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Heráclito de Éfeso

Heráclito foi um pensador pré-socrático que viveu VI-V a.C. faz parte da primeira geração de
pensadores, aqueles que vão romper com o conceito de mito e vão buscar uma explicação racional para as
coisas que nos cercam, para a natureza, para o mundo, até então essas explicações eram dadas pelas
narrativas míticas, que tinham por características serem narrativas baseadas no sobrenatural, na imaginação,
na fabulação. A partir de Tales de Mileto, inicia-se outro movimento de tentativa de explicação do mundo,
porém, a partir da própria realidade que percebemos pela inteligência, pela racionalidade.
Heráclito se situa nesse cenário, seu pensamento dialoga com o pensamento de Parmênides, frente a
frente. Os dois pensamentos entram em embate, boa parte das temática propostas por Heráclito irão as de
Parmênides, porém, nem todas. Em primeira análise, partindo da ideia da imobilidade: para Parmênides, o ser
(aquilo que é verdadeiro) é imóvel, a verdade (aquilo que é) é algo imóvel e imutável; para Heráclito, o imóvel (o
xo) é uma ilusão.
Enquanto Parmênides defendia a ideia da verdade do ser como a imobilidade, Heráclito , nesse sentido,
se contrapõe totalmente, pois o imóvel ou o xo são ilusões. Para Heráclito tudo é guerra (combate), tudo
envolve opostos. Ele utiliza uma linguagem (analisada na Doxogra a) difícil, por isso ganhou o apelido de “O
obscuro”, ele escrevia deliberadamente, de maneira camu ada. Pior, poucos fragmentos da sua obra original
foram achados, tornando a compreensão mais complicada. Assim, há uma grande quantidade de interpretes
dele: Doxo/Doxa (opinião) e Doxogra a (conjunto de opiniões sobre esse pensamento).
Com destaque, fundamentalmente, há necessidade de conhecer os conceitos mais comuns em que há
um consenso dessa Doxogra a. Um deles é o conceito de que todo o que há, tudo que há; a visão é sempre
universal (matéria) do todo como con ito (os opostos), constantemente em um combate. Ao contrário de
Parmênides as coisas não são imóveis, as coisas estão sempre em guerra. A palavra grega para isso é
“pólemos” de onde vem, na língua portuguesa, a palavra “polêmica”: bom debate, bom con ito. Opostos
caracterizavam toda a existência. Dirá Heráclito: se tudo é combate, se tudo é tensão, isso quer dizer que não é
possível admitir a ideia da imobilidade ou xidez, para ele, tudo está em um processo constante e interminável
de movimento.
Uma expressão grega importante é “Panta Rei”: tudo ui, tudo é movimento. É dessa ideia que surge a
mais famosa de Heráclito: a do rio e do banhista “ninguém pode se banhar duas vezes nas águas d mesmo rio,
porque, se tudo ui, quando vou me banhar pela segunda vez, o rio não é mais o mesmo rio e o banhista não é
mais o mesmo banhista. Tudo ui, é um processo de constante movimento. No senso comum, até hoje,
acreditamos que acreditamos algo quando podemos dizer tudo sobre aquele algo, um grande conhecedor é
alguém que sabe falar tudo sobre algo, mas, ora, se tudo se transforma, nunca poderemos falar tudo sobre algo,
porque na hora que continuemos a falar, tudo o que falamos no começo já se transformou. A própria ideia de
conhecimento exige que se mobilize o objeto do conhecimento para conhecê-lo, isso contraria essa a rmação
de Heráciito de que tudo ui e, por isso, ele era chamado de “O obscuro”, não só porque escrevia difícil, mas
também porque defendia uma ideia uma ideia complexa.
Um dos seus comentadores mais famosos foi Hegel (século XIX) que vai recuperar essa ideia de que
tudo ui, essa ideia de guerra, a guerra de opostos, para desenvolver sua própria loso a. Hegel deve suas
ideias a Heráclito e vai buscar no passado grego distante esses princípios do pensamento de Heráclito para
colaborar, contribuindo para o desenvolvimento da própria loso a hegeliana. Então, Hegel diz que Heráclito foi
o pai da Dialética, palavra que surge com Platão, mas que vai ser recuperada por Hegel. Ele atribui à Dialética o
signi cado de combate, de guerra, de oposição, de tensão, conceitos do próprio Heráclito. Aqui há uma
metáfora importante para essa ideia de Dialética: a ideia do Arco (arma com uma corda) e da Lira (instrumento

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de cordas). Modernamente, pode-se intuir a ideia ao violino: o atrito do instrumento faz um choque de opostos,
entre o arco e a corda, que você tem um som.
Hegel, recuperando o pensamento de Heráclito, vai associar essa ideia de opostos à produção de
harmonia, como ideia. Apesar de aparentemente ilógico, da guerra, do combate, do con ito, dos opostos, da
tensão, surge a harmonia, a qual só pode ser captada ou percebida pelo Logos (razão), a inteligência, o
pensamento.
Para Heráclito, o logos que é capaz de perceber a harmonia desse uxo constante. Tudo é um, o
múltiplo é um e o um é múltiplo. Quando estamos cercados de coisas na realidade, tudo está em transformação,
inclusive nós mesmos. Se fosse possível elevar o olhar até o universo, veríamos que desse processo de uxos
e transformações há toda uma unidade. Então, Heráclito a rma que nossa percepção não é capaz de dar-nos o
conhecimento adequado das coisas, por isso camos apenas na percepção da mudança, mas essa mudança,
esse choque de contrários esse combate, esse atrito, tudo compõe uma unidade. A unidade que se dá na
natureza (physis) é percebida pelo logos, ele capta a unidade. O que quer dizer que a percepção dos nossos
sentidos não é su ciente para captar essa unidade, mas o logos sim.
Todos esses primeiros pensadores chamados de pré-socráticos têm seus pensamentos associados à
ideia de buscar um princípio originário de todas as coisas. A exemplo, Tales de Mileto a rmou que esse princípio
originário era a água; Anaxímenes de Mileto, entretanto, a rmou que esse princípio originário era o ar; mais
tarde, Empédocles de Agrigento diz que o princípio originário de todas as coisas são 4 princípios: Terra, Ar, Fogo
e Água. Heráclito, por ser pensador dessa geração, vai também vai fazer uma a rmação a respeito do que os
gregos chamavam de “arkhé” que era o princípio, o fundamento. Para ele, a imagem ( gura) que traduz esse
princípio é o fogo, o fogo é um símbolo desse princípio que é, ao mesmo tempo, criador e transformador de
todas as coisas. Então ele vai usar a metáfora do fogo para ilustrar essa sua ideia de que tudo é movimento, de
que o movimento é sempre combate; tensão; con ito e que apenas o logos (razão, inteligência ou pensamento)
é capaz de capturar a unidade lógica de tudo que existe.
Heráclito era extremamente avante de seu tempo, é difícil imaginar que na época as pessoas
compreendiam de maneira simples, o que hoje é difícil. Porém, quando pensamos na ciência atual percebemos
que ele teve intuições muito avançadas para sua época.
Nietzsche se apropria do pensamento de Heráclito, este fala em guerra, aquele fala em forças
dionisíacas. Para Nietzsche, o seres não é movido apenas pela razão, o ser humano é movido também por
essas paixões, e elas, as forças dionisíacas, e as forças que Nietzsche chamava de apolíneas, ou seja, a razão
e paixão, estavam em constante combate, a tensão permanente. Logo, não havia como depois os cristãos e,
segundo Nietzsche, o próprio Platão, separarem a razão da emoção, buscando isolar a razão da emoção.
Nietzsche a rmava que os seres humanos estavam em constante tensão, con ito, buscando, desse modo, na
ideia de forças dionisíacas, a ideia de “pólemos”, o con ito, do pensamento de Heráclito. A própria noção de
fogo como um processo de transformação contínua de todas as coisas, associa-se ao pensamento de
Nietzsche com o conceito de eterno retorno, ele vai falar sobre essa ideia de que nós também vivemos em um
processo cíclico eternamente (in nitamente). Essa ideia de um eterno retorno: nós, em algum momento,
passaríamos novamente por essa mesma vida, depois passaria de novo, que é o lugar em que Nietzsche tira um
fundamento ético na forma de uma pergunta (“imagine que você vivesse exatamente a sua própria vida, tudo de
novo, do mesmo jeito, então, se isso acontecesse, você iria querer viver essa vida novamente?, caso a resposta
for não, faça alguma coisa melhor com sua vida”).
Essa noção de eterno retorno é buscada como inspiração no pensamento de Heráclito, como conceito.
Nietzsche e Hegel são pensadores da contemporaneidade que buscaram inspiração nos conceitos
heraclitianos. Embora que para ajeitar e encaixar, de maneira diferente, nos seus respectivos pensamentos, em






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suas próprias loso as. A loso a de Hegel tem uma proposição nalística, ou seja, para ele, essa Dialética
nos levará até o momento em que ela é superada, já em Nietzsche, não há esse nalismo. Para ele, nós, a todo
tempo, estamos nesse uxo, mas não vamos a lugar nenhum, não há um lugar nal para todas as coisas. Pelo
contrário, em Nietzsche há a ideia de ciclo, o eterno retorno.

Platão, o pensamento clássico


Pensador do século IV a.C., mais de um século depois de Heráclito, estamos no momento no declínio da
democracia ateniense após a Guerra do Peloponeso; morte de Sócrates — precursor desta virada da loso a:
da preocupada em entender a natureza das coisas, portanto, entender a cosmos (cosmos em grego quer dizer
“ordem”), a ordem da “physis” (natureza), uma virada antropológica, ou seja, a loso a acaba se deslocando
para outra preocupação, sobre o homem e sua capacidade de conhecimento, então, a busca por uma verdade,
uma relação na qual o homem seja capaz de conhecer efetivamente as coisas que o cercam. Essa passagem
da loso a, de uma cosmologia para uma antropologia, é muito importante.

Hípias Maior
Diálogo da juventude de Platão, ele não desenvolve plenamente suas ideias, isso acontece porque ele
estava em um processo de amadurecimento delas. O tema da obra é a Estética (campo da loso a que estuda
o gosto, estuda nossas relações com as coisas, na maneira que elas nos agradam e sensibilizam-nos). O texto
trata do conceito de belo, é um diálogo realizado de um lado por Sócrates, de outro um famoso so sta, Hípias.
So stas eram pessoas com muita erudição, com muitas técnicas de retórica, que, no ambiente da democracia
grega, ganharam muito dinheiro e fama treinando as pessoas para o exercício do debate público. So sta vem
de “sofos”, que quer dizer “sábio”, eram pessoas que tinham conhecimento e desenvolveram técnicas,
vendendo-as aos cidadãos que quisessem educar seus lhos ou a si próprio, para o exercício da democracia.
Nesse diálogo, Hípias se encontra com Sócrates, sendo que aquele era muito senhor de si, um homem
vaidoso e que se gaba, a todo tempo, das suas habilidades. Então, Sócrates lhe apresenta uma questão,
dizendo que um amigo tinha lhe feito uma pergunta e ele desejava a resposta (Sócrates sempre a rmando que
não sabe nada), e, visto que Hípias sabia de tudo, perguntaria-lhe o questionamento. A pergunta é a respeito do
que é o “belo, como substantivo (conceito), algo que pode ser aplicado de maneira atemporal e universal. Hípias
retruca dizendo que ele queria saber o que é belo, porém, Sócrates insiste dizendo que quer saber o que é o
“belo”. Requisitando saber o que signi ca essa réplica do Hípias. O so sta entende o belo como adjetivo, não
como conceito, mas como contingente (particular).
É aqui que se estabelece o tema do diálogo; o confronto, em que, de um lado, Sócrates busca um
conceito atemporal e universal do belo e, de outro, Hípias replica propondo uma explicação contingente, ou seja,
aquilo que não é essencial, necessário, que pode existir ou não, uma explicação particular do belo, como
adjetivo, não como substantivo. Dessarte, esse é o grande debate.
Do lado de Hípias, há o belo como vivência, uma experiência, ou seja, a ideia de belo como um
conhecimento. Isso vai em con ito com o que Sócrates requisitara. Em razão disso, o diálogo se estende por
muitas e muitas páginas, é um diálogo aporético. A aporia é um diálogo que não chega a lugar algum (beco
sem saída), cada parte pressupõe um propósito, e uma não cede a outra, o diálogo não avança ou evolui. A
ideia de aporia, que contempla o diálogo em que cada parte não cede aos argumentos da outra, esse debate
não tem m.





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Elementos do diálogo: Hípias dava uma resposta à pergunta de Socrátes, este buscava desconstruir
aquele argumento mostrando que não podia ser um conceito universal e atemporal, pois não se aplicava a todos
os casos. A ponto de Hípias dar outra ideia de belo e Sócrates, novamente, contrapunha. Esse movimento, que
é o próprio diálogo, torna-o exasperante, visto que, em um momento, Hípias desiste, e o próprio Sócrates
reconhece que, nessa questão conceitual, de nir o “belo” era difícil. Nesse ponto, o diálogo encerra sem que um
dos lados tenham conseguido chegar a um termo.
3 exemplos de como Hípias vai propondo ideias de belo: inicia falando do belo como uma jovem moça,
uma mulher bela, conceito que Hípias crê ser pací co (levando em conta todo o contexto da sociedade
ateniense, marcada por uma visão masculina). Essa ideia de belo como uma mulher bela é pautada no
pressuposto que todos a conseguem identi car (dentro desse padrão histórico). Socrátes, então, refuta
destacando o caráter particular e contingente da ideia, portanto inapropriado ao que ele buscava: o conceito.
Assim, Hípias busca outro exemplo dizendo que belo é uma coisa rara, tal como o ouro, portanto muito
desejado e procurado, é belo. Algo que Sócrates vai retrucar com uma ideia de útil (ele também participa do
diálogo colocando um elemento para caracterizar o belo), a passagem menciona uma situação em que, caso
você cozinhe, questiona-se sobre o que é melhor: usar uma colher de madeira ou de ouro, desse modo, Hípias
é obrigado a concordar que uma colher de madeira era mais adequada, mais útil que uma colher de ouro.
É um diálogo muito rico, em que se contrapõe o belo como aquilo que particularmente consideram, com
o belo como um conceito capaz de servir para todas as coisas. Por m, já sem paciência, Hípias junta uma série
de características particulares para constituir uma ideia geral do belo. Aqui repousa outra diferença importante:
uma ideia geral não é su ciente para de nir um conceito, cabe-se ressaltar a diferença entre aquilo que é uma
ideia geral (soma de situações particulares, geralmente aceitas, mas não é o universal) e o que é uma ideia
universal (aquilo que cabe, sem exceções, a todos os casos).
Hípias vai dizer que belo é uma vida bela, então, se eu trabalho naquilo que eu gosto; relaciono-me com
pessoas que gosto; vivo confortavelmente; crio os meus lhos para terem uma vida digna, se ao m da vida eu
enterro meus pais e meus lhos me enterram, ou seja, tudo seguindo uma cronologia, logo, só se pode chegar a
conclusão que essa vida é feliz, é uma vida bela, a soma dessas particularidades. Ao que Sócrates também irá
retrucar a despeito de ser algo que pode se dizer desejado por muitos, ainda sim, não pode ser considerado um
conceito que se aplique em qualquer lugar e em qualquer tempo.
Finaliza-se, dessa maneira, o diálogo, sendo que o próprio Sócrates reconhece como é difícil tratar
dessa questão. Assim, o diálogo termina sem uma conclusão, é um diálogo em que se faz um exercício
conceitual, ou seja, mostrar os limites do conceito, suas contradições, um exercício losó co, sem mitologia. O
texto demonstra como exercitar a nossa capacidade de pensar e argumentar em torno de um tema qualquer.
Um destaque: as obras de Platão (cerca de 30 diálogos e algumas cartas) têm como característica em
comum recorrer a metáforas, alegorias, explorando, inclusive, a mitologia, a m de didatizar o que o autor quer
dizer. A exemplo, na obra “A República”, está uma de suas alegoria mais conhecidas: o Mito da Caverna. No
entanto, em “Hípias Maior”, ele não faz nenhuma referência mitológica, não utilizando essa técnica. Tornando,
desse modo, a obra enxuta, que se fundamenta, todo tempo, no debate, no exercício conceitual em torno do
“belo”.

Capítulo X - A República
A obra faz parte da maturidade de Platão, sendo que o excerto se concentra na crítica que Platão
formula aos artistas, discussão presente em toda essa parte. Crítica ao artista em torno da palavra “mimese”,
que vem do grego “mimeses”, ou seja, copiar ou imitar. Os artistas são imitadores, fazem apenas cópias de um







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fenômeno e, evidentemente, essa imitação não pode ser confundida com um conhecimento da realidade.
Aquele que olha a obra de um artista e pensa estar aprendendo algo de verdadeiro, na verdade está se iludindo,
enganando-se. Platão, novamente pela boca de Sócrates —seu personagem favorito —, faz uma denúncia: os
artistas, exatamente por induzirem, particularmente os jovens, a entenderem que suas obras re etem o real, os
artistas estariam iludindo-os, distorcendo a formação desses jovens. Uma acusação grave. A obra se encaixa
em um momento da história de Atenas em que Platão, que tinha criado uma escola, na qual buscava métodos
de aprendizados, fundamentados na escrita e na razão. O artista: o pintor e o poeta, com formas de expressão
não escritas, visto que os poetas, nessa época, cantavam seus versos, eram chamados de aedos, utilizam da
memorização e da repetição, muito apreciados, ainda hoje (repentistas, herdeiros longínquos desses poetas
gregos). Desse modo, Platão se rebela contra isso, uma vez que se entendia que a educação de um jovem
deveria passar pela poesia escrita, parte importante da formação. Fazendo, assim, uma crítica: os artistas, na
verdade, produzem uma versão de terceira de ordem da realidade, ou seja, a cópia da cópia da cópia. Para
Platão, a verdade repousava no Mundo das Ideias, sendo assim, quando reconhecemos uma cadeira, por
exemplo, é apenas uma cópia imperfeita da ideia perfeita que está no Mundo das Ideias, cujo conhecimento só é
acessível à razão. Então, o artista quando pinta um quadro da cadeira, e um jovem olha aquela pintura, ele está
olhando a cópia da cópia da cópia imperfeita do Mundo da Ideias, sendo assim, o olhar do jovem é impregnado
por três ordens de distância do perfeito e original.
É preciso entender essa parte, na qual ele discute sobre o artista, e o conjunto geral da obra, cujo tema
geral do livro é a questão da justiça, em como construir uma sociedade justa. Nessa concepção de sociedade,
para Platão, não havia lugar para os artistas. Eles, de fato, deveriam car fora dessa sociedade, porque não
colaboram para a formação do jovem — formação necessária para uma sociedade justa, é nesse cenário que as
coisas entram em uma dimensão mais profunda.

Maquiavel - Discursos sobre a primeira


década de Tito Lívio
Maquiavel cou famoso não propriamente por essa obra, a obra que todos conhecem ou já ouviram falar
é “O Príncipe”, obra escrita em 1513 e publicada somente após sua morte, tudo leva a crer que ele escreveu os
Discursos (como o nome é muito grande, é comum fazer referências a esse texto como: Os Discursos de
Maquiavel) na mesma época da outra obra. A pergunta é essa: se as duas obras são escritas ao mesmo tempo
— Discursos levou um pouco mais de tempo —, por que escrever dois livros? O autor dará um tratamento
diferente a esses dois textos. Enquanto “O Príncipe” trata da formação do Estado, ele tem a preocupação de
destacar, principalmente, a fundação do principado novo, então, a criação do Estado, nos Discursos Maquiavel
faz uma re exão sobre o Estado já constituído, são duas temporalidades— essa é a primeira diferença. “O
Príncipe” destaca as orientações para a conquista do Estado e os Discursos fazem uma série de re exões sobre
a manutenção do Estado, por isso que no livro O Príncipe, Maquiavel dá uma preferência (ou demostra-a) pelas
monarquias, daí vem a ideia de que ele seria um teórico do absolutismo. De fato, nesta obra O Príncipe, isso se
evidencia, no entanto, quando é estudado os Discursos, vê-se que Maquiavel, na verdade, tem uma preferência
pela república: a monarquia como melhor ferramenta para a criação do Estado, mas a república sendo
melhor para a manutenção desse Estado.
Quando Maquiavel está falando dessa república, que é a analisada na obra Discursos sobre a primeira
década de Tito Lívio, havia um modelo de república que ele considera o melhor para a manutenção do Estado
(já que ele era da Renascença, outro detalhe importante, do período do cinquecento ou século XVI), sendo



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pensador renascentista, por via de regra, buscava a inspiração para suas ideias — não no sentido de cópia —
na antiguidade clássica. Então, é por esse motivo que ele, quando fala da república, tem como referência as
cidades estado gregas, mas, principalmente, a república romana — é em razão disso o título dessa obra, tendo
em vista que Tito Lívio foi um importante historiador romano, o qual conta uma história sobre esta república
romana. É de suma importância saber essa inspiração de Maquiavel.
Nessa obra ele vai associar (relacionar) a liberdade ou o aspecto democrático na república com a ideia
de con ito. Desse modo, insere o tema do con ito, que normalmente tem um caráter negativo, ele o coloca
como um sinal positivo. Para Maquiavel, o que faz com que os Estados avancem e tornem-se melhores é
exatamente entre os componentes da sociedade — que ele divide, basicamente, entre dois componentes, os
poderosos e o povo, os quais podem aparecer no vestibular com outras expressões, tais como: elite e povo,
minoria e maioria. Maquiavel enxerga a sociedade como dividida e entende que o o con ito, ou seja, a tensão
dessa sociedade, é um fator de avanço. Comparar com Heráclito é pouco provável, haja vista que este fala do
pensamento e Maquiavel fala de política ou do Estado, de qualquer maneira, é possível fazer uma ligação com
essa ideia de dinâmica, ou seja, a ideia do con ito paralela ao avanço, sabendo-se que Maquiavel não se
inspirou em Heráclito, mas pode haver relação. A despeito de estarem pensando em campos distintos: o
pensamento de Heráclito está na gnosiologia — A palavra é formada a partir do grego gnosis (conhecimento) e
logos (doutrina), ou seja, a doutrina que se debruça sobre o conhecimento, a teoria do conhecimento. Voltada
para uma re exão em torno da origem, natureza e limites do ato cognitivo, apontando suas distorções e
condicionamentos subjetivos — e no pensamento de Maquiavel há uma loso a política.
A democracia é uma arena em que interesses entram em con ito, e o avanço ou aperfeiçoamento se dá
exatamente por essa tensão. É possível pensar deste modo: se todos remassem em uma só direção, não
haveria renovação de ideias, não haveria avanços institucionais, o barco se moveria em círculos. Maquiavel, já
no século XVI, trazia essa informação. O propósito dos poderosos é dominar o povo, o propósito do povo é não
deixar ser dominado. Logo, Maquiavel não aponta para nenhuma superação dessa situação, mas para
manutenção da tensão, para ele é exatamente o con ito que resulta desses interesses diversos é que há
aperfeiçoamento do Estado e suas instituições.
A nalidade e propósito da ação do príncipe seria justamente de manter a ordem (estabilidade), ele não
pode ser movido por ideias xas, o príncipe deve ser adaptável, movido pelas circunstâncias, ou seja, ser
pragmático (realista) — entendendo que são as circunstâncias que ditam as suas ações —. Entretanto, seu
papel é a manutenção da estabilidade de uma sociedade que ele sabe, de antemão, ser instável (cindida, ou
seja, dividida entre entre poderosos e o povo). Maquiavel traça um cenário do estado moderno que até hoje tem
repercussões bastante importantes. Ressaltando, a relação entre tumultos (con ito) e fraqueza — uma
sociedade marcada por tumultos não representa, necessariamente, a fraqueza do governo, os tumultos sinal de
fraqueza, são, do contrário, constituintes da sociedade republicana que é dividia e instável. O autor diz o
contrário: os tumultos são desejáveis, porque eles justamente vão implicar, por sua vez, a necessidade das
melhorias, o que Maquiavel chama atenção para essas manifestações ocorrerem dentro do campo
institucional, ou seja, sem desordem ou violência, sem o caos; dentro de certos limites institucionais, por isso
ele fala das instituições, discorrendo sobre o importante papel dos tribunos da plebe (fazendo sempre
referência ao modelo de sua inspiração, a república romana). Por outro lado, ele fala também da importância do
senado, que era o órgão de intermediação dos interesses dos poderosos, logo, a república seria uma espécie
de governo misto — um pouco de aristocracia (“o governo dos melhores”) e um pouco de democracia ("governo
do povo") —, que ainda hoje tem in uência no parlamentarismo inglês (câmara do lordes - aristocracia e a
câmara dos comuns - povo), esse desenho institucional é inspirado no pensamento de Maquiavel — de como as



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instituições devem expressar essas divergências, devendo mediar essas divergências a m de manter certa
estabilidade, o príncipe tem o papel de estar no comando desse controle de estabilidade.
Por outro lado, um príncipe violento implica sinal de fraqueza: a presença de um príncipe cruel não é
sinal de poder; é, muito pelo contrário, sinal de fraqueza. Muito tempo depois, Hannah Arendt em seu texto
“sobre a violência” discorre sobre a distinção entre força, violência e poder; claramente inspirada por Maquiavel:
a violência não é sinal de poder. A título de exemplo: Dom Pedro I fechou a Assembleia Constituinte em 1823,
prendeu os responsáveis pelo anteprojeto institucional, forçou parte da liderança política a ir para o exílio,
cando, desse modo, mais fraco. Entretanto, é necessário ter cuidado ao a rmar que o príncipe não pode ser
violento nunca, pois isso contrapõe o fundamento do pragmatismo (realismo), ele deve agir com a virtù, ou seja,
saber agir para obter o m que se deseja. Assim, caso seja necessário agir com violência, ele assim o será, mas
para atingir um m: a instabilidade; do contrário, ser violento sem nalidade, utilizando a violência como
ferramenta comum, não é sinônimo de poder, não se traduz na ideia de poderio.
O que gera a ruína de um governo? Qual é o risco que o príncipe deve evitar a todo custo? Essa ruína é
aquilo que Maquiavel chama de corrupção. Duas considerações notáveis: Primeiro, sobre a inevitabilidade, o
autor acredita que todo o governo se corrompe (não no sentido puramente econômico, mas no sentido de “se
estragar”). Maquiavel entende que tudo que existe — como visão genérica — se corrompe, tudo se
degenera. Isso afeta também os governos, por mais virtuosos que sejam os príncipes; mais atentos; mais
geniais, eles vão acabar se estragando e , por esta razão, o papel do príncipe é buscar manter a estabilidade do
Estado pelo máximo de tempo possível. Aqui, Maquiavel aponta para algo importante para a democracia
contemporânea: a renovação do poder, uma vez que, naturalmente, os governos tendem a se estragar (um
exemplo contemporâneo de uma democracia consolidada é a Alemanha e sua primeira ministra Angela Merkel,
considerada uma das grandes lideranças políticas da atualidade, ela está no cargo há 16 anos e, nos últimos
anos, seu governo começou a dar sinais de senilidade, ou seja, de decadência, tanto é que ela já anunciou que
irá se aposentar e deixar o cargo — caso ela fosse movida pelas ambições tipicamente periféricas, ela tentaria,
forçosamente, sua continuação, do contrário, ela tem a clareza e grandeza de entender que seu ciclo de
governo está próximo do m, não devido a algum fato particular, mas simplesmente porque os governos, como
tudo que há no mundo material, tende à ruína, tudo tende à corrupção.
Logo, Maquiavel vai associar a ideia da ruína do governo ao processo de corrução, sendo que o papel do
príncipe é procurar modulá-lo, ou seja, evitar que isso se dê de maneira mais célere. Não obstante, quanto mais
virtù tem o príncipe, maior a sua capacidade de dar longevidade ao governo — a ideia de eternidade de um
governo, para Maquiavel, não pode existir, tampouco faz sentido. A exemplo disso, as ditaduras (governos que
estão há muito tempo de poder), na visão de Maquiavel, necessariamente, são governos ruins, mantendo-se
pela força e violência — na verdade, são governos fracos, mas que se impõe à população, essa submissão é,
logicamente, está muito longe da ideia de república como pensada por Maquiavel.
Em última análise, o que dá longevidade ao governo é o equilíbrio do apoio do povo e dos poderosos.
Mas, é escrito por Maquiavel: caso o príncipe tivesse que escolher (o ideal seria manter a estabilidade), em
circunstâncias especias, entre o apoio o do povo ou dos poderosos, ele deve optar pelo apoio do povo. Para o
autor, o apoio do povo é preferencial. Isso, reme-te ao exposto pelo autor na obra O Príncipe: o príncipe pode
até ser cruel, o que não pode é ter o ódio do povo, já que esse ódio seria, para Maquiavel, fatal. O ideal é o
equilíbrio, buscando estabilizar as relações que são con ituosas por natureza, mas, se circunstancialmente tiver
que tomar uma decisão, é melhor ter o apoio do povo ao apoio dos poderosos. O autor também defende o apoio
da religião (ele defende isso porque a religião tem um discurso que é mais enraizado na população), como uma
ferramenta para garantir o apoio popular, algo como uma adoção de uma religião o cial institucional (tal qual
havia na época).
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John Locke
Locke não foi um autor que se dedicou apenas a discussão epistemológica, ele é mais conhecido por
sua teoria política: uma espécie de pai do liberalismo. O liberalismo político, que foi inaugurado por Locke,
foi um dos pontos mais destacados do Iluminismo do século 18. O questionamento do direito divino dos reis e a
defesa de sistemas representativos como forma de governo foram lançados por Locke no nal do século 17 e
extensivamente abraçados pela maioria dos pensadores iluministas que se seguiram. John Locke era um
defensor de que as regras políticas estivessem alinhadas com as leis naturais do mundo. Nesse sentido,
qualquer poder estatal que não garantisse a vida dos cidadãos e o direito à propriedade privada não seria
legítimo. Fato inédito até então, Locke foi um dos primeiros a defender abertamente o direito da população
de depor o chefe de estado caso este atente contra os direitos fundamentais.
Locke acaba sendo responsável por duas grandes contribuições para a loso a: liberalismo (contrato
social entre os indivíduos para preservação de seus direitos naturais — jusnaturalismo —, o Estado como corpo
arti cial que resulta desse contrato é mínimo e de pouca interferência, cuja única função é regulação de
punições aos indivíduos que violam os direitos naturais alheios).

LIGAÇÕES POSSÍVEIS ENTRE AUTORES PARA SINTETIZAR:


Em continuidade, saindo um pouco de Locke, temos um possível diálogo entre Maquiavel e Hannah
Arrendt, que trabalha com o tema da loso a política. Recapitulando, para continuar: Heráclito poderia ter
alguma comparação a Platão e com Locke; este e Platão, no que diz respeito especi camente a pergunta “como
conhecemos as coisas?”, particularmente em Hípias Maior (diálogo no qual se confrontam as ideias de
conhecimento como experiência interpessoal e intrapessoal e conhecimento como conceito abstrato das
coisas); entre Maquiavel e Hannah Arrendt há um discurso que tem a mesma raiz: análise da política clássica,
aquele olhando mais para a Roma Republicana e esta olhando mais para a Grécia Clássica ou Atenas
democrática. Ainda um comentário: a prova também pode analisar as obras a partir de uma perspectiva
contemporânea, trazendo uma notícia ou assunto mais recente buscando uma relação com o passado. Em
Heráclito a discussão sobre a dinâmica das coisas, o conhecimento do ser como um vir-a-ser e a ideia da
imobilidade como uma ilusão; em Platão uma discussão estética e também da educação, uma crítica dele aos
artistas; em Maquiavel a questão da democracia e o con ito em si e por si.

John Locke - Ensaio Sobre o Entendimento


Humano
Esforço desse pensador inglês do século XVII tentar desenvolver uma teoria do conhecimento. Temos,
desse modo, uma possível leitura de Locke no campo da Epistemologia em paralelo a Heráclito, por exemplo,
já que este também busca desenvolver uma teoria do conhecimento. Entretanto, o efésio vai além, falando de
uma ontologia do ser (estudo do ser); da ideia de essência e o que ela é, ou seja, o que é a essência do universo
(kosmos); enquanto Locke busca estudar como é que nós conhecemos as coisas. Sinteticamente, temos em
Heráclito a busca por precisar a essência do universo; em Platão, a discussão sobre a estética e, também, de
certo modo, sobre o ponto de vista de uma teoria do conhecimento, que é a ideia de que o conhecer é conhecer
o conceito das coisas, nessa esfera, Platão irá se opor ao pensamento de Locke: para Locke conhecer é
vivenciar a experiência da “coisa”.




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Nesse enquadramento, temos uma síntese da sua teoria do conhecimento: o empirismo; ou seja, o
entendimento que o conhecimento está, necessariamente, associado à experiência com as coisas, a
percepção. À vista disso, depreende-se um Locke a semelhança de Kant, este que é um lósofo que também
trabalha com a teoria do conhecimento, admite que o conhecer implica conhecer, sumariamente, algo sobre a
percepção: a ideia que o conhecimento começa sempre com a experiência com a “coisa real”, sempre com a
percepção do real. Aquilo que não é dado pela percepção não é possível para o conhecimento, essa visão,
chamada de empirista, está na base da teoria do conhecimento de Locke e depois ela será aproveitada pelo
chamado pensamento idealista kantiano (idealismo transcendental ou crítico, segundo o qual os fenômenos da
realidade objetiva, por serem incapazes de se mostrar aos homens exatamente tais como são, não aparecem
como coisas-em-si, mas como representações subjetivas construídas pelas faculdades humanas de cognição
ou logos).
A teoria da Tábula Rasa, ou seja, a nossa razão nasce com a ausência de conhecimento e a razão que
irá colocá-los na nossa razão, e é a partir dessa impressão que a razão começa a funcionar (Kant, por meio
meio de seu idealismo critica, na Revolução Copernicana da Filoso a, os limites do conhecimento pela razão, a
ponto que a razão é usada para criticar ela mesma. Não temos condições de conhecer a realidade pura, “a coisa
em si”, como ela realmente é. O mundo real, que Kant chama de o mundo dos númenos, ou seja, da coisa em si,
é inalcançável para nós, impossível de ser de ser plenamente conhecido pela nosso entendimento. Tudo o que
conhecemos não é a realidade, mas o que Kant chama de fenômeno, isto é, o objeto na medida em que ele é
apresentado, organizado e entendido pelo pensamento. A realidade em si não está condicionada ao sujeito –
por isso, é impossível conhecê-la). Mas, também para Kant, conhecimento começa pela percepção, já Locke é
radical: nossa razão, sem a percepção, de nada serviria, do contrário, com a percepção é possível a razão
operar para o conhecimento.
Locke irá chamar essa relação com as coisas, que a percepção dá, de experiência (essa palavra quer
dizer justamente você sair de seu própria racionalidade, a qual é fechada em si mesma), isso é uma
capacidade. O autor divide essa experiência de duas maneiras: a experiência externa ou sensação, é o passo
fundamental de início ao conhecimento, sem a percepção subjetiva (tátil, sonora, visual, gustativa…), não iria
haver conhecimento — essa sensação “imprime” uma imagem e minha razão age sobre ela —; a segunda
experiência é a interna ou re exão, essa palavra que dizer “dobrar-se novamente sobre a coisa”, o caminho é:
percepção - imagem impressa na razão - razão se “dobra” sobre essa imagem - re exão (o processo de
experiência). Assim como para Kant, nós não temos conhecimento da coisa em si, temos uma percepção que
projeta uma imagem nominal (não o real), o que vai para a razão é essa projeção nominal sobre a qual a minha
racionalidade opera. A linguagem, nessa conjuntura, a partir desse exercício da razão, dá a nomeação das
coisas, que é a explicitação de como a razão identi ca aquela imagem que lhe é dada pela percepção,
completando, assim, o circuito do conhecimento (percepção - re exão - linguagem), a linguagem é fundamental
para completá-lo. A exemplo disso: quando é dito que algo é áspero, ocorre o processo de reconhecimento
dessa palavra pela razão na mente, a linguagem recupera a re exão anterior sobre algo áspero, ou seja, a
memória impressa na mente pela experiência; desse modo ocorre o entendimento acerca do que é dito.
Também para Locke, a experiência sensorial constituí, na nossa razão, uma ideia, por formação: a ideia
é o conhecimento que se forma em nossa mente a partir da experiência com as coisas. Ele classi ca essa ideia
de três maneiras: o que ele chama de ideia de substância, que é justamente o elemento que de ne aquilo que
nós percebemos (uma constituição de ideia, “do que é feito…”, o que de ne o ser, que no português é chamado
de substantivo); o modo é a maneira que a ideia se apresenta, como ela se apresenta a nossa razão; a relação
é aquilo que nos permite comparar ideais. Sintetizando tudo: a mente está “em branco” e recebe uma
percepção, forma uma primeira ideia, essa ideia é primeiro de qual é a substância, que modo ela se apresenta e,




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a partir de outras percepções, a mente começa a fazer relações, usando a razão, dando-nos, desse modo, a
capacidade de comparação, estabelecimento de padrões, en m, uma visão mais complexa do mundo ao redor,
sempre com a razão operando sobre essas percepções, de nindo substâncias, modos e relações. A isso, o
autor irá chamar de processamento das ideias.
Locke usa, portanto, o método descritivo, o passo a passo do conhecimento, com um empirismo como
crítica ao inatismo, ou seja, dizendo que não nascemos conhecendo as coisas (As teorias inatistas, ou seja, a
concepção que algumas ideias/conhecimentos advindos de conteúdos mentais estão presentes desde o
nascimento, isto é, não são adquiridas ou aprendidos. já estão presentes em Platão, mas também na Filoso a
moderna — notadamente entre os racionalistas dos séculos XVII e XVIII, especialmente Descartes, Espinoza e
Leibniz, entre outros). Por isso a Tábula Rasa: nós precisamos nos relacionar com o mundo, por meio das
sensações e, após, por meio das re exões, tudo começa com a percepção, nossa razão, assim, opera
formulando ideias sobre as coisas do mundo (de substância, modo, relacionando-as).
Essas ideias possuem, segundo o autor, dois tipos de qualidades: primárias e secundárias, aquelas
nos informam sobre as coisas que a própria “coisa” tem (tamanho ou extensão, textura, formato,…), uma espécie
de descrição do como são essas coisas, ou seja, a projeção (ideia) que isso faz na mente de cada um —
características do objeto em si—; enquanto estas são as sensações que esta percepção causa, elas não estão
nas coisas, mas são produzidas por nós a partir da nossa relação com o mundo (cores, conforme a exposição de
algo à luz, a diferenciação entre cores, que não está no objeto e sim em nossa percepção; gostos; aromas; tudo
que pode ser subjetivo). Tudo o que Locke busca, a partir de uma ideia principal é o conhecimento que se dá por
percepção, esta ativa nossa razão a m da re exão sobre o mundo, depois, manifestamos essa re exão por
meio de palavras (ideias), no campo da linguagem, e, assim, descrever-se-á mais minuciosamente a operação
da experiência e da formação de ideias (fruto da sensação e da anterior re exão), qualidades primárias como
sendo o que vem diretamente da sensação e qualidades secundárias são característica que já derivam da
re exão, portanto, passíveis da razão particular de cada um operando sobre as ideias, uma subjetividade, um
processo de aprendizado. É importante ressaltar que, para Locke, nenhum conhecimento é inato, ao passo que
não quer dizer que nada é inato, uma vez que temos aparatos cognitivos e o mundo que nos cerca. no geral, o
autor busca uma crítica da a rmação que o conhecimento existe desde o começo da vida, assim, precisamos
exercer nossas capacidades empíricas para o aprendizado, que também é subjetivo.

Hannah Arendt - Condição Humana


Final dos anos 50, estudo no qual ela busca entender o que aconteceu com a política (vida na pólis, ou
seja, a vida em comunidade) após a chamada “quebra da tradição”, que se dá, segunda a autora, com a
modernidade. Ela irá entender a modernidade como o conjunto de fatos que ocorrem a partir do século XVI-
XVII, destacando, entre essas mudanças: as grandes navegações, a reforma protestante, a mudança da
ciência com Nicolau Copérnico, Ptolomeu e demais astrônomos do geocentrismo. Esses fenômenos marcariam
a modernidade e, segundo ela, a partir desse período, começam a ocorrer alterações no modelo político vigente,
que tinha como referência a Grécia. Desse modo, Arendt vai analisar como era a organização política dos
gregos e como esse sistema criou conceitos considerados por ela fundamentais, como o conceito de liberdade,
igualdade, a diferença entre o espaço público e o privado, a própria construção de um mundo de coisas
fabricadas pelo homem, que nos condiciona a medida que transformamos a natureza, esta nos transforma
também. Ao ponto que, com a modernidade, ocorre uma mudança nesse modelo criado pelos gregos e o
objetivo de Hannah Arrendt é analisar esse fenômeno da modernidade, assim como essas as mudanças
ocorridas na tradição, que segundo ela, criarão um ambiente propício para a desenvolvimento dos governos



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autoritários. No fundo, o trabalho da autora é buscar compreender o fenômeno do totalitarismo. Para ela, a
quebra da tradição promovida pela modernidade vai, praticamente, apagar as fronteiras entre o mundo público e
o mundo privado, é que cria as condições necessárias para esse fenômeno que se dá no século XX.
Começamos pela expressão chave do texto: vida ativa; pois, nesta obra, irá ser destacado com se dava
a organização da pessoas na sociedade a partir desse conceito, que se compõe ao conceito de vida
contemplativa — algo que ela irá estudar mais tarde, ou seja, a questão da vontade, do julgamento, aquilo que
diz respeito ao ato de pensar e que ela analisa em outra obra chamada Vida do Espírito, sinteticamente: a obra
nos traz um universo de indagações e possibilidades de conclusões em torno do Pensar, do Querer e do Julgar.
A obra condição humana destaca esse conceito de vida ativa e para compreendê-lo é necessário fazer o recorte
com essa outra obra, a vida do pensamento. A vida da exposição, na qual os homens buscam se reproduzir;
produzir; assim como se relacionar entre si, é, portanto, ativa.
Hannah Arendt divide essa vida ativa em três expressões: o Labor, o Trabalho ou Fabricação, a Ação
(ponto em que ela mais se detêm); assim, essas três manifestações das pessoas ocorrem em relação a si
mesmas, em relação as outras, e a relação com mundo.
O Labor está ligado a manutenção da vida, a reprodução, a tudo aquilo que busca manter a existência,
tem, portanto uma natureza coletiva: a deia do alimento, do biológico, reproduzir aquilo que é necessário para
nossa existência. Para ela, o Labor está ligado a vida privada, a vida doméstica, não é à toa que os gregos
chamavam a casa e o mundo doméstico de Oikos (O termo Economia vem dessa palavra, que em grego
signi ca Casa com Nomos, o qual, por sua vez, signi cam Lei ou Ordem. A junção dessas duas palavras fez
surgir a palavra OIKONOMIA e depois Economia, que signi cava a Economia particular ou Economia da casa,
mas que hoje está presente em todos os espaços). Assim, a crítica que ela irá fazer a modernidade se baseia
nos valores que eram próprios da vida privada, que se tornaram valores públicos. Para os gregos a construção
da sobrevivência e a manutenção do corpo (bios) eram uma tarefa da vida privada e nessa vida não havia
liberdade ou igualdade, as relações eram com base em ordens e hierarquias, uma imposição, era, portanto, o
lugar da violência, seja contra a natureza — que era afetada para produzir alimentos —, seja entre os elementos
componentes (mulheres, escravos, lhos,…). Esses são, pois, os elementos do Labor.

OBSERVAÇÃO: É de Locke a frase que Arendt utiliza como mote para iniciar o estudo sobre o labor: “O
Labor de nosso Corpo e o Trabalho de nossas Mãos”. Locke, juntamente com Adam Smith, na “Riqueza das
Nações”, enfatiza que é a riqueza que implica a acumulação de mais riqueza, e não a propriedade, a base do
progresso das nações. Como a apropriação para a acumulação depende da repetição in nita de atos, é o labor,
e não o trabalho, a atividade humana apta para prover essa acumulação, porque das três atividades é a única
que se esgota somente com o nal da vida e tem consequências previsíveis. Daí o surgimento da “força de
trabalho” ou “labor power”, que pode ser vendida com o objetivo de acumulação de riqueza.

O outro componente, o Trabalho ou Fabricação, de ne-se como quando os seres humanos explicitam-
se, ou seja, manifestam a sua individualidade, na transformação da natureza, não para o consumo (produzir
para destruir, para o consumo), mas para a promoção de transformação da natureza com a nalidade de deixar
uma marca no mundo. Disso, Arrendet associa esse conceito a palavra mundanidade: deixar uma obra, algo
que permaneça além da época. Os artistas, os artesãos, aqueles que transformam os elementos físicos,
tornando-os obras para permanecer no tempo. É, portanto, uma outra face da vida ativa, a transformação da
natureza que vai individualizá-la.
Das três manifestações da vida ativa, há apenas uma que não tem uma nalidade, é a Ação, a única que
se dá, exclusivamente, entre homens (da primeira, o Labor, posso plantar e consumir e da segunda, o Trabalho






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ou Fabricação, posso pegar algo da natureza para transformá-lo, sendo que em ambas as manifestações não é
preciso, necessariamente, o contato com outrem, o relação com outras pessoas). A Ação se dá unicamente
entre pessoas e pelo discurso: a Ação e o discurso estão interligados, ou seja, essa manifestação não é da
violência, é um mundo do diálogo, em que é reconhecido o outro como condição para minha própria Ação —
sem essa presença do outro não há Ação. A palavra-chave dessa manifestação é a Pluralidade, nós e o outro
(ao invés de manutenção da vida, ou mundanidade, Labor e Trabalho ou Fabricação, respectivamente). É
necessário que esse outro seja igual a mim no que diz respeito a condição de agir (capaz de praticar Ação), mas
também, é necessário que ele seja diferente de mim para que o meu discurso o alcance e o dele a mim: se nós
formos absolutamente iguais, não há necessidade de Ação, já que a Ação visa, justamente, o convencimento, a
persuasão, a construção do consenso. Pessoas singulares, que são únicas e, portanto, precisam ser
persuadidas pela Ação do outro, assim, a autora vai a rmar que a liberdade é a igualdade são características
próprias do mundo da ação. A liberdade não é a própria liberdade de fazer o que desejar (liberdade que
percebemos hoje no mundo moderno, “ser quem quiser”), do contrário, é uma liberdade no sentido de poder se
relacionar, de ser singular, mas sempre na relação com o outro, no mundo público, apenas. Dessa de nição,
entra a crítica de Arendt a modernidade: para ela, a modernidade vai enfraquecer o mundo público, ou seja,
esse espaço público, em que se dará a Ação, a pluralidade, a liberdade, a igualdade e o discurso, é atro ado no
mundo moderno porque há uma hipertro a da economia, da reprodução dos bens materiais (aqui reside uma
forte crítica que Hannah Arendt faz ao marxismo, imaginado que de um movimento econômico possa advir um
movimento político, ela vai dizer que esse crescimento do Labor, como ideia de produção, vai reduzir o espaço e
com isso todos os componentes desse espaço público, garantidores da liberdade e igualdade, favorecendo o
ambiente totalitário).

OBSERVAÇÃO: Em outras palavras, seu objetivo nunca foi o de criticar o homem moderno pelo fato de
ele não empregar o seu tempo livre (do trabalho) no cuidado da coisa pública, mas no consumo desenfreado —
ela simplesmente constatava que isso era o que ocorria na modernidade, buscando compreender as origens
desse processo e as consequências políticas daí decorrentes. Se ela se recusa a pensar o trabalho como
político (tal como pensa o marxismo), é justamente porque ela detecta na moderna glori cação do trabalho a
outra face da moeda do obscurecimento da esfera pública. Para Arendt, portanto, a glori cação do trabalho
proposta por Marx e Hegel é um sintoma das profundas transformações por meio das quais o capitalismo se
a rmou mundialmente, motivo pelo qual ela não se ampara nas teses desses lósofos para a formulação de seu
diagnóstico crítico. Para Arendt, o nascimento da política não se dá prioritariamente a partir do campo do
trabalho, pois ele não é uma atividade com a qual o homem se identi que e na qual encontre auto-
aperfeiçoamento.

É importante destacar a importância da coragem, ou seja, a coragem de agir, já que para ela, toda vez
que eu ajo no espaço público, é estabelecido o início de alguma coisa. O conceito de natalidade também tem
suma importância: toda vez que eu ajo, eu inicio algo que é irreversível, portanto, é sem volta e não há como
calcular os resultados da Ação (o critério da imprevisibilidade). Se, para falar de ação e política, a autora inspira-
se, em grande parte, nas experiências da pólis grega e da república romana, sua abordagem da natalidade
inspira-se, preponderantemente, nos escritos de Agostinho, pois Arrendt interpreta sua a rmação de que o
homem é livre porque ele é um “começo”, o homem quando introduzido no mundo, é livre e tem a possibilidade
de fazer novos começos: um diálogo menos religioso com a noção de livre-arbítrio.
Segundo Arendt, o mundo público ele funciona como uma teia, e nesta teia de relações — não sabendo
se estamos no começo, meio ou m — é que se processa os negócios humanos, relações onde cada




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intervenção (discurso), por mais mínima que seja, inaugura o novo: o poder de criarmos coisas destaca o
ambiente o ambiente público. No mundo do Labor temos apenas a repetição, o processo não é singular, tal qual
o mundo de consumo contemporâneo, um mundo cíclico (consumo - produção - consumo -…). Não é à toa que
atualmente, a despeito de termos produzido tantas coisas e consumidos outras várias coisas, e muitos se
sentirem livres porque podem consumir, não conseguimos nos sentir plenos. Porque, falta-nos, justamente,
essa possibilidade com o outro, a Ação e seu espaço, a possibilidade criar coisas: é essa a re exão da autora.
Dessa maneira, a crítica de Arendt a modernidade repousa na a rmação de o Labor se sobrepõe aos
outros elementos da vida ativa: vivemos para garantir nossa sobrevivência e não há mais essa distinção clara
entre o público e o privado. É dito pela autora que na medida que o mundo o mundo privado vai ocupar os
espaços do mundo público, reduzindo, assim, a política, a modernidade teve que criar um outro conceito para
car no lugar do mundo privado, a intimidade, que é uma invenção do mundo moderno. É um espaço em que
tentamos nos esconder do mundo de consumo: no entanto, essa “intimidade” não deve ser confundida com o
conceito de vida privada dos gregos. Em síntese, assim como aquilo que chamamos de sociedade de consumo
(mercado) não é o mesmo que a noção de mundo público grega. Tudo feito na cronologia “pré-modernidade e
modernidade”.
A autora, portanto, está falando nessa obra que toda a nossa intervenção no mundo, principalmente no
que diz respeito ao Trabalho ou Fabricação, e do que diz respeito a Ação, essa interferência nos condiciona: a
condição humana tem sentido na de nição que somos seres humanos na medida que vivemos nesse ambiente
produzido por nós mesmos. Por isso, quando Arendt abre o texto e fala que o texto foi publicado em 1958, faz
referência ao lançamento do satélite russo Sputnik (agora nome da vacina “Sputnik V”) como grande conquista
tecnológica, falando que naquela já era falado sobre a hipótese de habitar outros planetas, essa obsessão por
deixar esse planeta e ela conclui que vivendo em outros planetas iremos manter nossa natureza, mas não
seremos mais as mesmas pessoas, nossa condição será alterada, nós somos na Terra um resultado conjunto
de nossa natureza com os condicionantes: tudo aquilo que transformamos e que nos transformou. Somos
resultado desses processos de transformação das coisas ao nosso redor, e isso ajuda a explicar as
transformações que nós proporcionamos à sociedade, que com a modernidade nós diminuímos o espaço
público e ampliamos o espaço de Labor, com isso, segundo Arendt, nós comprometemos a ideia de liberdade,
igualdade e, sobretudo, a ideia de política como possibilidade de exercício de criação, pluralidade, coragem, tais
como os gregos faziam. E, nessa conjuntura, abrimos espaço para os regimes autoritários. No fundo, essa obra
é de re exão sobre os tempos atuais (os tempos dela como pós 2 Guerra Mundial, Guerra Fria, em que todos
ainda estavam complexos com os horrores do totalitarismo. Em paralelo com os autoritarismo de hoje, essa
atitude comum as pessoas de recusarem a política, de a rmarem a inutilidade do exercício político e, ao mesmo
tempo, que em todo mundo é desenvolvido governos autoritários. A previsão de Arendt, apesar de feita décadas
atrás, ainda é atual.

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