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Resumo
A partir da inspiração em Fernando Pessoa, o artigo discorre a respeito de alguns aspectos da
condição humana, seus elementos paradoxais e como abordá-los na clínica, desdobrando-se
em algumas tarefas na relação terapêutica segundo a imagem do terapeuta como “barqueiro”
que auxilia o outro em sua travessia existencial e na busca da compreensão e aceitação do
fluxo da vida. São tratados temas como a abertura originária, o risco do fechamento frente ao
sofrimento e a impermanência. Também são abordados os sentidos e a função do sofrimento,
a criatividade e a arte como caminhos para lidar com o sofrimento. Observa-se o trabalho da
artista plástica Yayoi Kusuma sob estes aspectos. O amor e a esperança são reposicionados
com base na contribuição de Buber, Arendt e Stein, reverberando em mais uma tarefa do
terapeuta: cuidar e acompanhar a esperança na prática clínica.
Abstract
From the inspiration of Fernando Pessoa, the article talks about some aspects of the human
condition, its paradoxical elements and how to approach them in the clinic, unfolding some
tasks in the therapeutical relationship with the therapist’s image as a “boatman” that helps
the other in their existential journey and the pursuit of understanding and acceptance of the
flow of life. With topics such as the original opening, the risk of shutting off from suffering and
impermanence. It also addresses the meaning and purpose of suffering, and using creativity
and art as ways to deal with suffering. The work of artist Yayoi Kusuma is observed under these
aspects. Love and hope are repositioned based on Buber, Arendt and Stein’s contributions,
reverberating in another task for the therapist: caring and monitoring hope in clinical practice.
Este artigo teve como inspiração e pano de para o processo terapêutico: somos barqueiros,
fundo a poesia de Fernando Pessoa. O ponto estamos sempre realizando travessias. Também
de partida é uma imagem que encontrei no me recordo desta ideia nas aulas da Jean Clark
budismo e que é usada para ilustrar parte de Juliano no curso de formação em abordagem
seus ensinamentos, de seus fundamentos e de gestáltica no Sedes Sapientiae. Jean, uma
sua proposta: o budismo como um barco que das precursoras da Gestalt-terapia no Brasil,
permitirá ao praticante realizar uma travessia, citava o livro de Herman Hesse (1950), Sidarta,
atravessar o rio da vida, atravessar e superar para ilustrar a função da terapia e o papel do
o sofrimento e alcançar a outra margem, o terapeuta. Especificamente, se referia ao final
que permite redimensionar a compreensão da do livro, quando Sidarta, depois de toda sua
existência. busca pessoal, opta por trabalhar como balsei-
De uma maneira muito livre, própria e sem ro – particularmente prefiro o termo barqueiro
grande rigor, passei a transportar esta imagem – ajudando as pessoas na travessia do rio.
O trabalho de Yayoi se revela como um esferas de aço inoxidável que flutuam sob
significativo ajustamento criativo, é ao mesmo um espelho d’água e que criam formas de
tempo a expressão de seu mundo e funciona acordo com o vento e outros fatores externos,
como um caminho para evitar seus sentimen- como, por exemplo, a intervenção do próprio
tos de morte, sua autodestruição, seu risco de visitante, refletindo a paisagem da água,
suicídio. Para ela, sua fonte de inspiração são o da vegetação, do céu e também do próprio
universo, a humanidade, suas ilusões e sonhos, expectador, criando “um tapete cinético”, nas
mas também os seus conflitos mentais, resul- palavras da artista. Esta obra é a expressão da
tando em sua exuberante criatividade. própria impermanência e da impossibilidade
da precisão na medida em que está em uma
A sua obra Narcissus Garden, de 1966,
constante transformação em função do movi-
criada em função da exposição de Veneza,
mento dos elementos da natureza.
teve várias versões para exposições e espaços
abertos e em 2009 chegou ao Instituto Inhotim A busca incessante pelo infinito como um tema
em Minas Gerais. O aspecto que gostaria de recorrente na obra de Yayoi, nos ajuda a desta-
destacar desta obra, que consiste em 500 car que é por meio do poético, nas artes como