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PODE O ASSISTENTE RECORRER PARA AUMENTAR A PENA DO ACUSADO?

ROGÉRIO TADEU ROMANO

Procurador Regional da Republica aposentado

I – DO ASSISTENTE

Dá-se o nome de assistente ao ofendido pelo crime e que tem interesse a


reparar na esfera civil. É o titular do bem jurídico lesado pelo ilícito penal.

Eugênio Pacelli de Oliveira1, anotando que o interesse que traz o assistente ao


processo não é exclusivamente de cunho patrimonial, registra que a modalidade de
procedimento que viabiliza essa intervenção é chamada de assistência, cujo legitimado a agir é
precisamente o ofendido, ou seu representante legal, se menor de 18 anos; ou, no caso de sua
ausência ou morte, qualquer das pessoas mencionadas no artigo 31 do Código de Processo
Penal. Conclui por dizer que a atuação do assistente não se resume à obtenção de título
executivo para a satisfação do direito civil reparatório embora tenha retificado sua posição
anterior de ver como possível o recurso do assistente inclusive para fins de aumento da pena
aplicada.

O artigo 530 – H do Código de Processo Penal prevê que as associações de


titulares de direitos do autor e os que lhe são conexos poderão funcionar como assistentes de
acusação nos crimes previstos no artigo 184 do Código Penal.

O assistente deverá ser representado por advogado.

Eduardo Espínola Filho2 vê na função do assistente de acusação o de auxiliar da


acusação pública.

Em verdade, o artigo 31 do Código de Processo Penal concede ao ofendido a


função de auxiliar da acusação, podendo habilitar-se no processo.

Para Guilherme de Souza Nucci3, trata-se, ao mesmo tempo, de sujeito e parte


secundária na relação jurídica processual, uma vez que o ofendido tem essa posição quando

1
OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de . Curso de processo penal, 17 ª ed. Atlas, 2013, pág. 482.
2
FILHO, Eduardo Espínola. Código de processo penal anotado, Borsoi, 1960, volume III, pág. 269 a 270.

1
ingressa no feito, acrescentando que a posição da vítima, no processo penal, atuando como
assistente da acusação, não mais pode ser analisada como mero intuito de conseguir a
sentença condenatória, para que sirva de título executivo judicial a ser deduzido no civil, em
ação civil ex delicto, tendo como objetivo a reparação do dano.

É ainda de se salientar a lição de Ada Pellegrini Grinover, Antônio Magalhães


Gomes Filho e Antônio Scarance Fernandes4 quando dizem que o assistente intervém no
processo com a finalidade de cooperar com a justiça, figurando como assistente do MP ad
coadjuvandum. Assim teria o assistente o interesse na justa aplicação da pena. No entanto,
com relação aos benefícios penais, como o sursis, a atividade de colaboração do ofendido com
a justiça esgota-se, no sistema processual pátrio, não se podendo, para eles, vislumbrar
interesse na modificação de benefícios inerentes à execução da pena.

Frederico Marques5 vê na assistência a função de auxiliar da acusação e não de


defesa de um interesse seu. Tal posição diverge de outra, no sentido de que há interesse civil
nessa intervenção, exposta em outra obra.6

Vou mais além: Frederico Marques, em outra obra7, considerou que a


atividade da vítima e do Ministério Público, como partes, estabelece um litisconsórcio criminal,
algo que se tenha como um litisconsórcio necessário para o acusador público e voluntário para
o acusador particular. Interessante.

Seria o assistente uma parte adjunta ou adesiva, para alguns. Para tanto,
explico que Antônio Alberto Machado8 chama o assistente de parte adesiva ou adjunta pelo
fato de ter assegurados alguns direitos típicos de autor, sem, no entanto, sê-lo.

É certo que há os que tratam o assistente como substituto processual,


identificando que so se ode considerar tal situação quando o ofendido recorre nos casos em
que o Ministério Público não o faz, pois, nesse caso, passaria a ser substituto processual,
agindo como parte principal.

Interessante a posição de Fátima Ziyade9 para quem esses atos decorrem da


condição do assistente como interveniente adesivo.

Para Marcelo Fontes Barbosa10 a assistência no direito processual penal


brasileiro é mero correlativo do direito de reparação do dano, eis que o ofendido intervém

3
NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado, 10ª ed. Revista dos Tribunais, pág.
597.
4
GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antônio Magalhães; Scarance Fernandes, Antônio. Recursos
no processo penal, ed. Revista dos Tribunais, pág. 88.
5
MARQUES, José Frederico.Elementos de direito processual penal. Forense, 1999, pág. 249.
6
MARQUES, José Frederico Marques. Estudos de direito processual penal. Forense, 1960, pág. 157.
7
MARQUES, José Frederico Marques. Elementos de direito processual penal. 2ª ed v.II, Millenium, 2000,
pág. 52.
8
MACHADO, Antônio Alberto. Curso de processo penal. 2ª edição, Atlas, 2009, pág. 88.
9
ZIYADE, Fátima. O assistente da acusação. Livraria do Advogado, 1993, pág. 25.
10
BARBOSA, Marcelo Fontes. Considerações sobre a natureza jurídica da assistência de acusação no
processo penal brasileiro, JTACrSP 15/35.

2
para reforçar a acusação pública, figurando em posição secundária o interesse mediato na
reparação do dano causado pelo delito.

Manoel Pedro Pimentel11 entende que o assistente no direito processual penal


brasileiro deva ter um legítimo interesse coligado à finalidade precípua da ação penal,
vinculado ao poder-dever de punir que o Estado exerce através do processo penal.

Deveras interessante é a conclusão de Fernando Capez12 ao lecionar que, no


processo penal, há as partes necessárias e as contingentes(autorizadas pela lei a participarem
do processo, mas que, contudo, não são necessárias para que este exista e de desenvolva
validamente). Aqui estaria a atuação do assistente da acusação.

Mas, não cheguemos ao ponto de ver na assistência uma instituição em


choque com a Constituição.

João Porto Silvério Júnior13 considera que, a partir da promulgação da


Constituição de 1988, que referendou o sistema acusatório( assegurando a imparcialidade do
juiz e relegando a produção da prova às partes, sob o crivo do contraditório e ampla defesa),
não se pode conceber que o Ministério Público necessite de auxílio, pois a assistência
desaguaria em flagrante violação ao princípio do contraditório, que exige a paridade de armas
no processo penal.

Estaríamos com a complexidade das funções que é dada ao assistente, no


processo penal, inclusive, diante da possibilidade de ele poder recorrer para aumentar a pena
do acusado, se a acusação não recorre, diante de um perigoso fenômeno de privatização da
Justiça Penal? Não se pode dar destaque à vítima, sob o argumento de que ele precisa se
ressarcir dos prejuízos que lhe foram postos pelo acusado.

Prevendo a lei a intervenção em estudo nas ações penais públicas, é incabível


falar em assistência em habeas corpus, ação mandamental, destinada a defender o ir e vir do
acusado.14

Não se deve confundir tal instituto com o de assistente da defesa,


vislumbrado, na Lei dos Juizados Especiais(Lei 9.099/95) na presença do responsável civil na
audiência preliminar, na hipótese de reparação de danos nas infrações de menor potencial
ofensivo. Outro exemplo que se tem é visto na redação do artigo 49 da Lei 8.906/94, na
assistência da Ordem dos Advogados do Brasil ao advogado que seja réu ou querelado.

Vem a pergunta: Poderão intervir as pessoas jurídicas, de direito público ou de


direito privado, como assistentes de acusação diante do interesse público subjacente?

Penso que sim.

11
PIMENTEL, Manoel Pedro. A figura do assistente do Ministério Público no direito processual penal
brasileiro, Justitia, v. 88, 1975, pág. 14.
12
CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 13ª edição. Saraiva, 2006, pág. 185.
13
SILVÉRIO JÚNIOR, João Porto. A incompatibilidade do assistente de acusação com o processo
acusatório de 1988. In. Revista Jurídica, n. 345, pág. 93, julho 2006.
14
RT 376/230; 533/393, dentre outros.

3
Em caso recente, na Justiça Federal, há notícia de intervenção do Banco
Central como assistente de acusação em furto qualificado ocorrido.

Diversos são os registros de sua possibilidade no direito positivo: artigo 26 da


Lei 7.492; artigo 81 da Lei 8.078/90; artigo 2º, § 1º, do Decreto-lei 201/67.

Veja-se o caso do interesse de um Município na condenação de um servidor


público acusado da prática de crime de peculato ou de desvio de verbas públicas, quando se vê
na necessidade de ampliação do campo probatório no processo penal para aplicação de pena
no processo administrativo.

Aliás, Eugênio Pacelli de Oliveira15 defendeu que se o ofendido for pessoa física
ou jurídica de direito privado, seu agir processual será como fiscal da lei, enquanto se for
pessoa de direito público não ocorre intervenção processual dessa natureza, mas como de
participação assistencial por ser função de custos legis atribuída já a outro órgão estatal que é
o Ministério Público.

O artigo 269 do Código de Processo Penal determina que, a partir do


recebimento da denúncia e até o trânsito em julgado da decisão, poderá haver o ingresso do
assistente, mas sem qualquer tipo de regressão no desenvolvimento regular da instrução.

Assim incabíveis o ingresso do assistente durante o inquérito policial e ainda


na ação penal privada propriamente dita.

Por sua vez, não há cabimento, como se vê da leitura do artigo 270, na atuação
do corréu como assistente.

Observa-se que o artigo 273 do Código de Processo Penal determina que do


despacho que admitir ou não o assistente não caberá recurso. No entanto, já se admitiu o
mandado de segurança.16

Ao pedido de intervenção do assistente, deverá ser ouvido o Parquet,


examinando a legitimidade da parte. No entanto, como afirma Júlio Fabbrini Mirabete17, se, no
curso do processo, o assistente trair o sentido teleológico da assistência, que é o de reforçar o
da acusação, pode o Ministério Público solicitar a sua exclusão.

II – O ASSISTENTE NO DIREITO COMPARADO

Em Portugal, o Código de Processo Penal estabelece, no artigo 69, que o


assistente tem posição de colaborador do Ministério Público, a cuja atividade subordina a sua
intervenção no processo, auxiliando no exercício da pretensão punitiva.

15
OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de processo penal. 2ª ed.. Del Rey, 2003, pág. 443 – 447.
16
RT 577; 386, do despacho o despacho de indeferimento ou reclamação ou correição(RT 505:392).
17
MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código de Processo Penal Interpretado. Ed. Atlas, pág. 361.

4
Naquele ordenamento processual, compete ao assistente: a) intervir no
inquérito e na instrução, oferecendo provas e requerendo diligências que se afigurem
necessárias; b) deduzir acusação independente da acusação do Ministério Público e, no caso
de procedimento dependente de acusação particular, ainda que aquele não a deduza; c)
interpor recurso das decisões que os afetem, mesmo que o Ministério Público não o tenha
feito.

Em Portugal, poderá o assistente, outrossim, requerer a intervenção do júri


para o julgamento de feitos de sua competência(artigo 13); requerer ao tribunal a cessação da
conexão(artigo 30) e arguir a exceção de incompetência(artigo 32). São , para tanto,
legitimados para se habilitarem as pessoas ou entidades a quem leis especiais conferirem tal
direito, e ainda os ofendidos, considerando-se, como tais, os titulares dos interesses que a lei
especialmente quis proteger com a incriminação, desde que maiores de 16 anos; as pessoas de
cuja queixa ou acusação particular depender o procedimento; no caso do ofendido morrer sem
ter renunciado à queixa, o cônjuge sobrevivente não separado judicialmente de pessoas e
bens, os descendentes e adotados, ascendentes e adotantes ou, na falta deles, irmãos e seus
descendentes e a pessoa que vivesse com o ofendido em condições análogas às dos cônjuges,
salvo se alguma dessas pessoas houver comparticipado no crime; no caso do ofendido ser
menor de 16 anos ou por outro motivo incapaz, o representante legal e, na sua falta, as
pessoas indicadas na alínea anterior, segundo a ordem ali referida, salvo se alguma delas
houver participado no crime; qualquer pessoa, nos crimes contra a paz e humanidade, bem
como nos crimes de tráfico de influência, favorecimento pessoal praticado por funcionário,
denegação de justiça, prevaricação, corrupção, peculato, participação econômica em negócio,
abuso de poder e fraude na obtenção ou desvio de subsídio ou subvenção.

Sendo assim, em Portugal, o assistente pode requerer: a aceleração de


processo atrasado(artigo 108), perícia e designar assistente técnico(artigos 153 e 1.534),
revisão e confirmação de sentença penal estrangeira(artigo 236) e prestar declarações em
juízo(artigo 346).

Na Espanha e na Argentina, há a figura do acusador particular, que poderá


impulsionar o processo, proporcionar elementos de convicção, argumentar sobre as provas e
recorrer dentro dos limites da legislação processual.

Na Itália, da leitura do artigo 74 do Codice penale e di procedura penal e leggi


complementari, o ofendido assume a condição de parte civil, garantindo a eficácia da ação civil
de reparação.

Na Alemanha, a vítima pode aderir à acusação pública.

Permito-me lembrar a preciosa lição de Antônio Scarance Fernandes18 para


quem atua, no ordenamento germânico, o ofendido como auxiliar da acusação, mas, quanto
ao recurso e à revisão criminal, tem poder autônomo de impugnação ou proposição, vindo a se
constituir num verdadeiro substituto processual.

18
Fernandes, Antônio Scarance. O papel da vítima no processo penal. Malheiros, 1995, pág. 128.

5
III – MODALIDADES DE INTERVENÇÃO DO ASSISTENTE

De acordo com o disposto no artigo 271 do Código de Processo Penal, ¨ao


assistente será permitido propor meios de prova, requerer as perguntas às testemunhas,
aditar o libelo e os articulados, participar do debate oral e arrazoar os recursos interpostos
pelo Ministério Público ou por ele próprio.¨ Digo isso, insistindo que em face da redação da Lei
11.689/2008 não se pode mais falar em libelo acusatório, não se podendo concluir pela
existência de peça processual de aditamento pelo assistente do Parquet.

Em resumo: pode o assistente arrolar testemunhas(respeitado o número legal


para a parte acusatória, podendo ser peticionado que o juiz ouça alguém como testemunha do
juízo); direito de reperguntar; produzir alegações finais; manifestar-se sobre os recursos
interpostos pelo Parquet; recorrer autonomamente.

Entendeu Júlio Fabbrini Mirabete19 que a enumeração do artigo 271 do Código


de Processo Penal é taxativa, não se podendo falar em recursos: em caso de sentença de
pronúncia, absolvição sumária, do despacho que concede fiança, de decisão que concede
desaforamento, da decisão em revisão criminal. Como tal, não poderia ajuizar mandado de
segurança.

Tem o assistente o direito de propor provas, e, uma vez admitido no processo,


deve o assistente, através de seu advogado, ser intimado de todos os atos que devam ser
realizados no feito, como, por exemplo, a audiência de instrução.

Se deixar de comparecer aos atos processuais, sem justificação, não mais será
intimado, uma vez que sua presença é dispensável.

A atuação do assistente será admissível nos seguintes casos:

a) Contra a sentença de impronúncia(recurso de apelação);


b) Contra a sentença proferida no âmbito do tribunal do júri, quando não for
interposta apelação pelo Ministério Público no prazo legal.

Se isso não bastasse, à luz da Lei 12.403/2011, tem o assistente na fase


processual, a legitimidade para requerer a prisão preventiva e ainda de recorrer das decisões
concessivas de liberdade provisória, de medidas cautelares diversas da prisão(artigo 319 do
CPP), das decisões que relaxem a prisão ou que defiram o habeas corpus.

Pode o assistente, nos processos de competência do tribunal do júri, requerer


o desaforamento, quando, por interesse de ordem pública, havendo dúvida sobre a
imparcialidade do júri, do que se lê do artigo 427 do Código de Processo Penal, na redação
dada pela Lei 11.689/2008.

Da mesma forma pode o assistente arrolar testemunhas, desde que não


ultrapassado o número máximo reservado á acusação.

19
MIRABETE, Jùlio Fabbrini, Processo Penal. 1991. Ed. Atlas, pág. 337.

6
No entanto não pode o assistente aditar a denuncia. Isso é faculdade do
Estado-Acusação e não de um terceiro que intervém no feito.

Mas, poderá, diante da inércia do Ministério Público, impugnar a sentença


absolutória e extintiva da punibilidade(artigo 386, art. 397 combinado com o artigo 598, todos
do Código de Processo Penal), bem como os de decisões de impronúncia(artigo 414 e 416 do
Código de Processo Penal), na linha do artigo 271 do Código de Processo Penal.

Se houver recurso do Parquet, ao assistente caberá apenas oferecer as suas


razões. Se não houver impugnação do Ministério Público, o assistente poderá fazê-lo com
relação às decisões já mencionadas.

Assim poderá opor embargos de declaração, apelação e até recurso especial


ou extraordinário20 e ainda recurso em sentido estrito, das decisões onde houver concessão de
liberdade provisória(artigo 581, V, CPP).

A súmula 208 do Supremo Tribunal Federal, que impossibilitava o recurso do


assistente, nos casos de concessão do habeas corpus, hoje está incompatível com a redação
dada pela Lei 12.403/2011, que possibilitou a intervenção do assistente, nessas hipóteses.

Havendo recurso parcial da acusação, pode o assistente recorrer da parte


irrecorrida, desde que absolutória a decisão, sumária(artigo 397, CPP) ou não(artigo 386, CPP).

O prazo para recurso do assistente é o mesmo reservado para o Ministério


Público, quando ele já estiver habilitado no processo, sendo que o seu prazo somente tem
início após o encerramento do prazo do titular da acusação.

Se não for o assistente habilitado, o recurso deverá ser interposto em 15


dias(artigo 598, CPP).

Na hipótese de sentença absolutória, ainda que esteja de acordo o Ministério


Público, abre-se ao assistente a possibilidade de interposição de recurso, nos termos do artigo
271 do Código de Processo Penal, uma vez que a decisão final na instância penal poderá
vincular a instância civil, a impedir a busca de uma recomposição civil dos danos causados ao
patrimônio, seja moral ou econômico da vítima.

Vem a pergunta: Pode o assistente recorrer das decisões condenatórias,


propondo o aumento da pena?

IV – DO INTERESSE DO ASSISTENTE EM RECORRER PARA AUMENTAR A PENA DO ACUSADO

Entende-se que a função do assistente é auxiliar a acusação para obter uma


condenação. Já que tem interesse na esfera civil a ser ressarcido. Assim faltaria ao assistente,
nessa hipótese, interesse em recorrer.21

20
Súmula 210 do STF e ainda HC 102085 – RS, Relatora Ministra Cármen Lùcia, 10.06.2010.

7
Para Paulo Lúcio Nogueira22, falece legítimo interesse ao assistente para
recorrer no caso de condenação, visto que o seu propósito já foi obtido.

Entretanto, colho, no passado, jurisprudência antagônica.23

Maurício Zanoide de Moraes24 apresenta posição favorável a tal intervenção


do assistente, pelas seguintes razões:

a) Inexiste dispositivo processual penal expresso vedando a atuação do


ofendido para fins penais;
b) Se a intenção do legislador fosse restringir a participação da vítima no
campo civil, deveria dar-lhe todos os instrumentos possíveis para provar
tal direito, o que não fez;
c) Seria irracional conceder ao ofendido uma atuação marcante, quando
propuser a ação penal privada subsidiária da pública, não permitindo o
mesmo no caso da assistência;
d) A restrita possibilidade de interpor recursos apenas demonstra que o
assistente é auxiliar do Ministério Público e não órgão principal;
e) Se fosse unicamente por finalidades civis, caso já tivesse ele recebido a
indenização, não poderia habilitar-se como assistente o que não acontece.

Duas correntes são apontadas no enfrentamento do problema: a) uma


favorável a apelação por qualquer motivo, da parte do assistente(Mirabete, Ada Pelegrini,
dentre outros); b) outra considerando que tal interesse é para garantir a condenação(Greco
Filho25 e ainda Fernando da Costa Tourinho26). Guilherme de Souza Nucci27 aplaude a posição
que considera correta tal intervenção pelo assistente, visando aumentar a pena.

Parece-me conclusiva a opinião de Fernando Costa Tourinho28 para quem a


razão de entender a ingerência do ofendido em todos os termos da ação penal pública, ao lado
do Ministério Público, repousa na influência decisiva que a sentença da sede penal exerce na
sede civil. Em verdade, o assistente não é auxiliar da acusação, pois ele procura defender seu
interesse na indenização do dano ex delicto.

Assim se o papel do assistente fosse reforçar a acusação, poderia ele propor


recursos em situações em que o juiz reconhece sua incompetência, julga exceções, etc.

21
RT, 588: 341, 534: 340, 520:436, 518:389, RTJ 56/877, RT 462/381, dentre outros.
22
NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Curso completo de processo penal. 3ª edição. 1987, Ed. Saraiva, pág. 134.
23
RT, 455:418, 462:421; RTJ, 69:365.
24
MORAES, Maurício Zanoide de. Interesse e legitimação para recorrer no processo penal brasileiro. Ed.
Revista dos Tribunais, pág. 335.
25
GRECO FILHO, Vicente. Manual de processo penal. Ed. Saraiva, pág. 226.
26
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Código de processo penal comentado. Volume I. 9ª edição.
2005. Ed. Saraiva, pág. 665.
27
NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado. 5ª edição. Ed. RT, 2006, pág. 960 –
961.
28
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 10ª ed. Ed. Saraiva, 2008, pág. 385-
386.

8
Para Júlio Fabbrini Mirabete29 o instituto da assistência, embora se prenda ao
interesse civil do ofendido na reparação do dano, tem ainda um interesse ligado à precípua
finalidade da ação penal vinculado ao poder-dever de punir do Estado, que lhe permite
recorrer, de forma supletiva, da sentença para justa aplicação da lei penal.

A posição do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal tem


sido favorável à corrente que reconhece no instituto do assistente de acusação mais que um
simples interesse de ser indenizado no campo civil, senão vejamos:

a) Recurso Especial 605.302/RS, julgado em 20.09.2005, onde se diz que


havendo absolvição, ainda que parcial, ou sendo possível o
agravamento da pena imposta ao acusado, o assistente de acusação
possui efetivo interesse recursal, em busca da verdade substancial,
com reflexos na amplitude da condenação ou no quantum da pena;
b) Recurso Especial 468.157/RS, julgado em 17.06.2003, onde se afirma
que o assistente de acusação tem legitimidade para, no silêncio do
Ministério Público, recorrer, objetivando a majoração da resposta
penal;
c) Recurso Especial 135.549/RJ, DJU de 26.10.98, e ,no mesmo sentido, o
Recurso Especial 31.881/DF, DJU de 08.11.93, onde o Superior Tribunal
de Justiça entendeu que o assistente é interessado na apuração da
verdade substancial;
d) HC 83.582/RJ, julgado em 10.04.2007, onde o Supremo Tribunal
Federal entendeu pela legitimidade do assistente da acusação para
recorrer independente de recurso do órgão ministerial.;
e) HC 107.714, onde o Supremo Tribunal Federal entendeu que o
assistente da acusação na ação penal pode recorrer de sentença que
considera injusta mesmo quando o Parquet, titular da ação penal, não
recorra por considerar adequada a decisão judicial.

Este último entendimento foi reforçado pela Primeira Turma do Supremo


Tribunal Federal, sob protestos do Ministro Marco Aurélio, que ficou vencido.

Aliás, disse o Ministro Marco Aurélio que admitir o recurso do assistente do


Ministério Público é o mesmo que aceitar ¨uma verdadeira corrida de revezamento¨. Para ele,
mais do que isso, esvazia-se o princípio da titularidade única para ação que é do Ministério
Público.

O Ministro Marco Aurélio se coloca contra a possibilidade de uma vez fixada a


pena haver possibilidade do assistente adotar uma posição antagônica, contrária a do titular
da ação penal.

29
MIRABETE, Júlio Fabbrini. Processo penal. 1991. Ed. Atlas, pág. 336.

9
O Ministro Marco Aurélio restou vencido naquele julgamento, pois a Primeira
Turma, com base no voto do Ministro Dias Tófoli, relator do recurso, entendeu que é
admissível o recurso autônomo do assistente de acusação.

Naquele caso, a Defensoria Pública da União recorreu ao Superior Tribunal de


Justiça de decisão que considerou legítima a apelação movida pelo assistente da acusação ao
Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, para aumentar a pena de dois condenados por lesão
corporal grave. O Parquet não havia recorrido da decisão. O Tribunal de Justiça daquele Estado
acolheu o recurso do assistente e reclassificou o crime para lesão corporal gravíssima, ficando
a pena dos dois condenados aumentada de dois para três anos de reclusão.

Bem disseram Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar30 que, limitando o


interesse do assistente ao de reparação de danos em ação ulterior, não teria ele interesse em
recorrer de sentença condenatória para o fim de majorar a pena, sob a alegação de equívoco
na sua individualização.

A lição de Canuto M. de Almeida31 permanece presente: ¨A sentença penal e o


processo penal não são exclusivamente sentença penal e processo penal. São sentença penal,
processo penal, sentença civil e processo civil , quanto ao fato e quanto a quem tenha sido o
seu autor. Daí poder dizer-se que o particular ofendido intervém na ação penal pública por
causa do seu interesse civil.¨

O artigo 598 do Código de Processo Penal não pode ter uma interpretação
isolada. O intérprete assim deve cotejá-lo com os artigos 63, 271 e 584, § 1º, todos do Código
de Processo Penal, senda onde se leva a crer que o ofendido entra no processo para preservar
o seu direito à satisfação do dano ex delicto. Havendo sentença condenatória, cessará o seu
interesse, uma vez que o seu direito à satisfação está garantido, como disse Fernando
Tourinho.32

Falamos no princípio da igualdade das partes, que exige plena isonomia de


tratamento. Fica cristalino que, no processo penal a igualdade além de ser numérica a de ser
qualitativa. Tese contrária, no sentido da possibilidade de tal recurso pelo assistente, leva em
conta poderes da parte acusatória, reforçada pelo assistente, onde a vítima acresce a
acusação, em posição a colocar em cheque o devido processo legal, levando a desequilíbrio de
forças e armas no processo. Sendo pública a ação, deve o Ministério Público cuidar dela e não
a vítima, assistente.

Não se pode olvidar que o ingresso do assistente quebra o princípio da


isonomia processual, pois ofende o equilíbrio da relação jurídica processual, uma vez que
confere ao polo ativo maior capacidade de produção de provas e de defesa de suas teses.

30
TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 7ª ed.. 2012. Ed.
JusPodivum, pág. 534.
31
ALMEIDA, Canuto. M. de. A ação penal no novo código penal, in Conferências sobre o novo Código
Penal na Faculdade de Direito de São Paulo, v. I, pág. 175.
32
Tourinho Filho, Fernando da Costa.Processo Penal, v. II, 12ª edição, 1990, pág. 429.

10
Ora, o que parece justificar a validade da atuação do assistente, na ação penal
pública é o fato de poder ele sustentar idêntica demanda contra o mesmo réu, em razão dos
mesmos fatos e em outro juízo.

Assim a conclusão que se tem é de que reconhecida a autoria e a


materialidade no juízo criminal satisfeita estará a defesa de seu interesse patrimonial.

11

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