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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

INSTITUTO DE PSICOLOGIA
CURSO DE GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA
IHAC – BACHARELADO INTERDISCIPLINAR EM HUMANIDADES

MILLENA G SIQUEIRA

CONTROLE AVERSIVO E SEUS IMPACTOS NO


COMPORTAMENTO DA CRIANÇA E ADOLESCENTE NO
AMBIENTE ESCOLAR

Salvador
2021

MILLENA G SIQUEIRA
CONTROLE AVERSIVO E SEUS IMPACTOS NO
COMPORTAMENTO DA CRIANÇA E ADOLESCENTE NO
AMBIENTE ESCOLAR

Ensaio acadêmico apresentado à disciplina


de Teorias e Sistemas Psicológicos III como
requisito final para a aprovação no disciplina
de Psicologia, da Universidade Federal da
Bahia.

Professora: Ana
Bárbara Neves

Salvador
2021

IPSA 10-T01-Teorias e Sistemas Psicológicos III

Ensaio Acadêmico

Resumo

O presente ensaio pretende trazer os possíveis comportamentos consequentes de

contingências aversivas que o indivíduo não tem controle, através de uma breve
revisão da bibliografia acerca dos conceitos e controvérsias presentes em torno do

controle aversivo, e quais são as respostas que educadores podem emitir ao

identificarem crianças e alunos que possivelmente estão sob esse tipo de controle

no seio familiar/de cuidadores. Um breve esquema sobre como não é viável pensar

nas crianças como naturalmente (desviando das concepções mentalistas) capazes

de “salvar o mundo”, sem que antes o ambiente possibilite que as crianças ampliem

o repertório comportamental. Defende-se o uso da Análise do Comportamento em

sala de aula, colocando o papel do professor para além do ensinar de

conhecimentos engessados e positivistas que não articulam a realidade ao que está

sendo estudado. Afinal, a escola é o ambiente que proporcionará que outras

habilidades sejam apreendidas no comportamento do ser humano em formação,

logo as competências sobre o que é ser um ser humano devem estar inseridas nas

contingências escolares, e os educadores devem atentar para comportamentos que

inibam associações saudáveis e funcionais.

Palavras chave: “controle aversivo”, punição, adolescentes, Escola,

comportamento, “psicologia escolar”

O presente ensaio atentou-se para as principais características do controle aversivo

(a punição) sob a análise de Skinner (1953/2007), que descreve a noção popular de

punição como a “intenção de reduzir tendências de se comportar de certa maneira”

(p. 199), contudo concluiu baseado em dados obtidos em suas pesquisas, que “o

efeito da punição foi uma supressão temporária do comportamento, não uma


redução no número total de respostas” (p.200). Sendo assim, a punição não tem o

efeito a que popularmente se acredita, não sendo um modo eficiente de fazer uma

pessoa deixar de se comportar ou se comportar de outra maneira.

O controle aversivo é um domínio difícil de delimitar, havendo controvérsias na

literatura, devido aos fenômenos que surgem nas funções aversivas. Perone (2003),

por exemplo, discorre sobre as possíveis repercussões aversivas em contingências

de reforçamento positivo. Cameschi e Abreu-Rodrigues (2005) apresentam a

supressão condicionada (pareamento de um estímulo neutro a um aversivo, numa

linha de base de comportamento operante) como parte de contingências aversivas.

Skinner evita caracterizar o reforçamento negativo como controle aversivo, e

centraliza suas explicações nos efeitos da punição.

Bruna Santos (2012) revisita a definição de Skinner sobre punição, referindo-se a ela

como um procedimento que manipula as variáveis, apresentando ora um reforçador

negativo, ora retirando um reforçador positivo, não enfraquecendo diretamente a

classe de respostas punidas, mas sim ocasionando novas respostas (respondentes

e operantes) – o que explica o desaparecimento temporário das respostas punidas,

assim como o surgimento de novos comportamentos, que não necessariamente

serão as respostas desejadas de quando cotidianamente se pune.

São quatro os efeitos de um único estímulo aversivo: produz reflexos

frequentemente de natureza emocional (1) e causa modificações consideráveis nas

predisposições emocionais para agir (2). Ao servir como estímulo reforçador no

condicionamento respondente (3), devido ao emparelhamento com estímulos que o

precederam ou acompanharam, o mesmo estímulo evoca as predisposições

alteradas e os novos reflexos com propósito de evitar o estímulo punitivo. O que


torna possível “o reforço de qualquer comportamento de fuga que termina como o

próprio estímulo punitivo (4).” (Skinner, 1953/2007. p.223)

Para Skinner o controle aversivo também é ineficaz por apresentar efeitos

supressivos ineficientes, que não permanecem no repertório do indivíduo por muito

tempo. Os efeitos negativos do controle aversivo se transformam em uma

desvantagem, para quem pune e quem é punido. Além de produzir subprodutos

indesejados:

“reações emocionais fortes, como ansiedades perturbadoras e medos (que

interferem com o operante a ser reforçado), resistência passiva, fobias, fuga e

contracontrole.” (Skinner, 1953/2007).

As condições aversivas fazem parte da vida, e desde que o ser humano segue

evoluindo, as mesmas atuam como importante catalisador para que a espécie

progrida e aprenda como esquivar do que atrapalhe a sobrevivência. A punição

aplicada artificialmente para que se retire uma resposta com a apresentação de um

estímulo aversivo, sendo o único esquema de reforçamento de uma pessoa, pode

retroagir no comportamento geral do organismo com a maioria dos ambientes em

que terá contato.

Maria Joana é a figura hipotética elaborada para exemplificar a ocorrência de um

dos subprodutos da punição, como a resistência passiva, que emerge quando não

há mais estímulo para fuga nem esquiva, tornando o comportamento dissonante aos

desejados pelos procedimentos de controle (Skinner, 1953/2007).

A maior parte dos estímulos apresentados à Joana no núcleo familiar faz

pareamento com a escola. Caso a garota deseje ir a uma festa do pijama ou cinema

com as amigas, deve tirar uma boa nota. Se porventura receber uma advertência,
recebe duas semanas de castigo - sem descer para o play, ou sem computador. O

que quer dizer que seus pais condicionam as brincadeiras e castigos às

contingências escolares, assim como resumem a existência da adolescente ao

desempenho escolar.

Os pais não emitem reforço positivo naturalmente para a Maria Joana, além de não

serem afetuosos tampouco responsivos aos comportamentos da jovem, desde sua

tenra idade. Benvenuti, Oliveira e Lyle (2017) demonstraram a relação entre

responsividade e comportamento parental e aos comportamentos dos jovens e

crianças no ambiente escolar, detalhando estudos que apresentaram “a força da

relação entre comportamento parental e desenvolvimento socioemocional das

crianças”, destacando “como crianças com esses pais (mais contingentes e

afetuosos para responder aos sinais) apresentam resultados desenvolvimentais

considerados superiores nos domínios socioemocionais e cognitivos.” No caso, são

as relações que vão proporcionar que as condições de aprendizagem sejam

desenvolvidas de maneira saudável.

Maria Joana já fugiu e se rebelou, e devido a constantes castigos e punições, se

tornou indiferente. Os métodos utilizados pelos professores em sala de aula, e as

aproximações de seus colegas não são estímulos para a jovem. Há uma resistência

passiva intensa, que deturpa seu comportamento aos de seus pares e o esperado

dentro do contexto escolar. Maria Joana não se comporta, apenas comparece à

escola e senta durante as aulas sem agir sobre esse ambiente.

Sendo a escola outra importante fonte de estímulos e respostas em que o ser

humano em formação está entrelaçado nas contingências, e que proporcionará o

desenvolvimento de outras habilidades. É necessário que o projeto pedagógico da


instituição atenda às necessidades individuais dos alunos, evitando que seu controle

por regras também se torne mais um controle aversivo na ontologia do sujeito.

A Psicologia Escolar se insere nesse cenário como necessário mediador dos

comportamentos de todos os atores que compõem essas contingências. Segundo o

Conselho Federal de Psicologia (CFP), na resolução nº 014/00, seguem algumas

possíveis atuações do psicólogo escolar:

“aplicar conhecimentos psicológicos na escola, concernentes ao processo

ensino-aprendizagem, em análises e intervenções psicopedagógicas;

referentes ao desenvolvimento humano, às relações interpessoais e à

integração família-comunidade-escola, para promover o desenvolvimento

integral do ser.” (Brasil, 2000)

Maria Joana é sempre vista sozinha pelos corredores da escola, ou de cabeça baixa

passando pelos locais de modo apressado. Quando questionada pelos professores,

assistentes e psicóloga, embora seja sempre tranquila, a aluna se comporta de

modo agressivo. Evita dialogar mais do que o suficiente, a fim de fugir da interação.

O que os funcionários não sabem, embora a psicóloga suspeite sobre algo, é que

Joana é cotidianamente ordenada a se calar aos gritos. O comportamento de falar

serve como estímulo reforçador no condicionamento respondente, eliciando calafrios

na espinha da jovem e suores frios na ponta dos dedos. Ela se mantém calada pelo

máximo de tempo do seu dia.

As contingências de reforçamento negativo e de punição fazem parte do

estabelecimento do comportamento de autocontrole, entretanto um excesso de

punição e reforçamento negativo atrapalham o comportamento de autocontrole, pois

o indivíduo não terá uma noção precisa de quando deve responder com

autocontrole, de quando seu comportamento deve ser autocontrolar próprias


respostas, diante de determinados estímulos (Skinner, 1953/2007). O que explica a

predisposição para o comportamento agressivo na contingência em que a

adolescente foi estimulada a se comunicar.

A sala de aula é apenas uma das dimensões do ambiente escolar, os outros

espaços também fazem parte dessa contingência vital. É papel dos profissionais

presentes respeitarem a influência inerente aos espaços que ocupam, e buscar

modos de entender uns aos outros e, se possível, intervir. As concepções sobre o

conceito de escola expandiram, procurando abarcar a complexidade que envolve

orientar ativamente para que seja possível o desenvolvimento de novas habilidades

intelectuais e socioemocionais que promovam o desenvolvimento geral dos alunos,

além da aprendizagem dos conhecimentos curriculares. (Prette, Paiva e Prette,

2005. p.62)

O psicólogo, então, deve observar os gestos dos sujeitos, como se comportam com

os pares, e que nível de atenção presta ao que está ocorrendo ao redor. A criação

de espaços de escuta para todos os atores da escola funciona como modo de

intervenção. Pensar novas maneiras de lidar com o cotidiano coletivamente é um

caminho para encontrar consenso entre as demandas, e criar vínculos para o

atendimento individual. Entender o que os alunos pensam sobre a escola e a turma,

através de desenhos, entrevistas e historinhas são métodos para integrar e tornar

funcional os comportamentos (Andrada, 2005).

A psicóloga da escola de Maria Joana acredita nas concepções atualizadas da

escola, e ao perceber não somente a garota como outros jovens com

comportamentos pouco funcionais, aplicou entrevistas com as turmas individual e

coletivamente. Assim como com a presença dos professores, e em dado momento


também chamou os responsáveis. Ao colher dados dos outros sistemas em que as

pessoas participam, entende melhor as contingências e quais são os esquemas de

reforçamento presentes. Intervindo com a escuta e atividades que promovam reforço

positivo, aumenta-se a probabilidade de relações saudáveis e estímulos que

evoquem sentimentos de autoestima, confiança e responsabilidade, além de bem

estar social.

REFERÊNCIAS

1. ANDRADA, Edla Grisard Caldeira de. Focos de intervenção em psicologia

escolar. Sugestões práticas, UFSC, jun. 2005. Disponível em:

https://doi.org/10.1590/S1413-85572005000100019. Acesso em: 17 nov. 2021.

2. BENVENUTI, Marcelo Frota Lobato; LYLE, Leticia Albernaz Guimarães;

OLIVEIRA, Thais Porlan de. Afeto e comportamento social no planejamento do

ensino: a importância das consequências do comportamento. Psicologia USP

[online], v. 28, n. 3, p. 368-377, dez. 2017. Disponível em:

https://doi.org/10.1590/0103-656420160135. Acesso em: 16 set. 2021.

3. BRASIL. Resolução nº 014/00: Institui o título profissional de Especialista em

Psicologia e dispõe sobre normas e procedimentos para seu registro. Conselho

Federal de Psicologia. 20 dez. 2000. Disponível em: https://site.cfp.org.br/wp-

content/uploads/2006/01/resolucao2000_14.pdf. Acesso em: 4 nov. 2021.


4. CAMESCHI, C., E. & ABREU-RODRIGUES, J. Contingências aversivas e

comportamento emocional. Porto Alegre, RS: Artmed. 2005.

5. PERONE, Michael. Negative effects of positive reinforcement. April 2003. The

Behavior analyst / MABA 1-14. Disponível em: https://doi.org/10.1007/BF03392064

6. PRETTE, Zilda Aparecida Pereira del & PAIVA, Mirella Lopez Martini Fernandes &

PRETTE, Almir del. Contribuições do referencial das habilidades sociais para

uma abordagem sistêmica na compreensão do processo de ensino-

aprendizagem. Interações, jun-dez. 2005, p.57-72. Universidade São Marcos, São

Paulo, Brasil.

7. SANTOS, Bruna Colombo dos. The study of aversive control in Brazil based

on theses and dissertations: a historical perspective. 2012. 237 f. Dissertação

(Mestrado em Psicologia) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São

Paulo, 2012. Disponível em:

https://tede2.pucsp.br/handle/handle/16693. Acesso em: 23 out. 2021

8. SKINNER, B. F. (2007). Ciência e Comportamento Humano. Tradução realizada

por J.C Todorov & R. Azzi. São Paulo: Martins Fontes (trabalho original publicado

em 1953).

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