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Enfrentamento à violência

doméstica e familiar contra

Mulher GRATUITA
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não pode ser
comercializada

4
Políticas
e diretrizes
nacionais para
investigar,
processar
e julgar
LUANNA MARLEY
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CURSO ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER


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Ilustrador

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Produtora
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Analista de Marketing

Este fascículo é parte integrante do Projeto “Programa de Enfrentamento à Violência Doméstica


e Familiar Contra a Mulher”, em atendimento do Contrato Nº 74/2020 firmado entre a Fundação
Demócrito Rocha e a Assembleia Legislativa do Estado do Ceará e do Termo de Fomento Nº 02/2020
firmado entre Fundação Demócrito Rocha e Câmara Municipal de Fortaleza.

Todos os direitos desta edição reservados à:

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SUMÁRIO
1. Introdução 52
2. Proteção Internacional dos Direitos Humanos das Mulheres 54
3. Investigar, processar e julgar com a perspectiva de
58
gênero as mortes violentas de mulheres no Brasil
4. A perspectiva de gênero e o papel do sistema de justiça 62
Referências 63
1
INTRODUÇÃO

E
stereótipos discriminatórios de
gênero no sistema de justiça ain-
da é um dos obstáculos que, mui-
tas vezes, mulheres sobreviven-
tes, familiares das vítimas de feminicídio
e outros crimes violentos contra as mulhe-
res enfrentam no cotidiano do sistema de
justiça. Esses estereótipos criam e refor-
çam, no imaginário social, como deve ser
o comportamento de homens e mulheres
e os papéis sociais que devem desenvol-
ver na sociedade. São criadas hierarquias
sociais de sexo/gênero, tendo como resul-
tado as desigualdades.
Além disso, os dados sobre violência
contra a mulher têm demonstrado que
há um entrelaçamento complexo dos
marcadores sociais da diferença, como
raça, classe e sexualidade que se imbricam
na produção de discriminações, opres-
sões e violências. Por isso, toda e qualquer
proposta de políticas públicas ou projeto
emancipatório para as mulheres, de de-

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fesa da vida e de seus direitos, precisa in-
corporar, simultaneamente, a interseccio-
nalidade, com o objetivo de dimensionar
os obstáculos à participação efetiva e de-
mocrática, no acesso a serviços e garantias
de direitos humanos. O entendimento da
diversidade das mulheres e suas experiên-
cias é primordial, porque evita a nulidade
de questões essenciais à compreensão
dos processos históricos de dominação e
constituição das vulnerabilidades sociais,
econômicas e políticas, e como esses pro-
cessos definem a preservação da vida, ao públicas de garantias e proteção de direitos,
mesmo tempo as violências contra as mu- como o acesso ao sistema de justiça, em
lheres, cis e trans, e o feminicídio. todas as suas fases, e com atuação na pers-

PARA No âmbito do sistema de justiça, histori-


camente, observamos inúmeras decisões
pectiva de gênero de todos os atores envol-
vidos – da investigação ao julgamento.
REFLETIR judiciais que reforçaram discriminações Neste módulo, conheceremos os mar-
contra as mulheres, como casos de vio- cos normativos internacionais e nacio-
Com base em estereótipos é que lência doméstica, estupro ou morte vio- nais de proteção aos direitos humanos
as mulheres, frequentemente, são lenta por razão de gênero, resultando em das mulheres e mostraremos os desa-
retratadas como uma espécie de uma não responsabilização do agressor. fios de implementação desses norma-
“categoria suspeita” por parte das Tem como consequência uma legitimação tivos. No percurso, daremos uma atenção
autoridades públicas: as crenças de injustiças e o não reconhecimento da especial ao Modelo de Protocolo Latino-
de que as mulheres exageram dignidade humana das mulheres, sejam -Americano para Investigação de Mortes
nos relatos sobre violência ou elas vítimas letais, sejam sobreviventes. Violentas de Mulheres (femicídios/femi-
mentem, de que utilizam o direito Quantos homens que estupraram nicídios) e as Diretrizes Nacionais para
por motivo de vingança ou para mulheres ou as agrediram não foram res- Investigar, Processar e Julgar com Pers-
obter vantagem indevida, de que ponsabilizados porque alegaram “legíti- pectiva de Gênero as Mortes Violentas de
são corresponsáveis pelos crimes ma defesa da honra”, “ciúme”/“crime Mulheres (feminicídios) no Brasil.
sexuais em razão de vestimenta ou passional”? Quantas mulheres não foram Esses documentos trazem importantes
conduta inadequada, por exemplo, ouvidas ao relatarem situações de violên- diretrizes e recomendações com a perspec-
são, muitas vezes, levadas em cia? Quantas foram consideradas culpadas tiva de gênero, voltadas aos atores que atu-
consideração em maior medida do por terem sido vítimas de violência, até por am no sistema de justiça, quanto ao acesso
que os princípios constitucionais sua morte pelo companheiro, cônjuge ou à justiça, à investigação, ao processo e ao
como isonomia, boa-fé, devido namorado? A garantia dos direitos humanos julgamento de morte violenta de mulheres
processo legal, ampla defesa na das mulheres e pela eliminação das violên- por razão de gênero, uma vez que é obri-
análise das provas processuais e cias perpassa por um devido acolhimento e gação dos Estados (países), dentre eles o
na elaboração da decisão judicial. acesso à justiça. Quando falamos de acesso Brasil, a eliminação das discriminações e
(SEVERI, 2016, p. 576) à justiça, referimo-nos ao acesso às políticas violências contra as mulheres.

ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA MULHER 53


Com a Convenção de Belém do Pará, di-
versos países da América Latina passaram
a reforçar suas legislações e medidas volta-
das para fazer cessarem as violências de gê-
nero e morte violentas por razão de gênero.
Constituindo-se uma obrigação a ser imple-
mentada de imediato pelos Estados, esses
devem agir em prevenção, investigação,
punição e na devida reparação em casos
de violência contra a mulher e em violações
perpetradas por atores estatais.

2
Os Estados devem empenhar-se, dentre
outros, a: i) adotar medidas jurídicas que
exijam do agressor que se abstenha de per-
seguir, intimidar e ameaçar a mulher; de fa-
zer uso de qualquer método que danifique
ou ponha em perigo sua vida ou integrida-
de; ou danifique sua propriedade; ii) tomar
todas as medidas adequadas, inclusi-
ve legislativas, para modificar ou abolir

PROTEÇÃO INTERNACIONAL
leis e regulamentos vigentes; ou modificar
práticas jurídicas ou consuetudinárias que

DOS DIREITOS HUMANOS


respaldem a persistência e a tolerância da
violência contra a mulher; iii) estabelecer
procedimentos jurídicos justos e efica-
DAS MULHERES zes para a mulher sujeitada a violência,

A
inclusive, entre outros, medidas de prote-
discussão sobre os direitos hu- sembleia Geral das Nações Unidas, deno- ção, juízo oportuno e efetivo acesso a tais
manos das mulheres e a ne- minada Convenção pela Eliminação de processos; iv) estabelecer mecanismos
cessidade do enfrentamento à todas as formas de discriminação con- judiciais e administrativos necessários
violência contra as mulheres tra as mulheres (Cedaw). O Brasil ratifi- para assegurar que a mulher sujeitada à
compõe uma agenda global, uma vez cou a Cedaw em 1984. violência tenha efetivo acesso a restituição,
que, como já reconhecido pelas Organiza- Outro importante instrumento inter- reparação do dano e outros meios de com-
ções das Nações Unidas (ONU), essas vio- nacional é a Convenção Interamericana pensação justos e eficazes (artigo 7).
lências e desigualdades se constituem um para Prevenir, Punir e Erradicar a Vio- Nesse sentido, o dever de agir do Esta-
fenômeno social preocupante no âmbito lência contra a Mulher (Convenção de Be- do, o acesso à justiça, a igualdade e a não
mundial. Os textos normativos e protoco- lém do Pará), adotada durante a Assembleia discriminação – considerando as intersec-
los que se inserem no âmbito da ONU e Geral das Organizações dos Estados Ameri- cionalidades de raça, cor, etnia, origem,
das Organizações dos Estados America- canos (OEA) ocorrida na cidade de Belém idade, território, religião, idioma, deficiên-
nos (OEA) representam a urgência de po- do Pará, no Brasil, em 1994. Conforme a cia, classe social, orientação sexual, iden-
líticas públicas de igualdade (equidade) Convenção de Belém do Pará, entende-se tidade de gênero, dentre outras, reconhe-
de gênero no mundo, a serem assumidos por violência contra a mulher “qualquer ato cendo, portanto, as diversas experiências e
pelos Estados (países). ou conduta baseada no gênero que cause vivências das mulheres – são os principais
O primeiro tratado internacional que morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou compromissos que devem ser assumido
aborda de forma ampla os direitos das psicológico à mulher, tanto na esfera públi- pelos Estados, trazidos por ambos os do-
mulheres foi adotado em 1979 pela As- ca como na esfera privada” (artigo 1). cumentos (Cedaw e Convenção de Belém).

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2.1 A NECESSIDADE DE UM
MODELO DE PROTOCOLO
PARA A INVESTIGAÇÃO E A
PERSECUÇÃO PENAL NOS
CASOS DE FEMINICÍDIO
Diante da adoção das Convenção de
Belém do Pará e da Convenção para a
Eliminação de Todas as Formas de Dis-
criminação contra a Mulher, a devida
implementação de políticas públicas de
proteção e acesso à justiça ainda se confi-
gura como um desafio. A comunidade inter-
nacional e movimentos de mulheres e femi-
nistas vêm, ao longo dos anos, chamando
atenção para os dados alarmantes quanto
às diversas formas de violência e mortes de
mulheres por razão de gênero.
Dentre os obstáculos, encontra-se a não
adoção da perspectiva de gênero nos
procedimentos de investigação, proces-
so e julgamento de crimes de mortes de
mulheres, consumadas ou tentadas, por
razão de gênero. Nesse sentido, atendendo
ao apelo das Nações Unidas para o Desen-
volvimento de recomendações que pudes-
sem orientar e contribuir para uma mudança
cultural na atuação dos atores do sistema de
justiça (polícia, Ministério Público, Tribunais,
Defensorias), e com respostas que resul-
tassem em igualdade e justiça às mulheres
vítimas e sobreviventes, foi elaborado o Mo-
delo de Protocolo Latino-Americano para
Investigação de Mortes Violentas de Mu-
lheres (femicídios/feminicídios).

ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA MULHER 55


O Modelo de Protocolo Latino-America-
SAIBA MAIS
no se baseia em normas e parâmetros in-
Conheça os objetivos do Modelo de
ternacionais e representa uma importante
Protocolo Latino-Americano:
contribuição com uma abordagem jurídica
sobre como investigar as mortes violentas • Proporcionar orientações
de mulheres em razão do gênero (o femini- gerais e linhas de atuação
cídio). Tem como principal objetivo: para melhorar a prática dos/
[...] proporcionar orientações e linhas de
as operadores/as de justiça,
atuação para melhorar a prática do(a)s peritos forenses ou qualquer
operadore(a)s de justiça, especialistas fo- pessoal especializado durante
renses ou qualquer pessoal especializado a investigação e o julgamento
– que intervenham na cena do crime, no das mortes violentas de
laboratório forense, no interrogatório de
mulheres por razões de
testemunhas e supostos responsáveis, na
análise do caso, na formulação da acusa- gênero, com vistas a que se
ção, ou ante os tribunais de justiça (MODE- punam os responsáveis e se
LO DE PROTOCOLO, §11, 2014, p. 9). reparem as vítimas.
O Modelo de Protocolo é resultado da • Promover a incorporação
colaboração entre o Escritório do Alto Comis- da perspectiva de gênero
sariado das Nações Unidas para os Direitos na atuação das instituições
Humanos (Acnudh) e a Entidade das Nações encarregadas da investigação,
Unidas para a Igualdade de Gênero e o Empo- punição e reparação das
deramento das Mulheres (ONU Mulheres), no mortes violentas de mulheres,
âmbito da Campanha UNA-SE pelo fim da como é o caso da polícia,
violência contra as mulheres, do secretário- do Ministério Público, das
-geral. É um documento didático, tendo como instituições forenses e outros
metodologia a perspectiva de gênero, abor- órgãos judiciais.
dando questões individuais, institucionais e • Oferecer ferramentas
estruturais presentes durante uma investiga- práticas para garantir os
ção e persecução penal nos casos de mortes direitos das vítimas, dos/
violentas de mulheres por razão de gênero. as sobreviventes e seus
São diversas as irregularidades bem familiares. Essas ferramentas
como omissões identificadas por instituições levam em consideração as
internacionais quanto a investigações e pro- testemunhas, os/as peritos/
cessos judiciais em casos de violência contra as, as organizações, os/as
a mulher, especialmente quando se trata de querelantes, e demais pessoas
mortes violentas por razões de gênero: intervindo nesses processos.

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• a utilização, pelos/as operadores/as
judiciais, de preconceitos, estereótipos
e práticas que impedem, entre outros
fatores, o exercício dos direitos à
justiça e à reparação, por parte das 2.2 CONHECENDO O MODELO
mulheres vítimas de violência;
• as demoras em dar início DE PROTOCOLO LATINO-AMERICANO
às investigações; O Modelo de Protocolo Latino-Americano um mecanismo de prevenção à violência
• a lentidão das investigações dispõe de diretrizes a serem seguidas contra as mulheres. Por isso a necessida-
ou a inatividade nos expedientes; pelos Estados-Nações. As diretrizes vol- de do aprimoramento da atuação das ins-
• as negligências e irregularidades tadas ao aprimoramento das investiga- tituições que atuam na justiça criminal, por
na coleta e no manuseio das provas ções e processos judiciais relacionados às meio de protocolos específicos voltados
e na identificação das vítimas mortes violentas de mulheres por razão aos aspectos de gênero. Isso quer dizer que
e dos responsáveis; de gênero (femicídio/feminicídio) foram é preciso racionalizar a investigação, o pro-
elaboradas considerando e reforçando cessamento e o julgamento de um feminicí-
• a gestão das investigações
as obrigações que os países assumiram dio, considerando as questões de gênero e
por autoridades que não são
quanto às garantias e às proteções dos reconhecendo que se trata se uma violência
competentes e imparciais;
direitos humanos das mulheres e pela letal contra a mulher por razão de gênero.
• a ênfase exclusiva na prova eliminação de toda e qualquer forma de Em geral, quando modelos de protocolos
física e testemunhal; violência e discriminação. (ou manuais) internacionais são elaborados
• a pouca credibilidade conferida Uma compreensão importante é que, por diversos organismos, instituições e espe-
às declarações das vítimas quando as diversas instituições do sistema cialistas, tem-se como propósito desenvolver
e seus familiares; de justiça – como Ministério Público, polícia, orientações que possam, sobretudo na práti-
• o trato inadequado das vítimas judiciário, defesa, equipes psicossociais – de- ca, contribuir para a consolidação da aplica-
e seus familiares quando procuram senvolvem e garantem protocolos baseados ção de princípios e normativas de direitos hu-
colaborar com a investigação na perspectiva de gênero, tornam-se possí- manos a partir da implementação de políticas
dos fatos; veis a memória e a justiça (responsabili- públicas por parte dos Estados. Não são mo-
• a perda de informação; zação e reparação) para as mulheres víti- delos de protocolos impositivos ou inflexíveis,
mas da violência e suas famílias. mas sempre adaptáveis à realidade de cada
• o extravio de partes dos corpos
A ruptura de maus-tratos, abusos e violên- país. Entretanto, é fundamental que a interpre-
das vítimas sob a custódia do
cias contra as mulheres exige a implementa- tação de suas diretrizes considere os parâme-
Ministério Público;
ção de políticas públicas que sejam eficazes tros, jurisprudências e interpretações interna-
• a ausência de análise das agressões nas mais diversas áreas, como cultura, edu- cionais das normas de direitos humanos.
contra mulheres como parte de um cação, saúde, segurança pública, assistência O Modelo de Protocolo não tem como
fenômeno global de violência de gênero. social, dentre outras, como mecanismos de proposta substituir manuais e protoco-
(Modelo de Protocolo, 2014, p. 8) prevenção às violências. As diversas formas los já existentes, mas trazer parâmetros, a
de violências contra as mulheres – a violência partir de diretrizes e orientações, para que
Portanto, para que as investigações e a doméstica e familiar, a violência sexual e o fe- os países, considerando suas realidades
devida justiça quanto ao enfrentamento às minicídio (expressão letal da violência) – im- sociais, seu tipo de judiciário e sua política
violências contra as mulheres, particularmen- plicam o acionamento do sistema de justiça de justiça criminal, possam aprimorar a in-
te nos casos de feminicídio, concretizem-se, para a responsabilização do agressor. vestigação e a persecução penal a partir da
é necessário que os diversos obstáculos e É na responsabilização do agressor perspectiva de gênero, nos casos de mortes
irregularidades observados sejam superados. perante a justiça que vamos encontrar mais violentas de mulheres.

ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA MULHER 57


PARA
REFLETIR
As políticas públicas e políticas judiciárias
devem levar em consideração as

3
interseccionalidades, ou seja, reconhecer que
as violências contra as mulheres também são
distintas, uma vez que há especificidades a
serem observadas: quando as mulheres são
negras, pobres, lésbicas, meninas, jovens,
adultas ou idosas, com ou sem deficiência.

INVESTIGAR, PROCESSAR
E JULGAR COM A usam como estratégia a sistematização
de notícias sobre a morte das mulheres,

PERSPECTIVA DE GÊNERO a verificação das circunstâncias e o con-


texto em que ocorreram bem como outros

AS MORTES VIOLENTAS marcadores sociais, como raça, classe e


idade. A busca por informações em órgãos

DE MULHERES NO BRASIL
policiais, judiciários, Instituto Médico Legal,
Defensorias Públicas e Ministérios Públicos

Q
também tem feito parte desses esforços. Po-
uantos crimes violentos contra tica brasileira, a necessidade do enfrenta- rém o uso de diferentes fontes de informa-
as mulheres em razão de gênero mento a essas violências, demonstrando ções pode gerar uma série de fragilidades
chegam a julgamento? Quais são que o ciclo de violências vivenciado pelas nos dados e, principalmente, uma subnotifi-
as decisões em relação a esses mulheres pode levá-las à morte. cação dos registros. Isso quer dizer que cada
tipos de crimes? Qual é o contexto em que Nomear a violência contra as mulhe- órgão sistematiza seus dados de forma dife-
as mulheres vítimas de feminicídio são mor- res e denunciá-la têm significado a des- rente e a partir da sua compreensão e atua-
tas? Essas questões têm se apresentado, ao naturalização da ideia de que “a violência ção, inclusive técnica e metodológica, resul-
longo dos anos, como desafios a serem en- doméstica é algo do âmbito privado e por tando em dados duplicados e nos inúmeros
frentados pelo sistema de justiça, no que diz isso ‘ninguém mete a colher’”. As denúncias casos que não são devidamente registrados.
respeito à violência letal de mulheres. também trazem consigo a necessidade de Mas qual é a importância de dados
No Brasil, nomear a violência contra as se conhecer melhor o fenômeno da violên- oficiais? Qual é a importância do julga-
mulheres, dentre elas a violência domésti- cia a fim de combatê-la, tanto no âmbito mento considerando a perspectiva de gê-
ca e familiar, tem sido um dos passos fun- público como no privado, exigindo a produ- nero? Conhecer os dados estatísticos, bem
damentais para pautar as instituições ção de dados oficiais sobre as violências e como dados qualitativos que permitam
públicas quanto à gravidade dessas as violações dos direitos das mulheres. compreender as questões estruturantes da
violências e à importância de uma com- Ao longo da história, têm ocorrido es- sociedade e o contexto de violência con-
preensão e atuação a partir da perspec- forços por parte de universidades, a partir tra as mulheres, permite a identificação de
tiva de gênero nos processos judiciais. A de grupos de pesquisa, organismos inter- elementos para a elaboração e implemen-
Lei nº 11.340 de 2006 (Lei Maria da Penha) nacionais e movimentos feministas, de sis- tação de políticas públicas voltadas à elimi-
se configurou como um dos passos funda- tematização de dados e informações sobre nação da discriminação e qualquer forma
mentais e que posiciona, na agenda polí- os feminicídios no Brasil. Muitas pesquisas de violência contra as mulheres.

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3.1 AS DIRETRIZES NACIONAIS PARA
INVESTIGAR, PROCESSAR E JULGAR COM
PERSPECTIVA DE GÊNERO AS MORTES
VIOLENTAS DE MULHERES (FEMINICÍDIOS)
As Diretrizes Nacionais se constituem quanto à razão de gênero que possa ter mo-
como um importante marco para a in- tivado o crime, seja ele na forma tentada,
cidência e a mudança de paradigmas seja na forma consumada.
na justiça criminal, uma vez que uma Sobre as características dessas mortes,
“mudança de olhar”, considerando gê- deve-se observar os contextos, as circuns-
nero e as interseccionalidades sobre a tâncias e a forma como o crime foi praticado:
vítima, as circunstâncias de crime, as re-
• Quanto aos contextos: “Envolvem
lações de poder existentes e o contexto
o ambiente privado e se referem
em que ocorre o feminicídio, é necessária
à violência doméstica e familiar,
para a efetivação dos direitos da vítima,
conforme definida na Lei 11.340/2006,
sua memória e a responsabilização (con-
mas não se restringem a esses
denação) de quem cometeu o crime.
espaços podendo ocorrer também nos
Conforme exposto no documento, o ob-
espaços públicos, inclusive em áreas
jetivo das Diretrizes Nacionais
dominadas pelo crime organizado
[...] é reconhecer que, em contextos e (narcotráfico, quadrilhas ou máfias).”
circunstâncias particulares, as desigualdades
de poder estruturantes das relações de
• Quanto às circunstâncias: “Incluem a
gênero contribuem para aumentar a violência nas relações familiares, mas
vulnerabilidade e o risco que resultam também aquelas situações de maior
nessas mortes e, a partir disso, aprimorar a vulnerabilidade como a exploração
resposta do Estado, em conformidade com sexual, o tráfico de mulheres e a
as obrigações nacionais e internacionais
presença do crime organizado.”
assumidas pelo governo brasileiro. (DIRETRI-
ZES NACIONAIS, 2014, p. 15) • Quanto às formas de violência:
“Geralmente envolvem a imposição
As diferentes experiências do ser
de um sofrimento adicional para as
mulher devem ser consideradas. As
vítimas, tais como a violência sexual, o
mulheres negras têm experiências distin-
cárcere privado, o emprego de tortura,
tas de mulheres brancas, como as mulhe-
o uso de meio cruel ou degradante, a
res lésbicas, indígenas, quilombolas, com
mutilação ou desfiguração das partes
deficiência, mulheres transexuais, dentre
do corpo associadas à feminilidade
outras. Esses fatores vão influenciar, dire-
e ao feminino (rosto, seios, ventre,
tamente, nos números de mortes, nas cir-
órgãos sexuais).”
cunstâncias e nos contextos. Considerar a
complexidade existente nas vivências das Diretrizes Nacionais, 2014, p. 16
mulheres é fundamental para alcançar As Diretrizes Nacionais são voltadas às
equidade e justiça. instituições que realizam a investigação,
Quanto aos crimes, destaca-se que as processam e julgam as mortes de mu-
Diretrizes Nacionais são voltadas para os lheres,, como: instituições de segurança
crimes de feminicídio, mas também serão pública – polícias civis, polícias militares,
aplicadas às mortes de mulheres com indí- órgãos de perícias criminais e de medicina
cios de violência, buscando-se evidências legal –, ministérios públicos, defensorias

ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA MULHER 59


públicas e poder judiciário. Há também
recomendações para os serviços de saúde,
em especial os profissionais que realizam o
socorro imediato, a partir da preocupação
em coletar vestígios e indícios, com a sua
devida preservação. Os direitos das vítimas
e as formas de apoio aos familiares das ví-
timas e às testemunhas compõem os pro-
cedimentos e diretrizes a serem adotados.
a) Qual é a importância de haver
diretrizes e orientações para investigar,
processar e julgar com a perspectiva de
gênero as mortes violentas de mulheres?
As diretrizes surgem de preocupações histó-
ricas, em que deparamos com um cenário
brasileiro de profundas violências contra as
mulheres, resultando na sua expressão mais
grave, que é a morte. Por ter características
que envolvem a condição feminina (por ser PARA
mulher), o ódio e a discriminação contra as REFLETIR
mulheres, a ideia das mulheres como pro- Por que incorporar a perspectiva de gênero?
priedade, gerando uma desigualdade de
A investigação da violência contra mulheres
poder e acesso a direitos, podemos afirmar
desprovida de estereótipos e preconceitos
que as motivações de um crime violento
discriminatórios não só responde às
contra as mulheres se baseiam no gênero.
exigências legais como também prepara
Os crimes como latrocínio ou homicídio
o caminho para a construção de uma
seguem linhas de investigação geral, inse-
sociedade mais justa e equitativa.
rida no contexto da violência urbana, por
exemplo. Quando deparamos com mulheres Incorporar uma perspectiva de gênero na
assassinadas, e muitas vezes são torturadas, investigação penal ajuda a evitar que a
estupradas ou vêm de um ciclo de violência violência cometida no âmbito privado ou
doméstica e familiar, as circunstâncias, as público seja seguida por uma posterior
formas e os contextos não são os mesmos violência institucional.
dos demais tipos penais. Há uma razão de (Modelo de Protocolo, 2014)

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gênero, uma motivação baseada no ódio à
mulher (ao feminino) e ao que aquele corpo/
performance representa para o agressor.
Para uma investigação e julgamento
terem resultados efetivos, nos casos de fe-
minicídio tentado ou consumado, o olhar,
a análise e a atuação devem considerar
as características presentes para um cor-
reto enquadramento. Conforme a Lei nº
13.104/2015, a violência praticada no âm-
bito doméstico e familiar ou o menosprezo
e a discriminação à condição de mulher Diversas são as questões a serem obser-
são elementos que caracterizam a morte vadas ao se investigar e julgar o feminicídio.
como feminicídio. Nesse sentido, são recomendadas as se-
É importante lembrar que nem todas guintes questões:
as mortes de mulheres são feminicí- a. Uma abordagem integral: é ne-
dios. Por isso a importância de observar cessário considerar tanto o contex-
se a morte violenta foi por razão de gênero, to da vítima e do agressor como as
como foi a morte, a motivação e as carac-
terísticas do homicídio.
circunstâncias em que o crime ocor-
reu. É preciso também observar os PARA
b) O que deve ser observado?
meios empregados para a execução. REFLETIR
Por exemplo: na violência doméstica e
A Lei Maria da Penha foi a primeira lei
A morte de mulheres por razão de gêne- familiar, a mulher vivencia um ciclo de vio-
lências, um contínuo de agressões físicas, federal a reconhecer que a violência
ro pode ocorrer tanto no âmbito privado
verbais e, gradativamente, a violência au- contra a mulher independe de
como em ambiente doméstico e familiar
menta, chegando ao extremo, que é a mor- orientação sexual.
como no âmbito público – nas ruas, luga- te da mulher. Em muitos casos, a mulher já
res de lazer, de pouca ou baixa circulação havia denunciado a violência doméstica,
de pessoas ou com muita circulação de
pessoas, no ambiente de trabalho, esta-
pedido medida protetiva, informando que
estava em risco e até mesmo informado SAIBA MAIS
belecimentos educacionais, dentre outros. que o agressor continha arma em casa.
As razões de gênero presentes nas
Pode ser cometida tanto por conhecidos O exemplo acima descrito demonstra mortes violentas de mulheres devem
(amigo, colega, companheiro, cônjuge ou um tipo de contexto que pode se apresentar ser buscadas de forma criteriosa,
pessoa de relações passadas) quanto por e que deve ser observado durante a investi- metodológica e exaustiva, de modo que
desconhecidos, que não tenham conexão gação e ao longo de todo o processo. a investigação não esteja circunscrita
com a vítima. Como bem pontuado pela apenas ao local do crime, mas envolva
a. A motivação do agressor: este é um
Diretrizes Nacionais, o acesso às informações sobre a história
dos elementos centrais que devem
As circunstâncias em que ocorrem essas ser observados. O que leva o agressor de vida e o entorno social da vítima
mortes podem envolver a violência do- e do(a) agressor(a), os perfis sociais e
méstica e familiar (conforme previsto na
a tirar a vida de uma mulher, a chegar
ao extremo de uma violência letal? psicológicos da vítima e do(a) agressor(a)
Lei 11.340/2006), a violência sexual, o tráfico
de mulheres para fins de exploração sexual b. Contextos e circunstâncias: as e a cena do crime (OACNUDH-FGR, 2012,
e a exploração sexual de meninas e adoles- denúncias de desaparecimento que p. 29). Elas não devem ser definidas de
centes. Devem também ser consideradas exigem uma atuação rápida da polí- antemão, uma vez que as evidências
outras circunstâncias associadas ao crime sobre as razões de gênero devem ser
cia para que sejam evitadas mortes;
organizado, como a disputa de territórios, os buscadas durante a investigação criminal
confrontos entre quadrilhas, quer envolvam situações de cárcere privado; e se a
ou não a participação direta das mulheres. mulher está inserida em contexto de e, também, na fase de instrução criminal.
(DIRETRIZES NACIONAIS, 2014, p. 42) violência doméstica e família. (DIRETRIZES NACIONAIS, 2014, p. 45)

ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA MULHER 61


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c. Meios empregados para a execu-
ção: é necessário investigar o tipo A PERSPECTIVA DE
GÊNERO E O PAPEL DO
de violência praticada e a forma
como foi concretizado o crime. Que

SISTEMA DE JUSTIÇA
marcas ficam registradas no corpo
da vítima? Crimes de feminicídio

A
muitas vezes apresentam caracte-
rísticas de extrema violência e tortu- s Diretrizes Nacionais têm se con- violência por sua condição de mulher (de
ras, evidenciando a raiva, o nojo e a figurado como um documento gênero). Tais episódios poderiam ser evi-
vontade de punição que o agressor orientador para o sistema de tados. Entretanto, ainda são necessárias
tem em relação à vítima. Ficam evi- justiça criminal, o que não quer políticas públicas, inclusive no âmbito
denciadas partes do corpo afetadas, dizer que tenha sido totalmente adotado. do sistema de justiça criminal, para a eli-
como seios, rosto, órgãos genitais, Ainda há passos importantes para a conso- minação de toda e qualquer forma de
que deixam nítida a razão do gêne- lidação da perspectiva de gênero quando violência contra a mulher e para a efe-
ro, de eliminação da condição de ocorrem mortes violentas de mulheres ou tivação de uma vida livre, saudável,
mulher (do gênero feminino). tentativas. Contudo, o documento tem es- sem opressões e com equidade.
timulado a elaboração de protocolos espe- A eliminação de todas as formas de dis-
d. Sujeito ativo: qualquer pessoa.
cíficos para a apuração e o julgamento dos criminação e violências de gênero exige es-
Com a Lei Maria da Penha (Lei
crimes de feminicídio em alguns estados. forços sociais do Estado, que considerem
11.340/2006), houve uma amplia-
O Distrito Federal, em 2017, foi a primeira as especificidades das mulheres, sejam
ção de quem é o sujeito ativo (a
unidade da federação a criar um Protocolo elas cis, trans, negras, brancas, indígenas,
pessoa agressora). Em geral, são
de Investigação e Realização de Perícias quilombolas, ciganas, de várias idades e
homens, mas há situações em que
nos Crimes de Feminicídio, da Polícia religiões, mulheres do campo ou da cida-
as mulheres podem também agre-
Civil do Distrito Federal (PCDF). Em Per- de, com ou sem deficiência.
dir, em relações entre pessoas do
nambuco foi lançado o Protocolo Pernam- A transformação dessa realidade é fun-
mesmo sexo, bem como ter partici-
bucano de Feminicídio (2018). Os estados damental. Por isso, podemos presenciar
pação, como nos casos que envol-
do Maranhão, Mato Grosso do Sul, Piauí, uma incansável luta dos movimentos fe-
vem exploração sexual, tráfico de
Rio de Janeiro e Santa Catarina aderiram à ministas, movimentos de mulheres negras,
pessoas, dentre outras.
implementação das Diretrizes Nacionais e de lésbicas e bissexuais e de mulheres tran-
e. Sujeito passivo: o feminicídio tiveram a assessoria da ONU Mulheres para sexuais pela implementação de leis, proto-
tem como vítimas meninas e mu- o desenvolvimento dos protocolos. colos, políticas públicas, e capacitações no
lheres, independe de raça, etnia, Em uma sociedade com desigualda- sistema de justiça, para que a segurança, a
classe, idade, procedência regio- des de gênero, etnia, geração, sexualida- integridade física e psicológica e a vida se-
nal ou nacional, orientação sexual de, raça e classe, como o Brasil, as mu- jam uma realidade garantida e concreti-
e identidade de gênero. lheres são alvo de múltiplas formas de zada no cotidiano das mulheres.

62 Fundação Demócrito Rocha | Universidade Aberta do Nordeste


PARA
REFLETIR REFERÊNCIAS
Em nenhuma hipótese deve ser admitido ALMEIDA, Suely Souza de. Femicídio: algemas MODELO DE PROTOCOLO LATINO-AMERICANO
que as evidências sobre a personalidade invisíveis do público-privado. Rio de Janeiro: DE INVESTIGAÇÃO DAS MORTES VIOLENTAS DE
Revinter: 1998. MULHERES POR RAZÕES DE GÊNERO (FEMICÍDIO/
da vítima, sua história de vida ou seu
ARDAILLON, Danielle; DEBERT, Guita. Quando FEMINICÍDIO). Escritório Regional para a América
comportamento reproduzam estereótipos Central do Alto Comissariado das Nações Unidas
a vítima é mulher: análise de julgamentos de
e preconceitos com base no gênero, crimes de estupro, espancamento e homicídios. para os Direitos Humanos; Escritório Regional
para julgamento moral das vítimas e sua Brasília: CNDM/CEDAC, 1987. para as Américas e o Caribe da Entidade das
responsabilização pela violência que sofreu. Nações Unidas para a Igualdade de Gênero e o
BRASIL. Diretrizes nacionais para investigar,
(DIRETRIZES NACIONAIS, 2014, p. 42) Empoderamento das Mulheres (ONU Mulheres).
processar e julgar com perspectiva de gênero as
Brasília: ONU Mulheres, 2014.
mortes violentas de mulheres. Abril, 2016.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS – ONU.

SAIBA MAIS
CARNEIRO, Sueli. Mulheres negras, violência e
Comitê para a Eliminação da Discriminação contra
pobreza. In: SECRETARIA ESPECIAL DE POLÍTICAS
a Mulher (CEDAW). Comentários finais. Brasil, 10
PARA AS MULHERES. Programas de Prevenção,
ago. 2007. CEDAW / C / BRA / CO / 6.
Criação de um Protocolo Nacional Assistência e Combate à Violência contra a
Mulher. Diálogos sobre a violência doméstica ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS – ONU. Comitê
Em junho de 2020 o Ministério da Justiça para a Eliminação da Discriminação contra a Mulher
e de gênero: construindo políticas para as
e Segurança Pública, por meio da Portaria mulheres. Brasília-DF, 2003. (CEDAW). Recomendação geral nº 28: sobre as
nº 340/2020, criou o Protocolo Nacional obrigações fundamentais dos Estados Partes ao
COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS
de Investigação e Perícias nos Crimes abrigo do art. 2º da Convenção sobre a Eliminação de
HUMANOS (CIDH). Acesso à justiça para mulheres
de Feminicídio. Entretanto, o Protocolo Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres
vítimas de violência nas Américas. OEA/Ser. L/V/II:
(adotada pelo Comitê na sua 47ª sessão) 2010.
tem sido questionado, ensejando um Doc. 68, 20 de janeiro de 2007.
PASINATO, Wania. “Femicídios” e as mortes
Projeto de Decreto Legislativo para sustar COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS
de mulheres no Brasil. Cadernos Pagu,
os efeitos da Portaria. Os principais HUMANOS (CIDH). Orientação sexual, identidade
(37), 219-246. 2016.
motivos são o fato de o documento ter de gênero e expressão de gênero: alguns
termos e padrões relevantes. Estudo elaborado SEVERI, Fabiana. (2016). Justiça em uma
um caráter sigiloso, sendo, portanto, perspectiva de gênero: elementos teóricos,
em cumprimento da resolução AG/RES. 2653
inconstitucional, e que “vai de encontro (XLI-O/11): Direitos Humanos, Orientação Sexual e normativos e metodológicos. Revista Digital
a compromissos internacionais firmado Identidade de Gênero, 23 de abril de 2012. de Direito Administrativo. 3. 574. 10.11606/
pelo Brasil”. Além disso, o Brasil já issn.2319-0558.v3i3p574-601.
FLAUZINA, Ana Luiza Pinheiro et al. Discursos
adotou o “Modelo de protocolo latino- Negros: legislação penal, política criminal e WERNECK, Jurema; IRACI, Nilza. A situação dos
racismo. Brasília: Brado Negro, 2015. direitos humanos das mulheres negras no Brasil:
americano de investigação de mortes
violências e violações. São Paulo: Criola-Geledés, 2016.
violentas de mulheres por razões de LAGARDE, Marcela. Por la vida y la liberdad de las
gênero (feminicídio), concretizando-o mujeres: fin al femicídio. El dia, V., fevereiro, 2004.
nas Diretrizes Nacionais para investigar, MELLO, Adriana de. Femicídio: uma análise
processar e julgar com perspectiva de sociojurídica do fenômeno no Brasil. Rio de
Janeiro: GZ Editora, 2016. MENDES, Soraia da
gênero as mortes violentas de mulheres.” Rosa. Criminologia Feminista: novos paradigmas.
Fonte: Agência Câmara de Notícias. São Paulo: Saraiva, 2017.

ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA MULHER 63


AUTORA
LUANNA MARLEY
Advogada popular e pesquisadora. Mestre em
Direitos Humanos e Cidadania pela Universidade de
Brasília (UnB), pesquisadora do Núcleo de Estudos
da Diversidade Sexual e de Gênero (NEDIG) - CEAM/
UnB, integrante do Observatório de Políticas
Públicas LGBTI da Universidade Federal do Ceará
(UFC) e Integrante da Rede Nacional de Advogadas
e Advogados Populares (Renap/CE).

ILUSTRADOR
CARLUS CAMPOS
Artista gráfico, pintor e gravador, começou
a carreira em 1987 como ilustrador no jornal
O POVO. Na construção do seu trabalho, aborda
várias técnicas como: xilogravura, pintura,
infogravura, aquarelas e desenho. Ilustrou
revistas nacionais importantes como a Caros
Amigos e a Bravo. Dentro da produção gráfica
ganhou prêmios em salões de Recife, São Paulo,
Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.

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REALIZAÇÃO

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