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PURA
Introdução
O Brasil possui uma das maiores biodiversidades do planeta, compre-
endendo quase um terço de toda a floral mundial. Contudo, o grande
potencial econômico e social desses recursos naturais, ainda, são pouco
desenvolvidos no país, principalmente, com relação à expansão das ino-
vações no setor farmacêutico, seja como fonte de novas matérias-primas,
novas substâncias químicas ou precursores de moléculas terapeutica-
mente ativas. Por outro lado, nos últimos anos, o mercado farmacêutico
tem observado um considerável aumento no consumo de fitoterápicos
por parte da população, que está cada vez mais preocupada com a própria
saúde e bem informada sobre os riscos dos medicamentos alopáticos,
que fazem parte da conhecida medicina tradicional.
Neste capítulo, você irá estudar o procedimento para coleta de ma-
terial vegetal, além de conhecer as técnicas para o seu preparo e as
especificações dos respectivos métodos de conservação.
2 Coleta, preparo e conservação de produtos naturais
Identificação botânica
Depois da coleta do material, é de fundamental importância realizar a sua
correta identificação botânica, já que a utilização equivocada de uma determi-
nada planta pode levar ao uso de um produto sem o princípio ativo desejado
ou mesmo causar intoxicações indesejadas.
Em geral, a identificação botânica pode ser feita por meio de uma análise
macroscópica (a olho nu ou por meio de microscópio), em que um botânico
responsável compara os caracteres morfoanatômicos do material vegetal com
ilustrações presentes em farmacopeias ou, até mesmo, alguma hexicata dispo-
nível. Além disso, informações sensoriais (coloração, forma, textura e odor)
do material vegetal, também, ajudam a fortalecer a sua correta identificação.
Vale salientar que a análise macroscópica, igualmente, permite reconhecer
a presença de espécies vegetais não desejadas ou identificar outras partes do
vegetal que não sejam permitidas ou de interesse terapêutico.
Coleta, preparo e conservação de produtos naturais 5
Limpeza
Consiste na retirada de corpos estranhos ou diferentes contaminantes que,
por ventura, estejam acumulados ao material vegetal. Assim, após a coleta,
é comum observar a presença de sujeira (terra, pedaços de outros vegetais,
insetos, fluídos, excrementos de animais, etc.) oriunda do próprio ambiente
ou que aparece durante o transporte do material vegetal até o seu local de
tratamento (SIMÕES et al., 2017).
Neste caso, recomenda-se lavar o material com água ou etanol (imersão
ou aspersão) sem provocar qualquer alteração irreversível da estrutura ou
a retirada acidental (lixiviação) de alguma substância química de interesse
terapêutico (SIMÕES et al., 2017). Inclusive, na maioria dos casos, utilizar
jato de ar pode ser o mais apropriado, já que evita a presença de umidade no
material vegetal, o que pode provocar a sua degradação.
Além da limpeza, caso seja necessário, é possível realizar a descontami-
nação de fungos ou bactérias tanto por desinfecção, como por esterilização.
Para isso, o material pode ser exposto a vapores de etanol (acima de 60%)
ou água sob pressão (autoclave) (SIMÕES et al., 2017). É importante evitar o
emprego de radiações ou a exposição a vapores de formol ou óxido de etileno
devido ao risco de contaminação da matéria-prima com resíduos tóxicos
(SIMÕES et al., 2017).
Seleção
Este processo consiste em retirar partes ou algum componente que não seja
de interesse. No caso de material de origem vegetal, é recomendado retirar
partes da planta que não possuam a substância química desejada, evitando,
assim, a presença de impurezas na matéria-prima final.
Estabilização
É recomendado para todo material que, facilmente, possa sofrer decomposição
(vegetal, animal e microrganismos) depois que for coletado. Normalmente, a
decomposição de um material orgânico pode alterar, de modo significativo,
a sua composição química, devido, principalmente, à presença de umidade e
a ação de alguma substância endógena (enzima) ou algum elemento exógeno
6 Coleta, preparo e conservação de produtos naturais
Trituração
Consiste em reduzir o material vegetal em fragmentos menores ou em pó.
A finalidade é deixar o material pronto para as próximas etapas de tratamento
(secagem, extração ou mistura). Para isto, são usados moinhos capazes de
fragmentar o material desejado, seja por impacto, atrito, corte ou pressão. O
tipo de fragmentação vai depender das características do material vegetal,
como a textura ou a estabilidade dos seus constituintes, já que esse processo,
na maioria das vezes, gera calor. Assim, em alguns casos, a fragmentação deve
ser feita sob refrigeração (criomoagem) para se evitar a destruição térmica,
química ou física dos seus componentes (enzimas, proteínas, óleos e outros)
(SIMÕES et al., 2017).
Seleção granulométrica
A granulometria da matéria-prima de origem vegetal é de fundamental im-
portância durante o desenvolvimento de um medicamento fitoterápico, já que
a dimensão das partículas é capaz de influenciar, de modo significativo, não
apenas, as propriedades farmacocinéticas e farmacodinâmicas do produto
Coleta, preparo e conservação de produtos naturais 7
Prensagem
Método que consiste na aplicação de pressão (prensa hidráulica) a frio, em
temperatura ambiente ou mais elevada, para extrair substância líquida ou
oleosa da matéria-prima vegetal de interesse. O azeite de oliva e óleo de
semente de uva são exemplos conhecidos de produtos vegetais obtidos por
prensagem.
Extração
Geralmente, este processo consiste na dissolução do material vegetal em um
solvente orgânico ou em uma mistura de solventes (etanol, acetona, etc.) para
a retirada de alguns constituintes químicos de interesse terapêutico. Portanto,
a escolha do solvente extrator depende das características físico-químicas
(polaridade e solubilidade) dos constituintes a serem extraídos e da finalidade
do produto final (uso humano ou veterinário). Alguns parâmetros como pH,
temperatura, pressão, tempo e contato do solvente com o material vegetal
podem ser controlados para se obter melhores resultados. Além disso, é possível
realizar uma extração mais seletiva partindo de um extrato bruto por meio
de matrizes sólidas sintéticas (gel de sílica, resina de troca iônica, polímeros,
etc.) que adsorvem, de modo seletivo, os constituintes de interesse durante a
eluição de um solvente orgânico (SIMÕES et al., 2017).
Acompanhe na Figura 1 as etapas para o alcance dos princípios ativos de
origem vegetal.
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PLANTA
TESTES TESTE
EXTRATO BRUTO EXTRATOS SEMIPUROS
BIOLÓGICOS BIOLÓGICOS
PROCEDIMENTOS
CROMATOGRÁFICOS
MODIFICAÇÃO SÍNTESE DE
ESTRUTURAL ANÁLOGOS
Purificação
Deve ser realizada sempre e quando as soluções extrativas, obtidas por meio
dos processos descritos, apresentem algum elemento ou artefatos indesejá-
veis. Esta purificação pode ser obtida por meio da sedimentação, decantação,
centrifugação ou filtração. Em geral, esses processos dependem do tamanho
das partículas e da viscosidade do sistema. O uso de pressão pode melhorar
a eficiência e a rapidez do procedimento (SIMÕES et al., 2017).
Concentração
Na maioria das vezes, a concentração de uma solução extrativa não é sufi-
ciente para se obter um efeito terapêutico desejado ou para realizar ensaios
de controle de qualidade. Além disso, algumas soluções extrativas podem ter
sido adquiridas por meio de algum solvente tóxico. Nestes casos, é necessário
remover parcial ou totalmente o solvente extrator (ou um deles, no caso de
misturas) para se conseguir uma concentração adequada dos seus constituintes
químicos ou apenas remover o solvente tóxico, incompatível com excipientes
farmacêuticos (SIMÕES et al., 2017). Assim, existem três métodos básicos
de concentração:
Secagem
Logo após a colheita do material vegetal, inicia-se um processo de degradação
enzimática que, também, causa a degradação de alguns constituintes quími-
cos de interesse terapêutico. Por isso, a secagem que consiste na eliminação
da fase líquida até valores mínimos é um ótimo método de conservação da
matéria-prima de origem vegetal, já que inibe a atividade enzimática e preserva
tanto os princípios ativos, como a cor e o aroma do material. Lembrando que a
secagem do material vegetal pode ser realizada de forma natural ou artificial
(SIMÕES et al., 2017; RIO DE JANEIRO, 2011).
Secagem artificial: este processo costuma ser mais rápido devido à utilização
de calor (temperatura entre 35 a 45°C) e circulação de ar no equipamento de
secagem. Lembre-se de que o uso de temperaturas maiores que 45°C pode
danificar, de forma irreversível, os constituintes químicos de interesse tera-
pêutico presentes no material vegetal. Entre os métodos de secagem artificiais
mais conhecidos podem ser citados a evaporação por aspersão ou spray drying
e a evaporação laminar ou evaporador rotatório (SIMÕES et al., 2017; RIO
DE JANEIRO, 2011).
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Para folhas e flores, o teor de umidade deve ficar em torno de 5 a 10%. Para
cascas e raízes, ele deve ser entre 12 e 20%. Já, para os extratos vegetais, o
teor de umidade e a concentração residual de solvente costuma variar bastante,
dependendo, principalmente, dos constituintes químicos de interesse e da sua
finalidade de uso (RIO DE JANEIRO, 2011).
Acondicionamento e embalagem
A etapa final consiste em adicionar o material vegetal pronto para o uso em
recipientes e embalagens, com a finalidade de manter as suas características e
propriedades terapêuticas, além de favorecer o seu correto transporte, dentro
e fora das áreas de produção (SIMÕES et al., 2017).
Importante destacar que o período de armazenamento deve ser o menor
possível para evitar perdas dos constituintes químicos do vegetal, e que o local
seja, preferencialmente, escuro, arejado, seco e limpo. Também, o material
armazenado deve ficar isolado da presença de pragas e insetos, sendo inspe-
cionado ocasionalmente (RIO DE JANEIRO, 2011). Em geral, o período de
conservação de partes de plantas secas, como folhas e flores, pode ser por um
período de seis meses. Enquanto que raízes, cascas e sementes este período
pode ultrapassar mais de um ano (RIO DE JANEIRO, 2011).
Com relação aos extratos obtidos, eles devem ser armazenados sob proteção
e em recipientes bem fechados, capazes de evitar evaporação, absorção de
umidade e, até mesmo, a degradação química devido ao oxigênio do ar. Em
alguns casos, é recomendável que os reservatórios, contendo os extratos, sejam
acondicionados em câmaras frias, com temperatura controlada. Também, é
importante identificar o conteúdo dos recipientes, data de fabricação, lote e
validade (LUCIO, 2013).
Por fim, a seleção do material de acondicionamento, principalmente, a
embalagem primária (a que fica em contato direto com a matéria-prima ou
o medicamento) deve ser feita de forma cuidadosa e rigorosa, já que pode
causar desvios de qualidade no seu conteúdo. Comumente, embalagem é todo
o material, invólucro ou qualquer recipiente que envolva um produto, por
tempo determinado, e tenha como finalidade conservar as suas características
durante o transporte, o armazenamento e o consumo. A Anvisa estabelece que
as embalagens de produtos farmacêuticos e correlatos devem seguir algumas
especificações importantes, além de cumprir com as funções de proteção,
identificação, comunicação, utilidade e acondicionamento (LUCIO, 2013).
De acordo com a Farmacopeia Brasileira, as embalagens podem ser divi-
didas nas seguintes categorias:
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Leitura recomendada
BASSANI, V. L. et al. Desenvolvimento tecnológico de produtos fitoterápicos. Revista
Fitos, v. 1 n. 1, p. 14-17, jun. 2005.
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