eficiente. do patilhão romperam o casco e as quilhas caíram no mar. Mas lá existem
Além das qualidades estruturais (solidez, flutuabilidade e estanqueida- modelos de barcos fabricados há trinta anos, como o Catalina 27, cujas
de), ele deve ter: resistência mínima à propulsão (um máximo de velo- características tem atraído grande número de cruzeiristas.
cidade com a mínima utilização de energia de propulsão); facilidade de Quem não pode comprar um bom barco pronto, de cruzeiro, deve
manutenção do rumo sob quaisquer condições de vento e de mar; esta- construí-lo; fica mais barato e bem melhor, podendo-se partir para um
bilidade estática (capacidade de voltar à posição original sob o maior ân- tamanho maior, mais adequado e de acordo com o gosto de cada um, pelo
gulo de inclinação possível, uma vez cessado o efeito do fator responsável mesmo preço de um menor comprado pronto.
pela alteração da posição); capacidade de manter movimentos oscilató- Ao completar dezoito anos velejando, o Krum II necessitou uma
rios (transversais e longitudinais) suaves sem comprometer a estabilida- reforma geral: estaiamento, esticadores, fuzis, parafusos dos fuzis, reser-
de. Essas qualidades estão estreitamente interligadas: todas dependem, vatório de óleo diesel, caixas dágua, rede elétrica inclusive quadros de
decisivamente, da relação de grandeza e de atributos dinâmicos entre o comando e chaves, bomba de porão, parafusos das catracas, parafusos do
barco e o mar. pé-de-galinha, hélice, âncoras e correntes, fogão, acrílicos das vigias, etc.
Portanto, se você quer um barco de cruzeiro, deve estar preparado etc., uma enormidade de pequenos itens, inclusive vários equipamentos
para uma longa procura, com persistência ou partir para construir. eletrônicos, cujo montante logo se afigurou impossível realizar em curto
A maioria não tem tempo disponível para grandes cruzeiros; pas- prazo.
seios de fim de semana ou férias serão melhor realizados em barcos leves Passei mais a efetuar cruzeiros nos barcos dos amigos e ia tocando
e velozes. a obra conforme as disponibilidades.
No multicasco, o momento máximo de endireitamento ocorre apro- O casco, porém, inteiramente irrepreensível; apenas a manutenção
ximadamente aos 40º de adernamento e se anula aos 90º. periódica: pintura antiincrustante, etc. Está novo, pronto para velejar por
Nos monocascos com quilha lastrada, o momento máximo de endi- mais outros tantos anos, ou muito mais...
reitamento ocorre aos 90º de adernamento e só se anula com o embor- No início do emprego da fibra de vidro na construção de barcos,
camento completado (180º), que é momentâneo, endireitando-se com a logo após o término da Segunda Grande Guerra, os amantes da madei-
própria ação do lastro e pela onda. ra procuravam desacreditar a fibra de vidro. Argumentavam que ela era
É claro que o objetivo de utilização do barco deve estar em mente como a galalite (que era um plástico fraco, quebradiço, muito usado na
desde o princípio: barco de regatas ou de cruzeiro? Cruzeiros prolonga- época); passados trinta anos, eles ainda vinham com o mesmo argumen-
dos ou curtos, raio de ação (autonomia), etc. to, a despeito das provas em contrário, com a indústria maciçamente em-
Muitos projetistas cedem os direitos dos projetos e as fábricas os pregando a fibra de vidro em todas as partes do mundo, inclusive nos
modificam e, claro, sempre visando o barateamento da construção. Um países onde a madeira abunda....
exemplo, para evitar prolongar o assunto: o Atol 23, um dos projetos de No final, passados mais de quarenta anos, não tendo mais argumen-
grande sucesso até hoje previa uma laminação de 7 mantas; os últimos tos para desancar a fibra de vidro, argumentavam que os barcos ficavam
saídos de fábrica só tinham 3 mantas... parecidos com geladeiras, lisos e brilhantes.
O Brasília 32, outro excelente projeto, foi “aperfeiçoado” sucessiva- Em 1975, uma revista americana (Motor Boating & Sailing, se não
mente pela fábrica ao longo dos anos e terminou com um casco transpa- me falha a memória) publicou um interessante artigo, muito bem funda-
rente de tão fino... mentado e com argumentos científicos convincentes, sobre o teredo que

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atacava a fibra de vidro, semelhante ao gusano na madeira: era, dizia o Mas, depois da gozação, para não deixar o assunto sem a devida
artigo, a terrível poliestermita. E mostrava a foto da assassina. resposta: as baratas no barco são exterminadas como em casa: com inse-
Eu havia acabado de chegar lá para uma longa permanência previs- ticida e cuidados normais para evitá-las, como não deixar comida expos-
ta para cerca de três anos, e já estava com a garagem de casa cheia de kits ta, limpeza, etc. Elas geralmente entram no barco junto com as compras
de fiberglass, manuais técnicos, ferramentas, epóxis, microbaloons, cata- e necessitamos combatê-las sempre: inseticida nelas. Além disso, faço
lisadores, aceleradores, etc.etc., tudo para estudo, já que aqui no Brasil a umas bolinhas de leite condensado com ácido bórico, misturando até a
palavra fiberglass era tabu. Com a simples leitura do artigo, senti um frio apropriada consistência, colocando em lugares estratégicos, nos cantos.
na barriga; fiquei inconformado. Quem tiver crianças no barco não deve adotar este processo.
Na terceira ou quarta leitura, vi que era pura gozação. Mas muitos Idem, para quem tem pequenos animais no barco, claro.
americanos não sintonizaram, ou por terem tomado conhecimento por
conversas ou por não terem prestado atenção suficiente durante a leitura,
e a gozação no clube foi grande: baixaram em cima dos proprietários de
barcos de fibra, cujo grande argumento era estarem livres dos gusanos.
Depois, o assunto causou grandes gargalhadas nas marinas e clubes du-
rante vários meses, sendo devolvida aos madeireiros toda a gozação...
Outro artigo muito espirituoso, da mesma revista, meses depois, foi
uma serie de consultas de um leitor: ele queria saber como eliminar as
baratas do barco, relatando que curtia demais o barco junto com a família,
nos fins de semana; mas que as baratas estavam demais... A resposta da
revista foi que ele experimentasse pegar uns seis grilos e levasse para o
barco e os argumentos eram convincentes: seguramente haveria fêmeas e
machos naquela quadrilha de grilos e eles iriam consumir as baratas. Pas-
sados dois ou três meses, volta o leitor, reclamando que, de fato, as bara-
tas tinham sumido, mas agora o problema eram os grilos; como proceder,
implorava o velejador: não podiam mais dormir no barco tal a cantiga de
grilos...
A resposta no número seguinte: coloque aranhas, que elas comerão O Krum II nos Abrolhos
os grilos... E tudo na maior seriedade.
Mas o mais engraçado é que houve uma enxurrada de cartas de lei- Características do Krum II
tores reclamando que naquela progressão, eles iriam terminar recomen-
dando tarântulas para acabar com a praga de aranhas menores e daí por Comprimento 8,30 metros (27´)
diante... Linha dágua 7,00
Na época, estava em moda o combate às pragas com medidas na-
Boca 2,75
turais.
Calado 1,45
Até hoje, quando me perguntam como acabar com as baratas no
barco, ofereço esta solução. Deslocamento 3,5 ton.

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Lastro (ferro) 1,3 ton (lastro interno)


Material do casco fibra de vidro (sanduíche de Airex)
Material do convés e cockpit fibra de vidro (sanduíche de Belco-
balsa)
Armação cúter
Altura do mastro (acima da cabine) 12 metros
Comprimento da retranca 3
Mastreação Alcan, alumínio naval, anodizado
Motorização Farymann, 12 hp, diesel.
Reservatório de Combustível 150 litros
Consumo de Combustível 1,5 litros por hora a 1500 rpm
Velocidade de Cruzeiro 4 nós (a 1500 rpm)
Reservatório de água 300 litros
Área das Velas:
Construção do Krum II, colocação do Airex sobre a “gaiola” (1981)
Mestra (grande) 16 m2
Genoa #1 25
Banana 18
Trinquete (bujarrona) 10
Pequena jiba auxiliar 7
Balão 34
Projetista: Bruce Roberts & Goodson
Estaleiros:
AMRJ: casco nu (1981).
BiancaFiberglass - SP : instalações
e acabamento (1982).







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Roteiro Costa Leste

Transcorria o ano de 1978, portanto já lá se iam dez anos de pers-


pectivas do Krum II, dos primeiros rabiscos ao projeto final, agora já
pronto, em condições de ser iniciada a construção. Pronto e minuciosa-
mente estudado, mastigado, triturado. Eu sabia de cor todos os detalhes
do calhamaço que era o projeto.
Da mesma forma que eu fazia quando menino em Maceió e Olinda,
Construção do Barco correndo distâncias enormes em praias desertas, pela beira dágua, chu-
tando as ondas, mergulhando, descansando e retomando a corrida, até
terminar em algum recife de coral, onde procurava polvos, siris, caran-
guejos, cavaquinhos e o que fosse.
Eram corridas de muitas horas, em Olinda, Rio Doce, Pau Amarelo,
Como de hábito, eu efetuava de manhã bem cedo mais uma corrida Janga, Maria Farinha, até Itamaracá, sendo a praia acompanhada por co-
pela beira da praia, molhando os pés na água fria do mar, do Leblon ao queirais sem fim e deles eu me aproveitava para matar a sede ao longo
Arpoador, antes de ir para o “batente”. das corridas. Além disso, um grande número de cajueiros, pitangueiras e
Dava uns mergulhos próximos às pedras do final, descansava um goiabeiras completavam a festa...
pouco olhando a paisagem e o movimento dos barcos, na maioria trainei- Mas, enquanto corria no Leblon ia pensando nos planos, na cons-
ras de pesca, as ilhas e o geral. trução do barco. Eu já estava com tudo adquirido, desde o projeto aos
principais materiais e equipamentos, as peças mais importantes. Estava
às voltas com a reforma do apartamento e tinha decidido só dar a partida
na construção do barco quando a terminasse, para evitar surpresas. E, o
pior de tudo, nessa época eu estava sem barco, ansioso por uma velejada.
Hoje, já passados mais de trinta anos de construído, flutuando e
velejando, o Krum II está com mais de cinqüenta mil milhas em sua es-
teira, sem acidentes graves, sem problemas. Percorremos inúmeras vezes
grandes trechos de nossa costa, demorando-nos nos abrigos mais interes-
santes, Abrolhos e sul da Bahia, intercalando os cruzeiros na tripulação
de barcos de amigos, ao Nordeste e a Fernando de Noronha.
Tive barcos de madeira, no método tradicional de construção e
após mais de vinte anos de “sofrimentos” com infiltrações, goteiras, gusa-
nos, calafeto, ressecamento, mofo, etc. etc. quando passei para a fibra de
vidro, jurei nunca mais voltar a possuir barco de outro material.
Passei para a fibra de vidro e nunca mais sairei dela. Outros mate-
riais melhores que estão surgindo, ou despontando, devem ser cogitados
pelos que pretendem iniciar a construção do barco.
Barco de metal, jamais (alumínio, ferro, aço, aço inox, etc.); os úni-

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cos problemas graves que tenho enfrentado são nas partes metálicas. Oxi- antigos e é completo, veleiros e lanchas de qualquer tamanho; fornece
dação, corrosão eletrolítica, um rol sem fim de pequenos senões. A fibra um livreto com os projetos disponíveis, principalmente de veleiros, desde
não dá o menor problema. O proprietário de um barco de metal de tanto as réplicas do Spray ao mais sofisticado sessenta pés. E os materiais são
fibrar as partes que vão sendo corroídas, acabará por transformá-lo num da escolha do interessado. Peça o folheto, e se gostar de algum modelo,
barco de fibra... proponha um desconto, mesmo que o preço já seja o de promoção. Ele
Existe um processo de construção em madeira, a moldagem a frio, terminará concedendo melhor abatimento.
empregando camadas finas de madeira folheada e cola epóxica, que fica Os fervorosos defensores de multicascos alegam que não é muito
muito bom, talvez tão bom quanto à fibra, pelo menos na aparência. Já vi lógico carregar um lastro pesadíssimo só para manter o barco em pé,
vários barcos construídos assim que ficaram realmente dignos de serem como nos monocascos; que o multicasco possui uma área de convés mui-
comparados à fibra de vidro. E fica mais barato. No final, leva várias cama- to maior e bem mais confortável, pode encalhar na praia, etc. etc.
das de fibra nas obras vivas...para variar. Quem simpatizar com multicascos, deve aproveitar todas essas
No Brasil, já temos projetistas que fornecem plantas completas vantagens; quem não simpatizar, deverá partir para um monocasco e terá
para a construção do barco, prestando assistência técnica durante a fase muitas vantagens, como a de carregar um lastro para manter o barco em
de construção. Existem inclusive cursos de construção de barcos, livros, pé, mesmo depois de virar; não achar compreensível manter um bizarro
empregando as mais modernas técnicas. Isto corresponde a dizer que o flutuador na ponta do mastro para não emborcar, ou abrir um açalpão no
velejador não necessita mais perder um tempão estudando uma enor- fundo do barco para o caso de emborcar, aproveitar as pequenas dimen-
midade de coisas para poder escolher o projeto e construir o barco. Um sões do convés, onde o mar quebrando não partirá o barco ao meio, etc.
exemplo, dentre vários, é o do Cabinho (Roberto Mesquita Barros), que etc.
possui projetos muito bons (Aladim, Samoa, Cabo Horn, etc.) e oferece São os barcos ideais de cada um.
assistência técnica, inclusive para consórcios de construtores amadores. Certa vez, encontrei um canadense, skiper de um trimaran, que
Na Internet são encontrados muitos portais, tanto brasileiros como ame- afirmava com veemência que todo monocasco era barco de brinquedo...
ricanos. Mas, está claro, o material de construção do barco deve ser de Perguntei se ele sabia a proporção de monocascos para multicascos
escolha do velejador, preferência pessoal. no mundo inteiro, se ele considerava os W-60 da Whitbread de brinque-
O projetista dos famosos Brasília 32, Gilberto Saeger, continua pro- do, etc. Se ele conhecia a proporção de desaparecimentos no mar, etc.etc.
jetando barcos muito bons; é só pesquisar. E assim é, em geral, tudo na vida; felizes aqueles que se mantêm
Outros exemplos, para não ficar apenas com dois: Tony Castro, velejando com seus barcos, mono ou multicascos, de brinquedo ou não...
John Aune, Eduardo e Jorge Arena, German Frers Jr., Bruce Bingham, etc. O nome do barco merece algumas considerações: conheci um ame-
Em Cabo Frio existe um projetista e construtor de multicascos. ricano em Annapolis que ria muito com o nome dos barcos que ia lendo
Em Joinville, fabricam trimarãs, projetos de Jim Brown. em voz alta e comentando . Dizia ele : “diga-me o nome do teu barco que
Perto de São Paulo, no Embú, existe uma fábrica de barcos, lanchas eu te direi quem és”. Uma vez, deparamos com um veleiro de nome “Pe-
e veleiros, inclusive em sanduíche (colméia). Há inúmeros construtores ter Plan”; o tal americano, já com a cachola cheia, fez a maior farra...Dava
de veleiros, inclusive de alumínio (Foch). pormenores da natureza do caráter do capitão, “um cara minucioso ao
Não há mais dificuldade de encontrar projetos de barcos. extremo, tipo arrumadinho, planejador por excelência”. Que diria ele se
Dos estrangeiros, uma simples consulta às revistas ou Internet for- deparasse com um “Aburus”, ou um “Kama Sutra”... jóias da imaginosa ca-
necerá o endereço de muitos projetistas. Bruce Roberts é um dos mais beça dos nossos velejadores. Sem querer generalizar, é indicador de barco

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de brinquedo um nome ridículo, jocoso, de mau gosto. Entre Icaraí e São Francisco, em Niterói, em frente a uma bela man-
O nome do barco realmente poderá dizer muito sobre a personali- são bem à beira dágua, ficava ancorado um enorme veleiro, o “Mariposa”,
dade do proprietário ou, pelo menos, de seu estado de espírito por oca- em 1954; eu passava por ele com o meu barquinho e ficava admirando
sião da escolha. e relembrando as barcaças e saveiros do Nordeste, que eu “amucegava”
E o dono do barco geralmente é conhecido pelo nome do barco em Olinda, indo saltar nágua em Maria Farinha. Amucegar quer dizer
como sobrenome: Sérgio Suiá, João Boumerang, Licio Krum, etc. ; não fica amorcegar, ou pegar carona à moda de morcego, na passagem, subindo
bem chamar alguém de Bráulio Suruba, ou coisa pior... a bordo. Da praia, ficávamos observando o aparecimento de alguma vela
Um amigo colocou o nome do barco de “Rock Creek”, e vivia se la- para os lados da barra do porto do Recife; nadávamos até o canal onde
mentando que tinha muito trabalho em explicar aos curiosos o signifi- as barcaças passavam e ficávamos na linha certa do rumo, bem à proa,
cado do nome; já estava de saco cheio... Dizia que o próximo barco seria embarcando com a ajuda de algum tripulante. Íamos saltar nágua muitos
batizado com um nome bem simples, comum, como por exemplo: “Man- quilômetros adiante e voltávamos correndo pela praia deserta, numa far-
teiga”. Lembrei-lhe da inconveniência da escolha, uma vez que poderiam ra alegre e sadia .
relacionar o nome com o filme “O Último Tango em Paris”, o que não seria, Mas, voltando ao nome Mariposa e suas interpretações: com certe-
por certo, uma boa coisa. za o barco não pertencia a alguma mulher, obviamente. ficava sempre na
Se você batizar o seu barco de “Saudades Imorredouras de Pinda- poita; nunca o vi sair, logo, o nome não se referia ao poder de locomoção
monhangaba 1999” irá ter na certa muito trabalho, muitas horas a fio de do inseto. Outras hipóteses levavam a coisas pouco lisonjeiras para um
dedicação e gastar muita tinta para pintar as inscrições na popa e nos barco tão bonito. Há pouco tempo, soube que ele ainda flutuava, agora em
bordos, nas bóias, na balsa, etc. além dos retoques periódicos de manu- Angra dos Reis.
tenção da pintura. É um outro aspecto a pensar, demonstrando que além Tive um barco de nome “High Society”; ao comprá-lo, tentei trocar
de pequeno, o nome do barco não deve ser motivo de galhofa (mesmo que o nome, pois o achava coquete, badaloso. Na época, dava muito trabalho
o barco seja realmente grande...). trocar o nome das embarcações...
Outro amigo, batizou o barco de “Inferno da Patroa”; naturalmente O High Society era um primor de barco, pequeno, todo de cedro
a cara-metade infernizava sua vida com relação ao barco (o que aliás é envernizado internamente, atapetado de borracha, uma verdadeira obra
muito comum...) e ele, para se vingar, sapecou o nome... A separação não de arte, com motor de centro Diesela Colding.
demorou muito a vir. Indiscutivelmente, o pior nome de barco com que Fiquei com ele cinco anos, até 1960, quando tive de vendê-lo com
me deparei foi “Lepra”. Um verdadeiro absurdo, sem comentários. uma dor no coração, senão seria reprovado na faculdade. Até hoje ainda
Tive muitos amigos cujas esposas não toleravam barco, nem mes- cruzo com ele navegando na baía da Guanabara, com outro nome e muito
mo o assunto sobre barcos; tinham verdadeiro horror, não de medo, mas diferente, fibrado e maltratado, mas sempre o reconheço e fico a relem-
por mera questão de ciúme. Ou outro motivo fútil qualquer. Infernizavam brar os velhos tempos, já lá se vão mais de quarenta anos...O antigo dono
a vida náutica dos inditosos maridos; naturalmente, muitos preferiram que me vendeu o High Society tinha posto o nome em referência a uma
ficar com o barco a ficar em casa fazendo crochê... música de muito sucesso na época.
O livro A Expedição Moana - A Volta ao Mundo em Caça Submarina, Um professor que tive, colocou o nome Spray num belo veleiro, im-
de Bernard Gorski (Hemus Editora Ltda.) disseca bem o assunto; é um pecável; atualmente está velejando na baía da Ilha Grande, aposentado.
livro que deve ser lido por todo velejador ou candidato: quatro mergulha- Quem o vê navegando, já sabe tudo sobre as intenções do comandante
dores velejadores fazem a clássica volta ao mundo num veleiro de 40 pés. que o timoneia, um verdadeiro amante das coisas do mar, prestando sua

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homenagem a Slocum. fantes para recuperá-lo, reconhece que não está aproveitando o mar, está
Dizem que mudar o nome do barco dá azar. Portanto, se você quer perdendo as velejadas, os cruzeiros que ouve os amigos comentarem.
mudar o nome do barco, dê preferência ao nome de algum santo ou Todos Termina desistindo, vendendo o barco e resolve achar que barco
os Santos... não é para ele, é “coisa de rico” (a famosa desculpa). A manutenção de um
Vi muitos e muitos casos de pessoas que trocaram o nome do barco barco é realmente trabalhosa, contínua e nunca acaba. Quando termina
e ao vendê-lo o novo dono retornava ao nome original, por mera supersti- a pintura anual (geralmente feita no inverno) e começamos as velejadas,
ção (poucos por tradição), ou por não gostarem do novo nome. temos que ir cuidando metódica e paulatinamente de outros detalhes de
Colocar o nome da amada é meio perigoso; ele mudará com o tem- manutenção. No barco, haverá sempre algo a ser feito, para mantê-lo sem-
po na mesma proporção...? Ou será eterno? E a grande desvantagem é não pre em condições de velejar. E, logicamente, quanto maior o barco... Mas a
poder ser identificado como, por exemplo, Rodrigo Odete ou Tancredo manutenção de um carro também é trabalhosa e onerosa e nem por isso
Raimunda, etc. alguém pensará que só os magnatas têm carro...
Um veleiro com o nome de “Maria” até que fica bonito. “Maria Bo- O americano define o barco como um buraco no mar, onde despeja-
nita”, por exemplo, para um admirador do cangaço (se é que alguém pode mos uma enorme quantidade de dólares.... Mas nem por isso deixa de ser
admirar bandidos, mesmo que eles tivessem motivos para iniciar a vida o país com a maior quantidade de barcos do mundo.
fora da lei), homenagem a Virgulino Ferreira, vulgo Lampião. Já “Maria A simples operação de raspar o fundo do barco, para tirar craca,
Arataca” denunciaria outros gostos, outros detalhes... num trinta pés, é demorada e hoje já a realizo em várias etapas, mergu-
O nome Krum foi inspirado num livro de Gustavo Barroso, A Ronda lhando em apnéia (sem aparelho). Talvez, conforme a temperatura da
dos Séculos, que li em minha juventude; dentre uma relação de nomes água, deixemos para outro dia e ao longo de muitos dias, vagarosamente.
possíveis, prováveis, uma votação em família homologou a escolha. Aliás, Num barco maior, a tarefa será para várias pessoas. Mesmo que o bar-
vale frisar, que a coisa mais certa é que o barco é da família e, lógico, é bom co seja guardado a seco, as dificuldades aumentam com o comprimento:
que ela participe ativamente de todas as fases, desde a construção até a rampa, pau de carga, guindaste ou travel-lift, refletindo tudo em $$.
escolha do nome e, principalmente, das velejadas. Krum é palavra de ori- Isto, apenas para exemplificar um trabalho comum e inevitável:
gem latina, derivado de Kro-Magnum (de Cro-Magnon), cidade francesa, raspar as cracas do fundo do barco. Tenho um pequeno compressor de ar
onde foi localizado o esqueleto de uma espécie de homem pré-histórico, para realizar o trabalho mais facilmente, mas a água da baía da Guanaba-
nosso ancestral, de características muito semelhantes ao homem moder- ra está suja demais, principalmente durante as enxurradas; não dá para
no, personagem do primeiro capítulo do citado livro. mergulhar; é uma grande vergonha...
O último capítulo é sobre dois pacifistas no ano 2050, que brusca- O inglês dá preferência ao barco de 35 pés de comprimento, levan-
mente, após um desastre aéreo, vêm-se sozinhos numa ilha e terminam do em consideração o mar (o comprimento de onda), o vento e a autono-
lutando de forma ferrenha por um pedaço de carne... mia; o americano, o de 45, mais pelo conforto, pelas comodidades. Como
Muitos consideram o tamanho do barco o fator mais importante; ele tem um carrão, quer um barcão, naturalmente.
quanto maior, melhor. Mas não é bem assim. Claro que um barco grande Sem a menor sombra de dúvida, o barco ideal para o solitário ou um
fornecerá mais conforto, maior capacidade de carga, mais espaço para os casal, em qualquer mar, é o de cerca de 30 pés, construído particularmen-
mantimentos e a arrumação geral fica mais fácil, terá maior autonomia, te, mediante um bom projeto. Com isso, teremos a capacidade de carga
maior raio de ação. Mas, o que tenho visto é o cara arrematar vibrando suficiente, sem necessidade de equipamentos sofisticados, com autono-
aquele barcão “espetacular” e, depois de vários anos de trabalhos esta- mia para vários meses, sem grandes contorcionismos e o desempenho

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é muito bom em qualquer situação; velas de tamanho razoável; motor dosa em lugares distantes (além do preço). Para uma ida ao Caribe, por
auxiliar pequeno, facilidade de dar partida manualmente; sistema de fun- exemplo, devemos seguir o estoque indicado para uma longa travessia.
deio fácil de manusear sem necessidade de guincho, desde a manutenção Se você vai construir um barco para ficar sempre na água, na poita
até ao espaço interno disponível, desde as facilidades de manobra; o de- ou em cruzeiro, os gastos com a manutenção normal serão os mesmos,
sempenho em qualquer vento; facilidade de abafar ou enrolar as velas quer ele seja um vinte e cinco pés ou um trinta pés ou um trinta e dois
em qualquer situação, etc. tudo é vantagem num trinta pés. Mas deve ter pés. Mas o trinta pés oferece muito mais vantagens. Portanto, vale partir
características especiais. direto para o de trinta.
Ressalto um item importante: motor que possa ser acionado ma- Acima de trinta pés, os gastos vão crescendo exponencialmente...
nualmente, além de ter partida elétrica; mas é muito difícil dar partida É claro que vender um projeto de 40 pés será melhor para o proje-
manual num diesel de dois cilindros. Portanto, há uma serie de caracte- tista, para o estaleiro, etc.; mas para quem deseja ter um barco por muitos
rísticas importantes, algumas conflitantes. anos, sem grandes gastos de manutenção, talvez não seja o ideal. Racioci-
Um veleiro tem que navegar à vela... o motor é para as manobras, é nar sempre a longo prazo.
auxiliar da vela. Certamente, sabemos que não só o comprimento dita as qualidades
Nas calmarias, o motor é aproveitado para recarregar as baterias, do barco.
tendo em vista principalmente as luzes de navegação e o equipamento A armação (posição do mastro, número de velas, etc.) também é
eletrônico. Portanto, qualquer tamanho de motor é bom. outro fator importante.
Tenho saído de muito sufoco, em barcos de amigos, por possuírem Um cúter, com duas velas de proa, é melhor para cruzeiros oceâ-
dois motores, um de centro e um de popa, menor, geralmente usado no nicos, por apresentar maior equilíbrio com jogo de velas menores, mais
caíque; um suporte basculante ou ajustável na popa permite usá-lo em fáceis de manusear em qualquer tempo.
caso de necessidade. Rizar ou enrolar a vela grande equilibrando apenas com a bujar-
Nos EUA há uma associação de velejadores que não possuem mo- rona (sem a buja) é muito bom para muitas ocasiões no mar: descansar,
tor no barco. Para safar dos perigos mais imediatos, eles usam grandes regular a hora de chegada no próximo abrigo, enfrentar um tempo mais
remos que se apoiam nas catracas. É um critério meio radical, mas tem difícil, um vento forte pela proa, etc. Uma buja menor, que pode ser expe-
seus adeptos, cujo número aumenta a cada dia. É bom lembrar aqui que, rimentada num dos estais de proa, com a escota passando por dentro dos
além de tudo, o motor auxiliar pode salvar a tripulação em casos de emer- brandais, oferece muitas vantagens.
gência; para isto, ele deve ser capaz de funcionar ininterruptamente por Se você é cruzeirista, fuja daquele projeto “barco de cruzeiro bom
vários dias e deve poder cobrir uma distância de cerca de 500 milhas, no para regatas de fim de semana”; você terminará por não fazer nem uma
mínimo. coisa nem outra.
No Krum II, o motor Farymann de 1 cilindro consome 1,5 litros por O barco ou é uma máquina de regata ou é um barco de cruzeiro,
hora na rpm normal, indicada no manual, que resulta numa velocidade de robusto, mais lento, mas muito mais confiável, inspirando confiança no
cruzeiro de 4 nós; portanto, deverei ter no barco, na previsão de alguma simples pisar no convés; o meio termo nunca será satisfatório. Barcos de
longa travessia, um estoque de OD de cerca de 200 litros (130 horas de regatas de oceano só entram nelas enquanto novos...
funcionamento, ou 520 milhas). Costumo sair para os longos percursos Mas o objetivo que se deseja é que ditará as características, as qua-
costeiros, com o tanque cheio (70 litros) e mais 2 bombonas de 40 litros, lidades, que o barco deverá ter; tudo tem suas vantagens e desvantagens.
cada. Isto é mais para evitar reabastecer com óleo de procedência duvi- Converse com o proprietário de um multicasco, escute seus argu-

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mentos; escute os argumentos de um lancheiro, de um proprietário de que ele era na realidade um defunto em muito maior potencial.
uma traineira ou de uma escuna, e tire suas conclusões. Ríamos um bocado e caçoávamos um com o outro. Ele só admitia
Outra mania de quem vai construir o barco é querer modificar o possuir um barco de categoria, enquanto eu tinha o barco que podia,
projeto depois de iniciada a construção; isto geralmente se transforma mantendo uma atividade integral com a família, nas horas de folga, do-
numa grande dor de cabeça. mingos e feriados, feriadões, férias; os filhos crescendo com saúde, física
Barco não é como casa, para que mudemos o projeto a bel prazer. e mental, inerentes ao desportista.
No barco, qualquer modificação de um parâmetro acarretará a mo- Para resumir, ele nunca adquiriu um barco; ficou apenas em sonho.
dificação de outros, o que nem sempre é pensado. É melhor pedir ao pro- E este é o tipo mais comum de candidato à compra de um barco; até
jetista para fazer as modificações desejadas e que sejam possíveis, como velejam em outros barcos, mas limitam a atividade apenas à leitura de ro-
a do lay-out interno, etc., antes de iniciada a construção. mances; não sabem dar um lais de guia com destreza (este é um requisito
Aumentar o comprimento do mastro para aproveitar algum even- essencial: você terá de ser capaz de dar um lais de guia com uma só mão, e
tualmente disponível, aproveitar velas de outro barco, incluir “saias”, mo- rapidamente). Só tentando, verificando os detalhes do nó, você consegui-
dificar o cockpit, etc. tudo isto é fonte futura de dores de cabeça para o rá, após escolher um cabo bem flexível para o treinamento.
cruzeirista. A não ser que seja feito com a supervisão do projetista. Outro, desejava realizar longos cruzeiros pelo litoral do Brasil, mas
Existe um fator que é de primordial importância àquele que gosta- não lia nem estudava nada a respeito. Dizia ele: aprenderei quando tiver o
ria de se iniciar no esporte da vela de oceano, construindo ou adquirindo meu barco próprio, na prática, que é o melhor professor. Um pouco antes
o barco e partindo para cruzeiros cada vez mais prolongados, antes de de se aposentar, comprou um barcão de madeira, vendendo-o logo em
zarpar para o Caribe e etc. seguida com enorme prejuízo. Explicou: “papagaio velho não aprende a
É a expectativa de só querer aquele barco dos sonhos, o barco que falar...”. Era muita coisa para ele aprender ou então ficou com medo de
lhe enche os olhos, o barco ideal. enfrentar o desconhecido.
Isto deve ser evitado; é melhor ir progredindo ao longo do tempo Desde uma jangada até o atual barco que possuo, um simples vinte
de atividade no esporte, passando de barco em barco, até conseguir aque- e sete pés, rústico, despojado mas eficiente, meu entusiasmo é o mesmo:
le que satisfaça aos seus desejos, às suas necessidades: este será o seu de fato, não importa o barco, o que interessa é estar nágua, velejando,
barco ideal e seguramente você chegará lá se mantiver as velejadas, se curtindo.
mantiver sempre as velas cheias... Como dizia o saudoso Coca, um dos grandes velejadores brasilei-
Mantendo uma atividade no setor, em contato com a comunidade, ros: Deus não computa o tempo que passamos velejando...
sempre aparecerão oportunidades de trocar de barco, de progredir cada Com mais de oitenta anos de idade, o Coca tinha disposição para
vez mais até o barco ideal, definitivo. E bem mais em conta. uma velejada ao Caribe em qualquer barco. E quase todo ano ia. Antes
Sobre este detalhe, lembro de um amigo que conhecia tudo sobre de falecer, estava preparando um barco para mais uma longa travessia ao
barco, lia tudo do setor, inclusive todas as revistas nacionais e inúmeras Caribe e Europa.
estrangeiras. A animosidade entre velejadores e lancheiros, entre os velejadores
Conversávamos bastante a respeito dos diversos planos de cada de multicascos e de monocascos; entre proprietários de “casquinhas de
um. ovo” e de “rochedos”, entre regatistas e cruzeiristas, etc.etc., deve ser en-
Mas ele torcia o nariz para o meu barco da época. Dizia “nesta cas- carada como mera brincadeira, mesmo existindo verdadeiros fanáticos.
quinha de nós você não passa de um náufrago potencial”. Eu retrucava Porém, como os objetivos e a mentalidade são muito diferentes, seria me-

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lhor a criação de clubes separados, para veleiros e para barcos a motor. para ir, ou o comandante se acomodou, perdeu o trem da oportunidade...
Isto evitaria as mudanças de orientação e ação principal no calen- Existem algumas relações que definem as qualidades do barco e
dário do clube, conforme o Comodoro eleito seja lancheiro ou velejador, que devem ser examinadas obviamente. Os itens referentes ao conforto,
dentre outras coisas óbvias. beleza, luxo, etc., ficam a critério de cada um (até hoje estes itens estão
Seria mais producente, mais lógico. inacabados no
Um dos barcos mais polêmicos da Marina da Glória é, sem dúvida, Krum II, vão ficando para depois, face aos itens mais importantes;
o Suiá; mesmo velejadores que nunca saíram barra a fora, opinam sobre barco tem de ser rústico).
as qualidades do barco, levando em consideração apenas o aspecto rús- Exemplos: Área Vélica/Deslocamento, Deslocamento/ Lastro, Com-
tico de suas obras mortas (parte acima da linha - dágua, que se avista do primento/Deslocamento, potência necessária do motor auxiliar, etc.
barco).
Hoje, o Suiá está em Miami, para onde foi velejando após uma lon-
ga permanência no Caribe e Bahamas e está em preparativos para fechar Equipamento
o circuito passando pela Europa, Mediterrâneo, África e ilhas do roteiro
normal de volta, seguindo os ventos girantes dos dois hemisférios.
Nele, fizemos inúmeros cruzeiros pelo litoral brasileiro, Abrolhos, Após construído o barco, casco nu, temos de equipá-lo convenien-
Fernando de Noronha, Natal, Recife, Maceió, Salvador, etc., tudo sem o me- temente.
nor incidente, livrando o mau tempo sempre de maneira tranqüila, pró- Sem falar no acabamento, que é a fase mais demorada, muito mais
pria de um bom barco. do que se possa imaginar.
O Suiá foi construído pelo seu proprietário e comandante há mais Mastro, cruzeta, retranca, estaiamento, fuzis, velas, adriças, escotas
de trinta anos, em madeira. Depois, revestido com fibra de vidro em ca- e etc. são peças e mais peças imprescindíveis.
mada tão espessa quanto à do casco original; trocou o motor, instalando Outros equipamentos, úteis ou não, dependem mais da cabeça de
um MWM de 6 cilindros, novinho; trocou a mastreação (grande e meze- cada um.
na) para de alumínio, mandou fazer velas novas, equipamento eletrônico Embora as opiniões variem muito a este respeito, o bom senso (e o
completo, dotando-o para uma volta ao mundo. Após realizar inúmeros bolso) indicarão o caminho a trilhar neste assunto. Vejamos alguns itens
cruzeiros a Angra, Cabo Frio, Santa Catarina, Vitória, Abrolhos e litoral de maior importância.
sul da Bahia, ajustando tudo e tirando os defeitos, vazamentos, goteiras, Um bom motor auxiliar, diesel, é obrigatório para a tranqüilidade,
etc., deu início aos longos percursos: Trindade, Noronha e costa nordeste. a comodidade e a segurança durante os trajetos sem vento, em calmaria.
Em seguida, Caribe e Miami, passando pelas Bahamas, pelo canal de Um veleiro sem motor auxiliar está incompleto e “mata” seu comandante
New Providence, durando o percurso mais de três meses. Neste fantástico do coração. Podemos fazer com que o barulho, a fumaça e a trepidação
cruzeiro, não pude ir. atinjam níveis quase imperceptíveis, com cuidados especiais, mormente
Suiá é o nome de uma tribo de índios, que o Sérgio estabeleceu o por ser o motor auxiliar normalmente pequeno.
primeiro contato, nos seus tempos de indigenista. Entrar (ou sair) da baía de Guanabara, por exemplo, com pouco vento,
Na realidade, o barco vale pelos cruzeiros que já realizou; não há sem estar com o motor pronto para funcionar em caso de necessidade, é uma
como deixar de reconhecer. Um barco de oceano que nunca velejou por al- façanha que só a longa prática (conhecimento das correntes e conhecimento
to-mar, não está completo, realizado. Ou nunca foi e está em preparativos do barco) poderá aconselhar. Idem, do porto do Recife e tantos outros.

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Sem o motor estar bom, não saio, mesmo sabendo que ele não será navegação é usar sempre todos os meios disponíveis, sucessivamente.
ligado durante o percurso. Dessalinizador, um simples item, mas de uma utilidade vital.
Esta é uma norma que sempre segui, desde o início. Embora não seja necessário enfatizar, é bom ter a andaina comple-
E devemos instalar o maior motor que o projeto permitir, indepen- ta, inclusive as velas de mau tempo, com algumas velas importantes de
dente do recomendado pelo cálculo em função da velocidade máxima reserva.
do casco, geralmente fornecido pelo projetista. Se o casco for construído Sem dúvida, um barco sem balão está capenga; ela é a principal
mais reforçado, podemos aumentar um pouco a potência do motor, desde vela nos ventos favoráveis, assim como a genoa e a grande nos ventos de
que seu peso seja próximo ao recomendado no projeto. É a tal potência proa. Quem não arma o balão nos ventos favoráveis, não obtém as alegrias
de reserva... maiores, a oportunidade de domínio de novas técnicas, além da beleza de
Existe atualmente uma corrente entre velejadores, nos EUA, para uma vela colorida e bem armada, o barco criando alma nova.
não usar motor auxiliar no barco, o que considero uma extravagância. O barco sem balão poderá demonstrar também que o comandante
Não vai colar; o americano adora motores potentes e mesmo em veleiros da embarcação não confia no barco, está com algum receio ...
vemos a potência aumentar cada vez mais. Além do mais, os motores es- Um detetor de radar é muito útil, principalmente para o solitário;
tão cada dia melhores, mais confiáveis, silenciosos, mais leves e eficientes, ele aciona um alarme toda vez que recebe algum sinal de radar de navio.
suaves no funcionamento e baratos; nada justifica dispensá-los. Assim, navega-se muito mais confortavelmente, sem a obrigação de acor-
Quando eu estava cogitando adquirir o motor do Krum II, minha dar de hora em hora para vigiar o horizonte.
preferência recaía no Westerbeke, no Volvo Penta e no Farymann. Como o E é normal que os navios andem com os radares ligados, uma vez
projeto previa um motor de 10 hp, optei pelo Farymann de 12, mais leve que eles têm naturalmente muito mais medo de abalroamento. Existem
que outros de 10 hp. Naquela época eu preferia largar a poita e retornar equipamentos muito bons, como o collision avoidance radar detector –
da velejada sem usar o motor; hoje, instalaria um motor de no mínimo C.A. R.D, encontrado em qualquer catálogo.
20 hp que não fosse muito pesado e sei que o casco agüentaria tranqüila- O próprio radar é um instrumento fantástico; ano a ano o preço e
mente. Não aumentaria muito a velocidade, mas forneceria maior potên- o consumo de eletricidade estão tornando o seu emprego atraente em
cia de reserva, para ocasiões de necessidade. E um dois cilindros dá mais veleiros; é um instrumento realmente útil, em todas as ocasiões, desde
tranqüilidade. o aspecto de segurança, principalmente em nevoeiro, até à facilidade de
Um bom motor é de primordial importância para qualquer veleiro, identificação do litoral nas aterragens. Já fabricam radares compactos as
principalmente para a recarga das baterias, nas calmarias, nas entradas seguintes firmas: Furuno, Simrad, Raytheon, JRC, e outras. Com a elimi-
de abrigos difíceis e nas manobras. nação do TRC (tubo de raios catódicos), substituído por tela de cristal
Uma ótima bússola de governo, bem instalada e compensada, à vis- líquido, soubrou apenas uma válvula, que parece ser insubstituível: a
ta do timoneiro. magnetron.
Um bom speed/log; um profundímetro (mesmo que seja um velho Um equipamento rádio-transceptor poderá conectar o barco com
prumo de mão); enroladores de velas; leme-de-vento; piloto automáti- qualquer parte do planeta através as inúmeras redes existentes.
co; toilet; um bom conjunto de âncoras com bastante corrente e amarras; O equipamento de segurança deve merecer toda a atenção, obvia-
fogão cardan (basculante); transceptor de rádio (VHF ou SSB-HF), etc. mente (voltaremos adiante ao assunto, pela importância).
Nunca se deixar levar pelo critério de modernidade: tal equipamento já Visor noturno, de qualquer espécie, é de grande valia; tanto o in-
não se usa mais... Se ainda é fabricado, é porque é útil. Uma boa regra de fravermelho, o de luz-das-estrelas ou o térmico, são muito bons. Mas o

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de luz-das-estrelas (luz residual) é o mais indicado para o barco, tendo Certa vez, quando rebocava via rodoviária meu antigo veleiro para
também preço bem menor que o térmico. os melhores abrigos, cheguei em Vitória e um amigo me convidou para
À medida que se vai aumentando o consumo de eletricidade a bor- sair no barco dele, um Guanabara, para evitar o trabalho de colocar o meu
do, é necessário instalar um sistema de células solares, que manterão as n’água, já que eu iria demorar pouco por lá (eu estava revendo Vitória,
baterias carregadas. Células solares ou outro sistema qualquer alternati- mas meu objetivo era velejar em Guarapari); aceitei meio constrangido e
vo de energia: gerador diesel, gerador eólico, segundo alternador no mo- no dia seguinte cedo saímos para os lajeados para pescaria antes do vento
tor, etc. entrar, o que seria aproveitado para a volta.
Tenho um amigo que avalia as qualidades do barco pelos equipa- Notei que o barco apresentava sinais de pouco zelo, fazendo água
mentos eletrônicos nele instalados; é um critério meio exagerado, mas e não tinha bomba elétrica nem manual, sendo o esgotamento feito com
tem uma grande parcela de verdade. Mas ele faz questão de ter no barco balde, achichando, motor com mau aspecto, enferrujado, não tinha cole-
tudo; vai mudando e vendendo os antigos, obsoletos em curto período. tes salva-vida, apenas uma bóia circular, não tinha remos nem bote inflá-
Um equipamento eletrônico fascina, desperta o interesse tanto pela vel, etc. Quando perguntei sobre esses itens, o meu amigo respondeu que
precisão e rapidez como resolve o problema, como pela simplicidade de iríamos para perto; sobre a ferrugem do motor, declarou que o barco era
operação, além de demonstrar a atenção que é dada ao barco pelo coman- veleiro. Quando lembrei que poderia ter trazido o meu inflável com mo-
dante. tor de popa, ele desdenhou e sugeriu a pergunta se eu estava com medo.
Particularmente, considero que um barco que possui GPS, sextante, Respondi que eu não era irresponsável e o estado daquele barco era re-
computador, receptor de ondas curtas, sonda, e uma excelente bússola, almente de dar medo. Mas, como ele ia junto e era o dono do barco, tudo
além do aspecto geral de bem cuidado, apresentando características vi- bem. Sempre fui bom nadador e o prejuízo maior seria dele.
síveis de robustez, deve ser confiável ou tornado confiável sem grandes Saímos lentamente a motor, jogamos duas linhas de corrico pela
esforços. popa; chegada na laje, jogada a fateixa, pescaria razoável, com muito pei-
Um ponto importante é o aspecto do barco, que deve ser o cartão de xe, a maioria pargo miúdo, de um palmo.
visita, a apresentação. Quando o vento entrou, firmando-se de SE e foi aumentando, le-
É claro que não podemos manter um barco antigo com o aspecto de vantamos a fateixa, mas o motor não pegava, por mais que o meu amigo
novo; podemos nos esforçar para que ele seja limpo, bem cuidado, mas o tentasse.
aspecto de barco novo é praticamente impossível manter, mesmo porque Era um motor de centro, à gasolina, partida elétrica, fabricado em
os projetos se modificam de ano para ano. Mas, desde que tudo esteja Joinvile.
em perfeito estado de funcionamento, o aspecto fica em plano um pouco Antes que a bateria arriasse de vez, abri o distribuidor e vi que os
abaixo. Velas escurecidas, com reforços e alguns remendos, marcas dos platinados estavam totalmente corroídos; ainda tentei limpar e raspar
estais e da cruzeta (onde colocamos reforços), adriças já perdendo a cor, com um canivete, mas foi tudo em vão, até a bateria zerar. Içadas as velas,
vernizes já queimados pelo sol, acrílicos já arranhados, âncora já enferru- ele afirmando que com aquele vento chegaríamos fácil ao clube.
jando, etc., dão ao barco a certidão de idade. Sem motor para afilar ao vento e subir a grande, foi uma operação
O próprio formato do casco, com roda de proa (curva, como o nome difícil, mas começamos a velejar de popa. Içada a vela de proa, o vento co-
diz, embora hoje elas sejam retas), roda de popa, escotilhas e vigias pequenas meçou a aumentar progressivamente; um macaco cedeu e o mastro que-
e com grossos acrílicos, próprias de um barco antigo. Nada disto, porém, deve brou na base, caindo para a bochecha de proa. Com o aumento do vento,
preocupar o velejador. Um bom barco de fibra de vidro é indestrutível... levantou mar e o pequeno veleiro parecia um potro selvagem, caturrando

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e balançando, rangendo e com o mastro fazendo barulho, batendo, amar- Depois, verificaremos, por meio de um testador ou uma lâmpada de pro-
rado no convés a boreste, para compensar a força do vento, que entrava vas, se há tensão chegando aos terminais do equipamento. Se tudo estiver
pela alheta do mesmo lado. normal, abrir o equipamento na primeira oportunidade, de preferência
Muito trabalho com o balde para manter o barco flutuando. O úni- em abrigo calmo. Um contato frouxo ou oxidado, um pino fora do lugar,
co consolo é que estávamos indo lentamente no sentido da costa à vista tudo deve ser minuciosamente examinado. Limpar e passar uma lixa dá-
a umas dez milhas. Resumindo, chegamos ao clube quase a meia-noite, gua bem fina (número 600, por exemplo) nos contatos oxidados, retiran-
exaustos, famintos e com sede, rebocados por uma grande traineira que do o pó com um algodão umedecido com um pouco de álcool, aplicar um
quase desmonta o veleiro e ferrou o meu amigo no preço do reboque, pouco de WD-40, se não tiver um spray limpador de contatos.
no que tive que contribuir. Minha esposa, embora acostumada, já estava Se você tiver a bordo (o que é muito bom) um multitester (volts,
apreensiva e levou um susto quando cheguei, todo molhado, descabelado, ohms, ampères) poderá ir mais adiante, verificando os primeiros com-
com cara de poucos amigos. ponentes de entrada de alimentação de 12 volts, até onde puder ir. Não
Com o meu barco tinindo em tudo, fui embarcar numa “canoa fu- adianta tentar maior profundidade nos testes, por ser impossível sanar o
rada” daquela; eu deveria ter “elogiado” o barco, a coragem do destemi- defeito com os recursos existentes no barco.
do comandante, agradecido a atenção e recusado sair naquela roubada, Todo equipamento moderno possui um diodo protetor, para evitar
como faria hoje... queimar o equipamento se os pólos forem inadvertidamente invertidos
Naquele tempo não se falava na Lei de Murphy, mas eu sempre des- na instalação.
confiei que ela de fato sempre valeu. Este diodo é o primeiro componente após a entrada dos fios de ali-
A eletrônica já faz parte da rotina do velejador, desde uma simples mentação no equipamento; ele pode queimar, abrindo o circuito, o que é
calculadora de bolso até aos mais sofisticados sistemas integrados de me- verificado medindo-se a tensão entre seus terminais (que deve ser próxi-
dição, acoplados ao computador do barco. mo a zero, se ele estiver bom) .
O GPS ocupará sempre um lugar de destaque dentre os equipamen- Como o equipamento já está instalado, portanto, com a polaridade
tos de qualquer barco; junto com o sextante, o cronômetro e o computa- correta, não há risco em ligar em curto este diodo, se ele estiver aberto
dor, formam a base do rol de instrumentos insubstituíveis de todo barco (queimado).
confiável, assegurando a auto suficiência na navegação. O interruptor do equipamento será testado da mesma forma.
As falhas do equipamento eletrônico no ambiente salgado do barco Com o motor, é semelhante o procedimento: se ele não funciona é
são causadas em sua maioria por corrosão e por indução; as falhas mais por falta de combustível; verificar, portanto, se há de fato combustível no
comuns são fusíveis, interruptores, mau contato. tanque e se ele está chegando à bomba injetora e ao bico.
A corrosão eletrolítica é a grande destruidora de contatos, conduto- Partir sempre da possibilidade mais simples mais provável para
res, chaves de onda, interruptores, etc. chegar até o limite de onde poderemos ir nas verificações. Se há combus-
Não é preciso ter curso de eletrônica, ou de mecânica, para verifi- tível, tocar na bomba manual de transferência e verificar se ele está che-
car a causa de um equipamento não estar funcionando. Se há tensão de gando até à bomba injetora do motor. Uma sangria deverá ser tentada. Al-
rede (12 v) ou se há alimentação de combustível, ele deve funcionar. Caso gum filtro obstruído pela sujeira ou por água pode ser a causa; a troca do
contrário, começar pela causa mais simples: ou um fusível queimado ou elemento filtrante ou uma limpeza resolverá o problema. Nunca se deixar
falta de combustível. Vamos ver a parte eletrônica, começando pela verifi- levar pela tendência inicial de pensar que o defeito é grave; verificar tudo
cação dos fusíveis: o do quadro de comando e o do próprio equipamento. sucessivamente, torcendo para que seja possível saná-lo. E geralmente é.

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Lembro de muitas vezes em que a pane de equipamentos comple- raios ultravioletas os enfraquecem com certa rapidez.
xos nos afligiu durante os cruzeiros, imaginando a pior. Chegado ao abri- Lembro alguns exemplos recentes de falhas do equipamento eletrô-
go, bem descansados, fomos verificar e raras vezes a coisa era grave. nico durante cruzeiros, por motivos diversos:
A indução elétrica (centelhamento durante a partida do motor, - retorno Noronha - Recife, no Popeye II, curto - circuito e pane
campos nas proximidades, etc.) podem ser evitadas; as mais traiçoeiras elétrica geral, inclusive sem possibilidade de dar partida no motor. Ao ser
são as descargas atmosféricas, para as quais apenas podemos colocar ri- avistada a costa, não identificada, com névoa, para que bordo guinar?
dículas proteções. Metade da tripulação opinou para boreste e a outra, para bombor-
Uma nuvem carregada à baixa altura, induz no solo uma concentra- do, cada um revestido dos maiores argumentos, defendidos com veemên-
ção de igual quantidade de carga; quando a descarga é deflagrada, mesmo cia, correção excessiva da corrente e da deriva, tendência do barco, ma-
para outra nuvem (vamos enfatizar chamando-a de descarga horizontal, nias dos timoneiros, etc.
no céu, entre nuvens), as cargas que foram induzidas (atraídas) no solo Uma visada de sextante e a solução instantânea do laptop resolveu
tendem a se escoar de maneira equivalente, instantânea, como se diz nor- o problema: guinada para bombordo (logo depois confirmada). A gozação
malmente: para terra. sobre o time de boreste foi grande.
Se no solo (na água, no nosso caso do barco) houver uma ponta (o - percurso Ilhéus - Porto Seguro, no Suiá, pane no circuito interno
mastro, no caso) a concentração das cargas será nele e a corrente que se do GPS: pane interna.
escoa será muito grande (tanto pelo poder das pontas como pela forma Decidido o cancelamento da entrada em Porto Seguro, indo-se dire-
fina e longa) e causará, por certo, forte indução com danos ao equipamen- to à ilha de Santa Bárbara pelo canal dos Abrolhos, empregando-se agu-
to eletrônico. lha, com confirmação (ponto) pela astronômica.
Isto, é bom frisar, sem ter havido descarga (raio) diretamente sobre - trecho Abrolhos-Vitória, no Krum II, antes do cabo de São Tomé
o mastro. A única providência que podemos tomar é um bom terra no em calmaria, a motor (curto circuito no regulador de carga da bateria e
mastro com um bom contato com a água. estouro da bateria por excesso de carga, dando como conseqüência forte
Além disso, esta forte corrente fluindo pelo mastro, induz no guar- centelhamento, que resultou em alteração do setup do GPS. Escutei o es-
da-mancebo (uma verdadeira espira) uma alta corrente que pode quei- touro, mas julguei que alguma coisa tivesse caído; examinei o interior do
mar ou decepar magneticamente quem estiver em seu interior: por isso barco, senti cheiro de queimado, mas continuei com o motor ligado.
os cabos de aço do guarda-mancebo devem ter obrigatoriamente uma in- Próximo ao ponto de guinar para Búzios, entre o cabo de São Tomé
terrupção (isolamento) da espira. e as Plataformas, a falha do GPS foi logo notada, comparando com a po-
Isto é de importância capital. sição anteriormente determinada quatro horas antes e locada na carta.
Um cabinho de nylon em várias voltas, formando uma ligação me- Só aí pude ligar os fatos e procurar a causa do barulho escutado: a
cânica e isolando, fornecendo um espaçamento de um palmo, no mínimo, tampa do compartimento de uma das baterias estava fora do lugar e con-
entre o púlpito e o cabo de aço, será o suficiente para oferecer isolamento, cluí que o centelhamento da ruptura da bateria é que tinha sido a causa
mesmo molhado. Evitar a continuidade da espira. da alteração.
Mas tenho visto atualmente vários barcos novos sem esta precau- Outros exemplos, com amigos e conhecidos:
ção. - demanda de um abrigo, à noite: perda do barco sobre os recifes
Parece que esqueceram ou acham que cargas não existem. Ou têm (veleiro de 32 pés de comprimento).
preguiça de trocar os cabinhos periodicamente, uma vez que a ação dos Causa possível: equipamentos portáteis (quatro celulares) coloca-

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dos inadvertidamente na prateleira da bitácula, desviaram a agulha, cau- mento mínimo exigido de acordo com a classificação do barco, os que fo-
sando o acidente. Comandante do barco muito experiente, conhecedor rem considerados importantes, dependendo do grau de responsabilidade
profundo da área, acostumado a entrar e sair do abrigo, mesmo à noite e do bom senso, para cada percurso.
(Maragogí - AL). Ao sair para o mar, o barco deve estar preparado para enfrentar
- navegação com GPS acoplado ao piloto automático (sistema inte- qualquer situação e a falta de um dos itens de segurança será lamentável,
grado): barco subindo nas pedras, conforme fora programado (veleiro de quase sempre vital no momento da necessidade.
40 pés). E devemos ter sempre mais, dentro do razoável; simule uma situ-
Comandante do barco de grande experiência, renomado navegador, ação de ter que abandonar o barco; raciocine no pior, esperando sempre
conhecedor profundo da área (ilha do Pau à Pino - entrada para Angra que nunca aconteça.
dos Reis). Causa possível: adormeceu e o equipamento cumpriu a ordem. Estar preparado representa um grande trunfo na luta para sobre-
Em apenas uma geração o homem saiu da carroça colonial e foi à viver.
Lua. E isto se deve em grande parte à eletrônica. Sem dúvida, ela foi a Manter sempre prontos, ao alcance, o bote (ou balsa), os coletes, o
ciência que mais contribuiu para o progresso, tanto por permitir cálculos saco de palamenta e um saco que possa carregar, reunindo o material de
rápidos e precisos, como pela transmissão segura de comandos e troca de abandono e rações adicionais, como algumas latas de leite condensado,
informações. latas de conservas, algumas garrafas de água mineral, um GPS, um VHF
De nada adiantaria enviar as naves espaciais, satélites e foguetes ao portátil, lanterna estanque, cargas sobressalentes, alguns abrigos de frio
espaço se eles não pudessem enviar informações. que servirão para melhorar a flutuabilidade e mais algumas coisas que
As telecomunicações e o computador eletrônico modificaram mais serão jogadas no saco rapidamente.
a vida do homem moderno que qualquer outra invenção, inclusive a tipo- Um camburão de vinte litros dágua doce não muito cheio para po-
grafia e a imprensa, que também foram transformadas em tarefas casei- der flutuar quando jogado no mar, deve estar à mão; marcá-lo com uma
ras ... Agora juntas, elas revolucionarão por completo a vida nos próximos pequena retinida, que auxiliará também no recolhimento.
séculos... A disciplina de bordo consiste em fazer tudo sempre da mesma
Voltando a enfatizar a questão da Segurança: conjunto de proce- maneira, tudo colocado sempre em seus lugares; isto facilita as coisas em
dimentos, medidas preventivas, equipamentos e conhecimentos que se caso de sufoco.
destinam a garantir a integridade física dos navegantes. Tirar uma lanterna do lugar, ou uma ferramenta, e “escondê-la” em
Portanto, desde a manutenção constante do barco, equipamentos, outro local, é uma falha grave...
boa prática de manobras, conhecimentos necessários para adotar as me- Um rolo de fita adesiva reforçada para emprego múltiplo, tipo sil-
didas em caso de mau tempo e em situações de emergência, conhecimen- vertape, inclusive para reparar pequenos vazamentos em mangueiras;
tos de sobrevivência no mar, enfim, tudo o que se refira ao barco, à previ- cones de borracha; cones de madeira, tarugos; durepoxi e araldite, são
são do tempo, à capacidade de determinar a posição de maneira rápida e materiais muito úteis no barco, normalmente.
segura, comunicações, etc., é em função da segurança. Equipamentos caros, como o Epirb (sinalizador de emergência na
A Convenção Internacional para a Salvaguarda da Vida Humana no freqüência aeronáutica, 121.5 MHz (de socorro), e com um canal via sa-
Mar regula essas medidas e as difunde por todas as organizações ligadas télite, em 243 MHz para as estações terrestres, a balsa de abandono, des-
aos esportes aquáticos. salinizador manual, etc. são sempre boas medidas que devem merecer
O comandante tem por obrigação manter no barco, além do equipa- análise de cada um.

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Um dos itens mais importantes a examinar para um longo trajeto é •  2 anzóis n.º 12 (3 cm)
a fixação de tudo no barco, principalmente os itens mais pesados; desde •  2 anzóis n.º 14 (5 cm)
as âncoras de reserva e a colocada na proa, pronta para ser usada, que •  3 chumbadas n.º 2
pode soltar e se transformar num verdadeiro ariete, garrafas de mergu- •  1 colher de corrico n.º 3 (ter muitas, de várias cores e tama-
lho, geladeiras, garrafas de um modo geral, camburões, panelas, fogão, nhos)
uma machadinha presa insuficientemente na antepara é um real perigo, Instruções de sobrevivência (Sobrevivência no Mar- Celso Rezen-
facas, ferramentas, um extintor com suporte deficiente, até mesmo os pa- de (Ed. Catau)
neiros sem retém, livros, mantimentos, etc.etc. • embalagem com 4 vidros de mertiolate (45 ml cada);
Se normalmente se soltam, imagine durante o mau tempo... • 1 esparadrapo de 5 cm por 4,5m; 3 protetores solares de 120 g;
Pouca gente acredita que os esticadores dos estais podem se soltar • 1 tesoura pequena com ponta redonda.
com a vibração durante a velejada; esquecem de travar. Após dois ou três
dias na orça, com vento e mar rugindo, prender um estai solto no macaco,
é dose. O comandante do barco e a tripulação devem estar atentos para Resumo de Sobrevivência no Mar:
todos os detalhes, examinando, verificando, para agir com antecedência,
antes do mastro desabar. Cinto de segurança sempre...
Muitos itens são importantes manter no barco, mesmo que não se- O principal fator é a vontade de viver.
jam obrigatórios. Não entrar em pânico.
Conteúdo do Saco de Palamenta (flutuante e estanque): Estar preparado para apanhar água da chuva.
• 1 cuia flutuante (caneco térmico de plástico) Durante a chuva, beber o máximo de água que puder, sem se sentir mal.
• 2 esponjas Se não tiver água, não coma (nem mesmo plancton).
• 1 bomba ou fole As latas vazias da ração de abandono devem ser guardadas para
• 1 conjunto para reparos quando chover.
• 1 âncora flutuante Se não tiver água, não beba sangue de aves, de peixes ou de tartaruga.
• 2 remos de pás flutuantes Não beber água do mar nem misturá-la à água doce.
• 1 faca flutuante de ponta redonda Sem água doce, o período de sobrevivência é da ordem de 10 dias.
Bebendo água salgada, este período é de 5 dias.
• 1 apito
Evitar suar; não fazer esforço desnecessário; não se desesperar.
• 2 sinais manuais com estrela vermelha
Estimular a salivação, chupando botão.
• 2 sinais de perigo diurno/noturno
Usar agasalhos; não sentir frio.
• 1 lanterna estanque
O orvalho pode ser apanhado usando uma esponja ou pano.
• 1 espelho de sinalização
Dessalinizador solar: em climas tropicais, em dias de sol, é possível
• Estojo de pesca com:
obter-se 1 litro de água doce por dia.
• 60m de linha de nylon fina, de 0.5mm
Tentar pescar.
• 1 anzol garatéia n.º 1/0 (3 cm) Evitar o enjôo: comprimidos de Dramin B6; Encil; Plasil; Stugeron;
• 1 anzol garatéia n.º 2/0 (5 cm) Rodavam, Vontrol,
• 2 anzóis n.º 10 ( 2 cm) Transdermscop ou Triptone.

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Navegação possível:

Tentar navegar, seja empregando a âncora flutuante ou com velas


de fortuna; o conhecimento da posição para manter a aproximação das
rotas dos navios ou de terra é de vital importância.
O processo mais indicado para o náufrago é o da duração do dia
(LOD, lenght of the day), que não necessita de sextante. O relógio digital
de pulso resolve a questão.
Mas, se você mantiver numa caixa estanque uma calculadora pro-
gramável e um sextante de plástico, pequeno e leve, no saco de salvata-
gem, o problema estará resolvido (as pilhas de uma calculadora progra-
mável duram muitos anos, às vezes três, se forem usadas todos os dias em
alguns poucos minutos).

Laminação do cockpit, convés e teto da cabine (1981)

Modelo reduzido do Krum II (1975)

Terminando a pintura (Bianca Fiberglass, SP-1980)

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Biblioteca do Barco

Os longos cruzeiros representam uma ótima oportunidade para


lermos aqueles livros para os quais nunca encontramos tempo suficiente
no rame-rame de terra. Enquanto lemos, o leme-de-vento trabalha... im-
primindo ao barco a proa convenientemente determinada.
Lançamento n´água ( Setembro/1982)
As paradas nos abrigos para aguardar o vento rondar serão melhor
enfrentadas quando temos novos livros para ler.
Mas é bom selecionar os livros que serão mantidos no barco e os
que têm passagem assegurada apenas temporariamente, para não ficar
carregando peso desnecessário e que ocupa espaço sempre valioso no
barco, absorvendo muita umidade. Por esta razão, sempre fiz resumos
da parte técnica, para não ficar carregando muitos livros, dos quais só me
interessavam alguns detalhes de alguns poucos capítulos. Agora, a digita-
lização facilitou demais.
Ler é adquirir conhecimento, é quase adquirir a experiência rela-
tada, apenas faltando a prática para completar a fixação do aprendizado.
Ler tudo o que estiver ao alcance, é uma boa norma.
Para acompanhar a evolução do esporte, é bom ler algumas revistas
e livros estrangeiros, principalmente sobre a parte técnica. O progresso
leva anos para chegar até aqui... e às vezes passa ao largo.
Outros projetistas: Van de Staad, Bruce Farr, Glen-L, etc.
O Roteiro DHN (Diretoria de Hidrografia e Navegação), da Marinha,
destinado aos navegadores de navios, é também de grande utilidade no
barco. Sua leitura é útil sempre que se estiver planejando um novo per-
Manutenção no ICAR (Iate Clube de Angra dos Reis): curso, cotejando-se com a carta as informações nele contidas. O objetivo

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é ressaltar os detalhes importantes e que poderão passar desapercebidos tes, os guias e diários de bordo publicados nas revistas especializadas,
numa simples olhada na carta. Para informações sobre pequenos abrigos, algumas traduções, como as de Carmem Ballot, nas Edições Marítimas, e
ele não satisfaz, limitando-se a dizer “indicado para pequenas embarca- alguns livros editados e distribuídos pelos próprios velejadores. A Edito-
ções com conhecimento local”. Mas já começam a surgir por aqui os rotei- ra Catau (Cmte. Miranda de Barros) já tem boa quantidade de excelentes
ros que interessam ao iatista, como já existem há milênios lá fora... livros. A Moana Livros é uma excelente opção, uma vez que reúne uma
Muitos iate-clubes, cujos integrantes velejam periodicamente pelo grande parte dos livros sobre mar e aventura; e está melhorando a cada
nosso litoral, podem ser consultados sobre os abrigos mais usados, da ano, estendendo inclusive a possibilidade de aquisições de livros estran-
possibilidade de demanda em qualquer tempo, etc., até mesmo via VHF. geiros. Outras editoras estão incluindo os livros náuticos em suas cole-
A Revista Náutica também vem publicando roteiros muito úteis aos cru- ções.
zeiristas. Fora isso, é tudo descoberto por conta própria, ou conseguindo Via Internet, podemos consultar a Amazon Books, a Alibris e ou-
os trabalhos realizados por cruzeiristas, como por exemplo os do Gomes tras; uma vasta coleção de livros sobre barcos e outro qualquer assunto.
Carneiro. Sobre as revistas, podemos citar a Náutica; a Mar&Mar; a Velejar e
Os abrigos do nordeste brasileiro são locais que dificilmente serão Meio Ambiente; a Mergulhar; a Offshore e outras poucas.
descobertos por quem tem tempo limitado para velejar, excursionar. Mas Artigos de grandes velejadores nas revistas são de grande valor
ninguém se furta a fornecer as informações sobre eles. para a difusão do esporte.
Muitos velejadores têm me perguntado sobre os abrigos existentes Podemos citar os livros de Aleixo Belov (três voltas ao mundo), Ed-
em Cabo Frio ou Arraial do Cabo, logo ali, cerca de 70 milhas velejando da son de Deus, Cabinho (Roberto de Mesquita Barros), Hilvir Cantanhede,
baía de Guanabara. E se espantam quando informo que há inúmeros abri- Miranda de Barros, Sérgio Mirsky, Pancho Audrá, Tolens Link, Amyr Klink,
gos excelentes para qualquer tempo e mar. Em todos estes anos, apenas os Schürmann, João Schmidt, Setti Jr., Coca (Ernane Simões), Márcio Doto-
uma vez não pude concluir a ida a Cabo Frio, devido ao nordestão muito ri, Álvaro Otranto, Aloysio Gomes Carneiro e mais uns poucos velejadores
forte, levantando muito mar, rasgando as duas velas grandes disponíveis escritores, de livros ou artigos em revistas; ao todo, uma quantidade irre-
e a genoa do enrolador: fui obrigado a voltar, mantendo o rumo possível, levante quando comparado ao que se publica lá fora...
defendendo-me como podia. Este fato, por si só, mostra o quanto o desportista brasileiro está
O próprio canal de Itajurú, onde o ICRJ mantém uma sub - sede distante do mar; os motivos, ninguém é capaz de determinar facilmente:
em que podemos reabastecer e reaprovisionar o barco, tanto já entrei lá são muitos. O maior, sem dúvida, é a burocracia. Como um bom veleiro
como saí sob forte SW. custa o mesmo que um carro médio, não se pode afirmar que o poder
A região da ilha de Cabo Frio, se não podemos entrar pelo Boquei- aquisitivo é o principal motivo.
rão, mais por falta de visibilidade, fato que não é raro, podemos contorná- De acordo com a mídia náutica brasileira a situação do setor em
la e entrar entre ela e a ilha dos Porcos, encontrando abrigos excelentes 2004 é a seguinte. O potencial de crescimento do mercado brasileiro fica
na enseada dos Anjos ou na do Forno, praia deserta, onde existe apenas claro na medida em que é comparado com o americano, onde as embar-
uma casa, a do Cel. Bezerra, cavalariano da velha guarda, que nunca per- cações destinadas ao lazer são contadas aos milhões. Aqui, a relação é de
deu o gosto pelas pescarias. Está sempre por lá, ou em sua traineira, pes- um barco para cada 1,6 mil habitantes, enquanto nos Estados Unidos a
cando no Focinho do Cabo, melhor pesqueiro do mundo, segundo ele. proporção é de 1 por 20. Espera-se, portanto, um desenvolvimento subs-
Vale a pena conhecê-lo. tancial. E de olho neste filão, empreendimentos como marinas e lojas de
No Brasil, temos poucas editoras que dão maior ênfase aos espor- serviços começam a proliferar em torno dos negócios gerados pela cons-

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trução das 3 mil novas embarcações fabricadas por ano pelos 116 esta-
leiros registrados pela Acobar. No total, o Brasil tem 654 marinas, iate-
clubes e garagens náuticas, 1247 operadoras de mergulho, 1518 lojas
náuticas e 1242 oficinas e lojas de acessórios e implementos.
A construção particular é, sem sombra de dúvida, a melhor solução
para o cruzeirista; fluxo de gastos, andamento da obra na medida das pos-
sibilidades, etc. Terá que ter também maior dose de paciência. Mas terá Orientação
um produto de confiança, bem melhor que as casquinhas de ovo que são
oferecidos prontos.
A quantidade de publicações sobre os assuntos náuticos demons-
trará sempre o estágio de desenvolvimento do setor em qualquer país.
E o número de veleiros expressa a verdadeira situação do desenvol- Antes da bússola, os astros orientavam os navegantes no mar.
vimento do esporte... Hoje, poucos distinguem e identificam algumas estrelas ou plane-
Com uma coleção de alguns poucos CD-ROMs podemos levar uma tas; raramente se olha o céu...
verdadeira biblioteca no barco, enciclopédias, guias náuticos, coleção de Houve tempo em que eu acreditava que o sentido de orientação era
cartas do litoral e o que mais for desejado. O emprego do computador a um dom natural, assim como é a música, por exemplo; uns nascem com o
bordo é generalizado, desde a navegação até como auxiliar de ensino dos dom do ouvido, do ritmo, aprendem uma melodia num piscar de olhos e
filhos (e dos adultos também), através cursos completos programados, não a esquecem mais; têm sensibilidade.
programas, roteiros, cartas, diário de bordo, resumos, controles admi- Outros, devem desenvolver com persistência e muita força de von-
nistrativos (estoques, manutenção, agenda, etc.), simuladores, enciclo- tade a aptidão, estudar muito, educar o ouvido, para poderem conseguir
pédias, tutoriais, jogos, telecomunicações ( fax, boletins meteorológicos, algum resultado (e outros devem desistir...). Inegavelmente, existe a “que-
etc.) e mais o que for necessário e desejado. da” para determinadas atividades, mas é certo que o treinamento, a edu-
Futuramente teremos os livros todos eletrônicos... cação, o empenho, produzem grandes resultados. E isto vale tanto para a
parte física como para a mental ou intelectual.
Às vezes, gosto de comparar o barco a um violão; dedilhar um vio-
lão desafinado dificilmente produz um som agradável. Da mesma forma
acontece no barco desafinado: você conseguirá andar mas dificilmente
conseguirá bons resultados.
O barco tem que ser afinado, regulado, ajustado para velejar bem.
Da mesma forma que no violão, você pode não ser um Dilermando Reis,
um Genésio Nogueira ou um Turíbio Santos, mas pelo menos deverá estar
com o violão afinado...
Conheci pessoas que pareciam ter o dom do sentido da orientação;
jangadeiros que ao longo de uma vida no mar foram aprimorando a sen-
sibilidade de observação de indícios no alto - mar de modo a saberem

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em qualquer tempo para que lado estava a terra, ou uma ilha distante ou incomoda muito; sempre temos (ou deveremos ter) uma idéia de onde
até mesmo a localização de uma laje ou “cascalho”. Eles já navegavam por nos encontramos, por cálculos mentais simples. Próximos a perigos, a coi-
intuição. sa complica; ficamos naturalmente ansiosos pela colocação da posição na
Mas, como constatei, nenhum deles se baseava em um único indí- carta. No caso de impossibilidade em obtê-la, sair na tangente, no rumo
cio; os astros, o vento, o mar, as aves, a corrente. Quando os indícios não de fuga: cair fora da área perigosa com a proa no rumo adequado o mais
estavam “casando”, recorriam à navegação formal, principalmente à bús- rápido possível.
sola e, ultimamente, ao GPS. Mas muitos mestres de traineira plotam o A navegação tem que ser cômoda, precisa, confiável e fácil de reali-
ponto na carta com o sextante, almanaque e tábua de navegação, pelo Sol. zar, para que possa ser mantida em um pequeno veleiro.
Muitos barqueiros atingem o Atol das Rocas, diminuto ponto em Em percurso longe da costa, não há necessidade de determinar a
pleno oceano, apenas com auxílio da bússola (e a experiência, claro). posição com muita freqüência; duas vezes numa singradura é uma boa
No mar, os indícios são mais sutis que em terra; são também mais escolha e é normal.
variáveis, às vezes fortuitos, mais difíceis de serem notados e devidamen- O sextante permanece útil e é empregado, inclusive, nas naves es-
te interpretados. paciais tripuladas; o bom senso aconselha a sua presença a bordo. A com-
Em alto-mar, é imprescindível que estejamos sempre “navegando”, binação eletrônica/astronômica é a opção adotada por todo cruzeirista
quer dizer, sempre devemos ter uma idéia razoavelmente precisa de onde consciente.
estamos, nunca perdendo o fio da meada. A determinação do ponto na Por orientação, entendemos reconhecer a situação do lugar em que
carta apenas confirma a nossa estimada mental . Isto não significa ficar- estamos, mantendo o rumo correto, pelos indícios do mar, do vento, do
mos escravos da bússola e do odômetro; sentimos o rumo pelo Sol ou por céu, da cor da água, plantas boiando, aves, estrelas, planetas, lua, sol, nu-
outro qualquer indício disponível, estimamos a distância percorrida pela vens, enfim, os mínimos detalhes que indicam o norte.
velocidade do barco, pelo “bigode”. Afinal, a singradura de um veleiro se Em seguida a este estágio, a navegação confirmará a nossa orien-
sitúa em cerca de 100 milhas. tação.
Dessa forma, os nossos sentidos vão se sensibilizando e passamos a Como exemplo de tudo isso, cito o caso do avião que decolou de Be-
notar com maior facilidade as alterações do vento em relação à corrente, lém para seguir para norte, ainda dia claro, com o Sol disponível e visível
às ondas. Uma olhadela na bússola apenas para tirar as dúvidas. Mesmo quase no poente a indicar o rumo.
numa noite escura, céu encoberto, em alto - mar, podemos manter o rumo O piloto, mesmo assim, seguiu para Sul. Até mesmo qualquer es-
pelos indícios naturais. É a experiência agindo... coteiro teria detectado o erro, como o co-piloto o fez e não foi levado em
Há uns vinte anos atrás, a navegação num veleiro era muito traba- consideração (faltou talvez a veemência necessária ao caso). O avião ter-
lhosa; não haviam alternativas. E por isso era muitas vezes relegada em minou por cair na selva amazônica, sem combustível, matando inúmeros
frente a trabalhos mais urgentes, por exemplo, no mau tempo. Algumas passageiros.
vezes, éramos tomados em pleno mar sem o conhecimento da posição. Piloto e co-piloto se salvaram e sofrem as conseqüências até hoje.
Depois de tudo posto em ordem, ou mais ou menos, tratava-se de saber Relembro também uma saída da baía de Guanabara para Cabo Frio
onde fôramos parar naquele temporal. Hoje dispomos de enormes avan- no barco de um amigo. Deveríamos manter o farol da Ilha Rasa pela popa,
ços tecnológicos, verdadeiramente fantásticos, que vieram resolver defi- barco no rumo de 90º verdadeiros.
nitivamente o problema. Ao passar o quarto ao leme, ás duas da madrugada, bordejando
O fato de não saber a posição do barco no mar, longe de perigos, não com bordo de mar, anotei no log a leitura do odômetro e o rumo da agu-

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lha, mostrei o farol de Cabo Frio lampejando pela bochecha de bombordo


e fui dormir. De manhã cedo, um pouco antes de o sol nascer, levantei e vi
dois companheiros tentando identificar as montanhas bem distantes pela
proa, em meio à neblina rala que dividia a paisagem, dizia um que era a
ilha de Cabo Frio e o outro, que mais pareciam as montanhas de Búzios.
Vi estupefato e mostrei que era o Pão de Açúcar, o Sumaré e a pedra
da Gávea, vistas a umas 20 milhas fora: em suma, estávamos voltando. Navegação
Eles não acreditaram e continuaram discutindo; voltei para cama;
eu era um mero tripulante e o comandante que decidisse o que ia fazer.
O que aconteceu foi que quando passei o quarto do leme, o farol da
ilha Rasa acabara de alagar pela alheta de boreste, aparecendo logo de-
pois o lampejo do farol de Cabo Frio pela bochecha de bombordo; o tripu- “Nunca vá para o mar confiando em um único sistema de navegação”
lante que assumiu o leme gostava de velocidade e forçava a arribada, ter-
minando por passar a avistar o farol da ilha Rasa e nele proar, velejando
com boa velocidade, agora com vento favorável. Firmou a proa em cima Erros de navegação geralmente são lastimáveis e o mar não costu-
do farol e continuou voltando, até quase o amanhecer... Daí em diante, foi ma perdoá-los por muito tempo...
uma motorada só até Arraial. Com o atual desenvolvimento dos instrumentos e o aperfeiçoamen-
to dos métodos e processos, ficou muito fácil comprovar a certeza da po-
sição do barco no mar.
Nunca suponha estar certo, ou imagine: calcule, comprove; confir-
me sempre e sempre.
Se estiver navegando entre perigos, carta sempre à vista, conferin-
do. Principalmente quando se está cansado, na ânsia de chegar a tendên-
cia é chutar uma solução qualquer, adotando-a como correta; geralmente
não é e o resultado poderá ser desastroso. No mar, já estamos correndo
perigos; não queira correr riscos adicionais. Apenas velejadores como Ta-
barly e Moitessier não se intimidaram com os acidentes que sofreram; e
foram muitos, pois eles velejavam muito. Nós, simples velejadores teimo-
sos, não podemos dizer o mesmo; um barco perdido por alguma falha,
deixará sempre seqüelas.
Um sistema de navegação confiável deve empregar diversos meios
com determinadas características: fontes de energia independentes; da-
dos recebidos de origens diferentes; operação inteiramente independen-
te entre si; e devem permanecer operantes (não deixar inativo um deles
até que seja necessário entrar em operação).

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A única combinação aceitável e adotada para a navegação em alto Planetas e Estrelas


mar, é a astronômica/eletrônica: empregando o GPS e o sextante, basica-
mente. Para empregar planetas e estrelas, é melhor começar o treinamento
A astronômica com o auxílio do computador (notebook, laptop, ou nos crepúsculos vespertinos, escolhendo astros inconfundíveis. Depois,
uma boa calculadora programável), se constitui numa alternativa cômo- com a prática, tudo ficará mais fácil. Embora o crepúsculo vespertino ofe-
da, econômica e eficiente que pode ser mantida no barco como processo reça menor precisão para as visadas, devido à maior refração, é a melhor
principal ou empregada como processo alternativo ou de reserva. E, nun- ocasião para treinamento.
ca é demais lembrar, estar sempre em condições de efetuar a navegação Os planetas de navegação são Vênus, Marte, Júpiter e Saturno. Mer-
por meio de tábua e almanaque. cúrio pode ser visto algumas poucas vezes; seu aparecimento é rápido e
Embora qualquer pessoa, sem saber nada de navegação, possa de- sua observação é difícil, devido à sua proximidade do Sol. Poucos veleja-
terminar a posição com o auxílio do computador programado, bastando dores já tiveram a satisfação de vê-lo, ao menos. Por isso, não é utilizado
apenas digitar (teclar) os dados solicitados que vão surgindo na tela, é ne- para navegação.
cessário dominar o processo completo da navegação astronômica, muito Como uma compensação pela falta de uma estrela polar sul, de
fácil com computador. grandeza suficiente para a observação a olho nu, parece que Deus colocou
Os navegadores de antigamente, criaram uma aura de mistério em as estrelas mais brilhantes no nosso hemisfério.
torno da astronômica, que persiste até hoje; na realidade ela era apenas A estrela polar sul, a Sigma do Oitante, é difícil de ser avistada, e
por demais trabalhosa, minuciosa e, principalmente, indispensável. Mas muito raros são os navegantes que já a avistaram. Porém, numa noite lím-
não sabemos, ao certo, se esta mística foi criada pelos navegadores ou pida e escura, em pleno mar (longe da claridade e da poluição das cida-
pela tripulação... des), marcando-se quatro vezes e meia o comprimento do braço maior do
O computador desmistificou definitivamente o assunto, com a sim- Cruzeiro do Sul, para sul, poderemos ter a sorte de vê-la balizando o Pólo
plificação do processo, sem artifícios, sem cálculos e a redução total dos Sul celeste: uma visada de sextante confirmará.
trabalhos, melhorando de muito a precisão e a rapidez. Uma estrela que se situe no Pólo, fornecerá a posição imediatamen-
A previsão de todo tipo de falhas aconselha o domínio do processo te: a sua altura é igual à latitude do observador. E a longitude pode ser cal-
clássico da moderna navegação astronômica: o do vertical estimado, de culada em função dos elementos já conhecidos: altura, latitude e declina-
Marc Saint-Hilaire, com ou sem auxílio do computador. ção. Daí a importância da Polaris para os navegantes do hemisfério norte.
E o astro mais utilizado, como não poderia deixar de ser, é o Sol; em No caso da Sigma do Oitante, sua altura acima do horizonte será
todos esses anos, raramente empreguei estrelas e planetas para a deter- aproximadamente igual à latitude do observador. No litoral do Rio de Ja-
minação da posição. Eles são mais observados como pontos de referência, neiro, por exemplo, ela estará cerca de 23 graus acima do horizonte.
ora dando uma idéia da latitude (quando passam na ponta do mastro, Por muitos anos procurei sistematicamente ver a Sigma do Oitante,
como antigamente se fazia), ora como mera referência para a orientação o planeta Mercúrio e o green-flash. A Sigma do Oitante, por ser a nos-
ou o rumo. sa estrela polar (sul); o planeta Mercúrio, por ser visível fortuitamente e
constar do ANB as ocasiões favoráveis. O green-flash, por ser um fenôme-
no dos trópicos e que foi muito citado pelo Almirante Gago Coutinho em
seu fantástico livro A Náutica dos Descobrimentos (em dois volumes); ele
faz muitas referências ao fenômeno, inclusive simulando-o com espelhos.

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Demorou bastante e eu até já estava resignado, quando eles foram quando faltam os alinhamentos de identificação, poderemos recorrer ao
aparecendo em diversas ocasiões, para meu entusiasmo e surpresa. O cálculo para denominar a estrela. E o computador se encarregará do tra-
mais fácil, foi a Sigma do Oitante; com auxílio do binóculo e do sextante balho.
com luneta, para confirmar. Como as estrelas nascem aproximadamente quatro minutos mais
A observação de Mercúrio exige planejamento pois sua aparição cedo a cada dia, vão mudando o aspecto do céu, num verdadeiro rodízio
é esporádica e muito rápida: temos que verificar os momentos em que ao longo das estações do ano.
ele será possivelmente avistado e ficarmos com a atenção voltada para o Existem quatro estrelas muito nítidas, que os antigos denominaram
evento, o que não é fácil devido aos outros afazeres no barco. de Estrelas Reais: elas dividem o céu em quatro partes aproximadamente
O green-flash foi o mais difícil: é como o pipocar de dois flashes iguais, uma vez que suas ARV (ascensão reta versa) diferem entre si de
de máquina fotográfica, quase simultâneos, de cor esverdeada e sem que aproximadamente 90º. São elas: Regulus (do Leão), Fomalhaut (do Peixe
saibamos de onde vem. Muitos cruzeiristas já o observaram, sem atinar Austral), Antares (do Escorpião) e Aldebaran, muito úteis à navegação.
que se tratava dele; viram aquele lampejo inexplicável, registraram no di- Mas os antigos a observavam mais porque houve tempo em que indica-
ário de bordo apenas como fato estranho; em solitário, ficamos confusos, vam o início das estações ( no HN).
matutando sobre o ocorrido, sem ter alguém para confirmar a mesma im- As estrelas são verdadeiras balizas, mostrando a latitude.
pressão. Indo, por exemplo, do Rio de Janeiro para Noronha, navegando ao
Para efeitos de navegação, no HS, basta identificar algumas poucas largo, quando Sirius estiver na ponta do mastro (na sua passagem meri-
constelações: diana), estaremos na latitude dos Abrolhos, ou muito próximo dela. Spica
• Cruzeiro do Sul (da Virgem), indicará quando estivermos entre Aracaju e Maceió. Rigel,
• Orion próximos à latitude de Recife. Haverá sempre uma estrela que passe na
• Escorpião ponta do mastro no decorrer do cruzeiro: nela deveremos estar de olho.
• Pegaso
• Gêmeos
Cada uma oferece as estrelas e os alinhamentos necessários para a O Sextante
identificação do céu.
As Três Marias, cinturão do Orion, indicam para um lado (SE) Si-
rius, do Cão Maior, a estrela mais brilhante do céu; para o outro lado (NW) Após sua invenção, em 1730, simultaneamente na Inglaterra (John
e a igual distância, Aldebaran, do Touro. Ao S de Sirius, Canopus se desta- Hadley ) e E.U.A. (Thomas Godfrey), levou cerca de trinta anos para ter
ca. Orion fornece mais: Rigel (vértice SW do quadrilátero que caracteriza seu uso generalizado entre os capitães de navios, só se firmando graças
a constelação), Bellatrix (vértice NW) e Betelgeuse (vértice NE). Procyon, ao aparecimento do cronômetro, em 1760 (Harrison), que permitiu de-
no alinhamento de Aldebaran e Betelgeuse, para Leste. terminar a posição do barco com grande facilidade, rapidez e aceitável
A nossa constelação, Crux (o Cruzeiro do Sul), além de Acrux ( Alfa precisão.
Crux, o pé do braço maior da cruz) e Gacrux, identifica Hadar e Rigil Kent O cronômetro pode ser um bom relógio de quartzo, comum, de pul-
(do Centauro), além de outras. so, que tenha a função lap (é uma qualidade interessante e deve ser cogi-
E assim por diante, dividindo o céu em partes e identificando as tada na escolha do relógio; quase todos a possuem).
estrelas mais brilhantes, terminaremos por conhecer as principais. Mas, Resumindo: ter um relógio comparador (aferido) na HMG, dois re-

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lógios de pulso na HMG, um cronômetro para facilitar a tomada das horas feita com os olhos abertos. Este olho mestre é o que deve ser usado para
das visadas, com lap, e um bom relógio de antepara na hora legal. É o as visadas.
eqüivalente a uns cem dólares de relógio, verdadeiras jóias da tecnologia No começo do treinamento, os valores obtidos para o SD serão mui-
moderna... to diferentes dos verdadeiros (e incluídos no programa, calculados para
Nos últimos anos, o sextante foi grandemente aperfeiçoado, o que cada caso). Com o continuar das visadas, vamos conseguindo melhorar,
melhorou a precisão das visadas: descobrindo e corrigindo nossos defeitos. Depois disso, não esquecere-
• na parte mecânica: tambor micrométrico e parafuso sem fim mos mais o jeitão de como obter uma boa visada. Após conseguir bons
• na parte ótica: visor de vista completa (full-view), filtros e lune- resultados em terra, repetir o treinamento no barco, na poita, abrigado.
tas. Assim, estaremos a meio caminho para obter boas retas no mar.
Um sextante de boa qualidade terá um ei (erro instrumental) de no O sextante de plástico, utilizado a princípio como reserva, ao lon-
máximo 2’ (mas podemos aceitar um pouco mais). go do percurso sempre assume a função principal, face às vantagens que
Com o surgimento dos teodolitos eletrônicos, surgiram os sextan- apresenta. Sua única desvantagem é a fragilidade; todo cuidado é pouco.
tes correspondentes, com botão de acionamento do cronômetro/leitura E ele desajusta com maior facilidade.
automática da altura, com computador acoplado. Até mesmo o horizonte O emprego do sextante é agradável e fornece grande confiança a
não é necessário. quem o utiliza; é de fácil manuseio, devido à sua simplicidade.
Exemplos: o CelNav e o NavComp da Platt. Mesmo com o GPS, a posição deve ser checada periodicamente por
Com cuidados periódicos, mesmo com os sextantes de plástico, po- meio do sextante, o que serve também de treinamento, mantendo o pro-
demos obter boas visadas, bastando que o mantenhamos bem ajustado, cesso ativo.
o que pode ser conseguido controlando-se o erro instrumental (processo O sextante do futuro, de acordo com o Instituto de Navegação, Wa-
ei, SD). shington, DC, será parecido com uma pequena filmadora, com computa-
Além disso, cada observador terá que corrigir seus próprios defei- dor embutido. Um tambor ótico com codificador substituirá os espelhos e
tos, o que só é conseguido com o treinamento. O processo de determina- o setor dentado do arco. As leituras serão introduzidas automaticamente
ção do erro instrumental e do SD (semi-diâmetro), não necessitando do no computador, que fornecerá a posição apenas com o acionar de um bo-
horizonte, pois visa-se diretamente o Sol, pode ser praticado de qualquer tão (na ocasião da visada).
lugar, desde que se aviste o Sol. Inclusive da varanda do apartamento. Exemplos: o Celnav Electronic Sextant e o C.Plath Electronic Navs-
É necessário, em alguns casos, onde os filtros da visada do hori- tar Professional Sextant. As visadas das estrelas serão enormemente fa-
zonte não são suficientes para a visada direta do Sol, de maneira cômoda, cilitadas por um visor especial. Para o caso de mau tempo, o instrumento
introduzir pequenos pedaços de acetato (de radiografia) entre cada filtro, pode realizar uma serie de visadas e adotar a altura e a hora compensa-
até obter bom obscurecimento para a visada direta. É um cuidado de fun- das.
damental importância, para não afetar o olho.
O segredo da boa visada está no cuidado com que ela é feita: capri-
char, portanto.
Verificar qual o “olho mestre”: com os olhos abertos, levante um
braço e faça pontaria por intermédio de um dedo sobre um objeto dis-
tante. Feche um olho de cada vez : o “mestre” é o que mantém a pontaria

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O Computador O computador (ou a calculadora) nunca apresentou defeito nos per-


cursos que realizei; o GPS, quando a bateria está um pouco descarregada
(abaixo de 12 volts), pode oferecer posições erradas. Isto pode acontecer
Atualmente, com a invasão do computador nos lares, a maioria já também por mudanças fortuitas do setup, por causas não identificadas
o manuseia como se fosse um eletrodoméstico; já não se pode prescindir (transitórios, indução, etc.). Deve-se tomar precauções para evitar inter-
dele. O mesmo acontece no barco, principalmente para a navegação. ferências do rádio com o GPS.
Infelizmente, houve também uma grande demora na adoção do Além disso, o americano pode desligar o sistema, o que já aconte-
computador no Brasil; de 1980 até hoje, já são passados mais de vinte ceu inúmeras vezes.
anos... e ainda se discutem por aqui argumentos da idade da pedra lasca- É bom, portanto, manter a auto-suficiência também e principal-
da... mente na navegação.
No barco, as calculadoras programáveis foram adotadas nos mea-
dos dos anos 70; quem não lembra das HP-45 e depois das HP-65? Eram
peças fantásticas, depois substituídas pelos laptops. Aliás, é preciso res- Céu
saltar que muitas coisas fantásticas hoje são encaradas com grande na-
turalidade, sem ao menos serem lembradas a luta enorme que foi desen-
volvida para conseguí-las, as dificuldades da época, etc.: relógios quartzo A Carta Celeste do Brasil, de autoria do astrônomo Ronaldo Rogé-
digitais de alta precisão, sextantes precisos e duráveis, laptops com gran- rio de Freitas Mourão, editada pela Francisco Alves, é de grande utilidade
de memória e programas fantásticos, a fibra de vidro, fibra de carbono, para a identificação do céu do Brasil.
tecidos especiais de velas, kevlar, mylar, etc., sistemas de comunicações Ela é constituída por um disco giratório contendo a representação
globais, pilotos automáticos, lemes de vento, dessalinizadores, etc. do céu e de diversas máscaras correspondentes à latitude do observador;
A dificuldade maior é encontrar programas prontos, adequados, é auto-explicativa.
precisos e objetivos. Para locar a posição dos planetas, de acordo com a ARV (ascensão
O emprego do computador no barco tem como objetivo apresentar reta versa), empregar fitas adesivas de cores diversas, uma para cada pla-
um instrumento de cálculo independente de tábuas e almanaques, ofere- neta: vermelha, para Marte, branca, para Vênus, etc. Locados os planetas,
cendo uma maneira rápida e cômoda de calcular, para auxiliar, junto com conferir pela hora da passagem meridiana no próprio girar do disco, pe-
o GPS, antes (na fase de planejamento) e durante os cruzeiros, principal- las horas, que deverão ser registradas na borda.
mente os de longa duração. Para o aprendizado da navegação, o calcular O starfinder será empregado para outros céus; o nosso, já está iden-
facilita demais. tificado...
O GPS é analisado e muitos detalhes de operação são fornecidos.
Desde a determinação da posição do barco e dos cálculos mais fre-
qüentes, até aos problemas mais complexos, o computador transforma Tábuas de Navegação
a navegação numa tarefa agradável, além de facilitar o estudo prático de
Astronomia de Posição, por permitir melhor e mais rápida compreensão
do assunto, evitando o laborioso roteiro de cálculo, consumidor de um Por uma questão de bom senso, devemos ter sempre no barco uma
tempo precioso. tábua de navegação simples, cômoda e precisa.

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A Radler preenche estes requisitos; é a DN-4-2, publicada pela DHN. Sistema Global de Posicionamento
Elaborada pelo Comandante Radler de Aquino, da nossa Marinha, é Global Positioning System - GPS
muito útil e cômoda (é constituída de apenas um volume).
Embora ela seja de dupla entrada, após acostumar com o processo
(mecanizar), é muito fácil e cômoda. É operado pelo governo dos EUA e está em desenvolvimento cons-
Outras tábuas são disponíveis, mas não há vantagem em adotá-las. tante, com aperfeiçoamentos rápidos e principalmente com uma verti-
Apenas a do Almirante Davis apresenta um detalhe prático muito inte- ginosa diminuição dos preços, o que o generalizou no meio náutico, tor-
ressante: você visa as estrelas e determina a posição do barco sem ne- nando-o instrumento indispensável em qualquer barco de cruzeiro, não
cessidade de identificá-las; se desejar saber o nome das estrelas visadas, necessariamente de oceano.
poderá ir ao final da tábua e identificá-las. Como ela é uma tábua baseada Ele oferece uma solução precisa, rápida e cômoda ao problema da
no ponto Vernal, só é válida por épocas, de cinco anos de intervalo. determinação da posição, independentemente das condições meteoroló-
gicas.
O manual do equipamento deve ser bem estudado para o domínio
da operação, que deve ser absoluto, através o treinamento em qualquer
oportunidade, mesmo em simples velejadas de fim de semana.
Num dos percursos de volta da região de Cabo Frio, enchi o equipa-
mento com boa quantidade de waypoints, para efeito de treinamento, em
rota escolhida bem mais próximo à costa do que o costumeiro. No través
da Ponta Negra, anoiteceu e entrou um nevoeiro daqueles de cortar fatias
com facão ; não se enxergava nem os lampejos do farol da Rasa, logo ali
pela proa.
Liguei o motor e vim em navegação cega, pelos waypoints, só conse-
guindo enxergar o Pão de Açúcar a menos de cinqüenta metros.
Sem o GPS, eu teria sido obrigado a aguardar as condições melho-
rarem lá fora, o que com nevoeiro não é nada agradável, além de próximo
ao porto do Rio de Janeiro...
Embora o equipamento forneça soluções gráficas em diversos mo-
dos, devemos sempre locar na carta a posição.
No início, entusiasmado com o GPS, mil vezes melhor que o Satnav,
relaxei nessa medida importante.
Mestre Rosalino no rumo de Noronha, na segunda forra Num dos cruzeiros aos Abrolhos, após montar o cabo de São Tomé,
dei bordo de praia bem longo e cheguei bem mais próximo à praia do que
costumo fazer, já bem além de Atafona (parece que o GPS nos fornece
maior confiança também neste aspecto...).
Continuei em bordejos curtos, quando resolvi locar na carta a posi-

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ção: pude ver bem nítido que se continuasse naquele procedimento, iria • durante o mau tempo, desligar o GPS.
passar em cima das extensas linhas de pedras que existem em frente a • com muitos waypoints registrados, o consumo do instrumento
Itabapoana, que chegam a quase duas milhas da praia, como o Baixo dos aumenta muito.
Moleques e o Baixo do Côco. Eu imaginava estar distante deles... Em nave- • várias vezes o americano desligou o sistema, algumas proposita-
gação, nunca devemos imaginar, supor... As palavras chave são confirmar, damente.
calcular, determinar. • ativada uma rota, ao necessitarmos arribar para um abrigo não
Em diversas outras ocasiões, corri perigos por excesso de confiança previsto, não
no equipamento, esquecendo que ele não enxerga...Seguindo apenas a so- • esquecer de avisar ao equipamento que mudamos de opinião...
lução gráfica apresentada na tela do instrumento, é difícil atinar que uma • empregar o modo simulator na fase de planejamento da navega-
deriva maior poderá levar a situações perigosas, à noite, com pouca visi- ção.
bilidade, principalmente em veleiros (bordejando). O costume de plotar a Termos que não devem causar dúvidas: waypoint, bearing (BRG),
posição na carta me livrou várias vezes do pior. track (TRK), crosstrack error (XTE), velocity made good (VMG), estimat-
Os erros de operação são comuns: você registra as coordenadas dos ed time enroute (ETE), estimated time of arrival (ETA), man overboard
waypoints para um desejado trajeto e no meio do caminho, por qualquer (MOB), desired track (DTK), course deviation indicator (CDI), turn, leg,
razão, resolve arribar a um abrigo não previsto na rota; digita as novas soa (speed of advance), setup, simulator, Mark, active route; Goto.
coordenadas, mas esquece que a rota antiga ainda é a ativa. Temos que Sempre treinar a operação do equipamento durante os percursos,
avisar ao equipamento que mudamos de idéia, claro... observando os detalhes e aperfeiçoando os conhecimentos.
Só a prática evitará as falhas de operação. Comentários práticos sobre manuseio e operação do equipamento:
A solução de acoplar o GPS ao computador com cartas digitalizadas, • GPS e respectivo manual de instrução: não ter dúvidas sobre a
de modo a ver a posição automaticamente no display, está se generalizan- operação.
do; é o máximo. • Sextante: leitura (escalas, tambor, precisão, ei, olho mestre);
Bearing (BRG), é visada; Track (TRK), é rumo; entre dois waypoints, toda visada exige uma comprovação da sua perfeição; leitura das escalas.
se o XTE = 0 (erro de rota = 0), o BRG será igual ao TRK. Pense sempre Marque , para o anotador, sempre na crista da onda. Caso do solitário: a
nisso. contagem dos três segundos (um mil, dois mil, três mil) para acionar o
O instrumento vai abandonando os waypoints atingidos, automati- cronômetro (não esquecer de abater).
camente, passando ao seguinte. • Computador: programa; rotinas; cuidados.
Cuidados no emprego do GPS: Com o surgimento dos laptops, com cada vez melhores baterias re-
• seja qual for o modo preferido (modos gráficos ou modo direto), carregáveis, o computador invadiu o mundo náutico:
devemos • cálculos rápidos, principalmente na navegação, programas espe-
• sempre utilizar todos (independente de preferência pessoal) e ciais;
plotar sempre a posição na carta. • com alguns poucos CD-ROMs, ficam disponíveis bibliotecas intei-
• deve haver uma bateria exclusivamente para o motor do barco, ras, enciclopédias, dicionários, livros técnicos, programas de ensino, cur-
de modo que o centelhamento por ocasião da partida não irradie pela sos, processadores, simuladores, compiladores, tradutores, etc.
rede para os demais instrumentos. • controles gerais no barco, de manutenção, suprimentos, localização
• antes de ligar o motor, sempre desligar o GPS (e o rádio). dos utensílios, roteiros, cartas, biblioteca de cartas, lista de waypoints, etc.

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• livro de bordo, anotações, agenda, etc visada, além de oferecer oportunidade de bom treinamento.
• telecomunicações: redes mundiais e locais, faxes, faxes meteoro- Há no comércio de usados excelentes sextantes japoneses, plastifi-
lógicos, Internet, etc. cados, precisos e de preço razoável.
• acoplamento ao GPS: plotter, cartas digitalizadas, piloto automá- Antes de zarpar para o Caribe, o Suiá teve incorporado um sextante
tico, sensores, etc. holandês, revisado, tinindo.
Num dia límpido em Salvador, no Iate Clube de Aratu, resolvi de-
terminar o erro instrumental e não dava certo: resultava sempre em erro
Custos: a curto e a longo prazos. nulo ou irrelevante. Repeti a operação várias vezes, constatando erro
zero. Para mim, até aquele momento, era inacreditável haver algum sex-
tante (ou outro qualquer instrumento) com erro nulo. Dentro da preci-
O GPS, a curto prazo, é mais barato que um sextante, mas a longo são de um bom sextante (cerca de 1 décimo de minuto, ou 6 segundos, o
prazo perde. método e a maneira de determinar o seu erro poderá fornecer erro nulo
O sextante, de preço um pouco mais elevado, dura uma vida inteira, ou irrelevante. O sextante é, como já foi dito, o calcanhar de Aquiles do
enquanto o equipamento eletrônico é consumido pela maresia em muito processo astronômico; além disso, os erros devido ao balanço do barco
maior escala. podem ser grandes, além dos erros próprios do operador.
Hoje, pode-se encontrar ótimos sextantes por preço equivalente ao
do GPS. Consulte www.celestaire.com e veja os diversos modelos de sex-
tantes, prestando atenção no Astra IIIB, que é o campeão de vendas e de O Campo Magnético da Terra
menos de quinhentos dólares de preço. Inclua na compra o livro de Bruce
Bauer “Sextante Handbook”, vale o preço.
A evolução do equipamento eletrônico também é outro motivo para Nosso planeta está envolto por um campo magnético, denominado
a necessidade de ter aquele novo equipamento, última palavra... campo geomagnético, que é gerado principalmente pelas correntes elé-
Não podemos ficar muito tempo com o mesmo equipamento, tor- tricas na periferia do núcleo semi-derretido e também influenciado pelas
nado ultrapassado, principalmente no setor de comunicações e informá- manchas solares e tempestades magnéticas, além de outras influências
tica: telemática. menores e localizadas esparsamente pela superfície.
Os cuidados com o sextante são indicados no manual do instrumen- Ele é decomposto em uma componente horizontal, Bh, que aponta
to (evitar a maresia, limpar os vidros e espelhos sempre com flanela lim- para o Norte Magnético, e uma Bv, vertical. O plano destas duas compo-
pa, etc.). nentes é denominado meridiano magnético.
São normais as desregulagens do sextante; devemos sempre checar O ângulo I do campo B com a horizontal, recebe o nome de Inclinação.
o perpendicularismo dos espelhos (com ele colocado em cima da mesa, O ângulo de Bh e o Norte Geográfico, contado positivamente para
olhar o arco pela visão direta e refletida: elas devem ser contínuas, não Leste, é denominado Declinação Magnética.
devendo ter dente). Outra maneira, é visar o horizonte com o instrumento Todos estes valores dependem do lugar e variam lentamente ao
a zero: não deve haver dente no horizonte. Além disso, periodicamente longo do tempo.
efetuar a determinação do erro instrumental ( ei ), comprovando pelo SD. Geralmente, esta variação é no mesmo sentido; porém, os pólos da
Essa comprovação do SD demonstra também a perfeição da nossa Terra já passaram por algumas inversões, com o Norte tornando-se Sul e

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Licio Maciel

vice-versa. É bom ter isto em mente...


No Equador Terrestre, a declinação magnética é mínima, aumen-
tando para o equador, podendo atingir valores extremamente altos para
posições geográficas relativamente próximas.
As linhas isogônicas, ou simplesmente isogônicas, são o lugar geo-
métrico dos pontos sobre a superfície terrestre que têm a mesma decli-
nação magnética. Forma Física e Saúde
O instrumento que mede a intensidade do campo magnético (decli-
nação e inclinação magnéticas) é o magnetômetro.

É importante que tenhamos hábitos saudáveis, sem vícios, prati-


cando esportes, fazendo ginástica, corridas, natação, mergulho e... muitas
velejadas.
Além de excepcional higiene mental, a velejada em si é um ótimo
exercício e com influência altamente benéfica na parte psicológica.
Mas, quando passamos muitos dias velejando sem atribulações,
com mar sempre calmo e ventos camaradas, sentimos naturalmente ne-
cessidade de fazer ginástica a bordo; qualquer apoio servirá de barra,
qualquer área livre servirá de prancha de abdominais, a gaiúta de entrada
da cabine é uma ótima barra de paralelas, etc. Mas, cuidado para não se
machucar.
A adaptação à vida no barco é de fundamental importância; não se
deve fazer uma modificação brusca nos hábitos diários, na rotina alimen-
tar, etc. Uma mudança progressiva é essencial, para que o organismo não
se ressinta demais. E isto é ainda mais importante para o solitário.
Em Búzios (ilha Rasa), com a esposa
Começar os longos cruzeiros, portanto, devagar, como quem não
está ainda zarpando... pequenas paradas em abrigos para reajustes do
equipamento, arrumação do barco, aproveitando as delícias dos locais
sem poluição, exercendo atividade física, natação, mergulhos, acostuman-
do o corpo, regularizando, enfim, a nova forma de vida, estabelecendo
rotina ...
Quando saio do Rio de Janeiro, se vou para o N, a parada inicial, de
cerca de 5 a 10 dias, é em Arraial do Cabo e Búzios; na espectativa de en-
trada do SW, é dada a largada.

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

Se o objetivo é para o S, a parada é na Ilha Grande ou Angra dos Reis. Poluição


O difícil é querer sair de lá... Com o barco e a tripulação tinindo, começa
realmente o cruzeiro, com a rotina de bordo, os quartos no leme, a comida
(rápida, simples e boa, principalmente se a pescaria ou mergulho foram Por afetar a saúde, é um assunto que diz respeito a todos nós, habi-
proveitosos no abrigo, o que sempre acontece). tantes do planeta água. Devemos ser intransigentes neste aspecto quando
Alguns preferem sair de uma vez, direto, por acharem que a adap- se tratar do nosso raio de ação; mesmo que todos poluam, que o lugar seja
tação vem mais rápido. extremamente sujo, não devemos contribuir nem um grama para piorá-la.
Talvez seja verdade, mas o sofrimento é muito maior, até acostumar Não podemos aceitar passivamente o que estão fazendo com o mar,
com as novas condições. julgado pelos burocratas como sendo uma lixeira geral.
Para os cruzeiros longos, manter o barco limpo, higiênico, é um Quem conheceu a baía da Guanabara sem poluição, até a década de
sério problema. Não se pode relaxar nesse item. Não deixar o barco se 70, com águas cristalinas, peixes em grande quantidade, inclusive jaman-
transformar numa tapera flutuante. Quanto maior a tripulação, maior o tas, tartarugas e grandes peixes, sente um enorme desgosto, uma grande
problema (aí uma outra grande vantagem do solitário...). Para facilitar a tristeza, ao ver em que a transformaram.
faina, ter sempre boa quantidade detergentes, sabão, desinfetantes, etc. Mudar de paragem, levar o barco para bem longe? Será que é a úni-
Os vícios são incompatíveis com o esporte; cigarro é um perigo num ca alternativa?
veleiro, considerando o nylon e o dacron do velame - estragar uma vela Conheci regiões fantásticas há trinta anos, limpas: o Pantanal, o rio
por causa do cigarro é imperdoável... O fumante nunca será um velejador Negro, o Amazonas, o lago do Paranoá, a lagoa dos Patos, a baía de Gua-
confiável, e muito menos um cruzeirista eficiente, responsável. Aliás, o nabara; hoje, está tudo poluído. Até mesmo o nosso litoral já apresenta
fumante, em princípio, é um fraco, dominado por um pavio fedorento, que sinais assustadores de poluição.
incomoda demais... Imaginem num veleiro. O inditoso puxador de bafora- Velejar de Vitória aos Abrolhos seguindo uma imensa mancha de
das não será nunca bem aceito em atividade alguma. Haverá sempre um óleo, contínua, deixada pelos navios, é de doer o coração. Até as linhas de
não fumante tão bom quanto ele, que lhe tomará o lugar na tripulação. pesca ficam imprestáveis, totalmente sujas de um óleo grosso, parecido
Quanto à bebida, não é preciso dizer muito; ela só se justifica so- com graxa. Por este motivo, não vejo exagero na luta persistente dos eco-
cialmente, em ocasiões especiais, nas comemorações, etc. e somente para logistas: é necessário tomar providências urgentemente, do contrário não
não ficar diferente dos demais, sem copo na mão, para não ser descortês haverá mais esperanças. Talvez já seja até tarde demais...
com os anfitriões. A nossa grande barreira de corais já está desaparecendo; nela, só
Quanto às drogas, sem comentários; existem meios mais rápidos de as pedras de arenito vão aumentando. Os corais estão diminuindo rapi-
suicídio. E menos caros... damente; em conseqüência, os peixes vão também desaparecendo, rare-
Existem outros pequenos vícios adquiridos naturalmente, sem ando, as aves desaparecendo dos locais onde antes eram numerosas. Os
que nos apercebamos, mas que devem ser evitados, descartados; a gente tubarões, em falta de alimentação, aproximam-se das praias para aboca-
chega à conclusão que o bombardeio da propaganda nos leva a adotar nhar os banhistas.
procedimentos completamente desnecessários por pura sugestão ou por Dentro de poucos anos, se não houver uma mudança radical de pro-
imitação. Um longo cruzeiro demonstrará quais esses cacoetes... cedimentos, teremos de diminuir o ritmo respiratório para não sermos
Um item de grande importância para o cruzeirista é, naturalmente, contaminados pela poluição atmosférica.
o referente à caixa de primeiros socorros; ela deve ser bem suprida. Os atletas começarão a morrer primeiro, mais cedo que os sedentários.

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Em seguida, os esportes serão terminantemente proibidos... O Esportista


O homem será, então, barrigudo, branquela, caixa dóculos fundo de
garrafa, cabeça avantajada, magricela, totalmente afastado da natureza e,
na certa, assexuado... Sem dúvida, um modelo alternativo de desenvolvimento sustentá-
Triste destino de uma espécie em extinção... vel começará principalmente na reconstrução da sociedade, uma socie-
Há muito que evito mergulhar na baía de Guanabara... muitos ami- dade consciente: a educação ambiental, a conscientização do cidadão, a
gos mergulhadores morreram por doenças misteriosas que os médicos formação de lideres da defesa do meio ambiente, leis mais severas, fisca-
chutam qualquer coisa... desde tosse (e que tosse...), até câncer. lização constante. Mas não podemos esperar as décadas necessárias para
Desde a primeira conferência internacional sobre o meio ambiente, isto vir a fazer efeito.
em 1972, em Estocolmo, até a Rio-92, temos visto e sentido um grande O atleta terá, forçosamente, um papel fundamental nessas mudan-
esforço em prol da preservação da vida e do meio ambiente. Mas a po- ças; mas ele terá que sair do seu dia a dia e participar de maneira direta
luição aumenta em muito maior escala, de maneira incontrolável, devido neste contexto, por ser de urgência vital.
principalmente ao comportamento da sociedade baseado no consumo e Em 1980 (já lá se vão mais vinte anos...), um grupo de mais de cem
na ostentação, no uso irracional dos recursos naturais e no modelo ado- atletas realizou um protesto, em Niterói, contra a poluição da Baía de
tado de desenvolvimento. Guanabara. A família Grael, liderando o movimento (irmãos Grael (Axel
E o exemplo mais expressivo é o da Baía de Guanabara: despejaram Schmidt, Torben e Lars). De lá para cá, nunca deixaram de batalhar no
(?) um mundo de dinheiro em vão e a poluição continua a aumentar. mesmo sentido.
O relatório da Associação de Empresas de Engenharia do Rio de Foi criado, também por atletas, o Instituto Baía de Guanabara - IBG,
Janeiro, publicado em Dez/98, denuncia que os despejos poluentes lan- que vem desenvolvendo esforços para o surgimento de uma nova menta-
çados diariamente nas águas da baía chegam perto da impressionante lidade principalmente nos jovens.
marca das oitenta mil toneladas, a despeito dos esforços desenvolvidos e O Comitê Olímpico Internacional tem tomado inúmeras iniciativas
do dinheiro gasto. Em conseqüência, a baía morrerá, como já estão quase firmes em proveito de um pacto pela terra, com a adesão de todas as Fe-
mortas a baía de Sepetiba, a lagoa de Marapendi, a lagoa de Piratininga, derações Esportivas Internacionais, um compromisso de cooperação para
enfim, tudo o que nos cerca. que a Terra se torne um lugar seguro e habitável para as futuras gerações.
Assim, chegaremos rapidamente aos índices de Cubatão, inexora- O COI e a PNUMA - Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente,
velmente. assinaram um importante acordo de cooperação, em 1994.
A poluição do mar, dos rios, do ar, a contaminação por agrotóxicos, Em conseqüência, o critério ambiental representa um item de peso
metais pesados, o desmatamento e a aceleração da extinção de espécies, na seleção das cidades para a realização dos eventos esportivos.
atingem atualmente níveis insuportáveis e sempre crescentes. O Comitê Olímpico Brasileiro - COB criou, em 1997, sua Comissão
O Brasil terá em breves anos uma população de um bilhão de ha- de Meio Ambiente.
bitantes. A China terá o dobro e assim por diante. Mesmo os países ricos Em Curitiba, foi realizado o Seminário Sul-Americano de Esporte e
adotaram o controle da natalidade, o planejamento familiar. No Brasil, a Meio - Ambiente, em 15/05/98; o papel do atleta é, portanto, de grande
Igreja não o admite, mas quem vai sustentar a família não é a paróquia... importância neste contexto.

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O Velejador

O velejador é, dentre todos os esportistas, o mais ligado à natureza:


o vento, a água, a corrente, as marés, as ondas, o tempo, o céu, o Sol, os
planetas, as estrelas, a Lua, enfim uma dose muito grande de coisas natu-
rais, de meio ambiente. Alimentação
A Natureza é a nossa filosofia de vida; sem ela não será possível
manter o barco velejando; não haverá motivação.
Velejar em águas poluídas é motivo de grande tristeza.
Por isso, devemos ser intransigentes defensores da Natureza e pro-
pagadores de tudo que se refira ao assunto. “ Como mal, perco a vontade de fazer as coisas. Não me sentia em forma,
Sob hipótese alguma, deveremos contribuir para aumentar a polui- pois não fizera uma refeição decente em vários dias...” - Moitessier, em sua
ção do local onde velejamos, mesmo que o local seja altamente poluído. Longa Jornada.
A ganância está decretando a pena de morte do planeta. Vamos fi-
car de braços cruzados? Abordaremos este assunto, com o propósito principal de conscien-
tizar o cruzeirista da necessidade de manter uma boa alimentação, não
relaxando na cozinha.
A parte referente à alimentação é um dos problemas mais difíceis
num barco. Se você quer passar muito tempo no barco, em longas tra-
vessias, terá que resolver muito bem este problema. Adotar alimentação
simples, mas eficiente.
A confecção de um cardápio escrito, bem simples e prático, ajudará
na vontade de querer cumpri-lo, contornando as desculpas para não cozi-
nhar. Principalmente quando em solitário, a preguiça de cozinhar é uma
constante, e o pior é que não tem ninguém para reclamar....
E tudo deve ser muito simples : saber refogar, fritar, temperar, cozi-
nhar, etc. O importante é não complicar as receitas, para não ficar escravo
do fogão. Não se deve destinar mais que uma hora à cozinha, para o pre-
paro das refeições, por dia. Exceção, é claro, nos cruzeiros culinários, que
são uma diversão a mais nos fins de semana.
Adotar os conceitos de alimentação já comprovados cientificamen-
No ICES (Iate Clube do Espírito Santo) te, evitando os modismos passageiros e inconseqüentes; o velejador é um
atleta e como tal deve ser alimentado; ele necessita comer para ter forças
para prosseguir, para resistir.

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Geralmente em cruzeiros curtos a alimentação consiste de sopas de Nutrientes


envelope, sanduíches e enlatados. Isto, de modo algum, deverá ser imita- Proteínas
do nos cruzeiros longos: não se ficará logo doente com um regime impró-
prio, claro; com o passar do tempo, os efeitos vão sendo notados e, se não
houver modificação, as conseqüências serão desastrosas. Difícil é saber Alimentos de origem animal, como carne, peixe, leite, queijo, etc.
até que ponto pode-se persistir nela... São chamadas também de albuminas ou protídios. São essencialmente
Elaborado o cardápio, devemos calcular, utilizando qualquer tabela materiais formadores de músculos e ossos, sendo necessários à formação
de composição química dos alimentos e valor energético, o total de calo- e à substituição dos tecidos.
rias consumido por dia, acrescentando quantidade para completar o que
faltar.
É comum encarar a alimentação como se fosse assunto já resolvido; Carboidrato
poucos reconhecem, por mera comodidade, a dificuldade que enfrentará
(ou faz de conta que não sabe); e quanto maior a tripulação e a duração
do cruzeiro, maior será o problema. Ou glicídios, ou hidrato de carbono, são considerados os alimentos
Sempre sentimos falta de uma boa geladeirinha para conservar os dos músculos. Tanto geram energia para o trabalho, como promovem o
alimentos, principalmente para aproveitar os já preparados. Uma bebida funcionamento dos músculos não motores, como o coração e o diafragma.
gelada a bordo também é uma boa idéia em qualquer ocasião. Quem está Transformam-se em reserva quando não são utilizados totalmente pelo
acostumado com a dupla freezer-microondas, sentirá muita falta dessas organismo. Eles são fornecidos por dois tipos de alimentos:
comodidades . Tenho visto muito barco com todas elas, inclusive lavado- • açúcares (de cana, de frutas, mel)
ras portáteis de roupa e de louças, principalmente se estão com a família • feculentos ou amidos (cereais e suas farinhas, batata, pão, man-
ou grandes tripulações. Mas são sempre grandes barcos, acima dos qua- dioca, as massas em geral).
renta e cinco pés, com gerador elétrico, etc.
Por ocasião dos preparativos para um longo cruzeiro, um amigo
velejador demonstrou vontade de ir junto. Após uma conversa inicial, re- Gorduras
comendei que ele recordasse o básico de cozinha, uma vez que nos reve-
zaríamos na função, democraticamente. Ele achou graça, pensando que
era brincadeira minha. Quando viu que não era, desistiu na hora. Natural- Fornecem energia, protegem do frio, constituem reserva e servem
mente ele não sabia que no mar não há restaurantes... de solventes a certas vitaminas não solúveis em água. Também são conhe-
cidas como lipídios; são alimentos fundamentalmente energéticos, ver-
dadeiros combustíveis que “queimam” para gerar energia e calor, ambos
expressos em calorias. São as manteigas, creme de leite, óleos e azeites,
cremes de amendoim, etc.

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

Outros Componentes Deve-se ingerir 1 ml (um mililitro) de água por caloria ingerida, em
Vitaminas princípio. Portanto, na dieta de 3000 calorias, necessitamos de 3 litros de
água por dia:
• 1,5 litros virão juntos com a alimentação
Servem de catalisador para a utilização das outras matérias-primas, • 1,5 litros deverão ser bebidos, no mínimo
regularizam os delicados mecanismos que asseguram o desenvolvimento
e mantêm o bom funcionamento do organismo.
Calorias

Sais Minerais
Considera-se suficiente ao homem médio normal (70 kg de peso,
1,70m de altura), um total de 2500 calorias diárias, a fim de enfrentar os
Entram na constituição de muitos dos nossos tecidos. gastos normais de energia. Para o desportista, uma dieta de 3000 calo-
rias, dependendo da modalidade praticada, é suficiente. Embora a idade
faça variar a quantidade de calorias necessárias, não a incluímos para a
Celulose estimativa.
As quantidades determinadas devem ser distribuídas de modo a
fornecerem:
Assim como a água e o oxigênio, a celulose não é propriamente di- • 15% de protídios (proteínas)
gerida pelo organismo, não sendo, portanto, considerada na categoria de • 30% de lipídios (gorduras)
nutriente. Entretanto, tem importância muito grande, pois é imprescindí- • 55% de glicídios (açúcares)
vel ao bom funcionamento do aparelho digestivo. Além de proporcionar Os protídios e glicídios ao serem queimados (absorvidos) pelo or-
volume que facilita a ação dos movimento dos intestinos, ajuda a arrastar ganismo, produzem 4,1 cal/g e os lipídios, 9,3 cal/g.
os resíduos da digestão, promovendo a higiene e a regularidade exigidas
para a manutenção da boa saúde.
Provisões

Água
Provisionar o barco para um longo cruzeiro não é tão simples como
possa parecer.
O organismo elimina por dia cerca de três litros de líquido através As quantidades, as espécies, etc., dependem também do gosto de
dos rins, da pele, dos pulmões e dos intestinos. Absorvemos cerca de 1,5 cada membro da tripulação, que deve ser naturalmente consultado.
litros com os alimentos. Para recuperar o restante, devemos beber acima No início do cruzeiro, a alimentação é copiosa, tudo fresquinho e
de 1,5 litros de água pura (mesmo que bebamos sucos de frutas, refrige- gostoso.
rantes, sopas, chá, café, etc.). À medida que os dias vão passando, as coisas vão se normalizando

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

e a alimentação passa a ser a que deve ser: variada, em quantidade certa Observações
e de acordo com o cardápio, se as condições permitirem.
Portanto, o planejamento deve ser feito, para ser seguido, inclusive
a alimentação para os períodos de mau tempo e a de emergência. Levar A carne seca dura muitos meses quando a colocamos no sol, reco-
quantidade a mais de gêneros alimentícios e água é uma boa iniciativa. A lhendo à noite; o mesmo para o peixe seco.
pescaria melhorará e reforçará, apenas. Mesmo com mar mexido e ventos frescos, devemos ter sempre con-
dições de preparar refeições quentes: sopas, chocolate, café com leite,
mingaus, etc (servidos em canecas grandes, à meio).
Resumo O sistema cardan de montagem do fogão é obrigatório, para barco
de oceano, para permitir cozinhar com o barco adernado.
Uma dieta fria por três dias consecutivos derrubará qualquer tripu-
Protídios (proteínas) 15% 4.1 cal/g lação, por melhor que ela seja.
Lipídios (gorduras) 30% 9.3 cal/g Devemos ter previsão de alimentação de emergência: amendoim
Glicídios (açúcares) 55% 4.1 cal/g torrado, biscoitos, batata frita, chocolates, balas, ameixas secas, frutas
cristalizadas, sanduíches, etc. para enfrentar o mau tempo com estômago
O que resulta em pouco mais de seiscentas gramas de alimentos, forrado. Aquele que se alimenta periodicamente, além de se manter em
por dia, por tripulante, considerando a dieta de três mil calorias, que é forma para as emergências, evita o enjôo.
plausível, como foi demonstrado. Lembrar sempre que em mau tempo o barco agüenta mais que a
Com uma margem de segurança de 25%, ficamos com pouco menos tripulação...
de um quilo de alimentos por homem por dia. Durante os cruzeiros prolongados, tomar pílulas complexo de vita-
minas, para garantir o suprimento ao organismo, por alguma falha even-
Água: tual na alimentação.
1 mililitro/cal (0.001 litro/cal) Nunca ter poucos depósitos de água: ela deve ser distribuída por
reservatórios separados: caixas dágua, camburões, etc. Considerar sem-
Logo, para 3000 calorias, serão necessários 3000x0.001= 3 litros pre a possibilidade de contaminação das caixas dágua da quilha, conside-
de água por dia por homem. rando-as sempre como um conforto, para enxaguar, etc.
Portanto: O enjôo pode ser evitado seguindo-se regime espartano: alimen-
tação controlada, sem gorduras em excesso, nada de bebidas alcoólicas,
Alimentos: 1 kg ginástica, horas de sono, etc .
Água: 3 kg Durante a velejada, manter sempre o estômago em funcionamento,
Soma: 4 kg/dia/homem comendo periodicamente, mesmo que esteja enjoado.
Stugeron, muitas vezes indicado contra enjôo, produz efeitos se-
Esta deve ser a base de cálculo, já com margem de segurança. cundários; tomar apenas uma pílula meia hora antes do início do cruzei-
ro, que é o suficiente. Se for usar o Transdermscop, lavar muito bem as
mãos depois da aplicação para não atingir os olhos, o que pode alargar

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

as pupilas (sem maiores conseqüências, porém) . O Dramin B6 é um dos Lembrar sempre de picles, compotas, etc. que também podem ser
mais usados. O Vontrol também é sugerido. Agora, mais recentemente, preparadas em casa, diminuindo muito o consumo de conservas indus-
surgiu o Triptone, que elimina o enjôo sem produzir insônia. triais.
O balanço do barco acostuma e o enjôo passa (de 2 a 3 dias, é o Em pleno oceano, podemos preparar os alimentos com um pouco
período normal). de água do mar misturada à água potável (relação aproximada de 1 parte
Mesmo enjoado, vomitando, deve ser mantida a atividade; isto é de água do mar para 3 de potável, num relance). Isto é bom, tanto como
primordial para o solitário, que tem de fazer tudo sozinho. medida de economia da água potável como para aproveitar os sais mine-
Em todos esses anos velejando, só deparei com apenas um exemplo rais da água do mar. E isto vale também para a água que se bebe.
de enjôo psicológico. Estar em condições de recolher água da chuva (toldos apropriados
Se o percurso fosse por mar aberto, o cara enjoava feio, deitando e ou mesmo coletores especiais). Mas esta água deteriora em poucos dias,
vomitando por três ou mais dias, sem alimentação; em percurso costeiro, se não for clorada.
nas mesmas condições de mar, o simples fato de ter terra à vista, ele não A água é a melhor bebida; chá, café, coca-cola, guaraná, etc., contêm
enjoava... cafeína e adoçantes, que exigem maior necessidade de água, não a substi-
Quem puder adotar as dietas fornecidas por firmas especializadas tuindo, como é comum se pensar.
(Nutrimental, etc) estará com o problema resolvido. Existem também Manter sempre a reboque uma linha de pesca com isca artificial; se
outros tipos de produtos instantâneos que devem ser experimentados; demorar a pegar, ir trocando o tipo da isca, a cor, etc. Cada região tem seus
naturalmente, muito antes de iniciado o cruzeiro. Atualmente, o mais uti- peixes característicos, que pegam em iscas de cores e tipos diferentes... A
lizado é o de produtos estabilizados ( thermo-stabilized), que duram mais melhor isca para o corrico é o filhote do peixe voador que cai no convés.
de três anos sob temperatura ambiente e consideravelmente mais com Um bom estoque de linhas também é necessário, pois os grandes peixes
pouca refrigeração ou em climas frios. não dão muita bola para uma simples linha oitenta.
Elas foram desenvolvidas nos EUA para fins militares. Maiores ex- Celulose: deve-se consumir uma quantidade de 30 gramas por dia,
clarecimentos, tais como menu, porções, preços, etc. podem. Ser pesqui- para manter em bom funcionamento os intestinos.
sados na Internet. Ameixas secas consumidas pela manhã são ótimas como regulador
Para enriquecer a alimentação, em regiões afastadas ou durante dos intestinos, além de tornar o trabalho da bomba da toilet mais fácil...
uma longa travessia, pode-se empregar a germinação de hortaliças: ir Nas cidades, mesmo as mais badaladas, encontraremos sempre
consumindo as folhas à medida que vão crescendo. É necessário reservar bons restaurantes com alimentação simples e boa a preço baixo; é só pro-
um lugar no barco para colocar a bandeja, o que nem sempre é fácil. Num curar.
barco de trinta pés, onde todos os espaços já estão distribuídos, fica ainda Em qualquer atividade, a saúde está em primeiro lugar, principal-
mais difícil. Emprego este processo para ter sempre gengibre a bordo, mente nos esportes.
numa bandeja funda, de plástico (o gengibre é ótimo na salada e beneficia
a digestão, evitando o enjôo).
Quem quiser baratear os custos, além de melhorar muito o rango,
pode preparar, antes do cruzeiro, suas próprias conservas, em gordura
vegetal, devendo cobrir totalmente a carne. Este sistema é bom principal-
mente para o preparo de aves, que duram meses.

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Roteiro Costa Leste

Angra dos Reis, Ilha Grande, Sepetiba, uma grande área, cheia de
atrativos, é, sem dúvida, a que mais deve merecer atenção. Vale a pena
tentar descobri-los aos poucos.

A baía de Guanabara, com suas praias e ilhas interiores. A parte ex-


terna adjacente, como ilhas Tijucas, Redonda, Comprida, Cagarras, Rasa,
Cruzeiros Costeiros Pai, Mãe, Maricás. As praias de Piratininga, Itaipu, Camboinhas, Itacoa-
tiara, Itaipuassú. Os clubes náuticos. Isto, sem falar nas praias mais ba-
daladas... podemos ancorar abrigados ao lado do Clube Marimbás, em
Copacabana: uma lage alagada no prolongamento das pedras do Forte de
Copacabana amortece as ondas, formando um ótimo abrigo. No futuro,
será ali uma marina, inevitavelmente.
A grande região de Cabo Frio, Arraial do Cabo, Búzios. com ventos
firmes a maior parte do ano. Os abrigos sensacionais, com águas cristali-
nas. O canal dos Papagaios e suas inúmeras ilhas, que vão de Cabo Frio à
Búzios. As praias, os passeios por terra, as pescarias, os mergulhos.
A região de Macaé, ilhas de Santana. Rio das Ostras, Barra de São
João e São Tomé.
O Iate Clube de Macaé: a entrada perigosa, que só deve ser feita no
estofo da maré alta e com alguém do clube que conheça os alinhamentos
que livram uma pedra no trajeto, bem no meio da entrada para o clube. A
Suiá, do Capitão Sérgio Vahia
chegada até o cais do peixe (onde as traineiras encostam) é fácil, mas deve
ser feita na maré alta.
Guaraparí e Vitória, lugares inesquecíveis. As modificações enor-
Entre 1956 e 1974, percorri de barco quase todos os abrigos entre mes que fizeram por lá : ilhas ligadas ao continente por enormes aterros,
Bertioga, SP, e Vitória do Espírito Santo, aproveitando as férias e os feria- porto de Tubarão, pontes etc.
dões. Para isso, preparei um veleiro rebocável sobre carreta rodoviária e Depois, já com o Krum II, repeti quase todos os percursos indo por
cada período era de grande atividade, com a viagem por terra e os pas- mar, com mais vagar, mais pormenorizadamente. A descoberta de novos
seios por mar, conhecendo cada área, sem grandes pressas. Os percursos esconderijos, novos aspectos e sempre aprendendo uma coisa nova em
oceânicos ficaram para a aposentadoria. cada cruzeiro.
A área adjacente à Bertioga e Guarujá, as ilhas próximas. A região Em 1980 eu estava trabalhando numa firma de S. Paulo e o Krum II
de São Sebastião e Ilhabela. Ubatuba e suas ilhas e enorme quantidade sendo terminado na Bianca Fiberglass, no bairro do Limão, perto de onde
de barco, suas enseadas, suas marinas, clubes, hotéis à beira mar. Não se eu morava (Perdizes).
pode evitar demorar por lá; a grande região de Ubatuba é o maior centro Aos sábados, quando não podíamos ir ao Guarujá, íamos ajudar no
náutico da América do Sul. barco, discutir detalhes, etc.

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

Para Guarujá são cerca de 90 km de estrada espetacular, e sempre O trópico de Capricórnio passa sobre Ubatuba; mas poucos vele-
que o tempo era ensolarado, partíamos para lá. jadores já viram o Sol na ponta do mastro por lá, o que acontece apenas
O apronto do barco para ser lançado ao mar foi uma seqüência na- uma vez a cada ano...
tural e a expectativa crescia à medida que ele ia ficando pronto, isto é, As falésias do saco do Mamanguá, região de Parati-Mirim, no per-
ficando em condições de flutuar, pois eu iria terminá-lo devagar, enquanto curso de Ubatuba para Angra. O contraste entre a calma da área e o alvo-
já velejando (cortinas, armários, etc.). roço do terráqueo. Certa vez eu estava com o Krum II ancorado bem para
A primeira vez que saí com o Krum II de Bertioga para o Rio de o interior da enseada do Mamanguá, quando apareceu um avião anfíbio
Janeiro, em 1982, pretendia fazer o percurso bem ao largo, direto, sem em vôo rasante, abrindo caminho para uma amerissagem. Era algum mi-
escala, para não demorar muito, pois cada ponto de parada do percurso é lionário chegando para um fim de semana tranqüilo, à sua maneira...
um convite a uma longa permanência: não há quem resista aos mergulhos Outra ocasião, estando ancorado na enseada do Aventureiro, na
e velejadas por tal área. Ilha Grande, aguardando um forte nevoeiro dissipar, escuto o ronco do
Não dispondo de mais de 15 dias para chegar com o barco ao Rio motor de uma enorme lancha que afinal surge de repente, contorna o bar-
de Janeiro, não podia arriscar ir costeando. Direto à Angra, como parada co e o piloto pergunta se a ilha Jorge Grego estava longe. Saiu em seguida
turística para conhecer Parati Mirim e suas falésias; mas tive que arribar em disparada, fazendo uma marola respeitável. Ele estava passando pelo
a Ilhabela, devido ao estado do mar (eu estava desacostumado e o enjôo paraíso sem enxergá-lo.
não dava trégua). O resultado é que fui parando em tudo quanto é abrigo Na baía da Ilha Grande, centenas de ilhas, praias a perder de conta,
e quase ultrapasso o tempo disponível. região das mais abrigadas, um verdadeiro paraíso, principalmente se va-
Ilhabela é, além do que o nome já diz, calma, simples e cheia de mos lá de barco.
lendas. A Marina Porto Bracuhy, uma boa parada. A ilha de Paquetá, ponto
Nos fins de semana ela é modificada em sua calma pelo grande mo- de reunião de barcos de turistas, animando o dia, o alvoroço do turista
vimento do turismo; o canal e as enseadas se enchem de velas e de lan- é engraçado de assistir. O ponto triste: as praias do Mamede e de Itaor-
chas. As regatas são uma constante na área. Depois, volta à calma. Flores- na, com a usina nuclear. Será que não havia outro lugar para construí-la?
tas preservadas e com muita vida selvagem. As colônias de pescadores, as Logo em Angra...
praias, as ilhas adjacentes, o tesouro do Saco do Sombrio, próximo à pon- O desaparecimento do Iate Clube de Piraquara, soterrado pelo des-
ta dos Castelhanos. Contam que o tesouro foi retirado de um galeão que moronamento de uma enorme barreira, em fevereiro de 1985, devido às
afundava na ponta de Pirabura e escondido numa caverna. O engenheiro fortes chuvas que caíram na região. Uma imensa barreira, em mais de um
belga Paulo Thiery passou os últimos trinta anos de sua vida procurando quilômetro de extensão, desabou sobre o mar. A onda resultante do im-
o tal tesouro, revirando minuciosamente a área mais provável. Morreu pacto foi causar estragos na Ilha Grande, a umas dez milhas de distância,
sem tê-lo encontrado, com quase 80 anos de idade, mas delegou aos filhos em Araçatiba. As duas únicas pessoas que estavam no Clube, dois mari-
a tarefa de continuar as buscas. E a expectativa é grande entre os ilhéus, nheiros, se salvaram milagrosamente quando tinham ido tirar água de um
todos torcendo para que a botija seja encontrada. barco que estava apoitado e foram catapultados à distância; tiveram ape-
Depois de Ilhabela, Ubatuba é uma região obrigatória para fundeio: nas algumas fraturas. Mas os prejuízos materiais foram grandes. Quando
é impossível passar por perto e não parar. passei por lá em agosto de 1986, não reconheci o lugar.
O Saco da Ribeira e as ilhas; as marinas. Ótimos abrigos e muito Em 1989, fui com o Krum II novamente lá e vi que tudo estava re-
barco. construído e já havia muito barco, tanto no galpão como apoitado.

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A parte leste, com Itacuruçá, Jaguanum e inúmeras ilhas, incluindo- todos os perigos sem balizamento.
se a ponta da Marambaia e a sensacional ilha da Pombeba, apresentam De noite, parar ou só navegar pelo meio do canal, na esteira da Lua
aspectos muito interessantes e merecem uma demorada visita. Embora e com olhos bem abertos.
as águas sejam mais escuras (ou menos claras), quanto mais nos aproxi- O percurso Angra - Rio, quando feito próximo à costa, é um dos mais
mamos da boca da barra, mais vão ficando cristalinas. bonitos. Os enormes tubarões-martelo que sempre aparecem ao largo da
A Ilha Grande é o centro do paraíso da Costa Verde. restinga da Marambaia; os imensos cardumes de botos, acompanhando
A parte de mar aberto da ilha é a mais bonita e tem mais vento. A o barco ou cruzando com ele. As pescarias de corso, quase certas; doura-
enseada de Lopes Mendes e as praias do Aventureiro, Sul e Leste, são as dos, bonitos, espadas, etc.
mais bonitas da ilha. Mas esta parte exige uma série de cuidados adicio- Ultimamente as baleias franca têm aparecido em cardumes, tanto
nais, para evitar surpresas de mudança de tempo, o que pode encurralar na ida como na volta dos Abrolhos, onde vão acasalar. Fico sempre na dú-
o barco nas estreitas baías, etc. vida se elas são inofensivas e procuro não chegar muito perto.
Abraão, uma espécie de capital da ilha, é ponto obrigatório, ofere- Lembro de uma velejada para a Ilha Grande, saindo da baía de Gua-
cendo possibilidade de reabastecimento de víveres e água potável, além nabara, com todo o pano em cima, aproveitando um bom nordeste, pas-
de uma permanência calma, bem abrigada. Mas ancorar sempre muito sando rapidamente por Copacabana e Leblon.
bem, pois os ventos por toda a região costumam ser repentinos, princi- As baleias estavam ao largo; passei de longe vendo os borrifos, não
palmente os de NW. querendo brincadeira (na realidade eu não queria perder aquela veleja-
Os passeios a pé pela ilha são ótimos e podem ser intercalados com da). No través de Guaratiba, o vento diminuiu e terminou por zerar. Como
velejadas aos locais mais distantes, partindo-se então para novas cami- eu tinha mantido a velejada relativamente perto da praia, resolvi baixar
nhadas. as velas e entrar a motor já imaginando uma dormida tranqüila, abrigado.
No inverno, o céu de Angra é dos mais bonitos, de uma nitidez im- Acordei dia seguinte ainda escuro, forrei o estômago, ultimei a ar-
pressionante, aparecendo as constelações com seus formatos caracterís- rumação e zarpei para vencer a restinga da Marambaia e chegar ainda
ticos e de fácil identificação. claro no Abraão, se o ventão da véspera repetisse.
No verão, muitos se queixam que chove muito na área, o que acho Ao pegar altura, após assegurar lazeira da área restrita de tiro (a
uma grande vantagem, aplacando o calor e oferecendo banhos de chuva Marambaia é área de lançamento de foguetes de pequeno alcance...) um
deliciosos (arrume o toldo em calha e experimente). Tampone os esgotos vento Sul entrou e foi melhorando. Coloquei o barco numa orça folgada,
do cockpit e tome banho de piscina, após uma velejada, antecedendo a bordo de mar e ajustei o leme-de-vento; antevia uma senhora velejada. Ao
borrasca. É tudo muito bom. longe, comecei a ver os esguichos das baleias, mais para dentro, de modo
As inúmeras lendas da região: Jorge Grego, Juan de Lorenzo, etc., o que eu passaria meio afastado com aquela proa .
pessoal mais velho gosta de contá-las, no bar, molhando a goela... Comecei a preparar para largar a linha de pesca pela popa, quando
O presídio nunca se constituiu num problema, uma vez que muitos vi que um filhote de baleia estava se aproximando do barco: se continuas-
moradores eram a favor e outros tantos contra a sua permanência. Mas se naquele rumo haveria colisão.
ele estava fadado a sair de lá. Foi melhor, embora a invasão turística esteja Destravar o leme-de-vento e desviar, ou pagar para ver? Preferi a
clamando por melhor atenção das autoridades, e urgentemente. segunda alternativa e o filhote (que era aproximadamente do tamanho do
Navegar no interior da baía da Ilha Grande sempre com a carta à barco) desviou quase ao alcançar a proa do Krum II, o que eu observava
vista, pois é impossível decorar o local de todas as lajes, todas as pedras, já arrependido de ter esperado tanto.

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Pelo rabo do olho, comecei a ver crescer ao meu lado um dorso es- No trajeto Angra - Rio, se estamos indo próximos à costa, podemos
curo descomunal, a menos de dois metros: era a mãezona-baleia que tam- fazer escala em Guaratiba, se o vento parar; é o mais indicado para per-
bém estava apreensiva pelo pimpolho. cursos curtos como este.
Fiquei extasiado com a beleza do momento; não havia nada a fazer. O Iate Clube do RJ é um dos melhores do Brasil, com uma grande
O que a baleia decidisse fazer, seria. Afinal, eu era o intruso ali. Ao mergu- vantagem: mantém uma sub-séde em Cabo Frio (canal de Itajurú) e outra
lhar, ela soltou o esguicho, que foi trazido pelo vento na minha cara. Nun- em Angra dos Reis (Praia Grande). Sem falar na sub-séde em uma ilha
ca eu tinha visto uma baleia tão de perto e aquele perto eu nunca tinha interior à baía de Guanabara. São, portanto, 4 sedes para o apoio do barco.
imaginado. Ela seguiu o filhote, o Krum continuou no rumo, com o meu O Iate Clube do Espírito Santo é outro exemplo de excelência; ofere-
coração batendo acelerado e forte pela emoção. A coisa foi tão repentina ce apoio integral aos cruzeiristas. Em todos esses anos passando freqüen-
que não deu tempo de sentir medo. temente por lá e utilizando seus apoios, nunca tive uma queixa sequer.
Felizmente, baleias acham que nós somos inofensivos... Todas as Diretorias, sem exceção, vêm mantendo as mesmas diretrizes de
A Cidade Maravilhosa é e sempre será uma bela cidade, embora ve- apoio aos cruzeiristas, o que é uma grande providência. Ele patrocina a
nha sendo maltratada e agredida impiedosamente. A entrada da baía da Regata para Trindade, a de maior percurso dentre as nossas, até agora; é
Guanabara é sempre uma paisagem admirável, mesmo quando estamos um fantástico percurso, de cerca de 700 milhas, só de ida.
por demais acostumados a ela; o Pão de Açúcar, o No trecho de Vitória direto à Maceió, passando pelos Abrolhos, va-
Cristo Redentor, a Pedra da Gávea e o morro Dois Irmãos dominam mos começar a observar a nossa Grande Barreira de Corais.
a atenção. O Sumaré, com as torres de antena e suas luzes são vistas desde Na região dos Abrolhos estão grandes formações de recifes, como a
a saída da baía da Ilha Grande, quando a visibilidade está boa. Coroa Vermelha, o parcel das Paredes, o parcel das Areias, os Timbebas,
Praias, pescarias, velejadas de fim de semana, preparativos do bar- Itacolomís, etc. É, por isso, uma região temida ou respeitada pelos nave-
co para cruzeiros mais ou menos prolongados, o tempo voando...veleja- gantes. Mas, uma festa para o mergulhador.
das inesquecíveis. A maior ilha do arquipélago, a de Santa Bárbara, possui um farol e
Quem conheceu as delícias da baía da Guanabara nos anos 50 e 60 e é a única habitada. Existe uma guarnição da Marinha e o IBAMA mantém
a vê hoje com tamanha poluição, sente uma imensa tristeza. um delegado residindo na ilha. O melhor ancoradouro é entre as ilhas
A queima de fogos em Copacabana na noite de 31 de dezembro, Siriba e Redonda; em caso de SW forte, o abrigo é na parte norte de Santa
um visual deslumbrante quando vista do mar, com o barco à deriva no Bárbara.
meio de outras centenas de embarcações. Mas, em 1988, o desastre com o O antigo faroleiro, o Mário, já não está mais lá após muitos anos na
Bateau-Mouche consternou a todos. Lamentável fatalidade. função; aposentou-se.
Devido à poluição da baía, são comuns cruzeiros de fim de semana Dedicou grande parte de sua vida ao farol. O seu sobrinho, o Adolfo,
a Itapu, Maricás e ilha Comprida, onde podemos ancorar o barco mais ou era o fiscal do Ibama na região: morreu em acidente de mergulho enquan-
menos abrigados, em águas bem mais limpas. to tentava permanecer mais de quatro minutos debaixo dágua em apnéia:
A partir da baía de Guanabara, são freqüentes os cruzeiros à região sofreu apagamento. O mesmo aconteceu, dias depois, com um sargento
de Angra e de Cabo Frio, englobando Arraial do Cabo e Búzios; são cruzei- da guarnição militar da ilha, que era companheiro de mergulho do Adolfo.
ros de cerca de 30 dias de duração, muito bons, muito peixe, bons ventos, A viúva do Adolfo, também fiscal do Ibama, assumiu a função na
águas cristalinas, velejadas memoráveis. E também à região de Angra dos ilha.
Reis. São pessoas de cuja dedicação não podemos esquecer.

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Desde que foi proibida a pesca na região, a densidade de vida ma- Naquela época, os recifes sempre foram a minha diversão, o meu
rinha nas proximidades do arquipélago aumentou espetacularmente. Há quintal; todas as minhas horas de folga eram passadas na praia e quase
enorme quantidade de peixe, principalmente de badejo e o mira é o mais sempre sobre alguma linha de recifes.
numeroso. Indiscutivelmente, os Abrolhos se incluem numa das mais in- Um dia, resolvi construir uma jangada, a partir de paus achados na
teressantes regiões de todo o nosso litoral. E está melhorando a cada ano praia após as ressacas (de junho a setembro). Eu recolhia os paus, trazen-
que passa. do-os por água, empurrando-os, até a frente de casa, rolando-os e enter-
Um dos maiores conhecedores da região dos Abrolhos é o mestre rando na faixa de areia fina e seca até ter a quantidade suficiente. Foi uma
Onofrófrio, que tem barco de serviço na área, atendendo inclusive ao pes- jangada a remo, sem cavalete, sem mastro, sem nada (era um autêntico
soal da guarnição militar da ilha de Santa Bárbara. chimbelo). Mas nela podíamos ir aos recifes mais distantes, mais cheios
Ao baixar âncora pela primeira vez no ancoradouro da ilha de Santa de vida. Depois, vieram outras jangadas mais aperfeiçoadas, com vela e
Bárbara, em 1988, recordei minhas várias tentativas frustradas em che- tudo.
gar lá. E levei as lembranças bem mais distantes, quando tinha apenas Até que terminei pilotando uma jangada profissional, que ficava so-
nove anos de idade, andando pelos recifes de rio Doce, em Pernambuco. bre os rolos na frente da nossa casa, no Bairro Novo (Olinda). Eu já estava
Na maré baixa, os recifes afloram a partir da praia e vão mar aden- então com l4 anos de idade, mas tinha dificuldade em dominá-la em ven-
tro a perder de vista. Embora eu fosse criado na praia, nunca tinha visto tos um pouco mais fortes. Nessa jangada, efetuei percursos por alto-mar,
antes recifes de tão grande extensão e principiando na areia da praia. Era sem ver terra, mas depois de várias vezes em dúvida se estava voltando
como uma estrada convidando a entrar mar adentro sem se molhar. Fi- no sentido certo, após períodos de chuva, fiquei mais cauteloso.
quei maravilhado com toda a vida em torno dos corais e fui progredindo, Felizmente, nunca aconteceu nada de anormal. Mas, comecei a
futucando as tocas, divertindo-me com os polvos, lagostas, ouriços, caran- procurar saber como era que se podia determinar para que lado estava
guejos, siris e peixes represados nas poças, não notando a maré enchente, a terra, se o vento rondasse, se a visibilidade diminuísse, etc. Um mestre
que não tardou em bloquear o meu caminho de volta. de barcaça me mostrou uma bússola, mas falou pouco a respeito, não sei
Quando dei pela coisa, as ondas já estavam quebrando sobre as se fazendo mistério ou por pouco caso, devido à minha pouca idade. Até
pedras, cada vez mais fortes, cortando a passagem. O susto inicial não 1950, foram mais de dez anos de jangada, barcaça, saveiro; sempre praia...
me fez perder a cabeça; compreendi imediatamente, de relance, que era Mas, por via das dúvidas, deixei o alto mar para outra ocasião...
impossível voltar pelo mesmo caminho, sendo por água a única forma de Vindo para o Rio de Janeiro, em 1950, as jangadas foram esquecidas
me livrar das ondas, uma vez que o canal entre os recifes e a praia, embo- por cinco anos, quando em l955 comprei o meu primeiro barco. Estava
ra fosse de águas espumosas, não oferecia perigo. Antes mesmo que eu morando em Icaraí, de modo que o ICI (Iate Clube de Icaraí) servia de
tivesse tempo de sentir medo, veio uma onda mais forte e me “ ajudou” a apoio. Época inesquecível, descobrindo as maravilhas da baía da Guana-
decidir cair nágua, nadar para a praia ... bara sem poluição. Nos fins de semana, chegava ao clube bem cedo, de
Nunca eu tinha nadado distância tão grande, com tamanha corren- bicicleta, e o Itagiba (marinheiro) já estava com o barco pronto na rampa.
teza. Ao chegar à praia, ofegante e ainda assustado, fiquei contemplando Como conselheiro, tinha o Amado, um dos fundadores do Clube, sempre
o mar invadindo tudo. pronto a tirar as dúvidas de marinharia, dar alguma sugestão, conversar
No dia seguinte, lá estava eu novamente, mas agora devidamente sobre barcos e a auxiliar em algum problema de manutenção. Até 1960 fo-
equipado com gancho de tirar polvo e puçá. E bem atento à maré, que ram navegadas fantásticas, por região para mim inteiramente desconhe-
ninguém é de ferro... cida, tanto por dentro da baía, como por fora, até as ilhas mais próximas.

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Mas tive que vender tudo, o barco e todo o equipamento de mer- horas avisaram que o mestre tinha chegado. Ligado o motor, zarpamos
gulho, para poder terminar o curso de engenharia (o grau estava ficando pelo rio sinuoso, até a saída pela barra.
baixo demais, desmoronando...). Mas, depois do curso, reiniciei tudo, ad- Tudo bem, o atraso não iria impedir a satisfação da aventura; só
quirindo um novo barco e todo o material de mergulho, com característi- que não era o mesmo mestre da véspera. O que interessava, pensei, é que
cas bem mais modernas. já estávamos a caminho.
E fui progredindo sempre, até montar um sistema barco/carreta Após o lento percurso pelo rio, saímos para o mar e logo em seguida
rodoviária que me permitia atingir rapidamente os melhores pontos da o mestre guinou para boreste, o que interpretei como uma demonstração
costa, sem as perdas de tempo dos percursos por mar. própria de quem conhece bem a rota pelos canais, entre os parcéis. Já
Há muito que eu vinha lendo sobre os Abrolhos; comecei a planejar bem passado o meio-dia, o André pediu para dar um mergulho numa faixa
uma ida até lá, com barco tripulado, alugado. Pensei em ir até Alcobaça, de águas claras e, enquanto ele mergulhava, fiquei descascando laranjas,
alugar uma traineira e passar um ou dois dias nos parcéis, mergulhando, quando o mestre veio nos acompanhar.
caçando, admirando... Depois, iria rebocando o barco, já conhecedor dos Ao lhe perguntar quantas vezes tinha ido aos Abrolhos, ele me res-
segredos da área. pondeu que estava se radicando em Alcobaça, vindo de Salvador e que
Pronto o planejamento, na primeira oportunidade que surgiu, cha- nunca tinha saído de barco na área; como o outro mestre tinha passado
mei o meu filho mais velho, o André Luiz, então com vinte anos de idade, mal à noite, o patrão tinha-o obrigado a vir. Nisso o André volta do mer-
terminando o curso de Educação Física da UERJ, e fomos nos revezando gulho e, com os olhos arregalados, diz que não tinha dois metros de água
na direção do carro até Alcobaça, numa viagem tranqüila. sob a quilha. Estávamos no meio do parcel das Areias, próximo ao das
Em Alcobaça, demos uma volta pela cidade e, como não poderia Paredes.
deixar de ser, fomos terminar na praia, depois do Farol. Tudo bem, mais uma vez, vamos deixar os Abrolhos para outro dia,
Paramos no restaurante Sirimar, de frente para o mar, onde uma outra ocasião; vamos mergulhar nos recifes das Timbebas, em frente a
boa peixada foi nosso almoço. Fizemos amizade com o proprietário do Alcobaça. Voltar, portanto, foi a decisão. Mal falara, o barco encosta numa
restaurante, que nos cedeu um bom gramado ao lado para armarmos a pedra e escutamos o ranger do tabuamento cedendo. O marinheiro desce
barraca, colocando o vestiário e o banheiro à nossa disposição. e volta dizendo que está fazendo água. Procuramos pelos baldes e só en-
Tínhamos regressado de um longo período, três anos morando e contramos um de lona, que o marinheiro pega e inicia o trabalho de esgo-
trabalhando no exterior, onde enfrentamos a neve e o frio e estávamos tamento, com a nossa ajuda. Eu e o André tentamos colocar uma almofada
loucos por uma boa praia, com bastante sol e águas mornas. com toalhas, escorando com paus para diminuir a entrada dágua, mas foi
O proprietário do Sirimar nos indicou um posto de gasolina onde tudo em vão: a entrada era maior que a nossa capacidade de esgotamento
poderíamos contratar uma traineira e conseguimos uma sem dificuldade, com aquele balde ridículo.
com um mestre calejado em idas aos Abrolhos. Em resumo, os esforços para manter o barco flutuando foram inefi-
Tudo combinado e ajustado, começamos a adquirir os mantimen- cazes. Às três da tarde a casa de máquina foi sendo tomada lentamente pela
tos e a carregar a traineira. água; o motor foi desligado. Mais hora e meia, estávamos dentro dágua, mas
No dia seguinte, na hora combinada, antes do alvorecer, estávamos o barco flutuava com a proa um metro para fora. O mar invadindo o convés e
a bordo, prontos para a tão almejada aventura. Éramos quatro : dois “tu- o barco afundando lentamente são impressões que ficam na nossa memória.
ristas” (eu e o André), o mestre e o marinheiro, um rapaz mais ou menos Embora a água estivesse morna, é uma experiência muito incômoda a gente
da mesma idade do André. Mas o mestre não chegava. Afinal, lá pelas 10 ter que abandonar um barco que soçobra, sem que se possa fazer nada.

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Ficamos com as mãos apoiadas no bico de proa do barco a tarde não prejudicar o “mestre”, mas em caso de necessidade...).
toda, e à noite notamos que a correnteza nos jogava lentamente para a Embora reconhecendo o grande perigo que corremos, nunca pen-
costa, o que era evidente pelos clarões de Caravelas e Alcobaça, refletidos samos, tanto eu como o André, na pior hipótese . Em qualquer cidade
nas nuvens. Os reflexos dos lampejos do farol dos Abrolhos também eram corre-se muito maior perigo...
vistos da mesma forma, nas nuvens. De madrugada, o tempo virou e já se Em uma outra tentativa, vários anos depois, em solitário, perdi o
tornava insuportável ficar apoiando na proa da traineira, que balançava pêndulo do leme de vento, que caiu no mar enquanto eu preparava uma
bastante. Começava a chover fino e o ar era frio, mas, para nossa sorte, sopa para o almoço, um pouco antes do momento de montar o cabo de
a água continuava morna. Cerca das duas horas da madrugada, o André São Tomé, para investir no rumo de Vitória.
resolve nadar para o lado da praia; não agüentava mais ficar boiando. Resolvi voltar, uma vez que seria muito penoso continuar, não es-
Recomendados os procedimentos para o caso de encontrar pedras tando eu preparado para dispensar o leme-de-vento (nem mesmo o she-
na linha de arrebentação, lá se foram os dois, ele e o marinheiro, nadan- et-to-tiller estava funcionando, por falta de elástico).
do calmamente. Não era provável que estivéssemos, nesta ocasião, muito Providenciado novo pêndulo na Foch, novamente saí para Arraial
longe da praia; eu calculava uns cinco quilômetros ou pouco mais, pois do Cabo no ano seguinte (época propícia), para tentar concluir o planeja-
observávamos a nossa lenta aproximação sempre no sentido da praia. do percurso. Desta vez, tudo correu bem.
Aos primeiros raios de luz do dia e numa abertura da cerração, avistamos Para mim, foi um fato memorável (todo homem tem seu lado místi-
bem ao longe, o que parecia ser a linha de coqueiros. Resolvemos, eu e co, por mínimo que seja... afinal já era a terceira tentativa).
o mestre, nadar para lá. Eu estava rebocando uma mochila cujo interior Depois, voltei lá várias vezes, algumas delas na tripulação de barcos
estava envolto em saco plástico, o que lhe dava flutuação suficiente para de amigos.
sustentar o arpão, o equipamento de mergulho e o material de higiene Embora seja uma das áreas mais interessantes do nosso litoral,
pessoal. existem inúmeras áreas que se assemelham, ao longo da costa, muito mais
Cerca das 10 horas da manhã, chegávamos à praia, meio entreva- próximas e livres das restrições adotadas para os Abrolhos. Mas sempre
dos, engelhados. Umas carreiras para esquentar e verifiquei as pisadas que tenho oportunidade, indo para o nordeste, ou voltando, faço uma pa-
na areia dos dois rapazes no sentido correto de Alcobaça. Os náufragos rada lá. É um santuário ecológico, com a vantagem de ter a Marinha como
estavam todos salvos... guardiã; só assim será respeitado. Esta é a única forma de preservar algu-
Após colher alguns côcos, beber a água e comer a polpa, empreen- ma coisa. O pessoal da Guarnição se reveza no binóculo...
demos a caminhada de volta. Até mesmo a caixa de fósforos que estava Próximo aos Abrolhos, estão as cidades de Caravelas, Nova Viçosa
na mochila, bem enrolada num plástico, estava intacta, mas não tentamos e Alcobaça.
fazer fogo, pois tudo na praia estava molhado pela chuva. Existe um iate clube em Caravelas, atendendo no VHF e fornecendo
Chegamos em Alcobaça quase à meia-noite estando quase toda a as informações necessárias sobre os apoios. Mas podemos ancorar no rio
cidade aguardando a chegada dos “gringos” náufragos. Como estávamos sem problemas.
vermelhos iguais a camarão, queimados do sol, não duvido que tenham Numa das vezes que entrei em Caravelas (a entrada é feita pela bar-
mesmo pensado que éramos gringos. ra do Tomba), entrou um pouco depois, logo em seguida, um Fast 500, o
No dia seguinte, a conversa com o irresponsável proprietário da Garimpeiro, de 50 pés, de uma família do Sul excursionando em grande
traineira foi áspera, mas ele amansou quando falei em ir à Capitania dar forma, pretendendo ir até Noronha.
queixa do ocorrido (eu tinha resolvido não participar a ocorrência, para O veleiro inglês, o Foot Loose , de 50 pés, tem base em Caravelas; lá

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já vi também vários veleiros, alguns pequenos, mas a maioria é de trai- Agora, o porto de Ilhéus passou a ser o do Malhado; com o cresci-
neiras e lanchas, para turismo. mento, não há mais espaço lá para os veleiros.
Com um pescador local como guia, é possível ir por dentro até Nova Em Salvador, terra do Senhor do Bonfim e do pai de santo Jubiabá,
Viçosa, atravessando uma região enorme de manguesais, contornando a as frutas, os sorvetes, os sucos de fruta, a comida; as demonstrações de
ilha da Cassumba, chegando ao Bocão, ancoradouro antes de Nova Viçosa. capoeira, o mercado, os coqueirais, as ilhas internas da baía - um mundo
O guia tem de conhecer o labirinto dos canais no mangue. à parte.
Mas é preciso estar com o motor em forma e aguardar as horas de O Iate Clube da Bahia, o Forte de São Marcelo e sua marina, no cen-
corrente favoráveis, o que talvez obrigará a efetuar o percurso em etapas, tro da cidade, em frente ao elevador Lacerda; as duas cidades: alta e baixa.
de acordo com a maré. Desde 1950 que conheço Salvador, logo quando começou a opera-
Um barco que tem base em Nova Viçosa é o Uhuru, um CAL 9.2, que ção da primeira refinaria de petróleo, acelerando o desenvolvimento da
já percorreu todo o nosso litoral e ilhas oceânicas e está atualmente em cidade e impulsionando o turismo.
Natal, em preparativos para uma velejada ao Caribe, sob o comando de Mas a poluição foi elevada ao cubo ... ou muito mais.
Luiz Carlos Pavão e Patrícia, um casal muito marinheiro. Custo de vida, idem.
Alcobaça, possui uma barra nova; o canal é sinuoso pelo rio até o Os recifes em torno da ilha de Itaparica.
mar, bom para traineiras, mas difícil para veleiros de quilha. As festas : João das Botas e do Bonfim, em janeiro.
Os parcéis adjacentes: Timbebas, muito bons para mergulho, mas O Aratu Iate Clube, um excelente apoio e uma comunidade de gran-
nem sempre a água está clara. des velejadores.
O farol, seguindo pela estrada à beira mar, passando o restaurante É onde Aleixo Belov, o primeiro brasileiro a efetuar a volta ao mun-
Sirimar. do em solitário mantém o Três Marias fundeado. Outro barco famoso, o
Hoje em dia, Alcobaça é uma das bases de lanchas de turismo para Aleluia, de Edson de Deus, também: deu a volta pelo Atlântico Norte, ele,
os Abrolhos e para os corais mais próximos, com maior incidência de a esposa e duas filhas, meninas ainda. Muitos barcos brasileiros de outros
águas cristalinas a pouca distância. Estados e também muitos estrangeiros.
A correnteza forma muitos rebojos nos parcéis e levanta areia fina Próximo a Salvador, na ilha de Tinharé, entre o mar e a montanha, o
do Parcel das Areias, que fica em suspensão, tornando as águas acinzen- Morro de São Paulo, um pequeno povoado, com praias e piscinas naturais
tadas principalmente ao Sul desta formação, além dos despejos dos inú- nas extensas linhas de recifes que correm paralelas à praia. É invadido
meros rios que desembocam na área. pelos turistas a maior parte do ano. Já tem luz elétrica, televisão, telefone,
Mas hoje podemos obter facilmente por telefone as condições de etc.
visibilidade da água na região, em qualquer época. Peixe, lagosta, camarão, polvo, siri, etc. tudo em profusão; é só esco-
Em seguida, vamos encontrar Porto Seguro e Baía Cabrália, uma re- lher o local de mergulho, nos recifes, e fazer a festa.
gião espetacular, principalmente para o mergulhador. Do outro lado da barra, está a praia do Curral, que merece uma visi-
Continuando a subir a costa para norte, vamos encontrar Ilhéus, ta; uma caranguejada lá é de doer na alma...
que já possui um iate clube, após o porto do Malhado, para norte. De lá, Cacha-Prego é um vilarejo na ponta SW da ilha de Itaparica, com
vai-se facilmente a pé para o centro da cidade. suas atividades típicas de pesca, com estaleiros de saveiros, escunas e
Muitas vezes, ficávamos à contrabordo de uma plataforma no porto barcaças. Próximo, está o chamado “pantanal baiano”: santuário ecológi-
do Malhado, evitando a entrada no rio, que não oferecia nenhuma vantagem. co semi-virgem, uma grande área selvagem.

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No bar do Iate Clube de Aratu, um velejador que construiu um Bru- todo o seu gosto pela vida, como ela deve ser vivida, mesmo os mais hu-
ce Roberts 40 Spray, réplica do famoso barco do Cap. Slocum, em aço, nos mildes.
relatou um fato ocorrido nesta área, acidente com um velejador lá mesmo As lagoas de Mundaú e Manguaba, enormes regiões de manguesais.
de Salvador. A marina Jaraguá, protegida pelo pier do Porto, onde funciona a
Próximo à Cacha-Prego, o veleiro encalhou nos bancos de areia e Flotilha Alagoana de Veleiros de Oceano (FAVO) e a Federação Alagoana
não houve como livrá-lo, a maré vazando rápido e a noite chegando; o de Vela e Motor, oferece um ótimo apoio. A FAVO é uma das responsáveis
cara resolveu ir à terra, com água pelo peito. Desapareceu. pelo desenvolvimento da vela no nordeste; ela programa as atividades e
O veleiro foi encontrado à deriva no dia seguinte sem ninguém a apoia tanto as regatas como os cruzeiros por uma fantástica área, abran-
bordo. A razão do acidente, disse-me ele, é que nos bancos de areia há gendo Rocas e Noronha. O Iate Clube de Maceió, sobre os recifes de Ponta
uma espécie de peixe muito grande, que fica à espreita semi-encoberto Verde, e o Iate Clube de Pajuçara, não possuem abrigo para veleiros, em-
pela areia fina do fundo, como as arraias costumam fazer. Um homem des- bora exista entrada possível, que deve ser identificada com guia local.
prevenido, dentro dágua, à noite, é uma presa fácil. Fiquei meio incrédulo, As piscinas naturais nos recifes ao longo das praias, sendo as mais
mas depois de quase um ano, no Rio de Janeiro, vi um documentário na famosas as de Pajuçara, dois quilômetros mar adentro. Este passeio eu fiz
TV que mostrou um enorme peixe que ficava sob a areia e engolia de um quando tinha quatro anos de idade, com minha mãe e meus irmãos, numa
só bote um mero de cerca de oitenta quilos. jangada; era uma aventura “perigosa” na época.
Disse o narrador da TV que se tratava do peixe-diabo. Muitos anos Aos vinte anos de idade, quando perguntei à minha mãe onde eram
antes, por ocasião de uma grande enchente em Recife, eu tinha visto uma aqueles recifes, se em Recife ou Maceió, ela ficou espantada de como eu
foto publicada na primeira página de um jornal local (acho que no Diário me lembrava.
de Pernambuco) de um enorme peixe, semelhante ao que vi na TV, le- Hoje, é um programa sofisticado, com jangadas-bares e muito turis-
vando na boca o cadáver de uma pessoa. E não era nenhum octopus, com ta; fica mais gente lá do que na praia.
tentáculos; era um peixe muito parecido com o famoso piraíba da bacia A hospitalidade do povo alagoano; a acolhida sempre atenciosa da
amazônica que chamam de “filhote”. Um “filhote” de piraíba pesa 200 kg... FAVO aos velejadores.
Por via das dúvidas, mergulhar em Cacha-Prego, nunca mais... É também ancoradouro de pesqueiros; a poluição é grande, mas a
Depois de Salvador, vamos em busca de Maceió, evitando entrar Prefeitura está realizando obras que vão resolver o problema, inclusive
para Aracaju, o que exigiria prático, pelas mudanças freqüentes do canal com a despoluição do rio Salgadinho, que desagua na praia.
e a água barrenta atrapalhando. Um local muito bom para ancorar o barco é o Porto Francês, en-
Deixar o Zé Peixe em paz... tre a praia e a linha de recifes; é um ponto turístico muito movimentado.
Zé Peixe é o único prático no mundo que vai nadando apanhar os Não há porto nenhum, apenas um ótimo abrigo antigamente utilizado por
navios; vai e volta nadando. pequenas embarcações, a maioria francesas (contrabando de pau-brasil,
Maceió, o paraíso das águas, praias enormes de não se ver o fim, escravos, etc.).
todas de areia branca, com suas vilas de pescadores, jangadas, tudo en- Com as maiores marés, algumas ondas cobrem as pedras, tornando
tre lagoas, recifes, coqueirais e cajueiros, onde o sol reina quase todos os um pouco agitado o abrigo, mas sem incomodar; é até um belo espetáculo.
dias do ano, terra de ventos sempre presentes, auxiliando os jangadeiros, De julho a setembro, o vento sudoeste pode levantar muito mar na
ajudando-os a voltar para casa. região, tornando impraticável os abrigos entre os recifes e a praia.
Povo feliz, que no próprio sotaque cantado, arrastado, demonstra Mais a sul, iremos encontrar a Barra de São Miguel, com um abrigo

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sensacional, entrando-se pela barreta, entre os recifes. qüentados, então, é uma festa para o paladar: muita lagosta, muito peixe..
Nos fins de semana o movimento de turistas aumenta muito. Maragogí é, sem dúvida, a mais bonita enseada do litoral alagoano;
Há muitas casas luxuosas de veraneio, bons restaurantes e bares. é larga, profunda e protegida pelos recifes.
Nasci em Maceió e minha família mudou-se para Recife quando eu O barco terá que passar no canal entre as pedras, largura de 800
tinha quatro anos de idade. Na juventude, eu voltava lá apenas durante metros, com cuidado, de vagar alguém na proa cantando o rumo; entrar
as férias de fim de ano. Depois que vim para o Rio de Janeiro, esporadi- sempre de dia, com bom tempo, a motor.
camente passei por lá e assim mesmo apressadamente, trabalhando. De Na maré baixa, a linha dos 4 (quatro) metros de profundidade fica
barco, agora, tenho ido mais vezes podendo demorar mais em seus abri- aproximadamente a 300 metros da praia.
gos. Na área de fundeio, a transparência das águas é espetacular, deline-
Ao final de cada cruzeiro ao Nordeste, nas conversas de cockpit, ando-se facilmente as áreas de pedras.
sempre é feita uma avaliação dos destaques do percurso, relembradas as A croa da galé é um banco de coral que forma piscinas naturais,
ocasiões mais marcantes, já com saudades, etc. como as já famosas de Pajuçara; fica antes da entrada para o fundeadou-
Mesmo que pesem as preferências pessoais (uns gostam mais de ro; é ótima para mergulho.
fotografar, filmar, enquanto outros preferem caçar, pescar, mergulhar ou Próximo a Maragogí e com a mesma entrada, está a enseada de São
simplesmente observar; os que gostam mais de velejar do que ficar nos Bento.
novos abrigos, etc.etc.) a escolha recai sempre sobre Noronha e Abrolhos, Outro abrigo muito bom: enseada de Marceneiro.
já que Rocas só passamos sem poder desembarcar.
Mas, no cômputo geral, incluindo os graus de liberdade, sai vence- Entre Maceió e Recife, o melhor abrigo é Tamandaré.
dor o litoral alagoano: são abrigos sensacionais, de águas mornas e crista- Existem locais muito bons, entre Tamandaré e Recife, mas são me-
linas, pouco afastados entre si, onde podemos exercer qualquer atividade. lhor alcançados por terra.
Um mergulho nas Galés ou em Maragogí se assemelha muito a es- O Cabanga Iate Clube de Pernambuco, às margens do rio. no centro
tarmos em Rocas. da cidade, também recebe a todos com muita eficiência e simpatia; man-
Os principais abrigos do litoral alagoano são, sem citar o ponto ini- tém uma espetacular sub-sede em Maria Farinha, depois de Olinda.
cial da Marina Jaraguá, Ele apoia o desenvolvimento do esporte da vela no Nordeste e re-
Barra de São Miguel (Gunga), Porto Francês, Maragogí, São Bento, aliza a já famosa regata REFENO ( Recife - Fernando de Noronha), anu-
Porto da Rua e Marceneiro. almente, em setembro. Esta regata, em cenário deslumbrante, velejada
Para exemplificar as maravilhas do litoral alagoano, cito aqui uma sensacional, com ventos fortes, constantes e largos (través aberto, geral-
chegada ao Porto Francês com o Suiá, de volta de Noronha, onde não é mente), a descontração dos participantes, uma verdadeira festa de velei-
permitido caçar. ros, onde o maior prêmio, na verdade, é chegar à ilha.
Enquanto a tripulação desembarcava para o clássico chopinho, eu Ela surgiu de uma brincadeira entre velejadores do Cabanga, apos-
preferi cair nágua para tentar fisgar alguma coisa diferente para o almoço. tando que barco tinha possibilidades de chegar à ilha; desta primeira re-
Quando a tripulação voltou, eu já estava com um belo risoto de fru- gata, participaram três barcos, sendo que apenas um completou o trajeto.
tos do mar (cavaquinhos e cocorocas) pronto, com purê de batatas e legu- A Refeno representa para os velejadores brasileiros o mesmo que a
mes. Tudo regado a vinho do Rio Grande... Bermuda Race para os americanos; até mesmo a forte corrente está presen-
Os mergulhos por lá são sempre proveitosos; em locais menos fre- te e quem não der o desconto vai velejar muitas horas a mais (ou voltar).

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O Cabanga mantem uma Bolsa de Tripulantes em sua home-page. Mas existem outros troféus igualmente em jogo: o de tartaruga ma-
Como todo evento bem organizado, exige uma grande antecedência rinha, ao penúltimo colocado; o de barco a velho, àquele de maior média
de providências, desde a inscrição e preenchimento de formulários, taxas, de idade, etc.
etc. As festividades na ilha terminam com um animado vatapá na praia,
Mas a principal providência, para os veleiros que vão do sul para a com muita música, muita viola, pandeiro e cantorias.
regata, é zarpar com bastante antecedência para chegar a Recife a tempo. Foi feita uma homenagem ao velejador Roberto Cabinho Barros,
Muitos velejadores, confiando na performance de suas máquinas, zarpam primeiro projetista brasileiro de veleiros e grande cruzeirista, autor de
tarde e não conseguem chegar; ficam no meio do caminho, gosando as inúmeros projetos excelentes, de reconhecida qualidade, inclusive vários
delícias do sul da Bahia... Aprendida a lição, não repetem o erro para a participando da Regata, tendo um deles ele próprio como tripulante; au-
regata do ano seguinte. tor de vários livros famosos, a começar pelo “Do Rio ao Taiti num barco à
Assim como o jangadeiro considera o Atol das Rocas um local en- Vela”, relato do cruzeiro que fez com a esposa, Aileen. Todo velejador leu
cantado em pleno mar, o iatista moderno considera Noronha um verda- os livros do Cabinho, que acabou de projetar e preparar um barco de 28’
deiro paraíso. , o Fiu, e está presentemente realizando novo cruzeiro, revendo as para-
A versão XI Refeno, de 1999, contou com a participação de cerca de gens e os amigos do primeiro roteiro.
80 veleiros de todos os tipos, vindos de vários recantos do país. Contou As características do Fiu devem ser analisadas por todo aquele que
também com vários barcos estrangeiros que vieram especialmente para a se decide a ingressar no esporte de cruzeiros a vela.
travessia e outros que estavam na área. Recife, a Veneza brasileira, recortada pelos rios Capibaribe e Bebe-
Lars Grael bateu o record da travessia com o moderno trimaran ribe, e banhada por um mar de águas mornas e cristalinas, cheias de uma
Bahia. quantidade enorme de recifes de corais e de arenito.
As condições foram muito boas; o SE soprando firme. Apenas na As lendas dos jangadeiros, histórias fantásticas à respeito do mar,
primeira noite o céu ficou claro; nas demais , totalmente encoberto. locais encantados e alguns protegidos por entes imaginários e perigosos,
A largada da regata é dada em frente à praia de Boa Viagem, num que afundam o barco que se aproximar...
espetáculo emocionante que transcende a qualquer tentativa de descri- O banco Tacis, temido recife que se estende por quase todo o litoral
ção, tanto pela beleza como pela performance dos veleiros participantes. NE.
Nesta XI Refeno, participei como tripulante do trimaran Viveiros, A arborização da cidade toda com árvores frutíferas: oitis, man-
projeto Jim Brown de 31, filiado à Flotilha Alagoana de Veleiros de Ocea- gueiras, jambeiros.
no; infelizmente, não conseguimos completar o percurso, por quebra da O Carnaval, o frevo, Timbus Coroados, o Galo da Madrugada. A mú-
ferragem do leme; na substituição, a vedação de popa ficou afetada, fa- sica folclórica do nordeste, com a Orquestra Armorial, o Quinteto Violado,
zendo muita água (o leme é externo). Foi, então, decidido voltar. Toda a e tantos músicos fantásticos, como Capiba, Nelson Ferreira, Ernani Braga,
tripulação já conhecia Noronha; mas perdemos as festas e a satisfação da Cussy de Almeida, Jarbas Maciel, Newton Vitória de Carvalho e tantos ou-
chegada e a velejada para Natal, passando por Rocas. tros. O nordestino não dispensa a música, uma boa praia com jangadas e
No final da regata, são concedidos diversos troféus, o de Fita Azul uma boa peixada com bastante pimenta.
(ao primeiro que chegar), aos primeiros colocados no tempo corrigido e a A UNESCO tombou Olinda como patrimônio cultural da humanidade.
classificação por ordem de chegada, dentro das diversas classes. Olinda é hoje uma extensão de Recife; são praticamente a mesma
cidade.

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As praias: dos Milagres à Itamaracá, extensões enormes de areia caminho andado para a Europa, aproveitando a circulação dos ventos do
branca acompanhadas por coqueirais, a perder de vista, onde eu passei Hemisfério Norte. Muitos veleiros brasileiros encontram em Natal o por-
minha infância e juventude. to ideal para servir de trampolim para Trinidad & Tobago ou Barbados,
Praias maravilhosas, cheias de vida nos recifes que a acompanham, numa velejada de cerca de duas mil milhas, uns vinte dias vendo só céu
formando um verdadeiro cordão de proteção, até a ilha de Itamaracá, e mar.
podendo-se velejar nele em mar espelhado e quase sempre com bons Em geral, o cruzeirista é recebido muito bem em todos os clubes
ventos: o cordão de recifes amansa o mar, transformando-o quase numa náuticos ao longo do nosso litoral. No entanto, é bom adotar um procedi-
lagoa. mento atencioso, em retribuição.
A sub-sede do Cabanga Iate Clube na praia de Maria Farinha, um Na aproximação do Clube, entrar em ligação com a estação - rádio
paraiso difícil de encontrar em outras partes do planeta. e pedir as informações necessárias, sobre a possibilidade de encostar no
Pode-se entrar Itapessoca, pequeno porto com grande tráfego de pier, questão de vaga e local, nome do Diretor de plantão, etc. Em deter-
traineiras e barcaças, na ilha de Itamaracá, pelo canal de Santa Cruz. minadas épocas, o Clube reserva áreas para os barcos que participam de
Esta área norte do litoral de Pernambuco, fronteira com a Paraíba, eventos, etc.
possui uma enorme concentração de recifes, uma verdadeira festa para Ao chegar ao Clube, procurar o Diretor para as apresentações e
o mergulhador. comparecer à Administração munido dos documentos pessoais de toda
Para o iatista, os inúmeros abrigos tornam a região muito atrativa; a tripulação e do barco e a carteira de sócio do clube congênere a que o
próximos estão os abrigos da ilha de Itamaracá e mais para o norte, já na barco está filiado.
Paraíba, o rio Paraíba com o porto de Cabedelo e a Marina Jacaré. Preencher a ficha de chegada, combinar a permanência, tomando
Já de volta de Noronha, vamos nos apoiar no Iate Clube de Natal, no conhecimento das normas e receber os cartões de entrada no Clube para
rio Potengi. a tripulação, etc.
A cidade fica em torno do rio e debruçada no mar, protegida por Com o crescimento do número de cruzeiristas, os Clubes foram
recifes de toda espécie, possui um dos mais bonitos litorais; a natureza obrigados a exigir maior controle de visitantes de outros Estados, por
caprichou em Natal. motivos óbvios.
O canal de São Roque, cheio de pontos especiais de mergulho. Portanto, ninguém deve estranhar esses pequenos itens.
Ao longo do litoral dos recifes, desde o cabo Calcanhar, no Rio Gran- E constitui uma garantia que interessa a todos.
de do Norte, até o pontal do Peba, em Alagoas, as pedras não vão além da Mesmo nos fins de semana, os clubes mantêm um Diretor de Plan-
linha de profundidade dos 12 metros. Isto constitui um bom indício na tão, a quem devemos procurar para um primeiro cumprimento e permis-
aproximação da terra, principalmente à noite ou em cerração. são para visitar o clube, não deixando, porém, de apresentar na Secretaria
Existem sempre muitos barcos estrangeiros descansando em Natal, a documentação no primeiro dia de expediente.
em preparativos para descer o nosso litoral ou de retorno aos seus países. É uma praxe a que devemos observar, mesmo que o cansaço seja
O Iate Clube de Natal é outro exemplo digno de nota, com recep- grande.
ção muito boa aos velejadores. Além de incentivar e apoiar os cruzeiros à Não podemos adentrar os domínios de ninguém sem permissão,
Noronha e aos Rochedos São Pedro e São Paulo, oferece excelente apoio. sem que nos apresentemos, é o mínimo que se pode exigir.
O litoral do Rio Grande do Norte é batido pelos ventos alísios, fa- E é uma medida de segurança, uma vez que registrando-se a passa-
voráveis a uma velejada à Fortaleza, ao Caribe e América do Norte, meio gem pelo local, fica-se sabendo do trecho provável em que o barco está, no

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prosseguimento do cruzeiro. da de mar aberto que ainda existia.


Mas um clube não é essencial para o cruzeirista; na maioria das ve- Cerca de dez mil quilômetros de canais navegáveis, com saídas para
zes, ancoramos em abrigos sem nenhum apoio, em frente à vilas de pes- o mar; ao longo de toda esta extensão, existem milhares de marinas, iate
cadores, apenas com o que se pode contar no local. E são as paradas mais - clubes, estaleiros, etc., uma verdadeira febre de barcos, numa atividade
lembradas. impressionante, principalmente nos fins de semana, no verão. Mas mes-
No entanto, há ocasiões em que o clube é de maior necessidade, mo no inverno, com o gelo quebrando tudo, a atividade náutica é grande.
como quando temos que nos ausentar por alguns dias; deixar o barco em Acho que eles se empolgaram com a construção do canal do Pana-
local seguro é muito bom. má e aproveitaram o embalo...
De 1975 a 1978, residi nos EUA, destinando como de costume to- As companhias aéreas que fazem a ligação entre as cidades cos-
das as horas de folga, fins de semana, feriados e feriadões, férias, etc. para teiras, empregam aviões pequenos, voando à baixa altura, de modo que
o assunto barco, velejadas, etc. podemos ver os detalhes: é um trecho realmente empolgante para quem
Visitei os mais famosos Boat Shows em três anos consecutivos, sen- gosta de barco.
do alguns com água pelos joelhos (Annapolis, 1976 e 1977) devido às O meu grau dez vai para Annapolis, às margens da baía de Chesape-
marés acima do normal naqueles anos (nem mesmo este fato impediu a ak; é uma cidade-marina, vivendo em função dos barcos.
realização do evento); freqüentei vários estaleiros, inclusive no Canadá A Academia Naval de Annapolis, que forma oficiais, ocupa uma área
(Samsom Marine) especialista em ferrocimento muito em voga na época enorme, possuindo uma marina impecável. A cidade é rodeada por ma-
(mas que não me seduziu). rinas: em cada braço da baía, dezenas de marinas, milhares de barcos de
Nunca concordei em instalar equipamento nobre num casco de ci- todos os tipos e tamanhos; um verdadeiro formigueiro anfíbio....
mento. No final, como em todos os outros materiais, o casco é protegido Annapolis praticamente é ligada à Baltimore, de marina em marina.
com fibra de vidro. Nunca vi um casco de fibra protegido com uma cama- Depois desta área, já na boca da baía, a cidade de Norfolk é outra
da de outro material... enorme marina, com estaleiros imensos, atividade náutica intensa.
Conheci inúmeras marinas estaduais e muitas particulares em qua- No verão, o esporte é velejar.
se toda a costa leste, desde Fairhaven até a Florida, destaques para Anna- Em seguida, pelo grau decrescente de preferência, pulamos para
polis, Baltimore, Norfolk, Fort Lauderdale e Key West. Fort Lauderdale, Miami e Key West, em ordem inversa de preferência.
O americano construiu uma fantástica via navegável, aproveitando Key West é ligada a Miami por uma auto-estrada sensacional, de-
rios, baías, lagos, canais, etc., de modo que se pode ir navegando com o bruçada sobre o mar, construída sobre as pedras, com inúmeras pontes-
veleiro da fronteira com o Canadá até a fronteira do México, com raros levadiças, existindo marinas, praias, residências, comercio, etc. de um
trechos de mar aberto: toda a costa Leste e a do Golfo do México. lado e de outro, sem interrupção, nos cerca de 400 quilômetros de estra-
Constituem a Atlantic Intracoastal Waterway e a Gulf Intracoastal da, ida e volta intimamente ligada ao mar, sempre olhando o mar.
Waterway, que se unem praticamente, na Florida, onde fica um pequeno Não pude conhecer a costa oeste, Marina Del Rey, San Diego ou a
trecho de mar aberto, entre Key West e Tampa, já no golfo. baía de San Francisco, mas duvido muito que seja mais ligada aos espor-
É como se a gente pudesse ir do Oiapoque ao Chuí em águas abriga- tes náuticos que a costa leste, principalmente no que se refere à quanti-
das, velejando na beira do mar. dade de veleiros.
Em 1978 estavam abrindo um largo canal para ligar as baías de A Marina del Rey pode ter, só ela, trinta e cinco mil barcos, mas o
Cheasapeake e Delaware, eliminando o maior e mais perigoso trecho ain- restante da costa não apresenta a dispersão de barcos da costa Leste.

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Para percorrer a Intracoastal, existem publicados vários guias, de- ter problemas para explicar a origem da grana e fazia preço camarada).
talhados e com os mapas; é absolutamente imprescindível adquirir um, Aliás, lá todos eram camaradas...
pois o número de pontes, braços de canais e saídas é muito grande e va- O Cal-28, muito parecido com o Arpège, porém bem mais moderno,
riam de ano para ano. era uma delícia nos ventos de alheta; orçávamos pela manhã, às vezes até
Nunca deixei passar as oportunidades de fazer algum curso mais receando o estaiamento não agüentar (o barco já era bem antigo, embora
para freqüentar o ambiente náutico, em qualquer tempo livre disponível. conservado). A volta era em popa, apenas com genaker, surfando nas on-
Haviam cursos inteiramente voltados para a técnica de vela, desde das, uma maravilha, chegando antes de anoitecer no clube.
o básico ao de oceano, mas também existiam os que eram mais de turis- Embora aqui no Brasil, ao longo da nossa grande barreira de corais,
mo, para serem feitos junto com a família, que às vezes nem sabia que eu não existam tão grande quantidade de barcos como nos EUA e não tão
era aluno (e eles também, por tabela). constantes ventos como no litoral africano, em compensação não existem
Em uma outra ocasião que tive oportunidade de trabalhar fora do os grandes problemas de furacões, tornados, gelo, nevascas, ondas pira-
Brasil, fui para Luanda, Angola, numa grande firma de engenharia. Em midais, guerra, etc. podemos velejar durante o ano todo, tirando de letra
plena rota dos alísios de SE, é impressionante como o vento lá sopra o ano o inverno tropical.
inteiro, chegando a roncar nos estais a maioria das vezes. Aqui existem locais muito melhores que os melhores do Caribe ou
Embora em época de guerra, podíamos manter atividades esporti- de qualquer parte do mundo. É só não aceitar a lavagem cerebral da pro-
vas de fim de semana; a guerra era mais no interior. paganda...
A maioria dos barcos estava abandonada e danificada no que fôra É claro que a magia de estar com o barco num lugar distante do
um ótimo iate clube, grande número de lanchas, a maioria de grande por- Brasil influencia muito o espírito do cruzeirista, além das atrações com-
te, de pesca oceânica, ou pequenos veleiros, tipo Laser e Hobby Cat; mas pletamente inexistentes, exóticas e na maioria das vezes exorbitantes.
existiam alguns um pouco maiores, italianos, franceses e americanos, que Onde podemos encontrar um melhor lugar que Maragogí, ou Porto
podíamos alugar. Francês, ou Gunga ? Tamandaré, Maria Farinha, Itapissuma, Porto Seguro,
E a recomendação principal era ficar no interior da baía e sempre Ilhéus, Camamu, Morro de São Paulo, Cabedelo, isto sem querer falar nos
atento ao vento; se saísse da baía, orçar para sul, pois era mais fácil voltar, Abrolhos ou Noronha. São locais maravilhosos que não são devidamente
caso o vento resolvesse roncar nos 20 nós por vários dias, como era nor- divulgados e que estão sendo desperdiçados por nós, brasileiros...
mal. Sempre soprava sudeste. Em Arraial do Cabo, logo ao entrar pelo Boqueirão, vamos encon-
É aproveitando tal vento que os sul-africanos têm presença cons- trar uma enseada, ficando na ilha de Cabo Frio a mais bonita praia da
tante no Caribe. região, difícil encontrar outra igual em todo o nosso litoral.
Eles vão pela costa africana, aproveitando também a forte corrente A Prainha, logo a primeira praia avistada por quem vem via rodovi-
favorável de Benguela e voltam ao largo da costa brasileira, sempre com ária, é outro exemplo, possui águas azuladas transparentes.
ventos e corrente favoráveis. As praias de Búzios, como a da Ferradura, da Ferradurinha, do For-
Em Luanda, comecei num HC-16, mas o vento forte maltratava mui- no, da Foca e muitas outras, são de tirar o chapéu.
to; era uma escora constante, sempre molhado, sempre fazendo força para
não emborcar, uma luta; e não era aconselhável sair da baía. Passei para
um Cal-28 de um angolano, filho de portugueses, que alugava baratinho
por dia (como o governo controlava as contas bancárias, ele não queria

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que o mar quebra conforme o vento e a maré.


Estes bancos se estendem a mais de uma milha para dentro do mar,
principalmente para o lado da Ponta da Enseada.
O número de marinas no canal de Bertioga aumentou muito nos
últimos dez anos, oferecendo várias boas opções, bom apoio e, em conse-
qüência, muito movimento de barcos.

Ilha de São Sebastião


Ilhabela (farolete) Ponta das Canas Ponta da Sela
23º 47,00’ S 23º 43,61’ S 23º 53,27’ S
045º 21,50’ W 045º 20,56’ W 045º 27,79’ W
Praia da Armação Praia do Perequê Marina Porto Ilhabela
23º 44,00’ S 23º 48,70’ S 23º 47,00’ S
045º 20,70’ W 045º 48,70’ W 045º 21,50´ W
Abrigo do Forno, em Arraial do Cabo
Há muito apoio náutico e de combustível, com inúmeros clubes e
marinas.
Abrigos Nos fins de semana ela é modificada em sua calma pelo grande mo-
vimento dos turistas; o canal e as enseadas se enchem de velas e de todo
tipo de embarcação.
Vejamos detalhes dos melhores abrigos, os mais procurados no Próximo, no continente, em São Sebastião, há o terminal portuário.
percurso da nossa costa, de Bertioga à Noronha. Centro Náutico São Sebastião: 23º 48,50’ S / 045º 24,00’ W; com-
bustível.
Bertioga Pedra do Corvo (farol) A Angel Marina (23º 41,00’ S / 045º 26,00’ W) oferece apoio náuti-
co, em São Sebastião.
23º 51,0’ S 23º 51,40’ S
046º 08,0’ W 046º 07,58’ W

Ubatuba (enseada) Saco da Ribeira Ilha Anchieta
O canal de Bertioga é um ótimo abrigo, com inúmeras marinas para
apoio do barco, oferecendo mecânico, eletricista, combustível, suprimen- 23º 26,30’ S 23º 30,20’ S 23º 32,0’ S
tos, rampa, etc. 045º 03,40’ W 045º 07,30’ W 045º 04’ W
Marinas Nacionais: 23º 51.97’ S / 046º 09.30’ W Saco Perequê-Mirim Enseada do Flamengo Enseada da Fortaleza
Devemos tomar cuidado na entrada do canal, chegando mais para 23º 29,40’ S 23º 30,0’ S 23º 30,10’ S
perto da pedra do Corvo, à bombordo de quem entra, uma vez que as 045º 06,30’ W 045º 06,70’ W 045º 09,70’ W
águas em frente à praia da Enseada são rasas, com bancos de areia, em

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

Picinguaba (enseada) Ubatumirim (enseada) Camburi (enseada) Marina Angra Inn Porto Marina Gipóia
23º 22,00’ S 23º 20,60’ S 23º 22,30’ S 23º 02,45’ S 23º 02,35’ S
044º 51,00’ W 044º 54,00’ W 044º 47,40’ W 044º 20,35’ W 044º 21,60’ W
Club Mediterranée
Ubatuba possui rádio-farol, de modo que é muito fácil demandá-la, 22º 59,70’ S
com mais uma opção para a aproximação segura. 044º 05,60’ W
Oferece apoio náutico, suprimentos em geral e combustível, além
de muitos hotéis, pousadas e restaurantes, tudo de primeira qualidade. Estaleiro Angra Diesel, na Internet: www.angradosreis-rj.com.br-
O Saco da Ribeira e as ilhas; as marinas; ótimos abrigos e uma gran- adiesel .
de quantidade de barcos de todos os tipos.
A região de Ubatuba e adjacências é o maior centro náutico da Amé- Para mergulho:
rica do Sul.
As marinas do percurso até Angra dos Reis ;a ilha de Anchieta, um Gruta do Acaiá Laje dos Meros Ilha Jorge Grego
bom abrigo.
23º 10,47’ S 23º 09,00’ S 23º 12,96’ S
As falésias do saco do Mamanguá, região de Parati-Mirim.
044º 22,70’ W 044º 32,20’ W 044º 09,32’ W

Baía da Ilha Grande Laje dos Moleques Laje do Coronel Ilha do Pau a Pino
23º 10,80’ S 23º 05,95’ S 23º 05,92’ S
Ponta de Juatinga Ponta de Castelhanos Angra dos Rei
044º 38,65’ W 044º 23,95’ W 044º 07,14’ W
23º 17,70’ S 23º 10,04’ S 23º 00,80’ S
044º 30,01’ S 044º 05, 46’ W 044º 18,80’ W
Existem muito grande quantidade de pontos bons para mergulho,
lajeados, cascos soçobrados, parcéis, etc.
A parte leste, com Itacuruçá, Jaguanum e inúmeras ilhas, incluindo- Algumas ilhas mais badaladas, com excelentes restaurantes e outra
se a ponta da Marambaia e a espetacular ilha da Pombeba merecem uma atrações:
demorada visita.
Ilha do Arroz Ilha de Paquetá
A parte próxima à cidade de Angra dos Reis possui muito apoio
22º 08,28 ´S 22 º 59,60 ´S
náutico, hotéis com diversas marinas e iate-clubes em diversas enseadas.
044º 24,47 ´W 044 º 24,47 ´W
Marina Porto Bracuhy Iate Clube de Angra dos Reis - ICAR Ilha de Caras Ilha de Sandri
22º 57,35’ S 22º 56,65’ S 23º 06,00 ´S 23 º 02,80 ´S
044º 23,70’ W 044º 19,80’ W 044 º 20,08 ´W 044 º 29,60 ´ W
ICRJ/ Sub-Sede Marina Porto Frade Ilha Grande (Vila do Abraão)
22º 57,80’ S 23º 01,40’ S 23 º 08,28 ´S
044º 20,55’ W 044º 26,00’ W 044 º 09, 88 ´W

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

A Ilha Grande é a maior ilha da região. No verão, fica difícil encontrar vaga para uma boa ancoragem, per-
A parte de mar aberto da ilha é a mais bonita e venta mais; ficar to da praia, em frente à Vila. E o progresso chegou à região de maneira
sempre atento às mudanças de tempo, para cair fora, pois os abrigos não assustadora. A cada ida, ficamos abismados com a grande quantidade de
são protegidos dos SW. novas construções, casas luxuosas, o comércio aumentando e a invasão
A enseada de Lopes Mendes e as praias do Aventureiro, Sul e Leste, dos turistas em quantidades cada vez maior.
são as mais bonitas da ilha. As praias do Sul e do Leste são na mesma en- A parte voltada para o continente é bem mais calma, com menos
seada do Aventureiro e formam um parque marinho e reserva biológica, vento.
existindo uma lagoa muito bonita próximo à praia. Araçatiba, Sítio Forte, Freguesia de Santana, ilha de Macacos, etc.,
são pontos muito bons para uma parada; bons hotéis e restaurantes.
Enseada de Lopes Mendes Enseada do Aventureiro Nunca facilitar: navegar na área sempre com a carta à vista, pois
23 º 10,80’ S 23 º 11,20’ S é impossível decorar o local de todas as lajes, todas as pedras, todos os
044 º 08,08’ W 044 º 18,91’ W perigos.
De noite, parar ou só navegar pelo meio do canal, na esteira da Lua
Saco do Céu Enseada da Estrela
e com olhos bem abertos, um olho em frente e outro na carta...
23 º 06,43´S 23 º 06,72` S
O percurso Ilha Grande - Rio, pode ser feito no visual da costa, quan-
044 º 12,55´S 044 º 11,60´ W do os ventos do quadrante Sul estão soprando; é um dos mais bonitos.
Enseada de Palmas Enseada de Parnaióca Podemos passar por fora da Laje da Marambaia ou no canal entre
23 º 09,00’ S 23 º 11,60’ S ela e a praia, se vamos mais próximos à costa.
044 º 07,84’ W 044 º 15,37’ W
Enseada de Provetá Ponta dos Meros Laje da Maram- Guaratiba(farol) Ilha de Palmas (fa-
23 º 10,90´S 23 º 13,43´S baia rol)
044 º 20,64´ W 044 º 21,00´ W 23º 06,9’ S 23º 04,8’ S 23º 01,5’ S
043º 50,2’ W 043º 33,7’ W 043º 12,3’ W
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Nunca é demais lembrar: ficar sempre atento ao tempo, é um pri- Ilhas Cagarras Ilha de Cotunduba Pão de Açúcar
meiro cuidado; um radinho de pilha dirá se existe alguma possibilidade
23º 02,0’ S 22º 57,8’ S 22º 57,0’ S
de mudança: as estáticas são um indício infalível.
Abraão é uma espécie de capital da ilha, ponto obrigatório, ofere- 043º 11,0’ W 043º 08,9’ W 043º 09,4’ W
cendo possibilidade de reabastecimento de víveres e água potável, além
de uma permanência calma, bem abrigada, nos dias da semana; nos fins- A Laje da Marambaia é um rochedo com várias pedras ao redor;
de-semana, há uma invasão de turistas, animando a praia com batucadas, nela há um farol. Podemos passar por fora ou entre a laje e o continente,
rodas de samba, etc. a restinga da Marambaia.
Ancorar sempre muito bem, mais para longe da praia, onde a tensa A enseada de Guaratiba, a meio caminho para a baía de Guanabara,
é melhor, pois os ventos por toda a região costumam ser repentinos, prin- pode ser usada para ancorar o barco, em caso de parar o vento, quando
cipalmente os de NW, verdadeiros pés-de-vento. estiver no percurso próximo à costa; a tensa é boa, permitindo um pernoi-
te tranqüilo. Mas, como o vento predominante é o nordeste, geralmente o

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percurso por perto não é o preferido, na ida da Guanabara para o Abraão. vela, devemos aguardar a maré vazante para sair.
A ilha de Palmas fica em frente a Ipanema e tem um farolete. O ca-
nal entre as ilhas Cagarras e a praia (Ipanema e Leblon) é navegável, sem Waypoint ao largo Marina da Glória Iate Clube do Rio de
perigos; apenas uma laje onde as ondas às vezes quebram, muito perto (farol da Ilha Rasa) Janeiro
da praia, onde não se deve chegar de barco. Entre as ilhas Cagarras há um
23º 03,8’ S 22º 55,0’ S 22 º 57,10 ´S
pequeno abrigo, próximo à ilha Comprida. Neste abrigo, as traineiras cos-
043º 08,7’ W 043º 10,3’ W 043º 10,32’ W
tumam fundear e muitas vezes largam âncoras entocadas, com parte da
Plataforma Argonauta Iate Clube Icaraí I Iate Clube Brasileiro
amarra, cabos de aço, podendo causar problemas ao fundeio, com perigo
(Urca) (plataforma do
de enroscar e perder a âncora do veleiro. No lado leste da ilha Rasa fica a
Tatalo)
área de espera para navios.
As baleias estão aparecendo em cardumes, tanto na ida como na 22º 56.5’ S 22º 54,9’ S 22 º 54,9´S
volta dos Abrolhos, onde vão acasalar. 043º 09.5’ W 043º 06,4’ W 043 º 06,6´W
Jurujuba Iate Clube Clube Naval Charitas Arraial do Cabo (faro
Baía de Guanabara (entrada, barra pequena) Cabo Frio)
22º 56,0’ S 22 º 56,2´S 22º 55,8’ S 23 º 01,00´S
043º 08,8’ W 043 º 06,5 ´W 043º 05,9’ W 042 º 00,00 ´W
Enseada do Forno
A entrada da baía de Guanabara pode ser feita pela barra pequena, 22º 57.87’ S
entre a Fortaleza de São João e a ilha da Laje (farol verde) ou pela barra 042º 00.79’ W
grande, entre a ilha da Laje e a Fortaleza de Santa Cruz (farol encarnado),
entrada normal dos grandes navios que vão para o Porto do Rio de Janei- Para uma parada técnica, os abrigos de Arraial do Cabo, entre a ilha
ro, que é bem balizada: luz verde na ilha da Laje (para deixar por bombor- de Cabo Frio e o continente, são os melhores de toda a área compreendida
do, vindo do mar), luz encarnada na Fortaleza de Santa Cruz, para deixar por Arraial do Cabo, Cabo Frio e Búzios.
por boreste (vindo do mar) e uma bóia próximo à ilha da Laje, balizando A praia do Forno é o melhor abrigo; lá só há uma casa, à boreste de
o canal para os navios. quem chega: a do Coronel Bezerra, uma grande figura local, que recebe a
Quem pretende ir para Niterói, deve escolher este canal (barra todos muito bem.
grande). Na praia dos Anjos, ao lado, passando-se o Porto, há uma marina,
Muito apoio náutico, suprimentos e combustível, tanto no Rio como com grande movimento de traineiras de pesca; muito peixe.
em Niterói. O porto do Forno divide as praias do Forno e dos Anjos.
Um bom local para ancorar o barco é na área do flutuante Argonau- O movimento de navios é pequeno, mas é comum haver platafor-
ta, ou flutuante do Tatalo, na enseada da Urca, após passar a Fortaleza de mas de petróleo em manutenção na área.
São João; águas mais limpas, mais perto da boca da barra. No entanto, não Para aproveitar a contra - corrente, a aproximação do Farol não
há serviço de segurança. Ancorar na Marina da Glória é mais seguro. deve ser feita vindo do largo; além disso, devido ao grande movimento
Em ambas as entradas, a correnteza é forte, com a passagem de um de navios e embarcações de apoio às plataformas, a aproximação menos
grande volume de água por duas bocas estreitas, um verdadeiro funil. À

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amarada oferece vantagem. Gelo pode ser conseguido em vários lugares à beira do canal, onde
Para investir o boqueirão à noite, vindo de W, é aproar o ponto mais as traineiras encostam.
alto do perfil da ilha de Cabo Frio, após sair do campo de visibilidade do Mais para dentro, seguindo-se pelo centro do sinuoso canal, encon-
farol e ir avançando de vagar até ver a estreita entrada entre a muralha de traremos muitos restaurantes e hotéis e o Clube Náutico de Cabo Frio,
pedra. Logo após distinguir o Boqueirão, avista-se a faixa de areia branca numa curva, com ancoradouro estreito e uma pequena praia.
da praia logo em seguida na primeira enseada à boreste. O Iate Clube de Cabo Frio fica depois da ponte, não sendo possível
Se o topo da ilha estiver encoberto, a aproximação deve ser feita chegar até lá de veleiro, tanto pela pouca profundidade do canal como
proando o farol, até ver os rochedos; guinar para bombordo e já com ve- pela guinda.
las abafadas e motor ligado, ir observando devagar até ver uma racha na Perto e antes da ponte, está o Clube Costa Azul: na maré alta pode-
pedra e logo em seguida o Boqueirão, com seus 150 metros de abertura, mos atracar lá (até 2m de calado), que oferece eficiente apoio.
canal profundo. De Cabo Frio à Búzios, podemos ir pelo canal dos Papagaios, com
Ao entrar pelo Boqueirão, deve-se seguir o trajeto próximo às pe- as ilhas servindo de antepara para o mar, ou por fora, para uma velejada
dras, indo-se até a pedra-vermelha; só então deve-se guinar para bom- sem tantos bordejos.
bordo, livrando os bancos de areia visíveis por bombordo. Dentre as inúmeras ilhas, a Comprida oferece algum abrigo, além
A pedra vermelha é uma parte avermelhada das pedras na beira da da dos Papagaios, que fica logo na saída do canal de Itajurú.
água; à noite, é impossível enxergá-la; preferir entrar de dia, pelo menos
a primeira vez. Búzios Ilha Branca (Farol)
Na praia dos Anjos há uma marina da Prefeitura, com muitos barcos 22º 44,82’ S 22º 43,81’ S
pesqueiros, com vários piers de atracação, onde é possível conseguir gelo 041º 51,90’ W 041º 52,45’ W
e apoio de mecânico e eletricista.

Depois de Arraial do Cabo, vem Cabo Frio, com o abrigo do canal
Combustível e água podemos pegar no posto ao lado do Iate Clube
de Itajurú.

Armação dos Búzios:


Cabo Frio
22º 44,8’ S
22º 53,0’ S
041º 53,0’ W
042º 01,2’ W


Foi construída pelo saudoso empresário Humberto Modiano uma
Logo após a entrada do canal de Itajurú está a sub-sede do ICRJ
grande marina na praia Rasa,
(Iate Clube do Rio de Janeiro),à bombordo, com apoio de combustível e
água, além de bar e restaurante.
Marina Porto Búzios:
Podem ser conseguidos também os demais apoios.
22º 45,1’ S
Sub-Sede do Iate Clube do Rio de Janeiro Costa Azul Iate Clube
041º 56,9’ W
22º 52,5’ S 22º 52,7’ S
042º 01,0’ W 042º 01,2’ W

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Na ilha Rasa, em frente à Marina Porto Búzios, há um hotel cinco A tensa não é boa, areia dura, de modo que deve ser mantida aten-
estrelas (Hotel Nas Rocas), do mesmo empreendimento. ção se o barco está garrando, o que geralmente é no sentido da praia. Cer-
Depois de Búzios, Rio das Ostras apresentando o Iate Clube Rio das ta vez, com âncora de 20 kg., Danforth e muito filame, ancorando a duas
Ostras onde podemos entrar de veleiro. milhas de distância do Farol, ao acordar de noite, vi que estava sendo le-
Em seguida, Barra de São João, também com um simples e bom iate vado para a praia; aproveitei e zarpei.
clube, que fica depois da ponte velha (em ruínas), não permitindo acesso É preferível prosseguir, com destino à Vitória, onde poderemos des-
a veleiros. cansar, reabastecer o barco para o salto maior para Maceió, direto, bem
O rio São João é limpo, sem poluição; podemos percorrê-lo de lan- ao largo.
cha ou de caíque com motor de popa até ao sopé das montanhas, em pas- Até Guarapari, não existe bom abrigo; algumas vezes parei em Iriri
seio sensacional. e Anchieta, só para conhecer.
Depois de Barra de São João, está Macaé, que tem as ilhas de Santa-
na logo em frente. Guarapari Ilha Escalvada
20º 40,1’ S 20º 42,10’ S
Macaé (farol) Ilhas de Santana (farol) 040º 29,7’ W 040º 24,50’ W
22º 22,27’ S 22º 24,16’ S
041º 44,52’ W 041º 42,38’ W Depois de montar o Cabo de São Tomé, o destino é Vitória do Espí-
rito Santo, mas sempre somos levados pela tentação (e pelo cansaço da
O melhor abrigo é na ilha do Francês, mas sempre há muita trainei- vigilância no trecho anterior, de São Tomé) a dar uma arribada em Guara-
ra fundeada, de modo que é difícil encontrar vaga. pari, que é o principal polo turístico do Estado.
Prosseguindo, vamos encontrar o Cabo de São Tomé; podemos es- O melhor ancoradouro em Guaraparí é o do canto da praia do Mor-
colher passar por perto, pelo canal, ou ao largo. ro da Pescaria, do lado oposto onde está o rio; uns a denominam apenas
Os bancos de areia não vão além das 12 milhas da costa, mas há um de praia do Morro e outros, de praia do Canto. A ancoragem no rio é di-
canal próximo à praia, bem mostrado na carta. Muitos cascos soçobrados ficultada pela falta de espaço (lazeira) e pela correnteza, que é grande.
já não existem mais. Na expectativa de entrada de frente fria, aproveitar para prosseguir para
Vitória.
São Tomé (farol) Farol Açu Ao largo 15 milhas Existe um cais em frente à Matriz, no rio, próximo a ponte, mas o
22º 02,54’ S 21º 59,95’ S 22º 00,0’ S movimento de barcos locais é grande.
041º 03,27’ W 040º 59,23’ W 040º 45,0’ W Na praia do Morro, para quem vai rebocando o barco sobre carreta,
pode-se colocar a carreta na praia para lançar o barco nágua, sem perigo
de atolar; a areia é firme.
Em São Tomé há um rádio-farol (SK), além dos de Macaé e os das
O posto de combustível pode levar em camburões até ao barco.
plataformas.
Em frente a Guarapari, no trajeto para Vitória, além da ilha Escal-
A ancoragem em frente ao farol de São Tomé (manter distância de
vada, existem:
uma milha, no mínimo) é em mar aberto, desprotegido; há muita vaga do
largo, não oferecendo repouso à tripulação.

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

Ilhas Rasas Três Ilhas Abrolhos (ilha de Santa Bárbara)


20º 40,80’ S 20º 36,60’ S 17º 57,8’ S
040º 22,00’ W 040º 22,80’ W 038º 41,6’ W

Onde deveremos estar prestando atenção, principalmente nas Três Arquipélago constituído por cinco ilhas de formação coralígena,
Ilhas, que são ainda menos visíveis, principalmente à noite. rodeada de parcéis submersos e bancos de areia, próximos a grandes for-
O percurso para Vitória, em cerca de 40, geralmente pode ser feito mações de recifes, como a Coroa Vermelha, o parcel das Paredes, o parcel
próximo à costa, a umas cinco milhas, devido à pouca distância da perna. das Areias, os Timbebas, Itacolomís, etc.
Com vento forte do quadrante norte, abrir a orça, afastando bastante da É, por isso, uma região temida ou respeitada pelos navegantes.
costa, para dar o bordo de chegada vindo do mar. Preferir chegar com dia Mas, uma festa para o mergulhador.
claro em Vitória, devido ao grande movimento de navios. Com tempo bom, uma navegação bem planejada, permitirá uma
passagem tranqüila por entre os perigos. Mas, com mau tempo, preferir
Vitória do Espírito Santo (ilha dos Farol de Santa Luzia passar por fora, com bordo de mar...
Pacotes) A maior ilha, a de Santa Bárbara, possui um farol e é a única habi-
20º 21,11’ S 20º 19,5’ S tada. Existe uma guarnição da Marinha e o IBAMA mantém um delegado
040º 15,04’ W 040º 16,0’ W residindo na ilha.
O melhor ancoradouro é entre as ilhas Siriba e Redonda; em caso de

SW forte, o abrigo é na parte norte de Santa Bárbara.
O Iate Clube do Espirito Santo (ICES) representa um ótimo ponto
Sem dúvida alguma, existem inúmeras áreas que se assemelham, ao
de apoio tanto para quem sobe como para quem desce a costa brasileira:
longo da nossa grande barreira, muito mais próximas à costa e livres das
é uma ótima parada, bom descanso, bom local de abastecimento, tanto de
restrições adotadas para os Abrolhos.
víveres como de combustível.
Bem próximo ao Clube há bom comércio, ótimos restaurantes e um
grande supermercado. Caravelas Barra do Tomba (primeira bóia,
O ICES fica situado por trás da ilha do Frade, em local bem abrigado. mais afastada)
O Porto de Tubarão, com seu crescimento veloz, a ponto de atrapa- 17º 45,2’ S 17º 46,6’ S
lhar a tomada de pontos de referência para a navegação: tudo muda tão 039º 13,4’ W 039º 11,8’ W
rápido, que a referência de um ano já não vale mais para o ano seguinte.
O ICES é o apoio ideal das lanchas da pesca oceânica, na temporada, A entrada para Caravelas, ressalto mais uma vez, é feita pelo Tom-
uma vez que o peixe de bico chega bem perto da costa capixaba, com a ba, braço de rio que oferece profundidade suficiente, na maré cheia, para
corrente quente. veleiros (4 metros, no canal). A parte mais rasa fica na aproximação da
Pela orientação de apoio ao desporto náutico imprimida por suas praia, para quem vem dos Abrolhos; ao entrar no Tomba, a profundidade
sucessivas diretorias, sem exceção, ele será um dos melhores centros de é grande. Nos Abrolhos, os barcos locais podem informar sobre como está
esportes náuticos do país. É um exemplo a ser seguido pelos demais iate- a entrada.
clubes. O rio Caravelas se espraia na foz, não permitindo a entrada, mesmo

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

para traineiras, em qualquer maré. #1: 17º 55.8’ S / 039º 18.8’ W #2 : 17º 55,40’ S / 039º 19.95’ W)
Ao entrar no rio Caravelas, após percorrer o pequeno percurso pelo
#3: 17º 54,71’ S / 039º 20,16’ W #4: 17º 54,45’ S / 039º 20,60’ W
rio Tomba, avistamos as casas da cidade de Ponta DAreia, em frente, na

outra margem do rio.
Este canal é bem conhecido pelos pescadores da região e varia du-
Guinar para bombordo, seguindo junto à margem direita do rio, já
rante o ano, de modo que é recomendável conversar com eles a respeito.
avistando as casas de Caravelas, praticamente ligada à Ponta DAreia. São
Depois de passar esta entrada, vamos encontrar uma parte larga,
cerca de duas milhas rio acima.
profunda, que é o ancoradouro do Bocão, próximo à ilha da Cassumba;
Só atravessar o rio, para a margem da cidade, após passar o ponto
podemos prosseguir até o ancoradouro da cidade, que é mais abrigado.
de travessia da balsa, caracterizado por um espraiado, se a balsa não esti-
Uma boa pedida é ancorar próximo à bóia de espera e chamar pelo
ver no local para balisar.
VHF, na tentativa de algum prático, ou por alguma traineira que esteja na
Nunca tentar entrar com ventos do quadrante Sul; aguardar nos
escuta; poderão informar sobre as condições do canal e, conforme o caso,
Abrolhos.
algum barco poderá orientar a entrada. Na área, as águas são sempre tur-
De veleiro, não tentar na vazante ou pouco antes; a correnteza é
vas; há muito rio desaguando.
muito forte.
Porto Seguro, um bom abrigo, mas já ficando pequeno para tanto
No cais da cidade é perigoso permanecer atracado, pois o barco
barco, principalmente no período de férias escolares de fim de ano.
pode entrar por baixo, não havendo proteção, uma vez que a amplitude
de maré é grande (cerca de 3 metros); ancorar em frente é seguro, pois o
Porto Seguro
fundo é de boa tensa.
Ancorar antes de começar a vazante ou enchente, pois a correnteza 16º 26’ S
é forte e poderá dar trabalho. 039º 02’ W
Com guia, é possível ir por dentro, pelos canais, até Nova Viçosa,
atravessando uma região enorme de manguesais, contornando a ilha da O clássico fundeio em frente à Igreja, protegido pelos recifes.
Cassumba. Cada dia fica mais difícil conseguir vaga para ancorar no abrigo.
Uma quantidade enorme de recifes para o mergulho.
Nova Viçosa Práticos (bóia de espera) Baía Cabrália, visita obrigatória; os recifes são a atração maior.
17º 53,60’ S 17º 56,0’ S
Ilhéus
039º 22,40’ W 039º 19,5’ W
14º 48’ S (práticos)
A entrada pela barra é possível, mas só na maré alta, mesmo com 039º 01’ W
uma traineira orientando.
É preciso esclarecer ao mestre que o veleiro tem muito mais calado O antigo porto, no rio, está desativado e só serve às traineiras locais.
do que a treineira, mesmo que ela seja bem maior que o veleiro, o que O porto do Malhado assumiu a função e agora é o Porto de Ilhéus.
normalmente acontece. É o maior pólo cacaueiro do Brasil.
Não tentar entrar com ventos do quadrante S, nem na vazante. Existem muitos monumentos históricos, muitas belas igrejas.
Os waypoints do canal são: A cidade ficou famosa graças ao romance de Jorge Amado Gabriela,

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Cravo e Canela, principalmente depois da novela e do filme; o Bar do Na- taurante com pier.
cib ainda existe. Salvador foi a primeira capital do Brasil e mantém costumes pecu-
Muitas atrações, muitos passeios. liares.
A entrada pela foz do rio é difícil e deve ser evitada por veleiros, As praias, os hotéis e os bares, os restaurantes.
mas não é impossível, para até dois metros de calado, mas, passada a bar- As festas de João das Botas e do Bonfim, em janeiro.
ra, o encalhe na lama é certo ao longo do sinuoso canal. A correnteza na entrada da baía é grande; na vazante, vai longe, mar
Entrar mais perto da pedra, à bombordo, e sempre na maré alta. a dentro.
No entanto, o melhor é procurar abrigo no Porto, bem para dentro, O vento predominante em toda a área é do quadrante Nordeste e
longe dos navios. permanece forte por muitos dias. Quem zarpar de Salvador para Maceió
Daí, vai-se à pé para a cidade. sem aguardar a entrada do ESE (lessulé, como eles dizem em toda a re-
Contamos agora com o apoio do Iate Clube de Ilhéus, inaugurado gião até Maceió), deve estar preparado para uma orça braba. Com o ESE,
há pouco tempo. esta perna do percurso é uma sopa.
Na aproximação, chamar o iate clube no canal 16 e passar para o O Aratu Iate Clube, um excelente apoio e uma comunidade de gran-
canal escolhido para a conversação, obtendo as informações, disponibili- des velejadores.
dade de apoios, etc. É fácil chegar até lá: avista-se a Base Naval logo à entrada do canal,
Ele fica situado depois do Porto, mais ao norte, na mesma enseada, que é balizado por uma grande ilha (é a terceira maior da baía), a ilha da
um pouco mais longe da cidade. Maré. Nela avistamos uma vila de pescadores, na sua parte sul.
Há um estaleiro para reparos: a Marina Estaleiro de Aratu.
Salvador Waypoint de entrada do canal para o Iate Clube de Aratu, entre a
13º 01,0’ S (entrada da Baía de Todos os Santos) Ponta da Areia e a Ponta do Marinho, deixando a ilha da Maré por bom-
038º 34,0’ W bordo: 12º 47,0’ S / 038º 30,0’ W .
A maior ilha da baía é a de Itaparica, rodeada de recifes, logo na
entrada, como querendo bloquear o acesso; é outro ponto de atração que
Corais e navios naufragados fazem a festa do mergulhador.
não pode deixar de ser visitado. Centro de veraneio, com casas sensacio-
O Iate Clube da Bahia, logo após a boca da barra, à boreste de quem
nais à beira do mar.
entra, é uma agradável surpresa. Excelente local, clube construído sobre
Salvador dispensa maiores comentários; o difícil é querer sair de lá.
as pedras, bela paisagem; restaurante internacional e apoios náuticos. Po-
demos ancorar o barco e desembarcar no clube de caíque (não há pier de
atracação). Se o tempo virar, com ventos do quadrante Sul, levantar ânco- Morro de São Paulo
ra e seguir mais para o interior da baía. 13º 22’ S
O Forte de São Marcelo e sua marina, no centro da cidade, o eleva- 038º 55’ W
dor Lacerda bem em frente; as duas cidades: alta e baixa.
Agora contamos, ao lado, com o Centro Náutico da Bahia que ofe- Situado na ilha de Tinharé, entre o mar e a montanha, um pequeno
rece todos os apoios necessários aos cruzeiristas; padrão internacional. povoado e um belo farol.
Fica bem ao lado do Mercado Modelo. Já tem luz elétrica, televisão e telefone.
A Marina dos Tainheiros também oferece apoio náutico e bom res- A infra-estrutura é precária para atender ao grande número de tu-

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

ristas; é comum faltar água. A Marina Jaraguá é também ancoradouro de pesqueiros.


O meio de transporte é o cavalo ou muar. Mas o melhor é o pé-dois. Desde o pontal do Peba, em Alagoas, até o final do cabo Calcanhar,
Não há apoio para o barco. Mecânico pode ser providenciado. no Rio Grande do Norte, as pedras não vão além da linha de profundidade
Ao longo das praias, que são denominadas por ordinais, Primeira, dos 12 metros.
Segunda, etc., correm fileiras de recifes, onde tem peixe demais, desde Isto constitui um bom indício na aproximação da terra, principal-
meros bem parrudos, garoupas e até o caramurú, uma espécie de moréia mente à noite ou em cerração.
marron, muito gostosa, mas difícil de preparar. Um local muito bom para ancorar o barco é o Porto Francês, entre a
Infelizmente é comum ver mergulhadores com narguilé ou garrafas praia e a linha de recifes; é um ponto turístico muito movimentado.
arpoando grandes peixes, meros, garoupas, etc., com a lancha ao lado; vai O waypoint para enxergar a entrada é:
acabar em breve o peixe na região.
09º 46,5’ S
Maceió 035º 50,0’ W
9º 42’ S (bóia de espera de práticos)
035º 48’ W Aí, estaremos vendo o término da linha de recifes que começam em
Maceió; contorná-lo e entrar no abrigo, entre a linha de pedras e a praia,
Chegar ao Nordeste após iniciado agosto; o mar está mais manei- calmo e protegido. Com as maiores marés, algumas ondas cobrem as pe-
ro, sem ressacas. Os barcos locais geralmente são postos à seco antes de dras, tornando um pouco agitado o abrigo, mas sem incomodar; é até um
agosto para manutenção anual (pintura do fundo, etc.), para ao mesmo belo espetáculo.
tempo ficar livre das ressacas. Ao chegar na área e ainda houver ressaca, Um pouco mais ao Sul, iremos encontrar a Barra de São Miguel, um
preferir ir direto a Recife, cujo abrigo é total. Deixar Maceió para uma de- bom abrigo, após entrar pelo canal, na barreta, entre os recifes. É a en-
morada estada na volta. trada de uma vasta lagoa e é bom ir com quem conheça os locais para
A Marina Jaraguá é o ponto de apoio; fica por trás do pier do Porto. ancorar o barco, uma vez que há bacias seguras que não atolam a quilha
A FAVO - Flotilha Alagoana de Veleiros de Oceano e a FAVM Fede- na lama durante a maré baixa.
ração Alagoana de Vela e Motor têm sede lá. Elas elaboram programação Na aproximação, manter meia milha da linha de recifes próximos e
com muitas regatas e idas anuais a Recife, Noronha, Rocas, Natal e Cabe- paralelos à praia até o waypoint para localizar a entrada:
delo. Há um pier da Marina logo no início do Porto da Salgema, próximo
à praia. 09º 52,0’ S
Para chegar à Marina Jaraguá, vindo de Sul, aproximando da bóia 035º 54,0’ W
cega de espera dos práticos, já com o Porto à vista; guinar para a praia,
avistando logo os mastros dos barcos apoitados, próximos à praia, prote- Daí, já estaremos vendo o farolete na praia; deveremos continuar
gidos pelo Porto. navegando vagarosamente até quase deixar este farolete pelo través de
Vindo de Norte, tomado o resguardo dos perigosos recifes de Pon- boreste, quando ficaremos no alinhamento farolete - ponta do recife (pi-
ta Verde, umas duas milhas de distância, seguir o mesmo procedimento: cão); estaremos vendo o canal, por onde deveremos entrar.
com o Porto à vista, proar para a bóia de espera e só então entrar em O canal passa a vinte metros do picão (que é a ponta do recife).
busca da marina.

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As linhas de recifes Baixo da Gamela e Baixo de Fora (ou Baixos de A entrada é entre os molhes construídos sobre os recifes. Após
São Miguel) ficam por bombordo e o mar arrebenta sobre elas. a entrada, guinar para BB e seguindo a linha de recifes ao longo dos ar-
Como os bancos de areia podem variar de lugar ao longo dos meses, mazéns do Porto, até o Iate Clube do Recife, do lado oposto do centro da
é preciso identificar o canal, navegando devagar. cidade.
Após entrar, continuar devagar pelo canal interno, fundo de lama. O temido banco Inglês desapareceu: um dos molhes foi construído
Só tentar entrar na maré alta e com bom tempo; evitar vazante, pois sobre ele, transformando-o de perigo em proteção. Podemos entrar tanto
a correnteza pode atrapalhar. pela parte norte como pela sul; ambas são entradas para navios. A entra-
da Sul fica próximo ao Pina e Boa Viagem; a Norte, fica mais para o lado de
Maragogí Olinda, vendo-se o farol de Olinda sobre o Morro do Serapião.
9º 01’ S O Iate Clube Cabanga, próximo à ponte que liga o centro da cidade
035º 13’ W ao bairro do Pina e à praia de Boa Viagem, é um excelente apoio e oferece
atenciosa acolhida.
O Iate Clube do Recife, fica localizado logo após o Porto, passando
A enseada é larga, profunda e protegida pelos recifes das vagas do
a entrada para o cais de Santa Rita (braço de rio onde existia uma ponte
largo.
giratória, hoje em ruínas).
O barco terá que passar no canal, que tem inicialmente oitocentos
Ancorar o barco na área do Iate Clube do Recife e aguardar, só pros-
metros de largura, mas vai estreitando até chegar ao local de ancoragem
seguindo para o Cabanga após ter visto na maré baixa o traçado do es-
entre as pedras, com cuidado, alguém na proa cantando o rumo; entrar
treito canal, entre a mureta da calçada e a coroa do Passarinho, que deve
sempre de dia, com bom tempo.
ser deixada à bombordo na ida para o Cabanga, mantendo o barco bem
Na maré baixa, a linha dos 3 ( três ) metros de profundidade fica a
próximo à margem da cidade.
300 metros da praia.
Com a maré alta, sempre.
Na área de fundeio, a transparência das águas é muito boa.
A croa galés é um grande banco de recifes onde são formadas pis-
cinas naturais; fica antes da entrada para o fundeadouro; é ótima para Natal
mergulho. Muito peixe, lagosta, polvo e caramurú. 5º 45’ S (bóia de espera de práticos)
Próximo a Maragogí e com a mesma entrada inicial, está a enseada 035º 12’ W
de São Bento: 09º 04’ S / 035º 14’ W
Outro bom abrigo é a enseada de Marceneiro: A entrada para o iate clube é pelo rio Potengí; o Iate Clube de Na-
tal fica na margem direita, antes do Porto, portanto à bombordo de quem
09º 18’ S entra.
035º 25’ W Na entrada do rio Potengi, passar entre a bóia e o enrocamento,
livrando as pedras à direita.
É o abrigo mais próximo de Noronha e Rocas e também dos Roche-
Recife
dos de São Pedro e São Paulo. Mas o regime de ventos não favorece, sendo
8º 05’ S (bóia de espera de práticos)
melhor ir direto de Recife a Noronha e, depois, Natal, sempre com ventos fa-
034º 48’ W
voráveis. De Natal para Recife, enfrentaremos quase sempre vento de proa.

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Para quem se destina ao exterior (Caribe, Miami, Europa, etc.), uma Cruzeiros Oceânicos
série de providências terá que ser desencadeada obrigatoriamente, para
preparar a documentação que será apresentada em cada porto de entra-
da nos países que serão visitados (para obter o Clearance), além de pas-
saporte, vistos, etc.
as estão sendo simplificadas, mas é na Capitania dos Portos que de-
vemos iniciar, levando os documentos do barco e de toda a tripulação;
solicitar o passe de saída ( Outgoing-Pass). Em seguida, ir à Secretaria
da Receita Federal (Aduana), com xerox dos documentos do barco e da
tripulação.
Levar todos os tripulantes para a Saúde dos Portos (vacinas).
Ir à Polícia Federal, para obter o passe de saída da tripulação.
Voltar à Capitania com toda a papelada e mais a lista de tripulantes,
preencher formulário com data e hora de saída e data e hora de chegada
no porto estrangeiro de destino (mesmo para veleiros, isto é exigido, e
não é previsão. Solução: chutar, após estimar).
Além de toda esta maratona, deve-se providenciar bandeiras dos Em Noronha
países a visitar, bandeira Q (amarela), e várias bandeiras brasileiras (de
reserva), documentos das armas de bordo, etc. Um cruzeiro ao nordeste, incluindo Noronha e Rocas, será mais fa-
Um guia completo da Atlantic Intracoastal Waterway, cartas da cos- cilmente realizado se escolhermos a época favorável e uma rota o mais
ta, etc. direta possível, na ida.
Um guia completo do Caribe, Bahamas, etc.(exemplo: Streets Crui- Deixar para a volta a visita a cada abrigo.
sing Guide To The Eastern Caribean, ou o da área escolhida). Será bem mais fácil, podendo-se escolher o percurso de ida mais
Do Caribe, passar pelo canal de New Providence, Nassau, chegando afastado da costa, que é o mais indicado, principalmente para o solitário,
a Miami, depois de cruzar a Gulf Stream (e entrar em Ft. Lauderdale obri- além de permitir aproveitar melhores condições de vento e de corrente.
gado pela corrente...). O desgaste durante a aproximação do abrigo é sempre grande e a impaci-
De Fort Lauderdale, em águas abrigadas até Miami é um pulo. ência não deve precipitar uma entrada à noite numa área desconhecida.
Para a travessia para a Europa, a melhor pedida é ir para Hamilton Regular a velocidade para permitir uma aproximação de dia e relaxar.
(Bermuda), aguardando a ocasião mais favorável: via VHF será informa- A época favorável para subir a costa brasileira de Bertioga até No-
do, inclusive da melhor rota para os Açores, se mais a N ou mais a S. Em ronha, é a que apresenta menor incidência de ventos Nordeste: vai de
geral, este é um procedimento válido para todo início de travessia: aguar- julho a meados de setembro, período em que o nordestão diminui e as
dar o aviso da estação do iate clube sobre a ocasião favorável. Frentes-Frias entram com maior freqüência permitindo vencer o trajeto
com maior facilidade, embora com mar um pouco mais mexido.
O estudo minucioso das Cartas Piloto do Brasil, arbitrando-se va-
lores convenientes para as porcentagens, sentidos e forças dos ventos e

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para as calmarias, resultarão numa média para cada mês, o que refletirá O percurso normal de chegada à Noronha, vindo de Recife, é con-
na determinação desta melhor época para o percurso de ida. E o com- tornando a Ponta da Sapata.
putador auxiliará bastante neste estudo, com um programinha simples e O ancoradouro é o de Santo Antônio, ao lado do enrocamento do
pequeno; é a única maneira de destrinchar a grande quantidade de infor- pequeno porto.
mações contidas nas cartas e poder chegar à alguma conclusão segura. Quando o tempo muda, a baía de Sueste é o abrigo indicado pelos
Com um bom barco, bem preparado, podemos realizar o percurso locais, mas é preciso tomar cuidado com uma pedra na entrada. Por isso,
comodamente, sem grandes dificuldades. ficar simplesmente à sotavento da ilha seja melhor em diversos casos; se
Além disso, devemos observar outros detalhes. o tempo piorar muito, zarpar, o que fica difícil se estivermos na baía de
Até Vitória, pegaremos, mesmo na época favorável, alguns períodos Sueste.
de ventos de proa, uma vez que há frentes frias de pequena duração, após A melhor época para visitar Noronha indo de barco, é entre setem-
as quais entra o nordeste. bro e fevereiro, quando os ventos são constantes e o mar é mais calmo,
A partir de Vitória, passaremos a velejar com maior freqüência de com condições gerais muito boas.
lestadas, com maior rendimento. Em julho, o peixe é em maior quantidade, as águas são mais trans-
De Abrolhos a Maceió, direto, serão cerca de seiscentas milhas ve- parentes, chegando a visibilidade aos 40 metros, mas o mar é um pouco
lejando ao largo. mais mexido.
Raramente no percurso para Noronha, a partir de Maceió ou Recife,
enfrenta-se vento de proa. De Maceió direto a Noronha, passa-se tão per- Atol das Rocas
to de Recife que é melhor arribar e aproveitar um pouco de suas delícias, 3º 52 S
devendo-se reabastecer o barco, principalmente de frutas e verduras, 033º 48 W
mesmo que seja de pouca quantidade; seguir para Noronha sempre com
o barco completo, água e gêneros alimentícios.
Avista-se o atol a umas dez milhas de distância, normalmente; à
A luta contra ventos de proa estraga as velas, cansa a tripulação e
noite, o farol é denunciado desde cerca de vinte milhas.
não é qualquer barco que agüenta o rojão por vários dias, o que acontece
Devemos zarpar de Noronha de modo a estimar a chegada ao atol
com a tripulação até mais rapidamente.
pela manhã bem cedo, no crepúsculo matutino: além da identificação à
O barco deverá estar preparado, com todos os macacos travados
noite ser melhor, aproveita-se melhor o tempo lá. Esta previsão é função
(não esquecer nunca este detalhe), tudo bem preso, etc.
do vento e da velocidade do barco.
No verão, o nordestão costuma entrar firme, permitindo realizar
É uma norma, depois de Noronha, passar em Rocas, mesmo que
uma volta para o Rio de Janeiro tranqüila e surpreendentemente mais rá-
seja só para avistá-lo, passar por perto, admirar toda a sua beleza, foto-
pida, com vento e corrente à favor.
grafar e proar Natal.
Agora há um delegado do Ibama em tempo integral; atualmente é
Fernando de Noronha uma bióloga, abnegada brasileira.
3º 51 S (Picos) Ao aproximar do atol, chamar pelo VHF, para saber se tudo vai bem,
032º 25 W etc.etc.(talvez com a identificação do barco via radio, seja autorizado o de-
sembarque, o que é realmente um ótimo programa). Belas fotos poderão
ser feitas; mergulhos inesquecíveis.

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Licio Maciel

Em 1982, um veleiro francês soçobrou na área, mas a tripulação foi


salva.
Existe no Atol um antigo farolete, em ruínas; muitas histórias, mui-
tas lendas são contadas sobre o atol, em Noronha.

Palavras Finais

“Todo homem tem duas frustrações na vida: a primeira, é não ter realiza-
do seu grande sonho; a segunda, é tê-lo realizado...”

Às vezes quando estou velejando à noite, com mar de proa e ven-


to assobiando nos estais, todo molhado, embora encapotado, com frio,
cansado e com sono, fico imaginando os jangadeiros em suas rústicas e
frágeis jangadas, em alto mar, sem um mínimo de conforto, pés sempre
molhados. E os “raids” que realizaram do nordeste ao Rio de Janeiro, a
Santos e a Buenos Aires, com o objetivo de chamar a atenção das autori-
Atol das Rocas – tripulação do Mestre Rosalino plantando coqueiros, para melhorar a identificação dades para o abandono da árdua e perigosa profissão, sem o devido reco-
à distância
nhecimento, até mesmo sem direito à aposentadoria para os poucos que
conseguiam atingir a idade para tal.
Em 1922, dois jangadeiros zarparam de Fortaleza, CE, e vieram até
o Rio de Janeiro. Este raid sacudiu o espírito do brasileiro, numa época em
que era muito difícil a ligação norte-sul do país, só conseguida de navio,
assim mesmo raros. Nasci oito anos depois e aos doze anos de idade ainda
ouvia as histórias contadas com orgulho nas vilas de pescadores.
Em 1928, mais uma jangada cearense repete o mesmo percurso.
Depois, em 1941, quatro jangadeiros do Ceará repetiram a proeza,
velejando de Fortaleza ao Rio de Janeiro, liderados por Mestre Jerônimo,
em 61 dias de velejada. No Rio de Janeiro, morreu o jangadeiro Jacaré,
numa filmagem para Orson Welles. Foi surpreendido pelas águas geladas
próximo à pedra da Gruta da Imprensa, da Avenida Niemeyer. Seu corpo
Abrigo do Gunga – AL: nunca foi achado.

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Durante a noite eles dormiam (dormiam?) sentados e amarrados à despeito de toda esta longa e incompreensível crise.
jangada. O número de barcos, de marinas, de clubes náuticos, etc., cresce
Como eram feitas as refeições, precariamente em fogareiros impro- surpreendentemente. Em 1978, a Marina del Rey, em San Diego, Califor-
visados, tudo molhado, podemos imaginar. nia, EUA, tinha dez mil barcos nela registrados; hoje, quase 30 anos de-
Uma demonstração espontânea de coragem tenaz, resitência pes- pois, está com cerca de quarenta mil.
soal e desprendimento. A última Regata Recife-Noronha contou com mais de oitenta velei-
Novamente, em 1951, Mestre Jerônimo realiza outro raid até o Rio ros inscritos.
de Janeiro e a Porto Alegre. Neo ano de 2000, foi realizada a Primeira Regata Vitória-Trindade,
Em 1958, repete a façanha, no maior percurso até hoje já realizado num percurso de 1400 milhas, de ida e volta à ilha, e que foi muito con-
por uma jangada, de Fortaleza, CE, até Buenos Aires, Argentina, em 6 me- corrida.
ses e 19 dias de mar. A Regata do Descobrimento, Brasil 500 Anos, Lisboa-Porto Seguro,
Em 1967, mais uma jangada zarpa de Fortaleza, CE, indo até Santos, SP. contou com grande número de veleiros, mais de quarenta, que vieram em
Em 1968, parte uma jangada de Maceió, AL, para o Rio de Janeiro. A flotilha e teve até um participante brasileiro em solitário.
jangada está exposta no Museu Histórico do Rio de Janeiro. Os antigos foram grandes velejadores, muito ativos exploradores:
Em 1972 e 1993, jangadeiros cearenses repetiram o percurso de gregos, romanos, babilônios, sumérios, egípcios, chineses, polinésios, etc.
Fortaleza ao Rio de Janeiro. O mais antigo velejador de que se tem notícia, foi o egípcio Hennu,
Naquela época, os jangadeiros eram aos milhares, em numerosas cujo relato de viagens realizadas há quatro mil anos, está esculpido em
vilas espalhadas por todo o litoral nordestino. Vida simples, gente humil- pedra que ainda hoje existe; ele percorreu todo o até hoje temido Mar
de e honesta, que vivia do mar, com muito orgulho da profissão. Mas ela já Vermelho, num barco de uma única vela.
começava a não produzir o suficiente para o sustento da família, o peixe Cerca de dois milênios depois, em Massalia (hoje Marselha), um ou-
escasseando e os barcos a motor concorrendo para dificultar ainda mais. tro destemido velejador solitário, Pytheas, velejava tranqüilamente, en-
Hoje, restam alguns poucos jangadeiros, sendo cada vez mais deslo- quanto Alexandre o Grande, rei da Macedônia, batalhava para a expansão
cados das praias onde nasceram e cresceram, pela expansão imobiliária. de seu já vasto império. Pytheas estudava o céu, as estrelas, particular-
Agora são mais guias de turismo, levando o turista para os bancos de co- mente a Polar, os planetas e o fenômeno das marés, trezentos anos antes
rais já badalados... de Cristo.
E me pergunto: será que o homem atual está se amofinando, enfra- Homem de ciência, matemático e astrônomo, explorou em seu
quecendo, perdendo o gosto pela vida simples, pelas coisas naturais, pela veleiro, o Mediterrâneo, passou o estreito de Gibraltar passando para o
aventura, perdendo o arrojo? Atlântico, velejou as costas do que hoje são Portugal, França e Espanha
Aí, vejo as notícias dos desafios das regatas de volta ao mundo, com navegando pelo Sol e pelas estrelas. Atravessou o Mar do Norte para a
barcos cada vez maiores, com cada vez maiores tripulações e grandes lis- Inglaterra, prosseguindo para a Irlanda, continuando para norte até ser
tas de espera de candidatos para a aventura. barrado pelo gelo. Foi, portanto, o primeiro explorador do Ártico e o pri-
Nunca se velejou tanto como hoje em dia, nunca se cruzou tanto os meiro a afirmar que nas altas latitudes o Sol nunca se põe. Foi também o
cabos mais perigosos do mundo, mesmo em períodos e rotas “impossí- primeiro a afirmar que a Lua é a principal causa das marés.
veis”. Os Vikings nos anos 1000 estiveram na América do Norte; depois
A quantidade de barcos brasileiros pelo mundo cresce a cada ano, a de meio milênio, veio a Época dos Grandes Descobrimentos, tornada pos-

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sível pelo Infante D. Henrique, de Portugal, culminando com a primeira astronomia de posição, navegação, meteorologia, aplicação do computa-
volta ao mundo, realizada pela expedição de Magalhães. dor no barco, etc.
O iatismo, como prática esportiva em veleiro, surgiu na Inglaterra, A Escola Naval é um tradicional incentivador da vela, organizando e
na primeira metade do século XVII; a primeira associação de veleiros es- realizando as mais concorridas regatas de todas as classes.
portivos foi fundada em 1720. Não existe ainda no Brasil um curso de ciências náuticas, com ênfa-
O esporte foi levado para os EUA em 1840 e lá se desenvolveu de se em vela, meteorologia e navegação; ele formaria os instrutores, profes-
maneira fantástica, principalmente depois da difusão do emprego da fi- sores e operadores para as mais diversas atividades no esporte, inclusive
bra de vidro na indústria de fabricação de barcos, logo após o término da no setor de charter e delivery nacionais e internacionais, organização de
II Grande Guerra. cruzeiros e de regatas, etc.
A circunavegação em solitário realizada por Joshua Slocum, em O esporte da vela é uma verdadeira filosofia de vida, que não se
1895, tem inspirado muitos velejadores a tentar realizar a mesma rota. adquire da noite para o dia.
Mas a febre de percursos de volta ao mundo em veleiros sugiu com a A vela fervilha na cabeça dos verdadeiros esportistas, acentuando-
realizada em 226 dias, em solitário e sem escala, pelo velejador inglês lhes o lado aventureiro.
Francis Chischester, então com 65 anos de idade, tendo batido o recorde Quem vê uma ilha distante no horizonte e não sente vontade de ir
de velocidade dos antigos clippers. O sucesso de Chischester levou o jor- até lá?
nal londrino “The Sunday Times” a oferecer um prêmio ao vencedor da
primeira regata de volta ao mundo em solitário, sem escala; oito barcos
deram a largada, mas apenas um a completou. Boas Velejadas!
A mais difícil regata de volta ao mundo é a BT Challenge, que faz
escala no Rio de Janeiro. Ela foi criada por Chay Blith, grande velejador
inglês, “para dar oportunidade às pessoas em geral, não necessariamente
velejadoras, de participarem de um desafio para lembrarem para o resto
da vida”, como ele mesmo declarou.
O iatismo foi trazido para o Brasil pelo Iate Clube Brasileiro de Ni-
terói há pouco mais de cem anos e propagou-se pelo país afora, tanto no
litoral como no interior. Hoje, a vela é o esporte que tem trazido o maior
número de medalhas olímpicas, projetando o nome do nosso país no ex-
terior.
O Brasil possui uma forte vocação náutica e tem tudo para o desen-
volvimento das atividades desse gênero de esporte, além de possuir uma
enorme quantidade de excelentes velejadores espalhada pelos inúmeros
iate-clubes.
As Universidades brasileiras estão adotando a atividade da vela e
incluindo em seus currículos matérias de interesse do setor náutico, des-
Da esquerda para a direita: skippers do Scheats, Suiá e Krum II, no abrigo do Forno:
de o projeto e construção de veleiros, materiais, teoria e técnica de vela,

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Licio Maciel

Referência Bibliográfica

1) Astronomie et Ordinateur - Serane (SAF)


2) Astronomical Algorithmics - Jean Meeus
3) The Calculator Afloat - Shufeldt
4) Navigator Pocket Calculator Handbook - Noer
5) Dutton’s - Navigation and Piloting - Naval Institute Press
6) The Sextant Handbook – Bruce Bauer (2ª ed)
7) Navegação Astronômica - DPC (E N)
8) Atlantic Crossing Guide - RCC Pilotage Fundation
9) Astronomy With Your Computer - Duffety,Smit’s (2ª ed)
10) Ocean Yacht Navigator - Wilkes
11) Offshore - Time-Life Library
12) Sail Power - W. Ross
13) Sailing Theory and Pratice - C.A.Marchaj
14) American Practical Navigator (Bowditch) - H.O. 9
15) Astronomia de Posição - R.Medice
16) Manual de Manobra - Eric Tabarly
17) Dicionário Enciclopédico de Astronomia e Astronáutica – Ronaldo
Mourão
18) Anuário do Observatório Nacional – vários
19) Almanaque Náutico (DHN) – vários
20) Conceitos de Astronomia – R. Boczko

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Abita: amarrador parrudo na proa ou na popa, para os cabos e amarras.

Aboçar: ligar um cabo a outro ou à amarra; prender por meio de boças.

Achicar : esgotar a água do barco com uma vasilha, balde, cuia.

Acostar: aproximar o barco da costa; o contrário de amarar.

Adernar: inclinar o barco.

Adaina: conjunto das velas do barco; velame; guarda-roupa.

Adormecer: permanecer o barco adernado, como se não conseguisse en-


O Autor e seu filho André (ICI-1958)
direitar

Adriça ou driça: cabo para içar vela ou bandeira. Elas são de grande im-
Vocabulário
portância, pois regulam o formato das velas; por exemplo, a testa da vela
é regulada (posição do cavado) por ação na adriça da testa. Portanto, de-
vem ser pré-estiradas, para que possamos marcar os pontos de regula-
Abafar: o pano; baixar e enrolar a vela.
gem, isto é, elas não devem deformar.
Abalroar: colidir com outro barco; existe regulamento para evitar abal-
Adriçar: suspender por meio de adriça
roamento e suas regras devem ser bem memorizadas (RIPEAM, que está
Aduchar: colher um cabo em voltas circulares sobrepostas.
sendo atualizado). São as regras de trânsito no mar, de precedência, de
direito ao caminho. São fundamentais para a condução de um barco, de
Aerodinâmica: ramo da Física que estuda o ar (e outros fluidos) em mo-
qualquer porte e classe. Para verificar se o barco está em rumo de colisão
vimento. O ar em movimento (o vento) é o propulsor do veleiro; o conhe-
com outro: marque dois pontos do barco alinhados com o outro barco; se
cimento das forças geradas e que agem no barco, portanto, é de funda-
o alinhamento persistir, estaremos em rumo de colisão. À noite, principal-
mental importância para o bom velejador. A velejada se compõe de duas
mente, isto é de grande valia.
partes: a aerodinâmica e a de estol.
Abatimento: decaída devido ao efeito do vento ou da corrente. Olhando-se
Afocinhado: barco mergulhado de proa devido à má distribuição da carga
a esteira do barco, podemos ver o abatimento, comparando com o rumo
ou defeito de construção.
(proa).

Agitado: mar com ondas de 2,5 a 4 metros, correspondendo a ventos de


Abicar: chegar de proa numa praia, quase encalhando.
força 6 e 7.

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Águas Amassadas: águas turvadas pelo barco roçando no fundo arenoso Alísios: ventos reinantes na zona tropical. No HS: sopram de sudeste para
ou lodoso. noroeste. No HN, de NE para SW.

Águas Mortas: sem correnteza, em determinadas marés. Alma: núcleo de um cabo.

Águas Vivas: forte correnteza nas enchentes ou vazantes, nas marés de Almeida: parte curva do costado do barco, na popa; parte superior das
lua nova ou cheia. bochechas.

Aguçar: chegar com a proa mais para a linha do vento; apertar a orça. Altura: barco de altura; barco de alto-mar. Reta de altura: lugar geométri-
co dos pontos da superfície da Terra com a mesma altura para um deter-
Agulha Magnética: bússola, agulha; bússola de governo, de fundamental minado astro (é uma circunferência, da qual consideramos uma reta nas
importância no barco, deve ser aferida (compensada), operação que pode dimensões da carta).
ser facilmente feita pelo comandante do barco, utilizando pontos bem de-
finidos em terra, pela proa, pela popa e pelos bordos, também podendo Amainar: diminuir de intensidade, abrandar
ser feita por processo astronômico ou por intermédio do ??. O norte mag-
nético difere do norte da agulha pelo erro da agulha do barco. Amantilho: cabo para manter na horizontal um pau ou a retranca; o con-
A regulagem é feita compensando para os pontos cardeais, pelos peque- tra-amantilho age em oposição, caçando para baixo.
nos magnetos da bússola.
Amarra: cabo amarrado à âncora.
Aileron: asa do leme de vento, que comanda a direção do barco.
Amarração: conjunto de cabos e amarras usados para fundear ou atracar.
Airex: poliuretano de núcleo fechado, especial para a construção de cas-
cos de fibra de vidro em sanduíche. Amarrar: unir por meio de cabos.

Alagar: desaparecer no horizonte. Amplitude de Maré: diferença de alturas da preamar e da baixamar.

Alar: um cabo, caçar, retesar, sirgar. Amura: direção qualquer entre a proa e o través. Cabo preso ao punho da
vela. Amuras à bombordo: quando o vento está entrando por bombordo
Alheta: ou aleta, parte curva do costado do barco, próximo à popa. Exem- (portanto, a retranca estará para boreste).
plo: navio visto pela alheta de boreste.
Anatifa: tipo de craca que se incrusta no casco, mesmo em deslocamento
Alidade: bússola portátil com prisma para obter marcações de pontos pelo mar.
(marcas) da costa, para cálculo de distância, podendo ser empregada de
qualquer lugar do barco. Âncora: ou ferro, para agüentar o barco parado nos ancoradouros. Todo
barco de oceano deve ter a bordo no mínimo três âncoras de tipos e pesos

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diferentes, com pelo menos 5m de corrente cada, amarras, arinque e sen- Arribar: afastar a proa da linha do vento.
tinelas apropriadas. Ser jogado à praia pelo vento não é experiência muito
agradável. Ver Sentinela. Ver Arinque. Árvore Seca: abaixar todas as velas e deixar o barco se defender, no mau
tempo.
Andar: navegar, velejar.
Asa: içar duas velas de estai, uma para cada bordo, ficando a de barlaven-
Anemômetro: instrumento para medir a velocidade do vento. to espichada, ou espichar as duas, no caso de popa rasa; formato de asa
significa forma aerodinâmica.
Anemoscópio: instrumento para medir a direção do vento.
Asa de Pombo: içar a buja para um bordo e a grande para o outro.
Ângulo Morto: ângulo entre o vento verdadeiro e a menor direção de proa
a que o barco pode chegar contra ele. Aterrar: entrar num abrigo, num porto, vindo do mar; aproximar de terra.

Anilha: proteção de metal ou plástico nas extremidades das amarras, em Atracar: encostar o barco no cais, usando defensas; à contrabordo: em
forma de anel. outro barco.

Ardente: barco que tem forte tendência própria de orçar sem ação no Autonomia: tempo que o barco pode permanecer no mar sem se reabas-
leme. tecer; o mesmo que raio de ação.

Arfagem: mergulho e levantamento da proa, balanço longitudinal. Bacalhau: sarrafo colocado por dentro do casco para limitar o remendo
ou calafeto, não deixando extravasar.
Arganéu: argola móvel de metal para amarração.
Balanço: movimento pendular do barco, longitudinal ou transversalmen-
Arinque: cabo que liga uma bóia à âncora, para indicar sua posição. A bóia te, causado pelas ondas do mar. Longitudinalmente, geralmente se deno-
será de arinque. mina caturrando ou arfando; transversalmente, jogando.

Armação: maneira como são distribuídas as velas do barco. A armação em Balão: vela de proa parecida com um paraquedas. Geralmente feito de
cúter permite ter duas bujas içadas simultaneamente (o mastro é coloca- náilon, colorido, é a maior e mais bonita vela da adaina. Ver Spinnaker.
do mais para trás do que no eslupe).
Banana: vela armada entre a buja e a bujarrona (embananada).
Arqueação: ato de medir o volume dos espaços do barco; tonelagem.
Banco: região de pouca água, encoberta.
Arquimedes: o peso do barco é igual ao peso do volume de água desloca-
do (corolário). Bandeiras de Sinalização: de acordo com código internacional, são pre-
vistas 40 ao todo, sendo usadas cinco cores: branco, azul, vermelho, ama-

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relo e preto. Os formatos são: galhardete farpado, retangular, trapezoidal Beaufort: escala da velocidade do vento, classificando-o em diferentes
e triângulos equiláteros. A bandeira amarela, por exemplo, é de interesse forças, desde a Força 0, calmaria, até a Força 12, furacão (hurricane). Um
particular, correspondente à letra Q, é a de quarentena, de solicitação da vento de 17 nós é Força 5 (strong breese); um vento de 28 nós, Força 7
Aduana e Emigração (antes da qual não se tem autorização de desembar- (near gale); uma velocidade de vento de 41 nós, corresponde a Força 9 e
car; após duas horas de espera, apenas o comandante poderá desembar- é denominado vento duro (strong gale); Com 48 nós de vento, teremos
car, levando os documentos do barco e de todos os tripulantes) quando o Força 10, denominado tempestade (storm). Ver tempestade.
barco estiver fundeado; se estiver em movimento, indicará alteração de
percurso. Bernouili (princípio): ou Bernoulli; resumo: onde estiver a maior veloci-
dade do vento, estará a menor pressão. Ele explica o efeito chaminé, os
Ao entrar num porto estrangeiro, o barco deve estar com três bandeiras formatos das velas, os ajustes e interações entre as velas, etc.
hasteadas: na popa, a bandeira do país de origem do barco, no lais de bo-
reste, a bandeira do país visitado e a bandeira amarela. Betas: nome genérico dado a todos os cabos de manobra do barco, inclu-
sive os teques.
Barcaça: embarcação muito usada antigamente no nordeste brasileiro.
No livro A Saga do Barcaceiro, o escritor alagoano Maya Pedrosa, narra o Bicha: cabinho embainhado nas valumas e esteiras da vela para regular
último período de operação das barcaças no nosso litoral, fato semelhan- um maior cavado.
te aos últimos dias dos grandes veleiros no começo do século, com seus
capitães sendo “massacrados” pelos vapores, dentre eles Joshua Slocum. Bigode: marola feita na proa do barco, proporcional à sua velocidade.

Barlavento: lado de onde vem o vento. Na orça, o mais importante é ga- Bigota: peça circular com furos por onde passam cabos, para tensão.
nhar barlavento. A vantagem de um barco sobre outro, geralmente em
regata, é ditada por três parâmetros: barlavento, distância e correnteza. Biruta: indicador de direção do vento; pedaço de fita cassete amarrado
A determinação da vantagem, facilitada por processo gráfico, é muito em- nos brandais (ou fios de lã); grimpa; lanyard, teltale.
pregada pelas Comissões de Regata para acompanhar os momentos finais
das regatas de longo percurso. Bitácula: caixa da bússola de governo, sobre o pedestal da roda de leme.

Barômetro: instrumento para medir a pressão atmosférica, que é um dos Blister: ver Gennaker.
parâmetros para a previsão do tempo. No barco, normalmente é empre-
gado o do tipo aneróide. Apenas pelas indicações do barômetro não será Blooper: vela usada em regatas, para preencher o espaço deixado pelo
possível fazer uma previsão do tempo. Ver na parte de meteorologia in- balão, em face da regra só permitir empregar um balão içado. Para o cru-
cluída nos Tópicos Importantes. zeirista, não sujeito a esta regra, que pode içar dois balões, o blooper não
existe.
Batateiro: local, geralmente na popa, onde são guardados os materiais
sem serventia imediata. Boca: largura máxima do casco do barco, ou da seção transversal a que se
referir.

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Boça: é todo cabo que se destina a prender outro cabo, uma verga, ou Brandais: cabos de aço inox que agüentam o mastro lateralmente, trans-
amarra. versalmente.

Bochecha: parte curva do costado em ambos os bordos próximo à proa. Brisa: vento brando, Força 2. Brisa marítima, do mar para terra, à noite.
Exemplo: vento entrando pela bochecha de bombordo... Brisa terrestre, de terra para o mar, durante o dia.

Bóia: flutuador para balizamento, para amarração e para salvamento. Broadseam: costura para obter o cavado da vela, correndo-se o tecido dos
painéis.
Boiar: aparecer na linha do horizonte.
Buja: vela de estai de proa; também denominada giba, a mais à frente.
Bolina: quilha, patilhão, para fornecer maior resistência lateral e posicio-
nar o centro geral de resistência (centro de resistência lateral), que vai Burro: cabo ou aparelho para manter a retranca, ou pau, na horizontal,
trabalhar junto com o centro vélico (centro geométrico da área vélica). O não deixando levantar.
equilíbrio do barco depende destes dois centros.
Bússola: ver Agulha Magnética
Bomba de Porão: bomba manual ou elétrica para esgotar o porão das
águas de goteiras, borrifos durante a navegada, vazamento da gaxeta do Buys-Balot (lei): (No HS): De frente para o vento, o centro de BP está aos
eixo, etc. 112 graus para a esquerda.

Bombordo: BB : lado esquerdo do barco quando olhamos de frente para a Buzina: passador de cabo no convés dos barcos.
proa, de costas para a popa.
Cabos: ou cordas; mas no barco não se chamam cabos de cordas. Os cabos
Bonança: tempo bom, calmo, após uma tempestade. têm chicotes (extremidades) e o seio (meio do cabo, ou corpo).

Bordos: bordejos; quando estamos velejando ao longo do litoral, vamos Caçar: puxar, tesar.
dando bordos de mar ou bordos de praia ou costa.
Cadernal: peça com moitões de várias roldanas, sendo um deles fixo; mul-
Bordejar: velejar em zigue-zague, aproveitando o vento. Na orça, só pode- tiplicam a força aplicada.
mos velejar bordejando. Na empopada, podemos bordejar para tornar a
velejada mais cômoda, para livrar a popa rasa. Caimento: desvio lateral do rumo desejado.

Boreste: BE; lado oposto ao bombordo. Caíque: barco de apoio, pequeno; bote.

Borrasca: vento muito forte (Força 8). Calado: distância vertical da parte inferior da quilha à linha-dágua.

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Cambar: manobra mudando de bordo, de amura. Chumbo: lastro do barco.

Campo Magnético: da Terra; nosso planeta está envolto por um campo Cinto de Segurança: peça de grande importância em todo barco de ocea-
magnético, denominado campo geomagnético, que é gerado pelas corren- no, para andar no convés.
tes elétricas no núcleo exterior semi-derretido e também influenciado pe-
las manchas solares e tempestades magnéticas. (Ver Agulha Magnética). Coca: dobra falsa, torção indesejável de um cabo, atrapalhando o manu-
seio, principalmente se o cabo é para passar num moitão ou mordedor.
Capear: maneira de velejar contra o vento, enfrentando mau tempo, com Retirar a coca se denomina desbolinar o cabo.
velas próprias, pequenas. Também podemos capear para aguardar o dia
clarear para investir uma barra desconhecida. Cochar-se ao Vento: cingir-se ao vento, apertar a orça, forçar a orça.

Carangueja: pau de vela com forquilha, que se encaixa no mastro, sendo Cockpit: ou banheira, onde fica o timão externo.
suspendida até quase o tope.
Convés: parte externa superior do barco.
Carneiros ou carneirada: conjunto de ondas de crista espumosa, comuns
em ventos a partir de 10 nós. Os carneirinhos começam geralmente aos 6 Cordas: cordas e flechas das velas, servem de guia para obtenção do ajus-
nós de vento. te do formato ótimo.

Catraca: molinete com manicaca; sistema para caçar (retesar) as escotas Coriolis (força): força desviadora aparente, devido ao movimento de ro-
ou adriças tação da Terra, resultante das forças centrífuga e de gravidade. Varia em
função da latitude. Rege a circulação dos ventos girantes nos dois hemis-
Cavado: parte em forma de colher, que fornece o formato aerodinâmico férios.
da vela.
Correr com o Tempo: tática para enfrentar mau tempo, indo com o vento;
Cavilha: tipo de prego de madeira ou de metal, para fixação ou para obs- recolher as velas e deixar o barco se defender à deriva (em árvore seca).
truir orifício. Só é empregado quando há lazeira à sotavento. Se não há lazeira, deve-se
Cavirão: pino da manilha. capear.

Chaminé: efeito; canal de vento formado entre duas velas onde o ar esca- Craca: ou caraca; crustáceo que prolifera no casco do barco; é um dos
pa com maior velocidade, formando uma maior força de sucção, na vela, maiores problemas, obrigando a pintar periodicamente com tinta anti-
aumentando a força propulsora na região aerodinâmica da velejada (orça incrustante.
e través). É uma das vantagens do cúter sobre o eslupe o fato dele (cúter) Croque: vara com gancho para pegar a bóia ou auxiliar nas atracações.
ter dois canais de vento.
Cruzeiro: percurso esportivo de barco, fora de regata.
Chicote: extremidades de um cabo; entre os chicotes, o cabo se denomina seio.

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Cruzeta: peças do mastro, para distribuir os esforços. Drogue: âncora de mar; saco de lona grossa que, rebocado pela popa, di-
minui a velocidade do barco.
Cunho: amarrador.
Efeito Chaminé: ver Chaminé.
Cunningham: ilhós existente na vela para tesar a testa. Em barcos de cru-
zeiro, o trilho do garlindéu faz o mesmo, com vantagem. Em regatas tam- Encalhar: colocar o barco com a quilha encostada no fundo.
bém já estão permitindo.
Enora: abertura no convés ou teto da cabine, por onde passa o mastro.
Dacron: fibra sintética para fabricação de velas; chamada de tetoron no
Japão, de terilene na Inglaterra e de terital na Itália. Enrascar: a âncora, quando ela se enrola com a amarra, impedindo de
unhar no fundo
Declinação: ângulo de um astro; corresponde à latitude.
Entocar: a âncora, quando ela prende nas pedras do fundo; o arinque per-
Declinação Magnética: angulo entre o norte geográfico (ou da carta) e o mite levantá-la, puxando-a no sentido contrário às unhas
norte magnético. No Brasil ela é W (subtrair ao passar da agulha à carta).
Ver bússola; ver campo geomagnético. Entralhar: introduzir a tralha da vela no sulco do mastro ou da retranca.

Defensa: proteção para o costado nas atracações. Equação do Tempo: diferença entre a hora verdadeira e a hora média;
pode ser positiva ou negativa.
Derivar: derrapar, deslizar para o lado.
Escada do mastro
Deslocamento: peso da água deslocada pelo barco.
Escaler: pequeno barco à remo.
Destalingar: desfazer as ligações que unem os quartéis da amarra.
Escota: cabo de laborar vela, ajustando a sua posição em relação à linha
Disciplina: manter tudo em seus respectivos lugares; operações efetuadas proa-popa.
sempre da mesma maneira; conduta pessoal irrepreensível (camarada-
gem, cooperação, etc.). Espia: amarração ao cais ou à bóia; lançante, espringue, través.

Display: tela do monitor do equipamento eletrônico; mostrador. Espicha: pau que mantém a vela para fora dos bordos, geralmente à bar-
lavento.
Douglas: escala do estado do mar, como a Beaufort é para o vento; a Força
5 da escala Douglas corresponde ao mar agitado, forças 6 a 7 na Beaufort. Estais: cabos de aço inox que agüentam o mastro para vante e para a ré.

Draft: cavado; parte em forma de concha das velas. Esteira da Vela: parte inferior.

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Esteira do Barco: turbulência à popa deixada pelo movimento do barco. proa, para prendê-las aos estais.

Estratégia: melhor aproveitamento das condições gerais (meteorologia, Gennaker: vela de proa para ventos folgados, parecendo um balão, mas
comunicações, rotas, correntes, etc.), em uma grande área. com um punho preso à proa. Blister.

Estropo: prolongamento de cabo. Genoa: vela de estai de proa maior que a buja. A maior vela do barco é a
genoa #1, depois do balão.
Falcaça: acabamento nas extremidades do cabo para evitar desfiar.
Gorne: entalhe na circunferência das roldanas dos moitões, onde o cabo
Ferro: âncora. se acama.

Fibra de Vidro: fiberglass ; plástico reforçado com base na combinação de Gornir: passar o cabo no gorne do moitão.
fibras de vidro em forma de mantas ou tecidos, com resina (poliester ou
epóxica). Gradiente: diferença de valores ao longo de um campo.

Filame: comprimento de cabo entre o barco e a âncora quando lançada e Gradiente de Vento: diferença dos valores de velocidade do vento entre
enterrada. dois pontos. Gradiente de pressão; gradiente de temperatura.

Formato: qualidade de qualquer peça aerodinâmica; o formato da vela Gradiente de Vento na Vela: diferença das velocidades do vento na esteira
varia com a intensidade do vento e nas duas regiões da velejada: aerodi- e no tope da vela.
nâmica e estol.
Grande: vela principal, entralhada no mastro e na retranca.
Forqueta: forquilha para adaptar os remos do caíque.
Green-Flash: clarão verde que acontece entre os trópicos, devido à refração.
Magnetômetro: instrumento destinado a medir a intensidade do campo
magnético (declinação e inclinação magnéticas). Grimpa: biruta, lanyard.

Forra: reforço da vela nas partes de maior esforço. Forra de rizes, por Groove: sulco, canal. Orçar na melhor proa, dentro do groove. São três
exemplo. modos: modo ferrado ou cochado (que fornece menor distância velejada,
mas com menor velocidade), modo folgado ou veloz (que fornece maior
Gaiúta: escotilha de convés com tampa; clarabóia. velocidade, mas teremos que velejar maior distância) e modo Vmg (que é
o que nos levará à chegada na frente dos demais).
Garlindéu: ou garlindréu; peça que liga a retranca ao mastro; mangual.
Guinada: desvio da proa do rumo escolhido.
Garrunchos: ganchos de metal com mola, colocados na tralha das velas de

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Guinda: altura do mastro acima da linha dágua. Largo: ao largo; longe da costa.

Gurupés: pau horizontal na proa dos barcos, para permitir maior área vé- Lazeira: espaço; um veleiro que pede lazeira está pedindo direito a ca-
lica. minho. Um barco que tem lazeira à sotavento, pode correr com o tempo.

Gurutil: testa de uma vela triangular. Leme-de-Vento: aparelho que assegura a velejada sem necessidade de
atenção ao leme. Os mais usados são o Aries, inglês; o Atoms, o Navic e o
Gybe ou Gibe: jaibe; cambar, virar de bordo. Em geral, virar por davante, Goiot, franceses e o Alado, brasileiro.
passando com a proa pelo vento, é dito cambar; cambar em roda, passan-
do a popa pelo vento, é dito jaibe. Lingada: guinchar o barco sobre carreta na rampa; suspender o barco pelo
pau de carga, ou guindaste, encalhando-o (pondo-o à seco para serviços).
Illingworth: ângulo; na orça, é mais aconselhável bordejar no angulo do
leito do vento, para evitar surpresas de rondadas. Quando este angulo é Linha-Dágua: linha que separa as obras vivas das obras mortas de um
de vinte graus, é denominado de Illingworth, quem primeiro demonstrou barco.
que este valor é o melhor.
Linhas Isogônicas: ou simplesmente isogônicas, são o lugar geométrico
Intracoastal Waterway: canal abrigado construído nos EUA, aproveitan- dos pontos sobre a superfície terrestre que têm a mesma declinação mag-
do braços de rios, lagoas, canais e baías, permitindo navegar por águas nética.
abrigadas desde a fronteira do Canadá à fronteira do México, abrangendo
toda a costa Leste e a do Golfo do México. Existem publicados inúmeros Linha de vida: cabo de aço ou de nylon robusto, atado na abita de proa e
guias pormenorizados, indispensáveis para quem pretende navegá-la. indo ao cunho de popa, de modo a ligar o cinto de segurança para permitir
o deslocamento livre no convés; conforme o tamanho do barco, usar duas
Isogônicas: ver linhas isogônicas. linhas de vida, uma em cada bordo.

Jogo: o mesmo que balanço. Loxodrômia: navegação segundo rumo constante com os meridianos
(rhumb-line). Na carta de Mercator, corresponde a uma reta. A navegação
Ketch: veleiro com dois mastros, sendo o de ré menor do que o de vante e ortodrômica é aquela efetuada segundo arco de grande círculo e aparece-
posicionado à frente do eixo do leme. rá na carta de Mercator como uma curva, de comprimento menor que a
rhumb-line (reta) correspondente. Ver Rhumb-line. Ver ortodrômia.
Lanyards: grimpa, biruta.
Luva: funil de tecido leve que veste o balão, permitindo que ele suba na
Lap: volta; propriedade de um cronômetro de voltar ao tempo corrido, sombra da vela grande, sendo puxado para o tope quando tudo pronto,
após uma tomada. livrando a vela ao vento. Para baixar o balão, a luva é descida, abafando-o.

Laptop: computador portátil. Macaco: esticador.

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Magnetômetro: instrumento destinado a medir a intensidade do campo gundo e da aceleração (variação da velocidade ou da direção) fornecida à
magnético (declinação e inclinação magnéticas). Ver bússola; ver linhas massa de ar pelas velas.
isogônicas.
Nó: medida de velocidade (1 milha por hora); 1852 metros por hora. Lais.
Manilha: peça metálica em forma de U com pino (cavirão), para emendar
cabos, amarras, etc. Odômetro: instrumento para medir distância navegada.

Marcação: ângulo de uma visada a uma marca de terra, em relação ao Orçar: velejar contra o vento, bordejando; barlaventear.
Norte.
Ortodrômia: navegação segundo arco de grande círculo. É a rota de me-
Mezena: mastro mais à popa; mastro de ré. nor distância. Navegamos numa rota ortodrômica, cujo rumo varia cons-
tantemente (na maioria das vezes), realizando singraduras loxodrômicas.
Montar: contornar, alcançar. Ver loxodrômia.

Muleta: pau armado no mastro, para afastar a escota dos brandais. Palamenta: conjunto de acessórios indispensáveis, de presença obrigató-
ria a bordo.
Multicasco: barco com vários cascos. Catamarã, dois; trimarã, três. São
barcos de grande velocidade, mas ao emborcarem, não endireitam. Palombar: costurar a tralha na orla da vela; os pontos de palombar podem
ser á portuguesa (ponto pela cocha) ou à inglesa (ponto redondo). Pela
Náilon (nylon): material sintético, de grande resistência, próprio para cocha, a linha de palombar passa por dentro do cabo; no redondo, a linha
spinnakers. passa em volta do cabo.

Navegação Estimada: processo para calcular a posição por rumos e dis- Palomar: nó muito utilizado pelos pescadores para unir a linha ao anzol,
tâncias navegadas; é corrigida por outros processos. Ela é mantida para por ser fácil e seguro (a linha arrebenta; o nó resiste). Dobrar o chicote da
servir de suporte à navegação astronômica, mas é muito trabalhosa e de- linha, com uns dois palmos de comprimento; passar esta parte dupla no
pende das anotações dos timoneiros (que sempre esquecem pernas da buraco do anzol e dar meio nó direito; passar o anzol pela alça e apertar:
velejada). Podemos determinar a posição aproximada empregando o azi- está dado o nó.
mute magnético do sol (transformado em verdadeiro), proando e lendo
na agulha. Junto com a altura e a hora, determina-se um triângulo de po- Panos: velas.
sição, que fornecerá a posição estimada.
Pára - raio: instalação importante; pode se usar uma corrente galvanizada
Newton ( leis ): resumidamente: para modificar um movimento deverá atada ao brandal de sotavento, para reforçar o terra.
haver uma força interferente; força é massa vezes aceleração; a toda ação
corresponde uma reação igual e contrária. Delas, concluímos que a for- Passagem Meridiana: passagem de um astro pelo meridiano do observa-
ça produzida pela vela depende apenas da massa de ar defletida por se- dor; pode ser superior ou inferior.

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Pau: nome genérico mais usado para denominar varas que espicham ve- Raio de ação: ver autonomia.
las para fora, apresentando sua maior área ao vento. Pau da buja; pau da
giba; pau de atracação; pau de pica-peixe. Ranhura: canal, slot, espaço entre duas velas, que deve ser ajustado para
maior velocidade de escoamento do vento.
Pé-de-galinha: peça de metal por onde passa o eixo do motor, para apoio;
logo após, está o hélice. Reta de Altura: lugar geométrico dos pontos da superfície da Terra com a
mesma altura para um determinado astro (é uma circunferência, da qual
Perna: parte do percurso, entre dois pontos do caminho (waypoints). consideramos uma reta nas dimensões da carta).

Pinha: de retinida; é uma bola pequena de cabo, para permitir o arremes- Retinida: cabo fino auxiliar, preso a uma bóia ou a uma pinha, para facili-
so para o cais ou para outra embarcação. Há vários formatos de pinha, tar o lançamento.
inclusive de adorno.
Retranca: verga que trabalha na parte inferior do mastro, espichando a
Plotar: locar, marcar na carta. esteira da vela grande.

Poita: bloco pesado onde fica amarrado o barco. Rhumb-line: linha de rumo quando navegando loxodrômicamente; na
carta de Mercator ela será uma reta. Ver loxodrômia.
Pólos: Norte e Sul. São muitos os pólos: verdadeiros, magnéticos, pólos
instantâneos, etc. Rizes: cabinhos na vela para permitir diminuir sua área. Quem comanda
a rizadura é a adernada.
Pólo Elevado: pólo do hemisfério do observador; para o Brasil, o pólo ele-
vado é o Sul; o pólo rebaixado é o Norte. Roach: para ser conseguido o formato das velas na fase de confecção.

Proa: parte da frente do barco, de forma afilada; bico; nariz. Sag: para compensar a deformação da vela quando da ação do vento, in-
troduzido na fase de confecção.
Prumo: profundímetro de mão.
Sanefa: espécie de cortina, que vai do toldo ao convés, para proteção da
QAM: boletim meteorológico, no código Q internacional. tripulação.

Quartel: cada seção de 30 metros da amarra. Sapatilha: terminal de metal ou plástico na extremidade de um cabo, para
evitar esgarçar.
Quilha: parte mais profunda do barco.
Sarrafo: ripa
Radiogoniômetro: instrumento que indica por meios eletromagnéticos a
direção de radiofaróis. Seio: corpo do cabo; as extremidades se chamam chicotes.

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

Sentinela: peso colocado na amarra, entre a âncora e o barco, de modo a Sonda: fio de prumo para medir a profundidade. Ecossonda ou ecobatí-
tornar maior o amortecimento, e o esforço mais na horizontal asseguran- metro, quando eletrônica.
do melhor poder de unhar.
Sotavento: lado do barco por onde escapa o vento. Barlavento é o lado por
Sextante: instrumento de medida de distâncias angulares em qualquer onde entra o vento.
plano. É de grande utilidade na navegação costeira, medindo ângulos ho-
rizontais e verticais e de fundamental importância na navegação astro- Spinnaker: balão; vela principal nos ventos favoráveis, equivalente à
nômica, propiciando a tão almejada autonomia em navegação. O sextante grande na orça. Uma empopada sem balão é como uma orça sem a vela
se compõe basicamente de um arco graduado em graus, dois espelhos, grande: o barco fica desequilibrado. Geralmente em náilon colorido, ela
um visor (onde pode ser inserida uma luneta) e uma alidade giratória. Os apresenta um visual bem marcante.
sextantes modernos possuem tambor micrométrico (leitura de minutos)
e vernier (leitura dos décimos de minuto). Alguns já vêm com computa- Starfinder: identificador de estrelas; conjunto de transparências para fa-
dor acoplado. cilitar a locação da posição dos astros por meio de suas coordenadas.

Um bom sextante lerá 0.1, mas podemos empregar os que lêem 0.2. Talas: réguas que sustentam o aluamento da valuma.

Sheet-to-tiller: escota e elástico armados para permitir velejar livre da Talingar: emendar os quartéis da amarra, para largar maior filame; fixar a
atenção ao leme, com o elástico acionando para um lado e a escota corri- amarra ao anete; preparar a âncora.
gindo para o outro. Os lemes-de-vento e pilotos automáticos o substitu- Tática: procedimentos para enfrentar uma situação, como o mau tempo,
íram, mas é bom tê-lo a bordo, para cruzeiros curtos, quando não insta- por exemplo, com a determinação da melhor proa, das mareações (amu-
lamos o leme-de-vento, principalmente em solitário, para preparar uma ras), procedimentos, etc.
refeição, descansar, tomar banho no convés, etc.
Tempestades (leis):
Singradura: distância navegada em vinte e quatro horas.
Primeira: Os ventos girantes em torno de uma BP produzem ao longo do
Sirga: cabo para puxar de terra o barco ao longo de um canal, quando ele seu trajeto um SC Perigoso e um SC Navegável.
não consegue vencer a correnteza. Cabos de sirga. Segunda (para o HS): Se o vento rondar para a esquerda, estaremos no
SC Perigoso. Se rondar para a direita, estaremos no SC Navegável. Se não
Skipper: comandante; patrão do barco. houver rondada (ou rondar pouco), estaremos no Trajeto. Estas leis dita-
rão o rumo a seguir. No HS: se no SC Navegável ou no Trajeto, velejar com
Slot: ranhura; canal aerodinâmico entre duas velas, responsável pela vento de popa, com a maior velocidade possível, com amuras a BB; se no
principal força de propulsão (sucção) na orça (região aerodinâmica da SC Perigoso, orçar com a maior velocidade possível, com amuras a BB. Se
velejada). tiver que capear, fazê-lo com o maior seguimento possível para a frente.
Portanto, no HS, amuras sempre a BB (orçando, em popa ou capeando).
Sombra: sombra do vento, parte protegida, onde a força do vento é menor.

- 196 - - 197 -
Licio Maciel Roteiro Costa Leste

Teque: cadernal de um só cabo, com dois moitões duplos, sendo um fixo e Trim: ângulo de ataque da vela. Todo barco deve ter um trimmer - timo-
outro móvel, para esforços de tesar ou carregar pesos. neiro que sabe ajustar o trim das velas. Depois de ajustado o formato da
vela, acionamos o traveler, para apresentá-la ao vento segundo um angulo
Testa: parte da frente da vela. apropriado e crítico. Entre o panejamento e o estol existe uma margem
de 2 ou 3 graus, o que fornece uma visão da sua importância. As velas
Tiller-Pilot: piloto automático eletrônico. de proa também possuem travelers, para ser obtido melhor rendimento.
Como a vela de proa opera em ar livre da interferência da grande (inicial-
Timão: barra do leme, cana do leme, roda do leme; o timoneiro age no mente), ela deve ser trimada primeiro.
timão para mudar de direção.
Turco: pequeno guindaste giratório para içar escaleres e caíques.
Tombadilho: parte da popa; castelo de popa.
Twist: torção da vela; é visto pelo ângulo do topo com a esteira; é função
Tope: parte superior do mastro, onde vão presos os estais. do gradiente de vento.

Tornel: destorcedor. Upgrade: aperfeiçoamento ou atualização de um programa de computa-


dor ou de uma peça de hardware.
Tosamento: curvatura do convés no plano vertical, com a proa bem mais
alta que a popa; os barcos modernos apresentam o tosamento reto. Valuma: aresta traseira de uma vela, considerando-a içada.

Tralha: cabo costurado na testa ou esteira da vela. Velame: conjunto de velas do barco; adaina.

Traquete: trinquete; vela de proa, armada entre a buja e a grande; bujar- Velas: propulsão normal de um veleiro; geralmente feitas de Dacron ou
rona. náilon. O conjunto de velas de um barco é denominado adaina ou vestu-
ário.
Traveller ou (traveler): trilho e carrinho onde vai presa a escota da vela
permitindo ajustar o ângulo de ataque sem alterar o seu formato Verdugo: proteção afixada no costado do barco, geralmente de madeira.

Través: o que está do lado. Vergas: ou paus, para espichar as velas .

Triângulo de Posição: triângulo cujos vértices são a posição geográfica Working jib: buja de serviço, buja de trabalho; pequena buja
do astro, a posição do barco e o polo elevado terrestre. Para ser resolvi-
do, são necessários três elementos conhecidos; como no mar só podemos Yawl: veleiro com dois mastros, sendo o de ré situado à ré do eixo do leme.
determinar com precisão dois elementos ( altura, medida com o sextante,
e a hora da observação), emprega-se o artifício da reta de altura (o de
Marcq Saint-Hilaire, normalmente).

- 198 - - 199 -
Licio Maciel Roteiro Costa Leste

Lift (empuxo)
Drag (arrasto)
Ângulo de ataque
Fluxo
Aparelhos especiais: flap, slat e slot
Forças
Forças principais que atuam no barco; componentes e resultantes.
Composição de forças; vetores
Barcos de alto-aspecto
Gradiente de Vento
Propulsão:
região aerodinâmica
região de estol.
Equipamentos
Função principal
Acréscimo de potência obtido
Custo x Complicação
Em Macaé Proas e Amuras
Modos da orça; birutas
Orça ferrada (ou cochada)
Currículo de Curso Orça folgada
Través
Través aberto
Vela Velocidade máxima do barco
Em popa
Rudimentos de hidrostática e de hidrodinâmica Popa arrasada
Princípio de Pascal Vento real, vento aparente; composição.
Equação da Continuidade Resultante
Arquimedes Indicadores de direção do vento
Princípios fundamentais de aerodinâmica Interação entre Velas
Teorema de Steven Tubo (ou ranhura)
Equação de Bernouilli Efeito de chaminé
Leis de Newton; forças, pressão, pressão atmosférica Ajuste da ranhura
Venturi: exemplos práticos Exemplos práticos
Aplicações à vela Velas: grande, de proa, spinnakers, especiais

- 200 - - 201 -
Licio Maciel Roteiro Costa Leste

Ajustes Básicos: Direito à caminho (precedência)


Shape (formato) : Draft (cavado) e Twist (torção) Montagem de bóias (ou de cabos) do percurso
Trim (angulo de ataque) Formação da tripulação
Slot (ranhura) Lay-out do barco
Outros Parâmetros Procedimento no mau - tempo
Sag Cruzeiros
Roach O barco de oceano
Broadseaming Logística
Camber Alimentação
Ajustes Planejamento em função da região, época e percurso
Seqüência Meios de Comunicações: rádio, visuais e sonoras.
Guia de Procedimento para os ajustes Segurança (normas).
Spinnakers
Tipos: vantagens e zonas de ação
Içar - baixar - luva - proas - pau - gybing - muleta Navegação
Emergências
Velas Especiais. Speed / Log
Autogoverno Ecossonda (ecobatímetro)
Equilibrar o barco (leme) Radiogoniômetro
Discriminação de forças Radar
Sheet-to-tiller: casos GPS
Leme de vento: tipos (eixo H e V) Comunicações:
Piloto automático: tipos (com asa e servo) Modulação em Amplitude; AM, DSB, SSB
Outros equipamentos Modulação em freqüência
Estratégia Modulação de Pulsos; PCM
Amuras, proas, vantagem no barlavento Transmissão e Recepção
Ângulos de bordejo, de orça, do leito do vento, do vento real, do vento Noções de Propagação
aparente. Espectro de Freqüência
Angulo de Illingworth HF, VHF, UHF
Corrente: composição e compensação Antenas
Escolha da melhor proa (largadas) Fontes de Energia Elétrica
Vmg (velocity made good); métodos gráfico e de cálculo. Legislação
Tática Cuidados e Recomendações
Mareações Comunicações de Emergência
Vantagem no contravento Redes Mundiais

- 202 - - 203 -
Licio Maciel Roteiro Costa Leste

Computador Outros métodos


Sensores Processos mais empregados
Programas (softwares) Programação existente (exemplos)
Legislação para barcos de esporte e recreio, diversas classes. Erros
Segurança Precisão
Equipamentos obrigatórios Ortogonalidade
Equipamentos adicionais Planetas, Estrelas, Lua
Sinalização Sol
Regulamentos Eletrônica: radiogoniometria
Sobrevivência no mar Satélites Artificiais
Navegação Costeira: escolha da rota GPS
Controle da rota (verificação se o barco se mantém sobre ela); deriva, cai- Radar
mento Radioposicionamento
Distâncias e ângulos Sondas
Sextante Planejamento e discussão de cruzeiros de longa duração
Alidade de mão Medidas de Segurança
Binóculo Astronomia de Posição
Faróis O céu austral
Serie de visadas sucessivas Constelações
Visadas simultâneas Identificação do céu
Outros processos úteis - por alinhamentos
Corrente - pelo cálculo
Ângulo de colisão - starfinder
Marés - Cartas Celestes do Brasil
Navegação Estimada e Astronômica: Precisão e erros: tolerância
Rumos e distâncias Ortodrômia e loxodrômia (rhumb-line)
A estimada como suporte para a navegação astronômica Métodos Estatísticos aplicados à navegação
Astronômica sem necessidade da Estimada Tábuas de Navegação
Azimute magnético Processos aproximados
Método de Wilis (visadas sucessivas) O computador do barco
LOD (lenght of the day) Noções de Programação
Lua e Estrelas
Estrela Polar
Passagem Meridiana (PMd)
Primeiro Vertical

- 204 - - 205 -
Licio Maciel Roteiro Costa Leste

Meteorologia

Princípios fundamentais
Estações do ano; climas
Declinação
Composição da atmosfera terrestre
Camadas
Jet stream
Ar: seco, úmido e saturado
Calor e energia: equilíbrio térmico; gradiente térmico
Temperatura; unidades e conversão
Atmosfera padrão
Barômetros
Pressão atmosférica
Estabilidade/Instabilidade do tempo
Vento Terminando o casco (Bianca Fiberglass-SP/1982)
Força de Coriolis
Circulação geral na atmosfera
Zonas de transição
Leis de Buys-Ballot
Ventos alísios
Nuvens
Massas de ar
Equador térmico e ITCZ (Inter Tropical Convergence Zone)
Procedimentos para enfrentar uma depressão
Escala Beaufort
Tempestades: estratégia e tática
Exemplos e análise

Rebocando o barco para Vitória – ES (1968)

- 206 - - 207 -
Licio Maciel Roteiro Costa Leste

Tópicos Importantes Perguntas:

Meteorologia • qual a variação diária normal da pressão atmosférica, de um mínimo a


um máximo (maré barográfica)? A que horas P acontecem os máximos e
1) As nuvens de mau tempo são: os mínimos?
• qual a pressão atmosférica normal?
• cirrucumulus,
• altocumulus, 2) As leis que regem o comportamento das tempestades, permitem locali-
• cumulunimbus. zar a BP e adotar os procedimentos para colocar o barco na melhor amura
e no melhor rumo.
As de tempo bom são:
• altostratus, De acordo com elas, estando o barco na área de ação de uma depressão, se
• nimbustratus o barômetro sobe bruscamente e o vento diminui, em que posição o barco
• stratus. estará em relação ao centro de BP?

Para evitar surpresas durante o percurso, observar as nuvens e o 3) As “leis das tempestades” são:
barômetro são uma constante, um “vício”... não se deve pensar, porém, a dos semicírculos
que a observação do barômetro (pressão atmosférica), fornece a resposta a de Buys-Ballot
à previsão do tempo. E a observação das nuvens fornece apenas alguns
indícios do que poderá ou não vir. Discorra resumidamente sobre elas, esquematizando para o HN e para o
Devemos velejar sempre atentos ao céu, ao barômetro, ao termô- HS, indicando em cada caso os procedimentos corretos a adotar (rumo,
metro e principalmente para os ruídos de estática do rádio. Escutar as amura, velocidade, rondadas).
previsões do tempo das estações-rádio e possivelmente os QAM’s (bole-
tins) das estações meteorológicas. 4) As duas principais forças que atuam na atmosfera e que regem o com-
Deveremos estar atentos, em particular, às nuvens que gradual- portamento do vento, são:
mente vão aparecendo a grandes altitudes (cirrus ) - as denominadas
“rabo-de-galo”, que se estendem de W ou de SW. • a do gradiente de pressão
A medida que a baixa pressão vai se aproximando, a leitura do ba- • a de Coriolis
rômetro vai caindo e a temperatura aumenta; o céu vai ficando cheio de
cirrustratos, que fornecem um aspecto enevoado-esbranquiçado ao céu Defina-as, esquematizando para os dois hemisférios.
muitas vezes formando um halo (coroa) em torno do Sol (ou da Lua).
5) Esquematize um sistema associado de AP/BP no HN e no HS, indican-
do:

• Em que amura você colocará o barco no trajeto da BP e em que marea-

- 208 - - 209 -
Licio Maciel Roteiro Costa Leste

ção. E no que se refere à velocidade? Perguntas:


• Quais as rondadas do vento (Trajeto, Semicírculo Navegável e SCPeri-
goso)? • qual o rumo ótimo de fuga? (324)
• qual a velocidade de avanço da BP sobre o barco? (21)
6) Considera-se mau tempo aquele em que o vento atinge da Força 5 para • a que distância do barco o centro de BP cruzará a nossa esteira? (246)
cima. • quanto tempo ela levará para isto? (14.7)
• em que amura velejaria? (BE) justifique. (SCNavegável, HN, em popa, de
Os temporais representam o máximo na vida de um velejador de acordo com o trajeto da BP)
oceano, por oferecer a oportunidade de lutar e vencer a força dos elemen-
tos, num pequeno barco, procedendo e manobrando corretamente. É isto 11) CB (cumulunimbus) é uma célula de circulação ciclônica (BP) e a FF é
que faz a diferença entre passatempo e esporte. um sistema alongado de BP.
No litoral SE brasileiro, com a chegada de uma FF cujo trajeto se
posicione sobre a linha geral da costa (SW-NE), o vento forte contrário à Se você avista uma CB no horizonte à proa, para que bordo procu-
corrente, pode formar arrebentações em alto-mar. rará guinar para tentar contorná-la de modo a enfrentar seus menores
Mostrar quais esses prováveis locais efeitos? (HS).

7) Onde se localiza o equador térmico no verão? E no inverno? 12) A duração do mau tempo depende das qualidades do ar frio:

8) O que é ITCZ? • se o vento se fixa de SE, o ar é úmido, vindo do mar


• se ele se fixa de SW, o ar é seco, vindo de terra.
9) Um barco que, para enfrentar ventos de 40’, reduz, por exemplo, a área
vélica para 30% da área nominal, ficando com : Qual deles fornecerá maior duração do mau tempo. Justifique sucinta-
vb= 2’ mente.
Ângulo de Orça = 70º
se a duração do vento foi de 3 horas, qual a lazeira adquirida da 13) Na madrugada do dia 16 de maio de 1987, a 20 milhas S do Focinho
costa à sotavento? do Cabo (Ilha de Cabo Frio), ventos fortes e mar grosso afundaram duas
traineiras que procuravam abrigo a sotavento da ilha, tendo morrido nes-
10) Estamos em alto-mar, no HN, quando ouvimos pelo rádio a notícia da te acidente onze pescadores.
existência de um centro de baixa - pressão acompanhado de fortes ventos
e grandes ondas. O trajeto da BP é informado como sendo para 35º à 22 As estações de rádio anunciaram o desenvolvimento e o avanço da
nós de velocidade e sua localização é tal que nos posiciona a 395 milhas BP com grande antecedência, uma vez que em seu trajeto ela vinha des-
de distância, marcação de 195º. Nossa velocidade é de 7 nós. truindo casas e provocando inundações. No dia 12, em São Joaquim, pro-
vocou um tornado, causando 5 mortes e mais de 100 feridos, deixando
cerca de mil desabrigados.

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

Na tarde do dia 15, os mestres das embarcações citadas resolveram, correndo com o tempo, usar ou não drogue (âncora de mar)?
diante do estado do mar, rumar para o abrigo.
Esquematize a passagem da FF sobre o RJ, de SW/NE, trajeto en- Exemplifique, de preferência com casos reais conhecidos, reporta-
tre a baía de Guanabara e Arraial do Cabo, e ressalte os principais erros dos pela imprensa ou por experiência própria.
cometidos pelos inditosos pescadores, de acordo com os procedimentos
para enfrentar o mau tempo (tempestade).
(Fato semelhante ocorreu em 1995, com o desaparecimento de 4 tripu- Vela
lantes de duas traineiras soçobradas na mesma região).

14) As três principais regiões de calmarias são: 1) Na orça, para determinar a melhor proa dentre as inúmeras possíveis,
empregamos as lanyards para nos posicionarmos num dos três modos
• horse latitudes (N e S); possíveis, que o americano define como “sailing in the groove”, o que dá
• doldrums (N e S); idéia da estreiteza deste canal (groove).
• sub-polares (N e S).
Descreva este procedimento, sabendo que são:
Indique suas respectivas localizações num pequeno esboço (mapa
mundi) e diga a razão de tais denominações. • modo ferrado
• modo veloz
15) Para realizar uma circunavegação, uma longa travessia ou mesmo um • modo Vmg
longo cruzeiro, é necessário preencher um extenso rol de qualidades pes-
soais e materiais, a par de uma longa experiência . Você pode ter velejado 2) Esquematize como você orçaria de A para B (d=100’), traçando os bor-
por trinta anos, pode ter ganho um bocado de regatas e mesmo ter feito dejos, pernas, Tc, sabendo que o vento vem diretamente da chegada:
parte da diretoria do seu iate clube, no entanto, no mar, terá sempre opor-
tunidade de aprender.
A * * B
Há alguns conceitos que são de fundamental importância para o ia-
tista de água-azul, à despeito de sempre causarem polêmica nos clubes, Largada Chegada
nas “rodas de velejadores”: você terá de ter seu próprio ponto de vista,
bem fundamentado, para optar pela ação que melhor se aplique ao caso,
na hora da decisão que, mais cedo ou mais tarde, terá que enfrentar. E 3) No contravento, um ajuste correto das velas poderá duplicar a veloci-
nada pior que a indecisão nessas horas. dade do barco, o que corresponde a uma possibilidade de melhorar a ve-
locidade de 100%. Na empopada, a atenção nos ajustes redundará numa
Discorra, dando sua opinião sobre os seguintes conceitos: melhoria de apenas 30% na velocidade e o que resolve mesmo é o aumen-
to da área vélica. O emprego de velas especiais para a empopada, além de
diante do mau tempo, fugir para mar aberto ou procurar abrigo? imprimir muito maior velocidade ao barco, fornece-lhe maior estabilida-

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

de de seguimento, além de outras inúmeras vantagens. O cruzeirista, não Para velejar bem, o barco deverá ter sido regulado (afinado) com
sujeito às regras de regatas, poderia, por exemplo, empregar dois balões antecedência (estais, brandais, inclinação do mastro, Tc).
ao mesmo tempo, ou duas genoas em asa (uma para cada bordo, com ou Durante a velejada, temos os ajustes do trilho do garlindéu (ou do
sem paus de espicha). O emprego das velas especiais, no entanto, é mais Cunnigham), do burro, do traveler, posição da retranca, escotas, adriças,
cômodo, por preencherem exatamente as lacunas ao fluxo de vento entre amantilhos, estais, moitões, bichas, tesadores, lanyards ou tell-tales, etc.
as velas. Com as velas içadas, com qualquer ajuste “simpático” das adriças e
escotas, se é largada a bóia, o barco sairá derivando e forçosamente pe-
Perguntas: gará seguimento para a frente, que é sua principal tendência: aí o neófito
poderá concluir, com grande euforia, que já sabe velejar. Com o passar do
• como se ajusta o spinnaker? (posição, altura do pau, angulo, mareação) tempo, porém, ele notará que os outros barcos idênticos andam mais e
• como se emprega a luva do balão? estão com “melhor aspecto”.
• descreva um gybe com balão Um cúter (ou um eslupe) normalmente necessita cerca de dezoito
• o seu barco tem (ou não) uma adriça especial para o balão? Por que? ajustes iniciais da velejada, que se repetirão progressiva e ciclicamente ao
• desde que angulo podemos iniciar o emprego do spinnaker? longo da velejada, uma vez que o ajuste de um elemento faz variar o ajuste
• o que é genaker, blister e blooper? dos outros e, mesmo, o vento sempre ronda, reiniciando-se os ajustes. É
• como fica posicionado o blooper? aí que reside a diferença de procedimento do regatista e do cruzeirista: o
regatista está sempre ajustando algo ao longo da velejada. O cruzeirista é
4) Do estudo da dinâmica dos fluidos, o entendimento do princípio de mais lento no atendimento à necessidade de reajustes...
Bernouilli é de fundamental importância e todo velejador deve ter em Podemos fazer uma pequena comparação:
mente sua aplicação à vela. Na prática, em resumo, o que interessa dele é você pode dirigir um automóvel sempre em primeira ou numa ou-
o fato de “na ranhura, quanto maior a velocidade do vento, menor a pres- tra marcha qualquer (como se não existisse caixa de marcha). No barco,
são”. Isto é conhecido como “efeito de chaminé”. é ainda mais fácil você proceder assim, pois além das “marchas” serem
contínuas, os outros barcos não reclamarão (muito pelo contrário...).
Explique-o e exemplifique no ajuste das velas para obter maior for- A esteira da vela é a caixa de marcha
ça de sucção. A escota, o acelerador.
Uma esteira folgada é equivalente à marcha de força (vela barriguda)
Por que a denominação efeito de chaminé? Uma valuma folgada corresponde à baixa aceleração.
Cite outros exemplos da utilização do princípio de Bernouilli. É claro que você só acelera após engrenar a marcha apropriada.
Primeiro você dá o formato (cavado e torção) apropriado à vela (ou
5) Para marear as velas, necessitamos saber a função de cada componen- às velas), iniciando pela vela de proa, que é livre de interferência da gran-
te do equipamento e os reflexos de um ajuste sobre os outros. de (pelo menos inicialmente). E este formato é mantido enquanto o vento
não variar (intensidade e sentido). Em seguida, ajusta o angulo de ataque
Ajustes Básicos: (trim). Depois, ajusta a ranhura, que modificará o formato, devendo ser
formato(shape) - cavado(draft) - torção(twist) - [testa, valuma, es- tudo retocado sistematicamente, até encontrar o ponto.
teira] - angulo de ataque (trim) - canal ou ranhura (slot) Como a incidência da força do vento varia sobre as velas por oca-

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

sião das rondadas, teremos de refazer os ajustes a cada variação. ções, bastando que se saiba o que se está fazendo:
Mostre num desenho simples, os formatos da vela grande, para um
mesmo vento, quando se passa de uma orça para um través (região aero- • o ângulo de ataque é constante (na região aerodinâmica da velejada:
dinâmica). orça, orça folgada e grande parte do través). Isto quer dizer que a propul-
O formato da vela variou? Os ajustes variaram? Justifique. são fornecida pela vela independe da proa ( nesta região aerodinâmica).
Em que componentes do equipamento você agirá para ajustar o for-
mato da grande? Embora varie de barco para barco, ele se situa entre 28º e 30º.
Você age primeiro no traveler e, depois, na escota, ou inversamen- a adernada máxima é de cerca de 30º com a vertical (mastro/ver-
te? tical). Cada barco possui sua adernada ótima, que deve ser verificada, de-
terminada.
6) O fabricante de uma vela, de acordo com as características do
barco, estabelece o shape básico apropriado. Para conseguir obter o for- • eliminar a tendência do leme (equilíbrio do leme), retocando os ajustes
mato, ele emprega o broadseam, o sag, o roach, o camber, etc. das velas
• observar as lanyards.
O velejador possui diversas maneiras de fazer variar este shape, • observar a terceira tala (de baixo para cima), para ajustar a valuma. Na
conforme desejado. Ele atua nos diversos controles, observando: orça, esta terceira tala, não deve estar passando para barlavento
• cordas e flechas, observadas por seções (formato por seções da vela)
• lanyards
• talas Explique cada um destes itens, e como você os classifica por ordem
• estais de execução.
• cordas e flechas (e dizem que em barco não há cordas, sem contar as
dos relógios...) 7) Quais as diferenças nos ajustes da vela grande quando você veleja com
• aproximação das rajadas (pela superfície da água), vento real, marolas, vela de proa e sem ela? Justifique.
rumo, etc.
8) Por que, numa rajada, o vento parece entrar mais de través? Mostre
Para um velejador desavisado, tudo isto, em condições extrema- num desenho sucinto.
mente variáveis, se constitui num intrincado problema, e ele se perde no
caos... 9) Esquematize as forças que atuam no barco como um todo (barco/vela/
A maioria se contenta em caçar as escotas, dar um formato “ boni- bolina).
tinho” nas velas e sair velejando... Ele raciocinou: se ando em qualquer
ajuste... 10) Esquematize a determinação da melhor proa (Vmg) na orça e como
Assim, com esse ponto de vista, ele jamais progredirá, ou demorará escolhê-la.
muito... Sugestão: empregue o processo gráfico.
Surpreendentemente, tudo é mais simples do que se imagina, por-
que há indícios ou guias gerais de procedimento para as diferentes condi- 11) Por que, na orça, o tope da vela deve permanecer mais aberto que a esteira?

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

12) O cavado máximo de uma vela de proa deve ficar no meio? E o da vela Navegação
grande? (considere apenas o caso da orça).
1) A determinação da posição do barco ao longo do percurso é, sem dúvi-
13) Numa orça, você deseja determinar a velocidade útil de avanço do da, um dos itens de maior importância para o sucesso do cruzeiro.
barco no sentido da chegada, diretamente contra o vento. Os instrumen-
tos indicam: Para barcos esportivos, podemos dispor da navegação costeira, es-
Va = 12 nós timada, astronômica e eletrônica.
Vb = 5 nós A navegação costeira, mantida enquanto avistamos as marcas de
Ângulo Va / Vb = 30º terra, é trabalhosa e cansativa, só sendo agradável quando conhecemos
Qual a sua velocidade útil? razoavelmente bem o trecho da costa a observar.
A estimada, baseada em rumos e distâncias navegadas, fornecerá a
14) Para empregar o sheet-to-tiller corretamente, é necessário usar uma posição aproximada do barco, geralmente corrigida por outro processo.
escota ajustada na faixa de discriminação das forças, caso contrário ele Embora a perfeição dos sistemas de navegação eletrônica seja fan-
não funcionará. tástica, a importância da astronômica não declinou, uma vez que ela é o
Explique este fato, com um esquema (utilizando a escota da buja ou da processo alternativo que satisfaz, por apresentar uma solução simples e
grande). cômoda, principalmente se adotarmos o computador para a eliminação
dos cálculos.
15) O que é angulo de Illingworth? Assim, mesmo que o barco possua sofisticado sistema eletrônico de
posicionamento, é sempre aconselhável estarmos em condições de deter-
16) O que é estropo? minar a posição pelo sextante.
Um processo muito difundido entre os barcos de recreio é o da PMd
17) Quando se emprega a genaker ou a blister? (passagem meridiana) do Sol, tanto pela simplicidade como pela facilida-
de de ser obtida a posição, apenas por soma e subtração. E serve como
18) As velas de temporal são também empregadas quando queremos treinamento no uso do sextante.
aguardar amanhecer para entrar em algum porto, quando as velas rizadas Um caso verídico, muito comentado em todas as partes do mundo
ainda são grandes. Se você quer colocar o barco em capa, como procede? (inclusive publicado em várias revistas náuticas e jornais) foi o de Spen-
Descreva e faça um desenho simples (calunga). cer Grift, operário inglês que, ao se aposentar, viúvo e com os filhos cria-
dos, vendeu a casa e todos os pertences, construiu um barco de 34 pés e
19) Quando se diz que o barco está estolado (stalled)? partiu para uma volta ao mundo, em fevereiro de 1971.
Sua experiência no mar era apenas a de ter observado de binóculo
20) Quais os tecidos normalmente empregados para construção de os barcos velejando na baía de Bristol. Ele tinha usado o sextante apenas
velas?(grande, genoa, balão) em terra e pretendia estudar e praticar durante os primeiros dias da tra-
vessia para o Caribe. Ele não contava, no entanto, com um enjôo renitente
que não lhe permitia ler. Assim, não lembrou do detalhe que em 21 de
março o Sol atravessa o equador, mudando o sinal da declinação, que é um

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

dos parâmetro do processo da PMd. gligenciado no uso, o que geralmente é a causa de erros grosseiros que
Dia após dia, o erro da navegação cometido por Spencer se torna- poderão resultar em sérios e desagradáveis acidentes.
va maior, à medida que o Sol se distanciava para o norte. Um navegador
mais experiente e menos enjoado teria atinado com o fato, mas Spencer • como evitar a ambigüidade?
compensava a proa para S, achando que a corrente o estava desviando • como navegar pelo processo homing?
da rota. O fato é que, procurando aterrar em Santa Lúcia, no Caribe, ele • como obter uma marcação de gônio? (ela será magnética ou verdadei-
foi encalhar ao largo de Macapá, sendo achado semimorto, com insola- ra?). Explique.
ção. Este enorme erro faria encerrar a carreira de qualquer candidato a
navegador, mas não foi o caso de Spencer Grift. Reabilitado da saúde, des- 4) Um procedimento comum na navegação costeira é:
pachou o barco de volta para Londres num cargueiro, arranjou emprego
numa marina, queimou as pestanas diligentemente estudando tudo o que • ao boiar um farol, sabemos de imediato a distância a ele.
era necessário e, após quase dois anos, iniciou uma épica viagem de volta • escolho a que distância quero deixá-lo no través e abro a proa conve-
ao mundo sem escala, via grandes cabos, continuando depois navegando nientemente.
repetindo a rota no sentido contrário, em solitário. Hoje ele é um renoma- • a fim de controlar o caimento e saber de imediato a distância ao farol
do lobo-do-mar, um verdadeiro herói na Inglaterra. ao longo do trajeto,
Explique, em detalhe, o erro de navegação cometido por Spencer, • efetuo uma serie de visadas sucessivas sobre o mesmo farol: a distância
justificando sua chegada ao Brasil ao invés de Santa Lúcia. navegada será sempre igual a distância barco/farol.

2) Os dois parâmetros que podemos medir com precisão, altura e hora, Descreva o processo completo.
não são suficientes para que possamos resolver o triângulo de posição :
fica faltando um parâmetro. Adotamos, então, o artifício da posição esti- 5) Numa determinada travessia, o rumo em relação ao solo entre A e B
mada e reta de altura : com o processo do vertical estimado, de Marq de (origem e destino) é de 45º.
Saint Hilaire. A vb = 4’
Descreva o processo completo. A corrente é de 1’ ( 1 nó), 135º.
Determinar a correção de proa e a velocidade no sentido útil.
Uma reta de altura obtida na PMd teria que traçado?
Para que as retas da manhã e da tarde (do Sol) se cortem ortogo- 6) Visando três marcas de terra, podemos plotar a posição com maior
nalmente, que condição deverá existir entre a latitude do barco e a decli- precisão, por meio do processo dos segmentos capazes.
nação?
Por que a PMd, tão empregada antigamente, caiu em desuso hoje • Em que se baseia ele?
em dia? • Em que casos é impraticável o seu emprego?

3) O radiogoniômetro (RDF) é um instrumento muito útil a bordo, tan- 7) O ANB fornece o AHG com erro de até 0.3’ e os erros de correção da
to pela simplicidade como pela comodidade que apresenta, num raio de altura são de mesma ordem.
emprego de até 100 milhas do radiofarol. No entanto, é muitas vezes ne- O relógio poderá apresentar erro de 0.25 segundos.

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

O sextante, calcanhar de Aquiles do processo, apresenta uma preci- de horizonte (podendo, portanto, ser realizada da varanda do apartamen-
são de 0.2’, mas as medidas a partir de um pequeno barco podem vir com to, por exemplo) é pelo método da determinação do ei (erro instrumen-
erros da ordem de minutos, dependendo do grau de perícia do observa- tal) e SD (semidiâmetro) do Sol.
dor (normalmente 0.5’). Descreva todo o processo e resolva para 29’, 30’ e 31’ (fora) e 32’, 32’ e 33’
As tábuas fornecem erros da ordem de 0.3’ . (dentro).
Assim, se considerarmos cumulativos todos esses erros, qual o erro
total que será cometido? 17) Uma forma de melhorar a precisão quando as condições de mar são
adversas e necessitamos obter uma posição com precisão, é através o em-
8) Quais as coordenadas geográficas dos pólos magnéticos da Terra? prego da serie de visadas em um pequeno intervalo de tempo (5 ou 6
visadas em 4 ou 5 minutos).
9) A Lua nasce todos os dias? Justifique.
Assim, visamos o Sol, obtendo:
10) Há seis pares de pólos terrestres. Quais são? 110315 27º 24’
110332 27º 30’
11) A declinação magnética varia de ano para ano num mesmo local. 110347 27º 33’
Que lei rege esta variação? 110558 27º 36’
110416 27º 39’
Na região dos Abrolhos, para o ano 2000, qual o valor da declinação mag- 110429 27º 42’
nética, se ela hoje é de 20º W e varia de +12 minutos ao ano?
Quais os valores ajustados?
12) Em que locais da Terra a agulha apontará para o Norte Verdadeiro? Qual o coeficiente de correlação (que fornece a qualidade do ajuste)?

13) A expedição de Magalhães, que completou a primeira volta ao mundo, 18) Se calcularmos a distância Maceió-Noronha na carta e pela ortodrô-
constatou que um dia tinha sido passado sem ser contado, inexplicavel- mia, qual será a maior?
mente. Meça pela carta e calcule pela ortodrômia.
Discorra sobre o fato, justificando.
19) Para a determinação da posição pelas estrelas, há um método que não
14) Quantos domingos, no máximo, haverá em um mês, considerando-se necessita identificá-las (apenas o cuidado de não confundir com algum
a linha de mudança de data? Justifique. Resposta: 10 (dez domingos). planeta).
Discorra sobre este método (método Davis).
15) As cartas em projeção de Mercator não servem para as regiões de
altas latitudes (acima de 60º). 20) No livro “The Calculator Afloat”, do Cap. Shufeldt (mesmo autor do
Explique porque. Dutton’s, da Academia Naval de Annapolis), é narrado um fato que se pas-
sou com um cargueiro inglês, ao largo da costa E da África, há alguns anos
16) Uma maneira de aferir o sextante, com a vantagem de não necessitar atrás.

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

O comandante do cargueiro reportou que o Sol se pôs e durante a ai = 62º 12’


realização dos cálculos para a determinação da hora do evento, ele subi- ei = -2’
tamente reapareceu acima do horizonte por alguns minutos, reiniciando
a se pôr. Quais os elementos para o traçado da reta de altura, considerando uma
Isto eqüivale a afirmar que, para aquela tripulação pelo menos, o posição estimada de -20º e 40º W?
Sol se pôs (ou nasceu) duas vezes no mesmo dia.
Explique e justifique o ocorrido, citando as possíveis causas que de- 25) No dia 15/Jul/1998 visei o Sol da PEst. -20º, 40º W, obtendo:
vem ter influenciado no fato descrito.
HMG 1 = 14303 ai 1= 48º 18.0’ ei= 2’
21) Esquematize um triângulo de posição, mostrando seus principais ele- HMG 2 = 145512 ai 2 = 48º 24.0’ PEst. -20.1º, 40.1º
mentos, ângulos e lados.
Estabeleça a diferença entre o ângulo no zênite e: Determinar as coordenadas geográficas do barco, comprovando pelo cru-
zamento das retas de altura.
• azimute verdadeiro
• azimute quadrantal 26) Mostrar que a navegação por um arco de paralelo não é a de menor
distância.
22) Na passagem meridiana, a declinação e a altura são combinadas para
o cálculo da latitude do barco . 27) Explique e exemplifique como um veleiro efetuaria uma travessia em
Explique o processo (HN e HS). rota ortodrômica, executando singraduras loxodrômicas.

23) As correções de altura instrumental, no caso do Sol, são: 28) O processo de determinação da posição pela duração do dia (LOD
-lenght of the day), é interessante porque oferece uma alternativa sem o
• do ei emprego do sextante (navegação de emergência, etc.) . Descreva-o.
• da depressão
• da aap 29) No percurso de Fortaleza para Barbados, a partir de que latitude ini-
ciaremos a poder ver a Polaris?
A correção da aap engloba a da refração, da paralaxe e do SD, dentre
outras. 30) Ao cruzar o Equador, estando o Sol com declinação nula, como você
A da depressão é função da altura do olho do observador determinaria a posição do barco por processo astronômico?
A do ei é própria do instrumento
Exemplifique valores possíveis (práticos), com os respectivos sinais 31) Os processos de determinar a posição por retas de altura (ou retas de
(para o caso do seu barco, por exemplo). posição), são:

24) No dia 15/03/1998, visei o Sol: • de Borda


HMG = 132303 • de Lalande

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

• de Saint-Hilaire CB: cumulunimbus


• Golem
DEC: declinação
O processo Golem, do ângulo de posição (paralático), do professor
Eli Gradsztajn, da Universidade de Tel Aviv, foi elaborado em 1972, a bor- DHN: Diretoria de Hidrografia e Navegação
do do barco Golem daquela Universidade, e publicado na revista Naviga-
tion - Journal of the Institute of Navigation. ei: erro instrumental do sextante
O de Borda é o do meridiano estimado; o de Lalande é o do paralelo
estimado e o de Saint-Hilaire, é o do vertical estimado. Descreva-os. EUA: Estados Unidos da América
Analise as vantagens do método Golem sobre o de Saint-Hilaire,
para uma solução analítica e na precisão. FAVO: Flotilha Alagoana de Veleiros de Oceano

Abreviaturas FF: frente fria

AHL: Angulo Horário Local GPS: Global Positioning System; sistema de navegação por satélites

AHG: Ângulo Horário de Greenwich ICAR: Iate Clube de Angra dos Reis

AMRJ: Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro HS: hemisfério Sul

ANB: Almanaque Náutico Brasileiro - DHN HN: hemisfério Norte

ARV: Ascensão Reta Versa ICES: Iate Clube do Espírito Santo

aap: altura aparente ICI: Iate Clube de Icaraí

ae: altura estimada ICRJ: Iate Clube do Rio de Janeiro

ai: altura instrumental HF: High Frequency, alta freqüência.

ao: altura observada ITCZ: Intertropical Convergence Zone; zona de convergência intertropical

AP: alta-pressão Lat: latitude

BP: baixa-pressão LOD (lenght of the day): processo aproximado de determinar a posição

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

pela duração do dia. Tem a vantagem de não necessitar do sextante; é Z: fuso Z (ou de Greenwich); hora Z = GMT= HMG = hora do fuso Z.
bom para navegação de emergência
Termos
Long: longitude
A
Min: minuto
A barlavento: aweaser, to windward
N: norte A bordo: aboard
S: sul À popa, à ré: abaft
E: este, leste Abatimento: leeway
W: oeste Abita: mooring bitt, bitt
NE: nordeste Aço: steel
SE: sudeste Aço inoxidável: stainless steel
SW: sudoeste Adernar: to heel
NW: noroeste Adriça: halyard
Agüentar um temporal: ride out the storm
QAM: do código Q internacional, em meteorologia: condições do tempo, Agulha (bússola): compass
boletim Alcatroado: tarred
Alheta: quarter, buttocks
P: fuso horário P, do Rio de Janeiro Altura do bordo livre: freeboard
Aluamento: sag
PMd: passagem meridiana Amanhecer: dawn
Amantilho: topping lift
RDF: (radio direction finder); o mesmo que radiogoniômetro: gônio. Amarrar: lashing
Amarras: chain, cables
SC: semicírculo Amuras a bombordo: port tack
Amuras a boreste: starboard tack
SD: semi-diâmetro Âncora: anchor
Ancorote: kedge
Seg: segundo Antena: aerial
Antepara: bulkhead
Vmg: (Velocity Made Good) é a componente da velocidade do barco dire- Apoio do eixo do leme no skeg: gudgeon
tamente na linha do vento real. Cada perna tem a sua Vmg; a maior delas, Aproado ao vento: head to wind
portanto, levará o barco em primeiro lugar na chegada diretamente a so- Aquartelado: aback
tavento. Arame: wire

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

Área de atuação do vento: fetch Barlavento: windward, weatherboard


Arinque: tripping line Baú: locker
Armação: rig Beliche: berth
Armar: to fit out Beliche de quarto: quarter berth
Armário: locker Bichas: sail tiers, gaskets
Arraste: drag Bicuda: guachanche barracuda
Arrebentação: breakers Biruta: lanyard, tell tale, vane
Arriar a bandeira nacional (para cumprimentar): dip the ensign Bitácula: binacle
Arribar: bears off Boca: beam
Árvore seca: lie to, leave to Bóia de arinque: anchor buoy
Atracado: moored Bolina: centreboard
Atualização: upgrade Bomba de esgoto do porão: bilge pump
Aurora: dawn Bombordo: port
Borda falsa: bulwark
Bordejar: to tack, to beat
B Boreste: starboard
Brigue: brig
Bainha: seam Brisa: breeze
Baixar a vela: lower the sail, hand the sail Bronze: bronze
Baixio: shoal Bujarrona : jib
Balão: spinnaker Burro: vang, kicking strap
Balanço longitudinal: to pitch Bússola: compass
Balanço transversal: to roll Buzina (sereia): horn
Balaustrada (guarda-mancebo): guardrail Buzina de nevoeiro: foghorn
Bandeira: flag Buzina (passador de cabo): chock
Bandeira a meio-pau: half mast
Bandeira nacional: ensign
Barca: barque
Barco com muita estabilidade: stiff boat C
Barco com pouca estabilidade: tender boat
Barco bom de orça: to point well Cabo de aço: wire rope
Barco de cruzeiro: cruiser Cabo para rebocar o caíque: painter
Barco de regata: racer Cabo pre-estirado: stretched rope
Barco para passeios curtos: daysailer Cabrestante: capstan, windlass
Barco a motor e à vela: motor sailer Caçar a vela: to sheet a sail

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

Caçar demais a escota, ficando a valuma reta: fall-off made good)


Caíque: dinghy Comprimento fora a fora: lenght overall (LOA)
Calado: draft, draught Comprimento na linha dágua: waterline lenght (LWL)
Calafetar: to caulk Consertar: mend
Calmarias equatoriais: doldrums Construtor: builder
Cambar por davante: to tack, to go about Contra-porca: locknut
Cambar em roda: to gybe Convés: deck
Camber ( relação entre a corda e a flecha de uma seção da vela): camber Cordame: rope
Cana de leme: tiller Corrediça: slide
Canto vivo: chine, multichine Corrente (amarra): chain
Capear: heave to, broaching to Corrente (correnteza): stream
Capota: doghouse Corrente enchendo: flood stream
Caranha: gray snapper Corrente vazando: ebb stream
Carga de rutura: breraking strain Corrente nula(parada): slack water
Carlinga e pé do mastro: step and heel Corrimão: grab rail
Caruncho: rot Corvina: whitemouth croaker
Casco: hull Costura: sewing, stitch, splicing
Castelo de proa: focsle Costura em concha (para obter o formato das velas): broadseaming
Catraca: winch Costura de cabos: splicing
Cavado: draft Cozinha: galley
Cavala: wahoo Croque: boathook
Cavalinha: club mackerel Cunho: cleat
Cavernas: rib Cunho muito forte na proa do barco: samson post
Cavilha: bolt Curvatura da aresta da vela: roach
Cedro: cedar Cuter: cutter
Cherne: snowy grouper Cuter de carangueja: gaff cutter
Chumbo: lead
Cinto de segurança: safety harness
Coberto de nuvens: overcast, cloudy D
Cobre: copper
Coca: kink Debrum: hem
Comandante do barco: skipper Declinação magnética: variation
Compasso: dividers Defensa: fender
Compensado: plywood Deriva: leeway
Componente da velocidade do barco na direção do vento: Vmg (velocity Desconto (correção) para a corrente: allowance

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

Desencalhar (lançar nágua): to launch Estai: stay


Desgaste da vela: chafe Estai de tope: topmast stay
Deslocamento: displacement Estai intermediário de proa: baby-stai
Desmontar: step Estaleiro: shipyard
Desvio da agulha: deviation Estanho: tin
De vento em popa: dead run Estanque: watertight
Divisória: bulkhead Esteira (da vela): foot
Do mestre: bosuns Esteira (do barco): wake
Dourado: commom dolphinfish Esticador (macaco): turnbuckle
Estofo da maré: stand tide
E Estol: stall

Em árvore seca: lying-a-hull F


Embarcado: afloat
Em direção à popa: astern Farol: lighthouse
Empuxo: lift Falcassa: whip
Encalhar (por à seco): haul out Fathom; six foot
Encalhado: aground, ashore, beneaped Ferro: iron
Encolher: shrink Ferro (âncora): anchor
Enjoado: seasick Ferro fundido: cast iron
Enora do mastro: mast partners Ferro entocado (preso): fouled
Enrolador de genoa: roller reef Ferro a garrar: dragging anchor
Erro de rota: crosstrack error Ferro unhado: holding anchor
Escada: ladder Fibra de vidro: fiberglass
Escaler: dinghy Final da quilha, á ré: skeg
Escoador: scuper Flâmula: pennant
Escota: sheet Flutuante: afloat
Escota/elástico/leme: sheet-to-tiller Fogão: stove
Escotilha: hatch Folgar a vela: to ease out
Escuna: schooner Formato: shape
Esgotar: to bail out Forqueta: rowlock
Eslupe: sloop Fundear: to anchor
Espia: warp Fundo (porão): bilge
Espicha (para costurar): marline spike Furacão: hurricane
Espuma: foam Fuzis: chainplates

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

G K

Gaiúta de entrada para a cabine: companionway kg: kilogram


Galhardete: burgee km: kilometer
Galope (topo do mastro): truck kHz: kilohertz
Garlindéu: gooseneck
Garoupa: dusky grouper L
Garruncho: hank, grommets, snap
Grimpa: vane, lanyard, tell tale Lais de guia: bowline
Guia para embainhar: fid Lastro: ballast
Guinar: to yaw Latão: brass
Guincho: windlass, capstan Lavatório: wash basin
Gurupés: bowsprit Leme: ruder, helm
Leme com tendência a orçar: weather helm
H Leme com tendência a arribar: lee helm
Leme-de-vento: wind vane
Hélice: popeller, screw Levantar ferro: to weigh anchor
Homem ao mar: man overboard (MOB) Liga: alloy
Homem que não tem barco: landlubber Liga de cobre e zinco (ou cobre e estanho): gunmetal
Hora estimada de chegada: estimated time of arrival Linha de costura: thread
Linha da quilha (espinha dorsal do barco): backbone
I Linha de pesca: cod line
Livro diário de bordo: log-book
Içar a vela: hoist the sail
Ilhós: eyelet, eye, thimble, grommet M
Imediato: mate
Inclinação do mastro: mast rake Madeira: timber, wood
Inspetor: surveyor Madeira compensado: plywood
Madeira podre ou com caruncho: dry rot
J Madeira seca: seasoned timber
Malagueta: belayng pin
Jangada: raft Manilha: shackle
Jusante: low tide, low water; a jusante: downstream Manilha de mola: snap shackle
Manutenção: maintenance
Mareações: points of sailing

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

Maré: tide No topo do mastro: aloft


Maré desfavorável: foul tide No través: forereaching
Maré favorável: fair tide Nuvem: cloud
Maré de sizígia: spring tide
Marimbá: silver porgy O
Mastreação: spars
Mastro de fortuna: jury rig Oak: carvalho
Mastreação: rig Obras mortas: topsides
Mezena: mizzen Obras vivas (fundo): bottom
Miolo, núcleo, alma: core, heart Odômetro: log
Mofo: mildew Olhal: eye, cringle
Mogno: mahogany Olhete: lesser amberjack
Moitão: block Onda: wave
Mola: spring Onda quebrando sobre a popa: pooped
Montante: high tide, rising tide; a montante: upstream Orçando: beating
Montar: to fit out Orça cochada: close hauled
Montar : unstep Orça folgada: full and by
Mosquetão de vela: snap Orçar ferrado: to point higher, pinch or squeeze mode
Motor: engine, motor Orçar: to beat, close hauled, on the wind, full and by
Motor à gasolina: petrol engine Orçar bem: to point well
Motor auxiliar: auxiliary engine Ovem: shroud
Mudar de amura (bordejando), por davante: to tack
Mudar de amura (em roda): to gybe P
Muito adernado: hove down
Paiol: locker
N Paiol de amarras: chain locker
Para frente: forward
Nas rajadas, quando aumenta a adernada: broaching Para trás: aft
Navegação estimada: dead reckoning Parafuso: screw
Navio de guerra: man-owar Parafuso sem-fim: worm gear
No contravento: close-hauled Paratí: white mullet
Nó: knot, hitche Passo da hélice: pitch
Nó de guia: bowline Patrão: skipper
Nó direito: reef knot Pau de bandeira (mastro): flagstaff
Nó volta do fiel: clove hitch Pau de galhardete: burgee stick

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

Pau de pica peixe: dolphin striker R


Pau de spinnaker: spinnaker boom
Pé direito: headroom Rajada: gust, blow
Peixe espada: largenhead hairtail Ranhura: slot
Pelo través: abeam Raspadeira: scraper
Perigo: danger Raspar o fundo: scrub the bottom
Perna (do trajeto): leg Rebentação: breacker
Piloto automático: auto-helm, tiller pilot Rebite: rivet
Pinho: pine Rebite: rivet
Poço: cockpit Rebocador: tugboat
Poita: a stone used instead an anchor Rebocar: to tow
Polegada: inch Recife: reef, cay
Ponto do caminho: waypoint Remar: to row
Popa: stern Remendo: patch
Porão: bilge Remo: oar, scull, sweep
Porca: nut Retranca: boom
Prancha de popa: transom Retranca da buja: jib vang
Pregas: creases Revisar o barco à seco: overhaul
Prego: nail Rizar: reefing
Presilhas: fastenings Rizar enrolando na retranca (sistema): roller reefing
Proa: bow Rizes: reef points
Projetista: designer Rebite de expansão: pop rivet
Prumo: lead, sounding line Rizes: reef point
Púlpito: pulpit Roda de leme: wheel
Punho da amura de uma vela: tack Roda de proa: stem
Punho da escota: clew Roldana: sheave
Punho da pena: head Rolha: dowel
Rondada do vento no sentido dos ponteiros: wind veer
Q Rondada do vento no sentido contrário: back wind
Rosa dos ventos: pelorus
Queche: ketch Rumo: course, rhumb
Querosene: paraffin Rumo em relação ao fundo: course made good
Quilha em forma de barbatana: fin keel Rumo entre dois waypoints: track
Quilha lastrada: ballast keel

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

S Transversalmente no barco: athwarship


Traquete: main staysail
Saco de vela: sailbag Traveller (ou urraca): traveller
Sapatilha: thimble Través aberto: broad reach
Sobrevivente: survivor Trim: angulo de ataque
Socorro: rescue Tripulação: crew
Soldar: weld Turcos: davits
Sonda de mão: lead
Sotavento: leeward U
Sulco: groove
Suspen Urca: hooker
Sapatilh são cardan: gimbals
V
T
Vaga (do mar): swell, wave
Tabuado liso: carvel Valuma: leech
Tabuado trincado: clinker Vara de sondagem: sounding pole
Tainha: lebranche mullet Vaso sanitário: head
Talas: batten Vela: sail
Teca: teack Vela grande: mainsail
Tempo estimado para completar a perna: estimated time enroute Velejando a um largo: reaching, beam reaching
Terra à barlavento: windward shore Velejando de vento em popa: running
Terra à sotavento: leeshore Velejando em popa arrasada: dead before the wind
Tesador da esteira da grande: outhaul Velejando em popa com pouca vela: scudding
Tesador da testa: downhaul Velejando na orça: beating
Testa: luff Velejando na orça, bolina cochada: close hauled
Tinta anti-encrustante: antifouling Velejando no través: beam reach
Toldo: shade, awning Velejando no través, bolina folgada: close reach
Topo do mastro: truck Velejando no través aberto: broad reach
Torção: twist Velejando no través cravado: reaching wind abeam
Tornel: swivel Velocidade útil de avanço: speed of advance
Tosado: sheer Vento: wind
Tralha: boltrope Vento moderado: fresh breeze
Trançado: braided Vento fresco: strong wind
Transferidor: protractor Vento forte: near gale

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Licio Maciel Roteiro Costa Leste

Vento muito forte: gale Remeter enderço completo, com CEP.


Vento duro: strong gale
Vento muito duro: storm FOTO da CAPA: saindo do abrigo de Arraial do Cabo pelo Boqueirão.
Vento tempestuoso: violent storm
Vento pela alheta: wind on the quarter AGRADECIMENTOS:
Vento pelo través: wind abeam Aos comandantes:
Vigia: porthole, portlight José Fernando de Maya Pedrosa (“Mestre Rosalino”, Brasília 32)
Virar (capotar): capsize José Stênio Nobre Maia (“Avoante”, Velamar 33)
Virar (cambar): to tack Sérgio Vahia (“Suiá”, veleiro de 33 pés)
Virar em roda(cambar em roda): gybing Múcio Porangaba (“Popeye II”, trimaran de 33´, Jim Brown)
Virar por davante (cambar por davante): to tack, to go about - que gentilmente autorizaram a inclusão das fotografias de seus
Visada: bearing veleiros, nos quais realizamos inúmeros percursos pelo nosso fantás-
tico litoral, com segurança, precisão e tranqüilidade.
W

W.C.: head, toilet

Xaréu: crevalle jack


Xerelete: blue runner

Zinco: zinc

Zênite: zenith
Na baía de Guanabara

Internet

Pedidos diretamente ao Autor, via Internet:


liciomaciel@terra..com.br

Preço do CD-ROM: R$50,00


Remessa via postal (despesas de embalagem e postagem já incluídas).

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ANEXO I 2. Manoel Olímpio de Meira (Jacaré)


3. Raimundo Correia Lima (Tatá)
JANGADEIROS 4. Manoel Pereira da Silva (Mné Preto)

Os jangadeiros realizaram uma serie de viagens ao Sul do país, prin- Chegaram ao Rio de Janeiro após 61 dias de viagem, no dia 15 de Novem-
cipalmente para protestar contra o esquecimento da profissão pelas auto- bro e são recebidos pelo Presidente Getúlio Vargas, a quem expõem as
ridades responsáveis. Os pescadores artesenais do nordeste não tinham condições de abandono da profissão de jangadeiros-pescadores.
sido incluídos nas leis trabalhistas criadas pelo Presidente Getúlio Vargas. Orson Welles produziu um filme da história dessa viagem. Durante as fil-
O jangadeiro chegava à velhice, depois de uma vida dedicada à pesca, e magens, o jangadeiro Jacaré morreu no mar da Avenida Niemeyer, ao lado
não tinha direito à aposentadoria, enquanto qualquer outra atividade por da Gruta da Imprensa. Seu corpo nunca foi achado.
mais irrelevante, oferecia um pequeno salário para a sobrevivência. Em 14 de outubro de 1951, Mestre Jerônimo parte de Fortaleza, CE, nova-
Em 1922: duas jangadas zarpam de Fortaleza, CE, para o Rio de Ja- mente numa jangada para Porto Alegre, RS, com:
neiro, para desfilar no 7 de Setembro, com os seguintes jangadeiros:
1. Tatá
1. Mestre J. Bernardino de Paula 2. João Batista
2. Francisco Pereira da Silva 3. Manoel Frade
3. Francisco Silva da Costa
4. Manoel F. de Andrade Chegam a Porto Alegre em 18/fev/52..
5. Francisco C. da Costa
6. Possidônio F. Barbosa Em 15/nov/1958 é iniciada a mais longo percurso de jangada, de
7. Luis R. da Costa Fortaleza, CE, a Buenos Aires, Argentina, realizada em 200 dias.
8. Antonio F. Barbosa Apenas a balsa Kon-Tiki de Thor Heyedahl, em 1947, perfez o tra-
jeto de Callao, Peru, ao Tahiti, Polinésia, em 101 dias, 7 mil quilômetros,
Em 1928, em agosto, uma jangada zarpa de Fortaleza, CE, para o Rio distância um pouco maior do que a realizada pelos jangadeiros, de Forta-
de Janeiro, com o mesmo objetivo de desfilar na parada de 7 de Setembro, leza a Buenos Aires. Mas a Kon-Tiki era uma grande balsa, não podendo
tripulada por: ser comparada à jangada nordestina. Tinha fogão, cama, coberta, muito
bem equipada e provisionada, um verdadeiro passeio. E era monitorada à
1. Mestre Bernardino Fernando do Nascimento distância por um navio especialmente fretado para isso. Muito diferente,
2. José Isidoro dos Santos portanto.
Enquanto noruegueses da Kon-Tiki eram condecorados pelo gover-
Em 1941, parte de Fortaleza, CE, para o Rio de Janeiro, com 4 janga- no norueguês e premiados pela comunidade científica internacional, os
deiros, para chamar a atenção do governo para o abandono da profissão humildes jangadeiros brasileiros foram esquecidos vergonhasamente no
de jangadeiro: Brasil varonil.
Mestre Jerônimo desapareceu no mar.
1. Mestre Jerônimo André de Souza Em 8 de dezembro de 1967 parte uma jangada de Fortaleza, CE,

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com destino a Santos, SP. Mestre Garoupa, Zé Lima, João Rodrigues da Imagens
Costa, Manoel Bezerra de Lima, Manoel Antonio de Lima. Chegam a San-
tos em 21 de fevereiro do ano seguinte. Foram 71 dias de velejada.
Em 24 de dezembro de 1968 parte uma jangada de Maceió, AL, com
destino ao Rio de Janeiro. Mestre João Batista Leitão, Nino, Helio Mar-
colino e o estudante alagoano Pedro Ernesto, que patrocinou a viagem.
Foram 21 dias de velejada, com paradas em Salvador e Vitória, ES.
Em julho de 1972, mais uma jangada zarpa do Ceará para Ilabe-
la, SP. Ao chegarem no Rio de Janeiro, os jangadeiros foram levados com
jangada e tudo, sobre carreta, até Brasília, onde são recebidos pelo Pre-
sidente Médice. Esta foi a única que resultou em benefícios reais para os
pescadores: foram incluídos no sistema de aposentadoria. Retornaram ao
Rio de Janeiro e continuaram o percurso pelo mar até Ilhabela, como pla-
nejado.
Em abril de 1993 zarpa uma jangada de Fortaleza com destino ao
Rio de Janeiro: Mestre Mamede Dantas Lima, Francisco Abílio, Francisco
Valente e Edílson.
Hoje, pouco existe da profissão no Nordeste. As jangadas já são
construídas de tábuas e o maior objetivo é o turismo. Mas o exemplo ficou
na memória do povo da região. Lagoa Azul, Ilha Grande, RJ

Mestre Rosalino, pescador Beto

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Com a família, em Angra dos Reis

O Avante nas águas cristalinas de Noronha

Saída do porto da Aracruz Celulose (Barra do Riacho), rumo ao largo, para os


Abrolhos
No mestre Rosalino, na Urca (Gb)

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Velejando com o amigo Newton Carvalho, o “Paiol“: dois jovens de 70 anos em


plena forma (2001) Manutenção periódica na Marina da Glória. O ajudante é o meu filho mais moço,
Fred.

Descansando nos Abrolhos O Krum II nos Abrolhos

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Construção do Krum II, colocação do Airex sobre a “gaiola“ (1981)


Modelo Reduzido do Krum II (1975)

Laminação do cockpit, convés e teto da cabine (1981)

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Manutenção no ICAR (Iate Clube de Angra dos Reis)


Terminando a pintura (Bianca Fiberglass, SP-1980)

Mestre Rosalino no rumo de Noronha, na segunda forra


Lançamento n´água (Setembro/1982)

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Suiá, do Capitão Sérgio Vahia

No ICES (Iate Clube do Espírito Santo) Abrigo do Forno, em Arraial do Cabo

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Em Noronha Abrigo do Gunga – AL

Atol das Rocas – tripulação do Mestre Rosalino plantando coqueiros, para me-
lhorar a identificação à distância Da esquerda para a direita: skippers do Scheats, Suiá e Krum II, no abrigo do
Forno

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Em Macaré

Na baía de Guanabara

Terminando o casco (Bianca Fiberglass-SP/1982)

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