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Rick Joyner
ISBN: 85-85685-18-2
Título original em inglês: The Final Quest
Tradução: Milton Azevedo Andrade
Revisão: Vitoria Silva Wanderley
Os textos bíblicos citados estão conforme a versão Almeida, Revista e Atualizada, 2ª Edição, da Sociedade Bíblica
do Brasil.
As notas foram feitas pelos editores no Brasil.
1ª edição brasileira: Outubro de 1999.
2a edição brasileira: Julho de 2000.
Filiado a: abec - Associação Brasileira de Editores Cristãos
Publicado por: Danprewan Editora e Comunicações Evangélicas Ltda.
A seqüência desta visão é apresentada no livro: O Chamado para a batalha final, publicado por
esta mesma editora.
Índice
Agradecimentos:.......................................................................................3
Introdução ...............................................................................................4
Notas .................................................................................................... 71
Agradecimentos:
Agradeço especialmente à equipe editorial por todo o árduo trabalho e pelas longas horas que
dedicaram a este livro para que ele pudesse ser publicado: Dianne Thomas, Julie Joyner, Steve
Thompson, Trisha Doran, Becky Chaille, Terri Herrera e Felicia Hemphill.
Introdução
No início do ano de 1995 o Senhor me deu um sonho, que foi o primeiro de muitas experiências
proféticas que se interligaram. Publiquei uma versão condensada do primeiro sonho em The
Morning Star Prophetic Bulletin e em The Morning Star Journal, sob o título de As Hordas do
Inferno Estão em Marcha. Continuando a buscar o Senhor por causa dessa grande batalha
espiritual que eu tinha visto, tive uma série de visões e de experiências proféticas que a ela se
relacionavam. Publiquei versões condensadas das mesmas em The Morning Star Journal, que
saíram com o título As Hordas do Inferno Estão em Marcha, Partes II e III.
Esta série tornou-se provavelmente a obra mais popular que publicamos até hoje. Recebemos
uma enxurrada de pedidos para que as três partes fossem publicadas num só livro. Tomei o
propósito de fazê-lo e dediquei-me a completar tudo o que tinha sido deixado de lado nas versões
condensadas. Entretanto, bem na hora em que eu estava para entregar todo o material para o
nosso departamento editorial, tive uma outra experiência profética que obviamente se
relacionava com esta visão e que continha o que eu senti ser a parte mais importante de tudo.
Ela foi incluída no que veio a ser as Partes IV e V deste livro (alguma coisa da Parte IV chegou a
ser publicada na Parte III em The Journal). Há ainda um considerável material neste livro, nas
suas primeiras três partes, que não havia sido anteriormente publicado.
Rick Joyner
Parte I
O exército demoníaco era tão grande que se estendia até onde a minha vista alcançava. Ele
tinha divisões que se separavam umas das outras, cada uma das quais carregava uma bandeira
diferente. As principais divisões marchavam com as bandeiras do Orgulho, da Retidão Própria,
da Reputação, da Ambição Pessoal, do Julgamento Injusto, e da Inveja. Havia muitas outras
divisões malignas como essas além do alcance da minha visão, mas as que estavam à frente
dessa terrível horda do inferno pareciam ser as mais poderosas. O líder desse exército era o
Acusador dos Irmãos em pessoa.
As armas que essa horda levava também tinham nomes. As espadas tinham o nome de
Intimidação; as lanças tinham o nome de Traição; e as flechas tinham os nomes de Acusação,
Fofoca, Calúnia e Crítica. Batedores e companhias menores de demônios com nomes tais como
Rejeição, Amargura, Impaciência, Falta de Perdão e Cobiça eram enviados à frente desse exército
para preparar o ataque principal.
Essas companhias pequenas com batedores em menor número, não eram menos poderosas do
que algumas das grandes divisões que as seguiam. Elas eram menores apenas por razões
estratégicas. Assim como João Batista foi um único homem, mas com uma extraordinária unção
para batizar o povo e prepará-lo para o Senhor, essas companhias demoníacas menores tinham
recebido extraordinários poderes malignos para "batizar o povo". Um único demônio da Amar-
gura podia disseminar o seu veneno em multidões de pessoas, até em raças e culturas inteiras.
Um demônio da Cobiça podia prender-se a um único artista, ou a um filme, ou até mesmo a
uma propaganda e enviar o que parecia ser descargas elétricas de um lodo que atingia e tornava
insensível uma grande parte das pessoas. Tudo isso era preparação para a grande horda do mal
que vinha em seguida.
Esse exército estava marchando especificamente contra a igreja, mas ele atacava a quantos
pudesse. Eu sabia que o seu propósito era esvaziar antecipadamente um mover de Deus que
está para vir, que se destinará a trazer muita gente para dentro da igreja.
A estratégia principal desse exército era causar divisão em todo possível nível de
relacionamento — nas igrejas, umas com as outras; nas congregações, em relação a seus
pastores; entre maridos e esposas; entre filhos e pais; e até mesmo nos pequeninos, pondo-os
uns contra os outros. Os batedores eram enviados para estabelecer aberturas em igrejas, em
famílias e em indivíduos que Rejeição, Amargura, Cobiça, etc. poderiam explorar, tornando essas
aberturas maiores. Então as divisões que os seguiam fluiriam através dessas aberturas para
vencerem completamente suas vítimas.
A parte mais chocante dessa visão era que essa horda não estava montada em cavalos, mas
principalmente em cristãos! A maioria deles era bem vestida, respeitável, e eles tinham a
aparência de ser refinados e educados, mas parecia haver também representantes de quase
todos os estilos de vida. Essas pessoas professavam as verdades cristãs de forma a apaziguar a
sua consciência, mas elas viviam mancomunadas com os poderes das trevas. Quanto mais elas
entravam em acordo com aqueles poderes, os demônios que a elas eram destacados cresciam e
com maior facilidade dirigiam o que elas faziam.
Muitos desses crentes hospedavam em si mais do que um demônio, mas um deles obviamente
ficava encarregado da sua vida. A natureza daquele que era o encarregado demonstrava em que
divisão ele estava marchando. Embora as divisões estivessem todas marchando juntas, também
parecia que ao mesmo tempo todo o exército estava à beira do caos. Por exemplo, os demônios do
ódio odiavam os outros demônios tanto quanto odiavam os cristãos. Os demônios da inveja
tinham inveja uns dos outros. O único modo pelo qual os líderes dessas hordas impediam que os
demônios lutassem entre si era fazer com que eles concentrassem o seu ódio, a sua inveja, etc.
na pessoa em que estivessem montados. Entretanto, essas pessoas com freqüência irrompiam
em lutas umas contra as outras. Eu sabia pelas Escrituras, que acontecera assim com alguns
dos exércitos que tinham vindo contra Israel, e que acabaram autodestruindo-se. Quando o
propósito deles contra Israel se frustrou, sua fúria foi incontrolável, e eles simplesmente
passaram a lutar uns contra os outros.
Notei que os demônios estavam montados nesses cristãos, mas não estavam dentro deles,
como no caso de não-cristãos. Era óbvio que esses crentes teriam apenas que deixar de
mancomunar-se com os demônios para que se libertassem deles. Por exemplo, se um cristão
sobre quem um demônio da inveja estivesse montado simplesmente começasse a duvidar da
inveja, aquele demônio ficava mais fraco bem depressa. Quando isso acontecia, o demônio
enfraquecido gritava e o líder da divisão mandava todos os demônios em volta daquele cristão
que o atacassem, até que a amargura, etc, conseguisse montar nele de novo. Se isso não desse
certo, os demônios começavam a citar as Escrituras, de uma maneira tão pervertida a ponto de
justificar a amargura, as acusações, etc.
Estava bem claro que o poder dos demônios tinha a sua raiz quase que totalmente no poder do
engano, mas eles tinham enganado esses cristãos até o ponto em que pudessem usá-los,
fazendo-os ainda pensar que estavam sendo usados por Deus. Isso acontecia porque bandeiras
de Retidão Própria estavam sendo carregadas por quase todos os cristãos, de forma que os que
marchavam não conseguiam nem mesmo ver as bandeiras que assinalavam a verdadeira
natureza dessas divisões.
Ao olhar para a última parte, bem distante, desse exército, eu vi o séquito do próprio Acusador.
Comecei a compreender sua estratégia, e fiquei impressionado por ela ser tão simples. Ele sabia
que uma casa dividida não pode permanecer, e esse exército representava uma tentativa de
trazer divisão à igreja de forma tal que ela decaísse completamente da graça. O que era visível
era que o único modo pelo qual ele poderia fazer isso era usar cristãos para guerrearem contra
seus próprios irmãos, e era por isso que quase todos os que estavam nas divisões avançadas
eram cristãos, ou pelo menos pessoas que professavam sê-lo. Cada passo que esses crentes
enganados davam em obediência ao Acusador fortalecia o poder deste sobre eles, isso fazia com
que a confiança dele e de todos os seus comandantes aumentasse com o progresso do exército,
enquanto marchava indo para a frente. Era visível que o poder desse exército dependia do acordo
que esses cristãos faziam com os caminhos do mal.
Os Prisioneiros
Multidões de outros cristãos, que eram prisioneiros desse exército, vinham em seguida a essas
primeiras divisões. Todos esses estavam feridos, e eram guardados por demônios menores do
Medo. Parecia haver mais prisioneiros do que demônios, no exército. Surpreendentemente, esses
prisioneiros ainda tinham suas espadas e escudos, mas não os usavam. Era chocante ver como
muitos podiam ser mantidos cativos por bem poucos pequenos demônios do Medo. Se aqueles
cristãos ao menos tivessem usado suas armas, eles teriam se libertado com facilidade, e
provavelmente teriam feito um grande estrago em toda aquela horda maligna. Em vez disso, eles
marchavam, submissos.
Por cima dos prisioneiros o céu estava preto, com abutres que se chamavam Depressão. De vez
em quando um deles pousava sobre o ombro de um prisioneiro e vomitava sobre ele. O vômito
era Condenação. Quando o vômito atingia um prisioneiro, ele se levantava e marchava com a
postura um pouco mais erguida por algum tempo, e então caía, bem mais fraco do que antes. De
novo fiquei imaginando por que os prisioneiros simplesmente não matavam esses abutres com
suas espadas, o que eles poderiam ter feito com facilidade.
Ocasionalmente os prisioneiros mais fracos tropeçavam e caíam. Assim que atingiam o chão, os
outros prisioneiros os apunhalavam com suas espadas, depreciando-os. Então os abutres
vinham e começavam a devorai- os que estavam caídos, mesmo antes de estarem mortos. Os
outros cristãos prisioneiros ficavam à sua volta e observavam isso concordando com o que
acontecia, e até apunhalando de novo com suas espadas os que estavam caídos.
Enquanto eu observava, percebi que esses prisioneiros pensavam que o vômito da Condenação
era uma verdade que tinha vindo de Deus. Então compreendi que esses prisioneiros na verdade
achavam que estavam marchando no exército de Deus! É por isso que eles não matavam os
pequenos demônios do medo, nem os abutres — eles pensavam que estes eram mensageiros de
Deus! A escuridão da nuvem de abutres dificultava esses prisioneiros de ver que tinham aceitado
inocentemente tudo o que lhes acontecia como tendo vindo do Senhor. Eles achavam que os que
tropeçavam estavam sob o juízo de Deus, e por isso os atacavam do modo como faziam — eles
pensavam estar ajudando a Deus!
O único alimento que era dado àqueles prisioneiros era o Vômito dos abutres. Os que se
recusavam a comê-lo simplesmente se enfraqueciam até que caíam. Os que o comiam
fortaleciam-se por algum tempo, mas com uma energia maligna. Então eles se enfraqueciam de
novo até que tomassem um pouco da água da amargura que constantemente lhes era oferecida.
Depois de beberem dessa água eles passavam a vomitar sobre os outros. Quando um dos
prisioneiros fazia isso, um demônio que estava esperando poder cavalgar montava-se sobre ele, e
o dirigia para uma das divisões da linha de frente.
Ainda pior do que o vômito dos abutres era um lodo repugnante que os demônios urinavam e
defecavam em cima dos cristãos sobre os quais cavalgavam. Esse lodo era o orgulho, a ambição
pessoal, etc, conforme a natureza da sua divisão. Contudo, aquele lodo fazia com que os cristãos
se sentissem aliviados de todo sentimento de condenação, de forma que facilmente acreditavam
que os demônios eram mensageiros de Deus, e na verdade eles pensavam que aquele lodo era
unção do Espírito Santo.
Senti tal repugnância do exército maligno que quis morrer. Então a voz do Senhor veio para
mim e disse:
— Esse é o princípio do exército do inimigo, do último dia. Esse é o engano final de Satanás. Seu
poder final de destruição é liberado quando ele usa cristãos para se atacarem entre si. Por todas
as eras ele tem usado esse exército, mas nunca ele pôde usar tantos para esse seu propósito
maligno, como agora. Não tenha medo. Eu tenho um exército também. Você agora tem é que se
dispor a lutar, porque não há mais para onde fugir dessa guerra. Você tem de lutar por meu reino,
pela verdade, e por aqueles que foram enganados.
Esta palavra do Senhor foi tão estimulante que imediatamente comecei a gritar aos cristãos
prisioneiros dizendo que eles estavam sendo enganados, pensando que eles me ouviriam. Quan-
do fiz isso, pareceu-me que o exército inteiro virou-se e olhou para mim. O medo e a depressão
que estavam sobre eles começaram a vir para mim. Permaneci ainda gritando, achando que os
cristãos despertariam e perceberiam o que lhes estava acontecendo, mas em vez disso muitos
deles passaram a pegar suas flechas para atingir-me. Outros apenas hesitaram, como se não
soubessem o que fazer com respeito a mim. Senti então que tinha agido prematuramente, e que
cometera um erro grosseiro.
A Auto-Estrada
Agora todos tinham espadas que tinham o nome A Palavra de Deus, e flechas cujos nomes
eram diferentes verdades bíblicas. Nós queríamos contra-atacar, mas não sabíamos como não
atingir os cristãos sobre os quais os demônios cavalgavam. Então veio-nos à mente que se
aqueles cristãos fossem atingidos com a Verdade, então eles despertariam e lutariam para se
desvencilharem de seus opressores. Eu lancei algumas flechas, como também o fizeram alguns
outros. Quase todas elas atingiram cristãos. Entretanto, quando a flecha da Verdade penetrou
neles, eles não despertaram, nem caíram feridos — eles enraiveceram-se, e os demônios monta-
dos sobre eles cresceram bastante.
Isso chocou a todos, e começamos a sentir que aquela era uma batalha impossível de se
vencer. Mesmo assim, com Fé, Esperança e Amor tínhamos confiança de que poderíamos pelo
menos manter a nossa posição. Um outro enorme anjo, de nome Sabedoria, então apareceu e
orientou-nos para irmos à montanha que estava atrás de nós para de lá lutar.
Na montanha havia plataformas, em diferentes níveis, umas sobre as outras, indo a uma altura
a perder de vista. A cada nível mais elevado, as plataformas estreitavam-se, e ficava mais difícil
para se posicionar. Cada nível tinha o nome de uma verdade bíblica. Os níveis mais baixos
tinham nomes de verdades fundamentais, tais como "Salvação", "Santificação", "Oração", "Fé",
etc, e os níveis mais elevados tinham o nome de verdades bíblicas mais profundas. Quanto mais
alto subíssemos, mais os nossos escudos e as nossas espadas cresciam, e menos flechas do
inimigo alcançavam nossas posições.
Um Trágico Erro
Alguns dos que haviam ficado nos níveis mais baixos começaram a pegar as flechas do inimigo
e passaram a lançá-las de volta. Isso foi um grave erro. Os demônios com facilidade esquivavam-
se das flechas para que elas atingissem os cristãos. Quando um cristão era atingido por uma
flecha de acusação ou calúnia, um demônio de amargura ou de raiva vinha voando e se
empoleirava naquela flecha. Então ele começava a urinar e a defecar o seu veneno em cima
daquele cristão. Quando um cristão tinha dois ou três desses demônios acrescentados aos do
orgulho e da retidão própria que ele já tinha, ele transformava-se na contorcida imagem do
próprio demônio.
Dos níveis mais altos dava para ver que isso acontecia, mas os que estavam nos níveis
inferiores, e que estavam usando as flechas do inimigo, estes não conseguiam ver que isso estava
acontecendo. Cerca da metade de nós decidiu continuar a subir a montanha, enquanto que a
outra metade desceu de volta para os níveis mais baixos para explicar aos que lá estavam o que
estava acontecendo. Todos foram então advertidos a que continuassem a subir e a não parar,
exceto alguns que permaneciam estacionados em cada nível para fazer com que os demais
soldados pudessem subir.
Segurança
Quando alcançamos o nível chamado "A Unidade dos Irmãos", nenhuma das flechas inimigas
podia atingir-nos. Muitos do nosso acampamento decidiram que não precisariam subir a níveis
mais altos. Entendi isso porque a cada novo nível o espaço que tínhamos era mais precário.
Entretanto, eu me sentia bem mais forte e com uma habilidade em manejar as armas bem maior
a cada novo nível, e então continuei a subir.
Em pouco tempo fiquei com a habilidade de atirar uma flecha e atingir o demônio e não o
cristão. Senti que se continuasse a subir eu conseguiria alcançar distâncias maiores de forma a
atingir os principais líderes das hordas malignas que se postavam atrás do seu exército.
Lamentei que muitos tivessem parado em níveis mais baixos onde estavam em segurança, mas
onde não dava para atingir o inimigo com tanta eficiência. Mesmo assim, o vigor e a disposição
que crescia nos que continuavam a subir fizeram deles grandes campeões, cada um deles sendo
capaz de destruir muitos inimigos.
Em cada nível havia flechas da Verdade espalhadas por todo lado, que eu sabia terem sido
deixadas por aqueles que, daquela posição, tinham caído (muitos tinham caído de cada posição).
Todas as flechas tinham o nome da Verdade daquele nível. Alguns estavam relutantes em pegar
aquelas flechas, mas eu sabia que necessitávamos de tudo o que pudéssemos obter para destruir
aquela grande horda lá em baixo. Peguei uma delas, atirei-a, e com facilidade atingi um
demônio, de forma que os outros começaram também a pegá-las e a atirá-las. Estávamos conse-
guindo dizimar várias das divisões do inimigo. Por causa disso, todo o exército maligno pôs a
atenção em nós. Por algum tempo parecia-nos que quanto mais tínhamos êxito, mais o inimigo
atacava-nos. Embora a nossa missão parecesse ser sem fim, ela tinha se tornado estimulante.
Como o inimigo não podia atingir-nos nos níveis mais altos com suas flechas, grupos de
abutres vinham e voavam por cima para vomitar sobre nós, e também levavam demônios para
urinar e defecar sobre as plataformas, tornando-as muito escorregadias.
A Âncora
Nossas espadas aumentavam quando alcançávamos cada nível mais elevado, mas por pouco eu
não deixei a minha em algum nível inferior, porque pensava que não iria necessitar dela nos
níveis mais altos. Foi mais ou menos por acaso que decidi mantê-la comigo, achando que deveria
haver alguma razão pela qual ela me tinha sido dada. Então, pelo fato de ser tão estreita a
plataforma em que eu estava, e por estar se tornando muito escorregadia, eu enterrei a espada
no chão e amarrei-me a ela, enquanto continuava a atirar no inimigo. A voz do Senhor então veio
até mim, dizendo: — Você teve a sabedoria que vai capacitá-lo a continuar subindo. Muitos caíram
porque não usaram a espada adequadamente para se firmarem.
Ninguém mais parecia ouvir esta voz, mas muitos viram o que eu fiz e assim fizeram também.
Considerei comigo mesmo por que o Senhor não tinha falado comigo para fazer isso antes.
Então percebi que ele de alguma forma já tinha dito isso para mim. Ao meditar nisso, comecei a
compreender que toda a minha vida tinha sido treinada para esta hora. Eu sabia que estava
preparado no grau em que havia ouvido o Senhor e obedecido à sua voz durante toda a minha
vida. Também sabia que por alguma razão a sabedoria e o entendimento que agora eu tinha não
podiam ser aumentados nem tomados de mim enquanto eu estivesse nesta batalha. Sentia-me
muito grato por toda provação que havia passado em minha vida, e lamentava-me por não as ter
apreciado mais quando estava passando por elas.
Logo estávamos alcançando os demônios com uma precisão quase que perfeita. A raiva
ascendia do exército inimigo como fogo e enxofre. Eu sabia que os cristãos que estavam presos
naquele exército agora estavam sentindo a maior parte de toda aquela raiva. Alguns tornaram-se
tão cheios de raiva que agora estavam atirando uns contra os outros. Normalmente isso seria
algo encorajador para nós, mas aqueles que mais sofriam eram os cristãos que tinham sido
enganados e que estavam no campo do inimigo. Eu sabia que perante o mundo aquilo parecia
ser um incompreensível desfalecimento do próprio cristianismo.
Alguns dos que não tinham usado a espada como âncora tinham condições de abater muitos
dos abutres, mas eles eram também mais facilmente derrubados das plataformas em que
estavam. Alguns deles caíram para um dos níveis inferiores, mas outros caíram até o sopé da
montanha e foram apanhados e levados pelos abutres. Eu passava todo momento em que estava
livre na batalha procurando firmar mais a fundo a minha espada na plataforma e prender-me
com maior segurança nela. Sempre que eu fazia isso, Sabedoria vinha ao meu lado de forma que
eu sabia que o que fizera era muito importante.
Uma Nova Arma
As flechas da Verdade algumas poucas vezes penetravam nos abutres, mas elas os feriam
bastante, fazendo-os recuar. Cada vez que eles eram forçados a recuar a uma certa distância,
alguns de nós subíamos até o nível seguinte. Quando atingimos o nível chamado "Gálatas 2:20" 1
ficamos a uma altura superior a que os abutres podiam opor-se a nós. Neste nível o acima de
nós quase nos cegava com o seu brilho intenso e com a sua beleza. Ali senti paz como nunca
tinha sentido antes.
Até atingir este nível, muito do meu espírito de luta tinha sido motivado quase tanto pelo medo,
pelo ódio e pela repugnância em relação ao inimigo, como por agir em prol do reino, da verdade,
ou por amor aos prisioneiros. Mas foi neste nível agora que eu fui alcançado pela Fé, pela
Esperança e pelo Amor, que antes eu apenas tinha podido ver a certa distância. Aqui eu estava
quase que tomado por sua glória. Mesmo assim, senti que ainda poderia aproximar-me mais
deles. Quando me acheguei a eles, eles se voltaram para mim e começaram a reparar e a polir a
minha armadura. Logo ela estava transformada e com muito brilho refletia a glória que vinha da
Fé, da Esperança e do Amor. Quando eles tocaram em minha espada, fortes raios de luz
começaram a faiscar nela. O Amor então disse: — Aqueles que alcançam este nível são revestidos
dos poderes da era futura.
Em seguida, voltando-se para mim, com muita seriedade, ele disse: — Ainda tenho que lhe
ensinar como usar esses poderes.
O nível de "Gálatas 2:20" era bastante largo, de forma que parecia não haver perigo de cair do
mesmo. Havia também um número enorme de flechas com o nome Esperança escrito nelas.
Lançamos algumas delas abaixo contra os abutres, e estas flechas os mataram com facilidade.
Cerca da metade dos que tinham atingido este nível ficaram lançando as flechas, enquanto que
os outros passaram a levar estas flechas para os que estavam ainda nos níveis mais baixos.
Os abutres mantinham-se vindo como ondas nos níveis inferiores, mas a cada vez havia um
menor número deles do que antes. De "Gálatas 2:20" dava para atingir qualquer um do exército
inimigo, exceto os líderes, que ficavam um pouco fora do nosso alcance. Decidimos não usar as
flechas da verdade até que tivéssemos destruído todos os abutres, porque a nuvem de depressão
que eles criavam tornava a verdade menos eficaz. Isso tomou um bom tempo, mas não nos
cansamos. Finalmente, ficamos com a impressão de que o céu sobre a montanha estava quase
que completamente livre dos abutres.
Fé, Esperança e Amor, que haviam crescido tal como as nossas armas a cada nível, estavam
agora tão grandes que eu vi pessoas muito além do que se podia ver da área de combate. Os três
irradiavam a sua glória, que alcançava até o campo dos prisioneiros, que ainda estava sob uma
grande nuvem de abutres. Fiquei então bastante animado, porque agora eles podiam ser vistos.
Talvez agora os cristãos que estavam sendo usados pelo inimigo, e os prisioneiros que eram
mantidos presos por eles, compreendessem que nós não éramos o inimigo, mas que de fato eles é
que tinham sido usados pelo adversário.
Mas isso não aconteceu, pelo menos por enquanto. Os que estavam no campo do inimigo, que
começaram a ver a luz da Fé, da Esperança e do Amor, começaram a chamá-los de "anjos de
luz", que eram enviados para enganar os fracos e os sem discernimento. Vi então que o engano e
as amarras sobre eles eram muito maiores do que eu tinha pensado.
Entretanto, todos os que não participavam de nenhum dos exércitos, os não-cristãos, viram a
glória deles e começaram a aproximar-se da montanha para terem uma visão melhor. Os que
vieram mais perto para ver esses anjos também começaram a entender de que tratava aquela
batalha realmente. Isso foi muito encorajador.
O estímulo pela vitória continuou a crescer em todos nós. Senti que estar neste exército, nesta
batalha, tinha que ser uma das maiores aventuras de todos os tempos. Depois de destruir a
maioria dos abutres que tinham atacado a nossa montanha, passamos a lançar flechas sobre
cada um dos abutres que ainda cobriam os prisioneiros. À medida em que a nuvem de escuridão
ia sendo dissipada e o sol começava a penetrar e brilhar sobre eles, eles também começavam a
despertar como se tivessem estado num profundo sono. Imediatamente eles sentiram uma
repulsa pela sua condição, especialmente em relação ao vômito que ainda os cobria, e
começaram a limpar-se totalmente. Quando eles contemplaram Fé, Esperança e Amor, eles
também viram a montanha e saíram correndo em direção a ela.
A horda maligna lançou flechas de Acusação e Calúnia às costas deles, mas eles não pararam.
Quando chegaram ao sopé da montanha, muitos deles tinham uma dúzia ou mais de flechas
cravadas neles, mas eles pareciam nem notar isso. Assim que começaram a escalar a montanha,
seus ferimentos iam sendo curados. Como a nuvem de depressão tinha sido dissipada, parecia
que agora tudo estava se tornando bem mais fácil.
A Armadilha
Os ex-prisioneiros tinham uma grande alegria por sua salvação. Eles pareciam tão tomados por
um sentimento de satisfação a cada nível, quando subiam pela montanha, que isso nos deu uma
satisfação ainda maior por aquelas verdades. Logo uma forte disposição para lutar contra o
inimigo surgiu também nos ex-prisioneiros. Eles se revestiram de uma armadura que lhes foi
dada e imploraram para que lhes fosse permitido voltar a atacar o inimigo que os tinha mantido
cativos, e que deles tinha abusado por tanto tempo. Pensamos a respeito, mas a decisão foi no
sentido de que todos permanecessem na montanha para lutar. De novo a voz do Senhor falou,
dizendo: — Pela segunda vez vocês escolheram a sabedoria. Vocês não poderão vencê-los se
tentarem combater o inimigo em seu próprio campo, mas têm de permanecer na minha santa
montanha.
Fiquei pasmado por termos tomado esta decisão de tamanha importância apenas pensando e
discutindo o assunto tão rapidamente. Então decidi fazer todo o possível para não tomar
nenhuma outra decisão, qualquer que fosse a sua importância, sem primeiro orar. Sabedoria
então acercou-se de mim rapidamente, segurou os meus ombros com firmeza, olhou para mim
bem nos olhos, e disse: — É isso que você tem de fazer!
Assim que Sabedoria me disse isso, ela me puxou para a frente como se estivesse me salvando
de algum perigo. Olhei para trás e vi que, apesar de eu estar na ampla plataforma de "Gálatas
2:20", eu tinha me afastado até quase a sua beirada, mesmo sem notar. Eu estava a ponto de
cair da montanha. Olhei de novo para os olhos de Sabedoria, e ele disse com a maior seriedade:
— Tome cuidado quando você pensa que está de pé, para que não caia. Nesta vida você pode cair
de qualquer um dos níveis.2
Pensei a respeito disso por um bom tempo. Com o sentimento de toda a vitória que estávamos
por alcançar, e pela unidade dos irmãos, eu tinha me descuidado. E era mais nobre cair devido a
um ataque do inimigo do que cair por causa de um descuido.
As Serpentes
Por um longo tempo continuamos a matar os abutres e atirando em cada um dos demônios que
estavam montados nos cristãos. Descobrimos que flechas correspondentes a determinadas
verdades tinham um efeito maior em determinados demônios. Sabíamos que teríamos pela frente
ainda uma grande batalha, mas não estávamos tendo mais vítimas agora, e tínhamos
continuado a subir para além do nível de "Paciência". Mesmo assim, depois que aqueles cristãos
tiveram os demônios atingidos e se viram livres deles, bem poucos vieram para a montanha.
Muitos deles tinham assumido a natureza dos demônios, e continuaram no engano, mesmo sem
eles. Com a dissipação das trevas dos demônios, podíamos ver o chão em torno dos pés daqueles
cristãos. Então eu vi que suas pernas estavam amarradas por serpentes. Olhando para as
serpentes, vi que elas eram da mesma espécie, e que tinham o nome Vergonha escrito sobre elas.
Lançamos flechas da Verdade sobre as serpentes, mas sem muito efeito. Então
experimentamos as flechas da Esperança, mas também sem resultado. De "Gálatas 2:20" tinha
sido bastante fácil ir mais para cima, porque todos nós nos ajudávamos, uns aos outros. Como
parecia haver pouco o que agora podíamos fazer contra o inimigo, decidimos procurar subir tão
depressa quanto pudéssemos, até descobrirmos alguma coisa que funcionasse contra as
serpentes.
Passamos por níveis de verdade bem depressa. Na maioria deles nem mesmo nos cuidamos de
olhar em volta para ver se não havia alguma arma que possivelmente desse resultado para
combater as serpentes. Fé, Esperança e Amor estavam conosco, mas não cheguei a notar que
tínhamos deixado Sabedoria bem para trás. Passou um longo tempo antes de eu perceber o erro
que tínhamos cometido. Ela nos alcançaria no cume, mas por deixá-la para trás isso nos custou
não termos tido uma vitória mais rápida e mais fácil sobre a horda maligna.
Quase que sem termos tido qualquer advertência, chegamos a um nível que se abria para um
jardim. Era o lugar mais belo que eu já tinha visto. Sobre a entrada desse lugar estava escrito:
"O Amor Incondicional do Pai". Esta entrada era tão gloriosa e convidativa que simplesmente não
dava para deixar de entrar. Assim que entrei, vi uma árvore que sabia ser a Árvore da Vida.
Estava bem no meio do jardim, e ainda estava guardada por anjos de um poder e autoridade que
impunham respeito. Quando olhei para eles, eles corresponderam ao meu olhar. Pareciam
amigáveis, como se estivessem estado nos esperando. Olhei para trás e havia agora uma hoste
de outros guerreiros no jardim. Isso encorajou a todos nós, e devido ao comportamento dos
anjos, decidimos passar por eles para chegar até a árvore. Um dos anjos gritou:
— Aqueles que conseguiram chegar até este nível, que conhecem o amor do Pai, podem comer.
Eu não tinha ciência de quão esfomeado eu estava. Quando provei a fruta, vi que era melhor do
que qualquer coisa que eu jamais tinha provado, mas me era também um tanto familiar. Ela
trouxe à memória lembranças de um dia de sol, de chuva, de belos campos, do sol se pondo
atrás do mar, mas até mesmo mais do que isso, ela me fez lembrar das pessoas que eu amava.
Com cada mordida eu amava tudo e a todos muito mais. Então os meus inimigos começaram a
vir à minha mente, e eu os amei também. O sentimento que eu sentia era em pouco tempo maior
do que qualquer coisa que eu já tinha experimentado, até mesmo do que a paz em "Gálatas
2:20", que sentimos ao chegar naquele nível. Então ouvi a voz do Senhor, que dizia: — Este é
agora o pão de cada dia de vocês. Ele nunca será retido de vocês. Vocês poderão comê-lo tanto
quanto quiserem e com a freqüência com que desejarem. Não há fim para o meu amor.
Olhei para dentro da árvore para ver de onde a voz tinha vindo, e vi que ela estava cheia de
águias de cor totalmente branca. Elas tinham os olhos mais belos e penetrantes que eu tinha
visto. Olhavam para mim como se estivessem esperando receber alguma instrução. Um dos
anjos disse: Elas atenderão o seu comando. Estas águias comem cobras.
Então eu disse: — Vão! Devorem a vergonha que tem amarrado nossos irmãos.
Elas abriram as asas e um forte vento veio que as elevou no ar. Essas águias encheram o céu
com uma glória deslumbrante. Mesmo na altura em que estávamos, eu podia ouvir os sons de
terror do campo inimigo quando viram que as águias tinham levantado vôo.
O Rei Aparece
O Senhor Jesus em pessoa então apareceu bem em nosso meio. Ele tomou tempo para
cumprimentar a cada um de nós pessoalmente, congratulando-nos por termos alcançado o topo
da montanha. Então ele disse: — Agora tenho que compartilhar com vocês o que compartilhei com
seus irmãos depois da minha ascensão — a mensagem do meu reino. O exército mais poderoso do
inimigo agora foi posto em retirada, mas não foi destruído. Agora é a hora para marcharmos com o
evangelho do meu reino. As águias foram liberadas e irão conosco. Tomaremos flechas de todos os
níveis, mas eu sou a Espada de vocês, e sou o Capitão de vocês. Agora é a hora para que a
Espada do Senhor seja desembainhada.
Então me virei e vi que todo o exército do Senhor estava a postos naquele jardim. Havia
homens, mulheres, e crianças de todas as raças e nações, com as bandeiras de seus países
sendo carregadas, as quais se moviam ao vento com perfeita harmonia. Eu sabia que nada igual
a isso jamais tinha sido visto na terra antes. Eu sabia que o inimigo tinha muitos outros
exércitos e fortalezas por toda a terra, mas nenhum deles poderia permanecer de pé diante deste
grande exército. Eu disse quase sem poder pronunciar:
— Este certamente é o dia do Senhor.
Toda a hoste então respondeu com um trovão amedrontador:
— O dia do Senhor dos Exércitos chegou.
Sumário
Alguns meses depois fiquei meditando sobre este sonho. O que me alarmou foi que certos
acontecimentos e condições na igreja pareceram-me ser paralelos ao que eu tinha visto quando a
horda do inferno começou a marchar. Lembrei-me então de Abraão Lincoln. A única maneira
pela qual ele pôde tornar-se "o Emancipador", e preservar a União, foi decidindo fazer uma
Guerra Civil. Não apenas ele teve que lutar nessa guerra, mas teve que fazê-lo com a resolução
de não ceder em nada até que a vitória fosse completa. Ele teve também que ter a graça de lutar
a guerra mais sangrenta da história americana sem "pichar de demônio" o inimigo por meio de
toda forma de propaganda. Se ele tivesse feito isso, ele poderia ter conseguido galvanizar a
resolução do Norte em tempo bem mais curto, e ter uma vitória militar bem mais rápida, mas
isso tornaria a convivência do Sul com o Norte muito mais difícil depois que a guerra terminasse.
Como a sua luta era verdadeiramente para preservar a União, ele nunca considerou os homens
do Sul como inimigos, mas sim escravizados pelo mal.
Uma grande guerra civil espiritual agora aproxima-se da igreja. Muitos farão tudo o que
puderem para evitá-la. Isto é compreensível, e até um ato nobre. Entretanto, o comprometimento
que implica em ceder alguma coisa nunca propiciará
Uma paz duradoura. Isso somente tornaria o conflito final muito mais difícil quando ele
ocorresse, e ele vai ocorrer.
O Senhor está agora preparando uma liderança que esteja desejosa de participar da luta numa
guerra civil espiritual com o objetivo de libertar os cativos. A principal questão será escravidão
versus liberdade. A segunda, que será a primeira para alguns, será o dinheiro. Assim como a
Guerra Civil Americana às vezes parecia que iria destruir a nação inteira, o que está por vir à
igreja às vezes parecerá como se fosse o fim da igreja. Entretanto, assim como a nação
americana não somente sobreviveu, mas prosseguiu para constituir-se na mais poderosa nação
do mundo, o mesmo vai se dar com a igreja. A igreja não será destruída, mas as instituições e as
doutrinas que têm mantido os homens em escravidão espiritual, essas sim serão.
Mesmo depois disso, uma perfeita justiça na igreja não será obtida da noite para o dia. Haverá
ainda lutas pelos direitos da mulher, e para libertar a igreja de outras formas de racismo e de
exploração. Todas essas são causas que terão de ser enfrentadas. entretanto, a Fé, a Esperança
e o Amor, e o reino de Deus sobre os quais estes três se firmam, começarão a ser vistos como
nunca foram antes. Isso começará a atrair todos os homens ao reino. O governo de Deus está
para ser demonstrado como mais grandioso do que qualquer governo humano.
E lembremo-nos sempre de que, com o Senhor, "mil anos é como um dia".3 Ele pode fazer em
nós em um dia o que pensamos que levará mil anos. A obra de libertação e de exaltação da igreja
será uma obra a ser realizada muito mais depressa do que possamos pensar ser humanamente
possível. Entretanto, não estamos falando de possibilidades humanas.
Parte II
A montanha santa
Estávamos no Jardim de Deus debaixo da Arvore da Vida. Parecia que o exército inteiro estava
ali, muitos deles ajoelhando-se diante do Senhor Jesus. Ele acabara de nos dar o encargo de
voltarmos para a batalha por causa de nossos irmãos que ainda estavam amarrados, e pelo
mundo que ele ama. Era uma ordem para nós maravilhosa, mas ao mesmo tempo terrível. Era
maravilhoso porque tinha partido dele. Era terrível porque implicava em que teríamos que nos
afastar da presença dele, conforme ele se manifestou ali, bem como do Jardim que era mais belo
do que qualquer outro lugar que pudéssemos ter estado antes. Deixar tudo isso para ir para a
batalha de novo parecia ser algo incompreensível.
O Senhor continuou com a sua exortação: — Eu lhes dei dons espirituais e poder, e uma
crescente compreensão da minha palavra e do meu reino, mas a maior arma que foi dada a vocês
é o amor do Pai. Enquanto vocês andarem no amor de meu Pai vocês nunca falharão. O fruto desta
árvore é o amor do Pai, que se manifesta em mim. Este amor que está em mim tem. de ser o seu
pão de cada dia.
Neste cenário tão belo e tão cheio de glória não parecia que o Senhor estava aparecendo em
glória. De fato, sua aparência era um tanto comum. Mesmo assim, a graça com que ele se movia
e com que falava tornava-o a pessoa mais atraente dentre todas que eu já vi. Ele ultrapassava
todo conceito humano em sua dignidade e nobreza. Era fácil compreender por que ele era tudo
que o Pai ama e estima. Verdadeiramente ele é cheio de graça e de verdade, ao ponto de fazer
parecer que nada mais importa, a não ser a graça e a verdade.
Quando eu comi o fruto da Árvore da Vida, o pensamento de toda boa coisa de que eu tenha
tido conhecimento em minha vida encheu a minha alma. Quando Jesus falou, aconteceu o
mesmo, mas de forma aumentada. Tudo o que eu queria fazer era ficar naquele lugar para ouvi-
lo falar. Lembrei-me de que uma vez eu pensei como deveria ser maçante para aqueles anjos que
não fazem nada além de ficarem continuamente adorando-o diante do trono. Agora eu sabia que
não há nada mais maravilhoso e estimulante para se fazer do que simplesmente permanecer
adorando-o. Para isso é que fomos criados, e certamente esta é a melhor parte do céu. Não deu
para imaginar quão maravilhoso seria se todos os coros celestiais fossem acrescentados. Era
difícil crer que eu tinha lutado tanto com uma sensação de tédio durante os cultos. Eu sabia que
isso era somente porque eu tinha estado quase que completamente fora de contato com a
realidade naqueles momentos.
Sentia-me quase que tomado pelo desejo de voltar para consertar aquelas horas nos cultos em
que deixei a minha mente vaguear ou quando me ocupei com outras coisas. O desejo de
expressar a minha adoração por ele ficou quase insaciável. Eu tinha que louvá-lo! Ao abrir a
minha boca tive o impacto dado pela espontânea adoração que irrompeu do exército todo ao
mesmo tempo. Eu quase tinha esquecido que todos os demais estavam lá, mas estávamos numa
perfeita unidade. A gloriosa adoração que se seguiu não pode ser expressa com palavras
humanas.
Enquanto adorávamos, um brilho dourado começou a emanar do Senhor. Depois ficou
prateado em torno do dourado. Depois cores, numa riqueza que eu nunca tinha visto com os
olhos naturais, envolveu a nós todos. Com essa glória eu fiquei sob o domínio da emoção de uma
forma que jamais sentira. De algum modo compreendi que essa glória tinha estado ali todo o
tempo, mas quando concentramos nele a nossa atenção, da forma como fizemos na adoração, o
que aconteceu foi que passamos a ver mais da sua glória. Quanto mais intensamente adorá-
vamos, maior a glória que contemplávamos. Se isso era o céu, era demais, era muito melhor do
que eu jamais sonhara.
Seu Lugar de Habitação
Não tenho idéia alguma de quanto tempo durou aquela adoração. Pode ter sido minutos, pode
ter sido meses. Não havia como medir o tempo com toda aquela glória. Fechei os olhos porque a
glória que eu via com o coração era tão grande quanto a que eu via com os olhos físicos. Quando
abri os olhos surpreendi-me ao ver que o Senhor não estava mais lá, mas uma tropa de anjos
postava-se onde ele havia estado. Um deles aproximou-se de mim e disse: — Feche os olhos de
novo.
Quando fechei, contemplei a glória do Senhor. Isso não foi um alívio pequeno. Eu sabia que
simplesmente não daria mais para viver sem a glória que agora eu tinha experimentado.
Então o anjo explicou:
— O que você vê com os olhos do coração é mais real do que o que você vê com os olhos físicos.
Eu mesmo já havia afirmado isso muitas vezes, mas quão pouco eu a vivi! O anjo continuou:
— Foi por essa razão que o Senhor disse a seus primeiros discípulos que era melhor que ele
partisse, de modo que o Espírito Santo pudesse vir.4 O Senhor habita dentro de você.5 Você já
ensinou isso muitas vezes, mas agora você tem de viver isso, pois você comeu da Arvore da Vida.
O anjo então foi me levando de volta para o portão. Protestei dizendo que não queria sair.
Parecendo estar surpreso, o anjo tomou-me pelos ombros e olhou em meus olhos. Foi então que
o reconheci. Ele era o anjo Sabedoria.
Você nunca terá que sair deste jardim. Este jardim está em seu coração porque o Criador, ele
mesmo, está dentro de você. Você desejou a melhor parte, a de adorar e sentar na presença dele
para sempre, e isso nunca lhe será tirado. Mas você tem de levar isso daqui para onde seja mais
necessário.
Eu sabia que ele tinha razão. Então olhei para além dele, para a Árvore da Vida. Tive a
compulsão de ir apanhar todas as trutas que pudesse antes de sair de lá. Conhecendo os meus
pensamentos, Sabedoria gentilmente me sacudiu: — Não faça isso. Mesmo esta fruta, colhida com
medo, não lhe faria bem. Esta fruta e esta árvore estão em seu interior porque ele está em você.
Você tem de acreditar.
Fechei os olhos e procurei ver o Senhor de novo, mas não consegui. Quando abri os olhos,
Sabedoria ainda estava olhando para mim. Com grande paciência ele continuou: — Você provou
algo da esfera celestial, e não há quem queira ir de volta para a batalha, depois disso. Não há
quem queira deixar a presença do Senhor quando ele se manifesta corporalmente. Quando o
apóstolo Paulo veio até aqui ele lutou pelo resto da sua vida quanto a se deveria permanecer e
trabalhar para o bem da igreja, ou se deveria voltar para cá e entrar em sua herança.6 Sua
herança ia sendo aumentada quanto mais tempo ele permanecesse e servisse na terra. Agora que
você tem o coração de um verdadeiro adorador, você sempre vai querer estar aqui, mas você
poderá sempre que entrar em verdadeira adoração. Quanto mais você se concentrar nele, mais
glória você verá, não importa onde você esteja.
As palavras de Sabedoria finalmente me acalmaram. De novo fechei os olhos apenas para
agradecer ao Senhor por esta maravilhosa experiência, e pela vida que ele tinha me dado. Ao
fechar os olhos comecei a ver de novo a sua glória, e toda a emoção da adoração anterior
inundou a minha alma. As palavras do Senhor para mim eram em som tão elevado e claras que
eu tinha certeza de serem audíveis:
— Nunca o deixarei, nem o abandonarei.
— Senhor, perdoa a minha incredulidade — respondi. — Ajuda-me a nunca deixar-te, a nunca
abandonar-te.
Isso foi um tempo maravilhoso e um tempo de prova. Aqui o "mundo real" não era real, e a
esfera espiritual era muito mais real, a ponto de que eu não podia nem imaginar ir de volta para
lá. Fui tomado tanto por uma sensação maravilhosa como por um temor de que eu poderia a
qualquer momento acordar e descobrir que tudo não passava de um sonho.
Sabedoria compreendeu o que se passava em meu interior. Disse-me então: — Você está
sonhando. Mas este sonho é mais real do que você possa pensar. O Pai deu sonhos aos homens
para ajudá-los a ver a porta que dá para o seu lugar de habitação. Ele habitará apenas em
corações humanos, e os sonhos podem ser uma porta para o seu coração, que o levará até ele. É
por isso que os seus anjos com tanta freqüência aparecem aos homens em sonhos. Em sonhos eles
podem passar por cima da mente humana decaída e irem direto ao coração.
Tendo aberto os olhos, vi que Sabedoria continuava agarrando em meus ombros.
— Eu sou o primeiro dom que lhe foi dado para o seu trabalho — disse ele. — Vou mostrar-lhe o
caminho, e vou mantê-lo nele, mas apenas o amor é que vai mantê-lo fiel. O temor do Senhor é o
princípio da sabedoria,7 mas a sabedoria mais elevada é amá-lo.
Então Sabedoria soltou-me e eu comecei a andar em direção ao portão. Eu o acompanhei com
dois sentimentos opostos dentro de mim. Lembrei-me da alegria da batalha e do subir a
montanha, e isso me compelia; mas não dava para comparar com a presença do Senhor e com a
adoração que eu acabara de experimentar. Deixar isso seria o maior sacrifício da minha vida.
Então lembrei-me de que tudo estava dentro de mim e fiquei impressionado de como eu poderia
esquecer-me tão depressa dessas coisas. Era como se uma grande batalha estivesse acontecendo
com muita violência dentro de mim, uma luta entre o que vi com os olhos físicos e o que vi com o
coração.
Adiantei-me um pouco de forma a andar ao lado de Sabedoria, e perguntei: — Tenho orado por
vinte e cinco anos para ser tomado e levado ao terceiro céu, tal como o apóstolo Paulo.8 Aqui é o
terceiro céu?
— Aqui é parte dele — respondeu-me ele — mas há ainda muito mais.
— Vou ter permissão para ver mais? — perguntei.
— Você vai ver muito mais. Estou levando-o para ver mais agora — respondeu.
Comecei a pensar no livro de Apocalipse. — A revelação de João fazia parte do terceiro céu? —
perguntei. — Parte da revelação dada a João era do terceiro céu, mas em sua maior parte era do
segundo céu. O primeiro céu foi antes da queda do homem. O segundo céu é a esfera espiritual
durante o reinado do mal sobre a terra. O terceiro céu é quando o amor e o domínio do Pai de novo
prevalecerá sobre a terra através do Rei.
— Como era o primeiro céu? — questionei, sentindo uma estranha friagem enquanto fazia a
pergunta.
— Faz parte da sabedoria não se preocupar com isso agora — Sabedoria respondeu com uma
seriedade maior, uma vez que a minha pergunta parecia tê-lo abalado um pouco. — Sabedoria é
buscar conhecer o terceiro céu, assim como você o fez. — Há muito mais para conhecer sobre o
terceiro céu do que você possa saber nesta vida, e é o terceiro céu, o reino, que você tem de pregar
nesta vida. Nas eras futuras você terá informações quanto ao primeiro céu, mas não lhe é conveni-
ente saber a respeito dele agora.
Resolvi lembrar-me do calafrio que eu acabara de sentir, e Sabedoria acenou-me, fazendo-me
saber que ele estava de acordo com esse pensamento.
— Que grande companheiro você é para mim — tive que dizer-lhe, ao perceber como aquele
anjo era uma dádiva valiosa. — Você vai mesmo me manter no caminho certo!
— Isso vou mesmo! — respondeu ele.
Eu tinha certeza que sentia amor vindo do anjo, o que me foi sem igual, uma vez que nunca
tinha sentido isso de outros anjos. Normalmente eles demonstravam o que tinham que fazer
mais por dever do que por amor. Sabedoria respondeu então os meus pensamentos como se os
tivesse pensado em voz alta.
— Faz parte da sabedoria amar, e eu não poderia ser Sabedoria se não o amasse. É também
parte da sabedoria contemplar a bondade e a severidade de Deus. É ter sabedoria amá-lo e temê-
lo. Você estará em engano se agir de outro modo. Esta é a próxima lição que você tem que
aprender. — disse ele com uma inconfundível seriedade.
— Eu bem que sei disso, e já ensinei isso muitas vezes — respondi, sentindo pela primeira vez
que talvez Sabedoria não me conhecesse completamente.
— Tenho sido um companheiro seu por muito tempo, e sei o que você ensinou — Sabedoria
replicou. — Agora você está prestes a aprender o significado de algumas coisas que você mesmo
ensinou. Como você disse muitas vezes, "não é crer em sua mente, mas em seu coração, que dá
como resultado a retidão".
Pedi desculpas, sentindo-me com um pouco de vergonha por ter duvidado de Sabedoria. Ele
graciosamente aceitou o meu pedido de desculpas. Foi então que percebi que o tinha estado
questionando e desafiando na maior parte da minha vida, e muitas vezes para meu prejuízo.
O Fiel
Eu estava cheio de amor por esses soldados, muitos dos quais eram mulheres e crianças. Suas
armaduras estavam em estado precário, e eles estavam cobertos de sangue, mas não tinham
desistido. De fato, eles ainda estavam radiantes e com coragem. Disse-lhes que eles mereciam
mais honra do que eu, porque eles tinham suportado a carga mais pesada da batalha, e tinham
sustentado a sua posição. Eles pareciam não crer em mim, mas apreciaram eu ter dito aquilo.
Entretanto, realmente senti que isso era verdade.
Cada nível da montanha tinha que ser ocupado, senão os abutres que ainda restavam vinham
e o profanavam com vômitos e excrementos até ficar difícil de ali permanecer. As plataformas,
em sua maioria, eram ocupadas por soldados que reconheci serem de diferentes denominações
ou movimentos que enfatizavam a verdade do nível que eles estavam defendendo. Fiquei
embaraçado diante da atitude que eu tinha mantido para com alguns desses grupos. Eu os tinha
considerado desinformados e desviados na melhor das hipóteses, mas aqui eles estavam lutando
fielmente contra um terrível ataque do inimigo. A defesa que eles fizeram dessas posições tinha
provavelmente contribuído para que eu continuasse subindo, como o tinha feito.
Alguns desses níveis situavam-se de forma que havia uma vista de uma boa parte da
montanha e do campo de batalha, mas outros eram tão isolados que os soldados que neles esta-
vam somente podiam ver a sua própria posição. Esses soldados pareciam não ter consciência do
furor do restante da batalha, nem do restante do exército que também estava lutando. Eles
estavam tão feridos pela calúnia e pelas acusações que resistiam a quem quer que descesse até
eles vindo dos níveis mais altos para encorajá-los a subirem para níveis mais acima. Entretanto,
quando alguns que tinham estado no cume da montanha desceram refletindo a glória do Senhor,
eles a observaram, em sua maioria com muita alegria, e logo começaram eles mesmos a subir,
com coragem e determinação. Enquanto eu via tudo isso acontecendo, Sabedoria não falou
quase nada, mas ele demonstrava estar bastante interessado em minhas reações.
A Realidade É Descoberta
Observei então que muitos soldados que tinham estado no cume vieram descendo a todos os
níveis para ajudar aqueles que vinham mantendo a sua posição naquelas verdades. Com a
chegada deles, cada nível começou a resplandecer com a glória que eles traziam. Logo a
montanha toda passou a brilhar com uma glória que cegava os abutres e os demônios que ainda
restavam. Depois de algum tempo havia tanta glória na montanha que ela já transmitia a mesma
sensação que tínhamos sentido no Jardim.
Passei então a pensar e a louvar ao Senhor e imediatamente me achei em sua presença de
novo. Era difícil conter as emoções e a glória que eu senti quando fiz isso. O que eu sentia
tornou-se tão intenso que parei. Sabedoria estava em pé ao meu lado. Pondo sua mão em meu
ombro, ele disse: — Você entra por seus portões com ações de graças, e em seus átrios com
louvor.10
— Mas era tão real! Eu me senti lá de novo! — exclamei.
— Você estava lá, — replicou Sabedoria — pode não ter parecido real, mas foi. Assim como o
Senhor disse ao ladrão na cruz: "Hoje você estará comigo no Paraíso",11 você pode entrar no
Paraíso em qualquer momento. O Senhor, o Paraíso dele, e a montanha dele estão habitando em
você, porque ele está em você. O que eram apenas antegozos antes, agora é uma realidade para
você, porque você subiu a montanha. A razão por que você pode me ver e os outros não podem não
é porque eu entrei na sua dimensão, mas porque você entrou na minha. Esta é a realidade que os
profetas conheceram e que lhes deu grande coragem, mesmo quando permaneceram sozinhos
contra exércitos. Eles viram as hostes celestiais que estavam com eles, não apenas o exército
terreno que alguém arregimentara contra eles.12
A Armadilha Mortal
Então olhei para a frente, para a carnificina lá em baixo, e vi o exército demoníaco em vagarosa
retirada. Atrás de mim vinham mais guerreiros cheios de glória que constantemente tomavam
lugar na montanha. Senti que agora estávamos suficientemente fortes para atacar e destruir o
que havia restado da horda inimiga.
— Ainda não — disse Sabedoria. — Olhe ali.
Olhei na direção que ele apontava, mas tive que proteger meus olhos da glória que emanava da
minha própria armadura, para ver alguma coisa. Então captei um vislumbre de algum
movimento num pequeno vale.
Não dava para discernir o que eu estava vendo porque a glória que brilhava da minha
armadura tornava difícil ver o que estava na escuridão. Perguntei a Sabedoria se havia alguma
coisa com que pudesse cobrir a minha armadura de forma a permitir-me ver. Ele então me deu
uma capa muito simples para vestir.
— O que é isso? — perguntei-lhe, sentindo-me um pouco ofendido pela simplicidade e pela cor
"de burro quando foge", sem brilho nenhum, daquela capa.
— Humildade — disse Sabedoria. — Você não conseguirá ver muito bem se não usar isso.
Relutantemente eu a vesti sobre a armadura e imediatamente vi muitas coisas que eu não
conseguira ver antes. Olhei para o vale e para o movimento que eu tinha pressentido. Para meu
espanto havia uma divisão inteira da horda inimiga que estava à espera para emboscar quem
quer que se aventurasse a sair da montanha.
— Que exército é aquele? — perguntei. — E como eles escaparam intactos da batalha?
— Aquele é Orgulho — explicou-me Sabedoria. — Aquele é o inimigo mais difícil de se ver depois
de se ter estado na glória. Os que se recusarem a vestir esta capa sofrerão muito nas mãos
daquele inimigo tão trapaceiro.
Voltei os olhos para a montanha e então vi muitos dos guerreiros cheios de glória cruzando a
planície para atacar a horda inimiga remanescente. Nenhum deles vestia a capa da humildade, e
eles não tinham visto o inimigo que estava pronto para atacá-los pela retaguarda. Quis sair
correndo para fazê-los parar, mas Sabedoria me impediu.
— Você não poderá parar com isso — disse-me ele. — Somente os soldados que estiverem
usando esta capa é que reconhecerão a sua autoridade. Venha comigo. Há ainda algo mais que
você tem de ver antes de poder ajudar a liderar na grande batalha que ainda haverá.
O Fundamento da Glória
Sabedoria levou-me descendo pela montanha até o nível mais baixo, que tem o nome de
"Salvação".
— Você pensa que este é o nível mais baixo, — declarou Sabedoria — mas este é o fundamento
de toda a montanha. Em toda jornada, o primeiro passo é o mais importante, e normalmente é o
mais difícil. Sem "Salvação" não haveria montanha.
Fiquei horrorizado com a carnificina neste nível. Todo soldado estava gravemente ferido, mas
nenhum deles estava morto. Multidões mal conseguiam segurar-se na plataforma. Muitos davam
a impressão que estavam prestes a cair, mas nenhum caiu. Havia anjos por toda parte
ministrando aos soldados com tamanha alegria que eu não agüentei e perguntei:
— Por que é que eles estão tão alegres?
— Esses anjos viram a coragem que foi necessária para que esses aí se sustentassem. Eles
podem não ter ido além desse ponto, mas também não desistiram. Logo eles estarão curados, e
então vão contemplar a glória de tudo o que há na Montanha, e começarão a subir. Eles serão
grandes guerreiros na batalha que haverá.
Mas não teria sido melhor para eles se eles tivessem subido a montanha junto conosco, quando
nós subimos? — protestei eu, vendo a presente condição em que eles se encontravam.
— Teria sido melhor para eles, mas não para você e para os que subiram com você. Ficando aqui
eles fizeram com que ficasse mais fácil para vocês subirem, por terem mantido a maioria dos seus
inimigos ocupados. Bem poucos dos níveis mais elevados saíram alguma vez. para ajudar outros a
virem até a montanha, mas estes fizeram isso. Mesmo quando eles próprios mal conseguiam subir
na montanha, ainda eles se esforçavam para puxar outros para cima. De fato, a maioria dos
grandes guerreiros foi levada para a montanha por esses homens fiéis. Eles não são menos heróis
do que aqueles que conseguiram chegar lá em cima. Eles proporcionaram grande alegria no céu por
levar outros à Salvação. Foi por esta razão que todos os anjos no céu queriam vir para ministrar a
eles, mas apenas os de maior honra é que receberam permissão.
De novo fiquei envergonhado por causa da minha atitude anterior para com aqueles grandes
santos. Muitos de nós tínhamos zombado deles quando subíamos para os níveis mais elevados.
Eles haviam cometido muitos erros durante a batalha, mas eles tinham demonstrado muito mais
o coração de Pastor do que todos nós. O Senhor deixaria os noventa e nove para ir atrás de
apenas um que estava perdido. Eles tinham permanecido no lugar em que ainda podiam
alcançar os perdidos, e pagaram um alto preço por isso. Eu, também, quis então ajudar, mas
não sabia como começar. Sabedoria então disse:
— É certo você querer ajudar, mas você vai ajudar mais fazendo aquilo para o que você foi
chamado a fazer. Esses aí vão ser curados e subirão a montanha. Eles agora poderão subir com
maior rapidez por causa de você e dos outros que foram antes deles, destruindo o inimigo, e
assinalando o caminho. Eles vão se juntar a vocês de novo na batalha. Eles são homens valentes
que não recuarão diante do inimigo.
O Poder do Orgulho
Fiquei então meditando que, ao descer a montanha, eu estava aprendendo tanto quanto eu
tinha aprendido quando fui subindo por ela. Então o barulho do campo de batalha chamou a
minha atenção. A essa altura havia milhares de poderosos guerreiros que tinham atravessado a
campina para atacar o que restava da horda inimiga. O inimigo fugia por todas as direções,
exceto uma única divisão: a do Orgulho. Completamente sem ser percebida, ela tinha marchado
até a retaguarda dos guerreiros que avançavam, e estava prestes a mandar uma chuva de
flechas. Foi então que notei que os guerreiros não tinham armadura alguma protegendo as suas
costas. Eles estavam totalmente expostos e vulneráveis ao que estava para atingi-los.
Sabedoria então observou:
— Você chegou a pensar que não há armadura para as costas, o que significaria que você ficaria
vulnerável se fugisse do inimigo. Entretanto, você nunca viu como avançar com orgulho também o
torna vulnerável.
Eu pude apenas fazer um sinal que concordava com o que ele disse. Era tarde demais para
fazer alguma coisa, e era quase insuportável observar o que estava acontecendo, mas Sabedoria
disse-me que eu tinha de observar. Eu sabia que o reino de Deus estava prestes a sofrer uma
grande derrota. Eu já tinha lastimado por alguma coisa antes em minha vida, mas nunca tinha
sido com este tipo de lástima que agora eu sentia.
Para meu espanto, quando as flechas de orgulho atingiram os guerreiros, eles nem mesmo
notaram. Contudo, o inimigo continuou a flechar. Os guerreiros estavam sangrando e en-
fraqueciam-se rapidamente, mas não se davam conta disso. Logo eles estavam tão fracos que
não conseguiam segurar o escudo e a espada; eles os lançaram ao chão, dizendo que não mais
precisariam dessas armas. E foram também tirando a armadura, dizendo que ela também não
era mais necessária.
Então uma outra divisão do inimigo apareceu e foi aproximando-se rapidamente. Chamava-se
Grande Engano. Os que nela estavam lançaram uma chuva de flechas e aparentemente todas
elas atingiram o alvo. Apenas alguns poucos demônios do engano, que eram pequenos e
visivelmente fracos, levaram então o exército que anteriormente era composto de gloriosos
guerreiros. Os cristãos foram levados a diferentes campos de concentração, cada um com o nome
de uma doutrina de demônios. Eu fiquei impressionado como aquela grande companhia de
justos tinha sido tão facilmente vencida, e parecia que eles ainda não sabiam o que os tinha
atingido.
Eu então balbuciei:
— Como é que esses que eram tão fortes, que subiram toda a montanha até o cume, que viram
o Senhor, podem estar assim tão vulneráveis?
— O orgulho é o inimigo mais difícil de ser visto, e ele sempre chega de mansinho por trás da
pessoa — lamentou Sabedoria. — De certo modo, os que atingiram as maiores alturas são os que
estão com o maior perigo de sofrer uma queda. Você tem de lembrar-se sempre que nesta vida você
poderá cair a qualquer hora e de qualquer nível em que esteja!
— "Aquele, pois, que pensa estar em pé veja que não caia."13 — repliquei. — Como este
versículo agora me imprime temor!
— Quando você pensa estar menos vulnerável para cair é de fato quando você está mais
vulnerável. Muitos são os que caem imediatamente após uma grande vitória — disse Sabedoria,
lamentando.
— Como posso evitar de ser atacado assim? — perguntei.
— Fique bem perto de mim, consulte o Senhor antes de tomar qualquer decisão mais importante,
e continue vestindo essa capa. Desse modo o inimigo não terá condições de cegá-lo, como ele fez
com aqueles guerreiros.
Olhei para a minha capa. Sua aparência era tão simples e sem apresentação alguma. Senti que
ela me fazia aparentar mais como algum desabrigado do que com um guerreiro. Sabedoria
respondeu, como se eu tivesse pensado em voz alta:
— O Senhor está mais próximo dos desabrigados do que de reis. Você somente tem uma força
verdadeira na medida em que andar na graça de Deus, e ele "dá graça aos humildes". 14 Nenhuma
arma maligna pode penetrar nesta capa, pois nada pode sobrepujar a graça de Deus. Enquanto
você estiver com este manto, você estará a salvo desse tipo de ataque.
Então olhei para cima para ver quantos guerreiros ainda estavam na montanha. Fiquei
chocado ao ver que eram bem poucos. Observei, entretanto, que todos eles estavam com a
mesma capa da humildade.
— Como foi que isso aconteceu? — perguntei.
— Quando eles viram a batalha que você há bem pouco presenciou, todos eles me pediram ajuda,
e dei capas para eles — respondeu Sabedoria.
— Mas você não estava comigo durante todo o tempo?
— Eu estou com todos os que se dispõem a fazer a vontade do meu Pai — respondeu Sabedoria.
— Tu és o Senhor! — gritei.
— Sim — respondeu ele. — Eu lhe disse que nunca o deixaria nem o abandonaria. Eu estou com
todos os meus guerreiros assim como estou com você. Vou ser para você aquilo que você necessitar
para realizar a minha vontade, e você tem tido necessidade de sabedoria. Então ele desapareceu.
Um Posto no Reino
Fui deixado ali no meio da grande companhia de anjos que estavam atendendo os feridos no
nível da "Salvação". Quando fui andando por entre os anjos, eles se encurvaram demonstrando-
me um grande respeito. Finalmente lhes perguntei por que estavam agindo desse modo, uma vez
que o menor deles era muito mais poderoso do que eu.
— Por causa da sua capa — um deles respondeu. — Esse é o posto mais elevado no reino.
— Esta é apenas uma simples capa, nada mais — protestei.
— Não! — replicou o anjo. — Você está vestido com a graça de Deus. Não há poder maior do
que esse!
— Mas há milhares de nós que estão vestindo a mesma capa. Como é que ela pode então
representar um posto no reino? — protestei.
— Vocês são lutadores que impõem respeito, filhos do Rei. Ele usou essa mesma capa quando
caminhou nesta terra. Enquanto você a estiver usando, não haverá poder no céu ou na terra que
possa enfrentá-lo. Todos no céu e no inferno reconhecem essa capa. Somos de fato servos do
Senhor, mas ele habita em vocês, e vocês estão vestidos com a sua graça.
De alguma forma eu sabia que se eu não estivesse com a capa, e se a minha gloriosa armadura
estivesse sendo exposta, o que o anjo disse e o seu comportamento diante de mim teria me
enchido de orgulho. Era simplesmente impossível sentir-se com orgulho ou com arrogância
estando vestido com aquela capa de cor estranha e simples. Entretanto, minha confiança neste
manto estava crescendo depressa.
Parte III
No horizonte eu vi uma grande nuvem branca que se aproximava. A esperança surgiu em mim
somente por vê-la. Logo toda a atmosfera ficou cheia de esperança, da mesma forma como o sol
nascente põe em fuga a escuridão da noite. Com o crescer da nuvem, reconheci que eram as
grandes águias brancas que tinham voado da Arvore da Vida. Elas foram pousando na
montanha, tomando lugar em cada nível ao lado das companhias de guerreiros.
Com cautela aproximei-me da águia que tinha pousado perto de mim, porque sua presença
inspirava-me bastante temor. Quando ela olhou para mim com seus olhos penetrantes, eu sabia
que não poderia esconder nada dela. Seu olhar era tão forte e firme que tremi com um calafrio
que senti em meu corpo todo, só de olhar para os olhos dela. Mesmo antes de eu fazer qualquer
pergunta, ela respondeu-me:
— Você quer saber quem somos nós? Somos os profetas que estavam escondidos, e que foram
mantidos assim para esta hora. Somos os olhos daqueles a quem foram dadas as armas
divinamente poderosas. A nós nos foi dado ver tudo o que o Senhor está fazendo, e tudo o que o
inimigo está planejando contra vocês. Estivemos esquadrinhando a terra, e juntas sabemos de
tudo o que é necessário saber para a batalha.
Vocês não viram a batalha que acabou de acontecer? — perguntei com uma certa irritação,
tanto quanto ousei expressar. — Não deu para vocês ajudarem aqueles guerreiros que há bem
pouco foram feitos prisioneiros?
— Sim. Vimos tudo, e poderíamos tê-los ajudado se eles tivessem querido a nossa ajuda. Nós
os teríamos ajudado retendo-os e não os deixando prosseguir, dizendo-lhes que se sentassem e
ficassem parados. Mas nós somente podemos lutar nas batalhas comandadas pelo Senhor, e
apenas podemos ajudar aqueles que crêem em nós. Somente os que nos recebem na condição de
quem nós somos, os profetas, é que podem receber a recompensa do profeta, ou os benefícios de
nossos serviços. Aqueles que foram emboscados não tinham ainda a capa que você está usando,
e os que não têm essa capa não conseguem entender quem nós somos. Todos nós necessitamos
uns dos outros, inclusive estes três aqui que ainda estão feridos, e muitos outros que você ainda
não conhece.
O Coração da Águia
Quando falei com a águia eu comecei a pensar como ela. Depois dessa curta conversa eu podia
olhar para os olhos dela e eu podia conhecê-la tal como ela me conhecia. A águia reconheceu
isso.
— Você tem alguns dons, observou ela. Você não fez muito uso deles. Eu estou aqui para
despertar esses dons em você, e em muitos outros como você, e vou ensiná-lo a como usá-los.
Desse modo a nossa comunicação vai ser segura. Tem de ser segura, ou então todos nós
teríamos muitas perdas desnecessárias, para não dizer que também perderíamos muitas grandes
oportunidades para a vitória.
— De onde você vem? — perguntei-lhe.
— Nós comemos cobras — a águia respondeu. — O inimigo é alimento para nós. O nosso
sustento vem de fazer a vontade do Pai, que é destruir as obras do diabo. Toda cobra que co-
memos contribui para aumentar a nossa visão. Toda fortaleza do inimigo que demolimos nos
fortalece, de forma que podemos voar mais alto e permanecer no ar por mais tempo. Acabamos
de vir de uma festa, devorando as serpentes da Vergonha, que amarravam muitos de seus
irmãos. Eles estarão aqui em breve. Estão vindo com as águias que deixamos para trás para
ajudá-los a achar o caminho, e para protegê-los do contra-ataque do inimigo.
Essas águias eram muito seguras de si mesmas, mas não eram presunçosas. Elas sabiam
quem elas eram, e a que tinham sido chamadas. Elas também nos conheciam e também
conheciam o futuro. Sua confiança me reanimava, mas reanimava muito mais aqueles feridos
que ainda jaziam ao nosso redor. Os que até há pouco estavam tão fracos, que não conseguiam
nem falar, agora tinham se endireitado e ouviam a minha conversa com a águia. Eles olharam
para ela como fazem as crianças perdidas quando olham para seus pais, assim que estes as
encontram.
O Vento do Espírito
Quando a águia olhou para os feridos, a expressão dela mudou também. Em lugar da forte e
firme determinação diante da qual eu tinha permanecido anteriormente, para com os feridos ela
era como uma avó idosa: bondosa e cheia de compaixão. A águia abriu as asas e gentilmente
ficou abanando-as, provocando uma brisa refrescante que fluía sobre os feridos. Era diferente de
qualquer outra brisa que eu tenha visto. A cada respiração eu me fortalecia e a minha mente
purificava-se. Logo os feridos puseram-se em pé e passaram a adorar a Deus com uma
sinceridade que trouxe lágrimas aos meus olhos.
De novo senti-me envergonhado por ter zombado daqueles que tinham permanecido neste
nível. Achávamos que eles eram muito fracos e tolos, quando estávamos subindo a montanha,
mas eles suportaram muito mais do que nós, e permaneceram fiéis. Deus os tinha guardado, e
eles o amavam com um grande amor.
Olhei então para cima, na montanha. Todas as águias estavam gentilmente abanando as asas.
Todo o mundo na montanha estava se refrescando com a brisa que elas estavam produzindo, e
todos passaram a adorar o Senhor. A princípio havia alguma discordância entre os louvores que
vinham dos diferentes níveis, mas depois de algum tempo, todos, em todos os níveis, estavam
cantando em perfeita harmonia.
Nunca na terra eu jamais ouvi algo tão belo. Eu queria que o louvor nunca terminasse. Logo
reconheci que era o mesmo louvor que tínhamos aprendido no Jardim, mas agora ele soava
ainda mais rico e mais cheio. Eu sabia que era porque estávamos louvando na presença dos
nossos inimigos, em meio a toda a escuridão e todo o mal que rodeava a montanha; era por isso
que me parecia muito mais belo.
Não sei por quanto tempo ficamos adorando, mas finalmente as águias pararam de abanar as
asas e o louvor terminou.
— Por que vocês pararam? — perguntei à águia com quem havia conversado.
— Porque agora eles estão curados — respondeu ela, apontando para os que tinham estado
com ferimentos mas que agora, em pé, denotavam estar em perfeitas condições. — Um verda-
deiro louvor pode curar qualquer ferimento — completou ela.
— Por favor, repitam tudo de novo! — supliquei.
— Vamos repetir isso muitas vezes, mas não somos nós que decidimos quando fazê-lo de novo.
A brisa que você sentiu era o Espírito Santo. Ele nos dirige; não somos nós que o dirigimos. Ele
curou os feridos e começou a fazer com que haja a unidade que é necessária para as batalhas à
nossa frente. A verdadeira adoração ainda faz derramar o precioso óleo sobre a Cabeça, que é
Jesus, e então desce por todo o corpo, fazendo-nos um com ele e criando uma unidade entre
nós. Ninguém que venha a unir-se com ele permanecerá ferido ou impuro. O seu sangue é vida
pura, e flui quando estamos ligados com ele. Quando estamos ligados com ele estamos também
ligados com o restante do corpo, de forma que o seu sangue flui em todos nós. Não é assim que
você faz sarar uma ferida no seu corpo, fechando-a de modo que o sangue possa fluir ao membro
afetado, trazendo-lhe regeneração? Quando uma parte do corpo está ferida, temos de nos unir
em unidade com aquela parte até que ela seja totalmente restaurada. Somos todos um.
Na euforia que ainda restava do louvor, este breve ensino parecia quase que difícil de ser
entendido, mas eu sabia que era fundamental. Quando o Espírito Santo se movia, toda palavra
parecia ser gloriosa, não importando quão elementar fosse. Eu me sentia tão cheio de amor que
o meu desejo era abraçar todo o mundo, inclusive as velhas águias, apesar de todo o temor que
despertavam.
Então, como que num susto, lembrei-me dos fortes guerreiros que tinham sido há pouco
capturados. A águia percebeu isso, mas não disse nada. Ela apenas me observava, com alguma
intenção. Finalmente quebrei o silêncio, e disse:
— Vai dar para recuperarmos aqueles que acabamos de perder?
O Coração do Rei
— Sim. Está certo você sentir o que está sentindo — disse a águia por fim. — Não estamos
ainda completos, e a nossa adoração ainda não está completa, até que todo o corpo se restaure.
Mesmo na adoração mais gloriosa, mesmo na própria presença do Rei, ainda sentiremos essa
falta até que todos sejam um, porque o nosso Rei também o sente. Todos nós sofremos por
nossos irmãos sob grilhões, mas sofremos ainda mais pelo coração do nosso Rei. Embora vocês
amem todos os seus filhos, vocês sofreriam mais por aquele que estivesse enfermo ou ferido. O
Rei, também, ele ama todos os seus filhos, mas os feridos e oprimidos recebem a sua maior
atenção agora. Por causa dele não desistimos até que todos tenham sido recuperados. Enquanto
houver feridos, ele estará ferido.
As Portas da Verdade
A águia então levantou-se da rocha sobre a qual ela tinha se empoleirado, e foi voando até a
extremidade do nível em que estávamos.
— Venha — disse ela.
Ao aproximar-me dela, vi degraus que desciam até o sopé da montanha, e vi uma pequena
porta.
— Por que é que eu não vi isso antes? — perguntei.
— Da primeira vez que veio para a montanha você não permaneceu neste nível o tempo
suficiente para dar uma olhada à sua volta — ela me respondeu.
— Como é que você sabe disso? Você estava aqui quando eu passei por este nível ao vir para a
montanha?
— Eu teria sabido mesmo que não tivesse estado aqui, porque todos que deixam de ver esta
porta é sempre pela mesma razão, mas realmente eu estava aqui — respondeu ela. — Eu era um
dos soldados por quem você passou rapidamente em seu caminho escalando a montanha.
Foi então que reconheci aquela águia como sendo um homem que fiquei conhecendo logo após
a minha conversão, com quem cheguei a manter de fato algumas conversas. A águia continuou:
— Eu queria muito segui-lo naquela hora. Eu havia estado neste nível por tanto tempo que
necessitava de uma mudança. Eu apenas não podia deixar todas aquelas almas perdidas que
ainda procurava trazer para cá. Quando finalmente me dispus a fazer a vontade do Senhor, quer
fosse ficar ou sair, Sabedoria me apareceu e mostrou-me esta porta. Ele disse que era um atalho
para o cume. É por isso que cheguei lá em cima antes de você. Lá então fui transformado numa
águia.
Lembrei-me então de ter visto portas como esta em vários dos níveis. Dei até mesmo uma
espiada entrando por uma delas e lembro-me de que me impressionei pelo que vi. Não me aven-
turei muito naquele caminho porque o meu foco estava na batalha e em querer chegar ao cume
da montanha.
— Será que se eu tivesse entrado por alguma daquelas portas eu teria ido direto para o topo da
montanha? — perguntei.
— Não é tão fácil assim — a águia observou, demonstrando uma leve irritação. — Em cada
porta há diversos caminhos, um dos quais vai até o cume.
Antecipando minha pergunta seguinte, ela continuou:
— Os outros vão para outros níveis da montanha. O Pai projetou cada uma dessas passagens
de forma a que cada pessoa pudesse escolher a que era ditada pelo seu nível de maturidade.
"Incrível! Como foi que ele fez isso?", foi o que eu pensei comigo mesmo, mas a águia ouviu os
meus pensamentos.
— Foi muito simples, — continuou ela, como se eu tivesse falado o meu pensamento em voz
alta — a maturidade espiritual é sempre determinada pela nossa disposição de sacrificar os nos-
sos próprios desejos pelos interesses do reino, ou por causa de outros. A porta que requer o
maior sacrifício para se entrar sempre nos levará ao nível mais elevado.
Procurei lembrar-me de tudo o que a águia estava me dizendo. Eu sabia que tinha de entrar
pela porta à minha frente, e que eu teria sabedoria se aprendesse tudo o que pudesse de alguém
que me havia precedido e que obviamente tinha escolhido a porta certa para o topo da
montanha.
— Eu não fui diretamente para o cume, e não me encontrei com ninguém que tenha
conseguido fazer isso — continuou a águia. — Mas cheguei lá bem mais depressa do que a
maioria porque eu tinha aprendido muito sobre sacrifício próprio enquanto lutava aqui no nível
da Salvação. Mostrei-lhe esta porta porque você está usando essa capa, e você acabaria
encontrando-a, de qualquer modo. Mas o tempo é curto e eu estou aqui para ajudá-lo a
amadurecer rapidamente.
— Há portas em cada nível, e cada uma delas leva a tesouros que estão além da sua
compreensão — continuou ela. — Eles não podem ser adquiridos fisicamente, mas cada tesouro
que você tomar com suas mãos você poderá levar em seu coração. O seu coração tem o propósito
de se constituir na casa do tesouro de Deus. Quando você chegar lá em cima de novo, o seu
coração conterá tesouros mais valorosos do que todos os tesouros da terra. Eles nunca serão
tirados de você, mas serão seus por toda a eternidade. Vá depressa. As nuvens de uma
tempestade estão se avolumando, e mais uma grande batalha está se aproximando.
— Dá para você vir comigo? — roguei-lhe.
— Não — respondeu ela. — O que me compete agora é ir ajudar aqueles que estiveram feridos.
Mas eu o verei aqui de novo. Você vai encontrar-se com muitas das águias que são irmãos meus
antes de você retornar, e todas elas vão poder ajudá-lo melhor do que eu no lugar em que as
encontrar.
Os Tesouros do Céu
Eu já amava tanto aquela águia que mal podia suportar ter que deixá-la. Mas estava alegre por
saber que a veria de novo. Agora aquela porta atraía-me como se fosse um ímã. Eu a abri e
entrei por ela.
A glória que contemplei era tão espantosa que de imediato caí de joelhos. O ouro, a prata e as
pedras preciosas eram muito mais belas do que eu posso descrevê-las. Elas na verdade ri-
valizavam com a glória da Arvore da Vida. Era um salão tão grande que parecia não ter fim. O
piso era de prata; as colunas, de ouro; e o teto era um diamante único que refletia todas as cores
que eu conhecia e muitas outras que me eram desconhecidas. Anjos num número incalculável
estavam por toda parte, vestidos com vestes diferentes e uniformes que não tinham uma origem
terrena.
Quando fui andando pelo salão, os anjos todos se encurvaram saudando-me. Um deles
aproximou-se de mim e deu-me boas-vindas citando o meu nome. Ele explicou que eu poderia ir
a qualquer parte ali e que poderia ver o que eu quisesse naquele salão. Nada era retido daqueles
que entrassem pela porta.
Eu estava tão tomado pela beleza que não conseguia nem falar. Finalmente observei que ali
tudo era mais belo do que o próprio Jardim. Surpreendido, o anjo respondeu:
— Mas este lugar é o Jardim! Este é um dos quartos da casa do seu Pai. Nós somos seus
servos.
Enquanto eu caminhava, uma grande companhia de anjos seguia-me. Voltei-me para eles e
perguntei ao que os liderava por que eles estavam me seguindo.
— Por causa da sua capa — disse ele. — Nós lhe fomos dados para servi-lo aqui e na batalha
que haverá.
Eu não sabia o que fazer com os anjos, de forma que simplesmente continuei a andar. Fui
atraído a uma enorme pedra azul que parecia ter o sol e nuvens em seu interior. Quando a
toquei, os mesmos sentimentos fluíram dela para mim, os mesmos de quando eu comi o fruto da
Arvore da Vida. Senti vigor, uma pureza mental não terrena, e amor por todos e por tudo sendo
aumentado em mim. Comecei a contemplar a glória do Senhor. Quanto mais eu tocava naquela
pedra, mais a glória aumentava. O que eu queria era não tirar a minha mão daquela pedra, mas
a glória tornou-se tão intensa que finalmente eu tive que me afastar.
Então os meus olhos deram com uma bela pedra verde.
— O que essa pedra tem? — perguntei ao anjo que estava próximo de mim.
— Todas essas pedras são tesouros da salvação. Você está agora tocando na dimensão
celestial, e essa aí é a restauração da vida — prosseguiu ele.
Ao tocar na pedra verde fiquei vendo a terra em cores ricas e espetaculares. Elas cresceram em
riqueza quanto mais eu mantinha a minha mão sobre a pedra, e o meu amor por todos a quem
eu via também aumentava. Então passei a ver uma harmonia entre todos os seres vivos num
nível que eu nunca tinha visto antes. E passei a ver a glória do Senhor na criação. Ela foi
crescendo até o ponto que de novo tive que me afastar, por causa da intensidade.
Percebi que eu não tinha idéia alguma de quanto tempo havia permanecido ali. Do que eu
tinha certeza era de que a minha compreensão de Deus e do seu universo tinha crescido
substancialmente apenas por ter tocado naquelas duas pedras, e ainda havia muitas e muitas
para serem tocadas. Havia mais somente naquele salão do que alguém pudesse absorver em
toda a sua vida.
— Quantos outros salões como este há? — perguntei ao anjo.
— Há salões como este em cada nível da montanha que você subiu.
— Como é possível a alguém experimentar tudo o que há num só destes salões, para não dizer
em todos os salões? — perguntei.
— Você terá toda a eternidade para fazer isso. Os tesouros contidos nas verdades mais básicas
do Senhor Jesus são suficientes para perdurarem por mais tempo do que o de muitas vidas, de
uma forma que não dá para você avaliar. Ninguém pode conhecer, no tempo de uma só vida,
tudo o que há para se conhecer, mas você tem de tomar aquilo de que você tem necessidade e
prosseguir em direção ao seu destino.
Mais uma vez me pus então a pensar sobre a próxima batalha, e sobre os guerreiros que
tinham sido capturados. Não era um pensamento agradável num lugar assim tão glorioso, mas
eu sabia que teria toda a eternidade para voltar para este salão; eu tinha apenas algum tempo
para encontrar o caminho que me levasse para o topo da montanha, e de lá para a frente de
batalha de novo.
Voltei-me para o anjo e disse:
— Você tem de me ajudar a encontrar a porta que leva ao cume.
O anjo ficou perplexo, e respondeu:
— Nós somos seus servos, mas você tem que nos liderar. Toda esta montanha é um mistério
para nós. Todos nós desejamos conhecer esse grande mistério, mas depois de sairmos deste
salão do qual viemos a conhecer apenas um pouco, vamos ter que aprender ainda bem mais do
que você.
— Você sabe onde se encontram as portas? — perguntei.
— Sim. Mas não sabemos para onde elas vão. Algumas têm uma aparência muito convidativa,
outras são simples, e outras ainda são até mesmo repugnantes. Uma chega a ser terrível.
— Neste lugar há portas que são repugnantes? — perguntei, incrédulo. — E há uma que é
terrível? Como é que pode?!
— Isso não sabemos, mas eu posso mostrá-la para você. — respondeu ele.
— Por favor, queira mostrar-me — disse.
Andamos algum tempo, passando por tesouros de glória inefável, os quais era difícil passar
sem parar. Havia ainda muitas portas, com diferentes verdades bíblicas sobre cada uma.
Quando o anjo disse "convidativas", senti que ele tinha diminuído em muito o apelo que elas
ensejavam. Eu bem que queria adentrar cada uma delas, mas a minha curiosidade pela "porta
terrível" manteve-me indo adiante.
Então eu a vi. "Terrível" foi uma expressão que não fez justiça ao que ela era. Um medo
apoderou-se de mim que pensei que fosse me sufocar.
Graça e Verdade
Dei as costas para aquela porta e retirei-me dali depressa. Havia uma bela pedra vermelha nas
proximidades, contra a qual eu praticamente me arremeti para tocar nela com as mãos.
Imediatamente achei-me no Jardim de Getsêmani, contemplando o Senhor em oração. A agonia
que presenciei foi ainda mais terrível do que a porta que eu acabara de ver. Chocado, puxei a
minha mão daquela pedra e caí no chão, exausto. O que eu queria fazer era voltar para aquela
pedra azul ou para a verde, mas eu tinha que recuperar as minhas forças e o meu sentido de
direção. Os anjos depressa ficaram ao meu redor para me servir. Deram-me a beber alguma
coisa que foi me fortalecendo. Logo eu estava sentindo-me bem, em condições de me levantar e ir
de volta para aquelas outras pedras. Entretanto, a visão do Senhor orando, que voltava à minha
mente, me fez parar.
— O que é que era aquilo, lá atrás? — perguntei.
— Quando você toca numa das pedras, somos capazes de ver um pouco do que você vê, e de
sentir um pouco do que você sente — disse um dos anjos. — Sabemos que todas essas pedras
são grandes tesouros, e todas as revelações que elas contêm são de valor inestimável. Nós
contemplamos por um momento a agonia do Senhor antes da sua crucificação, e sentimos
brevemente o que ele sentiu naquela terrível noite. É difícil para nós entender como o nosso
Deus pôde sofrer desse modo. Isso nos faz apreciar muito mais que honra é para nós servirmos
aos homens por quem ele pagou um preço tão terrível assim.
As palavras do anjo eram como relâmpagos que atingiam a minha alma. Eu tinha lutado na
grande batalha. Havia subido até o cume da montanha. Tinha me tornado tão familiar com a
dimensão espiritual que já nem mesmo notava os anjos, e podia falar em quase que nos mesmos
termos com as grandes águias. Contudo eu não conseguia compartilhar nem por um momento
dos sofrimentos do Senhor, sem desejar fugir para uma experiência mais agradável.
— Eu não deveria estar aqui — disse, quase gritando. — Eu, mais do que ninguém, é que
merecia ser um prisioneiro do maligno!
— Compreendemos, senhor, — um anjo me disse, apreensivo — que ninguém está aqui por ter
merecimentos para isso. Você está aqui porque foi escolhido antes da fundação do mundo, para
cumprir um propósito. Não sabemos qual é o seu propósito específico, mas sabemos que para
todos os que estão nesta montanha há um propósito grandioso.
— Obrigado. Você está me ajudando. Minhas emoções têm sido muito distendidas neste lugar,
e isso tem sobrepujado a minha compreensão. Você tem razão. Ninguém está aqui por ser digno.
Verdadeiramente, quanto mais subimos nesta montanha, mais indignos somos por estarmos
aqui, e de mais graça necessitamos para permanecer aqui. Como foi que eu consegui chegar ao
topo da primeira vez?
— Pela graça — o anjo respondeu.
— Se você quiser ajudar-me, — disse — por favor repita esta palavra para mim toda vez que me
encontrar confuso ou em desespero. Esta palavra eu a estou compreendendo melhor do que
qualquer outra.
— Agora tenho que voltar para a pedra vermelha. Sei agora que ela é o maior tesouro que há
neste salão, e não posso sair sem levar aquele tesouro em meu coração.
A Verdade da Graça
O tempo que passei junto da pedra vermelha foi o tempo mais doloroso pelo qual já passei.
Muitas vezes simplesmente eu não agüentava mais, e tinha que retirar a minha mão. Várias
vezes fui de volta para as pedras azul ou verde para acalmar a minha alma e depois voltar para
lá. Era cada vez mais difícil retornar para a pedra vermelha, mas o meu amor e apreciação pelo
Senhor crescia mais daquele modo do que por qualquer outra coisa que eu tivesse aprendido ou
experimentado antes.
Finalmente, quando a presença do Pai afastou-se de Jesus na cruz, não pude permanecer ali
por mais tempo. Saí. Posso dizer que os anjos, que também estavam sentindo, até um certo
grau, o que eu sentia, estavam plenamente concordes com o que eu fiz. O poder da vontade para
tocar a pedra de novo simplesmente não estava mais em mim. Nem mesmo senti vontade de
voltar para a pedra azul. Simplesmente fiquei prostrado no chão. Eu chorava pelo que o Senhor
tinha passado. Chorava também porque sabia que eu havia desertado, tal como os seus
discípulos. Eu tinha falhado, no momento em que ele mais precisava, assim como eles o fizeram.
Depois do que me pareceu terem sido vários dias, abri os olhos. Uma outra águia estava do
meu lado. Em frente dela havia três pedras, uma azul, uma verde, e uma vermelha.
— Coma-as — disse ela.
Quando as comi, todo o meu ser se renovou, e uma grande alegria e uma grande sobriedade
inundaram o meu coração.
Quando me pus de pé, vi que aquelas três pedras estavam encravadas no punho da minha
espada, e também sobre cada um dos meus ombros.
— Elas são agora suas para sempre — a águia disse. — Elas não poderão ser tiradas de você e
você não as poderá perder.
Mas eu não cheguei a completar esta última — protestei.
Cristo, somente ele, é que terminará essa prova — replicou ela. — Você fez o suficiente, e agora
você tem que prosseguir.
— Para onde? — perguntei.
— Isso é você quem decide, mas com o tempo ficando cada vez mais curto, sugiro que você
procure chegar logo no cume da montanha.
A águia então se retirou, obviamente com muita pressa.
Então lembrei-me das portas. Comecei com aquelas que tinham me parecido tão atraentes.
Quando cheguei diante da primeira delas, ela não me parecia atraente agora. Então fui para
outra, e senti o mesmo.
— Alguma coisa mudou — observei em voz alta.
— Foi você que mudou — os anjos responderam de imediato.
Voltei-me para olhar para eles e impressionei-me por vê-los tão diferentes. Eles não tinham
mais aquele olhar inocente em si, mas tinham agora uma postura regia e uma aparência de
sábios. Eu sabia que eles refletiam o que também tinha acontecido comigo, mas agora eu me
sentia incomodado de simplesmente pensar em mim mesmo.
— O que você me aconselha a fazer? — disse ao líder deles.
— Ouça o seu coração — disse ele. — É lá que essas grandes verdades agora habitam.
— Nunca pude confiar em meu próprio coração — respondi. — Ele está sujeito a muitos
conflitos. Eu também sou sujeito a ilusões, a enganos e a ambições egoístas. Por causa de todo o
clamor do meu coração, para mim é até mesmo difícil ouvir a voz do Senhor falando comigo.
— Com a pedra vermelha agora no seu coração, senhor, não creio que de agora em diante será
desse modo — foi o que me propôs o líder, com uma confiança inusitada.
Encostei-me então na parede, pensando por que a águia não estava aqui, nesta hora em que eu
mais precisava dela. Ela tinha ido por aquele caminho antes, e saberia que porta escolher. Mas
eu sabia que ela não voltaria, e sabia que o certo era eu mesmo escolher. Enquanto meditava, a
"porta terrível" era a única que vinha à minha cabeça. Movido pela curiosidade, decidi voltar
para lá e olhá-la de novo. Eu tinha me afastado dela tão depressa da primeira vez que nem
cheguei a observar que verdade ela representava.
Ao aproximar-me dela dava para sentir o temor brotando em meu interior, mas nem de perto
era tão intenso como foi na primeira vez. Diferentemente das outras portas, era muito escuro ao
redor desta aqui, e tive que chegar bem perto para poder ler a verdade que estava posta sobre
ela. Um tanto surpreso, li: "O TRONO DO JULGAMENTO DE CRISTO".
— Por que será que esta verdade é tão amedrontadora? — perguntei em voz alta, sabendo que
os anjos não iriam me responder.
Fiquei olhando para aquela porta por algum tempo e então fiquei sabendo que era por ela que
eu deveria ir.
— Há muitas razões pelas quais ela é assim tão amedrontadora — foi o que aquela voz já
familiar da águia me respondeu.
— Alegro-me por você ter voltado — respondi. — Será que eu fiz uma escolha infeliz?
— Não! Você escolheu bem. Esta porta vai levá-lo de volta para o topo da montanha mais
depressa do que qualquer outra. Ela inspira medo porque o maior medo que há em tudo que foi
criado tem a sua origem através daquela porta. A maior sabedoria que os homens podem
conhecer nesta vida, ou na vida futura, também se obtém através desta porta. Mesmo assim, são
bem poucos os que vão por ela.
— Mas por que esta porta é tão escura? — perguntei.
— A luz dessas portas reflete a atenção que a igreja presentemente está dando à verdade que se
acha por detrás de cada uma delas. A verdade por detrás desta porta é uma das mais
negligenciadas nos dias atuais, mas é uma das mais importantes. Você vai compreender isso
quando entrar. A maior autoridade que alguém possa receber será confiada apenas àqueles que
entrarem por esta porta. Quando você vir Jesus Cristo assentado nesse seu trono, você, também,
estará preparado para assentar-se com ele.
— Então esta porta não seria tão escura e não causaria medo tivéssemos tão somente dado
mais atenção a esta verdade? perguntei.
— Isso é correto. Se os homens soubessem que glória há por revelada atrás desta porta, ela
seria uma das mais brilhantes — a águia lamentou. — Entretanto, ela é ainda uma porta difícil
de se passar. Foi-me dito para retornar e encorajá-lo, porque em breve você disso necessitará.
Você verá uma glória maior, mas também um terror maior, tal como você nunca teve. Mas saiba
que por ter você agora escolhido este caminho difícil, depois você não terá perdas. Muitos têm
grande prazer em conhecer a bondade do Senhor, mas bem poucos são os que querem conhecer
a sua severidade. Se você não abraçar essas duas coisas, você estará sempre em perigo de ser
enganado e de cair de sua grande graça.
— Sei que nunca teria vindo até aqui se eu não tivesse gasto o tempo que fiquei com a pedra
vermelha. Como é que eu poderia procurar ir pelo caminho fácil, quando isso é tão contrário à
natureza do Senhor? — perguntei.
— Mas agora que você escolheu este caminho, vá, então, depressa. Uma outra grande batalha
está prestes a acontecer, e precisam de você na linha de frente — disse ela.
Voltando-me para a águia, vendo uma forte determinação em seus olhos, a minha confiança
cresceu. Finalmente fui em direção daquela porta.
Parte IV
O trono branco
Dei uma última olhada naquele enorme salão dentro da montanha. As pedras preciosas e os
tesouros que representavam as verdades da Salvação eram emocionantes, pela sua glória.
Parecia que a sua extensão não tinha fim, e que a sua beleza era impossível de ser totalmente
apreciada. Eu não conseguia imaginar como os salões que contêm as outras grandes verdades
da fé pudessem ter uma glória maior. Isso me ajudou a compreender por que tantos cristãos
nunca quiseram deixar este nível, contentando-se a apenas maravilharem-se com as doutrinas
básicas da fé. Eu sabia que poderia permanecer ali durante toda a eternidade, e que nunca me
sentiria enfadado.
Então a águia que estava ao meu lado exortou-me:
— Você tem que prosseguir!
Quando me voltei e olhei para ela, ela abaixou a voz, mas continuou:
— Não há uma paz, nem uma segurança maior do que quando se está habitando na salvação
do Senhor. Você foi trazido aqui para saber isto porque você vai ter necessidade desta fé em sua
jornada para onde você está indo agora, mas não se demore mais aqui.
Fé e Coragem
Olhei para o líder da companhia de anjos que me seguia. Eu nunca havia presenciado antes
uma emoção assim tão profunda num anjo. Mas essas palavras sem dúvida estavam tocando
nele profundamente, assim como nos demais. Até mesmo pensei que eles estavam prestes a
chorar. Então o líder deles disse:
— Temos observado muitas maravilhas desde a criação. Mas o sofrimento voluntário de
homens pelo Senhor, e pelos seus semelhantes, é das maravilhas a maior de todas. Nós, tam-
bém, temos que lutar de vez em quando, e sofremos, mas habitamos onde há uma luz e uma
glória tão maravilhosas que para nós é muito fácil fazer isso. Quando homens e mulheres, que
vivem num lugar assim de escuridão e onde há o mal, tendo tão pouco encorajamento, não
podendo contemplar a glória, mas tendo apenas uma esperança por alcançá-la, quando eles se
dispõem a sofrer por essa esperança, que quase não dá para eles verem em seu coração, isso faz
com que o maior dos anjos implore a Deus para vir servir a esses herdeiros da salvação, e faz
isso com prazer. A princípio nós não entendíamos por que o Pai decretou que os homens teriam
que andar pela fé, não contemplando a realidade e as glórias do reino espiritual, mas sofrendo
toda essa oposição. Mas agora compreendemos que é através desses sofrimentos que eles dão
prova de que serão dignos de receber a grande autoridade que lhes será dada como membros da
família de Deus. Agora este caminhar de fé é a maior maravilha no céu. Os que passarem por
essa prova são dignos de se assentarem com o Cordeiro em seu trono, pois eles os tornou digno
disso, e eles deram prova de seu amor.
Então a águia o interrompeu, dizendo:
— A coragem é uma demonstração de fé. O Senhor nunca prometeu que o seu caminho seria
fácil, mas ele nos assegurou que valeria a pena. A coragem daqueles que lutaram no nível da
Salvação fez com que os anjos do céu avaliassem o que Deus tinha feito nos homens caídos. Eles
sofreram ferimentos no terrível ataque, enquanto podiam ver apenas a escuridão e uma aparente
defesa da verdade, da mesma forma como o Senhor fez na cruz. Mesmo assim eles não
desertaram, eles não retrocederam.
De novo me veio o pensamento de me lamentar por não ter permanecido no nível da Salvação e
lutado junto com aquelas almas corajosas. Mais uma vez, lendo os meus pensamentos, a águia
os interrompeu.
— Por subir pela montanha você também estava demonstrando ter fé e sabedoria, o que
também lhe dá autoridade. A sua fé libertou muitas almas de maneira que elas puderam vir à
montanha para serem salvas. Você recebeu também alguns ferimentos, mas a sua autoridade no
reino é proveniente mais de atos de fé do que do sofrimento. Porque você foi fiel no pouco, agora
se lhe será dada a grande honra de voltar para lá e sofrer, e você poderá ser posto para reinar
sobre muitos mais, Mas lembre-se de que todos nós trabalhamos juntos para os mesmos
propósitos, não importa se estejamos construindo ou sofrendo. Muito mais almas encherão esses
salões, contribuiu do para a grande alegria do céu, se você subir mais. Agora você foi chamado
para subir, e para construir, mas depois lhe será dada a honra de sofrer, se nisso você se
mantiver fiel.
Então virei-me e olhei para aquela porta escura e que causava medo, sobre a qual estava
escrito: "O Trono do Julgamento de Cristo'". Assim como um calor e uma paz tinham vindo à
minha alma a cada vez que eu olhava para os grandes tesouros da Salvação, um receio e uma
insegurança se apossava de mim quando eu olhava para aquela porta. Agora o que eu sentia é
que tudo em mim queria que eu permanecesse naquele salão, e nada em mim queria que eu
entrasse por aquela porta. De novo a águia respondeu os meus pensamentos.
— Antes de você entrar pela porta de qualquer grande verdade, você terá esses mesmos
sentimentos. Você os sentiu até mesmo quando entrou neste salão, que está cheio de tesouros
da salvação. Esses receios são decorrentes da queda. São o fruto da Árvore do Conhecimento do
Bem e do Mal. O conhecimento que vem daquela árvore nos torna inseguros e centrados em nós
mesmos. O conhecimento do bem e do mal faz com que o verdadeiro conhecimento de Deus
pareça inspirar medo, quando de fato toda verdade que vem de Deus nos leva para uma paz e
uma segurança ainda maiores. Até mesmo os juízos de Deus devem ser desejados, porque são
perfeitos todos os seus caminhos.
Até agora pela minha experiência eu sabia que, o que parece ser o caminho certo, geralmente é
o caminho que tem menos frutos, e muitas vezes é a estrada que nos leva ao fracasso. Por toda a
minha jornada, o caminho de mais alto risco foi o caminho que me levou para a maior
recompensa. Mesmo assim, a cada vez parecia-me que mais coisas estavam em jogo. Portanto, a
decisão de ir mais para cima tornava-se mais difícil a cada vez. Eu passava a simpatizar com
aqueles que paravam em algum ponto da sua jornada, e que se recusavam a prosseguir, embora
soubesse mais do que nunca que isso era um erro. A única segurança verdadeira veio de
permanecer indo para a frente nos domínios que exigiam mais fé, o que significava uma
dependência maior do Senhor.
Sim, é necessário ter mais fé para andar nos domínios mais elevados do Espírito — a águia
acrescentou. — O Senhor nos deu o mapa do seu reino quando ele disse: "Quem quiser, pois,
salvar a sua vida perdê-la-á; e quem perder a vida por causa de mim e do evangelho salvá-la-á." 16
Somente estas palavras é que podem mantê-lo no caminho que vai para o cume da montanha, e
que o levará à vitória na grande batalha à frente. Elas ainda o ajudarão a permanecer diante do
Trono do Julgamento de Cristo.
No Hall
Então o caminho chegou num hall tão grande que me pareceu que o mundo inteiro era
pequeno para comportá-lo. Sua beleza não pode ser imaginada por uma referência a qualquer
obra de arquitetura humana. Ela excedia a maravilha de tudo o que eu já tinha visto, inclusive a
do jardim, ou a do quarto que continha os tesouros da salvação. Neste ponto eu estava tão
tomado pela alegria e pela beleza quanto tinha sido tomado pela escuridão e pelo pavor alguns
minutos antes. Então compreendi que toda vez que eu senti uma forte dor ou uma escuridão em
minha alma, em seguida tive uma revelação da glória e da paz muito maior.
Bem distante no fim estava a Fonte da glória que fazia com que tudo o mais naquela sala
brilhasse. Eu sabia que era o Senhor, ele mesmo, e embora agora eu já o tivesse visto muitas
vezes, fiquei com algum temor ao caminhar na direção dele. Entretanto o temor que eu sentia
era um temor santo, que apenas aumentava a alegria e a paz que eu também sentia. Eu sabia
que o trono do julgamento de Cristo era uma fonte de muito mais segurança, tal como eu nunca
tinha experimentado, mas ao mesmo tempo ela era a fonte de um temor bem maior, mas bem
mais puro.
Não notei quão grande era a distancia até o trono. Era tão maravilhoso simplesmente andar
aqui que nem liguei se levou mil anos para chegar lá. Em termos terrenos, de fato me tomou um
grande tempo. De um certo modo senti que foram dias, mas de um outro modo, pareceu-me que
foram anos. Mas de alguma forma o tempo da terra não afetava em nada aqui.
Meus olhos estavam tão fixados na glória do Senhor que caminhei por um bom tempo antes de
notar que eu estava passando por multidões de pessoas que estavam enfileiradas à minha
esquerda (havia de igual forma multidões à minha direita, mas elas estavam tão distantes que
não dava para vê-las até que cheguei perto do trono). Quando olhei para elas, tive que parar.
Elas estavam me ofuscando, e tinham uma aparência mais nobre do que qualquer pessoa que eu
tivesse visto antes. A expressão facial delas era cativante. Nunca uma paz assim e uma
confiança assim tinha agraciado um rosto humano. Cada um tinha uma beleza que ultrapassava
qualquer comparação com a beleza da terra. Ao voltar-me para aqueles que estavam perto de
mim, eles se curvaram saudando-me como se me tivessem reconhecido.
— Como é que vocês me conhecem? — perguntei-lhes, surpreso comigo mesmo pela coragem
de lhes ter dirigido uma pergunta.
— Você é um dos santos lutando na última batalha — um homem que estava por perto
respondeu-me. — Todos aqui o conhecem, como também conhecem a todos os que agora estão
lutando na terra. Nós somos os santos que serviram ao Senhor nas gerações anteriores à sua.
Somos a grande nuvem de testemunhas a quem foi dado o direito de assistir à última batalha.17
Nós conhecemos todos vocês, e vemos tudo o que vocês fazem.
As Virgens Néscias
Para minha surpresa, reconheci uma pessoa que eu tinha conhecido na terra. Ele havia sido
um crente fiel, mas eu achava que ele nunca tinha feito nada de maior importância. Ele tinha
uma aparência fisicamente tão pouco atraente que isso o tornara tímido. Aqui ele tinha os
mesmos traços, mas de alguma forma ele era mais belo do que qualquer pessoa que eu conheci
na terra. Ele deu uns passos em minha direção com uma confiança e com uma dignidade que eu
nunca tinha visto nele, ou em ninguém mais.
— O céu é maior do que podíamos ter imaginado enquanto estávamos na terra — ele começou
a falar. — Este local não é senão o limiar dos domínios da glória que se acham muito além da
capacidade que tínhamos de compreender. É também verdade que a segunda morte é muito
mais terrível do que compreendíamos. Nem o céu nem o inferno são como pensávamos. Se eu
tivesse sabido na terra o que fiquei sabendo aqui eu não teria vivido do modo como vivi. Você é
grandemente abençoado por ter vindo aqui antes de ter morrido — disse ele, olhando para as
minhas vestes.
Então olhei para mim mesmo. Eu ainda estava com a capa da humildade encobrindo a minha
armadura. Senti-me indigno e grosseiro por estar diante daqueles que tinham uma postura tão
gloriosa. Fiquei então pensando que eu estava numa situação difícil, se eu planejava apresentar-
me ao Senhor do jeito que eu estava. Tal como as águias, aquele meu velho conhecido podia
entender os meus pensamentos, e ele respondeu:
— Os que chegam aqui usando essa capa nada têm a temer. Essa capa é o posto mais elevado
de honra, e é por isso que todos eles se curvaram saudando-o quando você passou.
— Não cheguei a notar que eles me saudaram — repliquei, um tanto desconcertado. — De fato,
nem cheguei a notar a presença de ninguém, até agora há pouco.
— Isso não tem problema algum — continuou ele. — Aqui nós damos uns aos outros o devido
respeito. Até mesmo os anjos nos servem aqui, mas apenas o nosso Deus é adorado. Há uma
acentuada diferença entre honrarmos uns aos outros em amor em relação ao que seria uma
adoração. Se tivéssemos entendido isso na terra, teríamos tratado os outros de forma bastante
diferente. É aqui, à luz da glória do Senhor, que podemos nos entender completamente, uns aos
outros, e assim relacionarmo-nos de maneira adequada entre nós.
Ainda me sentia envergonhado. Eu tinha que me segurar para não me curvar a eles, e ao
mesmo tempo o meu desejo era de esconder-me, porque me sentia com muita humildade. Então
lamentei pelo fato de que os meus pensamentos aqui eram tão tolos quanto os que eu tinha na
terra, e aqui todos podiam entendê-los! Senti-me impuro e um idiota por estar ali diante
daqueles que impunham tanto respeito e eram tão puros. Mais uma vez o meu velho amigo deu
uma resposta a estes meus pensamentos:
— Agora nós temos um corpo incorruptível, mas você não. A nossa mente não é mais
perturbada pelo pecado. Temos condições portanto de compreender muito melhor do que a mais
dotada mente terrena, e passaremos a eternidade crescendo em nossa capacidade de
compreensão. Isso é assim para que possamos conhecer o Pai, e entender a glória da sua cria-
ção. Na terra não dá nem para começar a compreender o que sabe o menor dos que aqui estão, e
nós somos os menores dos que aqui estão.
— Como é que vocês podem ser os menores? — perguntei, não acreditando.
— Há uma aristocracia de classes aqui. O galardão que é dado em função da nossa vida na
terra é a posição eterna que teremos por toda a eternidade. Toda essa multidão constitui aqueles
a quem o Senhor chamou de "virgens néscias".18 Nós conhecíamos o Senhor, confiávamos na sua
obra na cruz para a salvação, mas realmente não vivemos para ele, mas para nós mesmos. Nós
não mantivemos nossas vasilhas cheias do óleo do Espírito Santo. Nós temos vida eterna, mas
desperdiçamos a nossa vida na terra.
Isso que ele disse surpreendeu-me muito, mas eu sabia que ninguém poderia mentir neste
lugar.
— Mas as virgens néscias ficaram a ranger os dentes do lado de fora, na escuridão — protestei.
— Foi o que aconteceu conosco. A dor que sentimos quando compreendemos que tínhamos
desperdiçado a nossa vida foi além da dor mais intensa que se possa ter na terra. A escuridão
daquela dor somente pode ser entendida por quem por ela passou. Ela é aumentada em muito
por ter sido revelada em face da glória daquele perante quem fomos reprovados. Você está agora
diante dos que estão na posição mais baixa aqui do céu. Não há loucura maior do que essa:
conhecer a grande salvação de Deus, mas continuar a viver para si mesmo. Chegar aqui e
descobrir esta verdade é uma dor que vai além da capacidade que uma alma humana pode
agüentar. Nós somos aqueles que passamos pelo sofrimento nesta escuridão do lado de fora, por
causa desta que foi a maior de todas as loucuras.
Eu não estava acreditando no que ouvia, e lhe disse:
— Mas vocês são mais gloriosos e com mais alegria e paz do que antes eu imaginava em relação
aos que estão no céu. Não vejo nenhum remorso em vocês, e contudo sei que aqui vocês não
podem mentir. Isso para mim não faz sentido.
Olhando para mim, diretamente em meus olhos, ele continuou:
— O Senhor também nos ama com um amor maior do que a sua capacidade de compreensão.
Diante do trono de julgamento dele eu passei pela maior escuridão de alma e pelo maior remorso
da minha vida. Embora aqui não meçamos o tempo como vocês medem, a duração daquele
momento parecia durar tanto tempo quanto foi a duração da minha vida. Todos os meus
pecados e todas as minhas loucuras pelos quais eu não tinha me arrependido passaram diante
de mim, e de todos os que aqui estão. Você não tem como sentir a dor que eu senti, a menos que
tivesse passado por ela. Senti-me no mais profundo calabouço do inferno, mesmo estando diante
da glória do Senhor. O Senhor permaneceu firme, até que toda a minha vida foi completamente
passada em revista. Quando eu disse que me arrependia e pedi a misericórdia da sua cruz, ele
enxugou as minhas lágrimas e retirou a escuridão. Passei então a não mais sentir a amargura
que tinha sentido quando estava diante dele; agora apenas me lembro dela. É somente aqui que
você pode lembrar-se dessas coisas sem que a dor por elas volte. Um momento na parte mais
baixa do céu é mais grandioso do que mil anos com a melhor vida que se possa ter na terra.
Agora todo o meu lamento pela minha loucura do passado transformou-se em alegria, e sei que
serei feliz por todo o sempre, mesmo estando no lugar mais baixo do céu.
Fiquei pensando de novo nos tesouros da salvação. De alguma forma eu sabia que tudo o que
ele havia me contado tinha sido revelado por aqueles tesouros. Todo passo que eu dei ao subir a
montanha, ou em direção a ela, revelou-me que os caminhos do Senhor são ao mesmo tempo
mais inspiradores de temor como mais maravilhosos do que eu antes podia compreender.
Olhando intensamente para mim, aquele meu velho conhecido continuou:
— Você não está aqui apenas para adquirir entendimento, mas para ter uma experiência e ser
mudado. O nível da posição seguinte à nossa aqui no céu é muito maior do que o que temos.
Cada nível depois é então bem maior do que o anterior. Não é que cada nível tenha um corpo
espiritual ainda mais glorioso, mas que cada nível está mais perto do trono de onde toda a glória
provém. Mesmo assim, não mais sinto a dor pelos meus erros do passado. Eu realmente não
mereço nada. Estou aqui pela graça, tão somente, e sou demasiadamente grato pelo que tenho.
Ser amado é algo valioso. Eu poderia estar fazendo muitas coisas maravilhosas agora em
diferentes domínios do céu, mas prefiro ficar aqui e apenas contemplar a glória do Senhor,
mesmo estando em sua orla mais afastada.
Então, com um olhar distante nos olhos, ele acrescentou:
— Todos os que estão no céu vieram para este local para verem a revelação do grande mistério
do Senhor, e também para observar aqueles que, como você, vão lutar a batalha final.
— Você consegue ver o Senhor de onde você está? — perguntei-lhe. — Vejo a glória dele lá bem
distante, mas não dá para vê-lo.
— Eu posso ver muito mais do que você, — respondeu ele — e, de fato, posso vê-lo, e vejo tudo
o que ele está fazendo, mesmo daqui. Dá inclusive para ouvi-lo. Consigo ainda contemplar o que
acontece na terra. Ele nos deu todo esse poder. Somos a grande nuvem de testemunhas que vai
presenciar a atuação de vocês.
Ele inclinou-se, saudando-me, e em seguida voltou para a sua posição na multidão. Continuei
então a caminhar, ao mesmo tempo procurando compreender tudo o que ele tinha me dito. Ao
olhar para aquela grande hoste a que ele havia se referido como sendo as virgens néscias, todos
os que espiritualmente tinham desperdiçado a vida na terra, eu sabia que se eles aparecessem
na terra agora, eles seriam adorados como sendo deuses. Contudo eles eram os menores de
todos os que estavam no céu!
Fiquei então pensando sobre quanto tempo eu tinha desperdiçado em minha vida. Era um
pensamento tão aterrador que o interrompi. Então partes da minha vida foram passando ante
meus olhos. Um terrível pesar tomou conta de mim por causa desse pecado. Eu, também, tinha
sido um daqueles grandes loucos! Talvez eu tenha guardado mais óleo do que os outros em
minha lâmpada, mas agora eu sabia quão tolo eu tinha sido por avaliar o que era requerido de
mim vendo o que os outros faziam. Eu, também, era uma das virgens néscias!
Novas Explicações
Olhei então de novo para o trono e surpreendi-me porque a glória pareceu-me estar muito mais
bela do que antes. Um outro homem que se achava perto de mim explicou-me:
— Em cada encontro, um véu é removido, de forma que você pode vê-lo com maior clareza.
Você não se transforma simplesmente por ver a glória do Senhor, mas por vê-la com um rosto
descoberto. Todo aquele que vem aos verdadeiros juízos de Deus passa por um corredor como
este para encontrar-se com aqueles que o poderão ajudar a remover os véus que ainda esteja
usando, véus esses que distorceriam a sua visão do Senhor.
Eu já tinha absorvido muito mais entendimento do que me fora dado durante os muitos anos
de ministério na terra. Tive então a compreensão de que todo o meu estudo e toda a minha
busca na terra tinham apenas feito com que eu avançasse a passo de tartaruga. Nem que a
minha vida tivesse uma duração muito maior, como me prepararia para o juízo? A minha vida já
me tinha desqualificado mais do que todos aqueles com quem me encontrara, e eles entraram
aqui raspando!
— Aqueles que não tiveram a graça de terem esta experiência, como poderão ter alguma
esperança, então? — perguntei.
Ouvi então uma voz diferente, que disse:
— O que você está experimentando aqui lhe foi dado na terra. Todo relacionamento, todo
encontro com uma outra pessoa poderá ensiná-lo sobre o que você está aprendendo aqui se você
mantiver essa capa da humildade sobre você, e se você aprender a sempre manter a sua atenção
na glória do Senhor. Esta experiência lhe está sendo dada agora porque você vai escrever depois
a visão, e os que a lerem vão compreendê-la. Muitos então terão condições de levar consigo a
glória e o poder que têm de levar para a última batalha.
Pedras de Tropeço
Surpreendi-me ao reconhecer este homem que acabara de falar comigo como sendo um
contemporâneo meu, mas eu não sabia que ele tinha morrido. Eu nunca o havia encontrado na
terra, mas ele tinha um grande ministério que eu respeitava muito. Por meio de muitos que ele
tinha treinado, milhares tinham sido salvos, e muitas igrejas que eram totalmente devotadas ao
evangelismo tinham sido ampliadas.
Ele pediu permissão para abraçar-me apenas por um minuto, e eu concordei, sentindo-me um
tanto embaraçado. Quando nos abraçamos, senti um tamanho amor vindo dele para mim que
uma forte dor bem profunda que eu estava sentindo parou imediatamente de doer. Eu havia me
acostumado tanto com aquela dor que eu nem mesmo a notava, e só percebi quando ela parou.
Depois de nos separarmos eu lhe disse que o seu abraço tinha me curado de alguma coisa. Sua
alegria por isso foi profunda. Então ele me contou por que estava no nível mais baixo do céu.
— Eu fiquei tão orgulhoso próximo ao fim da minha vida que achava que o Senhor não faria
nada que fosse de maior importância a não ser por meu intermédio. Passei então a tocar nos
ungidos do Senhor e a maltratar os seus profetas.22 Senti um orgulho egoísta quando o Senhor
usou um de meus discípulos, e ficava com inveja quando o Senhor operava através de pessoas
que não eram do meu ministério. Então eu ficava procurando encontrar alguma coisa errada
nessas pessoas para "desmascará-las". Eu não sabia que a cada vez que agia assim eu estava me
rebaixando, cada vez mais.
— Nunca soube que o senhor tivesse agido desse modo disse eu, surpreso.
— Tudo isso não foi pessoalmente que eu fiz, mas incitei subordinados meus para investigarem
aquelas vidas e assim fazerem todo o meu trabalho sujo. Eu os fiz ir por toda parte,
investigando, para encontrar erros ou pecados na vida de outros, para que eles assim ficassem
expostos diante de todos. Tornei-me a pior coisa que se pode ser na terra: uma pedra de tropeço
que produzia outras pedras de tropeço. Semeamos medo e divisão por toda a igreja, tudo com a
justificativa de que era em defesa da verdade. Em minha justiça-própria eu me dirigia para a
perdição. Por sua grande misericórdia o Senhor permitiu que eu fosse atingido por uma
enfermidade que veio acarretar uma morte vagarosa e humilhante. Um pouco antes de morrer eu
caí em mim e me arrependi. Sou de todo grato por estar aqui. Pode ser que eu seja um dos
menores do Senhor aqui, mas é muito mais do que eu mereço. Eu simplesmente não poderia
deixar este local antes de ter a oportunidade de pedir desculpas a todos vocês a quem eu causei
tanto dano.
— Mas o senhor nunca me causou dano algum — disse-lhe.
— Oh, não, causei-lhe danos, sim — replicou ele. — Muitos dos ataques dirigidos contra você
foram feitos por aqueles que eu tinha mobilizado e encorajado para atingirem outras pessoas.
Muito embora eu não tenha realizado pessoalmente esses ataques, o Senhor me tem como
responsável, da mesma forma como os que os perpetraram.
— Compreendo. É claro que o perdôo.
Fiquei então considerando como eu mesmo tinha agido dessa mesma forma, mesmo que numa
escala menor. Lembrei-me de quando permiti que ex-membros de uma igreja, que saíram des-
contentes da mesma, espalhassem todo o seu veneno a respeito daquela igreja, e eu não os fiz
parar de fazerem isso. Entendi então que por simplesmente não interferir no que eles faziam,
deixando de corrigi-los nesse sentido, isso foi como encorajá-los a continuar agindo daquela
forma. Lembrei-me de que na época eu pensava que aquilo tudo se justificava devido aos erros
daquela igreja. Então me veio à lembrança como eu mesmo cheguei a propagar muitas daquelas
situações, justificando as minhas palavras sob o disfarce de que o que eu dizia era para que as
pessoas orassem a respeito. Logo uma grande enxurrada de outros incidentes desse tipo fluiu
em meu coração. Mais uma vez eu me senti sobrecarregado pelo mal e pela escuridão da minha
alma.
— Eu também fui uma pedra de tropeço! — lamentei.
Eu sabia que merecia a morte, que merecia o pior do que há no inferno. Eu nunca tinha visto a
impiedade e crueldade como agora eu via em meu coração.
— E, quando atacávamos os filhos de Deus, sempre apagávamos a nossa dor de consciência
pensando que fazíamos um favor ao Senhor — voltou aquela voz, que bem compreendia a
situação. — É bom que você esteja vendo isso aqui, porque você pode voltar. Por favor, advirta os
meus discípulos quanto ao destino que em breve eles terão, se não se arrependerem. Muitos
dentre eles são chamados para serem reis aqui, mas se não se arrependerem eles enfrentarão o
pior dos juízos — o juízo das pedras de tropeço. A enfermidade que me humilhou foi uma graça
de Deus. Quando eu estava diante do Trono do Julgamento, pedi ao Senhor que enviasse essa
mesma graça a meus discípulos. Eu não posso voltar até eles, mas o Senhor permitiu que eu
tivesse este tempo com você. Queira perdoar e liberar aqueles que o atacaram. Na verdade eles
não sabem que o que estão fazendo é a obra do Acusador. Obrigado por me perdoar, mas por
favor perdoe também a eles. Está em seu poder reter pecados ou cobri-los com amor. Eu lhe
suplico que ame aqueles que agora são seus inimigos.
Mal dava para ouvi-lo falar, devido ao peso de meus próprios pecados. Ele era tão glorioso,
puro, e agora obviamente tinha poderes que não são conhecidos na terra. Entretanto, ele me
suplicava aquelas coisas com uma grande humildade. Foi tal o amor que eu senti fluindo dele
que não tinha como recusar o seu pedido. Mas mesmo sem o impacto do seu amor, senti-me
muito mais culpado do que quem quer que estivesse me atacando.
— Com certeza faço por merecer tudo o que eles possam ter feito contra mim, e muito mais —
repliquei.
— Isso é verdade, mas agora não é este o ponto em questão suplicou. — Todos na terra fazem
por merecer a segunda morte, mas o nosso Salvador nos trouxe graça e verdade. Para fazermos a
sua obra, tudo temos de fazer com graça e verdade. O inimigo e quem jamais nos traz a verdade
e a graça, mesmo quando se apresenta como "um anjo de luz".23
— Se eu me libertar disto, pode ser que eu consiga ajudá-los respondi. — Mas o senhor não vê
que possivelmente eu me encontro numa condição muito pior do que a deles?
— Sei que o que acabou de passar pela sua memória foi algo muito mau — respondeu ele, com
muito amor e uma graça enorme
Eu sabia que agora ele estava preocupado comigo e com a minha condição da mesma forma
como ele se preocupara em relação a seus discípulos.
— Aqui é mesmo o céu! — foram as palavras que então balbuciei. — Isto é realmente luz e
verdade. Como é que nós que vivemos em tão grande escuridão pudemos ter tanto orgulho,
pensando que sabíamos muito acerca de Deus? Senhor, misericórdia!
Voltei-me então para a direção do trono e disse:
— Senhor, deixa-me voltar e levar esta luz para a terra!
Imediatamente toda a hoste celestial pareceu-me ficar em sentido, e eu sabia que era o centro
de sua atenção. Senti-me muito insignificante diante de apenas um desses que eram tão glorio-
sos, mas quando percebi que todos estavam olhando para mim, uma onda de medo atingiu-me
de supetão. O que senti foi que não haveria um destino tal como o que eu pensava que ia ter.
Senti-me como se o maior inimigo da glória e da verdade tivesse tomado todo aquele lugar.
Então lembrei-me do meu pedido para voltar. Eu estava corrompido demais. Jamais eu poderia
representar adequadamente aquela glória e aquela verdade. Por causa da minha corrupção, eu
não teria como expressar a realidade tão gloriosa daquele lugar e daquela Presença. Senti que
nem mesmo Satanás tinha caído tanto quanto eu tinha caído. "Isto é o inferno", pensei. Não
poderia haver uma dor maior do que ser tão mal assim e saber que essa glória existe. Ser banido
daqui seria uma tortura pior do que qualquer outra coisa que eu já tivesse temido em minha
vida. Disse então, quase sem fôlego:
— Não é de se admirar que os demônios estejam doidos e com tanta raiva!
No momento em que senti que eu estava para ser enviado pura as mais profundas regiões do
inferno, simplesmente gritei:
— JESUS!
Imediatamente uma paz me sobreveio. Eu sabia que tinha que continuar indo em direção à
glória de novo, e de alguma forma senti confiança em fazer isso.
O Grande Escritor
Fui então andando até que vi um homem que eu considerava ter sido um dos maiores
escritores de todos os tempos. Eu tinha considerado que a profundidade da revelação da verdade
que ele teve era a maior do que todas que eu tinha encontrado em meus estudos.
— Prezado senhor, sempre desejei poder encontrá-lo — falei quase balbuciando.
— Eu também — replicou ele com muita sinceridade. Surpreendi-me com a sua palavra, mas
achava-me tão emocionado por encontrá-lo, que continuei:
— Sinto que o conheço, e em seus escritos quase me sentia como se o senhor me conhecesse.
Acho que devo mais ao senhor do que a qualquer outra pessoa, além dos que escreveram os
textos que compõem o cânon das Escrituras — continuei.
— Isso é bondade sua — respondeu ele. — Mas lamento não ter lhe servido melhor. Eu fui uma
pessoa muito superficial, e meus escritos eram mais cheios da sabedoria mundana do que da
verdade divina.
— Pelo tempo em que tenho estado aqui, e por tudo o que já aprendi, sei que isso deve ser
verdade, porque só se pode falar a verdade aqui, mas isso é muito difícil para eu compreender.
Considero os seus escritos uns dos melhores que temos na terra — respondi.
— Você tem razão — admitiu com sinceridade o famoso escritor. — É tão triste! Todo o mundo
aqui, até mesmo os que se assentam mais perto do Rei, viveriam a sua vida de maneira
totalmente diferente se tivessem uma oportunidade de vivê-la de novo, mas creio que no meu
caso eu viveria a minha ainda muito mais distinta do que a maioria deles. Eu fui honrado por
reis, mas fracassei diante do Rei dos reis. Fiz uso dos grandes dons e revelações que me foram
dados para atrair os homens mais para mim mesmo e para a minha sabedoria do que para o
Senhor. Além disso, eu somente o conhecia pelo ouvir com os meus ouvidos, que foi o modo pelo
qual eu também compeli as pessoas a conhecerem-no. Tornei-as dependentes de mim, e
semelhantes a mim. Eu as levei para um raciocínio dedutivo muito mais do que para o Espírito
Santo, que eu mal conhecia. Não levei as pessoas a olharem para Jesus, mas para mim mesmo e
para outros que, como eu, dávamos a entender que o conhecíamos. Quando eu olhei para o
Senhor aqui, me deu vontade de picar em pedacinhos tudo o que eu tinha escrito, algo
semelhante ao que Moisés fez com o bezerro de ouro. A minha mente era o meu ídolo, e eu
queria que todos adorassem a minha mente junto comigo. A sua estima em relação a mim não
me alegra em nada. Se eu tivesse passado tanto tempo procurando conhecer o Senhor quanto
gastei procurando ter conhecimentos sobre ele, de forma a impressionar as pessoas com o meu
conhecimento, muitos dos que estão neste nível, que é o mais baixo, estariam sentados nos
tronos que lhes haviam sido preparados, e muito mais pessoas estariam aqui neste local.
— Eu sei que o que o senhor está dizendo sobre o seu trabalho tem de ser a verdade, mas será
que o senhor não está sendo um tanto rigoroso consigo mesmo? — questionei. — As suas obras
alimentaram-me espiritualmente por muitos anos, como sei que também serviram para muitas e
muitas pessoas.
— Não estou sendo rigoroso comigo. Tudo o que lhe disse e a verdade, e foi confirmado quando
me apresentei diante do trono. Eu produzi muito, mas me foram dados mais talentos do que à
maioria dos que aqui estão, e eu os enterrei embaixo do meu orgulho espiritual e das minhas
ambições. Tal como Adão que poderia ter levado a humanidade a um futuro o mais glorioso de
todos, mas que pelo seu fracasso levou bilhões de almas ao pior dos destinos, com a autoridade
também vem a responsabilidade. Quanto mais autoridade se recebe, tanto maior será o potencial
que se tem de causar o bem ou o mal Aqueles que reinarão com o Senhor por todo o sempre
terão a responsabilidade maior. Ninguém permanece só, e todo erro humano, ou toda vitória,
ressoará muito além da nossa compreensão, até em gerações futuras.
Fiquei pensando como ele tinha escrito empregando as frases mais belas e bem articuladas,
sentindo que ele era a própria definição do "senhor palavra", um artista que transformava
palavras em obras de arte. Mas aqui ele falava como um homem comum, sem o talento pelo qual
seus escritos eram tão bem conhecidos. Eu sabia que ele conhecia o que eu estava pensando,
como acontecia com todos aqui, mas ele prosseguiu dizendo o que obviamente considerava mais
importante.
— Tivesse eu buscado o Senhor, em vez de ter procurado apenas ter conhecimento a respeito
dele, milhares de pessoas que eu poderia ter liderado com sucesso teriam conduzido muitos
milhões a estarem aqui agora. Todo aquele que compreende a verdadeira natureza da autoridade
nunca a procura, mas apenas a aceita quando sabe que está com o jugo do Senhor, o único que
pode desempenhar a autoridade sem tropeçar. Nunca busque ser influente você mesmo, mas
busque apenas o Senhor e disponha-se a tomar o seu jugo. Minha influência não alimentou o
seu coração, mas alimentou apenas o seu orgulho de ter conhecimentos.
— Como é que eu vou saber que comigo não está acontecendo o mesmo? — perguntei,
pensando no que eu também tinha escrito.
— Procure apresentar-se a Deus aprovado,24 e não aos homens — respondeu ele, enquanto
voltava às fileiras daquela multidão. Antes de ele desaparecer no meio daquela gente, ele se virou
e com um sorriso deu-me mais um pequeno conselho:
— E não faça o que eu fiz...
Os vencedores
Enquanto ia me afastando do trono de julgamento fui pensando em tudo pelo que eu tinha
acabado de passar. Tinha sido ao mesmo tempo algo terrível e maravilhoso. Como tudo tinha
sido tão desafiador e também de quebrantar o coração, sentia-me mais seguro do que nunca.
Não foi fácil a princípio abrir-me assim, ficando totalmente descoberto à frente de tantas
pessoas, não podendo esconder nem mesmo um pensamento sequer, mas quando relaxei e
aceitei a situação, sabendo que isto estava purificando a minha alma, senti uma profunda
libertação. Não ter nada para esconder era como tirar o jugo e os grilhões mais pesados. Fiquei
sentindo-me aliviado, como se pudesse respirar de maneira tal como nunca antes.
O Que Me Aconteceu
Quanto mais à vontade fui me sentindo, mais a minha mente parecia se multiplicar em sua
capacidade. Então passei a sentir uma comunicação que estava sendo transmitida, que não tem
como ser expressa por palavras humanas. Lembrei-me então do apóstolo Paulo ter comentado,
quando de sua visita ao terceiro céu, que lá ele ouviu palavras inefáveis.27 Há uma comunicação
espiritual que transcende em muito toda forma de comunicação humana. Ela é mais profunda e
com muito mais significado, ultrapassando a possibilidade que as palavras humanas podem
expressar. De um certo modo é uma comunicação pura, feita conjuntamente pelo coração e pela
mente, e é tão pura que não há possibilidade alguma de haver qualquer incompreensão.
Ao olhar para alguém ali naquele local fui entendendo o que ele estava pensando, da mesma
forma como lhe tinha sido possível compreender o que eu pensava. Quando olhei para o Senhor,
também o entendi da mesma maneira. Nós continuamos a usar palavras, mas o significado de
cada uma delas tinha uma profundidade não possível de ser registrada por nenhum dicionário
humano. A minha mente havia sido liberta, de forma que sua capacidade tinha se multiplicado
muitas vezes. Ela estava estimulada como nunca estivera em minha vida.
Era óbvio também que o Senhor tinha prazer em poder comunicar-se desta forma comigo, tal
como eu estava me comunicando com ele. Nunca antes eu tinha compreendido tão pro-
fundamente o que significa ele ser a Palavra de Deus. Jesus é a Comunicação de Deus à sua
criação. Suas palavras são espírito e vida, e o significado e o poder delas ultrapassam em muito
as nossas definições humanas do presente. As palavras humanas constituem uma forma muito
superficial da comunicação do espírito. Deus nos criou com a capacidade de nos comunicarmos
num nível que em muito transcende as palavras humanas, mas por causa da queda, e do
fracasso da Torre de Babel, viemos a perder essa capacidade.28 Não podemos ser quem fomos
criados para ser até que recuperemos esta habilidade, e apenas poderemos fazer isso quando
formos libertos em sua presença.
Foi então que entendi que quando a transgressão de Adão fez com que ele se escondesse de
Deus,29 isso foi o começo da mais terrível distorção em relação ao que o homem tinha sido criado
para ser, e foi também uma tremenda redução em sua capacidade, tanto intelectual como
espiritual. Isso somente poderia ser restaurado quando viéssemos a sair do nosso "esconderijo",
abrindo-nos a Deus e aos outros, tornando-nos verdadeiramente transparentes. É quando
contemplamos a glória do Senhor sem véu algum cobrindo a nossa face que somos trans-
formados em sua imagem. Os véus foram causados por nos termos escondido.
Quando o Senhor perguntou a Adão onde ele se encontrava depois da transgressão, essa foi a
sua primeira pergunta ao homem, e esta é a primeira que temos que responder para sermos
totalmente restaurados para ele. Claro que o Senhor sabia onde Adão estava. A pergunta era
para Adão. Aquela pergunta foi o princípio da procura de Deus.
A história da redenção é Deus buscando o homem e não o homem buscando a Deus.
Quando pudermos responder a esta pergunta, saberemos onde estamos na relação com Deus.
E a resposta a ser dada a esta pergunta nós somente saberemos quando estivermos em sua
presença.
Isso foi a essência do que aconteceu comigo diante do trono do julgamento. O Senhor já sabia
de tudo o que teria que saber a meu respeito. Foi tudo para o meu bem, para que eu soubesse
onde eu estava. Tudo aconteceu para retirar-me de todo esconderijo, para trazer-me das trevas
para a luz.
Isso me fez pensar mais acerca de Paulo. "Como poderemos até mesmo chegar a seus pés,
tornando-nos tão dedicados e fiéis como ele foi?" — pensei comigo mesmo.
— Não é isso que eu estou pedindo para que vocês alcancem — o Senhor respondeu. — Estou
pedindo que vocês habitem em mim. Vocês não podem continuar a se compararem com os outros,
nem mesmo com Paulo. Vocês sempre estarão aquém em relação às pessoas para quem olharem,
mas se vocês olharem para mim vocês irão muito além do que, de outra forma, vocês teriam
conseguido. Como você mesmo já ensinou, quando os dois na estrada de Emaús me viram partir o
pão foi que os olhos deles se abriram? 37 Quando você ler as cartas de Paulo, ou quaisquer outras,
você terá que ouvir-me. Somente quando receber o seu pão diretamente de mim é que os olhos do
seu coração se abrirão.
Continuou ele:
— Vocês poderão ser desviados principalmente por aqueles que mais se parecem comigo, se
vocês através deles não chegarem a me ver. Há ainda uma outra armadilha para aqueles que
chegarem a conhecer mais da minha unção e do meu poder do que os demais. Esses muitas vezes
se desviarão por olharem para si mesmos. Como lhe disse antes da sua conversa com Paulo, os
meus servos têm de se tornar cegos para que possam ver. Permiti que você conversasse com Paulo
porque ele é um dos meus melhores exemplos disso. Foi por causa da minha graça que eu permiti
que ele perseguisse a minha igreja. Quando ele viu a minha luz, ele entendeu que o seu próprio
raciocínio o tinha levado a um conflito direto com a mesma verdade a que ele pensava estar
servindo. O raciocínio de vocês sempre acabará dando nisso, levando-os a fazer o que é
exatamente o oposto da minha vontade. Uma grande unção traz um perigo ainda maior disso
acontecer com vocês, se vocês não aprenderem o que Paulo fez. Se vocês não tomarem a sua cruz.
a cada dia, colocando nela tudo o que vocês são e tudo o que vocês têm, vocês cairão por causa da
autoridade e do poder que eu lhes darei. Até que vocês aprendam afazer todas as coisas para a
causa do evangelho, quanto mais influentes vocês forem, maior será o perigo que os cercará.
Disse ainda o Senhor:
— Um dos maiores enganos que atingem os meus ungidos é que eles ficam achando que, porque
lhes dei um pouco de conhecimento ou poder sobrenaturais, então os seus caminhos terão de ser
os meus caminhos, e o que estiverem pensando terão de ser os meus pensamentos. Isso é um
grande engano, e muitos tropeçaram por causa disso. Vocês vão pensar como eu quando estiverem
em perfeita união comigo. Até mesmo na vida dos mais ungidos que têm caminhado na terra, até
mesmo em relação a Paulo, a união comigo tem sido apenas parcial e por breves momentos. Paulo
de fato andou comigo tão de perto como nenhum outro homem, até agora. Mesmo assim, ele tam-
bém foi acossado por temores e fraquezas que não tinham vindo de mim. Eu o poderia ter livrado
de tudo isso, e ele até mesmo pediu isso muitas vezes, mas eu tinha uma razão para não o
libertar. A grande sabedoria de Paulo foi assumir a sua fraqueza, entendendo que se eu o tivesse
libertado de seus temores e fraquezas eu não poderia lhe ter confiado a revelação e o poder no
nível em que lhe dei. Paulo aprendeu a distinguir entre a sua própria fraqueza e a revelação do
Espírito. Ele sabia que quando ele era acossado pela fraqueza, ou por temores, ele não estava
vendo a partir da minha perspectiva, mas da sua. Isso fazia com que ele me buscasse, e que
dependesse de mim, cada vez mais. Ele tinha também o cuidado de não atribuir a mim o que
provinha do seu próprio coração. Portanto eu pude confiar a ele revelações que não podia dar a
outros. Paulo reconhecia a sua própria fraqueza, e conhecia a minha unção, e soube fazer distinção
entre essas duas coisas. Ele não tomou o que tinha vindo da sua mente e do seu coração como se
fosse da minha mente e do meu coração.
Intimidade com o Senhor
Fiquei conjecturando como todas estas coisas aqui se tornam tão claras, mas como muitas
vezes, mesmo depois de eu ter passado por experiências tão maravilhosas como esta, eu
esqueço-me de tudo tão facilmente. É fácil compreender e andar na luz aqui, mas lá na batalha
tudo fica nublado de novo.
Considerei ainda o fato de eu não ser tão acossado por temores, mas muito mais pela
impaciência, e pela raiva, o que é uma grande distorção do que se esperaria ser a nossa situação
por habitarmos no Espírito Santo.
Sabedoria parou e voltou-se para mim.
— Você é um vaso terreno, e isso é tudo o que você sempre será enquanto estiver andando sobre
a terra. Entretanto, você pode me ver lá com a mesma clareza com que me vê aqui, se tão somente
olhar com os olhos do seu coração. Lá você poderá ficar tão perto de mim como qualquer outro que
esteja comigo, e ainda mais. Eu providenciei para que cada um possa ficar tão perto de mim
quanto verdadeiramente deseje. Se realmente você desejar ficar mais perto de mim do que até
mesmo Paulo, você poderá. Alguns vão desejar isso, e de tal forma que porão de lado qualquer
coisa que os impeça de ter intimidade comigo e de se entregarem totalmente a mim, e eles terão o
que estiverem buscando. Se você se dispuser a andar na terra da mesma maneira como você está
podendo andar comigo aqui, eu estarei tão perto de você lá como estou aqui agora. Se você me
buscar me encontrará. Se você se aproximar de mim, eu me aproximarei de você. É meu desejo
preparar-lhe uma mesa na presença dos seus adversários? 38 Isso não é apenas o meu desejo para
com os meus líderes, mas para com todos os que invocam o meu nome. Eu quero estar bem mais
perto de você, e também de todos os que me invocam, do que me foi possível estar com todos os
que já viveram. É você quem determina quão perto estaremos, um do outro, e não eu. Todos os que
me buscarem me encontrarão.
Sabedoria disse ainda:
— Você está aqui porque pediu o meu julgamento em sua vida. Você me buscou como Juiz e
agora está me achando. Mas não pense que porque você viu o meu trono de julgamento então
todos os seus julgamentos serão os meus julgamentos. Os meus juízos você apenas os terá à
medida em que andar em unidade comigo, e buscar a unção do meu Espírito. E isso pode ser
recebido ou perdido a cada dia. Eu deixei que visse anjos, e lhe dei muitos sonhos e visões, porque
você os vivia pedindo. Eu tenho grande prazer em dar aos meus filhos toda boa dádiva que eles
pedem.39 Por muitos anos você me pediu sabedoria, de forma que a está recebendo. Você me pediu
que o julgasse e é isso que está recebendo. Mas todas essas experiências não o tornam totalmente
sábio, nem um reto juiz. Você apenas terá sabedoria e juízo se habitar em mim. Nunca pare de me
buscar. Quanto mais você amadurecer, mais saberá da sua desesperadora necessidade de mim.
Quanto mais amadurecer, menos coisas procurará esconder, de mim e dos outros, de forma que
você poderá sempre andar na luz.
O Senhor disse também:
— Você me viu como Salvador, Senhor, Sabedoria e Juiz. Ao retornar para a batalha, ainda
poderá ver o meu trono de julgamento com os olhos do seu coração. Andando na verdade de saber
que tudo o que pensa e faz se acha totalmente revelado aqui, você terá a liberdade de viver lá da
mesma forma como vive aqui. É apenas quando você se esconde, de mim e dos outros, que os véus
voltam a esconder-me de você. Eu sou a Verdade, e os que me adoram têm de me adorar em
Espírito e em Verdade.40 A Verdade nunca é encontrada escondida nas trevas, mas sempre busca
permanecer na luz. A luz a expõe e a faz manifestar-se. Somente quando procurar ser exposto, e
permitir ser conhecido quem você é em seu coração, é que você andará na luz. como eu estou na
luz. A verdadeira comunhão comigo requer uma completa exposição. A comunhão com o meu povo
requer isso também.
Continuou ele:
— Quando você estava diante do trono do julgamento sentiu mais liberdade e segurança do que
nunca, porque não teve mais que se esconder. Você sentiu mais segurança porque sabia que os
meus julgamentos eram verdadeiros e justos. A ordem moral e espiritual do meu universo é assim
tão certa como é a ordem natural estabelecida sobre as leis naturais. Você confia na minha lei da
gravidade sem nem mesmo pensar nela. Você tem de aprender a confiar nos meus julgamentos da
mesma maneira. Meus critérios de justiça são imutáveis, e de igual modo seguros. Viver conforme
esta verdade é viver pela fé. A verdadeira fé consiste em ter confiança em quem eu sou.
O Poder e o Amor
Disse mais o Senhor:
— Você procura conhecer-me e andar em meu poder de modo a curar os enfermos e realizar
milagres, mas você ainda não começou nem a compreender o poder da minha palavra. Restaurar
todos os mortos que um dia viveram sobre a terra não será esforço algum para mim. Eu preservo
todas as coisas pelo poder da minha palavra. A criação existe por causa da minha palavra, e se
mantém unida pela minha palavra. Antes do fim, vou ter que revelar o meu poder sobre a terra.
Mesmo assim, o maior poder que já revelei sobre a terra, ou que ainda vou revelar, é ainda uma
pequena demonstração do meu poder. Eu não o revelo para fazer com que os homens creiam nele,
mas para que os homens creiam no meu amor. Se eu tivesse desejado salvar o mundo com o meu
poder quando eu andava na terra, eu poderia ter movido montanhas simplesmente apontando-lhes
o meu dedo. Então todos os homens teriam se inclinado diante de mim, mas não por me amarem,
ou por amarem a verdade, mas por temerem o meu poder. Eu não quero homens que me obedeçam
por temerem o meu poder, mas por me amarem, e por amarem a verdade. Prosseguiu ele:
— Se você não conhecer o meu amor, então o meu poder vai corrompê-lo. Não lhe dou amor
para que você possa conhecer o meu amor, mas dou-lhe poder para que você conheça o meu
amor. O alvo da sua vida tem de ser o amor, e não o poder. Então lhe darei o poder junto com o
amor. Eu lhe darei o poder para curar os enfermos porque você os ama, e eu os amo, e não
desejo que fiquem enfermos. Assim, você terá primeiro que amar, e depois ter fé. Você não
poderá agradar-me sem a fé. Mas a fé não é apenas ter conhecimento do meu poder, mas é o
conhecimento do meu amor e do poder do meu amor. A fé tem que primeiro ser para se ter amor.
Busque ter fé para amar mais, e para fazer mais com o seu amor. Somente quando você buscar
ter fé para amar é que poderei confiar-lhe a você o meu poder. A fé opera mediante o amor.
Disse ainda o Senhor:
— A minha palavra é o poder que preserva todas as coisas. Segundo o grau em que você crê que
a minha palavra é verdadeira, você poderá fazer todas as coisas. Aqueles que realmente crêem
que as minhas palavras são verdadeiras também serão verdadeiros com suas próprias palavras. É
da minha natureza ser verdadeiro, e a criação confia na minha palavra porque eu sou fiel a ela.
Aqueles, que são como eu, também são verdadeiros diante de suas próprias palavras. Sua palavra
é segura, e seus compromissos são dignos de confiança. O "sim" deles significa "sim", e o "não"
deles significa "não". Se as suas palavras não forem verdadeiras, você também passará a duvidar
das minhas palavras, por haver engano em seu coração. Se você não for fiel às suas próprias
palavras, é porque você realmente não me conhece. Para ter fé, você tem que ser fiel. Eu o chamei a
andar pela fé porque eu sou fiel. Esta é a minha natureza. Por causa das palavras descuidadas
que tenha falado é que você será julgado. Ser descuidado é não cuidar de alguma coisa. As pala-
vras têm poder, e os que não têm cuidado com as palavras não podem receber o poder da minha
palavra. É sábio ser cuidadoso com o que você fala, guardando as suas palavras tal como eu faço
com as minhas.
As palavras do Senhor me atingiram como enormes ondas do mar. Senti-me como Jó diante do
redemoinho.41 Senti-me como se ficasse menor e menor, e então descobri que o Senhor estava
ficando maior. Eu nunca tinha me sentido tão presunçoso. Como pude ser tão negligente para
com Deus? Senti-me como uma formiga que olhasse para cima, para uma cadeia de montanhas.
Eu era menos do que pó, e contudo ele estava gastando tempo falando comigo. Não dava para
agüentar, e assim me virei.
Depois de alguns momentos senti uma mão tranqüilizadora tocando em meus ombros. Era
Sabedoria. A sua glória estava agora ainda maior, mas ele tinha de novo a minha altura.
— Você entendeu o que acabou de acontecer? — perguntou ele.
Sabendo muito bem que quando o Senhor faz uma pergunta ele não está buscando uma
informação, fiquei então meditando nela. Sabia que tinha sido uma realidade o que acontecera.
Em comparação com ele eu sou menos do que uma pitada de pó é em relação à terra, e por
alguma razão ele quis que eu sentisse isso. Respondendo os meus pensamentos, ele então
completou:
— O que você está pensando é verdade, mas a comparação do homem com Deus não é apenas
em dimensões. Você começou a sentir o poder das minhas palavras. Quando eu confio minhas
palavras a alguém, estou revestindo essa pessoa com poder, com o mesmo poder pelo qual o
universo é mantido unido. Não fiz. isso para fazê-lo sentir-se pequeno, mas para ajudá-lo a
entender a seriedade e o poder do que lhe foi confiado: a palavra de Deus. Em todos os seus
esforços, lembre-se de que uma única palavra de Deus para o homem tem maior valor do que todos
os tesouros da terra. Você tem que compreender e ensinar aos meus irmãos a respeitarem o valor
da minha palavra. Você, como todos os que são chamados a levar as minhas palavras, tem
também de respeitar o valor das suas próprias palavras. Os portadores da verdade têm que ser
verdadeiros.
Há Perigo no Poder
Enquanto eu o ouvia, senti-me compelido a olhar para um dos tronos ao nosso lado.
Imediatamente vi um homem que reconheci. Ele tinha sido um grande evangelista quando eu era
criança, e muitos achavam que ninguém teria tido mais poder do que ele, desde o tempo da
igreja primitiva. Eu tinha lido a respeito dele, e cheguei a ouvir algumas de suas mensagens
gravadas. Era difícil deixar de ser tocado por sua genuína humildade, e pelo amor que ele
demonstrava ter pelo Senhor e pelas pessoas. Mesmo assim, eu tinha a impressão de que alguns
de seus ensinos tinham incorrido em sérios erros. Surpreendi-me por vê-lo, mas senti-me ao
mesmo tempo aliviado por estar ele sentado num grande trono. Fui captado pela humildade e
pelo amor que ele ainda exalava.
Ao voltar-me para o Senhor para perguntar-lhe se eu poderia falar com aquele homem, era
evidente o quanto o Senhor o amava. Entretanto, o Senhor não me permitiu falar com ele, mas
com um gesto me deu a entender que continuasse andando.
— Eu queria apenas que você o visse aqui, — explicou o Senhor — e que compreendesse a
posição que ele tem comigo. Há muitas coisas para você compreender ainda quanto a ele. Ele foi
um mensageiro para a minha igreja do último dia, mas a igreja não podia ouvi-lo por razões que
você terá de compreender no devido tempo. De fato ele passou por um período de desânimo e de
engano, e sua mensagem se distorceu. Ela tem de ser reparada, como também as partes que dei a
outros, que também foram distorcidas.
Eu sabia que tudo aqui acontecia na hora certa para que eu aprendesse tudo o que tinha que
aprender, e então considerei como o fato de ter visto aquele irmão se relacionaria com o que
tínhamos acabado de falar, ou seja, com o potencial que tem o poder para corromper.
— Sim. Há um grande perigo em andar com muito poder — respondeu o Senhor. — Isso
aconteceu com muitos de meus mensageiros, e isso é parte da mensagem que eles devem dar para
a minha igreja do último dia. É para você andar no meu poder, e num poder ainda maior do que
esses tiveram, mas se você pensar que o poder é sinal de que estou dando endosso a você, ou até
mesmo à sua mensagem, você estará abrindo a porta para esse mesmo engano. O Espírito Santo é
dado para testificar apenas de mim. Se você for sábio, como Paulo, você aprenderá a gloriar-se
mais na sua fraqueza do que nas suas forças. A verdadeira fé é o verdadeiro reconhecimento de
quem eu sou. Não é nada mais nem nada menos. Mas lembre-se sempre, mesmo habitando em
minha presença, mesmo vendo-me como eu sou, ainda assim você poderá cair, se você deixar de
olhar para mim e passar a olhar para si mesmo. Foi desse modo que Lúcifer caiu. Ele vivia aqui no
céu. Ele contemplou a minha glória e a glória do meu Pai. Entretanto, ele veio a olhar para si
mesmo mais do que ele olhava para nós. Ele passou a sentir-se orgulhoso pela sua posição e pelo
seu poder.42 Isso é o que tem acontecido a muitos de meus servos a quem foi dado ver a minha
glória, e que foram revestidos de poder. Se você pensar que é por causa da sua sabedoria, da sua
retidão, ou até mesmo por causa da sua dedicação à sã doutrina, então você tropeçará..
Eu sabia que esta era a advertência mais séria que eu tinha recebido, ou de que me falaram
aqui. Eu queria voltar para lutar a batalha final, mas estava considerando questões muito
importantes para poder lutar sem me deixar cair nas armadilhas que agora me pareciam estar
por toda parte. Voltei a olhar para o Senhor. Ele era Sabedoria, e então pensei como eu iria
necessitar muito dele como Sabedoria, quando retornasse para a batalha.
— É importante que você perca a confiança em si mesmo. Eu não posso confiar-lhe os poderes da
era futura se isso não acontecer. Quanto mais confiança em relação a si mesmo você perder, de
mais poder eu lhe poderei revestir, se...
Esperei por um bom tempo que o Senhor completasse o que ele dizia, mas ele não completou.
De alguma maneira ele queria que eu continuasse a sentença, mas eu não sabia o que dizer.
Entretanto, quanto mais eu olhava para ele, mais confiança eu sentia. Finalmente soube o que
dizer.
—... se eu puser toda a minha confiança em ti — acrescentei.
— Sim. Você tem que ter fé para fazer o que você é chamado a fazer, mas tem que ser fé em mim.
Não basta você apenas perder a confiança em si mesmo. Isso somente leva à insegurança, se você
não preencher o vazio com uma confiança em mim. Foi desse modo que muitos desses homens
caíram em engano. Muitos deles eram profetas. Mas alguns deles, por causa da insegurança, não
se deixaram ser chamados de profetas. Mas isso não era verdade, porque eles eram profetas.
Falsa humildade é também uma forma de engano. O inimigo, podendo enganá-los desse modo,
fazendo-os pensar que não são profetas, ele também poderá enganá-los fazendo-os pensar que
são profetas maiores do que na realidade são, e isso por simplesmente nutrir neles sua própria
autoconfiança. A falsa humildade não eliminará o orgulho. É apenas uma outra forma de
egocentrismo, que o inimigo tem então o direito de explorar.
E ele então concluiu:
— Todos os seus fracassos serão decorrentes de apenas uma coisa: do seu egocentrismo. O
único modo de se libertar disso é andar em amor. O amor não busca o que é seu.43
Ao pensar eu sobre tudo isso, uma maravilhosa clareza foi surgindo. Eu podia ver toda a
experiência por que passava, do princípio ao fim, tendo como foco esta única e simples men-
sagem.
— Com que facilidade eu me deixo enganar, desviando-me da simplicidade da devoção a ti —
lamentei.
Então o Senhor parou e olhou-me com uma expressão que peço a Deus que dela nunca venha
a esquecer. Ele sorriu. Neste momento eu não queria abusar, mas de alguma maneira senti que,
por ter ele sorrido daquele modo, eu poderia pedir-lhe qualquer coisa que ele me daria, e assim
aproveitei esta oportunidade.
— Senhor, quando disseste: "Haja luz", então houve luz. Tu oraste em João 17 para que nós o
amássemos com o mesmo amor que o Pai tinha para contigo. Será que o Senhor poderia dizer
para mim, agora, "que haja amor em você", de forma que assim eu venha a amar-te com o amor
do Pai?
Ele não parou de sorrir, mas pôs seu braço em minhas costas como um amigo.
— Isso eu disse para você antes da criação do mundo, quando o chamei. Disse a mesma coisa
também para os seus irmãos, com quem você vai lutar a batalha final. Você vai conhecer o amor do
meu Pai por mim. É um perfeito amor que eliminará todos os seus temores. Este amor vai capacitá-
lo a crer em mim de forma a lhe possibilitar fazer as obras que eu fiz, e obras ainda maiores,
porque eu estou com o meu Pai; e você conhecerá o amor do Pai para comigo, e as obras que você
poderá realizar me glorificarão. Mas, porque você me pediu, eu digo de novo: "que o amor do Pai
esteja em você".
Senti-me por demais gratificado pelo que me acabava de acontecer.
— Como aprecio os teus julgamentos — disse, ao mesmo tempo em que comecei a virar-me
para trás, querendo voltar a minha visão para o trono do julgamento. O Senhor, porém, me
barrou.
— Não olhe para trás. Para você eu não estou lá agora; estou aqui. Vou levá-lo de volta deste
lugar para o seu posto na batalha, mas não olhe para trás. Veja o meu trono de julgamento em seu
coração, porque é ali que ele se encontra agora.
"Da mesma forma que o Jardim, e que os tesouros da salvação..." — pensei comigo mesmo.
— Sim. Tudo que eu estou fazendo, estou fazendo em seu coração. É de onde fluem as correntes
de água viva.44 É ali que eu estou.
Ele então fez um gesto apontando-me, de forma que olhei para mim mesmo, puxando para trás
o manto da humildade. Fiquei pasmado com o que vi. A minha armadura continha a mesma
glória que o cercava. Rapidamente eu a cobri de novo com aquela capa.
— Também orei a meu Pai na noite anterior à minha crucificação, que a glória que eu tinha com
ele no princípio viesse para os meus, de forma a serem todos um.45 É a minha glória que traz. a
unidade. Quando você se unir com outros que me amam, a minha glória será aumentada. Quanto
mais a minha glória aumentar pela união entre todos os que me amam, mais o mundo verá que eu
fui enviado pelo Pai. Agora o mundo realmente saberá que vocês são meus discípulos por vocês me
amarem, e por amarem uns aos outros.
Fiquei olhando para ele, e então a minha confiança continuou a crescer. Era como se eu
estivesse sendo lavado em meu interior. Em pouco tempo senti-me pronto para fazer qualquer
coisa que ele me solicitasse.
— Há ainda mais uma pessoa com quem você terá de encontrar-se, antes de voltar para a
batalha — disse ele enquanto caminhávamos.
Enquanto andávamos, eu continuei maravilhado por ver como ele tinha ficado muito mais
glorioso do que bem pouco tempo antes.
— Toda vez que você me vê com os olhos do seu coração, a sua mente é renovada um pouco mais
— continuou ele. — Um dia você terá condições de estar na minha presença continuamente.
Quando isso acontecer, tudo o que você tiver aprendido por meio do meu Espírito lhe estará
totalmente disponível, e eu estarei pronto para servi-lo.
Eu podia ouvir tudo o que ele dizia, e compreendia tudo, mas eu estava tão tomado por sua
glória que não pude deixar de lhe perguntar:
— Senhor, por que tu estás tão mais glorioso agora do que das outras vezes em que tu
apareceste a mim como Sabedoria?
— Não fui eu que mudei, eu nunca mudo; mas foi você que mudou. Você mudou ao contemplar a
minha glória com um rosto sem véus. As situações pelas quais você tem passado removeram véus
da sua face, fazendo com que você me veja com mais clareza, mas nada os remove tão depressa
quanto ver o meu amor.
Continua...
(A seqüência desta visão é apresentada no livro: O Chamado para a batalha final, publicado por
esta mesma editora.)
Notas