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FOLHETIM
O JORNALZINHO DA GALERA DA FÍSICA
NOVEMBRO - 1999
Encontrada a solução
para a seca do Nordeste
Em espetacular missão de resgate, a equipe do
Folhetim partiu para a Antártica com o objeti-
vo de rebocar o gigantesco iceberg B10A, des-
prendido das geleiras Thwaites. A idéia foi do
Luiz Alberto, numa tentativa de encontrar uma
solução para a seca do Nordeste. Quem está
entusiasmado com a missão é o Fonte Boa, que
não perde uma Antártica gelada. Na foto, a equi-
pe do Folhetim tenta descobrir como passar a
corda debaixo da pedra, sem rachar - Página 11
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criticá-la. O meu personagem Sim- Como vocês podem ver, a prensa Perguntus: Mas o que isso tem a
plicius não é o mesmo Simplicius hidráulica tem dois ramos cilíndricos ver com os 9?
de Galileu, aquele um Aristotélico com êmbolos de áreas bem diferen- Expertus: Professor, ele não en-
convicto, cheio de certezas. O meu tes entre si, A1 e A2. Dêem uma olha- tendeu mesmo.
Simplicius é tão somente um pro- da na figura do livro. Pois bem, devi- Perguntus: E tu que entendeu, diz
fessor de Física comum, atual, não do ao princípio de Pascal, visto na de onde vêm os nove!
um Aristotélico como o personagem aula anterior, a pressão exercida so- Expertus: O professor já expli-
galileano, mas como aquele, tam- bre o líquido se transmite por igual cou, animal. Presta atenção.
bém, com muitas certezas e poucas em todas as direções. Olhando para Simplicius: Calma pessoal. Eu vou
dúvidas. Como nos filmes america- a figura vocês podem ver que isso repetir tudo de novo. Preste aten-
nos, porém, cabe ressaltar, que qual- nos garante que: F1/A1 = F2/A2 . E ção. O princípio de Pascal não diz
quer semelhança com personagens sendo A2 = nA1, teremos: F1/A1 = que a pressão no líquido vai ser a
reais, é uma mera coincidência. F2/nA1. Logo: F2 = nF1. Se, por mesma dos dois lados? Lembra
O conteúdo dessa conversa re- exemplo, F1 fosse igual a 1 newton e daquele experimento que eu fiz o
trata as observações, de muitos a área A1 igual a 1m2, enquanto a área desenho na aula passada?
anos de ensino, da prática docente A2 fosse igual a 10m2, então a força Perguntus: Qual, professor?
de vários colegas. Neste sentido, F2 deveria ser igual a 10 newtons. Simplicius: Aquele que a gente ti-
os personagens são fictícios, mas Nós conseguimos, assim, multiplicar nha um vaso com vários furos ta-
o tipo de acontecimento retratado, o valor da força, daí a utilidade da pados com rolhas e então a gente
certamente, não é. prensa hidráulica. Ela é usada, por colocava líquido dentro, até à boca,
De Onde Vêm os Nove? exemplo, nos freios de automóvel e e empurrava a tampa. O que é que
A cena passa-se numa sala de aula nos lava-jatos dos postos de gasoli- acontecia?
comum onde o professor Simplicius na, para elevar os carros.
inicia a sua aula sobre a prensa hi- Perguntus: Professor, de onde
dráulica. Os alunos Expertus e Per- vêm os nove?
guntus escutam atentamente. Simplicius: Que nove?
Simplicius: O que vimos na aula Perguntus: Os nove, professor.
passada? Não era 1 e não passou para 10?
Expertus: O princípio de Pascal. Simplicius: Do que você está fa-
Simplicius: Muito bem! O que ele lando?
dizia? Perguntus: A força que aumen-
Expertus: Que um líquido com- tou, professor, de onde vem?
primido transmite a pressão exer- Simplicius: É uma conseqüência
cida sobre ele da mesma forma, por imediata, como vimos, do princí-
igual, em todas as direções. pio de Pascal. Você não entendeu
Simplicius: Muito bem! Hoje nós a explicação? Veja lá, você se lem-
vamos estudar um tópico bem sim- bra da aula passada, do princípio
ples, mas muito importante, do de Pascal? Acabamos de falar nele.
ponto de vista das suas aplicações: Perguntus: Hum!
a prensa hidráulica. Vejamos o se- Simplicius: Hum, o que? Lembra
guinte desenho, ele representa uma ou não lembra?
prensa hidráulica: Perguntus: Lembro!
Simplicius: Então, o que ele diz?
Perguntus: É aquele negócio da
pressão que ... Sei não, me lembro
não!
Expertus: Professor, eu sei. Dei-
xa eu dizer. É que a pressão se
transmite por igual nos líquidos.
Simplicius: Isso!
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Perguntus: O senhor falou que as sor. Não presta atenção no que o estudante. Sua tentativa de reduzir
rolhas pulavam todas ao mesmo senhor fala. a questão levantada a uma mera
tempo. Perguntus: Vou te dar um murro conseqüência do princípio de Pas-
Simplicius: Isso. Pois bem, a Fí- lá fora. cal, conduziu a aula a uma circulari-
sica é uma ciência experimental. Expertus: Vem, vem! dade. Suas frases sobre ser a Físi-
Como nós vimos, no desenho da- Simplicius: Epa!, lá fora vocês se ca uma ciência experimental, não
quele experimento, as rolhas pula- acertam, mas aqui eu quero calma. parecem passar de um jogo de
vam todas ao mesmo tempo. Isso Como é, você entendeu, agora? palavras. Seu tratamento do con-
é o princípio de Pascal. A prensa Perguntus: Não! teúdo é essencialmente livresco.
hidráulica é apenas uma aplicação Simplicius: Como não? Qual a Refere-se aos desenhos dos expe-
dele. OK? dúvida? Eu não acabei de explicar, rimentos, como se estivesse refe-
Expertus: Ele num tá entendendo de novo? rindo-se aos experimentos em si
não, professor. Deixa que eu ex- Perguntus: Professor, eu não en- mesmos. Por outro lado, sua ten-
plico a ele. tendo de onde vêm os nove. tativa final de escamotear a ques-
Simplicius: Não. Deixe que eu Simplicius: Mas você não falou tão, afirmando que os experimen-
mesmo explico. Veja, o princípio que estava certo? tos mostram que as coisas aconte-
de Pascal não diz que a pressão Perguntus: Professor, eu entendi cem desse modo, é uma mera ten-
vai ser a mesma dos dois lados da as contas, né? Mas, o que eu que- tativa de esconder o fato de não
prensa? Que a pressão feita na área ro saber é de onde vêm os nove. ter, ele mesmo, compreendido a
A1 vai ser transmitida por inteiro à Simplicius: Então você não com- profundidade e a seriedade da
área A2? preendeu o princípio de Pascal. questão. Essa postura empirista, do
Perguntus: Diz! Não tem nenhum nove. As pres- nosso professor hipotético, serve-
Simplicius: Então! sões são iguais e pronto. O aumen- lhe de refúgio nas horas mais difí-
Perguntus: Então, o que? to da força é uma conseqüência ceis, nas quais a sua fragilidade te-
Expertus: Professor, ele num tem matemática, elementar, do princí- órica é a sua principal companheira.
jeito mesmo. Deixe pra lá. Conti- pio de Pascal. O que mais você O comportamento igualmente
nue a matéria. O senhor tá perden- quer entender? Os experimentos caricaturado do outro aluno,
do tempo. mostram que é assim. A Física é Expertus, é um retrato do quanto
Perguntus: Cala a boca, chato. uma ciência experimental. É um se pode ser bem sucedido e ao
Deixa o professor explicar. problema muito simples. Não en- mesmo tempo mal formado dentro
Simplicius: Pois é, como a pres- tendeu as contas? dos padrões de um ensino tradici-
são é a mesma dos dois lados, pelo Perguntus: As contas eu entendi. onal que não incentiva o questiona-
princípio de Pascal, teremos que Eu não entendi é de onde vêm os mento, mas sim a repetição des-
F1/A1 = F2/A2 . Como F1 é igual a nove. provida da crítica. A adesão incon-
1 newton e A1 é igual a 1 m2, a Reflexões sobre a aula teste de Expertus às explicações
pressão do primeiro lado é 1N/m2, Certamente a estória apresen- dadas pelo professor Simplicius e
certo? tada acima é uma simples carica- a sua recusa em aceitar, de bom
Perguntus: Certo! tura do que acontece verdadeira- grado, o valor do questionamento
Simplicius: Então! Do outro lado mente em sala de aula, mas como mais radical de Perguntus, são li-
a pressão tem que ser 1 também. toda caricatura ela procura ressal- ções da mais pura subserviência à
Como ela é igual a F2/A2 e A2 é tar os traços a serem criticados. E palavra do mestre.
10m2, qual deve ser o valor de F2 o ponto central, é o pouco caso que Mas, afinal, o que poderia estar
para que dividido por 10 dê igual a é feito das considerações energé- por trás da questão levantada por
1? 10, certo? ticas envolvidas na concepção da Perguntus? Por que a sua estra-
Perguntus: Certo! prensa hidráulica. Retomemos, por nheza em relação à mudança no
Simplicius: Olhe aí, eu não disse exemplo, a dúvida do estudante valor da força? Por que a simples
que era fácil? Física é fácil, é só Perguntus: de onde vêm os nove? explicação matemática de Simpli-
prestar atenção e repetir como uma Na estória que apresentamos cius não o satisfez?
canção. As contas nesse caso são acima o professor Simplicius não Perguntus parece ter compre-
facílimas, não têm no que errar. parece ter entendido, ou mesmo le- endido, paradoxalmente, os passos
Expertus: Ele é voador, profes- vado muito a sério, a dúvida do seu matemáticos, sem dúvida muito
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simples, dados pelo professor, e mesmo êmbolo d1. No outro ramo sobre o trabalho realizado na pren-
mesmo assim, ter continuado com da prensa, uma área maior A2 re- sa hidráulica. Toda a exposição é
a sua dúvida. Na verdade, o tipo cebe uma força igualmente maior centrada nas relações entre as áre-
de dúvida por ele suscitada é mui- F2 às custas da realização do mes- as e na conseqüência, devido ao
to freqüente nas aulas de Física, mo trabalho: F1 x d1 = F2 x d2. princípio de Pascal, do aumento do
mas nem sempre devidamente va- Assim sendo, há uma compensação valor da força. Não é observado,
lorizado. do aumento do valor da força com por exemplo, que a obediência ao
O que parece conferir um senti- uma conseqüente e idêntica redu- princípio de Pascal dá-se a um cus-
do ao questionamento do nosso hi- ção no deslocamento do segundo to energético a ser pago: onde a for-
potético estudante é uma expecta- êmbolo. Desta forma, apesar de F2 ça é maior, o deslocamento do êm-
tiva da existência de uma certa “si- ser igual a nF1, a mesma relação exis- bolo é proporcionalmente menor.
metria” na situação em causa. A in- tente entre as áreas (A2 = nA1), o Por outro lado, a simplicidade
quietação parece provir de uma ex- deslocamento d2 será d1/n. da matemática que é utilizada nas
pectativa de que houvesse algo Esta questão está ilustrada nu- apresentações tradicionais da pren-
como uma “conservação da força”. ma animação da prensa hidráulica sa hidráulica é enganosa, não de-
Ainda que o nosso personagem que anexamos ao presente texto e vendo ser confundida com a sim-
Perguntus não tenha demonstrado está disponível no site deste Folhe- plicidade do conteúdo em si mes-
a possibilidade de explicitar sua tim na Internet. Ela não se preten- mo. É uma simplicidade que decor-
dúvida nesses termos, parece ter de solução para coisa nenhuma, re essencialmente de uma triviali-
sido a idéia de um princípio de con- mas é oferecida apenas como uma zação deste conteúdo.
servação, de fato não existente, simples ilustração a mais para sub- Não é de se estranhar, portan-
que estava por trás desse tipo de sidiar a insubstituível discussão a ser to, que muitos alunos não compre-
questionamento. desenvolvida pelos nossos colegas endam a natureza mais íntima do
Se por um lado, não existe real- professores de Física em suas sa- seu funcionamento, a forma apa-
mente uma conservação da força, las de aula. rentemente “mágica” de multiplicar
por outro lado, a forma como a No geral, há, efetivamente, uma o valor da força. A argumentação
força evolui espacialmente, ou seja, relação de simetria sendo obser- do nosso professor hipotético so-
o trabalho que realiza, define, efe- vada, relação esta diretamente li- bre o que mais haveria a compre-
tivamente, uma relação de simetria gada a um princípio de conserva- ender, uma vez tendo-se acom-
do tipo esperado. Ou seja, a ener- ção. A distinção entre força e ener- panhado o desenvolvimento mate-
gia mecânica posta em jogo de um gia, no entanto, não é algo trivial, mático, encerra uma questão de
lado da prensa hidráulica deve ser como possa, à primeira vista, pa- grande importância no ensino da Fí-
a mesma que é transferida para o recer. A tortuosa história da cons- sica. Ela lembra um acontecimento
outro ramo do instrumento. Isso, trução do conceito de energia mos- narrado por Heisenberg, um dos
baseado no pressuposto de que o tra que ainda nos trabalhos de maiores físicos de todos os tem-
líquido seja, de fato, incompres- Helmholtz, na metade do século pos, a respeito da sua dificuldade,
sível, para que não ocorra perda XIX, a idéia de energia, enquanto quando ainda estudante, de com-
de energia. Pascal tinha essa ques- uma grandeza física nova e de alto preender a teoria da relatividade.
tão do pressuposto da incompres- poder generalizador, aparecia ain- Numa conversa com o seu colega
sibilidade muito clara em sua men- da com o nome de “kraft”, que em Wolfgang Pauli, Heisenberg retra-
te, ao introduzir a idéia dos “des- alemão pode significar, igualmen- ta, de forma brilhante, a questão,
locamentos virtuais”, que seriam te, força (Harman, 1985, p. 41). aqui levantada, da aparência enga-
posteriormente reformulados na Uma parcela dos professores de nosa do raciocínio matemático em
Física como “trabalhos virtuais”. Física não chama a atenção destes relação ao conteúdo por ele repre-
A questão energética, posterior aspectos ligados à conservação da sentado.
a Pascal, mas no fundo, latente em energia quando discutindo conteú- “Wolfgang perguntou-me -
sua formulação do problema, pode dos de hidrostática. O testemunho creio ter sido à noite, numa hos-
ser colocada da seguinte forma. O maior da pouca importância dada pedaria de Grainau - se eu ha-
trabalho realizado sobre o êmbolo a este assunto pode ser encontra- via finalmente compreendido a
de área A1 é igual ao produto da do, por exemplo, na ausência de teoria da relatividade, de
força F1 pelo deslocamento deste referências claras às discussões Einstein, que desempenhava um
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papel tão importante no seminá- ao menos percebidas, mas que po- University Press, 1985
rio de Sommerfeld. Só pude di- dem ser problematizadas à luz de - Heisenberg, W. A Parte e o Todo.
zer que eu não sabia realmente o uma cuidadosa análise histórico- Rio de Janeiro: Contraponto, 1996
que significava ‘compreender’ conceitual. - Hewitt, P. Conceptual Physics.
em nossa ciência natural. O apa- Conclusão Boston: Scott, Foresman and
rato matemático da teoria da re- Incursões históricas sobre a for- Company, 1989
latividade não me causava ne- mulação original de Pascal e sobre
- Mach, E. The Science of Me-
nhuma dificuldade, mas isso não o problema da prensa hidráulica,
chanics. La Salle, Illinois: Open
significava, necessariamente, assim como sobre outros assuntos
Court Classics, 1989.
que eu houvesse ‘compreendido’ da Física, poderiam ser extrema-
porque um observador em mo- mente interessantes de serem dis- - Taylor, L. Physics: The Pioneer
vimento, ao usar a palavra ‘tem- ponibilizadas aos nossos professo- Science. New York: Dover, 1959.
po’, referia-se a algo diferente de res. Principalmente se aliadas a
um observador em repouso. considerações filosóficas, educaci-
Aquilo me intrigava e me pare- onais e experimentais. Elas pode-
cia incompreensível. riam revelar aos nossos mestres
- Mas, havendo compreendi- certos detalhes essenciais da for-
do o arcabouço matemático - mação dos conceitos envolvidos
contestou Wolfgang -, com cer- que, com certeza, poderiam ser de
teza você pode prever o que um grande valia na compreensão das
observador em repouso e um ob- dificuldades de construção daque-
servador em movimento têm que
observar ou medir. Temos boas
razões para supor que um expe-
rimento real confirme essas pre-
le conhecimento e das possíveis
origens das dúvidas dos seus
próprios alunos. O espaço dispo-
nível de um artigo, no entanto, não
“ O ensino de Física tem-se
realizado freqüentemente me-
diante a apresentação de con-
ceitos, leis e fórmulas, de for-
visões. O que mais você quer? comporta mais que uma provoca- ma desarticulada, distancia-
- Eis aí o meu problema - re- ção analítica, como a aqui ofereci- dos do mundo vivido pelos
truquei. - Não sei o que mais pode da. Um tratamento mais pormeno- alunos e professores e não só,
ser exigido. Sinto-me meio ludi- rizado da questão demandaria, cer- mas também por isso, vazios
briado pela lógica implícita no tamente, um texto muito mais lon- de significado. Privilegia a
arcabouço matemático. Talvez go, não condizente com o objetivo teoria e a abstração, desde o
você possa até dizer que aprendi aqui estabelecido. Infelizmente, primeiro momento, em detri-
a teoria com o cérebro, mas não uma literatura deste tipo não pare- mento de um desenvolvimen-
ainda com o coração” (Heisen- ce, ainda, ser do interesse da mai- to gradual da abstração que,
berg, 1996, pp. 41-42). oria dos editores, ao menos em lín- pelo menos, parta da prática
Esse sentimento de ter sido “tra- gua portuguesa. e de exemplos concretos. En-
ído” pelo raciocínio matemático, é fatiza a utilização de fórmu-
Alexandre Medeiros, PhD
algo que parece estar na base de las, em situações artificiais,
(med@hotlink.com.br) desvinculando a linguagem
boa parte das dificuldades manifes- Programa de Pós-Graduação em
tas por alguns estudantes de Físi- matemática que essas fórmu-
Educação nas Ciências - Departa- las representam de seu signi-
ca; justamente os mais questiona- mento de Física e Matemática - ficado físico efetivo. Insiste na
dores, mas não necessariamente os Universidade Federal Rural de solução de exercícios repetiti-
mais bem sucedidos nesse modelo Pernambuco vos, pretendendo que o apren-
formalista e repetitivo de educação. dizado ocorra pela automati-
A questão da prensa hidráulica, le- Referências Bibliográficas
zação ou memorização e não
vantada neste artigo, é apenas um - Dugas, R. A History of Me- “
pela construção do conheci-
exemplo, dentre tantos outros pos- chanics. New York: Dover, 1988. mento através das competên-
síveis, nos quais um aparato mate- - Harman, P. Energy, Forces and cias adquiridas.
mático extremamente simples, en- Matter: The Conceptual Deve-
cerra armadilhas conceituais nem lopment of Nineteenth-Century MEC, Parâmetros Curriculares
sempre seriamente confrontadas ou Physics. Cambridge: Cambridge Nacionais (Ensino Médio).
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SEGUNDA PARTE
Partículas elementares e
forças da natureza
Apresentamos anteriormente as vitacional, a força eletromagnética é curto alcance, pois está restrita a di-
partículas elementares as quais de- de longo alcance, sendo responsá- mensões de 10-15m (dentro do núcleo).
nominamos de “tijolos da Natu- vel por manter os elétrons ligados aos O fato desta força só ocorrer en-
reza”. No entanto, nos fica a per- núcleos, formando os átomos. Essas tre hádrons é o que os diferencia dos
gunta: “Como essas partículas se forças são responsáveis pelas liga- léptons. Dentro do núcleo, a força
rearranjam de maneira a formar ções químicas e pelas propriedades forte é aproximadamente 137 vezes
os objetos que nos rodeiam”? físicas dos sólidos, líquidos e gases. maior que a força eletromagnética.
Como veremos nesta segunda par- A teoria que descreve o comporta- A teoria que hoje acreditamos des-
te, existem quatro forças funda- mento quântico das interações ele- crever a força forte é a Cromodinâ-
mentais na natureza, responsáveis tromagnéticas é a Eletrodinâmica mica Quântica. Entretanto, devido à
pelo Universo que temos ao nosso Quântica. Essa teoria é certamente complexidade desta teoria, ainda
redor. Vejamos a descrição de cada uma das teorias com maior sucesso não sabemos se várias característi-
uma dessas forças. na Física, cujas previsões teóricas cas da força forte são descritas pela
AS FORÇAS têm sido confirmadas experimental- teoria, apesar de existirem fortes evi-
FUNDAMENTAIS mente com grande precisão. dências de que ela descreve os fe-
A Força Forte nômenos dentro do núcleo.
A Força Gravitacional A força forte é responsável por A Força Fraca
Força de atração que existe en- manter a estabilidade dos prótons Ao contrário das três forças an-
tre todos os elementos da Nature- e nêutrons dentro do núcleo. Para teriores, pelo que se sabe até hoje, a
za. Estamos mais acostumados a vermos a necessidade de uma for- força fraca não é responsável por
associá-la à atração entre corpos ça diferente da força eletromagné- manter partículas ligadas. As forças
que possuem massa. Essa força é tica para manter os nucleons uni- fracas são responsáveis por decai-
responsável por nos manter sobre dos, basta lembrar que os prótons mentos, como, por exemplo, o de-
a Terra, assim como por manter a possuem carga elétrica positiva e caimento b de nêutrons livres. Mes-
trajetória dos corpos celestes e as os núcleos dos átomos, a partir do mo dentro do nucleon, a força fraca
estruturas de galáxias, conglomera- Hélio, possuem vários prótons lo- é da ordem de 10-5 vezes menor que
dos de galáxias, que há no Universo. calizados dentro de uma região cujo a força forte. A força fraca é de cur-
A força gravitacional é uma força raio é da ordem de 10-15m, o que to alcance. O seu raio de ação é da
atrativa de longo alcance. Isto quer ocasiona uma enorme repulsão en- ordem de 10-17m, que é menor que
dizer que, a qualquer distância entre tre essas partículas carregadas ele- o diâmetro nuclear (10-15m).
dois corpos, sempre há uma força tricamente. Para que o núcleo seja Tanto os léptons quanto os
de atração entre eles, embora, em estável, é necessário existir uma hádrons interagem através da for-
alguns casos, essa força seja despre- força maior que se contraponha a ça fraca. No caso dos neutrinos,
zível comparada a outras forças a que essa repulsão. Entretanto, essa no- que são partículas sem carga elé-
os corpos estão sujeitos. va força só deve ser importante den- trica, a única força através da qual
A Força Eletromagnética tro do núcleo, uma vez que sabemos eles interagem é a força fraca.
A força eletromagnética existe que prótons livres se repelem. Como esta interação é muito pe-
entre partículas que possuem car- Os nucleons são estados ligados quena, temos como conseqüência
ga elétrica. Ao contrário da força de partículas chamadas de quarks. que o estudo das características
gravitacional, a força eletromagné- Os quarks interagem entre si atra- dos neutrinos é muito difícil. Ape-
tica pode ser de atração ou de re- vés da força forte que mantém a es- sar de existirem várias experiênci-
pulsão. Como no caso da força gra- tabilidade do nucleon. Esta força é de as em andamento envolvendo os
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A força gravitacional é a força das Gostaríamos de lembrar que to- distintas entre si, e o fato de o fóton
grandes escalas (o cosmo). Na figu- das as partículas carregadas eletri- ter massa zero faz com que a força
ra 1, vimos que a força gravitacional, camente, quer sejam léptons, quer pela qual ele é responsável seja de
inclusive dentro do nucleon, é muito sejam hádrons, interagem eletro- longo alcance, podendo ser senti-
menor que as outras forças funda- magneticamente através da troca da a qualquer distância, enquanto
mentais, de forma que, de agora em de fótons. que a força fraca restringe a sua
diante, nos restringiremos a discutir A força fraca é sentida por to- ação a distâncias dentro do núcleo,
as outras três forças fundamentais: dos os tipos de partículas: léptons devido às partículas responsáveis
eletromagnética, fraca e forte. e hádrons. As partículas respon- por essa interação serem muito
O fóton (luz) é a partícula respon- sáveis pela força fraca são os cha- pesadas.
sável pelas forças eletromagnéticas. mados bósons vetoriais W ± e Z0. A força forte é mediada pelo
Quando duas partículas carregadas Os bósons vetoriais W ± e Z0 fo- glúon, que é um bóson que não tem
eletricamente interagem entre si, elas ram detectados no início da déca- massa. Apesar da partícula respon-
estão trocando fótons. Devemos res- da de 80 no CERN (Europa). Des- sável pela força forte ter massa
saltar que, apesar dos fótons serem de então as suas propriedades têm zero, a força forte tem alcance
os responsáveis pela interação entre finito, que se restringe ao tamanho
sido estudadas sistematicamente.
as partículas carregadas, o fóton não
O bóson Z0 tem carga elétrica nula, do núcleo. Isto ocorre devido à pe-
possui carga elétrica. O fato de a
enquanto que os W ± possuem car- culiaridades da Cromodinâmica
força eletromagnética ser de longo
ga elétrica ±1e. Quântica. Ao contrário da força
alcance nos permite garantir que a
O decaimento b do nêutron, que fraca, apenas os hádrons interagem
massa associada ao campo respon-
é mediado pelo bóson W-, passa via força forte.
sável por essa interação é zero.
Como o fóton é o campo responsá- a ser descrito pelo diagrama da fi- (Como dissemos anteriormente,
vel por esta interação, podemos afir- gura 4. todos os hádrons são estados li-
mar que a sua massa é zero, e, conse- p νe gados de partículas fundamentais
-
qüentemente, sua velocidade é igual W chamadas quarks. Os quarks são
à velocidade c da luz. A velocidade e- muito mais pesados que o elétron.
n Lembremos que uma característi-
do fóton é sempre igual a c, qual-
quer que seja o referencial a partir D iag ram a do de ca im en to β. O b ó so n ca interessante dos quarks é que
-
v eto ria l W d ec ai nu m elétron (e - ) e no eles possuem carga elétrica fracio-
do qual o observamos. an ti-n e utrino do elétron ( νe ), d e form a
Esta nova formulação das for- q u e os produ tos d o d ec aim en to do
nária, como foi mencionado na pri-
ças da Natureza preserva leis de n êu tron são: p ró ton (p ), elétron (e - ) e o meira parte deste artigo. Lá, tam-
conservação, tais como, por exem- an ti-n e utrino do elétron ( νe ). bém comentamos que, experimen-
plo, a conservação da carga elétri- talmente, até hoje nunca foi medi-
ca total em todo o espaço. No caso fig ura 4 da uma carga elétrica fracionária
eletromagnético temos os proces- em nenhum material. Isto equivale
sos descritos na figura 3. Voltamos a mencionar a unifica- a dizer que não existem quarks li-
ção das forças fraca e eletromag- vres. Os quarks aparecem na Na-
e+ γ
e- e+ e- nética para distâncias menores que tureza apenas na forma de estados
γ
γ 10-18m. As energias envolvidas ligados. Esses estados ligados têm
e+
e- nessa escala de tamanho são tão cargas elétricas expressas por múl-
(a) (b )
grandes que não faz diferença o tiplos inteiros da carga elétrica fun-
P roc essos e m q ue a carga elétric a fato do fóton não ter massa, en- damental do elétron).
tota l se co n serv a em tod os os in stan tes. quanto que a massa dos bósons Cada tipo (sabor) de quark (up,
(a) E spa lh am en to d o elétron (e - ) po r vetoriais W ± e Z0 é da ordem de down, strange, charm, botton, top)
su a an tipa rtícu la (e + , p ósitro n) p ela 105 me, onde me é a massa do elé- existe em três estados diferentes,
tro ca d e u m fó to n ( γ).
tron. Para distâncias menores que que chamamos de cor. Daí dizer-
(b ) C riaçã o d e u m p ar elé tro n -pó sitro n 10-18m não é possível distinguir as mos que os quarks têm carga de
a p artir d e um fóto n. P ara c riar o p ar,
a e ne rg ia m ín im a d o fó ton ( γ) é d e 1M e V.
partículas: W ± , Z0 e o fóton. En- cor. No caso de partículas carre-
tretanto, para distâncias maiores gadas eletricamente, temos dois ti-
fig u ra 3 que 10-18m, as forças voltam a ser pos de carga elétrica: carga elétri-
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ca positiva e carga elétrica nega- essas partículas e suas interações. G. (1988), Quando a energia se
tiva. No caso das forças fortes, te- Para isso os grandes aceleradores transforma em matéria...Um re-
mos três cargas de cores distintas. de altas energias como o CERN, lance sobre o mundo das partí-
A presença da carga de cor faz com Fermi Lab., SLAC, continuam tra- culas, Publicação do CERN.
que exista a interação forte. A es- balhando. Um sem número de físi- [4] WEISSKOPF, V. F. (1981)
colha dos nomes das cores é arbi- cos teóricos trabalha no sentido de The Development of Field Theory
trária, e vamos aqui denominá-las ver quais são as previsões teóricas in the Last 50 years, Physics
de: verde, vermelho e azul. Os para compará-las com os resulta- Today, November, p. 69.
glúons, que são as partículas in- dos experimentais. Certamente esta [5] GLASHOW, S. L. (1975),
termediárias da interação, apare- é uma área da Física muito ativa e Quarks with Color and Flavor,
cem como a combinação dessas deverá continuar como tal, excitan- Scientific American , vol. 233, no.
três cores. Por isso os glúons exis- do a criatividade do pesquisador a 4 (October), p. 38.
tem em 8 tipos distintos, como mos- desenvolver novas formas de se [6] QUIGG, C. (1985), Elemen-
trado no exemplo da figura 5. obter energias mais altas, de ma- tary Particles and Forces, Scien-
neira a se poder penetrar cada vez tific American, April, p. 64.
u a zu l d v erd e u a zu l d v erd e mais nas partículas e verificar se [7] WICHMANN, E. H. (1971),
g objetos como o elétron e o quark Quantum Physics, Berkeley Phy-
=
são realmente pontuais ou possu- sics Course, vol. 4, MacGraw-Hill:
u v erd e u a zu l u v erd e d a zu l em alguma estrutura. Acima de New York.
tudo isso, está a busca do sonho [8] Particle Adventure - An Inter-
T ro c a d e c o res en tre o s q u ark s de Albert Einstein de que é possí- active Tour of the Inner Workings
vel unificar todas as forças da Na- of the Atom and the Tools of
fig u ra 5 tureza. Nesta unificação, que se Discovery. Home-page: http://
Podemos fazer a analogia entre espera ocorrer em distâncias da pdg.lbl.gov/cpep.html
glúon e fóton de muitas maneiras, ordem de 10-31m, as quatro forças [9] Review of Particle Properties,
pois ambos são bósons que não fundamentais seriam apenas dife- Home-page: http://pdg.lbl.gov/
possuem massa, responsáveis pela rentes manifestações de uma única
força. Mas isto é um outro aspec-
interação entre partículas. Entretan-
to da Teoria Quântica de Campos FOLHE TIM
to, uma característica os distingue:
o fóton não possui a carga elétrica e deixamos a sua discussão para Esta é uma publicação mensal da
uma próxima oportunidade. Galera Hipermídia
que é a carga responsável pela inte-
Maria Teresa Thomaz Jornalista Responsável:
ração por ele mediada, enquanto Sandra Filippo - DRT /BA-739
que o glúon possui a carga de cor, (Instituto de Física, Universidade Redação:
Federal Fluminense, RJ) Luiz Alberto Guimarães, Marcelo
que é a carga responsável pelas Fonte Boa, Mauro Santos Ferreira,
interações fortes. Aqui está toda a mtt@if.uff.br Sandra Filippo e Ovidio Brito
Bibliografia Desenvolvimento de software:
diferença que explica o fato de que, Thiago Guimarães
apesar do glúon não ter massa, a [1] MIGNACO, J.A. E SHHEL- Ilustração:
força forte que ele media é de cur- LARD, R.C. (1984) Quarks, Marcelo Pamplona
Léptons, Glúons, g, W, Z ...A Diagramação:
to alcance. Ovidio Brito
Palavra Finais Matéria Indivisível, Ciência Hoje, Apoio Operacional:
vol. 3, no14 (Setembro/Outubro), Fernando Guimarães
Muito já se sabe do mundo das Folhetim é distribuído gratuitamente. A
partículas elementares, que são os p. 42. autoria das colaborações é identificada
em cada artigo e as opiniões emitidas
tijolos da Natureza como Leucipo [2] Abrindo o Coração da Maté- são de responsabilidade dos seus auto-
res, não refletindo necessariamente a opi-
e Demócrito procuravam há mais ria, Ciência Ilustrada, Novembro/ nião da direção do jornal. Ao remeter
uma colaboração, seu autor concorda
de 2.400 anos atrás. Entretanto, Dezembro (1982) pág. 58. que seja publicada, sem nenhum ônus,
de qualquer espécie, para o Folhetim.
muito ainda há por aprender sobre [3] CARRERAS, R. e HENTSCH,
NOVEMBRO DE 1999 FOLHE TIM 11
b) 1,7 . 1021 J
c) 1,3 . 105 anos!!! A simplicidade vem de Fortaleza
3. a) 3,6 . 103 km. Esta é a solução algébrica
Em nosso livro de Termologia
b) 3,1 . 103 km.
e Óptica, há um exercício suple- clássica. No entanto, recebemos
c) 1,4km/dia; 1,2km/dia
mentar (número 61 da unidade II), do professor Geraldo Majela, de
4. Aproximadamente 30 mil quilô-
metros. Esta distância corresponde do vestibular da Universidade Fe- Fortaleza, a sugestão de acres-
a 3/4 de uma volta completa em deral do Ceará, aqui reproduzido: centar no manual de resolução a
torno da Terra. É, portanto, muito Um objeto frontal O, de 10cm “solução inteligente”, ou seja,
maior do que o deslocamento do de altura, encontra-se a 50cm de aquela que “mata o problema em
iceberg, da Antártica até as Ilhas um espelho côncavo de distância uma linha”. Nesse caso, em um
Malvinas. Isto significa que os focal f = 10cm, formando uma ima- desenho, pois a solução alterna-
12km/dia ou se referem à veloci- gem I, conforme a figura. Se reti- tiva é gráfica. Vamos a ela.
dade atual do bloco de gelo, e não rarmos o espelho, a que distância Reproduzimos a seguir a figura
à sua velocidade média no percur- do objeto devemos colocar uma da questão, e nela adicionamos o
so, ou então, “esqueceram da vír- lente convergente, a fim de que esta raio que, saindo da extremidade do
gula”: o item (c) da questão anteri- produza uma imagem igual àquela objeto, passa pelo centro de cur-
or mostra que a velocidade média obtida com o espelho? vatura do espelho, reflete-se e re-
do iceberg é da ordem de 1,2km/ torna na mesma direção, passan-
dia. O
F do pela extremidade da imagem:
5. 38 dias; 68km.
Luiz Alberto e Marcelo I 50 cm
10 cm
f2g@cen.g12.br
C F
No gabarito comentado dos
Agora nós temos a cartilha, re- ocupação. sores da UERJ lotados no CAP.
chear o contexto depende da com- Marcos: São poucos os pesqui- O diferencial da instituição é a for-
petência do professor. A universi- sadores que conseguem falar para mação do corpo docente, todo ele
dade tem um papel muito impor- públicos distintos. Tem pesquisa- com mestrado. Nossa preocupa-
tante para a educação continuada, dor que só consegue falar para ção é avaliar, permanentemente, a
no sentido de trazer os professo- pesquisador da mesma área. O praxis pedagógica aqui desenvol-
res afastados, sem a visão globa- papel do professor que está na li- vida.
lizante do ensino. A universidade cenciatura é o de fazer essa tradu- Folhetim: Como funciona o es-
deve dar conta de um processo de ção para o aluno de graduação. tágio supervisionado do CAP/
ensino e aprendizado que respon- Arruda: O ensino da Física é ina- UERJ que a Cristina coordena?
da a situações vivenciais. Nós da dequado tanto no 2o quanto no 3o Cristina: Cabe ao estagiário mon-
academia, nesse momento do graus. O professor de Física do 3o tar um projeto que implique em ati-
PCN, temos que resgatar a quali- grau é um bacharel, um mestre ou vidades de observação e partici-
dade do ensino público, até por- um doutor. Essas pessoas foram pação no sentido de não dissociar
que somos de uma universidade formadas numa perspectiva de pes- a teoria da prática. O estágio tem
pública. quisa. Não foram dadas a eles fer- importância porque permite o con-
Arruda: Não adianta as regras do ramentas, instrumentos metodoló- tato direto com a realidade de 1o e
PCN serem bem feitas. É impor- gicos de como encaminhar a trans- 2o graus. Através dele se analisa e
tante saber implementá-las. Não missão do conhecimento. A CA- caracteriza a realidade escolar
adianta fazer um projeto pedagó- PES está com uma proposta de pesquisando e testando inovações
gico para uma escola se o profes- fazer com que o mestre, o doutor metodológicas. Assim é possível
sor não tem conhecimento de me- venham à sala de aula. integrar os conhecimentos teóricos
todologias. Então, coisas que ele Folhetim: Vocês têm um site na e práticos no desenvolvimento e
aplicava há 10 anos vão continuar Internet onde a gente lê: “O aprimoramento do futuro profissi-
sendo aplicadas. O papel da uni- CAP/UERJ é concebido no sen- onal de ensino.
versidade é fundamental para a tido de construir um modelo es- O estágio é aberto às licencia-
aplicação e a adequação do PCN. colar livre de preconceitos de turas e áreas de especialização
Folhetim: Vocês estão falando toda ordem...” Na prática, isso como Odontologia - o CAP tem
da importância do papel da uni- acontece de que forma? um projeto que atende a comuni-
versidade. Vamos falar do pa- Cristina: Na época em que eu fui dade - Administração, Nutrição,
pel, das responsabilidades, dos diretora do CAP/UERJ havia um Supervisão Escolar. Somos procu-
professores que atuam nas li- concurso para a 1a série do 1o grau. rados por instituições que não têm
cenciaturas preparando/orien- Os candidatos faziam um vestibuli- colégio de aplicação. No entanto,
tando os futuros profissionais do nho. Isso não combinava com a para o estágio, é necessário um
magistério do 2o grau. nossa proposta. Se nós queremos convênio firmado entre o CAP e a
Arruda: A questão passa pelo ter um diferencial em termos de instituição requerente.
conhecimento que o professor uni- ensino, não vai ser com alunos gê- Folhetim: Vocês têm algum cur-
versitário deve ter. As nossas refe- nios que vamos testar nossas so de atualização para profes-
rências são os nossos professores. metodologias. O compromisso por sores de Física?
A qualidade do nosso produto não mim assumido foi acabar com o Arruda: Vamos iniciar um de es-
atende bem às exigências atuais. concurso e o ingresso passou a ser pecialização a partir do próximo
Essa é uma visão crítica. O que é por sorteio. Hoje, nós temos o con- ano. A parte central dele será me-
que se espera? Que a própria uni- vívio de classes sociais distintas. todologia. Nós acreditamos que um
versidade e os professores criem Folhetim: Todo o corpo docen- dos problemas do ensino da Física
condições propícias para um tra- te do CAP é proveniente da no país diz respeito ao metodoló-
balho de atualização, encaminhan- UERJ? gico. Também vamos trabalhar com
do o ensino medológica e cientifi- Cristina: O CAP tem 42 anos de a Física Moderna pensando no pro-
camente para a adequação aos alu- existência e foi criado para ser fissional formado há mais de 10
nos do 2o grau. Na formação do campo de experimentação metodo- anos.
licenciando já deve haver essa pre- lógica. Nós somos todos profes- Folhetim: Existe outra opção de
18 FOLHE TIM NOVEMBRO DE 1999
atualização sem ser um pós-gra- necessária a existência de força, questão é séria. O compromisso da
duação? com uma visão ainda aristotélica. universidade, através da educação
Arruda: Se o interessado não qui- Marcos: A gente brigou muito continuada, é resgatar o professor
ser sair com o título de especialista para mudar o livro de Física. Nós, da rede pública. A universidade
ele pode optar por duas discipli- aqui, lutamos para ser um campo tem o compromisso político com
nas: Instrumentação e Metodolo- de experimentação. O CAP é uma os cursos de licenciatura.
gia do Ensino de Física. Se dese- instituição com 42 anos. Dá um Folhetim: Como vocês reagiram
jar uma formação mais aprofunda- certo trabalho mudar alguma coi- ao aparecimento do Folhetim?
da, opta pelas 4 disciplinas. Dessa sa. A equipe de Física discutiu Cristina: É prazerosa a forma jo-
forma, podemos atender a vários muito a questão da adoção. cosa como é trabalhado o conhe-
interesses. A coleção dá a possibilidade de cimento. Isso traz uma leveza. A
A partir desse curso de especi- explorar o aluno com o conheci- entrevista é uma maneira de apro-
alização, estamos com a idéia de mento que ele está trazendo para a ximar os profissionais ligados à
implementar o ensino à distância. sala de aula. O livro coloca algu- educação. Isso fortalece a nossa
No ensino à distância, o aluno viven- mas perguntas e diz: tente respon- luta. Nós, que lutamos por uma
ciará dois momentos: o momento em der da maneira como você pensa. mudança de mentalidade, somos
que ele comparece à universidade e Isso é importante. O aluno se sen- muito solitários.
cumpre um determinado número de te valorizado e pensa: Pô, eu sei Folhetim: O que o Folhetim não
horas e, outro momento, em que ele alguma coisa, eu sei um pouco de perguntou, mas vocês gostari-
se comunica via Internet com os pro- Física. É claro que nisso tudo tem am falar?
fessores das disciplinas para a exe- o papel do professor em organizar Cristina: Eu quero lembrar uma
cução de trabalhos. as idéias do aluno. citação do Carlos Drummond de
A idéia é bastante interessante, Trabalhar com a coleção não é Andrade, referendando o tempo.
permitindo aos professores afasta- fácil. A começar pelo professor. É Ela foi lembrada por uma turma de
dos da academia e dos grandes mais fácil pegar a apostila do ves- formandos da qual fui paraninfa:
centros produtores de conheci- tibular e entupir o aluno com um “Quem teve a idéia de cortar o tem-
mento manterem-se atualizados. É montão de fórmulas. Mas isso im- po em fatias, ao qual deu o nome
uma grande contribuição para o possibilita o aluno de questionar. de ano, foi certamente um indiví-
ensino da Física. Folhetim: Por falar em vestibu- duo genial. Pois conseguiu, por
Folhetim: Como foi a opção do lar, o CAP/UERJ tem um ótimo decorrência, industrializar a espe-
CAP/UERJ pela coleção “Físi- índice de aprovação... rança”. Eu estou esperançosa numa
ca para o 2o Grau”? Cristina: O vestibular é uma neu- mudança de mentalidade do pro-
Cristina: Foi uma idéia feliz. O tra- rose. A neurose é reforçada pela fessor que está saindo das univer-
balho do Luiz e do Marcelo já vem ansiedade dos pais. O aprendiza- sidades; das instituições governa-
com uma carta de credenciamento, do e o domínio do conteúdo têm mentais; e dos jovens. As institui-
pois passa pela análise de uma uni- que perpassar o ingresso à univer- ções precisam descobrir a impor-
versidade como a UFF. A coleção sidade. O aluno deve aprender a tância da educação. Os jovens
traz uma visão diferenciada. O ves- ser um cidadão. Quando o aluno é acreditarem nas oportunidades
tibular está mudando de uma manei- ensinado a pensar, ele dá conta des- com o domínio do conhecimento.
ra bastante significativa, para melhor. sa passagem ritualesca para o 3o Arruda: É fundamental toda essa
As universidades estão cobrando o grau. O ingresso na universidade não discussão para mostrar a importân-
ensino aplicável ao cotidiano. é um bicho-de-sete-cabeças. cia da Física na formação do nos-
A proposta do Luiz e do Mar- Folhetim: Não é um bicho-de- so cidadão. Mostrar o aspecto da
celo vem exatamente na linha de sete-cabeças para os alunos que relevância social não só do ensino
trabalhar o conceito, o aspecto estudam no CAP/UERJ ou em da Física como, também, da ciên-
fenomenológico, e trazer idéias so- outros bons colégios. Fora disso, cia física. Devemos, desde cedo,
bre o surgimento da Física. Gosto a realidade do Brasil é outra. dar ao jovem cidadão o conheci-
muito do capítulo 9, A Evolução Cristina: E aí, como é que a gente mento do que é ciência e tecnolo-
das Idéias, no livro de Mecânica. faz? Eu me preocupo muito com gia. Mostrar às pessoas que estão
Você situa o aluno. Muitos ainda isso. O papel da universidade é jus- envolvidas na gestão da educação,
chegam ao 3o ano acreditando que tamente o de se preocupar com a particularmente do ensino de 1o e 2o
para a existência de velocidade é qualidade do ensino de 2o grau. A graus, que a Física tem o seu devido
NOVEMBRO DE 1999 FOLHE TIM 19
numa sinuca
tífica deve fazer com que a Física
seja uma coisa mais perto do dia-
a-dia. A nova visão dos livros tex-
tos, a nova visão dos parâmetros
curriculares, já apontam para con- Mesas de sinuca são excelentes locais para se divertir e even-
teúdo, conhecimento e habilidade. tualmente aplicar alguns conhecimentos de Física. Pode-se mes-
A Física é uma disciplina que está mo desenvolver um bom curso de Física apenas analisando os
interagindo em todas as esferas de fenômenos que ocorrem nesse espaço bidimensional.
conhecimento. Como um exemplo, vamos aplicar alguns princípios físicos
Marcos: Quando eu concluí o
mestrado, agradeci aos colegas importantes a uma jogada de sinuca, representada pela foto-
pelas discussões que tínhamos so- grafia estroboscópica reproduzida no final deste artigo (a foto
bre Física em todos os lugares, até original você encontra na página 75 do PSSC, parte 3, 4a edi-
na lanchonete. A minha geração ção, 1974).
tem essa visão nova, procurando A bola (1) foi impulsionada pelo sa interação?
romper com o passado. A confian- taco contra a bola (2), que estava 6. Em uma colisão bidimensional e
ça que eu tenho no futuro do ensino
inicialmente parada. Considerando perfeitamente elástica entre massas
da Física está na gente procurar ino-
var e fazer coisas diferentes. a escala da foto, o intervalo entre iguais (na qual não ocorram efeitos
Eu sinto que tem muita gente se posições sucessivas das bolas e que de rotação), estando uma delas ini-
mexendo. Veja o Folhetim, quan- a massa de ambas vale 250g, res- cialmente parada, as direções após
ta gente enviando cartas e colabo- ponda às seguintes questões: a colisão fazem entre si 90o (quan-
rações! Quem lucra com isso é o 1. Qual o módulo das velocidades to maior a perda de energia ocor-
aluno, que vai ser melhor formado. (em cm/s) da bola (1), antes e de- rida na colisão, menor será este
A melhor coisa que um professor pois da colisão? ângulo).
de Física pode ouvir é o aluno di-
zer que gostou da aula porque não 2. Qual a velocidade da bola (2) a) Demonstre esse resultado (dica:
foi uma coisa chata. após receber o impacto da bola (1)? escreva a expressão da conser-
3. Calcule as quantidades de mo- vação da energia e simplifique as
Seja assinante do vimento das duas bolas, antes e massas. O que aparece?)
FOLHETIM
depois da colisão. Escolha uma es- b) Verifique se na colisão repre-
cala conveniente e represente-as sentada pela fotografia houve ou
vetorialmente, todas a partir de um não perda de energia. Inicialmen-
Para receber GRÁTIS o Fo-
mesmo ponto. A quantidade de te, calcule as energias cinéticas
lhetim, envie este cupom pre-
enchido para a Rua Macaé, 12, movimento (total) é a mesma antes das bolas antes e depois da coli-
Pé Pequeno, Santa Rosa, e depois da colisão? Esse resulta- são e, a seguir, meça o ângulo
Niterói/RJ, Cep: 24240-080 do era esperado? Por que? entre elas após o choque.
Professor: 4. Determine o impulso (em mó- Para finalizar, um truque que
dulo, direção e sentido) exercido sempre faz muito sucesso numa
Endereço completo: pela bola (1) sobre a bola (2) du- mesa de sinuca, e pode render
rante a colisão. Idem para o im- uma boa aposta: coloque quatro
pulso exercido pela bola (2) sobre bolas alinhadas e bem próximas
a bola (1). de uma das caçapas centrais, e
Escola em que trabalha: 5. Considere a interação inicial, desafie o parceiro a que, com
entre o taco e a bola (1). Supondo uma só tacada, arremesse uma
Se preferir, passe um e-mail que o tempo de contato entre am- quinta bola contra elas, colocan-
com todos esses dados para bos foi de 0,01s, qual a intensida- do as quatro de uma só vez na
f2g@cen.g12.br
de da força (média) que atuou nes- caçapa (veja figura 1).
20 FOLHE TIM NOVEMBRO DE 1999