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Doutor em História e membro do Conselho Curador da Fundação Astrojildo Pereira.
Nessa nova configuração política trata-se de, por meio das relações de força que
caracterizam a política, disputar a hegemonia na sociedade. Com isso, o tempo da
revolução se torna incompatível com o tempo da política. Enquanto o primeiro é
marcado por urgências, o segundo se alonga indefinidamente e constrói um novo
significado de ruptura, marcado pela ideia de que as transformações históricas devem
ocorrer a partir de consensos pactuados politicamente no interior de uma moldura
democrática. Por isso, Aggio afirma que “sem conseguir traduzir o seu projeto numa
grande criação em que o novo nascesse, de fato, da particularidade chilena que havia
possibilitado a existência daquela experiência, e sem formular uma nova noção de
tempo político na construção do socialismo, o que implicava uma nova noção de ruptura
– pactada e reformadora –, a via chilena apenas conseguiu anunciar-se como uma via
democrática”.
Diante disso, precisamos refletir em torno dos significados dessa experiência
para a política contemporânea. Não revisitamos a “experiência chilena” para perscrutar
seus fracassos ou mesmo para reconstruir a oportunidade perdida para a construção do
socialismo no século XXI. Distante de qualquer perspectiva socialista, a via chilena
dialoga com o nosso tempo na medida em que marca um ponto de inflexão que aponta a
necessidade de abandono das expectativas revolucionárias e um redirecionamento das
políticas de esquerda para o enfrentamento da democracia enquanto perspectiva
civilizacional capaz de garantir transformações históricas sem a perda das liberdades e
das individualidades.
Cinco décadas após, o desafio apontado por Aggio na via chilena, marco da
história da política democrática das esquerdas de hoje, ainda nos pertence. Para o
presente, marcado pela ascensão de discursos autoritários e de perspectivas anti-
políticas, considerar o tempo da política significa abandonar o sentido de ruptura como
um momento condensado no tempo e, ao mesmo tempo, compreender que o
enfrentamento desse desafio civilizacional ocorre em uma temporalidade alongada e
multidirecional, na qual, devemos produzir os caminhos a partir dos dilemas do
presente.