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Universidade Federal de Santa Catarina

Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção

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Altamir da Silva Souza (doutorando)


Professora Dra. Olga Regina Cardoso (orientadora)

Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-Graduação em


Engenharia de Produção da Universidade Federal de Santa Catarina.

Florianópolis, 2005
Altamir da Silva Souza

SOBRE A CONSTRUÇÃO DA INSATISFAÇÃO: REFLEXÕES


CRÍTICAS SOBRE O DISCURSO DO MARKETING

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-


Graduação em Engenharia de Produção da Universidade
Federal de Santa Catarina como requisito parcial para
obtenção do título de Doutor em Engenharia de Produção.

Orientadora: Profa. Olga Regina Cardoso, Dra.

Florianópolis, 2005
Ficha catalográfica

S729s Souza, Altamir da Silva


Sobre a construção da insatisfação: reflexões críticas sobre o
discurso do marketing / Altamir da Silva Souza – Florianópolis:
UFSC, 2005.
206 p.

Tese (Doutorado em Engenharia da Produção) – Programa de


Pós-Graduação em Engenharia da Produção, Universidade Federal de
Santa Catarina, Florianópolis, 2005.

1. Marketing 2. Produção 3. Cultura de Consumo I. Título

CDU 658.8

Catalogação na fonte: Roseli Senna Prestes Barenho CRB-10/1601


Altamir da Silva Souza

SOBRE A CONSTRUÇÃO DA INSATISFAÇÃO: REFLEXÕES


CRÍTICAS SOBRE O DISCURSO DO MARKETING

Esta Tese foi julgada adequada pelo Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção
da Universidade Federal de Santa Catarina como requisito parcial para obtenção do título de
Doutor em Engenharia de Produção.

Florianópolis, 31 de março de 2005.

Prof. Edson Pacheco Paladini, Dr.


Coordenador do Programa

BANCA EXAMINADORA:

Profa. Olga Regina Cardoso, Dra.


Orientadora

Profa. Edinice Mei Silva, Dra.


Moderadora

Prof. Marcelo Milano Falcão Vieira, Dr.


Membro

Profa. Maria Ceci Misoczky, Dra.


Membro

Profa. Rosimeri da Fátima Carvalho da Silva, Dra.


Membro
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À professora Olga Regina Cardoso que me aceitou como orientando, entendeu a longa

parada e apoiou a mudança, que sempre demonstrou respeito, atenção e disposição.

Às professoras Edinice Mei Silva, Maria Ceci Misoczky, Rosimeri de Fátima

Carvalho da Silva e ao professor Marcelo Milano Falcão Vieira pelas críticas e sugestões

realizadas durante o exame de qualificação que foram, significativamente, importantes para a

consolidação do trabalho.

Ao amigo Cassiano Paes da Silva pelas estimulantes discussões realizadas ao longo da

tese e pelas inúmeras contribuições, em especial, nos últimos momentos da trabalho.

Aos autores e atores que aparecem ao longo do texto por suas ideais, opiniões, relatos

e histórias fundamentais para a construção e ilustração das minhas verdades.

Aos ex-alunos e amigos Alam Casartelli, Carlos Eduardo Dorini, Fausto Knorr,

Fabrício Freitas, José Augusto Fossati, Leonardo Pereira, Paulo Eduardo Freire, Rafael

Zunino, que trabalharam comigo e motivaram a realização do doutorado.

Às funcionárias do Programa de Pós-Graduação em Engenharia da Produção Neiva

Aparecida Gasparetto e Rosimeri Maria de Souza, pela atenção e dedicação demonstradas.

Aos amigos, em especial, Francisco Antonio Branco Junior, José Vanderlei Silva

Borba, Márcio Silva Rodrigues, Patrizia Raggi Abdallah, que inúmeras vezes perguntaram

pelo final do trabalho e se mostraram sempre dispostos a ajudar.

Aos professores Fernando Rafael Cunha, Márcio Leal Bauer, Nelson Monteiro Rangel

que me substituíram em algumas atividades acadêmicas.

À professora Rosa Maria Fernandes de Albernaz pelo trabalho de revisão do texto

final.

Aos meus familiares e demais amigos, não citados nominalmente, que me

acompanharam durante toda a realização deste trabalho.

Obrigado por tudo!


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SOUZA, Altamir Silva. 6REUHDFRQVWUXomRGDLQVDWLVIDomRFUtWLFDVVREUHRGLVFXUVRGR


PDUNHWLQJ2005 206 f. Tese de doutorado (doutorado em engenharia de produção). Programa
de Pós-Graduação em Engenharia de Produção. Universidade Federal de Santa Catarina,
Florianópolis.

O consumo faz parte da vida de todo e qualquer ser humano, movimenta o sistema econômico
e afeta o sistema sociocultural de um país. Vivemos em uma época de intensa produção de
bens e serviços em que os significados atribuídos aos mesmos se multiplicam com tamanha
velocidade e constante reprodução, suplantando inclusive as suas características funcionais.
Para isso, discursos, símbolos e imagens são criados para a produção de sentidos e de
realidades voltadas para estimular o consumo. As áreas de produção e marketing têm
participação direta nesse contexto e, por terem entre si íntima relação, devem dividir
responsabilidades frente às suas realizações. Percebendo que o marketing tem adotado
princípios e práticas indesejáveis para a sociedade brasileira, e entendendo a importância
dessa discussão no âmbito da engenharia de produção, faço neste ensaio teórico uma reflexão
crítica a partir da análise do discurso do marketing. Apresento tal reflexão em quatro seções.
Na primeira, faço um resgate da história do marketing para demonstrar que a área é aberta a
novas e diferentes idéias e (re)interpretações, pois é uma construção dos homens marcada por
disputas, diversidades e crises recorrentes. Na segunda, realizo uma análise das contradições,
incoerências e manipulações nas linguagens do marketing, que são indesejáveis para o
contexto brasileiro e, também, preocupantes para uma área que contribui para a construção da
cultura do consumo, e se diz preocupada com as necessidades dos consumidores. Ao mesmo
tempo, apresento as possíveis implicações e participação da engenharia de produção nesse
contexto. Na terceira seção, argumento que o consumidor contemporâneo se encontra à mercê
das linguagens do marketing e que, assim, o discurso do consumidor exigente é apenas
parcialmente aceitável e dentro das condições de produção de sentidos estabelecidas pelo
marketing e pela cultura de consumo vigente, fato esse que tende a perpetuar os problemas
ora percebidos. Na quarta, defendo que o marketing, no sentido de estimular o consumo, tem
sido uma função responsável pela construção da insatisfação, realizada, em muito, mediante
estratégias de manipulação e persuasão. Considero, também, as implicações para o futuro da
área e da sociedade. Finalmente, argumento sobre a experiência de ter realizado o trabalho e
as possibilidades de desdobramentos e de continuidade das idéias que fazem parte do estudo.

Palavras chave: discurso do marketing, construção da insatisfação, cultura de consumo.


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SOUZA, Altamir Silva. About insatisfactrion’s construction: critical reflections about the
marketing’s speach. 2005. 206 f. Doctoral Thesis (doctorate in operations and management
engineering). Program of the Postgraduate in Operations and Management Engineering.
Federal University of Santa Catarina, Florianópolis, Brazil.

The consumption is a part of life from every human being; it makes the economic
system move, and compromisses the social-cultural system of a country. We live in a intense
period of products and services manufactures and the results that are related with them
multiply themselves so fast and with constant reproduction, even running over the functional
feature. For that, speachs, symbols and images are created for the meaning and reality
production, which are supposed to estimulate the consumption itself. The consumption and
marketing areas have direct participation in this context and, for having avery deep relation on
it, must divide responsabilities facing its acomplishments. Knowing that the marketing has
been adapting principles and practices not very worthy for the brazilian society, and
understanding the production’s engineering’s area, I make from the analysis of the
marketing’s speach. I pusent this reflection in four sections. On the first one, I try to rescue
the history of marketing tooshow that this área is very “open” to new and diferent ideas and
(re)interpretations, because it’s a men’s construction, marked by diversities, disputes and
appellanty crises. On the second one, I make an analysis from the contradictions,
incoherences and manipulations on the marketing’s language, which are not very welcome for
the brazilians context, and also, very worry in an area that helps for the construction of the
consumptions culture, and calls itself worried with the consumer’s needs. At the same time, I
present you the possible implications and the participation from the production’s enginury in
this context. On the third section, I contend that the now-a-days consumer can be found
booned from the marketing’s languages and that, like this, the speach from the consumer that
is very demanding is just partially acceptable and inside the meaning production’s conditions
stablished by the marketing and for its culture as valid consumption, fact that tends to
perpetuate the problems that have been show. On the fourth, I defend that, the marketing, in
the meaning for estimulation of the consumption, has been a function that is responsible for
the insatisfaction’s construction, and realization, facing manipulation and persuasion
strategies. I also consider the implications for the future of the área and the society. Finally, I
argue about: the experience of have been done the paper, and the possibilities of unrollment
and continuity of the ideas that are part of this study.

.H\:RUGV: marketing’s speach, insatisfaction’s construction, consumer culture


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RESUMO.................................................................................................................................... 007
ABSTRACT................................................................................................................................ 008
1 PRÉ-TEXTO/PRETEXTO...................................................................................................... 012
1.1 INÍCIO DO CAMINHO E A MUDANÇA DE CAMINHO.......................................... 012
1.2 O QUE PRETENDO COM O TEXTO........................................................................... 015
1.3 CARACTERÍSTICAS, VALIDADE, ESTRUTURA E OBJETIVO ............................ 018
2 AS IDÉIAS QUE CONSTROEM O TEXTO......................................................................... 022
2.1 MODERNIDADE, PÓS-MODERNIDADE E CAPITALISMO................................... 022
2.2 AS NECESSIDADES INSACIÁVEIS NA SOCIEDADE INSATISFEITA................. 025
2.3 A ESCOLHA DA EPISTEMOLOGIA CRÍTICA E DA ANÁLISE DO DISCURSO.. 030
2.4 O CAMINHO PARA A CONCEPÇÃO DAS IDÉIAS E OS PROCEDIMENTOS E
INSTRUMENTOS UTILIZADOS....................................................................................... 035
2.4.1 Narrativa autobiográfica....................................................................................... 036
2.4.2 Conversas do cotidiano......................................................................................... 037
2.4.3 Observação............................................................................................................ 039
2.4.4 Re-análise de material previamente coletado....................................................... 040
2.5 ARGUMENTOS FINAIS DAS IDÉIAS........................................................................ 045

3 CONSTRUÇÃO DO PENSAMENTO EM MARKETING: DISPUTAS,


DIVERSIDADES E CRISES.................................................................................................... 047
3.1 CULTURA DO CONSUMO E O MARKETING: RETROSPECTIVA ATÉ O
SÉCULO XX......................................................................................................................... 047
3.2 UM RELATO DA EVOLUÇÃO DO MARKETING DURANTE O SÉCULO XX..... 057
3.2.1 As primeiras décadas do marketing: 1900-1950.................................................... 060
3.2.2 O moderno conceito de marketing: 1950-... ......................................................... 067
3.3 MARKETING: ARTE OU CIÊNCIA? .......................................................................... 075
3.4 FRAGILIDADE DA CONCEPÇÃO “ORIENTAÇÃO PARA MARKETING´........... 079
3.5 O CONCEITO DE MARKETING: AMPLIAÇÃO E VALIDADE............................... 081
3.6 SISTEMAS DE MAXIMIZAÇÃO DE MARKETING: DEFESAS E CRÍTICAS........ 090
3.7 O MARKETING É PÓS-MODERNO............................................................................ 094
3.8 ARGUMENTOS FINAIS DA HISTÓRIA DO MARKETING:.................................... 098
4 REFLEXÃO SOBRE O DISCURSO DO MARKETING NA SOCIEDADE PÓS-
MODERNA DA COMUNICAÇÃO.......................................................................................... 100
4.1 O MARKETING DESCOBRE NECESSIDADES E RESPONDE COM OS
PRODUTOS DESEJADOS?................................................................................................. 100
4.1.1 Atender necessidades através da obsolescência planejada?.................................. 102
4.1.2 A redução de embalagens como estratégia de satisfação?..................................... 108
4.1.3 As estratégias de precificação atendem necessidades?.......................................... 111
4.2 A TELEVISÃO COMO PRODUÇÃO DE SENTIDOS................................................. 114
4.2.1 A comunicação explícita e a comunicação implícita............................................. 117
4.2.2 A propaganda na televisão..................................................................................... 129
4.3 A IMAGEM DAS MARCAS E A IDIOTIZAÇÃO DO SER HUMANO..................... 132
4.4 ARGUMENTOS FINAIS DA REFLEXÃO................................................................... 138
5 O CONSUMIDOR VULNERÁVEL NA SOCIEDADE PÓS-MODERNA DE DADOS..... 141
5.1 O CONSUMIDOR CONTEMPORÂNEO...................................................................... 142
5.1.1 A prontidão para viver um presente perpétuo........................................................ 143
5.1.2 O aumento do número de opções de escolha......................................................... 146
5.1.3 As armadilhas da liberdade de escolha.................................................................. 147
5.1.4 As necessidades determinadas pelas pressões sociais........................................... 148
5.1.5 A ênfase se no valor da imagem e do símbolo...................................................... 153
5.1.6 O poder da comunicação como produtora de sentidos.......................................... 155
5.1.7 O desconhecimento das grandes estratégias e interesses das empresas................ 156
5.1.8 A distância do consumidor do processo de produção............................................ 158
5.1.9 O desconhecimento das técnicas e ferramentas de marketing............................... 159
5.1.10 A falta do comportamento de reclamação........................................................... 161
5.2 ARGUMENTOS FINAIS DO CONSUMIDOR VULNERÁVEL................................. 162
6 MARKETING COMO FUNÇÃO DE CONSTRUÇÃO DA INSATISFAÇÃO............... 164
6.1 PROPOSIÇÃO E REJEIÇÃO DE UMA TEORIA: ARGUMENTOS PARA A
TESE DA INSATISFAÇÃO.......................................................................................... 166
6.2 ESTAMOS NO BRASIL!........................................................................................ 170
6.2.1 O local e o global: desafio.............................................................................. 171
6.2.2 O Consumo de turistas e vagabundos e suas conseqüências.......................... 172
6.3 SOBRE A INSATISFAÇÃO: A EXPERIÊNCIA DO DEBATE EM AULA........ 180
6.4 ARGUMENTOS FINAIS DO MARKETING COMO CONSTRUÇÃO DA
INSATISFAÇÃO........................................................................................................... 183
7 PÓS-TEXTO/PRÓXIMOS TEXTOS................................................................................ 185
7.1 A EXPERIÊNCIA DE REALIZAÇÃO E O RESGATE DE IDÉIAS..................... 185
7.2 AS REALIZAÇÕES FUTURAS.............................................................................. 189
7.3 OS ÚLTIMOS PARÁGRAFOS............................................................................... 191
REFERÊNCIAS.................................................................................................................... 193
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O presente trabalho representa a organização, ou mais precisamente a reorganização,

de idéias e a abertura de novas perspectivas e sentidos para meu trabalho como educador e

pesquisador, tendo como motivação minhas reflexões a respeito da cultura do consumo que

estamos vivenciando, e a conseqüente influência do marketing nesse contexto. Faço nesta

seção uma breve exposição sobre os acontecimentos que ocorreram em minha trajetória

profissional e que foram determinantes para que eu decidisse produzir este trabalho,

enfatizando, ao mesmo tempo, o que pretendo com o mesmo.

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O discurso teórico a respeito do marketing que recebi durante minha formação

acadêmica foi embasado no paradigma positivista, que representa a corrente dominante na

área. No entanto, no transcorrer da minha trajetória profissional passei a dar atenção para

algumas críticas direcionadas às “verdades” de determinados princípios apresentados na

literatura de marketing como, por exemplo, as limitações da matriz de

crescimento/participação do Boston Consulting Group (WENSLEY, 1982;

VARADARAJAN, CLARK e PRIDE, 1992), do conceito de ciclo de vida do produto

(DHALLA e YUSPEH, 1976; BROWN, 1993b); do conceito de segmentação de mercado

(GIGLIO, 2002). No plano das ações de marketing das empresas passei a observar os

problemas de atendimento ao consumidor (BERRY, 2000). Ao mesmo tempo, entendia que as

estratégias de marketing de empresas consideradas bem-sucedidas no mundo dos negócios e

sob o ponto de vista de marketing, não eram desejáveis à sociedade e não estavam em sintonia

com a minha visão de mundo. Nesse sentido, voltei-me para o tema de falhas e estratégias de
13

recuperação em empresas de serviços e a conseqüente satisfação/insatisfação dos clientes

frente a tais situações. Realizei duas pesquisas sobre o tema, uma no ramo de serviços ligados

à manutenção de automóveis (SOUZA e PEREIRA, 2000) e outra ligada ao ramo varejista

(SOUZA, 2001). Os resultados de ambos estudos indicaram haver sérios problemas de

atendimento por parte das empresas pertencentes aos ramos analisados.

Inicialmente, pensei que estivesse nesse tema a possibilidade de desenvolver minha

tese de doutorado, tendo em vista as possibilidades de investigações em torno dos problemas

sobre atendimento ao consumidor. Porém, ao mesmo tempo em que procurava maior

profundidade a respeito do tema, percebia que deveria realizar um outro tipo de estudo, pois

havia, na verdade, um questionamento mais amplo: como e se o marketing atendia as

necessidades dos consumidores? Precisava, assim, de algo que fosse capaz de oferecer

respostas mais amplas e sustentar meu trabalho profissional. Essa situação me desestimulou a

dar continuidade à idéia inicial de tese e, entre paradas para a reflexão e momentos de total

inércia, fui em busca de novos caminhos e conhecimentos.

Foi um longo tempo decifrando novas linguagens, novas formas de pensamento

relacionadas a outras visões de mundo e novas (ou outras) formas de realizar pesquisas na

área de marketing. Como resultado dessa busca, encontrei em autores pertencentes à

epistemologia crítica – como Boaventura Sousa Santos, David Harvey, Jean-François

Lyotard, Ludwig Josef Wittgenstein – a sustentação necessária para conceber o meu trabalho

de tese. Por outro lado, identifiquei em autores de marketing classificados como pertencentes

à corrente pós-moderna – em especial, Fuat Firat, Alladi Venkatesh, Douglas Brownlie, Nikhi

Dholakia, Stephen Brown – idéias, práticas, métodos e estilos desconsiderados nos processos

tradicionais de formação da área de marketing, mas que poderiam me oferecer um novo rumo

para construir um estudo que fosse ao encontro das minhas inquietações e preocupações.
14

Durante o segundo semestre de 2002 consegui organizar, em forma de texto, as

primeiras idéias sobre aquilo que estava pensando e que poderiam constituir uma tese. Escrevi

alguns parágrafos, algumas colagens e hipertextos. No início de 2003 recebi um convite para

participar do IX Colóquio Internacional sobre Poder Local: “Gestão XXI, Gestão Social e

Gestão do Desenvolvimento”, que se realizaria em Salvador, no primeiro semestre desse

mesmo ano. Elaborei um texto em forma de ensaio intitulado “Uma Reflexão sobre as

Influências Negativas da Função de Marketing”. Naquele encontro participei do painel

“Velhos Conceitos, Novas Idéias – Velhas Idéias, Novos Conceitos?”, coordenado pela

professora Rosimeri de Fátima Carvalho da Silva, do Departamento de Ciências

Administrativas, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e com a participação dos

pesquisadores Andreu Solé, da École de Hautes Études Commerciales (HEC), de Paris e

Maria Ceci Misoczky, da Escola de Administração da Universidade Federal do Rio Grande do

Sul (UFRGS). Este trabalho foi o embrião das idéias que hoje estão no presente trabalho.

Além disso, a troca e a obtenção de idéias resultantes desse encontro foram muito

significativas para algumas definições conceituais e para reforçar a idéia de que deveria

continuar no caminho que estava começando a percorrer. Este mesmo texto, com pequenas

modificações, foi publicado em 2003, na revista GESTÃO.Org – Revista Eletrônica de Gestão

Organizacional, do Programa de Pós-Graduação em Administração, Universidade Federal de

Pernambuco.

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15

Estendo o argumento do sociólogo Boaventura de Sousa Santos (2000), quando se

refere à sociologia, para evidenciar minha posição em relação àqueles que, como eu, estudam

o marketing e se deparam em uma posição ambígua que oscila entre

[...] a distância crítica em relação ao poder instituído e o comprometimento


orgânico com ele, entre o guiar e o servir. Os desafios que nos são colocados
exigem de nós que saiamos deste pêndulo. Nem guiar nem servir. Em vez de
distância crítica, a proximidade crítica. Em vez de compromisso orgânico, o
envolvimento livre. Em vez de serenidade autocomplacente, a capacidade de
espanto e de revolta [...] (SANTOS, 2000a, p. 19).

248(35(7(1'2&2027(;72

Inicialmente, não pretendo com a realização desta tese desconsiderar todo o

conhecimento produzido na área de marketing nem negar sua contribuição à gestão

organizacional, mas, sim, demonstrar que seus princípios, são, de fato, uma construção teórica

comprometida e vinculada aos valores e princípios éticos da sociedade capitalista e, por isso,

podem merecer novas e diferentes interpretações.

Com a produção de um ensaio teórico, a exemplo de outras teses de doutorado

(ALVES, 2001; ROHN, 2003) defendidas em âmbito nacional e, também, neste programa de

Pós-Graduação (FONSECA, 2001), procuro oferecer uma outra forma de enxergar o

marketing e sua contribuição para a sociedade. Ao mesmo tempo, contribuir para a redução da

lacuna que há na área entre a produção de estudos práticos e interesses imediatos e de estudos

teóricos (BURTON, 2001).

Por outro lado, busco superar a supremacia da visão positivista da pesquisa e indicar

que o marketing pode ser compreendido de modo diferente mediante uma perspectiva crítica.

Frente à avalanche de trabalhos que defendem as idéias da corrente dominante, aposto na

conquista de audiências que se interessem por, pelo menos, prestar atenção às idéias

alternativas de interpretação do marketing que estou propondo neste ensaio. Como menciona
16

Foucault (2000, p. 10), “ por mais que o discurso seja aparentemente bem pouca coisa, as

interdições que o atingem revelam logo, rapidamente, sua ligação com o desejo e com o

poder” . Além disso, é bom lembrar o que diz o filósofo Alain de Botton sobre o fato de

muitas vezes não questionarmos o VWDWXV TXR em função da possibilidade de hostilidade

alheia,

Nosso desejo de levantar dúvidas pode ser salpicado por uma sensação
íntima de que as convenções sociais devem ter bases sólidas, mesmo se não
soubermos discernir exatamente quais bases seriam estas pelo fato de terem
sido adotadas por tantas pessoas há tanto tempo. Parece implausível que a
nossa sociedade esteja profundamente equivocada em suas crenças e, ao
mesmo tempo, que seríamos os únicos a perceber este fato. Reprimimos
nossas dúvidas e nos incorporamos ao rebanho porque não conseguimos nos
imaginar pioneiros na tarefa de desvendar as verdades até agora
desconhecidas e dolorosas. (BOTTON, 2001, p. 19).

Pretendo, também, demonstrar que os argumentos e evidências que apresento a

respeito do marketing são importantes para o contexto interdisciplinar da engenharia de

produção, em função de vários aspectos. Sabe-se que, em tese, marketing e produção devem

funcionar integrados e dividir responsabilidades no âmbito de uma organização e, ao mesmo

tempo, precisam considerar as soluções e problemas, os benefícios e custos de suas

realizações para a sociedade. Por outro lado, o reconhecimento do fim da dicotomia produção

e consumo em que, respectivamente, uma era considerada a criação e a outra, a destruição,

leva ao reconhecimento de que se reconheça que quando se produz, se consome, e que isso

gera um ciclo interminável de símbolos, bens, serviços e, conseqüentemente, de realidades

que são uma só (FIRAT e VENKATESH, 1995). Além disso, há uma tendência de considerar

que a cultura do consumo pós-moderna

[...] está organizando a economia em aspectos básicos: o valor dos bens


depende mais de seu valor cultural (‘valor de signo’ ) do que de seu valor
funcional ou econômico; a propaganda e o marketing deixaram de ser
funções subordinadas à produção; passaram a ser discursos imperiosos
dentro das empresas; um número cada vez maior de mercadorias assume
forma que não é, em absoluto, a de bens materiais, e sim, de signos e
representações. (SLATER, 2002, p. 39).
17

Segundo Meszáros (2003), na atual fase do capitalismo não se trata, como em fases

anteriores, de ampliar o círculo do consumo em função das necessidades humanas, mas de um

processo de reprodução ampliada do capital em que consumo e destruição são equivalentes

funcionais. Em decorrência deste fenômeno contemporâneo produção e marketing se

interconectam com maior intensidade, já que o acelerado processo de “ destruição” de

produtos envolve tanto um processo produtivo que o garanta quanto a geração da necessidade

de consumo continuado dos mesmos produtos.

A transformação da natureza num artefato global, graças à imprudente


produção-destruição tecnológica, e a crítica epistemológica do etnocentrismo
e androcentrismo da ciência moderna convergem na conclusão de que a
natureza é a segunda natureza da sociedade e que, inversamente, não há uma
natureza humana porque toda a natureza é humana. Assim sendo, todo o
conhecimento científico-natural é científico-social. (SANTOS, 2000c, p. 89).

Desejo, também, que meu trabalho contemple essa posição de Santos, uma vez que

acredito que toda e qualquer área envolvida com o consumo deva ser vista dentro de

interesses sociais mais amplos e considerando, assim, o ambiente.

Por fim, entendo que a universidade tem a obrigação de formar profissionais que,

além do conhecimento técnico e específico que diz respeito a sua área de atuação, pensem

sobre as implicações (econômicas, sociais, culturais, políticas e ecológicas) que envolvem as

práticas teóricas existentes, e que tenham conhecimento sobre diferentes formas de interpretar

o conhecimento construído e de construir a sociedade. Conforme Vieira R. HWDO (2002) as

abordagens críticas no âmbito do marketing podem

[...] trazer uma série de implicações para o ensino e para o aprendizado,


proporcionando benefícios em termos de conteúdo e de uma abordagem
reflexiva do aprendizado [...] [como] a superação do paradigma
epistemológico moderno, que parece não mais poder ser posto no mundo
contemporâneo como a única ou principal maneira de entender e fazer
conhecimento [...] (VIEIRA R. HWDO 2002, p. 6)

Por isso, como educador, tenho preocupação centrada “ em uma educação para a

cidadania” (SANTOS, 2003b), com aquilo que estou produzindo e ajudando a construir em
18

termos de ensino e pesquisa para ser utilizado nas organizações e afetar a vida das pessoas e o

futuro da sociedade brasileira. Isso faz com que vincule meu trabalho à produção “ de idéias,

de concepções, de consciência através da interação intelectual” (MARX, 1979 DSXG

MISOCZKY, 2002, p. 10). Sendo o conhecimento uma questão de produção, penso que cabe

aos profissionais da educação, sem abandono da perspectiva crítica, o exercício da criação

(produção) de novas teorias ou novas interpretações sobre suas áreas de atuação, para que

essas criações em um segundo momento sejam analisadas, interpretadas, discutidas e, logo

após, utilizadas, adaptadas ou rechaçadas.

Por todos esses argumentos e pretextos, quero crer que as reflexões, perguntas e

argumentações que fazem parte deste ensaio sejam pertinentes não apenas à engenharia de

produção e ao marketing, mas a todas as áreas que, de forma direta ou indireta, têm relação

com o consumo, e que o trabalho se enquadre nos requisitos de uma Tese de Doutorado em

Engenharia de Produção.

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Considerando que os pesquisadores constroem o conhecimento a partir da dinâmica

de suas relações socioculturais, de suas experiências de vida, de seus interesses individuais e

de suas visões de mundo que influenciam seus juízos e valorações(PETER e OLSEN, 1983)

procuro, como recomenda Santos (2000a), tornar explícitos meus pré-juízos, meus valores,

minhas posições ideológicas. Esta opção metodológica se vincula ao que Case (2003)

denomina de método autêntico. Tratando a pretensão de objetividade como uma quimera que

nunca se realiza, o autor defende que se reconheça a inevitável subjetividade e as incursões

ideológico-retóricas presentes em qualquer prática de pesquisa. Trata-se, adotando esta opção,

de fazer escolhas morais, declará-las claramente e, então, submetê-las a críticas.


19

Ainda segundo Case (2003) a construção do texto na terceira pessoa, mais do que

uma convenção, induz ao engano de que o texto é objetivo, chamando esta “ visão a partir de

nenhum lugar” de “ estilo de não estilo” . “ De modo a comunicar um sentido de solidez e

certeza [...] com relação ao conhecimento fático sendo relatado, os textos objetivistas

precisam ser não ambiciosos em termos de estilos, precisos e funcionais” (CASE, 2003, p.

166).

Já a pretensão de objetividade, para Lincoln e Guba (2000, p.181), é uma “ criatura

mitológica que nunca existiu, a não ser na imaginação daqueles que acreditam que o

conhecimento pode ser separado de quem conhece” .

Entendi, portanto, que não deveria me esconder, me apagar na narrativa e fiz a opção

de escrever o texto na primeira pessoa do singular. Ainda que, como lembra Cavedon (2001),

precisemos quebrar a resistência dos pesquisadores que revelam uma certa tendência estética

mais ortodoxa. Cabe, ainda, considerar que em vários momentos de minha narrativa aparecem

longas transcrições de autores/atores, pois descobri em Misoczky (2001) que elas funcionam

como interlocuções e são importantes para juntar e costurar os retalhos e formar os

argumentos. Assim, meu texto é fruto de minhas idéias e reflexões, mas é concebido com a

contribuição e a intersecção, fundamentais, de saberes, autores e atores.

A validade de uma tese que é pessoal e subjetiva não se baseia nos critérios de um

“ bom texto científico’ ’ da pesquisa positivista, ela se baseia em novos critérios

(CZARMANIAWA, 2004). A validade em Lincoln (1995) tem relação com a ética e está

relacionada com cinco critérios: adotar uma posição a partir de um ponto de referência

claramente expresso; ser reconhecido por árbitros de qualidade (comunidades discursivas e

espaços de pesquisa); adotar uma postura de pesquisador que privilegie a reciprocidade em

vez da hierarquia; considerar como o conhecimento pode contribuir para a emancipação


20

humana; compartilhar os pré-requisitos de privilégio que possuímos como acadêmicos, com

espaços nas universidades. Em Fisher (1987) a validade tem a ver com três aspectos: a

probabilidade de coerência da narrativa; a lealdade da narrativa; e a constituição da narrativa

confiável. Já, Denzin e Lincoln (1998 DSXG MISOCZKY, 2002) argumentam a favor das

pesquisas que valorizam: o intuitivo; o emocional; a interpretação como arte; a crítica; e a

percepção da ciência como poder. Alvesson e Deetz (2000), por sua vez, defendem como

critérios de validade: a compreensibilidade; a sinceridade; a autenticidade; e a legitimidade.

Em Misoczky (2001) encontrei a inspiração, ousadia e coragem para a definição da

estrutura de apresentação do meu trabalho e, dessa forma, fugi dos padrões tradicionais de

apresentação de uma tese. Para que o leitor tenha uma prévia noção das seções que formam o

estudo, faço uma breve apresentação das mesmas.

• $VLGpLDVTXHFRQVWURHPRWH[WRapresento as idéias que sustentam e motivaram

a realização da tese; a opção pela epistemologia crítica e pela ordem do discurso, o caminho

para a concepção do trabalho; as técnicas e instrumentos utilizados para a construção das

idéias;

• &RQVWUXomRGRSHQVDPHQWRHPPDUNHWLQJGLYHUVLGDGHVGLVSXWDVHFULVHV

• 5HIOH[}HVVREUHRGLVFXUVRGRPDUNHWLQJQDVRFLHGDGHSyVPRGHUQDGD

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• 2FRQVXPLGRUYXOQHUiYHOQDVRFLHGDGHSyVPRGHUQDGHGDGRV

• 2PDUNHWLQJFRPRIXQomRGHFRQVWUXomRGDLQVDWLVIDomR

Essas seções se articulam em torno do REMHWLYR TXH RULHQWD D SURGXomR GHVWH

HQVDLR WHyULFR UHIOHWLU FULWLFDPHQWH VREUH D IXQomR GR PDUNHWLQJ TXH GLIHUHQWHPHQWH

GDTXLOR TXH WHP VLGR DWULEXtGR SHOD OLWHUDWXUD QD iUHD WHP VLGR UHVSRQViYHO SHOD

FRQVWUXomRGDLQVDWLVIDomRSDUDTXHRVFRQVXPLGRUHVPHGLDQWHRFRQVXPRSHUPDQHQWHH
21

LQFHVVDQWHPDQWHQKDPRFUHVFLPHQWRGDVHPSUHVDVHGRVLVWHPDFDSLWDOLVWDID]HQGRLVVR

FRPRDSRLRGHHVWUDWpJLDVGHSHUVXDVmRHPDQLSXODomR

Para tanto, baseado em questões norteadoras da minha vida, ao longo das seções,

formulo perguntas orientadoras para a tese e ofereço algumas respostas, que se baseiam em

minhas “ verdades” e nas “ verdades” de autores/atores que me acompanham neste trabalho,

assim como, nas informações fáticas resultantes de dados empíricos que ilustram e apóiam a

reflexão. Além dessas, por ser este um trabalho reflexivo, encaminho outras indagações às

quais não apresento respostas, para que o leitor possa fazer as suas reflexões e com elas criar

respostas e/ou gerar outras perguntas que resultarão em outras respostas.

• 3yVWH[WR3Uy[LPRVWH[WRVdescrevo a experiência de ter realizado este trabalho,

resgato idéias, descrevo as perspectivas para o meu trabalho como educador e, nesse sentido,

encaminho as possibilidades de desdobramento e apresentação das idéias e continuidade do

estudo.
$6,'e,$648(&216752(027(;72

Esta seção é de suma importância para que o leitor entenda o processo de concepção

deste ensaio teórico. Inicialmente, faço uma breve apresentação sobre a era moderna, a

passagem para a era pós-moderna e, também, do atual estágio do capitalismo. Posteriormente,

descrevo aspectos da epistemologia crítica e da análise do discurso que sustentam o processo

de produção do ensaio. Logo após, apresento o caminho de reflexões e ações no período de

amadurecimento, avaliação e pré-concepção do ensaio e descrevo os procedimentos que

utilizo para a consolidação da tese.

02'(51,'$'(3Ï602'(51,'$'((&$3,7$/,602

De acordo com Berman (1987) a história da modernidade pode ser apresentada em

três fases: a primeira tem início no século XVI e termina no final do século XVIII; a segunda

inicia no final do século XVIII com a Revolução Francesa, fase em que surgem as idéias do

modernismo e da modernização, indo até o final do século XIX; e a terceira, que começa no

século XX, na qual o processo de modernização toma conta do mundo interiro. Mas

continuamos na modernidade ou estamos na pós-modernidade? Berman (1987, p. 15) entende

que continuamos na modernidade e não aceita o termo pós-modernidade. Para o autor “ [...]

estamos em um ambiente que promete aventura, poder, alegria, crescimento, transformação de

nós mesmos e do mundo – e que, ao mesmo tempo, ameaça destruir tudo o que temos, o que

sabemos, tudo o que somos. [...] é uma unificação paradoxal, uma unificação de desunião;

despeja todos nós no turbilhão de eterna desintegração e renovação, de luta e contradição,

ambigüidade e angústia” . Já Heller e Fehér (1998) aceitam a pós-modernidade como o tempo

presente da modernidade.
23

A pós-modernidade não é nem um período histórico nem uma tendência


cultural ou política de características bem definidas. Pode-se em vez disso
entendê-la como o tempo e o espaço privado-coletivos, dentro do tempo e
espaço mais amplos da modernidade, delineados pelos que têm problemas
com ela e interrogações a ela relativas, pelos que querem criticá-la e pelos
que fazem um inventário de suas conquistas, assim como de seus dilemas
não resolvidos. Os que preferiram habitar na pós-modernidade ainda assim
vivem entre modernos e pré-modernos. Pois a própria fundação da pós-
modernidade consiste em ver o mundo como uma pluralidade de espaços e
temporalidades heterogêneos. A pós-modernidade, portanto, só pode definir-
se dentro dessa pluralidade, comparada com esses outros heterogêneos.
(HELLER e FEHÉR, 1998, p. 11).

De acordo com Mandel (1982) vivemos no capitalismo tardio. O autor argumenta

que após a passagem do estágio do capitalismo de mercado para o estágio monopolista ou

imperialista, estamos no momento do capital multinacional. Essa sistematização em estágios

não implica a adoção de uma leitura evolucionista, mas a concepção de que a contradição

interna do capitalismo (a discordância constante entre produção e reprodução social) o impele

a um desenvolvimento permanente.

O estado “ normal” do capitalismo é o da revolução permanente de suas


próprias condições de existência: desde o começo, o capitalismo “ apodrece” ,
é marcado por uma contradição mutilante, pela discórdia, por uma falta de
equilíbrio imanente: é exatamente por isso que ele se modifica e se
desenvolve sem parar - o desenvolvimento incessante é sua única maneira de
resolver reiteradamente, de entrar em acordo com seu desequilíbrio
fundamental e constitutivo, a “ contradição” . Longe de ser restritivo,
portanto, seu limite é o próprio impulso de seu desenvolvimento. Nisso
reside o paradoxo característico do capitalismo, seu último recurso: o
capitalismo é capaz de transformar seu limite, sua própria impotência, na
fonte de seu poder quanto mais ele “ apodrece” , quanto mais se agrava sua
contradição imanente, mais ele tem que se revolucionar para viver. (ZIZEK,
1996, p. 329).

Mandel (1982) entende que a atual forma do capitalismo é a mais pura que já surgiu,

incluindo a expansão não imaginada do capital para áreas antes fora de sua esfera. Jameson

(1996), a partir dessas formulações, destaca que, ao contrário do que preconiza a vertente da

sociedade pós-industrial, o estágio atual do capitalismo não é o resultado dos

desenvolvimentos tecnológicos, pelo contrário, esses desenvolvimentos são decorrentes do

processo de expansão do capital através do sistema mundo em sua etapa transnacional. Assim,

Jameson (1996) e, também, Harvey (1992) entendem que a pós-modernidade representa o


24

estágio atual do capitalismo e é fruto das transformações que começaram a ocorrer nas

últimas décadas do século XX.

[...] um dos aspectos fundamentais da análise de Marx sobre o capitalismo: o


capital tem que se expandir incessantemente, ele nunca pode considerar o
trabalho concluído e, relaxar com seus ganhos. O acúmulo do capital tem de
ser ampliado, a taxa de produtividade constantemente aumentada, com todos
os resultados bastante conhecidos de transformação perpétua, do entulho do
atacado e novas construções, e similares ("tudo que é sólido... "). Mas o
capitalismo é supostamente também contraditório e constantemente se vê em
lugares nos quais enfrenta a lei da queda da taxa de lucro sob a forma da
diminuição dos proventos, estagnação, rajadas improdutivas de especulação,
e assim por diante. Uma vez que esses efeitos derivam em grande parte da
superprodução e saturação de mercados disponíveis, Ernest Mandel sugeriu
não só que o capital tende a se livrar disso através da inovação tecnológica
que reabre esses mercados para produtos de tipos inteiramente novos, mas
também que o sistema como um todo teve assim que se rejuvenescer em
vários momentos de crise em sua carreira de duzentos anos. Cada um desses
momentos de transmutação foi, portanto, marcado pela introdução de tipos
radicalmente novos de tecnologia, mas também caracterizados por um
alargamento convulsivo do sistema como um todo que de um só golpe
amplia seu domínio, o que quer dizer a operação de sua lógica intrínseca e
seus mecanismos internos, sobre áreas dramaticamente mais extensas do
planeta. (JAMESON, 2004, p. 79-80).

Em Jameson (1996, p. 22) o capitalismo tardio é uma “ expressão que funciona como

uma espécie de signo, que traz uma carga de intenções e conseqüências [...] [que é usada

como] sinônimos adequados (‘capitalismo multinacional’ , ‘sociedade do espetáculo ou da

imagem’ , ‘capitalismo da mídia’ , ‘o sistema mundial’ , ou o próprio ‘pós-modernismo’ ) [...]” .

Cabe, também, exaltar que o capitalismo tardio de Jameson tem a ver com as empresas

transnacionais, a nova divisão internacional do trabalho, a nova dinâmica vertiginosa de

transações bancárias internacionais e das bolsas de valores, as novas formas de mídia,

computadores e automação, a fuga da produção para áreas desenvolvidas do Terceiro Mundo,

além das conseqüências sociais mais conhecidas (incluindo a crise do trabalho). É esta a

posição que adoto para efeitos deste trabalho.


25

$61(&(66,'$'(6,16$&,È9(,61$62&,('$'(,16$7,6)(,7$

Slater (2002) entende que um tema central no estudo da cultura do consumo é

[...] saber se os sistemas sociais de alocação de recursos satisfazem as


necessidades definidas autonomamente por comunidades e grupos sociais, se
o fazem de maneira eqüitativa, ou se esses sistemas (forças de mercado,
grandes empresas privadas, a mídia e instituições culturais, ciências e
conhecimentos especializados modernos) têm a capacidade de definir as
necessidades das pessoas para elas, ou de reduzir a tal ponto o acesso de
algumas pessoas aos recursos que sua capacidade de determinar e levar uma
vida que elas acreditam ser boa – isto é, de ‘satisfazer suas necessidades’ – é
limitada injustamente. (SLATER, 2002, p. 13).

Segundo Schumpeter (1976) o sistema capitalista funciona tão bem porque cria

expectativas irrealistas de êxito para os empresários, que se esforçam demasiadamente em

busca de aumento da produção, das vendas, de lucros, de conquista de novos mercados, etc, e,

assim, propiciam um grande crescimento que não ocorreria se esses fossem espíritos mais

prudentes. Ou seja, como metáfora, poderíamos dizer que o capitalismo sinaliza aos

empresários que o êxito se encontra no céu. Chegar ao céu é uma tarefa impossível, mas o

esforço resultante para tal façanha faz com que os empresários alcancem o equivalente à

altura do terraço de um grande edifício, o que já é uma conquista suficientemente interessante

para o “ sucesso” do sistema. Esse raciocínio pode ser estendido, também, aos trabalhadores e

aos consumidores.

O trabalho é uma atividade humana fundamental na constituição do ser social e nas

atuais condições de reprodução do capital. Por um lado, os trabalhadores se sentem inseguros

pela redução do número de empregos, pelo fim do trabalho formal, pelo subemprego ou até

mesmo pelo desemprego; e, por outro, vêem-se diante da intensificação do trabalho e da

exigência de envolvimento com a empresa (ANTUNES, 1999). Em busca da sobrevivência no

trabalho, as pessoas são pressionadas para que constantemente busquem novos saberes e

competências; sejam pró-ativas, criativas, líderes, empreendedoras, dominem informática,


26

falem idiomas, amem o que fazem, tomem decisões rapidamente, saibam trabalhar em equipe,

comandem pessoas, e etc. Tudo para que se tornem bem-sucedidas e “ cheguem ao céu” . Para

tanto, os trabalhadores realizam um esforço absurdo, mas como ser tudo é uma tarefa

praticamente impossível, se esses conseguirem alcançar algumas dessas condições já será

muito bom para o “ sucesso” do sistema. Como lembra Slater (2002):

“ Existe o medo perpétuo de que os trabalhadores venham a preferir tempo a


mais bens como recompensa do progresso industrial. [...] A redefinição das
horas de folga como horas de consumo, a transformação do lazer em
mercadoria, tem sido crucial na manutenção do crescimento capitalista” .
(SLATER, 2002, p. 35):

Nesse mesmo sentido, o sistema insinua que os consumidores – que são inclusive

empresários e trabalhadores – consumam bens e serviços mais e mais para que tenham

reconhecimento social, vivam com mais conforto, mais segurança, mais felizes, e satisfeitos

de suas necessidades.

Como relatam Brownlie e Saren (1992), é uma doutrina básica da ideologia de

marketing que as empresas deveriam satisfazer as demandas do consumidor e que tal

demanda é determinada pela escolha e manifestação do consumidor de suas necessidades e

desejos. Engel, Blackwell e Miniard (2000) entendem que o marketing não cria necessidades,

a área pode estimular uma vontade ou um desejo de um produto ou serviço, mas isso não

acontecerá se uma necessidade não existir antes. Engel e seus colegas acreditam que as

necessidades são pré-existentes, muito embora possam estar adormecidas e em grande parte

não-reconhecidas. Cobra (1997, p. 32), por sua vez, acredita que

[...] o papel social do marketing é, sem dúvida, satisfazer as necessidades do


consumidor. Mas o que se vê na realidade brasileira é que o marketing é
muitas vezes acionado na expectativa de criar desejos de consumo de certos
produtos ou serviços inócuos ou que não atendem a nenhuma necessidade” .
[A área] “ não cria hábitos de consumo, mas estimula a compra de produtos e
serviços que satisfaçam a alguma necessidade latente” . (COBRA, 1997, p.
32).
27

No entanto, apesar de Cobra (1997) defender a idéia de que o marketing não cria

necessidades, ele concorda que o tema merece discussão.

Segundo Heller (1998), Karl Marx, em sua teoria das necessidades, descreve a

satisfação da necessidade como condição VLQHTXDQRQpara qualquer troca, e o valor de troca

se dá pelo significado de seu valor de uso. O capitalista valoriza suas mercadorias (bem como

a força-de-trabalho) não por suas qualidades específicas (valor de uso), mas pelo valor

econômico abstrato (valor de troca). Mas, para que esse valor econômico se configure, as

mercadorias precisam ter valor de uso para alguém e esse precisa ter dinheiro para comprá-la.

O valor de uso precisa satisfazer necessidades: as necessidades da produção da mais-valia e,

por conseguinte, do capital. De modo que tais necessidades de crescimento sejam atendidas o

sistema capitalista precisa produzir mais do que o suficiente. O desenvolvimento da divisão

do trabalho e da produtividade cria, junto com a riqueza material, também a riqueza e a

multiplicidade das necessidades, porém as necessidades se repartem sempre em virtude da

divisão do trabalho: o lugar ocupado no seio de divisão do trabalho determina a estrutura da

necessidade ou ao menos seus limites. Segundo a autora, nos Manuscritos de Economia e

Filosofía de 1844, Marx rechaça energicamente a concepção puramente econômica de

necessidade.

A sociedade como se manifesta aos economistas, é a ‘sociedade civil’ na


qual cada individuo é um conjunto de necessidades e só existe para o outro,
como o outro só existe para ele, na medida em que se convertem em meio de
um para o outro. [...] A redução do conceito de necessidade à necessidade
econômica constitui una expressão da alienação (capitalista) das
necessidades, em uma sociedade na qual R ILP GD SURGXomR QmR p D
VDWLVIDomR GDV QHFHVVLGDGHV VH QmR D YDORUL]DomR GR FDSLWDO QD TXDO R
VLVWHPD GDV QHFHVVLGDGHV VH GHVWLQD D YDORUL]DomR GR FDSLWDO em que o
sistema de necessidades está baseado na divisão do trabalho e a necessidade
somente aparece no mercado, sob a forma de uma demanda solvente [...].
(MARX, [1844] 1969 DSXG HELLER, p. 24-25, grifo meu).
28

Em O Capital, Marx, além de mostrar como o valor de uso esconde o valor de troca e

ambos escondem o valor do trabalho, demonstra que a mercadoria é trabalho social

cristalizado e alienado. O capitalista (sua ciência ou sua economia política) apresenta a

mercadoria como ela não é, ou seja, coisificada, como se essa tivesse propriedades exclusivas,

independentes do produtor e das relações de produção. É no fetichismo da mercadoria que a

classe dominante tende a projetar e impor sua maneira de ver as coisas a todas as outras

classes (IANNI, 1980).

A tese central de Heller (1998) é de que precisamos construir novos valores críticos e

opostos ao sentido do valor de troca, em que o valor de uso se afirme como medida efetiva

nas relações de trocas. Entendo que essa postura da autora seja adequada para as idéias que

defendo nesta tese.

A busca interminável de necessidades do consumidor contemporâneo é, segundo

Campbell (2001), um enigma a ser desvendado. Conforme o autor, a insaciabilidade não se

limita à sociedade atual, uma vez que há indícios de que os seres humanos, em todas as

culturas, são capazes de desenvolver inclinações.

[...] o consumidor moderno [...] mal satisfez [uma necessidade] [...] outra já
se acha à espera preparada, reclamando a satisfação; quando esta é atendida,
uma terceira aparece, então subseqüentemente uma quarta, e assim por
diante, aparentemente sem fim. O processo é incessante e ininterrupto.
Raramente pode um habitante de sociedade moderna, não importa quão
privilegiado ou opulento, declarar que não há nada que esteja querendo. Que
isso deva ser assim nos causa admiração. Como é possível as necessidades
aparecerem com tamanha constância, e de uma forma tão inexaurível,
especialmente quando se referem, tipicamente, a novos produtos e serviços?
(CAMPBELL, 2001, p. 59).

Campbell (2001, p. 59) argumenta que essa propensão, descrita por alguns

observadores como uma “ revolução de frustrações ascendentes” , leva o consumidor a nunca

fechar o hiato entre necessitar e alcançar. O autor diz que pode haver a objeção de que a

origem do consumismo moderno esteja na inventividade do homem moderno que faz com que
29

surjam invenções e produções sem fim de novos produtos e serviços. Porém, Campbell (2001)

adverte que essa possível verdade esbarra no fato que nem todas as novas invenções são

destinadas a atender as necessidades existentes, mas sim em atender novas necessidades.

“ Essa dinâmica racional e instrumental pode ter pouco efeito sobre o modelo básico das

satisfações típicas de um consumidor, enquanto afeta profundamente o uso econômico dos

recursos.” (CAMPBELL, 2001, p. 60). Ainda segundo o autor, da mesma forma que a criação

de necessidades constitui-se em um enigma, a extinção contínua das necessidades é quase um

outro enigma, “ pois um corolário natural de necessitar incessantemente é a alta taxa de

obsolescência (e, por conseguinte, da necessidade) do produto. Como é que as necessidades

partem tão subitamente, e tão facilmente, quanto chegam? Como é que os indivíduos

conseguem parar de ter necessidade do que ardentemente desejaram apenas um pouco antes?”

(CAMPBELL, 2001, p. 60). Complementando a posição de Campbell (2001), a tendência

generalizada de considerar “ normal” ou “ racional” esse comportamento da sociedade de

consumo contemporânea merece reflexão.

Nas sociedades não-alfabetizadas e pré-industriais, o consumo, como outros


aspectos da vida, é amplamente orientado pelo costume e pela tradição, e
essas forças especificam uma noção das necessidades mais estável do que
indeterminada. [...] o consumo nessas sociedades não é uma atividade
claramente colocada à parte daquela da produção. [...] Assim, sejam quais
forem as práticas de consumo observadas, elas não requerem nenhuma teoria
separada, apenas uma compreensão completa da cultura e das tradições do
grupo. Por conseguinte, a idéia de que os seres humanos, por algum motivo,
têm inclinação “ natural” a exibir insaciável insuficiência não recebe
qualquer apoio da história ou da antropologia. Ao contrario, se há uma coisa
desse tipo, como um padrão “ normal” nesses assuntos, é o do conjunto
tradicional de necessidades familiares, estáveis e limitadas. (CAMPBELL,
2001, p. 61-62).

Assim, na análise de Campbell (2001), dar por normal e natural o fato do homem

contemporâneo ter uma fome ilimitada, incessante e ininterrupta por bens é produto da

etnocentricidade e da ausência de uma investigação histórica. Como refere Marx, as

necessidades dependem da historicidade, da tradição e da cultura. Assim, o consumo


30

insaciável pode ser explicado pela idéia de Heller e Fehér (1998) da “ sociedade insatisfeita” .

Essa formulação

[...] busca captar a especificidade de nossa época mundial da perspectiva das


necessidades, ou, mais particularmente, da criação, percepção, distribuição e
satisfação das necessidades. Isso sugere que a forma moderna de criação,
percepção e distribuição de necessidades reforça a insatisfação, independente
de alguma necessidade concreta ser ou não de fato satisfeita. Além disso,
sugere que uma insatisfação geral atua como uma vigorosa força
motivacional na reprodução das sociedades modernas [...].

[É possível inferir] [...] que se as pessoas deixassem de se sentir insatisfeitas


com sua sorte – sua riqueza material, posição social, relações pessoais,
conhecimento e desempenho, de um lado, e, do outro, suas instituições,
organizações sociais e políticas, e a condição geral de tudo no mínimo – a
sociedade moderna não mais poderia reproduzir-se. No mínimo, certamente
entraria numa era de decadência ou decomposição sem dúvida
desmoronando” (HELLER e FEHÉR, 1998, p. 29).

Segundo Slater (2002, p. 36) “ a idéia de necessidade insaciável está intimamente

ligada às noções de modernização cultural” . Para o autor nessa condição os dos desejos das

pessoas se tornam cada vez mais sofisticados, refinados, imaginativos e pessoais, assim como

à aspiração de ascender social e economicamente. Conforme Slater (2002, p. 36) o consumo

ávido pode ser visto como “ [...] um grande avanço da civilização humana, quanto como o

começo do fim” .

Nesse contexto, R PDUNHWLQJ MXQWDPHQWH FRP RV HVIRUoRV GH RXWUDV IXQo}HV

SURGXomR ILQDQoDV JHVWmR GH SHVVRDV VLVWHPDV GH LQIRUPDomR H HWF  TXH ID]HP SDUWH GH

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',6&8562

A RSomR SHOD HSLVWHPRORJLD FUtWLFD para a realização desta tese tem a ver com a

perspectiva de pesquisa crítica e reflexiva das ciências sociais e com a necessidade de


31

comprometimento e engajamento crítico do pesquisador defendidos por Morgan (1983). Tal

opção tem, também, inspiração em Faria (2003), que, baseado em Horheimer e Adorno,

aconselha que os estudos críticos devam, além da preocupação com a crítica à teoria,

considerar as contradições da sociedade capitalista e investir contra as imagens deformadas da

realidade que procuram servir ao poder e não dão voz aos problemas do capitalismo. Faria

(2003) entende que a teoria crítica precisa

[...] denunciar a repressão e o controle social a partir da constatação de que


uma sociedade sem exploração é a única alternativa para que se estabeleçam
os fundamentos da justiça, da liberdade e da democracia. [...] [E que a teoria
crítica tem a função] de questionar e transformar a realidade social,
amparada em fundamentações teóricas que procuram entender tanto as
relações sociais quanto os sujeitos e sua inserção nestas relações [...].
(FARIA, 2003, p. 2-3).

Assim, novas e velhas concepções de diferentes saberes (administração, antropologia

do consumo, economia, filosofia, jornalismo, lingüística, psicologia social e sociologia)

podem – por estarem à distância e não vê-lo tão de perto – apoiar a análise crítica do

marketing e contribuir para diferentes construções a visões sobre a área. Como menciona

Santos (2003a, p. 14), hoje possuímos “ muitas teorias da separação e poucas teorias de união,

[...] [não devemos buscar] uma grande teoria que em si mesma envolva tudo e todos em um

certo momento, mas [criar uma] [...] ‘teoria da tradução’ [...] uma maneira de reunir áreas

distintas e de dar voz a diferentes grupos” .

Como postura crítica adoto a proposição de Santos (2000c), defensor de uma crítica

que se desvie da teoria crítica modernaem três aspectos fundamentais: o primeiro diz respeito

ao fato de que não é possível conceber estratégias emancipatórias genuínas dentro do

paradigma dominante, pois essas estão condenadas a se transformarem em outras tantas

estratégias regulatórias; o segundo refere-se à idéia de que em relação ao estatuto e objetivos

da crítica, o pensamento crítico é centrífugo e subversivo, na medida em que visa a criar


32

desfamiliarização com o que está estabelecido e é convencionalmente aceito como normal,

virtual, inevitável e necessário, mas a desfamiliarização deve ser um momento de suspensão

necessário para criar uma nova familiaridade com a vida e estabelecer um novo senso comum

emancipatório; o terceiro aspecto é a auto-reflexividade, pois “ o que dizemos acerca do que

dizemos é sempre mais do que sabemos acerca do que dizemos. Neste excesso reside o limite

da crítica. Quanto menos se reconhece este limite, maior ele se torna” (SANTOS, 2000c, p.

16-17).

A DQiOLVHGRGLVFXUVRFRQVWLWXLDIRUPDHVFROKLGDGHUHDOL]DUDUHIOH[mRFUtWLFD

VREUH PDUNHWLQJ O ser humano utiliza-se da linguagem – composta por sinais, discursos,

símbolos (signos) e imagens – para compor uma narrativa, produzir uma histórica, dar sentido

à vida, construir a realidade social, fundamentar a fala, e fornecer as bases e as regras para o

comportamento das pessoas. Wittgenstein (1996) explica que não existe significação e

conhecimento anteriores ao uso de linguagem, porém desfaz a concepção defendida pelo

positivismo de que a linguagem pode ser plenamente compatível e conviver com a prática do

critério último de certeza e da verificação empírica, pois a exatidão da linguagem é um mito

filosófico. O autor apresenta a linguagem como um fenômeno social e a vida social em termos

de “ jogos de linguagem” .

O discurso, em Foucault (2004), tem ligação com o poder e o saber. As práticas

discursivas condicionam, controlam e delimitam a forma de ver os fatos, de conceituar as

coisas e as práticas sociais. Uma prática discursiva “ é um conjunto de regras anônimas,

históricas, sempre determinadas no tempo e no espaço, que definiram, numa dada época, e

para uma determinada área social, econômica, geográfica ou lingüística, as condições de

exercício da função enunciativa” (FOUCAULT, 2004, p. 147-148).

Um saber é aquilo de que podemos falar em uma prática discursiva que se


encontra assim especificada: o domínio constituído pelos diferentes objetos
33

que irão ou não adquirir um VWDWXV científico [...] um saber é, também, o


espaço em que o sujeito pode tomar posição para falar dos objetos de que se
ocupa em seu discurso [...] um saber é também o campo de coordenação e de
subordinação dos enunciados em que os conceitos aparecem, se definem, se
ampliam e se transformam; [...] um saber se define por possibilidades de
utilização e de apropriação oferecidas pelo discurso [...].
[...] mas não há saber sem uma prática discursiva definida, e toda prática
discursiva pode definir-se pelo saber que ela forma [...]. (FOUCAULT,
2004, p. 204-205).

Foucault (2000, p. 8-9) afirma que “ em toda a sociedade a produção do discurso é ao

mesmo tempo controlada, selecionada, organizada e redistribuída por um certo número de

procedimentos que têm por papel conjurar seus poderes e perigos, dominar seu acontecimento

aleatório, esquivar sua pesada e temível materialidade” . Assim,

[...] diante de qualquer discurso proferido, de qualquer coisa dita, de


qualquer coisa escrita, procura-se de imediato localizá-la, amarrá-la, e isto
por intermédio de mecanismos que ligam aquilo que é transitoriamente dito
ou a qualquer coisa já dita, ou a um sentido não dito mas que esclarece,
explica aquilo que é dito (é este o mecanismo do comentário), ou a alguém,
ou a uma disciplina teórica. (CORDEIRO, 1995, p. 186).

A instância do discurso é resultado das mais diversas práticas restritivas da palavra

que limitam: o que pode ser dito, o que pode ser dito de verdadeiro, o que pode ser dito de

razoável (FOUCAULT, 2000). Bourdieu (1996) chama de “ a linguagem autorizada” aquilo

que pode ser dito porque segue um padrão lógico e coerente com as intenções de cunho

político, econômico ou ideológico das elites.

“ A análise crítica do discurso faz emergir a intenção opacificada da narrativa,

possibilitando que os sujeitos se tornem mais conscientes de sua própria prática, e mais

críticos dos discursos investidos ideologicamente a que são submetidos” (OLIVO e

MISOCZKY, p. 2, 2003). Como refere Foucault (2004, p. 207) “ a questão da ideologia

proposta à ciência não é a questão das situações ou das práticas que ela reflete de um modo

mais ou menos consciente; não é, tampouco, a questão de sua utilização eventual ou de todos
34

os empregos abusivos que se possa dela fazer; é a questão de sua existência como prática

discursiva e de seu funcionamento entre outras práticas” . Dessa forma,

[...] a análise do discurso pode demonstrar que aquilo que é lido não é a
realidade, mas apenas um relato da realidade propositadamente construído
de um determinado modo, por um determinado sujeito. Através do
destrinchamento do funcionamento dos textos e da conseqüente observação
de sua articulação com as formações ideológicas, ela permite desvendar, no
contexto da sociedade, o confronto de forças, as relações de poder, os
domínios do saber. (CABRAL, 1999, p. 4).

Para compreender um discurso é necessário que a análise não se detenha a um ato

isolado e a determinada situação presenciada, é preciso uma análise longitudinal no tempo e

no conteúdo conceitual do vocabulário utilizado (FARIA e MENEGHETTI, 2001). Nesse

sentido, baseado na arqueologia foucaultiana, utilizo a análise de discurso como perspectiva

para analisar o marketing como função de produção de sentidos, de conceitualização das

coisas, influenciador das práticas dos seres humanos nas organizações e nas ações de

consumo. Para tanto, faço, inicialmente, uma narrativa histórica das origens da cultura do

consumo e do marketing, procurando apontar fatos e acontecimentos, que começam na

modernidade até chegar no período contemporâneo. Em um segundo momento, realizo uma

análise crítica do discurso do marketing no contexto contemporâneo brasileiro, mediante três

gêneros do discurso: o discurso acadêmico, o discurso das organizações (empresas), e o

discurso da mídia de massa (em especial da televisão).

O primeiro, o discurso acadêmico é aquele dos livros, dos artigos, das conferências,

dos congressos e “ estaria como que sempre a dizer ao interlocutor: ‘Eis a realidade!’ [...] [e

que é levado] “ a comunidade (sempre pequena, pois que de elites) a produzir um discurso

fechado” (MATTOS, 2001, p. 11). O segundo é o discurso das organizações, e tem duas

configurações: o interno, de difícil identificação, onde são realizadas as análises,

determinados os objetivos, montadas e discutidas as estratégias e feitas as avaliações daquilo

que a empresa realizou; e a configuração externa, que se manifesta na forma de produtos,


35

marcas, GHVLJQV, precificações, propagandas, publicidades, promoções de vendas, vendas, e

aparece em todos os locais (virtuais, ou não) do cotidiano (ruas, lojas, meios de

comunicação). Este é aberto, mas, em muitos aspectos, incompreensível e desconhecido por

grande parte da população (onde estão consumidores, acadêmicos e praticantes). Lembrando

Canclini (1999), a comunicação das organizações cria condicionantes sociais, culturais,

econômicos e políticos que acabam determinando, estabelecendo ou até impondo significados

que os atores sociais – inclusive aqueles que como eu se aventuram a realizar pesquisas –

desconhecem. O terceiro é o discurso das rádios, dos jornais, das revistas, da internet e, em

especial, da televisão, que também é aberto como o segundo, é poderoso, mágico, persuasivo

e, também, perigoso. Como afirma Thompson (1999), em uma sociedade construída por

símbolos, imagens e marcas, a mídia desempenha um papel importante na difusão de novos

modos e modelos de comportamento.

As análises desses três gêneros do discurso se articulam, se interconectam a ponto de

evidenciar as possíveis implicações e a participação da engenharia de produção nesse

contexto. Ao mesmo tempo, aponto de que forma o consumidor participa e é influenciado por

este contexto do mundo capitalista.

2&$0,1+23$5$$&21&(3d­2'$6,'e,$6(26
352&(',0(1726(,167580(172687,/,=$'26

Faço, a seguir, um relato de como e porque incorporei cada técnica ao estudo, com o

intuito de deixar transparente a forma como o trabalho foi sendo concebido, de modo a não

apresentá-lo como parecendo realizado de uma forma objetiva, como comumente se vê e

tradicionalmente se exige de um trabalho acadêmico. Ao mesmo tempo, realizo a descrição

conceitual dos procedimentos e indico como eles estão dispostos nas seções que compõem a

presente tese. O Quadro I demonstra, em síntese, essa disposição.


36

4XDGUR,±6tQWHVHGRVSURFHGLPHQWRV GHVXVWHQWDomRGDDQiOLVHGRGLVFXUVRGRPDUNHWLQJ
6HomR 3URFHGLPHQWRV
Construção do pensamento em marketing: diversidades, disputas e crises Narrativa autobiográfica
Reflexões sobre o discurso do marketing na sociedade pós-moderna da Conversas do cotidiano
comunicação Observação
O consumidor vulnerável na sociedade pós-moderna de dados Re-análise de material
Re-análise de material
Marketing como construção da insatisfação Conversas do cotidiano
Narrativa autobiográfica

1DUUDWLYDDXWRELRJUiILFD

Tamboukou (2004), baseada na genealogia foucaultiana, descreve sua experiência

com a “ narrativa autobiográfica - uma abordagem genealógica” em sua tese sobre mulheres na

educação. Inspirado em suas argumentações, utilizo a “ narrativa autobiográfica” de duas

diferentes maneiras: a primeira para a composição do referencial teórico para o estudo; e a

segunda para relatar minha experiência em sala de aula junto aos alunos de graduação e

especialização no período de pré-concepção da tese.

Foucault (2004) menciona que ninguém diz nada sem ter ouvido dizer, e sem ter

estado neste ou naquele lugar, e sem ser, ele próprio, qualquer coisa diferente dele próprio,

muitas coisas diferentes, um “ estatuto” , uma “ posição” , “ vários eus” até. Assim, com base nos

meus referenciais e experiências realizei as seguintes ações para efetuar a composição do

referencial teórico do ensaio: consultas nas bibliotecas (em especial da FURG, UFSC e

UFRGS), acessos a bases de dados (Proquest e Emerald) e livrarias virtuais; buscas em artigos

publicados nos Anais do Encontro Nacional dos Programas de Pós-graduação em

Administração (ENANPAD); “ procurar no labirinto de documentos velhos e empoeirados”

(TAMBOUKOU, 2004) anotações realizadas durante meu curso de mestrado e, em especial,

na disciplina de Evolução do Pensamento em Marketing, ministrada pelo professor Fernando

Bins Luce; e, finalmente, consultas em livros e artigos do meu acervo particular e de colegas e

amigos. Cabe ressaltar que em função da natureza da proposição do trabalho, o referencial

teórico cumpre duas finalidades: a primeira é a sustentação e a construção de idéias; e a


37

segunda é a de rejeição e de contra argumentação das idéias que compõem o discurso

dominante do marketing. As referências permeiam as seções da tese como um todo, mas

aparecem de forma especial na seção “ Construção do pensamento em marketing:

diversidades, disputas e crises” .

A segunda maneira pela qual a “ narrativa autobiográfica” aparece na tese refere-se

ao meu trabalho em sala de aula realizado no período de pré-concepção da tese. Como

argumenta Tamboukou (2004): a narrativa autobiográfica pode oferecer respostas às

perguntas de uma pesquisa. A experiência que relato se refere ao período de 2003 até 2004,

quando comecei a apresentar idéias que estão nesta tese às turmas das disciplinas de

Administração de Marketing e Pesquisa de Marketing da Graduação em Administração, e da

disciplina de Marketing para o Curso de Especialização em Gestão Empresarial, ambos da

Fundação Universidade Federal do Rio Grande. Descrevo o resultado dessa experiência na

seção “ Marketing como construção da insatisfação” .

Cabe considerar que o fato (não planejado) de ter retornado às atividades

profissionais na Universidade antes do tempo que me era de direito para a realização da tese,

em um primeiro momento foi muito ruim porque absorveu muito do meu tempo, mas, por

outro, possibilitou que obtivesse “ ilustrações” para o meu trabalho e permanentemente fez

com que eu fosse obrigado a “ testar” minhas idéias.

&RQYHUVDVGRFRWLGLDQR

Segundo Menegon (2000, p. 215) “ as conversas do cotidiano permeiam as mais

variadas esferas de interação social. Mas, por serem consideradas corriqueiras, dificilmente

pensamos na riqueza e nas peculiaridades que possam estar presentes nessa forma de

comunicação” . As conversas são espaços privilegiados de interação social e de produção de

sentidos.
38

Incorporei esse procedimento ao estudo nos momentos iniciais de sua concepção e

com o objetivo de ilustrar, enriquecer, apoiar meus argumentos com relação à análise de dois

dos gêneros que compõem a formação discursiva do marketing: o discurso das empresas e o

discurso da mídia de massa. Inspirado nas idéias de Santos (2003b) decidi que deveria

valorizar as experiências do cotidiano, do mundo vivido, do senso comum dos indivíduos em

geral, buscando, com isso, apresentar realidades não reveladas. Sendo assim, acredito que a

contribuição de atores que não pertencem à área acadêmica e exercem diferentes papéis

(consumidores, trabalhadores, alunos, pais e mães) também é significativa para a produção

dos argumentos que defendo nesta tese. Ao fazer isso espero diminuir o problema que, de

acordo com Santos (2003b), a ciência moderna incentiva, que é o de considerar o cientista um

ignorante especializado, e o cidadão comum um ignorante generalizado.

Na seção “ Reflexões sobre o discurso do marketing na sociedade pós-moderna da

comunicação” incluo as conversas com alunos e ex-alunos de graduação e pós-graduação que

relataram suas experiências a respeito de práticas indesejáveis ou questionáveis de marketing

e observadas nas empresas em que trabalhavam ou trabalharam, estagiavam ou estagiaram.

Além dessas, acrescento as informações de conversas que surgiram nas ruas, nas festas, nos

aniversários, nos bares, enfim em todos os encontros onde foi possível trocar idéias e obter

informações, histórias, hábitos sobre consumo e sobre marketing.

As conversas do cotidiano têm a informalidade como principal vantagem. Como

descreve Menegon (2000), a informalidade das conversas permite que um profissional utilize

repertórios interpretativos (termos, descrições, lugares-comuns e figuras de linguagem) que

não utilizaria numa situação de trabalho, ou vice-versa. Nesse sentido, não utilizei um padrão

para a obtenção das informações ou início das conversas. Por outro lado, a maior dificuldade

desse procedimento é que muitas das práticas discursivas surgem de maneira inesperada e são

difíceis de ser registradas. Utilizar as “ conversas do cotidiano como fonte de informação


39

significa estar sempre em campo durante todo o tempo da pesquisa” (MENEGON, 2000, p.

226). Em muitas situações inesperadas surgiam assuntos relacionados com o meu estudo,

assim muitas informações acabavam sendo perdidas pela dificuldade de registro. A grande

maioria dos registros foi feita de memória ou por escrito no momento do relato. É verdade

que, quando havia alguma proximidade com o “ entrevistado” , solicitava que o mesmo me

relatasse novamente aquilo que havia falado, para que eu pudesse registrar a informação por

completo. Poucas conversas foram gravadas. Isso ocorreu não apenas pelo momento em que

as conversas surgiam, mas também pelo constrangimento de gravar algo que surgia de forma

natural, despretensiosa e, às vezes, confidencial. Quando do registro das conversas gravadas

pude adotar a análise do fluxo da conversa em si, mediante as análises dos seguintes

elementos da conversação: silêncios, suspiros e diferentes tonalidades dadas às expressões.

A partir dos registros das conversas passei a fazer inferências, baseadas em meu

conhecimento em marketing, para estabelecer inter-relações entre os repertórios

interpretativos com o discurso do marketing. Posteriormente, dentre as inúmeras conversas

que mantive durante o período de realização do trabalho, decidi por escolher algumas, para

apresentar no ensaio, pois, como refere Misoczky (2002), a existência de uma autoria implica

a realização de escolhas sobre o que incluir e o que excluir, sobre formas, palavras, tons e

omissões de nomes ou fontes. Logo após, realizei as interpretações, reflexões ou comentários

pertinentes. Finalmente, adaptei as conversas aos argumentos das seções correspondentes.

2EVHUYDomR

A observação consiste no registro de comportamentos, fatos e ações relacionados

com pessoas, objetos e eventos, sem que exista a resposta dos participantes (MALHOTRA,

2001). Esse procedimento foi incorporado ao estudo como forma de ilustrar meus argumentos

a respeito do discurso da comunicação de massa. Nesse sentido, registrei comentários,


40

notícias, reportagens, eventos e imagens que caracterizassem discursos persuasivos e retóricos

(BILLIG, 1987; 1991 DSXG BAUER e GASKELL, 2003, p. 250) destinados a reproduzir a

cultura do consumo dominante, manifestados de forma explícita ou implícita na programação

da televisão brasileira e, por fim, relacionados com os interesses do discurso do marketing.

Para isso, utilizei um formulário aberto no qual registrava as informações pertinentes, bem

como o tipo de programa, a data e a emissora de televisão na qual o fato havia sido observado.

De forma atenta, mas fragmentada, assisti programas de jornalismo, de entrevistas,

de esporte, femininos, de auditório, novelas, seriados e propagandas. Decidi por não fazer

escolhas prévias dos programas a serem observados, bem como de turnos e horários. As

observações foram realizadas no período de março de 2002 até janeiro de 2005. Ao mesmo

tempo em que realizava as observações comecei a organizar o material procurando identificar

os contextos teóricos em que cada observação poderia se enquadrar. Também procurava

estabelecer relações entre observações e conversas do cotidiano. Posteriormente, fiz a seleção

das observações (bem como dos trechos e formas de apresentação), realizei as interpretações,

reflexões ou comentários que julguei pertinentes para ilustrar os argumentos na seção

“ Reflexões sobre o discurso do marketing na sociedade pós-moderna da comunicação” .

5HDQiOLVHGHPDWHULDOSUHYLDPHQWHFROHWDGR

Conforme descrevem Äkerström; Jacobsson e Wästerfors (2004), nós fomos

ensinados a trabalhar na seguinte ordem: ir a campo, coletar dados, analisá-los e escrever

coisas sobre eles. Os autores argumentam que o ato de escrever a respeito dos dados é visto

como um fim da produção de uma pesquisa, é uma declaração final (em forma de um relatório

específico, artigo ou livro), porém é significante a exploração analítica contínua. Äkerström e

seus colegas defendem, ao invés de descartarmos o material anteriormente coletado e que já

teve algo escrito, que se deva re-visitar e re-analisar dados coletados. Nesse sentido, decidi
41

fazer uma UHDQiOLVH GH XP HVWXGR UHDOL]DGR MXQWR DR VHJPHQWR DGROHVFHQWH e que foi

idealizado por mim e produzido em parceria com Cassiano Paes da Silva, pois entendi que as

informações por nós obtidas eram significativas para ilustrar os argumentos das seções “ O

consumidor vulnerável na sociedade pós-moderna de dados” e “ Marketing como função da

construção da insatisfação” .

Além disso, as razões que motivaram a realizar esta pesquisa têm profunda relação

com as idéias que estão nesta tese. O primeiro motivo diz respeito ao fato de que os jovens

movimentam no Brasil bilhões de dólares anuais com despesas pessoais “ o que os faz

merecedores de uma avalanche de pesquisas de produtos, de propaganda, de ponto de venda,

de todas as atividades mercadológicas voltadas para este segmento. [...] [além do que] os

jovens brasileiros seguem o lema: ‘Consumo, logo existo’ ” (GADE, 1998, p. 190). O que é

algo muito preocupante e passível de investigação. O segundo motivo, e intimamente

relacionado ao primeiro, é que a natural dependência econômica dos adolescentes faz com

que a vida de suas famílias seja afetada pelo seu consumo. O terceiro motivo é porque os

adolescentes são tidos como pouco idealistas, muito individualistas, críticos e bem informados

(GADE, 1998); e, em contrapartida, o senso comum atribui a eles o novo, a mudança e a

esperança de construir um futuro diferente. Sendo assim, nada melhor do que uma

investigação para analisar de que forma eles encaram o marketing e o consumo. Além desses

motivos, idealizei o estudo em consonância com a posição de Holbroock (1987), que

considera importante estudar o comportamento do consumidor sem qualquer intenção futura

de influenciá-lo; e considerei a proposição de Brown (1995b) sobre a necessidade da pesquisa

do consumidor incluir uma crítica da sociedade.

O HVWXGRpGHFDUiWHUTXDOLWDWLYR, pois, segundo Goldman e McDonald (1987),

[...] a incorporação dos métodos qualitativos à pesquisa do consumidor


responde à necessidade de utilização de metodologias que permitam
42

interações e construções em um tema tão diverso. Esses métodos produzem


dados de maior validade, comparativamente aos dados de levantamentos que
utilizam questionários padronizados, graças à interação flexível entre
pesquisador e pesquisado, favorecendo o surgimento de elementos novos e
não esperados a priori e o entendimento de aspectos ambíguos que não
seriam capturados por instrumentos que padronizam as informações.
(GOLDMAN e McDONALD, 1987 DSXGROSSI e HOR-MEYLL, 2001, p.3)

Conforme Hirschman (1986), é preciso compreender que o ser humano constrói

múltiplas realidades. A autora acredita que a riqueza dos detalhes pode ser mais interessante

do que a amplidão das abstrações que se faz em abordagens metodológicas mais fechadas e,

ao mesmo tempo, entende que o pesquisador e o fenômeno em estudo devem ser mutuamente

interativos.

A coleta das informações transcorreu no período de janeiro de 2003 a julho de 2004,

e mediante a utilização de P~OWLSODVWpFQLFDVGHLQYHVWLJDomR. Como argumenta Vieira M.

(2004) o uso de múltiplos métodos de pesquisa e investigação pode abrir novos horizontes

para a compreensão de um fenômeno. Spink e Menegon (2000) entendem que a combinação

de métodos heterogêneos deve ser usada para o enriquecimento da interpretação, podendo

fornecer resultados contrastantes ou complementares para possibilitar uma visão

caleidoscópica do fenômeno em estudo.

Inicialmente, realizamos HQWUHYLVWDVHPSURIXQGLGDGH com o auxílio de um roteiro

que continha os seguintes tópicos de investigação: relacionamento com família, hábitos

diários, motivações e perspectivas de vida, hábitos de consumo e compra. Repeitando a

importância do grupo em relação ao consumo (COVA, 1997; GIGLIO, 2002), os

questionamentos foram realizados considerando o comportamento de grupo dos adolescentes.

Os temas considerados polêmicos, tabus, embaraçosos foram tratados de forma indireta.

Optamos, preferencialmente, por realizar as entrevistas nas residências dos adolescentes, no

entanto algumas entrevistas foram realizadas em escolas ou ainda em locais públicos, tendo

em vista a disposição ou disponibilidade dos jovens. As entrevistas, após o consentimento dos


43

adolescentes, foram gravadas. O tempo de cada entrevista variou de quarenta até noventa

minutos. Ao mesmo tempo em que as entrevistas eram realizadas, utilizamos a técnica de

REVHUYDomR QDWXUDOVHPLHVWUXWXUDGDHGLVIDUoDGD (MALHOTRA, 2001) como forma de

identificar roupas e acessórios de uso pessoal dos adolescentes, bem como registrar a presença

de marcas e símbolos associados ao consumo. As observações foram anotadas em um

formulário semi-estruturado destinado a registrar as características de objetos e acessórios dos

adolescentes e a atmosfera de sua residência. Após a transcrição das gravações, realizamos a

análise interpretativa das informações (HIRSCHMAN, 1986) de ambos os procedimentos

procurando preservar o discurso dos adolescentes (suas palavras, expressões e comunicações

não-verbais). Essa etapa serviu para solidificar os procedimentos das demais etapas.

Posteriormente, utilizamos as WpFQLFDVSURMHWLYDVGHDVVRFLDomRHGHFRPSOHPHQWR

(MALHOTRA, 2001) para revelar aspectos ocultos do comportamento dos adolescentes e

relacionados ao conhecimento e envolvimento com determinadas marcas, bens e serviços.

Nesse sentido, solicitávamos, mediante a utilização de um instrumento estruturado, que os

adolescentes informassem as três primeiras palavras que lhe vinham à mente quando

pensavam: em roupas das marcas Gang, Nike, Hang Loose, Oakley, Billabong, Blue Steal; em

tênis das marcas Nike, Rainha, Drop Dead, Reef. Por outro lado, pedíamos para que os

adolescentes dissessem qual a associação achavam que seus amigos fariam das lojas Renner,

Quebra-mar, Pompéia e San Marino. Cabe considerar, que as três últimas lojas são empresas

regionais do sul do Rio Grande do Sul e, respectivamente, vendem: roupas e acessórios de

surf; roupas e calçados “ populares” para a família; roupas para jovens a preços baixos. Por

fim, pedíamos para que os adolescentes complementassem o significado de celular; de curso

de línguas; de moto; de computador; e de festas noturnas. A análise e a interpretação das

informações obtidas nessa fase serviram para que percebêssemos envolvimentos,

desconhecimentos, rejeições e sonhos de consumo associados a cada item investigado.


44

Tendo cumprido essas etapas, realizamos novas HQWUHYLVWDVHPSURIXQGLGDGH com

os adolescentes, no sentido de identificar o preparo e conhecimento dos mesmos frente às

estratégias de marketing adotadas pelas empresas. Novamente, adotamos um roteiro que

continha os seguintes tópicos iniciais de questionamento: conhecimentos sobre estratégias de

produto, preço, marca, promoção. Essas entrevistas foram realizadas em um tempo médio de

quarenta minutos, sendo que com alguns adolescentes de menor poder aquisitivo a duração

das entrevistas não foi maior do que vinte minutos. Paralelamente, utilizamos IRWRJUDILDV

para registrar situações, imagens e fatos a respeito da vida, dos símbolos e dos objetos de

consumo dos adolescentes. Solicitamos a permissão dos adolescentes para tirar fotografias de

seus quartos e, posteriormente, pedimos que apontassem objetos que mais gostavam ou que

consideravam significativos. A fotografia de acordo com Guran (2000) é um instrumento que

pode servir para a ilustração da conclusão de uma reflexão, já que é prova de um fato, um

excelente complemento do diário de campo, a extensão do olhar e uma opção possível para a

substituição da pergunta. Como menciona Cavedon (2001), inúmeras imagens que ocupam a

mente do pesquisador quando registradas, através de fotos, parecem mais eloqüentes do que

as palavras. Além desses aspectos a fotografia propiciou a leitura crítica das imagens de parte

do cotidiano dos adolescentes e o registro da diversidade, da desigualdade e de contrastes.

Apresento nesta tese as fotos que revelam a relação dos jovens com o consumo e seu contexto

sócio-econômico.

Concomitantemente à realização dos procedimentos anteriormente descritos,

empregamos a prática de FRQYHUVDV GR FRWLGLDQR (MENEGON, 2000) junto a parentes,

amigos ou pessoas que conheciam os adolescentes, no sentido de complementar e confrontar

informações colhidas dos mesmos.

Os seguintes parâmetros guiaram a escolha dos adolescentes que participaram do

estudo: pertencentes a grupos sócio-econômicos distintos, incluindo aqueles que estavam à


45

margem do consumo; residentes em diferentes bairros da cidade do Rio Grande, idades entre

14 e 16 anos e do sexo masculino – como forma de facilitar a obtenção dos dados, já que a

natureza da investigação implicava em certa intimidade, fato que poderia inviabilizar a

obtenção de dados, frente aos recursos humanos disponíveis (todos homens), caso fossem

incluídas adolescentes do sexo feminino. A decisão sobre o número de entrevistas que

deveriam ser realizadas foi norteada pela recomendação de que a quantidade final de

entrevistas em profundidade deva cessar no momento em que mais entrevistas não

melhorarem necessariamente a qualidade ou a compreensão mais detalhada sobre o tema

(BAUER e GASKELL, 2003). Ao todo, participaram do estudo 15 adolescentes. Desse total,

cinco adolescentes não participaram da etapa de fotos, por negação ou constrangimento em ter

suas casas e/ou objetos expostos.

$5*80(1726),1$,6'$6,'e,$6

Como argumenta Feyerabend (1989), importantes descobertas científicas poderiam

não ter ocorrido se os pesquisadores tivessem seguido o “ método científico” que vigorava em

sua época, pois a validade de um método está nos resultados que é capaz de produzir. Daudi

(1986) lembra que a necessidade de questionamento dos métodos tradicionais de pesquisa

parece ser um consenso crescente, muito embora haja resistência das correntes dominantes.

Becker (1999), por sua vez, defende que os sociólogos

[...] deveriam se sentir livres para inventar os métodos capazes de resolver os


problemas das pesquisas que estão fazendo [...] [pois] toda pesquisa tem o
propósito de resolver um problema específico que, em aspectos importantes,
não é parecido com nenhum outro problema, e deve fazê-lo dentro de um
ambiente específico diferente de todos os que existiram antes. (BECKER,
1999, p. 12-13)
46

Essas posições referendam a maneira pela qual concebi a presente seção de forma a

alcançar o objetivo do estudo. Nas próximas seções apresento meus argumentos e dados

empíricos que ilustram e suportam minha reflexão crítica.


&216758d­2'23(16$0(172(00$5.(7,1*
',6387$6',9(56,'$'(6(&5,6(6

Nesta seção realizo, inicialmente, um pequeno resgate histórico, que começa no

início da era moderna e vai até o final do século XIX, como forma de situar o

desenvolvimento da cultura do consumo, primeiro pela influência do comércio e,

posteriormente, pela revolução industrial. Ao mesmo tempo, apresento as primeiras

manifestações que apontam a existência do marketing como técnica. A seguir, faço uma

retrospectiva das primeiras cinco décadas de existência do marketing como área do

conhecimento, apontando as principais contribuições teóricas dessa época. Na seqüência

apresento uma descrição histórica que envolve o período em que surge o “ moderno conceito

de marketing” na década de 1950 até o final do século XX. Em paralelo a essas apresentações

descrevo acontecimentos históricos, não diretamente ligados à área de marketing, mas que

influenciaram a configuração da cultura do consumo da época e a construção do pensamento

em marketing. Posteriormente, destaco: as discussões em torno da questão marketing: arte ou

ciência?; a fragilidade da concepção “ orientação para marketing” ; o debate sobre a ampliação

do conceito de marketing e as considerações em torno de sua validade; e os sistemas de

maximização de marketing. Logo após, apresento argumentos que descrevem o marketing

como uma função com características pós-modernas. Finalmente, faço o fechamento da seção.

&8/785$'2&216802(20$5.(7,1*5(75263(&7,9$
$7e26e&8/2;;

Como apresentam Vergara e Vieira M. (2003), as noções construídas – objetiva e

subjetivamente, material e imaterialmente, real e virtualmente – de espaço social, cultural e

econômico erguem-se com a evolução temporal do conhecimento e da informação. Os


48

espaços são indissociáveis do tempo e criados em um processo de alimentação recíproca, a

qual se faz tanto individual quanto coletivamente. Historiadores da área de marketing

entendem que somente olhando para trás é que nós poderemos ver à frente (SAVITT, 1989),

uma vez que o futuro do pensamento em marketing está em recapturar seu passado

(HOLLINGER, 1993), além do que o momento pós-moderno é propício para uma retro-

orientação (BROWN, 2002; 2001, 1997a). Por outro lado, entendo que um resgate histórico

sobre os acontecimentos que marcam o surgimento da cultura do consumo pode ser

importante para a melhor compreensão do surgimento do marketing. A cultura do consumo e

o marketing são frutos da era moderna e, muito embora tenham surgido em momentos

distintos, possuem íntima relação, e ambos são motivo de estudo na atualidade. Segundo

Slater (2002, p. 12), “ A cultura do consumo talvez seja menos um campo [...] e mais uma

miscelânea de disciplinas, metodologias e políticas inter-relacionadas. [...] [onde a questão]

permanente subjacente a todas elas é a natureza do “ social” . Minha narrativa sobre o

surgimento da cultura do consumo, basicamente alicerçada no trabalho de Slater (2002), não

se detém em detalhes, pois o intuito é de apenas evidenciar alguns fatos marcantes de uma

época bastante distante da civilização humana.

Em uma concepção moderna, o consumo pode ser definido como a criação, a compra

e o uso de produtos e serviços (McCRACKEN, 1986), podendo ser classificado em três

grupos: bens e serviços básicos (alimentação, vestuário e moradia; saúde, educação,

transporte público, diversão popular); bens e serviços correspondentes a um padrão

intermediário de bem-estar (eletrodomésticos, automóveis); e os bens e serviços conspícuos

(automóveis de luxo, alimentos requintados, turismo externo, vestuário sofisticado) (SODRÉ,

1984). Em uma concepção pós-moderna o consumo pode ser entendido a partir de dois pilares

principais: primeiro como um processo de significação e de comunicação; e segundo como


49

um elemento de classificação e diferenciação social (BAUDRILLARD, 1995). Como explica

Slater (2002):

O consumo é sempre e em todo lugar um processo cultural, mas “ cultura do


consumo” é singular e específica: é o modo dominante de reprodução
cultural desenvolvido no Ocidente durante a modernidade [...] crucial,
certamente, para a prática significativa da vida cotidiana no mundo moderno;
e, num sentido mais genérico, está ligada a valores, práticas e instituições
fundamentais que definem a modernidade ocidental, como a opção, o
individualismo e as relações de mercado. [...] A cultura do consumo não foi
o único modo de reprodução cultural operante nos últimos trezentos anos,
nem é o único que existe agora. [...] não é a única maneira de realizar o
consumo e reproduzir a vida cotidiana; mas é, com certeza, o modo
dominante [...]. (SLATER, 2002, p. 16).

Com base nos estudos de vários autores, Slater (2002) descreve que até o século

XVIII a palavra consumo significava desperdício, esgotamento, consumição, esbanjamento,

gasto (sem ganho), uma perda (e não uma reprodução ou expansão) para os fluxos

econômicos, morais e políticos de valor. O consumo excessivo por parte das camadas

inferiores era rotulado de luxúria e considerado mais um problema de “ ordem cósmica”

(pecado contra a hierarquia natural) que de estabilidade econômica, embora o consumo

extravagante da elite pudesse representar poder. A demanda era entendida como algo que está

dentro da economia, um aspecto chave dentro de um circuito de recursos materiais à medida

em que flui através de um corpo político. A riqueza do país era identificada pela quantidade

de ouro guardado pelo monarca, já o consumo de mercadorias importadas tenderia a esgotar

essa riqueza.

Alguns autores vêem a modernidade e o capitalismo como conseqüências da

Revolução Industrial; sendo assim, a produção seria o motor e a essência da modernização e a

cultura do consumo uma conseqüência da industrialização. Outros autores contestam essa

posição, chamada de “ tendência produtivista” , e afirmam que houve uma Revolução do

Consumidor, que antecedeu a Revolução Industrial ou foi pelo menos um fator fundamental

para o começo da modernização ocidental. Se não fosse assim, a industrialização


50

provavelmente não teria prosseguido numa base capitalista sem a existência anterior de uma

demanda efetiva para sua produção. Para quem seriam vendidas as mercadorias resultantes

das invenções racionais e científicas? Em contrapartida, os defensores de uma visão

econométrica entendem que simplesmente as pessoas já desejavam mais coisas, por

acreditarem na existência de uma demanda insaciável. Slater (2002), tendo o suporte dos

trabalhos de historiadores que revisaram a “ tendência produtivista” , faz uma descrição dos

processos ocorridos a partir do século XVI, período que marca a primeira fase da era

moderna, e que podem ser divididos de acordo com três características principais: o

surgimento de um novo “ mundo de mercadorias” que penetravam no cotidiano de mais

classes sociais; o desenvolvimento e a disseminação da “ cultura do consumo” , motivada pela

moda e o gosto como elementos-chave do consumo; e o desenvolvimento de infra-estruturas,

organizações e práticas que tinham como alvo esses novos tipos de mercados, o surgimento

do varejo, da publicidade e do marketing. Nesse século começa uma reorganização da

produção, do comércio e do consumo. Conforme Sekora (1977 DSXG SLATER, 2002, p. 30),

ao final do século XVI, surge um dilema na sociedade entre “ o problema ou o potencial de

uma sociedade em que os indivíduos podem se fazer de acordo com seus próprios desígnios

ao comprar mercadorias” .

Na Europa do século XVII, como resposta à mercantilização, surgiram políticas de

governo e iniciativas de empresários para promover a substituição de importações, mediante o

estímulo de novos empreendimentos domésticos voltados para a produção de bens de

consumo (como meias, botões, alfinetes1 e pregos, sal, farinha, sabão, facas, ferramentas,

cachimbos, potes, fornos, fitas, rendas, roupa de cama e mesa, e aguardente). A volumosa

força de trabalho, apesar de não ter acumulado riqueza nesse período, ao mesmo tempo em

que era produtora também era consumidora sendo, provavelmente, os primeiros consumidores
51

modernos, em oposição aos consumidores de elite (THIRSK, 1978 DSXG SLATER, 2002).

Esses novos projetos de empreendimento tinham considerável inovação técnica e

organizacional “ [...] e lançaram as bases da industrialização [...], mas não como fruto da

ciência e da engenharia, nem de um grande investimento de capital [...], nem eram voltados

para o consumidor [...] surgiram e inovaram, como parte de uma política e de uma prática de

oportunismo comercial, de uma orientação para o FRPpUFLR” (SLATER, 2002, p. 29). Além

de mercadorias, o lazer (teatros, bailes, esportes, jardins) era transformando em eventos

comerciais, mediante a compra de entrada ou fazendo uma assinatura; mas o lazer também era

transformado em mercadoria (brinquedos para criança, romances e partituras para o público

feminino)” . Cabe considerar que o comércio, desde suas origens no século XVI até o século

XVII, tem dois sentidos: o sentido econômico ligado ao tráfico (intercâmbio) entre indivíduos

durante a compra e venda de mercadorias e, também, relacionado ao processo como um todo

do sistema de troca de coisas; e o sentido geral de intercâmbio social entre as pessoas, de

conversa e troca de idéias, comunicação e etc. (SLATER, 2002).

Esse período marca, também, o surgimento da moda, e essa, destinada a um público

consumidor ampliado. A moda passa a ser equiparada à competição por status, imitação e

consumo conspícuo. Os novos padrões do consumo são associados à crença de que a riqueza

adicional obtida pelas pessoas mais ricas de uma sociedade trará um efeito econômico

positivo na vida de todos. Conforme Campbell (2001), o aparecimento da moda é um feito

significativo na comercialização do consumo, pois

[...] a manipulação da procura só foi realmente possível por meio do controle


da moda ou, se isso é uma pretensão demasiadamente grande, através de sua
cuidadosa exploração, como o fez Josiah Wedgwood, com tanto sucesso. Na
verdade, a própria manipulação da emulação social só foi possível mediante
o veículo da moda, não havendo outro mecanismo disponível pelo qual os
fabricantes pudessem, tão diretamente, afetar os desejos ambiciosos ou

1
A fabricação de alfinetes foi estudada por Adam Smith e considerada modelo de eficiência da
técnica de divisão de trabalho.
52

invejosos dos consumidores. O aparecimento do modelo da moda moderna


é, assim, o ingrediente crucial em qualquer explicação dos motivos pelos
quais quer a emulação por parte dos consumidores, quer a manipulação da
parte dos produtores devem ter começado a tomar essas formas novas e
dinâmicas no século XVIII. (CAMPBELL, 2001, p. 38).

A terceira característica da Revolução do Consumidor diz respeito às novas formas

de empresas e de organização comercial, o surgimento precoce do marketing e do varejo

voltado para o consumidor. O trabalho de McKendrick HW DO (1983, DSXG SLATER, 2002)

revela que Josiah Wedgwood produzia cerâmicas baseado na imitação de peças antigas (tendo

em vista o interesse do público por arqueologia e cultura clássica), procurava o aval de seu

trabalho em famílias aristocráticas e na família real, fazia sua divulgação levando peças para

as casas de “ líderes do bom gosto” entre a nobreza e abria lojas em pontos estratégicos com a

finalidade de tornar seus produtos um espetáculo de moda.

Cabe ressaltar que, segundo os registros de historiadores de marketing, o

aparecimento deste somente se dá como área do conhecimento, no inicio do século XX, nos

Estados Unidos. Bartels (1978), por exemplo, chega até a questionar: o marketing sempre

existiu? “ Um exame histórico do comércio leva à conclusão de que o marketing sempre

pudesse ter existido. Mais de seis mil anos de história escrita mostram como as raízes, tanto

da civilização ocidental como da oriental, incluíram diversas formas de comércio. Entretanto,

esta não parece uma evidência definitiva de que o marketing sempre houvesse existido”

(BARTELS, 1978, p. 16). Posição semelhante tem Fullerton (1988) que denomina esse

período de antecedentes (1500-1750).

Slater (2002, p. 29) reconhece as limitações nos trabalhos de autores que consideram

a Revolução do Consumidor precedente à Revolução Industrial e propõe uma posição

alternativa de que ambas são decorrentes de uma revolução comercial, “ onde os conceitos de

troca, dinheiro, novos instrumentos financeiros e propriedade de bens móveis, contratos e


53

orientação para a exploração comercial de mercados cada vez maiores e mais impessoais

geraram um vasto leque de novas idéias e atividades chamadas modernas” . Dessa forma:

É a negociação e o comércio (e não a produção ou o consumo) que começam


a tomar vulto no início da era moderna. Foram reconhecidos muito cedo
como catalisadores, para o bem e para o mal, da transição da sociedade
agrária tradicional para a sociedade moderna. Além disso, é o comércio que
fornece muitas das novas imagens e conceitos por meio dos quais aquela
sociedade é compreendida e por meio dos quais o consumo é reconhecido e
reavaliado de maneira que trazem a marca do que hoje chamamos de cultura
do consumo: noções de economia e governo, a idéia de sociedade civil e da
própria sociedade, imagens da individualidade, de interesse individual, da
razão e desejo, dos novos conceitos de VWDWXV e cultura. (SLATER, 2002, p.
29).

É no século XVIII que a cultura do consumo se manifesta de forma reconhecível no

ocidente e diferenciada do resto do mundo, como uma cultura moderna, progressista, livre,

racional, pois são muitas as evidências de algum tipo de revolução do consumo tendo em vista

o mundo abundante de novas mercadorias derivadas dos descobrimentos e da exploração

colonial (café, tabaco, roupas e corantes importados, batata, tomate, frutas).

Não é possível desconsiderar que o movimento iluminista surgido no século XVIII,

que tinha como objetivo a difusão da razão como meio de dirigir o progresso da vida em todos

os aspectos, influenciou fortemente o pensamento moderno. O iluminismo baniu a tradição e a

fé, valorizou a racionalidade e apostou na autonomia do sujeito. Ao mesmo tempo, os ideais

da Revolução Francesa (1789) – “ Liberdade, Igualdade e Fraternidade” – foram influenciados

pelo pensamento iluminista. A Revolução Francesa marcou a chegada da segunda fase da

modernidade (BERMAN, 1987).

Na medida em que “ o moderno” se estabelece com base em uma visão de


mundo vivenciada por um agente social que é supostamente livre e racional
enquanto indivíduo, dentro de um mundo que não é mais governado pela
tradição, e sim pela abundância, um mundo produzido pela organização
racional e pelo saber científico, a figura do consumidor e a experiência do
consumismo são ao mesmo tempo típicas do novo mundo e parte integrante
de sua construção.
[Além disso], os conceitos modernos de individualismo, baseados nas
práticas modernas da troca no mercado, varreram a possibilidade, bem como
a conveniência de uma ordem de VWDWXV fixa. A passagem “ do VWDWXV para o
54

contrato” torna a mobilidade social uma questão de princípio: mobilidade


para cima ou para baixo, pois agora o VWDWXV é uma conquista do momento
(sempre há dinheiro novo e mais dinâmico ameaçando você de baixo), e não
um atributo pertencente a uma herança da ordem cósmica. (SLATER, 2002,
p. 18-37).

O comércio configurava-se na oportunidade de o homem exercer sua liberdade

individual pela negociação de bens e troca de idéias, determinando uma nova “ sociedade

civil” (termo que veio posteriormente a ser substituído pela idéia de “ cultura do consumo” ). É

através do comércio que o consumo começa a ser redefinido ao final do século XVIII,

passando a palavra consumo a designar uma parte natural dos fluxos econômicos e a venda de

mercadorias, como sendo necessárias e importantes (SLATER, 2002).

O século XVIII é palco de acontecimentos importantes para a idéia de consumo. Na

Grã-Bretanha, entre 1760 e 1860, acontece a primeira Revolução Industrial que alterou

profundamente a economia e a sociedade inglesa. Mudanças significativas foram obtidas na

natureza da produção, graças à aplicação de conhecimento científico e prático no processo,

que resultaram em maior produtividade e eficiência na produção de bens (STORCK, 1983). O

uso de ferramentas e maquinário passou a ser intensivo e permitiu que novos bens fossem

mais bem produzidos. Grandes empreendimentos passaram a ficar situados dentro de áreas

limitadas e urbanizadas, surgiram também novas classes vocacionais e sociais (dentre essas os

capitalistas). Londres passou a ser o centro de uma rede de comércio mundial associado a

produtos industrializados. As exportações propiciaram poder aquisitivo aos produtores

britânicos para importar matérias-primas destinadas à produção industrial, e a experiência dos

comerciantes com o comércio de exportação impulsionaram o comércio doméstico

(ENCARTA ENCYCLOPEDIA, 1997).

De acordo com Santos (2000a) a modernidade ocidental e o capitalismo são dois

processos diferentes e autônomos que tiveram sua dinâmica de desenvolvimento

separadamente e relativamente autônomas, mas que convergiram e se cruzaram. Fromm


55

(1976) menciona que desde o início da era industrial a grande promessa de progresso

ilimitado manteve a fé e as esperanças de várias gerações de que era possível o caminho da

produção e do consumo ilimitados.

Em meio ao desenvolvimento do sistema capitalista, Marx e Engels, em 1848,

apresentam uma veemente contestação a esse sistema com o “ Manifesto Comunista” . O

manifesto profetizava que através da força e conscientização dos trabalhadores, haveria a

derrota da burguesia, a abolição da propriedade privada e término da exploração capitalista.

A burguesia não pode existir sem revolucionar constantemente os


instrumentos de produção, portanto as relações de produção e, por
conseguinte, todas as relações sociais. A conservação inalterada dos antigos
modos de produção era a primeira condição de existência de todas as classes
industriais anteriores. A transformação contínua da produção, o abalo
incessante de todo o sistema social, a insegurança e o movimento
permanentes distinguem a época burguesa de todas as demais. As relações
rígidas e enferrujadas, com suas representações e concepções tradicionais,
são dissolvidas, e as mais recentes tornam-se antiquadas antes que se
consolidem. Tudo o que era sólido desmancha no ar, tudo que era sagrado é
profanado, e as pessoas são finalmente forçadas a encarar com serenidade
sua posição social e suas relações recíprocas.
A necessidade de mercados sempre crescentes para seus produtos impele a
burguesia a conquistar todo o globo terrestre. Ela precisa estabelecer-se,
explorar e criar vínculos em todos os lugares. (MARX e ENGELS, 1848).

No início do século XIX a cultura do consumo existia como um problema para os

críticos sociais, uma ideologia para a população e uma realidade para a burguesia. Esse século

marca a expansão da industrialização para países como França, Bélgica, Alemanha e Estados

Unidos. As transformações econômicas e sociais da Revolução Industrial norte-americana

(1860-1870) são especialmente significativas para as histórias da cultura do consumo e do

marketing. Weber (1983) demonstra que o “ espírito do capitalismo” tem relação com a “ ética

protestante” , cujos valores propiciam a acumulação da riqueza. Nesse sentido, o capitalismo

surge como um fenômeno cultural. Para Weber, os capitalistas de outras épocas também

procuravam o lucro, mas eram aventureiros e desenvolviam atividades de caráter irracional e

especulativo. Foram determinadas atitudes da religião protestante, somadas a outros fatores


56

(como a ciência), que impulsionaram o desenvolvimento de uma busca racional para a

acumulação econômica.

Por outro lado, Campbell (2001) atribui ao movimento romântico papel fundamental

ao facilitar o desenvolvimento da Revolução Industrial e, mais do que isso, ao despertar o

consumismo e o caráter da economia moderna. O autor desafia a concepção defendida por

outros cientistas sociais de que foram os anunciantes que escolheram fazer uso do material

“ romântico” nas propagandas para estimular o consumo. Foi o romantismo que sob o impacto

de uma sociedade materialista, promoveu idéias de autenticidade pessoal como resultado do

emocional, do irracional, do sensual, da imaginação e do natural, fazendo com que a cultura

do consumo se tornasse extremamente lúdica e séria. Tal situação ocorreu mesmo que, desde

a metade do século XVIII até meados do século XIX, o romantismo e seu conceito de cultura

apresentassem reações contra a sociedade industrial e comercial, no sentido de terem tornado

a modernidade materialista, carente de valores e verdades coletivas e autênticas.

Ao final do século XIX, a industrialização chega a países como Suécia e Japão.

Quanto à cultura do consumo, Slater (2002) diz que nesse período essa tomou duas direções

contraditórias, mas interligadas: de um lado, a cultura do consumo parece surgir da produção

do espetáculo público e, de outro, o consumismo aparece ligado à construção da

domesticidade privada burguesa. O autor lembra, ainda, que até o início do século XX, na

história econômica a modernização aparece como um processo de poupança, investimento e

acumulação em escala social, apoiado numa ética puritana voltada para o trabalho e no

adiamento da gratificação do consumo, de um plano de poupança para a família nacional. No

entanto, como Slater (2002, p. 176) registra, Marx já afirmava que “ todo capitalista exige de

fato que seus operários poupem, mas somente seu próprio dinheiro, porque os vê como

operários, mas de forma alguma o resto do mundo dos operários, pois, estes, ele os vê como

consumidores” .
57

Na subseção posterior passo a descrever os acontecimentos e as profundas

transformações que ocorreram no século XX e marcam a terceira fase da modernidade

(BERMAN, 1987). É nesta época que surge o marketing como área do conhecimento e a

cultura do consumo se consolida com o aparecimento do mercado de massas.

805(/$72'$(92/8d­2'20$5.(7,1*'85$17(2
6e&8/2;;

A cultura do consumo do início do século XX é convencionalmente descrita como o

consumo em massa, em contrapartida da produção em massa. Esse século, em especial, foi

palco do surgimento e desenvolvimento tecnológicos no campo da comunicação que passaram

a disseminar informações e padrões de comportamento, encurtaram distâncias entre pessoas e

invadiram países e lares (HARVEY, 1992). Slater (2002), baseado no trabalho de Michel

Aglietta, aponta a importância do consumo de massa para o sistema capitalista:

[...] o consumo em massa mata dois coelhos capitalistas com uma só


cajadada, a do padrão de vida ascendente - em primeiro lugar, assegura os
mercados necessários à absorção da produção em massa; em segundo,
assegura a paz industrial e política. A cultura do consumo é um “ suborno”
no sentido de que aos operários (de qualquer forma, operários qualificados e
organizados) é oferecida liberdade e abundância relativa na esfera do
consumo em troca de aceitarem a racionalização intensiva, a alienação e a
total falta de controle sobre sua vida profissional, e também de aceitarem
politicamente um sistema “ democrático” que administra, mas não questiona
radicalmente o capitalismo. (SLATER, 2002, p. 183).

É a partir do século XX que a América Latina, “ inventada” pela Europa e dependente

dessa em séculos anteriores, torna-se mais dependente dos Estados Unidos, no que diz

respeito aos “ mercados agrícolas industriais e financeiros, na produção, circulação e consumo

de tecnologia e cultura, e nos movimentos populacionais – turistas, migrantes, exilados – que

alteram estruturalmente o caráter dessa dependência. [...] através da relação com a Europa,

nós latino-americanos, aprendemos a ser cidadãos, enquanto os vínculos preferenciais com os

Estados Unidos nos reduziram a consumidores” (CANCLINI, 1999, p. 12-13).


58

Com relação ao marketing, como descreve Bartels (1978), muito embora tenha

havido antecedentes, pois a prática se vincula aos primórdios da troca e do comércio, é no

início do século XX que esse surge como área de estudo, tendo os Estados Unidos como terra

natal, onde os progressos da industrialização haviam consolidado a economia de mercado e

determinado fortes mudanças na estrutura econômica e social e, também, uma nova atitude

nos negócios. O autor enumera diversas circunstâncias que motivaram o surgimento do

marketing: aumento da produção industrial, aumento da população, da educação, dos

ingressos pessoais; criação de novos produtos, em função das invenções; o fato de os valores

sociais darem maior importância para o êxito financeiro; mercados novos e cada vez mais

amplos; maior atenção ao mercado, às suas instituições, ao seu papel social e mudanças nos

costumes daqueles que se dedicavam as suas operações.

É de fundamental importância considerar que essa história e esse desenvolvimento

são contados tendo por base o contexto e a situação norte-americana. Paralelamente à

apresentação desse resgate, introduzo idéias de outros autores, não necessariamente ligados à

área de marketing, no sentido de oferecer uma contribuição crítica a respeito desse contexto.

Quando do surgimento do marketing, de acordo com Bartels (1978), algumas idéias

da teoria econômica clássica que prevaleciam na época se mostravam inadequadas para

explicar o mercado. Entre essas, a idéia de que a demanda se originava na criação de uma

oferta. As compras do consumidor seriam racionais e feitas de forma a maximizar a

“ utilidade” na aquisição e obter o maior retorno possível, tendo em vista seus recursos

limitados. Porém, aqueles que começaram a desenvolver a área de marketing consideravam

que a demanda consistia em algo mais que o simples poder de compra, pois poderia refletir

um desejo e, assim, ser aumentada e moldada, tendo em vista as indicações das novas

experiências com propaganda e vendas. Outro conceito vigente na época era de que o

mercado possuía a capacidade para ajustar-se automaticamente a um equilíbrio harmonioso,


59

ou seja, uma tendência de equilíbrio motivada pelos próprios interesses do mercado, o que

Adam Smith denominou de “ mão invisível” . Entretanto, aqueles que iniciaram o marketing

sentiam a necessidade de melhores explicações em curto prazo para a conduta do mercado.

Uma terceira idéia de mercado da época era a de o custo ser o principal fator determinante do

preço. Porém, havia quem entendesse que além dos fatores de produção, existiam outros

fatores de mercado que poderiam explicar a formação dos preços. Bartels (1978) também

relata que o significado de valor era um outro campo do pensamento econômico que afetou os

primeiros estudos sobre marketing. Os economistas entendiam que o valor era uma

característica da riqueza, e essa consistia em bens vendáveis, tangíveis, materiais. Os serviços

não eram riquezas, por isso aqueles serviços que não alteravam o produto físico não poderiam

criar valor.

Os aumentos da produção e a melhoria nos transportes possibilitavam o atendimento

de mercados cada vez maiores e distantes. O desafio era a distribuição dos produtos que

estavam sendo produzidos (BARTELS, 1978). No início do marketing prevaleciam os

interesses acadêmicos (BARTELS, 1967), pois a economia clássica não oferecia respostas

condizentes com o fenômeno de mercado de massa e ao estudo da distribuição (DAWSON,

1979). De acordo com Kotler (1972), nesse estágio da evolução o marketing é um ramo

dependente da economia voltado para o estudo da distribuição. Tanto é assim, que o primeiro

curso de marketing tinha como título “ 'LVWULEXWLYH,QGXVWULHV” e foi ministrado na University

of Michigan, em 1902. O termo marketing surgiu em 1905, em uma disciplina chamada “ 7KH

0DUNHWLQJRI3URGXFWV” , na University of Pensylvania(BARTELS, 1978).

Na concepção de Bartels (1978), durante as primeiras cinco décadas de existência do

marketing, o pensamento relativo ao assunto passou pelas seguintes etapas: período do

descobrimento (1900-1910); período da conceitualização (1910-1920); período da integração

(1920-1930); período do desenvolvimento (1930-1940); período da reflexão (1940-1950); e


60

período de reconceitualização (1950). Na seqüência da minha exposição, apresento as idéias

principais e contribuições que fizeram parte dessas primeiras décadas da disciplina, bem como

o registro de alguns acontecimentos históricos que foram importantes para o desenvolvimento

do marketing e do consumo na sociedade. Faço o resgate dessa narrativa ancorado pelo estudo

de Bartels (1978).

$VSULPHLUDVGpFDGDVGRPDUNHWLQJ

A primeira década do marketing é considerada por Bartels (1978) como SHUtRGRGR

GHVFREULPHQWR   Como já evidenciado em parágrafo anterior, essa foi marcada

pela realização de cursos e, também, pela produção de vários textos que tratavam de temas

como os seguintes: métodos para marketing de produtos, sobretudo agrícolas; vendas e

publicidade (BARTELS, 1978). Nessa época a intenção dos autores da área era comprovar a

existência da área e conduzí-la às recentes abordagens científicas. Os conceitos de outras

disciplinas (Economia, Psicologia, Sociologia, Administração Cientifica) eram aproveitados

para melhorar a prática e a administração comercial. As áreas de produção e finanças já

estavam mais consolidadas, e os autores de marketing procuravam uma equiparação. A

literatura sobre propaganda, depois de 1903, aumentou rapidamente; tais trabalhos tinham a

intenção de aumentar a compra através da promoção (BARTELS, 1978).

O SHUtRGR GD FRQFHLWXDOL]DomR   foi quando muitos dos conceitos

básicos de marketing se cristalizaram. Essa década resultou em ganhos importantes na

economia, negócios e cultura, principalmente dos Estados Unidos. Com o crescimento

industrial houve a necessidade crescente de novos distribuidores de atacado e varejo. O

crescimento das empresas desorganizou os canais tradicionais de distribuição. Surgiram novas

obras sobre varejo, propaganda, vendas, administração de vendas, crédito e cobrança. Como

relata Bartels (1978), os novos e especializados produtos constituíam um desfio para a


61

propaganda e para a arte de vendas. A venda pessoal e a propaganda eram simplesmente a

expressão final das idéias de Ralph Butler, gerente de vendas de uma grande empresa, que

tratou de considerar as inúmeras questões que um fabricante deveria fazer antes de introduzir

um produto no mercado, como por exemplo, enviar um agente ou colocar um anúncio em

alguma publicação (BARTELS, 1978).

Nessa fase aparecem as primeiras generalizações sobre os processos de marketing,

como as questões relativas à distribuição, funções e responsabilidades dos intermediários,

importância da diferenciação de produtos, da fixação de marcas, da fixação de preços e a

indicação da função de marketing para todos os negócios. Além desses, três enfoques de

análise de marketing se formaram: o de FRPPRGLWLHV (destinado ao estudo de um produto ou

grupo de produtos); o funcional (destinado ao estudo das funções ou atividades de marketing)

e o institucional (destinado ao estudo das instituições de atacado e varejo) (BARTELS, 1978).

Segundo Slater (2002) a produção em massa e a participação em massa no consumo

assinalam o verdadeiro nascimento da cultura do consumo, e a década de 1920 foi

provavelmente a primeira a proclamar uma ideologia generalizada de riqueza, uma ligação

fortíssima entre o consumo cotidiano e a modernização. Esse SHUtRGRGDLQWHJUDomR 

 na interpretação de Bartels (1978), é consideradoa década de ouro no desenvolvimento

do pensamento de marketing e impulsionou tal atividade. É uma década fértil em obras de

marketing especializadas em propaganda, administração de vendas e crédito. É quando os

princípios de marketing são apresentados pela primeira vez em forma de livros, integrando

conceitos dispersos e buscando generalizações, e a pesquisa baseada em censos começa a ser

utilizada (BARTELS, 1978).

A produção agrícola alcança novos patamares de produção, florescem as

cooperativas de produtos agrícolas graças ao estímulo oficial, e continuam a surgir novos


62

produtos no mercado a varejo (BARTELS, 1978), uma vez que a produção em massa de bens

de consumo que as grandes empresas geravam precisava ser vendida em mercados cada vez

maiores, tanto geográfica quanto socialmente. Isso motivou a utilização de novas técnicas de

criação de marcas e embalagens (SLATER, 2002).

O sistema fordista – com sua industrialização pesada, sua rígida linha de montagem

industrial e seu processo de trabalho com operários taylorizados – começa a representar o

padrão de acumulação capitalista dessa fase da modernidade. A denominação fordismo foi

inspirada na indústria automobilística de Henry Ford, que popularizou a estratégia de

mercado: “ qualquer um pode comprar qualquer carro, desde que seja o Ford modelo ‘T’ e

preto” (que começou a ser produzido em 1908). Essa estratégia, segundo Slater (2002), foi

rapidamente suplantada pela General Motors, que passou a produzir modelos de automóveis

voltados para diferentes segmentos (solteiros, casais jovens e famílias).

Enquanto alguns autores descrevem o fordismo como uma forma de acumulação e

sucesso econômico do sistema capitalista, Harvey (1992), por sua vez, atribui ao modo de

acumulação fordista a criação de expectativas que não podiam ser atendidas por todos aqueles

que não conseguiam acesso ao trabalho privilegiado:

[...] essas desigualdades eram particularmente difíceis de manter diante do


aumento das expectativas, alimentadas em parte por todos os artifícios
aplicados à criação de necessidades e à produção de um novo tipo de
sociedade de consumo. Sem acesso ao trabalho privilegiado da produção de
massa, amplos segmentos da força de trabalho também não tinham acesso às
tão louvadas alegrias do consumo de massa. Tratava-se de uma fórmula
segura para produzir insatisfação [...]. (HARVEY, 1992, p. 132).

A década de 1920 surge como a primeira década consumista, mas vista mais de

perto, parece apenas a época de colheita de uma revolução muito mais longa, em geral datada

de 1880-1930 (SLATER, 2002). A publicidade e o marketing vendiam não só bens de

consumo, mas o próprio consumismo como o caminho cintilante para a modernidade:


63

incitavam seus públicos a se modernizarem mediante a mecanização da vida cotidiana, desde

a compra de bens duráveis (máquinas de lavar roupa, aspiradores de pó, geladeiras, telefones)

para as casas, até o automóvel, que promovia a impressão moderna de estar se dirigindo para

o futuro e para a orgia permissiva da era do jazz (EWEN, 1976 DSXG SLATER, 2002). Essa é,

também, a década do cinema de Hollywood, das noites do Harlem e da Lei Seca. Conforme

Aglietta (1979 apud SLATER, 2002), o consumo foi sendo estruturado de acordo com a vida

do operário de produção, a idéia de canalizá-lo para vida privada e doméstica tinha o objetivo

de mantê-lo mental e fisicamente apto para voltar ao trabalho “ recuperado” e continuar a

produzir, já o automóvel tinha a ver com a possibilidade de circular livremente e obter o status

social.

Ao mesmo tempo, como revela Bartels (1978), Fred E. Clark aparece com a

preocupação da eficiência do marketing numa perspectiva social. Esse autor defendia a

propaganda pelo seu valor educativo e por ser, algumas vezes, um método de venda mais

barato do que a venda pessoal, porque confiava nas lojas como método de vendas eficiente

para oferecer mercadorias e recomendava uma maior padronização dos bens de consumo.

Nesse período, também, foram escritos vários livros sobre “ princípios de marketing” , sendo

Paul W. Ivey o pioneiro em usar o termo na obra “ 3ULQFLSOHVRI0DUNHWLQJ” , em 1921.

No Brasil, nas primeiras décadas do século XX, o marketing existia como uma

manifestação das ações naturais das trocas comerciais, mas não como área de estudo. As

mensagens dos anúncios publicitários tratavam de temas racionais, ou seja, a associação entre

mensagem e produto anunciado era direta e eram realizadas pelos próprios comerciantes e

veiculadas em jornais (ARRUDA, 1978).

2 SHUtRGR GR GHVHQYROYLPHQWR   caracteriza-se por uma revisão e

ampliação do pensamento de marketing. O interesse que já vinha sendo revelado há bastante


64

tempo sobre o marketing de produtos, continua nesse período. Bartels (1978) destaca o

trabalho Ralph F. Breyer, “ &RPPRGLW\0DUNHWLQJ” , de 1931, que é considerado um excelente

exemplo a respeito do planejamento de produtos para mercados técnicos (petróleo, mineral de

ferro, cimento, algodão têxtil, serviços de eletricidade, telefone entre outros). Em outro

trabalho “ 7KH 0DUNHWLQJ ,QVWLWXWLRQ” , também publicado em 1931, Breyer rompeu com os

conceitos convencionais de marketing e integrou princípios da física, da sociologia, da

psicologia e de outras ciências sociais para configurar o funcionamento do sistema de

marketing em conjunto, pois concebia os canais de forma análoga a dos circuitos elétricos,

mediante os quais fluxos e correntes se moveriam em ambas direções.

Dos livros sobre marketing geral, Bartels (1978) destaca a obra de Charles F.

Phillips, “ 0DUNHWLQJ” , de 1938, pela importância que deu ao consumidor. Diferentemente de

outros autores genéricos que também demonstraram interesse pelo consumidor, Philips foi

mais além de simplesmente pressupor os motivos de compra do consumidor e as condições

que afetam os consumidores em geral. Preocupou-se com o papel dos consumidores na

orientação econômica, com a questão de precisarem valorizar ao máximo o seu dinheiro e

com os efeitos que os esforços de compra causavam aos consumidores. Bartels (1978)

também, revela que uma outra tendência dessa época foi a publicação de obras especializadas

para fins acadêmicos rudimentares, como a de C. W Barker e N. Anshen, “ 0RGHUQ

0DUNHWLQJ” , de 1939, que procurava a simplificação de um conjunto de idéias sobre

marketing, ou seja textos introdutórios para que pessoas de vários campos de atuação se

interessassem pela área.

No entanto, não é possível desconsiderar que a década de 1930 começa com a grande

depressão que abateu a economia mundial e que também influenciou o marketing. Nesse

sentido, foi dada ênfase aos preços baixos, à aparição do movimento do consumidor e ao
65

aumento da competitividade entre as empresas mediante o desenvolvimento da distribuição.

Slater (2002) refere:

As experiências de depressão econômica global nos anos interguerras


propiciaram o surgimento de uma estrutura primorosa de estratégias para
administrar a demanda (o keynesianismo, o Estado previdenciário). Também
proclamou-se que a propaganda e o marketing não só canalizaram demanda
insuficiente para certas marcas e produtos, como também participaram na
transformação dos valores que tinham por base uma tendência puritana à
poupança, a preocupação com o futuro, a preservação dos bens e a
sobriedade em um clima hedonista de gastos e crédito, orientado para o
presente, de rápida obsolescência técnica e estética, com estilos e
mercadorias descartáveis e em uma cultura lúdica. (SLATER, 2002, p. 35-
37).

Nesse contexto, a crítica em relação ao marketing é de que esse não estava sendo

agressivo no sentido de incentivar o consumo, pois estava contribuindo, mesmo que

indiretamente, para a poupança do consumidor com vistas ao seu futuro.

A depressão de 1930 também abateu a economia da América Latina e,

conseqüentemente, a economia brasileira, que era baseada na exportação de produtos

primários. Como influência desse problema, surge no Brasil a idéia de que o Estado precisa

intervir no mercado, é o chamado ” Estado Desenvolvimentista” , como meio de propiciar o

desenvolvimento do capitalismo e instaurar a ordem industrial moderna. A partir dessa época

termina o ciclo hegemônico da economia agrário-exportadora (a cafeicultura) e se implantam

as bases urbano-industriais da produção. Com isso, as taxas de crescimento industrial

aumentaram e se intensificou o processo de modernização das cidades, de acordo com os

modelos cosmopolitanos dos países desenvolvidos. Nessa década, começa a substituição de

importações de bens de consumo e produtos agrícolas (SODRÉ, 1984).

No início do século, a humanidade passou pelo terror da I Guerra Mundial (1914-

1918), que abalou o ideal iluminista (HARVEY, 1992). Pouco tempo depois, a II Guerra

Mundial (1939-1945) é outro grande acontecimento que, novamente, impacta esse

pensamento iluminista. A Guerra também determinou, como explica Bartels (1978), uma
66

interrupção no desenvolvimento do marketing. Assim, quase nada ocorreu nos primeiros anos

da quinta década da história do marketing, denominada de SHUtRGRGDUHIOH[mR  

Após a guerra, as obras de Converse, Maynard e Philips foram revisadas. O interesse dos

autores passa a não ser apenas exclusivo à aplicação de normas e princípios, mas também a

administração de marketing recebe maior atenção, e há um esforço para tratar as questões

integradas. Ralph Alexander, F. M. Surface, R. F. Elder e Wroe Alderson, publicam

“ 0DUNHWLQJ” em 1940 e dão maior importância ao planejamento, à investigação e ao controle

das atividades de marketing. Em seus estudos, evidenciam a importância de considerar o

marketing como uma função da administração, além de dedicarem uma seção especial sobre a

questão do ponto de vista do consumidor no sistema de marketing. Uma outra obra destacada

por Bartels (1978) é a de Roland S. Vaile, E. T. Grether e Reavis Cox, “ 0DUNHWLQJ LQ WKH

$PHULFDQ (FRQRP\” , que consideravam o marketing como uma instituição social vasta e

completa da economia da livre empresa. Para eles, o marketing era um processo destinado a

distribuir e orientar o uso de recursos, as atividades e organizações, coletivamente, por meio

das quais todas as coisas são reunidas de forma simultânea para seu consumo.

Para Bartels (1978), a década de 1950 representa o auge da área de marketing e surge

como sendo o SHUtRGR GH UHFRQFHLWXDOL]DomR O autor descreve que embora não houvesse

uma grande distinção entre as obras da década passada e as obras desta década, a medida que

os anos passavam haviam evidências de que o conceito de marketing estava sendo

reformulado. Os principais fatores de distinção eram os seguintes: o grau de preocupação com

as questões teóricas do conhecimento de marketing; a confiança em conceitos de outras

ciências sociais para interpretar a conduta do mercado; a substituição da classificação

mercadoria-função-instituição para a relativa a produtos, preços, canais, e atividades

promocionais (BARTELS, 1978). Dentre as obras destacadas dessa época estão: a de Reavis

Cox e Wroe Alderson, “ 7KHRU\LQ0DUNHWLQJ” , de 1950, que, tendo em vista o interesse dos
67

aspectos teóricos do marketing, realizaram uma compilação de ensaios sobre diferentes

aspectos da disciplina; a de Wroe Alderson, “ 0DUNHWLQJ %HKDYLRU DQG ([HFXWLYH $FWLRQ” ,

1957, que buscava elevar o marketing a condição de negócios no mercado e não apenas

considerá-lo como uma teoria funcional.

É na década 1950 que surge a idéia do “ moderno conceito de marketing” . Tendo em

vista a importância dessa fase para o desenvolvimento da área e os desdobramentos que se

sucederam a partir desse momento, continuo a descrever a história do marketing em uma nova

subseção. Essa década também marca o início da discussão em torno do tema “ marketing é

arte ou ciência?” (BROWN, 1997a) que se estendeu nas próximas décadas. Considerando a

importância do tema para os propósitos deste trabalho, apresento o desenrolar dessa discussão

na subseção “ 3.3 Marketing: arte ou ciência?” .

2PRGHUQRFRQFHLWRGHPDUNHWLQJ

Na década de 1950, o marketing configura-se como uma área não mais associada à

economia (BARTELS, 1974; KOTLER, 1972). Em 1954, quando Peter Drucker publica “ 7KH

3UDFWLFH RI 0DQDJHPHQt” e diz que o marketing é de extrema importância, é lançada a

expressão “ orientação para o marketing” . Seus argumentos impulsionam o surgimento de um

novo conceito de marketing (BROWN, 1995c). A satisfação do consumidor se consolida

como a forma das empresas praticarem marketing, para tanto deveriam produzir seus produtos

de forma a facilitar a vida do consumidor (FELDMAN, 1971). Surge, assim, a idéia de que o

conceito de marketing depende de uma orientação para o consumidor, apoiada pelo marketing

integrado e mediante a satisfação do cliente, a empresa alcançaria o lucro (KOTLER, 1972).

Nesse momento, começam a surgir expressões: “ o consumidor é o rei” ; “ o cliente é quem

manda” , “ o cliente em primeiro lugar” .


68

Em 1956, o conceito de segmentação de mercado foi pela primeira vez considerado

com o trabalho, de Wendell Smith, “ 3URGXFW 'LIIHUHQWLDWLRQ DQG 0DUNHW 6HJPHQWDWLRQ DV

$OWHUQDWLYH 0DUNHWLQJ 6WUDWHJLHV” (WEINSTEIN, 1995). Embora o conceito tenha sido

proposto somente nesta década há registros bem anteriores da adoção desse tipo de estratégia.

Por exemplo, a Pepsi já adotava a estratégia de segmentação de mercado antes de 1940

(HOLLANDER e GERMAIN, 1992 DSXG BROWN, 1995c).

Porém, Slater (2002), sintetizando as posições de economistas e sociólogos,

demonstra que nesta época a cultura do consumo era estimulada a absorver o excedente de

produção, uma vez que a quantidade de valor produzida era maior do que a demanda efetiva

disponível para absorvê-lo. O desequilíbrio gerado requeria níveis extraordinários de

desperdício (o chamado “ consumo improdutivo” ). Assim, as mudanças no design, nas

embalagens e nas propagandas serviam para acrescentar custos improdutivos e extraordinários

à produção, como forma de valorizar a forma em detrimento ao valor de uso dos produtos e,

ao mesmo tempo, promover a demanda efetiva e eliminar a concorrência de mercado –

controlando o teor cultural dessa demanda. Ainda de acordo com Slater (2002)

[...] a cultura do consumo – principalmente na década de 1950 – aparece


como uma nova era de conformismo, do “ homem organizado” , do narcisista
“ voltado para o outro” , do entorpecente cultural de massa ou do consumidor
de batata frita sentado na frente da televisão, que segue o vizinho no
consumo de massa passivo de mercadorias padronizadas produzidas em
massa. (SLATER, 2002, p. 20).

Em relação ao Brasil, os anos de 1950 representam um marco para o

desenvolvimento da industrialização brasileira: especialmente, as indústrias de automóvel e de

bens de consumo não-duráveis têm um grande incremento com a instalação do governo de

Juscelino Kubitschek, em 1955. Um pouco antes, devido à falta de profissionais na área de

administração, que pudessem atender às necessidades das estatais brasileiras, criadas no

governo de Getúlio Vargas, e das grandes multinacionais que começavam a chegar ao Brasil,
69

é criada a Escola de Administração de Empresas, da Fundação Getúlio Vargas (STORCK,

1983). Em 1954, através dessa instituição, o ensino de marketing é introduzido no Brasil, com

a vinda do professor norte-americano Karl Boadecker. Sendo que nesse momento é adotado o

termo mercadologia2 no País, uma vez que os introdutores imaginavam que a expressão

marketing seria de difícil entendimento para os brasileiros. Cabe enfatizar que as idéias de

marketing norte-americanas e fundadas em circunstâncias e acontecimentos particularmente

diferentes das brasileiras são importadas para serem “ generalizadas” para o contexto

econômico, social e cultural brasileiro (MOTTA, 1982).

Conforme Brown (1995c), a propagação do moderno conceito de marketing é

resultado, inicialmente, das idéias de McKitterick e, logo após, das contribuições de Robert

Keith e Theodore Levitt. Mesmo com todas as críticas dirigidas aos trabalhos “ The Marketing

Revolution” e “ Marketing Myopia” escritos em 1960, respectivamente, por esses dois últimos

autores, esses influenciaram significativamente o pensamento em marketing. Na subseção

“ Fragilidade da concepção orientação para marketing” descrevo em detalhes essas críticas,

uma vez que este tema tem significado especial para o escopo do presente ensaio.

Importantes proposições a respeito das ferramentas de marketing surgiram durante o

início dos anos de 1960. McCarthy (1960 DSXG McCarthy, 1978), revisando trabalhos

anteriores, propôs a clássica composição dos 4 P’ s de marketing: produto, preço, promoção e

praça. Essa classificação até hoje continua sendo citada nos principais livros textos da área.

Kotler (2000) entende que mais duas proposições de composto de marketing realizadas neste

período merecem destaque: a realizada por Albert W. Frey em 1961, onde esse sugeriu que

todas as variáveis de decisões de marketing pudessem ser categorizadas em dois fatores:

oferta (produto, embalagem, marca, preço e serviços); métodos e ferramentas (canais de

2
O termo mercadologia está em desuso no contexto brasileiro.
70

distribuição, vendas pessoais, propaganda, promoção de vendas e publicidade); e a proposição

de William Lazer e Eugene J. Kelly em 1962, que propuseram uma classificação de três

fatores: bens e mix de serviços, mix de distribuição e mix de comunicações.

No que diz respeito à cultura do consumo nas décadas de 1950 e 1960, Slater (2002,

p. 20) lembra que “ a prosperidade e uma vida boa significavam a capacidade de não ficar

atrás dos vizinhos, [...] [mas ao mesmo tempo havia o sentimento] do consumo

perturbadoramente explosivo e hedonista entre os novos grupos sociais” . A prosperidade

econômica criou necessidades insaciáveis e moralmente duvidosas, uma crise de valores a

respeito da ética do trabalho, uma bifurcação do desejo entre o consumo respeitável familiar e

o consumo hedonista, amoral, não familiar.

A superprodução de produtos e, conseqüentemente, o consumismo passam a ser

questões preocupantes na década de 1960 nos EUA. Packard (1960) descreve esse período

como sendo da “ estratégia do desperdício” e faz severas críticas às estratégias usadas pelas

empresas para estimular o crescimento. “ Para que os americanos comprem e consumam tudo

quanto a manufatura automatizada, a venda sob pressão e a publicidade total lançam sobre

nós, cada um de nossos crescentes milhões precisaria ter ouvidos, olhos e outros sentidos

adicionais – assim como renda adicional. Com efeito, o único meio seguro de satisfazer todas

as exigências talvez seja criar uma raça inteiramente nova de superconsumidores” (Principal

redator da revista Sales Management DSXG PACKARD, 1960, p. 10). Já nessa época, Packard,

além de demonstrar sua inquietação com relação ao consumidor frente ao excesso de estímulo

ao consumo, manifesta sua preocupação com relação aos problemas que essa forma de fazer

negócios traria ao meio ambiente. Cabe lembrar que, em meio a essa década, começa, nos

EUA, o movimento do consumerismo, com o objetivo de informar, educar e proteger os

consumidores, nos momentos de compra e utilização de produtos ou serviços, em resposta aos

desrespeitos causados pelas empresas.


71

Ao final da década de 1960 e início de 1970, alguns autores (como por exemplo:

Willian Lazer, David Luck, Philip Kotler, Gerald Zaltman, Sidney Levy, M. Bell, e C.

Emory) travaram um longo debate em torno do conceito de marketing e vários artigos foram

publicados. Tendo em vista a importância desse debate para os propósitos do presente ensaio,

este tema é tratado na subseção “ O conceito de marketing: ampliação e validade” . Por ora,

cabe considerar que a discussão, em princípio, girava em torno da ampliação ou não do

conceito para organizações que não visassem lucro; e, por outro lado, havia a preocupação

quanto aos efeitos sociais e ambientais das atividades de marketing.

A partir dos anos de 1970 o modelo de acumulação fordista começa a dar sinais de

esgotamento e revela-se incapaz de continuar promovendo o crescimento econômico

capitalista. Fatores políticos, culturais e econômicos explicam o esgotamento desse modelo.

De acordo com Slater (2002):

Os custos e o tempo investidos na produção fordista tornaram-se colossais,


enquanto a lógica da produção em massa e dos custos unitários mais baixos
foi levada até o ponto em que vastas quantidades de mercadorias têm de ser
vendidas com margens decrescentes de lucro. [...] mercados de consumo
cada vez mais saturados e de uma rotatividade cada vez mais rápida nas
modas, gostos, tendências (ela própria resultado de décadas de marketing
fordista em massa). Pense no investimento de centenas de milhões durante
cinco anos de pesquisa, desenvolvimento e construção de fábricas em
unidades de produção e redes de distribuição inflexivelmente dedicadas a
produzir milhões de unidades de mais um tipo de chocolate em barra, que
tem de ser vendido em volumes imensos junto com dúzias de outros aos
consumidores de daqui a meia década: o risco é absurdo. (SLATER, 2002, p.
184).

Soma-se a esses a crise do petróleo, de 1973, que dá início a um período de tensão na

economia mundial, caracterizado por: inflação, desemprego, dívidas públicas, capacidade

ociosa no setor produtivo, queda na produtividade, aumento da competição internacional. A

sociedade de consumo, que até então era vista como parte de um sistema capaz de superar

crises econômicas, entra também em colapso. Esse momento é chamado por alguns autores de

pós-fordismo ou modelo de acumulação flexível. Outros entendem que é o começo de um


72

novo tipo de sociedade que recebe generalizações como: sociedade pós-industrial, sociedade

do conhecimento, sociedade da informação, economia globalizada. Para Mandel (1982), como

anteriormente já considerei, estamos em um estágio do capitalismo: o capitalismo tardio.

Neste estágio, o capitalismo desenvolve novas tecnologias para continuar seu processo de

crescimento (JAMESON, 1996). Esse modelo baseia-se na flexibilidade de produção, do

trabalho e do consumo. Como menciona Harvey (1992):

A acumulação flexível é marcada por um confronto direto com a rigidez do


fordismo. Ela se apóia na flexibilidade dos processos de trabalho, dos
mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo. Caracteriza-se
pelo surgimento de setores de produção inteiramente novos, novas maneiras
de fornecimento de serviços financeiros, novos mercados e, sobretudo, taxas
altamente intensificadas de inovação comercial, tecnológica e
organizacional. (HARVEY, 1992, p. 141).

De acordo com Slater (2002) a produção flexível além de ser rápida e barata,

possibilitou que o preço unitário da produção personalizada de pequenas quantidades não

fosse maior do que as quantidades muito grandes de artigos padronizados. Com isso, a cultura

do consumo passa a ter relação com a fragmentação e a diversificação, tanto no consumo

quanto na produção. No entanto, não é possível desconsiderar que os custos de comunicação

tornam-se mais elevados, uma vez que as empresas buscam intensificar as estratégias de

segmentação de mercado específicas a diferentes grupos visados.

A década de 1980 é momento do sistema econômico neoliberal, do Estado mínimo,

das privatizações, da luta pela competitividade internacional e da globalização. A

globalização não aparece como um novo processo da civilização, mas como uma

característica do capitalismo tardio (MANDEL, 1982) que foi ao longo do tempo se formando

(ONUF, 2002). Como afirma Santos (2000a) é a década do pós-marxismo:

A década de oitenta é considerada a década do pós-marxismo. [...]


isolamento progressivo dos partidos comunistas e a descaracterização
política dos partidos socialistas; a transnacionalização da economia e a
sujeição férrea dos países periféricos e semi-periféricos às exigências do
capitalismo multinacional e das suas instituições de suporte, o Banco
73

Mundial e o Fundo Monetário Internacional; a consagração mundial da


lógica econômica capitalista sob a forma neoliberal e a conseqüente apologia
do mercado, da livre iniciativa, do Estado mínimo, e da mercantilização das
relações sociais; o fortalecimento sem precedentes da cultura de massas e a
celebração nela de estilos de vida e de imaginários sociais individualistas,
privatistas e consumistas.[...]. (SANTOS, 2000a, p.29).

Nesse contexto, Slater (2002) registra que a cultura do consumo é marcada pela

exploração visual e verbal dos objetos, e afinada com os signos, imagens e com a propaganda.

É o auge da estetização das mercadorias e de seu ambiente (propagandas, embalagens,

vitrines, pontos de venda, GHVLJQV de produto). Fato esse, que de acordo com o autor, também

não representava nada de novo, uma vez que essas manifestações já apareciam desde os

tempos do capitalismo comercial, mas eram motivo de reflexão na década de 1980. Era o

anúncio, também, da subordinação da produção ao consumo sob a forma de marketing, e da

cultura do consumo orgulhosamente superficial e profundamente voltadas às aparências.

Nessa nova cultura do consumo:

O consumidor era o herói do momento, não apenas como provedor do poder


aquisitivo que serviria de combustível para o crescimento econômico [...]
mas como o próprio modelo do sujeito e cidadão moderno. [...] forjar uma
identidade pessoal seria um processo firme e agradavelmente desvinculado
tanto do mundo do trabalho quanto da política, e seria realizado num mundo
de identidades de consumidor plurais, maleáveis, lúdicas, um processo
governado pelo jogo da imagem, do estilo, do desejo e dos signos. Tanto o
neoliberalismo quanto o pós-modernismo proclamaram e aparentemente
endossaram o assassinato da razão crítica pela soberania do consumidor.
(SLATER, 2002, p. 19).

Até mesmo no Brasil da “ década perdida” , da indústria obsoleta, de produtos sem

competitividade internacional e da hiperinflação, o consumidor recebeu o VWDWXV de herói. Em

1986, o presidente José Sarney, em defesa do Plano Cruzado, convocou a população

(consumidores) para que ajudassem a fiscalizar os preços que haviam sido congelados. As

pessoas atenderam ao pedido e inúmeras queixas são apresentadas aos órgãos de defesa do

consumidor (basicamente o PROCON e a Superintendência Nacional de Abastecimento –

SUNAB) (TASCHNER, 2000).


74

Na década de 1980, o interesse acadêmico que havia prevalecido no início do

marketing, se desfaz e a investigação aplicada suplanta a investigação teórica (BARTELS,

1967), o interesse pelos métodos chega a ser mais importante do que o objeto de estudo

(BARTELS, 1983). É também nessa década que o pós-modernismo emerge para o interesse

acadêmico na área organizacional (ALVESSON e DEETZ, 1999) como também na área de

marketing (ENGEL, BLACKWELL e MINIARD, 2000). Especificamente com relação ao

marketing, Casotti (1999), registra que nesse período aparecem visões filosóficas e

metodológicas de pesquisas alternativas ao positivismo: abordagem naturalista; a abordagem

humanista, os métodos etnográficos, os métodos históricos, a teoria crítica, a semiótica e o

relativismo.

Brown (1999) revela que essa década marca o aparecimento de trabalhos que

valorizam a teoria literária em particular. Graças aos empenhos de autores – como Russell

Belk, Elizabeth Hirschman, Linda Scott e Barbara Stern – que reconheceram nas ferramentas

e técnicas da crítica literária contribuições importantes para a área de marketing. É possível

distinguir duas grandes perspectivas de estudos: a primeira, é ligada a análise de elementos

tratados na literatura de marketing; e a segunda, envolve a utilização de ferramentas e técnicas

de crítica literária para análise de fenômenos da propaganda e da promoção.

Na década de 1990 o processo de globalização econômica adquire maior intensidade.

No Brasil, o Governo Fernando Collor de Mello deflagra o processo de privatização.

Começam as negociações para a consolidação do Mercosul, o câmbio e as importações são

liberadas e uma série de produtos importados invade o País. O consumidor brasileiro pode,

assim, na diversidade de mercadorias globais produzidas, com o objetivo de estimular o

consumo efêmero e volátil, suprir e satisfazer necessidades reais e imaginárias múltiplas, que

podem ser descartadas com um piscar de olhos (ARAÚJO, 2000).


75

Preocupado com as conseqüências dessa nova configuração do capitalismo e crítico

do atual momento, Santos (2000a) argumenta que:

[...] a conversão do progresso em acumulação capitalista transformou a


natureza em mera condição de produção. Os limites desta transformação
começam hoje a ser evidentes e os riscos e perversidades que acarreta,
alarmantes, bem demonstrados nos perigos cada vez mais iminentes de
catástrofe ecológica. Por outro lado, sempre que o capitalismo teve de
confrontar-se com as suas endêmicas crises de acumulação, vê-lo ampliando
a mercadorização da vida, estendendo-se a novos bens e serviços e a novas
relações sociais e fazendo-se chegar a pontos do bloco até então não
integrados na economia mundial. Por uma outra via, tal processo de
expansão e ampliação parece estar a atingir limites inultrapassáveis. A
mercantilização de bens e serviços até agora livres começa hoje a envolver,
com a biogenética, o próprio corpo humano, e quando isso suceder não será
possível ir mais longe. (SANTOS, 2000a, p. 34-35)

A década de 1990 é a do crescimento da perspectiva pós-moderna de marketing,

aberta aos discursos, interpretações e posições discordantes e divergentes. Na subseção “ 3.7 O

marketing é pós-moderno” faço maiores considerações a este respeito. Antes, porém, destaco

dois importantes debates acadêmicos (marketing arte ou ciência? e a ampliação do conceito de

marketing) que foram travados na história do marketing contemporâneo e, a seguir, apresento

críticas e defesas a respeito dos sistemas de maximização em marketing.

0$5.(7,1*$57(28&,Ç1&,$"

No entendimento de Brown (1997a), o artigo “ 7KH GHYHORSPHQW RI WKH VFLHQFH RI

PDUNHWLQJ±DQH[SORUDWRU\VXUYH\” , escrito por Paul Converse em 1945, é considerado um

marco a respeito da discussão se o “ Marketing é arte ou ciência?” . Muito embora o artigo de

Converse tratasse de uma pesquisa VXUYH\ relativa aos interesses acadêmicos de pesquisadores

de marketing, Brown (1997a) argumenta que foram alguns comentários passageiros de

Converse relacionados à “ arte” e à “ ciência” que acenderam a faísca de um dos debates mais

inflamados da história acadêmica de marketing e que de décadas em décadas voltou a ocorrer.


76

Brown (1997a) descreve que a discussão arte versus ciência se intensificou com o

artigo de Robert Bartels intitulado “ &DQPDUNHWLQJEHDVFLHQFH"” , publicado em 1951, onde o

autor avaliava o estado atual da pesquisa de marketing e a natureza do rigor científico e

imaginava que, com a utilização continuada de métodos científicos, o marketing receberia a

conotação de ciência. Brown (1996) relata que Kenneth Hutchinson, em 1952, com o texto

“ 0DUNHWLQJ DV D VFLHQFH DQ DSSUDLVDO” , responde de forma devastadora a Bartels, dizendo

que a razão para que o marketing ainda não tivesse um corpo teórico único era pelo fato de

não ser uma ciência e sim uma arte ou uma prática, e, como tal, seria semelhante à

engenharia, à medicina e à arquitetura, e não à física, à química ou à biologia. Brown (1996)

registra que, na oportunidade, Hutchinson dizia ser uma paródia cômica relacionar a procura

de cientistas por conhecimento para que depois os homens (sic) realizassem pesquisas de

mercados para conquistar clientes. No entanto, o esforço de Hutchinson não foi suficiente

para combater a ambição da American Marketing Association (AMA) de ver o marketing

avançar como ciência.

De acordo com Brown (1997a), com o intuito de contribuir para a elevação do

marketing como ciência, em 1962 é criado nos EUA o Marketing Science Institute e, em

1963, Buzell, no artigo “ ,VPDUNHWLQJDVFLHQFH?” argumenta que qualquer executivo médio,

se perguntado sobre o agente mais importante do progresso da sociedade contemporânea,

provavelmente, responderia: “ a ciência” , e que esse fato tornava justa a aspiração de o

marketing ser uma ciência. No entanto, Brown menciona que Buzzell era um tanto cético

sobre as pretensões científicas do marketing, dizendo que essa condição só seria alcançada se

a área tivesse determinadas condições: uma classificação e uma sistematização do seu

conhecimento, organizados em torno de uma ou mais teorias centrais, expressas

preferencialmente em termos quantitativos e usadas para predizer e controlar eventos futuros.


77

Quanto à questão de encarar o marketing como ciência, Brown (1997a) lembra que,

nos primeiros anos da década de 1970, várias figuras proeminentes na área (como Robin,

Kotler e Ramond) entendiam que o marketing já era uma ciência (ou pelo menos uma ciência

primitiva); já outros entendiam que isso era um sonho utópico (como Kernan e Levy).

Continuando o debate arte-ciência Hunt (1976) argumenta no artigo “ 7KH1DWXUHDQG

6FRSHRI0DUNHWLQJ” que a falta de consensos sobre o VWDWXV científico de marketing foi, em

parte, ocasionado porque não existiam bons critérios de qualificação (fato que já havia sido

evidenciado por Buzzell em 1963). Assim, o autor propõe uma classificação do “ escopo de

marketing” composta de três critérios tendo cada um duas modalidades: setor lucrativo e setor

sem fim lucrativo, micromarketing (relativo à organização) e macromarketing (exterior à

organização); positivo (o que é) e normativo (o que deve ser). Segundo Hunt (1976), o escopo

de marketing era inquestionavelmente amplo, uma vez que incluía as mais diversas áreas,

como: comportamento do consumidor, preço, compra, gerência de vendas, gerência de

produtos, comunicação de marketing, canais de distribuição, responsabilidade social e tantos

outros, sendo sua aplicação possível tanto nas organizações que visam ao lucro como

naquelas de caráter eminentemente social. De acordo com Baker (1995 DSXG BROWN,

1997a), a maioria dos acadêmicos do PDLQVWUHDP de marketing parece subscrever a

caricaturada versão da ciência que caracterizou até esse momento o grande debate

“ marketing: arte ou ciência?” .

A continuidade do debate ocorre quando Anderson (1983, 1986) argumenta que o

marketing, até então, tinha sido mal-servido pelo determinismo, pelo reducionismo e pelas

generalizações da perspectiva positivista/empirista lógica e que uma abordagem relativista

poderia oferecer muito mais para a área. Peter e Olson (1983), por sua vez, realçaram que a

ciência é considerada um sistema social, e seus significados, determinados pelos seres

humanos. As características, os interesses e as experiências passadas do pesquisador, bem


78

como as questões contextuais de local e tempo influenciam as observações empíricas. Hunt

(1984 DSXG Brown, 1997) respondeu dizendo que a adoção do relativismo levaria o marketing

ao niilismo, ao irracionalismo, à incoerência e à irrelevância, ameaçando o progresso

científico e tecnológico construídos ao longo dos últimos séculos.

Para Brown (1997a), mesmo que Hunt, descaradamente, tente reivindicar vitória, o

fato é que os revolucionários do relativismo triunfaram, na medida em que a academia de

marketing passou a ser muito menos monolítica que antes, em termos epistemológicos e

metodológicos. Com o argumento irônico de que deveria respeitar a tradição de esquemas de

marketing baseados em três elementos, Brown (1996) propõe “ o modelo de todos os modelos

de marketing” , para classificar as eras de disputas em torno do tema “ arte ou ciência?” : a era

pró-ciência (1945-83); a era anti-ciência (1983-99); e a era não-ciência (2000-). De acordo

com Brown (1996), nessa perspectiva o marketing deve, primeiro, reconhecer que o tempo de

ficar procurando o seu estado científico passou, e a área deveria buscar a designação de arte,

porém, não no sentido da arte de um artesão (a arte ou técnica de marketing) como sempre foi

solicitado desde os primeiros debates em torno da questão “ arte ou ciência?” , mas sim, no

sentido artístico, no sentido de estética. Segundo ponto: o marketing deveria, para alguns

pensadores, voltar-se ao estudo de artefatos artísticos (livros, filmes, jogos, poesia e etc.) e

procurar os benefícios das artes liberais (ciências humanas) e do espectro acadêmico; para

outros pensadores, o marketing deveria aderir a uma orientação de um espírito mais estético e

criativo. Terceiro e mais significativo: a busca de uma tendência estética, provavelmente,

promoverá uma reação dialética, em que defensores da ciência de marketing buscarão uma

posição articulada para argumentar contra a concepção pós-moderna de ciência.


79

)UDJLOLGDGHGDFRQFHSomR³RULHQWDomRSDUDPDUNHWLQJ´

Segundo Brown (1995c), os autores Robert Keith e Theodore Levitt são, juntamente

com alguns outros entusiastas como McKitterick, os responsáveis pela SURSDJDomR GR

FRQFHLWRGHPDUNHWLQJPRGHUQR. A formulação inicial do moderno conceito de marketing é

atribuída a McKitterick, que escreveu “ :KDW LV WKH PDUNHWLQJ FRQFHSW"´ em 1957, onde

recomendava que as empresas deveriam ser hábeis em conceber e fazer negócios baseados

S, 1957 DSXG CRANE e DESMOND, 2002).


nos interesses do consumidor (McKITTERICK'

Conforme anteriormente referi, na década de 1950 surge o moderno conceito de

marketing e aparece a expressão “ orientação para marketing” . As três RULHQWDo}HV GH

PDUNHWLQJ SURGXomR YHQGDV H PDUNHWLQJ têm origem no artigo “ 7KH 0DUNHWLQJ

5HYROXWLRQ´, de Robert J. Keith, publicado em 1960. Essa classificação passa a ser a base da

“ orientação para marketing. Segundo Brown (1996, 1995c), o texto de Keith é um clássico e

um dos artigos mais citados de toda a literatura de marketing. Nesse artigo, Keith descreve as

três eras vividas pela The Pillsbury Company. Do século XIX até 1930, a empresa era

“ orientada para a produção” ; nesse período estava preocupada com o processo de fabricação,

e os novos produtos eram lançados em função da disponibilidade de subprodutos industriais

em lugar de servir a uma necessidade de mercado. De 1930 até 1950, a Pillsbury foi

caracterizada por uma “ orientação para vendas” , em que uma sofisticada organização de

vendas, apoiada de anúncios e análises de mercado, foi reunida para distribuir as linhas de

produto da companhia. Na era subseqüente, entretanto, a empresa estava “ orientada para

marketing” , já que o propósito da Pillsbury não era moer farinha ou fabricar e vender uma

gama extensiva de produtos, mas, sim, satisfazer as necessidades e desejos de seus clientes.

O artigo de Keith é duramente criticado por Brown (1996), que se refere ao texto,

comentando que é muito fraco, tem apenas quatro páginas, não possui qualquer citação,
80

baseia-se na experiência vivida por uma única empresa e é algo para ser lido após o jantar.

Hollander (1986 DSXG BROWN, 1995c), por sua vez, lembra que na metade do século XIX já

havia empresas que estavam “ orientadas para marketing” . Para Marion (1993 apud Brown,

1995c), o artigo de Keith é um documento de motivação essencialmente política, destinado a

promover a empresa e o autor como executivo, uma vez que o mesmo era vice-presidente

executivo e diretor de produtos ao consumidor da Pillsbury. Brown (1995c; 1996), argumenta

que, SRU PDLV GHIHLWXRVD H TXHVWLRQiYHO TXH IRVVH D GLYLVmR HP WUrV HUDV FRPR PRGHOR

JHUDO HOD WRUQRXVH R SLODU LGHROyJLFR GR PDUNHWLQJ (em outras palavras, seu sistema de

crenças), a base da “ orientação para marketing” ; e, conforme Fullerton (1986), utilizada

indiscriminadamente em quase todos os livros textos introdutórios de marketing.

Ainda segundo Brown (1995c), outro artigo de fundamental importância na

propagação da “ orientação para marketing” é o trabalho de Theodore Levitt, “ 0DUNHWLQJ

0\RSLD” , publicado em 1960. Levitt (1960 [1986]) relata em seu texto o problema das

empresas que não sabem definir as necessidades dos consumidores e, assim, dão ênfase a seus

produtos, e não às necessidades de seus consumidores, pois com o passar do tempo uma

necessidade passa a ser satisfeita com outros tipos de produtos. A razão principal para que um

setor que, após passar por um momento de rápida expansão, tivesse seu desenvolvimento

ameaçado, retardado ou detido não era a razão da saturação de mercado, mas, sim, uma falha

administrativa. De acordo com Levitt, vários setores tiveram problemas porque não souberam

definir o seu negócio: as ferrovias pararam de crescer porque se voltaram para o trem

(produto), e não para o transporte (negócio); o cinema de Hollywood quase desapareceu

porque a indústria do cinema deu ênfase aos seus filmes (produto) quando deveria ter dado ao

entretenimento (negócio).

O artigo de Levitt foi duramente criticado, porque suas observações foram realizadas

depois de os fatos terem ocorrido, o que é bastante cômodo para qualquer analista. Ao
81

mencionar que as empresas de petróleo deveriam se preocupar em desenvolver outros tipos de

energia (necessidade) e não continuarem insistindo com o petróleo (produto), já que até o

final da década de 1970 o combustível não mais existiria na terra, o próprio autor, com essa

previsão infundada, demonstra o quanto é difícil visualizar o futuro. No entanto, o termo

“ miopia de marketing” até hoje aparece como sinônimo daquelas empresas que são

“ orientadas para o produto” , mesmo que as idéias de Levitt tenham sido consideradas falhas,

ambíguas e contraditórias (MARION, 1993 DSXG BROWN, 1995c).

Um HVTXHPD DOWHUQDWLYR GD HYROXomR GR PDUNHWLQJ foi proposto por Fullerton

(1988). Para a elaboração do esquema o autor desenvolveu um amplo conjunto de análises

sobre as condições socioeconômicas da civilização e propõe um esquema dividido em quatro

eras interpenetrantes: a era dos antecedentes (1500-1750); a era das origens (1750-1870); a

era do desenvolvimento institucional (1850-1929) e a era do refinamento e formalização

(1930-...). Segundo Brown (1996), embora esse modelo ofereça uma maior nuança e

represente melhor a história do marketing no mundo ocidental, não é universalmente

aclamado.

O próprio Brown (1996), procurando incendiar o debate em torno do esquema ideal,

resolveu propor um modelo, que ele mesmo intitulou como debatível e passível de ser julgado

como uma meta-narrativa, baseado também em três estágios: a era pré-moderna de marketing

(antes até aproximadamente 1900); a era moderna de marketing (1900-1999) e a era pós-

moderna (2000 em diante).

2&21&(,72'(0$5.(7,1*$03/,$d­2(9$/,'$'(

A partir do final da década de 1960 é iniciado um longo debate a respeito do conceito

de marketing. As discussões giravam em torno de: DPSOLDomRGRFRQFHLWRLQWHUHVVHSHODV


82

FDXVDVVRFLDLVHSUHRFXSDomRVRFLHWDOA seguir são relatados os principais argumentos que

envolvem esses debates, bem como apresentadas as proposições, posteriores, relativas à

IRUPD GH UHODomR GR PDUNHWLQJ FRP R PHUFDGR e juntamente são registradas as FUtWLFDV

VREUHDYDOLGDGHGRFRQFHLWR

Até o momento em que Kotler e Levy (1969) escrevem “ %URDGHQLQJWKH&RQFHSWRI

0DUNHWLQJ´ o marketing era uma disciplina voltada unicamente aos interesses das empresas

com fins lucrativos. Nesse momento, os autores entendem que o conceito de marketing estava

muito limitado e sugerem D DPSOLDomR GR FRQFHLWR, uma vez que os administradores de

igrejas, museus, sindicatos, escolas, partidos políticos – frente às mudanças sociais

decorrentes do pós-guerra e da necessidade da gestão profissional – não poderiam

desconsiderar o marketing. A decisão estava em realizá-lo bem ou mal, pois essas

organizações: possuíam produtos (bens, serviços, idéias), lidavam com grupos de interesses

(fornecedores, clientes, diretores, públicos e público em geral); e tinham certos instrumentos

de marketing (aperfeiçoamento do produto, preço, distribuição e comunicação). No mesmo

ano, Luck (1969), com o texto “ %URDGHQLQJWKH&RQFHSWRI0DUNHWLQJ7RR)DU” , argumenta

que a idéia dos autores era intrigante e imaginativa, mas era importante a demarcação do

conhecimento, e que a ampliação do conceito poderia trazer problemas de entendimento em

relação à natureza do marketing e ocasionar um julgamento depreciativo a respeito da área.

De acordo com Luck (1969), a ampliação tinha o intuito de diminuir a culpa de especialistas

que não se sentiam à vontade pelo fato de a atividade visar ao lucro e, por isso, não ser

socialmente benéfica. Para o autor, o marketing deveria ficar restrito aos processos e

atividades existentes e concentrar-se em resolver os problemas relacionados às transações de

mercado. Kotler e Levy (1969b) respondem a Luck, dizendo que sua preocupação se tratava

de uma nova forma de “ miopia em marketing” e argumentando que o eixo de marketing está

baseado na idéia de troca, e não na restrita tese de transação de mercado.


83

Em meio à discussão sobre a ampliação do conceito, e depois de algumas

manifestações realizadas em décadas anteriores, a SUHRFXSDomR FRPR D UHVSRQVDELOLGDGH

VRFLDOGRPDUNHWLQJrecebe a atenção de alguns acadêmicos.Lazer (1969), preocupado com

essa questão, alerta com o artigo “ 0DUNHWLQJ


V &KDQJLQJ 6RFLDO 5HODWLRQVKLSV” que o

marketing não deveria apenas servir aos negócios, mas, também, preocupar-se com os

interesses de longo prazo da sociedade. Com isso, o interesse da área não deveria se restringir

à transação de compra e venda; sua responsabilidade deveria se estender muito além de

produzir o lucro. Bell e Emory (1971) lembram que a satisfação do consumidor pode ser um

eficiente meio de uma empresa alcançar o lucro, mas não implica a proteção do bem-estar do

consumidor. Por sua vez, Feldman (1971) argumenta em “ 6RFLHWDO DGDSWDWLRQ D QHZ

FKDOOHQJH IRU PDUNHWLQJ” que alguns produtos que se destinam à satisfação individual do

consumidor impactam negativamente o ambiente e o bem-estar da sociedade. Visando a

atender a satisfação das necessidades dos consumidores e da sociedade a longo prazo, o autor

propõe RFRQFHLWRGHPDUNHWLQJVRFLHWDO.

Nesse mesmo ano, Kotler e Zaltman (1971) apresentam no trabalho “ 6RFLDO

PDUNHWLQJDQDSSURDFKWRSODQQHGVRFLDOFKDQJH” o conceito de PDUNHWLQJVRFLDO, referente

ao projeto, implementação e controle de programas destinados a influenciar a aceitabilidade

de idéias sociais (como, por exemplo, campanhas para diminuição da poluição, do

desemprego, do uso de drogas). Lazer e Kelley (1973) entendem que o marketing deveria se

envolver com atividades sociais, por duas grandes razões. Primeiro, é do próprio interesse do

marketing estar envolvido ativamente na solução de problemas sociais, e esses sendo

resolvidos, maior seria a satisfação dos consumidores, melhores seriam os mercados, e

surgiria um ambiente mais adequado para a prática do marketing. Segundo: problemas sociais

como, por exemplo: poluição, má qualidade de vida, degradação do ambiente, aumento das

taxas de desemprego, além de inúmeros outros, são aspectos que estão, inevitavelmente,
84

relacionados com a área de marketing. Para os autores, a administração de marketing, através

das empresas, criou alguns desses problemas, e os conceitos e abordagens de marketing

devem ser usados para desenvolver as respectivas soluções.

É importante frisar que a diferença entre “ marketing social” e “ marketing societal”

foi definida por Fox e Kotler (1980), uma vez que Lazer e Kelley (1973) não fizeram qualquer

distinção entre as responsabilidades e os impactos sociais das atividades de marketing de

idéias sociais.

Retomando a discussão a respeito da ampliação do conceito de marketing, Kotler

(1972), com o artigo “ $ *HQHULF &RQFHSW RI 0DUNHWLQJ´ expressa que o problema da

ampliação estava no fato de o conceito não ter sido ainda ampliado suficientemente e, assim,

argumenta a favor do marketing ser aplicado a qualquer relação social que envolva duas

partes. Assim, defende que a essência do conceito de marketing é a troca de valores entre duas

partes, pois as coisas de valor não se limitam a produtos, serviços e dinheiro; elas incluem

outros recursos tais como tempo, energia e sentimentos.

Paralelamente a essas posições e em resposta aos desrespeitos das empresas na

relação com os consumidores, o movimento do consumerismo ganha força no EUA. Alguns

teóricos e praticantes viam esse movimento com surpresa, pois não entendiam como os

consumidores poderiam se voltar contra empresas que tinham como lema a satisfação do

consumidor. Porém, Buskirk e Rothe (1973 DSXG Chauvel, 1999), anunciam que o

consumerismo era a prova de que o conceito de marketing não havia funcionado, e Drucker

(1973 DSXG Chauvel, 1999) afirma que o movimento era a vergonha do marketing.

Kotler (1972) considera que o consumerismo viria pra ficar e seria benéfico aos

consumidores e também para as empresas. Os consumidores se tornariam mais bem

informados e exigentes em relação ao consumo, enquanto que as empresas desenvolveriam


85

uma atitude mais consciente em relação ao meio ambiente e melhorariam a qualidade e a

segurança dos produtos. Para o autor, a ênfase no consumo material e as ações que visavam

apenas ao lucro, sem considerar o impacto social ou ambiental a longo prazo, indicavam uma

atitude imediatista e egoísta e não atendiam aos reais interesses do consumidor. Nesse sentido,

Kotler (1972) afirma que o termo “ satisfação do consumidor” é ambíguo, pois poderia indicar

uma preocupação de curto prazo e a idéia de apenas atender aos desejos do consumidor.

Dessa forma, o autor propõe a reformulação do conceito de marketing: “ as empresas devem

procurar não apenas a satisfação do cliente, mas também, e sobretudo, o bem-estar do

consumidor a longo prazo” (KOTLER, 1972, p. 54).

Lazer e Kelley (1973) acreditam em uma mudança social nos países desenvolvidos e

de economia abundante. Segundo os autores, após atendidas as necessidades materiais e

individuais, as pessoas prestariam mais atenção aos objetivos e necessidades da sociedade.

Posição semelhante aparece em Stanton (1975), que argumenta apoiado na teoria da

hierarquia das necessidades de Maslow3. Além disso, no entendimento de Stanton (1975), os

praticantes de marketing deveriam realizar suas atividades de forma socialmente desejável,

para fazer jus ao fato de operarem em um sistema econômico relativamente livre.

Webster (1974) considera que a idéia de conciliar as necessidades de marketing e de

lucro das empresas, os desejos dos consumidores e seus interesses a longo prazo é uma

“ falácia otimista” , e que é necessário um pouco de realismo para observar que nenhum desses

interesses é compatível com o outro, sendo mais difícil ainda conciliar os três juntos. As

conseqüências sociais do conceito de marketing para Webster (1974) são fruto de um

enfoque, a longo prazo, nos desejos do consumidor e do cidadão e não no seu interesse e bem-

estar.

3
Estudos têm indicado que a teoria da hierarquia das necessidades é na melhor das hipóteses uma
pobre simplificação do comportamento humano (MARSDEN, 2001).
86

Bagozzi (1974) defende que o marketing não é apenas uma simples transferência de

dinheiro por produto ou serviço, pois é, na verdade, um processo de troca que envolve

aspectos sociais, psicológicos, simbólicos, intangíveis, decorrentes dos sentimentos, e ainda

experiências e significados que estão envolvidos nas relações entre dois ou mais participantes.

Conforme Bagozzi (1975) as trocas de marketing podem ser classificadas como: trocas

restritas (mantidas reciprocamente entre dois elementos); trocas generalizadas (mantidas por

pelo menos três agentes em relações recíprocas e indiretas) e trocas complexas (que envolvem

um sistema de relações mútuas por pelo menos três elementos, havendo, no mínimo, uma

troca direta).

Argumentando em defesa da ampliação do conceito, Hunt (1976), com o artigo “ 7KH

1DWXUH DQG 6FRSH RI 0DUNHWLQJ” , propõe o que seria o escopo de marketing (já citado

anteriormente na subseção que aborda o debate “ marketing arte ou ciência?” ), a saber: setores

lucrativo e sem fim lucrativo; micromarketing e macromarketing; positivo e normativo.

Segundo Brown (1995c), é com este trabalho que os defensores da ampliação do conceito são

declarados “ vencedores da batalha” . Porém outras contestações continuaram sendo feitas;

Arndt (1978), por exemplo, argumenta que a questão do mérito da ampliação não estava no

fato da possibilidade de aplicação das técnicas no setor de organizações sem fins lucrativos,

mas questiona a possibilidade de tal aplicação ser tratada como uma parte integrante do

marketing. Para o autor, o marketing estaria, de forma imperialista, entrando em áreas como

antropologia social, sociologia, psicologia social.

No entanto, em meio a todas essas argumentações e contra-argumentações, alguns

DXWRUHVGXYLGDPGDDSOLFDELOLGDGHHYDOLGDGHGRFRQFHLWRGHPDUNHWLQJ. Sachs e Benson

(1978 DSXG BROWN, 1995c) afirmam que o êxito do marketing não está somente em

satisfazer as necessidades dos clientes, mas, sim, em lhes proporcionar satisfação maior do

que a oferecida pelos concorrentes. Posteriormente, Sachs e Benson (1980) defendem a idéia
87

de que o ambiente de negócios dificulta a fiel adoção do conceito de marketing, assim, as

empresas não praticam o conceito de marketing porque ele é impraticável e não representa os

seus melhores interesses. Os autores sugerem que, se a teoria do conceito de marketing não

pode ser realmente implementada, então o conceito deveria ser mudado para perto da

realidade.

É na década de 1980 que aparece o FRQFHLWRGHPDUNHWLQJGHUHODFLRQDPHQWR, com

antecedentes nas idéias de trocas comerciais da década anterior e em meio às dúvidas em

relação à aplicabilidade do conceito de marketing, voltado para a conquista, desenvolvimento

e manutenção de relacionamentos duradouros e lucrativos com os consumidores. Berry (1983

DSXG Berry, 1996) é um dos primeiros autores a tratar do conceito como uma forma para

atrair, manter e incrementar relacionamentos em empresas de serviços. No entanto, é a década

de 1990 que marca o desenvolvimento do marketing de relacionamento. Segundo Morgan e

Hunt (1994), o escopo do marketing de relacionamento, além das transações entre

consumidores e fornecedores, envolve quatro grandes elementos: supridores (fornecedores de

materiais e prestadores de serviços); compradores (clientes organizacionais e canais de

marketing); laterais (alianças estratégicas, parcerias de pesquisa e desenvolvimento); internos

(trocas entre os departamentos, funcionários e direção, unidades de negócios). A capacidade

de cumprir promessas (GRÖNROOS, 1994) e a confiabilidade (MORGAN e HUNT, 1994;

BERRY, 1996) são dois elementos fundamentais para a consolidação do relacionamento. Para

Sheth e Parvatiyar (1995), o principal axioma do marketing de relacionamento é que o

onsumidor UHGX] HVFROKDV QR VHQWLGR GH EXVFDU UHODo}HV FRQWtQXDV GH OHDOGDGH por
co

motivos comportamentais ancorados em fatores pessoais e influências sociológicas.

Para Brown (1995c), o marketing de relacionamento pode ser a forma de superação

da crise do conceito de marketing. No entanto, Fournier, Dobscha e Mick (1999, p. 104)

lembram que em meio à moda do marketing de relacionamento “ o nível de satisfação dos


88

clientes chegou ao ponto mais baixo de todos os tempos nos Estados Unidos, ao mesmo

tempo em que cresceram as manifestações de descontentamento do consumidor. Cedo ou

tarde o desempenho das empresas será prejudicado se o marketing de relacionamento não se

tornar o que deve ser: expressão máxima em orientação ao consumidor” . Berry (2000)

também argumenta no sentido da diminuição da satisfação dos consumidores em outros

países, além dos EUA. Para Fournier, Dobscha e Mick (1999), as empresas, se não quiserem a

morte prematura do conceito, deverão avaliar com rigor as constantes invasões de privacidade

e reconhecer que sucessivos lançamentos de produtos só causam ruído e não atendem a

necessidades. Por outro lado, existe a incerteza a respeito de quais aspectos poderiam

despertar fenômenos relacionais: a lealdade à loja, ao produto, ao processo, ou a outros

comportamentos; a lealdade à marca (REICHHELD, 1996), tendo em vista a tendência à

perda de compromisso e lealdade à marca, que previamente tinham sido firmados (FIRAT e

VENKATESH, 1995).

No início da década de 1990, procurando ampliar a idéia da orientação para o cliente

e melhor desempenho competitivo das empresas, surge uma outra proposta: D RULHQWDomR

SDUD R PHUFDGR (KOHLI e JAWORSKI, 1990). Narver e Slater (1990) propõem três

elementos básicos para essa orientação: a orientação para o cliente, a orientação para a

concorrência e a coordenação interfuncional. É necessário salientar que, nesta abordagem, é

feita uma distinção entre orientação para mercado e orientação para cliente, visto que a

segunda é uma das dimensões da primeira. Essa direção aposta na disseminação da

inteligência de mercado entre os departamentos para responder com soluções em curto e

longo prazos (KOHLI e JAWORSKI, 1990).

Retomando a questão da validade do marketing, de acordo com Brown (1995c) a

TXHVWmR IXQGDPHQWDO QmR p VH RV SURGXWRV RX VHUYLoRV SRGHP VHU GHVHQYROYLGRV SDUD

DWHQGHU jV QHFHVVLGDGHV GR FRQVXPLGRU H VLP VH GHYHULDP VHU GHVHQYROYLGRV OHYDQGR
89

HP FRQVLGHUDomR RV VXEVHTHQWHV UHVXOWDGRV VRFLDLV (como, por exemplo: poluição

ambiental, redução de recursos naturais, efeito estufa, néo-colonialismo e etc.). Brownlie HW

DO (2000) também argumentam a favor da necessidade de contextualização da disciplina.

Segundo Carson e Gilmore (2001), muitos estudos têm mostrado que os profissionais de

marketing falham ao entender e considerar os processos e práticas organizacionais, assim

como em relação ao que deve ou não ser feito em um contexto organizacional. Ainda segundo

os autores, muitos estudos de administração de marketing têm sido centrados na suposição

técnica ou nas decisões feitas que satisfaçam o trabalho de marketing, enquanto que

negligenciam os processos sociais mais amplos.

Na análise de Abratt e Sacks (1988), R FRQFHLWR GH PDUNHWLQJ p HJRtVWD em lidar

com interesses de indivíduos apenas como consumidores, mostrando-se restrito e

unidimensional. Dawson (DSXG Abratt e Sacks, 1988) fez críticas ainda mais duras dizendo

que o conceito de marketing é “ míope” em relação à sua orientação para o consumidor, já que

atua sobre os interesses de determinado segmento de consumidores de um dado produto e

desconsidera os demais segmentos da sociedade. Collins (1993) entende que,

tradicionalmente, as contribuições das empresas para com os interesses da sociedade têm sido

motivadas e executadas, primordialmente, para promover uma imagem positiva da

organização. O autor entende que o desafio do marketing é ser, ao mesmo tempo, lucrativo e

socialmente responsável.

Como bem lembra Chauvel (1999, p. 1), os debates da década de 1970 motivaram a

realização de trabalhos sobre a satisfação do consumidor nas décadas subseqüentes. No

entanto, mesmo que “ estes debates tenham apontado a necessidade de uma abordagem

‘social’ do conceito de marketing, o exame da literatura mostra que a satisfação do

consumidor continua sendo investigada, essencialmente, como fenômeno individual” .


90

Brownlie e Saren (1992), no artigo “ 7KH )RXU 3¶V RI WKH 0DUNHWLQJ &RQFHSW

3UHVFULSWLYH 3ROHPLFDO 3HUPDQHQW DQG 3UREOHPDWLFDO´ abordam as crescentes G~YLGDV

OHYDQWDGDVDUHVSHLWRGDYHUDFLGDGHGRFRQFHLWRGHPDUNHWLQJ e questionam se o mesmo,

da forma como tem sido propagado, pode prover a base para o sucesso dos negócios no século

XXI. Segundo os autores,o conceito de marketing é uma meta idealizada, e nenhuma empresa

é capaz (ou será capaz) de alcançá-lo completamente, porém a utilidade do conceito está em

providenciar um objetivo específico ao qual uma empresa pode visar. Qualquer “ conceito”

apresenta dificuldades de operacionalização. Segundo Brownlie e Saren (1992), embora a

intenção inicial de Drucker e Levitt fosse apenas propor um novo conceito, ele se desenvolveu

como uma espécie de ideologia, um modo de pensar sobre os negócios que ofereceria uma

estrutura para o sucesso. A forma pela qual o conceito emergiu na literatura empresarial fez

com que o mesmo se tornasse ideológico, ao invés de conceitual.

Alguns autores consideram o FRQFHLWRGHPDUNHWLQJDQDFU{QLFRXPDDEHUUDomR

XP UHJUHVVR SDUD XPD HUD DQWLJD GH PHUFDGRV GH PDVVD (HOYT, 1991; McKENNA,

1991); falam, também, que o tempo passou e que estamos diante do fim do marketing

(BROWNLIE, HWDO 1994; HOYT, 1991). Assim, Brown (1995c), com o texto “ /LIHEHJLQVDW

" )XUWKHU WKRXJKWV RQ PDUNHWLQJ


V µPLGOLIH FULVLV¶´ argumenta em defesa de um novo

ciclo evolutivo, tendo o marketing de relacionamento como recomeço e forma de responder à

crise do conceito de marketing.

6,67(0$6'(0$;,0,=$d­2'(0$5.(7,1*'()(6$6(
&5Ë7,&$6

Segundo Kotler e Armstrong (1993), quatro VLVWHPDV DOWHUQDWLYRV GH PDUNHWLQJ

poderão ser adotados por uma sociedade: PD[LPL]DU R FRQVXPR PD[LPL]DU D HVFROKD,

PD[LPL]DU D VDWLVIDomR GRFRQVXPLGRU H PD[LPL]DUD TXDOLGDGH GH YLGD. A análise dos


91

discursos em torno desses sistemas constitui-se em uma forma de entender como o

pensamento em marketing trata a “ satisfação das necessidades dos consumidores” .

O sistema de PD[LPL]DomRGRFRQVXPR pressupõe que as pessoas se tornam mais

felizes através do consumo maximizado. Como registram Kotler e Armstrong (1993, p. 9),

“ muitos executivos do ramo de negócios acreditam que a tarefa do marketing seria estimular o

consumo máximo. [...] A premissa por trás disso é a de que, quanto mais as pessoas gastam,

compram e consomem, mais felizes elas se tornam. [...] Contudo, algumas pessoas duvidam

que o aumento da quantidade de bens materiais signifique uma vida mais feliz” . Segundo

Giannetti (2002, p. 64), estudos realizados em países desenvolvidos com alto crescimento

econômico revelam que o consumo “ muito pouco ou nada altera as proporções de indivíduos

felizes e infelizes. O crescimento compra a felicidade nos países extremamente pobres, mas a

partir do momento em que uma nação atinge determinado nível de renda [...], acréscimos

adicionais de renda não mais se traduzem em ganhos de bem-estar subjetivo [...]” .

Outros profissionais defendem a idéia de que o marketing deveria PD[LPL]DU D

HVFROKD mediante o aumento da variedade de produtos e opções de escolha, para que assim os

indivíduos alcançassem à satisfação máxima. Nas palavras de Kotler e Armstrong (1993),

essa posição também é passível de críticas, porque a maximização da escolha gera inúmeros

problemas para o consumidor, a saber: o aumento dos custos de produção e de estoques gera

preços mais altos e reduz a renda dos consumidores; o aumento na variedade exige um

esforço maior de procura; a opção de mais produtos não implica necessariamente a efetiva

diferenciação entre eles; e, por fim, muitos consumidores se sentem confusos e frustrados com

muitas opções de escolha.

Uma evidência significativa que contraria as vantagens da maximização da escolha

está em estudos realizados por pesquisadores sociais em países desenvolvidos. Schwartz


92

(2004, p. 63) argumenta que “ o aumento do leque de opções e da riqueza, ao contrário do que

inicialmente poderia parecer, determina uma diminuição do bem-estar dos indivíduos” .

Principalmente, os “ maximizadores” (aqueles que sempre almejam fazer a melhor escolha

possível) fazem mais comparações entre os produtos, no pré-compra e no pós-compra, levam

mais tempo para decidir o que comprar, empenham-se em ler rótulos, conferir anúncios e

experimentar novos produtos, passam mais tempo comparando suas decisões com as de outras

pessoas. Vários fatores explicam por quê, especialmente para essas pessoas, a existência de

mais opções nem sempre é melhor. Dentre esses, estão os “ custos de oportunidade” . Os

“ custos” de fazer uma escolha implica na perda das oportunidades que uma escolha diferente

poderia proporcionar. Além do mais, os “ maximizadores” procuram conferir cada uma das

opções existentes; como isso é praticamente impossível, tornam a tomada de decisão cada vez

mais hesitante e ficam preocupados com as alternativas que não tiveram tempo de investigar.

Em contrapartida, a situação é um pouco mais cômoda para as pessoas que “ buscam a

satisfação” (os que se contentam com o “ suficientemente bom” , independentemente da

existência ou não de melhores opções). Assim, a experiência dos pesquisadores Fournier,

Dobscha e Mick também ilustra o que tem significado a maximização de escolhas e opções:

Quando falamos com as pessoas sobre suas experiências como


consumidoras, não se escutam elogios. Ao contrário, ouve-se que se sentem
vítimas, presas a um mercado confuso, estressante, insensível e manipulador.
As empresas se entusiasmam em aprender mais sobre seus clientes e oferecer
produtos e serviços capazes de agradar a cada paladar. Os clientes, porém,
não ficam satisfeitos. Eles apenas agüentam. Perdem-se no emaranhado de
produtos nas prateleiras dos supermercados. Lutam contra o excesso de
novos recursos de seus computadores e câmeras fotográficas. Atrapalham-se
com os diversos programas de fidelidade que lhes são ofertados.
(FOURNIER, DOBSCHA e MICK, 1999, p. 104)

Uma outra interpretação que contesta as vantagens do aumento das possibilidades de

escolha é feita por Santos (2000c, p. 89): “ O modo dominante de assegurar material e

institucionalmente o aumento das escolhas faz com que, paralelamente ao aumento das
93

escolhas, se assista à diminuição da capacidade de escolher. A criação de uma dada escolha

cria a impossibilidade de escolher não a ter no momento seguinte.”

Além disso, tanto a maximização do consumo como da escolha podem ser criticadas

em função dos problemas ecológicos gerados pelo consumo. Como argumenta George (2002)

[...] nosso sistema econômico é um subsistema do mundo natural e não o


contrário” . A autora menciona que o “ [...] século XXI terá pela frente a
difícil tarefa de encontrar um equilíbrio entre a preservação da liberdade de
mercado e o controle do efeito social colateral que essa liberdade não apóia,
mas engendra. Caso contrário os custos pesarão mais que os benefícios [...]
(GEORGE, 2002, p. 27-35).

Nesse contexto, Kotler e Armstrong (1993, p. 10) relatam que o marketing provoca

controvérsia, de um lado há defensores e de outro críticos ferrenhos que “ [...] sentem aversão

ao marketing, pois o acusam de arruinar o meio ambiente, bombardear o público-alvo com

anúncios sem sentido, criar desejos desnecessários, prover o espírito de consumismo entre os

jovens [...]” .

A terceira alternativa é a PD[LPL]DomR GD VDWLVIDomR GR FRQVXPLGRU. No

entendimento de Kotler e Armstrong (1993) é difícil avaliar o sistema de marketing em

termos de quantidade de satisfação proporcionada, porque ninguém descobriu ainda como

medir a satisfação criada por um produto ou atividade de marketing em particular; porque a

satisfação obtida pelos aspectos “ bons” de um produto devem ser contrabalançados com os

aspectos “ maus” , tais como os danos ao meio ambiente; e, finalmente, porque a satisfação que

alguns obtêm em consumir certos produtos que geram status depende do fato de que poucas

pessoas podem ter tais produtos. Esse último, conforme Giglio (2002), contribui para o

consumismo associado à posse de produtos e serviços representados pela identidade e posição

social, e não pelo que eles tecnicamente oferecem.


94

Entendo importante resgatar três argumentos anteriores considerados em meu texto:

a insatisfação geral como elemento motivacional para a reprodução da atual sociedade

capitalista, a “ sociedade insatisfeita”  HELLER e FEHÉR, 1998); a produção de sentidos

através da linguagem (WITTGENSTEIN, 1996) e o discurso como fonte de poder

(FOUCAULT, 2004) das grandes organizações (principalmente através da força da

comunicação de massa). Considero que esses argumentos são fatores fundamentais para a

constituição das maximizações de consumo, escolha e satisfação.

O quarto sistema defende que o PDUNHWLQJGHYHPD[LPL]DUDTXDOLGDGHGHYLGD,

que inclui não apenas a qualidade, quantidade, disponibilidade e custo dos bens, mas também

a qualidade do meio físico e cultural. Cobra (1997, p. 33) entende que o marketing estimula

“ o consumo de produtos que efetivamente constituam melhora na qualidade de vida das

pessoas [...] melhorar as condições físicas e culturais da população, bem como oferecer

produtos e serviços de qualidade compatível com as necessidades e expectativas de preço e de

acesso fácil” .

A idéia do marketing voltado para a qualidade de vida tem íntima relação com o

conceito de marketing societal (FELDMAN, 1971) e faz parte do discurso do marketing há

mais de três décadas. No entanto, as evidências teóricas até aqui consideradas indicam que tal

intenção é, na melhor das hipóteses, limitada.

20$5.(7,1*e3Ï602'(512

Não obstante o fato de o PDUNHWLQJFRQWHPSRUkQHRVHUPDLVEHPHQWHQGLGRFRPR

XPIHQ{PHQRSyVPRGHUQR Brown (1993a) argumenta que RSHQVDPHQWRKHJHP{QLFRGD

iUHD DLQGD HVWi DVVRFLDGR j PRGHUQLGDGH O autor lembra que a obra mais famosa de

marketing, que é de Philip Kotler, tem o título de “ Administração de marketing: análise,


95

planejamento, implementação e controle” e está fundamentada em modelos e teorias

generalizáveis e determinísticos. Um exemplo disso está no fato de o discurso do discurso

hegemônico de marketing argumentar fortemente que a demanda do mercado deve ser o

princípio determinante na condução de um novo produto de uma empresa. Entretanto,

Brownlie e Saren (1992) explicam que as técnicas de pesquisa de mercado podem ajudar a

empresa a identificar necessidades. No entanto, a pesquisa de mercado também pode

desencorajar maiores inovações, havendo, também, evidências de que inovações tecnológicas

bem-sucedidas não tinham suas demandas de mercado previamente conhecidas. Os autores

defendem que não há dúvida de que, para ter êxito no mercado, um novo produto precisa

satisfazer as necessidades dos consumidores; porém para uma grande organização, a gama de

necessidades potenciais é, freqüentemente, tão maior que a própria escolha delas e dos

consumidores devem ser “ pesquisados” . Nessa perspectiva a pesquisa apenas delineia a

direção do desenvolvimento subseqüente. Além disso, conforme Brownlie e Saren (1992), tais

escolhas devem ser feitas com base em vários outros critérios, além das necessidades dos

consumidores como, por exemplo: experiência tecnológica, recursos de P&D, capacidade de

produção, objetivos estratégicos e experiência com o produto ou mercado.

Os alertas de Brownlie e Saren (1992) e de Brown (1993a) podem ser importantes

não apenas aos acadêmicos e praticantes de marketing, como também aos profissionais

envolvidos em áreas que se valem da pesquisa de marketing para tomar decisões, como é o

caso da produção. Como contraponto à idéia de Brownlie e Saren (1992), é preciso considerar

que a realidade é uma construção social (BERGER e LUCKMANN, 1985); com isso é

possível que o poder de uma empresa interfira no mercado a ponto de criar uma necessidade.

Como argumenta Casotti (1998), “ o marketing procurou o caminho seguro das

ciências, [...] [porém] deve estar associado a características como abertura, tolerância,
96

flexibilidade, crítica, relativismo, que [...] são características mais associadas à condição pós-

moderna” .

Firat e Venkatesh (1995) entendem que o marketing pós-moderno possui cinco

características básicas: a fragmentação, a hiper-realidade, a inversão produção e consumo; a

descentralização do sujeito; a justaposição de opostos; e, como uma conseqüência geral dessas

condições, a perda de compromisso e lealdade à marca.

A IUDJPHQWDomR é um aspecto fundamental da condição pós-moderna e se manifesta

em várias instâncias da sociedade. A fragmentação tem ligação com as mudanças

tecnológicas, sem precedentes, que alteraram os processos de produção, informação,

comunicação e consumo, propiciaram a substituição do mercado de massa pelo de nichos ou

individualizado (THOMAS, 1997) e, ao mesmo tempo, impactaram a vida do ser humano.

Humanos e organizações estão em meio ao excesso de informação (DAWES e BROWN,

2000) que gera a “ infotoxicação” (CORNELLA, s.d). A fragmentação tem afetado o mercado

e o marketing contemporâneo e é um aspecto significativo para definir o consumidor na pós-

modernidade, pois a cada nova idéia, mensagem, símbolo, imagem, conceito que o marketing

propaga é uma nova oportunidade para que o “ eu” seja alterado e novos hábitos e

comportamentos sejam estabelecidos (FIRAT e DHOLAKIA, 1998). O excesso de produtos e

serviços exige a existência de superconsumidores para consumir tudo que está à disposição

(BROWN, 1995c). Uma característica da fragmentação é que, como conseqüências da

imprevisibilidade e do individualismo pós-modernos, a lealdade tende a diminuir (FIRAT e

VENKATESH, 1995). Soma-se a esses a própria IRUPDomRGLVFXUVLYDGRPDUNHWLQJTXHVH

UHYHODIUDJPHQWDGDHPLGpLDVYHUWHQWHVDVVXQWRVHLQWHUHVVHV

Como argumentam Vergara e Vieira M. (2003), na atualidade o presente está cada

vez mais curto, e o futuro mais próximo. 2SUHVHQWHpFDGDYH]PDLVHIrPHURe cercado de


97

rápidas transformações, especialmente pelo frenesi da inovação tecnológica. A expectativa

futura é a do próximo evento, e quando este chega já é hora de uma nova expectativa. Harvey

(1992) descreve em detalhes essa condição da pós-modernidade que:

[...] ao concentrar-se nas circunstâncias esquizofrênicas induzidas pela


fragmentação e por todas as instabilidades (inclusive as lingüísticas) que nos
impedem até mesmo de representar coerentemente, para não falar de
conceber estratégias para produzir, algum futuro radicalmente diferente. [...]
A imagem, a aparência, o espetáculo podem ser experimentados com uma
intensidade (júbilo ou terror) possibilitada apenas pela sua apreciação como
presentes puros e não relacionas no tempo. [...] O caráter imediato dos
eventos, o sensacionalismo do espetáculo (político, científico, militar, bem
como de diversão) se tornam a matéria de que a consciência é forjada [...]
(HARVEY, 1992, p.57-58)

Vivemos em uma KLSHUUHDOLGDGH de simulações nas quais imagens, espetáculos, e

jogos de sinais substituem a lógica de produção (BAUDRILLARD, 1973 DSXGKELLNER,

[?]). A hiper-realidade é uma inabilidade para distinguir entre a “ realidade” e a representação

da “ realidade” (BROWN, 1995a; 1997b). Um traço de hiper-realidade manifesta-se quando “ o

homem abate uma floresta para no mesmo local construir um conjunto e batizá-lo de ‘Cidade

Verde’ e onde se tomarão a plantar algumas árvores, que darão uma sugestão de ‘natureza’ ”

(BAUDRILLARD, 1995, p. 89). São hiper-reais as imagens dos meios de comunicação de

massa, que são espaços culturais onde o marketing forma os desejos dos consumidores e

reformula as suas preferências (THOMPSON, C., 1997); como também o ciberespaço criado

pela internet e a World Wide Web (COVA, 1996).

O marketing, também, é associado à pós-modernidadeporque RGHVHMRGHFRQVXPLU

p XP VLQDO GD FRQGLomR SyVPRGHUQD (BROWN, 1993a; FIRAT, DHOLAKIA e

VENKATESH, 1995). Os bens sempre tiveram significado de identidade social, porém nos

processos fluidos de uma sociedade pós-tradicional, a identidade parece ser mais uma função

do consumo que o contrário (SLATER, 2002). O consumo não é mais definido pelo

custo/benefício das escolhas, mas por experiências adquiridas através do consumo. Ou seja, RV

VLQDLV H DV LPDJHQV VXEVWLWXHP D PDWHULDOLGDGH H R YDORU GH XVR (FIRAT e SHULTZ,
98

1997). Segundo Schoreder (2000), uma característica chave da economia do século XXI é D

LPDJHP. Se nós entendermos que o mercado é baseado em imagens – de marcas, imagens da

corporação, imagens nacionais e imagens de identidade, então nós compreenderemos que essa

visão é central para entender a administração na sociedade.

O pós-modernismo é o consumo da própria produção de mercadorias como


processo. O “ estilo de vida” da superpotência tem, então, com o
“ fetichismo” da mercadoria de Marx, a mesma relação que os mais
adiantados monoteísmos têm com os animismos primitivos ou com as mais
rudimentares formas de idolatria; na verdade, qualquer teoria sofisticada do
pós-moderno deveria ter com o velho conceito de “ indústria cultural” de
Adorno e Horkheimer uma relação semelhante à que a MTV ou os anúncios
fractais têm com os seriados de televisão dos anos 50. (JAMESON, 2000, p.
14).

A FRPXQLFDomR esteve presente em todos países, sociedades, culturas e civilizações,

mas na sociedade pós-moderna a comunicação é mais intensa e torna o mundo mais próximo

e universal. O poder na sociedade pós-moderna está na posse dos melhores meios de difusão

ou recepção da informação, pois a sociedade só existe e progride quando as mensagens que

nela circulam são ricas em informações e fáceis de serem decodificadas (LYOTARD, 1998).

Por fim, conforme os argumentos de Brown (1993a), cabe registrar que a condição

pós-moderna oferece a possibilidade de autocrítica e re-análise do arcabouço teórico, métodos

e, até mesmo, a justificativa de continuidade do marketing.

&216,'(5$d®(6),1$,6'$+,67Ï5,$'20$5.(7,1*

É no início da modernidade que surge a cultura do consumo e aparecem as primeiras

manifestações de marketing, porém é somente no século XX que esse passa a existir como

uma área do conhecimento. Os EUA é sua terra natal e o lugar onde o discurso hegemônico

foi sendo construído para atender aos interesses das empresas capitalistas. Ao mesmo tempo,

na busca da propagação e generalização das idéias, o marketing foi sendo levado para
99

“ funcionar” em contextos distintos em termos econômicos, políticos, culturais e naturais,

incluindo aí o Brasil.

Minha narrativa a respeito da história do marketing, em especial a partir do

aparecimento do “ moderno conceito de marketing” na década de 1950, revela inúmeras

contribuições, disputas, divergências e crises recorrentes, ao mesmo tempo em que a cultura

do consumo desse momento desperta preocupações e dúvidas quanto as suas conseqüências

sociais e ambientais. Foi nesse período que o marketing chegou ao Brasil e hoje, pouco mais

de quatro décadas de sua chegada, ele está consolidado, mas nem um pouco contextualizado

no que se refere à sociedade brasileira.

O marketing, como uma construção dos homens, não admite uma única “ verdade” e

pode ser mais bem compreendido mediante uma posição relativista. Considerando minha

posição crítica, a associação que faço do marketing com o relativismo não implica apoiar a

idéia do “ tudo pode, tudo é bem-vindo” , uma vez que a aproximação com o relativismo é no

sentido de demonstrar que a área admite idéias antagônicas àquelas que vêm sendo atribuídas

pelo discurso do marketing.

Como refere Brown (1996, p. 10), o marketing “ acumula simultaneamente

evidências de sucesso e falha, de triunfo e desastre, de avanço e anacronismo, de otimismo e

pessimismo [...] paradoxo dos tempos atuais” . Neste trabalho, que é crítico e reflexivo, tenho

especial interesse pelo segundo elemento que compõe esses pares binários. Na próxima seção

analiso o discurso do marketing na sociedade pós-moderna da comunicação no contexto

brasileiro do século XXI.


5()/(;­262%5(2',6&8562'20$5.(7,1*1$
62&,('$'(3Ï602'(51$'$&2081,&$d­2

Nesta seção analiso o discurso do marketing no contexto brasileiro, mediante três

gêneros: o acadêmico, o das empresas e o da comunicação de massa (em especial o da

televisão). Assim, busco demonstrar que a força conjunta e inter-relacionada dos mesmos é

fator de fundamental importância para a produção de sentidos e de realidades que

movimentam o capitalismo tardio e constituem a sociedade insatisfeita. A adoção do termo

“ sociedade pós-moderna da comunicação” não tem por intenção a generalização da

denominação, mas, sim, de caracterizar a comunicação como sendo uma marca distintiva e

poderosa do capitalismo tardio e, nesse sentido, vital para a consolidação do discurso do

marketing. Ao mesmo tempo, faço considerações sobre implicações e participação da área de

engenharia de produção. Nesse contexto, ilustro meus argumentos com fatos e evidências

baseados em conversas do cotidiano e observações. Realizo minha análise e argumentação a

partir dos questionamentos: FRPR R PDUNHWLQJ WHP ³DJUHJDGR YDORU´" FRPR SRGHPRV

LQWHUSUHWDURVLJQLILFDGRGRVFKDPDGRV³JDQKRVP~WXRV´"FRPRTXHRVFRQVXPLGRUHVHVWmR

VHQGR HVWLPXODGRV SHOR PDUNHWLQJ D FRQVXPLU" RV SULQFtSLRV FRQFHLWRV H WpFQLFDV GH

PDUNHWLQJ HVWmR HP VLQWRQLD FRP R LQWXLWR GR PDUNHWLQJ GH DWHQGHU jV QHFHVVLGDGHV GRV

FRQVXPLGRUHV"FRPRDSURGXomRSDUWLFLSDGHVVHFRQWH[WR"

20$5.(7,1*'(6&2%5(1(&(66,'$'(6(5(6321'(&20
26352'8726'(6(-$'26"

De acordo com Kotler (2000, p. 20), é possível atribuir duas funções para o

marketing: uma social e outra gerencial. Como função social, “ marketing é um processo

social por meio do qual pessoas obtêm aquilo de que necessitam e o que desejam com a
101

criação, oferta e livre negociação de produtos e serviços de valor com os outros.” Como

função gerencial, Kotler (2000, p. 30) menciona um conceito da American Marketing

Association (AMA), que refere: “ 0DUNHWLQJ DGPLQLVWUDomRGH é o processo de planejar e

executar a concepção, a determinação do preço (SULFLQJ), a promoção e a distribuição de

idéias, bens e serviços para criar trocas que satisfaçam metas individuais e organizacionais.”

Kotler, juntamente com seu colega Armstrong, argumenta que:

Os profissionais de marketing responsáveis descobrem o que os


consumidores desejam e respondem com os produtos certos e com preços
que lhes ofereçam um bom valor e lucro para os fabricantes. O conceito de
marketing é uma filosofia de serviço e ganho mútuos. Sua prática guia a
economia com uma mão invisível para satisfazer às várias mudanças das
necessidades de milhões de consumidores. Porém, nem todos os
profissionais de marketing seguem o conceito de marketing. Na verdade,
algumas empresas utilizam práticas questionáveis de marketing, e algumas
ações que parecem intrinsecamente inocentes afetam muito a sociedade
como um todo. Vejamos a venda de cigarros. Normalmente, as empresas
deveriam ter liberdade de vender cigarros, e os fumantes, de comprá-los.
Mas essa transação afeta o interesse público. Primeiro, o fumante pode estar
encurtando sua própria vida; segundo, o fumo impõe um peso sobre a família
do fumante e sobre a sociedade em geral; terceiro, a fumaça respirada em
volta do fumante pode causar desconforto e ser prejudicial à saúde. Assim,
as transações privadas podem envolver grandes questões de política pública.
(KOTLER e ARMSTRONG, 1998, p. 472-473).

Kotler e Armstrong (1998) afirmam que profissionais de marketing responsáveis

descobrem o que os consumidores desejam e respondem com os produtos certos. Essa posição

dos autores é a mesma de outros tantos textos que constituem o discurso hegemônico do

marketing, o que começaria pela descoberta das necessidades dos consumidores para,

posteriormente, através do “ processo de marketing” , desenvolver estratégias para atendê-los

melhor do que a concorrência. Kotler e Armstrong (1998) também mencionam que algumas

empresas (como, por exemplo, a indústria de cigarros) utilizam práticas questionáveis de

marketing e que podem afetar muito a sociedade.

No entanto, entendo que não são apenas algumas, mas, sim, muitas as empresas que

se valem de práticas questionáveis, bem como são discutíveis determinados princípios


102

teóricos de marketing. A seguir, mediante as análises de três, questionáveis, estratégias de

marketing (a obsolescência planejada, a redução de embalagens e a estratégia de

precificação), apresento fatos e evidências que configuram a existência de estratégias de

insatisfação.

$WHQGHUDQHFHVVLGDGHVDWUDYpVGDREVROHVFrQFLDSODQHMDGD"

A obsolescência planejada é fruto do capitalismo tardio; o que antes era permanente,

passou a ser transitório, efêmero, fugaz. Segundo Churchill e Peper (2000, p. 42) essa

estratégia “ significa que a empresa construiu os produtos para que não durassem, pelo menos

não tanto quanto os compradores gostariam de usá-los” . Schewe e Smith (1982, p. 265, grifo

meu) argumentam: “ Algumas vezes os mercadizadores usam a estratégia de IRUoDU um

produto em sua linha a tornar-se desatualizado e, depois, aumentar o mercado de reposição. A

isso se dá o nome de obsolescência planejada que existe em quatro formas:” a técnica (quando

a empresa efetua melhorias técnicas em um produto); a adiada (quando a empresa possui

condições de realizar melhorias tecnológicas, mas não realiza tal introdução até que a

demanda pelos produtos existentes não decline, e os estoques não se esgotem); a física

(quando os produtos são feitos para durar apenas um tempo limitado) e a de estilo (quando a

aparência física de um produto é modificada para que os existentes pareçam desatualizados).

Os autores argumentam que:

A base para o uso desta estratégia está no desejo básico das pessoas de terem
alguma coisa nova. Para a maioria das pessoas a variedade e a mudança
parecem ser quase instintuais. A obsolescência planejada tem sido muito
criticada como estratégia – particularmente a obsolescência de estilo. Ela
parece propiciar a compra de produtos que na realidade não são necessários
no mercado. É como se os mercadizadores fossem os que mandam e ditam
as compras aos consumidores – o povo seguindo como um “ rebanho de
cordeirinhos” para comprar o que quer que os mercadizadores desejem que
comprem. Mas as críticas a esta posição têm encontrado alguns argumentos
de oposição. Os que defendem a obsolescência planejada indicam que o
comprador é uma pessoa com livre arbítrio que tem liberdade para tomar
decisões a respeito de seu comportamento de compra [...]. Além do mais a
variedade e a mudança proporcionam mais incrementos de satisfação. Ter
103

novos produtos torna as pessoas mais felizes. [...] [melhora] o padrão de vida
[...] Por isso, parece que a obsolescência planejada não é coisa assim tão má
– salvo se houver abuso por parte dos mercadodizadores. Quando são feitas
mudanças falsas ou inconseqüentes e as compras são induzidas sob falsa
representação. (SCHEWE e SMITH, 1982, p. 266-267).

De início cabe ressaltar que os autores acreditam na pretensa liberdade de escolha

dos consumidores, na variedade e na mudança como fatores de motivação, no entanto não é

essa a posição que defendo neste trabalho. Por outro lado, uma análise das quatro formas de

obsolescência apresentadas por Schewe e Smith (1982) indica que cada uma delas depende de

ações e do empenho de diferentes áreas de uma empresa, por exemplo, marketing e produção.

A intenção da direção de uma empresa brasileira fabricante de produtos da linha branca é uma

evidência dessa situação.

“ Logo no começo do meu estágio tive a oportunidade de participar de uma reunião em que estavam
presentes o diretor industrial, os engenheiros de produção, os projetistas e alguns diretores da
administração. Na verdade, tinha um monte de gente!
O desafio que a direção estava propondo era que a empresa desenvolvesse um novo refrigerador que
fosse diferente a ponto de ficar obsoleto em cinco anos [...].
Achei aquilo tudo muito maluco, não imaginava como isso seria possível. [...] Fiquei pensando
quantos anos tem o refrigerador da casa de minha mãe? E o da minha vó, então? [...] Porque a idéia
que tenho é que eles estão lá há muito mais tempo do que cinco anos. E bota mais tempo nisso! O da
minha vó deve ter quase a minha idade [...]”

Relato feito por Flávio, acadêmico do curso de Engenharia Mecânica, em maio de 2003.

Inicialmente, entendo que uma boa reflexão a ser feita sobre esse caso é: SRUTXHXP

FRQVXPLGRUQHFHVVLWDULDGHXPUHIULJHUDGRUTXHHPWmRFXUWRSHUtRGRGHWHPSRVHWRUQDVVH

REVROHWR" 3RU RXWUR ODGR TXH WLSR GH LQRYDomR SRGHULD DWHQGHU HVVH GHVDILR XPD QRYD

WHFQRORJLD GH UHVIULDPHQWR FRQJHODPHQWR H GHVFRQJHODPHQWR" XP QRYR GHVLJQ QRYRV

DFHVVyULRV QRYDV GLYLV}HV LQWHUQDV" Toda e qualquer inovação nesses termos parece não

justificar a “ necessidade do consumidor” em trocar em tão curto espaço de tempo uma

“ máquina de fazer frio” . Nem mesmo uma nova campanha de comunicação com uma

mensagem daquelas “ Não é uma Brastemp!” poderia justiçar tal pretensão. 0DVVHULDHVVHXP

SURGXWRGHWHFQRORJLDWmRLQRYDGRUDHDRPHVPRWHPSRWmRHFRORJLFDPHQWHFRUUHWRDSRQWR

GH QmR FRQVXPLU HQHUJLD HOpWULFD" Porém, se isso não for possível “ um bom caminho para
104

atender às necessidades da empresa” pode ser a redução da vida útil dos principais

componentes do produto: como por exemplo: o compressor. De qualquer modo, seria uma

estratégia que dependeria do “ esforço” de vários profissionais que exaustivamente

trabalhariam em prol da “ satisfação do consumidor brasileiro” .

Uma outra evidência de que a obsolescência planejada depende do trabalho conjunto

de diferentes áreas que fazem parte de uma empresa está na estratégia que vem sendo adotada

pelas empresas que fabricam aparelhos de televisão.

A cada seis meses as empresas lançam novos modelos de aparelhos, vários dos componentes desses
aparelhos são produzidos por empresas terceirizadas e localizadas na China. Depois de algum tempo
de uso, quando o produto começa a apresentar algum defeito o cliente muitas vezes não consegue
encontrar peças de reposição. Recentemente, um cliente precisou de dois circuitos integrados
“ micro” (responsável pelo armazenamento de informações como brilho, cor e contraste da televisão)
do modelo GL da Philips. Até bem pouco tempo atrás esse modelo era vendido no mercado. Depois
que lhe disse que o componente não era mais fabricado, o cliente entrou em contato por e-mail com
a empresa para saber o que poderia fazer. O cliente, muito indignado, me disse que a empresa lhe
informou que a peça não era mais fabricada, e junto com o e-mail de resposta enviou informações
sobre novos modelos de televisão da empresa.
O número de modelos e a “ vontade de vender” é tanta que as empresas estão desrespeitando o
código de defesa do consumidor que determina que as peças de reposição sejam fabricadas por até
cinco anos após o término da fabricação de um produto.
Além disso, os aparelhos avançaram em termos de recursos tecnológicos, mas perderam muito em
durabilidade. Alguém que tenha um aparelho com vinte anos de uso, se esse for bem cuidado, é
muito provável que ainda funcione, o mesmo não é possível dizer de um aparelho mais novo. Dentre
outras características, esses aparelhos não resistem às freqüentes variações de energia e tendem a
oxidar mais facilmente.
A verdade é que as empresas querem vender novos aparelhos. Está cada vez mais difícil prestar
serviços de assistência técnica nessa área, não vale nem a pena ser uma assistência autorizada.

Descrição do relato de Celso, técnico em manutenção de televisores, feita em setembro de 2004.

Kotler e Armstrong (2003), fazendo referência ao fato de que nas últimas décadas as

empresas evoluíram para a qualidade definida pelo cliente e para sua satisfação total, dizem

que

[...] muitas empresas transformaram a qualidade orientada ao cliente numa


potente arma estratégica. Elas criam satisfação e valor para os clientes, por
satisfazerem consistente e lucrativamente as necessidades e preferências
deles quanto à qualidade. De fato, a qualidade agora se tornou uma
necessidade competitiva – no século XXI, somente sobreviverão as empresas
que tiverem a melhor qualidade. (KOTLER e ARMSTRONG, 2003, p. 211).
105

No entanto, percebo que, sob o discurso da qualidade e da inovação, as empresas

estão utilizando a estratégia de obsolescência física, para atender as suas necessidades, em

detrimento das necessidades dos consumidores.

Por outro lado, como diz Slater (2002, p. 15), “ na experiência cotidiana a cultura do

consumo vive num perpétuo ano zero de novidade, gira em torno da autocriação contínua por

meio da acessibilidade às coisas que são elas próprias apresentadas como novas, a última

moda, a coqueluche ou febre do momento, sempre aperfeiçoada e aperfeiçoadora” . Conforme

McCracken (1986), o sistema de moda é capaz de inventar significados culturais através de

líderes formadores de opinião que estimulam a mudança de princípios e categorias culturais.

Embora não pretenda desconsiderar a importância das melhorias técnicas e dos avanços

tecnológicos na criação de produtos e serviços, o fato é que, em curto espaço de tempo (e

alguns em médio espaço de tempo), muitas mudanças ocorrem no campo da “ criação de um

conceito” . Por essa razão, de um ano para o outro, alguns formadores de opinião dizem: “ essa

é a nova tendência” , “ agora não se usa mais...” , “ agora já é possível usar...” . 6HULDP HVVHV

DUJXPHQWRV IUXWRV GH SHVTXLVDV FRP RV FRQVXPLGRUHV RX FRQVXPLGRUDV" 2X HVWDULDP PDLV

SUy[LPRVGDLGpLDGHTXHHVVHVVmRGLVFXUVRVGH³SURGXWRUHVGHFRQFHLWRV´ (SLATER, 2002),

GH³PDQLSXODGRUHVGHVLJQRV´ (BAUDRILLARD, 1995)?

O que ocorreu é que a produção estética hoje está integrada à produção das
mercadorias em geral: a urgência desvairada da economia em produzir novas
séries de produtos que cada vez mais pareçam novidades (de roupas a
aviões), com um ritmo de WXUQ RYHU cada vez maior, atribui uma posição e
uma função estrutural cada vez mais essenciais à inovação estética e ao
experimentalismo. [...] a nova era da cultura pós-moderna global, ainda que
americana, é expressão interna e superestrutural de uma nova era de
dominação, militar e econômica dos Estados Unidos sobre o resto do mundo:
nesse sentido, como durante toda a história de classes o avesso da cultura é
sangue, tortura, morte e terror. (JAMESON, 2000, p. 30-31).

2TXHKiGHQRYRDFDGDDQRQDQRYDFROHomRGD)yUXP"4XDORVHQWLGRGHD1LNH

ODQoDU D FDGD VHLV PHVHV XPD FROHomR LQILQGiYHO GH QRYRV PRGHORV GH WrQLV"2 TXH Ki GH

UHDOPHQWHQRYRDFDGDQRYDFROHomRDQXDOGHFDUURVGDLQG~VWULDDXWRPRELOtVWLFD"3RUTXHD
106

FDGD PRPHQWR VXUJHP FDQWRUHV H P~VLFDV TXH VmR LQFHVVDQWHPHQWH WRFDGRV H GLYXOJDGRV

SDUD QXP LQVWDQWH VHJXLQWH VXUJLUHP RXWURV TXH WDPEpP VHUmR WRFDGRV H ORJR DSyV

GHVFDUWDGRV SDUD QRYRV ³IHQ{PHQRV´ VXUJLUHP" Na verdade, tudo tem que ficar obsoleto,

tudo tem que ser descartado. As empresas (de vestuário, material esportivo, telefonia celular,

automóveis, entretenimento entre outras) trabalham dentro dessa urgência do novo que na

concepção do marketing é para atender a necessidades, mas que, no entanto, entendo que é

para a FRQVWUXomRGDLQVDWLVIDomR.

A obsolescência relaciona-se intimamente com o domínio da cultura do consumismo

que se intensifica e tem determinado a modalidade dos discursos nos negócios na sociedade

pós-moderna. A velocidade de lançamentos de produtos e imagens no mercado gera desejos

sem limites. Sahlins (1979) chama o profissional de marketing de mercenário do símbolo que

não cria nada de novo, que tem como função ser sensível às correspondências latentes na

ordem cultural e que procura na conjunção produto-símbolo o sucesso mercantil.

O fenômeno do crescimento da telefonia celular no Brasil nos últimos anos é um

outro bom exemplo para caracterizar essa situação. O telefone celular constitui-se em uma

importante invenção tecnológica que facilita a comunicação e a troca de informação entre as

pessoas, seja para fins profissionais ou particulares. No entanto, os esforços de promoção

(comunicação), juntamente com o desenvolvimento tecnológico das operadoras e dos

fabricantes de aparelhos de celular, são tantos que o celular se tornou um sucesso de vendas e

ao mesmo tempo de efemeridade, pois não basta ter um aparelho e realizar chamadas, é

preciso muito mais. A experiência de um vendedor que trabalha na área ilustra o que é esse

fenômeno:

“ Eu só trabalho com a venda de planos para pessoas jurídicas. Esse catálogo [de vendas] tem apenas
alguns modelos de aparelhos que fazem parte do plano empresarial. Não tenho a mínima idéia dos
recursos que a maioria desses aparelhos possui, só conheço os recursos daqueles que vendo mais,
assim mesmo...[risos] não conheço tudo. É muita coisa!!! É muita coisa!!!!
107

Só vendo plano empresarial, mas tenho lidado com o consumidor, porque o que as pessoas têm feito
muito é utilizarem o registro de uma empresa [por exemplo: uma padaria] para formarem um plano
[que tem duração de vinte quatro meses] e em conjunto reduzirem as tarifas. Costumo lembrar que
isso pode ser arriscado porque a responsabilidade da fatura mensal é do dono [proprietário da
empresa], se alguém não pagar as suas ligações.
Fico impressionado porque pessoas com pouca grana saem do celular de cartão e entram nesses
planos que não são nada baratos [algo em torno de R$ 45,00 mensais] e que terão de ser pagos
mensalmente, é assustador porque algumas pessoas ganham muito pouco [salário mínimo ou um
pouco mais]. A minha impressão é de que as pessoas se motivam porque os aparelhos acabam saindo
praticamente de graça em função do contrato de comodato que é criado. Pode deixar que quem tem
menos grana, menos condições, procura aparelhos mais sofisticados.
É muito interessante porque muitos acompanham os lançamentos das empresas e procuram comprar
os aparelhos que fazem ‘mais coisas’ , os ‘mais completos’ , mas percebo que no fundo não usarão
quase nada daquilo que o aparelho oferece. Esses dias um cliente me disse que precisava de um
celular diferente para impressionar as minas (sic) [mulheres], outro me disse que queria trocar o
celular, que possuía há seis meses, porque a tela não era colorida, embora não soubesse ainda usar
nem a metade das funções do aparelho atual .
Este é meu ganha pão e não posso falar mal dele [risos], mas celular é como um vício qualquer,
depois de ter não é fácil largar.”

Relato feito por Eduardo, Consultor de Vendas da Tim, em janeiro de 2004.

Além disso, conforme D’ aveni (1995), em um ambiente de hipercompetição, as

empresas precisam criar vantagens competitivas temporárias, que derrubem as vantagens dos

concorrentes. A estratégia da obsolescência planejada pode ser enquadrada perfeitamente

nesse discurso estratégico, pois a empresa, ao tornar seus próprios produtos descartáveis,

efêmeros e passageiros, obriga a concorrência a fazer o mesmo para que não fique em

desvantagem. As funções de marketing e de produção nesse contexto têm participação

conjunta e decisiva, podendo as ações ser ou não integradas. Nesse processo de criação e de

destruição, muito provavelmente, a única coisa que fica e que deve ser preservada é o

fortalecimento da marca, pois é essa que deve permanecer com o tempo.

Para Schumpeter (1988), a “ destruição criadora” , ou seja, a substituição de antigos

produtos e hábitos de consumir por novos é, geralmente, iniciada pelo produtor, e não pelo

consumidor. Para o autor, o produtor ensina os consumidores a quererem coisas novas, ou

coisas que diferem em um aspecto ou outro daquelas que tinham o hábito de usar. Nesse

sentido, quero enfatizar que D REVROHVFrQFLD SODQHMDGD DWHQGH jV ³QHFHVVLGDGHV GDV

HPSUHVDV´HQmRjV³QHFHVVLGDGHVGRVFRQVXPLGRUHV´
108

$UHGXomRGHHPEDODJHQVFRPRHVWUDWpJLDGHVDWLVIDomR"

Kotler e Armstrong (2003) mencionam que as embalagens se transformaram em uma

importante ferramenta de marketing, devido a maior concorrência e saturação nas prateleiras

das lojas do varejo essas devem realizar inúmeras tarefas de vendas: desde atrair a atenção até

efetuar a venda. Churchill e Peper (2000) vêem a embalagem como um aspecto que

acrescenta valor para o cliente, através de propósitos: funcionais, promocionais e de distinção

(diferenciação) frente aos produtos dos demais concorrentes. Os autores dizem que além dos

cuidados com os custos das embalagens os profissionais “ precisam responder aos desejos e

necessidades dos clientes” (CHURCHILL e PEPER, 2000, p. 276). Nesse sentido, entendo

que é relevante considerar um tipo de estratégia que tem sido bastante utilizada pelas

empresas brasileiras: a PDTXLDJHPHPWRUQRGHHPEDODJHQV.

No segundo semestre de 2001, várias empresas encontraram uma “ bela forma” de

comemorar os dez anos de existência do Código de Defesa do Consumidor, na época

resolveram reduzir tamanhos e mantiveram as embalagens, nomes e preços. Ou seja,

decidiram induzir o consumidor ao erro, vendendo menos pelo mesmo preço.

O PROCON de São Paulo identificou mudanças em: papel higiênico, caixa de sabão em pó,
embalagens de biscoitos, bebidas isotônicas, ceras em pasta, pão de forma, maionese, toalhas de
papel, requeijão, fraldas, extrato de tomate, sardinha em lata, desodorante, refil para aparelho de
barbear, xampu e rações para animais.
Círio Brasil, Conlexpress, Karambi, Procter & Gamble, Gessy Lever, Quaker Brasil, GDC Alimentos
alteraram [maquiaram] suas embalagens.

Reportagem veiculada Revista Época, 20 de agosto, de 2001.

Dentre as “ maquiadoras” de embalagens estavam empresas líderes de mercado ou

que ocupavam posição de destaque em suas categorias. Vieira F. (2003), baseado em uma

investigação empírica sobre esse mesmo acontecimento, relata que a redução de embalagens

(shrinking sizes) contrapõe frontalmente a idéia de que o consumidor é soberano nas relações
109

comerciais, como também contrapõe a idéia de que o mercado, por si só, é capaz de regular de

maneira ética as ações das empresas. O autor também registra que

[...] a estrutura de varejo (supermercados) é co-responsável pela redução das


embalagens e alteração nos produtos, pois não as denunciou e permaneceu
em silêncio. É como se a estratégia, deliberada, fosse transferir a
responsabilidade para a indústria, isentando-se de culpas perante os olhos
dos consumidores, da imprensa e dos órgãos governamentais de fiscalização.
(VIEIRA F., 2003, p. 10).

Nesse mesmo período, Prates (2001) constata que as embalagens dos medicamentos

sofreram reduções e alterações; três estratégias de manipulação foram utilizadas pelos

laboratórios para promover reajustes de preços: retirada do mercado de embalagens com

menos unidades e oferta do produto com nova apresentação contendo maior quantidade,

porém com preço unitário de venda mais alto, redução na concentração do medicamento, sem

uma proporcional redução no preço; redução na quantidade de unidades na embalagem sem

diminuição do preço do produto. Dentre os laboratórios envolvidos nessas ações estavam

Medley, Pfizer, Glaxo Welcome, Libbs, Merck Sharp, Aché, e Searle. Durante o ano de 2005,

[...] dezesseis fabricantes, dentre eles Nestlé, Hewlett-Packard, Johnson & Johnson, Chocolates
Garoto, Procter & Gamble, Danone, Quaker e Unilever, foram multados pelo Departamento de
Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC) do Ministério da Justiça por terem reduzido a quantidade
de seus produtos sem informar aos consumidores.
De acordo com a Portaria número 81 do Ministério da Justiça, as alterações nas quantidades dos
produtos devem ser informadas pelos fabricantes pelo prazo mínimo de três meses, em mensagem
específica no painel principal da embalagem do produto, utilizando letras e cores destacadas.
Segundo, Antônio Carlos Fraquelli, economista da Fundação de Economia e Estatística (FEE), essa
tática vem sendo adotada no momento em que a inflação está crescendo, depois de três anos em
queda - de 12% em 2002, passou para 9%, em 2003 e 7%, no ano passado. Nesse contexto, os
fabricantes, ficam com pouca margem para reajustar os preços e acabam tomando medidas como
esta para evitar que os consumidores corram para os concorrentes. A tática, geralmente, é bem-
sucedida, já que as pessoas não têm o hábito de comparar o mesmo produto de um mesmo
fabricante.

Reportagem veiculada no Jornal do Comércio, 21 de fevereiro de 2005.

Além das possíveis mudanças de marca de produto por parte dos consumidores,

entendo que um outro fato de fundamental importância que precisa ser enfatizado nesses

casos de reduções do tamanho de embalagens, é que HPIXQomRGDPD[LPL]DomRGDHVFROKD

IDWRUGHFRQVWUXomRGDLQVDWLVIDomRRVFRQVXPLGRUHVVHWRUQDPYXOQHUiYHLVTXDQGRGDV
110

HVFROKDV GH HPEDODJHQV. Ou seja, o excesso de opções (marcas, linhas de produtos,

embalagens) faz com que o consumidor tenha dificuldade de transformar dados em

informações, e isso favorece o “ sucesso” desse tipo de estratégia de manipulação.

Acredito que, muito provavelmente, essas empresas fariam um grande alarde

promocional se resolvessem aumentar o tamanho de suas embalagens e vender os produtos

pelo mesmo preço. Propagandas e material de merchandising anunciariam: “ o consumidor

agora vai levar mais e pagar menos” ou “ pensando no bolso do nosso consumidor nós

resolvemos mudar para melhor” . 'H TXH IRUPD SRGHPRV LQWHUSUHWDU WDLV ³HVWUDWpJLDV´"

&RPR SRGHPRV SHUFHEHU D SUHRFXSDomR GHVVDV HPSUHVDV FRP DV QHFHVVLGDGHV GRV

FRQVXPLGRUHV"6HULDSHODTXDOLGDGHGHFRQIRUPLGDGHTXHWDLVSURGXWRVSRVVXHPTXHPXLWDV

GHVVDVHPSUHVDVVmROtGHUHVGHPHUFDGR"

No entanto, é preciso evidenciar que a realização desse tipo de estratégia não envolve

apenas a “ contribuição” do marketing, pois uma empresa, ao perceber que seus lucros estão

diminuindo, e que, provavelmente, os consumidores não desejam pagar mais pelo produto,

será necessária “ uma nova estratégia que atenda às necessidades dos consumidores” , nesse

caso, “ produzir novas embalagens” .

As empresas que manipulam embalagens correm o risco de deixar os consumidores

indignados a ponto de rejeitarem seus produtos e marcas. Mas, esse caso me estimula a fazer

as seguintes indagações: VH RV FRQVXPLGRUHV IRVVHP RUJDQL]DGRV PDQLIHVWDVVHP XP

FRPSRUWDPHQWRDVVHUWLYRHIRVVHPEHPLQIRUPDGRVDVHPSUHVDVFRQWLQXDULDPDWHQGHQGRDV

VXDV QHFHVVLGDGHV GHVVD IRUPD" 6H RV FRQVXPLGRUHV QmR HVWLYHVVHP GLDQWH GR H[FHVVR GH

RSo}HV GH HVFROKD DV SRVVLELOLGDGHV GH ³VXFHVVR´ PHGLDQWH D DGRomR GH WDO ³HVWUDWpJLD´

VHULDPDVPHVPDV"
111

$VHVWUDWpJLDVGHSUHFLILFDomRDWHQGHPQHFHVVLGDGHV"

Kotler e Armstrong (2003, p. 263) afirmam que preço “ [...] é a soma de todos os

valores que os consumidores trocam pelos benefícios de obter ou utilizar um produto ou

serviço” ; assim, o preço não diz respeito apenas ao desembolso financeiro do consumidor.

Dentre as HVWUDWpJLDV GH SUHoRV mencionadas por Kotler e Armstrong (2003) destaco as

estratégias de determinação de: preços psicológicos; preço-isca; preço para produto

complementar (ou cativo). A determinação de preços psicológicos, pressupõe a fixação de um

preço psicológico para indicar que um produto possui qualidade superior. Como afirma

Beckwith (2001, p. 20), “ não é à toa que os vendedores experientes nunca sugerem que algo

tem preço baixo, quando querem passar a mensagem de que o serviço oferecido é excelente” ,

pois conforme Churchill e Peper (2000), o valor percebido é que determina quanto um cliente

está disposto a pagar por determinado produto e serviço. Cabe considerar que como o

consumidor se encontra distante do processo de produção, ele normalmente tem na qualidade

percebida a possibilidade de julgamento sobre a qualidade de um produto, fato que o deixa em

uma situação vulnerável. Essa questão vou abordá-la posteriormente; por ora indago:

FRQVLGHUDQGRRSRGHUGRGLVFXUVRGDVHPSUHVDVSDUDDFRQVWUXomRGHVHQWLGRVDGHFLVmRGH

IL[DU XP SUHoR DOWR SDUD SDVVDU D LGpLD GH TXDOLGDGH p XPD IRUPD GH ³DWHQGHU jV

QHFHVVLGDGHV´GRFRQVXPLGRURXGDHPSUHVD"

Um outro tipo de estratégia de preço psicológico é a determinação de preço de

referência. Nesse tipo de precificação, a empresa fixa um preço, por exemplo, de R$ 599,00

para que o consumidor perceba que o produto pertence a uma faixa de preço de “ quinhentos

reais” e não de “ seiscentos reais” . (VVDIRUPDGHGHWHUPLQDomRGHSUHoRTXHpLQWHQVDPHQWH

DGRWDGD SRU HPSUHVDV YDUHMLVWDV EUDVLOHLUDV FRPR SRU H[HPSOR VXSHUPHUFDGRV ORMDV GH

FRQIHFo}HVHGHHOHWURGRPpVWLFRV pFRPSDWtYHOFRPRGLVFXUVRGHXPDiUHD RXHPSUHVD TXH

VHGL]YROWDGDD³IDFLOLWDUDWURFD´"
112

Churchill e Peper (2000, p. 349) argumentam que no preço de mercadoria-isca “ o

varejista vende alguns produtos por preço abaixo ou quase igual ao custo, a fim de atrair

clientes, na espera de que eles comprem outros produtos também” . Os autores lembram que

os varejistas escolhem para esse tipo de estratégia aqueles produtos que atrairão muitos

consumidores e colocam esses produtos no fundo da loja, para que os consumidores passem e

comprem outros produtos de altas margens que estão ao longo da loja. Cabe ainda ressaltar

que alguns varejistas aproveitam para aumentar o preço de produtos que são complementares

àqueles que estão em promoção, como forma de compensar as perdas causadas pelo fato de

determinados produtos estarem com preço reduzido.

Segundo Kotler e Armstrong (2003, p. 286), no preço para produto cativo “ os

fabricantes quase sempre estabelecem um preço baixo para os produtos principais e margem

alta para os complementares” . É o caso das estratégias de preços das impressoras (produtos

principais) que são vendidas por um preço baixo (atrativo) para que a empresa obtenha um

ganho maior com a reposição do cartucho (produto cativo). (VVD HVWUDWpJLD SRGH VHU

FRQVLGHUDGDXPDHVWUDWpJLDSDUDSURSLFLDU³JDQKRVP~WXRV´RX³PDQWHUUHODFLRQDPHQWR´"

Por falar em relacionamento, o plano de tarifas para clientes leais de uma operadora

de telefone fixo ilustra a preocupação da direção da empresa com o repasse de informações

para atender aos interesses dos clientes que optassem pelo plano.

Semana passada tivemos uma reunião com a gerência [de marketing], sobre um novo plano de tarifas
que a empresa está implantando. O plano é para ligações interurbanas e é constituído de apenas três
tarifas para todo o Brasil: uma para o dia, uma para a noite, e outra para final de semana. Os clientes
para participarem do plano precisam ligar e se inscrever no programa “ Tarifa Reduzida” (nome
fictício).
Depois que o plano foi apresentado, um colega de empresa perguntou ao gerente como ficariam as
tarifas dos clientes que optassem pelo plano, mas que realizassem ligações interurbanas de curta
distância, pois o valor dessas tarifas era mais baixo, em qualquer turno e dia da semana, comparado
aos valores de qualquer uma das três tarifas do plano.
Sabe qual foi a resposta? “ O cliente é que vai ter que analisar isso e, daí, optar por uma outra
operadora [concorrente] para realizar uma ligação com tarifa mais baixa” . Meu colega voltou a
questioná-lo perguntando se não seria possível incluir uma nova tarifa. O gerente disse que não, pois
seria muito difícil operacionalizar essa mudança, principalmente, porque a empresa entendia que
seria mais fácil comunicar a idéia do plano com três tarifas.
113

$OJXQV PHVHV GHSRLV GHVVD FRQYHUVD HP XP RXWUR HQFRQWUR FRP $QGUp LQGDJXHL FRPR HVWDYD R
SODQRHOHPHGLVVHTXHQmRVDELDQDGDVREUHYROXPHGHDGHV}HVPDVPHUHODWRXRVHJXLQWH

“ Lembra daquela história sobre as tarifas interurbunas serem mais baixas que as tarifas do plano? O
que posso te dizer é que a empresa não está dando qualquer informação nas propagandas veiculadas
pela tv. O consumidor mais atento e com tempo disponível pode pegar as tarifas no site da empresa e
identificar o possível prejuízo que terá se fizer uma análise comparativa entre as tarifas que estão
disponíveis no site.
)DODQGRGHIRUPDLQGLJQDGD$QGUpPHGLVVH
Cara!! Os caras são muito f.d.p.

Relato feito por André, assistente de marketing de uma operadora de telefonia convencional.

Novamente, entendo que o excesso de informação contribui para que as empresas

adotem estratégias de determinação de preços questionáveis sob o ponto de vista das

necessidades de seus consumidores. Cabe registrar que no caso específico da empresa de

telefonia, não há nada ilegal em sua estratégia de preço, mas HPXPSURJUDPDFRPRHVVHQmR

p SUHFLVR FRQVLGHUDU RV³JDQKRV P~WXRV´ SDUD ³PDQWHURUHODFLRQDPHQWR´" Considerando

que é uma grande empresa que está constantemente anunciando na mídia de massa, é razoável

pensar que a empresa poderia alertar seus clientes dos possíveis prejuízos que esses poderiam

ter caso realizassem ligações interurbanas de curta distância. Além disso, atitudes como essa

reforçam o argumento de que:

[...] o discurso presente na comunicação de massa cria uma contradição


insuperável: a organização empresarial, cada vez mais vista pela sociedade
como uma instituição política, engendrada com o objetivo de atender
demandas específicas, assume perante o público o papel de uma instituição
que tem o fim em si mesma, orientada apenas para o lucro a qualquer preço,
sem nenhuma responsabilidade para com o conjunto da sociedade. (LEVY,
2003, p. 11).

Na próxima subseção passo a analisar o discurso da comunicação de massa (em

especial, a televisão) que é um gênero do discurso do marketing de fundamental importância

para a produção de sentidos e consolidação das estratégias acima descritas.


114

$7(/(9,6­2&202)$725'(352'8d­2'(6(17,'26

Em um mundo globalizado, onde as empresas cada vez mais procuram consolidar

sua presença em todos os países em que possam obter lucros, é previsível que as estratégias de

comunicação das marcas procurem criar uma cultura global. Como exemplo estão as

expressões da Levi’ s “ uma cultura de estilo mundial” ou da IBM “ soluções para um mundo

pequeno” (KLEIN, 2002, p. 19). No entanto, não são apenas as empresas que atuam em mais

de um país que buscam esse tipo de consolidação; tal condição se aplica também às empresas

que atuam em países de dimensões globais, como o Brasil, e que buscam aumentar sua

penetração, aceitação e participação no mercado. Em tais estratégias há um inevitável

distanciamento entre empresa e consumidor:

As relações de mercado são anônimas e, em princípio, universais: o


consumidor não é um “ freguês” conhecido, e sim um sujeito anônimo que só
pode ser imaginado e formulado como um objeto - o alvo de uma ofensiva
de marketing, o perfil produzido por uma pesquisa de mercado, um mercado
de massa ou um segmento do mercado.
Além disso, quando o significado cultural do bem do consumo não é
fornecido imediatamente pelas relações personalizadas nas quais é produzido
e trocado, então ele também tem de ser produzido e distribuído numa escala
cada vez maior de forma impessoal e generalizada: o design, a propaganda, o
marketing, todos eles começam antes que a industrialização se dissemine,
por causa da necessidade de personalizar o impessoal, de especificar
culturalmente o geral e o abstrato. (SLATER, 2002, p. 34).

Por isso, os esforços de comunicação são voltados para criar símbolos e mercados

antes mesmo que os produtos e serviços cheguem às lojas. Como argumenta Baudrillard

(1991a, p. 97), fazendo referência aos objetos que estão em hipermercados, diz:“ [...] Os

objetos já não são mercadorias; já nem se quer são exatamente signos cujos sentidos e

mensagens decifrássemos e dos quais nos apoderássemos; são testes, são eles que nos

interrogam e nós somos intimados a responder-lhes e a resposta está incluída na pergunta” .

Como descreve Ianni (2000, p. 143), “ na época da globalização as tecnologias

eletrônicas, informáticas e cibernéticas impregnam crescente e generalizante todas as esferas


115

da sociedade nacional e mundial; e de modo particularmente acentuado as estruturas de poder

sem esquecer as corporações da mídia. Esse pode ser o clima em que se forma, impõe e

sobrepõe 2 SUtQFLSH HOHWU{QLFR” . A mesma comunicação bombardeia adultos, jovens e

crianças, ricos e pobres. As pessoas que moram em aldeias pequenas, aparentemente remotas,

em países pobres do “ Terceiro Mundo” , podem receber, na privacidade de suas casas, as

mensagens e imagens das culturas ricas, consumistas do Ocidente, fornecidas através de

aparelhos de televisão ou de rádios portáteis, que as prendem à “ aldeia global” das novas

redes de comunicação (HALL, 1997, p. 79). Jameson (2004), reportando-se a países do

terceiro mundo, argumenta que o desejo de participar do novo mercado mundial determina

que

[...] além do desenvolvimento de uma dependência quanto a produtos


importados e a destruição da produção local, deve ser, hoje em dia,
marcadamente cultural, [...] o desejo de estar integrado ao mercado mundial
é claramente perpetuado pelos circuitos internacionais de informação e
diversões exportadas (principalmente por Hollywood e pela televisão norte-
americana), que não somente reforçam tais estilos internacionais de
consumismo mas também, o que é ainda mais importante, bloqueiam a
formação de culturas autônomas e alternativas baseadas em valores ou
princípios diferentes [...] (JAMESON, 2004, p. 71).

Fazendo referência à importância da televisão nos Estados Unidos, Harvey (1992)

diz que não é difícil atribuir alguma espécie de papel plasmador à proliferação do uso da

televisão:

Apontar a potência dessa força na moldagem da cultura como modo total de


vida não é, no entanto, cair necessariamente num determinismo tecnológico
simplista do tipo “ a televisão gerou o pós-modernismo” . Porque a televisão é
ela mesma um produto do capitalismo avançado e, como tal, tem de ser vista
no contexto da promoção de uma cultura do consumismo. Isso dirige a nossa
atenção para a produção de necessidades e desejos, para a mobilização do
desejo e da fantasia, para a política da distração como parte do impulso para
manter nos mercados de consumo uma demanda capaz de conservar a
lucratividade da produção capitalista. (HARVEY, 1992, p. 64).

Entendo que essa posição é adequada para expressar o significado que a televisão

também tem no Brasil, que é um país de “ teledependentes” (para usar uma expressão de
116

Erausquin, Matilla e Vazquez, 1983), muito embora não desconsidere a importância do rádio,

já consolidado em todos os segmentos sociais, bem como da internet, que vem aumentando a

sua penetração na sociedade brasileira. Como refere Sodré (1984), desde a década de 1970 a

televisão brasileira faz parte da estratégia de crescimento nacional, no sentido de estimular o

consumo do excedente econômico produzido na forma de bens e serviços de luxo, bem como

representa um meio sistematizador da linguagem de massa.

São as grandes organizações (brasileiras e/ou multinacionais) que comandam a

televisão no Brasil e estão em todas as regiões, como qualquer organização capitalista, em que

existam possibilidades de obtenção de lucro. São comandadas por empresários do jornalismo,

da comunicação, que podem ter, ou não, sido jornalistas. São organizações “ de comunicação

social” e, ao mesmo tempo, “ indústrias culturais” , pois buscam informar, formar, entreter,

ocupar, persuadir, manter, transformar seus telespectadores para que afinal alcancem seus

resultados econômico-financeiros. Entendo que as intenções estratégicas das grandes

corporações, tanto daquelas que comandam como das que se beneficiam da mídia, são de

difícil análise e identificação. No entanto, existem evidências que podem ser observadas

mesmo que estejamos à distância das instâncias de decisão.

O discurso dessas organizações se mostra em permanente conflito, uma vez que se

misturam e se confundem interesses jornalísticos, políticos, econômicos, sociais e de

mercado. Durante minhas observações pude perceber que a mesma televisão que, em

determinado momento, divulga e apóia o consumo do supérfluo (como os trezentos pares da

coleção de sapatos de uma famosa atriz), logo após, mostra-se surpresa e indignada com as

pessoas que não possuem as mínimas condições de alimentação (como a mãe que alimenta

seus filhos à base de farinha de mandioca), e, no instante seguinte, revela entusiasmada a

escolha do milionário jogador de futebol que se tornou o mais novo embaixador da


117

Organização das Nações Unidas (ONU) contra a fome no mundo. Na sociedade pós-moderna,

plural, heterogênea, efêmera e contraditória não seria a televisão uma exceção a essa regra.

Tais condições estão em seus telejornais, em seus programas de entretenimento e nas

propagandas que ela exibe. Nesse sentido, apresento minha interpretação de como o discurso

da televisão brasileira tem auxiliado indesejavelmente o marketing na construção de imagens,

símbolos e marcas. Faço isso com pequenos e sutis exemplos, frutos de minhas observações,

mas que, no meu entender, são significativos para defender minhas idéias.

$FRPXQLFDomRH[SOtFLWDHDFRPXQLFDomRLPSOtFLWD

Começo minha argumentação pelo jornalismo na televisão. Bourdieu (1997)

demonstra especial preocupação com as influências de mercado, que cada vez mais

pressionam os jornalistas da televisão; em seguida, e em parte através deles, com os diferentes

campos da produção cultural, jurídica, literária, artística, científica, filosófica, política e

democrática. É o jornalismo se dedicando ao mercado do “ shownalismo” (ARBEX, 2001). Há

estudos (HAYS e REISNER, 1990; SOLEY e CRAIG, 1992) realizados no exterior,

evidenciam a tentativa de influência de anunciantes no conteúdo editorial e, muitas vezes,

obtêm sucesso no que se refere à publicação de matérias contrárias às suas imagens, bem

como em relação à conquista de espaço para a veiculação de matérias que promovam seus

produtos e negócios.

A retórica do discurso jornalístico é marcada pela confusão de ser isento e

demonstrar neutralidade, emitindo porém opinião sobre aquilo que é certo ou errado; ser

persuasivo e atrativo a ponto de dar audiência e atender aos interesses econômicos e políticos

e ainda conciliá-los com os interesses sociais. Com duas pequenas reportagens que foram

apresentadas em um telejornal de uma mesma rede de televisão, descrevo a evidência de


118

contradição no discurso da televisão, em favor de seus interesses de mercado, da cultura do

consumo vigente e do marketing.

Em maio de 2003, a Rede Globo realizou uma reportagem em um de seus telejornais que
denunciava o valor exorbitante de R$ 20.000,00 que a viúva de um funcionário público recebia
mensalmente como pensão. Como forma de obter a opinião da pensionista, a reportagem foi até a
sua casa, mas a senhora negou-se a dar qualquer declaração e disse que seu filho é que poderia falar
em seu nome. A reportagem, após ter encontrado o filho da pensionista, perguntou a sua posição a
respeito do valor exorbitante da pensão que sua mãe recebia. Esse respondeu que a pensão estava
amparada legalmente e, por isso, considerava que a mesma era justa. Após a reportagem, o âncora
do telejornal, concluindo a matéria, fez um comentário sobre o fato, dizendo que o valor da pensão
era injusto e demonstrava a distorção das aposentadorias e pensões federais. Principalmente em
relação àquelas pagas aos demais trabalhadores da iniciativa privada. Tais distorções não poderiam
mais ocorrer para o bem do país.
Em junho de 2003, alguns dias depois, a emissora no mesmo telejornal exibe uma matéria sobre os
jogadores de futebol mais bem pagos do futebol mundial, A matéria mostrava que o jogador inglês
David Beckham - jogador do Manchester United e capitão da seleção inglesa - como o jogador de
futebol mais bem pago do mundo, com um rendimento anual de US$ 17 milhões. Na terceira
colocação aparecia o jogador Ronaldo, do Real Madrid e da seleção brasileira, com rendimentos de
US$ 13,2 milhões. Na lista dos 20 mais bem pagos apenas mais um outro brasileiro, Rivaldo, do
Milan e da seleção brasileira, com US$ 8,1 milhões anuais. Ao final da matéria o âncora do
telejornal faz um questionamento: Como Beckham pode ganhar muito mais do que Rivaldo? Afinal
o jogador brasileiro é melhor que o inglês, além de ter o título de campeão mundial de seleções,
título que o inglês não possui. Por fim, o jornalista diz: “ Rivaldo tem que melhorar o seu
marketing” .

O que motiva a equipe de edição de um mesmo jornal a ter posições tão antagônicas

para dois casos que poderiam ter o mesmo tratamento? 6HULDUD]RiYHOVXSRUTXHRFRPHQWiULR

DUHVSHLWRGRMRJDGRUIRVVHXPDSRVLomRSHVVRDOGRkQFRUDGRWHOHMRUQDOQmRWHQGRQHQKXPD

UHODomRFRPDOLQKDHGLWRULDOGRMRUQDOHGDHPLVVRUD" No entanto, não entendo que seja essa

a questão. 6H R YDORU PHQVDO GD SHQVmR GD YL~YD p DOWR RX DEVXUGR R TXH GL]HU GRV

UHQGLPHQWRV GH XP MRJDGRUGHIXWHERO" Ah! O primeiro é “ dinheiro público” , que deve ser

bem gasto, e o segundo é da iniciativa privada, e ninguém tem nada a ver com isso. Essa

talvez seja uma justificativa para tal posição. Mas faço outras perguntas a respeito desse caso:

TXHP p R IXQFLRQiULR S~EOLFR IDOHFLGR" TXDLV VHUYLoRV RX GHVVHUYLoRV HVVH IXQFLRQiULR

SUHVWRX DR 3DtV" p XP GDTXHOHV ³KHUyLV GD SiWULD´ RX ³VtPERORV GD SiWULD´" TXHP p R

5LYDOGR"TXDLVRVVHUYLoRVTXHHOHSUHVWDRXSUHVWRXDR3DtV"TXDORPRWLYRGHXPDSHQVmR

GHYDORUWmRH[SUHVVLYRHPUHODomRjPpGLDGHVDOiULRVHSHQV}HVSDJDVQR%UDVLO"TXDOD

UD]mRGHXPMRJDGRUGHIXWHEROVHUWmRYDORUL]DGR"FRPTXDO³LPDJHP´pSRVVtYHOOXFUDUD
119

GR IXQFLRQiULR IDOHFLGR RX D GR 5LYDOGR" DV GXDV SHVVRDV SRGHP VHU FODVVLILFDGDV FRPR

³VtPERORV´³SHUVRQDJHQV´³SURGXWRV´"VHDOJXpPWHPLQWHUHVVHHPOXFUDUFRPDLPDJHP

GHDOJXPGRVGRLVTXHPVHULD"

Entendo que é ponderável dizer que não apenas o Rivaldo, mas os jogadores de

futebol são valorizados porque são importantes para os interesses das emissoras de televisão,

uma vez que dão audiência para inúmeros programas (telejornais, programas de esportes, de

entrevistas, jogos de futebol). Também, não é possível esquecer que as “ imagens de sucesso”

dos jogadores são vinculadas às imagens de uma série de empresas (materiais esportivos,

celulares, automóveis, medicamentos, roupas, etc.) que veiculam seus comerciais e

patrocinam programas na televisão (inclusive telejornais). A valorização atribuída a um

jogador torna-o uma “ personalidade” que faz jus a altos salários e cachês pagos pelas

empresas que inevitavelmente superdimensionam seus custos e, em parte por isso, e por outra,

pelo reforço de imagem que obtêm, estipulam preços de venda mais altos. Bem, mas de onde

vem o dinheiro que sustenta tudo isso? Vem do “ dinheiro do público” , espalhado pelo mundo

inteiro. Voltando ao funcionário falecido, não se sabe quem é; certamente, não é uma

“ celebridade” , já a pensionista não é nada mais do que uma provável telespectadora e alguém

que no momento em que a matéria foi ao ar, proporcionou insignificantes pontos na audiência

da emissora.

Continuando meu raciocínio, apresento outras duas situações decorrentes de minhas

observações e que também evidenciam o discurso contraditório da televisão na defesa de seus

interesses de mercado. A primeira situação diz respeito a uma reportagem em um telejornal, e

a outra é relacionada com a exibição de uma propaganda de televisão e uma série de pequenas

notícias.

Em abril de 2003, a reportagem de um telejornal da Rede Globo acompanhou por alguns dias a vida
de uma senhora aparentando ter bastante idade, que durante o dia pedia esmolas em um sinal de
120

trânsito da cidade de São Paulo e que fazia isso simulando ter algum problema físico que dificultava
a sua capacidade de locomoção. Durante alguns dias a equipe de reportagem acompanhou o trajeto
que a senhora fazia do local onde ela pedia esmolas até a sua casa, demonstrando que a mesma
conseguia caminhar perfeitamente. Em um desses dias a equipe conseguiu flagrar a senhora
chegando à sua casa. A repórter procurou fazer algumas perguntas para a senhora, como: “ a senhora
está caminhando normalmente, mas porque não caminha dessa forma enquanto permanece durante o
dia no sinal de trânsito? por que a senhora faz isso? a senhora acha certo enganar as pessoas? por sua
vez, a senhora não respondeu a nenhuma pergunta formulada e foi logo fechando o portão de sua
casa. Ao final da matéria, o âncora do telejornal fez uma crítica sobre o comportamento indesejável
dessa senhora, uma vez que, para pedir dinheiro, procurava sensibilizar as pessoas com um problema
que ela não tinha.
Essa mesma emissora, durante vários meses do ano, exibiu em sua programação uma propaganda da
empresa C & A, em que a modelo Gisele Bündchen aparece usando e recomendando as roupas da
empresa. Durante esse período de tempo, a emissora exibiu reportagens em vários de seus telejornais
sobre a “ melhor modelo do mundo” , onde essa aparecia desfilando para grifes famosas, chegando e
saindo do Brasil, passeando por pontos turísticos, namorando, etc.

Não sabemos em que condições econômicas e financeiras vive a senhora que

apareceu pedindo esmolas e enganando as pessoas, mas é muito provável que seja em uma

situação bastante difícil e não invejável. A modelo, sabe-se, mesmo que seja de forma

imprecisa, que ganha milhões de dólares, tem fama mundial e é uma construção do

capitalismo que a torna referência para muitas jovens mulheres de todos os “ padrões

estéticos” , que gostariam de ser igual a ela e ganhar tanto quanto ela. O que não sabemos é se

ela usa a marca de roupa que, por ter ganhado muito dinheiro para fazer o comercial, diz usar.

A pergunta que fica é: VHUiTXHDHPLVVRUDGHWHOHYLVmRQmRGHYHULDLQYHVWLJDUVHDPRGHOR

*LVHOH%QGFKHQXVDUHDOPHQWHDTXHODVURXSDVGD& $MiTXHVXDLPDJHPpXWLOL]DGDSDUD

VHQVLELOL]DU RXSHUVXDGLU PLOKDUHVGHPXOKHUHV³DILFDUHPWmREHODVHVHQVXDLVTXDQWRHOD´

TXDQGR XWLOL]DUHP WDO PDUFD" (VVHV FDVRV VmR VHPHOKDQWHV" $V GXDV PXOKHUHV QmR HVWmR

H[HUFHQGRSDSpLVQDVRFLHGDGHHDPEDVDVVLWXDo}HVQmRVmRSDVVtYHLVGHFUtWLFDV"2VGRLV

SDSpLVVmRVRFLDOPHQWHDFHLWRVLQWHUHVVDQWHVjFXOWXUDGRFRQVXPRHDWHQGHPDRVLQWHUHVVHV

GDWHOHYLVmRHGRPDUNHWLQJGDVHPSUHVDV"

Sabe-se que a imagem construída da modelo, da mesma forma que a do jogador de

futebol, dá audiência quando aparece em programas da emissora, ajuda a vender as roupas das

marcas que divulga (chegando, inclusive, a receber UR\DOWLHV pela venda de produtos), como
121

também, das marcas pelas quais desfila e que são noticiadas em telejornais. O montante que é

pago a essas pessoas pode ser uma boa razão para que o mundo do marketing esteja sempre

“ quebrando o recorde mundial do último ano e planejando repetir a façanha no ano seguinte

com números cada vez maiores de peças publicitárias e novas e agressivas fórmulas para

atingir os consumidores, superando inclusive o crescimento da economia mundial” (KLEIN,

2002, p. 32). Já a senhora proporcionou alguma audiência no horário em que a matéria foi

apresentada e pode ser, simplesmente, só mais uma telespectadora da emissora de televisão.

Não custa lembrar que “ todas as necessidades sociais são explicadas em termos do papel

(funcional ou disfuncional) que desempenham [os trabalhadores] no sentido de manter o

capitalismo em atividade” (SLATER, 2002, p. 179).

O exemplo de Gisele Bündchen é apenas um entre tantos símbolos que são

construídos e supervalorizados pela mídia televisiva. Como diz Baudrillard (1995),

[...] a sedução e o narcisismo são previamente revezados por modelos,


industrialmente produzidos pelos ‘mass midia’ e transformados pelos
signos referenciáveis (para que todas as raparigas se apaixonem por
[Gisele Bündchen] requer-se que os cabelos, a boca ou determinado
pormenor do vestido as distinga, isto é, forçosamente a mesma coisa
para todas). Cada qual encontra a própria personalidade no
cumprimento de tais modelos. (BAUDRILLARD, 1995, p. 97).

Há uma série de outras pessoas (cantores, atletas, atores e apresentadores de

televisão) que, depois de algum tempo aparecendo na mídia, tornam-se símbolos e passam a

anunciar produtos e serviços ou a ter um produto ou uma linha de produtos associados aos

seus nomes, sem que necessariamente haja uma correspondência direta com a sua área de

competência ou atuação. Assim, Xuxa pode ter seu nome associado a uma linha de calçados

infantis; Sandy e Júnior, um telefone celular associado ao nome da dupla; a modelo Ana

Hichman, a uma linha de óculos; a Hebe Camargo, a uma linha de jóias, etc. Os produtos
122

associados a tais “ personalidades” podem mais facilmente conquistar espaços nos pontos de

venda e até mesmo reduzir os esforços de venda nos respectivos pontos. O “ sucesso” de tais

estratégias pode ser explicado em virtude da autoridade que a mídia atribui a essas pessoas.

Como argumenta Fromm (1976), há

[...] uma diferença entre ter uma autoridade e ser uma autoridade. [...] Nas
sociedades mais primitivas, a autoridade é exercida pela pessoa em geral
reconhecida como competente para a função. [...] Quando desaparecem ou
enfraquecem as qualidades em que a autoridade repousa, a própria
autoridade acaba. [...] em sociedades baseadas numa ordem hierárquica e
muito maiores e mais complexas [...] a autoridade pela competência cede
lugar à autoridade pela posição social. [...] milhões de pessoas em nosso
sistema conhecem [uma autoridade] apenas pela imagem artificial criada
pelos especialistas em relações públicas [propaganda, marketing]. Na
maioria das sociedades maiores [...] ocorre o processo de alienação da
autoridade [...] Se a autoridade veste o uniforme adequado ou tem o título
adequado, este sinal externo de competência substitui a competência
YHUGDGHLUD e suas qualidades. [...] Quem use esses símbolos de autoridade e
quem se beneficiar deles deve iludir o pensamento crítico e realista de seu
povo e obrigá-lo a crer na ficção. Quem quer que pense sobre ela saberá das
maquiações da propaganda, os métodos pelos quais o julgamento crítico é
destruído [...] (FROMM, 1976, p.53-55, grifo meu).

A autoridade que a televisão atribui às pessoas, também denominadas de

“ celebridades” , que habitualmente estão na mídia, pode ser também estendida às pessoas que

desenvolvem atividades na sociedade e, pelo menos a princípio, não estão diretamente ligadas

à mídia. A popularidade que adquirem os participantes de um programa do tipo UHDOLW\VKRZ,

mesmo que por uma ou duas semanas, é um fato bastante significativo para demonstrar o

poder da televisão para a construção de realidades. Além disso, essas pessoas, mesmo que por

curto espaço de tempo porque eles também são “ produtos” efêmeros e obsoletos, passam a

transitar e dar audiência às produções de programas de outras emissoras.

Uma outra questão que merece destaque se refere à forma pela qual a televisão

procura dar sentido àquilo que ela produz defendendo diretamente seus interesses e,

indiretamente, os interesses dos diversos atores que ela atende. As mensagens passadas

ocorrem na forma de FRPXQLFDomRH[SOtFLWDHLPSOtFLWD. A comunicação explícita manifesta-


123

se nas propagandas veiculadas nos intervalos da programação (esse tipo de comunicação será

abordado em outro momento) e em mensagens veiculadas durante a exibição dos programas

em formas bastante variadas. A ditadura do controle remoto (efeito ]DSSLQJ) que permite ao

consumidor ficar trocando de canal é um bom motivo para a realização de propagandas

durante a exibição dos programas de entretenimento e de entrevistas. Por outro lado, a

possível perda de atratividade e força da propaganda tradicional pode ser um outro bom

motivo para tais iniciativas. Ries e Ries (2003) afirmavam que, em função do excesso de

comunicação eletrônica, a propaganda não possui mais o poder de criar novos conceitos, e

sim, de trabalhar sobre aquilo que já está posicionado na mente dos consumidores. Os autores

entendem que, em razão de a propaganda não ter mais eficácia e credibilidade para a

construção de marcas junto aos consumidores, a mídia espontânea e as relações públicas é que

podem desenvolver a imagem das marcas junto aos consumidores.

Os comentários dos apresentadores e a forma descontraída como esses são realizados

(com brincadeiras, bom-humor e MLQJOHV) garantem a naturalidade à mensagem, ao mesmo

tempo em que os testemunhos e as indicações dos apresentadores (formadores de opinião que

são) dão a credibilidade necessária à mensagem anunciada. Um bom exemplo para esse tipo

de comunicação percebi na mensagem da Fininvest exibida no Domingão do Faustão.

Assistente de Palco do Programa: “ Essa é a semana do aposentado na Fininvest É a grande


oportunidade para você, aposentado, levar a vida como merece. O aposentado faz o empréstimo e
ainda leva um presente” .
Faustão (demonstrando entusiasmo): Ah! Então, essa semana o aposentado faz o empréstimo, resolve
os seus problemas financeiros e ainda ganha um presente? [...] Como é então Caçulinha?
Caçulinha juntamente com a banda do programa canta, com o auxílio do auditório, o MLQJOH: “ Não
precisa papelada, não precisa confusão, o dinheiro sai na hora [...] quem disse que não dá? Na
Fininvest dá!!!” .
Faustão: “ Precisando de dinheiro para pagar dívida, realizar o sonho da moto, da viagem, passe em
uma loja da Fininvest mais próxima de você” .

Exemplo de mensagem apresentada pela Fininvest em sua campanha exibida no programa Domingão
do Faustão, da Rede Globo, no ano de 2004.

124

No entanto, essa mensagem esconde a violência, a ganância e o desrespeito ao

consumidor de uma empresa que pertence a um dos setores da economia que mais lucram no

Brasil: o setor financeiro. O exemplo de um empréstimo feito em uma agência dessa empresa

a uma senhora evidencia essa questão.

“ Fizemos um empréstimo de R$ 15,00 para uma senhora que somado à tarifa de abertura de crédito
de R$ 29,00, resultou em um valor de R$ 44,00 para ser pago em três vezes a juros de 12,9%. Mas,
ela não conseguiu pagar a dívida e em três meses o valor virou uma bola de neve. Se ela tivesse feito
o pagamento mínimo (R$ 10,00), a taxa de refinanciamento seria de 16,9%. No entanto, como nada
foi pago a taxa de refinanciamento foi de 14,9%; mais 14% de taxa por atraso; custo de cobrança de
R$ 2,00; juros de mora de 2,9%; e o custo de manutenção de conta R$ 3,00.
Essa história de crédito pré-aprovado, sem burocracia, que não precisa de documentação, só dá
problema para nós. A aprovação até acontece se o cliente já tiver comprado a crédito em uma das
lojas associadas, se não, para a aprovação do crédito o cliente precisa apresentar carteira de
identidade, cpf, comprovante de renda e de residência. Precisamos enrolar o cliente dizendo que não
foi possível aprovar o crédito por problema de escore, pois dizer que o crédito não foi aprovado em
função da pessoa trabalhar a pouco tempo ou não possuir referências bancárias ou compras a crédito,
pode caracterizar preconceito.”

Relato feito por Andréia, responsável por uma mini-loja da Finivest.

A combinação de imagem, música e discurso podem ser responsáveis pelo sucesso

de vendas de uma estratégia de comunicação desse tipo, mas não demonstra (de ambas as

partes, anunciante e anunciador) a preocupação com as “ necessidades do consumidor” , uma

vez que somente há a preocupação em criar expectativas e apresentar os benefícios do

“ dinheiro fácil” para a solução de problemas ou a aquisição de outros tantos bens e serviços

que a sociedade insatisfeita tem à disposição. Esse caso, mais uma vez, revela que não apenas

o marketing tem a responsabilidade por tal tipo de situação extremamente questionável. A

produção mediante o mapa de todas as transações integrantes do processo de prestação do

serviço (FITZSIMMONS e FITZSIMMONS, 2000) poderia sugerir oportunidades de

melhorias de certos processos quando da interação com os clientes. A empresa poderia

considerar os potenciais pontos de falha, projetar procedimentos à prova de erros (poka-yoke)

nos momentos da decisão na “ hora da verdade” (NORMANN, 1993) a fim de evitar tais

situações. Porém, é preciso enfatizar que esse tipo instituição pertence ao setor financeiro que

domina a economia mundial. Tendo em vista a força e a ganância do sistema financeiro


125

mundial (JAMESON, 2000; SANTOS, 2000c) não é possível esperar muita coisa em termos

de preocupação com o cliente.

Um outro banco anuncia: “ nenhum banco se preocupa tanto em cuidar que você

economize o seu dinheiro como o Unibanco” . Entretanto, esse mesmo banco tem como meta

para atender as suas necessidades vender, também, empréstimos para aposentados:

“ Nossa meta é fazer oitenta empréstimos pra aposentados na agência. Não é mole, porque eu sei que
muitos não sabem nada sobre as taxas e os juros, e também vão fazer um baita sacrifício pra paga.
Eu preciso vender, mas quando eu estou sozinho, sem ninguém por perto, eu faço de tudo pra
mostrar o que tem ruim pra pessoa. Cara, só por favor não comenta isso pra ela [uma gerente do
banco que era aluna da universidade e defendia ferrenhamente a instituição].”

Relato feito por Paulo, funcionário do Unibanco.

Se a comunicação explícita é preocupante, DFRPXQLFDomRLPSOtFLWDHGLVIDUoDGDp

DLQGDPDLVSUHRFXSDQWHSRUTXHDLQGDp PDLVQDWXUDOVXWLOHVSRQWkQHDVXDYHSRGHQGR

LQFOXVLYH WHU XPD FRQRWDomR VXEOLPLQDU. Segundo Luce (informação oral), esse tipo de

comunicação recebe dois tipos de denominação; o PHUFKDQGLVLQJ que é de influência

européia, decorrente das propagandas realizadas de forma dissimulada durante a realização de

programas exibidos em meios de comunicação estatais que não podiam ter propaganda paga;

e o LQVLJKW DGYHUWLVLQJ que é de origem norte-americana; nesse tipo de comunicação as

mensagens e imagens sobre produtos, serviços, lugares, pessoas, idéias, estilos e marcas são

inseridas nos enredos de novelas e seriados4. Da mesma forma, as “ personalidades” (que

pertencem aos chamados grupos de referência) exibem durante entrevistas (inclusive em

telejornais) as marcas de roupas que vestem porque são pagos para usá-las. Também não

podem ser esquecidos os comentários realizados por todas as espécies de âncoras e

apresentadores (como aqueles descritos anteriormente).

4
Notas de aula da disciplina de Evolução do Pensamento em Marketing, ministrada pelo professor
Fernando Bins Luce, no curso de mestrado do PPGA/UFRGS, em 1987. Segundo Luce, o PHUFKDQGLVLQJ, de
tradição americana, refere-se a todas as atividades realizadas no ponto de venda (forma de exposição e
localização de produtos e preços nas gôndolas, técnicas e ferramentas promocionais) como apoio às demais
atividades promocionais da empresa.
126

Preocupa-me, de modo especial, além do conteúdo do discurso que é embutido nesse

tipo comunicação, o fato de que essas mensagens disfarçadas têm, por trás, os interesses de

um anunciante que está pagando por aquilo que está sendo dito e mostrado, e que, na forma de

notícia e de enredo, pode obter o tom de verdade necessário para alcançar os seus objetivos,

sem, é lógico, que o consumidor perceba e tenha a dimensão de como está sendo influenciado.

São discursos e imagens socializadoras que, em forma de consumo, dão sentido e orientação à

vida das pessoas, sem que as empresas tenham que dizer diretamente: compre.

“ Alguns anos atrás um amigo que tinha uma pequena fábrica de confecção de roupas no Rio de
Janeiro, me contou da sorte que teve quando por casualidade, em razão da amizade que fez com um
produtor de televisão, conseguiu que suas roupas fossem usadas por um personagem do ator Nuno
Leal Maia durante uma novela das sete da Rede Globo. Depois de alguns dias de pequenas aparições
da marca junto ao personagem da novela, a procura pela marca na loja começou a aumentar de
forma significativa, e as vendas explodiram no Rio de Janeiro.
As roupas eram as mesmas de sempre, nada havia mudado, mas as pessoas que já conheciam a loja e
até já tinham comprado roupas passaram a ter uma espécie de carinho ou maior atenção com a
marca.
Ele disse que foi um impulso e tanto pra fábrica, mas que não teve mais chance de fazer isso porque
é muita grana, naquela época as coisas eram diferentes [provavelmente, início dos anos 1990], e o
que ele tinha conseguido era, na verdade, um presente de amigo.”

Relato feito por Cláudio Prado, médico, residente no Rio de Janeiro.

Cabe lembrar que, além das roupas, os acessórios pessoais e para casa, as cores e

padrões de móveis fazem parte desse contexto e começam, muitas vezes, a aparecer na

televisão antes de os produtos chegarem às lojas. A televisão é uma ótima oportunidade para

indicar as tendências que os “ produtores de conceitos” (SLATER, 2002) criaram para manter

a “ sociedade insatisfeita” . 4XHPQXQFDRXYLXFRPHQWiULRVGRWLSR³WXYLXTXHQDQRYHODGDV

RLWRDVPXOKHUHVYROWDUDPDXVDU´RX³DJRUDpVyRTXHDSDUHFHQDQRYHOD´" Depois de as

pessoas perceberem tais tendências é momento de começarem a pensar que aquilo que elas

possuem está começando a ficar velho e desatualizado.

Em outro sentido, D FRPXQLFDomR HP IRUPD GH QRWtFLD SRGH GDU D FUHGLELOLGDGH

TXHXPDHPSUHVDSUHFLVDSDUDYHQGHUVHXVSURGXWRVHVHUYLoRV. Churchill e Peper (2000,

p. 496) descrevem que a “ 3XEOLFLGDGHé a comunicação vista como não paga de informações
127

sobre a organização ou produto, geralmente por alguma forma de mídia [...]. Uma vez que é

vista como não paga por ser veiculada pela mídia como notícia, a publicidade geralmente goza

do crédito e da confiança do público em geral. Cuidados nessa área, contudo, são

imprescindíveis, pois, do mesmo modo que a publicidade eficaz pode melhorar muito a

imagem e aumentar as vendas de uma companhia, a publicidade negativa pode causar sérios

prejuízos” . A história de comunicação implícita realizada por uma micro-empresa, embora

veiculada em jornal, ilustra essa questão.

“ Quando comecei a pizzaria fiz algumas propagandas na televisão e no rádio, mas não deram muito
resultado, pois o movimento de clientes na casa continuava pequeno. Continuei insistindo com
propaganda no rádio, porque o dinheiro era curto.
Sem muito resultado contei minha situação para um amigo que trabalha na assessoria de
comunicação de uma grande empresa do ramo de bebidas. Logo recebi uma orientação simples e que
faz parte da estratégia de qualquer empresa que possui uma boa assessoria de imprensa. Ele me
orientou que eu não tirasse o comercial da rádio, mas que conseguisse algumas matérias que
falassem da minha pizzaria. Ele me deu algumas dicas, e resolvi procurar um jornal local, onde fiz
um contrato de propaganda com o jornal e um contrato de “ relações públicas” com o colunista social
do jornal.
Coloquei um anúncio da pizzaria três vezes por semana no jornal. Acertei com o colunista para que o
mesmo passasse a freqüentar de graça a pizzaria e junto levasse seus amigos e pessoas de suas
relações. Esse, posteriormente, noticiava em sua coluna suas idas a casa, elogiava a comida, o
ambiente etc. Cada vez que ele fazia isso, eu pagava pelo espaço que ocupava em sua coluna.
Pouco tempo depois era comum ver as pessoas que circulavam em sua coluna, e outras tantas que
gostariam de circular ou ao menos conhecer a pizzaria que passou a ser badalada na cidade.
Acho que, se não fosse assim teria que ter investido muito dinheiro em propaganda, coisa que eu não
tinha, ou teria fechado sem que as pessoas conhecessem a minha pizza, que é muito boa!”

Relato feito por Renato, empresário no ramo de restaurante.

Esses dois exemplos referem-se a histórias de comunicação implícita realizadas por

duas empresas pequenas e de poucos recursos. É de se imaginar o que pode ser feito nesse

sentido por iniciativa dos grandes anunciantes da televisão no Brasil. Por exemplo, existem

programas na televisão brasileira (apresentados por pessoas como Amauri Jr., Otávio

Mesquita, Goulard de Andrade, Dória Jr.) que mostram inúmeras atividades de empresas

(lançamentos de produtos, participação em feiras, eventos culturais, etapas do processo

produtivo), entrevistam “ personalidades” (políticos, empresários, atores, cantores,

esportistas), visitam locais turísticos e etc. Normalmente, são matérias pagas, mas que

aparecem em forma de reportagens do programa, mas sem que isso seja revelado ao
128

telespectador, o que elimina a neutralidade do conteúdo exibido e revela a parcialidade

daquilo que está sendo dito. 4XDO PDWpULD SDJD DSUHVHQWDULD D QmR VHU SRU GHVFXLGR

PHQVDJHQVHLPDJHQVGRVDVSHFWRVQHJDWLYRVGHXPDHPSUHVDSURGXWRRXSHVVRD"

$FRPXQLFDomRGDWHOHYLVmRUHYHODVHDLQGDPDLVSRGHURVDQRPRPHQWRHPTXH

DVLQLFLDWLYDVLPSOtFLWDVHH[SOtFLWDVVHPDQLIHVWDPHPFRQMXQWR. O exemplo da indústria

fonográfica é bastante interessante para demonstrar esse tipo de configuração. As gravadoras,

quando apostam em um grupo ou pessoa, desenvolvem uma série de estratégias que inclui a

criação do nome, escolha do figurino e do gestual, passa pela escolha do repertório, definição

da música de trabalho – divulgada na forma de “ jabás” ou de espaços comprados em

programas de televisão – criação de YtGHR FOLS e coreografias, seções de entrevistas e

badalações em eventos que tenham a cobertura da mídia, propagandas, material promocional

nos pontos de venda, etc. Esse conjunto de ações configura a chamada comunicação integrada

de marketing (KOTLER, 2000; CHURCHILL e PEPER, 2000). Como resultado, temos

elevadas expectativas de consumo direcionadas à sociedade insatisfeita que acabam sendo

consumadas de forma plural e fragmentada, com a venda de cds originais, cds piratas ou

reproduções em PS, atendendo assim aos diversos segmentos de renda que compõem a

sociedade brasileira.

Como inicialmente frisei, atribuo à televisão a função de produtora de sentidos. Ou

seja, SDUD TXH D FRPXQLFDomR LPSOtFLWD H H[SOtFLWD VH FRQILJXUH p IXQGDPHQWDO D

WUDQVIRUPDomR GH UHFXUVRV. Assim, D SURGXomR como função (referente à parte da

organização que produz os bens e serviços para os consumidores) e como atividade

(significando qualquer transformação de recursos de LQSXW para produzir bens e serviços para

os consumidores) (SLACK HW DO, 1997) WRUQDVH SUHVHQWH H QHFHVViULD SDUD D

PDWHULDOL]DomRGHWXGRTXHIRLDQWHULRUPHQWHGHVFULWRHPIRUPDGHFRPXQLFDomR.
129

Por fim, é importante enfatizar que não acredito no fato de que toda a comunicação

da televisão tenha em si uma estratégia deliberada, e muito menos que tudo que apareça seja

mediante um acordo previamente estabelecido, mas entendo que “ [...] a mídia não é apenas

um meio poderoso de criar e fazer circular conteúdos simbólicos, mas possui um poder

transformador ainda pouco estudado – e, talvez, ainda subestimado – de reestruturação de

espaços de interação propiciando novas configurações aos esforços de produção dos sentidos”

(SPINK e MEDRADO, 2004, p. 58). Trata-se de uma fonte de poder extremamente

preocupante, se considerarmos que a mídia é um canal de direção única, no qual o consumidor

participa como receptáculo de seus produtos (THOMPSON, 1999).

$SURSDJDQGDQDWHOHYLVmR

Embora as empresas estejam procurando disfarçar as suas estratégias de

comunicação, a propaganda tradicional, que é uma comunicação explícita, ainda é muito

utilizada pelas empresas. A “ [...] propaganda é qualquer anúncio ou mensagem persuasiva

veiculada nos meios de comunicação de massa em determinado período e espaço e pagos ou

doados por um indivíduo, companhia ou organização identificados” (CHURCHILL e PEPER,

2000, p. 472). 2V GLVFXUVRV DV LPDJHQV H RV VtPERORV FULDGRV QDV SURSDJDQGDVVHPSUH

IRFDOL]DPVLJQLILFDGRVHLGpLDVSRVLWLYDVVREUHRVSURGXWRV No entanto, a propaganda como

ferramenta de comunicação, informação, lembrança e persuasão tem sido acusada pelo fato de

ao mesmo tempo em que presta informações importantes, não retrata o que efetivamente

ocorre na sociedade. “ Ao contrário do panorama caótico do mundo apresentado nos jornais, a

mensagem publicitária cria e exibe um mundo perfeito e ideal, sem fome, guerras,

deterioração ou subdesenvolvimento. Tudo são luzes, calor e encanto, numa beleza perfeita e

não-perecível” (CARVALHO, 2000, p.11). Segundo Baudrillard (2000), que descreve a

propaganda como publicidade:


130

A publicidade constitui no todo um mundo inútil, inessencial. Pura


conotação. Não tem qualquer responsabilidade na produção e na prática
direta das coisas e contudo retorna integralmente ao sistema dos objetos, não
somente porque trata do consumo, mas porque se torna objeto de consumo.
É preciso distinguir direito esta dupla determinação: é discurso sobre o
objeto e ela própria objeto. E é enquanto discurso inútil, inessencial que se
torna consumível como objeto cultural. Trata-se de todo o sistema [...] ao
nível dos objetos: sistema de personalização, de diferenciação forçada e de
proliferação do inessencial, de degradação da ordem técnica em uma ordem
de produção e de consumo, de disfunções e de funções segundas que
encontra na publicidade sua autonomia e sua realização. Como sua função é
quase inteiramente segunda, como imagem e discurso são no caso
grandemente alegóricos, a publicidade constituirá o objeto ideal e revelador
deste sistema de objetos. Porque se designa a si própria como todos os
sistemas fortemente conotados, é ela que melhor nos dirá o que consumimos
DWUDYpV dos objetos. (BAUDRILLARD, 2000a, p. 174).

A propaganda tem sido utilizada para incentivar os motoristas a conduzirem seus

carros com prudência e cuidado, não abusarem da velocidade e não dirigirem depois de

ingerir bebida de álcool. Por outro lado, a indústria automobilística produz carros com

motores de elevada potência, que alcançam altíssima velocidade em poucos segundos. Esses

carros são feitos para circular em cidades e estradas que têm limite de velocidade muito

abaixo daqueles que os carros podem alcançar em um país que briga há muito tempo para a

redução do número de acidentes de trânsito. Não bastasse isso, além da imagem de sucesso

das pessoas que possuem um automóvel, as propagandas das indústrias habitualmente

reforçam, em seus comerciais, a velocidade e a potência dos carros. Um exemplo disso é um

comercial de televisão criado pela Ford:

Um automóvel roda por uma rodovia que possui, ao longo de suas laterais, uma série de cataventos
girando; em dado momento o automóvel breca bruscamente para que alguns patos possam cruzar a
estrada. Nesse instante todos os cataventos param de girar e só voltam a se movimentar depois que o
automóvel retoma a sua velocidade, indicando que o poder do motor e a velocidade do carro é que
provocavam o movimento dos cataventos.

Comercial de lançamento do novo Ford Fiesta, exibido em 2002.

Entendo que sob o ponto de vista estético, o comercial é muito bonito e ilustra

perfeitamente a idéia da potência do automóvel, mas, sob o ponto de vista social, o apelo à

velocidade pode ser questionado. Como o Brasil é um país que constantemente revela ao

mundo grandes pilotos de automobilismo, talvez seja uma atribuição das empresas do ramo
131

automobilístico alimentar através da comunicação dos automóveis o ego dos pilotos amadores

que podem se imaginar disputando uma corrida a cada momento que seguram o volante de um

automóvel.

O tráfico de drogas é um dos grandes problemas que a sociedade brasileira enfrenta,

e a propaganda de televisão também tem sido utilizada para fazer um alerta sobre essa

questão. A propaganda revela os perigos das drogas para a saúde, além de evidenciar que elas

estão associadas à violência, o que é observado em discursos como: “ cada vez que uma

pessoa fuma um baseado está apoiando o temível tráfico de drogas, que mata. Isso é

horrível!” . No entanto, o álcool que também é uma droga, mas é legal, aparece em

propagandas de televisão, mas de uma maneira diferenciada, como sinônimo de sucesso, de

conquista de mulheres (porque a propaganda é de estética machista), de alegria e de fantasia.

As propagandas das diversas marcas de cerveja que existem no Brasil são exemplos da

situação descrita. É verdade que ao final de cada anúncio, por uma imposição legal, existe

uma recomendação para que as pessoas consumam moderadamente. Por isso, além das

propagandas, essas empresas patrocinam eventos musicais e esportivos, e festas populares que

também aparecem na televisão. No entanto, existe uma questão fundamental e contraditória:

essas empresas estão em busca de participação de mercado e de lucros e, assim, de consumo.

Além das campanhas de comunicação, a chamada “ força de vendas” tem um papel importante

para o aumento de consumo de cerveja, sendo, permanentemente, “ estimulada” e “ motivada”

ou “ obrigada” a aumentar suas quotas de vendas. A descrição de um promotor de vendas de

uma empresa do ramo sintetiza o que é feito no processo de “ motivação” de vendedores.

“ A pressão para cumprir quotas de vendas é cada vez maior na empresa.


Pela manhã antes dos vendedores saírem a campo, há reuniões de motivação, onde são passadas
mensagens de incentivo, são dados gritos de guerra. É uma coisa punk!
Os vendedores pegam as motos e saem feito loucos para cumprir suas quotas. No decorrer de três
meses na cidade de Feliz (nome fictício), dois vendedores se acidentaram pela manhã e, por culpa
deles. Um ficou inválido para o trabalho em função do acidente [...]
Uma coisa que o pessoal ficou muito brabo é que a empresa ao final do ano, fez uma campanha de
vendas que envolvia a família dos vendedores. Para aqueles que tinham filhos era enviada uma mala
132

direta com uma mensagem comunicando que o ‘papai’ estava participando de uma gincana na
empresa e que, por isso, deveria ser incentivado a vender bastante, pois caso atingisse os pontos
necessários (o volume de vendas estipulado) o filho ganharia um belo presente [...]
Outra prática da empresa são os “ convites” para que os vendedores participem das “ chopadas” para
comemorar os resultados de vendas. Na verdade não são convites, são convocações porque pega
muito mal não ir, embora sejam realizadas fora do horário de expediente.”

Relato feito por Miguel, promotor de vendas de uma empresa de bebidas, em janeiro de 2003.

Essas técnicas podem ser efetivas para que a empresa alcance seus resultados de

vendas, mas são questionáveis sob o ponto de vista social. A televisão tem, veementemente e

de forma compreensível, divulgado que jovens e crianças têm sido aliciados pelo tráfico de

drogas. Mas entendo que o exemplo de estratégias de motivação dessa empresa de cerveja é

também uma forma de aliciamento indesejável e preocupante, mas que, no discurso de uma

empresa que vende droga legalizada recebe o nome de estratégia de motivação de vendas.

(VVDV WpFQLFDV QmR SRGHULDP UHFHEHU R QRPH GH WpFQLFDV SDUD PDQWHU D IRUoD GH YHQGD

LQVDWLVIHLWD"

$,0$*(0'$60$5&$6($,',27,=$d­2'26(5+80$12

$PtGLDpXPDIRUWHDOLDGDGDVHPSUHVDVSDUDRGHVHQYROYLPHQWRGHPDUFDV. Os

profissionais de marketing sabem que muitas vezes é a imagem que determina se uma troca

será efetivada (FIRAT, DHOLAKIA e VENKATESH, 1995), uma vez que os consumidores

não desenvolvem lealdade às marcas em si, mas, sim, aos símbolos e às imagens que são

construídas (FIRAT e VENKATESH, 1995).

Segundo Kotler e Armstrong (1998, p. 393), “ talvez, a habilidade mais

diferenciadora dos profissionais de marketing é sua habilidade para criar, manter, proteger e

enriquecer marcas. A American Marketing Association define uma marca da seguinte forma:

marca é um nome, termo, sinal, símbolo ou combinação dos mesmos, que tem o propósito de
133

identificar bens ou serviços de um vendedor ou grupo de vendedores e de diferenciá-los de

concorrentes” .

As empresas procuram vincular subjetividades a consciência de marca, buscando a

cooptação dos estilos de vida com integração social – tudo dentro de uma lógica mercantil,

em que somos valorizados pelas marcas que temos e usamos. Segundo Pietrocola (1986), as

diferenças que se acentuam entre classes, consumo e cultura são encobertas pelos símbolos e

imagens fantásticas e otimistas de poder e prestígio incorporados a cada objeto que o homem

adquire. Na interpretação de Klein (2002), DVPDUFDVWrPDSRVWDGRQDLGLRWL]DomRGRVHU

KXPDQR O estudo da autora revela que a lógica das empresas é não gastar seus recursos

finitos em fábricas e máquinas que se desgastam ou funcionários que envelhecerão ou

morrerão. A estratégia é, sim, concentrar seus recursos em aspectos que ajudarão a construir

suas marcas (patrocínios, embalagens, expansão e publicidade).

O estudo de Klein (2002) revela que é na força de poderosas técnicas de persuasão da

gestão de marcas (EUDQGLQJ) que as empresas têm obtido sucesso. Considero que um bom

exemplo para ilustrar o que a autora chama de idiotização do ser humano é o clássico e

premiado anúncio “ The Sculptor” da Peugeot, criado na Itália e veiculado no Brasil em 2002.

Um jovem pobre, indiano e insatisfeito com seu velho veículo, inicialmente, vem em velocidade e
bate com a frente de seu carro em um muro, depois dá marcha à ré e amassa a traseira também. As
pessoas que passam na rua ficam espantadas e sem entender o que está ocorrendo. A seguir, aparece
um elefante sentando no capô do seu carro. Na seqüência, o jovem resolve dar umas marteladas no
carro. O telespectador fica sem entender a loucura do jovem indiano até que esse olha a foto do
Peugeot 206 em uma banca de revista e compara com seu carro, agora transformado em um 206.
Então, o jovem sai com seus amigos para dar uma volta de carro e desperta a atenção de todos que
passam na rua. Para finalizar, a mensagem: “ Peugeot 206. Irresistível” .
134

O comercial do Peugeot 206 exibe um estilo marcadamente associado ao pós-

modernismo: a hiper-realidade. Partindo do pressuposto de que imagens anunciadas, assim

como textos, não são estáveis, mas admitem mais de uma interpretação (McQUARRIE e

MICK 1992; SCOTT, 1990), minha leitura dessa mensagem é de que, com bom humor, para

um jovem do terceiro mundo que, não possui condições de adquirir o produto original, o que

importa é o símbolo. Poderíamos dizer que, nessa concepção, as marcas se enquadram na

“ sociedade do espetáculo” de Debord (1997), em que a ocupação total da vida social em

busca da acumulação de resultados econômicos conduz a uma busca generalizada do

“ parecer” . Esse é um sinal do porquê as pessoas muitas vezes compram produtos que são

imitação ou falsificação dos “ supostos” produtos originais.

Descrevo como “ supostos” originais porque HPXPDVRFLHGDGHRQGHDVHPSUHVDV

WUDQVIHUHP WHUFHLUL]DP VXDSURGXomRDRXWUDVHPSUHVDVDPDUFDRULJLQDODFDEDVHQGR

XPDKLSHUUHDOLGDGHEm nome de suas “ competências essenciais” (PRAHALAD, 1997), as

empresas procuram racionalizar recursos e esforços em atividades que lhes dêem melhores

resultados. Assim, não apenas as chamadas marcas próprias (ou de distribuidores) como

também as marcas de fabricantes (das indústrias) adotam a estratégia de transferir a produção

para outras empresas.

Segundo Klein (2002), as marcas é que estão absorvendo todo o valor agregado,

fazendo com que um produto atinja margens próximas a 400% entre os custos de fabricação e

o preço de varejo. Para Klein, na falta de tradição, referências, heranças filosóficas e

religiosas, o indivíduo volta-se para objetos e serviços, ou seja, o sistema de consumo passa a

ser central na sua existência e no processo de criação de sua identidade. As marcas passam a

preencher um espaço antes ocupado por outras instituições. De forma semelhante à concepção

de Klein, minha preocupação, além, é claro, da forma como as imagens de marcas têm sido
135

construídas, é com o preço que o consumidor paga ao adquirir uma marca. O relato de um

engenheiro ligado ao processo de produção de confecções é uma mostra dessa questão:

“ Meu pai estava fazendo aniversário e fui comprar um presente para ele. Não tinha a menor idéia do
que dar. Encontrei uma camisa pólo Lacoste que estava em promoção por R$ 119,00, cheguei até a
pensar em dar a camisa, mas depois pensei melhor e desisti, porque vi que era um absurdo comprar
um produto com preço tão alto tendo em vista o custo de produção” .
O custo total de produção de uma camiseta pólo em fio cardado, que nós fabricamos, é de R$ 24,15,
desse total R$ 5,24 são de despesas comerciais. No varejo o nosso produto é vendido por volta de R$
38,00. Podes acreditar que a qualidade de processo é a mesma entre a camisa que produzimos e a
camisa Lacoste.
Pensei: por que deveria pagar todo esse dinheiro a mais? pra dizer que gosto do meu pai?
Depois fiquei pensando, como conheço o processo de fabricação, é claro, como que uma empresa
pode ganhar tanto dinheiro por colocar um jacarezinho bordado em uma camisa.
A gente tem que dar mais valor ao dinheiro que ganha!!!”

Relato feito por Paulo, Gerente de Engenharia de Produto Têxtil de uma empresa de confecções de
Santa Catarina.

Assim, não é por outro motivo, senão pela imagem de marca, que muitas vezes

encontramos o mesmo produto com a mesma qualidade de conformidade, mas com preços tão

diferenciados. $GHVPDWHULDOL]DomRGDVFRLVDVWHPXPLPSDFWRSURIXQGRVREUHDYLGDGH

XPDVRFLHGDGHHPTXHRVVHUHVKXPDQRVVmRYDORUL]DGRVSHORVVtPERORVTXHRVWHQWDPDR

YHVWLUDRFRPHUDRDQGDU

A natureza do consumo metamorfoseia-se. Para além de que alguns objectos


de consumo não têm qualquer existência material (as imagens digitais, por
exemplo), a retração da produção em massa e a sua gradual substituição pela
clientelização e personalização dos objetos transforma estes em
características da personalidade de quem os usa e, nessa medida, os objetos
transitam da esfera do ter para a esfera do ser [...] (SANTOS, 2000b, p. 255-
256).

Entendo que não é apenas dessa forma que podemos interpretar o processo de

idiotização a que os consumidores estão submetidos pelas marcas. Como forma de atender ao

discurso da “ necessidade de maximização da escolha” , ou de “ atender às necessidades de

diferentes segmentos de mercados” , as empresas podem optar por ter marcas diferentes, e não

por produzir produtos diferentes, o que certamente representa uma vantagem em termos de
136

custos de produção à empresa, mas é um meio de ludibriar os consumidores. A estratégia

adotada por uma empresa de compota de pêssego é um indicativo dessa forma de atuação:

“ Fomos obrigados, para não perder o Carrefur, a criar duas marcas de compota de pêssego. Esse tipo
de empresa, normalmente, alega que o cliente quer variedade de produtos nas gôndolas, mas eles não
querem muitos fornecedores para um mesmo produto. Por isso, exigiram que a empresa tivesse mais
de uma marca.
Nossas duas marcas são vendidas por preços diferentes no varejo para que o cliente possa optar por
um produto de mais ou menos qualidade, mas na verdade o produto que sai aqui da fábrica é o
mesmo, o que muda é a marca, o rótulo e depois o preço.
Essa exigência deles acabou sendo importante para a nossa empresa, porque agora temos mais poder
de barganha junto a outros supermercados.
Relato feito por um funcionário de uma empresa de compotas da cidade de Pelotas.

Esse tipo de artificialidade é difícil de ser captada pelo consumidor. Nesse caso

específico, o consumidor poderia, ao ler o rótulo, identificar que as marcas são de uma mesma

empresa, mas não teria como julgar se os produtos vendidos apresentam qualidades

diferenciadas. O varejo brasileiro está repleto de exemplos semelhantes a esse, não apenas no

setor de alimentação (pão de forma, café, enlatados), mas também no setor de confecção

(camisetas, meias, malhas), calçados (sapatos, chinelos), farmacêuticos (água oxigenada,

algodão, gaze), etc. Assim, produtos (terceirizados ou não) podem ser produzidos por uma

única empresa, utilizando a mesma tecnologia, a mesma matéria-prima, mas terem marcas e

preços diferentes. Na sociedade pós-moderna fragmentada e hiper-real, DVGLIHUHQWHVRSo}HV

GH HVFROKD PXLWDV YH]HV QmR SDVVDP GH DUPDGLOKDV H WUXTXHV SDUD ³VDWLVID]HU R

FRQVXPLGRU´

Uma outra questão que entendo deva ser evidenciada diz respeito à ³FULDomR GH

YDORU´ DVVRFLDGD j FRPXQLFDomR H QmR j SURGXomR. Sahlins (1979) argumenta que a

produção e a comercialização dos bens não dizem respeito apenas à lógica utilitarista, mas,

sim, à lógica do significado e, nesse sentido, a função simbólica, e não apenas a função

prática, é o que importa. É a separação do objeto de sua função. Casotti (1988) afirma:

O produto adquirido no mercado é independente das necessidades


inicialmente pensadas pelo consumidor e pelo produtor, o que é uma
137

separação do objeto de sua função. Na verdade, o consumidor adquire o


objeto pela imagem que ele representa, e essa imagem é apenas
parcialmente, se muito, construída com base na necessidade funcional. Desta
forma, um simples produto é capaz de representar múltiplas imagens,
dependendo da cultura e dos esforços de marketing. Conseqüentemente,
imagens e produtos são desconectados um do outro, de seus conteúdos e
contextos originais. (CASOTTI, 1988, p. 10).

Baudrillard (2002) argumenta que

[...] quando as coisas, os signos, as ações são liberadas de suas idéias, de seu
conteúdo, de sua essência, de seu valor, de sua referência, de sua origem e de
sua finalidade, entram então numa auto-reprodução ao infinito. As coisas
continuam a funcionar ao passo que as idéias delas já desapareceram há
muito. Continuam a funcionar numa indiferença total a seu próprio
conteúdo. E o paradoxo é que elas funcionam melhor ainda.
(BAUDRILLARD, 2002, p. 12).

Por isso, o sucesso de mercado de bens e serviços não está apenas vinculado à

eficácia do processo produtivo de um produto ou das operações de um serviço. Como afirmou

John Lucáks, “ no mundo moderno a produção do consumo se torna mais importante do que o

consumo da produção” (LUCÁKS DSXG CAMPBELL, 2001, p. 57). Entendo que essa frase

continua mais atual do que nunca, porém, voltando aos argumentos de Heller (1998), são

necessários novos valores críticos e opostos ao sentido do valor de troca, em que o valor de

uso se afirme como medida efetiva nas relações de trocas.

Desse modo, a idéia inicial de um “ pacote de serviços” pode, ao chegar ao mercado,

ser profundamente alterada, ou seja, aquilo que Gianesi e Corrêa (1996) chamam de serviço

explícito (a razão principal do serviço) pode passar a ser o serviço implícito (considerado o

benefício psicológico ou acessório do serviço) e esse passar a ser o serviço explícito, ou, em

determinado momento, confunde-se o que é principal e o que é acessório. É nessa condição

que Slater (2002) percebe a função de marketing não mais como uma função secundária em

relação à produção. Mais uma vez, o fenômeno da telefonia celular pode ser um bom exemplo

para ilustrar essa questão, uma vez que, principalmente entre as crianças e os adolescentes, é

um símbolo de VWDWXV, de modernidade, de estar dentro, um brinquedo, uma mania e que,


138

também, serve para a comunicação. O que de certo modo não seria problema se essas pessoas

tivessem renda suficiente para adquirir os aparelhos e pagar as tarifas de serviços que são

cobradas pelas empresas operadoras.

&216,'(5$d®(6),1$,6'$5()/(;­2

Nesta seção analisei o discurso do marketing no contexto brasileiro mediante três

gêneros do discurso (acadêmico, das empresas e da comunicação) e procurei evidenciar de

que forma os mesmos têm contribuído para a manutenção da cultura do consumo.

[...] o regresso do princípio do mercado nos últimos vinte anos representa a


revalidação social e política do ideário liberal e, conseqüentemente, a
revalorização da subjetividade em detrimento da cidadania. Também neste
domínio a resposta do capital aproveita e distorce sabiamente algumas das
reivindicações dos movimentos contestatórios dos últimos trinta anos. A
aspiração de autonomia, criatividade e reflexividade é transmutada em
privatismo, dessocialização e narcisismo, os quais, acoplados a vertigem
produtivista, servem para integrar, como nunca, os indivíduos na compulsão
consumista. (SANTOS, 2000a, p. 255).

Em termos de Brasil, lá se vão mais de vinte anos que foi publicada a primeira edição

do livro “ Marketing no Brasil não é fácil” , escrito em 1981 por Penteado Filho. O tempo

passou, duas das condições que na visão do autor justificavam a expressão irônica “ não é

fácil” , estão bastante diferentes. Primeira: não temos mais as reservas de mercado, tão

impeditivas para o sucesso do marketing de acordo com Penteado Filho (1981), pois, para que

a área pudesse representar seu papel no país, seria necessária uma economia que permitisse a

liberdade de escolha dos consumidores. Segunda: a concorrência aumentou, em grande parte

motivada pela abertura de mercado que o processo de globalização neoliberal propiciou.

Outra condição descrita pelo autor não mudou no decorrer desse período: a generosidade da

profissão que aceita pessoas das mais variadas formações. Na época o autor mencionava uma

preocupação futura em relação ao marketing:

[...] o Marketing é, de certa forma, um microcosmo da própria vida e pode,


139

se soubermos apertar os botões certos e manipular as alavancas apropriadas,


contribuir para melhorar e aperfeiçoar imensamente o sistema econômico no
qual vivemos. Ao contrário, se não formos capazes de exercer um
discernimento que é, sem dúvida, de fundo ético, acabaremos
inevitavelmente por confundir as regras do jogo e contribuir para
rebaixamento de valores, a destruição e a morte que caracterizam muito essa
sociedade. (PENTEADO FILHO, 1981, p. 14).

Porém, percebo que os “ botões certos” têm sido manipulados à base: de

obsolescência planejada, de criação de símbolos e imagens de marcas que fortalecem e

legitimam estratégias “ idiotizantes” , de precificações psicológicas, do mundo “ maravilhoso”

da propaganda. Tudo funcionando de forma a manter o crescimento econômico. Penteado

Filho (1981) lembrava também “ o que não é marketing” , como por exemplo:

[...] botar ar dentro do tubo de pasta de dente, nem juntar uma maçã podre a
onze maçãs mais ou menos e cobrir tudo com VKULQNSDFN, para vender no
supermercado, nem fabricar um sabonete cujo perfume acaba na primeira
lavada [...], lançar um produto com uma forma e ir modificando tudo aos
pouquinhos, para o consumidor não perceber, tornando a fórmula mais
barata para a fábrica e o produto mais ordinário [...] não é mudar a lanterna
de um carro antigo e anunciar uma linha nova. [...] Os bancos e as
financeiras devem saber que nem seu Marketing nem sua imagem são
promovidos colocando os estagiários e os aprendizes, no primeiro dia de
trabalho, lidando com o público e que é feio e inconveniente anunciar que os
clientes vão ganhar com títulos de renda fixa que rendem muito menos que a
taxa de inflação. (PENTEADO FILHO, 1981, p. 36-37).

Quero ressaltar que essa obra não é um clássico da literatura de marketing, mas seu

título é sugestivo e, embora tantos anos tenham se passado e muita coisa tenha mudado, as

situações que o autor menciona serem exemplos “ do que não é marketing” permanecem no

marketing brasileiro, pois as manipulações, truques e desrespeitos que evidenciei nesta seção

permanecem os mesmos. E são as grandes empresas pertencentes aos mais diversos ramos da

economia, inclusive da comunicação de massa que atuam dessa forma. Tal condição não é

nada indicada, além de ser inquietante para uma área que se diz preocupada com as

necessidades dos consumidores e que é importante para a construção da cultura do consumo.

Por outro lado, as “ realizações” do marketing não são efetivadas isoladamente, e, dentre

outras funções que fazem parte desse processo, está a área de produção.
140

Deixando de lado as ações das empresas e analisando alguns dos princípios,


ferramentas e estratégias que fazem parte dos principais livros-texto de marketing percebem-
se, também, as manipulações, os truques e as contradições. Profissionais respeitados
internacionalmente na área (HOYT, 1991; BROWNLIE HWDO 1994; BROWNLIE e SAREN,
1997) questionam se as teorias de marketing já não são relevantes para o mundo atual,
chegando a dizer que são mais nocivas do que benéficas e que o marketing está perto do fim.

Dentre várias citações que fiz nesta seção, muitas se referem à obra de Philip Kotler.

É impossível negar as contribuições históricas e permanentes do autor para a formação do

discurso hegemônico do marketing e suas preocupações sociais em torno do tema. No entanto,

há evidências de que o discurso de Kotler é um discurso contraditório, plural e questionável,

assim como é o discurso de outros autores, porque o marketing é a pura contradição, já que

por ser tão amplo e por ter que atender aos interesses das empresas como: retorno em vendas,

participação de mercado, imagem de marca, percentual de lucro, é que se torna contraditório.

Uma análise de suas ações permite constatar que elas invariavelmente subvertem princípios

consagrados como sendo a “ verdade” na área.

Na próxima seção encaminho minhas considerações a respeito da participação do

consumidor neste contexto, embora já tenha feito breves referências a esse respeito ao longo

desta seção. Pois, se o sentido de tudo é o consumidor, não é possível analisar o discurso do

marketing sem que se faça uma análise do mesmo.

Apresentei fatos, evidências, pontos de vista sobre práticas teóricas e ações de

marketing que a mim são visíveis; outras tantas, e provavelmente até mais interessantes que

essas que apontei, posso tê-las deixado de fora. Também entendo que o conteúdo deste

capítulo é muito pouco diante do mundo de interesses e manipulações que envolvem as

decisões dos seres humanos nas organizações.


2&21680,'2598/1(5È9(/1$62&,('$'(3Ï6
02'(51$'('$'26

Nesta seção apresento meus argumentos a respeito da participação do consumidor na

sociedade pós-moderna de dados. Assim como utilizei na seção anterior o termo “ sociedade

pós-moderna da comunicação” apenas com o intuito de apresentá-lo como uma marca

distintiva e poderosa do capitalismo tardio (JAMESON, 2000), faço o mesmo nesta seção ao

propor o termo “ sociedade pós-moderna de dados” . Criei esse termo para fazer um

contraponto à denominação “ sociedade da informação” , ou melhor, “ sociedade do excesso de

informação” , pois entendo que o ser humano em muitas situações da vida tem na verdade

muitos dados a sua disposição. Condição que o torna vulnerável em relação à inúmeras

circunstâncias de seu dia-a-dia, como é o caso das relações de consumo. Nesse sentido,

apresento a idéia do “ consumidor vulnerável” que se opõe ao discurso do “ consumidor cada

vez mais exigente” . Essa idéia é composta de dez aspectos: a prontidão para viver um

presente perpétuo; o aumento do número de opções de escolha; as armadilhas da liberdade de

escolha; as necessidades determinadas pelas pressões sociais; a ênfase no valor da imagem e

do símbolo; o poder da comunicação como produtora de sentidos; o desconhecimento das

estratégias e interesses das empresas; a distância do consumidor do processo de produção; o

desconhecimento das técnicas e ferramentas de marketing e a falta do comportamento de

reclamação. Argumentos, fatos e evidências que apresentei ao longo da tese apóiam a

elaboração dessa idéia. A re-análise de material de uma pesquisa sobre o consumo no

segmento adolescente ilustra a seção.


142

2&21680,'25&217(0325Æ1(2

Há evidências de que as transformações que ocorreram na sociedade capitalista pós-

moderna trouxeram grandes mudanças para a vida dos seres humanos. Além do H[FHVVRGH

LQIRUPDomR traço dos tempos pós-modernos que se manifesta em todas as instâncias da vida,

outros elementos são importantes para que se possa analisar o consumidor atual. Para

Venkatesh (1999), de todas as condições pós-modernas ligadas ao consumo a IUDJPHQWDomR

parece ser aquela que melhor define o consumidor contemporâneo. Thomas (1997) argumenta

que a fragmentação tem ligação direta com as mudanças tecnológicas sem precedentes que

alteraram os processos de produção, informação, comunicação e consumo, propiciando a

substituição do mercado de massa pelo de nichos ou individualizado. Venkatesh (1999)

argumenta que outra marca pós-moderna é a KLSHUUHDOLGDGH essa sugere que como seres

humanos construímos nossas próprias realidades e que essas são produto de nossas

imaginação, ingenuidade, fantasias e necessidades pragmáticas. A FRQWUDGLomR é um outro

traço dos tempos atuais e significativa para definir o consumidor contemporâneo.

“ Em termos do senso comum, ser um consumidor significa saber quais são as

necessidades e as formas de satisfazê-las: como escolher, comprar, usar e desfrutar – ou como

não fazê-lo [...]” (SLATER, 2000, p. 12). A pesquisa sobre o comportamento do consumidor

nessa perspectiva tem foco na racionalidade, na objetividade e na mensuração dos fenômenos,

com vistas a obter informações que propiciem generalizações e criação de leis universais.

Conforme Spiggle (1994), as opções de pesquisas alternativas ao positivismo têm

como características principais: a busca do entendimento de significados nos textos mediante

procedimentos interpretativos; o foco no contexto; a utilização da análise qualitativa de dados

e a utilização de estruturas de pesquisa emergentes e de processos de inferência. Para Firat e

Venkatesh (1995), a análise do comportamento do consumidor precisa ser feita de forma


143

ampliada. Lengler, Vieria e Fachin (2000) argumentam que os seres humanos são por demais

complexos para que se aceitem fórmulas cartesianas e predeterminadas de classificação de

comportamentos. Baseado nessas considerações apresento, a seguir, um conjunto de aspectos

que apóiam a idéia doFRQVXPLGRUYXOQHUiYHO

$SURQWLGmRSDUDYLYHUXPSUHVHQWHSHUSpWXR

Tonelli (2000) destaca que nas últimas décadas o modelo de casamento duradouro,

que foi marca das relações entre casais até meados da década de 1970, combinava

perfeitamente com o ideal de emprego para a vida toda. A partir da década de 1980, quando a

sociedade começa a se caracterizar pela fugacidade e pela incerteza, ambos começam a ser

feitos para não mais durar para sempre. Sennett (2003) descreve que a ênfase na flexibilidade

vem mudando o significado do trabalho e o sentido de carreira, que não mais representam

uma estrada reta devido às constantes trocas de trabalho que o ser humano é obrigado a fazer.

As mudanças tecnológicas reduziram postos de trabalho e, conseqüentemente, dificultaram as

possibilidades de exercer uma profissão. As constantes trocas de empresas e empregos fazem

com que as pessoas tenham que mudar de cidade, estado, região ou país. Canclini (1999)

lembra que os seres humanos sempre mudaram de local, mas as mudanças atuais são

diferentes das de outros períodos da civilização, que eram mais definitivas; hoje as trocas,

além de mais freqüentes, caracterizam-se pelo ir e vir permanente. Esse conjunto de aspectos

torna as relações humanas frágeis e fragmentadas e deixa o ser humano inseguro em relação

ao futuro. As relações, obrigações, valores, opções, convívios, fidelidades e estabilidades

passam a ser efêmeras e anônimas.

Algumas histórias da vida de adolescentes revelam que os mesmos já passaram ou

passam por experiências dessa natureza, pois são filhos de casamentos terminados, já viram

pais ou familiares desempregados e com dificuldades de conseguirem novos empregos. Além


144

disso e, em parte como conseqüência dessas mudanças, alguns residem não apenas com seus

pais e irmãos, mas com uma “ surperfamília” : primos, tios e avós. Nesse tipo de configuração,

como considerar a renda familiar de um adolescente para identificar o seu potencial de

consumo? Isso sem contar que alguns recebem o apoio financeiro de familiares que não

residem em seus mesmos lares. Apresento no quadro II uma caracterização de cada um dos

quinze adolescentes que participaram da pesquisa e uma interpretação sobre seu potencial de

consumo. Essa interpretação é resultado da experiência de campo e, em que pese as possíveis

distorções existentes, serve de guia para o entendimento das demais considerações que estão

ao longo desta seção. Como forma de preservar a individualidade dos jovens optei por omitir

suas identidades e adoto apenas uma sigla como pseudônimo para cada um deles. Por outro

lado, como forma de facilitar a leitura e a interpretação do texto adotei quatro cores que

representam o potencial de consumo: azul (alto), verde (médio), laranja (baixo), e vermelha

(muito baixo/nenhum). No texto essas cores aparecem a cada posição ou relato dos

adolescentes.

Brown (1993b) entende que a descrença nos ideais iluministas e as incertezas em

relação ao futuro determinam que o ser humano pós-moderno permaneça em SURQWLGmRSDUD

YLYHUXPSUHVHQWHSHUSpWXR; para Brown (1997a), a sociedade pós-moderna está mais ligada

com o que “ está sendo” do que com o que “ se tornará” , mais com a “ retrospectiva” do que

com “ perspectiva” . Nesse sentido, os jovens afirmam que o estudo é a sua maior preocupação,

até mesmo aqueles que não estão estudando. No entanto, a ênfase é em “ passar de ano” , e

alguns dizem que vão começar a pensar no vestibular.

“ Vou pro colégio, estudar não estudo [...] [somente estudo] quando tem uma prova difícil, se não me
f... [...].” (/2)
“ [...] [me preocupo] em passar, pra futuramente fazer um vestibular, depois fazer um curso e
trabalhar.” (/')
145

4XDGUR,,±&DUDFWHUL]DomRHSRWHQFLDOGHFRQVXPRGRVDGROHVFHQWHV
3RWHQFLDO
&DUDFWHUL]DomR GH
FRQVXPR
9,, 15 anos, cursa o 1º ano do 2º grau em uma escola estadual, mora com seu pai,
(empresário), sua mãe (do lar) e dois irmãos mais velhos em uma casa nova e bastante $OWR
confortável, localizada em um bairro central da cidade. Tem à disposição uma suíte com tv
a cabo e som. Possui em casa computador e internet. Utiliza motos e carros.
/2, 15 anos, cursa o 2º ano do 2º grau em uma escola particular, mora com seu pai
(produtor rural aposentado), sua mãe (do lar), e dois irmãos mais velhos em um
apartamento de três quartos, localizado em um bairro central. Conta com familiares que lhe
dão apoio financeiro. Divide o quarto com o irmão, onde há tv a cabo e som. Em casa tem
computador e internet.
/1, 14 anos, cursa a 6ª série do 1º grau em uma escola estadual, mora com seu pai,
(desempregado), avó (professora aposentada) e a tia (secretária de gabinete aposentada) em
uma casa confortável e localizada em um balneário. Possui em seu quarto tv, computador e
internet. 0pGLR
:0, 14 anos, cursa o 1ª ano do 2º grau em uma escola federal, mora com seu pai (gerente
de um posto de gasolina) e sua mãe (atendente de uma sorveteria) em uma boa casa
localizada em um balneário. Possui em seu quarto tv, computador e internet.
21, 16 anos, cursa o 2º ano do 2º grau em uma escola particular, é órfão de pai, mora em
uma casa modesta com sua mãe (funcionária pública), avó, tio, tia e prima em casa de três
quartos localizada em um bairro de classe média. Possui em casa computador e internet.
*%, 14 anos, cursa o 1ª ano do 2º grau de uma escola estadual, mora em uma casa junto
com sua mãe, que é aposentada por invalidez, em um bairro de classe média baixa. Seus
pais são separados, e seu pai é funcionário público aposentado.
)/, 15 anos, cursa o 1ª ano do 2º grau em uma escola federal, mora com sua mãe
(professora municipal) em um apartamento localizado em um bairro de classe média baixa.
Seus pais são separados, mas mantêm um bom relacionamento. Conta com familiares que
lhe dão apoio financeiro. Possui em seu quarto tv, computador e internet.
$/, 15 anos, cursa o 1ª ano do 2º grau em uma escola estadual. Órfão de mãe, mora com
seu pai, funcionário municipal, e seu avô, aposentado, em uma casa antiga com móveis
velhos, em péssimo estado de conservação, localizada em um bairro de classe média baixa.
Possui em seu quarto um computador.
7*, 14 anos, cursa o 1ª ano do 2º grau em uma escola federal, mora em uma casa modesta
com seu pai, porteiro, sua avó e um irmão, em um bairro de classe média baixa. Possui em %DL[R
seu quarto computador e internet.
'8, 15 anos, cursa a 7ª série do 1º grau em uma escola estadual, mora com seu pai
(proprietário de um bar), sua mãe (secretária em um consultório médico) e duas irmãs em
uma casa construída nos fundos do terreno da casa em que reside sua avó, localizada em
um bairro de classe média baixa. Divide um pequeno quarto com uma das irmãs.
%,, 16 anos, parou os estudos na 6ª série do 1º grau e não trabalha, mora com sua mãe
(auxiliar de cabeleireiro) em uma pequena casa de dois quartos, com pouco conforto,
localizada em um bairro de classe média baixa. A casa é herança da avó e deve ser
partilhada com a mãe e cinco tios de BI.
'1, 14 anos, cursa a 8ª série do 1º grau em uma escola municipal, com seu pai (pedreiro), e
sua madrasta (do lar), mora em uma casa de dois quartos, bastante modesta, localizada em
um bairro de classe baixa e periférico. Tem pouca relação com a mãe.
/', 16 anos, cursa a 8ª série do 1º grau em uma escola municipal, mora com seu pai
0XLWR
(pedreiro), sua madrasta (do lar), e uma irmã em uma casa bastante modesta, localizada em
um bairro de classe baixa e periférico. Seus pais são separados. Sua casa só possui um
quarto, que é compartilhado por toda a família. %DL[R
$', 16 anos, estudante da 8ª série do 1º grau em uma escola municipal, mora com seu pai
(pedreiro), sua mãe (do lar), e uma irmã, em uma casa de dois quartos, bastante modesta, RX
1HQKXP
localizada em um bairro de classe baixa e periférico.
:5, 15 anos, órfão de pai, mora com a mãe, operária, em algumas peças de madeira em
bairro muito pobre. Não possui em casa tv, rádio e telefone. No início da pesquisa, cursava
a 8ª série do 1º em uma escola estadual, recebia doações de alguns estudantes da
universidade e trabalhava no campus em uma atividade informal. Ao final da pesquisa,
havia abandonado o estudo, deixado o trabalho e tinha sido proibido de freqüentar a
Universidade por ter realizado pequenos furtos.
146

O consumidor voltado à condição de um eterno presente busca o consumo daquilo

que hoje é relevante e pouco se importa com as conseqüências futuras de suas ações. Essa é

uma condição propícia para a geração do consumismo.

2DXPHQWRGRQ~PHURGHRSo}HVGHHVFROKD

O aumento do número de opções de escolha é uma categoria relacionada às

mudanças tecnológicas e ao excesso de informação. Em síntese e resgatando argumentos

apresentados em seções anteriores, é possível dizer que a infinidade de produtos e serviços à

disposição dos consumidores implica: ruído, confusão, stress, insensibilidade, manipulação

(FOURNIER, DOBSCHA e MICK, 1999), diminuição do bem-estar motivado pelo esforço

necessário para fazer uma escolha e o desconforto pela perda das oportunidades que uma

opção diferente poderia ter propiciado (SCHWARTZ, 2004).

Cabe considerar que o volume de fontes de informações e posições (verdades)

existentes (sobre qualquer assunto), somado ao tempo muitas vezes exíguo para

processamento das mesmas e à capacidade limitada das pessoas para transformar dados em

informação torna a possibilidade de avaliação do que é o mais indicado um tanto quanto

remota (SOUZA, 2003a; 2003b). Como um exercício de reflexão e apenas considerando

alguns dos produtos e serviços que fazem parte do consumo diário de muitos consumidores

brasileiros, indago: quais são as possibilidades que um consumidor tem de avaliar as melhores

opções de preços dos produtos semanalmente comprados? quais são as informações que um

consumidor tem, por exemplo, sobre os riscos à saúde que os alimentos industrializados

possuem? dentre aqueles produtos que um consumidor adquire e que são oferecidos em

diferentes marcas, quantos são produzidos por um mesmo fabricante (com as mesmas

matérias-primas e condições de conformidade) mas que, por estarem com marcas diferentes,

são vendidos por preços igualmente diferentes? quem, ao efetuar uma chamada interurbana,
147

faz isso ciente e considerando a melhor opção para o momento? Packard (1965) já anunciava

na década de 1960 que, para dar conta do excesso de produtos existentes nos EUA, seria

necessária a existência de superconsumidores. Hoje, em um mundo tomado pela globalização,

o que dizer dessa situação? Os demais aspectos apresentados nos itens seguintes reforçam a

dificuldade que os consumidores têm de lidar com essa questão.

$VDUPDGLOKDVGDOLEHUGDGHGHHVFROKD

A soberania do consumidor é uma imagem extremamente sedutora, e o consumo, um

campo privilegiado de autonomia, de significado, de subjetividade, de privacidade e de

liberdade humana (SLATER, 2002). No entanto, essa imagem parece esconder outras

possibilidades.

Baudrillard (1991b) entende que a mentalidade individualista e consumista do ser

humano é formada pela manipulação e a grande variedade dos objetos que implicam a “ livre”

possibilidade de escolha, mas “ livre” no sentido de não ser possível deixar de escolher. Santos

(2000c) descreve que a ênfase em assegurar materialmente o aumento de escolhas determina

que, paralelamente a esse, seja observada a diminuição da capacidade de escolher. Ou seja, as

pessoas passam a ser dependentes daquilo que consomem ou usam. O telefone celular, no

primeiro momento, surgiu como uma opção para que as pessoas não mais tivessem a

necessidade de permanecer presas em um local fixo de trabalho – pudessem tornar-se mais

livres – mas, no segundo momento, deixou-as ainda mais presas e ligadas ao trabalho. Na vida

pessoal o celular representa hoje “ uma extensão do corpo” de uma pessoa e que por isso não é

possível deixá-lo de lado por qualquer instante do dia. Assim como o celular outras tantas

criações do sistema tornam o consumidor cada vez mais dependente do consumo de produtos.

O esforço do sistema capitalista é de manter o ser humano refém dos produtos e serviços que
148

suas instituições criam e recriam incessantemente como forma de não parar o processo de

crescimento (HELLER e FEHÉR, 1989).

Como o sistema cresce a partir da produção sempre excedente, a cada novo instante

são necessárias “ novas” escolhas, “ novas” dependências, “ novas” insatisfações. O

consumidor contemporâneo, sem possibilidade de construir sua identidade seja através do

passado, ou com base em uma perspectiva futura, constrói a sua “ identidade do momento”

baseado na linguagem daquilo que é moda, do consumo de luxo, da marca, do efêmero da

vida local e global, até mesmo porque as posições políticas ou religiosas não são mais

determinantes (LIPOVETSKY, 1989; BAUDRILLARD, 1992; KLEIN, 2002).

“ Razoavelmente, todos meus colegas não são consumistas compulsivos, mas têm aquilo que tá na
moda, o que todo mundo consome.” ()/)

“ Todo mundo usa roupa de surfista, então todo mundo agora só pode usar e tem que comprar tênis,
roupa, óculos, relógio, só na Quebra Mar [loja de especializada em acessórios de VXUIZHDU e VNDWH
ZHDU].” (:0)

Como o ser humano não existe além da linguagem (WITTGENSTEIN, 1996) e só

possui força e expressão na coletividade, sendo reduzido a um componente social

(FOUCAULT, 2004), acaba por ficar preso aos constantes e renovados condicionantes criados

pelas estratégias de marketing das empresas e projetam nelas seus sonhos, esperanças,

angústias e frustrações. Dessa forma, ele abdica de sua liberdade de agir e pensar, fica

alienado de suas necessidades e sem conhecer seus limites, regularidades e potencialidades,

busca a felicidade naquilo que o grupo social coloca de importante (GIGLIO, 2002). Surge,

assim, o quarto aspecto da vulnerabilidade do consumidor.

$VQHFHVVLGDGHVGHWHUPLQDGDVSHODVSUHVV}HVVRFLDLV

Todo consumo é cultural e envolve significados socialmente compartilhados.

Conforme Baudrillard (1995), os objetos de consumo têm um significado cultural no qual as


149

pessoas reproduzem seus sistemas de relações sociais. Com base no que o autor pensa, é

possível dizer que a partir do momento em que os sinais são trocados entre seres humanos,

eles tornam-se símbolos, imagens e marcas, substituindo a materialidade e o valor de uso dos

bens. Baudrillard (2000) ressalta que isso não significa que os produtos não tenham qualquer

utilidade funcional. No entanto, a funcionalidade é vista como um sinal, pois são as pessoas

que conferem função ou quaisquer outros valores aos objetos, uma vez que as significações

assumidas por eles não se manifestam isoladamente, e sim, nas relações sociais. É o

significado social que torna um objeto útil a uma certa categoria de pessoas e determina o seu

valor de troca, mantendo-se menos visível por suas propriedades físicas.

Em especial os adolescentes gostam de comprar roupas dos estilos VXUIZHDU e VNDWH

ZHDU e tênis. O computador e o telefone celular só não são realidades para os adolescentes de

potencial de consumo muito baixo. Uma das regras do grupo são as “ roupas largas” , no

entanto os mais pobres usam roupas de tamanhos maiores para que possam se enquadrar no

estilo. Alguns adolescentes afirmaram que pedem a opinião de amigos e da mãe. Os amigos

servem para dar informações sobre onde é possível encontrar um produto, ou se o local de

compra é bom, já a mãe serve para informar sobre a qualidade de um produto. Por outro lado,

outros adolescentes disseram que não se baseiam em ninguém, porque possuem o próprio

estilo. No entanto, possuem e usam as mesmas marcas de roupas e tênis e admitem que se

baseiam na televisão. Alguns recortes das entrevistas com os adolescentes e de imagens de

suas roupas dão a dimensão e ilustram essas questões.

“ Gosto de comprar roupa de marca, porque com elas me destaco no meu


grupo e chamo a atenção das gurias.” (*%)

“ [...] se eu gosto deu.” (9,)


“ Assisto filmes, algumas novelas até gosto. A Malhação e a das sete [...]
[Gosto porque] A maioria é gurizada, chama atenção, e o esporte [...]” (9,)
Regra: roupas largas
“ [...] paro pra ver Malhação, é um bagulho que o pessoal da minha idade não tem um que não pare
pra ver.” ($/)
150

“ [...] eu vou por mim [...] gosto de andar do meu próprio estilo, do meu
jeito.” (21)
“ [...] tô sempre vendo tv [...] vendo informação na internet, tô sempre nas
lojas vendo o que tão usando e como tão usando [...] aí vejo um amigo e
digo: legal essa tua roupa, como eu sei que ela tá na moda, pergunto a loja e
Camiseta de surf de 21
vou lá.” (21)

Nesse sentido, percebe-se a influência da televisão como produtora de identidades e

sentidos. Até adolescentes como, por exemplo, %,e '8 que afirmavam não assistir muito a

televisão foram observados assistindo ao programa, que é uma fonte de comunicação

disfarçada de apresentação de estilos.

Conforme Slater (2002), os bens sempre tiveram identidade social, porém nos

processos fluidos de uma sociedade pós-tradicional, a identidade parece ser mais uma função

do consumo que o contrário. Assim, a utilidade não é uma qualidade própria do objeto, mas

um significado construído pelos seres humanos, pois nenhum objeto é ou tem movimento na

sociedade humana, exceto pela significação que os homens lhe atribuem (SAHLINS, 1979;

SLATER, 2002).

O conjunto de significações e símbolos pode tornar a simulação uma experiência

internalizada e adotada como real, tornando a hiper-realidade “ mais real” que a própria

realidade (FIRAT e VENKATESH, 1995). O consumo de produtos de marcas é um bom

exemplo dessa situação. Já havia argumentado que em um mundo onde as empresas

terceirizam a sua produção uma marca é uma experiência hiper-real. Como é que podemos

definir um produto original de uma marca se quem o produz é uma outra empresa? Para

alguns consumidores existe uma boa forma de identificar um produto original: apenas

acreditar na identidade da marca estampada como algo “ verdadeiro” , real, que satisfaz. As

experiências hiper-reais com as marcas são muito significativas para que se possa ver a força

de uma imagem contra a vulnerabilidade de um consumidor adolescente ou, como prefere

Klein (2002), dos “ idiotas” consumidores. )/, no momento em que fazia um comentário
151

sobre a qualidade de suas roupas, que eram peças compradas em loja especializada em estilo

surf, disse:

“ A melhor roupa que tenho é esse moletom; [...] também, é Rip Curl.” ()/)

“ [...] custou dezoito reais no super.” (Comentário da tia )/ evidenciando que


se tratava de produto falsificado)

“ Ele não tira esse moletom.” (Observação posterior da mãe de )/)


Moleton de )/

É na força da imagem de uma marca referendada pelo grupo que um adolescente

pode conseguir “ ter” (FROMM, 1976) seu destaque, pois como diz o ditado popular “ o que os

olhos não vêem o coração não sente” . Por outro lado, outros, mesmo sabendo que “ aquilo”

não é a suposta “ marca original” , podem buscar a satisfação no “ parecer” (DEBORD, 1997),

já que não conseguem “ ser” nem “ ter” , como é o caso da seguinte descrição:

“ Roupa não precisa ser original, existem várias falsificadas que até dá pra enganá. [...] Prefiro de
marca, mas se minha mãe me trouxer [uma outra parecida com uma original] eu uso.” (*%)

Quando o valor de um produto (serviço) é decorrente do quanto ele representa como

posição social e não pelo que ele tecnicamente oferece, a subjetividade das imagens que são

importantes no momento dá lugar à materialidade e ao valor de uso. Nessa condição a

qualidade de conformidade é avaliada em segundo plano.

Outra questão que entendo deva ser evidenciada é que as necessidades dos

adolescentes que ainda não possuem um emprego são atendidas por familiares e, dessa forma,

o consumo baseado nessas condições também envolve e condiciona, indiretamente, as

famílias dos jovens.

“ A gente tem que ir às festas bem-arrumado para não se sentir constrangido frente aos colegas e às
gurias.” (7*)
“ Ele (7*) me pediu um moletom, mas disse que não queria dessas lojas e pediu pra escolher um que
é mais caro, que é de marca. Fazer o quê? Mais uma prestação.” (tia de 7*)
152

“ Têm amigos meus que têm pais que acham um absurdo dar um bagulho tri
caro pra um filho. A minha mãe também até certa parte achou um absurdo,
mas aí ela não teve escolha e começou a me dar os bagulho (sic). Às vezes
tem amigos que dizem: “ ah! esse tênis tri caro queria ganhar, mas minha mãe
não me dá isso.” (21)
  


Em relação aos sonhos dos jovens com maior potencial de consumo aparecem: o

desejo de viajar, a vontade de comprar uma moto ou carro, pois “ ter um carro pra mim, é um

bagulho sem noção!” (/2  Por outro lado, os adolescentes mais pobres sonham com aquilo

que os demais adolescentes já têm.

“ Queria um computador pra ter em casa, botar um gravador de cd e fazer um


dinheiro. [...] tem que ter um jogo né cara. [...] tá barato a internet, vinte
centavos o pulso, dá pra ver filme, ouvir música, eu não tenho rádio nem tv,
nem na minha casa nem da minha mãe.” (:5)
“ Celular é útil, bom e bonito, porque todo mundo tem e eu gostaria de ter.”
('8 sobre o significado de um celular quando da realização da projetiva)
&DVDGH:5

As lojas especializadas que vendem as roupas de VXUI ZHDU e VNDWH ZHDU não são

freqüentadas pelos adolescentes mais pobres. Duas descrições realizadas sobre uma dessas

lojas, quando da aplicação da técnica projetiva, ilustram a posição desses adolescentes em

relação às mesmas:

“ Dizem que é a loja que sai mais roupa, ganha das outras lojas, é a melhor loja que tem.” ($')
“ Daqui da Castelo [bairro pobre e periférico da cidade] achamos que é cara, pra filhinho de papai, só
tem coisa destaque.” ('1)

Independentemente do potencial de consumo, os jovens têm a mesma preferência de

estilo, mas, como não freqüentam os mesmos locais de compra, não possuem as mesmas

marcas de produtos. Dependendo do ponto de vista, essa questão pode ser apenas

“ segmentação de mercado” , por outro lado pode ser um indicador preocupante de diferença

social. O acesso à comunicação de massa (em especial à televisão) é possível, para muitos, já

o acesso à compra é privilégio de poucos. Entretanto, ambos os segmentos podem ser

considerados vulneráveis aos apelos.


153

$rQIDVHVHQRYDORUGDLPDJHPHGRVtPEROR

Como refere Schoreder (2000), o mercado está baseado em imagens, e essa

concepção é fundamental para que se possa entender a administração na sociedade. E tal

observação reforça os argumentos a respeito da separação do objeto de sua função. A

separação faz com que o mesmo seja adquirido pela imagem que representa e essa pode ser

apenas parcialmente concebida a partir da necessidade funcional. As imagens e os produtos

ficam desconectados um do outro, de seus conteúdos e contextos originais. Soma-se a isso o

fato de que a sociedade contemporânea é marcada, também, pelo excesso de imagens e

símbolos.

Cabe considerar que, de forma geral, os jovens afirmaram que em primeiro plano

admiram os pais, os avós e os amigos, e, em segundo plano e de forma discreta, expressaram

admiração por pessoas que pertencem às áreas esportiva e artística:

“ Admiro o Ronaldinho, pobre, sem dinheiro e agora é respeitado no mundo todo, baita jogador [...]
Senna, raça, brasileiro de coração, ajudou crianças pobres e o país.” (:0)
“ Eu gosto de banda de música, mas não tem esse negócio de ídolo que eu admire a f... ” (21)

Mas é na valorização das marcas de roupas e tênis que se torna mais evidente o

interesse dos adolescentes por imagens e símbolos. No entanto, não existe uma lealdade a

uma marca específica. No mundo fragmentado as opções são muitas, e as preferências

também. Eis aí uma vulnerabilidade das empresas e uma “ oportunidade” para ter de

comunicar mais e mais. 0DV VHULD PDLV XP LQGtFLR GD PRUWH GDV PDUFDV FRPR Ki DQRV

DOJXQVSURIHWL]DPGHVGHDFKDPDGD³6H[WDIHLUDGH0DUOERUR´HPGHDEULOGH"2X

DSHQDVRILPGDOHDOGDGHjVPDUFDV(KLEIN, 2002)". Essas outras questões mereceriam um

outro esforço de reflexão.

Voltando aos adolescentes, o interesse pelas marcas nem sempre foi revelado de

forma explicita e espontânea. Dos quinze adolescentes que participaram da pesquisa, durante
154

as primeiras entrevistas quatro jovens manifestaram interesse explícito por marcas e onze

manifestaram desinteresse ou interesse em marcas de apenas alguma espécie de produto.

Daqueles que manifestaram interesse em marca foram realizadas declarações como:

“ [...].com uma camiseta de marca tu pode ir a qualquer lugar, como se fosse


uma roupa social. Se não, parece que tu não te preocupa [com o lugar], outra
porque acho legal. Não sei por que isso [marca]. Na Quebra Mar [loja de
especializada em VXUIZHDU] camiseta só porque tem marca tu já acha a f... , se
não tem tu já não gosta. Todo mundo que convivo usa isso aí.” (/2)
“ Não sei [porque o preço de um tênis da marca Reef é tão caro]. [...] mas eu Camisetas de /2
nunca parei pra pensar [...]. Será que não é por causa da marca que ele tem? Não sei, por causa da
marca que tem, os caras botam um preço tal? Eu nunca parei pra pensar. Eu acho legal um bagulho
diferente.” (21)

Dos onze adolescentes que inicialmente se mostram desinteressados, a partir da

aplicação das demais técnicas de pesquisa apenas três se mostraram fiéis a esse discurso; os

demais revelaram discursos contraditórios em relação ao interesse pelas marcas. Como todo e

qualquer produto vendido possui uma determinada marca, cabe ressaltar que a expressão “ de

marca” citada pelos jovens diz respeito às marcas mais consagradas e de preços mais altos. A

seguir, apresento trechos de entrevistas e de conversas do cotidiano, observações e fotografias

que revelam posições não-contraditórias e contraditórias em relação ao interesse por marcas.

“ Marca é só nome.” (%,)


“ A maioria é só falsificado.” (associação de %, a respeito da Nike quando da
realização da projetiva)
“ Depende, uns acham uma m..., loja de boy, outros acham que é legal,
curtem.” (descrição de %, a respeito de uma loja de VXUI ZHDU, durante a
realização da projetiva)
Guarda-roupa %,
“ Não ligo pra marca.” (/')
“ É a melhor marca.” (descrição de /' a respeito da Nike quando da realização
da projetiva)
“ Eles adoraram, ficam falando que é Nike, nós sabemos que não é original, são
produtos falsificados que foram apreendidos pela Receita Federal e doados à
escola.” (supervisora da escola de /')
Tênis de /'
“ Não ligo pra marca.” ('8)
“ Essa marca é muito boa, [...] gostaria de usar.”
(descrição de '8 a respeito da Nike)
Seu quarto é repleto de adesivos de marca de roupas de
VXUI e VNDWHZHDU
Tênis Quix de DU Guarda roupa de DU
155

“ [...] calça e moletom não precisam ser de marca [...]” (/1)


“ [...] quando ele sai pra namorar sai todo com roupa de marca. A vó dele deu
três moletons [que não eram de marca famosa] e ele resolveu dar de presente
pro pai dele, que é uma coisa que ele não costuma fazer [presentear o pai].”
(tia de /1 )
Moleton Drop Dead LN

O interesse dos adolescentes pelas marcas não seria problema se essas não fossem

lptão caras e agravantes de diferenças sociais, uma vez que os adolescentes pobres também

têm expectativas de consumo semelhantes àquelas dos adolescentes com melhores condições

financeiras.

2SRGHUGDFRPXQLFDomRFRPRSURGXWRUDGHVHQWLGRV

Ao longo deste trabalho dei atenção à comunicação e, de forma especial, à televisão,

pois essa é um elemento vital para o fortalecimento do capitalismo pós-moderno (HARVEY

1992; JAMESON, 2000, JAMESON, 2004). A televisão produz sentidos hiper-reais: TXHP

QXQFD YLX DOJXP WHOHVSHFWDGRU EULJDQGR FRP XP SHUVRQDJHP GH XPD QRYHOD" TXDQWDV

SHVVRDVVHUH~QHPjIUHQWHGDWHOHYLVmRSDUDFRPHQWDURXDFRQVHOKDUDYLGDGHXPDIDPtOLD

GHVVD PHVPD QRYHOD" TXDQWRV VH VHQWHP UHFRPSHQVDGRV SRU WHUHP ³FRQVHJXLGR´ HOLPLQDU

XPSDUWLFLSDQWHGRUHDOLW\VKRZRXHVFROKLGR³RVPHOKRUHVGRDQRGDP~VLFDEUDVLOHLUD´"

A fragmentação e a dinâmica da comunicação contínua de novas imagens criam a

excitação a cada mensagem incorporada na comunicação e no marketing (PROCTOR e

KITCHEN, 2002). Os seres humanos passam a ser “ controlados” pelo mercado que, aliado ao

ambiente urbano, configura relações sociais baseadas na efemeridade dos signos. No entanto,

a hiper-realidade da comunicação dá a idéia de que o ser humano está “ controlando” , está

“ interferindo no jogo” .
156

A televisão foi citada como fonte confiável de informação, da mesma forma que a

internet. Chama atenção a relação que os adolescentes têm com a imagem. Quando

respondiam se confiavam nas informações da televisão foram dadas respostas como:

“ Agora confio, porque presenciei um acidente que apareceu no jornal.” (/')


“ Confio por causa que eles tão te comprovando de alguma maneira. Morreu Carlos aí aparece a foto
dele e o lugar onde ele morreu. Tem a batida de carro aí aparece o carro ali.” (21)
“ [...] a informação na tv é boa, mas não vejo muito. [...] Acho que não falariam mentira na tv.” (9,)
“ Tudo depende” (resposta de %, quando perguntado se confiava na televisão)

Além dos programas de entretenimento, como a novela Malhação já anteriormente

citada, alguns jovens estão procurando assistir os telejornais, a fim de se manterem

atualizados. A propaganda também aprece como um produto de interesse dos adolescentes e

essa abordarei posteriormente.

2GHVFRQKHFLPHQWRGDVJUDQGHVHVWUDWpJLDVHLQWHUHVVHVGDVHPSUHVDV

4XDLVVmRDVSRVVLELOLGDGHVGRVFRQVXPLGRUHVFRQKHFHUHPRVJUDQGHVHSULQFLSDLV

REMHWLYRVHVWUDWpJLFRVGDVHPSUHVDV"(VVDpXPDSULPHLUDHLPSRUWDQWHTXHVWmRDVHJXQGDp

TXDLVVmRRVUHDLVLQWHUHVVHVHVWUDWpJLFRVGDVHPSUHVDV"

Um verdadeiro circuito de marca não pode ser criado da noite para o dia, e é
por isso que em geral o processo começa com a forma mais simples de
extensão de marca, uma fusão gigante: a Bell Atlantic e a Nytex; a Digital
Equipment e a Compaq; a WordCom Inc. e a MCI; a Time Wamer e a
Tumer; Disney e ABC; [...] Seagram e a Polygram; America Online e
Netscape; Viacom e CBS [...] A lista aumenta a cada dia. Em geral, as
empresas citam o princípio Wal-Mart: todo mundo no setor está se fundindo
e somente os maiores e mais fortes sobreviverão. Mas R SRUWH SDUD VHX
SUySULR EHP, é apenas o começo da história. Uma vez que o perímetro da
marca tenha se expandido, a atenção corporativa inevitavelmente muda para
formas de torná-la mais auto-suficiente, através de várias interpromoções
coordenadas de dentro. Isto é, através da sinergia. (KLEIN, 2002, 170-171,
grifo meu).

Como refere Klein (2002), as fusões são para o próprio bem da empresa. Quanto

maior for uma empresa mais poderosa e ameaçadora ela se tornará. eQDIRUoDGDIRUPDomR
157

GH JUDQGHV FRQJORPHUDGRV GLYLGLGRV VRE GLIHUHQWHV PDUFDV TXH RV FRQVXPLGRUHV SRGHUmR

ID]HUYDOHUVHXVGLUHLWRVHVHWRUQDUHPPDLVH[LJHQWHV"

Em um sistema de mercado que defende a livre concorrência e a competição entre as

empresas, quando as empresas procuram destruir seus concorrentes, não é plausível que se

entenda nessa estratégia algum tipo de intenção de favorecer os clientes. Klein (2002, p. 170)

revela que “ [...] empresas como a Molson e a Nike buscaram criar marcas célebres exibindo-

se nos shows e jogos que patrocinavam, muitas dessas mesmas empresas estão agora tentando

derrubar varejistas locais ao criar superlojas de grife, e depois, indo mais além, hotéis, e

minicidades de grifes” .

Black (2001 DSXG FARIA J. HWDO 2001) em um trabalho que reconstruiu a história da

IBM identificou que a empresa prestava colaboração a líderes nazistas como forma de obter

monopólio do mercado. Interesse dessa natureza, além de ser deplorável, é algo que ocorre à

distância do consumidor.

Não são apenas as grandes empresas que definem estratégias voltadas para os seus

interesses. As chamadas “ indústrias fragmentadas” (PORTER, 1986), como é o caso do setor

varejista de combustível, os preços são “ milagrosamente” parecidos. Esse tipo de estratégia

pode até ser percebida pelo consumidor, mas não o torna menos vulnerável. Médicos de uma

determinada especialidade podem se unir e decidir não aceitar qualquer espécie de plano ou

seguro de saúde para as consultas dos pacientes. Essas e outras tantas estratégias muitas vezes

não são do conhecimento dos clientes e revelam sua impotência diante daquilo que as

empresas de grande ou pequeno porte podem fazer em defesa de seus interesses.


158

$GLVWkQFLDGRFRQVXPLGRUGRSURFHVVRGHSURGXomR

A distância do consumidor do processo de produção fragiliza por demais suas

decisões. Giglio (2002) relata que o consumidor alienado dos processos de produção fica sem

conhecer como os objetos são feitos e o seu valor de uso. Daí emerge a oportunidade para que

a troca seja baseada na estetização, pois nessa

[...] as mercadorias circulam por meio de redes impessoais e anônimas: a


divisão entre produtor e consumidor passa da simples encomenda (na qual
ainda existe uma relação pessoal) para a produção voltada para um grande
público anônimo. Para religar consumidor e produto no interior desse espaço
mediado, ambos precisam ser personificados de novo, ter um significado, e
um significado que os una. (SLATER, 2002, p. 38).

É através da qualidade percebida que o consumidor encontra a forma de avaliar as

melhores opções de aquisição. Alguns adolescentes disseram que realizam a compra com base

no estilo.

“ Pra mim, dando pra sair, uma roupa que seja nova, que eu não sinta frio, tá bom [...]. [Roupas] que
não tenham qualidade muito boa, vou pela cor, pelo desenho, só por isso.” ($/)
“ Entre o bom e o bonito primeiro faço opção pelo que acho bonito.” ()/)
“ [...] [roupa] compro pela imagem ou cor, apenas me preocupo com a qualidade dos tênis.” (21)

Os adolescentes que afirmaram ter preocupação com a qualidade dos produtos

demonstraram dificuldade para avaliar a qualidade de um dos produtos que mais gostam de

comprar: roupa.

“ Não sei, assim, eu gosto muito de roupa de surfista, cores diferentes, não gosto de preto, cores
alegres, estilo de roupa que eu gosto de usar.” (:0)
“ [...] por exemplo, roupa, a malha, a costura, às vezes vejo que o bagulho tem uma malha ruim.”
(/2)
“ [...] roupa é melhor ver pelo tecido [...] e confio na palavra de minha madrasta [...] (/')
“ Se não estraga fácil, [mas] não sei como ver [...]. Depende [...] placas dizendo que é de qualidade.”
('8)
“ Nem sei! [...] vendo se o material é resistente.” (%,)
“ O que é ruim é fácil identificar pelo preço. [...] Roupa de inverno eu toco no tecido e vejo se é
grosso, daí eu compro. Se é fino eu já deixo mais pro verão. Numa loja, que eu não saiba identificar
que tipo de roupa tem, eu busco direto o vendedor, porque eles sabem mais que a gente. Eles
conhecem a melhor qualidade. Noventa por cento deles querem te vender o mais caro, mas fico
sempre sabendo pelo vendedor se é melhor. Ele sabe o que tá vendendo [...] Se tivesse dinheiro não
iria pelo preço e sim pela qualidade [...]. Pra identificar qualidade é pelo preço, em comida também, o
mais caro sempre o gosto é melhor.” (:5)
159

Algumas empresas de serviços estão aumentando o grau de participação do cliente

no processo de operações do serviço. Como mencionam Fitzsimomons e Fitzsimomons

(2000), uma empresa quando da definição do pacote de serviços pode optar por uma

abordagem do cliente como co-produtor, para que o cliente deixe de ser um espectador

passivo e passe a realizar algumas atividades do serviço, como benefício a empresa substitui

seu trabalho pelo trabalho do cliente, mediante, por exemplo, caixas automáticas e auto-

serviços em restaurantes por quilo. Essa estratégia aproxima o consumidor do processo de

operações, permite uma maior autonomia por parte do cliente pelo uso do auto-serviço, mas

também o torna, conforme Fitzsimomons e Fitzsimomons (2000) sugerem, cliente e

empregado da empresa. Isso sem contar na redução direta de postos de trabalho que torna a

vida voltada para o eterno presente. No entanto, é uma forma de o consumidor julgar parte do

processo de operações.

Quanto aos adolescentes, considero que o aspecto mais intrigante na relação

produção-marca é que eles desconhecem o fato de que empresas transferem a tarefa da

produção de seus produtos para outras empresas. Quando questionados, por exemplo, sobre

onde e por quem são fabricados os produtos da Nike, as respostas recorrentes eram: “ Pela

Nike” ($/), “ Acho que nos Estados Unidos” (9,) ou ainda “ Não sei” (%,).

2GHVFRQKHFLPHQWRGDVWpFQLFDVHIHUUDPHQWDVGHPDUNHWLQJ

2TXHRFRQVXPLGRUEUDVLOHLURFRQKHFHDUHVSHLWRGHHVWUDWpJLDVGHPDUNHWLQJFRPR

PDUFD SUHFLILFDomR HPEDODJHP SURPRomR GH YHQGDV SXEOLFLGDGH SURSDJDQGD

PHUFKDQGLVLQJ YHQGDV" 'HVGH TXH XPD SHVVRD QDVFH HOD REULJDWRULDPHQWH FRPHoD D

FRQVXPLUQRHQWDQWRTXHWLSRGHHGXFDomRRXLQIRUPDomRUHFHEHGXUDQWHWRGDDVXDYLGDD

HVVHUHVSHLWR"
160

Os adolescentes foram instigados a falar de que forma eles encaravam os estímulos

de marketing. Quanto às propagandas, os jovens demonstraram simpatia e maior interesse por

aquelas ligadas aos produtos e marcas de suas preferências de compra ou sonhos de consumo,

em especial aquelas veiculadas pela televisão e que circulam na internet.

“ Algumas propagandas são ridículas não valem a pena, outras são legais [...]. Gosto de filmezinhos de
carros mexidos que aparecem na internet. [...] das propagandas da Nike que aparecem os jogadores de
futebol [...] aqueles bagulho de tele-mensagem, não acho que tenha necessidade de botar na tv. Gosto
de bagulho que me interessa. Entendeu? Tênis, boné, bagulho de carro que eu gosto, som, surf, skate
eu paro e olho.” (21)
“ [...] as [propagandas] da MTV são mais uma viagem, as da Nike são a f... pegam os que jogam legal,
sempre tem algo diferente, as de Rio Grande acho meio chinelo o bagulho.” (/2)
“ [Propaganda serve] só pra aquilo que tu não conhece. Propaganda de pasta de dente [...] [a gente] vai
pelo mais barato.” (/1)
“ [Gosto de propaganda] das de lojas com promoções, daí fico sabendo pra comprar coisas.” (/')
“ Vejo propaganda de vez em quando [...] Umas são divertidas chamam atenção, mas não me lembro
de nenhuma.” (7*)
“ Gosto de algumas propagandas que acho engraçadas, de cerveja, de alguns celulares, propaganda de
venda. [...] Já propaganda na internet não gosto.” (:0) (No entanto, o adolescente possui vários
arquivos em seu computador com filmes de propagandas da Nike, que baixou da internet)

Cabe ressaltar que alguns adolescentes têm certa desconfiança em relação às


propagandas.

“ [...] algumas vezes eles dizem algumas coisas e tu vai ver são bem diferentes.” ($/)
“ Geralmente eles põem [propagandas] na tv pra atrair e de repente chego lá e não gosto. [...] Depende
do contexto da propaganda, mas a maioria não é muito boa, alguma que se safa. Às vezes têm
propagandas que não são boas pelo que trazem, mas são engraçadas.” ()/)
“ Não gosto das propagandas que estão na internet, porque dizem uma coisa ali, aí tu vai comprar, é
outra coisa, às vezes é menor, ás vezes não é a mesma qualidade que mostra na tv.” (/1)

Em relação às estratégias de preços os jovens percebem apenas que os preços

“ quebrados” confundem um pouco, é difícil gravar, no entanto têm dificuldade de reconhecer

o porquê que algumas marcas têm preço muito alto. Quanto à promoção de vendas os

adolescentes lembraram as liquidações e relacionaram a ferramenta como algo para aumentar

as vendas. As demais técnicas e intenções de promoções não são por eles percebidas. As

posições, nesse sentido, eram manifestadas de forma curta e objetiva.

“ [Promoção] serve pra vender as últimas peças de uma roupa e esvaziar o estoque.” ($/)
“ [Promoção] é pra vende mais.” ()/)
161

Os jovens também desconhecem a existência de técnicas e incentivos de vendas, bem

como a utilização de treinamento de vendedores. As posições a esse respeito eram como:

“ [...] acho que não tem nada [treinamento], talvez conversem com o dono.” (9,)

“ Eles aprendem a vender trabalhando.” (:1)

O consumidor, tendo dificuldade em identificar as técnicas e ferramentas utilizadas

pelas empresas e propostas na literatura, propicia que as condições indesejáveis perdurem na

sociedade insatisfeita e manipulada.

$IDOWDGRFRPSRUWDPHQWRGHUHFODPDomR

Singh (1990) descreve as características do comportamento de reclamação dos

consumidores. O autor identifica quatro tipos de comportamento de reclamação: os passivos,

que não reclamam à empresa nem a outra pessoa sobre sua experiência ruim e continuam,

pelo menos por algum tempo, a comprar ou usar seus produtos; os falantes que contam sua

experiência ruim para a empresa; os irados que normalmente não repassam à empresa a

experiência ruim, mas contam para inúmeras pessoas seu problema e, além disso, deixam de

comprar da empresa; e os ativistas que desejarão vingança pela experiência ruim, além de não

quererem mais comprar da empresa. Por sua vez Thomas (1997) descreve nove facetas do

consumidor: como comprador, como selecionador, como comunicador, como explorador de

caráter, como investigador, como rebelde, como vítima, como ativista e como cidadão.

A falta do comportamento assertivo, reivindicador e ativista dos consumidores,

somados à existência de poucas instituições e grupos organizados em defesa de seus

interesses, limita as possibilidades de eliminação dos problemas de manipulação.


162

O contato com os adolescentes revelou que alguns deles se dizem indignados quando

são mal atendidos, mas não descrevem experiências significativas de reclamação. Por outro

lado, desconhecem os meios e órgãos disponíveis para atender a possíveis problemas.

A falta de um efetivo comportamento de reclamação do consumidor brasileiro

(SOUZA e PEREIRA, 1999; SOUZA, 2000) é mais um dos aspectos que implica a

manutenção de sua vulnerabilidade. Firat e Shultz (1997) argumentam que o consumidor

moderno vive a ilusão de encontrar o seu “ eu” , já o pós-moderno nem o procura, pois aceita

diferentes “ eus” . Sem que pretenda adotar uma classificação prescritiva a respeito do

comportamento de reclamação anteriormente referido, entendo que precisamos caminhar para

que o consumidor dentro de seus vários “ eus” seja mais rebelde, ativista, irado e cidadão.

$UJXPHQWRVILQDLVGRFRQVXPLGRUYXOQHUiYHO

A sociedade pós-moderna de dados é a sociedade do excesso de informações que

torna o consumidor vulnerável e abre caminho para que as construções sociais sejam

estabelecidas para atender prioritariamente a interesses de empresas e do sistema capitalista,

em detrimento dos interesses dos consumidores.

Procurei evidenciar nesta seção que o consumidor contemporâneo se encontra à

mercê do discurso do marketing e que, assim, a idéia do consumidor exigente só é

parcialmente aceitável e nas condições de produção de sentidos estabelecidas pelo marketing

e pela cultura do consumo vigente, situação que é preocupante para o futuro da sociedade

brasileira.

A respeito das informações sobre os adolescentes, enfatizo que a divulgação dos

resultados de uma pesquisa é sempre uma simplificação que fica aquém da riqueza das

informações coletadas e observadas, como também representa um olhar, uma forma de


163

registro e de interpretação daquilo que foi constatado. Porém, a utilização de múltiplas

técnicas de investigação ampliou a análise de algo tão complexo como é o caso do

comportamento humano.

Percebo que a influência do consumo na vida dos adolescentes e de suas famílias,

independentemente do potencial de consumo, é notória, assim como é o fascínio pelas marcas.

Ao mesmo tempo constato a evidente vulnerabilidade dos jovens em relação ao consumo,

tendo em vista que desconhecem técnicas e ferramentas de marketing. Devo considerar que

eles foram “ educados” ou, para ser mais preciso, acostumados a cultura de consumo que cria,

valoriza e reforça o efêmero, o hiper-real, o símbolo, a imagem, o valor da troca.

Embora entenda que a vulnerabilidade não deva ser atribuída apenas aos

adolescentes, cabe considerar que, sendo este um segmento que representa a esperança do

novo e de mudança, mantidas as condições atuais é de se esperar que continuaremos a ter

futuros consumidores dependentes e não-exigentes, o que abre caminho para a manutenção

das estratégias de manipulação voltadas à construção da insatisfação.

Diante de tal situação defendo a adoção de projetos de conscientização e educação

para o consumo. Nesse sentido, o projeto do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor

(IDEC), realizado em parceria com o Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e

Qualidade Industrial (INMETRO), que tem por objetivo contribuir para a formação de

cidadãos conscientes de seu papel como consumidores participativos, autônomos e críticos a

partir da sala de aula, é um exemplo do que pode ser feito. Tal projeto está embasado nos

parâmetros curriculares nacionais elaborados pelo Ministério da Educação em 1988, os quais

introduziram o consumo entre os temas transversais a serem abordados nas escolas.


0$5.(7,1*&202)81d­2'(&216758d­2'$
,16$7,6)$d­2

[O capitalismo em seu estágio tardio], não assumiu as formas mais antigas e


brutais de exploração geográfica e reivindicações territoriais, mas, sim, a
saturação por mercadorias e a extraordinária simultaneidade informacional
pós-geográfica e pós-espacial que tece uma teia bem mais fina, minuciosa e
penetrante do que qualquer coisa imaginável com as velhas sinalizações de
rota do cabo e do jornal, ou até mesmo do avião e do rádio. (JAMESON,
2004, p. 81).

É nessa perspectiva que o marketing tem sido aplicado e cumprido sua missão, e foi

sob esta perspectiva que procurei descrevê-lo nas seções anteriores mediante três diferentes

gêneros de sua formação discursiva (discurso acadêmico, discurso das empresas e discurso da

comunicação de massa – televisão). Formação essa que busca legitimar práticas e idéias para

manter em crescimento o sistema capitalista. Como já anteriormente citei, Marx observou que

o capital precisa da expansão incessante (JAMESON, 2004) e, para que esse processo

perdure, é necessário manter a sociedade permanentemente insatisfeita, mas não no sentido da

falta de algo.

As QHFHVVLGDGHV SRGHP VHU GHVFULWDV FRPR VHQWLPHQWRV FRQVFLHQWHV GH


TXH ³IDOWD DOJXPD FRLVD´. Em conseqüência, o termo “ necessidade” não
indica um determinado sentimento concreto, mas muitos sentimentos
distintos na condição de assinalar uma falta. Nem todos os sentimentos
podem assinalar uma “ falta” , mas muitos, e tão diferentes quanto a fome, a
curiosidade, a ansiedade, o amor e inúmeros outros, certamente o fazem. Em
sua maioria, as QHFHVVLGDGHV VmR VHQWLPHQWRV FRPELQDGRV, chamados
“ disposições de sentimento” . O sentimento consciente da falta de alguma
coisa também é uma motivação: DIDOWDWHPGHVHUSUHHQFKLGDHOLPLQDGD.
O preenchimento ou eliminação de uma falta implica a preservação ou a
expansão do Eu. Ou, para formular isso de outra maneira: sem o sentimento
de que falta alguma coisa, não se pode preservar o Eu, nem, menos ainda;
expandí-lo. O sentimento de que IDOWD DOJXPD FRLVD QmR HTXLYDOH D
LQVDWLVIDomR. A LQVDWLVIDomRVySRGHVHUDYDOLDGDVHRVHQWLPHQWRGHTXH
IDOWD DOJXPD FRLVD p SHUSHWXDGR RX VH LQWHQVLILFD. Isso ocorre se: (a) os
PHLRV SDUD D VDWLVIDomR das necessidades socialmente atribuído a uma
pessoa ou grupo de pessoas QmR VH HQFRQWUDP DR DOFDQFH GHVVD
GHWHUPLQDGD SHVVRD ou grupo de pessoas, (b) sH RV PHLRV TXH
SURSRUFLRQDPDVDWLVIDomR, em princípio ao alcance da pessoa, embora não
socialmente atribuídos a ela, LQIRUPDP D SHVVRD FULDP QHOD D
165

QHFHVVLGDGHPDVQmRVmR QmRSRGHPVHU DGTXLULGRVSRUHOD, e (c) se a


falta não pode ser preenchida ou eliminada por qualquer meio satisfatório,
ou se a pessoa sente a falta sem saber o que é que falta. (HELLER e FEHÉR,
1998, p. 38-39, grifos meus).

O marketing tem explorado ao máximo a satisfação das necessidades através do

consumo de bens e serviços que não estão ao acesso de todos. Segundo Baudrillard (1995, p

59) a “ análise da lógica social do consumo [...] não é a da apropriação individual do valor de

uso dos bens e dos serviços – lógica de produção desigual, em que uns têm direito ao milagre

e outros apenas às migalhas do milagre –; também não é a lógica da satisfação, mas a lógica

da produção e da manipulação dos significantes sociais” . Segundo o autor é através da lógica

da diferenciação que podemos entender o consumo e a insatisfação definitiva a ele associada

nos dias de hoje.

O consumidor vive as suas condutas distintivas como liberdade e como


aspiração, como escolha, e não como condicionamento de diferenciação e de
obediência a um código. [...] Ao distinguir-se na ordem das diferenças, o
indivíduo restabelece-a, condenando-se, portanto, a inscrever-se nela só de
modo relativo [...] é este condicionamento de relatividade que é
determinante, na medida em que é por referência a ele que a inscrição
diferencial jamais terá ILP. Só ele explica o caráter fundamental do consumo,
o seu caráter ILIMITADO – dimensão inexplicável por meio de uma teoria
das necessidades e da satisfação já que, se fosse calculada em balanço
calórico, energético ou em valor de uso, depressa se atingiria o limiar de
saturação [...] (BAUDRILLARD, 1995, 59-60).

Esse é o palco para que as estrelas do marketing atuem: a obsolescência planejada, o

lançamento dos novos “ velhos” produtos, os truques da maximização da escolha, a idiotização

das imagens de marcas, os preços psicológicos e o mundo perfeito das mensagens das

propagandas. Tudo isso e muito mais é construído e oferecido para vulneráveis consumidores.

É momento de exacerbação da dimensão do valor de troca em detrimento da noção do valor

de uso, relação que, mediante novos valores críticos, precisa ser invertida (HELLER, 1998),

com base em Slater (2002) indago: os sistemas sociais de alocação de recursos satisfazem as

necessidades dos grupos sociais (ou as pessoas) de maneira autônoma, eqüitativa, livre, justa e
166

feliz? Minhas observações, análises e reflexões, reveladas ao longo desta tese, levam- me a

responder que, infelizmente, inúmeras evidências e fatos indicam que as necessidades das

pessoas não estão sendo atendidas dessa maneira e, por isso, precisamos de posições críticas

sobre essa questão. Até mesmo porque estamos no Brasil – país com sérios problemas de

distribuição de renda, de saúde, de segurança, de educação e de meio ambiente. Nesse sentido,

é que a partir deste momento apresento os argumentos teóricos sobre a constituição de uma

teoria, para rejeitar a proposição atual de que o marketing atende às necessidades dos

consumidores e, assim, defender minha tese de que o marketing é responsável pela construção

da insatisfação.

352326,d­2(5(-(,d­2'(80$7(25,$$5*80(1726
3$5$$7(6('$,16$7,6)$d­2

Ernest Nagel descreve a respeito do FRQKHFLPHQWR QDV FLrQFLDV VRFLDLV e sua

argumentação é significativa para que eu possa iniciar meus argumentos a respeito do

conhecimento na área de marketing.

[...] as ciências sociais não dispõem de teorias explicativas que lhes


permitam abstrair do real para depois buscar nele, de modo
metodologicamente controlado, a prova adequada, as ciências sociais não
podem estabelecer leis universais porque os fenômenos sociais são
historicamente condicionados e culturalmente determinados; as ciências
sociais não podem produzir previsões fiáveis porque os seres humanos
modificam o seu comportamento em função do conhecimento que sobre ele
se adquire; os fenômenos sociais são de natureza subjetiva e como tal, não se
deixam captar pela objetividade do comportamento; as ciências sociais não
são objetivas porque o cientista não pode libertar-se, no ato de observação,
dos valores que informam a sua prática em geral e, portanto, também a sua
prática de cientista. (NAGEL, 1961 DSXG SANTOS, 2000c, p. 86).

A esse argumento acrescento a SHUVSHFWLYD UHODWLYLVWD FUtWLFD de Peter e Olson

(1983) onde a VXEMHWLYLGDGH p XP DVSHFWR LQHUHQWH j FLrQFLD SRUTXH D FRQVWUXomR GD

FLrQFLDpXPSURFHVVRVRFLDO, já que é produzida pelos seres humanos. Segundo os autores, as

teorias são científicas porque um determinado grupo de pesquisadores, em um dado momento,

assim definiu. A FLrQFLD SRGH VHU HQWmR XPD TXHVWmR GH SURPRomR RX SHUVXDVmR de
167

determinado grupo que tenta validar sua percepção da realidade (subjetiva) perante a

comunidade científica. Peter e Olson (1983) advertem que inclusive as observações empíricas

podem ser enviesadas pelas características pessoais e experiências passadas de um

pesquisador. Reforçando essa posição, lembro que todo discurso (inclusive o científico) é uma

fonte de saber e poder (FOUCAULT, 2004).

Razzaque (1998) descreve FRPR XPD WHRULD p IRUPDGD VRE XPD SHUVSHFWLYD

UHODWLYLVWD. A partir de uma dada realidade e de seus contextos de origem são propostas

conceitualizações (observáveis e não-observáveis), em uma dada estrutura contextual e

temporal que vão apoiar uma teoria. Sob uma determinada tecnologia do conhecimento, essa

teoria será instrumentalizada e fornecerá o embasamento para a ação (prática ou teórica).

Ação que, por sua vez, intervirá na realidade e influenciará na formulação de teorias gerando

um novo ciclo de desenvolvimento da ciência. A dinâmica desse processo determina a

influência das teorias existentes: sobre a realidade, sobre as proposições conceituais e sobre a

estrutura contextual e temporal da realidade. Tal dinâmica implica que o processo de

formulação da teoria influencie as teorias existentes e determina que o próprio processo de

observação mude a realidade.

No entanto, Santos (2000b, p. 77-78), ao fazer referência sobre o que significa uma

SURSRVLomRWHyULFDHXPDSURSRVLomR REVHUYDFLRQDO(ou o hiato entre a linguagem teórica e

a linguagem da pesquisa empírica), menciona a necessidade de se analisar: “ o que é que em

dado momento da evolução do contexto da ciência funciona como teoria ou interpretação do

que existe (o não-observável), e o que é que funciona como descrição factual do que existe (o

observável)?” Com base nas proposições teóricas do marketing, formuladas sob o modo e

contexto de vida norte-americano e na ideologia capitalista, bem como nas reflexões a partir

da conjuntura brasileira, não se observa o funcionamento das conceitualizações teóricas do


168

marketing que foram propostas para dar sentido à vida e estabelecer verdades a serem

seguidas pelas diversas audiências interessadas ou envolvidas com o marketing.

Por falar em produção de sentidos, outro argumento que é extremamente relevante

para que se possa entender de que forma é possível rejeitar uma proposição teórica ou

conceitual é a posição de Wittgenstein (1996). O autor critica a concepção de que entende que

um significado ou conceito pode ser constituído como uma realidade mental prévia e distinta.

Mattos (2000), baseado nas idéias desse autor, menciona que:

Os conceitos, que são unidades de significado produzidas pelo uso, são


DEHUWRV porque os usos são incomensuráveis − não podemos estabelecer
regras para todos os casos − e isso porque ocorrem no plano histórico da
ação de pessoas livres; entre um número indefinido de possibilidades de uso
das palavras, estamos a cada instante escolhendo alguns, e jamais os
repetimos inteiramente, mesmo que se possa estudar incessantemente
características comuns de sistemas lingüísticos em seus contextos culturais.
Mas eles também estarão mudando. Por isso mesmo, toda linguagem é
sempre SURYLVyULD Desse caráter sempre aberto à criação e dessa
provisoriedade participa o conhecimento humano [...]

[Assim], Os usos, e, portanto, oVVLJQLILFDGRV H[HUFLGRVHPSDODYUDVQmR


VmRUHDOLGDGHV³DWXUDLVGRXQLYHUVR´, [...] simplesmente porque só temos o
mundo na linguagem; não é possível ‘falar’ propriamente do mundo “ em si” .
E se falamos do mundo de forma objetiva, como a ciência procura fazer, isso
só é possível como mais um recurso de linguagem.

[...] [Soma-se a isso o fato de que] as palavras seriam signos arbitrários; elas
podem produzir significado porque fomos acostumados, desde a infância, na
escola e na convivência com outras pessoas, a usá-las para fazer algo,
mesmo que sejam ações sutis no relacionamento, ou que tal relacionamento
seja introjetado (MATTOS, 2000, p. 7-8, grifos meus).

Os GLIHUHQWHVDWRUHV (pesquisadores, professores, alunos, e praticantes) – espalhados

pelas universidades, órgãos de representação, empresas e etc – HQFDUUHJDGRV GH DFHLWDU

GLVVHPLQDU H OHJLWLPDU R GLVFXUVR GR PDUNHWLQJ WHQGHP D VH DFRVWXPDU FRP WRGD D

UHDOLGDGH SURGX]LGD SHORV SHVTXLVDGRUHVDXWRUHV GD FRUUHQWH GRPLQDQWH (em especial,

norte-americanos). Nesse contexto, cabe considerar os procedimentos de exclusão, pois “ sabe-

se bem que não se tem o direito de dizer tudo, que não se pode falar de tudo em qualquer
169

circunstância [...]” (FOUCAULT, 2000, p. 9), não é qualquer palavra que serve, não é

qualquer discurso que cabe, pois nem tudo contribui para a (re)produção da ideologia

dominante. Assim, o argumento do marketing voltado para a criação da insatisfação é uma

linguagem inadequada, não é uma “ linguagem autorizada” (BOURDIEU, 1996), pois não

constitui a regra do jogo que deve ser disseminada pela coletividade do marketing. Já o

discurso da satisfação é uma expressão “ politicamente correta” para justificar a criação da

insatisfação.

Para Santos (2000b) a verdade da ciência se dá sempre na e para a sociedade, todo o

conhecimento é social, e os resultados da ciência trazem impactos sobre a vida dos cidadãos

comuns, assim eles têm o direito e o dever de discutir os aspectos positivos e negativos do

conhecimento científico.

Todo conhecimento é contextual. O conhecimento científico é duplamente


contextualizado, pela comunidade científica e pela sociedade. O contexto
desta última é, por sua vez, internamente diversificado [...] A dupla
contextualização do conhecimento científico significa que ele é
simultaneamente uma prática científica e uma prática social e que essas duas
dimensões não podem ser separadas senão para fins heurísticos. Esta idéia,
se plenamente assumida, obriga à reformulação de várias das questões [...]
(SANTOS, 2000b, p. 77).

O marketing, ao ser fator de geração de expectativas e influenciador do consumo

afeta a vida de todos cidadãos. Como professor de marketing percebo que o discurso da área,

aos olhos de muitos, exerce charme, encanto e fascínio, independentemente da formação ou

qualificação profissional. É de se convir que tal condição não é nada surpreendente em uma

sociedade que valoriza o sucesso econômico, o consumo, e o VWDWXV do mercado. Mas chama a

atenção, também, que outros tantos quando se referem (ou relacionam) à área, usam

expressões como: “ marketing é vendas” , marketing é propaganda” , “ isso é só marketing” , “ ele

só faz marketing” , “ isso é coisa de marketeiro” , ‘marketing é sacanagem” . Embora vendas e

propaganda possam ter algum tipo de conotação negativa, as quatro últimas expressões são
170

marcadamente pejorativas. Na condição de professor, não considero agradável embora

entenda justificável tais considerações. No papel de educador, pelo poder de influência e pelas

responsabilidades que tenho, considero relevantes essas manifestações do senso comum, para que eu não aceite

os benefícios da área (e relacionados à gestão) sem que considere os perigos e os riscos que ela oferece à

sociedade.

Os fatos, evidências e reflexões que descrevi ao longo da tese, somados às posições e

argumentos descritos nesta subseção, levam-me a propor uma nova (ou outra) interpretação,

80$7(6(, sobre o marketing: RPDUNHWLQJWHPVLGRDIXQomRJHUHQFLDOUHVSRQViYHOSHOD

FRQVWUXomR GD LQVDWLVIDomR GR FRQVXPLGRU FRPR IRUPD GH PDQWHU R SHUPDQHQWH H

LQFHVVDQWH FRQVXPR H FRP LVVR SURSLFLDU R OXFUR GDV HPSUHVDV H R FUHVFLPHQWR GR

VLVWHPDFDSLWDOLVWDHSDUDWDQWRXWLOL]DVHGHUHFXUVRVGHPDQLSXODomRHSHUVXDVmRO

marketing na verdade como técnica gerencial pode em uma mesma dimensão tempo-espaço

admitir mais de uma interpretação e ser mais de uma coisa, porém é essa condição que tem se

mostrado efetiva e aplicável. Na próxima subseção, tendo em vista o contexto brasileiro,

apresento as razões para apresentar e defender tal interpretação. Logo após apresento uma

síntese da experiência em sala de aula a respeito do debate em torno dessa questão.

(67$02612%5$6,/

Nesta subseção focalizo minhas argumentações em torno de dois principais aspectos:

o desafio da relação entre as questões local e global e o consumo dos ricos (turistas) e dos

pobres (vagabundos) no contexto brasileiro. A re-análise do material da pesquisa realizada

junto aos adolescentes e as conversas do cotidiano ilustram os argumentos desta subseção.


171

2ORFDOHRJOREDORGHVDILRDVHUHQIUHQWDGR

Santos (2003b) analisa o fenômeno da globalização como um processo

simultaneamente hegemônico e contra-hegemônico, em que existem UHODo}HVHQWUHRORFDOH

R JOREDO O autor argumenta que para entender a situação do Brasil é preciso considerar a

situação pós-colonial particular do país, buscando evitar a importação de um debate baseado

em outros contextos sociais. Afinal, cada sociedade precisa “ resolver os problemas que têm

perante si. Não há um conjunto natural de problemas, são problemas aquilo que socialmente é

construído como tal numa determinada sociedade” (SANTOS, 2003b, p. 18). Em tempos de

globalização, é preciso encontrar alternativas para tudo aquilo que não é global, e sim, local.

A questão, pois, que se põe a nós [...] [brasileiros] não é apenas de saber se
podemos pensar a pós-modernidade numa sociedade semiperiférica, mas
sobretudo se podemos pensar e agir pós-modernamente. A questão é
complexa. Por um lado, a discussão do moderno e do pós-moderno seria
algo telescópico, discussão à distância, guerra de miniaturas. Por outro lado,
os artefatos da cultura pós-moderna entram diariamente em nossas casas por
múltiplos canais de informação e até se dirá que a nossa capacidade para
gerir ou para atenuar a sua penetração é menor que a dos habitantes das
sociedades centrais por não termos as resistências modernas tão
desenvolvidas quanto eles. (SANTOS, 2000b, p. 93-94).

Assim, é um tremendo desafio tratarmos as questões do marketing de forma

particular, local, pois estamos em um mundo globalizado, principalmente, pela comunicação.

Mas é dessa forma que penso ser necessário estudarmos o marketing e a cultura de consumo

contemporânea, uma vez que temos problemas e desafios particulares e as conceituações, os

debates, os modelos, as soluções de marketing de outros contextos não podem ser

simplesmente importados. Estamos no Brasil, onde nem mesmo o acesso aos bens e serviços

básicos é uma realidade de toda a população, quanto mais àqueles relativos a um padrão de

consumo de bem-estar intermediário. No entanto, o estímulo ao consumo e a diferenciação

através do consumo estão no acesso, se não de todos, pelo menos da esmagadora maioria da

população.
172

Santos (2003b) entende que nossos problemas modernos precisam de uma produção

científica mais multicultural, e a educação constitui-se em um campo privilegiado para

trabalhar nesse sentido, em que a colaboração de acadêmicos de diferentes áreas (e partes do

mundo) somem esforços, misturem seus saberes aos saberes do senso comum para que

apresentem seus conhecimentos e soluções sobre os problemas que enfrentam. Penso que é

mediante o exercício de reflexões críticas a respeito da cultura do consumo no âmbito do

marketing e da produção que poderemos contribuir para uma sociedade mais justa, pois, como

diz Santos, precisamos do viés multidisciplinar para resolver nossos problemas sociais

causados pela exacerbação do consumo.

2FRQVXPRGHWXULVWDVHYDJDEXQGRVHVXDVFRQVHTrQFLDV

Hoje, o direito de o ser humano consumir livremente é inquestionável, no entanto

essa é uma condição que levanta dúvidas e manifestações críticas. Slater (2002) refere que

a privacidade da escolha individual parece contradizer a solidariedade, a


autoridade e a ordem social. Se os indivíduos definem seus próprios
interesses, como a sociedade pode se manter coesa? Se a escolha é
governada por preferências individuais privadas, o que acontece aos valores
culturais duradouros? Em muitos aspectos, essa é a maior preocupação dos
críticos da cultura do consumo, tanto os conservadores quanto os radicais: se
não podemos julgar ou regular os desejos dos indivíduos, como podem eles
trabalhar para constituir uma vida coletiva boa, progressista ou autêntica?
(SLATER, 2002, p. 36).

O marketing é uma função concebida dentro de uma visão de consumo ilimitado e

fundamentalmente baseada na lógica e nas condições de vida norte-americanas. Um olhar em

alguns livros-texto de marketing publicados apenas nos últimos anos no Brasil (KOTLER e

ARMSTRONG, 2003; KOTLER, 2000; CHURCHILL e PEPER, 200; ETZEL, WALKER e

STANTON, 2001), pode dar uma mostra de que a influência dos EUA continua presente no

marketing brasileiro. No entanto, RSDGUmRGHFRQVXPRQRUWHDPHULFDQRpGHVHMiYHOSDUDR

SODQHWD TXH QmR GLVS}H GH UHFXUVRVQDWXUDLV LOLPLWDGRVHVWDQGR SDUWH GHVVHV Mi LQGLFDQGR

VLQDLVGHHVJRWDPHQWRRXGHVpULRVFRPSURPHWLPHQWRV"$VSUy[LPDVJHUDo}HVSRGHUmRYLYHU
173

VREDFXOWXUDGHFRQVXPRLQGLYLGXDOHLOLPLWDGR"1R%UDVLOpGHVHMiYHODDGRomRGDVPHVPDV

Do}HVGHPDUNHWLQJWHQGRHPYLVWDRVSUREOHPDVGHFRQFHQWUDomRGHUHQGDH[FOXVmRVRFLDO

YLROrQFLDXUEDQD"

Bauman (1999) entende que na globalização os turistas (os ricos) são aqueles que

recusam qualquer forma de fixação; movimentam-se porque assim o preferem; saem e

chegam em qualquer tempo e a qualquer espaço para realizarem seus sonhos, suas fantasias,

suas necessidades de consumo e seu estilo de vida; para isso, viajam física ou virtualmente

pela internet, já os vagabundos (os pobres) movimentam-se porque estão sendo empurrados

pela necessidade de sobrevivência, e, mesmo assim, existem severas restrições nos

tempo/espaços em que eles perambulam, seus sonhos e fantasias resumem-se a um emprego

qualquer, geralmente tarefas consideradas humilhantes pelos turistas. &DEH DR PDUNHWLQJ

HVWXGDURLPSDFWRGHVXDVLGpLDVHDo}HVVREUHRV³YDJDEXQGRV´"2HVWXGRGHVWH³VHJPHQWR

GHPHUFDGR´QmRGL]UHVSHLWRjVSUHRFXSDo}HVGHDFDGrPLFRVGRPDUNHWLQJ"

“ No nível da sociedade civil pesa contra a defesa do consumidor um modelo

econômico excludente, que não assegurou até hoje o direito ao consumo a parcelas

significativas da população e que, através do desemprego, tende a excluir novos contingentes

do mercado” (TASCHNER, 2000). No que se refere a emprego, as pessoas quando procuram

emprego precisam vender seu trabalho como também sua “ personalidade; [...] – realizado por

meio do consumo – de se vestir bem, ter boa aparência, ser atraente, manter-se atualizado em

termos de cultura, notícias e moda” (SLATER, 2002, p. 189). Ou seja, até mesmo para

trabalhar ou conseguir trabalho, o ser humano precisa consumir de forma que se configure em

uma imagem que o torne “ um bom produto” (mesmo que seja apenas visualmente).

As divisões e diferenças sociais são reconhecidas e existem como resultado de um

conjunto de fatores anteriores à existência do marketing no Brasil, não sendo assim plausível
174

apontá-lo como o responsável pela situação. Mas entendo ser possível dizer que a área é

motivadora dessa situação, quando contribui para a criação e o posicionamento de produtos

que devem ser destinados ao segmento de “ turistas” e não aos “ vagabundos” que desejam ser

“ turistas” . É interessante voltar a Baudrillard (1995), que vê o consumo como um processo de

diferenciação social e descreve que o consumo organizado em torno de um sistema de signos

formata o mundo moderno como “ sociedade de consumo” . Nessa lógica do consumo, os

indivíduos procuram se diferenciar uns dos outros, no entanto o processo de diferenciação é

perverso, pois, ao distinguir-se, o indivíduo restaura, de forma inconsciente, a diferença.

Nesse mesmo sentido, Turow (1997 DSXG HOLBROOK, 1999) acredita que as reais divisões

sociais configuram abordagens da mídia e que essa reforça diferenças. Entendo que essas

posições constituam elementos significativos para uma reflexão profunda acerca do marketing

brasileiro.

Penso que, na sociedade do “ ter” (FROMM, 1976) e do “ parecer” (DEBORD, 1997),

é compreensível que cada um busque sua forma de atender as expectativas de consumo

geradas e que os “ vagabundos” (BAUMAN, 1999), muitas vezes, façam um esforço absurdo e

negativo para ter acesso ao consumo. Para uma significativa parcela da população que não

tem poder aquisitivo, a violência é um meio de participar do consumo. Como afirma Misse

(2002), foi-se o tempo em que o pessoal das favelas contentava-se em não participar do jogo

do consumo, hoje eles querem consumir o que o sistema capitalista oferece e, na falta de

oportunidade, o tráfico é uma forma de atingir tal situação. Argumento semelhante é o de

Gilberto Nascimento, Presidente da Febem de São Paulo, que diz: “ O excesso de consumismo

vendido todo o dia leva ao roubo de um tênis, de um carro para dar volta na favela ou para

comprar drogas” (REVISTA ISTO É, 26/01/2005, p. 11). Retorno a minha re-análise da

pesquisa com os adolescentes para que com imagens e discursos seja ilustrado esse problema

e um pouco da indiferença.
175

“ Alguns amigos pra irem à festa e conseguirem mina,


procuram usá uma roupa melhor, conseguem isso
roubando, outros compram dos guris que roubam.” (:5)
“ [...] aqueles que não podem comprar não se sentem
inferiorizados por não poderem comprar.” (9,)
“ Alguns guris com grana acabam comprando roupa de
Guarda roupa de VI rolo [roubo].” (9,) Guarda roupa de WR

Assim como as informações descritas na pesquisa sobre o comportamento dos

adolescentes, o relato de um morador de um bairro de classe média baixa também ilustra essa

situação.

“ Os guris lá da zona querem ter tudo aquilo que aparece na televisão, que estão na moda: tênis, boné,
bicicleta, moto, camiseta e bermuda de surfista, aparelhos de som, dvd, celular e que eles vêem e
sabem que outros adolescentes têm [...]
Os guris mais velhos que aparecem com tais produtos servem de exemplo para os menores que
passam a valorizá-los, pois são exemplos de ascensão e sucesso no bairro. Passam a ser referência
para os outros porque podem usar grifes famosas e produtos desejados. Além disso, demonstram ser
corajosos, porque conseguem não ter medo para assaltar. Um dia um guri me disse que quase pegou
uma bicicleta de marcha de um cara que tinha entrado numa loja e deixado a bicicleta sem cadeado
na calçada. Ele disse que não roubou porque faltou coragem, mas lamentou porque “ era uma baita
magrela” . É verdade que não são todos que roubam, mas aqueles que não roubam porque não têm
coragem ou não acham certo fazer isso acabam comprando o roubo, também têm aqueles que
ganham alguma bermuda dos pais, mas sei que é f... ter só uma bermuda ou camiseta de marca.”

Relato feito por André, administrador e morador do bairro.

Por enquanto, aqueles poucos brasileiros que têm muito para gastar circulam de

helicóptero, freqüentam UHVRUWVe locais com fortes esquemas de segurança, fazem compras e

se divertem no exterior; já outros não tão privilegiados se refugiam em condomínios fechados,

compram em VKRSSLQJ FHQWHUV, andam em carros com vidros escuros. Ambos consomem

livremente, mas a cada dia têm sua liberdade de “ turista” cerceada.

Quando as pessoas dizem que não é possível matar por conta de um FGSOD\HU ou de

um celular e que é preciso fazer campanhas contra a violência, entendo que – além de outras

tantas campanhas como para mais educação e mais emprego –são necessárias campanhas para

reduzir o consumismo e a mercantilização da vida. Para isso, dentre outros aspectos, a

televisão pós-moderna precisa efetivamente exercer seu papel de veículo de comunicação

social e adotar um discurso oposto ao de valor de troca que dá sentido à construção de


176

símbolos efêmeros de diferenciação (materializados em modelos de passarelas, jogadores de

futebol, atores, marcas de “ idiotização” , etc). Essa é sem dúvida uma grande utopia, mas é

uma utopia autêntica de um texto científico contemporâneo.

A valorização do consumo em um país de excluídos gera outros problemas. Como

não entender natural o crescimento na criação de produtos piratas ou falsificados? É sabido

que os produtos piratas e falsificados contribuem para a competição ilegal, para a

consolidação de máfias, para a evasão de tributos e impostos; são produtos com baixa

qualidade de conformidade que enganam o consumidor, podendo-lhe causar problemas ao seu

bolso, a sua segurança, a sua saúde (como é o caso dos remédios dos laboratórios

clandestinos); ferem o princípio do direito de autoria, são resultados das ações de empresários

aproveitadores e inescrupulosos (mas não custa lembrar que todos esses problemas e

acusações podem ser atribuídos às empresas legalizadas). Porém, quero enfatizar que em um

país onde a comunicação de marketing estimula quem não tem a consumir, essa é uma

condição que tende a permanecer, até mesmo porque é dessa forma que muitas pessoas

encontram a chance de sobreviver, e outras de enriquecer.

Mais uma vez abrindo espaço para o estudo com os adolescentes, é possível perceber

que os produtos piratas são aceitos e constituem alternativas de aquisição dos jovens das

diferentes possibilidades de acesso ao consumo. As roupas são compradas por aqueles com

menos recursos econômicos, já os cds musicais e de vídeo-game são comprados por todos. O

preço alto do produto original aparece como justificativa para a compra de piratas.

“ [....] têm que baixar o preço do original. Acho que eles não têm muito lucro mas fazem cd muito
caro. [...] empresa, tipo a Sony, até tem lucro mais não tem muito por causa do cd pirata e porque eles
gastam muito, no encarte por exemplo.” ()/)
“ [...] dá de compra quatro [cds] se proibirem então tem que baixa o preço do da loja.” (%,)
“ Vai ser difícil acabar com o bagulho [piratas], eu acho.” (/2, comentando a respeito sobre das
campanhas contra os cds piratas].
177

Por outro lado, o consumo no mundo capitalista é tão “ mágico” que até mesmo

aquilo que é tido como pirata beneficia as grandes empresas. Como relata Klein (2002, p. 98),

nos EUA “ [...] grifes como a Nike e a Pólo têm se recusado a dar uma dura na pirataria de

seus logos em camisetas e bonés de beisebol nos bairros pobres da cidade e várias delas têm

claramente evitado tentativas sérias de refrear o exuberante furto em lojas. Agora as grandes

marcas sabem que os lucros de roupas de grife não fluem apenas da compra de roupas, mas

também de pessoas que vêem seu logotipo nas ‘pessoas certas’ ” . Em extensão a essa

evidência indago: VHUiTXHD0LFURVRIWVHULDDSRWrQFLDPXQGLDOTXHpFDVRQmRH[LVWLVVHD

SURSDJDomRGHFySLDVSLUDWDVGRVLVWHPDRSHUDFLRQDO:LQGRZV"

Voltando aos “ turistas” , àqueles que possuem renda para consumir no Brasil – que

através do que consomem e ostentam, indiretamente, contribuem para o aumento da violência

urbana – em busca do alcance da (in)satisfação estão sendo levados para construir suas vidas e

felicidade com base no consumo.

Como refere Campbell (2001, p. 60) “ os seres humanos também podem [...] obter

satisfação de atividades que, em qualquer sentido econômico convencional, não envolvem

absolutamente o uso de recursos (exceto o do tempo e o da energia humana), como a

apreciação das belezas naturais ou o prazer da amizade” . No entanto, o que percebo é que o

marketing tem contribuído para estimular as pessoas a acreditarem que os substitutos: de

amizade é o “ amigos toda hora 21 da Brasiltelecom” , de amor é uma viagem a Disney World

para o filho querido que o pai não tem tempo de brincar; de cuidado é o telefone celular da

Vivo para saber onde anda o filho que a mãe não tem condições de controlar; de carinho é

perfume do Boticário para substituir os beijos e abraços que a falta de tempo deixou pra trás

pela falta de tempo, de alegria é o Abadá do Araketo porque pular sem gastar o bastante não

haverá muito o que contar; de patriotismo é a nova camisa da seleção de futebol brasileira, e

da Nike! porque é o mais novo símbolo nacional. Defendo que as pessoas possam “ ser” tudo
178

isso sem necessariamente “ ter” ou “ parecer” tudo isso. Com o relato de um pai de dois filhos

apresento mais uma ilustração, dessa vez relacionada a uma pessoa com possibilidades de

acesso ao consumo, que evidencia o meu desconforto em relação à sociedade de consumo

vigente.

“ Não sei aonde a gente vai parar. [...] uma coisa que me preocupa bastante são meus dois filhos,
sempre pensei que deveria dar a eles uma boa educação. Não ganho pouco e, também, não me
preocupo com muito luxo. A Fernanda [esposa] também é assim [...] Mas não sei se vou mantê-los
[estudando] em escola particular, até posso pagar a mensalidade, mas o que tá f... é que tem sempre
alguém vendendo um álbum de fotos, um cd rom maravilhoso sobre a história do universo. As festas
na escola sempre são com fantasias compradas.
[...] A febre do celular é uma loucura, porque os pais dão aparelhos caros para crianças. É uma
disputa para ver quem tem o mais moderno, e tu imagina a pressão que é em casa porque os meus
[filhos], apesar de não exigirem muito, querem também. [...]
Já decidimos que, com exceção da mochila, o resto do material escolar quem decidi e vai comprar é
a Fernanda, porque se eles [os filhos] forem junto comprar é um terror. [...] Só que não adianta muita
coisa porque durante o ano eles pedem a caneta com cheiro de laranja, a figurinha do filme de não sei
quem, o tênis igual ao do amiguinho ‘que quando caminha acende uma luzinha tri legal!’ .
[...] não vou nem comentar os pedidos para entrar na escolinha de judô, de querer fazer natação [...]
Tudo é abaixo de grana. Sei que muitos pais têm um padrão de vida muito bom, mas acho que a
maioria deve se ver muito mal pra dar tudo isso [para os filhos].
Ah! Tem a briga da merenda. Levar de casa? Nem pensar, isso é “ pagar mico” . A cantina do colégio
é rica em produtos de tudo quanto é marca, pra mim é quase um supermercado, pois não pensa que é
só comida que tem lá. [...] Lá tem de tudo. Que coisa maluca!!! [falando bastante irritado] [...]
Eu penso como que um aluno [com pais] de renda mais baixa, mesmo que tenha uma bolsa [de
estudos] vai estudar em um colégio particular.
A gente deve fazer tudo pra um filho, mas acho que não é por aí. As vezes penso em colocá-los em
outro colégio, mas será que adianta?
[...] Não vou estar aqui daqui a uns cem anos, mas acho que nem precisa tanto tempo assim, para ver
como os filhos dos meus filhos vão viver. Cercados de tecnologia, com muita coisa pra comprar, mas
com que segurança? [...] E os que estão hoje à margem disso tudo? Pode ser que eu me engane,
tomara, mas alguma coisa vai ter que mudar, não apenas no Brasil [...]”

Relato feito por Paulo, funcionário público, casado e pai de dois filhos, de 9 e 12 anos.

Além da contribuição indireta do consumo dos “ turistas” para o aumento da

violência, aqueles que consomem de maneira exagerada, extravagante e imprudente

contribuem diretamente para o aumento dos níveis de poluição e esgotamento dos recursos

naturais. Dessa forma, mesmo que tenhamos um crescimento econômico mais distributivo no

futuro, muito provavelmente não será possível pensar em consumo livre e ilimitado como até

hoje o sistema capitalista apostou. Muitos recursos naturais não são renováveis, conforme

George (2002) talvez uma visão diferente fosse possível há mais de cem anos. Segundo a

autora, atualmente, o mundo produz, em menos de duas semanas, o equivalente a tudo o que
179

foi produzido no ano de 1900. A produção econômica (ou a transprodução, que no sentido

mais dinâmico do processo envolve a tomada de recurso, a sua transformação e as sobras)

dobra aproximadamente a cada 25 ou 30 anos. O impacto negativo que o consumo tem

causado à ecologia tem sido noticiado e observado há muitos anos. Problemas como a redução

das reservas de água doce, a diminuição da camada de ozônio, a redução dos cardumes de

pesca, as alterações climáticas da terra estão preocupando pesquisadores e grupos de defesa

da ecologia. Ainda segundo George (2002), tão grande é a força do sistema econômico

capitalista que este tem sido considerado como um sistema e a natureza como um subsistema

deste. Examinar o consumo a partir dessa relação é um procedimento artificial e uma receita

para o desastre. Em termos de marketing, embora Kotler (2002) “ prescreva” que a função da

gestão de marketing é administrar a demanda (manter, aumentar, diminuir) o que se percebe é

que para atender o modelo capitalista vigente os esforços são voltados e comprometidos com

o aumento de produção e, assim, do consumo.

Tendo apresentado esses argumentos quero dizer que, em uma fase de crise

conceitual e de transição, D SURSRVWD GR PDUNHWLQJ FRPR IXQomR GH FRQVWUXomR GD

LQVDWLVIDomR p XP DOHUWD HP IDYRU GD VRFLHGDGH, GD YLGD PXLWR DQWHV GH VHU XPD

SUHRFXSDomRFRPDJHVWmR. É uma mensagem para que diferentes audiências do marketing

tenham a idéia dos riscos e problemas que hoje enfrentamos e que no futuro, mantidas as

condições atuais de produção de sentidos serão ainda piores. Conforme Santos (2000c, p. 60)

o dever do pesquisador é de “ perguntar sobre o papel de todo o conhecimento científico

acumulado no enriquecimento ou no empobrecimento prático das nossas vidas, ou seja, pelo

contributo positivo ou negativo da ciência para nossa felicidade” .


180

62%5($,16$7,6)$d­2$(;3(5,Ç1&,$'2'(%$7((0$8/$

Minha experiência em sala de aula em relação a idéia do marketing como construção

da insatisfação foi ao longo do período de concepção da tese bastante significativa e, por isso,

considero de fundamental importância relatá-la, mesmo que de forma resumida. Os alunos de

graduação e especialização chegam para cursar a disciplina com diferentes percepções e

níveis de conhecimento sobre a área. Os alunos de graduação do Curso de Administração, da

Fundação Universidade Federal do Rio Grande (FURG), começam a disciplina de

Administração de Marketing5. com uma vaga noção sobre a área e, normalmente, com as

associações feitas pelo senso comum em que o marketing é: “ vendas!” , “ tem haver com

propaganda!” , ou até mesmo “ é sacanagem” . Outros ainda, possuem uma noção do

significado da área em função de alguma referência anterior (decorrente de alguma disciplina

cursada). Por fim, há aqueles que trazem alguma informação fruto de sua atividade

profissional vinculada a área.

Quanto aos alunos de especialização que cursam a disciplina de Marketing6 no Curso

de Especialização em Gestão Empresarial, da FURG, alguns têm formação específica na área

de administração e, assim, são familiarizados com o discurso do marketing; outros, com

formação em áreas diversas (engenharias, pedagogia, psicologia, direito, economia, medicina,

etc.) possuem vaga noção sobre a área; porém, dentre todos esses profissionais, há os que

trabalham em áreas vinculadas ao marketing (mesmo que nunca tenham realizado qualquer

curso de (in)formação nesse sentido). Em ambas as disciplinas apresentava as posições

conceituais comumente defendidas (de atender a necessidades e todas as demais que expus ao

longo deste trabalho) e as posições que defendo (de criação da insatisfação, etc.) e, ao longo

5
Esta disciplina é a primeira disciplina de marketing do curso e é oferecida no quinto
semestre do curso.
6
Esta disciplina é, normalmente, a quarta a ser ministrada no curso que possui doze
disciplinas.
181

das aulas, procurava ilustrar, a cada ferramenta e técnica apresentada, as evidências que

apoiavam a minha posição.

O que ficava evidente era a resistência que muitos daqueles alunos acostumados com

o discurso tradicional e defensores das concepções atuais de gestão de marketing ou, até

mesmo, em busca de soluções específicas como, por exemplo, como vender mais,

manifestavam resistência ou dificuldade em aceitar uma posição contrária à concepção

tradicional, e, ao a escutarem, sentiam-se incomodados, pois eu estava subvertendo uma

verdade que lhes tinha sido passada como algo inabalável, que representava a “ linguagem

autorizada” (BOURDIEU, 1996), por outra linguagem que inclusive não tinha uma “ aplicação

prática” . Soube que um aluno, formado em administração, que estava em busca de “ técnicas

de motivação” para o pessoal de linha de frente de uma empresa de serviços, após ter

participado da disciplina no Curso de Especialização, disse em uma conversa com um amigo

em comum: “ Pô! O cara destruiu tudo, marketing não é isso!” . Um outro, crítico das minhas

posições disse: “ Business são business” .

Por outro lado, aqueles que não tinham um conhecimento prévio e não estavam

“ acostumados” (MATTOS, 2002) a ouvir o conceito dessa forma que não conheciam os

“ jogos de linguagem” (WITTGENSTEIN, 1996) da área, e sensíveis à pressão a que estão

submetidos para consumirem sempre e mais e mais, aceitavam o conceito mais facilmente.

Além do que estariam, provavelmente, acostumados à linguagem do senso comum “ marketing

é sacanagem” . Em um certo dia um aluno fez o seguinte comentário a respeito da idéia de que

na orientação para marketing o consumidor é o rei: “ Professor, com tanta sacanagem, o

marketing deveria dizer que o consumidor é Deus, porque se sabe que pelo menos Deus

perdoa!”
182

Uma outra experiência que entendo relevante descrever diz respeito às discussões

sobre a construção de imagens de marca de alto valor e de símbolos em torno de pessoas

(ligadas às áreas esportiva, artística e à moda) para, posteriormente, darem credibilidade e

apoio a imagem dessas mesmas marcas. Em síntese, aqueles que manifestavam apoio a tais

construções acreditam que a valorização das marcas era justificada por ser uma questão de

diferenciação e de direito. As expressões usadas para defesa de tal posição eram: “ Se a marca

é diferente tem mais é que cobrar mais” ; “ Se os caras batalharam pela marca devem ser

recompensados por isso, pelo esforço que tiveram” . Já as pessoas que entendiam como natural

a supervalorização de determinadas pessoas do mundo do esporte, da moda, etc, justificavam

sua posição dizendo que tais pessoas eram talentosas ou porque eram exemplos de exceção.

Os comentários realizados eram os seguintes: “ Ele merece porque é um fenômeno [Ronaldo

Nazário, jogador de futebol]” , “ Todo mundo diz, e não é só no Brasil, que ela [Gisele

Bündchen, modelo] é a melhor modelo do mundo” . Além disso, um outro argumento comum

era “ eles podem ganhar desse jeito porque dão retorno” . Essas posições reforçam o consumo

em função do valor de troca e, em minha opinião, não contribuem para a construção de uma

cultura do consumo mais justa. Além disso, mascaram os talentos e os valores de tantos outros

profissionais, como os professores ou professoras das séries iniciais que lutam para alfabetizar

e dar esperança às crianças que pertencem ao segmento que Bauman (1999) intitula de

“ vagabundos” e que vão à escola na verdade por um prato de comida. Ou, o talento de um

bombeiro que diariamente corre risco de vida em uma profissão fundamental para a

sociedade. No entanto, esses não são valorizados porque não dão retorno para o sistema, pois

não representam e nem constroem marcas.

Por fim, um outro tipo de discussão em torno da insatisfação diz respeito a

maximização da escolha. Esse é um aspecto que os alunos, em sua grande maioria, entendem

como de fundamental importância para que as pessoas exerçam a sua liberdade, sejam
183

diferentes, façam suas opções de escolha. Porém, no momento que se deparam com a noção

de que muitas das diferentes opções não passam de hiper-realidades essa posição se torna

frágil e muitos se vêem como participantes do processo de “ idiotização do ser humano” de

Klein (2001).

$5*80(1726),1$,60$5.(7,1*&202&216758d­2'$
,16$7,6)$d­2

Como já havia evidenciado no início deste trabalho, minhas dúvidas, inquietações e

reflexões ora expostas não foram motivadas por um acontecimento específico, muito menos

recente, uma vez que elas têm relação com minha visão de mundo e são resultado de um

longo período de observações, análises e reflexões.

As empresas “ orientadas para marketing” – termo popularizado por Peter Drucker na

década de 1950, e revisto e ampliado a partir das discussões do final da década de 1960 para

“ orientadas para o marketing societal” , ou mesmo aquelas da década de 1990, “ orientadas

para o marketing de relacionamento” – atendem às necessidades dos consumidores para assim

alcançar o lucro. Porém, é possível dizer que a incessante busca por expansão do sistema

capitalista determina que as necessidades não possam ser nunca satisfeitas sob pena de parar o

processo de crescimento, assim as pessoas devem ser mantidas insatisfeitas. É possível,

também, argumentar que o “ observável” é que as empresas têm atendido às suas necessidades

e às do sistema, mediante estratégias explícitas de construção de insatisfação e manipulação.

Dessa forma, abre-se o caminho para uma nova interpretação para a área, pois o conceito não

tem se submetido a prova dos fatos.

Brown (1995c) denomina Kotler de “ megalomaníaco” tendo em vista as suas idéias de

ampliação do conceito e por considerar o marketing como um processo social. No entanto,

entendo que podemos fazer uma outra análise para essa questão: VHUi TXH D SRVVLELOLGDGH
184

HIHWLYDGHUHDOL]DomRHDGRomRGRFRQFHLWRGHPDUNHWLQJQmRHVWiIRUDGRVHWRUGHQHJyFLRV

RQGHROXFURQmRHVWiHQYROYLGR" No entanto, essa questão é motivo de um outro exercício de

reflexão e não faz parte das pretensões desta tese.

Voltando à realidade atual e considerando o contexto brasileiro, é preciso voltar à

proposição de Heller (1998) quanto à necessidade de que é preciso trabalhar valores críticos e

opostos ao valor de troca, dando atenção para o valor de uso como medida efetiva nas

relações de troca. Um exemplo de caminho alternativo a ser seguido, como revelam Silva,

Azkuenaga e Cañadilla (2001), são as Organizações Não-Governamentais de

Desenvolvimento localizadas nos países do Norte Europeu, constituídas na forma de

importadoras, distribuidoras e varejistas de produtos de comércio justo, vindos de produtores

agrícolas e artesanais dos países do Sul. Os autores descrevem que essas lojas são conhecidas

por Organizações de Comércio Alternativo e Solidário (OCAS) e vendem os produtos a um

preço justo (com margem de preço e pré-financiamento da produção) para o consumidor

responsável, disposto a contribuir com a sustentabilidade e a permanência dos povos em suas

terras, conscientes dos aspectos éticos, trabalhistas e ambientais, presentes em todo processo

produtivo.

Por fim, as argumentações que estão nesta seção, bem como ao longo de toda esta

tese, são realizadas sob a ótica do marketing, mas, como já relatei, os problemas evidenciados

não dizem respeito apenas àquilo que é realizado pela área. É importante ressaltar que o

marketing funciona (ou não funciona) equacionando, atendendo, ajustando os diversos

interesses e poderes de atores internos e externos a uma organização, o que envolve as esferas

econômicas, culturais, políticas e sociais.


3Ï67(;7235Ï;,0267(;726

Nesta seção apresento as considerações finais da tese, descrevendo a experiência de

tê-la realizado, resgato algumas idéias, descrevo perspectivas e desdobramento futuros, e

procedo o fechamento do texto.

$(;3(5,Ç1&,$'(5($/,=$d­2(25(6*$7('(,'e,$6

Em um primeiro momento, minha idéia de elaboração da tese estava próxima aos

trabalhos que anteriormente havia realizado; desse modo, a tese seria assim a possibilidade de

continuidade e aprofundamento de conhecimentos. No entanto, os diferentes caminhos e

acontecimentos da vida me fizeram despertar por idéias e concepções até então não

consideradas. As investidas em leituras não antes realizadas me impuseram uma série de

desafios e até problemas, pois não foram poucos os momentos de paradas, crises e incertezas

em que a vontade maior era de não continuar. O ineditismo da experiência e a abrangência da

proposta fizeram com que em muitos momentos do trabalho fosse obrigado, como diz

Vasconcelos (2002), a “ aprender fazendo” , no entanto tenho a certeza de que se tivesse

optado por seguir as regras normais de metodologia, as quais Feyerabend (1989) tanto critica,

não conseguiria atingir as interações que alcancei.

Foi em Misoczky (2002) que encontrei a inspiração para a concepção deste trabalho.

Inspiração que começa pelas idéias alternativas de produção de um trabalho acadêmico, passa

pela responsabilidade na forma de realização e culmina na crítica. No meu caso específico, a

crítica ao marketing, uma área da gestão que tem o papel de estimular o consumo do sistema

capitalista ora em sua fase tardia.


186

George (2002, p. 26) argumenta que o capitalismo “ não é simplesmente uma

doutrina econômica e uma realização intelectual, mas um poder revolucionário e milenar,

além de uma força de esperança, assim como foi o comunismo” . Firat, Dholakia e Venkatesh

(1995) mencionam que a economia foi a questão de maior interesse na sociedade moderna e,

se a economia não fosse bem, nada mais iria bem. Tal condição permanece dessa forma na

atual fase de exacerbação capitalista. A coisificação que Marx descreveu no século XIX é

hoje muito mais do que atual – as relações econômicas não são interpretadas como relações

entre pessoas produtivas, mas como relações entre mercadorias e coisas que levarão ao lucro.

Contudo, este novo século clama por transformações sociais e ambientais. Muito

provavelmente, em um futuro não muito distante seremos obrigados a romper com o atual

modelo de consumo e, assim, mudar o discurso e as práticas a respeito de como os seres

humanos podem e devem atender às suas necessidades. A liberdade de consumo individual e

ilimitado, a extrema valorização das imagens e dos símbolos têm causado inúmeros

problemas para a sociedade. Nesse contexto, o marketing tem sua parcela de culpa e

participação. A área foi ao longo de sua história incorporando ao discurso ideológico

capitalista (representado pelo lucro) o discurso humano (voltado à preocupação com o

consumidor), o discurso social (do conceito do marketing para causas sociais), o discurso

democrático (do conceito de troca), e o discurso ambiental (do marketing societal) entre

tantos outros argumentos. Mas o marketing chega ao século XXI impregnado ainda mais da

ideologia capitalista, com um meta-discurso que envolve uma série de princípios, conceitos e

técnicas desarticulados, contraditórios e manipulativos, que não se assentam em verdades

absolutas e universais, mas, sim, em uma base frágil e que pode ser assim questionado. O

poder do discurso do marketing voltado para atender às necessidades dos consumidores tem

sido uma bela abstração.


187

Como mencionam Moyer e Hunt (1978), as atividades de marketing possuem um

papel fundamental na formação, desenvolvimento e crescimento da economia de um país,

independentemente do fato de ser o país rico ou pobre, tecnologicamente avançado ou em

desenvolvimento. Porém, penso da mesma forma que Firat, Dholakia e Venkatesh (1995): o

marketing não pode pretender ser uma disciplina instrumental que afeta consumidores e

sociedade, mas deve ser uma disciplina reflexiva e estudada dentro de um processo

sociocultural que tem relação com a perspectiva crítica. Pois a validade e a contribuição de

determinados princípios e ações precisam ser rechaçadas, principalmente, aquelas baseadas

em manipulação que não servem para qualquer país, muito menos para o Brasil que apresenta

sérios problemas de distribuição de renda, emprego, violência e educação.

2GLVFXUVRGRPDUNHWLQJFRPRFRQVWUXomRGDLQVDWLVIDomRpXPDOHUWDHPGHIHVD

GRIXWXURGDVRFLHGDGHEUDVLOHLUDDQWHVGHVHUXPDOHUWDHPGHIHVDGRPDUNHWLQJFRPR

iUHD GR FRQKHFLPHQWR ± e espero que o mesmo seja incorporado aos demais discursos da

área. Como argumentam Alvesson e Deetz (1999), é possível que diferentes discursos

coexistam, mas que alguns com mais, e outros com menos poder. Nesse sentido, as idéias de

produtividade, lucro, crescimento e competição, certamente, conduzem o discurso do

marketing como construção da insatisfação como àquele com menos poder, o discurso

marginal, pois não representa a “ linguagem autorizada” (BOURDIEU, 1996) da gestão das

empresas. Por outro lado, como argumentam Vieira R. e seus colegas:

Diante do cenário atual, abordar um discurso crítico pode levar um


acadêmico ou pesquisador ao ostracismo ou mesmo ao suicídio profissional,
não só no campo das consultorias, mas também no acadêmico. [...] os que
estão inseridos na corrente de pensamento dominante tendem a exercer seu
poder para que outros pesquisadores ou acadêmicos sejam levados ao
conformismo e resignação a esta ortodoxia que define como as pesquisas
devam ser conduzidas e publicadas. (VIEIRA R. HWDO., 2002, p. 2-3).
188

No entanto, DRGHIHQGHUWHVHVRSRVWDVjTXHODVGDFRUUHQWHGRPLQDQWHpQDWXUDO

TXHVHFRUUDULVFRVmas também é provável que surjam novas e diferentes oportunidades.

Penso que, em função do ritmo alucinante e “ produtivista” de sociedade pós-

moderna capitalista, os espaços para o pensamento crítico estejam sendo combalidos de

muitas profissões. Lembrando Carvalho C. e Vieira M. (2003), até mesmo na área acadêmica,

estamos sendo levados a produzir (reproduzir) textos, pesquisas, projetos que muitas vezes só

servem para que possamos acumular pontos e engrossar currículos. O ensino e a pesquisa são

espaços de reprodução de idéias e “ verdades” dos discursos de campos do saber e de suas

figuras de autoridade, mas também são espaços propícios para pensar, questionar, debater,

propor, criar, desfamiliarizar, recriar, transformar (sem o compromisso do resultado de curto

prazo de uma empresa capitalista). Nesse sentido, para que surjam novos caminhos, novas

construções sociais, novas verdades, pode ser preciso desafiar aquilo que existe de “ verdade” .

Conforme Santos (2000a, p. 33), “ é a condição presente quem impõe condições ao

pensamento pensado do presente e o impele a despensar-se e a repensar-se” .

A atribuição dada às universidades de formar profissionais que respondam às novas

exigências do mundo do trabalho e às demandas da sociedade como um todo é por demais

complexa. O desafio está em identificar e conciliar os interesses, sociais, econômicos,

políticos e ambientais. &RPRFRQFLOLiORVVHIUHTHQWHPHQWHVmRLQFRPSDWtYHLVHQWUHVL"

Ao final deste trabalho lembro da necessidade da “ auto-reflexividade” (SANTOS,

2000c) em relação às críticas que estão no meu texto, pois este se constitui em mais uma

verdade dentre tantas outras possíveis de serem construídas. Além do que – mesmo com a

incorporação de outros textos, outros discursos, outros atores/autores e mesmo diante das

inúmeras possibilidades de consultas virtuais ou não – é preciso considerá-lo restrito e

incompleto, uma vez que a exaustiva tarefa de transformar dados em informações é sempre
189

limitada. 4XDQWDVIRUDPDVOHLWXUDVTXHIDOWDUDP"4XDQWDVIRUDPDVLGpLDVQmRDSURYHLWDGDV

RXQmRSHUFHELGDV"3RUTXHQmRKiUHIHUrQFLDVGHGLVFXUVRVHSUiWLFDVWHyULFDVGDFXOWXUD

RULHQWDO" A busca a essas questões, muito provavelmente, formaria um novo discurso e traria

outras verdades às minhas verdades sobre marketing.

Creio que os argumentos, as evidências e os fatos que foram apresentados ao longo

da tese, sejam suficientes para validar o trabalho, uma vez que, de acordo com os novos

critérios de validade de um “ bom texto científico’ ’ (CZARMANIAWA, 2004), procurei:

contribuir para a emancipação humana (LINCOLN, 1995); considerar a probabilidade de

coerência da narrativa (FISHER,1987); valorizar o emocional e a interpretação como crítica;

perceber a ciência como poder (DENZIN e LINCOLN, 1998 DSXG MISOCZKY, 2002); ser

compreensível, sincero e legítimo (ALVESSON e DEETZ, 2000).

$65($/,=$d®(6)8785$6

Ao concluir este trabalho, pretendo dar continuidade ao processo de apresentação das

idéias no meio acadêmico, processo esse que foi iniciado durante sua concepção. Ao mesmo

tempo, desejo divulgá-las em outras audiências, como as com estudantes do ensino médio e

fundamental.

Como educador da área de marketing optei por assumir um papel de agente ativo na

busca de idéias e realizações alternativas para o desenvolvimento. Para tanto, pretendo

realizar trabalhos que permanentemente me levem a buscar respostas para os

questionamentos: TXDOpRPHXSDSHOHOXJDUQRPXQGR"DTXHPTXHURVHUYLU"DTXHPHVWRX

VHUYLQGR"RTXHHVWRXFRQVWUXLQGR"TXHKHUDQoDHVWRXGHL[DQGRjVIXWXUDVJHUDo}HV"FRPR

GHYRHVWDEHOHFHUPLQKDVXWRSLDV"
190

A análise do presente e do passado, por mais profunda que seja, não pode
fornecer mais do que um horizonte de possibilidades, um leque de futuros
possíveis; a conversão de um deles em realidade é fruto da utopia e da
contingência. Mas se é assim, em geral, é-o muito mais num período de
transição paradigmática como o que atravessamos (SANTOS, 2000a, p. 37).

Mas, é preciso adotar uma posição e trabalhar de acordo com aquilo que acreditamos

ser, pelo menos no momento, o melhor.

Além de dar seqüência à análise crítica do discurso do marketing nos diferentes

gêneros de sua formação discursiva, desejo continuar investigando o comportamento de

consumo dos adolescentes, em especial, daqueles com baixo poder de compra. Ao mesmo

tempo, pretendo analisar outros grupos de consumidores excluídos ou vulneráveis em relação

ao marketing, em especial: crianças e idosos. Segmentos esses que são alvo de estratégias das

mais variadas empresas. Investigar a forma como tais pessoas lidam com os apelos e

investidas dessas organizações é, no meu entender, algo interessante e de interesse social.

Por outro lado, pretendo dar atenção a outras formas de obtenção de dados a respeito

do comportamento dos consumidores. Zaltman (1997 DSXG ROSSI E HOR-MEYLL, 2001)

defende a necessidade do enriquecimento das metodologias baseadas na linguagem verbal

mediante a incorporação de procedimentos que envolvam expressões não-verbais,

encontradas nas imagens sensoriais dos consumidores, relativas à percepção, ao aprendizado e

ao pensamento. Tal preocupação deve-se ao fato de que a grande maioria das ferramentas de

pesquisa em marketing é centrada na verbalização, enquanto que a maior parte da troca de

significados entre as pessoas manifesta-se na forma não-verbal (ZALTMAN, 1996 DSXG

ROSSI e HOR-MEYLL, 2001).

26Ò/7,0263$5È*5$)26

Espero que esta contribuição crítica conquiste audiências e estimule outras produções

no âmbito do marketing e da produção, bem como de outros saberes que desenvolvem


191

atividades relacionadas ao consumo. Ficaria extremamente gratificado se outros

completassem idéias, dessem respostas, formulassem novas perguntas, no sentido de

continuar a reflexão sobre o marketing como construção da insatisfação.

A história da civilização nos mostra que sempre existiram problemas, mas a

complexidade da sociedade contemporânea, esta do capitalismo tardio, pós-moderno, parece

só ter aumentado problemas e dificultado soluções, mas precisamos pensar em resolver pelo

menos alguns, pois não são poucos os exemplos de injustiça, de exclusão, de violência, de

infelicidade, de stress, de depressão, de poluição apenas motivados pelo consumo.

O resultado final da produção desta tese representa uma oportunidade de realização

pessoal, diferentemente de alguns outros trabalhos produzidos por mera obrigação acadêmica

de ter que escrever ou produzir algo. Com esta contribuição consolidei idéias, encontrei

explicações, amadureci posições e obtive novas dúvidas e descontentamentos. Assim, quero

deixar claro que HVWDQmR p XPD WHVH DFDEDGD PDVp XP SURMHWR SDUD VHU DSHUIHLoRDGR

GXUDQWHDPLQKDYLGDDFDGrPLFD. eXPSRQWRGHSDUWLGD.

Qual a contribuição das idéias? O tempo e os diferentes atores que lerem o trabalho

dirão, mas o certo, a “ verdade” , é que, como se diz no Rio Grande do Sul, foi legal tchê fazê-

lo, pois entendo que nele está a (r)evolução, mas a minha.


























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GHVHMRVVmRDLQGDPDLVFRPSOH[RV
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