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Para que servem os princípios distributivos da As teorias distributivas norteiam moralmente o

justiça? rumo destas decisões e caminhos para a


governação.
Em consenso, diz-se que um Estado justo deve ter
como um dos seus objetivos centrais propiciar aos Mas a divergência entre as várias teorias pode
membros que o compõem as condições para que conduzir a uma inação governativa (não optando
cada um possa agir de acordo com as suas por nenhuma delas por falta de um consenso) ou
convicções sobre aquilo que possui um valor por outro lado a uma certa tendência para remeter
intrínseco na vida. este tipo de decisões para a área da economia.
O Estado deve ser neutro em relação às escolhas
individuais das pessoas sobre a vida boa, ou seja,
Igualitarismo estrito
deve haver respeito pela liberdade de cada um.
Aponta para a necessidade de todos os sujeitos
O exercício do poder político não se pode
acederem aos mesmos bens (incluindo encargos e
justificar com base na suposição de que há uma só
serviços).
doutrina ou ponto de vista verdadeiros sobre como
se deve viver. Um dos principais problemas desta proposta é a
quantificação dos bens a distribuir.
O argumento de que nem todas as pessoas
Delimitação de posições no campo da justiça
necessitam ou querem aceder à mesma quantidade
distributiva
dos mesmos bens é também um problema. Assim,
Dá-se através da resposta a duas questões: talvez pudesse ser mais vantajoso uma
distribuição que considerasse a vontade ou a
 Como é que podemos analisar as necessidade das pessoas em causa
condições que, sob um Estado considerado
justo, capacitam cada pessoa a viver de
acordo com aas suas próprias convicções
Objeções ao igualitarismo estrito
morais sobre a vida boa?
 Como distribuir os bens de base São justamente o facto de se restringir
necessários para que cada um possa ser significativamente a liberdade individual.
livre de viver a sua vida?
Além disso, parece não existir para os seus
proponentes qualquer preocupação com os fatores
de merecimento de cada um para aceder a
Durante séculos foi possível verificar que a
determinada quantidade de benefícios.
posição social de origem era relativamente rígida
para a maior parte das pessoas e nela se
mantinham ao longo da sua vida, assim como a
Teorias da justiça com base no bem-estar: o
sua descendência.
utilitarismo
Dentro desta realidade a noção de distribuição era
O utilitarismo foi formulado por Bentham seguido
remetida para fatores naturais ou de origem
por Stuart Mill.
divina.
Defendiam a definição dos padrões de justiça
A partir do século das Luzes as sociedades
distributiva com base na maior utilidade possível
começaram a organizar-se com base em modelos
de cada proposta para o maior número de sujeitos,
de governação mais liberais e democráticos.
ou seja, o maior prazer/satisfação possível para a
Os debates sobre a justiça distributiva são maior parte possível das pessoas implicadas.
incontornáveis. A maior parte das decisões
Assim, esta proposta de justiça distributiva baseia-
governativas têm implicações no que concerne a
se no bem-estar.
distribuição, quer seja ao nível da taxação,
indústria, educação, saúde, regulação do trabalho
etc.
Objeções ao utilitarismo Justiça como equidade de John Rawls
 Dificuldade em considerar a As propostas distributivas variam entre a
particularidade das pessoas e a facilidade ponderação do caminho entre a liberdade e a
com que se poderiam tomar decisões igualdade.
favoráveis à maioria que criassem forte
Resumindo a sua proposta de forma muito
opressão sobre as minorias
simplista: para Rawls, o mais importante é
 O sofrimento pontual que seria aceitável a
garantir a igualdade de oportunidades para todos
que qualquer sujeito se submetesse em
dentro de uma sociedade.
vista a uma melhor situação futura, mas
que se torna altamente questionável No entanto, segundo Rawls, para atingir a
quando proposto a alguém em prol de uma igualdade de oportunidades, a liberdade individual
maioria que não o incluí. nunca deve ser sacrificada.
 A medição do grau de utilidade pode
Para garantir uma sociedade justa, Rawls propõe
apresentar grandes dificuldades
dois princípios básicos para a justiça:
 Igualdade de liberdade
Teorias do merecimento o Pressupõe que “cada pessoa deve
ter um direito igual ao mais
Estas teorias dão importância central ao
abrangente sistema de liberdades
merecimento pessoal.
básicas iguais que seja compatível
Enquanto uma visão mais aristotélica do com um sistema semelhante de
merecimento assentaria em fatores morais e que liberdades para as outras”
ponderassem a virtude pessoal, os defensores mais  Diferença
atuais do merecimento consideram aspetos mais o “as desigualdades sociais e
concretos que concernem a complexidade das económicas devem ser ordenadas
sociedades modernas. de tal modo que sejam ao mesmo
tempo:
São consideradas três categorias para a
 Consideradas como
determinação:
vantajosas para todos
 O grau de contribuição individual para o dentro dos limites do
desenvolvimento social razoável
 O esforço alocado ao desenvolvimento da  Vinculadas a posições e
sua atividade laboral por determinada cargos acessíveis a todos.
pessoa
Esta teoria pressupõe que aqueles com maior
 O entendimento de que deve existir uma poder de produção terão, por consequência, acesso
compensação para quem mais se esforçar a maiores benefícios, prevendo-se uma ação
Há aqui uma distinção entre merecimento com posterior do Estado no reequilíbrio das
base no mérito pessoal e merecimento com base consequências das desigualdades causadas.
num direito à priori.

Objeções ao princípio da diferença de Rawls


Objeções às teorias do merecimento Algumas críticas apontam no sentido da
A estruturação económica de determinada importância moral da igualdade per se, às quais
sociedade, com base no merecimento, pode Rawls respondeu justificando que o mais
conduzir a situações dramáticas em que não são importante será avaliar a posição em que os mais
considerados os fatores da lotaria natural e social desfavorecidos à partida acederão no final, mais
que podem influenciar na capacidade para do que avaliar a sua posição relativa.
contribuir para determinada atividade que é
compreendida como útil para o projeto comum.
Gerald Cohen apresentou a sua crítica numa visão Objeções ao libertarismo
que definiu como ethos igualitário. Para o autor,
Porque razão alguém que acede primeiramente a
remunerações desiguais seriam justificáveis
determinado bem e se apropria dele deve justificar
considerando o grau de desprazer ou dificuldade
que mais ninguém tenha hipótese de aceder àquele
que determinada função acarretasse ou um
bem em concreto?
elevado grau de perigo no seu desempenho.
Rejeita, assim, altas remunerações como  Nozick aponta um justo ou legítimo
compensação de um elevado talento. processo de apropriação que só se
verificará quando determinado sujeito se
Os utilitaristas criticaram o princípio da diferença
apropria de uma bem considerando que
afirmando que este não considera a maximização
existirá desse mesmo bem quantidade
da utilidade.
excedente para os demais que dele
Os libertaristas argumentaram que este princípio necessitem.
se constitui como uma forte limitação à liberdade
Ainda assim, esta justificação parece carecer de
de propriedade (verdadeira liberdade das pessoas).
estabilidade porque o autor não parece preocupar-
Os igualitaristas da sorte sublinham o facto de se com fatores moralmente arbitrários como a
Rawls não ter considerado suficientemente o papel lotaria social e a genética que facilitam a
moral que a responsabilização dos sujeitos pelos propriedade das coisas.
seus percursos deve ter.
O aspeto da propriedade de si mesmo reúne alguns
consensos por se considerar que pode existir um
comprometimento de salvaguarda desta
Libertarismo
propriedade sem que, no entanto, outro tipo de
Para os libertaristas não existe um padrão de propriedades sejam apropriáveis de forma
justiça distributiva que se possa aplicar a todas as absolutamente desregulada.
situações pelo que partem de um outro tipo de
Philippe Van Parijs, que pode ser considerado um
abordagem para definir uma série de direitos à
libertário de esquerda, propõe uma solução que
priori que influirão no desenvolvimento do
assente em mecanismos pré-distributivos como
percurso das pessoas ao longo da vida.
um rendimento básico incondicional que combina
Robert Nozick propôs que para um mundo justo a preocupação com a propriedade de si mesmo
cada sujeito deveria ter assegurados: com a noção de que a apropriação dos recursos
naturais (e outros bens) deve acontecer no sentido
 O seu direito à propriedade da promoção da equidade.
 O seu direito à transferência de bens
 A propriedade só pode ser justificada de
acordo com os dois primeiros princípios Igualitarismo da sorte
Nozick parte da assunção básica do direito à Há quem considere insuficiente a distribuição de
propriedade de si próprio por compreender que bens e reclame a importância da distribuição de
essa será a primeira que deve ser considerada – oportunidades – existem caminhos de dignificação
cada sujeito pertence a ele mesmo e, por isso, é da consideração das pessoas que não assentam na
responsável não só por si mesmo como pelas suas distribuição igualitária nem compreendem apenas
escolhas e o valor mais importante que possui é o princípio da diferença. Estes caminhos de
justamente a total liberdade para conduzir essas dignificação da consideração das pessoas
escolhas. assentem no garante de oportunidades económicas
Resta, então, por consequência, ao Estado um semelhantes para todos os sujeitos.
papel de interferência mínima no sentido apenas
do garante jurídico desta liberdade.
A interpretação moral do que definirá a igualdade E para responder ao que resulta das dotações,
de oportunidades tem sido o campo de estudo dos Dworkin propôs um esquema de compensações
igualitaristas da sorte, que aceitam a desigualdade provenientes de seguros.
apenas como consequência da justa aplicabilidade
Objeções ao igualitarismo da sorte
do conceito de igualdade de oportunidades como
resultado direto do infortúnio das escolhas As principais críticas apresentadas a estas
pessoais ou de fatores que possam ser remetidos à propostas são muito similares às apresentadas ao
sua responsabilidade. princípio da diferença, mas também à sua natureza
demasiado hipotética, ficando por responder de
Analisando fatores como a etnia, género ou idade,
que forma concreta se poderia medir os talentos de
facilmente se pode compreender como estes
determinada pessoa e pesar a justa medida entre a
podem resultar em situações de desigualdade de
sua responsabilidade por determinado resultado ou
oportunidades dentro de uma sociedade.
a influência da má sorte bruta.
São estes os aspetos que reúnem mais consenso no
sentido de não se considerar aceitável que
qualquer um deles defina as oportunidades de Suficientarismo
determinada pessoa, já que a mesma não detém
qualquer responsabilidade por eles – considera-se O suficientarismo é uma teoria da justiça
que são fatores imputáveis à lotaria natural. distributiva que defende que em vez de se
preocupar-nos com as desigualdades em si ou com
Apesar de não se considerar um igualitarista da a melhor situação possível dos menos favorecidos,
sorte mas antes um propulsor do que definiu como devemos procurar garantir que cada um de nós
um igualitarismo de recursos, Ronald Dworkin tenha o suficiente.
avançou com importantes contributos para uma
distinção importante para esta proposta. “Do ponto de vista da moralidade, não é
importante que todos tenham o mesmo. O que é
Para o autor, a ponderação deveria acontecer entre moralmente importante é que cada um tenha o
ambições (escolhas pessoais sobre as quais se suficiente. Se todos tivessem dinheiro suficiente,
pode ser imputada responsabilidade) e dotações não seria relevante nem constituiria uma
(resultados da má sorte bruta, aspetos sobre os preocupação saber se alguém teria mais do que os
quais o sujeito não pode decidir ou influir e que outros” – Harry Frankfurt
resultam normalmente de situações de herança a
vários níveis)
Estes são fatores que desde logo apontam para a Objeções ao suficientarismo
insuficiência do princípio da diferença proposto  O limiar da suficiência pode ser demasiado
por Rawls que, segundo Dworkin, não teria baixo
suficientemente em conta o direito de determinada  Não tem em conta a responsabilidade
pessoa a aceder a mais recursos no caso de individual abaixo do limiar da suficiência
existirem fatores de má sorte bruta (por exemplo  Pode ser uma teoria pouco coerente
uma condição de saúde incapacitante) e por outro
não ser capaz de responsabilizar os sujeitos pelas
suas escolhas (favoráveis ou desfavoráveis para o
seu percurso). Republicanismo

Para responder às ambições o autor propôs uma O republicanismo defende a liberdade como não –
distribuição à priori de acordo com as mesmas, dominação, como alternativa a liberdade positiva
sendo que caberia à própria pessoa e a liberdade negativa.
responsabilizar-se pelo resultado das suas escolhas
Para o republicanismo, o Estado deve distribuir
após esse momento.
os recursos de maneira a maximizar a liberdade
como não-dominação.
A objeção principal ao republicanismo é a de não nova empresa. O que seria uma boa
constituir uma alternativa real ao liberalismo. regra para ultrapassar os conflitos
entre os três?
o Para Rawls, devemos pensar na
sociedade da mesma forma: que
regras formular para ultrapassar os
John Rawls, Uma Teoria da Justiça
conflitos entre os interesses
Contexto filosófico individuais? Mas qual é a regra de
distribuição mais justa para todos?
 Utilitarismo e intuicionismo
o O utilitarismo, que nasce com  Ideia da “estrutura de base da
Bentham no século das luzes, e sociedade”
desenvolve-se com Mill, domina os o É a forma pela qual as instituições
debates morais sociais mais importantes
o O intuicionismo é uma alternativa distribuem os direitos e obrigações
fraca ao utilitarismo fundamentais e determinam a
 A tradição do contrato social divisão dos benefícios da
o Influência de Locke, Rousseau e cooperação em sociedade.
Kant o Numa sociedade feudal onde o
Conceito de estado de natureza +acordo original=contrato social João nasce campesino e a Carla
aristocrata, a vida da Carla corre
 A filosofia moral de Kant melhor, apesar dos esforços do
o Imperativos hipotéticos vs. João.
imperativos categóricos

A estrutura de base para uma sociedade é a que se


Objeções ao utilitarismo e ao intuicionismo escolhe quando não se conhece o seu lugar no
sistema de cooperação da sociedade. A nossa
O utilitarismo era uma teoria dominante, no qual
resposta a esta maneira de escolher o nosso lugar
se a felicidade total da sociedade superar a
na sociedade dá-nos uma ideia do que seria a
infelicidade da minoria, então a sociedade é justa.
sociedade justa. Esta é então a ideia desenvolvida
Como objeção a esta teoria temos a nossa própria pela Teoria da Justiça.
intuição, que nos diz que esta sociedade é injusta
Esta teoria tem influências
(por exemplo, uma sociedade com escravos).
 O contrato social permite imaginar a
Por sua vez, o intuicionismo também tem algumas
estrutura de base (que vem do estado de
objeções porque não dá respostas para o que
natureza de Locke)
devemos fazer dado que as nossas instituições são
incompletas, vagas e muitas vezes em conflito.  A ideia de véu de ignorância (a qual vem
da influência da razão moral imparcial em
Kant)
Um “sistema de cooperação”
 Ideia da sociedade como um “sistema de
cooperação”
o Exemplo de três amigos que
querem começar uma nova
empresa juntos. Um é designer de
produto, o outro tem talento para o
marketing, e o terceiro é um
contabilista experiente. Têm que
decidir como dividir os lucros da
colocados numa situação de igualdade e
interessadas em prosseguir os seus objetivos, para
definir os termos fundamentais da sua associação.
Um esboço da justiça como equidade
O véu de ignorância na posição original
Contra o utilitarismo, Rawls defende duas ideias
Um grupo de pessoas racionais situadas numa
centrais, apelando às ideias de cooperação e de
posição original por trás de um véu de ignorância
estrutura de base:
chegam a decisões imparciais. Assim, deduzem os
 A justiça é a primeira virtude das princípios da justiça para a estrutura de base: são
instituições estes princípios que permitem avaliar se as
o Uma teoria, por mais elegante ou instituições e as práticas sociais são justas.
parcimoniosa que seja, deve ser Exemplo: a escravidão é justa ou injusta? Se a
rejeitada ou alterada se não for escravidão está em conformidade com os
verdadeira; da mesma forma, as princípios gerais de justiça social que as pessoas
leis e as instituições, não obstante o racionais numa posição original por trás de um
serem eficazes e bem concebidas, véu de ignorância teriam selecionado para a
devem ser reformadas ou abolidas sociedade em que querem viver, então seria justa.
se forem injustas
 As pessoas têm direitos invioláveis Se rejeitamos o utilitarismo (por ser injusto), que
o Cada pessoa beneficia de uma princípios de justiça devemos escolher detrás do
inviolabilidade que decorre da véu de ignorância rawlsiano?
justiça, a qual nem sequer em  O primeiro princípio exige a igualdade na
benefício do bem-estar da atribuição dos direitos e deveres básicos
sociedade como um todo poderá  O segundo princípio afirma que as
ser eliminada desigualdades económicas e sociais, por
exemplo as que ocorrem na distribuição da
riqueza e poder, são justas apenas se
Explicitação de certas limitações desta teoria resultarem em vantagens compensadoras
 A Teoria da Justiça não se aplica a para todos e, em particular, para os mais
diversas instituições (como igrejas) desfavorecidos membros da sociedade
 Diferença entre “conformação estrita” e
“conformação parcial” na aplicação da
Teoria da Justiça Utilitarismo
o Conformação estrita quando as A ideia central do utilitarismo é a de que a
pessoas fazem tudo aquilo que a sociedade está bem ordenada e, portanto, é justa
teoria espera delas quando as suas instituições principais estão
o Conformação parcial quando as ordenadas de forma a conseguir a maior soma
pessoas não seguem os princípios líquida de satisfação, obtida por adição dos
da justiça resultados de todos os sujeitos que nela
participam.

Definição da justiça como equidade É uma teoria teleológica, ou seja, o bom é


definido independentemente do justo, e o justo é
O seu objetivo é apresentar uma conceção da definido como aquilo que maximiza o bom.
justiça que generaliza e eleva a um nível superior
a teoria do contrato social. Assim, para o utilitarismo o bom é sinónimo de
felicidade.
A ideia condutora é a de que os princípios da
justiça aplicáveis à estrutura básica formam o Para o perfecionismo, o bom significa excelência
objeto de acordo original. Estes princípios são os humana.
que seriam aceites por pessoas livres e racionais,
intuições morais e os nossos princípios, até que
ambos se ajustem.

Rawls contra as teorias teleológicas


As teorias teleológicas são indiferentes ao
princípio da distribuição: não importa a maneira
de distribuir a felicidade na sociedade, desde que a
felicidade total seja a maior possível.
A justiça como equidade é uma teoria
deontológica porque rejeita o princípio de
maximização do bem assim como a prioridade do
bem sobre o justo. Os dois princípios da justiça
Rawls tem agora dois objetivos:
Intuicionismo  Explicar em que consiste a teoria da justiça
O intuicionismo tem duas características: como equidade
 Mostrar que a justiça como equidade é
 Consistem numa pluralidade de primeiros superior ao utilitarismo
princípios, que podem entrar em conflito
ao darem diretivas contraditórias A estrutura de base é o objeto da Teoria da Justiça
 Não incluem nenhum método explícito, e distingue a justiça formal da justiça substantiva.
nenhuma regra da prioridade. Para pesar Esta distinção baseia-se na diferença entre
esses princípios um contra o outro, apenas imparcialidade indiferente à moralidade e
temos a intuição imparcialidade moral: uma sociedade esclavagista
Objeções apresentadas: pode ser justa formalmente mas não é justa
substancialmente
Para a justiça como equidade é fundamental que
haja uma regra de prioridade, para resolver de
maneira justa os conflitos na sociedade. Formulação dos dois princípios da Teoria da
De onde vêm as nossas instituições morais? Dos Justiça
costumes? Mas são justos esses costumes ou são  A sociedade deve assegurar a máxima
parciais? liberdade para cada pessoa compatível
A posição original, detrás do véu de ignorância, com uma liberdade igual para todos os
reduz ao máximo a parcialidade das nossas outros – Princípio da liberdade igual.
intuições. Uma sociedade bem ordenada  As desigualdades económicas e sociais
conforma-se a uma conceção pública da justiça devem:
social. o Gerar o maior benefício para todos
e para os menos favorecidos em
particular (princípio de diferença);
O método do equilíbrio refletido o Devem estar ligadas a postos e
posições acessíveis a todos em
Se os princípios corretos de justiça social são condições de justa igualdade de
aqueles sobre os quais as pessoas racionais oportunidades (princípio de
concordariam na posição original, como podemos igualdade de oportunidades).
ter a certeza que o procedimento na posição
original está correto? A ideia geral é que devemos ser igualitários
quando se trata de distribuir coisas importantes
Rawls responde com o método do equilíbrio para todos. As desigualdades apenas se justificam
refletido. Trata-se de um vai e vem entre as nossas
quando beneficiam todos, e em particular os
menos favorecidos.
Há uma prioridade lexical do primeiro princípio
sobre o segundo.
“Todos os valores sociais- liberdade e
oportunidade, rendimento e riqueza, e as bases Igualdade liberal
sociais do respeito próprio – devem ser
distribuídos igualmente, salvo se uma distribuição É a soma entre o princípio de eficiência (Pareto) e
desigual de algum desses valores, ou de todos a igualdade equitativa de oportunidades
eles, redunde em benefício de todos.” O sistema público de educação permite responder
ao problema das desigualdades sociais
moralmente arbitrárias.
Interpretação do segundo princípio
Rawls formula duas objeções a esta interpretação:
As desigualdades sociais e económicas permitidas
têm de ser:  A existência da família impede a
realização da igualdade equitativa de
 Vantajosas para os menos favorecidos oportunidades
 O resultado de posições abertas a todos  A distribuição dos talentos naturais (lotaria
genética) provoca desigualdades
Há três interpretações possíveis face a este
arbitrárias.
princípio:
 Sistema de liberdade natural (libertarismo)
 Igualdade liberal (liberalismo clássico) Igualdade democrática
 Igualdade democrática (Rawls)
É a soma do princípio da diferença e a igualdade
equitativa de oportunidades.

Sistema de liberdade natural (libertarismo)


É a soma entre o princípio da eficiência (Pareto) e O princípio de diferença
a igualdade formal de oportunidades.
Imaginemos uma sociedade dividida em dois
Segundo o princípio da eficiência, uma grupos: uma maioria de trabalhadores sem talentos
distribuição de bens é eficiente quando é especiais e uma minoria de empreendedores com
impossível melhorar a situação de alguém sem talentos. Ninguém é responsável por nascer com
piorar a situação de ninguém. talentos naturais.

Objeção à eficiência – a eficiência não especifica Mas se os bens sociais e económicos forem
um padrão distributivo distribuídos de maneira igual (dado que os
empreendedores não têm mérito pelos seus
Objeção à igualdade formal – não tem em conta a talentos), então os talentosos não têm incentivos
lotaria genética e a lotaria social em cultivar esses talentos.
Rawls rejeita esta interpretação libertária pois não Se o sistema recompensa os talentosos, apesar de
tem em conta as desigualdades sociais e naturais gerar desigualdades irá melhorar a situação dos
de partida. menos favorecidos. Os limites a estas
desigualdades são impostos pelo princípio da
diferença – as desigualdades “são justas se, e
apenas se, funcionarem como parte de um sistema
que melhore as expectativas dos membros menos
beneficiados da sociedade”.
felicidade de acordo com os seus planos de vida.
Assim, há mais respeito pela liberdade.

Todos os bens primários devem ser distribuídos de


A igualdade democrática e a justiça processual
maneira igual, a menos que uma distribuição
Igualdade democrática= princípio da diferença+ igualdadedesigual dede
equitativa alguns ou de todos estes bens
oportunidades
beneficie os menos favorecidos. Os bens
Relação entre as duas cláusulas do segundo
primários são:
princípio:
 Direitos e liberdades básicas;
 Justiça processual perfeita
 Liberdade de circulação e ocupação diante
o Critério + Método de avaliação de
um conjunto plural de oportunidades;
resultados
 Poderes e prerrogativas dos cargos e
 Justiça processual imperfeita
posições de responsabilidade nas
o Critério sem método seguro
instituições políticas e económicas da
 Justiça processual pura estrutura básica;
o Método sem critério  Riqueza e rendimento;
A justiça processual pura domina o sistema de  As bases sociais do respeito próprio.
liberdade natural e o de igualdade liberal: nenhum
deles avança um critério independente duma
distribuição justa, mas apenas um método. Justiça e solidariedade
Seguindo as regras, o resultado será sempre o Como conciliar os diferentes interesses em
padrão do justo. conflito na sociedade?
Nozick faz uma objeção a Rawls dizendo que é
 Utilitarismo
necessário intervir em permanência na vida das
o É escolhida a opção que soma a
pessoas para realizar o padrão do justo. Esta
maior felicidade, contanto a
objeção viola o primeiro princípio da justiça
felicidade de todos igualmente
(princípio da liberdade igual)
o Por ser uma teoria teleológica,
considera o justo como
maximização do bem
Caracterização da justiça como equidade
 Justiça como equidade – resposta ao
Os bens primários pluralismo razoável
o É escolhida a opção que respeita os
Métrica para a revelação destes bens:
direitos de cada cidadão
 Utilitarismo o Numa teoria deontológica, o justo é
o Níveis de felicidade independente do bem
 Justiça como equidade
o Os bens de base sociais e
económicos, bons para qualquer A posição original
tipo de vida são moralmente
Como devemos escolher os princípios que devem
neutros e pertencem a todas as
governar a estrutura de base da sociedade?
conceções do bem
Através da experiência do pensamento da posição
Os bens primários revelam uma maneira diferente original (um modelo idealizado dum processo de
de olhar para o problema da justiça social pois decisão justo).
envolvem a atribuição aos indivíduos da
responsabilidade de encontrar a sua própria
O véu de ignorância
O véu de ignorância torna possível uma
deliberação imparcial sobre a justiça social,
excluindo informação sobre alguns factos dos
participantes, não se sabendo então:
 o seu lugar na lotaria social
 o seu lugar na lotaria genética
 a sua conceção da vida boa
 o nível de evolução da sua sociedade
É possível deliberar sem estas informações
particulares uma vez que temos acesso a
conhecimentos gerais sobre a condição humana:
A apresentação das alternativas
 conhecimento das circunstâncias da justiça
(que geram conflitos e identidades de Constrangimentos formais para qualquer teoria da
interesses): Justiça:
o a cooperação é mutualmente
 Generalidade
benéfica
o Os homens devem ter salários
o os recursos são escassos
elevados (não universal pois não
o existe uma pluralidade de
inclui as mulheres)
conceções da vida boa
 Universalidade
 conhecimento geral da economia,
o Todos devem obedecer ao
sociologia, psicologia
primeiro-ministro (não geral pois
refere-se a uma pessoa)
 Publicidade
A racionalidade dos participantes
o Regras conhecidas de todos
As pessoas na posição original são racionais: na  Eficácia
escolha dos princípios de justiça, cada pessoa o Ordem lexical
tenta avançar o melhor que pode os seus próprios  Finalidade interna
interesses. o Sem autoridade exterior, como
Não conhecendo conceções particulares sobre a Deus
vida boa, deve-se defender o máximo possível de O intuicionismo não passa os constrangimentos da
bens privados – condição necessária e qualquer eficácia e da finalidade interna.
vida boa.
As pessoas na posição original são estritamente
racionais, mutuamente desinteressadas, sem inveja As alternativas
e sem altruísmo.
 A justiça como equidade, com uma
interpretação da igualdade democrática do
segundo princípio
 O libertarismo como forma de egoísmo
geral
 O utilitarismo
 O perfecionismo
Agora Rawls necessita de provar que na posição
original as pessoas escolhem a justiça como
equidade.
As instituições de uma sociedade justa
O argumento a partir das liberdades de base
As pessoas na posição original são racionais e vão
A Justiça como Equidade garante a igualdade das
escolher princípios realistas que podem ser
liberdades de base a todas as pessoas, o que não
implementados.
ocorre com o utilitarismo.
Rawls propõe uma sequência em 4 etapas como
Escolhendo a teoria da justiça na posição original,
maneira de tornar possível a sua implementação:
é uma escolha incerta pois não conhecemos a
nossa posição na sociedade.  A etapa da posição original, a mais
abstrata, que permite escolher os princípios
Para Rawls, devemos maximizar o mínimo, ou
da Teoria da Justiça.
seja, escolher a opção cujo pior resultado é o
melhor possível.  A etapa da convenção constitucional, onde
se escolhe um sistema de governo e de lei
Maximin – estratégia de redução do risco em constitucional. Aqui o véu de ignorância é
situação de incerteza. parcial, pois as pessoas podem conhecer as
circunstancias da sua sociedade (aplicação
Razões para escolha do maximin:
do primeiro princípio)
 se não tivermos bases para estimar  A etapa da proposta das políticas públicas
probabilidades (e na PO não as temos) e das regulações socioeconómicas – o véu
 se dermos pouco valor aos ganhos de ignorância é parcial (aplicação do
possíveis acima do mínimo garantido segundo princípio)
 se os resultados negativos possíveis forem  Os cidadãos efetuam as políticas públicas e
muito maus mesmo regulações (não há aqui véu de ignorância)

O argumento das exigências do compromisso Em relação à etapa da convenção constitucional:


O maximin permite justificar o primeiro princípio,  São discutidos os limites da tolerância
mas não o segundo, o princípio de diferença (o como ilustrações do primeiro princípio
qual justifica as desigualdades até certo ponto, e (liberdade de consciência e de expressão).
logo permite tomar riscos até certo ponto). Rawls defende a tolerância dos
intolerantes.
O princípio da diferença justifica-se pelas
 São discutidos exemplos de design
“exigências do compromisso”: ao escolher os
institucional como o financiamento
Princípios da Justiça, as pessoas na posição
público das campanhas políticas.
original não querem que as exigências em
respeitar os estes princípios sejam demasiado  É discutido o design do sistema legal,
elevadas. como, por exemplo, a independência dos
juízes
Ora o utilitarismo e o libertarismo exigem
demasiado das pessoas, como o sacrifício de si
pelos outros (num caso voluntário, no outro não). Em relação à etapa da proposta das políticas
públicas e das relações socioeconómicas, Rawls
distingue vários tipos de sociedade
 sistema de planificação central
 sistema socialista liberal
 sistema capitalista de mercado livre total
 democracia de proprietários
Há, mais tarde, uma distinção entre Estado social Segundo princípio
capitalista e a democracia de proprietários. Rawls
 As desigualdades económicas e sociais
assume a democracia de proprietários sendo o
devem ser ordenadas de tal modo que, ao
mais compatível com os seus princípios da justiça.
mesmo tempo:
O sistema capitalista do welfare state não é o Tragam o maior benefício possível
compatível com a igualdade equitativa de para os menos favorecidos,
oportunidades, bem como com a reciprocidade obedecendo às restrições do
implicada na ideia da sociedade como um sistema princípio da poupança justa
de cooperação entre pessoas livres e iguais. o Sejam vinculadas a cargos e
O sistema capitalista do welfare state mantém posições abertos a todos em
apenas as pessoas num nível mínimo de proteção condições de igualdade equitativa
social, o precariado. de oportunidades
Primeira regra de prioridade (A prioridade da
Liberdade)
Completando o argumento
 Os princípios da justiça devem ser
 Justiça intergeracional classificados em ordem lexical e, portanto,
 O argumento concluído as liberdades básicas só podem ser
restringidas em nome da liberdade.
 Existem dois casos:
Justiça intergeracional o Uma redução da liberdade deve
fortalecer o sistema total das
Como pesas os interesses das gerações futuras em
liberdades partilhadas por todos
relação à geração atual? O principio de diferença,
o Uma liberdade desigual deve ser
se aplicado generosamente à geração atual,
implica não colocar recursos na investigação e aceitável para aqueles que têm
desenvolvimento, o que prejudicará as gerações liberdade menor
futuras. Segunda regra de prioridade (a prioridade da
Assim, o princípio da diferença deve ter em conta Justiça sobre a eficiência e sobre o bem-estar)
estes interesses através do véu de ignorância, o  O segundo princípio da justiça é
qual nos impede de saber a que geração vamos lexicalmente anterior ao princípio da
pertencer. eficiência e ao princípio da maximização
da soma de vantagens
 A igualdade equitativa de oportunidades é
O argumento concluído anterior ao princípio da diferença.
Rawls apresenta a versão final dos Princípios da  Existem dois casos:
Justiça, com as regras da prioridade. o Uma desigualdade de
oportunidades deve aumentar as
Primeiro princípio oportunidades daqueles que têm
 Cada pessoa deve ter um direito igual ao uma oportunidade menor
mais abrangente sistema total de o Uma taxa excessiva de poupança
liberdades básicas iguais que seja deve, aliados todos os fatores,
compatível com um sistema semelhante de mitigar as dificuldades dos que
liberdades para todos carregam esse fardo
A justiça e o indivíduo
Desobediência civil
Até que ponto somos obrigados a obedecer às
exigências que nos são impostas pela sociedade ou
quando é que devemos obedecer a leis que são
injustas?
Na tradição do contrato social, obedecemos à
autoridade política, pois damos o nosso
consentimento ao contrato.
Por outro lado, a posição original é estritamente
hipotética, logo não temos obrigação de obedecer.
Rawls apela à obrigação de equidade e ao dever
natural de justiça como razões para obedecer. No
entanto, estes dois princípios só resolvem o
problema da obediência à autoridade apenas se
aceitarmos que o dever moral da justiça é uma
obrigação moral primitiva quando as instituições
são justas. Caso contrário, devemos desobedecer.

A procura da estabilidade
Estabilidade e congruência entre o bem e o
justo
Tem como objetivo explicar de que maneira os
cidadãos, numa sociedade bem ordenada cuja
estrutura reflete os dois princípios da Teoria da
Justiça, tendem a apoiar a justiça social, tornando
a sociedade estável.
Trata-se do problema da congruência entre o
pluralismo do bem e o universalismo do justo: a
justiça torna-se reguladora do plano de vida de
cada pessoa – mais tarde, refuta esta ideia dado
que é fundada na autonomia individual (Kant) que
é incompatível com o pluralismo razoável das
conceções do bem.
Robert Nozick, Anarquia, Estado e Utopia A tese da propriedade de si
Introdução Não devemos ignorar que todos temos vidas
separadas – propriedade de si. Segundo este autor,
Robert Nozick defende o libertarismo: defesa do
a propriedade de si deve ser absoluta
mercado livre, dos direitos absolutos de
propriedade e do Estado mínimo.
A teoria de Nozick fundamenta-se no valor dos A teoria da justiça da titularidade
direitos absolutos de propriedade: direitos da
Nozick quer um Estado mínimo que proteja a
propriedade de si e da propriedade de coisas no
propriedade privada, a qual deve ser moralmente
mundo.
justificada graças à titularidade.
Ninguém tem o direito de intervir com a nossa
Exemplo: uma pessoa muito rica recebe por
pessoa nem com as nossas possessões sem o nosso
herança mais riqueza ainda. Não é uma
consentimento, a não ser que tenhamos perdido os
necessidade e não tem mérito por isso. Mas tem o
nossos direitos por ter violado os dos outros.
direito a essa riqueza, ou seja, tem titularidade?
O direito à liberdade é a consequência do direito à
Se a riqueza foi obtida com justiça na aquisição ou
propriedade de si.
com justiça na transferência ou com justiça na
retificação, então tem titularidade.
Uma tradição individualista
Influenciado por Locke, a tradição de Nozick é a O Estado mínimo
tradição individualista dos direitos naturais.
Ter direitos absolutos de propriedade sobre si e
A defesa do Estado mínimo de Nozick é composta sobre as coisas não garante que estes sejam
por três etapas: respeitados. Como proteger-nos das violações
possíveis? Chamando a polícia e levando a
 Contra o anarquista, Nozick defende que o tribunal os violadores.
Estado mínimo é justificado Os anarquistas não querem Estado. Mas isto é
 Contra o que defende um Estado extenso, idealista e leva ao risco de caos e guerra civil.
Nozick defende um Estado limitado Nozick quer um Estado “guarda-noturno”.
 O Estado mínimo não é um problema, pois
serve de inspiração para as utopias Nozick é contra a redistribuição compulsiva das
riquezas, e contra o paternalismo. É contra a ajuda
compulsiva aos pobres (Estado social).
O libertarismo de Nozick
Entre anarquia e Estado Uma estrutura para a utopia?
Nozick diz que os indivíduos têm direitos e que há Nozick não é contra a filantropia. Devemos, no
coisas que nenhuma pessoa ou grupo lhes pode entanto, distinguir entre o moralmente correto e
fazer sem violar os seus direitos. aquilo que é justo inscrever na lei como
A anarquia não é uma consequência inevitável, ao obrigatório.
contrário do Estado mínimo. Nozick é, então, Nozick não é contra os seguros no mercado
contra o Estado social uma vez que viola os privado, dado que muito bens são distribuídos
direitos individuais. graças a este.
O Estado mínimo é uma estrutura neutra que dá o Influência de Kant sobre Nozick: segunda
máximo de liberdade para criar sociedades muito formulação do imperativo categórico “Age de
variadas. maneira a nunca tratar os outros apenas como
meios mas sempre ao mesmo tempo como fins.”

Os direitos libertários
Os direitos são restrições absolutas pois as pessoas
Direitos invioláveis
são fins e não meios: têm vontade racional, fazem
Para Nozick, os direitos individuais são absolutos. escolhas racionais, e merecem por isso ser
Se eu estou a morrer de fome, e tenho um direito
absoluto à vida, isso não me dá o direito à comida
de outra pessoa.
Direitos negativos (direito à não-interferência dos
outros): não contratuais.
Direitos positivos (implicam deveres dos outros
em relação a mim): devem ser apenas voluntários
Quando há conflito de direitos: os direitos
negativos são como restrições absolutas.

Direitos naturais e John Locke


Os direitos são naturais, universais e
independentes das convenções.
Contra Filmer, Locke defende que Deus não deu a
terra apenas a Adão, mas a todos os homens, e
criou os humanos moralmente iguais, livres e respeitadas.
independentes.

John Locke e o estado de natureza O Estado mínimo contra o anarquista


Segundo Locke, os homens vivem no estado de Do Estado de natureza à empresa dominante e
natureza: “um estado de liberdade, mas não um ao Estado mínimo
estado de licença”
 No estado de natureza cada um é o seu
Existem limites ao que as pessoas podem fazer, próprio juiz, e tende a ser parcial
dados pela Lei Natural: “ Ninguém deveria (influência do estado de natureza em John
prejudicar o outro na sua vida, saúde, liberdade ou Locke)
possessão” o Também podemos não ter a força
de exercer o nosso direito à
punição, nem à auto-defesa.
Fundamento Kantiano dos direitos em Nozick o Este problema resolve-se com
Nozick não pode fundamentar a sua teoria dos “gangs” de pessoas que se
direitos naturais em Locke, pois Locke é religioso associam para proteção mútua.
(o fundamento é teológico), defende direitos o Inicialmente haverão várias
positivos (direito à vida implica a obrigação dos empresas destas, mas tendem ao
outros em impedirem que eu morra de fome) e monopólio, até que uma empresa
pode ser considerado utilitarista. fica com o monopólio do uso da
força.
o Esta empresa dominante será o
Estado? Um Estado ultra-mínino
talvez.

Resumindo:
 O Estado ultra-mínimo e o Estado mínimo:
O John Wayne é um justiceiro que se pode  Estado de natureza: cada um é juiz
enganar, ser parcial, na sua procura da  Juntam-se em gangs
justiça privada  Transferem os seus direitos a uma
o Deve a empresa dominante tomar o empresa, que é mais eficaz embora custe
risco de não fazer nada e permitir dinheiro
que o John Wayne utilize a força  Uma empresa dominante que também
contra os seus clientes? protege os John Wayne deste mundo –
o Ou deve a empresa reclamar o Estado Mínimo
monopólio do uso da força e usar a
violência contra o John Wayne se
for necessário? Se sim, está Como convencer o anarquista?
justificado o Estado ultra-mínimo.
O John Wayne deve ser compensado por não ter
 A empresa deve no entanto compensar o podido exercer o seu direito à punição,
John Wayne de o impedir de usar a força, protegendo-o também: é o “principio de
oferecendo-lhe os seus serviços de compensação”.
proteção Nozick consegue justificar o Estado mínimo ao
o Está assim justificado o Estado anarquista? Talvez, mas a que preço? Pois a
mínimo. compensação parece implicar uma redistribuição
o Oferecendo serviços mesmo aos compulsiva.
que não os querem, o Estado
mínimo é redistributivo: alguns
pagam para proteger todos
o A razão não é welfarista mas
A teoria da justiça de Nozick
apenas para proteger os direitos
negativos Direitos, justiça distributiva e Estado mínimo
Dilema de Nozick: aceitar o Estado ultra-mínimo
e ignorar a justiça distributiva ou aceitar a justiça
Obediência ao Estado
distributiva e desistir do Estado mínimo?
Nozick justifica a obediência ao Estado em duas
Uma terceira opção – definir a justiça distributiva
etapas:
de forma a torná-la compatível com o Estado
 É racional consentir ao Estado pois é mínimo: esta é a função da sua teoria da justiça
melhor (mais eficaz na administração) do como titularidade.
que a anarquia e acontece pela “mão
Se a teoria da titularidade for verdadeira e se não
invisível”, a través da empresa de
puser em causa os direitos naturais à propriedade
segurança dominante.
de si, então o Estado mínimo é justificado.
 Mesmo aqueles que não estão convencidos
com o argumento, como o John Wayne,
devem obedecer ao Estado, pois temos o
Teorias da Justiça
direito de nos proteger de “justiceiros”
embora devamos compensá-los, Justiça distributiva = Justiça económica
protegendo-os também. = Distribuição justa dos recursos
Exemplos de padrões de distribuição:
 Função do mais útil para sociedade
 Função da prioridade aos + desfavorecidos
 Função dos recursos, capacidades,
trabalho, mérito, excelência…
Contra o “pote social” Três formas de justiça – teoria da titularidade

Para Nozick não existe um “pote social” à espera  Justiça na aquisição


de ser distribuído por uma entidade central, apenas o Passagem legítima de algo que não
existem pessoas que produzem riquezas. pertence a ninguém e que é
transformado em propriedade
Em consequência de tal situação, a justiça
privada
distributiva não pode ser realizada sem recorrer a
 Justiça na transferência
uma entidade central, logo não é compatível com
o Da propriedade justamente
o Estado mínimo
adquirida por alguém à
A teoria da titularidade é a teoria do justo título transferência voluntária a outra
das posses, justas. pessoa
 Justiça retificativa
o Se a aquisição não foi legítima ou
A teoria da titularidade se a transferência não foi voluntária
então devemos corrigir injustiças
Em vez de procurar um padrão ao qual a
passadas
distribuição se deve conformar, Nozick pergunta
como se chega a ser o proprietário de maneira
justa.
Liberdade e padrões
A resposta é clara – se e apenas se a apropriação
foi feita graças a um processo correto: Se uma transferência é justa se, e apenas se, for
voluntária, então as teorias padronizadas são
 Quem adquire uma participação de acordo inaceitáveis.
com o princípio da justiça na aquisição
tem direito a essa participação. Nozick generaliza Hume – a liberdade de
transferência elimina a igualdade e todas as
 Uma pessoa que adquire uma participação
distribuições padronizadas.
de acordo com o princípio da justiça na
transferência, de outra pessoa com direito
à participação, tem direito à participação.
A disrupção dos padrões
 Ninguém tem direito a uma participação,
exceto por (repetidas) aplicações de 1 e 2. Contrariamente ao que Nozick parece assumir, os
padrões iniciais não são necessariamente
arbitrários. São escolhidos por razões que podem
A teoria da titularidade é histórica, onde uma ser boas ou más.
distribuição é justa se for o resultado de outra
No entanto, o ónus da prova está do lado daqueles
distribuição justa feita por procedimentos
que mantêm que os padrões podem permanecer
legítimos.
voluntariamente e não do lado de Nozick.

Transferência voluntária
Nozick defende que se D1 é justo e provocou uma
transferência voluntária para D2, então D2 é justo.
No entanto, não é fácil saber quando algo é Segundo Nozick, para fazer respeitar um padrão
realmente voluntário. Por exemplo, “o teu de justiça são necessárias intrusões permanentes e
dinheiro ou a tua vida” não é uma troca voluntária inaceitáveis na vida das pessoas.
livre, mas forçada.

Existem duas condições para a transferência


Objeções a Nozick
involuntária:
 Um padrão igualitário não precisa de ser
 As nossas opções estão limitadas por ações
tão intrusivo, embora possa implicar
de outros
algumas restrições à liberdade
 Estas ações devem violar os nossos
 Numa teoria da justiça, a liberdade é um
direitos
valor entre outros valores, com os quais é
Exemplo 1: 26 homens e 26 mulheres. A e A’ preciso fazer trade-offs
casam coincidindo perfeitamente com os seus o Por exemplo, o princípio da
desejos. Z e Z’ casam uma vez que não têm mais diferença de Rawls não implica
ninguém com quem casar. No entanto, casam uma intrusão significativa na vida
voluntariamente pois ninguém violou os seus das pessoas – esta é uma forma de
direitos. harmonizar vários valores
fundamentais como a liberdade e a
Exemplo 2: um trabalhador que prefira não
igualdade.
trabalhar e morrer de fome, pode fazer uma
escolha voluntária ao preferir morrer de fome se
as ações dos outros que afetam essa escolha não
violaram os direitos do trabalhador. Desta forma, Duas conceções da liberdade
segundo Nozick podemos distinguir a Se aceitarmos que os padrões podem em certos
transferência livre da transferência forçada. casos limitar legitimamente a liberdade de alguns,
por exemplo para reduzir a pobreza extrema de
outros, estamos a conceder um ponto importante a
Transferências voluntárias, mas fraudulentas Nozick.
Quando as transferências voluntárias são Serão, então, realmente limitações da liberdade?
fraudulentas, não podemos considerá-las como Imaginando que um professor quer vender o seu
realmente voluntárias. lugar a um familiar em vez de o ceder por
concurso ao candidato com mais mérito: impedi-lo
de o fazer seria uma negação da sua liberdade?
Ser voluntário é suficiente para a justiça da
transferência?
Liberdade e direitos
 Riqueza é poder. Por exemplo, o poder de
subir os preços das casas graças à Aquilo que conta como liberdade depende dos
especulação imobiliária coloca os outros direitos que temos.
em situação de considerar o contrato
Resolvendo a questão anterior, como um professor
injusto.
não tem o direito de vender o seu lugar, impedi-lo
 Devemos permitir transferências
de o fazer não representa uma limitação da sua
voluntárias como a liberdade de dar
liberdade.
presentes ou a liberdade de amar.
Nozick, na sua obra, afirma “Os meus direitos de
Se impusermos um padrão, estamos a negar que o
propriedade sobre a minha faca permitem-me
ser voluntário é uma condição suficiente da
deixá-la onde me apetecer, mas não no peito do
justiça.
leitor”
Para Locke, liberdade não é licença. É antes um o É considerado simplista, uma vez
agir segundo a lei moral. que transferências podem levar a
injustiças
Para Hobbes, qualquer restrição física é uma
 Aplicar um padrão viola a liberdade
limitação da liberdade, incluindo a questão do
o É um argumento fraco dado que a
impedimento de colocar uma faca no peito de
outrem. liberdade é um valore entre outros
e a liberdade implica direitos
Assim, Nozick apoia Locke dizendo que a nossa morais (contra a liberdade negativa
liberdade é limitada apenas quando alguém nos de Hobbes)
impede de fazer aquilo que tenho o direito de
fazer. Desta forma, como não tenho o direito de Locke e a propriedade
esfaquear uma pessoa inocente, a minha liberdade Para Locke, tudo o que existe espontaneamente na
não é limitada quando sou impedida de o fazer. terra pertence em comum à humanidade. Assim,
cada homem tem a propriedade exclusiva da sua
própria pessoa e o seu trabalho pertence-lhe. É
Liberdade negativa vs. Liberdade positiva este mesmo trabalho que determina a posse dos
bens (frutos da terra).
Para a liberdade negativa (freedom from), somos
livres quando não somos impedidos de fazer o que Locke definiu três restrições à acumulação de
quisermos – liberdade dos modernos propriedade no estado de natureza:
A liberdade positiva (freedom too) associa-se ao  Só se pode apropriar duma propriedade na
autodomínio, ao controle sobre si próprio e à medida em que esta não se estrague
capacidade de obedecer à lei moral – vem de  Deve deixar-se a propriedade “suficiente e
Aristóteles e é conhecida como a liberdade dos tão boa” para os outros (restrição da
antigos. suficiência)
Nozick está assim entre os dois conceitos acima  Só podemos ter propriedade através do
referidos, pois a influência é mais lockeana do que nosso trabalho
hobesiana.

Objeção de Nozick a Locke


Titularidade e liberdade Nozick questiona a mistura de uma atividade com
Para Hobbes, se o meu direito à vida previne um objeto, indo até mais longe e perguntando se a
alguém de me matar, então isso é uma limitação mistura não será um meio de perder um objeto em
da sua liberdade. No entanto, esta restrição à vez de ganhar um maior (exemplo da lata de sumo
liberdade faz sentido dado que é um dever da lei de tomate despejada no mar. Fico proprietário do
moral. mar ou perco o meu sumo de tomate?).

A teoria da titularidade também choca com a Locke responde dizendo que misturar o trabalho
liberdade negativa e não apenas os padrões dá mais valor ao objeto (produtivismo) e deixa
chocam com esta. mais recursos para outros.
Nozick volta a refutar argumentando que o
produtivismo pode ser fruto do coletivo e não
Rejeição da conceção da titularidade apenas devido à propriedade privada.
Argumento de Nozick:
 As transferências voluntárias destroem A cláusula lockeana e a cláusula nozickeana
padrões
 O que se segue duma situação justa é justo Para Nozick, a cláusula lockeana da apropriação
legítima da propriedade “suficiente e tão bom”
deve ser interpretada como “ninguém deve ficar o Nozick não defende a liberdade
pior”. negativa de Hobbes.
A cláusula não é violada se ninguém ficar pior no
 Princípio de retificação
uso da terra, mesmo se a terra for propriedade de
o Igualitário?
uma só pessoa.

O problema dos parâmetros


É a cláusula nozickeana uma condição suficiente O Estado mínimo como utopia
para a justificação da apropriação? A teoria dos direitos do Nozick é contestável. O
Para isso, precisamos de conhecer os parâmetros defensor anarquista dos direitos naturais não fica
de comparação: o que quer dizer “se não piorar as convencido com o Estado mínimo.
condições dos outros”? A teoria da titularidade revela-se sem
Para Nozick, a comparação relevante é a situação fundamentos sólidos. Ficamos com pouco, o que é
em que não há apropriação. estimulante e não dogmático.

Esta visão sofre com uma objeção dado que De qualquer forma, a filosofia política raramente
podemos compará-la com outras situações como a atinge verdades.
propriedade socialista.
Assim, Nozick só pode argumentar que a cláusula Nozick e Rawls
pretende apenas ser uma condição necessária, mas
não suficiente. Formulação dos dois princípios da Teoria da
Justiça:
 A sociedade deve assegurar a máxima
Justiça na retificação liberdade para cada pessoa compatível
Para Nozick, muitas aquisições são injustas (como com uma liberdade igual para todos os
os impostos para financiar a saúde pública). outros – Princípio da liberdade igual.
Assim, o princípio da retificação corrige as  As desigualdades económicas e sociais
aquisições injustas. devem:
o gerar o maior benefício para os
menos favorecidos (princípio da
Conclusão diferença)
o devem estar ligadas a postos e
 Princípio de aquisição posições acessíveis a todos em
o Não se percebe bem em que condições de justa igualdade de
consiste. oportunidades (princípio da
o Nozick defende uma versão fraca oportunidade justa).
da cláusula lockeana: se ninguém
ficar pior. Mas em relação a que
situação? Nozick é contra o princípio da diferença. Para
Rawls a sociedade é um sistema de cooperação
 Princípio da transferência para a vantagem mútua. A cooperação justa
o É justa se for voluntária. permite uma divisão justa do produto social.
Para Rawls os melhores na sociedade têm sorte Mesmo se é provável que um sistema libertário de
social e sorte genética, e essa sorte é moralmente direita provoque desigualdades fortes na
arbitrária. sociedade, na verdade Nozick nada tem contra a
igualdade, se esta for o resultado de transferências
O princípio da diferença corrige essa
voluntárias, e não duma “planificação
arbitrariedade moral: os talentos que são
centralizada”.
consequência do moralmente arbitrário são para
Rawls “common assets” (ativos comuns).

Nozick para Rawls Nozick e Marx


Se não somos responsáveis nem sequer dos nossos Para Marx, os trabalhadores são alienados e
esforços então não podemos defender que somos explicados. Explica tal alienação dizendo que:
pessoas autónomas.
 O trabalho não tem sentido
 As pessoas não seriam responsáveis pelos o Nozick diz que no socialismo
seus crimes? Deveríamos castigar toda a também não. Trabalho com sentido
comunidade e não apenas o criminoso? e mal pago vs. trabalho sem sentido
o Segundo Rawls, devemos e bem pago?
distinguir o direito de usufruir das  Os trabalhadores não controlam a sua
nossas propriedades naturais atividade económica
(moralmente arbitrárias) do direito o Nozick defende que podem sempre
de ficarmos com todos os lucros fazer cooperativas
que podem decorrer da possessão  Os trabalhadores são impedidos de
desse direito dizerem algo sobre os temas que os afetam
o Nozick argumenta que o “princípio
 A lotaria social e genética é realmente dos afetados” raramente é aplicado
moralmente arbitrária? As pessoas podem e é muito complicado de realizar
ter o direito às possessões derivadas dos
seus talentos naturais, mesmo sem mérito
nenhum. Em Marx, a teoria da exploração permite explicar
o Rawls responde com uma outra o mecanismo que causa o lucro capitalista. Para
questão: então que outra razão este autor, há exploração no trabalho porque:
justificaria esta possessão dos
recursos?  O trabalhador é usado apenas como um
meio
 O princípio de diferença viola a  O trabalhador é pago menos do que o valor
separabilidade das pessoas. Os melhores que o seu trabalho produziu
estão ao serviço dos menos favorecidos. o Nozick diz que, assim sendo, há
o Rawls diz que sem princípio de exploração sempre que se investe
diferença, o sacrifício dos mais no futuro ou na segurança social
pobres pelos mais ricos seria ainda  O trabalhador não tem alternativa
pior o Ao que Nozick responde que se
ninguém violar os seus direitos,
então tem alternativas e podem
Nozick e igualdade criar cooperativas
sobre elas próprias (ser proprietário da máquina da
roupa ou de escravos).
Libertarismo e utopia
A plena propriedade de si é o conjunto
O libertarismo pode servir de estrutura para as
logicamente mais forte de direitos de propriedade
utopias.
sobre uma coisa. Esta pode vir em vários graus.
Apesar de estar associado ao laissez-faire e ao
Se os direitos protegerem as escolhas das pessoas,
capitalismo selvagem, o libertarismo não obriga a
então há plena propriedade de si. Para os
isto, pois é compatível com qualquer tipo de
libertários, os direitos protegem as escolhas e estas
sociedades, mesmo não capitalistas, desde que
devem ter prioridade lexical sobre os interesses.
isso seja o resultado de decisões voluntárias.
Se os direitos protegerem os interesses das
As pessoas podem sair de uma e entrar noutra
pessoas, estamos perante a propriedade parcial.
quando quiserem – o resultado é um pluralismo de
Para os liberais, há certas coisas que não podemos
utopias possíveis
fazer.
Propriedade de si e distribuição dos recursos:
A plena propriedade de si implica a defesa de
diferenças entre o libertarismo de direita e o
direitos absolutos e incondicionais.
libertarismo de esquerda
Em alternativa, podemos defender alguma forma
Justiça e libertarismo
de propriedade de si parcial, mas isso implica
A justiça permite evitar danos interpessoais. Não rejeitar o libertarismo.
tem nada de substancial a dizer sobre estes danos
A maioria das pessoas aceita alguma forma de
(como queimar bandeiras).
propriedade de si parcial.
Todas as formas de libertarismo defendem a plena
propriedade de si e rejeitam a propriedade de si
parcial. Plena propriedade de si e anti-paternalismo
No entanto, diferem no que diz respeito aos As pessoas têm autoridade moral e são capazes de
poderes morais que os indivíduos têm a adquirir a escolhas autónomas. Devem ter uma proteção
propriedades de coisas externas (questão sobre moral contra as interferências que limitam a forma
danos impessoais ou interpessoais?) como as pessoas podem ser utilizadas.
Exemplo: é injusto matar ou torturar pessoas
inocentes contra a sua vontade,
Teses discutidas
independentemente de outros objetivos morais
 A propriedade plena é mais plausível que a importantes (a igualdade, a utilidade total, etc.).
propriedade de si parcial (mesmo quando o
preço a pagar pela propriedade plena
implica aceitar a legitimidade da Crítica consequencialista
escravidão voluntária).
O consequencialismo nega que existem tradições
absolutas sobre como as pessoas podem ser
 O libertarismo de esquerda é mais coerente
tratadas. Assim, a eutanásia e o sexo homossexual
que o libertarismo de direita na defesa da
podem ser moralmente errados, mesmo quando
propriedade plena de si.
são frutos de um consentimento entre adultos.
Para o libertarismo, as restrições servem para
Propriedade de si: parcial ou total proteger os indivíduos dos outros e não deles
próprios ou segundo normas impessoais. Desta
Definição de plena propriedade de si (PPS) forma, pode ser razoável ferir levemente alguém
As pessoas são plenamente proprietárias de si para salvar milhões, mas não deixa de ser injusto
próprias quando têm todos os direitos morais do ponto de vista da plena propriedade de si.
A justiça protege a possessão da autonomia das
pessoas ou deve proteger o exercício da
Limites à liberdade da plena propriedade de si
autonomia?
A plena propriedade de si implica o direito à
liberdade total de usar a sua pessoa. Não significa,
no entanto, que ela está autorizada a fazer o que
quer com a sua pessoa (não pode, por exemplo,
espancar alguém).
Ao necessitarmos da permissão dos outros para
usar os seus recursos, podemos perder alguns dos
nossos direitos de liberdade sobre nós próprios
através das nossas ações (como quando fazemos
um contrato de prestação de serviços).

Dever de assistência
A plena propriedade de si tem a implicação
contraintuitiva de que não temos o dever de
prestar assistência aos outros. Distribuição dos recursos

Pode ser “imoral” não ajudar os outros, mas eles Como adquirir recursos?
não têm o direito de exigir tal ajuda da minha. A plena propriedade de si dá aos agentes direitos
Pode, então, ser um dever impessoal, mas não sobre si mesmos, o que deixa em aberto a questão
uma obrigação interpessoal. dos direitos sobre os recursos naturais e artefactos:
 Quid da possibilidade de adquirir recursos
Escravidão voluntária por transferência consensual (por exemplo,
por venda ou doação)?
A Plena Propriedade de Si implica os plenos  Quid da possibilidade de adquirir recursos
poderes para transferir os direitos da propriedade sem o consentimento dos outros (por
de si (como a escravidão). exemplo, por apropriação unilateral de
A escravidão voluntária sobre objeções dado que recursos sem proprietário)?
é impossível transferir o controlo da sua própria
pessoa para outra pessoa.
Uma das teorias libertárias de esquerda sustenta
A ideia central é que é impossível alienar a que inicialmente ninguém tem o direito de usar os
vontade de alguém (Rousseau). Isso é verdade, recursos naturais sem o consentimento coletivo
mas é irrelevante uma vez que a questão não tem a (por maioria ou unanimidade) dos membros da
ver com alienar a sua vontade, mas sim alienar a sociedade. Esta teoria sobre com uma objeção
autoridade legítima sobre a sua vontade. dado que toda a ação requer o uso de alguns
Os escravos têm obrigações morais para com os recursos naturais – então é uma teoria implausível.
seus proprietários – respeitar o contrato. Uma versão menos radical permite que os agentes
Um ponto mais profundo é o de que a Plena usem os recursos naturais, mas sem se
Propriedade de Si implica a liberdade de transferir apropriarem dos recursos naturais sem o
os direitos sobre si mesmo, mas não garante que consentimento coletivo dos membros da
os outros têm o poder moral para adquirir esses sociedade.
direitos. Esta versão sofre com a objeção de que dada a
importância de poder possuir alguns recursos
externos, é mais plausível defender que os agentes
têm o poder de se apropriar de alguns recursos,
sem o consentimento dos outros.
Suficientarismo
Para Locke, não há necessidade de ter o
O suficientarismo libertário (no meio entre a
consentimento dos outros se não nos apropriarmos
direita e a esquerda) interpreta a cláusula de Locke
de mais do que uma parte justa dos recursos.
como exigindo que os outros fiquem com uma
parte suficiente dos recursos naturais. Exatamente
volta a questão do que é suficiente.
Apropriação unilateral
O suficientarismo parece mais justo que o
Pode haver apropriação unilateral sem depender
libertarismo de Nozick por ser sensível à
do consentimento real dos outros, pois os recursos
qualidade de perspetivas de vida deixadas para os
naturais inicialmente não são protegidos por um
outros pelo uso ou pela apropriação dos recursos.
regime de propriedade. As pessoas que primeiro
reivindicam direitos sobre um recurso natura Objeção: O suficientarismo não reconhece que os
adquirem esses direitos desde que certas recursos naturais pertencem a todos.
condições sejam cumpridas.
Exemplo: alguém que deixa para os outros apenas
o necessário para vida minimamente decente. Tal
não parece plausível
Libertarismo de esquerda e valor igual
Versão unilateral radical do libertarismo de
direita Os recursos naturais inicialmente pertencem aa
todos e devemos deixar aos outros uma parte per
Não existem restrições em relação à justa parte
capita igualmente valiosa dos recursos naturais
sobre o uso ou sobre a apropriação dos recursos
naturais. Objeção:
As pessoas podem destruir todos os recursos Será este libertarismo suficientemente igualitário?
naturais que quiserem e têm o poder de se Uma vez que esta interpretação de esquerda da
apropriar dos recursos naturais se forem os cláusula lockeana não faz nada para compensar
primeiros a fazê-lo. desvantagens nas capacidades internas não
escolhidas dos indivíduos (a má sorte bruta).
Objeção:
Este libertarismo é então compatível com
Isto não é plausível dado que nenhum agente
perspetivas de vida radicalmente desiguais.
humano criou os recursos naturais. Não há razão
para que o primeiro que reivindique direitos sobre
um recurso natural deva colher todos os benefícios
Libertarismo de esquerda e igualdade de
que o recurso proporciona. Assim, os indivíduos
oportunidades
não podem monopolizar os recursos naturais como
bem entendem. Um libertarismo de esquerda mais radical deve
repousar sobre uma teoria robusta da igualdade de
oportunidades.
Libertarismo de direita menos radical
Locke diz que devemos deixar o suficiente para
A condição da justa parte na apropriação é a que outros possam ter uma oportunidade para o
condição de Locke, que exige que “o suficiente e bem-estar que seja pelo menos tão boa como a
tão bom deve ser deixado aos outros”. Nenhum oportunidade de bem-estar obtida no uso ou na
indivíduo deve ficar pior pela apropriação em apropriação de recursos naturais.
comparação com o estado de não apropriação.
Desta forma, aqueles cujas capacidades internas
Objeção: inicialmente lhes proporcionam oportunidades
efetivas menos favoráveis para o seu bem-estar,
Isto pode determinar o pagamento de
compensações muito baixas.
têm direito a partes maiores de recursos naturais – Este rendimento fornece aos indivíduos não
igualdade de recursos de Dworkin produtivos a mesma oportunidade para o bem-
estar que os indivíduos produtivos.
As pessoas não produtivas seriam assim capazes
Libertarismo de esquerda contra Nozick
de se sustentarem através de intercâmbios
O libertarismo de esquerda rejeita que a plena verdadeiramente voluntários com as pessoas
propriedade de si seja incompatível com uma produtivas, o que levaria ao fim da assistência
redistribuição igualitária dos recursos externos. forçada aos não produtivos.

A tributação redistributiva do rendimento equivale Desta maneira pode alcançar-se a igualdade de


ao trabalho forçado (escravidão parcial). No oportunidades, sem quaisquer invasões do direito
entanto, para ter um rendimento devemos sempre robusto de propriedade de si.
fazer uso de recursos externos.
Podemos legitimamente adquirir direitos de
Direito à plena propriedade de si
propriedade sobre a terra que nos deem o direito
de manter todos os frutos do nosso trabalho. Esse O direito de propriedade de si é robusto se e
direito só pode estender-se a uma aquisição que somente se, além de ter o próprio direito em si, a
seja consistente com a realização duma real pessoa também tem direitos sobre os recursos
igualdade de oportunidades. Assim, Nozick não naturais suficientes para garantir que não será
tem razão. forçado (pela necessidade) em ajudar os outros.
Igualdade de resultados vs. Liberdade de
oportunidades
Síntese
Iniciando no mesmo ponto, dois indivíduos
O libertarismo de esquerda sustenta que os
tomam diferentes escolhas sobre o que fazem.
recursos naturais devem ser utilizados para
Igualdade de resultados – exige a redistribuição promover a igualdade efetiva de oportunidades
das riquezas para igualar a riqueza de dois sujeitos para uma vida boa e garantir assim a todo o direito
(mesmo que os seus esforços não sejam iguais) robusto a uma plena propriedade de si. Se esta tese
for verdadeira, isto implica que o libertarismo de
Igualdade de oportunidades – condenaria essa
direita é falacioso.
redistribuição que não respeita as escolhas
responsáveis desses indivíduos
A segunda forma de igualitarismo (igualdade de
oportunidades) é compatível com o libertarismo
de esquerda dado que respeita a plena propriedade
de si.
A Plena Propriedade de Si é compatível com uma
teoria igualitária da justiça na aquisição que exige
uma distribuição de recursos que equaliza as
oportunidades para o bem-estar.
É possível, sem violar a plena propriedade de si de
ninguém, fornecer aos que são incapazes de se
envolver em trabalho produtivo, a oportunidade de
adquirir recursos naturais suficientes para gerar
um fluxo constante, generoso e ao longo da vida,
dum rendimento garantido, quer seja a partir do
investimento, do aluguer ou venda dos recursos.
Os comunitaristas são contra as pretensões
universais da teoria liberal. São contra a
“perspetiva da eternidade” da posição original de
Rawls, a partir da qual a estrutura de um sistema
social pode ser avaliada.
Para os comunitaristas, os padrões de justiça
devem ser encontrados nas tradições das
sociedades particulares e, portanto, podem variar
de contexto para contexto.
Para Alasdair MacIntyre e Charles Taylor, por
exemplo, o juízo moral e político depende do
quadro interpretativo dentro do qual os agentes
vêm o seu mundo.
Por isso, são contra a abstração das dimensões
interpretativas das crenças humanas, as suas
práticas e instituições.

A crítica comunitarista e a neutralidade do Para Rawls, a conceção da pessoa como um


Estado cidadão imparcial fundamenta-se na cultura
política democrática e liberal.
Os comunitaristas vs. Rawls
Assim, ele defende que a sua teoria da justiça é o
O comunitarismo começou como uma reação melhor ideal político possível que todos os
crítica ao liberalismo exposto em John Rawls. indivíduos racionais desejariam se pudessem
Contra a teoria da Rawls, segundo a qual a escolher entre as alternativas políticas disponíveis.
principal função do Estado é a de garantir e Podem haver regimes não liberais justificáveis,
distribuir de forma justa as liberdades e os mas estes podem apenas ser tolerados e talvez
recursos económicos e sociais de que os respeitados, não idealizados nem desejados.
indivíduos precisam para viver as suas vidas
livremente escolhidas. Contra a crítica comunitarista, outros teóricos
liberais argumentam que a teoria liberal pode e
deve ser apresentada como um ideal
Críticas a Rawls universalmente válido.

Existem três tipos de críticas a este autor: Michael Walzer refere o sistema de castas indiano
como um exemplo de uma sociedade não liberal
 Afirmações metodológicas sobre a que é legítima de acordo com os seus próprios
importância da tradição e do contexto padrões. No entanto, as conceções pré-modernas
social para o raciocínio moral e político de uma comunidade onde os membros apoiam o
 Afirmações ontológicas sobre a natureza sistema de forma irrefletida é inadequada na
social do eu contemporaneidade que é confrontada com o
 Afirmações normativas sobre o valor da pluralismo razoável das conceções da vida boa.
comunidade
O colapso do comunismo soviético levou ao
debate sobre a teoria e a prática dos direitos
humanos universais.
Universalidade vs. particularismo
Francis Fukuyama, apoiante do universalismo valores particulares, como a liberdade, que
liberal, argumentou que o triunfo da democracia fundamentam a comunidade liberal.
liberal sobre os seus rivais significaria o fim da
Nem os pensadores liberais nem Rawls defendem
história.
a ideia de que o eu é criado fora do contexto social
O momento de euforia que se seguiu ao colapso e de que podemos existir independentemente
soviético levou à reflexão as dificuldades deste. No entanto, segundo o liberalismo, os
(temporárias) de implementar práticas liberais fora indivíduos podem ser livres do seu contexto social
do ocidente: escolhendo de maneira livre a vida que desejarem.
 Guerras étnicas permanentes Por sua vez, os comunitaristas argumentam que tal
 Pobreza extrema visão não tem em conta as áreas das nossas vidas
 Degradação ambiental que são governadas por rotinas e hábitos não
 Corrupção generalizada escolhidos individualmente.

Do Leste Asiático emergiu o maior desafio para a Apesar de os liberais considerarem de que certas
democracia liberal. Atualmente, a emergência de práticas comunais guiam os nossos
movimentos nacionalistas e autoritários no comportamentos, não apoiam que o Estado deva
Ocidente constituem um novo desafio para esta promovê-las. A questão chave para os liberais é a
democracia. provisão dos direitos, poderes e oportunidades que
os indivíduos necessitam desenvolver para
Devido à posição da harmonia familiar e social na implementar as suas conceções de vida boa.
Ásia, é difícil aqui a intervenção para promover os
direitos humanos e a democracia. Assim, as perspetivas morais deveriam ser o
produto da escolha individual.
O debate sobre o eu
Há certos autores, como Kymlicka, que defendem
Para Michael Sandel, o liberalismo rawlsiano um multiculturalismo liberal, no qual a melhor
implica uma conceção excessivamente vida é aquela em que o indivíduo escolhe o que
individualista do eu. vale a pena fazer, independentemente do quadro
Rawls defende que temos um interesse supremo moral no qual está inserido.
em sermos livres de fazer os nossos planos de Os comunitaristas assumem que os indivíduos têm
vida. No entanto, podemos ser definidor por um interesse em liderar as vidas comunitárias
vínculos comunais que afetam esses planos. dignas, tendo em conta a implicação política que
Desta forma, a política não deve apenas garantir pode ser necessária para sustentar e promover
as condições para que os indivíduos escolham valores comuns cruciais. No entanto, alguns dos
livremente, mas também manter e promover vínculos comunais podem ser problemáticos.
vínculos comunais cruciais para o nosso bem-estar Então, o Estado deve proteger a nossa capacidade
e autorrespeito e que definem quem somos. de perseguir e rever os nossos planos de vida.

Por outro lado, Charles Taylor opôs-se à visão


liberal de que os homens são autossuficientes fora As políticas da comunidade
da sociedade.
Os críticos comunitários do liberalismo foram
Taylor junta-se a Aristóteles na visão de que o motivados por preocupações políticas decorrentes
homem é um animal social dado que sozinho ou dos efeitos sociais e psicológicos negativos
fora da polis não é autossuficiente. relacionados às tendências atomísticas das
A visão atomística do eu pode prejudicar a sociedades liberais modernas.
sociedade liberal uma vez que não consegue As práticas liberais tradicionais contribuíram para
entender até que ponto o liberalismo pressupõe a alienação do processo político e para as elevadas
um contexto em que os indivíduos estão taxas de divórcio, por exemplo.
comprometidos com uma sociedade que promova
Alguns comunitaristas, como Etzioni, e liberais É de relevância salientar que o ideal de
perfeccionistas, como Galston, enfatizaram a comunidade não deve necessariamente entrar em
responsabilidade social e promoveram políticas conflito com o ideal liberal.
destinadas a conter a erosão da vida comunal
numa sociedade cada vez mais fragmentada.
O que é a neutralidade do Estado
Os comunitaristas culpam tanto as políticas de
esquerda como as de direita pelo nosso mal-estar A neutralidade política exige que os princípios e
atual: leis políticas possam ser fundamentados em
valores do justo independentemente dos valores
 Demasiados gastos em bem-estar que são
do bem para serem legítimos.
economicamente insustentáveis numa era
de crescimento lento e envelhecimento Segundo o ideal de neutralidade, o justo e o bem
populacional devem ser separados. Desta forma, os valores do
 Deslocamento do poder das comunidades justo têm prioridade sobre os valores do bem.
locais para estruturas burocráticas
Os comunitaristas são contra a neutralidade do
centralizadas, levando a uma crescente
Estado, defendendo a prioridade do bem sobre o
sensação de impotência e alienação do
justo e argumentando que o contrário não é
processo político
possível nem desejado.
 A lógica universalista dos direitos
prejudicou os laços familiares e sociais na O debate sobre a neutralidade é uma constante
sociedade civil ao tornar supérfluas as procura da resposta à questão “qual é o
obrigações para com a comunidade, fundamento do poder político legítimo?”
desencorajando os esforços privados para
ajudar os outros

Para tal, há algumas possibilidades, embora


As soluções de direita agravaram a erosão das
nenhuma conclusão fidedigna:
responsabilidades sociais e das formas da vida
comunitária.  Deus
Assim, e longe de produzir consequências  As pessoas
comunitárias benéficas, a mão invisível do  Os valores
capitalismo de livre mercado: o Valores do bem – valores da
comunidade
 Mina a família  Perigo de relativismo e de
 Destrói as comunidades locais ataque aos direitos
 Corrompe o processo político individuais
 Aumenta as considerações instrumentais o Valores do justo – que vão além da
que regem as relações no mercado nas comunidade
esferas previamente alimentadas por um  Perigo de universalismo
sentido de reciprocidade sem relação à realidade

O comunitarismo é fundamentalmente uma defesa Três tipos de neutralidade: efeitos, objetivos e


moral da comunidade: justificações
 Comunidade geográfica (cooperativas…) A neutralidade política é uma restrição normativa
 Comunidade de memória (língua, nação...) imposta sobre as consequências, intenções ou
 Comunidade psicológica ( altruísmo…) justificações os princípios políticos e das políticas
do Estado liberal democrático.
Segundo tal restrição, o Estado justo tem de ser nas suas consequências dado que irá promover
neutro em relação a qualquer conceção da vida uma língua (uma conceção do bem) em
boa, não promovendo umas em detrimento de detrimento das outras.
outras.
Objeção: como podemos ter a certeza de que
Uma conceção de vida boa consiste no conjunto realmente existe uma neutralidade de intenção?
de crenças normativas sobre como um indivíduo
Deste modo, a neutralidade das justificações adota
deve viver bem a sua vida pessoal.
maior plausibilidade devido à dificuldade de saber
Para os liberais, defensores da neutralidade, a a real intenção do Estado.
melhor maneira para o Estado ajudar as pessoas a
levar uma vida boa é não favorecer nenhuma
conceção de bem. 3. Neutralidade das justificações
Assim, o Estado deve limitar-se a garantir a As políticas do Estado devem ser justificadas sem
proteção dos interesses fundamentais comuns a referência a quaisquer conceções de bem.
todos os indivíduos.
Assim, se as justificações são neutras, então talvez
seja uma maneira de tornar menos relevante a
questão de saber se as intenções do Estado são
neutras ou não.
Exemplo da língua: o Estado pode ter como
intenção não neutra de promover uma língua
específica, mas se a justificação dada é neutra
(comunicação eficaz), então a política é
considerada legítima.

Objeção: o Estado pode dar uma justificação de


uma política neutra tendo uma intencionalidade
1. Neutralidade das consequências não neutra. Assim, a neutralidade das justificações
De acordo com a neutralidade das consequências, não é suficiente para evitar a promoção de
as políticas seguidas pelo Estado não devem ter políticas perfecionistas.
como consequência a promoção de qualquer
conceção da vida que lhe dê vantagem sobre as
outras. Perfecionismo político

Objeção: impossibilidade de realização dado que O Estado, para agir de maneira justa, tem de
qualquer política pública terá consequências promover uma conceção perfecionista do bem nas
desiguais entre as conceções da vida boa. suas políticas. Este perfecionismo pode não ser
liberal.
De acordo com o perfecionismo liberal, o Estado,
2. Neutralidade das intenções tem de promover uma conceção do bem liberal
Para a neutralidade das intenções, nenhuma nas suas políticas como a promoção do respeito
política prosseguida pelo Estado deve ter intenção pela liberdade de cada um.
de promover um determinado estilo de vida. Nos regimes totalitários, a conceção do bem
Supondo que o Estado tem intenção neutra de promovida pelo Estado não é liberal (nazismo –
promover uma comunicação mais eficaz e, para promoção do arianismo em detrimento de outros).
isso, adota uma única língua oficial. Este objetivo De acordo com a neutralidade, é moralmente
pode ser considerado neutro, se não há intenção de errado usar o poder do Estado com o objetivo de
promover uma conceção de bem em detrimento de
outras. No entanto, esta política não será neutra
promover uma conceção controversa do bem  Alguns defensores da neutralidade não se
humano. opõem à promoção de conceções do bem,
se esta promoção for limitada aos direitos
Por outro lado, o perfecionismo político pode ser
e liberdades que não pertencem à
coercivo ou então não coercivo (apenas
“estrutura de base ” da sociedade.
iniciativo). Ambos podem ser aplicados a questões
 Devido, por exemplo, à votação, o Estado
essenciais ou não essenciais, ou seja, a direitos
pode promover uma conceção controversa
fundamentais ou direitos secundários.
do bem em assuntos políticos não
essenciais, fora da esfera da estrutura de
base da sociedade
Neutralidade e perfeição: dois ideais opostos ou
convergentes?
- Existe um acordo sobre uma conceção - A neutralidade é compatível com um
perfecionista do bem como base para a ação perfecionismo não coercivo
política legítima
 Uma quarta forma de propor uma
 Alguns defensores da neutralidade não se convergência entre a neutralidade e o
opõem à promoção de conceções perfecionismo consiste em promover
perfecionistas da vida boa pelo Estado, conceções do bem de uma forma não
desde que esta promoção não seja coerciva.
controversa  É defendida por autores liberais
 Devido ao pluralismo, é irrealista esperar perfecionistas
um acordo sobre o bem como base da ação  Algumas decisões governamentais podem
política legítima não ser coercivas, mas são perfecionistas
 Esta improbabilidade empírica torna trivial incentivando alguns tipos de
a convergência entre a neutralidade e o comportamento, como dar honras a
perfecionismo. pessoas exemplares, e desencorajando
outros comportamentos com campanhas de
incentivo a um estilo de vida saudável
- Neutralidade das intenções sem neutralidade das
Conclusão sobre a convergência entre
justificações
neutralidade e perfecionismo
 Podemos distinguir duas variantes:
A única forma aceitável de perfecionismo
o Neutralidade das intenções
coercivo, compatível com a neutralidade, é um
(legislativa) perfecionismo coercivo limitado a questões
o Neutralidade das justificações políticas não essenciais, ou seja, fora da estrutura
 De acordo com o princípio da neutralidade de base da sociedade de Rawls.
das intenções, o governo não deve
restringir a liberdade dos indivíduos com a Um perfecionismo coercivo que implicasse a
intenção de desencorajar estilos de vida violação dos direitos políticos básicos, não seria
considerados inúteis ou degradantes. perfecionismo liberal, mas antes um
 De acordo com a neutralidade das perfecionismo antiliberal.
justificações, o governo deve agir de No entanto, é preferível que o perfecionismo seja
acordo com um sistema de princípios que não coercivo
pode ser justificado sem referência a
qualquer conceção controversa da vida
boa.

- A neutralidade é limitada à estrutura de base da


sociedade

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