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Estudos de avaliação de impactos ambientais vêm ganhando importância para .

empreendedores e instâncias oficiais.que licenciam as atividades econômicas, à medida que


cresce a consciência ambiental na sociedade e as decisões devem ser tomadas em base de
estudostécnicos bem fundamentados. Este livro trata da realização desses estudos!
\ * ■ . ’
Combinando clareza e rigor teórico, o texto apresenta e analisa as várias tarefas da
preparação de estudos ambientais, ligando a técnica ao contexto legal. Casos históricos
(20 nacionais e 12 ínternacionaisrenriquecem esta obra, abordando empreendimentos,
como hidrelétricas, minerações e sistemas de transporte. -
Avaliação de Im pacto Am biental: conceitos e métodos é didático ao estudante -
ultrapassando a form ação nessa disciplina, - é,útil ao profissional - por ser excelente
fonte dè consulta - e aos técnicos dos órgãos de licenciamento e pfanejamento
a m b ie n ta is - por ser fa rto material de referência e reflexão.
Luis.Enrique Sánchez é engenheiro de minas e geógrafo pela Universidade de São Paulo.
Possui-doutorado em Economia dos Recursos Naturais e do Desenvolvimento pela 9788586238796

Escola de Minas de Paris. É professor da Escola Politécnica da USP, atuando em


planejamento e gestão ambiental. Foi diretor da Associação Internacional de
Avaliação de Impactos. Trabalhou na preparação e revisão de estudos
de impacto ambiental e como consultor de órgãos governamentais e internacionais;
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© C o p y r ig h t 2 0 0 6 O f ic in a d e T e x to s
1a r e im p r e s s ã o 2 0 0 8
2 a r e im p r e s s ã o 2010
3 a r e im p r e s s ã o 2011

Grafia atualizada conform e o A cordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990,


em vigor no Brasil a partir de 2009.

C O N S E L H O E D I T O R I A L Cylon G o n ç a lv e s da Silva; Jo s é G a liz ia Tund isi; Luis E n r iq u e S á n c h e z ;


Paulo H e le n e ; R o zely Ferreira dos S a n to s; T e re sa G a llo tti F lo r e n z a n o

A S S IS T Ê N C IA E D IT O R IA L A n a Paula R ib eiro
C A P A M a lu Vallim
D I A G R A M A Ç Ã O A n a K a rin a R. C a e t a n o
F O T O S Luis E n r iq u e S á n c h e s
P R E P A R A Ç Ã O DE F IG U R A S A n a K a rin a R. C a e t a n o e M a lu Vallim
P R O JE T O G R Á F I C O M a lu Vallim
P R E P A R A Ç Ã O DE T E X T O J o n a t h a n B u sa to
R E V IS Ã O DE T E X T O S A n a Paula Ribeiro, Ecila C ia n n i C o sta , M a r ia n a C a stilh o M a r c o a n t o n i o e
V e r a Lucia Q u in t a n i lh a

D a d o s In t e r n a c io n a is de C a t a l o g a ç ã o na P u b lic a ç ã o (CIP)
( C â m a r a Brasileira d o Livro, SP, Brasil) '

S á n c h e z , Luis E n r iq u e
A v a lia ç ã o d e im p a c t o a m b i e n t a l : c o n c e it o s e m é t o d o s /
Luis E n r iq u e S á n c h e z . — S ã o Paulo : O f ic in a d e T ex to s, 2 0 0 8 .

B ib lio g rafia .
ISBN 9 7 8 -8 5 -8 6 2 3 8 -7 9 -6

1. D e s e n v o l v im e n t o s u s t e n t á v e l 2. E d u c a ç ã o a m b i e n t a l
3. Im p a c t o a m b i e n t a l — A v a lia ç ã o 4. Im p a c t o a m b i e n t a l — E s tu d o s
I. T ítu lo

06-8282 C D D -3 3 3 .7 1 4

índices para c a t á l o g o sistem á tico :


1. Im p a c t o a m b i e n t a l : A v a lia ç ã o : E c o n o m
333.714

T o d o s os d ireitos r e s e r v a d o s à Oficina de Textos


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C E P 0 4 0 1 3 -0 4 3 S ã o P a u lo - SP - Brasil
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CAPITULO
C o n c e it o s e d e f in iç õ e s 17

1.1 A m b ie n te 18

1.2 Cultura e p a trim ô n io c u ltu ra l 23

1.3 Poluição 24

1.4 Degradação am b ie n ta l 26

1.5 Im p acto am b ie n ta l 28

1.6 Aspecto am b ie n ta l 32

1.7 Processos a m bie ntais 34

1.8 Avaliação de im p a c to am b ie n ta l 38

1.9 Recuperação am b ie n ta l 40

1.10 Síntese 42

CAPITULO
O r ig e m e d if u s ã o d a a v a l ia ç ã o de im p a c t o a m b ie n t a l 45

2.1 Origens 46

2.2 Difusão in te rn a c io n a l: os países 48


desenvolvidos
2.3 Difusão in te rn a c io n a l: os países 53
em d e se nvolvim en to
2.4 A AIA em tra ta d o s in terna ciona is 58

2.5 AIA no Brasil 62

CAPITULO TRES
Q u a d r o legal e in s t it u c io n a l d a a v a l ia ç ã o de im p a c t o 69
AMBIENTAL NO BRASIL

3.1 Breve histórico 70

3.2 Licenciam ento am b ie n ta l 80

3.3 Im p acto de vizinhança 88


3.4 Visão de c o n ju n to 89

CAPITULO QUATRO
O PROCESSO DE AVALIAÇÃO DE IMPACTO AMBIENTAL E SEUS OBJETIVOS 91

4.1 Os objetivos da avaliação de im p a c to a m b ie n ta l 93


/
4.2 0 o rd e n a m e n to do processo de AIA 95

4:3 As principais etapas do processo 97

4.4 0 processo de A IA no Brasil 101


4.5 0 processo de AIA em o u tro s países 104

CAPITULO CINCO
Et a p a de t r i a g e m 109

5.1 0 que é im p a c to s ig n ifica tiv o ? 111


5.2 Critérios e pro ce d im e n to s de tria g e m 114

5.3 Estudos prelim inares em algum as jurisdições selecionadas 125

5.4 Síntese 130

CAPITULO SEIS
D e t e r m in a ç ã o d o esc o po d o es tu d o e f o r m u l a ç ã o de
ALTERNATIVAS

6.1 D eterm inação da abrangência e do escopo


de um estudo de im p a c to a m b ie n ta l
6.2 Histórico 136

6.3 Participação pública nessa etapa do processo 139

6.4 Termos de referência 141

6.5 Diretrizes para id e n tifica çã o das questões 147

relevantes
6.6 A fo rm u la ç ã o de alte rn a tiva s 152

6.7 Síntese e problem ática 159

CAPITULO
Et a p a s d o p l a n e j a m e n t o e d a e l a b o r a ç ã o de u m e s t u d o de
im p a c t o a m b ie n t a l

7.1 Duas perspectivas c o n tra d itó ria s na realização de um estudo


de im p a c to a m b ie n ta l
7.2 Principais atividades na elaboração de um estudo de 165
im p a c to am b ie n ta l
7.3 Custos do estudo e do processo de avaliação de im p a c to 174
am b ie n ta l
7.4 Síntese 176
CAPITULO OITO
I d e n t if ic a ç ã o de im p a c t o s 177

8.1 Fo rm ula ndo hipóteses 178

8.2 Id e n tifica çã o das causas: ações ou atividades hum ana 181

8.3 Descrição das conseqüências: aspectos e im pactos am bientais 191

8.4 Im pactos c u m u la tiv o s 196

8.5 Ferramentas 200


8.6 Integração 214

8.7 Síntese 215

CAPITULO NOVE
E s tu d o s de base 217

9.1 Fundam entos 218

9.2 O c o n h e c im e n to do m eio a fe ta d o 220


9.3 P lanejam ento dos estudos 221
9.4 C onteúdos e abordagens dos estudos de base 227

9.5 Descrição e análise 254

CAPITULO DEZ
P r e v is ã o de im p a c t o s 257

10.J Planejar a previsão de im pactos 258

10.2 Indicadores de im pactos 259

10.3 M é to d o s de previsão de im pactos 2 63

10.4 Incertezas e erros de previsão 280


/

10.5 Area de in flu ência 285

CAPITULO ONZE
A v a l ia ç ã o d a im p o r t â n c ia d o s im p a c t o s 287

11.1 Critérios de im p o rtâ n c ia 288

11.2 M é to d o s de agregação 296

11.3 Análise e com paração de alte rn a tiva s 304


CAPITULO DOZE
A n á l is e d e r is c o 313

12.1 Tipos de riscos am bientais 3 15

12.2 Um longo histórico de acidentes te cn o ló g ico s


12.3 Definições
12.4 Estudos de análises de riscos
12.5 Ferramentas para análise de riscos
12.6 Percepção de riscos

CAPÍTULO
P la n o de g estão a m b ie n t a l

13.1 C om ponentes de um plano de gestão


13.2 M edidas m itigad oras
13.3 Prevenção de riscos e a te n d im e n to a em ergências
13.4 M edidas com pensatórias
13.5 Reassentamento de populações hum anas
13.6 M edidas de valorização dos im pactos benéficos
13.7 Estudos eom plem entares ou adicionais
13.8 Plano de m o n ito ra m e n to
13.9 M edidas de capacitação e gestão
13.10 Estrutura e c o n te ú d o de um plano de gestão a m b ie n ta l

CAPÍTULO
C o m u n ic a ç ã o dos resultados

14.1 0 interesse dos leitores


14.2 Objetivos, c o n te ú d o e veículos de c om unica ção
14.3 Deficiências com uns dos relatórios técnicos
14.4 Soluções simples para reduzir o ruído na
c o m u n i c a ç ã o e s c rita

14.5 Mapas, plantas e desenhos


14.6 C om unicação com o público

CAPÍTULO
A n á l is e t é c n ic a d o s e s t u d o s a m b ie n t a is

15.1 F u n d a m e n t o s
15.2 0 problem a da qualidade dos estudos am bientais 388

15.3 Ferramentas para análise e avaliação dos estudos a m bie ntais 395

15.4 Os co m e n tá rio s do pú b lico e as conclusões da análise técnica 401

CAPITULO DEZESSEIS
Pa r t ic ip a ç ã o p ú b l ic a
d
403

16.1 A am pliação da noção de direitos hum anos 404

16.2 Os vários graus de participação pública 407

16.3 O bjetivos da consulta pública 412

16.4 Form atos de consulta pública 414

16.5 Procedim entos de consulta pública em algum as jurisdições 418

16.6 A consulta pública v o lu n tá ria 422

CAPITULO DEZESSETE
A T O M A D A DE DECISÃO NO PROCESSO DE AVALIAÇÃO 427

DE IMPACTO AMBIENTAL

17.1 M odalidades de processos decisórios 428

17.2 M o d e lo decisório no Brasil 432

17.3 Decisão técnica ou política? 4 33

17.4 Negociação
435

' 17.5 M ecanism os de c o n tro le 441

CAPITULO DEZOITO
A ETAPA DE A C O M PANH AM ENTO NO PROCESSO 4 43

DE AVALIAÇÃO DE IMPACTO AMBIENTAL

18.1 A im p o rtâ n c ia da etapa de a c o m p a n h a m e n to 444

18.2 In s tru m e n to s para a c o m p a n h a m e n to 448

18.3 A rra njos para a c o m p a n h a m e n to 451

18.4 Integração entre p la n e ja m e n to e gestão 456

G l o s s á r io 461

A p ê n d ic e A 465

A p ê n d ic e B 470

R e fe r ê n c ia s B ib l io g r á f ic a s 477
APRESEN"-

V in t e a n o s p a ra e s c re v e r u m liv r o n ã o é m u it o . N ã o é e x a g e ­
ro d iz e r q u e c o m e c e i a e s c r e v ê - lo em j u l h o de 1 9 8 5 , em u m f r i o e
c in z e n t o v e r ã o da t a m b é m c in z e n ta A b e r d e e n , na c o s ta o r ie n t a l da
Escócia. 0 C e n te r f o r E n v ir o n m e n t a l M a n a g e m e n t a n d P la n n in g -
CEMP, da U n iv e rs id a d e de A b e r d e e n , era r e c o n h e c id o p e lo s e m in á r io
in t e r n a c io n a l de d u a s s e m a n a s , q u e t o d o s os a n o s re u n ia , s e m p r e n o
"ve rã o '', e s p e c ia lis ta s de v á r io s países p a ra p a le s tra s , d e b a te s e e x e r­
cício s s o b re A v a lia ç ã o de I m p a c t o A m b ie n t a l (AIA). Era u m a e x c e le n te
o p o r t u n i d a d e p a ra q u e m , em p o u c o s meses, p r e te n d ia in ic ia r u m d o u t o ­
r a d o s o b re esse te m a . Foi u m a lo n g a v ia g e m d e sd e a França, o n d e eu já
era b o ls is ta d o CNPq (C o n s e lh o N a c io n a l de D e s e n v o lv im e n t o C ie n tí f ic o
e T e c n o ló g ic o ), de ô n ib u s , n a v io , t r e m e a té c a ro n a , p o is era p re c is o
e c o n o m iz a r - os o r g a n iz a d o r e s d o s e m in á r io h a v ia m m e o f e r e c id o u m a
bolsa, m as eu te r ia de c h e g a r e m e h o s p e d a r p o r m e u s p r ó p r io s m e io s .

N o in v e r n o p a ris ie n s e de f e v e r e ir o de 1989, o u t r o f a t o in flu e n c ia r ia


este liv ro . Bill K e n n e d y , R é m y Barré, I g n a c y S achs e P ie r r e - N o é l G ira u d ,
estes ú ltim o s , r e s p e c t iv a m e n te , c o - o r i e n t a d o r e o r ie n ta d o r , a c h a r a m q u e
a q u e le " o b je t o fís ic o , p r e s c r it o pela lei, c o m p o s t o de u m c e r t o n ú m e r o de
p á g in a s d a tilo g r a f a d a s , q u e se s u p õ e t e n h a a lg u m a re la ç ã o c o m a d is c i­
p lin a na q u a l a pessoa se g ra d u a , e q u e n ã o d e ix e a b a n c a em u m e s ta d o
de d o lo r o s o e s tu p o r " , c o m o U m b e r t o Eco (198 6, p. 249) d e f in e u m a tese,
m e re c ia a p ro v a ç ã o . B em , eu h a v ia c o n c lu í d o u m a te s e s o b r e "Os p a p é is
d o s e s tu d o s de im p a c t o a m b ie n t a l de p r o je to s m in e iro s ", d e p o is de q u a t r o
a n o s e m e io c o m o b o ls is ta d o CNPq. Foi, na v e rd a d e , o p o n t o de p a r t id a
p a ra m in h a d e d ic a ç ã o p r o fis s io n a l à a v a lia ç ã o de im p a c t o a m b ie n t a l.

De v o lt a a São Paulo, a p ó s o d o u t o r a d o , h a via b o a d e m a n d a


p a ra e s tu d o s de im p a c t o a m b ie n t a l e, fe liz m e n t e , p u d e lo g o c o m e ­
ç a r a t r a b a lh a r n o r a m o . C o m o m e u in te re s s e era m a is v o l t a d o p a ra a
v id a a c a d ê m ic a , e n v ie i u m t r a b a lh o b a s e a d o em m in h a te s e para
u m s im p ó s io o r g a n iz a d o p e lo P ro fe s s o r S é rg io M é d ic i de E ston, na
Escola P o lité c n ic a da U n iv e rs id a d e de São P aulo, e m a g o s to de 1989.
Na s e q ü ê n c ia , v e io u m c o n v i t e para m in is t r a r a lg u m a s a u la s em u m a
n o v a d is c ip lin a q u e o D e p a r t a m e n t o de E n g e n h a ria de M in a s h a via
c r ia d o para os q u in t o a n is t a s . C o in c id e n te m e n te , a b r iu - s e u m c o n c u r ­
so p a ra c o n t r a t a r u m n o v o d o c e n t e e, de z a n o s d e p o is de m e g r a d u ­
a r na Poli, v o lt e i c o m o p r o fe s s o r de p ó s - g r a d u a ç ã o na d is c ip lin a de
A v a lia ç ã o de I m p a c t o A m b ie n t a l de P ro je to s de M in e r a ç ã o , em 1990.

M e u in te re s s e p o r t e m a s a m b ie n t a is v in h a de sd e a g r a d u a ç ã o - p e r í o ­
d o q u e t a m b é m m e p o s s ib ilit o u as p r im e ir a s e x p e riê n c ia s de c o n v iv ê n c ia
m u lt id is c ip lin a r . Já n o p r im e ir o a n o de u n iv e rs id a d e , in g re sse i n o CEU -
C e n tr o E x c u rs io n is ta U n iv e r s it á r io - , o n d e e s t u d a n t e s de to d a s as áreas
se r e u n ia m para fa z e r c a m in h a d a s , escaladas, m e r g u lh o s e v is it a r c a v e r­
nas. Para a lg u n s a d e p to s d o e x c u r s io n is m o , a a t iv id a d e im p lic a v a m ais
q u e r e c re a ç ã o e d e m a n d a v a u m a v e r d a d e ir a in t e r p r e t a ç ã o da n a tu re z a .
L o g o n o te i q u e isso a in d a era in s u fic ie n t e : os b e lo s lu g a re s q u e f r e q ü e n ­
t á v a m o s e ra m cada v e z m a is a s s e d ia d o s p o r in te re s s e s e c o n ô m ic o s -
im o b iliá r io s , tu r ís tic o s , m in e r á r io s - , c u jo s im p a c t o s ia m se e v id e n c ia n d o .
SENTACAO 3

Nessa época, n o te i que a E ngenharia era in s u fic ie n te para


lidar c o m a n a tu re z a e a sociedade, e f u i bu sca r na G e o g ra fia um
c o m p le m e n to indispensável. No início dos anos 1980, de pois de
me f o r m a r em E ngenharia de M in a s e e n q u a n to fazia a g r a d u a ­
ção em G e o g ra fia , a ava lia çã o de im p a c to a m b ie n ta l s u rg iu c o m o
um a s s u n to p ro m is s o r para q u e m quisesse se d e d ic a r ao e n tã o
r e s trito c a m p o de t r a b a lh o do p la n e ja m e n to e g e stã o a m b ie n ta l.

0 p rim e iro e m b riã o deste liv ro só s u rg iu m u ito s anos depois, em


1998, q u a n d o passei a m in is tr a r um a d iscip lin a sobre ava lia çã o de
im p a c to a m b ie n ta l no Pece - P ro g ra m a de Educação C o n tin u a d a em
E nge nha ria da Escola P o lité c n ic a . Tive de p re p a ra r um a ap o stila , bem
esbelta nesse p r im e ir o ano, m as que fo i e n g o r d a n d o cada vez mais,
pois os a lu n o s do c u rs o de especialização do p e río d o n o t u r n o t in h a m
um p e rfil d ife r e n te dos a lu n o s da p ó s -g ra d u a ç ã o . Para estes, eu a p o n ­
ta v a um a vasta b ib lio g r a fia e cada um se v ira v a c o m o podia. Já os
a lu n o s do c u rs o n o t u r n o não t in h a m t e m p o de f r e q ü e n t a r b ib lio te ca s .

O u tra m o tiv a ç ã o para este liv ro v iria c o m a a p ro x im a ç ã o de um a


d iscip lin a de g ra d u a ç ã o , in icia d a em 2 0 0 6 . M ais um a vez«. eu te ria de
pensar em m é to d o s d ife re n te s de ensino, e seria m u it o b o m t e r um a
a p o s tila c o m p le ta . No e n ta n to , um liv ro seria m u it o m elho r. Os a m ig o s
já m e d izia m isso havia anos. Sem me c o n s u lta r, Rozely Ferreira dos
S antos f u r t i v a m e n t e e n tr e g o u um e x e m p la r de u m a versão da a p o s ti­
la para S hoshana Signer, que havia f u n d a d o um a e d ito ra (a O fic in a de
Textos) e que se in te re sso u pelo te m a , d e c id in d o p u b lic á - lo . A p a r t ir de
e n tã o , não p u de m ais f u g ir da re s p o n s a b ilid a d e . Dei m in h a palavra de
q u e e n tre g a ria um t e x t o c o m p le to , m as n e gocie i v á rio s meses de prazo.

Com esta breve h is tó ria de m eu e n v o lv im e n to pessoal, q u e ro dizer


q u e a a valiação de im p a c to a m b ie n ta l é um te m a fa s c in a n te , que reúne
tr a b a lh o de c a m p o c o m o e m p re g o de so fis tic a d a s fe r r a m e n ta s c o m p u t a ­
cionais, e n g lo b a a conve rsa c o m o c id a d ã o c o m u m , a n e g o c ia ç ã o p riv a d a
c o m interesses e c o n ô m ic o s e o d e b a te p ú b lic o . 0 p ro fis s io n a l da a valiação
de im p a c to a m b ie n ta l só terá s u c e s s o s e fo r c a p a z d e d ia lo g a r c o m p ro fis s io ­
nais especializados, ao m e s m o t e m p o que c u ltiv a a m u ltid is c ip lin a rid a d e .

0 t e r m o "a v a lia ç ã o de im p a c to a m b ie n ta l" te m hoje m ú ltip lo s s e n ti­


dos. Designa d ife re n te s m e to d o lo g ia s , p r o c e d im e n to s ou fe r ra m e n ta s
e m p re g a d o s p o r a g e n te s p ú b lic o s e p riv a d o s no c a m p o do p la n e ja m e n to
e g e stã o a m b ie n ta l, sendo usado para de screve r os im p a c to s a m b ie n ta is
d e c o rre n te s de p ro je to s de e n g e n h a ria , de ob ra s ou a tiv id a d e s h u m a n a s
quaisquer, in c lu in d o t a n t o os im p a c to s causados pelos processos p r o d u - /

tiv o s q u a n to aqueles d e c o rre n te s dos p r o d u to s dessa a tiv id a d e . E usado


para de screve r os im p a c to s que p o d e m a d v ir de um d e te r m in a d o e m p r e ­
e n d im e n to a ser im p la n ta d o , assim c o m o para d e sig n a r o e s tu d o dos
im p a c to s que o c o rre ra m no passado ou estão o c o r r e n d o no presente.

A ssim , é c o m u m e n c o n tra r-s e , sob a d e n o m in a ç ã o de avaliação


de im p a c to a m b ie n ta l, a tiv id a d e s tã o d ife re n te s c o m o : (i) previsão dos
im p a c to s p o te n c ia is que um p r o je to de e n g e n h a ria p o d e rá v ir a causar,
APRESENTA

caso ve n h a a ser im p la n ta d o ; a tu a lm e n te , essa m o d a lid a d e da avaliação


de im p a c to a m b ie n ta l d iv id e -s e em ra m o s específicos, c o m o a valiação
de im p a c to social, de im p a c to s sobre a saúde h u m a n a e o u tro s ; (ii) id e n ­
t if ic a ç ã o das c o n se q ü ê n c ia s f u t u r a s de planos ou p ro g ra m a s de de se n­
v o lv im e n t o s o c io e c o n ô m ic o ou de p o lític a s g o v e rn a m e n ta is (m o d a lid a d e
c o n h e c id a c o m o a v a lia ç ã o a m b ie n ta l e s tra té g ica ); (iii) e s tu d o das a lte r a ­
ções a m b ie n ta is o c o rrid a s em um a d e te rm in a d a re g iã o ou d e te rm in a d o
local, d e c o rre n te s de um a a tiv id a d e in d iv id u a l ou de um a série de a t iv i­
dades h u m an as, passadas ou presentes (nesta acepção, a a valiação de
im p a c to a m b ie n ta l ta m b é m é c h a m a d a de avaliação de d a n o a m b ie n ta l ou
a va lia çã o do passivo a m b ie n ta l, um a vez que se p re o c u p a c o m os im p a c ­
to s a m b ie n ta is ne g a tivo s); (iv) id e n tific a ç ã o e in te r p r e ta ç ã o de aspe cto s e
im p a c to s a m b ie n ta is d e c o rre n te s das a tiv id a d e s de um a o rg a n iz a ç ã o , nos
te r m o s das n o rm a s té c n ic a s da série ISO 14 .0 00; (v) análise dos im p a c ­
to s a m b ie n ta is d e c o rre n te s do processo de p ro d u ç ã o , da u tiliz a ç ã o e do
d e sc a rte de um d e te r m in a d o p r o d u t o (esta f o r m a p a r tic u la r de avaliação
de im p a c to a m b ie n ta l é t a m b é m c h a m a d a de análise de cic lo de vida).

E m bora to d a s essas v a ria n te s da ava lia çã o de im p a c to a m b ie n ta l


t e n h a m um a raiz c o m u m , passaram a t r ilh a r c a m in h o s p ró p rio s , o
que é n a tu ra l em to d a d iscip lina . T ratar de to d a s elas c o m a d e vid a
p r o fu n d id a d e não é possível em um ú n ic o livro. Para cada um a das
c in c o m o d a lid a d e s de a va lia çã o de im p a c to a m b ie n ta l, f o r a m d e s e n ­
v o lv id a s m e to d o lo g ia s e fe r r a m e n ta s específicas, haja v is ta que
seus o b je tiv o s não são in te ira m e n te c o in c id e n te s . Assim , este liv ro
tr a ta , e ssen cialm ente, da p rim e ira v a ria n te , aquela que deu o rig e m
às dem ais e q u e te m c o m o o b je tiv o a n te v e r as c o n s e q ü ê n c ia s f u t u - t

ras sobre a q u a lid a d e a m b ie n ta l de decisões to m a d a s hoje. E nesse


s e n tid o que a a valiação de im p a c to a m b ie n ta l será a b o rd a d a aqui.

O te m a é a p re s e n ta d o em seis partes. Na p rim e ira (Cap. 1), a lin h a ­


v a m -s e c o n c e ito s e d e fin iç õ e s essenciais para a boa c o m p re e n s ã o do
t e x to . As o rig e n s e a e v o lu ç ã o da A v a lia ç ã o de Im p a c to A m b ie n ta l,
um a d iscip lin a em c o n s ta n te m o v im e n to , são tra ta d a s na s e g u n ­
da p a rte (Caps. 2 e 3). Na te rc e ira parte, d e fin e -s e o processo de A IA
e a p re s e n ta m -s e suas etapas iniciais (Cap. 4 ao 6). 0 p la n e ja m e n to e
a p re p a ra ç ã o de um e s tu d o de im p a c to a m b ie n ta l (m o d e lo para as
dem ais m o d a lid a d e s de e s tu d o s a m b ie n ta is ) é t r a t a d o na q u a r ta p a rte
(Cap. 7 ao 14). As e ta p a s do processo de A IA q u e levam à to m a d a de
decisões é o a s s u n to d is c u tid o na q u in ta p a rte (Cap. 15 ao 17), ao
passo que a s e x ta e ú ltim a p a rte (Cap. 18) a b o rd a a c o n tin u id a d e da
a valiação de im p a c to a m b ie n ta l após a a p ro v a ç ã o dos p ro je to s . G los­
sário, b ib lio g r a fia e a n exos c o m in d ica ç õ e s de d o c u m e n to s e e n d e ­
reços para busca de in fo r m a ç õ e s a d ic io n a is c o m p le m e n ta m o livro.
sçso ze ~ pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

Os diversos ramos da ciência desenvolveram terminologia própria, dando às pala­


vras um significado o mais exato possível, eliminando ambigüidades e reduzindo a
margem para interpretações de significado. A gestão ambiental, ao contrário, utiliza
vários termos do vocabulário comum. Palavras como “impacto”, “avaliação” e mesmo
a própria palavra “ambiente” ou o termo “meio ambiente”, por exemplo, não foram
cunhadas propositadamente para expressar algum conceito preciso, mas apropriadas
do vernáculo, e fazem parte do jargão dos profissionais desse campo. Por essa razão,
é preciso estabelecer, com a maior clareza possível, o que se entende por expressões
como “impacto ambiental” e “degradação .ambiental”, entre outras. Neste capítulo,
serão apresentadas definições de vários termos correntes no campo de planejamento e
gestão ambiental, empregados seguidamente neste livro. Essa revisão conceituai tem
o propósito de, em primeiro lugar, m ostrar a diversidade de acepções, mesmo entre
especialistas, e, em segundo lugar, estabelecer um a base terminológica sólida que
será empregada ao longo de todo o livro.

Uma visão histórica sobre o entendimento coletivo da problemática da degradação


ambiental constatará a grande diferença conceituai entre “impacto ambiental” e
“poluição”, termo bem incorporado ao linguajar contemporâneo. A partir da década de
1950, a palavra “p oluição” passou a ser bastante difundida, primeiro, no meio acadêmi­
co e, em seguida, pela imprensa. Foi incorporada a um a série de leis que estabeleceram
\ ^ f

condições e limites pára a emissão e presença de diversas substâncias nocivass —


chamadas de “poluentes” — nos diversos compartimentos ambientais. Durante algum
tempo, a ideia de “poluição” dominou o debate sobre temas ambientais, mas a com­
plexidade dos problemas de meio ambiente mostrou que esse conceito era insuficiente
para dar conta de um sem-número de situações. Foi quando se consolidou a ideia de
“impacto ambiental”, ao longo dos anos 1970.\

0 próprio conceito de “ambiente” admite múltiplas acepções, que serão exploradas


antes de se buscar conceituar “impacto ambiental”. A questão ambiental diz respeito
ao m eio natural ou ao meio de vida dos seres humanos? Quando se diz que deter­
minado projeto não é viável ambientalmente, o que se entende por ambiente? Ao se
declarar que determinado produto é preferível em relação a produtos similares porque
causa menor /impacto
""1
ambiental,
« nj
de que ambiente se fala? Quem afirma que tal resí-
duo industrial não representa um risco ambiental, refere-se a qual ambiente? Quando
se ouvem alegações de que a qualidade ambiental nos países desenvolvidos melhorou
nos últimos dez anos, devemos entendê-las com referência ao ambiente total ou a
determinado aspecto do meio?

1.1 A m b i e n t e
0 conceito de “ambiente”, no campo do planejamento e gestão ambiental, é amplo,
multifacetado e maleável. Amplo porque pode incluir tanto a natureza como a socie­
dade. Multifacetado porque pode ser apreendido sob diferentes perspectivas. Maleável
porque, ao ser amplo e multifacetado, pode ser reduzido ou ampliado de acordo com
as necessidades do analista ou os interesses dos envolvidos.

Muitos livros-texto de ciência ambiental sabiamente passam longe de qualquer ten ­


tativa de definição do termo. Envolver-se em insolúveis controvérsias filosóficas e

CAPÍTU LO
C o n c e it o s e D e - y

epistemológicas ou em ásperas discussões sobre campos de competências profissio­


nais pode ser a sina de quem se arrisca nessa seara. Mesmo assim, não são poucos os
que o fizeram, desde anônimos assessores parlamentares, redatores de projetos de lei,
até renomados cientistas. Conceituar o termo “ambiente” está longe de ter somente
relevância acadêmica ou teórica. 0 entendimento amplo ou restrito do conceito de­
term ina o alcance de políticas públicas, de ações empresariais e de iniciativas da
sociedade civil. No campo da avaliação de impacto ambiental, define a abrangência
dos estudos ambientais, das medidas mitigadoras ou compensatórias, dos planos e
programas de gestão ambiental. » "K

Nesse sentido, a interpretação legal do conceito de “ambiente” é determ inante na defi­


nição do alçance dos instrumentos de planejamento e gestão ambiental. Em muitas
jurisdições, os estudos de impacto .ambiental não são, na prática, limitados às reper-
—• — v ..y
cussões físicas e ecológicas dos projetos de desenvolvimento, mas incluem também
seus efeitos nos planos econômico, social e cultui:a-L Tal entendimento faz bastante
sentido quando se pensa que as repercussões de um projeto podem ir além de suas
conseqüências ecológicas (Fig. 1.1). Uma barragem que afete os movimentos m igra­
tórios de peixes poderá causar uma redução no estoque de espécies consumidas por
populações hum anas locais ou capturadas para fins comerciais. Isso certamente terá
implicações para as comunidades hum anas, seu modo de vida ou sua capacidade de
obter renda. Trata-se, claramente, de impactos sociais e econômicos que, de modo
algum, deveriam ser ignorados ou menosprezados em um estudo ambiental dessa
barragem. E o que dizer quando agricultores perdem suas terras ou mesmo suas casas
para dar lugar a um a represa? Não é apenas seu meio de subsistência que é afeta­
do, mas o próprio local em que vivem, onde nasceram muitos dos habitantes atuais
e onde jazem seus ancestrais. 0 impacto da hipotética barragem não inclui um a
mudança, possivelmente radical, sobre os modos de viver e fazer dessas pessoas? 0
que pensar quando as águas inundam os pontos de encontro da comunidade, locais
de lazer como praias fluviais ou um a determinada curva do rio onde tem início um a
procissão fluvial que ocorre todos os anos? Trata-se, nesse exemplo, de um signifi-
cativo impacto sobre a cultura popular. Deveria ser levado em conta no estudo de
impacto ambiental? f
y' tC
Uma rápida consulta a leis de diferentes países mostra similaridades e diferenças na
maneira de definir seu campo de aplicação. Na legislação brasileira, meio ambiente
é “o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e
biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas” (Lei Federal
n° 6.938, de 31 de agosto de 1981, art. 3o, I).

No Chile, “meio ambiente” (medio ambiente) é “o sistema global constituído por ele­
mentos naturais e artificiais de natureza física, química ou biológica, socioculturais e
suas interações, em permanente modificação pela ação hum ana ou natural e que rege
e condiciona a existência e desenvolvimento da vida em suas múltiplas manifesta­
ções” (Ley de Bases dei Medio Ambiente n° 19.300, de 3 de março de 1994, art. 2o, k).

No Canadá, “am biente” (environm ent) “significa os componentes da Terra, e inclui


(a) terra, água e ar, incluindo todas as cam adas da atmosfera; (b) toda a matéria
orgânica e inorgânica e organismos vivos; e (c) os sistemas naturais em interação que
ação ce Im pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

incluam componentes mencionados em (a) e (b)” (Canadian Environmental Assessment Act


(2) 1, sancionado em 23 de junho de 1992).

Na província canadense do Quebec, “ambiente” (environnement) é “a água, a atmos­


fera e o solo ou toda combinação de um ou outro ou, de um a m aneira geral, o
meio ambiente com o qual as espécies vivas entretêm relações dinâm icas” (Loi sur
la Qualité de l’Environnement - L.R.Q., c. Q-2, Section I, 1). No Quebec, a questão do
alcance dos estudos de impacto ambiental é explicitada pelo Escritório de Audiências
Públicas Ambientais (BAPE - Bureau dAudiences Publiques sur 1’Environnement) da
seguinte forma:

A noção de ambiente geralmente adotada pelo BAPE não se aplica somente às


questões de ordem biofísica; tal como designado na Lei sobre a Qualidade do
Ambiente (L.R.Q., c. Q-2 - a.20), ela engloba os elementos que podem “am ea­
çar a vida, a saúde, a segurança, o bem -estar ou o conforto do ser h u m an o ”.
Quer tenh am um alcance social, econômico ou cultural, estes elementos são
abordados, quando da análise de um projeto, da mesma m aneira que as preo­
cupações acerca do meio natural. Esta visão ampliada do conceito de ambiente
é reconhecida no Regulamento sobre a avaliação e a análise dos impactos a m ­
bientais [...] (BAPE,1986).

Em Hong' Kong, “ambiente” (environment)


“(a) significa os componentes da terra; e
(b) inclui (i) terra, água, ar e todas as ca­
madas da atmosfera; (ii) toda a matéria
orgânica e inorgânica e organismos
vivos; e (iii) os sistemas naturais em
interação que incluam qualquer um a das
coisas referidas no subparágrafo (i) ou
(ii)” (Environmental Impact Assessment
Ordinance, Schedule I, Interpretation, de
5 de fevereiro de 1997).

Definições legais muitas vezes acabam


por se revelar tautológicas ou, então,
incompletas, a ponto do termo nem
íg. 1.1 Porque N acional Kakadu, situado nos Territórios Setentrionais, mesmo ser definido em muitas leis, dei­
ustrália. No plano médio, a m ina de urânio Ranger e, ao fundo, escarpa xando eventuais questionamentos para
renítica onde cultuam -se os espíritos sagrados dos aborígenes. Uma das
a interpretação dos tribunais. 0 caráter
rincipais dificuldades para aprovação deste projeto fo i seu im pacto sobre
múltiplo do conceito de ambiente não só
s valores culturais da população aborígene
permite diferentes interpretações, como
se reflete em uma variedade de termos
correlatos ao de meio ambiente, oriundos de distintas disciplinas e cunhados em
diferentes momentos históricos. 0 desenvolvimento da ciência levou a um conhe­
cimento cada vez mais profundo da natureza, mas também produziu um a grande
especialização não somente dos cientistas, mas tam bém dos profissionais formados
nas universidades. Por essa razão, o campo de trabalho do planejamento e gestão

CAPÍTU LO
\ is:;nrc
------» ■-
C o n c e it o s e DEr
ern - i

ambiental requer equipes multidisciplinares (além de profissionais capazes de inte­


grar as contribuições dos vários especialistas). As contribuições especializadas aos
estudos ambientais costumam ser divididas em três grandes grupos, referidos como o
meio físico, o meio biótico e o mei&antrópico, cada um deles agrupando o conheci­
mento de diversas disciplinas afins. Uma síntese das diferentes acepções do ambiente
e de termos descritivos de diferentes elementos, compartimentos ou funções é mos­
trada na Fig. 1.2.

Por um lado, ambiente é o méio de onde a sociedade extrai os recursos essenciais à


sobrevivência e os recursos demandados pelo processo de desenvolvimento socioeco-
nômico. Esses recursos são geralmente denominados naturais. Por outro lado, o
ambiente é tam bém o meio de vida, de cuja integridade depende a manutenção de
funções ecológicas essenciais à vida. Desse modo, emergiu o conceito de recurso
ambiental, que se refere não mais somente à capacidade da jiatareza_jie fornecer
recursos físicos, mas tam bém de prover serviços e desem penhar funções de suporte
à vida.

Até a primeira metade do século XX era quase universal o usp do termo recurso na-
tuxal. Desenvolveram-se disciplinas especializadas, como a Geografia dos Recursos
Naturais
v_
e a Economia\
dos Recursos
l ^
Ambiente
Naturais. Implícita nesse conceito está
* j *

um a concepção da natureza como Meio físico Meio biótico Meio antrópico


V
• - ^
fornecedora de bens. No entanto, a Litosfera
dá Terra
Esferas

Atmosfera Antroposfera
sobre-explotação dos recursos naturais Hidrosfera
Biosfera
desencadeia diversos processos de_de­ Pedosfera
gradação ambiental . afetando a própria
Componentes
ou elementos

Litologia Fauna Economia


capacidade da natureza de prover os Solos Flora Sociedade
Ecossistemas
do meio

Relevo Cultura
serviços e as funções essenciais à vida. Ar 9

Aguas
(É nítido, então, que o conceito de
ambiente oscila entre dois_polos: o for­ Natureza Sociedade
<U
necedor de recursos e o meio de vida,
“CO*
■O .

O
OJ
que são duas faces de uma só realidade. ’ cj Paisagem
0
Ambiente não se define “somente on
cu
1

como um meio a defender, a proteger, <U


NI
Am biente natural Am biente ■
construído
ou mesmo a conservar intacto, mas 03
C

também como potencial de recursos E


O
Espaços naturais Espaços rurais Espaços —
<o urbano-
que permite renovar as formas m ate­ industrials
lo
riais e sociais do desenvolvimento” o
"O
(Godard, 1980, p. 7). *o
aj Recursos naturais - Recursos humanos
o* Recursos ambientais Recursos culturais
QJJ
Q _

C
Para Theys (1993), que examinou 03
OO Patrimômio natural Patrimômio cultura
aj
várias classificações, tipologias e defi­ 4 —'
c
< L)

nições de ambiente, há três diferentes H—


<U Capital Capital humano —
Q natural Capital sociai
maneiras de conceituá-lo: um a concep­ Capital econômico
ção objetiva, um a subjetiva e outra que,
na falta de melhor termo, o autor deno­ Fig. 1.2 Abrangência do conceito de am biente e termos correlatos uscco.
mina de tecnocêntrica. Na concepção diferentes disciplinas
5ção de ~ p s c to A m b ie ntal: conceitos e métodos

objetiva, ambiente é assimilado à ideia de natureza e pode ser descrito como: um a


coleção de objetos naturais em diferentes escalas (do pontual ao global) e níveis
de organização (do organismo à biosfera), e as relações entre eles (ciclos, fluxos,
redes, cadeias tróficas). Tal concepção pode ser vista como biocêntrica, um a vez que
nenhum a espécie tem mais importância que outra, e a própria sociedade, em certa
medida, pode ser analisada à luz desses conceitos, como o fazem disciplinas como a
Ecologia Humana (Morán, 1990).

A concepção subjetiva encara o ambiente como “um sistema de relações entre o


homem e o meio, entre ‘sujeitos’ e ‘objetos’” (Theys, 1993, p. 22). Essas relações entre
os sujeitos (indivíduos, grupos, sociedades) e os objetos (fauna, flora, água, ar etc.)
que constituem o ambiente implicam necessariamente relações entre esses sujeitos
a respeito das regras de apropriação dos objetos do ambiente, transform ando-os em
objetos de conflito, e o ambiente, em um campo de conflitos. A concepção antropo-
cêntrica pode ser profundamente fragmentada, na medida em que “cada indivíduo,
cada grupo social, cada sociedade seleciona, entre os elementos do meio e entre os
tipos de relações, aquelas que lhe im portam ” (Theys, 1993, p. 26), de modo que o
ambiente não é um a totalidade, e sua apreensão depende do ponto de vista, de um
sistema de valores, crenças, da percepção (uma implicação prática desse relativismo
será vista no Cap. 6, em um estudo de impacto ambiental de uma grande barragem
no Canadá). Em qualquer caso, ambiente é algo externo ao agente ou a um sistema.
Conflitos entre “desenvolvimentistas” ou “produtivistas” e integrantes de certas cor­
rentes do movimento ambientalista podem ser facilmente vistos e interpretados sob
esse ângulo.

No entanto, a extensão do “natural” no planeta Terra modifica-se conforme a hu m a­


nidade expande sem cessar suas atividades e interfere de modo crescente na natureza.
A relação das sociedades contemporâneas com seu ambiente é mediada pelo emprego
de técnicas cada vez mais sofisticadas, a ponto de muitas vezes diluir a própria noção
de ambiente como um elemento distante ou virtual. Na prática, a sociedade moderna
não tem outra opção a não ser gerir o meio ambiente, ou seja, ordenar e reordenar
constantemente a relação entre a sociedade e o mundo natural. Na verdade, a dis­
tinção entre “sujeito” e “objeto” perde muito de seu sentido, haja vista a crescente
artificialização do mundo natural. Mas, como não há nem pode haver independência
ou autonomia da cultura em relação à natureza, faz-se necessário melhor gerir essa
relação, e duas perspectivas são possíveis (Theys, 1993, p. 30):

(i) tentar determ inar as condições de produção do melhor ambiente possível para
o ser humano, renovando sem cessar as formas de apropriação da natureza, ou
(ii) tentar determ inar o que é suportável pela natureza, estabelecendo, portanto,
limites à ação da sociedade.

Assim, sob um ponto de vista que, idealmente, coadune as visões e contribuições


das diversas disciplinas para o campo do planejamento e gestão ambiental, deve-se
buscar entender o ambiente sob múltiplas acepções: não somente como um a coleção
de objetos e de relações entre eles, nem como algo externo a um sistema (a empresa,
a cidade, a região, o projeto) e com o qual esse sistema interage, mas também como
um conjunto de condições e limites que deve ser conhecido, mapeado, interpretado -
definido coletivamente, enfim -, e dentro do qual evolui a sociedade.

CAPÍTU:L0
C o n c e ito s e D er

1.2 C u l t u r a e p a t r i m ô n i o c u l t u r a l
Já foi dito anteriormente que as repercussões de um projeto podem ir além de suas
conseqüências ecológicas. Ações hum anas repercutem sobre as pessoas, quer no
plano econômico, quer no social, quer no cultural. 0 reassentamento de um a popu­
lação deslocada por um empreendimento pode desfazer toda um a rede de relações
comunitárias, causar o desaparecimento de pontos de encontro ou de referenciais
de memória e, com isso, relegar lendas, mitos ou manifestações da cultura popular
ao esquecimento. Ademais, empreendimentos modernizadores modificam profunda­
mente os modos de vida das populações tradicionais, nem sempre preparadas ou
mesmo desejosas dessas modificações.

A palavra “cultura” reflete um a noção muito vasta. Em certo sentido, tudo o que faz
o ser hum ano é cultura. Cultura pode ser entendida como o oposto ou o complemento
da natureza. Cientistas sociais falam em cultura técnica, administradores, em cul-
| tura organizacional. Para se discutir “impacto cultural”, é preciso ter um a definição
operativa de cultura. Bosi (1994) sintetiza o conceito de cultura como “herança de
valores e objetos compartilhada por um grupo hum ano relativamente coeso”. Morin
e Kern (1993, p. 60) a definem como:

conjunto de regras, conhecimentos, técnicas, saberes, valores, mitos, que per­


mite e assegura a alta complexidade do indivíduo e da sociedade hum ana e que,
não sendo inato, precisa ser transm itido e ensinado a cada indivíduo em seu
período de aprendizagem para poder se autoperpetuar e perpetuar a alta com­
plexidade antropo-social.

Uma m aneira de tra ta r a cultura emprega a noção de“patrimônio cu ltu ral”, que na
atualidade é um conceito muito abrangente, abarcando um sem-número decriações
hum anas, passadas ou presentes. No passado, o conceito de “patrim ônio” lim itava-
se a bens de natureza material que recebiam algum a forma de reconhecimento
oficial, como na locução* “patrimônio histórico”. Modernamente, “patrimônio cul­
tu ra l” inclui tam bém bens de natureza imaterial, assim como produtos da cultura
popular. A Constituição brasileira traz um a definição ampla e atual de patrimônio
cultural (art. 216):

Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e im a­


terial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à
identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade
brasileira, nos quais se incluem:
I - as formas de expressão;
II - os modos de criar, fazer e viver;
III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas;
IV - as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às
manifestações artístico-culturais;
V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico,
arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.

Os bens imateriais ou intangíveis incluem um a ampla variedade de produções coleti­


vas, como línguas, lendas, mitos, danças e festividades, atualmente tão necessitadas
de proteção quanto os recursos ambientais.
ação ae im pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

Os bens materiais podem ser classificados em móveis ou imóveis. Aqueles são mais
facilmente protegicfos dos impactos que podem advir de projetos de desenvolvimento
devido à sua própria mobilidade (o que não impede, contudo, sua descontextualização,
que já é um impacto). Os bens imóveis constituem sítios de interesse cultural, que
podem ser sítios arqueológicos,'Tirstoricos, religiosos ou naturais. Exemplos de sítios
naturais são cavernas, vulcões, gêiseres, cachoeiras, cânions, sítios paleontológicos
e locais-tipo de formações geológicas. Paisagens, que muitas vezes combinam atri­
butos naturais com a interferência do homem, também têm sido enquadradas nessa
categoria. 0 patrimônio genético representado pela biodiversidade também deve ser
considerado como patrimônio cultural, além de natural, pois supõe conhecimento
(científico ou tradicional) que permita seu aproveitamento.

1.3 P o l u i ç ã o
Em países como o Brasil, a incorporação de temas ambientais ao debate público
deu-se anos ou décadas após a inclusão do tema na agenda internacional, e as
primeiras leis que explicitamente visavam à proteção am biental (ou de uma parce­
la dele) tratavam principalmente de problemas relativos à poluição. Dito de outra
forma, a partir do momento em que o conceito de ambiente foi paulatinam ente
assimilado à ideia de meio de vida (e, portanto, de -qualidade de vida), e não mais
somente como recurso natural, os problemas então denominados ambientais foram
assimilados à noção de poluição.

0 verbo poluir é de origem latina, polluere, e significa profanar, manchar, sujar.


Poluir é profanar a natureza, sujando-a. No relatório preparado para a Conferência
das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano, realizada em Estocolmo, em 1972,
intitulado Uma Terra Somente, Ward e Dubos (1972) discutem “o preço da poluição”,
do qual o mundo se conscientizava: entre outros exemplos, os autores citam o grande
smog londrino de 1952, ao que se atribuíram mais de 3 mil mortes.

Basicamente, poluição é entendida como uma condição do entorno dos seres vivos
(ar, água, solo) que lhes possa ser danosa. As causas da poluição são as atividades
hum anas que, no sentido etimológico, “sujam” o ambiente. Dessa forma, tais ativi­
dades devem ser controladas para se evitar ou reduzir a poluição. Já em 1948, os
Estados Unidos contavam com um a Lei de Controle da Poluição das Aguas e a partir
de 1955, com uma Lei de Controle da Poluição do Ar, enquanto, em 1956, o Reino
Unido decretava um a Lei do Ar Limpo.

A Declaração de Estocolmo recomendava que os governos agissem para controlar as


fontes de poluição, e a década de 1970 viu florescer leis de controle de poluição e surgir
entidades governamentais encarregadas da vigilância ambiental e dá fiscalização
das atividades poluentes. Os Estados Unidos modificaram e atualizaram suas leis de
controle de poluição durante essa década, enquanto, no Brasil, os Estados do Rio de
Janeiro, em 1975, e São Paulo, em 1976, estabeleceram suas próprias leis de controle
/

de poluição. E interessante verificar como estas foram definidas:

Qualquer alteração das propriedades físicas, químicas ou biológicas do meio


ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das
atividades hum anas, que direta ou indiretamente:

CAPÍTUt o
C o n c e ito s e D ernig

I - seja nociva ou ofensiva à saúde, à segurança e ao bem -estar das popu­


lações;
II - crie condições inadequadas de uso do meio ambiente, para fins domésticos,
agropecuários, industriais, públicos, comerciais, recreativos e estéticos;
III - ocasione danos à fauna, à flora, ao equilíbrio ecológico e às propriedades;
IV - não esteja em harm onia com os arredores naturais.
(Decreto-lei Estadual do Rio de Janeiro n° 134/75, art. Io.)

A presença, o lançamento ou a liberação, nas águas, no ar ou no solo, de toda e


qualquer forma de energia ou matéria com intensidade, em quantidade, de con­
centração ou com características em desacordo com as que forem estabelecidas
em decorrência desta lei, ou que tornem ou possam tornar as águas, o ar ou o
solo:
I - impróprios, nocivos ou ofensivos à saúde;
II - inconvenientes ao bem -estar público;
III - danosos aos materiais, à fauna e à flora;
IV - prejudiciais à segurança, ao uso e gozo da propriedade e às atividades
normais da comunidade.
(Lei Estadual de São Paulo n° 997/76.)

Tais definições legais são coerentes com o conceito de poluição então vigente (e que
continua atual). Comum a ambas é a conotação n eg a tiva do conceito de poluição.
Outra ideia comum é a associação entre poluição e emissões ou presença de matéria
ou energia. Isso significa que à poluição podem-se correlacionar certas g ra n d eza s
f í s i c a s ou p a râ m e tro s q u ím ico s ou fís ic o - q u ím ic o s , que podem ser medidos e para os
quais podem ser estabelecidos valores de referência, conhecidos como p a d rõ es a m ­
bientais. São exemplos de poluentes:
# Elementos ou compostos químicos presentes nas águas superficiais ou subterrâ­
neas, cujas concentrações podem ser medidas por procedimentos padronizados
(são normalmente expressas em mg/£, pg/f ou ainda ppm) e para alguns dos
quais existem padrões "estabelecidos pela regulamentação.
# Material particulado ou gases potencialmente nocivos presentes na atmosfe­
ra, cujas concentrações podem ser medidas por métodos normalizados (são
normalmente expressas em pg/m 3) e para alguns dos quais também existem
padrões estabelecidos pela regulamentação.
# Ruído, medido usualmente em decibéis - dB(A), cujos níveis de pressão sonora
são fixados por textos legais ou normas técnicas.
# Vibrações, medidas, por exemplo, em mm/s, cujos valores são estabelecidos por
normalização técnica.
# Radiações ionizantes, medidas, por exemplo, em Bq/f ou Sievert, que são
tam bém objeto de regulamentação específica.

A possibilidade de se medir a poluição e estabelecer padrões ambientais permite que


sejam definidos com clareza os direitos e as responsabilidades do poluidor e do fiscal
(os órgãos públicos), assim como da população. Abre também campo para estudos
científicos que definam a capacidade de assimilação do meio, estabelecendo, dessa
forma, os padrões ambientais. Estes não são estáticos, dados de um a vez por todas,
mas estão em contínua evolução, sendo fruto de pesquisas que tendem a aprofundar
nosso conhecimento dos processos naturais, dos efeitos dos poluentes sobre o homem
e os ecossistemas e dos efeitos sinérgicos e cumulativos de diferentes poluentes.
ação 3e im pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

Essa clareza está ausente na definição de poluição da Lei da Política Nacional do Meio
Ambiente (Lei Federal n° 6.938, de 31 de agosto de 1981): poluição é

a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou


indiretamente:
a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem -estar da população;
b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas;
c) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente;
d) lancem matéria ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabe­
lecidos.

I Ao igualar poluição e degradação ambiental, esta lei propõe uma definição muito
ampla e demasiado subjetiva.

Há um a série de processos de degradação ambiental aos quais não está associada a


emissão de poluentes, como é o caso da alteração da paisagem - por exemplo, a cons­
trução de um complexo turístico na orla marítima ou a submersão das Sete Quedas
pelo reservatório de Itaipu - ou dos danos à fauna causados pela supressão da vege­
tação ou pela modificação de hábitats - como o aterro de um manguezal.

Foi por razões como essas, ou seja, porque inúmeras atividades hum anas causam per­
turbações ambientais que não se reduzem à emissão de poluentes, que o conceito de
poluição foi sendo ora substituído, ora complementado pelo conceito mais abrangente
de impacto ambiental. Como conseqüência, as políticas ambientais evoluíram.

( Assim, pode-se trabalhar com a seguinte definição operacional concisa de poluição:


in tro d uçã o no m e io a m b ie n te de q u a lq u e r f o r m a de m a té r ia ou energia que p o ssa
a fe ta r n e g a tiv a m e n te o h o m e m ou outros organism os. De uma m aneira geral, com
pequenas mudanças na formulação ou na terminologia, é esse o conceito de poluição
que se encontra na literatura técnica internacional das últimas quatro décadas.

1.4 D e g r a d a ç ã o a m b i e n t a l
Degradação ambiental é outro termo de conotação claramente negativa. Seu uso na
“moderna literatura ambiental científica e de divulgação é quase sempre ligado a um a
mudança artificial ou perturbação de causa hum ana - é geralmente um a redução
percebida das condições naturais ou do estado de um ambiente” (Johnson et al., 1997,
p. 583). 0 agente causador de degradação ambiental é sempre o ser humano: “pro­
cessos naturais não degradam ambientes, apenas causam m udanças” (Idem, p. 584).
■A
{
A degradação de um objeto ou de um sistema é muitas vezes associada à ideia de
perda de qualidade. Degradação ambiental seria, assim, um a perda ou deterioração
da qualidade a m b ie n ta l. A Lei da Política Nacional do Meio Ambiente define de­
gradação ambiental como “alteração adversa das características do meio ambiente”
(art. 3o, inciso II), definição suficientemente ampla para abranger todos os casos de
prejuízo à saúde, à segurança, ao bem -estar das populações, às atividades sociais e
econômicas, à biosfera e às condições estéticas ou sanitárias do meio, que a mesma
lei atribui à poluição.

CAPÍTU LO
7S7Í
C o n c e ito s e D e r * , i OES 27

Qualidade ambiental é, com certeza, outro conceito controverso e difícil de


definir. Johnson et al. (1997), que se dedicaram a um a compilação e reflexão
sobre o significado dos termos mais usuais em planejamento e gestão ambiental,
consideram que qualidade ambiental “é um a medida da condição de um ambiente
relativa aos requisitos de um a ou mais espécies e/ou de qualquer necessidade ou ob­
jetivo h u m an o ” (p. 584). Se, de algum modo, a qualidade ambiental pode ser medida
por indicadores, como se tenta fazer com a qualidade de vida ou com o desenvolvi­
mento humano, Sachs (1974, p. 556) lembra que “a qualidade ambiental deve
ser descrita com a ajuda de indicadores ‘objetivos’ e apreendida no plano de sua
percepção pelos diferentes atores sociais”.

\
Assim, degradação ambiental jpode ser conceituada como q u a lq u e r alteração adversa
dos processos, f u n ç õ e s ou c o m p o n e n te s a m b ie n ta is, ou como um a alteração adversa
da q u a lid a d e a m b ie n ta l . Em outras palavras, degradação ambiental corresponde a
impacto ambiental negativo.

A degradação refere-se a qualquer estado de alteração de um ambiente e a qual­


quer tipo de ambiente. 0 ambiente construído degrada-se, assim como os espaços
naturais. Tanto o patrimônio natural como o cultural podem ser degradados, desca­
racterizados e até destruídos. Vários desses termos descritivos serão utilizados para
caracterizar impactos ambientais. Assim como a poluição se manifesta a partir de
um certo patamar, também a degradação pode ser percebida em diferentes graus. 0
grau de perturbação pode ser tal que
um ambiente se recupere espontanea­ Tipo de sistema Funções
mente; mas, a partir de certo nível de
Sistem as de suporte
degradação, a recuperação espontâ­ à vida e regulagem
O
Sistem as
o n

nea pode ser impossível ou somente se "Oo o


CO
n a tu rais dos ciclos naturais
CT3
dar a prazo muito longo, desde que a cn
Í£) < ^u
QJ

fonte de perturbação seja retirada ou í/3 O


=3 Produção de recursos
reduzida. Na maioria das vezes, uma 03
Sistem as naturais em estado
ação corretiva é necessária. A Fig. 1.3 m odificados selvagem
mostra de maneira esquemática o
<
> U
conceito de degradação ambiental e '03

os objetivos das ações de recuperação < U c: A g ricultu ra, pecuária,


5 Agrossistemas silvicultura e a q u icu ltu ra
QJ
4 -»
0 0

ambiental. cE E o 3
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Se o ambiente pode ser degradado de Cl on CO Q_


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03 T D Produção industrial CO

diversas maneiras, a expressão área E CO u rb a n o - cQJ ' cj

£ QJ
industriais e de serviços
4 -»
degradada sintetiza os resultados da 175 a
00 CD
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O
degradação do solo, da vegetação e
£
cr muitas vezes das águas. Em que pese
í a relatividade do conceito de degra­
cr dação ambiental, a Fig. 1.4 mostra QJ
>
G
Recuperação c:
•CO

um a área inegavelmente degradada. Sistem as am biental QJ


4—'

Situada em Sudbury, província de On- degradados 3 C O

CO.

tário, Canadá, uma vasta área (cerca


de 10.000 ha) no entorno das usinas Fig. 1.3 Conceitos de degradação e recuperação am biental e sua relação com a
de metalurgia de níquel e cobre foi sustentabilidade (m odificado de UICN/PNUMA/IA/WF, 1991)
sçso de im pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

degradada pelas emissões de S 02, pro­


venientes dos fornos de fundição por
rejeitos das minas e pela poluição das
águas, desde que as primeiras fundições
começaram a funcionar em 1888, libe­
rando o dióxido de enxofre praticamente
ao nível do solo, matando a vegetação
e acidificando o solo e as águas (Win-
terhalder, 1995).

A capacidade de um sistema natural se


recuperar de um a perturbação imposta
v. por um agente externo (ação hum ana
' ou processo natural) é denominada
/ resiliência. Esse conceito surgiu na Eco­
Fig. 1.4 Area degradada em Sudbury, Canadá. A chuva ácida resultante das
emissões de S02 degradou a vegetação, com conseqüente perda de solo e logia, no início dos anos 1970, a partir
degradação das águas. A área era originalm ente coberta p o r florestas de co­ de analogias com conceitos da física,
níferas, mas fo i sujeita a exploração florestal desde o fin a l do século XIX. Ao como resistência e elasticidade. Westman
fundo, uma cham iné de 381 m de altura tem o objetivo de d ilu ir e dispersar 1 (1978, p. 705) reviu várias definições e
os poluentes atm osféricos conceituou resiliência como “o grau,
_ - maneira e ritmo de restauração da estru-
x tura e função iniciais de um ecossistema após um a perturbação”. Já Holling (1973,
p. 17) dá ao conceito de resiliência um entendimento distinto: “a capacidade de um
sistema de absorver mudanças (...) e ainda assim persistir”. Para esse autor, resiliência
é diferente de estabilidade, entendida como “a capacidade de um sistema retornar a
um estado de equilíbrio depois de um a perturbação tem porária”.

1 . 5 Im p a c to a m b ie n t a l
A locução “impacto ambiental” é encontrada com frequência na imprensa e no dia a
dia. No sentido comum, ela é, na maioria das vezes, associada a algum dano àjnatu-
reza, como a mortandade da fauna silvestre após o vazamento de petróleo no mar ou
em um rio, quando as imagens de aves totalmente negras devido à camada de óleo
que as recobre chocam (ou “impactam”) a opinião pública. Nesse caso, trata-se, indu­
bitavelmente, de um impacto ambiental derivado de um a situação indesejada, que é o
vazamento de um a matéria-prima.

Embora essa noção esteja incluída na noção de impacto ambiental, ela dá conta de
apenas um a parte do conceito. Na literatura técnica, há várias definições de impacto
ambiental, quase todas elas largamente concordantes quanto a seus elementos bási­
cos, embora formuladas de diferentes maneiras. Alguns exemplos são:

® Qualquer alteração no meio ambiente em um ou mais de seus componentes -


provocada por um a ação hum an a (Moreira, 1992, p. 113.).
• 0 efeito sobre o ecossistema de uma ação induzida pelo homem (Westman,
1985, p. 5.).
• A mudança em um parâmetro ambiental, num determinado período e numa
determinada área, que resulta de um a dada atividade, comparada com a situação
que ocorreria se essa atividade não tivesse sido iniciada (Wathern, 1988a, p. 7.).

CAPÍTUiLO
C o n c e ito s e D ehnüc OE5 29

A definição adotada por Wathern, na linha do que havia sido proposto por M unn
(1975, p. 22) tem a interessante característica de introduzir a dimensão dinâmica dos
processos do meio ambiente como base de entendimento das alterações ambientais
denominadas impactos (Fig. 1.5). Um exemplo de aplicação desse conceito pode ser
dado com a seguinte situação: suponha um a determinada área ocupada por um a
formação vegetal, que já foi, no passado, alterada por ação do homem, com o corte
seletivo de espécies arbóreas. 0 estado atual da vegetação dessa área pode ser descrito
com a ajuda de diferentes indicadores, como a biomassa por hectare, a densida­
de de indivíduos arbóreos de diâmetro acima de um determinado valor ou algum
índice de diversidade de espécies. Se a vegetação foi degradada por ação antrópica
no passado, mas não sofre hoje pressões desse tipo, provavelmente estará em pro­
cesso de regeneração natural, ou seja, tenderá, dentro de um certo período (talvez da
ordem de dezenas de anos), a voltar a uma si­
tuação próxima à original ou à de clímax. A
descrição da situação atual da área por meio
do uso de algum indicador pode sugerir que
ela tenha pouca importância ecológica -
por abrigar poucos indivíduos arbóreos de
grande porte, por exemplo. Mas com o passar
do tempo, a área deve estar em melhores con­
dições do que as atuais, abrigando árvores
maiores e de maior diversidade. De acordo com
o conceito de M unn e Wathern, se um empreen­ Fig. 1.5 Representação do conceito de im pacto am biental
dimento vier a derrubar a vegetação atual, seu
impacto deveria ser avaliado não comparando
a possível situação futura (área sem vegetação) com a atual, mas comparando duas
situações futuras hipotéticas: aquela sem a presença do empreendimento proposto
com a situação decorrente de sua implantação.
s
1A s normas da
Na prática da avaliação de impacto ambiental, nem sempre é possível empregar esse Organização
conceito, devido à dificuldade de se prever a evolução da qualidadejpnbiental em uma Internacional de
Normalização -
dada área. Nesses casos, que são muito freqüentes, o conceito operacional de impacto ISO (International
ambiental acaba sendo a, diferença entre a provável situação futura de um indicador Organization fo r
ambiental (com o projeto proposto) e sua situação presente. Imagine o problema de ava­ Standardization)
liar o impacto sobre a qualidade do ar de uma nova fonte de emissão de poluentes: o são traduzidas
e publicadas
cenário de referência para comparação normalmente seria o atual, e não um hipotético pela Associação
cenário futuro, no qual novas fontes contribuiriam para deteriorar a qualidade do ar, Brasileira de
uma vez que essas hipotéticas novas fontes não estão em análise hoje, e, caso venham Normas Técnicas-
ABNT, entidade
a ser consideradas no futuro, será necessário avaliar seu impacto, levando em conta a
privada brasileira
situação do momento futuro. filiada à ISO. As
normas A B N T
Al Uma outra definição de impacto ambiental é dada pela normaVNBR ISO 14.001:i 2004
.
são recojihecidas
pelo governo,
(versão atualizada da primeira norma ISO 14.001, de 1995. Aqui é reproduzida a por intermédio
tradução oficial brasileira da norma internacional.)1: “qualquer modificação do meio do Inmetro -
ambiente, adversa ou benéfica, que resulte, no todo ou em parte, das atividades, pro- Instituto Brasileiro
dutos ou serviços de uma organização” (item 3.4 da norma). E interessante conhecer de Metrologia,
Normalização
o conceito de impacto ambiental adotado por essa norma porque muitas empresas e e Qualidade
outras organizações têm adotado sistemas de gestão ambiental nela baseados. Sob Industrial.
5 çsc de .^oacto A m biental: conceitos e métodos

tal ponto de vista, impacto ambiental é um a conseqüência de “atividades, produtos


ou serviços” de uma organização; ou seja, um processo industrial (atividade), um
agrotóxico (produto) ou o transporte de um a mercadoria (serviço ou atividade) são
causas de modificações ambientais, ou impactos. Segundo essa definição, impacto é
qualquer modificação ambiental, independentemente de sua importância, entendi­
mento coerente com o de muitas outras definições de impacto ambiental.

Também as leis de diversos países procuraram definir o que entendem por impacto
ambiental. Na legislação portuguesa,

conjunto das alterações favoráveis e desfavoráveis produzidas em parâmetros


ambientais e sociais, num determinado período de tempo e num a determi­
nada área (situação de referência), resultantes da realização de um projeto,
comparadas com a situação que ocorreria, nesse período de tempo e nessa área,
se esse projeto não viesse a ter lugar.

Na legislação finlandesa,

os efeitos diretos e indiretos dentro e fora d» território finlandês de um projeto


ou operações sobre (a) saúde hum ana, condições de vida e amenity, (b) solo,
água, ar, clima, organismos, interação entre eles, e diversidade biológica, (c) a
e stru tu ra da comunidade, edifícios, paisagem, paisagem u rb an a e o patrim ônio
cultural, e (d) utilização de recursos naturais.

Na legislação de Hong Kong,

(a) uma mudança on-site ou off-site que o projeto possa causar no ambiente;
(b) um efeito da mudança sobre (i) o bem-estar das pessoas, flora, fauna e ecossis­
temas; (ii) patrimônio físico e cultural; (iii) uma estrutura, sítio ou outra coisa que
seja de importância histórica ou arqueológica; (c) um efeito on-site ou off-site de
quaisquer das coisas referidas no parágrafo (b) das atividades desenvolvidas para
0 projeto; (d) uma mudança do projeto que o ambiente possa causar, se a mudança
ou efeito ocorrer dentro ou fora do recinto do projeto.

No Brasil, a definição legal é aquela da Resolução Conama n° 1/86, art Io:

Qualquer alteração das propriedades físicas, químicas ou biológicas do meio


ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das
atividades hum anas, que direta ou indiretamente afetem:
1 - a saúde, a segurança e o bem -estar da população;
II - as atividades sociais e econômicas;
III - as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente;
IV - a qualidade dos recursos ambientais.

Salta aos olhos, no caso brasileiro, a impropriedade dessa definição, que felizmente
não é levada ao pé da letra na prática da avaliação de impacto ambiental nem é
tomada em seu sentido restrito na interpretação dos tribunais. Trata-se, na verdade,
de um a definição de poluição, como se observa pela menção a “qualquer forma de
matéria ou energia” como fator responsável pela “alteração das propriedades físi­

CAPÍTU LO
C o n c e ito s e D er

cas, químicas ou biológicas” do ambiente. Paradoxalm ente, a definição de poluição


dada pela Lei da Política Nacional do Meio Ambiente reflete melhor o conceito de
impacto ambiental, embora somente no que se refere a impacto negativo. Como se
sabe, impacto ambiental tam bém pode ser positivo.
t
E oportuno agora apontar algumas características do conceito de impacto ambiental
quando comparado ao de poluição:
# Impacto ambiental é um conceito mais amplo e substancialmente distinto de
poluição.
# Enquanto poluição tem somente uma conotação negativa, impacto ambiental
pode ser benéfico ou adverso (positivo ou negativo).
# Poluição refere-se a matéria ou energia, ou seja, grandezas físicas que podem
ser medidas e para as quais podem-se estabelecer padrões (níveis admissíveis de
emissão ou de concentração ou intensidade).
# Várias ações humanas causam significativo impacto ambiental sem que estejam
fundamentalmente associadas à emissão de poluentes (por exemplo, a constru­
ção de barragens ou a instalação de um parque de geradores eólicos).
# A poluição é uma das causas de impacto ambiental, mas os impactos podem ser
ocasionados por outras ações além do ato de poluir.
# Toda poluição (ou seja, emissão de matéria ou energia além da capacidade as-
similativa do meio) causa impacto ambiental, mas nem todo impacto ambiental
tem a poluição como causa.

A possibilidade de ocorrerem impactos ambientais positivos é um a noção que deve ser


bem assimilada. Um exemplo corriqueiro de impacto positivo, encontrado em muitos
estudos de impacto ambiental, é descrito como “criação de, empregos”. Trata-se, como
é evidente, de um impacto social e econômico, campo em que é relativamente fácil
compreender que possa haver impactos benéficos. Mas também há impactos positivos
sobre componentes físicos e bióticos do meio. Um projeto que envolva a coleta e o
tratamento de esgotos resultará em melhoria da qualidade das águas, em recuperação
do hábitat aquático e em efeitos benéficos sobre a saúde pública. Uma indústria que
substitua um a caldeira a óleo pesado por uma caldeira a gás emitirá menos poluentes,
como material particulado e óxidos de enxofre, ao mesmo tempo em que, caso venha
a ser abastecida por um duto de gás, serão eliminadas as emissões dos caminhões de
transporte de óleo e os incômodos causados pelo tráfego pesado.

Se impacto ambiental é uma alteração do meio ambiente provocada por ação humana,
então é claro que tal alteração pode ser benéfica ou adversa. Mais que isso, um projeto
típico trará diversas alterações, algumas negativas, outras positivas, e isso deverá ser
considerado quando se prepara um estudo de impacto ambiental, embora seja devido
às conseqüências negativas que a lei exige a elaboração desse estudo.

Pode-se, então, postular que o impacto ambiental pode ser causado por um a ação
hum ana que implique:
1. Supressão de certos elementos do ambiente, a exemplo de:
# supressão de componentes do ecossistema, como a vegetação;
# destruição completa de hábitats (por exemplo, aterramento de um mangue);
sção ae . t pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

# destruição de componentes físicos da paisagem (por exemplo, escavações);


# supressão de elementos significativos do ambiente construído;
# supressão de referências físicas à memória (por exemplo, locais sagrados, como
cemitérios, pontos de encontro de membros de um a comunidade);
# supressão de elementos ou componentes valorizados do ambiente (por exemplo,
cavernas, paisagens notáveis).

2. Inserção de certos elementos no ambiente, a exemplo de:


# introdução de uma espécie exótica;
# introdução de componentes construídos (por exemplo, barragens, rodovias,
edifícios, áreas urbanizadas).

3. Sobrecarga (introdução de fa to r e s de estresse a lém da ca p a cid a d e de su p o r te do


m eio, gerando desequilíbrio), a exemplo de:
# qualquer poluente;
# introdução de um a espécie exótica (por exemplo, coelhos na Austrália);
# redução do hábitat ou da disponibilidade de recursos para um a dada espécie
(por exemplo, impacto dos elefantes na África contemporânea);
# aumento da demanda por bens e serviços públicos (por exemplo, educação,
saúde).

À luz de todas essas considerações, o conceito de impacto ambiental adotado neste


livro será “alteração da qualidade ambiental que resulta da modificação de processos
naturais ou sociais provocada por ação hum ana” (Sánchez, 1998a). Tal definição, ao
trabalhar sob a óptica dos p ro cesso s ambientais, tenta refletir o caráter d in â m ico do
ambiente. Pode-se ponderar que as questões ligadas à supressão ou inserção de ele­
mentos em um ambiente não estejam suficientemente explícitas nessa definição, mas
a vantagem da concisão é preponderante.

Impacto ambiental é, claramente, o resultado de uma ação humana, que é a sua causa.
Não se deve, portanto, confundir a causa com a conseqüência. Uma rodovia não é
um impacto ambiental; um a rodovia causa impactos ambientais. Da mesma forma,
um reflorestamento com espécies nativas não é um impacto ambiental benéfico, mas
um a ação (humana) que tem o propósito de atingir certos objetivos ambientais, como
a proteção do solo e dos recursos hídricos ou a recriação do hábitat da vida selvagem.

Há que se tomar cuidado com a noção de impacto ambiental como resultado de


um a determinada ação ou atividade, não o confundindo com ela. Uma leitura
medianamente atenta de muitos estudos de impacto ambiental revelará que esse erro
básico é freqüente. Evidentemente, tal erro conceituai compromete a qualidade do
estudo ambiental.

1.6 A s p e c t o a m b ie n t a l
A série ISO 14.000 é um a fam ília de norm as sobre gestãqjambiental. Começaram a ser
desenvolvidas em 1993, tendo por base um a norma britânica de 1992 e regulam en­
tos europeus sobre auditoria e gestão ambiental. A família ISO 14.000 compreende
normas sobre sistemas de gestão, desempenho ambiental, avaliação do ciclo de vida
de produtos (equivalente à avaliação de impactos ambientais de produtos), rotulagem

CAPÍTU LO
C o n c e it o s e D efiniç

ambiental (selo verde) e integração de aspectos ambientais no desenho de produtos


(iecodesign).

A norma ISO 14.001 introduziu o termo aspecto ambiental. Tal termo era desconhecido
dos profissionais envolvidos em avaliação de impacto ambiental, ou era utilizado
com outra conotação. No entanto, devido às normas da série ISO 14.000, passou
lentamente a ser incorporado ao vocabulário de profissionais da indústria e de consul­
tores, e chegou também aos órgãos governamentais. A norma NBR ISO 14.001: 2004
assim define aspecto ambiental: “elemento das atividades, produtos ou serviços de
um a organização que pode interagir com o meio ambiente” (item 3.3).

Tal definição requer explicação e exemplificação. Situações tipicamente descritas


como aspectos ambientais são a emissão de poluentes e a geração de resíduos. Produzir
efluentes líquidos, poluentes atmosféricos, resíduos sólidos, ruídos ou vibrações não
é o objetivo das atividades hum anas, mas esses aspectos estão indissociavelmente
ligados aos processos produtivos. São, assim, elementos, ou partes dessas atividades
ou produtos ou serviços. Aqueles elementos que podem interagir com o ambiente são
chamados de aspectos ambientais. Outros aspectos ambientais típicos são aqueles
ligados ao consumo de recursos naturais. Ao consumir água (recurso renovável),
reduz-se sua disponibilidade para outros usos ou para suas funções ecológicas. Ao
consumir combustíveis fósseis, seu estoque (finito) é reduzido. 0 consumo de água
ou de combustíveis, um a parte indissociável de um sem-número de atividades, são
aspectos ambientais.

A palavra “aspecto” parece pouco adequada, pois é de uso corrente, mas consta de
um a norma internacional, e por isso é inevitável empregá-la. Uma característica posi­
tiva da diferenciação entre aspecto e impacto ambiental adotada pela norma é deixar
claro que a emissão de um poluente não é um impacto ambiental. Impacto é alteração
/
da qualidade ambiental que resulta dessa emissão. E a manifestação no receptor, seja
este um componente do meio físico, biótico ou antrópico. A Fig. 1.6 mostra esquema-
ticamente a relação entre as ações hum anas, os aspectos e os impactos ambientais.
As ações são as causas, os impactos são as conseqüências, enquanto os aspectos am ­
bientais são os mecanismos ou os processos pelos quais ocorrem as conseqüências.

Aspecto ambiental pode ser entendido como o mecanismo através do qual um a acão
hum ana causa um impa,cto--Ambierttal. Exemplos desta cadeia de relações são dados
no Quadro 1.1.

Evidentemente, um a mesma ação pode levar a vários aspectos ambientais e, por con­
seguinte, causar diversos impactos ambientaisTDa mesma forma, um determinado
impacto ambiental pode ter várias causas.
Munn (1975, p. 21), um dos autores pio­ Ações humanas:
neiros no campo da avaliação de impacto Atividades Aspectos ,A?1 Impactos
ambiental, por sua vez, conceitua efeito Produtos Am bientais Am bientais
ambiental como “um processo (como a Serviços
erosão do solo, a dispersão de poluentes, o
deslocamento de pessoas) que decorre de
um a ação h um ana”. Diferencia-se, assim, Fig. 1.6 Relação entre ações humanas, aspectos e im pactos a m b ‘er
ação de Impacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

Q u a d r o 1.1 E xem plos de rela çõ es a tiv id a d e -a s p e c to -im p a e to a m b ie n ta l


Lavagem de roupa — ► c o n s u m o de agua ------------------------------ ► redução da d isp onib ilid ade hídrica
Lavagem de louça --------------------------------— ► la n ç a m e n to de á g u a ^ eu trofização
----------------------------------- ------------------------------

com detergentes
<v ]

C o z im e n to de pão — ► emissão de gases -------------------------------- ► dete rio ração da qualidade do ar


em fo r n o a lenha e partículas
Pintura de uma peça — — ► emissão de c o m p o s to s — ---------------------------------- ► deterioração da qualidade do ar
metálica o rgâ nicos voláteis
. , • -V | 1 /

A rm a z e n a m e n to de — ► v a z a m e n to --------------------------------- ► c o n ta m m a ç a o do solo e agua


com bustível ' " -V-'. . / . .- V . v i v . . ; . . 1. ..... -C .
subterrânea
Transporte de carga ---------------------------- — ► emissão de r u í d o s ----------------------------------------------------- --------------------------------- ► in c ô m o d o aos vizinhos
por cam inhões
Transporte de carga — ► a u m e n to do t r á f e g o -------------------------------------------------------------------------► m a io r fre que ncia de c o n g e s tio n a ­
por cam inhões
.............. . . .. ' ... • . H H H H S S R H H
m e n to s
H H N B j n l H s H l l H H H H f l H H H i H I H M M H H H H l i a i H M n n l l M l i i n H H K H

de impacto ambiental, entendido como um a alteração na qualidade do meio ambiente.


Segundo Munn, ações hum anas causam efeitos ambientais, que, por sua vez, produ­
zem impactos ambientais.
0 conceito de efeito ambiental é usado em alguns estudos de impacto ambiental e
em alguns livros-texto sobre avaliação de impacto ambiental. Tem a vantagem de
servir de “ponte” entre as causas (ações humanas) e suas conseqüências (impactos)
e reservar o termo impacto ambiental para as alterações sofridas pelo receptor, seja
ele elemento do ambiente físico, biótico ou antrópico. A fim de torná-la coerente
com as demais definições adotadas neste texto, a definição de efeito ambiental será
reformulada para alteração de um processo natural ou social decorrente de uma ação i
humana. Dessa forma, percebe-se que há pontos em comum entre a noção de aspecto
ambiental e a noção de efeito ambiental, ambos representando interfaces ou meca­
nismos entre um a causa (ação humana) e sua conseqüência (impacto ambiental).

1.7 P r o c e s s o s a m b i e n t a i s
0 ambiente é dinâmico. Fluxos de energia e matéria, teias de relações intra e interes-
pecíficas são algumas das facetas dos processos naturais que ocorrem em qualquer
ecossistema, natural, alterado ou degradado. Uma das maneiras de se estudar os
impactos ambientais é entender como as ações hum anas afetam os processos n atu ­
rais. Um exemplo pode clarificar esse raciocínio: os processos erosivos.

A erosão é um fenômeno (processo) que afeta toda a superfície da Terra. Sua intensi­
dade varia dependendo de fatores, como clima, tipo de solo, declividade e cobertura
vegetal. Em climas úmidos, há a formação de solos espessos e cobertura vegetal que
tende a cobrir toda a superfície; já em climas áridos, a vegetação é mais rala e os
solos mais rasos; nesses casos, a erosão eólica é intensa. Em climas tropicais, ocorrem
chuvas intensas (ou seja, grande quantidade de água em curto período de tempo), de
grande potencial erosivo. Por sua vez, escarpas íngremes estão mais sujeitas à ação
erosiva da chuva do que vertentes suaves. Assim, a erosão natural varia em inten­
sidade e pode ser medida em termos de massa de solo perdida por unidade de área
e por intervalo de tempo (t/ha/ano). A ação hum ana interfere no processo erosivo,

CAPÍTU LO
C o n c e ito s e D e r n i 35

em geral tornando-o mais intenso. A substituição de um a floresta por um a cultura,


assim como a abertura de um a estrada ou de um a mina, são ações que expõem 0 solo
desprovido de sua proteção vegetal natural à ação da chuva e do vento, aumentando
as taxas de erosão.

0 Quadro 1.2 mostra exemplos de taxas de erosão lam inar no Brasil, em diferentes
locais submetidos a diferentes formas de uso do solo. A perda de solos é medida por
experimentos realizados no campo, e a busca de correlações entre os tipos de uso do
solo e as taxas erosivas tem sido empreendida há décadas. Observa-se claramente
que a floresta atua como principal protetora do solo; quando substituída por pasta­
gem, as taxas de erosão são cerca de um a ordem de grandeza (dez vezes) maior; já
quando ocorre a substituição por culturas, 0 processo erosivo é cerca de três ordens
de grandeza (mil vezes) mais inten­
so - as taxas de erosão variam muito Q u a d r o 1.2 E s tim a tiv a s de ta xa s de erosão, se g u n d o d ife re n te s c a te g o ­
de cultura para cultura e depen­ ria s de uso do solo
dem também das práticas agrícolas T ipo de u s o , lo c a l P e r d a de s o l o C ontexto geo
usadas, como 0 plantio em curvas de
nível, por exemplo. A implantação de Floresta Am azônica 150 V ertente com declividade
loteamentos urbanos e a a E ê r tu r a de prim ária, Roraima de 2 0 %
minas elevam ainda mais as taxas de Latossolo v e rm e lh o -a m a re lo
erosão, um a vez que os solos ficam Pastagem de 1.128 V ertente com declividade
diretamente expostos à ação da água B ra c h ia ria em an tig a de 2 0 % (1)
de chuva e também dos ventos. Por­ área de floresta Latossolo v e rm e lh o -a m a re lo
tanto, não é correto afirm ar que a prim ária, Roraima
construção de um a estrada, a aber­ 330 "
Floresta A m azônica ( 1)
tura de um a m ina ou a derrubada prim ária, Rondônia
de um a floresta causam erosão, haja ■ : • .................. ■........................• .....................■ " .v ; " " • _ ..........

Pastagem, R ondônia 3.556 ( 1:.,.í:


)
vista que processos erosivos já atu a­ . . . ........................................................ ..................................................... ■. ..... •

Mata, Goiânia 32 V ertente com declividade


vam antes. 0 que essas ações fazem é
de 16% (2)
intensificar a erosão, acelerando um
Latossolo v e rm e lh o -a m a re lo
processo natural (Figs. 1.7 e 1.8).
Pastagem de capim 230 V ertente com declividade mmmi
n a pier, Goiânia de 14% (2)
0 corolário da erosão é 0 assorea­
Latossolo v e rm e lh o -a m a re lo
mento de corpos d’água. Parte dos
sedimentos transportados por ação C ultivo de arroz, 51.655 Vertente com declividade
das águas fica retido no fundo de Goiânia de 11% (2)
rios e lagos. Estudos feitos em um Latossolo v e rm e lh o -a m a re lo
: .................. . . . . . . . -------- . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ........................................ .. ■ ■ .......... . . . . . .

lago de várzea de um afluente do rio Áreas urbanas, 170.000 Solos de alteração de filitos,
Madeira, em Rondônia, mostraram Q uadrilátero xistos e itabiritos, bacias (3)
que, entre os anos de 1875 e 1961, a Ferrífero, M inas h id ro g rá fic a s com vertentes
taxa de sedimentação média era de Gerais íngrem es
i

0,12 g/cm2/ano, mas, a partir desse Areas de m ineração, 700.000 Solos de alteração de filitos,
período, com a construção da rodovia Q uadrilátero xistos e itabiritos, bacias (3)
BR-364, 0 desmatamento progressivo Ferrífero, M inas Gerais h idrográficas com vertentes
nessa bacia hidrográfica e a m inera­ íngremes
ção aluvionar de cassiterita, a taxa
de sedimentação aumentou exponen- (1) Barbosa e Fearnside (2000); (2) Casseti, (1995); (3) Coppedê Jr. e Boechat
(2002)
cialmente para atingir um valor dez
a çã o ae ..r.pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

vezes maior em 1985 (Forsberg et al.,


1989).

Esse exemplo ilustra que ações como


remoção de vegetação nativa também
afetam outros processos, além do
processo erosivo. A infiltração de água
no solo é mais um dos processos m o­
dificados pela retirada de vegetação.
Nesse caso, o processo é retardado, ou
seja, ao invés de se infiltrar e alimen­
tar os reservatórios subterrâneos, uma
proporção maior da água de chuva escoa
superficialmente, aumentando o volume
de água nos rios. Estudos realizados
na Am azônia pelos autores Barbosa e
Ip I-N à Fearnside (2000) m ostraram que o es­
tf ’V ‘

coamento superficial aumentou quase


três vezes em Roraima, onde a floresta
foi substituída por pastagem, e até 30
vezes em Rondônia, em situação similar.
Neste último caso, sob cobertura vegetal,
apenas 2,2% da chuva escoava super­
ficialmente, mas, em áreas de pasto, o
escoamento subiu para 49,8%. Além
de acelerar a erosão, o aumento do es­
coamento superficial acarreta maior
frequência e intensidade das inundações,
r *i< •. .>í2tSV«í4SÇ
outro processo do meio físico modificado
por ações humanas.
Figs. 1.7 e 1.8 Região de Nyanga, no Zimbábue, um dos m uitos locais do
planeta afetados pelo uso excessivo das capacidades de suporte do solo, no
Outros processos podem ser induzidos
caso por atividades de criação extensiva de gado em terras com unitárias,
ou deflagrados pela ação do homem.
tendo como resultado a degradação dos solos e a erosão intensa, exem pli­
Por exemplo, o bombeamento de água
ficada pela voçoroca subterrânea em áreas de rochas calcá­
rias onde ocorrem cavernas (conhecidas
como regiões cársticas) pode deflagrar um processo de abatimento da superfície do
terreno, formando depressões fechadas, conhecidas como dolinas.

Vários processos podem ser retardados pela ação humana. Em um a clareira aberta
em um a floresta tropical, o processo denominado sucessão ecológica tende a restabe­
lecer a vegetação nativa, primeiro pelo crescimento de espécies arbóreas adaptadas
à intensa luz solar e à tem peratura elevada - as pioneiras - e, em seguida, depois do
sombreamento da área, pelo crescimento de outras espécies adaptadas à sombra e a
temperaturas mais amenas características do solo dessas florestas. A dispersão de se­
mentes pelo vento e pelos animais auxilia a regeneração. Todavia, o manejo humano
dessa clareira pode retardar ou mesmo impedir a regeneração, como acontece em caso

CAPÍTU LO
C o n c e ito s e D ern 37

da semeadura de gramíneas forrageiras


para criação de gado.

Finalmente, processos naturais podem


ser alterados de forma complexa, como
no caso do lançamento de~Tésíduos do
beneficiamento de bauxita em um lago
situado às margens do rio Trombetas, em
Oriximiná, Pará (Figs. 1.9 e 1.10). Até a
implantação desse empreendimento, 0
lago Batata havia sofrido pouquíssima
alteração antrópica, 0 que 0 torna um
caso muito interessante de estudo. Os
rejeitos, constituídos por um a polpa de
argilas e água, cobriram os sedimentos
lacustres naturais, de onde nutrientes,
como nitratos, fosfatos e sulfatos, eram
liberados para a coluna d’água e incor­
porados ao fitoplâncton, e daí a toda a
cadeia alimentar, até retornarem ao
fundo do lago na forma de detritos. Os
rejeitos acumulados no fundo do lago
interromperam esse ciclo, afetando a
qualidade da água e todo 0 ecossistema
lacustre, com as seguintes conseqüências
(Esteves, Bozelli e Roland, 1990):
redução na densidade de fito e
zooplâncton e de peixes;
redução da densidade e alteração
da diversidade da comunidade
Figs. 1.9 e 1.10 Duas vistas do iago Batata, situado às margens do rio
bentônica; Trombetas, Pará. A prim eira m ostra o lago em sua condição natural, e a
redução da liberação de nutrientes segunda, recoberto p o r rejeitos de lavagem de bauxita
do sedimento para a coluna d’água;
# diminuição da concentração de
matéria orgânica no sedimento;
# alteração na ciclagem e na disponibilidade de nutrientes.

Fornasari Filho et al. (1992) apresentam uma lista de processos do meio físico que
usualmente são alterados por atividades h u manas, alguns dos quais são mostrados no
Quadro 1.3, com alguns processos ecológicos. Além de completar o quadro com deze­
nas de outros processos físicos e ecológicos, é possível acrescentar também processos
sociais, formando, dessa maneira, um a base para o entendimento de como as ativi­
dades hum anas afetam a dinâmica ambiental. Um processo social frequentemente
induzido por obras de engenharia e outros projetos públicos e privados é a atração
de pessoas em busca de oportunidades de trabalho, verdadeiros fluxos migratórios
postos em m archa pelo mero anúncio de um grande projeto.
ação de Impacto A m biental: conceitos e métodos

Q uadro 1.3 Exemplos de processos ambientais físicos e ecológicos A Fig. 1.11 mostra a relação entre pro­
F'zcessos geológicos de superfície cessos e impactos ambientais. A situação
Erosão ambiental atual pode ser exemplificada
M o v im e n ta ç ã o de massa (escorregam entos etc.)
por um a fazenda de criação de bovinos,
A fu n d a m e n to s cársticos M
onde um empreendedor pretende implan­
Processos hidrológicos
tar um loteamento; dentre os processos
Transporte de poluentes nas águas
Eutrofização de corpos d'água atuais, pode-se selecionar o processo
A c ú m u lo de poluen te s nos s edim e ntos erosivo, que, atuando sobre os pastos, im­
Inundações plica certa perda de solo. A implantação de
Deposição de s edim e ntos em rios e lagos
um loteamento induz um a intensificação
Processos hidrogeologicos dos processos erosivos, devido à abertura
D ifusão de poluentes na água subterrânea de vias e à construção de casas, com
Recarga de aqüíferos
T - AAv • T-AA...’ ... A CM,.: maior exposição do solo à ação das águas
Processos atmosféricos pluviais. Esses processos modificados (no
Transporte e d ifu s ã o de poluentes gasosos exemplo, intensificados) conduzem a um a
Propagação de ondas elásticas
nova situação ambiental, e o impacto
Processos ecológicos ambiental do loteamento, com relação
Biodegradação de m atéria orgânica em corpos d'água
ao processo erosivo, é representado pela
B ioa cu m u lação de m etais pesados
Sucessão ecológica situação futura com o loteamento em
Ciçlagem de n u trie n te s
■■ : s : , . . . . ..
relação à evolução (situação futura) sem
o loteamento. Nesse exemplo, para fins
de simular a situação futura sem o lotea­
Supressão de elementos do ambiente mento, pode-se levantar a hipótese que
Inserção de elementos no ambiente esta seria muito semelhante à situação
Sobrecarga
Situação futura do ambiente atual (pastagem), de modo que, nessa hi­
Ação proposta
pótese, o impacto pode ser determinado
comparando a provável situação futura
Impacto
ambiental com a situação atual.

Situação atual do ambiente


1.8 A v a l ia ç ã o de im p a c t o
Processos ambientais Processos modificados AMBIENTAL
I i l i
0 termo avaliação de impacto ambiental
(AIA) entrou na terminologia e na lite­
ratura ambiental a p artir da legislação
pioneira que criou esse instrum ento
de planejamento ambiental, National
Fig. 1.11 Processo e im pacto am biental Environmental Policy Act - NEPA, a lei
de política nacional do meio ambiente
dos Estados Unidos. Essa lei, aprovada
pelo Congresso em 1969, entrou em vigor em l^ d e janeiro de 1970 e acabou tran s-
formando-se emmodelo delegislações similares em todo o mundo. A lei exige a
preparação de um a “declaração detalhada” sobre o impacto ambiental de iniciativas
do governo federal americano.

Tal declaração [statement) eqüivale ao atual estudo de impacto ambiental necessário


em muitos países para a aprovação de novos projetos que possam causar impactos
ambientais significativos. 0 termo assessment passou a ser usado na literatura para

CAPÍTU LO
C o n c e ito s e D e = \ ; ç^ m 39

designar o processo de preparação dos estudos de impacto ambiental. Essa palavra


inglesa tem raiz latina, a mesma que deu origem a assentar, sentar, em português, e
é sinônimo de e v a lu a tio n , outra palavra de origem latina, o mesmo que avaliar. Daí a
tradução corrente em línguas latinas de e n v ir o n m e n ta l im p a c t a s s e s s m e n t como ava­
liação de impacto ambiental, eva lu a c ió n de im p a c to a m b ie n ta l, é v a lu a tio n d ’im p a c t
s u r V e n viro n n e m e n t, v a lu ta zio n e d 'im p a tto a m bien ta le.

0 significado e o objetivo da avaliação de impacto ambiental prestam-se a inúmeras


interpretações. Sem dúvida, seu sentido depende da perspectiva, do ponto de vista e
do propósito de avaliar impactos. As principais definições de avaliação de impacto
ambiental são encontradas em livros-texto sobre o assunto. Algumas delas são trans­
critas a seguir.
# Atividade que visa identificar, prever, interpretar e comunicar informações so­
bre as conseqüências de uma determinada ação sobre a saúde e o bem-estar
humanos (Munn, 1975, p. 23.).
# P rocedim ento para encorajar as pessoas encarregadas da tomada de decisões a
levar em conta os possíveis efeitos de investimentos em projetos de desenvolvi­
mento sobre a qualidade ambiental e a produtividade dos recursos naturais e um
in stru m e n to para a coleta e a organização dos dados que os planejadores necessi­
tam para fazer com que os projetos de desenvolvimento sejam mais sustentáveis
e ambientalmente menos agressivos (Horberry, 1984, p. 269).
# Instrumento de política ambiental, formado por um con ju nto de p ro ced im en to s,
capaz de assegurar, desde o início do processo, que se faça um exame sistemático
dos impactos ambientais de uma ação proposta (projeto, programa, plano ou
política) e de suas alternativas, e que os resultados sejam apresentados de forma
adequada ao público e aos responsáveis pela tomada de decisão, e por eles sejam
considerados (Moreira, 1992, p. 33).
# A apreciação oficial dos prováveis efeitos ambientais de uma política, programa
ou projeto; alternativa^ à proposta; e medidas a serem adotadas para proteger o
ambiente (Gilpin, 1995, p. 4-5).
# Um processo sistemático que examina antecipadamente as conseqüências
ambientais de ações humanas (Glasson, Therivel e Chadwick, 1999, p. 4).
# 0 processo de identificar, prever, avaliar e mitigar os efeitos relevantes de ordem
biofísica, social ou outros de projetos ou atividades antes que decisões importan­
tes sejam tomadas (LAIA, 1999).

Uma definição sintética é adotada pela International Association for Impact Assess-
ment - IAIA: “avaliação de impacto, simplesmente definida, é o processo de identificar
^ Ri

as conseqüências futuras de um a ação presente ou proposta”.

Embora com diferentes formulações,.esses conceitos diferem pouco em sua essência.


A avaliação de impacto ambiental é apresentada, seja como instrumíento, seja, como
^
procedimento (ou ambos), visando antevenas possíveis conseqüências de um a deci-
/

são. E claro que os livros-texto tom am como pressuposto as legislações que, a p artir
da pioneira lei am ericana d e J 9 6 9 . foram adotadas em grande número de países e
que, como a brasileira, vieram a exigir a aplicação desse instrum ento em determ i­
nadas situações. A tais exigências vieram somar-se os procedimentos adotados por
instituições multi ou bilaterais de ajuda ao desenvolvimento e, mais recentemente,
Ig c ação de i r p a c t o A m b ie n ta l: conceitos e métodos

por políticas v o lu n tárias adotadas por algum as empresas. Em todos esses contextos,
a avaliação de impacto am biental g u ard a determ inadas características comuns:
caráter prévio e v ínculo com o processo decisório são atributos essenciais da AIA,
aos quais se j u n ta a necessidade de envolvim ento público nesse processo.

0 caráter prévio e preventivo da AIA predom ina na literatura, mas tam bém se
pode encontrar referências à avaliação de impactos de ações ou eventos passados,
por exemplo, depois de um acidente envolvendo a liberação de algum a substância
química. Embora a noção de impacto ambiental envolvida em tais avaliações seja
fundam entalm ente a mesma daquela da AIA preventiva, o objetivo do estudo não é
o mesmo, nem o foco das investigações. Nesse caso, a preocupação é com os d a n o s
causados, ou seja, os impactos negativos. É claro que tam bém os procedimentos de
investigação são diferentes, pois não se trata de antecipar um a situação futura, mas
de ten tar medir o dano ambiental e, ocasionalmente, de valorar economicamente
as perdas. A Fig. 1.12 representa graficamente essas duas acepções da avaliação de
impacto ambiental.

Parav maior clareza, neste livro, AIA


Avaliação de dano am b ien tal Avaliação de im pacto am biental
será sempre referida como esse exer­
cício prospectivo, antecipatório,
tem po prévio e preventivo. 0 outro signifi­
Passado Presente Futuro
cado será entendido como a atividade
de a va lia çã o do dano a m b ie n ta l. Uma
Fig. 1.12 Duas acepções distintas da avaliação de im pacto am biental preocupa-se com o futuro, outra, com
o passado e o presente. Ambas têm um
procedimento comum, que é a comparação entre duas situações: na avaliação do
dano ambiental, busca-se fazer a comparação entre a situação atual do ambiente
e aquela que se supõe ter existido em algum momento do passado. Na avaliação
de impacto ambiental, parte-se da descrição dessa situação atual do ambiente para
fazer um a projeção de sua situação fu tu ra com e sem o projeto em análise. E claro
que, em ambos os casos, é necessário o conhecimento da situação atual do ambiente.
Denomina-se d ia g n ó stic o a m b ie n ta l a descrição das condições ambientais existentes
em determ inada área no momento presente. A abrangência e a profundidade do diag­
nóstico ambiental dependerá dos objetivos e do escopo dos estudos.

Nessa ordem de preocupações com o passado, outro termo bastante utilizado é p a s s iv o


a m b ie n ta l, aqui entendido como “o valor monetário necessário para reparar os danos
am bientais” (Sánchez, 2001, p. 18), mas tam bém usado para designar a própria m an i­
festação (física) do dano ambiental “acúmulo de danos ambientais que devem ser
reparados a fim de que seja m antida a qualidade ambiental de um determinado local”
(Sánchez, 2001, p. 18).

1.9 R e c u p e r a ç ã o a m b i e n t a l
0 ambiente afetado pela ação h u m an a pode, em certa medida, ser recuperado mediante
ações voltadas para essa finalidade. A recuperação de ambientes ou de ecossistemas
degradados envolve medidas de melhoria do meio físico, por exemplo, a condição do
solo, a fim de que se possa restabelecer a vegetação ou a qualidade da água, a fim de

CAPÍTU LO
C o n c e it o s e D er niç

que as com unidades bióticas possam ser restabelecidas - e medidas de manejo dos
elementos bióticos do ecossistema - como o plantio de mudas de espécies arbóreas ou
a reintrodução da fauna.

Quando se trata de ambientes terrestres, tem -se usado o termo recuperação de áreas
degradadas. A Fig. 1.13 m ostra diferentes entendim entos ou variações do conceito de
recuperação de áreas degradadas. No eixo vertical, representa-se de m aneira q u ali­
tativa o grau de perturbação do meio, enquanto o eixo horizontal m ostra um a escala
temporal. A p a rtir de u m a dada condição inicial (não necessariam ente a condição
“orig inal” de um ecossistema, mas a situação inicial para fins de estudo da d egrada­
ção), a área analisada passa a um estado de degradação, cuja recuperação requer, na
maioria das vezes, um a intervenção planejada - a recuperação de áreas degradadas.
Vale recordar o conceito de recuperação am biental expresso na Fig. 1.3, que fu n d a ­
m entalm ente significa dar a um ambiente degradado condições de uso produtivo,
restabelecendo um conjunto de funções ecológicas e econômicas.

Tempo
RecupexaçãjQ_anibienta 1 é um termo
geral que designa a aplicação de téc­ Recuperação que
nicas de manejo visando tornar um supera a condição
inicial
ambiente degradado apto para um novo Condição
inicial Restauração
uso produtivo, desde que sustentável.
Ação corretiva Reabilitação
Dentre as variantes da recuperação
Remediação
ambiental, a restauração é entendida
como o retorno de uma área degra­ Condição Atuação natural
dada às condições existentes antes atual
Recuperação
da degradação, com o mesmo senti­ Abandono espontânea
do que se fala da restauração de bens
Continuidade
culturais, como edifícios históricos. da degradação
Em certas situações, as açõeS de re­
cuperação podem levar um ambiente
Grau de perturbação
degradado a um a condição ambiental
melhor do que a situação inicial (mas
Fig. 1.13 D iagram a esquem ático dos objetivos de recuperação de áreas
somente, é claro, quando a condição
degradadas
inicial for a de um ambiente alterado).
Um exemplo é um a área de pastagem
com erosão intensa que passa a ser usada para explotação mineral e em seguida é re­
povoada com vegetação nativa para fins de conservação ambiental.

A reabilitação é a m odalidade mais freqüente de recuperação. No caso das atividades


de mineração, esta é a modalidade de recuperação am biental pretendida pelq regula-
mentador, ao estabelecer que o sítio degradado deverá ter “um a forma de utilização”.
As ações de recuperação ambiental visam habilitar a área para que esse novo uso
possa ter lugar. A nova forma de uso deverá ser adaptada ao ambiente reabilitado, que
pode ter características bastante diferentes daquele que precedeu a ação de degra­
dação, por exemplo, um ambiente aquático em lugar de um ambiente terrestre, prática
relativamente comum em mineração. Essa nova forma de uso é cham ada de “redefi­
nição” ou “redestinação” por Rodrigues e Gandolfi (2001, p. 238), através da criação
ie um “ecossistema alternativo” (Cairns Jr., 1986, p. 473).
ação ae T;pacto A m biental: conceitos e métodos

0 Decreto Federal n° 97.632, de 10 de abril de 1989, que estabelece a necessidade


de preparação de um Plano de Recuperação de Areas Degradadas para todas as
atividades de extração mineral, define que: “A recuperação deverá ter por objetivo
o retorno do sítio degradado a um a forma de utilização, de acordo com um plano
pré-estabelecido para o uso do solo, visando à obtenção de um a estabilidade do
meio ambiente” (art. 3o).

A remediação é o termo utilizado para designar a recuperação ambiental de um


tipo particular de área degradada, que são as áreas contaminadas. Remediação é
definida como “aplicação de técnica ou conjunto de técnicas em um a área conta­
minada, visando à remoção ou contenção dos contaminantes presentes, de modo a
2 Bens a proteger” assegurar um a utilização para a área, com limites aceitáveis de riscos aos bens a
é a terminologia proteger”2 (Cetesb, 2001). Uma modalidade de remediação é conhecida como atenua­
adotada no
ção natural, na qual não se intervém diretamente na área contaminada, mas deixa-se
Manual de Áreas
Contaminadas
que atuem processos naturais - como a biodegradação de moléculas orgânicas. A
da Cetesb. atenuação natural é um a forma de regeneração que somente tem sido autorizada em
Correspondem aos áreas contaminadas se acompanhada por um programa de monitoramento.
recursos ambientais
definidos na Lei da A inexistência de ações de recuperação ambiental configura o abandono da área.
Política Nacional do
Dependendo do grau de perturbação e da resiliência do ambiente afetado, pode
Meio Ambiente, à
saúde e ao bem- ocorrer um processo de regeneração, que é um a recuperação espontânea. 0 abandono
estar públicos. de um a área contaminada também pode, em certos casos, por meio de processos de
atenuação natural da poluição, levar à sua recuperação.

Quando se trata de ambientes urbanos degradados, têm sido empregados termos


como requalificação e revitalização. Os ambientes urbanos podem ser degradados em
razão de processos socioeconômicos, como a redução dos investimentos públicos ou
privados em certas zonas, ou em decorrência da degradação do meio físico, como a
poluição dos rios ou a contaminação dos solos.

1.10 S ín t e s e
Definir com clareza o significado dos termos que emprega é um a obrigação do profis­
sional ambiental. Esse profissional está sempre em contato com leigos e técnicos das
mais diversas áreas e especialidades. A comunicação é um a necessidade indissociável
da atuação profissional na área ambiental. Por outro lado, estabelecer uma terminolo­
gia comum é obrigatório para uma comunicação eficaz entre autor e leitor. Ao longo
deste texto, serão adotados os seguintes conceitos:
i # Poluição: introdução no meio ambiente de qualquer forma de matéria_ou energia
/ ^ \ * \
que possa afetar negativamente o homem ou outros organismos. x
\ # Impacto ambiental: alteração da qualidade ambiental que resulta da modificação
de processos naturais ou sociais provocada por ação humana.
# Aspecto ambiental: elemento das atividades, produtos ou serviços de uma orga-
nização que pode interagir como meio ambiente (segundo NBR ISO 14.001:
Í 2004). ^

# Efeito ambiental: alteração de um processo natural ou social decorrente de uma


ação humana.

CAPÍTU
C o n c e ito s e D eh

# Degradação ambiental: qualquer alteração adversa dos processos, funções ou


componentes ambientais, ou alteração adversa da qualidade ambiental.
# Recuperação ambiental: aplicação de técnicas^ de m anejo visando tornar um
ambiente degradado apto para um novo uso produtivo, desde que sustentável.
# Diagnóstico ambiental: descrição das condições ambientais existentes em deter-
fat— r ■
minada área no momento presente.
% Avaliação de impacto ambiental: processo de exame das conseqüências futuras
de uma ação presente ou proposta. "
pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

A avaliação de impacto ambiental (AIA) é um instrumento de política ambiental ado­


tado atualmente em inúmeras jurisdições - países, regiões ou governos locais assim
como por organizações internacionais - como bancos de desenvolvimento - e por
/

entidades privadas. E reconhecida em tratados internacionais como um mecanismo


potencialmente eficaz de prevenção do dano ambiental e de promoção do desenvolvi­
mento sustentável. Sua formalização ocorreu pela primeira vez nos Estados Unidos,
por intermédio de um a lei aprovada em 1969 pelo Congresso americano. A partir de
ií w ii i i

então, a AIA disseminou-se, alcançando hoje um a difusão mundial. Atualmente,


mais de um a centena de países incorporou às suas legislações nacionais provisões
requerendo a avaliação prévia dos impactos ambientais. Somando-se os procedimen­
tos formais seguidos pelas agências bi e multilaterais de desenvolvimento, pode-se
afirm ar que a AIA é hoje universalmente empregada.

2.1 O r ig e n s
A sistematização da avaliação de impacto ambiental como atividade obrigatória, a
ser realizada antes da tomada de certas decisões que possam acarretar conseqüências
ambientais negativas, ocorreu nos Estados Unidos em decorrência da lei da política
nacional do meio ambiente daquele país, a National Environmental Policy Act, usual­
mente referida pela sigla NEPA. Essa lei foi aprovada pelo Congresso em dezembro de
1969 e entrou em vigor no dia Io de janeiro de 1970, requerendo de “todas as agências
do governo federal” (artigo 102 da lei):

(A) utilizar um a abordagem sistemática e interdisciplinar que assegurará o uso


integrado das ciências naturais e sociais e das artes de planejamento ambiental
nas tomadas de decisão que possam ter um impacto sobre o ambiente humano;
(B) identificar e desenvolver métodos e procedimentos, em consulta com o Con­
selho de Qualidade Ambiental estabelecido pelo Título II desta lei, que assegu­
1Em inglês, rarão que os valores1ambientais presentemente não quantificados serão levados
amenities. adequadamente em consideração na tomada de decisões, ao lado de considera­
ções técnicas e econômicas;
2 No original, (C) incluir, em qualquer recomendação ou relatório sobre propostas de legislação
major. e outras im portantes2 ações federais que afetem significativamente a qualidade
do ambiente humano, um a declaração3 detalhada do funcionário responsável
3 Em inglês,
statement. sobre:
(i) o impacto da ação proposta,
(ii) os efeitos ambientais adversos que não puderem ser evitados caso a proposta
seja implementada,
(iii) alternativas à ação proposta,
(iv) a relação entre os usos locais e de curto prazo do ambiente hum ano e a m a ­
nutenção e melhoria da produtividade a longo prazo, e
(v) qualquer comprometimento irreversível e irrecuperável de recursos que
seriam envolvidos se a ação proposta fosse implementada.

0 campo de aplicação da NEPA é bastante complexo. Resumidamente, a lei aplica-se


a decisões do governo federal que possam acarretar modificações ambientais signifi­
cativas, o que inclui projetos de agências governamentais e também projetos privados
que necessitem de aprovação do governo federal, como a mineração em terras
públicas, usinas hidrelétricas e nucleares etc.

CAPITU
O r ig e m e d if u s ã o d a a v a l ia ç ã o d e im p a c t o a m b i e n

O Conselho de Qualidade Ambiental - Council on Environm ental Quality (CEQ), a


instituição criada pela NEPA, é elemento fundam ental para atingir os objetivos de
“criar e m anter condições para que homem e natureza possam existir em harm onia
produtiva e atingir os anseios sociais e econômicos das gerações presentes e futuras
de am ericanos” (Sec. 101 (a)). 0 CEQ é formado por três membros nomeados pelo
presidente e aprovados pelo Senado; é subordinado diretam ente à Presidência, tendo
status equivalente ao do Conselho de Atividades Econômicas. Supostamente, isso
perm itiria que as considerações am bientais merecessem as mesmas deferências que
as questões econômicas nas decisões governam entais. Uma das principais funções
do CEQ é assegurar que as agências do governo federal efetivam ente implementem
os requisitos da NEPA, ou seja, levem em conta as implicações de suas ações sobre o
ambiente hum ano antes da tom ada de decisões.

Um dos artífices da NEPA foi o professor de ciência política Lynton Caldwell, convi­
dado pelo Senado para assessorar a discussão e a redação do projeto de lei. Segundo
Caldwell (1977, p. 12), para que a política fosse eficaz, dois enfoques eram necessários:
0 primeiro era estabelecer um fundam ento substantivo, “expresso através de declara­
ções, resoluções, leis ou diretrizes”; o segundo, fornecer meios para a ação, “sendo que
um aspecto crítico é o m ecanismo para assegurar que a ação tencionada [realmente]
ocorra”. 0 m ecanism o foi ju stam en te o environmental im paet statem ent (EIS), in i­
cialmente concebido como u m a “eheeklist de critérios para planejamento am biental”
Caldwell, 1977, p. 12). A inda segundo o depoimento de Caldwell (p. 15), “dentre as
dezenas de projetos de lei sobre política am biental (...) n en h u m era operacional”,
ou seja, n en h u m deles incluía algum m ecanism o para asseg urar a implementação
prática dos princípios retóricos enunciados. D urante os debates de 1969, a ideia de
"avaliar os efeitos (...) sobre o estado do meio am biente” gan ho u força e transform ou-
se na redação da Seção 102 (C) da lei, tran scrita acima. Caldwell (p. 16) afirm a que,
curiosamente, “a exigência de um EIS não provocou debate nem suscitou apoio ou
objeções e x te rn a s”.
>
Foi somente depois da aprovação da lei que suas implicações foram plenamente
zompreendidas: “a NEPA pegou os empresários e os burocratas públicos de surpresa
... e mesmo agências governam entais não a levaram a sério até que os trib un ais come-
: assem a exigir o estrito cum prim ento da exigência do estudo de impacto am biental”
(Caldwell, 1989, p. 27). Diversos foram os questionam entos levados à Justiça, desde
alegações de implementação m eram ente formal da lei por parte das agências até
pura e simplesmente sobre a suposta tomada de decisões sem que a lei fosse levada
em conta. Em dois anos, as agências federais produziram 3.635 estudos de impacto
ambiental, e foram contestadas em 149 ações judiciais. Nove anos mais tarde, j á havia
cerca de 11 mil estudos e nada menos que 1.052 ações na Justiça (Clark, 1997).

1 urro autor privilegiado do processo de concepção e aprovação da NEPA foi o assessor


-rgislativo Daniel Dreyfus, para quem a NEPA é u m a exceção à regra segundo a qual
'a s intenções originais dos formuladores de políticas públicas acabam sendo tra n s-
:’:rm adas quando os responsáveis por sua implementação assum em as rédeas. No
:aso da NEPA, os objetivos foram expandidos durante a implementação, e o impac-
:: da lei foi sentido para além das expectativas iniciais” (Dreyfus e Ingram , 1976,
p. 243). Para o senador H enry Jackson, que apresentou o projeto ao Congresso, “o
O r ig e m e d if u s ã o d a a v a l ia ç ã o d e im p a c t o a m b

O Conselho de Qualidade Ambiental - Council on Environmental Quality (CEQ), a


instituição criada pela NEPA, é elemento fundamental para atingir os objetivos de
“criar e m anter condições para que homem e natureza possam existir em harmonia
produtiva e atingir os anseios sociais e econômicos das gerações presentes e futuras
de americanos” (Sec. 101 (a)). 0 CEQ é formado por três membros nomeados pelo
presidente e aprovados pelo Senado; é subordinado diretamente à Presidência, tendo
status equivalente ao do Conselho de Atividades Econômicas. Supostamente, isso
permitiria que as considerações ambientais merecessem as mesmas deferências que
as questões econômicas nas decisões governamentais. Uma das principais funções
do CEQ é assegurar que as agências do governo federal efetivamente implementem
os requisitos da NEPA, ou seja, levem em conta as implicações de suas ações sobre o
ambiente hum ano antes da tomada de decisões.

Um dos artífices da NEPA foi o professor de ciência política Lynton Caldwell, convi­
dado pelo Senado para assessorar a discussão e a redação do projeto de lei. Segundo
Caldwell (1977, p. 12), para que a política fosse eficaz, dois enfoques eram necessários:
o primeiro era estabelecer um fundamento substantivo, “expresso através de declara­
ções, resoluções, leis ou diretrizes”; o segundo, fornecer meios para a ação, “sendo que
um aspecto crítico é o mecanismo para assegurar que a ação tencionada [realmente]
ocorra”. 0 mecanismo foi justam ente o environmental impact statem ent (EIS), ini­
cialmente concebido como um a “checklist de critérios para planejamento ambiental”
(Caldwell, 1977, p. 12). Ainda segundo o depoimento de Caldwell (p. 15), “dentre as
dezenas de projetos de lei sobre política ambiental (...) nenhum era operacional”,
ou seja, nenhum deles incluía algum mecanismo para assegurar a implementação
prática dos princípios retóricos enunciados. Durante os debates de 1969, a ideia de
“avaliar os efeitos (...) sobre o estado do meio ambiente” ganhou força e transformou-
se na redação da Seção 102 (C) da lei, transcrita acima. Caldwell (p. 16) afirma que,
curiosamente, “a exigência de um EIS não provocou debate nem suscitou apoio ou
objeções externas”.

Foi somente depois da aprovação da lei que suas implicações foram plenamente
compreendidas: “a NEPA pegou os empresários e os burocratas públicos de surpresa
(...) e mesmo agências governamentais não a levaram a sério até que os tribunais come­
çassem a exigir o estrito cumprimento da exigência do estudo de impacto ambiental”
(Caldwell, 1989, p. 27). Diversos foram os questionamentos levados à Justiça, desde
alegações de implementação meramente formal da lei por parte das agências até
pura e simplesmente sobre a suposta tomada de decisões sem que a lei fosse levada
em conta. Em dois anos, as agências federais produziram 3.635 estudos de impacto
ambiental, e foram contestadas em 149 ações judiciais. Nove anos mais tarde, já havia
cerca de 11 mil estudos e nada menos que 1.052 ações na Justiça (Clark, 1997).

Outro autor privilegiado do processo de concepção e aprovação da NEPA foi o assessor


legislativo Daniel Dreyfus, para quem a NEPA é um a exceção à regra segundo a qual
“as intenções originais dos formuladores de políticas públicas acabam sendo tra n s ­
formadas quando os responsáveis por sua implementação assumem as rédeas. No
caso da NEPA, os objetivos foram expandidos durante a implementação, e o impac­
to da lei foi sentido para além das expectativas iniciais” (Dreyfus e Ingram, 1976,
p. 243). Para o senador Henry Jackson, que apresentou o projeto ao Congresso, “o
e -o a c to A m b ie ntal: conceitos e métodos

aspecto mais importante da lei é que ela estabelece novos processos decisórios para
todas as agências do governo federal” (Spensley, 1995, p. 310).

Os mecanismos de implementação não eram triviais. 0 objetivo do environmental


impact statem ent não era “coletar dados ou preparar descrições, mas forçar um a
mudança nas decisões adm inistrativas” (Dreyfus e Ingram, 1976, p. 254). Para guiar
a aplicação dos requisitos da Política Nacional de Meio Ambiente dos Estados Unidos,
o Conselho de Qualidade Ambiental publicou, em Io de agosto de 1973, suas diretrizes
para a elaboração e apresentação do EIS. Essas diretrizes estabeleceram os fu nd a­
mentos do que viriam a ser os estudos de impacto ambiental não somente nos EUA,
mas em diversos países, que acabaram se inspirando no modelo americano para im­
plementar suas próprias leis e regulamentos sobre a avaliação de impacto ambiental.

0 texto da NEPA, ao estabelecer princípios e linhas gerais da política ambiental,


nunca foi alterado. No entanto, a aplicação das diretrizes fixadas pelo CEQ em 1973
revelou-se, em vários pontos, insatisfatória, o que motivou sua substituição por um
regulamento, publicado em 28 de novembro de 19784. Cabe às diferentes agências
4 43 Federal (ministérios, departamentos, serviços etc.) aplicar a NEPA. Para isso, cada agência
Register 55.990, desenvolveu suas próprias diretrizes e procedimentos. Ao CEQ cabe somente estabe­
nov. 28, 1978. Um lecer as diretrizes gerais, zelar pela boa aplicação da lei e acom panhar sua aplicação.
decreto de 1977
Em certas situações, cabe-lhe tam bém um papel de árbitro, quando há desacordo
(Executive Order
11.991) determinou
entre agências governamentais acerca dos impactos ambientais de certos projetos.
que o CEQ adotasse Trata-se do processo conhecido como “referral”, que, no entanto, é ocasional. 0 CEQ
um regulamento registrou somente 27 casos até 2003.
para uniformizar
os procedimentos Por outro lado, como a NEPA somente se aplica a ações do governo federal, diversos
de preparação Estados aprovaram suas próprias leis nos anos que se seguiram à aprovação da NEPA.
e análise dos
Atualmente há 17 Estados com “requisitos de planejamento ambiental similares aos
EISs. No sistema
norte-americano,
da NEPA”, sendo Califórnia, Washington e Nova York reconhecidos como os mais
os regulamentos avançados (Welles, 1997, p. 209).
(regulationsj
têm aplicação Um ponto fundam ental quanto às origens da avaliação de impacto ambiental é que o
compulsória, instrumento não nasceu pronto nem foi concebido por um grupo de iluminados. Por
ao contrário um lado, a AIA resultou de um processo político que buscou atender a um a demanda
das diretrizes
social, que estava mais madura nos Estados Unidos no final dos anos 1960. Por outro,
(guidelines).
a AIA evoluiu ao longo do tempo e foi modificada conforme lições eram aprendidas
na experiência prática. Evoluiu nos próprios Estados Unidos e modificou-se ou adap­
tou-se conforme foi aplicada em outros contextos culturais ou políticos, mas sempre
dentro do objetivo primário de prevenir a degradação ambiental e de subsidiar um
processo decisório, para que as conseqüências sejam apreendidas antes mesmo de
cada decisão ser tomada.

2 .2 D if u s ã o i n t e r n a c i o n a l : o s p a ís e s d e s e n v o l v id o s
Nos países do Norte, a adoção da AIA deveu-se fundam entalm ente à similaridade de
seus problemas ambientais, decorrentes, por sua vez, do estilo de desenvolvimento.
Canadá (1973), Nova Zelândia (1973) e Austrália (1974) estiveram entre os primeiros
países que adotaram políticas determinando que a avaliação dos impactos ambientais
deveria preceder decisões governamentais importantes (Quadro 2.1). Da mesma forma

CAPITU
O r ig e m e d if u s ã o d a a v a l ia ç ã o de im p a c t o a m b i e n ^ B 49

que os Estados Unidos, esses países foram colônias de povoamento britânicas, her­
dando um sistema jurídico e político muito semelhante. Por outro lado, a explotação
dos recursos naturais teve um papel historicamente muito importante em todos eles

e, ao intensificar-se após a Segunda Guerra Mundial, colocou em evidência o vasto


alcance dos impactos ambientais acumulados. Países de estrutura federativa, várias
províncias e Estados na Austrália e no Canadá, assim como nos Estados Unidos,
também adotaram leis sobre AIA, ampliando assim o escopo e o campo de aplicação
desse instrumento (Quadro 2.2).

Q u a d r o 2.1 M a rc o s da in tro d u ç ã o da A IA em a lg u n s países d e se n vo lvid o s se le cio n a d o s


J u r isd iç ão A n o de P r i n c i p a i s i n s t r u m e n t o s l e g a is
INTRODUÇÃO
Canadá 1973 Decisão do C onselho de M in is tro s de estabelecer um processo de ava lia çã o e exam e
a m b ie n ta l em 2 0 de d e ze m b ro de 1973, m o d ific a d o em 15 de fe v e re iro de 1977
D ecreto sobre as d ire triz e s do processo de ava lia çã o e exam e a m b ie n ta l, de 22 de ju n h o
de 1 9 8 4
Lei Canadense de A v a lia ç ã o A m b ie n ta l, sancionad a em 23 de ju n h o de 1992
Nova 1973 P ro c e d im e n to s de p ro te ç ã o e m e lh o ria a m b ie n ta l de 1973
Zelândia Lei de Gestão de Recursos de ju lh o de 1991
A u s trá lia 1974 Lei de Proteção A m b ie n ta l (Im p a c to de Propostas), de d e ze m b ro de 1974, m o d ific a d a em
1987
Lei de Proteção A m b ie n ta l e P roteção da B iod iversidad e de 1999
-rança 19 7 6 Lei 6 2 9 de P roteção da N atureza, de 10 de ju lh o de 1 9 7 6
Lei 6 6 3 sobre as Instalações Registradas para a Proteção do A m b ie n te , de 19 de ju lh o de
1 9 76
Decreto 1.133, de 21 de s e te m b ro de 1977, sobre in stalações registradas
D ecreto 1.141, de 12 de o u tu b r o de 1977, para a p lic a ç ã o da Lei de P roteção da N a tureza
Lei 630, de 12 de ju lh o de 1983, sobre a d e m o c ra tiz a ç ã o das c o n s u lta s p ú blicas
União 1985 D iretiva 85/337/EEC, de 27 de ju n h o de 1985, sobre a a valiação dos e fe ito s a m b ie n ta is de
Européia c e rto s p ro je to s p ú b lico s e privados
M o d ific a d a pela D iretiva 97/11/EC, de 3 de m a rço de 1997
Rússia (à época 1985 in s tru ç ã o do S oviete S u p re m o para realização de " p e rita g e m e co ló g ica de Estado"
U niã o S oviética) Decisão do C o m itê Estatal de C o n s tru ç ã o de 1989, e s ta be lecen do a a p re se n ta ç ã o de um a
"a va lia ç ã o d o c u m e n ta d a de im p a c to a m b ie n ta l"
Lei de Proteção A m b ie n ta l da R epública Russa de 1991
R e g u la m e n to de 1994, do M in is té r io do M e io A m b ie n te , sobre A IA
Espanha 1986 Real D ecreto Le gislativo 1.302, de 28 de ju n h o de 1 9 86
H olanda 1987 Decreto sobre AIA, de 1o de s e te m b ro de 1987, m o d ific a d o em 1o de s e te m b ro de 1 9 9 4
República 1992 Lei 244, de 15 de abril de 1992, sobre A IA
Tcheca Decreto 49 9, de 1o de o u tu b r o de 1992, sobre c o m p e tê n c ia p rofission al para a valiação de
im p a c to s e sobre m eios e p ro c e d im e n to s para discussão pú blica da o p in iã o dos peritos
H un g ria 1993 Decreto 8 6 : r e g u la m e n to p rovisó rio sobre a ava lia çã o dos im p a c to s a m b ie n ta is de certas
a tiv id a d e s
Lei A m b ie n ta l de m a rço de 1995, in c lu in d o um c a p ítu lo sobre A IA
^ 1

Hong Kong 1997 Lei de AIA, de 5 de fe v e re iro de 1997


Japão 1999 Lei de A v a lia ç ã o de Im p a c to A m b ie n ta l, de 12 de ju n h o de 1999
Fontes: elaborado a p a rtir de diversas fontes, incluindo prospectos editados p o r organismos governamentais, sites governam entais
e Bellinger et a i (2000).
^ J ia çã o de Im pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

ü - = z 'o 2 . 2 r xem plos de in s titu c io n a liz a ç ã o da A IA em a lg u m a s ju ris d iç õ e s subn a c io n a is


j 5DÇÃO A n o de P r in c ip a is in s t r u m e n t o s legais

ll\jtr o d u ç ão
C a lifó r n ia , EUA 1970 Lei de Q ualidade A m b ie n ta l da C a lifó rn ia , diversas m o d ific a ç õ e s subsequentes
Nova York, EUA 1978 Lei de Exame da Q ua lid a d e A m b ie n ta l, de 1978, m o d ific a d a em 1987 e 1 9 96
A lb e rta , Canadá 1973 Lei de Conservação e R ecuperação de Terras
O ntá rio, Canadá 1974 Lei de A v a lia ç ã o de Im p a c to A m b ie n ta l, de 1 9 75
Lei sobre as avaliações a m b ie n ta is , de 19 9 0
Quebec, Canadá 1978 M o d ific a ç ã o da Lei sobre a Q u a lid a d e do A m b ie n te (de 1972)
R e g u la m e n to sobre a a valiação de im p a c to a m b ie n ta l, de 1980, m o d ific a d o em 1 9 96
C o lú m b ia 1979 Lei de A m b ie n te e Uso do Solo e o u tra s leis (até 2 0 0 2 não havia processo ú n ic o de
B ritâ nica, AIA, mas d ife re n te s processos criados por diversas leis que e sta b e le c ia m necessi-
Canadá dade de o b te n ç ã o de licenças)
Lei de A v a lia ç ã o A m b ie n ta l de d e ze m b ro de 2 0 0 2
N o rte do 1 9 75 C onvenção da Baía James e do N o rte do Q uebec (este acordo, fir m a d o e n tre os g o v e r­
Quebec, Canadá nos do Canadá e do Quebec e as c o m u n id a d e s a u tó c to n e s In u it e Cri, estabelece um
regim e p a rtic u la r de A IA em to d a a porção n o rte do te r r itó r io p ro v in c ia l; os Cri e os
In u it c ria ra m seus p ró p rio s c o m itê s para g e rir o processo de AIA)
Nova Gales do Sul , 1 9 7 4 Princípios e P ro c e d im e n to s para A valiação^de im p a c to A m b ie n ta l da Com issão Esta­
A u s trá lia dual de C o n tro le de Poluição, de 1 9 7 4
V ic to ria , 1978 D iretrizes para A v a lia ç ã o A m b ie n ta l, de 1977
A u s trá lia Lei sobre Efeitos A m b ie n ta is , de m a rço de 1978
D iretrizes para A v a lia ç ã o A m b ie n ta l, de 1977
A u s trá lia 1978 Lei de Proteção A m b ie n ta l, m o d ific a d a em 1 9 86
O cidental, A u s trá lia P ro c e d im e n to s A d m in is tr a tiv o s de A v a lia ç ã o de Im p a c to A m b ie n ta l, de 1993
Ilhas Baleares, 1 9 86 D ecreto 4 /1 9 8 6 , sobre im p le m e n ta ç ã o e regulação dos estudos de im p a c to a m b ie n ta l
Espanha
C astilha e Leon, 1994 Lei 8 /1 9 9 4 , sobre A v a lia ç ã o de Im p a c to A m b ie n ta l e A u d ito ria A m b ie n ta l, m o d ific a d a
Espanha pela lei 6 /1 9 9 6
D ecreto 2 0 9 /1 9 9 5 , que aprova o r e g u la m e n to da lei
Fontes: elaborado a p a rtir de diversas fontes, incluindo prospectos editados p o r organismos governam entais, sites governam entais,
Couch (1988), M orrison-Saunders e Bailey (2000) e Palerm (1999).

Já na Europa, entretanto, o modelo americano de AIA não foi bem visto, pelo menos em
um primeiro momento. Os governos sustentavam que suas políticas de planejamento já
levavam em conta a variável ambiental, situação que se oporia à dos Estados Unidos,
pais onde o planejamento tinha pouca tradição. Mesmo assim, depois de cinco anos de
discussão e cerca de 20 minutas (Wathern, 1988b), a Comissão Européia adotou uma
resolução (Diretiva 337/85), de aplicação compulsória por parte dos países-membros
da então Comunidade Econômica Européia (atual União Européia), obrigando-os a
adotar procedimentos formais de AIA como critério de decisão para uma série de em-
preendirhentos considerados capazes de causar significativa degradação ambiental. Na
verdade, a elaboração da diretiva europeia tardou dez anos, uma vez que os estudos
preliminares começaram em 1975.

Para Wathern (1988b), quando finalmente a diretiva foi aprovada, representou grandes
mudanças para aqueles países onde a AIA havia sido praticamente negligenciada nas
políticas públicas - Bélgica, Espanha, Grécia, Itália e Portugal. Os demais países, de

CAPÍTU LO
O r ig e m e d ifu s ã o d a a v a lia ç ã o de im p a c to a m b i e n ^ B 51

diferentes formas, j á aplicavam alguma modalidade de AIA (geralmente associada ao


planejamento territorial), embora somente a França tivesse um sistema formalizado e
embasado em lei.

A França, de fato, antecipou-se e foi 0 primeiro país da Europa a adotar a avaliação de


impacto ambiental pela lei de 1976. Na verdade, foi 0 único a legislar sobre AIA antes
da diretiva europeia.

Diferentemente dos Estados Unidos - e sem dúvida em função de um regime jurídico


e de uma organização administrativa muito diversos -, a AIA foi adotada na França
como uma modificação no sistema de licenciamento (ou autorização governamental)
de indústrias e outras atividades que possam causar impacto ambiental, de modo que
os estudos de impacto ambiental devem ser feitos pelo próprio interessado, enquanto,
segundo a NEPA, nos Estados Unidos é a agência governamental encarregada da
tomada de decisões que deve proceder à avaliação dos impactos potencialmente decor­
rentes dessa decisão. Além disso, no modelo francês, a exigência aplica-se a qualquer
proposta, seja ela de um proponente público ou privado, enquanto a legislação federal
americana aplica-se, fundamentalmente, a propostas públicas federais ou a decisões do
governo federal sobre iniciativas privadas5. 5 Vários Estados
americanos
Como sucedeu em inúmeros países, houve na França muita resistência de alguns também adotaram
legislações exigindo
setores governamentais e empresariais à nova exigência de preparação prévia de um
a aplicação da
estudo de impacto ambiental (Sánchez, 1993b). A regulamentação da lei francesa avaliação de
tardou mais de um ano, e os novos procedimentos efetivamente entraram em vigor impacto ambiental
em 1978. Entretanto, a aplicação da lei consolidou-se rapidamente e seu vasto campo para decisões
de aplicação levou à preparação de cerca de 5 a 6 mil estudos de impacto por ano no seu âmbito
(Turlin e Lilin, 1991), número bem mais alto que a quantidade de estudos de impacto jurisdicional,
preparada em outras jurisdições, como os EUA (Kennedy, 1984). Um aspecto relevante em alguns casos
incidindo também
da AIA na França é que os procedimentos instituídos em 1976 introduziram uma nova
sobre vários
exigência - a apresentação prévia de um estudo de impacto - a um processo de licen­ tipos de projetos
ciamento que já vigorava para algumas atividades desde 1917. Mesmo procedimentos privados, eomo é o
de consulta pública já existiam para obras que necessitassem de um decreto de utili­ caso da Califórnia.
dade pública para fins de desapropriação. Ou seja, a AIA representou uma evolução de
práticas de planejamento já existentes e foi incorporada a uma estrutura administrativa
preexistente. Aqui também reside uma diferença entre a maneira como a AIA surgiu
na França e como foi adotada em outros países, posto que não foi criada nenhuma
nova instituição para implementar 0 novo instrumento, mas apenas um departamento
dentro do Ministério do Meio Ambiente, ativo desde 1971. Aliás, 0 termo avaliação de
impacto ambiental até hoje é pouco usado na França, predominando simplesmente 0
termo étude cVimpact, que resume tanto 0 próprio estudo como o processo de avaliação
de impacto ambiental.

Um indicador que ilustra as diferenças de receptividade da AIA nos Estados Unidos e


na França é a porcentagem de casos levados a contestação judicial: enquanto nos EUA
nada menos que 10% das decisões baseadas em um environmental impact statement
foram contestadas nos tribunais no período de 1970 a 1983 (Kennedy, 1984), somente
0,65% dos études d ’impaet franceses foram contestados na Justiça durante os primei­
ros cinco anos de aplicação da nova lei (Hébrard, 1982).
ação ce Im pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

0 extenso campo de aplicação dos estudos de impacto na França e sua recepção


“suave” pela administração pública resultaram em uma certa banalização do proce­
dimento e em sua excessiva burocratização (Sánchez, 1993b). Mesmo assim, as novas
exigências contribuíram para modificar substancialmente a postura de empresas pú­
blicas e privadas, levando a modificações de projetos como condição indispensável
para aprovação, chegando mesmo a recusar conceder algumas licenças.

Sem dúvida, a preocupação de evitar a avalanche de processos judiciais observada nos


Estados Unidos esteve presente no desenho da maioria dos procedimentos de avalia­
ção de impacto. Na Alemanha, diversos estudos apontavam para o encam inham ento
de um projeto de lei, preparado em 1973 por um grupo de especialistas a convite do
governo federal. Entretanto, o projeto nunca foi encaminhado ao Parlamento (Cupei,
1994). 0 governo federal adotou recomendações, em 12 de outubro de 1975, sob a
forma de “Princípios para Avaliação de Impacto Ambiental de Ações Federais”, cujo
cumprimento não era obrigatório e não podia ser controlado pelos tribunais. Ademais,
os Estados tampouco tinham qualquer obrigação a respeito (Kennedy, 1981). Esse do­
cumento, “por seu pouco poder formal, não conseguiu obrigar ninguém a fornecer tal
relatório [de impacto ambiental]” (Summerer, 1994, p. 407).

Somente após a aprovação da diretiva europeia, e como obrigação de todo


Estado-membro, a Alem anha adotou um a lei sobre AIA, conhecida como Umwelt-
vertràglichkeitprufung (UVP), cuja tradução direta seria “exame de compatibilidade
ambiental” (conforme Muller-Planterberg' e Ab’Sáber (1994, p. 323), e, para Schlup-
m ann (1994, p. 366), “estudo de conseqüências ambientais”). Schlupmann (1994)
relata que foram parcas as discussões que precederam a aprovação do projeto de lei
no Parlamento, o que parece paradoxal em um país onde o movimento ambientalista
foi pioneiro em conseguir amplo reconhecimento social. Esse autor considera que,
justamente, o “temor da pressão popular”, tendo os protestos contra usinas nucleares
como pano de fundo, “constitui o fio condutor da história da Lei de AIA” (p. 373),
a qual, em sua análise e fazendo eco a outros críticos, estabelece um procedimento
excessivamente burocrático com pouco espaço para participação pública. A lei alemã
sobre UVP data de 12 de fevereiro de 1990, quando já haviam transcorrido 20 anos
desde a NEPA.

Em parte, as dificuldades de adaptação da diretiva europeia ao ordenamento jurídico


de cada país-membro decorrem da existência anterior, nesses paises, de exigências
de planejamento territorial e de controle de poluição, que precisaram ser modificadas
para incorporar o novo instrumento sem que fossem postas em risco as garantias
representadas por essas leis. Se em alguns países, como a Espanha, a introdução da
AIA deu-se por novas leis ou decretos que estabeleceram a necessidade de preparação
de um EIA nos moldes preconizados pela diretiva europeia, quase que a transcrevendo,
em outros, exigências de AIA permearam uma complexa legislação de planejamento,
como no Reino Unido, onde a diretiva europeia foi implementada por meio de mais de
40 “regulamentos secundários” (Glasson e Salvador, 2000).

A difusão da AIA para outros países desenvolvidos continuou durante a década de


1990, alcançando o Japão e Hong Kong - então colônia britânica e depois como
Região Administrativa Especial da China. Ao mesmo tempo, em países onde a prática

CAPÍTU LO
O r i g e m e d i f u s ã o d a a v a l i a ç ã o d e i m p a c t o a m b ie n i

já era bem estabelecida, como Canadá, Austrália e Nova Zelândia, os processos foram
fortalecidos por meio da criação de leis ou da reforma de procedimentos (Quadros 2.1 e
2.2). Assim, não se pode deixar de registrar que a AIA tem passado por um a contínua
evolução, na qual as práticas vêm sendo revistas e novos procedimentos e exigências
são formulados, com base no aprendizado proporcionado por uma avaliação crítica
dos resultados, essencial para o vigor de toda política pública. Um avanço significa­
tivo é a avaliação ambiental estratégica, ou avaliação do impacto de políticas, planos
e programas, e não de projetos, obras ou atividades. No entanto, esse tema não será
abordado neste livro.

2.3 D if u s ã o i n t e r n a c i o n a l : o s p a ís e s e m d e s e n v o l v i m e n t o
As razões da difusão internacional da AIA são muitas. Talvez a principal delas seja
que tanto os países ditos desenvolvidos quanto aqueles classificados como em desen­
volvimento têm diversos problemas ambientais em comum. Em outras palavras, o
estilo de desenvolvimento adotado engendra formas semelhantes de degradação
ambiental.
U
Em 1972, na época da Conferência de Estocolmo, existiam apenas onze órgãos
ambientais nacionais, a maioria em países industrializados. Em 1981, a situação
havia mudado de forma dramática: contávam-se lOELpaíses, na maioria em
desenvolvimento. Uma nova década se passa, em 19E-1, praticamente todos os
países dispõem de algum tipo de in stitu ição__similar (Monosowski, 1993, p. 3).

Também teve importante papel na adoção do instrumento pelos países do Sul a


atuação das agências bilaterais de fomento ao desenvolvimento, como a U.S. Agency
for International Development (USAID) e suas congêneres dos países da OCDE (Orga­
nização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), assim como as agências
multilaterais, que são os bancos de desenvolvimento, como o Banco Mundial e o
Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).

Os tribunais dos Estados Unidos julgaram casos decidindo que mesmo as ações
externas do governo federal americano deveriam ser sujeitas à NEPA, afetando,
dessa forma, seus projetos de cooperação para o desenvolvimento e até as atividades
de pesquisa na Antártida, que, coordenadas pelo U.S. National Research Council,
foram consideradas como ações do governo federal que podiam causar significativa
degradação ambiental. Em 1975, quatro ONGs ambientalistas americanas entraram
em um a ação judicial contra a USAID, tencionando obrigá-la a preparar estudos de
impacto ambiental, nos termos da NEPA. Em conseqüência, a USAID foi a primeira
agência de cooperação internacional a aplicar regularmente procedimentos de avalia­
ção dos impactos de seus projetos (Horberry, 1988; Runnals, 1986).

A lei americana de cooperação para o desenvolvimento (Foreign Assistance Act)


foi modificada em 1978 e passou a impor a necessidade formal de preparação de
estudos de impacto ambiental para os projetos de cooperação (Runnals, 1986). A
partir da ação das ONGs na Justiça americana e depois da modificação da lei de
assistência, a USAID estabeleceu um a política ambiental e criou diversos procedi­
mentos para levar em conta as implicações ambientais de seus projetos; também
teve que realizar um a reforma adm inistrativa e contratar novos técnicos para atuar

DO IS
ação ae Im pacto A m biental: conceitos e métodos

em planejamento e gestão ambiental (Horberry, 1988). Posteriormente, as principais


agências de cooperação para o desenvolvimento, como a canadense ACDI/CIDA, a
dinamarquesa Danida e várias outras, estabeleceram seus próprios procedimentos de
avaliação de projetos, em geral empregando os mesmos critérios que outras agências
de seus respectivos governos deviam usar para analisar seus projetos internos. No
entanto, até 1986, as agências de cooperação da maioria dos países da OCDE tinham
experiência muito limitada com a avaliação ambiental de suas atividades (OECD,
1986). Embora a maioria de seus países-membros aplicasse a AIA para muitos pro­
jetos domésticos que pudessem causar impactos significativos, esse procedimento
não era aplicado para os mesmos tipos de projeto quando executados em um país
em desenvolvimento sob financiamento de um país da OCDE (Kennedy, 1988). Foi
somente a partir do final dos anos 1980 e principalmente ao longo dos anos 1990 que
tal atividade se consolidou.

Um marco nesse processo de internacionalização da avaliação de impacto ambiental


é a Recomendação do Conselho Diretor da OCDE, aprovada em 20 de ju n h o de 1985,
segundo a qual os países-membros da organização devem assegurar que:

(a) Projetos e programas de assistênsia ao desenvolvimento que, devido à sua


natureza, porte e/ou localização, possam afetar significativamente o ambiente
devem ser avaliados sob um ponto de vista ambiental no estágio mais inicial
possível;
(b) Ao e x am in ar se um projeto ou programa específico deve ser sujeito a
uma avaliação ambiental detalhada, as agências de cooperação dos países-
membros devem prestar especial atenção aos projetos ou program as listados no
Anexo [...]

0 documento traz um anexo com uma lista de projetos e programas que mais neces­
sitam de avaliações ambientais. Atualmente, as principais agências de cooperação
têm listas próprias e procedimentos mais sofisticados para enquadrar os projetos de
assistência de acordo com o nível de detalhe da avaliação ambiental necessária.

Uma outra recomendação do Conselho da OCDE, aprovada em 23 de outubro de 1986,


conclama os países-membros a:

(a) Apoiar ativamente a adoção formal de um a política de avaliação ambiental


para suas atividades de assistência ao desenvolvimento;
(b) E xam inar a adequação dos procedimentos e práticas atuais com relação à
implementação de tal política;
(c) Desenvolver, à luz deste exame e na medida necessária, procedimentos efi­
cazes para um processo de avaliação ambiental considerando, na medida do
necessário, o Anexo I;
[...1
(g) A ssegurar a provisão de recursos hum anos e financeiros para os países em
desenvolvimento que desejem melhorar sua capacitação para realizar avalia­
ções ambientais, considerando no todo ou em parte as medidas do Anexo II.

Dessa forma, a OCDE recomendou um modelo de processo de avaliação de impacto


ambiental para analisar os projetos de ajuda ao desenvolvimento que é consistente

CAPÍTUi LO
O r ig e m e d if u s ã o d a a v a l ia ç ã o de im p a c t o

com as boas práticas internacionais de AIA, e propôs fomentar a capacidade dos países
receptores em avaliar internamente os impactos ambientais. Consequentemente,
não apenas muitos projetos foram avaliados individualmente como foram também
expandidos programas de cooperação voltados especificamente ao fortalecimento
institucional e à formação de recursos humanos envolvidos em avaliação ambiental
nos países em desenvolvimento. Por exemplo, a agência canadense de cooperação
financiou cerca de CAN$ 41 milhões para um Projeto de Desenvolvimento de Gestão
Ambiental na Indonésia, liderado pela Universidade Dalhousie e executado entre
1983 e 1994 por um consórcio de universidades canadenses e indonésias, em colabo­
ração com o Ministério do Meio Ambiente da Indonésia. 0 projeto incluiu um grande
componente de capacitação em avaliação de impacto ambiental e a publicação de
guias e diretrizes (Villamere e Nazrudin, 1992).

Também nas instituições multilaterais, como os bancos de desenvolvimento, o


período entre o final dos anos 1980 e o início dos anos 1990 marcou um a inflexão
em suas políticas face às implicações ambientais de suas atividades. 0 Banco M un­
dial teve papel muito importante na difusão da AIA, na medida em que movimenta
bilhões de dólares por ano em projetos de desenvolvimento nos países do Sul, muitos
deles capazes de causar impactos ambientais significativos. Os primeiros estudos de
impacto ambiental feitos no Brasil o foram para projetos financiados em parte pelo
Banco Mundial, como as barragens de Sobradinho, no rio São Francisco, em 1972
(Moreira, 1988), e Tucuruí, no rio Tocantins, este realizado em 1977 (Monosowski,
1986; 1990), um ano depois que a construção da barragem havia sido iniciada. Na
época, não havia legislação brasileira exigindo tais estudos, que não foram, portanto,
submetidos à aprovação governamental, mas utilizados pelo Banco para decidir sobre
as condições dos empréstimos.

Uma das principais razões do envolvimento do Banco Mundial foi a pressão exerci­
da pelas organizações não governamentais ambientalistas e suas fortes críticas aos
importantes impactos ecológicos e socioculturais dos grandes projetos financiados
pelo Banco (Rich, 1985). Um dos casos sistematicamente citados como um dos piores
exemplos de atuação do Banco foi o empréstimo concedido ao governo brasileiro
para pavimentação da rodovia BR-364, de Cuiabá a Porto Velho, nos anos 1980 -
a obra foi apontada como indutora de um processo perverso de ocupação da região, cau­
sando desmatamento indiscriminado e dizimação de grupos indígenas (Lutzemberger,
1985). As críticas tiveram repercussão no Congresso dos Estados Unidos, país que,
por ser o maior acionista do Banco, sempre indicou seu presidente. Os congressistas
convocaram o secretário do Tesouro (equivalente ao ministro da Fazenda) para depor
acerca das ações do Banco e o pressionaram para exigir que fosse dada maior impor­
tância aos impactos ambientais dos projetos financiados pelo Banco, como um dos
critérios de concessão de empréstimos (Walsh, 1986).

0 primeiro documento de política ambiental do Banco, que data de 1984, estipu­


lava que os impactos de projetos de desenvolvimento fossem avaliados durante a
preparação do projeto e que seus resultados fossem publicados somente depois da
implantação (Goodland, 2000). Finalmente, em 1989, o Banco promoveu um a reor­
ganização interna, criando um Departamento de Meio Ambiente e contratando uma
equipe multidisciplinar cuja atribuição era analisar previamente, sob o ponto de vista

DO IS
s sçãc je im pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

ambiental, os projetos enviados ao Banco, já que, até então, a equipe encarregada de


assuntos ambientais era composta por apenas cinco pessoas, face a mais de 300 pro­
5Segundo Goodland jetos analisados anualmente pela instituição (Runnals, 1986)6. Também em 1989, o
(2000, p. 3), Banco adotou um a nova política a esse respeito e estabeleceu procedimentos internos
a categoria de de cumprimento compulsório, que incluíam a elaboração de um estudo de impacto
“profissional
ambiental (Beanlands, 1993a).
am biental”fo i
então acrescida
à lista oficial de Além da Diretiva Operacional 4.00 de outubro de 1989, substituída pela Dire­
especialidades, que tiva Operacional 4.01 em setembro de 1991, o Banco adota hoje um a série de
antes enquadrava procedimentos relativos às considerações ambientais na análise de solicitações
os analistas de empréstimos, que devem observar as condições impostas por vários documentos de
ambientais
políticas operacionais, conhecidos como políticas de salvaguardas, das quais pode-se
como “outros
especialistas citar as seguintes, de maior importância no campo ambiental: OP 4.04 Hábitats n a tu ­
técnicos”. rais; OP 4.10 Povos indígenas; OP 4.11 Patrimônio cultural; OP 4.12 Reassentamento
involuntário; OP 4.36 Setor florestal; OP 4.37 Segurança de barragens.

Goodland (2000) aponta que a versão de 1989 da política de avaliação ambiental


encontrou muita resistência interna e, por tal razão, era restrita - excluía, por exem­
plo, qualquer procedimento de participação çública. Já a versão de 1991 finalmente
aproximou-se dos padrões internacionais de avaliação de impactos, incluindo, entre
outras modificações, procedimentos para participação e consulta pública. No entanto,
somente projetos apresentados ao banco para financiamento eram abarcados por essa
política, que não abrangia empréstimos para ajuste estrutural ou setorial. Ao longo
dos anos 1990, outros organismos multilaterais seguiram os passos do Banco M un­
dial, adotando políticas e procedimentos internos para avaliação ambiental.

Assim, muitos países adotaram leis sobre avaliação de impacto ambiental ou introdu­
ziram exigências de avaliação de impactos em leis ambientais mais amplas. 0 Quadro
2.3 mostra alguns exemplos. Deve-se destacar o pioneirismo da Colômbia, que já
em 1974 incluiu provisões sobre AIA em seu Código Nacional de Recursos Naturais
Renováveis e de Proteção do Meio Ambiente. 0 artigo 28 desta lei estabelece que:

Para a execução de obras, o estabelecimento de indústrias ou o desenvolvi­


mento de qualquer outra atividade que, por suas características, possa pro­
duzir deterioração grave dos recursos naturais renováveis ou do ambiente ou
introduzir modificações consideráveis ou notórias à paisagem, será necessário
o estudo ecológico e ambiental prévio e, ademais, obter licença. Em tal estudo,
deve-se levar em conta, além dos fatores físicos, os de ordem econômica e so­
cial, para determ inar a incidência que a execução das obras mencionadas possa
ter sobre a região.

Atualmente, a maioria dos países em desenvolvimento tem leis nacionais que exigem
a preparação prévia de estudos de impacto ambiental. 0 processo de difusão e con­
solidação da AIA continua, mesmo após a adoção de leis nacionais. Assim, em
empréstimos de bancos multilaterais ou doações bilaterais, é freqüente a exigência
de avaliações que podem ultrapassar os requisitos legais nacionais. Pode ser o caso
de se exigir um a avaliação ambiental estratégica ou de se insistir em processos par­
ticipativos e de consulta pública que ultrapassem as formalidades previstas em lei.
O r ig e m e d if u s ã o d a a v a l ia ç ã o de im p a c t o a m b :e\ J

Q u a d r o 2 . 3 M o rc o s da in s titu c io n a liz a ç ã o da A IA em a lg u n s países em d e se n vo lv im e n to


J u r is d iç ã o A n o de P r i n c i p a i s i n s t r u m e n t o s l e g a is
in tr o d u ç ã o

C olô m b ia 1974 Código N a cio n a l de Recursos N a tu ra is Renováveis e de Proteção do M e io


A m b ie n te , de 18 de de ze m b ro de 1 9 7 4
Filipinas 1978 Decreto sobre Política A m b ie n ta l
D ecreto sobre o Sistem a de Estudos de Im p a c to A m b ie n ta l, de 1978
R e g u la m e n to s sobre ElAs do C onselho N a c io n a l de Proteção A m b ie n ta l, de 1979
China 1979 Lei "P rovisó ria" de Proteção A m b ie n ta l, revista e fin a liz a d a em 1989
D ecreto de 1981 sobre "P roteçã o A m b ie n ta l de Projetos de C on stru çã o ", m o d if i­
cado em 1986 e em 1998
Decreto de 1990 sobre p ro c e d im e n to s de A IA
Lei de A v a lia ç ã o de Im p a c to A m b ie n ta l, de 28 de o u tu b r o de 2 0 0 2
'/lé x ic o 1982 Lei Federal de Proteção A m b ie n ta l, de 1982
Lei Geral do E quilíb rio E cológico e da Proteção do A m b ie n te , de 28 de ja n . de 1988
*

R e g u la m e n to de 3 0 de m a io de 2 0 0 0
indonésia 1986 Lei de Provisões Básicas para Gestão A m b ie n ta l, de 1982
R e g u la m e n to 29 de 1986, sobre análise de im p a c to a m b ie n ta l, m o d ific a d o pelo
R e g u la m e n to 51, de 1993 e pelo R e g u la m e n to 27, de 1999, in c lu in d o m e c a ­
nism os de p a rtic ip a ç ã o pú blica
M alásia 1987 Lei de 1985, que m o d ific a a Lei de Q ua lid a d e A m b ie n ta l (de 1974)

»
D ecreto sobre Q u a lid a d e A m b ie n ta l (A tiv id a d e s C ontroladas), de 1987
A fric a do Sul 1991 A rt. 39 da Lei de M in e ra ç ã o , de 1991
Lei de C onservação A m b ie n ta l, de 1989, e R e g u la m e n to sobre A v a lia ç ã o de Im p a c to
A m b ie n ta l, de 1o de s e te m b ro de 1997, re la tiv o à Lei de Conservação A m b ie n ta i
Tunísia 1991 D ecreto de 13 de m a rço de 1991 sobre os estudos de im p a c to a m b ie n ta l
Bolívia 1992 Lei n° 1.333
D ecreto 2 4 .1 7 6 /9 6
Chile 1994 > Lei de Bases do M e io A m b ie n te , de 3 de m a rço de 1 9 9 4
R e g u la m e n to do S istem a de A v a lia ç ã o de Im p a c to A m b ie n ta l, de 3 de abril de
1997, m o d ific a d o em 7 de d e ze m b ro de 2 0 0 2
U ruguai 1994 Lei 16.246, de 8 de abril de 1992, requ er A IA para a tiv id a d e s p o rtu á ria s
Lei de Prevenção e A v a lia ç ã o de Im p a c to A m b ie n ta l 16.466, de 19 de ja n . de 19 9 4
D ecreto 4 3 5 /9 9 4 , de 21 de s e te m b ro de 1 9 9 4 (re g u la m e n to )
Bangladesh 19 95 Lei de C onservação A m b ie n ta l, de 1995
Regras de Conservação A m b ie n ta l, de 1997
Equador 1999 Lei de Gestão A m b ie n ta l
Texto U n ific a d o de Legislação A m b ie n ta l Secundária
Fontes: elaborado a p a rtir de diversas fontes, incluindo prospectos editados p o r organismos governam entais nacionais, sites
governam entais, Aham m ed e Harvey (2004), M ao e Hills (2002), M emon (2000) e Purnama (2003).

Muitos países recebem montantes de ajuda econômica que representam percentagem


significativa de seus orçamentos públicos e, para manter o fluxo de recursos, devem
se submeter às exigências dos financiadores e doadores que, por sua vez, estão su­
jeitos a pressões em suas jurisdições. Para um doador internacional, nada pior que a
comprovação de que, ao invés de um projeto ter contribuído para o desenvolvimento
humano, este tenha, na realidade, piorado a qualidade de vida das populações que
supostamente deveria ter ajudado, ou causado danos ambientais.
liação de Im pacto A m biental: conceitos e métodos

2 .4 A I A E M TR ATADO S IN T E R N A C IO N A IS
Vários Estados promoveram ativamente a difusão internacional da AIA, não apenas
agindo no plano bilateral, como também buscando inseri-la em acordos interna­
cionais. Da mesma forma, algumas grandes ONGs internacionais trabalharam para
incluir cláusulas relativas à AIA em tratados internacionais, que vêm se multiplicando
nos últimos anos.

Um grande impulso para a difusão internacional da AIA veio com a Conferência das
Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD), a Rio-92. Além
de toda a discussão pública, com grande repercussão na imprensa, suscitada durante
o período preparatório da conferência, um dos documentos resultantes desse encon­
tro, a Declaração do Rio, estabelece, em seu princípio 17:

A avaliação do impacto ambiental, como um instrum ento nacional, deve ser


empreendida para atividades propostas que tenham probabilidade de causar um
impacto adverso significativo no ambiente e sujeitas a um a decisão da autori­
dade nacional competente.

Em um outro documento resultante da CNUMAD, a Agenda 21, os Estados signatá­


rios reconhecem a AIA como instrumento que deve ser fortalecido para estimular o
desenvolvimento sustentável. Várias vezes a Agenda 21 menciona a necessidade de
avaliar os impactos de novos projetos de desenvolvimento. Menções ao papel da AIA
aparecem, entre outros, nos seguintes itens da Agenda 21:

Certificar-se de que as decisões relevantes sejam precedidas por avaliações


do impacto ambiental e que, além disso elas levem em conta os custos das
eventuais conseqüências ecológicas;
(no Cap. 7 - Promoção do desenvolvimento sustentável dos
assentamentos hum anos [7.41 (b)l)

Promover o desenvolvimento, no âmbito nacional, de metodologias adequadas


à adoção de decisões integradas de política energética, ambiental e econômica
com vistas ao desenvolvimento sustentável, inter alia, por meio de avaliações
de impacto ambiental;
(no Cap. 9 - Proteção da atmosfera [9.12 (b)])

Desenvolver, melhorar e aplicar métodos de avaliação de impacto ambiental


com o objetivo de fomentar o desenvolvimento industrial sustentável”;
(no Cap. 9 - Proteção da atmosfera [9.18 (d)])

Realizar análises de investimento e estudos de viabilidade que incluam uma


avaliação do impacto ambiental, para a criação de empresas de processamento
florestal;
(no Cap. 11 - Combate ao desflorestamento [11.23 (b)])

Introduzir procedimentos adequados de estudos de impacto ambiental para a


aprovação de projetos com prováveis conseqüências importantes sobre a di­
versidade biológica e tomar medidas para que as informações pertinentes fi­
quem amplamente disponíveis, com a participação do público em geral, quando

.0
O r i g e m e d i f u s ã o d a a v a l i a ç ã o d e i m p a c t o a m b íen w w

apropriado, c estimular a avaliação dos impactos de políticas e programas per­


tinentes sobre a diversidade biológica;
(no Cap. 15 - Conservação da diversidade biológica [15.5 (k)])

Avaliação obrigatória do impacto ambiental de todos os grandes projetos de


desenvolvimento de recursos hídricos que possam prejudicar a qualidade da
água e dos ecossistemas aquáticos, combinada com a formulação de medi­
das reparadoras e um controle intensificado de instalações industriais novas,
aterros sanitários e projetos de desenvolvimento da infra-estrutura;
(no Cap. 18 - Proteção da qualidade e do abastecimento dos recursos hídricos:
aplicação de critérios integrados no desenvolvimento, manejo e uso dos
recursos hídricos [18.40 (b) (v)])

Os Governos devem tomar a iniciativa de estabelecer e fortalecer, quando apro­


priado, procedimentos nacionais de avaliação de impacto ambiental levando em
consideração uma abordagem “de ponta a ponta” do manejo de resíduos perigo­
sos, a fim de identificar opções para m inim izar a geração de resíduos perigosos
por meio de manipulação, arm azenam ento, depósito e destruição mais seguras;
(no Cap. 20 - Manejo ambientalmente sustentável dos resíduos perigosos,
incluindo a prevenção do tráfico internacional ilícito de resíduos perigosos V

[20.19 (d)]) \
/ y se
Maior desenvolvimento e promoção do uso mais amplo possível das avaliações
de impacto ambiental, inclusive de atividades com os auspícios dos organismos
especializados do sistema das Nações Unidas, e em relação com todo projeto ou
atividade importante de desenvolvimento econômico.
(no Cap. 38 - Arranjos institucionais internacionais, acerca do papel do
Prograrqa das Nações Unidas para o Desenvolvimento [38.22 (i)])

A Declaração do Rio e a Agenda 217 são documentos cuja preparação requereu 1A Agenda 21 é
intensas negociações internacionais, inclusive com a participação de ONGs e outros “um documento
grupos de interesse. A preparação da Conferência do Rio foi um processo muito de normatividade
reduzida, sem
rico, cujos resultados ultrapassam em muito os documentos firmados durante os dias a efetividade de
do evento. Muitos países aprovaram novas leis, prepararam relatórios de qualidade ■'A uma declaração
1
ambiental, e as ONGs estimularam os cidadãos a buscar maior envolvimento nos ! e muito menos
processos decisórios. 0 surgimento de novas leis que requerem a avaliação prévia de de um tratado
ou convenção
impacto ambiental foi um a das conseqüências da Conferência.
internacional”
(Soares, 2003,
v>
Durante o período preparatório da Conferência do Rio e nos anos que se seguiram, p. 67).
novos países incorporaram a AIA em suas legislações, principalmente na América
Latina, na África e na Europa Oriental, a exemplo do Peru em 1990, da Bolívia em
1992, do Chile, do Uruguai e da Nicarágua em 1994, da Tunísia em 1991, da Costa do
Marfim em 1996, da Bulgária em 1992 e da Romênia em 1995 (Quadro 2.3). A

Além de documentos genéricos como a Declaração do Rio e a Agenda 21, diversas


convenções internacionais têm incorporado a AIA em seus textos, devendo-se citar
a Convenção sobre Diversidade Biológica, também aprovada durante a Conferência
do Rio:
a ;ã o de Im pacto A m biental: conceitos e métodos

Arligo 14 - Avaliação de impacto e minimização de impactos negativos:


1. Cada Parte Contratante, na medida do possível, e conforme o caso, deve:
a) estabelecer procedimentos adequados que exijam a avaliação de impacto
ambiental de seus projetos propostos que possam ter sensíveis efeitos negativos
na diversidade biológica, a fim de evitar ou m inim izar tais efeitos e, conforme
o caso, perm itir a participação pública nesses procedimentos;
b) tomar providências adequadas para assegurar que sejam devidamente leva­
das em conta as conseqüências ambientais de seus programas e políticas que
possam ter sensíveis efeitos negativos na diversidade biológica; [...]

A Convenção avançou bastante nas recomendações quanto ao uso da AIA. Em sua


8Várias convenções 6a Conferência das Partes Contratantes (COP)8, realizada em Haia, Holanda, em 2002,
internacionais aprovou um documento intitulado “Diretrizes para incorporação de questões relativas
têm dispositivos à biodiversidade à legislação e/ou ao processo de avaliação de impacto ambiental e à
de avaliação
avaliação ambiental estratégica” (Resolução VI/7), que traz recomendações detalhadas
e atualização,
mediante a sobre o assunto.
realização de
reuniões periódicas A Convenção sobre Mudança do Clima, igualmente firmada durante a Conferência do
oficiais de Rio, tam bém faz menção à AIA, neste casõ, sobre seu emprego, para avaliar medidas
representantes de mitigação ou de adaptação às mudanças climáticas, lembrando que muitas vezes
dos países, as
as próprias iniciativas ambientais também precisam ter seus impactos avaliados:
conferências das
partes contratantes.
Artigo 4 - Obrigações
1. Todas as Partes, levando em conta suas responsabilidades comuns mas dife­
renciadas e suas prioridades de desenvolvimento, objetivos e circunstâncias
específicas, nacionais e regionais, devem:
[...]
f) levar em conta, na medida do possível, os fatores relacionados com a
mudança do clima em suas políticas e medidas sociais, econômicas e ambientais
pertinentes, bem como empregar métodos adequados, tais como avaliações
de impactos, formulados e definidos nacionalmente, com vistas a m inim izar
os efeitos negativos na economia, na saúde pública e na qualidade do meio
ambiente, provocados por projetos ou medidas aplicadas pelas Partes para miti­
garem as mudanças do clima ou a ela se adaptarem; [...1

Mesmo convenções firmadas antes da difusão internacional da AIA incorporaram


seus princípios e recomendações, como é o caso da Convenção de Ramsar para a
/ /

Proteção de Areas Úmidas de Importância Internacional. Essa convenção foi firmada


em 1971, na cidade iraniana de Ramsar, com o objetivo principal de proteger os há-
bitats de aves migratórias, cuja sobrevivência depende do estado de conservação de
planícies de inundação, lagos, estuários, manguezais e demais zonas úmidas. Como
outras convenções firmadas sob a égide da ONU, os países aderentes reúnem-se pe­
riodicamente nas Conferências das Partes, durante as quais são tomadas decisões
relativas à implementação da convenção. Resoluções da 6a Conferência das Partes
Contratantes (COP), realizada em Brisbane, Austrália, em 1996; da 7a COP, realizada
em San José, Costa Rica, em 1999; e da 8a COP, realizada em Valência, Espanha, em
2002, preconizam o uso da AIA para proteger as zonas úmidas. Por exemplo, a Reso­
lução VI.16, tomada en San José:

CAPÍTU! LO
O r ig e m e d if u s ã o d a a v a l ia ç ã o d e im p a c t o a m b ie n

PEDE às Partes Contratantes que fortaleçam e consolidem seus esforços para as­
segurar que todo projeto, plano, programa e política com potencial de alterar o
caráter ecológico das zonas úmidas incluídas na lista Ramsar ou de impactar ne­
gativamente outras zonas úmidas situadas em seu território, sejam submetidos
a procedimentos rigorosos de estudos de impacto, formalizando tais procedi­
mentos mediante os ajustes necessários em políticas, legislação, instituições e
organizações.

ALENTA as Partes Contratantes a se assegurar de que os procedimentos de


avaliação de impacto se orientem à identificação dos verdadeiros valores dos
ecossistemas de zonas úmidas, em termos dos múltiplos valores, benefícios e
funções que proveem, para permitir que estes amplos valores ambientais sejam
incorporados aos processos de tomada de decisões e de manejo;

ALENTA, ademais, as Partes Contratantes a assegurar que os processos de


avaliação de impactos referentes a zonas úmidas sejam realizados de maneira
transparente e participativa, e que incluam os interessados diretos locais [...]
(Secretaria de la Convención de Ramsar (2004).

Outra convenção que inicialmente não fazia menção à AIA, mas incorporou reco­
mendações explícitas, é a Convenção sobre a Conservação de Espécies Migratórias
de A nim ais Selvagens, firmada em Bonn, A lem anha, em 1979. A Resolução 7/2 da 7a
COP, realizada em Bonn, em 2002,

ENFATIZA a importância da avaliação de impacto ambiental e da avaliação


ambiental estratégica de boa qualidade como ferramentas para implementar
o Artigo 11(2) da Convenção, para evitar ameaças às espécies migratórias (...)

URGE às Partes que incluam, quando for relevante, nas avaliações de impacto
ambiental e nas avaliações ambientais estratégicas, a consideração mais com­
pleta possível dos efeitos de impedimento à migração [...], dos efeitos transfron-
teiriços às espécies migratórias e dos impactos sobre os padrões migratórios.

Um ponto que não é tratado pelas legislações nacionais é o de que alguns em preen­
dimentos podem causar impactos para além das fronteiras. Um tratado internacional
promovido pela Comissão Econômica das Nações Unidas para a Europa, mas aberto
à adesão de países que não sejam membros dessa organização, é a Convenção sobre
Avaliação de Impacto Ambiental em um Contexto Transfronteiriço, conhecida como
Convenção de Espoo, cidade da Finlândia onde foi aprovada em 1991. Trata-se da
primeira convenção multilateral desse tipo, e está em vigor desde 10 de setembro de
1997. A semelhança das leis nacionais sobre AIA, a Convenção estabelece:
% uma lista de atividades às quais se aplica (Anexo I);
& um procedimento a ser seguido;
# a necessidade de que os países potencialmente afetados sejam notificados;
& procedimentos para participação pública em todos os países potencialmente afe­
tados;
• um conteúdo mínimo para a documentação do processo de TUA (Anexo II).
ação ce ■Ti pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

Essa convenção procurou estimular a cooperação internacional, evitar o aparecimento


de conflitos entre Estados e, quando surgem, estabelecer mecanismos para resolvê-los.
Certamente convenções similares são necessárias em outras regiões do Planeta, como
mostra a controvérsia que emergiu, em 2005 e 2006, entre o Uruguai e a Argentina,
motivada pela proposta de construção de duas fábricas de celulose naquele país, e que
suscitou reações governamentais e manifestações populares na Argentina, inclusive
com bloqueio de pontes internacionais, devido ao receio de poluição das águas do rio
Uruguai, que nesse local forma a fronteira entre os dois países, e aos possíveis impac­
tos sobre a agricultura e o turismo.

Trata-se de projetos de grande porte para um país como o Uruguai. 0 maior deles
prevê investimentos de US$ 1,1 bilhão em uma indústria de celulose e em plantações
de eucaliptos, cuja “influência socioeconômica se estenderá direta ou indiretamente
a todo o Uruguai e mesmo às zonas vizinhas na província argentina de Entre-Rios”
(Botnia, 2004, EIA Summary, p. 95). As duas fábricas localizam-se na pequena cidade
de Fray Bentos, com 22 mil habitantes. 0 presidente argentino pediu que fosse reali­
zado um “estudo de impacto ambiental independente” (A. Vidal, “Kirchner pidió a
Uruguay q u cfren e por 90 dias las papeleras”, El Clarín, 2 de março de 2006).

Observa-se, então, que, para além de leis nacionais ou subnacionais, a avaliação de


impacto ambiental é promovida em inúmeros documentos de âmbito internacional,
que preconizam seu uso, voluntário ou obrigatório, para diferentes finalidades de
planejamento ou de auxílio à decisão. Cada vez mais, a AIA vem atender a uma
necessidade de estabelecer mecanismos de controle social e de decisão participativa
acerca de projetos e iniciativas de desenvolvimento econômico.

2 .5 A I A n o B r a s il
Os primeiros estudos ambientais preparados no Brasil para alguns grandes projetos
hidrelétricos durante os anos 1970
,i, .
são, em grande parte, um reflexo da influência de
^_

demandas originadas no exterior, de modo similar ao ocorrido em outros países. Mas


não haveria também pressões internas para prevenir a ocorrência de danos ambientais
causados por grandes projetos de desenvolvimento?-

A década de 1970 foi marcada pelo significativo crescimento da atividade econômica


e pela expansão das fronteiras econômicas internas, com a progressiva incorporação
à economia de mercado de vastas áreas do domínio dos cerrados e da Amazônia.
A expansão econômica e territorial foi impulsionada por investimentos governamentais
de grande monta em projetos de infraestrutura, dos quais a rodovia Transamazônica e
a barragem de Itaipu são ícones. A estratégia de desenvolvimento econômico da qual
esses projetos faziam parte era criticada por alguns setores da intelectualidade (por
exemplo, Furtado, 1974, 1982; Cardoso ^ Muller, 1978; Oliveira, 1980), mas seus im­
pactos ambientais eram mencionados somente en passant. No entanto, nessa mesma
época, começa a cristalizar-se no País um pensamento “ecológico” bastante crítico
desse mesmo modelo de desenvolvimento (Lago e Pádua, 1984).

0 estudo de impacto da usina hidrelétrica de Tucuruí certamente não influenciou a


decisão de realizar o projeto, tendo sido feito em 1977, embora as obras já tivessem

LO
O r ig e m e d if u s ã o d a a v a l ia ç ã o de im p a c t o a m b ie

sido iniciadas no ano anterior. Esse estudo foi realizado por ura único profissional9, °Robert Goodland
que basicamente compilou a informação disponível e identificou os principais im­ fe z seu douwrado
pactos potenciais. Em seguida, um Plano de Trabalho Integrado para Controle sobre a ecologia do
cerrado brasileiro
Ambiental, de ju n h o de 1978, orientou o subsequente aprofundamento dos estudos,
e fo i coauror de
com vários levantamentos de campo realizados por instituições de pesquisa e a Amazon Jungle:
“adoção de algumas ações de mitigação de impactos negativos” (Monosowski, 1994, Green Hell to Red
p. 127). Segundo esta autora, na ausência de exigência legal para avaliação prévia de Desert?, publicado
impactos ambientais, no Brasil como A
Selva Amazônica:
entre os fatores que m otivaram a realização dos estudos incluem-se a falta de do Inferno Verde
ao Deserto
experiência na implantação de projetos hidrelétricos de grande porte em regiões
Vermelho?, em,
de floresta tropical úmida, a influência de práticas adotadas pelas agências de
uma versão da qual
financiamento internacionais e a pressão da opinião pública nacional e interna­
foram suprimidas
cional, em especial da comunidade científica, de grupos ecologistas e de inte­ menções à atuação
resses locais (p. 127). governamental
e seu papel na
No meio acadêmico, por outro lado, já se iniciavam pesquisas sobre os impactos destruição da
ambientais de grandes projetos, como as barragens no baixo curso do rio Tietê, São floresta amazônica.
(Goodland e Irwin,
Paulo. Tundisi (1978) montou um experimento de muitos anos visando a estabelecer
1975). Mais tarde,
uma linha de base das condições ecológicas antes da construção de dois reservatórios, esse ecólogo fo i
que pudesse ser comparada com as condições após a inundação. Também em 1978 foi um dos primeiros
realizado um seminário sobre os “Efeitos das Grandes Represas no Meio Ambiente e profissionais da
no Desenvolvimento Regional”, e Garcez (1981) contrapôs qualitativamente os “efei­ área ambiental
contratados pelo
tos benéficos e prejudiciais das grandes barragens”. Banco Mundial
quando da
Foi uma conjunção de fatores internos e externos, ou endógenos e exógenos, na an á­ reformulação do
lise de Pádua (1991), que propiciou um avanço das políticas ambientais no Brasil e Departamento de
Meio Ambiente, em
acabou levando o Poder Executivo a formular o projeto de lei sobre Política Nacional
1989.
do Meio Ambiente, aprovado-pelo Congresso em 31 de agosto de 1981, e que incluiu a
avaliação de impacto ambiental como um dos instrumentos para atingir os objetivos
dessa lei, que são, entre outros (art. 4o):
# compatibilizar o desenvolvimento econômico e social com a proteção ambiental;
# definir áreas prioritárias de ação governamental;
# estabelecer critérios e padrões de qualidade ambiental e normas para uso e
manejo de recursos ambientais;
# preservar e restaurar os recursos ambientais “com vistas à sua utilização racio­
nal e disponibilidade permanente, concorrendo para a manutenção do equilíbrio
ecológico propício à vida”;
# obrigar o poluidor e o predador a recuperar e/ou indenizar os danos.

Não há dúvida de que a atuação de agentes financeiros multilaterais e de outras orga­


nizações internacionais teve um papel central na adoção da AIA por muitos países em
desenvolvimento. Todavia, foram as condições internas - os fatores endógenos - que
propiciaram uma acolhida mais ou menos favorável para que se pusessem em prática
os princípios de prevenção e de precaução inerentes à AIA. No Brasil, parece ter
ocorrido uma convergência entre as demandas colocadas por agentes exógenos e as
demandas internas formuladas por determinados grupos sociais, como o Movimento
64 |R J ja lia ç ã o de im pacto A m biental: conceitos e métodos

dos Atingidos por Barragens (MAB) e diversos setores do movimento ambientalista.


Durante as décadas de 1970 e de 1980, apesar das restrições à democracia impostas
pelo governo militar, o movimento ambientalista foi paulatinamente se firmando e
legitimando seu discurso (Silva-Sánchez, 2000; Viola, 1987, 1992), tendo os impactos
socioambientais dos grandes projetos estatais ou privados como um dos focos da
crítica ao modelo de desenvolvimento adotado, visto como socialmente excludente e
ecologicamente destrutivo (Lutzemberger, 1980; Sánchez, 1983).

Em termos de institucionalização, a avaliação de impacto ambiental chegou ao Brasil


por meio das legislações estaduais - Rio de Janeiro e Minas Gerais adiantando-se
à legislação federal. 0 caso do Rio de Janeiro tem maior interesse, pois foi a partir
dessa experiência pioneira que mais tarde foi regulamentado o estudo de impacto
ambiental no País. A origem da AIA no Estado está ligada à implementação de um
sistema estadual de licenciamento de fontes de poluição (Moreira, 1988) em 1977,
que atribuiu à Comissão Estadual de Controle Ambiental (Ceca) a possibilidade de
estabelecer os instrumentos necessários para analisar os pedidos de licenciamento.
Segundo Wandesforde-Smith e Moreira (1985), foram alguns dos próprios técnicos
]0Órgão da Feema10 (Fundação Estadual de Engenharianio Meio Ambiente) que levantaram a
governamental possibilidade de exigir um relatório de impacto ambiental como subsídio ao licencia­
encarregado de mento. Isso permitiria que fossem levados em conta aspectos relativos a “uso do solo,
zelar pela proteção
fauna e flora, e variáveis demográficas e econômicas”, ao invés de restringir a a n á ­
ambiental, em
lise a questões de qualidade do ar e da água. Uma relação tão direta entre a AIA e o
especial no que se
refere ao controle licenciamento foi um a estratégia empregada por esse grupo para facilitar a aceitação
da poluição. Foi de uma nova ferramenta de planejamento ambiental, e estabelecer um contexto de
criado em março de aplicação que já era familiar, ou seja, o licenciamento ambiental. Em outras palavras,
1975. tratava-se de um compromisso entre o uso ideal da AIA (o planejamento de novos
projetos, planos ou programas) e a possibilidade de aplicação imediata.

0 esforço rendeu poucos frutos, pois até 1983 a Ceca exerceu seu poder de exigir um
relatório de impacto ambiental somente duas vezes e, em ambos os casos, com parcos
resultados. Todavia, os profissionais comprometidos com a AIA conseguiram pôr em
prática, entre 1980 e 1983, um programa de capacitação técnica, com a assistência do
Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, que incluiu intercâmbios inter­
nacionais e proveu uma sólida formação acerca dos fundamentos e dos métodos de
avaliação de impactos, a ponto de dar ao grupo “um nível de visibilidade e competência
que lhe rendeu respeito e legitimidade” (Wandesforde-Smith e Moreira, 1985, p. 235).
Esse conhecimento teria importância capital alguns anos depois, quando os estudos
de impacto ambiental foram regulamentados no âmbito da legislação federal.

Dessa forma, a AIA somente se firmaria no Brasil a partir da legislação federal.


Inicialmente, cabe menção à avaliação de impacto ambiental prevista na Lei n° 6.803,
de 2 de julho de 1980, para subsidiar o planejamento territorial dos locais oficialmen­
te reconhecidos como “áreas críticas de poluição” (Essa denominação foi introduzida
pelo Decreto-lei n° 1.413, de 14 de agosto de 1975). 0 projeto de lei sobre zoneamento
industrial, antes de ser votado em plenário, foi examinado por um a comissão mista do
Congresso Nacional. Ao projeto governamental foram apresentadas 17 emendas, das
quais oito propunham a introdução do estudo de impacto, tendo a proposta partido

CAPÍTU LO
O r ig e m e d if u s ã o d a a v a l ia ç ã o de im p a c t o a m b i f m M í 65

da Sociedade Brasileira de Direito do Meio Ambiente. Houve o acolhimento em parte


da proposição (Machado, 2003).

Segundo esse mesmo autor, que à época era presidente dessa sociedade, a proposta
encam inhada ao Congresso tin ha o seguinte teor:

0 Estudo de Impacto compreenderá um relatório detalhado sobre o estado in i­


cial do lugar e de seu meio ambiente; as razões que m otivaram a sua escolha;
as modificações que o projeto acarretará, inclusive os comprometimentos irre­
versíveis dos recursos naturais; as medidas propostas para suprimir, reduzir e,
se possível, compensar as conseqüências prejudiciais para o meio ambiente; o
relacionamento entre os usos locais e regionais, a curto prazo, do meio ambiente
e a manutenção e a melhoria da produtividade, a longo prazo; as alternativas
propostas. 0 Estudo de Impacto será acessível ao público, sem quaisquer ônus
para a consulta dos interessados.
Os congressistas não acolheram integralmente a proposta, mas incluíram a
ideia:
[...]
§ 2° Caberá exclusivamente à União, ouvidos os governos estadual e municipal
interessados, aprovar a delimitação e autorizar a implantação de zonas de uso
estritamente industrial que se destinem à localização de pólos petroquímicos,
cloroquímicos, carboquímicos, bem como instalações nucleares e outras defi­
nidas em lei.
§ 3o Além dos estudos normalm ente exigíveis para o estabelecimento de zone-
amento urbano, a aprovação das zonas a que se refere o parágrafo anterior será
precedida de estudos especiais de alternativas e de avaliação de impacto, que
perm itam estabelecer a confiabilidade da solução a ser adotada.

A parte essa iniciativa pioneira, foi com a aprovação da Lei da Política Nacional do
Meio Ambiente, de 1981, que efetivamente a AIA foi incorporada à legislação bra­
sileira, incorporação esta conjfirmada e fortalecida com o art. 225 da Constituição
Federal de 1988:

Art. 225 - Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,


bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se
ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as
presentes e as futuras gerações.
§ Io Para assegurar a efetividade desse direito, incum be ao Poder Público:
[-]
IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencial­
mente causadora de significativa degradação ambiental, estudo prévio de im ­
pacto ambiental, a que se dará publicidade;

A partir de então, diversas constituições estaduais e leis orgânicas municipais também


adotaram o princípio, e o Estado do Rio de Janeiro aprovou uma lei específica^sobre
AIA, de número 1.356/88.

Na prática, as legislações estaduais que precederam a Lei n° 6.938/81 foram aplicadas


em poucas ocasiões, e foi somente a partir da regulamentação da parte especifica­
mente referida à AIA dessa lei, em 1986, que o instrumento realmente passou a ser
ação de Im pacto A m biental: conceitos e métodos

aplicado. A lei havia dado ao Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama) uma
série de atribuições para regulamentá-la e, usando dessa prerrogativa, o Conselho
aprovou sua Resolução 1/86, em 23 de janeiro desse ano, estabelecendo um a série de
requisitos. 0 Conama é composto por representantes do governo federal, de governos
estaduais e de entidades da sociedade civil, incluindo organizações empresariais e
organizações ambientalistas. Alguns conselheiros atuaram ativamente na preparação
da Resolução 1/86. A resolução estabelece:
# uma lista de atividades sujeitas a AIA como condição para licenciamento
ambiental;
# as diretrizes gerais para preparação do estudo de impacto ambiental;
# o conteúdo mínimo do estudo de impacto ambiental;
# o conteúdo mínimo do relatório de impacto ambiental;
# que o estudo deverá ser elaborado por equipe multidisciplinar independente do
empreendedor;
# que as despesas de elaboração do estudo correrão por conta do empreendedor;
# a acessibilidade pública do relatório de impacto ambiental e a possibilidade deste
participar do processo.

Ficou assim estabelecido que, dentro do processo de avaliação de impacto ambiental, o


proponente do projeto deveria apresentar dois qjocumentos, preparados por uma equipe
técnica multidisciplinar independente:
# o Estudo de Impacto Ambiental (EIA); e
# o Relatório de Impacto Ambiental (Rima), documento destinado à informação e
consulta pública e que, por tal razão, deve ser escrito em linguagem não técnica
e trazer as conclusões do EIA.

A Resolução Conama 237/97 aboliu a “independência” da equipe que elabora o EIA.


Em teoria, a regulamentação brasileira, de modo inovador, previa que o EIA fosse o
equivalente de um a auditoria de terceira parte, na qual um a equipe independente for­
mula um parecer sobre determinada atividade, à imagem da auditoria contábil. Como
a própria regulamentação também estabelecia que as despesas correriam por conta
do proponente dos empreendimentos submetidos à avaliação de impacto ambiental,
na prática, esses empreendedores contratavam empresas de consultoria, pagando
diretamente pelo serviço prestado. A Resolução Conama 237/97 definiu critérios de
competência para o licenciamento ambiental, cujos princípios já constavam da Lei
da Política Nacional do Meio Ambiente (artigo 10). Quando da votação da Resolução
1/86 no Conama, alguns conselheiros sugeriram que caberia à administração pública
escolher a equipe multidisciplinar que realizaria os estudos, mas tal provisão não foi
aprovada.

É conveniente conhecer a correspondência entre a terminologia americana - muito


usada na literatura internacional - e a brasileira:
# em inglês, a sigla ELA - Environmental Impact Assessment eqüivale a AIA -
Avaliação de Impacto Ambiental;
# em inglês, a sigla EIS - Environmental Impact Statement eqüivale a EIA - Estudo
de Impacto Ambiental.

LO
O r ig e m e d if u s ã o d a a v a l ia ç ã o de im p a c t o a m b i e ^

Na literatura técnica, também se encontra EIA como Environmental Impact Analysis e


EIR - Environmental Impact Report como sinônimo de EIS. Além disso, termos como
environmental assessment também são usados.

A legislação americana não previu o Rima, mas a prática impôs tal necessidade:
o equivalente desse documento é muitas vezes chamado de summary EIS. Outras legis­
lações, como a brasileira, também requerem a apresentação de uma versão do EIA
escrita em linguagem não técnica.

Quando da promulgação da Constituição, a lei já existia - era justamente a Lei da


Política Nacional do Meio Ambiente - e havia sido regulamentada em 1983, pelo
Decreto Federal 88.351 que determinou que “caberá ao Conama fixar os critérios
básicos, segundo os quais serão exigidos estudos de impacto ambiental para fins de
licenciamento (...)” (Art. 17, parágrafo I o). Esse decreto foi revogado e substituído pelo
Decreto 99.274, de 6 de ju n h o de 1990, que manteve inalterado tal dispositivo.

Dessa forma, no Brasil, o processo de avaliação de impacto ambiental é vinculado ao


licenciamento ambiental, que é primariamente de competência estadual. Devido à sua
regulamentação, o processo de AIA no País passou a ser conduzido, essencialmente,
pelos órgãos estaduais de meio ambiente. Face à necessidade de emitir licenças
ambientais, estabelecidas pela lei federal, muitos Estados tiveram que criar estruturas
administrativas para receber e analisar os pedidos, uma vez que a maioria ainda não
dispunha, em meados dos anos 1980, de instituições com essa finalidade. Foi a partir
da publicação da Resolução Conama 1/86 que começaram efetivamente a ser realizados
estudos de impacto ambiental no Brasil, que rapidamente atingiram a casa das dezenas
ou mesmo da centena de estudos realizados anualmente em Estados como São Paulo. Ao
Ibama - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, na
qualidade de organismo federal, cabe o licenciamento de obras ou atividades de compe­
tência da União (o licenciamehto ambiental será tratado no Cap. 3).

Deve-se observar que não se exige a apresentação de estudo de impacto ambiental


para toda e qualquer atividade que necessite de uma licença ambiental para funcionar.
A Constituição estabelece que somente para aquelas com o potencial de causar signi­
ficativa degradação ambiental deve-se preparar um EIA. A princípio, a lista do artigo
2o da Resolução Conama 1/86 estabelece a relação dessas atividades, podendo o órgão
licenciador, eventualmente, exigir o EIA também para outras atividades, desde que
possam causar impactos significativos (essa questão será tratada no Cap. 5).
'ação de Impacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

O Brasil tem hoje um complexo sistema institucional de gestão do meio ambiente,


regido por vasto aparelho legal. A legislação vigente foi criada em diferentes momen­
tos, sob distintos contextos sociais, políticos e econômicos. Por essa razão, e porque
toda norma legal representa um compromisso entre interesses diversos e muitas ve­
zes divergentes, é útil conhecer um pouco dessa história legislativa. Embora se trate
de um instrumento bastante inovador, a AIA foi inserida em um contexto legal e
institucional que a precedeu, de forma que convém conhecer suas principais caracte­
rísticas para apreciar todo seu alcance.

Na primeira parte deste capítulo será apresentada um a periodização da legislação


e da política ambiental brasileira, no plano federal, apontando os principais textos
legais e as instituições criadas para aplicar essa política. A periodização aqui apre­
sentada é baseada principalmente em Monosowski (1989).

A organização institucional para gestão ambiental vigente no Brasil decorre de


um certo número de políticas públicas, expressas formalmente pela legislação.
• Políticas e leis estabelecem alguns instrumentos de intervenção do Estado, que são
os mecanismos, procedimentos e métodos empregados com a finalidade de aplicar
um a política pública, ou seja, para atingir os objetivos nela expressos. Exemplos
desses instrumentos são o licenciamento ambiental, a autorização adm inistrativa
para supressão de vegetação nativa e a própria avaliação de impacto ambiental.

3.1 B r e v e h is t ó r ic o
Pode-se identificar, segundo Monosowski (1989), quatro fases principais na política
ambiental brasileira, que correspondem a diferentes concepções do meio ambiente
e do seu papel nas estratégias de desenvolvimento econômico. Embora elas pratica­
mente se sucedam cronologicamente, não há substituição de um a política por outra,
mas, sim, superposição, o que transform a a atual política ambiental brasileira em um
mosaico onde coexistem os conceitos dos anos 1930 com aqueles do final do século
XX. 0 Quadro 3.1 indica os principais marcos dessa evolução, apontando algumas
leis aqui citadas e as instituições do governo federal encarregadas de aplicá-las.

A d m i n i s t r a ç ã o de r e c u r s o s n a t u r a is
Datada dos anos 1930, com a reorganização do Estado brasileiro promovida por Ge-
túlio Vargas e o início de um processo mais intenso de industrialização, a principal
preocupação inerente a essa fase da política ambiental brasileira é racionalizar o uso
e a explotação dos recursos naturais mediante políticas públicas setoriais que regu-
i

\ lamentam o acesso e a apropriação desses recursos.

Isso não significa que inexistissem iniciativas a fim de disciplinar o uso dos recursos
naturais em território nacional. No final do século XVIII, a Coroa portuguesa editou
medidas para preservar madeiras de lei utilizadas na construção naval, pois “as ins­
peções e relatórios indicam que não existia mais madeira adequada por muitas léguas
nas proximidades das vilas maiores” (Dean, 1997, p. 152). É bem conhecido o Alvará
do Rei Dom José, de 9 de ju lh o de 1760, que tenta conter a devastação dos mangues,
empregados em curtumes:

CAPÍTU
Q u a d r o l e g a l e in s t it u c io n a l d a a v a l ia ç ã o d e im p a c t o a m b ie n t a l n o B r

Q u a d r o 3.1 P rin c ip a is le is e in s titu iç õ e s fe d e ra is e n vo lv id a s n a g e s tã o a m b ie n ta l no B ra s il


A no Instrum ento leg al I n s titu iç ã o
A d m i n i s t r a ç ã o d e r e c u r s o s n a t u r a is
/

1934 C ódigo de A g u a s (e Política N a c io n a l de DNAEE (a tu a l A neel)


Recursos H ídricos - 1997) ANA
1934 C ódigo Florestal (m o d ific a d o em 1965) S erviço Florestal (desde 1921), depois
DRNR (1 9 5 9 ), IBDF (196 7), a tu a l Ibam a
(desde 1989)
1934 C ó d ig o de M in a s ( p o s te r io r m e n te D N PM
C ódigo de M in e ra ç ã o - 1967, m o d if i­
cado em 1996)
1937 D e c re to -le i de P ro te çã o ao Iphan (ta m b é m , ao lo n g o dos anos, Sphan
P a trim ô n io H is tó ric o , A r tís tic o e e IBPC)
A r q u e o ló g ic o
1938 C ó d ig o de Pesca (m o d ific a d o em 1967) Sudepe (1 9 6 2 ) (a tu a l Ibam a)
1961 Lei sobre m o n u m e n to s a rq u e o ló g ic o s N ão cria nova in s titu iç ã o
e p r é - h is tó r ic o s
1967 Lei de P rote ção à Fauna IBDF (a tu a l Ibam a)
2000 Lei do S iste m a N a c io n a l de U nid ade s N ão cria nova in s titu iç ã o
de C onse rva çã o
[ C o n t r o l e d a p o l u iç ã o in d u s t r ia l ■

1973 D e cre to 7 3 .0 3 0 (criação da Sema) Sem a (1 9 7 4 ), a tu a l Ibam a


1 9 75 DL 1.413 - c o n tr o le da p o lu iç ã o Sema, a tu a l Ibam a
in d u s tria l
■ P l a n e j a m e n t o t e r r it o r ia l 1

T 9 79 \_e\ 6 .7 6 6 - p a rc e la m e n to do solo u rb a n o N ão cria n o va in s titu iç ã o


1 9 80 Lei 6 .8 0 3 - z o n e a m e n to a m b ie n ta l nas N ão cria nova in s titu iç ã o
áreas c r itic a s de p o lu iç ã o
1988 Lei 7.661 - p la n o n a c io n a l de Parte in te g r a n te da Política N a c io n a l
g e re n c ia m e n to c o s te iro do M e io A m b ie n te
2001 Lei 10.257 - E s ta tu to da Cidade Não cria nova in s titu iç ã o
2002 D e c re to 4 .2 9 7 - z o n e a m e n to Parte in te g r a n te da Política N a c io n a l
e c o ló g ic o - e c o n ô m ic o do M e io A m b ie n te
| P o l ít ic a N a c io n a l d o M eio A m b i e n t e

1981 Lei 6 .9 3 8 - Política N a c io n a l do M e io S isnam a


A m b ie n te (a lte ra ç õ e s : leis 7 .8 0 4 /8 9 Conama
e 9 .0 2 8 /9 0 )
N ota: Estão referidas som ente as datas de criação das in stitu içõ e s e as leis que lhes deram origem . A m a io ria delas
fo i alterada diversas vezes.
Siglas: ANA - A gência N acional de Águas; A neel - A gência N a cio na l de Energia E létrica; Conam a - Conselho
N a cional do M eio A m biente; DNAEE - D epartam ento N a cio n a l de Águas e Energia E létrica; DNPM - D e p a rta ­
m ento N acional da Produção M in e ra l; DRNR - D epartam ento de Recursos N aturais Renováveis; Ibam a - In s titu to
B rasileiro do M eio A m biente e dos Recursos N aturais Renováveis; IBDF - In s titu to B rasileiro de D esenvolvim ento
Florestal; IBPC - In s titu to Brasileiro do P atrim ônio C ultural; Iphan - In s titu to do P atrim ônio H istórico e A rtís tic o
N acional; Sema - Secretaria Especial do M eio A m biente; Sisnam a - Sistem a N a cion a l do M e io A m biente; Sudepe -
S uperintendência de Desenvolvim ento da Pesca.
sção ae mpacto A m biental: conceitos e métodos

[...] sou servido ordenar que, da publicação desta em diante, se não cortem as
árvores dos mangues que não estiverem já descaídas, debaixo da pena de cinqüenta
mil réis, que será paga da cadeia, onde estarão os culpados por tempo de três meses,
dobrando-se as condenações e o tempo de prisão pelas reincidências [...]

Também a explotação irracional das minas de ouro e diamante, decadentes nessa


mesma época, levou a Coroa a reagir, buscando a orientação de especialistas luso-
brasileiros, inicialmente, e estrangeiros depois da transferência da Corte para o Rio
de Janeiro (Sánchez, 2003). Nessa tarefa destacou-se José Bonifácio, que, no cargo
de Intendente Geral das Minas, teceu fortes críticas não apenas aos métodos rudi­
mentares usados na mineração, como também à agricultura itinerante (Pádua, 1987).

A derrubada das matas para dar lugar a uma agricultura incipiente era percebida por
intelectuais do final do período colonial e do Império como um dos graves entraves ao
desenvolvimento nacional (Pádua, 2002). Hoje o processo seria descrito como a dilapi­
dação do capital natural, sem que disso resultasse o crescimento do capital econômico
ou humano. A regulação do acesso e do uso dos recursos naturais, dos quais o Brasil
era rico, seria essencial para colocar o País no rumo do desenvolvimento.

A regulamentação posta em prática no período getulista se deu pela promulgação


de diversos códigos, cada um estabelecendo critérios para o aproveitamento econô­
mico de um único recurso natural. Os principais recursos naturais reconhecidos à
]0 conceito de época foram incluídos nesse conjunto de leis1. Assim, os recursos hídricos, florestais,
recurso natural minerais e pesqueiros foram objeto de regulamentação específica, definindo-se as
é dinâmico.
modalidades e condições de uso e apropriação por parte dos agentes econômicos.
Depende, dentre
outros fatores, da Ao mesmo tempo, foram criadas ou reorganizadas as instituições governamentais
disponibilidade de encarregadas de aplicar os dispositivos legais e, portanto, da gestão governamental
conhecimento ou desses recursos.
tecnologia capaz
de promover o
aproveitamento Como o objetivo principal dessa primeira fase de políticas ambientais era regulam entar
econômico de um o acesso aos recursos naturais, não se trata a rigor de um a política ambiental, tal qual
recurso. Assim , a entendemos hoje, mas de um conjunto de políticas de recursos naturais. No entanto,
tenta-se atualmente
regulamentar o traziam em seu bojo diversos mecanismos destinados a compatibilizar o uso desses
acesso aos recursos recursos com sua conservação a longo prazo.
genéticos, que vêm
sendo reconhecidos
0 melhor exemplo é o Código Florestal, que estabeleceu as florestas protetoras e abriu
como de grande
importância neste a possibilidade do poder público declarar determinadas porções do território como
início de século e, parques nacionais, estaduais ou municipais, hoje conhecidos como unidades de con­
ao mesmo tempo, servação, locais onde o uso direto dos recursos naturais é proibido ou estritamente
vem sendo objeto de
disputas políticas
regulamentado. Ademais, as florestas também têm reconhecidas suas funções de:
e geopolíticas
(Shiva, 2001), a) conservar o regime das águas;
como também b) evitar a erosão das terras pela ação dos agentes naturais;
ocorreu com outros c) fixar dunas;
recursos.
d) auxiliar a defesa das fronteiras [...];
e) assegurar condições de salubridade pública; proteger sítios que por sua beleza
natural mereçam ser conservados;
f) asilar espécimes raros da fauna indígena.
(Art. 4o, Decreto n° 23.793, de 23/01/1934, Código Florestal.)

CAPÍTU LO
Q u a d r o l e g a l e in s t it u c io n a l d a a v a l ia ç ã o de im p a c t o a m b ie n t a l n o B

Tais salv ag u ard as atendiam em parte a dem andas de m aior controle do Estado sobre
a desenfreada derrubada de florestas para a contínua expansão das áreas destinadas
a atividades agropecuárias. Nesse sentido, j á se faziam ouvir vozes entre intelectuais
e altos funcionários ainda no período colonial (Pádua, 2002). Em 1934, a realização
da Prim eira Conferência Brasileira de Proteção da Natureza, no Rio de Janeiro, em
defesa da “flora, fauna, sítios e m onum entos n a tu ra is ” (Urban, 1998, p. 88), é um a
expressão ainda tím ida de um m ovim ento associativo com objetivos de proteção
ambiental, como a Sociedade dos Amigos das Árvores.

Não é por coincidência que nesse período se prom ulga a prim eira lei referente à
preservação do patrim ônio histórico, arqueológico e artístico que, aliás, tam bém p ro ­
move a conservação ambiental:

Equiparam-se aos bens a que se refere o presente artigo e são tam bém sujeitos a
tom bam ento os m onum entos naturais, bem como os sítios e paisagens que im­
porte conservar e proteger pela feição notável com que tenham sido dotados pela
natureza ou agenciados pela indústria hum ana.
(Art. I o, par. 2o, Decreto-lei n° 25, de 30/11/1937.)

0 ano de 1937 é tam b ém o da criação do prim eiro parque nacional brasileiro, o de


Itatiaia. 0 conceito de “parque nacional”, oriundo dos Estados Unidos, foi bem aco­
lhido por alg u n s intelectuais e cientistas brasileiros, com destaque para o engenheiro
A ndré Rebouças, que j á em 1876 publicou u m a obra em que p ro p u n h a a criação de
um parque na ilha do B ananal e outro nas Sete Quedas ou Guaíra, no rio P a ra n á
(Urban, 1998).

Todos os códigos promulgados durante o governo Vargas foram revistos e reform u­


lados por ocasião do regime m ilitar im plantado em 1964, que acrescentou a Lei de
Proteção à Fauna ao rol da, legislação de recursos naturais, dando ao então Instituto
Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (IBDF) a atribuição de aplicá-la. Foram
significativas as modificações introduzidas no Código Florestal (Lei n° 4.775, de 15 de
setembro de 1965), que passou a ter um caráter um pouco mais conservacionista, com
a declaração de que são de preservação perm anente as florestas e demais form as de
vegetação n atu ral situadas ao longo de rios, ao redor de lagoas e nascentes, no topo
de morros, nas encostas de alta declividade, nas restingas, nas bordas de tabuleiros e
chapadas, e em altitudes superiores a 1.800 m.

No entanto, um a característica desse período, com reflexos que p erd uram ainda hoje, é
o tratam ento profundam ente desarticulado dado a essas políticas, aplicadas por órgãos
independentes, vinculados a m inistérios diferentes e, não raras vezes, com objetivos
contraditórios. Assim, aos conflitos legais, ou seja, incompatibilidades e incoerências
entre as leis, sobrepuseram -se conflitos políticos referidos às orientações quanto à
aplicação das leis. Isso é ilustrado pelo conflito entre o Código de M ineração e o Código
Florestal. Enquanto o primeiro estabelecia critérios p ara concessão de autorizações de
pesquisa e lavra m ineral, o segundo estabelecia unidades de conservação, onde toda
explotação de recursos n atu rais era proibida. Todavia, desconhecendo ou desconsi­
derando o Código Florestal, o D epartam ento Nacional da Produção Mineral (DNPM)
dava essas autorizações inclusive em áreas de parques nacionais ou estaduais.
ação de Impacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

Conflitos e profundas dificuldades de articulação existiam no interior de um


mesmo órgão governamental. 0 IBDF era, ao mesmo tempo, responsável por esti­
mular a produção florestal e implantar e gerir parques nacionais e outras unidades
de conservação, enquanto corria a anedota de que as tartarugas, quando dentro
d’água, estavam sob jurisdição do IBDF, e, fora d’água, sob jurisdição da Sudepe -
Superintendência de Desenvolvimento da Pesca.

A fragilidade institucional é uma característica dos órgãos públicos encarregados da


gestão dos recursos naturais no Brasil. Isso significa mais que carência de recursos
financeiros ou falta de vontade política dos dirigentes: envolve a preparação e a ca­
pacitação de recursos humanos, bem como a definição clara da missão institucional
/

do órgão. E sintomática a declaração de Alceo M agnanini, em depoimento a Teresa


Urban: “Quando foi criado, o IBDF recebeu um orçamento especial que nenhuma
repartição pública jam ais recebeu no ato de criação, mas não teve preparo para em­
pregar esses recursos, que simplesmente foram devolvidos. Quase 60% devolvidos,
enquanto nós precisávamos, desesperadamente, de guardas florestais, de guarda-
-parques, de pessoal de pesquisa, tudo” (Urban, 1998, p. 253).

As instituições encarregadas dos recursos florestais passaram por diversas tra n s ­


formações, sem nunca ter condições institucionais plenas de realizar sua missão. “0
Serviço Florestal, criado em 1921 e regulamentado em 1925, não chegou a desen­
volver atividades expressivas até 1930, quando foi praticamente substituído por uma
‘Seção de Reflorestamento’ dentro do Serviço de Fomento da Produção Florestal”
(Urban, 1998, p. 103). Nessa época, havia ainda duas outras instituições encarre­
gadas do fomento da produção de recursos florestais, o Instituto Nacional do Mate,
criado em 1938, e o Instituto Nacional do Pinho, de 1941. 0 Serviço Florestal voltou
em 1944, contando inclusive, e pela primeira vez, com um a Seção de Parques
Nacionais, até que fosse substituído, em 1959, pelo Departamento de Recursos
Naturais Renováveis. Manteve-se com esse nome até 1967, quando foi criado o IBDF -
Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal - já na vigência do novo Código
Florestal de 1965.

C o n t r o le d a p o l u iç ã o in d u s t r ia l
No início dos anos 1970, alguns recursos naturais, antes abundantes, tornaram-se es­
cassos em várias regiões do mundo, inclusive no Brasil. Um exemplo é a bacia do alto
Tamanduateí, na região do ABC paulista, onde se concentram ainda hoje inúmeras in­
dústrias. Nessa região, a água estava tão poluída que era imprópria para abastecimento
industrial. Já se notavam também problemas de poluição do ar em grandes cidades.

Por outro lado, havia nessa época todo um contexto internacional que trouxe pela
primeira vez a questão ambiental para o rol das principais preocupações da socieda­
de. Alguns países já haviam criado instituições governam entais especializadas em
problemas de poluição, como foi o caso dos Estados Unidos, cuja Environm ental Pro-
tection Agency (EPA) fora criada em 1970. Dentre os eventos marcantes do período,
deve-se mencionar a Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano,
realizada em Estocolmo, em 1972. Foi bastante difundida a versão de que a posição
da delegação brasileira nessa conferência caracterizou-se por defender que, se a po ­
luição era o preço a pagar para o desenvolvimento, então o País receberia de braços

capítuíW SIH H ^BSIBI


Q u a d r o l e g a l e in s t it u c io n a l d a a v a l ia ç ã o de im p a c t o a m b ie n t a l n o B

abertos as indústrias poluidoras. Porém, segundo Guimarães (1991), os representantes


oficiais argum entaram que o desenvolvimento não deveria ser sacrificado em prol de
um ambiente mais limpo e que os países mais ricos deveriam pagar pelos esforços
de despoluição.

Nessa conferência, começou a ser esboçado o conceito de ecodesenvolvimento, que


precedeu a noção hoje vigente de desenvolvimento sustentável.

Apesar da posição governamental, algumas medidas foram tomadas. Uma delas


foi a criacão, em 1973, da Secretaria Especial do Meio Ambiente (Sema), vinculada
ao Ministério do Interior, que era então o grande promotor do modelo de desen-
volvimento no País, liderando a imphjnbagãp de grandes projetos, como a rodovia
Transamazônica e as usinas hidrelétricas de Tucuruí e Itaipu. Pelo Decreto-lei
n° 1.413, de 14 de agosto de 1975, o governo federal introduziu orientações de política
voltadas para o controle da poluição industrial, que incluíam:
# atribuição de competência à Sema para estabelecer padrões ambientais;
# o estabelecimento de penalidades em caso de não cumprimento da legislação;
# a criação de “áreas críticas de poluição”, correspondentes a porções do território
nacional onde o governo reconhecia a existência de problemas graves de polui­
ção; essas áreas incluem regiões metropolitanas, Cubatão e a bacia carbonífera
de Santa Catarina;
# atribuição de competência exclusiva ao governo federal para aplicar a san ­
ção de suspensão de atividade para aqueles empreendimentos considerados “de
alto interesse do desenvolvimento e da segurança nacional” (Guimarães, 1991,
p. 59), competência que foi efetivamente exercida quando o município de Con­
tagem, em Minas Gerais, depois de um a série de protestos populares, pretendeu
determ inar a paralisação das atividades de um a fábrica de cimento.

Cabe notar que, além das iniciativas do governo federal, alguns Estados também
começaram a legislar sobre poluição. Esse foi o caso do Rio de Janeiro, por meio do
Decreto-lei n° 134/75, e de São Paulo, por meio da Lei n° 997/76. As políticas estaduais
também criaram instituições, como a Feema - Fundação Estadual de Engenharia
do Meio Ambiente -, criada no Rio de Janeiro em março de 1975, e a Cetesb, hoje
chamada de Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental, criada com essa
mesma sigla, mas outro nome, em julho de 1973, sucedendo um centro de pesquisa
também chamado Cetesb e fundado em 1968. Em abril de 1975, a Cetesb incorporou
as atribuições da Superintendência de Saneamento Ambiental da Secretaria da Saúde.

A política federal, assim como suas contrapartidas estaduais, era de cunho essen­
cialmente corretivo_e foi formulada para ter um a ap]icaçjLo exclusivamente
tecnoburocrática, ou seja, estava excluída toda forma de participação pública.
Ao público, cabia, no m áximo, o papel de denunciar condutas lesivas à qualidade
ambiental. 0 controle governam ental exercia-se por meio de um a negociação
restrita entre Estado e poluidor.

Diversas atividades causadoras de.degradação ambiental escapavam completamente


a essa política. Por exemplo, a produção de agrotóxicos estava enquadrada, mas não
sua utilização; o mesmo se dava com a produção de automóveis, pois não havia
aliação de Impacto A m biental: conceitos e métodos

normas de emissão para os veículos automotores. Além disso, um a série de atividades


não industriais, como a construção de barragens, rodovias e portos, estava comple­
tamente fora do alcance dessa política.

Era também uma política de alcance territorial restrito às zonas urbanizadas e indus­
triais, ficando, portanto, excluída de sua aplicação a maior parte do País, que era
justam ente objeto das políticas desenvolvimentistas governamentais. O interesse
econômico e a visão de curto prazo predominavam mesmo nos raros casos em que
era evocada a proteção da saúde pública, como na fábrica de cimento de Contagem.

Paralelamente, o governo federal continuava a aplicar a política de criação de es-


paços protegidos, agora tam bém atribuição da Sema, em concorrência ao IBDF. A
Sema competia criar estações ecológicas, nova categoria de unidade de conservação
(a primeira foi decretada em 1977). Por meio da Lei n° 6.513/77, foi também dada
atribuição à Empresa Brasileira de Turismo (Embratur) para declarar áreas de inte­
resse turístico, onde deveriam ser restringidas as atividades capazes de degradar o
potencial turístico.

P l a n e j a m e n t o t e r r it o r ia l
Datam de meados da década de 1970 os primeiros planos de uso do solo no Brasil,
que procuravam ordenar as formas de ocupação do espaço urbano. Por insufici­
ência das políticas anteriores, já se notavam sérios problemas de fornecimento de
água em certas regiões metropolitanas. Assim, em dezembro de 1975, o Estado
de São Paulo, pela Lei n° 898, estabeleceu uma área de proteção doa m ananciais na
Região Metropolitana. Essa lei passou a disciplinar o uso do solo para a proteção de
mananciais, cursos e reservatórios de água e demais recursos hídricos. A Lei Estadual
n° 1.172, de 17 de novembro de 1976, delimitou as áreas de proteção relativas aos
mananciais, cursos e reservatórios de água a que se refere o artigo 2o da Lei n° 898,
impondo normas de restrição de uso do solo em tais áreas e oferecendo providências
correlatas. 0 Decreto.n.° 9.714, de 19 de abril de 1977, aprovou.o Regulamento das Leis
n° 898 e 1.172, que dispõem sobre o disciplinamento do uso do solo para a proteção
aos mananciais da Região Metropolitana da Grande São Paulo.

Isso foi um esboço de atuação preventiva, que, nesse caso, foi malsucedida, pois não
conseguiu evitar a degradação dos mananciais. Da mesma época, datam iniciativas
de zoneamento industrial, em um a perspectiva de separação entre uso de solo
industrial e áreas residenciais. Em 27 de outubro de 1978, a Lei Estadual de São Paulo
n° 1.817 definiu diretrizes para o zoneamento e a localização de indústrias na Região
Metropolitana, visando, entre outros objetivos, “compatibilizar o desenvolvimento
industrial com a melhoria de condições de vida da população e com a preservação do
meio ambiente” (Art Io, III).
f
A Lei Estadual n° 1.817 estabeleceu os objetivos e as diretrizes para o desenvolvimento
industrial metropolitano e disciplinou o zoneamento industrial, a localização, a
classificação e o licenciamento de estabelecimentos industriais na Região Metropoli­
tana de São Paulo. Não se trata de licenciamento ambiental no sentido atual do termo
(Res. Conama 237/97), mas do que é denominado “licenciamento metropolitano”, um a

CAPÍTU LO
Q u a d r o l e g a l e in s t it u c io n a l d a a v a l ia ç ã o de im p a c t o a m b ie n t a l n o B

aprovação da localização de estabelecimentos industriais, desde que respeitadas as


diretrizes de zoneamento e de uso do solo. O Decreto n° 13.095, de 5 de janeiro de
1979, aprovou o regulamento da Lei n° 1.817 nas matérias relativas à localização, ao
licenciamento de estabelecimentos industriais na Região Metropolitana de São Paulo
e sua fiscalização.

As iniciativas federais a fim de usar o planejamento territorial como instrumento


de prevenção da degradação ambiental incluem a Lei n° 6.766, de 19 de dezembro de
1979, conhecida como Lei Lehman, que dispõe sobre o parcelamento do solo urbano,
e a Lei n° 6.803, de 2 de julho de 1980, que estabelece diretrizes para o zoneamento
industrial nas áreas críticas de poluição. Um ponto importante dessa lei é que nela
consta a primeira menção à avaliação de impacto ambiental na legislação federal
(conforme seção 2.5).
'Âi
Como estratégia de política ambiental, o planejamento territorial dessa época padece
dos mesmos problemas que a política de controle da poluição industrial. Aplicava-se
a porções restritas do território (essencialmente as zonas urbanas), enquanto a maior
parcela do País estava sujeita a pressões crescentes sobre os recursos naturais e a
formas difusas de poluição, como aquela proveniente do uso descontrolado de agro-
tóxicos. Não havia mecanismos de participação pública na formulação dos planos
de uso do solo e as atividades reguladas eram essencialmente as de caráter privado.
A lei não era aplicada às ações do próprio governo, seja porque não havia dispositivos
jurídicos para isso (por exemplo, para prevenir e mitigar impactos ambientais decor­
rentes de grandes obras de infraestrutura), seja por falta de vontade política quando
a lei permitia a ação do Estado (por exemplo, a complacência face à poluição causada
pelas grandes indústrias estatais como a Companhia Siderúrgica Paulista - Cosipa -,
localizada em Cubatão).

0 planejamento territorial com fms de proteção ambiental ganhou um espectro mais


amplo a partir do final da década de 1980, com a Lei Federal n° 7.661, de 16 de maio
de 1988, que estabelece um plano nacional de gerenciamento costeiro, já subordinado
à Política Nacional do Meio Ambiente. 0 ordenamento territorial com fms de prote­
ção ambiental passou a ser conhecido como Zoneamento Ecológico-Econômico (ZEE),
ganhou força a partir dos anos 1990 e foi regulamentado pelo Decreto n° 4.297, de 10
de julho de 2002.

Por outro lado, a Lei n° 10.257, de 10 de julho de 2001 — Estatuto da Cidade —, esta­
beleceu um quadro atualizado para a gestão urbana, reforçando dispositivos como
o ordenamento e controle do uso do solo urbano. Dentre os instrumentos de política
urbana, a lei inclui “o estudo prévio de impacto ambiental (EIA) e o estudo prévio de
impacto de vizinhança (EIV)” (Art. 4o, VI), ressaltando que “os instrumentos mencio­
nados neste artigo regem-se pela legislação que lhes é própria, observado o disposto
nesta lei” (Art. 4o, Io).

0 gerenciamento costeiro, o Zoneamento Econômico-Ecológico e o Estatuto da Cida­


de, ainda que inseridos nessa mesma óptica de planejamento territorial inaugurada
nos anos 1970, decorrem de uma redefinição de direitos e responsabilidades decor­
rentes da Constituição Federal de 1988. Antes dela, porém, o Congresso Nacional já
tin ha aprovado a inovadora e abrangente Política Nacional do Meio Ambiente.
78 f K B a l'aÇ3 ° ^ Im pacto A m biental: conceitos e métodos

P o l ít ic a N a c i o n a l d o M eio A m b i e n t e
Um modelo radicalmente novo de política ambiental foi inaugurado com a aprova­
ção pelo Congresso Nacional da Lei n° 6.938, de 31 de agosto de 1981, que instituiu
a Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA). Essa lei trouxe diversas inovações.
No plano dos instrumentos de ação, instituiu, entre outros, a avaliação de impacto
ambiental e o licenciamento ambiental, até então existente apenas na legislação de
alguns Estados (Quadro 3.2).
Q u a d r o 3 . 2 In s tru m e n to s do P o lític a N a c io n a l do M e io A m b ie n te (segundo o A r t 9 a da Lei 6.9 3 8 /8 1 , m o d ific a d a pelas
Leis 7 .0 0 4 /8 9 e 8 .0 2 8 /9 0 )
I - 0 e s ta b e le c im e n to de padrões da q u a lid a d e a m b ie n ta l.
II - 0 z o n e a m e n to a m b ie n ta l.
III - A a v a lia ç ã o de im p a c to s a m b ie n ta is .
IV - 0 lic e n c ia m e n to e a revisão de a tiv id a d e s e fe tiva ou p o te n c ia lm e n te poluidoras.
V - Os in c e n tiv o s à p ro d u ç ã o e in s ta la ç ã o de e q u ip a m e n to s e à cria ç ã o ou absorção de te c n o lo g ia , v o lta d o s para a
m e lh o ria da q u a lid a d e a m b ie n ta l.
VI - A criação de espaços te r r ito r ia is e s p e c ia lm e n te p ro te g id o s pelo Poder Público Federal, Estadual e M u n ic ip a l, tais
c o m o Áreas de Proteção A m b ie n ta l, de Relevante Interesse Ecológico e Reservas E xtrativistas.
VII - 0 S istem a N a c io n a l de In fo rm a ç õ e s sobre o M e io A m b ie n te .
VIII - 0 C adastro Técnico Federal de A tiv id a d e s e In s tru m e n to s de Defesa A m b ie n ta l.
IX - As p e nalidad es d is c ip lin a re s ou c o m p e n s a tó ria s ao não c u m p r im e n to das m edid as necessárias à preservação ou
correção da de g ra d a çã o a m b ie n ta l.
X - A In s titu iç ã o do R ela tó rio de Q ua lid a d e do M e io A m b ie n te , a ser d iv u lg a d o a n u a lm e n te pelo Ibama.

No plano institucional, a lei inovou ao criar uma estrutura articulada deórgãos


governamentais dos três níveis de governo, o Sisnama (Sistema Nacional do Meio
f Ambiente), inovou também ao criar o ..Conama (Conselho Nacional do Meio Am ­
biente), composto por representantes de diferentes órgãos federais, estaduais e por
representantes da sociedade civil, incluindo o setor empresarial, sindical e organi­
zações não governamentais. O Conama foi incumbido de diversas tarefas, entre as
quais a de regulam entar a Lei n° 6.938 e a de formular diretrizes de política ambiental
(Quadro 3.3).

Na esfera política, a nova lei e seu decreto regulamentador (n° 88.351, de Io de j u ­


2 Esse decreto nho de 1983)2 estabelecem avanços importantíssimos: criam um mecanismo formal
foi revogado e de participação, ainda que restrito, que é o próprio Conama; oferecem ao público o
substituído pelo
direito de ser informado (acessibilidade do Rima - Relatório de Impacto Ambiental);
Decreto n° 99.274,
de 6 de junho de instituem o princípio da responsabilidade objetiva do poluidor, que, “independente
1990. No entanto, da existência de culpa, é obrigado a indenizar ou reparar os danos causados ao meio
para o que aqui ambiente e a terceiros”; e permitem a legitimidade ao Ministério Público para propor
interessa, não
ação de responsabilidade civil e criminal por danos causados ao meio ambiente.
houve modificações
dignas de nota,
razão pela qual é A lei foi regulamentada inicialmente por um decreto do Poder Executivo que tardou
preferível registrar mais de dois anos em ser publicado, possivelmente devido às novidades que trazia e às
o primeiro decreto
que regulamentou a mudanças de postura que exigia, inclusive do próprio governo. Uma inovação quase
Política Nacional do inédita foi que as atividades de iniciativa governamental também passavam a ser
Meio Ambiente. regidas pelos princípios da legislação ambiental.

CAPÍTU LO
Q u a d r o l e g a l e i n s t i t u c i o n a l d a a v a l i a ç ã o de i m p a c t o a m b i e n t a l n o 79

Q u a d r o 3 .3 A trib u iç õ e s do C onselho N a c io n a l do M e io A m b ie n te (segundo 0 A rt. 8 o da Lei 6.9 3 8 /8 1 , m o d ific a d a pe las


Leis 7 .0 0 4 /8 9 e 8 .0 2 8 /9 0 )
l - Estabelecer n o rm a s e c rité rio s para 0 lic e n c ia m e n to de a tiv id a d e e fe tiv a ou p o te n c ia lm e n te p o lu id o ra , a ser c o n ­
cedido pelos Estados e s u p e rv isio n a d o pelo Ibama.
II - D e te rm in a r a realização de estudos de a lte rn a tiv a s e das possíveis co n se qüê ncias a m b ie n ta is de p ro je to s públicos
ou p rivad os e s p e c ia lm e n te nas áreas consideradas p a tr im ô n io na ciona l.
III - Decidir, c o m o ú ltim a in s tâ n c ia a d m in is tr a tiv a em grau de recurso, m e d ia n te d e p ó s ito prévio, sobre as m u lta s e
o u tra s penalidades im p o sta s pelo Ibama.
V - D eterm inar, m e d ia n te represe nta ção ao Ibama, a perda ou restriçã o de be nefícios fiscais co n ce d id o s pelo Poder
Público, em c a rá te r geral ou c o n d ic io n a l, e a perda ou suspensão de p a rtic ip a ç ã o em lin has de fin a n c ia m e n to em
e s ta b e le c im e n to s o fic ia is de crédito.
VI - Estabelecer, p riv a tiv a m e n te , norm as, c rité rio s e padrões na cio n a is de c o n tro le de p o lu iç ã o por ve ículos a u t o m o ­
tores, aeronaves e em barcações, m e d ia n te a u d iê n c ia dos M in is té rio s c o m p e te n te s .
VII - Estabelecer norm as, c rité rio s e padrões re la tiv o s ao c o n tro le e à m a n u te n ç ã o da q u a lid a d e do m e io a m b ie n te ,
com vistas ao uso ra cio n a l dos recursos a m b ie n ta is , p rin c ip a lm e n te os hídricos.

Alguns princípios que hoje podem parecer evidentes e mesmo autoexplicativos não 0
eram quando da discussão da lei, ainda sob 0 regime militar que governou 0 País entre
1964 e 1984. Os grandes projetos de alto impacto ambiental construídos nesse período
foram decididos exclusivamente no âmbito de círculos restritos do poder e, mesmo de­
pois de concluídos, 0 acesso a seus documentos era difícil. Fearnside (1989), que analisa
os impactos da barragem de Balbina, construída no rio Uatumã, Amazonas, comen­
ta que “muitos relatórios são mais raros que manuscritos medievais copiados à mão”
(p. 418). O direito de acesso à informação avançou muito desde então, e a lei da Política
Nacional do Meio Ambiente foi fundamental para sua consolidação.

Finalmente, é fundamental citar outra lei que representou importantes avanços na


proteção ambiental, embora não estabeleça política. Trata-se da Lei n° 7.347, de 24 de
julho de 1985, conhecida como Lei dos Interesses Difusos. Por meio dela, ampliou-se 0
conceito de dano ambiental com a definição dos chamados interesses difusos, que são
aqueles comuns a um grupo indeterminado ou indeterminável de pessoas, como ocorre
com os moradores de uma região, os freqüentadores de um espaço público, os consumi­
dores de certos produtos e as minorias raciais. Essa lei permitiu um a ação contundente
do Ministério Público em matéria ambiental.

Coroando as iniciativas legislativas de proteção ambiental, a Constituição Federal de \


1988 estabeleceu 0 direito de todos a um ambiente sadio. Seu artigo 225 estabeleceu
diversos princípios de defesa da qualidade ambiental, inclusive a necessidade de que
0 poder público exija “para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora
de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a
que se dará publicidade” (inciso IV).

Estava assim consolidado 0 papel da avaliação de impacto ambiental no ordenamento


jurídico brasileiro. A evolução posterior deu-se somente no sentido de detalhar sua
aplicação, estabelecer competências entre os níveis de governo e aprimorar a relação
entre a AIA e os demais instrumentos de política ambiental.
ação de Impacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

3 .2 L i c e n c i a m e n t o a m b i e n t a l
No Brasil, estudos am bientais são exigíveis para obter-se um a autorização gover­
nam ental para realizar atividades que utilizem recursos am bientais ou ten ham o
potencial de causar degradação ambiental. Tal autorização, conhecida como li­
cença am biental, é um dos instrum entos mais im portantes da política ambiental
pública. Tem caráter preventivo, pois seu emprego visa evitar a ocorrência de
danos ambientais.

Fundamentos ju r íd ic o s
0 licenciamento ambiental é um a das manifestações do poder de polícia do Est ado
< W *£

(Mukai, 1992), que é o poder de limitar o direito individual em benefício da co­


letividade. Os especialistas em Direito Administrativo distinguem entre licença e
autorização. Esta designa o ato unilateral e discricionário pelo qual a Administração
possibilita ao particular o desempenho de atividade material ou a prática de ato que,
sem esse consentimento, seriam legalmente proibidos. A autorização pressupõe um
julgam ento de valor por parte do agente público na análise do projeto e aplica-se aos
casos em que não existe um direito preexistente por parte do administrado para o
exercício daquela atividade. Esse direito nasce da vontade do Estado e no momento
em que é expedida a autorização.

Já a licença, para o Direito Administrativo, é o ato administrativo unilateral e v in cu ­


lado (à legislação e aos regulamentos) pelo qual a Administração faculta àquele que
preencha os requisitos legais o exercício de um a atividade. A licença é cham ada de
“ato vinculado” porque o agente público não pode agir com discricionariedade no
caso, mas apenas conferir se o empreendimento atende ou não às normas, exigências
e padrões da legislação. Parte-se do pressuposto de que o direito preexiste à licença,
que nada mais faz do que reconhecê-lo.

Nessa linha, se um cidadão pretende construir um edifício em um local permitido pela


legislação municipal de uso do solo e se o projeto do edifício atender aos requisitos do
Código de Obras, a Prefeitura não pode negar-lhe a licença para construir. A licença
significa estabilidade temporal e não pode ser suspensa por simples discricionarie­
dade. Já a autorização é sempre precária e pode ser retirada pela Administração que
a concedeu. Naturalmente, tanto a concessão como a revogação de uma autorização
devem ser “motivadas” (Machado, 1993, p. 52), ou seja, fundam entadas não somente
em um a apreciação jurídica como em uma análise técnica.

Com fundamento nesses conceitos, alguns juristas argumentam que a licença ambiental
é, na verdade, uma autorização (Machado, 1993; Mukai, 1992). Como tal, não há direito
“líquido e certo” de um empreendedor obter um a licença ambiental, mas cabe ao agente
público (o órgão licenciador) analisar o projeto pretendido e seus impactos ambientais
para decidir da conveniência ou não de conceder a licença (autorização), e quais con­
dições podem ser impostas para que esta seja concedida.

Oliveira (1999) discorda dessa classificação. Para ele, licença ambiental é mesmo uma
licença no sentido jurídico do termo, porém, “é informada pelos princípios do Direito
Ambiental, que fazem a diferença” (p. 37), ao torná-la não definitiva, com prazo de
validade e com condicionantes.

capítuI S E HHHHHHH
Q u a d r o l e g a l e in s t it u c io n a l d a a v a l ia ç ã o de im p a c t o a m b ie n t a l n o B

Independentemente de sua natureza jurídica, é claro que a proteção ambiental e o


zelo pela saúde pública são os fundamentos da necessidade de obter uma autorização
prévia do Poder Público para se empreender atividades potencialmente danosas ou
incômodas. Nesse sentido, pode-se postular que as funções do.licenciamento ambienta 1 \
são: (i) disciplinar e regulam entar o acesso aos recursos ambientais e suajLtiiização;
(ii) prevenir danos ambientais.

L i c e n c i a m e n t o a m b i e n t a l n o B r a s il
0 licenciamento ambiental no Brasil começou em alguns Estados, em meados da
década de 1970, e foi incorporado à legislação federal como um dos instrum entos
da Política Nacional do Meio Ambiente.

Mas a necessidade de autorização governamental para exercer atividades que inter­


firam com o meio ambiente tem um longo histórico, antes que o licenciamento
ambiental surgisse com as feições atuais. Já o Código Florestal de 1934 introduzira
a necessidade de obtenção de um a autorização para a “derrubada de florestas em
propriedades privadas”, o “aproveitamento de lenha para abastecimento de vapores e
máquinas”, e a “caça e pesca nas florestas protetoras e remanescentes”.

A legislação moderna sobre licenciamento ambiental começou no Rio de Janeiro, _


quando o Decreto-LeLiL0._D_á/Z5 tornou “obrigatória a prévia autorização para
operação ou funcionamento de instalação ou atividades real ou potencialmente
poluidoras”, enquanto o Decreto n° 1633/77 instituiu o Sistema de Licenciamento de
Atividades Poluidoras, estipulando que o Estado deve emitir Licença Prévia, Licença
de Instalação e Licença de Operação, modelo que seria posteriormente retomado pela
legislação federal.

Em São Paulo, a Lei n° 997/76' criou o Sistema de Prevenção e Controle da Polui­


ção do Meio Ambiente e foi regulamentada pelo Decreto n° 8.468/76, posteriormente
modificado. Em sua redação original, esse decreto estabelecia, em seu Título V -
Das licenças e do registro, duas modalidades de licença, denominadas Licença de
Instalação e Licença de Funcionamento.

0 licenciamento estadual paulista e o fluminense aplicavam-se a fontes de poluição,


basicamente atividades industriais e certos projetos urbanos como aterros de resíduos
e loteamentos. Com a incorporação da AIA à legislação brasileira, esses sistemas
preexistentes de licenciamento tiveram que ser adaptados, não somente no que tange
ao seu campo de aplicação (atividades que utilizem recursos ambientais ou que possam
causar degradação ambiental, ao invés de atividades poluidoras), mas também quanto
ao tipo de análise que passou a ser feita, não mais abrangendo somente emissões
de poluentes e sua dispersão no meio, agora incluindo os efeitos sobre a biota, os
impactos sociais etc.

Na legislação federal, o licenciamento aparece como um dos instrumentos da Política


Nacional do Meio Ambiente, descrito como “licenciamento e revisão de ativida­
des efetiva ou potencialmente poluidoras” (Art. 96, Inciso IV). São as seguintes as
condições para exigência de licença:
açso ne m pacto A m biental: conceitos e métodos

A construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e ativi­


dades utilizadoras de recursos ambientais, considerados efetiva ou potencialmente
poluidores, bem como os capazes, sob qualquer forma, de causar degradação
ambiental, dependerão de prévio licenciamento de órgão estadual competente,
integrante do Sistema Nacional do Meio Ambiente - Sisnama, e do Instituto Bra­
sileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - Ibama, em caráter
supletivo, sem prejuízo de outras licenças exigíveis.
(Art. Io, Lei n° 6938/81.)

Trata-se, portanto, não somente de atividades que possam causar poluição ambiental,
mas qualquer forma de degradação, denotando um a evolução no entendimento das
causas da deterioração da qualidade ambiental, que não mais são somente atribuídas
/

à poluição, mas a outras causas oriundas das atividades humanas. E também interes­
sante observar, na redação do Artigo 10, que se exige licença ambiental tanto para
a construção e instalação como para a ampliação de estabelecimentos e atividades
já existentes, assim como para seu funcionamento. Desta forma, a lei federal foi
redigida de forma a comportar os estágios de licenciamento já existentes no Rio de
Janeiro e em São Paulo. Finalmente, deve-se tam bém notar que o fechamento ou a
desativação de empreendimentos e atividades Utilizadoras de recursos ambientais ou
capazes de causar degradação ambiental não é objeto de licenciamento ou autoriza­
ção governamental. Essa última fase do ciclo de vida dos empreendimentos não era
percebida, no início dos anos 1980, como capaz de causar danos ambientais. Seria
preciso esperar até 2002 para encontrar na legislação ambiental brasileira referências
a obrigações relativas ao encerramento de atividades.

0 licenciamento na legislação federal seria detalhado no decreto que regulamentou a


Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, n° 88.351/83, revogado em 1990 e substi­
tuído pelo Decreto n° 99.274/90. Segundo esse decreto:

0 Poder Público, no exercício de sua competência de controle, expedirá as


seguintes licenças:
1 - Licença Prévia (LP), na fase preliminar do planejamento da atividade, con-
^ tendo requisitos básicos a serem atendidos nas fases de localização, instalação e
operação, observados os planos estaduais ou federais de uso do solo.
II - Licença de Instalação (LI), autorizando o início da implantação, de acordo
com as especificações constantes do Projeto executivo aprovado; e
III - Licença de Operação (LO), autorizando, após as verificações necessárias, o
início da atividade licenciada e o funcionamento de seus equipamentos de con­
trole de poluição, de acordo com o previsto nas Licenças Prévia e de Instalação.
(Art. 19, Decreto n° 99.274/90.)

Há um a lógica na seqüência de licenças. A licença prévia é solicitada quando o


projeto técnico está em preparação, a localização ainda pode ser alterada e alter­
nativas tecnológicas podem ser estudadas. 0 empreendedor ainda não investiu no
detalhamento do projeto e diferentes conceitos podem ser estudados e comparados.
A Licença de Instalação somente pode ser solicitada depois de concedida a Licença
Prévia; o projeto técnico é detalhado, atendendo às condições estipuladas na licença
prévia. Finalmente, a Licença de Operação é concedida depois que o empreendimen­
to foi construído e está em condições de operar, mas sua concessão é condicionada

CAPITU
Q u a d r o le g a l e in s t i t u c io n a l d a a v a lia ç ã o de im p a c to a m b ie n t a l n o Br

à constatação de que o projeto foi instalado de pleno acordo com as condições


estabelecidas na Licença de Instalação.

O vínculo entre o licenciamento e os estudos de impacto ambiental é tam bém estabe­


lecido pelo decreto regulam entador da Política Nacional do Meio Ambiente. O caput
do Artigo 17 do Decreto 99.274/90 retoma os termos do Artigo 10 da Lei n° 6.938/81
(transcrito acima) e acrescenta quatro parágrafos:

§ I o - Caberá ao Conama fixar os critérios básicos, segundo os quais serão exigidos


estudos de impacto ambiental para fms de licenciamento, contendo, entre outros,
os seguintes itens:
- diagnóstico ambiental da área;
- descrição da ação proposta e suas alternativas; e
- identificação, análise e previsão dos impactos significativos, positivos e nega­
tivos.
§ 2° - 0 estudo de impacto ambiental será realizado por técnicos habilitados e
constituirá o relatório de impacto ambiental - Rima, correndo as despesas à custa
do proponente do projeto.
§ 3o - Respeitada a matéria de sigilo industrial, assim expressamente caracteri­
zada a pedido do interessado, o Rima, devidamente fundamentado, será acessível
ao público.
§ 4o - Resguardado o sigilo industrial, os pedidos de licenciamento, em qualquer
de suas modalidades, sua renovação e a respectiva concessão da licença serão
objeto de publicação resumida, pelo interessado, no jornal oficial do Estado e em
periódicos de grande circulação, regional ou local, conforme modelo aprovado
pelo Conama.
(Art. 17, Decreto n° 99.274/90.)

Não se pode deixar de observar que esse vínculo entre o EIA e a licença foi reforçado
pela Constituição Federal de 1988>

[...1 incumbe ao Poder Público:


U
IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente
causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impac­
to ambiental, a que se dará publicidade;
(Art. 225, Constituição Federal.)

Ainda no plano federal, um im portante instrum ento regulador do licenciamento


ambiental é a Resolução n° 237, de 19 de dezembro de 1997, do Conama. Nessa reso­
lução, encontra-se a seguinte definição de licenciamento ambiental:

Procedimento adm inistrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a


localização, instalação, ampliação e operação de em preendim entos e atividades
utilizadoras de recursos am bientais consideradas efetiva ou potencialm en­
te poluidoras e daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação
ambiental, considerando as disposições legais regulam entares e as norm as téc­
nicas aplicáveis ao caso.
(Art. I o, Inciso I, Resolução Conama n° 237/97.)
'ação de Im pacto A m b ie n ta l: conceitos e m étodos

Recursos ambientais e degradação ambiental são termos definidos pela Lei da Política
Nacional do Meio Ambiente.

Recursos ambientais: a atmosfera, as águas interiores, superficiais e subterrâneas,


os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo e os elementos da biosfera, a fauna
e a flora.
Degradação da qualidade ambiental: alteração adversa das características do meio
ambiente.
(Art. 3o, Lei n° 6938/81.)

A Resolução Conama n° 237/97 tam bém estabelece regras para definir a competência
do Poder Público para fins de licenciamento. Licenciamento integra o âmbito da com­
petência de comum (Art. 23, VI da Constituição Federal), podendo ser disciplinado
pelos três níveis de governo.

A Lei da PNMA, j á em sua redação original de 1981, havia definido a prim azia dos
Estados para proceder ao licenciamento ambiental, cabendo ao governo federal, re­
presentado pelo Ibama, licenciar em caráter supletivo. A alteração da Lei da PNMA
feita pela Lei n° 7.084, de 18 de ju lho de 1989, definiu um campo específico para
o Ibama, que é o licenciamento “de atividades* e obras com significativo impacto
ambiental, e âmbito nacional ou regional” (Art. 10, § 4o, Lei n° 6.938/81). Mas a Reso­
lução Conama n° 237/97 tentou delim itar as competências, inclusive dos municípios.
Dessa forma, cabe ao Ibama o licenciamento de “empreendimentos e atividades com
significativo impacto ambiental de âmbito nacional ou regional”:

I - localizadas ou desenvolvidas conjuntamente no Brasil e em país limítrofe; no


mar territorial; na plataforma continental; na zona econômica exclusiva; em ter­
ras indígenas ou em unidades de conservação do domínio da União;
II - localizadas ou desenvolvidas em dois ou mais Estados;
III - cujos impactos ambientais diretos ultrapassem os limites territoriais do País
ou de um ou mais Estados;
IV - destinados a pesquisar, lavrar, produzir, beneficiar, transportar, armazenar e
dispor material radioativo, em qualquer estágio, ou que utilizem energia nuclear
em qualquer de suas formas e aplicações, mediante parecer da Comissão Nacional
de Energia Nuclear - CNEN;
V - bases ou empreendimentos militares, quando couber, observada a legislação
específica.
(Art. 4o, Resolução Conama n° 237/97.)

Em suas decisões de licenciamento, o Ibama deve ouvir os órgãos ambientais dos


Estados e municípios, assim como, quando pertinente, obter o parecer de outros ór­
gãos da adm inistração pública. Por outro lado, o Ibama poderá delegar aos Estados o
licenciamento de atividade com significativo impacto ambiental de âmbito regional.

Na prática, desde a publicação dessa resolução, o Ibam a tem ampliado sua atuação
no licenciamento ambiental em detrimento dos órgãos estaduais. A competência para
licenciar pode ser questionada na Justiça, como tem ocorrido em alguns casos.

A lguns municípios tam bém passaram a conceder licenças ambientais. Compete aos
municípios o licenciamento ambiental de empreendimento e atividades de impacto

CAPÍTU LO
Q u a d r o le g a l e in s t i t u c io n a l d a a v a lia ç ã o de im p a c to a m b ie n t a l n o Br

ambiental local e daquelas que lhe forem delegadas pelo Estado por instrumento legal
ou convênio (Art. 6o, Resolução Conama n° 237/97).

E studo s a m b ie n t a is
A definição dos estudos técnicos necessários ao licenciamento cabe ao órgão licen-
ciador. Todavia, nos casos de empreendimentos que tenham o potencial de causar
degradação significativa, sempre deverá ser exigido o estudo de impacto ambiental,
nos termos do dispositivo constitucional. Diversos tipos de estudos ambientais foram
criados, por diferentes instrum entos legais federais, estaduais ou municipais, com
o intuito de fornecer as informações e análises técnicas para subsidiar o processo
de licenciamento. Além do EIA e seu respectivo Rima, encontram-se denom ina­
ções como o plano e relatório de controle ambiental, relatório ambiental preliminar,
diagnóstico ambiental, plano de manejo, plano de recuperação de área degradada e
análise prelim inar de risco (Quadro 3.4). 0 termo “estudos am bientais” foi definido
pela Resolução Conama n° 237/97 para englobar diferentes denominações:

[...] são todos e quaisquer estudos relativos aos aspectos ambientais relacionados
à localização, instalação, operação e ampliação de uma atividade ou empreendi­
mento, apresentados como subsídio para a análise da licença requerida, tais como:
relatório ambiental, plano e projeto de controle ambiental, relatório ambiental
preliminar, diagnóstico ambiental, plano de manejo, plano de recuperação de área
degradada e análise preliminar de risco.
(Art. I o, Inciso III, Resolução Conama n° 237/97.)

Muitas normas adicionais foram estabelecidas para orientar o licenciamento de ativi­


dades específicas, estipulando a necessidade de apresentação de estudos ambientais
ou procedimentos simplificados. 0 Quadro 3.5 mostra as principais resoluções do
r

Conama que tratam da questão. E interessante observar, por meio da cronologia das
resoluções citadas, o tipo de projeto que mais atraía a atenção: no início, foram os
empreendimentos do setor elétrico, principalmente usinas hidrelétricas, seguidos de
>
projetos de mineração. Com efeito, quando a Resolução Conama n° 01/86 foi publi­
cada, exigindo a apresentação de estudos de impacto ambiental, várias barragens
estavam em construção ou em fase avançada de projeto, quase todas pertencentes a
empresas estatais, e foi preciso clarificar a função do EIA no planejamento. Assim,
a Resolução n° 6/87:

Na hipótese dos empreendimentos de aproveitamento hidroelétrico, respeitadas as


peculiaridades de cada caso, a Licença Prévia (LP) deverá ser requerida no início
do estudo de viabilidade da Usina; a Licença de Instalação (LI) deverá ser obtida
antes da realização da Licitação para construção do empreendimento e a Licença
de Operação (LO) deverá ser obtida antes do fechamento da barragem.
(Art. 5o, Res. Conama n° 6/87.)

Segundo essa resolução, o estudo de impacto ambiental deve ser apresentado para
obtenção da LP, enquanto, para solicitação da LI, um novo estudo ambiental deve ser
preparado, denominado Projeto Básico Ambiental.

Já os empreendimentos de mineração rapidamente formaram a maior parcela dos


estudos de impacto ambiental protocolizados nos órgãos ambientais de vários Estados.
'ação de Impacto A m biental: conceitos e métodos

Q u a d r o 3 . 4 Tipos de estudos a m b ie n ta is p re v is to s na le g isla ç ã o b ra sile ira


D e n o m in a ç ã o R e f e r ê n c ia leg al A p l ic a ç ã o

Estudos am b ie n ta is Res. Conam a 237, "são to d o s e quaisquer estudos rela tivo s aos aspectos a m b ie n ta is re­
de 19/12/1997 lacionados à localização, instalação, o p eração e a m p lia ç ã o de um a a t iv i­
dade ou e m p re e n d im e n to , a p re se ntado c o m o subsídio para a análise da
licença requ erida" (A rt. 1°, III)
Estudo prévio de C o n s titu iç ã o Instalação de obra ou a tiv id a d e p o te n c ia lm e n te causadora de s ig n ific a ­
im p a c to a m b ie n ta l Federal, A r t. 225,1°, tiv a de g ra d a çã o a m b ie n ta l
IV (1988)
EIA - Estudo de Res. Conam a 1, L ice n c ia m e n to de a tiv id a d e s m o d ific a d o ra s do m eio a m b ie n te e x e m ­
Im p a c to A m b ie n ta l e de 2 3 /1 /1 9 8 6 plifica das no A r t. 2° da Resolução
Rima - Rei. de
Im p a c to A m b ie n ta l
PBA - Projeto Básico Res. C onam a 6, O b te n çã o de licença de in sta la çã o de e m p re e n d im e n to s do se to r
A m b ie n ta l de 1 6 /9 /1 9 8 7 e lé tric o
PRAD - Plano de D ecreto Federal
/
O b rig a to rie d a d e de ap re se n ta çã o para to d o e m p re e n d im e n to de m in e ­
Recuperação de Areas n° 97.632, ração: deve ser in c o rp o ra d o ao EIA para novos projetos
Degradadas de 1 0 /4 /1 9 8 9
PCA - Plano de Res. C onam a 9, de O b te n ç ã o de licença de in s ta la ç ã o de e m p re e n d im e n to s de m in e ra ­
C o n tro le A m b ie n ta l 6 /1 2 /1 9 9 0 ção: "(...) c o n te rá os p ro je to s e x e c u tiv o s de m in im iz a ç ã o dos im p a c to s
a m b ie n ta is (...)"
Res. C onam a 286, O b te n ç ã o de licença de in s ta la ç ã o de e m p re e n d im e n to s de irrig a ç ã o
de 2 0 /8 /2 0 0 1
Res. C onam a 23, O b te n çã o de licença de op eração para p ro d u ç ã o de p e tró le o e gás
de 7 /1 2 /1 9 9 4
RCA - R elatório de Res. C onam a 10, O b te n çã o de licença de in sta la ç ã o de e m p re e n d im e n to s de e x tra ç ã o
C o n tro le A m b ie n ta l de 6 /1 2 /1 9 9 0 de bens m inerais de uso im e d ia to na c o n s tru ç ã o civil
Res. Conam a 23, O bte nção de licença prévia para p e rfu ra ç ã o de
de 7 /1 2 /1 9 9 4 poços de pe tró le o
EVA - Estudo de Res. C onam a 23, O b te n çã o de licença prévia para pesquisa da v ia b ilid a d e e co n ô m ica
V ia b ilid a d e A m b ie n ta l de 7 /1 2 /1 9 9 4 e de um c a m p o p e tro lífe ro
RAA - R elatório de Res. C onam a 23, O btenção de licença de instalação para pe rfu ra çã o de poços de petróleo
A valia ção A m b ie n ta l de 7 /1 2 /1 9 9 4
EVQ - Estudo de Res. C onam a 264, L ice n c ia m e n to de c o p ro c e s s a m e n to de resíduos em fo rn o s de c im e n to
V ia b ilid a d e de Q ueim a de 2 0 / 3 / 2 0 0 0
Plano de Res. C onam a 273, D esativação de postos de c o m b u s tíve is
E ncerram ento de 2 9 /1 1 /2 0 0 0
RAS - R elatório Res. C onam a 279, O b te n çã o de licença prévia de e m p re e n d im e n to s do se to r e lé tric o de
A m b ie n ta l S im p lific a d o de 27 /6 /2 0 0 1 pequeno p o te n cia l de im p a c to a m b ie n ta l
Plano de Emergência Res. C onam a 293, L ice n c ia m e n to de p o rto s organizados, in stalações p o rtu á ria s ou t e r m i­
Individual de 12/12/2001 nais, dutos, p la ta fo rm a s e in stalações de apoio
Plano de C o n tin g ê n cia Res. C onam a 316, L ice n c ia m e n to de unidades de tr a ta m e n to té r m ic o de resíduos
Plano de Emergência, de 2 9 /1 0 /2 0 0 2
Plano de D esativação Res. C onam a 316, E n ce rra m e n to de a tiv id a d e s dos sistem as de t r a ta m e n to té r m ic o de
de 2 9 /1 0 /2 0 0 2 resíduos
RAP - R elatório Res. S M A -S P 42, Para in s tr u ir re q u e rim e n to s de lic e n c ia m e n to a m b ie n ta l de e m p re e n d i­
A m b ie n ta l P relim inar de 2 9 /1 2 /1 9 9 4 m e n to s que possam causar im p a c to s s ig n ific a tiv o s
EAS - Estudo Res. S M A -S P 54, Para analisar e avaliar as conseqüências a m b ie n ta is de a tiv id a d e s e
A m b ie n ta l S im p lific a d o de 3 0 /1 1 /2 0 0 4 e m p re e n d im e n to s considerados de im p a c to s a m b ie n ta is m u ito pequenos
e não s ig n ific a tiv o s

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Q u a d r o l e g a l e in s t it u c io n a l d a a v a l ia ç ã o de im p a c t o a m b ie n t a l n o B r a ^ B 87

EAR - Estudo de N o rm a Técnica Para o lic e n c ia m e n to de a tivid a d e s in d u s tria is perigosas


Análise de Riscos/ Cetesb P 4.261,
PGR - Program a de de 2 0 /8 /2 0 0 3
G e re n cia m e n to de
Riscos / PAE - Plano de
A ção de Emergência
Plano de D esativação Dec. Estadual SP Para o e n c e rra m e n to de e m p re e n d im e n to s sujeitos ao lic e n c ia m e n to
47.400, a m b ie n ta l
de 4 /1 2 /2 0 0 2

Q u a d r o 3 . 5 R esoluções do C ona m a re fe re n te s a lic e n c ia m e n to a m b ie n ta l

A ssunto I

6, de 1 6 /9 /1 9 8 7 Dispõe sobre o lic e n c ia m e n to de e m p re e n d im e n to s do s e to r e lé tric o


9, de 6 /1 2 /1 9 9 0 Dispõe sobre p ro c e d im e n to s para o lic e n c ia m e n to de a tiv id a d e s de pesquisa m in e ra l, lavra
e b e n e fic ia m e n to de m in é rio s
10, de 6 / 1 2 /1 9 9 0 Dispõe sobre o lic e n c ia m e n to a m b ie n ta l de a tiv id a d e s de e x p lo ra ç ã o de bens m in e ra is de
uso na c o n s tru ç ã o civil
13, de 6 /1 2 /1 9 9 0 O b rig a to rie d a d e de lic e n c ia m e n to de q u a lq u e r a tiv id a d e que possa a fe ta r a b iota , caso se
situ e em um raio de 10 km de um a u n id a d e de conservação
23, de 7 / 1 2 /1 9 9 4 Dispõe sobre lic e n c ia m e n to a m b ie n ta l de a tiv id a d e s de exploração, p e rfu ra ç ã o e p ro d u ç ã o
de p e tró le o e gás n a tu ra l
264, de 2 0 /3 /2 0 0 0 Dispõe sobre lic e n c ia m e n to para o c o p ro c e s sa m e n to de resíduos em fo rn o s ro ta tiv o s de
c lín q u e r para fa b ric a ç ã o de c im e n to
273, de 2 9 /1 1 /2 0 0 0 Torna o b rig a tó r io o lic e n c ia m e n to a m b ie n ta l de postos revendedores, postos de a b a s te c i­
m e n to , in sta la çõ e s de sistem as re ta lh is ta s e postos flu tu a n te s de d e riva dos de p e tró le o e
o u tro s c >o m b u s tív e is
279, de 2 7 /1 /2 0 0 1 Estabelece p ro c e d im e n to s im p lific a d o para o lic e n c ia m e n to de e m p re e n d im e n to s de g e ra ­
ção e tra n s m is s ã o de energia e lé tric a com pe q u e n o p o te n c ia l de im p a c to a m b ie n ta l
284, de 3 0 /8 /2 0 0 1 Dispõe sobre o lic e n c ia m e n to de e m p re e n d im e n to s de irrig a ç ã o e os classifica em três
c a te g o ria s
286, de 3 0 /8 /2 0 0 1 O briga a realização de estudos e p id e m io ló g ic o s para o lic e n c ia m e n to de e m p re e n d im e n to s
cujas a tiv id a d e s p o te n c ia liz e m os fa to re s de risco para a o c o rrê n cia de m a lá ria em regiões
e n d ê m ica s
289, de 2 5 /1 0 /2 0 0 1 Estabelece d ire triz e s para o lic e n c ia m e n to a m b ie n ta l de p ro je to s de a s s e n ta m e n to s de
re fo rm a agrária
3 3 4 , de 3 /4 /2 0 0 3 Estabelece p ro c e d im e n to s de lic e n c ia m e n to a m b ie n ta l de e s ta b e le c im e n to s d e stin a d o s ao
re c e b im e n to de e m b a la g e n s vazias de a g ro tó x ic o s
335, de 3 / 4 /2 0 0 3 Dispõe sobre o lic e n c ia m e n to a m b ie n ta l de c e m ité rio s
344, de 2 5 / 3 / 2 0 0 4 Estabelece as d ire triz e s gerais e os p ro c e d im e n to s m ín im o s para a ava lia çã o do m a te ria l a
ser d ra g a d o
349, de 1 6 /8 /2 0 0 4 Dispõe sobre o lic e n c ia m e n to a m b ie n ta l de e m p re e n d im e n to s fe rro v iá rio s de pequeno
p o te n c ia l de im p a c to a m b ie n ta l e a re g u la riz a ç ã o dos e m p re e n d im e n to s em operação
350, de 6 / 7 / 2 0 0 4 Dispõe sobre o lic e n c ia m e n to a m b ie n ta l específico das a tiv id a d e s de aq u isiçã o de dacos
sísm icos m a rítim o s e em zonas de tra n s iç ã o
sção de Im pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

Tal fato não se devia a um a inusitada proliferação de novos projetos, mas à busca de
regularização de centenas de empreendimentos que já funcionavam sem as devidas
autorizações do DNPM e mesmo sem licença ambiental nos Estados que já a exigiam.
As duas resoluções do Conama, n° 9/90 e n° 10/90, estipularam a obrigatoriedade da
licença e os documentos necessários para requerê-la. Para solicitação de LP, deveria
ser apresentado um EIA, enquanto para a solicitação da LI, deveria ser preparado um
Plano de Controle Ambiental. A Resolução n° 10/90 abriu a possibilidade de dispensa
de apresentação do EIA, a critério do órgão licenciador, caso em que outro documento
deveria ser apresentado, denominado Relatório de Controle Ambiental.

Observe-se que, por meio das três resoluções citadas, foram criados nada menos que
três novos tipos de estudos técnicos - Projeto Básico Ambiental, Plano de Controle
Ambiental e Relatório de Controle Ambiental -, que a Resolução Conama n° 237/97
viria a denom inar de estudos ambientais.

Novas resoluções para guiar o licenciamento de outros tipos de empreendimentos


surgiram somente dez anos depois. Nesse ínterim, os órgãos ambientais estaduais
aperfeiçoaram seus procedimentos, ou mesmo os criaram. Nesse processo, foram
publicadas por esses órgãos outras normas aplicáveis a determinados tipos de
empreendimentos (por exemplo, licenciamento de aterros de resíduos, de m arinas etc).

3 .3 I m p a c t o de v i z i n h a n ç a
0 termo “impacto de vizinhança” é usado para descrever impactos locais em áreas u r­
banas, como sobrecarga do sistema viário, saturação da infraestrutura - como redes
de esgotos e de drenagem de águas pluviais -, alterações microclimáticas derivadas
de sombreamento, aumento da frequência e intensidade de inundações devido à im­
permeabilização do solo, entre outros. Planos diretores e leis de zoneamento - que
são instrumentos bem difundidos de política urbana - não se mostram suficientes
para “fazer a mediação entre os interesses privados dos empreendedores e o direito à
qualidade urbana daqueles que moram ou transitam em seu entorno” (Rolnik et al.,
2002, p. 198).

O entendimento dos limites desses e de outros instrum entos de planejamento e


gestão ambiental urbana, como padrões de ruído, por exemplo, levou urbanistas e
outros profissionais a proporem um a modalidade específica de avaliação de impacto
ambiental adaptada a empreendimentos e impactos urbanos, o Estudo de Impacto
de V izinhança - EIV. 0 conceito foi adotado pelo Estatuto da Cidade, que lhe dedica
três artigos:

Art. 36. Lei municipal definirá os empreendimentos e atividades privados ou


públicos em área urbana que dependerão de elaboração de estudo prévio de im­
pacto de vizinhança (EIV) para obter as licenças ou autorizações de construção,
ampliação ou funcionamento a cargo do Poder Público municipal.
Art. 37. 0 EIV será executado de forma a contemplar os efeitos positivos e nega­
tivos do empreendimento ou atividade quanto à qualidade de vida da população
residente na área e suas proximidades, incluindo a análise, no mínimo, das
seguintes questões:
I - adensamento populacional;

CAPÍTU:LO
Q u a d r o l e g a l e i n s t i t u c i o n a l d a a v a l i a ç ã o de i m p a c t o a m b i e n t a l n o Br

II - equipamentos urbanos e comunitários;


III - uso e ocupação do solo;
IV - valorização imobiliária;
V - geração de tráfego e demanda por transporte público;
VI - ventilação e iluminação;
VII - paisagem urbana e patrimônio natural e cultural.
Parágrafo único. Dar-se-á publicidade aos documentos integrantes do EIV, que fi­
carão disponíveis para consulta, no órgão competente do Poder Público municipal,
por qualquer interessado.
Art. 38. A elaboração do ErV não substitui a elaboração e a aprovação de estudo
prévio de impacto ambiental (EIA), requeridas nos termos da legislação ambiental.
(Lei n° 10.257, Seção XII - Do estudo de impacto de vizinhança.)

0 Estatuto da Cidade conferiu ao estudo de impacto de vizinhança um conteúdo mui­


to próximo ao de um EIA. Anteriormente, alguns municípios já haviam incorporado
exigências similares às suas leis, como São Paulo, de cuja lei orgânica, de 4 de abril
de 1990, já constava um artigo instituindo um “relatório de impacto de vizinhança -
Rivi”. Decretos de novembro de 1994 (n° 34.713) e de dezembro de 1996 (n° 36.613)
definem as modalidades de exigência dos relatórios (que dependem da área a ser
construída, que, por sua vez, varia de acordo com o uso - industrial, institucional,
comercial ou residencial), casos de dispensa, o conteúdo do Rivi e os procedimentos
de análise.

3 .4 V is ã o de c o n j u n t o
A legislação ambiental é hoje extraordinariam ente complexa, a ponto de constituir
um ramo especializado do Direito, o Direito Ambiental. As leis e decretos citados
no Quadro 3.1 formam apenas um a pequena parte do corpo legal e normativo em
vigor no País, que inclui também leis estaduais e municipais. A avaliação de impacto
ambiental, que em todo o mundo foi formalizada e se consolidou pela via legal, é
apenas um dos instrumentos empregados para tentar compatibilizar desenvolvimen­
to econômico e social com proteção e melhoria da qualidade ambiental, tendo como
ideal o desenvolvimento sustentável.

Quando a AIA foi introduzida no País, j á havia, no plano federal, diversos in stru ­
mentos legais no campo do meio ambiente - então, a AIA soma-se a um quadro
preexistente, mas o modifica, ao estabelecer, de maneira incontestável, a importância
I dos enfoques preventivos, a prevenção do dano ambiental e a prevenção da degra­
dação ambiental. 0 fato de que a qualidade ambiental continue a se deteriorar nos
centros urbanos e nas áreas rurais, de que a perda de biodiversidade prossiga a passo
acelerado, de que a paisagem litorânea se degrade de modo provavelmente irrever-
sivel, entre inúmeros outros problemas ambientais (Ibama 2002; ISA, 2004), apenas
indica que resta muito por fazer, inclusive fortalecer e ampliar o papel da avaliação
de impacto ambiental. '
^ Bn M M M y ..... - ü l m , J1 - ~ *

A avaliação de impactos não apenas se soma ao que já havia em termos de legislação.


Associada ao licenciamento ambiental, a AIA vai exigir a estruturação de órgãos
ambientais em todos os Estados da União, e vai, paulatinamente, impor aos empreen­
dedores privados e públicos novos requisitos para a planificação de projetos, alguns
ação ce m pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

dos quais terão suas licenças negadas, ao passo que outras somente serão aceitas
mediante modificações substanciais ou na dependência da aceitação de medidas mi-
tigadoras e compensatórias.

CAPÍTU LO V : ■
a;ào oe im pacto A m b ie ntai: conceitos e métodos

A finalidade da avaliação de impacto ambiental é considerar os impactos ambientais


antes de se tomar qualquer decisão que possa acarretar significativa degradação da
qualidade do meio ambiente. Para cumprir esse papel, a AIA é organizada de forma
a que seja realizada um a série de atividades seqüenciais, concatenadas de maneira
lógica. A esse conjunto de atividades e procedimentos se dá o nome de processo de
avaliação de impacto ambiental. Em geral, esse processo é objeto de regulamentação,
que define detalhadamente os procedimentos a serem seguidos, de acordo com os
tipos de atividades sujeitos à elaboração prévia de um estudo de impacto ambiental,
o conteúdo mínimo desse estudo e as modalidades de consulta pública, entre outros
assuntos.

Em primeira aproximação, pode-se apontar as seguintes características do processo


de AIA:
# É um conjunto estruturado de procedimentos: os procedimentos estão organi­
camente ligados entre si e devem ser desenhados para atender aos objetivos da
avaliação de impacto ambiental.
# É regido por lei ou regulamentação específica: os principais componentes do
processo são previstos em lei ou outra figura jurídica que tenha instituído a AIA
em uma determinada jurisdição; no caso de organizações (como um banco mul-
tilateral ou uma empresa que adote voluntariamente a AIA), o processo é regido
por disposições internas que emanam da alta direção.
# É documentado: esta característica tem dupla conotação; por um lado, os re­
quisitos a serem atendidos são estabelecidos previamente; por outro, em cada
caso, o cumprimento desses requisitos deve ser demonstrado com ajuda de re­
gistros documentais (e.g., a preparação de um EIA, o parecer de análise técnica,
as atas de consulta pública etc.).
& Envolve diversos participantes: em qualquer caso, os envolvidos no processo de
AIA são vários (o proponente de uma ação, a autoridade responsável, o consul­
tor, o público afetado, os grupos de interesse etc.).
& É voltado para a análise da viabilidade ambiental de uma proposta: este ob-
jetivo-mestre da AIA é o que norteia todo o processo, é sua finalidade; não
se estabelece uma série de requisitos e de procedimentos no vazio, mas para
atingir determinado propósito, perspectiva que não se pode perder ao analisar o
processo de AIA, pois procedimentos ou exigências que não se encaixem nessa
finalidade não têm razão de ser e são mera formalidade burocrática.

Estabelecidos esses fundamentos, pode-se definir processo de avaliação de impacto


ambiental como um conjunto de procedimentos concatenados de maneira lógica, com
a finalidade de analisar a viabilidade ambiental de projetos, planos e programas, e
fundam entar uma decisão a respeito.

0 conceito de processo de AIA é ampla e irrestritamente utilizado tanto na literatura


especializada internacional como em documentos governamentais e de organizações
internacionais. Às vezes, o termo sistema de avaliação de impacto ambiental é em­
pregado com significado próximo ao de processo de AIA. Wood (1995) utiliza-o,
embora sem defini-lo, no sentido de um a tradução legal do processo de AIA em cada
jurisdição, observando que “nem todos os passos do processo de AIA (...) estão pre­
sentes (...) em cada sistema de AIA” (p. 5) e que “cada sistema de AIA é produto de

CAPÍTl
0 P r o c e s s o de A v a lia ç ã o de Im p a c to A m b ie n t a l e s e u s O b j e t i v ^ B 93

um conjunto particular de circunstâncias legais, adm inistrativas e políticas” (p. 11).


Espinoza e Alzina (2001) definem sistema de AIA como a estrutura organizativa e
adm inistrativa necessária para implementar 0 processo de AIA, que, por sua vez, é
definido como “os passos e os estágios que devem ser cumpridos para que uma análise
ambiental preventiva seja considerada suficiente e útil, de acordo com padrões usual­
mente aceitos no plano internacional” (p. 20).

Portanto, u m s i s t e m a d e A I A é 0 m e c a n i s m o l e g a l e i n s t i t u c i o n a l q u e t o r n a o p e r a c i o ­
n a l 0 p r o c e s s o d e A I A e m u m a d e t e r m i n a d a j u r i s d i ç ã o (um país, um território, um
Estado, um a província, um município ou qualquer outra entidade territorial adm i­
nistrativa).

4.1 OS OBJETIVOS DA AVALIAÇÃO DE IMPACTO AMBIENTAL


A questão “para que serve a avaliação de impacto am biental?” vem sendo debatida
desde sua origem. Esse debate tem sido ampliado à medida que floresce 0 campo
de aplicação da AIA. Se, de início, a AIA voltava-se quase que exclusivamente a
projetos de engenharia, seu campo hoje inclui planos, program as e políticas (a ava­
liação ambiental estratégica, que se consolidou a p artir dos anos 1980), os impactos
da produção, consumo e descarte de bens e serviços (a avaliação do ciclo de vida, que
se consolidou a p artir dos anos 1990) e a avaliação da contribuição líquida de um
projeto, um plano, um program a ou um a política, para a sustentabilidade (a análise
de sustentabilidade, que vem se firmando na primeira década do século XXI).

A compreensão de objetivos e propósitos da AIA é essencial para apreender seus papéis


e funções, e também para se apreciar seu alcance e seus limites. A AIA é apenas um
instrumento de política pública ambiental e, por isso, não é a solução para todas as
deficiências de planejamento ou brechas legais que permitem, consentem e facilitam a
continuidade da degradação ambiental. Como lembrado por Wathern (1988a), “0 objetivo
da AIA não é 0 de forçar os tomadores de decisão a adotar a alternativa de menor dano
ambiental. Se fosse assim, poucos projetos seriam implementados. 0 impacto ambiental
é apenas uma das questões” (p. 19). Ortolano e Shepherd (1995a, 1995b) enumeram alguns
“efeitos da AIA sobre os projetos”, ou seja, os resultados reais da AIA e sua influên­
cia nas decisões: (i) retirada de projetos inviáveis; (ii) legitimação de projetos viáveis;
(iii) seleção de melhores alternativas locacionais; (iv) reformulação de planos e projetos;
(v) redefinição de objetivos e responsabilidades dos proponentes de projetos.

Há convergência na literatura quanto às funções da AIA. Glasson, Therivel e


Chadwick (1999) descrevem essas funções como (i) ajuda ao processo decisório;
(ii) ajuda à elaboração de projetos e propostas de desenvolvimento; (iii) um in stru ­
mento para 0 desenvolvimento sustentável. Sánchez (1993a) propõe que a AIA é
eficaz se desem penhar quatro papéis complementares: (i) ajuda à decisão; (ii) ajuda
à concepção e planejamento de projetos; (iii) instrum ento de negociação social;
(iv) instrum ento de gestão ambiental.

A função da AIA no processo decisório é a mais reconhecida. Trata-se de pre­


venir danos - e prevenção requer previsão, ou antecipação da provável situação
futura (Milaré e Benjamin, 1993). A AIA pressupõe a racionalidade das decisões
públicas, que deveriam sempre observar princípios jurídicos adm inistrativos, como

QU
sçso ce t pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

o da impessoalidade, o da moralidade pública e o da publicidade (Mukai, 1992). Ora,


decisões governamentais sempre estiveram sujeitas a pressões e interesses privados, e
a simples introdução de um novo requisito, o ambiental, não é suficiente para mudar
práticas arraigadas.

As pessoas encarregadas da tomada de decisões, públicas ou privadas, decidem acer­


ca daquilo que lhes é submetido. Os tomadores de decisão raramente também são
criativos, inovadores ou empreendedores. Logo, a prevenção do dano ambiental não
pode começar pelo fim (a tomada de decisão), mas, é claro, pelo começo, ou seja,
a formulação, a concepção e a criação de projetos e alternativas de soluções para
determinados problemas. Assim, a função do processo de AIA seria a de “incitar os
proponentes a conceber projetos ambientalmente menos agressivos e não simples-
mente ju lg a r se os impactos de cada projeto são aceitáveis ou não” (Sánchez, 1993a,
p. 21). 0 que tradicionalmente fazem engenheiros e outros técnicos é reproduzir, para
cada novo problema, maneiras de solucioná-los que atendem a certos critérios técni­
cos e econômicos, enquanto o que se pretende com a AIA é introduzir o conceito de
viabilidade ambiental e colocá-lo em pé de igualdade com os critérios tradicionais
de análise de projeto. Pela AIA haveria uma busça de soluções que pudessem atender
aos novos e mais exigentes critérios ambientais, o que, idealmente, resultaria em um
aprendizado e, consequentemente, em projetos que levassem em conta os aspectos
ambientais desde sua concepção.

Uma das grandes dificuldades práticas da AIA é fazer com que alternativas de menor
impacto sejam formuladas e analisadas comparativamente às alternativas tradicionais.
Ortolano (1997), ao estudar a resistência cultural dos engenheiros do Corpo de Enge­
lEssa agência nheiros do Exército Americano (U.S. Army Corps of Engineers)1 às novas exigências
governamental tem ambientais na análise de projetos, observou mudanças “notáveis” que se seguiram à
a atribuição de
contratação de “centenas de especialistas ambientais” para atender aos requisitos da
projetar e construir
obras civis, sem NEPA. 0 autor constata que alguns desses profissionais, contratados fundamentalmente
relação direta para elaborar EIAs, souberam “influenciar os engenheiros responsáveis pela elabora­
com a defesa ou ção de projetos”, encontrando, às vezes, soluções inovadoras. Ortolano concluiu que
outras funções as mudanças “foram extraordinárias, dada a enorme burocracia dominada por enge­
eastrenses, como nheiros com uma tradição de construtores, e seus aliados no Congresso, interessados
barragens, obras
em promover novos projetos em suas bases políticas”.
de proteção contra
enchentes, abertura
e conservação de 0 conceito de viabilidade ambiental não é unívoco, como, aliás, também não o é o
vias navegáveis. de viabilidade econômica. Para a análise econômica, um projeto é viável dentro de
determinadas condições presentes, dadas determinadas hipóteses que se faz sobre o
futuro (custos, preços, demandas etc.) e em função do nível de risco aceitável para os
investidores. Para a análise ambiental, um projeto pode ser viável sob determinados
pontos de vista, desde que certas condições sejam observadas (o atendimento a requi­
sitos legais, por exemplo). Mas os impactos socioambientais de um projeto (que na
análise econômica são tratados como externalidades) distribuem-se de maneira desi­
gual. Os grupos humanos beneficiados por um projeto geralmente não são os mesmos
que suportam as conseqüências negativas - um novo aterro sanitário beneficia toda
a população de um município, mas pode prejudicar os vizinhos; um a usina hidrelé­
trica beneficia consumidores residenciais e industriais, porém, prejudica aqueles que
vivem na área de inundação.

CAPÍTU
0 P r o c e s s o d e A v a l i a ç ã o de I m p a c t o A m b i e n t a l e s e u s O B J E n v g j 95

O debate sobre ônus e benefícios de projetos de desenvolvimento é atualmente


mediado pela avaliação de impacto ambiental, que passou a desempenhar um papel
de instrumento de negociação entre atores sociais, Muitos dos projetos submetidos ao
processo de AIA são polêmicos, e pode-se mesmo argum entar que, se um projeto não
for controvertido, não faz sentido submetê-lo à AIA; é melhor que seja tratado por
procedimentos mais simples e baratos, como 0 licenciamento ambiental tradicional.
0 processo de AIA pode organizar 0 debate com os interessados (a consulta pública é
parte do processo), tendo 0 EIA e 0 Rima como fontes de informação e base para as
negociações.

A AIA tem tam bém 0 papel de facilitar a gestão ambiental do futuro em preen­
dimento. A aprovação, do projeto implica certos compromissos, assumidos pelo
empreendedor, que são delineados no estudo de impacto ambiental, podendo ser
modificados em virtud e de negociações com os interessados. A m aneira de imple­
m entar as medidas mitigadoras e compensatórias, seu cronograma, a participação de
outros atores na qualidade de parceiros
e os indicadores de sucesso podem ser Quadro 4/1 Objetivos da avaliação de impacto ambiental «*d4 \
estabelecidos durante o processo de 1. Assegurar que as considerações ambientais sejam explicitamente
AIA, que não term ina com a aprovação tratadas e incorporadas ao processo decisório
de um a licença, mas continua durante 2. Antecipar, evitar, minimizar ou compensar os efeitos negativos
todo o ciclo de vida do projeto. relevantes biofísicos, sociais e outros
3. Proteger a produtividade e a capacidade dos sistemas naturais,
Para concluir esta seção, o Quadro 4.1 assim como os processos ecológicos que mantêm suas funções
mostra os objetivos da AIA, segundo a 4. Promover o desenvolvimento sustentável e otimizar o uso e as
Associação Internacional de Avaliação oportunidades de gestão de recursos
de Impactos - IAIA. Fonte: IAIA (1999)

4 .2
/
O ORDENAMENTO DO PROCESSO DE AIA
E contra o pano de fundo desses objetivos que deve ser entendido o processo de AIA.
Embora as diferentes jurisdições estabeleçam procedimentos de acordo com suas
particularidades e a legislação vigente, qualquer sistema de avaliação de impacto
ambiental deve obrigatoriamente ter um certo número mínimo de componentes, que
definem como serão executadas certas tarefas obrigatórias. Isso faz com que os sis­
temas de AIA vigentes nas mais diversas jurisdições guardem inúmeras semelhanças
entre si. A Fig. 4.1 mostra essas atividades ao representar um esquema genérico de
AIA. Não se trata do processo brasileiro, paulista ou americano, mas de um processo jk
universal. Cada jurisdição pode conceder maior ou menor importância a alguma des­
sas atividades, ou até mesmo omitir um a delas, mas, essencialmente, o processo será
sempre muito semelhante.

A literatura internacional sobre AIA valida a ideia de um processo genérico.


Wathern (1988a) fala em “principais componentes de um sistema de AIA”. Wood
(1995), um dos principais pesquisadores sobre estudos comparativos em AIA, fala
em “elementos do processo de AIA”. Para Glasson, Therivel e Chadwick (1999), “em
essência, AIA é um processo, um processo sistemático que exam ina as conseqüências
ambientais de ações de desenvolvimento, previamente”(p. 4). Espinoza e Alzina (2001
mostram um processo de AIA “padronizado” ou “clássico”. André et al. (2003,
p. 69) apresentam um “processo tipo de AIA”. Weaver (2003) descreve os princi-

QU
^ v j— ^ ce m pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

Apresentação de uma proposta pais “passos” do processo. O Manual de


i s a c s '-Leial: t r i a g e m Treinamento em Avaliação de Impacto
i Ambiental, do Programa das Nações
A proposta pode causar impactos
ambientais significativos? Unidas para o Meio Ambiente (Unep,
1996), define um processo de AIA e seus
r~ “1 “principais estágios”. 0 Estudo Interna­
Não Talvez Sim
cional sobre a Eficácia da Avaliação de
I
Impacto Ambiental (Sadler, 1996) esta­
Avaliação ambiental inicial
belece os elementos básicos do processo,
Licenciamento ^ Licenciamento apoiado ao passo que os Princípios para as Me­
ambiental convencial em estudo de impacto
ambiental lhores Práticas da Avaliação de Impacto
Ambiental, elaborados pela Associação
Análise detalhada Internacional de Avaliação de Impactos,
descrevem “princípios operacionais” e “os
Determinação do
escopo do estudo principais passos e atividades específi­
cas” da AIA (IAIA, 1999). Finalmente, a
6a Conferência das Partes da Convenção
Elaboração do
Análise técnica
EIA e Rima
da Diversidade Biológica reitera o estabe­
lecido na literatura internacional em suas
I Diretrizes para incorporação de questões
Consulta pública
relativas à biodiversidade à legislação e/
Decisão ou ao processo de avaliação de impacto
1
ambiental e à avaliação ambiental estra­
í 1
tégica (Resolução VI/7).
Reprovação Aprovação
Pode-se dividir o processo de AIA em três
Etapa pós-aprovação etapas, cada uma delas agrupando dife­
M onitoram ento e gestão ambiental rentes atividades: (i) a etapa inicial, (ii) a
1 etapa de análise detalhada e (iii) a etapa
Acompanhamento pós-aprovação, no caso da decisão ter sido
favorável à implantação do empreen­
Fig. 4.1 Processo de avaliação de im p a c to a m b ie n ta l dimento. As etapas iniciais têm a função
de determ inar se é necessário avaliar de
maneira detalhada os impactos ambien­
tais de um a futura ação e, em caso positivo, definir o alcance e a profundidade
dos estudos necessários. Pode-se exemplificar com a legislação ambiental brasilei­
ra, segundo a qual um a série de empreendimentos estão sujeitos ao licenciamento
ambiental, mas nem todos precisam da preparação prévia de um estudo de impacto
ambiental. Segundo o regime de licenciamento, as atividades que utilizam recursos
ambientais ou que, por alguma razão, possam concorrer para degradar a qualidade
ambiental, devem obter previamente um a autorização governamental, sem a qual não
podem ser construídas, instaladas nem funcionar. Em alguns desses casos, quando
houver o potencial de ocorrência de impactos ambientais significativos, a autoridade
governamental exigirá a apresentação de um estudo de impacto ambiental.

É importante notar que, na hipótese de não ser julgado necessário apresentar um estudo
de impacto ambiental, há outros instrumentos que permitem um controle governa­
mental sobre essas atividades e seus impactos ambientais. Assim, o licenciamento

CAPITU
0 P r o c e s s o de A v a l i a ç ã o de I m p a c t o A m b i e n t a l e s e u s O b j e t iv ^ J 97

ambiental baseia-se em diferentes normas - técnicas e jurídicas —, que regulam e


disciplinam a atividade licenciada, como, entre outras, normas e padrões de emissões
de poluentes, regras de destinação de resíduos sólidos, regras que determinam a
manutenção de um a certa porcentagem de cobertura vegetal em cada imóvel rural e
0 zoneamento, que estabelece condições e limitações para 0 exercício de uma série de
atividades em função de sua localização.
jss * £k
0 procedimento de análise detalhada é aplicado somente aos casos de atividades que
tenham 0 potencial de causar impactos significativos. A análise detalhada, por sua
vez, é composta de uma série de atividades, que vão desde a definição do conteúdo
preciso do estudo de impacto ambiental até sua eventual aprovação, por meio de um
processo decisório próprio a cada jurisdição.

Finalmente, caso 0 empreendimento seja implantado, a avaliação de impacto ambiental


continua, por meio da aplicação das medidas de gestão preconizadas no estudo de
impacto ambiental e do monitoramento dos impactos reais causados pela atividade,
não mais, portanto, como exercício de previsão de conseqüências futuras, mas por
meio de comparação entre a situação posterior à implantação do empreendimento
com a situação anterior. Um bom estudo de impacto ambiental fornecerá elementos e
informações de grande valia para a gestão ambiental do empreendimento, principal­
mente se for adotado um sistema de gestão ambiental nos moldes preconizados pela
norma ISO 14.001.

4.3. Â S PRINCIPAIS ETAPAS DO PROCESSO


A Fig. 4.1 representa um processo genérico de AIA. Cada jurisdição, baseada em
suas leis e normas jurídicas, assim como em sua estrutura institucional e seus proce­
dimentos administrativos, adapta 0 processo genérico às suas necessidades. Esse
modelo genérico simplesmente representa uma concatenação lógica para atender à
necessidade de executar certas tarefas. Os componentes básicos do processo de AIA,
que correspondem às tarefas a serem realizadas, são:

A p r e s e n t a ç ã o d a pr o po s ta
0 processo tem início quando um a determinada iniciativa, como um projeto ou
um plano, programa ou política (PPP) é apresentada para aprovação ou análise de
uma instância decisória, 110 âmbito de uma organização que possua um mecanismo
institucionalizado de decisão. Essa organização pode ser um a empresa privada, um
organismo financeiro, um a agência de desenvolvimento, ou ainda um órgão gover­
namental. Este último é 0 caso mais geral e por isso será usado aqui como modelo de
referência. Normalmente, deve-se descrever a iniciativa em suas linhas gerais, infor­
mando a localização de um projeto ou a abrangência de um PPP. Muitas iniciativas
têm baixíssimo potencial de causar impactos ambientais relevantes, enquanto outras, 2Esse princípio
incontestavelmente, serão capazes de causar profundas e duradouras modificações. costuma ser
Como regra geral, a avaliação prévia dos impactos ambientais somente será reali­ legalmente
estabelecido, por
zada para as iniciativas que tenham 0 potencial de causar impactos significativos2.
exemplo, na Nepa
Na Fig. 4.1, para fins de simplificação, é utilizado 0 termo “proposta” para designar e na Constituição
qualquer ação que possa causar impactos ambientais (significativos ou não), incluindo Federal brasileira
projetos, programas ou políticas. (Art. 225, § 1% IV).

QU
fi­ ação de n p a c t o Am oientai: conceitos e metooos

Também para fins de simplificação, denom ina-se “licenciamento am biental conven­


cional” o procedim ento de análise de solicitações de licença ambiental que não
requeira a apresentação de um estudo de impacto ambiental. Deve-se notar que a
expressão “licenciamento ambiental convencional” não existe na legislação brasileira
e é empregada aqui somente para fins didáticos.

3Na literatura de T r ia g e m 3
língua inglesa, essa Trata-se de selecionar, dentre as inúm eras ações hum anas, aquelas que tenham um
etapa é conhecida potencial de causar alterações am bientais significativas. Devido ao conhecim ento
como screening, acum ulado sobre o impacto das ações hum anas, sabe-se de muitos tipos de ações que
termo que também
realm ente têm causado impactos significativos, enquanto outras causam impactos
pode ser traduzido
por classificação, irrelevantes ou têm medidas am plam ente conhecidas de controle dos impactos. Há,
ou ainda porém, um campo interm ediário no qual não são claras as conseqüências que podem
enquadramento. advir de determ inada ação, casos em que um estudo simplificado é necessário para
enquadrá-la em um a das categorias. A triagem resulta em um enquadram ento do
projeto, usualm ente em um a de três categorias: (a) são necessários estudos aprofun­
dados; (b) não são necessários estudos aprofundados; (c) há dúvidas sobre o potencial
de causar impactos significativos ou sobre as mqdidas de controle. Os critérios básicos
de enquadram ento costum am ser:
Listas positivas: são listas de projetos para os quais é obrigatória a realização de
um estudo detalhado;
* Listas negativas: são listas de exclusão, que compreendem projetos cujos impactos
são sabidamente pouco significativos ou projetos para os quais é conhecida a
eficácia de medidas, técnicas ou gerenciais, para mitigar os impactos negativos;
Critérios de corte: aplicados tanto para listas positivas como para listas negativas,
» • «

geralmente baseados no porte do empreendimento;


& Localização do empreendimento: em áreas consideradas sensíveis, pode-se exigir
a realização de estudos completos independentemente do porte ou do tipo de
empreendimento;
4Na literatura de ® Recursos, ambientais potencialmente afetados: para projetos que afetem determi­
língua inglesa, essa nados tipos de ambiente que se queira proteger (como cavernas, áreas úmidas de
etapa é conhecida importância internacional etc.).
como scoping.
Na legislação As listas auxiliam no enquadram ento, mas não conseguem resolver todas as situa­
portuguesa, é
ções. A elaboração de algum tipo de estudo simplificado é prática comum em inúm eras
denominada
"definição do jurisdições (Canadá e Estados Unidos, por exemplo).
âmbito do estudo
de impacto D e t e r m in a ç ã o do es c o p o d o e s t u d o de im p a c t o a m b i e n t a l 4
ambiental”. Nos casos em que se m ostra necessária a realização do EIA, antes de iniciá-lo é pre­
No Quebec, é
ciso estabelecer seu escopo, ou seja, a abrangência e a profundidade dos estudos a
conhecida como
definição do serem feitos. Embora o conteúdo genérico de um EIA seja definido de antem ão pela
alcance (portée) do própria regulam entação, tais norm as são gerais, aplicando-se a todos os estudos; por­
estudo de impacto tanto, não podem ser norm as específicas nem norm as aplicáveis a um caso particular,
ambiental. Adota- um a vez que a regulam entação deve prever todas as situações possíveis. Na verdade,
se aqui a palavra é em função dos impactos que podem decorrer de cada em preendim ento que deve ser
escopo, com o
definido um plano de trabalho para a realização de estudos, que, um a vez concluídos,
significado de
alvo, mira, intuito, m ostrarão como se m anifestarão esses impactos, sua m agnitude ou intensidade e os
intenção, meios disponíveis para mitigá-los ou compensá-los.
0 P r o c e s s o de A v a l ia ç ã o d e I m p a c t o A m b ie n t a l e s e u s O bjeti 99

oC
Por exemplo, em um projeto de geração de eletricidade a p artir de combustíveis fós­
seis, evidentemente o EIA deverá dar grande atenção aos problemas de qualidade
do ar. Já em um a barragem, certam ente devem receber grande atenção as questões
relativas à qualidade das águas, à existência de remanescentes de vegetação nativa rW -i* * J

rc v
na área de inundação e à presença de populações e atividades hum anas nessa área,
enquanto a qualidade do ar possivelmente seria tratada de m aneira rápida no EIA,
uma vez que os impactos de um a barragem sobre esse elemento são, geralmente, de j
pequena m agnitude e importância.

A etapa de determinação da abrangência é usualm ente concluída com a prepara­


ção de um documento que estabelece as diretrizes dos estudos a serem executados,
conhecido como termos âp rpfcrpnrin ou instruções técnicas. j

E laboração d o e s t u d o de im p a c t o a m b i e n t a l
Essa é a atividade, central do processo de avaliação de impacto ambiental, a que
normalmente consome mais tempo e recursos e estabelece as bases para a análise
da viabilidade amhientaLdo empreendimento, O estudo deve ser preparado por um a
equipe composta de profissionais de diferentes áreas, visando determ inar a extensão
e a intensidade dos impactos ambientais que poderá causar e, se necessário, propor
modificações no projeto, de forma a reduzir ou, se possível, elim inar os impactos
negativos. Como os relatórios que descrevem os resultados desses estudos costumam
ser bastante técnicos, é usual preparar um resumo escrito em linguagem simplificada
e destinado a com unicar as principais características do empreendimento e seus
impactos a todos os interessados5. 5AJo Brasil, a
regulamentação
lorna obrigatória
A n á l is e t é c n ic a do e s tu d o de im p a c t o a m b i e n t a l a preparação
0s estudos devem ser analisados por um a terceira parte, norm alm ente a equipe técnica desse documento,
do órgão governam ental encarregado de autorizar o empreendimento - ou a equipe denominado
relatório de
da instituição financeira à qual fQi solicitado um empréstimo para realizar o projeto.
impacto ambiental
- Rima.
Trata-se de verificar sua conform idade aos term os de referência e à regulam entação
ou procedim entos aplicáveis. Trata-se tam bém de verificar se o estudo descreve
adequadam ente o projeto proposto, se analisa devidam ente seus impactos e se
propõe medidas m itigadoras capazes de aten u ar suficientemente os impactos nega­
tivos. A análise é feita não somente por equipe multidisciplinar, como tam bém
pode ser interinstitucional, ou seja, podem -se co nsultar diferentes órgãos especia­
lizados da adm inistração, como aquele encarregado do patrim ônio cultural, ou o
responsável pela utilização das águas de um a bacia hidrográfica. Normalmente, os
an alistas preocupam -se mais com os aspectos técnicos dos estudos, como o grau
de detalham ento do diagnóstico am biental, os métodos utilizados para a previsão
da m agnitude dos impactos e a adequação das m edidas m itigadoras propostas.
As m anifestações expressas na consulta pública podem ser consideradas e e v e n tu a l­
mente incorporadas para fins de análise dos estudos.

C onsulta p ú b l ic a
Desde sua origem, na legislação americana, o processo de ATA compreende mecanismos
formais de consulta aos interessados, incluindo os diretam ente afetados pela decisão,
âçso ce Im pacto A m biental: conceitos e métodos

mas não se limitando a estes. Há diferentes procedimentos de consulta, dos quais


a audiência pública é um dos mais conhecidos. Há tam bém diferentes momentos
no processo de AIA nos quais pode-se proceder à consulta, como a preparação dos
termos de referência, a etapa que leva à decisão sobre a necessidade de realização de
um estudo de impacto ambiental, ou mesmo durante a realização desse estudo. Após
■\sua conclusão, porém, essa consulta é mais típica e necessária, pois somente nesse
momento haverá o quadro mais completo possível sobre as implicações da decisão a
ser tomada.

D ec isão
Os modelos decisórios no processo de AIA são muito variados e estão mais ligados
à tradição política de cada jurisdição que a características intrínsecas da avaliação
de impacto ambiental. Em linhas gerais, a decisão final pode caber (i) à autoridade
ambiental, (ii) à autoridade da área de tutela à qual se subordina o empreendimento
(decisões sobre um projeto florestal, por exemplo, cabem ao ministério responsável
por esse setor), ou (iii) ao governo (por meio de um conselho de ministros ou do chefe
de governo). Há ainda o modelo de decisão colegiada, por meio de um conselho com
participação da sociedade civil - muito usado no Brasil - em que esses colegiados
são subordinados à autoridade ambiental. Três tipos de decisão são possíveis: (i) não
autorizar o empreendimento, (ii) aprová-lo incondicionalmente, ou (iii) aprová-lo com
condições. Cabe ainda retornar a etapas anteriores, solicitando modificações ou a
complementação dos estudos apresentados.

M o n it o r a m e n t o e g e s t ã o a m b ie n t a l
Em seqüência a uma decisão positiva, a implantação do empreendimento deve ser
acompanhada da implementação de todas as medidas visando reduzir, eliminar ou
compensar os impactos negativos, ou potencializar os positivos. 0 mesmo deve ser
observado durante as fases de funcionamento e de desativação e fechamento da obra
ou atividade. A gestão ambiental, lio sentido aqui empregado, corresponde a todas
as atividades que se seguem ao planejamento ambiental e que visam assegurar a
implementação satisfatória do plano. 0 monitoramento é parte essencial das ativi­
dades de gestão ambiental e, entre outras funções, deve permitir confirmar ou não
as previsões feitas no estudo de impacto ambiental, constatar se o empreendimento
atende aos requisitos aplicáveis (exigências legais, condições da licença ambiental
e outros compromissos) e, por conseguinte, alertar para a necessidade de ajustes e
correcões.

A gestão ambiental é hoje uma atividade cada vez mais sofisticada e há diversas
ferramentas desenvolvidas para a gestão de empreendimentos e de organizações,
que podem ser conjugadas e integradas à avaliação de impacto ambiental (Sánchez,
2006a), tais como sistemas de gestão ambiental (ISO 14.001), auditorias ambientais
(ISO 19.011) e avaliação de desempenho ambiental (ISO 14.031).
6Na literatura
de língua A companham ento6
inglesa, o termo Tem-se constatado, no mundo todo, várias dificuldades na correta implementação
correspondente é
das medidas propostas pelo estudo de impacto ambiental e adotadas como condições
follow-up.

c a p ít u I S H H H
0 P r o c e s s o d e A v a l i a ç ã o d e I m p a c t o A m b i e n t a l e s e u s O b je t i

vinculadas à licença ambiental do empreendimento (de acordo com, entre outros,


Sadler, 1996). Por essa razão, têm sido buscados mecanismos para garantir o pleno
cumprimento de todos os compromissos assumidos pelo empreendedor e demais
intervenientes. O acompanhamento agrupa o conjunto de atividades que se seguem à
decisão de autorizar a implantação do empreendimento.

As atividades de acompanhamento incluem fiscalização, supervisão e/ou auditoria,


............. . « « ■ ■ ■ r w n n m n - o -f J L - 1

observando-se que o monitoramento é também essencial para esta etapa. A função


da supervisão é primariamente a de assegurar que as condições expressas na au­
torização (licenças ambientais, no caso do Brasil) sejam efetivamente cumpridas.
No sentido empregado aqui, a supervisão ambiental é realizada pelo empreendedor,
ao passo que a fiscalização é uma função dos agentes governamentais; já a auditoria
pode ter caráter público ou privado.

D ocum entação
A complexidade do processo de AIA e suas múltiplas atividades tornam necessária
a preparação de grande número de documentos. O Quadro 4.2 fornece um a visão de
conjunto da documentação, tomando por base as exigências brasileiras de licencia­
mento ambiental. Dada a relativa autonomia de cada órgão licenciador, à parte o termo
estudo de impacto ambiental, os nomes dados a cada documento dependerão da regu­
lamentação em vigor em cada jurisdição. 0 grande número de documentos envolvidos
dá um a ideia do tempo necessário até a obtenção de um a licença ambiental, e também
permite inferir que os custos não são desprezíveis, tanto para o empreendedor como
para o agente público gestor do processo.

4 .4 O PROCESSO DE AIA NO BRASIL


A primeira norma de referência para avaliação de impacto ambiental no Brasil foi
/

a Resolução Conama 1/86. E essa resolução que estabelece a orientação básica para
a preparação de um estudo de impacto ambiental. Ainda que de modo conciso, os
principais elementos do processo cie AIA são tratados nessa norma. Outras resoluções
Conama e regulamentos estaduais e municipais estabelecem requisitos adicionais,
mas os elementos essenciais do processo estão inalterados desde 1986.
Triagem: é feita por meio de uma lista p ositiva (Art. 2o) (outras resoluções do
Conama introduziram outros critérios deflagradores para um EIA, conforme
Cap. 5).
Determinação do escopo: o parágrafo único do Art. 6o estabelece que cabe ao
órgão licenciador definir “instruções adicionais” para a preparação dos estudos
de impacto ambiental, levando em conta “peculiaridades do projeto e caracterís­
ticas ambientais da área” (Não há requisitos de procedimento para a definição
da abrangência de um EIA. 0 órgão ambiental pode fazê-lo internamente, sem
nenhum a forma de consulta).
Elaboração do EIA e do R im a: tratada nos Arts. 5o, 6o, 7o, 8o e 9o; a Resolução
estabelece as diretrizes e o conteúdo mínimo dos estudos, e define a respon­
sabilidade por sua execução (“equipe multidisciplinar habilitada”) e a quem
são imputados os custos (ao empreendedor).
Análise técnica do EIA: o Art. 10 estabelece que deve haver um prazo para
m anifestação do órgão licenciador, mas não estipula esse prazo.
9 ação de Impacto A m biental: conceitos e métodos

ífc Consulta pública: o Art. 11 determina que o Rima será acessível ao público
e aos órgãos públicos que manifestarem interesse ou tiverem relação direta
com o projeto; os interessados terão um prazo para enviar seus comentários;
poderá ser promovida audiência pública para “informação sobre o projeto e
seus impactos ambientais e discussão do Rima”

Quadro 4.2 Principais documentos técnicos das diversas etapas do processo de avaliação de impacto ambiental
D o c u m e n t o s de e n t r a d a

Memorial descritivo Apresentação Parecer técnico que define o nível de avaliação ambiental
do projeto1 da proposta e o tipo de estudo ambiental necessários
Publicação em jornal anunciando
a intenção de realizar determinada
iniciativa2
Avaliação ambiental Triagem Parecer técnico sobre o nível de avaliação ambiental e o
inicial ou estudo preliminar3 tipo de estudo ambiental necessários
Plano de trabalho Definição da Termos de referência4
abrangência e
conteúdo do EIA
Termos de referência Elaboração do EIA EIA e Rima
e do Rima
EIA Análise técnica Parecer técnico
EIA e Rima Consulta pública Atas de audiência e outros documentos de consulta
Publicação em jornal pública
EIA, estudos complementares, Análise técnica Parecer técnico conclusivo
documentos de consulta pública
EIA, Rima, pareceres técnicos, Decisão Licença prévia5 (ou denegação do pedido de licença)
documentos de consulta pública
Planos de gestão6 Decisão Licença de instalação
Relatórios de implementação Implantação / Licença de operação
do plano de gestão construção
Vários documentos Operação Renovação da licença de operação, relatórios de
monitoramento e desempenho ambientai7
Plano de fechamento8 Desativação Licença de desativação9
N ota: o quadro to m a p o r referência p rin c ip a lm e n te as exigências brasileiras de lic e n c ia m e n to am biental.
1 Exemplos: M CE - M e m o ria l de C aracterização do E m preendim ento (São Paulo), FCE - F orm ulário de C aracterização do Em pre­
e nd im ento (M inas Gerais).
2A p u b lica çã o em jo rn a is de grande circulação é um a das form as m ais com uns de a n u n c ia r a in te n çã o de re a liza r um e m preendi­
m ento, m as há diversas outras form as de d iv u lg a r essa in fo rm a ç ã o ; a d ivu lg a çã o p e rm ite que o p ú b lico possa se m a n ife s ta r e que,
p o rta n to , as preocupações do p ú b lico possam ser utilizadas com o um c rité rio de triagem .
3 Exemplos: RAP - R elatório A m b ie n ta l P re lim in a r (São Paulo), RAS - R elatório A m b ie n ta l S im plificado, RCA - R elatório de C ontrole
A m b ie n ta l.
4 No Rio de Janeiro, esse d o cu m e n to recebe o nom e de "Instrução Técnica".
5A licença pode in c lu ir condiciona ntes que só a to rn a m válidas se as condições forem cum pridas.
6Exemplos: PBA - Projeto Básico A m b ie n ta l (setor elétrico), PCA - Plano de C ontrole A m b ie n ta l (setor de m ineração).
1 Exem plo: Roda - R elatório de A va lia çã o de Desempenho A m b ie n ta l (M inas Gerais). Em alguns Estados, exige-se rela tó rio s de
a u d ito ria a m b ie n ta l para certas atividades.
8 No Brasil é exigido o Prad - Plano de Recuperação de Áreas Degradadas para em preendim entos de m in eração e planos de desa­
tivação p ara algum as categorias de em preendim entos (segundo resoluções do Conama); no Estado de São Paulo, desde dezem bro
de 2 0 0 2 é exigível um p la n o de fe ch a m e n to para certas atividades.
9A in d a não existente no Brasil.

CAPITU
0 P r o c e s s o d e A v a l i a ç ã o de I m p a c t o A m b i e n t a l e s e u s O b j e t i v ^ J 103

% Decisão: o Art. 4o estabelece que os processos de licenciamento deverão ser


compatíveis com as etapas de planejamento e implantação dos projetos; o
licenciamento cabe aos “órgãos ambientais competentes”, que também deter­
minam a “execução do estudo de impacto ambiental e a apresentação do Rima”
(Art. 11, § 2o).
# Acomvanhamento e m onitoramento.: a “elaboração do programa de acompanha­
mento e monitoramento dos impactos positivos e negativos” é uma “atividade
técnica” exigida para o estudo de impacto ambiental (Art. 6o, IV).

De um modo geral, a Resolução Conama 1/86 aborda todos os componentes principais


do processo de AIA e, indubitavelmente, permite a aplicação imediata da avaliação de
impactos pelos órgãos ambientais estaduais, os principais encarregados de colocá-la
t

em prática. E claro que inúmeras dificuldades surgiriam com a prática, mas a expe­
riência então acumulada, os erros e acertos, perm itiriam aperfeiçoá-la.

Desde então, o Conama baixou outras normas relativas ao licenciamento ambiental,


mas coube aos órgãos ambientais estaduais, na qualidade de principais operadores
do licenciamento, defmir procedimentos, critérios e normas voltadas para as suas
peculiaridades7. 0 Estado do Rio de Janeiro foi o primeiro a norm alizar o processo, 7Ibama (1995)
inclusive com lei própria. A Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo, por faz uma revisão
meio de diversas Resoluções, procurou resolver os problemas colocados pela prática geral do estado
da AIA. Talvez o problema que mais tenha exigido esforços da SMA tenha sido a de aplicação dos
principais passos
definição de quais empreendimentos devam ser sujeitos à apresentação de um estudo
do processo de
de impacto ambiental, ou seja, a etapa de triagem do processo de AIA (Gouvêa, 1998). AIA no Brasil,
com sugestões de
Por outro lado, em 1992, o Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema) tomou melhoria.
a iniciativa de regulam entar os procedimentos para análise dos estudos de impacto
ambiental no Estado de São Paulo, tendo para isso constituído um a comissão interna
que estudou o assunto, ouviu especialistas, realizou debates e propôs ao plenário um
procedimento que viria reform ane ao mesmo tempo consolidar os procedimentos até
então adotados. Uma vez aprovadas pelo Consema e encaminhadas ao Secretário, as
propostas da comissão tornaram -se a Resolução 42/94 da SMA. Os principais elemen­
tos do processo de AIA são tratados por essa resolução.
m Triagem: foi introduzido um estudo inicial, denominado RAP - Relatório
Ambiental Preliminar, cuja análise pode levar a três caminhos: indeferimento
do pedido de licença, exigência de apresentação de EIA e Rima, ou dispensa de
apresentação de ELA e Rima. Posteriormente, com a edição da Resolução SMA
54/04, foi criado o EAS - Estudo Ambiental Simplificado, em princípio aplicável
a projetos considerados de impactos ambientais muito pequenos e não signifi­
cativos, mas que pode servir de base para a exigência de um RAP, se o órgão
ambiental considerar necessários estudos ambientais mais aprofundados.
Determinação do escopo: a elaboração de um EIA é precedida da apresentação
de um plano de trabalho “que deverá explicitar a metodologia e o conteúdo dos
estudos necessários à avaliação de todos os impactos ambientais relevantes”;
esse plano, depois de devidamente analisado pelo Departamento de Avaliação de
Impacto Ambiental (Daia), dá origem a um termo de referência para a elaboração
do EIA.
sçso de mpacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

m Elaboração do EIA e Rima: além das diretrizes gerais estabelecidas na Resolução


Conama 1/86, o EIA deverá observar explicitamente o termo de referência; cada
EIA deve ter o seu próprio termo de referência.
# Análise técnica do EIA: deve considerar explicitamente as manifestações do
público; como resultado dessa análise (chamada de revisão), o Daia deve emitir
“relatório sobre a qualidade técnica do EIA e Rima, informando se demonstram
a viabilidade ambiental do empreendimento e sugerindo condições para as dife­
rentes etapas do licenciamento”.
# Consulta pública: foi bastante ampliada; os interessados podem se manifes­
tar por escrito após a publicação do pedido de licenciamento (item 2), solicitar
que seja realizada audiência pública antes da apresentação do plano de tra­
balho (item 4), ser ouvidos pelas câmaras técnicas do Consema (item 9), além
de solicitar uma audiência pública para análise do EIA e debate do projeto,
nos termos já instituídos anteriormente pela regulamentação federal. (A ques­
tão de solicitação de audiência pública para análise de EIA ficou suplantada
com a edição da Deliberação Consema 34/01, que determina a realização de
audiência pública sempre que o empreendimento for submetido a EIA/Rima -
Art Io, § Io). ^
Decisão: a decisão sobre aprovação dos estudos cabe ao Consema (item 12),
prática que já vigorava no Estado.
# Acompanhamento c monitoramento: cabe ao Daia preparar um “relatório
técnico atestando cumprimento das exigências” constantes da Licença Prévia
e da Licença de Instalação (itens 13 e 15).

Como se vê, a Resolução 42/94 tratou de modo ordenado e orgânico os principais ele­
mentos do processo genérico de AIA. Outras resoluções, publicadas posteriormente,
detalharam algumas dessas tarefas, como a realização de reuniões públicas de infor­
mação e as formalidades de publicação de convocações e anúncios. Todavia, um item
controverso do processo de AIA em São Paulo é o uso do relatório ambiental preli­
m inar como estudo ambiental suficiente para nortear o licenciamento ambiental de
vários empreendimentos. Outros problemas são a falta de complementação da lista de
projetos do Artigo 2° da Resolução Conama 1/86 e as deficiências da etapa de acom­
panhamento.

4 .5 0 PROCESSO DE AIA EM OUTROS PAÍSES


P ara exemplificar os pontos com uns (e tam bém para ilustrar algum as diferenças)
do processo de AJA em diferentes jurisdições, são m ostrados os procedim entos
adotados em dois países: Estados Unidos e A frica do Sul. 0 primeiro por sua impor­
tância histórica, já que o processo am ericano serviu de modelo para muitos países,
e o segundo por se tra ta r de um país em desenvolvimento, no qual a introdução da
AIA coincidiu com a democratização.

A Fig. 4.2 mostra os principais componentes do processo Nepa. A aplicação da lei


americana é descentralizada, cabendo a cada agência (ministério, departamento,
serviço) a elaboração de seu próprio conjunto de procedimentos para cada etapa do
processo. Naturalmente, há de se respeitar a lei e o seu regulamento expedido pelo
Conselho de Qualidade Ambiental.

.0
0 P r o c e s s o d e A v a l i a ç ã o d e I m p a c t o A m b i e n t a l e s e u s O b je t i 105

Um campo em que cada agência tem Proposta de ação de uma Agência Federal
bastante liberdade é a triagem, sendo co­
Etapa Inicial I
mum o emprego de listas positivas e de
listas negativas. Segundo Weiner (1997), Consta da lista de exclusão categórica?
o procedimento de implementação da
Não
Nepa adotado por cada agência “deveria
identificar ações que tipicamente reque­ Sim
Consta da lista de inclusão
rem um EIA e aqueles que não requerem \
Não
(exclusão categórica)” (p. 77), sendo o en­ Sim
l
Preparação de um -
quadramento das demais ações resolvido
Environmental Assessment
caso a caso. O enquadramento dos casos r

intermediários, que são em grande nú­ Impactos Impactos Impactos


não significativos significativos significativos
mero, é resolvido pela preparação de uma mitigáveis não mitigáveis
avaliação inicial denominada environ- 1 *
Finding o fn o significant impact
mental assessment, literalmente, avaliação
ambiental. A avaliação ambiental deve Análise detalhada
conduzir a proposta por um de três ca­
Anúncio da elaboração de um EIS
minhos: (1) a preparação de um estudo de
J
impacto ambiental (Environmental Impact Definição do escopo do estudo
Statement - EIS), porque os impactos
Elaboração e divulgação
potenciais são significativos; (2) a dis­ do EIS preliminar
mplementação
pensa de um EIS porque são conhecidas i
Audiência Pública
medidas mitigadoras adequadas e de efi­
i
ciência comprovada; ou (3) a dispensa de Resposta ao^comentários
um EIA porque se constata que os impactos
EISfinal
ambientais não são significativos. Nos
últimos dois casos, é obrigatória a ela­ Record ofDecision

boração de um Relatório de Ausência Etapa pós-aprovação


de Impacto Ambiental Significativo, ou
Implementação
Finding ofN o Significant Impact - Fonsi.

Na hipótese de que a proposta possa v ir R9' 4 ’2 Processo de de ambiental nos EUA


, . . -r- ,. , Fonte: adaptado de Ortolano (1997).
a ocasionar impactos significativos, e ^ 1 1
obrigatória a preparação de um estudo
de impacto ambiental. Ele começa pela apresentação da proposta em um anúncio
público (notice o fin te n t) de que um EIA será preparado, anúncio que deve trazer
um a breve descrição da proposta e de suas alternativas, assim como inform ar onde
os interessados podem obter mais informações.

0 passo seguinte é o scoping, procedim ento obrigatório que frequentem ente inclui
a realização de reuniões públicas, mas que tam bém pode ser baseado no recebi­
mento de m anifestações escritas após a divulgação da notice o fin ten t. Por meio do
scoping identificam -se (1) ações, (2) alternativas e (3) impactos a serem abordados
no EIA, cuja análise pode, assim, “concentrar-se nas questões que são verdadeira­
mente significativas” (Eccleston, 2000, p. 71).

De posse das diretrizes e orientações resultantes do scoping, a agência governa­


mental prepara o estudo de impacto ambiental. Note que, mesmo no caso de um
- =ção ae Im pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

projeto privado, cabe à agência responsável a preparação do EIA (ou a contratação do


serviço), pois é essa agência que tem o poder decisório, e a lei requer que ela o faça
para fundam entar sua decisão. Na prática, porém, quando há um projeto privado (por
exemplo, um projeto de mina em terras públicas), é o próprio interessado que prepa­
ra um rascunho do EIA e o submete à autoridade, que, naturalmente, pode ou não
aceitá-lo. 0 rascunho (d r a f t E IS ) é um documento de trabalho para revisão, críticas
e comentários. Trata-se de um documento completo, colocado à disposição dos inte­
ressados para a consulta pública. 0 prazo para comentários é de 45 dias, contados a
partir da publicação no Diário Oficial (F e d era l R e g iste r).

Todas as críticas e comentários substantivos têm de ser respondidos. A agência


prepara um estudo de impacto ambiental final, corrigido, que deve ser enviado para
todos aqueles que apresentaram comentários, e o disponibiliza ao público. Abre-se
novo período de 30 dias para comentários públicos, e somente ao térm ino desse
período a agência pode form alizar sua decisão, emitindo um Registro de Decisão
(R cco rd o f D e c is io n ), “um a declaração pública que explica a decisão (...), o peso
dos fatores ambientais face aos fatores de
ordem técçica e econômica (...) e as ações
Apresentação de pedido de autorização
para m itigar os efeitos ambientais adver­
Etapa inicial |
sos” (Ortolano, 1997, p. 320).
Decisão de dispensa
Sim •*—
Is I*—= Não
A Fig. 4.3 mostra o processo de AIA na
t

Africa do Sul. A triagem ocorre em dois


estágios, o primeiro sendo uma lista positi­
va prevista pela regulamentação. 0 segundo
estágio consiste na preparação de um a ava­
Análise técnica do relatório
liação inicial denominada s c o p in g re p o rt.
Identificação de questões e de alternativas
A preparação desse relatório é precedida da
que necessitem mais estudos
apresentação de um plano de estudos e sua
Análise detalhada aprovação pela autoridade competente. As
conclusões do relatório de s c o p in g podem
c ser suficientes para justificar a aprovação
do projeto, caso em que são estabelecidas
conteúdo de estudo condições para sua implantação e funcio­
Elaboração do EIA namento. Quando se trata de casos mais
complexos, todavia, o relatório de s c o p in g
Análise do EIA
forma a base para o futuro estudo de
impacto ambiental; nesse caso, um novo
Decisão sobre a plano de estudos é apresentado, aprovei­
Rejeitada -*
solicitação apresentada tando os levantamentos e as análises já
*• Aprovada j
realizados. Após a aprovação desse plano
pela autoridade competente, o interessado
Condições de aprovação
prepara e apresenta o EIA.
Etapa pós-aprovação

Plano de gestão ambiental e m onitoram ento ■* A consulta pública ocorre em vários


momentos: na definição do conteúdo do rela-
Fig. 4.3 Processo de avaliação de im p a c to a m b ie n ta l na Á fric a do Sul tório de s c o p in g e em sua análise, e também
Fonte: ada ptado de Rossouw e t a i (2003). na preparação do plano de estudos para o

CAPÍTU LO
0 P r o c e s s o d e A v a l i a ç ã o d e I m p a c t o A m b i e n t a l e s e u s O b je t i

EIA e em sua análise. Após aprovação do EIA, a autoridade decide sobre a aprovação
do projeto, podendo impor condições e requerer a preparação de um plano de gestão
ambiental.

Esses dois exemplos ilustram aquilo que foi afirmado ao início do capítulo acerca
da convergência dos sistemas de avaliação de impacto ambiental. Suas semelhanças
devem-se aos objetivos similares.
3Ç30 ae m pacto A m biental: conceitos e métodos

-Jurisdições Todo sistema de AIA deve definir o universo de ações hum anas (projetos, planos,
t

incluem governos programas) sujeitos ao processo, ou seja, seu campo de aplicação. E intuitivo ou de
nacionais, regionais
bom senso que não se vai exigir um estudo prévio de impacto ambiental de todo
e locais, como é
o caso da União, projeto ou de qualquer intervenção no meio natural, mas o patam ar a partir do qual
dos Estados e dos deveria ser aplicado o processo? 0 conceito-chave aqui é o de impacto significativo.
m unicípios no
Brasil. Organizações
incluem empresas
Todas as jurisdições e organizações1 nas quais a avaliação de impacto ambiental
públicas ou foi adotada estabelecem, de uma forma ou de outra, que esse instrumento de políti­
privadas que ca ambiental deverá ser empregado para fundam entar decisões quanto à viabilidade
adotam a avaliação ambiental de obras, atividades e outras iniciativas que possam afetar negativamente
de impacto
am biental em o meio ambiente. Mais precisamente, leis, regulamentos e políticas adotados por essas
suas políticas jurisdições e organizações estabelecem, como parte do processo de AIA, a necessidade
corporativas, assim de preparação de um estudo de impacto ambiental (EIA) antes da tomada de decisões
como organizações
sobre iniciativas que tenham o potencial de causar alterações ambientais significativas.
internacionais
que adotam a
avaliação de Segundo a Constituição Federal Brasileira de 1988, “incumbe ao Poder Público: (...) exi­
im pacto ambiental gir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de
como requisito para
significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que
certas decisões
de alocação de se dará publicidade” (Art. 225, IV). Nos Estados Unidos, a Nepa estabelece a necessidade
recursos, como é de preparação de um environmental impact statement para ações que “possam afetar
o caso do Banco significativamente a qualidade do ambiente hum ano” (Seção 102 (C)).
M undial e de
outras instituições
multilaterais. Dessa forma, as primeiras etapas do processo de avaliação de impacto ambiental
implicam um a decisão acerca de quais tipos de projetos ou ações devem ser submetidos
ao processo. Em princípio, todas as ações que possam causar impactos ambientais
significativos devem ser objeto de um estudo de impacto ambiental. Algumas ações
podem passar por um processo mais simples de avaliação de impacto, enquanto outras
dificilmente provocarão algum impacto ambiental digno de nota.

0 Banco Mundial, por exemplo, classifica os projetos que lhe são submetidos em três
categorias, de acordo com seu potencial de impacto2:
zHá urna quarta # Categoria A: projetos que requerem um a avaliação ambientaj completa, pois
categoria, FI, usada
quando o Banco podem causar impactos significativos e irreversíveis.
repassa fu n d o s para # Categoria. B: projetos que, embora não requeiram uma avaliação ambiental
agentes financeiros completa, devem ser objeto de uma análise ambiental simplificada, por meio da
intermediários, m as
seleção de medidas já conhecidas para minimização de impactos, do emprego
essa categoria não
interessa aqui. de tecnologias cujos impactos j á são conhecidos e largamente mitigáveis ou por
meio de outros procedimentos.
# Categoria Ç;. projetos que normalmente não causam impactos ambientais
significativos.
(Política Operacional 0P 4.01, Avaliação Ambiental, janeiro de 1999.)

Um dos problemas mais críticos que devem resolver as regulamentações sobre ava­
liação de impacto ambiental é, portanto, aquele da definição operacional a dar ao
termo “significativo”. A resposta a essa questão depende de diversos fatores, dentre os
quais a própria definição que se dá ao termo (e ao instrumento) “avaliação de impacto
ambiental”, as funções e os objetivos que se atribuem ao estudo de impacto ambiental
e a abertura para que sejam realizados estudos ambientais de diferentes graus de
profundidade, segundo o potencial de impacto da proposta em análise.
5.1 0 QUE É IMPACTO SIGNIFICATIVO?
Em primeira análise, significativo é tudo aquilo que tem um significado; é sinônimo
de expressivo. Mas é com o sentido de considerável, suficientemente grande, ou ainda
como importante que deve ser entendida a locução impacto ambiental significativo.
A definição, porém, não resolve o problema, porque impacto significativo é um termo
carregado de subjetividade. E dificilmente poderia ser de outra forma, uma vez que
a importância atribuída pelas pessoas às alterações ambientais chamadas impactos
depende de seu entendimento, de seus valores, de sua percepção.

0 reconhecimento de que existem dificuldades contextualiza o problema, mas não o


resolve. Se não forem arbitrados limites para o campo de aplicação da AIA3, ela será 3E ntende-se p o r
totalmente ineficaz. Aplicada para tudo, banaliza-se. 0 exercício seguinte ajudará a campo de aplicação
da avaliação de
melhor formular o problema. impacto am biental
o conjunto de
Claramente, um a padaria ou um a usina eletronuclear não têm o mesmo potencial ações hum anas
(atividades, obras,
de causar impactos ambientais e haveria pouca ou nenhum a dúvida em incluir um em preendim entos,
projeto de geração de eletricidade a partir de materiais físseis dentro do campo de projetos, planos,
aplicação da AIA. Mas o caso da padaria pode dar margem a dúvidas. 0 problema programas) sujeitas
ao processo de
pode ser dividido em dois: (1) Pode um a padaria causar impacto ambiental? (2) Pode
A I A em uma
um a padaria causar impacto ambiental significativo? determinada
jurisdição.
Uma padaria artesanal consome uma certa quantidade de recursos naturais, emite
um a certa carga de poluentes e ainda causa outros impactos ambientais. Farinha,
água e lenha são os principais insumos, além de energia elétrica e alguns outros
ingredientes. Por sua vez, ao observar a cadeia produtiva dos principais insumos,
nota-se que a produção de lenha, a produção de trigo e a sua transformação em
farinha, assim como o fornecimento de água, são atividades que causam impactos
ambientais, assim como o transporte desses insumos até a padaria. Para simplificar
o problema, os impactos associados à produção e ao transporte de matérias-primas e
de insumos não são levados em conta, porque deve haver outros controles ambientais
para essas atividades. Assim, o limite do problema é o processo de fabricação de pão
e sua comercialização. Na fabricação, são emitidos gases de combustão pela chaminé
da padaria, que também emite material particulado. Efluentes líquidos escoam pelos
ralos enquanto calor e ruído são os outros poluentes emitidos pelo processo produ­
tivo. Embalagens e resíduos sólidos orgânicos são descartados. Normas de higiene
requerem o uso diário de produtos de limpeza e o uso periódico de produtos químicos
biocidas. Se o pão for bom, os clientes vêm em grande quantidade, a pé ou de auto­
móvel, e contribuem para perturbar o trânsito ou ocupar vagas de estacionamentos,
emitindo mais ruídos e poluentes atmosféricos.

São muitas as inter-relações entre a fabricação de pão e o meio ambiente. Tudo isso
justificará a realização de um estudo de impacto ambiental antes da abertura de toda
nova padaria?

Certamente não, pois há outras maneiras de regular a atividade de produção de pão, de


modo a reduzir seus impactos ambientais. Pode-se exigir que a lenha venha de plan­
tações sustentáveis e certificadas (lenha com “selo verde”), que todo consumidor de
o ae m pacto A m biental: conceitos e métodos

'E ar.zência legal no lenha, como um a padaria, pague um a tax a para financiar a reposição florestal4, que o
Brasil. trigo seja produzido sem agrotóxicos, que o moinho de farinha não descarregue seus
efluentes líquidos diretamente em um rio5, que os caminhões que entregam a farinha
-Em preendim ento
e a lenha sejam regulados para emitir o mínimo de fumaça preta e outros poluentes
sujeito ao
licenciamento
atmosféricos6, que o term inal portuário que receba o trigo importado tenha licença
ambiental. ambiental7 etc. Pode-se tam bém determinar, por meio de zoneamento municipal, que
padarias não sejam instaladas em determinadas vias ou quadras, ou que ofereçam
6Há normas certo número de vagas de estacionamento aos seus clientes, para citar apenas algu­
de emissão mas medidas de gestão ambiental aplicáveis a esse tipo de estabelecimento comercial.
para veículos
*

autom otores e
Já um a usina nuclear é bem mais complexa, entre outras razões porque representa
procedim entos de
inspeção. um risco à saúde e à segurança das pessoas e dos ecossistemas. Também um a grande
barragem causa impactos ambientais radicalmente diferentes daqueles decorrentes
7Terminais de um a padaria, a exemplo de Itaipu, que submergiu um sítio de incomparável beleza
portuários também cênica, as Sete Quedas (Fig. 5.1). Os cidadãos que nasceram no final do século XX e
requerem licença as gerações seguintes foram privados da possibilidade de apreciar uma paisagem de
ambiental.
beleza incomum devido a um a decisão, praticamente irreversível, de construir um a
barragem de uma determinada altura em um determinado local. Trata-se, indubita­
velmente, de impacto ambiental significativo, irreversível, permanente, e que afeta
potencialmente toda a população do planeta, presente e futura. Ora, um a decisão
de tam anhas implicações justificaria um a detalhada análise de suas conseqüências
/

e ampla discussão pública. E justam ente esse o objetivo da avaliação de impacto


ambiental, e é nesses casos que se torna necessário empregar o chamado processo
completo de avaliação de impacto ambiental, incluindo a preparação de um estudo de
impacto ambiental, sua publicidade, a realização de audiências públicas e a análise
técnica criteriosa dos estudos apresentados.

0 potencial que tem determinada obra ou ação hum ana de causar alterações ambientais
depende de duas ordens de fatores:
% as solicitações impostas ao meio pela ação ou projeto, ou seja, a sobrecarga^
imposta ao ecossistema, representada pela emissão de poluentes, supressão ou
adição de elementos ao meio;
% a vulnerabilidade do meio, ou seja, o inverso da resiliência, que por sua vez
dependerá do estado de conservação do ambiente e das solicitações impostas
anteriormente e cujos efeitos se acumularam; ou a importância do ambiente
ou do ecossistema — muitas vezes é difícil tornar operacionais os conceitos de
vulnerabilidade ou de resiliência, sendo mais fácil designar tipos de ambiente
que se deseje proteger (devido à sua importância ecológica, valor cultural ou
outro atributo), ou ainda áreas geograficamente delimitadas.

A Fig. 5.2 ilustra, de maneira esquemática, a conjugação desses fatores. A confron­


tação da solicitação (ou pressão) imposta pelo projeto com a vulnerabilidade do
ambiente definirá a resposta do meio. Projetos que impliquem um a grande solici­
tação sobre um ambiente de alta vulnerabilidade (ou baixa capacidade de suporte)
representarão um alto potencial de impactos significativos, como também ilustra a
Fig. 5.3. Portanto, esses projetos deveriam ser objeto de um planejamento cuidado­
so, com a contribuição da avaliação de impacto ambiental. Por outro lado, projetos

CAPÍTü
E t a p a de T r i a g ü H 113

de baixa solicitação executados em um


meio resiliente não necessitariam, a prin­
cípio, de cuidados especiais, devendo-se
apenas tomar-se precauções no sentido
de m inim izar os impactos ambientais,
por meio de técnicas já bem conhecidas.

Considere-se um projeto de aterro sanitário


para disposição de resíduos sólidos urba­
nos. Se 0 local cogitado localizar-se em uma
zona de recarga de aqüíferos (zona onde
a água superficial se infiltra e alimenta
0 lençol freático), os riscos de contami­
nação do aqüífero (potencial de impacto Fig. 5.1 Vista das Sete Quedas do rio Paraná, subm ersas pela represa de
sobre a qualidade das águas subterrâneas) Itaipu, em 1984, p o r decisão do governo m ilita r e antes da re g u la m e n ­
são altos. Trata-se de um meio vulnerável tação, da avaliação de im p a c to a m b ie n ta l no Brasil. 0 lo c a l havia sido
declarado Parque N a c io n a l em 1961, mas o decreto de criação fo i revogado
para esse tipo de atividade. Já se 0 mesmo
pa ra p e rm itir a construção da usina. Na ocasião, entidades a m bientalista s
projeto for implantado em um local com
fizeram um a m a n ife s ta ç ã o em p ro te s to pela perda de um sítio de grande
substrato argiloso bem consolidado e de beleza cênica e v a lo r sim bó lico
baixa permeabilidade (ou seja, um meio
de baixa vulnerabilidade), seu potencial de Solicitação ou pressão

impacto será mais baixo.

Da mesma forma, projetos propostos em ambientes


importantes devido a um ou mais atributos (recursos
ambientais ou culturais) deveriam ser cuidadosamente
avaliados, ao passo que os mesmosNtipos de projetos, AIA necessária
em outro contexto ambiental ou cultural, poderiam
ser dispensados de um estudo de impacto ambiental. AIA pode ser necessária
AIA desnecessária

Assim, 0 potencial de impacto ambiental resulta de Vulnerabilidade ou importância do meio


uma combinação entre a solicitação (característica Fig. 5.2 D iagram a esquem ático pa ra d e te rm in a r a necessi­
inerente ao projeto e seus processos tecnológicos) e a dade de estudos am bientais
vulnerabilidade do meio. Tal combinação se dá em uma
Solicitação ou pressão Potencial de impacto
relação direta, como mostra a Fig. 5.3, ou seja, quanto imposta pelo projeto
maior a solicitação e maior a vulnerabilidade, maior
0 potencial de impactos. Inversamente, quanto maior
a solicitação e maior a resiliência do ambiente, menor
0 potencial de impactos. Não é 0 potencial de impacto
que é inerente ao projeto e sim a solicitação ou pressão
que ele pode exercer sobre os recursos ambientais. /
Resiliência e capacidade Vulnerabilidade ou
de suporte sensibilidade do meio
Em termos práticos, a solicitação potencial que
um empreendimento pode impor ao meio (e, por ^ Importância
conseqüência, sua capacidade de causar impactos) do am biente

depende não somente de suas características técnicas Característica ecológica Critério social

intrínsecas, mas também largamente da capacidade Fig. 5.3 P otencial de im p a c to a m b ie n ta l

Ü ^ B S B B B ic o
114 ^ ^ a l i a ç ã o de Im pacto A m b ie n ta l: conceitos e m étodos

gerencial da organização responsável pelo projeto. É indiscutível que dois projetos


idênticos, se realizados por duas empresas com culturas organizacionais diferentes,
podem resultar em impactos ambientais muito diferentes.
«

5 .2 C r itér io s e p r o c e d im e n t o s de t r ia g e m
Com o propósito de definir para quais atividades se aplicará a avaliação de impacto
ambiental, a relação teórica solicitação/vulnerabilidade, que define o potencial de
impactos ambientais, deve ser transform ada em um conjunto de critérios práticos
que perm itam en quadrar cada nova proposta em um dos três campos da Fig. 5.2. A
Fig. 5.4 situa o campo de aplicação da AIA dentro do universo das ações antró-
picas. Há três conjuntos, cujos limites são linhas
tracejadas, para indicar a inexistência de fron-
teiras nítidas. 0 sempre crescente conjunto das
%

Conjunto das atividades atividades hum anas, constantem ente ampliado pela
humanas inventividade hum ana, comporta um subconjunto
de atividades que podem afetar o meio ambiente
ou causar algum a forma de impacto negativo ou
* * * .

degradação ambiental e que, por essa razão, podez:


Conjunto das atividades ser objeto de< regulação governamental, como :
que podem causar impacto licenciamento, regras de zoneamento, pagam em o
am biental e são sujeitas a
controle adm inistrativo de tax a s ou qualquer outro instrum ento de políti­
am biental (licenciam ento ca ambiental pública. Dentro desse subconjunto há
ou outro mecanismo)
outro, o de atividades que são capazes de causar
Conjunto da5 impactos significativos, e que devem ser sujeitas à
A k

atividades suje it a s l avaliação prévia de seus impactos antes de serem


a AIA (impac
autorizadas.
1 am biental 1 0

significativo)

■ ,
E im portante notar que dispensar um projeto da
¥

apresentação de um estudo de impacto ambiental


Fig. 5.4 Campo de aplicação da AIA
não significa que o mesmo estará desprovido de
toda e qualquer forma de controle ambiental gover­
nam ental, como exemplificado pelo caso da padaria. Outro exemplo é dado pelos
postos de abastecimento de combustíveis. Pode-se discutir se os impactos desse tipo
de empreendimento são ou não significativos, mas o fato de não se exigir um EIA para
todo novo posto é compensado pela existência de outros mecanismos de controle, que
8A obrigatoriedade são o licenciamento am biental8, norm as técnicas para projeto, construção e insta­
de licenciamento lação de tanques subterrâneos, rotinas de inspeção, poços de monitoramento e, em
ambiental para postos alguns países, a exigência de acreditação para o pessoal operacional envolvido na
de combustíveis é
instalação e manutenção. Ademais, regras de zoneamento do uso do solo podem esta­
recente na legislação
brasileira. Esses belecer critérios de localização desses empreendimentos.
estabelecimentos
sequer constavam Entre a padaria ou o posto de combustíveis e a usina hidrelétrica de Itaipu há eviden­
da lista de fontes temente um vasto campo interm ediário ao qual se aplica, ou não, o procedimento
de poluição sujeitas completo de avaliação de impacto ambiental. 0 problema de selecionar os projetos a
ao licenciamento
serem submetidos ao processo tem sido resolvido mediante a aplicação de dois critérios
estadual em São
P a u lo a p a r tir de largam ente utilizados pelas regulam entações de AIA em diferentes jurisdições:
1976. ° e ^ /q c a /pretendido para sua implantação. No entanto, nem

CAPÍTU
sem pre esses dois critérios são suficientes, sendo necessário lan ç ar mão de alg u m a
forma de análise das singularidades de cada caso.

C l a s s if ic a ç ã o por t ip o de e m p r e e n d im e n t o s
Este critério é operacionalizado por meio do estabelecim ento de listas de
em preendim entos sujeitos à preparação prévia de um estudo de impacto am biental
(cham adas de listas positivas) ou dispensados de tal procedim ento (cham adas de
listas negativas); tais listas podem ser aco m p an h ad as de critérios de porte p ara os
em preendim entos listados. Listas positivas são provavelm ente o m ecanism o m ais co­
m um p ara delim itar o cam po de aplicação da AIA. Fazem parte da regulam entação
da União Europeia e da lei federal canadense, m as não co nstam da Nepa nem de seu
regulam ento, que d eix am essa tarefa p ara as agências federais.

Uma lista.po sitiva é a principal ferram enta em pregada pela regulam entação brasi­
leira p a ra definir os tipos de em preendim entos sujeitos à apresentação e aprovação
prévia de um estudo de impacto am biental: o artigo 2o da Resolução Conama 1/86
arrola dezessete tipos de em preendim entos, a lg u n s dos quais acom panhados de um
critério de porte. Um exemplo é o inciso XI, “u sin as de geração de eletricidade, q u a l­
quer que seja a fonte de energia prim ária, acim a de 10 MW".

As listas positivas são am plam ente utilizadas d e v i d j q ^ |a c il i d â á e de_sua_aplicação


e a p ^ p t e ^ b j e t i y i d a d e . Outra v a n ta g e m é que podem ser facilm ente_a^aptadnj às
condições locais. Por exemplo, n u m a d eterm in ad a ju risd iç ão pode ser im p o rtan te
subm eter ao processo de avaliação de impacto am biental qualq uer tipo de rodovia
e, em outras, som ente rodovias de um a d ete rm in ad a classe, como autoestradas. Os
Quadros 5.1 e 5.2 tra z e m exemplos de listas positivas, oriundas, respectivam ente, das
legislações brasileira e m exicana.

A classificação por tipo de em preendim ento tam b ém com porta listas negativas, ig u al­
m ente adotadas em v á ria s jurisdições, a exemplo dos Estados Unidos e do Canadá.
Nos EUA, listas negativas são m uito difu n d id as e em pregadas por v á ria s agências
federais, en qu anto no Canadá são in tegran tes do regulam ento da lei federal de a v a ­
liação am biental.

As ljsfas, tan to positivas como negativas, em bora sejam de fácil aplicação, refletem
u m a classificação prévia genérica do potencial de dano am biental de u m em p reen ­
dim ento que não leva em conta as condições locais - assim, u m projeto tu rístico em
u m a área litorânea com m anguezais, restingas e ecossistem as diversificados poderá
cau sar im pactos significativos mesmo que ocupe u m a área m uito m enor que 100 ha
(o critério de porte constante da lista positiva brasileira), en quanto um grande
em preendim ento tu rístico em u m a área ru ra l ocupada por pastagens talvez não )
v e n h a a cau sar im pactos significativos.

Essa é u m a das razões pelas quais as legislações co stu m am d e ix a r certa m argem de


m anob ra à autoridade g ov ern am en tal encarregad a de aplicar a avaliação de impacto
am biental para e n q u a d ra r os projetos. E tam b ém u m a das razões que leva à adoção
freqüente de um outro critério prático de triagem , o das áreas de interesse am biental.
ação de Im pacto A m biental: conceitos e métodos

Q-=dro 5.1 L isto de e m p re e n d im e n to s s u je ito s à a p re se n ta çã o de um e stu d o de im p a c to a m b ie n ta l no B ra s il


- Es:raaas de rodagem com duas ou mais faixas de rolamento;
II - Ferrovias;
Iii - Portos e terminais de minério, petróleo e produtos químicos;
IV - Aeroportos, conforme definidos pelo inciso 1, Artigo 48, do Decreto-Lei n° 32, de 18/11/1966;
V - Oleodutos, gasodutos, mineriodutos, troncos coletores e emissários de esgotos sanitários;
VI - Linhas de transmissão de energia elétrica, acima de 230 KV;
VII - Obras hidráulicas para exploração de recursos hídricos, tais como: barragem para fins hidrelétricos, acima de 10 MW,
de saneamento ou de irrigação, abertura de canais para navegação, drenagem e irrigação, retificação de cursos d'água,
abertura de barras e embocaduras, transposição de bacias, diques;
VIII - Extração de combustível fóssil (petróleo, xisto, carvão);
IX - Extração de minério, inclusive os da classe II, definida no Código de Mineração;
X - Aterros sanitários, processamento e destino final de resíduos tóxicos ou perigosos;
XI - Usinas de geração de eletricidade, qualquer que seja a fonte de energia primária, acima de 10MW;
XII - Complexo e unidades industriais e agroindustriais (petroquímicos, siderúrgicos, cloroquímicos, destilarias de
álcool, hulha, extração e cultivo de recursos hídricos);
XIII - Distritos industriais e zonas estritamente industriais - ZEI;
XIV - Exploração econômica de madeira ou de lenha, em áreas acima de 100^hectares ou menores, quando atingir
áreas significativas em termos percentuais ou de importância do ponto de vista ambiental;
XV - Projetos urbanísticos, acima de 100 ha ou em áreas consideradas de relevante interesse ambiental a critério da
Sema e dos órgãos municipais e estaduais competentes;
XVI - Qualquer atividade que utilize carvão vegetal, em quantidade superior a dez toneladas por dia;
XVII - Projetos agropecuários que contemplem áreas acima de 1.000 ha ou menores (neste caso, quando se tratar
de áreas significativas em termos percentuais ou de importância do ponto de vista ambiental, inclusive nas áreas de
proteção ambiental).
Fonte: Resolução Conama 1/86 de 23 de ja n eiro de 1986, A r t. 2 o.

Quadro 5.2 L ista de a tiv id a d e s s u je ita s à a v a lia ç ã o de im p a c to a m b ie n ta l no M é x ic o


I - Obras hidráulicas, vias gerais de comunicação, oleodutos, gasodutos e polidutos;
II - Indústria do petróleo, petroquímica, química, siderúrgica, papeleira, açucareira, do cimento e elétrica;
III - Exploração, explotação e beneficiamento de minerais e substâncias reservadas à Federação, nos termos das leis
Mineira e Regulamentadora do Art. 27 Constitucional em matéria nuclear;
IV - Instalações de tratamento, confinamento ou eliminação de resíduos perigosos, assim como resíduos radioativos;
V - Aproveitamentos florestais em florestas tropicais e espécies de difícil regeneração;
VI - Plantações florestais1;
VII - Mudanças de uso do solo de áreas florestais, assim como em florestas e zonas áridas;
VIII - Parques industriais onde se preveja a realização de atividades altamente perigosas;
IX - Projetos imobiliários que afetem os ecossistemas costeiros;
X - Obras e atividades em zonas úmidas, manguezais, lagunas, rios, lagos e estuários conectados com o mar, assim
como em suas costas ou zonas federais;
XI - Obras em áreas naturais protegidas de competência da Federação;
XII - Atividades pesqueiras, de aquicultura ou agropecuária que possam pôr em perigo a preservação de uma ou mais
espécies ou causar danos aos ecossistemas;
XIII - Outras obras que correspondam a assuntos de competência federal, que possam causar desequilíbrios eco­
lógicos graves e irreparáveis, danos à saúde pública ou aos ecossistemas, ou ultrapassar os limites e condições
estabelecidas nas disposições jurídicas relativas à preservação do equilíbrio ecológico e à proteção do ambiente.
1 1tem revogado. Fonte: Ley General dei Equilíbrio Ecológico y Ia P rotección a l A m b ie n te de 28 de enero de 1988, A rt. 28.
Etapa de T r i a g U B 117

Por exemplo, empreendimentos de pequeno porte dentro de um a área de proteção


ambiental9 são muitas vezes sujeitos à preparação prévia de um estudo de impacto 9Área de proteção
ambiental. A citada resolução Conama contempla essa possibilidade, ao exprimir, ambiental (APA) é
no caso dos empreendimentos urbanísticos, a possibilidade de ser exigido EIA para uma das categorias
de unidades de
projetos que ocuparão área inferior a 100 ha, porém se situem “em áreas consideradas conservação
de relevante interesse ambiental”. classificadas como
de uso sustentável
pela legislação
C l a s s if ic a ç ã o l e v a n d o e m c o n t a o l o c a l do projeto brasileira (Lei n°
A presença de ecossistemas sensíveis ou de áreas de reconhecida importância natural 9.985, de 18 de
ou cultural é um critério muito usado para exigência de um EIA, mesmo para tipos julho de 2000). A s
de empreendimentos que não constem de listas positivas. A legislação mexicana, demais categorias
de uso sustentável
conforme 0 Quadro 5.2, fornece dois exemplos: “IX - Projetos imobiliários que afetem /

são Area de
os ecossistemas costeiros” e, “X - Obras e atividades em zonas úmidas, manguezais, Relevante Interesse
lagunas, rios, lagos e estuários conectados com 0 mar, assim como em suas costas ou Ecológico, Floresta
zonas federais”. 0 inciso IX inclui na lista de empreendimentos os de tipo imobiliário, Nacional, Reserva
Extrativista,
enquanto projetos industriais ou de infraestrutura que possam afetar os ambientes Reserva de Fauna,
costeiros j á estão inclusos pelas próprias características desses projetos, 0 que não Reserva de
acontece com os imobiliários, para os quais somente vai se exigir 0 EIA nessa situação. Desenvolvimento
Por sua vez, o inciso X abarca qualquer tipo de empreendimento, desde que situados Sustentável e
Reserva Particular
nos locais especificados. do Patrimônio
Natural.
As características de determinados ambientes são levadas em conta como um critério
de triagem também adotado pela regulamentação brasileira. 0 Decreto Federal
n° 99.556, de Io de outubro de 1990, estabelece a necessidade de preparação de estudo
de impacto ambiental para obras ou empreendimentos potencialmente lesivos ao
patrimônio espeleológico nacional:
/

E obrigatória a elaboração de estudo de impacto ambiental para as ações ou


empreendimentos de qualquer natureza, ativos ou não, temporários ou perma­
nentes, previstos em área de ocorrência de cavidades naturais subterrâneas ou de
potencial espeleológico, os quais, de modo direto ou indireto, possam ser lesivos
a essas cavidades, ficando sua realização, instalação e funcionamento condicio­
nados à aprovação, pelo órgão ambiental competente, do respectivo relatório de
impacto ambiental” (Art. 3o).

0 Decreto Federal n° 750, de 10 de fevereiro de 1993, admite a derrubada de vegetação


na área de domínio da Mata Atlântica somente para “obras, planos, atividades ou
projetos de utilidade pública ou interesse social”, e desde que seus impactos sejam
devidamente avaliados por meio de um EIA.

Ficam proibidos o corte, a exploração e a supressão de vegetação primária ou nos


estágios avançado e médio de regeneração da Mata Atlântica.
Parágrafo único. Excepcionalmente, a supressão da vegetação primária ou em
estágio avançado e médio de regeneração da Mata Atlântica poderá ser autoriza­
da, mediante decisão motivada do órgão estadual competente, com anuência pré­
via do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
(Ibama), informando-se ao Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama),
quando necessária à execução de obras, planos, atividades ou projetos de utili­
dade pública ou interesse social, mediante aprovação de estudo e relatório de
impacto ambiental (Art. 1°)-”
de im pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

Trata-se, assim, de situações particulares que suscitam a exigência de apresentação


de um EIA mesmo em caso de empreendimentos que não constem da lista do Art. 2o
da Resolução Conama 1/86. Em cada região, determinado tipo de ambiente pode ser
valorizado por razões de ordem histórica ou social, mescladas à sua importância
ecológica, como é o caso da Mata Atlântica, no Brasil, das ancient woodlands, na
Grã-Bretanha, das old-growth forests, no Canadá, e das wetlands (áreas úmidas), nos
Estados Unidos e em outros países.

Uma tipologia de ambientes, para fms de planejamento de EIAs, é apresentada


no Quadro 5.3. Extraída de um m anual do Governo Federal sobre licenciamento

Q u a d r o 5 . 3 T ip o lo g ia de a m b ie n te s
T ip o s b á s ic o s de a m b ie n t e s
São três os tipos básicos. Conforme já descrito, esses ambientes podem ocorrer simultaneamente em um empreendi­
mento, porém não podem ocorrer sobre a mesma superfície, sendo portanto excludentes entre si, para cada porção
da superfície estudada. São os seguintes:
....... . . ■A . y v r a s . g y * :

ES DE USO ANTROPICO INTENSIVO


São ambientes onde os impactos ambientais mais importantes são referentes ao meio antrópico. Podem ser subdi­
vididos em:
t
v
Areas urbanizadas ou concentrações habitacionais rurais;
Áreas rurais de uso intensivo (pastagens, culturas, reflorestamentos comerciais etc.).
. . . .
M tM M O ín i

iENTES DE USO ANTROPICO EXTENSIVO


São ambientes que já foram antropicamente alterados, mas ainda apresentam os ambientes ecológicos originais
relativamente mantidos, como, por exemplo, áreas de pastagens extensivas, áreas desmatadas com crescimento de
vegetação secundária etc. Neste caso, são importantes os impactos sobre os meios antrópico, biótico e físico.
v r;. v - W nrV T T *

IBIENTES CONSERVADOS
São ambientes com pouca ou nenhuma alteração antrópica, onde são mais importantes os impactos sobre o meio
biológico. Podem estar em qualquer bioma, inclusive naqueles onde existem maiores restrições quanto ao uso e
ocupação.
T ipo 4 : T ip o l o g ia s e s p e c ia is de a m b ie n t e .^ . | .;
Além dessa classificação, têm-se situações especiais, que podem ser cumulativas entre si ou a qualquer um dos três
tipos de ambientes:
T e rre n o s c á rs tic o s : os terrenos cársticos são aqueles formados pela dissolução das rochas pelas águas, onde ocorrem
cavernas e riôs subterrâneos. São ambientes especialmente sensíveis a impactos sobre as águas e a fauna subterrânea,
ao patrimônio espeleológico e ao patrimônio arqueopaleontológico.
A m b ie n te s a q u á tic o s : refere-se a ambientes costeiros, de rios e de lagos. São ambientes sensíveis a impactos, para
os quais existem leis e normas específicas.
Á re a s de re le v â n c ia d o p a t r im ô n i o n a tu r a l e c u l t u r a l : são ambientes onde ocorrem elementos do patrimônio
natural (picos e/ou monumentos naturais), patrimônio histórico (núcleos históricos, ruínas etc.) ou pré-históricos
(sítios arqueológicos).
r
A re a s de s e n s ib ilid a d e s o c io e c o n ô m ic a : são áreas onde existem municípios e núcleos urbanos com pequena popula­
ção e infraestrutura urbana deficientes frente ao porte do empreendimento. Neste caso, a demanda por mão de obra,
associada à indução da migração à área, pode provocar sobrecarga às frágeis estruturas urbanas e sociais.
Á re a s de o c o r r ê n c ia de p o p u la ç õ e s t r a d ic io n a is : são áreas (demarcadas ou não) onde ocorrem populações indíge­
nas, remanescentes de quilombos ou outros grupos sociais organizados de forma tradicional e historicamente ligados
a uma região.
Fonte: M in is té rio do M e io A m b ie n te /lb a m a , M a n u a l de N orm as e Procedim entos pa ra Licenciam ento A m b ie n ta l no S e to r de
E xtração M in eral, 2001.

CAPÍTÜ;lo
E ta p a de T riag 119

ambiental, o propósito original dessa tipologia é orientar os analistas ambientais na


formulação de termos de referência, cham ando a atenção para a necessidade de maior
cuidado (estudos mais detalhados sobre aspectos específicos) caso um empreendi­
mento possa afetar algum tipo de ambiente valorizado por sua im portância ecológica
ou cultural (chamadas tipologias especiais de ambientes). Transposta de sua aplicação
original, essa tipologia permite apreciar a existência de um a variedade de situações
que tam bém podem servir para determ inar a necessidade de elaboração de um EIA ou
de algum outro tipo de estudo ambiental, como se verá na seção seguinte.

Esses ambientes especiais podem ser valorizados por sua beleza cênica, por sua biodi­
versidade, por sua vulnerabilidade ambiental ou por sua importância cultural, atributos
que não raro se apresentam em conjunto (Figs. 5.5, 5.6 e 5.7). Muitas vezes, esses locais wO inverso também
são áreas protegidas - no Brasil, são chamadas de unidades de conservação - como pode acontecer:
uma área perder
parques nacionais ou áreas de proteção ambiental, onde a legislação pode impedir a
sua proteção legal
realização de determinados empreendimentos. Outras vezes, o reconhecimento da im­ para dar lugar a um
portância desses locais pode se dar sob outra forma de proteção legal, como leis de projeto de impacto
zoneamento ou de ordenamento territorial. significativo. Foi
o que ocorreu com
Ab'Sáber (1977), ao propor critérios para uma política de preservação de espaços Sete Quedas, que
era um parque
naturais, sugere que se aplique “o princípio da distinção entre paisagens consideradas
nacional desde
banais e paisagens reconhecidamente de exceção (morros testemunhos, topografias 1961 (Pádua e
ruineformes, altos picos rochosos, domos de esfoliação, ‘mares de pedras’, cânions e Coimbra Filho,
furnas, feições cársticas, cavernas e lapas, lajedos dotados de minienclaves ecológicos, 1979, p. 202).
ilhas continentais, promontórios, pontas costeiras e estirâncios de praias)” (p. 6). A esse
critério se somaria a preservação de “amostras significativas de diferentes ecossiste­ UA Organização
mas”, que é o princípio que atualmente governa a seleção de áreas para unidades de das Nações Unidas
para a Educação,
conservação.
Ciência e Cultura
(Unesco) atribui
Por outro lado, tam bém ocorre que tais locais não gozem de proteção jurídica sufi­ o título de “sítio
ciente, e a proposição de um projeto de alto potencial de impacto pode ser o estopim do patrimônio
de conflitos inconciliáveis em torno de posições do tipo “ou projeto ou preservação”. m undial” a locais
de excepcional
A região do rio Tatshenshini, na Colúmbia Britânica, fronteira entre o Canadá e o
valor por razões
Alasca, é um desses casos: a área não gozava de proteção legal quando um a empresa históricas, culturais
de mineração pretendeu abrir um a mina de cobre; a proposta deflagrou grande ou naturais.
movimentação de entidades ambientalistas, que acabaram vencendo a batalha. A Outras categorias
autorização para a m ina foi negada e a área foi declarada parque provincial em ju n h o de importância
de 199310. Ao final do ano seguinte, já estava na lista de sítios do patrimônio mundial internacional são
as Reservas da
da Unesco11.
Biosfera, também
sob a égide da
Destino semelhante teve a região m arinha conhecida como Banco de Abrolhos, no Unesco, e os
litoral da Bahia (Fig. 5.8), onde a Agência Nacional de Petróleo retirou de licitação, Sítios Ramsar,
para exploração de petróleo e gás, blocos avaliados como de alta sensibilidade a áreas úmidas
danos ambientais, segundo estudo conduzido por pesquisadores de ONGs e insti­ de importância
internacional,
tuições públicas. Para fundam entar cientificamente o estudo das áreas sensíveis,
designadas
Marchioro et al. (2005) fizeram um a avaliação ambiental estratégica e sim ularam os nos termos da
possíveis impactos das atividades de prospecção sísmica, perfuração e produção sobre Convenção de
uma vasta área do litoral. Ramsar.

Cl
açào ce mpacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

Tanto as listas de projetos como a triagem


pelo critério de localização e sensibilidade
ou importância do ambiente afetado são
mecanismos que apresentam incontestá­
veis vantagens, dentre as quais:
# são de aplicação simples e rápida;
# permitem consistência de uso e conse­
qüente consistência das decisões de
triagem tomadas, assim como tratamento
equitativo dado a distintos proponentes;
# facilitam o controle judicial e do pú ­
blico.

Entretanto, um a aplicação automática


Fig. 5.5 Chapada dos Parecis, M a to Grosso. No início do período de e xp a n ­ desses mecanismos não necessariamente
são do c u ltiv o de soja no C entro-O este do País, a borda da chapada arenítica garantiria a inclusão no processo de AIA
dos Parecis ainda exibia, em bom estado de conservação, um am biente onde de todos os projetos com potencial de
os a trib u to s físicos, bióticos e hum anos m ereciam pro te çã o causar impactos significativos. Inversa­
mente, um excesso de zelo na confecção
dessas listas poderia estender o campo
de aplicação da AIA a projetos de baixo
impacto, exigindo desnecessariamente
do proponente do projeto em termos de
tempo e custos, do mesmo modo que au­
mentaria a demanda de tempo e recursos
dos agentes públicos, tempo e recursos
que poderiam ser alocados de maneira
mais eficiente na análise e no controle de
empreendimentos de alto impacto.

Em um extremo, um projeto de alto


potencial de impacto poderia ser auto­
maticamente excluído da exigência de
apresentar um EIA por alguma m anipu­
lação do empreendedor, como reduzir o
porte do projeto para um nível imediata­
mente inferior ao patam ar de exigência,
ou fatiá-lo em projetos menores. Na outra
ponta, para um pequeno projeto de baixo
potencial de impacto poderia ser reque­
rido um EIA, a um custo incompatível
com a dimensão econômica do empreen­
Fig. 5.6 A flo ra m e n to calcário e entrada de caverna no vale do rio Iporanga, dimento. Por essa razão, é desejável
m u n icíp io h o m ô n im o situa do no sul do Estado de São Paulo. Nesta região que exista alguma flexibilidade para a
cárstica, m esclam -se a vuln erabilidad e do terreno, o v a lo r paisagístico, a tomada de decisão sobre o enquadram en­
elevada biodiversidade, o p a trim ô n io c u ltu ra l a tu a l e o arqueológico. Em um to de um projeto para fins de exigência
caso de re conh ecim ento precoce de sua im p o rtâ n cia , a área fo i declarada de um EIA, ou, na expressão de Glasson,
parque estadua l em 1958 Therivel e Chadwick (1999), “abordagens

CAPÍTlí 1 0
híbridas”, que combinem o uso de listas
e patamares indicativos com um a análise
caso a caso. André et al. (2003) também
reconhecem ser inevitável alguma for­
ma de análise caso a caso, e resumem os
procedimentos de triagem em duas mo­
dalidades: por categorias (de projeto, de
localização) e discricionários, ou alguma
combinação de ambos.

Tanto o critério de listas positivas ou ne­


gativas como o de áreas sensíveis têm
certa dose de arbitrariedade e podem estar
sujeitos a manobras por parte de empre-
endedores. Por exemplo, o município de FiS- 5-7 R“ ™ s * Tulum' Yuoatán, M é x ic ° ■Wesíe lo ca l■sobrepõem -se d i-
c ~ r, ^ 4. i , ~ versos a trib u to s que valorizam o sítio: construções m o n u m e n ta is da c u ltu ra
Sao Paulo tem um a regulamentacao que M *
... . . _ . maia, relevo cárstico, zona costeira e im p o rtâ n c ia econôm ica derivada do
determina a necessidade de obtencao de A .
turism o
um parecer da Companhia de Engenharia
de Tráfego antes da implantação de
qualquer estacionamento com capacidade acima de um determinado número de vagas,
devido à possibilidade de esses empreendimentos serem fontes de impactos sobre o
trânsito. A regulamentação estabelece critérios de corte orientativos, por exemplo,
duzentas vagas para usos não residenciais e quinhentas vagas para uso residencial, ou
ainda oitenta vagas em zonas consideradas “áreas especiais de tráfego”.

No entanto, no caso de condomínios residenciais, não basta que o empreendimento


tenha apenas 490 vagas para liberá-lo do procedimento, pois é óbvio que os impactos
sobre o tráfego de um estacionamento de 490 vagas não são muito diferentes de ou­
tro com 510 vagas. Há um a análise caso
a caso, que leva em conta outros fatores. 7 m m

Por essa razão, muitas regulamentações


estabelecem um espaço de discriciona­
riedade da autoridade decisória.

Se a discricionariedade é inevitável,
como exercê-la da forma menos arbitrá­
ria possível? Uma das respostas é tornar
públicos todos os atos administrativos,
permitindo seu controle judicial e por
parte do público, ampliando a tra n s ­
parência do processo decisório. Mas se
tal saída pode solucionar o problema
político, não o faz sob o ponto de vista
técnico. Entre a padaria e a usina nuclear
continua a existir vasto campo em que
diferentes projetos podem ou não resultar Fig. 5.8 A rq u ip é la g o de A brolhos, no lito ra l sul da Bahia, p a rte do Parque
em impactos ambientais significativos. N a cio n a l M a rin h o de A brolhos
ação ce Impacto A m biental: conceitos e métodos

A solução adotada por muitas jurisdições é preparar um estudo preliminar ou um a ava­


liação inicial que indique o potencial do empreendimento causar impactos ambientais
significativos. Caso a conclusão desse estudo seja positiva, então o empreendimento é
submetido ao processo completo de avaliação de impacto ambiental. Caso seja nega­
tiva, o empreendimento passa por outras vias decisórias, que usualmente requerem a
obtenção de um a série de autorizações, como a de suprimir vegetação nativa, de cap­
tar recursos hídricos superficiais ou subterrâneos, de emitir poluentes atmosféricos
ou hídricos, ou outras, de acordo com a teia de regulamentações ambientais existente
hoje na maioria das jurisdições.

Na verdade, ao se reconhecer que o conceito de impacto ambiental significativo tem


muito de subjetividade e depende da percepção dos indivíduos e grupos sociais, deve-
se admitir que tanto razões técnicas como políticas (no sentido nobre da palavra)
deveriam concorrer para decidir qual nível de detalhamento e, portanto, que tipo de
estudo ambiental será necessário para fundam entar decisões quanto ao licenciamento
de um empreendimento.

A Fig. 5.9 sintetiza os critérios que podem ser adotados, incluindo a manifestação de
interesse e preocupação do público como uma 4as razões que podem determ inar a
necessidade de elaboração de um estudo completo. Para que possa haver tal m anifes­
tação é preciso que haja um procedimento que regulamente (a) a divulgação das
intenções do proponente do projeto e (b)
Descrição da proposta as formas e os canais de manifestação do
Atividadade permitida segundo zoneamento público. Tais procedimentos também fa­
ou outras normas de uso do solo
zem parte das etapas iniciais do processo
de AIA e formam um a das modalidades
de participação pública neste.

Lista negativa Capacidade desconhecida Lista positiva


ou de mitigar impactos ou E studos p r e l im in a r e s
ou Impactos negativos Uma avaliação ambiental inicial, por
Impactos negativos potenciais significativos meio de estudos preliminares mais
Impactos potenciais
potenciais
desconhecidos ou simples e mais rápidos que um EIA (e,
insignificantes
Ambiente sensível
ou ou de importância consequentemente, mais baratos), é
Impactos negativos ou uma solução largamente adotada para
facilmente mitigáveis Preocupação do público o campo intermediário de aplicação da
AIA, aquele em que não há clareza sobre
a possibilidade de ocorrência de impac­
tos significativos. Unep (1996, p. 237)
conceitua esses estudos (ali chamados
Avaliação ambiental inicial de exames ambientais iniciais) como
“avaliações ambientais de baixo cus­
to que usam informação já disponível”.
Nos casos em que a informação disponí­
vel for somente de âmbito regional, um
Licenciamento ambiental + ^ Estudo de impacto
convencional ambiental reconhecimento de campo feito com um a
equipe reduzida pode atender às necessi­
dades dessas avaliações.
Fig. 5.9 C ritérios de triagem p ara avaliação de im p a c to a m b ie n ta l

CAPITU
Estudos simplificados servem não somente para enquadrar a proposta entre aquelas
que necessitem de um EIA ou aquelas que podem ser dispensadas desse estudo, mas
atendem também ao objetivo de determ inar as condições em que o projeto pode ser
executado, caso seja isento de apresentação de EIA. Dito de outra forma, os estu­
dos preliminares podem ser suficientes para estabelecer as condições particulares de
implantação, funcionamento e desativação de um empreendimento (condicionantes
da licença ambiental), ou seja, aquelas condições que vão além dos requisitos legais
\ automaticamente obrigatórios.

No Estado de São Paulo, essa sistemática foi introduzida pela Resolução SMA 42/94,
regulamentação da Secretaria do Meio Ambiente que disciplinou os procedimentos
de avaliação de impacto ambiental e criou, para o caso de projetos cujo potencial de
impactos não é evidente, um documento para avaliação inicial chamado “relatório
ambiental prelim inar” (RAP). Procedimentos semelhantes de avaliação inicial são
empregados em vários países, como Estados Unidos e Canadá, tema que será explo­
rado ainda neste capítulo.

No plano internacional, um exemplo do uso de estudos preliminares é dado pelo


Protocolo de Madrid sobre Proteção Ambiental, firmado na capital espanhola em
1991 sob a égide do Tratado Antártico de 1959. 0 Protocolo estabelece, entre ou­
tros requisitos para avaliação de impacto ambiental de iniciativas de turismo,
pesquisa e outras atividades no continente, três níveis de estudos. Uma “avaliação
prelim inar” serve para determ inar se um a atividade proposta tem “menos que im­
pactos pequenos e transitórios”. Em caso contrário, o interessado, por exemplo, uma
operadora de turismo ou um a instituição de pesquisa, deve preparar um a “avaliação
ambiental inicial". Para projetos que acarretam impactos mais fortes que “pequenos e
transitórios”, é preciso preparar um a “avaliação ambiental completa”, tipo de estudo
que não vem sendo feito para turismo, mas sim para atividades como a construção de
um a pista de pouso, de um a bas^e de pesquisa e sondagens para coleta de amostras
de gelo e rocha (Kriwoken e Rootes, 2000, p. 145).

à TRIAGEM E 0 CAMPO DE APLICAÇÃO DA AIA


Pode-se agora resumir o campo de aplicação da avaliação de impacto ambiental e
o papel na etapa de triagem. A Fig. 5.2 mostra três campos, o primeiro no qual a
avaliação de impacto ambiental seria necessária, outro onde ela não seria, e um
terceiro, intermediário, onde ela poderia ser necessária, sugerindo que, na prática, a
conjugação dos princípios de solicitação x vulnerabilidade pode necessitar um exame
mais detido antes de ser aplicada a certos casos. Uma representação mais detalhada
do campo de aplicação da AIA é agora apresentada na Fig. 5.10, na qual a solicitação
ou pressão ambiental das atividades hum anas é representada como um espectro
contínuo, sobre o qual são definidos arbitrariamente (com base, essencialmente, na
observação de casos passados similares) limites administrativos, para fins de definir
o campo de aplicação da avaliação de impacto ambiental. Observam-se os seguintes
campos, cujos limites, contudo, nem sempre são precisamente identificáveis, possibi­
litando uma decisão caso a caso da autoridade governamental:
# A linha horizontal superior representa a aplicação do critério de listas positivas
(por tipo ou porte de empreendimento).
5;ã c de °"pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

0 quadrante inferior esquerdo representa um campo onde não seria necessá­


rio o EIA, campo que pode ser delimitado por listas negativas conjugadas com
critérios de localização (e.g., estão isentos de apresentar EIA os empreendimentos
do tipo X, desde que não localizados em áreas com as características Cl ou C2).
-Desde que o Os casos de dispensa de ELA podem ser tratados mediante outras formas de con­
zoneamento tenha trole, como zoneamento de uso do solo (que discrimine as atividades permitidas
levado em conta em cada zona)12 e a obrigatoriedade de atender a determinadas normas técnicas
as características ou requisitos regulamentares, como padrões de emissão.
ambientais, como
0 campo à direita da linha fracionada, em função da importância ou da sensibili­
o zoneamento
econômico- dade do ambiente, representa a situação em que determinados empreendimentos
ecológico previsto podem ser simplesmente proibidos e, portanto, não há porque exigir EIA; por
na legislação exemplo, certas categorias de indústrias em áreas de proteção de mananciais
brasileira. Ver ou usinas hidrelétricas em parques nacionais. Para aplicação deste critério, é
Santos (2004). preciso que essas áreas sejam delimitadas geograficamente, mas como a auto­
ridade responsável por elas pode não ser a mesma que gera o processo de AIA,
é necessária um a boa dose de coordenação institucional para aplicação eficaz
de tal critério.
# 0 campo intermediário é onde um EIA pode ser necessário para fundam entar
decisões. A necessidade aumenta conforme a conjugação dos fatores solicitação
x vulnerabilidade ou a importância do ambiente se aproxima dos limites supe­
riores. Nesses casos, pode ser conveniente reaíizar um a avaliação ambiental
inicial (estudo preliminar) antes de tomar a decisão sobre a necessidade do EIA.
A decisão também pode ser tomada
com base em outros tipos de estudos
ambientais, mais simples que o EIA.
Determinados
Pressão empreendimentos
ambiental podem ser proibidos 0 papel do zoneamento pode ser
potencial do em certas áreas apreciado no estudo comparativo
projeto
de sete sistemas de AIA realizado
Listas positivas----------
por tipo e porte +■ Cresce o potencial de por Wood (1995), todos eles de paí­
de projeto 2= impactos de um projeto ses desenvolvidos. Somente dois
“QJO (Reino Unido e Holanda) não u sa­
-a
QJ

03 vam avaliações ambientais iniciais


‘l/l Condicionantes
i / l
ambientais decorrem
ou algum tipo de estudo ambiental
U
QJ

QJ
C dos estudos ambientais de menor alcance que o EIA (es­
I (regras particulares) tudos preliminares), justam ente
os únicos dois que dispunham de
Listas negativas------------
Campo de aplicação “fortes sistemas de planejamento de
por tipo e porte
preferencial de regras
de projeto uso do solo” (p. 128), sistemas que
de zoneamento, normas
técnicas etc. (regras gerais) permitem controlar projetos que
causam impactos menos signifi­
Importância ou sensibilidade do ambiente cativos, e instituições fortes o
1 EIA sempre necessário
2 EIA desnecessário; aplicam-se outros instrumentos de planejamento ambiental
suficiente para fazer valer as regras
3 Regras de zoneamento impedem a realização de determinados tipos de de zoneamento.
empreendimentos (portanto, não faz sentido preparar um EIA)
4 A necessidade de EIA é determinada por análise caso a caso; estudos preliminares
podem ser suficientes para a tomada de decisão
Em resumo, o Quadro 5.4 sintetiza
í os procedimentos que podem ser
Fig. 5.10 Cam po de aplicação da avaliação de im p a c to a m b ie n ta l e sua relação utilizados para a etapa de triagem
com o u tro s in stru m e n to s de p la n e ja m e n to a m b ie n ta l do processo de avaliação de impacto

CAPÍTU ;L0
ambiental. Cada sistema de AIA pode empregar mais de um procedimento, ou uma
combinação deles.

Q u a d r o 5 . 4 P ro c e d im e n to s de tria g e m p a ra o p rocesso de A IA
A bordagem P r o c e d im e n t o
Por categorias Lista positiva com patamares
Lista negativa com patamares
Lista positiva sem patamares
Lista negativa sem patamares
Lista de recursos ou de áreas importantes ou sensíveis
Discricionária Critérios gerais
Análise caso a caso com avaliação ambiental inicial
Análise caso a caso sem avaliação ambiental inicial
Mista Combinação da abordagem por categorias com a abordagem discricionária
Fonte: André et al. (2003, p. 293).

B a s e p a r a a d e c i s ã o : d e s c r iç ã o d o p r o je t o
Para aplicar os critérios de triagem a cada caso real, a autoridade pública encar­
regada do processo de AIA (o órgão licenciador, no Brasil) deve ser informada da
proposta pretendida pelo proponente, usualmente por meio de um documento descri­
tivo dessa proposta. Trata-se de um documento que deflagra todo o processo de AIA.
A “apresentação de um a proposta” (Fig. 4.1) é feita com algum “documento de entra­
da” (Quadro 4.2), tal como um memorial descritivo do projeto, uma notice o f intent
americana ou um avis de projet canadense. São diferentes denominações (que podem
comportar diferentes formatos e conteúdo) para um documento que deve servir de
base para a decisão quanto à classificação do projeto e exigência de apresentação de
um EIA, ou de outro tipo de estudo ambiental.

Esse documento de entrada deve apresentar informação suficiente para enquadrar a


proposta no campo de aplicação da AIA (Fig. 5.10): um a descrição do projeto e de suas
alternativas, sua localização e um a breve descrição das características ambientais do
local e seu entorno. 0 anúncio público da intenção de realizar o projeto (com infor­
mação sobre sua localização) permite a manifestação de interesse ou de preocupação
por parte de vizinhos e outros interessados.

De posse desse documento, o analista do órgão ambiental, conforme a Fig. 5.9, pode
1) verificar se a localização proposta é permitida por leis de zoneamento eventualmente
existentes; (2) verificar se há enquadramento em listas positivas ou negativas; 13Para Milaré e
Benjamin (1993,
(3) constatar se houve manifestação dos cidadãos ou de associações; e (4) caso não haja
p. 27), o estudo de
enquadramento automático em listas positivas ou negativas, avaliar se a informação
impacto ambiental,
apresentada é suficiente para um a decisão de enquadramento ou se é necessária uma “por seu alto custo
avaliação ambiental inicial. e complexidade,
deve ser usado
com parcimônia
5 . 3 E s t u d o s p r e l i m i n a r e s em a l g u m a s j u r i s d i ç õ e s s e l e c i o n a d a s
e prudência, de
Tomando por base o princípio de proporcionalidade entre os fins e os meios, diferentes preferência para
jurisdições adotaram diferentes níveis de estudos ambientais: estudos aprofundados os projetos mais
para empreendimentos mais complexos13 e estudos simplificados para empreendi­ importantes sob a
mentos de menor potencial de causar impactos ambientais significativos. 0 Banco ótica ambientar.
ação ce im pacto A m biental: conceitos e métodos

Mundial, a legislação federal canadense, a regulamentação da Nepa e a regulam enta­


ção do Estado de São Paulo fornecem exemplos de aplicação desse princípio.

0 Banco Mundial classifica os projetos submetidos para possível financiamento em


três categorias, de acordo com seu potencial de causar impactos ambientais signifi­
cativos. A classificação é feita com base em “julgam ento profissional e informação
disponível no momento da identificação do projeto” (Environmental Assessment
Sourcebook Update, n° 2, abril de 1993), e deve levar em conta os componentes de
um projeto com o maior potencial de causar impactos negativos. 0 Banco publicou
um a lista positiva com propósito ilustrativo (Quadro 5.5) para auxiliar na triagem
dos projetos. A lista é baseada na “experiência internacional e na do Banco”, que
mostra que “projetos de certos setores ou de certos tipos” são classificados dessa m a­
neira segundo seu potencial de causar impactos significativos (Operacional Directive
14 Esse documento 4.01, outubro de 1991, anexo E)14. Outros critérios que devem ser considerados na
não está mais triagem incluem:
em uso pelo # localização, como, por exemplo: (i) proximidades de ecossistemas sensíveis
Banco, tendo sido como áreas úmidas, recifes de coral ou hábitat de espécies ameaçadas; (ii) áreas
substituído pela
de interesse histórico, arqueológico ou cultural; (iii) áreas densamente povoadas;
Política Operacional
OP 4.01, Avaliação (iv) locais onde possa haver conflitos pelo uso cje recursos naturais; (v) ao longo
Ambiental, janeiro de rios, em zonas de recarga de aqüíferos ou áreas de mananciais; (vi) áreas
de 1999. Como os contendo recursos importantes, como recursos pesqueiros, minerais, plantas me­
procedimentos de dicinais ou solos agrícolas;
classificação não
# questões sensíveis segundo critérios do Banco ou do país que solicita o
mudaram em sua
essência, mantém- empréstimo, como, por exemplo, destruição de florestas tropicais ou áreas úmi­
se aqui a referência das, existência de áreas ou sítios protegidos, influência sobre terras ou direitos de
original. povos indígenas ou outras minorias vulneráveis, reassentamento involuntário,
impactos sobre cursos d ’água internacionais e disposição de resíduos tóxicos;
# natureza dos impactos, como conversão permanente de recursos produtivos
como florestas, destruição de hábitats e perda de biodiversidade, riscos à saúde
ou segurança do homem, deslocamento de grande número de pessoas ou ativida­
des econômicas e ausência de medidas mitigadoras ou compensatórias eficazes;
# magnitude dos impactos, incluindo a possibilidade de ocorrência de impactos
cumulativos.

Para a triagem, “o Banco faz uma análise ambiental preliminar de cada um dos
projetos propostos para determ inar o grau e o tipo apropriado de avaliação ambiental”
(Política Operacional OP 4.01, Avaliação Ambiental, janeiro de 1999).

No Canadá, a lei federal de 1993 (Canadian Environmental Assessment Act), que


entrou em vigor em 1995, estabelece duas categorias de estudos ambientais, as au-
toavaliações e as avaliações independentes. Estas envolvem complexas audiências
públicas ou encontros públicos de mediação, conduzidos por um a comissão indepen­
dente. As autoavaliações formam cerca de 99% das avaliações de impacto realizadas
nos termos da legislação federal, e tam bém comportam dois níveis: as avaliações
prévias (screening/examen préalablc) e os estudos detalhados (comprehensive studys/
étude approfondie). A regulamentação dessa lei traz quatro listas, bastante detalha­
das, de atividades sujeitas ou dispensadas de um a avaliação ambiental, e também

CAPÍTU L0
E ta p a de T r i a g U M 12 7

estabelece qual dos dois níveis de avaliação ambiental se aplica. São três listas posi­
tivas e um a negativa. A lista de exclusão (lista negativa) arrola todos aqueles projetos
para os quais não é necessário realizar um estudo de impacto ambiental. As listas
positivas são: (i) um a lista de inclusão (arrola diversos tipos de projetos submetidos
a avaliação prévia), (ii) um a lista de empreendimentos sujeitos a estudos detalhados
(deve obrigatoriamente ser realizado um estudo de impacto ambiental) e (iii) um a
lista de licenças adm inistrativas cuja concessão é condicionada a um a avaliação de
impacto ambiental. 0 Quadro 5.6 mostra alguns exemplos de atividades incluídas na
lista de estudos detalhados.

Q u a d r o 5 . 5 C la s s ific a ç ã o de p ro je to s p a ra e fe ito s de tria g e m a d o ta d a p e lo B a n co M u n d ia l


C a t e g o r ia A - a v a l ia ç ã o a m b ie n t a l c o m p l e t a n e c e s s á r ia

(a) b a rra g e n s e re s e rv a tó rio s


(b) p ro je to s de p ro d u ç ã o flo re s ta l
(c) p ro je to s in d u s tria is de g ra n d e escala
(d) p ro je to s de g ra n d e escala de irrig a ç ã o , d re n a g e m e c o n tr o le de in u n d a ç õ e s
(e) supressão de v e g e ta ç ã o n a tiv a e te rra p le n a g e m
(f) m in e ra ç ã o e p ro d u ç ã o de p e tró le o e gás
(g) p ro je to s p o rtu á rio s
(h) a te rro s e c o lo n iz a ç ã o de novas áreas
(i) re a s s e n ta m e n to e to d o s os g ra n d e s p ro je to s co m im p a c to s sociais p o te n c ia lm e n te im p o r ta n te s
(j) p ro je to s e n v o lv e n d o bacias h id ro g rá fic a s
(k) p ro d u ç ã o de e n e rg ia e lé tric a de o rig e m h ídrica ou té r m ic a
(I) m a n u fa tu r a , tr a n s p o r te e uso de p e stic id a s e o u tra s s u b s tâ n c ia s perigosas ou tó x ic a s
C a t e g o r ia B - n o r m a l m e n t e n ã o é n e c e s s á r io p r e p a r a r u m e s t u d o de im p a c t o c o m o t a l , o s ím p a c t o s p o d e m ser a n a l is a d o s
EM UM CAPÍTULO ESPECÍFICO DO ESTUDO DE VIABILIDADE

(a) a g ro in d ú s tr ia s de peque na escala


(b) tra n s m is s ã o de e le tric id a d e
(c) a q u ic u lt u r a e m a r ic u lt u r a >
(d) irrig a ç ã o e d re n a g e m em pe q u e n a escala
(e) e n e rg ia renovável
(f) e le tr ific a ç ã o rural
(g) t u r is m o
(h) f o r n e c im e n t o de água e s a n e a m e n to em m e io rural
(i) g e stã o e r e a b ilita ç ã o de bacias h id ro g rá fic a s
(j) p ro je to s de pe q u e n a escala de m a n u te n ç ã o , re a b ilita ç ã o e m e lh o ria
C a t e g o r ia C - p r o je to s c u j a p o s s ib il id a d e de c a u s a r im p a c t o s a d v e r s o s é m í n i m a

(a) e d u c a ç ã o
(b) p la n e ja m e n to f a m ilia r
(c) saúde
(d) n u tr iç ã o
(e) d e s e n v o lv im e n to in s tit u c io n a l
(f) assistência té c n ic a
(g) p ro je to s de recursos h u m a n o s
N o ta : essas lis ta s nâo im p lic a m cla s s ific a çã o a u to m á tic a dos p ro je to s. São u tiliz a d a s apenas co m o g u ia p a ra a u x ilia r na triagem ,
que deve ser fe ita caso a caso u tiliz a n d o o "m e lh o r ju lg a m e n to p ro fis s io n a l", levando em c o n ta o u tro s c rité rio s , e n tre os quais
in c lu e m -s e a lo c a liz a ç ã o do p ro je to , a s e n sib ilid a d e do m eio, questões a m b ie n ta is conside radas a priori sensíveis p a ra o B anco
(com o d e s tru iç ã o de flo re s ta s tro p ic a is e áreas úm idas, p ro je to s que a fe te m os d ire ito s de povos indígen as ou o u tra s m in o ria s
vu ln e rá ve is e o u tra s questões) e a m a g n itu d e dos im p a cto s.
Fonte: O p e ra tio n a l D ire c tiv e 4.01, a n n e x E, O cto b e r 1991.
ação de m pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

Em ambos os casos, a adoção desses múltiplos níveis de estudos ambientais foi


decorrente de um amadurecimento da aplicação da avaliação de impacto ambiental.
Depois de anos adotando um procedimento simples para tentar resolver um problema
complexo, os procedimentos de triagem foram modificados, reconhecendo que entre
a padaria e a usina nuclear há um sem-número de casos intermediários. Enquanto
a experiência do Banco Mundial e o tipo de projetos em que esta organização está
envolvida dá grande margem para decisões caso a caso, a experiência canadense
evoluiu para o estabelecimento de listas detalhadas de tipos de empreendimentos,
considerando também seu porte e localização.

Nos Estados Unidos, a regulamentação de 1978 do CEQ estabeleceu um procedimento


de triagem que inclui a avaliação prelim inar dos impactos de cada ação das agências
do governo federal. A triagem se dá pela preparação de um documento chamado
de environmental assessment, definido como “um documento público conciso de

Q u a d r o 5 .6 A lguns e m p r e e n d im e n t o s s u je it o s a e s t u d o s de im p a c t o a m b ie n t a l s e g u n d o a l e g is la ç ã o fe d e r a l c a n a d e n s e

4. P r o je to de c o n s tr u ç ã o , d e s a tiv a ç ã o o u fe c h a m e n to :_______________________________________________________________________________

a) Usina e lé tric a a lim e n ta d a p o r c o m b u s tív e l fóssil de c a p a cidad e igual ou s u p e rio r a 2 0 0 M W


b) Usina h id re lé tric a de c a p a cidad e igual ouSRw
sBuwb
íG
pSeBIrio r a 2 0 0 M
MWW fS
^
7. P r o je to de c o n s tr u ç ã o de u n h a de tra n s m is s ã o e lé tr ic a com v o lta g e m ig u a l ou s u p e rio r a 345 kV ou c o m p rim e n to ig u a l
OU SUPERIOR A 75 KM______________________________________________________________________________________________________________________
11. P rojeto de c o n s t r u ç ã o , d e s a t iv a ç ã o o u f e c h a m e n t o :_____________________________________________________________________________

b) De in s ta la ç ã o de t r a t a m e n t o de óleo pesado ou a re n ito a s fá ltic o cuja c a p a cidad e de p ro d u ç ã o de p e tró le o é de


m ais de 10.000 m 3/dia
2 2 . P rojeto de c o n s t r u ç ã o , d e s a t iv a ç ã o o u f e c h a m e n t o , o u pro jeto de a m p l ia ç ã o d a c a p a c id a d e de p r o d u ç ã o de m a is de

3 5% :_________________________________________________________________________________________________
a) De in s ta la ç ã o de p ro d u ç ã o de aço p rim á rio de um a ca p a cidad e de p ro d u ç ã o de m e ta l igual ou s u p e rio r a
5 .0 0 0 t/d ia
b) De f u n d iç ã o de m e ta is não ferrosos de um a c a p a cid a d e de p ro d u ç ã o igual ou s u p e rio r a 1.000
d) De in sta la ç ã o de fa b ric a ç ã o de p ro d u to s q u ím ic o s de um a c a p a cid a d e de p ro d u ç ã o igual ou s u p e rio r a
2 5 0 .0 0 0 t /a n o
ij De c u r tu m e de um a c a p a cidad e de p ro d u ç ã o igual ou s u p e rio r a 5 0 0 .0 0 0 r m /a n o
I) De in sta la ç ã o de fa b ric a ç ã o de ba te ria s de c h u m b o ________________________________________________________________
23. P r o je to de c o n s tr u ç ã o de base ou in s ta la ç ã o m ilita r , ou de cam po de tr e in a m e n to , ou de t i r o , ou de c e n tr o de te s te s
PARA TREINAMENTO MILITAR, OU TESTES DE ARMAS

2 4 . P rojeto de d e s a tiv a ç ã o de base ou in s t a la ç ã o m il it a r

2 8 . P rojeto de c o n s t r u ç ã o , d e s a tiv a ç ã o ou f e c h a m e n t o :

a) De canal, eclusa ou estrutura conexa para controlar 0 nível da água nas vias navegáveis existentes
c) De terminal marítimo projetado para receber navios de mais de 25.000 t
2 9 . P rojeto de c o n s t r u ç ã o :

a) De estrada de ferro de comprimento superior a 32 km em uma nova via


b) De via pública permanente de comprimento superior a 50 km
c) De ferrovia projetada para trens cuja velocidade média é superior a 200 km/h
3 2 . P rojeto de c o n s t r u ç ã o , d e s a tiv a ç ã o ou f e c h a m e n to de in s t a la ç ã o u t il iz a d a e x c lu s iv a m e n t e pa r a o t r a t a m e n t o , a in c i ­
n e r a ç ã o , A e l im in a ç ã o ou a r e c ic la g e m de resíduo s perig o so s , ou projeto de a m p l ia ç ã o de t a l in s ta la ç ã o q ue acarrete u m
AUMENTO DA CAPACIDADE DE PRODUÇÃO DE MAIS DE 3 5 %

Fonte: Canada G azette/G aze tte du Canada P a rt ll/P a rtie II, vol. 128, n°21, p. 3 .4 0 1 -3 .4 0 9 , O cto ber 19,1994.

CAPÍTU
responsabilidade da agência federal que serve para: (1) brevem ente fornecer evi­
dência e análise para d eterm in ar se deve ser preparado um estudo de impacto
am biental ou um relatório de ausência de impacto am biental significativo; (2) ajudar
a agência a aplicar a lei quando não é necessário um estudo de impacto ambiental;
(3) facilitar a preparação do estudo quando ele for necessário”. Também o conteúdo
desses docum entos é definido na regulam entação: “deve incluir um a breve discussão
da necessidade da iniciativa, das alternativas (...), dos impactos am bientais da ação
proposta e suas alternativas e u m a lista de agências e pessoas consultadas”.

Nos dois primeiros anos de aplicação da Nepa, foram preparados 3.635 estudos de
impacto ambiental, ou seja, cerca de 1.800 por ano. Ao final de nove anos, a média
anual de EIAs havia caído para cerca de novecentos, e em meados da década de
1990, entre quatrocentos e quinhentos estudos de impacto am biental federais eram
realizados anualm ente. Em contrapartida, nada menos que 50 mil environmental
assessments são feitos a cada ano (Clark, 1997).

Ao fazer um balan ço de 25 anos de aplicação da Nepa, Clark (1997), na qualidade


de diretor do Conselho de Qualidade A m biental, com enta que um a das c o n seq ü ê n ­
cias im previstas das diretrizes de 1978 foi o fenom enal aum ento da qu antid ade
de estudos p relim in ares, denom inados environm ental assessm ents (EAs), e o uso
excessivam ente liberal de listas negativas na etapa de triagem , levando a um ele­
vado núm ero de “declarações de ausência de im pacto significativo” (Findings O fN o
Significant Impacts - Fonsi j 15. 1BA Fig. 4.2 mostra
o procedimento
americano.
A prática de u sa r os EAs para evitar os estudos completos tam bém é dissem inada
(e criticada) nos Estados Unidos. Para Ortolano (1987, p. 318), as agências do governo
federal am ericano “frequentem ente veem os environmental assessments como docu­
mentos que podem ser usados para ju stificar (e defender) a declaração de ausência
de impacto significativo, e alguns EAs têm o ta m a n h o e a aparência de um estudo
completo de impacto am biental”. Nesse caso, as declarações Fonsi indicam medidas
m itigadoras para o projeto analisado. Parte das críticas fu n d am en ta-se na pouca
participação pública quando um a decisão é exclusivam ente baseada em um EA e no
grande núm ero dessas decisões, que não levam em conta os impactos cumulativos.
16As audiências
Também na província canadense de Ontário o núm ero de em preendim entos que passa públicas em
pelo processo completo de avaliação de impacto am biental é reduzido. Cerca de 90% Ontário, como de
dos projetos que requerem algum a forma de autorização são dispensados de qualquer resto na maioria
das províncias
estudo am biental; dos 10% restantes submetidos a um a avaliação preliminar, apenas
canadenses, são
1% é submetido à avaliação completa, com a preparação de um estudo de impacto muitíssimo mais
am biental e, destes, somente 0,1% é submetido ao procedim ento mais complexo, que complexas que
inclui um a audiência pública16 (Sadler, 1996). as audiências
brasileiras; duram
No Estado de São Paulo, as avaliações am bientais iniciais, feitas em um tipo de estudo vários dias e são
conduzidas por uma
denom inado Relatório Ambiental P relim inar (R AP), foram introduzidas em dezembro de
comissão indepen­
1994 (Resolução SMA 42), quando da modificação dos procedim entos de avaliação
dente, que formula
de impacto ambiental. Os RAPs têm sido utilizados para licenciamento de centenas recomendações
de projetos, ao passo que o núm ero de EIAs foi reduzido. Quatro críticas principais para a decisão
são feitas aos RAPs. A prim eira é que um uso excessivam ente liberal dos RAPs teria governamental.
sção ce Im pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

eximido projetos de significativo impacto da apresentação do EIA. A segunda crítica


é que o procedimento necessariamente tin h a início com a apresentação de um RAP, o
que alongava os prazos de análise para aqueles projetos que acabavam necessitando
de um EIA. Este último problema foi corrigido com nova modificação de procedi­
mentos (Resolução SMA 54, de 30 de novembro de 2004), segundo a qual, quando
se trata de atividade que possa causar impacto significativo, não mais se apresenta o
RAP, mas o plano de trabalho para o estudo de impacto ambiental. A terceira crítica,
similar à mencionada para os EAs americanos, é que muitos RAPs têm o tam anho
e a aparência de um EIA, estando longe do nível de detalhe compatível com um
projeto conceituai, e são muito mais caros e demorados do que um estudo feito com
base em dados secundários e um a visita ao campo; na verdade são verdadeiros EIAs
submetidos a um trâmite um pouco mais simplificado e com menor participação pú­
blica. Esta é, justam ente, um a quarta crítica, a de que o licenciamento fundado no
RAP não tem suficiente abertura para participação pública.

Avaliações preliminares são usadas em muitas outras jurisdições. A lei federal austra­
liana adota dois tipos de estudos, o estudo de impacto ambiental (environmental
impact statement) e o relatório ambiental público (public environment report - PER).
Esse documento descreve sucintamente o projeto, apresenta seus impactos ambientais
e as medidas necessárias para proteger o ambiente. 0 PER é requerido quando o projeto
suscita um número relativamente restrito de questões, um a vez que esse estudo pro­
picia um “tratam ento seletivo” das implicações ambientais. Todavia, o processo tem
início com a apresentação de uma Notice oflntention, documento que descreve breve­
mente o projeto — e deve ser devidamente ilustrado com “mapas, plantas e fotos” —,
apresenta a lista de alternativas que o proponente analisou e indica o “potencial de
impactos ambientais” da alternativa escolhida.

A preparação de estudos simplificados na etapa inicial também é usada na região


belga da Valônia, onde o interessado deve apresentar um a “notícia de avaliação
prévia”. Na Holanda, o proponente de um projeto deve, inicialmente, apresentar um
“documento de registro”, em que são descritos a atividade proposta, sua localização,
sua justificativa e os efeitos ambientais. É com base nesse documento que a auto­
ridade competente avalia a necessidade de apresentação de um estudo de impacto
ambiental.

Em Portugal, o Decreto-lei n° 69/2000, que modificou os procedimentos de AIA, prevê


o caso de “dispensa do procedimento de AIA”, para o que o proponente deve apresentar
“um requerimento de dispensa do procedimento de AIA devidamente fundamentado,
no qual descreva o projeto e indique os seus principais efeitos no ambiente” (Art. 3o, 2).
Caso o parecer da “autoridade de AIA” seja favorável à dispensa, ele deve “prever
medidas de minimização dos impactos ambientais considerados relevantes a serem
impostas no licenciamento ou na autorização do projeto” (Art. 3o, 4).

5 .4 S ín t e s e
0s procedimentos e critérios usados para a triagem de ações sujeitas à avaliação de
impacto ambiental são da maior importância para se estruturar um processo efi­
caz. De um lado, critérios muito inclusivos delimitam um universo por demais vasto

CAPÍTÜ10
de tipos de propostas que podem dem andar a elaboração de um EIA, ao risco de
banalização e burocratização desse instrum ento. De outro lado, exigir a elabora­
ção de um EIA somente em situação excepcional deixa de fora um a vasta gam a de
em preendimentos que podem acarretar impactos adversos significativos. Uma so­
lução, empregada em vários países e organizações internacionais, é desenhar um
procedimento que dê lugar a diferentes níveis de avaliação, conforme o potencial de
impacto de cada projeto, dem andando, assim, um a análise prelim inar rápida.

Além da análise preliminar, os critérios mais freqüentes de enquadram ento são listas
positivas e negativas por tipo e porte de projetos, e a im portância ou sensibilidade
ambiental do local. As ações ou empreendimentos não enquadrados na necessidade de
preparação de um EIA, mas que possam causar algum a forma de impacto ambiental,
são regulados e controlados por meio de outros instrum entos de política ambiental
pública, como zoneamento, licenciamento, norm as técnicas e padrões legais.
a ação de Im pacto A m biental: conceitos e métodos

A realização de um estudo ambiental, como, aliás, a de qualquer trabalho técnico,


requer planejamento. Não se começa um estudo de impacto ambiental simplesmente
coletando toda informação disponível, mas definindo previamente os objetivos do
trabalho e o que se pode chamar de sua abrangência ou alcance. Este capítulo discute
a necessidade e o papel dessa etapa do processo de AIA, apresenta um a breve evolução
histórica que levou à sua consolidação e os principais requisitos legais. Um adequado
planejamento dos estudos ambientais, calcado naquilo que é realmente relevante para
a tomada de decisão, é a chave da eficácia da avaliação de impacto ambiental.

Pode-se enunciar as funções da etapa de seleção das questões relevantes como:


• dirigir os estudos para os temas que realmente importam;
• estabelecer os limites e o alcance dos estudos;
# planejar os levantamentos para fins de diagnóstico ambiental (estudos de base),
definindo as necessidades de pesquisa e de levantamento de dados;
# definir as alternativas a serem analisadas.

6.1 D e t e r m in a ç ã o d a a b r a n g ê n c ia e do escopo de u m es tu d o de
IMPACTO AMBIENTAL
A experiência prática em avaliação de impacto ambiental tem mostrado que, na
discussão pública de empreendimentos que podem causar significativos impactos
ambientais, o debate geralmente se dá em torno de algumas poucas questões-chave,
que atraem a atenção dos interessados. Por exemplo, na análise de seis casos de
aplicação da AIA no Estado de São Paulo, para empreendimentos que suscitaram
o interesse do público, observou-se que as controvérsias envolviam alguns poucos
pontos críticos (Sánchez, 1995b). Um dos casos estudados foi o projeto de duplicação
da rodovia Fernão Dias, no qual um a grande parte das discussões sobre a viabili­
dade e a aceitabilidade do projeto derivaram do fato da rodovia atravessar o Parque
Estadual da Serra da Cantareira e de estimular a ocupação intensiva de uma área de
mananciais, que corresponde às bacias dos rios Atibaia, em São Paulo, e Jaguari, no
sul do Estado de Minas Gerais. Num outro caso muito polêmico, o aterro de resíduos
industriais Brunelli, em Piracicaba, Estado de São Paulo, um dos principais pontos
críticos foi o risco de poluição das águas subterrâneas - a questão foi tão controver­
tida que gerou nada menos que sete diferentes pareceres técnicos adicionais ao EIA
(Sánchez et al., 1996).

Esta característica parece ser universal: embora o potencial de causar impactos


ambientais próprio da maioria dos empreendimentos seja, a princípio, bastante vasto,
nem todos os impactos potenciais terão igual importância. Por exemplo, o impacto
visual causado por uma linha de transmissão de energia elétrica em uma região tu ­
rística será certamente mais significativo que o impacto visual causado por uma linha
semelhante, mas localizada em uma zona industrial. Em cada um a dessas situações, as
questões-chave que norteariam os respectivos estudos ambientais seriam diferentes.

Trata-se, dessa forma, de reconhecer o princípio de que a avaliação de impacto


ambiental deve ser empregada para identificar, prever, avaliar e gerenciar impactos
significativos. Assim como o instrumento avaliação de impacto ambiental é utilizado
como auxílio na tomada de decisões que possam causar significativa degradação
D e te r m in a ç ã o d o e s c o p o d o e s tu d o e f o r m u la ç ã o de a l t e r n a t ; ^ » 135

ambiental, da mesma forma 0 estudo de impacto ambiental deve ser dirigido para a
análise dos impactos significativos.

As implicações práticas de se adotar 0 princípio de que a AIA trata de impactos


significativos são enormes, pois os estudos ambientais deixam de ser meras com­
pilações de dados (muitas vezes dados secundários e irrelevantes para a tomada de
decisões) e passam a ser ferram entas para organizar a coleta e a análise de informações
pertinentes e relevantes. Infelizmente, são muitos os estudos ambientais executados
sem que se tenha dado a devida atenção à definição clara e precisa de sua abran­
gência e escopo. Um exemplo, dentre vários, é 0 projeto proposto pelo Ministério
dos Transportes visando à melhoria das condições de navegação de trechos dos rios
A raguaia e Tocantins, no Centro-Oeste brasileiro, projeto denominado de Hidrovia
Araguaia-Tocantins. Um de seus objetivos era increm entar 0 transporte fluvial. Nesse
caso, foram feitos, sucessivamente, dois estudos de impacto ambiental (0 primeiro foi
considerado insuficiente e retirado de análise). Como 0 projeto era bastante polêmico,
houve muita discussão pública, mesmo antes da conclusão do EIA, 0 que, por sua vez,
trouxe grande repercussão na imprensa.

Dentre os pontos críticos identificados nas discussões públicas, um a das questões


dizia respeito ao possível impacto do empreendimento sobre a atividade turística no
rio A raguaia, concentrada no mês de julho, período de vazante, e centrada na pesca
esportiva e nos atrativos das praias fluviais, atributos que poderiam ser modificados
pela hidrovia. Não havia dados oficiais sobre as atividades turísticas nessa zona (origem
dos visitantes, tempo de permanência, atividades desenvolvidas etc.), mas tudo 0 que se
pode ler no EIA é justam ente essa constatação (Fadesp, Fundação de Amparo e Desen­
volvimento da Pesquisa, Estudo de Impacto Ambiental, Hidrovia Araguaia-Tocantins,
8 volumes, versão preliminar, 1997). Se eram necessárias informações sobre 0 nível
de atividades turísticas para melhor identificar e avaliar os impactos do empreen­
dimento sobre 0 turismo, então, caberia à equipe que preparou 0 EIA levantar tais
informações - se dados secundáriQS não existem ou não são disponíveis, então dados
primários devem ser produzidos.

A seleção das questões relevantes depende da identificação preliminar dos impactos


prováveis. Uma relação de questões relevantes, por sua vez, serve para estruturar e
planejar as atividades subsequentes do estudo de impacto ambiental. Se um determinado
impacto não é identificado já nessa etapa preliminar, então os estudos de base não
serão direcionados para coletar informações sobre 0 componente ambiental que poderá
ser afetado, e 0 prognóstico da situação futura não poderá ser feito de modo confiável;
em conseqüência, será difícil avaliar adequadamente a importância dos impactos e
mais difícil ainda propor medidas mitigadoras (conforme a seqüência de atividades no
planejamento e execução de um estudo ambiental apresentada no Cap. 7).

Na literatura internacional sobre AIA, a questão da identificação das questões rele­


vantes e definição da abrangência e escopo dos estudos ambientais recebe 0 nome
de scoping (na legislação portuguesa, é traduzido como definição do âmbito de um
estudo). 0 scoping é reconhecido como um a das atividades essenciais do processo de
avaliação de impacto ambiental, e é etapa obrigatória segundo as regulamentações
de AIA de diversas jurisdições.

S
ação de Im pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

Para Tomlinson (1984, p. 186), scoping é um termo usado para “o processo de desen­
volver e selecionar alternativas a um a ação proposta e identificar as questões a serem
consideradas em um a avaliação de impacto ambiental”. Para Wood (2000), seu propó­
sito é estimular avaliações dirigidas (focused) e a preparação de EIAs mais relevantes
e úteis.

Beanlands (1988, p. 33) conceitua scoping como “o processo de identificar, dentre um


vasto conjunto de potenciais problemas, um certo número de questões prioritárias para
serem tratadas na AIA”. Significa, portanto, escolher, selecionar e classificar os impac­
tos potenciais, para que os estudos sejam dirigidos para aqueles de maior relevância.

Fuggle et al. (1992) definem scoping como “um procedimento para determ inar a
extensão e a abordagem apropriada para um a avaliação ambiental”, que inclui as
seguintes tarefas:
# envolvimento das autoridades relevantes e das partes interessadas;
# identificação e seleção de alternativas;
# identificação de questões significativas a serem examinadas no estudo ambiental;
# determinação de diretrizes específicas ou termos de referência para o estudo
ambiental.

A legislação portuguesa sobre avaliação de impacto ambiental, modificada em


maio de 2000, conceitua “definição do âmbito do EIA” como um a “fase prelim inar e
facultativa do procedimento de AIA, na qual a Autoridade de AIA identifica, analisa
e seleciona as vertentes ambientais significativas que podem ser afectadas por um
projecto e sobre as quais o estudo de impacto ambiental (EIA) deve incidir” (Decreto-
lei n° 69/2.000. Facultativa em Portugal, essa etapa é obrigatória em outros países.

Nem todas as jurisdições que regulam entaram a AIA incluem em suas regulamentações
um a etapa formal de definição do âmbito ou escopo do EIA - no Brasil, apenas
uns poucos Estados adotam explicitamente esse procedimento. Mesmo assim, é
imprescindível que quem executa um estudo ambiental faça uma seleção das ques­
tões relevantes a serem tratadas em profundidade no estudo; de preferência essa
seleção deveria ser feita com base em critérios claros previamente definidos. Dire­
trizes da Comissão Européia estabelecem como objetivo do scoping “assegurar que
os estudos ambientais forneçam toda a informação relevante sobre (i) os impactos do
projeto, em particular aqueles mais importantes; (ii) as alternativas ao projeto; (iii)
qualquer outro assunto a ser incluído nos estudos” (European Commission, 2001a).

Dessa forma, o scoping é, ao mesmo tempo, parte do processo de avaliação de impacto


ambiental e parte das etapas de planejamento e elaboração de um estudo ambiental.

6 .2 H istó r ic o
A necessidade de inserção de um a etapa formal de scoping no processo de
avaliação de impacto am biental foi percebida j á d u ran te os prim eiros anos de
experiência prática. Estudos excessivam ente longos e detalhados, assim como, ao
contrário, estudos dem asiado sucintos e lacônicos, refletiam a falta de diretrizes
p ara sua condução.

CAPÍTU L O
D e te r m in a ç ã o d o e s c o p o d o e s tu d o e f o r m u la ç ã o de a l t e r n a t H '3 7

Foi por meio da regulamentação de 1978 do Conselho de Qualidade Ambiental dos


Estados Unidos que o scoping foi reconhecido como um a etapa formal do processo
de AIA. Sua exigência pode ser em parte explicada pela interpretação jurídica da lei
americana Nepa e por certas decisões dos tribunais que determ inaram que alguns
estudos de impacto ambiental analisassem as possíveis implicações ambientais de
empreendimentos. De fato, alguns dos primeiros estudos de impacto ambiental eram
excessivamente sucintos. Beanlands e Duinker (1983) citam que 0 primeiro EIA
feito para um oleoduto no Alasca, de 1.900 km de extensão, tin h a somente oito
páginas! Considerado pela Justiça como incompatível com os objetivos da Nepa, 0
EIA foi refeito, resultando em um volumoso e pouco objetivo relatório de milhares
de páginas.

0 oleoduto liga a baía de Prudhoe, na costa do m ar de Beaufort, ju n to aos campos pe­


trolíferos do norte do Alasca, a um terminal marítimo situado no estreito do Príncipe
William, ao sul, conhecido por ser 0 local onde, em 24 de março de 1989, ocorreu 0
tristemente célebre naufrágio do petroleiro Exxon-Valdez. 0 EIA havia sido apresen­
tado em fevereiro de 1970, imediatamente após a Nepa entrar em vigor; questionado
na Justiça por grupos ambientalistas, 0 Bureau of Land Management fez um estudo
detalhado, aprovado três anos mais tarde (Burdge, 2004, p. 5). 0 novo estudo era
composto de “seis gordos volumes de análise ambiental, mais três volumes de análise
econômica e de risco, além de quatro volumes com comentários do público sobre os
nove volumes precedentes” (Beanlands e Duinker, 1983, p. 31). Burdge, em contraste
com 0 ponto de vista de Beanlands e Duinker, é de opinião que, no novo estudo, “a
maioria dos problemas ambientais potenciais foi tratada de maneira satisfatória para
os tribunais, para os ambientalistas e para a empresa proponente”, mas os impactos
sociais foram completamente negligenciados.

0 CEQ tornou, então, obrigatória um a etapa de scoping, na qual seriam definidos


a abrangência e 0 conteúdo do^ estudo de impacto ambiental. 0 Conselho definiu 0
scoping como “um processo aberto e precoce (early) para determ inar 0 escopo das
questões a serem abordadas e para identificar as questões significativas relacionadas
com um a ação proposta (Seção 1501.7)”.

0 Quadro 6.1 mostra as diretrizes estabelecidas pela regulamentação em vigor nos


Estados Unidos para a realização desse exercício. Elas incluem a consulta ao público e
a agências governamentais e chegam a determ inar que os estudos ambientais devem
eliminar questões não significativas, limitando-se a justificar por que não 0 são
e focando o estudo nas questões relevantes. 0 regulamento do CEQ define 0 que
denomina processo de scoping, ou seja, um a série de atividades articuladas e coor­
denadas com o objetivo de determ inar 0 escopo das questões a serem tratadas e para
identificar as questões relevantes.

0 princípio foi adotado por outras jurisdições, que passaram a exigir, em geral de
maneira formal, a prévia identificação e 0 devido tratamento das questões relevantes
nos estudos ambientais. Hoje, esse princípio faz parte da boa prática de avaliação
ambiental, recomendada em todos os m anuais e obras de referência (Unep, 1996).
Wood (2000) reporta que de um total de 25 países cujos sistemas de AIA foram
examinados para 0 Estudo Internacional sobre a Eficácia da Avaliação de Impacto

S
- çao ae m p a cto A m b ie n ta l: conceitos e m étodos

= 6.1 D ire triz e s p a ra s c o p in g do C o u n c il on E n v iro n m e n ta l Q u a lity d o s E sta d o s U n id o s


W C O m o p a r te d o p ro c e s s o de s c o p in g a a g ê n c ia p r in c ip a l d e v e rá :

C o n v id a r para p a r t ic ip a r do processo as a g ê n c ia s fe d e ra is , o p r o p o n e n te da a ç ã o e o u tr a s pessoas in te re s s a d a s


( in c lu in d o a q u e la s que possam n ã o e s ta r de a c o rd o c o m a ação em t e r m o s a m b ie n ta is ).
D e te r m in a r o escopo e as q u e stõ e s re le v a n te s a serem a n a lis a d a s em p r o fu n d id a d e no e s tu d o de im p a c to a m b ie n ta l.
I d e n t if ic a r e e lim in a r do e s tu d o d e ta lh a d o as q u e s tõ e s q u e n ã o são s ig n ific a tiv a s ou que t e n h a m sido c o b e rta s p o r
e s tu d o a n te rio r, lim it a n d o a discu ssã o dessas qu estõ es, no e s tu d o de im p a c t o a m b ie n ta l, a u m a breve a p re s e n ta ç ã o
das razões pelas q u a is elas não tê m um e f e it o s ig n if ic a t iv o sobre o a m b ie n t e h u m a n o , ou fa z e n d o re fe rê n c ia a o u t r o
e s tu d o q u e as ab o rd e .
A lo c a r re s p o n s a b ilid a d e s e n tre a g ência s.
In d ic a r o u tr o s e s tu d o s q u e estão se n d o ou serão p rep arado s.
I d e n t if ic a r o u tr o s re q u is ito s de e s tu d o s ou c o n s u lta s .
In d ic a r a re la çã o e n tre o c r o n o g r a m a de p re p a ra ç ã o das a n á lis e s a m b ie n t a is e o c r o n o g r a m a de p la n e ja m e n t o e
d e cis ã o da a g ê n c ia .
(b ) C o m o p a r te do p ro c e s s o de s c o p in g a a g ê n c ia p r in c ip a l d e v e rá :

E sta b e le c e r lim ite s de p á g in a s para os d o c u m e n t o s a m b ie n ta is .


E sta b e le ce r lim ite s de te m p o .
A d o t a r p r o c e d im e n to s de a c o rd o c o m a Seção 15 07.3 para c o m b in a r o processo de a v a lia ç ã o a m b ie n t a l c o m o p r o ­
cesso de s c o p in g .
R e a liz a r u m a re u n iã o de s c o p in g , q u e deve ser in te g ra d a c o m o u tr o s e n c o n tr o s de p la n e ja m e n t o q u e a a g ê n c ia
realize.
(c) U m a a g ê n c ia d e v e r á r e v is a r a s d e te rm in a ç õ e s fe ita s sob os p a r á g r a f o s (a ) e (b) d e s ta s e ç ã o se m u d a n ç a s s u b s ta n c ia is
FOREM FEITAS POSTERIORMENTE NA AÇÃO PROPOSTA OU SE NOVAS CIRCUNSTÂNCIAS OU INFORMAÇÕES SIGNIFICATIVAS SE APRESENTAREM.

F o n te : R e g u la tio n s , See. 1501.7.

A m biental (Sadler, 1996), cerca de metade tin h a requisitos específicos sobre procedi­
mentos de scoping, e apenas dois não utilizavam n en h u m a forma de scoping.

Muitas das deficiências dos primeiros EIAs (e os conseqüentes resultados insatisfa­


tórios do processo de AIA) foram im putadas à falta de foco e excessiva generalidade
dos estudos. Uma revisão crítica de trin ta EIAs canadenses, conduzida por Beanlands
e D uinker (1983), concluiu que “a norm a é a de tudo exam inar, ainda que superficial­
mente, sem se im po rtar sobre o quão insignificante isto possa ser para o público ou
para os tomadores de decisão” (p. 29). Esses autores tam bém apontam as in co n g ru ên ­
cias de estudos excessivam ente abrangentes:

[...] a p r e p a r a ç ã o d e d ir e t r iz e s c a d a v e z m a is lo n g a s c o n d u z a d o c u m e n t o s m a is
v o lu m o s o s . C o m o o b s e r v a d o v á r ia s v e z e s d u r a n t e as r e u n iõ e s d e t r a b a lh o , as m i ­
n u ta s d a s d ir e t r iz e s i n v a r i a v e l m e n t e c r e s c e m e m t a m a n h o à m e d id a q u e c ir c u la m
e n t r e v á r ia s a g ê n c ia s g o v e r n a m e n t a is [...]. 0 r e s u lt a d o é q u e e s tu d o s d e im p a c t o
a m b ie n t a l s ã o a g o r a e s c r ito s c o m o o b je t iv o d e a t e n d e r a d e m a n d a s t ã o d iv e r s a s
q u e u m a c o b e r t u r a e x te n s a d e to d a s as q u e s tõ e s p r e c e d e u m e x a m e m a is d ir ig id o ,
p o r é m r ig o r o s o , d a q u e la s q u e p a r e c e m s e r as m a is c r ític a s , (p . 2 1 )

0 fortalecim ento da etapa de seleção das questões relevantes é um a das quatro


áreas prioritárias p ara m elhoria dos processos de AIA, segundo o Estudo Internacio­
nal sobre a Eficácia da Avaliação de Impacto A m biental (Sadler, 1996, p. 117), que
recom enda que a determ inação do alcance seja feita pela autoridade responsável:

CAPITU
D e t e r m in a ç ã o d o es c o p o d o e s t u d o e f o r m u l a ç ã o de a l t e r n a t : | j :3 9

® d e a c o r d o c o m as le is e d ir e tr iz e s a p lic á v e is a c a d a ju r is d iç ã o ;
• d e m o d o c o n s is te n te c o m as c a r a c te r ís tic a s d a a t iv id a d e p r o p o s ta e a c o n d iç ã o
d o a m b ie n te re c e p to r;
• le v a n d o e m c o n ta as p re o c u p a ç õ e s d a q u e le s a fe ta d o s p e lo p r o je to .

As demais áreas prioritárias são; avaliação da significância dos impactos, análise


técnica da qualidade dos estudos e monitoramento e acompanhamento.

6 .3 P a r t ic ip a ç ã o p ú b l ic a n e s s a e t a p a d o p r o c e s s o
Há todo interesse em envolver o público na etapa de determ inação da abrangência
e escopo dos estudos ambientais. A principal razão é que o conceito de impacto
significativo depende de um a série de fatores, entre os quais a escala de valores
das pessoas ou grupos interessados. Há inúm eros motivos pelos quais as pessoas
valorizam determ inado componente ou elemento ambiental, inclusive razões de
ordem estética ou sentim ental, perfeitam ente válidas quando se discute os im ­
pactos de um em preendim ento. Um dos primeiros estudos de impacto am biental
realizado em Minas Gerais analisou a ampliação da área de lavra de um a m ina de
fosfato no município de A raxá.

O projeto implicaria a supressão de alguns hectares de vegetação secundária, numa


área conhecida como Mata da Cascatinha (Fig. 6.1). Segundo diversos observadores
da época, o local não tinh a grande importância ecológica, mas era extrem am ente
prezado pela população como área de lazer e seu valor derivava, portanto, de seu uso
recreativo, real ou potencial. 0 resultado da mobilização popular foi que a expansão
da m ina para esse setor não foi aprovada pelo órgão ambiental.

Por outro lado, a realização de um estudo de impacto ambiental é tarefa em inente­


mente técnica, e seu conteúdo não pode ser determinado unicamente em função das
preocupações do público. Há questões
que somente os técnicos ou ^cientistas
conseguem identificar e valorizar ade­
quadamente, pois sua apreciação depende
de conhecimento especializado. Por isso,
Beanlands e Duinker (1983) propõem dois
critérios complementares para o scoping,
o social e o ecológico, termo que poderia
ser ampliado para científico. 0 scoping
social visa identificar e compreender os
valores de diferentes grupos sociais e do
público em geral, e de que m aneira eles
podem ser traduzidos em diretrizes para
o estudo de impacto ambiental. Já o sco­
ping científico estabelece os termos e as
condições sob os quais os estudos podem
ser efetivamente conduzidos. Fig. 6.1 Vista da m in a de rocha fo s fá tic a de A raxá, M in a s Gerais (junho
de 1979), observando-se, na p o rçã o c e n tro -d ire ita da foto, um bosque
Reconhecendo essa realidade, muitas re­ conhecido com o M a ta da C ascatinha, cuja supressão não fo i autorizada. \ !o
gulamentações sobre AIA estabelecem p o rçã o centro -e sq u e rd a , a m in a e, ao fundo, a p ilh a de rocha estér;

S
EÇ5 ~ de im pacto A m biental: conceitos e métodos

que a responsabilidade pelo scoping é partilhada entre o órgão governamental regu­


lador e o proponente do projeto, mas o público deve ser ouvido de maneira formal.

A forma de consulta ou envolvimento pode variar, incluindo até audiências públicas,


convocadas com o fim específico de debater e discutir as diretrizes para os estudos
ambientais que se seguirão. Reuniões abertas, pesquisas de opinião, encontros com
pequenos grupos ou lideranças e a criação de comissões multipartites são também
técnicas apropriadas para essa fase do processo de AIA, que, idealmente, deveria
resultar em um a “maior compreensão dos efeitos ambientais potenciais” e “esclarecer”
quais são os problemas percebidos pela comunidade (Beanlands, 1988, p. 38).

Snell e Cowell (2006, p. 359) referem-se a um “dilema entre duas racionalidades para
o scoping - a precaução e a eficiência do processo decisório”. Enquanto o princípio
da precaução pode incitar a ampliar o leque de questões a serem estudadas, a preo­
cupação com os prazos, os custos e com a proporcionalidade entre o detalhamento
dos estudos e o potencial de impactos pode levar justam ente ao contrário, um afuni-
lamento das questões. Enquanto um modelo “tecnocrático” busca resolver a questão
tendo por base somente a eficiência do processo (não desperdiçar recursos que pode­
riam ser usados de modo mais produtivo em outra tarefa), um modelo “deliberativo”
busca construir consensos que possam durar até o final da avaliação de impactos.
Indubitavelmente, esses dois polos fundam entam -se em razões de ordem prática, e a
tensão entre ambos deve ser resolvida na prática e, não raro, a cada caso.

As dificuldades decorrentes de um a insatisfatória compreensão das preocupações


do público - e, consequentemente, da inadequada definição do escopo dos estudos
ambientais - são muito freqüentes, causando atrasos, aumento de custos ou até invia­
]0 terceiro e bilizando a aprovação de projetos. No caso da usina hidrelétrica de Piraju, situada
definitivo estudo
no rio Paranapanema, em São Paulo, onde três versões sucessivas do EIA tiveram
(que levou à
aprovação do de ser feitas1, um a das principais razões da oposição ao projeto foi que a alternativa
projeto) foi: escolhida pelo proponente implicaria o desvio das águas do rio, com a conseqüente
CNEC - Consórcio redução de vazão em seu trecho urbano. 0 rio Paranapanem a é visto pela população
Nacional de local como componente essencial da vida e da paisagem da cidade: um leito quase
Engenheiros
seco parecia inaceitável e a população se mobilizou em torno desta causa, conse­
Consultores,
Estudo de Impacto
guindo modificações substanciais no projeto. Uma discussão prévia estruturada teria
Ambiental, Usina mostrado inequivocamente as dificuldades de tal alternativa; o EIA teria sido dire­
Hidrelétrica cionado para a análise de outras alternativas mais viáveis, e a licença ambiental teria
Piraju, Companhia sido obtida mais rapidamente e com menores custos.
Brasileira de
Alumínio - CBA, 5
Em outro caso, um estudo de impacto ambiental feito para um a nova fábrica de
volumes, 1996.
cimento e mina de calcário no Mato Grosso do Sul2 (Centro de Tecnologia Promon, Es­
tudo de Avaliação de Impacto Ambiental, Fábrica de Cimento Eldorado, Bodoquena,
MS, Camargo Corrêa Industrial - S/A CCI, 2 volumes, 1988) suscitou polêmicas quanto
2Esse caso será aos impactos do empreendimento sobre as cavernas existentes na região. Nesse es­
retomado no Cap. 9, tudo, o patrimônio espeleológico não foi abordado com profundidade suficiente
na discussão sobre
para concluir se haveria ou não impacto e, caso houvesse, qual sua m agnitude -
a importância do
planejameyito dos enquanto isso exigiria um levantamento de campo, a questão foi tratada apenas com
Trabalhos de campo. base em consulta bibliográfica.

CAPÍTU: L O
D e t e r m in a ç ã o do es c o p o d o e s t u d o e f o r m u l a ç ã o de a l t e r n a t

O protesto de um a organização não governamental local, veiculado pela imprensa,


resultou na abertura de um inquérito civil pelo Ministério Público e o estudo teve de
ser complementado, a um custo muito maior para o empreendedor do que se a questão
tivesse sido devidamente tratada desde o início. Além dos custos diretos, a imagem
da empresa foi afetada, e o processo de licenciamento demorou muito mais. Nesse
caso, um incorreto levantamento das questões relevantes resultou em um inadequado
planejamento do estudo de impacto ambiental, que teve de ser complementado.

Esses exemplos ilustram o interesse de se identificar corretamente as questões


relevantes antes da preparação do estudo de impacto ambiental, e isso independente­
mente da existência de exigências legais para tanto. Dito de outra forma, mesmo que
a legislação não exija a consulta pública durante a fase de planejamento do EIA, o
empreendedor tem todo o interesse em conhecer os pontos de vista e as preocupações
da comunidade onde pretende se implantar e dos demais interessados.

6 .4 T e r m o s de r e fe r ê n c ia
Um dos objetivos do scoping é o de formular diretrizes para a preparação de estudos
ambientais. Dessa forma, esse resultado do exercício de scoping é normalmente
sintetizado em um documento que recebe o nome de termos de referência ou instruções
técnicas. Diferentes jurisdições adotam seus próprios termos. Por exemplo, o Banco
Mundial emprega terms ofreference, e a legislação de Hong Kong usa EIA study brief
Termos de referência podem ser conceituados como as diretrizes para a preparação de
um EIA; um documento que (i) orienta a elaboração de um EIA; (ii) define seu con­
teúdo, abrangência, métodos; e (iii) estabelece sua estrutura.

Há diferentes m aneiras ou estilos de p rep a rar os term os de referência. A lguns são


extrem am en te detalhados, podendo estabelecer obrigações p ara o em preendedor e
seu consultor quanto à metodologia a ser utilizada p ara levantam entos de campo,
quanto à forma e frequência de honsultas públicas a serem realizadas duran te o
período de preparação do estudo de impacto am biental, e ainda quanto à forma
de apresentação dos estudos, por exemplo definindo de antem ão as escalas dos
m apas a serem apresentados. Outros listam os pontos principais que devem ser
abordados, deixando ao em preendedor e seu consultor a escolha das metodologias
e procedim entos.

A Comissão Européia recomenda que as diretrizes para a elaboração de um estudo de


impacto ambiental incluam (European Comission, 2001a):
tf alternativas a serem consideradas;
# estudos e investigações de base que devam ser realizados;
# métodos e critérios a serem usados para previsão e avaliação dos efeitos
# medidas mitigadoras que devam ser consideradas;
# organizações que devam ser consultadas durante a realização dos estudos;
# a estrutura, o conteúdo e o tamanho do EIA.

Dois exemplos de termos de referência que estabelecem detalhes do EIA a ser reali­
zado são mostrados nos Quadros 6.2 e 6.3. Em ambos são mostrados apenas extratos
de um documento mais extenso. No primeiro exemplo, os termos de referência citam
especificamente algumas espécies de fauna ameaçadas de extinção cuja presença na
ação ae Im pacto A m b ie ntal; conceitos e métodos

área era suspeita, pois levantamentos anteriores em escala regional haviam encon­
trado indícios de sua ocorrência. Essas espécies caracterizam-se como componentes
valorizados do ecossistema, conceito apresentado adiante neste capítulo. Nem sempre
os termos de referência chegam a tal nível de detalhe, o que ocorreu aqui devido
à existência de um RAP que precedeu o planejamento do EIA e que, por sua vez,
utilizou dados de um levantamento anterior realizado voluntariamente pela própria
empresa interessada.

Q u a d r o 6 .2 E x tra to de te rm o s de re fe rê n c ia p a ra re a liza çã o de um e stu d o de im p a c to a m b ie n ta l de um p ro je to de


m in e ra ç ã o de p e q u e n o p o rte
V e g e t a ç ã o - o e s t u d o d a v e g e t a ç ã o r e m a n e s c e n t e in c l u ir á ;

Realização de levantamento botânico das diferentes fitofisionomias presentes na área de influência direta; os locais
onde forem realizadas amostragens deverão ser identificados em planta em escala 1:10.000;
M a p e a m e n to das fo rm a ç õ e s ve g e ta is em escala 1 :10.000 e d e te rm in a ç ã o do seu e stágio sucessional;
D e lim ita ç ã o em ca rta 1 :10.000 das áreas de preservação p e rm a n e n te ;
Q u a n tific a ç ã o e q u a lific a ç ã o de q u a is q u e r in te rv e n ç õ e s necessárias para m e lh o ria dos acessos, im p la n ta ç ã o do p á tio
ou q u a is q u e r o u tra s atividades.
Fauna - o es tu d o d a fa u n a n a tiv a in c lu ir á :

L e v a n ta m e n to de c a m p o da o r n ito fa u n a , realizado em pelo m enos q u a tro c a m p a n h a s trim e s tra is ; o le v a n ta m e n to


deverá ser realizado por observação direta, v o c a liz a ç ã o e o u tro s m é to d o s usuais, v is a n d o id e n tific a r as espécies de
aves de o c o rrê n c ia na área; as c a m p a n h a s deverão te r d u ra çã o s u fic ie n te para p e r m itir a id e n tific a ç ã o do m a io r
n ú m e ro possível de espécies; as áreas onde fo re m realizadas observações e le v a n ta m e n to s deverão ser localizadas
em p la n ta em escala 1 :10 .0 00;
Estudos específicos v is a n d o c o n fir m a r a presença de P yroderus s c u ta tu s , A n th u s h e llm a y n , A n th u s n a tte re ri e
Taoniscus n a n u s na área de in flu ê n c ia d ire ta ;
Descrição de o u tra s c o m u n id a d e s fa un ísticas, co m ênfase em m a m ífe ro s e répteis; esses gru p o s fa u n ís tic o s deverão
ser d e scritos através de m eios d ire to s ou in diretos, ta is c o m o observações, en trevistas, v is u a liz a ç ã o de rastros e o u ­
tro s m é to d o s que não in c lu a m coleta.
Fonte: P rom iner P rojetos S/C Ltda, EIA Lavra de B a u xita Cia. G eral de M in a s -A lc o a , 2002.

O segundo exemplo mostra aspectos dos termos de referência (guidelines) para o EIA
de um grande projeto hidrelétrico no norte do Quebec, Canadá, o projeto Grande
Baleia. Esses termos de referência têm nada menos que 713 tópicos e um a centena de
páginas, fora os anexos, e ilustram os problemas apontados por Beanlands e Duinker
(1983, p. 21), acima citados, de “m inutas das diretrizes [que] invariavelmente cres­
cem em tam anho à medida que circulam entre várias agências governamentais”.
Trata-se de um EIA feito em um contexto institucional bastante complexo, um a vez
que se aplicam disposições de nada menos que três diferentes regimes jurídicos e
sistemas de AIA, a saber, o sistema federal canadense e dois sistemas adm inistra­
dos pelas “Primeiras Nações”, o termo canadense para designar os descendentes
dos primeiros habitantes do território. Como o documento de orientação para esse
EIA é extremamente longo, somente uns poucos tópicos foram selecionados para o
Quadro 6.3. Talvez a principal característica e a originalidade das diretrizes seja seu
t

marcado viés multicultural. E também interessante notar os requisitos de supervisão


ambiental, dentre os quais a adoção de procedimentos sistematizados de gestão, por
meio do que nesse documento denominam-se “códigos”; nesse sentido, as diretrizes
D e t e r m in a ç ã o d o e s c o p o d o e s t u d o e f o r m u l a ç ã o de a l t e r n a '4 3

Quadro 6.3 E x tra to do te rm o s de re fe rê n c ia p a ra re a liz a ç ã o de u m e s tu d o d e im p a c to a m b ie n ta l de um p ro je to h 'd re -


lé tr ic o de g ra n d e p o r te
C a p . 3 D e s c riç ã o dos a m b ie n te s b io fís ic o e s o c ia l
302. Três p rin cíp io s devem g u ia r a descrição do a m b ie n te e seus c o m p o n e n te s . 0 p ro p o n e n te deve disp or de um a
d e fin iç ã o de a m b ie n te c o e re n te com o c a rá te r m u lt ic u lt u r a l do t e r r itó r io no qual o p ro je to p ro p o s to seria co n stru íd o ,
deve id e n tific a r e o r ie n ta r a análise dos c o m p o n e n te s v a lo riz a d o s do ecossistem a, e deve in d ic a r e ju s t if ic a r os lim i­
tes espaciais e te m p o ra is escolhidos para cada c o m p o n e n te .
30 4. E n q u a n to o processo de classificação dos c o m p o n e n te s v a lo riza d o s e da e s tru tu ra do a m b ie n te é universal, a
m a n e ira de re a liza r ta is classificações é d e p e n d e n te da c u ltu ra . Assim, os Cri, os In u it e o u tro s h a b ita n te s da região
a fe ta d a pelo p ro je to p ro p o s to podem d e fin ir o a m b ie n te de seu e n to rn o de m odos dife re n te s . Por conse qüê ncia, além
de d e fin ir o a m b ie n te de a co rd o com m é to d o s c ie n tífic o s a tu a liza d o s, o p ro p o n e n te ta m b é m deve d e sc re v ê -lo de
a c o rd o com o c o n h e c im e n to dos Cri e dos In u it, e m p re g a n d o , e n tre o u tra s m e to d o lo g ia s , aquelas dese nvolvidas no
c a m p o da e tn o c iê n c ia .
3 4 6 . 0 p ro p o n e n te deve a p re s e n ta r um a análise da o c e a n o g ra fia física (te m p e ra tu ra , salinidade, circu la çã o , condições
de gelo etc.) e q u ím ic a do e s tre ito M a n ito u n u k , c o b rin d o , em p a rtic u la r, os processos de m is tu ra que d e te rm in a m os
te m p o s de residência das águas no e s tre ito e das águas costeiras e n tre os estuários dos rios G rande Baleia e Pequena
Baleia. 0 tra n s p o rte de n u trie n te s e s e d im e n to s em c ond ições n a tu ra is e a c o m p o s iç ã o da v e g e ta ç ã o s u b lito râ n e a do
e s tre ito e da linha de costa da baía de H udson ta m b é m devem ser d iscu tid os, e a im p o rtâ n c ia e cológica das zonas
n a tu r a lm e n te livres de gelo deve ser avaliada.
C a p . 4 D e s c r iç ã o do projeto

401. 0 p ro p o n e n te deve descrever o p ro je to h id re lé tric o G rande Baleia em sua to ta lid a d e , acesso, a lo ja m e n to ,


in fr a e s tr u tu r a de c o m u n ic a ç ã o , assim c o m o o sistem a de tra n sm issã o (...)
402. 0 p ro je to s e le ciona do é a única a lte rn a tiv a a ser c o b e rta em d e ta lh e no e studo de im p a c to . Q u a lq u e r re to rn o a
o u tra s a lte rn a tiv a s requ er nova a u to riz a ç ã o , precedida por um novo EIA e nova c o n s u lta pública.
408. 0 p ro p o n e n te deve fa z e r um a análise c o m p a ra tiv a dos im p a c to s a m b ie n ta is e e c o n ô m ic o s e dos a rg u m e n to s
té c n ic o s que levaram à escolha do p ro je to de m an e ira ta l que os c o m itê s e as com issões de a va lia çã o possam ju lg a r
ra z o a v e lm e n te a v a lid a d e das escolhas feitas.
C a p . 5 I m p a c t o s do projeto
504. A fim de e v ita r as te n d ê n c ia s re d u c io n ista s e c o m p a r tim e n ta liz a d o r a s de um e n fo q u e e n cic lo p é d ic o , os im p a c ­
tos do p ro je to p ro p o sto sobre os vários c o m p o n e n te s do a m b ie n te devem ser avaliado s em te rm o s de c in c o questões
fu n d a m e n ta is : (i) saúde; (ii) acesso ao te r r itó r io ; (iii) d is p o n ib ilid a d e de recursos; (iv) coesão social; (v) respeito por
valores.
C a p . 6 M e d id a s m it ig a d o r a s e c o m p e n s a t ó r ia s
613. 0 p ro p o n e n te deve in d ic a r c o m o o livre m o v im e n to dos povos n a tiv o s será m a n tid o , em caso de a p ro va ç ã o do
projeto , de m o d o a g a r a n tir o acesso aos te rritó rio s , in c lu in d o a s u b s titu iç ã o de rotas de acesso para pesca e caça
(...) t a n t o no verão c o m o no inverno.
614. A d ic io n a lm e n te , o p ro p o n e n te deve in d ic a r as m edidas específicas para g a r a n tir que as a tiv id a d e s dos na tivo s
possam c o n t in u a r com segurança. Nos lugares onde os cursos d'água se to rn a re m to t a l ou p a rc ia lm e n te in adeq uad os
para navegação d e vid o ao a u m e n to ou redução da vazão, o p ro p o n e n te deve e s p e c ific a r m edid as m itig a d o ra s .
C a p . 7 S u p e r v is ã o a m b ie n t a l , m o n it o r a m e n t o e p r o g r a m a s de g e s t ã o de l o n g o p r a zo
705. A supervisão a m b ie n ta l envolve a supervisão geral da c o n s tru ç ã o para assegurar que as co n d içõ e s da a u to r iz a ­
ção e to d a s as leis, re g u la m e n to s e códigos a m b ie n ta is sejam respeitados.
706. 0 p ro p o n e n te deve id e n tific a r m edidas de supervisão específicas a serem im p le m e n ta d a s , o c ó d ig o a m b ie n ta l a
ser ap licado , assim c o m o as obrigaçõe s dos e m p re ite iro s (...)
707. 0 p ro p o n e n te deve descrever as m edidas a serem to m a d a s para assegurar que os tra b a lh a d o re s da c o n s tru ç ã o
estejam bem in fo rm a d o s acerca dos d ire ito s dos n a tiv o s e dos m odos de vida tra d ic io n a is .

Fonte: E va lu a tin g C om m ittee, K a tivik E n viro n m e n ta l Q u a lity Com m ission, Federal R eview C o m m itte e N o rth o f the 5 5 th P aral-
lel, Federal E n viro n m e n ta l A ssessm ent R eview Panei, G uidelines, E n viro n m e n ta l Im p a c t S ta te m e n t fo r the Proposed G reat W hale
H y d ro e le c tric P roject, 1992.
ação de Im pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

refletem práticas de gestão ambiental avançadas para a época, e que somente viriam
a ser difundidas com a publicação das primeiras normas da série ISO 14.000 (0 tema
será abordado no Cap. 17).

0 Quadro 6.4 traz um extrato de termos de referência bastante “abertos”, ou seja, que
basicamente listam os problemas que devem ser tratados, deixando as soluções intei­
ramente para o interessado. Esse documento orientou a preparação de um EIA para
um a mina de ferro e um a nova ferrovia no Estado da Austrália Ocidental, situado em
um a zona árida e de baixa densidade populacional, porém habitada por aborígenes.
Notem-se as exigências de consulta pública e, notadamente, uma preocupação com
a possibilidade de fiscalizar e acompanhar a satisfatória implementação das medidas
mitigadoras.

Quadro 6.4 E x tra to de te rm o s de re fe rê n c ia p a ra re a liz a ç ã o de u m e s tu d o de im p a c to a m b ie n ta l d e u m p r o je to de


m in e ra ç ã o de g ra n d e p o r te
V is ã o g e r a l

P r o p ó s it o de u m E IA

Q Iu e s t õ e s - c h a v e

A q u e stã o c rític a para a proposta é, p ro v a v e lm e n te , a gestão das a tiv id a d e s m in e ira s e de tra n s p o r te em um enclave
d e n tro do Parque N a cio n a l da Serra H am ersley (...) É, p o rta n to , c rític o que o EIA m o s tre um a co m p re e n s ã o d e ta lh a d a
da paisagem e dos valores sociais da área e se eles estão representados em o u tro s locais. Os valores de conservação
das áreas a serem p e rtu rb a d a s devem ser e x a m in a d o s em d e ta lh e (...)
Neste caso, as q u e s tõ e s -c h a v e d e ve ria m in c lu ir:
• as razões para escolha do local da m ina e do c o rre d o r de tra n s p o rte ;
• flora, fa u n a e ecossistem as;
• paisagem e valores recreativos;
• gestão da água: (1) s u p r im e n to de água sub te rrâ n e a , necessidades de b o m b e a m e n to , zonas de in flu ê n c ia , im p a c to s
na flo ra , fa u n a e c o m u n id a d e s v e g e ta is; (2) d e s a g u a m e n to e eflue ntes, erosão e a sso re a m e n to (...)
C o n s u l t a e p a r t ic ip a ç ã o p ú b l ic a

A p re s e n ta r um a descrição das a tiv id a d e s de c o n s u lta e p a rtic ip a ç ã o p ú blicas desenvolvidas pelo p ro p o n e n te d u ra n te


a preparação do EIA. Deve-se descrever as atividades, datas, g ru p o s e in d iv íd u o s envolvidos, e os o b je tiv o s das
atividades. Deve-se fa z e r referências aos ite n s do EIA que in d iq u e m c la ra m e n te c o m o as preocupações da c o m u n i­
dade serão tra ta d a s no p ro je to (...)
L is t a d e t a l h a d a d e c o m p r o m is s o s a m b ie n t a is

Os c o m p ro m is s o s assum idos pelo p ro p o n e n te devem ser c la ra m e n te d e fin id o s e listados s e p a ra d a m e n te (...) Os


co m p ro m is s o s devem ser n u m e ra d o s e in c lu ir: (a) responsável; (b) descrição; (c) c ro n o g ra m a ; (d) órgão a atender.
Todos os c o m p ro m is s o s passíveis de a u d ito ria fe ito s no corpo do EIA devem ser resum ido s na lista.
Fonte: H am ersley Iron Pty. Ltd., M a ra n d o o Iron Ore M in e a nd C entral P ilbara Railway, E n viro n m e n ta l Review and M a n a g e m e n t
Program m e, 1992.

0 atendimento às orientações dos termos de referência pode tomar várias formas


no EIA. Algumas exigências podem ser tratadas no texto principal, enquanto a
compreensão de estudos de detalhe pode ser facilitada se o estudo for apresentado de
forma completa em anexo. Uma deferência ao leitor (incluindo o analista do órgão
governamental responsável) é indicar com clareza em que parte do EIA encontra-se
a resposta às questões levantadas. Isso pode ser feito com quadros explicativos que
relacionem as questões levantadas com os capítulos e seções do EIA em que pos­
sam ser encontradas as informações e análises requeridas. 0 Quadro 6.5 traz, como
exemplo, a indicação de onde podem ser encontradas respostas às questões levantadas
durante reuniões públicas de scoping para o EIA de um projeto de perfuração de pe-

CAPÍTU LO
D e t e r m in a ç ã o d o es c o p o d o e s tu d o e f o r m u l a ç ã o de a l t e r n a t

tróleo no mar. Nesse caso, os autores do EIA optaram por colocar quase tudo como
estudos individualizados, mas esta não é necessariamente a melhor resposta em todos
os casos; tal estratégia requer atenção especial da equipe coordenadora, não somente
para assegurar coerência entre os diversos estudos especializados, mas também para
integrar as análises e conclusões de cada especialista no estudo principal.

Para auxiliar na preparação de termos de referência, existem diretrizes para a seleção


de questões relevantes e também modelos de termos de referência produzidos por
diferentes organizações, como o Banco Mundial, a Comissão Européia e, no Brasil,
pelo Ministério do Meio Ambiente (por exemplo, Ministério do Meio Ambiente/
Ibama, Manual de Normas e Procedimentos para Licenciamento Ambiental no Setor
de Extração Mineral, Brasília, Ministério do Meio Ambiente, 2001).

No Brasil, são poucas as jurisdições que adotam um a sistemática estruturada de prepa­


ração de termos de referência. No Estado de São Paulo, a modificação dos procedimentos
de AIA introduzida pela Resolução SMA n° 42/94 estabeleceu que o proponente deve
apresentar um documento denominado Plano de Trabalho, no qual se expõem o conteúdo
sugerido para o EIA e os métodos de trabalho a serem empregados (por exemplo, nos
levantamentos para o diagnóstico ambiental, ou na análise dos impactos). De acordo
com essa regulamentação, o interessado prepara um Plano de Trabalho, “que deverá
explicitar a metodologia e o conteúdo dos estudos necessários à avaliação de todos os
impactos ambientais relevantes do Projeto, considerando, também, as manifestações
escritas (...), bem como as que forem feitas na Audiência Pública, se realizada”. 0 Plano
de Trabalho é analisado pela Secretaria de Meio Ambiente, que, ao aprová-lo (muitas
vezes com modificações), emite os termos de referência, documento oficial para nortear
a elaboração dos estudos. Textualmente:

[...] com base na análise do Plano de Trabalho, do RAP [Relatório Ambiental Pre­
liminar] e de outras informações constantes do processo, o Daia [Departamento de
Avaliação de Impacto Ambiental] definirá o Termo de Referência (TR), fixando o
prazo para elaboração do EIA e Rima, publicando sua decisão [...]

No Rio de Janeiro, denomina-se instruções técnicas o documento pelo qual o órgão


regulador estabelece oficialmente o conteúdo dos estudos a serem apresentados:

A Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente - FEEMA orientará a


realização de cada Estudo de Impacto Ambiental através de Instrução Técnica -
IT específica, de forma a compatibilizá-lo com as peculiaridades do projeto, as ca­
racterísticas ambientais da área e a magnitude dos impactos (Art. 2o, Lei n° 1.356
de 3 de outubro de 1988).

Note-se que a Resolução Conama 1/86 já estabelecia que cada estudo deve ser objeto
de diretrizes específicas:

Ao determinar a execução de estudo de impacto ambiental, o órgão estadual com­


petente, ou o Ibama ou, quando couber, o Município, fixará as diretrizes adicio­
nais que, pelas peculiaridades do projeto e características da área, forem julgadas
necessárias, inclusive os prazos para conclusão e análise dos estudos.
(Art. 5o, Parágrafo Único, Res. Conama 1/86)
nação de Im pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

Q u a d r o 6 .5 Q uestões re le va n te s em um p ro je to de e x p lo ra ç ã o de p e tró le o
A Chevron Overseas (Namíbia) Ltd. obteve direitos de exploração de petróleo na plataform a co n tin e n ta l da Namíbia. Foi
preparado um EIA para perfuração de poços de exploração de petróleo (ou seja, a fase que precede a perfuração de poços
de produção) na p lata fo rm a c o n tin e n ta l ao largo da costa da Namíbia, no A tlâ n tic o Sul, em local conhecido como Bloco
2.815 (10.000 km 2); o projeto prevê a perfuração de, no mínimo, dois poços, com possibilidade de perfurações adicionais,
dependendo dos resultados.
As questões relevantes foram identificadas em reuniões de tra b a lh o com participação das partes interessadas e afetadas,
e em seguida trabalhadas pelo consultor.
P o l u iç ã o e g e s t ã o de r e s íd u o s |
Q uestões- c h a ve A ções para tratar as q u estõ es - c h a ve
D e rra m a m e n to de óleo M o d e la g e m de dispersão (apêndices A, B e E)
Poluição re s u lta n te de lam as de p e rfu ra ç ã o Estudo Chevron (apêndice C)
O u tra s fo rm a s de p o lu iç ã o D is c u tid o no Cap. 3
Im p a c to s causados p o r ru p tu ra ou deriva de C hevron respeitará to d o s os re q u isito s de segurança m a rítim a e
p la ta fo rm a s (com o colisões c o m navios) c ó d ig o s de c o m u n ic a ç ã o
M eio b io f ís ic o |
Q uestões- cha ve A ções para tratar as q u estõ es- c h a v e

Im p a c to s em áreas ú m id a s costeiras Estudo especializado "1"


Im p a c to sobre G ra e ila ría (alga) Estudo e spe cializa do * T
Im p a c to sobre estoques e in d ú s tria da lagosta Estudo especializado "K"
Im p a c to sobre m a r ic u ltu r a Estudo e spe cializa do W ÊÈÊÊÊÊÊÊÊÈÊÊÈÊÊÊÈÊÈÊÈÊÊÈÈÊ
Im p a c to sobre estoques e in d ú s tria pesqueira Estudos especializados "D" e " M "
Im p a c to sobre aves costeiras e pelágicas Estudo e spe cializa do " N "
Im p a c to sobre focas Estudo especializado " 0 "
Im p a c to sobre g o lfin h o s e baleias Estudo especializado "P"
Danos e s itu a ç ã o a m b ie n ta l a tu a l S itu a ç ã o a tu a l avaliada nos vá rio s estudos especializados
P r e o c u p a ç õ e s s o c ia is e m L ü d e r it z
Q uestões- c ha ve A çõ es p a r a tr a t a r a s q u e s t õ e s - c h a v e

Preocupações diversas, c o m o falsa e x p e c ta tiv a Reuniões de tra b a lh o e e n c o n tro s de a c o m p a n h a m e n to


de c re s c im e n to e c o n ô m ic o , c o n ta to com
tra b a lh a d o re s das p la ta fo rm a s etc.
I m p a c t o s s o b r e in f r a e s t r u t u r a
Q uestões- ch a ve A ções para tratar a s q u estõ es- c h a v e

Im p a c to s em Lü deritz (a b a s te c im e n to Estudos especializados "Q", "R", “ S" e NT"


de água e gestão de resíduos, im p a c to sobre
o p o rto
Im p a c to s n a c io n a is (rede de tra n s p o rte ) Chevron fará acordo s co m T ra n sn a m ib

C o n s id e r a ç õ e s le g a is
Q uestões- c h a ve A ções para tratar a s q u estõ es- c h a ve

Respeito a to d a s as exig ência s legais Chevron c o m p r o m e te - s e com o respeito à legislação e c o n s id e ­


aplicáveis e d e m a n d a s de c o m p e n s a ç ã o rará d e m a n d a s razoáveis de a c o rd o com a descrição do p ro je to
(c a p ítu lo 3)
| R ela ç õ e s p ú b l ic a s e c o m u n ic a ç õ e s

Q uestões- c ha ve A çõ es p a r a tr a t a r a s q u e s t õ e s - c h a v e

Prevenção de perigos à navegação Chevron c o m p ro m e te -s e a s e g u ir o C ódigo de C o m u n ica ç õ e s


M a rítim a s

Fonte: CSIR, EIA fo r E x p lo ra tio n D rillin g in O ffsh o re A re a 2.815, 1994.

CAPITU
D e t e r m in a ç ã o d o esc o po d o e s tu d o e f o r m u l a ç ã o de a it f r n a t j a C B u ?

Em algumas jurisdições, as atividades preliminares de preparação de estudos


ambientais resultam em um documento denominado scoping report (por exemplo,
t

na Africa do Sul)3, que sintetiza os resultados de um a avaliação ambiental inicial 3Novamente, a


e aponta os impactos mais importantes. Essa é, teoricamente, um a das funções do terminologia pode
Relatório Ambiental Prelim inar - RAP empregado no Estado de São Paulo. variar segundo
as jurisdições.
Nos termos da
6 .5 D iretrizes p a r a id e n t if ic a ç ã o d a s q u e s tõ e s r e le v a n t e s legislação federal
Ao planejar um estudo de impacto ambiental, o analista depara-se com a necessidade canadense,
de estabelecer critérios para incluir ou excluir determinado impacto potencial da esse estudo é
denominado
relação daqueles que merecerão estudos e levantamentos detalhados durante a prepa­ screening report ou
ração dos estudos. Em outras palavras, quais serão os impactos significativos de um estudo preliminar
projeto em análise? Identificar as questões relevantes para um estudo ambiental é o (étude préalable).
método para se estabelecer seu escopo. O termo genérico
empregado pela
Comissão Européia
Inúmeros critérios poderiam ser adotados para tentar responder a essa pergunta, mas,
é também scoping
em termos práticos, pelo menos três tipos de critérios têm se mostrado úteis para report (European
definir as questões relevantes em um estudo de impacto ambiental: Commission,
tf a experiência profissional dos analistas; 2001a).
# a opinião do público;
# requisitos legais.

Os requisitos legais formam o grupo mais evidente de critérios para selecionar as ques­
tões relevantes. Trata-se, indubitavelmente, de questões que o público (a sociedade)
considera relevantes, haja vista que foram incorporadas a leis votadas por parla­
mentos ou inseridas em regulamentos decorrentes dessas leis. Alguns exemplos de
requisitos legais existentes na maioria dos países são:
» proteção de espécies da flora e fauna ameaçadas de extinção;
# proteção de ecossistemas que desempenham relevantes funções ecológicas, como
recifes de coral, manguezais e outras áreas úmidas;
t proteção de bens históricos e arqueológicos;
t proteção de elementos do patrimônio natural, como cavernas e paisagens
notáveis;
# proteção de modos de vida tradicionais e outros elementos valorizados da cultura
popular;
tf restrição de atividades em áreas protegidas, como parques nacionais e outras
unidades de conservação;
t restrições ao uso do solo, estabelecidas em zoneamentos, planos diretores e ou­
tros instrumentos de planejamento territorial.

As Figs. 6.2 a 6.7 ilustram alguns elementos valorizados do ambiente (e reconhecidos


formalmente por meio de proteção legal) que podem ser determinantes na definição
dos termos de referência de um estudo de impacto ambiental. Além dos exemplos
acima listados, que gozam de reconhecimento quase universal, em certos países,
determinados recursos ambientais são objeto de proteção especial, geralmente devido
à sua escassez, como é o caso dos solos agricultáveis, de recursos hídricos superfi­
ciais e subterrâneos, e de áreas de recarga de aqüíferos subterrâneos.
ação ce Impacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

Note-se que muitos desses requisitos estão presentes em convenções internacionais,


o que realça seu caráter universal e de interesse comum da humanidade. “0 fato de
um tratado internacional haver sido aprovado pelo Congresso Nacional, ratificado
internacionalmente e promulgado pelo Presidente da República faz com que o tratado
passe a integrar o ordenamento jurídico nacional, internalizado segundo o processo

Fig. 6.2 D elta do Okavango, B otsuana, um a área úm ida de Fig. 6.3 G rande B arreira de Recifes, A u strá lia . Recifes de c o ra l
im p o rtâ n c ia in te rn a c io n a l (sítio Ramsar), in u n d a d a sa zo n a l- fo rm a m ecossistem as de gra nde riqueza e diversidade b io ló ­
m ente pela cheia dos rios que o a lim e n ta m . Um dos poucos gicas. Podem ser a fe ta d o s p o r p ro je to s terrestres que alterem
deltas de um rio s itu a d o no in te rio r de um co n tin e n te , a área a qua lid a d e das águas costeiras e p o r em preendim entos m a -
in u n d á v e l a tin g e 18.000 km 2, fo rm a n d o um dos lugares de rí-tim o s , com o p o rto s e p e rfu ra ç õ e s para p e tró le o . Os recifes
/

m a io r riqueza de vida selvagem na A fr i ca tam bém estão am eaçados pelo a q u e cim e n to g lo b a l

Fig. 6.4 M a n g u e za l na ilh a do Cardoso, São Paulo, tendo Fig. 6.5 O uidah, Benin, m o n u m e n to co n stru íd o no p o n to
ao fu n d o a M a ta A tlâ n tic a . M anguezais são ecossistem as fin a l da "ro ta dos escravos", em um dos p rin c ip a is p o n to s de
/

costeiros de tra n siçã o entre os am bien te s te rre stre e m arinho, em barque de escravos da A fric a O ciden tal ru m o à A m érica. Os
típicos da zona in te rtro p ic a l. Sua flo ra é a d a p ta d a a c o n d i­ sítios de im p o rtâ n c ia c u ltu ra l podem te r um s ig n ifica d o p a r ti­
ções de s a lin i-d a d e e ao ciclo das m arés. Tidos com o berçários c u la r para cada com unidade
da vida m arinha, esses ecossistem as são valo rizado s p o r sua
im p o rtâ n c ia ecológica, so cia l e econôm ica. C om unidades
iocais (caiçaras) fazem uso d ire to dos recursos do ecossistem a,
ao passo que crescem as dem andas p o r uso tu rístico , re cre a tivo
e e du cativo

CAPÍTU 1 0
DETERMINAÇÃO DO ESCOPO DO ESTUDO E FORMULAÇAO DE ALTERNATfTCvM 149

legislativo instituído pela Constituição Federal”


(Silva, 2002, p. xvii). A lguns tratados in tern a­
cionais sobre a proteção de recursos am bientais e
culturais são:
# Convenção de Ramsar sobre Áreas Úmidas
de Importância Internacional, especialmente
como hábitat de aves aquáticas (1971).
# Convenção sobre a Salvaguarda do Patrimônio
Mundial, Cultural e Natural (Paris, 1972).
% Convenção sobre o Comércio Internacional de
Espécies da Fauna e da Flora Selvagens em Pe­
rigo de Extinção (Cites) (Washington, 1973).
% Convenção sobre o Direito do Mar (Montego
Fig. 6 .6 Toca da Boa Vista, a m a io r caverna da A m érica do
Bay, 1982).
Sul. S ituada em Campo Formoso, Bahia, não está incluída em
# Convenção sobre a Diversidade Biológica (Rio nenhum a unidade de conservação, mas goza de proteção legal
de Janeiro, 1992). com o p a trim ô n io espeleológico. Não explorada turisticam ente,
% Convenção sobre Mudança do Clima (Rio de essa caverna, com o m uitas outras, vem sendo intensam ente
Janeiro, 1992). estudada p o r cientistas naturais de várias especialidades,
Convenção sobre a Proteção do Patrimônio que dela fazem um verdadeiro laboratório, p a rticu la rm e n te
Cultural Subaquático (Paris, 2001). propício para estudos sobre m udanças clim áticas ocorridas no
passado (paleoclim as)

Via de regra, a existência de um requisito legal


significa não som ente que um impacto que possa
afetar o bem ou o recurso designado seja p o ten ­
cialm ente significativo, mas tam bém que tais
im pactos merecerão atenção p a rtic u la r nos e s tu ­
dos am bientais, seja para m elhor conhecer como os
bens ou recursos serão afetados, seja para orientar
a busca de altern ativ as de projeto p ara ev itar ou
reduzir os impactos, seja, ainda, p a ra a le rta r para
a necessidade da form ulação de m edidas m itig a­
doras para reduzir a m ag nitude e a im portância
dos impactos.

Fig. 6.7 Parque N acional Kruger, A fric a do Sul. Criado em


Documentos oriundos de entidades reconhecidas -
1926 a p a rtir de um a reserva de caça existente desde 1898,
intergovernam entais, não governam entais ou pro­ o mais conhecido e mais visitado dos parques su l-a frica n o s
fissionais - tam bém podem serv ir de referência já enfrentou diversas ameaças à sua integridade, com o a
p ara a seleção de questões relevantes. Um exem ­ proposta de construção de um duto de m inério que cruzaria o
plo de docum ento proveniente de u m a organização parque, p ro je to rejeitado. Propostas que afetam diretam ente
do primeiro tipo é a Carta de Veneza sobre Con- unidades de conservação usualm ente requerem estudos de ta­
servação e Restauração de M onum entos e Sítios, lhados de alternativas
elaborada em 1964 sob a égide do Conselho Inter­
nacional de M onumentos e Sítios (Icomos - International Council on M onum ents
and Sites), entidade v in cu lad a à Unesco - Organização das Nações Unidas para a
Educação, a Ciência e a Cultura. Uma noção de grande im portância adotada por essa
carta é que
ação ae m pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

A n o ç ã o d e m o n u m e n t o h is tó r ic o c o m p r e e n d e a c r ia ç ã o a r q u it e t ô n ic a is o la d a ,
b e m c o m o o s ítio u r b a n o o u r u r a l q u e d á te s te m u n h o d e u m a c iv iliz a ç ã o p a r t ic u ­
la r , d e u m a e v o lu ç ã o s ig n if ic a t iv a o u d e u m a c o n te c im e n t o h is tó r ic o . E s te n d e -s e
n ã o só às g ra n d e s c ria ç õ e s , m a s t a m b é m às o b ra s m o d e s ta s , q u e te n h a m a d q u ir i­
d o , c o m o te m p o , u m a s ig n ific a ç ã o c u lt u r a l (A r t. I o).

Outra declaração emanada do Icomos e que pode ter relevância em AIA é a Declara­
ção de Tlaxcala, México, de 1982, sobre a conservação do patrimônio monumental e
revitalização das pequenas aglomerações. Os participantes desse colóquio

1. R e a f ir m a m q u e as p e q u e n a s a g lo m e r a ç õ e s se c o n s titu e m e m re s e rv a s d e m o d o s
de v id a q u e d ã o te s te m u n h o d e n o s s a s c u ltu r a s , c o n s e r v a m u m a e s c a la p r ó p r ia e
p e r s o n a liz a m as re la ç õ e s c o m u n itá r ia s , c o n fe r in d o , a s s im , u m a id e n tid a d e a seus
h a b ita n te s . [...]
3 . [...] a a m b iê n c ia e o p a t r im ô n io a r q u it e t u r a l d as p e q u e n a s z o n a s d e h á b it a t são
b e n s n ã o r e n o v á v e is c u ja c o n s e r v a ç ã o d e v e e x i g i r p r o c e d im e n to s c u id a d o s a m e n te
e s ta b e le c id o s [...]

Vários outros documentos de referência podem ser usados para guiar o planejamento
de um EIA, a exemplo da Recomendação sobre a Conservação dos Bens Culturais
Ameaçados pela Execução de Obras Públicas ou Privadas, adotada pela Conferência
Geral da Unesco celebrada em Paris em 1968 (As referências e citações foram ex traí­
das da tradução brasileira publicada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional, Cartas Patrimoniais, Brasília, 1995, 343 p.).

Exemplo de documentos amplamente reconhecidos originados de ONGs são as conhe­


cidas listas de espécies de fauna e flora ameaçadas de extinção (as chamadas listas
vermelhas) e seus critérios de enquadramento, promovidas pela União Internacional
para a Conservação da Natureza e seus Recursos (IUCN), entidade não governamental
sediada na Suíça.

Uma entidade profissional do campo da avaliação de impactos é a IAIA -


International Association fo r Impact Assessment, que, entre outras iniciativas, publica
diretrizes e recomendações para a boa prática da avaliação de impactos.

A opinião do público compõe outro conjunto de critérios a serem usados para definir
as questões relevantes. Conforme mencionado, a opinião do público pode ser colhida
por diversos meios, como audiências públicas, consultas por escrito, reuniões abertas
ou com pequenos grupos e pesquisas de opinião, dentre outros, e isso independe de
obrigação legal de fazê-lo. Pelo contrário, como visto nos exemplos acima, o propo­
nente do projeto deveria ter um interesse em conhecer a opinião dos interessados
antes de seguir adiante com o projeto e com os estudos ambientais. Nos casos em que
o empreendedor não tenha sensibilidade suficiente para realizar essas consultas, cabe
ao consultor explicar e explicitar suas vantagens. Deve-se notar que nem sempre os
canais formais de consulta nessa fase do processo de avaliação de impacto ambiental
são suficientes ou adequados para estabelecer um meio eficaz de comunicação com
as partes interessadas.

c a p ít u :LO
D eterm in ação do escopo do estudo e fo rm ulação de alternati ^ m 151

Finalmente, a experiência dos consultores e analistas, como apontado por Beanlands


e Duinker (1983), com seu conhecimento das características do meio afetado, do per­
fil da comunidade afetada, ou seu entendimento dos processos naturais ou sociais
modificados pelo projeto, constitui outro aporte importante para calibrar 0 estudo de
impacto ambiental e definir seu escopo e abrangência. A consulta a órgãos especiali­
zados da administração pública, como é feito em algumas jurisdições para a análise
técnica dos estudos de impacto, pode também ser útil nessa fase, com vista a definir os
termos de referência dos futuros estudos.

Um modo prático de sistematizar tanto a experiência profissional dos analistas como


as opiniões do público interessado é por meio da identificação de elementos relevantes
do ambiente. O conceito foi inicialmente expresso por Beanlands e Duinker (1983)
como “componentes valorizados do ecossistema” (valued eeosystem components), isto
é, os “atributos ou componentes” do ambiente tidos como importantes devido a suas
funções ecológicas ou porque assim são percebidos pelo público. Exemplos de ele­
mentos relevantes do ambiente são espécies da fauna ou flora nativas de interesse
econômico ou cultural, como espécies usadas na alimentação de subsistência ou para
comercialização, ou ainda espécies medicinais. Muitas vezes não há requisito legal
para proteção de tais espécies, e elas não constam de listas de espécies ameaçadas,
mas sua importância para as populações locais é motivo suficiente para que se estude
os possíveis impactos que 0 projeto poderia ter sobre elas. Um empreendimento que
possa afetar 0 hábitat dessas espécies - por exemplo, por meio do aterramento de
um manguezal ou da drenagem de um a várzea - deve ter seus impactos sobre os
ambientes e as espécies cuidadosamente avaliados.

Por último, deve-se lembrar que 0 gestor do processo de avaliação de impacto


ambiental tem um papel da maior importância na definição dos termos de referência,
ao integrar as demandas e pontos de vista de todos os interessados. Caso contrário,
as várias rodadas de consultas poderão levar a um a somatória de questões a serem
tratadas no estudo de impacto ambiental, fazendo-o novamente perder 0 foco e an u ­
4Se um estudo
lando 0 objetivo do scoping. Não é por outra razão que a regulamentação americana detalhado e
exige que sejam deixados claros os critérios, tanto de inclusão como de exclusão de especializado
itens, no estudo de impacto, chegando ao ponto de determ inar que se estabeleçam f a z parte de um
EIA, então suas
limites máximos ao número de páginas de um EIA.
conclusões e reco­
mendações devem
Bregm an e M ackenthum (1992) recom endam p rep arar um prelim inary environ- ser incorporadas ao
m ental analysis antes do scoping m eeting exigido pela regulam entação am ericana. EIA e claramente
explicadas ao
Esse breve docum ento condensaria inform ações sobre a localização do projeto, as leitor. Infelizmente,
características das alternativas, as características am bientais im portantes da área nem sempre é o que
e as questões significativas. acontece. Alguns
coordenadores
parecem se
0 planejamento e a organização de um EIA deve levar em conta as questões rele­ contentar em
vantes, mas há muitas maneiras de inseri-las. Alguns temas podem ser tratados em anexar estudos, ao
estudos especializados anexados ao estudo principal, desde que suas conclusões e passo que órgãos
ambientais ainda
principais considerações sejam efetivamente usadas para a análise do projeto4, como
aceitam estudos
no exemplo do Quadro 6.5, extraído de um EIA preparado para perfuração de petróleo fragmentados e
em plataforma continental na Namíbia. Nesse caso, após a conclusão, a equipe do pouco conclusivos.
s:à o oe t pacto A m b ie ntal; conceitos e métodos

EIA encomendou vinte estudos especializados para tratar dos temas levantados pelo
público; cada tema é tratado em um relatório independente, mas as conclusões são
integradas em um relatório final. Tal relatório é suficientemente sintético para for­
necer um a visão geral do projeto, seus impactos e medidas mitigadoras; aqueles que
necessitam ou se interessam por informações e análises detalhadas são remetidos ao
estudo especializado correspondente.

Em suma, a boa prática internacional da AIA recomenda que a seleção das ques­
tões relevantes seja um a etapa formal do processo de avaliação, e que os estudos
ambientais sejam dirigidos para os impactos potencialmente significativos. Os termos
de referência, preparados antes da realização dos estudos ambientais, deveriam orien­
tar os estudos de base para que estes coletem os dados necessários para a análise dos
impactos relevantes e ajudem a definir as medidas de gestão que assegurem efetiva
proteção ambiental caso o projeto venha a ser aprovado.

6 .6 A F O R M U L A Ç Ã O DE A L T E R N A T IV A S
Na década de 1970 estavam sendo construídas as primeiras linhas de metrô na cidade
de São Paulo. Uma das principais estações foi projetada para a Praça da República,
no centro da cidade. Com o projeto já bem avançado, veio a público que a construção
implicaria a demolição de um edifício, o colégio Caetano de Campos, que no passado
havia sido um dos mais importantes estabelecimentos públicos de ensino da Capital,
ocupando o mesmo edifício da antiga Escola Normal, um dos importantes prédios
desenhados pelo célebre engenheiro e arquiteto Ramos de Azevedo (Lemos, 1993).
Segundo os engenheiros projetistas, a derrubada desse edifício era “a única alterna­
tiva” para a construção de um a estação moderna e funcional, nos moldes requeridos
por um a metrópole.

A proposta suscitou uma reação de cidadãos e de órgãos governamentais envolvidos


na proteção do patrimônio histórico, e teve repercussão na imprensa. Por fim, a
ideia foi abandonada, outras alternativas surgiram, a estação foi construída e se­
gue funcionando. “Em 1975, a gestão do prefeito Olavo Setúbal decidiu derrubar o
prédio histórico de 1894, por onde passaram alunos como Mário de Andrade, Cecília
Meirelles e Sérgio Buarque de Holanda, para dar lugar a um a megaestação de me­
trô.” Ex-alunos entraram na Justiça para impedir a demolição, “conseguiram apoio
dos jornais e da população (...) e o movimento antidemolição cresceu. ‘Foi a primeira
reação popular contra um a decisão do regime militar desde 1969’, contabiliza [o líder
do movimento]” (Sérgio Dávila, “Muito além dos Jardins”, Folha de São Paulo, 21 de
dezembro de 2003, p. Cl). 0 exemplo mostra que a ideia de “única alternativa” não
se sustenta. Sempre há alternativa para se atingir um determinado objetivo, e um
conjunto de alternativas “razoáveis” deve ser examinado durante o processo de AIA.
A busca e a comparação de alternativas é um dos pilares da avaliação de impacto
ambiental, que tem como um a de suas funções “incitar os proponentes a conceber
projetos ambientalmente menos agressivos e não simplesmente julg ar se os impactos
de cada projeto são aceitáveis ou não” (Sánchez, 1993a, p. 21).

Fosse diferente, faria pouco sentido despender tempo e recursos na prepara­


ção de EIAs para um resultado muito pobre: sim ou não ao projeto. Ao contrário,

ÍLO
D eter m in a ção do escopo do estudo e fo rm u lação de alternati

uma das vantagens da AIA é a de permitir um questionamento criativo dos proje­


tos tradicionais, assim como estimular a própria formulação de novas alternativas,
que sequer seriam consideradas se o projeto não tivesse que passar por um teste
de viabilidade ambiental. Ortolano (1997) observou que práticas muito arraigadas
podem ser mudadas em decorrência do processo de AIA (conforme seus estudos
sobre o U.S. A rm y Corps of Engineers, citados na seção 4.1), e um dos caminhos de
mudança é a abertura de espírito para a consideração de alternativas. 0 Quadro 6.6
mostra alguns exemplos de alternativas apresentadas em estudos de impacto
ambiental.

Ross (2000) cita um caso muito interessante, que se passou durante as audiências públi­
cas de um projeto de uma indústria de celulose em Alberta, Canadá, no qual a comissão
de avaliação recomendou que o projeto não fosse aprovado até que algumas questões
fossem mais bem elucidadas, especialmente as emissões de compostos organoclorados
no rio Athabasca. Após a divulgação do relatório da comissão, a empresa

“subitamente descobriu uma nova e melhor tecnologia de branqueamento, que


reduziria as emissões de compostos organoclorados para um quinto da quantidade
inicial. Durante as audiências, nós tínhamos perguntado para a empresa se tal
alternativa não existiria, o que ela negou, mas, milagrosamente, encontrou tal
alternativa duas semanas depois de concluído o relatório” (p. 97).

Benson (2003) vê uma “fraqueza inerente” à avaliação de impactos de projetos, j u s ­


tamente por abordar somente projetos e por ser “controlada pelo proponente”, de
maneira que, quando chega o momento de preparar um EIA, alternativas locacio-
nais já foram rejeitadas, assim como desenhos ou projetos alternativos. Ademais,
Benson aponta, com toda razão, que a alternativa de não realizar o projeto rara­
mente faz parte da agenda do proponente (porém, trata-se de um a alternativa a ser
seriamente considerada no caso de projetos governamentais). Para Tomlinson (2003)
parece “inevitável” que a proposição de alternativas seja pouco freqüente, mas isso
não constitui uma “fraqueza” da AÍ*A, à medida que cabe a um órgão governamental
“considerar os méritos” da proposta.

Ao invés de uma “fraqueza”, World Bank (1995a, p. 4) pondera que a capacidade de


aportar “melhorias ao projeto, considerando alternativas de investimento sob uma
perspectiva ambiental é o lado proativo da AIA, se comparado com a tarefa mais
defensiva de reduzir os impactos de um projeto já fechado”. Mas reconhece, com base
na experiência de dezenas de projetos submetidos ao Banco, que essa tarefa é “muito
mais difícil do que simplesmente concentrar os esforços em evitar ou m inim izar
impactos negativos de um projeto dado”.

Steinemann (2001) observa que há mais trabalhos técnicos e acadêmicos sobre a


análise de alternativas que sobre como desenvolver boas alternativas, para posterior
análise, comparação e escolha. Ela exam inou 62 EIAs americanos, com o intuito de
analisar o processo de formulação de alternativas, e constatou diversos problemas,
dentre os quais:
# a definição estreita do “problema” a ser resolvido com a ação proposta restringe
as possíveis “soluções”;
ação ce im pacto A m biental: conceitos e métodos

o “problema” pode ser “construído” para justificar a “solução”;


# as alternativas dependem da autonomia e das atribuições da agência governa­
mental proponente;
# as agências tendem a favorecer alternativas já empregadas no passado;
# outras alternativas podem ser intencionalmente desconsideradas;
# alternativas não estruturais (isso é, que não envolvem obras, mas soluções
como ordenamento territorial ou gestão da demanda) não são seriamente con­
sideradas;

Q u a d r o 6 .6 E xem plos de a lte rn a tiv a s a p re se n ta d a s em ElAs *


D e s a t iv a ç ã o de u m t a n q u e f l u t u a n t e de a r m a z e n a m e n t o de petr ó leo b r u to n o M a r d o N orte

O b je tiv o do p ro je to : rem oção e disposição fin a l da e s tru tu ra oceânica d e n o m in a d a B re n t Spar, um a boia cilín d ric a
de 140 m de a ltu ra , 29 m de d iâ m e tro e peso de 15 .5 00 t, d o ta d a de h e lip o n to e a lo ja m e n to s , e c o n te n d o resíduos
perigosos, in c lu in d o fo n te s ra d io a tiv a s n a tu ra is de baixa a tivid ade.
A lte rn a tiv a s consideradas: (1) d e s m a n te la m e n to em terra fir m e ; (2) d e s m a n te la m e n to no m ar; (3) a fu n d a m e n to no
local; (4) reboque e a fu n d a m e n to em águas p ro fu n d a s ; (5) recupe ração e re u tiliz a ç ã o ; (6) m a n u te n ç ã o c o n tín u a e
p e rm a n ê n c ia no local.
A lte r n a tiv a s estudadas em d e ta lh e : (1) d e s m a n te la m e n to em te rra fir m e ; (4) reboque e a fu n d a m e n to em águas
profundas.
A lte r n a tiv a sele ciona da: (4), de vido à m e n o r p ro b a b ilid a d e e m e n o r severidade dos im p a c to s a m b ie n ta is , m e n o r risco
de liberações a c id e n ta is de resíduos, m e n o r risco para os tra b a lh a d o re s e outros.
D e s c o n t a m in a ç ã o d o c a n a l de La c h in e , M o n t r e a l , C a n a d á

O b je tiv o do p ro je to : rem edia ção de s e d im e n to s c o n ta m in a d o s presentes no fu n d o do canal, c o n s tru íd o no séc. XIX


para ve n c e r rápidos do rio São Lourenço e não m ais u tiliz a d o para navegação co m e rcia l, mas s o m e n te a tiv id a d e s
recreativas; o perfil in d u s tria l dos te rre n o s às m argen s do canal está sendo a lte ra d o para residencial; o p ro je to visa
m e lh o ra r a q u a lid a d e a m b ie n ta l da zona.
A lte r n a tiv a s consideradas: (1) d ra g a g e m e a te rro em solo; (2) c o n te n ç ã o in s itu no f u n d o do c a n a l; (3) d ra g a g e m e
e n c a p s u la m e n to na m a rg e m ; (4) e s ta b iliz a ç ã o s u b a q u á tic a co m reagentes q u ím ic o s e s o lid ific a ç ã o co m c im e n to ;
(5) drag age m , separação g ra n u lo m é tric a e e x tra ç ã o fís ie o -q u ím ic a .
A lte r n a tiv a sele cio n a d a : (3), p o r fic a r re s trita à área a d m in is tra d a pelo responsável pelo p ro je to (Parks Canada - a
área é declarada de interesse h is tó ric o nacional), por se t r a t a r de um a té c n ic a c o m p ro v a d a e g a r a n tir um a solução
de lo n g o prazo.
D r a g a g e m d o c a n a l de P ia ç a g u e r a , S a n t o s , São P a u l o
O b je tiv o do p ro je to : d ra g a g e m de m a n u te n ç ã o do canal de acesso ao te r m in a l p o rtu á rio de um a usina s id e rú rg ic a ;
pa rte dos s e d im e n to s é c o n ta m in a d a .
A lte r n a tiv a s consideradas: (1) não d ra g a g e m do canal; (2) m é to d o s de d ra g a g e m : (2.1) d ra g a g e m h id rá u lic a ; (2.2)
dra g a g e m m e c â n ica ; (2.3) d ra g a g e m h id ro m e c â n ic a ; (2.4) d ra g a g e m p n e u m á tic a ; (3) disp osição dos s e d im e n to s
drag ado s: (3.1) disposição no ocea no; (3.2) disposição em cavas s u b a q u á tic a s recobe rtas co m m a te ria l de p ro te ç ã o ;
(3.3) disposição em áreas c o n fin a d a s, diques em te rra ou na zona e n tre marés; (3.4) disposição em a te rro s in d u s ­
tria is ; (3.5) t r a ta m e n to ou p ro ce s s a m e n to in d u s tria l.
A lte rn a tiv a s selecionadas: (3.2) ou (3.3), para estudos de d e ta lh a m e n to .
E x p a n s ã o d o r e s e r v a t ó r io de B u c k h o r n , C a r o l in a d o N o r t e , E U A

O b je tiv o do p ro je to : a u m e n ta r a o fe rta de água para a cidade.


A lte rn a tiv a s consideradas: (1) a (8) d ife re n te s c o m b in a ç õ e s de barragens; (9) a b a s te c im e n to p o r fo n te s de água s u b ­
te rrâ n e a ; (10) uso de água de d re n a g e m de áreas de m in e ra ç ã o ; (11) tra n s p o s iç ã o de água de o u tra bacia h id ro g rá fic a ;
(12) d ra g a g e m dos reservatórios a tu a is para a u m e n ta r a c a p a cid a d e de a rm a z e n a m e n to ; (13) não im p la n ta ç ã o do
e m p re e n d im e n to .
A lte rn a tiv a selecionada: duas a lte rn a tiv a s fo ra m estudadas em detalhe.
*A s referências com pletas e n co n tra m -se na Lista de Estudos A m b ie n ta is Citados.

cap\i [WBÊÊÊÊSÊÊÊÊSÊÊÊÊÊÊ
D eterm in a ção do escopo do estudo e fo rm u lação de a iie r n a t M m 155

# a seleção de alternativas pode ser arbitrária e não incluir fatores ambientais;


♦ o envolvimento do público ocorre demasiado tarde para influenciar a formulação
de alternativas.

Vários desses problemas podem ser detectados em projetos públicos de vários tipos
que parecem não resolver nenhum problema real, mas criar outros. São projetos
polêmicos que muitas vezes suscitam acalorados debates públicos. O projeto do
governo brasileiro conhecido como “transposição de águas da bacia do rio São Fran­
cisco” também padece da maioria dos problemas detectados por Steinemann.

Com a intenção de “assegurar a oferta de água para uma população e uma região que
sofrem com a escassez e a irregularidade das chuvas”5, 0 projeto pretende transferir sEcology Brasil/
uma parte da vazão do rio São Francisco para outras bacias hidrográficas da região Agrar/ JP Meio
do semiárido nordestino, através de um a sucessão de canais e estações de bombea- Ambiente, Relatório
de Impacto
mento. A iniciativa suscitou ásperos debates e resultou em posições aparentemente
Ambiental, Projeto
inconciliáveis, divididas entre aqueles que defendem 0 projeto argum entando por de Integração do
seus benefícios esperados (irrigação e valorização de terras) e aqueles que, ademais de Rio São Francisco
apontar os impactos adversos (redução da vazão do rio, redução da geração de energia com Bacias
elétrica nas usinas existentes a jusante, entre outros), questionam seus próprios ob­ Hidrográficas
do Nordeste
jetivos, indicando que projetos similares conduziram à concentração fundiária e
Setentrional,
expulsão de pequenos agricultores, tornando, por fim, mais vulneráveis aqueles que Ministério
se pretendia beneficiar. da Integração
Nacional, 2004,
Duas décadas antes do estudo de Steinemann, Shrader-Frechette (1982) já havia p. 9.
chamado a atenção para uma abordagem reducionista e um escopo limitado das
avaliações de impacto, que teria como um a de suas questões mais importantes não
“escolher entre uma tecnologia poluidora A ou B como meio de atingir um objetivo
C, mas 0 de escolher C ou um outro objetivo”. Contudo, “parece duvidoso que as
legislações nacionais (...) tenham 'pretendido abarcar um escopo tão amplo. Tal tipo
de questão depende de decisões propriamente políticas cujo fórum não é 0 processo
de avaliação de impactos” (Sánchez, 1993a, p. 18).

Não se pode deixar de notar, porém, que as objeções do público são muitas vezes des­
sa ordem, questionando a própria justificativa ou necessidade do projeto apresentado.
Por exemplo, a ausência de um entendimento prévio sobre a utilização dos recursos
hídricos pode levar a posições antagônicas e inconciliáveis quando é apresentado um
projeto (como é nítido no caso do rio São Francisco). Olivry (1986) estudou casos agu­
dos de desentendimento entre 0 público e os proponentes governamentais de projetos
hídricos na França; enquanto estes estavam dispostos a discutir apenas projetos es­
pecíficos (barragens), aquele questionava 0 conjunto de projetos e os objetivos de
utilização dos recursos hídricos, impossibilitando 0 diálogo e a negociação.

Se questões desse calibre não forem resolvidas na etapa de scoping, então os projetos
controversos simplesmente adiarão 0 debate para etapas posteriores do processo de
AIA, ou 0 transferirão para os tribunais. Assim, incluir nos termos de referência uma
relação de alternativas a serem tratadas no EIA é, na maior parte dos casos, um a es­
tratégia melhor que deixar que alternativas “apareçam” no EIA.
ação ce Im pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

A Nepa desde o início tocou neste ponto fulcral: os estudos têm, obrigatoriamente, que
apresentar alternativas (Seção 102, (C), (iii)), embora, como apontado por Steinemann
(2001), seja a própria agência interessada quem define os objetivos e as justificativas
da ação proposta. Mas nem todas as legislações foram a fundo na questão: na França,
o estudo de impacto deve somente explicitar quais as razões, de ordem ambiental,
que levaram à escolha da alternativa apresentada. No Brasil, o EIA deve “contemplar
todas as alternativas tecnológicas e de localização de projeto, confrontando-as com a
hipótese de não execução do projeto” (Resolução Conama 1/86, art. 5o, I). Nos Estados
Unidos, a obrigatoriedade de considerar alternativas no EIA foi claramente reafirmada
pelos tribunais. Segundo o regulamento da Nepa, o EIA deve:

(a) rigorosamente explorar e objetivamente avaliar todas as alternativas razoáveis


e, para as alternativas que forem eliminadas do estudo detalhado, brevemente
discutir as razões de sua eliminação;
(b) devotar tratam ento substantivo a cada alternativa [...];
(c) incluir alternativas razoáveis fora da jurisdição da agência principal;
(d) incluir a alternativa de não realizar nenhum a ação;
(e) identificar a alternativa preferida [...];
(f) incluir medidas mitigadoras apropriadas [...].
(CEQ Regulations, § 1.502.14; 29 de novembro de 1978.)

Diferente localização, diferentes tecnologias e a “alternativa zero” (a não realização


do projeto) podem definir vastos campos de alternativas a explorar. McCold e
Saulsbury (1998) defendem que, se para projetos novos a “alternativa zero” significa,
claramente, não executar o projeto, para atividades existentes (e que podem ser
sujeitas ao processo de AIA em razão de um a proposta de ampliação ou da renovação
de uma licença), a “alternativa zero” tem dois significados: (a) a continuidade nas
condições atuais; e (b) a descontinuidade ou suspensão das atividades. Os autores
argum entam que ambas deveriam ser estudadas. Um EIA de um a rodovia deveria
considerar a alternativa ferroviária? 0 EIA de um a usina hidrelétrica deveria consi­
derar um a termelétrica ou um parque de turbinas eólicas? 0 alcance das alternativas
pode ser tam anho que inviabilize um EIA, pelo nível de generalização necessário ou
pela indefinição quanto à localização. Campos muito amplos de alternativas são mais
bem explorados em avaliações ambientais estratégicas, enquanto EIAs de projetos
têm mais condições de considerar alternativas de projeto. Assim, para uma barragem,
é razoável estudar alternativas de localização do eixo do barramento e de altura da
barragem (influenciando a área de inundação) e, para um gasoduto ou uma linha de
transmissão de energia elétrica, alternativas de traçado, enquanto para um aterro de
resíduos urbanos pode (ou não!) ser razoável estudar a alternativa de incineração,
sendo que ambas podem ser acopladas a iniciativas de coleta seletiva, reciclagem e
compostagem. 0 limite do “razoável”, como o sentido de impacto “significativo” pode
dar margem a muita discussão.

Fuggle (1992) considera que três questões devam ser consideradas para a identificação
e seleção de alternativas a serem estudadas em um EIA:
# Como as alternativas deveriam ser identificadas?
# Qual é a faixa razoável de alternativas que deveria ser considerada?
# Em qual nível de detalhe deve cada alternativa ser explorada?

CAPÍTUÍLO
D eter m in a çã o do esco po do estudo e fo r m u la çã o de a l t e r n a -

E conveniente responder a essas perguntas antes de iniciar o EIA, sob risco de


atrasos ou de questionamentos, inclusive judiciais. No caso da barragem de Piraju,
citada anteriorm ente neste capítulo, a insatisfatória definição de alternativas levou à
sucessiva retirada de dois EIAs, incapazes de dem onstrar a viabilidade ambiental do
projeto. Somente o terceiro estudo, que tratou de um a alternativa mais favorável sob
o ponto de vista ambiental (Fig. 6.8), resultou na aprovação do projeto, conforme a
cronologia apresentada no Quadro 6.7.

A barragem de Três Gargantas, na China, é o empreendimento hidrelétrico de maior


potência instalado no mundo. Segundo Shu-yan (2002), como um a das principais
justificativas do empreendimento é o controle de cheias do rio Yangtze, duas outras
alternativas foram consideradas. 0 governo chinês estima que de cerca de 145 mil
pessoas m orreram em cada um a das grandes enchentes dos anos de 1931 e 1935, e
ou tras 30 mil na enchente de 1954. Uma altern ativ a seria a co nstru ção de u m a
série de barragens menores nos principais afluentes e no curso principal do Yangtze,
a m ontante do local escolhido para a barragem de Três Gargantas. Outra alternati­
va seria a construção de diques laterais e canais de derivação a ju sa n te do local da
barragem , mas essa opção foi descartada porque em alguns trechos o leito do rio já
está situado 10 m acima da planície aluvionar.

Por fim, há de se destacar que os pontos de vista bastante pessimistas expressos por
autores como Benson (2003) e Shrader-Frechette (1982), acerca da formulação de
alternativas, não encontram eco em muitos autores diretam ente envolvidos na prática
da AIA, como Tomlinson (2003) e Garis (2003), para quem projetistas e proponentes

Linha 230 kv
Chavantes - Jurumim

Rio Paranapanema Lençóis


Paulista

Alternativa I Alternativa II
Reservatório Reservatório

0 2 4km

Linha 230 kv
Cha.vantes - Jurumim

Fig. 6.8 A lte rn a tiva s de localização da barragem Piraju, rio


Pananapanema, São Paulo. Na a lte rn a tiva 1, a água re ti­
Rio Paranapanema
Lençóis da na barragem situada a m ontante da cidade (leste) seria
Paulista
conduzida p o r tubulação até a casa de força, localizada a
ju sa n te da cidade. A a lte rn a tiva 2 in c lu i a construção de
o u tra barragem a jusante, enquanto na a lte rn a tiva 3, a
barragem de ju sa n te seria maior, inundando p a rte da cidade
Fonte: CNEC (1996) - Estudo de Im pacto A m b ie n ta l UHE
Alternativa II
Reservatório
Piraju.
ação ce im pacto A m biental: conceitos e métodos

= 6 .7 estudos de a lte rn a tiv a s p a ra a UHE P ira ju


0 5 .E T M ) DO PROJETO

C o n s tru ç ã o de um a usina h id re lé tric a no rio Paranapanem a, nas p ro x im id a d e s da cidade de Piraju; b a rrag em de


37 m de a ltu ra e 6 5 0 m de c o m p r im e n to ; re se rva tó rio de 1.357 ha, p o tê n c ia in sta la d a de 71,4 M W .
C o n t e x t o d o projeto

No m o m e n to da ap re se n ta çã o do ú ltim o p ro je to (1996), o rio já tin h a sete barragens co n s tru íd a s e duas em


c o n s tru ç ã o ; a p o tê n c ia in stalada na bacia era de 5 3 0 M W e a in v e n ta ria d a re m a n e sce n te de 162,6 M W ; a bacia do
rio P aranapanem a te m 1 0 6.530 k m 2; o p ro je to UHE Piraju se insere em um pla n o de a p ro v e ita m e n to h id re lé tric o
da bacia que estabelece um a divisão ideal de quedas, s itu a n d o -s e e n tre duas barragens já existe n te s; em 1 9 25 fo i
c o n s tru íd a um a pequena c e n tra l h id re lé tric a (d e n o m in a d a P aranapanem a) ju n t o à cidade.
C r o n o l o g ia d o s e s t u d o s e d o s d e b a te s

Década de 1 9 6 0 : Estudos sobre o p o te n c ia l h id re lé tric o d e fin e m três locais para fu tu r a s barragens em um tre c h o de
140 km do rio P aranapanem a.
A n o de 1 9 6 6 : Estudo de v ia b ilid a d e do a p ro v e ita m e n to de Piraju.
Fevereiro de 1991: A p re s e n ta ç ã o de um EIA c o n te n d o três a lte rn a tiv a s lo ca c io n a is ; a a lte rn a tiv a escolhida (a lte rn a ­
tiv a 1) previa um a b a rrag em a m o n ta n te da cidade de Piraju, o desvio das águas do reservatório através de um tú n e l
a d u t o r até a casa de força, a 17 km a ju s a n te do rio, o c a s io n a n d o um a g ran de redução da vazão na a ltu ra da cidade,
fa to que causaria um a m u d a n ç a d ra m á tic a na paisagem urbana, um a vez que desapareceria a cascata a r tific ia l de
um a a n tig a usina, considerada p a tr im ô n io c u ltu ra l de interesse tu r ís tic o e a m b ie n ta l, e oco rre ria d e te rio ra ç ã o da
q u a lid a d e das águas, pois o esgoto da cidade era lançado, nesse tre c h o , sem n e n h u m tr a ta m e n to .
A b ril de 1991: A to p ú b lic o realiza d o em Piraju, re u n in d o cerca de 6 m il pessoas: "Usina sim, a lte rn a tiv a 1, não".
M a io de 1 9 9 2 : Daia (D e p a rta m e n to de A v a lia ç ã o de Im p a c to A m b ie n ta l) c o m u n ic a a necessidade de re fo rm u la ç ã o
do EIA.
J u lh o de 1 9 9 2 : A em presa c o m u n ic a que passou a p re fe rir u m a a lte rn a tiv a (a lte rn a tiv a 2) que não im p lic a v a a co n s­
tru ç ã o do tú n e l de desvio (casa de fo rç a ao lado da barragem ), de fo rm a que não haveria a lte ra ç ã o da vazão do rio,
mas p re te n d ia c o n s tr u ir um a pequena b a rra g e m a ju s a n te da cidade.
D ezem bro de 1 9 9 4 : Consema (Conselho Estadual do M e io A m b ie n te ) aprova novos p ro c e d im e n to s de A IA no Estado
(Resolução 4 2 /1 9 9 4 ).
Ja n e iro de 1 9 9 5 : A p re s e n ta ç ã o de no vo EIA.
Fevereiro de 1 9 9 5 : Daia s o lic ita reelaboraçã o do novo estudo, e n tre o u tro s m o tiv o s , po rq ue não eram an alisad os os
im p a c to s a ju s a n te do e m p r e e n d im e n to nem os im p a c to s da c o n s tru ç ã o da nova b a rrag em de ju s a n te ; adem ais, a
precariedade do d ia g n ó s tic o a m b ie n ta l c o m p ro m e tia a ava lia çã o dos im pactos.
A b ril de 1 9 9 5 : Empresa apresenta Plano de T rab alh o para e la b o ra r um novo EIA.
O u tu b ro de 1 9 9 5 : Daia e m ite te rm o s de referência para o novo EIA.
Ja n e iro de 1 9 9 7 : A p re s e n ta ç ã o do te rc e iro EIA, co m escolha da a lte rn a tiv a 2 m o d ific a d a (s o m e n te a c o n s tru ç ã o da
b a rra g e m de m o n ta n te , com casa de fo rç a j u n t o ao co rp o da b a rra g e m ); a re fo rm a da usina e x is te n te e a b a rra g e m
de ju s a n te são considerado s p ro je to s in d e p e n d e n te s ; um a a lte rn a tiv a 3, a n te rio r m e n te estudada, ta m b é m é descar­
tada.
Fevereiro de 1 9 9 8 : Parecer do Daia fa vo rá v e l ao lic e n c ia m e n to do e m p re e n d im e n to .
M a rç o de 1 9 9 8 : D eliberação de C âm ara Técnica do Consem a fa v o rá v e l ao e m p re e n d im e n to .
M a io de 1 9 9 8 : M in is té r io P úblico Federal q u e s tio n a a c o m p e tê n c ia estadu al para licenciar.
M a io de 1 9 9 8 : D eliberação do p le n á rio do Consem a fa v o rá v e l ao e m p r e e n d im e n to e em issão de licença prévia.
D ezem bro de 1 9 9 9 : Emissão de licença de in stalação.
J u n h o de 2 0 0 2 : R e q u e rim e n to de licença de operação.
A g o s to de 2 0 0 2 : E n c h im e n to do reservatório.
Fontes: Carvalho, A lm e id a e Bastos (1998); CNEC, EIA UHE P iraju; R im a UHE Piraju, 1996; Ronza (1997).

CAPÍTU LO
D eter m in a ç ã o do esco po do estudo e fo r m u la ç ã o de a l t f r n a ~ 77 m '5 9

Q uadro C omparativo
C a r a c t e r ís t ic a A l t e r n a t iv a 1 A l t e r n a t iv a 2 A ltern ativa 3

N ú m e r o de b a rra g e n s 1 3 1
P o tê n c ia ( M W ) 150 1 4 6 (a) 160
i

Area de in u n d a ç ã o (ha) 1.35 7 (b) 1.357 2 .0 3 0 (b)


L o c a liz a ç ã o em re la ç ã o à m o n ta n te m o n t a n t e + a m p lia ç ã o da ju s a n t e + d e s a tiv a ç ã o
b a rra g e m e x is te n te usina e x is te n te + ju s a n t e usina e x is te n te
Túnel de desvio sim não não
Casa de fo rç a 17 km a b a ix o ao la d o da b a rra g e m ao la d o da b a rra g e m
V azão m ín im a à a ltu r a da 10 sem a lte r a ç ã o sem a lte r a ç ã o
c id a d e ( m 3/s)
In u n d a ç ã o de z o n a u rb a n a não não sim ( ~ 4 0 0 e d ifíc io s )
Fonte: CNEC, EIA UHE Piraju, 1996.
N otas: (a) Barragem de m o n ta n te no m esmo lo ca l que a lte rn a tiv a 1 (70 M W ), m elhoria da usina existente (46 M W ), barragem de
ju s a n te (30 M W ); (b) 403 ha correspondem ao espelho d'água do rio.

têm aprendido, por experiência própria, que a falta de soluções concretas de proteção
am biental e de medidas para evitar impactos socialm ente inaceitáveis m uitas vezes
impede a realização de projetos, e que não há alternativa exceto a de fo rm u la r uma
alternativa de m enor impacto. Não são poucas as empresas que, ao depararem com
grandes dificuldades na aprovação de seus projetos, tiveram que alterar substancial­
m ente seu modo de a tu a r (Ortolano, 1997; Sánchez, 1993a).

6.7 S ín t e s e e p r o b l e m á t ic a
A preparação de um estudo de impacto am biental não pode prescindir de um
planejamento que inclua a determ inação daquilo que é relevante e, portanto, deve ser
analisado em profundidade nos estudos. A qualidade dos EIAs - e, por conseguinte,
a qualidade da decisão que será tom ada - depende de um planejam ento criterioso e
de term os de referência cuidadosam ente preparados, necessariam ente com consulta
pública.

A definição do escopo de um estudo am biental estabelece a meta a ser atingida.


Conhecendo-a, o coordenador do estudo e sua equipe podem preparar seu mapa de
navegação, definindo os cam inhos a serem percorridos. Vale aqui a transposição de
um a afirm ativa de Kuhn (1970, p. 15) acerca da função dos paradigm as para nortear
a pesquisa científica:

Na ausência de um paradigm a ou de algum candidato a paradigm a, todos os fa­


tos pertinentes ao desenvolvim ento de um a dada ciência parecem ser igualm ente
relevantes. Em conseqüência, a coleta de dados é um a atividade quase aleatória
[...]. Ademais, na ausência de um a razão para buscar algum a forma particular
de inform ação [...], a coleta é usualm ente restrita à riqueza de dados ao alcance
da mão.

0 scoping significa estabelecer hipóteses, e sem elas não há como ordenar a reali­
zação de estudos ambientais. Situa-se provavelmente nessa tarefa um a das maiores
ação ae Im pacto A m biental: conceitos e métodos

dificuldades de lograr um trabalho integrado e multidisciplinar. Como lembra Godard


(1992, p. 342), “para muitos cientistas, ambiente não é senão um a denominação nova
para um velho objeto de estudo (...) e o estudo do ambiente simplesmente se confunde
com o estudo dos objetos (...) das ciências naturais”. Em avaliação de impacto ambiental,
não se trata nem de investigar a natureza nem a sociedade (a AIA não tem o propósito
de produzir conhecimento, embora ocasionalmente possa fazê-lo), mas de estabelecer
relações, usando métodos e critérios científicos. A definição do escopo de um estudo
ambiental formula problemas, que devem ser respondidos no desenvolver dos estudos -
e, como se sabe, um problema bem formulado já traz metade da solução.

CAPÍTÜ LO
= ação cie m pacto A m biental: conceitos e métodos

0 estudo de impacto ambiental JJJA), é o documento mais importante de todo o


f

processo de avaliação de impacto ambiental. E com base nele que serão tomadas as
principais deciso.es..quanto à viabilidade ambiental de um projeto, quanto à necessi­
dade de m edjdasjnitigad oras ou cq.mpensatórias e quanto ao tipo e ao alcance dessas
medidas. Dado o caráter público do processo de AIA, é também esse o documento que
servirá de base para as negociações que poderão se estabelecer entre empreendedor,
governo e partes interessadas.

'O termo “estudos Há atualmente no Brasil diversos tipos de estudos ambientais1, incluindo o próprio
ambientais” EIA, o plano de controle ambiental (PCA), o relatório de controle ambiental (RCA) e
f o i introduzido
o relatório ambiental preliminar (RAP), além de estudos de aplicação circunscrita a
form alm ente
pela Resolução certos tipos de empreendimentos, como o plano de recuperação de áreas degradadas
Conama n° 237/97 (Prad), empregado no setor de mineração, e o projeto básico ambiental (PBA), empre­
(conforme Cap. 3), gado para projetos do setor elétrico (conforme Quadro 3.4).
mas já era usado
há tempos por
De maneira semelhante, outras jurisdições também lançam mão de diferentes tipos
profissionais do
setor. e formatos de estudos ambientais, requerendo maior ou menor grau de detalhe na
descrição do ambiente afetado ou na análise dos impactos, como o environmental
assessment americano, a notice dHmpact francesa, o screening/étude préalable cana­
dense e o scoping report sul-africano, todos eles versões reduzidas ou simplificadas
do estudo de impacto ambiental clássico (conforme Cap. 5).

Todavia, todos esses estudos baseiam-se no formato e nos princípios do EIA, que
será aqui apresentado. Essa metodologia básica para planejamento e elaboração de
um estudo de impacto ambiental pode, portanto, com adaptações, ser utilizada para
[qualquer um dos estudos ambientais.

7.1 D u a s perspectivas c o n t r a d it ó r ia s n a r e a l iz a ç ã o de u m estu d o de


IMPACTO AMBIENTAL
Tipicamente, um estudo de impacto ambiental é feito para uma determinada proposta
de empreendimento ou projeto de interesse econômico ou social, que requerem a
2Neste livro, realização de intervenções físicas no ambiente (obras), e que podem ser genericamente
“empreendim ento ”,
classificados como projetos de engenharia. Projetos de aproveitamento de recursos
“projeto” e “projeto
de engenharia” vivos, como manejo florestal ou pesqueiro, ou ainda projetos de aquicultura, silvi­
são empregados cultura ou agropecuária, também podem ser enquadrados nessa categoria, posto que
de maneira demandam ações ou interferências no meio, que, por sua vez, podem ser causas de
intercambiável. impactos ambientais2.
Estudos ambientais
realizados
em etapas de
Uma das finalidades da avaliação de impacto ambiental é auxiliar na seleção da
planejamento alternativa mais viável, em termos ambientais, para se atingir determinados objetivos.
que antecedem Por exemplo, a AIA pode ser empregada para selecionar o melhor traçado para uma
a concepção rodovia ou a melhor opção de remediação de uma área contaminada. Embora a for­
de projetos de
mulação de alternativas seja central em avaliação de impacto ambiental (conforme
engenharia são
seção 6.6), as etapas descritas adiante não incluem a comparação de alternativas. Isso
enquadrados
na categoria de se deve ao fato de que esse modelo genérico pode ser aplicado a qualquer número de
a vali a çã o ambie n ta l alternativas, inclusive aquela de não realizar projeto algum. Os impactos decorrentes
estratégica.

CAPITU
C IAKAb UU T L A N U A M tN IU b UA tZLABUKAÇAO Db UM ESTUDO DE IMPACTO A M B E \

de cada alternativa podem assim ser comparados a p a rtir de um a base comum (se­
ção 11.3), dada pelo estudo de impacto ambiental.

Há duas perspectivas bem diferentes para a elaboração de um EIA, que podem ser c h a­
madas de abordagem exaustiva e abordagem dirigida. A abordagem exaustiva Jm sca \
um conhecimento quase enciclopédico do meio e supõe que quanto mais se disponha \
de informação, melhor será a avaliação. Resultam Longos e detalhados estudos de
impacto ambiental, nos quais a descrição das condições atuais — o diagnóstico
ambiental - ocupa a quase totalidade do espaço.

Tal visão é exemplificada pelo que se pode jocosam ente cham ar de “abordagem do
taxonom ista ocupado”, que consiste em ten tar estabelecer listas completas de espécies
de flora e fauna da área de influência do empreendimento em estudo, o que consome
a maior parte do esforço, do tempo e do dinheiro disponíveis para o EIA e desdenha
0 estudo..das relações funcionais, entre os componentes do ecossistema. Isso não
significa que inventários de fauna e flora sejam desnecessários para um a avaliação
de impacto ambiental, mas, simplesmente, que a função de tais levantam entos precisa
ser estabelecida claram ente antes do início de cada estudo - e em muitos casos eles
podem simplesmente não ter utilidade. Outro exemplo comumente encontrado em
EIAs é o das descrições extensas da geologia regional, sem que daí se tire qualquer
inform ação diretam ente utilizável para an alisar os impactos do empreendimento, e
muito menos para gerenciá-lo. 0 mesmo vale para extensas compilações de dados
sociais e econômicos.

A seguinte passagem extraída de um EIA ilustra a abordagem exaustiva: “A finalidade


principal [dos trabalhos realizados] foi a de reunir todos os dados existentes, bem
como de efetuar trabalhos de campo, interagindo com os demais estudos”.

Ora, não há nenhum a razão para reu n ir “todos” os dados existentes sobre um
determ inado assunto; o que in te re s s ã ^ reunir os dnd.os_necessários p ara a n alisarmos
impactos do empreendimento, que, na maioria das vezes, não existem e devem ser
levantados. Quanto aos trabalhos de campo, tampouco podem ser a “finalidade” dos
estudos - trabalhos de campo frequentem ente são um meio de coletar previam ente
dados não existentes e necessários para a análise dos impactos. Mais adiante, pode-se
ler no mesmo capítulo desse mesmo EIA: “Foram relacionadas todas as publicações de
interesse, visando a um a avaliação dos estudos existentes, lacunas de informações e
proposições para novos estudos”.

Essa passagem denuncia que faltou direção e coordenação ao EIA. Propor novos
estudos só excepcionalm ente pode ser objetivo de um estudo de impacto ambiental.
Na verdade, o EIA deveria ser organizado de m aneira a coletar os dados necessários e
preencher as lacunas de informação relevantes para an alisar os impactos; se houver
algum a informação im portante, mas não disponível, ela deve ser obtida.

Contrapõe-se a essa visão a abordagem dirig.i.da, que pressupõe que só faz sentido
levan tar dados que serão efetivamente utilizados na análise dos impactos, ou seja,
serão úteis para a tomada de decisões. 0 objetivo é o entendim ento das relações entre
2 ação de Im pacto A m b ie n ta l: conceitos e m étodos

o empreendimento e o meio e não a mera compilação de informações, nem mesmo o


entendimento da dinâm ica ambiental em si. Afinal, a AIA não busca o conhecimento,
nem am pliar as fronteiras da ciência; a AIA utiliza conhecimento e métodos cientí­
ficos para auxiliar na solução de problemas práticos, concretamente o planejamento
do projeto e a tomada de decisões.

Assim, dado um projeto, como se começa o estudo de impacto ambiental?

Dentro de um a abordagem exaustiva, o estudo começaria pela compilação de dados


existentes acerca da região onde se pretende im plantar o empreendimento. Como não
há orientação prévia, é difícil discernir quais dados são relevantes, o que acaba resul­
tando em vastas compilações, seguidas de alguns levantamentos básicos de campo,
por exemplo, sobre fauna e flora.
i
J
Já sob um a perspectiva dirigida, a primeira atividade em um EIA é a identificação
dos prováveis impactos ambientais. Tal identificação é prelim inar e permite um
entendimento inicial e provisório das possíveis conseqüências do empreendimento.
Corresponde à formulação de hipóteses sobre a resposta do meio ..às solicitações que
serão impostas pelo empreendimento.

Essa etapa será seguida de um a classificação ou hierarquização dos impactos listados,


com o objetivo de selecionar aqueles mais im portantes ou significativos. Somente en ­
tão deve-se passar à fase de estudo, das condições do meio ambiente, mas ainda assim
*
mediante a preparação prévia de um plano de estudos.
/

E claro que, para se poder form ular essas hipóteses, é preciso dispor de um m ínimo de
conhecimento da região onde se pretende im plantar o projeto, assim como um conhe­
cimento do próprio projeto. Suponha-se o projeto de construção de um a barragem: é
óbvio que se a área a ser inundada é usada como pasto, os impactos prováveis serão
muito diferentes daqueles que adviriam se a área tiver cobertura de vegetação nativa.
/

E evidente, então, a necessidade de dispor de um conhecimento mínimo do ambiente


que poderá sofrer os impactos do projeto.

Tal atividade pode ser denom inada de reconhecimento, e é feita por meio de um a
visita de campo, da visualização de fotografias aéreas ou imagens de satélite, de uma
rápida revisão bibliográfica, de um a consulta aos órgãos públicos que detêm inform a­
ções setoriais (como estatísticas socioeconômicas, classificações de uso da terra etc.)
e, se possível, por meio de conversas informais com moradores ou lideranças locais.
0 Quadro 7.1 sintetiza as fontes de informações geralmente empregadas para o reco­
nhecimento inicial do sítio e de seu entorno.

Tão im portante quanto o reconhecimento do meio ambiente é o entendimento do


projeto cujos impactos serão analisados e de suas alternativas. As atividades de pre­
paração do terreno, o processo construtivo, a forma de operação, os insumos e as
m atérias-prim as consumidos, os tipos de resíduos e a mão de obra empregada são
algum as informações fundam entais para se planejar um estudo de impacto. Usual­
mente esses dados j á estão disponíveis ju n to ao empreendedor, mesmo que o projeto
não esteja detalhado, e podem ser obtidos por meio de realização de entrevistas com

CAPÍTU LO
Et a p a s do P l a n e j a m e n t o e d a E l a b o r a ç ã o de u m E s t u d o de I m p a c t o A m b ie n

os responsáveis pelo empreendimento e Q u a d r o 7.1 Fontes de in fo rm a ç ã o p a ra o reconhecimento ambienta:


consulta a documentos técnicos como in ic ia l da área e de seu e n to rn o
plantas e memoriais descritivos. Mesmo M apas to p o g rá fic o s oficia is (escalas 1:10 0.000 a 1:10.000'
quando o projeto técnico é desenvolvido F o to g ra fia s aéreas
em paralelo aos estudos ambientais - Im agens de s a té lite
a situação ideal - deve-se partir de in­
Plantas rela tiva s ao p ro je to
formações sobre o empreendimento
M e m o ria is d e scritiv o s do p ro je to
proposto, estejam elas formalizadas em
anteprojetos ou sejam apenas inten­ Estudos a m b ie n ta is a n te rio re s
ções do proponente. Para certos tipos de Breve pesquisa b ib lio g rá fic a
empreendimentos, a empresa projetista Bases de dados s o c io e c o n ô m ic o s 1
ou o proponente dispõem de informações Bases de dados a m b ie n ta is 2
ambientais necessárias ao projeto e que Conversas co m m orado re s locais
podem ser aproveitadas nessa etapa de
Conversas com lideranças locais
reconhecimento.
Conversas com p re fe ito s e fu n c io n á rio s m u n ic ip a is

Assim, com pouco esforço e poucas horas 7AIo Brasil, esses dados podem ser o b tid o s no IBGE - In s titu to B rasileiro de
G eografia e E sta tística e em entidades estaduais, com o a Fundação Seade
de trabalho, é possível realizar um bom
(São Paulo) e a Fundação João P inheiro (M inas Gerais).
planejamento dos estudos a serem execu­ 2Dados sobre lim ite s de unidades de conservação, zoneam entos e o u tra s
tados. Quase sempre o próprio contexto inform ações, que podem ser o b tid o s em órgãos federais ou estaduais.
comercial dos estudos de impacto
ambiental obriga a tal exercício: é usual
que as empresas e demais entidades que precisam realizar um EIA convidem duas ou
três empresas de consultoria para apresentar propostas técnicas e comerciais. Como
tais propostas envolvem uma descrição do trabalho a ser realizado e um a estimativa
das horas técnicas necessárias (base para cálculo do preço), um nível mínimo de co­
nhecimento do projeto proposto e do ambiente possivelmente afetado é imprescindível.

7.2 P r in c ip a is a t iv id a d e s na elaboração de um estu d o de im p a c t o


A M B IE N T A L
Dentro de um a perspectiva dirigida, um EIA deve ser feito adotando-se uma seqüência
lógica de etapas, cada uma dependente dos resultados da etapa anterior. Sua concatenação *
e seqüência são extremamente importantes, pois a maneira de iniciar e conduzir um
estudo ambiental afetará a qualidade do resultado final. São sete as atividades bási­
cas na preparação de um estudo de impacto ambiental (Fig. 7.1), às quais podem ser
acrescentadas algumas atividades preparatórias ou complementares, como o estudo da
legislação aplicável e dos planos e programas governamentais incidentes sobre a área
do empreendimento, ou ainda alguns estudos sobre os tipos de impactos normalmente
associados ao projeto em análise, atividades que usualmente são realizadas nas primei­
ras etapas da elaboração dos estudos.

0 termo “plano de trabalho” usado na Fig. 7.1 coincide com o termo usado na regula­
mentação em vigor no Estado de São Paulo. No entanto, à parte questões terminológicas
(poder-se-ia empregar “proposta de trabalho”, “proposta técnica”, “plano de execu­
ção” ou qualquer outra expressão equivalente), que não são relevantes aqui, o que se
pretende m ostrar com essa figura é um a seqüência lógica e genérica de planejamento
e preparação de um estudo de impacto ambiental. Todo EIA deve ter um a fase de
de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

- acento planejamento antes de sua execução (como, aliás, qualquer


Caracterização das Reconhecimento trabalho técnico, projeto de engenharia ou projeto de pesquisa
5 :em ativas para o ambientai inicial científica), e 0 resultado dessa fase deve ser consolidado em
er.preendimento
algum documento ou plano. 0 plano de trabalho descreve a #
J
estratégia de execução do estudo e os métodos que nele serão
Identificação preliminar empregados. Mesmo nas jurisdições que não adotam a prática
dos impactos de discussão prévia de termos de referência para estudos de
impacto ambiental, esse procedimento é necessário, no m íni­
Determinação do escopo mo, para que a equipe ou a empresa encarregada da preparação
do EIA possa estimar seus custos ou preparar suas propostas
Plano de trabalho técnica e comercial. Portanto, independentemente de requisitos
legais, 0 bom planejamento de um estudo de impacto ambiental
implica a preparação de um plano de trabalho. 0 Quadro 7.2
Execução
mostra como se pode estruturar um plano de trabalho para um
Plano de trabalho/termos de refêrencia
EIA. A seguir, cada etapa da seqüência de planejamento e exe­
cução de um EIA é apresentada de forma resumida. Cada uma
Estudos de base
delas será tratada em detalhe nos capítulos subsequentes.
1 sO
Identificação dos impactos O
Q . A t iv id a d e s p r e p a r a t ó r ia s
s
Previsão dos impactos V ',
o Já foi comentado anteriormente sobre a necessidade de um reco­
*C
3
1 Qj
. 0 0
nhecimento ambiental preliminar. Outra atividade preparatória
Avaliação dos impactos ■d*0 imprescindível é a caracterização do projeto proposto e de suas
Plano de gestão alternativas. No caso geral, a equipe consultora é contratada
para realizar um estudo ambiental para um dado projeto, que
I
Estudo de impacto ambiental já pode estar razoavelmente detalhado (por exemplo, na forma
Relatório de impacto ambiental de um projeto básico) ou ainda se encontrar em fase conceituai.
A projetista já pode ter estudado um certo número de
Fig. 7.1 P rincipais etapas no p la n e ja m e n to e alternativas, tendo eventualmente descartado algumas.
execução de um estudo de im p a c to a m b ien tal.
Fonte: m o d ific a d o de Sánchez (2002a). 0 conhecimento e a caracterização do projeto e suas alternativas
deve, idealmente, ser tal que permita disseminar informação
consistente e homogênea para todos os
Q u a d r o 7.2 C o n te ú d o de um p la n o de tra b a lh o p a ra re a liz a ç ã o de um membros da equipe multidisciplinar, de
e stu d o de im p a c to a m b ie n ta l
modo tal que cada um possa desenvolver
1- Breve descrição do e m p re e n d im e n to . uma boa compreensão do projeto a ser
2 - Breve descrição das a lte rn a tiv a s que serão avaliadas. analisado. Caso a equipe não tenha fami­
3 - Localização.
liaridade com 0 tipo de empreendimento,
4 - D e lim ita ç ã o da área de estudo.
nada melhor que realizar uma visita a
5 - C aracterísticas a m b ie n ta is básicas da área.
um empreendimento similar e discutir
6 - P rincipais im p a c to s prováveis devidos ao e m p re e n d im e n to .
com seus gerentes e encarregados.
7 - C onsiderações sobre os prováveis im p a c to s m ais s ig n ific a tiv o s .
8 - E strutura prop osta para 0 EIA e c o n te ú d o de cada c a p ítu lo e
seção.
Alguns membros da equipe ambiental
9 - M e to d o lo g ia de le v a n ta m e n to s e t r a t a m e n t o de dados. deverão se debruçar sobre os documentos
1 0 - P ro c e d im e n to s de análise dos im p a c to s . de projeto (plantas, memoriais descri­
11- Formas de a p re se n ta ç ã o dos resultad os (e.g., escala dos mapas). tivos, memórias de cálculo etc.) para
1 2 - C om p ro m isso s de c o n s u lta pública. alcançar uma compreensão detalhada

CAPÍTU .0
Et a p a s d o P l a n e j a m e n t o e d a E l a b o r a ç ã o de u m E s t u d o de I m p a c t o A m b ie n

das atividades e processos a serem realizados em cada etapa do ciclo de vida do


empreendimento - da implantação à desativação.

Além do reconhecimento ambiental preliminar e da caracterização do projeto e de suas


' alternativas, é conveniente, ainda como atividade preparatória, realizar um a análise
da compatibilidade do projeto proposto com a legislação ambiental. As principais leis
e regulamentos nacionais e estaduais normalmente já devem ser de conhecimento da
equipe ambiental, mas pode ser necessário coletar legislação específica sobre o tipo
de projeto, e também observar se existe legislação municipal. Uma tarefa básica é
verificar se o empreendimento proposto é compatível com a legislação municipal de
uso do solo. Alguns órgãos ambientais brasileiros pedem um a declaração ou certidão
que ateste essa compatibilidade, sem a qual a análise do projeto não segue adiante.

Caso haja impedimentos legais absolutos, naturalm ente não há porque continuar com
o EIA. Na verdade, essa análise já deve ser feita antecipadamente, em algum tipo
de estudo preliminar de viabilidade ambiental (como um relatório ambienatal preli­
m inar ou alguma avalição interna à empresa proponente). Impedimentos absolutos
podem ocorrer em situações de restrições impostas por zoneamento, entre outros, mas
as leis não são imutáveis, e forças políticas e econômicas podem alterar leis e tornar
compatíveis com os requisitos legais empreendimentos que antes eram inviáveis. Isso
não é raro nos casos de empreendimentos considerados como de “utilidade pública”, ;
e já houve casos em que até unidades de conservação de proteção integral foram
alteradas para dar lugar a esse tipo de empreendimento.

Contudo, na maioria das vezes, a legislação apenas impõe restrições parciais, que de­
3Como se trata
vem ser conhecidas para assegurar um bom planejamento do projeto. Por exemplo, a de uma nocão
legislação florestal brasileira designa “áreas de preservação perm anente” o entorno de que envolve
nascentes, as margens de rios, os topos de morros, as vertentes de grande declividade apreciável porção
e algumas outras situações. Nesses casos, deve-se fazer um levantamento de todas as de subjetividade,
restrições, cartografar aquelas que têm um a expressão espacial, e buscar respeitar as sua aplicação
prática pode gerar
restrições durante o planejamento do projeto, o que vai exigir uma interação entre a
controvérsias. Porém,
equipe ambiental e a equipe de projeto.
o contexto social,
político e legal em
Usando o exemplo das áreas de preservação permanente, nota-se que certos tipos que se realiza um
de projeto podem respeitar integralmente (ou quase) as restrições, como as linhas de estudo ambiental
transmissão de energia elétrica, cujas torres podem ser localizadas fora dessas áreas é determinante na
e cujo traçado também pode, em larga medida, evitar corte de vegetação nativa. definição do que é
Já uma barragem é necessariamente construída barrando um rio, e portanto é inevi­ : relevante. Certos tipos
de impactos podem
tável que inunde áreas de preservação permanente.
ser vistos como
muito importantes
As mais freqüentes atividades preparatórias para a elaboração de um estudo de em um lugar, ao
impacto ambiental são mostradas no Quadro 7.3. Note que nem todo EIA demandará passo que sequer
a execução de todas essas tarefas. são reconhecidos em
outros. Não que o
relativismo seja rorc'..
I d e n t if ic a ç ã o p r e l im in a r do s im p a c t o s p r o v á v e is
Há diversas quesrões
A identificação dos impactos ambientais na fase prelim inar consiste na preparação
universalmente
de uma lista das prováveis alterações decorrentes do empreendimento. Nessa fase, valorizadas
não há preocupação com a classificação dos impactos segundo seu grau de im portân­ (conforme Cap. 5
cia, mas devem ser descartados os impactos irrelevantes3. Normalmente, parte-se de e 6).

S
a a;ãa de pacto Am biental: conceitos e métodos

L - a ; * o 7,3 C id a d e s p re p a ra tó ria s usuais p a ra re a liz a ç ã o de um um a descrição do empreendimento pro­


esz^do de im p a c to a m b ie n ta l posto e de suas alternativas, do estudo
' - _e .a - ta m e n t o de bases ca rto g rá fic a s . dos documentos de projeto disponíveis
2 - L e v a n ta m e n to de fo to g r a fia s aéreas. (tais como estudos de viabilidade eco­
3 - A q u is iç ã o de fo to g r a fia s aéreas ou im a g e n s de satélite. nômica, estudos de alternativas, projetos
4 - L e v a n ta m e n to p re lim in a r de dados s o c io a m b ie n ta is . ou anteprojetos de engenharia) e de um
5 - L e v a n ta m e n to p re lim in a r de estudos sobre a região. reconhecimento do local proposto para
6 - C o m p ila ç ã o de dados sobre o p ro je to e e studo dos d o c u m e n to s implantação do empreendimento.
de p ro je to (plantas, m e m o ria is d e scritiv o s etc.).
7 - Entrevistas ou reuniões de tra b a lh o com p ro je tis ta e p ro p o n e n te No reconhecimento é possível identi­
para e scla re cim e nto s. ficar as mais evidentes características
8 - V isita s a e m p re e n d im e n to s sem elhantes. ambientais que poderão ser afetadas pelo
9 - V isita de c a m p o para re c o n h e c im e n to da área do p ro je to e projeto; por exemplo, pode-se verificar
e n to rn o . a existência de diferentes tipos de
1 0 - Conversas in fo rm a is na área do p ro je to e e n to rn o . vegetação, as formas de uso do solo e
11- L e v a n ta m e n to e análise da legislação aplicável. as atividades antrópicas realizadas no
1 2 - Id e n tific a ç ã o da equipe necessária. entorno, vias de acesso, características
1 3 - O rç a m e n to para execução dos serviços. físicas do meio, como relevo, solos e rede
hidrográfica, entre outras.

Documentação cartográfica ou fotografias aéreas costumam ser muito úteis nessa fase,
pois possibilitam uma visão de conjunto do local do empreendimento e seu entorno.
As demais atividades preparatórias tam bém podem fornecer vários elementos úteis
para a identificação preliminar de impactos.
4Em A IA , a
indução, fo rm a de A análise dos impactos do empreendimento sempre será feita com base no estudo das
argumentação que interações possíveis entre as ações ou atividades que compõem o empreendimento e os
vai do particular componentes ou processos do meio ambiente, ou seja, de relações plausíveis de causa
para o geral,
e efeito (conforme Cap. 1). Na etapa inicial, as interações podem ser identificadas a
frequentemente fa z
parte do discurso
partir de:
engajado - a fa vo r analogia com casos similares;
ou contra um experiência e opinião de especialistas (incluindo a equipe ambiental);
> » <

empreendimento -, dedução, ou seja, confrontar as principais atividades que compõem o


enquanto a dedução empreendimento com os processos ambientais atuantes no local, inferindo
é o método que guia conseqüências lógicas;
os procedimentos
indução, ou seja, generalizar a partir de fatos ou fenômenos observados4.
analíticos da equipe
multidisciplinar
que realiza o Na prática, caso os profissionais envolvidos nessa etapa não ten h a m familiaridade
EIA e da equipe com o tipo de empreendimento que será analisado, é comum se utilizar listas de
de analistas verificação (checklists) e outras listagens de impactos existentes na literatura
dos órgãos técnica. Um especialista no tipo de empreendimento proposto (mesmo que pouco
governamentais. versado em planejamento e gestão ambiental) será capaz, ao lado de um a pessoa
Mas não se deve
experiente em análise de impactos ambientais, de identificar um grande número de
contrapor os
impactos prováveis. 0 mesmo ocorrerá se for consultado um cientista que detenha
métodos; ambos
contribuem para o conhecimento especializado sobre o tipo de ambiente onde se pretende im plantar
conhecimento, que o projeto; por exemplo, para um projeto de m arina em zona de m anguezais, um
é um dos pilares especialista nesse tipo de ecossistema poderá rapidamente preparar uma lista de
da avaliação de
■j vários impactos ambientais potenciais, que posteriormente serão validados, ou não,
impacto ambiental. na seqüência dos estudos.

CAPÍTU L0
= s ç 8 3 ce Irr.pacto Ambiental: conceitos e métodos

CLisriro 7.3 i.id a d e s p re p a ra tó ria s usuais p a ra re a liz a ç ã o de um uma descrição do empreendimento pro­
es7-jdo de im p a c to a m b ie n ta l posto e de suas alternativas, do estudo
' - L e .a d ia m e n to de bases c a rto g rá fic a s . dos documentos de projeto disponíveis
2 - L e v a n ta m e n to de fo to g r a fia s aéreas. (tais como estudos de viabilidade eco­
3 - A q u is iç ã o de fo to g r a fia s aéreas ou im a g e n s de satélite. nômica, estudos de alternativas, projetos
4 - L e v a n ta m e n to p re lim in a r de dados s o c io a m b ie n ta is . ou anteprojetos de engenharia) e de um
5 - L e v a n ta m e n to p r e lim in a r de estudos sobre a região. reconhecimento do local proposto para
6 - C o m p ila ç ã o de dados sobre o p ro je to e e studo dos d o c u m e n to s implantação do empreendimento.
de p ro je to (plantas, m e m o ria is d e scritivo s etc.).
7 - E ntrevistas ou reuniões de tra b a lh o com p ro je tis ta e p ro p o n e n te No reconhecimento é possível identi­
para escla re cim e nto s. ficar as mais evidentes características
8 - V isita s a e m p re e n d im e n to s sem elhantes. ambientais que poderão ser afetadas pelo
9 - V is ita de c a m p o para re c o n h e c im e n to da área do p ro je to e projeto; por exemplo, pode-se verificar
e n to rn o . a existência de diferentes tipos de
10- Conversas in fo rm a is na área do p ro je to e e n to rn o . vegetação, as formas de uso do solo e
11- L e v a n ta m e n to e análise da legislação aplicável. as atividades antrópicas realizadas no
1 2 - Id e n tific a ç ã o da equipe necessária. entorno, vias de acesso, características
1 3 - O rç a m e n to para execução dos serviços. físicas do meio, como relevo, solos e rede
hidrográfica, entre outras.

Documentação cartográfica ou fotografias aéreas costumam ser muito úteis nessa fase,
pois possibilitam um a visão de conjunto do local do empreendimento e seu entorno.
As demais atividades preparatórias também podem fornecer vários elementos úteis
para a identificação preliminar de impactos.
4Em A IA , a
indução, fo rm a de A análise dos impactos do empreendimento sempre será feita com base no estudo das
argumentação que interações possíveis entre as ações ou atividades que compõem o empreendimento e os
vai do particular componentes ou processos do meio ambiente, ou seja, de relações plausíveis de causa
para o geral,
e efeito (conforme Cap. 1). Na etapa inicial, as interações podem ser identificadas a
frequentemente fa z
parte do discurso
partir de:
engajado - a fa vo r analogia com casos similares;
ou contra um experiência e opinião de especialistas (incluindo a equipe ambiental);
empreendimento -, # dedução, ou seja, confrontar as principais atividades que compõem o
enquanto a dedução empreendimento com os processos ambientais atuantes no local, inferindo
é o método que guia conseqüências lógicas;
os procedimentos
indução, ou seja, generalizar a partir de fatos ou fenômenos observados4.
analíticos da equipe
multidisciplinar
que realiza o Na prática, caso os profissionais envolvidos nessa etapa não tenh am familiaridade
EIA e da equipe com o tipo de empreendimento que será analisado, é comum se utilizar listas de
de analistas verificação (checklists) e outras listagens de impactos existentes na literatura
dos órgãos técnica. Um especialista no tipo de empreendimento proposto (mesmo que pouco
governamentais. versado em planejamento e gestão ambiental) será capaz, ao lado de um a pessoa
Mas não se deve
experiente em análise de impactos ambientais, de identificar um grande número de
contrapor os
métodos; ambos
impactos prováveis. 0 mesmo ocorrerá se for consultado um cientista que detenha
contribuem para o conhecimento especializado sobre o tipo de ambiente onde se pretende im plantar
conhecimento, que o projeto; por exemplo, para um projeto de m arina em zona de m anguezais, um
é um dos pilares especialista nesse tipo de ecossistema poderá rapidamente preparar uma lista de
da avaliação de vários impactos ambientais potenciais, que posteriormente serão validados, ou não,
impacto ambiental. na seqüência dos estudos.

CAPITU
Et a p a s d o P l a n e j a m e n t o e d a E l a b o r a ç ã o d e u m E s t u d o d e I m p a c t o A m b i e

D e t e r m in a ç ã o do escopo
Dois empreendimentos idênticos localizados em ambientes diferentes resultarão em
diferentes impactos ambientais. Da mesma forma, num mesmo local, dois projetos
distintos poderão ocasionar impactos ambientais bem diferentes; por exemplo, a
monocultura de cana-de-açúcar ou de soja poderá causar impactos mais extensos
que um a mineração, a qual, por sua vez, pode causar impactos de grande intensidade,
porém concentrados em áreas restritas. Em certos locais, um a rodovia pode causar
mais impactos adversos que um gasoduto, ou vice-versa, dependendo das interações
projeto x meio que poderão v ir a se estabelecer.

Por outro lado, sabe-se que os impactos e os riscos ambientais não são percebidos da
mesma forma por pessoas ou grupos sociais diferentes. Por exemplo, o sentimento de
perda ocasionado pela inundação de um cemitério indígena, ou de qualquer outro sí­
tio sagrado de um a comunidade, dificilmente poderá ser apreendido em sua plenitude
por pessoas que não façam parte daquele grupo.

Devido a essas duas razões - tanto de ordem científica como de ordem social -,
alguns impactos causados por um determinado empreendimento deverão ser
considerados como mais im portantes que outros e, portanto, deverão receber mais
atenção no estudo de impacto ambiental. Além disso, por razões de ordem prática,
é impossível estudar detalhadam ente todas as interações projeto x meio. Isso eqüi­
valeria a um a abordagem exaustiva, que acaba forçosamente redundando num
estudo superficial, um a vez que todo EIA é realizado num contexto de limitação de
recursos e de tempo.

E mais eficaz e mais útil analisar com profundidade três ou quatro questões rele­
vantes que descrever com igual superficialidade vinte ou trinta impactos ambientais
abordados genericamente. Ademais, a experiência tem mostrado que, quando um
determinado projeto é submetido a discussão pública do processo de avaliação de
impacto ambiental, somente umas poucas questões críticas atraem a atenção dos
interessados (Sánchez, 1995a).

Para estabelecer o escopo de um estudo de impacto ambiental, procede-se primeiro à


identificação das questões relevantes, com emprego de métodos como:
# analogia com casos similares;
# experiência e opinião de especialistas;
# consulta ao público;
# análise das questões definidas previamente por via legal (por exemplo, bens
tombados, patrimônio arqueológico e paleontológico, cavidades naturais sub­
terrâneas, espécies raras e áreas protegidas).

Como foi visto no Cap. 6, a definição do escopo do estudo é tanto uma etapa do
processo de AIA como uma atividade de planejamento de um estudo ambiental.
Mesmo que não exista uma formalização dessa etapa (que é obrigatória em diversas
jurisdições), é impossível conceber um estudo de impacto ambiental que não contenha
alguma forma de seleção das questões principais - muitas vezes isso se faz de ma-
liação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

neira implícita, mas a desvantagem neste caso é que os critérios de seleção não são
conhecidos do público, e a equipe de analistas não tem conhecimento de suas opiniões.

Nas jurisdições em que o scoping é etapa obrigatória, costuma dar lugar a um docu­
mento de orientação para o estudo de impacto ambiental conhecido genericamente
como term os de referência (conforme seções 4.3 e 6.4). Aqui se emprega o termo plano
de trabalho para descrever o documento que resulta da atividade de determinação do
escopo de um estudo, de maneira análoga a um plano de pesquisa para a condução
de trabalhos de investigação científica ou tecnológica (coincidentemente, é também
a expressão empregada no regulamento do Estado de São Paulo - SMA n° 42/94 -,
conforme seção 6.4).

E s t u d o s de b a s e
Os estudos de base têm uma posição central na seqüência de etapas de um EIA. Eles
devem ser organizados de maneira a fornecer as informações necessárias às fases
seguintes do EIA, ou seja, a previsão dos impactos, a avaliação de sua importância
e a elaboração de um plano de gestão ambiental; essas informações, por sua vez,
são definidas em função das duas etapas anteriores, a identificação preliminar dos
impactos potenciais e a seleção das questões mais relevantes.

A realização dos estudos de base é certamente a atividade mais cara e mais demorada
da avaliação de impacto ambiental, e é justam ente por isso que deve ser planejada
cuidadosamente. Depois de definir o tipo de informação que se pretende coletar, o plano
de estudos deve estabelecer as escalas temporal e espacial dos estudos e os métodos de
coleta, a eventual necessidade de análises laboratoriais e os procedimentos ou métodos
de tratamento e interpretação dos dados. Em particular, deve-se definir se serão neces­
sários dados primários ou secundários. Estes são dados preexistentes, publicados ou
armazenados em instituições públicas, organismos de pesquisa ou pelo próprio propo­
nente do projeto. Dados primários são aqueles levantados especialmente para o estudo
de impacto ambiental, o que demandará trabalhos de campo e, consequentemente,
maior esforço, custo e tempo. A importância de se adotar uma abordagem dirigida
transparece aqui. Caso contrário, a equipe técnica que elabora o EIA estará arriscada
a levantar uma quantidade imensa de dados secundários disponíveis, mas absoluta­
mente inúteis ou, pior ainda, inúmeros dados primários que posteriormente não serão
utilizados para a análise dos impactos decorrentes do empreendimento. Infelizmente,
isso é bastante comum em boa parte dos estudos de impacto ambiental.

Uma questão importante aqui é a definição prévia da área de estudo, ou seja, a área
geográfica onde serão realizados os estudos de base, área que será objeto de coleta
/

de dados primários ou secundários. E comum se confundir a área de estudo com a


área de in flu ência. Muitas regulamentações sobre EIAs, como a Resolução Conama
1/86, requerem que a equipe determine a área de influência do empreendimento
analisado. Esta não é conhecida na fase dos estudos, mas somente depois de analisa­
dos os impactos (e varia conforme os impactos afetem o ambiente físico, biótico ou
antrópico). Pode ser definida como a área cuja q u a lid a d e a m b ie n ta l sofrerá m o d ific a ­
ções direta ou in d ir e ta m e n te decorrentes do e m p re e n d im e n to . Por sua vez, a área de
estudo é simplesmente aquela em que serão coletadas informações a fim de realizar o

CAPÍTUlLO
Et a p a s d o P l a n e j a m e n t o e d a E l a b o r a ç ã o de u m E s t u d o de I m p a c t o A m b ie n E

diagnóstico ambiental - o resultado dos estudos de base norm alm ente irá form ar um
capítulo do EIA denom inado diagnóstico ambiental.

I d e n t if ic a ç ã o e p r e v is ã o d o s im p a c t o s
A nálise dos impactos é um termo que descreve um a seqüência de atividades.
A conclusão dos estudos de base, ao fornecer u m a descrição da situação ambiental na
área de estudo, possibilita que a identificação prelim inar dos impactos - feita no in í­
cio do planejamento dos estudos - seja revista à luz de um conhecim ento que a equipe
m ultidisciplinar não possuía naquele momento. Trata-se, portanto, não de um a nova
identificação, mas de um a revisão, atualização ou correção da lista prelim inar de im ­
pactos, enriquecida com as novas informações geradas ou compiladas pelos estudos
de base.

Como a avaliação de impacto ambiental é um a atividade que objetiva antecipar as


conseqüências fu tu ras de decisões tomadas no presente, a previsão dos impactos é
um a etapa fu nd am ental do EIA. Prçy isão deve ser entendida como um a hipótese
fu n dam entada e justificada, se possível quantitativa, sobre o com portam ento futuro
de alguns parâm etros, denom inados indicadores ambientais, representativos da q u a­
lidade ambiental.
- s .

Infelizmente, é comum a confusão entre identificação e previsão dos impactos.


A identificação é apenas um a _enumeração das prováveis conseqüências futuras
de um a ação. Também deve ser justificada e fundam entada, mas, ao contrário da
preyisãp de impactos, não resulta da aplicação sistemática e dirigida de métodos e
técnieas^próprios de cada uma, das disciplinas científicas conhecidas pelos membros
de um a equipe m ultidisciplinar de preparação de um EIA, mas de procedimentos
dedutivos e indutivos de formulação de hipóteses (que, claro, não prescindem de tais
conhecimentos, mas não os utilizam a fundo).
>
Na prática da AIA, a previsão dos impactos dem anda um entendim ento muito mais
detalhado das relações ecológicas e das interações sociais do que a simples iden-
/

tificação dos impactos. E por isso que a previsão somente pode ser feita depois de
concluídos os estudos de base, que fornecerão os elementos necessários para que as
previsões sejam devidam ente fundam entadas.

Uma das formas de realizar previsões de impacto é a utilização de modelos m atem á­


ticos, que representam o com portam ento de diferentes indicadores am bientais em
função de variáveis de entrada. Assim, por exemplo, a concentração de poluentes no ar
pode ser prevista a p artir de informações sobre as emissões de um processo industrial
e sobre as condições atmosféricas que permitem a dispersão dos poluentes emitidos.
A concentração de poluentes pode ser representada por um indicador ambiental - por
exemplo, a concentração de material particulado no nível do solo.

No entanto, nem todos os processos ambientais, e ainda menos os sociais, podem ser
modelados matematicamente, de forma que outras técnicas devem ser empregadas
para a previsão de impactos, dentre as quais encontram -se as experiências e os en­
saios de laboratório e de campo, a extrapolação, modelos de simulação com o auxílio
- ação ae Impacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

de computadores, as técnicas de construção de cenários e a opinião de profissionais,


baseada em analogia com casos similares ou em seu conhecimento do meio. Todas as
técnicas de previsão, inclusive os modelos matemáticos, têm seus limites e produzem
resultados com certa margem de incerteza. Isso é inerente à avaliação de impacto
ambiental e deve ser levado em conta na elaboração do EIA, durante sua análise e
nas decisões que são tomadas em decorrência.

A v a l ia ç ã o dos im p a c t o s
Enquanto a previsão dos impactos informa sobre a m agnitude ou intensidade das
modificações ambientais, a avaliação discorre sobre sua importância ou significânçia..
É importante diferenciar os dois conceitos, já que a avaliação da importância tem uma
subjetividade muito maior que a previsão dos impactos, atividade esta que demanda
conhecimentos especializados e a aplicação do método científico.

Por exemplo, previsões de impacto em um EIA poderiam vir na forma de enuncia­


dos como:
ííf “Devido aos despejos de efluentes, e mesmo após tratamento, a concentração
de zinco nas águas do corpo d’água receptor dêverá atingir 10 mg/f nas piores
condições de diluição, ou seja, com vazão mínima num período consecutivo de
7 dias e período de retorno de 10 anos (Q7ii0).”
& “Como o empreendimento implicará a drenagem completa da área úmida conhe­
cida localmente como Brejo do Matão, a espécie Brejus brasiliensis, recentemente
descrita e considerada endêmica da região, correrá sério risco de desaparecer.”

Que interpretação dar a esses enunciados? 0 que significam 10 mg/f de zinco num
rio e a destruição do hábitat de um a espécie? No primeiro caso, a interpretação -
ou avaliação de impacto - discutirá o significado daquele rio apresentar aquela
concentração de metal. Isso representa um risco para a saúde de um a comunidade
indígena situada a jusante e que utiliza a água do rio para diversas atividades? 0
metal poderá acumular-se nos tecidos dos peixes desse rio, peixes que fazem parte da
dieta alim entar dessa comunidade, e conferir-lhes características tóxicas?

No segundo caso, a destruição do hábitat de uma espécie que só ocorre naquele local
significará muito provavelmente sua extinção, exceto se ela puder ser introduzida em
hábitat semelhante ou reproduzida em cativeiro, hipóteses possivelmente desconhecidas.
Dado que hoje em dia há um reconhecimento social mundial da importância da biodi-
versidade, tal impacto deveria ser julgado como muito importante. Na verdade, deve ser
tão importante que poderia determinar a recusa da aprovação do projeto.

Embora existam alguns elementos balizadores da discussão s.obre a importância.de


um im pacto, ambiental, como textos legais que definem de antemão a importância
social atribuída a determinado elemento do ecossistema, tal atividade implica
fundam entalm ente um juízo de valor e, portanto, extrapola o âmbito de competência
do empreendedor ou da equipe técnica que elabora o EIA; essa é um a das razões
que faz com que as regulamentações sobre avaliação de impacto ambiental incluam
mecanismos formais de consulta pública e fazem do licenciamento ambiental um ato
discricionário (seção 3.2).

CAPÍTU LO
Et a p a s d o P l a n e j a m e n t o e d a E l a b o r a ç ã o de u m E s t u d o de I m p a c t o A m b ie n

E evidente que a equipe do EIA estará bem posicionada para em itir seus próprios
ju lg am en to s de valor, um a vez que, em princípio, conhece melhor que ninguém os
possíveis impactos do projeto. Na verdade, deve fazê-lo avaliando a im portância
dos impactos que identificou e previu, mas para isso é necessário que descreva com
clareza os critérios de atribuição de im portância que empregou, de modo que o EIA
possa ser exposto ao escrutínio público e a outras opiniões.

P l a n o de g e s t ã o
A lguns impactos negativos poderão ser aceitáveis se houver medidas capazes de redu­
zi-los. Conhecidas como medidas mitigadoras, ou seja, ações que visam a atenu ar os
efeitos negativos do empreendimento, devem ser descritas no EIA. A regulam entação
brasileira, por meio da Resolução Conama 1/86, somente determ ina, explicitamente,
que todo EIA deve incluir a “definição das medidas m itigadoras dos impactos nega­
tivos” (Art. 6o, III). Na prática, os EIAs vão além desse requisito mínim o, propondo
outras medidas, ações, iniciativas ou program as que contribuam para m elhorar a
viabilidade am biental do projeto em análise.

Esse conjunto de medidas é aqui cham ado de plano de gestão ambiental, entendido
como “o conjunto de medidas necessárias, em qualquer fase do período de vida do
em preendim ento, para evitar, atenuar ou com pensar os impactos adversos e realçar
ou acentu a r os impactos benéficos”. Trata-se de um plano a ser aplicado (e detalhado,
adaptado ou aperfeiçoado) após a aprovação do projeto, sendo necessário um com ­
promisso do empreendedor com seu cum primento. Sua implementação e fiscalização
correspondem à fase de acom panham ento do processo de AIA.

A lgum as medidas mitigadoras já podem estar embutidas no projeto técnico, como


sistemas de abatimento de emissões; neste caso, compete tam bém à equipe que elabora
o EIA um a análise da eficácia que deverão ter essas medidas nas fu turas condições
operacionais do empreendimento, podendo-se propor medidas ou controles adicionais.

Outro com ponente dos planos de gestão am biental de um EIA é um conjunto de


m edidas compensatórias, aquelas que visam a com pensar a perda de elementos
im portantes do ecossistema, do ambiente construído, do patrim ônio cultural ou
ainda de relações sociais. Um caso típico de compensação ocorre quando um a porção
de vegetação nativa tem de ser elim inada; nesta situação a compensação poderia ser
feita m ediante a proteção de um a área equivalente ou m aior que aquela que será per­
dida, ou m ediante a recuperação de u m a área degradada, ou ambas.

Medidas de valorização ou realce dos impactos positivos são m uitas vezes necessárias
para que estes se concretizem em benefício da região onde o em preendim ento será
implantado. Por exemplo, um impacto positivo com um ente citado em estudos de impacto
ambiental é a geração de empregos. No entanto, determ inados em preendim entos
requerem mão de obra especializada nem sempre disponível localmente, necessitando
atrair trabalhadores de fora e, portanto, não criando empregos na região que acolhe o
projeto. Um program a de formação de mão de obra e de qualificação de fornecedores
locais de bens e serviços pode contribuir sobrem aneira para to rn a r realidade os im ­
pactos benéficos possíveis.
ação oe Im pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

Muitas vezes, o estudo de impacto ambiental não é capaz de chegar a conclusões


inequívocas sobre os impactos do empreendimento analisado, seja devido à comple­
xidade das relações ecológicas, seja devido ao reduzido conhecimento prévio sobre a
área. Por outro lado, no sistema de licenciamento ambiental empregado no Brasil, há
três licenças sucessivas (conforme seção 3.2) e o estudo de impacto ambiental é requi­
sito para a primeira delas, a licença prévia. Por essas razões, frequentemente ocorre
que estudos complementares sejam realizados depois do estudo de impacto ambiental,
geralmente envolvendo o detalhamento dos próprios programas de gestão ambiental.
Assim, recomendações para aprofundamento de alguns estudos também podem fazer
parte de um plano de gestão.

Finalmente, outro componente essencial dos planos de gestão é o plano de monito­


ramento e acompanhamento. Esse plano deve ser coerente com as demais atividades
do EIA. Por exemplo, os indicadores ambientais e as estações de monitoramento
deverão, a princípio, ser os mesmos empregados na elaboração dos estudos de base,
o que permitirá a comparação do comportamento desses indicadores antes e depois da
implantação e operação do empreendimento. Na verdade, o monitoramento é quase
uma continuação dos estudos de base, e a maior parte das considerações feitas para
estes também é valida para aquele. Pelo menos quatro objetivos podem ser atribuídos
ao monitoramento dos impactos de um projeto submetido ao processo de avaliação de
impacto ambiental:
& verificar os impactos reais do projeto;
# compará-los com as previsões;
# alertar para a necessidade de intervir caso os impactos ultrapassem certos limites;
# avaliar a capacidade do EIA de fazer previsões válidas e formular recomendações
para a melhoria de futuros EIAs de projetos similares ou localizados no mesmo
tipo de meio.

0 monitoramento ambiental do projeto não deve ser confundido com o m onito­


ramento da qualidade ambiental ou do estado do meio ambiente, norm alm ente
executado por instituições públicas. Trata-se de um automonitoramento concebido
em função dos impactos previstos e que deve ser capaz de captar as m udanças
induzidas pelo empreendimento e distingui-las de eventuais m udanças naturais ou
induzidas por outras fontes.

Em suma, o plano de gestão ambiental é a ligação entre os estudos prévios e os


procedimentos de gestão ambiental que a empresa adotará caso o empreendimento
seja aprovado.

7.3 C u s t o s d o e s t u d o e d o p r o c e s s o de a v a l i a ç ã o de i m p a c t o a m b i e n t a l
Estimar antecipadamente os custos de elaboração do EIA e das demais tarefas
associadas ao processo de AIA é uma demanda freqüente da parte dos proponentes
de projetos públicos ou privados. Infelizmente, há poucos estudos sobre o assunto,
seja porque as empresas mantêm sigilo sobre seus custos, seja porque os itens de custo
podem nem mesmo ser apropriados contabilmente pelas empresas: muitas vezes não
há registros de despesas especificamente imputáveis ao processo de AIA.

CAPÍTU LO
E ta p a s d o P la n e ja m e n to e d a E la b o r a ç ã o de u m E s tu d o de Im p a c to A m b i f n í e M 175

Em term os da divisão clássica entre custos de investim ento e custos de operação, os


custos do processo de AIA são classificados na categoria de custos de investim ento
ou custos de capital. Tais custos recaem basicam ente sobre 0 investidor, mas parte
dele é assum ida pelo governo, principalm ente para a etapa de análise do EIA. Para
0 proponente, os principais itens a considerar são (i) 0 custo de elaboração do EIA e
(ii) 0 custo de organização da consulta pública. Em algum as jurisdições, 0 governo
pode cobrar ta x a s ou um ressarcim ento de suas despesas de análise do EIA. Como se
verá abaixo, esses custos situam -se, na m aioria dos casos, abaixo de l°/o do valor do
investim ento, e frequentem ente abaixo de 0,5%.

Por outro lado, um dos objetivos do processo de AIA é p re v e n ir danos am bientais.


P ortanto, 0 investidor terá interesse em saber em que p atam ares se situ arã o os ç.usto.s
de m itigação e de com pensação, um a vez que tais m edidas farão p arte dos custos
totais do projeto e devem ser levadas em conta na avaliação de sua viabilidade
econôm ica. A in d a que, do ponto de vista da autoridade g o v ern a m e n ta l, os custos
de m itigação e com pensação não interessem (em geral eles não são in fo rm ad o s nos
ElAs nem nos estudos com plem entares e subsequentes), é evidente que estim ativ as
desses valores in teressam ao proponente do projeto, u m a vez que podem influ en ciar
sua rentabilidade.

Finalmente, outros com ponentes de custo que não devem ser esquecidos são (i) os estudos
com plem entares e subsequentes, como aqueles que no Brasil podem ser exigidos para
a obtenção das licenças de instalação e de operação, e (ii) os custos da etapa de acom ­
panham ento, que podem incluir supervisão, auditoria e m onitoram ento ambiental.

As inform ações publicam ente disponíveis sugerem que 0 custo de preparação de um


EIA, em geral, situa-se na faixa entre 0,1 e 1,0% do custo de investim ento (Hollick,
1986; World Bank, 1991a). Os custos de consulta pública, segundo levantam en to feito
pelo Banco M undial para alg u n s projetos financiados por essa entidade (World Bank,
1999), co n stitu íram em torno de 0,0025% do valor dos investim entos, enquanto, em
núm eros absolutos, v a ria ra m entre US$ 25 mil e US$ 1,5 milhão.

Um estudo feito para a Comissão Européia sobre custos e benefícios da A IA 5 avaliou 5EIA in Europe: a
18 casos de EIAs feitos para diferentes tipos de projetos em quatro países da União Study on Costs and
Benefits.
Européia. Suas principais conclusões em relação aos custos são:
# 0 custo de elaboração do EIA corresponde a um a parcela entre 60 e 90% do
custo total do processo de AIA.
® 0 custo do EIA não excede 0,5% do valor do investim ento (custos de capital do
projeto) em 60% dos casos exam inados.
% Custos acima de 1% correspondem a casos de exceção, em geral associados a
“projetos p articu larm en te controvertidos em ambientes sensíveis”, ou a casos
nos quais “a boa prática da AIA não foi seguida”.
& A faixa de variação dos custos da AIA em relação ao valor do investim ento em
cada projeto foi de 0,01 a 2,56%, com a média situando -se em 0,5%.
# Em term os percentuais, os custos são maiores para os projetos que implicam
menores custos de capital.

S
a ação de Im pacto A m biental: conceitos e métodos

Na Africa do Sul, um levantamento feito com 107 companhias que negociavam ações
na bolsa de valores de Joanesburgo constatou que 25°/o delas informaram gastar com
o processo de AIA menos de 1% do valor do investimento em novos projetos, ao
passo que 13% das empresas reportaram gastos entre 2 e 4%; 60% das empresas não
haviam contabilizado essas despesas (Rossouw et ah, 2003).

Sobre custos de acompanhamento há ainda menos informação. 0 estudo de Sánchez


e Gallardo (2005) sobre a fase de acompanhamento da construção da pista descen­
dente da rodovia dos Imigrantes, em São Paulo, entre 1998 e 2002, computou custos
fornecidos pelo empreendedor e estimou os custos dos órgãos governamentais, che­
gando a um total de 1,14% do valor do investimento, cabendo 1,03% ao empreendedor
e 0,11% ao governo. Nesse caso, a etapa de acompanhamento acabou absorvendo
alguns custos que normalmente seriam atribuíveis à elaboração do EIA, haja vista
que ele precedeu de dez anos o início da construção e teve que ser atualizado para
fins de obtenção da licença de instalação. Os itens de custo propriamente relativos à
etapa de acompanhamento incluem atividades de supervisão e gestão ambiental da
parte do empreendedor e do consórcio construtor, além de monitoramento ambiental
e serviços de consultoria para tratamento, interpretação dos dados de monitoramento
e preparação de relatórios de andamento. A esses custos somam-se a implementação
de medidas mitigadoras e a compensação ambiental, que ascendeu a cerca de 4% do
valor do investimento devido ao fato da rodovia atravessar um parque estadual.

7.4 S ín t e s e
0 bom entendimento dos objetivos da avaliação de impacto ambiental, assim como
das possibilidades e limites desse instrumento, é essencial para que se possa obter
o m áximo de sua aplicação. Um dos pontos, centrais de um bom estudo de impacto
ambiental é dirigir as atividades para um certo número de questões previamente
definidas como importantes. 0 estudo será estruturado em torno dessas questões
mais relevantes, que direcionarão as atividades de coleta de dados, a análise dos
impactos e a proposição de medidas de gestão. A análise dos impactos é composta
de três atividades distintas: a identificação, a previsão e a avaliação, que podem ser
definidas da seguinte forma:
* Identificação de impactos é a descrição das conseqüências esperadas de um
determinado empreendimento e dos mecanismos pelos quais se dão as relações de
causa e efeito, a partir das ações modificadoras do meio ambiente que compõem
tal empreendimento.
# Previsão de impactos significa fazer hipóteses, técnica e cientificamente
fundamentadas, sobre a magnitude ou intensidade dos impactos ambientais.
# Avaliação dos impactos a atribuição de um qualificativo de importância ou
significância a esses impactos, qualificativo esse sempre referido ao contexto
socioambiental no qual se insere o empreendimento.

CAPÍTU
ação de n p a c to A m biental: conceitos e métodos

O fundamento para estruturar e organizar um estudo de impacto ambiental é a iden­


tificação prelim inar dos prováveis impactos. Ao enunciar tais impactos, pode-se
orientar as etapas seguintes da preparação de um estudo de impacto ambiental, ou
seja, a seleção das questões relevantes, os estudos de base, a análise dos impactos e a
proposição de medidas de gestão ambiental. Aparentemente, o resultado do trabalho
de identificação nada mais é que um a lista de impactos possíveis, mas, na verdade,
a identificação dos prováveis impactos permite que a equipe multidisciplinar orga­
nize, de modo racional e partilhado entre seus membros, o entendimento acerca das
relações entre os vários componentes do empreendimento e os elementos e processos
ambientais que podem ser alterados pelo projeto.

Identificar prováveis impactos não é uma tarefa difícil, mas deve ser executada
com discernimento e de maneira sistemática e cuidadosa, de modo a cobrir todas as
possíveis alterações ambientais decorrentes de um empreendimento, mesmo se for
sabido de antemão que algumas dessas alterações serão pouco significativas, ou seja,
que algumas serão muito mais importantes que outras e que, portanto, nem todas
receberão igual atenção nas etapas subsequentes do EIA.

0 entendimento das atividades e operações que compõem o projeto, e de suas


alternativas, ao lado do reconhecimento das características básicas do ambiente
potencialmente afetado, são os pontos de partida para a identificação preliminar dos
impactos prováveis, conforme a Fig. 7.1. Como se pode observar nessa mesma figura,
após a conclusão do diagnóstico ambiental, há um a nova identificação de impactos,
na verdade, uma revisão ou confirmação dos impactos preliminarmente identificados
no planejamento do EIA. Os conceitos e as ferramentas apresentados neste capítulo
são empregados em ambas as modalidades de identificação de impactos.

8.1 F o r m u l a n d o h ip ó t e s e s
Identificar impactos prováveis eqüivale a formular hipóteses sobre as modifica­
ções ambientais a serem direta ou indiretamente induzidas pelo projeto em análise.
A analogia com situações similares, a experiência dos membros da equipe multidis­
ciplinar ou de consultores externos e o emprego conjunto do raciocínio dedutivo e
indutivo são alguns dos métodos empregados para auxiliar na identificação preliminar
dos impactos.

0 conhecimento acumulado por profissionais e pesquisadores de todo o mundo, assim como


a experiência anterior dos analistas que compõem a equipe multidisciplinar que elabora o
EIA, formam a base de conhecimento para uma boa identificação de impactos.

Estudos de casos individuais e estudos de síntese sobre os impactos socioambientais


de um determinado setor de atividade econômica são dois tipos de fontes que podem
ser consultadas no início dos trabalhos. Os efeitos ambientais observados ou medidos
em casos de empreendimentos semelhantes fornecem um a primeira pista para iden­
tificar os possíveis impactos de um novo projeto. Assim, pesquisa bibliográfica e
consulta a trabalhos similares são prováveis primeiros passos de um a equipe encar­
regada de planejar ou elaborar um estudo de impacto ambiental.

Há de se ter cuidado ao consultar estudos ambientais feitos para empreendimentos


similares. Dada a quantidade de estudos ruins, se não houver, de fonte segura,
I d e n t if ic a ç ã o de I m p a ™

o indicativo de que se trata de um bom estudo, ao usá-lo pode-se simplesmente


propagar erros. Não se pode esquecer, tam bém , que os estudos ambientais são a n a ­
lisados pelos órgãos governam entais competentes, que frequentem ente dem andam
eomplementações, quando não a reelaboração completa do estudo. No Brasil, o
documento que efetivamente serve para fu n d am en tar o licenciamento ambiental
pode ser bastante diferente do EIA original. Da mesma forma, a confiança que se
pode ter em documentos obtidos por via de busca na Internet depende da credibilida­
de da fonte. Sítios governam entais tendem a apresentar, além de docum entos oficiais
(que podem ser bastante úteis), documentos que, m uitas vezes, refletem os pontos de
vista de diferentes partes interessadas, exceto, claro, quando o governo é o propo­
nente do projeto. Sítios de empresas, de associações em presariais e de ONGs podem
trazer informação fidedigna e balanceada, mas muitas vezes refletem somente seus
interesses. Organizações internacionais usualm ente são fontes bastante confiáveis, e
artigos publicados em periódicos científicos com arbitragem [peer reviewed) geral­
mente são de alta credibilidade.

É comum, em alguns países (como o Canadá e a Holanda), a publicação de relatórios


contendo os resultados de análises de EIAs ou as conclusões de comissões de consultas
públicas sobre em preendim entos submetidos ao processo de AIA. Também os bancos
de desenvolvimento facilitam ao público diversos docum entos relativos ao processo
de análise dos projetos submetidos para financiam ento. Além disso, muitas vezes
p od em s e r c a a sa ltaabs os pareceres técnicos de análise de EIAs preparados por ór­
gãos am bientais da própria jurisdição em que se está trabalhando. Todo esse material
pode serv ir não apenas para au x iliar na identificação de impactos, mas tam bém para
informação sobre técnicas de previsão de impactos e para inspiração sobre medidas
de gestão ambiental.

Muito do conhecimento acum ulado sobre impactos ambientais encontra-se tam bém
sistematizado em m anuais e publicações especializadas em avaliação de impacto
am biental1 (por exemplo, World Bank, 1991a, 1991b, 1991c) ou em estudos sobre o ]Roe, Dalal-
estado da arte da análise dos impactos em um determ inado setor ou tipo de atividade. Clayton e Hughes
Este é o caso das barragens. Não somente existem m ilhares de estudos e publicações (1995) compilaram
sobre efeitos am bientais de barragens, como um esforço m ulti-institucional de síntese uma relação de
várias dezenas
foi empreendido por ONGs e bancos de desenvolvimento, com o apoio de alguns
de diretrizes para
governos, com a constituição da Comissão M undial de Barragens. Tal comissão pro­
avaliação de
moveu um a ampla discussão m undial sobre os benefícios, os custos, os impactos e os impacto amhiemal
riscos das barragens, e coletou um vasto material analítico, tornan do -o disponível publicadas em
T.\CD, 2000). A lguns exemplos de constatações da Comissão que podem au x iliar a vários países e
realização de futuros EIAs são: por organizações
* Raramente os EIAs são claros quanto à repartição social dos impactos, mesmo internacionais.
que muitos empreendimentos afetem de maneira mais significativa alguns gru­
pos sociais em comparação a outros.
^ "Os pobres, outros grupos vulneráveis e as gerações futuras têm mais chance de
arcar com uma parte desproporcional dos custos sociais e ambientais das gran­
des barragens sem que recebam uma parcela proporcional (eommensurate) dos
benefícios econômicos” (WCD, 2000).
^ Entre as comunidades afetadas, as disparidades de gênero aumentaram, com
mulheres arcando com uma parte desproporcional dos custos sociais e sendo
frequentemente discriminadas negativamente na partilha dos benefícios.

0 .TO
ação ce mpacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

« Comunidades indígenas e minorias étnicas vulneráveis padeceram de índices


maiores de deslocamento forçado e sofreram maiores impactos sobre sua subsis­
tência, cultura e valores espirituais.

Uma iniciativa similar abordou a indústria mineral (IIED/WBCSD, 2002), traçando


um amplo panoram a de seus impactos e de sua contribuição para o desenvolvimento
socioeconômico sob a perspectiva, nem sempre concordante, de vários grupos de
interessados. Esse tipo de documento é também excelente fonte de exemplos e de boas
práticas para mitigação e compensação de impactos adversos, e para a valorização de
impactos benéficos.

Há, portanto, um a ampla disponibilidade de informação e conhecimento a res­


peito das conseqüências socioambientais de muitas atividades humanas, mas esse
conhecimento acumulado [knowledge base) só se torna produtivo à medida que for
efetivamente apropriado pelos membros da equipe multidisciplinar que realiza o
estudo ambiental. Conhecimento não pode ser confundido com informação, pois
pressupõe o estabelecimento de relações entre os objetos. Há cada vez mais inform a­
ção disponível, mas é o conhecimento que permite discernir a informação relevante
da irrelevante e também possibilita um questionamento crítico da informação, que
pode ser errada, enganosa, deliberadamente manipulada ou descontextualizada.

Deve-se ressaltar novamente o papel do coordenador dos estudos, que precisa ser real­
mente um profissional da avaliação de impacto ambiental. Enquanto dos especialistas
que compõem a equipe dos consultores externos, espera-se atualização e competência
para tratar dos temas que lhes cabem (além de habilidades comunicativas), ao coorde­
nador ou à equipe de coordenação cabe um olhar crítico, abrangente e inclusivo para
produzir um estudo socialmente útil, isto é, que atenda às necessidades e às expecta­
tivas do cliente (o proponente do projeto) e demonstre respeito pelas necessidades das
demais partes interessadas (conforme seção 14.1).

Tal postura é necessária desde a identificação preliminar dos impactos potenciais,


que é o pilar a partir do qual será construído o estudo de impacto ambiental.

A indispensável visita de campo para reconhecer o local do empreendimento e


seu entorno pode ser completada por um a rápida consulta a mapas topográficos da
região, geralmente disponíveis em pelo menos um a escala (às vezes mais de uma), e
a algum as cartas temáticas, como as de uso do solo ou as geológicas, estas últim as
tam bém disponíveis na maioria dos países, embora com detalham ento e precisão
variados. Esses mapas fornecem informações muito úteis sobre o ambiente regional
e perm item ao analista formar rapidamente um a ideia do contexto ambiental em
que estará inserido o empreendimento. Uma rápida consulta a fotografias aéreas
ou a imagens de satélite de alta resolução permite contex tualizar o local do projeto
em relação ao uso do solo e a possíveis fontes de degradação ambiental situadas no
entorno (Quadro 7.1).

Se os impactos ambientais resultam da interação entre o projeto proposto e o meio


ambiente, para identificar corretamente os impactos é preciso, então, ter um bom
entendimento do projeto, de seus diversos componentes, das obras e demais atividades
necessárias para sua implantação e das operações que serão realizadas durante seu

CAPÍTU LO
I d e n t if ic a ç ã o d e I m p a

funcionamento, assim como das atividades relacionadas à desativação do em preen­


dimento, ao final de sua vida útil. Muitas vezes, um a visita a um a obra sim ilar é um
excelente meio de compreender o projeto proposto, principalmente se os membros da
equipe do EIA não têm familiaridade com o tipo de empreendimento a ser analisado.
Nessas visitas pode-se visualizar muitos impactos que possivelmente ocorrerão no
caso em estudo e também conhecer operações semelhantes àquelas que serão reali­
zadas no local do novo projeto.

Enfim, há vários cam inhos para se ir formulando hipóteses sobre o provável impacto
do empreendimento, mas após um a investigação inicial, que pode ser muito abran­
gente, é preciso começar a sistematizar as hipóteses e transferir informação e
conhecimento para a análise do projeto concreto, cujas características construtivas e
operacionais devem ser plenamente entendidas pela equipe.

8 .2 I d e n t i f i c a ç ã o d a s c a u s a s : a ç õ e s o u a t i v i d a d e s h u m a n a s
Os impactos ambientais decorrem de uma ou de um conjunto de ações ou atividades
hum anas realizadas em um certo local. Um estudo de impacto ambiental pressupõe
que tais ações sejam planejadas, sendo usualm ente descritas por meio de documentos,
como projetos de engenharia, memoriais descritivos, plantas etc. Dessa premissa,
decorre a impossibilidade (ou incoerência) de aplicar a avaliação de impacto ambiental
para a análise de ações não planejadas, como um garimpo, o lançamento clandestino
de resíduos, a construção individual de residências em áreas rurais ou em periferias
urbanas. A equipe encarregada da preparação do estudo ambiental deve ter conhe­
cimento de todos os estudos técnicos relevantes que tenham sido produzidos para a
preparação de um projeto, inclusive para alternativas que tenham sido descartadas.

Na maioria das vezes, os estudos de impacto ambiental são realizados quando há a


perspectiva de se encontrar impactos significativos. Estes, por sua vez, são geralmente
originados de ações ou atividades de caráter tecnológico, como a construção de um a
barragem, a extração de minerais ou o carregamento de navios em um porto. Esta-
belece-se, assim, um a relação cie causa e efeito, na qual as ações tecnológicas são a
causa de alterações de processos ambientais que, por sua vez, modificam a qualidade
do ambiente - ou, em outras palavras, induzem a impactos ambientais.

Deve-se, aqui, ter clareza acerca dos conceitos discutidos no Cap. 1. As ações ou
atividades são as causas, enquanto os impactos são as conseqüências sofridas (ou
potencialmente sofridas) pelos receptores ambientais (os recursos ambientais, os
ecossistemas, os seres humanos, a paisagem, o ambiente construído - conforme os
vários termos e conceitos ali discutidos). Os mecanismos ou os processos que ligam
um a causa a um a conseqüência são os efeitos, os aspectos ou processos ambientais,
conforme se prefira empregar um ou outro termo (seções 1.6 e 1.7).

Para identificar os impactos ambientais, deve-se conhecer bem suas causas ou


ações tecnológicas. Por isso, é usual que, antes da identificação propriamente dita
dos impactos - ou como um passo dessa identificação - seja elaborada um a lista
das atividades que compõem o empreendimento. Tal lista deve ser o mais detalhada
possível, de m aneira a m apear todas as possíveis causas de alterações ambientais. 0
Quadro 8.1 é um exemplo de lista de ações tecnológicas tipicamente realizadas em
empreendimentos de mineração, embora nem todos os empreendimentos desse tipo

ouTO
ação de Im pacto A m b ie n ta l: conceitos e m étodos

Q u a d r o 8.1 P rin c ip a is a tiv id a d e s c o m p o n e n te s de u m e m p re e n d im e n to de m in e ra ç ã o


F a s e d e p e s q u is a e p l a n e j a m e n t o

Contratação de pessoal temporário


Serviços topográficos
Abertura de vias de acesso
Instalação de acampamentos
Mapeamento geológico, prospecção geofísica e geoquímica
Perfuração e coleta de testemunhos
Retirada de material para ensaios
Realização de ensaios de laboratório ou em escala-piloto
Elaboração de projeto de engenharia
F a s e de im p l a n t a ç ã o

Aquisição de terras
Contratação de serviços de terceiros
Encomenda de máquinas e equipamentos
Construção ou serviços de melhoria das vias de acesso
Implantação de canteiro de obras
Contratação de mão de obra para a construção
Remoção da vegetação
Decapeamento e terraplenagem
Estocagem de solo vegetal
Perfuração de poços e galerias de acesso para minas subterrâneas
Preparação dos locais de disposição de estéreis e de rejeitos
Instalação de linha de transmissão de energia elétrica ou instalação de grupo gerador
Implantação de sistema de captação e armazenamento de água
Construção e montagem das instalações de manuseio e beneficiamento
Construção e montagem das instalações de apoio
Disposição de resíduos sólidos
Implantação de viveiro de mudas
Recrutamento de mão de obra para a fase de operação
Fa s e d e o p e r a ç ã o

Remoção de vegetação
Decapeamento da jazida
Abertura de vias subterrâneas
Drenagem da mina e áreas operacionais
Perfuração e desmonte de rocha
Carregamento e transporte de minério e estéril
Disposição de estéreis
Disposição temporária de solo vegetal
Revegetação e demais atividades de recuperação de áreas degradadas
Estocagem de minério
Britagem e classificação

CAPÍTU!iLO
I dentific aç ão de I m p a 183

Beneficiamento
Secagem dos produtos
Processamento metalúrgico ou químico
Disposição de rejeitos
Estocagem dos produtos
Expedição
Transporte
Estocagem de insumos
Disposição de resíduos sólidos
Manutenção
Aquisição de bens e serviços
F a s e d e d e s a t iv a ç ã o

Retaludamento e implantação de sistema de drenagem


Preenchimento de escavações
Fechamento do acesso a aberturas subterrâneas e sinalização
Revegetação e recuperação de áreas degradadas
Desmontagem das instalações elétricas e mecânicas
Remoção de insumos e resíduos
Demolição de edifícios
Dispensa da mão de obra
Supervisão e monitoramento pós-operacional

com preendam todas essas atividades. Listas como essa podem ser usadas diretamente
ou, o que é mais apropriado, servirem de ponto de partida para a equipe m ontar sua
própria lista de ações ou atividades, adequada ao projeto que será analisado. Os Quadros
8.2 a 8.5 apresentam listas similares, respectivamente das ações que costum am ser reali­
zadas durante as diferentes etapas do ciclo de vida de barragens para fins de geração de
energia elétrica e durante as etapas de planejamento, construção e operação de rodovias,
aterros de resíduos e linhas de transmissão de energia elétrica. Naturalmente, trata-se
de atividades suscetíveis de modificar o ambiente e de originar impactos significativos.
/

E im portante b u scar o m elhor entendim ento possível do projeto, pois isso será o fu n ­
dam ento de u m a boa identificação dos impactos. A participação, na equipe, de um
técnico especializado no tipo de projeto analisado é então essencial, mas tam bém é
necessário que os demais membros da equipe com preendam bem as ações tecnológicas
que compõem o em preendim ento. Cada um a dessas ações poderá ocasionar um ou
mais impactos ambientais.

Embora a “divisão” do empreendimento em diversas ações seja justificável como pro­


cedimento analítico, não se pode perder de vista sua totalidade. Determinados impactos
[que poderiam ser chamados de “sistêmicos”) não decorrem de um a ação isolada, mas do
conjunto de ações que compõem o projeto. Por essa razão, encontra-se em alguns EÍAs
a identificação de impactos associados a esse conjun to, e não som ente dos impactos
associados a um a ou outra ação tecnológica individualizada.

o TO
sção de im pacto A m biental: conceitos e métodos

Q u a d r o 8 . 2 P rin c ip a is a tiv id a d e s c o m p o n e n te s de u m a b a rra g e m


Fas e de p la n e ja m e n to

Estudos hidrológicos
Contratação de pessoal temporário
Levantamentos aerofotogramétricos
Serviços topográficos
Abertura de vias de acesso
Instalação de acampamentos
Estudo da disponibilidade de materiais de construção
Investigações geológico-geotécnicas
Perfuração, abertura de trincheiras e coleta de amostras
Retirada de material para ensaios geológico-geotécnicos
Realização de ensaios de laboratório ou em escala-piloto
Levantamento fundiário
Elaboração de projeto de engenharia
Fase p r e p a r a t ó r ia

Veiculação de informações sobre o empreendimento '


Aquisição de terras para instalação do canteiro de obras
Encomenda de máquinas e equipamentos
Fa s e de im p l a n t a ç ã o

Aquisição de terras
Contratação de serviços de terceiros
Construção ou serviços de melhoria das vias de acesso
Ampliação e melhoria da infraestrutura existente
água potável, coleta e tratamento de esgotos etc.)
Decapeamento e terraplenagem da área do canteiro de obras
Estocagem de solo vegetal
Implantação de canteiro de obras
Contratação de mão de obra para a construção
A , - '- ' •• ..
Implantação de alojamentos e vila residencial
Construção de oficinas, pátios de máquinas, galpões de armazenagem
Abertura de áreas de empréstimo e pedreiras
Remoção da vegetação
c iS S s K S

Implantação das fundações da barragem


Extração de material de empréstimo (solo e rocha)
Construção de ensecadeira e desvio do rio
Serviços de terraplenagem, compactação, transporte de material, concretagem
• • ................................... - - ' - A. - • •A ' \ - . . v . . : ' : V ..T - . P . .V ,.. ' '• ■ A . L ..

Disposição de resíduos sólidos


Transporte, recebimento e armazenamento de insumos e equipamentos
Montagem eletromecânica
Construção de linha de transmissão
Construção de locais para reassentamento da população
Reinstalação de infraestrutura afetada (estradas etc.)
Recrutamento de mão de obra para a fase de operação
d e e n c h im e n t o d o r e s e r v a t ó r io

Desocupação da área e transferência da população

CAPITU
I d e n t if ic a ç3 ã o d e I m p a

Pagamento de indenizações
Desmatamento e limpeza da área de inundação
Fechamento das comportas
Fa s e de o p e r a ç ã o

Operação do reservatório (controle de vazão)


Acompanhamento do comportamento das estruturas
Manutenção civil, elétrica e mecânica

Todas as etapas do ciclo de vida de um empreendimento devem ser levadas em conta, pois
impactos significativos podem decorrer de ações realizadas em diferentes etapas. Não
há uma forma única para dividir o ciclo de vida de um empreendimento em períodos -
deve-se considerar as características próprias de cada tipo de projeto. A periodização do
ciclo de vida deve ser a mais apropriada para descrever com suficiente detalhe cada um
dos tipos, como exemplificam os Quadros 8.1 a 8.5. Para uma barragem, é conveniente
discriminar uma etapa de enchimento do reservatório, pois alguns impactos importantes
ocorrem especificamente nesse momento. Já para uma mina, não se pode esquecer da
etapa de desativação e fechamento, quando ocorrem impactos socioeconômicos como o
desemprego e a redução da arrecadação tributária municipal, e deve-se preparar medidas
de gestão voltadas para atenuar os impactos remanescentes e programas de recuperação
de áreas degradadas. De qualquer forma, as etapas básicas geralmente consideradas são
planejamento, implantação e operação, ao passo que a importância de planejar as etapas
de desativação e fechamento vem sendo progressivamente reconhecida (Sánchez, 2001).
0 entendimento de cada uma dessas etapas é:
Planejamento: corresponde à execução de estudos técnicos e econômicos e
pode incluir certo número de atividades de investigação ou levantamento de
campo, como serviços de topografia, cadastramento de moradores e sondagens
geológicas ou geotécnicas. Essas atividades podem causar alguns impactos fí­
sicos e bióticos; os mais importantes, porém, costumam ser registrados no meio
antrópico.
# Implantação: compreende todas as atividades necessárias para a construção de
instalações ou de preparação para o início do funcionamento, como, por exemplo,
sçso de Im pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

Q u a d r o 8 .3 P rin c ip a is a tiv id a d e s c o m p o n e n te s de um e m p re e n d im e n to ro d o v iá rio


F a s e d e p la n e ja m e n t o

Estudos de viabilidade técnico-econômica e de alternativas de traçado


Divulgação do empreendimento
Investigações geotécnicas preliminares, levantamentos topográficos e cadastrais
Declaração de utilidade pública e anúncio de desapropriações
Fa s e d e i m p l a n t a ç ã o : a t iv id a d e s p r e p a r a t ó r ia s

Execução da desapropriação, desocupação de imóveis e demolições


Pagamento de indenizações
Construção de moradias e benfeitorias para reassentamento
Transferência da população afetada
Remanejamento de redes de utilidades públicas
Contratação de serviços
Contratação de mão de obra
Implantação de canteiros, acampamentos e demais áreas de apoio
Abertura de vias de acesso e pistas de serviço
Transporte de máquinas até os locais das obras
Desvios e bloqueios de trânsito de veículos, pedestres e animais
Aquisição de bens e insumos
Estocagem de bens e insumos
Remoção da vegetação
Implantação de pedreiras ou aquisição de brita
Instalação de usina de asfalto
Fas e d e i m p l a n t a ç ã o : a t iv id a d e s d e c o n s t r u ç ã o

Terraplenagem, execução de cortes e aterros


Implantação de sistema de drenagem de águas pluviais
Desvio e canalização de cursos d'água
Transporte e disposição de materiais em bota-foras
Transporte de insumos e materiais para os canteiros e distribuição na área de construção
Execução de obras de arte
Preparação do leito carroçável
Pavimentação
Plantio em taludes e outras áreas
Sinalização
Manutenção de máquinas e equipamentos
F a s e d e im p la n t a ç ã o : d e s m o b iliz a ç ã o

Desmontagem do canteiro de obras


Retirada de entulho e resíduos
Recuperação de áreas degradadas
Dispensa da mão de obra
Fase de o p e ra ç ã o
Circulação de veículos
Conservação e manutenção da via
Conservação e manutenção de áreas verdes
Proteção da faixa de domínio
Controle de operações

CAPÍTU 10
I d e n t if ic a ç ã o de I m p a 18 7

Q u a d r o 8 . 4 P rin c ip a is a tiv id a d e s co m p o n e n te s de um a te rro de resíduos


Fa s e de p l a n e j a m e n t o

Estudos de viabilidade técnico-econômica e de alternativas de localização


Investigações geotécnicas preliminares
Divulgação do empreendimento
Declaração de utilidade pública e anúncio de desapropriações
Fa s e d e i m p l a n t a ç ã o : a t iv id a d e s p r e p a r a t ó r ia s

Execução das desapropriações


Pagamento de indenizações
Contratação de serviços
Contratação de mão de obra
Implantação do canteiro de obras
Deslocamento de máquinas
Aquisição de bens e insumos
Estocagem de bens e insumos
Remoção da vegetação
Fa s e de im p l a n t a ç ã o : im p l a n t a ç ã o d o ate r r o

Escavações para preparação de células


Compactação do solo do fundo das células
Instalação de sistema de drenagem no fundo e nos taludes laterais
Instalação de manta impermeável no fundo e nos taludes laterais
Instalação de dutos para coleta de biogás
Implantação de sistema de drenagem de águas pluviais
Perfuração de poços de monitoramento das águas subterrâneas
Construção de guaritas, escritórios e demais instalações
Instalação de cerca
Implantação de cortina vegetal
Fa s e de o pe r aç ão

Circulação de caminhões pelas vias de acesso


Recebimento e pesagem dos caminhões
Descarga dos caminhões
Compactação do lixo
Recobrimento do lixo com terra
Coleta de chorume
Tratamento de chorume ou encaminhamento para estação de tratamento
Coleta e queima de biogás (ou aproveitamento)
Conservação e manutenção de áreas verdes
Monitoramento ambiental
Fa s e de d e s a t i v a ç ã o

Recobrimento definitivo com solo


Plantio de gramíneas nas bermas e taludes
Monitoramento geotécnico
Monitoramento ambiental
Tratamento de chorume ou encaminhamento para estação de tratamento
Coleta e queima de biogás (ou aproveitamento)

o
ação ae im pacto A m biental: conceitos e métodos

Q u a d r o 8 . 5 P rin c ip a is a tiv id a d e s c o m p o n e n te s de u m a lin h a de tra n s m is s ã o de e n e rg ia


e lé tric a
ENTO

Estudos de viabilidade técnico-econômica e de alternativas de traçado


d e im p l a n t a ç ã o : a t iv id a d e s p r e p a r a t ó r ia s

Serviços de topografia
.......
x&m zm
Abertura de estradas de acesso e de serviço, abertura de helipontos
Investigações geológico-geotécnicas dos locais de construção das torres
Contratação de serviços
Contratação de mão de obra
Aquisição de equipamentos e materiais
Remoção da vegetação na faixa de servidão
Abertura de praças para montagem das estruturas e lançamento dos cabos
- de im p l a n t a ç ã o : c o n s t r u ç ã o

Transporte das torres, cabos e demais componentes


Execução das fundações .
: .. . v ... . v

Execução de obras de estabilização de taludes e drenagem


.......

Montagem das estruturas metálicas


Lançamento dos cabos e instalação dos componentes
DE OPERAÇÃO

Transmissão de energia
r;r'"-
Inspeções periódicas (terrestres ou aéreas} I

Manutenção preventiva das torres e fundações


Manutenção da faixa de servidão
Manutenção corretiva
DE DESATIVAÇÃO

Retirada dos cabos


Desmontagem das torres
Remoção de resíduos
Reabilitação das áreas degradadas ■■■■■■

a execução de plantios florestais em um projeto de silvicultura. A instalação de


canteiros de obras, o recrutamento de mão de obra, a desmobilização do pessoal
empregado na construção e a desmontagem do canteiro são algumas atividades
desta fase. Pode incluir a realização de testes em projetos industriais antes da
posta em marcha definitiva (operação). Para certos empreendimentos, como
rodovias, portos e outros projetos de infraestrutura, essa etapa pode acarretar
os impactos mais importantes, inclusive aqueles relacionados ao deslocamento
de populações humanas. Para conveniência na identificação de impactos, a fase
de implantação pode ser subdividida.
# Operação: corresponde ao funcionamento do empreendimento, sendo normalmente
a etapa mais longa. Durante a operação, os empreendimentos são modificados,
corrigidos, melhorados, ampliados; as matérias-primas de processos industriais
podem mudar e o uso do solo no entorno do empreendimento pode ser radical­
mente modificado; incidentes e acidentes podem ocorrer. Tudo isso requer uma
gestão adaptativa, pois é impossível que o estudo de impacto ambiental preveja
detalhadamente todos os cenários da vida futura de um empreendimento. Em

CAPÍTU LO
I d e n t i f ic a ç ã o de I m p a j

casos de m odificações ou am pliações substanciais, um novo EIA pode ser


necessário. Para m uitos em preendim entos, como indústrias, minas, usinas
term elétricas e aterros de resíduos, a etapa de operação causa os im pactos
mais significativos.
Desativação: corresponde à preparação para o fechamento das instalações ou
paralisação das atividades2. A desativação requer um planejamento específico 2Não há
com suficiente antecedência, mas, para certos empreendimentos, as principais concordância
atividades para que a etapa de desativação transcorra com os menores efeitos quanto ao uso
de termos como
adversos são conhecidas desde o planejamento do projeto. É o caso de minas,
desativação,
aterros de resíduos e indústrias. 0 plano de desativação ou o plano de recupe­ fechamento ou
ração de áreas degradadas podem constar como medidas de gestão no EIA, mas pós-fechamenlo.
deverão ser revistos e atualizados com periodicidade. Em diversos países, como No Brasil
Estados Unidos e Canadá, assim como na Região Administrativa de Hong Kong, também é usada
pode ser requerida a preparação de um ELA para a desativação de certos tipos de a palavra “des-
comissionamento”,
empreendimentos.
adaptada do inglês
& Fechamento: é a cessação definitiva das atividades. Impactos residuais (perma­ decommissioning.
nentes) podem ocorrer e devem ser devidamente identificados no EIA. Após o Em português, o
fechamento de um empreendimento, um novo projeto pode ser proposto para termo que eqüivale
o mesmo local. Caso esse novo projeto tenha o potencial de causar impactos a decommissioning
adversos significativos, deverá ser objeto de um novo estudo ambiental, como é desativação,
com o sentido de
para um aterro de resíduos projetado para ocupar a cava de um a pedreira.
preparação para
o fechamento,
0 tipo de inform ação necessária para lograr um bom entendim ento do projeto é muito tratando-se de duas
diferente para cada etapa de seu ciclo de vida. Enquanto o licenciamento ambiental etapas diferentes no
convencional de atividades industriais ou poluidoras focaliza essencialm ente a etapa ciclo de vida de um
de operação, a avaliação de impacto ambiental deve, necessariamente, abordar o empreendimento.
projeto “do berço ao tú m u lo ”, para tom ar emprestado o jarg ão da avaliação do ciclo
de vida de produtos.

Assim, para a etapa de operação, é fu ndam ental conhecer o processo industrial,


o consum o de m atérias-prim as, energia, água e outros insumos, as emissões e a
geração de resíduos. Já para avaliar os impactos da fase de implantação, é preciso
conhecer os métodos construtivos, a necessidade de mão de obra e os critérios de
recrutam ento, a necessidade de in stalar sistemas auxiliares, como linhas de tr a n s ­
missão de eletricidade ou sistemas de captação e arm azenagem de água, entre várias
outras informações sobre o projeto (Figs. 8.1 a 8.4).

Não se deve esquecer de que, no EIA, um capítulo deve ser dedicado à descrição do
empreendimento. Se essa descrição for adequada (a adequação, clareza e suficiência
serão avaliadas pelos analistas técnicos do órgão governam ental encarregado do
licenciamento ambiental), perm itirá que os leitores do estudo (incluindo os analistas)
tirem suas próprias conclusões sobre os impactos potenciais.

Xa literatura técnica pode-se encontrar listas de atividades ou descrições de um a


série de tipos de em preendim entos preparadas especificamente com o propósito de
facilitar a identificação de impactos ambientais. A título de exemplo, são citadas aqui
duas dessas fontes. Fornasari Filho et al. (1992) descrevem com detalhe as principais
"ações tecnológicas” típicas de quinze tipos de projetos de engenharia, incluindo
90 K Q a li a ç ã o de Im pacto A m b ie n ta l: conceitos e métodos

Fig. 8.1 Construção da barragem La Grande I, Quebec, Canadá. A b e rtu ­


ra de um canal de desvio e construção de um a ensecadeira são algum as
atividades causadoras de im pactos am bientais durante a fase de im ­
plantação

Fig. 8.2 Construção de uma linha de transm issão de


energia elétrica em área urbana. O estudo dos m é­
todos e processos construtivos é um a das principais
tarefas para a identificação dos im pactos am bientais.
Nesta foto, está em execução a instalação dos cabos
e dos isoladores

Fig. 8.3 Escavação em m ina de carvão com o em pre­


go de um a dragline, atividade que resulta em aspectos
am bientais evidentes, com o a m odificação do relevo, Fig. 8 .4 Parque eólico nas proxim idades da cidade de Tarazona, região
a emissão de poeiras e ruídos e o consum o de co m - de Aragão, Espanha, tip o de em preendim ento que, em bora produza
/

bustíveis fósseis. M in a de carvão Duhva, A frica do Sul "energia lim pa", causa ruído, im pactos sobre a paisagem e a avifauna

CAPÍTU
I d e n t if ic a ç ã o de I m p a

b arra g en s, can ais, aterros de resíduos, projetos de irrigação e projetos urbanísticos.


Fernández-V ítora (2000) apresenta listas de “ações im p a c ta n te s” p a ra dezoito d ife re n ­
tes tipos de atividades, incluindo plantio florestal, planos de o rd en am en to territorial
e projetos de irrigação.

A subdivisão de um em p reendim ento pode re su lta r em dezenas ou mesmo centenas


de atividades. Canter (1996, p. 97) reporta u m lev a n ta m e n to feito p a ra o Exército
am ericano, segun do o qual foram in v e n ta ria d a s cerca de 2 mil “atividades b ásicas”
em nove diferentes “áreas fu n c io n a is”. Por exemplo, n a área fu n cio n al de con stru ção
civil, alg u m as atividades são rem oção de vegetação, p reen ch im en to de fundações,
lim peza de form as de concreto e in stalação de isolam ento term oacústico.

Com que g rau de detalhe devem ser descritas as atividades de u m projeto? Quais
atividades podem ser a g ru p a d a s em categorias afins p a ra que a descrição do projeto
não resulte em centen as de p eq u en as tarefa s e procedim entos? Não pode h a v e r u m a
resposta ú n ica a essas questões. A descrição do em preendim en to deve ser tal que
p erm ita sua perfeita com preensão pelos a n a lista s e ta m b é m pelos fu tu ro s leitores
do EIA. Uma dificuldade prática decorre da freqü ente situação de nem m esm o o
em preendedor ou o projetista serem, m u itas vezes, capazes de descrever o projeto em
detalhe, pela simples razão deste não ter sido cla ra m e n te definido qu an do se iniciam
os estudos am bientais. Mas há situações m ais difíceis p a ra o a n a lis ta am biental,
como aquelas que se ap resen tam q u an d o o projeto é m odificado no curso dos estudos
am bientais, de m a n e ira que as tarefa s iniciais da avaliação dos im pactos am bientais
têm de ser refeitas, e m esmo refeitas m ais de u m a vez.

Em outras situações de planejam en to e gestão am bien tal ta m b é m deve ser ex e cu tad a


a tare fa de le v a n ta r as atividades que podem c a u sa r im pactos am bien tais - como no
planejam ento de u m sistem a de gestão am b ien tal ou n a im plan tação de p ro g ra m a s de
prevenção à poluição e de produção m ais lim pa -, m as nesses casos o exercício é m ais
simples, pois o objeto de estudo é um em p reendim ento real, não um projeto.

8 . 3 D e s c r iç ã o d a s c o n s e q ü ê n c ia s : a s p e c t o s e im p a c t o s a m b ie n t a is
Os impactos são norm alm ente descritos por meio de enunciados sintéticos, como os
seguintes exemplos de impactos u sualm en te encontrados na construção de barragens:
perda e alteração de hábitats devido ao enchim ento do reservatório;
$ perda de anim ais por afogam ento;
$ proliferação de vetores;
$ destruição de elementos do patrim ônio espeleológico;
% desaparecim ento de locais de encontro da com unidade local;
$ perda de terras agrícolas;
$ aum ento da arrecadação tributária m unicipal;
^ aum ento da dem an da de bens e serviços.

-.Lém de concisos, os enunciados deveriam ser suficientem ente precisos p a ra e v ita r


am bigüidades na sua interpretação; idealm ente deveriam :
$ ser sintéticos;
$ ser autoexplicativos;

011TO
ja ç ã o de Impacto A m biental: conceitos e métodos

# descrever o sentido das alterações (perda de..., destruição de..., redução de...,
aumento de..., risco de...).

Entretanto, tais características dos enunciados que descrevem os impactos identifi­


cados nem sempre se encontram nos estudos de impacto ambiental, sendo freqüente
encontrar enunciados dúbios ou de difícil compreensão. Muitas vezes, os enunciados
encontrados são vagos, como “impactos sobre a fauna” ou “impactos sobre o solo” -
embora termos similares possam ser discutidos com clareza e detalhe em textos expli­
cativos; enunciados mais precisos possibilitam uma comunicação mais eficaz com os
leitores do EIA e até mesmo entre os próprios membros da equipe multidisciplinar. 0
seguinte exemplo ilustra um detalhamento de impactos sobre o patrimônio arqueológico,
feito para um estudo de impacto de uma usina hidrelétrica:
destruição de acampamentos e aldeias pré-coloniais;
* destruição de oficinas líticas pré-coloniais;
# soterramento de vestígios arqueológicos;
submersão de sítios arqueológicos;
erosão e dispersão de vestígios arqueológicos;
3CNEC - Consórcio # descaracterização do entorno dos sítios arqueológicos3.
Nacional dc
Engenheiros Esse conjunto de enunciados transm ite ao leitor um a informação muito mais precisa
Consultores
do que simplesmente “impactos sobre o patrimônio arqueológico”, mesmo que não se
EIA da Usina
Hidrelétrica Piraju, tenha conhecimento sobre a disciplina científica.
preparado para
a Companhia Claro que tal detalhamento somente é possível em etapas mais avançadas da prepa­
Brasileira de ração de um EIA, quando já tenha sido concluído o diagnóstico ambiental. Durante
Alumínio, 1998. a identificação preliminar dos impactos prováveis, que é feita para o planejamento
de um estudo ambiental, pode-se nem mesmo saber com certeza se há ou não sítios
arqueológicos na área de influência do empreendimento. Por isso trata-se, nesta fase
dos trabalhos, da identificação preliminar, conforme a Fig. 7.1. Somente depois de
feitos os estudos de base, esses impactos podem ser confirmados (em muitos casos
somente se pode reduzir a margem de incerteza sobre os impactos previstos). Pos­
teriormente, na etapa de análise dos impactos, a identificação preliminar é revista,
com eventual acréscimo de novos impactos ou descarte de impactos sobre os quais
não foram coletadas evidências suficientes de que possam ocorrer, ou que sejam cla­
ramente irrelevantes.

A identificação de impactos faz-se, portanto, por aproximações sucessivas, e os enun­


ciados (hipóteses) podem ser revistos pela equipe a cada vez que houver um a nova
evidência sobre a natureza de cada impacto ou nova informação sobre o diagnóstico
ambiental. Assim, vai-se refinando a identificação ao mesmo tempo em que se avan­
ça no diagnóstico ambiental e mesmo na própria análise dos impactos. Os enunciados
podem se tornar mais precisos e se desdobrar em enunciados de detalhe (como no
exemplo acima sobre os impactos arqueológicos). Interagindo com a comunidade —
mesmo por meio de conversas informais - pode-se detectar novos impactos antes
insuspeitos (porém, se serão ou não significativos será motivo de análise posterior).

Nesse processo, vão surgindo peculiaridades locais que poderiam não ter ficado
evidentes durante a identificação preliminar. Por exemplo, em um a região carbonífera

CAPITU
I d e n t i f i c a ç ã o de I m p a ^ 193

no sul da França, em que, após mais de um século de m ineração subterrânea, u m a


m ina seria fechada, a em presa estatal detentora das concessões apresentou um projeto
de prolongam ento da vida útil que previa a lavra a céu aberto de cam adas superficiais
de carvão. 0 uso do solo e a econom ia da zona hav iam sido largam ente d e te rm in a ­
dos pela história recente, e a paisagem apresentava um mosaico de vilas operárias,
pequenas propriedades agrícolas e instalações in d u striais que seriam afetados pela
alternativa escolhida. A lg u n s dos im pactos socioeconômicos identificados no EIA
(Houillères de Bassin du Centre et du Midi/Houilères dA quitaine, Étude d’Impaet,
Exploitation p ar Grandes Découvertes des Stots de C arm aux, 1982) foram:
» m anutenção de empregos industriais;
# interrupção de cam inhos rurais;
interrupção de canalizações de suprimento de água;
# ocupação de propriedades agrícolas;
% deslocamento forçado de pessoas;
% impacto visual;
# modificação do microclima.

Este último impacto decorre do efeito de sombra devido à construção de pilha de estéreis
(rochas que não contêm carvão), com conseqüências para a agricultura, j á que na lati­
tude de 44°, a b aixa altura do sol sobre 0 horizonte durante os meses de inverno reduz
a insolação dos terrenos agrícolas, que passariam a ficar situados na sombra da pilha.
Neste caso, 0 EIA concluiu que culturas situadas a menos de 70 m da borda da pilha
poderiam ter perda de rendim ento devido à sombra, pela menor tem peratura e maior
ocorrência de geadas decorrentes (esse é um exemplo de previsão da m agnitude de um
impacto e tam bém de determ inação de área de influência do mesmo).

0 exem plo ilu stra que, ao se identificar os im pactos prováveis de um projeto, é


preciso ir além de um p e n sa m e n to conv encion al e de m a n e ira a lg u m a se lim ita r
a com pilar listas de tipos genéricos de im pactos ex iste n te s na lite ra tu ra ou em
outros estudos, que podem não refletir a im p o rtâ n c ia que local ou reg io n alm en te
se atrib ui a d ete rm in ad o s elem entos do am biente (os com ponentes v alorizados do
ecossistema). A im p o rtâ n c ia de tais elem entos am b ien tais é um fator que deve ser
ievado em conta na identificação de im pactos, como é 0 caso da p aisag em que, nos
estudos de im pacto franceses e de outros países europeus, u su a lm e n te têm lu g a r de
destaque (Figs. 8.5 e 8.6).

Um exemplo de lista genérica de impactos é mostrado no Quadro 8.6, que apresenta


os principais impactos am bientais decorrentes da im plantação e operação de linhas
de transm issão de energia elétrica. Ali estão tam bém descritas algum as ações tipi­
cam ente realizadas p ara esse tipo de em preendim ento, ao lado de diversos impactos
encontrados com frequência. 0 quadro não mostra, porém, n e n h u m a correlação entre
as ações e os impactos. Embora 0 leitor possa, com relativa facilidade, associar ações e
impactos, essa tarefa deveria ser executada pelo an alista de impactos, que desta forma
poderia m ostrar como chegou às suas conclusões sobre os prováveis impactos.

A relação de todos os impactos identificados no estudo relativo ao projeto de captação


de águas do rio São Francisco e transferência para outras bacias hidrográficas, p ro ­
jeto conhecido como “transposição do rio São Francisco”, é m ostrada no Quadro 8.7.

0 TO
ação de Impacto A m biental: conceitos e métodos

Dos 44 impactos identificados, 23 foram


considerados como “de maior relevância”, e
destes, onze são positivos e doze negativos.
0 projeto pretende captar 63,5 m 3/s de água
do rio (cerca de 3,5°/o da vazão disponível)
e transferi-la para outras bacias situa­
das nos Estados de Pernambuco, Paraíba,
Rio Grande do Norte e Ceará, por de
um sistema de canais, estações de bom-
beamento, pequenos reservatórios e
pequenas usinas hidrelétricas (Ecology
Brasil/Agrar/JP Meio Ambiente, Rima do
Projeto de Integração do Rio São Francisco
com Bacias Hidrográficas do Nordeste
Setentrional, preparado para o Ministério
Fig. 8.5 Na cidade costeira de Luanco, Astúrias, Espanha, a regularidade e da Integração Nacional, 2004).
o padrão repetitivo de um em preendim ento habitacional contrasta com o
p a trim ônio histórico e a arquitetura vernacular dom inante no local (visível A descrição de impactos biofísicos e an-
na foto abaixo), um exemplo de im pacto visual significativo
trópicos de uma atividade realizada em
ambiente m arinho é ilustrada pela relação
de impactos de um projeto de produção
de petróleo e gás no campo de Albacora
Leste, situado ao largo do Estado do Rio
de Janeiro, em profundidades que variam
de 800 a 2.000 m (Quadro 8.8). Neste
caso, os enunciados indicam a principal
causa de cada impacto, podendo-se notar
que certas atividades ocasionam mais de
um impacto, como o “lançamento ao mar
da água produzida”.

Para identificar os impactos, as rela­


ções de causa e conseqüência podem ou
não ser descritas com a explicitação dos
mecanismos ou processos que as unem.
Enquanto alguns analistas ambientais
Fig. 8.6 Centro histórico de Luanco, com seu pequeno p o rto pesqueiro, ca- preferem descrever um a relação como
sas com balcões e igreja do século XVIII atividade-aspecto-impacto ambiental, em
muitos estudos ambientais é usada so­
mente a categoria de impacto ambiental.
Porém, para avaliar um novo empreendimento de um a empresa que já disponha de
um sistema de gestão ambiental, é útil seguir um procedimento que permita, já desde
a preparação do EIA, identificar aspectos e impactos ambientais. Assim, o EIA poderá
também ter utilidade no planejamento do SGA do novo empreendimento, um a vez
que a etapa inicial - a identificação dos aspectos e impactos - já terá sido feita. (E, da
mesma forma, os planos de gestão propostos no EIA poderão ser compatíveis com os
programas de gestão, objetivos e metas estabelecidos em decorrência do SGA.)

CAPÍTU LO
I d e n t if ic a ç ã o de I m p a 195

Q u a d r o 8 . 6 P rin c ip a is a tiv id a d e s na im p la n ta ç ã o e o p e ra çã o de u m a lin h a de tra n sm issã o de e n e rg ia e seus p rin c ip a is


a spe cto s e im p a c to s a m b ie n ta is
P r in c ip a is ações P r in c ip a is a s p e c t o s e im p a c t o s

Serviços de topografia Aumento da erosão


Abertura de estradas de acesso e serviço Modificação do escoamento superficial da água em áreas de
estradas e torres
Investigações geológico-geotécnicas dos Perda e modificação de hábitats da vida selvagem
locais de construcão das torres
D

Contratação de serviços e mão de obra para Interferência com a produção agropecuária


construção
Remoção da vegetação Emissão de ruído
Transporte das torres, cabos e demais Emissão de gases, material particulado e compostos orgânicos
componentes voláteis
Execução das fundações e obras de Dispersão de agroquímicos
estabilização de taludes e drenagens
Montagem das estruturas metálicas Geração de resíduos sólidos (embalagens, bobinas, latas e restos
de tintas e solventes etc.)
Lançamento dos cabos e instalação Geração de campos eletromagnéticos
dos componentes
Transmissão de energia Riscos para a saúde humana
Inspeções Riscos à segurança das pessoas e dos bens econômicos
Manutenção da linha Facilidade de acesso através das estradas de serviço
Manutenção das torres
Manutenção da faixa desmatada Valorização/desvalorização de imóveis
Manutenção da estrada de serviço Impacto visual

Q u a d r o 8 .7 Im p a c to s a m b ie n ta is id e n tific a d o s p a ra o p ro je to de tra n s p o s iç ã o das ág uas do rio São F rancisco


Impactos Fase Fa s e Fa s e
planejam ento construção operação

In tro d u ç ã o de tensões e riscos s o cíb is d u ra n te a c o n s tru ç ã o


R u p tu ra de re la çõ e s s o c io c o m u n itá ria s d u ra n te a fase de o b ra
P o ssib ilid a d e de in te rfe rê n c ia com p o p u la ç õ e s in d íg e n a s
Risco de acidentes com a população
Aumento das emissões de poeira
Aumento e/ou aparecimento de doenças
Aumento da demanda por infraestrutura de saúde
ràfe
perda de terras potencialmente agricultáveis 1:;gi'

°erda te m p o rá ria de em p re g o s e re n d a p o r e fe ito das d e sa p ro p ria çõ e s - -


,

interferências com áreas de processos minerários


G eração de e m p re g o s e re n d a d u ra n te a im p la n ta ç ã o
D in a m iz a ç ã o da e c o n o m ia re g io n a l
Jressão so b re a in fra e s tru tu ra u rb a n a
nspeculação imobil. nas várzeas potencialmente irrigáveis no entorno dos canais
' SCO de in te rfe rê n c ia com o p a trim ô n io c u ltu ra l
-u m e n to da o fe rta e da g a ra n tia h íd ric a
A u m e n to da o fe rta de á g u a p a ra a b a s te c im e n to u rb a n o
^oastecimento de água das populações rurais
.
z e d u çõ o da e xp o siçã o da p o p u la ç ã o a s itu a ç õ e s e m e rg e n c ia is de seca

OüTO
ação de Im pacto A m b ie n ta l: conceitos e m étodos

: - Z7GS Fa s e Fase Fa s e

PLANEJAMENTO CONSTRUÇÃO OPERAÇÃO

D in a m iz a ç ã o da a tiv id a d e a g ríc o la e in c o rp o ra ç ã o de n o va s te rra s a o p ro ce sso


p ro d u tiv o
D im in u iç ã o do ê x o d o r u r a l e d a e m ig ra ç ã o da re g iã o
R e d u çã o da e x p o s iç ã o da p o p u la ç ã o a d o e n ç a s e ó b ito s

R e d u çã o d a p re ssã o s o b re a in fr a e s tr u tu r a de sa ú d e
Perda e fra g m e n ta ç ã o de c e rc a de 4 3 0 h a de á re a s co m v e g e ta ç ã o n a tiv a e de
h á b ita ts d a fa u n a te rre s tre
D im in u iç ã o da d iv e rs id a d e da fa u n a te rre s tre
A u m e n t o das a tiv id a d e s de caça e d im in u iç ã o das p o p u la ç õ e s das espécies
c in e g é tic a s
M o d ific a ç ã o d a c o m p o s iç ã o das c o m u n id a d e s b io ló g ic a s a q u á tic a s n a tiv a s
na s b a c ia s re c e p to ra s
R isco de re d u ç ã o d a b io d iv e rs id a d e das c o m u n id a d e s b io ló g ic a s a q u á tic a s
n a tiv a s n a s b a c ia s re c e p to ra s
C o m p r o m e t im e n t o do c o n h e c im e n t o da h is tó ria b io g e o g rá fic a dos g ru p o s
b io ló g ic o s a q u á tic o s n a tiv o s
R isco de in tro d u ç ã o de espécies de p e ix e s p o te n c ia lm e n te d a n in h a s ao h o m e m
n a s b a c ia s re c e p to ra s v
In te rfe rê n c ia s o b re a p e sca n o s a çu d e s re c e p to re s
Risco de p r o life ra ç ã o de v e to re s
O c o rrê n c ia de a c id e n te s c o m a n im a is p e ç o n h e n to s
In s ta b iliz a ç ã o de e n c o s ta s m a r g in a is dos c o rp o s d 'á g u a
In ício ou a c e le ra ç ã o de processos erosivos e c a r r e a m e n to de s e d im e n to s
M o d ific a ç ã o do re g im e flu v ia l da s d re n a g e n s re c e p to ra s
A lte r a ç ã o do c o m p o r t a m e n t o h id r o s s e d im e n to ló g ic o dos c o rp o s d 'á g u a
Risco de e u tr o fiz a ç ã o dos n o vo s re s e rv a tó rio s
M e lh o ria da q u a lid a d e d a á g u a n a s b a c ia s re c e p to ra s
A u m e n t o da recarga flu v ia l dos a q ü ífe ro s
In ício ou a c e le ra ç ã o dos processos de d e s e rtific a ç ã o
M o d if ic a ç ã o do re g im e f lu v ia l do rio São Francisco
R edu ção da g e ra ç ã o de e n e rg ia e lé tric a no rio São Francisco
D im in u iç ã o de re ce ita s m u n ic ip a is
N o ta : Os im p a c to s m ais re le va n te s estão em itá lic o . F onte: a d a p ta d o de E co lo g y B rasil, A grar, JP M e io A m b ie n te , R im a P ro je to de
In te g ra ç ã o do Rio São Francisco com B acias F lid ro g rá fic a s do N o rd e ste S e te n trio n a l, 2 0 0 4 .

Não existe um a única m aneira de identificar ou a n a lisa r impactos, mas múltiplas


formas, e cabe a cada equipe de an alistas definir seus métodos de trabalho. Na seção
8.5 são apresentadas algum as ferram entas em pregadas para facilitar o trabalho de
identificar impactos, a saber, listas de verificação, redes de interação e diferentes
tipos de matrizes.

8 .4 I m p a c t o s c u m u l a t iv o s
Impactos cum ulativos ou acum ulativos são aqueles que se acum ulam no tempo
ou no espaço, resultando de um a combinação de efeitos decorrentes de um a ou
diversas ações. Uma série de impactos insignificantes pode resultar em significativa
degradação ambiental se concentrados espacialmente ou caso se sucedam no tempo.

capítu!!9 H IIIH [H ÍH |
Identificação de I mpa

Q u a d r o 8 . 8 Im p a c to s a m b ie n ta is de u m p ro je to de p ro d u ç ã o de p e tró le o e g á s n a p la ta fo rm a c o n tin e n ta l
Im pacto s s o b r e o m e io f ís ic o - b ió t ic o

A lte r a ç ã o dos níveis de tu r b id e z da água, em d e c o rrê n c ia da in s ta la ç ã o do s is te m a s u b m a r in o da a tiv id a d e de


p ro d u ç ã o
M o r te dos o rg a n is m o s b e n tô n ic o s , em d e c o rrê n c ia da in s ta la ç ã o do s is te m a s u b m a r in o da a tiv id a d e de p r o c m ã :
In tro d u ç ã o de espécies e x ó tic a s via á g ua de lastro, em d e c o rrê n c ia do c o m is s io n a m e n to da UEP FPSO P -5 0
A lte r a ç ã o da b io ta m a rin h a , sob in flu ê n c ia da presença física do s is te m a de p ro d u ç ã o
A lte ra ç ã o da b io ta m a rin h a , a p a r t ir da d e s a tiv a ç ã o da a tiv id a d e de p ro d u ç ã o
A lte r a ç ã o dos níveis de n u tr ie n te s e de tu r b id e z na c o lu n a cTágua, em d e c o rrê n c ia do la n ç a m e n to ao m a r dos
e flu e n te s g e ra d o s na FPSO P -5 0
A lte r a ç ã o da b io ta m a rin h a , em d e c o rrê n c ia do la n ç a m e n to ao m a r dos e flu e n te s ge ra dos na FPSO P -5 0
A lte r a ç ã o da q u a lid a d e da água, em d e c o rrê n c ia do la n ç a m e n to ao m a r da água p ro d u z id a
A lte r a ç ã o da b io ta m a rin h a , em d e c o rrê n c ia do la n ç a m e n to ao m a r da água p ro d u z id a (m o rte de o rg a n is m o s
p la n c tô n ic o s )
A lte ra ç ã o da q u a lid a d e do ar, em d e c o rrê n c ia da em issão de p o lu e n te s gasosos
Impactos s o b r e o m e io s o c io e c o n ô m ic o

G eração de c o n f lito s e n tre a tiv id a d e s , d e c o rre n te da c ria ç ã o da zona de s e g u ra n ç a no e n to r n o do FPSO


G eração de em preg os, p o r m e io da d e m a n d a de m ã o de obra
G eração de t r ib u t o s e in c r e m e n to das e c o n o m ia s local, e s ta d u a l e n a c io n a l, em d e c o rrê n c ia da a tiv id a d e de
in s ta la ç ã o do s is te m a de p ro d u ç ã o
A u m e n t o da d e m a n d a sobre a a tiv id a d e de c o m é r c io e serviços, em d e c o rrê n c ia da a tiv id a d e de in s ta la ç ã o do
s is te m a de p ro d u ç ã o
Pressão sobre os trá fe g o s m a r ítim o , aéreo e ro d o v iá rio , d e c o rre n te das a tiv id a d e s de p ro d u ç ã o de óleo e gás
Pressão sobre a in fr a e s tr u tu r a p o rtu á ria , de tra n s p o r te s ro d o v iá rio e m a r ítim o , c o m a u m e n t o da d e m a n d a da
'•d ú s tria naval e d in a m iz a ç ã o do s e to r aéreo d e c o rre n te s das a tiv id a d e s de p ro d u ç ã o de óleo e gás
A u m e n t o da p ro d u ç ã o de h id r o c a r b o n e to s d e c o rre n te das a tiv id a d e s de p ro d u ç ã o de óleo e gás
Geração de ro y a ltie s e d in a m iz a ç ã o da e c o n o m ia d e c o rre n te s das a tiv id a d e s de p ro d u ç ã o de ó le o e gás
A u m e n to do c o n h e c im e n t o t é e n ic o - e ie n tí f ie o e f o r t a le c im e n t o da in d ú s tria p e tro lífe ra d e c o rre n te das a tiv id a d e s
de p ro d u ç ã o de ó le o e gás %
Geração de e x p e c ta tiv a s d e c o rre n te s das a tiv id a d e s de p ro d u ç ã o de ó le o e gás
-m s s ã o sobre a in fr a e s tr u tu r a de d isp o s iç ã o f in a l de resíduos s ó lid o s e oleosos_______________________________________
Gonfe; H a b te c E ngenharia A m b ie n ta l, R im a FPSO P -5 0 . A tiv id a d e de P rodução e E scoam ento de P etró leo e Gás N a tu ra l. Campo ce
A Jbacora Leste, 200 2.

Assim, se esgotos de um a residência forem lançados in natura em um córrego, suas


conseqüências podem nem ser mensuráveis, mas se muitas residências procederem
da mesma forma, certam ente a qualidade das águas ficará sensivelmente degradada.
G corte de vegetação ripária em um a pequena propriedade rural pode não ter efeitos
mensuráveis sobre o ecossistema aquático, mas se essa vegetação for elim inada de
toda um a bacia hidrográfica, não há dúvidas sobre seus efeitos deletérios. Pequenos
empreendimentos turísticos, como pousadas e restaurantes, e pequenas obras de
infraestrutura u rb an a individualm ente podem ter impacto pouco relevante, mas so­
mados e concentrados em um a área modificam paisagens, qualidade das águas e a
cultura local (Fig. 8.7).

Tradicionalmente, a AIA não se ocupa de impactos insignificantes ou de baixa signi-


mcância, tampouco de ações que, tomadas individualmente, ten h am baixo potencial
ie causar impactos significativos, pois tais situações são tratadas por outros in stru ­
mentos de planejamento e gestão ambiental, como o zoneamento de uso do solo,
I dentificação de I mpa

Q u a d r o 8 . 8 Im p a c to s a m b ie n ta is de um p ro je to de p ro d u ç ã o de p e tró le o e gá s n a p la ta fo rm a c o n tin e n ta l
Im pacto s s o b r e o m e io f ís ic o - b ió t ic o

A lte r a ç ã o dos níveis de tu r b id e z da água, em d e c o rrê n c ia da in s ta la ç ã o do s is te m a s u b m a r in o da a tiv id a d e de


p ro d u ç ã o
M o r t e dos o rg a n is m o s b e n tô n ic o s , em d e c o rrê n c ia da in s ta la ç ã o do s is te m a s u b m a r in o da a tiv id a d e de p r o d u ç ã :
In tro d u ç ã o de espécies e x ó tic a s via ág u a de lastro, em d e c o rrê n c ia do c o m is s io n a m e n to da UEP FPSO P -5 0
A lte r a ç ã o da b io ta m a rin h a , sob in flu ê n c ia da presença física do s is te m a de p ro d u ç ã o
A lte r a ç ã o da b io ta m a rin h a , a p a r t ir da d e s a tiv a ç ã o da a tiv id a d e de p ro d u ç ã o
A lte r a ç ã o dos níveis de n u tr ie n te s e de tu r b id e z na c o lu n a d 'á g u a , em d e c o rrê n c ia do la n ç a m e n to ao m a r dos
e flu e n te s g e ra d o s na FPSO P -5 0
A lte r a ç ã o da b io ta m a rin h a , em d e c o rrê n c ia do la n ç a m e n to ao m a r dos e flu e n te s ge ra d o s na FPSO P -5 0
A lte r a ç ã o da q u a lid a d e da água, em d e c o rrê n c ia do la n ç a m e n to ao m a r da água p ro d u z id a
A lte r a ç ã o da b io ta m a rin h a , em d e c o rrê n c ia do la n ç a m e n to ao m a r da água p ro d u z id a ( m o rte de o rg a n is m o s
p la n c tô n ic o s )
A lte r a ç ã o da q u a lid a d e do ar, em d e c o rrê n c ia da em issão de p o lu e n te s gasosos
Impactos s o b r e o m e io s o c io e c o n ô m ic o

G eração de c o n f lito s e n tre a tiv id a d e s , d e c o rre n te da c ria ç ã o da zona de s e g u ra n ç a no e n to r n o do FPSO


G eração de em preg os, p o r m e io da d e m a n d a de m ã o de obra
G eração de t r ib u t o s e in c r e m e n to das e c o n o m ia s local, e s ta d u a l e n a c io n a l, em d e c o rrê n c ia da a tiv id a d e de
in s ta la ç ã o do sis te m a de p ro d u ç ã o
A u m e n to da d e m a n d a sobre a a tiv id a d e de c o m é r c io e serviços, em d e c o rrê n c ia da a tiv id a d e de in s ta la ç ã o do
sis te m a de p ro d u ç ã o
Pressão sobre os trá fe g o s m a r ítim o , aéreo e ro d o v iá rio , d e c o rre n te das a tiv id a d e s de p ro d u ç ã o de ó le o e gás
Dressão sobre a in fr a e s t r u t u r a p o rtu á ria , de tra n s p o r te s ro d o v iá rio e m a r ítim o , c o m a u m e n to da d e m a n d a da
in d ú s tria naval e d in a m iz a ç ã o do s e to r aéreo d e c o rre n te s das a tiv id a d e s de p ro d u ç ã o de óleo e gás
A u m e n t o da p ro d u ç ã o de h id r o c a r b o n e to s d e c o rre n te das a tiv id a d e s de p ro d u ç ã o de óleo e gás
3 e ra ç ã o de ro y a ltie s e d in a m iz a ç ã o da e c o n o m ia d e c o rre n te s das a tiv id a d e s de p ro d u ç ã o de ó le o e gás
A u m e n to do c o n h e c im e n t o t é c n ic o - c ie n t í f ic o e f o r t a le c im e n t o da in d ú s tria p e tro lífe ra d e c o rre n te das a tiv id a d e s
de p ro d u ç ã o de ó le o e gás %
3e ra çã o de e x p e c ta tiv a s d e c o rre n te s das a tiv id a d e s de p ro d u ç ã o de ó le o e gás
~ressão sobre a in fr a e s t r u t u r a de d isp o s iç ã o fin a l de resíduos s ó lid o s e oleosos_______________________________________
zonte: H a b te c E ngenharia A m b ie n ta l, R im a FPSO P -5 0 . A tiv id a d e de P rodução e E scoam ento de P etró leo e Gás N a tu ra l. Campo ce
-Jbacora Leste, 20 0 2 .

Assim, se esgotos de um a residência forem lançados in natura em um córrego, suas


conseqüências podem nem ser mensuráveis, mas se muitas residências procederem
í a mesma forma, certam ente a qualidade das águas ficará sensivelmente degradada.
O corte de vegetação ripária em um a pequena propriedade rural pode não ter efeitos
mensuráveis sobre o ecossistema aquático, mas se essa vegetação for elim inada de
roda um a bacia hidrográfica, não há dúvidas sobre seus efeitos deletérios. Pequenos
empreendimentos turísticos, como pousadas e restaurantes, e pequenas obras de
m rraestrutura u rb an a individualm ente podem ter impacto pouco relevante, mas so­
mados e concentrados em um a área modificam paisagens, qualidade das águas e a
cultura local (Fig. 8.7).

Tradicionalmente, a AIA não se ocupa de impactos insignificantes ou de baixa signi-


-íeáncia, tampouco de ações que, tomadas individualmente, tenham baixo potencial
ze causar impactos significativos, pois tais situações são tratadas por outros in stru ­
mentos de planejamento e gestão ambiental, como o zoneamento de uso do solo,

0
liação de Im pacto A m b ie n ta l: conceitos e m étodos

o licenciamento convencional e a obri­


gatoriedade de atendim ento a norm as e
padrões (conforme Cap. 5, em particular,
Fig. 5.10). Mas para projetos sujeitos à
preparação de um estudo ambiental, a
consideração de impactos cum ulativos
pode ser crucial para bem fu n d a m e n ­
ta r um a decisão. Nos Estados Unidos,
a Lei da Á gua Limpa (Clean Water Act)
requer explicitam ente que a E nviron­
mental Protection A gency considere os
impactos cum ulativos quando a n a li­
sa pedidos individuais de descarga de
m ateriais dragados ou de execução de
Fig. 8.7 A o P h a n g -N g a , T ailândia, re g iã o com g ra n d e c o n c e n tra ç ã o de aterros em ambientes aquáticos ou á re ­
e m p re e n d im e n to s tu rís tic o s que, ju n to s , causam im p a c to s c u m u la tiv o s as úm idas (Leibowitz et al., 1992). Para
re le va n te s exemplificar o problema de que “m uitas”
pequenas ações, que individualm ente
s
têm impacto desprezível, podem ju n ta s causar impactos significativos, considere-se o
dado apresentado por Abbruzese e Leibowitz (1997, p. 458): um a ú nica agência fede­
ral, o Corpo de Engenheiros do Exército, recebe nada menos que 62 mil solicitações
anuais para intervenções físicas em ambientes aquáticos.

A Resolução Conama 1/86 determ ina que a análise dos impactos inclua suas “proprie­
dades cum ulativas e sinérgicas” (Art. 6o, II). A consideração dos impactos cum ulativos
tam bém é requerida pelas regulam entações am ericana e canadense, entre outras. 0
regulam ento da Nepa define impacto cum ulativo como

[...] o impacto que resulta do impacto incrementai da ação [em análise] quando
acrescida de outras ações passadas e presentes e de ações futuras razoavelmente
previsíveis, independentemente de qual agência (Federal ou não) ou pessoa
execute tais ações. Impactos cumulativos podem resultar de ações individual­
mente pequenas, mas coletivamente significativas que ocorram em um período de
tempo [Seção 1508.7].

Por sua vez, a lei canadense de avaliação am biental estabelece que os estudos
am bientais devem considerar:

a) os efeitos ambientais do projeto, incluindo aqueles causados por acidentes ou


disfunções e quaisquer efeitos cumulativos que possam resultar do projeto, com­
binados com outras atividades existentes ou com a realização futura de outros
projetos ou atividades [Art. 16(1) (a)].

Quando o poder decisório reside no mesmo organism o responsável pelo processo de


AIA, como ocorre nos Estados Unidos, a consideração de “outras ações presentes” e
de “ações futuras razoavelm ente previsíveis” pode, em boa parte, estar sob seu
controle. Mas em sistemas de AIA como o brasileiro, em que o proponente do projeto
prepara o seu EIA (ou contrata serviços sob seu controle), as informações sobre essas
outras ações podem simplesmente ser inacessíveis.

capítuI sH ^H H H H I
I dentificação de I mpa

As conseqüências de ações passadas podem, até certo ponto, ser detectadas por meio
dos estudos de base (que descrevem a situação am biental no m omento de preparação
do EIA), assim como aquelas decorrentes de “outras ações presentes”, mas “ações
f u tu r a s ” são raram en te do conhecim ento do proponente de um projeto privado,
em bora possam ser do conhecim ento do órgão am biental, caso este ten h a recebido
pedidos de licenciam ento de outros projetos situados na mesma área. Assim, em 2002,
o D epartam ento de Avaliação de Impacto A m biental (Daia), da Secretaria do Meio
Am biente do Estado de São Paulo, tin h a em análise, ou recentem ente licenciados,
nada m enos que dezessete em preendim entos localizados na área do porto de Santos,
a m aioria de novos term in a is de cargas. Por ser o único órgão que d isp u n h a de tal
inform ação, som ente o Daia poderia fazer algum a análise que levasse em conta o
acúm ulo de impactos.

Mesmo as co n seq ü ên cias das ações p assad as e presentes sobre a qualidade atu al do
am biente não são u su a lm e n te consideradas nos EIAs, cujos d iag n ó stico s ten dem a
ser descritivos e ra ra m e n te a n a lis a m com alg u m a p ro fu n d id a d e os processos que
le v a ra m à situação neles descrita. McCold e S a u lsb u ry (1996, p. 767) a rg u m e n ta m
que “u s a r o am biente a tu a l como lin h a de base não é apropriado p a ra a avaliação de
im pactos cu m u lativ o s, porque os efeitos das ações p assad as e p resentes são vistos
como p a rte das condições ex isten tes e não como fatores que c o n trib u íra m p a ra
im pactos c u m u la tiv o s”.

No Canadá, a insuficiente consideração de im pactos cum ulativos j á m otivou de­


cisões ju d ic ia is de suspensão de licenças am bientais, como ocorreu em 1998 com
o projeto da m in a de carv ão Cheviot, na província de A lberta, ocasião em que o
ju iz determ inou que o EIA fosse refeito e que nova consulta pública fosse p ro m o ­
vida (Kennet, 1999, p. 7). T ratam ento insuficiente dos im pactos cu m ulativ os é u m a
deficiência com um dos estudos de im pacto am biental. Uma am o stra de cin q ü e n ­
ta EIAs preparados no Reino Unido foi an alisad a por Cooper e Sheate (2002), que
co n stataram que, em bora 48% deles m encionassem o term o “im pactos ou efeitos
cu m u lativ o s”, som ente 18% tra z ia m u m a discussão desses impactos, en q u an to “co n ­
sideração e avaliação sistem áticas de efeitos cum ulativos foram en co n trad as som ente
em três EIAs” (p. 432). No Canadá, Baxter, Ross e Spaling (2001) advogam que “um a
estratégia d istin ta de estudos” (p. 255) é necessária p ara um tratam en to adequado
dos im pactos cum ulativos. Em doze casos analisados por esses autores, som ente um
EIA de u m a b arrag em foi guiado por term os de referência separados para a análise
dos im pactos cum ulativos. Nesse caso, os lim ites da área de estudo foram estabele­
cidos “explicitam ente considerando os efeitos c u m u lativ o s” (p. 262). Adem ais, “um a
série de reuniões de trab alh o foi realizada para identificar todas as dem ais ativ i­
dades h u m a n a s na área, p ara c a rac te riz ar os efeitos cum ulativos potenciais, para
identificar os com ponentes valorizados do ecossistem a sobre os quais poderiam se
m an ifesta r os efeitos cum ulativos e para desenvolver u m a estratégia para a n a lis a r
os problem as p oten ciais” (p. 255).

Tais deficiências decorrem de duas ordens de causas: (i) dificuldade ou mesmo


impossibilidade de obter inform ação sobre outros projetos presentes e, ainda mais,
sobre projetos futuros; (ii) problem as de planejam ento e condução dos estudos
ambientais. 0 prim eiro grupo de causas diz respeito a questões de ordem in stitu -

TO
I
liação de Im pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

cional ou mesmo legal (acesso a informação de agentes privados), o que leva autores
como Kennet (2000) a argum entar que há limites inerentes ao processo de AIA no
que tange ao tratam ento de impactos cumulativos, e que um a gestão efetiva de efeitos
cumulativos deve ir além do “paradigma da avaliação ambiental” e avançar para o
campo da regulação do uso do solo e da gestão integrada de recursos. Já o segundo
tipo de problemas pode ser resolvido ou minimizado se a identificação de impactos
cumulativos for vista como um a necessidade durante a etapa de identificação de im­
pactos potenciais de um projeto. Smith e Spaling (1995, p. 82) sugerem que os métodos
de avaliação de impactos cumulativos geralmente sigam um modelo causai que con­
siste de três componentes:
# identificação de fontes de mudanças ambientais cumulativas, que podem ser
distintos tipos de atividades;
# identificação dos caminhos ou processos de acumulação, considerando que
m udanças ambientais acum ulam -se no tempo e no espaço de modo aditivo
ou interativo;
# desenvolvimento de uma tipologia de efeitos cumulativos, considerando que as
mudanças podem ser diferenciadas, em geral de acordo com atributos temporais
ou espaciais. v

Esse esquema não difere, em essência, dos procedimentos que podem ser usados
para identificar impactos ambientais, independentemente de sua cumulaíividade,
conforme será visto na seção seguinte. Cumulatividade e sinergismo referem-se,
respectivamente, à possibilidade de os impactos se somarem ou se multiplicarem.
Para McDonald (2000, p. 299), o caráter aditivo ou cumulativo dos impactos ambien­
tais é bem mais comum que o sinergístico; este ocorre quando a ação combinada de
substâncias químicas é maior que a soma dos efeitos individuais, sobre os seres vivos,
dessas substâncias (Moreira, 1992), embora “respostas não-lineares” também possam
ser vistas como um tipo de sinergismo4.
4Segundo McDonald
(2000), o aum ento
da carga de
Uma maneira prática de identificar impactos cumulativos é ordenar uma relação de
sedim entos em rios projetos localizados como exemplificado no Quadro 8.9. É preciso definir, de antemão,
situados em regiões qual a área de abrangência do estudo para que se possa identificar outras atividades
de clima temperado ou projetos cujos impactos possam se acumular aos impactos do projeto em análise.
pode resultar em Esse recorte espacial poderá ser diferente para distintos tipos de impactos.
efeitos deletérios
sobre a população
de peixes que não 8 .5 F e r r a m e n t a s —
são associados de Induzir e/ou deduzir quais serão as conseqüências de uma determinada ação é um a
modo linear à carga das primeiras tarefas do analista ambiental. Felizmente isso pode ser feito a partir de
de sedimentos. Ou
um certo patamar, pois a equipe multidisciplinar pode contar com conhecimento já
seja, ao se buscar
correlacionar a acumulado e sistematizado, assim como buscar analogias em casos similares.
carga de sedim entos
com a população de Há diversos tipos de ferramentas utilizáveis para auxiliar uma equipe na tarefa de
determ inada espécie, identificar os impactos ambientais. Tais instrumentos foram desenvolvidos para
os estoques podem
facilitar o trabalho dos analistas, mas não se trata de “pacotes” acabados. São, na
d im in u ir mais
rapidam ente do que verdade, métodos de trabalho cuja aplicação demanda (i) um razoável domínio dos
o incremento da conceitos subjacentes; (ii) um a compreensão detalhada do projeto analisado e de todos
carga de sedimentos. os seus componentes; e (iii) um razoável entendimento da dinâmica socioambiental

CAPÍTUÍ LO
IDENTIFICAÇÃO DE i M P A l f i M 201

Q u ad ro 8.9 M a triz de im p a cto s cu m u la tivo s


T ip o de Im pacto I n f l u ê n c ia E f e it o C a r a c t e r ís t ic a s
im p a c t o do pro jeto ? PERSISTENTE O utr as aç õ e s presentes e fu tu r as CUMULATIVO
DE AÇÕES POTENCIAL?
PASSADAS? PROJETO A projeto B PROJETO C

Im p a c to 1
Im p a c to 2 S im S im In d ú s tria de C a n a v ia l R o d o via S im Impacto potencial­
degradação direto, outras fe r tiliz a n te s queimadas emissões aumento mente significativo
da qualidade negativo, fontes emissões duas vezes de NOx, das emissões Estudo requer
do ar significativo industriais de F, S02, ao ano CO, HC, de NOx, MP modelagem de
e atividade MP emissões de S02, MP dispersão
agrícola MP, CO,
NOx
Im p a c to n
Fonte: m odificado de Senner e t al. (2002).

do local ou região potencialm ente afetada. Dito de outra forma, para um a boa iden­
tificação de impactos é necessário que haja colaboração entre os membros de um a
equipe m ultidisciplinar que inclua cientistas naturais e sociais, assim como enge­
nheiros ou outros técnicos que tenham um bom conhecimento do projeto ou do tip.o
de empreendimento analisado.

L is t a s de v e r if ic a ç ã o

Listas de verificação (checklists) são instrum entos bastante práticos e fáceis de usar.
Há diferentes tipos de listas. A lgum as arrolam os impactos mais comuns associados
a certos tipos de empreendimentos, como aquelas incluídas no Livro de Consulta
sobre Avaliação A m biental do Banco Mundial e suas atualizações5, que traz listas dos 5A edição original é
impactos ambientais mais comuns associados a um a grande variedade de projetos. World Bank (1991a,
1991b, 1991c). As
Outras listas indicam os eletfientos ou fatores ambientais potencialmente afetados
atualizações foram
por determinados tipos de projetos, como as indicadas por Fernández-Vítora (2000). feitas na forma de
Um exemplo de lista detalhada de elementos ou fatores ambientais é apresentado no folhetos temáticos,
Quadro 8.10. Essa lista, preparada quando da introdução das exigências de AIA na impressos sob
África do Sul (Department of Environm ental Affairs, 1992), traz nada menos que a denominação
Environmental
328 itens ou características que podem ser afetadas por um projeto ou que podem
Assessment
representar algum a forma de restrição ao mesmo. 0 elevado número explica-se por se Sourcebook
tra ta r de um a lista genérica, não voltada para um a determ inada categoria de projetos. Updates.
Naturalm ente, as características listadas foram selecionadas levando em considera­
ção o perfil social e ambiental do País. Para o quadro, foram selecionados alguns
itens relativos a características socioeconômicas, ao uso do solo e aos ecossistemas.

Os Quadros 8.11 e 8.12 mostram, respectivamente, listas de efeitos e aspectos


ambientais e os impactos ambientais mais comuns tipicamente associados a projetos
de mineração. No primeiro desses quadros, emprega-se a term inologia sugerida por
M unn (1975), que diferencia efeito ambiental (alteração de processos ambientais) de
impacto ambiental (alteração da qualidade ambiental), e a noção de aspecto ambiental
da norma ISO 14.001 (conforme seção 1.6). Embora as noções de efeito e de aspecto
ação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

ambiental sejam próximas, não são coincidentes, pois efeito ambiental refere-se a pro­
cessos ambientais, ao passo que aspecto ambiental refere-se a atividades, ou processos
tecnológicos. Com a difusão das normas ISO, o termo e o conceito aspecto ambiental
tornam -se cada vez mais conhecidos,
d e ix a n d o a n o ç ã o de efeito ambiental em
Q u a d r o 8 .1 0 E x tra to de lis ta de v e rific a ç ã o de c a ra c te rís tic a s
a m b ie n ta is posição secundária. Os Quadros 8.13 e
8.14 trazem listas similares de impactos
0 p ro je to p ro p o s to poderia te r um im p a c to s ig n ific a tiv o ou poderia
ambientais e de efeitos e aspectos típicos
so fre r a lg u m a restriçã o em relação a a lg u n s dos itens seguintes?
de obras rodoviárias.
6 . C a r a c t e r ís t ic a s s o c io e c o n ô m i c a s do p ú b l ic o a f e t a d o
6.2 S itu a ç ã o e c o n ô m ic a e e m p re g a tíc ia dos gru p o s sociais a fe ta d o s
Canter (1996, p. 87) comenta que lis­
Base e co n ô m ic a da área
tas de verificação eram amplamente
D is trib u iç ã o de renda
utilizadas nos Estados Unidos nos pri­
In d ú stria local
meiros anos da prática da avaliação de
Taxa e escala de c re s c im e n to do e m p re g o
impacto ambiental, quando vários órgãos
Fuga de m ão de obra dos em preg os a tu a is
governamentais publicaram tais lis­
A tra ç ã o de m ão de obra de o u tro s locais
tas. Embora amplamente disponíveis na
P erm anência de pessoas de fo ra após o té r m in o das obras
literatura técnica ou em guias divulga­
O p o rtu n id a d e s de tra b a lh o para recém -egressos de escolas
dos por órgãos ambientais, poucas vezes
Tendências de dese m p re go de c u rto e lo n g o prazo
pode-se utilizar uma lista de verificação
6.3 B e m -e s ta r
sem introduzir correções ou adaptações,
In c id ê n c ia de crim e, abuso de drogas ou v io lê n c ia
seja devido às características do proje­
N ú m e ro de pessoas s e m - te to
to, seja por causa de condições do meio
A d e q u a ç ã o dos serviços p ú b lic o s
ambiente que não estão adequadamente
A d e q u a ç ã o de serviços sociais c o m o creches e ab rig o s para
c rianças de rua
descritas nas listas preexistentes. Todas
Q u a lid a d e de vida essas listas são genéricas, descrevem
impactos por categorias de projeto e não
4 . USO ATUAL E POTENCIAL DO SOLO E CARACTERÍSTICAS DA PAISAGEM
projetos individuais. São úteis para um a
4.1 C onsiderações gerais aplicáveis a to d o s os p ro je to s
primeira aproximação à identificação
C o m p a tib ilid a d e de usos do solo na área
dos impactos de um projeto específico,
Q ua lid a d e estética da paisagem
principalmente se a equipe não tiver ex­
S e n tid o de lu g a r
periência prévia com o tipo de projeto em
Preservação de vistas cênicas e feições va lo riza d a s
análise. Porém, os impactos não são cor­
R e vitaliza ção de áreas degradadas
relacionados às suas causas e, tanto para
Necessidade de z o n a s -ta m p ã o para processos n a tu ra is co m o
um a correta análise dos impactos como
erosão costeira, m o v im e n to de dunas e m u d a n ç a s em canais
flu v ia is etc. para comunicar aos leitores do EIA os re­
3 . C a r a c t e r ís t ic a s e c o l ó g ic a s d o lo c a l e e n t o r n o
sultados dessa análise, a apresentação de
3.3 C o m u n id a d e s n a tu ra is e s e m in a tu ra is
um a simples lista não satisfaz.
Im p o rtâ n c ia local, regional ou n a cio n a l das c o m u n id a d e s
n a tu ra is (por exem plo, e c o n ô m ic a , c ie n tífic a , c onse rva cionista, M a t r iz e s
e d u ca tiva ) Outra das ferramentas comuns para iden­
F u n c io n a m e n to e c o ló g ic o de c o m u n id a d e s n a tu ra is de vido à tificação dos impactos é a matriz. Apesar
d e s tru iç ã o física do h á b ita t, redução do ta m a n h o da c o m u n id a d e , do nome sugerir um operador m ate­
q u a lid a d e do flu x o da água subterrâne a, presença ou in tro d u ç ã o mático, as matrizes de identificação de
de espécies e xó tica s invasoras, barreiras ao m o v im e n to ou m i­ impactos têm esse nome somente devido
gração de a n im a is etc. à sua forma. Na verdade, um a matriz é
Fonte: D epartm ent o f Environm ental A ffa irs (1992). composta de duas listas, dispostas na

CAPITU
Identificação de Impa ^ o t 203

Q u a d r o 8.11 P rin c ip a is e fe ito s e a s p e c to s a m b ie n ta is Q u a d r o 8 .1 2 P rin c ip a is im p a c to s ambientais decorrentes


in d u z id o s p o r u m e m p re e n d im e n to de m in e ra ç ã o de u m e m p re e n d im e n to de m in e ra ç ã o
Físicos S obre o m e io físico
Alteração das características do solo (estrutura, com­ Alteração da qualidade das águas superficiais e
pactação etc.) subterrâneas
Alteração da topografia local Alteração do regime de escoamento das águas
Alteração da rede hidrográfica subterrâneas
Alteração do regime hidrológieo Alteração da qualidade do ar
Aumento da erosão Alteração da qualidade do solo
Aumento da carga de sedimentos nos corpos d'água Alteração das condições climáticas locais
Geração de estéreis S obre o m e io biótico
Geração de rejeitos Alteração ou destruição de hábitats terrestres
Geração de resíduos sólidos Alteração de hábitats aquáticos
Dispersão de gases e poeiras Redução da produção primária
Emissão de ruído Diminuição da disponibilidade de nutrientes
Emissão de vibrações e sobrepressão atmosférica Diminuição da produtividade dos ecossistemas
Dispersão de efluentes líquidos Deslocamento da fauna
Rebaixamento ou elevação do nível freático Perda de espécimes de fauna
Subsidência Criação de novos ambientes
Aumento dos riscos de escorregamentos de taludes Proliferação de vetores
B ióticos S obre o m e io antrópico
Interferência sobre processos bióticos nos corpos d‘água Impacto visual
(e.g. ciclagem de nutrientes) Desconforto ambiental
Eutrofização de corpos d'água Riscos à saúde humana
Bioacumulação de poluentes Substituição de atividades econômicas
Fragmentação da cobertura vegetal Incremento da atividade comercial
Perda de cobertura vegetal Aumento local de preços
A ntrópicos Aumento da população
Modificação da infraestrutura de-serviços Sobrecarga da infraestrutura de serviços
Deslocamento de assentamentos humanos Expansão da infraestrutura local e regional
Indução de fluxos migratórios Perda de patrimônio cultural
Modificação das formas de uso do solo Perda de referências espaciais à memória e à cultura
Alteração ou destruição de sítios de interesse cultural popular
ou turístico Redução da diversidade cultural
Aumento do tráfego de veículos Alteração dos modos de vida tradicionais
Aumento da demanda de bens e serviços Alteração das relações socioculturais
Aumento da oferta de empregos Limitação das opções de uso do solo
Aumento da arrecadação tributária
Qualificação profissional da mão de obra local

forma de linhas e colunas. Em um a das listas são elencadas as principais atividades


ou ações que compõem o em preendim ento analisado e na outra são apresentados
os principais componentes ou elementos do sistema ambiental, ou ainda processos
ambientais. O objetivo é identificar as interações possíveis entre os componentes do
projeto e os elementos do meio.

Uma das prim eiras ferram entas no formato de m atrizes propostas para avaliação
de impacto am biental data de 1971 e resulta do trabalho de Leopold et al. (1971), do

0
iiação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Q u a d r o 8.13 P rin cip a is im p a c to s a m b ie n ta is in d u z id o s p o r um Serviço Geológico dos Estados Unidos.


e m p re e n d im e n to ro d o v iá rio Nesse esforço pioneiro de sistematizar a
Fase de p la n e ja m e n to análise dos impactos, os autores prepa­
C riação de e x p e c ta tiv a s e in q u ie ta ç ã o ju n t o à p o p u la çã o raram um a lista de cem ações hum anas
Especulação im o b iliá ria que podem causar impactos ambien­
Fase de im p la n ta ç ã o : a tiv id a d e s p re p a ra tó ria s e de c o n s tru ç ã o tais, e outra lista de 88 componentes
Físicos ambientais que podem ser afetados por
A lte ra ç ã o da qu alid ade das águas superficiais ações humanas. São, portanto, 8.800 as
A lte ra ç ã o das propriedades físicas e biológicas do solo interações possíveis. Para cada empreen­
A lte ra ç ã o da qu alid ade do ar dimento, os analistas deviam selecionar
A lte ra ç ã o do a m b ie n te sonoro as ações que se aplicavam ao caso em
estudo, ou criar eles mesmos sua própria
D estru ição e fra g m e n ta ç ã o de h á b ita ts da vida selvagem lista de ações e aplicar o mesmo procedi­
Perda e a fu g e n ta m e n to de espécim es da fa u n a mento para os componentes ambientais.
A n t r ó p ic o s Leopold e seus colaboradores aplicaram
A lte ra ç ã o ou perda de sítios a rq u e o ló g ic o s e o u tro s e le m e n to s do seu método à análise dos impactos de
p a trim ô n io c u ltu ra l uma mina de fosfato (Fig. 8.8), e para isso
Im p a c to visual selecionaram nove ações e treze compo­
Fase de o p e ra çã o nentes ambientais. Das 117 interações
A lte ra ç ã o da qu alid ade do ar possíveis, consideraram que somente
A lte ra ç ã o do a m b ie n te sono ro quarenta eram pertinentes ao projeto que
A lte ra ç ã o da qu a lid a d e das águas supe rficia is analisaram.
C o n ta m in a ç ã o do solo e águas subterrâneas
Estresse sobre v e g e ta ç ã o n a tu ra l Depois de selecionadas as ações e os
Perda de espécimes da fa u n a por a tro p e la m e n to componentes ambientais pertinentes,
V a lo riza ç ã o /d e s va lo riz a ç ã o im o b iliá ria o analista deve identificar todas as
interações possíveis, marcando a célula
Sítios industriais e edifícios II B.b.

correspondente. De acordo com a proposta


Processamento de minério II D.f

Transporte por caminhões II G.c


Escavações de superfície II C.b.
Detonação e perfuração II C.a.
Linhas de transmissão II B.h.

original, a matriz de Leopold também se


Disposição de rejeitos II H.c.

presta a outras finalidades além da iden­


Estradas e pontes II B.d.

tificação dos impactos, principalmente


Vazamentos II J.b.

para a comunicação dos resultados, mas


estas não serão discutidas neste
capítulo. Por ora, menciona-se apenas
que os números inseridos em cada cé­
lula correspondem a um a pontuação de
A.2.d. Qualidade da água AM AA magnitude e importância da interação,
A.3.a. Qualidade da atmosfera A
A.4.b. Erosão A Al em um a escala arbitrária de 1 a 10 (se
A.4.c. Sedimentação A a A a magnitude for zero não há interação
B.1.b. Arbustos M e a célula não é marcada). A magnitude
B .l.c . Gramíneas M
B.1.f. Plantas aquáticas A A>M é apontada no canto superior esquerdo
B.2.c. Peixes A A da célula, ao passo que a importância é
C.2.e. C am ping e caminhadas A apontada no canto inferior direito.
C.3.a. Vistas cênicas e paisagem 2/ÍÍ ^ 3 A> M
C.3.b. Qualidade do ambiente selvagem K yk y í K í A A A> Os autores explicam que seu procedimento
C.3.h. Espécies raras e importantes A> 5doA AoAo emprega uma “matriz que é suficiente­
C.4.b. Saúde e segurança A* mente geral para ser usada como uma lista
Fig. 8.8 E x tra to da m a triz de Leopold. Fonte: Leopold e t al, 1971. de verificação de referência ou como uma

CAPITU
I d e n t if ic a ç ã o d e I m p a

Q u a d r o 8 . 1 4 P rin c ip a is e fe ito s e a sp e cto s a m b ie n ta is in d u z id o s p o r u m e m p re e n d im e n to


ro d o v iá rio
Fase de im p la n ta ç ã o : a tiv id a d e s p re p a ra tó ria s e de c o n s tru ç ã o

Indução de inundações (aumento de frequência e intensidade)


Risco de poluição da água e do solo com substâncias químicas
S obre o m e io b ió t ic o

Interferência sobre processos bióticos nos corpos cTágua (e.g. ciclagem de nutrientes)
Soterramento de comunidades bentônicas
Criação de ambientes lênticos
S obre o m e io a n t r ó p ic o

Modificação da infraestrutura de serviços


Alteração das formas de uso do solo
Deslocamento de pessoas e atividades econômicas
Aquecimento do mercado imobiliário
Aumento da oferta de empregos
Aumento da demanda de bens e serviços
Aumento da arrecadação tributária
Fase de im p la n ta ç ã o : d e s m o b iliz a ç ã o
Redução das oportunidades de trabalho
Redução da arrecadação tributária
Fase de o p e ra ç ã o
Emissão de poluentes atmosféricQs
. ' - - - V i . ...... .... v , - •- • ^

Geração de ruído
Drenagem de águas pluviais
Geração de resíduos sólidos
Risco de poluição da água e do solo com substâncias químicas
Perturbação e afugentamento da fauna (efeito evitação)
Bloqueio ou restrição de movimento através da rodovia (efeito barreira)
Interferência com caminhos e passagens preexistentes
Aumento do tráfego nas vias interconectadas
Adensamento da ocupação nas margens e área de influência

recordação do amplo espectro de ações e impactos ambientais que podem estar relacio­
nados às ações propostas”. A matriz tam bém teria um a função de comunicação, pois
serviria como “um resumo do texto da avaliação ambiental” e possibilitaria que “os
vários leitores dos estudos de impacto determinem rapidamente quais são os impactos
considerados significativos e sua importância relativa” (Leopold et al., 1971, p. 1).

Uma das críticas mais usuais à matriz de Leopold e suas congêneres é que representam
o meio ambiente como um conjunto de com partim entos que não se inter-relacionam.
ação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Por exemplo, um a determinada ação pode causar impactos sobre os componentes


“avifauna”, “mastofauna” e “características físico-químicas das águas superficiais”,
mas os mecanismos como se manifestam os impactos não são descritos. Por outro
lado, a interação entre uma ação e um compartimento ambiental não caracteriza pro­
priamente um impacto, entendido como alteração da qualidade ambiental.

Hoje em dia, há inúmeras variações da matriz de Leopold, que, na verdade, pouco


têm a ver com a original, a não ser a forma de apresentação e de organização das
linhas e colunas. A Fig. 8.9 apresenta um a matriz que correlaciona ações de um tipo
de empreendimento (linhas de transm is­
Fontes de im p a cto s são e subestações de energia elétrica)
Projeto Operação
com “elementos do meio”. 0 empreen­
Pós- Operação
Pré- C onstrução cons- e manu­ dimento é descrito em quinze diferentes
co n stru çã o trução tenção atividades, desde o planejamento até a

Presença, funcionamento e manutenção


desativação. Uma diferença em relação
à matriz de Leopold é que aqui se tem

Manutenção da faixa de domínio


Explotação de pedreiras/areieiras

Gestão de poluentes e resíduos

um único tipo de empreendimento, então Ordenamento e recuperação


Construção e obras conexas
Escavação e terraplenagem
Topografia e mapeamento

é natural que esta matriz possa descre­

Desativação e demolição
Preparação dos acessos

Transporte e circulação
Transporte e circulação

Remoção da vegetação

vê-lo de maneira muito mais detalhada.


Aquisição de direitos

Já os elementos do ambiente afetado


Desmobilização

são agrupados em três categorias: meio


natural, meio humano e paisagem. Ob­
Im p acto p o te ncial
servam-se três diferenças importantes
O Q ualidade dos solos
em relação à divisão do ambiente empre­
o
on V e rte n te de e q u ilíb rio gada por Leopold e seus colaboradores.
Q ualidade das águas Em primeiro lugar, há aqui alguns pro­
su p e rficia is
cessos do meio físico (ver seção 1.7),
Perfil dos corpos
d’água
como o escoamento de águas superficiais
M — §— *
j
Q ualidade das águas e a dinâmica de infiltração de águas
ç subterrâneas pluviais, em vez do meio ser descrito ex­
O;
Escoam ento nos rios clusivamente em compartimentos, como
2
Escoamento superficial
o
e infiltração
fazem Leopold e sua equipe. Em segundo
<u
£ Ü lugar, para a descrição do ambiente hu ­
o w> ^ Q ualidade do ar
-§ < A m b ie n te sonoro mano esta matriz lança mão do conceito
t/i 1
O . 03
Espécies de espaço geográfico, categorizando-o
<U o =3 í
rr- CX3 H á b ita ts
.
(— </ -j
E:
QJ
I _ <4—
ll
segundo a forma predominante de uso.
ÜJ Espaço urbano e '* *• -

r. •': *-■ ■
■ periurbano
Finalmente, um a integração entre os
V •iv - L.ir •

Espaço de lazer e meios natural e hum ano é buscada por


o ln
O c: tu ris m o intermédio do conceito de paisagem (a v.

: W ^
s 33 § Espaço agrícola
-C ■ Fig. 1.1 pode ser consultada para um a ■

Espaço flo re s ta l :• :

Espaço p a trim o n ia l comparação e para um a contextualiza-


In fra e s tru tu ra ção desses termos).
E Cam po visual
<u ■

cn
03 Elem ento p a rtic u la r A Fig. 8.10 mostra outra matriz de identi­
da paisagem i : * *ÍV
■£
CL | ■

ficação dos efeitos e impactos ambientais


Fig. 8.9 M a triz de id e n tific a ç ã o de im p a c to s p o te n cia is p a ra p ro je to s de que indica as interações entre ações do
lin h a s de transm issão e subestações de energia e lé trica empreendimento e elementos ambientais
Fonte: H ydro Québec, p. 307. selecionados, um a variação da estrutura

CAPITU
I d e n t i f ic a ç ã o d e I m p a w t í M 207

m atricial para au x ilia r na identificação de impactos. Diferentemente das matrizes


anteriores, nesse exemplo é apresentado um caso real, relativo a um projeto de ex­
tração de bau xita em pequena escala, situado em um a zona rural. A m atriz aponta
as interações entre as atividades que compõem o em preendim ento analisado e al­
guns processos e elementos am bientais selecionados por sua im portância no local
pretendido para a implantação do projeto. Dessa forma, essa m atriz serve de auxiliar
na identificação dos impactos - por exemplo, pode-se observar que a ação “serviços
de melhoria nas estradas vicinais” interfere com vários processos ou elementos a m ­
bientais, dentre eles os ecossistemas aquáticos. Tal interação foi indicada porque, no
local estudado, os serviços de terraplenagem, alargamento, construção de bueiros etc.
aum entarão a carga de sedimentos
Processos e e le m e n to s a m b ie n ta is
enviada aos riachos, o que, por sua p o te n c ia lm e n te a fe ta d o s
vez, deverá promover assoreamento

Processos erosivos e a s s o re a m e n to

Escoamento de águas s u p e rfic ia is


dos leitos, com conseqüente soterra-

Qualidade das águas s u p e rfic ia is


mento de comunidades bentônicas

Mercado de bens e serviços


e seus efeitos secundários sobre a

Ecossistemas a q u á tic o s
Características do so lo
cadeia alim entar - como a m atriz em

Tráfego de ve ícu lo s
Pequena in te rfe rê n c ia 03

Produção a g ríco la

Finanças p ú b lica s
“O

Ambiente so n o ro
si não explica tudo isso, a identifica­

Qualidade do ar

Fauna te rre s tre


’>
<u
ção dos impactos deverá ser feita por | G rande in te rfe rê n c ia "O
<u

V e g e ta çã o
“O
meios enunciados apropriados. 03
“D

Relevo
A ções c o m p o n e n te s do ”03
zs
e m p re e n d im e n to a
Uma outra variação é m ostrada na
D iv u lg a ç ã o do e m p re e n d im e n to ju n t o
Fig. 8.11, na qual cada interação é à p o p u la ç ã o local
classificada segundo dois critérios: N e g o c ia çã o de a co rd o s v is a n d o a
a n atu reza do impacto (benéfico ou in d e n iz a ç ã o i
P a g a m e n to das in d e n iza çõ e s
adverso) e um a apreciação subjeti­
C o n tra ta ç ã o de serviços de e x tra ç ã o e
va da possibilidade de ocorrência tra n s p o rte de m in é rio
de cada impacto apontado. Esse Serviços de m elhoria nas estradas
é um problema com um e n fre n ta ­ vicinais
do na identificação p relim in ar dos R em oção da c o b e rtu ra v e g e ta l
Im p la n ta ç ã o de siste m a de d re n a g e m
impactos: algu m as conseqüências
Remoção da camada superficial de solo
são certas, mas há grand e dose de E stocagem da ca m a d a de solo
incerteza sobre m uitos impactos, R em oção do c a p e a m e n to e sté ril
que poderão ou não ocorrer. Nessa
matriz, preparada para um relatório
ambiental p relim in ar de um term in al
E xtra çã o do m in é rio p o r escavação
m e câ n ica
C a rre g a m e n to em c a m in h õ e s
1 l

b a s c u la n te s
portuário, há u m a indicação sobre T ra n sp o rte ro d o v iá rio a té a fá b ric a
tal probabilidade. Essa indicação é de a lu m ín io

baseada em interpretação subjetiva


e pode ser, portanto, contestada. De
M a n u te n ç ã o de m áquinas e cam inhões
P a g a m e n to de sa lários
R e c o lh im e n to de im p o s to s
■ L

U
qualquer forma, nesta fase de iden­ P a g a m e n to de royalties aos
tificação prelim inar, é conveniente p ro p rie tá rio s
Remodelagem da superfície top o g rá fica
apontar o m aior núm ero possível de
Reposição da cam ada superficial de solo
impactos, inclusive aqueles de b aix a
orobabilidade de ocorrência. Fig. 8.10 M a triz de id e n tific a ç ã o de im pactos am bientais. Pequena m ineração
de b a u xita
Um tipo diferente de m atriz é Fonte: P rom iner Projetos S/C Ltda. EIA M inas de B auxita de D ivinolândia. C d. Ce­
organizado de modo a m ostrar ra I de M inas, 2001.
'ação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Componentes não as relações entre ações e elemen­


Físico Biótico Socioeconômico tos ou processos ambientais, mas as
relações entre as causas (ações) e as

Ecossistema m anguezal e de transição


conseqüências (impactos). Assim, ao in­

Condições de vida da população


vés de ser organizada como um a lista

Ecossistema te rrestre/restin g a
Clima/qualidade do ar/ruíd o
Geologia/recursos m inerais
de ações e um a lista de elementos e/ou

Pesca artesanal e esportiva


Patrimônio arqueológico
processos, a m atriz é organizada como

Uso e ocupação do solo

Patrimônio paisagístico
Ecossistema aquático
um a lista de ações (a mesma) e um a lista

Recursos hídricos

Porto de Santos
dos impactos, podendo-se então apontar

Economia local
N atureza do impacto
P (positivo) N (negativo) quais os impactos causados por cada
Possibilidade de ocorrência ação. Essa abordagem pressupõe um
C (certa) - Pr (provável) - In (incerta) entendim ento prévio, anterior, sobre as
P P interações projeto x meio. Na verdade,
Recrutam ento de mão de obra
C C em um EIA pode-se empregar os dois ti­
Im plantação e operação do canteiro N N N N/P N P
pos de matriz: primeiro um a matriz ações
de obras e instalações provisórias Pr C Pr Pr Pr Pr
N N N N N N N N x elementos/processos ambientais para
Desm atam ento e limpeza do terreno
Pr Pr C C Pr In C Pr identificar as interações entre o projeto e
Utilização de áreas de N P N N N o me«io, e depois um a m atriz ações x im ­
em préstim o/jazidas minerais Pr C In In In
pactos para m ostrar as relações de causa
% B ota-fora do m aterial de limpeza N N N N N
£ do terreno e do entulho das obras Pr In In In In e efeito. A Fig. 8.12 mostra um exemplo
B5B
s Im plantação de diques periféricos
N N N de m atriz deste último tipo, e x tra í­
Pr Pr Pr do de um estudo de impacto ambiental
<0 Execução de dragagem na área N N
Pr
feito para um a usina hidrelétrica. As
u? entre o canal e o cais Pr
N N colunas indicam os nove impactos sobre
Execução do aterro hidráulico
Pr Pr o meio biótico identificados nesse estudo
B ota-fora do m aterial de N N P
e a matriz m ostra a correlação com as
dragagem não aproveitável Pr Pr C
Im plantação das obras civis N P P atividades do projeto, aqui denom inadas
(cais, pavim. armazéns, tancagem ) Pr C Pr “fatores geradores”.
Dispensa de mão de obra da N N
construção civil C C
No exemplo mostrado na Fig. 8.13,
Fig. 8.11 E xtra to de "m a triz de interação de im pactos", fase de im plantação além das ações e dos impactos, a matriz
de um te rm in a l p o rtu á rio . Fonte: Equipe Umah. RAF Term inal P ortuário do m ostra os m ecanism os por meio dos
Rio Sandi, Empresa Brasileira de Terminais P ortuários S.A., 2000. (N ota: quais eles ocorrem. Ela é composta de
foram extraídas apenas as atividades p e rtine ntes à fase de im plantação dois campos: o da esquerda m ostra as
e listados apenas os respectivos com ponentes am bientais potencialm ente
interações entre ações tecnológicas e
afetados).
processos ambientais, gerando efeitos
am bientais (no sentido proposto por
M unn, 1975); à direita mostra-se, p ara cada efeito, os impactos possíveis. Neste caso,
o meio ambiente não é representado por um a somatória de compartimentos, mas por
processos selecionados em função da influência que as ações podem ter sobre eles.

Finalmente, a Fig. 8.14, extraída de Sánchez e Hacking (2002), mostra um a constru­


ção semelhante, mas que adota o conceito de aspecto ambiental. Esse tipo de matriz é
particularm ente útil para o caso de novos empreendimentos propostos por organiza­
ções que já disponham de um sistema de gestão ambiental, um a vez que permite, já
durante a preparação do EIA, que sejam identificados aspectos e impactos ambientais,

CAPÍTU LO
I d e n t if ic a ç ã o de I m p a 209

uma atividade obrigatória para a implan­

Fuga de animais para as áreas adjacentes


tação de um SGA segundo o modelo da

infraestrutura de apoio e obras civis


ISO 14.001. Dessa forma, os objetivos, as

Interferência com as comunidades

Interferência com as comunidades


Perda de animais por afogam ento
Perda/alteração de hábitats pela

Interferências nas comunidades


metas ambientais e os programas de ges­

ícticas na área do reservatório

Criação de novos ambientes


Perda/alteração de hábitats
tão já podem ser preparados para tratar

decorrente do enchim ento

Proliferação de vetores
animais (caça e pesca)
dos aspectos e impactos ambientais mais
significativos.

ícticas à jusante
A Fig. 8.13 difere da Fig. 8.14 apenas
em termos conceituais, naquilo que
concerne à noção de aspecto ambiental Fatores geradores
Divulgação
e à de efeito ambiental. O recurso a ^

Aquisição de terras e
qualquer um desses conceitos é um ■“ benfeitorias
cam inho possível para identificar 2 Recrutamento e contratação
impactos, assim como a busca de rela­ B de mão de obra
4-*

ções diretas entre ações e impactos, ou o £ Desmatamento/terraplenagem


o= o para acessos
uso de outras formas de matrizes descri­
-S ra Ampliação e melhoria da
tas acima. A escolha do melhor formato o -o infraestrutura
»CT3

dependerá da equipe realizadora e dos B Implantação de canteiro


próprios objetivos do estudo ambiental. ■5. Implantação de alojamentos
JÊ e vila residencial
A crescente difusão dos sistemas de
Mobilização de equipamentos
gestão ambiental sugere que o formato c/i

’™ Exploração de fontes de
de m atriz apresentado na Fig. 8.14 tem ‘ü materiais de empréstimo
potencial de aplicação como ferram enta o. Execução das obras civis
CO
integradora entre a AIA e o SGA. Deposição de material
° excedente em bota-foras
CO

0 Montagem eletromeeânica
D i a g r a m a s de i n t e r a ç ã o ' ICO

Implantação de linha de
Jg

Outro método para identificar impactos j= transmissão


CL

é utilizar o raciocínio lógico-dedutivo, Transporte de materiais e


insumos
por meio do qual, a p artir de um a ação,
.0 Desocupação da área a ser
inferem-se seus possíveis impactos am ­ •2 -o submersa
bientais. As Figs. 8.15 a 8.18 mostram - i B Desmatamento e limpeza da
esquemas chamados de diagram as ou «3 área de inundação
L JJ . O ,
Enchimento
redes de interação, que indicam as re­
0 Dispensa
?m 1 de mão de obra
lações seqüenciais de causa e efeito O-
<3 Desmobilização do canteiro
(cadeias de impacto) a partir de um a ação de alojamentos
impactante. Na Fig. 8.15 observam-se as ü Retirada de materiais e
q equipamentos
diferentes conseqüências do processo
° ro Operação da usina
de urbanização sobre o processo de O
§ = Fiscalização/manutenção da
escoamento de águas superficiais. A 0 -S faixa de segurança
urbanização tam bém causa outras modi­
ficações ambientais, sobre o microclima, Fig. 8.12 E xtrato de "m atriz de identificação de im pactos nom eio biótico".
sobre a fauna e sobre outros processos e Fonte: m odificado de CNEC. EIA da Usina H idrelétrica Piraju, São Paulo, p re ­
componentes ambientais. Assim, outras parado para a CBA, 1998.
relações poderiam ser acrescentadas
a esse diagrama. A Fig. 8.16 mostra os
efeitos, para o sistema público de saúde, da implantação de um grande projeto que
atraia mão de obra e induza fluxos migratórios. 0 aumento da população local e a

0
liação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Operação do Infraestrutura Meio Meio Meio


empreendimento de apoio físico biótico antrópico
y\

Alteração da qualidade do solo


Alteração da qualidade do ar
4C->

Alteração dos ecossistemas


cd

Beneficiamento do m in é rio

Abastecimento de insum os

Demolição após a vida útil


Remoção de solo org â n ico
o

Alteração das populações


(U

Aumento da arrecadação
Construção de barragens
tz
Remoção da vegetação lo

Alteração da qualidade

Desconforto a m b ie n ta l
Estocagem de insum os
o <u

Expedição de produtos

Destruição de h á b ita ts

Incremento co m ercial
£ E
CD
X) CO
"O c- O
Lavra do m in é rio ™ wV, 4-*
U
-O

Impacto visual
In fra e s tru tu ra
> CL CD
CL

< n J E

das águas

a q u á tico s
terrestres

trib u tá ria
anim ais
Efeitos a m b i e n t a i s ^ ^
A lte ra çã o da to p o g ra fia
Geração de resíduos sólidos
Geração de e flu e n te s líquidos
A u m e n to da erosão
A u m e n to do assoream ento
Geração de ruídos
A lte raçã o do nível fre á tic o
Geração de poluentes
a tm osfé rico s
Alteração características do solo *
Supressão da vegetação e
h á b ita ts
Dem anda de bens e serviços
Geração de im postos
Tráfego de cam inhões

Fig. 8.13 M a triz de id e n tific a ç ã o de e fe ito s e im p a c to s a m b ie n ta is


Fonte: P ro m in e r P rojetos S/C Ltda. EIA M in a s de C alcário de Corum bá, Arcos, MG, 1991.

ocupação desordenada de áreas sem saneamento básico acarretam impactos negati­


vos para a saúde pública e aumentam a demanda por serviços de saúde. A Fig. 8.17
indica as principais conseqüências sobre os ambientes físico e biótico de ações de
terraplenagem, comuns em muitos projetos e obras de engenharia. São indicados os
principais impactos sobre os ecossistemas aquáticos.

As figuras representam situações simples, enquanto um projeto real teria várias ações
originando impactos ambientais, de forma que as redes podem resultar em figuras
extremamente complexas e de difícil compreensão. Uma vantagem, contudo, é que
tais redes permitem um bom entendimento das relações entre as ações e os impactos
resultantes, sejam eles diretos ou indiretos, enquanto as matrizes dividem o meio
ambiente em compartimentos estanques, dificultando o entendimento da relação
entre as partes. Os diagramas de interação também possibilitam evidenciar impactos
indiretos de segunda e terceira ordem, e assim sucessivamente, sem limite.

Uma limitação das redes de interação é sua capacidade restrita de representar adequa­
damente sistemas complexos caracterizados por relações não lineares de causalidade
e retroalimentações múltiplas. Os exemplos das Figs. 8.15 a 8.17 mostram situações
que, além de lineares e relativamente simples, podem ser delimitadas espacialmente.
Quando se trata de processos sociais e mesmo de muitos processos ecológicos, as
redes de interação podem acarretar uma simplificação exagerada das interações. Um
exemplo extraído de um EIA é mostrado na Fig. 8.18.
tl1 1Atividades/instalações Impactos ambientais
§ *p
r-* f.

Classificação de aspectos M eio biofísico M eio antrópico

Transporte equipamentos/insumos
H> 00
LO ^

Perturbação da vida comunitária


A Aspecto significativo

Deterioração da qualidade do ar

Aumento arrecadação tributária


Capacitação da força de trabalho

Diminuição da renda disponível


Aumento da atividade comercial
Q>

Deterioração da qualidade das

Deterioração da qualidade das

Impactos sobre saúde humana

Redução da produção agrícola


Possíveis ferimentos e mortes
Redução da base de recursos
o g H Aspecto pouco significativo

Redução da disponibilidade

Alteração dos ecossistemas


Perda de qualidade do solo
nN> Q

Perda de recursos culturais

Crescimento da população
Redução do nível de água
<"*h

Disseminação de doenças

Aumento da demanda de
Aspecto não significativo

Degradação do ambiente
Perda líquida de hábitats

Incômodo e desconforto
Escavação a céu aberto
("D N*

Tratamento de minério

Contaminação do solo
Disposição de estéreis

Disposição de rejeitos
cl
n>

águas subterrâneas
águas da superfície
Q Classificação de impactos
Conjunto da mina

Serviços de apoio
o

serviços públicos
2T Sj
3' >n 9 Impacto muito importante

Impacto visual
+ Impacto pouco importante

subterrânea

infecciosas
kJ 3S

construído
aquáticos
r ~ > O

de água
cR '“O
Q
K

Q?
- 5

Aspectos
nCL>
Q A A mA ■ Degradação do solo • $ •
"o
o
n> □ A A Uso p e r c j a de vegetação 9 • •
o ,tArfa .r A A do solo Restrições de uso © o
LO /A A
H) ■ Alteração da topografia 9
-•w
A .. ^ Vazamentos área da mina ■ 4= M$K
"O mciaenies ..
Q
O
A Vazamentos externos • • • ❖
O m M atérias-prim as •
L0
Q □ ■ , sumo Produtos manufaturados •
3
cr A ■ A A
UC I C C U I j U j _
Energia •
r5
:s* A Consumo
§

Agua subterrânea +
f-h ----
Q A A de água Águas superficiais • +
Cò'
A A Emissões Fontes pontuais í ti • © _
*• e> '*

A hídricas Fontes difusas • + •


A A A Emissões M aterial particulado • 4a
A atmosféricas Gases e fumaça • +
A Emissões Infiltração no solo • • + • +
A para o solo Resíduos sólidos • • + • 4
A A A A □ Ruído • * ----
A 0uL,f Vibrações •
emissões n O
■ Radiações + >
-O
A 4 ¥ V >*
Geração de empreaos O
A Atração de pessoas e © o
A , _Capacitação profissional +
Aspectos K v
A cnrl^:c Demanda de bens e serviços O •
sociais *
A Oportunidades de negócios • €) 4
■ •
A Geração de impostos •
M
Esta célula é assinalada se a alteração da topografia (ASPECTO) decorrente da escavação a Esta célula é assinalada se a perda de qualidade do solo (IMPACTO) resultante de emissões
céu aberto (ATIVIDADE) fo r significante. Para uma análise com mais detalhe, essas hídricas - fontes pontuais (ASPECTO) - fo r significante.
atividades podem ser subdivididas em outras.
iiação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

U rbanização Im p la n ta çã o de grande p rojeto A tra ç ã o de m ão de obra


in d u stria l ou grande obra civil para co n stru çã o
I
Im perm eabilização i
do solo A tra çã o de pessoas em busca de
em pregos e o p o rtu n id a d e s
1
Redução da taxa de i
In filtra ç ã o de água O cupação de áreas para m oradia
(a u m e n to do co e fic ie n te de população de baixa renda
de deflúvio)
I
I Lançam ento de resíduos sólidos
A u m e n to do e esgotos não tra ta d o s
escoam ento sup e rficia l
i
I Poluição hídrica e degradação das
A u m e n to do ap o rte condições san itá ria s dos corpos d'água
h ídrico para cursos
d'água 1
A u m e n to da in cidência de A u m e n to da dem anda por
I doenças de ve icu la çã o hídrica serviços de saúde
A u m e n to rápido da
vazão dos cursos
d'água Fig. 8.16 D iagram a de in te ra ç ã o in d ica n d o algum as conseqüências sociais da
im p la n ta ç ã o de um gra n d e p ro je to
l
A u m e n to rápido da
vazão dos cursos
d'água
Terraplenagem
\ i
Danos e perdas A u m e n to da superfície
econôm icas de solo exposto

J
8.15 Diagrama de interação indicando as In te n sifica çã o dos
nsequências do processo de urbanização sobre processos erosivos
processos de escoamento das águas superficiais
i
* . , . A u m e n to da q u a n tid a d e
A u m e n to do ca rre a m e n to . , , *,• , M e n o r incidência de luz
, i de partícu la s sólidas
de partícu la s sólidas r solar na coluna d ’água
em suspensão na agua
4
M e n o r produção prim á ria
Deposição de partículas
4
sólidas em cursos d'água
Redução do z o o p lâ n cto n
i 4
S o te rra m e n to de Redução da população
A ssoream ento --------'
com u n id a d e s ben tô n ica s de peixes
1
A u m e n to da fre q u ê n cia e
in tensidade das inundações

Fig. 8.17 D iagram a de in te ra ç ã o in d ica n d o algum as conseqüências da


a tiv id a d e de te rraplenage m sobre os ecossistem as a q u á tico s

O utras fe r r a m e n tas e m éto do s


A literatura sobre AIA é pródiga em métodos, técnicas e ferramentas para as três tarefas
da análise de impactos (identificação, previsão e avaliação). Como indicado por Glas-
son, Therivel e Chadwick (1999, p. 109), muitos desses métodos foram desenvolvidos

CAPÍTU LO
por ou para agências governamentais
americanas, como o Serviço Florestal
(.Forest Service), o Serviço de Pesca e
Vida Selvagem (Fish and Wildlife Ser­
vice), o Serviço de Parques Nacionais
(National Parks Service) ou o Depar­
tamento de Gestão de Terras Públicas
(Bureau ofLand Management), que lidam
com grandes quantidades de projetos6. Os
três tipos de utensílios expostos nesta se­
ção não esgotam a caixa de ferramentas
do analista de impactos ambientais.

Como foi dito e repetido, a identificação


de impactos deve ser refinada à pro­
porção que se avança na confecção
do estudo de impacto ambiental, em
particular quando se pode utilizar os re­
sultados dos estudos de base. No início
dos trabalhos, nem sempre se dispõe de
cartografia adequada, mas à m edida que
os levantam entos de campo e a inter­
pretação de im agens produzam mapas
com escalas mais precisas (conforme
seção 9.4), to rn a-se possível sobrepor
mapas temáticos e sim ular a im p la n ta ­
ção do em preendim ento em diferentes
localizações, o que pode levar à identi­ Fig. 8.18 D iagram a de in te ra ç ã o de im p a cto s p o te n cia is derivados da su ­
ficação de novos impactos. pressão de vegetação em um a m in a de ca lcá rio
Fonte:M K R Tecnologia, Serv., Ind. e Com. L td a ./E .la b o re A sse sso ria A m b ie n ta l
E s tra té g ic a / C om panhia de C im ento R ibeirão G rande - CCRG. 2 0 0 3 . Estudo
Para os impactos sociais, os proce­
de Im p a c to A m b ie n ta l, A m p lia ç ã o da M in a Lim eira, C om panhia de C im ento
dimentos de identificação podem ser
R ibeirão G rande - CCGR, volum e 5, anexo 16.
aprimorados se houver participação di­
reta da comunidade afetada (em certos
casos, isso também pode ser verdadeiro para os impactos físico-bióticos, conforme
seção 9.4). Becker et al. (2004), ao analisar comparativamente os resultados de um
60 total de terras
enfoque “técnico” e os de um enfoque participativo em um EIA americano, observa­ públicas geridas
ram que um espectro maior de impactos pôde ser obtido pela combinação de ambos. pelo governo
0 enfoque técnico é basicamente dedutivo, ao passo que, por meio de métodos de en­ americano atinge
volvimento da comunidade, foi possível induzir uma série de impactos que não foram cerca de 2,4
milhões de km 2.
identificados pelo outro método. Os autores propugnam um a combinação desses dois
Tamanha extensão
enfoques, de modo a aproveitar os pontos fortes de cada um. Por exemplo, a abor­
territorial fa z
dagem participativa tende a identificar com maior precisão os impactos locais; em dessas agências
contraponto, um a abordagem técnica facilita a agregação dos impactos e a identifica­ governamentais
ção de impactos regionais. Para uma identificação prelim inar de impactos sociais, um as gestoras de
enfoque técnico-dedutivo similar àquele empregado para os impactos físico-bióticos territórios maiores
que o da maioria
deve ser suficiente. Para uma análise aprofundada, porém, técnicas participativas
dos países.
certamente enriquecem os resultados.

0 TO
ilação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

8 .6 C o e r ê n c i a e in t e g r a ç ã o
Um dos desafios da prática da AIA é lograr uma integração das diversas ferramentas
e procedimentos analíticos usados para investigar os processos e os efeitos das intera­
ções entre as ações hum anas e os processos naturais e sociais. Métodos desenvolvidos
no âmbito de um a disciplina podem ser eficazes para fornecer explicações plausíveis
dentro de seu campo de investigação, mas nem sempre se consegue estabelecer a
necessária comunicação com outros campos do conhecimento.

Coerência é uma necessidade incontornável em avaliação de impacto ambiental.


Assim, as medidas mitigadoras devem ser coerentes com os resultados da classificação
de significância dos impactos, o enfoque dado ao diagnóstico ambiental deve ser
consistente com os resultados da etapa de seleção das questões relevantes, do mesmo
modo que os esforços de previsão de impactos devem ser coerentes com a importância
dos impactos. Um EIA coerente começa com coerência e rigor na identificação dos
impactos. Coerência demanda esforço integrador, mas um a análise integrada só é
possível se o trabalho é executado dessa maneira.

“Integração” tem diversos sentidos em planejamento e gestão ambiental, um dos


mais genéricos sendo a integração dos diyersos componentes do diagnóstico
ambiental, no sentido de fornecer algum a forma de quadro sinóptico ou “integra­
do” da situação, do estado ou da qualidade do ambiente. A identificação de impactos
tam bém tem a g a n h a r com algum a forma de integração, originando interpretações
que ultrapassem assertivas simples como “impactos sobre a fau n a” ou “deterioração
da qualidade da ág u a”.

Um caminho de integração foi proposto por Slootweg, Vanclay e van Schooten (2001),
utilizando o conceito de “funções da natureza” e dos recursos naturais para servir
às necessidades da sociedade hum ana. Tal conceito foi elaborado por de Groot (1992),
que agrupa as funções em quatro classes:

(1) Funções de produção: suprir a sociedade de recursos naturais, seja como pro­
vedora direta (e.g. recursos pesqueiros, combustíveis fósseis), seja como fonte de
recursos manejados pelo homem (e.g., por meio da agricultura).
(2) Funções de regulação: relativas à manutenção do equilíbrio dinâmico dos pro­
cessos da biosfera (e.g., captação de carbono, regulação do fluxo hídrico).
(3) Funções de suporte: desempenhadas pelo espaço geográfico como o território
onde se assenta a sociedade; na medida em que são as condições ambientais de
cada porção do território que o tornam mais ou menos adequado para determi­
nados usos.
7Slootweg, (4) Funções de informação7: decorrentes do significado que a sociedade atribui à
Vanclay e van natureza ou a certos componentes da paisagem, por sua vez associados a valores
Schooten (2001) culturais de raiz histórica, espiritual ou psicológica, entre outras.
as redenominam
de funções de Nessa perspectiva, a natureza desempenha inúmeras funções, como:
significação.
v> regulação do clima local e global;
regulação do escoamento hídrico superficial e prevenção de inundações;
9SÍ fixação de energia solar e produção de biomassa;
-L V *

armazenamento e reciclagem de nutrientes;


$ manutenção da diversidade biológica e genética.

CAPITU
I d e n t if ic a ç ã o de I m p a

As atividades hum anas interferem nessas funções,


Intervenção
causando impactos ambientais. Para Slootweg,
Vanclay e v an Schooten (2001), há duas categorias
de impactos: os biofísicos e os antrópicos. Impac­
Alterações em Alterações
tos biofísicos podem ser entendidos como alterações processos físicos em processos
(em qualidade ou quantidade) nos bens e serviços e bióticos sociais
fornecidos pela natureza (ou “meio biofísico”), ou
O O
seja, um a m udança que afeta as funções da n a tu ­ 2“z~z~
2 a ordem
reza como provedora de serviços para a sociedade.
De modo similar, os impactos sobre o meio antró- Funções
pico podem resultar de alterações induzidas em am bientais
afetadas
processos sociais ou, indiretamente, dos impactos
biofísicos (Fig. 8.19). Segundo a visão desses autores,
“os impactos biofísicos podem ser expressos em
termos de m udanças nos produtos e serviços forne­ Impactos
Im pactos
físicos e
cidos pelo meio ambiente e, por conseqüência, terão antrópicos
bióticos
impactos sobre o valor dessas funções para a socie­
dade h u m a n a ” (p. 24). Desse modo, a identificação Fig. 8.19 Relação entre processos e impactos fisico-bióticcs
de impactos pode ser precedida da identificação das e sociais
funções ambientais afetadas, o que j á dá um a medida Fonte: Slootweg, Vanclay e Van Schooten (2001).
da relevância de tais impactos.

Slootweg (2005, p. 38) lembra que identificar as funções dos ecossistemas é uma
das diretrizes da cham ada “abordagem ecossistêmica” (ecosystem aproach), enten­
dida como “um a estratégia para a gestão integrada do solo, da água e dos recursos
vivos que promova a conservação e o uso sustentável dos recursos de um a m aneira
equitativa”. Outros cam inhos para integração foram propostos por outros autores.
Independentemente do método de trabalho e dos procedimentos empregados para
identificar impactos, é im pqrtante que esta tarefa seja executada de modo rigoroso e
com um a perspectiva multidisciplinar.

8.7. S ín te s e
Para realizar um a identificação apropriada dos prováveis impactos ambientais, há dois
requisitos: (i) o entendimento do projeto (ou plano ou programa) proposto e (ii) um re­
conhecimento das principais características do ambiente afetado. Para identificação
prelim inar de impactos ambientais, não é necessário dispor de um conhecimento
detalhado do ambiente potencialm ente afetado. Na verdade, são os impactos que
podem advir das atividades de planejamento, implantação, funcionam ento ou desa­
tivação do projeto, plano ou program a analisado que nortearão o prosseguimento do
estudo, ao indicar que tipo de informação sobre o ambiente afetado será necessária
para prever a m agnitude dos impactos, avaliar sua im portância e propor medidas
de gestão com a finalidade de evitar, reduzir ou com pensar os impactos adversos e
m ax im izar os benéficos.

A consideração de impactos cum ulativos é um a das dificuldades de ordem prática que


se colocam na identificação dos impactos. Para que os estudos ambientais levem em
conta, de modo satisfatório, os impactos cumulativos, é imperativo que estes sejam
^ J a i i a ç ã o de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

delineados já na fase de identificação, para que o planejamento dos estudos incorpore


as necessidades específicas de levantamentos de dados e de análises requeridas para
o tratamento dos impactos.

Uma abordagem ordenada e sistemática das relações de causa e conseqüência,


intermediadas por interferências ou alterações de processos ambientais ou sociais
(com possível consideração das funções
ambientais que podem ser afetadas pela
Ação — ►E feito/aspecto a m b ie n ta l (alterações de processos)— *• Im p acto
proposta analisada), auxilia na identifi­
cação de todos os impactos relevantes. 0
Fig. 8.20 Esquema básico das relações entre causa e conseqüência p a ra esquema fundam ental para identificação
id e n tific a ç ã o de im p a cto s a m b ie n ta is imp actos ambientais está resumido na
Fig. 8.20.

CAPITU
liação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Os estudos de base ocupam um a posição central na seqüência de atividades de um


estudo de impacto ambiental. São eles que permitirão a obtenção das informações
necessárias à identificação e à previsão dos impactos, à sua posterior avaliação e,
finalmente, fornecerão elementos para a elaboração do plano de gestão ambiental.
Por sua vez, o tipo e a qualidade das informações obtidas por meio dos estudos de
base serão determinados em função das duas etapas anteriores do EIA, a identificação
preliminar dos impactos e sua hierarquização (seleção das questões relevantes).
t f . — "—" ' * *

Desta forma, os estudos de base funcionam como um pivô no processo de elaboração


de um estudo de impacto ambiental, e em torno deles gira a organização dos trabalhos
de campo e de gabinete, assim como a estruturação do próprio documento. Os estudos
de base têm como resultado o diagnóstico ambiental, capítulo obrigatório de todo EIA.

Os estudos de base têm tam anha importância na avaliação de impacto ambiental


que muitas vezes acabam confundidos com o próprio EIA. Isso é particularm ente
forte quando se adota um a abordagem exaustiva, com sua tendência a descrever
detalhadamente os mais variados elementos que compõem o meio ambiente afetado.
Assim, os estudos de base formam o elemento mais amplamente reconhecido dos
estudos de impacto ambiental - todos concordam que são necessários - mas um dos
menos compreendidos (Beanlands, 1993), j á que a função do EIA não é levantar ou
compilar dados sobre o ambiente afetado, mas (nunca é demais relembrar) analisar
a viabilidade ambiental de um a proposta, antecipando as conseqüências futuras de
um a decisão presente.

As funções dos estudos de base em um EIA são:


* fornecer informações necessárias para a identificação e previsão dos impactos, e
para sua posterior avaliação;
* contribuir para a definição de programas de gestão ambiental (medidas mitiga-
doras, compensatórias, programas de monitoramento e demais componentes de
um plano de gestão ambiental integrante de um EIA);
* estabelecer uma base de dados para futura comparação com a real situação, em
caso de implementação do projeto.

9.1 F u n d a m e n t o s
Como podem ser definidos os estudos de base? Uma definição genérica é a seguinte:
Levantamentos acerca de alguns componentes e processos selecionados do meio
ambiente que podem ser afetados pela proposta (projeto, plano, programa, política)
em análise.

Esta definição é bem ampla, mas insiste no princípio de que os estudos de base
não podem ser entendidos como qualquer acumulação de informações disponíveis;
antes, devem ter um foco em “componentes e processos selecionados” que possam ser
afetados pela proposta em estudo. Logo, trata-se de coletar e organizar informação
(ou seja, compilar informações existentes ou produzir nova informação) selecionada,
para atender às funções dos estudos de base dentro do EIA.

Beanlands (1988) correlaciona os estudos de base com o monitoramento ambiental.


Enquanto os estudos de base descrevem as condições ambientais existentes em um

LO
E s t u d o s de B a s e e D ia g n ó s t ic o A m b

dado momento em determinado local (área de estudo), mudanças subsequentes podem


ser detectadas com o monitoramento. Nesta acepção, os estudos de base fornecem
uma referência pré-operacional para o monitoramento e deveriam ser organizados de
tal maneira que permitissem uma comparação entre a situação pré-projeto e aquela
que poderia ser encontrada após a implantação. Tais estudos deveriam, portanto,
selecionar indicadores ambientais a serem levantados antes e depois da implantação
do projeto, de modo que se tratem de estudos essencialmente quantitativos, e que
possibilitem a comparação multitemporal.

Beanlands define estudos de base como “de§jcri£0es estatisticamente válidas de


componentes ambientais selecionados, feitas antes da implantação do projeto”
(p. 41). Tal definição vai além do conceito formulado no início desta seção, sem
deixar, porém, de seguir a mesma linha de raciocínio: não só a descrição da situa­
ção pré-projeto deve ser feita de modo a possibilitar um a comparação com a situação
futura, como precisa ser validada estatisticamente; logo, deve ser rigorosamente
quantitativa. Beanlands e Duinker (1983, p. 29) lamentam que poucos EIAs tentem
estabelecer de maneira quantitativa qual é a natural variabilidade espacial e tem po­
ral de parâmetros descritivos da situação pré-projeto, de modo que a comparação com
a situação pós-projeto tenha validade estatística.

Na prática é raro que um estudo de impacto ambiental atinja esse nível de sofistica­
ção, mas o princípio de que a descrição da situação atual deveria tornar possível uma
comparação com a situação depois de implantação do empreendimento é coerente
com o conceito de impacto ambiental da Fig. 1.5.

Logo, os estudos de base não podem se limitar a uma descrição, por mais rigorosa,
completa ou detalhada que seja; seu objetivo não é apenas possibilitar comparações
multitemporais, mas também, e principalmente, permitir que os analistas ambientais <£
façam previsões cientificamente bem fundamentadas sobre a provável situação futura.

Os estudos de base também devem ser realizados de forma a mostrar a dinâmica


ambiental da á rea afetada, apresentando um a caracterização dos principais processos
atuantes na área de estudo (Fornasari Filho et al., 1992), em vez de se limitar a uma
descrição estática do ambiente afetado. Dito de outra forma, isso significa que os
estudos de base devem indicar a evolução mais provável das condições ambientais na
área de estudo, descrevendo-a com a ajuda de indicadores apropriados.

Os resultados dos estudos de base formam um a descrição e análise da situação atual


de uma área de estudo feita por meio de levantamentos de componentes e processos
do meio ambiente físico, biótico e antrópico e de suas interações, o que é usualmente
chamado de diagnóstico ambiental, um retrato da situação pré-projeto, ao qual virá
se contrapor um prognóstico ambiental, ou seja, um a projeção da provável situação
fu tura do ambiente potencialmente afetado, caso a proposta em análise seja implemen­
tada; também se pode fa zer um prognóstico ambiental considerando que a proposta
em análise não seja implementada.

0 prognóstico ambiental será resultante da próxima etapa na preparação do EIA, que


é a análise dos impactos e, dentro desta, principalmente da atividade de previsão de
impactos.

NO)
ação ae Impacto Ambiental: conceitos e métodos

O conceito de estudos de base proposto por Beanlands e Duinker (1983) tem outro
ponto importante: aborda componentes ambientais selecionados ou, em outras pa­
lavras, componentes valorizados do ecossistema (valued ecosystem components).
Esses autores colocam-se decisivamente contra a abordagem exaustiva, defendendo
a necessidade de elaborar-se um a estratégia para os estudos de base que sejam
articulados com as demais atividades da avaliação de impacto ambiental. M edian­
te a seleção dos com ponentes am bientais mais significativos (feita na etapa de
scoping ou seleção das questões relevantes), os estudos am bientais são dirigidos
para elucidar os principais desafios impostos pelo projeto em análise. Para Bean­
lands (1993), parte das dificuldades dos primeiros anos da prática da AIA derivava
da tentativa de incluir-se quase tudo em um EIA, resultado de termos de referência
muito pobres. Daí um dos meios para se focalizar os estudos nas questões relevan­
tes ser utilizar o conceito de componentes valorizados do ambiente.

9 . 2 O C O N H E C IM E N T O DO M E IO A FE TA D O
Uma das funções dos estudos de base é fornecer dados para confirmar a identificação
preliminar e para a previsão da magnitude dos impactos. Pode-se afirm ar que, quan-
-=~>to mais se conhece sobre um ambiente, maior é a capacidade de prever impactos e,
portanto, de gerenciar o projeto de modo a reduzir os impactos negativos. A Fig. 9.1
10 potencial de ilustra a relação entre o potencial de impacto1 e o grau de conhecimento do ambiente.
impacto é a relação
Quanto menos se sabe, maior é o potencial de um empreendimento causar impactos
entre a solicitação
ambientais significativos, devido, justam ente, ao desconhecimento dos processos am ­
ou pressão imposta
por um projeto e a bientais, da presença de elementos valorizados do ambiente e da vulnerabilidade ou
vulnerabilidade do da resiliência desse ambiente. Por exemplo, considere-se um empreendimento propos­
ambiente afetado, to para um a região com potencialidade de ocorrência de cavernas (região cárstica). A
conforme Cap. 5 única maneira de se saber se o projeto poderá afetar cavernas, e como estas poderão
especialmente
ser afetadas, é verificando se elas existem. Em um primeiro momento, portanto,
Fig. 5.3.
quando o conhecimento é baixo (não se sabe se realmente existem cavernas no local),
é necessário admitir que o potencial de impactos é elevado, ou seja, o empreendi­
mento pode causar grandes danos ao patrimônio espeleológico. Somente depois de se
realizar um levantamento pode-se reduzir a incerteza.

0 mesmo raciocínio é válido para outros elementos ou componentes valorizados do


ambiente (por exemplo, espécies de fauna e flora ameaçadas, ecossistemas de ele­
vada produtividade como os manguezais, sítios de importância cultural, pontos de
encontro da comunidade local). 0 raciocínio também se aplica a processos ambientais:
a dragagem de um canal de acesso a um novo porto poderá afetar os padrões de
circulação em um estuário e ter alguma conseqüência sobre a fauna? 0 rebaixamento
de um a soleira rochosa no rio Paraguai no ponto em que este deixa o Pantanal pode­
ria contribuir para secar ou drenar essa vasta planície de inundação? (Essa foi um a
questão-chave na discussão sobre o projeto da hidrovia Paraná-Paraguai.)

Outro ponto ilustrado na Fig. 9.1 é que, quando sabemos pouco acerca das condições
ambientais de um local, qualquer aquisição de conhecimento já representa um
grande avanço 110 sentido de se entender melhor os impactos potenciais do projeto.
No entanto, a p artir de um certo ponto, é preciso um grande esforço de investiga­
ção para lograr grandes avanços no conhecimento. Como os estudos ambientais são

CAPÍTU L O
E s t u d o s d e B a s e e D ia g n ó s t ic o A m b i e Zz

sempre executados em um contexto de limitação de tempo e


A partir deste ponto, a u m e n ta r o
recursos, é interessante poder identificar o momento a p a rtir
de conhecim ento do meio não diminu .
do qual com pensa pouco co n tin u ar investindo em aquisição sign ificativam ente, o conhecim ento
de dados. Um exemplo prático dessa limitação é dado pela sobre o potencial de im pacto.

Fig. 9.2, que representa um a cu rv a hipotética de esforço


am ostrai na identificação de avifauna. Levantam entos de
aves são relativam ente com uns em estudos ambientais, por­
que esse grupo faunístico é um bom indicador do estado Nível de conhecim ento do meio am b ien te
de conservação dos hábitats e porque as espécies são de
Fig. 9.1 Representação esquem átiea da relação
identificação relativam ente fácil, ao contrário de ou ­
entre o nível de conhecim ento do am biente e o
tros grupos. A Fig. 9.2 m ostra que, a p a rtir de um certo
p o te n cia l de im p a cto a m b ie n ta l
momento, o esforço adicional de levantam ento (representa­
do pelo núm ero de dias de cam po de um especialista) não
produz aum ento significativo no conhecim ento (o núm ero
de espécies identificadas), um a vez que o ornitólogo passa
a ver mais exem plares das mesmas espécies, mas poucas
novas espécies, ou nenhum a. Isso ocorre porque o núm ero
de espécies de aves em um dado local é finito, sendo te o ­
ricam ente possível identificar todas. Em um levantam ento
de avifauna realizado du rante quatro anos em um a u n i­
dade de conservação na região da Serra do Mar, o Parque
Estadual de Intervales, São Paulo, Vielliard e Silva (2001)
identificaram um total de 338 espécies, ao longo de 22
cam p an h as de dois a quatro dias de duração, espaçadas de Fig. 9 .2 Curva h ip o té tic a do esforço a m o stra i no
dois a três meses. A prim eira ca m p an h a identificou cerca de levantam ento de avifauna. Os núm eros indicados na
cem espécies, núm ero que já dobrou após a segunda; cada fig u ra não representam , necessariam ente, valores
cam p an ha adicional representou um pequeno increm ento típicos de nenhum ecossistema. A fig u ra indica
em relação à anterior. esforço a m o stra i contínuo, não levando em conta
cam panhas de am ostragem realizadas em diferentes
épocas do ano, p rá tic a que corresponde às recom en­
9 .3 P l a n e j a m e n t o d o s e s t u d o s dações da m a io ria dos especialistas
São muitos os estudos am bientais executados sem que se
tenha dado previam ente a devida atenção à definição clara
e precisa de sua abrangência e escopo (Ross, M orrison-Saunders e Marshall, 2006).
0 exemplo do EIA da hidrovia A raguaia-Tocantins (conforme seção 6.1), no qual os
impactos sobre o turism o não puderam ser avaliados de modo satisfatório por falta de
dados prim ários (e por ausência de dados secundários), serve para ilustrar a dimensão
dos problemas decorrentes da deficiência ou mesmo da inexistência de planejamento
adequado dos estudos.

0 caso m ostra a ausência do que deveria ser um princípio básico para um bom
diagnóstico ambiental, ou seja, realizar os levantam entos necessários e não fazer
um a compilação de dados disponíveis.

Um outro exemplo ajuda a melhor ilustrar a relação entre dados disponíveis e dados
necessários. No projeto de um a nova fábrica de cimento e m ina de calcário, um dos itens
do diagnóstico am biental era a espeleologia. 0 EIA fez um levantam ento bibliográfico
e verificou que não havia registro de cavernas conhecidas na região, concluindo sobre
.'ação de impacto Ambiental: conceitos e métodos

a inexistência de cavernas na área da futura mina. 0 empreendimento foi aprovado


administrativamente e obteve a licença de instalação, mas entidades ambientalistas,
denunciando o risco de destruição do patrimônio espeleológico, foram à impren­
sa, ao órgão federal encarregado da defesa do patrimônio e ao Ministério Público.
A imprensa regional publicou várias matérias sobre o caso, o Iphan (Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) abriu um processo administrativo e o
2À época (1989), Ministério Público abriu um inquérito civil2. Em decorrência do inquérito, o empreen­
o Instituto
dedor contratou novos estudos, desta vez específicos para prospecção e mapeamento
Brasileiro do Meio
Am biente e dos
de cavernas, que foram efetivamente localizados no entorno da área da futura mina,
Recursos Naturais mas não na área diretamente afetada. Esses estudos complementares acabaram por
Renováveis (Ibama) resolver o problema, que poderia ter sido evitado se os primeiros estudos tivessem
ainda não era sido adequadamente planejados, definindo quais os dados necessários e quais os mé­
ativo na proteção todos para obtê-los3.
do patrimônio
espeleológico.
Tais casos mostram a importância de que os estudos de base sejam planejados previa­
30 caso deve mente - e, de preferência, que as orientações para sua realização sejam incorporadas
ser apreciado aos termos de referência. Tendo em vista que serão utilizados métodos e técnicas das
em seu contexto várias disciplinas cobertas pelos integrantes dà equipe técnica, cabe uma aborda­
histórico. Embora já gem semelhante àquela empregada em projetos de pesquisa científica, com definição
houvesse, na época,
prévia dos objetivos do trabalho, sua metodologia e dos resultados esperados, para
exigência legal
de levantamento cada levantamento. Como afirma Beanlands (1993, p. 63), é preciso dispor de uma
espeleológico para estratégia, de estudo, um plano para “coordenar os vários programas de coleta de
empreendimentos dados e exercícios de modelagem”.
“potencialmente
lesivos ao 0 planejamento dos estudos deve responder a quatro perguntas:
patrimônio
1) Quais as informações necessárias e para qual finalidade serão utilizadas?
espeleológico
nacional", o tema 2) Como serão coletadas essas informações?
era novo e nele 3) Onde serão coletadas? í)
havia poucos 4) Durante quanto tempo, com qual frequência e em que épocas do ano serão coletadas?
especialistas.
Somente depois de conhecidas as respostas a essas quatro perguntas é que se pode
iniciar os levantamentos. Caso contrário, há grandes chances de obter resultados
insatisfatórios, e talvez o trabalho tenha de ser refeito ou complementado. Uma
conseqüência certa de um diagnóstico ambiental insuficiente é o atraso na aprovação
do empreendimento. Além disso, a realização de levantamentos complementares em
um EIA geralmente representa maiores custos e sempre há o risco de contestações
judiciais, uma nova fonte de demora e custos adicionais.

D e f in iç ã o d a s in f o r m a ç õ e s q u e d e v e m ser l e v a n t a d a s
Em face da exigência de multidisciplinaridade e da vasta gama de impactos possí­
veis da maioria dos empreendimentos para os quais são feitos estudos de impacto
ambiental, há um grande risco de que sejam coletadas vastas quantidades de infor­
mações irrelevantes, que são aquelas não utilizadas para a previsão e avaliação dos
impactos, nem para a formulação do plano de gestão, e tampouco permitem uma
comparação da situação e.r ante com aquela ex post. Basta consultar um a amostra de
EIAs para encontrar-se boa quantidade e variedade de informações irrelevantes na sua
maioria. A compreensão imperfeita das funções e dos papéis da avaliação de impacto

CAPÍTU LO
E s t u d o s de B a s e e D ia g n ó s t ic o A m b ie J

*
ambiental resulta em u m a tendência para se apresentar inform ações disponíveis em
detrimento das necessárias para a análise dos impactos e, consequentem ente, para a
tom ada de decisões.

Um exemplo pode a u x ilia r novam ente na com preensão do conceito. Considere-se


im estudo de impacto am biental de um projeto que envolva processos causadores
de poluição atmosférica, como u m a u sina term elétrica ou um a fábrica de cimento,
"•este caso, n a tu ra lm e n te um dos impactos mais significativos será a degradação
da qualidade do ar decorrente das em issões poluentes. Logo, o estudo de impacto
ambiental deverá ocupar-se em prever a situação fu tu ra da qualidade do ar em toda
um a zona ao redor da fonte de emissão. Isso n orm alm en te é feito com a ajuda de
modelos m atem áticos que calculam as concentrações de poluentes, desde que devi­
damente alim entados com dados num éricos sobre as emissões propriam ente ditas e
sobre as condições atm osféricas p ara dispersão dos poluentes. Assim, ao se planejar
:s estudos, devem -se estipular que tipos de dados serão necessários (direções predo­
m inantes dos ventos e sua intensidade, classes de estabilidade atm osférica e outros),
: ia l a confiabilidade requerida e outras condições para que a etapa seguinte do EIA,
= previsão dos impactos, possa ser ex ecu tad a a contento (conforme Cap. 10). Eccleston
2000, p. 176) com enta que nos EUA, apesar das diretrizes gov ern am en tais explícitas
sobre focalização dos estudos - o regulam ento de 1978 do Conselho de Qualidade
Ambiental determ ina que os EIAs devem “descrever sucintam ente o am biente da área
s ser afetada” e que “as descrições não devem ser m ais longas que o necessário para
: empreender os efeitos das a lte rn a tiv a s” - , “não é incom um en c o n tra r um EIA que
sire se n te um a ex te n sa discussão de recursos am bientais, mesmo daqueles que cla ra­
mente não têm potencial para serem afetados”.

- definição da abrangência e do alcance dos estudos ocorre n o rm alm ente na prep a­


ração dos term os de referência (conforme seção 6.4). No entanto, nem sem pre estes
são suficientem ente precisos e detalhados, e podem necessitar de revisão ou ajuste
na execução dos estudos. Por oufro lado, quando as em presas consultoras preparam
propostas técnicas e comerciais para realizar estudos am bientais, devem ter um a esti­
m ativa razoável dos custos dos estudos, de modo que precisam definir seu escopo e
abrangência com pequena m argem de erro, um a vez que isso influencia sobrem aneira
os custos dos serviços oferecidos.

Uma vez iniciado o EIA, ainda é possível fazer correções e ajustes, embora, na
m aioria das vezes, m u danças substanciais devam ser ju stificad as perante o cliente
e aprovadas pelos agentes governam entais. Canter (1996, p. 117) recom enda que a
equipe do EIA deixe explícitas as razões para inclusão ou exclusão de elementos ou
fatores am bientais nos estudos de base, sugerindo que se apliquem critérios como:
# scoping: elemento selecionado para os estudos de base por resultar do processo
de seleção das questões relevantes ou constar dos termos de referência;
# trabalhos de campo: elemento incluído por ter sido verificado ou constatado
durante os trabalhos de campo;
$ julg am en to profissional: elemento incluído em razão da apreciação da equipe
multidisciplinar;
# ju lg am en to profissional: elemento excluído por não ser um recurso que possa ser
afetado pelo empreendimento.
íiação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

M étodos de coleta e a n á l is e
0 plano de trab alh o p ara realização dos estudos de base deveria, na m edida do
possível, descrever as m etodologias que serão u tilizadas p ara a coleta das inform ações.
Diversas decisões a serem tom adas aqui influenciarão o resultado dos estudos. Dentre
elas destacam -se as seguintes:

D evem -se levantar dados prim ários ou secundários? Dados secundários são aque­
les preexistentes, disponíveis ju n to a diferentes fontes, públicas ou privadas, como
bibliografia, cartografia, relatórios não publicados, bancos de dados de órgãos públi­
cos, de organizações não gov ern am en tais e, finalm ente, dados j á obtidos pelo próprio
empreendedor. Dados prim ários são aqueles inéditos, levantados com a finalidade
4[/m erro estratégico específica do estudo de impacto am bien tal4. Em qualquer EIA haverá tanto dados
no planejamento secundários como prim ários. Por exemplo, dados sobre a dem ografia e a econom ia
do EIA da fábrica são geralm ente disponíveis, enqu an to as características de u m a porção de v eg eta­
de cimento e mina ção existente na área onde será construído o em preendim ento som ente poderão ser
de calcário citado
conhecidas após lev an tam ento apropriado no campo. Cabe ao especialista que u tili­
a nteriormente foi
ter escolhido usar zará os dados to m a r a decisão sobre o tipo de dados que necessita. Por exemplo, na
dados secundários m odelagem da dispersão de poluentes, o especialista poderá info rm ar-se sobre as
para uma situação fontes se cu n d á ria s disponíveis p ara dados sobre variáveis atm osféricas (por exemplo,
que requeria dados em aeroportos ou estações climatológicas governam entais), e então decidir se são ou
primários oriundos não adequados para seu trab alh o de previsão.
de levantamentos
de campo.
D evem -se realizar inventários ou pode-se proceder por am ostragem ? A resposta d ep e n ­
derá do tipo de dado e de sua relevância para a análise dos impactos. Por exemplo,
nos estudos relativos a u m a barragem , a população h u m a n a que ocupa a área de
inu ndação deverá ser objeto de levan tam en to censitário detalhado, en q u an to p ara
o levantam en to da vegetação n o rm alm en te vai-se proceder por am ostragem — não
se vai m edir e identificar todas as árvores, m as realizar estudos em áreas reduzidas,
segundo determ inados critérios de am ostrag em conhecidos dos profissionais do setor
e que poderão ser extrapolados para a totalidade da área, com um a m argem de erro
definida antecipadam ente.

D evem -se coletar séries temporais ou podem -se realizar am ostragens únicas? N ova­
mente, a estratégia dependerá da variável estud ada e de seu com portam ento ao longo
do tempo. Por exemplo, a qualidade da á g u a de um rio, que, em geral, tem variação
sazonal, deveria ser objeto de estudo d u ra n te um certo período, u su a lm e n te um ciclo
hidrológico, mas a c o b e rtu ra vegetal não tem essa variabilidade e m uitas vezes pode
ser estud ada em u m a única c a m p a n h a de campo. No entanto, p a ra o levantam en to
da vegetação podem ser necessárias diversas c a m p a n h a s em um mesmo local, pois
as espécies florescem em diferentes épocas do ano e, às vezes, a identificação de um a
espécie só é possível por interm édio das flores. 0 mesmo vale p ara levantam entos
faunísticos.

A lim itação do tem po dos estudos devido aos interesses do em preendedor em obter sua
aprovação o mais rápido possível nem sempre conduz aos resultados esperados (em
term os de rapidez na obtenção da licença), e tam b ém pode ter repercussões fu tu ras.
A Fig. 9.3 ilustra um exemplo hipotético de m onitoram ento da qualidade das águ as
superficiais, sugerindo que um a estratégia de am o stragem que não leve em conta

capituI I H H H H H H H
E s t u d o s de B a s e e D ia g n ó s t ic o A m b i e 225

a sazonalidade pode levar a conclusões


errôneas. Caso tenha sido coletada so­
mente um a amostra de água antes do
início da implantação do empreen­
dimento e a amostragem tenha sido feita
no dia Tl, e supondo que haja monito­
ramento contínuo ou freqüente após a
implantação do empreendimento, e ain ­
da tomando a média do indicador para
o período pós-implantação, o analista
chegará a um a conclusão errônea sobre
Fig. 9.3 R epresentação esquem ática da variação de um in d ic a d o r h ip o té tic o
o impacto do empreendimento sobre esse
de qu a lid a d e de água
indicador: terá a impressão de que o im­
pacto foi muito maior do que realmente
é. Inversamente, se a amostragem foi realizada no dia T2, a conclusão será a de que
praticamente não houve impacto.

Devem-se efetuar amostragens contínuas ou discretas? Para certos parâmetros


ambientais pode ser necessário efetuar medições contínuas ou a intervalos de tempo
muito curtos, enquanto para outros são suficientes algumas amostras coletadas com
semanas ou meses de intervalo. Como regra geral, na maioria dos estudos de impacto
ambiental não são necessárias amostragens contínuas, procedimento mais empregado
no monitoramento operacional (por exemplo, emissões de poluentes atmosféricos em
chaminés).

A título de exemplo, o Quadro 9.1 indica algumas estratégias usuais para estudos de
base no Brasil. Note-se que os exemplos são apenas ilustrativos, e de modo algum
prescritivos. Procurou-se indicar as características mais freqüentes em estudos de
base para EIAs realizados em>ambientes terrestres.
w

A rea de estudo
Todo planejamento de um estudo ambiental deve estabelecer de antemão a área de
estudo, ou seja, a delimitação do local que será objeto dos diferentes levantamentos,
sejam eles primários ou secundários. A área de estudo poderá variar em função do
tipo de levantamento a ser realizado, e o grau de detalhe de um tipo de levantamento
especializado poderá ser diferente de um levantamento temático.

Uma delimitação m ínim a da área de estudo corresponde à própria área a ser ocupada
pelo empreendimento, usualmente chamada de área diretamente afetada. Trata-se
ia área de implantação e de seus componentes ou instalações auxiliares, em que
pode ocorrer perda da vegetação preexistente, impermeabilização do solo e demais
modificações importantes. Por exemplo, no caso de um a usina hidrelétrica, a área di­
retamente afetada compreende a área do reservatório, a área do barramento, da casa
ce força, da subestação elétrica, as áreas ocupadas por acampamentos, vilas residen­ ._/V
V
ciais e instalações administrativas e de apoio (oficinas, pátios, estacionamentos), assim
::m o os locais de extração de materiais de empréstimo e as áreas de reassentamento
j
ia população.

NOl
___ c liação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Q u a d r o 9.1 Exemplos de estratégias para alguns levantamentos de No entanto, os impactos de um em preen­


dados em estudos de base] dimento nunca ficam restritos à sua
D a d o s p r im á r io s - D a d o s s e c u n d á r io s própria área de implantação, no mínimo
Geologia local Geologia regional fazendo-se sentir em sua vizinhança.
Relevo e solos Clima Por isso a área de estudo pode ser signifi-
Ruído Hidrologia cativamente maior que a área diretam ente
Qualidade do ar e Fontes de poluição afetada. Para muitos empreendimentos, a
meteorologia bacia hidrográfica é um a unidade de a n á ­
Qualidade da água Areas contaminadas lise adequada no que se refere a vários
Dinâmica e qualidade da água Poços profundos impactos sobre o meio físico. Já em rela­
subterrânea ção aos impactos sociais e econômicos,
Radiações ionizantes Finanças municipais unidades políticas como municípios
Fauna, flora, ecossistemas População e indicadores ou conjuntos de municípios costum am
aquáticos sociais ser recortes territoriais adequados,
População local diretamente Emprego, renda e atividade um a vez que vários desses impactos se
afetada econômica
_ . . . ^ m anifestam nesse nível, como o aumento
Uso de recursos naturais Bens culturais de importân­
da arrecadação tributária ou o aumento
cia reconhecida
da dem anda de serviços públicos. A in-
Sítios de interesse natural Unidades de conservação
ou cultural tensidade e o detalham ento de certos
Sítios arqueológicos estudos temáticos poderá ser diferente
W . í v\*‘Y.‘v..v.X & x S & à u & Z •... ■ S w

Uso do solo segundo diferentes recortes territoriais,


Populações tradicionais Ipjllg .
por exemplo, mais detalhados e baseados
em dados primários na área diretam en­
I n v e n t á r io s X A mostragem
te afetada pelo empreendimento, e de
Sítios de interesse natural Água, ar, ruído, radiações
menor detalhe ou baseados em inform a­
ou cultural
ções secundárias no restante da área de
População local diretamente Fauna, flora, ecossistemas
afetada aquáticos estudo.
Uso de recursos naturais Nível e qualidade da água
subterrânea Não se deve co n fun dir área de estudo
Uso do solo Sítios arqueológicos com área de influência. Este último
S é r ie s t e m p o r a is x A m o s t r a s p o n tu a is 3 4
termo designa a área geográfica que
/
pode sofrer as conseqüências, diretas ou
Agua, ar Ruído
indiretas, do empreendimento. P o rtan ­
Ecossistemas aquáticos Fauna, flora
to, a área de influência somente poderá
Nível e qualidade da água Sítios arqueológicos
subterrânea ser conhecida depois de concluídos os
estudos. Por exemplo, para saber qual a
1Os exemplos são apenas ilustrativos e não prescritivos; procurou-se indicar
área de influência de um a usina term elé­
as características mais freqüentes em estudos de base para ElAs realizados
em ambientes terrestres. Como discutido exaustivamente neste livro, os trica quanto à alteração da qualidade do
estudos devem ser individualizados; esta lista não esgota os temas que ar, deve-se primeiro coletar informações
podem ser tratados em diagnósticos ambientais. sobre as tax a s de emissão de poluentes
2Os levantamentos primários não prescindem de levantamentos secundários atmosféricos (tarefa norm alm ente execu­
sobre os mesmos assuntos, seja para obter dados do passado, seja para tada na fase de caracterização do projeto)
ampliar a área sobre qual informação é obtida, seja, ainda, porque é sempre e sobre as condições atmosféricas e de
recomendado conhecer os estudos anteriores realizados para o mesmo local relevo da área (tarefa realizada na fase
ou região. de estudos de base), a fim de conhecer as
2Aplica-se a levantamentos primários. possíveis concentrações futuras de polu­
4Aplica-se somente a dados levantados por amostragem. entes (conclusão que somente pode ser
obtida na etapa de previsão dos impactos).

CAPÍTU LO
E s t u d o s de B a s e e D ia g n ó s t ic o A m b i e J

De modo semelhante, a área afetada por um derram am ento de petróleo no m ar so­


mente será conhecida após um a modelagem que leve em conta ventos e correntes
marítimas, a qual depende de dados oceanográficos coletados ou compilados durante
os estudos de base.

Em determ inadas situações, a área de estudo pode ser maior que a área de influência. —
Por exemplo, em geral, os impactos diretos sobre o patrimônio arqueológico ficam
restritos à área diretam ente afetada ou suas imediações. No entanto, para realizar
levantamentos de potencial arqueológico de um a área, os arqueólogos necessitam
estudar áreas maiores, para entender como os grupos hum anos no passado utiliza­
vam os recursos do território que ocupavam.

0 inverso tam bém é verdade. Im agine-se um empreendimento que possa afetar um a


área úmida, como o Pantanal. Esse ambiente é ocupado por espécies migratórias,
que ali passam apenas parte de seu ciclo de vida. Embora a área de influência de
um empreendimento de grande impacto (como a hidrovia Paraná-Paraguai) possa
estender-se até a América do Norte, muito dificilmente um estudo de im pac­
to ambiental abarcaria um a área continental como área de estudo. Neste caso, a
estratégia seria considerar as espécies potencialmente afetadas como componentes
valorizados do ambiente e estudar sua biologia com base primordialm ente em fontes
secundárias.

T emporalidade DOS ESTUDOS


A temporalidade é, evidentemente, da maior relevância para o planejamento dos
estudos. A duração pode ser determ inada por necessidades intrínsecas de certos
procedimentos de amostragem ou de levantamento censitário, cuja escolha, por sua
vez, depende do grau de detalhamento desejado. Porém, o que pode ser determ inante
para estabelecer a duração total dos estudos são características sazonais próprias a
certos fenômenos que devem ser estudados.

Em tal situação, alguns empreendedores estabelecem, por conta própria, um a base de


dados pré-operacionais e os colocam à disposição da equipe encarregada de preparar
os estudos ambientais. Nada impede que dados que necessitem de séries temporais
longas para serem convenientemente analisados sejam coletados bem antes de ser
iniciado o EIA. Por exemplo, a modelagem de dispersão de poluentes atmosféricos
conforme seção 10.3) necessita de, pelo menos, um ano contínuo de monitoramento
ãe parâmetros meteorológicos, raram ente disponíveis para o sítio no qual ocorrerão
as emissões, o que leva os analistas a adquirir dados de outras localidades - como
aeroportos - que podem se situar a mais de 100 km do ponto de interesse.

9.4 C onteúdos e abordagens dos estudos de base


No Brasil, é quase padrão a divisão do ambiente em três grandes compartimentos
para fins de diagnóstico ambiental: os meios físico, biótico e antrópico. Basicamente,
a filosofia por trás dessa divisão coloca no compartimento “meio físico” tudo o que
diz respeito ao ambiente inanimado, e no “meio biótico”, tudo o que se refere aos
seres vivos, excluídos os humanos, que são tratados no “meio antrópico”. 0 “meio
antrópico” no Brasil é frequentemente, mas de modo pouco apropriado, também de­
nominado de “meio socioeconômico”, termo que deixa de fora a dimensão cultural
liação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

das atividades humanas. É bem verdade que a dimensão cultural é raramente tratada
nos EIAs, ou então, nos casos de projetos que possam afetar comunidades indígenas, é
tratada em um estudo à parte, desconectado do EIA, como um “laudo antropológico”.
Uma expressão alternativa para “meio antrópico” poderia ser “ambiente hum ano”.
A divisão do ambiente em três meios é artificial, como qualquer outra que se faça, mas
esta não é a única maneira de compartimentar o ambiente total para fins de descrição
e análise. Em outros países, são usados critérios diferentes, como a inclusão da cate­
goria “paisagem”, que abarca componentes bióticos, como a vegetação, e elementos
antrópicos, como as formas de uso do solo e a infraestrutura. Outras vezes, agrupa-se
em “meio biofísico” tudo o que diz respeito ao ambiente natural, eom todo o restante
apresentado em um a seção sobre “ambiente hum ano”. Muitos dos termos apresentados
na Fig. 1.2 servem como estrutura para fins de diagnóstico ambiental. 0 Quadro 9.2
mostra exemplos de estrutura do diagnóstico ambiental em alguns EIAs; é interes­
sante notar os exemplos nos quais a estrutura geral não abarca um capítulo separado
para o diagnóstico e outro para a análise dos impactos, mas apresenta um a seqüência
de tópicos no qual cada componente ambiental selecionado é primeiro descrito e, em
seguida, tem seus impactos avaliados.

Qualquer divisão do ambiente para fins de análise ou descrição será sempre arbitrária
e não pode ser empregada de modo rígido. A descrição da qualidade das águas
superficiais, por exemplo, pode ser feita por meio de parâmetros físicos e químicos
(temperatura, turbidez, pH, oxigênio dissolvido, demanda bioquímica de oxigênio
etc.) e, ao mesmo tempo, com parâmetros biológicos (presença de microrganismos,
diversidade de algas, composição das comunidades planctônicas etc.). Logo, como há
elementos do meio físico e do meio biótico, onde enquadrar essa parte do diagnós­
tico? Uma alternativa poderia ser a divisão da área de estudo em um mosaico de
ambientes (como ambientes urbanos, rurais, seminaturais, aquáticos etc.) e enquadrar
a descrição da qualidade da água nesta últim a categoria.

Outro exemplo é a descrição das formas de uso do solo, essencial para apreender-se
o contexto em que se insere a proposta analisada. Para fins de descrição estrita das
modalidades de uso e ocupação pela sociedade, a legenda de um mapa de uso do solo
poderá apresentar classes como “área urbana”, “culturas temporárias”, “pastagens”,
“culturas permanentes” e “vegetação nativa”. Todavia, esta últim a classe pode ser ex­
pandida para incluir os diferentes tipos de vegetação nativa que podem ser encontrados
na área de estudo, de modo que, ademais de um mapa das formas de uso do espaço,
tem-se também um mapa das formações vegetais identificadas. Tal mapa deveria ser
apresentado na seção correspondente ao meio biótico ou ao meio antrópico?

Há, inegavelmente, certa dose de arbitrariedade em qualquer compartimentação do


ambiente. A maneira de fazê-lo reflete escolhas da equipe multidisciplinar consultora
e eventuais orientações dos termos de referência ou preferências da equipe do órgão
ambiental regulador. Mais importante, no fim das contas, é o conteúdo do diagnóstico
ambiental e não a m aneira como está estruturado, embora um a boa estruturação fa­
cilite sua leitura e compreensão.

0 conteúdo do diagnóstico ambiental de cada EIA deve ser específico. Todavia, há


alguns traços gerais comuns a muitos EIAs, que serão tratados na seqüência de acordo
com a compartimentação predominante no Brasil de meio físico, biótico e antrópico.

CAPÍTU
E s t u d o s de B a s e e D ia g n ó s t ic o A m b i e

Q uadro 9.2 Exemplos de estruturas de diagnóstico am biental em ElAs*

U s in a H id r e l é t r ic a Ea s t m a in 1, Q uebec, Canadá 3.2.13 Geologia


Parte 3: Descrição do Meio 3 .2.14 Á g u a s u b te rrâ n e a e s a linida de
3.2.15 Flora e fa u n a
C ap ítu lo 1: Zona de estudo 3.2.16 Florestas
C ap ítu lo 2: M e io físico 3.2.17 Paisagem
1. G eografia física geral 3.2.18 Fogo
2. G e o m o rfo lo g ia 3.2.19 Q u a lid a d e do ar
3. Clima 3.2.20 Ruído
4. H id ro lo g ia e re g im e té r m ic o 3.2.21 A tiv id a d e agrícola
5. Q u a lid a d e da água
M e m o r ia l W o r l d T r a d e C e n te r , N o v a Y o r k , E s t a d o s
C ap ítu lo 3: M e io b io ló g ic o
U n i d o s 5- 6
1. V ege ta ção
2. Ic tio fa u n a C a p ítu lo 3: Uso do solo e p o lític a pública
3. A v ifa u n a C a p ítu lo 4: Desenho u rb a n o e recursos visuais
4. G rande f a u n a 1 C a p ítu lo 5: Recursos h istó ric o s
5. Pequena f a u n a 1 C a p ítu lo 6: Espaço a b e rto
6. M e rc ú rio no m eio n a tu r a l2 C a p ítu lo 7: Som bras
C apítulo 4: M e io h u m a n o C ap ítu lo 8: E q u ip a m e n to s c o m u n itá rio s
1. H is tó ric o da o cu p a ç ã o do te r r itó r io C a p ítu lo 9: C ondições s o c io e c o n ô m ic a s
2. Perfil s o c io e c o n ô m ic o C a p ítu lo 10: C aráter do bairro
3. U tiliz a ç ã o do t e r r itó r io C a p ítu lo 11: M a te ria is perigosos
4. Paisagem C a p ítu lo 12: In fra e s tru tu ra
5. A rq u e o lo g ia C a p ítu lo 13A: Tráfego e e s ta c io n a m e n to
C ap ítu lo 13B: Transportes p ú blicos e pedestres
M in a de F erro M arandoo e F e r r o v ia C entral P il b a r a ,
A u s t r á l ia O c id e n t a l , A u s t r á l ia
C a p ítu lo 14: Q u a lid a d e do ar
C ap ítu lo 15: Ruído
Parte 3 :0 Ambiente3 C ap ítu lo 16: Zona costeira
C ap ítu lo 5: A m b ie n te regional C a p ítu lo 17: Várzeas7
C apítulo 6: Parque N a cio n a l K arijini C a p ítu lo 18: Recursos n a tu ra is
C ap ítu lo 7: C lim a e te m p o C a p ítu lo 19: Cam pos e le tro m a g n é tic o s
C ap ítu lo 8: Á gua
C ap ítu lo 9: U nidades te r r ito r ia is *As referências com pletas se e n co n tra m na Lista de Estudos
C ap ítu lo 10: Fauna A m b ie n ta is Citados.
Capítulo 11: Flora e v e g e ta ç ã o IR efere-se a espécies selecionadas de m am íferos, de im p o r­
Capítulo 12: A m b ie n te social e p a rtic ip a ç ã o pública tâ n cia ecológica e c u ltu ra l.
Capítulo 13: A v a lia ç ã o de im p a c to s o c ia l4 2Esse ite m ju s tific a -s e pelo a u m e n to da co n ce n tra çã o do
Contorno de W oodend, R o d o v ia C a l d e r , V ic t o r ia , m e ta l na água, após inundação, co n fo rm e seção 10.4.
A j s t r á l ia 3Essa é a te rce ira seção do EIA, e in c lu i o d ia g n ó stico
Jarte 3: C a ra c te rís tic a s da A re a de E studo a m b ie n ta l e a análise dos im p a cto s; as o u tra s seções são: (1) o
3.1 Processo e área de e studo cenário regional, (2) a p ro p o s ta e (4) gestão e com prom issos.
3.2 S itu a ç ã o a m b ie n ta l 4Trata-se do ú nico c a p ítu lo em que a a va lia çã o é separada do
3.2.1 Uso da terra, p ro p rie d a d e e c o n tro le diagnóstico .
3.2.2 C ondições sociais e d e m o g rá fic a s sA presen tado com o "um p ro je to de re co n stru çã o e x tra o rd i­
3.2.3 C ondições e c o n ô m ic a s n á ria p a ra lem brar, re c o n s tru ir e re n o va r o que fo i p e rd id o em
3.2.4 Recreação e tu ris m o I I de setem bro de 2001".
3.2.5 A rq u e o lo g ia aborígene 60 d ia g n ó stico é apresentado com a análise dos im p a cto s
3.2.6 Patrimônio p a ra cada tó p ico selecionado; m edidas m itig a ú o ra s são apre­
3.2.7 U tilid a d e s e fe rro v ia s sentadas em c a p ítu lo próprio.
3.2.8 T ran sporte e trá fe g o 7Esse tó p ico atende a um re q u isito legal específico da
3.2.9 T o p o g ra fia legislação fe d e ra l am ericana.
3.2.10 C ondições c lim á tic a s
3.2.11 S egurança ro d o viá ria
3.2.12 Cursos d'água

NOj
ação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Antes, contudo, apresentam-se considerações sobre cartografia, ferramenta essencial


para o planejamento dos estudos, para os trabalhos de campo, para as análises poste­
riores e também para a apresentação dos resultados ao público.

C a r t o g r a f ia
Mapas são essenciais para a representação da maioria das informações produzidas ou
compiladas pelos estudos de base. Ao planejar um EIA, é necessário saber de antemão
qual é a disponibilidade de bases cartográficas e de outros meios de visualização e
representação espacial, como fotografias aéreas e imagens de satélite. 0 ideal é poder
decidir qual a escala dos mapas a serem apresentados no EIA durante seu planeja­
mento (requisitos quanto à escala mínima de representação podem ser incorporados
aos termos de referência).

A melhor escala dependerá do tipo de projeto analisado. Projetos lineares como duto-
vias e linhas de transmissão poderão requerer escalas pequenas (por exemplo 1:100.000
O ou 1:200.000) se tiverem dezenas de quilômetros de extensão. Naturalmente, detalhes
i

\
i
podem ser representados em escalas maiores. Projetos pontuais, como aterros de resí­
duos e empreendimentos urbanísticos, normalmente devem ter o diagnóstico ambiental
apresentado em escalas como 1:10.000 ou 1:5.000 (sempre sendo possível representar
detalhes em escalas maiores).

5Mapas Um problema prático é que nem sempre se dispõe de bases cartográficas5 oficiais nas
planialtimétricos escalas requeridas. Muitos países fazem seus levantamentos básicos em escala de
(ou seja, que 1:50.000, mas em um país com as dimensões do Brasil essa escala só é disponível
representam o
em parte do território. Mapas em escala 1:25.000 ou 1:10.000 são comuns na Europa,
terreno em duas
mas restritos a poucas regiões no Brasil. Para projetos de médio ou grande porte,
dimensões com
indicação das podem-se produzir mapas topográficos (restituições a partir de fotografias aéreas) es­
altitudes por meio peciais para as finalidades do projeto, como é o caso de barragens, rodovias e minas.
de curvas de nível) Nesses casos, é recomendável que a equipe ambiental possa opinar sobre a delimita­
sobre os quais ção da área a ser mapeada, pois suas necessidades nem sempre se limitam às áreas
serão representadas mapeadas para fins de projeto de engenharia. Para projetos pontuais, pode-se realizar
as informações
um levantamento topográfico (teodolito ou estação total), mas tais levantamentos
do diagnóstico
ambiental, por raramente são feitos para grandes áreas.
exemplo, um mapa
de uso do solo ou As fotografias aéreas não substituem os mapas porque sempre têm distorções maiores
um mapa geológico. em suas bordas. Já imagens de satélite, por serem tomadas em altitude muito superior
à dos aviões que realizam os levantamentos aerofotogramétricos, têm distorção muito
baixa e podem ser usadas como base planimétrica (ou seja, sem altimetria), desde
que gcorrcferenciadas. Georreferenciamento é o nome que se dá ao procedimento de
amarração de pontos conhecidos e perfeitamente identificáveis na foto ou imagem
a um sistema de coordenadas, de acordo com um a determinada projeção que repre­
senta a forma tridimensional aproximadamente elíptica da Terra (figura geométrica
chamada de elipsoide) sobre um a superfície bidimensional (plana). Na atualidade, os
fornecedores de imagens j á oferecem a opção de entregá-la georreferenciada.

Além de servirem de base para mapeamentos temáticos, os documentos cartográ­


ficos preexistentes são fonte de informação secundária da maior relevância, assim
como as fotografias aéreas e imagens de satélite. Algumas regiões dispõem de foto­

CAPÍTU LO
E s t u d o s de B a s e e D ia g n ó s t ic o A v . e e MT*
llnL

grafias aéreas há mais de cinqüenta anos, formando séries históricas descontínuas


que podem servir para reconstituir seu histórico de ocupação. Já fotografias recen­
tes são utilizadas para mapeamento de fragm entos de vegetação, de formas de uso
do solo, de áreas urbanas, para identificação de feições geomorfológicas de in te­
resse, como cavernas, e têm vários outros usos em estudos ambientais. A Fig. 9.4
mostra um exemplo de um mapa de uso de solo feito a p a rtir de fotografias aéreas. É
sempre necessário um controle de campo para verificar a atualidade das informações
(uma área fotografada como “reflorestamento homogêneo” continua com esse uso?).
Ademais, não é possível tran sferir o conteúdo de um a foto diretam ente para um
mapa, devido às distorções, sendo necessário efetuar correções geométricas que de­
m andam um serviço especializado.

Na inexistência de fotografias aéreas disponíveis, pode-se contratar um a empresa


de aerofotogrametria para realizar um sobrevoo da área de estudo. Por outro lado,
imagens de satélite de alta resolução espacial (abaixo de 1 m) converteram -se em
alternativa econômica e comparável às fotografias aéreas, com a vantagem da facili­
dade do georreferenciamento. Outra vantagem das imagens de satélite é que, além de
poderem ser adquiridas como composições coloridas (a m istura de cores equivalente
à de um a fotografia aérea), podem tam bém ser encomendadas por bandas espectrais,
ou canais RGB (red, green, blue). Determinados aspectos são mais realçados em certas
cores (por exemplo a vegetação ou a presença de água), ampliando as possibilidades
de interpretação e uso. Ademais, program as de computador perm item m anipular
'processar) as imagens para salientar ou esconder determ inado aspecto. Também há a
possibilidade de tom ar imagens em diferentes épocas do ano, para destacar aspectos
de sazonalidade.

Normalmente, em um EIA são usadas diferentes escalas de análise e apresentação.


Em um a escala regional (a p artir de 1:100.000) pode-se contextualizar o projeto,
situando-o em relação a assèntam entos hum anos, recursos hídricos, unidades de
conservação. Em um a escala local (1:10.000 a 1:25.000) situam -se os principais recur­
sos ambientais potencialm ente afetados ou alguns elementos valorizados do ambiente,
como os recursos hídricos, fragm entos de vegetação nativa e outros hábitats, sítios
de interesse n atural ou cultural e as formas de uso do solo. Já em um a escala de
ietalhe (1:1.000 a 1:5.000) são representados detalhes da implantação do em preen­
dimento sobre o terreno natural, m ovim entações de solo e rocha necessárias, limites
i a área de intervenção. Deve-se notar que o grau de detalhe decresce com a redução
da escala de m apeam ento - em um mapa 1:10.000, 1 mm no mapa corresponde a
1 m no terreno, de modo que nenhu m a feição m enor que 10 m pode ser adequadam ente
representada em um mapa impresso nessa escala, considerando que se empregam
linhas de 0,5 a 1 m m de espessura.

 m udança de escala pode afetar (João, 2002): (i) o número de feições mapeadas,
:: a medida de comprimentos e áreas e (iii) a posição das feições no mapa, interferindo,
desta forma, na identificação e na previsão de impactos. A autora mostrou que as
conclusões de um EIA podem depender da escala de trabalho adotada. Em um EIA
de um contorno rodoviário de um a cidade do sul da Inglaterra, a autora constatou
diferenças entre os impactos estimados a p artir de um mapa de escala 1:10.000 e um
ziapa em escala 1:25.000, entre outras para a área de fragmentos florestais afetados,

N0|
'ação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

47: 50'20" 47°49'10"


208.000 209.000 22°25’41"
.517.000

D renagem

Uso e ocup a çã o do solo

P asto/C am po a n tró p ic o

P la n ta çã o de cana

R e flo re s ta m e n to

M a ta c ilia r
7.516.000
Floresta m e só fila sem idecídua em estágio
in ic ia l de regeneração

Floresta m esófila sem idecídua em e stágio


m é dio e avan ça d o de regeneração

Base c a rto g rá fic a : iGC, Folha 0 6 5 /0 8 6 (Serra de São Pedro), escala 1 :10.000, 1979. 400 500m

Uso e o cu p a çã o do solo

P asto/C am po a n tró p ic o

P lantação de cana

R e flo re sta m e n to

M a ta c ilia r

Floresta m e só fila sem idecídua em e stágio


in ic ia l de regeneração
Floresta m e só fila sem idecídua em e stágio
5 m é dio e avançado de regeneração

Fig. 9.4 M a p a de uso do solo e respectiva


fo to g ra fia aérea
Fonte: P rom iner P rojetos S/C Ltda. R epro­
duzido com a u to riza çã o

Foto aérea: BASE, Foto 0 0 5 4 , Faixa 40, Obra 719, Data 0 8 /0 7 /0 0 ,

CAPÍTU L0
E s t u d o s d e B a s e e D ia g n ó s t ic o A m b i e 233

para a im portância de sítios arqueológicos e para o núm ero de residências situadas em


um a faixa de 200 m de cada lado do alinham ento e que poderiam ser afetadas pela
deterioração da qualidade do ar.

Assim, embora não possa haver um a regra universal, é im portan te que, duran te o
planejamento dos estudos de base, a escala de realização de levantam entos e a escala
de representação sejam pensadas com cuidado. Embora erros e deficiências possam
ser, direta ou indiretam ente, atribuíveis a escalas inapropriadas, não se pode descar­
tar, como lembra M onm onier (1996), que há v árias m aneiras de “m en tir com m ap as”.

M eio físico
Para muitos projetos de eng enh aria, o meio físico é um suporte - aqui em prega­
do tanto no sentido de fundação como no de lugar - ou um recurso a explotar.
.^or isso, m uitas inform ações sobre o meio físico podem ser obtidas em docum entos
de projeto (vazão de rios, propriedades m ecânicas de solos, por exemplo), mas nem
sempre essas inform ações são suficientes, ou mesmo necessárias p ara estudos a m ­
bientais. Por outro lado, a especialização profissional e o avanço da ciência levaram
í um a tendência de realizar estudos nos quais predo m inam descrições setoriais em
ez de análises integradas. Clima, qualidade do ar, qualidade das ág uas superficiais,
hidrologia das águas superficiais, águas subterrâneas, contam inação dos solos, solos
s:b o ponto de vista agronômico, solos sob o ponto de vista da en g e n h aria e outras
ram as especializações existem para o estudo dos recursos do meio físico.
i

Por essa razão, os estudos sobre o meio físico podem (mas não deveriam) ser muito.
: im partim entados, com seções descritivas e stru tu ra d a s em torno de disciplinas ou
ireas do conhecim ento - Geologia, Geomorfologia, Pedologia, Hidrologia, Hidrogeo-
:gia, Meteorologia e outras - , porém, com pouca ou n e n h u m a integração. Nesses
casos, não é rara a apresentação de m apas tem áticos de escalas diferentes e com
:e-cones territoriais variados.

-dem ais, os estudos do meio físico podem facilm ente perder-se em detalhes irrele-
iztes. Mesmo quando é claro que determ inado tem a (por exemplo, Geologia) deva
3cr tratado nos estudos de base, pode haver um a multiplicidade de enfoques possíveis.
I nem todos são de interesse para os estudos am bientais. No exemplo da Geologia,
: :em a pode ser apresentado como u m a descrição da história geológica da região,
::m o um a discussão sobre as e s tru tu ra s geológicas existentes na área de estudo,
::m o um a descrição das rochas presentes e seus m inerais constituintes, entre outras
3: crdagens possíveis. Porém, cabe..ao coordenador dos estudos am bientais dizer ao
rfcecialista que tipo de inform ação necessita e p ara qual finalidade será-utilizada.
l3cando claros os objetivos, estabelece-se qual o enfoque mais adequado e quais os
~ tcodos para atin g ir os objetivos desejados. Segundo Santos (2004, p. 73), “no Brasil,
::>esar de se reconhecer que o sucesso de u m planejam ento depende dos tem as esco-
: . i o s [para diagnóstico], é muito raro encon trar justificativas sobre sua seleção, e do
: :nreúdo de cada um deles. A prática m ostra que é com um essa decisão se basear na
disponibilidade de dados de e n tra d a ”.

De qualquer forma, os m apas e as cartas são as principais formas de expres-


: i : dos resultados dos estudos do meio físico, tanto pelo seu caráter de síntese (de

NO]
ação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

levantamentos de campo, de interpretação de imagens e de estudos anteriores) como


por possibilitarem um meio de comunicação com os usuários e com os leitores dos
estudos ambientais. 0 Quadro 9.3 mostra diversas cartas temáticas que podem ser
usadas para estudos de planejamento municipal (CPRM, 1991). Várias delas também
são empregadas em estudos de impacto ambiental.

Existem diferentes métodos e ferramentas que buscam promover a integração de


6“A Cartografia informações temáticas, a exemplo de cartas geotécnicas6e de cartas de suscetibilidade
Geotécnica constitui à erosão, entre outras. Nesses casos, dados como geologia, declividade e tipos de so­
a representação los são combinados para fornecer algum atributo ou alguma propriedade do terreno,
gráfica do
como suas vulnerabilidades (por exemplo, a escorregamentos de solo e outros movi­
levantamento,
avaliação e análise mentos de massa) ou sua aptidão para determinados usos (como o uso agrícola).
dos atributos do Essas ferramentas não são de uso exclusivo em avaliação de impacto ambiental.
meio físico (...) ” Ao contrário, como sói acontecer nesse campo, a AIA utiliza métodos, procedimentos
(Gandolfi, 1999, e instrumentos de diversas disciplinas e procura integrá-los para sua finalidade,
p. 117). que é a análise dos impactos. A cartografia geotécnica foi inicialmente empregada
para obras civis, mas gradualmente teve seu uso expandido para o planejamento
territorial e ambiental. Na França, cartas geotécnicas têm sido utilizadas desde os
anos 1970 como ferramenta para orientar a elaboração de planos de ordenamento ter­
ritorial (Sanejouand, 1972, p. 13). Na França, b planejamento urbano é requerido por
lei, e a inclusão de fatores ambientais nos documentos de urbanismo é obrigatória,
nos termos da Lei de Proteção da Natureza de 1976, a mesma que introduziu a obri­
gatoriedade de apresentação de estudos de impacto (conforme seção 2.2). No Brasil,
um a das primeiras aplicações da cartografia geotécnica ao planejamento urbano e
ambiental foi o mapeamento dos morros de Santos e São Vicente, na Baixada Santista
(Prandini et al., 1980); apresentada em escala 1:5.000, essa carta é voltada para a
prevenção de processos de escorregamento naturais e induzidos, tendo identificado,
na área de estudo de 830 ha, seis unidades geotécnicas, três delas adequadas para a
ocupação urbana e três impróprias.

Todavia, o emprego de cartas geotécnicas em estudos ambientais ainda não é muito


difundido, apesar de suas potencialidades e de um a considerável experiência prática
e sua confecção. Assim, o traçado de um gasoduto, por exemplo, deveria evitar as
porções do terreno com maior suscetibilidade a escorregamentos e outros movimentos
de massa, enquanto um loteamento deveria observar a suscetibilidade à erosão,
assim como a possibilidade de indução de escorregamentos. Em Minas Gerais, para
a implementação da Deliberação Copam n° 58/2002, que estabelece normas para o
licenciamento de projetos de parcelamento do solo para fins residenciais, a Feam (Fun­
LA dação Estadual do Meio Ambiente) tem exigido que os estudos ambientais incluam,
entre outros, um mapa de declividade e um mapa de risco geológico-geotécnico,
\ ambos em escala de 1:2.000 (Corteletti e Sá, 2004).

Cartas geotécnicas, de suscetibilidade à erosão, de riscos geológicos, de vulnerabi­


lidade de aqüíferos, de aptidão de solos e várias outras têm a função de interpretar
informações do meio físico para que determinados usuários possam melhor fu n d a­
m entar suas decisões ou análises. Bitar, Cerri e Nakazawa (1992, p. 36) agrupam, sob a
denominação genérica de cartas geotécnicas, denominações especializadas segundo a

CAPITU
E s t u d o s de B a s e e D ia g n ó s t ic o A m b ie 235

Q u a d r o 9 . 3 M a p a s te m á tic o s e m p re g a d o s p a ra d ia g n ó s tic o s a m b ie n ta is 1
C a r t a d a s C o n d i ç õ e s C l i m á t i c a s e H id r o l ó g i c a s
Parâmetros climáticos: pluviometria, insolação, evaporação, temperatura, direção dos ventos.
3arâmetros hidrológicos: hidrografia, açudes e canais, divisores de águas, vazões, qualidade das águas, áreas sujeitas
à inundação.
C arta de S olos
Classificação dos solos: classificação pedológica, potencial, fatores limitantes do uso.
C a r t a G e o l ó g ic a
^ormações superficiais: granulometria, espessura da formação, grau de consolidação.
Substrato rochoso: classificação litológica, nomenclatura estratigráfica, geocronologia._______________________
E ementos estruturais: orientação, mergulho e tipologia do acamamento, foliações, juntas, falhas, eixos de dobras, carac­
terização de, discordâncias, lineamentos, zonas de cisalhamento e outras estruturas.
5ecursos minerais: ocorrências, jazidas e minas, classificação dos depósitos minerais.
C a r t a G e o m o r f o l ó g ic a
r ormas do relevo: formas estruturais, erosivas, de modelado fluvial, de litorâneo, cársticas, de antrópico, processos
erosivos.
C a r ta H id r o g e o l ó g ic a

2aracterização dos aqüíferos: litologias e suas classificações quanto à porosidade de fraturam ento, profundidade e
: rodutividade, direção de fluxo das águas subterrâneas, localização dos pontos de captação, identificação de zonas
de recarga, qualidade das águas.
C - r t a d e I n d i c a d o r e s G e o t é c n ic o s
5oios: textura, espessura de material inconsolidado, parâmetros físicos.___________
Vaciços rochosos: origem, grau de alteração, fraturam ento, permeabilidade, descontinuidades.
C a r ta de C o b e r t u r a V egetal
.egetação natural: tipo e classificação das formações vegetais.
Culturas: áreas cultivadas, reflorestadas, abandonadas, pastagens.
C - p ta de U so e O c u p a ç ã o d o S olo
■^eas urbanas: delimitação, tipo de uso urbano, densidade de ocupação, equipamentos.
- — — — - — — ---------------- — — ~ - — — .. — - - . . .
Jsos industriais: instalações industriais, mineração, aterros de resíduos.
: 'eas rurais: culturas permanentes e temporárias, reflorestamento, pastagem.
" ‘raestrutura: rodovias, linhas de transmissão, barragens e açudes.
O con te ú d o é ilu s tra tiv o e não esgota os tem as que podem se r apresentados em fo rm a de cartas.
Fo nte: m o d ific a d o de CPRM (1991).

Aplicação ou o enfoque p red o m in an te, como c a r ta de suscetibilidade, c a rta de v u l n e ­


rabilidade, c a rta de risco, zo neam en to de risco. Os autores propõem as seg u in tes
refm ições: c a rta geotécnica convencional: “ap resen tam a d istribuição geográfica das
características dos terrenos, a p a r t i r de atributos do meio físico e de d eterm in ad o s
p arâ m e tro s geológico-geotécnicos”; c a rta s de suscetibilidade: “in d icam a potenciali-
iade de ocorrência de processos geológicos n a tu r a is e induzidos (...) seg u n d o classes
i e probabilidade de o co rrên cia”; c a rta s de risco geológico: a v a lia m “o dano potencial
a ocupação [dos terrenos], expresso segundo diferentes g rau s de risco, resu lta n te s da
conjugação da probabilidade de ocorrência de m an ifestaçõ es geológicas n a tu r a is ou
r.duzidas e das co n seq üências sociais e econôm icas d eco rren tes”.

- c o n ta m in a ç ã o de aqüíferos su b te rrâ n e o s pode se d a r por v á ria s fontes. P ara


Hirata (1993, p. 49), a v u ln e ra b ilid a d e de u m aqüífero “é u m a fu n ção p rim á ria de:

NO]
liação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

(1) acessibilidade hidráulica de contam inantes à sua zona saturada; (2) capacidade
de atenuação (filtração, diluição, sorção, degradação, precipitação etc.) dos estratos
sotopostos à zona sa tu ra d a ”. Empreendimentos que possam afetar a qualidade das
águas subterrâneas deveriam, preferencialmente, localizar-se em áreas de baixa
vulnerabilidade.

Um exemplo de estudo de vulnerabilidade de aqüíferos pode ser visto na Fig. 9.5, que
mostra o mapeamento realizado para o EIA de um a fábrica de celulose de fibra curta
branqueada e de papel de impressão, situada no Mato Grosso do Sul. Foi utilizado,
em escala local, o mesmo procedimento empregado na confecção do mapa de v u ln e ­
rabilidade dos aqüíferos do Estado de São Paulo (IG/Cetesb/DAEE, 1997), que leva em
conta três fatores: (1) tipo de aqüífero (confinado, livre etc.); (2) litologia da zona não
saturada (acima da água subterrânea) e (3) profundidade do nível de água subterrânea,
combinando-os por meio de um sistema de pontuação.

Zuquette e Nakazawa (1998, p. 283) diferenciam mapa de carta de acordo com o


seguinte critério: um m apa apenas registra inform ações ou atributos do meio físico
(como um m apa topográfico), e um a c a rta interpreta inform ações contidas em mapas
para um a finalidade específica. Embora tal diferenciação não seja de uso universal,

411.000 414.000 420.000 423.000


i

Área D iretam ente A fetada - ADA

O Poço tu b u lar profundo

A Sondagem
num Isolinha da profundidade do nível
de água subterrânea (inferido)
7,o/7,s Profundidade do nível de água
subterrânea (m)

Vulnerabilidade dos aqüíferos


Baixa - baixa
O M oderada - alta
O \
"'T
■ Alta

Extrema

0 6km Fonte: im agem de s a té lite fo rne cid a pela IP-SP0T 10m, 200 5
Projeção U niversal transversa de M e rc a to r
escala original 1:50.000 D atum H o riz o n ta l: SAD -69

Fig. 9 . 5 M a p a de v u ln e ra b ilid a d e de a q ü ífe ro s de um a área co n s id e ra d a p a ra im p la n ta ç ã o de um a fá b ric a de p a p e l e


celu lose. A lin h a a m a re la d e lim ita o e m p re e n d im e n to ; o desenho in d ic a os p o ço s p ro fu n d o s e x is te n te s e a lo c a liz a ç ã o
das so n d a g e n s que p o s s ib ilita ra m a c o n fe c ç ã o de um m a p a de p ro fu n d id a d e do a q ü ífe ro , o qual, c o m b in a d o com o m apa
g e o ló g ic o , fu n d a m e n to u o e stu d o de v u ln e ra b ilid a d e
F o nte : ERM B ra s il Ltda. (2 0 0 5 ) - EIA F á b rica Três Lagoas. R e p ro d u zid o com a u to riz a ç ã o .

L0
E s t u d o s de B a s e e D ia g n ó s t ic o A m b ie

im p orta d estacar o sentido de interpretativo , que é aquele que se busca em estudos


am bientais. Na m esm a lin h a , Libault (1975) explica que se deve d is c rim in a r entre
m apa topográfico e c a rta geográfica, que sem pre im plica interpretação.

Há outras m etodologias de m a p e a m e n to a m b ie n ta l ou g eo a m b ie n ta l que ta m b é m


podem f u n c io n a r como in s tr u m e n to in te g ra d o r do d iag n ó stico am b ien tal, como a
“ca rto g ra fia in te g ra d a do meio am b ien te e su a d in â m ic a ” (Jo u rn a u x , 1985), a qual
engloba não som ente elem entos do meio físico geológico, m as ta m b é m das á g u a s
superficiais, do ar, da vegetação e dos espaços co n stru íd o s. Porém , ao ser m ais
am biciosa e ab ra n g en te, a c a rto g ra fia in te g ra d a é ta m b é m m ais custosa, e d e m a n d a
grande q u a n tid a d e de in fo rm a ção com patível com a escala escolhida. Um exem plo
de aplicação é o estudo feito p a ra a B a ix a d a S a n tista (Cetesb, 1985), não com a
" n a lid a d e de a v a lia r im pactos m as de d ia g n o s tic a r a evolução dos processos de
degradação.

A presença de áreas c o n ta m in a d a s ou suspeitas de c o n ta m in a ç ã o ta m b é m deve ser


apontada no diagnóstico am biental.

A qualidade das á g u a s é u m dos tem as m ais freqüentes nos diag nósticos am bien-
tais, haja v ista que q uase todos os em p reen d im en to s têm o potencial de a lte ra r a
qualidade das ág u a s superficiais. Há critérios e n o rm as técnicas p a ra coleta e p re­
servação de a m o stra s de água, assim como procedim entos p ad ro n izad o s p a ra an álise
química. Há de se o b se rv a r e g aran tir, contudo, requisitos de qualidade dos ser­
viços. Nas situações em que a q ualidade da á g u a possa ser u m problem a crítico,
deveriam ser to m ad as precauções como duplicatas de a m o stra s e a escolha de la b o ­
ratórios certificados. No Brasil, a certificação deve e star de acordo com os critérios e
as n o rm as do In m etro (In stitu to Brasileiro de M etrologia, N orm alização e Qualidade
industrial). É evidente que a m o s ti^ g e n s p o n tu a is pouco in fo rm a m sobre o estado das
rguas, que v a r ia m com fatores como ch u v a s e estações do ano.

Para em p reen d im en to s que possam a fe ta r a q u an tid ad e de á g u a disponível, são neces-


sários estudos hidrológicos, os quais geralm en te se b aseiam em redes de estações
ghiviom étricas e fluviom étricas ex isten tes e operad as por órgãos g o v ern a m e n ta is.
Séries históricas de dados de c h u v a e v azão são tra b a lh a d o s estatisticam en te p ara
fornecer inform ação sobre vazõ es m á x im a , m édia e m ín im a e a ltu r a de rios, e sobre
intensidade p luviom étrica (quantidade de c h u v a em u m certo período de tempo) p a ra
::ferentes períodos de retorno (ou seja, a e x p e c ta tiv a de que o evento possa ocorrer
em in terv alo s de 10, 25, 50 ou m ais anos). Neste caso, o diag nóstico baseia-se q u a ­
se que ex clu siv am en te em dados secu n d ário s, m as estes devem ser tra b a lh a d o s de
modo a atender às necessidades da an á lise de impactos. Por exemplo, caso se d e­
seje con hecer a v az ão m ín im a de u m rio que v á receber efluentes p a ra e stim a r sua
íiluição, então os estudos hidrológicos n o rm a lm e n te fornecem a v azão m ín im a em
sete dias consecutivos p a ra um período de retorno de dez an o s (Q7)io) — n o v am e n te
vale o princípio geral p a ra o p lanejam ento do EIA: se o uso desse p a râ m e tro for acor-
iado p rev iam en te e estiver incluso nos term os de referência, ta n to a elaboração como
- revisão e an á lise técnica do estudo serão facilitadas e a atenção do a n a lis ta poderá
co n cen trar-se em an álise e interpretação, em vez de b u sc a r deficiências.
.‘ação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Estudos sobre águas subterrâneas podem tratar de qualidade da água ou do forne­


cimento de informações para previsão de impactos sobre os fluxos subterrâneos.
Qualquer que seja o objetivo principal, a compilação de dados secundários consiste
na consulta a cadastros de poços profundos e a levantamento bibliográfico. 0 cadas-
tramento é um a obrigação legal de todos os que perfuram poços ou utilizam água
subterrânea. Entretanto, no Brasil, o cadastro é reconhecidamente incompleto. No
campo, buscam-se levantar todos os usos de água subterrânea, principalmente
cacimbas que sirvam áreas rurais ou urbanas. Dependendo do projeto em análise,
pode ser necessário perfurar poços para monitoramento da qualidade e do nível da
s água ou para a realização de ensaios de vazão. Se o projeto tiver o potencial de afetar
a qualidade das águas, então o monitoramento deverá estender-se pelo maior período
possível (mesmo após a conclusão do EIA), pois é de interesse do proponente formar
um a base de dados sobre a situação do pré-projeto. A locação dos poços depende de
um estudo geológico que indique quais são os aqüíferos presentes na área de estudo e
qual a direção do fluxo subterrâneo, casos em que pode ser produzido um mapa po-
tenciométrico, que mostre as linhas prováveis de fluxo. Da mesma forma que para as
águas superficiais, a rede de monitoramento deverá ter, pelo menos, um ponto situado
a montante da futura fonte de impacto.

Estudos sobre a qualidade do ar geralmente envolvem a compilação de informa-


ção secundária proveniente de estações de amostragem existentes na área de estudo
(situadas, com mais frequência, em áreas urbanas ou em grandes indústrias) e a
compilação de dados climatológicos provenientes de estações meteorológicas. Para
certos tipos de empreendimentos também se faz a coleta de dados primários, com
a instalação de amostradores. 0 parâmetro medido costuma ser a quantidade total
de partículas em suspensão, um a vez que as poeiras estão entre os poluentes mais
comuns emitidos por grande variedade de fontes. A dificuldade de ordem prática é
dispor de um período suficientemente longo de amostragem; como é raro dispor de
vários meses para realizar o diagnóstico, um a estratégia é escolher os meses mais
secos, quando há maior quantidade de partículas no ar. 0 equipamento mais usado
é o amostrador de grandes volumes (Hi-vol). Como ocorre com todo procedimento de
medição, é preciso calibrar o equipamento e dispor de um operador capacitado.

No que se refere a ruídos, a maioria dos EIAs deveria incluir o diagnóstico da situação
pré-projeto, um a vez que quase todas as atividades causadoras de impactos ambien­
tais significativos são fontes de ruído, se não durante o funcionamento, pelo menos
na etapa de implantação. Deve-se atentar para o uso de decibelímetros devidamente
calibrados, para as diferenças entre o ruído diurno e o noturno e para a identificação
das principais fontes preexistentes. A apresentação da informação em mapa é muito
útil, pois facilita a compreensão por parte do usuário e dos leitores do EIA.

Eventualmente, o diagnóstico ambiental deve incluir informação sobre radiações io-


nizantes. Trata-se de um campo especializado e que tem regras próprias, estabelecidas,
no plano internacional, pela Agência Internacional de Energia Nuclear, um organis­
mo do sistema das Nações Unidas. No Brasil, a regulamentação e as diretrizes para
estudos e licenciamento são estabelecidas pela Comissão Nacional de Energia Nucle­
ar. Existe um procedimento específico de licenciamento conduzido por esse órgão
governamental.
E s t u d o s de B a s e e D i a g n ó s t i c o Ay =

F erram en ta s cada vez mais. u sa d as p ara integração são os sistem as de inform ação
geográfica (SIGs). SIGs são p ro g ra m a s de com putador que p erm item a g u ard a, a
m anipulação, a an álise e a exibição de dados espacialm ente referenciados, e são a
base da ca rto g ra fia digital. Por exemplo, os SIGs p erm item que se faça rapidam ente
a sobreposição de m apas tem áticos. Todavia, como todo sistem a de tra ta m e n to de
dados, os resultados não podem ser m elhores que os dados de en trad a. L ev antam en tos
incom pletos ou inconsistentes não podem lev ar a boas análises, e o u su á rio de u m EIA
não pode se d e ix a r im pressionar por m apas coloridos antes de a n a lis a r seu conteúdo
e os m étodos de elaboração. Como o b se rv am R odríguez-B achiller e Wood (2001,
p. 393), deve-se reco n h ecer que dados de m o n ito ram en to são custosos de coletar, e
em m uitos EIAs os recursos serão dirigidos p ara m o n ito rar locais que p o ssam ser
m ais seriam ente afetados pelo projeto, ao invés de b u sc a r u m a am pla representação
espacial que possa satisfazer os requisitos ideais de u m SIG.

M eio biótico
Os estudos relacionados aos aspectos biológicos ra ra m e n te podem .._p r e s c i n d i r de
Trabalhos de campo. P ara u m estudo de médio a g ra n d e porte, pode ser n ecessá­
ria u m a equipe de m ais de u m a dezena de pessoas. Os lev a n ta m e n to s de vegetação
m uitas vezes são feitos por u m a ou duas pessoas, além de au x ilia re s de cam po, m as
os le v a n ta m e n to s de fa u n a d e m a n d a m especialistas nos vários g ru p o s zoológicos,
u su alm en te ornitólogos (aves), m astozoológos (mamíferos), herpetólogos (répteis e
anfíbios) e ictiólogos (peixes), além de, ev en tu alm en te, entom ólogos (insetos) e outros
especialistas. Na prática, é raro e n c o n tra r estudos que considerem os invertebrados.

N orm alm ente, os estudos com eçam por u m lev a n ta m e n to de dados secu nd ários, como
publicações e relatórios oficiais, publicações científicas, teses e dissertações. Sua
ú n alid ad e não é e n c o n tra r info rm açõ es locais (o que só acontece por coincidência,
em poucos casos), m as inform ações de âm bito regional ou su b-regio nal sobre os tipos
re formação vegetal e sobre as com unidades fau nísticas associadas. Tal le v a n ta m e n to
perm ite fo rm ar u m a im agem sobre o que pode ser encontrado no cam po - em condi-
:! e s que, na m aioria das vezes, e n c o n tra m -se an tro p izad a s (alteradas pelo Homem)
m diversos graus Fig. 9.6 - e assim plan ejar com detalhe os tra b a lh o s no terreno.
As inform ações se c u n d á ria s podem e star desatu alizad as, m as a in d a assim serão úteis
i.: possibilitarem que se forme u m q u ad ro sobre quais era m as condições ecológicas
tt região antes que tivessem se acum ulado as p e rtu rb a ç õ e s que form am o cenário
presente. ->

A rris e E m berton (2001, p. 260) classificam os estudos biológicos de cam po feitos


u r a EIAs seg und o três g rau s de apro fu n d am en to . Os estudos “fase I” devem obter
t ip re s e n ta r inform ação sobre hábitats, sendo que todo e q u alq u e r estudo deveria
n c lu í-lo s (Fig. 9.7 a 9.9). Os estudos “fase II” são lev a n ta m e n to s m ais detalh ado s de
esp-ecies, háb itats e com unidades em u m a área designada (área de estudo); a m aioria
t : s EIAs req u er esse tipo de estudo. Já os estudos “fase III” incluem a m o stra g e n s

-rrensivas p a ra obtenção de dados q u a n tita tiv o s sobre populações ou com unidades,


s r u a ç ã o m ais ra ra em um EIA.

r ; ran (2000, p. 39) su sten ta que, sem dados sobre a b u n d â n c ia de espécies, é “e x tre -
Z r n e n t e difícil a v a lia r a significância dos prováveis im pactos sobre as po p u laçõ es”
liação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

e propõe que, como requisito mínimo, os


estudos de base deveriam “mapear todos
os hábitats da área provável a ser afetada”,
incluindo um a avaliação da qualidade de
cada hábitat, e realizar “levantamentos
de campo mais detalhados” a respeito da
abundância e distribuição de espécies-
- chave selecionadas. A autora sugere que
a seleção das espécies que serão estuda­
das com maior detalhe não seja feita pela
equipe que elabora o EIA, mas resulte de
um a consulta a entidades governam en­
tais e não governamentais, e que sejam
incluídas nos termos de referência. As
espécies selecionadas costumam estar
em um a ou mais das seguintes categorias
(Byron, 2000, p. 42):

Fig. 9.6 Mosaico paisagístico composto de fragmentos de vegetação nativa e «. (1) Espécies ameaçadas. São aquelas que
áreas antropizados na região do Pontal do Paranapanema, oeste do Estado de constam de alguma lista oficial, em qualquer
São Paulo. Destacam-se a área de tonalidade verde correspondente ao Parque categoria de ameaça, ou que sabidamente
Estadual do M orro do Diabo e o reservatório da barragem de Rosana, em meio estejam em avaliação para possível inclusão
a áreas com predominância de uso agrícola nessas listas.
Fonte: São Paulo [Estado], Secretaria do Meio Ambiente (1998). Carta-lmagem (2) Espécies endêmicas. São aquelas que só
de Satélite. Planta 01, Zoneamento Ecológico-Econômico do Pontal do Para­ ocorrem em determinado ambiente.
napanema. Escala original 1:250.000, projeção UTM, imagens Landsat TM -5 (3) Espécies características de cada hábitat.
tomadas entre ju lh o e dezembro de 1997, composição colorida 5R, 4G, 3B. São aquelas “usualmente associadas a um
determinado hábitat”; não são necessaria­
mente raras e avaliar sua situação (população e distribuição) pode ajudar a medir
o estado de conservação de seu hábitat.
(4) Espécies suscetíveis à fragmentação de hábitats. Predadores situados no topo
da cadeia alimentar, vários pequenos mamíferos, espécies mutualistas, como po-
linizadores e simbiontes, e outras.

Quanto à classificação e ao mapeamento de hábitats (fase I), assim como para avalia­
ção de seu estado de conservação, há diversas metodologias, como o “mapeamento çle
biótopos” e o “procedimento de avaliação de hábitats” do Serviço Americano da Pesca
e da Vida Selvagem (USFWS). Um método simples é identificar e mapear as formações
vegetais, descrevendo sua fitofisionomia e, às vezes, associando-as a características
/

de relevo. E interessante, sempre que possível, usar algum sistema classificatório de


amplo reconhecimento no âmbito da comunidade científica. 0 Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística adota um a classificação bioecológica que contém diversos
tipos e subtipos de formações vegetais (IBGE, 1992).

0 mapeamento de biótopos é um método desenvolvido na Alem anha e também apli-


cado no Brasil (Bedê et al., 1997). Trata-se de um procedimento de classificação e
cartografia de unidades de paisagem ou zonas homogêneas. Um aspecto integrador
dessa metodologia deriva do reconhecimento de que ambientes a ntropizados. e até
altamente antropizados, como áreas urbanas densas, também desempenham fu n ções

CAPITU
E s t u d o s de B a s e e D ia g n ó s t ic o A m b

teológicas e ambientais que não podem ser desconsideradas (Fig. 9.10). Esta é uma
costura que se contrapõe a certos enfoques que tratam com desdém as funções desses
ambientes. Para assegurar consistência e reprodutibilidade nos mapeamentos, assim
como para permitir comparações, Bedê et al. (1997) propõem que se adotem sempre as
mesmas categorias de biótopos na legenda das cartas. Recomendam também que, em
areas rurais, o mapeamento seja executado em escala de 1:10.000 £ apresentado em
'_:25.000. Os biótopos podem ser areais, lineares (cursos d'água, rodovias7, avenidas) 7A vegetação
:u pontuais (aqueles que têm forma e dimensão que não são passíveis de represen­ que margeia as
tação na escala adotada, porém são dignos de registro devido à sua importância, a rodovias pode
exemplo de paredões rochosos com comunidades florísticas particulares — Fig. 9.11). compor hâbitats
importantes
quando o entorno é
J Habitat Evaluation Procedure (Quadro 9.4) foi desenvolvido para uso em avaliações
deficiente em outros
:e impacto ambiental, ao passo que o mapeamento de biótopos é utilizado em pla- hâbitats (Dawson,
lejamento ambiental de um modo geral. Como toda simplificação da realidade, o 2002, p. 188).
método do USFWS pode ser criticado por diversos pontos fracos, entre eles, a orien-
mção estreita para algumas espécies, a desconsideração da diversidade biológica e o
tesprezo de características de estrutura e função dos ecossistemas (Ortolano, 1984).
Esses e diversos outros métodos de mapeamento da paisagem (Naveh e Lieberman,
E94) partem da identificação e delimitação dos tipos de ambientes existentes em uma
mea de estudo, que é o mínimo que se pode esperar em um diagnóstico ambiental.

Contudo, “para muitos planejadores e botânicos, o mapeamento não é um a tare-


m suficiente (...). Seu produto não, expressa a dinâmica nem a heterogeneidade dos
/

ecossistemas naturais. E necessário, no mínimo, complementá-lo com levantamentos


cejçampo que discriminem a composição florística, a estrutura e a heterogeneidade
-zcerna (...), a distribuição de espécies (...)” (Santos, 2004, p. 92). Um método bastante
empregado é o estudo fitossociológico, um levantamento amostrai estatístico em
: _e. ademais de se identificar cada espécie arbórea (inventário florístico), também
:e estudam as relações quantitativas entre os táxons (espécies, gêneros e famílias) e
=• estrutura horizontal e vertical da comunidade vegetal, por meio de alguns índices,
::zlo frequência, densidade, dominância e valor de importância. A frequência indica
*c determinada espécie é bem distribuída nos locais amostrados; densidade é o
■umero de indivíduos de determinada espécie por unidade de área; a dominância
~mresenta a área basal dos indivíduos arbóreos de um a mesma espécie em relação à
i:ea amostrada; o índice de valor de importância de um a espécie é a somatória dos
r é s parâmetros anteriores e indica a importância ecológica da espécie. Esse levan-
r mento enquadra-se na categoria “fase II” de Morris e Emberton. Podem ser usadas
i ferentes estratégias de amostragem, como parcelas, quadrantes e perfis retilíneos
i7runsects).

Caso exista alguma classificação oficial de vegetação, como ocorre para a Mata
Atlântica, é conveniente (ou mesmo necessário) que o levantamento conclua em
:ue classe se enquadra cada fragmento de vegetação ou cada maciço florestal.
Resolução Conama 10/93 define vegetação primária e secundária da Mata Atlântica,
-rim ária é “aquela vegetação de m áxima expressão local, com grande diversidade
r.ológica, sendo os efeitos das ações antrópicas mínimos, a ponto de não afetar
: çnificativamente suas características originais de estrutura e de espécie” (Art. 2o).
A vegetação secundária é classificada segundo seu estágio de regeneração em inicial,
nedio ou avançado, de acordo com diversos parâmetros.

N0|
. ação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Fig. 9.7 a 9.9 Diferentes ambientes em uma mesma área de


estudo. Na prim eira foto, floresta om brófila densa; na segun­
da, cam pinarana, form ação vegetal de baixo porte sobre solos
arenosos; na terceira, pasto antrópico sobre antiga área de flo ­
resta. Nestes casos, porte e fisionom ia de cada form ação são
visivelmente distintos, mas em outros casos a diferenciação
entre form ações vegetais pode necessitar de levantam entos
florísticos e de outros procedim entos. M unicípio de M anaus

Os levantamentos de fauna visam, no mínimo,


à elaboração de um a lista de espécies para cada
grupo faunístico selecionado. Várias cam panhas
podem ser necessárias para cobrir a variação sa­
zonal. Sempre há interesse, quando se realizam tais estudos, em identificar espécies
ameaçadas, raras ou endêmicas (típicas de um determinado local ou ambiente). Uma
falha freqüente, mas que pode ser evitada em um trabalho cuidadoso, é deixar de

Fig. 9.10 0 am biente urbano tem biótopos variados, como se observa em Hong Kong, com sua zona
costeira, d istrito com ercial denso e m orros florestados ao fundo
E studos de B ase e D iagnóstico A m bie W B B 243

registrar em que tipo de hábitat foi vista


cada espécie (ou foram encontrados in ­
dícios de sua presença) e a localização
desse ou desses pontos. Outro cuidado a
se to m ar é in fo rm a r 0 método usado para
identificar cada espécie. O Quadro 9.5
m ostra um ex trato de u m a lista de m a ­
míferos lev an tad a p ara um EIA, na qual
se apontam alg um as dessas inform ações
que facilitam a rastreabilidade dos dados
e a eventual reprodução dos resultados,
assim como u m a análise do grau de co n ­
fiança dos dados de cada espécie; um a
inform ação obtida apenas por entrevista
com m oradores locais é u m a evidência Fig. 9.11 Um b ió to p o p o n tu a l, um a flo ra m e n to ca lcá rio com vegetação
fraca da presença de qualquer espécie. esclerófila. Vale do rio Peruaçu, M in a s Gerais

le v a n ta m e n to s q uantitativos de fauna, como censos populacionais, são raros em


EIAs, pois requerem gran d e esforço de cam po e d em an d am u m tem po poucas v e ­
zes disponível. Os levantam entos de faun a podem, e m uitas vezes devem, ser
complementados e aprofundados em etapas posteriores do licenciam ento am biental
(conforme seção 13.7).

Q u a d r o 9 . 4 U m m é to d o p a ra a v a lia r 0 e s ta d o de c o n s e rv a ç ã o de h á b ita ts
Z p r o c e d im e n t o de a v a lia ç ã o de h á b it a t s (h a b it a t e v a lu a tio n p ro c e d u re - HEP) é a m p la m e n t e u s a d o em
E As nos E stados U n id o s (C anter, 1 9 9 6 , p. 4 0 0 ) para f in s de d ia g n ó s tic o a m b ie n t a l e de a n á lis e de im p a c -
cds. D e s e n v o lv id o p e lo U.S. Fish a n d W ild life S e rv ic e (USFWS) nos a n o s 1970, e o f ic ia liz a d o em 1 9 8 0 , 0 m é t o d o
: ' e t e n d e a v a lia r 0 e s ta d o de c o n s e rv a ç ã o de a m b ie n t e s para fin s de s u p o r te à f a u n a s ilv e s tre , c o m a a ju d a de in -
: cadores. Seu o b je t iv o é " i m p l e m e n t a r u m p r o c e d im e n t o p a d r o n iz a d o para a v a lia r os im p a c t o s de p r o je to s s o b re
" á o i t a t s te r re s tr e s e a q u á t ic o s c o n tin e n ta is " . A q u a lid a d e d o h á b i t a t para espécies s e le c io n a d a s é o b tid a p o r m e io de
- m “ ín d ic e de a d e q u a b ilid a d e do h á b it a t " , e s t im a d o em u m a escala de 0 a 1, q u e t e n c io n a in d ic a r a c a p a c id a d e de
c o m p o n e n t e s e s s e n cia is d a q u e le a m b ie n t e de a t e n d e r aos r e q u is ito s v it a is de espécies a n im a is s e le c io n a d a s .
I n d ic e é m u lt ip li c a d o pela área de cada h á b it a t , para o b t e r " u n id a d e s de h á b ita ts ". Os trê s passos in ic ia is são
c e f in iç ã o da área de e s tu d o , (ii) d e te r m in a ç ã o do s t ip o s de h á b it a t s e x is te n te s nessa área e (iii) s e le çã o de espécies
z t : nteresse (espécies in d ic a d o ra s ). D eve -se l e v a n t a r a área d is p o n ív e l para cada espécie in d ic a d o r a , ou seja, a q u e la
u e p ro vê c o n d iç õ e s de a b rig o , a lim e n t a ç ã o e r e p ro d u ç ã o da espécie. Os ín d ice s de a d e q u a b ilid a d e são c a lc u la d o s
s e g u n d o " m o d e lo s " d e s e n v o lv id o s para 0 HEP - para u m c e r to n ú m e r o de espécies, 0 USFWS d e s e n v o lv e u fic h a s
i t s c r i t i v a s a c o m p a n h a d a s de g r á fic o s e fu n ç õ e s m a t e m á t ic a s q u e g u ia m 0 u s u á rio na d e te r m in a ç ã o dos índices. Por
e x e m p lo , para u m a ave q u e n e ce ssita de u m a flo r e s ta de c o n ífe ra s c o m o a b rig o d u r a n t e 0 in v e rn o , 0 m o d e lo usa
• a f á v e is c o m o a p o r c e n ta g e m de c o b e r tu r a do s o lo d a da pelas copa s das árvores, 0 e s tá g io s u c e s s io n a l do f r a g m e n t o
~ : restal e a p o r c e n ta g e m da s u p e rfíc ie do s o lo c o b e rta p o r d e t r it o s o r g â n ic o s m a io re s de trê s p o le g a d a s .
*«ota-se q u e ta l p r o c e d im e n t o re q u e r u m c o n h e c im e n t o d e t a lh a d o da b io lo g ia de cada espé cie in d ic a d o r a , para que
assam ser m o n t a d o s os " m o d e lo s " , t a r e f a c o n s id e r a v e lm e n te m a is d ifí c il em e c o s s is te m a s tr o p ic a is .
- c a r t i r da c a r a c te r iz a ç ã o da s it u a ç ã o p r é - p r o je t o , seus im p a c t o s p o d e m ser a v a lia d o s p r o je t a n d o - s e a s itu a ç ã o
* - : u r a de cada h á b i t a t na área de e s tu d o . Se u m a área será p e rd id a p o r causa d o p r o je to ( d e s tr u iç ã o ou f r a g m e n t a ç ã o
: : r á b i t a t ) , as u n id a d e s de h á b it a t s f u t u r a s se rã o m e n o re s d o q u e s e ria m se 0 p r o je to n ã o fosse im p la n t a d o , t i r a n d o -
se aaí u m in d ic a d o r do im p a c t o a m b ie n t a l. Se 0 p r o je to a lt e r a r as c a r a c te r ís tic a s d o h á b i t a t sem m o d if ic a r sua área
q o r e x e m p lo , 0 c o r te s e le tiv o de espécies a rb ó re a s ), 0 ín d ic e de a d e q u a b ilid a d e d e c a irá , 0 q u e t a m b é m po d e se"
-s a d o c o m o in d ic a d o r de im p a c to . A lt e r n a t iv a s t a m b é m p o d e m ser c o m p a r a d a s c o m base no m e s m o c r i t é f o .
E: ~:es: C anter (1996); USFWS (1980) e USFWS Service M anual, 870, FW1.
diciu u c im p d L iu rv m u ic n id i. e u n e c iiu s c m ciu u u s

Quadro 9.5 Extrato de uma lista de mamíferos apresentada em um EIA


N o m e C ie n t íf ic o N o m e Popular A mostragem A r e a s d e O c o r r ê n c ia A meaça

D IDE LPH IM O R P H IA
D id e lp h id a e
Didelphis albiventris g a m b á , saruê (C; E) CP, SO, M A
Didelphis aurita g a m b á , m u c u ra (C ;E ) CP, SO, M A
XENARTHRA
D asyp o d id a e
Dasypus sp. t a t u - g a li n h a (E;V) CP, SO, M A , MS, CR
Euphractus sexcintus ta tu -p e b a , (A;V) CP, SO, M A
t a t u - p e lu d o
PRI MATES
C ebidae
Callicebus personatus sauá, g u ig ó (A; E; VO) CP, SO, M A , MS, CR A -V U
CARNÍVO RA
C anid a e
Chrysocyon brachyurus lo b o - g u a rá (VF) MA A -V U
Cerdocyon thous c a c h o rro -d o -m a to (VP; E) CP, SO, M A , MS, CR
Pseudalopex vetulus rap o sa -d o -ca m p o (E) CP A -E P
Cervidae
Mazama americana v e a d o - m a te ir o (E; VP) CP
Fonte: Prom iner Projetos S/C Ltda. (2002)
N ota: Foram selecionadas apenas algum as espécies, para fins de ilustração.
A m ostragem : indica o m odo de registro da espécie na área de estudo:
(A) = A vistam ento, (C) = Captura, (VP) = Vestígios-pegadas, (VF) = Vestígios-fezes, (VO) = Vocalização,
(V) = Visualização, (CT) = Camera trap, (E) = Entrevista.
ê

Areas de ocorrência: código dos locais onde foram encontradas evidências de cada espécie.
Am eaça: Classificação de acordo com o Decreto Estadual (São Paulo) n° 42.838, de 4 de fevereiro de
1998:
A-EP = "Em Perigo": espécies que apresentam riscos de extinção em fu tu ro próxim o. Esta situação é
decorrente de grandes alterações am bientais, de s ig n ifica tiva redução p o p u la cio n a l ou ainda de grande
dim inuição da área de distribu ição do táxon em questão, considerando-se um in te rva lo pequeno de
8Plâncton é um tem po (dez anos ou três gerações).
termo usado A -V U = "Vulnerável": espécies que apresentam um a lto risco de extinção a m édio prazo. Esta situação é
para designar decorrente de grandes alterações am bientais preocupantes, da redução p o p u la cio n a l ou ainda da d im i­
os organismos nuição da área de distribu ição do taxon em questão, considerando-se um in tervalo pequeno de tem po
aquáticos animais (dez anos ou três gerações).
ou vegetais, PA = "Provavelm ente Am eaçada": estão incluídos aqui todos os táxons que se encontram presum ivel­
geralmente
m ente am eaçados de extinção, sendo os dados disponíveis insuficientes para se cheg ara uma conclusão.
microscópicos,
que vivem na
zona superficial Há um campo, porém, em que levantam entos quantitativos ou sem iquantitativos
iluminada eflutuam podem ser feitos sem muita dificuldade, que é o estudo de ecossistemas aquáticos,
passivamente ou particularm ente para bentos e plâncton8. Neste caso, são feitas coletas em diferentes
nadam fracamente.
pontos de rios e lagos (ou em ambiente marinho), as espécies são descritas e, em
Bentos designa o
conjunto de seres seguida, pode-se contar o número de indivíduos de cada espécie, o que permite
que geralmente empregar índices de diversidade. Em condições de ausência de poluição, as com uni­
vivem no fundo de dades bentônicas caracterizam -se por um a alta diversidade - ou seja, pela presença
corpos
de grande número de espécies — e reduzido número de indivíduos de cada espécie.
d ’água e têm
baixa mobilidade A maioria das formas de poluição reduz a complexidade do ecossistema, elimi­
(Magliocca, 1987). nando as espécies mais sensíveis. Os índices de diversidade permitem com parar as

CAPÍTU LO
E s t u d o s d e B a s e e D i a g n ó s t i c o A m b i e TAL 245

condições ecológicas de diferentes trechos de um rio e tam bém fazer com parações
m ultitem porais.

A identificação de u m a espécie am eaçada ou endêm ica pode ter diferentes implicações


para o projeto. Em u m extrem o, caso se trate de u m a espécie de am pla distribuição
isto é, que ocorre em um a g ran d e área geográfica) e de baixo grau de am eaça (por
exemplo, “provavelm ente am eaçad a”)9, as conseqüências para o projeto podem ser 9As categorias
m ínim as, e m edidas como a recom posição de hâbitats, a proteção de hâbitats rem an es- adotadas pela
legislação
rentes na m esm a região ou o estabelecim ento de “corredores ecológicos”, verdadeiras
brasileira, assim
'p o n te s ” u n in d o fragm entos isolados de vegetação nativa, podem ser suficientes. como as leis e os
\ 'o outro extrem o, u m a espécie endêm ica de ocorrência m uito restrita, que pode regulamentos de
mesmo coincidir com a área d iretam ente afetada pelo em preendim ento, pode to rn a r muitos países,
inviável um projeto, ou encarecê-lo sobrem aneira. baseiam-se nos
trabalhos da IUCN
(International
■ícw p h ryn o id es asperginis é um pequeno sapo que só existe na g a rg a n ta de K ihansi, Union fo r
Tanzânia, e vive em condições m uito específicas de te m p e ra tu ra e um idade, som ente Conservation o f
:n c e chegam as gotículas de á g u a dispersas pela queda de um rio em u m a série de Nature and Natural
Resources), uma
zachoeiras ao longo de 700 m de desnível. Infelizm ente, um projeto hidrelétrico
ONG na Suíça
reduziu sensivelm en te a v az ão do rio, red uzindo ta m b é m a ch an ces de sobreviv ên cia que publica a
i a espécie. A ex istên cia do sapo som ente foi descoberta em 1996, depois de iniciadas “Lista Vermelha
-5 obras da b arra g em , que foi concluída em 1999. A spersão artificial foi te n ta d a das Espécies
: :m o m edida m itigadora, assim como a criação em cativeiro e a busca de outros Ameaçadas” e
desenvolveu uma
ermos com condições ecológicas sim ilares em que a espécie pudesse ser in tro d u zid a, classificação do
mas a sobrevivên cia do sapo a in d a é in ce rta (Pritchard, 2000). 0 caso ilustra a grau de ameaça às
rm portância de le v a n ta m e n to s d etalhados, m esmo ex au stivo s, q u an d o se e n c o n tra m espécies de fauna e
r r r i t a t s raros no co ntexto regional, ou em áreas pouco conhecidas sob o ponto de flora. As categorias
empregadas pela
v ista faunístico.
IUCN são: extinta,
extinta na natureza,
Mao a n t r ó p ic o : s o c ie d a d e criticamente em
perigo, em perigo,
I acerca do meio antrópico que costum a h a v e r m aior ab u n d â n cia de dados
vulnerável e de
jm: - n d ário s. Censos e lev an tam en to s sociais e econômicos de âmbito nacional, como risco mais baixo, às
i : leles realizados no Brasil pelo IBGE (Instituto Brasileiro de G eografia e Estatística) quais acrescentam-
r : : r organism os estaduais como a F undação Seade (Sistema Estadual de A n álise de se as categorias
T rio s) em São Paulo e a F undação João Pinheiro em M inas Gerais proveem infor­ “dados deficientes”
e “não avaliada”.
mação a b u n d a n te sobre dem ografia, ocupação, renda, escolaridade e v ário s outros
ã* mcadores, por m unicípio ou por recortes territoriais menores.

f c i v e z por essa razão sejam os d iag n ó stico s do meio an tró p ico que não raro apre-
e x te n s a s com pilações de d a d o s .s e c u n d á rio s não u tilizad o s na a n á lis e dos
m ractos. A a b u n d â n c ia (relativa) de dados p re e x iste n te s pode m a s c a r a r a v isão dos
pia r : s necessários. Dados c e n sitário s ou outros são m uito úteis p a ra c o n te x tu a liz a r
« mgião e o local do projeto, m as nem sem pre tra z e m in fo rm ação em escala local,
m u itas vezes é aquela n ecessária p a ra a a n á lis e dos im pactos.

E acnanto os estudos atinentes ao meio biótico parecem ser quase p ad ro n iza-


Ak . com o uso de métodos sem elhantes p ara cada grupo faunístico ou p ara o
-rrn io de vegetação, o objetivo e os m étodos do diagnóstico do meio antrópico
Av a l ia ç ã o de I m p a c t o A m b i e n t a l : c o n c e i t o s e m é t o d o s

dependerão, em larga medida, dos impactos diretos e indiretos previamente iden­


tificados. Para os projetos que impliquem deslocamento de populações humanas,
é essencial que se disponha de um perfil detalhado de todos os afetados, obtido
mediante o levantamento do tipo censitário, que forneça dados essenciais para dese­
nh ar os programas de reassentamento. Quando não há deslocamento forçado, o mais
freqüente é que os levantamentos sejam amostrais e tenham como objetivo conhecer
o perfil da população afetada, para que, em seguida, se possam analisar os impactos.
Questionários e entrevistas são métodos muito usados nesses casos.

0 usa cursos n a tu rais por parte da população local é outra questão relevante
a ser levantada durante os estudos de base. Se o projeto afetar esses recursos, de
m aneira direta ou indireta, causará um impacto significativo (Fig. 9.12). Um levanta­
mento, por meio de entrevistas, questionários ou outros meios, das tipologias de uso
dos recursos (por exemplo, usos da água, usos de recursos faunísticos para alimen­
tação, coleta de plantas medicinais, entre outros) é um a das tarefas freqüentes em
EIAs. Krawetz (1991) comenta sobre a utilidade de elaborar-se um “perfil de acesso a
recursos”, mas não apenas os naturais. A autora entende que é necessário conhecer
como as populações afetadas podem dispor de recursos como terra, capital, educação
e treinamento; o perfil é obtido por meio de entrevistas com homens e mulheres.

Os impactos sociais requerem um a abordagem distinta daquela dada aos impactos


físico-bióticos, pois “a avaliação de impacto social lida com pessoas que, diferente­
mente dos seres ou coisas tratados na avaliação de impactos biofísicos, podem falar
por si próprias” (Boothroyd, 1995, p. 87).

Há todo um campo de especialização conhecido como avaliação de impacto social que


teve desenvolvimento paralelo à AIA, seja porque muitos EIAs tratam tais impactos
de maneira deficiente (Burdge e Vanclay, 1995), seja porque em algumas jurisdições
as leis não incluem requisitos explícitos para incorporação dos impactos sociais aos
EIAs. Para alguns (Boothroyd, 1982), há
duas “escolas” de avaliação de impacto
social, que grosseiramente poderiam
ser rotuladas de “tecnocrática” e “p arti­
cipativa”. Na primeira, os analistas são
inteiramente externos às comunidades
afetadas, que seriam apenas um objeto de
análise, abordado com o mesmo distan­
ciamento que qualquer elemento do meio
físico ou do meio biótico. Para a segunda,
os impactos sociais somente podem ser
if apreendidos a partir dos pontos de vista
\ das populações afetadas, o que demanda
pesquisa participativa e um certo enga­
jam ento do analista ju n to à comunidade.
A primeira forma de abordagem seria
Fig. 9.12 Rio Tapajós, na a ltu ra de A lte r do Chão, Pará. 0 rio e seus recursos
mais objetiva e teria preferência por mé­
são usados p ara diversas finalidades pela população, entre as quais pesca,
navegação, a b a stecim ento e lazer
todos quantitativos, como pesquisas de

CAPITU
E s t u d o s de B a s e e D i a g n ó s t i c o A m b i e H ™ 247
1

opinião, sendo tam bém mais cômoda, dem andando menos tempo e recursos e cer­
tam ente menos engajamento do analista. Em contraposição, os críticos da segunda
escola a tom am por demasiado subjetiva, levando muitas vezes os analistas a tom ar
partido das populações afetadas, distanciando de um ideal de neutralidade. Wolf
1983) fala de um a “ten são ” entre fins hum anísticos e meios científicos que se reflete
no debate entre objetividade e subjetividade, 0 receio desta últim a conduzindo a um a
'preocupação com métodos de análise quantitativa em um esforço de g a n h a r credibi­
lidade” na arena decisória. Burdge (2004) coloca 0 debate nos seguintes termos: um a
-valiação de impacto social participativa ou analítica?

Há iniciativas com 0 intuito de superar a polêmica, como 0 interessante método


ie “avaliação dos valores dos cidadãos” desenvolvido na Holanda a p artir de 1995
Quadro 9.6), que permite conhecer em detalhes os pontos de vista das pessoas sobre
: lugar em que vivem, trab alh am ou usam para qualquer finalidade. 0 método, que
é aplicado em quatro etapas, pode ser integrado ao planejamento e à preparação de
-ítudos ambientais — e aqui reside seu principal interesse, u m a vez que pode influen­
ciar no desenho e na escolha de alternativas, assim como no processo decisório.
A primeira etapa é um estudo preparatório que pode ser integrado ao planejamento
ie um EIA e à preparação do plano de trabalho. A segunda etapa corresponde a um
rvantam ento de campo por meio de entrevistas e produz um perfil preliminar, que
r aprofundado na últim a etapa. Nesta, 0 ordenamento por im portância dos valores
i t s cidadãos transform a-se em critérios para avaliar a im portância dos impactos e
comparar alternativas.

Be:ker et al. (2004) relatam a aplicação paralela de um a abordagem “técnica” e partici-


; cciva para análise de um a proposta de remoção de barragens no noroeste dos EUA,
c 5iber, 0 “relatório de análise social” e 0 “fórum com unitário interativo”. Cada proce­
dimento foi aplicado independentem ente por equipes diferentes. Embora 0 proponente
:: projeto, 0 U.S. A rm y Corps of Engineers, tivesse contratado um a empresa de
::n su lto ria para preparar um relatório social, foi pressionado por diferentes atores e
:: ntratou tam bém um a universidade para realizar um a avaliação participativa.

Os autores concluem que, idealmente, os dois enfoques deveriam ser combinados,


t a p vista sua complementaridade, constatada nesse estudo, pois, “separadam ente,
i r í resultam em um a visão mais limitada dos impactos sociais que aquela que pode
ser obtida usando am bos” (p. 184). Cada enfoque tem suas v antagens e suas lim ita-
::es. que decorrem do uso de “métodos inerentem ente diferentes” (conforme seção
i 5 e. por isso, os resultados da aplicação de um método “não podem ser usados como
u rd id a da eficácia do outro” (p. 186).

V~o a n t r ó p ic o : c u l t u r a e p a t r im ô n io c u l t u r a l

A la la v ra “cu ltu ra” reflete um a noção muito vasta (conforme seção 1.2). Há diversos
~ : : n e s possíveis para 0 estudo da cultura, como a cultura popular, a cultura de
3t£ísa e a cu ltura erudita. Um recorte útil para estudos socioambientais é 0 conceito
/

i: : itrim ônio cultural. E tam bém um conceito muito abrangente, mas tem funciona-
d ürde, ou seja, pode ser aplicado na tom ada de decisões.

NO!
'ação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Q u a d r o 9 .6 A v a lia ç ã o dos va lo re s dos c id a d ã o s - Citizen Values A sse sm e n t


0 m é to d o de a va lia çã o dos valores dos cidadãos (AVC) (Citizen Values A ssessm ent - CVA) fo i c ria d o e d e se nvolvido
pelo m in is té rio ho landês de Transporte, Obras Públicas e Gestão das Á gua s (R ijk w a te rs ta a t). Em sete anos de uso, já
havia sido a p lic a d o a m ais de duas dezenas de p ro je to s públicos. 0 m é to d o baseia-se no pressuposto de que a lte ­
rações a m b ie n ta is tê m um s ig n ific a d o p a rtic u la r para as pessoas afetadas, e que esse s ig n ific a d o pode d ife r ir da
in te rp re ta ç ã o dos p ro fissio n a is e n vo lv id o s na a va lia çã o a m b ie n ta l e social. Assim, a AVC visa à " in c o rp o ra r ao EIA a
im p o rtâ n c ia que as pessoas dão aos a tr ib u to s a m b ie n ta is ", a p a r tir de um nível in d iv id u a l de análise. São realizadas
e n tre v is ta s de ta lhad as, p o s te rio rm e n te valid a d a s por um le v a n ta m e n to q u a n t it a t iv o de um a a m o s tra re p re se n ta tiva
da popula ção. 0 tra b a lh o é realizado em q u a tro etapas.

i
Estudo p re p a ra tó rio . Inclui d e fin iç ã o do prob lem a, d e lim ita ç ã o da área de e stu d o e dos g ru p o s de cidadãos p o te n ­
c ia lm e n te a fe ta d o s ou interessados. Para essa fin a lid a d e podem ser realizadas e n tre v is ta s breves com lideranças ou
re p re s e n ta n te s de gru p o s de interesse. A etapa 1 é c o n c lu íd a com a preparação de um p la n o de pesquisa, no qual
são d e fin id o s os g ru p o s a serem e n tre v is ta d o s e os c rité rio s para escolha in d iv id u a l.

Id e n tific a ç ã o de valores im p o rta n te s . E o c o ra çã o da AVC. Os dados são c o le ta d o s por m eio de e n tre v is ta s


s e m ie s tru tu ra d a s (entrevistas abertas), nas quais o e n tre v is ta d o r segue um ro te iro p re d e fin id o . Os e n tre v is ta d o s
d is c u te m os te m a s e respondem com suas próprias palavras. As e n tre v is ta s são gravadas, d u ra m cerca de um a hora e
devem ser co n d u z id a s por profission ais experientes. A in fo rm a ç ã o assim c o le ta d a é o rg a n iz a d a segu n d o as m enções
aos e le m e n to s a m b ie n ta is e seus respectivos significados, que em 'seguida são classificados e o rd e n a d o s segundo
té c n ic a s de análise q u a lita tiv a . 0 re su lta d o é um perfil p re lim in a r que id e n tific a as ligações das pessoas com a
área a fe ta d a pelo p ro je to e apresenta um a lista de valores s ig n ific a tiv o s a trib u íd o s ao a m b ie n te . A lg u n s e xem plos
de valores a m b ie n ta is são a m b ie n te tra n q ü ilo , local de fá c il acesso, existê n cia e acessibilidade de áreas de lazer. 0
re la tó rio desta etapa, que já representa um a c o n tr ib u iç ã o para o d ia g n ó s tic o a m b ie n ta l, é en via d o a to d o s os e n tr e ­
v ista d o s (pelo m enos seu resumo), ou m esm o d is c u tid o em um a re u n iã o com rep re se n ta n te s da c o m u n id a d e .

C o n s tru ç ã o de um perfil de valores dos cidadãos. Um le v a n ta m e n to q u a n tita tiv o , u s u a lm e n te fe it o por m eio de


q u e s tio n á rio s enviados pelo c o rre io a um a a m o s tra a le a tó ria da p o p u la ç ã o a fe ta d a , serve para v a lid a r o perfil p re ­
lim in a r e d e te r m in a r a relevância de cada um dos valores, c la s s ific a n d o -o s em um a escala de im p o rtâ n c ia . Q uando
há d ife re n te s a lte rn a tiv a s para um p rojeto , são usadas a m o s tra s d ife re n te s e, se necessário, q u e s tio n á rio s diferentes.
0 p ro d u to desta etapa, o perfil dos valores dos cidadãos, in c lu i um a lista de valores ordenada s e gu ndo sua im p o r ­
tâ n c ia para as pessoas da c o m u n id a d e .
El
D e te rm in a ç ã o dos im p a c to s das a lte rn a tiv a s de projeto . Os valores o b tid o s na etapa a n te r io r são tra n s fo rm a d o s em
c rité rio s de a va lia çã o das a lte rn a tiv a s (q u a n to m a io r o v a lo r a trib u íd o a um e le m e n to do a m b ie n te , m ais im p o r ta n te
será o im p a c to sobre esse e le m e n to ; assim, se o v a lo r essencial é a m b ie n te tra n q ü ilo , a lte rn a tiv a s que a u m e n te m
o ruído ou o v o lu m e de trá fe g o de ve ículos te rã o a lto im p a c to ). R ecom endações para m itig a ç ã o ou co m p e n sa çã o
podem re s u lta r desta fase. " 0 passo c ru c ia l (...) é c o m o o perfil de valores dos cida dão s é tra n s fo r m a d o em c rité rio s
de avaliação. Isso envolve escolha e ju lg a m e n t o profission al acerca da in fo rm a ç ã o disponível. Transparência e j u s t i ­
fic a tiv a s são essenciais. Não deve haver n e n h u m a d ú vid a sobre c o m o os c rité rio s fo ra m operacionalizados".
Fonte: Stolp e ta l. (2002).

A seleção dos elementos do patrimônio cultural a serem incluídos nos estudos de


base deve ter sido tratada na etapa de s c o p in g , mas com o início dos levantamentos
de campo, outros elementos podem ser agregados. Tanto os elementos tangíveis como
os intangíveis podem ser abordados, embora grande parte dos EIAs sequer mencione
os elementos imateriais, e muito menos os analisem sob a perspectiva dos impactos
que possam ocorrer.

Em meados da década de 1980, analistas do Banco Mundial escreviam: “o número


extrem am ente pequeno de projetos nos quais se reconheceu a necessidade de exa-

CAPÍTU LO
E studos de B ase e D iagnóstico A mbie

m in ar fenômenos culturais m ostra que a questão não se resume a desenvolver um a


política ou um conjunto adequado de diretrizes para tra ta r do tema (...) [mas é necessá­
ria] maior conscientização sobre a im portância do patrim ônio cultural na formulação
ie projetos” (Goodland e Webb, 1987, p. 16). Na atualidade, a integração de certos
elementos do patrim ônio material, como sítios arqueológicos ou históricos, aos estu ­
dos am bientais é prática comum em muitos países, porém, os elementos intangíveis
i a cultura raram ente são considerados. Para o Banco M undial (1994), os term os de
referência podem determ inar a realização de vários tipos de investigações, como
pesquisa docum ental, m apeam entos com indicação dos locais de interesse e lev an ta­
mentos arqueológicos, entre outros, mas sempre com trabalho de campo.

Sítios de rara beleza n atural ou de im portância científica são elementos do patrim ônio
cultural, cuja im portância pode ser reconhecida de modo relativam ente fácil. Certa­
mente, a existência de qualquer sítio de interesse cultural (seja ele de âmbito local,
regional, nacional ou internacional) na área de um projeto deve ser registrada no EIA.
Muitos países dispõem de inventários de sítios de interesse n atu ral ou de im portância
científica, mas a inexistência de tal registro não pode ex im ir a equipe m ultidis-
ciplinar do EIA de fazer um a investigação, p articularm ente na área que sofrerá
intervenção direta do projeto. De acordo com a Convenção de Paris, considera-se
patrimônio natural.

[...] os monumentos naturais constituídos por formações físicas, biológicas,


geológicas e fisiográficas, assim como as zonas que constituem hábitat de espécies
animais ou vegetais ameaçadas e os lugares ou áreas naturais estritamente
delimitadas e que tenham um valor universal excepcional do ponto de vista da
ciência, da conservaçãp ou da beleza natural.

O patrim ônio geológico é um exemplo de patrim ônio natural; é entendido como


‘ formações rochosas, estruturas, acum ulações sedimentares, formas, paisagens,
azidas m inerais ou paleontológicas ou coleções de objetos geológicos de valor cien­
tifico, cultural, educativo e/ou de interesse paisagístico ou recreativo” (ITGE, s/d,
t. 6). No Brasil, há poucas iniciativas de identificar sítios de interesse geológico
Fig. 9.13), mas há requisitos legais para proteção do patrim ônio paleontológico e
espeleológico. Em muitos países, porém, o EIA deve apontar a existência de sítios
geológicos e os possíveis danos que um em preendim ento possa causar a feições geoló­
gicas, paleontológicas ou fisiográficas, a exemplo do Reino Unido (Hodson, Stapleton
e Emberton, 2001). Na falta de um inventário oficial, cabe aos profissionais da equipe
multidisciplinar registrar a eventual ocorrência de locais de interesse devido à
tresença de m inerais, fósseis, seqüências estratigráficas, aos quais se acrescentam os
locais de interesse ou patrim ônio mineiro.

Ds patrim ônios histórico e arquitetônico tendem a ser am plam ente valorizados, mas
'.evantamentos dessa categoria patrim onial não devem ficar restritos a m onum entos
ou bens reconhecidos oficialmente. É tam bém preciso estar atento ao patrim ônio
industrial, categoria insuficientem ente reconhecida no País, mas de im portância bem
h rm a d a em vários países.
iiação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Um campo específico dentro dos estudos


sobre o patrimônio cultural é a arqueo­
logia, tanto pelo objeto de estudos como
pela especialização requerida. Trata-se
de um setor relativamente bem desen­
volvido, devido, em grande medida, à
existência de legislação específica em
muitos países. A arqueologia ocupa-se do
estudo do passado e tem como principal
fonte de informação a cultura material,
ou seja, os artefatos produzidos ou usa­
dos pelos grupos humanos que ocuparam
determinada área. Caldarelli (1999, p.
347) define recursos arqueológicos como
“qualquer evidência material de ativi­
dades hum anas passadas”. A ocorrência
desses artefatos define um sítio arqueo­
lógico, que é um local que pode ser
afetado por qualquer empreendimento
que envolva movimentação de solo ou
construção.

No Brasil, o patrimônio arqueológico


Fig. 9.13 Elemento notável do patrim ônio geológico e espeleológico, o Poço é protegido pela Constituição Federal,
Encantado (Itaetê, Bahia) é uma caverna calcária onde há um im pressionante
mas desde a promulgação da Lei Federal
lago de cerca de 30 m de profundidade e águas m uito cristalinas. Durante
n° 3.924, de 1961, que dispõe acerca de
um período m uito curto do ano, no inverno, o sol incide pela abertura la teral
monumentos arqueológicos e pré-histó­
e penetra obliquam ente no lago
ricos, existe tutela legal específica. Para
realizar qualquer tipo de estudo arqueológico que implique intervenção no terreno
é necessário que o especialista solicite um a autorização ao Iphan. Os levantamentos
arqueológicos também devem ser submetidos ao Iphan, para análise e aprovação,
ao passo que escavações de sítios arqueológicos também necessitam de autoriza­
ção específica. Segundo a Portaria 230, de 17 de dezembro de 2002, do Iphan, para
empreendimentos sujeitos ao licenciamento ambiental, o órgão deve ser informa­
do e deve aprovar os estudos. Na fase de solicitação de licença prévia, “dever-se-á
proceder à contextualização arqueológica e etnohistórica da área de influência do
empreendimento, por meio de levantamento exaustivo de dados secundários e levan­
tamento arqueológico de campo” (Art. Io).

Via de regra, a existência de sítios arqueológicos não impede a realização de um


projeto de engenharia, apenas coloca certas condições, como a necessidade de estudo
(arqueologia de salvamento) dos sítios antes de sua destruição ou descaracterização.
A barragem de Três Gargantas, na China, afetou 853 sítios arqueológicos (Rushu,
2003), onde foram realizados 1,1 milhão de metros quadrados de escavações (Hichao
e Rushu, 2006).

No diagnóstico ambiental, os estudos arqueológicos têm como objetivo principal


mapear o potencial arqueológico da área de estudo e identificar eventuais sítios

CAPÍTU
J ■
E s t u d o s de B a s e e D i a g n ó s t i c o -

arqueológicos que possam ser afetados pelo projeto analisado. Em um a segunda


etapa, os estudos levados a cabo durante o diagnóstico ambiental podem ser aprofun­
dados por intermédio de trabalhos de detalhe, até envolvendo a escavação de sítios
arqueológicos, o que já se configura como um programa de gestão executado na fase
de construção ou implantação do empreendimento.

Para projetos que abranjam grandes áreas, como hidrelétricas, aplica-se o levanta­
mento amostrai, ao passo que para obras de pequeno porte aplica-se o levantamento
“total” (Caldarelli, 1999). Uma estratégia de amostragem é percorrer a área de estudo
em linhas paralelas (transectsY0 de espaçamento regular; outra estratégia é investigar 10O verbo
as áreas mais prováveis de ocupação, relacionadas às características geomorfológicas significa “cortar
da área de estudo, como a presença de rios, abrigos e elevações topográficas, que transversalmente ”.
Houaiss e Avery
corresponde a um a amostragem estratificada por compartimentos ambientais; na­
não registram
turalm ente essas duas estratégias não são excludentes. Os levantamentos também
substantivo
podem ser feitos com base em estratégias sistemáticas, ou seja, “caminhamentos com equivalente em
vistoria de superfície, que podem ou não estar associadas ao emprego de técnicas de português.
subsuperfície (sondagens, tradagens, raspagens) distribuídas regularmente sobre as
linhas de cam inham ento”. Por sua vez, as estratégias oportunísticas incluem levan­
tamento de informação oral junto aos moradores locais sobre prováveis ocorrências,
vistoria de pontos de exposição de solo devido a fatores de ordem antrópica (cortes
de estradas, áreas aradas) ou natural (barrancos de rio), e visita a locais de maior
potencial conhecido de ocorrência de sítios (paredões rochosos, abrigos, terraços)
(Caldarelli e Santos, 2000, p. 62).

Para o arqueólogo, todo artefato tem significado e é de interesse para o estudo da


sociedade que o produziu. Por outro lado, certas manifestações das culturas passadas
apresentam um interesse major para a sociedade contemporânea,
como é o caso de monumentos ou de arte rupestre (Figs. 9.14 e 9.15),
cuja beleza plástica pode atrair a atenção tanto do leigo quanto do
especialista. Naturalmente, a eventual existência de sítios contendo
cinturas rupestres deve ser assinalada nos estudos ambientais; em

m p w s s :- ■ .
V A'V •—'--
“" .

Fig. 9.15 Pintura rupestre em pcrec


calcários do Vale do Rio Perua; -
: g, 9.14 Pintura rupestre em paredões areníticos de M onte Alegre, Pará Gerais

NOl
ação de Im pacto A m biental: conceitos e métodos

seguida a importância, dada pelo valor cultural do sítio, deve ser avaliada, o que até
pode dem andar mudanças de projeto para proteger determinados sítios.

Mello (1996) critica os levantamentos “assistemáticos” por não serem probabilistas


nem reprodutíveis, e fornece um exemplo de levantamento sistemático realizado na
área da usina hidrelétrica de Corumbá, Goiás, um empreendimento que forma um
reservatório de 6.500 ha. Em setenta dias de campo, a equipe realizou 225.840 m de
caminhamento e também intervenções no solo a cada 30 m, em um total de 7.526,
sendo 6.505 limpezas e 1.021 tradagens. Foram encontrados sete sítios arqueológicos.

Em empreendimentos lineares, o levantamento total também pode ser empregado,


como foi o caso da rodovia Carvalho Pinto, na região do vale do rio Paraíba do Sul,
no Estado de São Paulo. A equipe de arqueólogos percorreu a pé os 70 km do empre­
endimento quando o levantamento topográfico já havia sido concluído e o percurso
estava todo demarcado e estaqueado. A cada 250 m eram feitas entre quatro e seis
sondagens ao longo de um a linha transversal à faixa de domínio da rodovia. Isso
levou à identificação de seis sítios arqueológicos. Em um projeto de duplicação de
rodovia existente, os estudos concentraram-se em locais onde havia solo preserva­
do, uma vez que o terreno lindeiro havia sido profundamente modificado devido à
própria existência da rodovia (Caldarelli, 1999).

Como nos demais levantam entos que compõem os estudos de base, os estudos
arqueológicos começam por compilações de informação existente em arquivos,
museus e publicações. Entrevistas com moradores também podem revelar indícios da
existência de artefatos e os locais de ocorrência.

Caldarelli e Santos (2000) apontam que um a das dificuldades do levantamento arqueo­


lógico desenvolvido no âmbito de estudos ambientais é a definição arbitrária da área
de pesquisa, de alguma m aneira condicionada pelo projeto analisado, em contra­
posição a estudos de finalidade acadêmica, nos quais a área de estudo é definida
pelo pesquisador. Para fms de planejamento dos estudos, os autores recomendam
a elaboração de um planejamento distinto para cada projeto, definindo estratégias
para a busca e localização de sítios arqueológicos. Souza (1986) defende que a melhor
estratégia a ser empregada em levantamentos arqueológicos é a combinação entre os
métodos oportunístico e sistemático.

Como ocorre em outras áreas do conhecimento, uma cuidadosa definição prévia da


metodologia a ser empregada nos levantamentos e na análise dos dados é uma das
chaves para um trabalho de qualidade e para a aceitação dos resultados por parte dos
analistas dos órgãos públicos, de assistentes de ONGs ou ainda do Ministério Público.

King (1998) coordenou um estudo para o Conselho de Qualidade Ambiental a respeito


do componente antrópico nos EIAs americanos. Ademais de observar um a partição
entre “estudos socioeconômicos” e “recursos culturais”, o autor constatou que neste
último tema os levantamentos arqueológicos são dominantes a ponto de seu artigo
intitular-se “Como os arqueólogos roubaram a cultura”. Tal situação deve-se à exis­
tência de requisitos legais explícitos com relação ao patrimônio histórico. Em uma

C A P Í T U lp I ® — ■
Es t u d o s de B a s e e D ia g n ó s t ic o A m b i e

im o stra de 69 EIAs analisados pelo autor, 72% referia-se a “recursos c u ltu ra is”,
intendidos seja como bens tombados ou passíveis de tom bam ento, seja como recursos
arqueológicos.

1 urros elementos tangíveis do patrim ônio cultural devem ser levantados, mas com-
:e te ao especialista decidir o que é relevante de ser mencionado, sempre tendo como
referência os impactos potenciais do projeto. 0 que é relevante, nesse contexto, quase
rempre vai além do espetacular e do que tem reconhecim ento oficial. Relevante é o
: _e tem significado para a com unidade ou aquilo que tem um a função que pode ser
lerd id a ou afetada caso o em preendim ento seja implantado. Um exemplo recorrente é
ü d o pelos cemitérios (Fig. 9.16), lugares cuja função e significado podem ser compre­
endidos por indivíduos de outras culturas. A Fig. 9.17 ilustra outro tipo de lugar que
nrstum a ter significado especial para as comunidades, neste caso um a capela locali­
zada em área quilombola.

A consideração da cu ltu ra im aterial nos estudos am bientais pode ser norteada pela
-lentificação dos lugares de produção e consum o de cu ltu ra popular, como pontos de
encontro da com unidade. Lam ontagne (1994) recom enda que o registro das práticas
: A turais seja feito com o apoio de cartas topográficas e que inclua, entre outros, a
laraeterização do patrim ônio, das pessoas portadoras de saberes tradicionais e do
espaço físico e social de cada prática.

Conhecimento ecológico local e tradicional


A n artir de meados dos anos 1980 e de modo crescente desde então, surgiu u m a cor-
*en:e. especialm ente no Canadá, que defende que os estudos sobre o meio am biente
e i-eus recursos não podem estar completos se não tiverem meios de levar em conta o
::n h ecim en to que populações tradicionais têm de seu am biente (ver Quadro 6.3, em
: i n i c u l a r o item 304). Dependentes de u m a m an eira direta e im ediata dos recursos
i c u r a i s , todas as sociedades tradçcionais desenvolveram estratégias de conhecim en-
io potencial e dos limites de seus territórios. Diagnósticos am bientais elaborados
- ric a m e n te com base no conhecim ento científico formal podem p assar ao largo de
: -lestões relevantes não somente para as próprias com unidades, mas tam bém sob a
perspectiva do conhecim ento acadêmico.

5:evenson (1996) nota a presença crescente de requisitos de incorporação de conhe-


im e n to tradiconal em term os de referência de EIAs canadenses. N akashim a (1990)
m u d o u o conhecim ento do meio de que d isp u n h a m com unidades Inuit residentes na
: =:a de Hudson, no m omento em que se planejavam perfurações de petróleo, consta-
^ rd o u m a com preensão m uito mais detalhada e sofisticada da parte dos nativos do
: - r o limitado conhecim ento científico disponível sobre a ecologia daquela porção
: : ambiente ártico, em p a rtic u la r sobre o com portam ento e as populações de um a
m é c i e de pato muito v u ln eráv el à poluição decorrente de um vazam ento de petróleo.

dise tipo de estudo, necessariam ente interdisciplinar, tem o potencial de estabelecer


diálogo entre as ciências n a tu ra is e as ciências sociais, tão necessário quando o
/

i n j e t o afeta populações tradicionais. E um a abordagem muito m ais rica que o lim i­


tado “laudo antropológico”.
lia ç ã o d e Im pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

Fig. 9.16 Cemitério de Santa Isabel, em Mucugê, cidade da Fig. 9.17 Capela de Ivaporunduva, situada às margens do rio
Chapada Diam antina, Bahia, tom bado em 1980 pelo In stitu to Ribeira de Iguape, no sul do Estado de São Paulo, erguida em
do Patrim ônio H istórico e A rtístico N acional uma com unidade quilom bola e situada em local considerado
para construção de uma usina hidrelétrica

9 .5 D esc r iç ão e a n á l is e
A seção precedente não deve dar a entender que o diagnóstico ambiental é uma mera
descrição de componentes ambientais de ym a área previamente delimitada para fins
110 modelo pressão-
de estudos. Como enfatiza a definição adotada de diagnóstico ambiental, trata-se de
estado-resposta é
muito empregado
“descrição e análise”. Infelizmente, a maioria dos EIAs apresenta diagnósticos mais
para o diagnóstico descritivos do que analíticos. Parece haver pouco tempo para um trabalho conjunto
de vários problemas da equipe (ou seja, um trabalho multidisciplinar) de reflexão e síntese sobre o estado
ambientais e para do meio ambiente.
análise de políticas
públicas ambientais
Idealmente, o diagnóstico deveria analisar as principais forças e tendências que con­
(a resposta).
tribuem para a degradação ambiental na área de estudo (a pressão), fazer um a síntese
da situação atual do ambiente nessa área (o estado) e discutir as iniciativas em curso
12Cenário, em para reduzir ou reverter a degradação (a resposta)11, tirando algumas conclusões so­
planejamento bre as tendências ambientais atuais. Esse desafio, mais um a vez, como é freqüente
estratégico, é “um
em análise de impacto ambiental, requer discernir o significativo do irrelevante,
conjunto formado
pela descrição
estratégia que sempre abre flancos para críticas.
de uma situação
futura e do percurso Esboçar um a síntese da situação atual também possibilita fazer alguma projeção para
coerente que parte o futuro, ainda que este não seja um dos objetivos do diagnóstico ambiental. Pode-
da situação atual se estabelecer, em primeira aproximação, qual seria o cenário tendencial12, isto é,
para lá chegar”
qual será a provável situação futura da área de estudo sem a proposta em análise. A
(Godet, 1983a,
p. 115). “Cenário previsão dos impactos possibilitaria, então, vislum brar uma provável situação futura
tendencial é aquele com tal proposta, de modo que, através de um a comparação dos cenários com e sem
que corresponde projeto, ter-se-ia uma noção de seus impactos ambientais.
ao percurso mais
provável (...),
Essa abordagem é coerente com o conceito de impacto ambiental exposto na
considerando as
tendências inscritas Fig. 1.5, mas há de se reconhecer as grandes dificuldades práticas, além das teóri­
em uma situação cas, de aplicar tal conceito ao conjunto de impactos de uma proposta. Não obstante,
de origem” (Godet, para um conjunto limitado de impactos significativos, não é apenas possível como
1983b, p. 111). desejável trabalhar nessa linha.

CAPITU LO
Es t u d o s de B a s e e D ia g n ó s t ic o A m b ie

Dor exemplo, para um projeto que afete diretam ente rem anescentes de vegetação
nativa, não é demasiado complexo fazer projeções da situação fu tu ra com e sem
trojeto. 0 problema é que tais projeções podem ser controversas. Na discussão de um
trojeto de parque temático no litoral sul do Estado de São Paulo, proposto para um a
nrea com rem anescentes de Mata Atlântica, os argum entos, simplificadamente, eram:
1 m antidas as tendências atuais, a vegetação será pau latin am en te degradada devido
a ocupações da área por populações de baix a renda, im pulsionadas por interesses
ezonômicos e políticos; o projeto poderá frear a expansão, g arantind o a preservação
te re n e de um a área apreciável (por meio de condicionantes da licença ambiental,
: : n o a obrigação de m anter u m a reserva p a rtic u la r do patrim ônio natural, ambos
: revistos na legislação); e (2) o proprietário da gleba em que seria im plantado o
tn p re e n d im e n to (que não era o proponente do projeto) tem obrigação legal de zelar
rela integridade dos rem anescentes florestais, e o poder público tem obrigação de
vscalizar o cum prim ento da lei. Nesse debate, não houve consenso sobre o cenário
'rzráencial.

fim, é oportuno lem brar que um diag n ó stico am biental que não, se limite a
zrrições técnicas dos com ponentes e processos, mas inclua u m a análise e um a
rrnrese que facilite sua compreensão, é tam bém um sinal de respeito e consideração
refo leitor. Não se pode esquecer que o usuário do EIA tem direito a um a inform ação
rfira. consistente e suficientemente decodificada. Claro que, ao sintetizar os resul-
rados do diagnóstico ambiental, há o risco de um a simplificação excessiva, portanto
: -jeita a críticas de outros especialistas. É, assim, u m equilíbrio difícil que se busca
gaíiação de Impacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

Um dos principais objetivos da avaliação de impacto ambiental é, certamente, o de


prever mudanças nos sistemas naturais e sociais decorrentes de um projeto de desen­
volvimento. Assim, todo estudo de impacto ambiental deve apresentar um prognóstico
da situação futura, no caso de realização do empreendimento analisado. Entendido
como um a descrição da situação futura do ambiente afetado, o prognóstico deve
ser fundamentado em hipóteses plausíveis e previsões confiáveis. Na seqüência de
atividades de preparação de um EIA, a previsão é a etapa que busca inform ar sobre a
m agnitude ou intensidade dessas mudanças.

A previsão é um dos passos da análise dos impactos. Ela provê uma descrição
fundam entada e, se possível, quantificada dos impactos identificados no passo ante­
rior, identificação esta que, por sua vez, se baseou no diagnóstico ambiental, mesma
atividade que fornece dados para a previsão, cujos resultados serão utilizados para
avaliar a importância dos impactos (o terceiro passo da análise dos impactos), deli­
neando medidas para evitar, atenuar ou compensar os impactos adversos. Entendida
dessa forma — conectada às demais atividades essenciais à elaboração de um estudo
de impacto ambiental - , percebe-se que a previsão não é a finalidade desses estudos,
mas um elo de um a corrente em que cada atividade tem um a função: cada atividade
depende da precedente e fornece informações ou conclusões para a subsequente, con­
forme a Fig. 10.1.
• Diagnóstico ambientalm
Assim, podem-se formular as funções da previsão de impactos
Prognóstico ambiental como:
# estimar a magnitude (intensidade) dos impactos ambientais;
Medidas mitigadoras ® fornecer informações para a etapa seguinte, avaliação da impor­
tância dos impactos;
Fig. 10.1 Encadeamento entre o diagnós­ # prognosticar a situação futura do ambiente com o projeto em
tico am biental e as medidas m itigadoras, análise;
m ediante o prognóstico am biental
# comparar e selecionar alternativas;
# fornecer subsídios para a definição de medidas mitigadoras.

10.1 P l a n e j a r a p r e v is ã o de im p a c t o s
Definir um roteiro de trabalho para prever impactos faz parte do planejamento de um
EIA. Nem todos os impactos são passíveis de previsão quantitativa, e nem todos são
suficientemente significativos para que se despenda tempo e dinheiro tentando quan­
tificá-los, mas todos devem ser satisfatoriamente descritos e qualificados no ELA.

A atividade de previsão de impactos envolve, basicamente, cinco passos:


1. Escolha de indicadores: eqüivale a decidir o que prever, selecionando os indicadores
que serão empregados para realizar o prognóstico, e levando em conta não somente a
“previsibilidade”, mas também a capacidade e o custo de monitorar esses parâmetros,
caso o projeto siga adiante (isto é, na fase de acompanhamento, após a decisão).

2. Determinar como fazer a previsão, tarefa que pode ser subdividida em duas,
a saber:
# definir materiais e métodos de trabalho (por exemplo, o uso de um modelo, qual
modelo);

CAPITU
P r e v i s ã o de I m p a S E S 259

& justificar as razões da escolha (por exemplo, por ser um método aprovado pelo
órgão regulador, como um modelo de dispersão de poluentes atmosféricos, ou
um método clássico e de emprego universal, como os usados para dimensionar
obras hidráulicas e que dependem de previsões de vazão).

3. Calibração e validação do método: procedimento necessário quando se emprega um


modelo desenvolvido para outra situação, cuja validade para um uso diferente precisa
ser analisada; os resultados que podem ser obtidos dependem de certas hipóteses (em
geral simplificadoras) e de certos pressupostos (em geral conservadores, isto é, a fa­
vor da segurança); tais hipóteses e pressupostos devem ser explicitados para que os
usuários (o leitor do EIA, o proponente do projeto, o analista técnico, os responsáveis
pela tomada de decisões) compreendam os limites das previsões.

v. Aplicação do método e obtenção dos resultados: este passo significa, finalmente,


'fazer as previsões”.

5. A nálise e interpretação: dados brutos são de pouca utilidade para a tomada de deci­
sões, e é função do analista interpretar os resultados dentro do contexto da avaliação
ze impacto em curso; nessa interpretação pode ser pertinente discutir as incertezas
ia s previsões e a sensibilidade dos resultados, ou seja: quais seriam os resultados se
rs hipóteses e os pressupostos adotados não se revelarem verdadeiros?

õomo em outras tarefas na preparação de um EIA, pode ser necessário discutir


previamente com o órgão ambiental (e eventualmente com alguns interessados) quais
abordagens serão utilizadas na previsão de impactos, se há real necessidade de forne­
cer previsões quantitativas, quais os indicadores mais apropriados e, se houver uso de
modelos matemáticos, quais são aceitos ou se há restrição a algum modelo. De comum
acordo, algumas dessas definições podem ser incluídas nas diretrizes ou nos termos de
referência para o estudo.

10.2 I n d i c a d o r e s de i m p a c t o s
ÕJma m aneira prática de descrever o com portam ento futuro do meio ambiente
afetado é por meio de indicadores am bientais convenientem ente escolhidos. Indi-
: adores têm uso crescente em planejamento e em gestão ambiental, e são úteis em
“ ârias partes dos estudos de impacto: no diagnóstico, na previsão de impactos e
no monitoramento.

Há inúmeras definições de indicadores ambientais, a exemplo das seguintes:


& “um parâmetro que fornece uma medida da magnitude do impacto ambiental”
(Munn, 1975);
& “um parâmetro que serve como medida das condições ambientais de uma área
ou ecossistema” (Moreira, 1992);
“uma variável ou estimativa ambiental que provê uma informação agregada,
sintética, sobre um fenômeno” (Ministério de Medio Ambiente, 1996).

Indicadores fornecem um a interpretação de dados ambientais (Fig. 10.2). 0 concei-


:o é de amplo uso em várias disciplinas, como nas ciências biológicas, nas quais

DEZ
aliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

significa “espécies cuja presença em determinado local, devido às


suas exigências ambientais bem definidas, é indicativa da ocorrência
dessas condições” (definição modificada a partir de Moreira, 1992).
Assim, uma determinada espécie aquática, por exemplo, só sobrevive
se as condições ambientais são de ótima qualidade (como em função
da quantidade de oxigênio dissolvido presente na água). Então, se tais
condições ambientais não forem preenchidas, a espécie, que norm al­
mente ocuparia aquele local, estará ausente; inversamente, a partir da
constatação de sua presença, pode-se concluir pelas boas condições do
ambiente aquático.

Fig. 10.2 Pirâmide da inform ação


No campo da qualidade do ar,, os indicadores ambientais são muito u ti­
am biental
lizados para avaliar as condições sanitárias de um a região ou local; por
Fonte: Ham m ond et al., 1995, p. 1.
exemplo, a concentração de partículas sólidas em suspensão no ar -
um parâmetro que pode ser medido por meio de métodos padronizados —
fornece um a informação sobre os possíveis riscos à saúde que incorreria um a pessoa
diariamente exposta ao poluente, um a vez que existe um a correlação entre a presença
dessas partículas (principalmente as mais fmas, chamadas de fração inalável ou par­
tículas inaláveis) e problemas do aparelho respiratório. Desta forma, a concentração
de partículas em suspensão é um bom indicador da qualidade do ar.

Porém, como muitas vezes encontram-se diferentes tipos de poluentes em um mesmo


local, é interessante saber seu possível efeito combinado ou sinérgico - ou ainda buscar
uma informação agregada e sinóptica sobre esses vários poluentes. Neste último caso,
adota-se índices ambientais que combinam diferentes parâmetros ou indicadores
(Fig. 10.2). Muitas vezes, o público é informado sobre o estado do meio ambiente por
meio de tais índices agregados (como índices de qualidade do ar ou da água). No Estado
de São Paulo, o índice de Qualidade do Ar agrega sete parâmetros: CO, S02, N 02, 0 3,
/

poeira total em suspensão, poeira inalável e fumaça. Já o índice de Qualidade das


Águas agrega nove parâmetros: coliformes fecais, pH, DBO, OD, N total, fosfato total,
turbidez, resíduo total e temperatura.

Também os profissionais das geociências vêm se preocupando em definir indicadores


para medir e acom panhar os processos do meio físico modificados por ação hum ana
(Berger, 1996). Por exemplo, Bitar et al. (1993) propõem diversos indicadores para este
fim, como:
feições erosivas de pequeno porte (sulcos e ravinas), cuja magnitude
pode ser indicada por meio de parâmetros como comprimento, profun­
didade e área afetada;
# posicionamento e variação dos níveis freáticos, que podem ser descri­
tos com a ajuda de parâmetros como profundidade média e amplitude
de oscilação dos níveis piezométricos;
# assoreamento, cuja magnitude pode ser indicada pela área afetada e
pelo volume de sedimentos depositados.

Para Hammond et al. (1995, p. 1), os indicadores ambientais têm duas características
básicas: (i) quantificam informação para que seu significado possa ser apreendido
mais rapidamente e (ii) simplificam informação sobre processos complexos a fim de

CAPÍTÚ LO
P r e v i s ã o de I m p a

n elh o rar a comunicação. Os indicadores proveem informação condensada, agregan-


I I dados primários.

-ssim , os indicadores ambientais são parâm etros representativos de processos


im bientais ou do estado do meio ambiente (ou seja, sua situação em um dado
momento, local ou região). A norma ISO 14.031:1999 - Avaliação do Desempenho
Ymbiental - recomenda a utilização de três tipos de indicadores: (i) indicadores de
zesempenho gerencial, (ii) indicadores de desempenho organizacional e (iii) indica-
: ::es de condições ambientais. No primeiro grupo, enquadram -se os indicadores que
n o v e e m informações sobre a adm inistração de um a empresa ou outra organização.
p í o segundo, sobre emissões poluentes, consumo de recursos e outros dados de
: mcesso ou de resultados. Já no terceiro grupo encontram -se os indicadores sobre
| rialid a d e do meio ambiente. Em avaliação de impacto ambiental, usam -se mais os
:: :s últimos grupos.

- -zuns indicadores e índices sobre condições ambientais ou o estado do meio ambiente


l : usualmente coletados por organismos governamentais e podem ser aproveitados
: EIAs, principalmente para fins de diagnóstico ambiental, desde que sejam clara-
nente associados a um local ou um a região. Organismos do sistema ONU, a exemplo
. -rogram a das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e do Programa das
^ i :: es Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), têm compilado informações agrega-
i i s sobre as condições ambientais do Planeta. Um exemplo é o Global Environmental
ÜKüíook, coletânea internacional de informações ambientais, que também tem ver-
i :e s nacionais e locais. A versão brasileira, GEO Brasil 2002, foi publicada um a única
i n Ibama, 2002) e alguns municípios também produziram os seus, a exemplo de São
' n . o . 0 Banco Mundial e algumas ONGs como o World Resources Institute também
t~i : alham no mesmo sentido. Assim, a ideia de que é preciso conhecer a situação do
n t : : ambiente para poder gerá-lo está sendo disseminada.

Ez _ma enorme quantidade de indicadores e índices ambientais que podem ser utilizados
~ -ALA. Selecionar os indicadores mais adequados é tarefa importante para o analista.

Se quase todo parâmetro pode ser transformado em indicador ambiental, é impor-


m n e estabelecer critérios para sua escolha, estando atento a adotar o indicador de um
znificado agregado àquele derivado da informação propriamente científica, com a
fc^alidade de refletir de forma sintética um a preocupação social a respeito do meio
i~ ::e n te e inseri-la coerentemente no processo de tomada de decisões” (Ministério
«e Medi o Ambiente, 1996, p. 16).

[ I s c : o universo amplo de parâmetros que têm potencial de ser transformados em


iin i a d o r e s para uso em AIA, Cloquel-Ballester et al. (2006) entendem ser necessário
l z irocedimento de validação, sem o qual a utilidade e a credibilidade dos indica-
icres poderiam ser prejudicadas. Alguns indicadores de uso amplamente difundido
f::m o os empregados em publicações governamentais) não necessitam de validação,
vjlí não há motivo para limitar-se a esse tipo de indicador, um a vez que sua versati-
. i z i e é grande. Na etapa de estudos de base, os indicadores permitem descrever, de
z -10 sistemático, a situação que precede a eventual implantação do empreendimen-
i : l ;ssim como facilitar a coleta de dados. Na etapa de previsão, auxiliam a descrição
aliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

da situação fu tu ra. Finalm ente, para fins de gestão e m onitoram ento am biental, de­
verão ju s ta m e n te ser os p arâ m e tro s ou v ariáveis a ser medidos e acom panhados. O
Quadro 10.1 m ostra exemplos de indicadores utilizados p ara descrever a m ag nitud e
de efeitos e im pactos am bientais identificados em um EIA — note que a lg u n s são in-

Quadro 10.1 Exemplos de indicadores para estudo da m agnitude de aspectos e im pactos


am bientais
A specto/ I m p a c to I n d ic a d o r e s

Aumento das taxas de erosão Superfície afetada (ha), taxa de perda de solo
(t/ha.ano)
Aumento da carga de Contribuição do empreendimento em relação a
sedimentos nos corpos d'água outras fontes situadas na mesma sub-bacia
Alteração da topografia Volumes de solo e rocha movimentados (m3)
hidrográfica
Geração de resíduos sólidos Massa gerada por classe de resíduo (t/ano)
Consumo de água Consumo mensal (m3/ano), vazão consumida em
relação à vazão mínima do rio
Geração de efluentes líquidos Vazão efluente, DBO, DQO, outros
Geração de ruídos Aumento do nível de pressão sonora em relação ao
ruído de fundo preexistente
Geração de material Quantidade emitida para a atmosfera em relação a
particulado outras fontes na região
Geração de gases de combustão Quantidade emitida para a atmosfera em relação a
outras fontes na região
Perda de áreas de cultura e Superfície afetada em relação às áreas cultivadas
pastagem no município ou sub-bacia hidrográfica
Perda de fragmentos de Superfície afetada (ha)
vegetação nativa
Aumento do tráfego de Porcentagem de aumento em relação ao volume
caminhões médio diário de tráfego preexistente
Aumento da demanda de bens Valor das aquisições no mercado local (R$)
e serviços
Geração de impostos e Montante a ser recolhido (R$)
contribuições
Criação de postos de trabalho Número de postos criados
Alteração da qualidade do ar Concentração ambiental do poluente P1
Alteração da qualidade das Concentração ambiental do poluente P2, índice
águas superficiais de qualidade das águas
Alteração da qualidade do solo Superfície afetada (ha)
Impacto visual Dimensões das áreas visíveis, número de pessoas
que potencialmente verão o sítio do projeto
Diminuição da produção Superfície afetada em relação às áreas cultivadas
agrícola no município ou sub-bacia hidrográfica
Incremento nas atividades Massa salarial gasta localmente e montante de
comerciais aquisições de bens e serviços
Aumento da arrecadação Massa tributária em relação à arrecadação
tributária preexistente no município

CAPITU
P r e v i s ã o de I m p a

dicadores absolutos (por exemplo, emissão total), ao passo que outros são relativos a
algum nível preexistente.

Quando o EIA faz distinção entre aspecto (ou efeito) e impacto ambiental, pode-se u sar
indicadores para am bas as categorias, pois geralm ente é mais fácil prever ou estim ar
a m agnitude dos aspectos que dos impactos. 0 Quadro 10.2 traz u m a lista parcial de
indicadores de aspectos am bientais estimados para um projeto de pequena mineração
de bauxita em um a zona ru ral do Estado de São Paulo. Os métodos empregados para
as estim ativas são comentados na seção 10.3.

Quadro 10.2 Exemplos de indicadores de m agnitude de aspectos am bientais


A specto A m biental I n d ic a d o r E s tim a tiva
Alteração da topografia local Volume de material removido 1.380.000 m3
9

Supressão de áreas de cultura Area afetada 372.500 m2


e pastagem Número de propriedades rurais afetadas 23 propriedades
9

^einserção dos terrenos minerados Area afetada 372.500 m2


no meio rural
Extração de recursos naturais não Quantidade de minério extraída 1.976.000 t
'enováveis
Eonsumo de água Volume diário consumido 100 m3/dia
Eonsumo de recursos não Volume mensal consumido 1.900 i/ m ê s de diesel
e-ováveis (óleos e combustíveis) 25 i / mês de lubrificantes
Eeração de efluentes líquidos Vazão efluente 0 m3/dia
Zsrreamento de partículas sólidas Volume de partículas por unidade de tempo ~ 0 t/ano
Emissão de material particulado Quantidade emitida por km de estrada 3 kg/km
E~ssão de gases de combustão Quantidade de gases de combustão Não estimado
/azamento de óleos e combustíveis Volume anual ~0 ü/a no
Eeração de resíduos sólidos •* Quantidade gerada 150 kg /ano
Seração de resíduos líquidos Quantidade gerada 300 H /ano
Emissão de ruídos Nível máximo de pressão sonora 71dB(A) a 10 m da operação
-^m ento do tráfego de caminhões Número adicional de veículos 36 veículos/dia (terra)
10 veículos/dia (asfalto)
-.m e n to da demanda de bens Dispêndio na aquisição de bens/serviços R$ 60.000/mês
e serviços
-Emento da massa monetária em Valor pago aos proprietários rurais em R$ 790.400 (total)
: rculação local decorrência de royalties
Eeração de impostos Volume anual recolhido CFEM R$ 4.050/ano CFEM,
Volume anual recolhido ICMS R$ 50.300/ano ICMS
% de aumento da receita local (ICMS) 41,9o/o
: edução das atividades comerciais Valor do minério + royalties ~ R$ 400.000/ano
b r t e : P rom iner Projetos S/C Ltda., EIA Lavra de B auxita Cia. Geral de M in a s-A lco a , 2002.

' 0 . 3 M é t o d o s d e p r e v is ã o d e im p a c t o s
Existe u m a gran de variedade de ferram entas e procedim entos utilizáveis para a
çrevisão de impactos sobre o meio ambiente. Na verdade, m uitas disciplinas cientí-

D
g a lia ç ã o de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

ficas buscam desenvolver métodos capazes de antecipar as variações dos fenômenos


que estudam, de modo que os métodos e procedimentos dessas disciplinas podem
ser empregados em AIA. Cinco grandes categorias de métodos preditivos utilizados
nos estudos de impacto ambiental são comentados a seguir. Não existe um método
intrinsecamente melhor que os demais. 0 melhor método é aquele mais adaptado ao
problema que se pretende resolver, dentro de seu contexto — por exemplo, um sofisti­
cado modelo matemático que necessite de um grande volume de dados, cuja obtenção é
difícil, demorada e cara, será completamente inapropriado se uma aproximação gros­
seira baseada em experiência prévia ou em analogia sugerir que determinado impacto
(por exemplo, alteração da qualidade do ar) será de pequena magnitude e importância.
Como nas demais etapas da preparação de um estudo ambiental, os meios empregados
devem ser proporcionais ao problema.

M o d e l o s m a t e m á t ic o s
Modelos são representações simplificadas da realidade. Busca-se um a aproximação
do entendimento de algum fenômeno, por meio da seleção de alguns aspectos mais
relevantes, negligenciando, necessariamente, outros aspectos tidos como menos
im portantes para a análise. Modelos podem ser analógicos (como um a represen­
tação em escala reduzida de um estuário ou do relevo), conceituais (descrição
qualitativa dos componentes e das relações de um sistema), ou matemáticos, que são
representações formalizadas mediante um conjunto de equações matemáticas que
descrevem um determinado fenômeno da natureza. Diversos processos ambientais
podem ser modelados dessa forma, principalmente fenômenos físicos e, em certa
medida, processos ecológicos.

Elaborar esses modelos é uma das tarefas dos cientistas, que assim buscam entender
melhor como funcionam os processos naturais. Vários foram desenvolvidos com o
objetivo específico de auxiliar no planejamento e na gestão ambiental, como é o caso
dos modelos de dispersão de poluentes atmosféricos, que correlacionam emissão de
poluentes de um a chaminé, por exemplo, com fatores meteorológicos como intensidade
e direção de ventos e insolação, prevendo as concentrações desses poluentes em vários
pontos situados em diferentes distâncias do local de emissão.

No campo da avaliação de impacto ambiental, modelos matemáticos têm sido muito


usados nos campos da qualidade do ar, da dispersão de poluentes na água subterrânea
ou em águas superficiais, da propagação de ruídos, entre outros. No caso de poluentes
atmosféricos, inicialmente são estimadas ou calculadas as emissões das futuras fon­
tes: tais emissões podem ser obtidas por meio de cálculos de balanço de massa do
processo industrial ou estimadas a partir de médias estatísticas compiladas em refe­
10s fatores rências bibliográficas específicas, os chamados fatores de emissão1. Em seguida, a
de emissão dispersão atmosférica dos poluentes é simulada com a ajuda de equações previamente
compilados e
validadas que descrevem o comportamento da pluma de poluição sob diferentes condi­
periodicamente
ções meteorológicas (por exemplo, intensidade dos ventos e estabilidade da atmosfera),
revistos pela
Agência de e desta forma são capazes de prever, para diferentes pontos de coordenadas conhecidas,
Proteção Ambiental as futuras concentrações de poluentes. 0 modelo propriamente dito é esse conjunto de
dos Estados Unidos equações. 0 Quadro 10.3 mostra os fundamentos dos modelos gaussianos de dispersão
são referência de poluentes na atmosfera, amplamente utilizados.
internacional.

CAPÍTU L0
P r e v is ã o de I m p a 265

- ~ a vantagem do uso de modelos matemáticos é que diferentes cenários podem ser


simulados e o analista pode assim considerar a pior situação possível. Pode tam -
: : z . se dispuser de dados estatisticamente confiáveis, apresentar os resultados sob
i-ierentes formatos: por exemplo, ainda no campo da poluição do ar, o número de
: as por ano em que a qualidade do ar ultrapassará certo valor, ou a concentração
: t ieierm inado poluente que deverá ser ultrapassada durante 5°/o do tempo. 0 Qua-
m 10.4 mostra um exemplo de previsão de qualidade do ar feito para um estudo 2 Os gases sobem
ae impacto ambiental de uma usina termelétrica a gás. No quadro são mostradas as na vertical a
:: "lentrações m áxim as previstas para cinco pontos de interesse situados na área partir da boca da
ié influência do empreendimento - para efeitos de comparação são tam bém mostra-
chaminé até uma
determinada altura
os padrões legais para os mesmos poluentes. Os resultados podem também ser
em que a pluma
na forma de mapas de isoconcentração para cada um dos principais é defletida pelo
: m e n te s . Além disso, tais modelos tam bém permitem que se encontrem os pontos vento; essa altura é
õe m áxim a concentração de poluentes. chamada de altura
efetiva da chaminé.
I m c r o 10.3 Modelos gaussianos de dispersão atmosférica
. . - a r t e as décadas de 1960 e 1970, o tra n s p o rte e a dispersão de poluen te s no ar c o m e ç a ra m a ser estudados, v i-
n - c o a c o m p re e n d e r os processos envolvidos, d e s ta c a n d o -s e os tra b a lh o s de Pasquill e de G iffo rd . A dispersão de
ssões a tm o s fé ric a s a p a rtir de um a fo n te fix a (cham iné de a ltu ra e fe tiv a 2 h) pode ser de scrita com a equação
<o, que m o stra as c o n c e n tra ç õ e s X esperadas do p o lu e n te no p o n to de coorde nad as x, y, z m edidas a p a rtir da
:e. 0 m o d e lo é c h a m a d o gaussiano (ou e statístico) porque a d m ite que a c o n c e n tra ç ã o m á x im a se e n c o n tra no
m o de um a plum a de dispersão de seção elíptica, de caindo segu n d o uma curva de Gauss (a con h e cid a curva em
~a de sino) do c e n tro para as bordas da plum a. Esta se desloca para ju s a n te s e gu ndo a direção do v e n to e c o n fo r -
:s ooluentes vão sendo diluídos, e sua c o n c e n tra ç ã o decresce com a distância da fo n te emissora. A d is trib u iç ã o da
r e e n t r a ç ã o no in te rio r da plum a depende da velo cid a d e do v e n to p e das c ond ições de e s ta b ilid a d e da a tm o s fe ra ,
iT s e n t a d a s pelos c o e fic ie n te s de dispersão o y (lateral) e g 2 (vertical), p a râ m e tro s q u a n tita tiv o s que representam
m ções q u a lita tiv a s a tm o s fé rica s . Esses c o e fic ie n te s dependem do c h a m a d o grau de estabilida de a tm o s fé rica ,
: : oor uma c o m b in a ç ã o entre a velo cidad e do v e n to e a insolação ou a c o b e rtu ra de nuvens, de a co rd o com c la s-
" la ç ã o p ro p o sta por Pasquill em 1971: A - e x tre m a m e n te instável; B - m o d e ra d a m e n te instável; C - levem ente
stável; D - n e u tra ; E - le ve m e nte estável; F - m o d e ra d a m e n te estável. Â m a io r in sta b ilid a d e c o rre sp o n d e a m a io r
;:a c id a d e de dispersão de poluentes. A tra n s fo r m a ç ã o dessas cond ições nos c o e fic ie n te s de dispersão é fe ita por
m c o s . A eq uação a segu ir expressa a d is trib u iç ã o da c o n c e n tra ç ã o de po luen te s (Seinfeld, 1978, p. 298):

Q / 1 fz -h V
\2
X(x, y,z) = exp y exp ----------------
+ exp
1
-------------------------- —

27lGyGzq vPy 2 2 G2 7

m a equação a p lic a -s e a po lu e n te s inertes, liberados a ta x a s c o n s ta n te s Q sobre te rre n o s planos. C ondições mais


: : ~ o exas requerem ajustes e, c o n s e q u e n te m e n te , m odelos mais sofisticados. Correções são necessárias q u a n d o o
:e ~ e n o não é plano, caso em que há m a io r tu rb u lê n c ia a tm o s fé ric a e, p o rta n to , m a io r dispersão v e rtic a l, e o respec-
i .o c o e fic ie n te de dispersão v e rtic a l deve assum ir o u tro s valores para dar c o n ta dessas c aracterísticas. 0 m esm o
zcorre qu and o a fo n te é situada em um vale, caso em que a dispersão lateral pode ser restrin gid a. Há m odelos para
* : ates lineares (rodovias) e para emissões difusas e fu g itiv a s de áreas abertas.

1 - a n t o mais c o m p le xa a situação, m a io r o possível erro dos resultados, haja vista que a c o m p le x id a d e da realidade
e : r aduzida no m od e lo por s im p lific a ç õ e s ainda maiores. Na a p licação dos m odelos, c o n tu d o , c o s tu m a -s e selecionar
=5 situações m enos favo rá ve is em te rm o s de dispersão, o que te n d e a dar resultados conservadores. Q uando as
z revisões de m odelos gaussianos são c o m p a ra d a s com resultados de m o n ito ra m e n to , estes ú ltim o s e n c o n tra m -s e
m q u e n t e m e n t e abaixo das previsões (ERL, 1985, p. 79). Hoje e xistem m odelos mais s o fis tica d o s que os gaussianos.
: _ e p e rm ite m , e n tre o u tra s operações, c o m p u ta r o p e rfil v e rtic a l de te m p e ra tu ra e v e lo c id a d e de v e n to acim a cs
*onte (Elsom, 2001, p.163), mas os m odelos gaussianos ainda são bem em preg ados em estudos de im p a c to a m b :er i a

D EZ
aliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Outro exemplo de modelagem preditiva da


Q u a d r o 1 0 .4 C o n ce n tra çõ e s p re v is ta s de p o lu e n te s a tm o s fé ric o s
p a ra a área de in flu ê n c ia de u m a u sin a te rm e lé tric a a gás n a tu ra l qualidade do ar é mostrado no Quadro 10.5,
C o n c e n t r a ç õ e s M á x i m a s S obre os R eceptores ( p g / m 3) que sintetiza o procedimento empregado
Receptores NOx SOx MP CO THC no EIA de uma rodovia de seis faixas de
(1 h ) ( 2 4 h) ( 2 4 h) ( Í h) ( 3 h)
rolamento projetada para fazer parte do
Seropédica 7 9 ,7 0 ,7 4,5 3 5 ,5 11,9
contorno da cidade de São Paulo, deno­
Q ueim ad os 8 5 ,0 0 ,3 4 ,5 4 0 ,6 10,1
minada Rodoanel. Nesse caso, a futura
E ngenheiro 7 5 ,0 0 ,6 3 ,7 2 7 ,0 16,1
qualidade do ar na área de influência
Pedreira da rodovia foi estimada com a ajuda de
Japeri 5 6 ,2 0 ,3 3,1 2 2 ,8 8,1
um modelo gaussiano que, por sua vez,
E TA de 7 7 ,0 0 ,7 7 ,4 3 0 ,1 1 2 ,2
depende de uma informação sobre o trá ­
G uandu fego de veículos na rodovia (as fontes de
Padrões 3 2 0 ,0 3 6 5 ,0 15 0 ,0 4 0 .0 0 0 ,0 1 6 0 ,0
emissão). Como não é possível fazer uma
p rim á rio s contagem do fluxo de veículos, posto que
THC = hidrocarbonetos totais a via não existia à época de elaboração
Fonte: M ineral/A grar, Estudo de im p a c to a m b ie n ta l Usina Termelétrica
do EIA, o volume de tráfego foi estimado
Riogen M erchan t, 2 0 0 0 .
com a ajuda de outro modelo matemático,
usado para previsões de trânsito. Uma das maipres dificuldades da modelagem preditiva
em rodovias é “calibrar o modelo de dispersão por meio de um melhor conhecimento
dos fatores médios de emissão da frota que efetivamente trafega” (Branco et al., 2003).
Em outras palavras, qualquer modelagem requer que se adotem certos parâmetros (no
caso, as emissões reais), o que introduz outra fonte de incerteza (de Jongh, 1988) além
daquela inerente ao modelo, por ser um a representação simplificada da realidade.

Mais um exemplo de previsão da qualidade do ar fundada em modelagem matemática


é mostrado na Fig. 10.3. Na figura, a previsão é apresentada na forma de isolinhas
superpostas a um mapa de uso do solo, o que lhe confere grande efeito comunicativo.
Trata-se de um projeto de construção de um a nova indústria de fundição de alumínio
r

primário em um a zona industrial e portuária situada na Africa do Sul, onde já fu n ­


ciona outra unidade da mesma empresa. São representadas as concentrações previstas
de fluoretos, um dos principais poluentes nesse tipo de empreendimento. 0 projeto
prevê a emissão total de 351 toneladas anuais de fluoreto, considerando as emis­
sões da indústria existente e as do projeto em análise; o modelo também computou
as emissões de um a indústria de fertilizantes existente na mesma zona industrial.
0 mapa apresenta as médias anuais de concentração de fluoreto, logo não corresponde
à situação mais crítica, que, no entanto, também foi simulada. A isolinha de
0,4 p g /m 3 representa a diretriz adotada para proteção da vegetação, haja vista que aci­
ma desse valor pode ser registrado o amarelamento das bordas das folhas de algumas
espécies sensíveis. A isolinha de 1,0 p g /m 3 foi adotada como diretriz para áreas in­
dustriais e comerciais, nas quais danos à vegetação não são tidos como relevantes.
Segundo os resultados da modelagem, para a alternativa de localização F, indicada
com essa letra na Fig. 10.3, cerca de 20% da área industrial apresentaria concentra­
ções médias acima desse valor. 0 padrão ambiental para proteção da saúde humana,
segundo o estudo, é de 26 p g /m 3.

A propagação de ruídos é outro campo no qual se dispõe de conhecimento suficiente


aplicável em previsão quantitativa de impactos ambientais. Conhecendo-se os níveis
de pressão sonora emitidos pelo conjunto de fontes que compõe o empreendimento,

c a p ít i ilg f iiM H K iM M
P r e v i s ã o de I m p a 267

_ = dro 1 0 .5 M o d e la g e m da q u a lid a d e do a r em um p ro je to de ro d o v ia
:'e v is ã o dos im p a c to s sobre a q u a lid a d e do ar de um a rodo via pode ser e x e m p lific a d a com o EIA do tre c h o sul
: -o d o a n e l M e t r o p o lita n o de São Paulo. C om o em o u tra s previsões, há duas etapas, a e s tim a tiv a das emissões e a
zzelagem da dispersão. R e s um ida m e nte, o p ro c e d im e n to u tiliz a d o fo i:
E stim ativa do n ú m e ro de veículos que c o m p õ e m a fr o ta registrada nos m u n ic íp io s da Região M e tr o p o lita n a de
: : Daulo, de a co rd o c o m o ano de fa b ric a ç ã o e o c o m b u s tív e l u tiliz a d o , para os anos 2 0 0 5 , 2 0 10 e 2 0 2 0 . Foram
: 'zados dados disponíveis no D e p a rta m e n to Estadual de T rân sito e na A ssociação N a c io n a l de Fabricantes de
r culos A u to m o to re s .
Estimativa da q u ilo m e tra g e m média anual percorrida pelos veículos, segundo a idade da fro ta c irc u la n te (a d m ite -s e
. e veículos m ais novos c irc u le m mais), usando dados da agência de c o n tro le de p o lu iç ã o a m b ie n ta l Cetesb e da
_ :e d S ta te s E n v iro n m e n ta l P ro te c tio n A g e n c y (USEPA)1.
. E stim ativa dos fa to re s de d e te rio ra ç ã o , que são m u ltip lic a d o re s usados para c a lc u la r as emissões (veículos com
a o r q u ilo m e tra g e m a c u m u la d a e m ite m m ais poluentes), para os anos 2005, 2 0 10 e 2020. Por exem plo, o f a t o r de
ezerioração e n c o n tra d o para emissões de CO em v e ícu lo s com dez anos de uso é 2,33, e n q u a n to para ve ículos com
m ano de uso esse f a t o r é de 1,19. Os fa to re s fo ra m c a lc u la d o s com base em fó rm u la s da USEPA.
Escolha de fa to re s de emissão (FE) para veículos novos. Os FE in d ic a m as emissões poluentes de um veículo
_ :o m o to r em g/km . Para c a lc u la r as emissões esperadas de um veículo, m u ltip lic a -s e seu FE pela distância percorrida,
: rr:gindo-se o resultado pelo f a t o r de deterioração. Os FE p e rm ite m s im p lific a r os cálculos das emissões to ta is de cada
~ cuIo, que dependem , en tre outros, da velocidade desenvolvida, da in clinaçã o da pista, da carga do veículo e do m odo
e conduzir, dependendo ta m b é m do com bustíve l utiliza do. Com o a gasolina brasileira te m 2 2 % de álcool e parte da
" ::a é m ovida com esse com bustível, não se pode e m p re g a r FE disponíveis em fo n te s estrangeiras: a Cetesb2 estabe-
r:e FE válidos para o Brasil. Foram usados fa to re s d iferen te s de acordo com a idade da fro ta , pois a re g u la m e n ta ç ã o
szaoelece m etas de redução de emissões para veículos novos, segundo o ano de fa b ric a ç ã o 3. A lém das emissões de
sses de escap am ento e de evaporação de com bustíveis, fo ra m ta m b é m estim adas as emissões de m a te ria l p a rtic u ia d o
e, do aos pneus (ressuspensão de partículas da pista devido à passagem de veículos). Finalm ente, fo ra m incorporadas
- :ções devidas à velocidade m édia dos veículos, que, por se t r a t a r de uma via expressa, são m aiores que a velocidade
a adotada para a e s tim a tiv a dos FE, que é de 31,5 km/h.
- .A e s tim a tiv a do v o lu m e previsto de trá fe g o fo i fe ita por o u tr o m o d e lo m a te m á tic o , e a m o d e la g e m da q u a lid a d e
: s r a d o to u os m esm os valores usados para o p ro je to rodo viário.
E á lc u lo das ta x a s de e m is s ã o (em g /d ia , a q u a n t id a d e t o t a l de cada p o lu e n t e e m it id a em 2 4 h) para cada
e i - e n t o de r o d o v ia (o v o lu m e de t r á f e g o m u d a ), p o r m e io da m u l t i p l i c a ç ã o do v o lu m e de t r á f e g o d iá r io
t o c o m p r i m e n t o de cada s e g m e n to e p e lo f a t o r de e m is s ã o , c o r r ig id o pela v e lo c id a d e e pela d e te r io r a ç ã o ,
. : o p o n d e r a d o p e lo t i p o de v e í c u lo (leve a á lc o o l, leve a g a s o lin a , pe sa d o a d iesel), para os a n o s 2 0 0 5 , 2 0 1 0
2020.
Seleção de dados m eteorológicos para uso no m odelo de dispersão. Foram utilizados dados coletados no aeroporto
e Congonhas (situado, grosso modo, a p ro x im a d a m e n te 20 km do e m pree ndim ento) nos anos de 1999 e 2000, com
''c n r ia c ã o de hora em hora.
Cálculo das c o n c e n tra ç õ e s fu tu r a s com e m p re g o do m o d e lo In d u s tria l Source C o m p le x S h o rt Term 3 - ISCST 3
esenvolvido pela USEPA, a d e q u a d o para fo n te s lineares (e ta m b é m para o u tro s tip o s de fontes). 0 p ro g ra m a c o m b in a
s zados ho rá rio s (8.760 horas ao ano) de v e lo c id a d e do ve n to , classe de e s ta b ilid a d e a tm o s fé rica , te m p e ra tu ra do
■e a ltu ra da cam ada de m is tu ra que resu lte m na c o n c e n tra ç ã o m á x im a do p o lu e n te no nível do solo, ou seja, a
: r situ a ç ã o possível re s u lta n te dos dados disponíveis. A c o n c e n tra ç ã o re s u lta n te pode ser expressa em m édia de
de 8 h, de 2 4 h ou anual.
-o re s e n ta ç ã o dos resultados em tabe las que in d ic a m as m aiores c o n c e n tra ç õ e s esperadas para cada p o lu e n te
1 Cx, CO, HC, S 0 2, MP), os p o n to s em que o c o rre m e m apas de pequena escala com curvas de is o c o n c e n ira ç ã c
z-am ta m b é m ap re se ntada s previsões de c o n c e n tra ç ã o em sete p o n to s de interesse.
265 ^ ^ a i i a ç ã o de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

'0 . A lg u m a s conclusões são (i) redução das emissões to ta is de p o lu e n te s na região m e tro p o lita n a , d e c o rre n te do
a u m e n to da v e lo c id a d e m édia da fr o ta ; (ii) a créscim o de emissões ao longo do tra ça d o , em relação à situ a ç ã o
p r é - p r o je to ; (iii) a m o d e la g e m de dispersão indica c o n c e n tra ç õ e s m á x im a s para 2010, decrescendo em 2020, sem
ultra p a ssa g e m dos padrões de q u a lid a d e estabelecidos pela legislação; e (iv) as c o n c e n tra ç õ e s m á x im a s lo c a liz a m -s e
ao lo n g o do c a n te iro c e n tra l da rodovia, c a in d o cerca de 6 0 % a um a d is tâ n c ia de 1 km.
Fonte: Fundação Escola de S ociologia e P olítica de São P a u lo , EIA P rogram a R odoanel M a rio Covas. Trecho Sul M o d ifica d o . Estudo
de Im p a c to A m biental, vol. 8, A nexo 4 - R elatório de A valiação da Q ualidade do A r no R odoanel Trechos Oeste e Oeste m ais Sul,
200 4.
1USEPA, U nited States E nvironm ental P rote ction Agency, C o m p ila tio n o f A ir P o llu ta n t Emission Factors - AP 42 - A p p e n d ix H -
F iighw ay M o b ile Source Emission F a cto r Table, 1995.
2Cetesb, C om panhia de Tecnologia de S aneam ento A m biental, R elatório de Q ualidade do A r no Estado de São Paulo 200 3, São
Paulo, 2 00 4, 132 p.
30 P rogram a de C ontrole de Emissões de Veículos A u to m o to re s (Proconve) fo i estabelecido p o r resolução do Conam a de 1986.

relações matemáticas (desde equa­


ções simples até funções complexas)
Branckenham permitem que se estude a atenuação
. W hdenwelde dada pela distância, pela existência
Spoomet Veldenvlel de barreiras físicas ou por terrenos de
Birdswood
diferentes rugosidades (gramados,
superfícies asfaltadas etc.). O Quadro
10.6 mostra alguns fundamentos da
Lago
propagação de ruídos e o Quadro 10.7,
oretu
M zingazí um exemplo de previsão de impactos,

íPvleerense' usando tais equações feitas no EIA de
uma usina termelétrica a gás.

As Figs. 10.4 a 10.6 ilustram uma


previsão mais sofisticada de impactos
sonoros, feita para um empreendi­
mento mineroindustrial. Aqui, foi
feita um a simulação da futura situa­
ção na área do empreendimento e em
Oceano Indico
Lagoa M hlatuze
seu entorno, considerando a compo­
Lago Qhubu sição de todas as fontes previstas
pelo projeto. Esse exemplo também
mostra que a previsão quantitativa
Uso do solo Concentração da poluição
-3
de impactos não pode prescindir
Parques/ Área pública Industrial 0,2 pg.m
de um detalhamento do projeto de
Residencial Porto e ferrovias 0,4 pg.m
-3 engenharia, no mínimo, compatí­
vel com o chamado projeto básico,
-3
Agricultura 0,1 pg.m no caso, a relação dos equipamentos
Comercial
emissores de ruído e sua localização
Fig. 10.3 Previsão da qualidade do a r no ento rno de um a fá b rica de alu m ín io -
dentro da área do empreendimento.
m édias anuais de concentra ção de flu o re to
Fonte: The Pelican J o in t Venture, EIA fo r a 4 6 6 ,0 0 0 tpa A lu m in iu m S m elter Do contrário, o analista deverá
in Richards Bay, S outh A frica . S u m m a ry Report. U n ive rs ity o f Cape Town assumir um a série de pressupostos
E nviro n m e n ta l E valuation Unit/CSIR E nviro n m e n ta l Services, 1992. Reproduzido que poderão estar bem distantes da
com autorização. realidade do futuro empreendimento.
P r e v is ã o de I m p a m » » 269

ÜBadro 10.6 Conceitos fundamentais sobre propagação de ruído


- :e s s ã o sonora é definida como a diferença entre a pressão to ta l quando da passagem da onda
: : ~ : ra e a pressão atm osférica norm al ou de referência (P0). 0 ouvido hum ano é sensível a pres-
: : t s acústicas acima de 2 .1 0 '5 Pa (Pascal), já que 20 Pa corresponde ao lim ia r de dano. Como
:s sons audíveis atingem uma faixa de variação de 10G Pa, utiliza-se uma escala Ioga rítmica, o
: r : oel, para m edir o NPS — nível de pressão sonora — L:
P2
_ = 10. lo g , onde a pressão de referência é P0 = 2 .1 0 '5 Pa, por convenção internacional.
Po2
Essa expressão tam bém pode ser escrita com o: L = 20.log (P/P0), e representa o nível de pressão
s : - D ra em decibéis (dB).

E: " .eis de ruído variam contin uam ente. A variação pode ser representada com a ajuda de um
;:*a~eo da porcentagem do tem po em que o NPS se situa em determ inados intervalos. Tal proce-
: ~ e n to perm ite que se determ ine Lx, o NPS que é excedido durante x°/o do tempo. Valores de L10,
e L^o são interpretados com o A/PS de pico, mediano e de fundo, respectivamente. Assim, L90 é
• .ei de pressão sonora ating ido ou ultrapassado durante 9 0 % do tempo.

I -TDO conceito utilizado é o nível sonoro equivalente Leq., o NPS constante que tem a mesma
t * e 'g ia acústica durante um mesmo período de tem po T. 0 nível sonoro equivalente é calculado
z ra v é s de uma fó rm u la baseada no princípio de igual energia:
1 1 T.
Leq = 1 0 .lo g Z t j. 1 0 Li/10 ou Leq = 10.log— J 10L/1°.dt,
100 T o
: ' :e: t ; = intervalo de tem po para o qual o nível sonoro permanece dentro dos lim ites da classe i
- i'e s s o em porcentagem do período de tempo), Lj = nível de pressão sonora correspondente ao
s e r i o médio da classe.

1 é o nível de energia que teria um ruído contínuo estável de mesma duração. Os decibelímetros
~ : : e r n o s j á fazem a integração e podem fornecer valores de para diferentes períodos de tempo
: : ~ c um minuto, uma hora ou um dia, e permitem, assim, um m onitoram ento contínuo dos níveis
: t -,'do. As medições de pressão sonora recebem um fa to r de correção para melhor representar a
: t ': e p ç ã o do ouvido humano, que varia de acordo com a faixa de frequência do ruído. A escala de
: :- d e ra ç ã o "A" é a mais usada. Representa-se essas medidas com o símbolo dB(A).

- 'te n s id a d e sonora dim in u i c o m x ) quadrado da distância. Todavia, a propagação das ondas


: : * : ras é m u ito mais complexa do que a simples atenuação devido à distância. Condições to p o -
: s ~ c a s e atm osféricas (vento, tem peratura e umidade do ar) afetam bastante a propagação do
:: Além disso, o próprio ar absorve parte da energia, principalm ente em altas frequências. Além
atenuação pela distância, a natureza do terreno entre a fo n te e o receptor pode te r um efeito
: : t ' e o NPS medido no receptor; uma superfície dura e reflexiva com o concreto ou asfalto pode
::as onar um ligeiro a u m e n to no NPS, enquanto que uma superfície rugosa como a grama tem
:o absorvente, assim com o vegetação arbustiva e arbórea. Sem levar em conta esses fatores,
t :;- s id e ra n d o somente a atenuação pela distância, utiliza-se a seguinte fó rm u la para estim á-la
£ zartir de uma fo n te p o ntual:

-: = L-i - 20.log (d2/ d 1), onde: d, = 2 m (ruído na fonte) e L-, = nível de ruído na fonte.

.= o ruído resultante de diversas fo n te s sim ultâneas pode ser calculado com a seguinte fó rm u la :

L, = 10.log L 1 0 (Ü/10), onde: Lj = nível de ruído da fo n te i.

Modelos m atem áticos para previsão de níveis de ruído utiliza m expressões mais sofisticadas que
=s mostradas e aplicam diferentes fatores de correção para levar em conta as características
~s‘cas da área e a frequência do ruído, uma vez que a atenuação é m aior nas altas frequências.
z:nte: Sánchez (1995c).

DEZ
a lia ç ã o d e Im p a c to A m b ie n ta l: c o n c e ito s e m é to d o s

Q u a d r o 10 .7 N íveis de ru íd o p re v is to s p a ra a área de in flu ê n c ia de A Fig. 10.4 mostra os resultados do


u m a usin a te rm e lé tric a a gás n a tu ra l mapeamento de ruído feito para o diag­
P o n t o s de R u íd o de R u íd o a ser R u íd o de f u n d o nóstico ambiental da área de estudo,
AMOSTRAGEM FUNDO [dB(A)] GERADO PELA + r u íd o d a
notando-se que as zonas mais ruidosas
USINA USINA
se encontram na vizinhança da via exis­
E m p re e n d im e n to 55,7 91 91,0
tente, enquanto os bairros residenciais
E scritórios RPBC 70,0 67 71,8
79 79,3 localizados a sudeste e a nordeste gozam
V iz in h a n ç a 68,0
(av. das Indústrias) de bom ambiente sonoro. Partindo de
V iz in h a n ç a 65,9 65 68,5 resultados de medição obtidos em 31
(p o rta ria RPBC) pontos (procedimento também chamado
V iz in h a n ç a (bairro) 70,9 59 71,2 de monitoramento pré-operacional), de
V iz in h a n ç a (rod. 84,1 53 84,1 coordenadas conhecidas, distribuídos na
P iaçag uera-G uarujá ) área de estudo - distribuição não alea­
Fonte: JP Engenharia, Estudo de Im p a cto A m b ie n ta l C entral de C o-geração tória, mas feita em função das fontes
da Baixada Santista, 2 0 0 0 . atuais e futuras e das características
físicas do terreno e do uso do solo —, o
autor dispôs os pontos em um mapa-base e utilizou um software de interpolação de
dados para delimitar as isolinhas.

Por sua vez, as Figs. 10.5 e 10.6 simulam a futura situação com o empreendimento
se constituindo em novo foco de emissão. Conhecidos os ruídos de cada um a das

7497000

7496500

7496000

300m

Base cartográfica: CIDE (Centro de Inform ações e Dados do Rio de Janeiro), 1997, escala original 1:10.000, folhas 217-F, 218-E, 2328-B , 2 3 9 -A
Isolinha s de ruído ;7 § j C urvas de nível V egetação D renagem ç f Edificações 67dBA Nível de ruído diurno medido

F ig . 1 0 . 4 M a p a da pro vável d istrib u iç ã o do ruído d iurno a tu a l em um lo ca l considerado p ara a im p la n ta ç ã o de um a m ina


Fonte: Schrage (2005).

CAPÍTU
P re v is ã o de I m p a B B M 271

ebeficia

Cruz da Serca
to t . Vila Santa

677000 677500 678000 678500 679000 679500


0 200
100 300m
03 03 CG 03 03
T3 "O “O “O “C
O
CO CO 00 r\ O
CO LO CM CD
r - x

! I

: c -n o g rá fica : CiDE (Centro de Inform ações e Dados do Rio de Janeiro), 1997, escala o riginal 1:10.000, folhas 217-F, 218-E, 2328-B , 2 3 9 -A

sc nhas de ruído Curvas de nível Vegetação Drenagem Edificações 67dBA Nível de ruído diurno
Galeria Pilares e salões . 0 . , , fu tu r0 estimacl0
~= _;de , . , , ^ Barreira Vegetal
subterrânea (mina subterrânea) '

' E.5 M apa da provável distribuição dos níveis de ruído diurno após a im plantação de uma m ina subterrânea
te: Schrage (2005).
%
1 : ts e sua distribuição espacial, 0 autor (Schrage, 2005, pp. 57-60) calculou os
a : s futuros em cada um dos pontos receptores, observando os fatores que influen-
c . r - a propagação das ondas sonoras, como presença de barreiras, a partir de um
iziim ento recomendado na literatura técnica que considera diferentes fatores de
aszuação dependentes da frequência do ruído. A Fig. 10.5 mostra a previsão para
- - nernativa de mina subterrânea, estudada em um EIA, e a Fig. 10.6, para a alter-
■Kiva de mina a céu aberto, na qual a distribuição de ruídos é bem diferente. Neste
í— mo caso, a simulação considerou a presença de uma barreira física situada entre
i*ea industrial e 0 bairro situado a sudeste (zona de coloração verde ao norte da
m ia), um a medida mitigadora já incorporada à alternativa de projeto - trata-se de
a pilha de terra resultante de terraplenagem. Esse exemplo também ilustra 0 papel
l i ALA. no planejamento do projeto (seção 4.1). Se não houvesse preocupação com a
a vgação de impactos, a pilha não seria construída. Dentro dessas condições, a etapa
ie análise dos impactos considera o projeto já com as medidas mitigadoras previstas,
: _e corresponde ao projeto submetido para aprovação (medidas mitigadoras adicio-
podem resultar do EIA ou de outras partes do processo de AIA). No caso desse
': : eto, uma mina e usina de beneficiamento de nefelina-sienito em Duque de Caxias,
Eitado do Rio de Janeiro, a obra não foi adiante por razões de viabilidade técnica e
r : : nômica, e 0 EIA não foi apresentado.
aliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

7497000 i

7496500

7496000

677000 677500 678000 678500 679000 679500


0 200
< < < < < < < < < <
CO CÜ CÜ cü CO CÜ CÜ Cü CÜ CÜ CÜ cü Cü Cü CD
■ü CO CÜ CÜ CO
-a •a CÜ
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“oa 100 300m
“O -O "O “O “
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CO CO CD O
o CN O CO CD CN OD CD CN! o CO CD CN
r - . CD
r " v CD CD CD CD LO LO LO LO LO Nt-
I j I | 5 \_________________j ________________ !
1 1
1 1

Base cartográfica: CIDE (Centro de inform ações e Dados do Rio de Janeiro), 1997, escala original 1:10.000, folhas 217-F, 218-E, 2328-B , 2 3 9 -A

Fig, 10.6 M apa da provável distribuição dos níveis de ruído diurno após a im plantação de uma m ina a céu aberto
Fonte: Laboratório de Controle Am biental, Higiene e Segurança na M ineração (Lacasemin, 2004)..

Entre as vantagens da representação em mapa dos níveis futuros de pressão sonora


mediante curvas de isorruído estão a rápida localização de pontos de interesse e a
facilidade de comunicação com o usuário do EIA. A justaposição do diagnóstico
com a previsão, por sua vez, possibilita a imediata
visualização das principais mudanças. Assim como
outros modelos matemáticos, também aqui é possí­
vel simular alternativas de outras situações futuras
(por exemplo, com outros equipamentos com ou sem
barreira anti-ruído, ou com aumento de tráfego na
rodovia) ou da situação em diferentes horizontes
temporais, simulando mudanças que possam ocor­
rer durante a operação do empreendimento.

A previsão dos efeitos hidrológicos de uma


barragem está entre as principais questões susci­
tadas por esse tipo de empreendimento, haja vista
que a própria função de um a barragem é regular
Fig. 10.7 Visto pa rcia l da barragem e do reservatório de o regime hídrico. Assim, conhecer antecipada-
Nangbéto, Togo, que, como todas as barragens, afeta o regime mente as variações de vazão de um rio é um dos
hídrico do rio, ao regular a vazão para g a ra n tir produção de itens usuais para o EIA correspondente. No caso da
eletricidade, reduzindo a variação sazonal, com im pactos a barragem de Nangbéto (Fig. 10.7), situada sobre o
ju sa n te ri0 Mono, no Togo, cujo fechamento de comportas

CAPITU
P r e v i s ã o de I m p a m » » 273

:correu em julho de 1987, Rossi e Antoine (1990) identificaram e previram os seguin­


tes efeitos hidrológicos e sedimentológicos:
& redução do aporte de sedimentos a jusante;
^ mudanças do traçado do rio a jusante da barragem (perda de meandros);
& erosão das margens a jusante;
^ redução da salinidade do sistema lagunar da foz do rio, afetando cerca de 100
mil pessoas que vivem da pesca (transformação de lagunas reguladas pela maré
em lagos de água doce);
^ elevação de 0,40 m do nível médio do lago Togo.

‘ s estudos previram as mudanças do regime fortemente sazonal do rio Mono - carac-


t Azado por vazão muito baixa de dezembro a abril, e por um período de águas altas de
n i i o a novembro, com pico em setembro; a barragem regulariza o fluxo, multiplicando
: :r dez a vazão de estiagem e reduzindo cerca de 30% a vazão média de setembro, e
n a s implicações para a hidroquímica das águas do sistema lagunar.

‘ ualquer que seja o campo em que for aplicada a modelagem em avaliação de


n p acto ambiental, é de fundam ental im portância compreender que a participação
lê um especialista é muito importante. Existem hoje muitos modelos disponíveis,
Lie softwares gratuitos, mas a escolha do modelo mais adequado, a obtenção dos
- l l o s para alimentá-lo, e principalm ente a interpretação dos resultados, raram ente

: :dem prescindir de um especialista.

- m a na década de 1980, de Broissia (1986) mapeou o uso de modelos matemáticos


t n AIA no Canadá e verificou seu emprego em dispersão de poluentes do ar, hidro-
i iia e hidrodinâmica, qualidade da água superficial, águas subterrâneas, erosão e
sedimentação, vazamentos de petróleo e derivados e risco ambiental. Não deve sur-
: 'ten d er a constatação de que se trata sempre de questões atinentes ao meio físico.

1 uso de modelos para previsãp ainda hoje se restringe, basicamente, ao meio


As:co. Analisando 38 EIAs feitos em quatro países da Europa, Gontier, Balfors e
A n b erg (2006) observam que, embora ten h a havido muitos avanços no campo
: l modelagem ecológica, estes se deram fundam entalm ente no âmbito da pesquisa
: tmífica, e ainda não há métodos bem estabelecidos para quantificar e prever
m a c to s sobre a biodiversidade decorrentes da perda e fragm entação de hábitats.

- i:e s de optar pelo uso de um modelo matemático na preparação de um EIA de-


t-se também ter em mente que modelos sempre requerem mais informação — e
informação confiável e de qualidade —, o que se traduz em custo e necessidade
ir pessoal capacitado, mas não significa informação adequada para a tomada de
lecisões. A informação necessária geralmente se desdobra em informação sobre o
::A eto e sobre o ambiente afetado. 0 projeto nem sempre está definido com suficien-
: lexalhe na preparação do EIA. Quanto às informações sobre o ambiente afetado, a
riem obtidas durante a etapa de diagnóstico ambiental, nem sempre são suficientes
cara alimentar o modelo. Há casos em que é necessário conhecer a variabilidade
i n u ra l dos parâmetros de entrada, como nos modelos de dispersão atmosférica, que
Amecerão melhores resultados se os dados formarem uma série histórica e forem
: cais, duas condições frequentemente ausentes que podem ser contornadas (i) com

■ M B K ez
g a lia ç ã o de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

dados de períodos curtos de tempo (menos de um ano) e (ii) com dados de outro local,
assumidos como válidos para o ponto de interesse. Os riscos e os benefícios dessas
extrapolações devem ser estimados em cada caso.

C omparação e extrapolação
Outra m aneira de fazer previsões de impactos é por comparação com situações
semelhantes e extrapolação para o caso em análise, levando em conta semelhanças e
diferenças entre a situação existente e aquela que é objeto de previsão.

Diferentes enfoques podem ser utilizados para extrapolações, como (i) ensaios em es-
cala-piloto (efluentes industriais), (ii) ensaios in situ desenvolvidos em condições
similares (vibrações em um a pedreira) e (iii) analogia com casos similares, mantendo-
se a proporcionalidade entre ação e efeito (comparando empreendimentos similares,
porém de porte diferente). Em todos os casos, é importante estabelecer, ainda que de
modo qualitativo, os limites e a confiança em tais previsões.

0 caso das vibrações engendradas pelo desmonte de rocha com explosivos em mi­
nerações ou obras de construção civil ilustra o uso de extrapolações a partir de
ensaios de campo in situ. Por meio da detonarão de uma carga explosiva (Fig. 10.8),
ondas de choque propagam-se pelo maciço rochoso e promovem a fragmentação da
rocha, que é o efeito desejado. Porém, energia em excesso, sempre presente na deto­
nação, propaga-se pela rocha na forma de ondas elásticas, similares às ondas de som
propagando-se pelo'ar. Essas vibrações podem causar danos a residências e outras
construções, dependendo de sua intensidade. Os indicadores que melhor expressam o
fenômeno são (i) a velocidade de vibração, também chamada velocidade de partícula,
que expressa a velocidade de movimento vertical de uma partícula imaginária na
passagem de uma onda elástica e (ii) a frequência do movimento vibratório. Ambos
dependem, entre outros fatores, da distância do local da detonação e das condições
geológicas do maciço rochoso em que se propagam as vibrações (Sánchez, 1995d).
Não há um modelo universal que permita prever as vibrações se for conhecida a
carga de explosivos e a distância, devido
justam ente a fatores locais ditados pela
geologia. No entanto, há certas simila­
ridades entre a propagação de ondas em
maciços constituídos pelo mesmo tipo de
rocha, de modo que estudos realizados
em um local podem, em certa medida,
ser extrapolados para outros. Assim,
pode-se ir a um a mina em atividade e
realizar medições de vibrações, correla­
cionando esses dados com a quantidade
de explosivo detonada e a distância entre
a detonação e o local de medição, levan-
tando-se uma equação de propagação
que, a princípio, só é válida para aque­
le local, mas que pode, dentro de certos
Fig. 10.8 D etonação de explosivos p ara desm onte de rocha em um a m in a limites, ser extrapolada para outros sítios
Foto do autor, setem bro de 2001

CAPITU
P r e v i s ã o de I m p a 275

zaracterísticas comparáveis. Essa equação pode assim ser utilizada para prever as
ra s vibrações na m ina em projeto, cujos impactos são analisados.

zpolações a partir de situações análogas têm múltiplas aplicações para prever


cios nos meios físico, biótico e antrópico. Certas extrapolações podem ser muito
áveis. Por exemplo, na análise de um novo projeto industrial, estim ativas de
;ão de resíduos, de núm ero de empregos diretos e indiretos, de volume de compras
mercados local e regional, entre outras, podem ser feitas a p a rtir de empreen-
: m rntos similares, especialmente se houver um empreendimento sim ilar da mesma
* ~ :re sa , quando se pode razoavelm ente assum ir que seus procedimentos de gestão
l o similares ou idênticos. Diversos valores numéricos que constam do Quadro 10.2
i m obtidos pelo emprego desse procedimento para estim ar quantitativam ente
: tetos ambientais.

f ~ :edimento sem elhante pode ser usado para estim ar aspectos ambientais a p artir
i " m io s de projeto, como no Quadro 10.8, que mostra um exemplo de projeções de
; tectos ambientais para um projeto de implantação de um loteamento residencial
ãe mto padrão.

I “ paração com casos sem elhantes e extrapolação é tam bém um método que muitas
i m e s é usado pelo público ou por ONGs para criticar projetos ou para apresentar ar-
. . nentos contrários. Com base em experiência pessoal ou observação e análise de
:s semelhantes, impactos podem ser identificados e previstos, com conclusões que
: : bem diferir das projeções governam entais ou dos proponentes.

. ~ exemplo sofisticado de extrapolação a p artir de situações análogas é dado pela


ffbscossão sobre os efeitos da abertura, melhoria e pavim entação de rodovias na
-Lr-zònia, cujos principais impactos são indiretos e estão relacionados ao acesso
::rc io n a d o a novas áreas de expansão da fronteira agrícola. No final dos anos
I-1?:. um program a do governo federal brasileiro denominado “Avança Brasil” pre-
'r z i i a implantar vários projetos de in fraestru tu ra, que incluíam diversas rodovias.

= : "o 1 0 .8 E xe m p lo s de p ro je ç ã o de m a g n itu d e de a s p e c to s a m b ie n ta is p o r e x tra p o la ç ã o


o M u l t ip l ic a d o r D ados de projeto Es t im a t iv a s de d e m a n d a Es t im a t iv a
- 3 S ÍT A L

C in s u m o 3 0 0 £ / hab.dia para m o ra d o re s 5 0 5 lo te s para residê ncias 2 5 2 5 re sid e n te s 7 9 2 m 3/d ia


:t í : _ s 1 5 0 £ /h a b .d ia para e m p re g a d o s u n ifa m ilia r e s (5 h a b ita n te s /lo te ) 9 ,1 7€/s
re sid e n te s 6 5 lo te s para c o m é rc io 8 6 5 e m p re g a d o s
7 5 € /h a b .d ia para e m p re g a d o s e se rviços locais d o m é s tic o s
não re sid e n te s P opu lação f lu t u a n t e -
5 0 0 pessoas
I f c c .,cão
3
8 0 % do c o n s u m o de ág u a Idem a c im a 6 3 4 m 3/d ia
iu e n te s 7,34 6/s
i ' ~ rs::co s
. r a ç ã o de 1,5 k g /h a b .d ia Idem a c im a 5 .8 3 5 k g/dia
ts :^o s
i COS

” t~ :o A lp h a ville Santana, 2003.


a lia ç ã o d e Im p a c to A m b ie n ta l: c o n c e ito s e m é to d o s

Pesquisadores de um conjunto de instituições previram o aumento das taxas de


desmatamento atribuíveis aos novos projetos por meio de extrapolação a partir do
observado em rodovias existentes. Laurance et al. (2001a) usaram o seguinte proce­
dimento:
# sobreposição da rede de rodovias amazônicas existentes em 1995 a imagens do
satélite Landsat de 1992; as principais rodovias, como Belém-Brasília e Cuiabá-
-Porto Velho, haviam sido construídas entre 15 e 25 anos antes;
delimitação de cinco “zonas de degradação , a distâncias de 0 a 10, 11 a 25, 26
a 50, 51 a 75 e 76 a 100 km de cada lado das rodovias;
# estimativa da perda de floresta primária em cada um a dessas zonas, usando a
imagem (outras formas de vegetação não foram consideradas);
m a d e g ra d a ç ã o das florestas foi dividida em quatro classes: alta, moderada, baixa
e sem a lte ra ç ã o ;
# montagem de dois cenários futuros, “otimista” e “não otimista”; neste, uma hi­
pótese é que rodovias pavimentadas criam uma faixa de 50 km de largura de
floresta altamente degradada de cada lado, contra uma faixa de 25 km no ce­
nário otimista, enquanto rodovias não pavimentadas criam uma faixa de 25 km
de largura no cenário “não otimista” e de 10 km no “otimista”; procedimento
semelhante foi usado para outras obras de infraestrutura incluída no programa
(dutos, linhas de transmissão, hidrovias e hidrelétricas); os cenários foram mon­
tados com base na análise do impacto das rodovias j á existentes, que constatou
que a rede de estradas vicinais, não planejada, chegava a mais de 200 km de
distância de rodovias pavimentadas;
* organização dos dados em um sistema de informações geográficas contendo oito
camadas (.layers): (i) cobertura florestal atual e rede hidrográfica (imagem); (ii)
rodovias atuais; (iii) rodovias planejadas; (iv) outra infraestrutura existente; (v)
infraestrutura planejada; (vi) vulnerabilidade florestal ao fogo (três classes de
vulnerabilidade); (vii) atividade de extração florestal e mineral; (viii) unidades
de conservação;
$ previsão de desmatamento futuro para cada cenário, considerando a influência
dos novos projetos;
$ previsão da situação futura para cada cenário sem a presença dos novos
projetos.

Assim, o método consistiu, essencialmente em (1) modelar o desmatamento passa­


do associado às rodovias; (2) montar dois cenários de situação futura; (3) montar um
banco de dados georreferenciado; e (4) extrapolar as tendências do passado. 0 método
foi criticado pelo coordenador do programa (Silveira, 2001), com base nas exigências
atuais de licenciamento ambiental, inexistentes quando da abertura das primeiras ro­
dovias, e que invalidariam a extrapolação, entre outros argumentos. A réplica dos
autores (Laurance et al, 2001b) observa que as taxas anuais de desmatamento continu­
am “alarmantes”, a fiscalização é ineficaz e “a situação não mudou fundamentalmente”.

A crescente conscientização acerca dos impactos ambientais e socioeconômicos dos


grandes hipermercados suburbanos nos Estados Unidos fornece um exemplo de uso
da previsão de impactos por parte de ONGs e pesquisadores no contexto de debates
públicos sobre o desenvolvimento local. Esse tipo de estabelecimento comercial é
contestado por promover a dispersão urbana, estimular o uso do automóvel, destruir
o pequeno comércio local e pagar baixos salários, entre outras críticas.

CAPITU
P r e v i s ã o de I m p a 277

estudo retrospectivo constatou um a baixa do nível de emprego entre 2 e 4°/o e


- - = redução de 3,5% na renda média dos assalariados em cada condado3 dos Estados 3Condado
-iidos, onde a rede Wal-Mart abriu um a loja. Isso se deve ao fato da empresa pagar corresponde a
si-irio s mais baixos que a média do setor varejista, o que leva a uma redução da ren- uma unidade
administrativa
ii média das comunidades onde se implanta, uma vez que toda abertura de um novo
equivalente a
: n r m e r c a d o leva ao fechamento de outros estabelecimentos comerciais (Neumark, município.
I r i n g e Cicarella, 2005). Outros dados, tam bém dos Estados Unidos, indicam que o
::t:io multiplicador de um grande estabelecimento comercial sobre a economia local
- b i verdade um efeito redutor: enquanto, na média americana, o comércio local faz
de suas compras no âmbito estadual, essa rede despende apenas 14%. Por moti-
■»ii como esses, a opinião pública às vezes mostra-se contrária à abertura de novas
Sr. eí da rede, como ocorreu em Inglewood, um subúrbio de Los Angeles, Califórnia,
: : le um plebiscito reprovou a abertura de um a nova loja, e na própria Los Angeles,
« c i e uma lei municipal de 2004 condiciona a instalação de hipermercados a uma
i r i-ise de impacto econômico (Wood, 2004). Outros plebiscitos já haviam impedido a
ciialação de lojas da rede durante os anos 1990 (Esteves, 2006).

- c i a s oriundos de estudos retrospectivos também são usados para prever os impactos


: t i o y o s projetos. Usando dados de produtividade do trabalho (volume de vendas
: : : empregado), que no caso do Wal-Mart é 51% superior ao índice dos pequenos
-:cios, economistas da Universidade de Chicago (Mehta et al., 2004) analisaram o
ável impacto sobre o comércio local da abertura de um novo hipermercado nessa
c i i le e previram que, para 250 empregos que seriam criados com a nova loja, seriam
: t i lidos 318 empregos diretos existentes e 11 indiretos.

I a mesma forma que o uso de modelagem para previsão de impactos requer cuidados,
U n b é m a extrapolação a partir de casos análogos, seja ela usada pelo proponente do
:~:;eto e seus consultores ou por eventuais opositores e seus consultores, demanda
vinção e uma consideração cuidadosa das semelhanças e distinções entre o problema
t u análise e os análogos que sefvirão de fonte para extrapolação.

I i ^ E R IM E N T O S DE LA B O R A T Ó R IO E DE C A M P O
: : :e-se desenvolver estudos experimentais com vistas à previsão de alguns
im iicio s. Por exemplo, ensaios de laboratório permitirão conhecer as características
: ermeabilidade de um maciço rochoso ou de solo, para o estudo da dispersão de
-rnte no solo e na água subterrânea. Tal abordagem pode ser útil para prever os
■ m e r o s decorrentes da implantação de um aterro sanitário, no qual a possibilidade
itt : Diitaminação da água subterrânea a partir de líquidos percolados é um dos prin-
c m n s impactos. Por intermédio de procedimentos padronizados, coletam-se amostras
at solo e rocha do local em que se pretende implantar o empreendimento; ensaios de
feicratório, também padronizados, determinam a permeabilidade desses materiais,
i - seja, sua capacidade de transm itir — ou reter — água ou um soluto, dada pela
« v : i i a d e de dispersão no meio. Pode-se assim calcular o tempo que a pluma conta-
■r:rante resultante de um eventual vazamento tardará para atingir o lençol freático.

5 :: e-se que qualquer extrapolação de dados obtidos em laboratório para um a situação


í **e requer cautela e a análise criteriosa de um especialista, como, aliás, qualquer
_ — a lia ç ã o de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

que seja o método de previsão de impactos. O procedimento do parágrafo anterior


pode ser usado para calibrar um modelo matemático: ao alimentá-lo com dados lo­
cais e não obtidos na literatura (muitas vezes incorporados ao modelo como default).
esperam-se resultados mais exatos.

S imulações e modelos análogos (físicos , digitais)


Certos impactos ambientais podem ser simulados em computador, como o impacto
visual de um a rodovia, um a linha de transmissão de energia elétrica, um a indústria
ou um a mina. Para isso é feito um modelo digital do terreno (uma representação em
três dimensões) e simula-se a vista que um observador hipotético teria se o empre­
endimento fosse implantado, podendo-se também determ inar o campo de influência
visual de um a futura obra.

Além de identificar as “bacias visuais”, técnicas de computação gráfica e de realidade


virtual permitem analisar alternativas de traçado de estruturas lineares (como linhas
de transmissão) e simular barreiras visuais (Schofield e Cox, 2005). Mas a simulação
dos impactos visuais pode também ser feita com o auxílio de simples cartas topográ­
ficas, sobre as quais pode-se indicar os pontos ou as áreas em que o empreendimento
será visível.

Os mapas temáticos frequentemente preparados durante os estudos de base têm uma


série de aplicações em análise de impactos ambientais, servindo, por exemplo, como
ferramentas para quantificar impactos sobre o uso do solo ou sobre fragmentos de
vegetação: tendo-se mapeado os tipos de vegetação existentes na área de influência
de um empreendimento, pode-se calcular as áreas afetadas (como áreas a serem des­
maiadas) para diferentes alternativas de projeto, conforme exemplificado no Quadro
10.9. Neste exemplo hipotético, a alternativa B é aquela que tem menor influência
sobre as formações vegetais de maior valor ecológico, que são a floresta primária e
a capoeira em estágio avançado de regeneração. Morris e Emberton (2001, p. 274j
sugerem que se o diagnóstico ambiental abrangeu o levantamento de populações de
determinadas espécies de fauna ou de flora, então é também possível estimar perdas
diretas de indivíduos dessas espécies em razão das áreas afetadas.

Modelos em escala reduzida podem tam bém ser empregados para sim ular certos
impactos. Por exemplo, pode-se construir modelos físicos de um a zona litorânea
para estudar os processos erosivos decorrentes de intervenções como dragagem ou
construção de um quebra-mar, ou ain-
Q u a d r o 1 0 .9 Área de vegetação afetada por um projeto hipotético da a construção de um a barragem em
T ipo de formação Á rea afetada ( hectares ) um no, que retera os sedimentos que
A lternativa A A lternativa B A lternativa C alim entam um estuário. Na atualidade.
Floresta primária 25,2 15,4 44,0 tais modelos são usados em conjugação
Capoeira em estágio 18,4 14,2 25,4 com modelos digitais.
avançado /

Capoeira em estágio 42,9 55,2 - E ainda possível realizar certos expe­


médio rimentos em verdadeira grandeza para
Pasto 260,0 325,0 223,0 análise de impactos. Assim, um grande
Cultura temporária 95,0 31,7 149,1 amplificador e um a caixa acústica podem

CAPITU
P r e v i s ã o de I m p a

emitir ruídos simulando as condições operacionais de uma indústria e, utilizando-se


um aparelho de medida (decibelímetro), pode-se verificar os níveis de pressão sonora
reais resultantes em diferentes pontos das imediações. Diferentemente da modelagem
preditiva, tem-se, aqui, um método de simulação analógico.

De maneira similar, o impacto visual de uma estrutura pode ser simulado inflando-se
um grande balão e erguendo-o até a altura de um edifício ou de um a chaminé de um a
m tura fábrica, de modo a possibilitar a identificação dos locais de onde tal objeto
seria visível.

J U L G A M E N T O DE ESPECIALISTAS
Esie método pouco formalizado de realizar previsões de impacto baseia-se na capaci-
rade de certos especialistas emitirem estimativas sobre a probabilidade de ocorrência,
a extensão espacial e temporal, e mesmo a m agnitude de certos impactos ambientais.
As opiniões são expressas com base na experiência e conhecimento dos cientistas e
codem, eventualmente, ser formalizadas com a ajuda de um sistema-especialista, um
programa de computador que sistematiza o conhecimento em um determinado ramo
io saber e permite, supostamente, a reprodutibilidade dos resultados.

Modelos conceituais, ou seja, aqueles que não empregam parâm etros mensuráveis,
n a s explicam determ inada situação a partir de sua descrição e contextualização,
rodem ser utilizados por especialistas de algum as disciplinas para auxiliar na
rrevisão de impactos. Por exemplo, em arqueologia, modelos preditivos desse tipo
sido usados para identificar o potencial de existência de recursos arqueológicos
em uma dada área, com base no conhecimento prévio de dados arqueológicos e não
arqueológicos (Kipnis, 1996).

Butra técnica utilizada em alguns estudos de impacto é a de reunir um grupo de experts


rara opinar sobre o problema. Evidentemente, a escolha dos especialistas é o fator crítico
rara o uso dessa abordagem e requer não somente um profundo conhecimento dos pro­
cessos biofísicos ou sociais envolvidos, mas também um bom conhecimento do tipo de
ambiente afetado, além de um adequado entendimento dos objetivos e das limitações de
um estudo de impacto ambiental. Infelizmente, este último requisito não é comumente
encontrado.

Mesta, assim como nas demais situações de previsão de impactos, o papel do


coordenador dos estudos é fundamental, no sentido de formular perguntas precisas
e comunicar claramente ao especialista os objetivos do estudo em curso. Qualquer
rne seja o método utilizado para obter as opiniões dos especialistas, as razões que
m ndam entam a opinião de cada um e as hipóteses assumidas devem ser clara e
reialhadamente descritas.

E comum encontrar nos EIAs diferentes tipos de previsões, que podem ser agrupadas
em quatro classes: (i) previsões formais; (ii) previsões baseadas na experiência de
rcofissionais; (iii) extrapolações a partir de casos conhecidos; e ... (iv) puras suposições,
emas infelizmente demasiado comuns. As previsões formais, usualmente derivadas de
madelos matemáticos, não são necessariamente melhores que as previsões feitas por

EZ
r
a lia ç ã o de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

outros métodos. Esses modelos devem ser validados e calibrados para as condições
locais e costumam requerer grandes quantidades de informações para produzir re­
sultados confiáveis. Se a calibração não for feita adequadamente e se os dados de
entrada não forem suficientes, os resultados serão pobres. Como se diz no jargão da
modelagem, garbage in, garbage out, ou seja, se entra lixo, sai lixo. As extrapolações,
evidentemente, devem ser cuidadosas, às vezes quase todas as condições parecem
semelhantes, mas um a pequena diferença pode significar a inaplicabilidade dos resul­
tados de um lugar em outro. As suposições e especulações são, naturalmente, coisas a
evitar, mas às vezes elas aparecem “disfarçadas” em opiniões de experts; nesses casos,
raramente as afirmações são justificadas, simplesmente “surgem” no meio do EIA sem
conexão com o restante do texto.

Todas as previsões têm certa margem de incerteza associada. 0 ideal seria que as
previsões quantitativas dos EIAs viessem acompanhadas de uma estimativa da
margem de erro, o que é possível algumas vezes em que se empregue modelagem. Um
problema é que muitos usuários dos EIAs não estão preparados para compreender a
noção de incerteza e não estão familiarizados com conceitos probabilísticos.

10 .4 Incertezas e erros de previsão *


Em uma situação ideal, “as previsões de impacto deveriam ser verificáveis, isto é.
deveriam ser livres de ambigüidades e colocadas como hipóteses que pudessem ser
testadas com um plano apropriado de estudo. Assim, uma análise preditiva deveria
esforçar-se em incluir detalhes quantificados da m agnitude dos impactos, duração
e distribuição espacial” (Beanlands e Duinker, 1983). Durante muitos anos, a litera­
tu ra sobre AIA deu grande importância à previsão, que chegou a ser vista como a
principal função de um EIA. Porém, estudos retrospectivos realizados em diversos
países, muitas vezes chamados de auditoria de EIAs ou auditoria de AIA (expressão
hoje em desuso), buscaram comparar as previsões feitas nos EIAs com os impactos
reais, observados por meio de programas de monitoramento. De um modo geral, esses
estudos chegaram a conclusões parecidas:
muitas previsões não são passíveis de verificação por serem formuladas em
termos vagos;
# muitas previsões não são passíveis de verificação devido a monitoramento
insuficiente;
# os projetos efetivamente implantados não correspondem exatamente àqueles
descritos no EIA, de modo que muitos de seus impactos tampouco poderiam ser
idênticos àqueles previstos.

Os dois primeiros pontos acima indicam impossibilidade de lograr o objetivo de


comparar o observado com o previsto, seja porque não se sabe exatamente o que foi
previsto (o primeiro caso), seja porque não há observações adequadas para permitir
a comparação desejada (o segundo caso). As duas situações refletem deficiências na
condução do processo de AIA: no primeiro caso, deficiências do EIA (e de sua análise
técnica) e no segundo, deficiências na etapa pós-aprovação.

Já o terceiro ponto reflete um problema muito comum de ordem prática, que são
as mudanças de projeto. Ainda que as legislações em geral requeiram que m udan­
ças importantes de projeto sejam comunicadas ao órgão regulador, tais mudanças

CAPÍTU L0
P r e v is ã o de I m p a

~aramente ensejariam um novo EIA. Quando os EIAs são preparados, quase sempre o
irojeto técnico ainda não foi definido em detalhe (felizmente, pois em caso contrário
iincilm ente o processo de AIA poderia contribuir para o planejamento do projeto);
zauitas vezes, os detalhes somente são definidos quando começa a implantação, e eles
podem influenciar os impactos reais.

Era sua revisão sobre o estado da arte da AIA no Canadá, Beanlands e Duinker (1983,
: 56) constataram que menos de metade dos EIAs traziam “previsões reconhecí-
cis". Dentre os estudos retrospectivos, pode-se citar o de Bisset (1984b), feito para
: istro projetos na Grã-Bretanha, cujos EIAs traziam, em conjunto, nada menos que
"51 previsões. Destas, apenas 77 puderam ser verificadas (“auditadas”), das quais o
isiudo constatou que 55 estavam “provavelmente corretas”.

- — dos estudos mais detalhados é o de Buckley (1991a, 1991b), feito na Austrália.


-*:ram analisadas 181 previsões selecionadas que o autor considerou verificáveis após
m alisar centenas de EIAs. A maioria das previsões era ligada à emissão de poluentes
: _ à sua concentração ambiente. Os dados de monitoramento indicaram que os im-
iir to s reais foram menos severos para 131 previsões (72%), e mais severos para 50
:~evisões (28%). 0 autor também concluiu que os estudos continham poucas previsões
estáveis, e que eles muitas vezes se limitavam a identificar questões.

la lh a n e (1985) estudou um a amostra de 29 EIAs feitos nos Estados Unidos, contendo


. 135 previsões. Destas, cerca de 24% eram quantitativas, 11% previsões de que não
n v e r i a impacto (o que não deixa de ser um a previsão quantitativa) e 65% previsões
: i : quantificadas; mas as previsões eram muitas vezes “confusamente vagas” (p.
- -ij.
i

I_lhane, Friesema e Beecher [1987) analisaram as previsões de uma amostra de 146


EIAs preparados nos EUA, escolhidos por sorteio de um universo de 10.475 EIAs e che-
i iram a conclusões relativamente positivas. Dentre as principais, destacam-se aqui:
^ a maioria das previsões indica a direção correta do impacto (isto é, se o EIA
previu deterioração da qualidade da água, o monitoramento constatou deterio­
ração, independente da magnitude estar ou não correta);
^ somente três impactos não foram “explicitamente antecipados” (p. 229), enquan­
to cinco outros foram tão subestimados que não podem ser considerados como
“apropriadamente antecipados”;
& poucas previsões foram “claramente erradas” ou “demonstravelmente inconsis­
tentes”, se bem que em diversos casos isso se deva a previsões demasiadamente
vagas (p. 253).

I : ses estudos trataram , principalmente, de previsões quantitativas. 0 monitoramento


i: i. ocasionalmente, a simples observação, pode constatar impactos não previstos
i : EIA, que vão requerer medidas mitigadoras que tam bém não puderam ser
i:~esentadas nem inseridas nas exigências da licença ambiental. A rigor, seria
~ a is correto, nesses casos, falar de impactos não identificados em vez de impactos
a i d previstos, mas este último termo é mais usado. Naturalmente, um impacto não
m itificado (não descrito) não pode ser previsto (ter inform ada sua magnitude)
:'-:a avaliado (ter discutida sua significância). Culhane, Friesema e Beecher (1987,

EZ


aiiação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

p. 229) defendem o ponto de vista de que é mais grave a falta de identificação de um


impacto do que a incorreta previsão de sua m agnitude, um a vez que um impacto
não identificado pode nem mesmo ser notado “simplesmente porque ninguém está
olhando para ele”.

No Brasil, Prado Filho e Souza (2004) analisaram uma amostra de oito EIAs prepara­
dos para projetos de mineração em um a região do Estado de Minas Gerais, nos quais
foi identificado um total de 256 impactos. Os autores constataram que a “previsão”
de impactos “se fez quase que exclusivamente de maneira qualitativa, exceto para
alguns impactos como a ocupação de áreas por barragens de rejeitos, as áreas a serem
desmaiadas nos domínios dos empreendimentos (...)” (p. 86), e alguns outros direta­
mente relacionados às características dos projetos.

Muitos EIAs podem não identificar impactos triviais, deliberada ou inadvertidam en­
te. Isso não é importante quando se trata de impactos triviais ou insignificantes, mas
é grave quando são impactos significativos. A não identificação de impactos signi­
ficativos pode ocorrer por dois motivos principais: (i) deficiências de organização
ou de coordenação do EIA e (ii) insuficiência de conhecimento acerca dos processos
ambientais ou acerca das interações entre o projeto e o meio.

Um exemplo do primeiro tipo é a geração de drenagem ácida de rocha observada du­


rante a construção da usina hidrelétrica de Irapé, no vale do rio Jequitinhonha, Minas
Gerais (2002-2006). Drenagem ácida é um problema ambiental que ocorre quando se
escava, se brita ou se mói rochas que contenham sulfetos - dos quais o mais comum
é o sulfeto de ferro FeS2 ou pirita. Expostos ao contato com água e ar, os sulfetos se
oxidam, e as águas meteóricas que entram em contato com a rocha se tornam ácidas,
podendo apresentar pH da ordem de 2 a 2,5 (Fig. 10.9). Esse fenômeno é comum em
minas, ocorrendo também em obras de construção civil, e pode ser previsto. A pre­
visão é feita a partir de coleta de dados de campo (amostras de rocha) e ensaios de
laboratório (colunas monitoradas que si­
mulam a ação da água sobre fragmentos
de rocha) realizados durante meses,
tempo compatível com um EIA bem
planejado. 0 EIA do projeto, realizado
em 1993, não identificou tal impacto, que
tampouco foi apontado durante a fase de
análise técnica. 0 problema somente foi
detectado durante as obras, ensejando
o estudo do processo gerador de ácido
e a busca de medidas corretivas depois
de iniciada a construção, o que sempre
acarreta custos maiores que os incorri­
dos se um programa de prevenção fosse
implementado (Gaspar et al., 2005).

Fig. 10.9 Pilha de rocha geradora de ácido, devido à presença de sulfetos. Outro exemplo de impacto não
M ina de urânio de Caldas, M inas Gerais, um dos m uitos locais onde o identificado e não previsto por deficiência
im pacto não fo i previsto quando da preparação do projeto (agosto de 1993) do EIA ocorreu durante a construção da

CAPÍTU 10
P r e v i s ã o de I m p a 283

pista descendente da rodovia dos Imigrantes (1999-2002). Trata-se da deterioração


i a qualidade das águas superficiais devido à drenagem dos túneis em construção.
0 único impacto previsto havia sido a alteração da qualidade das águas devido à
presença de partículas sólidas n a mesma; consequentemente, a medida mitigadora
foi a instalação de bacias de decantação para retenção de sedimentos, limpas perio­
dicamente. No entanto, o grande volume de água que percola pelo maciço rochoso,
ao entrar em contato com o concreto usado para revestir os túneis, dissolveu os car-
bonatos do cimento, transform ando a drenagem em alcalina, para a qual a simples
decantação não faz efeito. Ao ser lançada nos córregos, com outras características
químicas, a drenagem dos túneis ocasionou a precipitação de um a crosta carbonáti-
ca sobre os blocos rochosos do leito. Em diversos túneis rodoviários, esse problema
não havia sido constatado, mas aqui ensejou um a ação judicial e o embargo da obra
durante um dia, até que o empreendedor e o consórcio construtor se comprometeram
em usar um a solução mitigadora, que foi a construção expedita de estações de tra ­
tamento de efluentes, para onde eram conduzidas todas as águas de drenagem dos
túneis; os Iodos resultantes foram transportados para os bota-foras da obra (Sánchez
e Gallardo, 2005).

Um exemplo de falta de previsão de impacto devido à insuficiência de conhecimento é


ilustrado por alguns reservatórios hidrelétricos construídos no norte do Canadá e na
Escandinávia, onde se verificou um incremento nos níveis de mercúrio presentes em
peixes da ordem de cinco a seis vezes em relação aos níveis pré-enchimento (Tremblay,
_ucotte e Hillaire-Marcel, 1993, p. 45). Mercúrio contido nas rochas subjacentes à
tacia hidrográfica ou transportado por via aérea a partir de fontes industriais ou
naturais fica armazenado na forma metálica (Hg0) em solos e sedimentos (Fig. 10.10),
porém é transformado em complexos organometálicos pela ação de bactérias (Verdon
et al., 1992, p. 68), sendo o metilmercúrio (CH3Hg+) o mais comum deles. Nesta forma
irgânica, o mercúrio fica bastante disponível para os seres vivos, acumulando-se
na cadeia alim entar - os peixes carnívoros tendem a concentrar maiores quanti­
dades do metal. 0 consumo hum ano de
peixes contaminados significa, portanto,
mscos à saúde. Descobriu-se que a taxa
te metilação do mercúrio aumenta com
s presença de matéria orgânica facil­
mente biodegradável, o que ocorre nos
reservatórios setentrionais que inundam
meas com abundância de diversos tipos
ee matéria orgânica (Tremblay, Lucotte
e Hillaire-Marcel, 1993, pp. 10-14). As­
sem. sem aum entar o aporte de mercúrio,
a inundação desses terrenos acelera o
ttocesso de metilação do metal (processo
:ne também ocorre em ambientes na-
mrais, como lagos e rios), ao submeter
mandes quantidades de matéria orgâni-
m á ação intensa de bactérias, tornando Fig. 10.10 Vista da região da baía James (setembro de 1992) nas p ro x — -
: metal disponível para os peixes, que dades da barragem La Grande 2, com grande quantidade de lagos naturais,
íc transform am em fator de risco para a turfeiras e grande acúm ulo de m atéria orgânica biodegradável
aiiação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

saúde humana. São afetados o próprio reservatório e o rio


a jusante.

Por meio de programas de monitoramento ambiental,


descobriu-se que nos reservatórios do norte do Quebec o pro­
cesso regredia conforme os estoques de mercúrio diminuíam
(Verdon et al., 1991). A Fig. 10.11 mostra dados agregados do
monitoramento de mercúrio em duas espécies de peixe, uma
delas com concentrações sistematicamente acima da norma
canadense para consumo humano, de 0,5 mg/kg. Os dados
mostram um rápido acréscimo do conteúdo em mercúrio após
700 mm -À— 55 0 m m 35 0 m m
o fechamento das comportas, em 1978, e que os peixes de me­
Fig. 10.11 Evolução tem poral dos teores de m ercú­ nor tamanho (mais jovens) mostram redução progressiva de
rio nos tecidos de lúcio (Esox lucius) (grand brochet, mercúrio, indicando desaceleração do processo de metilação.
northern pike) após enchim ento do reservatório La Verdon et al. (1991) estudaram vários reservatórios situados
Grande 2, Quebec, Canadá, de acordo com três classes no escudo canadense e avaliaram que pode demorar entre
de tam anho dos peixes vinte e trinta anos para a concentração de mercúrio em peixes
Fonte: Comitê de Ia Baie James sur le Mercure, 1992. retornar aos níveis precedentes ao enchimento dos reservató­
Reproduzido com autorização rios. Entretanto, úma ampla revisão bibliográfica preparada
durante os estudos ambientais de outro grande projeto hi­
drelétrico na região sustenta que os dados da literatura são
inconclusivos acerca da duração do fenômeno, podendo variar entre cinco e 150 anos
(Tremblay, Lucotte e Hillaire-Marcel, 1993, p. 49).

Tanto a modelagem como a extrapolação podem resultar em erros de previsão por


motivos intrínsecos (isto é, não relacionados às diferenças entre o projeto analisado
no EIA e aquele efetivamente implantado). Extrapolação de evidências empíricas foi
usada para prever impactos sobre a qualidade das águas de uma mina de fluorita,
denominada Montroc, na França. Era um projeto de ampliação de uma mina existente,
que funcionava nas proximidades de outra de menor porte. Como o monitoramento
nunca detectara níveis de flúor acima do permitido no corpo receptor, o EIA da
ampliação da mina assumiu que o mesmo sucederia. 0 EIA afirma textualm ente que
“desde a abertura da mina o descarte de águas superficiais na represa de Rassisse não
causou nenhum problema particular; a ampliação da cava não modificará em nada
0 estado atual”, para reafirmar, mais adiante, que “as águas de drenagem manterão
a mesma qualidade que aquelas atualmente bombeadas”; ademais, o estudo confir­
ma que um a medida mitigadora proposta (uma canaleta perimetral para interceptar
as águas de escoamento superficial) “implica que não haverá nenhum a alteração da
qualidade das águas que chegam ao reservatório” situado a jusante, usado para abas­
4jBRGM, Sogerem, tecimento público4.
Etude d lm p a c t sur
1'Environnement de Declaradamente, a extrapolação fundam entou essas previsões que podem ser
VExtension de la
entendidas como previsões quantitativas (mudança nula). No entanto, depois de
Mine à Ciei Ouvert
de Montroc (Tarn), ampliada a nova mina, o programa de monitoramento detectou elevados níveis de
1981. metais na água do rio e do reservatório (Sánchez, 1993b, p. 262). Em seis anos.
as concentrações de flúor das águas de descarte subiram de valores abaixo de
1 m g/t para valores da ordem de 30 mg/f, enquanto as águas da represa apresentavam
concentrações de flúor superiores ao padrão de 1,7 mg/t. Ademais, ferro, cobre e

CAPITU
P r e v is ã o de I m p a

manganês dos efluentes tinham concentrações de uma a duas ordens de grandeza


acima da permitida (Sánchez, 1989, pp. 120-127). Ocorre que a geologia das duas
minas não era similar; havia sulfetos nos estéreis da nova mina, que lentamente
foram acidificando as águas de drenagem e mobilizando flúor e outros metais que,
como se sabe, são mais solúveis em águas ácidas. A solução foi construir um a estação
de tratamento de águas ácidas.

lio exemplo anterior, um diagnóstico ambiental insuficiente (deveria ter sido


caracterizada a geologia e a mineralogia das rochas a serem escavadas), ele mesmo
ierivado da falta de scoping (a qualidade das águas não foi considerada um problema,
0 EIA dedica espaço bem maior aos impactos sobre a paisagem), resultou em erros
áe previsão de impactos, que, por sua vez, redundaram na necessidade de medidas
mitigadoras adicionais, não programadas, e cujo custo, por conseguinte, não foi leva-
io em conta na análise de viabilidade econômica do projeto. Fica clara, desta forma,
a inter-relação entre as etapas do planejamento e da execução de um EIA (Fig. 7.1):
íeficiências em uma etapa repercutem sobre as demais.

As dificuldades de prever impactos e as incertezas de previsão são inerentes ao


rrocesso de AIA. Daí a importância das medidas de gestão ambiental e da fase de
acompanhamento do processo, capazes de detectar impactos não previstos e alertar
r ara a necessidade de medidas corretivas. Por outro lado, as previsões, mesmo incer-
tas, contribuem para a definição dos programas de gestão.

E inegável que conhecer a m agnitude dos futuros impactos ambientais auxilia na


interpretação de sua importância, mas a previsão de impactos é um meio, não uma
finalidade do EIA, cujo objetivo não é prever impactos mas analisar a viabilidade
re um projeto e reduzir a magnitude e a importância dos impactos adversos. Neste
conto, deve-se relembrar que um a das tarefas da avaliação de impactos é comparar
alternativas; as técnicas de pr&visão, se aplicadas de maneira consistente, também
zontribuem para tal finalidade, ao possibilitar, com base nos mesmos métodos e
critérios, a visualização da situação futura sob diferentes alternativas.
r

' 0 . 5 A r e a de i n f l u ê n c i a
E somente depois da previsão de impactos que se pode tirar alguma conclusão sobre
1 área de influência do projeto. Se esta é a área geográfica na qual são detectáveis os
mpactos de um projeto, então ela não poderá ser estabelecida de antemão (antes de se
iniciarem os estudos), exceto como hipótese a ser verificada. Assim, um a modelagem
i= qualidade do ar ou da propagação de ruídos poderá dizer até onde se fazem sentir
:s efeitos do projeto, o que vem a ser sua área de influência para fins de avaliação de
mpacto ambiental (o que também é um a hipótese). Se o projeto for implantado, é o
monitoramento ambiental que estabelecerá sua real área de influência, desde que o
crograma de monitoramento seja capaz de discernir as modificações causadas por ele
daquelas que têm outras causas.

Se cada impacto é detectável em uma certa área, então um mesmo projeto terá distintas
rreas de influência, e a área de influência total corresponderá à soma das áreas
5e influência parciais. Entretanto, isso nada diz sobre a importância dos impactos.
Uma fábrica de cimento tem impacto sobre o clima global, pois emite C02, mas seus
liação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

impactos locais podem ser mais significativos. 0 tam anho da área de influência não
é necessariamente um indicativo da importância do impacto ambiental, mas é claro
que, em alguns casos, pode ser.

A área de influência é um a das conclusões da análise dos impactos. A análise dos


impactos identifica, prevê a m agnitude e avalia a importância dos impactos decor­
rentes da proposta em estudo. Faz parte de toda boa análise indicar e informar qual
é o alcance geográfico dos impactos, que é um a das características usadas para
descrevê-los, e, eventualmente, para discutir sua significância, conforme será visto
no próximo capítulo.

CAPÍTU 10
A valiação da
I m portância dos

11
a 'ação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

A etapa de avaliação da importância dos impactos é um a das mais difíceis de ri


quer estudo de impacto ambiental. Isso se deve ao fato de que atribuir maior ou m
grau de importância a um a alteração ambiental depende não só de um trabalho
nico mas também de um juízo de valor. Como todo juízo de valor, há aqui g n
subjetividade. Na opinião de Beanlands e Duinker (1983, p. 43), “a questão da
nificância das perturbações antropogênicas no ambiente natural constitui o pri
coração da avaliação de impacto ambiental. De qualquer ponto de vista - té
/

conceituai ou filosófico —, o foco da avaliação de impacto em algum momento


verge para um julgam ento da significância dos impactos previstos”.

Avaliar os impactos é uma forma de classificá-los, de separar os mais imporia]


dos demais. Parte desse exercício já foi feita na etapa de scoping. 0 raciocínk
procedimentos e as ferramentas podem ser similares àqueles já empregados. Tod.
essa nova etapa de avaliação apoia-se em todo o diagnóstico ambiental já con
e nos resultados da etapa de previsão dos impactos, que informam sobre sua m
tude ou intensidade. Há, assim, muito mais informação e conhecimento para avj
a importância dos impactos do que havia anteriormente.

Isso não elimina, contudo, a subjetividade inerente a todo juízo de valor. Antf
pelo contrário, uma das funçõe^ do EIA é justam ente a de permitir que tal 1
de valor — ou seja, essa avaliação —, seja fundamentado em estudos técnicos i
lhados. Não fosse por isso não seria necessário realizar o estudo. Opiniões, as
variadas, poderiam ser emitidas por qualquer interessado e as decisões sobre pr
de investimento voltariam a ser tomadas com base em critérios puramente té
e econômicos, senão políticos. Indubitavelmente, é um paradigma racionalisi
fundamentEf a avaliação de impacto ambiental (Bailey, 1997; Culhane, Fries
Beecher, 1987), mas a inevitabilidade da subjetividade na avaliação deve ser n
nhecida.

Como não é possível eliminar toda subjetividade, é conveniente apontar com cia
no EIA quais julgamentos se baseiam em apreciação pessoal ou opinião do conj
da equipe técnica e quais conclusões derivam de um trabalho cientificamente
damentado. Esta é a principal razão para se fazer a diferenciação mais clara po
entre previsão de impacto, que decorre, principalmente, da aplicação de me
científicos, e avaliação dos impactos, resultado do julgamento de valor de um i:
de pessoas, mesmo que sejam especialistas altamente capacitados.

11.1 C r it é r io s de i m p o r t â n c i a
Todo estudo de impacto ambiental deveria explicitar os critérios de atribuiçã
importância que adota. Expressões como “grande importância” ou “impacto de
porções negligenciáveis” ou, ainda, “impacto m ínim o” são muitas vezes encorir
nesses estudos, mas é óbvio que não significam a mesma coisa para todas as pes:
0 que seria impacto significativo ou importante?

-Para Duinker e Beanlands (1986) há um a interpretação estatística da impoi


de um impacto que poderia ser considerado como significativo se resultar ei
mudança mensurável (detectada por meio de um programa de amostragem esid
camente válido) e se essa mudança permanecer durante anos. Tal conceito nãa

CAPITU
A v a l ia ç ã o d a Im p o r t â n c ia dos Im p a

1 aplicação em um estudo de impacto ambiental, pois pressupõe o monitoramento


1:5 impactos ex post, ou seja, somente depois de ocorrido o dano, o mesmo pode ser
CDnsratado.

Irjrra definição, sob um a perspectiva ecológica e menos dependente de constatação


nsierio r, é que os impactos que impliquem uma perda irremediável de elementos
: : r exemplo, o capital genético) ou de funções (por exemplo, a produção primária)
i : 5 ecossistemas deveriam ser considerados como importantes (Beanlands e Duinker,
1983).

. n a outra definição de impacto importante poderia ser “aquele que excede os padrões
rmbientais”. Assim, se uma indústria emite poluentes atmosféricos em concentrações
t zuantidades que a qualidade do ar nas imediações estiver fora dos padrões esta-
iclecidos pela legislação para proteção da saúde e da integridade dos ecossistemas,
'i i impacto deveria ser considerado significativo. Certamente, tal critério pode ser
iigam ente utilizado na prática, m as não existem padrões ambientais para todos os
mpactos. Aliás, praticamente só há padrões para poluentes, mas inúmeros impactos
:iibientais guardam pouca ou nenhum a relação com a emissão de poluentes.

' i i ortando as conclusões de um seminário realizado no Canadá para discutir critérios


: i importância de impactos, Beanlands (1993, p. 61) propõe um a síntese. Deveriam
cr considerados significativos os impactos que:
$ afetem a saúde ou a segurança do homem;
$ afetem a oferta ou a disponibilidade de empregos ou recursos à comunidade
local;
^ afetem a média ou variância de determinados parâmetros ambientais (significân-
cia estatística);
^ modifiquem a estrutura ou a função dos ecossistemas ou coloquem em risco
espécies raras ou ameaçadas (significância ecológica);
^ o público considere importantes.

I:5i lista contempla critérios de ordem científica e social. Assim, se houver com-
: : rentes do ecossistema ou quaisquer outros elementos que possam ser afetados
: r : empreendimento e que o público considere relevantes, deveriam ser assim con-
s íerados no EIA e no processo decisório, mesmo que não seja essa a opinião dos
especialistas.

Lrckson (1994) sugere outros critérios para avaliar a importância de impactos am-
fckniais:
^ probabilidade de ocorrência (estimativas qualitativas ou quantitativas da proba­
bilidade de que o impacto ocorra);
^ magnitude (estimativa qualitativa ou quantitativa do porte ou extensão do im­
pacto — o mesmo que previsão da magnitude do impacto);
$ duração (período de tempo que o impacto, se ocorrer, deverá durar);
^ reversibilidade (natural ou por intermédio da ação humana);
^ relevância com respeito às determinações legais (existência de leis locais, nacio­
nais ou tratados internacionais que se refiram ao tipo de impacto ou elemento
afetado);
aliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

# distribuição social dos riscos e benefícios (de que maneira o empreendimeni:


impõe um a repartição desigual dos riscos e benefícios ambientais).

Glasson, Therivel e Chadwick (1999) sugerem que os critérios para avaliação possam
ser escolhidos entre:
% magnitude do impacto;
# probabilidade de ocorrência do impacto;
# extensão espacial e temporal;
# a possibilidade de recuperação do ambiente afetado;
# a importância do ambiente afetado;
# o nível de preocupação pública;
# repercussões políticas.

A literatura traz, portanto, diversas sugestões para a escolha de critérios de avaliaç


da importância dos impactos. Também a legislação ambiental dá diversas pistas p
um a classificação da importância dos impactos em um estudo de impacto ambieni
Além dos padrões existentes para diversos poluentes, há várias outras questões d
nidas previamente por via legal. Pode-se entender que essas questões foram defini
pela sociedade — por intermédio dos lqgisladores - como importantes e, p o rtar
deveriam ser automaticamente levadas em conta na interpretação da importân
dos impactos decorrentes do projeto analisado. No Brasil, são exemplos de elemer
tidos expressamente como importantes mediante a legislação:
# o patrimônio cultural do país;
% bens tombados;
» certos biomas, como a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-gr:
sense, a Zona Costeira e a Floresta Amazônica;
# as cavidades naturais subterrâneas;
# as espécies animais e vegetais consideradas raras ou ameaçadas de extinção

Para cada um desses itens há dispositivos legais que caracterizam o interesse s<
em sua conservação. A própria Constituição Federal declara os ecossistemas ante:
mente citados como “patrimônio nacional”, ao mesmo tempo em que afirma que
Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patri:
nio cultural brasileiro”. Outros documentos legais dispõem acerca das condições
conservação e utilização de bens como sítios paleontológicos, cavernas, mangui
e outros elementos constituintes do ambiente. Dispositivos específicos, como Po:
rias e outros atos normativos, estabelecem condições ainda mais específicas, com:
tombamento de determinado bem cultural ou natural ou a declaração de que d
minada espécie é considerada, oficialmente, como ameaçada.

Portanto, impactos que possam atingir algum desses bens ou elementos do amfc
te, considerados protegidos por força legal, devem necessariamente ser conside:
como importantes. 0 mesmo ocorre com impactos que possam afetar espaços
ritoriais protegidos, como unidades de conservação, às quais aplica-se o mi
raciocínio; ou seja, o Poder Público, pela via legal, considera como de interesse
blico a proteção desses espaços e, portanto, quaisquer impactos que os possam a:
deverão ser vistos como de grande importância.

CAPITU
A v a l ia ç ã o da Im p o r t â n c ia dos Im p a 291

Hmretanto, nem tudo o que tem im ­ Q u a d r o 11.1 V a lo r re la tiv o dos e le m e n to s do m e io e m p re g a d o n a


portância ecológica ou cu ltu ral é a v a lia ç ã o dos im p a c to s de u m a b a rra g e m
'rconhecido por lei, particu larm ente em E lemento V alor J u s t if ic a t iv a

:aises em que o Estado de Direito não V e g e ta ç ã o Pequeno A v e g e ta ç ã o te r re s tr e da z o n a de e s tu d o


está plenam ente consolidado, em que a te r re s tr e é c o m u m no Q u e b e c e não t e m v a lo r
s-ieiedade civil não é bem organizada ou c o m e rc ia l
cs direitos de m inorias étnicas não são T u rfe ira s M é d io As t u r fe ir a s o c u p a m 4 , 4 % da área de
I
^conhecidos. Desta forma, a existência
iit requisito legal pode não ser suficien-
e s tu d o ; as t u r fe ir a s in u n d a d a s tê m b o m
p o te n c ia l para a b rig o de fa u n a

t para apreciar a im portância de um Ic tio fa u n a G ra n d e Os rios e la gos da z o n a de e s tu d o a p r e ­


s e n ta m h á b ita ts a q u á tic o s de q u a lid a ­
«: imponente ambiental. 0 Quadro 11.1
de para v á ria s espécies de peixes; os Cri
ciastra um exemplo de classificação do
u t iliz a m a lg u m a s espécies para fin s
1 iior de alguns componentes am bientais a lim e n ta r e s
toados pela Hydro-Québec, um a empre-
A v if a u n a G ra n d e A z o n a de e s tu d o é u tiliz a d a p o r essas
•íõ canadense de geração, transm issão e a q u á tic a aves c o m o área de n id ific a ç ã o e de re­
distribuição de energia elétrica, como p o u so q u a n d o de m ig ra ç õ e s ; c o n s t i­
; i n e do procedim ento para avaliar os t u e m u m a f o n t e de a lim e n t o s para os
-npactos de um a nova usina hidrelétrica. Cri; seu interesse u ltra p a s s a as f r o n t e i ­
ras do Q u e b e c
C v a l o r é classificado em pequeno, médio
r. _ grande, segundo critérios estabeleci- A v if a u n a Pequeno As aves da zo n a de e s tu d o são espécies
te r re s tr e c o m u n s no Q u e b e c e r e p re s e n ta tiv a s
éorS caso a caso. Escala e justificativas
do m e io - N o r t e ; as aves flo r e s ta is não
k :êm validade para este EIA e de modo
c o n s t it u e m f o n t e de a lim e n t a ç ã o para
u r a podem ser generalizadas para ou- os Cri
Trirs ambientes. Note-se que os critérios
Lazer e M é d io 0 uso a tu a l é lim it a d o e a z o n a de e s t u ­
valoração empregados são fortemente t u r is m o do não a p re s e n ta a t r a t iv o s p a r tic u la r e s
opocêntricos e enraizados principal- que possam c o n t r i b u i r para um
te nos valores de uso de componentes a u m e n t o s ig n if ic a t iv o do t u r is m o ; t o ­
*dmrizados do ambiente (enfoque sim ilar davia, há um p o te n c ia l de d e s e n v o lv i­
m e n t o q u e pode f a v o r e c e r a e c o n o m ia
id i e ser visto no Quadro 6.3, para outro
local
im n d e projeto hidrelétrico na mesma
A r q u e o lo g ia G ra n d e Se bem que os sítio s seja m r e la t iv a m e n ­
-:ão). Uma alternativa para atribuir
te raros, este e le m e n to é im p o r t a n t e
*-Ior ou im portância a elementos do
para a h is tó ria das p o p u la ç õ e s locais
io é identificar suas funções (confor-
N ota: 0 quadro é p a rc ia l e não transcreve todos os elem entos usados no EIA
seção 8.6).
Fonte: H ydro-Q uébec, A m énagem ent H ydroélectrique d'Eastm ain 1,
R apport d A v a n t Projet, 1991.
1 lavia, a im portância do ambiente afe­
tado não pode ser suficiente para avaliar
importância de um impacto. Se um componente am biental de alta im portância for
mente afetado por um impacto temporário, isso eqüivale a um impacto muito
iftcativo? Provavelm ente não. Outras pistas para discutir a im portância dos im-
ds são fornecidas pela regulam entação sobre avaliação de impacto ambiental. No
Hmsil, a Resolução Conama 1/86 estipula que a análise dos impactos deve considerar
seguintes atributos:
^ impactos benéficos ou adversos;
^ impactos diretos ou indiretos;
^ impactos imediatos, a médio ou longo prazo;
^ impactos temporários ou permanentes;
^ impactos reversíveis ou irreversíveis;
aliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

# propriedades cumulativas ou sinérgicas dos impactos;


€< distribuição dos ônus e benefícios sociais decorrentes do empreendimento.

Essa regulamentação não fornece um a orientação acerca do entendimento que deva


ser dado a esses atributos. Uma interpretação de seu significado pode ser a seguinte:
# Expressão: este atributo descreve o caráter positivo ou negativo (benéfico ou
adverso) de cada impacto; note-se que, embora a maioria dos impactos tenha
nitidamente um caráter positivo ou negativo, alguns impactos podem ser ao
mesmo tempo positivos e negativos, ou seja, positivos para um determinado
componente ou elemento ambiental e negativos para outro.
# Origem: trata-se da causa ou fonte do impacto, direto ou indireto; impac­
tos diretos são aqueles que decorrem das atividades ou ações realizadas pelo
empreendedor, por empresas por ele contratadas, ou que por eles possam ser
controladas; impactos indiretos são aqueles que decorrem de um impacto direto
causado pelo projeto em análise, ou seja, são impactos de segunda ou terceira
ordem; os indiretos são mais difusos que os diretos e se manifestam em áreas
geográficas mais abrangentes (onde os processos naturais ou sociais ou os recur­
sos afetados indiretamente pelo empreendimento também podem sofrer grande
influência de outros fatores).
# Duração: impactos temporários são aqueles que só se manifestam durante uma
ou mais fases do projeto e que cessam na sua desativação. São impactos que
cessam quando acaba a ação que os causou, como a degradação da qualidade
do ar devido à emissão de poluentes atmosféricos; impactos permanentes repre­
sentam uma alteração definitiva de um componente do meio ambiente ou, para
efeitos práticos, uma alteração que tem duração indefinida, como a degradação
da qualidade do solo causada por impermeabilização devido à construção de um
centro comercial e de um estacionamento; são impactos que permanecem depois
que cessa a ação que os causou.
# Escala temporal: impactos imediatos são aqueles que ocorrem simultaneamente
à ação que os gera; impactos a médio ou longo prazo são os que ocorrem com
uma certa defasagem em relação à ação que os gera; uma escala arbitrária pode­
ria definir prazo médio, como da ordem de meses, e o longo, da ordem de anos.
# Reversibilidade: esta característica é representada pela capacidade do sistema
(ambiente afetado) de retornar ao seu estado anterior caso (i) cesse a solicitação
externa, ou (ii) seja implantada uma ação corretiva. A reversibilidade de um
impacto depende de aspectos práticos; por exemplo, a alteração da topografia
causada por uma grande obra de engenharia civil ou uma mineração é prati­
camente irreversível, pois, mesmo se tecnicamente exeqüível, é na maioria dos
casos inviável economicamente recompor a conformação topográfica original; a
extinção de uma espécie é um impacto irreversível.
# Cumulatividade e sinergismo: referem-se, respectivamente, à possibilidade de
os impactos se somarem ou se multiplicarem; impactos cumulativos são aqueles
que se acumulam no tempo ou no espaço, e resultam de uma combinação de
efeitos decorrentes de uma ou diversas ações.

Algumas dessas características são ilustradas na Fig. 11.1, na qual a qualidade


ambiental é representada no eixo vertical e o tempo, no eixo horizontal, como na
Fig. 1.3. A linha contínua decrescente representa a provável evolução da qualidade

CAPÍTU LO
A valiação da I mportância dos I m pa 293

ambiental da área independentemente do


projeto em análise e é representada como
uma reta para s im p lific a r o desenho. Os im ­
pactos imediatos são perceptíveis assim que
tem início o projeto (por exemplo, a constru­
ção) —um exemplo é a alteração do ambiente
ponoro, que também é um impacto temporá­
rio, pois cessa ao final do empreendimento.
Os impactos reversíveis são paulatinamente
corrigidos por meio de medidas de recupera­
ção ambiental, ao passo que os irreversíveis
não são passíveis de recuperação. Os impac­
tos permanentes perduram quando cessa a Fig. 11.1 Tipos de im pactos am bientais em relação à escala tem poral
ação que os causou, mas podem ser reversí­ Fonte: m odificado de Fernández-Vítora (2000).
veis, isto é, medidas corretivas perdem fazer
cessar esse impacto.

Nem todos esses atributos têm utilidade para discutir a importância de um impacto.
0 caráter benéfico ou adverso de um impacto não tem muita relevância para uma
avaliação da importância dos impactos, pois ambos são de grande ou pequena signi-
ftcância. 0 mesmo se passa com os impactos diretos ou indiretos, mas a Resolução
Conama lembra que sua análise é fundam ental em um estudo de impacto ambiental
e que a etapa de identificação dos impactos não pode passar ao largo dos impactos
indiretos. Para certos empreendimentos, os impactos indiretos podem ser tão ou mais
importantes que os diretos. Por exemplo, a construção de um a rodovia causa inúmeros
impactos diretos, como degradação da qualidade das águas superficiais e perda ou
fragmentação de hâbitats ao longo do seu traçado; no entanto, ao facilitar o acesso
à região servida pela obra, os impactos indiretos poderão ser maiores que os diretos,
como o adensamento populacional, com seus conseqüentes impactos (alteração de
hâbitats, degradação das águas superficiais e subterrâneas etc.); neste exemplo, os
impactos indiretos ocorrem em uma área muito maior que a área influenciada pelos
impactos diretos. 0 propósito de distinguir entre tipos de impactos não é declarar que
um impacto é direto e outro indireto, mas organizar nossa análise de m aneira tal que
assegure que exam inarem os todos os efeitos possíveis das ações hum anas propostas
nos ambientes físico e social, altamente complexos e dinamicamente interconectados.
(Erickson, 1994, p. 12). Tanto a expressão quanto a origem são, portanto, atributos a
serem considerados para a identificação dos impactos, mas não para a avaliação de
sua importância, o mesmo ocorrendo com a escala temporal.

A escala espacial pode ser, eventualmente, mais um atributo utilizado na classifi­


cação do grau de importância dos impactos previstos. Assim, os impactos de escala
regional poderão, em certos casos, ser considerados mais importantes que aqueles
que se manifestam apenas localmente, mas um critério como este deve ser muito
bem fundamentado, pois frequentemente os impactos locais são intensos (de grande
magnitude), ao passo que os impactos regionais são difusos e de baixa magnitude. A
escala deverá ser definida caso a caso, para cada empreendimento analisado, como,
por exemplo:
294 aliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Escala espacial: (i) impactos locais são aqueles cuja abrangência se restrinja
aos limites das áreas do empreendimento; (ii) impacto linear é aquele que se
manifesta ao longo das rodovias de transporte de insumos ou de produtos; (iii
abrangência municipal é usada para os impactos cuja área de influência esteja
relacionada aos limites administrativos municipais; (iv) escala regional é em­
pregada para os impactos cuja área de influência ultrapasse as duas categorias
anteriores, podendo incluir todo o território nacional; e (v) escala global para os|
impactos que potencialmente afetem todo o planeta.

Em termos de atributos efetivamente utilizáveis para discutir a importância do:


impactos, é comum o entendimento de que impactos irreversíveis e permanentes se­
jam tidos como importantes, embora tal orientação não conste da Resolução Conam
1/86. Os atributos de cumulatividade ou de sinergismo também podem, em certa me
dida, ser considerados para avaliação de importância, desde que estejam associado;
à m agnitude dos impactos, este sim um atributo indubitavelmente fundam ental par;
avaliar a importância.

Outras regulamentações de avaliação de impacto ambiental estabelecem diretrizes o;


estipulam alguns critérios a serem adotados para avaliar a importância dos impacto
Por exemplo, a regulamentação federai dos Estados Elnidos estabelece vários critérf
a serem considerados na análise dos impactos, entre os quais encontram-se alguns;
discutidos anteriormente:

(i) o grau pelo qual o projeto pode afetar a saúde ou a segurança pública;
(ii) características particulares do local, como proximidade a recursos historio
ou culturais, parques, áreas de importância agrícola, áreas úmidas, rios de beb
cênica ou áreas ecologicamente críticas;
(iii) o grau pelo qual os efeitos sobre a qualidade do ambiente humano possam
altamente polêmicos;
(iv) o grau pelo qual os possíveis efeitos sobre o ambiente humano são altamerr
incertos ou envolvem riscos únicos ou desconhecidos;
(v) o grau pelo qual a ação pode estabelecer um precedente para ações futu:
com efeitos significativos ou representa uma decisão em princípio acerca de ir
consideração futura;
(vi) se a ação está relacionada a outras ações cujos impactos são individualmei
insignificantes, mas cumulativamente significativos;
(vii) o grau pelo qual a ação pode afetar, de forma adversa, distritos, sítios, esi
das, rodovias ou objetos tombados ou passíveis de tombamento ou pode cau:
]U.S. Department
o f Transportation, perda ou destruição de recursos científicos, culturais ou históricos significativi
Federal Highway (viii) o grau pelo qual a ação pode afetar de forma adversa uma espécie ameaça
Administration, ou seu hábitat;
Technical Advisory: (ix) se a ação ameaça violar uma lei federal, estadual ou municipal ou outros r
Guidance f o r quisitos de proteção do meio ambiente.
preparing and (CEQ Regulations, §1508.27, 20 de novembro de 197!
Processing
environmental A regulamentação geral estabelecida pelo Conselho de Qualidade Ambiental ami
and section 4(f)
ricano foi, em muitos casos, detalhada pelas agências setoriais. 0 Departamento
documents, T
6640.8A, 30 out. Transportes1, por exemplo, estabelece a seguinte recomendação para avaliar a imp'
1987. tância dos impactos de uma rodovia sobre áreas úmidas:

CAPITU
A v a l ia ç ã o d a I m p o r t â n c ia dos I m p a

Para avaliar o impacto de um projeto proposto sobre as áreas úmidas (wetlands),


os seguintes dois tópicos deveriam ser abordados: (1) a importância da(s) área(s)
úmida(s) impactada(s) e (2) a severidade desse impacto. Simplesmente arrolar a
área ocupada por diversas alternativas não fornece informação suficiente para
determinar o grau de impacto sobre o ecossistema da(s) área(s) úmida(s). A análise
deveria ser suficientemente detalhada para possibilitar um entendimento desses
dois elementos.
Ao avaliar a importância da(s) área(s) úmida(s), a análise deveria considerar fa­
tores como: (1) suas funções primárias (por exemplo, controle de inundações,
hábitat de vida selvagem, recarga de aqüíferos etc.), (2) a importância relativa
dessas funções em relação ao total da(s) área(s) úmida(s) e (3) outros fatores que
poderiam contribuir para a importância dessa(s) área(s) úmida(s), como seu caráter
único (uniqueness).
Ao avaliar o impacto sobre a(s) área(s) úmida(s), a análise deveria mostrar os
efeitos do projeto sobre a estabilidade e a qualidade da(s) área(s) úmida(s). Essa
análise deveria considerar os efeitos a curto e longo prazos e a importância de
qualquer perda como: (1) capacidade de controle de inundações, (2) potencial de
ancoramento nas margens, (3) capacidade de diluição da poluição da água e (4)
hábitat de peixes e vida selvagem.

Finalmente, é claro que há um fator a ser sempre levado em conta na apreciação


im portância dos impactos, que é sua m agnitude ou intensidade. Assim, a signi-
í lin c ia estatística e a significância ecológica de Beanlands (1993) são critérios de
ntensidade dos impactos, mas isso não implica que impactos de grande m agnitude
/

sejam necessariam ente mais im portantes que impactos de pequena m agnitude. E o


n n ju n to de atributos, o contexto em que se m anifestarão os impactos e, em últim a
i inlise, a interpretação social que definirão a im portância dos impactos decorrentes
:c im determ inado empreendimento.

"im pouco se deve desconsiderar que nem todos os impactos identificados em um EIA
sé: de ocorrência certa, de forma que a probabilidade de ocorrência é, muitas vezes,
i i i a como mais um critério que contribui para a avaliação:
$ Probabilidade de ocorrência: refere-se ao grau de incerteza acerca da ocor­
rência de um impacto; os impactos podem ser classificados, por exemplo, de
acordo com a seguinte escala de probabilidade de ocorrência (i) certa, quando
não há incerteza sobre a ocorrência do impacto; (ii) alta, quando, baseado em
casos similares e na observação de projetos semelhantes, estim a-se que é muito
provável que o impacto ocorra; (iii) média, quando é pouco provável que se
manifeste o impacto, mas sua ocorrência não pode ser descartada; (iv) baixa,
quando é muito pouco provável a ocorrência do impacto em questão, mas,
mesmo assim, essa possibilidade não pode ser desprezada.

- -igica por traz desse raciocínio é de que impactos de baixa probabilidade poderiam
: ulgados como menos im portantes que os de alta probabilidade, mas tal raciocínio
sn faz sentido se a probabilidade de ocorrência for de algum a forma associada à
/

n ig n itu d e do impacto (este é o conceito de risco ambiental, conforme Cap. 12). E ne-
: t5sário, então, verificar como os diversos atributos descritivos dos impactos podem
tr combinados para satisfazer aos critérios de im portância.
aliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

11.2 M é t o d o s d e a g r e g a ç ã o
Se há múltiplos critérios para avaliar a importância dos impactos, então se deve de­
finir um mecanismo para organizá-los. Alguns critérios poderão ter mais peso que
outros. Na avaliação do rendimento escolar, os professores costumam atribuir notas
ou conceitos aos alunos. As notas são geralmente distribuídas em uma escala numé­
rica de 0 a 10, enquanto os conceitos podem ser adjetivos, como “ótimo”, “bom” ou
“ruim ”, ou ainda categorias como letras de A a E. Os impactos de um empreendimento
também podem ser classificados desta maneira, mas geralmente são usados adjetivos
como “impacto significativo” ou “impacto de pouca importância”. Algumas maneiras
práticas de se chegar a esses resultados incluem:
* combinação de atributos;
ponderação de atributos;
análise por critérios múltiplos.

Exemplos desses métodos serão vistos a seguir. É oportuno, porém, relembrar uma
advertência já feita anteriormente neste texto: não há receitas universais em avalia­
ção de impacto ambiental. Metodologias deverão ser aplicadas, adaptadas, ou mesmo
criadas, para cada caso. Antes de prosseguir, é também conveniente esclarecer a
terminologia empregada neste capítulo:
Atributo de um impacto (ou de um aspecto) ambiental é uma característica ou
propriedade desse impacto e pode ser usada para descrevê-lo ou qualificá-lo.
como sua expressão, origem e duração, entre outros. 0 termo tem origem la­
tina, significando: “aquilo que é próprio de um ser”; “característica, qualitativa
ou quantitativa, que identifica um membro de um conjunto observado” (A.B.H
Ferreira, Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, 1986), ou ainda “o qus
é próprio e peculiar a alguém ou a alguma coisa” (A. Houaiss e M.S. Villar.
Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, 2001).
# Critério de avaliação é um a regra ou um conjunto de regras para avaliar a im­
portância de um impacto, conforme se verá nesta seção. A palavra de origina
do grego kritérion, “aquilo que serve de base para comparação, julgamento o_
apreciação” [Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, 1986).

C o m b in a ç ã o d e a t r ib u t o s
A forma mais simples de classificar impactos consiste em (i) definir os atributos que
serão utilizados, (ii) estabelecer um a escala para cada um deles e (iii) combiná-los
mediante um conjunto de regras lógicas (o critério de avaliação). Pode-se começar per
um exemplo simples para ilustrar o método: se os atributos escolhidos são magnitude
e reversibilidade, as escalas adotadas poderiam ser:
# Magnitude: pequena, média ou grande.
% Reversibilidade: reversível, irreversível. ^

A combinação, dois a dois, de cada um desses atributos, resulta em seis arranjos


possíveis:
# impacto reversível de pequena magnitude;
impacto reversível de média magnitude;
impacto reversível de grande magnitude;
impacto irreversível de pequena magnitude;

CAPITU
A v a l ia ç ã o d a I m p o r t â n c ia dos I m p a 297

•**4
impacto irreversível de média magnitude;
* :ií impacto irreversível de grande magnitude.

As regras de arranjo (critério) poderiam ser as seguintes:


qualquer impacto irreversível é de importância grande;
impacto revejsível de magnitude pequena ou média é de importância pequena;
& impacto reversível de m agnitude grande é de importância média.

E óbvio que outras regras podem ser adotadas, como não considerar de grande im­
portância todos os impactos irreversíveis, mas somente aqueles de magnitude média
ou grande; neste caso, pequenos impactos, ainda que irreversíveis, teriam média
importância. Como não há, nem pode haver, regra universal, os autores do estudo
ambiental devem especificar claramente quais os critérios adotados. Isso permite que
os leitores possam discordar dos critérios, ou arranjá-los diferentemente.

A combinação pode ser feita com qualquer número de atributos. Por exemplo, o Qua-
iro 11.2 mostra o esquema de combinação de atributos usado em alguns estudos de
impacto ambiental pela Hydro-Québec, um a empresa canadense de geração, tra n s ­
missão e distribuição de energia elétrica. Nesse exemplo, a escala dos atributos é
:ada por adjetivos que denotam intensidade. Resultados semelhantes poderiam ser
obtidos usando cifras em vez de adjetivos, como será visto a seguir. Três atributos são
combinados: (1) duração do impacto, cuja escala inclui três níveis: (i) momentânea,
ii) temporária, (iii) permanente; (2) extensão espacial do impacto, ou área abrangi-
ia, cuja escala tam bém inclui três níveis: (i) pontual, (ii) local, (iii) regional; e (3)
magnitude ou intensidade do impacto, cuja escala inclui quatro níveis: (i) fraca, (ii)
média, (iii) forte, (iv) muito forte. Os resultados da combinação três a três desses doze
elementos são agrupados em três categorias de importância dos impactos: (i) fraco,
ii) médio, (iii) forte. Conforme mostra o Quadro 11.2, um impacto será avaliado como
forte nas seguintes condições:
magnitude muito forte e duração permanente ou
* magnitude muito forte e duração temporária e abrangência regional ou local ou
* m agnitude muito forte e duração
momentânea e abrangência regio­
Quadro 11.2 Critérios para avaliar a importância de impactos
nal ou ambientais
* magnitude forte e duração perm a­ DURAÇÃO EXTENSÃO MAGNITUDE OU 1
nente ou FRACA MÉDIA FC
magnitude forte e duração tem po­
-» » V

M o m e n tâ n e a Pontual Fraca Fraca Fraca


rária e abrangência regional ou M o m e n tâ n e a Local Fraca Fraca M é d ia M é d ia
& magnitude média e duração per­
T em porária Pontual Fraca Fraca M é d ia M é d ia
manente e abrangência regional.
T em porária Local Fraca Fraca M é d ia g È ò itê 1
M o m e n tâ n e a Regional Fraca M é d ia M édia Forte
Quadros sinópticos como o Quadro 11.2
P erm anente Pontual Fraca M é d ia M é d ia Forte
facilitam a aplicação das regras de com­
T em porária Regional Fraca M é d ia Forte Forte
binação de atributos, mas também podem
enunciar as regras por intermédio de P erm anente Local Fraca M é d ia Forte Forte

sentenças como as citadas anteriormente P erm anente Regional M é d ia Forte Forte


ou como no seguinte exemplo: Fonte: Hydro-Q uébec (1990).
a iação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

São considerados como de grande importância todos os impactos:


que tenham alta ou média magnitude e, ao mesmo tempo, para os quais haja requi­
sitos legais, independentemente de sua reversibilidade; ou
# que tenham alta magnitude e sejam irreversíveis, independentemente da exis­
tência de requisitos legais (situação que não ocorre em nenhum deles).
São considerados de pequena importância aqueles impactos:
# que tenham pequena magnitude e sejam reversíveis, independentemente da
existência de requisitos legais.
Os demais impactos são classificados como de médio grau de importância.

A escolha das escalas não deve ser desprezada. É tarefa das mais importantes para
assegurar a coerência e inteligibilidade do trabalho de avaliação. O Quadro 11.3 mos­
tra exemplos de definição de escalas para alguns
Quadro 11.3 Exemplos de escalos para atributos de
avaliação de impactos critérios usualmente empregados em estudos de
r

ESPACIAL
impacto ambiental. E possível utilizar escalas nu­
m p a c to p o n tu a méricas em vez de escalas qualitativas.
m p a c to local
m p a c to regiona No planejamento de sistemas de gestão ambientai,
m p a c to global também é necessário avaliar a importância dos
TEMPORAL impactos. A norma ISO 14004 sugere atributos
m p a c to im e d ia to que podem ser empregados para avaliação da
m p a c to de m édio ou lo n g o prazo
importância de impactos, como escala espacial,
D uração severidade, probabilidade de ocorrência e dura­
Im p a c to te m p o rá rio
ção. (NBR ISO 14.004: 1996, “Sistemas de Gestãn
m p a c to in te r m it e n t e
m p a c to c o n tín u o Ambiental — Diretrizes gerais sobre princípios,
m p a c to p e rm a n e n te sistemas e técnicas de apoio”, item 4.2.2).

Block (1999) apresenta nove atributos que podem ser usados nessa tarefa:
a

severidade (que eqüivale à magnitude);


**-

probabilidade de um aspecto resultar em um impacto mensurável;


frequência (número de vezes que um impacto pode ocorrer por unidade dr
tempo);
* abrangência espacial;
possibilidade de controlar os aspectos ambientais;
* enquadramento legal;
* necessidade de informar sobre a ocorrência de impactos;
$ preocupação das partes interessadas;
duração do impacto.

Para cada atributo, a autora sugere a utilização de uma escala com cinco graus, d:
mais ao menos intenso, sempre usando números de 5 a 1, respectivamente, com:
mostra o exemplo do Quadro 11.4. A avaliação da significância de cada impacto pode
ser feita por adição ou multiplicação. Como exemplo de aplicação de um a variaçã:
desse procedimento, largamente difundido no planejamento dos sistemas de gestã:
ambiental, o Quadro 11.5 indica os atributos e suas rçspectivas escalas, adotados por
um a empresa do setor petroquímico. Para avaliar a importância de um impacto, três
atributos principais são usados: (a) a existência de um requisito legal; (b) a demand:
ou manifestação de interesse do público (“partes interessadas”, no jargão dos SGA?

CAPITU
A v a l ia ç ã o d a I m p o r t â n c ia dos I m p a 299

e (c) a severidade c^a probabilidade de ocorrência (ou frequência), que são combi-
*=dos de acordo com um a “m atriz de risco”. A classificação final é feita em apenas
ü a s categorias - significativo ou não significativo. Para enquadrar um impacto
: :imo significativo, basta aplicar qualquer um dos três critérios citados anteriormente
• Combinação de atributos por regras lógicas). Esse exemplo mostra como utilizar, de
n a n e ira rápida e simples, alguns dos atributos mais citados na literatura.

Buadro 11.4 Exemplo de escalo para o atributo "enquadramento legal"


' , / el C a r a c t e r ís t ic a s

5 Regulamentado mediante lei ou qualquer outro diploma legal.


4 Considerado para futura regulamentação, por exemplo, mediante de projeto de lei ouem estudo por
uma agência governamental. W .s

3 Política empresarial: apesar de não existir exigência legal, o tema é tratado na política ambiental da em­
presa, em algum código de prática que a empresa subscreva.
2 P rática e m p re s a ria l: c o n d u ta u s u a lm e n te a d o ta d a pela em presa ou p o r o u tra s , e m b o ra não c o ­
d ific a d a .
1 Não há regulamento ou diretriz sobre o assunto.
Fonte: Block (1999, p. 25).

3 onderação de atributos
Boa parte da literatura inicial sobre AIA, isto é, artigos e relatórios publicados durante
:s anos 1970 e início dos anos 1980, ocupou-se de conceber e testar métodos para
:o n d erar atributos diferentes em um a avaliação da im portância dos impactos. Essa
neratura deu origem a várias compilações, das quais pode-se citar Bisset (1984a,
988); Moreira (1993a, 1993b), Shoppley e Fuggle (1984) e Thompson (1990), entre v á ­
rias outras, como fontes de informação sobre esses métodos e sobre as potencialidades
e os limites de sua aplicação.

-‘onderar atributos é arbitrar entre diferentes alternativas de dar pesos a cada um dos
rrributos selecionados e, em seguida, combiná-los segundo um a função matemática
rredeterm inada. Assim, a principal diferença entre a combinação e a ponderação de
irributos é que, nesta últim a, os atributos são ordenados segundo sua importância
r i r a o critério de avaliação, com os atributos mais im portantes recebendo maiores
pesos. ^

Métodos simples de ponderação são bem usados no planejamento de sistemas de


-estão ambiental. Neste caso, depois de identificar todos os aspectos e impactos am-
::entais, é preciso classificá-los de acordo com sua importância ou significância,
:rja em grupos de importância semelhante, seja em uma lista ordinal. Os aspectos
e impactos mais significativos deverão ser tratados prioritariamente. Como o pro-
:Iema é muito parecido à etapa de avaliação de impactos de um estudo de impacto
ambiental, as soluções tam bém se assemelham.

Tal raciocínio permite múltiplas variações. 0 resultado pode ser dado pela soma dos
-fores de cada atributo. Pode-se tam bém decidir que um atributo, como “exigência
egal”, é mais im portante que os demais, dando-lhe peso 2, enquanto os outros têm
:«eso 1; neste caso, a “nota” final refletirá a maior im portância desse atributo (caso de

ZE
230 ^ ^ a i i a ç ã o de I m p a c t o A m b i e n t a l : c o n c e i t o s e m é t o d o s

Q u a d r o 11.5 Um c rité rio p a ra c o m b in a r m a g n itu d e e p ro b a b ilid a d e de o c o rrê n c ia dos im p a c to s


Severidade do Im p a c to
S e v e r id a d e Po n t u a c - :

Sem e fe ito N e n h u m e fe ito a m b ie n ta l id e n tific á v e l 0


Baixa Im p a c to de m a g n itu d e de sp re zíve l/R e strito ao local de o c o rrê n c ia /T o ta lm e n te 1
reversível com ações im e d ia ta s /C o n s e q u ê n c ia s fin a n c e ira s desprezíveis
M édia Im p a c to de m a g n itu d e c o n s id e rá v e l/C o n ta m in a ç ã o /R e c la m a ç ã o u n ic a /U m a v io la ç ã o
de c rité rio legal/Reversível com ações m itig a d o ra s
Localizada Descarga lim ita d a de su b stâ n cia s de to x ic id a d e c o n h e c id a /R e p e tid a v io la ç ã o de padrões
le g a is/E fe ito s observados além dos lim ite s da em presa
A lta Im p a c to de g ran de m a g n itu d e / gran de e x tensã o/N e cessidad e de grandes ações 4
m itig a d o ra s para re v e rte r a c o n ta m in a ç ã o a m b ie n ta l/V io la ç ã o c o n tin u a d a de
padrões legais
M u it o alta Im p a c to de gran de m a g n itu d e /G ra n d e extensão com co nse qüê ncias irreversíveis,
m esm o com ações m itig a d o ra s /G ra n d e perda e c o n ô m ic a para a e m p re s a /V io la ç ã o alta
e c o n s ta n te dos padrões legais
Frequência ou P ro b a b ilid a d e de O corrência
F r e q u ê n c ia C r it é r io Po n t u a c - ;

M u it o baixa M u it o im p ro v á ve l de o c o rre r/N ã o há registro n® m u n d o A


Baixa Im p ro vá ve l de o c o rre r/O c o rre u em in d ú s tria s im ila r B

M édia Provável de o c o rre r/O c o rre u pelo m enos um a vez na em presa (f < 1 vez/ano) c
A lta M u it o provável de o c o rre r/O c o rre m ais de um a ve z/a n o na empresa
(1 v e z /a n o < f < 1 vez/sem estre) 0

M u it o alta Esperado que o c o rra /O c o rre m ais de um a vez p o r sem estre na em presa E
(f > 1 vez/sem estre)
M a tr iz de risco
S e v e r id a d e F r e q u ê n c ia
A B C D E
0

/
/ z
/
V YL V
/

Nota: a área hachurada indica potencial de im pacto significativo.


Fonte: adaptado de Shell Internation al (2000) e Polibrasil.

ponderação de atributos). A escala de Block para atributo “enquadramento legal” é u n


exemplo de criatividade na montagem de critérios de avaliação, pois não se restringi
às tradicionais categorias sim ou não (Quadro 11.4).

Um arranjo de ponderação é mostrado no Quadro 11.6. Cada um dos quatro atributos


escolhidos é descrito com a ajuda de um a escala numérica (há uma escala para cads
atributo). Cada atributo tem um peso, de modo que a signifieância de cada impaci:
é resultante da soma ponderada (multiplicação docvalor numérico de cada atribui:
por seu peso). Neste caso, a importância é diretamente dada pelo valor numérico. Eu

CAPITU
A v a l i a ç ã o d a I m p o r t â n c i a d o s Im p a 301

Q u a d r o 11 .5 (c o n tin u a ç ã o )____________________________________
Uma m a triz para a v a lia r a im p o rtâ n c ia de im p a c to s a m b ie n ta is

<
L /O

O
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uo
LU
O 00
LU
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c c

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1—

R esultadc
I ncidênci /

Legislaçãi
S everidad
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A tividade

CJ — ! <LU
<

S ituação
< =)
A specto

I mpacto z:
CC <LU 0 a

C lasse
0 ZD ^ LU
UQ

Cl. aLU LU 60 1LU



1— Zi CC
LU CC
h- LL_ £ 8 á
A tiv id a d e 1 A s p e c to n im p a c to / N D Ad At 1 E NS N N NS
A tiv id a d e 2 A s p e c to m Im p a c to j N D Ad At 1 E NS N N NS
A tiv id a d e 3 A s p e cto p Im p a c to / Ad N
S itu a ç ã o : N - n o rm a l A - a n o rm a l R - risco
Incid ê n cia : D - d ire ta I - in d ire ta
Classe: Ad - adverso B - benéfica
T e m p o ra lid a d e : A t - a tu a l P - passada PI - planejada
Severidade: escala de 1 a 5, c o n fo r m e acim a
zrequ ência : escala de A a E, c o n fo r m e acim a
Potencial de c o n s e q ü ê n c ia : S - s ig n ific a tiv o NS - não s ig n ific a tiv o
Legislação: S - não e x is te n te ou não se aplica S - existe re q u is ito legal aplicável
Partes interessadas: N - não consta m a n ife s ta ç ã o S - preocupações co nh ecida s
-onte: adaptado de Shell Internation al (2000) e Polibrasil.

Q u a d r o 11.6 E xem p lo de p o n d e ra ç ã o de a trib u to s


A t r ib u t o s / P e s o s

I mpacto M agnitude R eversibilidade P robabilidade E nquadram ento S ignificância


DE OCORRÊNCIA LEGAL ( so m a ponderada )
m p a c to 1 3 *5 1 3 *2 5*3 41
m p a c to 2 4 *5 2 * 5 1 * 2 4 *3 44
m p a c to 3 2*5 2 *5 1 *2 2*3 28
im p a c to 4 3 *5 1 * 5 5*2 0*3 33
Pesos: Escala de valores dos a trib u to s:
m a g n itu d e = 5 peq. = 1; m édia = 2; gra nde = 3; m u ito gra nde = 4
reversibilidade = 5 reversível = I; irreversível = 2
orobabilidade de ocorrência = 2 m u ito baixa = I; baixa = 2; a lta = 3; ce rta = 5
enquadram ento legal = 3 não há = 0; p o lític a da em presa = 2; p ro je to de n o rm a legal = 4 ;
n orm a le g a l (lei, decreto, resolução, p o rta ria etc.) = 5
zscala de sig n ificâ n cia :
pequena = 0 a 2 0 ; m édia = 2 1 a 35; g ra n d e = 3 6 a 55

seguida, é conveniente estabelecer uma escala para interpretação (qualitativa) da


significância, que, no exemplo hipotético, é entre 0 e 20, 0 impacto é pouco significa­
tivo; entre 21 e 35 é de média importância; e acima de 36, 0 impacto é avaliado como
de grande importância.

Como fica claro no exemplo, 0 resultado da ponderação de atributos não é uma “me­
dida” do impacto, no sentido físico de um a “grandeza que possa servir de padrão para
avaliar outras do mesmo gênero”, mas um a apreciação qualitativa da importância do
O ‘“ ‘ O
SJÍ aiiação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

impacto (Gregorim, C.O. (1998) — Michaelis: Moderno Dicionário da Língua Portugue­


sa. Melhoramentos, São Paulo, 3. ed.).

Raciocínios mais sofisticados para as escalas dos atributos são encontrados na litera-
/

tu ra sobre AIA. E o caso das “funções de impacto”, relações que tran sfo rm am o valor
de um determ inado indicador ambiental em um a cifra de um a escala arbitrária de im ­
pacto. 0 environmental evaluation system , tam bém conhecido como “método Batelle”,
é um a dessas ferram entas (Dee et al., 1973). 0 método parte de um a divisão do meio
ambiente em 74 parâm etros descritivos ou componentes, cobrindo quatro grandes
campos: ecologia, poluição ambiental, paisagem (aestheties) e interesse hum ano. 0
método pressupõe que cada um desses parâm etros, que representa um aspecto da
qualidade ambiental, pode ser expresso em termos numéricos, em um a escala de 0
a 1, respectivam ente ambiente extrem am ente degradado e alta qualidade ambiental.
Cada um dos parâm etros tem um peso e a soma total dos pesos é 1.000. A alocação
dos pesos foi feita por um a comissão de especialistas. Por exemplo, o parâm etro “de­
m anda bioquímica de oxigênio” tem peso 25, ao passo que o parâm etro “ruído” tem
peso 4, denotando a im portância relativa desses aspectos de qualidade ambiental. 0
valor de cada parâm etro é convertido no índice de qualidade ambiental entre 0 e 1,
de acordo com um a função que lhe é própria. A Figura 11.2 mostra um exemplo das
funções de conversão. *

A aplicação do método depende dos resultados da etapa de previsão dos impactos. Por
exemplo, se o em preendim ento analisado alterar o ambiente sonoro, o índice de qua­
lidade ambiental desse parâm etro será reduzido, o mesmo acontecendo com todos os
demais parâm etros. A qualidade ambiental total é calculada ponderando-se o índice
de qualidade am biental de cada parâm etro individual por seu peso respectivo e so­
m ando-se cada índice. A qualidade m áx im a seria 1.000 (quando todos os índices são
iguais a 1). 0 impacto do projeto é avaliado (“medido”) por intermédio de comparação
entre a qualidade ambiental de antes (o diagnóstico) e a
de depois (o prognóstico).

A aplicação integral do método Batelle é dificulta­


da pelas seguintes razões: (i) é preciso dar um valor
para o índice de qualidade ambiental de cada um dos
74 parâm etros, o que requer um a investigação deta­
lhada e, portanto, levantam entos longos e custosos; (ii)
vários dos 74 parâm etros são extrem am ente subjetivos;
(iii) a divisão do “am biente” nesses 74 parâm etros e a
alocação de pesos é controversa, pois reflete os valo­
res e a opinião da equipe que elaborou o método - o
ambiente poderia ser descrito com a ajuda de outros
parâm etros e a distribuição de pesos pode ser diferen­
te. A pesar dessas dificuldades (todo método integrador
Oxigênio dissolvido
tem deficiências), o environmental evaluation system
pode ser aproveitado em estudos de impacto ambiental
Fig. 11.2 Função de qualidade a m b ie n ta l para oxigênio m ediante adaptações e, possivelmente, simplificações.
dissolvido Uma variação é reduzir drasticam ente o número de
Fonte: Dee et al., 1973, p. 529. parâm etros descritivos, agru pand o-os por áreas afins -

CAPITU
A v a l ia ç ã o d a I m p o r t â n c ia dos Im p a

por exemplo, os parâm etros que descrevem a qualidade da água podem ser agrupados
em um índice de qualidade das águas (IQA), que já integra dez parâm etros usuais de
qualidade, os parâm etros relativos aos ecossistemas aquáticos poderiam ser ag ru p a­
dos em índices de diversidade de espécies. Vários parâm etros de outras categorias
tam bém poderiam ser substituídos por parâm etros que representem os elementos
valorizados do ambiente, como a presença de espécies ameaçadas. As funções de
impacto tam bém deveriam ser modificadas, tanto como intuito de refletir os novos
parâm etros usados para a descrição da qualidade ambiental quanto para adaptá-la ao
ambiente afetado pelo projeto. Neste caso, a distribuição dos pesos tam bém deveria
ser refeita, seja pela equipe de analistas que prepara o estudo, seja de comum acordo
com a equipe governam ental incum bida de analisá-lo.

A matriz de Leopold et al. (1971), Fig. 8.8, tam bém foi concebida como um método de
avaliação dos impactos. Neste caso, os autores propõem que, para cada impacto, sua
m agnitude e sua im portância sejam descritos por meio de núm eros inteiros, em um a
escala de 0 a 10.

Em suma, os métodos de ponderação são muitos e suas variações compõem um


conjunto imenso de possibilidades. Contudo, eles têm em comum o fato de tr a n s ­
formarem aspectos essencialmente qualitativos (e em larga medida, subjetivos) em
dados quantitativos. Isso pode ser enganoso ao tra n sm itir ao leitor desavisado a ideia
de um a precisão m atem ática dos métodos de avaliação, o que definitivam ente não
é um a característica sua. Além disso, a quantificação pode induzir o analista e o
'.eitor a cálculos m atemáticos indevidos, pois são desprovidos de sentido físico. Vale
".embrar, no entanto, que essas deficiências não desqualificam o emprego de métodos
de ponderação, apenas expõem seus limites.

A nálise por critérios múltiplos


A análise por critérios múltiplos é u*n nome genérico dado a diversos instrum entos
que tencionam form alizar o processo decisório por meio de procedimentos de
agregação das preferências dos tomadores de decisão. Segundo Simos (1990, p. 39),
d campo da ajuda à decisão por critérios múltiplos começou a consolidar-se no fmal
ios anos 1960, sem relação com a AIA, mas com o “objetivo de aliviar as insuficiên­
cias do cálculo econômico clássico e da pesquisa operacional”, de forma que seus
métodos tin h a m por pressuposto a existência de um único tomador de decisões e não
;m sujeito coletivo. Seu desenvolvimento subsequente incorporou a situação mais
comum de múltiplos tomadores de decisão.

I caráter pouco formal e m uitas vezes prim ário da etapa de hierarquização e avaliação
ie impactos de muitos EIAs (Ross, M orrison-Saunders e Marshall, 2006) levou alguns
pesquisadores a tentarem aplicar ou adaptar as ferram entas da análise por múltiplos
critérios a esta tarefa da elaboração de um EIA. Simos (1990, p. 48), no entanto,
reconhece o caráter mais acadêmico dessas preocupações, evidenciado por poucas
aplicações a EIAs reais.

O formalismo matemático dos métodos por múltiplos critérios pode ser um a das
zausas que lim itam sua aplicação à análise dos impactos. A avaliação da im portância
ios impactos é um a das partes da preparação de um EIA, no qual é mais necessário o
rrabalho conjunto e integrado da equipe multidisciplinar; a formalização matemática
304 p i p j aliacão de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

pode ser um empecilho a essa integração, possivelmente mais fácil quando a avalia­
ção é qualitativa e cada profissional pode utilizar os conceitos que lhes são familiares.

Na atualidade, o conceito de múltiplos critérios é muito amplo e frequentemente usa­


do sem preocupação formal, mas simplesmente para designar qualquer procedimento
que empregue mais de um ponto de vista ou critério. Uma aplicação dos métodos por
critérios múltiplos é a escolha entre alternativas, que será exemplificado na próxima
seção por uma interessante abordagem usada na Holanda para comparar seis alterna­
tivas de um projeto rodoviário.

11.3 A n á l i s e e c o m p a r a ç ã o d e a l t e r n a t i v a s
Na preparação de um estudo de impacto ambiental — assim como na aplicação de
outras ferramentas de avaliação de impacto ambiental, como a avaliação do ciclo de
vida de um produto ou a identificação de efeitos e impactos ambientais de um empre­
endimento em operação, visando a implantação de um sistema de gestão ambiental —,
o analista se depara com a necessidade de comparar, classificar ou hierarquizar im­
pactos de características jpiuito diferentes. Por exemplo, um a opção de traçado de um
trecho de rodovia pode implicar a supressão de 128 ha de um certo tipo de vegeta­
ção, enquanto outra opção acarretaria a demolição de 18 casas de um bairro rural
e o secionamento de dez propriedades rurais. Com base nessas informações, como é
possível escolher a alternativa de menor impacto?

Como os casos reais de avaliação de impacto ambiental são muito mais complexos e
envolvem mais variáveis que o caso hipotético acima, pode-se perceber as dificulda­
des dessa etapa na preparação de um EIA. Em um tal estudo, sempre há, no mínimo,
duas alternativas em análise: realizar ou não o projeto proposto. A essa configura­
ção básica podem-se ju n ta r diferentes situações, como variantes de localização de
componentes do empreendimento ou de sua totalidade, ou diferentes alternativas
tecnológicas. Como o problema é comum a todo processo decisório, encontra-se, em
avaliação de impacto ambiental, inumeráveis tentativas de aplicar ou adaptar ferra­
mentas desenvolvidas em outros contextos decisórios, como a análise por critérios
múltiplos ou sistemas de suporte à decisão, que formam um ramo daquela.

Por outro lado, há diversas tentativas de construir um a base comum para compara­
2Em contrapartida, ção e mensuração de impactos ambientais. Algumas escolas de pensamento, como
métodos de
a economia ambiental e a economia ecológica, propõem que essa base possa ser o
valoração
econômica valor econômico dos bens afetados ou os custos e benefícios ambientais decorrentes
de impactos de alterações ambientais. Embora haja um bom potencial para aplicação dos instru­
encontraram boa mentos desenvolvidos por pesquisadores dessas áreas à avaliação de impactos, a falta
acolhida nas de consenso acerca de seus princípios ou suas modalidades de aplicação dificulta sua
avaliações ex post aplicação a casos reais de estudos de impacto ambiental, e por isso o tema não será
ou avaliações de
explorado aqui2. Na seqüência, esta seção tratará da análise por critérios múltiplos e
danos ambientais
(Fig. 1.12), do uso de SIGs como ferramenta para ponderar atributos.
principalmente
para subsidiar A nálise por critérios múltiplos na seleção de alternativas
ações judiciais Trata-se de procedimentos que visam a agregação de informação de natureza dife­
de reparação de
rente sobre alguma base comum, de modo a permitir comparações e simulações de
danos.

CAPITU
A v a l ia ç ã o d a I m p o r t â n c ia d o s I m p a

opções. A lguns desses métodos são muito sofisticados e complexos e podem levar
= um a análise detalhada das v an tag ens e desvantagens das principais alternativas
consideradas. No entanto, encontram -se inum eráveis exemplos de aplicação simplis-
de procedim entos que levam à atribuição de um valor num érico (arbitrário) a um
: t n o impacto - por exemplo a perda de vegetação - e a posterior com paração a outro
impacto, de n atu rez a com pletam ente diferente.

°ara comparar seis altern ativ as de um projeto rodoviário na Holanda, Stolp et al.
1302) u sa ram quatro diferentes “p ersp ectiv as”: a “h u m a n a ”, a “dos cidadãos”, a “eco-
logjca” c a “técnico-econôm ica”. A perspectiva h u m a n a foi desenvolvida a p artir
de docum entos governam entais que estabelecem políticas de qualidade de vida. A
perspectiva dos cidadãos foi construída com a técnica de avaliação dos valores dos
cidadãos (conforme Quadro 9.6). A perspectiva ecológica foi baseada no trabalho
da equipe do EIA, assim como a perspectiva técnico-econôm ica. Um procedim ento
simples de critérios múltiplos foi desenvolvido p ara com parar as alternativas sob
essas quatro perspectivas. Quatro tem as e dez subtem as tratados no EIA receberam
pesos diferentes, segundo cada perspectiva (Quadro 11.7); a soma dos pesos de cada
subtema é sempre igual a 1. Nota-se que, enquanto os cidadãos valorizam elemen-
:ds como “proteção contra ru íd o ”, “ecologia” e “fluidez do tráfego”, a equipe do EIA
aloriza as categorias “água e solo”, “ecologia” e “paisagem ”. Já sob a perspectiva
'tcnico-econôm ica, as categorias mais im portantes são “impactos sobre a atividade
econômica” e “fluidez de tráfego”.

--i alternativas estudadas foram três, cada u m a com duas variantes, ou seja, detalhes
i: zrojeto que podem m odificar seus impactos, e denom inadas “m á x ” e “m ín ”:
^ A l: ampliação e melhoria da autoestrada existente;
^ A2: ampliação e melhoria da autoestrada existente com a construção de uma
nova via; >
55 A3: nova autoestrada, segundo novo traçado.

C - a : *o TT.7 D is trib u iç ã o de p e s o s p o ro q u a tr o p e rs p e c tiv a s d e a n á lis e de a lte rn a tiv a s de u m p r o je to ro d o v iá rio n a


: nda
- • r \
S ubtema P e r s p e c t iv a P e r s p e c t iv a d o s P e r s p e c t iv a P e r s p e c t iv a
HUMANA CIDADÃOS ECOLÓGICA ECOUÔMKA \
T rá fe g o Fluidez 0 ,0 5 0 ,1 5 0 ,0 5 0 ,2 5
S e g u ra n ç a 0 ,1 5 0,01 0 ,0 5 0 ,1 5
D e s e n v o lv im e n to u r b a n o Im p a c to s lo ca is e re g io n a is 0 ,1 5 0,11 0 ,1 5 0 ,1 4
E c o n o m ia Im p a c to s d ir e to s e in d ir e to s 0 ,1 0 0 ,1 5 0,10 0 ,4 0
M e io a m b ie n t e Q u a lid a d e do ar 0 ,1 3 0 ,1 0 0 ,1 0 0,01
Á g u a e s olo 0 ,0 5 0,01 0 ,1 5 0,01
E c o lo g ia 0 ,0 5 - 0 ,2 2 0 ,1 5 0,01
S e g u ra n ç a e x te rn a 0 ,1 3 0,01 0 ,0 5 0,01
Q u a lid a d e da p a is a g e m 0 ,0 5 0,01 0 ,1 5 0,01
R uído e v ib r a ç ã o 0 ,1 4 0 ,2 3 0 ,0 5 0,01
o ta l 1,00 1,00 1,00 1,00
zonte: S to p e t al. (2002).
306 aliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Os pesos constantes no Quadro 11.7 foram multiplicados, para cada variante, pelo
valor atribuído a cada impacto, dentro de um a escala predeterm inada, resultando
nos e s c o re s totais que podem ser vistos no Quadro 11.8. P reviam ente foi empregado
o seguinte procedim ento: para atribu ir um valor a cada impacto, 17 impactos foram
ordenados segundo sua im po rtância entre 1 e 17; para cada u m a das seis alternativas,
esses impactos receberam um a nota v arian d o entre -2 e +2, nota esta que foi m ultipli­
cada por seu núm ero de ordem, resultando em um escore total para cada alternativa,
dado pela som a do produto de cada nota pelo núm ero de ordem. 0 resultado mostra
que a m elhor alternativa sob o ponto de vista técnico-econôm ico não é a m elhor sob
o ponto de v ista ecológico, que, por sua vez, coincide com os pontos de vista hum ano
e dos cidadãos. A alternativa preferida por esses últim os está longe da m elhor sob a
perspectiva técnico-econôm ica, mas ainda é positiva sob a perspectiva econômica.

Q u a d r o 1 1 .8 R e s u lta d o s de a n á lis e p o r c rité rio s m ú ltip lo s de a lte rn a tiv a s de u m p ro je to


ro d o v iá rio n a H o la n d a
V a r ia n t e P e r s p e c t iv a P e r s p e c t iv a d o s P e r s p e c t iv a P e r s p e c t iv a
humana c id a d ã o s e c o l ó g ic a e c o n ô m ic a

A1 m á x + 0 ,0 3 + 0 ,1 4 + 0,03 + 0 ,2 9
A1 m ín + 0 ,0 8 + 0 ,1 9 + 0 ,0 5 + 0 ,2 4
( m e lh o r) (m e lh o r) (m e lh o r)
A2 máx - 0,11 -0 ,0 9 -0 ,2 6 + 0 ,2 3
(pior) (pior) (pior)
A 2 m ín -0 ,0 4 + 0 ,0 5 -0 ,1 9 + 0 ,3 8
A3 m áx - 0,01 -0 ,0 2 -0 ,3 5 + 0 ,4 9
(pior) (m e lh o r)
A 3 m ín + 0,01 -0 ,0 8 -0 ,2 7 + 0 ,4 8
F onte: S to p e t al. (2002).

Na com paração de 17 alternativas de disposição de sedim entos a serem dragados do


canal de acesso ao term in al po rtu ário da usina siderúrgica Cosipa, no estuário de
Santos, Estado de São Paulo, foi m ontado um esquem a de pontuação que levou em
conta fatores am bientais, operacionais e econômicos. Segundo o EIA3 (p. 34), “devi­
2Consultoria do às m uitas possibilidades e variáveis inerentes a cada parâm etro ou alternativa,
Paulista de Estudos as pontuações foram estabelecidas segundo faixas de variação, as quais aum entam
Ambientais S/C
exponencialm ente p ara representar, de forma ponderada, o peso ou a im portância do
Ltda, Estudo de
Impacto Ambiental, grau atribuído ao p arâm etro analisado. Sua distribuição foi estabelecida a p a rtir de
Dragagem do Canal progressões geométricas de razão (q) = 2; 2,5; 5; 10; 25; 50 ou 100, para diferenciar
de Piaçaguera e de forma m ais enfática e significativa a im portância do p a râ m e tro ”.
Gerenciamento
dos Passivos Foram escolhidos p arâm etros relativos aos im pactos sobre os meios físico, biótico,
Ambientais,
“socioeconômico e do patrim ônio arqueológico e paisagístico”, classificados quanto
Cosipa, 2005.
à sua duração, reversibilidade, m agnitude, relevância/significância e abrangência,
conform e os seguintes graus e pontuações:
* duração: temporário = 1; perm anente = 25
* reversibilidade: reversível = 1; irreversível = 50
# m agnitude: pequena = 1; média = 25; grande = 50
V relevância/significância: baixa = 1; média = 50; alta = 100
■ * v

abrangência: interna à empresa = 1; externa à empresa = 25


> • <

CAPITU
A v a l ia ç ã o d a I m p o r t â n c ia do s I m p a 307

Foram tam bém escolhidos parâm etros operacionais e econômicos com a seguinte
pontuação:
% negociações com terceiros: necessárias = 1; não necessárias = 50
* interferência com navegação: alta = 1; média = 10; grande = 25
custos: baixos = 1; médios = 5; altos = 10
A *»-

tecnologia: disponível = 1; i n d i s p o n í v e l = 100


capacitação: plena = 1; parcial = 50; nula = 100
-» * V

reaplicação futura: possível = 1; parcial = 10; impossível = 25

I c Tinido este critério, cada alternativa recebeu um a nota, dada pela som a dos p o n t o s
correspondentes (denominada ZaitJ* As pontuações finais foram ordenadas de forma
crescente (Quadro 11.9), da alternativa mais favorável para a menos favorável. Em
seguida, foi calculado um fator de relação {K) p ara cada alternativa, dado pela razão
entre a pontuação total de cada um a delas (ZaitJ e a pontuação da alternativa mais
favorável (Zait. mín)> Que é a disposição oceânica de sedimentos não contaminados.
Por fim, esse fator foi transform ado em um índice de desempenho (Id), dado pela
relação 1/R, que representa um a proporcionalidade entre as alternativas. A pontuação
obtida para um a das alternativas, a disposição em cava submersa, é mostrada no
Quadro 11.10.

Q u a d r o 11.9 C o m p a ra ç ã o de a lte rn a tiv a s p a ra d is p o s iç ã o de s e d im e n to s d ra g a d o s


A l t e r n a t iv a P o n tu a ç ã o F a t o r de Ín d ic e de
to ta l (Xalt) r e la ç ã o d esem p enho
(R = Xalt/Xalt.mín) (Id = 1/R)
1. D isposição de s e d im e n to s não c o n ta m in a d o s em área o c e â n ic a 152 1,00 1,00
2. D iqu e do Canal C 153 1,01 0 ,9 9
3. D ique do F u ra d in h o 190 1,25 0 ,8 0
4. Cava c o n fin a d a no Largo do Casüjueiro 195 1,28 0 ,7 8
5. Cava c o n fin a d a no Largo do C u b a tã o 203 1,34 0 ,7 5
6. Cava c o n fin a d a no Largo do Canéu 244 1,61 0,62
7. Cava subm ersa no Canal de Piaçagüera 255 1,68 0 ,6 0
8. In c in e ra ç ã o 754 4 ,9 6 0 ,2 0
9. C o p ro c e s s a m e n to em fo rn o s de c im e n t o 827 5 ,4 4 0 ,18
10. In c o rp o ra ç ã o dos s e d im e n to s em processo in d u s tria l 951 6 ,2 6 0 ,1 6
11. Cavas c ria d a s pela m in e ra ç ã o 1.138 7,49 0,13
12. A te rro s in d u s tria is classe 1 1.238 8 ,1 4 0 ,1 2 3
13. E n c a p s u la m e n to 1.240 8 ,1 6 0 ,1 2 2
14. T r a ta m e n to q u ím ic o 1.313 8 ,6 4 0,116
15. B io rre m e d ia ç ã o 1.313 8 ,6 4 0,116
16. Reúso do m a te r ia l d ra g a d o 1.338 8 ,8 0 0,11 4
Fonte: C o n su lto ria P au lista de Estudos A m b ie n ta is S/C Ltda. E studo de Im p a c to A m b ie n ta l, D ragagem do C anal de P ia çag üera e
G e ren cia m e nto dos Passivos A m b ie n ta is, Cosipa, 2 0 0 5 .

Note que esquemas de análises por critérios múltiplos similares ao empregado neste
último caso são, de longe, mais com uns que o trabalho desenvolvido na Holanda por
Stolp et al. (2002), que apresenta um a discussão mais sofisticada e que reconhece os

0
308 ia Iiação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

r f

Q u a d ro 11.10 Pontuação para a alternativa "cava submersa no canal de Piaçaguera


T ransporte

R e v e r s ib il id a d e
R e v e r s ib il id a d e

R e v e r s ib il id a d e

M a g n it u d e

R e l e v â n c ia
M a g n it u d e

R e l e v â n c ia
M a g n it u d e

R e l e v â n c ia

D uração
D uração
D uração
H id ro lo g ia e d in â m ic a — — _ —
1 1 1 1 4
s u p e rficia l
8 H id ro d in â m ic a 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 12
*u- G eotecnica 1 1 1 1 - - — - 4
O
5V‘ *. ,j í ; *'

A q ü ífe ro s _ ~ — -
__
1 1 1 1 4
Corpos d'água 1 1 25 1 - - - - 1 1 25 50 105
A tm o s fe ra 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 12

yf— A v ifa u n a 1 1 1 1 - — — - 1 1 1 1 8
O
“ Fauna a q u á tic a 1 1 1 1 — — — —
1 1 25 1 32
lZj
^ Flora — — - - * -

| Pesca - - - - - - — — — — -

| Saúde pública - - — - - - — - — — — — —

o Vias p ú blicas — — — — — - - - — — _ — —

CJ
$ N egociações 1 1
P a trim ô n io a rq u e o ló g ic o e — — «.» •— «— m
mm _ — mmm

paisagístico
A b ra n g ê n c ia 1 1
N avegação 10 1 25 26
Custos 5 5 10 20
Tecnologia 1 1 1 3

C a pa citação 1 1 1 3

Reaplicação 10 10
TOTAL 225
Fonte: C onsultoria P aulista de Estudos A m b ie n ta is S/C Ltda. Estudo de Im p a c to A m b ie n ta l, D ragagem do Canal de P iaçagüera e
G erenciam ento dos Passivos A m bie nta is, Cosipa, 2 0 0 5 .

conflitos inerentes a toda atribuição de valor, ao passo que a análise por critérios
múltiplos “tradicional” pressupõe ou tenta formar um consenso — o critério de ava­
liação — que na sociedade só existe raramente.

S is t e m a s de in f o r m a ç ã o g e o g r á f ic a n a a n á l is e de a l t e r n a t iv a s
0 uso cada vez mais difundido dos sistemas de informação geográfica (SIG) no plane­
jam ento de projetos e na avaliação de impacto ambiental pode trazer embutida a
utilização de critérios arbitrários de atribuição de importância às diferentes variáveis
mapeadas. 0 mesmo exemplo simplista citado no início desta seção, das opções de
traçado rodoviário que podem afetar uma área de vegetação nativa ou um bairro
rural, pode ser novamente citado: na escolha do traçado que menor interferência

CAPITU
A valiação da Importância dos I m p a J J 309

causa nos atributos am bientais escolhidos é preciso dar um peso a cada um desses
atributos (o próprio uso de pesos idênticos já é um critério que deveria ser explícito),
mas diferentes grupos de interesse podem atribyir pesos diferentes a u m a mesma lista
de atributos.

Xa seleção de traçados de projetos lineares é comum a elaboração de mapas temáticos


como vegetação, declividade do terreno, hidrografia e outros), seguida por sua
superposição, com o intuito de determ in ar o m elhor traçado sob o ponto de vista
ambiental. Segundo o procedim ento adotado, a cada tema pode ser atribuído um peso.
Por exemplo, a distância de nascentes e de cursos d’água pode ser escalonada em duas
ou três zonas na qual pode ser dividido um mapa temático de hidrografia - assim,
distâncias inferiores a 50 m poderão ter peso 1; distâncias entre 50 e 100 m, peso 2;
e distâncias maiores, peso 3. Os diversos atributos são depois combinados. Assim, o
Traçado ideal de um gasoduto poderia ser aquele mais distante dos cursos d’água e
das zonas urbanas, ao mesmo tem po que evite fragm entos de vegetação nativa, zonas
de alta declividade ou de alta suscetibilidade à erosão ou que cruze o m enor núm ero
possível de cursos d’água. Raram ente haverá coincidência total (“u n a n im id a d e ”) na
aplicação dos critérios para seleção da rota e, por isso, é necessário arbitrar pesos que
possam atender a diferentes interesses.

Como pode haver discordância na alocação dos pesos, é conveniente que estes sejam
clara e explicitam ente expostos no EIA. A discordância pode dar-se entre a equipe
m ultidisciplinar que elaborou o EIA e a equipe de análise técnica, ou com terceiros,
como ONGs e consultores de associações. Uma situação como esta ocorreu na discus­
são pública de um projeto de duto de derivados de petróleo de São Paulo a Brasília.
Para avaliação am biental do projeto, foram feitas cartas tem áticas e um a divisão da
área de estudo em células quadradas de 2,5 km de lado, na qual foram identificados os
componentes am bientais mais relevantes (Ibrahim, Bartalini e Iram ina, 1995). Foram
selecionados onze temas, visto que cada um recebeu um peso entre 0 e 10. Para cada
xema, foram definidas classes que designam características am bientais que poderiam
ser afetadas pelo em preendim ento, às quais tam bém se atribuíram pesos entre 0 e 10,
este últim o valor representando a m aior fragilidade do ambiente diante do projeto.
Cada célula de 2,5 km de lado apresentava um a única classe para cada um dos temas,
o que configura um a escala pouco detalhada de análise4. Em seguida, foi estimado
o “grau de incom patibilidade” de cada quadrícula p ara receber o em preendim ento 4Como discutido
proposto, dado pela somatória da multiplicação dos pesos de cada tem a pelo peso de na seção 9.4, João
(2002) mostrou que
cada classe, em cada quadrícula. Desta forma, obtém-se o m elhor traçado possível,
a escala adotada
que é dado pela seqüência de quadrículas com o m enor grau de incompatibilidade. afeta os resultados
da análise dos
Como se pode observar, os resultados da aplicação desse procedim ento dependem de impactos, pois
ij escala adotada (o ta m a n h o da quadrícula); (ii) a acurácia das inform ações tem á­ uma unidade de
terreno com 625 ha
ticas de cada quadrícula; (iii) a escolha dos tem as e a escolha das classes dentro de
(2,5 km x 2,5 km)
cada tema; (iv) os pesos atribuídos a cada tem a e a cada classe; (v) os critérios de
pode ter diferentes
combinação dos atributos. M udando-se cada um desses cinco itens, os resultados classes de uso do
podem ser diferentes. solo, de distâncias
a cursos d’água e
Souza (2000) refez o trabalho do EIA do poliduto para um pequeno trecho, utilizando demais atributos.
um SIG e modificando o ta m a n h o das quadrículas, e obteve um traçado diferente do
310 ^ ^ a l i a ç ã o de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

originalm ente proposto. Ademais, esse autor questionou o local selecionado para a
instalação de um a base de distribuição de combustíveis (uma das “saídas” do duto ao
longo de seu percurso), mostrando que a alternativa escolhida não levou em conta o
grau de incompatibilidade da área e teve o efeito de induzir o traçado do duto sobre
quadrículas de baixa compatibilidade; ao contrário, “a definição prem atura da [lo­
calização da] base implicou, nesse caso, em um traçado que se desvia das células ou
pixels que representam menos impactos ambientais, favorecendo interesses do em­
preendedor que j á era proprietário da área em questão, em detrimento da definição
do melhor traçado am biental” (p. 84).

Esse caso aconteceu entre 1991 e 1994; o Departamento de Avaliação de Impac­


to Ambiental da Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo emitiu um
parecer favorável ao projeto, recomendando ao Consema a aprovação do traçado
proposto. Entretanto, a intervenção de um a ONG, questionando o traçado escolhido
e a localização dessa base de distribuição (em Ribeirão Preto), convenceu os conse­
lheiros do Consema a determ inar que o empreendedor (Petrobras) apresentasse um a
complementação “no que diz respeito ao traçado dos dutos, à localização da base de
arm azenam ento e distribuição”. “A partir de então, segundo depoimentos, a empresa
deixou de tentar influenciar a escolha do traçado e a localização das bases, retirando,
inclusive, as restrições técnicas que antes'im punha, e passando a decisão quase que
inteiramente para a consultora” (Ibrahim, Bartalini e Iramina, 1995, p. 40).

W arner e Diab (2002) utilizaram um SIG para escolher o melhor traçado para uma
linha de transm issão na Africa do Sul. Foram selecionados oito temas, os quais
tiveram sua im portância relativa determ inada por meio de comparações de pares, |
respondendo a perguntas como; quanto mais im portante é um tem a (como recursos
culturais) que outro? (por exemplo, uso do solo), um procedimento “subjetivo, porém
quantificado de modo transparente, tornando-o disponível para debate e possível
modificação” (p. 42). Cada tema é dividido em fatores (ou subtemas) e cada um recebe,
também, um peso. Cada fator é, então, multiplicado por seu peso e os resultados são
somados para dar a “adequabilidade” de cada quadrícula em que é dividida a área
de estudo. Naturalm ente é preciso dispor de mapas em escala adequada (neste caso,
1:10.000), de imagens aéreas (neste caso, fotos) e de dados de campo, compilados ou
produzidos durante os estudos de base.

Como no caso do poliduto, o estudo de W arner e Diab (2002) tam bém foi feito após a |
conclusão do EIA e chegou a conclusões diferentes, pois usou critérios de avaliação
distintos. Uma vantagem do uso do SIG, apontada pelos autores, é a possibilidade de
sim ular diversos cenários e v ariar os pesos, simulando a valoração que diferentes
interessados podem dar aos atributos considerados (temas e subtemas). Uma vez u l­
trapassada a etapa inicial de m ontar as bases de dados georrefereneiadas e preparar
os mapas para os vários temas, o SIG permite simulações rápidas.

C omparação q u a l it a t iv a
0 reconhecimento da inevitável subjetividade na comparação de alternativas e de que
a classificação da im portância dos impactos depende de um a escala de valores leva
ao uso de procedimentos ainda mais simples e exclusivamente qualitativos. André

_____________________________________________ I
CAPÍTUlSl
A v a l i a ç ã o d a I m p o r t â n c ia d o s I m p a m B M 311

et al. (2003, p. 273) argum entam que a simples apresentação da informação na forma
de um quadro comparativo facilita uma tomada de decisões e a escolha entre as alter­
nativas; diante de um quadro sinóptico, cada um avalia a situação utilizando seus
próprios critérios ou seus próprios pesos, como em qualquer decisão que as pessoas
tomam em suas próprias vida.

Uma comparação entre 0 estado de conservação de duas microbacias hidrográficas


situadas na zona de ocorrência de cerrados no interior do Estado de São Paulo foi fei­
ta para selecionar a localização de um a usina de beneficiamento de areia industrial,
proposta para ser construída junto a um a nova mina (Quadro 11.11). Dois locais foram
pré-selecionados pelo critério de proximidade da futura mina, mas cada um estava
situado nas cabeceiras de diferentes microbacias hidrográficas. Para fins de compa­
ração, e como um dos impactos era 0 risco de degradação da qualidade das águas,
foram desenvolvidos índices que pudessem descrever 0 estado de conservação de cada
microbacia, pressupondo que a melhor localização deveria corresponder àquela que
estivesse mais alterada em decorrência do histórico agrícola de uso do solo. Com 0
emprego de mapas em escala 1:10.000 e de fotografias aéreas, os índices foram calcu­
lados para cada microbacia e tabulados, para efeitos de comparação. 0 Quadro 11.11
mostra que a bacia do córrego Bocaina se encontra em estado de conservação ligei­
ramente melhor, sendo recomendada a instalação da usina na outra bacia. Note que
esses índices representam as características naturais e os tipos de intervenção mais
característicos dessa área de estudo, podendo não ser os mais apropriados para um
trabalho semelhante em outro local.

Q uad ro 11.11 índices do estado de conservação dos hábitats de duas microbacias


M ic r o b a c ia
B o c a in a S em N ome

Relação e n tre área de m a ta c ilia r e área to t a l da bacia 4 r640/o 4,23o/o


Relação e n tre área de m a ta c ilia r e c o m p r im e n to do ta lv e g u e 9 ,7 4 h a /k m 6 ,3 3 h a /k m
Relação e n tre área de v e g e ta ç ã o na tiva e área t o t a l da bacia 12,10/0 18 ,00/0

M úm ero de b a rra m e n to s p o r km lin e a r de ta lv e g u e 0,9 1,6


Área in u n d a d a por b a rra m e n to s por km lin e a r de ta lv e g u e 0 ,0 7 5 h a /k m 0 ,8 6 2 h a /k m
Área in u n d a d a por b a rra m e n to s por m e tro lin e a r de ta lv e g u e 0 ,7 5 m 2/m 8 ,6 2 5 m 2/m
w

Area in u n d a d a por b a rra m e n to s em relação à área to t a l 0,04o/o 0,580/o


M argen s p ro te g id a s p o r v e g e ta ç ã o n a tiv a em relação ao c o m p r im e n to do ta lv e g u e 840/o 50°/o
Fonte: Prom iner Projetos S/C Ltda. Estudo Com parativo de A lternativas Locacionais do Projeto Fartura, M ineração Jundu Ltda.,
2001
..

u.
M

A nálise de
risco

12
aliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Muitos dos impactos negativos considerados na avaliação de impacto ambiental


somente se manifestam em caso de funcionamento anormal do empreendimento ana­
lisado. Por exemplo, durante a operação de um duto de petróleo, não se espera que 05
cursos d’água atravessados venham a ser poluídos com o produto transportado, e c
aspecto ambiental “emissão de óleo” normalmente não faz parte dos problemas iden­
tificados. No entanto, se 0 duto se romper, 0 petróleo poderá contam inar o solo e : 5
recursos hídricos superficiais e subterrâneos, sendo pertinente identificar o aspec::
ambiental “risco de vazamento de petróleo”. De modo análogo, se a barreira imper­
meável instalada na base de um aterro de resíduos sólidos apresentar problemas, z
água subterrânea poderá ser poluída, mas, se a barreira funcionar adequadam em t
não se esperam problemas com a qualidade das águas. ;

Perguntas do tipo “0 que aconteceria se...” são muitas vezes feitas ao se analisar 1
viabilidade ambiental de um projeto. Os resultados do mau funcionamento do em­
preendimento podem ser mais significativos do que os impactos decorrentes de se.
funcionamento normal. São situações que tipificam risco ambiental.

Podem ser muito graves as conseqüências de eventos como explosão em um a indústri;


química, vazamento de petróleo em um oleoduto ou a ruptura de um a barragem. I
risco ligado a tais acidentes tecnológicos é, legitimamente, uma preocupação a st*
levada em conta na análise dos impactos ambientais desses empreendimentos. Ne
dia 10 de julho de 1976, em um a indústria química situada na localidade de Seves :
norte da Itália, rompeu-se uma válvula de um vaso de pressão contendo solvente,
organoclorados; um a nuvem de gases elevou-se a 50 m de altura e foi dispersa p e l : :
ventos, espalhando dioxina em um a zona de 1.430 ha e obrigando à evacuação c:_
moradores (Alloway e Ayres, 1993).

Outros riscos são menos evidentes. Por exemplo, a emissão de efluentes líquid:.
contendo metais pesados ou determinados compostos orgânicos pode represem: -
um a situação de risco, na medida em que esses poluentes poderão acumular-se mr
certos compartimentos do meio físico (como sedimentos ou água subterrânea) e tzr
certos componentes da biota e, em decorrência, causar danos à flora, à fauna e à s=_-
/

de humana. E 0 caso do tristemente célebre evento de Minamata, assim denomina: -


quando foi identificada, a partir do final dos anos 1950, a relação de causa e efex:
entre as emissões de mercúrio contido nos efluentes de um a indústria química e um:
doença degenerativa do sistema nervoso central que atacou um a comunidade de pes­
cadores na baía de Minamata, Japão.

Lançados diretamente na pequena e bem abrigada baía, os efluentes continham


mercúrio, usado como catalisador no processo de produção de cloreto de vinila, ma­
téria-prima para a fabricação de cloreto de polivinila, 0 PVC. Por intermédio úrj
mecanismos hoje bem estudados, mas virtualm ente desconhecidos na época, 0 merc _-
rio metálico transform a-se em metil-mercúrio, composto absorvido pelos organism is
que arm azenam e concentram 0 metal. As características geomorfológicas da baía dt
M inamata tornam muito baixa a dispersão de poluentes (Ellis, 1989), favorecendo s - i
absorção por moluscos, crustáceos e peixes, importantes fontes alimentares da eom_-
nidade de pescadores. Até 1975, 899 pessoas foram oficialmente reconhecidas coraj

CAPÍTU
A n á lis e de 315

afetadas pela doença de Minamata, das quais 143 haviam morrido em conseqüência;
outras 3.454 ainda estavam sendo avaliadas clinicamente. Uma decisão judicial de
1973 condenou a empresa a pagar 0 equivalente a US$ 35 milhões em indenizações
às famílias de 112 vítimas.

Também a emissão contínua de poluentes do ar representa situações reconhecidas


de risco à saúde. Por exemplo, a incineração de resíduos sólidos resulta na emissão
de uma certa quantidade de poluentes ao ar, mesmo com a utilização de sistemas de
controle e abatimento das emissões. Alguns desses poluentes são particularmente
perigosos, devido aos seus possíveis efeitos sobre a saúde humana. É 0 caso do grupo
de substâncias químicas conhecido como dioxinas e furanos, reconhecidos como
carcinogênicos, ou seja, substâncias que têm 0 potencial de causar câncer. Desta
forma, a população que vive nas imediações de incineradores ou de outras fontes de
poluição do ar está exposta ao risco de contrair doenças do aparelho respiratório, ou
mesmo câncer, devido à presença de poluentes no ar. Trata-se, como no caso do mer­
cúrio, de riscos crônicos, ao contrário daqueles decorrentes do mau funcionamento de
um sistema tecnológico, que são riscos agudos.

Para dois tipos de riscos — agudos e crônicos —, há duas famílias de análise de


risco, um a voltada para a análise de situações agudas, como os acidentes industriais
ampliados, e outra para situações crônicas, como a exposição da população a agentes
físicos (como 0 ruído) ou químicos (como substâncias químicas presentes em águas
subterrâneas utilizadas para abastecimento doméstico). Kolluru (1993, p. 327) prefere
dividir a análise de risco em três classes: (1) análise de segurança (avaliação de risco
probabilística e quantitativa), (2) avaliação de riscos à saúde, (3) avaliação de risco
ecológico. Embora 0 conceito subjacente de risco seja 0 mesmo, as características de
cada situação são tão diferentes quç levaram ao desenvolvimento de diferentes ferra­
mentas. A análise dos riscos tecnológicos será privilegiada aqui, pois guarda mais
proximidade com a avaliação de impacto ambiental.

12.1 T ip o s de r is c o s a m b i e n t a i s
São muitas as classificações possíveis para os chamados “riscos ambientais”. Tecno­
lógicos ou naturais, agudos ou crônicos são algumas das categorias utilizadas para
descrever diferentes tipos de riscos. Seu reconhecimento necessita de um a definição
prévia de qual tipo de risco se pretende identificar.

A Fig. 12.1 mostra um a possível classificação dos riscos ambientais. Dentre os


chamados “naturais” figuram (i) riscos de origem atmosférica, ou seja, aqueles oriun­
dos de processos e fenômenos meteorológicos e climáticos que têm lugar na atmosfera,
incluindo os de temporalidade curta (como tornados, trombas d’água, granizo, raios
exc.) e os de temporalidade longa (como secas); (ii) riscos associados aos processos
e fenômenos hidrológicos, como inundações; (iii) riscos geológicos, que podem ser
subdivididos nos que têm origem em processos endógenos, como sismos e atividade
vulcânica, e nos de origem exógena, como escorregamentos, subsidências e processos
erosivos e de assoreamento; (iv) riscos biológicos, relativos à atuação de agentes v i­
vos, como organismos patogênicos; e (v) riscos siderais, ou seja, que têm origem fora
do planeta, como a queda de meteoritos. Note-se que, na caracterização de situações

D
a .ia ç ã o de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

de risco natural, deve-se sempre levar em conta a ação c:


homem como agente deflagrador ou acelerador de processe:
Riscos a m b ie n ta is
naturais. Por exemplo, inundações são fenômenos naturais l i
Riscos N a tu ra is maior parte do planeta, mas sua intensidade e frequência sã:
A tm o sfé rico s aumentadas devido às ações antrópicas, como desmatamenr:
H idrológicos
e impermeabilização do solo.
G eológicos
B iológicos
Siderais Já os riscos tecnológicos são aqueles cuja origem está direiE-
mente ligada à ação hum ana. Incluem-se os riscos de acidente:
Riscos Tecnológicos tecnológicos (explosões, vazamentos etc.) e os riscos à saúzt
Agudos
(humana ou dos ecossistemas) causados por diferentes açõe:
Crônicos
antrópicas, como a utilização ou liberação de substânci:
químicas, de radiações ionizantes e de organismos genetic:
Fig.12.1 Uma tip o lo g ia de riscos a m bien tais mente modificados. As atividades de risco são chamadas i t
perigosas, e incluem, dentre aquelas capazes de causar dan>:
ambiental, muitas atividades industriais, o transporte e o ar­
mazenamento de produtos químicos, o lançamento de poluentes ou a m anipulaçi:
genética. Essas situações podem acarretar danos materiais, danos aos ecossistem
ou danos à saúde do homem - e não raro ocorrem os três tipos de danos.

0 reconhecimento de um a situação de risco depende de inúmeros fatores, den


os quais inclui-se o tipo de risco. No âmbito dos riscos tecnológicos, é mais fácL
reconhecer um risco agudo do que um risco crônico. Tal situação decorre primordial­
mente do fato de que, no primeiro caso, há facilidade em se estabelecer um a relaçã
entre causa e efeito, o que não ocorre na maioria das situações de risco crônic:
Ademais, o efeito é imediato, enquanto nos casos de risco crônico, como o nome diz
manifesta-se a médio ou longo prazo.

O vazamento de petróleo de um duto ou um navio traz efeitos imediatos e visíveis


ao passo que a liberação contínua de pequenas quantidades de poluentes pode nâ:
só trazer efeitos a longo prazo, mas também tornar incerta a conexão entre causa :
efeito. Em tal situação, o reconhecimento das situações de risco é mais difícil.

Em avaliação de impacto ambiental, a preocupação com o risco normalmente s-


refere a riscos tecnológicos; dentro destes, são os riscos agudos os que mais chamam
a atenção. No entanto, em muitos casos, riscos crônicos podem ser mais significativ::
que os agudos, como no exemplo do incinerador, caso em que, embora possa haver
perigos como explosões ou vazamento de substâncias, são os eventuais danos à saúde
que podem se manifestar a longo prazo, constituindo grande fonte de preocupaçã:
e, frequentemente, de polêmica. Por sua vez, os estudos ambientais também podem
tratar das modificações de processos naturais que resultem em um aumento de riso
como um a rodovia, que aumenta riscos geológicos de escorregamentos, ou a canali­
zação de um rio, que aumenta os riscos de inundação.

12.2 U m LONGO HISTÓRICO DE ACIDENTES TECNOLÓGICOS


Há diversas razões para considerar o risco de acidentes na avaliação dos impact::
ambientais de certos tipos de empreendimentos: as conseqüências de um aciderz

CAPITU
A n á l is e de

podem representar impactos am bientais significativos, mesmo que sua operação


norm al não os cause, e há um longo histórico de acidentes industriais. Os Quadros
12.1 e 12.2 m ostram alguns dos mais relevantes acidentes industriais in tern acio ­
nais de grandes conseqüências, e acidentes envolvendo barragens, ilustrando a
multiplicidade de situações de risco. Trata-se, em sua maior parte, de acidentes ca­
tastróficos, pela m agnitude de seus efeitos, aos quais deve-se acrescentar m ilhares
de acidentes de menores proporções e conseqüências, como os freqüentes vazam entos
de combustíveis e produtos químicos.

Lagadec (1981), um dos primeiros estudiosos a an a lisar em profundidade a multipli­


cação dos acidentes tecnológicos, fala na “descoberta do risco tecnológico m aior”,
surpreendentem ente tardia, e cita como marco dos estudos de perigos um lev an ta­
mento feito em 1978 na zona de Canvey Island, situada no estuário do rio Tâmisa, que
concentrava diversas instalações de arm azenam ento e processamento de produtos
químicos e hidrocarbonetos.

Um im portante grupo de pessoas expostas aos riscos são os trabalhadores das in sta ­
lações perigosas. São tam bém aquelas diretam ente envolvidas com a prevenção de
riscos. Por isso, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) negociou um docu­
mento sobre a Prevenção de Acidentes Industriais Ampliados denom inado Convênio
174, que tra z um a definição de acidente tecnológico ampliado:

Todo acontecimento repentino, como uma emissão, um incêndio ou uma explosão


de grande magnitude, no curso de uma atividade dentro de uma instalação
exposta aos riscos de acidentes ampliados, em que estão implicadas uma ou várias
substâncias perigosas e que exponha os trabalhadores, a população ou o meio
ambiente a um perigo grave, imediato ou retardado (Convênio OIT 174, 1993).

Há um a preocupação, justificada, com os “acidentes tecnológicos ampliados”, às vezes


chamados de acidentes “maiores” (major technological accidents), especialmente q u a n ­
to à proteção de vidas hum anas. No entanto, muitos acidentes menores, incidentes ou
"quase acidentes” ocorrem com maior frequência, e seus efeitos cumulativos sobre o
ambiente podem ser significativos — basta pensar em um a sucessão de vazam entos de
petróleo em um estuário ou em um a seqüência de liberações acidentais de efluentes de
uma indústria de celulose.

No Estado de São Paulo, um sistema de atendim ento a acidentes am bientais foi


implantado em 1978 e, até o final de 2002, havia atendido cerca de 5 mil ocorrên­
cias. As situações mais com uns (com 36% dos casos) são as de vazam ento de líquidos
principalm ente combustíveis) em acidentes rodoviários, seguida de vazam entos de
combustíveis em postos de abastecimento, com 10% dos casos registrados. Somente
7% dos casos atendidos ocorreram em indústrias, enquanto apenas 3% deles se re­
ferem a vazam entos em locais de arm azenam ento de substâncias químicas. Deve-se
registrar, no entanto, que essa base de dados - o Cadastro de Acidentes Am bientais —
:em diversas lacunas, principalm ente o excessivo núm ero de ocorrências de causa
iesconhecida. Ademais, tais casos perfazem somente aqueles atendidos pela Cetesb
ou a ela comunicados, e não incluem, portanto, as situações de emergência ambiental
atendidas pelas próprias empresas. 0 que deve ser ressaltado é que a ocorrência de
a lia ç ã o d e Im p a c to A m b ie n t a l: c o n c e ito s e m é to d o s

Q u ad ro 12.1 A lg u n s a c id e n te s in d u s tria is de g ra n d e s conse q ü ê n cia s a m b ie n ta is


D ata Q B I Ev e n t o
1 de ju n h o F lixb o ro u g h , Explosão de um a nu ve m de 40 a 50 t de 28 m o rto s, 89 feridos, 2 .4 5 0 casas
de 19 7 4 UK c ic lo h e x a n o em um a in d ú s tria q u ím ic a a fe ta d a s 1
10 de ju lh o Seveso, Itália V a z a m e n to de te tra c lo ro d ib e n z o d io x in a 7 3 6 pessoas evacuadas, 190
de 1 9 7 6 in to x ic a d a s 2
16 de m arço Costa da B re ta ­ V a z a m e n to do p e tro le iro A m o e o -C a d iz 3 0 m il aves m o rta s e 2 3 0 m il peixes
de 1978 nha, França (2 2 3 .0 0 0 t) e fr u to s do m a r3
28 de m arço Pensilvânia, A m e aça de fu g a de ra d io a tiv id a d e em 2 5 0 m il pessoas evacuadas
de 1979 EUA Three M ile Island nu m raio de 8 k m 4
10 de n o v e m b ro Mississauga, D e s c a rrila m e n to de dois vagões seguido 2 4 0 m il pessoas e vacu ada s5
de 1979 Canadá de explosões
2 5 de fe v e re iro C ubatão, Brasil V a z a m e n to de ~ 7 0 0 . 0 0 0 1 de gasolina 93 m orto s, 4 m il fe rid o s 6
de 1 9 8 4 de um d u to segu ido de in c ê n d io
19 de n o v e m b ro Cidade do Explosão de gás n a tu ra l 4 5 2 m orto s, 4 .2 5 8 fe rid o s
de 1 9 8 4 M é x ic o , M é x ic o 31 m il e va c u a d o s 7
2 de de ze m b ro Bhopal, India V a z a m e n to de is o c ia n a to de m e tila 1.762 m orto s, 60 m il pessoas
de 1 9 8 4 in to x ic a d a s 8
Jane iro de C ubatão, Brasil V a z a m e n to de d u to de a m ô n ia 6 m il pessoas evacuadas,
1985 65 h o s p ita liz a d a s 9
2 6 de abril Tchernobil, V a z a m e n to de ra d io a tiv id a d e 32 m orto s, 135 m il e v a c u a d o s 10
de 19 8 6 Ucrânia
6 de ju lh o Basiléia, Suíça V a z a m e n to de a g ro tó x ic o s C o n ta m in a ç ã o do rio R eno11
de1988
2 4 de m a rço Alasca, EUA V a z a m e n to do p e tro le iro E xxon-V alde z 1.000 km de costa poluída, m ais de
de 1989 3 5 m il aves m o r ta s 12
11 de ju lh o H a m ilto n , Incênd io em fá b ric a de plásticos 6 5 0 pessoas e va c u a d a s 13
de 1997 Canadá
18 de ja n e iro Duque de V a z a m e n to de 1 .3 0 0 .0 0 í de óleo C o n ta m in a ç ã o de praias, m angues,
de 2000 Caxias, Brasil co m b u s tív e l de um d u to na baía da danos à pesca e ao tu r is m o 14
G uanabara

acidentes e disfunções em sistemas tecnológicos não representa situação m eram er/t


fortuita ou ocasional, mas faz parte dos cenários usuais de funcionamento de indús­
trias, sistemas de transporte e inúmeras outras atividades, ainda que se trate i t
'A Diretiva situações anômalas ou atípicas. Desta forma, esse tipo de situação deve ser objev.
Europeia 96/82/CE, de programas específicos de gerenciamento, incluindo aspectos preventivos e corre­
de 9 de dezembro tivos. Na medida em que acidentes tecnológicos resultam em potenciais de im pact::
de 1996, conhecida
ambientais significativos, esses impactos devem ser identificados e analisados n©
como “Seveso I I ”,
processo de AIA.
define perigo como
“a propriedade
intrínseca de uma 12.3 D e f in iç õ e s
substância perigosa Em análise de risco, costuma-se diferenciar os conceitos de perigo e risco. Perigo q
ou de uma situação
definido como um a situação ou condição que tem potencial de acarretar conseqüências
física de poder
indesejáveis. 0 perigo é um a característica intrínseca a um a substância (natural : i
provocar danos à
saúde humana e/ou sintética), um a instalação ou um artefato — uma refinaria de petróleo, por exemple .
ao ambiente”.

CAPITU
A n á l is e de

N otas do Q u a d r o 1 2 .1

In d ú stria quím ica N ypro Ltda. Fonte: Lagadec, 1981.


2Usina qu ím ica Icm esa (H o ffm a n -L a Roche), um a vá lvu la de segurança fu n c io n a e deixa escapar um a
nuvem de gás; o p ro b le m a não é perceb ido im e d ia ta m e n te , mas, nos dias que se seguem, anim ais m o r­
rem e crianças devem ser levadas às pressas p a ra h o sp itais; a zona é in te rd ita d a até o u tu b ro , quando
os m oradores a invadem e re to m a m suas casas (Lagadec, 1981); a fá b ric a fo i desm antelada dois anos
depois, danos estim ados em U 5$ 150 m ilhões. Fonte: Crump, 1993.
-2 5 0 km de costa p o lu íd a ; em 1988 um ju iz fe d e ra l am ericano decide p o r um a indenização de
US$ 85 m ilhões, m as noventa m un icíp io s franceses pedem US$ 750 m ilhõe s e apelam da sentença.
Fonte: Crump, 1983.
~Dois reatores de 9 0 0 M W cada, bom bas de re frig e ra ç ã o fa lh a ra m e o re a to r p a ro u a u to m a tica m e n te ,
mas os dutos de re frig e ra ç ã o de em ergência fo ra m bloqueados.
: 0s vagões c o n tin h a m p ro d u to s quím icos desconhecidos; o vazam ento causou q u a tro explosões seqüen­
ciais (Lagadec, 1981).
6Fonte: Cetesb, w w w .cetesb.sp.gov.br, acesso em 24 de setem bro de 200 6.
7Fonte: Bowonder, Kasperson e Kasperson, 1985.
3Usina quím ica U nion Carbide; dados segundo Bowonder, Kasperson e Kasperson (1985); n ú ­
mero de m o rto s e feridos é m u ito d ifíc il de avaliar, pois m u ito s corpos foram crem ados e várias
pessoas m o rre ra m depois de a b a n d o n a r a área; o u tra s fo n te s estim am o núm ero de m o rto s em
3.150 e o de a fe ta d o s em 5 0 0 m il. Um acordo ju d ic ia l fixo u a indenização em US$ 470 m ilhões
(Crump, 1983).
7R uptura devido a um a in u n d a çã o que se seguiu a fo rte s chuvas, lib e ra n d o cerca de 4 0 t de gás. Fonte:
Dean, 1997.
10Fonte: Crié (1989); a nuvem ra d io tiv a a tin g iu toda a Europa.
Usina Sandoz; devido a um incêncio, 3 0 1 de fu n g ic id a s e p esticidas vazaram de um arm azém que g u a r­
dava m ais de trin ta tipos de p ro d u to s quím icos; as equipes de lim peza descobriram p ro d u to s que não
constavam da lis ta fo rn e cid a pela Sandoz, de scobrindo-se então que na véspera a vizinha C iba-G eigy
tam bém tin h a tid o um a cid ente (Crum p, 1993).
2Vazam ento de 4 0 m il t de um ca rre g a m e n to de 2 0 0 m il t devido a um erro de p ilo ta g e m ; custo da lim ­
peza acim a de US$ 2 bilhões (Crump, 1993).
’ 3Incêndio levou q u a tro dias p a ra ser apagado; um a inversão té rm ica d ific u lto u a dispersão dos
aoluentes. F o n te :E n v iro n m e n ta !S c ie n c e ^ Engineering, setem bro 1997, p. 74-75).
’4Jablonski, Azevedo, e M o re ira , 2 0 0 6 .

Dentre as fontes de risco, há uma preocupação especial com as substâncias químicas


perigosas, definidas pelo Convênio 174 da OIT como “toda substância ou mistura
que, em razão de suas propriedades químicas, físicas ou toxicológicas, seja só ou em
combinação com outras, represente um perigo”. Há classificações internacionais de
periculosidade de substâncias químicas e cada uma tem um código, conhecido como
"número ONU”, que a identifica. 0 uso de códigos evita que substâncias sejam confun­
didas devido a semelhanças de nomenclatura ou durante o transporte internacional.

0 risco, por sua vez, é conceituado como a contextualização de um a situação de pe­


rigo, ou seja, a possibilidade da materialização do perigo ou de um evento indesejado
ocorrer. Uma substância perigosa não identificada e arm azenada em recipientes mal
vedados representa um risco maior do que uma situação em que há identificação clara
da substância, quando as pessoas que a manuseiam conhecem sua periculosidade e
há procedimentos de segurança para o manuseio. Assim, risco, como definido pela
320 IIB p lia Ç ã o de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Q u a d ro 1 2 .2 Alguns acidentes em barragens de grandes conseguências ambientais


Características
31 de maio S outh Fork Dam, H - 22 m G algam ento, liberação de 2 .2 0 9 m o r to s 1' 2
de 1889 J o h n s to w n , 2 0 m t de água e s e d im e n to
Pennsylvania, EUA
27 de abril Bouzey Epinal, A lvenaria R uptura do corpo, liberação 8 5 m o rto s , danos a
de 1895 França H = 27 m / de 7 M m 3 água vilas, ferro vias, canais
L = 525 m e fa z e n d a s 3
12 de m arço St. Francis Dam, San C o ncreto PI = 60 m Problem as nas o m b re ira s da 4 6 0 m o rto s , dez pontes
de 1928 F rancisquito Canyon, co n stru íd a entre barragem e mais de 1.200 casas
C alifórnia, EUA 1926 e 1928 de stru íd a s 1
2 de d e z e m ­ M aipasset, A rc o de c o n c re to P rim eiro e n c h im e n to 4 3 3 m o rto s , 3 5 0 casas
bro de 1959 Fréjus, Var, H = 66 m / Problem as na fu n d a ç ã o da destruídas, p o n te e
França L = 223 m ba rrag em rodovia danificadas,
onda de cheia de 2 0 m
de a lt u r a 5
1 de o u tu b ro V ajo nt, Itália A rc o de c o n c re to R uptura de ta lu d e rochoso 1.925 m o rto s
de 1963 H = 276 m (270 M m 3), que caiu sobre cidade de Longarone
V = 120 M m 3 o re s e rv a tó rio a 50 m da d e s tru íd a 6- 7
crista da barragem , onda
sobre a crista
*
7 de a g osto Banqiao e S h im a n ta n rio Huai (afluen te R uptura de 2 barragens 2 4 0 mil m o rto s ,
de 1975 Henan, China Yangtsé) principais e 62 o u tra s após cerca de 2 m ilhõ es de
chuvas co m período de pessoas d e sa b rig a d a s8,9
re to rn o de 2 mil anos mm
5 de ju n h o Teton Dam Terra R uptura do m a ciço após Onda de cheia de 22 m
de 1976 Idaho, EUA H = 93 m / percolação, p rim e iro de a ltura, 14 m o rto s,
L = 910 m e n c h im e n to danos de US$ 4 0 0 M a
US$ 1 b ilh ã o 10' 11
A g o s to de M a c h u II Terra Onda de cheia ~ 2 5 0 0 m o r to s 2
1979 G ujarat, India H = 26 m G a lg a m e n to
14 de m aio Silver Lake Dam, Terra Erosão do e x tra v a s o r de Evacuação de 1.872
de 2 0 0 3 Tourist Park Dam, H = 10 m / em ergência, seguida de pessoas, danos de
M a rq u e tte , L - 500 m ru p tu ra US$ 100 milhões,
M ic h ig a n , EUA Liberação de cerca in u n d a ç ã o de casa
de 9 0 0 mil m 3 de de fo rç a , fe c h a m e n to
sedim e ntos de duas m inas e dis­
pensa de 1.100 t r a b a ­
lhadores p o r sem anas1,12
]Spragens e M a y fie ld , 200 5. 5G outal, 1999. 9Pisaniello, Z h ifa n g e M cKay, 200 6.
2D o n n e lly e M o rg e n ro th , 2 0 0 5 . 6M u lle r-S alzb u rg , 1987. ™ Boffey, 1977.
3S m ith, 1995. 7Panizzo e t al, 20 0 5. 11 W a tts e t aI, 2002.
*Back, 1990. 8M cC ully, 1995. U FERC (Federal Energy R e g u la to ry Com m ission), 200 4.

Society f o r Risk A nalysis, é o potencial de ocorrência de resultados adversos indesejados


para a saúde ou vida hum ana, para o ambiente ou para bens materiais. Risco pode ser
definido de modo mais formal como o produto da probabilidade de ocorrência de um
determinado evento pela magnitude das conseqüências, ou

R = PxC

Utilizando-se essa expressão, é possível calcular matematicamente diversos riscos e


comparar diferentes situações de risco. Pode-se, por exemplo, tentar responder à seguinte

CAPITU
A n á l is e de

pergunta: a produção de energia de origem nuclear é mais arriscada que a de origem


hidrelétrica?

A construção de grandes barragens para fms de geração de energia tem pouco mais
de cinqüenta anos, mas barragens são construídas há séculos. Muitas não resistiram
e romperam. Contabilizam-se algumas centenas de casos importantes de rupturas de
barragens. Esse número não pode, naturalmente, ser avaliado em termos absolutos,
pois há diferentes técnicas construtivas de barragens — que evoluíram em função da
experiência prática, incluindo aquilo que foi aprendido estudando os casos que deram
errado - e diferentes critérios de dimensionamento das estruturas que permitem a
passagem de água - mais de metade dos casos de ruptura devem-se a excesso de
agua nessas estruturas, que, ao não dar vazão, permitem que a água passe sobre o
corpo da barragem, fenômeno chamado de galgamento. Assim, deve-se considerar
que certas barragens representam maior perigo que outras.

Por outro lado, os resultados da ruptura de uma barragem dependem de sua locali­
zação e do potencial de danos possíveis. Uma barragem situada a montante de uma
área densamente habitada, por exemplo, terá efeitos graves caso se rompa, enquanto
um a barragem localizada em região de baixa densidade populacional terá efeitos de
menor monta, ou menor magnitude, no que se refere a perdas de vidas hum anas e
danos materiais. Poderá, todavia, ter conseqüências ecológicas importantes.

0 grau de risco depende, pois, da magnitude das conseqüências; o mesmo raciocínio


pode ser aplicado a duas instalações industriais idênticas, porém situadas em locais
diferentes.

A avaliação de riscos é um a atividacle correlata à avaliação de impacto ambiental,


mas as duas se desenvolveram “em contextos separados, por comunidades profis­
sionais e disciplinares diferentes” (Andrews, 1988, p. 85). A avaliação de riscos é
usualmente realizada em três etapas (Carpenter, 1995; Kates, 1978):
# identificação dos perigos;
# análise das conseqüências e estimativa dos riscos;
# avaliação dos riscos;
# gerenciamento dos riscos.

Grima et al. (1986) conceituam essas etapas. A estimativa do risco é um a tentati­


va de estimar matematicamente as probabilidades de um evento e a m agnitude de
seus efeitos. A avaliação do risco é a aplicação de um juízo de valor para discutir a
importância dos riscos e suas conseqüências sociais, econômicas e ambientais. Já o
gerenciamento dos riscos é um termo que, para esses autores, engloba o conjunto de
atividades de identificação, estimação, comunicação e avaliação de riscos, associado
à avaliação de alternativas de minimização dos riscos e suas conseqüências.

Se risco é entendido como a conjugação da probabilidade de que ocorra um a falha


com a magnitude das conseqüências, então o gerenciamento de riscos deve agir
sobre ambos. Assim, medidas de prevenção de acidentes devem ser associadas a
considerações sobre localização do empreendimento.
322 aliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

12.4 E s t u d o s de a n á l i s e de r is c o s
Em um estudo de risco, além de se buscar identificar os perigos e estimar o risco
(ou seja, estimar matematicamente as probabilidades de ocorrência de um evento e
a magnitude das conseqüências), deve-se propor medidas de gerenciamento. Estas
dividem-se em medidas preventivas (visando reduzir as probabilidades de ocorrência
e, por conseguinte, reduzir os riscos) e ações de emergência (medidas a serem toma­
das no caso de ocorrência de acidentes).

Os estudos de risco podem ser integrados aos estudos de impacto ambiental ou ser
conduzidos como avaliações separadas do EIA. Esta últim a forma é usada no Estado
de São Paulo, onde cabe à Cetesb exigir e aprovar estudos de análise de risco (EARs).
ao passo que cabe ao Departamento de Avaliação de Impacto Ambiental da Secretaria
2N o Estado de São do Meio Ambiente a análise dos EIAs2.
Paulo, a Cetesb
siste m a tiza os
São exigidos estudos de análise de risco para o licenciamento (instalação ou ampliação,
procedim entos de
análise de risco
de certas indústrias ou outras atividades potencialmente perigosas, e esses estudos
desde os anos 1990. são sistematicamente necessários nos casos de sistemas de dutos de transporte de
Os procedim entos petróleo e seus derivados, gases e outras substâncias químicas e plataformas de pe­
fo r a m oficializados tróleo ou gás. Os critérios de classificação das instalações perigosas e a conseqüente
cm agosto dc 2003.
exigência de estudos especializados sobre risco baseiam-se no perigo de um a insta­
D iá r io O f ic ia l do
113 (156),
E s ta d o
lação para a comunidade e o meio ambiente circunvizinho, característica que, por
2 0 dc agosto de sua vez, depende diretamente dos tipos de substâncias químicas manipuladas, das
2003, p. 3 4 -4 3 . quantidades envolvidas e da vulnerabilidade do local. A Fig. 12.2 mostra esquemati-
Esse docum ento camente os critérios para exigência de estudos de risco no Estado de São Paulo. Desta
será aqui referido
forma, a triagem de empreendimentos para realização de EARs baseia-se unicamente
como Cetesb (2003).
no fato de que, em determinadas instalações industriais (fontes de poluição), podem
ocorrer acidentes ambientais. A avaliação de risco ainda não se estendeu, institucio-
nalmente, a outras atividades que causem impactos ambientais significativos.

Há dois tipos de estudos de riscos em São Paulo: os estudos de análise de risco e os


planos de gerenciamento de riscos (PGRs), que, por sua vez, podem ser de dois tipos.
0 PGR Ié empregado para empreendimentos de médio e grande porte, ao passo que o
PGR II é exigido para empreendimentos de pequeno porte. Basicamente, o EAR é um
estudo mais complexo e detalhado que o PGR e pode incluir a análise quantitativa de
riscos. Os critérios para exigência de um EAR baseiam-se no
tipo e na quantidade de substâncias perigosas armazenadas
Periculosidade das Quantidade e na distância entre as instalações industriais e a população
substâncias das substâncias
do entorno, até as vias públicas. Ademais, a regulamentação
paulista prevê que será exigido um EAR em todos os casos
Nível de periculosidade Vulnerabilidade de licenciamento ambiental de dutos externos a instala­
da instalação da região ções industriais destinados ao transporte de petróleo ou
derivados, gases ou outras substâncias químicas, assim *

como para plataformas de explotação de petróleo ou gás.


Tipo de estudo

Os EARs têm um conteúdo específico e devem descrever as


Fig. 1 2 .2 Critérios pa ra exigência de estudos de
instalações analisadas, identificar os perigos, quantificar
análise de risco

capítuí
A n á l is e de ri

riscos e propor medidas de gestão para reduzi-los, assim como um plano de ação
para situações de emergência. Os principais itens de um tal estudo são (Cetesb, 2003,
p. 35):
% Caracterização do empreendimento e da região. Apresenta-se uma descrição
das instalações e atividades, assim como algumas características importantes
do local, tais como características climáticas e meteorológicas, uso do solo no
entorno do empreendimento, presença de concentrações populacionais e locali­
zação de bens a proteger (recursos hídricos, fragmentos florestais etc.).
& Identificação dos perigos e consolidação de cenários de acidentes. Por meio
de procedimentos sistematizados, busca-se identificar possíveis seqüências de
eventos que poderão resultar na liberação acidental de substâncias ou em outro
efeito negativo. Em função, entre outros, da severidade dos danos possíveis,
preparam-se “cenários”, ou seja, situações plausíveis de acidentes. Há várias
técnicas disponíveis para a identificação dos perigos, dentre as quais a análise
prelim inar de perigos (APP), a análise de perigos e operabilidade (Hazop) e a
análise de modos de falhas e efeitos (AMFE).
# Estimativa dos efeitos físicos e análise de vulnerabilidade. Trata-se de uma
previsão das conseqüências ambientais, caso se concretizem os cenários consi­
derados para análise. Existem disponíveis diversos modelos matemáticos que
simulam os efeitos de acidentes, como a propagação de uma nuvem de gás, a
explosão de gás inflamável etc. As atividades nesta fase envolvem a estimativa
de quantidades liberadas, o estudo do comportamento da substância imedia­
tamente após a liberação (espalhamento de líquido, volatilização de líquido,
dispersão a jato, expansão adiabática de gás pressurizado, explosão de nuvem
de gás ou vapor etc.) e a simulação da dispersão no meio.
# Estimativa de frequências. Trata-se da quantificação das frequências de ocor­
rência dos cenários acidentais identificados, com base em dados históricos ou
na opinião de especialistas.1*
# Estimativa e avaliação de riscos. Consiste na estimativa quantitativa, em termos
probabilísticos, do risco ao qual estão expostas as pessoas na área de influência
da instalação.
» Gerenciamento de riscos. Consiste na formulação de diferentes medidas preven­
tivas para evitar a ocorrência de acidentes ou reduzir seus efeitos. Inclui-se
também em um plano de gerenciamento de riscos (PGR) a descrição das medi­
das a serem tomadas em caso de ocorrência de acidentes, também conhecidas
como Plano de Atendimento a Emergências (PAE). 0 PGR deve descrever todos
os procedimentos propostos e os recursos necessários, concentrando-se nos
aspectos críticos identificados anteriormente e dando prioridade aos cenários
acidentais mais importantes.

Muitas vezes a preparação de um estudo completo de análise de risco pode ser substi­
tuída pela preparação de um plano de gerenciamento de riscos. Com isso, evitam-se
as atividades complexas e detalhadas de estimativa das frequências e de simulação
dos efeitos físicos, concentrando os esforços na formulação de medidas para reduzir
os riscos e na preparação de um PAE. Esse plano de gerenciamento de riscos pode
facilmente ser incorporado a um EIA ou a algum documento subsequente no processo
de licenciamento ambiental.
ação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Um PGR apresentado para fins de licenciamento é muito semelhante a um plano de


gerenciamento de risco usado internamente por algumas empresas. Esses documentos
normalmente contêm as seguintes informações:
# Informações de segurança do processo. Tratam-se de informações como (i) listas
de todas as substâncias químicas m anuseadas ou produzidas e suas caracte­
rísticas, (ii) tecnologia de processo, na forma de fluxogramas e balanços de
massas e descrição das condições normais de operação; (iii) equipamentos de
processo, acerca de tubulações e instrumentação e sistemas de segurança; e
(iv) procedimentos, contendo um a descrição dos procedimentos adotados na
instalação.
o

# Revisão dos riscos do processo: trata-se de um a atualização que deve levar em


conta mudanças ocorridas nas instalações.
# Gerenciamento de modificações: são procedimentos gerenciais para planejar,
analisar e comunicar modificações que tenham sido feitas nas instalações
industriais.
Manutenção e garantia da integridade de sistemas críticos: o PGR deve descrever
os procedimentos de manutenção de equipamentos considerados críticos para
a segurança do sistema e formas de garantir sua integridade, como testes e
inspeções.
# Procedimentos operacionais: descrição das atribuições, responsabilidades e
tarefas para todas as situações operacionais, incluindo partidas, paradas de
rotina e de emergência e operações normais.
# Capacitação de recursos humanos: descrição dos programas de treinamento.
% Investigação de incidentes: descrição dos procedimentos de investigação, aná­
lise e documentação.
# Plano de ação de emergência: o PAE é um a espécie de documento-síntese da
análise de risco, devendo descrever as instalações, os cenários acidentais, as
atribuições e as responsabilidades dos envolvidos, um fluxograma de aciona­
mento, as ações de resposta às situações emergenciais identificadas nos cenários
acidentais considerados, os recursos humanos e materiais, os programas de
treinamento e divulgação e documentos anexos como plantas, listas de equi­
pamentos etc.
# Auditorias: auditorias devem ser realizadas para verificar a conformidade dos
procedimentos e as ações constantes do PGR.

Esse modelo de plano de gerenciamento de risco é calcado na experiência e nos problemas


da indústria química, mas variações ou adaptações podem e têm sido empregadas por
outros setores industriais, como a mineração, o setor de transportes e o de geração de
energia elétrica, na qual algumas empresas geradoras realizam estudos de risco para
barragens. A canadense BC Hydro realizou estudos quantitativos na década de 1990
(Salmon e Hartford, 1995), aplicando um a análise probabilística tipo “árvore de even­
to”. Na época, os estudos de risco foram impulsionados nos Estados Unidos por ocasião
de projetos de reabilitação de barragens construídas havia vários anos (Donnelly e
Morgenroth, 2005). Desde o final dos anos 1970, porém, haviam sido desenvolvidos
os primeiros estudos de riscos em barragens nos EUA, impulsionados pela ruptura de
uma barragem no Estado da Geórgia (Spragens e Mayfield, 2005). Evidentemente, mais
importante que fazer estimativas quantitativas de risco é reduzi-lo (Dubler e Grigg.
1996), mas esta é justamente uma das funções da análise de risco.

CAPÍTU LO
A nálise de ri

No Estado de M inas Gerais, depois de diversos eventos de ru p tu ra s de barragens


de rejeitos de m inas e indústrias, o órgão estadual, Fundação Estadual do Meio
Ambiente (Feam), obrigou todas as em presas responsáveis por barragens a fazer
cadastro, o primeiro passo para um program a público de gerenciam ento de riscos
(Torquetti e Farias, 2004). E certo que, hoje em dia, as empresas mais bem o rg an iza­
das dão a devida atenção a b arragens industriais, pois um a ru p tu ra representa perdas
econômicas significativas (multas e indenizações a pagar, despesas com advogados e
peritos e estudos de avaliações de dano, paralisação da produção e custos de imagem).
Assim, docum entos de projeto são devidam ente arm azenados, há program as contí­
nuos de m onitoram ento geotécnico, inspeções realizadas por consultores externos e
realização de auditorias, até mesmo auditorias de projeto, que verificam a qualidade
do projeto conceituai e do projeto básico da barragem . Por outro lado, m uitas em pre­
sas sequer dispõem de dados técnicos básicos sobre suas b arragens e diques.

12.5 F e r r a m e n t a s p a r a a n á l is e de r is c o s
A análise de riscos am bientais teve grande desenvolvimento com a indústria nucle­
ar. Acidentes com reatores e outras instalações nucleares são tipicam ente de b aix a
probabilidade de ocorrência, porém de grandes conseqüências.

I dentificação de pewgos
A identificação de perigos é o ponto de p artid a dos estudos de risco. A lguns não vão
além dessa fase, passando para a preparação de um plano de gerenciam ento. Em casos
que requerem análises m ais sofisticadas, estim am -se as frequências de ocorrência de
certos cenários para, em seguida, estim ar os riscos. P ara identificar os perigos, é feita
um a v a rre d u ra da instalação an a lisad a p a r a identificação de eventos iniciadores de
falhas operacionais e posterior quantificação de suas frequências.

Já se observa aqui u m a contradição entre as ferram entas de análise de risco e as


diretrizes da avaliação de impactò am biental, pois os EIAs são (ou devem ser) feitos
nas fases iniciais de concepção de um projeto, para que se possam considerar altern a­
tivas. Por outro lado, um a análise de riscos necessita de um projeto detalhado, sem o
qual não é possível quantificar riscos. Uma solução é lim itar-se a um a análise quali­
tativ a e prelim inar, transferindo um estudo detalhado, caso necessário, para a fase de
obtenção da licença de instalação e, portanto, após a conclusão e aprovação do EIA.

Awazu (1993) descreve dez diferentes técnicas de identificação de riscos:


$ A nálise histórica de acidentes: consiste no levantam ento de acidentes ocorridos
em instalações similares, u tilizando-se a consulta a bancos de dados de
acidentes ou referências bibliográficas específicas.
Inspeção de segurança: por definição, é um método que somente se aplica a
instalações em funcionam ento.
# Lista de verificação: baseia-se na elaboração e aplicação de u m a seqüência
lógica de questões para a avaliação das condições de segurança de um a in sta ­
lação, por meio de suas condições físicas, dos equipam entos utilizados e das
operações praticadas; listas de verificação aplicam-se às etapas de elaboração
de projeto, de construção, de operação e du rante as paradas para m anutenção.
# Método “E se...?” (W h a t if...?): trata-se da identificação de eventos indesejados
feita por u m a equipe de dois ou três especialistas experientes; “melhores
326 ■ B a lt e ç ã o de impacto Ambiental: conceitos e métodos

resultados podem ser obtidos quando da sua aplicação em instalações existentes"


(p. 3.200-3.211).
Análise preliminar de riscos (também conhecida como análise preliminar de
perigos (Preliminary Hazard Analysis — PHA): é uma técnica que foi desenvol­
vida especificamente para aplicação nas etapas de planejamento de projetos,
visando a uma identificação precoce de situações indesejadas, o que possibilita
adequação do projeto antes que recursos de grande monta tenham sido compro­
metidos; trata-se, portanto, de uma técnica de potencial emprego em estudos
de impacto ambiental, pois não exige o detalhamento da instalação industrial
a ser analisada. Preparam-se planilhas nas quais, para cada perigo identificado,
são levantadas suas possíveis causas, efeitos potenciais e medidas básicas de
controle aplicáveis (preventivas ou corretivas). Além da identificação, os perigos
são também avaliados com relação à frequência de ocorrência e grau de severi­
dade de suas conseqüências. A análise preliminar de perigos pode ser uma etapa
inicial, seguida de outras ferramentas de análise.
Estudo de riscos e operabilidade (Hazard and Operability Study — Hazop):
consiste no trabalho integrado de uma equipe de especialistas que realiza “um
exame crítico sistemático (...) a fim de avaliar o potencial de riscos decorrentes
da má operação ou mau funcionamento de itens individuais dos equipamen­
tos e os efeitos na instalação”, seguindo uma estrutura dada por determinadas
palavras-guia (por exemplo “mais pressão”) que permitam identificar desvios ou
afastamentos da normalidade. Segundo Awazu (1993, p. 3.200-3.215), “a melhor
ocasião para a realização de um Hazop é a fase em que o projeto se encontra
razoavelmente consolidado. Nessa altura, o projeto j á está bem definido, a ponto
de permitir a formulação de respostas expressivas às perguntas do estudo. Além
disso, neste ponto ainda é possível alterar o projeto sem grandes despesas”.
Tipos de ruptura e análise das conseqüências (Failure Modes and Effects A n a ly­
sis - FMEA): consiste na identificação de falhas hipotéticas, anotadas em uma
planilha, na qual cada falha é relacionada com seus respectivos efeitos. As falhas
podem ter diversas causas, mas aqui parte-se dos modos de falha - por exemplo,
os modos de falha de uma válvula manual podem ser: falha para fechar, quando
requisitada; falha para abrir, quando requisitada; emperrada; ajuste errado para
mais ou para menos; ruptura no corpo da válvula (Awazu, 1993, p. 3.200-3.219).
Em seguida, identificam-se os possíveis efeitos — se a falha da válvula ocasio-
/

nar vazamento de um líquido inflamável, um efeito é incêndio. E uma técnica


indutiva.
* Análise de árvore de falhas (Fault Tree Analysis — FTA): técnica dedutiva que
parte da montagem de um diagrama com bifurcações sucessivas - por exemplo,
um sistema de alimentação de água pode falhar por falta de água no reservatório
ou por falha no sistema de bombeamento; este, por sua vez, pode falhar em cada
uma das bombas. 0 método permite análise quantitativa, atribuindo-se probabi­
lidades a cada evento, determinando-se a taxa de falha de cada componente do
sistema. Pode-se também determinar caminhos críticos, seqüências de eventos
com maior probabilidade de levar ao evento indesejado (denominado evento
topo, por situar-se no topo, ou tronco de uma árvore invertida, cujas bifurcações
são as raízes). 0 método foi desenvolvido para as indústrias aeronáutica e aero­
espacial.

CAPITU
Q u ad ro 12.3 Exemplo de planilha de avaliação preliminar de perigos (APP),

Local : Sistema:
R eferência :

DETECÇÃO DE FREQUENCIA

Eventos que Falhas in trín s e - In s tr u m e n ­ C o m p o r ta m e n to Classificação de


p o d e m te rc o n - c a s d e e q u ip a - ta ç ã o ou de um p ro d u to a c o rd o com c a -
sequências a m - m e n to s e erros percepção liberado ou c o n - te g o ria s definidas
bientais ou para h u m a n o s de hum ana sequencia im e ­ p revia m e nte,
a saúde ou s e g u - m a n u te n ç ã o ou diata do e ven to c o m o " m u ito p r o -
rança hum anas op eração vável", "provável",
"o c a s io n a l" etc.
E x e m p l o : A r m a z e n a m e n t o de E n x o f r e a c é u a b e r t o
C o m b u s tã o C o m b u s tã o V isual Liberação de Raro
espontâne a calo r ou cham a,
q u a n d o e x p o s to fo rm a ç ã o de
à te m p e ra tu ra e n x o fre fu n d id o
a m b ie n te
E x e m p l o : A r m a z e n a m e n t o de Á c id o S ú l f ir o de T u b u l a ç ã o S it u a d a e m Á r e a I n d u s t r ia l
Pequenos v a z a ­ Furos ou r u p t u ­ Visual Liberação para Ocasional
m e n to s ras na tu b u la ç ã o piso, canaletas,
(< 100 £) e ta nq ues, v a z a ­ sistem a de
m e n to s em v á l­ drenagem
vulas ou c o n e ­
xões, de vido a
corrosão, des-
desgaste, a tr ito
ou fa lh a s de
vedação
G randes v a z a ­ Idem In s tr u m e n ­ Liberação para Raro
m entos ta ç ã o visua sistema de
(>1.000 £) drenagem
s (APP)

E laborado por: A p ro v a d o por:


Data : Revisão:
C a t e g o r ia de O bservações C ó d ig o
DE SEVERIDADE r is c o

C lassificação de C o m b in a ç ã o de In fo rm a ç ã o C ódigo in te r­
a co rd o com c a ­ severidade e c o m p le m e n ta r no, nú m e ro
te g o ria s d e fin i­ fre quê ncia, ou re c o m e n ­ seqüencial ou
das p revia m e nte, de acordo com dações de o u tr o id e n tifi­
c o m o " c a ta s tr ó ­ c rité rio p ré d e - ações cador
fico", "desprezí­ fin id o preventivas
vel" etc.

Pequena M u it o baixo Inspeção p e rió - 1


dica das pilhas;
tre in a m e n to de
operadores para
e x tin ç ã o de fo c o s

Pequena Baixo C o n tro le de 14


c o n c e n tra ç ã o do
ácido para re­
d u z ir potencial
corrosivo;
inspeção e
m a n u te n ç ã o
preventiva
>
>•

M o d e ra d a Baixo Idem 15

G
roJ
-^j
328 HMwaliacão de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

# Análise de árvore de eventos (Event Tree Analysis - ETA): diagramas descrevem


a seqüência de eventos necessária para que ocorra um acidente; cada ramificação
só permite duas possibilidades, sucesso ou falha, às quais se atribuem probabi­
lidades que, somadas, sempre são iguais a zero e um. Parte-se da escolha de
determinados eventos, que muitas vezes são identificados por meio de outras
técnicas de análise de risco.
si* Análise de causas e conseqüências: utiliza-se da preparação de diagramas
de causas e conseqüências em uma seqüência de passos: (1) identificação dos
fatores que podem causar acidentes; (2) preparação de uma árvore de eventos; (3)
detalhamento de um evento para determinação de suas causas básicas (árvore de
falhas); (4) determinação de medidas de redução de eventos acidentais.

A e e s t im a t iv a de r is c o s
n á l is e d a s c o n s e q ü ê n c ia s
Trata-se da parte quantitativa da avaliação de riscos, mas nem sempre se avança
até esse ponto. A análise das conseqüências é uma simulação de acidentes que per­
mite estimar a extensão e a magnitude das conseqüências, o que é feito por meio
de modelos matemáticos específicos para determinado cenário acidental. Para cada
hipótese acidental, deve-se usar procedimentos apropriados de cálculo. Em se tratan ­
do da liberação de um a substância química, deve-se (Technica, 1988):
# saber a fase (líquida, gasosa ou uma rhistura de líquido e gás);
# estimar a quantidade liberada;
# determinar o comportamento da substância após a liberação (vazamento de
líquido pouco volátil, vazamento de líquido volátil, inflamável, expansivo etc.);
# verificar como se dá a dispersão (nuvem densa, subida de pluma) e se pode haver
incêndio ou explosão;
# determinar os efeitos agudos e crônicos de liberações tóxicas.

Podem-se aplicar alguns modelos de dispersão atmosférica (conforme seção 10.3), e


existem modelos desenvolvidos para a análise das conseqüências de acidentes que
permitem calcular a radiação térmica (no caso de incêndios), a sobrepressão (no caso
de explosões) ou a concentração de um a substância tóxica.

Como o risco é o produto da combinação entre probabilidade de ocorrência e m agni­


tude das conseqüências, é preciso estimar essa magnitude. Ela pode ser medida em
termos de perdas econômicas ou ecológicas, mas um a característica bastante usada
para os riscos agudos é o número esperado de mortes. Para os riscos crônicos, a
característica usada é o número de mortes ou o número adicional de casos de câncer,
para as substâncias causadoras de tumores.

A v a l j a ç á o d e r is c o s
A avaliação de riscos, como a avaliação da importância de impactos, implica juízo de
valor. 0 conceito de risco aceitável vem sendo debatido há décadas. Algumas pessoas
são mais propensas a correr ou aceitar riscos, enquanto outras mostram aversão a
situações arriscadas. Seria possível determinar alguma média de aceitabilidade de
risco? Para o ambiente, a dificuldade é maior, pois muitas vezes trata-se de riscos
impostos e não voluntários, e a fonte de risco é a atividade exercida por um terceiro
e não pelo próprio indivíduo.

capítuI R ^^H H H M H
A n á lis e de r i ^ m 329

Convenciona-se definir risco social como a quantidade anual de perda de vidas


hum anas associada a determinada atividade, dada pelo produto do número de mortes
por acidente pelo número de acidentes por ano. A formulação de tal definição pode
assustar, mas na verdade trabalha-se com cifras da ordem de 10'4 a 10"7, ou seja,
uma morte a cada 10 mil anos ou a cada milhão de anos, respectivamente. Também
se define risco individual como a razão entre 0 risco social e 0 número de habitantes
da zona em estudo.

Os critérios de risco aceitável são estabelecidos tendo como base estimativas quanti­
tativas. Assim, por exemplo, Hong Kong, de m aneira similar às outras jurisdições,
estabelece que 0 risco individual máximo aceitável é 10~5, ao passo que 0 risco social
varia entre 10"3 e IO-6, devendo ser mitigado de acordo com 0 conceito de “tão baixo
quanto razoavelmente praticável” (ALARP - As Low as Reasonable Practicable)
(HKEPD, 1997, p. 25).

12.6 P e r c e p ç ã o de r is c o s
Uma das questões mais relevantes dentro da avaliação de impacto ambiental é a ma­
neira como diferentes pessoas encaram e se comportam diante de situações de risco.
Sabe-se que há pessoas mais e menos propensas a aceitar riscos, em qualquer área -
por exemplo, a propensão a riscos econômicos em investimentos financeiros, riscos
de vida praticando esportes radicais ou ainda riscos à saúde devido ao uso de tabaco.

0 mesmo se passa diante dos riscos ambientais. Quando um empreendimento subme­


tido ao processo de AIA passa pelas etapas de consulta pública, muitas das discussões
se dão em torno da possibilidade de “algo dar errado”, de que ocorram acidentes ou
disfunções que causem impactos ambientais muito mais significativos do que aqueles
que poderiam ocorrer em situação normal.

As ciências do comportamento têm se interessado pelo campo da percepção de riscos,


que estuda como as pessoas encaram situações perigosas. Os especialistas dessa área
têm chegado a algumas conclusões gerais que parecem ter validade em diferentes
culturas. As seguintes características da percepção de riscos têm grande interesse
para 0 campo da avaliação de impacto ambiental (Fisher, 1991; Kasperson et al.,
1988; Renn, 1990a, 1990b):
íft Preferência intuitiva por raciocínio determinístico. Ao contrário dos
especialistas em risco, que veem as situações de risco como fenômenos pro-
babilísticos, a maioria da população tem grande dificuldade em raciocinar em
termos de probabilidade. Afirmações do tipo “os riscos de danos sérios à popu­
lação de tartarugas m arinhas devido à ruptura de um a tubulação de transporte
de petróleo são da ordem de 2,5 x 10'5” nada significam para a maioria das
pessoas. A percepção de probabilidades é, em geral, muito influenciada (a) pela
experiência pessoal (como a de j á ter estado exposto a uma situação similar;
sabe-se que quem já presenciou determinado tipo de acidente tende a vê-lo
como mais provável), (b) por uma tendência, identificada através de estudos
comportamentais, de evitar a chamada dissonância cognitiva (informações ou
fatos que contradizem a percepção pessoal tendem a ser ignorados, enquanto a
pessoa também busca informações que reforcem suas opiniões e convicções), e
aliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

(c) pela disponibilidade da memória (eventos que vêm imediatamente à mente


são percebidos como mais prováveis; assim, acidentes recentemente difundidos
pela mídia são vistos como mais freqüentes). Em outras palavras, a percepção
da probabilidade é ajustada à informação disponível.
# Maior importância atribuída às conseqüências possíveis de um evento do que
à probabilidade de ocorrência. Se considerarmos duas situações em que tecni­
camente o risco seja idêntico, onde a primeira se refere a um evento de baixa
probabilidade de ocorrência (por exemplo, 10~6), mas grandes conseqüências (por
exemplo, cem mortes), e a segunda a um de probabilidade mais elevada (IO"4),
mas pequenas conseqüências (uma morte), a população considera a primeira
situação como mais perigosa. 0 conceito social de risco não é o mesmo que o
conceito técnico.
# Distribuição social dos riscos e benefícios. A população usualmente atribu:
grande importância a esta característica, sendo mais difícil aceitar uma situaçãt
de risco na qual os beneficiários não são os mesmos que a população exposta
ao risco.
*:& Circunstâncias qualitativas do risco. Questões como familiaridade com a situaçàc
de perigo (riscos “novos” tendem a ser mais dificilmente aceitos), controle pes­
soal (riscos parecem ser mais aceitáveis se a própria pessoa controla - ou pensa
que controla - a situação de perigo) ç experiência individual interferem sobre­
maneira na percepção de riscos. 0 fato do risco ser imposto por terceiros ou
assumido voluntariamente pela pessoa também tem um peso muito grande em
sua aceitação. Finalmente, a credibilidade das instituições de gerenciamento de
risco tem também um grande peso na aceitabilidade social de uma situação de
perigo — uma empresa ou instituição governamental que já demonstrou compe­
tência (ou incompetência) em lidar com situações concretas como acidentes ou
incidentes terá sua credibilidade e confiança em futuros eventos julgada em
termos dessa experiência prévia.

A repartição dos riscos e dos benefícios é talvez um dos pontos centrais quando a
instalação de um empreendimento perigoso está em discussão. Na maior parte dos
casos, aqueles que se beneficiam com o empreendimento (empresários, acionistas,
financiadores, fornecedores, empregados) não são aqueles que deverão suportar os
riscos (principalmente a comunidade vizinha), estabelecendo-se, então, um grande
potencial de conflito.

Tais características (entre outras que interferem na percepção dos riscos) devem
necessariamente ser levadas em conta na análise e na discussão sobre os impactos
ambientais de um empreendimento. Elas podem até determinar a aceitação ou não d:
projeto, de modo que o envolvimento público desde suas fases iniciais pode facilita;
muito a comunicação e a eventual aceitação do empreendimento. No Brasil, a ela­
boração e a análise de estudos de análise de risco não envolvem nenhum a forma ce
consulta ou comunicação pública, ao contrário dos estudos de impacto ambiental; ca;
a necessidade de integrar os estudos e sua análise técnica. 0 processo de avaliaçã:
de impacto ambiental, por outro lado, representa uma oportunidade de participaçã:
pública na análise e decisão sobre instalações perigosas, e a possibilidade de esta­
belecimento de um canal formal de comunicação com as partes interessadas. Esse:
estudos são ferramentas de identificação e análise de riscos agudos, e não de riscos

CAPÍTU LO
A n á l i s e de

crônicos - considerações sobre essa categoria de riscos am bientais, em geral, estão


ausentes do processo de AIA, embora possam fazer parte das preocupações do público.
Como coloca Lagadec (2003, p. 7), há um “déficit intelectual” nas discussões sobre
risco (tomadas em um sentido amplo, não som ente risco ambiental): “nos anos 1970,
as discussões sobre risco eram dom inadas por um a equação, risco = probabilidade x
gravidade das conseqüências. (...) Hoje nós somos obrigados a reconhecer a realidade
intrínseca do risco: risco é, primeiro, um a brecha, um a descontinuidade”.
334 aliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Uma das funções da avaliação de impacto ambiental é servir como ferramenta para
planejar a gestão ambiental das ações e iniciativas às quais se aplica. Ao estudar
detalhadamente as principais interações entre a ação proposta e o meio ambiente, a
equipe técnica que elabora o estudo de impacto ambiental está bem posicionada para
formular recomendações que visem à redução dos impactos adversos, realçar os im­
pactos benéficos e traçar diretrizes de manejo.

Diferentemente dos sistemas de gestão ambiental e de outras ferramentas correlatas,


o estudo de impacto
»' 1 —*■■■1* " 'ambiental não trabalha
—-----“c com
r - situações
3 . concretas
- de impactos
* ou
de risco ambiental, mas com situações potenciais, de modo que as medidas de gestão
propostas em um EIA só poderão ser aplicadas na eventualidade, do empreendimento
ser aprovado e efetivamente implantado. Outra diferença importante entre um SGA
e um EIA-é que o plano de gestão ambiental decorrente da preparação do EIA é diri­
gido às três principais etapas do ciclo de vida de um empreendimento [implantação,
operação e desativação), ao passo que as medidas e os programas de gestão oriundos
de umjSGA costumam limitar-se à etapsudê^qp-êlâção. Com efeito, para muitos empre­
endimentos, os impactos decorrentes da implantação e das atividades de construção
norma ISO
14.031: 1999 podem ser muito mais significativos do que aqueles advindos do seu funcionamento,
define desempenho como é o caso de boa parte das obras de infraestrutura, a exemplo de rodovias, linhas
ambiental como de transmissão de energia elétrica, sistemas de abastecimento de água e de tratamento
“resultados do de esgotos ou resíduos sólidos, e até muitas indústrias, entre outros.
gerenciamento
dos aspectos
Entende-se que o desempenho ambiental da atividade, isto é, o conjunto de resultados
ambientais de uma
organização”. concretos e demonstráveis de proteção ambiental\ tenderá a ser mais satisfatório à
medida que as próprias ações (atividades, produtos e serviços) do empreendimento
forem planejadas para assegurar a proteção ambiental, que é uma das finalidades da
AIA. Gestão ambiental, nesse contexto, pode ser conceituada como: um conjunto de
medidas de ordem técnica e gerencial que visam a assegurar que o empreendimento
2Desde o trabalho da
Comissão Mundial seja implantado, operado e desativado em conformidade com a legislação ambiental
de Meio Ambiente e outras diretrizes relevantes, a fim de minimizar os riscos ambientais e os impactos
e Desenvolvimento, adversos, além de maximizar os efeitos benéficos.
instituída pela ONU
em 1983 e resumida
Durante muitos anos, o foco da avaliação de impacto ambiental foi evitar e m ini­
no relatório Nosso
mizar as conseqüências negativas dos investimentos públicos e privados. 0 enfoque
Futuro Comum,
desenvolvimento atual é muito mais amplo, pois vários protagonistas perceberam que o potencial do
sustentável vem processo de AIA é muito maior: em vez de concentrar-se na redução dos impactos
sendo conceituado negativos, o processo de AIA tem permitido analisar, sob a perspectiva de múltiplos
como “aquele atores, a contribuição que os projetos analisados podem trazer para a recuperação da
que atende às
qualidade ambiental, para o desenvolvimento social e para a atividade econômica
necessidades das
da comunidade ou da região sob sua influência. Trata-se, na verdade, de analisar
gerações presentes
sem comprometer a contribuição do projeto para o desenvolvimento sustentável2 (IFC, 2003), o que
a capacidade das alguns têm chamado de “análise ou avaliação de sustentabilidade”.
gerações fu tu ra s
atenderem às 0 plano de gestão, ambiental resultante da avaliação de impactos de um novo projeto
suas próprias
é uma ferramenta importante para transform ar um potencial em contribuição efetiva
necessidades”
para o desenvolvimento sustentável. Um plano de gestão cuidadosamente elaborado,
(WCED, 1987, p. 8).
e satisfatoriamente implantado por um a equipe competente, pode fazer toda a dife­
rença entre um projeto tradicional e um projeto inovador, entre um projeto no qual

CAPITU
P l a n o de g e s t ã o a m b i e n ^ J 335

sobressaiam os impactos negativos, ainda que minimizados, e um projeto no qual se


destaquem os impactos positivos.

-Há três condições para realizar tal potencial. A primeira delas é a preparação cuida­
dosa do plano de gestão, devidamente orientado para atenuar os impactos adversos
significativos, para reduzir as lacunas de conhecimento e as incertezas sobre os
impactos reais do projeto.

A segunda condição é o envolvimento das partes interessadas na elaboração do


plano - o plano de gestão é certamente um dos componentes que devem ser mais bem
negqçiadqs de todo o EIA. Ele envolverá compromissos do empreendedor que dem an­
darão recursos humanos, financeiros e organizacionais, e também pode requerer o
irabalho com parceiros institucionais, como órgãos de governos e organizações não
governamentais.

Finalmente, a terceira condição para o sucesso de um plano de gestão ambiental


e, eventualmente, para o sucesso do empreendimento sob o ponto de vista ambiental)
’ é sua_adequada implementação, dentro de prazos compatíveis com o cronograma do
empreendimento. A implementação deveria ser verificada com a ajuda de indicadores
mensuráveis de andamento e de consecução dos objetivos pretendidos. Ferramentas
para a realização dessa terceira condição são a supervisão am bie n ta l a fiscalização,
a auditoria ambiental e o nmrütqram 0 processo de AIA prevê o uso
áessas ferramentas na etapa que se segue à aprovação do projeto, conhecida como
etapa de acompanhamento.

13.1. C o m p o n e n t e s de u m p l a n o de g e s t ã o
Fostuma-se abrigar sob o termo genérico de “medidas mitigadoras” a designação do
conjunto de ações a serem executadas visando a reduzir os impactos negativos de
um empreendimento. Dentro da perspectiva preventiva que norteia a avaliação de
impacto ambiental, trata-se de antever quais serão os principais impactos negativos
e buscar medidas para evitar que ocorram, ou para reduzir sua m agnitude ou sua
importância.

— Outro item usual dos estudos de impacto ambiental é o plano de monitoramento, ou


seja, um a descrição dos procedimentos que serão adotados quando da implantação,
operação e desativação do empreendimento. A finalidade é constatar, com a ajuda de
indicadores predefinidos, se os impactos previstos no EIA se m anifestaram na prática —
e verificar se o empreendimento funciona dentro dos critérios aceitáveis de desempe­
nho, atendendo a padrões legais, condições estabelecidas em sua licença ambiental ou
quaisquer outras condicionantes, como exigências de agentes financiadores e com­
promissos assumidos com partes interessadas.

Esses dois componentes obrigatórios dos EIAs têm em comum o fato de se referirem
a providências que deverão futuram ente ser tomadas caso o projeto seja aprovado;
normalmente as ações propostas e descritas nos estudos ambientais se transform am
em compromisso do empreendedor ou em condições obrigatórias impostas pelo agente
regulador (licenciador).

TR
•• • i> : V.
336 I j ^ a l i a ç ã o de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Na prática, as condições impostas quando da análise e aprovação de um novo


em preendim ento podem, m uitas vezes, ir além desses dois elementos essenciais, para
incluir outras medidas correlatas, tam bém destinadas a com patibilizar o projeto com
as características do ambiente afetado. Tal conjunto de m edidas pode ser agrupado
sob a denom inação mais genérica de plano de gestão ambiental. Além das medidas
mitigadoras e do plano de monitoramento, os planos de gestão costum am abordar
pelo menos duas outras categorias de ações: as medidas compensatórias e as medidas
de valorização dos impactos benéficos. Ademais, pode-se tam bém incluir no plano de
gestão eventuais outros estudos que v en h am a ser necessários para m elhor conhecer
os impactos do em preendim ento e detalhar as medidas de gestão. Sinteticamente,
pode-se dizer que, dentro de um estudo de impacto ambiental, um plano de gestão
ambiental é um conjunto de medidas propostas para prevenir, atenuar ou compensar
impactos adversos e riscos ambientais, além de medidas voltadas para valorizar os
impactos positivos.

Como exemplo, o Quadro 13.1 traz um a lista de medidas que, frequentemente,


fazem parte dos planos de gestão am biental apresentados em EIAs de barragens.
Essas medidas, individualm ente ou agrupadas, podem constituir programas de ação.
Cada program a deve ser individualm ente descrito no próprio EIA ou em documentos

Quadro 13.1 Medidas típicas de um plano de gestão ambiental de uma barragem


Remoção da vegetação antes da inundação
Compensação pela perda de hábitats mediante a proteção de uma área equivalente e/ou da recuperação de áreas
degradadas
Extrair os materiais de construção das áreas a serem inundadas
Adotar medidas de controle da poluição durante as obras
■ • ......................

Adotar medidas de controle de erosão durante as obras


Recuperar as áreas degradadas
Educação ambiental e treinamento da mão de obra
Salvamento arqueológico na área diretamente afetada
Reassentamento das populações atingidas
Provisão de infraestrutura e serviços nas áreas de reassentamento
Indenização das benfeitorias perdidas
Indenização de direitos de exploração mineral
Assistência técnica para os reassentados
Regularização jurídica das propriedades
Manutenção de vazão mínima a jusante
Regularização da vazão a jusante de forma a reproduzir o regime hídrico preexistente
Construção de escada para passagem de peixes
Desenvolvimento da produção pesqueira no reservatório
Desenvolvimento do potencial turístico e recreativo
Reconstrução da infraestrutura inundada (estradas, linhas de transmissão, armazéns, infraestrutura social)
Documentação cultural e programa de valorização da cultura local
Documentação e registro do patrimônio natural perdido
Medidas de proteção da bacia hidrográfica (revegetação das margens do reservatório, programas de conservação ce
solos etc.)
P l a n o de g e s t ã o a m b i e n H * 337

costeriores como o Projeto Básico Ambiental (PBA) ou o Plano de Controle Ambiental


PCA). 0 Projeto Básico Ambiental é um estudo ambiental para empreendimentos do
setor elétrico (usinas hidrelétricas, termelétricas e linhas de transmissão) introduzido
Tela Resolução Conama 6/87. É preparado como requisito para a solicitação da licença
ie instalação; portanto, depois da aprovação do EIA. 0 Plano de Controle Ambiental
r outra modalidade de estudo ambiental, introduzido pelas Resoluções Conama 9/90
t 10/90, ambas de 6 de dezembro de 1990. 0 PCA é exigido como requisito para a
solicitação de licença de instalação de empreendimentos de mineração e “conterá os
projetos executivos de minimização dos impactos ambientais avaliados na fase de
1? [licença prévia]” (Art. 5o de ambas resoluções). 0 Quadro 13.2 traz programas que
fazem parte do Plano de Controle Ambiental de um a usina hidrelétrica.

ã u a d r o 1 3 .2 P ro g ra m a s de g e stã o a m b ie n ta l p a ra u m a usin a h id re lé tric a


-30GRAMAS P r o je t o s

S o c io e c o n ô m ico e c u ltu ra l R e m a n e ja m e n to e c o m p e n s a ç ã o da p o p u la ç ã o a tin g id a


R e e stru tu ra ç ã o e re v ita liz a ç ã o das c o m u n id a d e s lin deira s
Resgate e preservação do p a tr im ô n io h is tó r ic o - c u ltu r a l
Resgate e preservação do p a tr im ô n io paisagístico
Resgate e preservação do p a tr im ô n io a rq u e o ló g ic o
A d e q u a ç ã o da in fr a e s tr u tu r a de serviços
Educação a m b ie n ta l
- d rologia , c lim a to lo g ia e Observação das cond ições h id ro ló g ic a s
qualidade da água Observação das c o n d içõ e s c lim a to ló g ic a s
M o n it o r a m e n to das c o n d içõ e s lim n o ló g ic a s e da q u a lid a d e
da água
M o n it o r a m e n to das m a c ró fita s a q u á tic a s
M o n it o r a m e n to e m a n e jo da ic tio fa u n a
M o n it o r a m e n to das cond ições h id ro s s e d im e n to ló g ic a s
Ações in te g ra d a s de conservação do solo e da água
3 e o te c n o lo g ia M o n it o r a m e n to s is m o ló g ic o
M o n it o r a m e n to da explo ra çã o dos recursos m in e ra is
M o n it o r a m e n to dos a q ü ífe ro s
M o n it o r a m e n to da e s ta b ilid a d e de ta lu d e s m a rg in a is
M eio B ió tic o M a n e jo e s a lv a m e n to de flo ra e fa u n a
R e flo re s ta m e n to
A p lic a ç ã o de recursos em un idades de conservação
M eio Físico Limpeza da bacia de a c u m u la ç ã o
G e re n c ia m e n to e re co m p o siçã o a m b ie n ta l das áreas
da obra
Gerencial Gestão do re se rva tó rio
M o n it o r a m e n to e a v a lia ç ã o da im p la n ta ç ã o do PBA
C o m u n ic a ç ã o social
-onte: Geab (Grupo de Empresas Associadas Barra Grande), UHE Barra Grande, Projeto Básico Am biental,
2001.

Os programas de controle e de gestão podem ser articulados em um sistema de gestão


ambiental. Diferentemente da gestão por programas, a gestão por sistemas articu-
Ia-se em torno de um ciclo de planejamento, implementação e controle, em que a
experiência adquirida é utilizada para promover melhorias gradativas no sistema.
A gestão por programas, por outro lado, é composta por um conjunto de medidas

TR
33-3 aliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

e ações não necessariamente articulados entre si e que nem sempre incluem meca­
nismos de avaliação. Caso o proponente tencione utilizar um sistema de gestão em
conformidade com a norma NBR ISO 14.001: 2004, então pode ser conveniente que já
durante a preparação do EIA sejam identificados os aspectos e impactos ambientais,
na etapa de identificação dos impactos, e que sejam definidos, na etapa de elaboração
do plano de gestão, os objetivos e as metas ambientais (item 4.3.3 da norma), assim
como programas e procedimentos de gestão ambiental (item 4.3.4 da norma), como
sugerido por Sánchez e Hacking (2002). Evidentemente, objetivos, metas e programas
são sempre sujeitos a revisão, e no caso de um empreendimento ainda em planeja­
mento certamente estarão sujeitos a detalhamento, o qual poderá ser feito durante a
preparação dos estudos necessários à etapa seguinte do licenciamento ambiental, a
obtenção da licença de instalação. Os estudos ambientais preparados nessa fase, como
os PCAs, normalmente devem incluir projetos detalhados ou executivos dos compo­
nentes do empreendimento e dos sistemas de controle ambiental, podendo também
incluir o detalhamento do sistema de gestão.

1 3 .2 M e d i d a s m i t i g a d o r a s
Ações propostas com a finalidade de reduzir a magnitude ou a importância dos
impactos ambientais adversos são chamadas de medidas mitigadoras ou de atenuação.
Medidas típicas incluem sistemas de redução da emissão de poluentes, como o trata­
mento de efluentes líquidos, a instalação de barreiras antirruído e o abatimento das
emissões atmosféricas por meio da instalação de filtros, mas os tipos de medidas
mitigadoras possíveis abrangem um a gama ampla, desde medidas muito simples,
como a instalação de bacias de decantação de águas pluviais para reter partículas
sólidas e evitar seu transporte para os cursos d’água durante a etapa de construção,
até o emprego de técnicas sofisticadas de redução de emissões atmosféricas.

Modificações de projeto para evitar ou reduzir impactos adversos também são


medidas mitigadoras. Assim, enterrar parte de um a linha de transm issão para evitar
3Medida tornada interferência com uma rota de migração de aves3, aum entar o espaçamento entre os
em um caso em cabos de uma linha aérea para evitar que aves de grande envergadura sejam eletro­
Northumberland,
cutadas, isolar um dos cabos de uma rede de distribuição, ou ainda aum entar a altura
Reino Unido
(C. Wood, de torres de linhas de transmissão na travessia de áreas florestadas para reduzir o
University of desmatamento, são exemplos de alterações de projeto que evitam alguns impactos e
Manchester, que também podem ser chamados de medidas mitigadoras.
comunicação
pessoal, junho Em 1997, um a ação movida pelo Ministério Público Federal, responsabilizando uma
de 2000).
empresa de transmissão de energia elétrica pela morte de tuiuiús [jabiru mycteria)
na rodovia Transpantaneira, propiciou a adoção de medidas para resolver o seguinte
problema: as aves estavam morrendo eletrocutadas ao colidirem com os condutores
energizados da rede de distribuição de energia elétrica. Em um projeto-piloto, um dos
cabos convencionais da rede de distribuição foi substituído por um cabo protegido:
“A modificação da linha demonstrou ser eficiente, pois não foi constatada nenhum a
morte de tuiuiús ou de outra ave nos dois trechos modificados” (Revista de Ornitolo­
gia Paranaense, 1(3), setembro de 2000).

Medidas para evitar a ocorrência de impactos às vezes também são chamadas de


mitigadoras e, na verdade, preferíveis às medidas de redução ou minimização de im-

CAPÍTU LO
P l a n o de g e s t ã o a m b i e m H H 339

” actos. Medidas de recuperação do ambiente que virá a


Evitar impactos e prevenir riscos
ser degradado também fazem parte do plano de gestão
ambiental. Pode-se propor a ordem de preferência para
as medidas mitigadoras indicada na Fig. 13.1.
I
Reduzir ou m inim izar impactos negativos

No caso de empreendimentos de mineração, um plano


ie recuperação de áreas degradadas (Prad) deve obri­ I
gatoriamente ser apresentado com o estudo de impacto Compensar impactos negativos que não podem
ambiental, nos termos do Decreto Federal n° 97.632, ser evitados ou reduzidos
ae 10 de abril de 1989. O Prad pode constituir um
aos programas de gestão ambiental. Trata-se, neste
caso, de áreas que virão a ser degradadas se o projeto
I
Recuperar o ambiente degradado ao final de cada etapa
for aprovado. Para outros tipos de empreendimen­
do ciclo de vida do empreendimento
tos, planejar a recuperação de áreas a ser degradadas
pode ser também necessário como medida de gestão,
como é o caso da maior parte dos empreendimentos de F i9- 13/1 Preferência no controle de impactos ambientais
infraestrutura. Por outro lado, quando o diagnóstico
ambiental indicar a existência de áreas já degradadas,
sua recuperação pode ser incluída como um dos programas de gestão. Em projetos in-
custriais, medidas de remediação de áreas contaminadas também podem ser exigidas
como requisito para a aprovação de novos projetos ou da expansão de empreendi­
mentos existentes. Trata-se, em ambos os casos, de ações voltadas para a redução do
passivo ambiental.

Evitar impactos adversos deve ser o primeiro objetivo da equipe de projeto. Se houver
colaboração efetiva entre a projetista e a equipe ambiental, muitos impactos poderão
ser prevenidos ou ter menor magnitude. Assim, reduzir ou mesmo evitar a intervenção
em áreas de vegetação nativa pode ser um a condição imposta aos projetistas e pla­
nejadores. Um exemplo de como a consideração de diferentes alternativas pode
contribuir para evitar e reduzir certos impactos é dado pelo projeto de construção da
pista descendente da rodovia dos Imigrantes (Figs. 13.2 e 13.3 e Quadro 13.3).

3 projeto inicial de engenharia foi elaborado nos anos 1970, na construção da


primeira pista (ascendente), mas não executado. Anos depois, a iniciativa foi reto­
mada, o que motivou a preparação de um EIA - em 1986, aprovado em 1988 e
de algumas modificações no projeto. No entanto, o projeto só viria a ser im plan­
tado mais de um a década depois, sob um novo modelo de concessões rodoviárias
para empresas do setor privado. Na ocasião, o consórcio que venceu a licitação se
responsabilizou pela obtenção da licença de instalação. 0 longo período transcor­
rido entre o projeto original e a assinatura do contrato de concessão levou o
consórcio a rever e atualizar o projeto, à luz de técnicas construtivas mais modernas
Fig. 13.4), o que ensejou (i) a modificação de parte do traçado devido, fundam ental­
mente, a considerações geotécnicas, e (ii) a redução do número de pilares necessários
para os viadutos, com o conseqüente ganho ambiental de redução da necessidade de
desmatamento e escavações.

Nova revisão para a preparação do projeto executivo resultou em mais um a modificação


substancial, também com ganhos ambientais, que foi a junção de dois túneis em um
"I“ a iia ç ã o de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

só e a eliminação de um dos
viadutos. Uma melhor carac­
terização das características
geomecânicas do maciço ro­
choso levou a mudar o traçado
do último túnel, inserindo-o
mais profundamente no maci­
ço. Tais mudanças acarretaram
a que a construção da pista
descendente implicasse um
desmatamento quarenta vezes
menor que a construção da
pista ascendente, três déca­
— Projeto o rig in a l - 17 viadutos, 10 tú n e is
das antes (Sánchez e Gallardo.
P rojeto revisto no EIA (1988) - 11 viadutos, 5 tú n e is
2005, p. 186), com redução de
Projeto revisto para LI (1999) - 7 viadutos, 4 tú n e is
650 m da extensão dos viadu­
. Projeto e xe cu tivo - 6 viadutos, 3 tú n e is
tos e aumento de 2.661 m da
Fig. 13.2 A lte rn a tiv a s de tra ça d o p a ra a p is ta descendente da ro d o via dos Im igrantes, extensão de túneis.
São Paulo
Fonte: G allardo (2004).

Vista ascendente anteriormente construída Trechos em túnel da nova pista Trechos a céu aberto da nova pis3

Fig. 13.3 B lo c o -d ia g ra m a m o stra n d o a im p la n ta ç ã o da p is ta descendente da ro d o via dos Im ig ra n te s


Fonte: G allardo (2004).

Em seguida, na ordem de preferência para o, controle de impactos, vem a mitigaçã:


propriamente dita. Algumas medidas mitigadoras podem fazer parte do próprio pro­
4Produção mais jeto de engenharia, dele sendo indissociáveis. Por exemplo, em fábricas de cimente.
limpa significa
a instalação de sistemas de captação de poeiras, como filtros de mangas e filtros ele-
a aplicação de
tecnologias que trostáticos, faz parte do projeto de engenharia e dos estudos de viabilidade econômica,
resultem em menor sendo inconcebível projetar um a fábrica moderna sem esses sistemas, que não somente
geração de resíduos reduzem os impactos ambientais decorrentes das emissões de poluentes atmosféricos
e de poluentes como também as perdas de matérias-primas.
para uma mesma
quantidade de
Há, na atualidade, um sem-número de projetos industriais que incorporam processos
produto, ou seja,
produzir com mais de reutilização de água, de minimização de resíduos e outros conceitos da produ­
ecoeficiência. ção mais limpa4. Nesse contexto, pode-se discutir até que ponto tais características

CAPITU
P lano de gestão ambien H * 341

iL ja d r o 1 3 .3 C a ra c te rís tic a s de d ife re n te s versões do p ro je to de c o n s tru ç ã o da p is ta de sce nde nte da ro d o v ia dos


u g ra n te s
~ : z co P rojeto E s t u d o de im p a c t o L ic e n ç a de P rojeto
o r ig in a l
1 AMBIENTAL2 in s t a l a ç ã o 3 e x e c u t iv o 4

_racado e 17 v ia d u to s 14 v ia d u to s - 4 .9 2 0 m 10 v ia d u to s - 4.417 m 9 v ia d u to s - 4.27 0 m


:b ra s de arte 10 tú n e is 5 tú n e is - 5.570 m 4 tú n e is - 7 .5 3 8 m 3 tú n e is - 8.231 m
~erraplenagem 3 .8 5 0 m 3 .8 5 5 m 4.62 3 m
Extensão to t a l 1 4 .3 4 0 m 15.810 m 1 7 .1 2 4 m
do tre c h o
M é to d o Vigas p ré - V igas p ré -m o ld a d a s O e s p a ç a m e n to e n tre pilares N ú m e ro to t a l de pilares
c o n s tru tiv o m o ld a d a s com 63 pilares (som ente passou de 4 5 m para 9 0 m redu zid o para 18,
:o s v ia d u to s zona serrana), dos quais de vido à m u d a n ç a do m é to d o dos qu ais 9 necessita­
33 n e ce ssita riam nova c o n s tr u tiv o para balanços riam de nova via
via de acesso sucessivos, re d u zin d o 0 de acesso
n ú m e ro de pilares para 23,
dos quais 11 necessitariam
de novas vias de acesso
'E la b o ra d o na década de 1970 com 0 p ro je to da p ista ascendente.
2P rojeto d escrito no EIA, elaborado entre 1986 e 1988.
-P rojeto d escrito nos docum entos encam inhado s à S ecretaria do M eio A m b ie n te do Estado de São Paulo p a ra s o lic ita ç ã o de
licença de insta la ção , em 1989.
4P rojeto re visto pelo consórcio construtor.
=onte: G allardo e Sánchez (2004).

de processos tecnológicos seriam me­ - :* r

didas mitigadoras, mas tal discussão é


pouco relevante, um a vez que 0 projeto
avaliado é aquele que já incorpora essas
medidas.
>
Da mesma forma, medidas de cum ­
primento compulsório, previstas em
legislação ou regulamento, não deve­
riam ser apresentadas como medidas
mitigadoras, já que são simplesmente
obrigatórias. É óbvio que 0 atendimen­
to a tais exigências contribuirá para
atenuar os impactos adversos dos empre­
endimentos, pois foram idealizadas com
essa finalidade, mas o projeto não pode­ Fig. 13.4 C onstrução de v ia d u to da p is ta descendente da ro d o via dos Im i­
rá ser executado sem sua observância, já grantes, São Paulo, com reduzida in te rfe rê n c ia sobre a vegetação n a tiv a
que são requisitos legais.

Uma lista de medidas para prevenir, ate­


nuar ou compensar os impactos adversos de projetos rodoviários é apresentada no
Quadro 13.4. Descritas dessa forma, são medidas genéricas, que só farão sentido
quando aplicadas e detalhadas para cada caso concreto, 0 que muitas vezes requer um
projeto de engenharia ou um programa detalhado de implementação.
342 rfSgjaliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Q u a d r o 1 3 .4 P rin cip a is m e d id a s m itig a d o ra s e c o m p e n s a tó ria s a d o ta d a s em p ro je to s ro d o v iá rio s


I m p a c t o a m b ie n t a l M e d id a m i t i g a d o r a o u c o m p e n s a t ó r ia

M o d ific a ç ã o do relevo Obras de arte, desvios e tra ç a d o s a lte rn a tiv o s


In te n s ific a ç ã o dos processos erosivos Redução da área de in te rv e n ç ã o
Drenagem e revegetação de ta lu d e s
E vitar c o n c e n tra ç ã o de flu x o s de e s c o a m e n to s upe rficia l
Bacias de re te n çã o te m p o rá ria das águas su p e rfic ia is
In d u çã o de e s c o rre g a m e n to s e o u tro s A nálise prévia das c o n d içõ e s g e o té c n ic a s
m o v im e n to s de massa
A u m e n to da carga de s e d im e n to s e D renagem e revegetação de ta lu d e s
a sso re a m e n to Bacias de d e c a n ta ç ã o
R epresam ento parcial de cursos d'água Tubulões de tra n s p o s içã o bem d im e n s io n a d o s e p o siciona dos
Fundações de p o n te s a b a ixo do nível de e s tia g e m da água
A lte ra ç ã o da q u a lid a d e das águas supe rficia is S istem as passivos de t r a t a m e n t o de águas
A lte ra ç ã o das prop riedad es físicas e bio ló g ica s Redução da área de in te rv e n ç ã o
do solo Recuperação de áreas degradadas
A lte ra ç ã o da q u a lid a d e do ar R egulagem e m a n u te n ç ã o de m á q u in a s e e q u ip a m e n to s
A u m e n t a r d istâ n c ia e n tre pista e áreas de o cu p a ç ã o densa
A lte ra ç ã o do a m b ie n te sonoro Barreiras físicas
Barreiras vegetais
A u m e n ta r d is tâ n c ia e n t r e v is t a e áreas de o c u p a ç ã o densa
Risco de p o lu iç ã o da água e do solo A rm a z e n a m e n to em s u p e rfície de de riva dos de pe tró le o
com su b stâ n cia s q u ím ic a s Planos de ação de e m ergê ncia
Criação de áreas de e s ta c io n a m e n to de cargas perigosas
D estru ição e fra g m e n ta ç ã o de h á b ita ts da Obras de arte, desvios e tra ç a d o s a lte rn a tiv o s
vida selvagem R e flo re s ta m e n to c o m p e n s a tó rio , conservação
Remoção, estocag em e reúso da cam ada s u p e rfic ia l de solo
Estresse sobre v e g e ta ç ã o n a tu ra l devido Desvios e tra ç a d o s a lte rn a tiv o s
à p o lu iç ã o do ar A u m e n t a r d istâ n cia e n tre pista e áreas de v e g e ta ç ã o s ig n ific a tiv a
Perda e a f u g e n ta m e n to de espécimes Redução das áreas de d e s m a ta m e n to
de fa u n a
Perda de espécim es da fa u n a por a tr o p e la m e n to Passagens de fa u n a
S o te rra m e n to de c o m u n id a d e s b e n tô n ic a s Bacias de d e c a n ta ç ã o
Tubulões de tra n s p o s içã o bem d im e n s io n a d o s e posicionados
Criação de a m b ie n te s lê n tico s Obras de d re n a g e m bem d im e n s io n a d a s
M o d ific a ç õ e s na cadeia a lim e n ta r Bacias de d e c a n ta ç ã o
S istem as passivos de t r a t a m e n t o de águas
A lte ra ç ã o das fo rm a s de uso do solo Z o n e a m e n to e pla n o de uso do solo
A d e n s a m e n to da o cu p a ç ã o nas m argens Z o n e a m e n to e p la n o de uso do solo
e na área de in flu ê n c ia
A lte ra ç ã o ou perda de sítios a rqu eoló gicos, Pesquisa e resgate, p u b lic a ç ã o dos resultados
o u tro s e le m e n to s do p a tr im ô n io c u ltu ra l
Im p a c to visual Redução da área de in te rv e n ç ã o
Redução das áreas de d e s m a ta m e n to
O bras'de arte, desvios e tra ç a d o s a lte rn a tiv o s
B arreiras veg e ta is
D e s lo c a m e n to de pessoas e a tiv id a d e s Redução da área de in te rv e n ç ã o
e co n ô m ica s R eassentam ento
C riação de e x p e c ta tiv a s e in q u ie ta ç ã o T ransparência na d iv u lg a ç ã o e nas c o n s u lta s p ú blicas
j u n t o à p o p u la ç ã o

CAPITU
P lano de gestão ambie 343

-:sndono ou redução das atividades agrícolas Redução da área de intervenção


Especulação imobiliária Divulgação prévia do traçado
--m ento do número de transações imobiliárias
. alorização/desvalorização imobiliária Zoheamento e plano de uso do solo
-.m ento da oferta de empregos
-.m e nto da demanda de bens e serviços
-.m e n to da arrecadação tributária
-edução das oportunidades de trabalho
- .mento do tráfego nas vias interconectadas Serviços de melhoria dessas vias
nterferência com caminhos e passagens Passagens de pedestres, rebanhos e para trânsito local
preexistentes

Embora o EIA possa apontar as medidas


compulsórias que deverão ser atendidas
(o que pode ser útil para conhecimento do
empreendedor e do público interessado),
a equipe deve dirigir seus esforços para
a concepção, a análise e a discussão de
medidas especificamente voltadas para o
projeto. Medidas de aplicação genérica,
como as relacionadas no Quadro 13.3,
devem ser particularizadas para o proje­
to em estudo. Assim, para o desenho de
passagens de fauna (Fig. 13.5), é preciso
selecionar os locais mais propícios (aque­
les com maior probabilidade de serem
usados pelas espécies visadas) e estudar
as dimensões mais apropriadas (seção Fig. 13.5 Passagem para fauna em rodovia que cruza o Parque N acional
transversal para o caso de passagens sob Banff, Alberta, Canadá

a pista, necessidade de poços de ilum ina­


ção se a passagem for muito longa).

0 estudo da Comissão Mundial de


Barragens constatou que muitas medidas
mitigadoras simplesmente não atingem
seus objetivos. Os esforços de “resgate”
de fauna, tantas vezes veiculados pela
mídia como exemplo de “responsabili­
dade ecológica”, tiveram pouco “sucesso
sustentável”, e as escadas para peixes
(Fig. 13.6) também tiveram pou­
co sucesso, na medida em que “a
tecnologia não foi especificamente
ajustada às condições e às espécies lo­
cais” (WCD, 2000, p. 83). Esse estudo
recomenda que, para um a boa mitiga- Fig. 13.6 Escada para peixes na barragem de Itaipu, Paraná

TR
344 ^ ^ a l i a ç ã o de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

ção, são necessários: (i) um a boa base de informação (diagnóstico);


(ii) cooperação, desde o início da avaliação ambiental, entre ecólogos, projetistas da
barragem e população afetada; e (iii) monitoramento sistemático, acompanhado de
análises sobre a eficácia das medidas mitigadoras que possam ser difundidas para
aplicação em outros projetos.

0 estudo sistemático dos erros e acertos de experiências passadas, com toda certeza, é
a melhor m aneira de avançar no projeto e nas especificações de medidas mitigadoras
eficazes. No setor das rodovias, vários
anos de pesquisas e aplicações permitem
que, em países como França e Holan­
da, viadutos para fauna, ou “ecodutos”,
sejam implementados em todos os locais
relevantes e que as faixas de domínio de
várias autopistas sejam manejadas como
corredores e não como barreiras ecológi­
cas (Rijkswaterstaat, 1995; Setra, 1993a).
Evidentemente, trata-se, aqui, de impac­
tos diretos. As questões suscitadas pelo
efeito i*ndutor à ocupação de áreas servi­
das pelas rodovias são de outra natureza.
E o caso do efeito da pavimentação de
rodovias amazônicas sobre as derrubadas
Fig. 13.7 Bacias de contenção ao redor de tanques de arm azenamento de florestas ou do efeito do adensamento
de produtos químicos (à esquerda) e sistemas de tratam ento de efluentes urbano em zonas de proteção aos
(no caso, chorum e de um aterro sanitário) estão entre as medidas correntes mananciais.
de prevenção e correção de im pactos adversos. A terro sanitário instalado na
antiga pedreira M iron, M ontreal, Canadá, onde tam bém funciona uma usina Atualmente, quase todos os seto­
term elétrica alim entada pelos gases produzidos no aterro res da atividade econômica já foram
suficientemente estudados para que
se possam prescrever as principais
medidas de mitigação e de prevenção
de impactos adversos (Fig. 13.7 e 13.8),
agrupadas sob a noção de melhores prá­
ticas ambientais e as inúmeras variações
do termo, como boas práticas de gestão
ambiental, melhores tecnologias dispo­
níveis ou melhores técnicas que não
acarretem custos excessivos. Essas boas
práticas foram compiladas e são conti­
nuamente atualizadas por associações
de empresas de um mesmo setor, por
entidades governamentais ambientais
Fig. 13.8 Pequenas bacias de retenção de sedimentos provenientes de áreas ou industriais e também por organiza­
de terraplenagem e proteção com gram a de talude em solo, realizada im e­ ções internacionais. Pode-se citar a série
diatam ente após a conclusão dos trabalhos de escavação, são medidas que publicada pela Agência de Proteção
reduzem a degradação da qualidade das águas superficiais. Construção da Ambiental Australiana sobre gestão
pista descendente da rodovia dos Imigrantes, SP ambiental na mineração (cujo resumo é

CAPITU
P lano de gestão am bien

EPA, 1995), publicações do Serviço Técnico de Rodovias da França (Setra, 1993b) e o


M anual de Gerenciamento Integrado de Lixo (IPT/Cempre, 2000)

Não há necessidade de o EIA alongar-se sobre as medidas genéricas, mas sim em


sua adaptação ao projeto analisado. Como toda prescrição genérica, esses guias de
boas práticas precisam ser traduzidos em medidas ajustadas para as condições de
cada empreendimento. Se, para vários setores industriais, as tecnologias de produção
guardam similaridades qualquer que seja a localização da fábrica, para obras de
infraestrutura, minas, barragens e outros tipos de projetos cujas características estão
diretam ente ligadas às condições do terreno, é sempre necessário que os program as
de mitigação sejam desenhados sob medida. Em qualquer caso, os guias de boas prá­
ticas representam referências im portantes que devem ser levadas em conta. Na gestão
ambiental de organizações, o conhecimento das melhores práticas empregadas por
empresas do setor é conhecido por benchmarking (balizamento).

13.3 P r e v e n ç ã o d e r i s c o s e a t e n d i m e n t o a e m e r g ê n c i a s
A lguns impactos são de ocorrência incerta, mas a incerteza n ã o p o d e de f o r m a
algum a, ser negligenciada na avaliação de impacto ambiental, e muito menos durante
o ciclo de vida do empreendimento.

Da mesma forma que impactos incertos devem ser identificados no estudo de impacto
ambiental, o plano de gestão deve incluir medidas voltadas a eles. Quando o EIA
comporta um estudo detalhado de risco, ou é complementado por um estudo de
análise de risco, isso se torna evidente. 0 estudo de risco proporá um a série de m e­
didas de redução e gestão do risco, que n aturalm en te deverão fazer parte do plano
de gestão do empreendimento. Entretanto, mesmo que o projeto não comporte graves
perigos e não seja necessária a preparação de um estudo de risco, a incerteza sobre a
ocorrência de certos impactos (que somente ocorrerão caso certas condições se m a n i­
festem) não pode ser usada para ju stificar a ausência de medidas para redução de
riscos. Elas devem, assim, fazer parte do conjunto de medidas mitigadoras.

Dois conjuntos de medidas especificamente voltadas para a gestão de riscos podem


fazer parte do plano de gestão ambiental: o plano de gerenciam ento de riscos e o
plano de atendim ento a emergências. 0 plano de gerenciam ento de riscos (PGR) deve
contemplar todas as ações voltadas para a prevenção de acidentes am bientais e todas
as ações a serem im plem entadas em caso de ocorrência de um acidente. 0 Quadro
13.5 traz os componentes de um plano completo de gerenciamento de riscos, aplicado
a em preendim entos do setor químico e ao tran sp o rte e arm azenam ento de petróleo
e derivados. Cabe ao órgão licenciador d eterm in ar a necessidade de apresentação
de um PGR, a fase do processo de licenciamento em que o plano e o seu conteúdo
devem ser apresentados. Muitas das inform ações a serem aí prestadas j á constam dos
estudos ambientais, como as inform ações de segurança do processo, que incluem a
relação das substâncias químicas utilizadas, a descrição do processo produtivo (com
fluxogram as, balanços de m assa e outras informações), os equipam entos e os proce­
dimentos operacionais.

Para boa parte dos em preendim entos sujeitos ao processo de AIA, não é necessário
um grande detalham ento dos procedim entos de segurança e gerenciam ento de riscos,
346 W ^ a lia ç ã o de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

haja vista que, via de regra, apresentam riscos substancialmente menores que o de
indústrias químicas ou de instalações de transporte e armazenagem de petróleo ou
derivados. Pode assim ser suficiente um a descrição dos procedimentos de prevenção
de riscos e das ações previstas em caso de ocorrência de acidentes.

Q u a d r o 1 3 .5 E s tru tu ra de um P lano de G e re n cia m e n to de Riscos


T ip o 1 <’ > T ip o II <2 >
In fo rm a ç õ e s de segurança de processo In fo rm a ç õ e s de segurança de processo
Revisão dos riscos de processos
G e re n c ia m e n to de m o d ific a ç õ e s
M a n u te n ç ã o e g a ra n tia da in te g rid a d e M a n u te n ç ã o e g a ra n tia da in te g rid a d e
de sistem as c rítico s de sistem as c rítico s
P ro c e d im e n to s o p e ra c io n a is P ro c e d im e n to s o p e ra cio n a is
C a p a c ita ç ã o de recursos h u m a n o s C a p a cita çã o de recursos h u m a n o s
Inve stig a çã o de in cid e n te s
Plano de ação de e m ergê ncia (PAE) Plano de ação de e m e rg ê n c ia (PAE)
A u d ito ria s
(1) Para empreendimentos de médio e grande porte.
(2) Para empreendimentos de pequeno porte.
Fonte: Cetesb (2003). *>

Tais ações podem ser descritas no Plano de Atendimento a Emergências (PAE). Esse
plano é exigível em certos casos —por exemplo, no Estado de São Paulo é obrigatório
para o licenciamento de empreendimentos sujeitos à apresentação de estudos de
análise de risco ou planos de gerenciamento de riscos, e também para rodovias. Por
outro lado, muitas empresas preparam planos de emergência de forma voluntária.
Vale lembrar que a preparação para atendimento a emergências é item obrigatório de
sistemas de gestão ambiental que sigam as diretrizes da norma NBR ISO 14.001: 2004
e para as empresas que adotam o programa Atuação Responsável® da Associação
Brasileira da Indústria Química (Abiquim).

0 programa Atuação Responsável® é a versão brasileira do programa internacional


Responsible Care, pelo qual, independentemente de obrigações legais, as empresas
associadas se comprometem a cumprir um a série de requisitos de segurança e quali­
dade ambiental, normalizados em “códigos”. 0 programa Atuação Responsável® é um
modelo de gestão ambiental adaptado à indústria química.

Um PAE deve conter, entre outros itens (Cetesb, 2003):

U
(i) uma descrição dos cenários ou hipóteses acidentais considerados;
(ii) as ações de resposta às situações emergenciais compatíveis com os cenários
acidentais considerados, incluindo os procedimentos de avaliação da situação, a
atuação emergencial (combate a incêndios, isolamento, evacuação, contenção de
vazamentos etc.) e ações de recuperação das áreas afetadas;
(iii) a descrição dos recursos materiais e humanos disponíveis, e os programas de
treinamento e capacitação.

CAPÍTUÍLO
Plano de g e s t ã o a m b ie n l S H 347

A capacitação dos recursos hum anos é


um dos requisitos mais importantes para
o sucesso dos planos de emergência e a
obtenção de bons resultados dos demais
elementos do plano de gestão ambiental.
As situações que combinam baixa pro­
babilidade com conseqüências de média
ou alta m agnitude podem representar
dificuldades para difundir um a cultura
de prevenção entre funcionários e diri­
gentes. A Fig. 13.9 mostra um a barragem
de rejeitos de um a m ina de cobre no sul
de Portugal, projetada e construída se­
gundo modernos conceitos de segurança
de barragens. Esse exemplo ilustra uma Fig. 13.9 Barragem de rejeitos da m ina Neves Corvo, Portugal, com função
situação na qual a probabilidade de ocor­ de arm azenar à perpetuidade os resíduos provenientes do tratam ento de
rência de um acidente grave é baixíssima, m inério; à esquerda, vê-se a bacia de rejeitos, perm anentem ente coberta
porém, se acontecer, os resultados certa­ de água para prevenir a form ação de drenagem ácida; ao mesmo tem po que
mente serão desastrosos, se não para o é uma medida m itigadora, uma barragem de rejeitos é um com ponente do
ambiente, para a companhia, que verá projeto que demanda grande atenção para o gerenciam ento de riscos
seu nome diariamente na imprensa asso­
ciado a um acidente de grandes proporções. Foi o que ocorreu com a empresa sueca
Bolidcn, a pouco mais de 100 km dali, quando, em abril de 1998, rompeu-se um a
barragem de rejeitos na localidade espanhola de Aznalcóllar. Cerca de 5,5 milhões
de m3 de rejeitos contendo metais pesados escoaram pelo rio Guadalquivir até sua
foz, inundando, pelo caminho, cerca de 2.600 ha de pomares, hortas e outras áreas,
ameaçando tam bém um parque nacional (Icold, 2001). Casos mais dramáticos, porém,
ceifaram vidas humanas.

0 gerenciamento de riscos ambientais precisa envolver a comunidade. Para esse


fim, o Program a das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) desenvolveu
o Program a APELL (Awareness and Preparedness f o r Emergencies at Local Levei),
"para reunir as pessoas a fim de possibilitar um a comunicação efetiva sobre riscos
e respostas emergenciais” e (i) reduzir riscos; (ii) melhorar a eficácia de resposta a
acidentes; (iii) perm itir uma reação apropriada das pessoas comuns durante emer­
gências (Unep, 2001).

13.4 M e d id a s c o m p e n s a t ó r ia s
Alguns impactos ambientais não podem ser evitados. Outros, mesmo que reduzidos
ou mitigados, podem ainda ter magnitude muito elevada. Nessas situações, fala-se
em medidas para compensar os danos ambientais que vierem a ser causados e que
não poderão ser mitigados de modo aceitável. Um exemplo típico é o da perda de um a
porção de vegetação nativa, comum em empreendimentos como rodovias, barragens,
minas e outros. 0 objetivo de m inim izar a perda de hábitats deverá estar presente em
todo EIA de um empreendimento que possa causar tal impacto. Assim, desviar um
trecho de estrada, fazer um túnel, reduzir a altura de um a barragem para diminuir a
348 aliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

área de inundação de um reservatório ou renunciar a extração de todo o minério de


um a jazida para m anter intactas porções de vegetação deverão ser alternativas consi­
deradas no planejamento desses projetos. No entanto, poderão apresentar-se situações
em que nenhum a alternativa elimina completamente a necessidade de remoção de
vegetação nativa, ou não reduz satisfatoriamente essa necessidade - em tais casos
pode ser socialmente aceitável a compensação. Em outras palavras, pode-se dizer
que o preço a pagar pelo empreendimento é, por exemplo, a remoção da vegetação
nativa (com seus impactos decorrentes), mas que tal perda pode ser compensada.
Mas compensada como?

Não se trata de indenização monetária, como ocorre, por exemplo, quando um imóvel
é desapropriado por razões de utilidade pública, mas de um a compensação “em
espécie”. Assim, a perda de 38 hectares de cerrado, por exemplo, pode ser compen­
sada pela conservação de um a área equivalente ou maior ou pela recuperação da
vegetação de uma área degradada, ou ainda por ambas as medidas.

No entanto, o entendimento acerca do que é um a compensação pode, na prática, se


afastar da ideia original de substituir um componente ambiental perdido ou recompor
um a função ambiental negativamente afetada. Assim, “medidas muito distantes das
preocupações ambientais puderam ser apresentadas no capítulo das compensações
de numerosos estudos de impacto” na França (Ministère de VEnvironnement,
1985, p. 5).

Medidas compensatórias são empregadas em várias partes do mundo, envolvendo


impactos ecológicos e sociais. No Brasil, a legislação prevê condições específicas
para a compensação ambiental. Em dezembro de 1987, a Resolução do Conama n°
10/87, já revogada, previa que “o licenciamento de obras de grande porte” teria como
pré-requisito a implantação de um a estação ecológica (uma categoria de área
protegida), “preferencialmente junto à área do empreendimento”. 0 investimento
nessa área deveria ser proporcional ao dano ambiental causado e nunca inferior a
0,5% dos “custos totais previstos” para o empreendimento. Nova regulamentação
surgiu através da Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Lei Federal n°
9.985 de 18 de abril de 2000), que fundam entalm ente manteve a redação da Resolução
Conama. Seu Art. 36 estipula que:

Nos casos de licenciamento ambiental de empreendimentos de significativo


impacto ambiental, assim considerado pelo órgão ambiental competente, eom
fundamento em estudo de impacto ambiental e respectivo relatório —EIA/Rima —,
o empreendedor é obrigado a apoiar a implantação e manutenção de unidade de
conservação do Grupo de Proteção Integral [...].

0 grupo de proteção integral inclui os tipos de unidades de conservação de maior


restrição para o uso direto, ou seja, parques nacionais, estações ecológicas, reservas
biológicas, monumentos naturais e refúgios da vida silvestre.

A lei também manteve o percentual mínimo de 0,5% “dos custos totais previstos para
a implantação do empreendimento” a ser aplicado nessas unidades de conservação,
cabendo ao órgão licenciador eventualmente estabelecer percentual maior, “de acordo

CAPITU
P lano de gestão am bien H ® 349

com o grau de impacto am biental causado”. Não há regra clara para estabelecer 0
m ontante ^ ser empregado na com pensação5. No caso do projeto de construção da 5A aplicação
pista descendente da rodovia dos Imigrantes, em São Paulo, a licença prévia fixou dos recursos da
0 percentual de 2% para ser aplicado em projetos no interior do Parque Estadual da compensação
Serra do Mar, atravessado por essa rodovia. ambiental foi
detalhada na
Resolução Conama
Na Holanda, com relação ao planejamento de rodovias, a compensação ecológica é bem
n° 357, de 5 de
sofisticada. Requerida por lei de 1993, ela deve ser buscada para situações de (i) perda de abril de 2006.
hábitats, (ii) degradação de hábitats devido ao ruído, ilum inação ou poluição das águas; e
iii) isolamento (fragmentação) de hábitats. A área degradada no entorno da rodovia
devido ao efeito do ruído sobre as aves deve ser calculada no estudo de impacto
ambiental e pode atingir até 1 km em áreas florestadas e u ltrap assar 2 km em áreas
abertas (Cuperus et al., 2001). 0 m ontante a ser dedicado à compensação não é esta­
belecido a priori, mas 0 custo, evidentemente, depende da estratégia de compensação
a ser empregada e do preço dos terrenos a serem adquiridos, se necessário. A regra
geral é a de compensação na base de um para um (1 ha de compensação para cada
1 ha afetado), 0 que, segundo 0 estudo de Cuperus et al. (2001), é insuficiente para
cobrir todos os danos ecológicos, haja vista que os impactos devido à fragm entação
de hábitats são raram ente quantificados.

Um princípio largam ente empregado na compensação am biental é evitar perda


líquida de hábitats (no n et loss). Usado na Holanda, tam bém é adotado em outras
jurisdições, como nos Estados Unidos. Nesse país, 0 artigo 404 da Lei da Á gua Limpa
(Clean Water Act), de 1972, estabelece a necessidade de obtenção de um a autorização
federal para 0 lançam ento de sólidos na água ou 0 aterro de áreas úmidas. Um reg u ­
lamento baseado nessa lei perm ite a compensação pela perda de zonas alagadiças,
/

caso não seja possível encontrar alternativas p ara evitar essa perda. E permitido
que a compensação seja feita em outro local, situado de preferência na mesma bacia 6Essa é uma
hidrográfica, por meio de ações de restauração ou reabilitação de outras áreas úmidas. grande diferença
0 empreendedor, público ou privado, promove primeiro a recuperação de um a certa conceituai
em relação à
área, que tem sua qualidade ambiental avaliada, 0 que lhe dá direito a créditos, depo­
compensação
sitados em um banco hipotético. Em seguida, ao obter a aprovação para seu projeto, ambiental
ele debita créditos dessa conta. Empresas ou instituições que têm vários projetos brasileira, a qual,
podem adicionar e retirar créditos do seu banco, conforme promovem iniciativas vista sob esse
de recuperação de zonas alagadiças e im plem entam seus projetos. Bancos privados ângulo, parece mais
foram criados. Eles com pram terrenos, promovem a restauração de u m a zona alaga- uma taxa ambiental
diça e, em seguida, vendem créditos a empreendedores que deles necessitam. Toda a ser recolhida por
um empreendedor
área recuperada nessa m odalidade deve passar a ter proteção legal que impeça sua
que cause impacto
ulterior degradação ou destruição, seja como propriedade privada, seja tran sferin d o -a
significativo e
para algum ente governam ental com atribuições de conservação am biental (Weems não como um
e Canter, 1995). mecanismo de
reposição, de
>»a A lem anha, a mitigação e a compensação são obrigatórias ^e.\a Lei L eàeiai úe substituição
Conservação da Natureza de 1976, não se lim itando a projetos submetidos à prepa­ ou mesmo de
indenização
ração de um EIA. Depois de exploradas as opções de evitar impactos adversos e
de funções ou
de m inim izá-los, devem ser consideradas as possibilidades de compensação ditas
componentes
de “recuperação am biental” e de “substituição”, que requerem um a “conexão dire­ ambientais
ta espacial e funcional” com as funções e os componentes am bientais perdidos6. perdidos.
P l a n o de g e s t ã o a m b ie n

pessoas (Rushu, 2003), além de deslocar atividades econômicas em um a área de mais


de 100 mil ha, incluindo 159 indústrias e cerca de 1.000 km de rodovias (Shu-yan,
2002). Os projetos de reassentam ento de populações h u m a n a s são u m a ten tativa de
m itigar e com pensar os efeitos negativos do deslocamento forçado.

Da mesma forma que os impactos ecológicos eram negligenciados quando do plan e­


jam ento e da execução de projetos de desenvolvimento, o deslocamento de pessoas
era tam bém tratado com descaso. Em m uitas b arrag en s co nstru íd as no Brasil, por
exemplo, se um a fam ília deslocada não podia com provar a propriedade ou a posse da
terra, era simplesmente despejada, sem que lhe fosse dada n e n h u m a compensação,
exceto um pagam ento, no m ais das vezes irrisório, pelas benfeitorias de sua terra.
Como esses projetos hidrelétricos eram geralm ente feitos em regiões interioranas
afastadas dos núcleos m ais dinâm icos do País, a economia local tam bém era fra ­
camente m onetarizada, caracterizando-se pela produção agrícola de subsistência e
pelas trocas com unitárias de produtos e serviços, reservando-se o uso do dinheiro
íomente para a aquisição de alg u n s produtos industrializados ou para o pagam ento
ie certos serviços como transporte. Assim, o pagam ento de u m a indenização m uitas
*ezes redundava no gasto quase imediato do dinheiro, sem que este fosse reinvestido,
i-eja por ser insuficiente p ara a aquisição de um a propriedade ru ra l ou u rbana, seja
porque o dinheiro era usado na aquisição de bens de consumo.

I s program as de reassentam ento v ieram ten tar suprir as deficiências dos esquem as
■adicionais de desapropriação e deslocamento de grupos h u m an o s afetados por g ra n -
íes projetos desenvolvim entistas. Data de 1980 a adoção pelo Banco M undial de
r j a primeira política sobre reassentam ento involuntário, que preconizava um tra ta -
~ento sistemático da questão, levando em conta os impactos sobre as populações
:-~e:amente afetadas. F u ndam ental para essa política era o planejam ento prévio
:: reassentam ento, visand o reproduzir, no novo local, condições sim ilares àquelas
I t-iperim entadas pela população no seu local de origem.

C : :rocedim entos preconizados por essa política eram muito diferentes dos modos de
l a i : então vigentes, e sua aplicação foi dificultada pela resistência dos promotores
l t : : projetos de desenvolvimento, que viam o reassentam ento apenas como custo
p i - d o n a l - o fato de em preendim entos como barragens e rodovias serem m uitas
^zts promovidos por agentes públicos e serem tidos ju rid icam en te como de utilidade
■ p L i l c a fornecia u m a legitimação à tal resistência.

■ r . entanto, em 1980, a política do Banco M undial não fazia mais do que refletir a
■ I " : -letação e a resistência ativa de m uitas com unidades atingidas por projetos que
■ i _: i v a m seu deslocamento. Em vários países em desenvolvim ento surgiam movi-
de protesto aos deslocamentos forçados. No Brasil, a década de 1990 viu
■ K r i i r o MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens), que continua opondo-se
■ i : "lo c a m e n to s involuntários de pessoas. Projetos de m enor porte tam bém foram
de contestação por parte das populações diretam ente afetadas. Na cidade de
IS -=ulo, por exemplo, a oposição ao projeto viário u rb an o denom inado “Operação
( f e ~ i l i m a ” teve grande repercussão na im prensa e deu origem a ações judiciais que
Tavam o em preendim ento proposto e suas desapropriações.
liação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Somente quando são esgotadas as possibilidades, a legislação permite uma compen­


sação em outro local. Para facilitar essa última modalidade de compensação, a lei foi
modificada em 2002, com a criação de pools ou bancos de compensação, pelos quais
o empreendedor pode buscar no mercado as áreas oferecidas para compensação que
atendam às necessidades do seu projeto. Isso, segundo Wende, Herberg e Herzberg
(2005) resolveu um dos principais problemas, que era a dificuldade de se encontrar
terrenos aptos para os projetos de compensação. Mas se a conexão espacial foi flexibi­
lizada, a conexão funcional continua um a obrigação e “j á não é possível argum entar
que faltam locais para receber os projetos de compensação” (p. 104).

Assim, os princípios que norteiam a compensação ambiental devem ser:


# proporcionalidade entre o dano causado e a compensação exigida, que deve ser,
no mínimo, equivalente;
# preferência por medidas compensatórias que representem a reposição ou a
substituição das funções ou dos componentes ambientais afetados (conexão
funcional);
# preferência por medidas que possam ser implementadas em área contígua à área
afetada ou, alternativamente, na mesma bacia hidrográfica (conexão espacial).

A compensação também pode dar-se pela conservação de um bem de natureza dife­


rente daquele afetado, desde que se possa çstabelecer alguma relação. Por exemplo, a
restauração de um monumento de valor histórico ou outro bem cultural poderia ser
aceita como compensação pela perda de um sítio arqueológico ou mesmo pela alte­
ração da paisagem.

A compensação é, portanto, um a substituição de um bem que será perdido, alterado


ou descaracterizado por outro, entendido como equivalente. Ela não deve ser confun­
dida com a indenização, que é um pagamento em espécie pela perda de um bem
(juridicamente, os bens ambientais e culturais são tidos como indisponíveis).

13.5 R e a s s e n t a m e n t o de p o p u la ç õ e s h u m a n a s
Os estudos ambientais de empreendimentos que envolvam o deslocamento de pessoas
devem dedicar uma atenção especial ao programa de reassentamento da população.
No passado, esses projetos somente pagavam indenização pelo valor da propriedade e
das benfeitorias afetadas, como, por exemplo, no caso de desapropriações para fins de
utilidade pública. As pessoas que não tinham título de propriedade - a realidade mais
comum nas zonas rurais dos países em desenvolvimento - eram, na maioria das vezes,
expulsos das terras que ocupavam, em uma atitude autoritária e profundamente injusta.

0 deslocamento involuntário de pessoas é uma conseqüência de diferentes ti­


pos de projetos de desenvolvimento, como barragens, rodovias, minas, projetos
agropecuários, urbanísticos e turísticos, entre outros. 0 número de pessoas involun­
tariamente deslocadas tem crescido nas últimas décadas e atinge a casa dos milhões
a cada ano. Estima-se que somente os projetos de transporte urbano resultam no
deslocamento de cerca de 6 milhões de pessoas por ano (M. Cernea, Banco Mundial,
comunicação pessoal, ju n h o de 1994). Um único projeto, a usina hidrelétrica de Três
Gargantas, construída no rio Yangtzé, China, provocou o deslocamento de 1.310.000

CAPÍTUi LO
P l a n o de g e s t ã o a m b i e n

pessoas (Rushu, 2003), além de deslocar atividades econômicas em um a área de mais


de 100 mil ha, incluindo 159 indústrias e cerca de 1.000 km de rodovias (Shu-yan,
2002). Os projetos de reassentamento de populações hum anas são uma tentativa de
mitigar e compensar os efeitos negativos do deslocamento forçado.

Da mesma forma que os impactos ecológicos eram negligenciados quando do plane­


jamento e da execução de projetos de desenvolvimento, o deslocamento de pessoas
era também tratado com descaso. Em muitas barragens construídas no Brasil, por
exemplo, se um a família deslocada não podia comprovar a propriedade ou a posse da
terra, era simplesmente despejada, sem que lhe fosse dada nenhum a compensação,
exceto um pagamento, no mais das vezes irrisório, pelas benfeitorias de sua terra.
Como esses projetos hidrelétricos eram geralmente feitos em regiões interioranas
afastadas dos núcleos mais dinâmicos do País, a economia local também era fra­
camente monetarizada, caracterizando-se pela produção agrícola de subsistência e
pelas trocas comunitárias de produtos e serviços, reservando-se o uso do dinheiro
somente para a aquisição de alguns produtos industrializados ou para o pagamento
de certos serviços como transporte. Assim, o pagamento de um a indenização muitas
vezes redundava no gasto quase imediato do dinheiro, sem que este fosse reinvestido,
seja por ser insuficiente para a aquisição de um a propriedade rural ou urbana, seja
porque o dinheiro era usado na aquisição de bens de consumo.

Os programas de reassentamento vieram tentar suprir as deficiências dos esquemas


tradicionais de desapropriação e deslocamento de grupos humanos afetados por g ran ­
des projetos desenvolvimentistas. Data de 1980 a adoção pelo Banco Mundial de
sua primeira política sobre reassentamento involuntário, que preconizava um tra ta ­
mento sistemático da questão, levando em conta os impactos sobre as populações
diretamente afetadas. Fundamental para essa política era o planejamento prévio
do reassentamento, visando reproduzir, no novo local, condições similares àquelas
experimentadas pela população no seu local de origem.

Os procedimentos preconizados por essa política eram muito diferentes dos modos de
agir então vigentes, e sua aplicação foi dificultada pela resistência dos promotores
dos projetos de desenvolvimento, que viam o reassentamento apenas como custo
adicional — o fato de empreendimentos como barragens e rodovias serem muitas
vezes promovidos por agentes públicos e serem tidos juridicamente como de utilidade
pública fornecia um a legitimação à tal resistência.

No entanto, em 1980, a política do Banco Mundial não fazia mais do que refletir a
inquietação e a resistência ativa de muitas comunidades atingidas por projetos que
forçavam seu deslocamento. Em vários países em desenvolvimento surgiam movi­
mentos de protesto aos deslocamentos forçados. No Brasil, a década de 1990 viu
surgir o MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens), que continua opondo-se
a deslocamentos involuntários de pessoas. Projetos de menor porte também foram
objeto de contestação por parte das populações diretamente afetadas. Na cidade de
São Paulo, por exemplo, a oposição ao projeto viário urbano denominado “Operação
Faria Lima” teve grande repercussão na imprensa e deu origem a ações judiciais que
contestavam o empreendimento proposto e suas desapropriações.
aliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

O reassentamento surgiu, assim, ao mesmo tempo como um a resposta aos problemas


causados pelo deslocamento de quantidades crescentes de pessoas e como umi
resposta à oposição encontrada pelos promotores de muitos projetos que implicavan
o deslocamento forçado. Trata-se de um a ação planejada de deslocamento, transfe­
rência e reinstalação involuntária de pessoas e suas atividades em um novo local -
um a medida mitigadora e compensatória de alguns impactos negativos causados
As populações afetadas podem ser rurais ou urbanas. 0 novo local deve ser api:
para que as comunidades reassentadas possam continuar a exercer suas ativida­
des e, se possível, deve fornecer melhores condições de infraestrutura e serviços
Além de prover condições adequadas de vida para as populações deslocadas, um
projeto de reassentamento não deveria provocar impactos ambientais significativos -
/

por exemplo, parte da população deslocada para a construção da avenida Agus


Espraiada, em São Paulo, foi se instalar em local com remanescentes de vegetação na­
tiva às margens da represa Guarapiranga, em plena área de proteção aos mananciais

Hoje é obrigatório realizar um trabalho cuidadoso antes da transferência dessa:


populações, durante a mudança e por anos depois de efetivada a transferência para
os novos locais. As diretrizes do Banco Mundial para reassentamento estabelecem
que as populações afetadas devem:
# ser informadas de seus direitos e opções de reassentamento;
# ser consultadas, poder escolher entre opções técnica e economicamente viáveis
de reassentamento;
# receber compensação imediata e efetiva mensurada pelo custo total de reposiçã:
de benfeitorias perdidas.
(Operational Policy 4.12, “Involuntary Resettlement”, dezembro de 2001, § 6(a)

As metodologias de reassentamentos humanos evoluíram bastante nas últimas três


décadas, quando um paradigma social substituiu paulatinamente o econômico. Dt
acordo com esse enfoque, as pessoas que deveriam ser deslocadas em decorrência àt
uma obra considerada de utilidade pública eram indenizadas monetariamente pel:
valor da propriedade e benfeitorias. Em países como o Brasil, tal enfoque tem se­
rias limitações, pois muitas vezes as populações deslocadas são de baixa renda e
não dispõem de títulos de propriedade. Além disso, para muitas dessas famílias
mesmo baixas indenizações podem parecer vultosas somas de dinheiro, mas sã:
insuficientes para adquirir outra moradia e rapidamente são usadas na aquisição de
bens de consumo. Por seu lado, a inexistência de título de propriedade pode dificultar,
retardar ou mesmo impedir a indenização.

Já o enfoque social parte do pressuposto de que a indenização monetária é urcs


compensação insuficiente para os impactos sociais, que vão muito além da perda cs
um a propriedade, de um local de moradia ou de exercício de atividades comerciais ou
de subsistência. Também as relações de vizinhança, de amizade e de parentesco sã:
afetadas, assim como as referências culturais, as referências à memória e as relaçõe:
econômicas no seio de um a comunidade. Por essa razão, o reassentamento deve­
ria buscar recriar essas condições, reproduzindo, em certa medida, no novo local,
as relações preexistentes. Na verdade, a própria ideia de reassentamento resulta d:
paradigma social, j á que, sob o paradigma econômico, não importa onde as pessoas

CAPITU
P l a n o de g e s t ã o a m b i e n tHa l B 353

deslocadas irão se reinstalar: a decisão é tomada isoladamente. A comunidade pode


dispersar-se e e os laços entre seus membros podem ser rompidos.

Mais modernamente, um paradigma cultural tem se sobreposto ao social. Não se


trata somente de prover condições de infraestrutura e serviços — saneamento, a r m a ­
mentos, iluminação pública, escolas, hospitais — na área de reassentamento, mas
de preservar as formas de produção e consumo cultural próprias às comunidades
afetadas. Assim, faz-se um a espécie de inventário prévio dessas formas e tenta-se
criar, no reassentamento, condições para que elas continuem a existir. Um exemplo
de aplicação desse enfoque é o reassentamento de comunidades indígenas afetadas
por alguns projetos hidrelétricos no Canadá, onde se buscou, entre outras medidas,
recriar os próprios arranjos espaciais das aldeias tradicionais (Fig. 13.10).

Nas concepções atuais de reassentamento, o projeto deve ser discutido e negociado


com a comunidade afetada. Ao invés de ser simplesmente reassentada passivamente, a
comunidade pode tornar-se agente do processo de mudança, participando ativamente
das decisões acerca da transferência e reinstalação. É freqüente no Brasil que os afe­
tados por empreendimentos rodoviários ou urbanísticos em regiões metropolitanas
sejam as populações carentes, que ocupam zonas de risco ou habitações insalubres.
Nesse caso, o reassentamento pode significar um a mudança para melhor, desde que
o processo seja bem conduzido e siga princípios democráticos. Há, por parte das po­
pulações afetadas, uma resistência às mudanças, devido a um a possível transferência
para um local distante, ruptura de relações de vizinhança e outras razões, de modo
que somente um processo participativo de reassentamento tem chances de ser bem
aceito. Contam-se diversos casos de projetos bem-sucedidos conduzidos segundo essa
óptica — por exemplo, na Alemanha, a mineração de carvão a céu aberto nas pro­
ximidades da cidade de Colônia obteve o consentimento da população local, mesmo
com vilarejos inteiros transferidos e, em alguns casos, reconstruídos; a paisagem
também foi radicalmente modificada,
surgindo lagos, hoje utilizados para ati­
vidades recreativas, onde antes só havia
terras agrícolas e florestais.

No caso de populações rurais, o proces­


so participativo é igualmente necessário,
mas há outras questões a serem consi­
deradas. 0 reassentamento deve fornecer
condições que garantam que as pessoas
continuem a viver da terra, de modo que
a fertilidade dos solos, a disponibilidade
hídrica, a infraestrutura para escoa­
mento da produção e mesmo o acesso ao
crédito e a serviços de extensão rural de­
vem ser condições levadas em conta na
formulação do projeto. Fig. 13.10 Comunidade indígena reassentada na região da baía James,
Quebec, Canadá. 0 arranjo físico das construções fo i discutido e negociado
Quando se prepara um estudo ambiental com os interessados e reproduz o padrão de assentamento de uma como - -
para um projeto que envolva a remoção dade tradicional

TR
354 aliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

forçada de populações humanas, é conveniente que o diagnóstico ambiental carac­


terize detalhadamente a população a ser deslocada. Os termos de referência deverão
especificar o contexto e o escopo de levantamento dos dados, mas em todos os ca­
sos as informações apresentadas deverão ter sido obtidas mediante levantamento de
campo (dados primários). Evidentemente poderão ser aproveitadas e mesmo repro­
duzidas (se convenientes e suficientes) as informações obtidas para a preparação do
projeto e para o cálculo do custo de desapropriação.

As modalidades de reassentamento poderão ser várias, até para diferentes grupos


afetados por um mesmo projeto — por exemplo, em certos casos, a opção preferida
pode ser o fornecimento de um lote, devidamente regularizado, acompanhado de uma
cesta de materiais de construção e de assistência técnica; em outros, a opção pode
ser a construção de moradias completas em locais com infraestrutura, que poderão
ser imediatamente ocupadas pela população afetada. As modalidades serão diferentes
segundo o projeto afete populações urbanas ou rurais e grupos que detenham títulos
de propriedade ou categorias como posseiros ou invasores.

0 Banco Mundial recomenda que um plano de reassentamento inclua:


# assistência durante a relocação;
vlí assistência durante um período de transição suficiente para a restauração do
padrão de vida das populações afetadas; '
# assistência como preparação da terra, crédito, treinamento ou oportunidades de
trabalho.
(Idem, parágrafos 6(b)(c).)

0 Banco Interamericano de Desenvolvimento recomenda firmemente um a estratégia


de evitar ou m inim izar a necessidade de reassentamentos, estabelecendo também a
necessidade de preparação prévia de um plano de reassentamento quando o deslo­
camento forçado for inevitável. Para os casos de reassentamento, o Banco considera
que tanto a população afetada como a anfitriã devem:
# dispor de um padrão de vida, acesso à terra, aos recursos naturais e aos serviços
pelo menos equivalentes aos níveis anteriores ao reassentamento;
# recuperar-se de todas as perdas causadas pelo processo de transição para a nova
situação;
# sofrer perturbação tão limitada quanto possível de suas redes sociais, oportu­
nidades de emprego e produção, e acesso aos recursos naturais e instalações
públicas;
# ter acesso a oportunidades de desenvolvimento econômico e social.

Como qualquer outra medida de gestão visando mitigar ou compensar impactos nega­
tivos, as atividades de reassentamento devem ser planejadas previamente de modo
consistente com os princípios adotados, respeitando-se o contexto legal e as regras
tradicionais vigentes nas comunidades afetadas. 0 Quadro 13.6 mostra o conteúdo de
um plano de reassentamento segundo a política de reassentamento do Banco Mundial.
Trata-se de um documento bastante extenso e detalhado, mas a política do Bancc
garante flexibilidade em sua aplicação, deixando claro que alguns dos elementos d:
plano podem ser apresentados de maneira simplificada ou mesmo deixados de lado.

CAPITU
Plano de gestão ambien 355

Quadro 13.6 Elementos de um plano de reassentamento


Descrição do projeto
dentificação dos impactos potenciais
Objetivos do programa de reassentamento
Estudos socioeconômicos
luadro legal
Quadro institucional
Critérios de qualificação para enquadramento no programa de reassentamento
Valoração das perdas de bens
'.'edidas de reassentamento
Seleção e preparação dos locais para reassentamento e relocação das pessoas
Habitação, infraestrutura e serviços sociais
Proteção e gestão ambiental
3articipação da comunidade
ntegração com a comunidade que receberá os reassentados
Mecanismos de resolução de controvérsias
Responsabilidades na implementação do plano
Cronograma de implementação
Custos e orçamento
Monitoramento e avaliação
Fonte: W orld B ank (2001): OP 4.12, A n n e x: In v o lu n ta ry R esettlem ent.

dependendo da complexidade do projeto. A política propõe também um a versão abre­


viada do plano de reassentamento, a ser aplicada em casos mais simples.

13.6 M e d id a s de v a l o r i z a ç ã o d o s i m p a c t o s b e n é f ic o s
Os impactos positivos de um empreendimento muitas vezes se manifestam mais no
campo socioeconômico. A criação de empregos e a dinamização da economia lo­
cal são frequentemente citados como impactos benéficos na maioria dos EIAs. No
entanto, trata-se muitas vezes de um potencial do que de um impacto de ocorrência
certa. Por exemplo, os empregos criados poderão requerer capacitação técnica não
disponível entre a força de trabalho local e os postos de trabalho acabarão preen­
chidos por indivíduos de fora da comunidade que acolhe o empreendimento. Outra
situação comum é a dificuldade das empresas locais atuarem como fornecedoras de
bens e serviços ao novo empreendimento, porque não têm capacidade técnica para
Tal (no caso de bens e serviços de alto conteúdo tecnológico), capacidade gerencial
para fornecer o bem ou serviço na qualidade requerida ou capacidade financeira para
investir no aumento de sua produção e atender à nova demanda.

Com isso, para to rn ar viável a concretização dos impactos potencialmente bené­


ficos, pode ser necessário o desenvolvimento de programas específicos, como de
capacitação de mão de obra, capacitação gerencial, fornecimento de crédito e de
assistência técnica, aparelhando a comunidade para aproveitar o empreendimento
como fator de desenvolvimento regional. Tais program as devem ser descritos com
nível de detalhe igual ao dos program as destinados à mitigação ou à compensação
de impactos negativos.

TR
J a S ia ç ã o de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Uma outra vertente dos programas voltados a realçar os impactos benéficos mescla-se
com a atuação das empresas na área conhecida como responsabilidade social, que
usualmente envolve iniciativas nas áreas de educação e saúde, de capacitação profis­
sional ou de geração de emprego e renda. Programas de educação ambiental ou a
implantação de centros de educação e estudos ambientais (Fig. 13.11] são exemplos
dessas iniciativas; aproveitando a capacidade das empresas em alocar e alavancar
recursos financeiros e humanos, ações voltadas para a conscientização acerca dos
problemas ambientais, para a difusão de conhecimento e para iniciativas de reci­
clagem ou de plantio de mudas de espécies nativas estão entre as mais comuns. Tais
programas deveriam, idealmente, incluir os próprios funcionários das empresas e
aqueles das empresas prestadoras de serviços.

Certas medidas compensatórias impostas


quando do licenciamento ambiental po­
dem também ter um caráter de realce dcs
impactos positivos. Assim, um programs
de educação patrimonial surgido da ne­
cessidade de compensar impactos sobre
o patrimônio arqueológico não é apenas
iwna compensação; serve também para
divulgar à população local os múltiplos
significados da História.

13.7 E s t u d o s c o m p l e m e n t a r e s o l
ADICIONAIS
0 planejamento de um projeto de enge­
nharia se faz em etapas de progressiv;
Fig. 13.11 Centro de educação am biental construído voluntariam ente pela
detalhamento, partindo-se de um a ideia.
empresa Alcoa em Poços de Caldas, M inas Gerais, no início dos anos!990;
intenção ou conceito até chegar-se a
fo i o pioneiro de uma rede de centros sim ilares m antidos p o r empresas hoje
um projeto executivo ou construtivc
existente no Estado
detalhado. Conforme aumenta o detalha­
mento, aumenta o custo de elaboração do
projeto. Nas etapas sucessivas são avaliadas as viabilidades técnica, econômica e
ambiental, cujas conclusões podem levar a modificações do projeto ou ideia original.

É natural que na avaliação de impacto ambiental se proceda de maneira compatível


ou seja, com sucessivo aprofundamento, conforme o projeto vá se mostrando viável.
Como os empreendimentos sujeitos ao processo de AIA dependem da obtenção de uma
licença ambiental, e o modelo adotado no Brasil tem três etapas sucessivas — licença
prévia, licença de instalação e licença de operação —, o EIA é exigível para a primeira
delas, ou seja, a licença prévia. Esta significa um acordo em princípio para a futura
implantação do empreendimento, sem que haja uma obrigatoriedade de concessão da
licença de instalação, que, no entanto, será concedida se forem cumpridas todas as
condições estabelecidas quando da emissão da licença prévia.

Nesse modelo, admite-se que o detalhamento do EIA seja compatível com o grau de
detalhamento do próprio projeto e, como há um a incerteza quanto à sua aprovação
governamental, ele vai sendo detalhado à medida que há bons indicadores de sua

CAPÍTU LO
P l a n o de g estão a m b ie n H ® 357

viabilidade am biental e possibilidade de realização - a concessão da licença prévia é


o m elhor indicador prático. /

Desta forma, se houver a perspectiva de aprovação, estudos detalhados poderão ser


realizados em paralelo ao detalham en to do projeto. Tais estudos podem incluir:
& um aprofundam ento do conhecimento sobre a dinâmica ambiental na área de
influência (a continuidade dos estudos de base e do m onitoram ento pré-opera-
cional);
& um detalhamento das medidas mitigadoras e demais medidas de gestão;
# negociações com agentes públicos, com unidade e outros interessados acerca do
alcance das medidas mitigadoras, valorizadoras e compensatórias.

Considere-se o caso do patrim ônio arqueológico que possa ser afetado por u m a rodovia,
um loteam ento ou u m a barragem . Pode acontecer que o núm ero de sítios arqueológicos
afetados seja b astan te alto, da ordem de dezenas. Ora, o estudo de cada um deles pode
dem and ar anos e pode ter um razoável custo econômico. Não faz sentido estu d ar com
detalhe cada um deles, se houver incerteza acerca da construção do em preendim ento,
já que o impacto somente ocorrerá se o projeto for adiante. Assim, os le v a n ta m e n ­
tos arqueológicos tam bém são feitos com progressivo grau de aprofundam ento,
podendo-se lim itar em m uitos casos a um simples levantam ento do potencial arq u e ­
ológico e identificação de possíveis sítios d u ran te a preparação do EIA, seguido de
trabalhos de prospecção e mesmo de escavação (Fig. 13.12) depois de concedida a
licença prévia, mas antes de solicitar a licença de instalação. No caso de um a b a r r a ­
gem, cujas obras poderão dem orar anos, pode-se então fazer um estudo detalhado da
área que será inu ndada depois de iniciada a construção, mas antes, evidentem ente,
do enchim ento do reservatório.

Embora sejam aqui classificados na categoria de estudos com plem entares, os p ro ­


gram as de salvam ento arqueológico tam b ém podem ser entendidos como m edidas
com pensatórias, um a vez que a perda física do recurso é com pensada pela produção
de conhecim ento (Multigeo Meio A m ­
biente, Estudo de Impacto A m biental,
M ineração de A rgila Vieira e Pirizal,
Camargo Corrêa Cimentos, 2004, p. 482).

13.8 P l a n o de m o n i t o r a m e n t o
As previsões de impacto feitas em u m
EIA são sempre hipóteses acerca da res­
posta do meio am biente às solicitações
im postas pelo em preendim ento. A v a li­
dade dessas hipóteses som ente p oderá ser
confirm ada — ou desm entida - se o p ro ­
jeto for efetivam ente im plantado e seus
impactos devidam ente monitorados.

Essa é a principal razão p ara a exigência, Fig. 13.12 Escavação arqueológica prévia à a b e rtu ra de um a estrada de
na m aioria das regulam entações, da apre­ acesso a um a m ina, onde se evidenciam vestígios de m ineração de ouro da
sentação de um plano de m onitoram ento época do Im pério Rom ano (século II d.CJ, em Belm onte, A stúrias, Espanha

TR
aliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

como parte integrante do EIA. Por sua vez, a gestão ambiental não pode prescindir do
monitoramento, que fornece a base de informações sobre o desempenho do empreen­
dimento e sobre o comportamento do meio.

Pode-se classificar o monitoramento ambiental, segundo as etapas do empreendimento,


em três fases: pré-operacional, operacional e pós-operacional. Todos fazem parte do
processo de avaliação de impacto ambiental: o pré-operacional corresponde ao moni­
toramento feito durante os estudos de base e que pode continuar depois da conclusão
do EIA, mas antes mesmo de ser iniciada a implantação do empreendimento; o
monitoramento operacional é aquele realizado durante as etapas de implantação,
funcionamento e desativação; já o monitoramento pós-operacional (depois do fecha­
mento da atividade) pode ser necessário em alguns setores nos quais há o potencial
de significativos impactos residuais, como a disposição de resíduos e a mineração.
0 plano de monitoramento apresentado no EIA aborda essencialmente a etapa opera­
cional, podendo ser estendido à pós-operacional onde for cabível.

0 plano de monitoramento deve ser compatível com os impactos previstos (obviamente)


e também com os estudos de base; portanto, com o monitoramento pré-operacional.
Em outras palavras, deve-se procurar monitorar os mesmos indicadores utilizados
nos estudos de base, preferencialmente nos jnesmos pontos e com métodos idênticos
ou compatíveis.

0 plano de monitoramento deve apresentar, no mínimo:


# os parâmetros a serem monitorados;
# a localização das estações de coleta;
# a periodicidade das amostragens;
# a técnica de coleta, preservação e análise das amostras.

O monitoramento ambiental do projeto não deve ser confundido com o controle geral
de qualidade do meio ambiente, feito por órgãos governamentais; deve ser concebido
em função dos impactos identificados e previstos, de modo que possa ser capaz de
distinguir as mudanças induzidas pelo empreendimento daquelas ocasionadas por
outras ações ou por causas naturais.

Dentre os objetivos do monitoramento operacional e pós-operacional, pode-se destacar:


# verificar os impactos reais de um empreendimento;
# compará-los com as previsões;
# detectar mudanças não previstas;
# alertar para a necessidade de agir, caso os impactos ultrapassem certos limites;
# avaliar a capacidade da AIA de fazer previsões válidas e formular recomenda­
ções para a melhoria dessas previsões em futuros estudos de impacto ambiental.

Na verdade, a principal função do monitoramento ambiental é controlar o desempenho


ambiental do empreendimento, e para isso ele só faz sentido se suscitar ações de
controle. Caso o monitoramento detecte algum problema, o empreendedor deve ser
capaz de adotar medidas corretivas dentro de prazos razoáveis.

O monitoramento não deve restringir-se a parâmetros ou indicadores físicos e


biológicos, mas incluir, na medida do possível, indicadores de impactos sociais e

CAPÍTU LO
P l a n o de g e s t ã o A M B i E N | j ^ | 359

econômicos. Obviamente, o monitoramento social não pode empregar a mesma estru-


rura que o monitoramento biofísico, com estações de coleta e intervalos curtos, mas
leve observar o mesmo rigor científico, dentro das especificidades das ciências sociais.

Armour (1988) aponta algumas especificidades do monitoramento de impactos sociais:


# deve ser baseado em um processo social de coleta de dados, ao invés de repro­
duzir procedimentos de monitoramento do meio biofísico (por exemplo, pelo
estabelecimento de comitês de moradores que mantêm encontros regulares);
% deve focalizar o monitoramento de problemas mais que o monitoramento de
impactos (por exemplo, por meio de levantamentos regulares das preocupações
das pessoas);
# deve considerar que o conceito de impacto significativo é de natureza qualitativa
e não mensurável objetivamente.

Isso posto, o acompanhamento de certos indicadores socioeconômicos não deve ser


descartado como técnica de monitoramento de impactos sobre o meio antrópico,
desde que tais indicadores sejam representativos dos fenômenos que se pretende
conhecer, da mesma forma que se pode trabalhar com indicadores selecionados para
acompanhar os impactos sobre o meio físico e sobre o meio biótico.

D monitoramento ambiental é, por sua própria essência, dinâmico —com base em seus
resultados, o próprio plano de monitoramento deve ser revisto, ajustado e atualizado.
Este também deve ser ajustado às mudanças pelas quais passa o empreendimento
durante sua vida útil, de modo que o plano proposto nos estudos ambientais é apenas
o ponto de partida para um programa contínuo de monitoramento ambiental que
acompanha todo o ciclo de vida de um empreendimento, e eventualmente perdura
após seu encerramento.
*
13.9 M e d id a s de c a p a c it a ç ã o e g e s t ã o
A existência de programas bem estruturados de gestão ambiental não garante seu
sucesso. Se a aplicação não for conduzida por um a equipe conscientizada e treinada, as
medidas de gestão podem simplesmente não dar certo. Porém, profissionais qualifica­
dos são necessários, mas não suficientes para atingir os resultados esperados, pois os
programas não podem depender somente das pessoas; devem ser institucionalizados,
de forma que possam resistir à troca do pessoal envolvido.

Uma das principais falhas dos programas de mitigação de impactos é “dar mais atenção
às medidas de ordem física do que a controles operacionais e gerenciais” (Marshall,
r

2001a, p. 196). E bem conhecido que projetos excelentes podem ser mal implemen­
tados. Muitas vezes, o questionamento público de um projeto ou a preocupação dos
analistas dos órgãos governamentais se dá justam ente sobre a capacidade do propo­
nente em implementar efetivamente as medidas requeridas para o empreendimento.
Essa questão não pode ser negligenciada ou tratada superficialmente: a capacidade
dos responsáveis pela implementação das medidas de gestão deveria ser demonstrada.
Isso pode ser relativamente simples quando se trata de um a empresa ou organização
que já opera ou já implantou empreendimentos similares e pôde demonstrar bom
desempenho nos casos anteriores, mas, pelo contrário, pode significar um a das
principais barreiras à aceitação de um projeto quando o proponente tem um histórico
ruim de desempenho ambiental.
liação de Im pacto A m biental: conceitos e métodos

Sánchez e Hacking (2002) sugerem que a gestão ambiental deva ser entendida sob três
dimensões: a preventiva, a corretiva e a gestão da capacidade, ou seja, da capacidade
organizacional de gerir um empreendimento respeitando os requisitos ambientais.
Essa dimensão envolve a capacitação das pessoas, a designação de responsabilidades,
a alocação de recursos e a gestão do conhecimento, tarefas para as quais os sistemas
de gestão (da qualidade ambiental ou de saúde e segurança do trabalho) podem ser
ferramentas muito úteis. Quando as organizações dispõem de sistemas de gestão para
cada um desses três componentes, sua fusão em um só resulta no chamado sistema
de gestão integrada.

Medidas de capacitação e gestão são de cunho sistêmico e organizacional; têm


função de preparar o pessoal da empresa e o pessoal contratado por terceiros para
desempenhar suas funções em consonância com os requisitos legais, e de maneira
respeitosa ao meio ambiente e à comunidade local. Medidas que podem ser desenvol­
vidas com esse fim incluem:
% programa de conscientização e capacitação ambiental das equipes de construção
e dos gerentes;
# programa de conscientização e capacitação ambiental das equipes de operação
e dos gerentes;
# implementação de um sistema de gestão ambiental.

A experiência prática tem demonstrado que, para que os impactos decorrentes da fase
de implantação de um empreendimento sejam mitigados de modo satisfatório, é da
maior importância que as equipes construtoras tenham plena consciência das impli­
cações ambientais de suas atividades e sejam devidamente preparadas e treinadas
para as tarefas que irão executar. Casos brasileiros documentados de comprovado
sucesso na implantação de medidas mitigadoras durante a fase de construção de
projetos de elevado impacto (Sánchez e Gallardo, 2005; Küller e Machado, 1998) mos­
tram a importância desse tipo de programa.

Ademais, é da maior importância que os futuros gerentes do empreendimento


conheçam a fundo os programas de gestão ambiental idealizados durante a fase
de planejamento e incorporados como condicionantes da licença ambiental. Estudos
empíricos realizados no Brasil m ostraram que os gestores ambientais de empreendi­
mentos sujeitos à apresentação prévia de um EIA raramente levam em consideração
as recomendações desses estudos (Prado Filho e Souza, 2004). Para prevenir e sanar
tais deficiências, as pessoas encarregadas de implementar os programas de gestão
ambiental devem dispor de um bom conhecimento do histórico de planejamento
ambiental do projeto, para que lhes seja possível compreender as razões que leva­
ram à definição das medidas integrantes do plano. Desta forma, um programa de
conscientização e capacitação das equipes de operação e dos gerentes deveria abordar
o histórico do empreendimento, as atividades realizadas na preparação do EIA, os
debates e questionamentos que possam ter ocorrido durante a audiência pública.

Já o programa voltado para o pessoal operacional deveria enfatizar as questões


relativas às implicações ambientais de suas respectivas funções e procedimentos ope­
racionais (Fig. 13.13). Programas semelhantes são organizados, de modo corriqueiro,
por empresas que dispõem de um sistema de gestão ambiental, e são importantes

LO
P l a n o de g e s t ã o a m b i e n ^ H 361
\

independentemente do modelo de gestão


adotado. Dependendo do perfil dos traba­
lhadores, essas atividades podem ser
acompanhadas por um programa escolar
no canteiro de obras ou um programa
de suplência de ensino para equipes de
operação.

Finalmente, os programas de gestão


podem ser integrados por meio de um
sistema de gestão ambiental, tanto para a
etapa de implantação do empreendimen­
to como para a etapa de operação.

13.10 E s t r u t u r a e c o n t e ú d o d e u m
Fig. 13.13 Dano decorrente da inexistência de program a de gestão
PLANO DE GESTÃO AMBIENTAL
am biental. As causas de condutas desrespeitosas perante o am biente podem
0 plano de gestão costuma ser apresen­
ser m últiplas, incluindo baixa capacitação do pessoal operacional e baixa
tado em um capítulo específico do EIA, conscientização dos gerentes. Neste exemplo, a fa lta de orientação clara e
no qual são descritas as medidas propos­ a inexistência de um procedim ento docum entado para a atividade de troca
tas, apresentados os resultados esperados de óleo lu b rifica n te de equipam entos pesados resultou em contam inação
de sua aplicação e, eventualmente, é do solo
apresentado seu custo estimado. Dois
itens são obrigatórios: o cronograma e a designação do responsável por cada ação.
A atribuição de responsabilidades pode ser um a questão delicada se algumas m e­
didas estiverem fora da jurisdição ou do alcance do proponente do projeto. No caso
de projetos privados, algumas medidas necessitam de aprovação governamental, que
nem sempre pode ser garantida no mofriento da apresentação do EIA. No caso de em­
preendedores públicos, a competência legal do proponente pode limitar o escopo das
medidas de gestão, ou podem ser necessárias medidas fora do campo de competência
legal da agência proponente.
ã

E importante compreender que um plano de gestão ambiental não é uma coleção de


boas intenções. Para que um programa de gestão tenha sucesso, são várias as condi­
ções necessárias. Dentre as mais importantes, pode-se citar as seguintes:
# Clareza, precisão e detalhamento do programa: os programas de gestão apresen­
tados nos estudos de impacto ambiental ou como condicionantes das licenças
ambientais devem ser descritos de forma suficientemente clara e precisa e com
detalhamento suficiente para que possam ser auditados, ou seja, verificados
por uma terceira parte (que pode ser um agente de fiscalização do governo, um
auditor do agente financiador do projeto, uma comissão representativa da co­
munidade e outras partes interessadas, ou ainda qualquer outra modalidade de
agente externo).
* Atribuição clara de responsabilidades e compromisso das partes, um a vez que
nem todas as medidas que constam dos programas de gestão serão de respon­
sabilidade do empreendedor. Muitas vezes há medidas muito importantes que
estão fora de seu alcance ou jurisdição, e devem ser executadas por outra parte,
como um órgão governamental; é importante discernir as respectivas respon­
sabilidades.
aiiação de Im pacto A m biental: conceitos e métodos

# Orçamento realista, que descreva os custos totais das medidas e o cronograma


de desembolsos; naturalmente, também é necessário o compromisso de liberação
dos recursos previstos; este item pode ser crítico em projetos públicos.

Normalmente, a configuração inicial de um programa de gestão parte do proponente


do projeto e de seu consultor ambiental. As medidas propostas costumam advir de
duas fontes principais:
# Da experiência anterior com o tipo de empreendimento analisado, caso em que
é comum se encontrar medidas quase que padronizadas, adotadas pela maioria
dos empreendimentos dessa categoria, como, por exemplo, a remoção seletiva
da camada superficial de solo fértil, para posterior reutilização, comum em
empreendimentos de mineração, e obras civis de grande porte, como barragens
e rodovias; outro exemplo é a manutenção de uma vazão mínima a jusante
de barragens. Medidas desse tipo são conhecidas como boas práticas dc ges­
tão ambiental e, mesmo que não exigíveis legalmente, são empregadas pelas
melhores empresas.
# Da análise dos impactos realizada no EIA, quando os impactos significativos de
cada empreendimento foram descritos e discutidos; de tal análise decorrerão me­
didas particulares para o empreendimento analisado, como passagens para fauna
silvestre em rodovias ou a implantação, em locais especificados, de barreiras
antirruído.

As medidas constantes de um estudo de impacto ambiental são submetidas à


apreciação dos órgãos governamentais e à consulta pública. Desse processo podem
resultar outras medidas de gestão que deverão ser adotadas pelo empreendedor.
Muitas vezes, as novas medidas são formuladas de maneira vaga ou imprecisa, o que
dificulta sua implementação e pode até impossibilitar sua fiscalização ou auditoria.
/

E importante que as novas medidas sejam consolidadas no plano de gestão e descri­


tas com o mesmo grau de detalhe que as demais. Dias (2001, p. 209) comenta uma
proposta radical de Goodland e Mercier (1999) de que o plano de gestão ambiental
- que conteria a descrição de todas as medidas a serem adotadas pelo proponente,
incluindo o monitoramento dos impactos e a demonstração de capacidade de geren­
ciá-los, desde a implantação do empreendimento até sua desativação —, poderia ser
o documento principal de aprovação do empreendimento, um a espécie de m inuta de
contrato entre o empreendedor e o órgão regulador.

0 Quadro 13.7 mostra como podem ser sintetizados os programas de gestão decorrentes
do processo de avaliação de impacto ambiental de um empreendimento, enquanto o
Quadro 13.8 mostra como pode ser organizada a descrição de um programa de gestão.

A padronização do formato de apresentação e descrição dos programas que consti­


tuem o plano de gestão é um a maneira simples, mas muito eficaz, de aum entar seu
valor para todas as partes interessadas e, principalmente, de facilitar atividades de
acompanhamento, fiscalização e auditoria. Para que esse objetivo possa ser atingido,
é necessário que o plano de gestão apresente todos os elementos necessários para seu
perfeito entendimento, sem necessidade de consulta a outros documentos, muitas
vezes de difícil acesso aos interessados (por exemplo, atas de reuniões públicas, de

c a p ít i líg g ^ M U M ^ —
P l a n o de g e s t ã o a m b i e n H ® 363

reuniões de conselhos estaduais ou m u­ Quadro 13.7 Exemplo de quadro sintético descritivo de um plano de
nicipais de meio ambiente ou pareceres gestão ambiental
de órgãos governamentais consultados Im pacto A ç ã o proposta T ip o R esponsável F ic h a d e s c r it iv a

durante o processo de avaliação de im­ Impacto 1 Ação 1 M 1


pacto ambiental). Ação 2 C 2
Impacto 2 Ação 2 C 2
E necessário que o EIA aponte ao menos Impacto 3 Ação 3 V 3
uma medida de gestão para cada impacto
Ação 4
/
E 4
significativo. E conveniente mostrar,
por meio de quadros ou diagramas, um a Impacto 4 Ação 5 G 5
correlação entre os impactos e as medi­ M - Medidas de m itigação ou atenuação de im pactos negativos.
das propostas. Para implementação de C - M edidas de compensação de im pactos negativos.
cada um a dessas medidas, podem ser ne­ V - M edidas de valorização de im pactos positivos.
cessárias diversas ações concatenadas, a E - Estudos complementares.
serem executadas de diferentes manei­ G - Medidas de capacitação e gestão.
ras. A descrição dos programas de gestão
e das ações que os compõem não pode se
limitar a assertivas genéricas, que poderiam ser encontradas em algum outro estu­
do de impacto ambiental. Ao contrário, devem ser descritos de modo particular ao
projeto discutido, mas seu detalhamento pode ser remetido à etapa seguinte de licen­
ciamento, a obtenção da licença de instalação.

Como o licenciamento ambiental no Brasil é um procedimento de múltiplas etapas, é


aceitável que, em um primeiro momento, os programas de gestão sejam apresentados
na forma de projeto conceituai ou equivalente, principalmente se ainda não houver
consenso sobre eles, como costuma ocorrer quando tais programas emanam exclusi­
vamente do empreendedor ou de seu consultor, e não foram ainda discutidos com o
público ou os órgãos de controle. Por essa razão, muitas vezes os estudos de impacto
ambiental apresentam descrições genéricas dos programas de gestão. Antes que tenha
início sua implementação, porém, os programas devem ser discutidos com os inte­
ressados, aprovados pelos órgãos governamentais e descritos com detalhe suficiente
para permitir seu acompanhamento e verificação por qualquer interessado.

Q uad ro 1 3 .8 E x e m p lo de c o n te ú d o de fic h a d e s c ritiv a d o s p r o g r a m a s de g e s tã o


Descrição do programa e das ações que o compõem
Identificação dos parceiros ou de outras partes intervenientes e descrição das responsabili­
dades respectivas
• ■ ...... . . . . . . . . .• ... . ^ ,-r-r-r ;• ....................

Situação das negociações já iniciadas com as partes interessadas


Estratégia de execução (por exemplo, contrato com universidade - o empreendedor constrói
uma obra e o governo local encarrega-se da manutenção)
Recursos necessários (financeiros, humanos, organizacionais) e sua fonte
Cronograma de implementação
- . , ■••• • ...... .. .... - .......... ;■ ■- > • • ■•■■■■ - ....... •• - ■ .... -. - Y ' . .................. •

Indicadores a serem utilizados para avaliar os resultados


.-; '. .... .... .. . •. . . . . . . ■ . • . V . . . ■ ....• ■ - ...'• -V .. : : -............... ' - • ' - • •••••••• -

Conteúdo e datas previstas para apresentação de relatórios de andamento e relatório con­


clusivo
aliação de Im pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

Para Goodland e Mercier (1999), as maiores dificuldades da gestão ambiental na


implementação de projetos submetidos ao processo de AIA referem-se a garantir
recursos financeiros e humanos para aplicar com sucesso as medidas mitigadoras
resultantes do processo de avaliação. Com base na experiência do Banco Mundial,
esses autores sugerem que a ênfase do processo de AIA tem mudado da “produção do
estudo de impacto ambiental” para as formas de garantir o sucesso da implementa­
ção das medidas de gestão (pp. 14-15). A capacidade de implementação é, de um lado.
dependente da capacidade gerencial do proponente do empreendimento e, de outrc.
da eficácia da fiscalização e dos arranjos institucionais para a fase de acompanha­
mento do processo de AIA (esse ponto será abordado no Cap. 18).

LO
C om unicação
DOS RESULTADOS
liação de Impacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

O redator de um estudo de impacto ambiental (ou de algumas partes dele) tem à sua
frente um problema inusitado. Não está escrevendo um relatório técnico que será
somente lido por outros técnicos com formação e nível de conhecimento similar ao
seu. Tampouco está preparando um texto no estilo jornalístico, que poderia ser lido
e compreendido por qualquer pessoa medianamente educada. Os estudos de impacto
ambiental têm um pouco das duas características, mas há ainda outras dificuldades
a serem enfrentadas por quem os redige.

Como a avaliação de impacto ambiental é um processo público, seus resultados


devem ser comunicados a todas as partes interessadas. No entanto, o público leitor
é bastante heterogêneo, podendo englobar desde a comunidade local até militantes
altamente capacitados do ponto de vista técnico. Como os diferentes interessados
buscam informações distintas nos documentos produzidos durante o processo de
AIA, a comunicação torna-se um problema bem complexo. Os estudos e os relatórios
de impacto ambiental serão lidos pelos analistas do órgão licenciador, por ativistas
de organizações não governamentais, por membros da comunidade local e, even­
tualmente, por diversos outros tipos de leitores, como consultores ou assessores de
diferentes partes interessadas, advogados, promotores, políticos e jornalistas.

É justam ente essa característica que possibilita que o EIA e o Rima sejam facilitadores
da discussão pública, um potencial instrum ento de inclusão. Amplia-se, assim, o
espectro de participantes implicados no processo de discussão, além do domínio
público sobre temas e questões que antigamente (ou seja, antes da legislação sobre
AIA) ficavam restritos a determinados círculos ou monopólios de interpretação
(conforme seção 17.3).

Para os redatores do estudo, o problema da multiplicidade e diversidade dos leitores é


difícil de ser enfrentado. Tanto um a frase mal colocada como uma leitura desatenta
de um texto excelente podem causar grandes estragos: um projeto pode ser questio­
nado, sua aprovação pode ser mais trabalhosa, novos estudos podem ser solicitados.
Se estudos tecnicamente impecáveis resultarem em relatórios mal estruturados, de
apresentação pífia e mal escritos, o leitor terá um trabalho extrem am ente árduo e
penoso para decifrar as intenções do proponente e as conclusões da equipe de consul­
tores. Diferentemente de um mau romance, cuja leitura pode ser interrompida sem
maiores conseqüências, um analista ambiental não pode abandonar a leitura de um
EIA; um estudo mal redigido pode ser um desafio à boa vontade desse leitor, que terá
um papel fundam ental na eventual aprovação do projeto. Como diz um consultor
norte-americano, “um estudo de impacto ambiental ilegível é um risco ambiental”
(Weiss, 1989).

14.1 0 INTERESSE DOS LEITORES


0 tipo de informação que cada um procura em um estudo ambiental e o grau de
detalhe que lhe interessa varia muito. Alton e Underwood (2003, p. 141) apontam que
“os profissionais da avaliação de impactos tradicionalmente têm escrito documentos
para eles mesmos”. 0 analista ambiental é um profissional da avaliação de impactos
e estará interessado em conhecer não só os resultados, mas também os métodos que
permitiram que a equipe que elaborou os estudos chegasse às suas conclusões. Esse

CAPÍTÚ110
C o m u n ic a ç ã o dos R e s u l t a m B 367

leitor também quer saber quais as técnicas utilizadas para análise dos dados e as j u s ­
tificativas para as conclusões apresentadas no estudo.

No entanto, muitos leitores dos estudos ambientais não são profissionais do ramo.
Se o estudo e o relatório de impacto ambiental devem servir como base para uma
discussão pública e para o “uso público da razão” (conforme seção 16.2) no processo
decisório, então sua redação e apresentação devem buscar a redução do nível de
ruído e interferência na comunicação. 0 ativista de um a organização não governa­
mental poderá estar interessado em um único aspecto particular ou em como o
empreendimento poderá afetar seus interesses — assim, a “Sociedade dos Amigos do
Papagaio-de-cara-roxa” pode querer saber de que maneira o projeto proposto poderá
afetar o hábitat ou as fontes de alimento dessa espécie. Da mesma forma, um grupo
de interesse com outra perspectiva, como a associação comercial local, buscará infor­
mações sobre como seus negócios serão afetados pelo projeto. Já a comunidade local
normalmente quer saber de que maneira o empreendimento poderá afetar seu modo
de vida, quantos empregos serão criados ou se haverá transtornos na sua locomoção.
Algumas pessoas têm interesse em saber se sua propriedade está situada nas proxi­
midades da área de intervenção, ou se seu acesso será interrompido ou dificultado.

0 Quadro 14.1, adaptado de Page e Skinner (1994), classifica os leitores dos estudos
ambientais em cinco grupos principais, indicando seus respectivos pontos de vista.
Trata-se, evidentemente, de uma divisão esquemática, pois, na prática, as perspec­
tivas, os interesses e os pontos de vista se sobrepõem e se mesclam de modo muito
mais intricado que qualquer esquema teórico. No entanto, essa classificação é útil
para identificar que tipo de informação os diferentes leitores vão buscar nos estudos
e, portanto, para orientar os redatores na preparação dos relatórios.

0 analista técnico é aquele cuja principal função é emitir um parecer sobre a quali­
dade e suficiência do estudo de impacto ambiental. Essa é tipicamente a atribuição
dos técnicos do órgão ambiental e dos profissionais das instituições governamentais
consultadas pelo órgão licenciador. Seu envolvimento com o processo de AIA e sua
perspectiva de análise é profissional, baseada em sua formação acadêmica e sua
experiência anterior. Ele pode ter lido dezenas de estudos de impacto e pode ter p arti­
cipado da preparação de outros tantos; pode também ter trabalhado na construção ou
na operação de um empreendimento similar àquele que está analisando. Seu principal
objetivo, ao ler os estudos, é verificar se os quesitos atinentes à sua especialidade
foram satisfatoriamente atendidos; em caso contrário, formulará exigências para
apresentação de estudos complementares ou para esclarecimento de pontos dúbios.
As informações buscadas por esse tipo de leitor referem-se aos métodos utilizados, às
hipóteses que possam ter sido assumidas para realização dos levantamentos e para
chegar às conclusões sobre o diagnóstico ambiental ou sobre a análise dos impactos,
ou ainda aos bons fundamentos das conclusões (por exemplo, quanto à classificação
dos impactos significativos, quanto à proposição de medidas mitigadoras e sua efi­
cácia). Dentro do grupo de analistas, normalmente, encontra-se um especialista no
tipo de projeto apresentado que buscará informações técnicas sobre o projeto e sobre
as medidas mitigadoras, assim como justificativas para as escolhas apresentadas.
Os analistas técnicos formam o grupo que provavelmente lerá o estudo de impacto
ambiental com mais atenção. Para um bom entendimento, esse tipo de leitor não só

C,
368 lE j^ a lia ç ã o de Impacto A m biental: conceitos e métodos

aceita um a descrição detalhada como poderá ficar frustrado se as informações apre­


sentadas forem superficiais.

Representantes de grupos de interesse, como organizações não governamentais, asso­


ciações de moradores e associações comerciais, podem preocupar-se em conhecer um
estudo ambiental, sobretudo quando se trata de um projeto polêmico, que possa afetar
determinados bens ou interesses ou que modifique substancialmente o status quo de
uma região ou de um local. Algumas associações podem dispor de quadros técnicos
com expertise para análise de um estudo ambiental, enquanto outras podem solici­
tar apoio de universidades ou de voluntários, ou dispor de recursos para contratar
consultores. A leitura de um estudo ambiental feita por representantes desses grupos
é, muitas vezes, dirigida para partes do documento, como trechos do diagnóstico
ambiental ou a descrição do projeto. As conclusões do estudo podem ser contestadas
se não estiverem bem fundamentadas; medidas mitigadoras ou compensatórias podem
ser vistas como insuficientes e pode haver demanda de outras medidas.

Quadro 14.1 Características dos principais leitores dos estudos ambientais


G rupo
P o n t o de v is t a A nalista G rupos de P úblico A dm inistrado r T o m ado r de
técnico INTERESSE do processo decisões
P erspectiva Profissional Social, Pessoal, Atendimento a Política
pública particular procedimentos
B ase de Formação Experiência Vida cotidiana, Leis, regulamentos, Desejo de
CONHECIMENTO acadêmica profissional conhecimento direito administrativo seus eleitores
e experiência empírico do ou interesses
profissional local de moradia de seus superiores
ou de trabalho

O bjetivos Verificar se as Apoiar ou Apoiar ou Garantir o cumpri­ Escolher entre


questões contestar o contestar mento da lei e dos alternativas
relativas à sua projeto; o projeto; procedimentos
especialidade modificar preparar-se para administrativos
foram tratadas o projeto a situação
de modo adequado futura
N ecessidades Métodos, hipóteses Impactos sobre Impactos sobre Alternativas consi­ Implicações de
DE INFORMAÇÃO assumidas, interesses seus interesses deradas, impactos ordem política,
fundamentos específicos pessoais e seu mais significativos social, econômica
das conclusões modo de vida e ambiental
I nteresse por Muito alta Alta a média Pequena Média Baixa
DETALHES

Fonte: adaptado de Page e Skinner (1994).

As informações buscadas por leitores desse grupo dizem respeito principalmente a


seus interesses; há organizações com agendas voluntariamente restritas ou focadas
- a proteção de determinado ambiente ou a promoção das atividades econômicas em
um local —, mas há tam bém organizações com missão ampla de proteção ambiental
ou de defesa de interesses de amplas parcelas da sociedade, como os sindicatos. Um
conhecimento prévio de quais são as principais partes interessadas (stakeholders;
pode alertar os redatores do EIA quanto a informações específicas que possam ser

CAPÍTÜ LO
C o m u n ic a ç ã o d o s R esulta 369

requeridas ou quanto à conveniência de apresentar análises mais aprofundadas a


respeito de determ inado impacto potencial do projeto analisado.

0 público, aqui entendido como um conjunto de indivíduos1, busca nos estudos 1Público é
ambientais inform ações sobre como poderá ser afetado pelo projeto. Um vizinho da entendido aqui, em
área de em preendim ento terá interesse em saber se sua propriedade sofrerá algum a um sentido restrito,
como os cidadãos
forma de impacto, se um a nascente poderá secar, se haverá cam inhões passando
que possam se
diante de sua porta ou se sua residência estará sujeita a ruído excessivo. 0 con he­ interessar por um
cimento dos indivíduos sobre seu local de moradia ou de trabalho pode ser muito empreendimento
mais profundo do que o dos consultores que elaboraram o diagnóstico ambiental, e seus impactos.
embora não sistematizado em bases científicas. Desse modo, inform ações apresen­ No que se refere à
tadas no EIA podem ser contestadas com base nesse conhecim ento empírico, e isso consulta pública
no processo de
pode influenciar os analistas do órgão ambiental. Muitas vezes, porém, as pessoas
avaliação de
estão interessadas em inform ar-se sobre as conseqüências de um projeto para to ­ impacto ambiental,
mar decisões sobre como agir para preparar-se ou adaptar-se à nova situação que o público é
será criada e o EIA tam bém terá essa função, principalm ente se não houver outros entendido como
veículos de comunicação para inform ar o público. uma categoria
extremamente
ampla, que engloba
Adm inistrador do processo é um termo que designa um a pessoa ou grupo de pessoas
todo e qualquer
com atribuições que v ariam entre jurisdições, pois seu papel e suas funções dependem interessado:
ia lei e de regulamentos. No Brasil, corresponde essencialmente aos dirigentes dos “Público é todo
jrgãos licenciadores. 0 adm inistrador não tem tempo de ler todo o EIA e se baseia no aquele que não é
parecer de um a equipe técnica. Sua principal preocupação é assegurar que todos os [o] empreendedor e
que não participou
requisitos legais sejam atendidos e que os procedimentos adm inistrativos sejam rigo-
da equipe
rrsam ente cumpridos. Se não o forem, o adm inistrador pode ser contestado por isso,
multidisciplinar
até por via judicial. Cabe a ele a responsabilidade de levar aos tomadores de decisão [que elaborou o
um arrazoado sobre as v antagens e os riscos do projeto e de suas alternativas. 0 adm i­ estudo]” (Machado,
nistrador pode ser contestado por grupos de interesse, se não obrigar o empreendedor 1993, p. 52).
a explorar com nível suficiente de detalhe todas as alternativas razoáveis de localiza­
rão e de mitigação. Ele tam bém pode ser questionado por seus superiores hierárquicos,
zm geral políticos sujeitos a pressões provenientes de todos os grupos de interesse, e
ieve prestar contas pelos mais variados problemas percebidos por esses grupos, como
; demora na análise, não ter exigido estudos suficientemente detalhados, não ter
iado a devida atenção a determ inado bem legalmente protegido, privilegiar interesses
:e ambientalistas radicais ao invés das necessidades prementes de desenvolvimento
social e econômico do País e diversos outros pontos de vista conflitantes.

1 tomador de decisão é tam bém um a pessoa ou grupo de pessoas com perfil e


urribuições diferentes segundo a jurisdição. No Brasil, as decisões acerca da aprovação
io s projetos submetidos ao processo de avaliação de impacto ambiental cabem seja
i ; m colegiado (um conselho de meio ambiente) seja a um órgão governam ental
: :>m atribuições de licenciamento ambiental. Em outras jurisdições, a decisão pode
>er tom ada por um organism o setorial, como um Ministério, ou por um conselho de
r in is tr o s . Em qualquer hipótese, a decisão se dá na esfera política e leva em conta
~ão somente os impactos ambientais, m as considerações de ordem econômica, social
e política. 0 tom ador de decisões está interessado em conhecer as implicações de
: . a decisão, as conseqüências, sob todos esses pontos de vista, de aprovar ou não
: projeto. Nas decisões colegiadas, cada representante defende os interesses de seu
aliação de Im pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

grupo e poderá ter de justificar seu voto junto a suas bases. Os representantes poderão
ler partes do estudo ambiental, em busca de informações selecionadas, mas estão
fundam entalm ente interessados em conhecer os prós e os contras de cada alternativa,
até mesmo da alternativa de não aprovar o projeto.

Por fim, há leitores ocasionais dos estudos ambientais, não referidos no Quadro 13.1,
dentre os quais pode-se destacar pessoas encarregadas da fiscalização dos atos gover­
namentais; no Brasil, são os membros do Ministério Público, que podem iniciar ações
judiciais, envolvendo, desta forma, juizes e peritos. Caso haja contestação de uma
decisão já tomada ou em vias de ser tomada, o estudo de impacto ambiental pode ser
detalhadamente revisto à procura de erros e incongruências.

14.2 O b j e t iv o s , c o n t e ú d o s e v e í c u l o s d e c o m u n i c a ç ã o
A comunicação em avaliação de impacto ambiental busca transm itir informação
técnica multidisciplinar a um público variado com interesses específicos distintos.
Além disso, busca convencer as partes interessadas acerca da viabilidade do
empreendimento proposto (isso pressupõe que, se o empreendimento for considerado
internamente como inviável, o projeto nem será submetido à aprovação governa­
mental; por outro lado, significa que, se o empreendedor e seus consultores estão
convencidos da viabilidade ambiental do psojeto, tentarão convencer os demais
interessados).

0 que deve, então, ser comunicado ao público? Tipicamente, o estudo de impacto


ambiental, como principal documento do processo de AIA, intenta comunicar:
# as intenções do proponente do projeto;
# os objetivos do projeto;
# as características técnicas do projeto e suas alternativas;
# as justificativas para a alternativa escolhida;
# a localização dos componentes do projeto;
# os atributos ou as condições ambientais da área que poderá ser afetada pelo
empreendimento;
# os impactos que o empreendimento causará;
# as medidas que podem ser tomadas para evitar, reduzir ou compensar os
impactos negativos.

Além do estudo e do relatório de impacto ambiental (ou outros estudos ambientais),


que são documentos obrigatórios, essa informação pode ser transm itida por meio de
diferentes suportes, incluindo folhetos informativos, vídeos, CD-ROMs e sites na in­
ternet. Pode também ser transm itida de forma oral em reuniões e audiências públicas.

Um dos maiores desafios é a transmissão de informação técnica e científica para


um público amplo. Muitos especialistas da área de comunicação concordam que o
conteúdo de ordem ambiental é dos mais difíceis de transmitir. Harrison (1992, p. 6)
aponta quatro razões para distinguir comunicação ambiental de outras modalidades:
a complexidade, a dimensão técnica, o impacto pessoal e os elementos de risco. Em
termos de comunicação inserida no processo de avaliação de impacto ambiental,
essas quatro características têm os seguintes aspectos relevantes:

CAPÍTU
C o m u n i c a ç ã o d o s R e s u lt a

& Complexidade: o conteúdo da mensagem não pode ser transmitido na forma de


um a breve explanação; demanda conceitos e conhecimentos de ordem científi­
ca (multidisciplinar), de natureza jurídica e envolve também aspectos relativos
a estratégias empresariais, a políticas de governo e à distribuição (desigual) dos
benefícios e dos ônus decorrentes.
# Dimensão técnica: a equipe do proponente do projeto, assim como os consultores,
têm um conhecimento técnico que supera em muito o dos vários segmentos do
público interessado; o público tende a ver o projeto e suas conseqüências como
um a totalidade (raciocínio integrador), ao passo que os técnicos tendem a ver e
a explicar os projetos como um sistema composto de diversas partes articula­
das (raciocínio analítico).
# Impacto pessoal: poucas formas de comunicação envolvem o público de
modo tão pessoal - “as pessoas trazem suas mais radiantes esperanças e seus
mais obscuros receios para a discussão, e frequentemente veem as questões
ambientais como ameaças diretas às suas famílias e comunidades” (Harrison,
1992, p. 7); o tom decididamente emocional das declarações de muitas pessoas
(a favor ou contra) contrasta com o rigor racionalista das previsões de impacto
e com a formalidade adm inistrativa (senão burocrática) do processo adm inis­
trativo de análise e aprovação de empreendimentos.
# Riscos: nos casos de empreendimentos perigosos ou de conseqüências incertas,
a comunicação é particularm ente difícil, devido às diferentes modalidades de
o

apreensão e percepção do risco (conforme seção 12.6).

No entanto, se a comunicação com o público requer atenção e dedicação, a preparação


de documentos escritos, na forma de estudos ambientais, é “talvez a mais importante
atividade no processo de avaliação de impacto ambiental” (Canter, 1996, p. 623),
merecendo cuidado especial da equip^ envolvida nos estudos.

Em várias jurisdições, regulamentos estabelecem diretrizes quanto ao conteúdo


mínimo ou à estrutura de um estudo de impacto ambiental. Como as funções dos
estudos ambientais são similares, diferentes jurisdições estabelecem conteúdos
mínimos muito parecidos. O Quadro 14.2 apresenta uma estrutura típica de um EIA.

Além de atender a esses requisitos legais, os estudos de impacto ambiental poderão


servir eficazmente como instrumento de comunicação se certos cuidados forem
tomados na sua redação e apresentação. A notória dificuldade que experimentam
engenheiros e outros técnicos em escrever de forma clara não poderia deixar de se
m anifestar na redação de um estudo de impacto ambiental. Idealmente, as empresas
de consultoria deveriam contar com um consultor lingüístico e estilístico em suas
equipes. O fato dos relatórios serem escritos por diferentes profissionais dificulta
ainda mais a tarefa de entregar um produto minimamente legível e compreensível,
apresentado de forma padronizada, que exiba o uso consistente de termos e conceitos
e evite jargão técnico muitas vezes desnecessário.

A regulamentação brasileira estabelece as seguintes diretrizes quanto à apresentação


do Relatório de Impacto Ambiental:
iia ç u o u e ir n p y c iu H m u ic r u a i: c u r ic e u u s c r n c iu u u s

Quadro 14.2 E strutura típica de um estudo de im pacto am biental


S u m á r io
L istas de q u a d r o s , fig uras , fotos e anexos
L ista de siglas e abreviaturas
R esum o

I ntrodução
Apresentação básica do empreendimento e resumo de suas características principais
Informação sobre termos de referência ou diretrizes seguidas
Apresentação do estudo, estrutura e conteúdo dos capítulos
I nfo rm ações gerais
Localização e acessos
Apresentação da empresa proponente
Objetivos e justificativas do empreendimento
Histórico do empreendimento e das etapas de licenciamento
Análise da compatibilidade do empreendimento com a legislação incidente
Análise da compatibilidade do empreendimento com planos e programas governamentais
D escrição de em pr een d im en to e suas alternativas
Alternativas consideradas
Critérios de seleção e justificativa de escolha
Atividades e componentes do empreendimento nas etapas de implantação, operação e
desativação
Cronograma do projeto *
D iagnóstico a m b ie n ta l
Descrição da área de estudo
Diagnóstico do meio físico
Diagnóstico do meio biótico
Diagnóstico do meio antrópico
A nálise dos im pactos
Metodologia empregada
Identificação, previsão e avaliação dos impactos ambientais
Síntese do prognóstico ambiental
P lano de gestão a m b ie n ta l
Medidas mitigadoras, compensatórias e de valorização
Plano de recuperação de áreas degradadas
Programa de monitoramento e acompanhamento
Cronograma de implantação
R eferências bibliográficas
E quipe técnica ( in c lu in d o u m parágrafo sobre a q ualificação de cada profissional )
G lossário
A nexos:
Termos de referência do estudo
Mapas, plantas, figuras, fotos
Estudos específicos detalhados
Leis ou trechos de leis citados
Laudos de ensaios e análises
Listas de espécies
Memórias de cálculo e anteprojetos de medidas mitigadoras
Cópias de documentos (como certidões municipais, memorandos de entendimento, atas de
reuniões, registros de audiências ou reuniões públicas etc.)

HO
C o m u n i c a ç ã o d o s R es u lt a

O Rima deve ser apresentado de forma objetiva e adequada à sua compreensão.


As informações devem ser traduzidas em linguagem acessível, ilustradas por
mapas, cartas, quadros e demais técnicas de comunicação visual, de modo que
se possam entender as vantagens e desvantagens do projeto, bem como todas as
conseqüências ambientais de sua implementação.
(Resolução Conama 1/86, Art, 9o, parágrafo único.)

Xesse artigo da Resolução Conama sobre os estudos de impacto ambiental, é clara


a intenção de tornar o relatório inteligível não somente por especialistas, mas por
qualquer interessado. Aqueles que preparam os estudos devem se preocupar com a
eficácia da comunicação, empregando técnicas de comunicação visual e adotando
"linguagem acessível”, isto é, livre de jargões. Os autores devem preparar um relatório
cuja forma seja “adequada à sua [do leitor] compreensão”. Logo, é evidente a intenção
de envolver o público interessado no processo decisório, o que somente poderá ser
possível se os interessados estiverem suficientemente informados sobre o projeto e
seus impactos.

Ora, comunicar de forma eficaz requer, sim, o uso de linguagem acessível e de


técnicas de comunicação visual, mas, acima de tudo, necessita de clareza na escrita,
correção na redação, um entendimento cristalino das finalidades dos estudos am ­
bientais e um a noção dos interesses dos leitores. 0 texto deve ser “compreensível,
porém rigoroso” (Eccleston, 2000).

Também a regulamentação americana deixa claros os objetivos de efetiva comu­


nicação que se espera dos documentos escritos produzidos ao longo do processo de
avaliação de impacto ambiental:

Os estudos de impacto ambiental devem ser escritos em linguagem simples e


podem usar materiais iconográficos apropriados, de forma que os tomadores de
decisão e o público possam entendê-los prontamente. As agências devem empregar
redatores que escrevam em prosa clara, ou editores para escrever, fazer revisões
ou editar os estudos, que deverão ser baseados em análise e dados provenientes
das ciências naturais e sociais e das artes do planejamento ambiental.
(Council of Environmental Quality, Regulations for Implementing NEPA, Section 1502.8.)

Não poderia ser mais clara a desconfiança na capacidade comunicativa de técnicos,


cientistas e demais especialistas. A regulamentação do Conselho de Qualidade
Ambiental americano, publicada depois da análise dos primeiros anos de prática de
AIA, é bem detalhada quanto ao formato do estudo de impacto ambiental e dá várias
outras diretrizes a respeito de seu conteúdo, como, por exemplo:

sobre o diagnóstico ambiental: Dados e análises devem ser proporcionais à impor­


tância dos impactos e o material menos importante deve ser resumido, consolidado
ou simplesmente citado como referência. [...] Descrições verbosas do ambiente
afetado não são em si mesmas um sinal da adequação de um estudo de impacto
ambiental.
(Idem, Section 1502.15.)

sobre o resumo: Todo estudo de impacto ambiental deve conter um resumo que
o sintetize de modo adequado e exato. 0 resumo deve enfatizar as principais
374 aliação de Im pacto A m biental: conceitos e métodos

conclusões, as áreas onde haja controvérsias (incluindo questões levantadas [...]


pelo público) [...] 0 resumo não deve normalmente exceder 15 páginas.
(Idem, Section 1502.12.)

Serão tais critérios de clareza cumpridos pela maioria dos estudos ambientais?

14.3 D e f ic iê n c ia s c o m u n s do s r e la tó r io s t é c n ic o s
A dificuldade de boa parte dos engenheiros e cientistas em comunicar-se com um
público leigo é bem conhecida (Barrass, 1979). No caso de estudos multidisciplinares,
o “leigo” pode ser outro engenheiro ou cientista que não domine as técnicas, os
conceitos ou o jargão de um campo do conhecimento que não é o seu.

As principais deficiências dos estudos de impacto ambiental em termos de comu­


nicação foram classificadas por Weiss (1989) em três grupos: (i) erros estratégicos,
(ii) erros estruturais e (iii) erros táticos. Trata-se de erros que “m inam a clareza e a
credibilidade de muitos estudos de impacto ambiental” (p. 236).

Erros estratégicos ocorrem devido à parca compreensão das razões pelas quais são
feitos os estudos ambientais e para quem se destinam. Muitos profissionais assumem
- erroneamente — que os relatórios serão lidos apenas por especialistas, esquecendo-
se dos demais grupos de leitores (Quadro 14.1); dentre eles encontram-se aqueles
favoráveis ao projeto, que “esperam que o EIA não apresente nenhum a previsão de
impactos inevitáveis ou indique alternativas mais favoráveis”, e o grupo a priori
contra o projeto, “alerta a qualquer passagem na qual impactos negativos tenham
sua importância menosprezada” (Weiss, 1989, p. 237). Mesmo quando o EIA atende
formalmente ao conteúdo exigido, erros estratégicos podem m arcar o estudo. Weiss
identifica um a tendência comum em engenheiros, cientistas e acadêmicos de “escrever
(divagar) a respeito do assunto”, esquecendo que o EIA deve atender a objetivos de
comunicação, pois, “quanto mais fascinado estiver um autor com o seu tema, maior
o risco de o texto perder o foco e frustrar o leitor”. Talvez a mais típica expressão
dessa fascinação sejam as longas descrições de aspectos regionais que povoam muitos
diagnósticos ambientais.

Poucos desenvolvem habilidades comunicativas, por meio da escrita, que lhes


concedam trânsito e compreensão entre um leque amplo de leitores. Engenheiros e
cientistas naturais parecem usar um dialeto próprio - ou mais que isso, um “tecno-
leto monossêmico” (Serres, 1980). Especialistas nos mais variados tipos de modelagem
se recusam a explicar em que se baseiam seus modelos — pior ainda, não os usam
para explorar possibilidades ou verificar hipóteses, mas parecem acreditar neles e se
esquecem de avisar que os resultados dependem das premissas adotadas. Cientistas
sociais ou, na sua falta, outros que se aventuram por essas searas, costumam usar
palavras conhecidas de todos, mas sua articulação nem sempre faz sentido para os
não iluminados. Infelizmente, os profissionais da comunicação nem sempre ajudam:
os especialistas acham que suas ideias ficam truncadas ou que os textos, editados e
enxutos, são francamente errados.

Os EIAs e Rimas certamente não se destinam a se tornar best-sellers, mas é descon-


certante quando o leitor desiste já na segunda página. É também curioso que tantos
/
CAPITU
C o m u n ic a ç ã o dos R es u lta j

coordenadores de estudos se espantem quando lhes fazem perguntas sobre assuntos


que eles acreditam estar suficientemente explicados no EIA - na maioria das vezes,
ou não está suficientemente explicado, ou o leitor não conseguiu avançar na leitura
e chegar na página que contém essa informação.

Esses comentários podem parecer um indulto àqueles que têm a tarefa profissional
de ler e comentar estudos ambientais — e realmente o são. Infelizmente, os analistas
e os críticos de um EIA tam bém têm de se exprim ir por escrito, e os resultados
não são melhores. Basta escolher ao acaso um parecer técnico de análise de um
EIA. Naturalmente há exceções, e há EIAs e Rimas bem redigidos, mas tam bém são
exceções.

Erros estruturais tampouco são raros. Um exemplo desse tipo de erro, provavelmente
resultante de pouco cuidado na redação e revisão, é a seguinte passagem, extraída do
capítulo relativo à análise dos impactos de um estudo de impacto ambiental:

O u tr o s p o n to s , c o m o a u m e n t o do t r á f e g o d e c a m in h õ e s , r is c o d e a c id e n te s d e
t r â n s it o e a t r o p e la m e n t o s , p o d e m s e r c o n s id e r a d o s i r r e le v a n t e s , u m a v e z q u e
s e rá r e s t r it o a u m a u m e n t o p o u c o s i g n i f i c a t i v o d u r a n t e a fa s e d e im p la n t a ç ã o ,
r e f e r e n t e a o t r a n s p o r t e d o s e q u ip a m e n t o s a s e r e m in s t a la d o s n a á r e a .

Dizer que risco de atropelamento é irrelevante é, no mínimo, um a afirmação infeliz,


que provavelmente não será compartilhada pelos moradores dos locais sujeitos a esse
impacto. No limite, tal afirmação poderia levar a um a situação constrangedora se em
uma audiência pública alguém pedisse ao empreendedor ou ao coordenador do estudo
que confirmasse sua interpretação de que um atropelamento é irrelevante.

Erros estruturais referem-se à organização do relatório e à dificuldade de o leitor


encontrar as informações relevantes requeridas, muitas vezes perdidas ou esparsas
ao longo do texto. Weiss (1989, p. 238) critica os estudos montados como “colchas
de retalhos” com a finalidade de atender aos itens de termos de referência e facilitar
a revisão por parte de técnicos de agências governamentais (“o a n a l i s t a s u p e rfic ia l
poderá facilmente verificar que todos os itens requeridos foram contemplados”),
porque a função de um estudo ambiental não é atender a um a lista de verificação,
mas apresentar informação e análise relevantes para perm itir um a discussão pública
esclarecida do projeto e de seus impactos. Ainda segundo Weiss, muitos leitores
não têm interesse em “refletir sobre a história do planeta antes de saber se o lençol
local de água subterrânea será comprometido”. Tudo isso leva a suspeitar que muitos
estudos ambientais são deliberadamente estruturados e redigidos de modo a dificultar
a leitura atenta e a ludibriar o leitor.

Um erro estrutural muito comum é apresentar quadros sintéticos, como matrizes de


impacto, incoerentes ou inconsistentes com o texto correspondente: impactos que
aparecem em matrizes e não estão descritos no texto, impactos que aparecem descritos
com termos distintos em matrizes e em capítulos diferentes do EIA, impactos classi­
ficados como pouco importantes em um a parte do texto e como insignificantes em
quadros etc.

C,
376 gRJjaliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Já os erros táticos são os erros de ortografia, pontuação, concordância etc., somados


àqueles que resultam da dificuldade encontrada por muitas pessoas de passar para o
papel ideias que, em sua mente, parecem muito claras. 0 resultado é que o leitor não
compreende o que o escritor quis dizer, ao passo que este pensa que qualquer leitor
entendeu perfeitamente não só o que foi escrito, como também o que pensou o autor
da frase. Afirma Weiss (1989, p. 239): “Erros táticos acrescentam atrito à comunicação.
Onde deveria haver um a simples transmissão de fatos e ideias do escritor para o leitor,
há distrações, irritações, obstáculos”.

A citação abaixo ilustra um erro tático na apresentação da justificativa de um


empreendimento:

[...) os rio s c o n s titu in te s d a h id r o v ia [...] te m [sic] c a r a c te r ís tic a s a s s o c ia d a s a [sic]


g e o m o r f o lo g ia a p r e s e n ta n d o e m seu le ito , tr e c h o s a re n o s o s o n d e os d e p ó s ito s d e
s e d im e n to s , re p re s e n ta d o s p e lo s b a n c o s de a r e ia , são as re s triç õ e s à n a v e g a ç ã o e
tre c h o s ro c h o s o s n o s q u a is as e s tr u tu r a s ro c h o s a s , re p re s e n ta d a s p e lo s p e d ra is e
os c h a m a d o s tra v e s s õ e s , é q u e são lim it a n t e s .

0 redator poderia ter escrito simplesmente que os rios apresentam obstáculos à


navegação, como bancos de areia e trechos rochosos, conhecidos como pedrais e
travessões. Esse erro poderia ser facilmente sorrigido por meio da leitura atenta do
próprio autor ou por um trabalho de revisão gramatical e estilística.

Dado o conteúdo altamente técnico e as análises às vezes sofisticadas encontradas


em muitos estudos de impacto ambiental, é provavelmente inevitável fazer certas
comparações com teses acadêmicas. Também estas podem deixar a banca exam i­
nadora em dúvida sobre sua qualidade não por causa de erros metodológicos ou
análises apressadas, mas simplesmente porque o autor foi incapaz de transm itir com
clareza suas ideias ou mesmo de descrever sem ambigüidades aquilo que fez. Por essa
razão, Umberto Eco propõe um a definição no fim das contas muito honesta de uma
tese: “um objeto físico, prescrito pela lei, composto de um certo número de páginas
datilografadas, que se supõe tenha alguma relação com a disciplina na qual a pessoa
se gradua, e que não deixe a banca em um estado de doloroso estupor” (Eco, 1986,
p. 9). 0 mesmo deveria valer para um estudo de impacto ambiental.

1 4 .4 S o l u ç õ e s s im p l e s para r e d u z ir o r u íd o na c o m u n ic a ç ã o e s c r it a
Há inúmeros m anuais de redação e outras obras de referência com recomendações
para um a comunicação escrita eficaz. Se ao menos esses princípios básicos fossem
seguidos, a legibilidade da maioria dos estudos ambientais já seria bastante ampliada.
Alguns autores fornecem sugestões específicas para a preparação de relatórios
ambientais, como Canter (1996), Dorney (1989) e Eccleston (2000).

Poucas empresas de consultoria preocupam-se em submeter a versão final do estudo


ao crivo de um revisor gramatical e estilístico, e provavelmente menos ainda buscam
os serviços de profissionais da comunicação para a u x ilia r a planejar o estudo, a or­
ganizar sua estrutura e a fazer uma boa diagramação. Normalmente os prazos, mais
do que os custos, são apontados como justificativas para tal lacuna, um argumento
que certamente peca por desconsiderar que um relatório ilegível tardará mais para
ser lido, ou pior, será devolvido.

CAPÍTU 10
C o m u n i c a ç ã o d o s R e s u lt a ^ 377

O fato dos relatórios serem escritos a muitas mãos só dificulta a tarefa de torná-los
coerentes e legíveis. Certamente cabe ao coordenador do estudo dar diretrizes claras
aos especialistas quanto ao estilo e formato de suas contribuições, ainda que muitos
deles acabem não seguindo as orientações. 0 coordenador poderá desempenhar
um papel importante na homogeneização do texto, eliminando as incongruências
mais evidentes e informações contraditórias. Contudo, todo cuidado é pouco para
não alterar as informações factuais, as interpretações e as conclusões dos autores
originais.

As deficiências do trabalho multidisciplinar transparecem facilmente em um estudo


ie impacto ambiental. A compartimentalização excessiva do texto é um dos indi­
cativos. 0 abuso de termos técnicos e de jargão é outro, e isso pode rapidamente
iesencorajar a leitura de seções inteiras do relatório. Um dos papéis do especialista
em comunicação é auxiliar o coordenador como se fosse um tradutor, “lavando” o
jargão sem “tu r v a r ” o significado (Dorney, 1989).

EJuando estudos especializados são encomendados a consultores, os relatórios por eles


croduzidos raramente podem ser utilizados ipsis litteris. Podem conter um a descrição
:o empreendimento que já constará do capítulo do EIA, revisões de documentos e de
nbliografia que já terão sido incluídas em outras seções, além de informação técnica
leialhada e de apêndices como memórias de cálculo, laudos de ensaios etc. E função
-o coordenador dos estudos — possivelmente auxiliado por um editor —, extrair do
txto preparado por esse consultor as partes que melhor se adaptem a cada seção
i- estrutura do EIA. Também pode haver interesse em manter a integridade desse
‘riaiório, situação em que ele poderá ser colocado como anexo, cabendo ainda ao co-
. rienador selecionar as informações e análises mais relevantes para serem inseridas
em capítulos ou seções determinados do EIA.
*
3epurar o texto de excesso de informação detalhada facilita a vida do leitor. A nexar
-. vidos detalhados é uma excelente maneira de não dispersar sua atenção. Assim,
leszrições de dados e resultados de modelagens, longos diagnósticos, listas de espécies
:t fauna e flora e muitas outras informações podem ser mais facilmente consultadas
: : : quem realmente se interessa pelo detalhe. A maneira de apresentar o diagnóstico
s: :re fauna e flora é um bom exemplo. A maioria dos leitores não tem interesse em
ivalisar quadros contendo a lista de dezenas de nomes científicos e seus respectivos
: rizvats, locais e épocas do ano em que foram avistados. Tudo isso pode ocupar várias
: rimas de anexos, trazendo para o texto principal as observações mais relevantes
. -r resultaram desses levantamentos, como a presença de espécies ameaçadas ou o
m r e r o total de espécies de cada grupo registrado durante os trabalhos de campo.

I : zieston (2000, p. 155) recomenda que se deveria “envidar todos os esforços para se
até mesmo um a aparência de parcialidade” no texto, chegando a sugerir que se
« n r regue o condicional ao invés do futuro, para deixar claro que nenhum a decisão
■ ainda tomada. Por outro lado,7 em muitos EIAs encontram-se recomendações 3 dos
caviulrores especializados mantidas na forma original, ou seja, como recomendação
svgestão, sem deixar claro se foram efetivamente acatadas pelo empreendedor,
confunde o leitor e o analista. Para maior clareza, termos como deve, deveria ou é
a" : : -Tinte que (referindo-se a medidas de gestão ou à descrição do empreendimento,

C
378 ^ ^ a l i a ç ã o de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

entre outros), devem ser evitados e substituídos por expressões afirmativas do tipo
será executado ou será construído caso o projeto venha a ser aprovado.

Uma estratégia para atender às necessidades dos vários tipos de leitores é prover
ferramentas que perm itam a rápida localização de informações relevantes. Um su­
mário detalhado (e evidentemente paginado) é o mínimo que pode ser oferecido,
mas índices remissivos tam bém são de grande valia. Esses índices normalmente são
colocados no final de cada volume e facilitam a localização de informações-chave.

Quadros e tabelas são um a excelente maneira de transm itir informação sintética ao


leitor. 0 espaço limitado leva o autor a concentrar-se no essencial, e a necessidade
de preencher todas as colunas favorece a própria escrita, incitando os autores a um
exame sistemático das questões sintetizadas no quadro. Quadros de impactos e de
medidas mitigadoras são bastante comuns em estudos ambientais.

Mapas e plantas são outra forma de sintetizar informação. Em muitos estudos


ambientais, por economia de tempo e de recursos, são aproveitados plantas e
desenhos técnicos elaborados para outras finalidades, muitas vezes exibindo excesso
de detalhes. Vários desses documentos não interessam ao analista ambiental e
dificultam a compreensão dos aspectos essenciais do empreendimento. Tal reciclagem
de desenhos deve ser evitada. *

A preparação de mapas temáticos como cartas geomorfológicas ou geológicas costuma


ser exigência de termos de referência, mas muitas pessoas têm dificuldade de entendê-
las. 0 mesmo vale para plantas do empreendimento, fluxogramas e desenhos técnicos.
Como forma de facilitar a compreensão, muitas vezes é possível inserir fotos ou
textos explicativos em mapas e plantas, sem prejudicar a transmissão de informação
de cunho eminentemente técnico.

Ilustrar o texto com fotografias tam bém auxilia na compreensão, desde que a
quantidade de fotos não seja excessiva e que elas ten ham legendas autoexplicativas.
Fotografias podem ser facilmente acomodadas ju n to ao texto para não tom ar muito
espaço nem quebrar a seqüência de leitura. Uma boa diagram ação é essencial para
que ilustrações e textos sejam complementares e não haja apresentação de um
contra o outro — evidentemente as fotos e ilustrações devem sempre ser cham a­
das no texto, da mesma forma que quadros, tabelas e diagram as, e inseridas o
mais próximo possível do ponto de chamada. Caso haja necessidade ou interesse de
incluir um número elevado de fotos, como de levantam entos faunísticos ou florís-
ticos, ou de comunidades ou propriedades rurais, o mais conveniente é selecionar
poucas fotos representativas para o volume principal e incluir todo o conjunto
como um anexo.

Feininger (1972, p. 11-12) relaciona os seguintes propósitos p ara a fotografia:


informação, inform ação intencionada, pesquisa, docum entação, entretenim ento e
autoexpressão. Seu emprego em relatórios técnicos está principalm ente relacio­
nado à informação (“seu propósito é educar as pessoas ou perm itir-lhes tom ar as
decisões corretas”) e à docum entação (“a fotografia conserva conhecim entos e
fatos de forma facilmente acessível”). Desta forma, espera-se que as fotografias

CAPÍTU ILO
C o m u n ic a ç ã o dos R e s u lt a » 379

inclusas cm um EIA informem e docum entem, ou seja, inform em os leitores sobre


as características am bientais das áreas de estudo, completando e facilitando a
compreensão do texto e dos mapas, e docum entem determ inadas tarefas execu-
ladas d u ra n te a preparação do E I A , co m o a coleta de a m o stra s e a realização de 2A categoria
e n tre v ista s ou de reuniões públicas2. “inform ação
in te n c io n a d a ’’ de
Feininger tem como
As legendas de fotos deveriam ser usadas como oportunidade de salientar as infor­ propósito “vender
mações mais importantes, um convite ao leitor para ler também, atentamente, a foto, um produto, um
em vez de passar os olhos rapidamente por ela. Por exemplo, ao invés de legendar serviço, uma ideia”
“aspecto da área a ser inundada”, a fotografia poderia ter uma legenda como “vista (p. 11); supõe-se
que não deva ser
da área a ser inundada, tomada a partir da atual residência do Sr. José Silveira; notar
esse o propósito de
em primeiro plano um a área de cultura temporária e, ao fundo, à direita, fragmento
um EIA.
de vegetação em estágio médio de regeneração”.

Nunca é demais lembrar que a qualidade das fotos é tão importante quanto a quali­
dade do texto - não se trata somente de resolução ou nitidez (instruções que podem
ser facilmente fornecidas e seguidas para a tomada e a reprodução de fotos digitais),
mas também, e principalmente, de enquadramento, foco nos elementos principais,
contraste, iluminação e todos os demais elementos que fazem um a boa foto. Não se
espera que as fotos de um EIA tenham qualidades artísticas memoráveis, mas “a foto
é como a palavra: uma forma que imediatamente diz algo” (Barthes, 1986, p. 74), e há
de cuidar-se do que se diz em um relatório técnico.

3Na verdade,
Sintetizando as diversas recomendações, algumas regras práticas para a apresentação
trata-se de
de estudos ambientais3 são propostas a seguir: regras práticas
Quanto à estrutura, um bom relatório deve: para facilitar o
conter sumário paginado; ' entendimento de
% conter resumo executivo apontando os principais pontos do estudo; qualquer relatório
& conter resumo por capítulo; técnico.
evitar compartimentação excessiva do texto (ou seja, muitas subdivisões e nume­
ração de seções que contenham mais de quatro algarismos);
adotar títulos e subtítulos apropriados;
incluir índices analíticos, lista de siglas, lista de figuras, tabelas e anexos;
* incluir glossário.
Quanto às referências e fontes de documentação, um bom relatório deve:
# citar de forma completa todas as referências bibliográficas utilizadas;
# citar de forma completa todos os relatórios internos e demais relatórios não
publicados, incluindo título, autores, entidade ou setor que o realizou, ano e
demais informações que permitam a localização do documento para consulta e
verificação das informações apresentadas;
* citar sites da Internet consultados, incluindo a data da consulta;
citar entrevistas telefônicas, mencionando pessoa entrevistada e data;
citar correspondências oficiais, informando data, número e órgão emissor.
Quanto ao estilo, um bom relatório deve:
>$ ser conciso sem ser lacônico;
# dar ao leitor informação suficiente para justificar sua conclusão;
evitar jargão técnico e explicar os termos menos usuais;
Ilação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

# remeter toda informação muito técnica para anexos devidamente identificados;


# colocar como anexo estudos técnicos completos (como modelagens, levanta­
mentos de espécies, sondagens de opinião etc.);
# utilizar palavras e conceitos coerentemente ao longo do texto;
# anunciar os objetivos de cada capítulo no seu início;
# padronizar a apresentação de figuras, tabelas, ilustrações, capítulos, seções e
subseções;
# numerar todas as figuras, tabelas e ilustrações, e sempre chamá-las no texto;
# inserir figuras, tabelas e ilustrações imediatamente após sua chamada no texto
(na mesma página ou na página seguinte);
# informar sempre as unidades de medida utilizadas;
# definir sempre o significado de termos subjetivos antes de empregá-los (médio,
grande, muito importante, relevante, insignificante etc.);
# evitar siglas e usá-las com parcimônia, sempre explicando seu significado
quando do primeiro uso, além de descrevê-las em uma lista de abreviaturas no
início do relatório;
# salientar em negrito ou itálico as informações e as conclusões mais importantes;
% cuidar da diagramação.
%
Quanto às ilustrações, um bom relatório deve:
# incluir material iconográfico relevante (fotografias, desenhos), com legendas
autoexplicativas, de forma que o leitor não precise ler todo o texto para entender
a mensagem transmitida pela ilustração;
# incluir quadros e figuras sinópticas, explicando o significado de todos os
símbolos e abreviações;
t incluir mapas e croquis, indicando sempre a escala, o norte e a fonte do mapa-
-base;
anexar mapas e desenhos de formato maior que aquele do relatório, identifican­
do sempre o relatório ao qual pertence;
# seguir as normas técnicas no que concerne à apresentação de desenhos técnicos.

A Fig. 14.1 mostra um a página de um EIA preparada com apoio de um profissional


de comunicação visual, particularm ente bem cuidado quanto à diagramação, na
qual se podem observar diversos elementos que facilitam a leitura e a inteligibili­
dade do documento:
# título do EIA em todas as páginas;
# clara indicação das seções;
% número de capítulo e título resumidos;
# documentos produzidos por terceiros colocados em anexo;
# fotos numeradas, chamadas no texto e relacionadas nas páginas introdutórias;
«st- fotos com legendas autoexplicativas;
# chamadas para outras seções;
# margem para encadernação e impressão frente e verso;
# quadro com título claro;
# quadros numerados, chamados no texto e relacionados nas páginas introdu­
tórias;

LO
C o m u n ic a ç ã o dos R esulta! 381

;
Núm ero do ca p ítu lo e
Clara indicação das seções
títu lo resum ido
EIA M in e ra çã o de A rg ila - V ie ira e Pirizal
MEDIDAS 8

( T itu lo do EIA
8.11 AVERBAÇÃO DE RESERVA LEGAL

n ^ As atividades m inerais serão desenvolvidas em duas propriedades de titu la rid a d e da


D ocum entos produzidos ~ ^ A r . , • . /V , ^
por terceiros colocados em anexo.. C am argo Correa- Em c u m Prim e n t0 a Lei 4.771/65, sera fe ita a averbaçao da Reserva
Legal das duas propriedades e, além disso, com o parte in te g ra n te das m edidas m itigadoras
e com pensatórias, será averbada uma área m aior que a m ínim a exigida legalm ente.
A propriedade V ieira (M a trícu la 4.417 - Anexo 7) possui 244,00 ha e a propriedade
Pirizal (M a trícu la 358 - Anexo 7) possui 145, 20 ha; suas reservas legais m ínim as (20% )
são respectivam ente 48,80 ha e 29,04 ha, perfazendo um to ta l de 77,98 ha.

Propõe-se a averbaçào de 100 ha de áreas localizadas


na propriedade V ieira , sendo a sua locação e
averbaçào in te g ra lm e n te nesta propriedade (m atrícula
4.417). Considerando sua vegetação m ais sig n ific a tiv a
(ver Foto 02, a seguir) e sua situação topo g ráfica
(m aiores declividades), ultrapassa-se . assim, o valor
m ínim o de averbaçào em 22,02 ha, con fo rm e m ostra
o Quadro 8.11.1, a seguir. Além disso, a área poderá
te r a fu nçã o de "ta m p ã o " entre as m inerações,
e possui duas cavernas - abism o do França e abism o
do O rlando (item 6.2.8.1 -E studo espeleológico), além
d e e s t a r m a i s d i s t a n t e da á r e a f a b r i l .

A área proposta para averbaçào é co n stitíd a por


02 Vista parcial da área com mata nativa que será
averbada. A área servirá como "tampào" entre a área
floresta nativa em estágio m édio e avançado e
de mineração no Vieira (1* plano) e o Pirizal, situado reflorestam entos de araucária. Desse to ta l, a "área. de
/ na vertente oposta m ata a ser averbada é de 72,37 ha, e a área ocupada
( Foto com legenda a u to -e xp lic a tiv a ) por reflorestam entos de araucária é de 27,63 ha. Chamadas para o utras seções
Fotos num eradas cham adas no Ressalta-se que cerca de 5.3 ha da área de araucária -
te x to e relacionadas incluída na averbaçào será enriquecida nos term os
nas páginas in tro d u tó ria s
program a de p la n tio de espécies nativas, apresentado
Q uadro com títu lo claro no Item 8.8.

QUADRO 8.11.1- RESUMO DAS AREAS PROPOSTAS PARA AVERBAÇAO DE RESERVA LEGAL

DESCRIÇÃO ÁREA (ha)

Quadros num erados, cham ados Reserva Legal (20% ) - Propriedade V ieira - M a trícu la 4.417 48,80
no te x to e relacionados nas Reserva Legal (20% ) - Propriedade Pirizal - M a trícu la 358 29,18
páginas in tro d u tó ria s
Total de averbaçào m ínim a prevista em Lei 77,98
Área to ta l proposta para averbaçào 100,00

Área proposta além do m ínim o estabelecido em Lei 22,02

A localização da área de averbaçào da Reserva Legal pode ser visualizada na Figura 8.8.2,
apresentada a n te rio rm e n te
\

M argem para encadernação e


v im pressão fre n te e verso

N úm ero da página referida no sum ário

CAMARGO CORREA CIMENTOS/ MULTIGEO MEIO AMBIENTE 479

Fig. 14.1 E xtrato de um a página de um EIA na qual se indicam vários elementos de diagram ação e
apresentação
Fonte: M u ltig e o M eio Am biente, EIA M ineração de A rg ila Vieira e Pirizal, 2004. Reproduzido com
autorização.

C
382 mggaliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

# proponente e consultor claramente identificados;


# número da página referida no sumário.

14.5 M a p a s , plantas e desenhos


Plantas e mapas são essenciais para prover e sintetizar informação em qualquer
estudo ambiental. Uma planta de localização, plantas contendo o arranjo físico
[layout] do empreendimento e cartas temáticas estão (ou deveriam estar) presentes em
todo estudo. A cartografia é um a arte muito antiga, mas ainda hoje muitas pessoas
têm dificuldades em ler mapas, e muitos mapas são feitos por pessoas sem suficiente
formação cartográfica. Bom e Morais (1993, p.2) constataram que “a maioria dos ma­
pas” apresentados em EIAs submetidos ao órgão ambiental do Estado do Paraná não
é apresentada de acordo com diretrizes de entidades oficiais, e alguns deles sequer
indicam as coordenadas e a escala, ao passo que “outros possuem todas as infor­
mações, porém são de difícil leitura, por estar em desacordo com normas básicas de
cartografia e apresentação gráfica”.

Há alguns elementos imprescindíveis na apresentação de qualquer documento


cartográfico (Fig. 14.2):
# escala gráfica;
# orientação (indicação do norte); *
# coordenadas;
% indicação da fonte do mapa-base;
# indicação das fontes de dados;
4A legenda # legenda e convenções cartog'ráficas4;
“compreende # informação sobre autor(es) ou responsável(eis) técnico(s), empresa que elaborou
todas as notas
o mapa, estudo ambiental ou projeto a que se refere, data;
informativas
complementares # número ou outra indicação que permita menção inequívoca no texto.
que acompanham
o mapa: título, Uma legenda completa e clara é da maior importância para a leitura do mapa. Como
escala, convenções, coloca Dreyer-Eimbacke (1992, p. 15): “Os mapas apresentam suas informações de
articulação, fontes
modo sintético por meio de símbolos, à maneira de um sistema de sinalização. Um
consultadas etc.”.
A s convenções são mapa só é inteligível para quem conhece essa linguagem visual, de modo que seja
“explicações sobre capaz de interpretar os códigos”. Daí a necessidade da legenda, que “decodifica os
o significado dos símbolos, explicando seu sentido num a linguagem de uso corrente como é, por
símbolos utilizados exemplo, a escrita”.
nos mapas e demais
ilustrações que
o acompanham” Há convenções internacionais para a preparação e impressão de mapas topográficos
(Santos, 1989, (IBGE, 1993), e é sempre recomendado adotar as mesmas convenções que os mapas
p. 2). oficiais servidos de base. Para mapas temáticos, a escolha das cores é um dos elemen­
tos mais importantes para lograr um a leitura confortável.

14.6 C o m u n ic a ç ã o c o m o p ú blic o
Várias jurisdições exigem que o estudo de impacto ambiental seja acompanhado
de um “resumo não técnico” ou de outro documento que sintetize as conclusões do
/

estudo e facilite a compreensão do projeto e de suas conseqüências. E o caso do Rima —


relatório de impacto ambiental, previsto pela regulamentação brasileira.
C o m u n ic a ç ã o d o s R e s u l t a 383

No Brasil, nem o Rima nem 411.000

quaisquer outros documentos de


divulgação costumam passar pelo
crivo do agente governamental
licenciador, de forma que o inte­
ressado deve estar atento para que
haja um a perfeita coerência entre
esses materiais e o conteúdo do
estudo de impacto ambiental, que
é documento oficial. É diferente a
postura da Comissão de Avaliação
de Impacto Ambiental da Holanda.
A Comissão entende que “um bom
resumo é importante para os admi­
nistradores e para o público”; por
isso o resumo é “um item chave de
todas as diretrizes de scoping” e é
analisado com o mesmo rigor que o
EIA, podendo até ser objeto de com-
plementação (Ceia, 2002a, p. 10).
o 6km Fonte: imagem de satélite fornecida pela IP-SP0T 10m, 2005
Projeção Universal transversa de Mercator
escala original 1:50.000 Datum Horizontal: 5AD-69
Muitos Rimas são elaborados de
forma burocrática, apenas para Area diretam ente afetada - ADA Locais onde foram avistadas as espécies
atender à exigência de que um @ Bugio ® Tam anduá-bandeira
Câmeras Trap
documento com esse nome seja ® Ema % Urubu-rei
Transeções
r

apresentado. E muito comum que ©> Macaco-prego ® Veado


sejam feitos de maneira apressada, # Queixada (rastro)

cortando parágrafos ou seções Ciiente Título Editor/Desenhista Responsável Técnico


International Paper Levantamento da Cristiane Miuki Isogai Leda Ferreira Prado i ] m
L ttjl
inteiras dos estudos de impacto do Brasil Fauna Terrestre
rr\
Projeto Ordem de Serviço Figura Controle de Edicão
ambiental. Esses Rimas certamente Estudo de Impacto Ambiental W 0 B 2052 IV.3.2 24/02/2006 - edição
Fábrica Três Lagoas 06/03/2006 - revisão
não atendem ao objetivo de comu­
nicação com o grande público. Há,
contudo, exceções. Alguns propo­ Fig. 14.2 Exemplo de figura inserida em um EIA contendo os principais elementos
nentes preparam e imprimem de um mapa ou imagem
centenas de exemplares de resumos Fonte:m odificado de ERM Brasil Ltda. (2005) - EIA Fábrica Três Lagoas. Reproduzido
dos Rimas, para promoverem uma com autorização.
verdadeira divulgação do projeto.
Há resumos de poucas páginas com ilustrações abundantes, como foi o caso doprojeto
de dragagem do canal de Piaçaguera, em Cubatão, SãoPaulo. Tal iniciativa não pode
ser confundida com a preparação de folhetos promocionais, que podem explicar o
projeto, mas basicamente procuram defendê-lo5. Outro enfoque, bem mais raro, é pre­ 5Há vários
parar um Rima mais atraente para a leitura, como foi feito para a usina hidrelétrica exemplos, como
de Tijuco Alto, na divisa do Paraná e São Paulo. um prospecto
distribuído durante
as audiências
Esse Rima tem 140 páginas e foi impresso como um a brochura colorida com tira­
públicas do Trecho
gem de mil exemplares, para distribuição aos interessados e, em particular, para Sul do Rodoanel
a comunidade local. Apresenta a estrutura do EIA. A terminologia e o estilo de Metropolitano de
um relatório técnico foram em parte mantidos, mas o texto é entremeado por dese- São Paulo.
384 g E p l i â ç ã o de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

nhos de personagens (um adulto e duas crianças) que vão explorando a região e as
implicações do projeto. Um capítulo essencialmente calcado em desenhos artísticos
descreve o empreendimento. Esse foi o segundo estudo de impacto preparado para
o projeto. 0 primeiro foi concluído no início da década de 1990 e chegou a receber
aprovação dos órgãos estaduais do Paraná e de São Paulo, mas um a ação judicial
contestou com sucesso a competência estadual para licenciar e a análise passou para
o Ibama, que não aceitou o primeiro EIA. 0 projeto é controverso.

0 documento preparado para a dragagem do canal de Piaçaguera é um a brochura


de quarenta páginas que faz um histórico do problema, justifica o projeto, informa
quais foram as principais alternativas estudadas, explica, com desenhos e fotos, como
será realizada a alternativa escolhida e informa quais são as medidas mitigadoras e
de monitoramento, mas é econômico na apresentação dos impactos. Fotos aéreas
oblíquas e ortogonais informam sobre o projeto e seu contexto, e são acompanhadas
pelas clássicas imagens de aves e do pôr do sol.

A eficácia da comunicação pode ser um fator determinante na aprovação de um


projeto, mas muitos empreendedores e seus consultores menosprezam o risco de não
serem satisfatoriamente compreendidos pela comunidade.
t

E importante ter claro que a eventual formulação de um a estratégia de comunicação


com o público por ocasião do licenciamento de um novo projeto não é um a campanha
de relações públicas nem um a ação de marketing, mas o estabelecimento de um canal
de comunicação de duplo sentido, tanto um emissor como um receptor de mensagens,
que permita que as mensagens recebidas sejam decodificadas, analisadas e talvez
transform adas em mudanças, ajustes ou correções de rota no projeto proposto, ou
ainda em medidas mitigadoras ou compensatórias que tornem o projeto aceitável ou
que o façam contribuir genuinamente para o desenvolvimento local (conforme Cap. 16,
em especial a seção 16.6).

CAPÍTU 10
iação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Os estudos de impacto ambiental são feitos normalmente dentro de um contexto legal


que estabelece requisitos a serem observados e procedimentos a serem cumpridos.
Dentro do processo de AIA, a etapa de avaliação ou análise técnica dos estudos
'Às vezes ambientais apresentados1 tem a função de verificar a conformidade dos estudos apre­
denom inada sentados com critérios preestabelecidos. Usualmente, os critérios observados são a
revisão, por
regulamentação em vigor na jurisdição em que foi apresentado o estudo e os termos
semelhança ao
de referência previamente formulados. Eventualmente, o objetivo da análise poderá
o

termo inglês
review. ser verificar a conformidade com alguma prática recomendada, como referências
internacionais ou as recomendações de alguma organização internacional.

Um balanço adequado entre descrição e análise, rigor metodológico e isenção estão


entre as qualidades desejáveis de todo estudo ambiental. Um estudo exaustivamente
descritivo, sem interpretação dos dados e com parca aplicação destes para a análise
dos impactos, tem tão pouca utilidade quanto uma coleção de opiniões que não esteja
solidamente ancorada em dados rigorosamente coletados ou compilados.

Uma definição muito simples do que seria um bom EIA é dada por Lee (2000, p. 138):
“é aquele que apresenta, de uma forma apropriada para os usuários, constatações e
conclusões que cubram todas as tarefas da avaliação, empregando métodos apropriados
de coleta de informação, análise e comunicação”. Em outras palavras, um bom EIA é
aquele que tem as qualidades de todos os to n s relatórios técnicos. Portanto, forma e
conteúdo deverão ser analisados.

15.1 Fundamentos
Em cada sistema de AIA, a regulamentação estabelece a quem cabe a responsabili­
dade de analisar os estudos. Por exemplo, na legislação brasileira cabe aos órgãos
ambientais licenciadores a análise dos estudos ambientais. Já em outros contextos
de uso da AIA, como sua aplicação por agentes financeiros multilaterais como o
Banco Mundial, a International Finance Corporation (IFC) e o Banco Interamericano
de Desenvolvimento (BID), tal análise cabe à equipe interna de meio ambiente des­
sas instituições, com freqüente emprego de consultores externos. Há ainda outros
modelos, adotados em diferentes jurisdições, como o interagency review, previsto na
legislação americana, ou as comissões independentes de avaliação, empregadas no
Canadá e na Holanda.

No Canadá, essas comissões de avaliação estão regulamentadas, no plano federal,


pela Canadian Environmental Assessment Act, de 1993, mas o modelo j á era adotado
desde que foi lá implantada a avaliação de impacto ambiental, em 1973 (Ross, 1987).
Para cada projeto que requeira um estudo aprofundado, um a comissão [panei] é
nomeada. Na Holanda, os membros da Comissão de Avaliação de Impacto Ambiental
têm um mandato predeteminado e são inamovíveis; emitem um a opinião sobre todos
os EIAs preparados no âmbito de sua competência.

Independentemente das modalidades e competências determinadas pelos regula­


mentos aplicáveis, os objetivos da análise técnica dos estudos de impacto ambiental
podem ser enunciados como avaliar se o estudo apresentado: (i) atende a requisitos
mínimos estabelecidos pela regulamentação aplicável; (ii) tem qualidade técnica

CAPÍTU LO
A nálise técn ica dos estudos am bien

suficiente para subsidiar a tom ada de decisões sobre o em preendim ento. Em outras
palavras, busca-se determ in ar se o estudo de impacto tem forma e conteúdo satisfa­
tórios e adequados.

^ ^ ‘àY&Ws.ç; m \ s d e m e n ta r è aquele que se preocupa com a forma dos estudos,


ou seja, o denom inador comum estabelecido pela regulam entação. No Brasil, o
conteúdo m ínim o dos estudos de impacto ambiental é determ inado pela Resolução
Conama 1/86, mas os órgãos licenciadores podem ter seus próprios critérios (desde
que estes não contradigam ou sejam menos restritivos que aqueles estabelecidos na
norm a federal). Evidentemente, um estudo que não atenda ao conteúdo m ínim o não
pode ser aceito. Mais do que isso, as decisões eventualm ente tom adas com base em tal
estudo (por exemplo, a concessão de um a licença ambiental) podem ser questionadas
jurid icam en te e consideradas nulas.

A análise do conteúdo dos estudos am bientais deve ser feita com base em certos
critérios preestabelecidos, por meio dos quais se avalia a qualidade e a adequação
dos estudos apresentados. 0 ju lg am en to sobre a qualidade dos estudos norm alm ente
é feito com base em um a com paração com aquilo que seria esperado. De um modo
geral, há duas grandes linhas de critérios de comparação: (i) os term os de referência
estabelecidos para o estudo de impacto am biental analisado e (ii) as boas práticas, ou
as melhores práticas adotadas internacionalm ente [best practice).

0 critério de comparação com os term os de referência tem a vantagem de prover um


quadro sistemático para análise dos estudos apresentados: basicamente, o analista
vai com parar o que pedem os termos de referência com aquilo que foi apresentado
nos estudos. A desvantagem da abordagem é não dar espaço para um a avaliação
crítica dos próprios term os de referência. Em outras palavras, se os term os de refe­
rência forem ru in s ou insuficientes para determ inar o âmbito e o escopo dos estudos
ambientais, então sua análise tam bém ficará prejudicada, pois serão contemplados os
aspectos formais, mas não os substantivos.

0 critério de comparação com as melhores práticas utiliza como referência (bcnch-


mark) o que há de m elhor e mais consistente na atualidade em termos de estudos
ambientais, no plano internacional, para o tipo de em preendim ento em análise. A
vantagem desse critério é dar m aior ênfase ao conteúdo, aos aspectos substantivos
dos estudos apresentados. 0 mesmo tam bém pode ser utilizado quando o estudo de
impacto ambiental foi feito sem discussão prévia de term os de referência específicos
(prática comum em muitos estados brasileiros). Por outro lado, um a possível d esv an ­
tagem é estabelecer um p a ta m a r alto demais para o país em que se localiza o projeto
analisado - estudos de melhor qualidade norm alm ente exigem mais em termos de
custo e de tempo de realização, e estudos realizados em países desenvolvidos podem
beneficiar-se de um a base preexistente de dados am bientais que m uitas vezes está
ausente nos países em desenvolvimento.

As melhores práticas internacionais de avaliação de impacto am biental vêm sendo


seguidam ente invocadas e citadas neste livro. Consistem em recomendações em a­
nadas de entidades de reconhecida credibilidade — como associações profissionais e
organizações internacionais —, e endossadas por convenções internacionais - como

QUI NZE
388 R QAv
a lia ç ã o de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

as Conferências das Partes da Convenção da Diversidade Biológica e da Convenção de


Ramsar (documentos citados no Apêndice “Recursos”).
r

E oportuno ressaltar que o critério de comparação com termos de referência e o


critério de melhores práticas não são excludentes. Se houve preparação prévia de
termos de referência, então a análise dos estudos deve obrigatoriamente tê-los como
base, mas não precisa limitar-se a eles. Para um país como o Brasil, o critério das
melhores práticas é não somente passível de aplicação, como tam bém desejável, uma
vez que já existe grande experiência acumulada em avaliação de impacto ambiental
e que os serviços de consultoria nesse campo são, via de regra, bem competentes
tecnicamente. Além disso, e o mais importante, em grande parte do País existe tal
acúmulo de pressões sobre o ambiente natural e social, que qualquer nova obra de
envergadura (que possa acarretar impactos significativos) deve ser analisada e discu­
tida cuidadosa e detalhadamente.

A análise técnica de um estudo de impacto ambiental não é de interesse exclusivo


do agente decisório. Todos os protagonistas podem analisar os estudos e tentar
influenciar o processo decisório, como:
# Empresas que contratam estudos de impacto ambiental podem analisá-los antes
de submetê-los à aprovação dos órgã^os governamentais ou de agentes financeiros.
# Associações que representam o público, como organizações não governamentais
e associações de moradores, podem analisar os estudos para buscar um melhor
entendimento do projeto e de suas conseqüências; no caso de posturas contrárias
ao empreendimento, a análise pode apontar falhas e lacunas que podem ser
apresentadas como argumentos no debate; ela pode também indicar deficiências
do projeto ou apontar para alternativas não estudadas, ou ainda sugerir novas
medidas mitigadoras ou compensatórias, não consideradas no estudo.
# Membros do Ministério Público, assistentes técnicos e peritos judiciais, no caso
de disputas judiciais envolvendo atividades sujeitas ao processo de avaliação de
impacto ambiental.
# Agências setoriais reguladoras e outros órgãos governamentais interessados no
empreendimento apresentado.
# Agentes financiadores públicos ou privados, cuja política inclua a discussão da
viabilidade ambiental dos empreendimentos que lhes são submetidos.
/

# Orgãos governamentais com atribuições específicas, que devem ser ouvidos no


licenciamento de uma atividade.

Em todos os casos, a análise pode ser feita internamente ou por um a terceira parte
contratada para esse fim. Em geral, espera-se que os órgãos ambientais responsáveis
jodn cíc equipes muftídiscipíúiarçs capacitadas para
realizar a análise técnica. No entanto, mesmo os organismos mais bem aparelhados
em pessoal técnico podem deparar-se com projetos muito complexos ou com situações
que fujam à experiência de sua equipe técnica, ocasiões em que devem lançar mão de
consultores especializados para complementar a capacitação interna.

1 5 .2 0 P R O B L E M A D A Q U A L ID A D E DOS ESTUDOS A M B IE N T A IS
Estudos retrospectivos que visam a um a avaliação crítica de estudos ambientais
e, principalmente, apontar suas deficiências, foram publicados por pesquisadores

c a p ít i
A n á l is e t é c n ic a d o s e s tu d o s a m b ie

de vários países. Uma linha de pesquisa aborda a capacidade preditiva dos EIAs
(conforme seção 10.4), mas tais estudos somente podem ser realizados para projetos
que seguiram adiante e foram implantados, após a aprovação dos estudos. 0 trabalho
clássico de Beanlands e Duinker (1983) não só apontou deficiências recorrentes
em EIAs canadenses, como formulou diversas recomendações que hoje integram o
conjunto de boas práticas de AIA.

A qualidade dos EIAs realizados no Brasil foi analisada em um certo número de


estudos retrospectivos. Agra Filho (1993) analisou vinte EIAs e Rimas preparados
para projetos de diversos setores de atividade, em diferentes regiões do Brasil, durante
os cinco primeiros anos de vigência da Resolução Conama 1/86. Uma de suas princi­
pais constatações diz respeito à pobre definição do escopo dos estudos que, nos casos
analisados, não levou em conta aspectos fundamentais de referência para sua reali­
zação, ou seja, o autor concluiu que a ausência ou a debilidade de termos de referência
é fator que compromete todo o processo de AIA, a começar pela qualidade dos estudos
apresentados. 0 autor também constatou que (i) a consideração de alternativas foi
negligenciada; (ii) as medidas mitigadoras propostas muitas vezes eram genéricas e
não correspondiam às características do ambiente afetado; (iii) os planos de moni­
toramento eram superficiais e não apontavam indicadores; (iv) há uma carência de
procedimentos técnicos adequados para identificar e prever impactos; e (v) os proce­
dimentos de valoração e interpretação do significado e importância dos impactos não
permitem um a avaliação conclusiva.

Teixeira et al. (1994) revisitaram sete dos dez primeiros Rimas preparados para
2Os primeiros
empreendimentos hidrelétricos no Brasil, entre 1986 e 19882. À época, as grandes
estudos de impacto
barragens eram fortemente questionadas devido à extensão e gravidade de seus eram relatados
impactos ecológicos e sociais e a um histórico de danos irreversíveis, como a in u n ­ somente nos Rimas,
dação das Sete Quedas do rio Paraná (Fig. 5.1), além do deslocamento forçado de inexistindo um
milhares de pessoas sem compensações adequadas. Por tais razões, a empresa es­ volume denominado
EIA, consoante
tatal Eletrobrás havia preparado um Manual de Estudos de Efeitos Ambientais de
uma interpretação
Sistemas Elétricos, tornado público (Eletrobrás, 1986), cujo conteúdo coincide em textual da
parte com as exigências da Resolução Conama 1/86. 0 manual aborda três tipos de Resolução Conama
empreendimentos — usinas hidrelétricas, usinas termelétricas, linhas de transmissão 1/ 86 .
e subestações —, descrevendo, para cada tipo, requisitos para estudos de planejamento;
no caso das hidrelétricas, há um “plano de levantamentos básicos” e um “plano de
controle ambiental”.

Nesse contexto, os estudos ambientais de projetos do setor elétrico provavelmente


representavam, à época, o que havia de mais avançado no Brasil. Ainda assim,
Teixeira e colaboradores encontraram inúmeras deficiências importantes nos Rimas,
podendo-se destacar:
# omissões e previsões subestimadas de impactos;
# critérios de valoração de impactos “subjetivos e técnicos, em detrimento da
percepção que as populações têm desses impactos sobre elas e as conseqüências
sobre seu próprio universo” (p. 175);
# falta de menção a estudos de alternativas locacionais e tecnológicas;
# as populações humanas são tratadas como “facilmente deslocáveis e conve­
nientemente adaptáveis a novas condições”, merecendo “tratamento igual ao

QU NZE
390 j^ ® a lia ç ã o de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

aplicado nos aspectos biológicos ou físicos dos espaços ocupados pelas hidrelé­
tricas” (p. 176-177);
# desconsideração dos processos sociais em diagnósticos fortemente descritivos
que enfatizam aspectos demográficos;
# imprecisão de critérios para definir a população atingida e a área afetada ou área
de influência.
/

E interessante observar que essa análise, se comparada à análise de Monosowski


(1994) sobre os estudos ambientais realizados para a hidrelétrica Tucuruí
(Cap. 2), permite inferir que teria havido pouco ou nenhum avanço em relação à
época que precedeu a exigência de preparação prévia de EIAs. A usina de Tucuruí,
cuja construção teve início em 1976, começou a funcionar em 1984. 0 diagnósti­
co ambiental foi fragmentário, elaborado durante a fase de construção, e composto
por diversos estudos especializados preparados por instituições de pesquisa da
Amazônia, que fizeram levantamentos bastante completos, chegando a identificar
novas espécies. Porém, afirma a autora:

Observa-se um grande contraste entre o grande número de estudos realizados e


a dificuldade de traduzir suas conclusões em propostas concretas de ação. De um
modo geral, os estudos foram concebidos como atividades regulares de pesquisa
científica. Os esforços da equipe se concentraram sobretudo nas atividades de
inventário e descrição dos elementos do meio natural, o que se justificava pelo
profundo desconhecimento inicial dos ecossistemas da região (p. 130).

Assim, a fraca conexão entre as diferentes partes do estudo de impacto ambiental


persistia como um problema.

As deficiências não eram somente dos estudos ambientais, mas, antes deles, dos
projetos de engenharia, concebidos antes que exigências ambientais tivessem se
tornado explícitas. Assim, as barragens propostas para o rio Xingu eram criticadas
devido aos impactos muito significativos que teriam sobre o ambiente natural e sobre
3O caso das as comunidades indígenas (Santos e Andrade, 1988)3. Sem dúvida, há qualidades e
barragens do
deficiências intrínsecas a cada estudo de impacto ambiental, e que estão sob controle
Xingu teve ampla
da equipe multidisciplinar que o prepara, mas se o projeto analisado for de alto
repercussão na
mídia internacional impacto ou afetar recursos muito valorizados, por melhor que seja o EIA, o projeto
(Hildyard, 1989). será severamente criticado. Duas décadas depois, esse problema ainda perdura. Na
A té o presente análise de um EIA, embora se deva diferenciar entre as deficiências do estudo e os
(2006), as problemas do projeto, não há como se fazer uma separação completa.
barragens não
foram construídas,
Na opinião de Moreira (1993a), a prática dos primeiros anos de AIA no Brasil padecia
mas os projetos
foram reformulados de um a série de dificuldades. Entre os problemas atinentes à preparação dos EIAs, a
e novamente autora comenta que
submetidos ao
licenciamento [...] o que mais afeta os estudos são os problemas de coordenação técnica. As
ambiental. empresas de consultoria tendem a tratar a organização dos estudos de impacto
como tratam os trabalhos com que estão mais familiarizadas. 0 coordenador
limita-se a distribuir e cobrar as tarefas, controlar os gastos e os cronogramas e for­
necer apoio aos profissionais das diferentes disciplinas, deixando a desejar a inte­
gração dos aspectos setoriais do meio ambiente, quase sempre interdependentes.

CAPÍTll LO
A n á l is e t é c n ic a d o s e s t u d o s a m b ie

O produto são relatórios formados de estudos setoriais justapostos que não


conseguem representar as possíveis alterações a serem produzidas nos sistemas
ambientais pela realização do projeto. As equipes encarregadas de um estudo de
impacto ambiental precisam de coordenação e métodos apropriados [...] (p. 43).

A percepção de que muitos consultores eram mal qualificados, que não entendiam
os objetivos e muito menos os fundamentos da AIA, e que reduziam sua atividade
a preparar documentos que pudessem facilitar a obtenção de uma licença ambiental
levou ao surgimento da expressão “indústria do Rima”, indicando a preparação em
série de relatórios quase idênticos, embora para projetos distintos.

Parte dos problemas pode ser atribuída a deficiências da etapa de triagem, que levaram
à preparação de uma grande quantidade de EIAs para empreendimentos de impacto
pouco significativo ou, pior, para empreendimentos já em operação há anos, embora
em situação irregular perante a legislação de licenciamento ambiental. Esse problema
foi claramente diagnosticado no Estado de São Paulo para o setor de produção de
areia de construção civil, que nos primeiros anos de aplicação da AIA respondia por
mais da metade dos EIAs protocolizados na Secretaria do Meio Ambiente, em claro
descompasso com sua importância na economia estadual ou seu potencial de causar
impactos adversos. Esses empreendimentos são muito semelhantes entre si, seus
impactos se repetem e podem ser prevenidos e corrigidos com medidas semelhantes,
o que faz que a maior parte de seus problemas ambientais possa ser resolvida com
procedimentos mais simples, mediante a aplicação de normas técnicas.

Libanori e Rodrigues (1993, p. 127) informam que, até setembro de 1991, de um total
de 145 EIAs analisados pelo Departamento de Avaliação de Impacto Ambiental da
Secretaria de Meio Ambiente do Estado de São Paulo, 96 eram de empreendimentos
minerários, a maior parte dos quais de extração de areia para uso na construção ci­
vil. A extração de areia para fins de construção civil faz parte do rol de atividades
do Art. 2o da Resolução Conama 1/86. Há um debate acerca da aplicação dessa lista, APode-se citar como
havendo os que defendem que ela exemplifica os tipos de empreendimentos cuja im­ exemplo desse
plantação está sujeita à apresentação prévia do EIA, no sentido de que todos os que tipo de crítica as
ponderações de
constam da lista são obrigatórios, podendo o órgão licenciador exigir o EIA de outras
Fairfax (1978),
atividades não constantes da lista (Machado, 1993). Outros defendem que o caráter para quem a Nepa
exemplificativo da lista faculta ao órgão licenciador exim ir da apresentação do EIA f o i “um desastre
alguns tipos de empreendimentos que constam da lista, mas de impacto pouco signi­ para o movimento
ficativo (Gouvêa, 1993). Esta última interpretação acabou prevalecendo no Estado de ambientalista
São Paulo (Gouvêa, 1998) e foi resolvida pelo próprio Conama, primeiramente para e para a busca
de uma melhor
atividades de mineração (Resoluções 9 e 10/90) e depois para outros tipos de atividade
qualidade
(Resolução 237/97 e várias outras que se seguiram, conforme Quadro 3.5). ambiental”, por
desviar a atenção
Um certo desapontamento com os primeiros resultados das leis que tornaram obri­ do “questionamento
gatória a avaliação de impacto ambiental parece quase universal. Há, porém, de se e redefinição
discernir as críticas aos procedimentos, que não estariam atingindo os resultados de poderes e
resp o n sabilidades
esperados e deveriam ser aprimorados, das críticas aos próprios princípios e fun da­
das agências
mentos da AIA, que tampouco faltaram 4. Nos primeiros anos de sua aplicação nos governamentais
Estados Unidos, diversos analistas sugeriram que os resultados alcançados estariam para a análise de
muito aquém do esperado, e dentre as razões apontadas tinha grande destaque o documentos”.

QU NZE
AvIaliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

entendim ento de que a maioria dos estudos de impacto ambiental seria de qualidade
sofrível, o que não perm itiria que decisões adequadas fossem tomadas tendo esses
estudos como base. Os críticos sugeriam que os estudos deveriam ser mais científicos,
o que poderia ser alcançado por intermédio de um a revisão pelos pares, fazendo-os
passar por um processo sem elhante ao de uma publicação científica (Schlinder, 1976)
ou submetendo à publicação as pesquisas que serviriam de base a esses estudos
(Loftin, 1976). No entanto, outras opiniões iam no sentido de fortalecer a revisão feita
pelos analistas dos órgãos governam entais - e não a crítica da parte de cientistas - e
o papel do público, tam bém interessado na qualidade dos estudos apresentados e em
seu conteúdo (Auerbach et al., 1976).

Os primeiros anos de aplicação da AIA no Canadá tam bém resultaram em “um alto
nível de fru stração ” dos principais envolvidos (Beanlands, 1993). Na França, as críti­
cas centraram -se mais nos procedimentos adm inistrativos e no que era percebido por
muitos como insuficiente independência dos serviços adm inistrativos que analisam
os estudos de impacto, enquanto o conteúdo propriamente dito dos estudos não foi
objeto de discussões aprofundadas.

Uma vertente que foi objeto de investigações empíricas sistemáticas em diversas


pesquisas internacionais é a qualidade das previsões apresentadas nos EIAs. No
início dos anos 1980, um dos focos das pesquisas sobre a eficácia da AIA voltava-se
para a qualidade e o acerto das previsões feitas nos estudos de impacto ambiental
(conforme 10.4). Dentre os trabalhos pioneiros, costum am ser referidos Bisset (1984b),
Buckley (1991a, 1991b), Culhane (1987) e Culhane et al. (1987). Esses autores, a n a li­
sando, respectivam ente, casos da Grã-Bretanha, da A ustrália e dos Estados Unidos,
até mesmo um a am ostra de cerca de um a centena de estudos de impacto am biental no
caso australiano, tiraram basicam ente duas conclusões. A prim eira é que muitas das
previsões apresentadas nesses estudos não eram passíveis de verificação, seja por não
serem quantitativas, seja por diversas outras deficiências relacionadas à forma como
eram apresentadas, como falta de indicação da abrangência espacial dos impactos
(área de influência) ou falta de escolha de indicadores apropriados para m onitorar os
impactos reais. Estudos conduzidos no Brasil sob essa óptica chegaram a conclusões
similares (Dias e Sánchez, 2001; Prado Filho e Souza, 2004).

Esses estudos, que eram cham ados de auditoria da avaliação de impacto ambiental,
tiveram um a segunda conclusão consistente: a de que muitos projetos realmente
implantados eram bastante diferentes daqueles que haviam sido descritos nos estudos
de impacto ambiental, um a situação que, evidentemente, dificulta ou mesmo impede
qualquer comparação entre impactos previstos e impactos reais. As razões dessas
alterações têm a ver com o tempo transcorrido desde o planejamento do projeto e a
preparação do estudo de impacto até sua aprovação e início da construção. As m odifi­
cações tam bém estão ligadas ao baixo grau de detalham ento dos projetos quando são
preparados os estudos de impacto ambiental; entre um projeto básico de engenharia -
o estágio em que são muitas vezes feitos os estudos am bientais - e um projeto exe­
cutivo, muitas modificações costum am ser introduzidas. Aliás, se um a das funções
do EIA é fazer que as ações hu m an as tenh am o menor impacto possível, então é de
se esperar que haja modificações entre a concepção inicial do projeto e um a versão
A n á l is e t é c n ic a d o s e s t u d o s a , s

modificada, na qual os fatores ambientais tenham sido incorporados (conforme o


exemplo da rodovia dos Imigrantes, apresentado na seção 13.2 e no Quadro 13.3).
Os órgãos ambientais brasileiros, como, aliás, a maioria de seus congêneres em outros
países, não fazem uma análise ou um a classificação sistemática da qualidade dos
estudos apresentados, de forma tal que seja possível alguma comparação ou aferição
de sua qualidade. É lícito pensar que a qualidade dos EIAs melhore ao longo do tempo,
conforme tanto as equipes que os preparam como aquelas que os analisam ganhem
mais experiência e possam, espera-se, aprender a partir de seus erros e acertos.
Lee (2000a) reporta que dois levantamentos encomendados pela Comissão Européia,
respectivamente no início e no final da década de 1990, para analisar a qualidade de
EIAs produzidos em oito países, concluíram que houve um a melhora na qualidade
dos estudos. Ambos os levantamentos, evidentemente, empregaram os mesmos crité­
rios para avaliar suas amostras de EIAs. Na Holanda, a Comissão de Avaliação de
Impacto Ambiental publica relatórios anuais de atividades, apresentando balanços
e análises; cerca de 40% dos EIAs analisados apresentam algum tipo de deficiência
que implica a requisição de informações complementares (Ceia, 2002b); entre as
deficiências mais comuns encontram-se a falta de apresentação detalhada de alterna­
tivas e um a descrição incompleta dos impactos.

No Brasil, onde há poucos estudos sistemáticos, o que se tem são predom inante­
mente análises impressionistas, baseadas na percepção de profissionais há anos
envolvidos na preparação ou na análise dos estudos ambientais, testemunhos que
em geral indicam uma melhoria. Todavia, um a compilação ao mesmo tempo abran­
gente e detalhada das principais deficiências dos EIAs foi feita por uma equipe de
analistas do Ministério Público Federal (MPF). Estudando um a população de oitenta
EIAs de projetos submetidos a licenciamento federal ou que implicaram, por razões
diversas, o envolvimento do MPF, os autores desse estudo identificaram as falhas
mais freqüentes ou mais grades (MPF, 2004), resumidas no Quadro 15.1.
r

E extensa a lista dos problemas encontrados pelos analistas do MPF nos diagnósticos
ambientais, problemas que envolvem desde questões de ordem metodológica até levan­
tamentos incompletos. 0 diagnóstico ambiental é a parte mais facilmente criticável dos
EIAs, haja vista que os inventários sempre podem ser mais detalhados e as análises
mais aprofundadas. Há, portanto, de se estabelecer qual a extensão e o grau de detalhe
dos estudos necessários para fundamentar a análise dos impactos e a proposição de me­
didas de gestão, de modo que a análise técnica do EIA tenha como referência esses
requisitos mínimos. Logo, é na etapa de preparação dos termos de referência que devem
ser buscadas as causas das falhas mais comuns dos diagnósticos ambientais, pois é antes
de ter início a preparação propriamente dita do EIA que devem ser definidos os levanta­
mentos necessários, a extensão da área de estudo, os métodos empregados e vários outros
parâmetros para orientar o estudo a ser feito. Com termos de referência falhos, grande é
a probabilidade de se encontrar estudos ambientais falhos. Naturalmente, um EIA feito a
partir de excelentes termos de referência também pode ser de má qualidade, concorrendo
para isso outros fatores, como capacitação da equipe e os recursos disponíveis.

Também é preocupante a observação do trabalho do MPF de que há desconexão


entre o diagnóstico ambiental, a análise de impactos e as propostas de mitigação,
394 Av aliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Q u a d r o 15.1 D e fic iê n c ia s em e s tu d o s de im p a c to a m b ie n ta l n o B ra s il
Elemento do EIA P r i n c i p a i s d e f ic iê n c ia s

Estudo de alternativas Ausência de proposição de alternativas


Apresentação de alternativas reconhecidamente inferiores à selecionada
no EIA
Prevalência dos aspectos econômicos sobre os ambientais na escolha de
alternativas
Comparação de alternativas a partir de base de conhecimento diferenciada
Delimitação das áreas Desconsideração da bacia hidrográfica
de influência1 Delimitação das áreas de influência sem alicerce nas características e
vulnerabilidades dos ambientes naturais e nas realidades sociais regionais
Diagnóstico ambiental Prazos insuficientes para a realização de pesquisas de campo
Caracterização da área baseada, predominantemente, em dados secundários
Ausência ou insuficiência de informações sobre a metodologia utilizada
Proposição de execução de atividades de diagnóstico em etapas do
licenciamento posteriores à Licença Prévia
Falta de integração dos dados de estudos específicos
Diagnóstico ambiental Ausência de mapas temáticos
meios físico e biótico Utilização de mapas em escala inadequada, desatualizados e/ou com ausência
de informações '
Ausência de dados que abarquem um ano hidrológico, no mínimo
Apresentação de informações inexatas, imprecisas ou contraditórias
Deficiências na amostragem para o diagnóstico
Caracterização incompleta de águas, sedimentos, solos, resíduos, ar etc.
Desconsideração da interdependência entre precipitação e escoamento
superficial e subterrâneo
Superficialidade ou ausência de análise de eventos singulares em projetos
envolvendo recursos hídricos
Ausência ou insuficiência de dados quantitativos sobre a vegetação
Ausência de dados sobre organismos de determinados grupos ou categorias
Ausência de diagnóstico de sítios de reprodução (criadouros) e alimentação
de animais
Diagnóstico ambiental - Pesquisas insuficientes e metodologicamente ineficazes
meio antrópico Conhecimento insatisfatório dos modos de vida de coletividades socioculturais
singulares e suas redes intercomunitárias
Ausência de estudos orientados pela ampla acepção do conceito de patrimônio
cultural
Não adoção de uma abordagem urbanística integrada em diagnósticos de áreas
e populações urbanas afetadas
Caracterizações socioeconômicas regionais genéricas, não articuladas às
pesquisas diretas locais
Identificação, caracterização Não identificação de determinados impactos (omissões em termos de impac­
e análise dos impactos tos passíveis de previsão, impactos negativos indiretos sequer mencionados)
Identificação parcial de impactos
Identificação de impactos genéricos (por vezes são tantos os impactos
agrupados sob um único título que sua importância e significado não podem
ser estabelecidos satisfatoriamente
Identificação de impactos mutuamente excludentes
Subutilização ou desconsideração de dados dos diagnósticos
Omissão de dados e/ou de justificativas quanto à metodologia utilizada para
atribuir pesos aos atributos dos impactos

CAPITU
A n á l i s e t é c n ic a d o s e s t u d o s a m b ie n i 395

C u m u la tiv id a d e e sinergia de A spectos desconsiderados


im p a c to s
M itig a ç ã o e co m p e n sa çã o Proposição de m e d id a s que não são a solução para a m itig a ç ã o do im p a c to
de im p a c to s Indicação de m edidas m itig a d o ra s po uco d e ta lh a d a s
Indica çã o de obrigações ou im p e d im e n to s , té c n ic o s e legais, c o m o propostas
de m edidas m itig a d o ra s
A usência de a va lia çã o da e fic iê n c ia das m edid as m itig a d o ra s propostas
D e slo ca m e n to c o m p u ls ó rio de po pula ções: propostas in ic ia is de com pensações
de perdas baseadas em d ia g n ó s tic o s in adeq uad os
Não in c o rp o ra ç ã o de propostas dos g ru p o s sociais afetados, na fase de f o r m u ­
lação do EIA
Proposição de U nidade de Conservação da c a te g o ria de uso s u ste n tá ve l para
a a p lica ç ã o dos recursos, em casos não previstos pela legislação
P rogram a de m o n it o r a m e n to e Erros c o n c e itu a is na in d ic a ç ã o de m o n ito r a m e n to
a c o m p a n h a m e n to a m b ie n ta l A usência de prop osição de p ro g ra m a de m o n it o r a m e n to de im p a c to s específicos
Rima 0 Rima é um d o c u m e n to in c o m p le to
E m prego de lin g u a g e m in a d eq uad a à c o m p re e n s ã o do p ú b lic o

1A rigor, áreas de estudo.


Fonte: MPF (2004).

deficiência já apontada no caso de Tucuruí e ainda persistente e alguns EIAs. Um bom


EIA não se faz somente com um bom diagnóstico, mas com um adequado balanço
entre diagnóstico, prognóstico e propostas factíveis e eficazes de atenuação dos im­
pactos adversos e valorização dos impactos benéficos.

Por fim, embora se tenha insistido nas deficiências dos estudos ambientais, é óbvio
que grande número deles tem diversos méritos e que muitos possam mesmo ser exce­
lentes. Apontar as deficiências certamente indica caminhos para saná-las, enquanto
identificar os pontos fortes contfibui para difundir as boas práticas.

1 5 .3 F e r r a m e n t a s p a r a a n á l is e e a v a l ia ç ã o dos es tu d o s a m b ie n t a is
A análise técnica de um estudo ambiental pode ser facilitada se houver um conjunto
de critérios ou de diretrizes preestabelecidos para orientar o trabalho do analista. Tais
critérios ajudam a reduzir a subjetividade da análise e podem levar a resultados mais
consistentes e reprodutíveis (grupos diferentes de analistas podem chegar às mesmas
conclusões). Unep (1996, p. 509) salienta, apropriadamente, que “a análise consistente e
previsível dos EIAs é importante para o tomador de decisão, para o proponente e para o
público”, ao passo que “a qualidade dos EIAs pode ser melhorada quando o proponente
conhece as expectativas da autoridade pública que gera o processo de AIA”.

Por exemplo, um teste simples consiste em verificar a coerência da avaliação da


importância dos impactos identificados. Em muitos EIAs, os impactos benéficos são
sistematicamente avaliados como de grande importância, ao passo que os adversos
são sempre apresentados como de menor importância. Assim, compilar uma lista dos
impactos, segundo sejam positivos ou negativos e em seguida verificar que grau de
importância foi atribuído a cada um, pode revelar um EIA tendencioso. Embora seja
teoricamente possível encontrar um projeto para o qual predominem os impactos
positivos, os EIAs são majoritariamente feitos para aquelas propostas que possam
causar significativa degradação ambiental, de onde se pode esperar que, na maioria

QUI NZE
396 Av aliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

dos casos, os impactos adversos sejam mais freqüentes. Para iniciativas cujas conse­
qüências prováveis sejam majoritariamente positivas, a fase de triagem deve ter
levado à dispensa de um estudo ambiental.

Para facilitar o trabalho dos analistas, podem ser preparadas previamente listas de
verificação, com a função de orientar a análise. Tais listas contêm um rol dos prin­
cipais elementos que devem estar presentes em um estudo de impacto ambiental e
podem também trazer recomendações para sua avaliação. Existem na literatura listas
para verificação formal (para avaliar a aderência ao conteúdo previsto na regula­
mentação) e listas para verificação do conteúdo dos estudos de impacto ambiental;
naturalm ente essas duas dimensões podem juntar-se em um a única lista. Listas de
verificação são ferramentas relativamente simples para analisar estudos de impacto
ambiental e têm a vantagem de serem utilizadas por diferentes interessados.

A elaboração de uma lista de verificação deverá refletir os requisitos da legislação e


da regulamentação em vigor na jurisdição em que se dá o processo de ATA, e também
as prioridades do organismo que realiza a análise dos estudos de impacto ambiental.
Desse modo, não se pode pensar em uma lista universal, mas em listas adaptadas a
cada jurisdição. Por exemplo, em Hong Kong, HKEDP (1997) apresenta um a lista com
79 perguntas, distribuídas em dez seções, sobre a estrutura e o conteúdo dos EIAs. 0
Quadro 15.2 mostra algumas questões dessa lista. '

Um grupo da Universidade de Manchester, na Inglaterra, desenvolveu um proce­


dimento de análise baseado na avaliação do conteúdo de cada um dos principais
componentes normalmente encontrados em um EIA. Conhecido como Lee and Colley

Quadro 15.2 Extrato de uma lista de verificação do conteúdo de um EIA


2 . D esc r iç ão do projeto

2.1 Os p ro p ó s ito s e o b je tiv o s do p ro je to são explicados?


2.13 Foram in d ica d o s os m eios pelos quais as q u a n tid a d e s de resíduos e p o lu e n te s fo r a m estim ados? Incertezas
q u a n to às e s tim a tiv a s fo ra m reconhecidas? Foram in dicada s fa ix a s de variação?
1 0 d o s im p a c t o s
5.1 Os e fe ito s d ire to s e in d ire to s /s e c u n d á rio s da co n s tru ç ã o , op eração e, q u a n d o relevante, da d e sa tiva çã o do
p ro je to fo ra m considerados (in c lu in d o e fe ito s p o sitivo s e negativos)?
5.5 A in v e s tig a ç ã o de cada tip o de im p a c to é a p ro p ria d a para sua im p o rtâ n c ia para a decisão, e v ita n d o in fo rm a ç ã o
desnecessária e se c o n c e n tra n d o nas qu e stõ e s-ch a ve ?
5.9 Os im p a c to s são d e scritos em te rm o s da n a tu re za e m a g n itu d e da m u d a n ç a s c a ra c te rís tic a s do re c e p to r
a fe ta d o (localização, q u a n tid a d e , valor, sensibilidade)?
6. M itig a ç ã o

6.2 Foram d e sc rita s as razões para e s c o lh e r d e te r m in a d o t ip o de m itig a ç ã o ? O u tra s opções d is p o n ív e is fo r a m


a p re se n ta d a s?
6.8 A lg u m e fe ito a m b ie n ta l adverso das m e d id a s de m itig a ç ã o fo i in v e s tig a d o e d e s c rito ?
9 . D if ic u ld a d e s n a c o m p il a ç ã o d a in f o r m a ç ã o ?

9.2 A lg u m a d ific u ld a d e na coleta ou análise de dados necessários para prever im p a c to s fo i reconhecida ou


explicada?
10. EXECUTIVO
10.1 0 resum o e x e c u tiv o (Rima) c o n té m pelo m enos um a breve descrição do p ro je to e do a m b ie n te , um a relação
das p rin cip a is m edidas m itig a d o ra s e um a descrição dos im p a c to s a m b ie n ta is rem ane sce nte s ou residuais?
Fonte: HKEDP (1997).

CAPÍTU 10
A n á l is e t é c n ic a d o s e s tu d o s an /E ; e

review package, do nome dos principais autores, esse procedimento foi usado ou
adaptado em inúmeros estudos sobre a qualidade de EIAs (Lee, 2000a). Para fins de
análise, os estudos ambientais são divididos em quatro áreas: (i) descrição do projeto e
do ambiente afetado; (ii) identificação e avaliação de impactos-chave; (iii) consideração
de alternativas e medidas mitigadoras; e (iv) comunicação dos resultados. Cada área é
subdividida em categorias, que por sua vez são subdivididas em subcategorias, estas
com maior grau de detalhe. Por exemplo, a área “identificação e avaliação de impactos-
chave” é composta pelas seguintes categorias: (a) identificação de impactos potenciais;
(b) hierarquização dos impactos; (c) previsão da magnitude dos impactos; (d) avaliação
da importância dos impactos. Já a área “comunicação dos resultados” inclui as seguin­
tes categorias: (a) organização e apresentação do EIA; (b) acessibilidade do conteúdo
para não especialistas; (c) impedimento de julgamentos tendenciosos; (d) apresentação
das fontes de dados e métodos de análise utilizados; (e) presença de um resumo não
técnico suficientemente abrangente.

0 método de Lee e Colley também emprega critérios para atribuição de um conceito


ou nota a cada subcategoria, categoria e área, e de um a nota geral ao estudo de
impacto ambiental, conforme Quadro 15.3. Pode-se adotar “C” como nota mínima
para que o estudo seja julgado satisfatório e estipular, ademais, que cada capítulo
também deva obter essa nota mínima. Caso contrário, o estudo deverá ser corrigido,
no todo ou em parte.

Outra lista de verificação foi desenvolvida pela também inglesa Universidade Oxford-
Brookes (Glasson, Therivel e Chadwick, 1999). A lista é organizada em oito seções,
cada uma delas com itens ou perguntas a serem avaliados segundo uma notação
idêntica (A-F) à de Lee e Colley. As seções são: (i) descrição do projeto; (ii) descrição do
ambiente; (iii) scoping, consulta e identificação de impactos; (iv) previsão e avaliação
de impactos; (v) alternativas; (vi) mitigação e monitoramento; (vii) resumo não téc­
nico; (viii) organização e apresentação da informação. 0 total de perguntas contidas
nas oito seções é de 92.

Diretrizes para a análise de EIAs também foram publicadas pela Diretoria de


Meio Ambiente da Comissão Europeia, acompanhadas de uma lista de verificação

Q u a d r o 1 5 .3 C o n ce ito s p a ra a v a lia ç ã o de estudo s de im p a c to a m b ie n ta l

A Tarefa bem e xecu ta da, n e n h u m a ta re fa im p o r ta n te in c o m p le ta .


B G e ra lm e n te s a tis fa tó rio e c o m p le to , c o m p o rta s o m e n te om issões m enores e poucos p o n to s
inadequados.
C S a tis fa tó rio ou aceitá ve l, apesar de om issões ou p o n to s inadequados.
D C o n té m partes s a tis fa tó ria s , mas o c o n ju n to é c o nsiderado in s a tis fa tó rio de vido a omissões
im p o rta n te s ou p o n to s inadequados.
E In s a tis fa tó rio , omissões ou p o n to s in a d e q u a d o s s ig n ific a tiv o s .
F M u it o in s a tis fa tó rio , ta re fa s im p o rta n te s desem p enh adas de m o d o in a d e q u a d o ou deixadas de
lado.
N /A C rité rio não aplicável.
Fonte: Unep (1996, p. 528).

QU NZE
398 iW ^aliacão de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Q u a d r o 1 5 .4 C o n ce ito s p a ra a v a lia ç ã o de e studo s de im p a c to a m b ie n ta l


C o n c e it o C r ité r io

C o m p le to Toda in fo rm a ç ã o re le va n te para o processo decisório fo i a p re se n ta d a ; n e n h u m a in fo rm a ç ã o


a d ic io n a l é requerida.
A c e itá v e l A in fo rm a ç ã o apre se ntada não está c o m p le ta , to d a via , as om issões não devem im p e d ir o prossegui­
m e n to do processo decisório.
In a d e q u a d o A in fo rm a ç ã o apre se ntada te m omissões s ig n ific a tiv a s ; é necessário a p re s e n ta r in fo r m a ç ã o ad iciona l
a n te s que o processo decisório possa prosseguir.
Fonte: European Commission (1994, p. 8).

(European Commission, 1994, 2001b). 0 Quadro 15.4 traz um a relação de conceitos


para avaliação (notas), sugeridos na edição de 1994; novamente, trata-se de uma
escala usada para separar os estudos aceitáveis daqueles que devem ser recusados por
não atingirem o nível exigível de qualidade.

A atribuição de um a nota para cada EIA, baseada no atendimento a critérios previa­


mente definidos, é também feita pela Environmental Protection Agency, dos Estados
Unidos (Quadro 15.5). Nesse caso, trata-se mais de uma análise qualitativa que resulta
em uma classificação final que de um a nota qi^e resulte de um a pontuação de cada
componente do EIA.

A EPA também avalia o projeto (ou ação) analisado no EIA. Pode haver um EIA
muito bem feito para um projeto ruim ou que cause muitos impactos significativos.
Inversamente, uma equipe incompetente pode preparar um EIA de péssima qualidade
para um projeto viável e de baixo impacto ambiental. É verdade que se a avaliação
ambiental de um projeto conclui que ele é inviável ambientalmente, o EIA nem seria
apresentado ou o projeto deveria ser modificado até que a avaliação concluísse sua
viabilidade. Na prática, isso pode não acontecer porque alguns empreendedores são
demasiado obtusos para aceitar que a avaliação ambiental possa interferir com “seu”

Q u a d r o 1 5 .5 C o n ce ito s p a ra a v a lia ç ã o de e studo s de im p a c to a m b ie n ta l a d o ta d o s p e la USEPA


C o n c e it o C r it é r io

1 (adequado) 0 EIA apresenta a d e q u a d a m e n te os im p a c to s a m b ie n ta is da a lte rn a tiv a preferida


e das a lte rn a tiv a s razoáveis para o p ro je to ou ação, não sendo necessárias novas
co le ta s de dados ou o u tra s análises; porém , o a n a lis ta pode s u g e rir o a créscim o de
in fo rm a ç ã o ou de e scla re cim e nto s.
2 (in fo rm a ç ã o in s u fic ie n te ) 0 EIA não c o n té m in fo r m a ç ã o s u fic ie n te para um a a va lia ç ã o c o m p le ta dos im p a c to s
a m b ie n ta is que de ve riam ser evitados, de fo r m a a p ro te g e r c o m p le ta m e n te o
a m b ie n te , ou o a n a lista id e n tific o u novas a lte rn a tiv a s razoáveis que estão d e n tro do
espe ctro de a lte rn a tiv a s analisadas no EIA e que p o d e ria m re d u z ir os im p a c to s
a m b ie n ta is da proposta.
3 (ina dequ ado ) 0 EIA não avalia a d e q u a d a m e n te os im p a c to s a m b ie n ta is p o te n c ia lm e n te s ig n ifi­
ca tiv o s da proposta, ou o a n a lis ta id e n tific o u novas a lte rn a tiv a s razoáveis que estão
fora do espectro de a lte rn a tiv a s analisadas no EIA, que p o d e ria m ser analisados a fim
de re d u z ir os im p a c to s a m b ie n ta is p o te n c ia lm e n te s ig n ific a tiv o s . As necessidades de
in fo rm a ç ã o , dados, análises ou discussões são de ta l m a g n itu d e que deveria haver
______________________________ um a nova c o n s u lta pú blica c o m p le ta .________________________
Fonte: USEPA (1984).

CAPÍTU
A n á l is e t é c n ic a d o s e s tu d o s a m b ie n 399

projeto ou por acreditar que, mesmo ruim, o projeto possa ser aprovado, talvez pelos
benefícios econômicos que possa gerar ou pelos empregos que criar ou mantiver. Por
isso se justifica a atitude da EPA de atribuir conceitos distintos ao EIA e ao projeto. O
Quadro 15.6 mostra a classificação usada pela EPA.

Q u a d r o 1 5 .6 C o n ce ito s p a ra a v a lia ç ã o da v ia b ilid a d e das ações ca u sa d o ra s de im p a c to a m b ie n ta l a d o ta d o s p e la


USEPA

LO {la c k o fo b je c tio n s ) - A análise da EPA não id e n tific o u im p a c to s a m b ie n ta is p o te n c ia is que


sem objeção requ eiram m u d a n ç a s s u b ta n tiv a s da prop osta apresentada. A análise a p o n to u
as o p o rtu n id a d e s para a p lic a ç ã o de m edid as m itig a d o ra s que podem ser
im p le m e n ta d a s com pequenas m u d a n ç a s na proposta apresentada.
EC [e n v iro n m e n ta lc o n c e rn s ) - A análise da EPA id e n tific o u im p a c to s a m b ie n ta is que devem ser e vita d o s
preocupações de o rd e m a m b ie n ta l para p ro te g e r c o m p le ta m e n te o a m b ie n te . M e d id a s c o rre tiv a s po dem requ erer
m u d a n ç a s na a lte rn a tiv a preferid a ou a a p lic a çã o de m e d id a s m itig a d o ra s que
redu za m o im p a c to a m b ie n ta l.
EO [e n v iro n m e n ta l o b je c tio n s ) - A análise da EPA id e n tific o u im p a c to s a m b ie n ta is , objeções de ordem
objeções de o rd e m a m b ie n ta l a m b ie n ta l, projeções de o rd e m a m b ie n ta l s ig n ific a tiv a s que precisam ser
evita d o s para um a p ro te ç ã o adequada do a m b ie n te . M e d id a s co rre tiv a s
podem requ erer m u d a n ç a s na a lte rn a tiv a preferida ou a consideração de
a lg u m a o u tra a lte rn a tiv a de p ro je to (in c lu in d o a a lte rn a tiv a de não realizar
o p ro je to ou um a nova a lte rn a tiv a ).
EU [e n v iro n m e n ta lly A análise da EPA id e n tific o u im p a c to s a m b ie n ta is adversos de m a g n itu d e
u n s a tis fa c to ry ) - s u fic ie n te para serem considerados c o m o in s a tis fa tó rio s do p o n to de vista
a m b ie n ta lm e n te in s a tis fa tó ria da saúde pública, do b e m - e s ta r ou da q u a lid a d e a m b ie n ta i.
Fonte: USEPA (1984).

A aplicação de listas de verificação, critérios de pontuação e outros procedimentos


similares não somente orienta a tarefa de análise técnica, mas também pode esta­
belecer um método de comparação de EIAs para fins de pesquisa ou de avaliação do
desempenho da AIA em uma determinada jurisdição, por exemplo procurando evi­
denciar alguma melhoria ao longo do tempo ou identificar setores da economia nos
quais os EIAs poderiam ser de melhor qualidade.

Bojórquez-Tapia e Garcia (1998), tendo analisado EIAs de 33 projetos rodoviários


aprovados no Mléxico, também verificaram que as avaliações são subjetivas e tenden­
ciosas. Ademais, sua análise mostrou problemas de scoping, uma vez que os estudos
não foram dirigidos para os prováveis conflitos ambientais gerados pelos projetos.
Esses autores empregaram dois enfoques para analisar os EIAs: (i) conformidade
com as diretrizes governamentais para a preparação de EIAs; e (ii) qualidade dos
dados, análises e conclusões. Para tornar operacional uma abordagem segundo este
último enfoque, os autores definiram de antemão um conjunto de critérios de ava­
liação e uma escala de pontos para cada critério; em seguida, a soma de pontos
resultava na nota de cada EIA, expressa como porcentagem da nota m áxim a possível.
O Quadro 15.7 mostra um a seleção e adaptação de alguns critérios empregados por
Bojórquez-Tapia e Garcia, escolhidos por seu potencial de aplicação a outras
jurisdições, ultrapassando, portanto, o contexto da regulamentação mexicana.
400 ^ ^Av
a l i a ç ã o de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Q u a d r o 1 5 .7 C rité rio s p a ra a v a lia ç ã o da q u a lid a d e de e s tu d o s a m b ie n ta is


C r it é r io D e s c r iç ã o Po n t o s
In fo r m a ç ã o Os da dos necessários para id e n tific a ç ã o e não = 0
a n á lise dos im p a c to s são f o r m a lm e n t e sim , c o m om issões im p o r t a n t e s = 1
a p re s e n ta d o s e a n a lis a d o s (c a ra c te rís tic a s sim, p o ré m in s u fic ie n te para a n á lise = 2
té c n ic a s do p ro je to e d ia g n ó s tic o a m b ie n ta l) sim, p o ré m de d ifíc il c o m p re e n s ã o = 3
sim, p e q u e n a s correções necessárias = 4
sim, a p re s e n ta ç ã o e x a ta e p ró p ria = 5
D o c u m e n ta ç ã o As f o n te s de in fo r m a ç ã o são c la r a m e n te não = 0
re fe rid a s sim = 1
L e v a n ta m e n to s Os le v a n ta m e n to s de da dos p rim á rio s e não = 0
s e c u n d á rio s são d e s c rito s c o m m e to d o lo g ia , sim, p o ré m de m a n e ira vaga = 1
re s u lta d o s e in te r p r e ta ç ã o sim , c o m e x a tid ã o e r ig o r = 2
M e to d o lo g ia Técnicas usadas para an á lise dos im p a c to s não = 0
são d e s c rita s e usadas de a c o rd o co m a sim , p o ré m não usadas = 1
d e sc riç ã o a p re s e n ta d a sim , p o ré m usadas in d ir e t a m e n t e = 2
sim , usadas d ir e ta m e n te = 3
C oerência Dados a p re s e n ta d o s em c a p ítu lo s a n te rio re s não = 0
são usados para a a n á lise dos im p a c to s sim , p a r c ia lm e n te = 1
sim , in te g r a lm e n t e = 2
Q u a n tific a ç ã o E s tim a tiv a s q u a n t it a t iv a s de área a fe ta d a , não = 0
a tiv id a d e s de p r o je to e in d ic a d o re s de sim , p a rc ia lm e n te = 1
im p a c to s q u a n d o a p lic á v e l sim , c la r a m e n t e = 2
C o n sistê n c ia D e fin iç ã o prévia e a p lic a ç ã o de c rité rio s de não = 0
a v a lia ç ã o da im p o r tâ n c ia dos im p a c to s sim , p o ré m a p lic a ç ã o iló g ic a = 1
sim, p o ré m a p lic a ç ã o in c o n s is te n te = 2
sim , a p lic a ç ã o c o n s is te n te = 3
O b je tiv id a d e A n á lis e s e c o n c lu s õ e s são im p a rc ia is e os não = 0
im p a c to s re le v a n te s são d e sta c a d o s sim, mas há a b u n d â n c ia de c o m e n tá rio s
te n d e n c io s o s = 1
sim = 2
E sp e cificid a d e M e d id a s m itig a d o r a s estão re la c io n a d a s não = 0
aos im p a c to s sim = 1
A 1 • . 1 • 1 • 1 • B A • 1 1 .• t
■ /• ■■ ■
A u d ita b ilid a d e M e d id a s m itig a d o r a s são fo r m u la d a s de não = 0
m o d o a p e r m it ir a v e rific a ç ã o p o s te r io r de sim , p o ré m f o r m u la ç ã o im p re c is a = 1
sua a p lic a ç ã o e e fic iê n c ia s im , p o r é m s o m e n t e a lg u m a s m e d id a s = 2
sim , para to d a s as m e d id a s = 3
Fonte: adaptado de Bojórquez-Tapia e Garcia (1998); alguns term os e descritores desse quadro são m uito próxim os do original,
porém alguns critérios foram renom eados e redefinidos.

Outras formas de pontuação podem ser desenvolvidas para au x ilia r na análise


de estudos ambientais, mas é preciso ser muito cuidadoso no desenvolvimento e
na aplicação de um enfoque de pontuação na análise de um estudo ambiental. Da
mesma forma que na avaliação da im portância dos impactos, o uso de um a escala de
pontos pode dar um a aparência de objetividade ou de possibilidade de quantificação
para um a atividade que é fundam entalm ente qualitativa.

Em conclusão, a análise criteriosa e balanceada de um EIA requer discernimento, rigor


e competência técnica. Como exprim e Wood (1995, p. 162), há diferentes m aneiras
de buscar a objetividade na análise, mas “não há substituto para profissionais
qualificados”.

CAPÍTU 10
A n á l is e t é c n ic a d o s e s t u d o s a m b ie n 401

1 5 .4 O S COMENTÁRIOS DO PÚBLICO E AS CONCLUSÕES DA ANÁLISE TÉCNICA


Se há um procedimento de participação pública, então é preciso que haja maneiras
de incluir os comentários e as opiniões do público em algum documento de síntese,
para que sejam também levados em conta no momento da tomada de decisão sobre
a aprovação do projeto. Há diferentes maneiras de fazê-lo, dependendo de qual é a
autoridade encarregada da análise técnica e de sua relação com o tomador de decisão.

No modelo de comissões independentes, adotado no Canadá, os comissários


recebem um parecer de análise feito por uma equipe técnica multidisciplinar e, em
seguida, promovem um a consulta pública5, ao final da qual formulam seu parecer 5Conforme
conclusivo, incorporando o ponto de vista do empreendedor (expresso no EIA), o dos Cap. 16, onde será
analistas (expresso no parecer técnico) e o do público (por meio da consulta pública). dado o exemplo do
procedimento de
Na Holanda, os relatórios da Comissão de Avaliação de Impacto Ambiental enfocam o
consulta pública no
conteúdo dos EIAs e não a aceitabilidde da proposta (Wood, 1995), que é competência Quebec.
da autoridade setorial responsável. Os relatórios são publicados e deixam claras as
recomendações feitas para os responsáveis pela decisão.

No modelo americano, a agência responsável (lead agency) prepara a m inuta do EIA


(draft EIS), submete o projeto a consulta pública, recolhe os comentários do público
e das demais agências que possam ter competências na matéria (interagency re-
view), e divulga o EIA corrigido e revisado (final EIS), documentando sua decisão
em um registro (record of decision). Cabe, então, à agência principal considerar os
comentários do público ao mesmo tempo que os pareceres técnicos.

No Brasil, nos Estados e municípios em que a decisão sobre licenciamento é tomada


por um colegiado, este recebe um parecer técnico elaborado pelo serviço especializado
do órgão ambiental. Tal parecer, fundamentalmente, analisa e avalia o EIA, mas deve
levar em conta, nessa análise, os comentários e as recomendações de outros órgãos
governamentais, assim como as manifestações do público, expressos em audiência ou
enviados diretamente por escrito6. Cabe, portanto, aos analistas ambientais a tarefa 6Machado (2003,
de integração das opiniões técnicas e das opiniões dos cidadãos. p. 238) observa:
“Os comentários
Portanto, o parecer técnico sobre o EIA e sobre o projeto é um dos documentos são escritos.
mais relevantes do processo de AIA (conforme Quadro 4.2). É essencialmente este Não têm form a
prevista, podendo
o documento que irá subsidiar e fundam entar a decisão, mesmo quando não são os
ser apresentados
analistas que a tomam diretamente. Em princípio, os Rimas deveriam fornecer um a manuscritos ou
descrição concisa e ao mesmo tempo abrangente do projeto e de seus impactos, mas datilografados;
sabe-se que eles costumam ser pouco sintéticos e não raro são tam bém pouco objeti­ pode-se exigir
vos. Os EIAs, por seu lado, ademais de geralmente serem longos — o que os torna de recibo de sua
difícil leitura para os tomadores de decisão —, podem ser rapidamente suplantados entrega ao órgão
por relatórios de informações complementares que nem sempre são do conhecimento público ambiental".
público. Por esse motivo, Wood (1995, p. 180) pondera que, quando há requisição
de informações complementares, “a forma desse material adicional pode ser dís­
par e consistir de vários documentos diferentes”, razão pela qual aponta que “uma
vantagem dos EIAs revisados (fin a l EIS) é que toda a informação está agregada em
um único docum ento”.

QUiiNZE
liação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Assim, também o parecer técnico deveria mostrar as mesmas qualidades de um


bom EIA, deixando claras, para os encarregados da tomada de decisões, quais as
implicações em jogo. Unep (1996) aponta que a análise técnica deveria observar dois
requisitos:
% identificar as deficiências dos ELAs;
• identificar os problemas cruciais e determinar quais são aqueles que podem
influenciar diretamente a decisão, “claramente separando os defeitos cruciais das
deficiências menos importantes”; caso nenhuma omissão séria seja verificada,
essa conclusão deve ser exposta, claramente.

Portanto, legibilidade, clareza e concisão são qualidades requeridas de um parecer


técnico. Obviamente não se pode estabelecer um tam anho m áxim o ou mínimo para
esse documento, pois o tam anho ideal dependerá da complexidade do projeto e da
importância dos impactos mais relevantes. Não é incomum encontrar pareceres
que são verdadeiros resumos do EIA, com longas transcrições e mesmo com a
reprodução de sua estrutura, mas sem mapas, figuras e fotografias que possam faci­
litar a compreensão do projeto, o que obriga o leitor interessado, necessariamente, a
consultar o EIA ou o Rima, se quiser realmente entender o projeto. Outro inconvenien­
te das longas transcrições é que afirmações feitas pelo empreendedor ou seu consultor
passam a ser assinadas pelos analistas do órgão governamental, nem sempre com as
devidas verificações ou ressalvas. Muita descrição e pouca análise são o contrário do
que se espera de um parecer conclusivo. '

Bom senso deveria ser exercido também nessa tarefa (Ross, Morrison-Saunders e
Marshall, 2006; Sánchez, 2006a). Contudo, não se deve desconsiderar a possibilidade
de um controle judicial (conforme seção 17.4), ou seja, de questionamentos na Justiça
sobre a decisão tomada, sendo importante, portanto, que as recomendações do pa­
recer técnico estejam adequadamente fundam entadas e justificadas - mas isso não
quer dizer que haja necessidade de fazer um longo resumo do EIA.

LO
aliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Uma das características mais marcantes do processo de avaliação de impacto


ambiental é a importância que tem a participação do público. Tal importância
decorre das questões que estão em jogo quando se trata de projetos que possam
causar impactos significativos. Se as decisões quanto à exequibilidade técnica e v ia ­
bilidade econômica de projetos privados são unicamente da esfera privada, o mesmo
não ocorre com as decisões acerca da viabilidade ambiental, que são necessariamente
públicas. Isso decorre de razões muito simples: os empreendimentos que têm o poten­
cial de causar impactos ambientais significativos usualmente afetam, degradam ou
consomem recursos ambientais que pertencem à coletividade e que dizem respeito
ao bem -estar de todos. Portanto, sua apropriação não pode ser decidida no âmbito
privado. A participação pública é essencial ao processo de AIA.

Informar, ouvir e decidir são tarefas relacionadas à participação pública no


processo, e estão diretamente relacionadas entre si. Para tomar decisões que con­
siderem as opiniões e os pontos de vista do público, este deve ter oportunidade
de se fazer ouvir. Ele se manifesta em reação a uma proposta, que normalmente
r

é um projeto submetido ao processo de AIA. E, portanto, necessário inform ar o


público acerca das intenções do proponente e d a %natureza da decisão a ser tomada
(na maioria das vezes, a emissão de um a licença ambiental e suas condicionantes).

Neste capítulo serão apresentados os fundamentos da participação pública no processo


de AIA, as modalidades e os graus de envolvimento dos cidadãos, as técnicas de
consulta mais usadas e um esboço dos procedimentos regulamentares de consulta. 0
foco do capítulo é a tarefa de ouvir o público. A tarefa de inform ar foi abordada no
Cap. 14 (embora o tema seja mais amplo do que o conteúdo do capítulo), ao passo que
decidir é tema do Cap. 17.

1 6 .1 A A M P L IA Ç Ã O D A N O Ç Ã O DE DIREITOS H U M A N O S
0 direito a um ambiente sadio para as presentes e futuras gerações é hoje amplamente
reconhecido, mas essa situação é recente e, claro, o reconhecimento em lei desse
direito não implica automaticamente seu reconhecimento de fato.

Durante muito tempo, no mundo ocidental, os únicos direitos reconhecidos eram os


individuais, emanados do direito natural e validados à medida que os outros indiví­
duos os respeitavam. Os direitos sociais, de âmbito coletivo, firmaram-se ao longo do
século XX, fruto de lutas sindicais e políticas, e ainda direta e nitidamente vinculados
a indivíduos e a grupos detentores desses direitos, ou sujeitos de direito. A novidade,
a partir dos anos 1960, é a emergência e a progressiva consolidação das gerações
futuras e da própria natureza como novos sujeitos de direito, com a característica
inédita de se constituírem em sujeitos para os quais não se pode exigir deveres (Silva-
Sánchez, 2000). Nash (1989), ao fazer um a “história da ética ambiental” associa a
ampliação da noção de direitos a um a “evolução da ética”, que, originalmente circuns­
crita ao “direito n atu ral” de um grupo limitado de seres humanos, expandiu-se para
os “direitos da natureza”.

Desde meados do século XX, o direito a um ambiente sadio passou a receber reconhe­
cimento explícito em leis nacionais e em tratados internacionais. 0 sujeito de direito

10■
não é mais o indivíduo na sua singularidade, mas a coletividade, a nação, os g ru ­
pos étnicos e regionais; trata-se de direitos de “titularidade coletiva” (Silva-Sánchez,
2000). As declarações de Estocolmo e do Rio de Janeiro, emanadas de conferências
intergovernamentais promovidas pela Organização das Nações Unidas, são marcos
fundam entais na explicitação do direito a um ambiente sadio e ecologicamente equi­
librado como um novo direito humano.

Ademais, para efetivar o direito dos cidadãos ao ambiente de qualidade, também


o direito à participação no processo decisório tem sido reconhecido. A Declaração
do Rio é um dos documentos internacionais que faz menção direta à participação
pública. Seu princípio 10 estabelece que:

0 melhor modo de tratar as questões ambientais é com a participação de todos os


cidadãos interessados, em vários níveis. No plano nacional, toda pessoa deverá
ter acesso adequado à informação sobre o meio ambiente de que dispõem as
autoridades públicas, incluída a informação sobre os materiais e as atividades que
oferecem perigo em suas comunidades, assim como a oportunidade de participar
dos processos de adoção de decisões. Os Estados deverão facilitar e fomentar a
sensibilização e a participação do público, colocando a informação à disposição de
todos. Deverá ser proporcionado acesso efetivo aos procedimentos judiciais e ad­
ministrativos, entre os quais o ressarcimento desses danos e os recursos pertinentes.

No plano dos tratados internacionais, há um documento específico sobre participação


pública, a Convenção de Aarhus, cidade dinam arquesa onde foi firmada, em 25 de
ju n h o de 1998. Essa convenção, que entrou em vigor em 30 de outubro de 2001, foi
promovida pela Comissão Econômica das Nações Unidas para a Europa, tendo sido
preparada e ratificada por seus integrantes, os países europeus e os da Ásia Central,
pertencentes à antiga União Soviética.
%
A convenção está assentada sobre três bases: (i) o acesso à informação; (ii) a partici­ 1Sua denominação
pação no processo decisório; (iii) o acesso à Justiça1, pois se considera que não pode oficial é Convenção
haver participação genuína sem informação, nem garantia de resultados sem que sobre o Acesso
à Informação
esteja assegurado o direito dos cidadãos de questionarem nos tribunais as decisões
Ambiental, a
tomadas. Esses três fundamentos são os mesmos que constam do princípio 10 da Participação do
Declaração do Rio. A convenção é tida como um novo tipo de acordo ambiental, pois Público na Tomada
associa direitos ambientais e direitos humanos e, no fundo, trata de democracia, de de Decisões e o
transparência e de responsabilidade governamental, tendo o meio ambiente como Acesso à Justiça
ponto de partida. em Assuntos
Ambientais.

Ainda que, formalmente, a aplicação da Convenção de Aarhus se restrinja aos países


signatários, seus princípios são de alcance universal, de modo que a convenção se
constitui em excelente referência para análise das questões relativas à participação
pública nos processos decisórios. Ademais, quando foi firmada, diversos países
(signatários ou não) já dispunham de leis próprias acerca de alguns dos três fund a­
mentos da convenção, que acabou tendo a função de difundir internacionalmente
esses princípios e essas práticas, e de fazer avançar o reconhecimento dos direitos
ambientais e humanos.
406 ^ ^ a l i a ç ã o de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

0 acesso à informação ambiental é abordado no Art. 4o da convenção, que estabe­


lece que as autoridades governam entais devem colocar à disposição do público as
informações que este solicitar e “sem que o público tenha que invocar um interesse
p a rtic u la r”. No Brasil, a Lei Federal n° 10.650, de 16 de abril de 2003, dispõe sobre o
direito à informação ambiental. Tratando-se de um direito universal, não é preciso
que o cidadão demonstre as razões de seu interesse ao dem andar uma determ inada
informação de cunho ambiental. Evidentemente, deve haver exceções, em respeito à
propriedade intelectual e à segurança pública, entre outros.

A participação do público nas decisões relativas a certas atividades é tema do


/

Art. 6o da convenção. E neste ponto que esta se relaciona fortemente com a avaliação
de impacto ambiental. As disposições acerca da participação pública preconizadas
nesse artigo aplicam-se quando se trata de autorizar atividades propostas “que
possam ter um efeito im portante sobre o meio am biente”, e que são listadas no Anexo
1 da convenção. Tal anexo nada mais é do que um a lista de atividades que deve­
riam ser sujeitas à participação pública antes da tomada de decisões por parte de
autoridades governam entais; logo, é o equivalente de um a lista positiva de projetos a
serem submetidos ao processo de AIA.

Para conhecimento do público, o texto da convenção determ ina que é necessário


inform ar qual é a atividade proposta, quais os procedimentos informativos e decisórios
previstos, quais são as possibilidades de participação, qual é a autoridade a quem as
pessoas devem se dirigir para obter informações e para en c am in h ar observações ou
perguntas, e quais são os respectivos prazos. Adicionalmente, o Art. 6" estipula que
o público pode consultar, de forma gratuita, todas as informações de interesse para a
tomada de decisões, tendo como mínimo:
• um a descrição do local e das características físicas e técnicas da atividade
proposta;
® um a descrição dos efeitos importantes da atividade proposta sobre o meio
ambiente;
& uma descrição das medidas previstas para prevenir ou para reduzir esses efeitos,
em particular as emissões;
® um resumo não técnico dos itens precedentes;
& uma síntese das principais soluções e alternativas estudadas pelo proponente.

Evidentemente, não é coincidência que essa lista reflita o conteúdo m ínim o de um


estudo de impacto ambiental.

No que se refere ao acesso à Justiça, o Art. 9 o da convenção advoga que:

Cada Parte velará, no âmbito de sua legislação nacional, para que toda pessoa
que estime que sua solicitação de informações apresentada em consonância com
o artigo 4o tenha sido ignorada, rechaçada abusivamente, em todo ou em parte,
ou insuficientemente levada em conta ou que não tenha sido tratada conforme
as disposições do presente artigo, tenha a possibilidade de apresentar um recurso
perante um órgão judicial ou ante outro órgão independente ou imparcial esta­
belecido pela lei.

CAPÍTU !L0
Participação P ú b im M i 407

0 direito de acesso à Justiça, em prazos e custos razoáveis, é essencial para que se


façam valer os outros dois, o direito à informação ambiental e o direito à partici­
pação no processo decisório. 0 Brasil é bastante avançado nessa área, haja vista
que desde 1985 o acesso à Justiça para fins de proteção ambiental é assegurado
aos cidadãos e às associações civis, sem que seja necessário dem onstrar um inte­
resse direto no tema ou que direitos individuais possam ser afetados. A Lei Federal
n° 7.347, de 24 de ju lh o de 1985, conhecida como Lei dos Interesses Difusos, possi­
bilitou um a grande ampliação das possibilidades de efetiva aplicação da legislação
ambiental, processo que se consolidou com a Constituição Federal de 1998 e a nova
função do Ministério Público.

Entre juristas, há debate acerca de noções como interesse público, interesse coletivo,
interesse social, interesse supraindividual e interesse difuso. Mancuso (1997, p. 73)
defende que “o interesse difuso concerne a um universo maior do que o interesse
coletivo”. Na mesma linha, Milaré (1990, p. 10) conceitua interesses difusos como
“os comuns a um grupo indeterminado ou indeterminável de pessoas”.

Adiante, neste capítulo, ao se estudar procedimentos de participação pública ado­


tados em algumas jurisdições, poder-se-á ver a aplicação prática dos princípios da
Convenção de Aarhus.

A convenção tem também outros dispositivos, relativos à participação do público


durante a elaboração de propostas de normas adm inistrativas visando à proteção
ambiental, nas discussões de planos, programas e políticas, e sobre a coleta e difusão
de informações sobre o estado do meio ambiente, mas esses dispositivos não serão
tratados aqui.

1 6 .2 OS V Á R IO S G R A U S DE P A R TICIP A Ç ÃO P Ú B LIC A
Para Webler e Renn (1995), a participação pública pode ser justificada com base em dois
tipos de argumentos. Fundamentalmente, a participação se justificaria por motivos
éticos, como um dos valores centrais da democracia; a participação seria necessária
para fazer valer princípios como a equidade e a justiça. Porém, em contraposição a
uma argumentação ética e normativa, a participação também se justificaria por ra­
zões puramente funcionais - nas sociedades contemporâneas, a participação daria
mais legitimidade às decisões, tornaria mais eficiente o processo decisório e facilita­
ria a implementação das decisões tomadas.

Dar legitimidade ao processo de tomada de decisão é algo desejável nas sociedades


democráticas, em que o livre debate e a inclusão de novos temas na arena pública são
valores fundamentais. Trata-se de um a ideia de democracia ampliada, como propõe
Habermas, ou seja, a democracia vinculada a um processo societário de discussão e
ao uso público da razão - não uma razão instrum ental ou subjetiva, mas um a razão
comunicativa.

“Habermas, em sua teoria da ação comunicativa, concebe um novo conceito de


razão - a razão comunicativa - constituída socialmente no processo de interação
dialógica entre os sujeitos de um a dada situação; uma razão intersubjetiva,
portanto, tornada possível pelo m é d iu m lingüístico”
(Silva-Sánchez, 2003, p. 71)

DEZE:
408 ^ ^ a l i a ç ã o de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Para o filósofo, a sociedade civil tem capacidade de dar ressonância a tem as próprios
dos domínios da vida privada dos cidadãos, transform ando -os em questões de in te­
resse público, tornando-se, assim, um a mediadora entre a vida privada e o sistema
político.

As estruturas comunicacionais da esfera pública estão muito ligadas aos domínios


da vida privada, fazendo que a periferia, ou seja, a sociedade civil, possua uma
sensibilidade maior para os novos problemas, conseguindo captá-los e identificá-
los antes do centro da política. Pode-se comprovar isso através dos grandes temas
surgidos nas últimas décadas - [...] pensemos nas ameaças ecológicas que colo­
cam em risco o equilíbrio da natureza [...]. Não é o aparelho de Estado [...] que
20 assunto será toma a iniciativa de levantar esses problemas2 (Habermas, 1997).
retomado, sob outra
perspectiva, na Quando se fala em consulta, participação ou envolvimento público no processo deei-
seção 17.3. sório em matéria ambiental, n aturalm en te surge a questão: de que tipo de participação
se trata? Até onde iria o poder popular? 0 governo abdicaria de seu poder decisório
em favor de um plebiscito ou de outra forma de decisão soberana?

Não se trata disso, ou pelo menos muito raram en te se trata disso. Na maioria das
vezes, a participação pública lim ita-se ao direito de ser inform ado e de ex p rim ir
seus pontos de vista, com a expectativa de que isso influencie a decisão a ser tom ada
pela autoridade competente. Os procedim entos de participação pública, em reali­
dade, visam colocar algum a ordem nas discussões e estabelecer canais formais de
expressão da vontade dos cidadãos. A Fig. 16.1 expõe um d iag ram a com as diversas
formas de m anifestação de opinião em um a democracia. À parte os processos t r a ­
dicionais de participação em u m a democracia representativa, m ediante eleições,
plebiscitos ou referendos, um entendim ento amplo do que é a participação pública
a define como qualquer forma de expressão de pontos de vista dos cidadãos. Tal
expressão pode dar-se de forma autônoma, por meio de m anifestações públicas,
passeatas, atos públicos, abaixo-assinados, cam p an h as de mídia e outras ações,
ou na forma de m anifestação sob convite, na qual as opiniões dos cidadãos são
expostas, registradas e debatidas segundo certas regras previam ente estabelecidas.

A ausência de procedim entos formais de participação can aliza todas as m anifestações


para os meios espontâneos e autônom os de expressão e de pressão da opinião
pública, incluindo os lobbies. A falta de m ecanism os de consulta pública tam bém
torna menos tra n sp a re n te s as decisões e amplia o poder de influência de grupos de
interesse, sejam interesses econômicos, sejam interesses políticos de curto prazo,
e que podem influenciar a aprovação de um projeto que te n h a o potencial de cau­
sar impacto am biental significativo. Note-se que a organização da participação
pública por meio de procedim entos estabelecidos em lei não significa um a in s tr u ­
m entalização ou um enq uadram en to do público, pois con tinu am abertas todas as
possibilidades de expressão compatíveis com a democracia. A realização de um a
audiência pública visando ao licenciam ento am biental de um novo projeto não im ­
pede que os mesmos cidadãos que nela estiveram tam bém se m anifestem , contra
ou favoravelm ente, por outros meios; ao contrário, a audiência (um dentre vários
modos de participação pública) pode favorecer o envolvim ento de pessoas que ta l­
vez não se expressassem em outros fóruns. A consulta pública não tolhe a liberdade
nem substitui o direito de expressão dos cidadãos, apenas o complementa.

HO
P a r t ic ip a ç ã o P ú b l , 409

Assim, usando a tipologia da Fig. 16.1, a participação Possibilidades de expressão cidadã em uma democracia
pública no processo decisório em matéria de meio ambiente
é tratada como uma participação “sob convite”, na qual os
Representação Participação
cidadãos se manifestam no momento apropriado e com base
em informações previamente disseminadas, não obstante Eleições

seu direito de se expressar fora do procedimento formal Plebiscitos


de participação pública, garantido em qualquer regime Conselhos
democrático. Os tratados internacionais e as leis nacio­
nais impõem às autoridades governamentais a obrigação Ação sob convite Ação autônoma

de promover uma consulta pública dentro do processo de Planejamento — Lobby


participativo
AIA, cabendo a cada jurisdição definir seus mecanismos e
— Petições
regras. Consulta pública
— Manifestações
Mediação Campanhas na
Estabelecidos tais princípios gerais para a consulta pública, imprensa
— Outros
não se pode deixar de lembrar que, evidentemente, as
tradições democráticas e a propensão ao diálogo variam Fig. 16.1 Tipologia das form as do expressão do cida­
imensamente de acordo com a cultura política de cada país dão em uma dem ocracia
e de cada grupo social. Também as organizações empresa­ Fonte: m odificado de Thibault (1991) e V incent (1994).
riais têm um a ampla variedade de maneiras de encarar a
participação pública nas decisões relativas a seus investi­
mentos e muitas vezes representantes de empresas que nunca se confrontaram com
um a consulta pública têm grande dificuldade de entender as razões subjacentes ao
processo.

A participação do público é um tema muito estudado nas disciplinas de planejamento


e nas ciências sociais. A avaliação de impacto ambiental que também é um a forma de
planejamento, ensejou um a ampliação da participação pública, que passou a abarcar
também certas decisões privadas. Então, de que grau de participação se trata? Alguns
autores propõem um a tipologia de graus de participação pública nos processos deci-
sórios. Uma das mais conhecidas é a escala de Arnstein (1969), que pode ser vista na
Fig. 16.2.

Para Arnstein, há simulacros de participação apresentados com esse nome, mas que,
na verdade, constituem uma manipulação da opinião pública, às
vezes sob os nomes de educação ou informação. Também os graus 8 Controle
Graus de poder
3 e 4, denominados informação e consulta, não constituiriam um a 7 Delegação
do cidadão
verdadeira participação, haja vista que o público não tem nenhum 6 Parceria
controle sobre a decisão tomada. Mesmo a conciliação constituiria
5 Conciliação
nada mais que uma deferência, um sinal de polidez do tomador de Graus de
4 Consulta
decisão, que convida o público para discutir, mas se reserva o poder deferência

de decidir. A conciliação seria também uma m aneira de atender a 3 Informação

formalidades legais (tokenism) sem perm itir que isso questione os 2 Terapia Graus de não
fundamentos da decisão a ser tomada. Apenas os graus superiores participação
M anipulação
constituiriam a verdadeira participação. Para a autora, na parce­
ria existiria um a verdadeira negociação, enquanto na delegação de Fig. 16.2 Escala de graus de participação
poder as decisões seriam tomadas pelos representantes do público. pública nas decisões
Para Arnstein, a participação é a partilha do poder. Fonte: Arnstein, 1969.
liação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Quando Arnstein publicou esse trabalho, ainda não havia sido iniciada nos EUA a
consulta pública dentro do processo de AIA, e a autora refere-se fundamentalmente
a processos decisórios acerca de outros assuntos de interesse público, como o plane­
jam ento territorial e as decisões em matéria de educação, saúde, habitação e direitos
civis. Parenteau (1988) aponta o uso da consulta pública no Canadá como forma de
participação na criação e no planejamento de parques nacionais e na elaboração de
planos de desenvolvimento regional, além da AIA.

Eidsvik (1978), ao tratar da participação pública no planejamento de parques nacionais


110 Canadá, adota um a escala pragmática, mostrada na Fig. 16.3. 0 planejamento de
parques e de outras unidades de conservação é também um campo em que a partici­
pação pública pode trazer benefícios, derivados do maior engajamento daqueles que
tomam parte do processo participativo —e de um sentimento de que a decisão também
lhes pertence - , ao passo que a falta de participação na escolha e implantação de
novas unidades de conservação foi muitas vezes criticada por não levar em conta os
interesses das populações tradicionais (Diegues, 1994).

Roberts (1995) adota uma escala com sete estágios de participação, desde a persuasão
até a “autodeterminação”, sendo a consulta colocada justam ente no meio do cami­
nho, enquanto o “planejamento conjunto” e a “decisão partilhada” se situam em um
degrau imediatamente superior. 0 autor prefere designar a relação com o público no
processo de AIA com um termo abrangente e mais neutro — envolvimento público
—, que se subdivide em consulta e participação. Consulta inclui educação, partilha de
informação e negociação, com o objetivo de tomar melhores decisões. Já participação
significa trazer o público para dentro do processo decisório. Roberts reconhece que a
principal forma de envolvimento público tem sido a consulta e aponta que há razões
pragmáticas para que um a organização busque envolver o público em seu processo
decisório, visto que o envolvimento permitiria evitar problemas, impedir confrontos
e até mesmo obter o apoio e a colaboração dos envolvidos.

Seus cinco níveis de participação também incluem a “não participação” de Arnstein e


aqueles níveis superiores de participação em que a decisão é tomada pelo público. De
acordo com essa tipologia, a participação pública no processo de AIA normalmente
f

se dá no nível da consulta. E verdade que, nesses casos, a autoridade pode tomar uma
decisão contrária à vontade da maioria, mas também é verdade que a participação
maciça e intensa do público interessado pode inviabilizar politicamente uma decisão
contrária a seus interesses. Por exemplo, no início dos anos 1990, uma empresa estatal
de São Paulo, a Cesp, apresentou um projeto de construção de um a usina termelétrica,
que teria como combustível o resíduo viscoso de uma refinaria de petróleo (deno­
minado “óleo ultraviscoso”), uma mistura de hidrocarbonetos muito pesados, cuja
queima seria potencialmente muito poluente. Embora os estudos ambientais tivessem
concluído que seriam pequenos e pouco significativos os efeitos sobre a qualidade
do ar, houve forte oposição popular, o que levou a empresa a mudar a localização
do projeto, de Paulínia (onde se situa a refinaria) para Mogi-Mirim, localizada a
algumas dezenas de quilômetros. Nesse local, a população também se mobilizou con­
tra o projeto, apesar das iniciativas da empresa de divulgar as supostas vantagens
do empreendimento, até mesmo levando uma comissão de vereadores para visitar

CAPÍTU LO
P a r t ic ip a ç ã o P ú b l .

usina similar no Japão. A mobilização Poder decisório da organização


foi tal que a Câmara Municipal votou
um a lei proibindo empreendimentos Informação Persuasão Consulta Parceria Controie
desse tipo em seu território. Como a
Constituição brasileira dá aos municí­ A decisão é A decisão é 0 problema é Os limites são A decisão é
tom ada e o tomada e há apresentado, previamente tomada pelo
pios a prerrogativa de controlar o uso público é uma tentativa opiniões são definidos; as público, que
do solo, a decisão municipal inviabi­ comunicado de convenci­ coletadas e informações assume a
a respeito mento do a decisão são partilhadas responsabilidade
lizou a implantação da usina também
público é tomada e a decisão é pública
em Mogi-Mirim. Em vez de continuar conjunta
buscando locais para construir a usi­
na, o governador do Estado, às vésperas Participação do público nas decisões
da Conferência do Rio sobre Meio
Ambiente e Desenvolvimento, em 1992, Fig. 16.3 Uma tipologia de graus de participação pública no processo
ordenou o arquivamento do projeto decisório
(Balby, Napolitano e Fernandes, 1995). Fonte: Eidsvik (1978).

Da mesma forma, o projeto de construção de um aterro de resíduos industriais


no município de Piracicaba, tam bém no interior do Estado de São Paulo, não foi
adiante por decisão do empreendedor. Apesar de o projeto ter recebido a licença
prévia, a discussão do EIA e sua aprovação foram bem difíceis e conflituosas
(Sánchez et al., 1996), o que levou o empreendedor, que não atuava nesse ramo de
negócios, a investir em outros setores. Outros empreendedores tam bém desistiram
de seus projetos quando encontraram oposição organizada por parte de segmentos
do público, às vezes conjugada por ações na Justiça, em diversas dem onstrações
práticas da eficácia dos três pilares da Convenção de Aarhus — a informação, a
consulta e o acesso à Justiça.

Na Austrália, uma ampla controvérsia pública emergiu no início da década de 1980


devido ao projeto de construção de um a barragem, no rio Franklin, no Estado da
Tasmânia. A polêmica levou o governo estadual a organizar um plebiscito, p ergun ­
tando aos cidadãos qual das duas opções de barragem seria a preferida, mas 45% dos
votos foram anulados por cidadãos que escreveram no dams nos boletins de voto.
0 projeto se transformou em objeto de disputa entre sucessivos governos estaduais
e federais, com os últimos pretendendo declarar o local como área protegida, e a
questão acabou resolvida pela Suprema Corte, inviabilizando legalmente o projeto.
“A cam panha para salvar o Franklin permanece como a mais famosa batalha
ambiental na história de nossa nação” (Toyne, 1994, p. 45). A área forma hoje o
Franklin-Gordon Wild Rivers National Park.

Na Argentina, a mobilização pública contrária a um a nova mina de ouro que seria


aberta em Esquel, cidade turística voltada para a prática de esportes de neve localizada
no sul do país, na Cordilheira dos Andes, inviabilizou o projeto. Pressionada pelos
eleitores, por ONGs e pela mídia, a municipalidade local convocou um plebiscito,
em 2002, no qual a população votou majoritariamente contra o projeto. Se alguém
dedicar-se a colecionar casos ou eventos de projetos recusados devido a seu impacto
ambiental ou devido à oposição popular, provavelmente ficará surpreso com sua
quantidade. A situação se repete em muitos países.
liação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

16.3 O bjetivo s d a c o n s u l t a p ú b l ic a
A consulta pública tem várias funções e serve a múltiplos objetivos no processo de
AIA. A literatura sobre o assunto arrola vários desses objetivos. Entre outros autores,
Ortolano (1997, p. 403) destaca os seguintes:
& aprimorar decisões com potencial de causar impactos em comunidades ou no
meio ambiente;
# possibilitar aos cidadãos a oportunidade de expressar-se e de serem ouvidos;
# possibilitar aos cidadãos a oportunidade de influenciar os resultados;
# avaliar a aceitação pública de um projeto e acrescentar medidas mitigadoras;
# desarmar a oposição da comunidade ao projeto;
# legitimar o processo de decisão;
» atender requisitos legais de participação pública;
iíí desenvolver mecanismos de comunicação em duas vias entre o proponente
do projeto e os cidadãos; identificar as preocupações e os valores do público;
fornecer aos cidadãos informações sobre o projeto; inform ar os responsáveis
pela decisão sobre alternativas e impacto do projeto.

Os benefícios da consulta pública também são frequentemente invocados. World Bank


(1999, p. 2) aponta os seguintes:
# a redução do número de conflitos e dos prazos de aprovação se traduz em maior
lucratividade para os investidores; '
# os governos melhoram os processos decisórios e demonstram maior transparência
e responsabilidade (accountability);
# órgãos públicos e ONGs ganham credibilidade e melhor compreensão de sua
missão;
# o público afetado pode influenciar o projeto e reduzir impactos adversos, m axi-
mizar benefícios e assegurar que receba compensação apropriada;
# há maiores possibilidades de que grupos vulneráveis recebam atenção especial,
que questões de equidade sejam levadas em conta e que as necessidades dos
pobres tenham prioridade;
# os planos de gestão ambiental são mais efetivos.

Em teoria, todos teriam a ganhar com a vinculação da consulta pública ao processo de


AIA, mas, na prática, observa-se muita resistência à realização de consultas amplas
e um receio de que, ao invés de reduzir o tempo de análise, a consulta o prolongue,
ou ainda, sob o ponto de vista do empreendedor, que uma decisão “técnica” sobre a
viabilidade ambiental do projeto torne-se “política” quando há um debate público
(no Cap. 17 será abordada a tensão entre a dimensão técnica e a dimensão política das
decisões em matéria ambiental). Por outro lado, é também fato que muitos investidores
privados têm receio de alocar recursos em projetos que não tenham boa aceitação pú­
blica. A expressão “licença social para operar” é usada com frequência para designar
a aceitação pública de um projeto, independentemente da existência de autorizações
ou licenças governamentais. Ademais, em projetos de cooperação internacional, os
países doadores podem condicionar a liberação de recursos não só à preparação de
um EIA, como também a um a consulta pública, enquanto os bancos de desenvolvi­
mento obrigam os tomadores de empréstimo a consultar as populações afetadas e
outros grupos de interesse.

CAPÍTU
Pa r t ic ip a ç ã o P ú b l c a 413

Serão limitadas as vantagens da consulta pública se ela ocorrer somente após a


conclusão do EIA. Quando o empreendedor ou órgão governamental enxergam a
consulta tão somente como obrigação legal ou formalidade administrativa, é claro
que seus benefícios serão inexistentes ou muito reduzidos. Nesses casos, a consulta,
aos olhos do público, parecerá “um ritual vazio de participação” (Arnstein, 1969,
p. 216). Muitos analistas e observadores, insatisfeitos com o grau de participação
alcançado, passaram a adjetivar as recomendações de consulta pública, e certos
guias de boas práticas e documentos oficiais clamam por participação efetiva, ou por
consulta significativa ou real.

Idealmente, a consulta pública (efetiva ou real) ocorreria em diferentes fases do


processo de AIA, com objetivos próprios em cada momento. 0 Quadro 16.1 aponta os
principais objetivos da consulta, segundo as fases do processo. A objetivos diferentes
devem se associar técnicas e procedimentos apropriados de consulta. Assim, se na
fase decisória um a audiência pública pode representar uma ferramenta adequada, na
fase de acompanhamento grupos de supervisão ou comitês de cidadãos podem reve-
/

lar-se os mecanismos mais viáveis para atingir os objetivos de participação. E claro


que o momento crucial é o da tomada de decisão, mas é importante compreender que
a influência real que o público poderá exercer aí dependerá muito de seu envolvi­
mento nas etapas anteriores. Do mesmo modo, o efetivo cumprimento das promessas
contidas no EIA e dos compromissos assumidos por meio da licença ambiental só
pode ser garantido se também o público estiver envolvido nas etapas pós-aprovação.

Quadro 16.1 Objetivos de consulta pública durante o processo de AIA


A DO PROCESSO

A p re s e n ta ç ã o da proposta D iv u lg a r in te n ç õ e s do p ro p o n e n te e o b je tiv o s do p ro je to
Triagem P e rm itir e v e n tu a is q u e s tio n a m e n to s sobre a classificação do p ro je to em te rm o s
de im p a c to p o te n c ia l e dos e studo s a m b ie n ta is necessários
D e te rm in a ç ã o do escopo do EIA Id e n tific a r grup os interessados
Id e n tific a r e m a p e a r preocupações do p ú b lic o
In c lu ir ou e x c lu ir questões do escopo do EIA
A p r im o r a r os te rm o s de referência
C onsiderar a lte rn a tiv a s ao p ro je to
Preparação do EIA Id e n tific a r e c a ra c te riz a r im p a c to s
D isse m in a r in fo rm a ç ã o sobre m é to d o s de e s tu d o e seus resultad os
In c lu ir no d ia g n ó s tic o a m b ie n ta l o c o n h e c im e n to que a p o p u la ç ã o local te m do
m e io a m b ie n te e a p r o v e itá - lo na análise dos im p a c to s
Id e n tific a r m edid as m itig a d o ra s e c o m p e n s a tó ria s
A nálise té c n ic a C on h e ce r os p o n to s de vista do p ú b lic o para e v e n tu a l consideração e
in c o rp o ra ç ã o ao parecer de análise
Decisão Levar em c o n ta as o p in iõ e s dos interessados
C onsiderar a d is trib u iç ã o social dos ôn us e dos be nefícios do p ro je to c o m o um
dos e le m e n to s da decisão
A c o m p a n h a m e n to C o n t r ib u ir para v e r ific a r o c u m p r im e n t o s a tis fa tó r io de c o m p ro m is s o s e
c o n d ic io n a n te s
P ossibilitar que reclam açõe s possam ser fo r m u la d a s e a te n d id a s
414 §rej|aliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Assim, os objetivos instrum entais da participação pública nas etapas pré-deci-


são inserem-se na lógica de que é preciso fortalecer todo o processo de AIA para
que melhores decisões sejam tomadas. Contudo, não se pode perder de vista que a
consulta pública pode questionar o próprio projeto, seus fundamentos e justificativas.
Em algumas ocasiões, a melhor decisão pode ser justam ente a recusa.

1 6 .4 F o r m a t o s d e c o n s u l t a p ú b l i c a
No processo de AIA, a consulta pública envolve informação bidirecional (do pro­
ponente para o público e vice-versa) com participação e intermediação de um
agente governamental, e envolve negociação entre as partes envolvidas e com o
público interessado. Também há a modalidade de consulta direta voluntária, sem
intermediação governamental. No entanto, quando se trata de obtenção de auto­
rização ou licença, a consulta voluntária não substitui a consulta pública oficial,
embora possa complementá-la. Para que possa atingir resultados, a consulta pública
necessita de regras claras (o procedimento de consulta) e de acesso à informação
(cujas regras devem ser definidas em leis e regulamentos). Uma atitude aberta ao
diálogo por parte do empreendedor (e do agente governamental) só pode contribuir,
pois leis, regulamentos e procedimento podem funcionar somente na medida em que
haja engajamento das partes.

Há diferentes formas de se estruturar a consulta pública e podem ser emprega­


das diferentes ferramentas para conduzir o processo. Há formas mais apropriadas
para determinadas fases do processo de AIA. Um dos formatos mais conhecidos é a
audiência pública. As public hearings anglo-saxônicas estão profundamente embre­
nhadas na cultura política desses países e em muito precedem a avaliação de impacto
3O primeiro registro ambiental3, ao contrário de países como o Brasil, onde foi a legislação ambiental que
de uma audiência inaugurou a prática da realização de audiências públicas, hoje bastante disseminadas
pública data do
e realizadas para uma série de finalidades. As public hearings foram logo associadas
ano de 1403, em
Londres (Webler e ao processo estabelecido pela Nepa, nos EUA, e são empregadas em vários países
Renn, 1990, p. 24). como parte indissociável do processo de AIA. Por exemplo, a ampla consulta conhe­
cida como Berger Inquiry, realizada no Canadá entre 1974 e 1977, acerca do traçado
preferencial de um oleoduto no extremo norte do país, é apontada como “um dos
mais significativos eventos no desenvolvimento do processo de avaliação de impacto
ambiental no Canadá” (Sewell, 1981, p. 77), tendo contribuído decisivamente para
estabelecer a consulta pública como parte indissociável da AIA.

As audiências públicas encontram mais ampla aplicação para as fases de scoping e de


tomada de decisão. As formalidades, a dinâmica e a duração das audiências variam
grandemente, mas esse tipo de evento participativo tem características comuns em
muitos locais. Audiências públicas ambientais são eventos formais, convocados e
conduzidos por um ente governamental, cuja dinâmica segue regras previamente
estabelecidas, e que tem como finalidade realizar um debate público — aberto a todos
os cidadãos — sobre um projeto e seus impactos.

Usualmente, em uma audiência pública que é parte do processo de AIA, há uma


exposição sobre o projeto e seus impactos, seguida de perguntas do público, esclare­
cimentos do proponente, consultores e agentes governamentais, e debates ou

c a p ít i if B M IM M ^ M il l ll
P a r t ic ip a ç ã o P ú b lj ! 415

questionamentos. Os objetivos das audiências públicas se sobrepõem aos objetivos


gerais da consulta pública e podem ser resumidos em:
• fornecer aos cidadãos informações sobre o projeto;
# dar aos cidadãos a oportunidade de se expressarem, de serem ouvidos e de
influenciarem nos resultados;
& identificar as preocupações e os valores do público;
avaliar a aceitação pública de um projeto com vistas a aprimorá-lo;
* identificar a necessidade de medidas mitigadoras ou compensatórias;
iY<
legitimar o processo de decisão;
aprimorar as decisões;
atender requisitos legais de participação pública.

Porém, audiências não são a única técnica para atender a esses objetivos. Aliás,
elas têm muitas limitações, embora sejam valiosos instrum entos para a dem ocra­
tização do processo decisório. Parenteau (1988), ao estudar a participação pública
nos processos decisórios ambientais no Canadá, identificou diversas deficiências
ou mesmo limitações estruturais desses processos, fundam entados em audiências
públicas. Para ele, a participação do público é lim itada por alguns “filtros”, fatores
que dificultam ou mesmo impossibilitam um envolvimento pleno.

Para participar efetivam ente de um a audiência, há muitas dificuldades de ordem


prática, a começar pelo tempo que os cidadãos podem dedicar. A inda que realizadas
à noite, se alguém realm ente quer engajar-se nos debates, não basta somente compa­
recer e ouvir as exposições; é preciso tom ar conhecimento do EIA, lê-lo atentamente.
Um EIA ou Rima mal escrito só acentua essa dificuldade. Em segundo lugar, há a difi­
culdade de acesso intelectual ao EIA ou ao Rima. Não somente se trata de informação
técnica a ser decodificada, mas de dificuldades ainda mais básicas de compreensão de
textos da parte de pessoas de baixia escolaridade ou de analfabetos funcionais.

Tais limitações não são características de países subdesenvolvidos, embora nestes


possam ser exacerbadas. No Canadá, país que tem um dos mais altos índices de
desenvolvimento hum ano, Parenteau (1988, p. 59) constata que a participação em
audiências públicas é muito centrada em “especialistas em audiências públicas”, que
estão presentes em várias delas e que fazem freqüente uso da palavra. Militantes, advo­
gados e técnicos reencontram -se com assiduidade e fazem intervenções fundadas no
conhecimento e na competência. Assim, o “objetivo inicial [das audiências públicas],
que consistia em produzir um debate público o mais amplo e diversificado possível,
com envolvimento das pessoas diretam ente afetadas, tende a ser seriam ente dim i­
nuído”. Nas consultas públicas promovidas pelo Banco Mundial acerca de projetos de
significativo impacto potencial, o próprio banco identifica aspectos que precisam ser
melhorados, entre os quais a participação de minorias e de grupos em desvantagem e
a inclusão de todos os grupos que possam ter algum interesse em relação ao projeto
(World Bank, 1999, p. 1).

Não obstante, são as próprias limitações do público geral que justificam o papel de
público esclarecido que assumem muitas ONGs. Não fosse pela atuação de algumas
associações da sociedade civil, como ONGs ambientalistas, entidades profissionais e
associações de moradores, entre outras, o debate público seria empobrecido ou sujeito à
dicotomia há muito ultrapassada e encapsulada no mote “economia x ecologia”.

DEZE
416 M aaaliacão de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Outra crítica freqüente às audiências públicas é que elas tendem a favorecer o


confronto e não a negociação. Em muitos casos há um inevitável clima de enfren-
tamento não cooperativo que mais se assemelha a um embate nos tribunais do que
a um a situação de consulta e diálogo. Claro que um a audiência pode ser muito dife­
rente de outra. 0 nível de participação pode ser muito pequeno ou muito grande; o
projeto pode ser relativamente consensual e esperado pela comunidade ou pode ser
altamente polêmico; a atitude do proponente e do consultor pode ser de arrogância ou
de humildade; o público pode ter maior ou menor grau de organização, em virtude de
lutas passadas; a comunidade local pode estar dividida devido às expectativas posi­
tivas ou negativas em relação às conseqüências do projeto ou porque alguns esperam
beneficiar-se do mesmo, enquanto outros serão afetados negativamente.

No Brasil, as audiências públicas ambientais representam um im portante espaço


de debate e participação, mas se deparam com muitas limitações similares às das
audiências dos países anglo-saxônicos. No Estado de São Paulo, a primeira audiência
foi realizada em janeiro de 1988. Ferrer (1998) estudou quarenta audiências públicas
realizadas no Estado entre 1988 e 1996. Em alguns casos, a participação foi baixa
na audiência, como em um projeto de aterro de resíduos industriais de Piracicaba
(conforme a seção 16.2); apenas sessenta pessoas compareceram, mas somente
quando o empreendimento chegou ao plenário do Consema as entidades da região
mobilizaram -se para tentar barrá-lo. Por outro lado, houve séries de audiências so­
bre o mesmo empreendimento que reuniram mais de 2 mil participantes. Na análise
da autora, as audiências contribuem para o aprimoramento do processo de licen­
ciamento ambiental e, principalmente, constituem fóruns em que os conflitos são
explicitados, o que contribui para sua resolução. No entanto, “seu formato é inade­
quado”, pois impede que sejam prestados esclarecimentos efetivos, não propiciam
informações isentas, o tempo de réplica é pequeno (embora a duração das audiências
possa ser longa, estendendo-se além do “limite de assimilação das pessoas”), possi­
bilitam posicionamentos e “informações enganosas” sem que seus locutores possam
ser responsabilizados, entre outras deficiências.

Em síntese, algumas deficiências das audiências públicas ambientais são:


# têm uma dinâmica que favorece um clima de confronto;
# representam um jogo de soma nula, pois, devido à confrontação, raramente se
consegue convergir para algum ponto em comum;
4Trata-se, aqui, de dão margem a manipulação por aqueles que têm mais poder econômico ou maior
audiências públicas capacidade de mobilização;
que ocorrem no # ocorrem muito tarde no processo de AIA, quando muitas decisões importantes
f i m do processo,
sobre o projeto j á foram tomadas4;
quando o EIA já
está concluído.
# a maior parte do público dispõe de pouquíssima informação sobre o projeto e
Como indicado no seus impactos; os processos de informação pública que deveriam preceder a
Cap. 6, audiência são deficientes;
também podem # grande parte do público não tem condições de decodificar e compreender a
ser realizadas informação de caráter técnico e científico colocada à sua disposição;
audiências antes ísí os tomadores de decisão raramente estão presentes (somente seus assessores);
da preparação do
# há um “déficit comunicativo implícito”, uma vez que os “técnicos se colocam em
EIA, com o intuito
de contribuir para
um degrau superior ao dos cidadãos” (Webler e Renn, 1990, p. 24);
a identificação das uso freqüente de argumentos de cunho técnico-científico em um contexto
questões relevantes. político no qual a verdade não pode ser verificada (Parenteau, 1988);

í
Pa r t i c i p a ç ã o P ú b l ^CA» 417

# surgimento de uma categoria de “especialistas em audiências públicas” que falam


em nome do público (Parenteau, 1988);
% uso freqüente de argumentos jurídicos e de ameaças de ações em Justiça,
tentando invalidar ou tornar ilegítimas decisões tomadas anteriormente ou a
ser tomadas.

Outras técnicas para facilitar o envolvimento, a consulta ou o diálogo com os inte­


ressados podem também ser empregadas no processo de AIA. As mais simples são
as reuniões públicas, eventos informais promovidos pelo proponente, aos quais os
interessados são convidados a comparecer para conhecer o projeto proposto e deba­
ter sobre suas conseqüências. Reuniões públicas podem ser realizadas em diversas
fases do processo de AIA, destacando-se: (i) triagem; (ii) determinação do escopo;
(iii) preparação do EIA; (iv) análise técnica; e (v) decisão.

Para o sucesso de um a tal reunião - com grande afluência de interessados e p re­


sença de líderes ou de pessoas influentes na com unidade - é essencial que seja
previam ente realizado um intenso trabalho de divulgação. A cooperação de in sti­
tuições locais como igrejas, escolas ou associações com unitárias é de grande valia
para divulgar um a reunião pública. A escolha de um local neutro e já conhecido
da população, como um salão paroquial, um a escola ou ginásio municipal, facilita
a participação.

Reuniões em grandes grupos, assim como audiências públicas, não têm um formato
muito bom nem um a dinâmica adequada para informar os interessados sobre o
projeto e sobre as intenções de seu proponente. 0 ideal é que a informação tenha
sido disseminada antecipadamente, por intermédio de diferentes meios (impressos,
audiovisuais etc.)5. 50 Cap. 14
apontou algumas
Em uma reunião pública, o propo'nente do projeto e seu consultor podem fazer uma questões ligadas
à comunicação
exposição sobre o tema, seguida de perguntas e debates, em uma seqüência parecida
no processo de
com a de uma audiência pública. A reunião pode ser muito útil para ouvir as preocupa­ A IA . Dentre as
ções da comunidade e conhecer suas expectativas em relação ao projeto. Por exemplo, deficiências,
em uma reunião pública promovida por uma empresa de mineração no Estado do nota-se que
Rio de Janeiro, acerca de um novo projeto que previa a abertura de mina de uma raramente o Rima
substância não metálica de uso industrial, diversos moradores vizinhos manifestaram tem valorizada
sua fu nçã o de
suas inquietações em relação ao suprimento de água, já que no bairro mais próximo,
comunicação com o
apesar de situado em zona urbana, as casas eram abastecidas por cacimbas indivi­ público.
duais e não por rede pública. Como o estudo de impacto ambiental ainda estava em
andamento, os consultores e o proponente decidiram que seria conveniente convidar
algum especialista vinculado a uma universidade pública para realizar um estudo
hidrogeológico independente do EIA. Embora suas conclusões fossem utilizadas
no EIA, esse estudo seria integralmente anexado, para evitar qualquer suspeita de
r

manipulação de dados. E interessante observar que os termos de referência desse EIA


(que no Rio de Janeiro são chamados de Instruções Técnicas) haviam dado pouca
importância às águas subterrâneas, porque a análise preliminar indicara que algum
impacto sobre a disponibilidade de água subterrânea seria de baixa probabilidade de
ocorrência. Ao ficar evidente a preocupação do público com o tema, a programação
do EIA foi revista.
418 f^ E s a lia ç ã o de Impacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

Reuniões públicas tam bém podem ocorrer em clima tenso e altam ente emocional, a
exemplo das audiências públicas, e isso se deve ao fato de que ambas têm dinâm ica
parecida, ainda que a prim eira seja menos formal. Uma alternativa é a realização
de reuniões com pequenos grupos, oficinas ou reuniões de trabalho, que não são
abertas à presença de todos, mas onde a participação se faz sob convite. Lideranças
locais e formadores de opinião podem ser convidados para sessões de informação,
de discussão ou mesmo reuniões visando à negociação de itens como m odifica­
ções de projeto ou medidas compensatórias. Embora a autoridade pública sempre
resguarde o direito de decidir, seus representantes podem tam bém estar presentes
e, em certos casos, atu a r como mediadores inform ais de algum conflito real ou
latente. Esse formato de consulta pode ser usado nas mesmas etapas do processo
de AIA que as reuniões públicas.

Se o objetivo for ampliar a consulta e atingir o maior número de interessados, a


realização de um a ou mais audiências ou o convite para participar de reuniões
talvez não seja a melhor estratégia, ou não seja suficiente. Pode ser mais eficaz que
técnicos e consultores se desloquem pela região e conversem diretam ente com lide­
ranças e cidadãos comuns. Há de notar-se, entretanto, que tal procedimento pode
não estar de acordo com as formalidades legalmente requeridas, situação em que
seria necessário tam bém realizar audiências.

A realização de pesquisas de opinião conhecidas como surveys é um método de levantar


opiniões, preocupações e pontos de vista que talvez não fossem exprimidos em fóruns
como audiências ou reuniões públicas. Essas pesquisas podem ser conduzidas com
base em questionários que contenham uma série de perguntas preestabelecidas, ou
na forma de entrevistas abertas, nas quais o pesquisador chega com alguns temas
previamente definidos, mas deixa amplo espaço para que o entrevistado introduza
outros assuntos de seu interesse. Essa técnica pode ser útil para a seleção das questões
relevantes e para a preparação do EIA.

Diversas ferram entas foram desenvolvidas para estim ular a participação pública
na formulação e avaliação de projetos de desenvolvimento, ultrapassando a noção
de consulta e entrando em graus superiores de participação, como a “parceria”
de A rnstein (1969). Em vez da participação ser um a resposta (ou um a reação) a
um projeto já definido, métodos participativos são usados para gerar, conceber
ou delinear projetos da base para o topo. No método conhecido como “Avaliação
Rural P articipativa” (Participatory Rural Appraisal - PRA) ou “Avaliação Rural
Rápida” (Rapicl Rural Appraisal - RRA), as populações locais coletam e analisam
os próprios dados, ajudadas por facilitadores que organizam discussões em grupos,
auxiliam a desenvolver critérios de classificação e ordenam ento de prioridade, e n ­
tre outras tarefas. Inúmeros outros métodos de planejamento participativo podem
ser adaptados ou usados parcialm ente em avaliação de impacto ambiental, quase
sempre em um a perspectiva que ultrapassa a simples consulta pública, o que já
QHá muitas fontes está além do escopo deste capítulo6.
sobre métodos
de planejamento
participativo. 1 6 .5 P r o c e d i m e n t o s de c o n s u l t a p ú b l i c a e m a l g u m a s j u r is d iç õ e s
World Bank (1995) Em muitos países — e o Brasil é um deles — a AIA foi pioneira na institucionalização
:raz uma síntese. de procedimentos formais de consulta e participação, como as audiências públicas.

CAPÍTU 10
P a r t ic ip a ç ã o P ú b l CA
d
419

Nos EUA, a National Environmental Policy A c t obrigou os agentes governamentais


a informar e ouvir o público — segundo regras detalhadas - antes que as decisões
sejam tomadas. Na atualidade, a consulta pública realizada em diversos momentos do
processo de AIA é uma boa prática internacionalmente recomendada.

A convocação, a organização e o andam ento de um a audiência pública devem


ter regras definidas de antemão, e de conhecim ento de todos os participantes. No
Brasil, as audiências públicas am bientais têm regulam entação m ínim a. Há regras
sobre as condições em que devem ser convocadas, porém poucas regras de procedi­
mento ou de conteúdo. A convocação está regulam entada pela Resolução Conama
9, de 3 de dezembro de 1987, segundo a qual deve ser realizada pelo menos um a
audiência quando:
% o órgão ambiental encarregado do licenciamento assim o decidir;
# houver uma solicitação de uma entidade civil;
% houver uma solicitação da parte do Ministério Público;
# for solicitada por pelo menos cinqüenta cidadãos.

No Estado de São Paulo, por força da Deliberação Consema n° 34/2001, para todos os
projetos que necessitem de estudo de impacto ambiental pelo menos uma audiência
/

pública deve ser realizada. E um reconhecimento de que se os impactos potenciais


foram considerados significativos na etapa de triagem, a audiência pública é impor­
tante e não pode deixar de ser realizada. Antes dessa deliberação, nem todo projeto
sujeito a um EIA era debatido em audiência pública.

Quanto ao desenrolar de uma audiência pública, o Quadro 16.2 mostra de maneira


resumida o procedimento adotado no Estado de São Paulo. A convocação e a organi­
zação de um a audiência pública é feita pela Secretaria Executiva do Conselho
Estadual de Meio Ambiente (Consema), colegiado integrante da Secretaria do Meio
Ambiente. A realização da audiência deve ser divulgada por meio de jornais e outros
meios de comunicação locais (por exemplo, radiodifusão e carros de som); o EIA e
o Rima (ou o RAP) devem estar à disposição do público por um período mínimo de
quinze dias, em algum local de fácil acesso. Durante o período de consulta, os Rimas -
e, ocasionalmente, os EIAs - têm sido mantidos à disposição também na Internet.
As audiências são marcadas para o período da noite, para facilitar a participação do
maior número de pessoas, e podem durar várias horas. Pode ser realizada mais de
uma audiência para debater o mesmo projeto, mas cada uma não se prolonga para
mais de um dia.

Além de manifestar-se verbalmente, os participantes podem apresentar documentos


ou requerimentos durante a audiência. Ademais, qualquer interessado, mesmo que
não tenha participado da audiência pública, pode também enviar à Secretaria do
Meio Ambiente documentos ou petições relativas ao projeto em questão. Para cada
audiência, a Secretaria Executiva do Consema prepara um a ata contendo a síntese
das intervenções dos participantes e a relação dos documentos entregues durante a
audiência. Normalmente, os debates e as apresentações são também gravados.

Uma audiência pública nunca é deliberativa. Nada se vota nem se decide, um a vez
que a decisão cabe ao órgão licenciador. No entanto, os debates e questionamentos

DEZE:
420 ^ ^ a l i a ç ã o de Im pacto A m biental: conceitos e métodos

Q u a d r o 1 6 .2 R egras p a ra C ond ução de A u d iê n c ia s P ú b lica s no E stado de São P aulo


O r g a n iz a ç ã o d a a u d i ê n c i a A gente

1a pa rte : a b e rtu ra S ecretário do M e io A m b ie n te (saudação inicial)


C o o rd e n a d o r da Secretaria do M e io A m b ie n te (e sc la re cim e n to s sobre o
processo)
2a p a rte : exposições sobre o p ro je to E m p re e n d e d o r - q u in ze m in u to s
em discussão Equipe responsável pela ela b o ra çã o do e stu d o a m b ie n ta l - t r in t a m in u to s
3 a pa rte : m a n ife s ta ç ã o de e n tid a d e s T rinta m in u to s
a m b ie n ta lis ta s
4 a p a rte : m a n ife s ta ç ã o de e n tid a d e s C inco m in u to s para cada um
da sociedade civil
5a p a rte : m a n ife s ta ç ã o de pessoas Três m in u to s para cada um
em p a rtic u la r
6a p a rte : m a n ife s ta ç ã o de represen­ C inco m in u to s para cada um
ta n te s de órgãos p ú blicos
7a p a rte : m a n ife s ta ç ã o dos m e m b ro s Cinco m in u to s para cada um
do Consema
8a p a rte : m a n ife s ta ç ã o dos C inco m in u to s para cada um
p a rla m e n ta re s
9 a pa rte : m a n ife s ta ç ã o de prefeitos, Cinco m in u to s para cada um
secretários m u n ic ip a is e estaduais
10a p a rte : respostas e c o m e n tá rio s Equipe responsável pela e la b o ra ç ã o do e stu d o a m b ie n ta l - q u in z e m in u to s
C onse lheiro do C onsem a - dez rrwnutos
E m p re e n d e d o r - c in c o m in u to s
11a pa rte : e n c e rra m e n to S ecretário do M e io A m b ie n te
Fonte: D eliberação Consema n° 34, de 2 7 de novem bro de 2001.

ocorridos podem influenciar a decisão, até naquilo que se refere à mitigação ou


compensação de impactos adversos, assim como acerca de compromissos que possam
ser publicamente assumidos pelo empreendedor, mesmo que não venham a constar
das condições da licença ambiental.

Outro exemplo de procedimento para o andamento de audiências públicas ambientais


é mostrado no Quadro 16.3, que resume os procedimentos empregados no Quebec.
Nessa província, há um a entidade independente criada por lei, o Escritório de Audiên­
cias Públicas Ambientais (Bureau d'Audiences Publiques sur VEnvironnement —Bape),
composto de comissários nomeados pelo m inistro7 do Meio Ambiente, que têm como
7Cargo equivalente única função a de promover consultas públicas. Os comissários são apontados por
ao de secretário
períodos de seis anos e inamovíveis durante seus mandatos.
de Meio Ambiente
para um Estado
brasileiro. Depois de concluído o estudo de impacto am biental e considerado adequado pelos
serviços técnicos do Ministério do Meio Ambiente, o mesmo é colocado à disposição
do público durante 45 dias. Nesse período, qualquer cidadão, associação ou pre­
feitura pode solicitar a realização de um a audiência pública. Compete ao Ministro
aceitar o pedido e determ inar ao Bape que realize a audiência (Grandbois, 1993).
No Brasil, a audiência pública é tam bém realizada depois da conclusão do EIA,
porém antes que se term ine sua análise por parte do órgão licenciador. A diferença
entre o procedimento brasileiro e o canadense deve-se à competência para tom ar
decisões de autorização, que, no caso quebequense, é do Conselho de Ministros, ao

CAPITU
Pa r t i c i p a ç ã o P ú b l

Quadro 1 6 .3 Regras para condução de audiências públicas no Quebec, Canadá


Eta p a d o processo de c o n s u l t a

1. Um c id a d ã o ou u m a associação re q u e r ao m in is tr o do M e io A m b ie n te a re a liz a ç ã o de um a
a u d iê n c ia p ú b lic a para d is c u tir um p ro je to .
2. Se o p e d id o é a c e ito , o p re s id e n te do E s c ritó rio de A u d iê n c ia s P úblicas A m b ie n ta is (Bape)
n o m e ia u m a c o m is s ã o de c o n s u lta e seu responsável.
3. A re a liz a ç ã o da a u d iê n c ia é p u b lic a d a nos jo r n a is e na In te rn e t.
4. A c o m is s ã o de c o n s u lta realiza re u n iõ e s p re p a ra tó ria s c o m o p r o p o n e n te do p r o je to e com
o re q u e re n te da a u d iê n c ia .
5. R ealização da p rim e ira p a rte da a u d iê n c ia c o m a s e g u in te s e q ü ê n c ia :
- e x p lic a ç õ e s p re lim in a re s (co m issã o de c o n s u lta ):
- e x p la n a ç ã o do re q u e re n te sobre os m o tiv o s da s o lic ita ç ã o de a u d iê n c ia ;
- a p re s e n ta ç ã o do p ro p o n e n te do p ro je to , p r in c ip a lm e n te sobre o EIA;
- d e p o im e n to s de o u tra s pessoas;
- q u e s tõ e s c o lo c a d a s pelo p ú b lic o .
6. E n c a m in h a m e n to de d o c u m e n to s , pareceres ou re la tó rio s dos interessados (até prefeituras).
7. R ealização da se g u n d a p a rte da a u d iê n c ia , co m a s e g u in te s e q ü ê n c ia :
- a lo c u ç ã o dos re p re s e n ta n te s de e n tid a d e s ou c id a d ã o s que a p re s e n ta ra m p re v ia m e n te
d o c u m e n to s ou pareceres ou que desejem se e x p r im ir v e r b a lm e n te ;
- a co m is s ã o de c o n s u lta pode o u v ir ou d ir ig ir p e rg u n ta s ao p r o p o n e n te do p ro je to , ao re q u e ­
re n te da a u d iê n c ia p ú b lic a ou a q u a lq u e r o u tra pessoa.
8. P reparaçã o do re la tó r io fin a l da c o m is s ã o de c o n s u lta .
9. P u b lic a ç ã o e d iv u lg a ç ã o do re la tó r io fin a l.
Fonte: Règles de Procédure Relatives au D éroulem ent des Audiences Publiques, Q-2, r. 19.

passo que, no Brasil, a decisão cabe à autoridade am biental. No Quebec, o serviço


de avaliações am bientais do M inistério gerencia todo o processo de AIA, desde a
triagem até a análise técnica, e pode não aceitar um EIA em razão de deficiências
que prejudiquem a boa avaliação do projeto proposto. Todavia, um a vez que o EIA
seja considerado satisfatório (ou seja, descreveu e analisou adequadam ente as con­
seqüências do projeto, mesmo que haja impactos adversos significativos), a decisão
passa a um a instân cia superior. N enhum a dessas duas filosofias pode ser ju lg ad a
como superior, pois sua prática depende das condições objetivas de cada jurisdição.
Esta questão será aprofundada no Cap. 17.

O Bape dispõe de quatro meses para realizar a audiência e preparar seu relatório.
As audiências desenrolam-se em duas partes, com intervalo de 21 dias. Cada parte
pode du rar vários dias, consecutivos ou não (a duração usual é de três a cinco dias).
A primeira parte da audiência tem função informativa. Nela, o proponente apresen­
ta o projeto, suas justificativas e seus principais impactos, assim como as medidas
mitigadoras propostas. 0 público pode fazer perguntas sobre o projeto, suas alter­
nativas, os estudos realizados, mas a formulação de críticas e opiniões deve ser
deixada para a segunda parte da audiência, e os comissários têm poder de cortar a
palavra dos participantes durante a audiência. Os comissários tam bém questionam
o empreendedor e seu consultor e podem convocar representantes de órgãos públicos
para prestar esclarecimentos. A seqüência de apresentações e de perguntas, os tempos
e a própria disposição dos participantes na sala seguem um a ordem precisa.
Pa r t i c i p a ç ã o P ú b l BCA^ K 423

A experiência é um grande professor. Recentemente, as companhias mais


avançadas (...) adotaram um processo [de participação pública] genuinamente
positivo, aberto, cooperativo e interativo. Elas estão prontas para começar cedo,
para escutar tanto quanto para informar. Elas aprenderam os benefícios de serem
ouvintes atentas. (EPA, 1995, p. 4)

Pragmatismo e eficiência são ilustrados por Millison e Hettige (2005, p. 40) que, ao
analisarem retrospectivamente projetos financiados pelo Banco Asiático de Desen­
volvimento, observam que “o processo de consulta [pública] não foi muito eficaz (...)
[e] resultou em identificação imprópria de impactos, surgimento de expectativas irre­
alistas entre as pessoas afetadas e medidas mitigadoras inadequadas”.

As corporações apoiariam e promoveriam voluntariamente a consulta pública por


razões meramente funcionais, usando a conceituação de Webler e Renn (1995), ou
seja, porque a consulta “produz resultados”. Tal atitude só pode contribuir para esta­
belecer boas relações com os futuros vizinhos, no caso de um novo empreendimento,
ou para melhorar as relações com os atuais vizinhos, sem que possa haver, contudo,
um a garantia de aceitação do projeto. Dentre os possíveis benefícios do envolvimento
público antes mesmo da preparação do estudo de impacto ambiental, enumeram-se:
# melhor entendimento mútuo;
# melhor compreensão das características e dos impactos do projeto;
# melhor compreensão dos pontos de vista do público;
# contribuição para um ambiente de respeito pelos valores da comunidade;
# livre expressão e manifestação de apreensões, dúvidas e necessidades;
# identificação de questões que causem preocupação.

Pode ser necessário um esforço vigoroso para conseguir a aceitação pública de um


novo projeto, mas não há garantias de que isso será conseguido em todos os casos. Em
um período de dois anos que precedeu a aprovação da primeira mina canadense de
diamantes, situada no norte do país, em um a região pouco povoada, mas inserida em
território tradicional de comunidades indígenas (denominadas, no Canadá, de “Pri­
meiras Nações”, isto é, aquelas que precederam a chegada dos colonizadores europeus),
a equipe do proponente (uma grande empresa australiana com operações em muitos
países) realizou cerca de trezentas reuniões com mais de cinqüenta diferentes grupos
de interesse (Azinger, 1998). Naturalmente, não foram meras reuniões de informação,
mas encontros de discussão e negociação, que resultaram em compromissos assum i­
dos pela empresa, como a contratação preferencial de pessoal da região.

Nos processos voluntários de consulta é importante tratar de identificar quais são


os potenciais grupos de interesse, em vez de esperar que eles “apareçam”. No caso
de um projeto de uma nova mina de areia industrial (para fabricação de vidro) no
interior de São Paulo, as equipes envolvidas no EIA e na preparação do projeto limi­
taram -se a esperar os procedimentos oficiais de consulta pública e term inaram por
“descobrir” que o proprietário de um imóvel rural vizinho era um militante ambien­
talista bastante ativo e hábil orador em audiências e reuniões públicas. 0 projeto
acabou sendo aprovado, mas não na configuração desejada pela empresa.

Azinger (1998) recomenda que, imediatamente após estabelecer seus objetivos de


consulta pública, um a empresa deve identificar os grupos de interesse (stakeholders),
422 ^ ^ a l i a ç ã o de Im p a cto A m b ie n ta l: co n ce ito s e m étodos

Pareceres, opiniões ou quaisquer outros docum entos podem ser en cam inhado s ao Bape
antes da segunda p arte da audiência, quando se estabelece um debate sobre o projeto,
suas justificativas, alternativas, seus impactos diretos e indiretos, sempre mediado
pela comissão, que tam bém nessa parte tem um papel ativo ao dirigir p erg u n tas
não somente ao proponente, mas tam bém aos participantes da audiência. Segundo o
próprio Bape, a divisão da audiência em duas partes é “o que torna original o procedi­
mento, que assegura a exatidão e a integralidade da informação, e que perm ite a
despolarização do debate” (Bape, 1994, p. 11).

Terminada a segunda parte, os comissários preparam um relatório dirigido ao


M inistro que em seguida é impresso e publicado. 0 Bape não tem nen hu m poder de
decisão, mas cum pre um a função de prom over ativam ente um a consulta pública.
Todos seus relatórios são tornados públicos, assim como os docum entos apresentados
durante a audiência. M uitas vezes há u m a duplicação entre o trab alh o de revisão
técnica do EIA realizado pela Direção de Avaliações A m bientais do M inistério do
Meio Ambiente e o conteúdo dos relatórios do Bape, mas a independência dos com is­
sários é um fator de credibilidade muito prezado pela sociedade local.

Digno de nota é o m ecanism o existente na legislação federal canadense, e tam bém


em algum as províncias, de auxílio financeiro para que'os interessados participem do
\

processo de consulta pública. A sem elhança do procedim ento do Quebec, no processo


federal as audiências tam bém são longas e dirigidas por um a comissão com poderes
de requisitar docum entos e depoimentos. A participação do cidadão com um não é
muito simples, e para reduzir as dificuldades de acesso e decodificação de info rm a­
ção técnica há fundos disponíveis, em valores limitados, que cidadãos, associações
locais e outras entidades podem pleitear, m ediante justificativa, para co n tratar as-
sessoria técnica que facilite seu entendim ento e análise dos estudos e docum entos
apresentados. Esses recursos tam bém podem ser empregados para produzir do cu m en ­
tos, adquirir certos m ateriais inform ativos e cobrir despesas de viagem, entre outros.

Tais exemplos ilustram abordagens muito distintas para a consulta pública. Há muitos
outros formatos em uso em outras partes do mundo. Possivelmente, a consulta públi­
ca seja a etapa do processo de AIA na qual haja menos convergência internacional,
e os prováveis motivos não são difíceis de entender, pois democracia e tran sp a rên c ia
não são, infelizm ente, valores igualm ente partilhados por todos os povos.

1 6 .6 A CONSULTA PÚBLICA VOLUNTÁRIA


A consulta pública pode ser feita não somente por meio dos canais oficiais, v in c u ­
lada ao processo de AIA e ao licenciamento ambiental, mas tam b ém por iniciativa
vo lu n tária de um a empresa, com o intuito de m elhorar seu relacionam ento com a
com unidade ou de conhecer quais são suas preocupações, valores e perspectivas.
D urante o planejam ento de um novo projeto, um a interação precoce com a com uni­
dade local e com grupos de interesse, como organizações não governam entais, pode
facilitar sua fu tu ra aprovação. É certam ente por interesse próprio (assim como para
h o n ra r eventuais compromissos de responsabilidade social) que um a empresa que
atue em setores de significativo impacto am biental deveria se envolver ativam ente
em consulta pública independentem ente de qualquer exigência legal:

CAPÍTU LO
Pa r t ic ip a ç ã o P ú b i CA 425

Intercâmbio e diálogo formam o caldo de cultura necessário para que avance a


consulta pública. Para que apareçam frutos, é necessário vencer resistências (até
mesmo internas à empresa ou organização que promove a consulta voluntária) e
forjar um clima de confiança, o que sempre leva tempo. Ainda que as discussões
possam ampliar o horizonte inicial do proponente, é importante não perder de vista
o objetivo do trabalho, organizando as atividades e mantendo um registro dos
avanços. Planilhas, diagram as e versões sucessivamente atualizadas de pontos de
acordo são algumas ferramentas que ajudam a não perder objetividade durante o
processo de consulta e negociação.

Uma vez que se tenha chegado a consensos, todos têm a g anhar se compromis­
sos escritos, como memorandos de entendimento, forem firmados, pelo menos entre
algumas das partes envolvidas. 0 passo seguinte será implementar as decisões e
monitorar seus resultados. Não é raro que grupos ou indivíduos inicialmente muito
interessados desapareçam de súbito, ou que novos grupos ou indivíduos venham se
ju n ta r ou apareçam no decorrer ou no final do processo de consulta. Não se trata de
fechar a porta nem de recomeçar a cada mudança, mas de m anter alguma referência
que possibilite o engajamento de novos interessados sem frear o avanço da consulta
e das negociações.

Mesmo depois de aprovado o projeto, é recomendável manter um centro de infor­


mação durante todo o período de construção, no qual se possa receber reclamações,
sanar dúvidas e veicular informações sobre o projeto. Idealmente, esse centro deveria
ter, pelo menos, uma pessoa permanente, suficiente e adequadamente informada e
conhecedora do projeto. 0 centro deve ser instalado em um local visível e de fácil
acesso, localizado fora do canteiro de obras ou de áreas industriais ou operacionais.
Naturalmente, ele pode ser complementado por um centro virtual (Internet), cuja
função não é substituir o centro'físico.

Resumindo, tanto empresas privadas como empreendedores públicos têm a ganhar ao


promoverem um a consulta pública relativa a projetos que possam causar impactos
ambientais. 0 Quadro 16.4 condensa as principais etapas usualmente recomendadas,
mas não há um a receita que possa garantir resultados. Nunca é demais lembrar que
o emprego de profissionais capacitados é um a das chaves do sucesso, que tampouco
pode prescindir de um engajamento ge­
nuíno da alta direção da empresa ou do Q u a d ro 1 6 .4 Principais tarefas em uma consulta pública voluntária
organismo promotor. Esse engajamen­ PROCESSO DE CONSULTA
to é tanto mais necessário quanto mais 1. D e fin ir os o b je tiv o s de c o n s u lta pública.
o tema de abertura para o público seja 2. Id e n tific a r as partes interessadas.
novidade na organização. Serão invi- 3. Preparação de m a te ria l para d iv u lg a ç ã o e d isse m in a çã o de
táveis os conflitos com profissionais
in fo rm a ç ã o .
técnicos, particularm ente engenhei­
4. In te rc â m b io e diálogo.
ros, poucas vezes dispostos a explicar a
5. E s ta b e le c im e n to de com prom issos.
leigos as razões que fundam entam as so­
luções técnicas adotadas, e ainda menos 6. E s ta b e le c im e n to e m a n u te n ç ã o de um canal de c o m u n ic a ç ã o
d u ra n te to d a s as etapas do ciclo de vida do e m p re e n d im e n to .
preparados para ouvir questionamentos
que podem colocar em cheque os pró­ Fontes: adaptado de A zinger (1998), EPA (1995) e W orld Bank (1995, 1999).
prios paradigmas de seu trabalho. Mas
esse é um risco de toda consulta pública.

DEZE'
424 í i E N ^ Ç ã 0 de Im pacto A m biental: conceitos e métodos

que, em alguns casos, podem envolver comunidades situadas a grandes distâncias.


No exemplo da mina canadense de diamantes, grupos nativos localizados a 550 km
foram incluídos na consulta, pois caçavam caribus, cujas manadas, migratórias, uti­
lizavam a área do projeto. Uma das principais recomendações de guias e m anuais de
8Há diversas consulta pública8 é “ser inclusivo”, não deixando de fora nenhum grupo ou indiví­
publicações duo que declare ter interesse. World Bank (1999, p. 6) enfatiza que a identificação de
com diretrizes e
grupos de interessados é “elemento crítico” do processo de consulta, e sugere que se
recomendações
para consulta
busque identificar: (i) aqueles que serão diretamente afetados; (ii) aqueles que serão
pública, até uma indiretamente afetados; (iii) aqueles que tenham um interesse; e (iv) aqueles que
norma técnica sintam que poderão ser afetados.
canadense:
CSA, Canadian A divulgação pública do projeto auxilia na identificação dos grupos de interesse.
Standards
Muitas vezes, há pouca participação por falta de informação (o primeiro pilar da
Association/
Association Convenção de Aarhus), e somente tarde demais os cidadãos descobrem que serão
Canadienne de afetados. Por exemplo, a construção da linha 4 do metrô de São Paulo levou ao
Normalisation, fechamento de algumas ruas e ao isolamento permanente de alguns quarteirões,
Z764-96 A causando um aumento nos tempos de viagem (para automóveis, ônibus, ciclistas e
Guiãe to Public
pedestres) para deslocamentos transversais próximos a uma extremidade da linha.
ínvolvement/
Guide pour la
Quando comerciantes e moradores descobriram o fato e perceberam que seriam preju­
Participation du dicados, mobilizaram-se para tentar manter aberta uma rua, mas era tarde demais
Public, 143 p. para modificar o projeto, mesmo com pressão política de vereadores.

Nesse caso, o descontentamento popular não teve nenhum a influência sobre o projeto,
mas em outros pode levar a questionamentos por via judicial e a atrasos na implanta­
ção. World Bank (1999) recorda que a inadequada identificação de interessados pode
representar custos adicionais para o projeto e também levar informação incompleta ou
incorreta a circular publicamente, criando um clima de hostilidade à proposta.

Disseminação de informação e intercâmbio com os interessados são os passos seguintes


de uma estratégia de consulta pública voluntária. Os meios de divulgação (material
escrito, visual, exposições orais, conversas frente a frente etc.) deverão ser escolhidos
de acordo com as características de cada grupo de interessados. Claramente, a maneira
de abordar populações tradicionais não pode ser a mesma usada para comunicação
com uma ONG ambientalista de atuação internacional, por exemplo.

A riqueza do processo está nos intercâmbios que se possam estabelecer e no en­


tendimento mútuo que se possa construir. Depois da disseminação de informação
sobre o projeto e de um primeiro mapeamento dos pontos de vista, expectativas,
demandas e objeções dos interessados, é preciso organizar as discussões em torno
de alguns pontos-chave. Por exemplo: há questões a serem elucidadas no EIA? Há
demandas específicas que possam ser atendidas? Há alternativas que devam ser
exploradas? Esta última questão pode ser ilustrada por um a demanda freqüente em
projetos industriais, a de reduzir os incômodos causados pelo tráfego de veículos
induzido pelo empreendimento, particularm ente caminhões. Ao identificar previa­
mente tal demanda, a empresa pode explorar vias de acesso alternativas antes de
incorrer em custos de construção e mais tarde precisar fazer modificações, in v aria­
velmente mais caras.

CAPITU
Av aliação de Im pacto A m b ie n ta l: conceitos e m étodos

Ao longo do processo de avaliação de impacto ambiental, várias decisões são tomadas


por diferentes protagonistas. Há decisões acerca das alternativas de projeto, do
alcance e profundidade dos estudos, das medidas mitigadoras e compensatórias, das
modalidades e do alcance das consultas públicas etc. Mas a principal decisão diz
respeito à aprovação do projeto em análise e às condições para sua implementação.
Assim, configura-se “um a sucessão de decisões parciais que conduzem a um a tomada
final de decisão” (André et al., 2003, p. 158).

A lgum as decisões são tomadas basicamente pelo proponente (que, frequentemente, é


auxiliado por um consultor), como aquelas relativas à formulação de alternativas e
escolha entre elas. Outras resultam da interação entre o proponente, seu consultor e
a autoridade reguladora, às vezes incluindo o público, como os term os de referência
para a condução de um EIA. Durante a realização dos estudos, tom am -se várias
decisões sobre a necessidade de medidas mitigadoras ou acerca de modificações de
projeto que possam reduzir a m agnitude ou a im portância dos impactos adversos.
Essa, aliás, é um a das partes mais ricas do processo de avaliação de impactos, na
qual a AIA é usada como aux iliar no planejamento de projetos, mas ela muitas vezes
se dá no âmbito privado, em reuniões, discussões (e mesmo disputas) entre o propo­
nente, o projetista e o consultor ambiental, e somente os resultados vão a público por
intermédio do EIA. *

Outras decisões decorrem ainda de negociação com as partes interessadas, como os


program as de compensação. Contudo, a decisão mais im portante é tomada ao final
do processo: a aceitação ou a recusa do projeto. Na verdade, essas duas alternativas
extrem as são raras, e na situação mais usual as questões a serem decididas dizem
respeito às condições para a realização do projeto. Em certos casos, tais condições p o ­
dem s e rtã o severas que implicam custos elevados e levam à desistência do projeto. Em
seu exam e comparativo de procedimentos de AIA em diversos países desenvolvidos,
Wood (1995, p. 183) notou, a respeito do balanço entre objetivos de proteção ambiental
e benefícios econômicos e sociais que norteia a maioria das decisões, que “é provável
(...) que os tomadores de decisão tendam a aprovar a ação, a menos que haja razões
politicamente avassaladoras para recusá-la, mas negociem melhorias nos benefícios
e maior mitigação dos impactos negativos”.

Finalmente, não se pode esquecer que outras decisões são tomadas após a aprovação
do projeto, durante sua implantação e, posteriormente, na fase de funcionamento.
Os resultados do m onitoram ento ambiental e dos program as de acom panham ento
podem levar a novas modificações de projeto ou à necessidade de novas medidas
mitigadoras, caso sejam detectados impactos significativos não previstos.

Trata-se, portanto, de decisões múltiplas e seqüenciais, em que se sobressai a decisão


sobre a aprovação do projeto.

17.1 M o d a l i d a d e s d e p r o c e s s o s d e c is ó r io s
0 poder decisório acerca dos empreendimentos sujeitos ao processo de AIA varia
entre um a jurisdição e outra. Há locais em que a decisão compete a um a autoridade
ambiental; em outros, a competência é de um a autoridade setorial - autoridade cuja
competência abarca um setor da atividade econômica, por exemplo, o setor energético

CAPÍTU LO
A Tom ada de D e c is ã o n o P ro c e s s o de A v a lia ç ã o de Im p a c to A m b i e n ^ M 429

ou o setor florestal. Há ainda as jurisdições nas quais as decisões são formalmente


tomadas por instâncias governamentais que congregam diferentes interesses, como
conselhos de ministros. Qualquer que seja a modalidade, a decisão é tomada direta­
mente por representantes políticos (ministros) ou é delegada a altos funcionários
indicados politicamente. Para dar maior credibilidade ao processo, alguns países,
como Holanda e Canadá, entregam a análise do EIA e a consulta pública a organismos
independentes, cujos integrantes têm autonomia e mandatos fixos, sendo inamovíveis
durante o mandato.

O tomador de decisão político certamente não irá ler a totalidade do estudo de impacto
ambiental, seus anexos e documentos complementares. Sua decisão será baseada em
informações prestadas por assessores e eventualmente em pressões políticas visando
promover interesses quase sempre contraditórios (conforme seção 14.1).

Na verdade, embora a formalidade do processo decisório seja sem dúvida importante


para a eficácia do processo de AIA, o mais relevante é seu aspecto substantivo. Dito em
outras palavras, a questão-chave é se as conclusões da AIA são realmente refletidas nas
decisões tomadas. Muitos autores apontam essa questão como central, por exemplo, Lee
(2000b) aponta as evidências de fraca integração dos resultados do processo de AIA
às decisões tomadas, particularm ente nos países menos desenvolvidos.

O C A S O A M E R IC A N O
0 caso americano é sempre uma referência nos estudos sobre AIA, devido ao pionei-
rismo da Nepa, a National Environmental Policy Act. Segundo essa lei, são as agências
do governo federal as responsáveis pela condução do processo de AIA e também
as responsáveis pela tomada de decisão1. Estas podem ser as próprias promotoras 1Le/s estaduais
americanas podem
do projeto (principalmente obras públicas), provedoras de fundos ou financiadoras
diferir bastante da
(por exemplo, para a construção de conjuntos habitacionais), ou podem ter atribuição lei federal quanto
de autorizar projetos privados, em*virtude de outras leis. Assim, em muitos casos, o às modalidades
tomador de decisões é o próprio interessado na aprovação e execução do projeto ou de decisão, dentre
programa, característica que propicia severas críticas à lei americana, vista como outras diferenças.
exercendo “influência limitada sobre as decisões” (Ortolano, 1997, p. 325).

Nos EUA, a Agência de Proteção Ambiental (EPA - Environmental Protection Agency)


tem função de analisar todos os EIAs e emitir um parecer, mas não tem poder deci­
sório nem de veto. 0 Conselho de Qualidade Ambiental pode ser acionado em caso
de discordância da EPA ou de qualquer outra agência federal, mas seus pareceres
tampouco são compulsórios. Entretanto, quando ocorre discordância intragoverna-
mental, a própria ameaça de levar o caso para aquele Conselho tem sido um estímulo
para que se chegue a um acordo (Wood, 1995).

Mesmo assim, a Nepa parece ter tido significativa influência sobre a maneira como
os projetos são formulados, e principalmente sobre a transparência do processo deci­
sório, dado o caráter público dos documentos que integram o processo de AIA, as
oportunidades de consulta e manifestação públicas, e o controle judicial exercido
pelos tribunais, com sua interpretação muito estrita de que todos os procedimentos
estabelecidos pela Nepa devam ser rigorosamente cumpridos (Kennedy, 1984).

SETE
430 « ü a l i a c ã o de Impacto A m biental: conceitos e métodos

0 procedimento americano é essencialmente de autoavaliação, cabendo a decisão às


agências setoriais ou responsáveis pela gestão de terras públicas. No caso de projetos
privados, os proponentes submetem seus projetos e seus estudos, mas é a agência
que o autoriza que tem a obrigação legal de preparar o EIA e submetê-lo à consulta
pública. São os dispositivos legais que asseguram transparência e a possibilidade de
controle do público, de controle judicial e de controle administrativo, exercido por
outras agências, os que dão coerência ao processo. A regulamentação do CEQ sobre os
estudos de impacto ambiental de 1978 contribuiu para essa coerência, ao estipular a
obrigatoriedade de publicação de um registro de decisão (Record Of Decision — ROD),
documento público no qual a agência que conduz o processo [lead agency) deve expli­
citar as razões de sua decisão, apresentar as medidas mitigadoras e o program a de
monitoramento que serão adotados.

O CASO CANADENSE
0 processo federal canadense é também, essencialmente, de autoavaliação. Cada m inis­
tério deve exam inar suas atividades e enquadrá-las segundo os critérios de avaliação
ambiental estabelecidos pela lei —a Lei Canadense de Avaliação Ambiental (Canadian
Environmental Assessment Act, Loi Canadienne d’Evaluation Environnementale, de
1993). Na maior parte dos casos, a decisão é tomada no âmbito de cada “autoridade
responsável”, mas somente após cumprido tc\do o procedimento estabelecido pela
lei e seu regulamento e depois de observadas até as provisões de consulta pública.
/

E interessante notar que a lei se aplica a toda a administração federal, incluindo os


ministérios com competências ambientais, como o Ministério de Parques Nacionais
e o Ministério do Meio Ambiente, cujas ações, evidentemente, também podem ter
impactos adversos significativos. A Agência Canadense de Avaliação Ambiental
(ACAA) deve ser notificada de todo procedimento executado em observância da lei,
e tem a atribuição de manter um registro público de todas as avaliações ambientais.
Naturalmente, os projetos privados também estão sujeitos ao processo, bastando para
isso que necessitem de uma autorização federal ou demandem fundos federais.

Segundo a lei canadense, um a decisão somente pode ser tomada após o término da
avaliação ambiental (Art. 13). A decisão quanto à execução do projeto é tomada pela
autoridade responsável (Art. 37), “levando em conta a aplicação das medidas mitiga­
doras”. 0 projeto poderá ser aprovado no âmbito da autoridade responsável se “não
for provável que cause efeitos ambientais adversos significativos” ou mesmo “se pu­
der causar efeitos ambientais adversos signi ficativos que possam ser justificados nas
circunstâncias”. Em todos os casos, a autoridade responsável deve assegurar que as
medidas mitigadoras sejam aplicadas.

0 ministro de Meio Ambiente tem um papel importante em iniciativas de impacto


potencial significativo, que demandam a realização de um estudo aprofundado
(conforme seção 5.3). Nesses casos, após análise da ACAA, o ministro decide se
devolve o processo para a autoridade responsável (para possível implementação) ou
se é necessário um exame mais cuidadoso, por meio de uma comissão (panei rçview)
ou um mediador. Nessa hipótese, a ACAA estabelece os termos de referência para
a comissão (ou para o mediador), e o ministro designa os membros da comissão ou
escolhe um mediador2. Concluídos os trabalhos, a comissão ou o mediador preparam

CAPÍTU LO
A Tom ada de D e c is ã o n o P ro c e s s o de A v a lia ç ã o de Im p a c to A m b i f n I M í 431

um relatório público contendo recomendações, que a autoridade responsável, aliás, 2Vale dizer que,
não é obrigada a acatar. Em caso de desacordo, porém, 0 assunto é levado para um a embora prevista
decisão no âmbito do Conselho de Ministros (cabinet) (Wood, 1995). em lei, a mediação
não vem sendo
utilizada.
O CASO HO LANDÊS
Também nos Países Baixos, a autoridade competente para tomar decisões em matéria
ambiental pode ser 0 proponente do projeto (caso de obras públicas), mas uma
decisão provisória é frequentemente modificada como resultado das recomendações
da Comissão de Avaliação de Impacto Ambiental e da participação do público
(Wood, 1995).

Essa comissão, independente e permanente, é um dos traços marcantes do proce­


dimento holandês. Ela é consultada para a preparação dos termos de referência e
para a análise técnica do EIA, mas não tem poder decisório, que é sempre da auto­
ridade competente. Entretanto, sua independência é um a garantia de credibilidade e
de “transparência do processo decisório”, no entendimento de um a outra comissão,
temporária, 0 comitê de avaliação dos resultados do processo de AIA (Evaluation
Committee, 1996). A atuação da Comissão de AIA é vista como trazendo resultados
concretos em termos de “melhoria da qualidade da informação usada na AIA, valori­
zação do conteúdo científico, redução de parcialidade e realce da importância da AIA
para 0 processo decisório” (Idem).

A Comissão de Avaliação de Impacto Ambiental atua com um grupo de comissários


e uma secretaria executiva que congrega pessoal técnico e administrativo; para rea­
lizar seu trabalho, também utiliza os serviços de consultores externos3. Seu papel 3A Comissão tem
no processo de AIA é 0 de fazer recomendações quanto aos termos de referência dos estatuto jurídico
EIAs e de analisar esses estudos, após a análise feita pela autoridade competente. de fundação
Assim, somente depois que 0 EIA% é tido como aceitável pela autoridade que detém 0 privada, mantido
poder de decisão é que será encaminhado para nova apreciação da Comissão. A lei com subsídios
go vernamenta is;
determina que a autoridade competente é “obrigada a incorporar as conclusões do
suas atribuições
EIA e do parecer da Comissão” (Wood, 1995, p. 189). são estabelecidas
na Lei de Gestão
Os relatórios da Comissão são públicos e contêm recomendações quanto à aceita­ Ambiental (Ceia,
bilidade do EIA como fundamento para a tomada de decisão. Para cada análise é 2002b).
montado um grupo de trabalho, que frequentemente inclui consultores externos
e cuja composição é submetida à autoridade competente, que tem 0 direito de fazer
objeções quanto à composição do grupo, “caso tenha boas razões para duvidar de sua
imparcialidade” (Ceia, 2002b). A Comissão também atua em projetos de cooperação
internacional nos quais 0 governo holandês seja doador.

0 C A S O FR A N C Ê S
A decisão pela própria parte interessada é também objeto de crítica no sistema francês.
Os estudos de impacto são analisados por serviços administrativos dependentes de
ministérios setoriais, tendo 0 Ministério do Meio Ambiente somente uma participação
restrita. 0 país não é regido por um sistema federativo, mas por um governo central
que atua em subdivisões administrativas denominadas departamentos (départements),
através de um adm inistrador nomeado chamado prefeito [préfet). Esse administrador
432 |R Q a lia ç ã o de Im pacto A m b ie ntal: conceitos e métodos

coordena os serviços departamentais dos ministérios e tem a atribuição de conceder


autorizações (licenças) para novos empreendimentos. Há certas exceções; porém, em
geral, um serviço departamental setorial recebe e analisa um EIA, recomendando
sua aprovação ou sua rejeição, normalmente com condicionantes, ao prefeito, que é
a autoridade competente para emitir a autorização. A consulta pública deve preceder
a tomada de decisão.

Uma particularidade do procedimento francês é que os mesmos tipos de autorização


previamente existentes (para certos empreendimentos, desde 1917) continuaram em
vigor depois da introdução da exigência de apresentação de um estudo de impacto
em 1976. Ademais, nenhum a nova instituição foi criada para gerir o processo de AIA
e monitorar seus resultados, mantendo-se o status quo e as competências decisórias.

17.2 M o d e l o d e c is ó r io n o B r a s il
A legislação brasileira atribui inequívoco poder de decisão aos órgãos ambientais.
0 licenciamento ambiental é sempre feito por um órgão (federal, estadual ou municipal)
integrante do Sisnama - Sistema Nacional do Meio Ambiente, introduzido pela Lei
n° 6.938/81, da Política Nacional do Meio Ambiente. A avaliação de impacto ambiental
está integrada ao licenciamento e cabe àquele que licerítia decidir pelo tipo de estudo
ambiental necessário, estabelecer seus procedimentos internos (respeitadas as normas
gerais estabelecidas pela União) e seus critérios de tomada de decisão.

A decisão pode ser tomada diretamente pelo órgão licenciador, como ocorre com o
licenciamento federal (Ibama) em certos Estados, ou por colegiados que contam com
representantes de diferentes segmentos da sociedade civil, além de representantes
governamentais — os conselhos de meio ambiente. Esta última modalidade é usada
em alguns Estados, como São Paulo, Bahia e Minas Gerais, e por diversos municípios.

A decisão mediante colegiados significa a busca de um certo consentimento por


parte da sociedade, representada nesses conselhos por organizações não governa­
mentais ambientalistas, associações profissionais, associações empresariais e outras
representações. Embora o parecer resultante da análise técnica realizada pela equipe
de analistas do órgão ambiental pareça prevalecer como fundamento da decisão,
os conselheiros podem impor ou negociar condições adicionais para a licença, ou
podem, ocasionalmente, divergir do parecer técnico. Por exemplo, em ju lh o de 1994,
ao discutir um projeto de implantação de um a pedreira no município de Barueri,
situado na região metropolitana de São Paulo, proposta para um local designado
como zona de exploração mineral no plano diretor municipal, os conselheiros do
Consema (Conselho Estadual do Meio Ambiente), pela primeira vez, votaram contra
um parecer favorável preparado pela equipe técnica da Secretaria do Meio Ambiente.

A vinculação da AIA ao licenciamento ambiental confere grande poder aos órgãos


governam entais encarregados da proteção ambiental. Com efeito, a Lei da Política
Nacional do Meio Ambiente, ao atribuir a tarefa de licenciamento primordialm ente
aos Estados (conforme seção 3.2), obrigou aqueles que não dispunham de órgãos
ambientais a se aparelharem , criando novas instituições ou adaptando organismos
já existentes.

CAPÍTU'LO
A Tomada de D ecisão no P rocesso de A valiação de Impacto A mbien

Nesse contexto, a função dos estudos ambientais é principalmente a de dem onstrar


a viabilidade ambiental do projeto em análise, supondo que a viabilidade econômica
e a exequibilidade técnica tenham sido comprovadas ou sejam decisões tomadas
exclusivamente na esfera privada. Não é raro, todavia, principalmente para projetos
públicos, que a viabilidade econômica ou a própria utilidade pública do projeto seja
contestada por intermédio do processo de AIA. Tal processo muitas vezes se transfor­
ma no locus de um debate público sobre a viabilidade e a sustentabilidade, vistas sob
enfoques múltiplos (sociais, econômicos, políticos, culturais). Por exemplo, o projeto
de melhoria das condições de navegação na hidrovia P arag u ai-P aran á foi duram ente
criticado não só por seus prováveis impactos sobre o Pantanal, mas tam bém por sua
viabilidade econômica (Cebrac/ICV/WWF, 1994), seus custos ambientais (Bucher e
Huzsar, 1995) e a severidade dos impactos socioambientais (Bucher et al., 1994).
Também o projeto de transposição das águas do rio São Francisco para bacias do
semiárido nordestino foi criticado não apenas por seus impactos ambientais, mas
tam bém com base em sua (in)viabilidade econômica (Silva et al., 2005).

17.3 D e c is ã o t é c n i c a o u p o l í t i c a ?
Há uma percepção recorrente em certos círculos de que as decisões baseadas no
processo de AIA seriam muitas vezes tomadas por motivações políticas em vez de
serem baseadas em critérios técnicos. Assim, empresários frequentemente reclamam
que os interesses que se m anifestam com maior visibilidade em audiências públicas
ou aqueles mais “ruidosos” pesam mais na decisão, enquanto associações da
sociedade civil desconfiam que o poder econômico das corporações é muito mais
influente que a pressão popular. Quando há um a disputa polarizada, envolvendo um
campo nitidam ente contrário a um projeto em oposição a outro campo favorável,
parece inevitável que o perdedor lamente que seus argum entos — indiscutivelmente
razoáveis - tenham sido preteridos por razões “políticas”. Até que ponto há fu n d a­
mentação em tais queixas? As decisões devem ser tomadas exclusivamente com base
em informações técnicas apresentadas nos estudos ambientais? Devem ser baseadas
/

em considerações políticas? E preciso clarificar o sentido desses termos para entender


o processo decisório.

Nesta seção, a análise ficará restrita à decisão pública, tomada ao final do processo de
AIA, de autorizar ou não a iniciativa proposta. No caso, um agente público é inves­
tido do poder decisório, e está obrigado a observar todos os princípios que norteiam
a gestão pública, como a impessoalidade e a moralidade. Ademais, sua decisão esta­
rá sujeita ao controle exercido no âmbito da adm inistração pública, até ao controle
judicial. Assim, toda decisão deve ser devidamente motivada e fundam entada. Em
matéria ambiental, o poder público deve tam bém observar outros princípios, como o
da precaução e o da prevenção.

Poucos duvidam que a decisão deva ser racional, mas raram ente há acordo sobre os
princípios e critérios que devam norteá-la. Fundam enta-se em um a racionalidade
econômica ou ecológica? Deve-se privilegiar os benefícios de curto prazo em detri­
mento dos custos de longo prazo? Questões de natureza ética - como os direitos das
futuras gerações - devem ser consideradas? (Pearce, 1983).
434 Av aliação de Im p a cto A m b ie n ta l: conceitos e m étodos

P ara Godelier (1983, p. 114),


a racionalidade intencional do comportam ento econômico dos membros de uma
sociedade se inscreve (...) sempre em um a racionalidade fundamental, não in­
tencional, da estrutura hierarquizada das relações sociais que caracterizam essa
sociedade. Não há, portanto, um a racionalidade econômica ‘em si’, nem, de forma
definitiva, ‘modelo’ de racionalidade econômica.

O autor usa um a perspectiva antropológica para relativizar as escolhas racionais da


sociedade, arg u m en tan d o que toda racionalidade é socialm ente determ inada.

Em tal contexto, as decisões têm intrínseca e inevitavelm ente um caráter político,


no sentido de que afetam ou modificam o status quo. Um novo projeto que acarrete
impactos significativos necessariam ente irá m ud ar um a situação preexistente e,
portanto, afetar interesses. Haverá setores, grupos ou pessoas que se beneficiarão
com a nova situação, ao passo que outros serão prejudicados, e isso necessariam ente
implica um a decisão política - toda redistribuição é um a decisão política.

Embora o term o “decisão política” seja desconfortável para muitos profissionais que
têm formação técnica ou científica - como é o caso daqueles que preparam os estudos
de impacto ambiental e dos que elaboram os projetos de e n g e n h aria —, não deve ser
assimilado a um a política p artidária ou a alg um a “politicagem ” de interesses m es­
quinhos e imediatistas, embora esses aspectos às vezes se apresentem nas decisões.
Mesmo a subjetividade da AIA ou de partes do EIA, tão deplorada por muitos técn i­
cos e cientistas naturais, e que é vista como “inevitável” pela maioria dos autores,
aparece, p ara alguns, como um a característica desejável (Wilkins, 2003).

W iklund (2005) entende que o processo de AIA tem grande potencial de fortalecer um
“estilo decisório deliberativo”, entendido como um diálogo não coercitivo que p erm i­
te legitim ar as decisões, ao possibilitar que os cidadãos ten h a m suas opiniões ouvidas
e consideradas, o que envolve “buscas coletivas de interesses com uns e negociação
entre interesses privados conflituosos” (p. 284). De fato, o processo de AIA possibilita
que os conflitos, as dem andas e as reivindicações ganhem visibilidade e ressonância
na esfera pública, no sentido atribuído por Haberm as (1984), o de um espaço público
político acessível aos argum entos e ao uso público da razão, em que se torna po s­
sível “um a política deliberativa” (Wiklund, 2005). É disso que efetivam ente se trata
quando se deve tom ar decisões sobre projetos que causem impactos significativos,
nas quais os ônus e os benefícios são desigualm ente distribuídos, até entre gerações
presentes e futuras.

Outros autores têm caracterizado a AIA como um a ferram enta ou como um processo
4“Resolver depois de deliberativo que tem potencial de m elhorar o processo decisório em matéria ambiental
exame e discussão’’ (Petts, 2000), ou ainda como um “fórum que promove o discurso” (Wilkins, 2003), o
(Novo Dicionário que, por sua vez, é tido como um “procedimento deliberativo ideal” (Wiklund, 2005).
Aurélio da Língua
Portuguesa,
Os conceitos de deliberação e de democracia deliberativa são empregados por esses autores
1986). “Decidir
com um a conotação mais restrita que o uso vernáculo do verbo deliberar4. Considerando
após reflexão e/
ou co nsu ltas’’ que conflito e desacordo são inerentes à democracia e que têm como causa não apenas
(Dicionário interesses econômicos ou pessoais, mas tam bém razões de natureza moral, Gutm ann e
Houaiss da Língua Thompson (1996, p. 52) afirm am que “a disposição de buscar razões m utuam ente j u s ­
Portuguesa, 2001).

CAPITU
A T o m a d a de D e c is ã o n o P r o c e s s o de A v a l ia ç ã o de I m p a c t o A m b ie n í H W 435

tificáveis exprime o coração do processo deliberativo”. De acordo com Wiklund (2005),


os diversos modelos de democracia deliberativa (um dos quais o de Habermas) têm em
comum a ênfase na importância da “voz” ou do discurso, instrumento por excelência de
construção de consensos e da busca de soluções socialmente aceitáveis 5. 5Alguns
empresários e
Não se trata de uma visão ingênua ou idealizada de que os cidadãos passam a ter dirigentes de
empresas têm
um poder real de influenciar as decisões por meio do processo de AIA, tampouco
muita dificuldade
de atribuir ao cidadão e à sociedade civil o lugar de um “macrossujeito”, mas, como em compreender
aponta Habermas (1997), quando problemas relevantes são identificados e debatidos ou admitir que
na esfera pública, os cidadãos “podem assum ir um papel surpreendentemente ativo a oposição a
e pleno de conseqüências”. Se a capacidade dos cidadãos de influenciar a decisão seus projetos
possa ter algum
pode ser limitada, não se pode negar sua capacidade de reorientar os processos de
fund am en to ético
tomada de decisão no âmbito da avaliação de impacto ambiental. Muitas dificuldades ou moral, sempre
e limitações são amplamente reconhecidas e regularmente reportadas e discutidas na desconfiando que os
literatura (conforme seção 16.4) - algumas serão retomadas na próxima seção - , mas opositores estejam
é notável que são muitas as ocasiões em que o potencial da AIA de produzir melho- a “serviço de
/

res decisões se realiza. E estudando esses casos que se pode identificar as condições interesses escusos
e não declarados”,
que contribuem para o sucesso e a eficácia do processo de AIA, de modo a tentar
que busquem uma
reproduzi-las para novos casos. autopromoção que
lhes possa render,
1 7 .4 N e g o c ia ç ã o posteriormente,
alguma vantagem
Se há conflito, deve haver negociação ou, pelo menos, diálogo em torno das
pessoal, ou mesmo
divergências. A negociação é um a característica inerente ao processo de AIA, que ajam a soldo de
aliás, é uma das funções da AIA (Sánchez, 1995a). Há negociação entre consultor concorrentes.
e proponente, e entre ambos e projetista, acerca de características de projeto, como
localização e arranjo físico das instalações (layout), alternativas de mitigação, alter­
nativas tecnológicas, possibilidades técnicas e custos para se evitar certos impactos
e muitos outros tópicos. Tais negociações raramente transparecem para os demais
envolvidos no processo de AIA, não são feitas na esfera pública, mas podem ter
grande influência sobre a viabilidade ambiental do empreendimento.

Há, também, negociação entre proponente e consultor com o órgão gestor do processo
de AIA, com relação aos termos de referência do estudo e, em certa medida, muitas
vezes pode haver negociação acerca das complementações necessárias para a completa
análise da viabilidade do projeto. Nesse âmbito, também costumam ocorrer negociações
sobre mitigação e compensação, e pode haver negociação sobre alternativas e modifi­
cações de projeto que possam resultar em ganhos ambientais, trazendo para o âmbito
governamental discussões que antes se davam somente na esfera privada.

Negociar, indubitavelmente, faz parte do relacionamento humano, no âmbito pessoal,


interpessoal, social e político; mas as negociações em torno de conflitos ambientais
tendem a ser especialmente difíceis, pois tais conflitos são, muitas vezes, de maior
complexidade que os oriundos de outras fontes. Bingham (1989, p. 21) aponta as
seguintes particularidades dos conflitos ambientais:
# envolvem múltiplas partes;
# envolvem organizações, não indivíduos;
# envolvem questões múltiplas;
436 Avaliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

# a “solução” de uma das questões de forma individual pode dificultar a “solução”


das demais;
# as questões em jogo requerem conhecimentos técnicos e científicos;
# muitas vezes não há consenso entre técnicos e cientistas sobre a interpretação
das questões em jogo;
# as partes têm acesso desigual à informação técnica e científica;
% as partes têm acesso desigual à decodificação da informação técnica e científica.

Além dessas características, as controvérsias de ordem ambiental não poucas vezes


envolvem conflitos de valor ou objeções de cunho moral (Crowfoot e Wondolleck,
1990). 0 único rio livre (sem barramentos) de um a região deveria ser represado?
Deveria ser mantido em estado selvagem para deleite das futuras gerações ou para
pesquisas em ciências naturais? Deveria ser permitida a extração de minério em um a
região particularm ente rica em termos de biodiversidade?

No caso de Kakadu, na Austrália (Fig. 1.1), onde pontos de vista econômicos,


ambientais e culturais estavam em conflito, um a pesquisa revelou que os austra­
lianos estavam dispostos a pagar para que não houvesse novos empreendimentos de
mineração na zona de amortecimento do Parque Nacional, que acabou sendo incor­
porada ao parque6.

N egociação direta
6“A Priee on the Ainda que intrínseca ao processo de AIA, a negociação nem sempre é explícita
Priceless”, The
(ou formal), e poucas vezes é estruturada com vistas a atingir um a solução aceitável
Economist, 17 ago.
1991, e Resource para as partes em conflito. As condições comumente apontadas para o início de uma
Assessm ent negociação formal são:
Commission, 1991. % definição clara do conflito;
# que as partes estejam dispostas e prontas para negociar;
# que as partes sejam interdependentes, ou que nenhuma delas possa, unilateral-
mente, atingir seus objetivos.

Gorczynski (1991) entende que há permanente negociação ambiental, mas nem sempre
de caráter formal (atendendo aos requisitos acima). Muitas negociações são informais
e ocorrem até à revelia do proponente do projeto. Quando os conflitos estão am adu­
recendo, “seria um erro monumental presumir que nenhum a negociação importante
está acontecendo (...) ambos os lados estão explorando e testando o outro (...) para
ver até onde este é capaz de ir” (p. 14). Em um a negociação formal, o negociador
Gorczynski ironiza que “ambos os lados concederam ao outro a suprema condescen­
dência de concordar em negociar”.

“Um pré-requisito de toda negociação é que as partes aceitem negociar. Isso impli­
ca o reconhecimento da legitimidade da outra parte” (Sánchez, Silva e Paula, 1993,
p. 489), o que nem sempre é fácil de conseguir. Entretanto, um fator que impulsiona
a negociação é a ameaça de uma disputa judicial, que pode ser longa e, se for até o
fim, resultar em uma parte ganhadora e outra perdedora. Para disputas ambientais, o
leque de opções é muito pobre, um “jogo de soma nula” no qual há necessariamente
um vencedor e seu corolário, o derrotado. A negociação, ao contrário, torna possível

CAPÍTU!L0
A T o m a d a de D e c is ã o n o P r o c esso de A v a l ia ç ã o de I m p a c t o A m b i e n 437

que as partes envolvidas em uma disputa possam ter algum ganho, através de um
“uso produtivo do conflito” (Bape, 1986).

Quando um grupo de cidadãos vê que um a ameaça a seus interesses ou seus valores


possivelmente emerge de um projeto público ou privado, pode usar diversas estra­
tégias para reagir. Barouch e Theys (1987) mapeiam os tipos de reação, como uma
“indignação moral” que desemboca em um a oposição ferrenha, por princípio avessa
a todo tipo de negociação, e fundada sobre princípios morais ou éticos; reação muitas
vezes rebatida com outros argumentos morais, como a defesa do emprego. Uma
postura de “resignação razoável” reconhece um a relação de forças frequentemente
desfavorável aos ideais conservacionistas, e por isso avança argumentos pragmáticos,
como o valor econômico e o uso sustentável dos recursos ambientais. Os que aí se
posicionam “reivindicam que a negociação seja colocada unicamente no terreno da
racionalidade” (p. 4). Barouch e Theys entendem que “legitimação por competência” é
um a estratégia eficaz, por se situar em um campo familiar ao proponente do projeto.
Demonstrar competência técnica “em 90% dos casos funciona melhor que a legitima­
ção ética” (p. 8).

Os pesquisadores que se filiam à escola da economia ecológica desenvolvem vários


trabalhos nessa linha (Costanza, 1991), como a estimativa de que o valor global dos
serviços ambientais fornecidos pela natureza se elevaria a cerca de US$ 33 trilhões
por ano (em valores de 1998), cerca do dobro da soma dos produtos nacionais brutos
de todos os países do globo naquele ano (Costanza et al., 1997). Balmford et al. (2002)
defendem que mais benefícios econômicos podem ser obtidos da conservação dos
hábitats naturais que de sua conversão a outras formas de uso, e que o benefício de
“um programa global de conservação dos remanescentes naturais” seria cem vezes
maior que os custos.
%
Para os empreendedores, a oposição ambientalista é muitas vezes descrita com adje­
tivos como “radical”, “poética”, “irrealista” e as ONGs podem ser classificadas como
“opositoras” ou “construtivas”, aquelas que colaboram. Os empreendedores, por sua
vez, distribuem-se em um largo espectro, representando interesses privados ou
empresas estatais, na qualidade de diretores regiamente pagos, de sclf-made men ou
de subalternos que representam interesses dos patrões. Seu discurso na atualidade
vai da responsabilidade social e da contribuição ao desenvolvimento sustentável aos
jargões de antigamente, em que ainda imperam palavras de ordem como “progresso”
e “pagamento de impostos”, além da “geração de empregos”.

Gorczynski sugere que o negociador sério deve compreender bem o que pensa seu
adversário, mas na negociação formal boas maneiras imperam: “é contraprodutivo e
tolo ridicularizar seu oponente e persistir em distorcer suas posições se ele mostrou a
cortesia e o respeito de concordar em negociar com você” (p. 15). Mas o autor, como
arguto observador, jocosamente traça caricaturas dos principais protagonistas. Como
toda caricatura, as características exacerbadas parecem ajudar a compreender melhor
a personagem: os empreendedores se acham “os verdadeiros heróis deste m undo”,
cujos esforços “criam riqueza e empregos e os incontáveis benefícios da moderna
civilização”; já os ativistas “acreditam estar imbuídos de um a missão divina (...) e
buscam perfeição e pureza e não compromisso e vitória”; engenheiros são uma lástima

DEZESS ETE
438 ^ ^ a l i a ç ã o de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

em negociações “e falam um a linguagem que 99% da raça hum ana não consegue en­
tender”, usando somente um dos hemisférios de seu cérebro, o lógico e analítico; eles
e seus colegas cientistas “sentem-se superiores ao restante dos mortais por ter um
conhecimento especial que os demais não têm”; os advogados são como “os pistolei­
ros de aluguel do velho Oeste”; já os políticos “não sabem sobre o que estão falando
durante 90% do tempo”; quanto aos jornalistas, devem ser tratados “como pessoas
arm adas” que podem atirar contra você; finalmente, quanto aos burocratas, deve-se
saber por que escolheram esse serviço, já que a maneira de tratá-los vai depender
de sua motivação. Na negociação direta, conhecer o perfil dos interlocutores e saber
antecipar suas jogadas é uma arte.

A negociação direta envolve estratégia e tática. Parte da estratégia é identificar e


compreender os interesses, entendidos como as “necessidades que têm as partes”.
Em um a disputa, os interesses estão frequentemente escondidos atrás de posições,
7A inspiração que são “preferências substantivas verbalizadas”7. As posições fazem parte do dis­
e os conceitos curso das partes em litígio, mas podem ser meras peças de retórica. Os interesses
apresentados nesse podem ser (1) substantivos (referentes ao conteúdo de uma decisão); (2) processuais
parágrafo e nos (referentes às formas e mecanismos através dos quais as decisões são tomadas); ou
seguintes vêm
(3) psicológicos (referentes à forma como as pessoas se sentem tratadas nas nego­
de uma oficina
sobre Effective ciações). Descobrir quais os reais interesses das outras partes já sinaliza quais são
Negotiation as possíveis soluções. Um líder comunitário pobe posicionar-se contra um projeto
ministrada por porque sua possível realização não lhe foi comunicada antes das demais pessoas e
Christopher W. diretamente pelo empreendedor (interesse psicológico), porque a comunidade não foi
Moore, em setembro consultada (interesse processual) ou porque acredita que seu grupo será excessiva e
de 1995, em Chiang injustamente prejudicado com a implantação do projeto (interesse substantivo).
Mai, Tailândia,
no âmbito do
Programa Lead Os estilos de negociação variam entre a discussão sobre posições (positional bargaining)
(Leadership f o r e a negociação sobre interesses. No primeiro tipo, a conversa já começa com um a
Environment and solução, expressa por meio de posições e ofertas, continuando com um a contraoferta
Development). da outra parte. 0 processo assemelha-se ao ato de pechinchar no mercado. Suares
(1996) denomina a discussão sobre posições como “modelo distributivo ou conver­
gente”, na medida em que se tenta convergir para algum acordo situado em um ponto
intermediário entre as posições iniciais.

A negociação com base em interesses visa manter boas relações duradouras; as partes
“educam” as outras sobre suas necessidades, justificam suas posições e tentam, juntas,
encontrar ou desenvolver soluções aceitáveis para todos. A modalidade permite
explorar opções, que são soluções potenciais que atendem a um ou mais interesses.
0 autor chama a negociação sobre interesses de “modelo integrativo ou de ganho
m útuo”, no qual ambas as partes podem sair ganhando. Pode-se gerar várias opções,
avaliar cada um a delas (até que ponto elas atendem aos interesses ou necessidades
das partes) e selecionar as mais viáveis. É tam bém um processo mais demorado e
que pode dem andar recursos, no mínimo o tempo despendido nas negociações e na
preparação para os encontros. A negociação termina, após acordo, com um plano de
implementação.

No mundo real, essas duas modalidades não são escolhidas antes, como se escolhem
as arm as em um duelo cinematográfico. A parte mais experiente pode tentar conduzir
a negociação de um duelo sobre posições para um diálogo sobre interesses. Assim,

CAPITU
A T o m a d a de D e c is ã o n o P ro c e s s o de A v a lia ç ã o de Im p a c to A m b ie m í w M 439

não responder a um posicionamento retórico com outra declaração de efeito, identi­


ficar e declarar os pontos comuns em vez de salientar as diferenças, buscar primeiro
um acordo sobre as questões mais fáceis, sugerir o hipotético atendimento de deter­
minada reivindicação para explorar opções que se seguiriam são algumas táticas que
podem ser usadas no curso de uma negociação.

N egociação assistida
A negociação entre partes em conflito pode ser facilitada por meio da participação de
especialistas. Métodos alternativos de resolução de disputas têm sido usados em vários
casos de conflitos ambientais, porém com aparente predominância em situações já
estabelecidas, quando já ocorreram impactos ou danos, ou quando um dano é imi­
nente. Uma provável razão para isso decorre do fato dos empreendimentos em fase
de avaliação prévia serem, justam ente, apenas projetos de situações potenciais e não
ainda concretas.

Não obstante, métodos alternativos de resolução de disputas encontram aplicação em


AIA, particularm ente onde as disputas judiciais são freqüentes, como nos Estados
Unidos (Bingham e Landstaff, 1997). 0 processo de AIA oferece diversas oportuni­
dades para negociação, e muitas vezes a autoridade responsável ou a que promove a
consulta pública pode atuar como facilitadora da negociação (mas raramente a auto­
ridade com poder decisório). Essa última modalidade é exemplificada pela atuação do
Bureau dAudiences Publiques sur l’Environnement (Bape) do Quebec (conforme seção
16.5), que, ao invés de realizar um a consulta ampla e aberta a todos, pode decidir por
usar uma modalidade de negociação, a mediação. A experiência desse organismo é de
um processo de mediação “menos conflituoso que a audiência pública” e que “favo­
rece um a melhoria dos projetos, ao mesmo tempo em que respeita as expectativas e
as restrições de todas as partes envolvidas” (Bape, 1994, p. 14).
*
Mediação é definida como “modo amigável de resolução de litígios no qual um
terceiro é encarregado de propor às partes uma solução para as suas desavenças”.
É uma modalidade de negociação que se diferencia da conciliação, definida como
“modo amigável de resolução de litígios no qual as partes tentam se entender direta­
mente, se necessário com a ajuda de um terceiro, para encerrar suas desavenças”. A
diferença entre conciliação e mediação é que um terceiro não necessariamente inter­
vém naquela, ao passo que na mediação a terceira parte tem um papel ativo (Bape,
1994, p. 27). Na Justiça brasileira, os casos levados aos tribunais de pequenas causas
são primeiro tratados por um conciliador, que convoca um a reunião entre as partes
litigiosas e pergunta se há alguma possibilidade de acordo.

Ao notarem que a maioria dos conflitos que envolvem múltiplas partes e diferentes
questões, como os ambientais, somente se resolvem com ajuda externa, Susskind e
Cruikshank (1987, p. 240) identificam três formas de “negociação assistida”: facili-
tação, mediação e arbitragem não vinculante. A arbitragem não vinculante é uma
categoria diferente da arbitragem comercial. Os contratos privados que estabelecem
o mecanismo de arbitragem para resolução de desavenças estipulam que as decisões
do árbitro são inapeláveis; caso contrário, a arbitragem é ineficaz. Na arbitragem não
vinculante, o árbitro oferece uma opinião sobre como as partes poderiam resolver
sua disputa. Esse é normalmente o “último estágio antes que as partes atravessem a

DEZESí ETE
aliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

fronteira rum o a u m a solução não co nsen su al” (Susskind e C ruikshank, 1987, p. 241).
A mediação não é vinculante.

0 facilitador executa tarefas pré-negociação, como a formulação de regras para g u iar


a negociação e o estabelecimento de um a agenda; pode tam bém fazer serviços de
secretaria, como identificar e preparar locais para encontros e p reparar atas e relatos.

A mediação se dá pela atuação de um a terceira parte, imparcial, no processo de


negociação, parte que não tem interesse em nen h u m resultado em particular. 0 m e­
diador não é um mero interlocutor, mas alguém que busca ativam ente possibilidades
de solução e assiste as partes na busca de um acordo. Um mediador se reu n irá sepa­
radam ente com cada parte, tan tas vezes quanto for necessário, para entender suas
necessidades e interesses, e som ente depois promoverá um ou mais encontros entre
as partes. Ele deve identificar e com preender os interesses das partes e não se d eixar
influenciar por suas posições e pela sua retórica.

0 conceito de mediação do Bape é de

um processo no qual uma terceira parte, independente e imparcial e que não tem
o poder e a missão de impor uma decisão, ajufla as partes, geralmente o propo­
nente de um projeto e cidadãos que requerem uma audiência pública, a resolver
suas desavenças ou a se entenderem acerca de pontos precisos (Bape, 1994, p. 18).

A autoridade que tem o poder de decisão - o órgão licenciador no Brasil - não pode
a tu a r como mediador. Nos Estados Unidos, diversos casos de mediação envolvem a
EPA e outra parte. Para Susskind e C ruikshank (1987, p. 10), “não é realista esperar
que agências adm inistrativas (como a EPA) nos ajudem quando outros m ecanism os
falh am ”, não é sua missão, pois seu papel é fazer cum prir a lei. Susskind e Crui­
k sh a n k vão mais longe: “a resolução ad m in istrativ a de disputas públicas tende a
favorecer aqueles que detêm poder de lobby e podem a tu a r nos bastidores da política”.

0 Bape atua como mediador público, mas nos Estados Unidos há muitos casos de m e­
diação privada. Sánchez, Silva e Paula (1993) relatam um caso de mediação conduzida
por um a empresa de consultoria ambiental envolvendo um a pedreira e a com un ida­
de v izinh a, mas não se tratav a de um novo projeto, e, sim, de um em preendim ento
que funcionava havia mais de 40 anos. A dificuldade de um mediador privado em
um conflito ambiental é ter credibilidade e conquistar a confiança da outra parte, já
que um a delas (normalmente o empreendedor) paga pelos serviços de mediação. Fo­
ram feitas v árias reuniões com cada parte, negociando-se um acordo. As partes em
conflito somente se encontraram pessoalm ente quando da assin atu ra do acordo, em
um território neutro, o escritório do consultor-mediador.

0 emprego de qualquer mediação requer adesão voluntária e que o conflito adm ita
possibilidade de compromisso. Ao ser voluntário, n atu ralm en te as partes podem a b a n ­
donar o processo a qualquer momento. 0 tipo de mediação preconizado pelo Bape é de
interesse porque se aplica ao tipo exato de problema colocado pela tom ada de decisão
no processo de AIA, ou seja, não se trata somente de mediação, no sentido amplo, nem
mesmo de mediação ambiental (aplicada a várias m odalidades de conflitos de cunho

CAPÍTU iLO
A T o m a d a de D e c is ã o n o P ro c e s s o de A v a lia ç ã o de Im p a c to A m b i e n ^ M 441

ambiental), mas de facilitar decisões sobre empreendimentos que causam impactos


significativos. Assim, “o recurso à mediação somente é possível quando há acordo
sobre a justificativa do projeto e sua eventual realização” (Bape, 1994). A lei federal
canadense também abriu a possibilidade de mediação, ao invés de um panei review,
mas a realidade tem mostrado que a maioria dos conflitos que surgem no âmbito do
processo federal não se presta a isso.

1 7 .5 M e c a n is m o s de c o ntro le
Cada país introduziu, em sua legislação, alguns mecanismos que permitem à socieda­
de exercer certo controle sobre as decisões governamentais. A clássica separação de
poderes, a liberdade de imprensa e, mais modernamente, a fiscalização exercida pelo
Ministério Público são alguns mecanismos de controle democrático. No campo da
avaliação de impacto ambiental, há mecanismos que permitem ao Estado controlar a
qualidade dos estudos de impacto ambiental e mecanismos que permitem à sociedade
exercer certo controle sobre as decisões. Há três tipos de mecanismos principais de
controle:
# Controle administrativo, exercido por uma autoridade governamental encarre­
gada de gerir o processo de AIA; tal controle é claramente aplicado durante a
análise técnica dos estudos ambientais, mas está presente em outras partes do
processo, como na formulação dos termos de referência para um ELA.
% Controle do público, exercido por intermédio de processos participativos previstos
pela legislação, como as audiências públicas ou a participação em colegiados,
ou ainda por intermédio do direito dos cidadãos manifestarem livremente suas
opiniões.
# Controle judicial, exercido por intermédio do Poder Judiciário, acionado por
cidadãos, ONGs ou pelo Ministério Público.

Além desses, dois outros mecanismos de controle podem ser exercidos no âmbito do
processo de AIA (Ortolano, Jenkins e Abracosa, 1987):
# Controle instrumental, quando um agente financiador avalia a qualidade dos
estudos e pode exigir modificações de projeto ou complementações dos estudos,
além de acompanhar a implantação do empreendimento por intermédio de
supervisão ou auditoria; bancos de desenvolvimento e agências bilaterais de
cooperação exercem esse tipo de controle.
# Controle profissional, quando códigos de ética ou mesmo procedimentos de
sanção no âmbito de uma categoria profissional têm influência sobre as atitudes
dos profissionais envolvidos na elaboração dos EIAs.

As modalidades práticas de controle e a importância relativa de cada um deles variam


entre jurisdições. A importância do controle judicial, por exemplo, depende do acesso
à Justiça, dos riscos e custos em caso de perda da causa e também das tradições ju r í­
dicas e democráticas do país. Assim, nos Estados Unidos, cerca de 10% dos estudos
de impacto ambiental realizados entre 1970 e 1982 foram objeto de disputa na Justiça
(Kennedy, 1984), ao passo que, na França, país com maior tradição de resolver
disputas por meio de negociações de cunho político, apenas 0,65% desses estudos
foram questionados judicialmente durante os cinco primeiros anos de aplicação da lei
que introduziu a exigência de apresentação de estudos de impacto (Hébrard, 1982).

DEZESSETE
442 ^ ^ a l i a ç ã o de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Na Holanda, o controle judicial é visto por Soppe e Pieters (2002) não somente como
efetivo, mas como capaz de cobrir lacunas da própria lei. A questão com maior
frequência levada aos tribunais é a da necessidade de um EIA, cujos julgamentos
são “rigorosos e usualmente lógicos”, além de “razoavelmente consistentes”, fazendo
da suspensão ou nulidade de um a licença um a sanção suficientemente forte, por
implicar “desperdício de tempo e dinheiro, algo que todo proponente deseja evitar a
todo custo” (p. 30).

0 alcance do controle administrativo depende dos procedimentos de análise dos


estudos. Como mencionado acima, nos Estados Unidos, onde a própria agência gover­
namental com responsabilidades sobre o projeto faz sua avaliação de impacto, o
controle administrativo é exercido por outras agências do governo federal (o proce­
dimento chamado de inter-agency revieiv) e pela Environmental Protection Agency.
Na França, os projetos públicos e privados são analisados por uma agência setorial
que exerce um primeiro nível de controle administrativo; outras agências setoriais
dão, em seguida, seu parecer, e o Ministério do Meio Ambiente, que só intervém se
acionado formalmente, constitui um terceiro nível de controle administrativo.

0 controle do público é, de longe, o mais importante, e deve ser visto em duas


dimensões, das quais a mais imediata é o controle direto mediante os mecanismos
formais de consulta e participação públicas. Mais importante talvez seja a dimensão
do controle indireto, quando o público pressiona para que sejam mais efetivos o
controle administrativo e o controle judicial. Mesmo sem mecanismos formais de
participação é possível haver um controle por parte do público, por intermédio de
denúncias, manifestações e pressão política. A formalização dos procedimentos de
consulta tenciona justam ente regulam entar o acesso do público à informação e m ini­
mizar a probabilidade de ocorrência de conflitos, canalizando o potencial para um
fórum reconhecido como legítimo pelas partes envolvidas. 0 direito à informação em
tempo hábil é o ponto nevrálgico para que possa haver um real controle do público.

CAPÍTÜLO

Ü lfe tt!

A companhamento
no P rocesso


lação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

A aprovação do empreendimento significa que, sendo considerado como viável


ambiental mente, o projeto deverá ser executado de acordo com um plano preestabe-
lecido, cabendo ao empreendedor observar todas as condições impostas para evitar,
reduzir ou compensar os impactos adversos e valorizar os benéficos. Vale lembrar
que essa aprovação pode ser interna, quando uma organização adota a avaliação de
impacto ambiental independentemente de exigências legais, ou externa, quando uma
terceira parte (como o órgão licenciador ou financiador) formalmente declara-se de
acordo com o projeto proposto e impõe suas condições.

Porém, a aprovação não significa que tenha se encerrado a avaliação de impac­


to ambiental. Ao contrário, ela continua durante todas as etapas do período de
vida do empreendimento, embora com ênfase diferente e através da aplicação de
ferramentas apropriadas. George (2000, p. 177) é incisivo: “se a estrada que leva ao
inferno é pavimentada com boas intenções, as avaliações ambientais que term inam
no momento da decisão formam um pavimento custoso e equivocado”.

Como se verá, se o objetivo é garantir a proteção e a melhoria da qualidade ambiental,


a etapa de acompanhamento é crucial para que o processo de AIA desempenhe satisfa­
toriamente seus papéis. 0 acompanhamento tem comq funções:
# assegurar a implementação dos compromissos assumidos pelo empreendedor
(descritos nos estudos ambientais e nas licenças ambientais);
# adaptar o projeto ou seus programas de gestão no caso de ocorrência de impactos
não previstos ou de magnitude maior que o esperado;
# demonstrar o cumprimento desses compromissos e a consecução dc certos obje­
tivos e metas (como o atendimento aos requisitos legais);
# fornecer elementos para o aperfeiçoamento do processo de AIA, identificando
problemas decorrentes das etapas anteriores.

18 .1 A IM P O R T Â N C IA D A ETAPA DE A C O M P A N H A M E N T O
A importância da etapa de acompanhamento tem sido cada vez mais reconhecida
por estudiosos e por participantes diretos do processo de AIA, pois não são raras
as ocasiões em que muitos dos compromissos assumidos pelos empreendedores
não são satisfatoriamente cumpridos, chegando às vezes a serem ignorados. Essa é
um a percepção recorrente entre muitos analistas de órgãos governamentais e entre
profissionais que trabalham em ONGs. Estudo realizado por Dias (2001), com uma
amostra representativa de projetos que passaram pelo processo de AIA no Estado de
São Paulo, confirmou tal percepção: ao investigar como se dava a real implemen­
tação das medidas mitigadoras, a autora constatou um amplo descolamento entre
o proposto e o realizado. Essa é também um a deficiência frequentemente citada na
literatura. Wood (1995) afirma que a implementação das medidas mitigadoras é fraca
em muitos países em desenvolvimento. Glasson, Therivel e Chadwick (1999, p. 209),
referindo-se principalmente ao Reino Unido, entendem que há muito pouco acompa­
nhamento após a implantação dos projetos, e que essa etapa é “provavelmente a mais
fraca em muitos países”. Shepherd (1998, p. 164) assevera que o monitoramento é
pouco praticado nos Estados Unidos; consequentemente é difícil verificar a efetiva
aplicação das medidas mitigadoras. Sadler (1988) sintetiza tais preocupações: “0 p a ra ­
doxo da avaliação de impacto ambiental, tal como praticada convencionalmente, é

CAPÍTU LO
r\ lim t m u c r A u v jiv im iN n M iv ic i^ iu in u i r u lc jo u uc n v n u t u v ir r v ^ iw a ^ iiv iu ili^ u ã i^ h <+ho

que relativam ente pouca atenção é dada aos efeitos am bientais e sociais que real­
mente decorrem de um projeto ou à eficácia das m edidas m itigadoras e de gestão que
são adotadas”.

Essas análises não significam a ausência da fase de acom panham ento, mas indi­
cam que tem um peso relativam ente pequeno diante da im portância e dos recursos
despendidos nas etapas pré-aprovação. Isso pode indicar um a excessiva preocupação
com os aspectos formais do processo de AIA em detrim ento de seu conteúdo subs­
tantivo. Dito de outra forma, grande atenção é dedicada à preparação de um EIA e à
exigência de que o projeto incorpore um extenso program a de mitigação de impactos,
mas, um a vez aprovado o projeto, há um interesse surpreendentem ente pequeno em
verificar se ele foi realm ente im plantado de acordo com o prescrito e se as medidas
m itigadoras ating iram seus objetivos de proteção ambiental.

Os resultados efetivos da aplicação dos principais instrum entos de planejam ento e


gestão am biental - sua eficácia - são discutidos por diversos autores, no contexto
de diferentes sistemas jurídicos. Vários estudos tiveram como foco a avaliação de
impacto ambiental. Nos primeiros anos de sua aplicação nos Estados Unidos, diversos
an alistas sugeriram que os resultados alcançados estariam muito aquém do esperado,
e dentre as razões apontadas tin h a grande destaque o entendim ento de que a maioria
dos estudos de impacto am biental seria de qualidade sofrível, o que não perm itiria
que decisões adequadas fossem tom adas tendo esses estudos como base. Os críticos
sugeriam que os estudos deveriam ser mais científicos, o que poderia ser alcançado
por meio de u m a revisão pelos pares, fazendo-os passar por um processo se m elh an ­
te ao de u m a publicação científica (Schlinder, 1976) ou subm etendo à publicação as
pesquisas que serviriam de base aos estudos (Loftin, 1976). Outras opiniões iam no
sentido de fortalecer a revisão feita pelos analistas dos órgãos governam entais e o
papel do público (Auerbach et al., 1976).

Um marco nos primeiros debates sobre a eficácia da avaliação de impacto ambiental


foi o estudo de Beanlands e Duinker (1983), baseado em ivorkshops realizados com
cientistas, consultores, profissionais de órgãos públicos e outros atores do processo
no Canadá, além de um a série de estudos de caso, tam bém de projetos canadenses
que haviam sido submetidos à avaliação de impacto ambiental. Os autores apontaram
inúm eras falhas de planejam ento e de condução dos estudos. Os primeiros anos de
aplicação da AIA no Canadá tam bém resultaram em “um alto nível de fru stração ”
dos principais envolvidos (Beanlands, 1993). As deficiências encontradas som en­
te poderiam ser san adas se houvesse, ao mesmo tempo, um m aior rigor técnico na
preparação e na análise dos estudos, assim como um sistemático m onitoram ento das
condições am bientais após a implementação do projeto.

No início dos anos 1980, um dos focos das pesquisas a respeito da eficácia da AIA
voltava-se para a qualidade e o acerto das previsões feitas nos estudos de impacto
ambiental. Trabalhos como os de Bisset (1984b), Buckley (1991a, 1991b), Culhane
(1985) e Culhane et al. (1987), conforme seção 10.4, tiveram , basicamente, como con­
clusão que m uitas das previsões apresentadas nos estudos não eram passíveis de
verificação, seja por não serem quantitativas, seja pela forma como eram apresenta­
das, com deficiências como a falta de indicação da abrangência espacial dos impactos

DE
aliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

(área de influência) ou a ausência de indicadores apropriados para monitorar os im­


pactos reais. Estudos conduzidos no Brasil sob essa óptica chegaram a conclusões
similares (Dias e Sánchez, 2001; Prado Filho e Souza, 2004).

Esses estudos, que eram chamados de “auditoria” da avaliação de impacto ambiental,


tiveram uma segunda conclusão consistente: a de que muitos projetos realmente
implantados eram significativamente diferentes daqueles que haviam sido descritos
nos estudos de impacto ambiental, um a situação que, evidentemente, dificulta ou
mesmo impede qualquer comparação entre impactos previstos e impactos reais. As
razões dessas alterações têm a ver com o tempo transcorrido desde o planejamento do
projeto e a preparação do estudo de impacto até sua aprovação e início da construção.
As modificações também estão ligadas ao baixo grau de detalhamento dos projetos
quando são preparados os estudos de impacto ambiental; entre um projeto básico de
engenharia — o estágio em que são muitas vezes feitos os estudos ambientais — e
um projeto executivo, muitas modificações costumam ser introduzidas (conforme o
exemplo da rodovia dos Imigrantes, apresentado na seção 13.2). Aliás, se uma das fu n ­
ções do estudo de impacto ambiental é fazer que as ações hum anas tenham o menor
impacto possível, então é de se esperar que haja modificações entre a concepção ini­
cial do projeto e uma versão final, na qual os fatores ambientais foram incorporados.
%
Assim, pesquisas nessa linha não se m ostraram muito promissoras, mas a questão da
eficácia da avaliação de impacto ambiental permaneceu aberta. De um lado, o in stru ­
mento era sujeito a críticas quanto à morosidade do processo de análise dos estudos
e os custos de levantamentos detalhados. De outro lado, questionava-se acerca da
efetiva proteção ambiental alcançada pelos projetos que haviam passado pelo crivo da
avaliação de impacto ambiental. Trabalhos teóricos e estudos de caso sobre critérios
para avaliar a eficácia discutiram as razões do sucesso e as causas da inadequação
dos resultados (Ortolano, Jenkins e Abracosa, 1987; Ortolano e Shepherd, 1995a,
1995b; Sánchez, 1993a, 1993b).

Sánchez (1993a) propôs que qualquer julgamento sobre a eficácia da AIA levas­
se em conta em que medida sua aplicação teria tido sucesso em promover quatro
papéis complementares: (i) fornecer informação relevante para ajuda à decisão;
(ii) auxiliar na concepção de projetos que minimizem os impactos ambientais
adversos; (iii) funcionar como instrumento de negociação entre as partes interessadas:
(iv) servir de fundamento para gestão ambiental, uma vez aprovado o projeto.

Durante os anos 1990 foi realizado um grande estudo comparativo internacional,


envolvendo dezenas de especialistas, sobre a eficácia da avaliação de impacto ambiental
(Sadler, 1996). Partindo do princípio de que era necessário avaliar as práticas para
melhorar o desempenho, isto é, o resultado da aplicação do instrumento, o estudo
identificou três grupos de critérios, com distintos objetivos, para avaliar a eficácia:
# relativos aos procedimentos: critérios para verificar em que medida o processo
de AIA está em conformidade com requisitos legais ou normativos de cada país
ou com diretrizes internacionais de boa prática;
substantivos: critérios para verificar se o processo de AIA atende a um conjunto
de objetivos preestabelecidos, como suporte à decisão, constituir um mecanismo
para levar em conta as preocupações do público e assegurar a proteção ambiental;
A Etapa de A companhamento no P rocesso de A valiação de Impacto A mbien 447

$ transacionais: critérios para aferir em que medida esses objetivos são atingidos
ao m enor custo e no m enor período de tempo possível.

Eiiley, Hobbs e M orrison-S aunders (1992) a rg u m en tam que a utilidade da AIA não
r encontra tan to no acerto das previsões de impacto, mas “no foco na gestão de
uupactos”. Nessa linha de raciocínio, a fase de aco m p an h am en to do processo de AIA
- apontada como um a etapa crítica p ara seu sucesso (Arts, 1998; Arts, Caldwell
e M orrison-Saunders, 2001; Dias e Sánchez, 2001; Gallardo e Sánchez, 2004;
f rrrison-S aunders et al., 2001). Talvez os m ais sólidos arg u m en to s que fu n d am en tam
Tãl afirm ação prendam -se ao fato de que os estudos de impacto tra ta m de situações
irais, no sentido de que são projetos a serem realizados: som ente quando com eçam
í ser implem entados, esses projetos se m aterializam e, portanto, m an ifestam -se tam -
: t n seus impactos. Como visto no Cap. 8, alg u n s im pactos ocorrem d u ran te a fase de
:rcparação do projeto, mas, em boa parte dos casos, os im pactos m ais significativos
:correm após o início da im plantação. Há um a incerteza inerente a m uitas previsões
: t impactos e não são poucos os casos de impactos que não são corretam ente identi­
ficados ou previstos pelo EIA (conforme seção 10.4), mas que podem ser corrigidos por
~e:o de m edidas m itigadoras desenvolvidas depois da aprovação do projeto.

csuficiente ex p lo ração das ligações en tre av a lia ção p rév ia e gestão ex p o s t “é


_z:a deficiência p erceptív el da lite ra tu r a te ó ric a ” sobre A IA (Bailey, 1997, p. 317),
zccis v o ltad a p a ra a n a l is a r sua in flu ên cia sobre o processo decisório que leva à
aprovação de u m a in iciativ a. W ilson (1998) en te n d e que não so m en te é n ecessário
n p ie m e n ta r os co m pro m issos a ssu m id o s pelos p ro po nentes, m as que a im p lem en-
*c;ão deveria ser m o n ito rad a , re la ta d a em d o c u m e n to s e au d ita d a p a ra v erific a r
sua conform idade.

'c b a lh o s recentes têm en fatizad o as v a riá v e is de ordem gerencial do processo de


ALA como d e te rm in a n te s do seu sucesso, m uito m ais do que a q ualidade técnica ou
: cDnteúdo científico de um estudo de im pacto am b ien tal. Tem-se a rg u m e n ta d o que
i z bom sistem a de geren ciam en to da im p lan tação e operação (e da desativação,
ru an do pertinente) de um em p reen d im en to pode co rrig ir im perfeições resu lta n te s
:i-S etapas p rév ias do processo de AIA (M arshall, 2002, 2005), haja v is ta que o
: _r se deve rea lm en te g e re n c ia r são “os im pactos reais e não os p re v isto s” (Noble
e Storey, 2004).

Em paralelo, há um reconhecim ento de que um aco m p an h am en to eficaz necessita da


iT-iaçào do em preendedor e dos agentes governam entais, e que o envolvim ento do
publico tende a m elhorar os resultados.

--isim , cabe ao em preendedor (e seus contratados):


^ cumprir os requisitos legais (controle de poluição, proteção dos recursos naturais
etc.);
^ observar todas as condicionantes da licença ambiental;
^ im plem entar todos os program as e planos de ação;
^ dem onstrar o cum primento de todos os requisitos aplicáveis;
s coletar evidências ou provas docum entais de cumprimento dos requisitos;
* organizar e m anter registros de sua atuação e dos resultados alcançados.

sSoiTO
a ação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Ao agente governamental, cabe:


verificar e fiscalizar o atendimento às exigências;
% impor sanções em caso de não atendimento;
# demonstrar às partes interessadas o cumprimento de todos os requisitos aplicáveis;
# conferir e validar evidências ou provas documentais fornecidas pelo empreende­
dor acerca do cumprimento dos requisitos legais.

Diferentes instrumentos são utilizados para realizar as tarefas de acompanhamento,


enquanto o papel dos atores principais (empreendedor e órgão ambiental) e dos demais
atores pode ser coordenado de diferentes formas, aqui denominadas arranjos para o
acompanhamento ambiental.

1 8.2 I n s t r u m e n t o s p a r a a c o m p a n h a m e n t o
0 termo acompanhamento em avaliação de impacto ambiental [EIA follow-up)
descreve um conjunto de atividades realizadas após a aprovação do empreendimento.
Essas atividades podem ser agrupadas em três categorias: (1) monitoramento,
(2) supervisão, fiscalização ou auditoria, (3) documentação e análise.

A responsabilidade pelo acom panham ento é partilhada entre o empreendedor e


o órgão governam ental responsável. 0 monitoramento, a implementação dos
program as de gestão, a documentação e a análise são responsabilidades do em pre­
endedor, que eventualm ente também pode ser obrigado a realizar auditorias, ou
pode realizá-las voluntariam ente. A fiscalização e o exame crítico dos relatórios
de monitoramento e de acom panham ento são responsabilidades que incum bem ao
agente público. 0 público tam bém pode ter um papel na fase de acom panham en­
to, como m ostrarão exemplos apresentados na próxima seção, mas não se trata de
um a responsabilidade assum ida e, sim, do exercício de um direito de ser informado
sobre as condições am bientais1.
10 acesso à
informação
0 monitoramento ambiental refere-se à coleta sistemática e periódica de dados
am biental é um
previamente selecionados, com o objetivo principal de verificar o atendimento a
dos f u n d a m e n to s
da Convenção de requisitos predeterminados, de cumprimento voluntário ou obrigatório, como padrões
A a rh u s , conforme legais e condições impostas pela licença ambiental. Os itens monitorados abarcam
secão 16.1. parâmetros do ambiente afetado e parâmetros do empreendimento. Quando o moni­
toramento ambiental usa os mesmos parâmetros, as mesmas estações de amostragem
e os mesmos métodos de coleta e análise que foram usados para a preparação do
diagnóstico ambiental, é possível constatar os impactos reais do projeto, por meio de
um a comparação com a situação pré-projeto (dada no diagnóstico ambiental prévio).
Todavia, isso pressupõe qualidade e consistência no monitoramento pré-projeto, que
desta forma se revela como um dos pontos críticos para promover a integração entre
o planejamento e a gestão ambiental.

A supervisão, a fiscalização e a auditoria são atividades complementares que se


superpõem parcialmente e não são definidas de maneira consistente. No sentido
mais comum desses termos, a supervisão é uma atividade contínua realizada pelo
empreendedor ou seu representante, com a finalidade de verificar o cumprimento
de exigências legais ou contratuais por parte de empreiteiros e quaisquer outros

CAPÍTU iLO
A Etapa de Acompanhamento no Processo de Avaliação de Impacto AmbifníBIm 449

contratados para a implantação, operação ou desativação de um empreendimento. A


supervisão também é utilizada por agentes financeiros com 0 mesmo sentido de veri­
ficar 0 atendimento a exigências de natureza contratual. Fiscalização é uma atividade
correlata, porém realizada por agentes governamentais no cumprimento do poder de
polícia do Estado. A fiscalização muitas vezes se faz por amostragem e é discreta, em
contraposição ao caráter contínuo e permanente da supervisão2. Já a auditoria é uma 2Há certa fo rça
atividade sistemática, documentada, objetiva e periódica que visa analisar a confor­ de expressão
midade com critérios prescritos, nesse caso, 0 atendimento aos requisitos legais, aos nessa afirmativa;
0 uso do termo
termos e condições da licença ambiental ou a outros critérios, como os que podem ser
“contínuo" não
impostos por agentes financeiros. significa uma
observação
Uma das modalidades de auditoria ambiental é aquela integrante dos sistemas de diuturna e cerrada
gestão ambiental e de qualidade, cuja orientação é dada pela norma NBR ISO 19.011: das atividades de
terceiros.
2002. Esse tipo de auditoria é definido como “processo sistemático, documentado
e independente para obter evidências de auditoria e avaliá-las objetivamente para
determinar a extensão na qual os critérios de auditoria são atendidos” (item 3.1). A
definição do parágrafo anterior é mais geral e mais condizente com a literatura e com
a evolução histórica do conceito de auditoria ambiental.

Tem-se demonstrado, em vários estudos de caso, que a supervisão ambiental é


ferramenta da maior importância para assegurar: (i) 0 cumprimento efetivo das m e­
didas mitigadoras e demais condições impostas (Goodland e Mercier, 1999; Küller
e Machado, 1998); (ii) a adaptação do projeto ou de seus programas de gestão, no
caso de impactos não previstos ou de impactos de m agnitude maior que 0 espera­
do (Gallardo e Sánchez, 2004; Sánchez e Gallardo, 2005). Entre outras vantagens,
a supervisão e a auditoria podem detectar alguma não conformidade3 antes que 0 2Não conform idade
monitoramento (ou a fiscalização, ou alguma denúncia) indique um problema ou é u m termo
um a não conformidade legal. m uito usado
em auditoria.
Designa qualquer
Documentação é parte da fase de acompanhamento que envolve 0 registro siste­ situação que não
mático de resultados de monitoramento, de constatações de não conformidades, de esteja de acordo
evidências de atendimento a requisitos e de quaisquer outras informações relevantes. com 0 esperado
Os registros devem ser coletados, armazenados de modo tal que permita sua fácil (por exemplo, em
desacordo com
recuperação e submetidos a um a análise que possa alertar para a necessidade de ado­
uma condição
tar medidas corretivas, caso os critérios preestabelecidos não sejam atendidos. estipulada em
licença ambiental).
Segundo USEPA (1989), diferentes meios são empregados pelas autoridades ambientais A in d a que de uso
para verificar 0 cumprimento das obrigações das empresas, destacando-se a análise corrente, 0 termo
não é definido na
de resultados de automonitoramento e as inspeções de campo. As inspeções são
norm a NBR ISO
usadas para as seguintes funções: 19.011: 2002.
# avaliar o grau de cumprimento dos requisitos legais;
# determinar se 0 automonitoramento e os relatórios resultantes estão de acordo
com protocolos estabelecidos;
# detectar e documentar violações dos requisitos legais.

Ainda segundo USEPA (1989, p. 3-12), há três níveis de aprofundamento para realizar-se
um a inspeção:
f i a ç ã o de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

# Inspeção visual (walk-through), limitada a uma caminhada pela área, verificando


a existência de dispositivos de controle, observando as práticas de trabalho e
verificando se há um armazenamento adequado de dados; tipicamente tais ins­
peções têm duração de algumas horas.
# Inspeção de avaliação de cumprimento (compliance evaluation), que, além das
observações visuais, inclui análise e avaliação de registros de monitoramento,
documentos, entrevistas e outras atividades de coleta de evidências (incluindo a
coleta de amostras físicas em alguns casos). Também pode incluir testes de pro­
cessos e equipamentos de controle.
Inspeção com amostragem [sampling inspeetion), que inclui coleta planejada
de amostras para checar resultados do automonitoramento; é uma investigação
completa que pode durar semanas.

As inspeções servem tanto à supervisão como à fiscalização e à auditoria. Frequen­


temente, um a inspeção segue um roteiro preestabelecido, de acordo com seu objetivo.
Assim, inspeções de rotina para fins de fiscalização usualmente se baseiam em
requisitos de um a lei ou regulamento cujo cumprimento se deseja verificar; caso o
inspetor ou fiscal constate alguma irregularidade, precisa enquadrá-la em alguma
categoria que tipifique uma conduta em desacordo com a lei, para que o transgressor
possa ser notificado, multado ou receber outras sanções previstas. Essas inspeções
têm escopo limitado pela competência legal do agente fiscal. Um exemplo é o sistema
de fiscalização empregado no Estado de São Paulo, extrem am ente fragmentado. Um
agente da Cetesb somente verifica o atendimento à legislação de controle de poluição,
ao passo que um agente do Departamento de Uso do Solo Metropolitano somente
verifica o atendimento à legislação de proteção aos mananciais; por sua vez, um
agente do Departamento Estadual de Proteção aos Recursos Naturais somente fisca­
liza o cumprimento da legislação florestal, embora todos esses órgãos pertençam à
Secretaria do Meio Ambiente. Dias (2001) comprovou que a compartimentação é um
dos principais empecilhos para o acompanhamento ambiental de projetos submetidos
ao processo de AIA.

Há de se considerar que, se a aprovação de um projeto dependeu da preparação de


um estudo de impacto ambiental, isso se deve à sua característica de poder oca­
sionar impactos significativos. Ora, esses projetos, via de regra, causam impactos
múltiplos, até mesmo sociais, que não são cobertos por legislação específica. Logo, a
fiscalização somente pode ser eficaz se ultrapassar os limites formais e burocráticos
das inspeções de rotina. Além disso, o acom panham ento também seria beneficiado
se fosse realizado por equipes multidisciplinares, da mesma forma que a preparação
do EIA e sua análise.

A demonstração dos resultados costuma ser feita por meio de relatórios que podem
ou não ser divulgados publicamente. 0 conteúdo de um relatório público é ilustrado
no Quadro 18.1, que traz a estrutura de um “balanço de atividades ambientais” anual
preparado pela Hydro-Québec durante a construção da usina hidrelétrica Sainte-Mar-
guerite 3, situada em um afluente da margem esquerda do rio São Lourenço. Vários
exemplares do relatório-síntese foram impressos e distribuídos para os interessados,
além dos documentos protocolizados nos organismos governamentais competentes.
A Etapa de A companhamento no P rocesso de A valiação de Impacto A mbien

Esse é o primeiro de um a série de relatórios anuais sobre a situação do monitoramento


e a implantação das medidas de gestão desse empreendimento, cuja construção teve
início em abril de 1994 e term inou em 2004. Projeto de grande porte, é constituído
de uma barragem de 410 m de altura, um reservatório de 25.300 ha e um a usina de
884 MW de potência instalada.

Q u a d r o 18.1 Balanço de a tiv id a d e s a m b ie n ta is - c o n s tru ç ã o da usina h id re lé tic a S a in te -


M a rg u e rite 3 r Quebec, Canadá
R esumo
In tro du ção

biental
Estudo m o rfo s s e d im e n to ló g ic o do e s tu á rio do rio S a in te - M a r g u e r ite
Q ua lid a d e da água
Fauna te rre s tre
A v ifa u n a
U tiliz a ç ã o do te r r itó r io
E conom ia regional
A tu a liz a ç ã o do c o n te x to s o c io e c o n ô m ic o
A v a lia ç ã o dos im p a c to s e c o n ô m ic o s regionais
Eficácia das m edid as de o tim iz a ç ã o das conse q ü ê n cia s e co n ô m ic a s regionais
A spectos sociais [para cada ite m do m o n it o r a m e n to a p re s e n ta m -s e o b jetivos, m é to d o s e
resultados]

,p ro v e ita m e n to de m adeira
A rq u e o lo g ia
D o c u m e n ta ç ã o a u d io v is u a l de cachoeiras e corredeiras
C o n tro le das estradas de acesso
P rogram a de c o m u n ic a ç ã o a m b ie n ta l
O tim iz a ç ã o dos im p a c to s e c o n ô m ic o s
M edidas de V alorização e I ndenização
C om pensação para p o p u la ç ã o a u tó c to n e
A p o io ao d e s e n v o lv im e n to regional e v a lo riz a ç ã o a m b ie n ta l

S u p e rvisão A m b ie n t a l

A utorizações entais

Lista das a u to riz a ç õ e s o b tid a s no período

C o n d ic io n a n te s das licenças a m b ie n ta is (39 c o n d ic io n a n te s p ro v in c ia is e onze federais)


A v a n ç o no c u m p r im e n to das c o n d ic io n a n te s
A u to s de in fra ç ã o recebidos
Principais d o c u m e n to s e n c a m in h a d o s ao M in is té r io de M e io A m b ie n te
C ro n o g ra m a s ( m o n ito r a m e n to , im p le m e n ta ç ã o das medidas)
Lista de estudos realizados
Lista de cartas preparadas ou a tu a liz a d a s
Fonte: Hydro-Québec, Aménagement Hydroélectrique de Sainte-Marguerite 3. Bilan des Activités
Environnementales 1994-1995.

1 8 .3 A rranjo s para aco m pan h am en to


0 proponente do projeto e o poder público têm papéis centrais (diferentes e com­
plementares) na fase de acom panham ento, mas outros protagonistas podem
aliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

d e s e m p e n h a r papel relev an te p ara o sucesso dessa etapa, em p a r tic u la r o público.


Não há u m a fórm ula ideal p ara o rg a n iz a r o a c o m p a n h a m e n to , que pode ser feito
sob diferentes form atos ou arran jo s. Quatro form atos são discutidos a seguir, os
quais, evidentem ente, não esgotam as possibilidades de org an ização p a ra ac o m p a­
n h a m e n to am biental.

F is c a l iz a ç ã o e s u p e r v is ã o

A fiscalização é o m ecanism o m ais com um de acom panham ento, m as nem sempre


o mais eficaz. As leis geralm ente atribuem aos órgãos go v ern am en tais o dever de
fiscalizar a conduta de indivíduos ou empresas, e preveem sanções em caso de não
cum prim ento das determ inações dos agentes de fiscalização. No entanto, fiscaliza­
ção requer procedim entos preestabelecidos e rotinas de trab alh o que nem sempre se
coadun am às necessidades dos projetos sujeitos à avaliação de impacto ambiental,
um a vez que é ju s ta m e n te devido às suas características que esses projetos foram
subm etidos ao processo. Por outro lado, toda fiscalização atua por am ostragem , e
para muitos em preendim entos sujeitos ao processo de AIA o aco m p an h am en to é
essencial, e não deveria ser facultativo.

%
Critérios de triagem podem ser usados para selecionar os em preendim entos que
necessitam de aco m p an h am en to m ais estrito, como inspeções mais freqüentes. A s­
sim, o aco m p an h am en to de certos em preendim entos de alto impacto poderia ser feito
por u m a comissão m ista (que será discutida a seguir), ao passo que em preendim entos
triviais (como extração de areia) ficariam sujeitos a u m a fiscalização reg u lar e ro ti­
neira. Ademais, as atividades de aco m p an h am en to tam bém podem ser m ais ou menos
intensas segundo a fase do em preendim ento; assim, p ara projetos de in fra e stru tu ra ,
a fase de im plantação co stum a ser crítica e pode provocar grande parte dos impactos
mais significativos, de modo que o aco m p an h am en to geralm ente dem anda m ais a te n ­
ção nessa fase.

P ara a etapa de construção, n u n c a é dem ais enfatizar o papel da supervisão que


o em preendedor deve exercer sobre as em presas contratadas e os demais tipos de
cuidados, como a inserção de cláusulas que estabelecem obrigações am bientais nos
contratos de prestação de serviços.

A u t o m o n it o r a m e n t o

Verificar se suas atividades atendem aos requisitos legais de proteção am biental é um a


das obrigações de toda empresa. Os custos de m onitoram ento am biental são p arte dos
custos operacionais de qualquer atividade econômica. Idealmente, a em presa coleta
dados sobre seu desem penho — de acordo com um plano previam ente estabelecido
registra-os, interpreta e prepara relatórios periódicos, que servem p ara co m un icar os
resultados interna e extern am en te.

A preparação de relatórios de an dam en to acerca dos p rog ram as de gestão ou relatórios


conclusivos sobre a im plantação de m edidas m itigadoras ou com pensatórias é u m a
exigência costum eira em m uitas licenças am bientais. A escolha prévia de indicadores
quando da preparação do plano de gestão e a coleta sistem ática de dados por meio de
p rog ram as de m onitoram ento são u m a condição necessária p ara o acom pan ham ento
A Etapa de Acompanhamento no Processo de Avaliação de Impacto AmbienJ™:] 453

mediante esses relatórios. Estes são preparados pelo empreendedor, muitas vezes com
a ajuda de consultores, e, para validá-los, é preciso submetê-los ao crivo do ór­
gão fiscalizador ou de uma comissão externa, pois, do contrário, podem ter baixa
credibilidade. O Quadro 18.1 mostrou um exemplo de relato de atividades de acompa­
nhamento ambiental durante a etapa de construção de um a usina hidrelétrica. É um
relatório público sintético que apresenta os mais importantes resultados dos trabalhos
realizados durante 0 período; informa quais foram os vários estudos técnicos em a n ­
damento ou concluídos e onde podem ser consultados.

C omissões especiais de acompanhamento


0 emprego de comissões de acompanhamento tem sido uma solução adotada em
alguns casos polêmicos, quando é reduzida a confiança do público nos órgãos de
governo ou ainda quando estes padecem de falta de recursos hum anos ou financeiros
para fiscalizar com eficácia. As comissões podem ser interinstitucionais ou incluir
representantes comunitários ou de organizações não governamentais.

Comissões interinstitucionais podem formar um mecanismo eficaz de acom panha­


mento quando há diversos órgãos governamentais com atribuições diferentes para
fiscalizar um empreendimento, conforme foi discutido no final da seção precedente.
Formam-se grupos com um representante de cada órgão que realizam inspeções
em conjunto, discutem em grupo e podem também formular exigências conjuntas
coerentes. Isso requer, é claro, disposição para colaborar e um a inequívoca repar­
tição de responsabilidades. 0 acompanhamento ambiental da construção da pista
descendente da rodovia dos Imigrantes utilizou esse modelo, que associou diversos
departamentos, com atribuições distintas, da Secretaria do Meio Ambiente de São
Paulo (Gallardo e Sánchez, 2004).

Durante 0 período de construção (1999-2002), inspeções periódicas eram realizadas


por equipes mistas. Essa foi a fase mais crítica do projeto, e os impactos mais
significativos se davam no meio físico. Para reforçar a ação dos órgãos diretamente
envolvidos, foi contratado 0 IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas), que entrou com
uma equipe especializada em processo de dinâmica superficial do meio físico, um dos
mais importantes problemas, pois a construção foi feita em uma área de vertentes
íngremes e de alta pluviosidade, a Serra do Mar. Relatórios mensais do IPT infor­
mavam 0 agente governamental (Daia) e 0 empreendedor sobre eventuais problemas
encontrados.

Em paralelo, 0 empreendedor tin h a sua própria equipe ambiental e contratou os


serviços de um a empresa de consultoria para, entre outras funções, implementar 0
programa de monitoramento ambiental, implementar um sistema de gestão e detec­
tar não conformidades com relação às boas práticas ambientais ou procedimentos
estabelecidos pela própria empresa. Por sua vez, 0 consórcio construtor também
tin h a sua equipe ambiental, encarregada de resolver os problemas à medida que
fossem detectados. Sánchez e Gallardo (2005) destacam a importância da organi­
zação interna do proponente e das empreiteiras como um fator essencial para a
satisfatória implementação das medidas mitigadoras, ao lado do controle externo
exercido no plano administrativo.

DE
liação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

As comissões mistas incluem a participação de representantes da comunidade, usual­


mente como observadores. Um exemplo inovador é o caso da abertura da mina do
Trevo, uma mina subterrânea de carvão localizada em Siderópolis, Santa Catarina,
cujo processo de AIA foi bastante conflituoso e contou com intensa participação da
comunidade, tendo várias vezes ocorrido manifestações contrárias ao empreendi­
mento. A mina situa-se em um a zona rural caracterizada por pequenas propriedades
e agricultura familiar. Os agricultores temiam principalmente que a mina viesse a
interferir no regime de circulação das águas subterrâneas e pudesse secar nascentes
e cacimbas (Crepaldi, 2003, p. 47), transformando, assim, a produção agrícola e a
qualidade da vida. Com a mediação do promotor de Justiça da comarca foi formada
um a comissão contando com a participação de moradores que, logo após o início dos
trabalhos de abertura da mina, passou a ter livre acesso a todos os dados de monito­
ramento e a realizar inspeções mensais na mina, verificando o avanço do projeto e o
cumprimento de medidas mitigadoras. Além disso, um morador local foi contratado
pela empresa, atuando como um a espécie de fiscal interno e verificando “se os órgãos
ambientais fazem cumprir os termos do acordo”, além de informar o Ministério
Público sobre o andamento dos trabalhos (Crepaldi, 2003, p. 49). Tal arranjo foi capaz
de forjar um a relação de confiança m útua entre as partes e também ajudou a garantir
o cumprimento dos compromissos firmados pela empresa.

0 programa intenso de monitoramento foi um elemento essencial da estratégia de


acompanhamento. Vários pontos de monitoramento situavam-se nas propriedades
daqueles que protestaram contra a implantação da mina. Com o intuito de aum entar
a credibilidade do programa de monitoramento, parte das medições e amostragens foi
inicialmente realizada pela Universidade do Extremo Sul Catarinense, enquanto os
dados dos impactos mais críticos — aqueles sobre os recursos hídricos subterrâneos —
foram interpretados e analisados por um instituto especializado ligado à Universidade
Federal do Rio Grande do Sul. Nas situações - bastante comuns - em que a comu­
nidade desconfia da empresa e mesmo dos órgãos governamentais, a chancela de
um organismo independente pode ser a única saída para resolver o conflito, pois
alterações ambientais observadas ou medidas na área de influência de um projeto
podem ser devidas às suas atividades, mas também a outros agentes degradadores
ou mesmo a causas naturais. A interpretação dos resultados pode até colocar em
cheque elementos essenciais do programa de monitoramento, como os procedimentos
de amostragem ou a qualidade das análises laboratoriais, e talvez sejam necessárias
alterações do programa.

0 caso da mina do Trevo também incluiu um a garantia interessante: a empresa foi


obrigada, pelo Ministério Público, a contratar um seguro contra danos ambientais,
segundo o qual, caso houvesse danos, a seguradora ressarciria as vítimas. A exigência
de garantias financeiras, como seguros, cauções ou outras modalidades, é um meca­
nismo para assegurar ao público, ao governo e a outras partes interessadas que os
compromissos assumidos pelo proponente do projeto serão realmente cumpridos
de modo satisfatório. Garantias financeiras são exigidas em diversos países para
atividades como mineração, disposição de resíduos e certas atividades industriais
(Sánchez, 2001).
A Etapa de A companhamento no P rocesso de A valiação de I mpacto A m bien iq B 455

Uma comissão mista também foi criada para acompanhamento no caso do aumento
das concentrações de mercúrio nos reservatórios hidrelétricos do norte do Quebec,
Canadá (conforme seção 10.4). Suas funções incluíam 0 seguimento do problema já
identificado nas represas existentes e das medidas preventivas ou compensatórias
para novos empreendimentos. A questão do aumento das concentrações de mercúrio
nas águas e nos tecidos dos peixes era da maior relevância, pois afetava não so­
mente a saúde, mas também 0 modo de vida tradicional das comunidades locais (os
Cri), para quem os peixes representam um a parte importante da dieta, e a pesca, um
elemento indissociável da cultura.

Para acom panhar a situação, orientar 0 monitoramento e estabelecer diretrizes


sobre as pesquisas necessárias para embasar as ações de mitigação, foi criado um
“Comitê da Baía James sobre 0 Mercúrio”, composto por representantes dos Cri, do
governo provincial e do empreendedor (Hydro-Québec), dotado de um orçamento de
CAN$ 18,5 milhões para um período de dez anos (1987-1996). Monitoramento, pes­
quisa e mitigação formaram os fundam entos do programa de acompanhamento. 0
monitoramento incluiu, entre outros, a determinação do teor de mercúrio nos tecidos
de algum as espécies de peixes (ver Fig. 10.11) consumidos pelos Cri, e a determ ina­
ção do conteúdo desse metal nos fios de cabelo da população (que é 0 procedimento
padrão para 0 acompanhamento de populações hum anas, como aquelas afetadas
pelo uso do mercúrio em garimpos de ouro). A pesquisa foi voltada, basicamente,
para a compreensão e a modelagem dos processos de transformação do mercúrio
metálico (Hg0) em metilmercúrio (CH3Hg), composto orgânico facilmente absorvido
pelos organismos. Finalmente, a mitigação buscou desenvolver fontes alternativas
de pescado com baixos teores de mercúrio (Comitê de la Baie James sur le Mercure,
1988, 1992).

Instituições especializadas
Outro arranjo, sofisticado e custoso, tem sido empregado em alguns casos altamente
polêmicos. Trata-se da criação de instituições independentes para acom panhar um
empreendimento. Um dos primeiros casos se deu na Austrália no final dos anos 1970.
Depois de anos de debates que abarcaram todo 0 país, 0 governo federal australiano
decidiu autorizar a abertura de duas minas de urânio no norte, em território federal.
No entanto, as incertezas quanto aos impactos potenciais dos empreendimentos, e
quanto à capacidade das empresas interessadas em controlar esses impactos, motivou
a decisão de criar, através de um a lei de 1978, três instituições para exercer controle 4Uma medida
e monitoramento das novas m inas4. As instituições criadas foram: compensatória fo i a
0 Comitê Coordenador para a Região dos Rios Alligator; criação do Parque
Nacional Kakadu,
# 0 Instituto de Pesquisa da Região dos Rios Alligator;
um dos mais
# a Agência do Cientista Supervisor (Office of the Supervising Scientist) para a importantes da
Região dos Rios Alligator. Austrália e também
designado como
As funções da agência foram definidas como: sítio do patrimônio
# “pesquisar os efeitos das operações de mineração de urânio sobre 0 meio ambiente mundial (Fig 1.1).

da região dos rios Alligator”;


# “coordenar e supervisionar a implantação das exigências ambientais relativas à
mineração de urânio impostas pela legislação em vigor”;
sliação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

# “desenvolver e promover normas, procedimentos e medidas para a proteção e a


restauração do meio ambiente”;
# “aconselhar o ministro (e o Parlamento) sobre esses temas” (OSS, 1986).

Entretanto, o governo, por meio do Departamento de Minas e Energia dos Terri­


tórios do Norte, mantém sua função legal de “licenciamento e regulamentação da
mineração de urânio”, pois o cientista supervisor “não impõe condições ambientais
sobre a mineração e não tem poderes para fazer cumprir a legislação” (OSS, 1986).
0 Office o f t h e Supervising Scientist, cujas funções foram ampliadas por leis poste­
riores, é um a importante instituição de pesquisa, produzindo anualmente dezenas
de relatórios e artigos científicos. Um relatório anual de atividades é apresentado ao
Parlamento (OSS, 1993).

Um arranjo semelhante, uma espécie de “cão de guarda”, foi a solução encontrada


para o acompanhamento ambiental de um a nova mina de diamante aberta no final
dos anos 1990 nos territórios do noroeste canadense. Foi criada uma agência inde­
pendente de monitoramento ambiental, que empregou pessoas da comunidade local
(comunidades indígenas) para o monitoramento da fauna, haja vista que os principais
impactos potenciais do empreendimento se dariam sobre a fauna autóctone, princi­
palmente espécies utilizadas pelas populações hum anas (Ross, 2002).

Há diversas maneiras de se fazer o acompanhamento e não há solução universal. Tal


é a conclusão de Morrison-Saunders, Baker e Arts (2003, p. 53) ao analisarem mais
de um a dezena de casos em diferentes países, desenvolvidos e em desenvolvimento,
pois “o sucesso da fase de acompanhamento depende de fatores contextuais” como
recursos, capacitação técnica, requisitos legais, tipo de projeto e envolvimento do
público. Mesmo no Brasil, onde há uma legislação federal com requisitos mínimos
que devem ser aplicados de m aneira consistente em todo o País, não há um a fórmula
única e de eficácia comprovada para a fase de acompanhamento.

18.4 I n t e g r a ç ã o entre p l a n e j a m e n t o e g e stão


Os benefícios de integrar a etapa prévia de avaliação às ações de gestão ambiental
durante as atividades de implantação, operação e desativação dos empreendimentos
são apontados por diversos autores (Jones e Mason, 2002; Ridgeway, 1999; Sánchez e
Hacking, 2002; van der Vorst, Grafé-Buckens e Sheate, 1999) como mais uma opor­
tunidade de melhorar os resultados concretos de proteção ambiental. Nesse sentido,
poderia haver um ganho com a integração da AIA às várias ferramentas de gestão
que foram desenvolvidas depois dela, como a auditoria ambiental, os sistemas de
gestão ambiental e a avaliação de desempenho ambiental, todas, aliás, inspiradas e
adaptadas da própria AIA.

A Fig. 18.1 ilustra a relação entre planejamento e gestão ambiental de um novo


empreendimento na fase de acompanhamento. A AIA se sobrepõe parcialmente ao
sistema de gestão ambiental (SGA), que a complementa. Já o SGA pode ser baseado na
AIA e desenhado para implementar, de modo eficaz, as medidas de gestão ambiental
preconizadas como resultado da avaliação prévia do projeto. Pode haver sinergismo
entre os dois instrumentos. Como afirmado por Marshall (2002, p. 287), “enquan-

CAPÍTU LO
A E t a p a de A c o m p a n h a m e n t o n o P r o c e s s o de A v a l ia ç ã o de I m p a c t o A m b ie n R M I 457

to o processo de AIA é antecipatório Início da implantação Início da operação— |


1
em sua previsão de efeitos adversos, PRE-DECISAO APROVAÇÃO POS-DECISÃO
cuja verdadeira escala somente pode
AIA etapa de A IA - etapa de A IA - etapa de
ser monitorada depois que o projeto análise detalhada acompanham ento acompanhamento
estiver em implantação, um SGA é rea­
tivo, com previsões de efeitos adversos Planejamento do projeto Implantação Operação + gestão
sendo feitas com base em dados obser­
AIA
vados ou monitorados”.
SGA

Outros instrumentos de gestão também


têm papel complementar. A auditoria Fig. 18.1 Relação entre os papéis da avaliação de impacto ambiental (AIA)
ambiental pode ser parte do SGA, e e dos sistemas de gestão ambiental (SGA) nas principais fases do ciclo de
serve para verificar sua conformidade vida de um empreendimento, mostrando a função da etapa de acompanha­
em relação a critérios preestabelecidos, mento na ligação entre o planejamento e a gestão ambiental
dentre os quais necessariamente figura Fonte: adaptado de Marshall (2001a).
o atendimento aos requisitos legais e às
condições impostas pela licença ambiental. Já a avaliação de desempenho ambiental
permite demonstrar se os resultados esperados em termos de proteção ambiental
e implementação de programas compensatórios estão sendo atingidos. A Fig. 18.2
ilustra o ciclo de planejamento, implementação, controle e melhoria5 que orienta e 5Também conhecido
estrutura os sistemas de gestão. como “ciclo
PDCA” - plan, do,
Embora os sistemas de gestão ambiental tenham aplicação mais difundida para a fase check, act.
de funcionamento de empreendimentos, também podem ser empregados com sucesso
para a fase de implantação, como demonstrado em alguns casos (Marshall, 2002;
Sánchez e Gallardo, 2004).

Identificar aspectos e impactos ambientais, estabelecer programas de gestão e realizar


monitoramento são alguns dos pontos comuns entre a avaliação de impacto ambiental
e os sistemas de gestão ambiental. Essa é um a das razões de existir um “alto grau de
congruência” (van der Worst, Grafe-
Buckens e Sheate, 1999) entre a ava­
uc:
liação de impacto e os instrumentos,
'

Impacto i
— Aspecto 1
Impacto ii U <03

como os sistemas de gestão ambiental C


Atividade A Impacto i Aspectos e impactos
e a análise de ciclo de vida. Ridgeway Aspecto 2 Impacto iii ’ uo
Atividade B
(2005) defende o ponto de vista de Atividade C Impacto iv ~Q aJ significativos
00
o
que, conforme vai se acumulando Impacto ii ’
Aspecto 3
Impacto v
a experiência com os sistemas de Ò
PLAN
gestão ambiental, vai ficando mais
claro como algumas das ferramentas r pi
do SGA podem ser usadas para auxi­ Melhoria ACT A D DO contínua

liar na implementação dos resultados L cJ


da AIA. A Fig. 18.3 mostra um can­ CHECK

teiro de obras de um a empresa que M onitoram ento Programas Objetivos e


Análise
adota um SGA de acordo com a crítica registro e auditoria de ação metas ambientais
norma ISO 14.001; atividades como
tratamento de efluentes de escavação Fig. 18.2 Identificação e avaliação de aspectos e impactos ambientais e ciclo
de um túnel, armazenamento de PDCA, para a melhoria da gestão do desempenho ambiental
■ a ç ã o de im p a c to A m b ie n ta l: c o n c e ito s e m é to d o s

derivados de petróleo e gestão de re­


síduos, entre outras, são organizadas
de forma a atender a objetivos e metas
de proteção ambiental e prevenção da
poluição.

A principal vantagem de organi­


zar a implementação das medidas
mitigadoras e, de um modo geral,
dos compromissos da empresa e das
condicionantes da licença ambiental
em torno de um sistema de ges­
tão, é que esse é um modo prático
e facilmente reconhecível (por ser
normalizado) de traduzir os compro­
missos e as obrigações do proponente
Fig. 18.3 Canteiro de obras de construção da usina hidrelétrica San Francis­
em um conjunto de tarefas passível de
co, Equador, que conta com sistema de gestão ambiental. Note-se, na porção
verificação e controle. Como consta­
inferior-esquerda da foto, uma instalação de tratam ento de efluentes dos t ú ­
neis em construção
tado por Dias e Sánchez (2001), entre
outr'os autores, muitos compromis­
sos assumidos pelo proponente estão
dispersos em diferentes partes do EIA ou de relatórios posteriores, e a verificação
de seu cumprimento pode facilmente passar ao largo dos trabalhos de supervisão
e fiscalização. Por outro lado, alguns desses compromissos (e mesmo exigências de
licenças ambientais) também precisam ser traduzidos em instruções precisas para as
equipes encarregadas do projeto.

Como maneira de sanar essas deficiências, pode-se dar mais atenção à elaboração
detalhada de um plano de gestão ambiental, como notado, entre outros autores, por
Goodland e Mercier (1999). Uma solução prática é adotada em Hong Kong, onde os
proponentes devem preparar um “Manual de Monitoramento e Auditoria” para cada
projeto; desse manual deve constar um resumo das recomendações do EIA (HKEPD,
1996). 0 Quadro 18.2, à semelhança do Quadro 13.7, ilustra um a maneira de sintetizar
a transformação das recomendações do EIA e das exigências da licença ambiental em
tarefas passíveis de verificação ou auditoria.

Dias (2001), enfatizando o caráter público do processo de AIA, vai mais longe na
proposta de tradução das condições impostas para o empreendimento, e propõe que
o resultado da etapa decisória deveria ser um “documento de aprovação” do projeto.
Esse documento, diferentemente das licenças atuais, que somente fazem menção
à obrigatoriedade de adoção das “medidas propostas no EIA”, deveria compilar
todas essas medidas em um formato adequado para a etapa de acompanhamento,
facilitando a supervisão, a fiscalização e a auditoria. A esse propósito, Morrison-
Saunders, Baker e Arts (2003) observam que no Estado da Austrália Ocidental os
proponentes devem apresentar, no EIA, um a “lista consolidada de compromissos de
mitigação e monitoramento”, que é usualmente incorporada às condicionantes da
autorização governamental.

CAPÍTU jLO
Quadro 18.2 Registro de requisitos de gestão ambiental para verificação de andamento e atendimento
N úmero T ipo de D e s c r iç ã o Fo n te e R esponsável P razo S it u a ç ã o R e g is t r o de n ã o D ocumentos
DE ORDEM m e d id a DA MEDIDA r e f e r ê n c ia atual c o n f o r m id a d e s c o m p r o b a t ó r io s

1 M A tiv id a d e s de c o n s tr u ­ EIA, vol. 2, João Pereira Todo o período Em a n d a m e n to 0 5 - doc 3 - 0 5 / 0 6


ção devem ser re a li­ p. 4 2 5 de c o n s tru ç ã o
zadas s o m e n te e n tre *
7h e 19h
2 V C a d a s tra m e n to de Termo de c o m ­ Pedro Silva Um mês antes T o ta lm e n te Sem registro R e la tó rio 1 - 0 3 /0 4
m ão de obra local prom isso firm a d o do in ício das im p le m e n ta d o
com a p re fe itu ra c o n tra ta ç õ e s
3 C
4 E Realizar s a lv a m e n to EIA, vol. 2, C o n tra ta ç ã o T é rm in o antes Em a n d a m e n to Sem registro R e la tó rio A rcheos
a rq u e o ló g ic o nos sítios p. 432 da em presa do in ício das 3 2 5 A -E -0 1
Piraquara e A n g e lim LI c o n d ic io n a n te "A rcheos" a tiv id a d e s no
#4 supervisão de s e to r no rte
Ana M a c ie ira
E
n G
M - medidas de mitigação ou atenuação de impactos negativos
C - medidas de compensação de impactos negativos
V - medidas de valorização de impactos positivos
E - estudos complementares
G - medidas de capacitação e gestão
a.'ação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

Afinal, se o EIA demonstra a viabilidade do empreendimento, esta é sempre condicio­


nada ao atendimento das medidas mitigadoras e demais programas de gestão. Se os
compromissos assumidos pelo empreendedor não forem redigidos de maneira clara,
então a verificação de seu atendimento será muito difícil ou mesmo impossível. 0 que
se requer, desta forma, é uma espécie de contrato público entre o empreendedor e a
sociedade, no qual esta é representada pelo agente governamental.

&

CAPÍTU LO
GLOSSÁR

A n á l is e de r is c o s
Conjunto de atividades de identificação, estimativa e gerenciamento de risco.

A n á l is e d o s i m p a c t o s
Em um estudo ambiental, designa a atividade de identificar, prever a magnitude e avaliar a
importância dos impactos decorrentes da proposta em estudo.
/

9
A r e a de e s t u d o
Area geográfica na qual são realizados os levantamentos para fins de diagnóstico ambiental.
r

A r e a de i n f l u ê n c i a
Area geográfica na qual são detectáveis os impactos de um projeto.

A specto a m b ie n t a l
Elemento das atividades, produtos ou serviços de uma organização que pode interagir com o
meio ambiente (segundo NBR ISO 14.001:2004).

A t r i b u t o ( de u m im p a c t o )
Característica ou propriedade de um impacto, podendo ser usada para descrevê-lo ou qua-
lificá-lo.

A u d it o r ia a m b ie n t a l
Atividade sistemática, documentada, objetiva e periódica que visa analisar a conformidade
de uma atividade com critérios prescritos.

A v a l ia ç ã o (da im p o r t â n c ia ) dos im p a c t o s
Atribuição de um qualificativo de importância ou significância de um impacto ambiental, qua­
lificativo esse sempre referido ao contexto socioambiental onde se insere o empreendimento.

A v a l ia ç ã o de i m p a c t o a m b i e n t a l
Processo de exame das conseqüências futuras de uma ação presente ou proposta.

A v a l ia ç ã o d e r is c o
Processo pelo qual os resultados da análise de riscos são utilizados para a tomada de decisão.

C ampo de a p l i c a ç ã o d a a v a l i a ç ã o de i m p a c t o a m b i e n t a l
Conjunto de ações humanas (atividades, obras, empreendimentos, projetos, planos, progra­
mas) sujeitas ao processo de AIA em uma determinada jurisdição.

C ompensação a m b ie n t a l
Substituição de um bem que será perdido, alterado ou descaracterizado por outro, entendido
como equivalente ou que desempenhe função equivalente.

C r it é r io de a v a l i a ç ã o
Regra ou conjunto de regras para avaliar a importância de um impacto.

D egradação a m b ie n t a l
Qualquer alteração adversa dos processos, funções ou componentes ambientais, ou alteração
adversa da qualidade ambiental.

D esempenho a m b ie n t a l
Conjunto de resultados concretos e demonstráveis de proteção ambiental. Resultados do ge­
renciamento dos aspectos ambientais de uma organização (segundo ISO 14.031:1999).
liação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

D iagnóstico ambiental
Descrição das condições ambientais existentes em determ inada área no momento presente.
Descrição e análise da situação atual de uma área de estudo feita por meio de levantamentos
de componentes e processos do meio ambiente físico, biótico e antrópico e de suas interações.

E feito ambiental
Alteração de um processo natural ou social decorrente de um a ação hum ana.

Estudo de impacto ambiental


Documento integrante do processo de avaliação de impacto ambiental, cuja estru tura e con­
teúdo devem atender aos requisitos legais estabelecidos pelo sistema de avaliação de impacto
ambiental em que esse estudo deve ser realizado e apresentado. Estudo ou relatório que e x a ­
mina as conseqüências ambientais futuras de uma ação proposta.

E studo de impacto de vizinhança


Mlodalidade específica de estudo de impacto ambiental adaptado a empreendimentos e im­
pactos urbanos.

Estudos de base
Levantamentos acerca de alguns componentes e processos selecionados do meio ambiente
que podem ser afetados pela proposta (projeto, plano, programa, política) em análise.

G estão ambiental
Conjunto de medidas de ordem técnica e gerencial que visam a assegurar que o empreendi­
mento seja implantado, operado e desativado em coíiformidade com a legislação ambiental e
outras diretrizes relevantes, a fim de m inim izar os riscos ambientais e os impactos adversos,
além de m axim izar os efeitos benéficos.

Identificação de impactos
Descrição das conseqüências esperadas de um determinado projeto e dos mecanismos pelos
quais se dão as relações de causa e efeito, a p artir das ações modificadoras do meio ambiente
que compõem um empreendimento ou outra ação hum ana.

Impacto ambiental
Alteração da qualidade ambiental que resulta da modificação de processos naturais ou so­
ciais provocada por ação humana.

Impactos cumulativos
Impactos que se acum ulam no tempo ou no espaço, e resultam de um a combinação de efeitos
decorrentes de um a ou diversas acões.

Impactos de médio (ou de longo) prazo


Aqueles que ocorrem com um a certa defasagem em relação à ação que os gera.

Impactos diretos
Aqueles que decorrem das atividades ou ações realizadas pelo empreendedor, por empresas
por ele contratadas, ou que por eles possam ser controladas.

Impactos imediatos
Aqueles que ocorrem simultaneamente à ação que os gera.

Impactos indiretos
Aqueles que decorrem de um impacto direto causado pelo projeto em análise, ou seja, são
impactos de segunda ou terceira ordem.
GLOSSAR 10

Impactos irreversíveis
Alterações para as quais há impossibilidade ou dificuldade extrema de retornar à condição
precedente; alterações ambientais que não podem ser corrigidas por iniciativa humana, por
razões de ordem técnica, econômica ou social.

Impactos permanentes
Alterações definitivas do meio ambiente ou alterações que têm duração indefinida (um im­
pacto permanente pode ser reversível ou irreversível).

Impactos reversíveis
Alterações do meio ambiente que podem ser corrigidas por iniciativa humana (ações de re­
cuperação ambiental).

Impactos temporários
Aqueles que só se manifestam durante uma ou mais fases do projeto, e que cessam quando
de sua desativação; impactos que cessam quando cessa a ação que o causou (a alteração do
ambiente sonoro termina quando cessa a fonte de ruído).

M atriz de impactos
Quadro ou planilha estruturado em linhas e colunas, que pode ser apresentado sob diferentes
formatos, e que mostra correlações entre (1) as ações ou atividades do empreendimento ana­
lisado e (2) os componentes ou elementos ambientais, ou entre (1) as ações ou atividades do
empreendimento analisado e (3) os aspectos e/ou impactos ambientais.

M edidas compensatórias
Ações que visam a compensar a perda de um bem ou função que será perdido em decorrência
do projeto em análise.

M edidas mitigadoras
Ações propostas com a finalidade çje reduzir a magnitude ou a importância dos impactos
adversos.

M edidas potencializadoras (ou de valorização)


Ações propostas com a finalidade de realçar a magnitude ou a importância dos impactos
benéficos.

M onitoramento ambiental
Coleta sistemática e periódica de dados previamente selecionados, com o objetivo principal
de verificar o atendimento a requisitos predeterminados.

P erigo
Condição ou situação física com potencial de acarretar conseqüências indesejáveis.

P lano de gestão ambiental


Em um estudo de impacto ambiental, um conjunto de medidas propostas para prevenir, ate­
nuar ou compensar impactos adversos e riscos ambientais, além de medidas voltadas para
valorizar os impactos positivos.
O conjunto de medidas necessárias, em qualquer fase do período de vida do empreendi­
mento, para evitar, atenuar ou compensar os impactos adversos e realçar ou acentuar os
impactos benéficos.

P rocesso de avaliação de impacto ambiental


Um conjunto de procedimentos concatenados de maneira lógica, com a finalidade de analisar a
viabilidade ambiental de projetos, planos e programas, e fundamentar uma decisão a respeito.
a'ação de Impacto Ambiental: conceitos e métodos

P oluição
Introdução, no meio ambiente, de qualquer forma de matéria ou energia que possa afetar
negativamente o homem ou outros organismos.

P revisão de impactos
Uso de métodos e técnicas para antecipar a m agn itud e ou a intensidade dos impactos
ambientais.

PROGNÓSTICO A M B IE N TA L
Projeção da provável situação futura do ambiente potencialmente afetado, caso a proposta
em análise (projeto, política, plano, programa) seja implementada; tam bém se pode fazer um
prognóstico ambiental considerando que a proposta em análise não seja implementada.

R ecuperação ambiental
Aplicação de técnicas de manejo visando tornar um ambiente degradado apto para um novo
uso produtivo, desde que sustentável.

R elatório de impacto ambiental (R ima)


Denominação dada pela regulamentação brasileira (Resolução Conama 1/86) ao documento
que sintetiza as conclusões do estudo de impacto ambiental.

Risco ambiental
Potencial de ocorrência de efeitos adversos indesejados para a saúde ou vida hum ana, para o
ambiente ou para bens materiais (segundo Society for Risk Analysis).

S istema de avaliação de impacto ambiental


Mecanismo legal e institucional que torna operacional o processo de avaliação de impacto
ambiental em um a determinada jurisdição.
Expressão legal do processo de avaliação de impacto ambiental em uma determinada jurisdição.

S istema de gestão ambiental


Conjunto de compromissos, procedimentos, documentos e recursos hum anos para planejar,
implementar, controlar e melhorar as ações de uma organização, com intuito de cum prir suas
obrigações e compromissos de natureza ambiental.

S ubstância perigosa
Toda substância ou m istura que, em razão de suas propriedades químicas, físicas ou toxico-
lógicas, só ou em combinação com outras, represente um perigo (Convênio OIT 174: 1993).

S upervisão ambiental
Atividade contínua realizada pelo em preendedor ou seu representante, com a finalidade
de verificar o cum prim ento de exigências legais ou co n tratu a is por parte de empreiteiros
e de quaisquer outros contratados p a ra a im plantação, operação ou desativação de um
em preendim ento.
Qualquer verificação do atendim ento de obrigações de natureza contratual, até mesmo o
atendim ento a obrigações legais.

Termos de referência
Diretrizes para a preparação de um EIA.
Um documento que (i) orienta a elaboração de um EIA; (ii) define seu conteúdo, abrangência,
métodos; e (iii) estabelece sua estrutura.
APÊNDICE A 465

G u i a p a r a a n á l i s e t é c n i c a de e s t u d o s d e i m p a c t o a m b i e n t a l

Este apêndice apresenta um guia para a análise de um estudo de impacto ambiental de


um projeto rodoviário, que pode ser aplicado para novas rodovias ou para ampliações e
melhorias de rodovias existentes. Este roteiro pode ser facilmente adaptado para outros
tipos de projetos.

0 roteiro segue a estrutura típica de um EIA. Para cada subdivisão importante de um


capítulo do estudo, a equipe de análise dá um conceito. Para tal, algumas subdivisões
típicas foram agrupadas por afinidade.

Para a apreciação da qualidade de cada item, podem-se adotar os conceitos propos­


tos pela Universidade de Manchester, ou aqueles sugeridos pela Comissão Européia.
0 analista pode também desenvolver seus próprios critérios para atribuir conceitos
a cada item. 0 importante é aplicá-los de modo sistemático durante toda a análise.
Para organizações que continuamente devem analisar estudos de impacto ambiental,
a utilização de critérios sistemáticos e homogêneos permite a realização de um trab a­
lho consistente e abre a possibilidade de fazer comparações - por exemplo, pode-se
comparar estudos feitos para o mesmo tipo de empreendimento ou analisar a evolu­
ção temporal da qualidade dos estudos apresentados.

Considera-se que os itens em itálico são fundam entais para o bom entendimento do
projeto e de seus impactos, e por essa razão deverão receber no mínimo conceito “C”,
ou “aceitável”. Deve-se atribuir um conceito a cada um dos quesitos que compõem um
ixem e em, seguida atribuir um conceito geral ao item. No caso de haver apenas um
quesito, o conceito atribuído valerá como conceito do item.

Esse rol de critérios não pretende nem pode substituir uma análise crítica do projeto
apresentado ou a discussão de seus eventuais méritos ou deficiências. Tem como única
finalidade auxiliar o analista em sua leitura do estudo de impacto ambiental e demais
documentos pertinentes. E sempre conveniente que o resultado da análise técnica seja
expresso na forma de um relatório ou parecer técnico expondo as conclusões e princi­
pais observações da análise realizada. Não é adequado nem eficaz apresentar somente
uma “nota” ou conceito baseado na aplicação de uma lista de verificação. Há de se
explicar e fundam entar os motivos pelos quais um estudo de impacto ambiental é ju l­
gado suficiente ou não. Nessa apreciação, é preciso discernir entre problemas menores
e falhas graves, ou cruciais. Para tanto, um a lista de verificação bem estruturada pode
ser uma ferramenta poderosa para subsidiar um a análise sistemática e rigorosa.
M jE N D IC E A

Listo de verificação poro análise de um estudo de im pacto a m b ie n ta l de um projeto rodoviário


I tem d o estudo C r i t é r i o s de a n á lis e /q u e s it o s B j H

S umário Há um sumário paginado que permita encontrar


rapidamente um assunto de interesse?
1. INTRODUÇÃO Faz uma boa contextualização do projeto e do
estudo realizado?
2 . 1NF0RMAC0ES
*
GERAIS ... ... .... . : . .•’
2.1 Identificação do empreendedor A informação apresentada é completa? ------------ —
2.2 Identificação da empresa A informação apresentada é completa?
responsável pelo EIA e Rima
2.3 H istórico do em preendim ento Permite um bom entendimento do histórico do
projeto atual e dos projetos que o precederam?
Há uma descrição dos estudos prévios que levaram
à formulação do projeto atual?
2.4 Objetivos do em preendim ento e Objetivos são claramente expostos?
sua ju s tific a tiv a Justificativas podem ser facilmente refutadas?
Há inconsistências entre objetivos e justificativas
aqui expostos e aqueles veiculados em outros
documentos ou declarações verbais?
2.5 Localização do empreendimento Mapas e plantas permitem localização inequívoca?
2.6 Etapas de implantação do Há uma descrição satisfatória?
empreendimento Há um cronograma?
2.7 Planos e programas governamentais Foram descritos?
colocalizados Falta algum programa importante de conhecimento
do analista?
2.8 Fontes de recursos financeiros A informação é clara?
2.9 C om patibilidade do em preendim ento Foi apresentada análise ou simples relação de leis e
com a legislação am biental regulamentos?
2.10 Atividades de consulta pública Há descrição detalhada ou remissão a outros
realizadas documentos pertinentes?
Há descrição dos principais pontos levantados na
consulta pública?
Há menção sobre em que parte do EIA esses pontos
são tratados?
3 . C a r a c t e r iz a ç a o do e m p r e e n d im e n t o
3.1 Projeto funcional A descrição permite boa compreensão do projeto?
Eventuais projetos de reassentamento foram
devidamente descritos?
As desapropriações necessárias foram descritas e
quantificadas?
3.2 Alternativas tecnológicas Há menção a estudos sobre outros modais de
transporte?
Há justificativa da escolha do modal rodoviário?
3.3 A lternativas de localização e traçado Alternativas de acesso a cidades, contornos de
áreas urbanas e equipamentos sociais são descritos
com detalhe?
Alternativas de transposição ou contorno de áreas
de interesse ambiental são descritas com detalhe?
Alternativas razoáveis apresentadas em reuniões
e audiências públicas foram consideradas?
São apresentadas razões de ordem ambiental para
as alternativas selecionadas?
3.4 Descrição da rodovia projetada A descrição permite boa compreensão do projeto?
Plantas, mapas, fotos e figuras esclarecem o projeto?
APÊNDICE A 467

. £ Descrição dos principais serviços As atividades causadoras de impactos ambientais são


- r etapa de construção descritas em detalhes?
Localização e características de canteiros de obras são
descritos?
0 número estimado de trabalhadores da construtora e de
terceiros é apresentado?
Critérios de contratação e dispensa de trabalhadores são
apresentados?
As necessidades de insumos, matérias-primas e outros itens
são descritas adequadamente?
Alguma importante atividade causadora de impactos foi
omitida?
/

E apresentado um cronograma consistente?


Emissões de poluentes e atividades que utilizem recursos
ambientais (como água) são descritas?
As necessidades de remoção de vegetação nativa são
quantificadas?
: r descrição dos principais serviços na As atividades causadoras de impactos ambientais são
b t d o de operação descritas em detalhes?
Alguma importante atividade causadora de impactos
foi omitida?
- I AGNÓSTICO AMBIENTAL
Ceiimitação da área de estudo Eventuais modificações da área de estudo com relação
àquela definida nos termos de referência (TR) são
justificadas?
-_2 '.fe/o físico As informações sobre o meio físico atendem às demandas
dosTR?
Os métodos utilizados para os diferentes levantamentos são
descritos com adequado detalhe?
Foram levantados dados primários quando necessário?
Foi dada ênfase a levantamentos que esclareçam sobre os
principais impactos ou sobre questões controversas?
Há informações supérfluas ou irrelevantes para a tomada de
decisões?
As escalas dos mapas apresentados permitem boa
representação dos processos ou fenômenos do meio físico?
Foram identificadas áreas com potenciais problemas de ordem
geotécnica? Neste caso, a informação prestada é adequada?
Recursos hídricos de utilização real ou potencial, como
mananciais, foram identificados e descritos?
Os principais usos da água a jusante da obra foram descritos?
Foram identificadas e mapeadas zonas com problemas
críticos de ruído?
- 3 M eio biótico As informações sobre o meio biótico atendem às demandas
do TR?
Os métodos utilizados para os diferentes levantamentos são
descritos com adequado detalhe?
Foram levantados dados primários quando necessário?
Foi dada ênfase a levantamentos que esclareçam sobre os
principais impactos ou sobre questões controversas?
Há informações supérfluas ou irrelevantes para a tomada de
decisões?
As ocorrências de vegetação nativa foram identificadas e
mapeadas?
Hábitats importantes ou ecossistemas frágeis foram
identificados e mapeados?
35ENDICEA

Item d o estudo C r i t é r i o s de a n á lis e /q u e s it o s C o n c e it o 1


4.4 M eio antrópico As informações sobre o meio antrópico atendem às
demandas dos TR?
Os métodos utilizados para os diferentes levantamentos são
descritos com adequado detalhe?
Foram levantados dados primários quando necessário?
Foi dada ênfase a levantamentos que esclareçam sobre os
principais impactos ou sobre questões controversas?
Há informações supérfluas ou irrelevantes para a tomada de
decisões?
As formas de uso do solo são adequadamente descritas e
mapeadas?
As populações a serem deslocadas foram caracterizadas?
Elementos significativos do patrimônio natural e cultural
foram identificados, descritos e mapeados?
4.5 Qualidade ambiental 0 texto traz uma síntese da situação pré-projeto?
5 . A n á l is e d o s im p a c t o s
Os métodos e procedimentos de análise são explicados?
Há clara distinção entre identificação, previsão e avaliação
dos impactos?
5.7 Identificação dos im pactos 0 método usado para identificação é claramente explicado?
am bientais Os impactos são descritos por intermédio de enunciados claros?
Impactos indiretos também foram identificados?
Algum impacto significativo de conhecimento do analista foi
omitido?
5.2 Previsão e avaliação dos im pactos Estimativas quantitativas de impactos foram apresentadas
am bientais quando pertinente?
A utilização de modelos matemáticos é justificada?
Há informações sobre sua calibração para as condições locais?
No caso de previsões quantitativas, há informação sobre as
incertezas associadas?
Os critérios de atribuição de importância aos impactos são
explicitados? São utilizados de forma coerente?
Caso tenha sido utilizada alguma ponderação, os critérios de
atribuição de pesos são claramente definidos? 0 número de
pessoas que participou das sessões de ponderação é
informado? 0 procedimento para dirimir divergências entre
a equipe foi explicitado?
Foram considerados impactos cumulativos decorrentes de
ações induzidas pelo projeto analisado?
Foram considerados impactos cumulativos decorrentes de
outras ações ou empreendimentos em curso ou previstos para
a área de influência do projeto analisado?
5.3 Análise preliminar de riscos Foi feita uma adequada identificação dos perigos?
As hipóteses de acidentes são plausíveis?
Alguma hipótese importante de acidente deixou de ser
considerada?
/

5.4 Prognóstico da qualidade ambiental E feita uma síntese da qualidade ambiental futura?
futura com e sem o empreendimento
6. P r o g r a m a s de g estã o a m b ie n t a l
6.1 Programas de gestão Medidas mitigadoras são compatíveis com os impactos
causados?
São propostas medidas para todos os impactos relevantes,
diretos e indiretos?
A P E N D IC E M 469

A forma de apresentação das medidas mitigadoras permite


confiarem sua eficácia? Há dúvidas quanto à sua eficácia?
Há medidas que permitam valorizar os impactos positivos?
Medidas de compensação foram negociadas previamente
com as partes interessadas e autoridades envolvidas? São
apresentadas evidências de negociações ou acordos?
Eventuais efeitos negativos dos programas de gestão
foram mencionados e descritos?
Caso alguma medida de gestão deva ser implementada por
outro(s) agente(s) que não o proponente do projeto, há
documentação que ateste o compromisso deste(s) outros(s)
agente(s)?
0 programa de gestão é descrito de modo que permita uma
verificação ou auditoria de sua implementação?
Há provisão para a preparação de relatórios de
acompanhamento das medidas propostas no plano de gestão?
6.2 Plano de m onitoram ento am biental Os principais impactos estão contemplados no plano?
A localização das estações de amostragem é adequada?
As frequências de amostragem são adequadas?
Os métodos de coleta e análise dos dados são informados?
6.3 Sistema de gerenciamento ambiental 0 sistema é compatível com as medidas de gestão
da rodovia propostas?
7 . S ín te s e e c o n c lu s õ e s
As principais conclusões do EIA são retomadas nessa seção?
R e f e r ê n c ia s b ib l io g r á f ic a s

Todas as citações bibliográficas do texto são adequadamente


referidas?
Há referência completa a estudos não publicados, com
indicação dos locais onde podem ser consultados?
G l o s s á r io d e t e r m o s t é c n ic o s u t il iz a d o s

' Os principais termos estão adequadamente definidos?


E q u ip e T é c n ic a
Os participantes do estudo são identificados com seus
respectivos números de registro profissional?
Menciona-se com suficiente detalhe a parte de cada um
no estudo?
A nexos

Algum anexo citado no texto deixou de ser apresentado?


As informações apresentadas são claras?
R e l a t ó r io d e im p a c t o a m b i e n t a l
*

E redigido em linguagem acessível ao público?


E suficientemente conciso para permitir uma leitura rápida?
Apresenta ilustrações que expliquem satisfatoriamente
o projeto?
Apresenta os objetivos e justíficativas do empreendimento?
Descreve com clareza os principais impactos ambientais?
R ecursos

Como em outras especialidades, também o profissional da avaliação de impacto


ambiental necessita de contínua atualização. A experiência individual é, sem dúvida,
inestimável, mas um profissional competente não pode prescindir da experiência co­
letiva acumulada para formar e consolidar sua base de conhecimento. Este apêndice
traz referências internacionais e a indicação de alguns recursos para a boa prática da
avaliação de impacto ambiental.

I n t e r n a t io n a l A s s o c i a t i o n fo r Impact A ssessment - IA IA - w w w .ia ia .o rg


A IAIA é uma associação profissional fundada em 1980. Com sede nos EUA, tem as­
sociados em dezenas de países, além de associações nacionais ou regionais filiadas,
reunindo mais de mil pessoas. A IAIA organiza um congresso internacional anual,
o primeiro, realizado no ano de sua fundação. Também edita Impact Assessment and
Project Appraisal, uma das principais publicações periódicas internacionais sobre
avaliação de impactos. Sua página na Internet é regularmente atualizada. Dentre os
documentos de interesse, citam-se:
# o SEA Performance Criteria
# o International Principies for Social Impact Assessment
# o Biodiversity in Impact Assessment
% o Public Participation International Best Practice Principies
& o Health International Best Practice Principies

que formam um conjunto de documentos sintéticos com diretrizes de boas práticas


da AIA. 0 site da IAIA também traz dezenas de indicações de outras páginas de in ­
teresse.

# International Study of the Effectiveness of Environmental Impact Assessment


Documento publicado em 1996, que relata os trabalhos de um grupo interna­
cional de especialistas sobre a eficácia da AIA, com um diagnóstico de sua
aplicação e recomendações para melhoria.

Programa das N ações U n id a s para o M e io A m b ie n t e - P N U M A /D iv is ã o de


Ec o n o m ia e C o m é r c io - w w w .u n e p .c h
A página desta divisão do PNUMA traz inúmeros materiais de interesse para a gestão
ambiental: especificamente acerca de avaliação de impacto ambiental, destaca-se:

# Training Resource Manual for Environmental Impact Assessment (2nd edition)


Trata-se de um compêndio escrito por um grupo de especialistas para progra­
mas de capacitação e treinamento em avaliação de impacto ambiental, sob uma
óptica internacional; apresenta fundamentos e ferramentas de AIA, disponível
em www.unep.ch/etb/publications/envilmpAsse.php

S e c r eta r ia da C onvenção I n t e r n a c io n a l sobre a D iv e r s id a d e B io l ó g ic a -


w w w .b io d iv .o rg
Este tratado internacional reconhece a importância da avaliação de impacto ambiental
e sua potencial contribuição à proteção da biodiversidade. Além do texto original da
APÊNDICE

Convenção preconizar sua aplicação, outros documentos produzidos sob a égide da


Convenção e aprovados pelos países aderentes enfatizam o uso da AIA e dão diretri­
zes específicas para incorporar a proteção da biodiversidade aos estudos ambientais
e à avaliação ambiental estratégica. Mencionam-se, em particular:

& Guidelines for Incorporating Biodiversity-Related Issues into Environmental


Impact Assessment Legislation and/or Process and in Strategic Environmental
Assessment
Documento aprovado pela 6a. Conferência das Partes (Haia, abril de 2002),
como “Decisão VI/7” e anexo a essa decisão.

# Impact Assessment: Voluntaiy Guidelines on Biodiversity-Inclusive Impact


Assessment
Documento aprovado pela 8a. Conferência das Partes (Curitiba, março de 2006),
como “Decisão VIII/28” e anexo a essa decisão.
Ambos os documentos estão disponíveis em www.biodiv.org/convention/cops.asp

B a n c o M u n d ia l - w w w .w o rld b a n k .o rg
lomo principal agente financeiro internacional, o Banco reconhece a importância da
AIA em seu processo decisório. Suas políticas e procedimentos são disponíveis para
o público. 0 site também traz informação atualizada sobre pedidos de empréstimos e
suas condicionantes ambientais, assim como diversos documentos acerca da aplica­
ção da AIA. Destacam-se:

Environmental Assessment Sourcebook


Manual com informações sobre os procedimentos adotados pelo Banco e dis­
cussão sobre os principais impactos e medidas mitigadoras de vários tipos de
projeto; publicado em 1991 e complementado por diversos capítulos de atualiza­
ção publicados até 2002.

& Safeguard Policies


Conjunto de documentos que explicitam as políticas do Banco com relação
à proteção dos recursos ambientais e culturais em projetos submetidos para
possível financiamento; uma delas define os procedimentos de AIA do Banco.

NTERNATIONAL FlNANCE CORPORATION - WWW.ifc.org/enviro


C IFC é o braço do Banco Mundial que financia projetos privados; por isso segue
:s mesmos princípios que o Banco, mas tam bém desenvolve e publica seus próprios
:rocedimentos e recomendações, adaptados às características dos projetos de investi-
iores privados. Destacam-se:

§ Padrões de Desempenho (Performance Standards)


Conjunto de documentos sintéticos que descrevem os papéis e as responsabili­
dades dos clientes na gestão de seus projetos, com recomendações para o trato
de questões socioambientais.
# Good Practice Guidance
Série de documentos que acompanha os padrões de desempenho, detalhando-os
e fornecendo diretrizes para projetos privados; suas recomendações podem ser
usadas em quaisquer tipos de projetos.

# Good Practice Notes


Conjunto de guias e diretrizes sobre temas socioambientais específicos, como
Addressing the Social Dimensions of Private Sector Projects, Handbook for
Preparing a Resettlement Action Plan, Doing' Better Business Through Effeeti-
ve Public Consultation e Pollution Prevention and Abatement Handbook, entre
outros.

S ites g o v e r n a m e n t a i s
A maioria das agências ambientais envolvidas com avaliação de impacto ambiental
dispõe de sites com informações sobre leis e regulamentos e casos em andamento,
com possibilidade, em algumas delas, de consultar ou copiar estudos ambientais. Em
geral, no Brasil deve-se buscar sob “licenciamento ambiental”.

No Brasil, pode-se citar:


# íbama, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renová­
veis: www.ibama.gov.br *
# Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo: www.ambiente.sp.gov.br
# Fundação Estadual do Meio Ambiente de Minas Gerais: www.feam.br

Nos EUA, informações sobre a aplicação da Nepa (National Environmental Po-


licy Act) podem ser encontradas nos sites de várias agências do governo federal.
Um ponto conveniente de acesso é a RedeNEPA (NEPA Net): www.nepa.gov/nepa/
nepanet.htm. Por meio da rede, há acesso ao texto da lei e seu regulam ento e às
páginas correspondentes das agências federais, assim como a informações sobre os
estados que têm requisitos semelhantes aos federais. Informações sobre a Nepa ta m ­
bém podem ser consultadas por meio da página do Conselho de Qualidade Ambiental:
www.whitehouse.gov/ceq

No Canadá, informações sobre avaliação de impacto ambiental podem ser encon­


tradas nas páginas dos governos provinciais e, sobre o governo federal, na Agência
Canadense de Avaliação Ambiental: www.ceaa-acee.gc.ca, que m antém um registro
de todos os estudos ambientais feitos sob sua jurisdição e daqueles feitos em con­
ju n to com as províncias, podendo-se consultar informações sobre os projetos, sua
situação, atas de audiências públicas e relatórios de comissões de avaliação.

Documentos da União Européia sobre AIA podem ser encontrados na Diretoria Geral
de Ambiente, setor responsável pela integração das políticas europeias e acompa­
nham ento de sua implementação pelos países-membros; a página correspondente,
que indica documentos e estudos disponíveis, é www.ec.europa.eu/environment/
eia, com destaque para guias sobre triagem, scoping e análise de EIAs. Informações
sobre cada país da União Européia devem ser buscadas nos respectivos governos
nacionais e regionais.
APÊNDICE

A página do Departamento de Meio Ambiente da Região Administrativa Especial


de Hong Kong (www.epd.gov.hk/eia/) foi organizada para fornecer aos cidadãos a
maior parte das informações que poderiam ser buscadas em arquivos ou documentos
impressos; há informações atualizadas sobre projetos em andamento, especialmente
sobre a fase de acompanhamento, como relatórios parciais e consolidados de m o­
nitoramento, m anuais de gestão e auditoria e a compilação das condicionantes das
licenças ambientais, além dos próprios estudos de impacto ambiental.

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