Você está na página 1de 69

REVISTA DE

MORFOLOGIA
63 Editorial

65 V. Oliveira
URBANA
Morfologia urbana: diferentes abordagens Revista da Rede Lusófona de Morfologia Urbana
85 A. C. Macedo e M. I. Imbronito
Tipos de corredores e ruas locais no distrito da Mooca, São Paulo
2016
Volume 4
Perspetivas
107 Morfologia urbana e legislação urbanística D. Antonucci Número 2
108 Praeter utilitas M. M. Bandeira
110 Uma reflexão sobre a necessidade e o contributo da morfologia urbana A. Fernandes
111 O FormaUrbis lab e a utilidade dos estudos de morfologia urbana S. P. Fernandes
113 Morfologia urbana pela estética, justiça social e sustentabilidade E. Mendonça
115 Como compreender as cidades? M. M. Gimmler Netto e S. A. Pereira Costa
117 Morfologia urbana: para entender as transformações urbanas K. S. Meneguetti
113 Para que serve a morfologia urbana? J. M. P. Silva

Relatórios
105 Rede Lusófona de Morfologia Urbana (PNUM), 2015-16 T. Marat-Mendes
121 5ª Conferência da Rede Lusófona de Morfologia Urbana, Guimarães, 2015 E. Mendonça
123 PNUM Workshop, Julho 2016, Vila Nova de Cerveira: Forma urbana e dinâmicas transfronteiriças
D. L. Viana
124 Curso ‘Morfologia urbana. Uma introdução ao estudo da forma física das cidades’, Porto, 2016
V. Oliveira

Notícias
64 Urban Morphology
84 PNUM 2017: Morfologia urbana: território, paisagem e planejamento
84 ISUF 2017: City and territory in the global era
105 ISUF Italia 2017: Learning from Rome – historical cities and contemporary design
Editor: Vítor Oliveira, Universidade do Porto, Portugal, vitorm@fe.up.pt

Editores Associados: Frederico de Holanda, Universidade de Brasília, Brasil


Paulo Pinho, Universidade do Porto, Portugal

Editores Assistentes: Cláudia Monteiro, Universidade do Porto, Portugal


Mafalda Silva, Universidade do Porto, Portugal

Consultores: Giancarlo Cataldi, Università degli Studi di Firenze, Itália


Ian Morley, Chinese University of Hong Kong, China
Jeremy Whitehand, University of Birmingham, Reino Unido
Kai Gu, University of Auckland, Nova Zelândia
Michael Conzen, University of Chicago, EUA
Peter Larkham, Birmingham City University, Reino Unido

Quadro Editorial: David Viana, Nottingham Trent University, Reino Unido


Giuseppe Strappa, Sapienza Università di Roma, Itália
Isabel Martins, Universidade Agostinho Neto, Angola
Jorge Correia, Universidade do Minho, Portugal
José Forjaz, Universidade Eduardo Mondlane, Moçambique
Judite Nascimento, Universidade de Cabo Verde, Cabo Verde
Luiz Amorim, Universidade Federal de Pernambuco, Brasil
Manuel Teixeira, Universidade de Lisboa, Portugal
Mário do Rosário, ISCTEM, Moçambique
Renato Leão Rego, Universidade Estadual de Maringá, Brasil
Sandra Pinto, Universidade Nova de Lisboa, Portugal
Sílvio Soares Macedo, Universidade de São Paulo, Brasil
Stael de A. P. Costa, Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil
Teresa Calix, Universidade do Porto, Portugal
Teresa Marat-Mendes, Instituto Universitário de Lisboa, Portugal
Vicente C. Sendra, Universitat Politècnica de València, Espanha
Xosé Lois Suarez, Universidade da Coruña, Espanha

Os autores são os únicos responsáveis pelas opiniões expressas nos textos publicados na
‘Revista de Morfologia Urbana’. Os Artigos (não deverão exceder as 6 000 palavras, devendo
ainda incluir um resumo com um máximo de 200 palavras), as Perspetivas (não deverão exceder
as 1 000 palavras), os Relatórios e as Notícias referentes a eventos futuros deverão ser enviados
ao Editor. As normas para contributos encontram-se na página 2.

Desenho original da capa - Karl Kropf. Desenho das figuras - Vítor Oliveira

REDE LUSÓFONA DE MORFOLOGIA URBANA ISSN 2182-7214


REVISTA DE MORFOLOGIA URBANA
Revista da Rede Lusófona de Morfologia Urbana

Volume 4 Número 2 Dezembro 2016


63 Editorial

65 V. Oliveira
Morfologia urbana: diferentes abordagens

85 A. C. Macedo e M. I. Imbronito
Tipos de corredores e ruas locais no distrito da Mooca, São Paulo

Perspetivas

107 Morfologia urbana e legislação urbanística D. Antonucci


108 Praeter utilitas M. M. Bandeira
110 Uma reflexão sobre a necessidade e o contributo da morfologia urbana A. Fernandes
111 O FormaUrbis lab e a utilidade dos estudos de morfologia urbana S. P. Fernandes
113 Morfologia urbana pela estética, justiça social e sustentabilidade E. Mendonça
115 Como compreender as cidades? M. M. Gimmler Netto e S. A. Pereira Costa
117 Morfologia urbana: para entender as transformações urbanas K. S. Meneguetti
119 Para que serve a morfologia urbana? J. M. P. Silva

Relatórios

105 Rede Lusófona de Morfologia Urbana (PNUM), 2015-16 T. Marat-Mendes


121 5ª Conferência da Rede Lusófona de Morfologia Urbana, Guimarães, 2015 E. Mendonça
123 PNUM Workshop, Julho 2016, Vila Nova de Cerveira: Forma urbana e dinâmicas
transfronteiriças D. L. Viana
124 Curso ‘Morfologia urbana. Uma introdução ao estudo da forma física das cidades’,
Porto, 2016 V. Oliveira

Notícias

64 Urban Morphology
84 PNUM 2017: Morfologia urbana: território, paisagem e planejamento
84 ISUF 2017: City and territory in the global era
105 ISUF Italia 2017: Learning from Rome – historical cities and contemporary design
Normas para contributos para a Revista de Morfologia Urbana
Os textos a submeter à ‘Revista de Morfologia Whitehand, J. W. R. e Larkham, P. J. (eds.)
Urbana’ deverão ser originais, escritos em (1992) Urban landscapes, international
Português, e não deverão estar em apreciação em perspectives (Routledge, Londres).
nenhuma outra revista científica. Os textos serão No caso de publicações com múltiplos
aceites para publicação depois da avaliação autores, todos os nomes devem ser incluídos na
favorável de, pelo menos, dois revisores lista de referências. Apenas as referências citadas
independentes. Os artigos não deverão exceder as devem ser incluídas na lista.
6.000 palavras, devendo ainda incluir um resumo
com um máximo de 200 palavras e até cinco Ilustrações e tabelas
palavras-chave. O título do artigo, o resumo e as Os desenhos e as fotografias deverão ter a
palavras-chave deverão ser bilingue, em dimensão adequada à sua reprodução. Nesse
Português e em Inglês. Como a autoria dos textos sentido, a dimensão das páginas da revista deverá
não é revelada aos revisores, o(s) nome(s) e o(s) ser tida em consideração pelo autor ao desenhar
endereço(s) do(s) autor(es) devem constar de uma as ilustrações. As ilustrações devem ser a preto e
folha em separado. As ‘perspetivas’ (também branco a menos que a cor seja essencial. Devem
sujeitas a ‘revisão por pares’) e os book reviews ser numeradas de forma consecutiva, referidas
não deverão exceder as 1.000 palavras. Os artigos diretamente no texto e submetidas em formato
e as ‘perspetivas’ devem ser formatados em word JPEG ou TIFF. As ilustrações fotográficas
e enviados por email para o Editor deverão ter uma resolução de, pelo menos, 1200
(vitorm@fe.up.pt). Os book reviews deverão ser dpi, e os desenhos de, pelo menos, 600 dpi. Todas
endereçados ao Editor dos Book Review as ilustrações devem ter uma designação. No
(marat.mendes@gmail.com). Os textos deverão final do texto, após a lista de referências, deve ser
ser submetidos em formato de coluna única com incluída uma lista das ilustrações, da seguinte
margens largas. Os autores não deverão tentar forma:
reproduzir o layout da revista. Todas as medições
devem ser expressas no sistema métrico. Figura 1. Análise metrológica de Lower
Os autores são os únicos responsáveis pelas Broad Street, Ludlow
opiniões expressas nos textos publicados na
‘Revista de Morfologia Urbana’. São ainda Deverá ser dedicada uma atenção especial ao
responsáveis por assegurar eventuais permissões layout das tabelas, devendo ser desenhada uma
para reprodução de ilustrações, citações extensas, tabela por página. As tabelas deverão ser
etc. desenhadas com o mínimo recurso a
normalizações quer na vertical quer na horizontal.
Referências Deverão ter margens largas em todos os lados.
Os autores deverão usar o sistema de
referenciação Harvard, no qual o nome do autor Página de título
(sem as iniciais) e a data são apresentados no Numa página em separado deverá ser indicado o
corpo do texto – por exemplo (Whitehand e título do artigo e o nome, a filiação académica
Larkham, 1992). As referências são apresentadas (ou profissional) e o endereço completo
por ordem alfabética no final do texto, sob o (incluindo email) do(s) autor(es).
título ‘Referências’, da seguinte forma:
Títulos
Conzen, M. P. (2012) ‘Urban morphology, ISUF Apenas na primeira letra e nos nomes próprios
and a view forward’, 18th International serão utilizadas maiúsculas. Os títulos deverão
Seminar on Urban Form, Montreal, 26 a 29 ser justificados à esquerda. Os títulos primários
de Agosto. deverão ser a negrito e os secundários em itálico.
Conzen, M. R. G. (1968) ‘The use of town plans
in the study of urban history’, em Dyos, H. J. Números
(ed.) The study of urban history (Edward Deverão ser usados algarismos para todas as
Arnold, Londres) 113-30. unidades de medida, à exceção de quantidades de
Hillier, B. (2008) Space is the machine objetos e pessoas, quando estas se referirem a
(www.spacesyntax.com) consultado em 9 valores compreendidos entre um e vinte. Nesse
Setembro de 2013. caso, os números deverão escritos por extenso.
Kropf, K. S. (1993) ‘An inquiry into the
definition of built form in urban morphology’, Por exemplo: 10 dias, 10 km, 24 habitantes, 6400
Tese de Doutoramento não publicada, m; mas dez pessoas, cinco mapas.
University of Birmingham, Reino Unido.
Moudon, A. V. (1997) ‘Urban morphology as an Provas
emerging interdisciplinary field’, Urban Durante o processo de publicação serão enviadas
Morphology 1, 3-10. provas aos autores. Nesta fase, apenas serão
corrigidos erros de impressão, não sendo
aceitáveis alterações de fundo.
Editorial

Para que serve a morfologia urbana?

Uma parte dos textos contidos neste número Fainstein são dois exemplos notáveis de
da ‘Revista de Morfologia Urbana’ aborda investigação, sendo que o trabalho de
uma questão crucial para a nossa área do Fainstein, em torno do conceito da cidade
conhecimento – para que serve a morfologia justa, tem um enfoque mais claro na forma
urbana? Qual a utilidade da teoria e física das cidades. Uma ligação ainda mais
investigação em morfologia urbana não explícita entre justiça social e forma urbana
apenas para uma intervenção profissional tem vindo a ser desenvolvida por Laura
direta sobre os diferentes elementos que Vaughan, na University College London, no
compõem a paisagem urbana, mas também âmbito da segregação social. Ao longo das
para as dimensões ambiental, social e últimas duas décadas, Vaughan tem
económica da nossa vida coletiva em cidade? evidenciado uma correspondência entre
Recentemente identificaram-se cinco temas, segregação social e segregação espacial,
dentro das três dimensões referidas, para os distinguindo na cidade a existência de áreas e
quais a morfologia urbana pode dar um ruas pobres e espacialmente segregadas e
contributo fundamental: saúde pública, áreas e ruas mais prósperas e espacialmente
justiça social, turismo patrimonial, alterações integradas (Vaughan, 2007; Vaughan e
climáticas e energia (Oliveira, 2016). Se nos Arbaci, 2011; Vaughan e Penn, 2006).
dois primeiros e no último tema existe já No âmbito do terceiro tema, o turismo
trabalho consistente construído ao longo das patrimonial, uma parte significativa da
últimas décadas, em relação ao terceiro e ao investigação tem-se centrado na ‘oferta’, ou
quarto temas registam-se ligações mais seja, na interpretação, conservação e gestão
embrionárias. Os parágrafos seguintes dos recursos bem como nos serviços de
sintetizam, de modo muito breve, a apoio a quem visita esse património. Se para
investigação desenvolvida. a ciência da forma urbana é consensual que
A investigação recente sublinha que, por as cidades podem e devem transformar-se,
um lado, um conjunto significativo de um dos principais problemas que se colocam
benefícios de saúde pode ser alcançado quando se fala de património e de
através de uma atividade física moderada conservação é como lidar com o processo de
(incluindo percursos pedonais e cicláveis) e mudança, procurando contribuir para a
que, por outro lado, o desenvolvimento dessa manutenção de áreas e estruturas que
atividade física é efetivamente influenciado contenham em si mesmo o esforço e o
por um conjunto de características dos investimento de gerações passadas. Uma das
diferentes elementos de forma urbana. Estas linhas mais consistentes sobre conservação
características incluem a conectividade dos de áreas urbanas tem sido desenvolvida, ao
sistemas de ruas, a dimensão dos quarteirões, longo de mais de duas décadas, por Peter
a idade dos conjuntos edificados, a posição Larkham, primeiro na University of
dos edifícios no interior das parcelas, a Birmingham e, depois, na Birmingham City
mistura de funções, entre outros. Neste tema, University (Larkham, 1996).
uma das mais consistentes linhas de trabalho Blanco et al. (2011) sustentam que o
tem sido desenvolvida por Lawrence Frank, modo como os principais elementos de forma
primeiro no Georgia Institute of Technology urbana – como as ruas e os edifícios – e os
e depois na University of British Columbia sistemas de infraestruturas são organizados
(ver, por exemplo, Frank e Engelke, 2001; podem contribuir para a emissão de gases de
Frank et al., 2005). efeito de estufa e ampliar os impactos das
Do mesmo modo que no primeiro tema, alterações climáticas (o quarto tema
existe tambem um sólido trabalho sobre a identificado). De facto, a estrutura, a
relação entre as dimensões física e de justiça orientação e as condições específicas de ruas
social da cidade. David Harvey e Susan e edifícios podem aumentar a necessidade de

Revista de Morfologia Urbana (2016) 4(2), 63-4 Rede Lusófona de Morfologia Urbana ISSN 2182-7214
64 Editorial

arrefecimento e / ou aquecimento de sociedades contemporâneas quais são os seus


edifícios, o que está, naturalmente, associado contributos mais relevantes e específicos
ao nível de utilização de energia, e podem para as nossas cidades, ou seja, quais os
ser responsáveis por uma proporção contributos que só a ciência da forma urbana
significativa de emissões de gases de efeito poderá fornecer.
de estufa numa cidade. Inundações e ilhas de
calor são outros fenómenos com uma ligação
à forma física da cidade. Referências
Até muito recentemente, uma parte
significativa da literatura sobre a relação Blanco, H., McCarney, P., Parnell, S., Schmidt,
entre forma urbana e energia centrava-se em M. e Seto, K. C. (2011) ‘The role of urban land
uma de duas escalas de análise, a escala da in climate change’, em Rosenzweig, C.,
cidade ou a escala do edifício. Na escala da Solecki, W. D., Hammer, S. A. e Mehrotra, S.
(eds.) Climate change and cities: first
cidade, a investigação tem vindo a explorar a
assessment report of the urban climate change
dicotomia entre padrões de desenvolvimento research network (Cambridge University Press,
urbano compactos e difusos, as variações de Cambridge) 217-48.
densidade e os padrões de uso do solo, Frank, L. D. e Engelke, P. O. (2001) ‘The built
relacionando estes aspetos com os environment and human activity patterns:
transportes. Na escala do edifício, a exploring the impacts of urban form on public
investigação tende a agrupar-se em três health’, Journal of Planning Literature 16, 202-
linhas: o estabelecimento de diferentes 18.
estruturas de classificação de formas Frank, L. D., Schmid, T. L., Sallis, J. F.,
construídas, o desenho de métodos para Chapman, J. e Saelens, B. E. (2005) ‘Linking
objectively measured physical activity with
estimativa do consumo de energia dos
objectively measured urban form – findings
edifícios, e a análise do potencial de from SMARTRAQ’, American Journal of
melhoria dos edifícios. No entanto, nos Preventive Medicine 28, 117-25.
últimos anos, um conjunto de estudos Larkham, P. J. (1996) Conservation and the city
começou a abordar uma escala intermédia de (Routledge, Londres).
análise. O desenvolvimento desta nova Oliveira, V. (2016) Urban Morphology. An
escala, bem como de novas abordagens, introduction to the study of the physical form of
teorias, conceitos e métodos deverá oferecer cities (Springer, Dordrecht).
uma melhor compreensão das interrelações Vaughan, L. (ed.) (2007) ‘The spatial syntax of
entre a forma urbana e o nível de energia urban segregation’, Progress in Planning 67, 1-
67.
utilizado na manutenção dos sistemas
Vaughan, L. e Arbaci, S. (2011) ‘The challenges
urbanos contemporâneos. Deverá também of understanding urban segregation’, Built
informar o debate sobre as atuais estratégias Environment 37, 128-38.
de desenvolvimento urbano, promovendo a Vaughan, L. e Penn, A. (2006) ‘Jewish immigrant
utilização sustentável de recursos, solo e settlement patterns in Manchester and Leeds
energia como elementos chave para uma 1881’, Urban Studies 43, 653-71.
prosperidade a longo prazo.
Um dos desafios mais importantes que se
colocará à morfologia urbana nos próximos
anos é o de tornar evidente perante as Vítor Oliveira

Urban Morphology
O último número da revista Urban Morphology aplicam o conceito de ‘cintura periférica’ numa
foi já publicado, sendo que a versão online se cidade multinuclear e em rápido crescimento.
encontra disponível, para os subscritores, em François Racine explora a componente
http://www.urbanform.org/online_public/2016_2. morfológica de uma prática de desenho urbano
shtml. Este número inclui quatro artigos. Andres em Montreal. Por fim, Jeremy Whitehand,
Sevtsuk, Raul Kalvo e Onur Ekmekci exploram a Michael Conzen e Kai Gu desenvolvem o método
influência de ruas, quarteirões e parcelas na de ‘análise do plano’ em duas cidades em
acessibilidade pedonal. Tolga Unlu e Yener Bas continentes diferentes, Como e Pingyao.
Morfologia urbana: diferentes abordagens

Vítor Oliveira
CITTA – Centro de Investigação do Território, Transportes e Ambiente, Faculdade de
Engenharia, Universidade do Porto, Rua Roberto Frias 4200-465 Porto, Portugal.
E-mail: vitorm@fe.up.pt

Artigo revisto recebido a 15 de Setembro de 2016

Resumo. Este artigo apresenta as origens, características e


desenvolvimentos fundamentais de quatro abordagens dominantes no debate
internacional em morfologia urbana: a abordagem histórico-geográfica
promovida pela Escola Conzeniana, a abordagem tipológica projetual
desenvolvida pela Escola Muratoriana, a sintaxe espacial e, por fim, a
análise espacial, incluindo autómatos celulares, modelos baseados em
agentes e fractais. Depois de descrever estas quatro abordagens, o artigo
sintetiza os seus elementos fundamentais; evidencia o modo como cada
abordagem lida com os elementos de forma urbana, os níveis de resolução e
o tempo; e ilustra o potencial de cada abordagem com aplicações na prática
profissional de planeamento.

Palavras-chave: morfologia urbana, abordagem histórico-geográfica,


abordagem tipológica projetual, sintaxe espacial, análise espacial

A abordagem histórico-geográfica aspetos-chave desta estrutura é a divisão


tripartida da paisagem urbana, incluindo o
Esta primeira secção divide-se em duas plano de cidade, o tecido edificado e os usos
partes: a primeira parte centra-se no trabalho do solo. O plano de cidade é definido como a
de Conzen, em particular em três conceitos organização topográfica (bidimensional) de
fundamentais desenvolvidos pelo geógrafo – uma área urbana em todas as suas
cintura periférica, região morfológica e ciclo características construídas pelo homem,
de parcela burguesa; a segunda parte centra- contendo três elementos complexos do
se nos desenvolvimentos e características da plano: as ruas e a sua organização num
Escola Conzeniana com um enfoque sistema de ruas; as parcelas e sua agregação
particular no Urban Morphology Research em quarteirões; e as plantas de implantação
Group (UMRG) coordenado por Whitehand. dos edifícios.
Outro aspeto fundamental na obra de
Conzen é o desenvolvimento de conceitos
As ideias de M. R.G. Conzen sobre o processo de desenvolvimento urbano.
Este artigo aborda três destes conceitos:
Apesar de não ter um grande número de cintura periférica, região morfológica e ciclo
textos publicados, Conzen publicou um de parcela burguesa. O conceito de cintura
conjunto de obras fundamentais. Alnwick, periférica foi primeiro reconhecido em
Northumberland – a study in town-plan Berlim em 1936 por Louis, mas foi
analysis (Conzen, 1960) é um dos livros desenvolvido com um maior grau de
mais importantes em morfologia urbana sofisticação por Conzen. O conceito baseia-
publicados até hoje – Figura 1. O trabalho de se no reconhecimento de que o crescimento
Conzen, como um todo, oferece uma de uma área urbana é descontínuo. Na
estrutura abrangente para o estudo e o verdade, o crescimento de uma cidade é
desenho da forma física das cidades. Um dos composto por um conjunto de expansões da

Revista de Morfologia Urbana (2016) 4(2), 65-84 Rede Lusófona de Morfologia Urbana ISSN 2182-7214
66 Morfologia urbana: diferentes abordagens

Figura 1. Alnwick, Northumberland – tipos de unidades de planos (fonte: Conzen, 1960).

área residencial separados por momentos de incluindo Ludlow, Conway e Manchester


pausa onde este uso do solo está ausente. (Conzen, 2009).
Uma cintura periférica tende a formar-se na Para Conzen, o clímax da análise do
franja urbana durante um período em que a desenvolvimento físico de uma área urbana
área construída não está a crescer ou que está era a divisão dessa área em regiões
a crescer muito lentamente. A cintura morfológicas (Whitehand, 2001) ou unidades
periférica inclui no seu interior áreas de plano (considera apenas uma leitura
relativamente abertas, muitas vezes cobertas bidimensional) como as representadas na
de vegetação, como parques, campos Figura 1. Uma região morfológica é uma
desportivos, equipamentos públicos e área que tem uma unidade em relação à sua
terrenos de diversas instituições (Whitehand, forma que a distingue das áreas envolventes.
2007). O contributo fundamental de Conzen Entre o final dos anos 1950 e o final dos
foi incorporar os padrões de cintura anos 1980, Conzen demonstrou num
periférica de uma cidade numa teoria conjunto de cidades britânicas tradicionais o
morfológica sobre as interações entre modo como a paisagem urbana é
diferentes processos espaciais formativos e estratificada, refletindo os ‘resíduos’
transformadores, conforme é evidenciado no distintivos dos últimos períodos e dando
registo cartográfico detalhado da evolução origem a uma hierarquia de regiões
física de uma cidade. Como parte desta morfológicas. Essa hierarquia pode ser
teoria, Conzen desenvolveu uma intrincada representada num mapa compósito, incluindo
classificação de processos de formação e regiões de ordem diferente. Enquanto em
posterior modificação de cinturas periféricas Alnwick, Conzen identificou uma hierarquia
em Alnwick e, mais tarde, em Newcastle de quatro ordens de regiões baseadas
upon Tyne. Conzen continuou ainda a aplicar principalmente no plano de cidade (uma
o conceito noutras cidades Britânicas, leitura bidimensional), em Ludlow o
Morfologia urbana: diferentes abordagens 67

geógrafo identificou uma hierarquia de cinco economia urbana (Whitehand, 1977). Mais
ordens baseada não só no plano de cidade, recentemente, o autor desenvolveu uma
mas também no tecido edificado (uma leitura preocupação explícita com os agentes no
tridimensional) e nos usos do solo. processo de transformação da cintura
Uma das características distintivas do periférica, realizando estudos sobre a
trabalho de Conzen é o detalhe da análise. interação entre proprietários, promotores e
Neste contexto, a relação entre as parcelas e planeadores nos processos de
as plantas de implantação dos edifícios desenvolvimento urbano (Whitehand e
assume um papel fundamental. Esta relação é Morton, 2003, 2004, 2006). Em termos de
conceptualizada no ‘ciclo de parcela escala de aplicação, Whitehand estendeu a
burguesa’: a ‘parcela burguesa’ representa a aplicação do conceito desde cidades até
posse de um cidadão proeminente num territórios mais vastos, como a conurbação
assentamento medieval; o ‘ciclo’ consiste no de Tyneside, Glasgow e Birmingham. Em
preenchimento progressivo, com edifícios, termos da variedade de contextos, também
das traseiras da parcela, terminando numa estendeu a aplicação a cidades em França, na
‘libertação’ de edifícios e, posteriormente, Rússia e na Zâmbia. Em 2009, M. P. Conzen
num período de pousio urbano antes do publicou uma análise comparativa da
início de um novo ciclo de desenvolvimento. aplicação do conceito nos diferentes cenários
Em Alnwick, o ciclo de parcela burguesa é culturais em que foi aplicada, refletindo
ilustrado com a evolução do Teasdale's Yard, sobre a eficácia e sobre os limites do
na Fenkle Street, entre 1774 e 1956. Este conceito na identificação e explicação de
ciclo é uma expressão particular de um variações na textura da forma urbana nesses
fenómeno mais geral em que as parcelas são diferentes contextos culturais (Conzen,
sujeitas a uma pressão crescente, muitas 2009). Finalmente, Ünlü (2013) apresenta
vezes associada a mudanças de requisitos um estado da arte sobre este conceito
funcionais numa área urbana em crescimento destacando as características distintivas de
(Whitehand, 2007). quatro tipos de ênfase – espacial, económica,
social e de planeamento. Três anos mais
tarde, o mesmo autor explora a aplicação do
Desenvolvimentos recentes conceito em cidades com padrões
multinucleares em contextos de rápido
Nas últimas quatro décadas, esta abordagem crescimento (Ünlü e Bas, 2016).
morfológica tem sido consistentemente Nas últimas décadas tem havido
desenvolvida pelo UMRG na Universidade aplicações e adaptações do conceito de
de Birmingham. O UMRG foi fundado em região morfológica e do método de
1974 por Whitehand (que foi sempre uma regionalização morfológica em todos os
figura central no desenvolvimento e continentes, bem como demonstrações do
consolidação do grupo e na promoção da seu potencial na conservação e planeamento
tradição Conzeniana) e é o principal centro patrimonial. Um importante estudo foi
de investigação existente no Reino Unido desenvolvido por Baker e Slater no início
dedicado ao estudo dos aspetos histórico- dos anos 1990. Tomando o núcleo de
geográficos da forma urbana. Worcester como caso de estudo, Baker e
Os parágrafos seguintes descrevem o Slater (1992) fornecem evidências para a
desenvolvimento dos três conceitos interpretação de algumas unidades de plano
apresentados na última subsecção – cintura como extensões planeadas criadas num curto
periférica, região morfológica e ciclo de período temporal e de outras unidades como
parcela burguesa. A investigação sobre produtos de um desenvolvimento mais
cinturas periféricas foi desenvolvida incremental. Neste capítulo de livro, o nível
principalmente por Whitehand, tendo tido de detalhe utilizado pelos autores na
também contributos de M. P. Conzen (filho explicação da aplicação do método é bastante
de M. R. G. Conzen) e de Slater. Na década invulgar. Numa revisão do método de
de 70, Whitehand explorou a relação entre as regionalização de Conzen e dos seus
cinturas periféricas e os ciclos de construção, desenvolvimentos ao longo de duas décadas,
demonstrando também a relação com a Whitehand (2009) sustenta a necessidade de
68 Morfologia urbana: diferentes abordagens

uma maior clareza nos métodos de Muratori prepara uma série de artigos para a
caracterização e de delimitação dessas revista Architettura sobre um conjunto de
unidades e uma maior apreciação do seu projetos arquitetónicos recentes construídos
potencial de aplicação na prática de na Europa. A sua prática profissional nesta
planeamento. Dois anos depois, Larkham e década inclui os planos para Aprília e
Morton continuam o estudo de Whitehand Cortoghiana (Maretto, 2012) e um conjunto
explorando o processo específico de desenho de projetos marcados pelo interesse pela
de limites entre diferentes regiões e composição de praças italianas, como temas
questionando a possibilidade de as regiões urbanos fundamentais, nos quais o ambiente
morfológicas, pelo menos nos níveis contruído envolvente é a razão
superiores da hierarquia, poderem ser contextualizada para a praça e para os
delineadas com rigor pela observação de edifícios monumentais que a conformam.
campo e pela análise de cartografia O segundo período, na década de 1940, é
(Larkham e Morton, 2011). marcado pelo desenvolvimento de uma
Slater continuou a linha de investigação perspetiva teórica e operacional. Neste
sobre parcelas – particularmente sobre os período, Muratori escreve uma série de
limites e as dimensões das parcelas – ensaios onde as ideias de cidade como
mostrando como a análise metrológica pode organismo vivo e obra de arte coletiva, e do
ser usada para reconstruir as ‘histórias’ dos desenho dos novos edifícios em continuidade
limites das parcelas. Como base na análise com a cultura construtiva do lugar parecem
das larguras das parcelas em Ludlow, Slater emergir. O programa INA-Casa, incluindo
foi capaz de especular sobre aquilo que tinha um conjunto de bairros em Roma, como
em mente o ‘agente’ medieval quando do Tuscolano (Maretto, 2012), são lançados no
desenvolvimento inicial da área bem como final da década de 1940. A Igreja de S.
inferir as larguras das parcelas originais e Giovanni al Gatano, em Pisa (Cataldi,
como elas foram posteriormente subdivididas 2013b), erguida neste período, tenta capturar
(Slater, 1990). as características fundamentais da arquitetura
românica.
A cidade é o tema principal da atividade
Abordagem tipológica projetual de Muratori na década de 1950. Os edifícios
projetados nesta década tentam abarcar dois
Esta secção divide-se em três partes: a dos períodos mais significativos da história
primeira e a segunda partes focam-se no da arquitetura italiana. Depois de uma fase
trabalho seminal de Saverio Muratori e de inicial em que parecia existir uma lacuna
Gianfranco Caniggia, descrevendo a sua conceptual entre os edifícios de Muratori,
atividade de investigação e ensino e a sua complexos e originais, e os seus planos, de
prática profissional; a terceira parte centra-se certo modo mais ‘banais’, no final da década
nos desenvolvimentos recentes desta de 1950 e, nomeadamente, na competição
abordagem, incluindo uma nova geração de para Barene di S. Giuliano, é construída uma
investigadores. forte ligação entre investigação (em
particular o Studi per una operante storia
urbana di Venezia, Muratori, 1959 – Figura
Saverio Muratori 2) e prática de arquitetura e planeamento.
Este plano corresponde uma recreação
Em Saverio Muratori: il debito e l’eredità, contemporânea, na margem da lagoa, de três
Cataldi (2013a), um dos principais momentos particularmente significativos da
proponentes da abordagem tipológica história urbana de Veneza (este plano será
projetual, divide a atividade de Muratori em retomado na penúltima subsecção).
cinco períodos correspondentes a cinco Território e civilização são os temas
décadas diferentes. O primeiro período fundamentais desenvolvidos por Muratori na
(1930-40) designado como ‘a década de 1960. Com base na experiência de
experimentação profissional’ corresponde Veneza (Muratori, 1959), Studi per una
aos primeiros anos após Muratori receber o operante storia urbana di Roma, publicado
seu diploma de arquiteto. Neste período, em 1963, constitui um atlas abrangente da
Morfologia urbana: diferentes abordagens 69

Figura 2. Studi per una operante storia urbana di Venezia – Quartieiri di S. Giovanni
Crisostomo, desde o século XI até aos anos 1950 (fonte: Muratori, 1959).

capital italiana (Muratori et al., 1963). ‘auto-consciência’, e Civilitá e territorio,


Muratori começa então a concentrar as suas sustentando a ideia de uma crise
reflexões filosóficas em questões mais vastas arquitetónica como expressão de uma crise
fora do campo da arquitetura. Achitettura e mais geral, são dois exemplos desta linha de
civilità in crisi, analisando os processos de pensamento mais abrangente (Muratori,
70 Morfologia urbana: diferentes abordagens

1963, 1967). Para Muratori, o único modo de anteriormente tinha aprendido sobre as
resolver a crise existente consistia na características peculiares do ambiente urbano
capacidade do ser humano estabelecer, a uma genovês (Cataldi et al., 2002).
escala global, uma relação equilibrada com Uma das principais preocupações de
os seus territórios (Cataldi et al., 2002). Caniggia era transmitir as ideias de Muratori
Nos seus últimos anos de vida, nos em termos arquitetónicos, partindo da
projetos não concluídos Atlante territorial e convicção de que a sua difusão estaria, de
Tabelloni, Muratori tenta estabelecer uma algum modo, obstruída por dificuldades de
classificação universal das estruturas compreensão inerentes ao pensamento de
construídas pelo homem. Muratori. Caniggia tentou simplificar e
reduzir o sistema teórico de Muratori,
destacando os seus aspetos mais
Gianfranco Caniggia operacionais. Nomeadamente, sublinhando a
importância dos conceitos de tipo, tecido
Em 1963 Caniggia conclui Lettura di una edificado e edifício básico – a matriz
città: Como (tese orientada por Muratori), o formativa do edifício especializado (Cataldi
seu primeiro grande contributo para a et al., 2002). Enquanto Muratori procurou,
morfologia urbana e a tipologia do edificado dedutivamente, contruir um sistema
(Caniggia, 1963). A interpretação do filosófico capaz de interpretar a história da
processo de desenvolvimento urbano desta civilização através da arquitetura, Caniggia
cidade permitiu-lhe evidenciar nas casas tentou construir, de modo indutivo, um
geminadas romanas a persistência da domus método tipológico capaz de interpretar
como um tipo de substratum. Esta foi uma transformações no ambiente urbano para fins
intuição fundamental que abriu uma linha de arquitetónicos (Cataldi, 2003).
investigação sobre os processos de formação Cataldi (2003) identifica seis contributos
de casas pátio medievais em cidades fundamentais de Caniggia para a abordagem
históricas europeias (Cataldi et al., 2002). tipológica projetual: i) o desenvolvimento de
Enquanto assistente de Muratori, Caniggia um conjunto de conceitos formulados por
trabalha no tema dos tecidos urbanos. Muratori: tipo, tipologia, estrutura, tecido,
Na década de 1970, Caniggia teve de série; ii) o estabelecimento do método
deixar Roma e iniciar uma longa viagem que tipológico projetual; iii) a descoberta e o
constituiria uma das razões para a difusão da reconhecimento da domus (casa pátio) como
abordagem tipológica projetual em Itália. Em a matriz, na arquitetura e no planeamento
Génova e Florença, Caniggia desenvolve romanos, para todos os tipos básicos
uma linha de investigação, nos seus cursos, seguintes; iv) a distinção entre tipo básico e
desenvolvendo uma metodologia para a tipo especializado; v) a teoria da
interpretação da cidade e dos seus ‘medievalização’ e os processos de utilização
componentes. Progressivamente, consegue espontâneos de estruturas planeadas; e,
acumular uma sólida experiência de ensino, finalmente, vi) o método de interpretação por
que viria a constituir material de base para a fases da história de uma cidade em
preparação de Composizione architettonica e articulação com os processos tipológicos
tipologia edilizia, escrito com Maffei, e básicos.
dividido em dois volumes. O primeiro
volume, sobre a interpretação dos edifícios
básicos (ou comuns), foi publicado no final Desenvolvimentos recentes
dos anos 70 (Caniggia e Maffei, 1979).
O segundo volume de Composizione Os desenvolvimentos recentes da abordagem
architettonica e tipologia edilizia é tipológica projetual são enquadrados por
publicado em 1984, com um enfoque no duas organizações, o Centro Internazionale
desenho dos edifícios básicos (Caniggia e per lo Studio dei Processi Urbani e
Maffei, 1984). Caniggia desenvolve um dos Territoriali (CISPUT) e o ISUF Italia, uma
seus projetos fundamentais na década de rede nacional do International Seminar on
1980, o bairro Quino em Génova, onde tem a Urban Form (ISUF). O CISPUT foi fundado
oportunidade de pôr em prática tudo o que em Pienza em 1981 por Cataldi – o seu
Morfologia urbana: diferentes abordagens 71

coordenador – e por um conjunto de evolução dos edifícios residenciais no


investigadores italianos e americanos. A contexto da evolução dessas duas cidades
intenção era fornecer um palco para que (Maffei, 1990; Bascià et al., 2000).
arquitetos e historiadores de arquitetura se
reunissem, desenvolvessem comparações e
verificassem, sob o ponto de vista de Sintaxe espacial
diferentes disciplinas, a validade do método
de Muratori (Cataldi et al., 2002). Apesar da Esta secção divide-se em três partes: começa
atividade dinâmica do CISPUT ao longo de por descrever as origens da sintaxe espacial e
quase três décadas – incluindo mais de 20 os textos seminais de Hillier e Hanson,
conferências em diferentes cidades italianas, passando para os principais
de Pienza a Modena – o grupo tem vindo desenvolvimentos desta abordagem
progressivamente a perder importância. configuracional nas duas últimas décadas e,
Depois de uma primeira fundação em 2007, finalmente, para uma descrição das suas
em Roma, o ISUF Italia foi refundado em características fundamentais.
2014 numa conferência na capital italiana. A
refundação do ISUF Italia – sob a
presidência de Strappa – coincidiu com o As origens da sintaxe espacial
início da preparação da conferência anual da
ISUF em Roma 2015 e com o lançamento de Se o núcleo de uma visão morfológica mais
uma nova revista, U+D Urbanform and quantitativa (particularmente quando
Design, dedicada à relação entre investigação comparada com as duas abordagens
morfológica e prática profissional. apresentadas anteriormente) está, nos anos
As origens e o desenvolvimento do 1960, no centro de investigação Land Use
CISPUT e do ISUF Italia estão claramente and Built Form (LUBFS), na Universidade
marcados por dois investigadores italianos, de Cambridge, dirigido por Martin e March,
Cataldi e Strappa. Cataldi tem desempenhado em meados da década de 1970 ganha um
um papel de liderança na promoção da novo ímpeto com a criação da Unit for
abordagem tipológica projetual ao longo das Architectural Studies na University College
últimas três décadas. Cataldi, que é um ex- London (UCL), coordenado por Hillier. O
aluno de Muratori, dedicou uma parte trabalho de investigação da sintaxe espacial
significativa de seu trabalho à reconstrução começa nesta unidade, com o propósito de
da história da Escola Muratoriana. Os seus compreender a influência do desenho
principais interesses de investigação incluem arquitetónico nos problemas sociais
a interpretação territorial e os processos existentes em muitos conjuntos de habitação
tipológicos, incluindo o tema da arquitetura social que estavam a ser construídos no
primitiva (Cataldi, 2015). As cidades de Reino Unido.
Pienza e Roma têm um papel central no Para além de um interessante conjunto de
trabalho de Cataldi (ver, por exemplo, trabalhos seminais publicados nos anos
Cataldi, 2016 e Cataldi e Formichi, 2007). 1970, durante os primeiros anos deste
Strappa tem vindo a desenvolver as noções programa de investigação (Hillier, 1973 e
de organismo e, em particular, de processo Hillier et al., 1976), três livros de Hillier e
na arquitetura – ver, por exemplo, L' Hanson devem ser destacados: The social
architettura come processo (Strappa, 2014). logic of space (Hillier e Hanson, 1984),
A sua investigação tem-se centrado nas Space is the machine (Hillier, 1996) e
cidades de La Valletta, Trani e Roma e em Decoding homes and houses (Hanson, 1998).
algumas cidades da região da Lácio. Outro Hillier e Hanson (1984) propõem uma nova
investigador com um papel crucial nesta teoria e novos métodos para a investigação
segunda geração é Gian Luigi Maffei. da relação entre sociedade e espaço (Figura
Conforme mencionado acima, Maffei 3). O livro tenta construir um modelo
colaborou com Caniggia e publicou os seus conceptual para a investigação desta relação
estudos inacabados após a sua morte. Além com base no conteúdo social dos padrões
disso, Maffei publicou dois livros sobre espaciais e no conteúdo espacial dos padrões
casas florentinas e romanas que analisam a sociais. Em seguida, tenta estabelecer um
72 Morfologia urbana: diferentes abordagens

Figura 3. The social logic of space – os mapas axiais de Gassin e Barnsbury


(fonte: Hillier e Hanson, 1984).

método de análise dos padrões espaciais, ‘Sínteses teóricas’ reúne algumas das
com ênfase na relação entre as relações questões levantadas na primeira parte, as
morfológicas locais e os padrões globais. regularidades evidenciadas na segunda parte
Estabelece uma teoria descritiva dos tipos de e as leis propostas na terceira parte do livro,
padrões e, em seguida, um método de para sugerir como os dois problemas centrais
análise. Esta teoria e este método são da teoria da arquitetura – o problema forma-
aplicados, primeiro, a assentamentos urbanos função e o problema forma-significado –
e, depois, a edifícios. Com base nestas podem ser ‘reconceptualizados’.
aplicações, o livro estabelece uma teoria Hanson (1998) analisa a evolução da
descritiva de como os padrões espaciais têm organização do espaço doméstico e da
associados conteúdos sociais. estrutura familiar na Grã-Bretanha através de
Hillier (1996) sintetiza o um conjunto de registos de ‘casas históricas’,
desenvolvimento da sintaxe espacial nos exemplos de ‘casas especulativas’ e de
anos 1980 e no início dos anos 1990, arquitetura doméstica inovadora
sublinhando as dimensões configuracional e contemporânea. Decoding homes and houses
analítica desta teoria. O livro divide-se em mostra como o espaço doméstico fornece um
quatro partes: i) ‘Preliminares teóricos’ trata enquadramento partilhado para a vida
das questões mais básicas a que a teoria quotidiana, como diferentes significados
arquitetónica tenta responder: o que é sociais são construídos em diferentes casas e
arquitetura e o que são teorias (?); ii) como diferentes subgrupos dentro de cada
‘Regularidades não discursivas’ apresenta sociedade se diferenciam através dos seus
uma série de estudos nos quais foram padrões de espaço doméstico e de estilos de
estabelecidas ‘regularidades’ na relação entre vida.
a configuração espacial e o funcionamento
dos ambientes construídos, utilizando para
tal técnicas não-discursivas de análise para Desenvolvimentos fundamentais
controlar as variáveis arquitetónicas; iii) ‘As
leis do campo’ utiliza essas regularidades Hillier (2007) identifica os principais
para reconsiderar uma questão fundamental contributos para a teoria e o método da
na teoria arquitetónica: como é que o vasto sintaxe espacial nas décadas de 1990 e 2000.
campo de possíveis complexos espaciais é Em termos de método – frequentemente
constrangido durante o processo de criação correspondente ao desenvolvimento de novo
de cada edifício (?); e, por fim, iv) software – Hillier destaca os textos de:
Morfologia urbana: diferentes abordagens 73

Turner (2004), Turner e Penn (1999) e espacialmente, e ruas mais prósperas,


Turner et al. (2001) sobre o processo de espacialmente integradas.
‘sintaxessização’ da análise da Visibility No seu estudo fundamental sobre espaço
Graph Analysis e sobre a proposta do e crime, Hillier (2004) sugere a ausência de
software Depthmap; de Dalton (2001) sobre uma correlação entre criminalidade e
análise angular; e, ainda, de Figueiredo e densidade e apenas uma correlação pobre
Amorim (2005) sobre linhas de continuidade entre afluência e crime. Contrariamente a
resultantes da agregação de linhas axiais. Em estes que são pressupostos correntes, Hillier
termos de teoria, importa destacar os textos defende uma correlação muito forte entre o
de Peponis et al. (1997, 1998a, 1998b) sobre tipo de layout urbano e os diferentes tipos de
questões geométricas, de Batty (2004a, crime. Cada tipo de crime e as características
2004b) sobre grafos, de Hillier (2002) sobre do ambiente construído associadas a esse
a forma urbana e de Hillier (1999) sobre as mesmo tipo de crime foram estudados por
relações entre espaço, movimento e padrões diferentes autores – o roubo de rua por
de uso do solo. Sahbaz e Hillier (2007), o roubo residencial
Se no início, a sintaxe espacial se centrou por López e Nes (2007), o roubo de viaturas
principalmente nos padrões de movimento por Nubani e Wineman (2005) e o
pedonal, atualmente as suas linhas de comportamento anti-social por Hanson e
investigação fundamentais incluem a Zako (2007). Este conjunto de estudos utiliza
cognição espacial, os desenvolvimentos a sintaxe espacial isoladamente ou em
metodológicos (incluindo modelação e combinação com outros métodos, vai desde a
desenvolvimento de software), morfologia e escala micro à escala macro, e pretende
performance do edificado, e a exclusão e fornecer evidências de diferentes contextos
coesão social. Os dois últimos temas são geográficos.
desenvolvidos nos dois parágrafos seguintes.
Um conjunto de artigos publicados num
número da revista Progress in Planning Principais características
mostra como a sintaxe espacial pode ser
utilizada no estudo da dimensão espacial dos O enfoque no espaço e as relações entre
processos de segregação (Dalton, 2007; espaço e movimento são dois aspetos
Hillier e Vaughan, 2007; Marcus, 2007; fundamentais da sintaxe espacial. Nos textos
Vaughan, 2007). Com base num estudo de seminais, como Hillier e Hanson (1984), este
uma pequena cidade americana, Dalton enfoque no espaço enfatiza as fronteiras
(2007) mostra como uma perspetiva entre a sintaxe espacial, então emergente, e
alternativa sobre transporte integrado pode outras propostas teóricas existentes. Hillier e
levar a soluções incomuns, embora eficazes, Hanson acreditavam que a maioria dessas
para lidar com a exclusão social e propostas estavam a discutir o espaço apenas
económica. Hillier e Vaughan (2007) em termos das superfícies que o definiam.
propõem um modelo explicativo para a Outros autores estariam a debater o espaço
capacidade de uma cidade acomodar por si só e não as relações espaciais dentro
diferenças sociais através da organização de dos edifícios ou nas áreas urbanas, que era
padrões de acessibilidade de acordo com o precisamente o propósito da sintaxe espacial.
grau de ‘co-presença’ exigido pela atividade Hillier e Hanson (1984) defendem o
contida em cada espaço. Marcus (2007) estabelecimento de uma teoria que sustente
mostra que quando o espaço público é uma autonomia descritiva do espaço,
desenhado para ser segregado ao invés de ser permitindo a consideração de uma variedade
parte de uma rede de ruas integrada, esse morfológica mais ampla de modo a refletir as
espaço pode ter efeitos profundos na diferentes relações entre espaço e sociedade.
capacidade dos moradores de bairros sociais Em síntese, é proposta uma nova visão da
formarem laços sociais efetivos. Por fim, arquitetura e da cidade, enfatizando os
tomando Londres como caso de estudo, espaços urbanos por onde as pessoas se
Vaughan (2007) identifica uma linha de movimentam e onde as atividades sociais e
pobreza, com uma forte dimensão espacial, económicas se realizam. A configuração
distinguindo ruas pobres, segregadas espacial é um conceito-chave nesta
74 Morfologia urbana: diferentes abordagens

abordagem, significando as relações entre espacial’ (expressão sugerida por Kropf,


dois espaços dentro de um sistema 2009) – autómatos celulares, modelos
considerando as suas relações com todos os baseados em agentes e fractais – cada um
outros espaços nesse sistema (Hillier et al., deles correspondendo a uma subsecção
1987). A configuração espacial é, portanto, diferente. No entanto, importa referir que os
um conceito mais complexo do que uma três modos de análise espacial não são
relação espacial simples que considera mutuamente exclusivos e podem ser
apenas dois espaços. utilizados de modo complementar.
A sintaxe espacial apresenta algumas
inovações ao nível das relações entre espaço
urbano e movimento (pedonal e de veículos). Autómatos celulares
Contrariando as teorias dominantes que
apontavam para a existência de fluxos ‘de’ e A história dos Autómatos Celulares (AC)
‘para’ os usos do solo atractores como a remonta à teoria de von Neumann sobre
principal explicação para estas relações, a autómatos ‘auto-reproduzidos’ e à sua
sintaxe espacial sugere que a configuração cooperação com Ulam numa altura em que
do layout urbano é o principal gerador de ambos estavam a trabalhar com conceitos de
padrões de movimento. Hillier et al. (1993) vida artificial e com a idealização de
designam o movimento gerado pela sistemas biológicos. A teoria dos autómatos
configuração do layout como movimento auto-reproduzidos descreve princípios
natural. Estes autores sustentam que o conceptuais de uma máquina capaz de se
movimento tem uma dimensão morfológica auto-replicar. Já na década de 1930, Turing
ou, por outras palavras, que é um produto trabalha com autómatos, quando define um
funcional da natureza intrínseca do layout. computador abstrato que mais tarde veio a
Como tal, a questão do movimento e da ser conhecido como a Máquina de Turing,
utilização do espaço em geral, não pode ser onde a ideia do autómato se aproxima do que
separada da questão da forma urbana. hoje é considerado como AC (Iltanen, 2012).
O modo como as relações espaciais Os modelos AC são uma ferramenta para
dentro de um edifício ou numa área urbana a modelação dinâmica de fenómenos urbanos
são representadas é outro elemento distintivo que procura captar a complexidade dos
da sintaxe espacial. Esta representação é fenómenos espaciais. Os modelos AC têm
traduzida num mapa axial que é constituído uma formulação simples que torna muito
pelo menor conjunto de linhas axiais que fácil a sua perceção para a área dos estudos
cobre todo o sistema, de tal modo que urbanos. Existem cinco componentes
qualquer espaço convexo seja atravessado básicos: i) as células, ii) os estados das
por uma dessas linhas (Hillier e Hanson, células (‘ligado’ ou ‘desligado’), iii) a
1984). A linha axial corresponde à linha mais vizinhança (as células adjacentes), iv) as
longa que pode ser desenhada através de um regras de transição (como, por exemplo, o
ponto arbitrário na configuração espacial. O número de vizinhos necessários para ‘ligar’ a
mapa axial pode ser traduzido num grafo, célula) e, por fim, v) o tempo. As células são
que é um conjunto finito de nós, designados partições de espaço nas quais ocorrem alguns
por vértices, conectados por ligações, fenómenos – por exemplo, unidades
designadas por arestas. A partir desse grafo administrativas territoriais. A cada instante,
pode extrair-se um conjunto de medidas cada célula tem um determinado estado a
topológicas de modo a quantificar as partir de um conjunto finito de possíveis
características da configuração espacial. A estados celulares – os diferentes usos que o
definição de medidas topológicas pretende solo pode ter. A vizinhança estabelece a
quantificar o padrão espacial de relações de extensão em que as interações espaciais entre
um sistema. células, considerando os seus estados são
contabilizadas (por exemplo, as interações
entre diferentes usos do solo). Tipos de
Análise espacial vizinhanças comuns são a ‘vizinhança de
Moore’ – todas as células nos oito espaços ao
Esta secção inclui três modos de ‘análise redor da célula em questão – ou a
Morfologia urbana: diferentes abordagens 75

‘vizinhança de von Neumann’ – as quatro modo como lidam com o espaço e como
células a norte, sul, este e oeste da célula capturam as dinâmicas espaciais dos
central. As regras de transição alteram os fenómenos – como podem ser mais úteis
estados das células ao longo do tempo, para os estudos urbanos e a prática de
simulando dinâmicas territoriais. O tempo dá planeamento.
assim a estes modelos um caráter dinâmico.
A combinação destes componentes permite
modelar a forma – através de células e de Modelos baseados em agentes
vizinhança – e a função das células – com
estados celulares e regras de transição (Pinto, Ao longo do século XX, a geografia
2013). incorporou ideias e teorias de outras
A designação ‘celular’ contribui com a disciplinas. Essas ideias fortaleceram a
estrutura espacial do conceito; a designação importância da modelação e da compreensão
‘autómato’ indica a capacidade de processar do impacto dos agentes individuais e da
este código (os estados da célula) de acordo heterogeneidade dos sistemas geográficos a
com um conjunto de regras de transição. Um diferentes escalas espaciais e temporais. Os
modelo no qual o espaço é constituído por Modelos Baseados em Agentes (MBA)
células diferentes será um modelo de permitem a simulação das ações individuais
autómatos celulares. Os modelos de AC de diversos agentes e a medição do
tiveram um desenvolvimento muito intenso comportamento e resultados do sistema ao
em diferentes áreas da física e matemática, longo do tempo. O desenvolvimento de
beneficiando dos avanços da computação abordagens de autómatos tem sido essencial
entre os anos 1950 e 1970. O trabalho de para os avanços nos MBA. Um autómato é
Wolfram compilado no seu livro A new kind um mecanismo de processamento com
of science (Wolfram, 2002) e Game of life de características que mudam ao longo do
Conway (publicado pela primeira vez por tempo com base nas suas características
Gardner, 1970, na revista Scientific internas, em regras e em inputs externos. Os
American) são dois exemplos notáveis. autómatos processam inputs de informação
Apesar de algumas experiências nas que lhes são fornecidos a partir da
décadas de 1950 e 1960 (Hagerstand, 1952; envolvente e as suas características são
Lathrop e Hamburg, 1965), os AC foram alteradas de acordo com regras que
aplicadas pela primeira vez em estudos controlam a sua reação a esses inputs. Dois
urbanos por Tobler no seu trabalho Cellular tipos de ferramentas de autómatos têm vindo
Geography. Tobler (1979) propõe um novo a dominar o debate – AC (que foram
modelo geográfico que recebe inputs do apresentados na última subsecção) e MBA
Game of Life e do conceito de vizinhança de (Crooks e Heppenstall, 2012).
von Neumann. Após este trabalho, vários Embora não exista uma definição precisa
autores passaram a implementar modelos de do termo ‘agente’, existem algumas
AC na simulação de fenómenos urbanos, características comuns à maioria dos agentes:
particularmente a partir dos anos 1980, os agentes são autónomos, heterogéneos e
quando a microcomputação amplia a ativos. Os agentes podem ser representações
utilização do cálculo computacional: de qualquer tipo de entidade autónoma
Couclelis (1985) sustenta a combinação de (pessoas, edifícios, parcelas). Cada um
AC e teorias de sistemas para estudar os desses agentes, animados e inanimados,
sistemas urbanos; White e Engelen (1993) possui regras que afetarão o seu
apresentam o seu primeiro modelo comportamento e as suas relações com
‘constrangido’, combinando mecanismos de outros agentes e / ou com o ambiente
escala micro e macro em regras de transição envolvente. O ambiente envolvente define o
de estados celulares. Couclelis (1997) espaço em que os agentes atuam, servindo
enumera uma série de questões-chave para apoiar a sua interação com o próprio
(relativas ao espaço e à sua modelação, às ambiente e com outros agentes (Crooks e
vizinhanças e à sua definição, e às regras de Heppenstall, 2012).
transição e à sua universalidade) para que os Os MBA têm muitas das características
modelos de AC sejam mais realistas no dos modelos de AC, exceto o ambiente e a
76 Morfologia urbana: diferentes abordagens

população do sistema, que são mantidos


separados. O setor populacional inclui os
agentes cujo comportamento é especificado
com um detalhe considerável. Os agentes
tendem a ser móveis num sentido espacial e
mesmo que não se movam fisicamente no
espaço, podem estar associados a espaços
diferentes e a sua transformação ao longo do
tempo pode, de modo implícito, refletir um
processo de movimento.
Neste sentido, o ambiente é tratado de
modo mais passivo do que a população (a Figura 4. Londres fractal: densidades de
população induz transformações no emprego (fonte: Batty e Longley, 1994).
ambiente) embora, em princípio, não haja
prioridade de um sobre o outro.
A ideia de um agente com um perfil fragmentados que a natureza, quando
comportamental específico e com uma comparada com a geometria euclidiana,
atuação propositiva é central para a definição exibe não apenas uma maior complexidade
dos MBA. Em termos de agregação e de mas também uma diferente complexidade.
escala, os MBA tendem para escalas Mandelbrot propõe uma nova geometria da
menores do que a região ou a metrópole, natureza – sustentando a sua utilização em
embora alguns modelos de uso do solo diferentes campos – com base no conceito de
baseados em MBA sejam aplicados nessas ‘fractal’. O título de seu ensaio de 1977,
escalas maiores. Estes modelos não são Fractals: form, chance and dimension,
constrangidos em termos de conservação de revela qual a natureza das características
quantidades, mas podem ser estruturados fundamentais deste conceito: i) a forma de
para gerar ou conservar um determinado um fractal é irregular, tendo uma aparência
nível de população, particularmente se o ‘quebrada’; ii) a maioria dos fractais está
enfoque é o movimento num espaço fixo associada ao acaso e as suas irregularidades
como no caso dos modelos pedonais. As suas são estatísticas; as suas formas tendem a ser
dinâmicas e as suas relações com o ambiente ‘escalares’ – o grau da sua irregularidade e /
envolvente são semelhantes às dos AC e ou fragmentação é idêntico em todas as
tendem a ser altamente desagregadas até os escalas; e, por fim, iii) a dimensão fractal não
indivíduos constituírem as suas unidades é um valor inteiro: enquanto na geometria
básicas. euclidiana as linhas, os quadrados e os cubos
têm uma dimensão integral, os padrões
fractais no plano têm uma dimensão entre 1 e
Fractais 2, enquanto que a ‘dimensão fractal’ dos
fractais no espaço é entre 2 e 3.
A geometria euclidiana é dominada pelo Nas décadas subsequentes, a geometria
conceito de ‘coisas’ com uma, duas ou três fractal é progressivamente aplicada ao
dimensões. Uma linha tem uma dimensão – ambiente urbano. Dois livros fundamentais
o comprimento; um plano tem duas sobre fractais são publicados em 1994. Batty
dimensões, o comprimento e a largura; e um e Longley (1994) aplicam a geometria fractal
cubo tem três dimensões, o comprimento, a às cidades (Figura 4). Estes autores
largura e a altura. No início dos anos 1950, sustentam que as cidades são fractais na sua
Mandelbrot lança uma linha de investigação forma e que, paradoxalmente, uma grande
que questiona esta visão e que conduz a dois parte da teoria urbana pré-existente é uma
ensaios fundamentais em meados da década teoria da cidade fractal. Frankhauser (1994)
de 1970, que vão adquirir a sua forma final sustenta a existência de processos de auto-
no livro The fractal geometry of nature. organização, ou princípios de ordem interior,
Mandelbrot (1982) sustenta que muitos que promovem o desenvolvimento de
padrões da natureza são tão irregulares e padrões urbanos ‘irregulares’. Como no caso
Morfologia urbana: diferentes abordagens 77

Tabela 1. Síntese das quatro abordagens

Quais são os textos Quais são os Como é que a Que exemplos de


seminais? conceitos chave? abordagem lida aplicação na prática
com: de planeamento?
i) elementos da
forma urbana
ii) níveis de
resolução e
iii) tempo?

Abordagem Conzen (1960) Divisão tripartida da i) ruas, parcelas e 1992 - O plano para
histórico-geográfica paisagem urbana edifícios Asnières-sur-Oise,
Cintura periférica ii) escalas micro à França, de Ivor
Região morfológica macro Samuels e Karl Kropf
Ciclo de parcela iii) importância da
burguesa história

Abordagem Muratori (1959) Tipo i) ruas e edifícios 1959 - O plano para


tipológica projetual Caniggia e Maffei Processo tipológico ii) escalas micro e Barene di San
(1979) Tecido macro Giuliano, Itália, de
Organismo iii) importância da Saverio Muratori
História operativa história

Sintaxe espacial Hillier e Hanson Configuração i) ruas e edifícios 2000s - Os planos


(1984) espacial (espaços interiores) para Jeddah, Arábia
Hillier (1996) Movimento natural ii) escalas micro à Saudita, de Space
Hanson (1998) Linha axial e mapa macro Syntax Limited
axial iii) antecipação de
Segmento e mapa de cenários futuros
segmentos
Medidas sintáticas
(integração,
escolha…)

Análise espacial Tobler (1979) Células e autómatos i) ruas e parcelas -


Batty e Longley celulares ii) escalas meso e
(1994) Agentes e modelos macro
Batty (2005) baseados em agentes iii) antecipação de
Fractais cenários futuros

de Batty e Longley, Frankhauser propõe o Finalmente, os fractais foram utilizados


uso de fractais para medir e caracterizar estas para analisar as características de ruas. Esta
estruturas irregulares. linha é desenvolvida fundamentalmente por
Bovill (1996) centra-se, não em cidades Cooper ao longo dos últimos 15 anos.
mas, em estruturas construídas individuais. Cooper começa por utilizar a análise
Bovill explora a utilização da dimensão fractal para avaliar a complexidade dos
fractal na avaliação e no desenho de skylines urbanos e naturais, passando então
edifícios. Esta linha de investigação é para uma análise das propriedades fractais
desenvolvida de modo sistemático ao longo dos limites das ruas e, finalmente, para uma
das duas últimas décadas – Joye (2011) análise de vistas de rua relacionando o
apresenta uma revisão dos diferentes modos cálculo da dimensão fractal com a perceção
como a geometria fractal tem sido utilizada de níveis de variedade visual presentes em
para analisar e desenhar formas ruas urbanas quotidianas (Cooper e
arquitetónicas. Oskrochi, 2008).
78 Morfologia urbana: diferentes abordagens

Figura 5. O POS de Asniéres-sur-Oise: Le Village


(fonte: Mairie d’Asnières-sur-Oise et al., 1992).

Síntese comparativa e aplicações principal do Plan d’Occupation des Sols


(POS) era a manutenção da identidade local
Depois de descrever as quatro abordagens (marcada por um forte património
nas secções anteriores, esta secção reune os arquitetónico) evitando os processos de
elementos fundamentais apresentados até suburbanização que estavam a ocorrer nos
agora. A Tabela 1 sintetiza estes elementos municípios vizinhos em torno da capital
em quatro grupos: textos seminais; conceitos francesa. O plano propõe um zoneamento
chave; o modo como cada abordagem lida tipo-morfológico, onde as referências para as
com os elementos de forma urbana, com os novas formas urbanas (a serem criadas pelos
níveis de resolução e com o tempo; e, por diferentes agentes) em cada uma das partes
fim, exemplos de aplicação destas que constituem o território de Asnières são
abordagens na prática de planeamento. as formas existentes nessa mesma parte do
A abordagem histórico-geográfica é território. Para mais detalhes sobre o plano,
construída em torno do trabalho de Conzen, ver Mairie d’Asnières-sur-Oise et al. (1992),
particularmente do seu livro sobre Alnwick Samuels (1993) e Samuels e Pattacini
(Conzen, 1960). É em Alnwick que ele (1997).
formula a ideia de uma divisão tripartida da A abordagem tipológica projetual é
paisagem urbana (plano de cidade, tecido construída em torno de duas figuras
edificado e usos do solo) e os conceitos de fundamentais, Muratori e Caniggia, e dos
cintura periférica, região morfológica (ou, seus livros Studi per una operante storia
mais precisamente, de unidade de plano) e urbana de Venezia (Muratori, 1959) e
ciclo de parcela burguesa. A abordagem Composizione architettonica e tipologia
histórico-geográfica é bastante equilibrada e edilizia I: lettura dell’ edilizia di base
abrangente, incluindo todos os elementos da (Caniggia e Maffei, 1979). Os conceitos de
forma urbana e todas as escalas de análise; tipo, processo tipológico, tecido, organismo
tem um forte enfoque na história. e história operativa surgem nestes dois livros
Um dos exemplos mais notáveis de chave e são desenvolvidos por novas
aplicação desta abordagem na prática de gerações de investigadores. A abordagem
planeamento é desenvolvido por Samuels e tipológica projetual partilha com a
Kropf no início dos anos 1990 no plano de abordagem historico-geográfica um conceito
Asnières-sur-Oise, uma pequena cidade nos de tempo em que a história tem um papel
arredores de Paris (Figura 5). O objetivo fundamental na descrição e na explicação da
Morfologia urbana: diferentes abordagens 79

Figura 6. Barene di San Giuliano em Veneza: Estuários I, II e III


(fonte: Maretto 2012).

paisagem urbana. A abordagem tipológica aplicação na prática de planeamento é


projetual é, de alguma forma, menos desenvolvido por Muratori no final da
equilibrada do que a histórico-geográfica década de 1950 num concurso de
com um enfoque menos evidente nas planeamento para uma área localizada a
parcelas (em termos dos elementos de forma nordeste da parte histórica de Veneza – a
urbana). área de San Giuliano (Figura 6). O programa
Um dos mais notáveis exemplos de de concurso define a criação de uma nova
80 Morfologia urbana: diferentes abordagens

cidade para cerca de 40.000 habitantes,


incluindo um conjunto de funções
características de uma cidade moderna que
eram difíceis de acomodar no centro
histórico de Veneza. Neste concurso,
Muratori aplicou a metodologia de ‘desenho
por fases’ (para uma descrição detalhada da
metodologia ver Cataldi, 1998 e Maretto,
2012). A aplicação desta metodologia leva à
preparação, não de uma única proposta final
mas, de três propostas – tantas quantas as
principais fases de crescimento da história
urbana de Veneza.
Embora com uma predominância menor
que Conzen, na primeira abordagem, e
Muratori e Caniggia, na segunda abordagem,
o trabalho desenvolvido por Hillier e
Hanson, e em particular os livros The social
logic of space, Space is the machine e Figura 7. O mapa axial de Jeddah: cenários
Decoding homes and houses constituem o alternativos (fonte: Karimi, 2012).
núcleo central da literatura sobre sintaxe
espacial (Hillier e Hanson, 1984; Hillier,
1996; Hanson, 1998). A partir deste núcleo Muratori) descritas nos parágrafos anteriores.
de livros emerge uma série de conceitos Um dos aspetos chave da sintaxe espacial é
fundamentais como configuração espacial, que ela constitui uma teoria e uma
movimento natural, linha axial (e mapa metodologia analítica, mas não impõe um
axial), segmento (e mapa de segmentos) e layout urbano. Pelo contrário, ajuda a
um conjunto de medidas sintáticas (sublinha- melhorar as qualidades do layout específico
se o protagonismo crescente que a integração de cada cidade. Como tal, a proposta para os
e a escolha têm obtido nos últimos anos). O assentamentos informais tentou identificar os
enfoque principal desta abordagem, em eixos mais integrados da estrutura local e
termos de elementos de forma urbana, são as depois melhorar a sua articulação com a
ruas e os espaços interiores dos edifícios. estrutura geral da cidade. Para mais detalhes
Partilha com a abordagem histórico- sobre estes planos ver Karimi et al. (2007) e
geográfica a capacidade de aplicação em Karimi e Parham (2012).
todas as escalas de análise. A sintaxe É importante sublinhar que a análise
espacial lida com o tempo de modo diferente espacial (Kropf, 2009) é muito mais
das abordagens histórico-geográfica e heterogénea do que as outras três
tipológica projetual – antecipando cenários abordagens. Textos como Cellular
futuros de desenvolvimento urbano. geography, Fractal cities e Cities and
Um excelente exemplo de uma aplicação complexity, para referir alguns dos mais
na prática de planeamento é o conjunto de importantes, constituem um núcleo
planos (um plano estratégico, um plano sub- fundamental para entender uma abordagem
regional, um plano estrutural e uma série de que se baseia nos conceitos e métodos dos
planos locais) preparados para Jeddah, autómatos celulares, modelos baseados em
Arábia Saudita, pela Space Syntax Limited agentes e fractais (Batty, 2005; Batty e
sob a coordenação de Karimi (Figura 7). Um Longley, 1994; Tobler, 1979). Em termos de
dos principais objetivos desta prática é lidar elementos de forma urbana, a análise
com um conjunto de 50 assentamentos espacial não tem a abrangência da
informais em Jeddah com uma população abordagem histórico-geográfica, centrando-
estimada de um milhão de habitantes. É, se principalmente nas ruas e nas parcelas;
portanto, uma realidade absolutamente inclui as escalas de análise meso e macro e
diferente dos planos para as duas cidades partilha com a sintaxe espacial uma conceção
europeias (de Samuels e Kropf e de de tempo, antecipando cenários futuros de
Morfologia urbana: diferentes abordagens 81

desenvolvimento urbano. Caniggia, G. (1963) Lettura di una città: Como


Ao contrário do que acontece com as (Centro Studi di Storia Urbanistica, Roma).
outras três abordagens, não é fácil encontrar Caniggia, G. e Maffei, G. L. (1979)
Composizione architettonica e tipologia edilizia
na literatura, aplicações da análise espacial
I: lettura dell’edilizia di base (Marsilio,
na prática de planeamento. No entanto, Veneza).
modelos como o Sleuth (Clark e Gaydos, Caniggia, G. e Maffei, G. L. (1984)
1998) e o UrbanSim (Waddell, 2002), terão, Composizione architettonica e tipologia edilizia
pelo menos de um modo indireto, uma II: il progetto nell’edilizia do base (Marsilio,
influência na prática de planeamento. Veneza).
Cataldi, G. (1998) ‘Designing in stages’ em
Petruccioli, A. (ed.) Typological process and
Conclusões design theory (Aga Khan Program for Islamic
Architecture, Cambridge) 159-77.
Cataldi, G. (2003) ‘From Muratori to Caniggia’,
O artigo apresentou uma revisão da literatura
Urban Morphology 7, 19-34.
sobre as principais abordagens em Cataldi, G. (2013a) ‘Saverio Muratori: il debito e
morfologia urbana que foram desenvolvidas l’eredità’ em Cataldi, G. (ed.) Saverio Muratori
nas últimas décadas: a abordagem histórico- Architetto (Aión Edizioni, Florença) 10-5.
geográfica promovida pela Escola Cataldi, G. (ed.) (2013b) Saverio Muratori
Conzeniana, a abordagem tipológica Architetto (Aión Edizioni, Florença).
projetual promovida pela Escola Cataldi, G. (2015) Abitazioni primitive (Aión
Muratoriana, a sintaxe espacial e as várias Edizioni, Florença).
formas de análise espacial. O artigo destacou Cataldi, G. (2016) ‘A double urban life cycle: the
as principais forças e fragilidades de cada case of Rome’, Urban Morphology 20, 45-57.
Cataldi, G., Maffei, G. L. e Vaccaro, P. (2002)
uma dessas abordagens e evidenciou alguns
‘Saverio Muratori and the Italian school of
pontos de contato entre diferentes planning typology’, Urban Morphology 6, 3-
abordagens (por exemplo, se for considerada 14.
uma conceção de tempo, as ligações entre as Cataldi, G. e Formichi, F. (2007) Pienza Forma
abordagens histórico-geográfica e tipológica Urbis (Aión Edizioni, Florença).
projetual e entre sintaxe espacial e análise Clarke, K. C. e Gaydos, L. J. (1998) ‘Loose-
espacial são evidentes) tendo em coupling a cellular automaton model and GIS:
consideração um potencial de combinação de long-term urban growth prediction for San
diferentes abordagens e uma utilização Francisco and Washington/Baltimore’,
integrada. International Journal of Geographical
Information Science 12, 699-714.
Conzen, M. R. G. (1960) Alnwick
Northumberland: a study in town-plan analysis
Referências (Institute of British Geographers Publication
27. George Philip, Londres).
Baker, N. J. e Slater, T. R. (1992) ‘Morphological Conzen, M. P. (2009) ‘How cities internalize
regions in English medieval towns’, em their former urban fringes: a cross-cultural
Whitehand, J. W. R. e Lakham, P. J. (eds.) comparison’, Urban Morphology 13, 29-54.
Urban Landscapes: international perspectives Cooper, J. e Oskrochi, R. (2008) ‘Fractal analysis
(Routledge, Londres) 43-68. of street vistas: a potential tool for assessing
Bascià, L., Carlotti, P. e Maffei, G. L. (2000) La levels of visual variety in everyday street
casa Romana: nella storià della città dalle scenes’, Environment and Planning B:
origini all’ Otocento (Alinea, Florença). Planning and Design 38, 814-28.
Batty, M. (2004a) ‘A new theory of space syntax Couclelis, H. (1985) ‘Cellular worlds – a
- Working Paper 75’ (CASA, Londres). framework for modeling micro-macro
Batty, M. (2004b) ‘Distance in space syntax - dynamics’, Environment and Planning A 17,
Working Paper 80’ (CASA, Londres). 585-96.
Batty, M. (2005) Cities and complexity (MIT Couclelis, H. (1997) ‘From cellular automata to
Press, Cambridge). urban models’, Environment and Planning B:
Batty, M. e Longley, P. (1994) Fractal cities: a Planning and Design 24, 165-74.
geometry of form and function (Academic Crooks, A. T. e Heppenstall, A. J. (2012)
Press, Londres). ‘Introduction to agent-based modelling’ em
Bovill, C. (1996) Fractal geometry in Heppenstall, A. J., Crooks, A. T., See, L. M. e
architecture and design (Birkhauser, Basileia). Batty, M. (eds.) Agent-based models of
82 Morfologia urbana: diferentes abordagens

geographical systems (Springer, Dordrecht) 85- movement’, Environment and Planning B:


105. Planning and Design 20, 29-66.
Dalton, N. (2001) ‘Fractional configuration Iltanen, S. (2012) ‘Cellular automata in urban
analysis and a solution to the Manhattan spatial modelling’, em Heppenstall, A. J.,
problem’ em Proceedings of the 3rd Crooks A. T., See, L. M. e Batty, M. (eds.)
International Space Syntax Symposium Agent-Based Models of Geographical Systems
(Georgia Institute of Technology, Atlanta). (Springer, Dordrecht) 60-84.
Dalton, R. C. (2007) ‘Social exclusion and Joye, Y. (2011) ‘A review of the presence and
transportation in Peachtree City’, Progress in use of fractal geometry in architectural design’,
Planning 67, 264-86. Environment and Planning B: Planning and
Figueiredo, L. e Amorim, L. (2005) ‘Continuity Design 38, 814-28.
lines in the axial system’ em Proceedings of the Karimi, K. (2012) ‘A configurational approach to
5th International Space Syntax Symposium analytical urban design: space syntax
(Technische Universiteit Delft, Delft). methodology’, Urban Design International 17,
Frankhauser, P, (1994) La fractalité des 297-318.
structures urbaines (Anthropos, Paris). Karimi, K. e Parham, E. (2012) ‘An evidence
Gardner, M. (1970) ‘Mathematical games: the informed approach to developing an adaptable
fantastic combinations of John Conway’s new regeneration programme for declining informal
solitaire game life’, Scientific American 223, settlements’ em Greene, M., Reyes, J. e Castro,
120-3. A. (eds.) Proceedings of the 8th International
Hagerstrand, T. (1952) ‘The propagation of Space Syntax Symposium (Pontificia
innovation waves’, Lund Studies in Geography Universidad Católica de Chile, Santiago do
B - Human Geography 4, 3-19. Chile).
Hanson, J. (1998) Decoding homes and houses Karimi, K., Amir, A., Shafiei, K., Raford, N.,
(Cambridge University Press, Cambridge). Abdul, E., Zhang, J. e Mavridou, M. (2007)
Hanson, J. e Zako, R. (2007) ‘Communities of ‘Evidence-based spatial intervention for
co-presence and surveillance: how public open regeneration of informal settlements: the case of
space shapes awareness and behaviour in Jeddah central unplanned areas’, Proceedings of
residential developments’, Proceedings of the the 6th International Space Syntax Symposium
6th International Space Syntax Symposium (Istanbul Technical University, Istambul).
(Istanbul Technical University, Istambul). Kropf, K. (2009) ‘Aspects of urban form’, Urban
Hillier, B. (1973) ‘In defense of space’, RIBA Morphology 13,105-20.
Journal 539-44. Larkham, P. J. e Morton, N. (2011) ‘Drawing
Hillier, B. (1996) Space is the machine lines on maps: morphological regions and
(Cambridge University Press, Cambridge). planning practices’, Urban Morphology 15,
Hillier, B. (1999) ‘Centrality as a process: 133-51.
accounting for attraction inequalities in Lathrop, G. T. e Hamburg, J. R. (1965) ‘An
deformed grids’, Urban Design International 4, opportunity-accessibility model for allocating
107-27. regional growth’, Journal of the American
Hillier, B. (2002) ‘A theory of the city as an Institute of Planners 31, 95-103.
object’, Urban Design International 7, 153-79. López, M. e Nes, A. (2007) ‘Space and crime in
Hillier, B. (2004) ‘Can streets be made safe?’, Dutch built environments: macro and micro
Urban Design International 9, 31-5. scale spatial conditions for residential
Hillier, B. (2007) Space is the machine (ebook). burglaries and thefts from cars’, Proceedings of
Hillier, B. e Hanson, J. (1984) The social logic of the 6th International Space Syntax Symposium
space (Cambridge University Press, (Istanbul Technical University, Istambul).
Cambridge). Maffei, G. L. (1990) La casa fiorentina nella
Hillier, B. e Vaughan, L. (2007) ‘The city as one storia della città (Marsilio, Veneza).
thing’, Progress in Planning 67, 205-30. Mairie d’Asnières-sur-Oise, Samuels, I. e Kropf,
Hillier, B., Hanson, J. e Graham, H. (1987) ‘Ideas K. (1992) Plan d’Occupation des Sols (Mairie
are in things: an application of the space syntax d’Asnières-sur-Oise, Asnières-sur-Oise).
method to discovering of housing genotypes’, Mandelbrot, B. (1982) The fractal geometry of
Environment and Planning B: Planning and nature (W H Freeman, Nova Iorque).
Design 14, 363-85. Marcus, L. (2007) ‘Social housing and
Hillier, B., Leaman, A., Stansall, P. e Bedford, segregation in Sweden’, Progress in Planning
M. (1976) ‘Space Syntax’, Environment and 67, 251-63.
Planning B: Planning and Design 3, 147-85. Maretto, M. (2012) Saverio Muratori, a legacy in
Hillier, B., Penn, A., Hanson, J., Grawewski, T. e urban design (FrancoAngeli, Milão).
Xu, J. (1993) ‘Natural movement: or, Muratori, S. (1959) ‘Studi per una operante storia
configuration and attraction in urban pedestrian urbana di Venezia I’, Palladio 3-4.
Morfologia urbana: diferentes abordagens 83

Muratori, S. (1963) Architettura e civilità in crisi Londres).


(Centro Studi di Storia Urbanistica, Roma). Turner, A. e Penn, A. (1999) ‘Making isovists
Muratori, S. (1967) Civilità e territorio (Centro syntactic: isovist integration analysis’, em
Studi di Storia Urbanistica, Roma). Proceedings of the 2nd International Space
Muratori, S., Bollati, R., Bollati, S. e Marinucci, Syntax Symposium (Universidade de Brasília,
G. (1963) Studi per una operante storia urbana Brasilia).
di Roma (Consiglio Nazionale delle Ricerche, Turner, A., Doxa, M., O’ Sullivan, D. e Penn, A.
Roma). (2001) ‘From isovists to visibility graphs: a
Nubani, L. e Wineman, J. (2005) ‘The role of methodology for the analysis of architectural
space syntax in identifying the relationship space’, Environment and Planning B: Planning
between space and crime’, Proceedings of the and Design 28, 103-21.
5th International Space Syntax Symposium Ünlü, T. (2013) ‘Thinking about urban fringe
(Technische Universiteit Delft, Delft). belts: a Mediterranean perspective’, Urban
Peponis, J., Wineman, J., Rashid, M. e Kim, S. Morphology 17, 5-20.
(1997) ‘On the description of shape and spatial Ünlü, T. e Bas, Y. (2016) ‘Multi-nuclear growth
configuration inside buildings: convex patterns in a rapidly changing Turkish city: a
partitions and their local properties’, fringe-belt perspective’, Urban Morphology 20,
Environment and Planning B: Planning and 107-21.
Design 24, 761-81. Vaughan, L. (2007) ‘The spatial form of poverty
Peponis, J., Wineman, J., Bafna, S., Rashid, M. e in Charles Booth’s London’, Progress in
Kim, S. (1998a) ‘On the generation of linear Planning 67, 231-50.
representations of spatial configuration’, Waddell, P. (2002) ‘UrbanSim: modeling urban
Environment and Planning B: Planning and development for land use, transportation and
Design 25, 559-76. environmental planning’, Journal of the
Peponis, J., Wineman, J., Rashid, M., Bafna, S. e American Planning Association 68, 297-
Kim, S. (1998b) ‘Describing plan configuration 314.
according to the covisibility of surfaces’, White, R. e Engelen, G. (1993) ‘Cellular
Environment and Planning B: Planning and automata and fractal urban form: a cellular
Design 25, 693-708. modelling approach to the evolution of urban
Pinto, N. N. (2013) ‘Modelos de autómatos land-use patterns’, Environment and Planning A
celulares como ferramentas de análise da forma 25,1175-99.
urbana’, Revista de Morfologia Urbana 1, 57-8. Whitehand, J. W. R. (1977) ‘The basis for an
Sahbaz, O. e Hillier, B. (2007) ‘The story of the historico-geographical theory of urban form’,
crime: functional, temporal and spatial Transactions of the Institute of British
tendencies in street robbery’, Proceedings of Geographers NS2, 400-16.
the 6th International Space Syntax Symposium Whitehand, J. W. R. (2001) ‘British urban
(Istanbul Technical University, Istambul). morphology: the Conzenian tradition’, Urban
Samuels, I. (1993) ‘The Plan d’Occupation des Morphology 5, 103-9.
Sols for Asnières-sur-Oise: a morphological Whitehand, J. W. R. (2007) ‘Conzenian urban
design guide’ em Hayward, R. e McGlynn, S. morphology and landscapes’, Proceedings of
(eds.) Making better places: urban design now the 6th International Space Syntax Symposium
(Butterworth, Oxford) 113-21. (Istanbul Technical University, Istambul).
Samuels, I. e Pattacini, L. (1997) ‘From Whitehand, J. W. R. (2009) ‘The structure of
description to prescription: reflections on the urban landscapes: strengthening research and
use of a morphological approach in design practice’, Urban Morphology 13, 5-27.
guidance’, Urban Design International 2, 81- Whitehand, J. W. R. e Morton, N. (2003) ‘Fringe
91. belts and the recycling of urban land: an
Slater, T. R. (1990) ‘English medieval new towns academic concept and planning practice’,
with composite plans’ em Slater, T. R. (ed.) The Environment and Planning B: Planning and
built form of Western cities (Leicester Design 30, 819-39.
University Press, Leicester) 71-74. Whitehand, J. W. R. e Morton, N. (2004) ‘Urban
Strappa, G. (2014) L’architettura come processo morphology and planning: the case of fringe
(FrancoAngeli, Milão). belts’, Cities 21, 275-89.
Tobler, W. R. (1979) ‘Cellular geography’ em Whitehand, J. W. R. e Morton, N. (2006) ‘The
Gale, G. e Olsson, G. (eds.) Philosophy in fringe-belt phenomenon and socioeconomic
Geography (Boston, Reidel) 379-86. change’, Urban Studies 43, 2047-66.
Turner, A. (2004) Depthmap 4, a researcher’s Wolfram, S. (2002) A new kind of science
handbook (Bartlett School of Graduate Studies, (Wolfram Media, Champaign).
84 Morfologia urbana: diferentes abordagens

Tradução do título, resumo e palavras-chave

Urban morphology: different approaches

Abstract. This paper presents the origins, main characteristics and fundamental developments of four
dominant approaches in the international debate on urban morphology: historico-geographical
approach, process typological approach, space syntax and spatial analysis – including cellular automata,
agent-based models and fractals. After describing these four approaches, the article synthesizes their
fundamental elements; shows how each approach deals with urban form elements, levels resolution and
time; and illustrates the potential of each approach with applications in professional planning practice.

Keywords: urban morphology, historico-geographical approach, process typological approach, space


syntax, spatial analysis.

PNUM 2017: Morfologia urbana: território, paisagem e planejamento


A 6ª conferência da Rede Lusófona de legados, permanências, transformações; iv)
Morfologia Urbana (PNUM), ‘Morfologia configuração territorial e urbana: escalas de
urbana: território, paisagem e planejamento’, abrangência, modelos de desenvolvimento, local
terá lugar em Vitória (capital do estado de vs global; v) sistemas urbanos e condição
Espirito Santo, no Brasil) entre 24 e 25 de suburbana: cidade formal, assentamentos
Agosto de 2017. Esta conferência tratará de aformais, ocupações ilegais; vi) padrões
possibilidades e alcances do estudo da forma morfológicos e sistemas de espaços livres
urbana na configuração e no planejamento e urbanos: modos de apropriação, instrumentos
projeto do território e da paisagem. Intrínsecos à legais, atores e agentes envolvidos; e, por fim,
problemática estão a articulação e os limites vii) ambiente construído e sustentabilidade:
entre manutenção da memória coletiva e desejo inquietações projetuais, métodos construtivos,
de transformação e a construção de estratégias interações tecnológicas.
que assegurem a justiça socioespacial. Os resumos deverão ser enviados até 15 de
A conferência estrutura-se em sete eixos Janeiro de 2017; a comunicação da sua eventual
temáticos: i) regimes de interação com a forma aceitação será realizada até 15 de Março; e o
urbana: metodologias de abordagem, envio dos artigos completos (opcional) deverá
procedimentos analíticos, metanarrativas ser feito até 30 de Maio.
descritivas; ii) configuração, forma e reforma A coordenação do evento é de Eneida
urbanas: aproximações epistemológicas, Mendonça e Milton Junior. Mais informações
estratégias projetuais, devir urbano; iii) história poderão ser obtidas no website do PNUM 2017
urbana e património material / imaterial: em http://pnum2017.wixsite.com/pnum2017.

ISUF 2017: City and territory in the global era


O 24º International Seminar on Urban Form urbana, e por fim, viii) espaços verdes urbanos.
(ISUF 2017) terá lugar em Valência, Espanha, Os resumos deverão ser submetidos até 31 de
entre 27 e 29 de Setembro de 2017. O tema da Janeiro de 2017. As notificações acerca da
conferência é City and territory in the global era. aceitação do resumo serão fornecidas até 15 de
Os tópicos da conferência, que deverão enquadrar Março. Após a aceitação dos resumos, os autores
as propostas submetidas, são os seguintes: i) fases poderão submeter os artigos completos até 30 de
na configuração territorial, ii) forma urbana e Maio.
utilização social do espaço, iii) leitura e Mais informações poderão ser obtidas no
regeneração da cidade informal, iv) utilização website do ISUF 2017 em
eficiente de recursos em cidades sustentáveis, v) http://valencia2017isufh.com/. Quaiquer questões
transformações da cidade, vi) grandes bases de ou sugestões relativas à conferência deverão ser
dados, vii) instrumentos de análise em morfologia enviadas para isufh2017valencia@gmail.
Tipos de corredores e ruas locais no distrito da Mooca, São
Paulo

Adilson C. Macedo e Maria I. Imbronito


Universidade São Judas Tadeu, Rua Taquari 546, 03166-000 Mooca, São Paulo, Brasil.
E-mail: ac.macedo@terra.com.br, imbronito@gmail.com

Artigo revisto recebido a 23 de Agosto de 2016

Resumo. Para análise do tecido urbano do distrito da Mooca, na cidade de


São Paulo, Brasil, foram consideradas duas categorias além de rua, quadra,
lote e edifício, respetivamente: o corredor que atravessa um setor e o corredor
de distribuição no setor. Corredor, como a somatória da via que lhe dá
origem, os lotes limítrofes e os edifícios neles construídos, formando os
elementos do espaço ampliado das vias. O estudo dos corredores começa pela
análise das vias. Os corredores delimitam porções do tecido conforme a escala
de aproximação em estudo: região, município, cidade, bairro, vizinhança. A
porção de espaço urbano contida entre corredores é chamada subárea.
Apresenta-se aqui um estudo dos corredores na formação do tecido urbano
tradicional.

Palavras-chave: morfologia urbana, corredores, subáreas, tipos de vias,


projeto urbano

Por mais complexas que sejam as cidade de tecido urbano tradicional os


transformações do tecido urbano de uma corredores se interceptam formando núcleos
cidade, quando consideradas por partes pode- de dimensões diferentes, cuja estrutura é
se explorar a natureza de cada uma delas e orgânica. Cada núcleo é delimitado por
encontrar relações de uma parte com a outra. corredores, que podem variar de tamanho e
No caso do presente estudo, é utilizado o forma conforme as características das vias
procedimento de identificar tipos de que lhe dão origem. A área interna de cada
‘corredores’, para delimitar o tecido urbano núcleo é chamada de ‘subárea’. Como relata
em partes cada vez menores. Além de Macedo (2002) este processo para interpretar
favorecer a análise, este procedimento pode a estrutura urbana se mostrou de utilidade,
servir como suporte para a formulação de tanto para os estudos preliminares quanto na
programas de projeto que atendam as fase de elaboração das diretrizes urbanísticas
demandas locais de uma comunidade. do Plano Local de Gestão Urbana de Barão
Denomina-se corredor o sistema de vias Geraldo, Município de Campinas, Estado de
públicas somado com as faixas lindeiras de São Paulo, Brasil. O presente artigo, com
lotes, edificados ou não. A intensidade de uso base no referido plano e em experimentos
destas vias influi em modificações da didáticos na universidade, procura elucidar e
ocupação do solo dos lotes voltados para desenvolver os conceitos de corredor e de
elas. Os lotes das faixas lindeiras de vias subárea. É uma abordagem teórica e de
principais diferenciam-se dos lotes voltados estudo de caso que sistematiza o estudo do
para as vias transversais ou paralelas. Daí elemento urbano corredor, tendo foco nas
vem o conceito de corredor, entendido como características da via que lhe dá origem.
o sistema formado pela via e a faixa de lotes No Grupo de Pesquisa Arquitetura da
lindeira das quadras que a acompanha. Na Cidade (GPAC), da Universidade São Judas

Revista de Morfologia Urbana (2016) 4(2), 85-105 Rede Lusófona de Morfologia Urbana ISSN 2182-7214
86 Tipos de corredores e ruas locais no distrito da Mooca, São Paulo

Figura 1. (a) Estrutura orgânica de uma folha (b) Estrutura urbana de corredores e
subáreas (fonte: fotograma; diagrama dos autores).

Tadeu em São Paulo, estudam-se os tipos autores e do Google Earth. Em segundo


edificados ao longo destes corredores, lugar, medição de fluxos incluindo transporte
construções geminadas acompanhando o público, privado e pedestre. Por fim,
alinhamento das calçadas, remanescentes do observações sobre o uso do solo. O conjunto
ordenamento tradicional das quadras, destes itens permite estabelecer um rol dos
interrompidas de quando em quando por lotes tipos de corredores, e criar uma classificação
onde as construções são recuadas, soltas no para ser aplicada na formulação de
terreno, como exemplares das diferentes programas para futuros projetos. Estudar e
fases do Movimento Moderno no Brasil. O classificar tipos de espaços auxilia nos
tecido característico da formação da cidade estudos da evolução urbana de cidades com
tradicional, tem por analogia a estrutura tecido tradicional, e serve para dar suporte à
orgânica de uma folha, conforme a ilustração definição de diretrizes urbanísticas para um
(Figura 1a). Dela pode-se inferir os conceitos novo projeto urbano (Macedo, 2002).
de corredores e subáreas, que para efeito de
análise morfológica se representa por um
diagrama (Figura 1b). Procedimentos de aplicação do conceito de
São consideradas as diferentes corredores e subáreas
características das vias conforme sua
inserção na malha urbana. Sendo possível Subdividir o espaço da cidade segundo o
deste modo se diferenciar os corredores, princípio da identificação de corredores e
segundo três tipos: i) corredor que atravessa subáreas serve para estabelecer partes
um setor da cidade em estudo; ii) corredor menores para efeito de análise e proposição.
que distribui o fluxo para a rua local; e iii) Inicialmente, identificam-se os corredores
rua local, como o menor componente do formados por um número de elementos
sistema viário (Imbronito e Macedo, 2016). variáveis, dentre os quais se encontram as
Para caracterizar os diferentes tipos de vias (faixa de rolamento, canteiros, calçadas,
corredores são considerados três elementos canais, linhas de infraestrutura) e os lotes das
morfológicos. Em primeiro lugar, aspetos faixas lindeiras, conforme anteriormente
físicos incluindo análise da largura (leito enunciado.
carroçável, calçada, canteiro, cursos de água, Os espaços ocupados pelos corredores
linhas de infraestrutura), comprimento da via, formam uma faixa de uso e ocupação do
tipo de lote das faixas lindeiras e volume solo, com características diferenciadas e
construído (gabarito e recuo da edificação, ocupam uma superfície significativa da área
recuo acima do embasamento, garagem e urbanizada. Na cidade com estrutura urbana
permeabilidade do solo). Para esta análise, tradicional – como São Paulo – os corredores
são utilizados elementos gráficos como se cruzam em um diagrama celular, e
plantas, cortes e fotos tomadas no local pelos determinam polígonos cujo contorno é
Tipos de corredores e ruas locais no distrito da Mooca, São Paulo 87

formado por faixas que têm a largura do subárea de pequenas dimensões, formada por
corredor. O miolo, que se denomina como ruas locais e delimitada por corredores que
subárea, é composto por vias de distribuição distribuem.
e ruas locais dando suporte a quadras, em Para este procedimento de análise urbana,
número que varia conforme o espaçamento procura-se aprofundar o entendimento e a
das faixas poligonais. sistematização dos tipos de corredores, de
A classificação de um corredor e a modo a se poder aplicar os tipos encontrados
determinação das subáreas relaciona-se com a outras situações de pesquisa. No momento
a escala de aproximação que se deseja trata-se especificamente dos tipos de vias que
observar. Os diferentes níveis de gradação de dão suporte para as duas categorias de
escalas relativizam os parâmetros para corredores (os que atravessam, os que
eleição dos corredores e para análise dos distribuem) e para as vias locais.
elementos do entorno. Deste modo, o
procedimento de estudar o tecido urbano por
corredores e subáreas é aplicável a qualquer Tipos de corredores
escala, desde a região até o trecho de
vizinhança formado por poucas quadras. Vias Corredor que atravessa o setor em estudo
de menor importância metropolitana
assumem papel estruturador ativo quando Em primeira análise do tecido urbano,
observadas no contexto de áreas menores. No evidenciam-se os corredores que atravessam
caso do fracionamento para a obtenção de um setor em estudo. Eles são de grande
subáreas pequenas, os corredores de importância por conectar setores diferentes
distribuição podem fazer parte da poligonal da cidade, interferindo na dinâmica urbana de
de contorno, como no estudo de caso que modo amplo e até regional. Outras vezes,
será apresentado a seguir. podem apenas recortar internamente partes
O que motiva este processo de análise em de um trecho do tecido urbano. Por este
especial é a possibilidade de estudar até a motivo, a definição de corredor que atravessa
menor unidade de fracionamento do espaço um setor urbano fica relacionada à escala de
urbano mantendo a relação com o todo do abrangência adotada para cada trabalho. O
tecido urbano da cidade. Particularmente, fotograma da Figura 1a ajuda a visualizar
compreender a formação de áreas de estes elementos por associação à estrutura
vizinhança formada por quadras de lotes orgânica de um vegetal. Em algumas
pequenos, de 100 m² para uso residencial, situações, o corredor que atravessa
entremeados (com certa frequência) por acompanha um limite definido por um forte
junções de lotes que chegam a 500 m², elemento físico difícil de transpor, como o
dimensão a partir da qual aparecem pequenos oceano, que forma uma barreira em um dos
galpões industriais. São quadras de 50 m de lados da avenida da praia, ou uma montanha
largura, que chegam a ter o comprimento de onde a via de contorno acompanha seu sopé
200 m, medida que marca a modulação entre separando dois tipos de área urbanizada.
vias de distribuição. Existem casos em que o Outra situação que causa o efeito de forte
responsável pelo loteamento inicial separação entre os dois lados de um corredor
organizou de forma tão intricada estas é quando ele é muito largo, formado por uma
quadras, que hoje elas formam remansos via expressa ou uma ferrovia, que separa
dentro do sistema urbano maior, contundentemente os dois lados da faixa de
evidenciando predominante uso residencial. lotes, constituindo um limite forte ou
Em consequência, este tipo de agenciamento barreira, indicando ser melhor estudar cada
das ruas e quadras desperta a curiosidade de lado em separado, apesar da possível
se investigar parâmetros para o que se possa existência de dispositivo especial para
definir o que é uma área de vizinhança numa transpô-lo, como por exemplo, uma ponte
cidade como São Paulo. Ou seja, uma (Lynch, 2006 [1960]).
88 Tipos de corredores e ruas locais no distrito da Mooca, São Paulo

Figura 2. (a) Município de São Paulo (b) distrito da Mooca no lado este do centro da
cidade (fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

Corredores que distribuem os fluxos dentro estudo são referidas como área de
de um setor urbano vizinhança. Anteriormente se destacou a
questão da subárea pequena como
Os corredores que distribuem são contraponto às subáreas de alta concentração
importantes para análise em escala menor, de edificações.
pois têm a função de articular os corredores A evolução dos estudos do GPAC sobre a
que atravessam com as vias locais. Do ponto classificação de tipos de subárea, no tecido
de vista do uso do solo, eles fazem a urbano tradicional de São Paulo, evidencia o
gradação entre o comércio, serviço e interesse de se comparar um setor, composto
instituições de abrangência regional, por uma ou mais subáreas e corredores, com
instalado nos corredores que atravessam, para modelos de unidade de vizinhança do
uma oferta local. urbanismo moderno e os conceitos de cidade-
jardim, tão divulgados internacionalmente.
Ruas locais Sobre a cidade-jardim destaca-se o diagrama
proposto por Clarence Stein, em 1929, para
Esta subsecção aborda a ruas (ou vias) locais um neighborhood (área de 64 ha) nas
que servem para o acesso final ao destino do cercanias do município de Nova Iorque;
usuário. Uma parte das ruas locais se atualizado por representantes do novo
conectam com vias de distribuição e fazem o urbanismo no início deste século e logo em
papel de ligação com outras ruas locais, seguida por Douglas Farr (urbanismo
gerando percursos ainda mais específicos. sustentável) – Farr (2008). A investigação
Outras vezes elas são loop ou cul-de-sac sobre corredores e subáreas serve também
levando e trazendo os fluxos para uma rua de para se procurar uma resposta à pergunta:
distribuição. As ruas locais são importantes como poderá ser entendida uma área de
para a análise das subáreas pequenas, de vizinhança, em um tecido tradicional de alta
predominância residencial, que para efeito de densidade de uso e ocupação do solo?
Tipos de corredores e ruas locais no distrito da Mooca, São Paulo 89

visualização de conjunto do tecido urbano


para efeito de análise (Figura 4a). Em
seguida foi escolhido um trecho (0,8 km²)
que apresenta diversidade de tipos para se
investigar as vias que atravessam, as vias que
distribuem e as ruas locais (Figura 4b).
No setor em estudo (Figura 4b) sua
proximidade ao centro da cidade favoreceu
que terrenos de até 60 000 m², destinados
originalmente a indústrias de porte médio e
pequeno (hoje muitas são apenas depósitos),
compartilhassem o espaço urbanizado com
áreas residenciais e escassos equipamentos
Figura 3. Posição da área de estudo em relação sociais. O setor possui boa inserção com
ao centro da cidade. relação ao sistema viário, evidenciando
corredores que atravessam e outros que
distribuem os fluxos para ruas locais.
Análise do distrito da Mooca Ajustado o recorte, passa-se à análise da
foto fornecida pelo Google Earth (Figura 5a),
O município de São Paulo tem superfície de que permite boa visualização da estrutura
1 521 110 km², sendo diminuta a área rural. urbana e possibilita o estudo das vias pelo
A população é de 11 967 825, e a resultante Street-view. Estes procedimentos são
densidade demográfica é de 7 398.26 acompanhados por visitas a pé pela área para
hab/km2. A área do município inclui uma observar o local, tomar notas, fotografar e
grande área de mananciais ao sul e outra, conversar com as pessoas (Figura 6). O
reserva ambiental, ao norte, incluindo água e resultado destes procedimentos se consolida
florestas. O sistema hídrico é caracterizado em um diagrama, mostrando os corredores
pelas bacias dos rios Tietê (cuja nascente que atravessam e os que distribuem os fluxos
localiza-se ao Norte do Estado) e pelos rios no setor (Figura 5b).
Pinheiros e Tamanduateí (Figura 2a). O
município de São Paulo é o centro de uma
área metropolitana que atinge 21 000 000 de Caracterização dos corredores
habitantes (segundo dados do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística para Apresenta-se nesta secção o estudo
2015), sendo considerada, do ponto de vista particularizado dos corredores: oito
económico, a região mais rica da América do corredores que atravessam o setor em estudo,
Sul. A cidade é subdividida, para fins indicados pela numeração de 1 a 8; três
administrativos, em 31 distritos, com o corredores que distribuem os fluxos com
distrito da Mooca a este do centro da cidade numeração de 9 a 11; e três ruas locais
(Figura 2b). Na Figura 3, o número 1, (exemplos) que estão indicadas pelas letras A
corresponde a área central da cidade, o 2 ao B e C na Figura 5b.
Rio Tietê, o 3 ao Rio Tamanduateí e, por fim, Para facilitar a organização dos elementos
o 4 ao distrito da Mooca. de análise, foi feita a apreciação de cada um
dos corredores considerando: breve descrição
de seu tipo de inserção na malha urbana; foto
Primeiros procedimentos de análise aérea do Google Earth mostrando todo o
corredor; dados quantitativos da via como
Inicialmente foram determinadas as vias comprimento, largura, fluxo de pedestres,
correspondentes aos corredores que veículos privados e transporte público;
atravessam o distrito e fazem as ligações sentido do tráfego pelas mãos de direção;
gerais entre diversos setores da cidade, sobre foto no nível do solo, tomada pelos autores, e
uma base cartográfica na escala 1:10.000. corte da via em pontos típicos, mostrando a
Esta escala mostra o sistema viário e os ocupação do lote. Foi feita a contagem de
limites das quadras e permite uma boa veículos privados em um tempo de 3
90 Tipos de corredores e ruas locais no distrito da Mooca, São Paulo

Figura 4. (a) Distrito da Mooca: vias que atravessam e distribuem; (b) área de estudo.

Figura 5. Área de estudo: (a) vista aérea, (b) numeração dos corredores
(fonte: Google Earth, autores).

Figura 6. Vista geral do setor estudado (fotografia dos autores).


Tipos de corredores e ruas locais no distrito da Mooca, São Paulo 91

Figura 7. Painel de caracterização do Corredor 1 – Alcântara Machado.

minutos, fora dos horários de pico do tráfego. Tobias Barreto; ii) corredores que distribuem
A quantidade de linhas de ônibus foi retirada - 9. Sapucaia, 10. Trilhos e 11. Itaqueri; e,
do guia oficial da cidade de São Paulo. por fim, iii) ruas locais: A. João Santisi, B.
O objetivo é gerar uma avaliação Miraluz e C. Comendador Alfaia.
comparativa dos tipos de vias e aferir, in loco
e através do quadro comparativo, as
diferenças entre os tipos de corredores e vias Corredores de atravessamento
locais. Sendo que no presente estudo o foco
será apenas na forma física das vias, sem Corredor 1. Alcântara Machado
entrar no uso do solo das faixas de lotes
lindeiras. Na Figura 5b pode-se observar: i) É caracterizado pela Avenida Alcântara
corredores que atravessam – 1. Alcântara Machado que, no trecho em estudo, funciona
Machado, 2. Bresser-Paes de Barros, 3. como via de distribuição do Sistema Radial
Siqueira Bueno, 4. Fernando Falcão, 5. Rua Este (Figura 7). O conjunto Radial Este,
da Mooca, 6. Cassandoca, 7. Taquari e 8. metrô e ferrovia (Companhia Paulista de
92 Tipos de corredores e ruas locais no distrito da Mooca, São Paulo

Figura 8. Painel de caracterização do Corredor 2 – Bresser / Paes de Barros.

Trens Metropolitanos, CPTM), complexo que Corredor 2. Bresser-Paes de Barros


conecta a zona este ao centro da cidade,
constitui uma barreira que separa o distrito da Este corredor conecta a Rua Bresser, desde a
Mooca dos vizinhos ao norte (Brás e Belém). Estação Bresser do Metrô, à Avenida Paes de
O presente estudo considera apenas a parte Barros, tendo na área de estudo a extensão de
sul do corredor, ou seja, a Avenida Alcântara 1 450 m (Figura 8). A face nordeste do
Machado no trecho em que atua como via corredor é ocupada por uma única parcela, o
que atravessa, fazendo a distribuição do antigo hipódromo da cidade de São Paulo,
trânsito para o distrito da Mooca e hoje subdividida para diversas instituições
incorporando a faixa de lotes pertencente ao públicas, incluindo a subprefeitura da Mooca.
distrito. Esta avenida é estruturadora do O trecho de 350 m da Avenida Paes de
trânsito em São Paulo, um corredor largo e Barros na área em estudo representa um
de tráfego intenso, caracterizado como um alargamento deste extenso corredor, que se
corredor que atravessa a cidade apresentando prolonga por 4 675 m em direção ao distrito
forte atividade comercial e de serviços. Vila Prudente (vizinho ao distrito da Mooca).
Tipos de corredores e ruas locais no distrito da Mooca, São Paulo 93

Figura 9. Painel de caracterização do Corredor 3 – Siqueira Bueno.

Corredor 3. Siqueira Bueno Corredor 4. Corredor Fernando Falcão

A rua que dá nome ao corredor transpõe o Corredor onde o trecho em análise é um


complexo viário Radial Este por meio de um segmento de 700 m de um total de 1 332 m
viaduto (Figura 9). Desde a Avenida (Figura 10). A via responsável pelo corredor
Alcântara Machado até a Rua Fernando faz a ligação de duas outras vias importantes
Falcão totaliza 1 890 m de extensão, e que atravessam a cidade e por isto apresenta
delimita o distrito da Mooca pelo lado um grande movimento de veículos
sudeste, seguindo para o distrito vizinho. A particulares e de transporte coletivo. Os
rua é essencialmente comercial e de serviços terrenos remanescentes de indústrias
(desde primeiras necessidades até pequenas foram utilizados para a construção
concessionárias de autos e motos), onde de edifícios residenciais de até quinze
também se encontram equipamentos sociais. pavimentos, havendo um conjunto edificado
Nota-se uma transformação gradativa do uso de construção subsidiada pelo governo, na
dos imóveis existentes, preponderando década de 1960, com prédios de três
construções antigas que sofreram reformas e pavimentos e casas (esquina com a Rua da
modificação das fachadas como resposta ao Mooca). Ao longo do corredor verifica-se
forte apelo comercial existente. uma significativa quantidade de prédios de
94 Tipos de corredores e ruas locais no distrito da Mooca, São Paulo

Figura 10. Painel de caracterização do Corredor 4 – Fernando Falcão.

três pavimentos (comércio no térreo e dois Corredor 6. Cassandoca


pavimentos de residência).
Este corredor atravessa longitudinalmente a
área de estudo numa extensão de 1 370 m,
Corredor 5. Mooca ligando os corredores Alcântara Machado e
Fernando Falcão (Figura 12). Nas imediações
Trata-se do corredor da Rua da Mooca, que da Rua Tobias Barreto, a Av. Cassandoca
percorre no sentido este o total de 5 013 m, passa a ter canteiro central, estendendo-se até
do Parque Dom Pedro (centro de São Paulo) a Rua Fernando Falcão (cerca de 700 m).
até uma grande avenida do distrito vizinho Entre a Avenida Alcântara Machado e a Rua
Vila Prudente (Figura 11). O trecho em Taquari (200 m) o corredor é caracterizado
estudo tem 1 450 m. A via é estreita, mas liga por lotes institucionais em ambos os lados.
o centro e os bairros com sentido único de Da Rua Taquari até à Rua Tobias Barreto
trânsito. É ocupada por comércio tradicional, predominam os grandes lotes ocupados por
de lojas pequenas e construções com um condomínios, havendo comércio e serviços
forte alinhamento; suas calçadas se mostram em pequenos centros comerciais no estilo
insuficientes para atender o intenso fluxo de norte-americano do strip-mall. No trecho
pedestres. As construções novas são feitas com canteiro central o uso misto é reduzido
obedecendo ao recuo de 5 m instituído em com a prevalência de prédios residenciais. O
1972. corredor Cassandoca aparece (à esquerda) na
Tipos de corredores e ruas locais no distrito da Mooca, São Paulo 95

Figura 11. Painel de caracterização do Corredor 5 – Mooca.

vista geral apresentada na Figura 12, imagem institucional e baixa densidade, trechos com
que ilustra a variedade de tipos de tecidos edificações antigas com uso de comércio e
urbanos existente no setor escolhido para serviços, lote grande ocupado por
análise. universidade e condomínios verticais.

Corredor 7. Taquari Corredor 8. Tobias Barreto

Este corredor conecta os corredores Bresser- Este corredor desenvolve-se desde a Rua da
Paes de Barros e Siqueira Bueno (1 180 m) Mooca na direção nordeste cruzando
prolongando-se na direção nordeste (Figura perpendicularmente o corredor Siqueira
13). Tem um tipo característico de uso e Bueno (Figura 14). No trecho de estudo tem
ocupação do solo com um grande lote de uso o comprimento de 850 m, de um total de
96 Tipos de corredores e ruas locais no distrito da Mooca, São Paulo

Figura 12. Painel de caracterização do Corredor 6 – Cassandoca.

1 900 m. Caracteriza-se por ser um corredor Corredores de distribuição


de uso misto, ainda com muitas residências e
volume de tráfego inferior aos demais Corredor 9. Sapucaia
corredores. Apresenta uma grande variedade
nos tipos de edificações, a maioria de Este corredor faz a ligação do corredor
construções antigas de casas e pequenos Taquari ao Tobias Barreto em um segmento
prédios, até os prédios altos isolados em de 700 m (Figura 15). O corredor tem uma
terrenos de 1 000 a 1 500 m². atmosfera de tranquilidade na medida em que
Tipos de corredores e ruas locais no distrito da Mooca, São Paulo 97

Figura 13. Painel de caracterização do Corredor 7 – Taquari.

não há trânsito muito intenso e pouco uso Avenida Alcântara Machado, a Rua dos
comercial e de serviços. Há um trecho onde Trilhos marca a entrada da Mooca para quem
existem condomínios verticais de grande se desloca a partir do Sistema Radial Este
porte, totalmente fechados por muros, o que (Figura 16). Entrando na área de estudo, a rua
colabora para haver poucas pessoas nas ruas. corta a Avenida Paes de Barros e vai até a
Rua Itaqueri (Corredor 11). Trilhos é um
Corredor 10. Trilhos corredor comercial por excelência, com
diversos trechos em transformação. A rua
Fora do trecho em estudo, com início na tem uma extensão de 2 260 m.
98 Tipos de corredores e ruas locais no distrito da Mooca, São Paulo

Figura 14. Painel de caracterização do Corredor 8 – Tobias Barreto.

Corredor 11. Itaqueri Ruas locais

Este corredor tem início na Rua da Mooca,


vai até a Siqueira Bueno (700 m) dentro da Rua A. João Santisi
área de estudo (Figura 17). Depois da
Siqueira Bueno se prolonga totalizando 1 375 Esta rua com 160 m de comprimento, fica
m de extensão. O corredor se caracteriza por localizada entre as ruas Professor Machado
ser bem arborizado e acompanhar extensa Tolosa e Arinaia (Figura 18). É formada por
faixa de ocupação por prédios de quatro construções no alinhamento da calçada sendo
pavimentos, típicos dos programas de a maioria das casas térreas e as restantes
habitação subsidiada pelo governo. No casas assobradadas. Como a largura da rua é
demais, predomina o uso misto com estreita os veículos estacionam ocupando
edificações em lotes pequenos. parte das calçadas em ambos os lados.
Tipos de corredores e ruas locais no distrito da Mooca, São Paulo 99

Figura 15. Painel de caracterização do Corredor 9 – Sapucaia.

Rua B. Miraluz Rua C. Comendador Alfaia

Esta rua, com 167 m de comprimento, É uma rua estreita com 90 m de extensão,
localiza-se entre a Rua Sapucaia e a Rua cujos lotes em sua maioria tem frente de 10
Joaquim Lopes Figueira (Figura 19). Trata-se até 15 m (Figura 20). Observou-se uma casa
de uma rua estreita, que apresenta testada de em lote de 15 m de frente, com dois
lotes indo até os 10 e 15 m onde aparecem pavimentos, com acesso para estacionamento
sobrados de qualidade da construção dentro do lote (quatro carros), podendo
relativamente boa. significar que a família mesmo tendo uma
100 Tipos de corredores e ruas locais no distrito da Mooca, São Paulo

Figura 16. Painel de caracterização do Corredor 10 – Trilhos.

boa renda, preferiu ali residir. Nesta rua o dela originados. Os corredores foram
padrão das construções é relativamente bom, denominados conforme a via que lhe dá
considerando o tipo de vizinhança. origem, e são compreendidos pelo conjunto
desta via com a ocupação e volumetria das
edificações lindeiras. Para sua caracterização,
consideraram-se ainda critérios como tráfego,
Considerações finais presença de transporte público, uso do solo e
comprimento da via, além de uma descrição
O objeto principal deste artigo se restringiu de seu papel como conectora de setores da
ao estudo das vias de ligação como suporte cidade, a fim de determinar sua importância
para a posterior caracterização dos corredores hierárquica no sistema viário como um todo.
Tipos de corredores e ruas locais no distrito da Mooca, São Paulo 101

Figura 17. Painel de caracterização do Corredor 11 – Itaqueri.

De entre os corredores que atravessam, o utilizado por pedestres e com ativo uso de
Corredor 1. Alcântara Machado e o Corredor comércio e serviços. Os demais corredores
2. Bresser-Paes de Barros apresentam maior que atravessam têm menor calha viária, em
largura e fluxo. Destes, o primeiro tem muitos casos de largura idêntica. Muitas
caráter expresso, menos comércio local e vezes nestes corredores a pista é estreita para
menor uso das calçadas. O corredor a função viária que cumprem; as calçadas
Bresser-Paes de Barros, por sua vez, é não chegam a 3 m de largura e no entanto
amplamente utilizado para transporte atendem a um uso intenso misto de comércio,
público (com longo trecho de corredor de serviços (incluindo oficinas), institucional e
ônibus, que se dispersa justamente na área residencial. Este é o caso do Corredor 3.
de estudo), sendo intensamente Siqueira Bueno e do Corredor 5. Mooca, que
102 Tipos de corredores e ruas locais no distrito da Mooca, São Paulo

Figura 18. Painel de caracterização da Rua Local A – João Santisi.

apesar da calha pequena, são vias uma porção nordeste e outra sudoeste. Do
significativas por apresentarem longa lado nordeste predomina o tecido ortogonal
extensão e atravessarem diferentes distritos. cortado transversalmente pela Rua Sapucaia
Deste modo, nota-se que um fator cujo traçado cobriu um córrego existente
determinante para a hierarquia da via dentro então canalizado. Na porção nordeste, a
do sistema de circulação do bairro, para além ortogonalidade do traçado segue o
de sua largura, é o comprimento da via e os alinhamento do Corredor 3. Siqueira Bueno.
destinos que conecta, e isto acaba Nesta porção do tecido, o espaçamento
determinando as características do uso do rigoroso de 200 m entre as vias
solo e a intensidade de fluxos de veículos e perpendiculares que distribuem o fluxo para
pedestres. O Corredor 6. Cassandoca, o interior da área estudada permite a
atravessa a área de interesse determinando identificação de uma retícula reguladora por
Tipos de corredores e ruas locais no distrito da Mooca, São Paulo 103

Figura 19. Painel de caracterização da Rua Local B – Miraluz.

trás do desenho das quadras, marcada por sem saída (cul-de-sac) e ruas em forma de
vias que distribuem e que apresentam largura loop, subdividindo as quadras regulares da
em torno de 16 m e traçado contínuo. Com malha. Este tipo de ocupação definiu as vias
base nesta malha inicial de 200 m, o traçado locais A, B e C analisadas neste estudo.
foi subdividido em função do parcelamento Nestas áreas, verifica-se que a não
em lotes com profundidade em torno de 25 continuidade do traçado das vias locais
m, possivelmente sob a iniciativa de auxiliou na preservação das vizinhanças
empreendedores independentes, o que residenciais horizontais. Contribuiram para a
determinou uma profusão de vias locais manutenção destas áreas as restrições de
estreitas e com pouca extensão (com um legislação e o intenso parcelamento com base
máximo de 200 m). em lotes de dimensão reduzida, o que não
A não padronização dos projetos para favoreceu o interesse dos empreendedores de
abertura de ruas locais resultou em um tecido grandes edifícios. É uma situação que
repleto de vias estreitas e descontínuas, ruas favorece uma diversificação de tipos de
104 Tipos de corredores e ruas locais no distrito da Mooca, São Paulo

Figura 20. Painel de caracterização da Rua Local C – Comendador Alfaia.

tecido urbano. Esta característica se repete análise. Espera-se desta maneira fornecer
em outros lugares da cidade, e aponta para a subsídios para a análise e o desenho da forma
necessidade de instrumentos de política física da cidade.
pública que possibilitem a manutenção e
implementação da qualidade ambiental destes
bolsões de uso predominante residencial. Agradecimentos
Deste modo, verifica-se que não apenas os
corredores assumem caráter próprio, mas Participou dos trabalhos de pesquisa de campo
para a elaboração deste artigo o estudante de
determinam subáreas que também poderão
arquitetura e urbanismo da Universidade São
apresentar características específicas muito Judas Tadeu, Anísio Serafim Júnior. Esta temática
diferentes dos corredores. Este facto está relacionada à sua pesquisa de Iniciação
corrobora a ideia inicial da investigação que Científica ora em desenvolvimento, com o título
sustenta o estudo do espaço urbano por partes ‘O distrito da Mooca, tipos do seu tecido urbano e
e a especificação de procedimentos de seus espaços de convivência’.
Tipos de corredores e ruas locais no distrito da Mooca, São Paulo 105

Referências
tipos’, 5ª Conferência do PNUM, Guimarães, 15
Farr, D. (2008) Sustainable urbanism, urban e 16 de Julho.
design with nature (John Wiley & Sons, Nova Lynch, K. (2006 [1960]) A imagem da cidade
Jérsia). (Martins Fontes, São Paulo).
Imbronito, M. I. e Macedo, A. C. (2016) ‘Tecido Macedo, A. (2002) ‘O espaço urbano por partes’,
urbano do distrito da Mooca: um estudo de Revista Sinopses 38, 11-6.

Tradução do título, resumo e palavras-chave

Patterns of local streets and corridors in the district of Mooca, São Paulo

Abstract. This analysis of the urban fabric of the so-called Mooca district, in the city of São Paulo,
Brazil, involves the consideration of streets, street-blocks, plots and buildings taken in isolation, and also
of two other composite elements: ‘corridors’ crossing each city sector and corridors within each sector.
The corridor is understood as the articulation between the street, the plots on both sides of the street and
the buildings erected in these plots. Each corridor contains different information on the urban tissue
varying according to the scale of analysis: region, municipality and neighborhood. Each part of the city
contained inbetween corridors is a subarea. The paper offers an analysis of corridors in the formation of
traditional residential fabrics.

Keywords: urban morphology, corridors, subareas, street patterns, urban project

ISUF Italia 2017: Learning from Rome – historical cities and


contemporary design
A 3ª conferência do ISUF Italia (a rede italiana operacionais com utilidade para a intervenção
associada ao International Seminar on Urban contemporânea.
Form / ISUF, presidida por Giuseppe Strappa, e Os chairs de Learning from Rome, à frente de
promotora da Escola Muratoriana), com o título duas vastas comissões, uma científica (com uma
Learning from Rome: historical cities and composição de grande abrangência geográfica) e
contemporary design, terá lugar na Faculdade de outra organizadora, são Paolo Carlotti, Anna Irene
Arquitetura na Piazza Borghese, Roma, entre 23 e Del Monaco e Dina Nencini (três académicos da
24 de Fevereiro de 2017. Sapienza Università di Roma).
O objetivo fundamental da conferência é Mais informações no website do ISUF Italia
recolher contributos da academia e da prática 2017, em http://rome2015.isufitaly.com/index.
profissional no âmbito da arquitetura e do php?conference=rome2017&schedConf=rome201
planeamento em contextos históricos, dirigindo 7, ou através do endereço electrónico
esses contributos para a definição de ferramentas rome2017@isufitaly.com.

Rede Lusófona de Morfologia Urbana (PNUM), 2015-16


O presente relatório da Rede Lusófona de workshops e publicações, e ainda uma breve
Morfologia Urbana (PNUM) apresenta um reflexão sobre futuras ações a promover.
resumo das principais atividades desenvolvidas Teve lugar entre 15 e 16 de Julho a quinta
pelo PNUM entre Julho de 2015 e Julho de 2016, edição da conferência promovida pelo PNUM,
onde se inclui a indicação de conferências, ‘Os espaços da morfologia urbana’. Esta
106 Relatório

conferência teve lugar no centro histórico de Pereira da Costa e Maria Manoela Gimmler Netto
Guimarães, Portugal, mais precisamente no (Costa e Netto, 2015), sobretudo pelas suas
Centro Cultural Vila Flor. O número de perspetivas pedagógicas. Finalmente, é de se
inscrições efetivadas ao PNUM 2016 é salutar a continua divulgação de publicações
significativo e corrobora as expectativas da realizadas por membros do PNUM na revista
equipa organizadora do evento, coordenada por Urban Morphology, na secção book reviews e
Jorge Correia e Miguel Bandeira, da que inclui os livros ‘Urbanismo na composição
Universidade do Minho. Na edição do PNUM de Portugal’ de Luísa Trindade (Coelho, 2015) e
2016 regista-se a presença de um número ‘Os elementos urbanos’, de vários autores e
significativo de jovens investigadores e coordenado por Carlos Dias Coelho (Dufaux,
estudantes, entre os vários palestrantes, o que 2015).
constitui um contributo muito positivo para o É desejo do PNUM continuar a promover o
assegurar da continuidade de conhecimento no estudo da forma urbana junto da comunidade
âmbito da morfologia urbana, entre diferentes lusófona, mas também internacional. Foi nesse
gerações de investigadores. sentido que em Setembro de 2016, no ISUF
Imediatamente a seguir ao PNUM 2016, entre Council que teve lugar na 22ª Conferência do
19 e 23 de Julho, teve lugar em Vila Nova de ISUF, em Roma, foi proposto por Teresa Marat-
Cerveira, na Escola Superior Gallaecia, o 2º Mendes, conselheira deste órgão a necessidade de
Workshop promovido pela Rede Lusófona de se promover uma Task Force no ISUF que
Morfologia Urbana, com o tema ‘Forma urbana e visasse estudar e implementar uma articulação
dinâmicas transfronteiriças’. À semelhança do 1º entre as várias Local Networks do ISUF, das
Workshop, o programa do workshop de 2016 quais o PNUM é uma delas. O objetivo seria: i)
incluiu a análise e a aplicação de um conjunto de proporcionar um maior cruzamento das várias
abordagens metodológicas específicas – redes existentes dentro do ISUF; ii) contribuir
abordagem Histórico-Geográfica da Escola para o reforço da identidade multicultural do
Conzeniana, abordagem Tipológica Processual da próprio ISUF, dando-lhe contudo maior
Escola Muratoriana, Space Syntax e Sistemas de visibilidade; e ao mesmo tempo iii) proporcionar
Informação Geográfica (SIG) – em casos de uma identificação de eventuais linhas de
estudo em concreto, Viana do Castelo e Tui. Está abordagem morfológica partilhadas quer
também prevista a realização de um e-book com historicamente ou na contemporaneidade pelas
os resultados do workshop de 2016. várias Local Networks do ISUF. Caberá neste
No que diz respeito à atividade editorial sentido ao PNUM procurar como melhor
realizada no âmbito do PNUM, a Revista de contribuir também para este desafio.
Morfologia Urbana, editada por Vítor Oliveira,
tem continuado a assegurar a publicação de
perspetivas e artigos na área da morfologia Referências
urbana. Traduções portuguesas de trabalhos
seminais originalmente publicados em inglês na Coelho, C. D. (2015) ‘O urbanismo na
revista Urban Morphology continuam a ser composição de Portugal’, Urban Morphology
disponibilizados pela Revista. 19, 189-91.
Em 2016 foi publicado o e-book resultante do Costa, S. A. P. e Netto, M. M. G. (2015)
1º Workshop do PNUM, com o título ‘Diferentes Fundamentos de morfologia urbana (C/Arte,
Abordagens no Estudo da Forma Urbana’ Belo Horizonte).
(Oliveira e Monteiro, 2016), contribuindo para a Dufaux, F. (2015) ‘Os elementos urbanos’,
difusão dos resultados do workshop e da Urban Morphology 19, 103-4.
divulgação das metodologias de análise da forma Oliveira, V. (2016) Urban morphology. An
urbana promovidas no workshop junto de uma introduction to the study of the physical form of
comunidade estudantil mais alargada. cities (Springer, Dordrecht).
Sem qualquer desrespeito pelas várias Oliveira, V. e Monteiro, C. (2016) Diferentes
publicações entretanto disponibilizadas por abordagens no estudo da forma urbana (FEUP,
outros membros do PNUM, no último ano de Porto).
atividades, gostaríamos de indicar aqui duas
publicações que merecem a nossa atenção no
âmbito do estudo da forma urbana. Teresa Marat-Mendes, Instituto Universitário de
Designadamente, o livro ‘Urban Morphology. An Lisboa ISCTE-IUL, DINÂMIA’CET-IUL,
Introduction to the Study of the Physical Form of Departamento de Arquitectura e Urbanismo, Av.
Cities’, de Vítor Oliveira (Oliveira, 2016) e das Forças Armadas, 1649-026 Lisboa, Portugal.
‘Fundamentos de Morfologia Urbana’ de Staël E-mail: teresa.marat-mendes@iscte.pt
PERSPETIVAS
Debate sobre temas fundamentais
em morfologia urbana

Morfologia urbana e legislação urbanística. Como a utilização


da análise tipo-morfológica pode auxiliar na aplicação da
legislação urbanística em diferentes setores da cidade de São
Paulo
Denise Antonucci, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade Presbiteriana
Mackenzie, Rua Itambé, 143 - Prédio 9, 01302-907 São Paulo, Brasil. E-mail:
antonucci.denise@gmail.com

O interesse pelos estudos e instrumentos definidos International Seminar on Urban Form (ISUF),
pela morfologia urbana surgiu por meio de anglo-saxã e italiana, baseadas nos ensinamentos
experiência didática desenvolvida na disciplina de M. G. R. Conzen e Saverio Muratori.
Urbanismo ministrada, inicialmente, em Porém, persiste uma preocupação maior –
diferentes semestres da Faculdade de Arquitetura apesar do aprofundamento dos debates sobre
e Urbanismo da Universidade Presbiteriana morfologia e projeto urbanos, pouco se evoluiu na
Mackenzie desde a virada do século. discussão da relação entre morfologia urbana e
Considerava-se, naquele momento, que as legislação urbanística. E ainda mais sério, a
Operações Urbanas (instrumento urbanístico relação entre análise morfológica e cidade real,
proposto pela gestão municipal para setores da não construída sob preceitos da legislação
cidade implicando parceria público-privada) urbanística.
seriam o instrumento urbanístico mais eficiente Deve-se destacar que se considera o Estado –
para a definição do projeto urbano, mas, o poder público municipal – como gestor dos
perguntava-se se deveriam ser sempre utilizadas. diversos interesses conflitantes existentes na
No entanto a análise morfológica é imprescindível cidade e o plano diretor como projeto social, e
para que esse processo se realizasse com sucesso. com este a distribuição racional dos benefícios
Ao longo de quase 20 anos, transitei por todas entre os diversos grupos de interesse na cidade.
as etapas da disciplina Urbanismo, abordando de A rentabilidade social dos recursos está
diferentes maneiras, da rua à região, a condicionada a uma intervenção mais ampla do
necessidade do conhecimento e reconhecimento poder público na produção do espaço urbano de
do facto urbano em suas diferentes escalas. Este modo a quebrar o círculo vicioso, que tem origem
conhecimento foi aprofundado pela utilização da nos vazios urbanos. Os vazios urbanos aparecem
metodologia proposta pela morfologia urbana a como causadores de problemas na cidade. Pode-
partir de duas vertentes reconhecidas pelo se deduzir que se todos os espaços vazios (lotes

Revista de Morfologia Urbana (2016) 4(2) 107-21 Rede Lusófona de Morfologia Urbana ISSN 2182-7214
108 Perspetivas

ou edifícios desocupados) existentes na área tornou um método de atrair capital e pessoas num
servida por infraestrutura fossem ocupados, os período de competição interurbana e de
problemas, em sua grande parte, encontrariam empreendimentos urbanos intensificados. Para
solução. que essas intervenções urbanas tenham um caráter
As premissas apontadas levam a refletir sobre democrático, devem ser precedidas de normas
dois pontos importantes, o caráter destemido - ou democraticamente elaboradas contidas no Plano
utópico - dos planejadores ao acreditar que por Diretor, que estabeleçam prioridades para a
meio de diretrizes poderiam dar uma nova cidade e na Legislação de Uso e Ocupação do
racionalidade a uma cidade já estruturada como Solo que as confirme.
São Paulo, e ainda pensar ser possível um Para avaliar-se a forma urbana atual de São
processo não voltado para o mercado imobiliário. Paulo, deve-se conhecer de um modo mais
Verifica-se a ausência de nuanças no atuar dos sistemático os tecidos urbanos que se formaram
planejadores, que não consideraram a presença em setores de bairros na cidade de São Paulo,
dos agentes produtores da cidade, o setor privado durante o século XX. Para isso torna-se necessária
e muitas vezes, o próprio setor público que age a análise dos tipos de tecidos urbanos, por meio
independente de regras racionalizadoras, ou de sua descrição e possíveis qualidades,
apesar delas. inserindo-os na lógica do processo de produção
A legislação urbanística ao estabelecer formas da cidade, ressaltando o papel da legislação
permitidas e proibidas, acaba por definir urbanística na sua definição. Esse instrumental
territórios dentro e fora da lei. analítico, colocado à disposição dos planejadores
A metodologia da análise tipo-morfológica urbanos, urbanistas e arquitetos, permitirá melhor
pode vir a contribuir na aplicação de novos qualificação de proposições relativas a planos e
instrumentos urbanísticos contidos na recente projetos urbanos para a cidade de São Paulo.
legislação do Município de São Paulo (Plano A partir da reflexão sobre um sistema de áreas
Diretor Estratégico, Planos Diretores Regionais e e respetivo conjunto de demandas, pode-se pensar
Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo). na antecipação de novas referências urbanas. A
A aprovação recente da nova Lei de perspetiva de expressão das áreas a serem
Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo (Lei n.º estudadas pressupõe reflexão teórica pela qual
16 402, 22/03/2016) não permite avaliar o quanto seria possível reconhecer conceitualmente
a cidade mudará a partir de sua aplicação. O que situações urbanas emergentes e elaborar projetos
trouxe de inovador foi a participação da que aumentassem suas potencialidades. Novas
população em sua formulação final. possibilidades seriam então consideradas por
A análise tipo-morfológica de setores de meio da articulação de projetos públicos e a
bairro construídos lícita ou ilicitamente permite transformação da cidade a partir de pontos
verificar a permanência da lei e os processos de estratégicos de renovação, garantindo sua
transformação causados por sua utilização. legitimidade.
As demandas por uma cidade inserida na A formação dos tecidos urbanos deve ser
economia global sugerem a participação do analisada, por meio de estudos sistemáticos,
Estado não apenas como coordenador, mas como condicionados pela estruturação urbana que passa
instigador de mudanças no espaço urbano, que pelo processo de produção, apropriação e
garantam acessibilidade e qualidade de vida aos consumo da cidade.
cidadãos e à cidade. Os estudos morfológicos abrirão novas
As cidades (e os seus governantes) tentam perspetivas para a compreensão da paisagem
hoje criar uma imagem positiva e de boa urbana, permitindo uma avaliação qualitativa do
qualidade de si mesmas, e têm procurado na espaço urbano e apontando caminhos tanto para a
arquitetura e no projeto urbano o atendimento a preservação e requalificação do tecido urbano
essa necessidade. Dar determinada imagem à quanto para a elaboração de projetos urbanos para
cidade por meio da organização dos espaços se áreas degradadas ou ainda não ocupadas.

Praeter utilitas
Miguel Melo Bandeira, Câmara Municipal de Braga, Praça do Município, 4700-435
Braga, Portugal. Centro de Estudos de Geografia e Ordenamento do Território, Via
Panorâmica s/n, 4150-564 Porto, Portugal. E-mail: miguel.bandeira@cm-braga.pt

Atualmente, tudo aquilo que não se justifica pela mesmo considerado como sendo inútil por uma
sua utilidade parece carecer de sentido, ou é ampla banda de pragmáticos. Até o próprio
Perspetivas 109

conhecimento, pela sua incondicionalidade e espaço urbano, em geral. Dada a sua natureza
voluntarismo intrínseco, que popularmente era física (os traçados e os planos) tende a privilegiar
tido por ‘não ocupar espaço’, hoje em dia, sugere- a análise visual do espaço urbano (desenho e
se, só poder ‘valer’ sentido, ou sequer merecer ‘morfo-volumetria’), pelo que frequentemente se
crédito, sobretudo, de quem se arvora de o confunde com o domínio da ‘paisagem urbana’. A
referenciar, se tiver uma aplicabilidade prática, morfologia urbana pode ser entendida à escala de
tanto melhor, quanto mais esta for imediata e diversas tipologias de plano, como por exemplo,
contenha uma suscetibilidade tecnológica. geomórfico, radio-concêntrico, ortogonal,
E no entanto, à questão de ‘para que serve’, no irregular, compósito (espontâneo e planeando).
caso, ‘a morfologia urbana’, para lá da sua Por outro lado, pode ser decomposta em
dimensão utilitarista, que não utilitária (tendo em dimensões espaciais, como nos propõe Rossi e
conta o fim), desde logo inscreve-se o valor Tricart (Lamas, 1993): a cidade, o bairro e a rua,
hermenêutico do que esta pode significar para o ou por elementos básicos: o solo, os edifícios, o
conhecimento e a compreensão dos fenómenos e lote, o quarteirão, a fachada, o logradouro, o
dos estudos urbanos. Questão, ela própria, que traçado / a rua, a praça, o monumento, árvores e
convoca outras bem mais elementares. O que é, vegetação, e mobiliário urbano (Lamas, 1993).
então, a morfologia urbana? Que importância A evolução das teorias relativas à forma
tem? E por fim, naturalmente, para que poderá urbana pode igualmente inscrever-se em diversas
servir? tradições fundamentais: os trabalhos pioneiros de
No princípio é sempre o étimo. Dos helénicos geografia urbana franceses e alemães, do início do
morphé e logos – μορφολογοσ – simplesmente século XX, com referência a R. Blanchard, Karl
remissível para o estudo das formas. Isto é, o Hassert e Otto Schlüter; a obra de M. Halbwachs,
conhecimento da ‘forma urbana’, uma das mais baseada nos estudos de E. Durkheim (Capel,
antigas apreensões do estudo da cidade, de cuja 2002); a abordagem italiana, fundada por Saverio
‘episteme’ geográfica nos pode ajudar a fixar uma Muratori, nos anos 1950, tendo por princípio ‘a
genealogia do desenvolvimento metodológico e história como processo de recuperação do sentido
do objeto de estudo. Diríamos, uma espécie de de continuidade de prática arquitetónica: tipo,
‘geomorfologia’ da geografia urbana. Desde logo tecido, organismo, e história operativa’,
alicerçada na indagação da origem da cidade, desenvolvida na década seguinte por duas
veiculada às condicionantes geomórficas do tendências: Muratori / Caniggia versus Aymonino
‘sítio’ e da ‘posição’; depois, ao estudo do ‘plano / Rossi; e o enfoque anglo-saxónico, com três
urbano’ (combinação dos ‘espaços construídos’ e abordagens. Neste caso, a ‘histórico-geográfica’,
os ‘livres’: de ‘circulação’ e ‘verdes’ (Oliveira, centrada na figura de M. R. G. Conzen, que
1973), e ao estudo sistemático dos elementos do estabelece três elementos concetuais básicos: o
desenho e da forma urbana, desde Mumford ‘plano de cidade’, o ‘tecido edificado’ e os ‘usos
(1961), um dos grandes sintetizadores deste do solo’; a abordagem ‘normativa’ que concorre
estudo interdisciplinar aplicado ao urbanismo. De da vontade de contribuir, através do planeamento,
espécie ou género (eidos) de caracterização para estabelecer a ‘boa’ forma urbana e melhorar
clássica da cidade, que considera ‘a forma como a qualidade do ambiente urbano (Christopher
princípio ativo do composto substancial’, a forma Alexander, Kevin Lynch, Gordon Cullen e Rob
urbana, na visão ‘Kantiana’, passa a ser uma Krier); e a abordagem ‘quantitativa’, desde os
‘estrutura sensível’ (espaço / tempo) do anos 1960, com Leslie Martin e Lionel March,
pensamento humano, para, a partir da uma investigação feita a partir da relação das
fenomenologia de Hegel, jamais se admitir formas com as estruturas urbanas (Oliveira,
destituída de conteúdo. Isto é, do estudo 2016). Finalmente, na península ibérica, as
epidérmico, estrito da configuração e / ou origens dos estudos sobre a cidade, baseiam-se na
estrutura externa, evoluiu até à morphé, pela qual, sua evolução morfológica, muito particularmente
glosando o romancista Victor Hugo, a forma em Portugal, onde se dá como referência pioneira,
urbana ‘é o fundo que remete à superfície’. A ‘A Physionomia de Setúbal’ (1918) de Fernando
morfologia urbana exprime, pois, ‘a organização Garcia.
económica, a organização social, as estruturas Hoje, o debate morfológico mais significativo
políticas, os objetivos dos grupos sociais centra-se em temas como o ensino da morfologia
dominantes’ (Capel, 2002), a cultura, as urbana, os estudos comparativos e a relação entre
cosmologias, utopias, etc., compreendendo os teoria morfológica e prática de planeamento
estudos sistemáticos da origem das cidades, dos (Oliveira, 2016) e são dinamizados pelo
processos e dos agentes de crescimento e de International Seminar on Urban Form (ISUF) e a
desenvolvimento (‘morfogénese’), do plano e da sua publicação, Urban Morphology, e também
estrutura de uma cidade, em particular, e do pelo promissor Portuguese-language Network of
110 Perspetivas

Urban Morphology. ‘ciborganização’ urbana que profeticamente se


Por fim, e do nosso ponto de vista, o grande anuncia. Útil, no mínimo, porque desafiador do
desafio instrumental que se coloca aos domínios vaticinado deus ex-machina que ameaça tornar
da morfologia urbana, prende-se inútil tudo o que restar fora de si.
incontornavelmente ao valor insubstituível do
desenho urbano nas suas diferentes asserções,
tanto na compreensão como na idealização / Referências
construção das cidades / espaços urbanos. Para
tal, evocamos Ernst Haeckel (1834-1919), o Capel, H. (2002) La morfología de las ciudades
‘inventor’ da ecologia, cultor da união entre a arte (Ediciones del Serbal, Barcelona).
e a ciência, e autor da famosa Generelle Garcia, F. (1918) A Physionomia de Setúbal.
morphologie der organismen (Morfologia geral Estudo de geografia humana (Liga de Defesa e
dos organismos – 1866), discorrendo acerca da Propaganda de Setúbal, Setúbal).
evolução da forma e da estrutura dos seres vivos, Haeckel, E. (1866) Generelle morphologie der
mais do que querendo a síntese, exemplifica com organismen (Reimer, Berlim).
a busca da fusão entre a arte e a ciência, entre o Lamas, J. (1993) Morfologia urbana e desenho da
sentir a natureza com o coração, e o poder de cidade (Fundação Calouste Gulbenkian,
investigar o mundo natural como um zoólogo. Lisboa).
De facto, enquanto desfrutarmos do corpo e da Mumford, L. (1961) La cité a travers l’histoire
essencialidade dos sentidos, o valor da (Paris, Éditions du Seuil).
materialidade do espaço e do ambiente que este Oliveira, J. M. P. (1973). O espaço urbano do
gera, persistirá como sendo um fator determinante Porto, condições naturais e desenvolvimento
do nosso bem-estar e da prospeção do devir (Coimbra, Instituto de Alta Cultura, CEG).
comum. Dir-se-ia uma condicionante mais do que Oliveira, V. (2016) Urban Morphology. An
resiliente face aos deslumbramentos fáusticos da introduction to the study of the physical form of
urbanização viral, global, autopropulsionada na cities (Springer, Dordrecht).

Uma reflexão sobre a necessidade e o contributo da


morfologia urbana
Armando Fernandes, Escola Superior Gallaecia, Largo das Oliveiras, 4920-275 Vila
Nova de Cerveira, Portugal. E-mail: armandofernandes@esg.pt

O estudo da forma urbana – a morfologia urbana é a sua interdisciplinaridade, despertando o


– é entendida sob uma panóplia de definições, interesse e a participação de diversas áreas de
com a utilização de variadas terminologias e com conhecimento, que dela se servem e para a qual
um léxico específico, dando por exemplos a muito contribuem, tirando partido dos ‘métodos’
designação de Lamas (1993), ‘…estudará que se encontram sistematizados num conjunto de
essencialmente os aspetos exteriores do meio abordagens, umas mais antigas e outras bem mais
urbano e das suas relações recíprocas…’, a de recentes (Oliveira et al., 2015), aproveitando os
Coelho (2013), ‘…o estudo sistemático da forma avanços tecnológicos ocorridos nas últimas
da cidade…’, ou de Oliveira et al. (2015), ‘…o décadas. Todavia há a destacar o papel pioneiro
estudo da forma urbana – bem como dos atores e das escolas tradicionais de morfologia urbana
dos processos responsáveis pela sua (Costa e Neto, 2015, p.35) de diferentes origens
transformação…’, referindo-se este último geográficas, na implementação de ‘processos’,
mesmo ao facto de não haver consenso quanto à afirmados como ‘método’ para a leitura e análise
sua exata definição, o que Costa e Netto (2015) da forma urbana, em muito devido aos contributo
demonstram, em parte, numa busca de conceitos e e empenho dos seus corregelionários.
da sua atuação mais abrangente no que à forma A partir das mais variadas leituras, o atender
urbana diz respeito. ao pensamento crítico de personalidades
Umas das muitas particularidades da contemporâneas da morfologia urbana e reflexões
morfologia urbana, e que se confirma consensual, tidas em conta, reconheço certos momentos em
Perspetivas 111

que a necessidade e o contributo desta área de prática profissional diz respeito, as opções
conhecimento assume o seu papel de forma estratégicas a ter em conta para uma atuação
preponderante junto da sociedade. direta em temas da morfologia urbana, que deverá
Num momento histórico (h) – o palimpsesto, e terá de ter o apoio incondicional da academia, a
como diversos autores o referem, que a partir das partir dos estudos e investigações morfológicas
várias camadas apostas, devidamente realizadas no âmbito teórico, contribuindo assim
identificadas nos seus mais variados elementos para uma aproximação, mais que desejada, entre
físicos, na relação intrínseca entre eles e a estas duas realidades – a prática e a teoria.
diversas escalas, se permite conhecer os vários Em suma, tendo por analogia os momentos
estádios históricos, desde a sua criação, ao seu enunciados, entendo a cidade na sua forma: como
desenvolvimento, passando mesmo pela foi (h); como é (a); e como será (f). E no que ao
reinterpretação do tempo presente (Coelho, 2013), ‘homem urbano’ se refere: o que fomos (h), o que
alterando-a para um novo e futuro tempo, logo, somos (a), e o que seremos (f)., devendo-se em
mais um estádio temporal da forma urbana. grande parte, a partir da necessidade do
Num momento atual (a) – em que o desenho conhecimento e consequentes contributos da
da cidade, intentado pela prática profissional, seja morfologia urbana.
feito de forma consciente, informada e
fundamentada, pelo já largo lastro do
conhecimento da morfologia urbana. Para tal Referências
contribuem não só a formação específica
académica nos mais variados cursos superiores, Coelho, C. D. (2013) Os elementos urbanos
ao nível dos últimos ciclos de ensino, como (Argumentum, Lisboa).
especificamente e de forma direta, os vários Costa, S. A. P. e Netto, M. M. G. (2015)
encontros internacionais e nacionais, ISUF e Fundamentos da morfologia urbana (C/Arte,
PNUM respetivamente, onde se congrega uma Belo Horizonte).
grande parte do conhecimento sobre a morfologia Lamas, J. (1993) Morfologia urbana e desenho da
urbana, e que por vezes, paralelamente, se cidade (Fundação Calouste Gulbenkian,
ensaiam e experimentam as diversas abordagens a Lisboa).
partir de formações complementares e optativas. Oliveira, V., Mendes, T. e Pinho, P. (2015) O
Num momento futuro (f) – o planeamento da estudo da forma urbana em Portugal (U.Porto
cidade, que deriva diretamente daquilo que à Edições, Porto).

O FormaUrbis lab e a utilidade dos estudos de morfologia


urbana
Sérgio Padrão Fernandes, Forma Urbis Lab, Faculdade de Arquitetura da
Universidade de Lisboa, Rua Sá Nogueira, Pólo Universitário do Alto da Ajuda, 1349-
063 Lisboa, Portugal. E-mail: serfer@fa.ulisboa.pt

O nascimento do urbanismo enquanto disciplina radicalmente diferentes.


que aborda a produção do objeto urbano decorre A história da cidade construída e sobretudo a
das exigências colocadas à cidade no século XIX, produção urbanística do pós-guerra demonstrou a
sobretudo da emergência de programar e construir falência do urbanismo científico e dos modelos
a expansão dos núcleos preexistentes para uma que pressupunham a criação de um objeto ideal,
sociedade industrializada e progressivamente às vezes belo e sedutor, mas que não reunia os
mais urbana. valores essenciais da cidade.
No início do século XX as vanguardas As visões imaginadas pelas utopias socialistas
ideológicas apoiadas nas correntes do pensamento contrapuseram-se ao desaparecimento da antiga
progressista repudiam a cidade herdada, o unidade orgânica da cidade sob a pressão
passado, a história, a tradição e vêm no desintegradora da industrialização, acentuando as
urbanismo, na sua vertente científica, a salvação visões diferentes e até mesmo antagónicas sobre o
de todos os problemas, em que o estudo das futuro da cidade.
formas de crescimento urbano é então a Para aqueles que Françoise Choay alinhou na
oportunidade para criar modelos urbanos ideais, corrente do pensamento culturalista, não é mais
112 Perspetivas

a situação do indivíduo que estava posta em causa linha de pensamento que adotou a cidade
mas a do agrupamento humano da cidade, construída como modelo conceptual para a sua
enquanto organismo urbano. Uma postura ‘contra própria criação e renovação. A cidade herdada
a cidade’ baseia-se na inevitabilidade da morte da tornou-se assim o objeto de estudo e a morfologia
cidade existente, no desaparecimento de uma urbana o método para descodificar os mistérios
realidade e do objeto que conhecemos e no que envolvem o processo de produção de uma
surgimento de um novo artefacto para uma nova entidade física complexa e extraordinária, tão
sociedade. Outra postura é ‘a favor da cidade’, no fascinante nos ambientes que cria como, às vezes,
sentido da continuidade histórica de um objeto aparentemente inexplicável na expressão física
herdado, onde se concentram os valores que materializa.
civilizacionais e da vida coletiva, um organismo O fundamento dos procedimentos de leitura,
que se renova e se ajusta às circunstâncias de cada tal como o próprio conceito de morfologia urbana,
momento, sem deixar de ser o suporte foi estabilizado em meados do século XX, em
fundamental da vida do Homem em sociedade. diferentes contextos culturais e até disciplinares.
Foi no contexto deste debate que se afirmou No sul da Europa a morfologia urbana adquiriu,
uma das posições teóricas mais relevantes e no âmbito do urbanismo, o estatuto de nova
fecundas sobre a cidade e veio a determinar o disciplina. Esta conheceu uma ampla difusão
nascimento da morfologia urbana como uma nova através dos arquitetos formados na linha
disciplina, cujos fundamentos culturais foram ideológica de Saverio Muratori que a partir do
construídos sobre os valores da memória e do contexto italiano influenciaram profundamente as
contexto, adotando as disciplinas da história e da diversas abordagens ao estudo da forma urbana,
geografia como suporte basilar para defender a mas também a postura sobre a conceção do seu
permanência da cidade como objeto eterno. processo de produção, formulada a partir da ideia
Esta nova atitude sobre a cidade despontou em de projeto urbano e da noção de cidade como
meados do século XX, aquando da revisão crítica organismo compacto (Muratori, 1959).
das pretensões científicas do urbanismo moderno, Quando há pouco mais de dez anos se
e teve como objetivo compreender a cidade como constituiu na Faculdade de Arquitetura da
obra de arte, como manufacto e como processo de Universidade de Lisboa um laboratório de
construção no tempo longo. O retorno à cidade investigação em morfologia urbana com o
histórica e à leitura da forma da cidade construída desígnio original e ambicioso de empreender o
reclamou a autonomia disciplinar do inquérito à forma da cidade construída em
procedimento análise e a responsabilidade da sua Portugal tomou-se como referência a
investigação uma competência específica dos Encyclopédie de l’Urbanisme dirigida por Robert
arquitetos, dado que a problemática da produção Auzelle e Ivan Jankovic que, no seu prefácio, se
da estrutura física da cidade é em primeiro lugar assume como um ‘instrumento insubstituível de
um problema de composição espacial. trabalho e cultura’.
O conceito de morfologia surgiu O FormaUrbis Lab é coordenado por Dias
pioneiramente como um termo genérico que Coelho, catedrático de urbanismo de Lisboa,
remete para o estudo das formas e da sua origem. tendo-se constituído a partir de uma equipa
Quando no final do século XVIII Johann Wolfgan pluridisciplinar de docentes / investigadores,
von Goethe se interessou pelo estudo da doutorandos e bolseiros de investigação com
mutabilidade das formas vegetais adotou o termo interesses comuns e perspetivas complementares
morfologia enquanto ciência de observação da sobre o estudo da forma urbana que tem vindo a
forma, mas o interesse do humanista alemão não ser publicada através da coleção ‘Cadernos de
se restringia somente à classificação, tendo morfologia urbana’ (Coelho, 2013, 2014).
abordado o estudo da forma no âmbito da Este grupo de trabalho integrou trabalhos
botânica a partir das noções de formação, anteriores que os membros fundadores haviam
transformação e metamorfose das plantas. realizado como ‘A praça em Portugal. Inventário
Etimologicamente o termo utilizado por morfológico’ e tem neste momento o objetivo de
Goethe é construído pela combinação da palavra construir o Atlas Morfológico da Cidade em
grega morphê, que remete para a noção de forma, Portugal, tarefa que se encontra em
e da palavra logos, que se reporta ao conceito de desenvolvimento e que trata 100 cidades sob o
estudo, de ciência ou de tratado, permitindo hoje ponto de vista da sua forma global e da forma dos
compreender o significado da expressão elementos que a compõem (Coelho e Lamas,
morfologia urbana como estudo da forma da 2007).
cidade e dos fenómenos que a determinaram, ou O objetivo da investigação empreendida pelo
seja, dos processos de produção. FormaUrbis lab é construir uma base de dados
A transposição do estudo da formação dos operativa baseada na utilização do desenho como
corpos orgânicos para o estudo das formas o principal instrumento de estudo da forma da
urbanas – morfologia urbana – provém de uma cidade. O desenho que se assume como parte
Perspetivas 113

integrante do ‘próprio discurso’ nos pioneiros novas conceções espaciais.


tratados de urbanismo, de Sitte ou Unwin, e que
permite aceder ao nível de conhecimento que a Referências
cidade construída encerra enquanto repositório e
arquivo essencial de informação sobre si própria, Coelho, C. D. (ed.) (2013) Os Elementos
tal como revelam os trabalhos mais recentes de Urbanos. Cadernos de Morfologia Urbana
Komossa ou Busquets (Komossa, 2010; Sitte, (Argumentum, Lisboa).
2001 [1889]). E que é também a principal forma Coelho, C. D. (ed.) (2014) O tempo e a forma.
de expressão nas leituras da cidade empreendidas Cadernos de Morfologia Urbana (Argumentum,
pelos arquitetos franceses, desde Auzelle, Panerai, Lisboa).
Manguin, ou nos trabalhos desenvolvidos por Coelho, C. D. e Lamas, J. (eds.) (2007) A praça
Krier, em Viena, Gandelsonas, nos Estados em Portugal - Continente, inventário de
Unidos, ou por Solà-Morales, em Barcelona, e espaço público (FAUTL / DGOTDU,
pela maioria dos arquitetos de uma geração que Lisboa).
influenciaram (Gandelsonas, 1999; Krier, 1981 Gandelsonas, M. (1999) X-Urbanism:
[1979]; Panerai et al., 1999; Solà-Morales, 1993). Architecture and the city (Princeton
Assumindo que a utilidade do procedimento Architectural Press, Nova Iorque).
de investigação provém da relação implícita entre Komossa, S. (2010) The Dutch urban block and
a leitura analítica e o exercício de composição em the public realm (Vantilt, Roterdão).
projeto, o atlas morfológico da cidade portuguesa Krier, R. (1981 [1979]) El espacio urbano
assume-se como um instrumento para a prática do (Gustavo Gili, Barcelona).
urbanismo, assim como para o ensino desta Muratori, S. (1959) ‘Studi per una operante storia
disciplina na medida em que trata, de forma urbana di Venezia’, Palladio 3-4.
metódica e comparável, os tecidos urbanos Panerai, P., Depaule, J. C. e Demorgon, M.
selecionados e cuja operacionalidade assenta na (1999) Analyse Urbaine (Éditions Parenthèses,
capacidade de constituírem referência para o Marselha).
desenvolvimento de criações urbanas Sitte, C. (2001 [1889]) Der städtebau nach seinen
contemporâneas, pressupondo que a cidade künstlerischen grundsätzen (Birkhäuser,
herdada, aquela que faz parte do nosso quotidiano Basileia).
poderá constituir uma referência inspiradora para Solà-Morales, M. (1993) Les formes de
creixement urbà (UPC, Barcelona).

Morfologia urbana pela estética, justiça social e


sustentabilidade
Eneida M. S. Mendonça, Departamento de Arquitetura e Urbanismo, Centro de Artes,
Universidade Federal do Espírito Santo, Av. Fernando Ferrari, 514, Vitória, 29075-910
Espírito Santo, Brasil. E-mail: eneidamendonca@gmail.com

Considerando os mais de 6 000 anos de sua gradativa e inadvertidamente, vem revertendo-se


permanência (Benevolo, 1983 [1982]), a cidade em impropriedades a esta própria vida, tornando
vem se configurando no ambiente ideal para a estranhos, o ser humano e a natureza (Kujawski,
vida humana, a despeito de descompassos 1982). Além do viés social e do ambiental
diversos. Estes remetem basicamente, desde sua comentados, há ainda o descompasso quanto aos
origem a conflitos entre grupos sociais distintos, valores estéticos da cidade. Mesmo assumindo
envolvendo situações de dominância versus este, como um aspeto bastante subjetivo, trata-se
submissão (Ferrari, 1982), mantidos de muitas de fator inerente à história da cidade, que vem
formas ao longo do tempo, resultando na sendo negligenciado (Porteous, 1996), seja em
atualidade, em desigualdades, que em algumas função de dificuldades técnicas e materiais na
sociedades assumem caráter inacreditavelmente manutenção ou no planejamento das estruturas
extremo. Outro descompasso verificado diz urbanas, seja em função da prevalência da
respeito às relações incongruentes estabelecidas extração de lucros financeiros específicos sobre
com a natureza, cujo intuito inicial de adequar o interesses mais amplos e coletivos. Deste modo,
ambiente ao conforto necessário à vida, questões sociais, ambientais e estéticas, com
114 Perspetivas

variações e intensidades, no tempo e no espaço, se distâncias entre a população e os serviços


são desafios à gestão das cidades. cotidianos. Deste modo é possível combinar as
Esses e outros desafios vêm sendo enfrentados possibilidades de prestação de serviços públicos
técnica, conceitual e empiricamente, por em infraestrutura urbana e atendimento básico aos
estudiosos de ciências como engenharia, habitantes quanto às necessidades imediatas,
arquitetura e urbanismo, geografia, história, dinamizando-se também, a economia.
sociologia, antropologia, economia, psicologia e Outra contribuição aplicativa da morfologia
filosofia, que se desdobram em especialidades, urbana encontra-se na oportunidade de análise da
esmiuçando e desvendando o amplo e complexo interação público-privado, considerando-se as
universo da problemática urbana. Neste contexto, relações entre espaço livre e edificação, estudo
a morfologia urbana, abarcando que se potencializa se realizado também, de um
reconhecidamente o campo da arquitetura e ponto de vista da evolução histórica, envolvendo
urbanismo, da geografia e da história, porém, de tanto aspetos quantitativos como qualitativos.
algum modo, envolvendo também os demais Atenção quanto às características físicas destes
campos acima citados, vem ao longo das últimas espaços e elementos, bem como quanto aos usos e
décadas apresentando destaque, ampliando sua apropriações permite a construção de reflexão
abrangência conceitual e com isso também, o seu crítica sobre a articulação público-privado como
alcance aplicativo, de modo a fornecer subsídios, algo inerente ao modo de vida urbano e, auxilia a
os mais diversos, aos desafios social, ambiental e decisão de planejamento e gestão sobre o que
estético de nossas cidades. Del Rio (1990) já deve ser mantido, recuperado e criado e em que
apontava diversas possibilidades de aplicação da escalas de abrangência e localizações. Esse estudo
morfologia urbana no conhecimento e no ampliaria sua abordagem, se realizado de modo
planejamento / projeto urbanos. Costa e Netto combinado ao de tipologias arquitetónicas. Este
(2015), em trabalho recente, reúnem os por sua vez, apresenta outras potencialidades. A
ensinamentos das principais escolas de análise das tipologias arquitetónicas, com seus
morfologia urbana, analisam, debatem e elementos intrínsecos à técnica e ao conforto e
demonstram a aplicação destes sobre determinado respetivas relações com os usos sociais e
território. econômicos propostos e apropriados, pode
Nota-se então, que estudos da forma urbana auxiliar também, na definição de formas
envolvendo de modo sistemático, a construtivas cada vez mais sustentáveis
transformação, ao longo do tempo, da estrutura de ambientalmente, engendrando relações cada vez
parcelamento, uso e ocupação do solo, das mais compatíveis entre as pessoas e o meio onde
centralidades e do sistema de espaços livres, entre vivem.
outros aspetos, podem contribuir tanto de modo Todas estas possibilidades devem ainda se
específico como de modo articulado, para o associar à compreensão dos valores, simbologias
planejamento sócio-urbano-ambiental em seus e significados da forma urbana no tempo e no
diversos alcances. espaço, permitindo que o planejamento possa
Uma destas contribuições diz respeito à também, favorecer a dimensão estética e
possibilidade de identificação dos sentidos de psicossocial (Tuan, 1980). Isso indica que além
expansão urbana já vivenciados e de de conhecimento histórico e técnico especializado
discernimento quanto aos que se apresentam é fundamental travar uma aproximação física
como tendência. Isso permite avaliação sobre a interativa com o lugar e suas pessoas.
articulação urbana, suburbana e regional desejada A reflexão aqui apresentada não ignora o forte
para o futuro e sobre os esforços administrativos papel do capital imobiliário e financeiro como
necessários tanto para neutralizar e corrigir indutor dos processos de planejamento e
determinada lógica de expansão indesejada, como organização do território em todo o mundo
para estimulá-la e acelerá-la caso se mostre (Rolnik, 2015), o que pode tornar em vão estudos
favorável. Assim, podem ser realizadas técnicos e desejos sociais. Ao contrário, o que se
ponderações sobre o custo dos serviços públicos buscou aqui, foi um exercício, que se pode dizer,
relacionados aos vetores de expansão, evitando- didático, porém, como tal, visa suscitar
se, espraiamento urbano desnecessário. Esse amplificação. Trata-se de reconhecer na
estudo, associado à evolução histórica, morfologia urbana, amplitude a ser explorada, em
identificação atual e potencialidades futuras conteúdo e em escala, para a formulação de
quanto à localização das centralidades urbanas, planejamento / projeto sócio-urbano-ambiental,
permite abordagem propositiva em escala urbana, que permita alcançar justiça social,
metropolitana e regional, de modo a delinear-se sustentabilidade e valorização estética relacionada
arranjo funcional adequado do ponto de vista ao referencial simbólico da população do lugar,
social, para localização das atividades reduzindo-se descompassos, que acompanham e
institucionais, de comércio e serviço, reduzindo- atormentam a história da cidade.
Perspetivas 115

Referências Kujawski, G. (1982) Ortega y Garzet: a aventura


da razão (Moderna, São Paulo).
Benevolo, L. (1983 [1982]) História da cidade Porteous, J. D. (1996) Environmental aesthetics.
(Perspectiva, São Paulo). Ideas, politics and planning (Routledge,
Costa. S. A. P. e Netto, M. M. G. (2015) Londres).
Fundamentos de morfologia urbana (C/Arte, Rolnik, R. (2015) A guerra dos lugares: a
Belo Horizonte). colonização da terra e da moradia na era das
Del Rio, V. (1990) Introdução ao desenho urbano finanças (Boitempo, São Paulo).
no processo de planejamento (Pini, São Paulo). Tuan, Y. (1980) Topofilia: um estudo da
Ferrari, C. (1982) Curso de planejamento percepção, atitudes e valores do meio ambiente
municipal integrado (Pioneira, São Paulo). (Difel, São Paulo).

Como compreender as cidades?


Maria M. Gimmler Netto e Staël A. Pereira Costa, Laboratório da Paisagem,
Universidade Federal de Minas Gerais, Rua Paraíba 697, Bairro dos Funcionários,
30130140 Belo Horizonte, MG, Brasil. E-mail: manoelagnetto@gmail.com,
staelalvarenga@gmail.com

Talvez essa seja a pergunta intrigante que se urbana.


deseja compreender quando se investiga a forma No processo de sobreposição das camadas, são
urbana. E supõe-se que a grande contribuição observados os fenômenos de adição, adaptação,
oferecida pela morfologia urbana é a substituição e preservação das formas. As adições
possibilidade de leitura das paisagens urbanas, representam novas formas introduzidas na
cujos métodos permitem reconstituir o processo paisagem urbana. As adaptações são as mais
formativo e transformativo das cidades. Então, os comuns e resultam de reformas das estruturas
estudos morfológicos se referem à forma física existentes para o ajuste às novas necessidades
tridimensional, variável em função do tempo. funcionais da sociedade. As substituições, muito
Nesse sentido, a expressão morfologia urbana frequentes, referem-se à destruição de uma forma
possui um significado espaço-temporal intrínseco, antiga para dar lugar a uma nova forma urbana. E
pois permite a compreensão da formação e da a preservação, menos comum na
estrutura urbana atual da cidade. contemporaneidade, garante a manutenção das
Necessário evidenciar, em relação ao tempo, formas antigas, reconhecendo e valorizando o
que os estudos morfológicos não se referem aspeto cultural das paisagens urbanas (Conzen,
apenas ao passado, pelo contrário, eles apontam 2004).
para o futuro, ao indicar soluções compatíveis Nesse sentido, tanto a teoria de evolução
para o desenvolvimento sustentável das cidades. urbana desenvolvida por Conzen, quanto o
Pois, é a partir de análises das transformações que processo tipológico, criado por Muratori e
se pode compreender as tendências futuras e Caniggia, apresentam em síntese as análises das
ajustar os rumos da gestão das paisagens urbanas. dimensões espaciais e temporais investigadas
Portanto, a análise e organização temporais são simultaneamente. As figuras 1 e 2 ilustram como
fundamentais para a compreensão das cidades, exemplo de abordagens espaço-temporais, o mapa
que estão materializadas na forma urbana de cada de figura-fundo que apresenta a evolução urbana
período. Assim, cada período de tempo representa do sistema viário e o processo tipológico que
uma camada, construída formalmente no sequencialmente apresenta as transformações nos
ambiente, indicando valores específicos edifícios, ambos reconhecidos na paisagem
associados a determinado momento da história da cultural de Ouro Preto. Esses estudos referem-se
cidade. respetivamente às escolas inglesa e italiana de
Em relação à forma urbana resultante é morfologia urbana (Conzen, 2004; Caniggia e
necessário aceitar que esta é o reflexo físico de Maffei, 2001; Costa e Netto, 2015).
camadas sobrepostas. E que todas são fruto de
ações humanas, orientadas por aspetos sociais, Contribuição dos estudos clássicos da
políticos, económicos e culturais. A cidade é, morfologia urbana
portanto, uma construção social que reflete a
cultura de seus habitantes, materializada na forma As escolas de morfologia urbana inglesa e italiana
116 Perspetivas

Figura 1. O processo de evolução urbana de Ouro Preto (fonte: Costa e Netto, 2015).

Figura 2. O processo tipológico de Ouro Preto (fonte: Costa e Netto, 2015).

foram fundadas pelo geógrafo Conzen e pelo tradicionais de morfologia urbana, inglesa e
arquiteto Muratori, respetivamente, a partir dos italiana, permitem observar que a metodologia
anos de 1960. O livro ‘Fundamentos de desenvolvida por cada escola divergia e convergia
morfologia urbana’, publicado em 2015 no Brasil, paradoxalmente. Divergia, pois a escola inglesa
se propõe a apresentar as escolas tradicionais de iniciava os estudos pela escala ampliada da cidade
morfologia urbana e introduzir suas bases e sucessivamente reduzia a escala para observar
conceituais, com aplicação prática na cidade de os tecidos urbanos e os lotes, enquanto que a
Ouro Preto. Os diferenciais da obra consistem na escola italiana propunha o processo inverso,
maneira didática da aplicação das técnicas e na iniciando pela edificação, ampliava-se a escala
inauguração em língua portuguesa de referência aos tecidos e por fim ao território. A convergência
bibliográfica sobre o assunto (Costa e Netto, explica-se por compreender que ambas as escolas
2015). reconheciam que a variação das escalas de
Pesquisas realizadas com foco nas interações observação dos elementos formais e o
entre os conceitos e aplicações das escolas conhecimento dos processos culturais ao longo do
Perspetivas 117

território, ilustrados na Figura 3, são organizações


abstratas para a compreensão das inter-relações
espaciais e temporais de fenômenos urbanos e
sociais. Bem como, possibilitam que novas
escalas de abordagem possam ser integradas às
investigações morfológicas.
No entanto, é percetível a todos, que no
processo de urbanização associado à
transformação da paisagem, observa-se o
ambiente sendo construído e degradado. Então,
Figura 3. Diferentes escalas de abordagem da torna-se imprescindível avaliar os impactos
morfologia urbana (fonte: Costa e Netto, 2015) ambientais relacionados à forma urbana. Pois,
somente as formas adaptadas ao suporte
ambiental poderão se manter no espaço-tempo.
tempo eram fundamentais para a compreensão das Conclui-se que os estudos morfológicos
cidades e das formas urbanas tradicionais (Costa e aliados à abordagem ambiental apresentam um
Netto, 2015). caminho para se compreender as cidades em sua
complexidade na contemporaneidade. E assim,
espera-se contribuir para a disseminação dos
Abordagens contemporâneas da morfologia conteúdos referentes à forma urbana e para as
urbana infinitas possibilidades de pesquisa oferecidas
pela aplicação do método que permite a
O conhecimento sobre as formas urbanas integração a outras abordagens.
tradicionais pode ser a base para o
desenvolvimento de pesquisas sobre as formas
contemporâneas, caracterizadas pela Referências
complexidade e indefinição de limites. Segundo
Morin (1999), a pesquisa que seja capaz de Caniggia, G. e Maffei G. L. (2001) Interpretating
compreender a complexidade, determinada pelas basic building: architectural composition and
relações estabelecidas entre o todo e as partes, buiding typology (Alinea, Florença).
estará contribuindo para o avanço do Conzen, M. P. (ed.) (2004) Thinking about urban
conhecimento em um contexto global. Esse, no form: papers on urban morphology, 1932-1998
início do século XXI, é transnacional, (Peter Lang, Oxford).
multidimensional, transversal, interdisciplinar e Costa, S. A. P. e Netto, M. M. G. (2015)
planetário. O autor explica que o planeta Terra Fundamentos de morfologia urbana (C/Arte,
também é mais que seu contexto, é reflexo da Belo Horizonte).
ordem e desordem de suas partes (Morin, 1999; Morin, E. (1999) Seven complex lessons in
Netto, 2016). education for the future (UNESCO, Paris).
Então, os estudos da forma urbana, com suas Netto, M. M. G. (2016) Paisagem Metropolitana:
escalas de abordagem, representam estudos de as formas dispersas no espaço urbano de Belo
inter-relação entre o todo e as partes. Assim Horizonte. Projeto de Tese de Doutorado,
edifícios, tecidos urbanos, plano urbano e Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil.

Morfologia urbana: para entender as transformações urbanas


Karin S. Meneguetti, Departamento de Arquitetura e Urbanismo, Universidade
Estadual de Maringá, Avenida Colombo 5790, 87090-200 Maringá PR, Brasil. E-mail:
karinschwabe@gmail.com

A morfologia urbana estuda o meio físico da do desenho urbano, a morfologia urbana é um


forma urbana, os processos e as pessoas que o método de análise para se detetar princípios,
formataram. Diretamente ligada ao planejamento regras e tipos inerentes ao desenho da cidade, e
das cidades, interage com uma ampla gama de subsidiar futuras intervenções urbanas (Del Rio,
disciplinas (Rego e Meneguetti, 2011). No campo 2000). Na geografia, a morfologia é utilizada para
118 Perspetivas

compreender características físicas e espaciais de busca por objetivos disciplinares diferentes. Em


toda a estrutura urbana (Jones e Larkham, 1991). ambas as escolas, os períodos históricos são
Na história da cidade, serve ao exame do processo analisados através da definição de componentes
de conformação urbana, identificando e morfológicos e relações mútuas, de acordo com
analisando seus componentes edificados, os uma perspetiva estruturalista. A leitura da forma
processos e os atores envolvidos neles, desde a urbana vai além desta perspetiva, no entanto, pois
sua gênese até as transformações mais recentes leva em conta o complexo de interações que
(Rego e Meneguetti, 2011). resulta na sua transformação, de um estado
Em comum, os pesquisadores da morfologia original a um posterior, fundamentalmente
urbana têm o foco de suas investigações no imprevisível, adicionando, portanto, um
produto físico, resultado dos processos sociais, componente dinâmico, uma perspetiva temporal
econômicos e políticos. Como expresso por (Marzot, 2005).
Moudon (1997), estudam a manifestação de ideias Na escola italiana, Caniggia introduziu o
e intenções na medida em que elas tomam forma conceito de ‘processo tipológico’ para descrever a
no chão e moldam as cidades. A análise transformação morfológica de tipos edilícios em
morfológica deve, portanto, examinar os relação aos processos de preenchimento ou
componentes elementares da forma urbana. esvaziamento do lote original. O tipo se adapta ao
Edificações, jardins, ruas, parques e monumentos longo do tempo, tornando-se um ‘traço vivo’ das
estão entre os elementos da análise morfológica transformações sistemáticas feitas pela evolução
(Moudon, 1997). O modo como cada um destes da sociedade. Já Conzen estabeleceu o conceito
elementos urbanos se cristalizou e conforma o de burgage cycle para entender as dinâmicas de
tecido da cidade é efetivamente o objeto da preenchimento e esvaziamento do lote original a
morfologia urbana (Rego e Meneguetti, 2011). fim de adaptá-lo aos usos emergentes (Marzot,
Do ponto de vista epistemológico, os estudos 2005). Segundo Kropf, ‘o trabalho de Conzen e
da morfologia urbana podem ser distinguidos de Caniggia é baseado na relação entre as coisas,
entre cognitivos e normativos, conforme o ao invés de objetos reais’ (Kropf, 2004, p. 27).
propósito primário destas abordagens (Gauthier e ‘Assim pode-se compreender a dicotomia
Gilliland, 2006). Os estudos que almejam estabelecida pelas escolas inglesa e italiana de
produzir explicações, ou estruturas explanatórias, morfologia urbana. A escola inglesa, estabelecida
para a forma urbana são cognitivos; aqueles por pesquisadores trabalhando na esteira dos
estudos que buscam determinar ou prescrever o estudos do geógrafo M. R. G. Conzen adota uma
modo como a cidade deveria ser planejada ou abordagem explanatória, cognitiva. A escola
construída no futuro são normativos. Gauthier e italiana, inspirada pelas ideias do arquiteto
Gilliland justificam a adoção desses termos da Saverio Muratori e, mais tarde, estimulada pelo
seguinte forma: ‘Usamos a expressão cognitivo trabalho de Gianfranco Caniggia, parece estar
para refletir a natureza heurística de um estimulada pelas possibilidades de desenho
empreendimento intelectual preocupado com a urbano, daí a abordagem de cunho mais
produção de conhecimento, ou pelo normativo, prescritivo, que, a partir do
desenvolvimento de meios teóricos, métodos e entendimento de tipologias urbanas, insinua
técnicas destinadas a produzir tal conhecimento. articular uma visão do futuro’ (Rego e
Da mesma forma, o termo normativo denota Meneguetti, 2011).
precisamente um exercício intelectual que visa A aplicação da teoria da morfologia urbana
articular uma visão de como o futuro deve ser, ou revela ainda potencialidades importantes para o
de expor uma doutrina ou conjuntos específicos levantamento e diagnóstico das formas urbanas
de normas e prescrições que serviriam a esta essenciais para o equilíbrio ambiental da cidade.
visão’ (Gauthier e Gilliland, 2006, p. 42). Segundo Costa e Netto (2015, p. 34), ‘a pesquisa
A diferenciação entre estudos normativos e morfológica pode desvendar e representar as
cognitivos é crucial para expor a natureza complexidades do mundo contemporâneo’, para
multifacetada da agenda intelectual da morfologia uso nos mais diversos fins e contextos. No
urbana. Isto se dá basicamente porque o campo da campo da pesquisa, se mostra como um espaço
morfologia urbana se encontra na confluência de de convergência entre pesquisadores de diversas
diversas disciplinas académicas, como áreas que se utilizam de suas metodologias e
arquitetura, planejamento urbano, geografia e conceituação para homogeneizar o debate entre
história. Cada uma destas disciplinas é objetos e interesses paralelos.
influenciada pelo seu conjunto conceitual,
tradições, programas, aparatos analíticos,
problemas e objetivos de pesquisa. Referências
As escolas inglesa e italiana são baseadas em
grande parte nos mesmos valores, apesar de seus Costa, S. A. P. e Netto, M. M. G. (2015)
dispositivos interpretativos diferenciarem-se na Fundamentos de morfologia urbana (C/Arte,
Perspetivas 119

Belo Horizonte). urban morphology may be right but not


Del Rio, V. (2000) Introdução ao desenho urbano popular’, Urban Morphology 8, 26-8.
no processo de planejamento (PINI, São Paulo). Marzot, N. (2005) ‘Typological analysis and
Gauthier, P. e Gilliland, J. (2006) ‘Mapping urban hermeneutics in the Conzenian and Caniggian
morphology: a classification scheme for schools: overlaps and differences’, Urban
interpreting contributions to the study of urban Morphology 9, 48-50.
form’, Urban Morphology 10, 41-50. Moudon, A. V. (1997) ‘Urban morphology as an
Jones, A. N. e Larkham, P. J. (1991) Glossary of emerging interdisciplinary field’, Urban
Urban Form (http://www.urbanform.org/ Morphology 1, 3-10.
glossary/online.html) consultado em 10 de Rego R. L. e Meneguetti, K. S. (2011) ‘Sobre
Dezembro de 2008. morfologia urbana’, Acta Scientiarum 33,
Kropf, K. (2004) ‘M. R. G. Conzen, Gianfranco 123-7.
Caniggia, Oscar Wilde and Aesop: or, why

Para que serve a morfologia urbana?


Jonathas M. P. Silva, PUC-Campinas – Pontifícia Universidade Católica de Campinas,
Rodovia Dom Pedro I, Km 136, Parque das Universidades, 13086-900 Campinas, SP,
Brasil. E-mail: jonathas.silva@puc-campinas.edu.br

Esse texto é fruto de uma reflexão estimulada construção do conhecimento potencializado pelas
pelo questionamento: para que serve a morfologia operações de analise e síntese de forma dialética.
urbana? Seu desenvolvimento segue o grande Lefebvre nunca se aventurou pelos estudos da
desafio de responder a questão travestida de morfologia urbana. Entretanto com seu livro ‘O
simplicidade, mas que na verdade guarda, entre direito a cidade’ de 1969, e ‘A revolução urbana’,
suas possíveis respostas, o coletivo de pensadores em 1970, o autor analisa as relações de forças
que auxiliaram na construção do conhecimento exercidas entre grupos sociais, destacando em
referente à morfologia urbana. seus estudos, a necessidade, de determinados
Procura-se não cair no ciclo vicioso onde os grupos em dar forma à cidade para atender seus
fundantes da matéria são citados por ordem interesses (Lefebvre, 1969, 1999 [1970]).
cronológica de contribuição, destacando seus Estes estudos sociológicos permitem afirmar
diversos estudos emblemáticos que motivaram o que a forma urbana não está descontextualizada
aprofundamento do saber referente à matéria. A das contradições sociais que a produzem.
pergunta não se refere a como foi construído o Portanto, adota-se a morfologia como estudo das
conhecimento que temos hoje a respeito da formas e dos fenômenos que lhes deram origem
morfologia urbana, mas sim ao significado desse como muito bem colocado por Lamas (1993). No
conhecimento para a vida prática ou para a caso brasileiro tal interesse nos é lembrado por
construção das ideias. Costa (2007), quando afirma que os primeiros
Decide-se então tomar o rumo da prática e o estudos sobre o tema estão relacionados aos
empréstimo de saberes outros, que não aspetos económicos, sociais e políticos das
necessariamente se debruçaram sobre a formas urbanas brasileiras, empreendidos por
morfologia urbana. historiadores, como Sérgio Buarque de Holanda, e
Algumas experiências profissionais (Silva e sociólogos, como Gilberto Freire na 1ª metade do
Manetti, 2012; Silva et al. 2013) e académicas século XX.
(Macedo, 1997; Magalhães, 2016; Silva, 2013) Podemos concluir que o interesse pelo estudo
documentam a contribuição da morfologia urbana da forma urbana nasce despido de qualquer
para levantamentos, diagnósticos e proposições de máscara disciplinar. Pode-se afirmar que
transformações urbanas. Entretanto a pergunta interessa-nos entender a forma, para assim,
ínsita em buscar a resposta nas causas primeiras, conhecer a sociedade e seus grupos sociais
isto é, nas razões mais fundamentais que compostos por individualidades.
justificam os estudos e usos dos saberes referentes Entretanto, nos distintos campos disciplinares
a morfologia urbana. a morfologia urbana toma diferentes matizes.
Partimos então a analisar a obra de Henri Assim como, conforme a estrutura educacional de
Lefebvre, sociólogo francês, que trata da cada país, os campos disciplinares são moldados
120 Perspetivas

de diferentes maneiras. No campo disciplinar da objetiva estabelecer sobre o território um objeto


arquitetura e do urbanismo no Brasil, que é fruto que gera novas conexões transformadoras de suas
de uma única graduação, o estudo da forma relações de força, portanto, as ações de
urbana busca estabelecer as relações entre as planejamento estão condicionadas por este
demandas sociais (por moradia, transporte, saúde, território, sem que isto seja fator determinístico,
ensino, alimentação, lazer, etc) e a paisagem, isto uma vez que estas mesmas ações irão
é, as ações que resultam das disputas sociais e que simultaneamente molda-lo para atender suas
conformam os espaços rurais, urbanos, sejam intenções. Entretanto, cabe destacar que: ‘Não se
estes livres de edificação ou edificados. pode considerar uma dialética que hierarquize
Os contextos socioeconómicos, as formas de estrutura (essência, totalidade nua), processo,
apropriações dos espaços públicos e as ações função e forma segundo um movimento linear, ou
públicas dialogam entre si imprimindo sobre o de uma maneira unívoca, pois, de um lado, a
território (o espaço onde grupos sociais, com estrutura necessita a forma para tornar-se
diferentes interesses, se relacionam) marcas que existência e, de outro lado, forma-conteúdo tem
atestam a grande transformação que ocorreu e um papel ativo no movimento do todo social
ocorrerá na paisagem urbana. (Santos, 1996, p. 101).
Cabe, entretanto a questão: como podemos Qualquer objeto novo inserido em um
analisar uma paisagem em constante território altera a forma urbana e,
transformação? Como nos coloca Thomas simultaneamente, estabelecem novas
Hobbes, tal como um relógio ou outro mecanismo contradições. Seja um novo padrão de edificação,
algo complexo é impossível saber com exatidão gerado por novas técnicas ou formas de produção,
qual é a função de cada uma das peças e pequenas quanto a um novo padrão de parcelamento do
engrenagens, salvo demonstrando o todo e solo, oriundo de uma nova necessidade de
estudando, um por um, a matéria, a forma e o negócio ou de demanda social. Toda ação
movimento dos elementos (Santos, 1996). ‘desloca’ a relação de poder entre grupos sociais.
Segundo Karel Kosik, a decomposição do (Hall, 2006). Todo deslocamento resultam em
todo é o traço mais característico do uma transformação, isto é, uma alteração da
conhecimento. Com o intuito de entender o forma.
suporte físico de um determinado recorte Este ‘novo objeto’ irá dialogar no presente
territorial analisam-se as paisagens percebidas na com o que fica do passado como forma, espaço
esperança de revelar o acúmulo de ações construído, paisagem. Isto é, a ação detona um
(passado), as formas de apropriações existentes processo de supressão, acumulação, superposição
(presente) assim como a paisagem prevista ou que será percebido pelos estudos morfológicos.
parcialmente planejada (futuro) (Kosik, 2011). São as ‘rugosidades’, termo cunhado por Milton
É preciso perceber o todo, entretanto este todo Santos para explicitar os aspetos perceptíveis
se encontra em constante deslocamento. Não há (forma) fruto da relação entre o espaço e o tempo
para Sartre a totalidade estática, mas apenas (Santos, 1996).
totalidades em movimento. As relações provocadas por uma determinada
A totalidade se apresenta constituída por ação de planejamento irão estabelecer novas
partes onde cada coisa (concreta, material, dotada relações de poder entre os agentes, mesmo que
de forma) nada mais é do que parte do todo, estes não venham a sofrer diretamente as pressões
entretanto, a apreensão das partes, que constituem geradas pela ação realizada. Como colocado por
a totalidade, não bastam para compreender o todo Whitehead (1929) os objetos somente estão no
(Santos, 1996). Isto ocorre, por exemplo, quando espaço e no tempo por causa de suas relações com
as dinâmicas socioespaciais mudam alterando a os eventos. Qualquer objeto de intervenção
quantidade e qualidade do conjunto das funções urbana estabelece no espaço e no tempo relações
que resultam em uma nova totalidade. Portanto a com eventos novos e existentes. Os estudos
totalidade está sempre se deslocando. A este morfológicos nos permitem conhecer melhor as
movimento constante Spinoza (2009) entende relações entre os eventos: ‘O reconhecimento é
como um processo denominado de totalização. refletido no intelecto como comparação. Os
Perceber a transformação da paisagem é lidar objetos reconhecidos de um evento são
com o processo de totalização, tomando a comparados com os objetos reconhecidos de outro
paisagem como processo e produto (morfo) fruto evento. A comparação pode ser entre dois eventos
da relação dialética com as ações sociais, que no presente, ou pode ser entre dois eventos dos
concretizam-se em manifestações físico-espaciais, quais um é posicionado pela consciência da
culturais, históricas e econômicas, memória e outro pela percepção imediata dos
necessariamente impregnadas na forma urbana. sentidos. Mas não são os eventos que são
Portanto como nos lembra Milton Santos o comparados. Porque cada evento é essencialmente
espaço não é apenas receptáculo da história, mas único e incomparável. O que são comparados são
condição de sua realização qualificada. A ação os objetos e as relações de objetos situados em
Perspetivas 121

eventos. O evento considerado como uma relação Kosik, K. (2011) Dialética do concreto (Paz e
entre objetos perdeu a sua passagem e neste Terra, Rio de Janeiro).
aspeto é em si mesmo um objeto. Este objeto não Lamas, J. M. R. G. (1993) Morfologia urbana e
é o evento, mas apenas uma abstração intelectual. desenho da cidade (Fundação Calouste
O mesmo objeto pode ser situado em muitos Gulbenkian & Junta Nacional de Investigação
eventos e, neste sentido, até o evento como um Científica e Tecnológica, Lisboa).
todo, visto como um objeto, pode voltar a ocorrer, Lefebvre, H. (1969) O direito à cidade (Ed.
embora não o próprio evento com a sua passagem Documentos, São Paulo).
e com as suas relações com outros eventos’ Lefebvre, H. (1999 [1970]) A revolução urbana
(Whitehead, 1929, p. 54). (UFMG, Belo Horizonte).
É preciso, portanto conhecer o objeto a ser Macedo, S. S. (ed.) (1997) ‘Litoral urbanização:
estudado por meio da leitura de suas ambientes e seus ecossistemas frágeis’,
‘rugosidades’, tendo a consciência do constante Paisagem e Ambiente 12.
processo de ‘totalização’ e dos nossos limites de Magalhães, N. C. T. (2016) ‘Unidades morfo-
percepção da ‘totalidade’ mutante. territoriais: estratégias de entendimento dos
Uma análise morfológica se mostra processos de produção da forma urbana’,
insuficiente para chegarmos a identificar as Dissertação, Pontifícia Universidade Católica de
relações de forças existentes. Por ‘onde’ ocorrera Campinas, Brasil.
a intervenção ou ação de planejamento? ‘Quem’ Santos, M. (1996) ‘A natureza do espaço: técnica
será impactado por elas? ‘Como’ se interfere no e tempo; razão e emoção’ (Editora Hucitec, São
território? Quais ‘conexões’ de facto serão Paulo).
estabelecidas? Entretanto o estudo da forma Silva, J. M. P. (2013) ‘As unidades de paisagem
possibilita ler concretamente os movimentos de como método de analise da forma urbana:
transformação da cidade. reflexões sobre sua incorporação pelo campo
Finalmente, respondendo à pergunta em uma disciplinar da arquitetura e urbanismo’,
única frase: a morfologia urbana nos serve para Cadernos do PROARQ 20, 71-93.
analisar o legado da ação humana sobre o Silva, J. M. P. e Manetti, C. (2012) ‘Memória,
território e desta maneira potencializa refletir mobilidade e complexidade: consideração pela
sobre como provocar deslocamentos convenientes história local’, Risco: Revista de Pesquisa em
a um querer socialmente construído. Arquitetura e Urbanismo 16, 61-77.
Silva, J. M. P., Manetti, C. e Tângari, V. R. (2013)
Referências ‘Compartilhamentos e unidades de paisagem:
método de leitura da paisagem aplicado à linha
Costa, S. A. P. (2007) ‘O estudo da forma urbana férrea’, Paisagem e Ambiente 31, 61-80.
no Brasil’ (http://vitruvius.es/revistas/read/ Spinoza, B. (2009) Short treatise on God, man
arquitextos/08.087/220) consultado em 10 de and human welfare (A. & C. Black, Londres).
Janeiro de 2013. Whitehead, A. N. (1929) The aims of education
Hall, S. (2006) A identidade cultural na pós- and other essays (Macmillan Company, Nova
modernidade (DP&A, Rio de Janeiro). Iorque).

5ª Conferência da Rede Lusófona de Morfologia Urbana, Guimarães,


2016
É com entusiasmo que relato a realização da V ensino e prática. Este tema geral foi tratado em
Conferência Internacional da Rede Lusófona de nove eixos temáticos envolvendo: História da
Morfologia Urbana – Portuguese-language forma urbana, Heranças patrimoniais e
Network of Urban Morphology – PNUM 2016 – regeneração urbana, Teoria da morfologia urbana,
nos dias 15 e 16 de Julho de 2016, ocorrida no Da cidade ao território, Práticas e experiências
Centro Cultural Vila Flor, na bela cidade de didáticas, Métodos e técnicas, Agentes e
Guimarães em Portugal. Organizada pela processos de transformação, Do plano ao projeto
Universidade do Minho, sob a primorosa e Espaço público e transformações recentes. O
coordenação geral de Jorge Correia e Miguel tema geral e respetivos eixos temáticos foram
Bandeira, a quinta edição da Conferência PNUM abordados por trabalhos prévia e criteriosamente
dedicou-se ao tema ‘Os espaços da morfologia selecionados, por comissão científica de
urbana’, nas abordagens referentes à pesquisa, estudiosos da morfologia urbana lusófona,
122 Relatórios

compondo 27 sessões paralelas. O elevado nível remetendo aos conceitos de Metápolis, acerca do
científico desses trabalhos propiciou debates futuro da cidade, conforme Ascher. A segunda
avançados. A maioria destes trabalhos relaciona- reflexão, direcionada especialmente a professores
se a pesquisadores de centros universitários e também, a alunos, referiu-se a como ensinar a
portugueses e brasileiros, percebendo-se também ler a forma urbana contemporânea. A autora
algumas participações de professores e alunos de alertou para a importância na aquisição de
outras nacionalidades. Os trabalhos aceites, cujos competências de leitura, escrita e de raciocínio
autores atenderam ao convite de submissão de espacial. Teresa Heitor indicou a importância de
texto completo, encontram-se publicados em e- incluir no estudo da forma urbana o exame da
book, compondo assim, as Atas do PNUM 2016 paisagem, do traçado, dos espaços exteriores, do
(http://193.136.14.37/Atas%20PNUM%202016.p espaço edificado, dos usos, metabolismo e
df) e permitindo consultas e estudos continuados. desempenho, elencando abordagem que abrange
Há que se destacar a qualidade das duas uma série de autores consagrados na morfologia
palestras principais, respetivamente nas sessões urbana. Com base na demonstrada complexidade
de abertura e de encerramento. Renato Leão urbana contemporânea, a palestrante assinalou
Rego, da Universidade Estadual de Maringá, que a escala de abordagem deve ser local x
Brasil, ao apresentar sua investigação sobre ‘As global, referindo-se a Moudon. Ao debater
cidades novas da Transamazônica e a morfologia possibilidades didáticas para o ensino da forma
urbana’, chamou a atenção para a importância do urbana a palestra apresentou ainda, a simulação
estudo da forma urbana não só a partir do exame de realidades virtuais por meio de jogos digitais,
de projetos, mas também dos resultados como aplicações ao estudo da forma urbana,
alcançados em projetos realizados. Ao analisar o especialmente atrativas para jovens estudantes.
planejamento urbano-rural empreendido no Brasil O PNUM 2016 propiciou uma estimulante
dos anos de 1970 com a implantação de visita de estudo, a pé, guiada por Maria Manuel
agrovilas, ao longo da rodovia federal construída Oliveira, da Universidade do Minho, ao espaço
na ocasião e conhecida como Transamazônica, o público requalificado da Praça do Toural e da
palestrante questionou uma suposta analogia Alameda de S. Dâmaso, em Guimarães. Como
entre este e projetos de cidades novas no norte do autora e coordenadora do projeto de
Estado do Paraná, sul do Brasil. Ao analisar requalificação desenvolvido pelo Centro de
detalhadamente o projeto, sua implantação e Estudos da Escola de Arquitetura da
situação recente, o autor assinalou como um dos Universidade do Minho, Maria Manuel Oliveira
fatores de insucesso da proposta, a tentativa de compartilhou pessoalmente com os participantes,
alteração da lógica estabelecida no modo de vida o conhecimento preciso e minucioso de inúmeros
nortista brasileiro relacionado ao rio pela detalhes acerca do projeto e de sua cuidadosa
inscrição de uma lógica rodoviária, que execução. A inserção da mobilidade urbana a
permanece incompleta. Em seu estudo, Renato serviço do pedestre foi um dos preceitos
Rego chama a atenção ainda, para o isolamento norteadores da proposta e plenamente evidentes
da região e para a dificuldade dos colonos, nos resultados. Os estudos sobre a forma urbana
previamente selecionados, de se manterem nas da área de projeto, realizados anteriormente por
áreas urbanas previstas para sua moradia, tendo estudantes, a título de atividade académica, foram
em vista a distância destas da área rural, que destacados como fundamentais para
necessitava de constante vigilância e trabalho. embasamento de diversas decisões de projeto. A
Além de transmitir conhecimento sobre uma corajosa inserção de arte pública contemporânea
realidade urbano-rural pouco comum, a palestra e o convívio desta com o retorno do histórico
permitiu vivenciar um exercício de morfologia chafariz resultaram em determinações tão
urbana, adotando-se como referência Conzen e complexas quanto acertadas, a julgar pela
Kropf, abrangendo diversas escalas geográficas e qualidade estética alcançada e pelo modo de
incluindo o elemento relativo à cultura em seu apropriação possibilitado. A suavidade dos
estudo. aclives /declives no estudo de acessibilidade ao
Teresa Valsassina Heitor, do Instituto longo da Alameda, bem como o estudo de
Superior Técnico, Portugal, ao encerrar o evento arborização que acompanha este percurso,
com sua palestra ‘Para ler a forma urbana é indicam sensibilidade de projeto e respeito à
preciso abrir portas e construir pontes’, assinalou pessoa que caminha. Além destas qualidades,
possibilidades para o avanço do debate e o ficou evidente a consideração com o interesse do
exercício da prática de ensino. Sua reflexão habitante de Guimarães, percebido no uso do
versou sobre duas abordagens. A primeira espaço e nos relatos quanto ao processo de
referiu-se ao papel da morfologia urbana. Neste participação realizados durante o projeto.
contexto a palestrante chamou a atenção para o Cabe ainda o registo do surpreendente
facto das cidades não serem organismos ou ambiente ao ar livre, que acolheu o descontraído
máquinas e sim sistemas complexos adaptativos, jantar da conferência, no Museu Alberto
Relatórios 123

Sampaio, cercado por parte da muralha medieval (http://pnum2017.wixsite.com/pnum2017).


da cidade. Assim, adeus Guimarães e... até Vitória!
Por fim, os avanços alcançados na V
Conferência PNUM 2016 pressupõem
continuidade, conforme anúncio na sessão de Eneida Mendonça, Departamento de Arquitetura
encerramento acerca da VI Conferência PNUM e Urbanismo, Centro de Artes, Universidade
2017, a ser realizada nos dias 24 e 25 de Agosto Federal do Espírito Santo, Av. Fernando Ferrari
de 2017, na Universidade Federal do Espírito 514, Vitória, 29075-910 Espirito Santo, Brasil.
Santo, em Vitória, no Brasil E-mail: eneidamendonca@gmail.com

PNUM Workshop, Julho 2016, Vila Nova de Cerveira: Forma urbana e


dinâmicas transfronteiriças
Decorreu na Escola Superior Gallaecia (ESG), de Tui.
em Vila Nova de Cerveira, entre 19 e 23 de No quadro do Apoio Institucional que o
Julho, o PNUM Workshop 2016, versando sobre PNUM Workshop 2016 teve – da Rede
‘Forma urbana e dinâmicas transfronteiriças’. Lusófona de Morfologia Urbana / PNUM, do
Neste contexto, a focagem dada a esta edição Centro de Investigação da ESG / CIESG, da
incidiu sobre problemáticas morfológicas entre CMVC, do Concello de Tui e da Câmara
o Alto Minho e a Galiza. Para o efeito, Municipal de Vila Nova de Cerveira / CMVNC
exploraram-se teorias, conceitos e métodos de – no dia de receção aos participantes realizou-se
análise da forma urbana tendo Viana do Castelo um Verde d’Honra oferecido pela CMVNC,
(Alto Minho, Portugal) e Tui (Galiza, Espanha) tendo todos os envolvidos no PNUM Workshop
como casos de estudo. Realizaram-se visitas a 2016 sido convidados pelo Exmo. Presidente da
ambas as cidades, conduzidas pelos Mestres Câmara Municipal de Vila Nova de Cerveira
Arq.os Armando Fernandes e João Pedro Passos para convívio com o próprio e membros do seu
(em Viana do Castelo) e Mestre Arq.ª Eva executivo.
Álvarez Espósito e Prof. Doutor Xosé Lois Durante os primeiros dias procedeu-se à
Martínez (em Tui). A Comissão Organizadora, escolha, por parte dos cerca de 20 inscritos no
composta pelo Prof. Doutor David Leite Viana PNUM Workshop 2016 (entre portugueses,
(Coordenação, ESG), Xosé Lois Martinez espanhóis e brasileiros), dos grupos de trabalho
(Universidad A Coruña / UdC), Prof. Doutor e respetivas abordagens a ensaiarem.
Vítor Oliveira (Universidade do Porto) e Mestre Posteriormente, entre quarta e sexta-feira,
Arq.º Paulo Vieira (Câmara Municipal de Viana predominou o trabalho de grupo apoiado por
do Castelo/CMVC), preparou para o PNUM comunicações teóricas de Eva Álvarez Espósito
Workshop 2016 um programa intenso e (sobre o espaço urbano de Tui, assente numa
diversificado para os dias entre terça-feira e perspetiva provinda do urbanismo comercial),
sábado. João Pedro Passos (a propósito da configuração
Nas duas primeiras sessões de trabalho urbana do território do Vale do Neiva, Viana do
(terça e quarta-feira) foram apresentadas as Castelo), da Mestre Arq.ª Delia Prado
abordagens Tipológica Processual (Escola (enquadrando Vigo entre cidade compacta e
Muratoriana), Histórico-Geográfica (Escola cidade difusa, dissecando alguns dos seus
Conzeniana), SIG/Sistemas de Informação fenómenos de periferia), do Prof. Doutor Jesus
Geográfica e Análise Sintática (Space Syntax) – Conde-Garcia (UdC) (sobre paisagens
por Xosé Lois Martinéz, Vítor Oliveira, Mestre cartográficas e contributo para a compreensão
Geóg.º Carlos Pereira (ESG) e David Leite da cidade de Tui) e, por fim, de David Patiño
Viana, respetivamente (Figura 1). Paulo Vieira Álvarez (estudante finalista do MIAU da ESG),
revelou aos participantes a abordagem de que discorreu sobre o ‘pulso’ urbano-industrial
análise que desenvolveu na CMVC, apoiada na de O Poriño a partir de técnicas de análise da
identificação de processos com expressão Space Syntax.
territorial (Figura 2). Vanda Pego (estudante O último dia do PNUM Workshop 2016 foi
finalista do Mestrado Integrado em Arquitetura destinado, na sessão matinal, à conclusão dos
e Urbanismo/MIAU da ESG) dissertou sobre trabalhos de grupo e preparação das
diversos elementos da forma urbana de Viana apresentações finais. Na parte da tarde,
do Castelo e sua alteração no tempo. A Mestre procedeu-se à discussão dos resultados
Arq.ª Sílvia Rodríguez expôs as várias fases da alcançados pelos grupos e realizou-se um debate
transformação morfológica do espaço urbano geral sobre a relevância da articulação das
124 Relatórios

Figura 1. Abordagem tipológica processual Figura 2. O território de Viana do castelo,


(Escola Muratoriana) por Xosé Lois por Paulo Vieira
Martinéz (fotografia: David Leite Viana). (fotografia: David Leite Viana).

diferentes abordagens morfológicas estudadas, para a morfologia urbana e a interrelação


reconhecendo e verificando o devido necessária entre as múltiplas análises possíveis
enquadramento para cada uma delas na análise à (adequadamente compatibilizadas às diversas
forma urbana. Moderaram o debate de fecho do formas das cidades). Do ‘PNUM Workshop
PNUM Workshop 2016 o Vereador do 2016: Forma urbana e dinâmicas
Urbanismo da CMVC, Arq.º Luís Nobre, e o transfronteiriças’ ficou a noção que são mais as
Prof. Doutor Rui Florentino (ESG). Este último, semelhanças que unem o território entre o Alto
juntamente com o Prof. Doutor José Juan Minho e a Galiza do que as eventuais diferenças
González-Cebrián Tello (UdC), a Prof.ª Doutora resultantes da circunstância de pertencerem a
Maria Manuel Oliveira (Universidade do Minho dois países.
/ UM) e a Prof.ª Doutora Stael Pereira da Costa
(Universidade Federal de Minas Gerais),
integrou o Conselho Consultivo do PNUM David Leite Viana, Escola Superior Gallaecia
Workshop 2016 e auxiliou na estruturação da (ESG) Largo das Oliveiras, 4920-275 Vila Nova
síntese do evento, apontando – tal como de Cerveira, Portugal. E-mail:
também o fez Luís Nobre – perspetivas futuras david.leite.viana@esg.pt

Curso ‘Morfologia urbana. Uma introdução ao estudo da forma física


das cidades’, Porto, 2016
O curso ‘Morfologia urbana. Uma introdução ao publicado pela Springer.
estudo da forma física das cidades’ realizou-se O curso dividiu-se em duas partes, a
na Faculdade de Engenharia da Universidade do primeira parte centrada no objeto cidade (trata-
Porto, entre 17 e 26 de Novembro de 2016, sob se de um olhar direto sobre a cidade), a segunda
orientação de Vítor Oliveira, Teresa Calix e parte com um enfoque no investigador /
Paulo Pinho. O curso atraiu participantes de morfologista (constituindo, portanto, um olhar
diferentes formações (arquitetura, arquitetura mediado sobre a cidade). A primeira parte
paisagista, engenharia civil, geografia e estruturou-se em três temas fundamentais. os
sociologia) e de diferentes contextos elementos da forma urbana, os agentes e
geográficos (Portugal, Brasil e Paraguai). processos de transformação urbana e as cidades
Ao longo de seis dias (o curso teve a contemporâneas. O primeiro tema envolveu
duração de 30 horas), foi apresentado e debatido uma discussão sobre como, perante um contexto
com os participantes um conjunto de conteúdos natural específico, diferentes padrões de
morfológicos recentemente reunidos no livro combinação dos mesmos elementos de forma
Urban Morphology. An introduction to the study urbana (nomeadamente ruas, quarteirões,
of the physical form of cities (Oliveira, 2016) parcelas e edifícios) dão origem a diferentes
Relatórios 125

Figura 1. Curso ‘Morfologia urbana. Uma introdução ao estudo da forma física das cidades’: The
game of cities (fotografia: Cláudia Monteiro).

tecidos urbanos. A ligação entre o primeiro e o transferência do conhecimento e dos resultados


segundo tema foi feita com recurso a The game da investigação em morfologia urbana para a
of cities (Oliveira e Perdicoulis, 2014), um prática profissional de planeamento. Utilizou-se
exercício que procura colocar em evidência o o Porto como caso ilustrativo. Por fim explorou-
papel fundamental do sistema de ruas no se a utilidade da morfologia urbana para um
processo de construção da cidade e o modo conjunto de outras dimensões (eventualmente
como essa construção resulta de um somatório mais ‘afastadas’) da nossa vida coletiva em
de intervenções por parte de diferentes agentes cidades, nomeadamente a dimensão ambiental, a
em diferentes períodos temporais (Figura 1). Os dimensão social e a dimensão económica.
conteúdos do segundo tema incluem, por um
lado, o papel dos diferentes agentes de
transformação urbana – promotores, arquitetos e Referências
construtores (de um modo direto) e técnicos das
autarquias e políticos (de um modo indireto); e, Conzen, M. R. G. (1960) Alnwick
por outro lado, os processos de transformação Northumberland: a study in town-plan
urbana, com um enfoque fundamental num analysis (Institute of British Geographers
conjunto de planos urbanísticos produzidos Publication 27. George Philip, Londres).
durante dois séculos, desde o plano de Nova Hillier, B. (1996) Space is the machine
Iorque no início do século XIX até ao plano (Cambridge University Press, Cambridge).
para Seaside no início dos anos 1980. Por fim, a Hillier, B. e Hanson, J. (1984) The social logic
primeira parte do curso encerrou com um debate of space (Cambridge University Press,
sobre os diferentes desafios que se colocam as Cambridge).
cidades contemporâneas, a partir do filme Oliveira, V. (2016) Urban Morphology. An
Urbanized realizado por Gary Hustwit. introduction to the study of the physical form
A segunda parte do curso, estruturada of cities (Springer, Dordrecht).
também em três partes distintas, centrou-se no Oliveira, V. e Perdicoulis, A. (2014) ‘The game
investigador. Começou pela apresentação de of cities’, Games 5, 1-4.
diferentes abordagens no estudo da forma
urbana. No âmbito do curso, foram discutidas
com maior detalhe a abordagem histórico- Vítor Oliveira, Centro de Investigação do
geografica promovida pela Escola Conzeniana Território, Transportes e Ambiente, Faculdade
(Conzen, 1960) e a sintaxe espacial (Hillier, de Engenharia, Universidade do Porto, Rua
1996; Hillier e Hanson, 1984). Em seguida Roberto Frias 4200-465 Porto, Portugal. E-
discutiu-se o potencial, e as dificuldades, de mail: vitorm@fe.up.pt
REDE LUSÓFONA DE MORFOLOGIA URBANA
A Rede Lusófona de Morfologia Urbana (PNUM) foi criada em 2010, em Hamburgo, como um
grupo regional do International Seminar on Urban Form. Os objectivos do grupo são: promover
e desenvolver o estudo da forma urbana; consolidar uma verdadeira rede de investigação no
domínio da morfologia urbana, através da organização de reuniões e conferências, e da
publicação da presente Revista; e, por fim, estabelecer uma relação privilegiada com o
International Seminar on Urban Form, através da colaboração com iniciativas de debate e
divulgação do ISUF. Para mais informações consultar o sitío do PNUM em: pnum.fe.up.pt/pt.

Conselho Científico

Presidente: Teresa Marat-Mendes, Instituto Universitário de Lisboa, Portugal (2016)

Membros: Frederico de Holanda, Universidade de Brasília, Brasil (2018)


Jorge Correia, Universidade do Minho, Portugal (2018)
Miguel Bandeira, Universidade do Minho, Portugal (2016)
Nuno Norte Pinto, The University of Manchester, Reino Unido (2016)
Stael de Alvarenga Pereira Costa, Universidade Federal de Minas Gerais,
Brasil (2018)
Vítor Oliveira, Universidade do Porto, Portugal (2018)

(As datas entre parentesis indicam o final do mandato)


63 Editorial

65 V. Oliveira
Morfologia urbana: diferentes abordagens

85 A. C. Macedo e M. I. Imbronito
Tipos de corredores e ruas locais no distrito da Mooca, São Paulo

Perspetivas
107 Morfologia urbana e legislação urbanística D. Antonucci
108 Praeter utilitas M. M. Bandeira
110 Uma reflexão sobre a necessidade e o contributo da morfologia urbana A. Fernandes
111 O FormaUrbis lab e a utilidade dos estudos de morfologia urbana S. P. Fernandes
113 Morfologia urbana pela estética, justiça social e sustentabilidade E. Mendonça
115 Como compreender as cidades? M. M. Gimmler Netto e S. A. Pereira Costa
117 Morfologia urbana: para entender as transformações urbanas K. S. Meneguetti
119 Para que serve a morfologia urbana? J. M. P. Silva

Relatórios
105 Rede Lusófona de Morfologia Urbana (PNUM), 2015-16 T. Marat-Mendes
121 5ª Conferência da Rede Lusófona de Morfologia Urbana, Guimarães, 2015 E. Mendonça
123 PNUM Workshop, Julho 2016, Vila Nova de Cerveira: Forma urbana e dinâmicas transfronteiriças
D. L. Viana
124 Curso ‘Morfologia urbana. Uma introdução ao estudo da forma física das cidades’, Porto, 2016
V. Oliveira

Notícias
64 Urban Morphology
84 PNUM 2017: Morfologia urbana: território, paisagem e planejamento
84 ISUF 2017: City and territory in the global era
105 ISUF Italia 2017: Learning from Rome – historical cities and contemporary design

Você também pode gostar