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PARECER JURÍDICO

Elaborado por: Mariana Carravetta Custodio dos Santos


Disciplina: Compliance
Turma 1

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Cabeçalho

Órgão solicitante: Diretoria da sociedade empresária Laboratório Remédios &


Medicamentos LTDA.

Assunto: Compra de medicamentos com prazo de validade abreviado.

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Ementa
O presente parecer abordará os princípios essenciais para uma boa gestão do
programa de Compliance, o papel do Auditor Interno, com o adicional de um comparativo
desse com o Auditor Externo e o Compliance Officer, de forma a delimitar as competências e
graus de independência nas atuações na gestão e aplicabilidade do programa de Compliance
e governança corporativa de cada um dentro da organização.

Ademais, serão analisados, dentro do caso concreto apresentado, as obrigações do


Auditor Interno em relação às suas obrigações profissionais, bem como da empresa em
relação ao seu vínculo trabalhista, estando no lugar de empregadora. Conjuntamente, as
atitudes da alta direção também serão objeto de detida análise, baseadas nos princípios
basilares de Compliance e governança corporativa.

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Relatório e Fundamentação
O caso concreto a ser analisado retrata a situação fática de CLÁUDIO, auditor interno da
sociedade limitada LABORATÓRIO REMÉDIOS & MEDICAMENTOS LTDA., que, durante detida
análise nos documentos da empresa, se deparou com a informação de que boa parte dos
medicamentos injetáveis destinados a crianças acima de 2 (dois) anos adquiridos para
comercialização continham em seus rótulos datas de validade próximas do seu vencimento,
mais precisamente nos 3 (três) meses subsequentes. Tal informação foi levada à alta
administração, que afirmou saber da situação, bem como autorizou a compra de tais
insumos, em razão de estarem com um preço de compra mais acessível por conta da
proximidade da data de vencimento. Além disso, importante dizer que a alta gestão deu a
ordem a CLÁUDIO de omitir tal informação de seu relatório e não tocar mais no assunto,
tendo em vista que é um funcionário contratado pela empresa.

A seguir, serão analisadas as condutas do auditor interno, do Compliance Officer (CCO)


e da alta direção, bem como os seus desdobramentos.

1. AUDITORIA E COMPLIANCE

Inicialmente, convém mencionar que o trabalho de Auditoria nas empresas, de modo


geral, consiste no exame cuidadoso e metódico das atividades como um todo que ocorrem
dentro de uma empresa, e tem como principal objetivo examinar se as suas práticas e
atividades estão condizentes com o que anteriormente foi estabelecido como padrão pela
organização, bem como se foram implementadas de modo eficaz e adequado ao
funcionamento e alcance da meta estipulada, a fim de que sejam mitigados ao máximo os
seus riscos operacionais mais importantes.

Nesse sentido, mister se faz traçar uma diferenciação entre os dois tipos de Auditoria,
sendo eles a Externa – que é feita por um auditor independente da organização, ou seja,
não possui vínculos empregatícios com a empresa, sendo, portanto, um terceiro contratado
especificamente para o fim de auditar o controle interno –, e a Interna – que ocorre dentro
dos liames da empresa, por um profissional contratado e vinculado à organização para o fim
de acompanhar o dia a dia organizacional e conhecer a fio o controle interno para que suas
análises e opiniões sejam utilizadas como ferramenta de melhoria para a alta direção ter um
poder decisório mais eficiente e saudável para a empresa, com a efetiva mitigação dos riscos
operacionais já mencionados. Dentre as suas diferenças mais relevantes, pode-se destacar
em relação à sua finalidade, ao auditor propriamente dito, ao tipo de análise elaborada e a
sua obrigatoriedade.

A finalidade de uma auditoria externa, normalmente, possui uma análise estritamente


contábil e mais focada para os negócios da empresa, como, por exemplo, quando a empresa

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precisa realizar algum tipo de transação empresarial, conseguir investidores, até mesmo
realizar um empréstimo, em razão de possui um nível de independência em seu parecer
muito forte, já que o auditor não possui quaisquer vínculos com a empresa e, por isso,
emitirá sua opinião sem ter o fator de influência em evidência no seu momento de emissão
da análise. Já a auditoria interna possui a finalidade de exprimir uma análise operacional e
contábil baseada em toda a documentação da empresa de acordo com o controle interno,
com a diferença de que o seu parecer será apenas uma ferramenta nas mãos da alta
administração, que terá o poder decisório para seguir ou não o que foi sugerido pelo auditor
– este que possui o vínculo de subordinação, normalmente, somente com a alta direção.

Vale dizer que a modalidade da auditoria interna se mostra mais eficaz, em razão do
auditor vivenciar o dia a dia da empresa e estar no ambiente onde, de fato, o programa de
integridade e de compliance está sendo aplicado em todas as suas diretrizes, sendo o auditor
impactado por tais normativas, estando, consequentemente, ligado, ainda que
intrinsicamente, com o controle interno da organização, tornando a sua análise mais natural,
completa e eficiente, sendo essa a modalidade utilizada pela Órgão solicitante, motivo pelo
qual será o objeto principal do presente parecer.

1.1. DIFERENÇAS ENTRE O CCO E O AUDITOR INTERNO

Noutro giro, cumpre examinar também a conduta do Compliance Officer, que é a


pessoa responsável por estabelecer e gerenciar regras, procedimentos e diretrizes dentro da
organização, a fim de que sejam obedecidas e seguidas as normas e os regulamentos
internos e legais, de forma que os funcionários sejam orientados e treinados a cumprir um
padrão de conduta estipulado, onde todos busquem valorizar os mesmos princípios éticos
escolhidos pela empresa, na busca da gestão eficaz para a redução dos riscos iminentes ao
negócio praticado. Por conta do seu encargo significativo na mantença das boas práticas e
do bom funcionamento do programa, o CCO possui poder de decisão dentro da organização,
e, normalmente, encontra-se dentro do corpo de diretores pertencentes da alta direção, até
mesmo por ser um cargo de altíssima responsabilidade e confiança.

Tal profissional se difere do auditor interno exatamente por conta da sua carga
decisória para atuar dentro da organização, o que, de fato, o auditor não possui, sendo
possível apenas a emissão de um parecer com a sua opinião sobre a atuação da empresa,
através dos seus funcionários e ações da alta gestão, em comparação com o controle interno
imposto para ser obedecido por todos.

Conforme já mencionado, a independência do auditor interno para a externalização da


sua opinião especializada sobre as diretrizes tomadas pela organização nas mais diversas
áreas operacionais deve ser respeitada em sua totalidade pela alta direção e levada em
consideração para a tomada de decisões, a fim de que seja alcançada a finalidade de um

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programa eficaz e eficiente de compliance e integridade. Entretanto, bem se sabe que a
realidade nem sempre é essa.

No caso em comento, Carlos é auditor interno e, portanto, possui o elemento de


subordinação à alta direção. Ao verificar que os insumos farmacêuticos estavam com a data
de validade e que, portanto, a empresa possuía um risco iminente – qual seja, de ser
enquadrada no tipo penal do artigo 132 da Decreto-lei nº 2.848/401, bem como na prática
ilícita de vício sanável presente no artigo 18, §6º do Código de Defesa do Consumidor2 –,
comunicou à alta direção a irregularidade, que optou por não seguir os protocolos corretos
de integridade e compliance e, portanto, decidiu por correr os riscos que poderiam ser
evitados se os conselhos do auditor fossem escutados.

Não obstante a característica fundamental de independência do auditor interno, é de


opinião inequívoca que tal profissional não possui o mesmo grau de independência do CCO,
inclusive por haver outras pendências em jogo, como, por exemplo, o seu cargo na empresa.
Pela simples análise das funções de ambos os profissionais, já pode-se observar que seus
papeis são bem separados.

Destarte, convém dizer que, embora o auditor interno tenha a necessidade de ser total
independência no seu parecer ao definir e recomendar ações em conformidade com o
programa de integridade da empresa, infelizmente em alguns casos a alta direção não se
comporta com os valores éticos, morais e legais suficientes para por em prática o perfeito
plano de atuação que o compliance propõe.

1.2. A OBEDIÊNCIA DO AUDITOR INTERNO

Não é prolixo repisar que a maior e mais importante característica da auditoria interna
para que esta seja bem-sucedida é a independência, motivo pelo qual o auditor deve,
necessariamente, se basear da codificação da organização para entregar o seu trabalho de
forma condizente com a sua profissão, a fim de que se concretize os reais objetivos do
programa de integridade e gerenciamento de riscos.

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Artigo 132. Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente: Pena – detenção, de três anos a um ano, se o fato
não constituir crime mais grave.
2
Artigo 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de
qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim
como por aqueles decorrentes da disparidade, com as indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem
publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.
§ 6º - São impróprios ao uso e consumo: I - os produtos cujos prazos de validade estejam vencidos; II - os produtos deteriorados,
alterados, adulterados, avariados, falsificados, corrompidos, fraudados, nocivos à vida ou à saúde, perigosos ou, ainda, aqueles em
desacordo com as normas regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação; III - os produtos que, por qualquer motivo,
se revelem inadequados ao fim a que se destinam.

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Portanto, o auditor interno, ainda que sujeito à hierarquia que o organograma
empresarial lhe impõe, possui a responsabilidade profissional de identificar todo e qualquer
tipo de irregularidade nos procedimentos adotados pela organização a fim de que seu
trabalho possibilite a proteção e minimalização dos riscos traçados, inclusive manter as
informações referente às suas apurações em sigilo, por conta do princípio da
confidencialidade – que existe para que sejam respeitadas e preservados os valores
institucionais, não havendo divulgação de informações importantes da empresa sem a
devida autorização da alta direção.

O referido princípio deverá ser mitigado por conta do sopesamento deste com o
princípio da integridade, na hipótese de tais informações serem objeto de algum ato ilícito
que traga a obrigação ao auditor de externalizar as irregularidades em seu relatório – em
razão do auditor interno ter a obrigação legal de expor fatos ilegais apurados de maneira
imparcial, a fim de que seja realizado um trabalho honesto, profissional e diligente.

2. ATUAÇÃO E CONDUTA DA ALTA DIREÇÃO – “TONE AT THE TOP”

Ato contínuo, conforme o doutrinador Lamboy3 dispõe, o compliance “é o dever de


cumprir e estar em conformidade com diretrizes estabelecidas na legislação, normas e
procedimentos determinados, interna e externamente, para uma empresa, de forma a
mitigar riscos relacionados a reputação e a aspectos regulatórios”. Ademais, afirma que “o
compliance não protege apenas a organização em si, mas a sociedade como um todo”.

Conforme se pode verificar, a alta administração possui um papel de tanta importância


para a efetiva prática do programa de compliance, que um dos princípios basilares do
referido instituto, o chamado “tone at the top” – em tradução livre, quer dizer “o exemplo
vem de cima”. Esse princípio consiste na total colaboração e apoio absoluto e irrestrido da
alta administração na implementação e aplicação do programa de compliance, caso
contrário, o referido programa estaria fadado ao insucesso. Isso se dá porque a alta direção
precisa ser o modelo de como agir, trabalhar e seguir as normas e legislações vigentes e
aplicáveis ao caso. A partir do momento que o descumprimento das boas práticas ali
estipuladas parte do nível mais alto da administração, não se pode esperar que os demais
colaboradores as sigam.

Da mesma forma que é importante a quebra de padrões obsoletos, também é de


extrema importância que haja dentro de uma organização uma liderança que seja um canal
de comunicação para os novos objetivos adotados pela empresa. Ou seja, a mudança de

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LAMBOY, Christian Karl de. – Coordenador. Manual de Compliance – Introdução ao Corporate Compliance, Ética e Integridade.
Via Ética – São Paulo (SP): 2018.

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comportamento é muito relavante a partir do mais alto nível de gestão, e deve ser
vinvenciado de forma efetiva à nova realidade adotada pela empresa no seu dia a dia, bem
como incorporá-la em seu discurso, e sempre que possível, a missão da empresa e seu
compromisso com a ética e a transparência – fatores basilares para um bom programa de
integridade.

Na prática, a liderança deve obedecer e agir de acordo com os padrões estabelecidos


no código de conduta da organização e da legislação vigente, o que às vezes equivale à
teimosia, o saber dizer “não” em alguns casos, mesmo que, à primeira vista, isso não seja a
opção mais confortável da empresa. No entanto, o mais importante nesse sentido é que a
liderança nunca sucumba às suas ações e decisões, mesmo diante de situações complicadas.

Por fim, se faz necessário que a alta gestão entenda e internalize a utilização a finco
dos princípios de compliance e governança corporativa, a fim de que sejam melhorados a
cada dia as práticas e gestão dentro da organização, aumentando, assim, a eficácia do
controle interno elaborado e beneficiando o bom relacionamento da empresa com
investidores, clientes e demais parceiros de negócios.

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Considerações finais
Em virtude de todas essas considerações, conclui-se que as organizações que desejam
permanecer no mercado por muito tempo, precisam alinhar o cumprimento dos objetivos
estratégicos, missão, visão e valores da empresa. Uma vez estabelecido o plano de
compliance, ele fortalecerá o relacionamento com o fornecedor, com o clima organizacional
e, mais importante, começará a fazer parte da cultura organizacional. Isso leva a uma
postura dos colaboradores voltada para a previsão e solução de problemas, melhorando a
confiança de todos os Stakeholders, principalmente os investidores.

Para que um programa de compliance seja eficaz e alcance seus objetivos, o


comprometimento da alta administração é essencial. É preciso participar verdadeiramente e
compreender que compliance não se opõe à atividade econômica, muito pelo contrário,
busca otimizar a rentabilidade para que ocorra de forma sustentável. Pode-se perceber pela
atitude da alta administração – ao ignorar o relatório do auditor – que se trata apenas de
uma visão puramente capitalista. Em um mercado altamente competitivo, o mais importante
para as empresas, muitas vezes, é a obtenção do lucro. Entretanto, é preciso mudar o
entendimento de que os objetivos da empresa, ou seja, os resultados alcançados dentro de
um curto prazo não terão duração quando em comparação ao médio e longo prazo. Para
que o programa de compliance seja eficaz e alcance os seus objetivos, o comprometimento
da alta administração é imprescindível.

Por fim, mas não menos importante, vale ressaltar também que os profissionais
responsáveis por compliance e governança devem conduzir as atividades com total
independêcia para demonstrar as ações e recomendações para as melhorias necessárias à
organização, o que é fundamental. Um plano de conformidade verdadeiramente eficaz pode
evitar que a reputação e o valor intangível da empresa sejam afetados, evitar penalidades
monetárias ou criminais e até mesmo afetar a economia da empresa. Os fatos comprovam
que políticas e procedimentos claramente definidos podem orientar as empresas a agir em
um mercado altamente competitivo e a serem mais estáveis e seguras nos produtos que
fornecem. Portanto, para as organizações, para obter maiores margens de lucro sem
renunciar à ética e dos valores estabelecidos, é possível e essencial alinhar o compliance à
eficiência do negócio.

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Referências bibliográficas
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https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788502622098/. Acesso em: 24 out. 2021.

Governança corporativa e compliance / coordenadores Rafael Carvalho Rezende Oliveira e Jéssica


Acocella. – 2ª ed. Ver., atual e ampl. – Salvador: Editora Juspodivm, 2021.

LIMA, Ariele Souza; ASSUNÇÃO, Rayane Alves Silva; HARANO, Fernando Takeo. Independência na
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