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Curso: Filosofia

Disciplina: Ética
Acadêmica: Nathalia Claro
Professor Amir Abdala

Atividade 3

O filósofo alemão Hans Jonas (1903-1993), em seu livro O princípio


responsabilidade, alerta para a necessidade de mudanças na filosofia moral
contemporânea. Explique as considerações desse filósofo acerca da técnica antiga e da
técnica moderna – suas diferenças sob o ponto de vista das relações entre seres humanos
e Natureza – e das implicações da tecnologia para as reflexões éticas atuais.

Herdeiro da filosofia de Martin Heidegger, o filósofo judeu Hans Jonas deu


continuidade a crítica heideggeriana à técnica moderna, abordando-a com a finalidade
de reelaborar a filosofia moral contemporânea. Em sua obra O princípio
responsabilidade: ensaio de uma ética para a civilização tecnológica, Hans Jonas
retomou a crítica à técnica moderna a partir do imperativo categórico de Immanuel
Kant, buscando readequar a ética a sua época, visto a condição excepcional da
humanidade em meio a emergência da era da maquinação. Para Jonas, o homem deveria
redefinir a ética segundo a responsabilidade, em face dos perigos que os avanços da
ciência têm gerado ao ecossistema e ao futuro do homem de modo geral.
Não obstante, o autor inicia seu livro com um trecho de Antígona, peça trágica
de Sófocles. O trecho em questão é um cântico do coral que aborda, metaforicamente, o
avanço do homem e de sua tecnologia contra a Natureza. “(...) Com seu engenho ele
amansa, igualmente o animal agreste que corre livre pelos montes, bem como o dócil
cavalo, em cuja nuca ele assentará o jugo, e o infatigável touro das montanhas”
(JONAS, 2006, p. 31). Conforme Jonas, o trecho narra a irrupção do poder humano
contra a ordem cósmica, sua invasão atrevida aos domínios da Natureza. Porém, apesar
de seu atrevimento, Jonas observa que o homem, na época dos antigos gregos, era ainda
imensuravelmente pequeno diante da Natureza, embora a aparente grandiosidade de
seus engenhos. A Natureza era sim explorada, mas tal exploração era superficial e, em
certa medida, impotente. Por isso mesmo o mote central do referido cântico de
Antígona era que, apesar dos avanços do homem, a Natureza possuía uma força
geradora que não se constrangia, mas que permanecia exatamente a mesma, enquanto o
homem era efêmero, determinado por sua finitude ontológica.
Na era da maquinação, o homem continua efêmero, mas a diferença é que a
Natureza também tem se curvado diante da destruição. Se antes a intervenção do
homem na Natureza ocorria no interior do enclave humano, servindo para lhe conceder
o básico para sua existência, hoje o mundo orgânico e inorgânico é interferido com toda
a potência da mais avançada ciência. Ora, conseguimos alcançar o núcleo do átomo e
transformar sua energia em força destrutiva a partir da reação nuclear. Com a gradativa
queima de combustíveis fosseis, nós rompemos as naturais camadas de ozônio da
estratosfera, e a tendência é que os respectivos buracos se expandam, desregulando os
filtros solares sobre a Terra.
Conforme Jonas, a intervenção na Natureza mudou à medida que os horizontes
de expectativa humana se alteraram. Uma vez que as cidades, o ápice das obras
humanas, jamais tiveram uma permanência de longo prazo, os homens precisaram
reinventá-las à medida que o próprio homem, com suas naturais características
existenciais de acaso, sorte e estupidez, promoveu guerras, prosperou, degenerou,
descobriu novos lugares para habitar, buscou desviar de desastres naturais, e etc.
Diante desta cidadela onde tudo se transforma para o usufruto do homem, a
Natureza não pode mais cuidar de si mesma como fazia antes. Por isso, Jonas observa
que a cidade “(...) forma o domínio completo e único da responsabilidade humana”
(JONAS, 2006, p. 34). Essa responsabilidade precisa ser estendida a Natureza, e a
cidade humana deve ser berço do matrimônio entre a inteligência e a moralidade para a
preservação de sua espécie e do ambiente natural.
Para ilustrar as mudanças que ocorreram na relação do homem com a Natureza,
Jonas observa que, na época dos antigos gregos, o domínio da techné era eticamente
neutro. Logo que a arte, entendida aqui como a manipulação do homem da Natureza
para a criação, “(...) só afetava superficialmente a Natureza das coisas, que se
preservava como tal, de modo que não se colocava em absoluto a questão de um dano
duradouro a integridade do objeto e da ordem natural em seu conjunto (...)” (JONAS,
2006, p. 35). A techné, conforme o autor, era um atributo de necessidade e não era
percebida em razão do progresso, pois a humanidade não figurava um projeto
porvindouro. Não se pensava no “futuro da humanidade”, e, caso se refletisse sobre o
porvir, o futuro refletido não possuía uma longa temporalidade e, tampouco possuía os
aspectos futurísticos calcados em um estrondoso avanço tecnológico, tal como se tem
hoje. O futuro era uma miríade de pequeno alcance na antiguidade, pois “(...) o intervalo
de previsão, definição de objetivo e imputabilidade era curto (...)” (JONAS, 2006, p.
36). O porvir, portanto, era de responsabilidade do acaso ou da providência divina.
Deste modo, entre os antigos gregos, não havia necessidade de se elaborar uma
ética que contemplasse a Natureza, e, portanto, toda a ética tradicional se voltou para a
relação do homem com o próprio homem (antropocêntrica). Conforme Jonas, o universo
moral da ética tradicional consistia “(...) nos contemporâneos, e o seu horizonte futuro
limita-se a extensão previsível do tempo de suas vidas” (JONAS, 2006, p. 36). O autor
denota que Kant foi o filósofo que mais avançou na questão moral ao dizer que a
moralidade se situa no âmbito da ação e pode ser alcançada por todos a partir da boa
vontade. Mas, ainda assim, denota Jonas, Kanr pecou pela generalidade de sua ética.
Conforme Jonas, a ética precisa estar fundada no presente, exigindo um conhecimento
sobre o “aqui e agora”, e este é inteiramente não-teórico.
O fato de a técnica moderna ter introduzido uma ordem inédita de grandeza, a
ética antiga não consegue ser suficiente em nossa época. Neste sentido, Jonas aborda a
questão da solidariedade humana com o mundo orgânico. Para o autor, tal solidariedade
é um dever, um imperativo categórico, e não uma opção, uma vez que o avanço da
tecnologia fez emergir seu potencial de destruição e, para que haja a preservação da
espécie humana, é mister que haja a preservação da biosfera. Deste modo, o filósofo
aponta que o dever para com o homem não se reduz mais a um antropocentrismo, logo
que o homem é inteiramente dependente da Natureza e não somente de seus pares. “Em
uma perspectiva verdadeiramente humana, a Natureza conserva sua dignidade, que se
contrapõe ao arbítrio de nosso poder. Na medida em que ela nos gerou, devemos
fidelidade à totalidade de sua criação” (JONAS, 2006, p. 93).

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