KANT
Fundamentação da Metafísica dos Costumes
Resumo/Apontamentos
Kant julga ser necessário elaborar uma pura filosofia moral completamente
depurada de tudo o que possa ser empírico. O princípio da obrigação há-de buscar-se a
priori, exclusivamente nos conceitos da razão pura. Se um preceito se apoiar em
princípios empíricos, um mínimo que seja, poderá chamar-se uma regra prática, mas
nunca uma lei moral. A lei moral, na sua pureza e autenticidade, deve buscar-se
somente numa filosofia pura (metafísica), depurada de tudo o que possa ser empírico, e
sem esta não pode haver uma filosofia moral.
Para Kant os princípios morais são universais e necessários e os deveres morais
apresentam-se como absolutos. Ora, para encontrar leis morais que fossem universais e
necessárias, Kant não podia partir da experiência; tinha que as deduzir da razão pura e
não do conteúdo empírico da experiência (sensível) sempre particular, subjectivo e
contingente.
Ler os seguintes excertos:
- pág. 27: «Não tendo propriamente ... como ser racional, leis a priori.»
- pág. 28: «Ora, a lei moral ... alguma filosofia moral;»
- pág. 50: «Do aduzido ... a capacidade da razão pura prática.»
Nesta obra, Kant não pretende fazer uma ciência da natureza humana; não
apresenta uma descrição daquilo que é o homem nem uma dedução das normas segundo
as quais ele deve agir. Não faz um estudo da psicologia humana nem vai procurar saber
qual é a essência humana. Também não vai tentar descobrir as normas/regras que regem
o homem na sua vida social. Nesta sua investigação/fundamentação, Kant não admite a
interferência de dados da psicologia e/ou da antropologia.
Resumindo: não é a partir de uma concepção de homem que se vão investigar os
princípios morais. Kant procura os princípios morais válidos para os seres racionais e
esses princípios são válidos para o homem unicamente na medida em que ele é racional.
Como diz Victor Delbos, «é porque as leis morais valem para a vontade de um ser
racional em geral que elas valem para a nossa própria vontade.»
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2
Agir por dever = agir por respeito à lei (lei universal, lei moral).
É aquilo que eu reconheço imediatamente como lei
para mim mesmo.5
1
Boa Vontade da riqueza (que pode ser objecto de abuso), do talento, ou da valentia, que se podem
utilizar para fins maus.
2
O seu valor intrínseco = o seu querer.
3
Ler os seguintes excertos:
- pág. 35: «Por exemplo: é na verdade ... o seu interesse assim o exigia; (...).»
- pág. 36: «Os homens conservam a sua vida conforme ao dever, sem dúvida, mas não por dever.»
4
Ler os seguintes excertos:
- pág. 36: «Em contraposição, quando ... um conteúdo moral.»
- pág. 45: «(...) quando atentamos na experiência ... portanto, valor moral.»
- pág. 46: «(...) mas, em realidade ... que se não vêem.»
3
O valor do carácter consiste em fazer o bem, não por inclinação6, mas por dever.
Ler o excerto seguinte:
- pág. 36: «Ser caritativo ... não por inclinação, mas por dever.»
O respeito pela lei produz a máxima7 formal que manda agir por obediência à lei
como tal. Ler o excerto:
- pág.38: «Só pode ser objecto de respeito ... todas as minhas inclinações.»
Máxima é um voto que eu faço para mim próprio; princípio que eu me dou a
mim mesmo. Quando a máxima se torna universal temos uma lei prática.
«Todos os imperativos se exprimem pelo verbo dever» (pág. 51, linha 26).Um ser
no qual razão e vontade constituíssem apenas um, e que estivesse liberto de toda a
influência estranha, escolheria sempre o que a razão considera como bom. Em
contrapartida, um ser finito, cuja vontade sente a atracção de móbeis sensíveis por vezes
em desacordo com a lei, não se conforma inevitavelmente com esta; e para ele a lei
apresenta-se sob o aspecto de uma imposição, de um mandamento, de um imperativo.
Portanto, o imperativo supõe uma vontade subjectivamente imperfeita, à qual é pedido
que se decida de acordo com regras, não segundo os impulsos da sensibilidade. Isto
vai ao encontro do que se diz na seguinte passagem:
- pág. 52: «Uma vontade perfeitamente boa ... humana por exemplo.»
1. «Age como se máxima da tua acção se devesse tornar, pela tua vontade, em lei
universal da natureza.»14 (Princípio da universalidade) pág. 59, linhas 13 e 14. Ler
também os seguintes excertos:
- pág. 59: «Uma pessoa, ... supremo de todo o dever.»
- pág. 60: «Uma outra pessoa ... como de vãos enganos.»
2. «Age de tal maneira que uses a humanidade, tanto na tua pessoa como na
pessoa de qualquer outro, sempre e simultaneamente como fim e nunca simplesmente
como meio.» (Princípio da finalidade) pág. 66, linhas 10,11,18,19,20. Ler ainda os
excertos seguintes:
- pág. 66: «Segundo o conceito do dever ... o degradar ou o matar.»
- pág. 67: «Pelo que diz respeito ... proceder a seu respeito, (...).»
11
«Devo proceder sempre de maneira que eu possa querer também que a minha máxima se torne
universal.»
12
Só o imperativo categórico ( = imperativo da moralidade) tem o carácter de uma lei prática. Ler o
seguinte excerto:
- págs. 57-58: « (...), que só o imperativo categórico ... categórico ou lei da moralidade.»
13
Característica fundamental do imperativo categórico: a universalidade. Afirmar «age apenas segundo a
máxima tal que possas ao mesmo tempo querer que ela se torne lei universal», significa que a máxima
vale para todos e sempre. Quando o homem age segundo uma regra particular, por exemplo, quando
mente, não pode querer que essa máxima se torne universal; quer apenas que essa regra valha para aquele
caso concreto.
14
Chama-se natureza, no mais lato sentido, à realidade que é determinada por leis universais. Portanto, o
conceito de “natureza” aparece ligado ao de “universalidade”.
5
- pág. 67: «Porque então é evidente ... ao mesmo tempo como fins, (...).»
- pág. 68: «Este princípio da humanidade ... não é extraído da experiência.»
Quanto à primeira fórmula, se o sujeito não puder querer que a máxima adquira
universalidade, ela não adquirirá valor moral. No caso dos exemplos do roubo e da
mentira, como certamente se viu, a máxima é determinada pelo egoísmo e não é,
consequentemente, universalizável (destruiria a convivência humana).
No que diz respeito à segunda formulação, ela aponta para a recusa da
instrumentalização e coisificação do outro; afirma o valor absoluto da pessoa. Daí a
condenação, por exemplo, da escravatura, da prostituição e do homicídio. O que quer
que seja que tenha valor aparece com valor de meio perante o homem, que tem valor
objectivo e absoluto de fim. Tudo está ao serviço do ser humano e este nunca pode ser
meio. Por outras palavras: para além de actuar em conformidade com a lei, a vontade
deve ter um fim último; este fim identifica-se com o ser racional (o Homem). Natureza
Racional = Humanidade.15
Esta última formulação do imperativo categórico («Age de tal maneira que uses a
humanidade, tanto na tua pessoa como na pessoa de qualquer outro, sempre e
simultaneamente como fim e nunca simplesmente como meio») conduz-nos ao Reino
dos Fins. Vejamos como.
O homem é um fim em si mesmo e é ele próprio quem promulga a legislação
universal. A lei a que o ser humano obedece, a lei que faz surgir no ser humano o
dever, tem origem na sua própria vontade. O homem está sujeito à lei de que afinal é o
autor. A vontade que legisla e a que cumpre são uma e a mesma vontade. A vontade
de todo o ser racional deve ser concebida como uma vontade legisladora universal. (pág.
68, linhas 20-21, 24-27; pág. 70, linhas 3-10)
Os seres racionais estão submetidos a uma lei que manda que cada um deles
jamais se trate a si mesmo ou aos outros simplesmente como meios, mas sempre como
fins em si. Daqui resulta uma ligação sistemática de seres racionais por meio de leis
objectivas comuns, isto é, um reino que, exactamente porque estas leis têm em vista a
relação destes seres uns com os outros como fins, se pode chamar reino dos fins. Em
Kant, o reino dos fins é o reino das vontades em que cada um é fim em si mesmo.
Ler o seguinte excerto:
- págs. 70-71: «Por esta palavra reino, ... à vontade de um outro.»
«A moralidade é a única condição que pode fazer de um ser racional um fim em
si mesmo, pois só por ela lhe é possível ser membro legislador no reino dos fins» (pág.
72). Como legislador, o ser racional é membro de um reino de fins, isto é, um ser com
dignidade. Só na moralidade o homem é um fim em si mesmo. 16 «Portanto, a
moralidade e a humanidade (enquanto capaz de moralidade) são as únicas coisas que
têm dignidade» (pág. 72), um valor íntimo, um valor incondicional.
Distinção entre “preço” e “dignidade” Ler págs. 71-72: «No reino dos fins,
tudo tem ou um preço ou uma dignidade. ... mas um valor íntimo, isto é, dignidade.»
15
Não basta que a vontade actue conformando-se com leis; ela é também a faculdade de prosseguir fins e
é preciso de facto que ela tenha um fim último, possuindo um valor absoluto e impondo-se a todo o ser
racional. Segundo Kant, esse fim identifica-se com o próprio ser racional. Mas como nós não conhecemos
por experiência nenhum ouro tipo de ser racional que não o ser humano, Kant identifica a “natureza
racional” com a Humanidade.
16
Ler os seguintes excertos: pág. 77, linhas 7-11 e 17-19.
6
17
Diz-nos Kant: «Autonomia é pois o fundamento da dignidade da natureza humana e de toda a natureza
racional.» (pág. 73, linhas 11-12). O ser humano é autónomo, independente de tudo; é capaz de se
autodeterminar; pode dar a si mesmo a sua própria lei.
18
Apoditicamente = de modo necessário.
19
Ler o seguinte texto:
- págs. 77-78: «Autonomia da vontade é ... precisamente esta autonomia.»
20
Devo agir desta ou daquela maneira, mesmo que quisesse outra coisa.
21
Autonomia = propriedade da vontade de ser lei para si mesma. Segundo Kant, a noção de autonomia é a
única que pode definir o verdadeiro princípio da vida moral. Se se procurar a origem da lei no objecto que
se visa, ou mesmo se ela for posta em Deus, cai-se na heteronomia.
22
Pág. 85, linhas 2-6.
23
Sem liberdade não há autonomia e sem autonomia não há moralidade.
7
inteligível ou numénico. Ler o seguinte excerto: pág. 89: «Como ser racional e, ... de
todos os fenómenos.»
Esclarecimento/desenvolvimento deste ponto No seu agir, a pessoa, enquanto
legisla, pertence ao mundo inteligível e é autónoma; enquanto cumpre, pertence
ao mundo sensível e está sujeita à lei. Ler o que Kant afirma na página 90, linhas
9-14, «(...) quando nos pensamos livres ... ao mundo inteligível.»
Os conceitos de mundo sensível e mundo inteligível são fundamentais. Do
conceito de mundo inteligível diz o autor que «é apenas um ponto de vista que a
razão se vê forçada a tomar fora dos fenómenos para se pensar a si mesma como
prática» (pág. 95, linhas 12-14). A distinção entre estes dois mundos permite
perceber como o homem pode ser livre. Se o ser humano fosse apenas sensível,
estaria subordinado às leis da natureza e não haveria espaço para a liberdade. Por
outras palavras: o ser racional não é um mero fenómeno e, por isso, enquanto ser
racional, não está subordinado às leis do mundo sensível. Este (mundo sensível)
está totalmente subordinado às leis da Física, enquanto que a pessoa, por ter
vontade e pertencer ao mundo inteligível, não está determinada por essas mesmas
leis.
24
«O dever moral é, pois, um próprio querer necessário seu do sujeito como membro de um mundo
inteligível , e só é pensado por ele como dever na medida em que ele se considera, ao mesmo tempo,
como membro do mundo sensível.» (pág. 92, linhas 2-4)
25
Ler o excerto seguinte: pág. 94, linhas 13-16.
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