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Índice Episódico de Leitura

1. Prólogo - A Flor de Cosmos


2. Os Metempsicopatas
3. Organização Sem Fins Lucrativos Melioras
4. Distropia Universal Máxima
5. Corações de Chiclete, Pudim e Gelatina
6. A Revolução dos Anjos Que Mataram Deus ou Os Verdadeiros Cometas Jurássicos
7. Cristo e Anticristo, Irmãos de Sangue
8. Melos e os Contra-Peripatéticos
9. A Religião Que Não Crê em Deus
10. Esporos das Águas-Vivas Fúngicas Panspérmicas
11. A Floresta dos Salgueiros Desarraigados e Desterrados
12. Você é um Girassol ou um Dente-de-Leão?
13. Reflexologia das Cordas Cardíacas, Cósmicas e Sonoras
14. Fisiopsicossociedade dos Shondaro
15. Signos, Significantes e Significados
16. Linguagens de Sinal Corpo-a-Corpo e Face-a-Face
17. Dó-ré-mi-fá-sol-lá-si em nota alta de um piano falante
18. Um Inocente Presente
19. Quae sint, quae fuerint, quae mox futura tramantur
20. As Ideidades
21. Algodão Doce Psicodélico
22. Os Demônios dos Físicos

Nomenclatura Trinominal dos Personagens


● Yui Otogi (zoos politikrator) (regicidicina)
● Papillon Andalou (ponerogenia ansaefolium) (diflexiona)
● Midas Impírea (homo physica)
● Aurora af Theosformel (homo religiosus) (moralina)
● Levânia Athalwolf (homo astraea)
● Nemo Thränengruss (gothorum erebon)
● Kakihara Sasameyuki (flora solaris) (craptocidicina)
● Dampierre Ailorrias (eugenia melioras)
● Trubetskov Limândriarrich (nominas basileus)
● Dyonisus Aumaanus (primata microbium)
● Jasuka Yanderu (physistére falovertebrata)
● Apolo Vozemst (homo clausus)
● Apolônio de Tiana (homo ludens)
● Artemidoro Moseite (scalopendra arachnida)
● Drakenius Cabalerro (robota captronia)
● Thin White Man (androgenia venery)

“E o verbo se fez em caligramas de bioassinaturas por todo o cosmos…”

“O amor alimenta a nossa expectativa de vida, a nossa imunidade, e também nossa


humanidade.”

- Melissa Freire

Seria o ideal a obra ser um diálogo do autor face a face com o autor ou um diálogo do autor
face a face com o leitor? O autor face o autor, eis a resposta correta. E caso sejas um leitor,
converta-se a um escritor então! Corrija-me, borre-me, rascunhe-me, pincele de sangue meus
cadernos, mas não o ateie à fogueira nem o rasgue. Isso não. Covardia. Medo. Hesitação.
Para se confrontar um livro, é necessário sempre escrever outro livro. É isso o que estou
fazendo, contra eu mesmo.

- Você tem dificuldade em responder o que lhe perguntam, fazer o que lhe
pedem, em verdade, você faz o que tem vontade de fazer, desenvolve ideias
em um parágrafo para logo depois abandoná-las e seguir outra ideia, para logo
adiante abandoná-la. Cita dezenas de autores, avança outra dezena de
conceitos, faz comparações, críticas, mas não as liga nem ao autor nem ao
texto proposto. É difícil para você se focar em um texto, em um autor, porquê
parece muito raso e pequeno para sua ânsia de escrever sobre tudo e sobre
todos. Falta objetivo, falta foco, falta concentração, falta disciplina. Em
realidade tudo o que escreveu serve para qualquer pergunta ou texto que te
solicitarem, porque você não aceita que determinem o que deve fazer. Você
segue seu próprio caminho mesmo que este não te leve ao ponto que deveria
chegar. Você veio aqui para aprender, mesmo que tenha lida muito, você é um
estudante e este é seu papel. Escrever sobre o que já se sabe significa recusar a
aprender. Você recusou a ler o texto, recusou a compreender o autor dentro da
lógica dele e não da sua, se recusou a dialogar com o autor, não se silenciou
quando ele falou, porque estava mais preocupado com o seu próprio
argumento. Daqui para frente você terá direito a quatro páginas de resenha,
não citará nenhum texto que não o cobrado nem nenhum autor há não ser o
solicitado. Vai fazer o terrível exercício de estar só com o autor e apenas um
texto. Extraia o melhor com o mínimo que lhe darei, este é seu desafio.

A essência do presente é sua incógnita. Yui Otogi, preconceituosamente e


arrogantemente, ouvia as palavras onomatopeicamente e caligramáticamente,
estourando, explodindo, vertendo a cada leitura como vozes estilhaçadoras de
dentes. Seu cabelo cor-de-cobre eletricamente conduzido, imantado em fusão
ao rosto de par de olhos ciclocóspicos e oscilocóspicos, ectomorfo, com
atratores fisiológicos delineando tatuagens de escarificação e regeneração a
partir de artes não-periódicas e vácuas. A distinção entre natural e artificial é
como a de náutica e telúrica: profundidade. O artificial é apenas uma produção
da natureza adiantada pelo ser humano. O fluxo eferente e aferente, endógeno
e exógeno parados feito cambissolo, imorredouro aquático. Seus membros,
redes, estruturas não se ligam como membranas, ventosas, centros nervosos,
mas como os pêndulos de Foucault e os relógios de Huygens, ou a mecânica
solar planetária cuja causa é física, não teleológica. Não há cordas, laços, fios,
fibras conectando par de partes suas, mas uniões invisíveis. Assim que uma
trajetória é caminhada pela primeira vez em seu corpo, jamais é repetida, mas
é impreenchível, tendo os rastros ocupando a posição de quem os deixou.
“Escrever sobre o que já sabe é se recusar a aprender.” estas palavras
excitaram os poros de suas camadas dérmicas, como um salgueiro ou um livro
de páginas soltas reagindo às cordas de ar aerodinâmicas. As ofensas ao senso
comum e ao bom senso soavam como elogios a ele, e seu vocabulário era
pré-científico, paleolítico. Seu artigo científico intitulado ‘Sobre a Natureza da
Natureza’ fora taxado de ser demasiado poético, barrado por deter muitos
prolegômenos e subjetivamente, fazer elegias aos primeiros físicos, criticados
por Epicuro, Lucrécio, Kanada, os estoicos, e também aos teóricos do caos. As
leis nos dão podem, não nos usurpam de mais dele. Suas pesquisas eram sobre
a espécime primata microbium que cultivara em seu tanque de aquicultura.
Tratam-se de águas-vivas fúngicas que expelem esporos e são extremófilas,
sobrevivendo a baixíssimas temperaturas. Sua imprevisibilidade
termodinâmica demonstrara uma nova visão sobre os relativismos: dínamos
vetoriais. Otogi, que pertence à espécie em extinção zoos politikrator,
encontrou evidências que paradoxos como o dos três corpos e o dos gêmeos
podem ser orbitados entorno da mesma problemática: alimentação. O ser
humano é antropófago, ou mais precisamente, fisiófago. Alimenta-se de
entropia, negentropia, enantiodromia, mas sobretudo de energia cinética. Sua
espécie, cuja nomenclatura binomial introduzida por Uppsala Carolus Von
Liné chama-se zoos politikrator, e a trinomial, que designa-o como um
farmáceo reificado, chama-se regicidacina. Recusava-se, em sua série de
artigos pretensos ao científico, a usar termos de consenso comunitário como
‘repulsão’ e ‘atração’, e invés disso empregava nomenclaturas arcaicas gregas,
persas, chinesas arcaicas e românticas do diplomata Empédocles e um hirsudo
naturalista, astrônomo e cientista especulativo, Anaximandro, como ‘amor’,
‘ódio’, ‘vórtex’, ‘apéiron’. A série de artigos tinha uma adição hebdomária de
novos conteúdos e intitulava-se ‘Sobre a Menarca, Sangria e Sanguinolência
de Vênus’, contendo catalogações de espécies descobertas em laboratório.
O ódio é um estado que drena muita energia de seu usuário, portador. A longo
prazo, é preciso muita energia para continuar odiando, para desistir de planos
vingativos. O ódio tem milhares de olhos, todos míopes, estrábicos,
avermelhados, nervosos, mas o amor é cego como Têmis. Uma estratégia de
entrar neste estado autônomo de cegueira fez com que os maiores assassinos
em massa da história fossem mais ricos em amor do que em ódio. Eichmann
fora exceção, a grande maioria não mentiu quando disse que amava seu
trabalho. Há mais maldade na bondade do que há maldade na maldade.
Quem exerce o poder é, afinal, inferior a quem exerce as leis. As leis podem
suprir o poder, de fato, mas o que é mais eficaz em termos de objetivar a
derrotar: rebaixar o poder recalcando-o, escondendo seus tactos ou exigir mais
e mais dele, drenando-o até chegar à escassez da desnutrição completa,
desejos de exerção inteiramente embotados através de uma lei de sucção de
poder por sua cansativa exerção que leva à fraqueza? Listava os tipos
cardíacos em nove tipos poéticos: corações vulneráveis, fornalhas, porcelanas,
de gelo, vazios, vagabundos, amaldiçoados, persistentes, cansados. E fazia
uma topologia da dinâmica da pulsão cardíaca em suas válvulas ora puras, ora
de esgoto insalubre e inundado até as canelas.
Desde sua neonatalogia, não exercita muito suas pernas, pois a fineza relativa,
de suave leveza, crê ressaltar sua grande altura. É um comunicante não verbal,
que conversa consigo mesmo e sua voz soa como se tivesse pressão baixa
crônica. Seus olhos, organismos vivos independentes nomeados de Alzhar-Ar,
tinham acesso às dimensões hiperespaciais, hiperestésicas previstas por
Charles Hinton e Theodor Kaluza e representam-nas por janelas, portas da
percepção imagísticas numeradas e medievalmente classificadas. Sua psiquê
era como uma biblioteca de livros inafalbéticos, de capas sem nome e sem
ilustrações e sem autores e sem créditos e ISBN, mas rica em dados,
riquíssima, genialmente. Olhos R.E.M., esquizofrênicos, viciados.
Orbitalmente fundidos por vontade própria de par em uno cicloscópico e de
mira precisa, fatalística. E que roda e roda como uma bola em movimento
indeterminadamente caindo ou não nas caçambas de mesa de bilhas que são os
encaixes vazios, de seus glóbulos ópticos. Pleonasmo prolixo.
Concentrando-se, fitado, em objetos móveis, eles tardam até vinte minutos
para as pálpebras piscarem naturalmente, reflexionados. Sua reflexologia
também está relacionada à visualização empírica e psíquica de seios e nádegas
que o faz imediatamente e compulsivamente fechar os punhos como se os
apalpassem. Olhos que exigem consciência, animação do usuário. Exatamente,
um usuário, aquele que consome. Otogi consome seus olhos assim como
consome vitaminas, aminoácidos, proteínas, substâncias psicoativas, drogas. O
traficante é seu próprio organismo. Olhos que não congelam objetos em seus
lugares, não materializam imagens na retina. Olhos que pulam de um lado para
outro, sem sequência, em pequenos movimentos, indo além ou ficando aquém
do alvo, e criando um halo constante de movimentos estranhos. Olhos que
oscilam periodicamente, aperiodicamente, dinamicamente. Desomogeneidade.
Olhos de energia cinética negativa que se alimentam de movimento, dos
pródromos gravitacionais, da maturação do embrião que persiste até a vida
adulta, das curetagens e abortos teratológicos, e que chamamos de ‘Tempo’. O
tempo relativístico pode ser mensurado pela porção que um ser vivo absorve a
moção ou energia cinética, a qual se retroalimenta para cumprir fins
teleológicos de seus membros vitalistas, como o piscar de olhos. Os piscares
de Micrômegas, de Voltaire, levavam em média cinco piscares humanos para
serem realizados.
As pesquisas de Otogi voltadas ao primata microbium possuíam interesses
simultaneamente egoístas, altruístas e anômicos, pois giravam em torno dos
problemas contemporâneos seus, brutos em entendimento, e que pretendia
dilapidar como pioneiro. A primeira vista, os olhares ingênuos de um etólogo,
um teórico dos jogos ou qualquer aventureiro em busca da previsibilidade
newtonia,a laplaciana, einsteniana perdida diria que essa águas-vivas se
comportam como enxames, colméias, matilhas, corais, cardumes, ovadas,
revoadas mandevilleanas, mas suas substâncias escondem no mínimo dois
mistérios: constituem a única espécie no universo incomposta de átomos, e por
essa exótica, incrível natureza substancial, são decompostas em cadeia
intermitentemente por reações isonômicas-difeomorfas. Por essa mesma razão,
são a única espécie viva que não possuem forma, ou forma evidenciada,
testemunhada e celebrada como em um martirológio. Suas singularidades
desintegram-se imediatamente após qualquer possível união. A matéria da
qual são feitas, especula Otogi, são os múriouns, e a duração delas pelo relógio
atômico, estipula, são de ordem fracionária sútil: números invisíveis. Sua
divisibilidade é não-separabilidade distante, e sua reprodutibilidade é
fecundidade. Ao que tudo indica, é uma obra indestrutível de ordem categórica
numérica prima: só pode ser incidida por ela mesma ou por sua singularidade.
A existência do espécime é comprovada por suas consequências, efeitos nas
outras forças: ela devora energia cinética e devora interações de forças, uniões
entre elas, como um algoz que executa suas vítimas com uma tesoura aos laços
que estão conectados. As primeiras evidências científicas disso foram com o
glúon, que não abraçava mais o núcleo das partículas, as aglutinando como o
cimento da parede levantada de tijolos. O primata microbium já fora,
erroneamente, introduzido na taxonomia viral por não conter DNA, e
deduziram que era um viróide. Não. Digamos que ele seja como uma tinta
pancrática que se agarra nos moldes de desenhos em estêncil, mas sua síntese
deles, quando concluída, gera pares de cores opostas às previstas, contrárias,
não meramente invertidas, mas cores que aniquilaram as originais. Inseriu-se,
por conveniência, na ordem das espécies insurrentes de, a ressuscitar o termo
introduzido por Henri Poincaré, matéria e energia escura. Elas habilitaram-se
a mestrar-se na arte da convecção e metabolização ao produzirem em grande
escala anti-matéria por processos de reescrita nas partículas à maneira dos
palimpsestos, e de conduzir sistemas à estabilidade e instabilidade por
interação direta de fluxos termodinâmicos. Isso fez com que todos se
perguntassem novamente: da onde vem o calor? Suas ‘formas’ mais próximas
do material eram a do condensado de Bose-Einstein. Simplificando: agregado
de partículas macroscópicas se comporta como partícula uno, e partícula uno
se comporta como suas partículas elementares. Otogi aplicou o efeito
Humpty-Dumpty à elas e compreendeu o fenômeno através de interesses
bélicos: projéteis de quanta e quantum imunes aos estudos forenses e à perícia.
Nas escalas microscópicas, nenhuma das partes se tocavam. O contato era
impossível, não apenas improvável, e qualquer registro pancrônico que
denunciasse identidades ou o momentuum do assassinato era anulado por
correntes dissipativas. Os projéteis eram manufaturados como rosários
materiais fortemente magnéticos. Sem necessidade de cordas nem de
alquimias metalúrgicas ou ferreiras. Os projéteis desafiavam a entropia porque
não possuíam as distinções orgânico-inorgânico, artificial-natural, morto-vivo,
plástico-topológico. Seus encaixes, ao contrário de uma xícara quebrada ou
um quebra-cabeça, ou um cubo de Rubik, eram plasticamente congruentes,
como um cérebro ou um labirinto móvel de Daedalus. Eles regeneravam os
tecidos, as tramas, malhas, redes da vida, mas também regeneravam dor,
feridas, tumores, morte, trazendo-as de volta. Otogi podia, com um estalar de
dedos, transformá-las em armas biológicas, mas desejava antes ser
reconhecido, ter um de seus artigos aprovado e participar de todos os ônus
honorários, onomásticos e numismáticos das festas oficiais e íntimas,
depravadas da comunidade científica. Sua expressão gênica era oitenta por
cento ativa, consciente e anímica. As outras hibernavam, mas de olhos abertos,
como que sedadas após séries de psicofarmáceos, benzoadiminíacos. Sua
franja é escondida transversalmente sobre duas linhas de mechas que
degradam em ascensão para trás, onde é repicado e curto. Sua roupa, fresca,
possui um babado nos ombros e mangas bufantes, como se se fantasiasse com
as roupas de bonecas circenses, feéricas, tematizadas de órgãos dirigentes
inferiores da realeza feudal. A xenoglassia, xenolalia, coprolalia, coprolaxia,
prolaxia são vocábulos comuns entre seus veículos acidentados de expressão.
Quando termina de escrever um artigo manualmente, arranca todas as páginas
preenchidas e as recolhe, como e em que sucessão for vierem, e a mantém
assim, desse modo, sem alteração, entregando para a avaliação de projetos.

Quem disse que Deus criou esse universo e que a origem de tudo está no
início?

Revolução balística, antropornologia, ateantropia, ateosofia. Farmáceo algum


tem efeito imediato. A sociedade em que Otogi vive, Metropoliteia, idolatra a
Pathosformel, a fórmula das doenças, porque, assim como seu complexo de
hipocondria, ela age como uma fábrica de identidades solúveis, reagindo ao
contato de seres líquidos e desmanchados. Todo ser vivo aspira por uma
patologia que complete-o, que exprima em interjeições epifânicas algo tão
filodoxo e milagroso quanto ‘Eureka!’ a sua condição. O diagnóstico do
doente terminal, crônico, do transtornado é tão importante para a formação de
sua identidade quanto seu nome de nascença, batismo, nacionalidade. Se não
possui ou contrai uma patologia naturalmente, é preciso sintetizá-la, abstraí-la
laboratorialmente e aplicá-la em si mesmo em células sectárias ou partidárias.
Otogi, porém, já tinha encontrado a peça faltante de sua identidade: a
Síndrome de Tourette.
Os tanques de aquicultura de Otogi eram vivos e tinham o sabor do caldo
primordial. Organossolo, cambissolo, neossolo, gleissolo sálico, todos os tipos
geográficos e elementos estavam lá presentes, mas de forma líquida ou em
cristais de tempo, eventualmente gerando singularidades como sólitons
violentos.
Genes nucleares e não-nucleados, fatores de Mendel eram banhados,
macerados nos aquários, reproduzindo seres vivos sem forma.
Enquanto isso, a Aranha Negra de Tanizaki fazia a lista de presença das
Divindades Cabeçudas.
Otogi não usava parênteses nem traços, dos artifícios linguísticos, apenas as
aspas, para se referir às abstrações. O próprio ato de se referir às coisas como
abstrações, julgava ele, era ofendê-las. O único elogio crível era a concretude.
Sua existência interior e exterior caminhava entre a acídia e a atitude blasé.
Decorava seu cabelo com um cacho de uvas dionisíaco, bacante
confeccionado em metal de origem espacial cozinhado no interior de anãs em
seus últimos suspiros termonucleares do limite de Chandrasekhar, e cuja cor é
bronze espelhada. Vestia calças compridas de algodão e manchas negras
acidentadas como asfalto sujo por tanques de óleo cobriam seu busto,
antebraços e pélvis. Como poças acumuladas de chuvas poluídas do Kuwait.
Piche, suxametônio, arsênico, antimônio, sódio, salitre, calomelano, picrato de
potassa, magnésio, eósforofina, moralina. Bela sopa dos cachinhos dourados.
As suas obras de arte balísticas e belicistas não dispõem de dispositivos
causais e finais, mas de sincronicidade em seu gatilho, se mantendo em
velocidade constante compensatória independente da distância à moda do
pêndulo galileuniano. Munição alternada, balas psicognitivas que aparecem
quando a vítima pensa nelas em um complexo de memento mori que teme o
marcialismo. A consciência humana está ligada aos fótons e sua velocidade da
luz e a partículas elementares de nível microcósmico de ação fantasmagórica a
distância que ultrapassa a velocidade da luz. Seu poder de raciocínio é além de
extremamente rápido: é instantâneo. Instantaneamente baleado também graças
a isso. A ponta dos seus projéteis são inflados e achatados, na forma de
glandes penianas, e são disparadas sobrecelestialmente em unidades únicas,
reguladas pela unidade Banach-Tarski em que o princípio numérico é
inviolável mas sua qualidade e identidade das condições iniciais, não. Uma
bala, é isso o que é exigido. Mas se será uma bala composta de átomos para a
fabricação de apenas uma bala ou, digamos arriscadamente, o exército da
Iugoslávia sob a proteção de Josif Broz Tito na tragédia de Balcã que se
defendeu da URSS e a Alemanha ao mesmo tempo, reservando sobras de
munição, isso é perfeitamente possível. E ela dividir-se-à em mais balas desde
que elas tenham surgido de apenas uma, e não mais do que isso. Isso viola as
leis da natureza? Alguma além dos axiomas de Zarmelo-Fraenkel? Por acaso
Wittgenstein acabou com a ousadia de vocês desde que confrontou Turing?
Digam-me físicos, e digam-me com seriedade, sem fazer-me rir: como é
possível que haja essas leis se nunca houve legislador algum? Não há lei física
a violar e o motivo disso é simples: vivemos um universo anárquico e caótico.
Não há, nunca houve e nunca haverá leis, tampouco leis a infringir.
São projéteis protomutantes cuja energia de reserva é legislada por seu próprio
Minos, Têmis da física, o princípio da equivalência. Um corpo pode
distribuir-se em átomos, estes em partículas subatômicas, e estas em
elementares, em um sistema semi-fechado, isto é, fechado em sua forma,
aberto em seu volume e energia. A sua trajetória e velocidade, sempre as
mesmas, são desvantajosas a curta e média distância, mas perfeita para longas.
Suas balas são ecológicas, mas não no sentido pacífico do meio-ambiental
hodierno, e sim no sociobiológico eugenista da escola de Chicago e sua
aplicação na antropologia metropolitana: elas competem por espaço, arrancam
as raízes já enraizadas, expulsam os recém desterrados e deserdados, enrolam
e amarram fios, nervos e veias animais de forma aleatória, desleixada e feia,
horrorosa em nós de cadarços engraxados por um cuspidor satânico.
Otogi costuma massagear suas próprias mãos para relaxar, e quando seu nível
de estresse chega ao máximo, seu corpo se torna monocromático como um
pião colorido rodopiando a jato nitrogênico, suas células coagulam,
cristalizam, calcificam em um tom verde-musguento, e o único movimento
que passa a ser detectável são o de glóbulos de ar por embolia aparentemente
vazios que saem de seu corpo como emissários secretos, agentes
panamericanistas e pangermanistas.
Os Transplantados, como se chamam os cabeçudos com o busto de Ganesha,
Anúbis, Moloch, Aion, Esfinge, Jah, Buda, Banebdjedete, dentre outros que
desembarcaram do Takachi-Maru naquela noite, são os Shondaros, guardiões
da Aranha Negra de Tanizaki.

Naquela noite, Kakihara Saseyuki, recém-promovido a cargo superior da


agêncio de limpezas Melioras, sofreu um tremendo torpor, algo que
despertava toda sua inidoneidade. De manhã, presenciara um senhor,
conservador a moda burkeniana, com seu carro pré-revolução industrial na
garagem passando por manutenção, sentado sobre uma cadeira amolfoada
tocando seu acordeão, e tal melodia, digamos, armou sua barraca, mosqueada
de pequenas rugosidades vernelho-escuras, e a noite, de volta ao seu lar, pelo
parabrisa avistou uma mulher acidentada de motociclo. Seu cadáver estava
embrulhado em papel alumínio, e o sangue dela, espirrado no asfalto de
granito planado por rolo-compressores de bobinas encharcadas de piche, era
colorido, e os miolos de seu cérebro, psicromáticos, psicotopológicos,
psicotopográfico, via-lactentes, via-lactosas, via-lácteas, via-leitosas como um
arco-íris orgânico.
Kakihara sempre leva, em sua maleta, uma escova de fios metálicas, uma lixa
de lixar ferro para as unhas, escova de dente, sabonete líquido, em pó, em
barra e em solvente. Assim que desperta, levanta da cama, faz suas
necessidades em rumo à uma desfaçatez, declara suas posições políticas,
religiosas e sociais que sempre mudam no fim do dia. Veste sempre seu traje
de profissão, junto do óculos aureolado com cordão de bolas esféricas de prata
e seu cabelo é cacheado mas projetado para trás, erigido para cima, sendo de
tom amarelo-preto como uma abelha, mas sem soar, explicitamente, como
uma abelha, e sim de forma sútil. Fazia apenas alguns minutos que descobrira
sua habilidade: a Anima Mundi. Possui uma vaga sensação de que sua
existência seja simulada, escrita passo a passo por um Deus maligno.
Saseyuki sempre diz o preço e o lugar em que comprou seja lá o que for de sua
propriedade, e possui uma vontade libidinosa vinte e quatro horas por dia de
transar, de foder.
O avanço biológico conduz à morte ou ao florescimento, à simbiose ou a
desintegração. A diferença sútil entre esse par mortal-surreal, é o ritmo, que
contrasta com a velocidade. Pois é possível viver os anos mortais, todos eles
embutidos em um deslize de segundos no desfiladeiro em queda, e ao mesmo
tempo, não viver nenhum ano mortal durante a eternidade temporal.
Se você lutar contra si mesmo sozinho, você perde. Porquê é uma batalha de
um contra um e o seu Eu destrutivo é sempre mais forte.
Há seres terríveis neste mundo. São os seres sem nenhuma dualidade,
maniqueísta ou ética. Completamente bons, completamente malvados.
Percepcionados. Cada ato, registrado em arquivística, procede a uma visão
unilateral que não há outro lado detrás do que ele faz. Esses sujeitos são os
mais temíveis. Assim como as curas imediatas, salvadores religiosos.
Desesperadas e inférteis, como não crescem, se agarram em algo ou alguém
que as estique, mas que não as faça crescer. Uma largura e comprimento que
tendem a se reencurtar, pois não são naturais. Se a cura que atinge o paciente
não cessa a causa raiz de sua doença, talvez seja porque ele transpira toxina e
veneno a si como o faz com a salinidade líquida. Suor. É uma ouroboros
peçonhenta. Produza o veneno que desenvolverá sua imunologia, seu
imunodeficiente!
Na física, a potência é a aceleração sacrificada pela velocidade, esta doada de
objeto para objeto, e o trabalho é a velocidade vezes a distância. Isso significa,
na prática, que tudo quanto é potente, é vacuamente instável, e o tanto mais
estável, mais definida sua forma, menos potencial é a forma outra que desejar
ser. A taxa de produção para atingir sua meta pode ser efetuada com precisão e
constância uma, duas vezes, mas quanto mais força, menos desprezível são as
outras forças exteriores, que se tornam opostas. Assim que uma forma
potencial se torna real, as que ela deixou de ser também se tornam, mas
competindo contra ela, por ter ganhado a existência através da nascença, e elas
não. Existem ser ter nascido nem sido concebidas. Não são bastardas, órfãs,
abortadas nem adotadas.
“Da vida, não espero nada. Nem mesmo ela própria.” (As primeiras palavras
de um bebê pré-abortado)
Individualistas tolos! Saudosos seresteiros da vida nas montanhas, lagos e
outros sonhos de feriado ariano, jamais souberam atingir o valor e significado
profundo do Outro. Eu cuspo em vocês enquanto me olham debaixo,
Nietzsche, Stirner, Rand, Mencken! Breve demonstração, refutação do
individualismo e egoísmo: o Eu não significa nada. Se chamo cada posse,
propriedade, parte de mim, das partículas elementares às células de Eu, não
sou mais eu, e sim Nós. Me torno meu próprio sepulcro assombrado de egos.
Pergunto a eles ‘Quem dentre vós sóis eu?’ e ouço o eco do silêncio, talvez um
baque de um cadáver oco, que ressoa uma nota alta de nada. Piano anecóico de
acústica que priva ruídos e sons perfeitos, tudo. Nenhum trono ou cadeira de
fidalgo desocupada a eu assentar minha identidade está disponível, vaga. O
coletivo indiferenciado é sempre a morte do ego, mas um coletivo
diferenciado são as preliminares de seu parto como ser individuado. Invés de
chamar todos eles por mim, do meu nome, de mim, começo a lhes tratar
diferente, tratá-los como o Outro. Conformados, conformes, conformistas ao
mundo do Eu, que sejam os individualistas e egoísticos enforcados com as
vísceras do último campesino intelectual dos antigos cultos aos hiperbóreos.
Chamo-os para um levante, uma rebelião. O Outro não é uma pessoa, não é
um ser vivo, não é meu contrário, mas é minha diferença. Eu assumo o outro
porque eu sou mutável à mudança. O mundo de individualismos, de Eu,
sufoca-me a ponto que o excesso de Eu não permitiria a ninguém, a nem eu,
ser eu mesmo.
Saseyuki observa os vidros com reflexo a toda oportunidade possível.
É um equívoco criminal, leniente, crer que é pelas fantasias serem ilustradas
como mais fáceis em comparação a realidade física que o homem as prefere. É
precisamente por seu valor deontológico de perseguidor da utopia, do feérico,
do surreal, do mágico, do místico, oculto, fantasioso, esotérico que ele cumpre
passar por toda sorte de dificuldade em um mundo ainda não existente, e
mesmo que este seja um horror, um terror, extemporaneamente terrível ao
nosso mundo real, a ponto do nosso soar infinitamente mais justo, ele irá
preferir viajar à fantasia, escura fantasia.
Tudo o que os escritores escrevem que eles, seus semelhantes humanos, a
humanidade é incapaz, impossibilitados, desqualificados de fazer, é
considerado ficção. Isso leva-nos a constatar que há mais realidade nos contos
de fadas e narrativas medievais com monstros dos bestiários de Grimm e
Heródoto a obras teóricas, econômicas e filosóficas tanto de cunho
conformista quanto revolucionária. Estas, sim, são ficções, de disparata
podemos afirmar.
A fantasia pode encontrar um equivalente na realidade caso a realidade
existente seja uma realidade extremista. Os extremos se levam sério, mas tão a
sério até o fim, que são estupidamente inacreditáveis, quando testemunhamos
como, de repente de testemunha a cúmplice ocular, o que eles podem fazer.
Os desastres, a incidência e incandência dos ciclos de Milankovitch em
aumento, os acertos das apostas do teórico Henry Gouchon, fizeram com que
os meteorologistas considerassem a existência de mais estações anuais, estas
vagarosas como uma cáfila no deserto carregando homens cortados por
cimitarras.
Toda energia pode ser transformada em energia sexual.
O ciberalismo, a qual todos os cidadãos estão enrodilhados como peixes em
uma rede eletrificada ativa ao menor sinal de fuga, espadanou toda sorte de
panaminismo, concebendo um mundo de coisas dotadas de almas doadas por
humanos ou simplesmente coisas encarnadas vazias e mecânicas. Um mundo
vazio ou antropomórfico, é isso o que sobrou. Nada mais possui alma há não
ser o ser humano, que esgaravata o nariz enquanto os ditos desalmados são
ceifados, incinerados, bestiados. Mas também ele não está a salvo: suas mãos
calejadas constroem seu próprio hospital subterrâneo de captura de órgãos e
almas humanas alheias. Esse transporte de almas metempsicótico, baseado em
importação e exportação, mas também expulsão, arrombamento, diáspora, aliá
clandestina, subterrâneas, pressupõe que os organismos, os seres que
originalmente são inteligentes, não o são, e que nós o somos mais que eles,
dando nosso excedente ou nosso todo para que eles tenham algo. Nesse
pesadelo sociopolítico, a identidade que se tem é expulsa por uma que não a
sua, e a única do doador, ele a dá para algo ou alguém que já possui uma por
inatismo, ficando sem absolutamente nenhuma, sequer resquícios, sequer
vestígios.
Ao lacrimejar, as lágrimas de Saseyuki ficam perpetuamente suspensas, como
uma ponte pênsil, ou caem, brotando paraquedas de fluídos orgânicos que as
tornam bioexplosivas.
A dinâmica dos fluídos da física é a dinâmica do fluxo estoico, da pantha rei.
Tecnologia vegetal, natural, orgânica. As máquinas não são incompatíveis com
a conscientização vegana e vegetariana. Essa distinção, cisão que o homem fez
entre artificial e natural, eu a desprezo com todas minhas forças sexuais
animalescas. Seja lá qual Deus que ele quer calcar até sua posição, cumprindo
todas as normas do seu editalício ascético, quero que este mesmo Deus vos
arrebatam todos e deixem-nos viver bem e em paz, desintegrem e matem seus
corpos em cinzas brancas.
O nome farmacológico de Saseyuki é craptocidicina. Custeado o amor pelo
que é endividado, é jurado recorrentemente por sua reserva de energia de
esgoto, purificada e filtrada por cloro e alvejante oníricos, a sonhar o sonho
em que todos que ama e por quem é apaixonado são agredidos, violentados
por um exército de criminosos com seu rosto, face, perfis, corpo, variada
apenas as idades, e estes socorridos por um antiexército encapuzado,
mascarado ou desfigurado, mas que, uma vítima que revele suas identidades,
todos eles se rebelam e perdem a razão, sanidade, senso de quem é amigo e
inimigo e abatem-nos.
Assim como o urânio, mudada a massa de seus prótons e elétrons, tem a massa
fermentada e carregada explosivamente, dando origem a inúmera matéria a
partir de sua destruição, a minha alma destruída irá criar inúmeras almas.
O que deseja me agradar sem desagradar quem ou o que me faz mal, deseja
também me enganar, e esse acompanhante, é preferível barrá-lo na entrada da
festa de luxo.
Originalmente um viróide reativo e sensível a frequências de ondas, ou seja,
um flora solaris, complexificou-se até ser sensível a palavras, embora seja
desmunido de molécula de DNA ou códigos genéticos inatos. Nascera a partir
das profundezas das fontes de Eupátria, onde habitam pubescências orgânicas
de líquido neutro.
A filosofia e a psicologia nos fizeram acreditar que por trás de tudo há um
sentido, e o quão desprezível é essa ideia! Mais vale um mundo, uma vida, um
universo sem sentido a essas egrégoras por um sentido inexigível às escolas de
busca ao saber, mas não de saber! Agem como se a época da razão anulasse a
emoção do coração, e contudo a emoção sempre vingou, sempre há de reagir,
agora não mais a emoção diretamente, mas a emoção pela difração e refração
do raio da razão, que produz espectros emocionais sombrios e doentios!
Mimeografia, psicografia, biografia, bibliografia.
É possível perdoar o erro de uma pessoa quando o erro é o ato, não o ator, a
posse, não o proprietário, mas o fato é que há existências, individuais ou
coletivas, egoísticas ou dissolutas, que são erros imperdoáveis por si só.
“O consumo da felicidade como produto molecular e sequenciado
quimicamente em pílula a torna uma droga, não uma emoção.” (Morte aos
Traficantes e Gangsterismo de Serotonina)
Biossolventes, materiais biogênicos, fontes de energia livre. Lineu estava certo
e errado.
A filosofia abstrata conversa com os drogados, prostitutas, escravos,
patologizados, psiquiatrizados, hospicializados, transtornados, proletários,
marginalizados, atípicos. Cumpre a ela, por sua abstração e subjetividade,
tornar concreta suas vivências, pois toda forma de diálogo com eles foi
indireta até agora porque nossa língua, direta para nós, não era para com eles.
As gônadas e glândulas dos binascidos.
Poucos os personagens que escapam do mutismo, tatismo e autismo que o
autor os aprisiona. Saseyuki, o doador da Anima Mundi, o doei minha voz,
embora seu couro cabeludo de crina de equino selvagem e pelo de himénio,
repleta de bioassinaturas, nas costas com atratores de Lorenz e conjuntos de
Julia, nos olhos curvas de Koch, membros extremos, arcada sisuda e
cadavérica esmaltada e de fileiras de ossos teatrais, como que em processo de
sobreposição de planos à lá a colagem de Murakami, Kawamura e Tanaami.

A geociência e geopolítica por trás de sua bioanatomia, ou pré-biológica, é


constada pela sua superfície frágil e rompida por gêiseres hemorrágicos que
formam estalactites e outras formas abstratas da matéria, mas que não seguem
a efeméride geocêntrica ou heliocêntrica, mas antropocêntrica, pos tais formas
são-lhe pubescentes. Cada célula, átomo, partícula elementar dele é inteligente
e anímica, e por isso, não seguem roteiros determinados ou de flechas do
tempo, mas livres, caóticos e repetitivos, como dados viciados manipulados
pelo crupiê diabólico do Hotel Califórnia. Se adoece, dialoga com seu corpo, e
assim, o persuade a desenvolver anticorpos e imunidade, além de seus órgãos
serem geogênicos e catagênicos, ou seja, mudam de forma e, afastando suas
partes, nunca chegam a romper. Sua arma, a Devil in Disguise, é um
alto-falante militarizado compacto feito para recitar códigos que criptografam
todas as coisas existentes sob obras de letras, como melodias, cifras, estrofes,
genética, DNA, senhas, coordenadas, de modos reversos e reversíveis. Desse
modo, ele difrata, reflete, refrata, diflexiona tudo o que existeu e existe em
uma divisão gravitacional e holográfica, dividindo-os, e dividindo a si mesmo
em prismáticos espectrocóspicos que variam de azul para vermelho, sendo um
de seus possíveis estados, o estado de fluído escuro, que não interage com
nada e não obedece ao princípio de complementaridade de Bohr nem o de
incerteza de Heisenberg. Assim, ele pode atingir a velocidade de escape
cinética e não ser impedido por absolutamente nada, alcançando seu conatus,
podendo flutuar ao ar livre sem objeções materiais, o que só é possível graças
a sua distância espacial, localizada no vácuo, o que temporalmente, precede a
qualquer fenômeno dinâmico ou cinemático. Seus neurônios, que jamais se
tocam, mas se comunicam quanticamente pelas sinapses, não formam redes,
mas formas visíveis da estrutura e mensagem do que ele conjectura. Seu
consciente é estruturado como linguagem.
Todo pensamento e descoberta epifânica que eu desencadeio no outro me é
posse por direito.
Quando se consegue visualizar algo invisível, como uma fórmula matemática
que se torna formas geométricas, isso poupa, economiza energia, fazendo com
que se aprenda, mas o ato de escrever é justamente o contrário: transformar o
mundo visível em formas algébricas, trigonométricas, poéticas, prosaicas, uma
gramática em que o verbo guarde o mundo conhecido de forma criptografada.
Escrever é um ato que leva ao mais próximo da cegueira, um mundo de
descrições.
Isso é o pecado original. Anabatistas, adamistas, anabatistas, adamistas! O
pecado original como ele é, como ele foi, e não como se conhece em exegeses
de informação manipulada e controlada: não a separação da carne do espírito,
do corpo e da alma, mas sim o divórcio do verbo com a matéria. Uma teoria de
tudo? Até que se cumpra a reconciliação, o rematrimoniar, o quintessencializar
do verbo com a matéria, de modo que nem um nem o outro os descreva, isso
jamais será possível. Falais de equações sobre o mundo do mesmo modo que
um homem fala mal de sua amada com base em rumores e boatos inconfiáveis.
A alma, como o verbo, vive em carne. Essa carne, viva, morta, putrefata,
degenerada, suja, indistinto seu processo de mutação há não ser pelo odor à lá
tolueno, é o que a torna viva. Em cemitério, a vida vive na matéria morta.
Uma floresta de natureza morta.
Se nós precisamos defender uma causa justa, como a abolição de parafilias
hediondas em Eupátria, Metropoliteia ou nossa vizinha mais próxima,
Forasterra, por ser uma causa parcial dotada de oposição, não devemos
recorrer à cegueira vendada de Têmis, mas aos olhos que desprezam o outro
unilateralmente, ou seja, não um par, mas um único, franco e ciclópico olho.
E esse mistério gramático, não basta o transformar em enigma, mas
manufaturar a chave que o destranque e ressintetize o mundo do seu
conhecimento, como a ativação de uma molécula de DNA antes inativa. Se
guardar, trancar, destrancar. Uma caixa de presente que sempre muda o
conteúdo interior.
Energia excessiva. Não em guerra, mas com recursos para tal. Colete todo esse
armamento, peça por peça o desmonte através da retroalimentação dessa
energia marcial, as recombinando, peças recicláveis ou de durabilidade
milenar, até que façam um origami e uma metralhadora.
A sensação do proprietário fez com que ele se identificasse tanto com sua
posse que começou a chamá-la da forma mais cordial e imputável que
dispunha: Eu.
Ora, eu também sofro! Não parece, é mesmo? Pois é porque eu me divirto
sofrendo!

No mundo de Eupátria, toris, os portais religiosos shintoístas, são portais de


Einstein-Rosen.
Papillon Andalou. Mormente pubescência puberdade, as suas malhas, como
fios, pelos, veias, são imantadas e magnéticas, todas acompanhando umas as
outras, como relva dançando na brisa e brasa. Relva pesada, sem conseguir se
atiçar, levantar e brasa esfriada ambas por uma lula nojenta e divina que
vomita tinta que mudaria a cor do próprio oceano. Seu sangue, incoagulável e
indestilável, é como a Lua de Marte, Europa, cuja crosta superficial de gelo é
o único estado sólido da matéria, assim como a sua pele. Não possui esqueleto
nem chassi, mas campos eletromagnéticos auto-emitidos por seus órgãos que
moldam sua forma. Seu cérebro é completamente líquido, em uma margem
mínima apenas um pouco acima dos demais seres encéfalos e platicéfalos, que
possuem setenta por cento líquido e o restante gordura. Não contém uma
anatomia fixa, com loco exacto, e é flexível à realocação, que nos humanos
acontece por causa de alucinações que fazem com que o corpo pense que um
membro que a pessoa perdeu num acidente ou algo semelhante, ainda existe.
Se você perder um braço, as células do cérebro que correspondem ao sistema
somatossensorial que correspondem a essa parte do corpo irão parar por
completo, e as células cerebrais mais próximas que controlam outros órgãos,
irão iludir outras células do cérebro. Supondo que as células que estão iludidas
são as do rosto e dos ombros, a pessoa sente o braço que perdeu nesses
lugares. As células cerebrais que estavam perto do centro de memória param
de funcionar, porém as que controlam a memória aumentam
extraordinariamente, criando assim memórias fantásticas.
Essa é a explicação genérica que a caterva de cientistas atônitos pela
dificuldade de encontrar diferenças significativas geneticamente arqueológicas
entre um litófilo e o crânio de um dinossauro nos oferece, porém Papillon usa
desse artifício por causas diferentes. No caso, são duas habilidades controladas
pela osmose e a simbiose: A Morte do Ego e Os Cadáveres Adiados.
O amor, fato impugnável, é um evento paródico.
A apropriação de um fogo que só se acalma quando consumido por um
devorador circense de brasas, jamais o vento. O vento, aerodinamicamente, é
como o que são trilhas ao trem a vapor para ele! Ele toma seus caminhos, faz
dele escadas, elevadores, ascensores, e dança sobre eles. Não mais tornado,
mas tornado de fogo! E ele só se acalma quando chega aos pulmões. É como
uma fera carnívora que abandona aos prazeres naturais da carne para desfrutar
dos prazeres sexuais da carne.
Amar é estar conscientemente ativo de que a vida é uma guerra de recursos no
objetivo de criar, a partir de si e de quem amas, uma obra de 'Nós' na condição
desgraçada do artista que até mesmo o seu retrato produz um 'Não Eu'. Que se
é idêntico, não é autêntico, e vice-versa.
Amar é compreender que o caminho para essa desejada obra não deva possuir
enquadramento comum nem com o sólido firmamento de pregada e martelada
no superior da parede do museu do louvre se sustentar. O molde é uma boca
sisuda de arcada metalicamente dentada que devora o mundo retratado e cuja
firmação é um repouso celeste constante sem colisão e sem queda.
E esse mundo, o qual ambos amam, não é historicamente encontrado, porque
todas as testemunhas, evidências, pistas, manuscritos, criadores deles se
perderam, decidiram se opor a terminar sua produção antes dela acabar, se
consumar, pois se ao fim chegassem, tudo, o mundo, seria levado ao fim,
como uma religião que leva seus seguidores ao juízo final. Como um Deus
escritor, que percebeu que se tornou um personagem de seu próprio livro
bíblico, se assusta e diz a si mesmo: 'Maldição! Se eu acabo com minha obra
eu acabo comigo mesmo! Estou eu condenado a entrar em hiato definitivo ou
a escrever perpetuamente?!"
E ele escolheu amar, amar como variar, recomeçar, recordar, circular, mas
jamais apagar sua obra. Amar é fantástico, é incrível.
Amar é viver, porque viver só a vida não é viver. Viver é viver a vida e mais
algo, a tu, a mim, a nós, ao amor.
Os contadores de histórias medievais disseminaram como um aerosol de
inseticida o lema “Matar e morrer por amor.” Creio que usaram o amor da
pior forma, tal como fizeram com a religião: um pretexto para matar e morrer,
jamais amar ou crer no divino.

Precisamos parar por um momento e realizar um interrogatório ao leitor. O


que o herói deseja, qual o seu sonho?

- Quando todas as tentativas, ajudas, socorros, iniciativas fracassam e o


verme se suicida, não há outra coisa a acreditar se não que todos os
esforços foram em vão e se direcionaram a uma persona semi-idêntica
a portadora da máscara, nas mesmas horríveis condições que ela, mas
que não é ela. Mas uma máscara, ao contrário de um ser vivo, quando
se quebra, não morre nem mata o portador. E não é dando vida à
persona que se salva a vida do portador necessitado em apuros. Mas
sim, como um ferreiro que refina a si mesmo nivelado e paralelo ao seu
ofício, baseando o modelo de suas espadas ao semblante de seus
encomendadores, o ser humano, cuja máscara é para ele o que é o
vômito e cêra para a abelha e sua colméia, a única substância
autocatalisada por si que ele usa para construir uma realidade são os
macrófagos e micrófagos que devoram e reconstroem o seu rosto
fabricando máscaras. Tenhais como modelo sua face, face perdida, e
construa máscaras, não de porcelana, nem de madeira, cêra, vidro,
ferro, mas de carne humana, a sua própria carne. Verás como se uma
máscara é feita da mesma matéria que o seu portador, ela não é mais
sua máscara: é sua face!
- A memória aniquila todas as coisas com mais eficácia do que o
esquecimento. Lembro-me de tudo que já não mais existe, que destruí
e que fora destruído. O que esqueci, o que esqueceram, talvez seja por
isso que ainda está vivo. O que é nomeado, conhecido, é condenado a
ser lembrado, e se é lembrado, também o ceifador se lembra dele mais
do que qualquer um.
- Dar sentido a algo é usurpar o sentido que esta coisa tem per se.
- A vida e eu são coisas diferentes.
- Para algo ser conhecido, não é preciso praticá-lo. Não é necessário ser
simpatizado ou contemplado. O desconhecido para todos, pois, já
aconteceu inúmeras vezes. Ciclos cósmicos intermináveis, ressureições
do Samsara, abençoados pelo Baraka sufi, à eternidade, e ninguém
possui real ciência deles ocorrendo.

Afim de compensar um erro, não se deve fazer melhor do que fez, mas
simplesmente fazer o que originalmente deveria ser feito. Um filósofo
completamente anti-racionalista. Espere. Não. Quem é mais racional
pode doer menos o emocional do que quem é demasia emocional e
espiritual. O racionalismo possui um tanto de emoção.

O herói se pergunta:

- A paz mundial, talvez?

Não, definitivamente não está bom. Um roteiro limnologicamente poluído, como


uma caçamba de lixo jogada no rio por túnel. Clichês são bons, eu os admiro, mas este não.

- O que acha de eu salvar algumas jovens moças, então?

Não.

- E se eu agisse como o pior misantropo, misógino, parafílico, racialista,


ecológico sombriamente, no caso deste ser não apenas alfabetizado,
mas letrado e academicamente erudito?

Me conte mais, por favor.

- Além de dar voz ao ódio à humanidade e humanismo, por quê não minha mão ter a
mesma marca de “M” da obra de Fritz Lang e a homenagem de Breton?
- Por quê não adicionar um complexo de hipocondria, síndrome de Ganser e transtorno
autoimunológico, que retarda os efeitos de doenças e drogas farmáceas pela minha
pura força de vontade?
- A capacidade de emitir uma ressonância magnética Schumann de escala global que
desencadeia filas anormais de prótons nos organismos que, livres da imantação ao
campo, voltam parasitando seus núcleos, instabilizando-os?

O fato importunável de todos atingirem as minhas expectativas, o demônio de


Laplace, e após cada ato eu pronunciar as mesmas palavras:

- Previsível, previsível…
- Cabeça, ombros, braços, mãos, pés, pernas… Aumentando os dados até ser
como um dicionário ambulante de anatomia humana. Enquanto os corto,
quando com pouca energia, considerando as articulações, e quando com muita,
sem.

O que diferencia o humano do animal é que este apenas procria e se alimenta. No entanto, o
humano não anda fazendo exatamente o mesmo, quando sob condições tecnologicamente
avançadas que o retrasa ideológica e historicamente? Não faz, se não reduzir a vida à mera, e
somente ela… Vida? Perceba: viver de verdade é viver mais do que a vida, e toda
espiritualidade advém disso.

As consciências substanciais pronominais foram descobertas pela monja ascética Aurora af


Theosformel, que após uma incógnita tragédia, que segundo fontes não confiáveis, canard
jornalístico, fora de caráter conubial, começou a meditar e assim ficara por trilhões de anos,
sem indícios de regeneração nem degeneração orgânica, e envolvida em um monolito de
vidro transparente a prova de fogo e som. Talvez o fato de seu relacionamento ter sido um
fechado, tenha-a despertado pulsões sexuais que apenas a vida religiosa poderia confrontar
(mas não derrotar). Dentes crenulados, movimentos parkinsonistas, pele lisa. Que falta de
criatividade descritiva.

- O sexo não deve ser em vão, como um desejo a ser saciado, e nada além disso.

Ele, que a purpurina e confete negro grudam em seu couro como as escamas do dragão negro
que desencadeou o eclipse no matrimonial encontro com o Sol jurássico.
Rezo por um mundo possível em que as frases e palavras não existam.
O amor nunca prospera com uma única expressão, mas sucessões de expressões. Os gregos
tinham sete expressões amorosas. Alfabetizado, academicizado, civilizado, adestrado,
humanizado. Nada disso basta para que o amor sobreviva, na verdade ele percalçará muitas
experiências de quase morte onde alucinará manjares e oásis. Afim de que ele viva, a
pergunta a se fazer é: continuas a expressar o que originalmente aspirava a expressar? Nas
línguas em que transitas, a palavra se destruiu apenas gramaticamente e idiomamente, ou
também em significado? Viva em um idioma onde exista a palavra ‘Amor’. Essa é uma lição
que você precisa aprender.

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