sê um homem de ação. O pensamento para transformar-se em ação precisa primeiro transformar-se em sentimento Ideia que não é sentida é ideia morta. A ação é forma objetiva de ideias vivas, oriundas de realidades e criadoras de novas realidades. Cultiva o ideal, mas sê realista”.
Plínio Salgado
Urgia o aparecimento de um estudo
dessa natureza que sistematizasse, direta e coerentemente, a lógica interna da doutrina integralista, como ensinada abundantemente pelos teóricos do nosso Movimento desde 1932. Apesar do seu caráter de introdução, o texto a seguir é preterível a iniciantes no mundo intelectual, por poder apresen- tar abordagens e discussões que lhes sejam desconhecidas. Mas, se lido com atenção, mesmo por estes, poderá agregar-lhes uma poderosa bagagem para pesquisa e avaliação dos fatos e dos conceitos no Brasil e no mundo. Cremos piamente na ausência de alternativas para o nosso País que não passem pela compreensão dessas ideias aqui expostas.
O Universo e o Homem
O Integralismo, enquanto filosofia, é
uma concepção unitária do Universo, do Homem e do Estado. Seu entendi- mento do Universo parte de considerar “a harmonia de todas as formas e movimentos”, segundo Plínio Salgado, “e nós acrescentaremos — do que é autônomo e do que é determinado”, comenta-o Félix Contreiras Rodrigues. É, assim, uma visão total do mundo — como a conjugação de espaço, matéria, movimento e tempo — e de suas expressões. “Procura sempre o com- plexo das causas, a ação dos múltiplos fatores, uns relativamente a outros”, diz Miguel Reale, em seu elucidativo prefácio à obra “Atualidades de um mundo antigo”, onde, a partir desse método, desenvolve um conceito tota- lista, ou integralista, da História, consi- derando a relação das ciências naturais e as psicológicas e a integralidade das causas e dos fatores do fato histórico. — Assim, o todo de uma coisa, compre- endido na composição total de suas partes e suas relações com o todo, é o objeto de consideração da filosofia integralista. Nesse sentido, o Integralismo rejeita todas as concepções ideocráticas e parciais do mundo, que o dobram à sua maneira, hipertrofiando alguns aspec- tos do mundo natural e atrofiando ou eliminando outros, naturais ou sobre- naturais, incapazes de transpor-se, por força de seu método, do processo dissociativo da análise para a agrega- ção lógica na Síntese. Só da compreen- são da substância profundamente parcialista das ideologias é que sere- mos passíveis de combatê-las, sem sujeitar-nos ao risco de cair no seu mesmo erro fundamental, elo unitivo de tudo o que se tem pensado nos últimos. séculos, que tão bem coube para fundamentar práticas na primeira, na segunda e na terceira posições políticas. — Contra a concepção moder- na do reducionismo às causas isoladas levantamos, magistralmente define o Prof. Acacio Vaz de Lima Filho, a ine- xistência de ordem das coisas senão por “constelações polifatoriais de cau- sas”. — O papel integralista, nesse sentido, é reconstruir através de uma Grande Síntese filosófica, com uma " herme- neutica da realidade” a partir do eterno e verdadeiro sistema aristotélico- tomista, uma ciência do Todo, que considere todas as partes do Cosmos para integrá-las em seu sentido mais absoluto. As partes, contudo, subordi- nam-se e se relacionam com o Todo anterior, sem que sejam capazes de precedê-lo. Diz N. F. G.: “as partes de um todo — por exemplo as classes de um Estado — só podem plenamente ser bem compreendidas e organizadas para o bem comum para a sua relação com o todo. O todo é o ser original, próprio que não deve ser confundido com a análise das partes”. — Também Fairbanks: “O Integralismo dentro da realidade natural considera a parte no todo, e não o todo na parte” — “o integralista é o que vê antes o conjunto, antes a máquina que o parafuso, antes o homem ou a planta que a célula microscópica". — Nisso se subordina a tese integralista à lição unívoca de Aristóteles e Euclides: “O todo é maior que a soma das partes”. São amplas as consequências a que, com isso, abrem- se-nos as portas no campo da filosofia, da sociologia ou da economia política. — No Direito deu-se frutos: é consensu- al no meio jurídico brasileiro (e, até certo ponto, ocidental) a definição do Direito segundo a Teoria Tridimencio- nal — ou Integral, como ele próprio a chamou — de Miguel Reale, desenvolvi- da no seio do movimento integralista. Restará, ainda, para superar os vícios de origem do pensamento moderno, estender o método integralista a todos os campos, como constam já desen- volvimentos abrangentes de aplicação na história, a economia e a projeção humana, na pena de Reale, Contreiras Rodrigues e Plínio, exclusos todos os demais conceitos à luz do método integral que apresentaremos ao longo destas linhas. “No sistema do mundo, na essência do cosmos”, disse Plínio Salgado, em “A Quarta Humanidade”, “não existe nem ‘esquerda’ e nem ‘direita’, e sim condi- ções de movimentos e processos de expressão de forças eternas, de um modo imutável. A Verdade está no Absoluto do Cosmos, e nós a atingire- mos, pela concepção integral do Universo”. — O Absoluto do Cosmos é o ens, e a concepção integral trará, segundo a luz do são realismo de Aristóteles e Santo Tomás, a adaequa- tio intellectus et rei. Essa concepção integral, portanto, não é uma inovação pliniana, mas um ideal antiquíssimo da filosofia perene, que o integralismo restaura concretamente a fim de supe- rar os particularismos das filosófias modernas, com tão penosas conse- quências para a humanidade. — Com maior autoridade se expressa Plínio Salgado: “O único sentido totalitário do Universo é ainda aquele ao qual nos ligamos: o pensamento de Aristó- teles”. O pensador integralista N. F. G. nos concede a passagem mais sublime sobre a verdadeira doutrina totalista, considerada em todos os seus aspec- tos e consequências, no subjetivo e objetivo: O jardineiro que cuidasse apenas das rosas dum jardim, despre- zando o cuidado das outras flores, não seria integralista, como não é integra- lista aquele príncipe de Estado que só atende aos interesses de um partido, de uma classe socialmente existente como parte integrante do todo ou do universo relativo chamado República”. — “O jardineiro que cuidasse de todas as flores e esquecesse do gosto dos seus patrões quanto à disposição dos canteiros e alegretes, não seria tam- bém integralista, como não seria inte- gralista aquele príncipe que desse car- ta branca a todos os partidos e classes sem se importar das finalidades supre- mas da sociedade, que são superiores aos partidos e classes ainda que exis- tissem só para o bem comum destas classes”. — “O jardineiro, pois, que ti- vesse presente a variedade total das flores, seu tempo exato de plantio e floração, as suas peculiaridades bioló- gicas, o seu efeito no lugar e no espa- ço, as suas relações de dependência do gosto dos patrões e dos proventos que disso nasceriam para ele prôprio, seria um verdadeiro integralista, porque a sua noção de jardim abrange- ria o todo, o universo, o conjunto de todos os ‘seres’ do jardim — dos seres e das suas relações entre si”. — E, ascendendo em sua narrativa: “O homem que se deleitasse em saciar com todos os requintes todos os seus sentidos e ignorasse crassamente a existência das suas faculdades espiri- tuais, intelectuais e volitivas não seria universalista, mas partidista — e dos piores. Assim também seria partidista aquele príncipe que facultasse toda a abundância material de bens aos súdi- tos, negligenciando o valor espiritual ou prescindindo dos imperativos mora- is da alma humana. O homem que se deleitasse na análise de suas potênci- as intelectuais, no seu rico funciona- mento para alcançar a verdade, que conhecesse perfeitamente todo o me- canismo lógico do espírito humano, a sua potência abstrativa, as leis e os últimos princípios do conhecimento, da evidência e da verdade, ainda seria um homem imperfeito, um falso integralis- ta, porque toda a filosofia não passa de um logro duma ilusão perigosa quando não integra ou não totaliza ser humano na interdependência do bem e da ver- dade de quadro de sua origem e do seu fim”. — “E assim não seria integralista aquele político, aquele príncipe que fizesse as suas leis sob o imperativo imediato das exigências do povo, dos partidos e das classes, desprezando as suas relações orgânicas com o ‘todo’ da sociedade, ‘todo’ que. reclama a integração nas finalidades últimas dum imperativo absoluto, independente dos interesses relativos dos partidos e das classes”. Prossegue, então, o autor, condenando como “místicos do diabo” todos aqueles apartados do " verdadei- ro integralismo” que, buscando atingir o Absoluto, são “condenados ao insuces- so pela fragilidade do último anel que fecha o ‘todo’ do sistema. São aqueles que reclamam o Absoluto, mas que o diluem nas sombras nebulosas de um apersonalismo misterioso, sem contor- nos precisos, um deus desconhecido ou pressentido com arrepios agnósti- cos, variáveis, subjetivos com tintu- ras de iodo asiático”. — É inseparável a essência pessoal divina da concep- ção integral do Universo. “O integralis- mo descobre na pesquisa do todo as relações que ultrapassam o reino do ser puramente natural e procura integrá-lo, alargá-lo e completá-lo no mundo sobrenatural. Só na luz do Ser sobrenatural se compreende o último sentido do ser natural. Só então o todo não admite interstícios vazios e repousa a inteligência no gozo puro da verdade” . E a Deus se deve, portanto, destinar a ordena- ção social, porquanto é o Fim Último do Homem a que se dirige a socie- dade. Sendo Ele a Eterna Verdade, só ele pode ser a régua a determinar todos os nossos construtos. Explican- do Plínio Salgado a filosofia integralis- ta, faz ressaltar que, oferecendo-nos uma concepção do mundo e do Homem, esta concebe “tudo se origi- nando em Deus e com finalidade traçada pelo Criador”. Porque a apreen- são das coisas, na pena de Contreiras Rodrigues, a partir de uma concepção integral do conhecimento, se opera segundo uma tríplice distinção de juízos, dos quais são dois de realidade e um de finalidade. — Estende Fairban- ks essa matéria, politicamente: “essa compreensão do Estado há de ser teísta e monoteísta, pois à maneira da Escola de Pitágoras, compreende Deus como unidade, criando o homem à sua semelhança, uno em essência, mas vário nos seus acidentes. A sociedade humana gera na sua organização júridi- ca, o Estado semelhante ao homem — uno na essência soberana e variado na autonomia das várias formas aci- dentais”. — Daí que Plínio Salgado anuncie, sucintamente:. “O Estado Integral é o Estado que vem de Cristo, age por Cristo e vai para Cristo”. Partindo desse princípio realista e totalista das coisas, o Integralismo atinge o campo antropológico, de onde virão todas as bases para o estudo da Sociedade. Todas as concepções poli- ticas partem primeiramente de um conceito prévio do Homem: o Integra- lismo, por sua segura concepção do Universo, é o único capaz de atingir, numa sequência lógica, uma segura concepção da Pessoa Humana. Ele reconhece uma multiforme personali- dade humana: material, racional e espiritual, em ligação interdependente de um e outro. É, mais uma vez, apesar da maior apreciação que lhe damos, uma extensão, conforme a Boécio, do pensamento de Aristóteles, que reco- nhecia no homem a conjugação do bruto e do racional. Não pode, assim, o Integralismo reduzir o Homem a uma mera deformidade parcial segundo uma dessas naturezas ou aspirações que se conjugam em sua personalida- de. O mesmo princípio pelo qual apre- ciamos o Universo, na relação entre o todo e as partes, o aplicamos, por questão lógica, ao particular humano, que é um todo em si mesmo — como o são os seus órgãos em relação às suas células, e o seu corpo em relação aos seus órgãos, cujo elo é melhor ressal- tado pela. biotipologia moderna. Nis- so destacou-se com fervor a pena do Dr. Alexis Carrel, no clássico L’homme, cet inconnu, em sua análise científica das deformações ideológica do ho- mem e da necessidade de uma síntese total das nossas atividades fisiológicas e psíquicas, segundo uma clara orien- tação metodológica e visando a instau- ração de um humanismo sem parcia- lismos. — No entanto, constituído co- mo um todo, a tendência (apesar da imprecisão do termo) espiritual do Homem exerce primazia sobre todas as outras, porque é sua aproximação a Deus, a Cuja imagem e semelhança foi feito para reinar sobre o mundo. E não há totalidade que não implique uma ideia de hierarquia interna, na ciência experimental, na filosofia nem na so- ciedade. — Anunciando o humanismo, é-nos forçoso insurgi-lo contra todos os vícios consequentes do Renasci- mento, que, condenando o Homem à autossuficiência, condenou-o, por fim, demonstra-nos Berdyaev, à Natureza — porque, em sua profunda essência espiritual (e aqui somos nós a intervir), incapaz de voltar-se a si mesmo por- que psicologicamente produzido para o que lhe é exterior, o Homem rebaixou sua submissão ao Céu para subordi- nar-se, em atitude negativa, à Terra — à Natureza, portanto. E, daí, desde a ele- vação do Homem, todos os males do naturalismo, na origem de todas as maiores teorias da filosofia, da socie- dade, da economia e da política hoje. Foi a descensão do Homem, ligado ao superior, para voltar-se ao inferior. Explica Le Goff, remetendo ao verda- deiro humanismo, que “repousará sem- pre sobre a relação entre o homem e Deus”, como aceito pelo cristianismo medieval: “De um lado, o homem é objeto de uma promessa de salvação, quer dizer, de um retorno a Deus. É a doutrina do reditus, do retorno, tão importante em Tomás de Aquino. E o homem se torna de certa maneira o centro do mundo, criado por Deus e prometido à salvação. De outro lado, o homem em si mesmo não é fonte de nenhum valor. Todos os valores vêm de Deus. E só pela obediência e pelo amor a Deus o homem fará seu destino crescer num sentido positivo e será salvo”. — Esse Homem que disseca- mos atrás sofre modernamente amea- ças contra a integridade de todas as suas realidades, mas muito particular- mente em sua realidade moral, a mais importante de todas elas — através, sobretudo, das manifestações daquilo que denunciamos como o espírito burguês, fonte de todos os males ho- diernos. É dever do integralista assegu- rar o Homem Integral nas aspirações de seu multíplice comportamento contra a sua desconstrução. Despren- didos de parcialismos, mas sem nos esquecer das hierarquias no Todo, ligamo-nos a todos os problemas que devem ser resolvidos, sem pecar por desconsideração. Daí a orientação manifesta de nosso programa político: “dar ao homem elementos para que ele realize as suas justas aspirações materiais, intelectuais e morais”. Política e Sociedade
“A concepção do Estado e da socieda-
de está ligada à concepção do próprio Universo”, ensina Plínio Salgado. — Derivando de uma segura concepção do Universo uma segura concepção do Homem, o Integralismo parte deste Homem como o sujeito político para a construção de um seguro conceito de Estado, surgindo, segundo Contreiras Rodrigues, de “uma síntese sociológica criadora de uma ordem também sinté- tica (de um fato histórico mais perfeito que os anteriores)”.
O Homem Integral é o alicerce do Esta-
do Integral. Sendo Integral, e, como tal, cívico — isto é, segundo entidade da Razão — , moral e econômico, este homem exerce trabalho, fruto unitário de cada aspecto daquela tríplice reali- dade antropológica. — Não há disso- ciação possível entre um e outro: o Trabalho só existe enquanto atividade intrinsecamente humana, conforme sua integral tríplice aspiração, e é, para a Pessoa, uma necessidade inelutável, um direito e um dever, ensinam-nos a Doutrina Social da Igreja Católica e os Evangelhos. O Integralismo considera o Trabalho, fonte a um só tempo de coesão social, prosperidade material e dignificação moral, como “fonte de todos os direitos públicos e privados” ( “Concepção Integralista do Trabalho”). Toma, por- tanto, o trabalho honesto do Homem como o fundamento de toda a sua arquitetura política e social. Esse con- ceito de Trabalho é um conceito, já não puramente material, como o dos fisio- cratas e marxistas, mas espiritual, co- mo dispêndio de energia direcionado finalisticamente. É tomado, de maneira mais particular, segundo Plínio Salgado (“Direitos e Deveres do Homem”) 1° como expressão da liberdade humana; 2° da capacidade criadora do Homem; 3° como meio pelo qual o Homem visa um bem temporal objetivando um dom sobrenatural”. O Trabalho assim conce- bido assume alta significância por derivar da alta dignificação da Pessoa Humana, alicerce primeiro da Socieda- de e do Estado.
O Estado, dessarte, se constitui e dirige
no sentido do Homem e se origina do seu Trabalho. Disso ocorre que o Estado deva provir do Trabalho e da Pessoa, indissociáveis entre si, e a eles garantir. Para provir do Trabalho e mesmo da Pessoa enquanto ser multi- forme, necessita o Estado ser corpora- tivo, advindo das fontes mesmas do Homem real e do seu Trabalho; para a eles garantir, necessita ser forte e técnico, baseado num conceito seguro de força. A sociedade, da qual o Estado Integral procede, é, como fundamento do nosso seguro conceito de Estado e como consequência lógica do nosso seguro conceito de Homem, uma hierarquia de grupos naturais, entendidos como expressões da Pessoa Humana no Tempo e no Espaço. Esses grupos são o escudo protetor da integridade das Pessoas. Só a partir deles é possível construir uma ordem justa e sadia para o Homem. O Trabalho, num Estado integralista, estará exprimido, em todas as suas manifestações, nas Corporações, que se entrosarão no corpo do Estado. — Vide bem: se entrosarão, porque existi- rão já previamente, enquanto socieda- de corporativa. Seu papel no Estado não é mais do que levar a sociedade ao Estado, sem o ritmo inverso, de trans- portar o Estado à sociedade, em pro- funda rivalidade contemporaneamente. As Corporações são autarquias da sociedade realizando a aproximação federativa entre o Estado e a Nação. Se hoje não existem, é pelos frutos de um processo histórico e social, mantendo, contudo, bases poderosas no fundo da alma dos povos ocidentais. — Essas Corporações, em sentido econômico, reunirão trabalhadores, patrões e téc- nicos de um determinado ramo ou ciclo de produção: todo o Trabalho, portanto, daquele setor, em todas as suas ex- pressões. São o Estado e a Economia cujos sujeitos de organização são a constante. Trabalho, da qual se origi- nam em fundamento e história. — Mas o Trabalho, como o Homem, não são exclusivamente econômicos. São, um e outro, sobretudo, de natureza espiritu- al. Por isso a associação fundada no Trabalho não pode se dirigir somente à Economia, que é apenas uma das face- tas da sociedade humana, mas a todas as manifestações do trabalho, dentre as quais as culturais, morais e cientifi- cas. — Reunindo todas as Corporações, inclusive as não-econômicas, no Esta- do, o Integralismo garantirá uma repre- sentação integral da Nação, oferecen- do de maneira geral os dados estatisti- cos disponíveis no disperso complexo nacional e auto-organizando a socieda- de segundo os interesses do Todo. Sem, por ausência do espírito indivi- dualista da totalidade como soma in- distinta, acreditar no postulado do equi- líbrio automático do contato entre con- trários, o Estado Integral deverá asse- gurar uma instância superior de poder público a que remetem todas as partes corporativas, como já enunciava Key- nes, mas sem, jamais, andar pelas vias do corporativismo subordinado de que nos fala Mihail Manoilescu, porque não existe representação no corparati- vismo integral — tanto no sentido origi- nário de Manoilescu como no brasilei- ro, exposto por Gustavo Barroso e Mi- guel Reale — que não seja de base corporativa. E isso porque, consideran- do o Homem e o Estado, o Integralismo é forçado a considerar, entre os dados do problema, a História e, por óbvio, mas que a muitos passa despercebido, a Sociedade. “A sociedade existe” é a fórmula com que Oliveira Vianna resu- me todo o seu pensamento. E não há homem apartado da sociedade, como não há homem que não seja um ser histórico nem sociedade que não seja o produto de um inapagável processo histórico. O desenraizamento é, mais do que apenas as categorias desenrai- zadas, por si mesmo,. desenraizado da história e da sociedade. E, mais do que o Homem e a Sociedade, nunca houve, recorda Othmar Spann, um Estado (mesmo os liberais) ao longo da histó- ria que não tenha sido, ainda que indiretamente, corporativo, fundamen- tado em indivíduos enraizados. É, tam- bém, digno de nota recordar o dado da contemporânea ação política dos pres- sure groups. Sem direitos políticos, os trabalhadores não deixam de agir na política, ainda que de maneira clandes- tina, pelo lobby. É porque é por ele que se expressa o Homem, e é para o Homem que se dirige o Estado e por ele é constituído. Associar Estado e Homem é vinculá-lo ao Trabalho. — Recordamos assim não só a doutrina do Direito Natural, mas, com. muito zelo, o “direito costumeiro”, social, constituído historicamente, de maneira orgânica. Esse direito é, sobretudo, a manifestação social da Tradição, que orienta o “que-fazer” cotidiano de uma determinada. sociedade. — E, sem ain- da nos descuidar da bio-psicologia em nosso pensamento integral, conjugan- do história (Espírito) e natureza, a fim de construir uma saudável democracia, forçoso é que, contra o igualitarismo radical, assimilemos, na ponderação do entrosamento da Pessoa humana no Estado, a desigualdade natural de to- dos os indivíduos, considerando-os de acordo com suas qualidades pessoais e constitucionais no trabalho orgânico que une toda a sociedade, segundo o ordenamento corporativo das coisas. — Nisso, contudo, subordinados a inequi- voca lição de Tasso da Silveira, sem cair no darwinismo: “Haverá, sem dúvida, uma física, mesmo uma quii- mica e uma biologia políticas e sociais. Mas intimamente fundidas a uma rea- lidade que escapa às determinações rigorosas e estreitas da ciência natural: à realidade do espírito, que só pode ser definida pela consideração da sua natureza transcendente e da sua finalidade superior”. Assim concebido o Estado, de maneira corporativa, este garantirá legitimidade suficiente para aplicar um novo concei- to de força sobre as diversas forças da sociedade nacional. Dessa maneira, poderá garantir a dignidade da Pessoa e a segurança e dignidade do Trabalho. Esse novo conceito de força, que é o nosso conceito mesmo do Estado, enquanto monopólio do uso de força, considerará as multíplices expressões da Pessoa no Tempo e no Espaço, a elas se destinando. Seu papel precípuo é garantir a integridade e a gravitação, interdependente e sem choques, de cada uma dessas expressões. Por isso, está acima de todas elas, com a incum- bência de coordená-las e harmonizá- las sem ferir sua integridade e sua autonomia próprias. — Considera Fair- banks: “O Estado há de ser total, inte- gral, cada célula produzindo para a totalidade social, e a totalidade social vigiando o bem-estar de cada célula, como a parábola bíblica do Bom Pastor: estão abrigadas as 99 ovelhas? Pois vamos cuidar de abrigar a centé- sima tresmalhada”. — “E é coerente com o que se observa na Natureza. Meu corpo — a integral de infinitas células — goza de saúde; de repente, pequenas células de um dente enfer- mam, a ramificação do nervo respecti- vo fica descoberta. A dor transmite-se ao cérebro. Todo o imenso rebanho corporal de células sofreu, porque algu- mas sofreram. Vou ao dentista, isto é, vou procurar atender às necessidades das poucas ovelhas tresmalhadas das células dentárias. Curo-me, todo o rebanho celular corporal sente-se bem. Porque nosso organismo não segue a política do Estado partidário, o conjunto celular do corpo não dirá às células doentes: nós estamos bem, vocês se arrumem. Esse tipo de Estado, visando assegurar a integridade da Pessoa Humana, se destina ao conjunto de pessoas dentro dos limites de sua Nação. Essa Nação, que confedera, de maneira familial , as pessoas com uma determinada identi- dade sob a impressão das mesmas tradições históricas, é uma expressão do Homem no Espaço-Tempo e, portan- to, um dos seus grupos sociais natura- is. O Estado Integral é a resultante lógi- ca e política dessa Nação e, portanto, seu fiel vanguardeiro. A ele cabe a de- fesa e o impulsionamento ao desenvol- vimento do organismo nacional, sem contentar-se, por isso, com a postura negativa de espectador, mas, com a autoridade de erguer-se sobre a socie- dade organizada e verdadeira, segundo valores transcendentes, promover, pe- lo Espírito, a ação positiva e revolucio- nária — ordenadora, portanto — nos se- tores da sociedade em desequilíbrio. Estado estatístico, forte, nacionalista e profundamente cristão, porque confor- me a uma filosofia clara: tal a fórmula política do Integralismo. — Suas máxi- mas definitivas são estas, segundo enumeradas por Plínio Salgado: Estado orgânico, organização corporativa. da Nação, economia orientada, represen- tação corporativa, homem integral, rea- lismo político, harmonia das forças sociais, finalidade social, princípio da autoridade, primado do Espírito. — Diri- gindo-se à Pessoa Humana, ele asse- gura o terreno mais propício para o seu culto das virtudes e da religião, en- quanto ser moral. Concede-lhe o con- sumo e satisfação material, enquanto ser econômico. Impõe-lhe normas e deveres sociais e políticos para com a comunidade, de origem racional, en- quanto ser cívico. — Gustavo Barroso sistematiza: “o Estado não deve ser somente natural, racional ou ideal, po- rém ideal, racional e natural, com a predominância do ideal, mas sem o esquecimento do natural e do racional". — “Sobre esse homem [integral] se deve construir um Estado Integral: espiritual na afirmação de Deus, da liberdade e da dignidade da pessoa humana; racional na sua feição hierár- quica e disciplinadora; material na sua organização econômica”. Administrativamente, segundo o espiri- to comum de toda a sua doutrina, a filosofia integralista leva-nos a reco- nhecer as múltiplas correlações dos fenômenos sociais e políticos, integra- dos uns aos outros. Por isso, proclama que nenhum problema será resolvido isoladamente, mas todos serão resolvi- dos juntos, contemporaneamente, em suas íntimas implicações. É Plínio Salgado quem ensinava ao País o método integralista, quando, na posi- ção de estadista, ocupa-se no Parla- mento, com as altas questões nacio- nais: “não há soluções isoladas para nenhum problema, porquanto, ou resolvemos todos num planejamento, ou não resolvemos nenhum. A Nação, assim como o corpo humano, é consti- tuída de órgãos, e esses órgãos se interferem, se intercorrespondem na harmonia do ritmo vital. É necessário realmente um planejamento, um largo planejamento que não descure setores da vida brasileira hoje abandonados”. Sistematicamente, expõe Fairbanks: “Chama-se Integralismo aquela teoria segundo a qual os problemas adminis- trativos e políticos são apreciados em conjunto e na respectiva correlação de suas intensidades e frequência”, se- gundo o critério estatístico, na orienta- ção de Gottfried Achenwall. — É, por exemplo, o problema do desenvolvi- mento econômico, desconsiderando a necessária duplicidade e hierarquia da agricultura e da indústria, como da repartição desse desenvolvimento, quando, pela reforma agrária, ocupan- do-nos apenas do problema da terra, deixamos de ter em mente, como é racionalíssimo, o problema maior do homem, que trabalhará na terra, e o da produção, sem o qual não terá sentido a terra nem o homem. — Foi por essa doutrina, clara, segura e transparente, que o movimento integralista esteve sempre na vanguarda das grandes soluções nacionais em todos os cam- pos, algumas adotadas com convicção pelos nossos sucessivos governantes e outras mantidas no termo das pro- postas, o que responsabilizou uma pro- funda desordem no rumo que segue o País. Basta remeter à apaixonada dis- cussão sobre a reforma agrária, em que, acima de todas as paixões e tac- ciosismos, o partido integralista apre- sentou, contrapondo-se às Reformas de Base do presidente João Goulart, os projetos da Revolução Agrária (nº 277 e nº 486), que é o maior e mais deta- lhado, realista e com maior esforço de produção sistema com o fim de reali- zar, não bem uma reforma, mas uma verdadeira revolução no sentido da ( sadia, desideologizada ) distribuição de terras no Brasil. E seguem-se infini- tas consequências práticas de método, como a fórmula política do Estado Corporativo Integral, constituído de maneira a sinergizar todos os dados do problema econômico e social na boa administração. Assim se poderá conhe- cer as partes do todo e bem ajusta-lo à sua satisfação. — Por isso tem razão Fairbanksb ao expor, didaticamente: “O Estado anti-integralista ou parcial ensi- na o contrário [à nossa criteriologia]: ‘governar é abrir rodovias’. O integralis- ta examinará em tal sentença as corre- lações estatísticas: quantas rodovias? Provocando a importação de quantos automóveis ? Estes gastando quantos milhões de divisas? E quantas tonela- das de gasolina? Estas custando quan- to em dólares ? O conjunto rodovia automóvel-gasolina quanto custará orçamentariamente? Será esse conjun- to apto a fixar populações, formando cidades, como costumavam fazer as ferrovias? Que prejuizo a concorrência da nascente rodovia poderá acarretar ao capital fixo das velhas ferrovias? Nada desse aspecto de interações estatísticas indaga o anti-integralista; se for médico, irá generalizando casos particulares, como se o geral se conti- vesse no particular, e irá aconselhando: ‘só se alimente de leite’ — até que al- guns pacientes cheguem a fabricar queijo no estômago; ‘viva só de coalha- da’. Arranque todos os dentes, se não quiser ter úlcera no estômago’. ‘Extraiam todas as amígdalas’. — Como se a natureza houvesse criado órgãos inúteis. Tudo isso para, tempos depois, as revistas médicas, onde tais conse- lhos haviam surgido. desacompanha- dos de correlações estatísticas, darem marcha-à-ré e começarem a desacon- selhar: ‘o leite nem a todos faz bem. ‘Muitos organismos não suportam a coalhada’. ‘Se as amígdalas fossem inúteis, a natureza não as teria criado’. ‘Em vez de extrair seus dentes, conser- ve-os com cuidado’, etc. Que resposta dará o já desdentado, o já desamigda- lado a tais tardios conselhos ? O de mandar o médico estudar Estatística, isto é, examinar o fenômeno das mo- léstias como atípicos e de difícil gene- ralização coletiva e portanto exigindo, para a generalização, observações em grandíssimo número. No método indu- tivo, a pressa em generalizar conduz a erro”. — Qual outra doutrina é capaz de dizer esses princípios verdadeiros de administração pública com tal clareza e por termos à nossa bagunça, restau- rando o império da ordem e da harmo- nia na organização política? Qual outra é, então, a solução política ao Brasil, baseada na Verdade, em conceitos transparentes e passíveis de interiorização sem recorrer a longas explicações, porque facilmente assimi- lável pelo Espírito humano?
Pátria e Família
A fórmula de valores políticos pelo qua-
is se bate o integralismo é simples: Deus, Pátria e Família. — Explica Fair- banks: “o Estado em nome de Deus, para a Pátria, pela Família, as necessi- dades materiais desta atendidas nas reivindicações profissionais de seus respectivos chefes”. A partir de uma filosofia supremamen- te realista, na ânsia de conhecer todas as realidades, o Integralismo encontrou a Pátria e a Família, duas das realida- des mais imperativas para o Homem e intimamente ligadas entre si. Contra elas, realidades naturais e orgânicas, insurgem-se, sem sucesso. todas as abstrações. Por isso o grito patriótico de Nicanor de Carvalho: " o amor da Pá- tria é tão vigoroso e se acha de tal mo- do arraigado no espírito dos povos, que serão baldadas quaisquer medidas que pretendam extinguir os seus efei- tos. Experimentem os governos, por exemplo, a direção dos destinos dos povos por elementos alienígenas; abra qualquer país as suas portas às forças armadas doutro país, cruzando os braços à invasão e à conquista; façam-se leis que não anteponham li- mites à imigração, de modo a haver a absorção do elemento nacional pelo estrangeiro, e os resultados de tudo isso hão de provar de sobejo a existên- cia do sentimento nacionalista, que ha de reagir violentamente em defesa própria”. E, nesse espírito, recorda-nos Miguel Reale: “Quando em 1914, a guerra lançou Nações contra Nações, os trabalhadores seguiram para as trincheiras. Esquecidos de tudo, per- doaram a pátria que tinha sido madras- ta. Assim, em poucos meses, a guerra resolvia uma questão que havia provo- cado dezenas de anos de discussões estéreis: o internacionalismo classista não passava de um sonho criado pelas mentes exaltadas de Marx e de Sorel. É que a Nação é uma realidade perma- nente, um fato natural, superior à cons- ciência de classe”.
Aqui recorremos a um popular autor
contemporâneo, de corrente distintissi- ma da nossa — Yoram Hazony. Em recente livro de sucesso, Hazony faz uma distinção fundamental entre dois conceitos da vida do homem em socie- dade, feliz em não cair numa moral parcialista: o Negócio e a Família. Para ele, ambos contrapõem-se substancial- mente pelo grau de força dos laços entre seus membros. As notas caracte- rísticas de um e de outro são, respecti- vamente, a liberdade, o cálculo e o consentimento e a lealdade, a devoção e a restrição. A família não permite fundamentar-se, como o negócio — que vai da empresa ao grupo de trabalho —, sobre o cálculo, porque seus laços sustentam-se exclusivamente a partir da mútua devoção, sem relação com a eficiência. — Bem o diz Plínio Salgado, em sua teoria dos “quatro totalitaris- mos”, que um deles, o capitalista, en- fraquece o Homem e a Família sobre- pondo-lhes o conceito de Negócio. Negócio. Nesse contexto, tanto as “tribos” quanto a Nação — uma união característica, peculiar de tribos — constituem-se de coletividades de tipo familial em maior escala. É a Nação, diz-nos o Manifesto de Outubro, “uma grande família”. Também Herder, o pioneiro das modernas ideações nacio- nalistas, definia nação como “uma família extensa com um só caráter nacional. A unidade nacional é, ademais, o resul- tado final de uma longa e importante evolução social. No Brasil, condições sociais, econômicas, administrativas e geopolíticas favoreceram-nos a que já a tivéssemos desde cedo. — A Nação, contudo, não é o que se quer dizer, na divisa, por “Pátria”. A Pátria é uma cate- goria presente, que se localiza na rela- ção entre o subjetivo e o objetivo, a partir do contato entre o Homem e a paisagem, isto é, sentimental-geográfi- co. — Nesse contexto, sempre o Ho- mem esteve inserido em sua Pátria, segundo o dístico (com maior ou menor grau de diferenças internas em cada conceito) “Deus, Pátria e Família”, proposto como gradação de piedade na Summa Theologiæ por Santo Tomás de Aquino. Ainda que subordinada a diferenças de tempo, espaço e cosmo- visão, contudo, essa tríade de grada- ções é uma realidade intríseca ao espí- rito do Homem em todos os tempos, incapaz de apartar-se dela, mesmo quando, na Modernidade, tem ele bus- cado negar-lhe ponto a ponto — e criado, então, apenas uma abstrata variação, novamente, de tempo, espaço e cosmovisão: Deusa-Razão, Pátria- Humanidade e Família-Identidade. A- tento a essa realidade imperativa da Lei Natural que o Homem, pelo Integra- lismo, busca fortalecer-lhe na Razão, fixos os olhos na orientação verdadeira da Lei Divina, firmando por ela um conceito integral da vida humana que se traduza no Direito Positivo ou — dirá Hayek — na Legislação. — Mas, sobre a Pátria, ergue-se (no nosso caso) a Na- ção. Em conceito, ela independe de ter- ritórios e paisagens. É autônoma tanto da Pátria quanto do Estado. É um gru- po, de maneira objetiva — com caracte- res peculiares, distintos dos demais —, a posteriori assimilado, subjetiva- mente, pelo Homem. Sem a assimila- ção — integração — do objetivo no sub- jetivo não há Nação. Daí um conceito que nos apresenta Plínio Salgado: Nação é consciência de diferenciação ( e de destino ) — e concorda com Francisco Elías de Tejada: unidade de espírito. A diferenciação é uma realida- de; a apreensão individual desse caráter a confirma. — No Brasil, Nação é Pátria. Desde o princípio, nossos valores nacionais fundaram-se na exploração e conservação do território. Nossa história ergueu-se sobre a integração de todos os povos na construção de um certo pedaço de terra, cujas relações humanas desen- volveram um caráter próprio de comu- nidade (Tradição). É diferente, então, o nosso patriotismo, e deverá sê-lo o nosso nacionalismo. Aqui, a Nação possui fatores distintos de unidade histórica perante os outros agrupa- mentos nacionais: é, sobretudo, a a- ção do espaço no tempo. É a relação telúrica do Homem e do espaço. É, portanto, um desenvolvimento maior da Pátria. A Pátria é a Nação. Está aí a relação coletiva dos conjuntos huma- nos, formados por homens integrais, com sua paisagem comum. Diz Plínio Salgado, referindo-se ao Brasil, que “a Pátria se confunde de tal modo com a Nação, que não sei como separá-las na conceituação política”. — Essa apreen- são das peculiaridades brasileiras é a única coisa que pode guiar qualquer nacionalismo, enquanto racionalização e salvaguarda da comunidade nacio- nal. Não nos cabem quaisquer naciona- lismos importados que se dirijam a nações fundamentalmente distintas da nossa. É pelo desenvolvimento lógico dos dados de que dispomos que poderemos pensar e legislar o Brasil. — Daí o caminho pliniano a seguir: “Nossa consciência coletiva depende da própria geografia, da ação do sol amorenando as raças, da luta com a selva e a comunhão cósmica, e temos de a ir preparando, também, com o nosso esforço, em prol da libertação completa dos preconceitos retardantes e opressivos das nações velhas”. A Nação, enquanto corpo, não pode se desprender de sua alma — a Tradição. É ela, como o é a memória nos indiví- duos, o nosso código de “que-fazer”, a partir do conhecimento prévio do nos- so ser. Não conhecemos mais sublime passagem sobre a Tradição do que aquela do liberal Ortega y Gasset: As revoluções, tão incontinentes em sua pressa, hipocritamente generosa, de proclamar direitos, sempre violaram, pisotearam e dilaceraram o direito fundamental do homem, tão funda- mental que é a própria definição da sua substância: o direito à continui- dade. A única diferença radical entre a história humana e a ‘história natural’ é que aquela nunca pode começar de novo. Köhler e outros mostraram como chimpanzé e o orangotango não se diferenciam do homem pelo que cha- mamos, rigorosamente, de inteligência, e sim porque têm muito menos memó- ria do que nós. Os pobres animais, a cada manhã, encaram o fato de terem esquecido quase tudo o que viveram no dia anterior, e seu intelecto tem que trabalhar sobre um material mínimo de experiências. Assim, o tigre de hoje é idêntico ao de seis mil anos atrás, por- que cada tigre tem que começar de novo a ser tigre, como se não tivesse existido nenhum outro antes. O ho- mem, ao contrário, graças ao seu poder de recordar, acumula seu próprio pas- sado, toma posse dele e o aproveita. O homem nunca é um primeiro homem: começa a existir, desde logo, sobre cer- ta quantia de passado amontoado. Esse é o tesouro único do homem, seu privilégio e seu sinal. — Romper a continuidade com o passado, querer começar de novo, é aspirar a cair e plagiar o orangotango. Plínio Salgado alerta: “Perder a Tradição, para os indi- víduos, como para os povos, é perder a memória” — “assim como para o ho- mem isolado, o caráter é a memória de cada ato individual e do conjunto dos atos individuais na sua vida de relação com outros homens e com o conjunto social [partes e todo], informando per- manentemente o ‘fazer’ e o que fazer’ no presente e no futuro, também o caráter de uma Nação ( a tradião ) consiste nessa faculdade de lembrar, de trazer em dia as atitudes pretéritas, para harmonizar o que foi, o que é e o que virá, num sentido de afirmação de personalidade”. — Por isso o integralis- mo “apresenta, como base do desen- volvimento e do progresso da nossa Pátria, a tradicionalidade do nosso Grupo Nacional”, segundo o Chefe. — E explica: “As nações sem memória se deixam conduzir pelos acontecimen- tos. Rege-as o determinismo brutal dos frutos. Decide seus destinos a vontade estranha de outros grupos nacionais conscientes. A Nação vegetalizada no pragmatismo dos interesses cotidia- nos, brutalizada pelos interesses mes- quinhos do dia a dia, absorvida pelas exclusivas preocupações materiais do comércio e da politicagem dos faccio- sismos estreitos, já não conhece a maravilhosa e exaltadora conjugação dos verbos em voz ativa, já não sabe clamar com força esta palavra: " eu ". Ensinar a Nação a saber quem é, para que ela continue a ser é a missão dos seus condutores. — Precisamos de homens conscientes para construir- mos o Brasil consciente. Precisamos dar sentido à vida brasileira. Sentido histórico derivando das fontes da His- tória. Sentido espiritual, superando as misérias da hora presente, a confusão prenunciadora da desintegração nacio- nal, e elevando o nível das preocupa- ções do nosso grupo huma- no”. — Tradição, contudo, não recorda-ção da história. É, bem diríamos, uma estrada, que nos trouxe do passado para levar-nos ao Futuro. Recordação refere-se “a coisas mortas, paralisadas no pretérito, ao passo que a Tradição é o próprio espírito dos fatos históricos, ocorridos no passado, mas vivos no presente, em renovadas formas de expressão”. — “A História é corpo; a Tradição é espírito. O corpo desapare- ce; o espírito se renova, se atualiza, se dirige para o futuro”. Concebendo os homens na integração dos Grupos Naturais, pauta a Família todo o nosso programa. Com razão anunciava Plínio Salgado que, acima de tudo, “o Integralismo é a Revolução da Família" — e, como consequência lógi- ca disso, acrescentaremos nós, torna- se também a Revolução do Município, da Propriedade, do Trabalhador e da Nação. É uma impossibilidade lógica que seja diferente — “nela encontra- mos a presença de Deus, a dor do Ho- mem, o sentimento da Pátria, o princí- pio da autoridade, a essência da bonda- de, a grandeza das abnegacões e das renúncias, a fonte ética perene onde o Estado haure a sua força e o seu es- plendor”. E, por isso, como “base do nosso movimento” — a Família, “é para defender a família do operário, do co- merciante, do industrial, do fazendeiro, do camponês, do comerciário, do mé- dico, do farmacêutico, do advogado, do engenheiro, do magistrado, do cientis- ta, do artista, do professor, do funcio- nário, do soldado e do marinheiro, con- tra a desorganização, a prostituição e a ruína, que desejamos o Estado Forte, baseado nas forças vivas da Nação”. Com muita sabedoria escrevia Fairban- ks: “Decepadas as raízes, a árvore vem abaixo, como razão natural”. Contra o totalitarismo capitalista, portanto, que subordina a vida social aos interesses materialistas do Negócio, o realismo integralista levanta a dignidade e poder dos laços familiares de lealdade, se- gundo o são conceito moral de Família — quer dizer, de família-célula de pri- meiro grau na sociedade — num con- ceito integral, jusnatural, do masculino e do feminino. Disso virá, também, a proteção política, econômica e social à Família e sua existência, visando a per- petuação do Homem que vive nela. — Não é contra o negócio que nos levan- tamos, mas pela família, como base do homem que atua no negócio. E, por isso, chegamos à Nação. — Destarte não havendo outra doutrina capaz de conceber a Nação na integralidade de sua comunidade, formação e valores, forçoso é que destaquemos nosso alerta, erguido já há oito décadas: fora do Integralismo não há Nacionalismo. Em termos práticos, sem nos apartar da nossa firme concepção política, li- vres de todo idealismo vão, proclama- mos com Plínio Salgado a suma de toda a nossa plataforma revolucioná- ria: “Os direitos da Família não passa- rão de pura proclamação romântica, se não se relacionarem com os direitos do Grupo de Trabalho, da Propriedade, do Município, da Nação e do Estado e, so- sobretudo, da Religião. Essa é a con- cepção integral, a concepção integra- lista do Homem e da Sociedade, sem a qual não haverá senão unilateralidades insuficientes, visões parciais que não resolverão o grave problema dos Direi- tos Humanos.
ANAUÊ !
Matheus Batista Suplente de Secretário Geral da Frente Integralista Brasileira