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DA IMAGEM
Rafaela Queiroz
Ferreira Cordeiro
Conceito de teoria
da imagem
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:
Introdução
A teoria da imagem faz parte do campo da semiótica, o qual se
preocupa em estudar os signos. Esse campo se preocupa em estudar
os signos. Hoje, ainda não existe uma tradição literária estável de estudo
da imagem, assim como há em relação ao estudo da palavra. Apesar
disso, uma reflexão baseada em uma semiótica explícita da imagem
traz subsídios para você entender como o discurso visual é construído
e interpretado. A imagem é, assim, um signo que pode remeter a
significações diversas de um mesmo objeto.
Neste texto, você vai refletir sobre o campo de estudo da semiótica. Além
disso, vai conhecer a teoria da imagem e identificar algumas noções sobre
ela – em especial, a visão da metafísica da imagem proposta por Aquino
– que exerceram influência nos estudos semióticos elaborados por Peirce.
2 Conceito de teoria da imagem
A semiótica
A semiótica se caracteriza como uma ciência geral que estuda os signos. Esse
campo de estudo abrange o estruturalismo e outros campos que se dedicavam
à significação, isto é, à análise do sentido atribuído por meio da linguagem.
Segundo Crystal (2008), esse campo científico estuda as propriedades dos
sistemas sígnicos – como um gesto, uma ação, um som, um símbolo –, sejam
esses naturais ou artificiais. Inicialmente, era também chamado de semiologia.
No entanto, em 1969, a Associação Internacional de Estudos Semióticos deu
preferência ao uso do termo “semiótica” em detrimento de “semiologia” (SIG-
NIFICADOS, c2011-2017). Essas expressões, empregadas anteriormente como
sinônimas, diferenciavam duas perspectivas de investigação teórica: enquanto
a semiologia havia sido fundada por Ferdinand de Saussure (1857–1913) e
se ligava à tradição europeia, a semiótica demarcava os estudos de tradição
norte-americana marcados principalmente pela contribuição de Charles San-
ders Peirce (1839–1914).
Conforme explica Nöth (2006), o estudo dos signos tem início com a origem
do homem, tendo em vista que interpretar o mundo e o homem é um estudo
que envolve os signos. Estes são, inclusive, a unidade mínima de estudo desse
campo, uma vez que a relação das pessoas com o mundo se dá por meio da
representação da linguagem. No entanto, o surgimento da semiótica como
ciência é recente. Mesmo assim, se você der uma olhada ao longo da história,
notará que o estudo do signo teve espaço em momentos importantes. Na
Antiguidade, em especial na Grécia, se desenvolveu uma filosofia do signo
conhecida como teoria do conhecimento humano. Já na Idade Média, havia
uma doutrina dos signos que deu origem a uma tipologia bem elaborada sobre
eles. Finalmente, na Renascença, diversas obras foram publicadas sobre os
signos. Quanto à definição de signo, você deve observar que, embora existam
diferentes conceituações, ele é basicamente definido como um veículo físico
básico de sentido em uma língua. Ou, ainda, como uma imagem que é sonora –
porque é possível visualizá-la ou ouvi-la – e que se refere a um objeto ou a um
aspecto do real ou referente (MCQUAIL, 2012). Assim, você usa os signos para
se comunicar, para produzir e transmitir sentidos sobre os objetos, as coisas,
os acontecimentos, as experiências, etc. Os outros “recebem” e interpretam
os signos usados por meio de uma linguagem ou sistema que é comum aos
sujeitos envolvidos no processo comunicativo.
Conceito de teoria da imagem 3
A teoria da imagem
Muito antes do surgimento da palavra escrita e do seu registro, os homens
das cavernas já se expressavam por meio de imagens. Isso deve levar você a
deduzir que as imagens têm sido, desde a pré-história, um importante meio de
expressão da cultura produzida pelo homem (SANTAELLA; NÖTH, 1998a).
Conceito de teoria da imagem 7
Diz a sabedoria popular que uma imagem vale mais do que mil palavras.
Esse antigo dito aponta, de alguma forma, para a relação íntima que existe
entre as imagens e as palavras. Essa relação muitas vezes é observada de
forma conflituosa ou, ainda, num tom de preeminência do signo visual sobre
o escrito, como se aquele “comunicasse por si só”. Imagens × palavras: ao
longo da história, o universo dos signos verbais e o dos visuais ora pareciam
entrar em confluência, ora em disputa, ora em um domínio de superioridade
de um sobre o outro. Foi assim, de maneira geral, que por muito tempo a
escrita controlou a imagem: a cultura do livro guiada pela tradição judaico-
-cristã, a qual dominou boa parte das sociedades ocidentais, controlava
rigorosamente as imagens. Afinal, elas eram vistas como um objeto de
Conceito de teoria da imagem 9
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Galileu Galilei (1564–1642) e René Descartes (1596–1650) são duas figuras proemi-
nentes da história, que viveram entre os séculos XVI e XVII. Suas concepções trouxeram
implicações muito importantes para as formas de pensar o conhecimento. O primeiro
foi um matemático, físico e filósofo italiano que se tornou conhecido por demonstrar as
leis do movimento e as leis da queda dos corpos. Além disso, a concepção de natureza
na filosofia moderna é proveniente de Galileu: para ele, a natureza é um sistema
ordenado de causas e efeitos, cuja estrutura profunda é de caráter matemático. Sendo
a natureza esse sistema de causa-efeito, este poderia ser conhecido pela consciência
e, assim, o homem se tornaria capaz de reproduzir ou evitar causas específicas para
impedir a produção de efeitos indesejados.
O segundo foi um matemático e filósofo francês muito conhecido pela publicação
da obra Discurso do método. Ele também é considerado o iniciador do racionalismo
moderno. Em seu livro, o francês descreve a famosa máxima do cogito cartesiano que
é penso, logo existo. Essa afirmação descreve o conhecimento intuitivo, uma vez que,
quando você pensa, está realizando o ato de pensar. Logo, aquele que pensa existe
como um sujeito pensante. Portanto, isso não precisa ser provado, uma vez que já é
evidente que existe alguém que pensa o pensamento e existe.
Fonte: Chaui (2013).
12 Conceito de teoria da imagem
A metafísica da imagem
De acordo com Mourão (2011), a noção de imagem é paradoxal e está incli-
nada a uma dispersão. Em Marin (1993 apud MOURÃO, 2011), se encontra a
seguinte resposta à pergunta o que é uma imagem?: a imagem é uma cate-
goria. Muitas vezes, a imagem é definida em oposição a um texto verbal, por
isso é interessante você notar, a partir dessa resposta, que há uma oposição à
teorização que a filosofia ocidental tem geralmente atribuído à imagem. Essa
teorização é de decalque, cópia, segunda coisa, véu, etc., ou seja, de um ser
“menor”, porque haveria outro maior em que ela se projetaria. Para Tomás
de Aquino, a imagem, enquanto percebida como apenas uma potência inte-
lectual, “[...] não ultrapassa o grau da alma sensitiva [...]” (MOURÃO, 2011,
p. 22). Dito de outro modo, o homem não consegue, por meio da imagem, se
distinguir do outro, pois sua diferenciação quanto ao outro se dá por meio
dessa alma sensitiva, a qual não é oferecida por meio da potência, mas pelo
ato: é este que especifica cada ser. Observe que, no volume II do livro De
Anima, de Aristóteles, referido por Aquino, a imagem é perfeição segunda e
não perfeição primeira. Contudo, o que define o ser é a perfeição primeira,
e não a segunda! Ainda, no volume III dessa obra, Aristóteles afirma que a
imaginação é um movimento determinado pelos sentidos, contudo não é a
imagem individual que define o homem.
Dito de outro modo, em Aristóteles, a imagem é gerada de uma potência
ativa para uma passiva. E o que isso significa? Significa que a potência e a ação
devem estar unidas, assim como alma e corpo, para produzir uma imagem.
E, nesse sentido, a compreensão da alma se dá então em relação aos objetos
situados no corpo (nos órgãos corporais), os quais produzem imagens. Desse
modo, as realidades corporais e singulares são objetos da imaginação – é
importante você atentar ao fato de que aqui a imaginação é observada como
diferente do intelecto. Portanto, para Aristóteles, a imaginação é um movimento
gerado pela atividade sensorial, isto é, pelos sentidos. Nessa atividade sensorial,
as imagens movimentam o intelecto da mesma forma que os objetos – que são
tomados como sensíveis – movimentam o sentido.
Nessa visão de Aristóteles, retomada por Aquino, sobre imagem × objeto,
a vontade de Deus pode produzir um efeito no mundo sem as causas geradas
pelo corpo, causas estas que o movimentam (MOURÃO, 2011). É por isso que
Aquino afirma que uma imagem viva acompanhada por uma forte emoção
pode provocar tanto a saúde como a doença sem a ação ou o movimento do
corpo. É por isso também que, no enunciado Deus é o verbo, o verbo é a
sua imagem; o verbo traz certa ideia ou semelhança. Tal semelhança pode
Conceito de teoria da imagem 13
A semiótica da imagem
De maneira geral, você pode considerar que o signo é alguma coisa que torna,
por meio de sua natureza (é um signo), outra coisa conhecida. Em Tomás de
Aquino, se observa que a imagem apresenta ou designa uma semelhança com
o ser, o objeto. É a partir dessa semelhança que se conhece a coisa que dela se
origina. Em Peirce (1867 apud MOURÃO, 2011), para se entender a imagem
como signo é preciso compreender a sua famosa tríade ou classes de signos:
(1) o ícone se caracteriza por apresentar semelhança com o objeto; (2) o índice,
por apresentar uma correspondência com o objeto, isto é, por indicar ou sugerir
o objeto; e (3) o símbolo, por apresentar uma relação abstrata, de qualidade,
com o objeto. Posteriormente, o filósofo norte-americano distinguiu três tipos
de ícones: imagens, diagramas e metáforas.
Para ficar mais claro, pense, a esse respeito, na Mona Lisa, a Gioconda.
Em primeiro lugar, há a elaboração da imagem pelo pintor italiano Leonardo
Da Vinci. Ela é, nesse sentido, um signo icônico. Depois, a pintura, que é
também o “retrato” da (ou a tentativa de retratar “fielmente” a) personagem,
pode ser vista como um índice da proeza do trabalho artístico de Leonardo
Da Vinci. Afinal, a pintura sugere a preocupação do artista com os detalhes
na representação da personagem. Por fim, a Mona Lisa pode também se
caracterizar como um símbolo da arte renascentista italiana. É possível falar
ainda, se for feita uma avaliação semiótica dessa imagem ao longo do tempo,
o seguinte: no início, há a personagem da Mona Lisa, que é retratada por
Leonardo da Vinci; depois, a sua reprodução final exposta no Louvre; e, por
fim, a fotografia da pintura, que é reproduzida em suportes diversos. Nessa
linha de análise, a semelhança entre os formatos (modelo, pintura e fotogra-
14 Conceito de teoria da imagem
Considerações finais
Como você viu, a semiótica contemporânea continua a avançar além dos limites
em que inicialmente se inseria. Hoje, seus estudos vão em direção não só ao
sistema de comunicação não humana, à esfera artificial e digital, mas conside-
ram processos sígnicos que atravessam o mundo da biologia (SANTAELLA;
NÖTH, 2004), do corpo e dos processos orgânicos que constituem o homem.
Além disso, a imagem, como signo preponderante do contexto comunicacional
atual, em suas diversas manifestações, é um campo de análise importante da
semiótica. Agora você já sabe que o estudo da imagem foi feito por diferentes
disciplinas, o que dificultou a constituição de uma tradição literária investi-
gativa. Apesar disso, a semiótica da imagem traz subsídios importantes para
a teorização da imagem, conforme defendem Santaella e Nöth (1998b), uma
vez que as pessoas são seres constituídos por signos e é por meio deles que
representam o mundo e as realidades.
Leituras recomendadas
BARTHES, R. Ensaios críticos. Lisboa: Edições 70, 2009.
MORRIS, C. W. Fundamentos da teoria dos signos. São Paulo: Edusp, 1976.
Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para
esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual
da Instituição, você encontra a obra na íntegra.
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