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Ação anulatória do art.

486 do CPC:

AÇÃO ANULATÓRIA DO ART. 486 DO CPC:


hipóteses de cabimento; Quais as alterações trazidas pelo art. 284 do CPC projetado?
Revista de Processo | vol. 235/2014 | p. 189 - 228 | Set / 2014
DTR\2014\9797

Guilherme Nascente Nunes


Pós-graduado e Mestrando em Processo Civil pela PUC-SP. Advogado.

Área do Direito: Civil; Processual


Resumo: O presente trabalho tem por escopo abordar a ação anulatória contra ato
judicial prevista no art. 486 do CPC vigente, mantida pelo projeto de Novo Código em seu
art. 284. Após análise no significado de ato judicial, sentença meramente homologatória e
nos termos da lei civil, dar-se-á enfoque às hipóteses de cabimento. É que não raras
vezes o sistema não deixa claro em quais situações terá cabimento a ação anulatória ou a
ação rescisória. Demonstrar-se-á ainda que grande parte das atuais críticas doutrinárias
quanto ao tema foram acolhidas pelo projeto do CPC. O CPC projetado, além de corrigir
os erros terminológicos contidos no art. 486 do CPC vigente, parece afastar o cabimento
da ação anulatória na hipótese de haver sentença de mérito, inclusive a meramente
homologatória, na contramão da jurisprudência do STJ.

Palavras-chave: Ação anulatória - Art. 486 do CPC - Hipóteses de cabimento - Atos


judiciais - Sentença meramente homologatória - CPC projetado.
Abstract: The main goal of this study is to approach the annulment action against
judicial act provided in art. 486, the current Civil Procedure Code, maintained by the New
Code project in its art. 284. After analyzing the meaning of a judicial act, merely ratifying
sentence and under civil law, it will give focus to the assumptions of advisability. It is not
rare that sometimes the system does not makes clear in which situations will have place
the annulment action or rescission action. It will be also demonstrated that much of the
current doctrinal criticism on the subject were received by the Civil Procedure Code
project designed. The Civil Procedure Code designed, besides being correct to redress the
terminology errors contained in art 486, from the current CPC, seems to depart from the
appropriateness of the annulment action when judgment on the merits, including the
ratification decision, against the ruling of the STJ.

Keywords: Annulment action - Art. 486 CPC - Chances of appropriateness - Judicial acts
- Merely ratification decision - CPC designed.
Sumário:

1. Introdução - 2. Considerações iniciais - 3. “Atos judiciais” que dependam (ou não) de


sentença meramente homologatória - 4. Significado de sentença meramente
homologatória - 5. Fundamentos para a invalidação - 6. Desistência, reconhecimento
jurídico do pedido, renúncia ao direito sobre o qual se funda a ação e confissão - 7.
Sentença que homologa transação - 8. A jurisdição voluntária - 9. Atos praticados na
execução - 10. Outras hipóteses de cabimento (ou não) da ação anulatória - 11.
Procedimento - 12. Conclusões - 13. Bibliografia

1. Introdução
Recebido em: 30.06.2014
Aprovado em: 04.08.2014
Este artigo tem por escopo analisar a ação anulatória prevista no art. 486 do CPC,
mantida pelo art. 284 do CPC projetado,1 em especial suas hipóteses de cabimento. Para
tanto, com apoio na doutrina e jurisprudência pátria, veremos o que significa “ato
judicial” dependente ou não de “sentença meramente homologatória”. Analisaremos
também os fundamentos para a anulação dos “atos judiciais”, dando enfoque aos vícios
de consentimento – erro, dolo, coação, etc. Em seguida, cuidaremos de algumas
hipóteses que dão ensejo à intensa e interminável divergência doutrinária e
jurisprudencial quanto ao cabimento da ação anulatória ou da ação rescisória, v.g.
sentença que homologa a transação, sentença baseada em confissão, sentença que
homologa a desistência da ação ou o reconhecimento jurídico do pedido ou ainda a
renúncia ao direito sobre o qual se funda a ação, além das sentenças proferidas em sede
de jurisdição voluntária, dentre outras.
Ao longo de todo o texto, traremos o regramento desta controversa ação no projeto do
novo CPC. Veremos que a crítica doutrinária a respeito da redação do art. 486 do CPC
vigente, foi acolhida pelo projeto do novo CPC, que não fala mais em ato judicial, nem
nos termos da lei e tampouco em rescindidos, além de subtrair o termo meramente.
Veremos ainda que o projeto do novo CPC ao que tudo indica, em conformidade com boa
parte da doutrina, ter afastado o cabimento da ação anulatória na hipótese em que, sobre
o ato praticado pela parte em juízo (ou trazido a juízo), sobrevenha sentença de mérito,
ainda que esta se limite a homologar o ato.
2. Considerações iniciais
O art. 486 do CPC, situado dentro do capítulo referente à ação rescisória, cuida do
cabimento da ação anulatória. Segundo este dispositivo, esta ação tem cabimento para
rescindir os atos judiciais que não dependem de sentença ou cuja apreciação jurisdicional
é meramente homologatória: “Os atos judiciais, que não dependem de sentença, ou em
que esta for meramente homologatória, podem ser rescindidos, como os atos jurídicos
em geral, nos termos da lei civil”.
A redação do dispositivo, além de padecer de impropriedade terminológica, é confusa.
Literalmente, interpreta-se que ação anulatória tem por escopo rescindir os atos
praticados pelo juiz que não dependem de sentença ou os atos judiciais em que a
sentença é meramente homologatória.
Diante da “péssima” redação do dispositivo em comento exsurgem inúmeros
questionamentos. O art. 486, por se utilizar do verbo “rescindir”, tem como fundamento
as mesmas hipóteses previstas no art. 485 do CPC? Quais os atos do juiz não dependem
de sentença? Há atos do juiz que dependem de posterior sentença homologatória? O
dispositivo serve para rescindir atos que não constituem “sentença”? Quando será cabível
a ação rescisória prevista no art. 485, VIII, do CPC, e quando terá pertinência a ação
anulatória?
Enfim. São inúmeras as perguntas que emergem deste “singelo” dispositivo, inserido
dentro do capítulo da ação rescisória, mas que com ela não guarda qualquer semelhança.
Berenice Soubhie Nogueira Magri, em excelente dissertação sobre o tema, anota que,
embora a ação anulatória seja distinta da ação rescisória, é certo que a ela se assemelha,
por se tratar de uma das formas de impugnação da sentença, não obstante a finalidade
da ação anulatória seja atacar o próprio ato (“judicial”) homologado por sentença.2
Entende a autora que a ação anulatória “foi inserida no capítulo da ação rescisória porque
o fim prático destinado à ação anulatória é o mesmo da ação rescisória, ou seja,
impugnar a sentença mesmo que reflexamente por meio da desconstituição do ‘ato
judicial’”.3
Mesmo que ambas, a ação anulatória e a ação rescisória, tenham finalidade semelhante
(impugnar a sentença), a primeira não se confunde com a segunda. Embora existam
situações em que ambas as ações, aparentemente, tenham cabimento, quando couber
uma não caberá a outra, ressalvada a aplicação do princípio da fungibilidade de meios.
A confusão em sua utilização por parte dos operadores do direito decorre, com a devida
vênia, da péssima redação do art. 486 do CPC. Sua compreensão somente é possível por
meio de preciosa contribuição doutrinária e jurisprudencial, que ao longo dos anos de
vigência do CPC deu a ele interpretação compatível com o sistema processual civil.
Cassio Scarpinella Bueno,4 em crítica à redação do dispositivo, afirma que o termo
“rescindidos” deve ser entendido como anulados ou ainda declarados nulos; os atos
judiciais, por sua vez, devem ser compreendidos como atos das partes que são praticados
em juízo e lá homologados. É que, como firma o autor, o que se impugna mediante o
ajuizamento da ação anulatória “não é o ato jurisdicional em si considerado (decisão
interlocutória, sentença ou acórdão), mas, diferentemente, o ato praticado entre as
partes e meramente homologado judicialmente”.5
Precisa também a lição de Sérgio Rizzi,6 que, com maestria, ensina que a ação anulatória
objetiva coisa diversa da ação rescisória: a ação anulatória não objetiva anular a decisão
de mérito, pois tem em mira tão somente o ato homologado. Considerando que o ato
homologado é o próprio conteúdo da decisão, caindo aquele esvazia-se esta, pois ex
nihilo, nihil. Mas, ‘a sentença em si não é rescindida’”. No mesmo sentido, encontra-se
elucidativo acórdão do STJ.7
José Carlos Barbosa Moreira8 anota que a ação prevista no art. 486 do CPC, tem por
escopo a anulação de atos praticados no processo, aos quais não se segue decisão
alguma ou, se segue decisão, esta é meramente homologatória com o condão de lhes
imprimir eficácia sentencial. O ato praticado pelo órgão jurisdicional, como frisa, é
insuscetível de ataque via ação anulatória. O dispositivo, embora denomine os atos
passíveis de ação anulatória de “judiciais” quer referir-se a “atos das partes” praticados
em juízo.
Em suma, a ação anulatória não pretende a anulação de atos judiciais, entendido como
“atos praticados pelo magistrado”, mas, sim, “atos praticados, ou inseridos, pelas partes
em juízo”.
Cassio Scarpinella Bueno propõe que o art. 486 seja lido da seguinte forma: “os atos das
partes, que não dependem de sentença ou em que esta é meramente homologatória,
podem ser reconhecidos como nulos ou anulados como os atos jurídicos em geral”.9 Isto
é, a ação anulatória tem cabimento quando seu autor pretende ver reconhecido algum
vício em ato seu, da parte contrária ou de ambas, praticado em juízo e, eventualmente,
homologado, apto a gerar efeitos jurídicos.
Felipe Jakobson Lerrer10 pontua as seguintes impropriedades na redação do dispositivo
em comento. São elas: (a) os atos anuláveis referidos no art. 486 do CPC, são aqueles
praticados pelas partes, entendendo-se a expressão “judiciais” apenas no sentido de
terem sido praticados em juízo, ou trazidos a juízo para homologação; (b) a expressão
“rescindidos” deve ser entendida como anulados; e (c) deve-se compreender que a
expressão “nos termos da lei civil” quer significar “nos termos do direito material”,
estendendo-se a todos os ramos do direito material público ou privado, inseridos nesse
conceito o direito civil como regra geral, o direito administrativo, o direito comercial, o
direito do trabalho e as legislações especiais.
Berenice Soubhie Nogueira Magri11 conceitua a ação anulatória prevista no art. 486 do
CPC, da seguinte forma: “ação anulatória é aquela que tem por objetivo anular o ato
processual praticado ou inserido em juízo pelas partes, ou terceiros juridicamente
interessados, que dependa ou não de sentença homologatória que extinga o processo
sem apreciação do mérito, observados os princípios dos atos jurídicos em geral, nos
termos do direito material”.
Do que foi visto até aqui, destaca-se que a doutrina reconhece que a ação anulatória tem
por escopo “anular” (e não rescindir), nos termos do direito material (e não apenas “nos
termos da lei civil”), os atos praticados pelas partes (e terceiros) em juízo ou trazidos a
juízo (e não “atos judiciais”) que dependam, ou não, de sentença homologatória para que
:
produzam efeitos.
Como dito, a redação do art. 284 do projeto do novo CPC parece ter acolhido a crítica
doutrinária a respeito da redação do art. 486 CPC vigente, na medida em que anota que
“o ato negocial praticado pela parte ou por participante do processo, homologado ou não
em juízo, está sujeito à invalidação, nos termos da lei”. O projeto do novo CPC não fala,
portanto em ato judicial, rescindidos, lei civil, mas, sim, em ato negocial praticado pela
parte ou participante do processo, invalidação e nos termos da lei.
Passemos, então, a comentar, de forma mais detalhada, as hipóteses de cabimento,
previstas no art. 486 do CPC: atos realizados ou inseridos pelas partes (ou terceiros) em
juízo (ato negocial, conforme redação do art. 284 do Projeto), que dependam ou não de
sentença meramente homologatória para que possam produzir efeitos.
3. “Atos judiciais” que dependam (ou não) de sentença meramente
homologatória
Como já visto, a ação anulatória tem cabimento quando se pretende desconstituir atos
das partes que não dependem de sentença ou atos praticados pelas partes que, para
produzirem efeitos, dependam de sentença meramente homologatória. Não obstante esta
diferenciação, em ambas as hipóteses pretende-se desconstituir o ato praticado pelas
partes em juízo que necessita ou não de pronunciamento judicial para surtir efeitos.12
Felipe Jakobson Lerrer13 ensina que os atos judiciais independentes de sentença aos quais
se refere o art. 486 do CPC, são os atos jurídicos praticados pelas partes em juízo, ou em
lugar das partes em juízo, e serão sempre regulados pelo direito material. Isto é, são atos
que envolvem declarações de vontade das partes e, em razão deste elemento volitivo,
possuem aptidão para criar, alterar ou extinguir direitos processuais.
Berenice Soubhie Nogueira Magri diz que, para efeitos de ação anulatória, interessam “os
atos de iniciativa das partes, que se consubstanciam: (a) nas ‘declarações unilaterais de
vontade’ (art. 158, caput, do CPC) das partes, tanto do autor como do réu, incluído os
atos de postulação; e (b) nas ‘declarações bilaterais de vontade (art. 158, caput, do CPC)
das partes (autor e réu) que não se constituem tecnicamente atos processuais, que se
transformam em atos processuais quando praticados no processo ou nele são inseridos
pelo procedimento e via adequados”.14 Pondera ainda a autora que os atos anuláveis a
que aduz o art. 486 do CPC, não se limitam aos atos das partes, englobando também os
atos praticados por terceiros, v.g. o assistente, o nomeado à autoria, o chamado ao
processo, o denunciado à lide, o opoente e etc.15
Em suma, é objeto da ação anulatória o ato jurídico praticado (ou trazido) pelas partes
(ou terceiros) em juízo que envolva declaração de vontade. Nesse ponto, o projeto do
novo CPC foi claro ao falar em participantes do processo.
São exemplos de atos das partes que não dependem de sentença a arrematação e a
adjudicação. Nestes casos, eventual invalidade deve ser postulada por meio de ação
anulatória, e não por meio de ação rescisória, uma vez que tanto a adjudicação como a
arrematação não dependem de sentença. Em se cuidando de arrematação ou
adjudicação, “se invalida, portanto, o negócio jurídico, por meio do qual houve a
transferência do domínio do bem que fora penhorado”.16 Barbosa Moreira17 dá ainda
como exemplos de atos praticados pelas partes que independem de sentença, cuja
anulação deve ser pretendida por meio da ação anulatória, a outorga de poderes em
procuração passada nos autos, a renúncia ao direito de recorrer, a aceitação expressa da
decisão, a desistência do recurso etc.18
Enfim, para o cabimento da ação anulatória deve-se observar se se cuida de ato volitivo
praticado pela parte ou inserido no processo pela parte, ou seja, se se encontra
processualizado e que, mesmo sem sentença homologatória, surta efeitos processuais.
Já os “atos judiciais” que dependem de sentença são os atos jurídicos praticados pelas
:
partes em juízo, mas cuja eficácia processual está a exigir que simplesmente os
homologue.
Muito discute a doutrina, como será visto a seguir, se existe alguma diferença entre
“sentença homologatória” e “sentença meramente homologatória”. Aqui, não existe um
consenso na doutrina. Berenice Soubhie Nogueira Magri,19 por exemplo, ensina que a
sentença homologatória a que se refere o art. 486 do CPC, é aquela que não tem
conteúdo próprio, uma vez que apenas atesta que o ato praticado pelas partes satisfaz os
pressupostos de fundo e/ou de forma, ou simplesmente dá-lhes autenticidade e, se
necessário, promove-lhes a integração para que o ato seja revestido de todas as
exigências legais determinadas pelo direito material. Menciona, como exemplo, as
seguintes situações, ou melhor, os seguintes atos que são dependentes de sentença
meramente homologatória: a desistência da ação (art. 158, parágrafo único); a
transação; a desistência de recurso (arts. 501 e 502); e a sentença proferida em sede de
jurisdição voluntária.
Barbosa Moreira20 indaga se todos os atos das partes praticados ou trazidos a juízo que
não dependem de sentença ou que por sentença apenas se homologam podem sempre
ser atacados via ação anulatória do art. 486 do CPC. Responde afirmativamente quanto à
primeira espécie, isto é, em relação aos atos que não dependem de sentença. Quanto à
segunda espécie – atos das partes que dependem de sentença homologatória para surtir
efeitos –, responde negativamente. É que, como entende o autor, o art. 485, VIII, do
CPC, prevê o cabimento de ação rescisória contra a sentença que homologa transação,
renúncia à pretensão e reconhecimento jurídico do pedido.21 E “a admitir-se que,
havendo em qualquer deles vício causador de invalidade, pudesse o ato homologado, em
si, constituir objeto de ação anulatória do art. 486, mesmo após o trânsito em julgado da
decisão que a homologou, ter-se-ia por concluir por uma injustificada superabundância de
meios de impugnação: realmente, de um lado caberia a ação rescisória contra a sentença
de homologação, com suporte no art. 485, VII; de outro lado ação anulatória do próprio
ato homologado (…)”.22
Com razão o autor. Concordamos que todos os atos volitivos praticados (ou trazidos)
pelas partes em (a) juízo, que dispensem sentença meramente homologatória, podem ser
atacados pelas partes via ação anulatória. Entretanto, cuidando-se de ato em que se
exige sentença meramente homologatória para que possa produzir efeitos, a resposta não
pode ser a mesma. Primeiro, porque o art. 269 do CPC, diz que a sentença que homologa
o reconhecimento jurídico do pedido pelo réu (inc. II), ou que homologa transação
celebrada pelas partes (inc. III) ou ainda que homologa a renúncia do autor ao direito
sobre o qual se funda a ação (inc. V) fazem coisa julgada material. Segundo porque estas
sentenças são rescindíveis por expressa previsão legal (cfr. art. 485, VIII).
Não seria mesmo adequado entender que a parte interessada teria duas medidas –
extremamente excepcionais, como o são a ação rescisória e a ação anulatória – para
desconstituir o mesmo ato. Não se justifica, com a devida vênia, permitir o cabimento de
ação rescisória para atacar a sentença que homologa a transação e ação anulatória para
desconstituir a transação em si. O mesmo raciocínio vale para o reconhecimento jurídico
do pedido e para a renúncia ao direito sobre o qual se funda a ação.
Como defendemos, sempre que houver sentença de mérito, terá cabimento unicamente a
ação rescisória. A ação anulatória é incompatível com a sentença que decide o mérito da
causa, mesmo que esta limite-se a homologar o ato praticado pela parte (v.g.
reconhecimento jurídico do pedido) ou pelas partes (v.g. transação). Nesse sentido,
parece ter andado o projeto no novo CPC, na medida em que o §2.º do art. 284, assinala
que “não se aplica o disposto neste artigo [cabimento da ação anulatória] quando o
pronunciamento homologatório resolver o mérito e transitar em julgado, caso em que
será cabível ação rescisória, nos termos do art. 978”.
Este entendimento, contudo, atualmente, está longe de ser pacífico. Por isso,
:
abordaremos algumas situações – transação, jurisdição voluntária, dentre outras –,
separadamente, em capítulo próprio.
É preciso, portanto, distinguir quando será cabível a ação rescisória e quando será cabível
a ação anulatória. Não se pode, contudo, admitir situações em que ambas sejam cabíveis,
embora concordemos que, excepcionalmente, possa se admitir a aplicação do princípio da
fungibilidade.
Antes, contudo, vale apenas esmiuçar o conceito de sentença “meramente
homologatória”, expressão contida no art. 486 do CPC.
4. Significado de sentença meramente homologatória
Como anota a melhor doutrina, “sentença meramente homologatória” significa “sentença
homologatória”. Não existem duas espécies de sentença homologatória: uma
homologatória propriamente dita e outra meramente homologatória. É falsa a impressão
que o art. 486, do CPC, poderia gerar nesse sentido: “qualquer sentença homologatória
poderia encarta-se na previsão contida no art. 486 do CPC”.23
Nesse sentido, de há muito, já ensinava Barbosa Moreira:24 “(…) não soam convincentes
as tentativas de diferenciar com nitidez, de um lado, sentenças meramente
homologatórias e, de outro, sentenças homologatórias que não o sejam ‘meramente’.
Para nós a sentença é homologatória quando se limita a imprimir a ato não oriundo do
órgão judicial força igual à que ele teria se de tal órgão emanasse – isto é, a equiparar
um ato a outro, sem nada acrescentar à substância do primeiro. O advérbio ‘meramente’
não visa caracterizar uma subespécie de sentenças homologatórias, mas apenas enfatizar
que é dessa espécie que se trata, e não de sentenças que não restrinjam a homologar;
simples realce do adjetivo, nada mais”.25
Berenice Soubhie Nogueira Magri,26 embora veja equívoco na utilização do termo
“meramente”, visualiza certa distinção entre a sentença homologatória e sentença
“meramente homologatória”. Para a autora “a sentença meramente homologatória
mencionada no art. 486 do CPC, é aquela que resume a atividade do juiz em homologar o
ato, sem tratar do mérito da causa, acolhendo ou rejeitando o pedido”, ou seja, “é aquela
proferida em processo sem tratar do mérito – denominada de forma equivocada de
‘meramente homologatória’”. Segundo entende, esta sentença é terminativa, extingue o
processo sem julgamento do mérito. A sentença homologatória prevista no inc. III do art.
269 do CPC, que faz coisa julgada material, por sua vez, seria aquela que homologa a
transação, “enfrentando o mérito, acolhendo ou rejeitando o pedido, na sua totalidade ou
em parte”. Esta não pode ser meramente homologatória. Conclui, assim, que contra a
primeira cabe ação anulatória e contra a segunda cabe ação rescisória.
Respeitado o entendimento em sentido contrário, sentença meramente homologatória
cuida-se de sentença homologatória, aquela que confere a determinados atos praticados
pelas partes efeitos próprios de ato judicial. Não há, no nosso entendimento, qualquer
distinção entre sentença homologatória e sentença meramente homologatória. Tanto é
assim que o projeto do novo CPC não utiliza mais o termo meramente.
Existe apenas sentença homologatória. Importa para o cabimento da ação anulatória ou
da ação rescisória verificar se a sentença homologatória extingue o processo com ou sem
julgamento de mérito. Se extinguir o processo com julgamento de mérito, caberá ação
rescisória; por outro lado, se extinguir sem julgamento de mérito, poderá caber ação
anulatória para desconstituir o ato praticado pela parte que a originou.
5. Fundamentos para a invalidação
Como visto, diz a doutrina, de forma unânime, que a expressão “nos termos da lei civil”,
contida no art. 486 do CPC, padece de imprecisão terminológica, na medida em que os
fundamentos para a propositura da ação anulatória não se limitam à matéria regulada
exclusivamente pela lei civil, mas, sim, abrangem os vícios de nulidade dos atos jurídicos
:
do direito material, de todos os ramos. Daí porque o projeto do novo CPC diz apenas nos
termos da lei.
Assim, o cabimento da ação anulatória não se limita também às invalidações regidas pelo
direito civil nos arts. 138 a 184: erro ou ignorância, dolo, coação, estado de perigo, lesão,
fraude contra credores, e das demais invalidades previstas nos arts. 166 e ss. Como bem
pontua Cassio Scarpinella Bueno,27 também as regras de direito público podem ser
fundamentais para identificar vício de ato praticado pela parte em juízo, como, por
exemplo, o disposto nos arts. 2.º e 4.º da Lei 4.717/1965 (Lei da Ação Popular) ou ainda
os arts. 9.º a 11 da Lei 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa).
Nesse mesmo sentido, Humberto Theodoro Júnior:28 “a expressão ‘lei civil’ do art. 486
deve ser entendida em sentido amplo, abrangendo todos os ramos do direito material”.
Idêntico é o entendimento de Barbosa Moreira,29 para quem “a referência à ‘lei civil’ é
injustificadamente restritiva: deve entender-se que os motivos de anulabilidade são os
previstos em quaisquer normas de direito material. Seja qual for o ramo do direito
material a que pertença a norma, se o ato homologado lhe estiver sujeito e nela se previr
algum motivo de anulabilidade, caberá a ação do art. 486”. Afinado com este
entendimento, encontra-se lição de Berenice Soubhie Nogueira Magri:30 “evidentemente,
a expressão ‘nos termos da lei civil’ quer significar ‘nos termos do direito material’,
estendendo-se a todos os ramos do direito material público ou privado, inseridos nesse
conceito o direito civil, o direito administrativo, o direito comercial, o direito do trabalho,
bem como as demais legislações especiais”.
Como bem adverte Rita de Cássia Corrêa de Vasconcellos,31 “a preocupação do legislador,
ao se referir à lei civil, certamente foi deixar claro que as nulidades do direito material
não se confundem com as nulidades processuais; são diferentes os sistemas das
nulidades do direito material e do direito processual, ainda que, como traço comum aos
dois sistemas, ambos considerem as nulidades mais graves que as anulabilidades”.
Aí está, portanto, uma das distinções entre a ação anulatória e ação rescisória: a primeira
encontra fundamento nos vícios de ordem material, ao passo que a rescisória deve ser
proposta com espeque em alguma das situações previstas no art. 485 do CPC, que tem
como fundamento vícios de ordem processual. Os fundamentos de invalidação dos atos
praticados pelas partes em juízo são os mesmos de quaisquer atos de direito material;
são diferentes, portanto, dos fundamentos previstos no art. 485 do CPC, para o
ajuizamento da ação rescisória.
Não obstante estas considerações, indene de dúvidas que a ação anulatória, na grande
maioria das vezes, encontra fundamento nos vícios de consentimento regulados pelo
direito civil, quais sejam: erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão e fraude contra
credores e a simulação. Vejamos então cada um deles, mesmo que brevemente.
Antes, contudo, vale anotar que, não obstante seja mais comum ajuizar-se a ação
anulatória quando se cuidar de vício de nulidade relativa, nada impede que se ajuíze ação
anulatória de ato nulo (nulidade absoluta), caso não tenha sido decretada a sua nulidade
no próprio processo, de ofício ou a requerimento das partes.32
Erro ou ignorância (arts. 138-144 do CC/2002). A legislação brasileira não diferencia o
erro da ignorância, embora a doutrina costume dizer que o erro é uma falsa
representação positiva da realidade, ao passo que a ignorância traduz um estado
negativo de conhecimento.33 O erro é causa de invalidade do negócio jurídico
(anulabilidade), devendo ter, segundo a doutrina clássica, dois requisitos: (a) ser
essencial ou substancial e (b) escusável ou perdoável.
A doutrina mais moderna, por sua vez, atenta ao fato de ser muito abstrato analisar a
escusabilidade ou não do erro, desconsidera este segundo requisito, a luz do princípio da
confiança. Nesse sentido, Enunciado 12 da I Jornada de Direito Civil: “na sistemática do
art. 138 é irrelevante ser ou não escusável o erro, porque o dispositivo adota o princípio
:
da confiança”.34
Rita de Cássia Corrêa de Vasconcellos35 anota que “exige-se como pressupostos para que
se invalide o negócio que o erro seja substancial, escusável e que seja conhecido ou
suscetível de ser conhecido da outra parte”. Segundo a autora, “este último pressuposto
constitui inovação do Código Civil de 2002 e traduz claramente a intenção do legislador
de assegurar a estabilidade das relações negociais e de proteger terceiros de boa-fé”. Em
sentido contrário, Carlos Roberto Gonçalves:36 “O erro consiste em uma falsa percepção
da realidade. Nessa modalidade de vício do consentimento o agente engana-se sozinho.
Quando é induzido em erro pelo outro contratante ou por terceiro, caracteriza-se o dolo”.
A luz do art. 139 do CC, temos quatro espécies básicas de erro: o erro sobre negócio, que
é aquele que incide sobre a natureza do ato que se realiza; o erro sobre o objeto, que é
aquele que incide nas características do próprio negócio; o erro sobre pessoa, que é
aquele que incide nos elementos de identificação da outra parte no negócio; e o erro de
direito.
Dolo (arts. 145 a 150 do CC/2002). O dolo, causa de invalidade do negócio jurídico
(anulabilidade), caracteriza-se quando uma das partes é maliciosamente induzida ao erro.
O dolo é um vício carregado de má-fé.
O dolo, para a teoria do negócio jurídico, pode ser de duas espécies básicas: (a) dolo
principal – aquele que ataca a causa do negócio, a sua essência, culminando na sua
invalidade (art. 145 do CC/2002); e (b) dolo acidental – aquele que, por não atingir a
causa do negócio, não o invalida, determinando apenas a obrigação de pagar perdas e
danos (art. 146 do CC/2002). O único dolo que invalida o negócio é o dolo principal; o
dolo acidental é secundário, não invalida o negócio jurídico, apenas gera obrigação de
pagar perdas e danos.
Há ainda o dolo negativo, previsto no art. 147 do CC/2002, que se traduz no silêncio
intencional; silêncio este que, em franca violação à boa-fé objetiva, induz a vítima ao
erro.37 Este dolo negativo afronta o dever de informação.
Por fim, vale lembrar que o chamado dolo bilateral é previsto no art. 150 do CC/2002,
caso em que nenhuma das partes pode pretender anular o negócio ou reclamar
indenização uma da outra.
Coação (arts. 151 a 155 do CC/2002). A coação que invalida o negócio jurídico (causa de
anulabilidade) traduz uma violência psicológica apta a influenciar a vítima a efetuar
negócio que voluntariamente não quer realizar. A coação que invalida o negócio jurídico é
a coação moral (vis compulsiva). A coação física (vis absoluta), que neutraliza
completamente a vontade, por sua vez, é causa de nulidade.38 Na coação moral existe
vontade, embora viciados em razão “de fundado temor de dano iminente e considerável à
sua pessoa, à sua família, ou aos seus bens” (art. 151 do CC/2002). Nos termos do art.
152 do CC/2002, ao apreciar a coação, não deve o juiz fazer um juízo abstrato, mas sim,
analisar concretamente a condição da vítima.
Estado de Perigo (art. 156, do CC/2002). Este vício não estava previsto no Código Civil de
1916, mas foi contemplado no Código Civil de 2002, em seu art. 156, cuja ideia básica é
o reconhecimento de um estado de necessidade invalidante do negócio jurídico. Isto é, o
estado de perigo, causa invalidante do negócio (anulabilidade), caracteriza-se quando
uma das partes premida da necessidade de salvar-se ou a pessoa próxima de grave dano
conhecido pela outra parte, assume uma obrigação excessivamente onerosa.
Talvez a mais nítida aplicação da teoria do estado de perigo para permitir a invalidação do
ato negocial refere-se à espúria exigência do cheque caução como condição para o
atendimento emergencial hospitalar. Esta exigência, hoje, é vetada pelo Código Penal, em
seu art. 135-A, acrescido pela Lei 12.653/2012.
A lesão (art. 157 do CC/2002), vício invalidante do negócio jurídico, consiste na
:
desproporção existente entre as prestações do negócio, em virtude da necessidade ou
inexperiência de uma das partes, que experimenta o prejuízo. A previsão deste defeito,
consagrada no Código Civil de 2002 e ausente no Código Civil de 1916, atende ao
princípio da função social.39 Como bem pontua Rita de Cássia Corrêa de Vasconcellos:40
“só estará caracterizada a lesão quando a desproporção entre as prestações for
acentuada, sendo inegável que o legislador conferiu ao juiz a função de decidir segundo
as especificidades da situação concreta que lhe é apresentada”.
A fraude contra credores, diferentemente dos vícios vistos acima (vícios de
consentimento), é vício social do negócio jurídico presente quando o devedor insolvente
ou que beira a insolvência realiza negócios onerosos ou gratuitos com o intuito de
prejudicar credores.
Os atos praticados em fraude contra credores, pela lei, são anuláveis (CC/2002, arts.
158, 171 e 178). Parte da doutrina e da jurisprudência, entretanto, entende que o ato
praticado deve ser considerado como ineficaz. Isto porque, anulado o negócio jurídico, o
bem volta ao patrimônio do devedor insolvente ou vai para o acervo em concurso de
credores (art. 165, do CC). Com esta solução, o credor pode “ganhar e não levar”, ou
seja, o credor pode vir a ganhar a ação anulatória, mas não receber o que lhe é devido
em razão de eventual comprometimento que os bens do devedor possam ter junto a
outros credores. Carlos Roberto Gonçalves anota que “sob o aspecto prático, a teoria da
ineficácia relativa é mais apropriada, pois a declaração de que o negócio jurídico não
prejudica aos credores anteriores ao ato, por ineficaz em relação a eles, é suficiente para
satisfazer o interesse destes, autorizando a penhora dos bens como se ainda se
encontrassem no patrimônio do executado”.41 No mesmo sentido, manifesta-se Yussef
Said Cahali.42–43
São requisitos da fraude contra credores: no caso de disposição onerosa de bens: (a)
conluio fraudulento entre o alienante e o comprador ou colusão (consilium fraudis) mais
(b) prejuízo ao credor (eventus damni); no caso de disposição gratuita, há um único
requisito, qual seja: o prejuízo ao credor (eventus damni).
Independentemente da divergência doutrinária e jurisprudencial mencionada acima
(anulação vs. ineficácia do ato), a fraude contra credores, como se sabe, exige a
propositura de uma ação anulatória, chamada pauliana, que deve ser proposta, em
litisconsórcio passivo necessário e unitária, contra o devedor, a pessoa que com ele
celebrou o negócio e contra terceiros de má-fé (cf. art. 161 do CC/2002). Esta ação,
portanto, não é proposta com base no art. 486 do CPC, mas, sim, com espeque no
Código Civil, mesmo porque os atos praticados em fraude contra credores não são
praticados ou inseridos dentro do processo: “embora semelhante, a ação pauliana não se
funda no art. 486 do CPC, até porque a ação própria deste dispositivo legal independe do
ajuizamento prévio de outra ação de conhecimento ou execução”.44 Entretanto, observa
Rita de Cássia Corrêa de Vasconcellos45 que “tendo sido praticados no processo ou nele
adequadamente inseridos, os atos fraudulentos são passíveis de anulação por meio de
ação anulatória de que ora se trata”.
Simulação. No Código Civil de 1916, a simulação foi tratada como causa de anulabilidade
do negócio jurídico. Contudo, a partir do CC/2002, a simulação passou a ser tratada como
causa de nulidade absoluta do negócio jurídico: “É nulo o negócio jurídico simulado, mas
subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma”.
Na simulação, celebra-se um negócio jurídico aparentemente normal, mas que, em
verdade, não pretende atingir o efeito que juridicamente deveria produzir. A simulação é
bilateral: “na simulação há conluio. Existe uma conduta, um processo simulatório; acerto,
concerto entre os contratantes para proporcionar aparência exterior do negócio (…) a
simulação implica sempre conluio, ligação de mais de uma pessoa para criar a
aparência”.46
Há duas espécies de simulação: (a) absoluta e (b) relativa (dissimulação). Na simulação
:
absoluta, as partes criam um negócio jurídico destinado a não gerar efeito jurídico algum.
Ele é nulo de pleno direito. Na simulação relativa, também chamada de dissimulação, as
partes celebram um negócio destinado a encobrir outro negócio, que produzirá efeitos
proibidos pelo ordenamento jurídico.47 Nas palavras de Carlos Roberto Gonçalves,
“simulação não se confunde, pois, com dissimulação, embora em ambas haja o propósito
de enganar. Na simulação, procura-se aparentar o que não existe; na dissimulação,
oculta-se o que é verdadeiro. Na simulação, há o propósito de enganar sobre a existência
de situação não verdadeira; na dissimulação, sobre a inexistência de situação real”.48
Na simulação relativa, nos termos da parte final do art. 167 do CC/2002, e do Enunciado
153 da III Jornada de Direito Civil,49 é possível, a luz do princípio da conservação,
aproveitar-se o negócio dissimulado se não houver ofensa à Lei ou a terceiros.
Nos termos do Enunciado 294 da IV Jornada de Direito Civil, perdeu espaço a regra do
art. 104 do CC/1916 que proibia às partes de alegar simulação uma contra a outra. Hoje,
após a vigência do Código Civil de 2002, por ser causa de nulidade absoluta, qualquer
pessoa pode impugnar ou até mesmo o juiz reconhecer o defeito de ofício. A ação
anulatória, fundada neste vício, pode, portanto, ser proposta por qualquer das partes, por
terceiro e também pelo Ministério Público.
Decomposto o enunciado do art. 486 do CPC, entendidas as hipóteses de cabimento da
ação anulatória e seus possíveis fundamentos, passemos, então, a analisar algumas
situações em que o CPC não deixa claro se se cuida de ato atacável via ação anulatória
ou por meio de ação rescisória.
6. Desistência, reconhecimento jurídico do pedido, renúncia ao direito sobre o
qual se funda a ação e confissão
Ao lado da transação,50 o reconhecimento jurídico do pedido e a renúncia ao direito sobre
o qual se funda a ação são atos praticados pelas partes – o primeiro pela parte passiva e
o segundo pela parte autora – que dão ensejo a uma sentença “meramente
homologatória”, mas de mérito, conforme incs. II e V do art. 269 do CPC.51
Nestes casos, tem cabimento a ação anulatória prevista no art. 486 do CPC, ou a ação
rescisória com fundamento no inc. VIII do art. 485 do CPC – cuja redação é seguinte: “A
sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando (…) houver
fundamento para invalidar confissão, desistência ou transação, em que se baseou a
sentença”?52
A desistência não leva a uma sentença de mérito, por isso, é unânime o entendimento de
que, ao invés de desistência, quis o inc. VIII do art. 485 do CPC, dizer renúncia ao direito
sobre o qual se funda a ação. É que, se desistência da ação leva a uma decisão sem
exame de mérito (cf. art. 267, VIII), é impossível cogitar-se de cabimento de ação
rescisória, que exige que o ato impugnável seja “sentença de mérito transitada em
julgado” (art. 485, caput).
Barbosa Moreira explica a origem do equívoco do legislador que fez parecer que a
sentença que homologa a desistência da parte é passível de ação rescisória. É que no
direito português o vocábulo “desistência” designa tanto a desistência da ação
(desistência de instância no direito luso) como a renúncia ao direito sobre o qual se funda
a ação (desistência do pedido no direito luso).53 Por isso, “deve-se encarar o termo
desistência contido no art. 485, VIII, do CPC como sendo renúncia”.54 A sentença que
homologa a renúncia, quando houver motivo para tanto, deve ser atacada via ação
rescisória.
A desistência, por sua vez, não obstante levar a uma sentença sem resolução de mérito,
não impede a repropositura da ação (cf. art. 268 do CPC). Entretanto, cuidando-se de ato
praticado em juízo pela parte, cuja eficácia não prescinde de decisão homologatória (cf.
redação do parágrafo único do art. 158 do CPC), pode-se, sim, cogitar ser hipótese de
:
ajuizamento de ação anulatória.
Em suma, a sentença lastreada em renúncia ao direito sobre o qual se funda a ação é
passível de ação rescisória;55 a sentença que homologa a desistência, embora não impeça
a repropositura da ação, pode ser, a princípio, objeto de ação anulatória: havendo vício de
anulabilidade ou nulidade, cabe ação anulatória para desconstituir a desistência enquanto
ato praticado pela parte em juízo, nos termos do direito material.56 A renúncia ao direito,
homologada por sentença de mérito, exige, para sua desconstituição, o ajuizamento de
ação rescisória.
O mesmo se diz em relação à sentença que se lastreia no reconhecimento jurídico do
pedido: esta, apta a formar coisa julgada material (art. 269, II), é passível de ação
rescisória e não se confunde com a confissão. O reconhecimento jurídico do pedido é ato
privativo do réu que consiste na admissão de que a pretensão do autor é fundada e,
portanto, deve ser julgada procedente. Recai, portanto, sobre o direito e só pode ocorrer
quanto a direitos disponíveis. Se se regular e correto na forma, implica necessariamente
a extinção do processo com julgamento de mérito, de procedência do pedido, cuja
desconstituição deve ser pleiteada via ação rescisória. A confissão, por sua vez, é meio de
prova, pode ser efetivada por qualquer das partes e tem como objetivo o fato e não o
direito.57 A confissão não dá ensejo, obrigatoriamente, a uma sentença de mérito, muito
menos de procedência da ação.
A confissão (prevista no art. 348 do CPC58) não se confunde com reconhecimento jurídico
do pedido e tampouco com a renúncia sobre a qual se funda a ação.59–60 Cuida-se de
meio de prova que deve ser levada em consideração pelo julgador no momento de
sentenciar.61 A confissão, por si só, não pode ser homologada por sentença apta a formar
coisa julgada material, tal como é possível com o reconhecimento jurídico do pedido.
Entretanto, não se nega que é bem provável que a confissão, caso feita sobre fato de
fundamental importância para o desfecho da lide, constitua o (único) fundamento da
sentença de mérito.
Sendo assim a confissão, deve ser impugnada via ação rescisória ou por meio de ação
anulatória? Como visto, o inc. VIII do art. 485 do CPC, diz que cabe ação rescisória
quando houver motivo para se invalidar a confissão em que se baseou a sentença;
entretanto, a confissão, enquanto meio de prova, não deixa de ser ato volitivo praticado
pela parte no curso do processo, o que daria ensejo à ação anulatória.
O art. 352 do CPC, nos dá a resposta, não deixando margem de dúvidas quando é cabível
a ação rescisória e quando será cabível a ação anulatória. De acordo com o inc. I, será
cabível a ação anulatória quando ação em que feita a confissão, viciada por erro, dolo ou
coação, ainda estiver em curso; por outro lado, será cabível a ação rescisória se já
transitada em julgado a sentença, da qual a confissão constituir o único fundamento.62
Esta regra, segundo a melhor doutrina, deve ser adotada ainda para invalidar os atos que
reconhecem a procedência da ação ou que renunciam o direito sobre o qual se funda a
ação. Isto é, caso o processo ainda esteja pendente, é cabível o ajuizamento da ação
anulatória; caso o ato da parte já tenha dado ensejo a uma sentença de mérito, apta a
formar coisa julgada material, somente terá cabimento a ação rescisória: “um critério
seguro para distinguir ambas as hipóteses, é o que leva em conta o momento da
impugnação do ato. Se pretendida sua impugnação do mundo jurídico enquanto pendente
o processo em que o ato produziu ou produzirá seus efeitos, a hipótese é de ‘ação
anulatória’, porque não há coisa julgada enquanto não houver litispendência (…). Caso
contrário, isto é, desde que transitada em julgado a decisão homologatória do ato, a
hipótese é de rescisória”.63
Esta parece ser a interpretação correta, na medida em que não obriga a parte, que tenha
motivos para invalidar o reconhecimento jurídico do pedido ou de renúncia sobre o qual
se funda a ação, aguardar a prolação da sentença de mérito para que busque a
:
desconstituição do ato viciado.64 Esta parece também ter sido a posição acolhida pelo
projeto do novo CPC (ex vi § 2.º do art. 284).
7. Sentença que homologa transação
A transação, assim como a desistência, confissão, reconhecimento jurídico do pedido e
renúncia ao direto sobre o qual se funda a ação, é outro ato da parte, ou melhor, negócio
jurídico celebrado por ambas as partes em juízo ou a ele trazido para homologação
judicial cuja desconstituição é palco de grande celeuma doutrinária e jurisprudencial. Isso
porque diz o inc. VIII do art. 485 do CPC, que: “a sentença de mérito, transitada em
julgado, pode ser rescindida quando (…) houver fundamento para invalidar (…) transação,
em que se baseou a sentença”. O art. 486 do CPC, por sua vez, anota que “os atos
judiciais, que não dependem de sentença, ou em que esta for meramente homologatória,
podem ser rescindidos, como os atos jurídicos em geral, nos termos da lei civil”. Anota-se
ainda que o inc. III do art. 269 do CPC, atribui status de sentença de mérito ao ato do
juiz que homologa transação.
Sendo assim, mais uma vez vem a pergunta: qual ação desconstitutiva é cabível quando
houver motivos para anular/rescindir, ou seja, para expurgar do mundo jurídico a
sentença que homologou transação viciada? A doutrina, ao longo dos anos, de diversas
formas, buscou responder esta indagação.
Uma primeira corrente diferencia a sentença que homologa a transação e a sentença em
que se baseia em uma transação. Segundo este entendimento, o inc. VIII do art. 485 do
CPC, fala em “fundamento”. Sendo assim, para os adeptos dessa corrente, é cabível a
ação rescisória quando houver um julgamento de mérito da demanda em que a transação
constituir um dos fundamentos da sentença que se busca rescindir; por outro lado, caso o
juiz tenha se limitado a homologar a transação, não decidindo absolutamente nada, é
cabível a ação anulatória. Neste último caso, quem pôs fim ao litígio foram as próprias
partes mediante a celebração do acordo. Esta “distinção entre a ação rescisória e a ação
anulatória, no tocante à rescisão ou anulação da transação, estaria a perquirir se o juiz,
na sentença, julgou o caso com base em transação celebrada entre as partes, ou se ele
cingiu-se a homologar a transação, tendo as partes, elas mesmas, ao celebrá-la,
encerrado o litígio”.65 Como sintetiza José Arnaldo Vitagliano, “se a sentença é
meramente homologatória, a ação cabível é a ação anulatória, não a rescisória. Se,
porém, a sentença adota o ato de vontade das partes como fundamento, aí o caso é de
rescisão.66 No mesmo sentido, encontra-se antiga lição da Prof. Thereza Arruda Alvim.67
Para esta primeira linha de pensamento, portanto, a ação rescisória seria cabível para
desconstituir sentença de mérito que, acolhendo ou rejeitando o pedido do autor, se
baseasse em transação celebrada pelas partes, ao passo que a ação anulatória tem como
escopo desconstituir sentença que se limita a homologar a transação celebrada pelas
partes. Na primeira hipótese, a sentença enquadra-se no inc. I do art. 269 do CPC; já na
segunda hipótese, a sentença enquadra-se no inc. III.68 Nesse sentido, colhem-se
julgados do STJ.69
Este é o entendimento de Berenice Soubhie Nogueira Magri:70 “a sentença homologatória
da transação que tenha apreciado o mérito, acolhendo ou rejeitando o pedido, será
rescindida, invalidando a transação, mediante ação rescisória, porque a decisão extinguiu
o processo com julgamento do mérito, operando coisa julgada material; e de outra parte,
se a sentença for simplesmente homologatória (‘meramente homologatória’) das
transações, sem apreciar o mérito, nem acolher ou rejeitar o pedido, contra esse ato de
transação inválido caberá ação anulatória do art. 486, esvaziando, por consequência, a
sentença ‘meramente homologatória’”.
Há inúmeros julgados do STJ no sentido de que o art. 486 do CPC, dirige-se aos casos de
sentença meramente homologatória, em que o magistrado não aprecia nenhum aspecto
da transação a que chegaram as partes, limitando-se a reconhecê-la como fundamento
único da sentença: “A teor da jurisprudência desta Corte, a ação anulatória, prevista no
:
art. 486 do CPC, é sede própria para a discussão a respeito dos vícios na transação
homologada judicialmente” (REsp 509.793/RS, rel. Min. Jorge Scartezzini, j. 04.05.2006);
“A ação ordinária anulatória, prevista no art. 486 do CPC, é a sede própria para a
invalidação de acordo homologado judicialmente, oportunidade em que poderão ser
discutidos os vícios do ato objeto da anulação” (REsp 693.960/RJ, rel. Min. Francisco
Falcão, j. 17.11.2005); “A decisão judicial que homologa acordo entre os litigantes do
processo não produz coisa julgada material, podendo ser anulada a avença por ação
diversa da rescisória” (REsp 763.762/GO, rel. Min. Eliana Calmon, j. 20.09.2005); e “A
ação anulatória, prevista no art. 486 do CPC é sede própria para a discussão a respeito
dos vícios na transação homologada judicialmente” (AgRg no REsp 596.271/RS, rel. Min.
Nancy Andrighi, j. 20.04.2004).71
Este parece ser o entendimento amplamente majoritário no STJ. Entretanto, com o
devido respeito, diferentemente do que sustenta esta linha de entendimento, não vemos,
diante da redação do inc. III do art. 269 do CPC, como sustentar que a sentença que se
limita a homologar transação não faça coisa julgada material.72
Por isso, Rodrigo Barioni, com razão, critica este posicionamento, à consideração de que
ele desconsidera que a sentença que homologa a transação faz coisa julgada material,
nos termos do art. 269 do CPC: “essa interpretação desconsidera o fato de que a
sentença que homologar a transação extingue o processo com resolução de mérito (art.
269, III, CPC), razão pela qual pensamos não deve prevalecer”.73 Rodrigo Barioni74
considera correto o entendimento de que contra a sentença que homologa transação cabe
única e exclusivamente ação rescisória: “Daí ser correta, a nosso ver, a posição que
considera a ação rescisória necessária a desconstituir a sentença homologatória de
transação, caso em que tanto o ato-base quanto a própria sentença deixarão de subsistir.
À ação anulatória fica reservado o ataque aos atos praticados em juízo e que estejam
sujeitos a homologação por decisão não enquadrada no art. 269, III, do CPC, como a que
homologa adjudicação ou a arrematação”.
No mesmo sentido, destaca-se lição de Rita de Cássia Corrêa de Vasconcellos:75 “a
transação, conforme disposição legal expressa, enseja a extinção do processo com
julgamento de mérito (CPC, art. 269, III). E as sentenças encartáveis nos incisos do art.
269 podem ser rescindidas, não anuladas”. Lembra que “o juiz, antes de homologar a
transação, deverá verificar se estão presentes os seus requisitos formais e se o ato está
em conformidade com a legislação aplicável ao caso singular”. O juiz, desse modo,
“exerce um ‘juízo de valor’ ao proferir a sentença, ainda que homologatória”.
Cassio Scarpinella Bueno faz referências a julgados que exigem, para o cabimento da
ação rescisória, que o descumprimento da transação possa acarretar execução da própria
decisão homologatória, e não mais do negócio jurídico entabulado entre as partes (art.
585, II).76 O mesmo autor faz referência a uma linha de raciocínio cujo “critério distintivo
entre as duas hipóteses repousa na circunstância de a transação ser homologada em
sede de ‘jurisdição contenciosa’ ou de ‘jurisdição voluntária’”.77 Segundo esta corrente,
“somente neste último caso, é que a invalidação do acordo deveria ser buscada pela ação
anulatória”.78
Cassio Scarpinella Bueno, no entanto, propõe que o cabimento da ação rescisória ou da
ação anulatória depende única e exclusivamente do pedido e da causa de pedir feito na
demanda que visa a desconstituição do ato impugnado. Isto é, a pretensão do autor que
irá dizer se será cabível a ação rescisória ou a ação anulatória: “se ele pretender
questionar, com sua nova investida jurisdicional, o ato tal qual praticado com a outra
parte no outro processo, cuja participação jurisdicional foi de cunho homologatório, deve
aplicar-se o art. 486; do contrário, se o objeto de questionamento do ato for a própria
decisão jurisdicional, em si mesma considerada, a hipótese reclama a sua rescisão, com
observância do disposto no art. 485”.79
:
Humberto Theodoro Júnior80 propõe que a distinção seja feita de acordo com a existência
de litigiosidade ou não no processo em que celebrada a transação. Para o brilhante
processualista, “a rigor, somente em procedimento de jurisdição voluntária seria possível
divisar a sentença meramente homologatória, porque só ai é que o ato jurisdicional não
faria coisa julgada material”. Diferentemente, na hipótese em que “o acordo dos litigantes
(transação) importa a solução de uma lide que já é objeto de um feito contencioso em
andamento na Justiça, a sentença que o homologa não deveria ser havida como
‘meramente homologatória’, visto que importa encerramento do processo com julgamento
do mérito (art. 269, III), e, consequentemente, produz a coisa julgada material (arts.
467 e 468)”. Neste caso, “a autocomposição da lide é jurisdicionalizada (…) pela
homologação do juiz, que a encampa e chancela como se fora uma solução dada pela
própria sentença. Daí ter antiga exegese assentado que o ataque à res iudicata gerada
pela sentença que homologa a transação haveria de ser feita somente pela via da ação
rescisória (art. 485, VIIII)”.
Uma outra corrente, mais acertada no nosso entendimento, sustenta a aplicação
analógica do art. 352 do CPC, à transação. Diz o art. 352 do CPC, como visto acima, que
a confissão, quando emanar de erro, dolo ou coação, pode ser revogada de duas
diferentes formas, quais sejam: por meio de ação anulatória, se ainda pendente o
processo em que foi feita (inc. I); ou por meio de ação rescisória, se a pretensão ocorrer
depois de transitada em julgado a sentença, da qual a confissão constituir o único
fundamento (inc. II). Esta corrente baseia-se, portanto, na existência de coisa julgada
material: se houver coisa julgada material, será cabível ação rescisória; se ainda não
houver, terá cabimento o ajuizamento da ação anulatória.
Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery, escorados na doutrina de Barbosa Moreira,
pensam desta forma: “a confissão, reconhecimento do pedido, renúncia, transação,
podem ser anulados pela ação de que trata a norma sob comentário [art. 486, do CPC],
no curso do processo, pois transitada em julgado a sentença de mérito, é cabível a ação
rescisória com fundamento no CPC 485 VIII”.81–82
A sentença homologatória de transação, a despeito de fazer ou não referências ao mérito
do litígio, cuida-se de sentença de mérito, nos termos do art. 269 do CPC, podendo se
enquadrar no inc. III, quando se limita a homologar a transação; ou no inc. I, quando
utiliza a transação como fundamento para acolher ou rejeitar o pedido do autor. A
sentença de mérito, por formar coisa julgada material, só pode ser desconstituída por
ação rescisória. Somente na hipótese da sentença não se enquadrar em uma das
hipóteses do art. 269 do CPC – e, portanto, não fazer coisa julgada material –, é que será
cabível a ação anulatória prevista no art. 486 do CPC. A sentença que homologa
transação é rescindível, e não simplesmente anulável, na medida em que se deve
proporcionar à parte a oportunidade de rediscutir a decisão e provocar, a um só tempo, o
rejulgamento da causa.83
Em suma, respeitado o entendimento em sentido contrário, cremos que estão com a
razão aqueles que defendem o cabimento da ação rescisória quando a transação já
estiver acobertada por uma sentença homologatória, não havendo qualquer relevância
distinguir sentença meramente homologatória e sentença homologatória; ou perquirir se
o juiz utilizou a transação como razão de decidir ou se simplesmente a homologou; ou
ainda indagar se sentença homologatória ocorreu em sede de processo contencioso ou
não. Importa que a sentença que homologa transação é sentença de mérito e, por isso,
deve ser rescindida via ação rescisória.84 Nesse sentido, parece ter andado o Projeto do
novo CPC: primeiro, porque o art. 497, III, b, diz que a sentença que homologa a
transação faz, sim, coisa julgada; e, segundo, porque o § 2.º do art. 284, parece afastar
definitivamente o cabimento da ação anulatória na hipótese em que se pretende a
desconstituição de ato acobertado por uma sentença de mérito.
Em razão da divergência doutrinária e da proximidade entre as situações que dão ensejo
à ação rescisória ou anulatória, é recomendável que se admita a aplicação do princípio da
:
fungibilidade de meios entre os dois tipos de ação, “determinando-se ao autor a emenda
da petição inicial para o atendimento dos pressupostos exigidos por uma e por outra e a
remessa dos autos ao juízo competente”.85
Nesse sentido, precisa a lição de Rita de Cássia Corrêa de Vasconcellos86 quanto à
aplicação do princípio da fungibilidade entre ação rescisória e anulatória para se
desconstituir transação homologada judicialmente: “a divergência doutrinária e
jurisprudencial, e a própria sistemática da legislação aplicável, podem gerar dúvida
objetiva quanto às hipóteses de cabimento da ação rescisória e da ação anulatória”.87
A despeito disso, não é pacífico o entendimento de que, nessas situações, deve ser
aplicado o princípio da fungibilidade, recebendo-se uma ação em lugar da outra. Berenice
Soubhie Nogueira Magri,88 mesmo reconhecendo a dificuldade em se diferenciar as
hipóteses de cabimento de uma ou de outra ação, nega a possibilidade de aplicação do
princípio da fungibilidade. É que, como sustenta, além das características da ação
rescisória e da ação anulatória serem distintas, torna-se impossível a aplicação do
princípio da fungibilidade em razão do juízo onde devem ser propostas – a ação
anulatória perante o juízo de primeiro grau e a ação rescisória de competência de
Tribunal. Com a devida vênia, não cremos que isso seja óbice à aplicação do princípio da
fungibilidade.
8. A jurisdição voluntária
A doutrina mais tradicional – e ainda predominante – costuma dizer que na jurisdição
voluntária o Poder Judiciário realiza atividade administrativa e, não, atividade
jurisdicional. Por meio desta atividade realiza-se a administração pública de interesses
privados.89 É que “existem atos jurídicos da vida dos particulares que se revestem de
importância transcendente aos limites da esfera de interesses das pessoas diretamente
empenhadas, passando a interessar também à própria coletividade”, como, por exemplo,
o casamente.90 A esses atos, de repercussão na vida social, torna-se necessária a
participação do Estado. Daí a razão da jurisdição voluntária.
A tradicional doutrina brasileira nega aos atos de jurisdição voluntária as características
de atos jurisdicionais, pelos seguintes motivos: “a) não se visa, com eles, à atuação do
direito, mas à constituição de situações jurídicas novas; b) não há o caráter substitutivo,
pois o que acontece é que o juiz se insere entre os participantes do negócio jurídico,
numa intervenção necessária para a consecução dos objetivos desejados, mas sem
exclusão das atividades das partes; c) além disso, o objetivo dessa atividade não é uma
lide, como sucederia sempre com a atividade jurisdicional; não há um conflito de
interesses entre duas pessoas, mas apenas um negócio, com a participação do
magistrado”.91
Diante da negativa de natureza jurisdicional, nega-se, consequentemente, a existência de
coisa julgada material à sentença proferida em sede de jurisdição voluntária. A não
ocorrência da res iudicata, por sua vez, impossibilita cogitar-se de ajuizamento de
eventual ação rescisória contra a sentença proferida na jurisdição voluntária. Por isso,
diz-se que as sentenças homologatórias a que alude o art. 486 do CPC, referem-se às
sentenças proferidas em procedimentos de jurisdição voluntária.92
Fabiano Carvalho93 também sustenta que contra a sentença proferida em sede de
jurisdição voluntária não cabe ação rescisória em razão da inexistência de formação de
coisa julgada material. Embora reconheça que cada vez é mais forte o entendimento
doutrinário no sentido de que na jurisdição voluntária há formação de coisa julgada
material, entende de forma contrária, negando-a. Sustenta o autor que “a coisa julgada é
instituto do processo funcional, cuja garantia articula-se com a necessidade de segurança
na vida social”94 e “justifica-se somente quando as relações jurídicas conflituosas devam
ser imunizadas, para que elas não fiquem indefinidamente sob a dependência de
discussões”. Como “a jurisdição voluntária pressupõe a inexistência de pretensão resistida
:
ou insatisfeita”,95 não havendo um conflito de interesses a ser resolvido pelo Estado-juiz,
não há razão para se falar em aplicação da regra do art. 468 do CPC, e
consequentemente, em formação da coisa julgada material.96 O mesmo autor, contudo,
ressalva que “se no curso do procedimento de jurisdição voluntária ficar caracterizada
uma pretensão resistida, poderá haver a instauração de demanda incidental, na qual será
proferida decisão que poderá ser revestida pela autoridade da coisa julgada,
desconstituível pela via da rescisória”.97 Fabiano Carvalho também nega a existência de
coisa julgada material na jurisdição voluntária diante da possibilidade de o juiz decidir
com base em equidade (art. 1.109 do CPC), não estando ele vinculado à observância
rigorosa do direito aplicável à espécie.98
Em suma, o autor nega a existência de coisa julgada material e, consequentemente, a
possibilidade do ajuizamento da ação rescisória para desconstituição da sentença ali
proferida.99 Entretanto, caso ocorra litigiosidade, tornando-se necessária a participação
efetiva do Estado-juiz a fim de solucionar o conflito de interesses, poder-se-ia falar em
existência de coisa julgada material e, consequentemente, no cabimento da ação
rescisória.
No mesmo sentido, destaca-se doutrina de Zaiden Geraige Neto, que, igualmente,
entende que na jurisdição voluntária não há formação de coisa julgada material. Como
sustenta, “nos procedimentos voluntários, a decisão não tem o condão de declarar a
existência de um determinado direito, mas, simplesmente, de dizer se o pleito está
formalmente em ordem e (…) o Estado somente atua nesses procedimentos por opção
legislativa”.100 Explica que a jurisdição propriamente dita, por sua vez, “tem natureza
secundária, isto é, substitutiva, na medida em que o Estado passará a atuar sobre
determinada situação que, antes de ser invocada a tutela jurisdicional, poderia ter sido
resolvida pacificamente entre as partes envolvidas”.101 A jurisdição voluntária, por sua
vez, não apresenta as características de litigiosidade, de substituição de vontade das
partes e também de possibilidade de formação de coisa julgada material, conforme regra
do art. 1.111 do CPC.102 Daí porque conclui não ser possível o ajuizamento da ação
rescisória, mas, sim, se o caso, o ajuizamento da ação anulatória prevista no art. 486 do
CPC.103
Por outro lado, parte da doutrina entende que a jurisdição voluntária tem natureza
jurisdicional. Para estes, na jurisdição voluntária há ação, podendo ser visualizada a lide
e, consequentemente, partes e coisa julgada. Fredie Didier Jr.,104 com apoio em outras
doutrinas (v.g., Olvídio Baptista e Leonardo Greco), elenca diversas razões para afirmar
que a jurisdição voluntária tem natureza jurisdicional. São estes os motivos apontados
pelo autor: (a) não se pode dizer que não há lide na jurisdição voluntária; a jurisdição
voluntária não pressupõe a existência de lide, mas seus casos são potencialmente
conflituosos e, por isso, mesmo são submetidos à apreciação do Poder Judiciário; (b) a
única definição possível de jurisdição se baseia em seu aspecto subjetivo, ou seja,
jurisdição é a atividade exercida por juízes, ou seja, por órgão investido nesta função; (c)
a jurisdição voluntária se exerce por meio de um processo, daí não poder se falar em
ausência de processo; (d) na jurisdição voluntária, o juiz atua para atender a interesses
privados (interesses das partes, no caso) como terceiro imparcial e desinteressado, ao
passo que a Administração age no seu próprio interesse, ou seja, no interesse da
coletividade como um todo; (e) se há processo e há partes, inegável que há ação; e (f)
existe, sim, coisa julgada na jurisdição voluntária, uma vez que a sentença somente
poderá ser modificada, sem prejuízo dos efeitos já produzidos, se ocorrerem
circunstâncias superveniente (art. 1.111 do CPC).
Para estes que concebem natureza jurisdicional à jurisdição voluntária – corrente
minoritária, é verdade – é, sim, possível falar-se em cabimento de ação rescisória e, não,
ação anulatória. Fredie Didier Jr. e Leonardo Carneiro da Cunha, por exemplo,
diferentemente da doutrina mencionada mais acima, afirmam, peremptoriamente, que a
:
sentença nos procedimentos voluntários (…) produz coisa julgada material, até em razão
do que dispõe o art. 1.111 do CPC, encerrando-se, portanto, no elenco do art. 269 do
CPC”.105 Em sendo assim, concluem que “das sentenças homologatórias em
procedimentos de jurisdição voluntária cabe ação rescisória, e não anulatória, caso haja
algum vício de vontade que lhe enseje a invalidade”.106
A questão, portanto, é polêmica. O projeto do novo Código de Processo Civil, no entanto,
parece resolver a questão, na medida em que, na contramão da doutrina majoritária,
anota que “é rescindível a decisão proferida em procedimento de jurisdição voluntária”
(cfr. § 4.º do art. 978 do CPC projetado).
9. Atos praticados na execução
A ação anulatória também terá cabimento para desconstituir a arrematação, a
adjudicação e a alienação por inciativa particular. Tais atos, entretanto, somente serão
desconstituídos por ação anulatória caso não tenha havido apresentação de embargos à
arrematação ou adjudicação, situações em que haverá julgamento de mérito, passível,
portanto, de rescisão via ação rescisória, ajuizada com fundamento no art. 485 do CPC.
Nesse sentido, precisa a lição de Humberto Theodoro Júnior. Ensina o eminente professor
que, embora a adjudicação e a arrematação se cuidem de atos anuláveis via ação
anulatória, “quando (…), após a expropriação dos bens penhorados, os executados opõem
embargos à adjudicação, à alienação ou arrematação (art. 746), ou o terceiro maneja os
embargos do art. 1.046, e tais impugnações são rejeitadas, a desconstituição do ato
passa a depender de ação rescisória”.107 É que nesses casos “terá havido um processo
contencioso em volta da questão, e o julgamento da ação de embargos, assegurando
validade à arrematação ou adjudicação, será, realmente, uma sentença de mérito”.108
No mesmo sentido, encontra-se doutrina de Berenice Soubhie Nogueira Magri:109 “os atos
de arrematação, de adjudicação e de remição110 são passíveis de anulação por meio de
ação anulatória (art. 486 do CPC) quando estiverem eivados de vício de nulidade e desde
que não tenham sido opostos ou não tenham o mesmo objeto dos embargos à
arrematação e à adjudicação, quando então ensejam sentenças de mérito, cujo remédio
processual contra a sentença proferida nos embargos será a ação rescisória”. No mesmo
sentido, pela possibilidade de ajuizamento de ação anulatória contra a “sentença
homologatória” de adjudicação e arrematação, caso não tenham sido opostos embargos à
adjudicação, à arrematação ou embargos de terceiros, encontram-se julgados do STJ.111
Na hipótese em que os embargos à adjudicação, arrematação ou de terceiros, tenham
sido ajuizados, mas ainda não tenham sido julgados, ainda assim não será possível o
ajuizamento simultâneo de ação anulatória com o mesmo objeto, em razão da ocorrência
de litispendência. Como a ação anulatória terá o mesmo objeto dos embargos,
acreditamos que o juiz deva extingui-la sem julgamento do mérito.
Berenice Soubhie Nogueira Magri vai além. Diz a autora que o cabimento da ação
anulatória em sede de execução não se restringe às hipóteses de arrematação,
adjudicação e remição. Para a autora, “todo o ato praticado pelas partes ou terceiros no
processo de execução – dependente ou não de sentença ‘meramente homologatória’ –
que estiver eivado de vício de nulidade material poderá ensejar a propositura de ação
anulatória do art. 486 do CPC”.112 Entende, inclusive, que a ação anulatória pode ser
meio de impugnação do ato executório homologado pela própria sentença que extingue a
execução, prevista nos arts. 794 e 795 do CPC (isto é, quando o devedor satisfaz a
obrigação; ou o devedor obtém, por transação ou por qualquer outro meio, a remissão
total da dívida; ou ainda quando o credor renunciar ao crédito). Nestes casos, como
sustenta, a sentença que extingue a execução tem natureza de sentença meramente
homologatória e a extinção ocorreu por ato das partes ou de terceiros juridicamente
interessados.
Não é este, todavia, o entendimento que compartilhamos. A sentença proferida com
:
espeque no art. 794 do CPC, tem, sim, conteúdo de mérito e, portanto, faz coisa julgada
material, de modo que sua rescisão exige o ajuizamento de ação rescisória. Fabiano
Carvalho,113 com maestria, diz que é possível traçar um comparativo entre os arts. 794 e
269, ambos do CPC. Segundo o autor, “os incs. I, II e III do art. 794 são correlatos,
respectivamente, aos incs. I, III e V do art. 269”. Observa ainda que “a extinção do
processo de execução com base no inc. I do art. 794 do CPC – quando o devedor satisfaz
a obrigação – também poderá corresponder ao inc. II do art. 269 do CPC, caso o devedor
cumpra espontaneamente a obrigação, como reconhecimento jurídico da pretensão
executiva”. Daí porque concluiu o autor que as decisões que estinguem a execução com
base no art. 794 do CPC, declaradas por sentença, conforme art. 795 do CPC, são
rescindíveis. Reconhece o autor que a única hipótese em que há verdadeiramente um
julgamento puro do mérito é a de rejeição ou acolhimento do pedido. Entretanto, por
política legislativa, o mérito é resolvido em outros casos, ex vi dos incs. II a V do art.
269.114
No projeto do novo CPC há previsão expressa quanto ao cabimento de ação anulatória
para desconstituição do ato negocial praticado no cumprimento de sentença e no
processo de execução (art. 284, § 1.º), dentre os quais podemos destacar a adjudicação
e a arrematação.
10. Outras hipóteses de cabimento (ou não) da ação anulatória
Contra a homologação de sentença estrangeira. Após a EC 45/2004, a homologação de
sentença estrangeira passou a ser de competência exclusiva do STJ, porém, sua
regulamentação ainda é encontrada no Regimento Interno do STF, de quem era a
competência antes de 2004. Nos termos do art. 215 do Regimento Interno do STF, “a
sentença estrangeira não terá eficácia no Brasil sem a prévia homologação pelo STF ou
por seu Presidente”. O art. 217 anota os requisitos para a homologação da sentença
estrangeira: “constituem requisitos indispensáveis à homologação da sentença
estrangeira: I – haver sido proferida por juiz competente; II – terem sido as partes
citadas ou haver-se legalmente verificado a revelia; III – ter passado em julgado e estar
revestida das formalidades necessárias à execução no lugar em que foi proferida; IV –
estar autenticada pelo cônsul brasileiro e acompanhada de tradução oficial”.
Entende a melhor doutrina que a homologação da sentença estrangeira cuida-se de
atividade jurisdicional – e não de atividade administrativa –, uma vez que “tende à
emissão de um pronunciamento através do qual, exatamente, se confere à decisão
alienígena idoneidade para produzir, no território nacional, efeitos como sentença; ou, em
outras palavras, através do qual se lhe comunica a força de um ato de jurisdição
praticado no Brasil”.115 Por se cuidar de atividade jurisdicional, seja qual for o resultado, a
homologação ou não, a sentença faz coisa julgada material: “quer se conceda, quer
recuse à homologação à sentença alienígena, a decisão do Presidente ou do Plenário do
STF reveste-se da autoridade da coisa julgada no sentido material”.116 O resultado desta
ação (de homologação) fica, portanto, “a salvo de futuras contestações ou modificações,
ainda que em feitos diversos (cfr. art. 467), a não ser, eventualmente, por meio de ação
rescisória, que pode caber”.117 É que “o conceito de ‘sentença’, no art. 485, caput,
abrange ainda a decisão do Presidente da Corte Suprema, que acolha ou rejeite o pedido
de homologação de julgado estrangeiro”.118 Caso esta decisão não venha a ser
impugnada via agravo regimental, ou deste não conhecer o Plenário, “será passível de
ataque por meio de ação rescisória”.119 Por outro lado, “em conhecendo do agravo, quer
reforme, quer confirme a decisão do Presidente, terá sido esta substituída pelo acórdão, e
unicamente contra o acórdão é que poderá caber a rescisória”.120
Correto este entendimento. Não há que se falar mesmo em cabimento de ação anulatória
contra a sentença que homologa julgado estrangeiro, eis que não se cuida de ato
praticado pela parte em juízo dependente de sentença homologatória para que possa
surtir efeitos, mas, sim, de verdadeira sentença de mérito, que faz coisa julgada material,
:
cuja desconstituição exige ação rescisória.121 Tranquila, aliás, a jurisprudência do STF,
que, de há muito, admite a ação rescisória contra a decisão (ou acórdão) que homologa
ou deixa de homologar julgado estrangeiro.122
A competência para o julgamento da rescisória tocará ao Tribunal que proferiu a decisão
que se pretende desconstituir. Se se cuidar de rescisória contra homologação de decisão
estrangeira proferida pelo STJ, caberá a este o julgamento da rescisória; por outro lado,
se se cuidar de homologação proferida pelo STF, originalmente (isto é, antes da vigência
da EC 45/2004) ou em sede de recurso extraordinário, será deste a competência para a
ação rescisória.
A sentença que fixa alimentos. Diz o inc. I do art. 471, do CPC, que: “Nenhum juiz
decidirá novamente as questões já decididas, relativas à mesma lide, salvo (…) se,
tratando-se de relação jurídica continuativa, sobreveio modificação no estado de fato ou
de direito; caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuído na sentença”.
A sentença que fixa alimentos se enquadra nesta hipótese, tendo em vista que os
alimentos definitivos trazem consigo a regra rebus sic stantibus, ou seja, podem ser
revisados ou exonerados quando modificadas as circunstâncias fáticas existentes na data
de sua fixação.
Isso, todavia, não significa que a sentença que fixa alimentos não faça coisa julgada
material. Apenas significa que a imutabilidade que decorre da coisa julgada se mantém
enquanto não alterada a situação fática existente no momento em que prolatada a
sentença; modificada a situação fática, isto é, reduzida a necessidade do alimentado ou
diminuída a possibilidade do alimentante a obrigação deve ser revista. A coisa julgada
opera-se conforme cláusula rebus sic stantibus:123
Diante da formação de coisa julgada material, a desconstituição do julgado deve se
pretendida via ação rescisória e, não, por meio de ação anulatória. Entretanto, eventual
ato praticado pela parte no curso da ação de alimentos (v.g. confissão), sem que ainda
tenha havido sentença de mérito, poderá ser objeto de ação anulatória.
Ação cautelar. Majoritariamente, entende-se que não há formação de coisa julgada
material no processo cautelar, em razão de sua sumariedade. É que no processo cautelar,
em regra, não temos cognição exauriente. Nesse sentido, é a regra do art. 810 do CPC:
“O indeferimento da medida não obsta a que a parte intente a ação, nem influi no
julgamento desta, salvo se o juiz, no procedimento cautelar, acolher a alegação de
decadência ou de prescrição do direito do autor”. Segundo este dispositivo, há uma
exceção, qual seja: reconhecimento da prescrição e decadência na cautelar faz coisa
julgada material na ação principal.124
Em sendo assim, em regra, não se pode admitir o ajuizamento de ação rescisória contra a
sentença proferida em sede de ação cautelar: “se a rescisória só poderá ser ajuizada para
rescindir a sentença de mérito transitada em julgado, não há como admitir o ajuizamento
desta ação, como de regra, em processos preventivos e preparatórios, a exemplo da
quase totalidade das ações cautelares”.125 Entretanto, demonstra-se cabível ação
anulatória do art. 486 do CPC, mesmo nas cautelares, desde que haja algum ato
praticado em juízo pelas partes, eivado de vício de nulidade, nos termos da lei civil, a ser
desconstituído”.126
Sentença de partilha em inventário. Diz o art. 1.029 do CPC, que: “A partilha amigável,
lavrada em instrumento público, reduzida a termo nos autos do inventário ou constante
de escrito particular homologado pelo juiz, pode ser anulada, por dolo, coação, erro
essencial ou intervenção de incapaz”. Seu parágrafo único anota ainda que “O direito de
propor ação anulatória de partilha amigável prescreve em 1 (um) ano, contado este
prazo: I – no caso de coação, do dia em que ela cessou; II – no de erro ou dolo, do dia
em que se realizou o ato; III – quanto ao incapaz, do dia em que cessar a incapacidade”.
O art. 1.030 do CPC, por sua vez, fala em rescisão da partilha: “É rescindível a partilha
:
julgada por sentença: I – nos casos mencionados no artigo antecedente; II – se feita com
preterição de formalidades legais; III – se preteriu herdeiro ou incluiu quem não o seja”.
Em sendo assim, a sentença que homologa partilha pode ser objeto de ação anulatória ou
de ação rescisória? Felipe Jakobson Lerrer,127 com apoio em lições de Luiz Fux, Humberto
Theodoro Júnior, Berenice Soubhie Nogueira Magri e outros, responde a indagação da
seguinte forma: “nos casos em que a partilha de bens em inventário ocorrer de forma
consensual, o meio para a sua desconstituição é a propositura da ação anulatória, ao
passo que a ação rescisória se destina às hipóteses de partilha judicial. Assim, havendo
incidente e controvérsias judiciais no processo de inventário, é cabível a ação rescisória
da sentença de partilha, e não a anulatória, pois tal decisão não era meramente
homologatória”. Segundo este entendimento, “nos casos em que não houver contenda
entre os herdeiros e a partilha dos bens for amigável, o prazo para a propositura de
eventual ação anulatória será o ditado pelo direito material, ou seja, de um ano. Sendo,
contudo, caso de ação rescisória, o prazo será de 2 anos, nos termos dos arts. 495 e
1.030, ambos do CPC”. Nesse sentido, encontram-se julgados do STJ.128
O projeto do novo CPC, no entanto, seguindo a linha de entendimento de que a sentença
homologatória faz coisa julgada e onde há formação de coisa julgada não há que se falar
em ação anulatória, assinala, em seu art. 672, § 2.º, que “em relação à partilha amigável
homologada pelo juiz, observar-se-á o disposto no art. 284, § 2.º”, isto é, não cabe ação
anulatória no processo em que houver prolação de sentença com resolução de mérito,
hipótese em que a desconstituição deve ser buscada por ação rescisória.
11. Procedimento
A ação anulatória não segue o rito da ação rescisória, devendo observar as regras do
procedimento comum. Seu prazo, prescricional ou decadencial, conforme o caso, é o do
direito material, não se aplicando o prazo de dois anos da ação rescisória.129
Diferentemente do que ocorre com a ação rescisória, também não há que se falar em
juízo rescindendo e juízo rescisório. A ação anulatória limita-se a invalidar (ou declarar
nulos) os atos praticados pelas partes e, nessa qualidade, introduzidos no processo.130
Berenice Soubhie Nogueira Magri131 ensina que o efeito da procedência da ação
anulatória proposta contra ato praticado pela parte, dependente de sentença
homologatória, é a desconstituição do ato homologado e, indiretamente, a
desconstituição da sentença meramente homologatória, embora esta não tenha sido
objeto (direto) da ação anulatória. A sentença, em si, não é anulada, mas, sim,
esvaziada, pois inconcebível permitir-se que a sentença homologatória possa continuar a
surtir efeitos se o ato se desfez. Neste caso, o processo primitivo, em que praticado o ato
anulado pela sentença proferida na ação anulatória, retomará sua marcha a partir daí,
isto é, a partir do momento anterior ao que foi praticado o ato nulificado. Sustenta ainda
a autora132 que “o efeito da sentença da ação anulatória julgada procedente, por ter
natureza constitutiva negativa (ou desconstitutiva) será ex tunc”, isto é, “retroage
apagando os efeitos anteriores provocados pelo ato desconstituído”.
A legitimidade para ajuizamento da ação anulatória dependerá do que disser a lei civil. Se
o ato que se pretende anular está maculado de vício de nulidade absoluta (v.g.
simulação), tem legitimidade não só a parte interessada em invalidá-lo, mas também o
terceiro juridicamente interessado e o Ministério Público nas causas em que intervenha
(cfr. art. 168 do CC/2002). A legitimidade para o ajuizamento da ação anulatória, quando
se cuidar de nulidade absoluta, é a mais ampla possível, mesmo porque esta poderá ser
reconhecida de ofício pelo magistrado se ainda pendente o processo primitivo, tornando-
se desnecessária a ação anulatória.133 De outra banda, cuidando-se de nulidade relativa,
tem legitimidade ativa apenas e tão somente as partes e terceiros juridicamente
interessados, conforme determina o art. 177 do CC/2002.
No que tange à legitimidade passiva, propõe Berenice Soubhie Nogueira Magri134 que: “a
:
ação anulatória deverá ser proposta, tratando-se de atos bilaterais, em face da outra
parte, se quem ajuizou a ação foi uma das partes que praticou o ato em juízo; ou em face
das partes, quando quem ajuizou a ação foi terceiro juridicamente interessado; ou em
face do terceiro interessado juridicamente, se foi esse quem praticou o ato em juízo nos
limites do disposto no CPC”.
A competência, por força do art. 108 do CPC, é do juiz em que tramitou a ação em que
praticado o ato que se pretende desconstituir. Nesse sentido, destaca-se lição de Nelson
Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery: “como a ação anulatória é acessória da ação onde
foi praticado o ato anulado, a competência para processá-la e julgá-la é do juízo da
homologação (art. 108)”.135–136
12. Conclusões
A redação do art. 284 do CPC projetado, que prevê a ação anulatória contra atos
praticados pelas partes em juízo, dependentes ou não de sentença homologatória (“atos
judiciais”), é infinitamente melhor que a anterior, refletindo a orientação doutrinária vista
acima: “O ato negocial praticado pela parte ou por participante do processo, homologado
ou não em juízo, está sujeito à invalidação, nos termos da lei”.
Não se fala mais em rescisão, deslocando a previsão da ação anulatório do capítulo
referente à ação rescisória. Deixa de se referir a ato judicial, passando a falar em ato
negocial, o que deixa claro que se cuida de ato praticado pelas partes ou terceiros
(participantes do processo) em juízo. Deixa de utilizar a expressão meramente,
totalmente desnecessária, uma vez que, como visto, não existe uma espécie de sentença
homologatória que seja meramente homologatória. E deixa também de se referir a nos
termos da lei civil, limitando-se a dizer nos termos da lei.
Apenas uma crítica à redação do art. 284: deveria ele ter falado em ato praticado pelas
partes ou terceiros em juízo e, não, ato negocial. É que ato negocial pressupõe acordo de
vontades e, nem sempre, o ato que se pretende desconstituir foi objeto de acordo de
vontades, como, por exemplo, na hipótese de desistência de recurso.
O novel dispositivo também se coaduna com o que defendemos ao longo desta
dissertação: a sentença homologatória que resolver o mérito e transitar em julgado faz
coisa julgada material e, por isso, só pode ser desconstituída por meio de ação rescisória,
não havendo que se falar em ação anulatória após o trânsito em julgado.
Louvável também a supressão da previsão de cabimento de ação rescisória quando
“houver fundamento para invalidar confissão, desistência ou transação, em que se baseou
a sentença” (conforme art. 978 do Projeto). O inc. VIII do art. 485 do CPC vigente, como
visto, é palco de grande controvérsia doutrinária, pois a desistência e a confissão não
levam, necessariamente, a uma sentença de mérito. E o reconhecimento jurídico do
pedido e a renúncia ao direito sobre o qual se funda a ação, quando homologados
judicialmente, fazem julgamento de mérito, cuja desconstituição, evidentemente, só pode
ocorrer pelo ajuizamento de ação rescisória, sendo desnecessária qualquer previsão
nesse sentido.
A sentença que homologar a transação, por sua vez, assim como já prevê o art. 269, III,
do CPC vigente, terá o condão de fazer coisa julgada material (de acordo com o art. 497,
III, b, do projeto). Por isso, reafirmamos que a transação homologada judicialmente deve
ser desfeita via ação rescisória e, não, por meio de ação anulatória, pouco importando em
que circunstâncias foi proferida (se em processo contencioso ou em sede de jurisdição
voluntária) ou se o juiz se limitou, ou não, a homologar a transação.
Nesse mesmo sentido, aliás, há no projeto do novo CPC, previsão expressa de que “é
rescindível a decisão proferida em procedimento de jurisdição voluntária” (cfr. § 4.º do
art. 978).
Até mesmo a sentença que homologa a partilha amigável deverá respeitar o § 2.º do art.
284, isto é, não será cabível a ação anulatória quando o pronunciamento homologatório
:
resolver o mérito e transitar em julgado, caso em que terá pertinência a ação rescisória.
Nesse sentido, está o § 2.º do art. 672: “Em relação à partilha amigável homologada pelo
juiz, observar-se-á o disposto no art. 284 § 2.º”.
Em suma, acreditamos que o projeto do novo CPC, embora trate do assunto em poucos
artigos, colocará “uma pá de cal” em boa parte das questões hoje controvertidas a
respeito da ação anulatória contra ato judicial, simplificando sua utilização perante os
tribunais pátrios.
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1 PL 8.046/2010, do Senado Federal, com a redação aprovada pela Câmara dos


Deputados em 26.03.2014.

2 MAGRI, Berenice Soubhie Nogueira. Ação anulatória: art. 486, do CPC. São Paulo: Ed.
RT, 1999. Coleção de Estudos de Direito de Processo Enrico Tullio Liebman, vol. 41. p. 41.

3 Idem, p. 41-42.

4 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil. São Paulo:
Saraiva, 2008. vol. 5, p. 405.

5 Idem, ibidem.

6 RIZZI, Sérgio. Ação rescisória. São Paulo: Ed. RT, 1979. p. 4.

7 “1. Pretende a recorrente desconstituir ato judicial de intimação realizado por auxiliares
da Justiça, no âmbito de Ação Monitória por ela proposta e extinta sem julgamento de
mérito, sob o fundamento de que tal ato seria inválido, em função dos limites impostos
pelo art. 236, § 1.º, do CPC, bem como da jurisprudência desta Corte. 2. A Ação
Anulatória visa a desconstituição de atos judiciais praticados pelas partes em juízo,
dependente ou não de sentença homologatória. O ato processual de que cuida é ato
jurídico praticado ou inserido no processo, emanado de declaração da vontade humana.
Isso, porque os ‘atos judiciais’ a que se refere o art. 486 do CPC são os atos realizados
‘em juízo’, não os atos do juiz ou dos auxiliares de justiça (MAGRI, Berenice Soubhie
Nogueira. Ação anulatória: art. 486 do CPC. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Ed. RT, 2004.
p. 49-67). 3. Dessarte, inexiste no sistema processual vigente a possibilidade de anular o
ato de juiz ou de auxiliares da justiça pela estreita via da Ação Anulatória. 4. Acrescente-
se que, ainda que se concebam, dentro do princípio da instrumentalidade das formas, a
fungibilidade da Ação Anulatória e da Ação Rescisória, in casu, tal possibilidade é vedada
diante da ausência de julgamento do mérito da Ação Monitória. Recurso especial
improvido” (REsp 1.197.027/RJ, rel. Min. Humberto Martins, j. 16.09.2010 –
destacamos).

8 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Comentários ao Código de Processo Civil. 10. ed. Rio
de Janeiro: Forense, 2002. vol. 5, p. 156.
:
9 BUENO, Cassio Scarpinella. Op. cit., 2008, vol. 5, p. 405.

10 LERRER, Felipe Jakobson. Ação anulatória. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009.
p. 39-44.

11 MAGRI, Berenice Soubhie Nogueira. Ação anulatória: art. 486, do CPC. 2. ed. São
Paulo: Ed. RT, 2004. Coleção de Estudos de Direito de Processo Enrico Tullio Liebman, vol.
41, p. 55.

12 BUENO, Cassio Scarpinella. Op. cit., 2008, vol. 5, p. 405.

13 LERRER, Felipe Jakobson. Op. cit., p. 60.

14 MAGRI, Berenice Soubhie Nogueira. Op. cit., 1999, p. 52.

15 Idem, p. 57-60.

16 DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de direito processual civil.
11. ed. Salvador: JusPodivm, 2013. vol. 3, p. 461.

17 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Op. cit., p. 159.

18 Os mesmos exemplos são trazidos por Berenice Soubhie Nogueira Magri: “temos como
exemplos de atos judiciais que não dependem de sentença: a outorga de poderes em
procuração passada nos autos; a renúncia ao direito de recorrer; a aceitação expressa da
decisão; a arrematação e a adjudicação; as declarações de vontade das partes,
unilaterais ou bilaterais (art. 158, caput, do CPC), que não precisam ser homologados”
(op. cit., 1999, p. 67).

19 Idem, p. 72.

20 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Op. cit., p. 160.

21 A correta interpretação do art. 485, VIII, do CPC, será vista em capítulo próprio a
seguir.

22 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Op. cit., p. 160.

23 DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Op. cit., p. 458.

24 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Op. cit., p. 159.

25 No mesmo sentido, encontra-se a doutrina de Cassio Scarpinella Bueno, para quem


“os atos meramente homologatórios, não devem, de seu turno, ser entendidos como uma
diferente categoria de atos jurisdicionais”. Primeiro, porque “os atos passíveis de anulação
ou de declaração de nulidade com fundamento no art. 486 são atos das partes, e não ato
do magistrado em si mesmo considerado”. Segundo, porque “não existe qualquer
distinção que possa ser traçada entre os atos que são homologatórios e os que são
meramente homologatórios” (BUENO, Cassio Scarpinella. Op. cit., 2008, vol. 5, p. 407).

26 MAGRI, Berenice Soubhie Nogueira. Op. cit., 1999, p. 77.

27 BUENO, Cassio Scarpinella. Op. cit., 2008, vol. 5, p. 406.

28 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso se direito processual civil. 50. ed. Rio de
:
Janeiro: Forense, 2009. vol. 1, p. 706.

29 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Op. cit., p. 168.

30 MAGRI, Berenice Soubhie Nogueira. Op. cit., 1999, p. 97.

31 VASCONCELLOS, Rita de Cássia Corrêa de. Fundamentos da ação anulatória do art.


486 do CPC, à luz do novo Código Civil. RePro 120/97-98.

32 MAGRI, Berenice Soubhie Nogueira. Op. cit., 1999, p. 97.

33 Nesse sentido, GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. 7. ed. São Paulo:
Saraiva, 2009. vol. 1, p. 362.

34 O STJ, julgando o REsp 744.311/MT, rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 19.08.2010, no
entanto, adotou a corrente tradicional, exigindo a conjugação dos dois requisitos.

35 VASCONCELLOS, Rita de Cássia Corrêa de. Op. cit., p. 100-101.

36 GONÇALVES, Carlos Roberto. Op. cit., p. 362.

37 Idem, p. 382.

38 Nesse sentido, Silvio de Salvo Venosa: “Na coação absoluta, não há vício de vontade,
mas existindo total ausência de manifestação volitiva, o negócio jurídico reduz-se a caso
de nulidade” (Direito civil. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2005. vol. 1, p. 452).

39 Silvio de Salvo Venosa: “o direito não pode desvincular-se dos princípios morais, da
equidade; não pode ser convertido em instrumento do poderoso contra o fraco” (op. cit.,
p. 468).

40 VASCONCELLOS, Rita de Cássia Corrêa de. Op. cit., p. 103-104.

41 GONÇALVES, Carlos Alberto. Op. cit., p. 422.

42 CAHALI, Yussef Said. Fraude contra credores. São Paulo: Ed. RT, 1989. p. 313 e ss.

43 No mesmo sentido, destaca-se precedente do C. STJ, de relatoria do Min. Sidnei


Beneti, proferido no REsp 971.884/PR, mencionado no Informativo de jurisprudência 467.

44 MAGRI, Berenice Soubhie Nogueira. Op. cit., 1999, p. 108.

45 VASCONCELLOS, Rita de Cássia Corrêa de. Op. cit., p. 105.

46 VENOSA, Silvio de Salvo. Op. cit., p. 547.

47 Idem, p. 554-556.

48 GONÇALVES, Carlos Alberto. Op. cit.,, p. 446.

49 “Art. 167. Na simulação relativa, o negócio simulado (aparente) é nulo, mas o


dissimulado será válido se não ofender a lei nem causar prejuízos a terceiros.”

50 A transação é tratada em capítulo próprio.

51 Pelo Projeto do novo CPC tanto o reconhecimento jurídico do pedido como a renúncia
:
ao direito sobre o qual se funda ação continuarão a dar ensejo a uma sentença de mérito:
art. 497, III, a e c.

52 Este inciso foi, em boa hora, suprimido do Projeto do novo CPC, eis que fonte de
divergência doutrinária e jurisprudencial.

53 “No que tange à desistência, cumpre notar que, no texto português, o vocábulo
compreendia a ‘desistência’ do pedido, extintiva do ‘direito que se pretendia fazer valer’
(art. 300, 1.ª alínea), como a ‘desistência da instância’, que em regra só fazia cessar o
processo (art. 300, 2.ª alínea). Ora, aqui também o Código de 1973 adota terminologia
diversificada: conforme o art. 267, VIII, extingue-se o processo sem julgamento de
mérito ‘quando o autor desistir da ação’, ao passo que, de acordo com o art. 269, V,
ocorre a extinção com julgamento do mérito ‘quando o autor renunciar ao direito sobre o
qual se funda a ação’. A primeira dessas figuras corresponde à ‘desistência da instância’, e
a segunda à ‘desistência do pedido’, no diploma luso de 1939. No dispositivo sob exame
[art. 485, VIII, do CPC], necessariamente deve tratar-se de sentença de mérito, nos
termos do caput; logo, não é possível supor que a lei se refira às hipóteses do art. 267,
VIII. Por desistência, aí, há de entender-se, pois, renúncia; o caso é unicamente do art.
269, V” (BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Op. cit., p. 142).

54 DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Op. cit., p. 456.

55 Nesse sentido, destaca-se julgado do TJSP: “Convém, inicialmente, esclarecer que o


pedido se assenta no art. 485, VIII, do CPC, que faz referência a desistência, quando o
certo é renúncia ao direito em que se fundou a ação acidentária, pois a rescisória tem por
objeto sentença de mérito, que é o caso da renúncia ao direito e não à desistência da
ação, que corresponde à extinção do processo sem julgamento do mérito. (…) Mostra-se,
por isso, apropriada a presente ação rescisória, pois a sentença rescindenda tomou as
declarações do autor como renúncia ao direito, declarando extinto o processo, com
julgamento de mérito, a teor do art. 269, V, do CPC” (AR 648984-00, rel. Des. Milton
Gordo, j. 23.02.2011).

56 MAGRI, Berenice Soubhie Nogueira. Op. cit., 1999, p. 232.

57 NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil
comentado e legislação extravagante. São Paulo: Ed. RT, 2006. p. 446.

58 “Art. 348. Há confissão, quando a parte admite a verdade de um fato, contrário ao seu
interesse e favorável ao adversário. A confissão é judicial ou extrajudicial.”

59 “A confissão exige para sua configuração, a admissão de fato desfavorável ao


interesse da parte confitente, mas favorável ao mesmo tempo ao interesse da parte
adversária. Esse prejuízo processual que assume o confitente se abre em duas ordens de
consequência normais: a exoneração da prova do fato pela parte contrária (art. 334, II) e
a efetivação da prova (quase absoluta da veracidade sobre o fato confessado (…)”.
Contudo, “(…) a confissão está longe de se assemelhar à renúncia do direito material ou
ao reconhecimento do pedido. Importa ela em mero meio de prova (embora com eficácia
probatória), que opera exclusiva no plano fático-processual. É, portanto, simples meio de
prova (assim como qualquer outro meio) e, como tal, não pode ser equiparada a figuras
de disposição de direito material”. Para o magistrado, a vinculação à confissão “(…)
apenas ocorrerá se outros meios de prova existentes nos autos não infirmarem esta
conclusão lógica” (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Prova. 2. ed. São
Paulo: Ed. RT, 2011. p. 447-449).

60 No reconhecimento, assim como na renúncia, há, de fato, ato de disposição sobre o


direito material. A parte abdica do conflito de interesse exposto no processo, ou porque
:
renuncia à pretensão feita incialmente sobre certo bem da vida (objeto do processo), ou
porque deixa de resistir à pretensão da parte adversa. Em ambos os casos, tem-se
situação em que dispensa análise judicial específica sobre a controvérsia inicialmente
exposta, já que o conflito de interesses é solucionado espontaneamente pelas partes (art.
269, II e V). Operam estes atos no campo de direito material e vinculam, por isso
mesmo, de forma absoluta, o juiz (salvo situações muito específicas, como a questão do
direito indisponível). Manifestam em ambas as hipóteses o animus específico da parte
dirigido à extinção do litígio (no plano do direito material), e esta vontade é levada ao
processo que, de consequência, deve ser concluído pelo magistrado. (…) Na confissão,
ocorre apenas a admissão de um fato (ou de certos fatos) como verdadeiro. Daí não se
conclui, inexoravelmente, que o direito objeto do litígio deva ser atribuído à parte
contrária, nem se pode logicamente deduzir qualquer solução a priori do conflito. A
pretensão e a resistência (ao menos em tese) permanecem, e deve o juiz sobre elas se
manifestar; apenas algum fato (ou fatos) do conjunto probatório dos autos recebe prova
forte e robusta capaz de – ausentes outros elementos que infirmem tal conclusão –
indicar sua efetiva ocorrência no mundo jurídico” (MARINONI, Luiz Guilherme;
ARENHART, Sérgio Cruz. Op. cit., p. 454-455).

61 “O direito brasileiro adotou como regra o princípio da persuasão racional do juiz; vale
dizer, ‘O juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstâncias
constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes; mas deverá indicar, na
sentença, os motivos que lhe formaram o convencimento’ (art. 131). Decorre daí que,
conquanto as partes fiquem vinculadas pela verdade da afirmação contida na confissão,
poderá o juiz suplantar aquele indicativo, desde que lastreado nos elementos da prova
constante dos autos, se convença de que o fato ocorreu de forma diversa. Terá ele não só
condições de afastar a presunção decorrente da confissão efetiva, como até mesmo
determinar de ofício a produção de provas que entender necessárias para aclarar seu
convencimento – provas essas que poderão se opor, indubitavelmente às conclusões que
ensejaram a confissão” (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Op. cit., p.
459-460).

62 O Projeto do novo CPC, em seu art. 400, anota que “a confissão é irrevogável, mas
pode ser anulada se decorreu de erro de fato ou de coação”.

63 BUENO, Cassio Scarpinella. Op. cit., 2008, vol. 5, p. 408.

64 Barbosa Moreira, atento às críticas a este entendimento, responde-as da seguinte


forma: “Objeção que poderia suscitar a respeito dos atos compreendidos no âmbito do
art. 485, VIII, é que a construção acima sugerida [aplicação análoga do art. 352, do CPC,
ao reconhecimento jurídico do pedido, à renúncia à pretensão e à transação] torna
diminuta a utilidade da ação anulatória, pois normalmente será pequeno o espaço de
tempo entre a prática dos atos como renúncia à pretensão, ou o reconhecimento jurídico
do pedido, ou a transação e o trânsito em julgado da sentença que os homologue. Assim
sucederá, sem dúvida, no comum dos casos, e o inconveniente prático é inafastável,
embora o seu peso tenha acabado por nos parecer menor que o dos argumentos
oponíveis a outras soluções. De qualquer sorte, sempre se concebem hipóteses em que o
referido lapso de tempo não seja tão breve, como, v.g., a de reconhecer o réu apenas
parcialmente, na resposta, o pedido do autor; aí, prossegue o feito em seus trâmites
normais, em relação a toda matéria não abrangida pelo reconhecimento, e na decisão
final é que se tirarão, quanto à parte reconhecida, as devidas consequências” (op. cit., p.
161).

65 DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Op. cit., p. 459.

66 VITAGLIANO, José Arnaldo. Coisa julgada e ação anulatória. São Paulo: Juruá, 2004.
n. 6.4.8, p. 154.
:
67 ARRUDA ALVIM, Thereza. Notas sobre alguns aspectos controvertidos da ação
rescisória. Re-Pro 39/14. Ressalva Teresa Arruda Alvim Wambier que Thereza Alvim
mudou seu posicionamento, por entender que a formação de coisa julgada material leva a
uma sentença de mérito, cuja desconstituição exige ação rescisória (ARRUDA ALVIM
WAMBIER, Teresa. Nulidades do processo e da sentença. 6. ed. São Paulo: Ed. RT, 2007.
Coleção de Estudos de Direito de Processo Enrico Tullio Liebman, vol. 16, p. 441).

68 DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Op. cit., p. 459.

69 “1. É pacífica a jurisprudência do STJ no sentido de que a decisão judicial


homologatória de acordo não produz coisa julgada material, podendo ser anulada a
avença por ação diversa da rescisória. 2. Admite esta Corte, no entanto, o cabimento de
ação rescisória na hipótese em que a sentença rescindenda, ao homologar transação
entre as partes da relação processual, analisa o conteúdo da avença emitindo sobre ele
juízo de valor” (REsp 1.201.770/MG, rel. Min. Eliana Calmon, j. 12.11.2013). No mesmo
sentido: “1. Os efeitos da transação podem ser afastados mediante a ação anulatória
própria prevista no art. 486 do CPC, sempre que o negócio jurídico tiver sido objeto de
sentença meramente homologatória, que nada dispôs a respeito do conteúdo da
pactuação. 2. Se, ao reverso, a sentença avança para além da mera homologação,
proferindo mesmo juízo de valor acerca da avença, mostrar-se-á descabida a ação
anulatória a que alude o art. 486 do CPC” (AgRg no REsp 1.314.900/CE, rel. Min. Luis
Felipe Salomão, j. 18.12.2012); e ainda: REsp 450.431/PR, rel. Min. Luiz Fux, j.
18.09.2003.

70 MAGRI, Berenice Soubhie Nogueira. Op. cit., 1999, p. 232-233.

71 No mesmo sentido, encontra-se antigo julgado do STF: RE 100.466, rel. Min. Djaci
Falcão, 2.ª T., j. 26.04.1985.

72 O Projeto do novo CPC segue a linha do CPC atual: “Haverá resolução de mérito
quando o órgão jurisdicional (…) homologar (…) a transação” (art. 497, III, b).

73 BARIONI, Rodrigo. Ação rescisória e recursos para os tribunais superiores. São Paulo:
Ed. RT, 2010. p. 129-130.

74 Idem, p. 131.

75 VASCONCELLOS, Rita de Cássia Corrêa de. Op. cit., p. 109-110.

76 BUENO, Cassio Scarpinella. Op. cit., 2008, vol. 5, p. 409.

77 Idem, ibidem.

78 Idem, ibidem.

79 Idem, p. 410.

80 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Op. cit., p. 707.

81 NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Op. cit., p. 687-688.

82 Barbosa Moreira, comentando a transação, o reconhecimento jurídico do pedido e


renúncia ao direito sobre o qual se funda a ação, anota que “regime será análogo ao da
confissão, tal como o define o art. 352, isto é: a ação anulatória unicamente poderá ser
utilizada no curso do processo, antes do trânsito em julgado da sentença homologatória;
:
depois disso, o remédio próprio e exclusivo será a ação rescisória do art. 485, VIII” (op.
cit., p. 160-161).

83 ARRUDA ALVIM WAMBIER, Teresa. Op. cit., p. 441.

84 Esta, contudo, como visto mais acima, não é a posição que prevalece no âmbito do
STJ.

85 BUENO, Cassio Scarpinella. Op. cit., 2008, vol. 5, p. 410.

86 VASCONCELLOS, Rita de Cássia Corrêa de. Op. cit., p. 110.

87 Nesse sentido, colhe-se julgado do TJSP: AR 1180427-0/2, rel. Des. Antonio Rigolin, j.
04.11.2008.

88 MAGRI, Berenice Soubhie Nogueira. Op. cit., 1999, p. 190-191.

89 CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pelegrini; DINAMARCO, Cândido


Rangel. Teoria geral do processo. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 169.

90 Idem, ibidem.

91 Idem, p. 171.

92 Nesse sentido, é a doutrina de Cassio Scarpinella Bueno (op. cit., 2008, vol. 5, p.
408).

93 CARVALHO, Fabiano. Ação rescisória: decisões rescindíveis. São Paulo: Saraiva, 2010.
p. 305.

94 Idem, ibidem.

95 Idem, ibidem.

96 Idem, ibidem.

97 Idem, ibidem.

98 Idem, p 305-306.

99 Nesse sentido, encontra-se antigo julgado do STJ: REsp 2.810/RJ, rel. Min. Claudio
Santos, j. 21.08.1990.

100 GERAIGE NETO, Zaiden. Ação rescisória: o lento caminhar do direito escrito,
comparado às rápidas transformações das sociedades contemporâneas. São Paulo: Ed.
RT, 2009. Coleção de Estudos de Direito de Processo Enrico Tullio Liebman, vol. 63, p.
210.

101 Idem, ibidem.

102 Idem, p. 211.

103 Idem, ibidem.

104 DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil. 14. ed. Salvador: JusPodivm,
2012. vol. 1, p. 128-130.
:
105 DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Op. cit., p. 461.

106 Idem, ibidem.

107 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Op. cit., p. 706.

108 Idem, ibidem.

109 MAGRI, Berenice Soubhie Nogueira. Ação anulatória de atos executórios. In: LOPES,
João Batista; CUNHA, Leonardo José Carneiro da (coord.). Execução civil: aspectos
polêmicos. São Paulo: Dialética, 2005. p. 34-35.

110 Vale lembrar que o CPC, antes da reforma promovida pela Lei 11.382/2006, previa
que o cônjuge, companheiro, descendentes ou ascendentes do executado poderiam remir
o bem penhorado, pagando o respectivo preço (cfr. arts. 787 e ss. do CPC, hoje
revogados). A remição tal como prevista no CPC tinha a finalidade de evitar que bens
penhorados em execuções fossem expropriados do patrimônio familiar do executado. O
objetivo era salvar o bem da execução. Este instituto permitia que, em igualdade de
condições, o bem fosse adjudicado a membro da família do executado ao invés de ser
transferido para o patrimônio de terceiro. Resgatava-se, assim, o bem que estava na
iminência de ser transferido a terceiro, alheio ao núcleo familiar do executado. Esta
previsão, contudo, não está mais prevista no CPC, tendo sido revogada pela Lei 11.382/
2006, que passou a autorizar a adjudicação pelos familiares do executado, cfr. art. 685-A,
§ 2.º. O CC/2002, por sua vez, ainda prevê em seu art. 1.482, o direito de remição no
caso de alienação forçada de imóvel hipotecado. Atualmente, a doutrina diverge se ainda
é possível, com espeque no art. 1.482, do CC/2002, ao cônjuge/companheiro, ascendente
e descendente exercer o direito de remição após a adjudicação/arrematação por terceiro.
Fredie Didier Jr. entende que não é possível a remição pelos parentes do executado, seja
qual for a espécie de execução, hipotecária ou não (Direito de adjudicar e direito de
remir: confronto do art. 685-A, §2.º, do CPC, com o art. 1.482 do CC/2002. RePro 146/
178-179). Francisco Eduardo Loureiro, por sua vez, em comentário ao art. 1.482 do CC/
2002, entende que o direito dos parentes do executado de remir o bem subsiste apenas
nas execuções hipotecárias (LOUREIRO, Francisco Eduardo. Código Civil comentado. 2.
ed. Coord. Cezar Peluso. São Paulo: Manole, 2008. p. 1540). No mesmo sentido,
encontra-se lição de Cassio Scarpinella Bueno (Curso sistematizado de direito processual
civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. vol. 3, p. 280). Parece ser unânime o entendimento
que, em sede de execução hipotecária, subsiste o direito do próprio executado de remir o
bem hipotecado.

111 REsp 33.694/RS, rel. Min. Garcia Vieira, j. 05.05.1993; REsp 35.054/SP, rel. Min.
Antônio de Pádua Ribeiro, j. 27.04.1994; AgRg no REsp 1.137.761/CE, rel. Min. Luis
Felipe Salomão, j. 01.12.2011; e AgRg no REsp 165.228/SP, rel. Min. Eliana Calmon, j.
23.05.2000; e REsp 755.155/PR, rel. Min. Eliana Calmon, j. 14.08.2007.

112 MAGRI, Berenice Soubhie Nogueira. Op. cit., 2005, p. 32.

113 Sobre o tema ver: CARVALHO, Fabiano. Op. cit., p. 217-227.

114 Há julgados do STJ que assinalam pela existência de julgamento de mérito, apto a
formar coisa julgada material, na sentença que extingue a execução: “A sentença que
extingue o processo de execução em razão do cumprimento da obrigação, por alcançar o
conteúdo material do direito assegurado no processo de conhecimento pode ser
desconstituída por via da rescisória” (REsp 147.735/SP, rel. Min. Vicente Leal, j.
23.05.2000); no mesmo sentido: REsp 1.246.515/RS, rel. Min. Mauro Campbell Marques,
j. 10.05.2011. Em sentido contrário, colhem-se julgados do TJSP: AR 0012657-
:
57.2012.8.26.0000, rel. Des. Xavier de Aquino, j. 15.03.2012; e AR 7.085.507-5, rel.
Eduardo Sá Pinto Sandeville, j. 12.11.2009.

115 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Op. cit., p. 83.

116 Idem, p. 93

117 Idem, ibidem.

118 Idem, p. 116.

119 Idem, ibidem.

120 Idem, ibidem.

121 Nesse mesmo sentido: MAGRI, Berenice Soubhie Nogueira. Op. cit., 1999, p. 244; e
LERRER, Felipe Jakobson. Op. cit., p. 202-203.

122 AR 893, rel. Min. Antonio Neder, Pleno, j. 16.06.1976.

123 “É bastante comum a afirmação da doutrina de que na hipótese ventilada, de ‘ação


de alimentos’, não há coisa julgada. Pelas razões até aqui desenvolvidas, não há como
concordar com a afirmação. Coisa julgada há. O que existe, contudo, é expressa previsão
legislativa para que o que foi decidido anteriormente à luz de uma específica situação de
fato ou de direito seja reexaminada por força da alteração destes fatos ou do direito. A
coisa julgada opera nestes casos rebus sic stantibus, isto é, ela prevalece enquanto a
situação a ela subjacente permanecer igual” (BUENO, Cassio Scarpinella. Curso
sistematizado de direito processual civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. vol. 2, t. I, p.
399).

124 No mesmo sentido, pela inexistência de formação de coisa julgada material no


processo cautelar, colhe-se precedente do STJ: AgRg no Ag 1.349.856/RS, rel. Min.
Hamilton Carvalhido, j. 02.12.2010.

125 MAGRI, Berenice Soubhie Nogueira. Op. cit., 1999, p. 229.

126 Idem, ibidem.

127 LERRER, Felipe Jakobson. Op. cit., p. 176-183.

128 A ementa do REsp 586.312/SC, de relatoria do Ministro Castro Filho é a seguinte:


“Inventário. Partilha judicial. Herdeiro menor. Ação rescisória. Comportabilidade.
Tratando-se de partilha judicial, face à existência no inventário de interesse de menor, o
meio impugnativo cabível da sentença proferida é o da ação rescisória e não o da ação de
anulação. Recurso especial não conhecido”. A controvérsia está assim colocada no corpo
de seu voto, “a questão consiste em saber se se trata de partilha amigável, e aí cabível a
ação anulatória, a ser ajuizada no prazo de um ano, ou se, de partilha judicial,
contenciosa, o que demanda o ajuizamento de ação rescisória, no prazo de dois anos.
Este último entendimento foi o que prevaleceu na instância ordinária”. E, em razão da
existência de interesse de menor, decide pelo cabimento da ação rescisória, mencionado
uma série de outros precedentes no mesmo sentido, dentre os quais: REsp 21.377/MG,
rel. Min. Barros Monteiro, DJ 22.11.1993; e REsp 32.306/ES, rel. Min. Costa Leite, DJ
07.11.1994.

129 BUENO, Cassio Scarpinella. Op. cit., 2008, vol. 5, p. 411.


:
130 Idem, ibidem.

131 MAGRI, Berenice Soubhie Nogueira. Op. cit., 1999, p. 134-135.

132 Idem, ibidem.

133 Idem, p. 128.

134 Idem, ibidem.

135 NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Op. cit., p. 688.

136 Barbosa Moreira elogia a solução dada pela aplicação da regra de competência
prevista no art. 108 do CPC, ao julgamento da ação anulatória, uma vez que “afigura-se
vantajosa do ponto de vista prático, já pela probabilidade de que o referido juízo se
encontre em melhores condições para apreciar a matéria, já em atenção a repercussões
que o processo da ação anulatória pode ter sobre o outro, no caso de pendência
simultânea (…) e que decerto gerariam maiores complicações procedimentais, se cada
qual corresse perante um órgão distinto”(op. cit., p. 165).
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