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A EDUCAÇÃO E LUTA CONTRA AS EXCLUSÕES: A EDUCAÇÃO DA RAPARIGA

COMO INSTRUMENTO DE EMANCIPAÇÃO E LUTA CONTRA AS EXCLUSÕES

Em todo mundo a educação é considerada um factor-chave no processo de socialização de


indivíduos, pois, sem está ferramenta dificilmente o ser humano consegue conviver com os
outros, por isso, este instrumento tem vindo a ser colocado como sendo uma das prioridades
quando se fala de desenvolvimento de um país.

A educação é um aliado muito forte na redução do índice de pobreza, pois este pode influenciar
positivamente a produtividade de um país, determinando assim padrões de vida e fazer com que
diferentes países possam competir economicamente.

Nos países em que a educação ocupa o topo em termos de investimentos feitos pelo Governo, os
resultados não tardam chegar porque a qualidade do ensino faz com que homens e mulheres se
terem cada vez mais produtivos e fortemente engajados na luta para o desenvolvimento do seu
país. E, neste contexto, vários países têm vindo a discutir formas cada vez mais eficazes para que
a educação chegue a todos os cidadãos e com qualidade. Moçambique é um dos países que tem
vindo a elevar as discussões em torno da educação de qualidade aos cidadãos e uma educação
inclusiva.

Neste âmbito, o nosso país dispõe de vários instrumentos que promovem a educação, dentre eles
se destaca a Constituição da República de Moçambique que define a educação como um direito
de todo cidadão (Artigo 88.º) e como um caminho para a unidade nacional, a erradicação da
desigualdade social. (MAVULULA, 2011).

O Sistema de Educação em Moçambique

O sistema educacional moçambicano está directa ou indirectamente ligada a educação na época


colonial, isto é, na nossa história educacional mostra-nos que o regime colonial fez ou faz grande
influência na educação moçambicana, visto que, os debates que hoje se apresentam mexem com
a questão da língua do ensino e também com a questão da inclusão da rapariga não só no sistema
nacional do ensino, mas também na vida profissional.

Como já dizíamos, a educação moçambicana sempre foi marcada pela exclusão, racial e género,
por isso, é importante que conheçamos um pouco a história da educação do nosso país.
A presença portuguesa no território foi muito débil até ao século XIX, não se verificando
qualquer preocupação do estado português com a implementação de um sistema de ensino.

A colonização efectiva de Moçambique é marcada por uma política profundamente


economicista, de realização de capital, baseada na exploração da mão-de-obra “indígena”.

MAZULA (1995:46) citado por SILVA (2007:54),

Em 1926 o “Estatuto Orgânico das Missões Católicas” extingue as


“missões laicas” e “missões civilizadoras” e revigora a intervenção das
missões católicas.Alguns anos mais tarde, em 1930, o governo colonial
implementa uma profunda modificação do sistema educacional, com vista
à obtenção de um controlo mais directo sobre a educação da população
negra, com o objectivo de “...criar um sistema capaz de habilitar o
‘indígena’ para o seu papel específico de trabalhador barato na economia
colonial moçambicana”.

A partir desta data dá-se a separação entre o ensino dos brancos e o ensino dos negros e a
legislação impede o ensino das línguas nacionais moçambicanas, excepto como recurso para o
ensino da religião. O ensino passa a ser obrigatório e há um aumento no número de missões e
igrejas católicas, por oposição à diminuição e mesmo discriminação da presença de outras
religiões.

O ensino passa, nessa altura, a ser dividido entre Ensino Primário Elementar (para os brancos e
assimilados) e Ensino Primário Rudimentar. Este facto aponta para exclusão no processo de
ensino, tal exclusão estava directamente ligado ao racismo pesembora se ache aqui maiôs de
ligar ao facto da política colonial.

Nesta época, a educação passou a desempenhar um papel muito importante na formação do


indígena e a criação da figura jurídico-política do ‘assimilado’, neste caso, a educação tinha
poder de transformar um simples indígena a pertencer um novo grupo social mais aceitado pelos
colonos, os assimilados. O saber ler, escrever e falar o Português eram produtos duma instrução e
posteriormente um caminho para a auto-emancipação destes indivíduos.
A partir da data da independência, em 1975, a FRELIMO estende a todo o país a política
educativa, até então desenvolvida nas zonas libertados. As mulheres adquirem então o direito de
voto, e alcançam níveis de cidadania participativa, inclusivamente na luta armada, até então
desconhecidos. A política instalada naquela época era, por meio da educação, formar um homem
novo, um homem com princípios virados a unidade nacional e conquista dos direitos dos
moçambicanos, independentemente das condições sociais de cada indivíduo.

Mais tarde, o novo governo (da FRELIMO) criou, assim, um sistema de ensino igualitário e
extensivo a toda a população (deixando de haver escolas para negros e brancos, para rapazes e
raparigas) e fez um grande esforço na construção de estruturas que permitiram o acesso da maior
parte da população à educação. No entanto, apesar da explosão de matrículas verificada nos
primeiros anos da independência, a percentagem de alunos a frequentar o ensino primário vai
diminuindo gradualmente e o abandono da escola e o insucesso escolar vão atingindo valores
cada vez mais elevados.

Um dos aspectos importantes a mencionar é que, além da educação colonial ser racista sempre
privilegiou os interesses do país colonizador e promoveu-se um sistema de ensino desigual e
excludente para os negros. Nesta fase, as questões de género associadas à educação implicavam
também mais factores de exclusão para as mulheres indígenas, que por pertencerem ao género
feminino viam os seus direitos de cidadania restritos e o seu direito à educação limitado e
desvalorizado, o que reflectia o retrocesso a que o estado ditatorial português votou o
desenvolvimento da igualdade de género e das liberdades em geral, sobretudo em Portugal, mas
também nas colónias de então.

O que é educação inclusiva?

De acordo com o artigo publicado no site https://diversa.org.br/educacao-inclusiva/o-que-e-


educacao-inclusiva/#os-principios-da-educacao-inclusiva, acessado no dia 10 de Junho de 2020,
"entende-se por educação inclusiva a concepção de ensino que tem como objectivo garantir o
direito de todos à educação, pressupondo a igualdade de oportunidades e a valorização das
diferenças humanas, contemplando, assim, as diversidades étnicas, sociais, culturais, intelectuais,
físicas, sensoriais e de género dos seres humanos.
A educação inclusiva implica:

 A transformação da cultura, das práticas e das políticas vigentes na escola e nos sistemas
de ensino, de modo a garantir o acesso, a participação e a aprendizagem de todos, sem
excepção.
 Ser guiado com princípios de que, toda pessoa aprende e toda pessoa tem o direito de
acesso à educação.

Neste caso, a educação pode ser vista como uma ferramenta poderosa no combate a exclusão e
também ela pode expressar grande contributo na organização social e no poder económico do
país. Isto é, de acordo com esta visão, investir na educação não só oferece aos cidadãos o
conhecimento (científico), mas também ajuda ao cidadão a munir-se de ferramentas que lhe vão
abrir seus horizontes a fim de que este tenha um pensamento crítico na sua forma de interpretar a
sua sociedade e os mundos que este indivíduo se sente inserido.

A educação é uma força capaz de dar ao indivíduo directrizes que lhe façam sentir responsável,
não só pela sua família originária, mas também pela sociedade em que ele vive. Portanto, é
importante perceber que, é a educação que faz com que os indivíduos tenham capacidades de
resolução dos problemas que a sociedade enfrenta no seu quotidiano.

Educação da rapariga como ferramenta de combate a exclusão

Como já nos referimos, a educação é o elemento que faz com que as sociedades sejam diferentes.
Por exemplo, a forma como os Governos dirigem seus países e a forma como estes gerem os
recursos existentes em seus países depende, em grande parte, do grau de instrução que estes
receberam quer seja pelos conhecimentos culturais, como também do conhecimento que estes
carregam sobre a governação. Tudo vai depende do grau de instrução, ou seja, da educação que
estes adquiriram durante a vida.

A educação pode tornar as sociedades num órgão que respeita os valores humanos e outras num
pacote fortemente preconceituosa. Sendo assim, nós encontramos nalgumas sociedades a
equidade e noutras uma total divisão de papéis sociais, isto é, uma sociedade em que uns tem
direitos e outros vivendo só para cumprir deveres. Neste caso, o elemento capaz de mudar uma
sociedade é a educação.

De acordo com o PROGRAMA DO GOVERNO PARA 1995/1999 (Extracto relativo ao sector


da Educação),

"a educação constitui um direito fundamental de cada cidadão e é o


instrumento central para a melhoria das condições de vida e a
elevação do nível técnico e científico dos trabalhadores. Ela é o meio
básico para a compreensão e intervenção nas tarefas do
desenvolvimento social, na luta pela paz e reconciliação nacional.

Por mais que a visão exista, os Governos devem fazer esforço para que os objectivos das
políticas de educação seja efectivadas e colocadas no auge das necessidades do povo e em
particular do Governo porque o mundo está cada vez mais dependente dos meios tecnológicos. A
ser assim, é importante que os Governos compreendam a necessidade de preparar seus
concidadãos para o manuseamento destes meios.

Segundo SILVA (2007:60),

Um dos principais problemas que caracterizam a desigualdade entre


homens e mulheres prende-se com o acesso à educação. Não apenas
o acesso à escola, mas o acesso efectivo à escolarização completa.
Nos meios rurais, a educação formal é muitas vezes alheia ao
processo de construção da identidade dos indivíduos e considerada
desnecessária para o desempenho do seu papel social, sobretudo no
caso dos indivíduos do sexo feminino. O papel social da escola é
diferente para diferentes grupos da população, sobretudo se
atendermos à distinção entre o meio rural e urbano, o que obriga a
uma “negociação cultural” para o promover.

Antigamente, a cultura tradicional assentava em estereótipos igualmente fortes e de dominação


masculina (a educação tradicional também separava rapazes e raparigas, e o principal papel
social da mulher era o de mãe e o casamento é uma instituição social incontornável), mas a
introdução de modelo da educação colonial veio inferiorizar as populações locais, a cultura e
organização social, criando um fosso civilizacional que, ao encarar a cultura local como inferior,
acentuava ainda mais as desigualdades de género. Ou seja, as mulheres eram inferiores por serem
“indígenas”, tal como os homens, face à população branca, mas elas eram duplamente inferiores
por serem mulheres, mesmo face às mulheres brancas, que por serem brancas correspondiam aos
modelos de mulher promovidos e socialmente aceites, pelo estado e pela Igreja.

Graças a independência nacional e as novas políticas educacionais, o país começou a desenhar


novos caminhos para a formação do homem novo e gradualmente a mulher começou a ganhar
espaço na sociedade provocando a sua emancipação.

A educação fez com que as mulheres deixassem de ser oprimidas e aos poucos foram ganhando
seu espaço no mundo da política, na economia e principalmente na governação deste país.

As Acções do Governo Moçambicano para a Promoção do Acesso da Rapariga à Educação

Para garantir a emancipação da mulher e promover a igualdade e equidade de oportunidades no


acesso da rapariga à educação, foram tomadas as seguintes medidas:

 Criação de um ambiente escolar sensível ao género, através da identificação e definição


das modalidades de organização do processo educativo e de mudanças nos programas de
formação de professores.
 Desenvolvimento da Carta Escolar Distrital para a estimação das necessidades da
educação a nível local e determinação óptima da localização dos estabelecimentos de
ensino.
 Sensibilização da sociedade para a redução da carga de trabalho doméstico das raparigas,
providenciando o acesso à água e a diminuição dos gastos em combustível lenhoso
através da utilização de fogões melhorados.
 Promoção de sistemas alternativos de atendimento à educação da rapariga, como seja a
organização de programas de educação não formal (ENF).
 Estabelecimento de acordos com ONGs, confissões religiosas e outros parceiros, para
envolvimento destas na execução do programa de educação da rapariga.
 Aumento do número de professoras, recrutando-as nas respectivas comunidades; e
melhorando as condições de vida e de estudo nos centros de formação.
 Concessão de apoio financeiro para a compra do material escolar.

Bibliografia

MAVULULA, Elisa Langa; Educação da rapariga: desafio do estado moçambicano, Maputo:


Universidade Pedagógica, 2011.

OLIVEIRA, Avelino da Rosa. Educação e Exclusão: Uma Abordagem Ancorada no


Pensamento de Karl Marx; Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2002.

STUBBS, Sue. Educação Inclusiva: Onde Existem Poucos Recursos; Noruega: Ingrid Lewis,
2008.

CHAMBAL, Luís Alfredo. As políticas de inclusão escolar em Moçambique e a


escolarização de alunos com deficiências: uma trajetória de pesquisa; Curitiba: Universidade
Católica do Paraná, 2011.

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Política Nacional de Educação e Estratégias de


Implantação. Maputo: Minerva Central, s/d.

SILVA, Gabriela. Educação e Gênero em Moçambique. Porto: lectrónicas CEAUP, 2007.

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