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FELIPE PERILO DE REZENDE MIRANDA

YVES PAULO RIBEIRO

TRABALHO: CUIDADOS PALIATIVOS

LAVRAS - MG
2021
FELIPE PERILO DE REZENDE MIRANDA
YVES PAULO RIBEIRO

TRABALHO: CUIDADOS PALIATIVOS

Trabalho apresentado à Universidade


Federal de Lavras, como parte das
exigências da disciplina GSA 193 –
Saúde do Idoso para a obtenção do título
de Médico.

Prof. Dr. Igor Petrini Alves


Docente Responsável

LAVRAS - MG
2021
SUMÁRIO

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1 INTRODUÇÃO E DEFINIÇÃO 3
2 ENVELHECIMENTO E DOENÇAS CRÔNICO-DEGENERATIVAS 6
3 PRINCIPAIS SINTOMAS 8
4 COMUNICAÇÃO EM CUIDADOS PALIATIVOS 12
5 O FIM DA VIDA 14
6 APÓS A MORTE: O LUTO 15
REFERÊNCIAS 17

1 INTRODUÇÃO E DEFINIÇÃO

A primeira vez que eu, Yves, tive contato com o termo “paliativo”, eu tinha catorze
anos. Minha avó, que estava extremamente ictérica, associado a perda importante de peso,
havia sido diagnosticada com câncer de cabeça de pâncreas. Eu não entendia muito bem o
que estava acontecendo, não entendia o porquê do desespero de meus parentes, e
principalmente da minha mãe ao receber o diagnóstico. Fui então buscar na internet
informações sobre aquele câncer, e descobri que era um dos mais agressivos existentes,
além de possuir rápida progressão. Também vi que o prognóstico era muito obscuro, e que
quando diagnosticado em estágio avançado o tratamento era basicamente paliativo. Esse
termo, “paliativo”, me marcou desde então. Para mim, tratamento paliativo era sinal de
morte, de que não se existia mais nada a se fazer, ou seja, algo muito negativo. Contudo,
anos depois eu entrei na faculdade de Medicina, e finalmente pude compreender do que se
tratam os cuidados paliativos.

Da mesma forma, eu, Felipe, antes da faculdade, sempre associei o termo “paliativo”
com emoções negativas, visto que havia uma forte aproximação deste com pessoas em
condições terminais e a morte. É um fato que os cuidados paliativos tem grande importância
no manejo de pacientes incuráveis, contudo, ao aprofundar no assunto, vemos que seu foco
não é tratar a doença, mas sim diminuir o sofrimento que essa pode causar, aumentando o
bem estar do paciente. Assim, reformulei meus sentimentos em relação ao assunto e pude
também compreender o quão importante e essencial são esses cuidados.

A morte é algo que gera dúvidas desde o início dos tempos. Ao longo dos anos, o
processo de morrer sofreu diversas mudanças por conta dos contextos históricos e culturais.
No passado os pacientes morriam em suas casas, cercado dos familiares. Com o avanço da
medicina, as pessoas passaram cada vez mais a morrer em leitos hospitalares, cercados
apenas por profissionais da saúde, o que gerou um certo distanciamento entre a população
e a morte.

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Os cuidados paliativos ajudam a aliviar o sofrimento e a oferecer melhor qualidade
de vida para pacientes muito debilitados. Portanto, não é interessante prolongar a vida
desses pacientes à custa de uma qualidade de vida horrível e com muito sofrimento. Para
isso, é importante que hajam centros de cuidados paliativos, profissionais que saibam
oferecer esse melhor cuidado, e ainda que seja respeitado a autonomia do paciente. É
importante frisar que atualmente os cuidados paliativos podem e devem ser iniciados mais
precocemente possível, devendo serem integrados junto aos cuidados curativos.

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a Medicina Paliativa é o estudo e o


controle de pacientes com doença ativa, progressiva e avançada, para quem o prognóstico é
limitado e a assistência é voltada para a qualidade de vida. A OMS considera os cuidados
paliativos como os cuidados totais ativos, prestados a pacientes com doença incurável,
progressiva e irreversível, que não respondem a qualquer tratamento curativo, sendo
fundamental o controle da dor, de outros sintomas e de problemas psicológicos, sociais e
espirituais. O enfoque terapêutico é o alívio dos sintomas que comprometem a qualidade de
vida, integrando ações médicas em conjunto com as de enfermagem, psicológicas,
nutricionais, sociais, espirituais, de reabilitação e assistência aos familiares. Como cada
sintoma é um fenômeno dinâmico, o paciente deve ser avaliado frequente e regularmente, e
a sua prescrição deve sempre ser atualizada. É importante salientar que os cuidados
paliativos não interferem no curso natural da doença e suas ações não visam apressar ou
retardar a morte. Deve-se ressaltar, mais uma vez, que tais medidas não têm caráter
curativo, mas pretendem dar conforto ao paciente.

Para atender às necessidades fundamentais de um paciente com uma doença em


fase avançada, é necessária a constituição de equipe multiprofissional com dinâmica de
atuação interdisciplinar. Todos os seus componentes devem ter sólida formação nos
princípios básicos do tratamento paliativo e agir de acordo com a ética profissional. Os
cuidados paliativos devem ser prestados por uma equipe bem articulada, com
conhecimentos básicos do controle de sintomas e que tenha à sua disposição os
medicamentos necessários: analgésicos não narcóticos, opioides, antiinflamatórios
esteroides e não esteroides, antieméticos, antipsicóticos, anticonvulsivantes,
antidepressivos, psicoestimulantes, ansiolíticos, antibióticos de amplo espectro, protetores
de mucosa gástrica e laxativos. O cuidado com o corpo do paciente e a utilização de técnicas
paliativas são quesitos essenciais e requerem competência. Capacidade de compreensão,
empatia e bom humor são características adicionais fundamentais para a boa prática da
paliação. Os componentes de uma equipe podem ser: médico, enfermeiro, fisioterapeuta,
fonoaudiólogo, nutricionista, psicólogo, terapeuta ocupacional, assistente social,
musicoterapeuta, assistente espiritual, farmacêutico e odontólogo. Todos precisam
trabalhar em conjunto e falar a mesma linguagem para alcançar os objetivos do cuidado, ou
seja, identificar e tratar as intercorrências, otimizar o uso de fármacos, manter o estado
nutricional e a mobilidade enquanto possível, oferecer apoio psicológico ao paciente e à
família e maximizar o funcionamento do paciente nas atividades habituais. Essa modalidade
assistencial visa oferecer maior conforto ao paciente com doença em fase avançada e
segurança e tranquilidade aos familiares. Encontrar um discurso comum e abdicar de
vaidades profissionais é um processo gradual e por vezes trabalhoso, mas que produz os
melhores resultados.

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Os cuidados paliativos tem como principais objetivos promover o alívio da dor e de
outros sintomas que geram sofrimento; reafirmar a vida e ver a morte como um processo
natural; não antecipar nem postergar a morte; integrar aspectos psicossociais e espirituais
ao cuidado; oferecer um sistema de suporte que auxilia o paciente a viver tão ativamente
quanto possível até a morte; oferecer um sistema de suporte que auxilia a família e entes
queridos a sentirem-se amparados durante todo o processo da doença e no luto; utilizar os
recursos de uma equipe multiprofissional para focar as necessidades dos pacientes e seus
familiares, incluindo acompanhamento no luto; melhorar a qualidade de vida e influenciar
positivamente no curso da doença. Eles devem ser iniciados o mais precocemente possível,
junto a outras medidas de prolongamento de vida – como a quimioterapia e a radioterapia –
e incluir todas as investigações necessárias para melhor compreensão e abordagem dos
sintomas.

Com o início dos cuidados paliativos existe uma mudança na modalidade do


atendimento. As intervenções requerem um profundo conhecimento da fisiopatologia da
doença de base e de suas complicações previsíveis. Os novos sintomas, controlados
mediante prescrição coerente e criteriosa, minimizam as iatrogenias tão temidas nos idosos.
Os pacientes geriátricos apresentam comorbidades, o que dificulta a abordagem
terapêutica. Deve-se ter em mente que os sintomas precisam ser priorizados e só se
intervém naqueles que realmente causem desconforto ou angústia.

Ademais, dois conceitos podem gerar muitas dúvidas, e merecem serem esclarecidos
e diferenciados. São eles: cuidados paliativos e cuidados ao fim da vida. Os cuidados
paliativos devem ser aplicados ao paciente de forma contínua, pelo período de tempo que
for necessário, associado a outros tratamentos pertinentes ao seu caso, desde a definição de
uma doença incurável e progressiva. Já os chamados cuidados ao fim da vida são uma parte
importante dos cuidados paliativos, referindo-se à assistência que um paciente deve receber
durante a última etapa de sua vida, a partir do momento em que fica claro que ele se
encontra em um estado de declínio progressivo e inexorável, aproximando-se da morte.

2 ENVELHECIMENTO E DOENÇAS CRÔNICO-DEGENERATIVAS

Ao lidarmos com os cuidados paliativos, estamos lidando principalmente com a


parcela da população mais velha. Sabemos que o envelhecimento é heterogêneo: o ritmo do
declínio não é uniforme, varia de um indivíduo para outro e, no mesmo indivíduo, de órgão
para órgão. Portanto, devemos individualizar nossas condutas, de acordo com as
necessidades de cada paciente.

De forma geral, existem doenças que se apresentam de forma aguda, e outras que se
apresentam de forma crônica. As doenças agudas podem evoluir para a cura, para a morte
ou para a cronicidade. A pessoa acometida por uma doença crônica e os seus familiares
frequentemente apresentam uma postura de não aceitação ou de acomodação ao
problema. Entretanto, a cronificação de uma doença traz o risco, durante a sua evolução, de
sequelas incapacitantes que levam a um grave comprometimento funcional, tornando a
pessoa acometida altamente dependente para as atividades da vida diária. Estas doenças
provocam um desgaste acentuado nas relações familiares, pois o curso é lento, com muito
sofrimento até a morte. Como a evolução da doença é inevitável e o paciente, por ser idoso,

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está sujeito ainda ao surgimento de novos problemas de saúde, o profissional se depara com
um quadro clínico de difícil abordagem terapêutica.

A morte é um processo natural do ciclo de vida. Nos idosos, a morte pode ser
associada a várias doenças que comprometem a independência e a autonomia. A
multiplicidade de sintomas que ocorrem, dependendo da doença de base, será
determinante ou não para o sofrimento do indivíduo. O adequado atendimento aos
pacientes, visando aliviar qualquer sintoma desgastante, é um ponto fundamental para a
boa prática da geriatria. Nos idosos, em geral a trajetória para a morte é lenta e com
sofrimento físico, mental, social e emocional. Entende-se por doenças crônico-degenerativas
aquelas de curso evolutivo e incapacitante, que não são passíveis de cura, porém podem ser
controladas. As doenças crônico-degenerativas podem acometer pessoas de todas as faixas
etárias, porém o envelhecimento é o maior fator de risco para sua ocorrência, aliado à
comorbidade. Para essas doenças, não existe tratamento curativo e sim de controle,
objetivando evitar complicações e sequelas graves.

Outra característica importante do envelhecimento é que as doenças se manifestam


de maneira atípica, em que os sinais e sintomas característicos de uma síndrome não se
apresentam como no adulto mais jovem. Portanto, o profissional médico precisa se
empenhar na busca de pistas para o correto diagnóstico em um curto espaço de tempo. A
presença de comorbidades é outro agente complicador da correta abordagem terapêutica. O
profissional deve estar capacitado a reconhecer os problemas precocemente, listá-los e
priorizá-los; também devem aprender a trabalhar em equipe, com atuações específicas nas
diversas fases do adoecimento do paciente. É importante mencionar, ainda, o “fenômeno do
iceberg”, ou seja, o fato de que os problemas médicos identificados em pessoas idosas são
apenas uma parcela dos problemas existentes. Sua etiologia é múltipla, o que torna
complexa a abordagem terapêutica. A falta de diagnóstico preciso acarreta maior sofrimento
para o paciente, comprometendo sua qualidade de vida.

Outro aspecto bastante pertinente e que merece ser discutido é o desgaste físico e
emocional ao qual os cuidadores dos pacientes fragilizados são submetidos. Os pacientes em
cuidados paliativos geralmente possuem doenças crônicas, como já discutido, que geram
prejuízo na qualidade de vida, bem como diminuem a funcionalidade do indivíduo. Na maior
parte das vezes esses pacientes necessitam receber cuidados de seus familiares e de pessoas
próximas. Esses cuidados incluem ajuda com mobilidade, higiene, alimentação e apoio
emocional. Contudo, pacientes que se encontram em fases mais avançadas de doença
possuem muitas limitações, necessitando de mais atenção e apoio de seus familiares.
Portanto, é de se esperar que essas situações promovam um exacerbado desgaste físico e
emocional para os familiares, ainda mais quando somente um familiar fica encarregado de
ser o cuidador do doente. Portanto, é necessário que se organize melhor todo esse processo,
para não sobrecarregar somente algumas pessoas e para evitar sofrimento e desgaste
emocional de ambas as partes. No decorrer da doença, uma nova rotina deve ser elaborada,
de forma mais organizada e confortável. Tarefas devem ser dividias entre os familiares da
melhor forma possível, e nesse momento a família vai aprendendo a lidar com a situação.

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3 PRINCIPAIS SINTOMAS

O paciente em cuidados paliativos geralmente é acometido por sintomas que


reduzem em muito sua qualidade de vida. Cabe ao profissional de saúde ajudar no alívio
desses sintomas utilizando todas as medidas possíveis. Após identificação dos sintomas
presentes, existem medidas de tratamento farmacológico e não farmacológico apropriadas
para o alívio e a manutenção do bem-estar da pessoa. A postura paliativista exige do
profissional médico uma intervenção rápida, intensiva, dinâmica e resolutiva no uso dos
fármacos e das técnicas específicas de paliação. O reconhecimento dos sintomas é o ponto
inicial do correto tratamento paliativo.

A dor é um dos sintomas mais importantes nos pacientes em cuidados paliativos,


sendo de extrema importância trata-la da melhor forma possível; possui alta prevalência,
gera muito impacto na qualidade de vida, e muitas vezes e subdiagnosticada e subtratada.
Ela pode ser definida e descrita como experiência sensorial e emocional desagradável,
associada a dano presente ou potencial, ou descrita em termos de tal dano. Portanto, é algo
totalmente subjetivo e individual. A dor não é somente física, tal como muitos acreditam. Ela
pode ser também psicológica, social e/ou espiritual, e geralmente estão juntas. Pode ser
aguda ou crônica, sendo que essa última perdura por mais de seis meses, e é geralmente a
mais prevalente em pacientes em cuidados paliativos. Ela é menos específica, mais refratária
a tratamentos exclusivamente medicamentos, mas também mais fácil do paciente se
adaptar. É importante ressaltar que a dor nos cuidados paliativos é esperada, mas não
normal. Portanto, os profissionais de saúde não devem permitir o sofrimento como se fosse
algo necessário e inevitável. E para melhor tratar, é de extrema importância o
acompanhamento de diferentes profissionais, tais como médicos, enfermeiros,
fisioterapeutas, psicólogos, etc.

Os princípios básicos do tratamento da dor são os seguintes: usar via oral sempre que
possível, pois é a mais fácil, poupa incômodo de injeções e dá mais controle sobre a
condição ao paciente; respeitar o relógio, usando analgésicos de forma regular e de acordo
com a farmacocinética do medicamento; administrar o reforço sempre que necessário;
sempre avaliar e reavaliar o esquema analgésico proposto, de 6 em 6 horas, ou então
diariamente; respeitar a escala analgésica, ou seja, inicialmente com analgésicos simples e

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AINES, seguido por opióides fracos, opióides fortes e por fim procedimentos
intervencionistas, sendo que podemos utilizar mais de uma classe, e tendo em mente que
dependendo se a dor for aguda ou crônica a progressão será diferente; sempre ter atenção
com os detalhes, informando ao paciente e familiares sobre o tratamento, sobre os horários
e sobre os possíveis efeitos colaterais existentes (ex.: opióides causam náuseas e vômitos,
constipação, etc); usar adjuvantes, como corticosteroides, antidepressivos,
anticonvulsivantes, ansiolíticos, laxantes, anti-heméticos, etc, mas sempre prescrevendo
medicamentos de acordo com a necessidade do paciente.

A dispneia é um dos sintomas mais presentes no fim da vida e dos que causam maior
angústia, tanto no paciente como na família e na equipe. Só de imaginarmos ficarmos sem
ar, já nos bate uma sensação de desespero eminente. A dificuldade em respirar sempre é
causada por uma causa primária, e portanto, sempre devemos tentar descobrir a causa da
dispneia (infecção, compressão, distúrbio metabólico) e intervir na ansiedade provocada por
esta condição. O uso do oxigênio tem um papel mais psicológico do que efetivo; o uso de um
ventilador ou a simples abertura da janela pode trazer um conforto muito grande. O uso dos
opioides (morfina em baixas doses em infusão contínua parenteral, preferencialmente pela
via subcutânea, se a via oral não for viável) reduz a frequência respiratória e confere uma
sensação de alívio e bem-estar ao paciente, possibilitando-lhe um sono mais tranquilo.

A insuficiência cardíaca acomete mais de 1 pessoa em 10 com idade acima de 70


anos, e a mortalidade (de até 80% em 5 anos) é semelhante ou até mesmo pior que a de
muitos tipos de câncer. O curso é geralmente de exacerbação intermitente dos sintomas de
dispneia e dor, o que provoca angústia, seguindo-se um retorno gradual ao nível funcional
anterior ou próximo dele. A morte pode vir após um declínio progressivo ou pode ser súbita,
durante uma crise. Apesar do progresso considerável no tratamento dos sintomas e das
crises, os pacientes e seus familiares costumam ter dificuldades para entender e controlar o
complexo regime terapêutico necessário. Pessoas com insuficiência cardíaca parecem ter
menos conhecimento formal de seu diagnóstico e prognóstico. Parece que não há uma
comunicação aberta dos profissionais de saúde, em parte pela dificuldade de se fazer uma
previsão e pela falta de vontade de se falar no assunto. A impressão que temos é que apesar
de se tratar de uma síndrome extremamente presente na população, não ganha tanto
destaque quanto deveria.
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A anorexia é muito frequente no fim da vida e uma causa de inquietação familiar. O
paciente simplesmente não tem fome ou vontade de comer. Os familiares geralmente ficam
muito preocupados, e podem até insistir e forçar os pacientes a se alimentarem. Contudo,
deve ser respeitado o desejo do paciente, principalmente quando ele estiver lúcido e
mantendo a sua autonomia. Nesses momentos, o aconselhamento médico é fundamental
para tranquilizar a família. Algumas medidas são interessantes e podem facilitar a ingesta de
alimentos, como fracionar a dieta em pequenas quantidades a cada duas horas; oferecer
bebida alcoólica 30 minutos antes da refeição para estimular o apetite e preparar refeições
com cheiro e aspecto apetitoso. O uso de baixas doses de corticosteroides (dexametasona,
prednisona), megestrol e antidepressivos tricíclicos do tipo nortriptilina pode ser útil por um
período transitório. A metoclopramida pode facilitar o esvaziamento gástrico, porém, o
efeito terapêutico não é linear e apresenta um risco de discinesia tardia nos idosos. O
metilfenidato em baixa dose é uma opção válida, embora possa provocar agitação.

A indicação de alimentação artificial deve ser bem avaliada ao fim da vida, pois as
sondas e cateteres nasoentéricos ou gástricos causam desconforto. É importante discutir sua
utilização e validade tanto com os pacientes como com os familiares. A sensação de sede
deve sempre ser corrigida. A hidratação básica pode ser atingida por uma reposição hídrica
no período noturno ou aliviada, colocando-se pequenos cubos de gelo na boca ao longo do
dia. Não há necessidade de alcançar os níveis ideais de hidratação e sim o conforto. A
manutenção da higiene bucal é fundamental para isso.

Existem alguns mitos a respeito do uso de cateteres nasoentéricos ou sondas de


gastrostomia. Acreditava-se que eles poderiam evitar a desnutrição, manter a integridade da
pele, evitar pneumonias por broncoaspiração, melhorar a qualidade de vida e aumentar
tanto a capacidade funcional, quanto a sobrevivência de pacientes com demência em fase
avançada. No entanto, hoje em dia sabemos que isso não é verdade. Essas vias artificiais de
alimentação devem ser reservadas para os pacientes com alguma expectativa de sobrevida
que requerem o uso contínuo de medicações para controle de suas doenças de base ou de
sintomas.

Muitos pacientes apresentam náuseas até o momento final, sem serem associadas a
vômito. Ainda assim, elas por si só provocam intenso mal-estar. A causa mais frequente de

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náuseas no fim da vida é a constipação intestinal crônica. Outras possíveis etiologias são:
alentecimento do esvaziamento gástrico (fisiológico na velhice), obstrução intestinal, efeito
colateral de opioide, aumento da pressão intracraniana, gastrite, úlcera péptica,
hipercalcemia, uremia e efeitos colaterais dos fármacos em uso.

A constipação intestinal costuma ser negligenciada na fase final, porém seu alívio é
importante para o paciente. A restrição ao leito, a inatividade, o pouco alimento, a
desidratação e o uso de opioides e anticolinérgicos são causas frequentes. É necessário
evitar a impactação fecal com o uso regular de laxativos e emolientes das fezes. Os laxativos
osmóticos do tipo lactulose são úteis para aumentar o conteúdo de líquido nas fezes e
melhorar a eliminação. É importante fazer toque retal quando o paciente ficar constipado
mais de 3 dias pelo risco de impactação por fecaloma. Quando a desimpactação manual for
necessária, recomenda-se analgesia prévia ou sedação leve para evitar a piora do
desconforto. Em casos de constipação intestinal grave secundária a opioides, pode ser usada
a metilnaltrexona pela via subcutânea.

O transtorno de ansiedade generalizada (TAG) precisa ser diferenciado da ansiedade


fisiológica. É de extrema importância avaliar se a causa da ansiedade é proporcional às
manifestações do paciente, e se aquilo está comprometendo a sua vida de forma exagerada.
Em cuidados paliativos, o estimulo geralmente surge com o diagnóstico de doença terminal,
ou então com a refratariedade do tratamento, apesar de poder ter diversas outras causas. A
terapia cognitiva comportamental tem eficácia comprovada no tratamento da TAG, e deve
ser a primeira escolha. Outras estratégias incluem atividades físicas, acupuntura,
massoterapia, suporte espiritual, etc. Com relação ao tratamento medicamentoso, os
benzodiazepínicos correspondem ao principal tratamento, devendo sempre ser usados com
muita cautela. Deve-se começar com a dose mínima e ir aumentando de acordo com a
necessidade, e evitar deixar o paciente sedado. Como exemplos de benzodiazepínicos de
curta duração temos o alprazolam e lorazepam; de média duração o clonazepam e de longa
duração o diazepam.

A depressão é uma doença crônica e recorrente, que produz alteração do humor


caracterizada por tristeza profunda, sem fim, associada a amargura, desencanto, baixa
autoestima e culpa, assim como distúrbios do sono e apetite. É necessário distinguir a

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depressão da tristeza esperada para uma pessoa diante da possibilidade de morte. Para o
diagnóstico da depressão, é importante obedecer aos critérios estabelecidos pelo DSM-5. O
manejo não farmacológico é necessário. Deve-se ser sempre sincero com o paciente, não
gerando falsas expectativas quanto a sua doença de base, e tentando estabelecer novos
objetivos de vida e fontes de prazer para o paciente. É fundamental que saibamos dar
notícias e comunicar da melhor forma possível, sendo claro e objetivo, mas também com
sensibilidade e empatia. Além disso, acupuntura, terapia, massoterapia, entre diversas
outras estratégias podem ser utilizadas para esses pacientes. Com relação ao tratamento
medicamentoso, se a expectativa de vida for menor que 4 semanas, deve-se utilizar um
psicoestimulante, caso seja possível. Para os outros pacientes pode-se utilizar
antidepressivos, tais como citalopram, escitalopram e sertralina.

O delirium é uma síndrome psiquiátrica de etiologia orgânica caracterizada por


desorganização transitória das funções cognitivas provocada por alterações no metabolismo
cerebral. O delirium pode ser hiperativo, hipoativo ou misto, sendo o hiperativo o mais
frequente. As principais causas são: medicações, dor, infecções, mudança de ambiente,
imobilidade, uso de cateteres, desidratação, distúrbios metabólicos, etc. Portanto, deve-se
trabalhar a fim de evitar as causas que são evitáveis, como por exemplo estimular conversas
e atividades mentais, oferecer líquidos, normalizar o sono e desencorajar dormir durante o
dia, encorajar e ajudar na deambulação quando possível. Para tratar, podemos suspender
possíveis medicamentos responsáveis pelo quadro, cuidar do ambiente, permitir a
permanência de pessoas conhecidas, retirar objetos incômodos para o paciente, etc. No
delirium hiperativo o fármaco de escolha é o haloperidol, e no delirium hipoativo não se tem
um medicamento de escolha para utilizar, sendo preferido medidas não farmacológicas.

4 COMUNICAÇÃO EM CUIDADOS PALIATIVOS

Em se tratando de cuidados no final de vida, é importante para o profissional saber


realizar uma comunicação efetiva, para que possa entender o outro e tentar atende-lo
quanto suas expectativas. A comunicação deve ser efetiva de forma verbal e não-verbal,
sempre observando o feedback que o paciente nos dá, através de palavras claras ou até
mesmo de gestos sutis. Notícias ruins são comuns nessas situações, tais como diagnóstico de
doença incurável, piora de um quadro ou então dar a notícia de morte. Essas notícias são

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ruins tanto para os profissionais, quanto para a família e para o próprio paciente. Quando o
profissional é novo, inexperiente, essas notícias tendem a serem mais pesadas ainda.
Contudo, ao longo do tempo vamos ganhando preparo e experiência, o que nos torna um
pouco menos abaláveis. As notícias ruins em algumas circunstâncias podem ser boas, em
situações por exemplo que o paciente está sofrendo muito, e a morte seria uma forma de
alivio. De qualquer forma, temos que ter segurança e chamar a responsabilidade para nós na
hora de darmos a notícia, e não jogar a responsabilidade para outra pessoa. E mais do que
isso, ter em mente que o paciente deve saber do seu quadro, e que não podemos mentir ou
tentar engana-lo.

O chamado protocolo SPIKES, elaborado pelo Dr. Robert Buckman, sugere estratégias
de como dar as más notícias. Como dito anteriormente, isso é uma obrigação do profissional
e ele tem que saber fazê-lo. As notícias devem ser dadas com sensibilidade, em um
ambiente de apoio, no ritmo do paciente e sempre com abertura para novas perguntas, pois
as más notícias não se transformam em boas. Para uma entrevista onde assuntos complexos
serão abordados, deve-se ter tempo para uma conversa sem interrupções. A privacidade é
fundamental para que uma relação de confiança se estabeleça. Seguindo as orientações do
protocolo SPIKES, aprende-se de maneira efetiva a comunicar uma notícia ruim com
sensibilidade, respeitando os limites do paciente e dos seus familiares. Antes de dar uma
informação, deve ser investigado junto ao paciente o que ele quer ouvir e deve ser avaliado
se aquele é o momento mais adequado para a conversa. O profissional envolvido na
comunicação precisa desenvolver a habilidade de separar a mensagem do mensageiro para
fortalecer sua relação com o paciente e os familiares. O ambiente tem relevância
fundamental para esse tipo de conversa. Tudo importa: a iluminação, a cor das paredes, a
disposição das cadeiras, a existência de um sofá em que paciente e profissional possam
sentar-se, a ausência de uma barreira física que impeça a possibilidade do olhar direto e da
leitura labial e o cuidado para que não ocorram interferências externas. O profissional deve
fazer contato visual com o paciente evitando, porém, o constrangimento provocado por um
olhar fixo. O tom da voz, a possibilidade do toque e a postura do profissional serão o esteio
da conversa. O que o paciente diz deve ser escutado com calma e atenção, evitando a
superposição de vozes. Repetir algumas palavras já utilizadas ajuda na compreensão final.
Com a observação cuidadosa do paciente, é possível apreender o quanto ele já sabe e o que

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mais quer saber. A utilização de um vocabulário acessível, evitando-se o linguajar técnico,
facilita o entendimento. Não se dá mais informações do que o paciente quer ouvir, pois a
capacidade de assimilação será mínima. Procura-se responder às perguntas com precisão,
transmitindo conhecimento, segurança e objetividade. Nesse ponto, é o paciente quem dita
o ritmo da conversa. Com frequência existe um tempo prolongado de silêncio durante o qual
as informações estão sendo processadas e internalizadas pelo paciente. Esse silêncio tem
grandes dimensões, devendo ser respeitado pelo profissional. Reações emocionais fortes
como raiva, desespero, negação e choro incontrolável podem ocorrer, e o profissional tem
que estar preparado para manter a situação controlada. A conversa deve ser finalizada com
um resumo do que foi dito, criando uma estratégia para os próximos encontros e a abertura
para novas perguntas. O paciente precisa ser envolvido no planejamento do tratamento e
nas futuras decisões. Aconselha-se que o profissional seja muito cauteloso no momento da
notícia, pois qualquer dificuldade irá repercutir diretamente na qualidade da relação com o
paciente e na continuidade do acompanhamento.

5 O FIM DA VIDA

Diversos aspectos geram angustia e medo em um paciente com uma doença


incurável e com evolução avançada. Dentre os diversos medos, o paciente habitualmente
tem receio de como e onde será a sua morte; se será no hospital, cercado por pessoas
desconhecidas, ou se será em casa, ao lado de familiares e amigos. É importante conversar
com ele e ouvir suas expectativas, pois isso ajudará na tomada de decisões. De um modo
geral, existe um medo maior de como será o processo de morrer do que da morte em si.
Medo da dor, de morrer só, de sufocação, de ser enterrado vivo, da perda do controle, de
perder a dignidade e de incomodar seus familiares. Todos esses receios podem e devem ser
aliviados com atitudes e condutas corretas, baseadas em evidências.

A medicalização da morte pode criar um senso de culpa do profissional que não


conseguiu bloquear esse curso e, então, considera-se incapaz de exercer sua profissão de
forma competente. Mudanças ocorrem no fim da vida e alguns tratamentos podem tornar-
se irrelevantes. O uso de anti-hipertensivos, hipoglicemiantes e quimioterápicos, por
exemplo, deve ser reavaliado, pois esses medicamentos podem não ter mais indicação em
uma pessoa que está em sua fase final.

O reconhecimento da morte iminente é feito por meio da mudança do sensório, da


presença recente de confusão mental, de fadiga intensa, da flutuação dos sinais vitais sem
uma causa aparente de descompensação hemodinâmica e da não aceitação de alimentos
pela via oral. Esses sintomas aumentam em intensidade e em número nos últimos dias de
vida de uma pessoa. Não adianta intervir nesse processo, pois a doença de base é
incapacitante e irreversível. Todos merecem morrer com conforto e com seus entes queridos
próximos em um ambiente tranquilo e amigável. A respiração ruidosa, que pode preceder o

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momento da morte, é causada por congestão dos brônquios ou relaxamento do palato.
Deve-se fazer medicação anticolinérgica do tipo hioscina pela via subcutânea e inalação com
ipratrópio para reduzir a secreção das vias respiratórias. Bons cuidados ao fim da vida são
uma questão de saúde pública. A atitude das pessoas em relação à sua saúde e aos serviços
de saúde será influenciada pela lembrança da morte dos seus familiares.

A espiritualidade possui definição complexa e subjetiva. Podemos entender como


sendo a forma como o indivíduo se relaciona com o seu sagrado. Ela pode englobar a
religião, mas não sinônimos. A espiritualidade ajuda a encontrar um sentido e/ou propósito
para a vida. Além disso, ajuda a manter a esperança no paciente em cuidados paliativos; é
importante ressaltar que a esperança nesse sentido não se trata apenas de cura da doença,
mas também de uma melhor qualidade de vida, bem como de atingir objetivos e metas que
ainda tenha. A espiritualidade ainda melhora a ansiedade e a depressão, aumenta a
sensação de bem-estar, por aumentar a produção de endorfinas e serotonina; diminui a
sensação de dor e promove melhor adesão ao tratamento. Existem diversas escalas para
mensurar a religiosidade do paciente e compreender melhor suas crenças, para se elaborar
medidas que possam ajudar na sua situação. A espiritualidade em muitas das vezes auxilia e
enfrentar o período de final de vida, gerando aceitação para o paciente. Contudo, pode ser
negativa em alguns casos, quando o paciente se apega exclusivamente em suas crenças e se
nega a receber outros tratamentos, ou então quando ele acredita ser necessário passar por
sofrimento. Portanto, o equilíbrio deve ser encontrado, para que o paciente e seus familiares
tenham paz e tranquilidade nesse processo tão difícil.

6 APÓS A MORTE: O LUTO

Por fim, o processo de cuidados paliativos não se encerra quando o paciente morre,
mas se estende para além disso. É importante que os profissionais tenham atenção com os
familiares durante o processo do luto. O luto corresponde a um processo de perda, durando
cerca de 2 anos geralmente, e possui altos e baixos, gerando sentimentos ambivalentes nos
indivíduos, oscilando entre aceitação e negação, superação e tristeza. É importante vivenciar
o pesar, passando pelos rituais da perda do ente querido (ajudam a cair a ficha da perda,
bem como ajuda a relembrar dos mortos e aliviar o sofrimento), seja antes e depois da
morte. Após isso, deve-se ajustar ao ambiente onde está faltando a pessoa falecida. A
terceira tarefa é elaborar a dor da perda, sendo a mais longa e que gera mais sentimentos
duais. Por fim, é importante reposicionar emocionalmente o ente falecido. Uma forma de
ver que o processo de luto foi eficaz e saudável é quando a pessoa consegue se lembrar do
ente falecido sem gerar tanta tristeza. O luto complicado geralmente ocorre em casos de
morte súbita, morte violenta, morte de criança, suicídio, aborto e natimorto, e se manifesta
com sintomas muito mais intenso que aqueles esperados no processo de luto normal,
persistindo por mais tempo e gerando afastamento do convívio social, sendo necessário
encaminhamento para especializado. Devemos ter sensibilidade e empatia com pessoas
passando por luto, ajudando-as a superar o momento difícil, a organizar a vida e sempre
ouvir e dar espaço para falar e desabafar.

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REFERÊNCIAS

NETTO, M.P. Estudo da Velhice/Histórico, Definição do Campo e Termos Básicos. FREITAS,


E.V. de e PY, L.Coeditores: GORZONI, M.L; DOLL, J e CANÇADO, F.A.X.Tratado de Geriatria e
Gerontologia.4ª edição. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan Ltda, 2016

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