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SNE MOÇAMBICANO E FASES DA EDUCAÇÃO EM MOÇAMBIQUE

1. EDUCAÇÃO TRADICINAL (antes da penetração colonial)

A educação como fenómeno social existe desde o surgimento da humanidade. Ela existe
mesmo onde não há escolas, embora aconteça por processos diferentes daqueles utilizados
pelo sistema escolar.

Salienta R. HUBERT citado por Roger (1974: 21) que “ cada sociedade por mais simples ou
complexa que seja tem a sua maneira de treinar, instruir e educar a sua juventude para a vida e
trabalho”. Depreende-se daí que enquanto ela visar no ajustamento da criança ao seu meio,
portanto a formação da personalidade humana, toda educação é valida na medida em que
corresponder com as expectativas da sociedade.

Os diferentes grupos moçambicanos sempre tiveram seus sistemas típicos de transmissão de


valores, vinculados geralmente pelo sistema de ritos de iniciação. “A educação tradicional
corresponde sempre aos valores dos grupos e as condições sócio-culturais, as quais os grupos
deveriam dar resposta. Para além dos valores das suas garantias meta-sociais, ensinava-se aos
jovens a cultura material sobre a qual deveriam agir, os relacionamentos hierárquicos no
interior dos grupos, ética social, mas também actividades integradoras com a doença e a
música, etc”. Ngoenha (2000: 44).

Contudo, embora cada grupo étnico ou tribo tenha a sua cultura específica, os objectivos da
educação tradicional em moçambique foram desde, e, segundo Tumbo Ernesto (s/d: 12),
comuns: formar o homem com o espírito de honestidade, hospitalidade, respeito e
integridade de modo a aderir e valorizar a sua cultura.

Avançando com Tumbo e Ernesto dizem ainda que o conteúdo dessa educação é constituído
por três aspectos nomeadamente: físico, moral e intelectual e tem como características:
caracter social, colectiva, informal e carácter funcional.

Actualmente, a educação tradicional não existe no seu estado puro, mas continua presente a
nível da ideologia e comportamento social através de: interesse pela colectividade,
solidariedade, hierarquia das idades, espírito de ajuda mútua, trabalho colectivo, relação muito
íntima da educação com a realidade, exercício de funções segundo sexo, veneração aos
antepassados, etc.

2. EDUCAÇÃO COLONIAL (durante a colonização)

O carácter político é, como se sabe uma das principais características da educação, pois que
ela traça os programas, conteúdos e objectivos de acordo com as necessidades políticas da
classe no poder.
Nisto, educação colonial teve com base a política de assimilação e o seu objectivo
principal consistia em integrar os nativos a cultura portuguesa. Uma vez alcançado este
objectivo principal foi fácil a prossecução de outros objectivos gerais, tais como:
-Facilitar de forma pacífica a penetração e domínio do sistema colonial;
-Facilitar a exploração económica pela burguesia portuguesa;
-Desvalorizar a cultura dos nativos e retardar o seu desenvolvimento.
E são apontados como objectivos específicos:
-Formar exploradores;
-Assegurar a opressão do povo;
-Fornecer o alienamento da sua própria pátria;
-Fornecer o alienamento da sua origem social;
-Favorecer o desprezo pela sua própria cultura;
-E, identificar-se com a cultura do Portugal.

De acordo com estes objectivos, a educação colonial manifestou-se pelas seguintes


características principais:
-Carácter discriminatório (estabelecimento de dois sistemas de ensino, um destinado a maioria
da população moçambicana e outro reservado a população branca e assimilados);
-Carácter de unidade entre a religião e o ensino;
-Carácter fictício da escolarização obrigatória;
-Carácter paternalista do ensino;
-Carácter urbano da rede escolar;
Os programas reproduzidos segundo o modelo da educação portuguesa.
2. 1 EDUCAÇÃO DURANTE A LUTA ARMADA (nas zonas libertadas)

Durante a luta armada de libertação nacional que teve o seu início em 25 de Setembro de 1964
e terminou com a proclamação da Independência Nacional em 1975; foi preocupação da
FRELIMO promover a educação escolar a população das partes dos territórios que iam sendo
libertadas da influência colonial.

IVALA et all (2000: 108) “a educação era concebida como um meio de realizar a libertação
do povo moçambicano da pesada herança colonial que era o analfabetismo considerado como
um dos males de que resultavam o obscurantismo, a ignorância e a superstição”.

Foi-se assim, afigurando nas zonas libertadas a escola como:


Centro de formação de frente de libertação de Moçambique;
Centro de combate as concepções e hábitos da cultura tradicional;
Centro de definição de conhecimento científico;
Centro de formação de combatentes para as exigências da luta;
Centro de formação d produtores, ao mesmo tempo militares e dirigentes.

De acordo com Eduardo Mondlane citado por Mazula (1991: 108) “educação era uma
condição política e ideológica básica para o sucesso da luta”. Realmente a educação fazia-se
fundamentalmente sob o princípio de negação e ruptura com o colonialismo e com os
aspectos negativos da tradição.
Assim, à medida que a guerra ia se estendendo por novas áreas territoriais, a Frelimo foi
criando bases de um novo objectivo de educação de acordo com os interesses da nova
sociedades que se tinha em vista.

Estrutura do ensino nas zonas libertadas.

Nas zonas libertadas, o ensino compendia a seguintes estrutura:


Educação formal, Alfabetização e escolarização de Adultos e a formação de professores.
Educação formal: destinada a crianças e adolescentes que viviam nas zonas libertadas e
abrangia 4 níveis: PRIMÁRIO, SECUNDÁRIO E UNIVERSITÁRIO, este ultimo que não
chegou de ser concretizado.

Alfabetização e escolarização de Adultos: era dada aos guerrilheiros que por sua vez
ensinavam as populações.

Formação de professores: este era formado os princípios de educação e programas de


ensino. De salientar que, por outro lado, os professores eram recrutados sob o principio de que
“ aquele que tinha estudado devia ensinar o que sabia aqueles que não sabiam ou sabiam
pouco”.

A escola desenvolvia um meio integrado nos seus programas, com vista a criar nos alunos
amor e apreço pela classe trabalhadora, tornar a escola auto suficiente e combater nos alunos
o espírito parasitário e atitude elitista. Dado o contexto de guerra, estendia-se a participação
do aluno na própria luta armada. Portanto, o aluno devia desenvolver um espírito guerrilheiro,
devendo participar em varias tarefas ao lado do guerrilheiro, ver o como um amigo velho.

Em síntese há que observar que a experiência da educação foi caracterizada pela relação
dialéctica entre a educação tradicional e do sistema de educação colonial e de síntese de
transformações operadas no novo modo de pensar, de sentir, de agir. Foi esta capacidade
realizada no mesmo espaço de dialecticidade cultural das zonas libertadas, que permitiu a
FRELIMO avançar na luta e lançar base para um sistema de educação a nível nacional.

3. EDUCAÇÃO APÓS O REGIME COLONIAL PORTUGUÊS (depois de proclamada


a indepência nacional)

Em 1975 a Frelimo Proclama a independência Nacional como o corolário da conquista do


poder pela via armada. Pela frente, a Frelimo tinha gigantesca tarefa de construir um pais com
elevado índice de analfabetismo, uma rede escolar insuficiente e sem professores com uma
formação adequada, como consequência do sistema de ensino Colonial que era
discriminatório, pois havia o ensino oficial e qualificado para os colonos brancos mais tarde
extensivo aos “assimilados” negros e ensino rudimentar para os indígenas, ministrado pela
Igreja Católica ao abrigo da Concordata de 1940 celebrada entre a Igreja Católica e Governo
Colonial Português e o estatuto Missionário de 1941.

Em consequência da debandada dos colonos o nosso país herdou uma desastrosa herança em
termos de quadros Nacionais e infra-estruturas sociais, sobretudo na área de Educação.

É neste " Mare Magnum" de dificuldades que a Frelimo devia traçar Definir estratégias para o
desenvolvimento do país que acabava de nascer e sob o peso da sua responsabilidade. É neste
contexto que a 24 de Julho de 1975, foram nacionalizados a terra e os recursos naturais do
país, os serviços de Saúde e da Educação. Estas nacionalizações visavam fundamentalmente,
eliminar a possibilidade de emergência de burguesia enquanto classe e introduzir novas
relações de produção, (BUENDIA, 1999: 234).

3. 1 GÉNESE DO SISTEMA NACIONAL DO ENSINO

Em 1977 Frelimo realiza o terceiro congresso onde traçaria as linhas mestres do


desenvolvimento do país com a elaboração do Plano Prospectivo Indicativo (PPI) que
preconizava a erradicação do sub desenvolvimento em dez anos (1980 - 1990) tendo como
sustentáculos mega projectos, tais como o complexo Agro industrial do Limpopo, o Projecto
dos 400 mil hectares do Unango, a textil de Mocuba (Pideco), Carbonífera de Moatize, etc.
Estes projectos funcionariam como varinhas mágicas para impulsionar o almejado
desenvolvimento acelerado de Moçambique em todas esferas da vida Social. Esta visão
quimérica do desenvolvimento do país é de inspiração Socialista imposta pelos "nossos
aliados naturais" no âmbito dos compromissos da Luta Armada de Libertação Nacional e no
contexto Global da Luta anti- imperialista.

Como diria Mazula, "O PPI reproduzia, na prática o modelo do desenvolvimento dos países
socialistas. A Frelimo pretendia dar "Grande salto" para o Socialismo. Criava-se a ilusão
como possibilidade racional de desenvolvimento ser vencido numa década o sucesso da
educação resultando rápido desenvolvimento económico.

Essa ilusão enquadrava-se, também, no espírito triunfalista que ainda predominava na


Frelimo, (MAZULA, Brazão, 1995: 170). Um dos resultados importantes e o marco de
referência na história de Moçambique da materialização das directivas do III Congresso foi a
elaboração, discussão e aprovação do SNE como concretização das directivas em matéria de
educação aplicada a fase actual e orientada para o nosso desenvolvimento. "A implementação
do SNE é parte integrante da estratégia da construção do socialismo, (SNE: 6).

Neste contexto, e ao abrigo da lei 4/83 de 23 de Março é criado o SNE que viria a ser
revogado, desta feita, pela lei 6/92 de 6 de Maio, que reajusta o quadro geral do SNE e adequa
as disposições nele contidas, tendo superado diferenças substanciais e profundas no referido
documento em termos da sua fundamentação, conforme o quadro que a seguir se apresenta:

3. 1. 1 Princípios gerais do SNE

Lei 4/83 de 23 de Março Lei 6/92 de 6 de Maio


Boletim da República no 12, I série Boletim da República no 19, I série
1. A Educação é um direito e um dever de 1 A Educação é direito e dever de todos
todo cidadão que se traduz na cidadãos ;
igualidade de oportunidade de acesso a
todos níveis de ensino e na educaçao 2 O Estado no quadro da Lei permite a
permanete e sistemática de todo povo. participação de outras entidades
incluindo comunitárias,
2. A Educação reforça o papel dirigente cooperativas,empresariais e privadas no
da classe operária e aliança operário processo educativo;
-Camponesa, garante a apropriação da
Ciência, da técnica e da Cultura pelas 3 O Estado organiza e promove o ensino,
classes trabalhadoras e constitui um como parte integrante da acção
factor impulsionador do educativa nos termos da Constituição
desenvolvimento económico, Social e da República;
Cultural do país.
4 O ensino Público é Laico.
3. A educação e um instrumento principal
da criação do Homem Novo, homem
liberto de toda carga ideológica da
formação colonial e dos valores
negativos da formação tradicional,
capaz de assimilar e utilizar a Ciência e
a Técnica ao Serviço da Revolução;

4. A Educação na República Popular De


Moçambique basea-se nas experiências
nacionais, nos princípios universais do
Marxismo- Leninísmo, e património
Ciêntifico Técnico e Cultural da
humanidade;

5. A Educação é dirigida, planificada e


controlada pelo Estado, que garante a
sua universalidade e laicidade no
quadro da realização dos objectivos
fundamentais consagrados na
constituição.

3. 1. 2 Objectivos Gerais do SNE:

Lei 4/83 de 23 de Março Lei 6/92 de 6 de Maio


Boletim da República no 12, I série Boletim da República no 19, I série
1. Formar cidadãos com uma sólida 1. Erradicar o analfabetismo de modo a
preparação Politica, Ideológica, proporcionar a todo cidadão o acesso ao
Ciêntífica,Técnica,Cultural e Física e conhecimento científico e o
uma elevada Educação patriótica e desenvolvimento pleno das suas
cívica capacidades;

2. Erradicar o analfabetismo de modo a 2. Garantir o ensino básico a todo cidadão


proporcionar a todo povo o acesso ao de acordo com o desenvolvimento do
conhecimento Científico e o país através da introdução progressiva
desenvolvimento pleno das suas da escolaridade obrigatória;
capacidades;
3. Assegurar a todos os moçambicanos o
3. Introduzir a escolaridade obrigatória e acesso a formação profissional;
universal de acordo com o
desenvolvimento do país, como meio 4. Formar cidadãos com uma sólida base
de garantir a educação Básica a todos científica, Técnica, Cultural e física de
moçambicanos; uma elevada educação moral cívica e
patriótica;
4. Assegurar a todos Moçambicanos o
acesso a formação profissional; 5. Formar o professor como educador e
profissional consciente com profunda
5. Formar o professor como Educador e preparação científica e pedagógica,
profissional consciente com profunda capaz de educar a criança, o Jovem e o
preparação Política e ideológica, adulto;
Científica e Pedagógica capaz de
educar os Jovens e adultos nos valores 6. Formar Cientistas e especialistas
da Sociedade Socialista; devidamente qualificados que
permitam o desenvolvimento da
6. Formar Cientistas e especialistas produção e da investgação Cientifica ;
altamente qualificados que permitam o
desenvolvimento da investigação 7. Desenvolver a sensibilidade estética e a
Cientifica; capacidade artistica das crianças,
Jovens e adultos, educando -os no amor
7. Difundir através do ensino a utilização pelas artes e no gosto pelo belo;
da lingua portuguesa para a
consolidação da unidade Nacional; 8. Educar a criança o jovem e o adulto
para o espirito da unidade nacional, paz
8. Desenvolver a sensibilidade estética e tolerância e democracia, solidariedade e
capacidades artísticas das crianças, respeito pelos direitos humanos, em
Jovens e adultos educando no amor particular os direitos da mulher e da
pelas artes e no gosto pelo belo; criança;

9. Fazer das instituições do ensino bases 9. Educar a criança o jovem e o adulto na


revolucionárias para a consolidação do prevenção e no Combate contra as
poder popular, profundamente inseridas doenças, particularmente o Sida e
na comunidade. outras de transmissão sexual;

10. Educar a criança e o jovem para o


respeito e preservação do ambiente e do
ecossistema;

11. Educar o cidadão a ter amor orgulho e


respeito pela tradição e culturas
moçambicanas;

12. Educar a criança o jovem e o adulto no


espírito da lealdade, obediência,
respeito e disciplina;

13. Proporcionar o desenvolvimento


integral e harmonioso da personalidade;

14. Desenvolver na criança, Jovem e adulto


habilidades e conhecimentos de
carácter vocacional que lhe permitam
uma integração plena na sua
comunidade;

15. Assegurar o conhecimento e o respeito


pela Constituição da República de
Moçambique;

16. Educar a criança o Jovem e o adulto no


espírito de Cooperação internacional,
de integração Regional, continental e
Mundial;

17. Proporcionar uma formação básica nas


áreas de comunicação, Ciências, Meio
Ambiente e Cultural.

Com efeito comparando os dois suplementos verifica-se claramente uma ruptura total e
completa, e nítida diferença em termos de fundamentação quer nos princípios quer nos
objectivos e a própria estrutura. Se constata com muita evidência que os princípios e os
objectivos consignados à luz da lei 4/83 são nitidamente Socialistas impregnados de
princípios Marxistas- Leninistas e a educação era da alçada exclusiva do estado. Na lei 6/92,
aqueles princípios foram na sua totalidade abandonados, estabelencendo-se princípios numa
perspectiva democrática pluralista e o estado se eximiu da tutela exclusiva da Educação. "
Pode - se constatar uma mudança radical do discurso da Frelimo. Este discurso não pode ser
entendido apenas como corolário das rápidas mudanças que ocorrem no país. É também o
reconhecimento explicito dos seus ideólogos, da impraticabilidade do projecto do
desenvolvimento do país, se tivermos em conta a desastrosa herança em quadros qualificados
que o colonialismo deixou e principalmente à falta de uma politica coerente de formação de
professores ", (BONNET, obra citada: 263).

O SNE, que tinha como prerrogativa servir de base para os "condenados da terra" tomarem o
poder, fracassou porque a partida e sob a imposição da ideologia Marxista - Leninista, visava
a formação do Homem Novo, a velha meneira socialista, livre do obscurantismo e com visão
científica do mundo, na óptica do materialismo dialéctico. Como consequência imediata, os
nobres valores tradicionais seculares (ritos de iniciação, Lobolo, Religiões e outros saberes
locais) pura e simplesmente foram sonecados e combatidos sob o estandarte de combate ao
obscurantismo. Foi um erro crasso que motilou as nobres e bem intencionais iniciativas do
SNE. " O SNE teve à nascensa intenções nobres que, se tivessem sido pensadas de acordo
com as práticas "educativas" de que a pedagogia tradicional é rica, teria capitalizado
experiências que fariam do projecto um sucesso com repercursões históricas para o país se
tivermos em conta os apelos da UNESCO, na área da Educação, sobretudo, acerca da
necessidade de substituição gradual dos curricula herdados da época colonial , tendo em vista
os interesses nacionais", (Ibidem, Obra citada: 264).

" O subsistema de formação de professores devia ter sido, efectivamente a espinha dorsal do
SNE. O sistema de educação, de forma como tinha sido concebido, só podia ter funcionado
com uma formação de professores em massa, sem descurar o aspecto qualitativo, para garantir
o seu sucesso. Houve um processo inverso: Massificar o ingresso para depois formar
professores sem uma adequação, articulação entre os conteúdos métodos e meios dos Centros
de Formação de professores com os escolares e com o quotidiano do povo, com o contexto
concreto dos educandos, tornou inviável o SNE."( Ibidem, Obra citada: 264).

É importante também ter em consideração de que a guerra movida pela RENAMO deu o
golpe de misericórdia ao fracasso do SNE. "Outro elemento que condicionou os resultados
que se esperavam no SNE, foi a guerra movida pela RENAMO, que destruiu ou paralisou
mais de 50% da rede escolar primária, agravando ainda mais a situação da rede urbana que ja
se ressentia da superlotação,"(Ibidem ,op.cit: 258)

3. 2 REFORMA CURRICULAR

3. 2. 1 Conceitos
A reforma curricular, como reconheceu Roberto (1987), é o vector principal de qualquer
reforma educativa, pois, o currículo é o elemento fulcral de um sistema educativo.
E como uma mudança contém muitas dimensões conflituosas e estratégicas não se poderá
desejar que as reformas educativas se esgotem por completo na reforma curricular; Manuel
Patrício (1991: 10) apud (PACHECO 2001: 157), “que aquilo em que veio a tornar-se psicose
curricular da reforma educativa do ministério Roberto Carneiro, apresentava apenas, no plano
global de actividades do CRSE, uma das 52 actividades previstas para o desenvolvimento.
Mesmo assim, a reforma curricular foi um dos pontos mais visíveis de todo o processo global
de reforma, suscitando opiniões muito diversas. De um modo global, a reforma curricular
supõe mudanças em várias dimensões que significam tanto uma mudança como uma
inovação. PACHECO, (1992: 77) apud (PACHECO 2001:157).

a) Estratégias para a Implementação de qualquer Reforma curricular


O sucesso de qualquer plano curricular está indiscutivelmente associado á concepção de
estratégias adequadas para sua implementação. Essas estratégias, por sua vez, pretende-se
com inúmeros factores, tais como os psicopedagógicos, linguísticos, socioeconómicos e
políticos. Assim sendo, para a implementação de qualquer proposta de um currículo, propõe-
se entre outras as estratégias que a seguir descriminam.
 Criação e expansão da rede escolar
 Formação de professores
 Capacitação de professores
 Preparação de formadores ao nível central
 Formação de formadores provinciais
 Formação de formadores distritais ou zonais
 Capacitação de professores em exercício
 Formação de professores para disciplinas novas
 Formação de instrutores e supervisores

3. 2. 2 A reforma curricular em Moçambique


A educação é um processo pelo qual a sociedade prepara os seus membros para garantir a sua
continuidade e o seu desenvolvimento. Trata-se de um processo dinâmico que baseia
continuamente, as melhores estratégias para responder aos novos desafios que a continuidade,
transformação e desenvolvimento da sociedade.
Por ex: pode se constatar que os objectivos dos programas escolares do 1º grau do ensino
básico já não estão a adequar-se à realidade do crescimento do ensino em Moçambique, neste
caso, os planificadores podem rever esses objectivos e introduzir emendas.
A reforma curricular não é mais do que a concretização, dos objectivos definidos numa nova
politica educativa para todo o país, tendo em vista produzir alterações significativas no
sistema educativo. É neste quadro complexo que se irá configurar o currículo, sendo essencial
ter presente questões, tais como:
 A definição mais ou menos explicita dos objectivos que deverão ser
prosseguidos.
 A tradição curricular do respectivo sistema educativo;
 O tipo do currículo (aberto ou fechado);
 O modelo de organização (centrado em disciplinas ou temas)
 A selecção das matérias e respectivos conteúdos
 Forma como os intervenientes no sistema educativo participarão
 As medidas de apoio á mudança curricular. ( www.hottopos.com )

A inovação curricular apesar de tudo acontece segundo González e Escudero (1987) apud in
www.hottopos.com em três grandes enfoques teóricos:
a) Enfoque técnico-científico - as mudanças curriculares são tratados como meras questões
técnicas. Os currículos são altamente estruturados, limitando-se o papel dos professores á
simples execução de instruções superiores.
b) Enfoque cultural – dá-se uma grande importância à complexidade dos processos de
mudança e às suas interacções. A cultura das escolas é particularmente valorizada. O papel do
professor é valorizado, como agente e intérprete das culturas em presença.
c) Enfoque sócio-político – a mudança é perspectivada em termos políticos e ideológicos. O
que é particularmente valorizado são as condições históricas e sociais. Os professores tendem
a ser reduzidos ao papel de simples instrumentos do poder.

A sociedade moçambicana, em particular, tem estado, nos últimos tempos, em mudanças


profundas motivadas por factores políticos-económicos e sócio-culturais.
Neste momento da globalização, as sociedades enfrentam o dilema da construção da aldeia
global e a pertinência da defesa e desenvolvimento das identidades nacionais. Este dilema,
constitui um factor que a educação deve equacionar na perspectiva de garantir que os
cidadãos, ao mesmo tempo que se capacitam para se integrarem na aldeia global, não percam
a sua identidade pessoal, comunitária e nacional.
Deste modo, procura-se em cada etapa, desenvolver estratégias educativas por forma a
responder cabalmente aos desafios que se colocam
O principal desafio que se coloca na reforma curricular, é tornar o ensino mais relevante,
no sentido de formar cidadãos capazes de contribuir para a melhoria da sua vida, a vida da
sua família, da comunidade e do país, dentro do espírito da preservação da unidade
nacional, manutenção da paz e estabilidade nacional, aprofundamento da democracia e
respeito pelos direitos humanos, bem como da preservação da cultura moçambicana.
A visão da relevância da reforma curricular fundamenta-se na percepção de que a educação
deve ter em conta a diversidade dos indivíduos e dos grupos sociais para que se torne num
factor, por excelência de coesão social e não de exclusão. Exemplo. Escola de necessidades
educativas de Anchilo na província de Nampula.
Efectivamente, muitas vezes, acusa-se os sistemas educativos formais de impor aos educandos
os mesmos modelos culturais e intelectuais sem prestar atenção suficiente à diversidade dos
talentos da imaginação, atitudes, predilecções, globais, dimensão espiritual e habilidade
manual. Assim, surge a presente reforma curricular que reformula o plano curricular
introduzido em 1983, pela lei 4/83 de 23 de Março, e revisto em 1992, pela lei 6/92, de
Março.
Para tornar realizável a perspectiva curricular exposta anteriormente, foram tomadas em
consideração as reflexões de diferentes estudos feitos por instituições do ministério de
educação, em particular do Instituto Nacional do Desenvolvimento da Educação INDE, bem
como de outras entidades colectivas e individuais foram também tomadas em conta reflexões
e recomendações dos pais e encarregados de educação em geral, das diferentes sensibilidades
da sociedade moçambicana. Governantes, políticos, religiosos, empresários, sindicalistas,
autoridades e lideres locais, organizações não governamentais de entre outras. Associada a
estas reflexões e recomendações foram equacionadas as experiências curriculares de outros
países sobretudo os da região Austral da África.
A construção de um currículo é um processo dinâmico que se deve ajustar às contínuas
transformações da sociedade.

3. 2. 3 As fases da reforma do SNE moçambicano


A adequar á exigências de desenvolvimento sócio-culturais das comunidades e da sociedade
em geral.
Ajustar as exigências de desenvolvimento técnico-cientificos, operadas na sociedade.
Adequar ás transformações/mudanças sócio-politicas do país.
Tornar relevantes os conteúdos de ensino.
Em Moçambique, desde 1975 as estruturas educacionais moçambicanas já promoveram várias
reformas curriculares nos diferentes níveis e ramos educacionais desde o primário, o técnico,
o secundário geral e universitário. Mazula (1995: 58) observa que,
A primeira reforma tinha como principal razão dar acesso ao ensino a maioria dos
Moçambicanos e na mudança dos conteúdos das disciplinas de carácter social (Português,
história, geografia, etc), disciplinas denominadas de secção de letras.
A segunda reforma, foi a estrutural, que decorreu em 1977. Esta, extingue o ensino
preparatório com as denominações de 1º e 2º ano (s) e 3º,4º,5º,6º e 7º ano (s) liceais e ensino
complementar na área técnica e introduz-se as denominações de 5ª…11ªclasses onde de 5ª a
9ª classes correspondia ao Ensino Secundário Geral e 10ª e 11ª ao pré-universitário, e deixava
de existir o complementar ou seu equivalente.
A terceira reforma é conhecida SNE, lei 4/83 de 23 de Março a qual abrangeu toda estrutura
educacional Moçambicana, desde o primeiro ano de escolaridade até ao nível pré-
universitário.
Em 1992, houve revisão da lei anterior para a lei 6/92 de 06 de Maio para se enquadrar na
nova constituição da República. Nesta fase, houve abertura para criação de Escolas Privadas.
Com SNE, a idade de ingresso no ensino primário, em todas as escolas públicas, passou a ser
6 anos e introduz-se as designações 1ª classe ao invés do pré, e o ensino primário estende-se
até a 6ª classe ao invés da 4ª classe.
Esta reforma teve um grande impacto social-económico e educacional também teve cunho de
reforma estrutural, de conteúdos de ensino económico porque a 9ª classe passou a ser o nível
mais alto de escolaridade geral para a maioria dos jovens antes de serem submetidos a um
ensino profissionalizante.
Além destas grandes reformas curriculares MAZULA( op cit. p 70) acrescenta que,
Existiram outras de menor vulto apesar de serem reformas insignificantes quanto ao historial
de reforma em Moçambique. Por exemplo, na reforma de1983 a disciplina de Física era
introduzida na 6ª classe mas dois anos depois, isto é, em 1985, a disciplina de física era
introduzida na 7ª classe. Pela magnitude da reforma de 1983 pode se afirmar que esta reforma
define a base do sistema educacional Moçambicano.

Do acima exposto, pode se afirmar que as primeiras reformas educacionais em Moçambique,


até 1983, basearam-se na gestão de factores sócio-políticas e de afirmação da cidadania, isto
porque, apesar do abandono massivo de muitos quadros administrativos do país, o poder
político continuou a prometer e a implementar a massificação do ensino com o slogan “fazer
da escola a base para o povo tomar o poder”.

3. 2. 3. 1 Inovações no ensino básico


Constituem inovações as propostas para o plano curricular do ensino básico: os ciclos de
aprendizagem, ensino básico integrado, currículo local, a distribuição de professores, a
promoção semi-automática e a introdução de línguas moçambicanas, Inglês, ofícios e de
educação moral e cívica.
O ensino pré-escolar, não é parte integrante da escolaridade regular de acordo com a lei 6/92
de 6 de Maio. A rede do ensino pré-escolar é constituída por instituições públicas, privadas e
comunitárias, cuja criação cabe à iniciativa dos órgãos governamentais ao nível central,
provincial ou local, e de outras entidades colectivas ou individuais nomeadamente,
associações de pais moradores, empresas sindicatos, organizações cívicas, conferências e de
solidariedade destina-se a crianças menores de 6 anos, a fim de complementar a educação
familiar, com a qual deve estabelecer uma estrita relação. A sua frequência é de carácter
facultativo. PCEB (2008: 25).
3. 2. 3. 2 Reforma do Ensino Técnico Profissional e Vocacional
Reforma de Educação Profissional (PIREP), com objectivo de estabelecer com envolvimento
de todos parceiros sociais, um Sistema de educação Profissional integrado, coerente, flexível e
orientado pela demanda do Mercado de trabalho.
Fase Piloto 2006 – 2010
Expansão 2011 – 2015
Consolidação 2016 – 2020.

Novos modelos de Formação de Professores


Articulação entre a vida da escola e da comunidade – o professor deve conhecer e saber
Introdução de novos modelos de formação inicial de professores para o ensino básico e
Secundário Geral.

Actividades de aprendizagem
1. Fale da génese do SNE.
2. Qual é a contribuição da FRELIMO no SNE moçambicano?
3. O que é reforma curricular?
a) Como se traduz a reforma curricular em Moçambique?
b) Mencione as fases da reforma curricular em Moçambique
4. Faça uma análise da educação em diversas fases em Moçambique
5. Analise encontrando as diferencas e semelhancas no SNE sob perspectiva da lei 4/83 e
6/92, no tocante aos seguintes aspectos: principios gerais, objectivos gerais e a sua estrutura.
6. Atente as razões que justificam a dificuldade da implementar as mudanças curriculares.
7. Fale dos enfoques teóricos e niveis da inovação curricular do SNE Moçambicano.
8. Analise a relevância das principais inovações propostas pelo Plano Curricular do Ensino
Básico à luz das reformas havidas neste subsistema de ensino.
BIBLIOGRAFIA

BONNET, João Alberto de Sá - Ethos Local e Currículo, São Paulo 2002


BUENDIA, Gomez Miguel. Educação moçambicana: História de um Processo, Maputo,
Moçambique, 1999.
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