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Agentes morais: seres dotados de consciência, capacidade de decisão e

responsabilidade e as suas ações avaliadas como um bem (corretas) ou mal


(incorretas).

ÉTICAS DEONTOLÓGICAS E ÉTICAS CONSEQUENCIALISTAS


Desde Sócrates que na filosofia moral se discutem e propõem respostas para o
problema “como devemos agir e porquê?”. Surgiram então dois tipos de resposta ao
problema:

ÉTICAS OU MORAIS
Deontológicas Consequencialistas
Reúnem todas as teorias que defendem
que certas ações devem ou não ser Reúnem todas as teorias em que as
realizadas, dependendo da intenção do ações são incorretas ou corretas,
agente. dependendo das suas consequências ou
Os atos são intrinsecamente corretos ou resultados.
incorretos, adequando-se a todas as Restrições como o dever de não matar,
situações. Restrições como o dever de admitem exceções.
não matar, nunca podem ser violadas.

A ética racional de Kant é um exemplo O utilitarismo de Stuart Mill é um


de ética deontológica. exemplo de consequencialismo.

ÉTICA DEONTOLÓGICA DE KANT


Kant acreditava no caráter universal e absoluto das regras morais. Por exemplo,
“Haverá alguma circunstância em que devo matar alguém por vingança?”, Kant
defenderia, sem hesitações, que não.

o Boa vontade e ação por dever

Kant diria que nenhuma virtude humana pode ser considerada boa em si mesma, não
descredibilizando a coragem, honra e outras características, mas estas podem ser más
dependendo do seu “uso”. Conclui que só a boa vontade é boa em si mesma,
absolutamente boa, sendo um bem último, só ela age por dever.

Existem as ações contra o dever, ações imorais ou incorretas, que agem contra o
dever, ações em conformidade com o dever e ações por dever.
AÇÃO EM CONFORMIDADE COM O DEVER AÇÃO POR DEVER
Legalidade Moralidade

Quando a ação é única e exclusivamente


Quando a ação cumpre a lei, mas persegue
motivada pelo respeito à lei, mesmo com
um interesse particular ou inclinação ou
prejuízo das minhas inclinações ou
desejo.
desejos.

Baixar os preços para vender mais, está de Baixar os preços para ajudar a população
acordo com a lei mas segundo Kant está em crise tem como único motivo o
ausente de valor moral, pois segue uma respeito pelo dever, possuindo valor
inclinação/desejo. moral.

O que as distingue, portanto, é o motivo ou intenção do agente. O valor moral não está
no que se espera da ação, mas sim no motivo (único motivo admissível- respeito pela
lei em si mesma sem visar satisfazer algo o alcançar/evitar uma consequência)

Porém, a boa vontade não é sempre “santa”, logo a razão prática (dirigida para a ação
moral, principalmente) atua segundo imperativos.

o Imperativo categórico e imperativo hipotético

Os imperativos são princípios, fórmulas ou leis que expressam a noção de dever ser,
mas não a determinam necessariamente, apenas ordenam.

IMPERATIVOS
Imperativo hipotético Imperativo Categórico

Uma ação é boa porque é um meio para Uma ação é boa, apenas se for realizada
conseguir algum propósito ou fim. por um respeito á lei em si mesma.

Ordena incondicionalmente, e é uma lei a


Ordena condicionalmente e é uma lei
priori (anterior e independente a qualquer
particular (determinadas circunstâncias e
experiência), universal (todos os seres
indivíduos) e contingente (é verdadeira
racionais qualquer circunstância) e
mas poderia ser falsa noutro mundo)
necessária (sempre verdadeira)

o Ações por dever


o Ações em conformidade com o dever o Deves/ não deves fazer Y, sem
o Se queres X, então deves fazer Y. mais.
o A obediência imposta pelo exterior- o A obediência é imposta por si
heteronomia. mesma, através da razão-
autonomia.
A ética de Kant é formal, contém apenas uma forma, sempre válida, é uma única lei, a
lei suprema da moralidade, mas podendo ser formulada de formas diferentes. (a
segunda e terceira formulações são redutíveis à primeira, sendo o imperativo
categórico uma única lei moral).

o 1ª Formulação: fórmula da lei universal


«Age apenas segundo uma máxima tal que possas ao mesmo tempo querer
que ela se torne lei universal.»
o 2ª Formulação: fórmula da lei universal da natureza
«Age como se a máxima da tua ação se devesse tornar, pela tua vontade, em lei
universal da natureza.»
o 3ª Formulação: fórmula do fim em si
«Age de tal maneira que uses a humanidade, tanto na tua pessoa como na
pessoa de qualquer outro, sempre e simultaneamente como fim e nunca
simplesmente como meio.»

Este princípio é o único válido para avaliar se um ato é, ou não, permissível.


Permissível, se desejamos que a nossa máxima (regra subjetiva) seja seguida por todos
em todas as circunstâncias. Moralmente reprovável, se tomamos a liberdade de abrir
uma exceção para nós em determinada circunstância, sendo contrário à lei da razão
prática e não tornada lei universal.

o Autonomia vs heteronomia

O conceito da moralidade está estritamente ligado à autonomia, ou seja, ao agir moral


e livremente, atuando de acordo com o imperativo categórico, princípio da
moralidade. Exemplo: Não devo atear fogos, pois esse é o meu dever. Já a
heteronomia rege-se por determinações exteriores, não estando a agir livremente.
Exemplo: Não devo atear fogos, porque posso ser multado.

A boa vontade é, então, agir de acordo com a lei da autonomia, isto é, de acordo com
o imperativo categórico. Kant diz que os seres humanos possuem um valor intrínseco,
dignidade, por isso devemos ser tratados como fins e não como meios (p. ex: salvar o
filho do Cr7 pensando na recompensa).

o Objeções ao deontologismo de Kant

1. A teoria de Kant não resolve facilmente o problema do conflito entre deveres,


p. ex. realizar uma obrigação moral pode implicar não cumprir outra. Alguns
deontologistas até introduziram um conceito de prima facie, em que, por vezes,
alguns deveres têm mais força que outros.
2. Cumprir cegamente uma obrigação moral pode conduzir a consequências
desastrosas, p. ex não mentir poderia levar à morte de milhares de pessoas.
Será que não existem exceções em que mentir pode ser adequado? Mas Kant
diria que não somos cientes das consequências que tal pode trazer, então não
deveríamos mentir para não sermos responsabilizados por elas.
3. Existem emoções e sentimentos distintivamente morais, ao contrário do que
Kant afirma, que ações que têm por base a compaixão ou culpa, pois estaria em
causa a imparcialidade do agente, são excluídas da moralidade. Há quem
defenda então que há emoções morais, e que a dimensão ética do ser humano
só pode ser compreendida a partir da análise das emoções e sua importância
para os julgamentos morais. Para além do mais, para a ética ser perfeitamente
aplicável a todas as situações, teria que haver seres humanos moralmente
infalíveis, um agente imperfeito não consegue conduzir à perfeição;

ÉTICA UTILITARISTA DE STUART MILL (JEREMY BENTHAM)


Uma ação como salvar alguém será moral? Segundo Kant, seria posta em questão a
intenção do agente, sendo uma ética mais complexa que o utilitarismo, que considera
as consequências dos atos como determinação da moralidade.

o Princípio da utilidade ou maior felicidade

Uma ação será correta se imparcialmente promover a felicidade e incorreta se fizer o


contrário, ou dito se outro modo, terá valor moral se produzir o máximo de felicidade
agregada. O utilitarismo não segue regras, mas visa um objetivo: a utilidade. Como
utilidade, Stuart Mill entende o bem-estar ou felicidade, esta última que entende
como prazer e a ausência de dor. Agir moralmente, então, visa a promoção de um
objetivo ou fim- a felicidade.

o O utilitarismo é uma teoria consequencialista

O utilitarismo é uma ética consequencialista, já que a moralidade dos atos reside nos
seus resultados ou consequências, neste caso específico, no mais promissor em
termos de felicidade ou bem-estar, ou seja os valores são relativos. A intenção ou
caráter do agente são irrelevantes para determinar o valor moral da ação.

o O utilitarismo é uma teoria hedonista

Esta teoria defende que o bem último é o prazer, ou seja é uma teoria hedonista.
Identifica o bem como o prazer e a ausência de dor e o mal com a dor e privação do
prazer, residindo a moralidade no esforço para maximizar o bem, considerando
imparcialmente (pois pode haver tentação para agir conforme a nossa felicidade) o
bem-estar de todos que são afetados pelos nossos atos, sendo o fim último de toda a
ação com valor moral.
o Prazeres superiores e inferiores

Como comparar e ordenar os diferentes prazeres quanto aos que causam maior
felicidade agregada? Bem, segundo Bentham e o seu hedonismo quantitativo, estes
apenas diferem quanto à sua duração e intensidade, ou seja, em grau ou quantidade,
para isso, propôs o cálculo felicífico. Para este filósofo, então, todas as fontes de
prazer são equivalentes, por exemplo, o prazer causado por um prato de lasanha pode
ser equivalente ao amor de uma pessoa. Tudo depende do grau de prazer, intensidade
e duração, em cada situação, sendo mais ou menos valiosa (mais se for mais i. e d.).
Mill discordava e introduziu o conceito de hedonismo qualitativo, em que os prazeres
variam tanto em quantidade como qualidade, introduzindo a distinção importante de
prazeres superiores (do intelecto, suas qualidades) ou inferiores (do corpo). Defende
ainda que a qualidade prevalece sobre a quantidade, um prazer superior é sempre
preferível ao inferior, ainda que menos intenso ou duradouro, não querendo isto dizer
que se deve prescindir dos prazeres inferiores, mas deve-se pender nos superiores
para a tomada de uma decisão.

Para se determinar a superioridade de um prazer sobre o outro, o critério passa pela


sentença ou veredito dos únicos juízes competentes, conhecedores dos prazeres, e
caso havendo divergência, a maioria prevalece.

o O utilitarismo assenta na imparcialidade

A felicidade visada nas ações, segundo o utilitarismo, deve ser imparcial: não importa
etnia, género, classe social ou estatuto; toda é contabilizada como sendo igualmente
importante e não se refere apenas a seres humanos, mas sim a seres que sejam
capazes de sentir prazer e dor (felicidade de qualquer ser senciente ou aquele que
sente). O utilitarismo obriga, assim, à consideração imparcial dos desejos e interesses
de todas (incluindo o agente) as pessoas afetadas pela ação.

o Objeções ao utilitarismo de Stuart Mill

1. O utilitarismo pode levar-nos a consequências moralmente inaceitáveis, como


culpar uma pessoa inocente para salvar outras, usar a objeção do “bode
expiatório”, uma vítima encontrada para solucionar um problema? (dilema
texto página 202) Mill responderia que este é um problema ultrapassável,
educando as pessoas em prol do bem comum, algo não aceitado por muitos.
2. Dar sempre prioridade à maior felicidade agregada é demasiado exigente, na
medida em que temos de considerar a máxima felicidade agregada, de quem
podemos ou não ter relação pessoal. É considerado por muitos
psicologicamente insustentável e deveras exigente. Porém Mill diria que
apenas se consideraria a felicidade dos envolvidos, algo que na nossa
sociedade seria visto como problemático.
3. O hedonismo qualitativo é inconsistente com o pressuposto de imparcialidade,
pois considerando a famosa afirmação de Stuart Mill «É melhor ser um ser
humano insatisfeito do que um porco satisfeito; é melhor ser Sócrates
insatisfeito do que um tolo satisfeito», esta leva a uma descredibilização de
uma parte da raça humana, os «tolos», e para além do mais, a considera
superior aos porcos, ou seja, que alguns tipos de vida são mais valiosos que
outros. Adquire, assim, uma perspetiva elitista dos seres humanos em relação
a outras espécies, em que os seres capazes de possuir prazeres superiores são
“sempre ouvidos”.

QUADRO-SÍNTESE ÉTICAS NORMATIVAS


Deontologismo de Kant Utilitarismo de Mill

Qual é o maior bem ou A boa vontade (uma vontade A felicidade (o prazer e a


bem último? que age por dever). ausência de dor).

O imperativo categórico,
Qual é o fundamento ou O princípio da utilidade ou
imperativo moral ou lei
critério da moralidade? da maior felicidade.
moral.

Importam as intenções ou Importam as intenções ou Importam as consequências


as consequências dos atos? motivos do agente. ou resultados dos atos.

Os deveres são relativos,


Os deveres são absolutos Os deveres são absolutos,
dependem das
ou relativos? incondicionais.
consequências.

As nossas ações são morais As nossas ações são morais


se, e somente se, quisermos se, e somente se, tenderem
Em que circunstâncias uma
que todas as pessoas as a promover imparcialmente
ação tem valor moral?
sigam em todas as a maior felicidade e a evitar
circunstâncias. a dor.

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