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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO

UNIDADE ACADÊMICA DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA E TECNOLOGIA

DISCIPLINA: INTRODUÇÃO AOS ESTUDOS DA HISTÓRIA


PROFESSOR: DR. JOSÉ BRITO
ALUNO(A): FELLIPE TORRES VERAS RODRIGUES
PERÍODO: 4º
INTRODUÇÃO

Até o século XIX, inexistia a figura do historiador enquanto pesquisador


especialista, que lança mão de correntes muito bem definidas. Eram mais comuns
intelectuais multifacetados, como é o caso de Karl Marx, que passeava por campos
do saber os mais diversos, como política, economia, sociologia (NETO, 2021). Um
de seus biógrafos, Jonathan Sperber (2014), o definiu como “historiador-economista-
sociólogo da Inglaterra vitoriana”.

Marx extrutura um pensamento materialista sobre a história, diferentemente


da corrente hegeliana, que se voltava muito para o campo das ideias. No bojo da
Revolução Francesa, da Revolução Industrial e da Revolução Científica, Marx lidava
com mudanças importantes, como o surgimento de classes sociais e, a partir daí,
descreve como o sistema econômico vigente, o capitalismo, estava criando
desigualdades imensas (NETO, 2021). Nas palavras de Roberto Anav (2017), Marx
“buscava compreender o mundo para transformá-lo”.

DESENVOLVIMENTO

Na obra de Marx e Engels é possível verificar, segundo aponta SILVA (205),


uma visão materialista da história, que faz uma releitura da historiografia clássica e
do método historiográfico. Essa visão materialista não consiste no desdobramento
da ideia de liberdade, à moda de Hegel, nem na enumeração de feitos individuais e
de acontecimentos políticos e militares, como ocorre com a historiografia clássica
europeia (idem, 2015). A história é baseada no trabalho e no desenvolvimento
progressivo das forças coletivas de produção material.

O primeiro pressuposto de toda a existência humana e também,


portanto, de toda a história, a saber, [é] o pressuposto de que os homens têm
de estar em condições de viver para poder fazer. Mas, para viver, precisa-se,
antes de tudo, de comida, bebida, moradia, vestimenta e algumas coisas
mais. O primeiro ato histórico é, pois, a produção dos meios para a satisfação
dessas necessidades, a produção da própria vida material, e este é, sem
dúvida, um ato histórico, uma condição fundamental de toda a história, que
ainda hoje, assim como há milênios, tem de ser cumprida diariamente, a cada
hora, simplesmente para manter os homens vivos. (Marx & Engels, 2007, p.
32 - 33).
O estudo de Marx se baseia no conflito entre as classes (ou luta de classes,
que seria o “motor” da história) e nos modos de produção do capitalismo. Esse
sistema de pensamento fornece ferramentas para se pensar a história, que, do
ponto de vista marxista, é marcada por pessoas comuns (NETO, 2021).

A história de todas as sociedades que existiram até hoje é a história


da luta de classes. Homem livre e escravo, patrício e plebeu, barão e servo,
mestres e companheiros, numa palavra, opressores e oprimidos, sempre
estiveram em constante oposição uns aos outros, envolvidos numa luta
ininterrupta, ora disfarçada, ora aberta, que terminou sempre ou com uma
transformação revolucionária de toda a sociedade, ou com o declínio comum
das classes em luta. (Marx & Engels, 2004, p. 45).

A produção material dos bens e seus muitos elementos são um ponto de


partida para Marx, que analisa o trabalho e as relações econômicas a partir de uma
perspectiva histórica. Para Marx, a história evolui dialeticamente, além de ser
multifacetada e não unilinear. Conforme indica Trigo e Souza (2009), o autor de O
capital “pensa dialeticamente, tem mentalidade historicista, dá grande importância à
história, é visivelmente empirista e também cientificista”.

Na interpretação de Silva (2015), todas as formas de organização social,


política e econômica derivam das relações de trabalho, inclusive os acontecimentos
de cunho político ou cultural das sociedades. Dessa forma, pode-se dizer que o
materialismo histórico é uma interpretação da história, dos eventos históricos nos
mais diversos níveis, à luz da compreensão dialética das regras, dos conflitos e do
processo de desenvolvimento dos sistemas de trabalho (idem, 2015).

Marx foi um dos herdeiros do ideário iluminista e, como os


pensadores de seu tempo, creditava à razão humana o caminho capaz de
construir uma sociedade mais justa e propícia ao desenvolvimento do
homem. À vista disso, ele dialogou com as principais correntes de
pensamento da época, tecendo-lhes críticas bem contundentes sem, a
despeito disso, romper definitivamente com elas. Todavia, contrapôs-se, já
em seus primeiros trabalhos intelectuais, ao idealismo de Hegel (invertendo a
dialética deste idealista) e ao positivismo (não aderindo às leis naturais como
causa final da sociedade), construindo um arcabouço teórico e conceitual
que, posteriormente, elevou a sua obra ao patamar máximo da teoria social.
(ARAÚJO e SIQUEIRA, 2021, p.2)

Quando aborda a história do desenvolvimento do dinheiro, por exemplo, Marx


o classifica como um desdobramento histórico da “oposição, latente na natureza das
mercadorias, entre valor de uso e valor” (MARX, 2013). Ao comentar sua obra, no
entanto, Christian Iber aponta que a história nem desempenha o papel de uma
“ilustração” nem de uma “prova” da explicação “dialética” do dinheiro da mercadoria,
mas da “apresentação crítica do conteúdo social da história do desenvolvimento do
dinheiro, cujo tratamento é tarefa da etnologia e da crônica econômica” (Iber, 2013,
p.160).

Marx narra como a troca dos produtos se transformou na troca das


mercadorias e o impacto disso na formação social de uma comunidade,
considerando que a mercadoria serviu como dinheiro por bastante tempo, até dar
espaço aos metais preciosos. Iber alerta, contudo, que Marx não escreve nenhuma
história do sistema de dinheiro, mas o descobrimento do conteúdo social da história
do desenvolvimento do dinheiro (idem, 2013, p.161).

A partir desse exemplo, é possível afirmar que a proposta metodológica do


materialismo histórico pode ser útil para a realização de leituras contemporâneas de
temas sociais e econômicos, inclusive do ponto de vista histórico. Na obra de Marx e
Engels há nuances que dialogam com a realidade do século XXI, como o fato de o
proletariado ser a classe mais explorada, e, por isso mesmo, mais revolucionária. A
construção dessas ideias vieram a reboque das obras de intelectuais os mais
diversos, entre eles historiadores franceses da época da Revolução, que atribuíram
à luta de classes entre aristocracia e burguesia uma série de conflitos, como a
própria Revolução (GORENDER, 2001).

O materialismo histórico traz uma visão nova da sociedade humana e um


novo projeto de lutas sociais para transformar a realidade. Isso ocorre, por exemplo,
quando classifica “ideologia” como uma consciência falsa, equivocada, da realidade,
mas necessária aos homens, que pensariam a realidade a partir do ponto de vista
de uma classe social. A partir daí, surgem desdobramentos de grande relevância,
como a teoria do fetichismo da mercadoria, do capital e de outras categorias da
economia burguesa (idem, 2001).

CONCLUSÃO

O materialismo histórico de Marx indica que a maneira de o homem


transformar a natureza de modo a possibilitar a própria sobrevivência são
desenvolvidos histórica e socialmente. A partir dele, fica claro que a história não
deriva de princípios abstratos, ou seja, não é resultado das ideias do homem, mas
da materialidade humana. Isso também nos leva a crer que é justamente por meio
do trabalho que a produção e a reprodução da vida material se efetivam, o que, por
conseguinte, confirmam a centralidade do trabalho na vida do ser social (ARAÚJO e
SIQUEIRA, 2021).

A partir dessa perspectiva marxista, as relações objetivas concretas passaram


a ser deveras importantes para o estudo dos fenômenos histórico-sociais. Para
Marx, a história é o processo de criação, recriação e satisfação contínuas das
necessidades do homem na sua relação com o mundo, isto é, a forma como
“produzem e autoproduzem continuamente a sociedade”.

Com o advento das ideias de Marx, inaugurou-se, no século XIX, a idéia de


que “o mundo é produto do trabalho humano, como realidade histórica construída
coletivamente pelos homens. Também pela primeira vez afirma-se, na filosofia, que
o homem é um ser histórico, o que é dado por sua capacidade de trabalho” (Sader,
2004, p. 12). Para Araújo e Siqueira (2021), essa perspectiva inédita foi responsável
por uma “virada epistemológica na forma como pensar a relação sujeito/objeto,
indivíduo/sociedade, objetividade/subjetividade, enfim, a forma como o
conhecimento é alcançado”.

REFERÊNCIAS

ANAV, Roberto Vital. O retorno de Karl Marx: a redescoberta de Marx no século


XXI. 2017 Editora: Serpente - Fundação Perseu Abramo.

ARAÚJO, Wagner dos Reis Marques. SIQUEIRA, Antonio Marcos de Oliveira. O


materialismo histórico dialético e a historicidade da sociedade em Marx (1818-
1883). Research, Society and Development, v. 10, n. 2. 2021. Disponível em
https://rsdjournal.org/index.php/rsd/article/download/12012/10983/162178. Acesso
em 13/12/2021.

ENGELS, F.; TALHEIMER; HARARI, J; SEGAL, L. Introdução ao Estudo do


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NETO, José Bezerra de Brito. Aula introdução aos estudos históricos. 11 de


dezembro de 2021. Disponível em
https://drive.google.com/file/d/1MTwj0G8FYZeZFc0hih_5IChbF78K_b87/view?
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IBER, Christian. Elementos de teoria marxiana do capitalismo: um comentário


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SILVA, Francisco Amsterdan Duarte da. História e Materialismo Histórico em Karl


Marx e Friedrich Engels. 2015

SPERBER, Jonathan. Karl Marx: Uma Vida Do Século XIX. Editora: Amarilys.
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Disponível em https://educere.bruc.com.br/cd2009/pdf/3190_1502.pdf. Acesso em
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