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TEXTOS BÁSICOS

Aula: Moral e Ética

- Immanuel Kant, Resposta à pergunta: ‘O que é Esclarecimento?’ [1783]


“Esclarecimento (Aufklärung) significa a saída do homem de sua minoridade, pela qual
ele próprio é responsável. A minoridade é a incapacidade de se servir de seu próprio
entendimento sem a tutela de um outro. É a si próprio que se deve atribuir essa
minoridade, uma vez que ela não resulta da falta de entendimento, mas da falta de
resolução e de coragem necessárias para utilizar seu entendimento sem a tutela de outro.
Sapere aude [Ousa conhecer]! Tenha a coragem de te servir de teu próprio
entendimento, tal é, portanto, a divisa do Esclarecimento.”

- Immanuel Kant, Fundamentação da metafísica dos costumes [1785]


“Cada coisa da natureza opera segundo leis. Só um ente racional tem a faculdade de agir
segundo a representação de leis, isto é, segundo princípios, ou uma vontade. Visto que
para a dedução de ações de leis requer-se razão, a vontade não é senão uma razão
prática. Se a razão determina inevitavelmente a vontade, então as ações de um tal ente,
conhecidas como objetivamente necessárias, são também subjetivamente necessárias,
isto é, a vontade é uma faculdade de escolher somente aquilo que a razão,
independentemente das inclinações, conhece como praticamente necessário, isto é,
como bom. Mas se a razão não determina, por si só, suficientemente a vontade, então
esta está submetida ainda a condições subjetivas (a certos incentivos), que nem sempre
concordam com as condições objetivas; em uma palavra, se a vontade não é em si
plenamente conforme à razão (como nos homens é efetivamente o caso), então as ações
que são conhecidas objetivamente como necessárias são subjetivamente contingentes, e
a determinação de uma tal vontade conformemente a leis objetivas é necessitação
[Nötigung], isto é, a relação de leis objetivas com uma vontade não totalmente boa é
representada como a determinação da vontade de um ente racional em verdade mediante
fundamentos da razão, os quais porém, em decorrência da natureza dessa vontade, não
são necessariamente seguidos por ela. A representação de um princípio objetivo, na
medida em que é obrigatória para uma vontade, chama-se um mandamento (da razão), e
a fórmula do mandamento chama-se imperativo. [...]

Ora, se a ação for boa meramente como meio para alguma outra coisa, então o
imperativo é hipotético; se for representada como em si boa, por conseguinte como
necessária em uma vontade em si conforme à razão, como princípio da vontade, então
ele é categórico. [...]

Finalmente há um imperativo que, sem pôr no fundamento como condição qualquer


outro objetivo a ser alcançado mediante uma certa conduta, ordena imediatamente essa
conduta. Este imperativo é categórico. Ele não diz respeito à matéria da ação e ao que
deve seguir-se dela, mas à forma e ao princípio do qual ela mesma decorre, e o
essencialmente bom da ação consiste na disposição [Gesinnung], seja qual for o seu
resultado. Este imperativo pode chamar-se de imperativo da moralidade. [...] O
imperativo categórico é, pois, um só, e em verdade este: age somente de acordo com
aquela máxima, pela qual possas ao mesmo tempo querer que ela se torne uma lei
universal.”

- “A vontade é uma espécie de causalidade dos seres vivos, enquanto racionais, e


liberdade seria a propriedade desta causalidade, pela qual ela pode ser eficiente,
independentemente de causas estranhas que a determinem; assim como necessidade
natural é a propriedade da causalidade de todos os seres irracionais de serem
determinados à actividade pela influência de causas estranhas. P. 93 (...) a liberdade,
se bem que não seja uma propriedade da vontade segundo leis naturais, não é por isso
desprovida de lei, mas tem antes de ser uma causalidade segundo leis imutáveis, ainda
que de uma espécie particular; pois de outro modo uma vontade livre seria um
absurdo. A necessidade natural era uma heteronomia das causas eficientes; pois todo o
efeito era só possível segundo a lei de que alguma outra coisa determinasse à
causalidade a causa eficiente; que outra coisa pode ser, pois, a liberdade da vontade
senão autonomia, i. é a propriedade da vontade de ser lei para si mesma? Mas a
proposição: «A vontade é, em todas as acções, uma lei para si mesma», caracteriza
apenas o princípio de não agir segundo nenhuma outra máxima que não seja aquela
que possa ter-se a si mesma por objecto como lei universal. Isto, porém, é precisamente
a fórmula do imperativo categórico e o princípio da moralidade; assim, pois, vontade
livre e vontade submetida a leis morais são uma e a mesma coisa.” (p. 94). Edições 70,
2007

- Immanuel Kant, Crítica da razão prática [1788]


“A razão pura é por si só prática e dá (ao homem) uma lei universal, que chamamos de
lei moral”.

- QUESTÕES:
O que diferencia o ente racional de um ente não racional, em termos do agir?
Por que o ser humano necessita de uma lei moral?
Como a vontade se relaciona com a razão?
Comente o imperativo moral kantiano e sua aplicabilidade.

- G. W. F. Hegel. Filosofia do direito [1820]


“[A] relação de vontade a vontade é o terreno próprio e verdadeiro, no qual a liberdade
tem ser-aí [existência]. Essa mediação de ter propriedade, não mais somente pela
mediação de uma coisa e de minha vontade subjetiva, mas também pela mediação de
uma outra vontade e, com isso, em uma vontade comum constitui a esfera do contrato.”
(§71).
“A eticidade é a ideia da liberdade, enquanto Bem vivente, que tem na autoconsciência
seu saber, seu querer, e pelo agir dessa, sua efetividade, assim como essa tem, no ser
ético, seu fundamento sendo em si e para si e seu fim motor, - [a eticidade é] o conceito
da liberdade que se tornou mundo presente e natureza da autoconsciência.” (§142).

“O ético, enquanto se reflete no caráter individual como tal, determinado pela natureza,
é a virtude, a qual, na medida em que ela nada mostra de outro que a conformidade
simples do indivíduo às obrigações referentes às relações a que pertence, é a retidão.” (§
150)

“Mas, na identidade simples com a efetividade dos indivíduos, o elemento-ético


aparece, enquanto modo de ação universal destes, como costume – o hábito desse
elemento-ético aparece como uma segunda natureza, que é posta no lugar da vontade
primeira meramente natural, e que é a alma que perpassa o ser-aí do costume, cuja
substância somente assim é como o espírito.” (HEGEL, 2022, p. 406, §151)

- QUESTÕES:
O que é “eticidade”?
Qual é sentido de inovação do termo “eticidade” em relação à “moralidade”?

Aula: Liberdade e necessidade

- Immanuel Kant, Crítica da razão pura [1787]


“...A liberdade em sentido prático é a independência do arbítrio em relação à
necessitação pelos impulsos da sensibilidade. Pois um arbítrio é sensível na medida em
que é patologicamente afetado (por meio de causas motrizes da sensibilidade); ele se
denomina animal (arbitrium brutum) quando pode ser necessitado patologicamente.
Embora seja um arbitrium sensitivum, o arbítrio humano não é brutum, mas sim
liberum, já que a sensibilidade não lhe torna necessária uma ação, e nele reside uma
faculdade de determinar-se por si mesmo, independentemente da necessitação por
impulsos sensíveis.” (B562)

- Kant, I. Metafísica dos costumes [1797]


“O arbítrio que pode ser determinado pela razão pura se chama livre-arbítrio. O que só é
determinável pela inclinação (impulso sensível, stimulus) seria arbítrio animal
(arbitrium brutum). O arbítrio humano, pelo contrário, é um arbítrio tal que é
certamente afetado, mas não determinado, pelos impulsos, e não é, pois, puro por si
mesmo (sem uma prática adquirida da razão), ainda que possa ser determinado às ações
por uma vontade pura. A liberdade do arbítrio é aquela independência de sua
determinação pelos impulsos sensíveis...” (INTRO, p. 23)
“Com os ensinamentos da moralidade, porém, a situação é outra. Eles ordenam a cada
um sem levar em consideração suas inclinações; apenas porque, e na medida em que,
ele é livre e tem razão prática. O aprendizado de suas leis não é extraído da observação
de si mesmo e da animalidade nele presente, nem da percepção do curso do mundo, do
que ocorre ou de como se age (ainda que a palavra alemã costumes signifique, como a
latina
mores, apenas maneiras e formas de vida), mas a razão ordena como se deve agir,
mesmo que não fosse encontrado nenhum exemplo disso, e também não leva em conta a
vantagem que disso poderia resultar para nós e que somente a experiência poderia
ensinar.” (INTRO, p. 26)

- G. W. F. Hegel. Filosofia do direito [1820]


“Tem o animal um círculo limitado de meios e modalidades para satisfazer as suas
carências também limitadas, mas o homem, até no que tem dessa dependência animal,
manifesta o poder de lhe escapar, e bem assim a sua universalidade, primeiro pela
multiplicação das carências e dos meios, depois pela divisão e distinção das carências
concretas em particularizadas, portanto mais abstratas.” (§190) – Martins fontes

Aula: Identidade pessoal

- Kant: eu penso

- G. W. F. Hegel. Filosofia do direito [1820]


“O Eu determina-se enquanto é relação de negatividade consigo mesmo, e é o próprio
caráter de tal relação que o torna indiferente a essa determinação específica, pois sabe
que é sua e ideal. Concebe-a como pura virtualidade à qual não se prende, mas onde se
encontra porque ele mesmo lá se colocou. Tal é a liberdade que constitui o conceito ou
substância ou, por assim dizer, a gravidade da vontade, pois do mesmo modo a
gravidade constitui a substância dos corpos.” (§7) – Martins fontes

“De acordo com essa definição, a liberdade da vontade é o livre-arbítrio onde se reúnem
os dois aspectos seguintes: a reflexão livre, que vai se separando de tudo, e a
subordinação ao conteúdo e à matéria dados interior ou exteriormente. Porque, ao
mesmo tempo, este conteúdo, necessário em si e enquanto fim, se define como simples
possibilidade para a reflexão, o livre arbítrio é a contingência na vontade.” (§15) –
Martins fontes

“Com o nome de purificação dos instintos, representa-se em geral a necessidade de os


libertar da sua forma de determinismo natural imediato, da subjetividade e da
contingência do seu conteúdo, para os referir à essência que lhes é substancial. O que há
de verdade nesta aspiração imprecisa é que os instintos devem reconhecer-se como o
sistema racional de determinação voluntária.” (§19) – Martins fontes
“Aplicada aos instintos, a reflexão traz-lhes a forma da generalidade representando-os,
medindo-os, comparando-os uns com os outros, também com as suas condições e suas
consequências e ainda com a satisfação total deles (felicidade). Assim os purifica
exteriormente de sua ferocidade e barbárie. Ao produzir-se esta universalidade do
pensamento, a cultura adquire um valor absoluto.” (§20) – Martins fontes

***

- Sobre racionalidade e repressão dos instintos em Kant:

- Kant, I. Metafísica dos costumes [1797]


“A comunhão sexual (commercium sexuale) é o uso recíproco que um ser humano faz
dos órgãos e faculdades sexuais de um outro (usus membrorum et facultatum sexualium
alterius), e pode ser um uso natural (pelo qual pode ser procriado seu semelhante) ou
antinatural, este último podendo ser o uso de uma pessoa do mesmo sexo ou de um
animal de uma espécie diferente da humana: enquanto lesão à humanidade em nossa
própria pessoa, essas transgressões das leis, esses vícios antinaturais (crimina carnis
contra naturam) a que também chamamos inomináveis, não podem ser salvos da mais
completa reprovação por nenhuma restrição ou exceção.” (§24)

Aula: Estado e Liberdade

- Kant, I. Metafísica dos costumes [1797]


“Os membros de uma tal sociedade (societas civilis), ou seja, de um Estado, unidos pela
legislação, chamam-se cidadãos (cives), e os atributos jurídicos inseparáveis de sua
essência (enquanto tal) são: a liberdade legal de não obedecer a nenhuma outra lei senão
àquela a que deu seu consentimento; a igualdade civil que consiste em não reconhecer
nenhum superior a si mesmo no povo, senão aquele que tenha tanta faculdade moral de
obrigar juridicamente quanto ele de obrigá-lo; e, em terceiro lugar, o atributo da
independência civil, que consiste em poder agradecer sua existência e conservação não
ao arbítrio de um outro no povo, mas aos seus próprios direitos e forças enquanto
membro da comunidade política – por conseguinte, a personalidade civil, que consiste
em não se
deixar representar por nenhum outro nos assuntos jurídicos.” (§46)

- G. W. F. Hegel. Filosofia do direito [1820]


“O solo do Direito é, em geral, o [elemento] espiritual e o seu lugar mais preciso e o seu
ponto de partida [é] a vontade que é livre, de maneira que a liberdade constitui a sua
substância e sua determinação e que o sistema do direito é o reino da liberdade
efetivada, o mundo do espírito produzido a partir do próprio espírito como uma segunda
natureza.” (§4) – trad. müller

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