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A TEMÁTICA INDÍGENA NO CURRÍCULO E A


LEI 11.645/2008: MAIS UM DESAFIO À
REALIDADE ESCOLAR
THE INDIGENOUS THEMATIC IN THE SCHOOL
CURRICULUM AND LAW 11.645/2008: ONE MORE
CHALLENGE TO SCHOOL REALITY
Maria da Penha da Silva

Resumo culture of peoples Indians in Brazil. We will


discuss the current conditions of which
approach this subject in the school
environment, educational grants and teacher
O presente texto pretende provocar breves training that fosters understanding, respect
reflexões sobre a implementação da Lei and recognition of indigenous peoples in
11.645./2008, que ampliou a Lei our society.
10.639/2003, complementando-a ao
determinar a inserção no currículo das Keywords: Curriculum. Culture. Indigenous
escolas no Ensino Fundamental e Médio, os Peoples.
conteúdos sobre história e cultura dos
povos indígenas no Brasil. Discutiremos
quais as condições atuais da abordagem
desse tema no espaço escolar, subsídios O currículo no Brasil: as influências
didáticos e a formação de professores que dos estudos culturais e movimentos
favoreça o conhecimento, o respeito e o
sociais
reconhecimento dos povos indígenas por
nossa sociedade.

Iniciaremos nossas discussões partindo


Palavras-chave: Currículo. Cultura. Povos de uma breve reflexão sobre das influências
Indígenas. dos estudos culturais e dos movimentos
sociais para as mudanças nos currículos
Abstract
escolares no Brasil. De acordo com alguns
teóricos como Silva (1999), Moreira e Silva
(2006) e Carvalho (2004), a introdução dos
This text is intended to provoke brief estudos sobre esse tema por meio dos
reflections on the implementation of Law
11.645./2008, which extended the Law debates e discussões teve início nas duas
10639/2003, adding it to determine the primeiras décadas do século XX, ganhando
inclusion in school curricula in elementary mais significado nos anos 1940, com a
and high school, the contents of history and ênfase dos grupos étnicos com o enfoque
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no “movimento negro” se contrapondo ao outros grupos participantes do


mito da “democracia racial”. (CARVALHO, processo civilizatório nacional.
2004, p.34-35).
Art. 231. São reconhecidos aos índios
Duas décadas depois, esse movimento sua organização social, costumes,
línguas, crenças e tradições, e os
ganhou força com a inserção dos grupos
direitos originários sobre as terras que
feministas, os esquerdistas e mais os tradicionalmente ocupam,
movimentos sociais da educação, com as competindo à união demarcá-las,
discussões voltadas para o campo do proteger e fazer respeitar todos os
currículo tendo como principal incentivador seus bens.
o educador Paulo Freire (SILVA, 999).
O reconhecimento da diversidade
Nos anos 1980, intensificou-se a étnica representa a garantia do direito à
discussão por parte dos homossexuais, diferença, à educação diferenciada, onde
igrejas e povos indígenas, essa última inclua a valorização das suas práticas
categoria visando à busca da retomada dos socioculturais, religiosas e preservação das
direitos a terra, educação diferenciada e a línguas originárias de cada povo. Na década
saúde. Ainda no final dessa década, os seguinte, essa discussão trouxe importantes
indígenas conquistaram no espaço da conteúdos que influenciaram diretamente na
elaboração da Constituição Brasileira formulação do Plano Decenal de Educação
promulgada em 1988, (1993/2003). Para em seguida fazer-se
presente também na Lei 9.394 de 20 de
Art. 210. Serão fixados conteúdos
dezembro de 1996, que estabeleceu as
mínimos para o ensino fundamental,
de maneira a assegurar formação
Diretrizes e Base da educação nacional
básica comum e respeito aos valores (LDB):
culturais e artísticos, nacionais e
Art. 26. Os currículos do ensino
regionais.
fundamental e médio devem ter uma base
§ 2º. O ensino fundamental regular será nacional comum, a ser contemplada, em
ministrado em língua portuguesa, cada sistema de ensino e estabelecimento
assegurada às comunidades indígenas escolar, por uma parte diversificada,
também a utilização de suas línguas exigida pelas características regionais e
maternas e processos próprios d e locais da sociedade, da cultura, da
aprendizagem. economia e da clientela.

Art. 215. O Estado garantirá a todos o § 4º. O ensino da História do Brasil


pleno exercício dos direitos culturais e levará em conta as contribuições das
acesso às fontes da cultura nacional, e diferentes culturas e etnias para a
apoiará e incentivará a valorização e a formação do povo brasileiro,
difusão das manifestações culturais. especialmente das matrizes indígena,
africana e européia.
§ 1º. O Estado protegerá as
manifestações das culturas populares,
indígenas e afro-brasileiras, e das de
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No que diz respeito ao sistema observar os interesses ocultos em


educacional brasileiro nota-se na LDB uma determinados conteúdos que aparentemente
sinalização para a implementação do artigo são inocentes. Mas, que por meio deles são
constitucional citado anteriormente. E com veiculados interesses econômicos, e assim
mais ênfase ainda percebemos nos PCNs devemos questionar: quem está conduzindo
(Parâmetros Curriculares Nacionais), uma as discussões? Quais os interesses implícitos
proposta inicial de trabalho com a temática nessas discussões? Para Carvalho:
“Pluralidade Cultural” que deveria abordar
Parece ser necessário, ainda desenvolver
temas transversais contemplando os estudos
um olhar sobre o processo educativo não
das diversidades culturais existentes nas
diretamente desenvolvido pelo sistema
diferentes regiões do país. (CARVALHO, educacional, mas que está relacionado
2004, p.34-36). mais fortemente com a economia global,
a exemplo da indústria cultural, e que tem
A autora acima citada nos chama a reflexos no campo curricular. Dois
atenção para o processo de construção do aspectos importantes desta economia
discurso sobre as diferenças culturais. Esse global, que têm reflexos na educação são:
mapa da trajetória das discussões vem nos a fabricação de identidade do que
mostrar os seguimentos que fomentaram os denominaram consumidor e a fabricação
debates e as pesquisas acadêmicas. Um dos da diversidade cultural do mundo
aspectos em destaque é o posicionamento globalizado. (CARVALHO, 2004, p. 74).
comum aos grupos que participam do
Esses aspectos citados pela autora nos
movimento pelo reconhecimento da
chamam atenção pela forma como os meios
diversidade em se contrapor à visão
de comunicação têm servido de veiculação
eurocêntrica e dominante. Como também a
para a “indústria cultural”, que tem se
dificuldade em estabelecer conceitos e
apropriado do discurso multiculturalista e
referência sobre as diferenças: o “ser
reelaborado uma dinâmica de investimento
diferente”, “diferente de quem?” Nessa
na formação de identidades do público
complexidade, corremos o risco de cairmos
consumidor. Direcionando a produção de
no relativismo. O mesmo relativismo do
seus produtos para determinados grupos de
qual em determinado momento o
consumidores e esses consequentemente
movimento multiculturalista foi acusado.
expandirão entre a rede de suas relações
Uma das acusações foi de enfatizar
sociais e assim sucessivamente.
determinadas culturas colocando-as em
guetos, ignorando conhecimentos comuns É interessante que ocorra discussões e
importantes para os demais grupos sociais. reflexões sobre quem e como está
Sobre essa mesma acusação que se conduzindo a inserção da temática
fundamenta a defesa ao acesso do “diversidade cultural” e a quem
conhecimento globalizado. Sendo essa verdadeiramente interessa. Por exemplo: é
também uma discussão perigosa no campo comum entre os membros dos grupos
do currículo, pois o processo de atuantes do “movimento negro”, o uso dos
globalização está diretamente interligado aos produtos que os identificam como tal,
campos político e econômico e precisamos roupas, acessórios, cosméticos e etc.
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Formando-se toda uma rede de consequentemente na sociedade? Para


consumidores em torno de uma Moreira e Silva (2009, p.28), a teoria crítica
caracterização da categoria étnica. do currículo mostra-nos que o currículo não
Fortalecendo a indústria desses produtos deve ser uma reprodução cultural passiva,
que se apropriam da “indústria cultural”. mas um campo no qual possibilite reflexões
e contestações sobre os modelos de
Igualmente nesse contexto não é difícil sociedades existentes, para construirmos
identificar grandes empresas que se formas de transgredi-las. Segundo Apple:
apropriam do conhecimento de alguns
povos indígenas para exploração de A educação está intimamente ligada à
matérias-primas da região amazônica, usadas política cultural. O currículo nunca é
na fabricação de produtos de beleza. Como apenas um conjunto neutro de
também veiculam imagens da mesma região conhecimentos, que de algum modo
aparece nos textos e nas salas de aula de
para propagar os produtos. Significa que
uma nação. Ele é sempre parte de uma
havendo uma valorização da cultura desses tradição seletiva, resultado da seleção de
povos indígenas nas escolas dos não-índios alguém, da visão de algum grupo acerca
resulta em mais lucros para essas empresas. do que seja conhecimento legítimo. É
Não devemos ser ingênuos e pensar que a produto de tensões, conflitos e
inserção desses valores culturais no concessões culturais, políticas e
currículo escolar é simplesmente uma econômicas que organizam e
conquista dos movimentos sociais e dos desorganizam um povo. (APPLE, 2009,
grupos étnicos aqui citados, pois pode ser p.59)
muito mais do que isso. Como afirmou
Aplle (2009), a educação está sempre
atrelada ao desenvolvimento político e De acordo com o autor acima, após as
econômico. teorias críticas e pós-críticas do currículo,
devemos debruçar outro olhar para o
Embasados nessas teorias
currículo, esqueçamos a “inocência” das
perguntamos: a trajetória de mudanças
propostas curriculares para observarmos no
ocorridas no currículo escolar no Brasil,
currículo os mecanismos de controle social.
como um instrumento que percorre
A seleção dos seus conteúdos está sempre
caminhos, estabelecendo conteúdos, metas
atrelada à formação das identidades, pois
para alcançar conhecimentos capazes de
“Nas teorias do currículo, entretanto, a
desenvolver nos indivíduos que deles se
pergunta o quê? nunca está separada de
apropriam, são habilidades “consideradas”
outra importante pergunta: o que eles ou
necessárias para uma convivência
elas devem se tornar?” (SILVA, 1999, p. 15,
harmoniosa na sociedade? Ou devemos
grifamos). É nessa perspectiva que
pensar no currículo como espaço de
gostaríamos de provocar uma reflexão sobre
reflexão e construção de conhecimentos
a nova proposta curricular implementada
capazes de reelaborar dinâmicas de
por meio da Lei 11.645/2008, que mantém
convivências e provocar mudanças de
em cena as discussões sobre a inclusão da
atitudes no público que dele dispõe e
diversidade cultural no espaço escolar.
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Mesmo diante de todo controle social discriminação contra indivíduos ou


que as mudanças curriculares estão atreladas, coletividades dos referidos grupos.
as discussões sobre as relações entre Preconceitos esses em que muitas vezes o
currículo e cultura têm resultado em próprio docente não tem consciência que
avanços significativos para a Educação. Ao está sendo preconceituoso, a exemplo
mesmo tempo, trazendo muitos desafios daqueles que ainda usam aquela conhecida
para toda comunidade escolar que até então expressão “não tenho preconceito, trato
vivenciava no seu cotidiano um currículo meus alunos todos iguais, como se fossem
afirmativo da cultura homogeneizadora, todos brancos”. E esses acreditam que tratar
carregado de conceitos e preconceitos a diversidade cultural é tratar todos os
excludentes que elegem quais os saberes que indivíduos como iguais. Nessa perspectiva,
tem maior ou menor valor, que merece ou Gomes (2008) fez a seguinte reflexão:
não destaque como conteúdo curricular.
O ser humano se constitui por meio de
Essa nova perspectiva de inclusão dos
um processo complexo: somos ao
valores socioculturais e históricos indígenas
mesmo tempo semelhantes (enquanto
no cotidiano escolar abre espaço para gênero humano) e muito diferentes
discutirmos as reais condições das relações e (enquanto forma de realização do
redes sociais que os povos indígenas estão humano ao longo da história e da
inseridos. cultura). Podemos dizer que o que nos
torna mais semelhantes enquanto gênero
humano é o fato de todos apresentarmos
diferenças: gênero, raça/etnia, idades,
Os índios no currículo: o que culturas, experiências entre outros.
propõe o texto da Lei 11.645/2008? (GOMES 2008, p.22).

Essa reflexão vem contribuir para que


possamos ficar atentos aos equívocos de se
Como foi citado no início deste texto,
trabalhar a diversidade cultural apenas de
além das influências políticas, econômicas e
forma superficial. Na ânsia de atender as
culturais para as mudanças no currículo no
exigências curriculares, sem a promoção de
Brasil, a atuação de dois grupos étnicos, os
estudos e questionamentos sobre a
negros e os índios, nesse processo tem sido
importância do processo de inserção dessa
de fundamental importância para a inserção
temática no ambiente escolar. Já que a
oficial da diversidade cultural no currículo.
forma de abordagem do referido tema
E para esses grupos pode significar uma
geralmente tem ocorrido de forma
conquista esperada por longas décadas que
desastrosa. Em consonância com Gomes, o
responde em parte suas reivindicações.
educador Burbules, afirmou que devemos
Esses povos por muito tempo em nome da
permanecer atentos no que diz respeito às
“teoria da mestiçagem” ficaram “ausentes”
diversas formas de abordar a diversidade
dos conteúdos curriculares, passando a fazer
cultural: “Há o perigo de que as discussões
parte de um passado distante no qual eram
da diferença só ocorram pautadas no
apresentados como indivíduos de “cultura
pressuposto de elementos comuns; que
inferior”, resultando em preconceito e
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todos somos diferentes, mas basicamente o


Art. 2 Esta Lei entra em vigor na data
iguais” (BURBULES, 2009, p.179). Segundo de sua publicação.
este autor, seguimos uma tendência em o
Brasília, 10 de março de 2008; 187 da
pensar a diferença como um fator externo: o
“o outro a partir do eu” ou “o eu a partir do Independência e 120 da República.
(BRASÍLIA, 2008).
outro”, enquanto deveríamos exercitar o
olhar para as trajetórias da construção dessas
diferenças que ocorre nos embates inerentes Observamos que no texto da Lei acima
a convivência e inter-relações entre os vários transcrito, a temática indígena ainda é
grupos humanos. tratada de forma superficial, no que diz
respeito aos níveis de ensino no qual serão
Como exercício desse olhar,
estudados os conteúdos referidos. O Art.
convidamos os leitores a fazermos uma
26-A assim expressa: “Nos estabelecimentos
breve reflexão sobre o texto da Lei nº
de ensino fundamental e de ensino médio”,
11.645/08,
excluindo a Educação Infantil e Educação
o o de Jovens e Adultos que não foram citadas
Art. 1 O Art. 26-A da Lei n 9.394, de
20 de dezembro de 1996, passa a vigorar nas modalidades contempladas.
com a seguinte redação:
No § 1º encontramos expressões que
Artigo 26-A. Nos estabelecimentos de estão ultrapassadas nas discussões atuais e
ensino fundamental e de ensino médio, podem trazer interpretações superficiais,
públicos e privados, torna-se obrigatório
panfletárias: “a luta dos negros e dos povos
o estudo da história e cultura afro-
indígenas”, “resgatando”, “contribuições nas
brasileira e indígena.
áreas sociais”, “formação da sociedade
§ 1º O conteúdo programático a que se nacional”. Essas afirmações dão margem a
refere este artigo incluirá diversos interpretações deturpadas. A expressão “luta
aspectos da história e da cultura que
dos negros e dos povos indígenas” pode dar
caracterizam a formação da população
lugar a uma abordagem na qual esses povos
brasileira, a partir desses dois grupos
étnicos, tais como o estudo da história da foram e continuam sendo pensados apenas
África e dos africanos, a luta dos negros e como vítimas permanentemente em lutas.
dos povos indígenas no Brasil, a cultura Enquanto isso, devemos refletir que, além
negra e indígena brasileira e o negro e o da luta e dos confrontos, ocorreram
índio na formação da sociedade nacional, diferente formas de mobilizações e
resgatando as suas contribuições nas interações dos povos indígenas e dos negros
áreas social, econômica e política, na História do Brasil, e não devemos
pertinentes à história do Brasil. esquecer que ocorreram e ainda ocorrem
§ 2º Os conteúdos referentes à história e inter-relações sociopolíticas desses grupos,
cultura afro-brasileira e dos povos na convivência com os demais grupos
indígenas brasileiros serão ministrados no sociais no Brasil.
âmbito de todo currículo escolar, em
especial nas áreas de educação artística e A expressão “resgatando” nos faz
de literatura e história brasileira. lembrar algo que está estático, quando
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sabemos que todos os grupos humanos Partindo da observação de atividades


vivenciam processos de reelaborações vivenciadas em algumas escolas das redes
socioculturais contínuos. Assim, não é públicas de ensino municipais e a rede
impossível considerar a possibilidade de estadual de Pernambuco, percebemos que a
manter essa cultura estática, capaz de ser tentativa de contemplar a cultura afro-
resgatada. Já a expressão “contribuições nas brasileira e indígena na área de Educação
áreas sociais” substitui a ideia da importante Artística, na imensa maioria é feita apenas
atuação desses povos no contínuo processo como aspectos simbólicos, representativos,
sociopolítico e histórico do país por uma genéricos do conhecido folclore brasileiro:
“mera contribuição”. enfatiza-se comumente as danças, música e
ritos, culinária, artefatos utilitários ou
A afirmação “formação da sociedade decorativos, tudo sempre superficialmente
nacional” reforça a ideia corrente de lembrado nas datas comemorativas.
incorporação dos valores socioculturais
desses indivíduos no contexto nacional Quando se trata da Literatura, uma
remetendo-nos a “teoria da mestiçagem”, na primeira pergunta: como a literatura regional
qual os negros e os índios são vistos como e nacional trata essas temáticas? De acordo
um dos elementos apenas formadores na com os estudos de Silva, constata-se uma
composição da sociedade brasileira. E abordagem preconceituosa realizada por
quando é de interesse dos administradores alguns estudiosos pernambucanos do início
dessa sociedade, esses elementos aparecem do século XX, sobre o índio nas expressões
ou desaparecem oportunamente da cena socioculturais regional,
nacional.
Escritores e vários estudiosos, como
Logo o § 2º indica que os devidos Gilberto Freyre, Estevão Pinto, Câmara
conteúdos citados “serão ministrados no Cascudo, dentre outros, reafirmam o
âmbito de todo currículo escolar em especial desaparecimento dos indígenas no
processo de miscigenação racial,
nas áreas de educação artística e de literatura
integração cultural e dispersão no
e história brasileira”. Dever-se-á estar conjunto da população regional. (SILVA,
presente em todo currículo escolar, porque, 2008, p. 30).
entretanto, atribui responsabilidade a
determinadas áreas mais que em outras pela
inserção dos conteúdos referidos?! O referido pesquisador observou
Correremos o risco de permanecer com uma também na sua pesquisa, que os escritores
abordagem restrita, onde as demais áreas se citados geralmente expõem nas suas obras a
sentirão desobrigadas a vivenciá-los. Ou extinção dos povos indígenas em
ainda, por outro lado, os conteúdos serem Pernambuco e no Nordeste, como resultado
tratados no âmbito dos temas transversais. do processo de “mestiçagem”. E os verbos
empregados nos seus textos estão sempre no
Então devemos nos perguntar: como pretérito e quando há referência aos poucos
tem ocorrido a abordagem dessa temática indivíduos indígenas encontrados, enfatizam
no âmbito do ensino das Artes, Literatura e o fato de não trazerem mais “características
da História do Brasil?
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típicas” do seu povo e por isso são escolas destinadas aos não-índios, conteúdos
denominados de “remanescentes, caboclos que diz respeito ao reconhecimento,
ou mestiços”. É comum encontrar nessas respeito e valorização desses povos.
obras termos como: “assimilação cultural”,
“aculturação”, “cruzamento”, a última Diante desta realidade não devemos
expressão se refere ao relacionamento sexual esquecer os questionamentos no início deste
entre índios e não-índios, comparando-os texto: quem está conduzindo as discussões?
aos animais. E quais os interesses? Quais os interesses
em formular um texto de uma Lei, que por
E mesmo que encontrássemos obras um lado responde em parte a reivindicações
literárias que tenham uma abordagem e pressões de grupos sociais, e por outro
significativa, onde essas estariam disponíveis lado deixa muitas lacunas passivas de
à comunidade escolar? Quantas bibliotecas interpretações múltiplas, dúbias,
escolares têm em toda rede pública ou ainda desvinculadas das discussões atuais, da real
disponível para população em geral tanto situação do cotidiano escolar?
nas capitais, como em cidades maiores e
municípios menores e povoados do interior?
E qual a diversidade do acervo literário que
Subsídios didáticos: são coerentes a
trata das questões relacionadas à
implementação da Lei 11.645/2008?
“contribuição histórica” afro ou indígena
encontra-se nesses espaços?

Tratando-se da área de História do Apesar das pesquisas acadêmicas


Brasil, ainda são poucos os professores de afirmarem avanços significativos no olhar
História que tratam esses conteúdos na sala sobre o índio: “Os atuais estudos sobre os
de aula de forma crítica. Mesmo porque a povos indígenas têm revelado, além da
formação desses na sua maioria não antiguidade da presença desses povos, a
permitiu ou não promoveu oportunidades grande diversidade e pluralidade das
de reflexões que possibilitassem a sociedades nativas encontradas pelos
desconstrução de alguns (pré)conceitos colonizadores.” (Silva, 2007, p. 3). Sabemos
criados e registrados na História do Brasil que essa abordagem ainda não consta nos
pelo olhar colonial e presentes no livro subsídios didáticos mais usados nas salas de
didático, salvo raríssimas exceções. aula, que são os livros didáticos.
Infelizmente, geralmente esses livros sobre a
As reflexões sobre a Lei 11.645/2008
História do Brasil, trazem informações
possibilitam compreendermos o processo de
apenas que datam a partir da colonização,
imobilidade da inserção da temática indígena
conteúdos que nos ensinam que os
no espaço escolar. Apesar das reivindicações
colonizadores europeus foram
dos povos indígenas no Brasil pelo direito
“conquistadores” e que os negros foram
ao reconhecimento da especificidade de suas
escravos “apenas vítimas”, não aparecem os
expressões socioculturais, desde a garantia
conflitos, as mobilizações e demais
de uma educação diferenciada como
estratégias de resistências negras na
também, de ter incluso no currículo das
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sociedade escravocrata. E os índios, ora cultural. Como outros materiais didáticos


aparecem como povos de cultura comum levam-se um tempo para a produção e mais
entre si, como se todos se comportassem tempo ainda para chegarem às escolas. Por
igualmente. exemplo: a citada coleção foi produzida no
ano de 2006, ou seja, dois anos antes da Lei
Não importa qual a região eles 11.645/2008, e só veio chegar até a
habitem, são “pacíficos”, “inocentes” e comunidade escolar quatro anos depois!
“incapazes”, necessitados de proteção e Significa que sobre os povos indígenas no
tutela do Estado. Ora aparecem como Brasil trouxe informações e dados
indivíduos selvagens, bárbaros ou estatísticos ultrapassados! Outro aspecto
revoltosos. Ou seja, sempre de forma importante ainda nos citados vídeos é a
negativa como afirmou Gobbi (2006). Nos ênfase dada aos povos da região amazônica,
seus estudos sobre a representação do índio são muito poucas as informações sobre
nos livros didáticos de História, após povos indígenas do Nordeste. Assim
analisar uma determinada coleção didática, a reproduzindo a antiga ideia, como já vimos
autora concluiu: tão evidenciada pelos estudos literários e
Entretanto, mesmo quando afirmam que pesquisas acadêmicas regionais, que não
os índios não foram passivos diante da existem índios no Nordeste.
colonização, alguns autores não deixam
de atribuir a eles uma ideia de demérito.
Um subsídio interessante distribuído
Em muitos casos, a agência indígena é pelo MEC às unidades escolares públicas,
apresentada na figura daqueles que para estudos entre o corpo docente, é a
lutaram contra outros índios ou negros, coleção Indagações sobre o currículo, que trouxe
formando bandeiras ou atuando como entre outros os títulos “Currículo,
capitães do mato. Assim retratada, essa conhecimento e Cultura” e “Diversidade e
não passividade indígena é também Cultura”, com discussões atuais que servem
apresentada de forma negativa. (Gobbi, como ponto de partida para uma reflexão
2006, p. 73).
sobre a inserção dessa temática na escola.
A citada autora ainda ressaltou na sua Iniciando pelo texto de Gomes, que faz
pesquisa a ênfase que os livros didáticos dão questionamentos ao trato dado à diversidade
à valorização da cultura européia as cultural no âmbito escolar:
“grandes invenções” das ciências e A incorporação da diversidade no
medicina, enquanto no que se referem a currículo deve ser entendida não como
outros povos tudo parece como uma ilustração ou modismo. Antes, deve
“contribuição inferior” e folclórica. ser compreendida no campo político e
tenso no qual as diferenças são
Recentemente o MEC enviou as produzidas, portanto, deve ser vista
escolas públicas mais uma coleção de vídeos como um direito. Um direito garantido a
da TV Escola. E nessa coleção encontramos todos e não somente àqueles que são
alguns vídeos com conteúdos que se considerados diferentes. (GOMES, 2008,
aproximam de uma tentativa possível de p.30).
iniciarmos um diálogo sobre a diversidade
120

O texto seguinte da citada coleção agente fundamental na construção do


entre outras reflexões sobre currículo, currículo. Para que esse se consolide na
conhecimento e cultura, fundamentos sobre prática, no cotidiano, de nada serve uma
a crítica aos livros didáticos, nos orienta a proposta curricular diferenciada se o
não só estarmos atentos às formas como mediador não dispor de formação e
determinados conteúdos aparecem ou não instrumentalização que favoreça sua eficácia:
nesse subsídio didático, mas também da
O currículo é em outras palavras, o
necessidade do porque, e o que fazer para
coração da escola, o espaço central em
mudar,
que todos atuamos o que nos torna,
Ao observarmos com cuidado os livros diferentes níveis do processo
didáticos, podemos verificar que eles não educacional, responsáveis por sua
costumam incluir, entre os conteúdos elaboração. O papel do educador no
selecionados, os debates, as processo curricular é, assim, fundamental.
discordâncias, os processos de revisão e Ele é um dos grandes artífices, queira ou
de questionamento que marcam os não da construção dos currículos que se
conhecimentos e os saberes em muitos materializam nas escolas e nas salas de
de seus contextos originais. (MOREIRA; aula. Aí a necessidade de constantes
CANDAU, 2008, p. 23). discussões e reflexões, na escola sobre
currículo, tanto currículo formalmente
planejado e desenvolvido quanto o
currículo oculto. (MOREIRA;
Como havíamos observado, os CANDAU, 2008, p. 19).
subsídios didáticos vêm carregados de
conteúdos com significados que precisam
ser analisados e questionados. Porém, uma É de grande relevância essa reflexão
das muitas dificuldades no ambiente escolar dos/as autores/as acima citados/as no que
para melhor aproveitamento dos poucos diz respeito à preocupação com a
subsídios didáticos oferecidos está em reunir implementação das atuais mudanças
tempo e lugar apropriado para que os/as curriculares, sendo o educador elemento
docentes possam estabelecer momentos de fundamental para o acontecer curricular.
estudos e discussões sobre o conteúdo Perguntamos então: como está sendo
desses subsídios, sem que haja prejuízos trabalhada a formação continuada desses/as
para o cumprimento dos dias letivos. docentes para a atuação com a temática
indígena?

Em Pernambuco os índios caçam As redes de ensino públicas municipais


ursos panda! Discutindo a formação e a estadual de Pernambuco ainda estão
continuada docente muito longe de atender a essa grande lacuna!
O Estado ainda promoveu recentemente,
talvez em resposta as pressões do Ministério
Público que vem exigindo a efetivação da
De acordo com Moreira e Candau Lei 11.645/2008, alguns encontros para
(2008), concebemos que o docente é um
121

coordenadores pedagógicos, que deveriam O autor ainda nos chama a atenção


servir de multiplicadores nas unidades para que essa participação de indígenas nos
escolares, mas nada que atenda diretamente encontros de formação, não ocorra
os docentes em salas de aulas. Enquanto nas meramente de forma folclórica com apenas
redes municipais nada foi implementado, apresentação de danças e ritos, mas no
temos conhecimento de pouquíssimas âmbito da participação nas discussões e
iniciativas pontuais de um ou outro debates.
município. Uma preocupação é como os
encontros citados são preparados, Diante da realidade tão conhecida do
acontecem, quando e onde? Com a sistema de formação dos profissionais em
assessoria de profissionais-formadores educação perguntamos: quais as estratégias
habilitados nos tratamentos das temáticas a pedagógicas desenvolvidas no âmbito
que se refere à Lei? Esses encontros escolar para inserção da temática indígena
geralmente reúnem anualmente docentes de na escola? Se os coordenadores pedagógicos
várias cidades em um hotel em meio a uma se comprometem em multiplicar o breve
semana de estudos diversos, na qual é conhecimento adquirido nos encontros de
reservada uma manhã para um palestrante formação, encontram tempo e espaço para
pesquisador da temática a ser abordada. Não socializá-lo e refletir junto à comunidade
há tempo necessário para as discussões escolar? A nossa experiência de alguns anos
pertinentes às questões expostas. como docente comprova o inverso!

A esse respeito, em meio a algumas Vivenciamos um embate no que se


sugestões, Silva (2007) afirmou a refere à necessidade de formação continuada
necessidade de se organizar encontros e de qualidade e o cumprimento dos 200 dias
estudos sistemáticos e periódicos para a letivos estabelecidos em Lei. Como atender
formação contínua de professores nesta ambas as necessidades? Onde e em que
área: espaço de tempo possibilitar os estudos sem
prejuízos no cumprimento da carga horária?
Incluir a temática indígena nas A maioria das escolas não dispõe de espaço
capacitações, estudos e treinamentos físico adequado, nem pessoal preparado
periódicos do professorado, a ser para substituir os professores no momento
abordada na perspectiva da pluralidade em que estão participando da formação
cultural historicamente existente no Brasil
continuada.
e na sociedade em que vivemos: através
de cursos, seminários, e encontros de Logo nos deparamos com
estudos específicos e interdisciplinares
desinformações generalizadas por parte
destinados ao professorado e demais
desses profissionais sobre a temática
trabalhadores/as em educação, com a
participação de indígenas e assessoria de indígena (e negra), e consequentemente
especialistas reconhecidos. (SILVA, 2007, continuam reproduzindo os conhecimentos
p. 6). adquiridos na trajetória da sua formação
acadêmica de anos passados, acarretando
sérios prejuízos para formação de cidadãos
que deveriam tornar-se conscientes e
122

críticos. Ou seja, passados mais de dois anos Figura 1.Fundo do stand que abrigava a citada
da publicação da Lei 11.645/2008, na exposição.

imensa maioria das escolas públicas ainda


são poucas e equivocadas as abordagens nas
salas de aulas, no âmbito escolar, sobre a
temática afro-brasileira e, sobretudo, a
indígena!

Como constatação dessa realidade,


relatamos o exemplo de uma exposição que
visitamos recentemente em uma cidade do
interior do Estado de Pernambuco, onde
acontecia uma feira agro-ecológica
municipal na qual uma escola pública local
“orgulhosamente” homenageava o falecido Figura 2. Estudantes junto à índia Xukuru
direita da image exibindo artefatos indígenas mais
Cacique “Xicão Xucuru” (o povo indígena produção dos próprios estudantes (panela pintada
Xukuru do Ororubá habita os municípios de com tinta de artesanato).
Pesqueira e Poção, na região do Agreste
pernambucano). Fizemos um registro
fotográfico dos trabalhos expostos no stand
ocupado pela referida escola. Reproduzimos
a seguir algumas imagens que destacamos da
exposição. Sugerimos que essas imagens
venham servir como conteúdo de reflexão
das poucas tentativas de estudar a temática
indígena, onde observarmos o produto das
desinformações, resultando em muitas
abordagens deturpadas e representações
folclorizadas sobre os povos indígenas.
Podemos observar nas figuras 1 e 2, a
representação da imagem indígena
estereotipada em gravuras que mostram o
índio ainda seminu, enquanto as estudantes
vestem algumas peças de roupas de nylon
numa tentativa de assemelharem-se às
roupas usadas pelos indígenas Xukuru em
rituais ou exposições públicas. Vemos
também a peça de cerâmica pintada com
tinta usada para peças artesanais populares
em geral. Trata-se de uma tentativa de
representar a cultura material indígena. O
grupo de estudantes informou a intenção
123

em reproduzir pinturas nos artefatos de Figura 4. Representação de aldeia indígena e


a prática da caça.
cerâmicas, que se reportassem às peças
encontradas em civilizações indígenas
antigas. Perguntamos se o povo indígena em
questão ainda tem essa prática de trabalhar
na confecção de peças de cerâmica,
responderam negativamente. E mais uma
vez afirmaram se tratar de uma prática do
passado. Ficou constatado que o
conhecimento sobre os povos indígenas que
está sendo discutido nas salas de aula
naquela escola ainda se detém nas práticas
passadas e não se investiga quais as relações
atuais dos processos socioculturais Observamos que nos trabalhos
vivenciados pelos povos indígenas, expostos só aparecem índios guerreiros e do
sobretudo os Xukuru do Ororubá ali sendo sexo masculino. A “representação” das
lembrados. práticas indígenas cotidianas é: a pesca, o
uso de tanga e flecha em punho, no cenário
Nas imagens seguintes podemos
da figura 3, a aldeia apresenta moradias
observar aspectos que resultam de visões
típicas dos antigos povos indígenas norte-
sobre os povos indígenas nos livros
americano. Na figura 4, a tentativa de
didáticos, como também a ideia sobre os
representar a prática da caça como algo
índios como seres selvagens.
comum a todos os povos indígenas, resulta
Figura 3. Maquete representando uma aldeia em uma desastrosa abordagem, a qual
indígena. mostra o animal capturado é um urso panda!
Não existem registros da existência do
habitat desse animal asiático no território
brasileiro! Imaginemos em Pernambuco!
Quanto aos modelos das casas indígenas
ainda são apresentados em forma de “oca”,
como única forma de moradia dos povos
indígenas, desconhecendo-se a diversidade
entre eles e seus padrões socioculturais.

Na referida exposição, o espaço


reservado a história do povo indígena
homenageado foi reduzido a algumas fotos
e recortes de notícias sobre as mobilizações
reivindicatórias periódicas ou anualmente
promovidas pelos Xukuru do Ororubá.
Culminando com a apresentação um tanto
folclorizada de um pequeno grupo de índios
124

Xukuru, que fizeram uma rápida A preocupação docente em enriquecer a


apresentação de danças “típicas”, com todos aula e tornar mais fácil e real a teoria tem
os participantes caracterizados. sido um campo no qual discretamente a
Lamentavelmente não houve uma fala supremacia social e cultural é
estabelecida. Além disso, a escola
sequer sobre a história daquele povo, bem
freqüentemente se utiliza de artefatos
como o significado das danças. Observamos culturais de “outras” culturas para
que o público que ali assistia concebia acentuar, frisar, a “diferença”. Assim, ao
aqueles indivíduos como seres estranhos. utilizar utensílios da cultura indígena para
Finda a apresentação, muita dos presentes tornar concreta a prática pedagógica, a
pousavam para fotos ao lado daqueles seres escola transpõe o significado de
“exóticos”, vistos e nomeados instrumentos de trabalho e práticas
genericamente apenas como “os índios”. culturais mostrando-as como
instrumentos lúdicos, decorativos e, às
Reconhecemos o grande empenho, vezes, ludopedagógicos, além de marcá-
os esforços a dedicação e o entusiasmo por los como pertencentes a uma cultura
parte da equipe gestora, docentes e “exótica”. (Oliveira, 2002, p. 31).
estudantes daquela escola para vivenciarem
A autora indica a necessidade de uma
e apresentarem a história e as expressões
abordagem desse conteúdo de forma que
socioculturais indígenas, mas o que ocorreu
discuta as relações interculturais, vinculadas
foi uma abordagem superficial e com muitos
às relações interpessoais dos indivíduos no
equívocos. Com a proposta de homenagear
processo de convivência familiar e social
o falecido Cacique “Xicão” Xucuru e o
inerente a todo e qualquer grupo humano. É
povo Xukuru do Ororubá, a temática
necessário pensarmos então em quais as
indígena além de generalizada, foi
condições que o espaço escolar e seus
apresentada de forma fragmentada e ao
agentes educadores encontram-se para
mesmo tempo gerando um amontoado de
conduzir a inclusão da temática indígena no
informações desconexas. Pensamos que
currículo e a quem realmente interessa que
seria mais proveitoso se a abordagem tivesse
essa abordagem ocorra da forma
se detido exclusivamente sobre a história
apresentada. O que dizer do Estado de
sociopolítica da figura homenageada e seu
Pernambuco onde são conhecidos
povo, assim reduziria o risco de se tornar
atualmente 11 povos indígenas e que
uma abordagem meramente folclórica.
mantém um sistema educacional público nas
Segundo Oliveira (2002), os esforços escolas para não-índios, no qual os
em atualizar as práticas pedagógicas e tornar professores ocupam cadeiras para ministrar
as aulas mais atrativas por meio da disciplinas que não são habilitados para
exposição de imagens e artefatos culturais lecioná-las (a exemplo da disciplina
indígenas, pensando que assim estão equivocadamente chamada “Educação
valorizando as culturas desses povos, têm indígena”, quando deveria ser “Educação
resultado em um efeito contrário, na Escolar Indígena”, pois sobre Educação
supervalorização da cultura “dominante”: indígena quem tem méritos para tratar são
os próprios índios!)?!
125

Nessa tão conhecida situação, muitas e apesar da morosidade na real


muitas escolas se deparam com docentes em implementação da já citada Lei que essa
final de carreira, sem nenhuma experiência proposta de mudança no currículo venha
sobre o assunto, ministrando a disciplina de contribuir na reelaboração de identidades
“Educação indígena” no Curso Normal sociais capazes de reduzir os estereótipos
Médio (antigo Magistério), são em sua criados em torno dos valores socioculturais
grande maioria professoras que se negam a e históricos dos povos indígenas. Por meio
ler, a estudar e aprofundar seus da incorporação das expressões
conhecimentos para lecionar sobre a socioculturais indígenas no currículo
temática indígena. O que podemos esperar integralmente consolidado também nos
desses futuros professores que saem desses subsídios didáticos, nas formações dos/as
cursos, vão atuar no Ensino Fundamental e docentes e nos projetos políticos
continuar reproduzindo as mesmas visões pedagógicos das escolas.
equivocadas?

Notas
Considerações finais (conclusões
parciais) Licenciada em Pedagogia. Especialista
em Ensino das Artes e das Religiões.
Professora no Ensino Fundamental I na
Rede Pública de Ensino Municipal (Recife) e
Por meio dessa pesquisa preliminar Técnica Educacional na Rede Pública
concluímos que discutir a inclusão da Estadual de Ensino em Pernambuco
diversidade cultural no currículo é antes de
tudo reconhecer as especificidades inerentes
a determinados grupos sociais. É direcionar
um olhar diferente do que ocorria no Referências bibliográficas
currículo anterior, sejam nos aspectos
relacionados a gênero, crenças, etnias, etc.
Compreender que não se trata apenas de CARVALHO, Rosângela T. de.
trabalhar “a tolerância” em sala de aula ou Discursos pela interculturalidade no campo
realizar “breves visitas” à cultura do outro, curricular da Educação de Jovens e Adultos no
ou ainda “contemplar” minorias que Brasil nos anos 1990. Recife, Bagaço, 2004.
estavam excluídas ou mal representadas
nesse currículo. Porém, em tomar ciência da SILVA, Tomaz Tadeu da. Documento de
complexidade em se constituir um currículo identidade: uma introdução às teorias do currículo.
democrático o qual viabilize espaços que Belo Horizonte, Autêntica, 1999.
favoreçam o encontro e a convivência, o
MOREIRA, Antonio Flávio B; SILVA
respeito e o diálogo entre os diferentes
Tomaz Tadeu da. (Orgs.). Currículo, Cultura e
atores sociopolíticos, oportunizando
Sociedade. 11ª ed. São Paulo, Cortez 2009.
igualmente o acesso e a socialização dos
múltiplos saberes. Espera-se ainda que
126

APPLE, Michael W. A política do Ciências Sociais, Universidade Federal de


conhecimento oficial: faz sentido a idéia de São Carlos, São Carlos, 2006.
um currículo nacional? In: Currículo, Cultura e
Sociedade. MOREIRA, Antonio Flavio B; SILVA, Edson. Xukuru: memórias e
SILVA, Tomaz Tadeu da. (Orgs.). São história dos índios da Serra do Ororubá
Paulo, 11ª ed. Cortez 2009, p. 59-91. (Pesqueira/PE), 1959-1988. 2008. Tese
(doutorado). Departamento de História,
BURBULES, Nicholas C. Uma Universidade de Estadual de Campinas,
gramática da diferença: algumas formas de Campinas, 2008.
repensar a diferença e a diversidade como SILVA, Edson. História, povos indígenas e
tópicos educacionais. In: Currículo na Educação: (re)conheçendo e discutindo a diversidade
Contemporaneidade: Incertezas e Desafios. cultural. Texto apresentado no I Encontro
GARCIA, Regina Leite; MOREIRA, Pernambucano de Ensino de História, no
Antonio Flávio B. (Orgs). 2ª ed. São Paulo, Centro de Educação/UFPE. Recife, 2007,
Cortez, 2006, p. 159-188. dig. 11p.

GOMES, Nilma Lino. Diversidade e


Currículo. In: Indagações sobre currículo.
BEAUCHAMP, Janete; PAGEL, Sandra; autor
NASCIMENTO, Aracélia Ribeiro do.
(Orgs). MEC, Brasília, 2008, p. 17-47. Maria da Penha da Silva

MOREIRA, Antonio Flávio B e


CANDAU, Vera Maria. Currículo,
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Currículo. BEAUCHAMP, Janete; PAGEL, Recebido em 05/10/2010
Sandra; NASCIMENTO, Aracélia Ribeiro
do. (Orgs). MEC, Brasília, 2008, 17-48. Aceito para publicação em 30/06/2011
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Olhares que fazem a “diferença”: o índio em
livros didáticos e outros artefatos culturais.
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Acesso em: 23 set. 2010.

GOBBI, Izabel. A temática indígena e a


diversidade cultural nos livros didáticos de história:
uma análise dos livros recomendados pelo
Programa Nacional do Livro Didático. 2006.
Dissertação (mestrado). Departamento de

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