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Florianópolis, 2005
Altamir da Silva Souza
Florianópolis, 2005
Ficha catalográfica
CDU 658.8
Esta Tese foi julgada adequada pelo Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção
da Universidade Federal de Santa Catarina como requisito parcial para obtenção do título de
Doutor em Engenharia de Produção.
BANCA EXAMINADORA:
À professora Olga Regina Cardoso que me aceitou como orientando, entendeu a longa
Carvalho da Silva e ao professor Marcelo Milano Falcão Vieira pelas críticas e sugestões
consolidação do trabalho.
Aos autores e atores que aparecem ao longo do texto por suas ideais, opiniões, relatos
Aos ex-alunos e amigos Alam Casartelli, Carlos Eduardo Dorini, Fausto Knorr,
Fabrício Freitas, José Augusto Fossati, Leonardo Pereira, Paulo Eduardo Freire, Rafael
Aos amigos, em especial, Francisco Antonio Branco Junior, José Vanderlei Silva
Borba, Márcio Silva Rodrigues, Patrizia Raggi Abdallah, que inúmeras vezes perguntaram
Aos professores Fernando Rafael Cunha, Márcio Leal Bauer, Nelson Monteiro Rangel
final.
O consumo faz parte da vida de todo e qualquer ser humano, movimenta o sistema econômico
e afeta o sistema sociocultural de um país. Vivemos em uma época de intensa produção de
bens e serviços em que os significados atribuídos aos mesmos se multiplicam com tamanha
velocidade e constante reprodução, suplantando inclusive as suas características funcionais.
Para isso, discursos, símbolos e imagens são criados para a produção de sentidos e de
realidades voltadas para estimular o consumo. As áreas de produção e marketing têm
participação direta nesse contexto e, por terem entre si íntima relação, devem dividir
responsabilidades frente às suas realizações. Percebendo que o marketing tem adotado
princípios e práticas indesejáveis para a sociedade brasileira, e entendendo a importância
dessa discussão no âmbito da engenharia de produção, faço neste ensaio teórico uma reflexão
crítica a partir da análise do discurso do marketing. Apresento tal reflexão em quatro seções.
Na primeira, faço um resgate da história do marketing para demonstrar que a área é aberta a
novas e diferentes idéias e (re)interpretações, pois é uma construção dos homens marcada por
disputas, diversidades e crises recorrentes. Na segunda, realizo uma análise das contradições,
incoerências e manipulações nas linguagens do marketing, que são indesejáveis para o
contexto brasileiro e, também, preocupantes para uma área que contribui para a construção da
cultura do consumo, e se diz preocupada com as necessidades dos consumidores. Ao mesmo
tempo, apresento as possíveis implicações e participação da engenharia de produção nesse
contexto. Na terceira seção, argumento que o consumidor contemporâneo se encontra à mercê
das linguagens do marketing e que, assim, o discurso do consumidor exigente é apenas
parcialmente aceitável e dentro das condições de produção de sentidos estabelecidas pelo
marketing e pela cultura de consumo vigente, fato esse que tende a perpetuar os problemas
ora percebidos. Na quarta, defendo que o marketing, no sentido de estimular o consumo, tem
sido uma função responsável pela construção da insatisfação, realizada, em muito, mediante
estratégias de manipulação e persuasão. Considero, também, as implicações para o futuro da
área e da sociedade. Finalmente, argumento sobre a experiência de ter realizado o trabalho e
as possibilidades de desdobramentos e de continuidade das idéias que fazem parte do estudo.
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SOUZA, Altamir Silva. About insatisfactrion’s construction: critical reflections about the
marketing’s speach. 2005. 206 f. Doctoral Thesis (doctorate in operations and management
engineering). Program of the Postgraduate in Operations and Management Engineering.
Federal University of Santa Catarina, Florianópolis, Brazil.
The consumption is a part of life from every human being; it makes the economic
system move, and compromisses the social-cultural system of a country. We live in a intense
period of products and services manufactures and the results that are related with them
multiply themselves so fast and with constant reproduction, even running over the functional
feature. For that, speachs, symbols and images are created for the meaning and reality
production, which are supposed to estimulate the consumption itself. The consumption and
marketing areas have direct participation in this context and, for having avery deep relation on
it, must divide responsabilities facing its acomplishments. Knowing that the marketing has
been adapting principles and practices not very worthy for the brazilian society, and
understanding the production’s engineering’s area, I make from the analysis of the
marketing’s speach. I pusent this reflection in four sections. On the first one, I try to rescue
the history of marketing tooshow that this área is very “open” to new and diferent ideas and
(re)interpretations, because it’s a men’s construction, marked by diversities, disputes and
appellanty crises. On the second one, I make an analysis from the contradictions,
incoherences and manipulations on the marketing’s language, which are not very welcome for
the brazilians context, and also, very worry in an area that helps for the construction of the
consumptions culture, and calls itself worried with the consumer’s needs. At the same time, I
present you the possible implications and the participation from the production’s enginury in
this context. On the third section, I contend that the now-a-days consumer can be found
booned from the marketing’s languages and that, like this, the speach from the consumer that
is very demanding is just partially acceptable and inside the meaning production’s conditions
stablished by the marketing and for its culture as valid consumption, fact that tends to
perpetuate the problems that have been show. On the fourth, I defend that, the marketing, in
the meaning for estimulation of the consumption, has been a function that is responsible for
the insatisfaction’s construction, and realization, facing manipulation and persuasion
strategies. I also consider the implications for the future of the área and the society. Finally, I
argue about: the experience of have been done the paper, and the possibilities of unrollment
and continuity of the ideas that are part of this study.
RESUMO.................................................................................................................................... 007
ABSTRACT................................................................................................................................ 008
1 PRÉ-TEXTO/PRETEXTO...................................................................................................... 012
1.1 INÍCIO DO CAMINHO E A MUDANÇA DE CAMINHO.......................................... 012
1.2 O QUE PRETENDO COM O TEXTO........................................................................... 015
1.3 CARACTERÍSTICAS, VALIDADE, ESTRUTURA E OBJETIVO ............................ 018
2 AS IDÉIAS QUE CONSTROEM O TEXTO......................................................................... 022
2.1 MODERNIDADE, PÓS-MODERNIDADE E CAPITALISMO................................... 022
2.2 AS NECESSIDADES INSACIÁVEIS NA SOCIEDADE INSATISFEITA................. 025
2.3 A ESCOLHA DA EPISTEMOLOGIA CRÍTICA E DA ANÁLISE DO DISCURSO.. 030
2.4 O CAMINHO PARA A CONCEPÇÃO DAS IDÉIAS E OS PROCEDIMENTOS E
INSTRUMENTOS UTILIZADOS....................................................................................... 035
2.4.1 Narrativa autobiográfica....................................................................................... 036
2.4.2 Conversas do cotidiano......................................................................................... 037
2.4.3 Observação............................................................................................................ 039
2.4.4 Re-análise de material previamente coletado....................................................... 040
2.5 ARGUMENTOS FINAIS DAS IDÉIAS........................................................................ 045
de idéias e a abertura de novas perspectivas e sentidos para meu trabalho como educador e
pesquisador, tendo como motivação minhas reflexões a respeito da cultura do consumo que
seção uma breve exposição sobre os acontecimentos que ocorreram em minha trajetória
profissional e que foram determinantes para que eu decidisse produzir este trabalho,
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área. No entanto, no transcorrer da minha trajetória profissional passei a dar atenção para
(GIGLIO, 2002). No plano das ações de marketing das empresas passei a observar os
sob o ponto de vista de marketing, não eram desejáveis à sociedade e não estavam em sintonia
com a minha visão de mundo. Nesse sentido, voltei-me para o tema de falhas e estratégias de
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frente a tais situações. Realizei duas pesquisas sobre o tema, uma no ramo de serviços ligados
profundidade a respeito do tema, percebia que deveria realizar um outro tipo de estudo, pois
necessidades dos consumidores? Precisava, assim, de algo que fosse capaz de oferecer
respostas mais amplas e sustentar meu trabalho profissional. Essa situação me desestimulou a
dar continuidade à idéia inicial de tese e, entre paradas para a reflexão e momentos de total
relacionadas a outras visões de mundo e novas (ou outras) formas de realizar pesquisas na
Lyotard, Ludwig Josef Wittgenstein – a sustentação necessária para conceber o meu trabalho
de tese. Por outro lado, identifiquei em autores de marketing classificados como pertencentes
à corrente pós-moderna – em especial, Fuat Firat, Alladi Venkatesh, Douglas Brownlie, Nikhi
Dholakia, Stephen Brown – idéias, práticas, métodos e estilos desconsiderados nos processos
tradicionais de formação da área de marketing, mas que poderiam me oferecer um novo rumo
para construir um estudo que fosse ao encontro das minhas inquietações e preocupações.
14
primeiras idéias sobre aquilo que estava pensando e que poderiam constituir uma tese. Escrevi
alguns parágrafos, algumas colagens e hipertextos. No início de 2003 recebi um convite para
participar do IX Colóquio Internacional sobre Poder Local: “Gestão XXI, Gestão Social e
mesmo ano. Elaborei um texto em forma de ensaio intitulado “Uma Reflexão sobre as
“Velhos Conceitos, Novas Idéias – Velhas Idéias, Novos Conceitos?”, coordenado pela
Sul (UFRGS). Este trabalho foi o embrião das idéias que hoje estão no presente trabalho.
Além disso, a troca e a obtenção de idéias resultantes desse encontro foram muito
significativas para algumas definições conceituais e para reforçar a idéia de que deveria
continuar no caminho que estava começando a percorrer. Este mesmo texto, com pequenas
Pernambuco.
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15
refere à sociologia, para evidenciar minha posição em relação àqueles que, como eu, estudam
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organizacional, mas, sim, demonstrar que seus princípios, são, de fato, uma construção teórica
comprometida e vinculada aos valores e princípios éticos da sociedade capitalista e, por isso,
(ALVES, 2001; ROHN, 2003) defendidas em âmbito nacional e, também, neste programa de
marketing e sua contribuição para a sociedade. Ao mesmo tempo, contribuir para a redução da
lacuna que há na área entre a produção de estudos práticos e interesses imediatos e de estudos
Por outro lado, busco superar a supremacia da visão positivista da pesquisa e indicar
que o marketing pode ser compreendido de modo diferente mediante uma perspectiva crítica.
conquista de audiências que se interessem por, pelo menos, prestar atenção às idéias
alternativas de interpretação do marketing que estou propondo neste ensaio. Como menciona
16
Foucault (2000, p. 10), “ por mais que o discurso seja aparentemente bem pouca coisa, as
interdições que o atingem revelam logo, rapidamente, sua ligação com o desejo e com o
poder” . Além disso, é bom lembrar o que diz o filósofo Alain de Botton sobre o fato de
alheia,
Nosso desejo de levantar dúvidas pode ser salpicado por uma sensação
íntima de que as convenções sociais devem ter bases sólidas, mesmo se não
soubermos discernir exatamente quais bases seriam estas pelo fato de terem
sido adotadas por tantas pessoas há tanto tempo. Parece implausível que a
nossa sociedade esteja profundamente equivocada em suas crenças e, ao
mesmo tempo, que seríamos os únicos a perceber este fato. Reprimimos
nossas dúvidas e nos incorporamos ao rebanho porque não conseguimos nos
imaginar pioneiros na tarefa de desvendar as verdades até agora
desconhecidas e dolorosas. (BOTTON, 2001, p. 19).
produção, em função de vários aspectos. Sabe-se que, em tese, marketing e produção devem
realizações para a sociedade. Por outro lado, o reconhecimento do fim da dicotomia produção
leva ao reconhecimento de que se reconheça que quando se produz, se consome, e que isso
que são uma só (FIRAT e VENKATESH, 1995). Além disso, há uma tendência de considerar
Segundo Meszáros (2003), na atual fase do capitalismo não se trata, como em fases
produtos envolve tanto um processo produtivo que o garanta quanto a geração da necessidade
Desejo, também, que meu trabalho contemple essa posição de Santos, uma vez que
acredito que toda e qualquer área envolvida com o consumo deva ser vista dentro de
Por fim, entendo que a universidade tem a obrigação de formar profissionais que,
além do conhecimento técnico e específico que diz respeito a sua área de atuação, pensem
práticas teóricas existentes, e que tenham conhecimento sobre diferentes formas de interpretar
Por isso, como educador, tenho preocupação centrada “ em uma educação para a
cidadania” (SANTOS, 2003b), com aquilo que estou produzindo e ajudando a construir em
18
termos de ensino e pesquisa para ser utilizado nas organizações e afetar a vida das pessoas e o
futuro da sociedade brasileira. Isso faz com que vincule meu trabalho à produção “ de idéias,
MISOCZKY, 2002, p. 10). Sendo o conhecimento uma questão de produção, penso que cabe
(produção) de novas teorias ou novas interpretações sobre suas áreas de atuação, para que
Por todos esses argumentos e pretextos, quero crer que as reflexões, perguntas e
argumentações que fazem parte deste ensaio sejam pertinentes não apenas à engenharia de
produção e ao marketing, mas a todas as áreas que, de forma direta ou indireta, têm relação
com o consumo, e que o trabalho se enquadre nos requisitos de uma Tese de Doutorado em
Engenharia de Produção.
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de suas visões de mundo que influenciam seus juízos e valorações(PETER e OLSEN, 1983)
procuro, como recomenda Santos (2000a), tornar explícitos meus pré-juízos, meus valores,
minhas posições ideológicas. Esta opção metodológica se vincula ao que Case (2003)
denomina de método autêntico. Tratando a pretensão de objetividade como uma quimera que
Ainda segundo Case (2003) a construção do texto na terceira pessoa, mais do que
uma convenção, induz ao engano de que o texto é objetivo, chamando esta “ visão a partir de
certeza [...] com relação ao conhecimento fático sendo relatado, os textos objetivistas
precisam ser não ambiciosos em termos de estilos, precisos e funcionais” (CASE, 2003, p.
166).
mitológica que nunca existiu, a não ser na imaginação daqueles que acreditam que o
Entendi, portanto, que não deveria me esconder, me apagar na narrativa e fiz a opção
de escrever o texto na primeira pessoa do singular. Ainda que, como lembra Cavedon (2001),
precisemos quebrar a resistência dos pesquisadores que revelam uma certa tendência estética
mais ortodoxa. Cabe, ainda, considerar que em vários momentos de minha narrativa aparecem
longas transcrições de autores/atores, pois descobri em Misoczky (2001) que elas funcionam
argumentos. Assim, meu texto é fruto de minhas idéias e reflexões, mas é concebido com a
A validade de uma tese que é pessoal e subjetiva não se baseia nos critérios de um
(CZARMANIAWA, 2004). A validade em Lincoln (1995) tem relação com a ética e está
relacionada com cinco critérios: adotar uma posição a partir de um ponto de referência
espaços nas universidades. Em Fisher (1987) a validade tem a ver com três aspectos: a
confiável. Já, Denzin e Lincoln (1998 DSXG MISOCZKY, 2002) argumentam a favor das
percepção da ciência como poder. Alvesson e Deetz (2000), por sua vez, defendem como
estrutura de apresentação do meu trabalho e, dessa forma, fugi dos padrões tradicionais de
apresentação de uma tese. Para que o leitor tenha uma prévia noção das seções que formam o
a realização da tese; a opção pela epistemologia crítica e pela ordem do discurso, o caminho
idéias;
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21
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Para tanto, baseado em questões norteadoras da minha vida, ao longo das seções,
formulo perguntas orientadoras para a tese e ofereço algumas respostas, que se baseiam em
assim como, nas informações fáticas resultantes de dados empíricos que ilustram e apóiam a
reflexão. Além dessas, por ser este um trabalho reflexivo, encaminho outras indagações às
quais não apresento respostas, para que o leitor possa fazer as suas reflexões e com elas criar
resgato idéias, descrevo as perspectivas para o meu trabalho como educador e, nesse sentido,
estudo.
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Esta seção é de suma importância para que o leitor entenda o processo de concepção
deste ensaio teórico. Inicialmente, faço uma breve apresentação sobre a era moderna, a
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três fases: a primeira tem início no século XVI e termina no final do século XVIII; a segunda
inicia no final do século XVIII com a Revolução Francesa, fase em que surgem as idéias do
modernismo e da modernização, indo até o final do século XIX; e a terceira, que começa no
século XX, na qual o processo de modernização toma conta do mundo interiro. Mas
que continuamos na modernidade e não aceita o termo pós-modernidade. Para o autor “ [...]
nós mesmos e do mundo – e que, ao mesmo tempo, ameaça destruir tudo o que temos, o que
sabemos, tudo o que somos. [...] é uma unificação paradoxal, uma unificação de desunião;
presente da modernidade.
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não implica a adoção de uma leitura evolucionista, mas a concepção de que a contradição
a um desenvolvimento permanente.
Mandel (1982) entende que a atual forma do capitalismo é a mais pura que já surgiu,
incluindo a expansão não imaginada do capital para áreas antes fora de sua esfera. Jameson
(1996), a partir dessas formulações, destaca que, ao contrário do que preconiza a vertente da
processo de expansão do capital através do sistema mundo em sua etapa transnacional. Assim,
estágio atual do capitalismo e é fruto das transformações que começaram a ocorrer nas
Em Jameson (1996, p. 22) o capitalismo tardio é uma “ expressão que funciona como
uma espécie de signo, que traz uma carga de intenções e conseqüências [...] [que é usada
Cabe, também, exaltar que o capitalismo tardio de Jameson tem a ver com as empresas
além das conseqüências sociais mais conhecidas (incluindo a crise do trabalho). É esta a
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Segundo Schumpeter (1976) o sistema capitalista funciona tão bem porque cria
busca de aumento da produção, das vendas, de lucros, de conquista de novos mercados, etc, e,
assim, propiciam um grande crescimento que não ocorreria se esses fossem espíritos mais
prudentes. Ou seja, como metáfora, poderíamos dizer que o capitalismo sinaliza aos
empresários que o êxito se encontra no céu. Chegar ao céu é uma tarefa impossível, mas o
esforço resultante para tal façanha faz com que os empresários alcancem o equivalente à
para o “ sucesso” do sistema. Esse raciocínio pode ser estendido, também, aos trabalhadores e
aos consumidores.
pela redução do número de empregos, pelo fim do trabalho formal, pelo subemprego ou até
trabalho, as pessoas são pressionadas para que constantemente busquem novos saberes e
falem idiomas, amem o que fazem, tomem decisões rapidamente, saibam trabalhar em equipe,
comandem pessoas, e etc. Tudo para que se tornem bem-sucedidas e “ cheguem ao céu” . Para
tanto, os trabalhadores realizam um esforço absurdo, mas como ser tudo é uma tarefa
Nesse mesmo sentido, o sistema insinua que os consumidores – que são inclusive
empresários e trabalhadores – consumam bens e serviços mais e mais para que tenham
reconhecimento social, vivam com mais conforto, mais segurança, mais felizes, e satisfeitos
de suas necessidades.
desejos. Engel, Blackwell e Miniard (2000) entendem que o marketing não cria necessidades,
a área pode estimular uma vontade ou um desejo de um produto ou serviço, mas isso não
acontecerá se uma necessidade não existir antes. Engel e seus colegas acreditam que as
necessidades são pré-existentes, muito embora possam estar adormecidas e em grande parte
No entanto, apesar de Cobra (1997) defender a idéia de que o marketing não cria
Segundo Heller (1998), Karl Marx, em sua teoria das necessidades, descreve a
se dá pelo significado de seu valor de uso. O capitalista valoriza suas mercadorias (bem como
a força-de-trabalho) não por suas qualidades específicas (valor de uso), mas pelo valor
econômico abstrato (valor de troca). Mas, para que esse valor econômico se configure, as
mercadorias precisam ter valor de uso para alguém e esse precisa ter dinheiro para comprá-la.
por conseguinte, do capital. De modo que tais necessidades de crescimento sejam atendidas o
necessidade.
Em O Capital, Marx, além de mostrar como o valor de uso esconde o valor de troca e
mercadoria como ela não é, ou seja, coisificada, como se essa tivesse propriedades exclusivas,
classe dominante tende a projetar e impor sua maneira de ver as coisas a todas as outras
A tese central de Heller (1998) é de que precisamos construir novos valores críticos e
opostos ao sentido do valor de troca, em que o valor de uso se afirme como medida efetiva
nas relações de trocas. Entendo que essa postura da autora seja adequada para as idéias que
limita à sociedade atual, uma vez que há indícios de que os seres humanos, em todas as
[...] o consumidor moderno [...] mal satisfez [uma necessidade] [...] outra já
se acha à espera preparada, reclamando a satisfação; quando esta é atendida,
uma terceira aparece, então subseqüentemente uma quarta, e assim por
diante, aparentemente sem fim. O processo é incessante e ininterrupto.
Raramente pode um habitante de sociedade moderna, não importa quão
privilegiado ou opulento, declarar que não há nada que esteja querendo. Que
isso deva ser assim nos causa admiração. Como é possível as necessidades
aparecerem com tamanha constância, e de uma forma tão inexaurível,
especialmente quando se referem, tipicamente, a novos produtos e serviços?
(CAMPBELL, 2001, p. 59).
Campbell (2001, p. 59) argumenta que essa propensão, descrita por alguns
fechar o hiato entre necessitar e alcançar. O autor diz que pode haver a objeção de que a
origem do consumismo moderno esteja na inventividade do homem moderno que faz com que
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surjam invenções e produções sem fim de novos produtos e serviços. Porém, Campbell (2001)
adverte que essa possível verdade esbarra no fato que nem todas as novas invenções são
“ Essa dinâmica racional e instrumental pode ter pouco efeito sobre o modelo básico das
recursos.” (CAMPBELL, 2001, p. 60). Ainda segundo o autor, da mesma forma que a criação
partem tão subitamente, e tão facilmente, quanto chegam? Como é que os indivíduos
conseguem parar de ter necessidade do que ardentemente desejaram apenas um pouco antes?”
Assim, na análise de Campbell (2001), dar por normal e natural o fato do homem
contemporâneo ter uma fome ilimitada, incessante e ininterrupta por bens é produto da
insaciável pode ser explicado pela idéia de Heller e Fehér (1998) da “ sociedade insatisfeita” .
Essa formulação
ligada às noções de modernização cultural” . Para o autor nessa condição os dos desejos das
pessoas se tornam cada vez mais sofisticados, refinados, imaginativos e pessoais, assim como
ávido pode ser visto como “ [...] um grande avanço da civilização humana, quanto como o
começo do fim” .
Nesse contexto, R PDUNHWLQJ MXQWDPHQWH FRP RV HVIRUoRV GH RXWUDV IXQo}HV
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A RSomR SHOD HSLVWHPRORJLD FUtWLFD para a realização desta tese tem a ver com a
opção tem, também, inspiração em Faria (2003), que, baseado em Horheimer e Adorno,
aconselha que os estudos críticos devam, além da preocupação com a crítica à teoria,
realidade que procuram servir ao poder e não dão voz aos problemas do capitalismo. Faria
podem – por estarem à distância e não vê-lo tão de perto – apoiar a análise crítica do
marketing e contribuir para diferentes construções a visões sobre a área. Como menciona
Santos (2003a, p. 14), hoje possuímos “ muitas teorias da separação e poucas teorias de união,
[...] [não devemos buscar] uma grande teoria que em si mesma envolva tudo e todos em um
certo momento, mas [criar uma] [...] ‘teoria da tradução’ [...] uma maneira de reunir áreas
Como postura crítica adoto a proposição de Santos (2000c), defensor de uma crítica
que se desvie da teoria crítica modernaem três aspectos fundamentais: o primeiro diz respeito
necessário para criar uma nova familiaridade com a vida e estabelecer um novo senso comum
dizemos é sempre mais do que sabemos acerca do que dizemos. Neste excesso reside o limite
da crítica. Quanto menos se reconhece este limite, maior ele se torna” (SANTOS, 2000c, p.
16-17).
A DQiOLVHGRGLVFXUVRFRQVWLWXLDIRUPDHVFROKLGDGHUHDOL]DUDUHIOH[mRFUtWLFD
VREUH PDUNHWLQJ O ser humano utiliza-se da linguagem – composta por sinais, discursos,
símbolos (signos) e imagens – para compor uma narrativa, produzir uma histórica, dar sentido
à vida, construir a realidade social, fundamentar a fala, e fornecer as bases e as regras para o
comportamento das pessoas. Wittgenstein (1996) explica que não existe significação e
positivismo de que a linguagem pode ser plenamente compatível e conviver com a prática do
filosófico. O autor apresenta a linguagem como um fenômeno social e a vida social em termos
de “ jogos de linguagem” .
históricas, sempre determinadas no tempo e no espaço, que definiram, numa dada época, e
procedimentos que têm por papel conjurar seus poderes e perigos, dominar seu acontecimento
que limitam: o que pode ser dito, o que pode ser dito de verdadeiro, o que pode ser dito de
que pode ser dito porque segue um padrão lógico e coerente com as intenções de cunho
possibilitando que os sujeitos se tornem mais conscientes de sua própria prática, e mais
proposta à ciência não é a questão das situações ou das práticas que ela reflete de um modo
mais ou menos consciente; não é, tampouco, a questão de sua utilização eventual ou de todos
34
os empregos abusivos que se possa dela fazer; é a questão de sua existência como prática
[...] a análise do discurso pode demonstrar que aquilo que é lido não é a
realidade, mas apenas um relato da realidade propositadamente construído
de um determinado modo, por um determinado sujeito. Através do
destrinchamento do funcionamento dos textos e da conseqüente observação
de sua articulação com as formações ideológicas, ela permite desvendar, no
contexto da sociedade, o confronto de forças, as relações de poder, os
domínios do saber. (CABRAL, 1999, p. 4).
coisas, influenciador das práticas dos seres humanos nas organizações e nas ações de
consumo. Para tanto, faço, inicialmente, uma narrativa histórica das origens da cultura do
O primeiro, o discurso acadêmico é aquele dos livros, dos artigos, das conferências,
dos congressos e “ estaria como que sempre a dizer ao interlocutor: ‘Eis a realidade!’ [...] [e
que é levado] “ a comunidade (sempre pequena, pois que de elites) a produzir um discurso
fechado” (MATTOS, 2001, p. 11). O segundo é o discurso das organizações, e tem duas
que os atores sociais – inclusive aqueles que como eu se aventuram a realizar pesquisas –
desconhecem. O terceiro é o discurso das rádios, dos jornais, das revistas, da internet e, em
especial, da televisão, que também é aberto como o segundo, é poderoso, mágico, persuasivo
e, também, perigoso. Como afirma Thompson (1999), em uma sociedade construída por
contexto. Ao mesmo tempo, aponto de que forma o consumidor participa e é influenciado por
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352&(',0(1726(,167580(172687,/,=$'26
Faço, a seguir, um relato de como e porque incorporei cada técnica ao estudo, com o
intuito de deixar transparente a forma como o trabalho foi sendo concebido, de modo a não
conceitual dos procedimentos e indico como eles estão dispostos nas seções que compõem a
4XDGUR,±6tQWHVHGRVSURFHGLPHQWRV GHVXVWHQWDomRGDDQiOLVHGRGLVFXUVRGRPDUNHWLQJ
6HomR 3URFHGLPHQWRV
Construção do pensamento em marketing: diversidades, disputas e crises Narrativa autobiográfica
Reflexões sobre o discurso do marketing na sociedade pós-moderna da Conversas do cotidiano
comunicação Observação
O consumidor vulnerável na sociedade pós-moderna de dados Re-análise de material
Re-análise de material
Marketing como construção da insatisfação Conversas do cotidiano
Narrativa autobiográfica
1DUUDWLYDDXWRELRJUiILFD
com a “ narrativa autobiográfica - uma abordagem genealógica” em sua tese sobre mulheres na
segunda para relatar minha experiência em sala de aula junto aos alunos de graduação e
Foucault (2004) menciona que ninguém diz nada sem ter ouvido dizer, e sem ter
estado neste ou naquele lugar, e sem ser, ele próprio, qualquer coisa diferente dele próprio,
muitas coisas diferentes, um “ estatuto” , uma “ posição” , “ vários eus” até. Assim, com base nos
referencial teórico do ensaio: consultas nas bibliotecas (em especial da FURG, UFSC e
UFRGS), acessos a bases de dados (Proquest e Emerald) e livrarias virtuais; buscas em artigos
Bins Luce; e, finalmente, consultas em livros e artigos do meu acervo particular e de colegas e
perguntas de uma pesquisa. A experiência que relato se refere ao período de 2003 até 2004,
quando comecei a apresentar idéias que estão nesta tese às turmas das disciplinas de
profissionais na Universidade antes do tempo que me era de direito para a realização da tese,
em um primeiro momento foi muito ruim porque absorveu muito do meu tempo, mas, por
outro, possibilitou que obtivesse “ ilustrações” para o meu trabalho e permanentemente fez
&RQYHUVDVGRFRWLGLDQR
variadas esferas de interação social. Mas, por serem consideradas corriqueiras, dificilmente
pensamos na riqueza e nas peculiaridades que possam estar presentes nessa forma de
sentidos.
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com o objetivo de ilustrar, enriquecer, apoiar meus argumentos com relação à análise de dois
dos gêneros que compõem a formação discursiva do marketing: o discurso das empresas e o
discurso da mídia de massa. Inspirado nas idéias de Santos (2003b) decidi que deveria
geral, buscando, com isso, apresentar realidades não reveladas. Sendo assim, acredito que a
contribuição de atores que não pertencem à área acadêmica e exercem diferentes papéis
dos argumentos que defendo nesta tese. Ao fazer isso espero diminuir o problema que, de
acordo com Santos (2003b), a ciência moderna incentiva, que é o de considerar o cientista um
Além dessas, acrescento as informações de conversas que surgiram nas ruas, nas festas, nos
aniversários, nos bares, enfim em todos os encontros onde foi possível trocar idéias e obter
descreve Menegon (2000), a informalidade das conversas permite que um profissional utilize
não utilizaria numa situação de trabalho, ou vice-versa. Nesse sentido, não utilizei um padrão
para a obtenção das informações ou início das conversas. Por outro lado, a maior dificuldade
desse procedimento é que muitas das práticas discursivas surgem de maneira inesperada e são
significa estar sempre em campo durante todo o tempo da pesquisa” (MENEGON, 2000, p.
226). Em muitas situações inesperadas surgiam assuntos relacionados com o meu estudo,
assim muitas informações acabavam sendo perdidas pela dificuldade de registro. A grande
maioria dos registros foi feita de memória ou por escrito no momento do relato. É verdade
que, quando havia alguma proximidade com o “ entrevistado” , solicitava que o mesmo me
relatasse novamente aquilo que havia falado, para que eu pudesse registrar a informação por
completo. Poucas conversas foram gravadas. Isso ocorreu não apenas pelo momento em que
as conversas surgiam, mas também pelo constrangimento de gravar algo que surgia de forma
pude adotar a análise do fluxo da conversa em si, mediante as análises dos seguintes
A partir dos registros das conversas passei a fazer inferências, baseadas em meu
que mantive durante o período de realização do trabalho, decidi por escolher algumas, para
apresentar no ensaio, pois, como refere Misoczky (2002), a existência de uma autoria implica
a realização de escolhas sobre o que incluir e o que excluir, sobre formas, palavras, tons e
2EVHUYDomR
com pessoas, objetos e eventos, sem que exista a resposta dos participantes (MALHOTRA,
2001). Esse procedimento foi incorporado ao estudo como forma de ilustrar meus argumentos
(BILLIG, 1987; 1991 DSXG BAUER e GASKELL, 2003, p. 250) destinados a reproduzir a
Para isso, utilizei um formulário aberto no qual registrava as informações pertinentes, bem
como o tipo de programa, a data e a emissora de televisão na qual o fato havia sido observado.
de esporte, femininos, de auditório, novelas, seriados e propagandas. Decidi por não fazer
escolhas prévias dos programas a serem observados, bem como de turnos e horários. As
observações foram realizadas no período de março de 2002 até janeiro de 2005. Ao mesmo
das observações (bem como dos trechos e formas de apresentação), realizei as interpretações,
5HDQiOLVHGHPDWHULDOSUHYLDPHQWHFROHWDGR
coisas sobre eles. Os autores argumentam que o ato de escrever a respeito dos dados é visto
como um fim da produção de uma pesquisa, é uma declaração final (em forma de um relatório
teve algo escrito, que se deva re-visitar e re-analisar dados coletados. Nesse sentido, decidi
41
fazer uma UHDQiOLVH GH XP HVWXGR UHDOL]DGR MXQWR DR VHJPHQWR DGROHVFHQWH e que foi
idealizado por mim e produzido em parceria com Cassiano Paes da Silva, pois entendi que as
informações por nós obtidas eram significativas para ilustrar os argumentos das seções “ O
construção da insatisfação” .
Além disso, as razões que motivaram a realizar esta pesquisa têm profunda relação
com as idéias que estão nesta tese. O primeiro motivo diz respeito ao fato de que os jovens
movimentam no Brasil bilhões de dólares anuais com despesas pessoais “ o que os faz
de todas as atividades mercadológicas voltadas para este segmento. [...] [além do que] os
jovens brasileiros seguem o lema: ‘Consumo, logo existo’ ” (GADE, 1998, p. 190). O que é
relacionado ao primeiro, é que a natural dependência econômica dos adolescentes faz com
que a vida de suas famílias seja afetada pelo seu consumo. O terceiro motivo é porque os
adolescentes são tidos como pouco idealistas, muito individualistas, críticos e bem informados
esperança de construir um futuro diferente. Sendo assim, nada melhor do que uma
investigação para analisar de que forma eles encaram o marketing e o consumo. Além desses
múltiplas realidades. A autora acredita que a riqueza dos detalhes pode ser mais interessante
do que a amplidão das abstrações que se faz em abordagens metodológicas mais fechadas e,
ao mesmo tempo, entende que o pesquisador e o fenômeno em estudo devem ser mutuamente
interativos.
(2004) o uso de múltiplos métodos de pesquisa e investigação pode abrir novos horizontes
entanto algumas entrevistas foram realizadas em escolas ou ainda em locais públicos, tendo
adolescentes, foram gravadas. O tempo de cada entrevista variou de quarenta até noventa
identificar roupas e acessórios de uso pessoal dos adolescentes, bem como registrar a presença
não-verbais). Essa etapa serviu para solidificar os procedimentos das demais etapas.
adolescentes informassem as três primeiras palavras que lhe vinham à mente quando
pensavam: em roupas das marcas Gang, Nike, Hang Loose, Oakley, Billabong, Blue Steal; em
tênis das marcas Nike, Rainha, Drop Dead, Reef. Por outro lado, pedíamos para que os
adolescentes dissessem qual a associação achavam que seus amigos fariam das lojas Renner,
Quebra-mar, Pompéia e San Marino. Cabe considerar, que as três últimas lojas são empresas
surf; roupas e calçados “ populares” para a família; roupas para jovens a preços baixos. Por
produto, preço, marca, promoção. Essas entrevistas foram realizadas em um tempo médio de
quarenta minutos, sendo que com alguns adolescentes de menor poder aquisitivo a duração
das entrevistas não foi maior do que vinte minutos. Paralelamente, utilizamos IRWRJUDILDV
para registrar situações, imagens e fatos a respeito da vida, dos símbolos e dos objetos de
consumo dos adolescentes. Solicitamos a permissão dos adolescentes para tirar fotografias de
seus quartos e, posteriormente, pedimos que apontassem objetos que mais gostavam ou que
pode servir para a ilustração da conclusão de uma reflexão, já que é prova de um fato, um
excelente complemento do diário de campo, a extensão do olhar e uma opção possível para a
substituição da pergunta. Como menciona Cavedon (2001), inúmeras imagens que ocupam a
mente do pesquisador quando registradas, através de fotos, parecem mais eloqüentes do que
as palavras. Além desses aspectos a fotografia propiciou a leitura crítica das imagens de parte
Apresento nesta tese as fotos que revelam a relação dos jovens com o consumo e seu contexto
sócio-econômico.
margem do consumo; residentes em diferentes bairros da cidade do Rio Grande, idades entre
14 e 16 anos e do sexo masculino – como forma de facilitar a obtenção dos dados, já que a
obtenção de dados, frente aos recursos humanos disponíveis (todos homens), caso fossem
deveriam ser realizadas foi norteada pela recomendação de que a quantidade final de
cinco adolescentes não participaram da etapa de fotos, por negação ou constrangimento em ter
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não ter ocorrido se os pesquisadores tivessem seguido o “ método científico” que vigorava em
sua época, pois a validade de um método está nos resultados que é capaz de produzir. Daudi
parece ser um consenso crescente, muito embora haja resistência das correntes dominantes.
Essas posições referendam a maneira pela qual concebi a presente seção de forma a
alcançar o objetivo do estudo. Nas próximas seções apresento meus argumentos e dados
início da era moderna e vai até o final do século XIX, como forma de situar o
manifestações que apontam a existência do marketing como técnica. A seguir, faço uma
apresento uma descrição histórica que envolve o período em que surge o “ moderno conceito
de marketing” na década de 1950 até o final do século XX. Em paralelo a essas apresentações
descrevo acontecimentos históricos, não diretamente ligados à área de marketing, mas que
como uma função com características pós-modernas. Finalmente, faço o fechamento da seção.
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$7e26e&8/2;;
entendem que somente olhando para trás é que nós poderemos ver à frente (SAVITT, 1989),
uma vez que o futuro do pensamento em marketing está em recapturar seu passado
(HOLLINGER, 1993), além do que o momento pós-moderno é propício para uma retro-
orientação (BROWN, 2002; 2001, 1997a). Por outro lado, entendo que um resgate histórico
o marketing são frutos da era moderna e, muito embora tenham surgido em momentos
distintos, possuem íntima relação, e ambos são motivo de estudo na atualidade. Segundo
Slater (2002, p. 12), “ A cultura do consumo talvez seja menos um campo [...] e mais uma
se detém em detalhes, pois o intuito é de apenas evidenciar alguns fatos marcantes de uma
Em uma concepção moderna, o consumo pode ser definido como a criação, a compra
1984). Em uma concepção pós-moderna o consumo pode ser entendido a partir de dois pilares
Slater (2002):
Com base nos estudos de vários autores, Slater (2002) descreve que até o século
gasto (sem ganho), uma perda (e não uma reprodução ou expansão) para os fluxos
econômicos, morais e políticos de valor. O consumo excessivo por parte das camadas
extravagante da elite pudesse representar poder. A demanda era entendida como algo que está
em que flui através de um corpo político. A riqueza do país era identificada pela quantidade
essa riqueza.
Consumidor, que antecedeu a Revolução Industrial ou foi pelo menos um fator fundamental
provavelmente não teria prosseguido numa base capitalista sem a existência anterior de uma
demanda efetiva para sua produção. Para quem seriam vendidas as mercadorias resultantes
acreditarem na existência de uma demanda insaciável. Slater (2002), tendo o suporte dos
trabalhos de historiadores que revisaram a “ tendência produtivista” , faz uma descrição dos
processos ocorridos a partir do século XVI, período que marca a primeira fase da era
moderna, e que podem ser divididos de acordo com três características principais: o
organizações e práticas que tinham como alvo esses novos tipos de mercados, o surgimento
produção, do comércio e do consumo. Conforme Sekora (1977 DSXG SLATER, 2002, p. 30),
uma sociedade em que os indivíduos podem se fazer de acordo com seus próprios desígnios
ao comprar mercadorias” .
consumo (como meias, botões, alfinetes1 e pregos, sal, farinha, sabão, facas, ferramentas,
cachimbos, potes, fornos, fitas, rendas, roupa de cama e mesa, e aguardente). A volumosa
força de trabalho, apesar de não ter acumulado riqueza nesse período, ao mesmo tempo em
que era produtora também era consumidora sendo, provavelmente, os primeiros consumidores
51
modernos, em oposição aos consumidores de elite (THIRSK, 1978 DSXG SLATER, 2002).
organizacional “ [...] e lançaram as bases da industrialização [...], mas não como fruto da
ciência e da engenharia, nem de um grande investimento de capital [...], nem eram voltados
para o consumidor [...] surgiram e inovaram, como parte de uma política e de uma prática de
oportunismo comercial, de uma orientação para o FRPpUFLR” (SLATER, 2002, p. 29). Além
comerciais, mediante a compra de entrada ou fazendo uma assinatura; mas o lazer também era
feminino)” . Cabe considerar que o comércio, desde suas origens no século XVI até o século
XVII, tem dois sentidos: o sentido econômico ligado ao tráfico (intercâmbio) entre indivíduos
consumidor ampliado. A moda passa a ser equiparada à competição por status, imitação e
consumo conspícuo. Os novos padrões do consumo são associados à crença de que a riqueza
adicional obtida pelas pessoas mais ricas de uma sociedade trará um efeito econômico
1
A fabricação de alfinetes foi estudada por Adam Smith e considerada modelo de eficiência da
técnica de divisão de trabalho.
52
voltado para o consumidor. O trabalho de McKendrick HW DO (1983, DSXG SLATER, 2002)
revela que Josiah Wedgwood produzia cerâmicas baseado na imitação de peças antigas (tendo
em vista o interesse do público por arqueologia e cultura clássica), procurava o aval de seu
trabalho em famílias aristocráticas e na família real, fazia sua divulgação levando peças para
as casas de “ líderes do bom gosto” entre a nobreza e abria lojas em pontos estratégicos com a
aparecimento deste somente se dá como área do conhecimento, no inicio do século XX, nos
Estados Unidos. Bartels (1978), por exemplo, chega até a questionar: o marketing sempre
pudesse ter existido. Mais de seis mil anos de história escrita mostram como as raízes, tanto
esta não parece uma evidência definitiva de que o marketing sempre houvesse existido”
(BARTELS, 1978, p. 16). Posição semelhante tem Fullerton (1988) que denomina esse
Slater (2002, p. 29) reconhece as limitações nos trabalhos de autores que consideram
alternativa de que ambas são decorrentes de uma revolução comercial, “ onde os conceitos de
orientação para a exploração comercial de mercados cada vez maiores e mais impessoais
geraram um vasto leque de novas idéias e atividades chamadas modernas” . Dessa forma:
ocidente e diferenciada do resto do mundo, como uma cultura moderna, progressista, livre,
racional, pois são muitas as evidências de algum tipo de revolução do consumo tendo em vista
que tinha como objetivo a difusão da razão como meio de dirigir o progresso da vida em todos
individual pela negociação de bens e troca de idéias, determinando uma nova “ sociedade
civil” (termo que veio posteriormente a ser substituído pela idéia de “ cultura do consumo” ). É
através do comércio que o consumo começa a ser redefinido ao final do século XVIII,
passando a palavra consumo a designar uma parte natural dos fluxos econômicos e a venda de
Grã-Bretanha, entre 1760 e 1860, acontece a primeira Revolução Industrial que alterou
uso de ferramentas e maquinário passou a ser intensivo e permitiu que novos bens fossem
mais bem produzidos. Grandes empreendimentos passaram a ficar situados dentro de áreas
limitadas e urbanizadas, surgiram também novas classes vocacionais e sociais (dentre essas os
capitalistas). Londres passou a ser o centro de uma rede de comércio mundial associado a
(1976) menciona que desde o início da era industrial a grande promessa de progresso
críticos sociais, uma ideologia para a população e uma realidade para a burguesia. Esse século
marca a expansão da industrialização para países como França, Bélgica, Alemanha e Estados
marketing. Weber (1983) demonstra que o “ espírito do capitalismo” tem relação com a “ ética
surge como um fenômeno cultural. Para Weber, os capitalistas de outras épocas também
acumulação econômica.
Por outro lado, Campbell (2001) atribui ao movimento romântico papel fundamental
outros cientistas sociais de que foram os anunciantes que escolheram fazer uso do material
“ romântico” nas propagandas para estimular o consumo. Foi o romantismo que sob o impacto
do consumo se tornasse extremamente lúdica e séria. Tal situação ocorreu mesmo que, desde
a metade do século XVIII até meados do século XIX, o romantismo e seu conceito de cultura
Quanto à cultura do consumo, Slater (2002) diz que nesse período essa tomou duas direções
domesticidade privada burguesa. O autor lembra, ainda, que até o início do século XX, na
acumulação em escala social, apoiado numa ética puritana voltada para o trabalho e no
entanto, como Slater (2002, p. 176) registra, Marx já afirmava que “ todo capitalista exige de
fato que seus operários poupem, mas somente seu próprio dinheiro, porque os vê como
operários, mas de forma alguma o resto do mundo dos operários, pois, estes, ele os vê como
consumidores” .
57
(BERMAN, 1987). É nesta época que surge o marketing como área do conhecimento e a
805(/$72'$(92/8d2'20$5.(7,1*'85$17(2
6e&8/2;;
invadiram países e lares (HARVEY, 1992). Slater (2002), baseado no trabalho de Michel
dessa em séculos anteriores, torna-se mais dependente dos Estados Unidos, no que diz
alteram estruturalmente o caráter dessa dependência. [...] através da relação com a Europa,
Com relação ao marketing, como descreve Bartels (1978), muito embora tenha
início do século XX que esse surge como área de estudo, tendo os Estados Unidos como terra
determinado fortes mudanças na estrutura econômica e social e, também, uma nova atitude
ingressos pessoais; criação de novos produtos, em função das invenções; o fato de os valores
sociais darem maior importância para o êxito financeiro; mercados novos e cada vez mais
amplos; maior atenção ao mercado, às suas instituições, ao seu papel social e mudanças nos
apresentação desse resgate, introduzo idéias de outros autores, não necessariamente ligados à
área de marketing, no sentido de oferecer uma contribuição crítica a respeito desse contexto.
explicar o mercado. Entre essas, a idéia de que a demanda se originava na criação de uma
“ utilidade” na aquisição e obter o maior retorno possível, tendo em vista seus recursos
que a demanda consistia em algo mais que o simples poder de compra, pois poderia refletir
um desejo e, assim, ser aumentada e moldada, tendo em vista as indicações das novas
experiências com propaganda e vendas. Outro conceito vigente na época era de que o
ou seja, uma tendência de equilíbrio motivada pelos próprios interesses do mercado, o que
Adam Smith denominou de “ mão invisível” . Entretanto, aqueles que iniciaram o marketing
Uma terceira idéia de mercado da época era a de o custo ser o principal fator determinante do
preço. Porém, havia quem entendesse que além dos fatores de produção, existiam outros
fatores de mercado que poderiam explicar a formação dos preços. Bartels (1978) também
relata que o significado de valor era um outro campo do pensamento econômico que afetou os
primeiros estudos sobre marketing. Os economistas entendiam que o valor era uma
não eram riquezas, por isso aqueles serviços que não alteravam o produto físico não poderiam
criar valor.
de mercados cada vez maiores e distantes. O desafio era a distribuição dos produtos que
interesses acadêmicos (BARTELS, 1967), pois a economia clássica não oferecia respostas
1979). De acordo com Kotler (1972), nesse estágio da evolução o marketing é um ramo
dependente da economia voltado para o estudo da distribuição. Tanto é assim, que o primeiro
of Michigan, em 1902. O termo marketing surgiu em 1905, em uma disciplina chamada “ 7KH
principais e contribuições que fizeram parte dessas primeiras décadas da disciplina, bem como
do marketing e do consumo na sociedade. Faço o resgate dessa narrativa ancorado pelo estudo
de Bartels (1978).
$VSULPHLUDVGpFDGDVGRPDUNHWLQJ
pela realização de cursos e, também, pela produção de vários textos que tratavam de temas
publicidade (BARTELS, 1978). Nessa época a intenção dos autores da área era comprovar a
literatura sobre propaganda, depois de 1903, aumentou rapidamente; tais trabalhos tinham a
obras sobre varejo, propaganda, vendas, administração de vendas, crédito e cobrança. Como
expressão final das idéias de Ralph Butler, gerente de vendas de uma grande empresa, que
tratou de considerar as inúmeras questões que um fabricante deveria fazer antes de introduzir
indicação da função de marketing para todos os negócios. Além desses, três enfoques de
princípios de marketing são apresentados pela primeira vez em forma de livros, integrando
produtos no mercado a varejo (BARTELS, 1978), uma vez que a produção em massa de bens
de consumo que as grandes empresas geravam precisava ser vendida em mercados cada vez
maiores, tanto geográfica quanto socialmente. Isso motivou a utilização de novas técnicas de
O sistema fordista – com sua industrialização pesada, sua rígida linha de montagem
mercado: “ qualquer um pode comprar qualquer carro, desde que seja o Ford modelo ‘T’ e
preto” (que começou a ser produzido em 1908). Essa estratégia, segundo Slater (2002), foi
rapidamente suplantada pela General Motors, que passou a produzir modelos de automóveis
sucesso econômico do sistema capitalista, Harvey (1992), por sua vez, atribui ao modo de
acumulação fordista a criação de expectativas que não podiam ser atendidas por todos aqueles
A década de 1920 surge como a primeira década consumista, mas vista mais de
perto, parece apenas a época de colheita de uma revolução muito mais longa, em geral datada
a compra de bens duráveis (máquinas de lavar roupa, aspiradores de pó, geladeiras, telefones)
para as casas, até o automóvel, que promovia a impressão moderna de estar se dirigindo para
o futuro e para a orgia permissiva da era do jazz (EWEN, 1976 DSXG SLATER, 2002). Essa é,
também, a década do cinema de Hollywood, das noites do Harlem e da Lei Seca. Conforme
Aglietta (1979 apud SLATER, 2002), o consumo foi sendo estruturado de acordo com a vida
do operário de produção, a idéia de canalizá-lo para vida privada e doméstica tinha o objetivo
produzir, já o automóvel tinha a ver com a possibilidade de circular livremente e obter o status
social.
Ao mesmo tempo, como revela Bartels (1978), Fred E. Clark aparece com a
propaganda pelo seu valor educativo e por ser, algumas vezes, um método de venda mais
barato do que a venda pessoal, porque confiava nas lojas como método de vendas eficiente
para oferecer mercadorias e recomendava uma maior padronização dos bens de consumo.
Nesse período, também, foram escritos vários livros sobre “ princípios de marketing” , sendo
No Brasil, nas primeiras décadas do século XX, o marketing existia como uma
manifestação das ações naturais das trocas comerciais, mas não como área de estudo. As
mensagens dos anúncios publicitários tratavam de temas racionais, ou seja, a associação entre
mensagem e produto anunciado era direta e eram realizadas pelos próprios comerciantes e
tempo sobre o marketing de produtos, continua nesse período. Bartels (1978) destaca o
ferro, cimento, algodão têxtil, serviços de eletricidade, telefone entre outros). Em outro
trabalho “ 7KH 0DUNHWLQJ ,QVWLWXWLRQ” , também publicado em 1931, Breyer rompeu com os
marketing em conjunto, pois concebia os canais de forma análoga a dos circuitos elétricos,
Dos livros sobre marketing geral, Bartels (1978) destaca a obra de Charles F.
outros autores genéricos que também demonstraram interesse pelo consumidor, Philips foi
com os efeitos que os esforços de compra causavam aos consumidores. Bartels (1978)
também, revela que uma outra tendência dessa época foi a publicação de obras especializadas
marketing, ou seja textos introdutórios para que pessoas de vários campos de atuação se
No entanto, não é possível desconsiderar que a década de 1930 começa com a grande
depressão que abateu a economia mundial e que também influenciou o marketing. Nesse
sentido, foi dada ênfase aos preços baixos, à aparição do movimento do consumidor e ao
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Nesse contexto, a crítica em relação ao marketing é de que esse não estava sendo
primários. Como influência desse problema, surge no Brasil a idéia de que o Estado precisa
1918), que abalou o ideal iluminista (HARVEY, 1992). Pouco tempo depois, a II Guerra
pensamento iluminista. A Guerra também determinou, como explica Bartels (1978), uma
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interrupção no desenvolvimento do marketing. Assim, quase nada ocorreu nos primeiros anos
Após a guerra, as obras de Converse, Maynard e Philips foram revisadas. O interesse dos
autores passa a não ser apenas exclusivo à aplicação de normas e princípios, mas também a
marketing como uma função da administração, além de dedicarem uma seção especial sobre a
questão do ponto de vista do consumidor no sistema de marketing. Uma outra obra destacada
por Bartels (1978) é a de Roland S. Vaile, E. T. Grether e Reavis Cox, “ 0DUNHWLQJ LQ WKH
$PHULFDQ (FRQRP\” , que consideravam o marketing como uma instituição social vasta e
completa da economia da livre empresa. Para eles, o marketing era um processo destinado a
das quais todas as coisas são reunidas de forma simultânea para seu consumo.
Para Bartels (1978), a década de 1950 representa o auge da área de marketing e surge
como sendo o SHUtRGR GH UHFRQFHLWXDOL]DomR O autor descreve que embora não houvesse
uma grande distinção entre as obras da década passada e as obras desta década, a medida que
promocionais (BARTELS, 1978). Dentre as obras destacadas dessa época estão: a de Reavis
Cox e Wroe Alderson, “ 7KHRU\LQ0DUNHWLQJ” , de 1950, que, tendo em vista o interesse dos
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1957, que buscava elevar o marketing a condição de negócios no mercado e não apenas
sucederam a partir desse momento, continuo a descrever a história do marketing em uma nova
subseção. Essa década também marca o início da discussão em torno do tema “ marketing é
arte ou ciência?” (BROWN, 1997a) que se estendeu nas próximas décadas. Considerando a
importância do tema para os propósitos deste trabalho, apresento o desenrolar dessa discussão
2PRGHUQRFRQFHLWRGHPDUNHWLQJ
Na década de 1950, o marketing configura-se como uma área não mais associada à
economia (BARTELS, 1974; KOTLER, 1972). Em 1954, quando Peter Drucker publica “ 7KH
como a forma das empresas praticarem marketing, para tanto deveriam produzir seus produtos
de forma a facilitar a vida do consumidor (FELDMAN, 1971). Surge, assim, a idéia de que o
conceito de marketing depende de uma orientação para o consumidor, apoiada pelo marketing
com o trabalho, de Wendell Smith, “ 3URGXFW 'LIIHUHQWLDWLRQ DQG 0DUNHW 6HJPHQWDWLRQ DV
proposto somente nesta década há registros bem anteriores da adoção desse tipo de estratégia.
demonstra que nesta época a cultura do consumo era estimulada a absorver o excedente de
produção, uma vez que a quantidade de valor produzida era maior do que a demanda efetiva
à produção, como forma de valorizar a forma em detrimento ao valor de uso dos produtos e,
controlando o teor cultural dessa demanda. Ainda de acordo com Slater (2002)
governo de Getúlio Vargas, e das grandes multinacionais que começavam a chegar ao Brasil,
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1983). Em 1954, através dessa instituição, o ensino de marketing é introduzido no Brasil, com
a vinda do professor norte-americano Karl Boadecker. Sendo que nesse momento é adotado o
termo mercadologia2 no País, uma vez que os introdutores imaginavam que a expressão
marketing seria de difícil entendimento para os brasileiros. Cabe enfatizar que as idéias de
diferentes das brasileiras são importadas para serem “ generalizadas” para o contexto
resultado, inicialmente, das idéias de McKitterick e, logo após, das contribuições de Robert
Keith e Theodore Levitt. Mesmo com todas as críticas dirigidas aos trabalhos “ The Marketing
Revolution” e “ Marketing Myopia” escritos em 1960, respectivamente, por esses dois últimos
uma vez que este tema tem significado especial para o escopo do presente ensaio.
início dos anos de 1960. McCarthy (1960 DSXG McCarthy, 1978), revisando trabalhos
praça. Essa classificação até hoje continua sendo citada nos principais livros textos da área.
Kotler (2000) entende que mais duas proposições de composto de marketing realizadas neste
período merecem destaque: a realizada por Albert W. Frey em 1961, onde esse sugeriu que
2
O termo mercadologia está em desuso no contexto brasileiro.
70
de William Lazer e Eugene J. Kelly em 1962, que propuseram uma classificação de três
No que diz respeito à cultura do consumo nas décadas de 1950 e 1960, Slater (2002,
p. 20) lembra que “ a prosperidade e uma vida boa significavam a capacidade de não ficar
atrás dos vizinhos, [...] [mas ao mesmo tempo havia o sentimento] do consumo
respeito da ética do trabalho, uma bifurcação do desejo entre o consumo respeitável familiar e
questões preocupantes na década de 1960 nos EUA. Packard (1960) descreve esse período
como sendo da “ estratégia do desperdício” e faz severas críticas às estratégias usadas pelas
empresas para estimular o crescimento. “ Para que os americanos comprem e consumam tudo
quanto a manufatura automatizada, a venda sob pressão e a publicidade total lançam sobre
nós, cada um de nossos crescentes milhões precisaria ter ouvidos, olhos e outros sentidos
adicionais – assim como renda adicional. Com efeito, o único meio seguro de satisfazer todas
as exigências talvez seja criar uma raça inteiramente nova de superconsumidores” (Principal
redator da revista Sales Management DSXG PACKARD, 1960, p. 10). Já nessa época, Packard,
além de demonstrar sua inquietação com relação ao consumidor frente ao excesso de estímulo
ao consumo, manifesta sua preocupação com relação aos problemas que essa forma de fazer
negócios traria ao meio ambiente. Cabe lembrar que, em meio a essa década, começa, nos
Ao final da década de 1960 e início de 1970, alguns autores (como por exemplo:
Willian Lazer, David Luck, Philip Kotler, Gerald Zaltman, Sidney Levy, M. Bell, e C.
Emory) travaram um longo debate em torno do conceito de marketing e vários artigos foram
publicados. Tendo em vista a importância desse debate para os propósitos do presente ensaio,
este tema é tratado na subseção “ O conceito de marketing: ampliação e validade” . Por ora,
conceito para organizações que não visassem lucro; e, por outro lado, havia a preocupação
A partir dos anos de 1970 o modelo de acumulação fordista começa a dar sinais de
sociedade de consumo, que até então era vista como parte de um sistema capaz de superar
crises econômicas, entra também em colapso. Esse momento é chamado por alguns autores de
novo tipo de sociedade que recebe generalizações como: sociedade pós-industrial, sociedade
Neste estágio, o capitalismo desenvolve novas tecnologias para continuar seu processo de
De acordo com Slater (2002) a produção flexível além de ser rápida e barata,
fosse maior do que as quantidades muito grandes de artigos padronizados. Com isso, a cultura
tornam-se mais elevados, uma vez que as empresas buscam intensificar as estratégias de
globalização não aparece como um novo processo da civilização, mas como uma
característica do capitalismo tardio (MANDEL, 1982) que foi ao longo do tempo se formando
Nesse contexto, Slater (2002) registra que a cultura do consumo é marcada pela
exploração visual e verbal dos objetos, e afinada com os signos, imagens e com a propaganda.
vitrines, pontos de venda, GHVLJQV de produto). Fato esse, que de acordo com o autor, também
não representava nada de novo, uma vez que essas manifestações já apareciam desde os
tempos do capitalismo comercial, mas eram motivo de reflexão na década de 1980. Era o
(consumidores) para que ajudassem a fiscalizar os preços que haviam sido congelados. As
pessoas atenderam ao pedido e inúmeras queixas são apresentadas aos órgãos de defesa do
1967), o interesse pelos métodos chega a ser mais importante do que o objeto de estudo
(BARTELS, 1983). É também nessa década que o pós-modernismo emerge para o interesse
marketing, Casotti (1999), registra que nesse período aparecem visões filosóficas e
relativismo.
Brown (1999) revela que essa década marca o aparecimento de trabalhos que
valorizam a teoria literária em particular. Graças aos empenhos de autores – como Russell
Belk, Elizabeth Hirschman, Linda Scott e Barbara Stern – que reconheceram nas ferramentas
liberadas e uma série de produtos importados invade o País. O consumidor brasileiro pode,
consumo efêmero e volátil, suprir e satisfazer necessidades reais e imaginárias múltiplas, que
marketing é pós-moderno” faço maiores considerações a este respeito. Antes, porém, destaco
0$5.(7,1*$57(28&,Ç1&,$"
No entendimento de Brown (1997a), o artigo “ 7KH GHYHORSPHQW RI WKH VFLHQFH RI
Converse tratasse de uma pesquisa VXUYH\ relativa aos interesses acadêmicos de pesquisadores
Converse relacionados à “ arte” e à “ ciência” que acenderam a faísca de um dos debates mais
Brown (1997a) descreve que a discussão arte versus ciência se intensificou com o
conotação de ciência. Brown (1996) relata que Kenneth Hutchinson, em 1952, com o texto
“ 0DUNHWLQJ DV D VFLHQFH DQ DSSUDLVDO” , responde de forma devastadora a Bartels, dizendo
que a razão para que o marketing ainda não tivesse um corpo teórico único era pelo fato de
não ser uma ciência e sim uma arte ou uma prática, e, como tal, seria semelhante à
registra que, na oportunidade, Hutchinson dizia ser uma paródia cômica relacionar a procura
de cientistas por conhecimento para que depois os homens (sic) realizassem pesquisas de
mercados para conquistar clientes. No entanto, o esforço de Hutchinson não foi suficiente
marketing como ciência, em 1962 é criado nos EUA o Marketing Science Institute e, em
marketing ser uma ciência. No entanto, Brown menciona que Buzzell era um tanto cético
sobre as pretensões científicas do marketing, dizendo que essa condição só seria alcançada se
Quanto à questão de encarar o marketing como ciência, Brown (1997a) lembra que,
nos primeiros anos da década de 1970, várias figuras proeminentes na área (como Robin,
Kotler e Ramond) entendiam que o marketing já era uma ciência (ou pelo menos uma ciência
primitiva); já outros entendiam que isso era um sonho utópico (como Kernan e Levy).
parte, ocasionado porque não existiam bons critérios de qualificação (fato que já havia sido
evidenciado por Buzzell em 1963). Assim, o autor propõe uma classificação do “ escopo de
marketing” composta de três critérios tendo cada um duas modalidades: setor lucrativo e setor
organização); positivo (o que é) e normativo (o que deve ser). Segundo Hunt (1976), o escopo
de marketing era inquestionavelmente amplo, uma vez que incluía as mais diversas áreas,
outros, sendo sua aplicação possível tanto nas organizações que visam ao lucro como
naquelas de caráter eminentemente social. De acordo com Baker (1995 DSXG BROWN,
caricaturada versão da ciência que caracterizou até esse momento o grande debate
marketing, até então, tinha sido mal-servido pelo determinismo, pelo reducionismo e pelas
poderia oferecer muito mais para a área. Peter e Olson (1983), por sua vez, realçaram que a
(1984 DSXG Brown, 1997) respondeu dizendo que a adoção do relativismo levaria o marketing
Para Brown (1997a), mesmo que Hunt, descaradamente, tente reivindicar vitória, o
marketing passou a ser muito menos monolítica que antes, em termos epistemológicos e
marketing baseados em três elementos, Brown (1996) propõe “ o modelo de todos os modelos
de marketing” , para classificar as eras de disputas em torno do tema “ arte ou ciência?” : a era
com Brown (1996), nessa perspectiva o marketing deve, primeiro, reconhecer que o tempo de
ficar procurando o seu estado científico passou, e a área deveria buscar a designação de arte,
porém, não no sentido da arte de um artesão (a arte ou técnica de marketing) como sempre foi
solicitado desde os primeiros debates em torno da questão “ arte ou ciência?” , mas sim, no
sentido artístico, no sentido de estética. Segundo ponto: o marketing deveria, para alguns
pensadores, voltar-se ao estudo de artefatos artísticos (livros, filmes, jogos, poesia e etc.) e
procurar os benefícios das artes liberais (ciências humanas) e do espectro acadêmico; para
outros pensadores, o marketing deveria aderir a uma orientação de um espírito mais estético e
promoverá uma reação dialética, em que defensores da ciência de marketing buscarão uma
)UDJLOLGDGHGDFRQFHSomR³RULHQWDomRSDUDPDUNHWLQJ´
Segundo Brown (1995c), os autores Robert Keith e Theodore Levitt são, juntamente
com alguns outros entusiastas como McKitterick, os responsáveis pela SURSDJDomR GR
atribuída a McKitterick, que escreveu “ :KDW LV WKH PDUNHWLQJ FRQFHSW"´ em 1957, onde
recomendava que as empresas deveriam ser hábeis em conceber e fazer negócios baseados
5HYROXWLRQ´, de Robert J. Keith, publicado em 1960. Essa classificação passa a ser a base da
“ orientação para marketing. Segundo Brown (1996, 1995c), o texto de Keith é um clássico e
um dos artigos mais citados de toda a literatura de marketing. Nesse artigo, Keith descreve as
três eras vividas pela The Pillsbury Company. Do século XIX até 1930, a empresa era
“ orientada para a produção” ; nesse período estava preocupada com o processo de fabricação,
em lugar de servir a uma necessidade de mercado. De 1930 até 1950, a Pillsbury foi
caracterizada por uma “ orientação para vendas” , em que uma sofisticada organização de
vendas, apoiada de anúncios e análises de mercado, foi reunida para distribuir as linhas de
marketing” , já que o propósito da Pillsbury não era moer farinha ou fabricar e vender uma
gama extensiva de produtos, mas, sim, satisfazer as necessidades e desejos de seus clientes.
O artigo de Keith é duramente criticado por Brown (1996), que se refere ao texto,
comentando que é muito fraco, tem apenas quatro páginas, não possui qualquer citação,
80
baseia-se na experiência vivida por uma única empresa e é algo para ser lido após o jantar.
Hollander (1986 DSXG BROWN, 1995c), por sua vez, lembra que na metade do século XIX já
havia empresas que estavam “ orientadas para marketing” . Para Marion (1993 apud Brown,
promover a empresa e o autor como executivo, uma vez que o mesmo era vice-presidente
que, SRU PDLV GHIHLWXRVD H TXHVWLRQiYHO TXH IRVVH D GLYLVmR HP WUrV HUDV FRPR PRGHOR
JHUDO HOD WRUQRXVH R SLODU LGHROyJLFR GR PDUNHWLQJ (em outras palavras, seu sistema de
0\RSLD” , publicado em 1960. Levitt (1960 [1986]) relata em seu texto o problema das
empresas que não sabem definir as necessidades dos consumidores e, assim, dão ênfase a seus
produtos, e não às necessidades de seus consumidores, pois com o passar do tempo uma
necessidade passa a ser satisfeita com outros tipos de produtos. A razão principal para que um
setor que, após passar por um momento de rápida expansão, tivesse seu desenvolvimento
ameaçado, retardado ou detido não era a razão da saturação de mercado, mas, sim, uma falha
administrativa. De acordo com Levitt, vários setores tiveram problemas porque não souberam
definir o seu negócio: as ferrovias pararam de crescer porque se voltaram para o trem
porque a indústria do cinema deu ênfase aos seus filmes (produto) quando deveria ter dado ao
entretenimento (negócio).
O artigo de Levitt foi duramente criticado, porque suas observações foram realizadas
depois de os fatos terem ocorrido, o que é bastante cômodo para qualquer analista. Ao
81
energia (necessidade) e não continuarem insistindo com o petróleo (produto), já que até o
final da década de 1970 o combustível não mais existiria na terra, o próprio autor, com essa
“ miopia de marketing” até hoje aparece como sinônimo daquelas empresas que são
“ orientadas para o produto” , mesmo que as idéias de Levitt tenham sido consideradas falhas,
Um HVTXHPD DOWHUQDWLYR GD HYROXomR GR PDUNHWLQJ foi proposto por Fullerton
eras interpenetrantes: a era dos antecedentes (1500-1750); a era das origens (1750-1870); a
(1930-...). Segundo Brown (1996), embora esse modelo ofereça uma maior nuança e
aclamado.
resolveu propor um modelo, que ele mesmo intitulou como debatível e passível de ser julgado
como uma meta-narrativa, baseado também em três estágios: a era pré-moderna de marketing
(antes até aproximadamente 1900); a era moderna de marketing (1900-1999) e a era pós-
2&21&(,72'(0$5.(7,1*$03/,$d2(9$/,'$'(
IRUPD GH UHODomR GR PDUNHWLQJ FRP R PHUFDGR e juntamente são registradas as FUtWLFDV
VREUHDYDOLGDGHGRFRQFHLWR
0DUNHWLQJ´ o marketing era uma disciplina voltada unicamente aos interesses das empresas
com fins lucrativos. Nesse momento, os autores entendem que o conceito de marketing estava
muito limitado e sugerem D DPSOLDomR GR FRQFHLWR, uma vez que os administradores de
organizações: possuíam produtos (bens, serviços, idéias), lidavam com grupos de interesses
que a idéia dos autores era intrigante e imaginativa, mas era importante a demarcação do
De acordo com Luck (1969), a ampliação tinha o intuito de diminuir a culpa de especialistas
que não se sentiam à vontade pelo fato de a atividade visar ao lucro e, por isso, não ser
socialmente benéfica. Para o autor, o marketing deveria ficar restrito aos processos e
mercado. Kotler e Levy (1969b) respondem a Luck, dizendo que sua preocupação se tratava
de uma nova forma de “ miopia em marketing” e argumentando que o eixo de marketing está
marketing não deveria apenas servir aos negócios, mas, também, preocupar-se com os
interesses de longo prazo da sociedade. Com isso, o interesse da área não deveria se restringir
produzir o lucro. Bell e Emory (1971) lembram que a satisfação do consumidor pode ser um
eficiente meio de uma empresa alcançar o lucro, mas não implica a proteção do bem-estar do
consumidor. Por sua vez, Feldman (1971) argumenta em “ 6RFLHWDO DGDSWDWLRQ D QHZ
FKDOOHQJH IRU PDUNHWLQJ” que alguns produtos que se destinam à satisfação individual do
atender a satisfação das necessidades dos consumidores e da sociedade a longo prazo, o autor
propõe RFRQFHLWRGHPDUNHWLQJVRFLHWDO.
desemprego, do uso de drogas). Lazer e Kelley (1973) entendem que o marketing deveria se
envolver com atividades sociais, por duas grandes razões. Primeiro, é do próprio interesse do
surgiria um ambiente mais adequado para a prática do marketing. Segundo: problemas sociais
como, por exemplo: poluição, má qualidade de vida, degradação do ambiente, aumento das
taxas de desemprego, além de inúmeros outros, são aspectos que estão, inevitavelmente,
84
foi definida por Fox e Kotler (1980), uma vez que Lazer e Kelley (1973) não fizeram qualquer
idéias sociais.
(1972), com o artigo “ $ *HQHULF &RQFHSW RI 0DUNHWLQJ´ expressa que o problema da
ampliação estava no fato de o conceito não ter sido ainda ampliado suficientemente e, assim,
argumenta a favor do marketing ser aplicado a qualquer relação social que envolva duas
partes. Assim, defende que a essência do conceito de marketing é a troca de valores entre duas
partes, pois as coisas de valor não se limitam a produtos, serviços e dinheiro; elas incluem
teóricos e praticantes viam esse movimento com surpresa, pois não entendiam como os
consumidores poderiam se voltar contra empresas que tinham como lema a satisfação do
consumidor. Porém, Buskirk e Rothe (1973 DSXG Chauvel, 1999), anunciam que o
consumerismo era a prova de que o conceito de marketing não havia funcionado, e Drucker
(1973 DSXG Chauvel, 1999) afirma que o movimento era a vergonha do marketing.
Kotler (1972) considera que o consumerismo viria pra ficar e seria benéfico aos
segurança dos produtos. Para o autor, a ênfase no consumo material e as ações que visavam
apenas ao lucro, sem considerar o impacto social ou ambiental a longo prazo, indicavam uma
atitude imediatista e egoísta e não atendiam aos reais interesses do consumidor. Nesse sentido,
Kotler (1972) afirma que o termo “ satisfação do consumidor” é ambíguo, pois poderia indicar
uma preocupação de curto prazo e a idéia de apenas atender aos desejos do consumidor.
Lazer e Kelley (1973) acreditam em uma mudança social nos países desenvolvidos e
lucro das empresas, os desejos dos consumidores e seus interesses a longo prazo é uma
“ falácia otimista” , e que é necessário um pouco de realismo para observar que nenhum desses
interesses é compatível com o outro, sendo mais difícil ainda conciliar os três juntos. As
enfoque, a longo prazo, nos desejos do consumidor e do cidadão e não no seu interesse e bem-
estar.
3
Estudos têm indicado que a teoria da hierarquia das necessidades é na melhor das hipóteses uma
pobre simplificação do comportamento humano (MARSDEN, 2001).
86
Bagozzi (1974) defende que o marketing não é apenas uma simples transferência de
dinheiro por produto ou serviço, pois é, na verdade, um processo de troca que envolve
experiências e significados que estão envolvidos nas relações entre dois ou mais participantes.
Conforme Bagozzi (1975) as trocas de marketing podem ser classificadas como: trocas
restritas (mantidas reciprocamente entre dois elementos); trocas generalizadas (mantidas por
pelo menos três agentes em relações recíprocas e indiretas) e trocas complexas (que envolvem
um sistema de relações mútuas por pelo menos três elementos, havendo, no mínimo, uma
troca direta).
1DWXUH DQG 6FRSH RI 0DUNHWLQJ” , propõe o que seria o escopo de marketing (já citado
anteriormente na subseção que aborda o debate “ marketing arte ou ciência?” ), a saber: setores
Segundo Brown (1995c), é com este trabalho que os defensores da ampliação do conceito são
Arndt (1978), por exemplo, argumenta que a questão do mérito da ampliação não estava no
fato da possibilidade de aplicação das técnicas no setor de organizações sem fins lucrativos,
mas questiona a possibilidade de tal aplicação ser tratada como uma parte integrante do
marketing. Para o autor, o marketing estaria, de forma imperialista, entrando em áreas como
(1978 DSXG BROWN, 1995c) afirmam que o êxito do marketing não está somente em
satisfazer as necessidades dos clientes, mas, sim, em lhes proporcionar satisfação maior do
que a oferecida pelos concorrentes. Posteriormente, Sachs e Benson (1980) defendem a idéia
87
empresas não praticam o conceito de marketing porque ele é impraticável e não representa os
seus melhores interesses. Os autores sugerem que, se a teoria do conceito de marketing não
pode ser realmente implementada, então o conceito deveria ser mudado para perto da
realidade.
DSXG Berry, 1996) é um dos primeiros autores a tratar do conceito como uma forma para
BERRY, 1996) são dois elementos fundamentais para a consolidação do relacionamento. Para
onsumidor UHGX] HVFROKDV QR VHQWLGR GH EXVFDU UHODo}HV FRQWtQXDV GH OHDOGDGH por
co
clientes chegou ao ponto mais baixo de todos os tempos nos Estados Unidos, ao mesmo
tornar o que deve ser: expressão máxima em orientação ao consumidor” . Berry (2000)
países, além dos EUA. Para Fournier, Dobscha e Mick (1999), as empresas, se não quiserem a
morte prematura do conceito, deverão avaliar com rigor as constantes invasões de privacidade
necessidades. Por outro lado, existe a incerteza a respeito de quais aspectos poderiam
perda de compromisso e lealdade à marca, que previamente tinham sido firmados (FIRAT e
VENKATESH, 1995).
e melhor desempenho competitivo das empresas, surge uma outra proposta: D RULHQWDomR
SDUD R PHUFDGR (KOHLI e JAWORSKI, 1990). Narver e Slater (1990) propõem três
elementos básicos para essa orientação: a orientação para o cliente, a orientação para a
feita uma distinção entre orientação para mercado e orientação para cliente, visto que a
TXHVWmR IXQGDPHQWDO QmR p VH RV SURGXWRV RX VHUYLoRV SRGHP VHU GHVHQYROYLGRV SDUD
DWHQGHU jV QHFHVVLGDGHV GR FRQVXPLGRU H VLP VH GHYHULDP VHU GHVHQYROYLGRV OHYDQGR
89
HP FRQVLGHUDomR RV VXEVHTHQWHV UHVXOWDGRV VRFLDLV (como, por exemplo: poluição
ambiental, redução de recursos naturais, efeito estufa, néo-colonialismo e etc.). Brownlie HW
Segundo Carson e Gilmore (2001), muitos estudos têm mostrado que os profissionais de
como em relação ao que deve ou não ser feito em um contexto organizacional. Ainda segundo
técnica ou nas decisões feitas que satisfaçam o trabalho de marketing, enquanto que
unidimensional. Dawson (DSXG Abratt e Sacks, 1988) fez críticas ainda mais duras dizendo
que o conceito de marketing é “ míope” em relação à sua orientação para o consumidor, já que
tradicionalmente, as contribuições das empresas para com os interesses da sociedade têm sido
organização. O autor entende que o desafio do marketing é ser, ao mesmo tempo, lucrativo e
socialmente responsável.
Como bem lembra Chauvel (1999, p. 1), os debates da década de 1970 motivaram a
entanto, mesmo que “ estes debates tenham apontado a necessidade de uma abordagem
Brownlie e Saren (1992), no artigo “ 7KH )RXU 3¶V RI WKH 0DUNHWLQJ &RQFHSW
da forma como tem sido propagado, pode prover a base para o sucesso dos negócios no século
XXI. Segundo os autores,o conceito de marketing é uma meta idealizada, e nenhuma empresa
é capaz (ou será capaz) de alcançá-lo completamente, porém a utilidade do conceito está em
providenciar um objetivo específico ao qual uma empresa pode visar. Qualquer “ conceito”
intenção inicial de Drucker e Levitt fosse apenas propor um novo conceito, ele se desenvolveu
como uma espécie de ideologia, um modo de pensar sobre os negócios que ofereceria uma
estrutura para o sucesso. A forma pela qual o conceito emergiu na literatura empresarial fez
XP UHJUHVVR SDUD XPD HUD DQWLJD GH PHUFDGRV GH PDVVD (HOYT, 1991; McKENNA,
1991); falam, também, que o tempo passou e que estamos diante do fim do marketing
(BROWNLIE, HWDO 1994; HOYT, 1991). Assim, Brown (1995c), com o texto “ /LIHEHJLQVDW
6,67(0$6'(0$;,0,=$d2'(0$5.(7,1*'()(6$6(
&5Ë7,&$6
poderão ser adotados por uma sociedade: PD[LPL]DU R FRQVXPR PD[LPL]DU D HVFROKD,
felizes através do consumo maximizado. Como registram Kotler e Armstrong (1993, p. 9),
“ muitos executivos do ramo de negócios acreditam que a tarefa do marketing seria estimular o
consumo máximo. [...] A premissa por trás disso é a de que, quanto mais as pessoas gastam,
compram e consomem, mais felizes elas se tornam. [...] Contudo, algumas pessoas duvidam
que o aumento da quantidade de bens materiais signifique uma vida mais feliz” . Segundo
Giannetti (2002, p. 64), estudos realizados em países desenvolvidos com alto crescimento
econômico revelam que o consumo “ muito pouco ou nada altera as proporções de indivíduos
felizes e infelizes. O crescimento compra a felicidade nos países extremamente pobres, mas a
partir do momento em que uma nação atinge determinado nível de renda [...], acréscimos
HVFROKD mediante o aumento da variedade de produtos e opções de escolha, para que assim os
essa posição também é passível de críticas, porque a maximização da escolha gera inúmeros
problemas para o consumidor, a saber: o aumento dos custos de produção e de estoques gera
preços mais altos e reduz a renda dos consumidores; o aumento na variedade exige um
esforço maior de procura; a opção de mais produtos não implica necessariamente a efetiva
diferenciação entre eles; e, por fim, muitos consumidores se sentem confusos e frustrados com
(2004, p. 63) argumenta que “ o aumento do leque de opções e da riqueza, ao contrário do que
mais tempo para decidir o que comprar, empenham-se em ler rótulos, conferir anúncios e
experimentar novos produtos, passam mais tempo comparando suas decisões com as de outras
pessoas. Vários fatores explicam por quê, especialmente para essas pessoas, a existência de
mais opções nem sempre é melhor. Dentre esses, estão os “ custos de oportunidade” . Os
“ custos” de fazer uma escolha implica na perda das oportunidades que uma escolha diferente
poderia proporcionar. Além do mais, os “ maximizadores” procuram conferir cada uma das
opções existentes; como isso é praticamente impossível, tornam a tomada de decisão cada vez
mais hesitante e ficam preocupados com as alternativas que não tiveram tempo de investigar.
Dobscha e Mick também ilustra o que tem significado a maximização de escolhas e opções:
escolha é feita por Santos (2000c, p. 89): “ O modo dominante de assegurar material e
institucionalmente o aumento das escolhas faz com que, paralelamente ao aumento das
93
Além disso, tanto a maximização do consumo como da escolha podem ser criticadas
em função dos problemas ecológicos gerados pelo consumo. Como argumenta George (2002)
Nesse contexto, Kotler e Armstrong (1993, p. 10) relatam que o marketing provoca
controvérsia, de um lado há defensores e de outro críticos ferrenhos que “ [...] sentem aversão
anúncios sem sentido, criar desejos desnecessários, prover o espírito de consumismo entre os
jovens [...]” .
satisfação obtida pelos aspectos “ bons” de um produto devem ser contrabalançados com os
aspectos “ maus” , tais como os danos ao meio ambiente; e, finalmente, porque a satisfação que
alguns obtêm em consumir certos produtos que geram status depende do fato de que poucas
pessoas podem ter tais produtos. Esse último, conforme Giglio (2002), contribui para o
comunicação de massa). Considero que esses argumentos são fatores fundamentais para a
que inclui não apenas a qualidade, quantidade, disponibilidade e custo dos bens, mas também
a qualidade do meio físico e cultural. Cobra (1997, p. 33) entende que o marketing estimula
pessoas [...] melhorar as condições físicas e culturais da população, bem como oferecer
acesso fácil” .
A idéia do marketing voltado para a qualidade de vida tem íntima relação com o
mais de três décadas. No entanto, as evidências teóricas até aqui consideradas indicam que tal
20$5.(7,1*e3Ï602'(512
iUHD DLQGD HVWi DVVRFLDGR j PRGHUQLGDGH O autor lembra que a obra mais famosa de
Brownlie e Saren (1992) explicam que as técnicas de pesquisa de mercado podem ajudar a
defendem que não há dúvida de que, para ter êxito no mercado, um novo produto precisa
satisfazer as necessidades dos consumidores; porém para uma grande organização, a gama de
necessidades potenciais é, freqüentemente, tão maior que a própria escolha delas e dos
direção do desenvolvimento subseqüente. Além disso, conforme Brownlie e Saren (1992), tais
escolhas devem ser feitas com base em vários outros critérios, além das necessidades dos
não apenas aos acadêmicos e praticantes de marketing, como também aos profissionais
envolvidos em áreas que se valem da pesquisa de marketing para tomar decisões, como é o
caso da produção. Como contraponto à idéia de Brownlie e Saren (1992), é preciso considerar
que a realidade é uma construção social (BERGER e LUCKMANN, 1985); com isso é
possível que o poder de uma empresa interfira no mercado a ponto de criar uma necessidade.
ciências, [...] [porém] deve estar associado a características como abertura, tolerância,
96
flexibilidade, crítica, relativismo, que [...] são características mais associadas à condição pós-
moderna” .
2000) que gera a “ infotoxicação” (CORNELLA, s.d). A fragmentação tem afetado o mercado
modernidade, pois a cada nova idéia, mensagem, símbolo, imagem, conceito que o marketing
propaga é uma nova oportunidade para que o “ eu” seja alterado e novos hábitos e
serviços exige a existência de superconsumidores para consumir tudo que está à disposição
UHYHODIUDJPHQWDGDHPLGpLDVYHUWHQWHVDVVXQWRVHLQWHUHVVHV
futura é a do próximo evento, e quando este chega já é hora de uma nova expectativa. Harvey
homem abate uma floresta para no mesmo local construir um conjunto e batizá-lo de ‘Cidade
Verde’ e onde se tomarão a plantar algumas árvores, que darão uma sugestão de ‘natureza’ ”
massa, que são espaços culturais onde o marketing forma os desejos dos consumidores e
reformula as suas preferências (THOMPSON, C., 1997); como também o ciberespaço criado
VENKATESH, 1995). Os bens sempre tiveram significado de identidade social, porém nos
processos fluidos de uma sociedade pós-tradicional, a identidade parece ser mais uma função
do consumo que o contrário (SLATER, 2002). O consumo não é mais definido pelo
custo/benefício das escolhas, mas por experiências adquiridas através do consumo. Ou seja, RV
VLQDLV H DV LPDJHQV VXEVWLWXHP D PDWHULDOLGDGH H R YDORU GH XVR (FIRAT e SHULTZ,
98
1997). Segundo Schoreder (2000), uma característica chave da economia do século XXI é D
corporação, imagens nacionais e imagens de identidade, então nós compreenderemos que essa
mas na sociedade pós-moderna a comunicação é mais intensa e torna o mundo mais próximo
e universal. O poder na sociedade pós-moderna está na posse dos melhores meios de difusão
nela circulam são ricas em informações e fáceis de serem decodificadas (LYOTARD, 1998).
Por fim, conforme os argumentos de Brown (1993a), cabe registrar que a condição
&216,'(5$d®(6),1$,6'$+,67Ï5,$'20$5.(7,1*
manifestações de marketing, porém é somente no século XX que esse passa a existir como
uma área do conhecimento. Os EUA é sua terra natal e o lugar onde o discurso hegemônico
foi sendo construído para atender aos interesses das empresas capitalistas. Ao mesmo tempo,
na busca da propagação e generalização das idéias, o marketing foi sendo levado para
99
incluindo aí o Brasil.
sociais e ambientais. Foi nesse período que o marketing chegou ao Brasil e hoje, pouco mais
de quatro décadas de sua chegada, ele está consolidado, mas nem um pouco contextualizado
O marketing, como uma construção dos homens, não admite uma única “ verdade” e
pode ser mais bem compreendido mediante uma posição relativista. Considerando minha
posição crítica, a associação que faço do marketing com o relativismo não implica apoiar a
idéia do “ tudo pode, tudo é bem-vindo” , uma vez que a aproximação com o relativismo é no
sentido de demonstrar que a área admite idéias antagônicas àquelas que vêm sendo atribuídas
pessimismo [...] paradoxo dos tempos atuais” . Neste trabalho, que é crítico e reflexivo, tenho
especial interesse pelo segundo elemento que compõe esses pares binários. Na próxima seção
televisão). Assim, busco demonstrar que a força conjunta e inter-relacionada dos mesmos é
denominação, mas, sim, de caracterizar a comunicação como sendo uma marca distintiva e
engenharia de produção. Nesse contexto, ilustro meus argumentos com fatos e evidências
partir dos questionamentos: FRPR R PDUNHWLQJ WHP ³DJUHJDGR YDORU´" FRPR SRGHPRV
LQWHUSUHWDURVLJQLILFDGRGRVFKDPDGRV³JDQKRVP~WXRV´"FRPRTXHRVFRQVXPLGRUHVHVWmR
VHQGR HVWLPXODGRV SHOR PDUNHWLQJ D FRQVXPLU" RV SULQFtSLRV FRQFHLWRV H WpFQLFDV GH
PDUNHWLQJ HVWmR HP VLQWRQLD FRP R LQWXLWR GR PDUNHWLQJ GH DWHQGHU jV QHFHVVLGDGHV GRV
FRQVXPLGRUHV"FRPRDSURGXomRSDUWLFLSDGHVVHFRQWH[WR"
20$5.(7,1*'(6&2%5(1(&(66,'$'(6(5(6321'(&20
26352'8726'(6(-$'26"
De acordo com Kotler (2000, p. 20), é possível atribuir duas funções para o
marketing: uma social e outra gerencial. Como função social, “ marketing é um processo
social por meio do qual pessoas obtêm aquilo de que necessitam e o que desejam com a
101
criação, oferta e livre negociação de produtos e serviços de valor com os outros.” Como
idéias, bens e serviços para criar trocas que satisfaçam metas individuais e organizacionais.”
descobrem o que os consumidores desejam e respondem com os produtos certos. Essa posição
dos autores é a mesma de outros tantos textos que constituem o discurso hegemônico do
marketing, o que começaria pela descoberta das necessidades dos consumidores para,
melhor do que a concorrência. Kotler e Armstrong (1998) também mencionam que algumas
No entanto, entendo que não são apenas algumas, mas, sim, muitas as empresas que
insatisfação.
$WHQGHUDQHFHVVLGDGHVDWUDYpVGDREVROHVFrQFLDSODQHMDGD"
passou a ser transitório, efêmero, fugaz. Segundo Churchill e Peper (2000, p. 42) essa
estratégia “ significa que a empresa construiu os produtos para que não durassem, pelo menos
não tanto quanto os compradores gostariam de usá-los” . Schewe e Smith (1982, p. 265, grifo
isso se dá o nome de obsolescência planejada que existe em quatro formas:” a técnica (quando
condições de realizar melhorias tecnológicas, mas não realiza tal introdução até que a
demanda pelos produtos existentes não decline, e os estoques não se esgotem); a física
(quando os produtos são feitos para durar apenas um tempo limitado) e a de estilo (quando a
A base para o uso desta estratégia está no desejo básico das pessoas de terem
alguma coisa nova. Para a maioria das pessoas a variedade e a mudança
parecem ser quase instintuais. A obsolescência planejada tem sido muito
criticada como estratégia – particularmente a obsolescência de estilo. Ela
parece propiciar a compra de produtos que na realidade não são necessários
no mercado. É como se os mercadizadores fossem os que mandam e ditam
as compras aos consumidores – o povo seguindo como um “ rebanho de
cordeirinhos” para comprar o que quer que os mercadizadores desejem que
comprem. Mas as críticas a esta posição têm encontrado alguns argumentos
de oposição. Os que defendem a obsolescência planejada indicam que o
comprador é uma pessoa com livre arbítrio que tem liberdade para tomar
decisões a respeito de seu comportamento de compra [...]. Além do mais a
variedade e a mudança proporcionam mais incrementos de satisfação. Ter
103
novos produtos torna as pessoas mais felizes. [...] [melhora] o padrão de vida
[...] Por isso, parece que a obsolescência planejada não é coisa assim tão má
– salvo se houver abuso por parte dos mercadodizadores. Quando são feitas
mudanças falsas ou inconseqüentes e as compras são induzidas sob falsa
representação. (SCHEWE e SMITH, 1982, p. 266-267).
essa a posição que defendo neste trabalho. Por outro lado, uma análise das quatro formas de
obsolescência apresentadas por Schewe e Smith (1982) indica que cada uma delas depende de
ações e do empenho de diferentes áreas de uma empresa, por exemplo, marketing e produção.
A intenção da direção de uma empresa brasileira fabricante de produtos da linha branca é uma
“ Logo no começo do meu estágio tive a oportunidade de participar de uma reunião em que estavam
presentes o diretor industrial, os engenheiros de produção, os projetistas e alguns diretores da
administração. Na verdade, tinha um monte de gente!
O desafio que a direção estava propondo era que a empresa desenvolvesse um novo refrigerador que
fosse diferente a ponto de ficar obsoleto em cinco anos [...].
Achei aquilo tudo muito maluco, não imaginava como isso seria possível. [...] Fiquei pensando
quantos anos tem o refrigerador da casa de minha mãe? E o da minha vó, então? [...] Porque a idéia
que tenho é que eles estão lá há muito mais tempo do que cinco anos. E bota mais tempo nisso! O da
minha vó deve ter quase a minha idade [...]”
Relato feito por Flávio, acadêmico do curso de Engenharia Mecânica, em maio de 2003.
Inicialmente, entendo que uma boa reflexão a ser feita sobre esse caso é: SRUTXHXP
FRQVXPLGRUQHFHVVLWDULDGHXPUHIULJHUDGRUTXHHPWmRFXUWRSHUtRGRGHWHPSRVHWRUQDVVH
REVROHWR" 3RU RXWUR ODGR TXH WLSR GH LQRYDomR SRGHULD DWHQGHU HVVH GHVDILR XPD QRYD
DFHVVyULRV QRYDV GLYLV}HV LQWHUQDV" Toda e qualquer inovação nesses termos parece não
“ máquina de fazer frio” . Nem mesmo uma nova campanha de comunicação com uma
mensagem daquelas “ Não é uma Brastemp!” poderia justiçar tal pretensão. 0DVVHULDHVVHXP
SURGXWRGHWHFQRORJLDWmRLQRYDGRUDHDRPHVPRWHPSRWmRHFRORJLFDPHQWHFRUUHWRDSRQWR
GH QmR FRQVXPLU HQHUJLD HOpWULFD" Porém, se isso não for possível “ um bom caminho para
104
atender às necessidades da empresa” pode ser a redução da vida útil dos principais
componentes do produto: como por exemplo: o compressor. De qualquer modo, seria uma
de diferentes áreas que fazem parte de uma empresa está na estratégia que vem sendo adotada
A cada seis meses as empresas lançam novos modelos de aparelhos, vários dos componentes desses
aparelhos são produzidos por empresas terceirizadas e localizadas na China. Depois de algum tempo
de uso, quando o produto começa a apresentar algum defeito o cliente muitas vezes não consegue
encontrar peças de reposição. Recentemente, um cliente precisou de dois circuitos integrados
“ micro” (responsável pelo armazenamento de informações como brilho, cor e contraste da televisão)
do modelo GL da Philips. Até bem pouco tempo atrás esse modelo era vendido no mercado. Depois
que lhe disse que o componente não era mais fabricado, o cliente entrou em contato por e-mail com
a empresa para saber o que poderia fazer. O cliente, muito indignado, me disse que a empresa lhe
informou que a peça não era mais fabricada, e junto com o e-mail de resposta enviou informações
sobre novos modelos de televisão da empresa.
O número de modelos e a “ vontade de vender” é tanta que as empresas estão desrespeitando o
código de defesa do consumidor que determina que as peças de reposição sejam fabricadas por até
cinco anos após o término da fabricação de um produto.
Além disso, os aparelhos avançaram em termos de recursos tecnológicos, mas perderam muito em
durabilidade. Alguém que tenha um aparelho com vinte anos de uso, se esse for bem cuidado, é
muito provável que ainda funcione, o mesmo não é possível dizer de um aparelho mais novo. Dentre
outras características, esses aparelhos não resistem às freqüentes variações de energia e tendem a
oxidar mais facilmente.
A verdade é que as empresas querem vender novos aparelhos. Está cada vez mais difícil prestar
serviços de assistência técnica nessa área, não vale nem a pena ser uma assistência autorizada.
Kotler e Armstrong (2003), fazendo referência ao fato de que nas últimas décadas as
empresas evoluíram para a qualidade definida pelo cliente e para sua satisfação total, dizem
que
Por outro lado, como diz Slater (2002, p. 15), “ na experiência cotidiana a cultura do
consumo vive num perpétuo ano zero de novidade, gira em torno da autocriação contínua por
meio da acessibilidade às coisas que são elas próprias apresentadas como novas, a última
Embora não pretenda desconsiderar a importância das melhorias técnicas e dos avanços
conceito” . Por essa razão, de um ano para o outro, alguns formadores de opinião dizem: “ essa
é a nova tendência” , “ agora não se usa mais...” , “ agora já é possível usar...” . 6HULDP HVVHV
DUJXPHQWRV IUXWRV GH SHVTXLVDV FRP RV FRQVXPLGRUHV RX FRQVXPLGRUDV" 2X HVWDULDP PDLV
O que ocorreu é que a produção estética hoje está integrada à produção das
mercadorias em geral: a urgência desvairada da economia em produzir novas
séries de produtos que cada vez mais pareçam novidades (de roupas a
aviões), com um ritmo de WXUQ RYHU cada vez maior, atribui uma posição e
uma função estrutural cada vez mais essenciais à inovação estética e ao
experimentalismo. [...] a nova era da cultura pós-moderna global, ainda que
americana, é expressão interna e superestrutural de uma nova era de
dominação, militar e econômica dos Estados Unidos sobre o resto do mundo:
nesse sentido, como durante toda a história de classes o avesso da cultura é
sangue, tortura, morte e terror. (JAMESON, 2000, p. 30-31).
2TXHKiGHQRYRDFDGDDQRQDQRYDFROHomRGD)yUXP"4XDORVHQWLGRGHD1LNH
ODQoDU D FDGD VHLV PHVHV XPD FROHomR LQILQGiYHO GH QRYRV PRGHORV GH WrQLV"2 TXH Ki GH
UHDOPHQWHQRYRDFDGDQRYDFROHomRDQXDOGHFDUURVGDLQG~VWULDDXWRPRELOtVWLFD"3RUTXHD
106
FDGD PRPHQWR VXUJHP FDQWRUHV H P~VLFDV TXH VmR LQFHVVDQWHPHQWH WRFDGRV H GLYXOJDGRV
SDUD QXP LQVWDQWH VHJXLQWH VXUJLUHP RXWURV TXH WDPEpP VHUmR WRFDGRV H ORJR DSyV
GHVFDUWDGRV SDUD QRYRV ³IHQ{PHQRV´ VXUJLUHP" Na verdade, tudo tem que ficar obsoleto,
tudo tem que ser descartado. As empresas (de vestuário, material esportivo, telefonia celular,
automóveis, entretenimento entre outras) trabalham dentro dessa urgência do novo que na
concepção do marketing é para atender a necessidades, mas que, no entanto, entendo que é
para a FRQVWUXomRGDLQVDWLVIDomR.
que se intensifica e tem determinado a modalidade dos discursos nos negócios na sociedade
sem limites. Sahlins (1979) chama o profissional de marketing de mercenário do símbolo que
não cria nada de novo, que tem como função ser sensível às correspondências latentes na
outro bom exemplo para caracterizar essa situação. O telefone celular constitui-se em uma
fabricantes de aparelhos de celular, são tantos que o celular se tornou um sucesso de vendas e
ao mesmo tempo de efemeridade, pois não basta ter um aparelho e realizar chamadas, é
preciso muito mais. A experiência de um vendedor que trabalha na área ilustra o que é esse
fenômeno:
“ Eu só trabalho com a venda de planos para pessoas jurídicas. Esse catálogo [de vendas] tem apenas
alguns modelos de aparelhos que fazem parte do plano empresarial. Não tenho a mínima idéia dos
recursos que a maioria desses aparelhos possui, só conheço os recursos daqueles que vendo mais,
assim mesmo...[risos] não conheço tudo. É muita coisa!!! É muita coisa!!!!
107
Só vendo plano empresarial, mas tenho lidado com o consumidor, porque o que as pessoas têm feito
muito é utilizarem o registro de uma empresa [por exemplo: uma padaria] para formarem um plano
[que tem duração de vinte quatro meses] e em conjunto reduzirem as tarifas. Costumo lembrar que
isso pode ser arriscado porque a responsabilidade da fatura mensal é do dono [proprietário da
empresa], se alguém não pagar as suas ligações.
Fico impressionado porque pessoas com pouca grana saem do celular de cartão e entram nesses
planos que não são nada baratos [algo em torno de R$ 45,00 mensais] e que terão de ser pagos
mensalmente, é assustador porque algumas pessoas ganham muito pouco [salário mínimo ou um
pouco mais]. A minha impressão é de que as pessoas se motivam porque os aparelhos acabam saindo
praticamente de graça em função do contrato de comodato que é criado. Pode deixar que quem tem
menos grana, menos condições, procura aparelhos mais sofisticados.
É muito interessante porque muitos acompanham os lançamentos das empresas e procuram comprar
os aparelhos que fazem ‘mais coisas’ , os ‘mais completos’ , mas percebo que no fundo não usarão
quase nada daquilo que o aparelho oferece. Esses dias um cliente me disse que precisava de um
celular diferente para impressionar as minas (sic) [mulheres], outro me disse que queria trocar o
celular, que possuía há seis meses, porque a tela não era colorida, embora não soubesse ainda usar
nem a metade das funções do aparelho atual .
Este é meu ganha pão e não posso falar mal dele [risos], mas celular é como um vício qualquer,
depois de ter não é fácil largar.”
empresas precisam criar vantagens competitivas temporárias, que derrubem as vantagens dos
nesse discurso estratégico, pois a empresa, ao tornar seus próprios produtos descartáveis,
efêmeros e passageiros, obriga a concorrência a fazer o mesmo para que não fique em
conjunta e decisiva, podendo as ações ser ou não integradas. Nesse processo de criação e de
destruição, muito provavelmente, a única coisa que fica e que deve ser preservada é o
produtos e hábitos de consumir por novos é, geralmente, iniciada pelo produtor, e não pelo
coisas que diferem em um aspecto ou outro daquelas que tinham o hábito de usar. Nesse
sentido, quero enfatizar que D REVROHVFrQFLD SODQHMDGD DWHQGH jV ³QHFHVVLGDGHV GDV
HPSUHVDV´HQmRjV³QHFHVVLGDGHVGRVFRQVXPLGRUHV´
108
$UHGXomRGHHPEDODJHQVFRPRHVWUDWpJLDGHVDWLVIDomR"
das lojas do varejo essas devem realizar inúmeras tarefas de vendas: desde atrair a atenção até
efetuar a venda. Churchill e Peper (2000) vêem a embalagem como um aspecto que
(diferenciação) frente aos produtos dos demais concorrentes. Os autores dizem que além dos
cuidados com os custos das embalagens os profissionais “ precisam responder aos desejos e
necessidades dos clientes” (CHURCHILL e PEPER, 2000, p. 276). Nesse sentido, entendo
que é relevante considerar um tipo de estratégia que tem sido bastante utilizada pelas
O PROCON de São Paulo identificou mudanças em: papel higiênico, caixa de sabão em pó,
embalagens de biscoitos, bebidas isotônicas, ceras em pasta, pão de forma, maionese, toalhas de
papel, requeijão, fraldas, extrato de tomate, sardinha em lata, desodorante, refil para aparelho de
barbear, xampu e rações para animais.
Círio Brasil, Conlexpress, Karambi, Procter & Gamble, Gessy Lever, Quaker Brasil, GDC Alimentos
alteraram [maquiaram] suas embalagens.
que ocupavam posição de destaque em suas categorias. Vieira F. (2003), baseado em uma
investigação empírica sobre esse mesmo acontecimento, relata que a redução de embalagens
(shrinking sizes) contrapõe frontalmente a idéia de que o consumidor é soberano nas relações
109
comerciais, como também contrapõe a idéia de que o mercado, por si só, é capaz de regular de
Nesse mesmo período, Prates (2001) constata que as embalagens dos medicamentos
menos unidades e oferta do produto com nova apresentação contendo maior quantidade,
porém com preço unitário de venda mais alto, redução na concentração do medicamento, sem
Medley, Pfizer, Glaxo Welcome, Libbs, Merck Sharp, Aché, e Searle. Durante o ano de 2005,
[...] dezesseis fabricantes, dentre eles Nestlé, Hewlett-Packard, Johnson & Johnson, Chocolates
Garoto, Procter & Gamble, Danone, Quaker e Unilever, foram multados pelo Departamento de
Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC) do Ministério da Justiça por terem reduzido a quantidade
de seus produtos sem informar aos consumidores.
De acordo com a Portaria número 81 do Ministério da Justiça, as alterações nas quantidades dos
produtos devem ser informadas pelos fabricantes pelo prazo mínimo de três meses, em mensagem
específica no painel principal da embalagem do produto, utilizando letras e cores destacadas.
Segundo, Antônio Carlos Fraquelli, economista da Fundação de Economia e Estatística (FEE), essa
tática vem sendo adotada no momento em que a inflação está crescendo, depois de três anos em
queda - de 12% em 2002, passou para 9%, em 2003 e 7%, no ano passado. Nesse contexto, os
fabricantes, ficam com pouca margem para reajustar os preços e acabam tomando medidas como
esta para evitar que os consumidores corram para os concorrentes. A tática, geralmente, é bem-
sucedida, já que as pessoas não têm o hábito de comparar o mesmo produto de um mesmo
fabricante.
Além das possíveis mudanças de marca de produto por parte dos consumidores,
entendo que um outro fato de fundamental importância que precisa ser enfatizado nesses
IDWRUGHFRQVWUXomRGDLQVDWLVIDomRRVFRQVXPLGRUHVVHWRUQDPYXOQHUiYHLVTXDQGRGDV
110
agora vai levar mais e pagar menos” ou “ pensando no bolso do nosso consumidor nós
resolvemos mudar para melhor” . 'H TXH IRUPD SRGHPRV LQWHUSUHWDU WDLV ³HVWUDWpJLDV´"
&RPR SRGHPRV SHUFHEHU D SUHRFXSDomR GHVVDV HPSUHVDV FRP DV QHFHVVLGDGHV GRV
FRQVXPLGRUHV"6HULDSHODTXDOLGDGHGHFRQIRUPLGDGHTXHWDLVSURGXWRVSRVVXHPTXHPXLWDV
GHVVDVHPSUHVDVVmROtGHUHVGHPHUFDGR"
No entanto, é preciso evidenciar que a realização desse tipo de estratégia não envolve
apenas a “ contribuição” do marketing, pois uma empresa, ao perceber que seus lucros estão
diminuindo, e que, provavelmente, os consumidores não desejam pagar mais pelo produto,
será necessária “ uma nova estratégia que atenda às necessidades dos consumidores” , nesse
indignados a ponto de rejeitarem seus produtos e marcas. Mas, esse caso me estimula a fazer
FRPSRUWDPHQWRDVVHUWLYRHIRVVHPEHPLQIRUPDGRVDVHPSUHVDVFRQWLQXDULDPDWHQGHQGRDV
VXDV QHFHVVLGDGHV GHVVD IRUPD" 6H RV FRQVXPLGRUHV QmR HVWLYHVVHP GLDQWH GR H[FHVVR GH
RSo}HV GH HVFROKD DV SRVVLELOLGDGHV GH ³VXFHVVR´ PHGLDQWH D DGRomR GH WDO ³HVWUDWpJLD´
VHULDPDVPHVPDV"
111
$VHVWUDWpJLDVGHSUHFLILFDomRDWHQGHPQHFHVVLGDGHV"
Kotler e Armstrong (2003, p. 263) afirmam que preço “ [...] é a soma de todos os
serviço” ; assim, o preço não diz respeito apenas ao desembolso financeiro do consumidor.
Dentre as HVWUDWpJLDV GH SUHoRV mencionadas por Kotler e Armstrong (2003) destaco as
preço psicológico para indicar que um produto possui qualidade superior. Como afirma
Beckwith (2001, p. 20), “ não é à toa que os vendedores experientes nunca sugerem que algo
tem preço baixo, quando querem passar a mensagem de que o serviço oferecido é excelente” ,
pois conforme Churchill e Peper (2000), o valor percebido é que determina quanto um cliente
está disposto a pagar por determinado produto e serviço. Cabe considerar que como o
uma situação vulnerável. Essa questão vou abordá-la posteriormente; por ora indago:
FRQVLGHUDQGRRSRGHUGRGLVFXUVRGDVHPSUHVDVSDUDDFRQVWUXomRGHVHQWLGRVDGHFLVmRGH
IL[DU XP SUHoR DOWR SDUD SDVVDU D LGpLD GH TXDOLGDGH p XPD IRUPD GH ³DWHQGHU jV
QHFHVVLGDGHV´GRFRQVXPLGRURXGDHPSUHVD"
referência. Nesse tipo de precificação, a empresa fixa um preço, por exemplo, de R$ 599,00
para que o consumidor perceba que o produto pertence a uma faixa de preço de “ quinhentos
DGRWDGD SRU HPSUHVDV YDUHMLVWDV EUDVLOHLUDV FRPR SRU H[HPSOR VXSHUPHUFDGRV ORMDV GH
VHGL]YROWDGDD³IDFLOLWDUDWURFD´"
112
varejista vende alguns produtos por preço abaixo ou quase igual ao custo, a fim de atrair
clientes, na espera de que eles comprem outros produtos também” . Os autores lembram que
os varejistas escolhem para esse tipo de estratégia aqueles produtos que atrairão muitos
consumidores e colocam esses produtos no fundo da loja, para que os consumidores passem e
comprem outros produtos de altas margens que estão ao longo da loja. Cabe ainda ressaltar
que alguns varejistas aproveitam para aumentar o preço de produtos que são complementares
àqueles que estão em promoção, como forma de compensar as perdas causadas pelo fato de
fabricantes quase sempre estabelecem um preço baixo para os produtos principais e margem
alta para os complementares” . É o caso das estratégias de preços das impressoras (produtos
principais) que são vendidas por um preço baixo (atrativo) para que a empresa obtenha um
ganho maior com a reposição do cartucho (produto cativo). (VVD HVWUDWpJLD SRGH VHU
FRQVLGHUDGDXPDHVWUDWpJLDSDUDSURSLFLDU³JDQKRVP~WXRV´RX³PDQWHUUHODFLRQDPHQWR´"
Por falar em relacionamento, o plano de tarifas para clientes leais de uma operadora
para atender aos interesses dos clientes que optassem pelo plano.
Semana passada tivemos uma reunião com a gerência [de marketing], sobre um novo plano de tarifas
que a empresa está implantando. O plano é para ligações interurbanas e é constituído de apenas três
tarifas para todo o Brasil: uma para o dia, uma para a noite, e outra para final de semana. Os clientes
para participarem do plano precisam ligar e se inscrever no programa “ Tarifa Reduzida” (nome
fictício).
Depois que o plano foi apresentado, um colega de empresa perguntou ao gerente como ficariam as
tarifas dos clientes que optassem pelo plano, mas que realizassem ligações interurbanas de curta
distância, pois o valor dessas tarifas era mais baixo, em qualquer turno e dia da semana, comparado
aos valores de qualquer uma das três tarifas do plano.
Sabe qual foi a resposta? “ O cliente é que vai ter que analisar isso e, daí, optar por uma outra
operadora [concorrente] para realizar uma ligação com tarifa mais baixa” . Meu colega voltou a
questioná-lo perguntando se não seria possível incluir uma nova tarifa. O gerente disse que não, pois
seria muito difícil operacionalizar essa mudança, principalmente, porque a empresa entendia que
seria mais fácil comunicar a idéia do plano com três tarifas.
113
$OJXQV PHVHV GHSRLV GHVVD FRQYHUVD HP XP RXWUR HQFRQWUR FRP $QGUp LQGDJXHL FRPR HVWDYD R
SODQRHOHPHGLVVHTXHQmRVDELDQDGDVREUHYROXPHGHDGHV}HVPDVPHUHODWRXRVHJXLQWH
“ Lembra daquela história sobre as tarifas interurbunas serem mais baixas que as tarifas do plano? O
que posso te dizer é que a empresa não está dando qualquer informação nas propagandas veiculadas
pela tv. O consumidor mais atento e com tempo disponível pode pegar as tarifas no site da empresa e
identificar o possível prejuízo que terá se fizer uma análise comparativa entre as tarifas que estão
disponíveis no site.
)DODQGRGHIRUPDLQGLJQDGD$QGUpPHGLVVH
Cara!! Os caras são muito f.d.p.
Relato feito por André, assistente de marketing de uma operadora de telefonia convencional.
que é uma grande empresa que está constantemente anunciando na mídia de massa, é razoável
pensar que a empresa poderia alertar seus clientes dos possíveis prejuízos que esses poderiam
ter caso realizassem ligações interurbanas de curta distância. Além disso, atitudes como essa
$7(/(9,62&202)$725'(352'8d2'(6(17,'26
sua presença em todos os países em que possam obter lucros, é previsível que as estratégias de
comunicação das marcas procurem criar uma cultura global. Como exemplo estão as
expressões da Levi’ s “ uma cultura de estilo mundial” ou da IBM “ soluções para um mundo
pequeno” (KLEIN, 2002, p. 19). No entanto, não são apenas as empresas que atuam em mais
de um país que buscam esse tipo de consolidação; tal condição se aplica também às empresas
que atuam em países de dimensões globais, como o Brasil, e que buscam aumentar sua
Por isso, os esforços de comunicação são voltados para criar símbolos e mercados
antes mesmo que os produtos e serviços cheguem às lojas. Como argumenta Baudrillard
(1991a, p. 97), fazendo referência aos objetos que estão em hipermercados, diz:“ [...] Os
objetos já não são mercadorias; já nem se quer são exatamente signos cujos sentidos e
mensagens decifrássemos e dos quais nos apoderássemos; são testes, são eles que nos
sem esquecer as corporações da mídia. Esse pode ser o clima em que se forma, impõe e
crianças, ricos e pobres. As pessoas que moram em aldeias pequenas, aparentemente remotas,
aparelhos de televisão ou de rádios portáteis, que as prendem à “ aldeia global” das novas
terceiro mundo, argumenta que o desejo de participar do novo mercado mundial determina
que
diz que não é difícil atribuir alguma espécie de papel plasmador à proliferação do uso da
televisão:
Entendo que essa posição é adequada para expressar o significado que a televisão
também tem no Brasil, que é um país de “ teledependentes” (para usar uma expressão de
116
Erausquin, Matilla e Vazquez, 1983), muito embora não desconsidere a importância do rádio,
já consolidado em todos os segmentos sociais, bem como da internet, que vem aumentando a
sua penetração na sociedade brasileira. Como refere Sodré (1984), desde a década de 1970 a
consumo do excedente econômico produzido na forma de bens e serviços de luxo, bem como
televisão no Brasil e estão em todas as regiões, como qualquer organização capitalista, em que
da comunicação, que podem ter, ou não, sido jornalistas. São organizações “ de comunicação
social” e, ao mesmo tempo, “ indústrias culturais” , pois buscam informar, formar, entreter,
ocupar, persuadir, manter, transformar seus telespectadores para que afinal alcancem seus
corporações, tanto daquelas que comandam como das que se beneficiam da mídia, são de
difícil análise e identificação. No entanto, existem evidências que podem ser observadas
mercado. Durante minhas observações pude perceber que a mesma televisão que, em
coleção de sapatos de uma famosa atriz), logo após, mostra-se surpresa e indignada com as
pessoas que não possuem as mínimas condições de alimentação (como a mãe que alimenta
Organização das Nações Unidas (ONU) contra a fome no mundo. Na sociedade pós-moderna,
plural, heterogênea, efêmera e contraditória não seria a televisão uma exceção a essa regra.
propagandas que ela exibe. Nesse sentido, apresento minha interpretação de como o discurso
símbolos e marcas. Faço isso com pequenos e sutis exemplos, frutos de minhas observações,
mas que, no meu entender, são significativos para defender minhas idéias.
$FRPXQLFDomRH[SOtFLWDHDFRPXQLFDomRLPSOtFLWD
demonstra especial preocupação com as influências de mercado, que cada vez mais
obtêm sucesso no que se refere à publicação de matérias contrárias às suas imagens, bem
como em relação à conquista de espaço para a veiculação de matérias que promovam seus
produtos e negócios.
demonstrar neutralidade, emitindo porém opinião sobre aquilo que é certo ou errado; ser
persuasivo e atrativo a ponto de dar audiência e atender aos interesses econômicos e políticos
e ainda conciliá-los com os interesses sociais. Com duas pequenas reportagens que foram
Em maio de 2003, a Rede Globo realizou uma reportagem em um de seus telejornais que
denunciava o valor exorbitante de R$ 20.000,00 que a viúva de um funcionário público recebia
mensalmente como pensão. Como forma de obter a opinião da pensionista, a reportagem foi até a
sua casa, mas a senhora negou-se a dar qualquer declaração e disse que seu filho é que poderia falar
em seu nome. A reportagem, após ter encontrado o filho da pensionista, perguntou a sua posição a
respeito do valor exorbitante da pensão que sua mãe recebia. Esse respondeu que a pensão estava
amparada legalmente e, por isso, considerava que a mesma era justa. Após a reportagem, o âncora
do telejornal, concluindo a matéria, fez um comentário sobre o fato, dizendo que o valor da pensão
era injusto e demonstrava a distorção das aposentadorias e pensões federais. Principalmente em
relação àquelas pagas aos demais trabalhadores da iniciativa privada. Tais distorções não poderiam
mais ocorrer para o bem do país.
Em junho de 2003, alguns dias depois, a emissora no mesmo telejornal exibe uma matéria sobre os
jogadores de futebol mais bem pagos do futebol mundial, A matéria mostrava que o jogador inglês
David Beckham - jogador do Manchester United e capitão da seleção inglesa - como o jogador de
futebol mais bem pago do mundo, com um rendimento anual de US$ 17 milhões. Na terceira
colocação aparecia o jogador Ronaldo, do Real Madrid e da seleção brasileira, com rendimentos de
US$ 13,2 milhões. Na lista dos 20 mais bem pagos apenas mais um outro brasileiro, Rivaldo, do
Milan e da seleção brasileira, com US$ 8,1 milhões anuais. Ao final da matéria o âncora do
telejornal faz um questionamento: Como Beckham pode ganhar muito mais do que Rivaldo? Afinal
o jogador brasileiro é melhor que o inglês, além de ter o título de campeão mundial de seleções,
título que o inglês não possui. Por fim, o jornalista diz: “ Rivaldo tem que melhorar o seu
marketing” .
O que motiva a equipe de edição de um mesmo jornal a ter posições tão antagônicas
DUHVSHLWRGRMRJDGRUIRVVHXPDSRVLomRSHVVRDOGRkQFRUDGRWHOHMRUQDOQmRWHQGRQHQKXPD
a questão. 6H R YDORU PHQVDO GD SHQVmR GD YL~YD p DOWR RX DEVXUGR R TXH GL]HU GRV
UHQGLPHQWRV GH XP MRJDGRUGHIXWHERO" Ah! O primeiro é “ dinheiro público” , que deve ser
bem gasto, e o segundo é da iniciativa privada, e ninguém tem nada a ver com isso. Essa
talvez seja uma justificativa para tal posição. Mas faço outras perguntas a respeito desse caso:
TXHP p R IXQFLRQiULR S~EOLFR IDOHFLGR" TXDLV VHUYLoRV RX GHVVHUYLoRV HVVH IXQFLRQiULR
SUHVWRX DR 3DtV" p XP GDTXHOHV ³KHUyLV GD SiWULD´ RX ³VtPERORV GD SiWULD´" TXHP p R
5LYDOGR"TXDLVRVVHUYLoRVTXHHOHSUHVWDRXSUHVWRXDR3DtV"TXDORPRWLYRGHXPDSHQVmR
GHYDORUWmRH[SUHVVLYRHPUHODomRjPpGLDGHVDOiULRVHSHQV}HVSDJDVQR%UDVLO"TXDOD
UD]mRGHXPMRJDGRUGHIXWHEROVHUWmRYDORUL]DGR"FRPTXDO³LPDJHP´pSRVVtYHOOXFUDUD
119
GR IXQFLRQiULR IDOHFLGR RX D GR 5LYDOGR" DV GXDV SHVVRDV SRGHP VHU FODVVLILFDGDV FRPR
³VtPERORV´³SHUVRQDJHQV´³SURGXWRV´"VHDOJXpPWHPLQWHUHVVHHPOXFUDUFRPDLPDJHP
GHDOJXPGRVGRLVTXHPVHULD"
Entendo que é ponderável dizer que não apenas o Rivaldo, mas os jogadores de
futebol são valorizados porque são importantes para os interesses das emissoras de televisão,
uma vez que dão audiência para inúmeros programas (telejornais, programas de esportes, de
entrevistas, jogos de futebol). Também, não é possível esquecer que as “ imagens de sucesso”
dos jogadores são vinculadas às imagens de uma série de empresas (materiais esportivos,
jogador torna-o uma “ personalidade” que faz jus a altos salários e cachês pagos pelas
empresas que inevitavelmente superdimensionam seus custos e, em parte por isso, e por outra,
pelo reforço de imagem que obtêm, estipulam preços de venda mais altos. Bem, mas de onde
vem o dinheiro que sustenta tudo isso? Vem do “ dinheiro do público” , espalhado pelo mundo
inteiro. Voltando ao funcionário falecido, não se sabe quem é; certamente, não é uma
“ celebridade” , já a pensionista não é nada mais do que uma provável telespectadora e alguém
que no momento em que a matéria foi ao ar, proporcionou insignificantes pontos na audiência
da emissora.
a outra é relacionada com a exibição de uma propaganda de televisão e uma série de pequenas
notícias.
Em abril de 2003, a reportagem de um telejornal da Rede Globo acompanhou por alguns dias a vida
de uma senhora aparentando ter bastante idade, que durante o dia pedia esmolas em um sinal de
120
trânsito da cidade de São Paulo e que fazia isso simulando ter algum problema físico que dificultava
a sua capacidade de locomoção. Durante alguns dias a equipe de reportagem acompanhou o trajeto
que a senhora fazia do local onde ela pedia esmolas até a sua casa, demonstrando que a mesma
conseguia caminhar perfeitamente. Em um desses dias a equipe conseguiu flagrar a senhora
chegando à sua casa. A repórter procurou fazer algumas perguntas para a senhora, como: “ a senhora
está caminhando normalmente, mas porque não caminha dessa forma enquanto permanece durante o
dia no sinal de trânsito? por que a senhora faz isso? a senhora acha certo enganar as pessoas? por sua
vez, a senhora não respondeu a nenhuma pergunta formulada e foi logo fechando o portão de sua
casa. Ao final da matéria, o âncora do telejornal fez uma crítica sobre o comportamento indesejável
dessa senhora, uma vez que, para pedir dinheiro, procurava sensibilizar as pessoas com um problema
que ela não tinha.
Essa mesma emissora, durante vários meses do ano, exibiu em sua programação uma propaganda da
empresa C & A, em que a modelo Gisele Bündchen aparece usando e recomendando as roupas da
empresa. Durante esse período de tempo, a emissora exibiu reportagens em vários de seus telejornais
sobre a “ melhor modelo do mundo” , onde essa aparecia desfilando para grifes famosas, chegando e
saindo do Brasil, passeando por pontos turísticos, namorando, etc.
apareceu pedindo esmolas e enganando as pessoas, mas é muito provável que seja em uma
situação bastante difícil e não invejável. A modelo, sabe-se, mesmo que seja de forma
imprecisa, que ganha milhões de dólares, tem fama mundial e é uma construção do
capitalismo que a torna referência para muitas jovens mulheres de todos os “ padrões
estéticos” , que gostariam de ser igual a ela e ganhar tanto quanto ela. O que não sabemos é se
ela usa a marca de roupa que, por ter ganhado muito dinheiro para fazer o comercial, diz usar.
*LVHOH%QGFKHQXVDUHDOPHQWHDTXHODVURXSDVGD& $MiTXHVXDLPDJHPpXWLOL]DGDSDUD
TXDQGR XWLOL]DUHP WDO PDUFD" (VVHV FDVRV VmR VHPHOKDQWHV" $V GXDV PXOKHUHV QmR HVWmR
H[HUFHQGRSDSpLVQDVRFLHGDGHHDPEDVDVVLWXDo}HVQmRVmRSDVVtYHLVGHFUtWLFDV"2VGRLV
SDSpLVVmRVRFLDOPHQWHDFHLWRVLQWHUHVVDQWHVjFXOWXUDGRFRQVXPRHDWHQGHPDRVLQWHUHVVHV
GDWHOHYLVmRHGRPDUNHWLQJGDVHPSUHVDV"
futebol, dá audiência quando aparece em programas da emissora, ajuda a vender as roupas das
marcas que divulga (chegando, inclusive, a receber UR\DOWLHV pela venda de produtos), como
121
também, das marcas pelas quais desfila e que são noticiadas em telejornais. O montante que é
pago a essas pessoas pode ser uma boa razão para que o mundo do marketing esteja sempre
“ quebrando o recorde mundial do último ano e planejando repetir a façanha no ano seguinte
com números cada vez maiores de peças publicitárias e novas e agressivas fórmulas para
2002, p. 32). Já a senhora proporcionou alguma audiência no horário em que a matéria foi
Não custa lembrar que “ todas as necessidades sociais são explicadas em termos do papel
televisão) que, depois de algum tempo aparecendo na mídia, tornam-se símbolos e passam a
anunciar produtos e serviços ou a ter um produto ou uma linha de produtos associados aos
seus nomes, sem que necessariamente haja uma correspondência direta com a sua área de
competência ou atuação. Assim, Xuxa pode ter seu nome associado a uma linha de calçados
infantis; Sandy e Júnior, um telefone celular associado ao nome da dupla; a modelo Ana
Hichman, a uma linha de óculos; a Hebe Camargo, a uma linha de jóias, etc. Os produtos
122
associados a tais “ personalidades” podem mais facilmente conquistar espaços nos pontos de
venda e até mesmo reduzir os esforços de venda nos respectivos pontos. O “ sucesso” de tais
estratégias pode ser explicado em virtude da autoridade que a mídia atribui a essas pessoas.
[...] uma diferença entre ter uma autoridade e ser uma autoridade. [...] Nas
sociedades mais primitivas, a autoridade é exercida pela pessoa em geral
reconhecida como competente para a função. [...] Quando desaparecem ou
enfraquecem as qualidades em que a autoridade repousa, a própria
autoridade acaba. [...] em sociedades baseadas numa ordem hierárquica e
muito maiores e mais complexas [...] a autoridade pela competência cede
lugar à autoridade pela posição social. [...] milhões de pessoas em nosso
sistema conhecem [uma autoridade] apenas pela imagem artificial criada
pelos especialistas em relações públicas [propaganda, marketing]. Na
maioria das sociedades maiores [...] ocorre o processo de alienação da
autoridade [...] Se a autoridade veste o uniforme adequado ou tem o título
adequado, este sinal externo de competência substitui a competência
YHUGDGHLUD e suas qualidades. [...] Quem use esses símbolos de autoridade e
quem se beneficiar deles deve iludir o pensamento crítico e realista de seu
povo e obrigá-lo a crer na ficção. Quem quer que pense sobre ela saberá das
maquiações da propaganda, os métodos pelos quais o julgamento crítico é
destruído [...] (FROMM, 1976, p.53-55, grifo meu).
“ celebridades” , que habitualmente estão na mídia, pode ser também estendida às pessoas que
desenvolvem atividades na sociedade e, pelo menos a princípio, não estão diretamente ligadas
mesmo que por uma ou duas semanas, é um fato bastante significativo para demonstrar o
poder da televisão para a construção de realidades. Além disso, essas pessoas, mesmo que por
curto espaço de tempo porque eles também são “ produtos” efêmeros e obsoletos, passam a
Uma outra questão que merece destaque se refere à forma pela qual a televisão
procura dar sentido àquilo que ela produz defendendo diretamente seus interesses e,
indiretamente, os interesses dos diversos atores que ela atende. As mensagens passadas
se nas propagandas veiculadas nos intervalos da programação (esse tipo de comunicação será
em formas bastante variadas. A ditadura do controle remoto (efeito ]DSSLQJ) que permite ao
possível perda de atratividade e força da propaganda tradicional pode ser um outro bom
motivo para tais iniciativas. Ries e Ries (2003) afirmavam que, em função do excesso de
comunicação eletrônica, a propaganda não possui mais o poder de criar novos conceitos, e
sim, de trabalhar sobre aquilo que já está posicionado na mente dos consumidores. Os autores
entendem que, em razão de a propaganda não ter mais eficácia e credibilidade para a
construção de marcas junto aos consumidores, a mídia espontânea e as relações públicas é que
são) dão a credibilidade necessária à mensagem anunciada. Um bom exemplo para esse tipo
Exemplo de mensagem apresentada pela Fininvest em sua campanha exibida no programa Domingão
do Faustão, da Rede Globo, no ano de 2004.
124
consumidor de uma empresa que pertence a um dos setores da economia que mais lucram no
Brasil: o setor financeiro. O exemplo de um empréstimo feito em uma agência dessa empresa
“ Fizemos um empréstimo de R$ 15,00 para uma senhora que somado à tarifa de abertura de crédito
de R$ 29,00, resultou em um valor de R$ 44,00 para ser pago em três vezes a juros de 12,9%. Mas,
ela não conseguiu pagar a dívida e em três meses o valor virou uma bola de neve. Se ela tivesse feito
o pagamento mínimo (R$ 10,00), a taxa de refinanciamento seria de 16,9%. No entanto, como nada
foi pago a taxa de refinanciamento foi de 14,9%; mais 14% de taxa por atraso; custo de cobrança de
R$ 2,00; juros de mora de 2,9%; e o custo de manutenção de conta R$ 3,00.
Essa história de crédito pré-aprovado, sem burocracia, que não precisa de documentação, só dá
problema para nós. A aprovação até acontece se o cliente já tiver comprado a crédito em uma das
lojas associadas, se não, para a aprovação do crédito o cliente precisa apresentar carteira de
identidade, cpf, comprovante de renda e de residência. Precisamos enrolar o cliente dizendo que não
foi possível aprovar o crédito por problema de escore, pois dizer que o crédito não foi aprovado em
função da pessoa trabalhar a pouco tempo ou não possuir referências bancárias ou compras a crédito,
pode caracterizar preconceito.”
de vendas de uma estratégia de comunicação desse tipo, mas não demonstra (de ambas as
“ dinheiro fácil” para a solução de problemas ou a aquisição de outros tantos bens e serviços
que a sociedade insatisfeita tem à disposição. Esse caso, mais uma vez, revela que não apenas
nos momentos da decisão na “ hora da verdade” (NORMANN, 1993) a fim de evitar tais
situações. Porém, é preciso enfatizar que esse tipo instituição pertence ao setor financeiro que
mundial (JAMESON, 2000; SANTOS, 2000c) não é possível esperar muita coisa em termos
Um outro banco anuncia: “ nenhum banco se preocupa tanto em cuidar que você
economize o seu dinheiro como o Unibanco” . Entretanto, esse mesmo banco tem como meta
“ Nossa meta é fazer oitenta empréstimos pra aposentados na agência. Não é mole, porque eu sei que
muitos não sabem nada sobre as taxas e os juros, e também vão fazer um baita sacrifício pra paga.
Eu preciso vender, mas quando eu estou sozinho, sem ninguém por perto, eu faço de tudo pra
mostrar o que tem ruim pra pessoa. Cara, só por favor não comenta isso pra ela [uma gerente do
banco que era aluna da universidade e defendia ferrenhamente a instituição].”
DLQGDPDLVSUHRFXSDQWHSRUTXHDLQGDp PDLVQDWXUDOVXWLOHVSRQWkQHDVXDYHSRGHQGR
LQFOXVLYH WHU XPD FRQRWDomR VXEOLPLQDU. Segundo Luce (informação oral), esse tipo de
programas exibidos em meios de comunicação estatais que não podiam ter propaganda paga;
mensagens e imagens sobre produtos, serviços, lugares, pessoas, idéias, estilos e marcas são
telejornais) as marcas de roupas que vestem porque são pagos para usá-las. Também não
4
Notas de aula da disciplina de Evolução do Pensamento em Marketing, ministrada pelo professor
Fernando Bins Luce, no curso de mestrado do PPGA/UFRGS, em 1987. Segundo Luce, o PHUFKDQGLVLQJ, de
tradição americana, refere-se a todas as atividades realizadas no ponto de venda (forma de exposição e
localização de produtos e preços nas gôndolas, técnicas e ferramentas promocionais) como apoio às demais
atividades promocionais da empresa.
126
tipo comunicação, o fato de que essas mensagens disfarçadas têm, por trás, os interesses de
um anunciante que está pagando por aquilo que está sendo dito e mostrado, e que, na forma de
notícia e de enredo, pode obter o tom de verdade necessário para alcançar os seus objetivos,
sem, é lógico, que o consumidor perceba e tenha a dimensão de como está sendo influenciado.
São discursos e imagens socializadoras que, em forma de consumo, dão sentido e orientação à
vida das pessoas, sem que as empresas tenham que dizer diretamente: compre.
“ Alguns anos atrás um amigo que tinha uma pequena fábrica de confecção de roupas no Rio de
Janeiro, me contou da sorte que teve quando por casualidade, em razão da amizade que fez com um
produtor de televisão, conseguiu que suas roupas fossem usadas por um personagem do ator Nuno
Leal Maia durante uma novela das sete da Rede Globo. Depois de alguns dias de pequenas aparições
da marca junto ao personagem da novela, a procura pela marca na loja começou a aumentar de
forma significativa, e as vendas explodiram no Rio de Janeiro.
As roupas eram as mesmas de sempre, nada havia mudado, mas as pessoas que já conheciam a loja e
até já tinham comprado roupas passaram a ter uma espécie de carinho ou maior atenção com a
marca.
Ele disse que foi um impulso e tanto pra fábrica, mas que não teve mais chance de fazer isso porque
é muita grana, naquela época as coisas eram diferentes [provavelmente, início dos anos 1990], e o
que ele tinha conseguido era, na verdade, um presente de amigo.”
Cabe lembrar que, além das roupas, os acessórios pessoais e para casa, as cores e
padrões de móveis fazem parte desse contexto e começam, muitas vezes, a aparecer na
televisão antes de os produtos chegarem às lojas. A televisão é uma ótima oportunidade para
indicar as tendências que os “ produtores de conceitos” (SLATER, 2002) criaram para manter
RLWRDVPXOKHUHVYROWDUDPDXVDU´RX³DJRUDpVyRTXHDSDUHFHQDQRYHOD´" Depois de as
pessoas perceberem tais tendências é momento de começarem a pensar que aquilo que elas
Em outro sentido, D FRPXQLFDomR HP IRUPD GH QRWtFLD SRGH GDU D FUHGLELOLGDGH
p. 496) descrevem que a “ 3XEOLFLGDGHé a comunicação vista como não paga de informações
127
sobre a organização ou produto, geralmente por alguma forma de mídia [...]. Uma vez que é
vista como não paga por ser veiculada pela mídia como notícia, a publicidade geralmente goza
imprescindíveis, pois, do mesmo modo que a publicidade eficaz pode melhorar muito a
imagem e aumentar as vendas de uma companhia, a publicidade negativa pode causar sérios
“ Quando comecei a pizzaria fiz algumas propagandas na televisão e no rádio, mas não deram muito
resultado, pois o movimento de clientes na casa continuava pequeno. Continuei insistindo com
propaganda no rádio, porque o dinheiro era curto.
Sem muito resultado contei minha situação para um amigo que trabalha na assessoria de
comunicação de uma grande empresa do ramo de bebidas. Logo recebi uma orientação simples e que
faz parte da estratégia de qualquer empresa que possui uma boa assessoria de imprensa. Ele me
orientou que eu não tirasse o comercial da rádio, mas que conseguisse algumas matérias que
falassem da minha pizzaria. Ele me deu algumas dicas, e resolvi procurar um jornal local, onde fiz
um contrato de propaganda com o jornal e um contrato de “ relações públicas” com o colunista social
do jornal.
Coloquei um anúncio da pizzaria três vezes por semana no jornal. Acertei com o colunista para que o
mesmo passasse a freqüentar de graça a pizzaria e junto levasse seus amigos e pessoas de suas
relações. Esse, posteriormente, noticiava em sua coluna suas idas a casa, elogiava a comida, o
ambiente etc. Cada vez que ele fazia isso, eu pagava pelo espaço que ocupava em sua coluna.
Pouco tempo depois era comum ver as pessoas que circulavam em sua coluna, e outras tantas que
gostariam de circular ou ao menos conhecer a pizzaria que passou a ser badalada na cidade.
Acho que, se não fosse assim teria que ter investido muito dinheiro em propaganda, coisa que eu não
tinha, ou teria fechado sem que as pessoas conhecessem a minha pizza, que é muito boa!”
duas empresas pequenas e de poucos recursos. É de se imaginar o que pode ser feito nesse
sentido por iniciativa dos grandes anunciantes da televisão no Brasil. Por exemplo, existem
programas na televisão brasileira (apresentados por pessoas como Amauri Jr., Otávio
Mesquita, Goulard de Andrade, Dória Jr.) que mostram inúmeras atividades de empresas
esportistas), visitam locais turísticos e etc. Normalmente, são matérias pagas, mas que
aparecem em forma de reportagens do programa, mas sem que isso seja revelado ao
128
daquilo que está sendo dito. 4XDO PDWpULD SDJD DSUHVHQWDULD D QmR VHU SRU GHVFXLGR
PHQVDJHQVHLPDJHQVGRVDVSHFWRVQHJDWLYRVGHXPDHPSUHVDSURGXWRRXSHVVRD"
$FRPXQLFDomRGDWHOHYLVmRUHYHODVHDLQGDPDLVSRGHURVDQRPRPHQWRHPTXH
quando apostam em um grupo ou pessoa, desenvolvem uma série de estratégias que inclui a
criação do nome, escolha do figurino e do gestual, passa pela escolha do repertório, definição
nos pontos de venda, etc. Esse conjunto de ações configura a chamada comunicação integrada
consumadas de forma plural e fragmentada, com a venda de cds originais, cds piratas ou
reproduções em PS, atendendo assim aos diversos segmentos de renda que compõem a
sociedade brasileira.
(significando qualquer transformação de recursos de LQSXW para produzir bens e serviços para
PDWHULDOL]DomRGHWXGRTXHIRLDQWHULRUPHQWHGHVFULWRHPIRUPDGHFRPXQLFDomR.
129
Por fim, é importante enfatizar que não acredito no fato de que toda a comunicação
da televisão tenha em si uma estratégia deliberada, e muito menos que tudo que apareça seja
mediante um acordo previamente estabelecido, mas entendo que “ [...] a mídia não é apenas
um meio poderoso de criar e fazer circular conteúdos simbólicos, mas possui um poder
espaços de interação propiciando novas configurações aos esforços de produção dos sentidos”
$SURSDJDQGDQDWHOHYLVmR
2000, p. 472). 2V GLVFXUVRV DV LPDJHQV H RV VtPERORV FULDGRV QDV SURSDJDQGDVVHPSUH
ferramenta de comunicação, informação, lembrança e persuasão tem sido acusada pelo fato de
ao mesmo tempo em que presta informações importantes, não retrata o que efetivamente
mensagem publicitária cria e exibe um mundo perfeito e ideal, sem fome, guerras,
deterioração ou subdesenvolvimento. Tudo são luzes, calor e encanto, numa beleza perfeita e
carros com prudência e cuidado, não abusarem da velocidade e não dirigirem depois de
ingerir bebida de álcool. Por outro lado, a indústria automobilística produz carros com
motores de elevada potência, que alcançam altíssima velocidade em poucos segundos. Esses
carros são feitos para circular em cidades e estradas que têm limite de velocidade muito
abaixo daqueles que os carros podem alcançar em um país que briga há muito tempo para a
redução do número de acidentes de trânsito. Não bastasse isso, além da imagem de sucesso
Um automóvel roda por uma rodovia que possui, ao longo de suas laterais, uma série de cataventos
girando; em dado momento o automóvel breca bruscamente para que alguns patos possam cruzar a
estrada. Nesse instante todos os cataventos param de girar e só voltam a se movimentar depois que o
automóvel retoma a sua velocidade, indicando que o poder do motor e a velocidade do carro é que
provocavam o movimento dos cataventos.
Entendo que sob o ponto de vista estético, o comercial é muito bonito e ilustra
perfeitamente a idéia da potência do automóvel, mas, sob o ponto de vista social, o apelo à
velocidade pode ser questionado. Como o Brasil é um país que constantemente revela ao
mundo grandes pilotos de automobilismo, talvez seja uma atribuição das empresas do ramo
131
automobilístico alimentar através da comunicação dos automóveis o ego dos pilotos amadores
que podem se imaginar disputando uma corrida a cada momento que seguram o volante de um
automóvel.
e a propaganda de televisão também tem sido utilizada para fazer um alerta sobre essa
questão. A propaganda revela os perigos das drogas para a saúde, além de evidenciar que elas
estão associadas à violência, o que é observado em discursos como: “ cada vez que uma
pessoa fuma um baseado está apoiando o temível tráfico de drogas, que mata. Isso é
horrível!” . No entanto, o álcool que também é uma droga, mas é legal, aparece em
As propagandas das diversas marcas de cerveja que existem no Brasil são exemplos da
situação descrita. É verdade que ao final de cada anúncio, por uma imposição legal, existe
uma recomendação para que as pessoas consumam moderadamente. Por isso, além das
propagandas, essas empresas patrocinam eventos musicais e esportivos, e festas populares que
Além das campanhas de comunicação, a chamada “ força de vendas” tem um papel importante
direta com uma mensagem comunicando que o ‘papai’ estava participando de uma gincana na
empresa e que, por isso, deveria ser incentivado a vender bastante, pois caso atingisse os pontos
necessários (o volume de vendas estipulado) o filho ganharia um belo presente [...]
Outra prática da empresa são os “ convites” para que os vendedores participem das “ chopadas” para
comemorar os resultados de vendas. Na verdade não são convites, são convocações porque pega
muito mal não ir, embora sejam realizadas fora do horário de expediente.”
Relato feito por Miguel, promotor de vendas de uma empresa de bebidas, em janeiro de 2003.
Essas técnicas podem ser efetivas para que a empresa alcance seus resultados de
vendas, mas são questionáveis sob o ponto de vista social. A televisão tem, veementemente e
de forma compreensível, divulgado que jovens e crianças têm sido aliciados pelo tráfico de
drogas. Mas entendo que o exemplo de estratégias de motivação dessa empresa de cerveja é
também uma forma de aliciamento indesejável e preocupante, mas que, no discurso de uma
empresa que vende droga legalizada recebe o nome de estratégia de motivação de vendas.
(VVDV WpFQLFDV QmR SRGHULDP UHFHEHU R QRPH GH WpFQLFDV SDUD PDQWHU D IRUoD GH YHQGD
LQVDWLVIHLWD"
$,0$*(0'$60$5&$6($,',27,=$d2'26(5+80$12
$PtGLDpXPDIRUWHDOLDGDGDVHPSUHVDVSDUDRGHVHQYROYLPHQWRGHPDUFDV. Os
profissionais de marketing sabem que muitas vezes é a imagem que determina se uma troca
será efetivada (FIRAT, DHOLAKIA e VENKATESH, 1995), uma vez que os consumidores
não desenvolvem lealdade às marcas em si, mas, sim, aos símbolos e às imagens que são
diferenciadora dos profissionais de marketing é sua habilidade para criar, manter, proteger e
enriquecer marcas. A American Marketing Association define uma marca da seguinte forma:
marca é um nome, termo, sinal, símbolo ou combinação dos mesmos, que tem o propósito de
133
concorrentes” .
cooptação dos estilos de vida com integração social – tudo dentro de uma lógica mercantil,
em que somos valorizados pelas marcas que temos e usamos. Segundo Pietrocola (1986), as
diferenças que se acentuam entre classes, consumo e cultura são encobertas pelos símbolos e
imagens fantásticas e otimistas de poder e prestígio incorporados a cada objeto que o homem
KXPDQR O estudo da autora revela que a lógica das empresas é não gastar seus recursos
morrerão. A estratégia é, sim, concentrar seus recursos em aspectos que ajudarão a construir
gestão de marcas (EUDQGLQJ) que as empresas têm obtido sucesso. Considero que um bom
exemplo para ilustrar o que a autora chama de idiotização do ser humano é o clássico e
premiado anúncio “ The Sculptor” da Peugeot, criado na Itália e veiculado no Brasil em 2002.
Um jovem pobre, indiano e insatisfeito com seu velho veículo, inicialmente, vem em velocidade e
bate com a frente de seu carro em um muro, depois dá marcha à ré e amassa a traseira também. As
pessoas que passam na rua ficam espantadas e sem entender o que está ocorrendo. A seguir, aparece
um elefante sentando no capô do seu carro. Na seqüência, o jovem resolve dar umas marteladas no
carro. O telespectador fica sem entender a loucura do jovem indiano até que esse olha a foto do
Peugeot 206 em uma banca de revista e compara com seu carro, agora transformado em um 206.
Então, o jovem sai com seus amigos para dar uma volta de carro e desperta a atenção de todos que
passam na rua. Para finalizar, a mensagem: “ Peugeot 206. Irresistível” .
134
como textos, não são estáveis, mas admitem mais de uma interpretação (McQUARRIE e
MICK 1992; SCOTT, 1990), minha leitura dessa mensagem é de que, com bom humor, para
um jovem do terceiro mundo que, não possui condições de adquirir o produto original, o que
“ parecer” . Esse é um sinal do porquê as pessoas muitas vezes compram produtos que são
empresas procuram racionalizar recursos e esforços em atividades que lhes dêem melhores
resultados. Assim, não apenas as chamadas marcas próprias (ou de distribuidores) como
Segundo Klein (2002), as marcas é que estão absorvendo todo o valor agregado,
fazendo com que um produto atinja margens próximas a 400% entre os custos de fabricação e
religiosas, o indivíduo volta-se para objetos e serviços, ou seja, o sistema de consumo passa a
ser central na sua existência e no processo de criação de sua identidade. As marcas passam a
preencher um espaço antes ocupado por outras instituições. De forma semelhante à concepção
de Klein, minha preocupação, além, é claro, da forma como as imagens de marcas têm sido
135
construídas, é com o preço que o consumidor paga ao adquirir uma marca. O relato de um
“ Meu pai estava fazendo aniversário e fui comprar um presente para ele. Não tinha a menor idéia do
que dar. Encontrei uma camisa pólo Lacoste que estava em promoção por R$ 119,00, cheguei até a
pensar em dar a camisa, mas depois pensei melhor e desisti, porque vi que era um absurdo comprar
um produto com preço tão alto tendo em vista o custo de produção” .
O custo total de produção de uma camiseta pólo em fio cardado, que nós fabricamos, é de R$ 24,15,
desse total R$ 5,24 são de despesas comerciais. No varejo o nosso produto é vendido por volta de R$
38,00. Podes acreditar que a qualidade de processo é a mesma entre a camisa que produzimos e a
camisa Lacoste.
Pensei: por que deveria pagar todo esse dinheiro a mais? pra dizer que gosto do meu pai?
Depois fiquei pensando, como conheço o processo de fabricação, é claro, como que uma empresa
pode ganhar tanto dinheiro por colocar um jacarezinho bordado em uma camisa.
A gente tem que dar mais valor ao dinheiro que ganha!!!”
Relato feito por Paulo, Gerente de Engenharia de Produto Têxtil de uma empresa de confecções de
Santa Catarina.
Assim, não é por outro motivo, senão pela imagem de marca, que muitas vezes
encontramos o mesmo produto com a mesma qualidade de conformidade, mas com preços tão
diferenciados. $GHVPDWHULDOL]DomRGDVFRLVDVWHPXPLPSDFWRSURIXQGRVREUHDYLGDGH
XPDVRFLHGDGHHPTXHRVVHUHVKXPDQRVVmRYDORUL]DGRVSHORVVtPERORVTXHRVWHQWDPDR
YHVWLUDRFRPHUDRDQGDU
Entendo que não é apenas dessa forma que podemos interpretar o processo de
idiotização a que os consumidores estão submetidos pelas marcas. Como forma de atender ao
diferentes segmentos de mercados” , as empresas podem optar por ter marcas diferentes, e não
por produzir produtos diferentes, o que certamente representa uma vantagem em termos de
136
adotada por uma empresa de compota de pêssego é um indicativo dessa forma de atuação:
“ Fomos obrigados, para não perder o Carrefur, a criar duas marcas de compota de pêssego. Esse tipo
de empresa, normalmente, alega que o cliente quer variedade de produtos nas gôndolas, mas eles não
querem muitos fornecedores para um mesmo produto. Por isso, exigiram que a empresa tivesse mais
de uma marca.
Nossas duas marcas são vendidas por preços diferentes no varejo para que o cliente possa optar por
um produto de mais ou menos qualidade, mas na verdade o produto que sai aqui da fábrica é o
mesmo, o que muda é a marca, o rótulo e depois o preço.
Essa exigência deles acabou sendo importante para a nossa empresa, porque agora temos mais poder
de barganha junto a outros supermercados.
Relato feito por um funcionário de uma empresa de compotas da cidade de Pelotas.
Esse tipo de artificialidade é difícil de ser captada pelo consumidor. Nesse caso
específico, o consumidor poderia, ao ler o rótulo, identificar que as marcas são de uma mesma
empresa, mas não teria como julgar se os produtos vendidos apresentam qualidades
diferenciadas. O varejo brasileiro está repleto de exemplos semelhantes a esse, não apenas no
setor de alimentação (pão de forma, café, enlatados), mas também no setor de confecção
algodão, gaze), etc. Assim, produtos (terceirizados ou não) podem ser produzidos por uma
única empresa, utilizando a mesma tecnologia, a mesma matéria-prima, mas terem marcas e
GH HVFROKD PXLWDV YH]HV QmR SDVVDP GH DUPDGLOKDV H WUXTXHV SDUD ³VDWLVID]HU R
FRQVXPLGRU´
Uma outra questão que entendo deva ser evidenciada diz respeito à ³FULDomR GH
produção e a comercialização dos bens não dizem respeito apenas à lógica utilitarista, mas,
sim, à lógica do significado e, nesse sentido, a função simbólica, e não apenas a função
prática, é o que importa. É a separação do objeto de sua função. Casotti (1988) afirma:
[...] quando as coisas, os signos, as ações são liberadas de suas idéias, de seu
conteúdo, de sua essência, de seu valor, de sua referência, de sua origem e de
sua finalidade, entram então numa auto-reprodução ao infinito. As coisas
continuam a funcionar ao passo que as idéias delas já desapareceram há
muito. Continuam a funcionar numa indiferença total a seu próprio
conteúdo. E o paradoxo é que elas funcionam melhor ainda.
(BAUDRILLARD, 2002, p. 12).
Por isso, o sucesso de mercado de bens e serviços não está apenas vinculado à
John Lucáks, “ no mundo moderno a produção do consumo se torna mais importante do que o
consumo da produção” (LUCÁKS DSXG CAMPBELL, 2001, p. 57). Entendo que essa frase
continua mais atual do que nunca, porém, voltando aos argumentos de Heller (1998), são
necessários novos valores críticos e opostos ao sentido do valor de troca, em que o valor de
ser profundamente alterada, ou seja, aquilo que Gianesi e Corrêa (1996) chamam de serviço
explícito (a razão principal do serviço) pode passar a ser o serviço implícito (considerado o
benefício psicológico ou acessório do serviço) e esse passar a ser o serviço explícito, ou, em
que Slater (2002) percebe a função de marketing não mais como uma função secundária em
relação à produção. Mais uma vez, o fenômeno da telefonia celular pode ser um bom exemplo
para ilustrar essa questão, uma vez que, principalmente entre as crianças e os adolescentes, é
também, serve para a comunicação. O que de certo modo não seria problema se essas pessoas
tivessem renda suficiente para adquirir os aparelhos e pagar as tarifas de serviços que são
&216,'(5$d®(6),1$,6'$5()/(;2
Em termos de Brasil, lá se vão mais de vinte anos que foi publicada a primeira edição
do livro “ Marketing no Brasil não é fácil” , escrito em 1981 por Penteado Filho. O tempo
passou, duas das condições que na visão do autor justificavam a expressão irônica “ não é
fácil” , estão bastante diferentes. Primeira: não temos mais as reservas de mercado, tão
impeditivas para o sucesso do marketing de acordo com Penteado Filho (1981), pois, para que
a área pudesse representar seu papel no país, seria necessária uma economia que permitisse a
Outra condição descrita pelo autor não mudou no decorrer desse período: a generosidade da
profissão que aceita pessoas das mais variadas formações. Na época o autor mencionava uma
Filho (1981) lembrava também “ o que não é marketing” , como por exemplo:
[...] botar ar dentro do tubo de pasta de dente, nem juntar uma maçã podre a
onze maçãs mais ou menos e cobrir tudo com VKULQNSDFN, para vender no
supermercado, nem fabricar um sabonete cujo perfume acaba na primeira
lavada [...], lançar um produto com uma forma e ir modificando tudo aos
pouquinhos, para o consumidor não perceber, tornando a fórmula mais
barata para a fábrica e o produto mais ordinário [...] não é mudar a lanterna
de um carro antigo e anunciar uma linha nova. [...] Os bancos e as
financeiras devem saber que nem seu Marketing nem sua imagem são
promovidos colocando os estagiários e os aprendizes, no primeiro dia de
trabalho, lidando com o público e que é feio e inconveniente anunciar que os
clientes vão ganhar com títulos de renda fixa que rendem muito menos que a
taxa de inflação. (PENTEADO FILHO, 1981, p. 36-37).
Quero ressaltar que essa obra não é um clássico da literatura de marketing, mas seu
título é sugestivo e, embora tantos anos tenham se passado e muita coisa tenha mudado, as
situações que o autor menciona serem exemplos “ do que não é marketing” permanecem no
marketing brasileiro, pois as manipulações, truques e desrespeitos que evidenciei nesta seção
permanecem os mesmos. E são as grandes empresas pertencentes aos mais diversos ramos da
economia, inclusive da comunicação de massa que atuam dessa forma. Tal condição não é
nada indicada, além de ser inquietante para uma área que se diz preocupada com as
Por outro lado, as “ realizações” do marketing não são efetivadas isoladamente, e, dentre
outras funções que fazem parte desse processo, está a área de produção.
140
Dentre várias citações que fiz nesta seção, muitas se referem à obra de Philip Kotler.
assim como é o discurso de outros autores, porque o marketing é a pura contradição, já que
por ser tão amplo e por ter que atender aos interesses das empresas como: retorno em vendas,
Uma análise de suas ações permite constatar que elas invariavelmente subvertem princípios
consumidor neste contexto, embora já tenha feito breves referências a esse respeito ao longo
desta seção. Pois, se o sentido de tudo é o consumidor, não é possível analisar o discurso do
marketing que a mim são visíveis; outras tantas, e provavelmente até mais interessantes que
essas que apontei, posso tê-las deixado de fora. Também entendo que o conteúdo deste
sociedade pós-moderna de dados. Assim como utilizei na seção anterior o termo “ sociedade
distintiva e poderosa do capitalismo tardio (JAMESON, 2000), faço o mesmo nesta seção ao
propor o termo “ sociedade pós-moderna de dados” . Criei esse termo para fazer um
informação” , pois entendo que o ser humano em muitas situações da vida tem na verdade
muitos dados a sua disposição. Condição que o torna vulnerável em relação à inúmeras
circunstâncias de seu dia-a-dia, como é o caso das relações de consumo. Nesse sentido,
vez mais exigente” . Essa idéia é composta de dez aspectos: a prontidão para viver um
2&21680,'25&217(0325Æ1(2
moderna trouxeram grandes mudanças para a vida dos seres humanos. Além do H[FHVVRGH
LQIRUPDomR traço dos tempos pós-modernos que se manifesta em todas as instâncias da vida,
outros elementos são importantes para que se possa analisar o consumidor atual. Para
parece ser aquela que melhor define o consumidor contemporâneo. Thomas (1997) argumenta
que a fragmentação tem ligação direta com as mudanças tecnológicas sem precedentes que
argumenta que outra marca pós-moderna é a KLSHUUHDOLGDGH essa sugere que como seres
humanos construímos nossas próprias realidades e que essas são produto de nossas
não fazê-lo [...]” (SLATER, 2000, p. 12). A pesquisa sobre o comportamento do consumidor
com vistas a obter informações que propiciem generalizações e criação de leis universais.
ampliada. Lengler, Vieria e Fachin (2000) argumentam que os seres humanos são por demais
$SURQWLGmRSDUDYLYHUXPSUHVHQWHSHUSpWXR
Tonelli (2000) destaca que nas últimas décadas o modelo de casamento duradouro,
que foi marca das relações entre casais até meados da década de 1970, combinava
perfeitamente com o ideal de emprego para a vida toda. A partir da década de 1980, quando a
sociedade começa a se caracterizar pela fugacidade e pela incerteza, ambos começam a ser
feitos para não mais durar para sempre. Sennett (2003) descreve que a ênfase na flexibilidade
vem mudando o significado do trabalho e o sentido de carreira, que não mais representam
uma estrada reta devido às constantes trocas de trabalho que o ser humano é obrigado a fazer.
com que as pessoas tenham que mudar de cidade, estado, região ou país. Canclini (1999)
lembra que os seres humanos sempre mudaram de local, mas as mudanças atuais são
diferentes das de outros períodos da civilização, que eram mais definitivas; hoje as trocas,
além de mais freqüentes, caracterizam-se pelo ir e vir permanente. Esse conjunto de aspectos
torna as relações humanas frágeis e fragmentadas e deixa o ser humano inseguro em relação
passam por experiências dessa natureza, pois são filhos de casamentos terminados, já viram
disso e, em parte como conseqüência dessas mudanças, alguns residem não apenas com seus
pais e irmãos, mas com uma “ surperfamília” : primos, tios e avós. Nesse tipo de configuração,
consumo? Isso sem contar que alguns recebem o apoio financeiro de familiares que não
residem em seus mesmos lares. Apresento no quadro II uma caracterização de cada um dos
quinze adolescentes que participaram da pesquisa e uma interpretação sobre seu potencial de
distorções existentes, serve de guia para o entendimento das demais considerações que estão
ao longo desta seção. Como forma de preservar a individualidade dos jovens optei por omitir
suas identidades e adoto apenas uma sigla como pseudônimo para cada um deles. Por outro
lado, como forma de facilitar a leitura e a interpretação do texto adotei quatro cores que
representam o potencial de consumo: azul (alto), verde (médio), laranja (baixo), e vermelha
(muito baixo/nenhum). No texto essas cores aparecem a cada posição ou relato dos
adolescentes.
com o que “ está sendo” do que com o que “ se tornará” , mais com a “ retrospectiva” do que
com “ perspectiva” . Nesse sentido, os jovens afirmam que o estudo é a sua maior preocupação,
até mesmo aqueles que não estão estudando. No entanto, a ênfase é em “ passar de ano” , e
“ Vou pro colégio, estudar não estudo [...] [somente estudo] quando tem uma prova difícil, se não me
f... [...].” (/2)
“ [...] [me preocupo] em passar, pra futuramente fazer um vestibular, depois fazer um curso e
trabalhar.” (/')
145
4XDGUR,,±&DUDFWHUL]DomRHSRWHQFLDOGHFRQVXPRGRVDGROHVFHQWHV
3RWHQFLDO
&DUDFWHUL]DomR GH
FRQVXPR
9,, 15 anos, cursa o 1º ano do 2º grau em uma escola estadual, mora com seu pai,
(empresário), sua mãe (do lar) e dois irmãos mais velhos em uma casa nova e bastante $OWR
confortável, localizada em um bairro central da cidade. Tem à disposição uma suíte com tv
a cabo e som. Possui em casa computador e internet. Utiliza motos e carros.
/2, 15 anos, cursa o 2º ano do 2º grau em uma escola particular, mora com seu pai
(produtor rural aposentado), sua mãe (do lar), e dois irmãos mais velhos em um
apartamento de três quartos, localizado em um bairro central. Conta com familiares que lhe
dão apoio financeiro. Divide o quarto com o irmão, onde há tv a cabo e som. Em casa tem
computador e internet.
/1, 14 anos, cursa a 6ª série do 1º grau em uma escola estadual, mora com seu pai,
(desempregado), avó (professora aposentada) e a tia (secretária de gabinete aposentada) em
uma casa confortável e localizada em um balneário. Possui em seu quarto tv, computador e
internet. 0pGLR
:0, 14 anos, cursa o 1ª ano do 2º grau em uma escola federal, mora com seu pai (gerente
de um posto de gasolina) e sua mãe (atendente de uma sorveteria) em uma boa casa
localizada em um balneário. Possui em seu quarto tv, computador e internet.
21, 16 anos, cursa o 2º ano do 2º grau em uma escola particular, é órfão de pai, mora em
uma casa modesta com sua mãe (funcionária pública), avó, tio, tia e prima em casa de três
quartos localizada em um bairro de classe média. Possui em casa computador e internet.
*%, 14 anos, cursa o 1ª ano do 2º grau de uma escola estadual, mora em uma casa junto
com sua mãe, que é aposentada por invalidez, em um bairro de classe média baixa. Seus
pais são separados, e seu pai é funcionário público aposentado.
)/, 15 anos, cursa o 1ª ano do 2º grau em uma escola federal, mora com sua mãe
(professora municipal) em um apartamento localizado em um bairro de classe média baixa.
Seus pais são separados, mas mantêm um bom relacionamento. Conta com familiares que
lhe dão apoio financeiro. Possui em seu quarto tv, computador e internet.
$/, 15 anos, cursa o 1ª ano do 2º grau em uma escola estadual. Órfão de mãe, mora com
seu pai, funcionário municipal, e seu avô, aposentado, em uma casa antiga com móveis
velhos, em péssimo estado de conservação, localizada em um bairro de classe média baixa.
Possui em seu quarto um computador.
7*, 14 anos, cursa o 1ª ano do 2º grau em uma escola federal, mora em uma casa modesta
com seu pai, porteiro, sua avó e um irmão, em um bairro de classe média baixa. Possui em %DL[R
seu quarto computador e internet.
'8, 15 anos, cursa a 7ª série do 1º grau em uma escola estadual, mora com seu pai
(proprietário de um bar), sua mãe (secretária em um consultório médico) e duas irmãs em
uma casa construída nos fundos do terreno da casa em que reside sua avó, localizada em
um bairro de classe média baixa. Divide um pequeno quarto com uma das irmãs.
%,, 16 anos, parou os estudos na 6ª série do 1º grau e não trabalha, mora com sua mãe
(auxiliar de cabeleireiro) em uma pequena casa de dois quartos, com pouco conforto,
localizada em um bairro de classe média baixa. A casa é herança da avó e deve ser
partilhada com a mãe e cinco tios de BI.
'1, 14 anos, cursa a 8ª série do 1º grau em uma escola municipal, com seu pai (pedreiro), e
sua madrasta (do lar), mora em uma casa de dois quartos, bastante modesta, localizada em
um bairro de classe baixa e periférico. Tem pouca relação com a mãe.
/', 16 anos, cursa a 8ª série do 1º grau em uma escola municipal, mora com seu pai
0XLWR
(pedreiro), sua madrasta (do lar), e uma irmã em uma casa bastante modesta, localizada em
um bairro de classe baixa e periférico. Seus pais são separados. Sua casa só possui um
quarto, que é compartilhado por toda a família. %DL[R
$', 16 anos, estudante da 8ª série do 1º grau em uma escola municipal, mora com seu pai
(pedreiro), sua mãe (do lar), e uma irmã, em uma casa de dois quartos, bastante modesta, RX
1HQKXP
localizada em um bairro de classe baixa e periférico.
:5, 15 anos, órfão de pai, mora com a mãe, operária, em algumas peças de madeira em
bairro muito pobre. Não possui em casa tv, rádio e telefone. No início da pesquisa, cursava
a 8ª série do 1º em uma escola estadual, recebia doações de alguns estudantes da
universidade e trabalhava no campus em uma atividade informal. Ao final da pesquisa,
havia abandonado o estudo, deixado o trabalho e tinha sido proibido de freqüentar a
Universidade por ter realizado pequenos furtos.
146
que hoje é relevante e pouco se importa com as conseqüências futuras de suas ações. Essa é
2DXPHQWRGRQ~PHURGHRSo}HVGHHVFROKD
necessário para fazer uma escolha e o desconforto pela perda das oportunidades que uma
existentes (sobre qualquer assunto), somado ao tempo muitas vezes exíguo para
processamento das mesmas e à capacidade limitada das pessoas para transformar dados em
alguns dos produtos e serviços que fazem parte do consumo diário de muitos consumidores
brasileiros, indago: quais são as possibilidades que um consumidor tem de avaliar as melhores
opções de preços dos produtos semanalmente comprados? quais são as informações que um
consumidor tem, por exemplo, sobre os riscos à saúde que os alimentos industrializados
possuem? dentre aqueles produtos que um consumidor adquire e que são oferecidos em
diferentes marcas, quantos são produzidos por um mesmo fabricante (com as mesmas
matérias-primas e condições de conformidade) mas que, por estarem com marcas diferentes,
são vendidos por preços igualmente diferentes? quem, ao efetuar uma chamada interurbana,
147
faz isso ciente e considerando a melhor opção para o momento? Packard (1965) já anunciava
na década de 1960 que, para dar conta do excesso de produtos existentes nos EUA, seria
o que dizer dessa situação? Os demais aspectos apresentados nos itens seguintes reforçam a
$VDUPDGLOKDVGDOLEHUGDGHGHHVFROKD
liberdade humana (SLATER, 2002). No entanto, essa imagem parece esconder outras
possibilidades.
humano é formada pela manipulação e a grande variedade dos objetos que implicam a “ livre”
possibilidade de escolha, mas “ livre” no sentido de não ser possível deixar de escolher. Santos
pessoas passam a ser dependentes daquilo que consomem ou usam. O telefone celular, no
primeiro momento, surgiu como uma opção para que as pessoas não mais tivessem a
livres – mas, no segundo momento, deixou-as ainda mais presas e ligadas ao trabalho. Na vida
pessoal o celular representa hoje “ uma extensão do corpo” de uma pessoa e que por isso não é
possível deixá-lo de lado por qualquer instante do dia. Assim como o celular outras tantas
criações do sistema tornam o consumidor cada vez mais dependente do consumo de produtos.
O esforço do sistema capitalista é de manter o ser humano refém dos produtos e serviços que
148
suas instituições criam e recriam incessantemente como forma de não parar o processo de
Como o sistema cresce a partir da produção sempre excedente, a cada novo instante
passado, ou com base em uma perspectiva futura, constrói a sua “ identidade do momento”
vida local e global, até mesmo porque as posições políticas ou religiosas não são mais
“ Razoavelmente, todos meus colegas não são consumistas compulsivos, mas têm aquilo que tá na
moda, o que todo mundo consome.” ()/)
“ Todo mundo usa roupa de surfista, então todo mundo agora só pode usar e tem que comprar tênis,
roupa, óculos, relógio, só na Quebra Mar [loja de especializada em acessórios de VXUIZHDU e VNDWH
ZHDU].” (:0)
(FOUCAULT, 2004), acaba por ficar preso aos constantes e renovados condicionantes criados
pelas estratégias de marketing das empresas e projetam nelas seus sonhos, esperanças,
angústias e frustrações. Dessa forma, ele abdica de sua liberdade de agir e pensar, fica
busca a felicidade naquilo que o grupo social coloca de importante (GIGLIO, 2002). Surge,
$VQHFHVVLGDGHVGHWHUPLQDGDVSHODVSUHVV}HVVRFLDLV
pessoas reproduzem seus sistemas de relações sociais. Com base no que o autor pensa, é
possível dizer que a partir do momento em que os sinais são trocados entre seres humanos,
eles tornam-se símbolos, imagens e marcas, substituindo a materialidade e o valor de uso dos
bens. Baudrillard (2000) ressalta que isso não significa que os produtos não tenham qualquer
utilidade funcional. No entanto, a funcionalidade é vista como um sinal, pois são as pessoas
que conferem função ou quaisquer outros valores aos objetos, uma vez que as significações
assumidas por eles não se manifestam isoladamente, e sim, nas relações sociais. É o
significado social que torna um objeto útil a uma certa categoria de pessoas e determina o seu
ZHDU e tênis. O computador e o telefone celular só não são realidades para os adolescentes de
potencial de consumo muito baixo. Uma das regras do grupo são as “ roupas largas” , no
entanto os mais pobres usam roupas de tamanhos maiores para que possam se enquadrar no
estilo. Alguns adolescentes afirmaram que pedem a opinião de amigos e da mãe. Os amigos
servem para dar informações sobre onde é possível encontrar um produto, ou se o local de
compra é bom, já a mãe serve para informar sobre a qualidade de um produto. Por outro lado,
outros adolescentes disseram que não se baseiam em ninguém, porque possuem o próprio
estilo. No entanto, possuem e usam as mesmas marcas de roupas e tênis e admitem que se
“ [...] eu vou por mim [...] gosto de andar do meu próprio estilo, do meu
jeito.” (21)
“ [...] tô sempre vendo tv [...] vendo informação na internet, tô sempre nas
lojas vendo o que tão usando e como tão usando [...] aí vejo um amigo e
digo: legal essa tua roupa, como eu sei que ela tá na moda, pergunto a loja e
Camiseta de surf de 21
vou lá.” (21)
sentidos. Até adolescentes como, por exemplo, %,e '8 que afirmavam não assistir muito a
Conforme Slater (2002), os bens sempre tiveram identidade social, porém nos
processos fluidos de uma sociedade pós-tradicional, a identidade parece ser mais uma função
do consumo que o contrário. Assim, a utilidade não é uma qualidade própria do objeto, mas
um significado construído pelos seres humanos, pois nenhum objeto é ou tem movimento na
sociedade humana, exceto pela significação que os homens lhe atribuem (SAHLINS, 1979;
SLATER, 2002).
internalizada e adotada como real, tornando a hiper-realidade “ mais real” que a própria
terceirizam a sua produção uma marca é uma experiência hiper-real. Como é que podemos
definir um produto original de uma marca se quem o produz é uma outra empresa? Para
alguns consumidores existe uma boa forma de identificar um produto original: apenas
acreditar na identidade da marca estampada como algo “ verdadeiro” , real, que satisfaz. As
experiências hiper-reais com as marcas são muito significativas para que se possa ver a força
Klein (2002), dos “ idiotas” consumidores. )/, no momento em que fazia um comentário
151
sobre a qualidade de suas roupas, que eram peças compradas em loja especializada em estilo
surf, disse:
“ A melhor roupa que tenho é esse moletom; [...] também, é Rip Curl.” ()/)
pode conseguir “ ter” (FROMM, 1976) seu destaque, pois como diz o ditado popular “ o que os
olhos não vêem o coração não sente” . Por outro lado, outros, mesmo sabendo que “ aquilo”
não é a suposta “ marca original” , podem buscar a satisfação no “ parecer” (DEBORD, 1997),
já que não conseguem “ ser” nem “ ter” , como é o caso da seguinte descrição:
“ Roupa não precisa ser original, existem várias falsificadas que até dá pra enganá. [...] Prefiro de
marca, mas se minha mãe me trouxer [uma outra parecida com uma original] eu uso.” (*%)
posição social e não pelo que ele tecnicamente oferece, a subjetividade das imagens que são
Outra questão que entendo deva ser evidenciada é que as necessidades dos
adolescentes que ainda não possuem um emprego são atendidas por familiares e, dessa forma,
“ A gente tem que ir às festas bem-arrumado para não se sentir constrangido frente aos colegas e às
gurias.” (7*)
“ Ele (7*) me pediu um moletom, mas disse que não queria dessas lojas e pediu pra escolher um que
é mais caro, que é de marca. Fazer o quê? Mais uma prestação.” (tia de 7*)
152
“ Têm amigos meus que têm pais que acham um absurdo dar um bagulho tri
caro pra um filho. A minha mãe também até certa parte achou um absurdo,
mas aí ela não teve escolha e começou a me dar os bagulho (sic). Às vezes
tem amigos que dizem: “ ah! esse tênis tri caro queria ganhar, mas minha mãe
não me dá isso.” (21)
Em relação aos sonhos dos jovens com maior potencial de consumo aparecem: o
desejo de viajar, a vontade de comprar uma moto ou carro, pois “ ter um carro pra mim, é um
bagulho sem noção!” (/2 Por outro lado, os adolescentes mais pobres sonham com aquilo
As lojas especializadas que vendem as roupas de VXUI ZHDU e VNDWH ZHDU não são
freqüentadas pelos adolescentes mais pobres. Duas descrições realizadas sobre uma dessas
relação às mesmas:
“ Dizem que é a loja que sai mais roupa, ganha das outras lojas, é a melhor loja que tem.” ($')
“ Daqui da Castelo [bairro pobre e periférico da cidade] achamos que é cara, pra filhinho de papai, só
tem coisa destaque.” ('1)
estilo, mas, como não freqüentam os mesmos locais de compra, não possuem as mesmas
marcas de produtos. Dependendo do ponto de vista, essa questão pode ser apenas
“ segmentação de mercado” , por outro lado pode ser um indicador preocupante de diferença
social. O acesso à comunicação de massa (em especial à televisão) é possível, para muitos, já
$rQIDVHVHQRYDORUGDLPDJHPHGRVtPEROR
separação faz com que o mesmo seja adquirido pela imagem que representa e essa pode ser
símbolos.
Cabe considerar que, de forma geral, os jovens afirmaram que em primeiro plano
“ Admiro o Ronaldinho, pobre, sem dinheiro e agora é respeitado no mundo todo, baita jogador [...]
Senna, raça, brasileiro de coração, ajudou crianças pobres e o país.” (:0)
“ Eu gosto de banda de música, mas não tem esse negócio de ídolo que eu admire a f... ” (21)
Mas é na valorização das marcas de roupas e tênis que se torna mais evidente o
interesse dos adolescentes por imagens e símbolos. No entanto, não existe uma lealdade a
também. Eis aí uma vulnerabilidade das empresas e uma “ oportunidade” para ter de
comunicar mais e mais. 0DV VHULD PDLV XP LQGtFLR GD PRUWH GDV PDUFDV FRPR Ki DQRV
DOJXQVSURIHWL]DPGHVGHDFKDPDGD³6H[WDIHLUDGH0DUOERUR´HPGHDEULOGH"2X
Voltando aos adolescentes, o interesse pelas marcas nem sempre foi revelado de
forma explicita e espontânea. Dos quinze adolescentes que participaram da pesquisa, durante
154
as primeiras entrevistas quatro jovens manifestaram interesse explícito por marcas e onze
aplicação das demais técnicas de pesquisa apenas três se mostraram fiéis a esse discurso; os
demais revelaram discursos contraditórios em relação ao interesse pelas marcas. Como todo e
qualquer produto vendido possui uma determinada marca, cabe ressaltar que a expressão “ de
marca” citada pelos jovens diz respeito às marcas mais consagradas e de preços mais altos. A
O interesse dos adolescentes pelas marcas não seria problema se essas não fossem
lptão caras e agravantes de diferenças sociais, uma vez que os adolescentes pobres também
têm expectativas de consumo semelhantes àquelas dos adolescentes com melhores condições
financeiras.
2SRGHUGDFRPXQLFDomRFRPRSURGXWRUDGHVHQWLGRV
1992; JAMESON, 2000, JAMESON, 2004). A televisão produz sentidos hiper-reais: TXHP
QXQFD YLX DOJXP WHOHVSHFWDGRU EULJDQGR FRP XP SHUVRQDJHP GH XPD QRYHOD" TXDQWDV
SHVVRDVVHUH~QHPjIUHQWHGDWHOHYLVmRSDUDFRPHQWDURXDFRQVHOKDUDYLGDGHXPDIDPtOLD
GHVVD PHVPD QRYHOD" TXDQWRV VH VHQWHP UHFRPSHQVDGRV SRU WHUHP ³FRQVHJXLGR´ HOLPLQDU
XPSDUWLFLSDQWHGRUHDOLW\VKRZRXHVFROKLGR³RVPHOKRUHVGRDQRGDP~VLFDEUDVLOHLUD´"
KITCHEN, 2002). Os seres humanos passam a ser “ controlados” pelo mercado que, aliado ao
ambiente urbano, configura relações sociais baseadas na efemeridade dos signos. No entanto,
“ interferindo no jogo” .
156
A televisão foi citada como fonte confiável de informação, da mesma forma que a
internet. Chama atenção a relação que os adolescentes têm com a imagem. Quando
2GHVFRQKHFLPHQWRGDVJUDQGHVHVWUDWpJLDVHLQWHUHVVHVGDVHPSUHVDV
4XDLVVmRDVSRVVLELOLGDGHVGRVFRQVXPLGRUHVFRQKHFHUHPRVJUDQGHVHSULQFLSDLV
REMHWLYRVHVWUDWpJLFRVGDVHPSUHVDV"(VVDpXPDSULPHLUDHLPSRUWDQWHTXHVWmRDVHJXQGDp
TXDLVVmRRVUHDLVLQWHUHVVHVHVWUDWpJLFRVGDVHPSUHVDV"
Um verdadeiro circuito de marca não pode ser criado da noite para o dia, e é
por isso que em geral o processo começa com a forma mais simples de
extensão de marca, uma fusão gigante: a Bell Atlantic e a Nytex; a Digital
Equipment e a Compaq; a WordCom Inc. e a MCI; a Time Wamer e a
Tumer; Disney e ABC; [...] Seagram e a Polygram; America Online e
Netscape; Viacom e CBS [...] A lista aumenta a cada dia. Em geral, as
empresas citam o princípio Wal-Mart: todo mundo no setor está se fundindo
e somente os maiores e mais fortes sobreviverão. Mas R SRUWH SDUD VHX
SUySULR EHP, é apenas o começo da história. Uma vez que o perímetro da
marca tenha se expandido, a atenção corporativa inevitavelmente muda para
formas de torná-la mais auto-suficiente, através de várias interpromoções
coordenadas de dentro. Isto é, através da sinergia. (KLEIN, 2002, 170-171,
grifo meu).
Como refere Klein (2002), as fusões são para o próprio bem da empresa. Quanto
maior for uma empresa mais poderosa e ameaçadora ela se tornará. eQDIRUoDGDIRUPDomR
157
GH JUDQGHV FRQJORPHUDGRV GLYLGLGRV VRE GLIHUHQWHV PDUFDV TXH RV FRQVXPLGRUHV SRGHUmR
ID]HUYDOHUVHXVGLUHLWRVHVHWRUQDUHPPDLVH[LJHQWHV"
empresas, quando as empresas procuram destruir seus concorrentes, não é plausível que se
entenda nessa estratégia algum tipo de intenção de favorecer os clientes. Klein (2002, p. 170)
revela que “ [...] empresas como a Molson e a Nike buscaram criar marcas célebres exibindo-
se nos shows e jogos que patrocinavam, muitas dessas mesmas empresas estão agora tentando
derrubar varejistas locais ao criar superlojas de grife, e depois, indo mais além, hotéis, e
minicidades de grifes” .
Black (2001 DSXG FARIA J. HWDO 2001) em um trabalho que reconstruiu a história da
IBM identificou que a empresa prestava colaboração a líderes nazistas como forma de obter
monopólio do mercado. Interesse dessa natureza, além de ser deplorável, é algo que ocorre à
distância do consumidor.
Não são apenas as grandes empresas que definem estratégias voltadas para os seus
pode até ser percebida pelo consumidor, mas não o torna menos vulnerável. Médicos de uma
determinada especialidade podem se unir e decidir não aceitar qualquer espécie de plano ou
seguro de saúde para as consultas dos pacientes. Essas e outras tantas estratégias muitas vezes
não são do conhecimento dos clientes e revelam sua impotência diante daquilo que as
$GLVWkQFLDGRFRQVXPLGRUGRSURFHVVRGHSURGXomR
decisões. Giglio (2002) relata que o consumidor alienado dos processos de produção fica sem
conhecer como os objetos são feitos e o seu valor de uso. Daí emerge a oportunidade para que
melhores opções de aquisição. Alguns adolescentes disseram que realizam a compra com base
no estilo.
“ Pra mim, dando pra sair, uma roupa que seja nova, que eu não sinta frio, tá bom [...]. [Roupas] que
não tenham qualidade muito boa, vou pela cor, pelo desenho, só por isso.” ($/)
“ Entre o bom e o bonito primeiro faço opção pelo que acho bonito.” ()/)
“ [...] [roupa] compro pela imagem ou cor, apenas me preocupo com a qualidade dos tênis.” (21)
demonstraram dificuldade para avaliar a qualidade de um dos produtos que mais gostam de
comprar: roupa.
“ Não sei, assim, eu gosto muito de roupa de surfista, cores diferentes, não gosto de preto, cores
alegres, estilo de roupa que eu gosto de usar.” (:0)
“ [...] por exemplo, roupa, a malha, a costura, às vezes vejo que o bagulho tem uma malha ruim.”
(/2)
“ [...] roupa é melhor ver pelo tecido [...] e confio na palavra de minha madrasta [...] (/')
“ Se não estraga fácil, [mas] não sei como ver [...]. Depende [...] placas dizendo que é de qualidade.”
('8)
“ Nem sei! [...] vendo se o material é resistente.” (%,)
“ O que é ruim é fácil identificar pelo preço. [...] Roupa de inverno eu toco no tecido e vejo se é
grosso, daí eu compro. Se é fino eu já deixo mais pro verão. Numa loja, que eu não saiba identificar
que tipo de roupa tem, eu busco direto o vendedor, porque eles sabem mais que a gente. Eles
conhecem a melhor qualidade. Noventa por cento deles querem te vender o mais caro, mas fico
sempre sabendo pelo vendedor se é melhor. Ele sabe o que tá vendendo [...] Se tivesse dinheiro não
iria pelo preço e sim pela qualidade [...]. Pra identificar qualidade é pelo preço, em comida também, o
mais caro sempre o gosto é melhor.” (:5)
159
(2000), uma empresa quando da definição do pacote de serviços pode optar por uma
abordagem do cliente como co-produtor, para que o cliente deixe de ser um espectador
passivo e passe a realizar algumas atividades do serviço, como benefício a empresa substitui
seu trabalho pelo trabalho do cliente, mediante, por exemplo, caixas automáticas e auto-
operações, permite uma maior autonomia por parte do cliente pelo uso do auto-serviço, mas
empregado da empresa. Isso sem contar na redução direta de postos de trabalho que torna a
vida voltada para o eterno presente. No entanto, é uma forma de o consumidor julgar parte do
processo de operações.
produção de seus produtos para outras empresas. Quando questionados, por exemplo, sobre
onde e por quem são fabricados os produtos da Nike, as respostas recorrentes eram: “ Pela
Nike” ($/), “ Acho que nos Estados Unidos” (9,) ou ainda “ Não sei” (%,).
2GHVFRQKHFLPHQWRGDVWpFQLFDVHIHUUDPHQWDVGHPDUNHWLQJ
2TXHRFRQVXPLGRUEUDVLOHLURFRQKHFHDUHVSHLWRGHHVWUDWpJLDVGHPDUNHWLQJFRPR
PHUFKDQGLVLQJ YHQGDV" 'HVGH TXH XPD SHVVRD QDVFH HOD REULJDWRULDPHQWH FRPHoD D
FRQVXPLUQRHQWDQWRTXHWLSRGHHGXFDomRRXLQIRUPDomRUHFHEHGXUDQWHWRGDDVXDYLGDD
HVVHUHVSHLWR"
160
aquelas ligadas aos produtos e marcas de suas preferências de compra ou sonhos de consumo,
“ Algumas propagandas são ridículas não valem a pena, outras são legais [...]. Gosto de filmezinhos de
carros mexidos que aparecem na internet. [...] das propagandas da Nike que aparecem os jogadores de
futebol [...] aqueles bagulho de tele-mensagem, não acho que tenha necessidade de botar na tv. Gosto
de bagulho que me interessa. Entendeu? Tênis, boné, bagulho de carro que eu gosto, som, surf, skate
eu paro e olho.” (21)
“ [...] as [propagandas] da MTV são mais uma viagem, as da Nike são a f... pegam os que jogam legal,
sempre tem algo diferente, as de Rio Grande acho meio chinelo o bagulho.” (/2)
“ [Propaganda serve] só pra aquilo que tu não conhece. Propaganda de pasta de dente [...] [a gente] vai
pelo mais barato.” (/1)
“ [Gosto de propaganda] das de lojas com promoções, daí fico sabendo pra comprar coisas.” (/')
“ Vejo propaganda de vez em quando [...] Umas são divertidas chamam atenção, mas não me lembro
de nenhuma.” (7*)
“ Gosto de algumas propagandas que acho engraçadas, de cerveja, de alguns celulares, propaganda de
venda. [...] Já propaganda na internet não gosto.” (:0) (No entanto, o adolescente possui vários
arquivos em seu computador com filmes de propagandas da Nike, que baixou da internet)
“ [...] algumas vezes eles dizem algumas coisas e tu vai ver são bem diferentes.” ($/)
“ Geralmente eles põem [propagandas] na tv pra atrair e de repente chego lá e não gosto. [...] Depende
do contexto da propaganda, mas a maioria não é muito boa, alguma que se safa. Às vezes têm
propagandas que não são boas pelo que trazem, mas são engraçadas.” ()/)
“ Não gosto das propagandas que estão na internet, porque dizem uma coisa ali, aí tu vai comprar, é
outra coisa, às vezes é menor, ás vezes não é a mesma qualidade que mostra na tv.” (/1)
o porquê que algumas marcas têm preço muito alto. Quanto à promoção de vendas os
as vendas. As demais técnicas e intenções de promoções não são por eles percebidas. As
“ [Promoção] serve pra vender as últimas peças de uma roupa e esvaziar o estoque.” ($/)
“ [Promoção] é pra vende mais.” ()/)
161
“ [...] acho que não tem nada [treinamento], talvez conversem com o dono.” (9,)
$IDOWDGRFRPSRUWDPHQWRGHUHFODPDomR
que não reclamam à empresa nem a outra pessoa sobre sua experiência ruim e continuam,
pelo menos por algum tempo, a comprar ou usar seus produtos; os falantes que contam sua
experiência ruim para a empresa; os irados que normalmente não repassam à empresa a
experiência ruim, mas contam para inúmeras pessoas seu problema e, além disso, deixam de
comprar da empresa; e os ativistas que desejarão vingança pela experiência ruim, além de não
quererem mais comprar da empresa. Por sua vez Thomas (1997) descreve nove facetas do
caráter, como investigador, como rebelde, como vítima, como ativista e como cidadão.
O contato com os adolescentes revelou que alguns deles se dizem indignados quando
são mal atendidos, mas não descrevem experiências significativas de reclamação. Por outro
(SOUZA e PEREIRA, 1999; SOUZA, 2000) é mais um dos aspectos que implica a
moderno vive a ilusão de encontrar o seu “ eu” , já o pós-moderno nem o procura, pois aceita
diferentes “ eus” . Sem que pretenda adotar uma classificação prescritiva a respeito do
que o consumidor dentro de seus vários “ eus” seja mais rebelde, ativista, irado e cidadão.
$UJXPHQWRVILQDLVGRFRQVXPLGRUYXOQHUiYHO
torna o consumidor vulnerável e abre caminho para que as construções sociais sejam
e pela cultura do consumo vigente, situação que é preocupante para o futuro da sociedade
brasileira.
resultados de uma pesquisa é sempre uma simplificação que fica aquém da riqueza das
comportamento humano.
tendo em vista que desconhecem técnicas e ferramentas de marketing. Devo considerar que
eles foram “ educados” ou, para ser mais preciso, acostumados a cultura de consumo que cria,
Embora entenda que a vulnerabilidade não deva ser atribuída apenas aos
adolescentes, cabe considerar que, sendo este um segmento que representa a esperança do
Qualidade Industrial (INMETRO), que tem por objetivo contribuir para a formação de
partir da sala de aula, é um exemplo do que pode ser feito. Tal projeto está embasado nos
É nessa perspectiva que o marketing tem sido aplicado e cumprido sua missão, e foi
sob esta perspectiva que procurei descrevê-lo nas seções anteriores mediante três diferentes
gêneros de sua formação discursiva (discurso acadêmico, discurso das empresas e discurso da
comunicação de massa – televisão). Formação essa que busca legitimar práticas e idéias para
manter em crescimento o sistema capitalista. Como já anteriormente citei, Marx observou que
o capital precisa da expansão incessante (JAMESON, 2004) e, para que esse processo
falta de algo.
consumo de bens e serviços que não estão ao acesso de todos. Segundo Baudrillard (1995, p
59) a “ análise da lógica social do consumo [...] não é a da apropriação individual do valor de
uso dos bens e dos serviços – lógica de produção desigual, em que uns têm direito ao milagre
e outros apenas às migalhas do milagre –; também não é a lógica da satisfação, mas a lógica
das imagens de marcas, os preços psicológicos e o mundo perfeito das mensagens das
propagandas. Tudo isso e muito mais é construído e oferecido para vulneráveis consumidores.
de uso, relação que, mediante novos valores críticos, precisa ser invertida (HELLER, 1998),
com base em Slater (2002) indago: os sistemas sociais de alocação de recursos satisfazem as
necessidades dos grupos sociais (ou as pessoas) de maneira autônoma, eqüitativa, livre, justa e
166
feliz? Minhas observações, análises e reflexões, reveladas ao longo desta tese, levam- me a
responder que, infelizmente, inúmeras evidências e fatos indicam que as necessidades das
pessoas não estão sendo atendidas dessa maneira e, por isso, precisamos de posições críticas
sobre essa questão. Até mesmo porque estamos no Brasil – país com sérios problemas de
é que a partir deste momento apresento os argumentos teóricos sobre a constituição de uma
teoria, para rejeitar a proposição atual de que o marketing atende às necessidades dos
consumidores e, assim, defender minha tese de que o marketing é responsável pela construção
da insatisfação.
352326,d2(5(-(,d2'(80$7(25,$$5*80(1726
3$5$$7(6('$,16$7,6)$d2
assim definiu. A FLrQFLD SRGH VHU HQWmR XPD TXHVWmR GH SURPRomR RX SHUVXDVmR de
167
determinado grupo que tenta validar sua percepção da realidade (subjetiva) perante a
comunidade científica. Peter e Olson (1983) advertem que inclusive as observações empíricas
pesquisador. Reforçando essa posição, lembro que todo discurso (inclusive o científico) é uma
Razzaque (1998) descreve FRPR XPD WHRULD p IRUPDGD VRE XPD SHUVSHFWLYD
UHODWLYLVWD. A partir de uma dada realidade e de seus contextos de origem são propostas
temporal que vão apoiar uma teoria. Sob uma determinada tecnologia do conhecimento, essa
Ação que, por sua vez, intervirá na realidade e influenciará na formulação de teorias gerando
influência das teorias existentes: sobre a realidade, sobre as proposições conceituais e sobre a
No entanto, Santos (2000b, p. 77-78), ao fazer referência sobre o que significa uma
que existe (o não-observável), e o que é que funciona como descrição factual do que existe (o
observável)?” Com base nas proposições teóricas do marketing, formuladas sob o modo e
contexto de vida norte-americano e na ideologia capitalista, bem como nas reflexões a partir
marketing que foram propostas para dar sentido à vida e estabelecer verdades a serem
para que se possa entender de que forma é possível rejeitar uma proposição teórica ou
conceitual é a posição de Wittgenstein (1996). O autor critica a concepção de que entende que
um significado ou conceito pode ser constituído como uma realidade mental prévia e distinta.
[...] [Soma-se a isso o fato de que] as palavras seriam signos arbitrários; elas
podem produzir significado porque fomos acostumados, desde a infância, na
escola e na convivência com outras pessoas, a usá-las para fazer algo,
mesmo que sejam ações sutis no relacionamento, ou que tal relacionamento
seja introjetado (MATTOS, 2000, p. 7-8, grifos meus).
GLVVHPLQDU H OHJLWLPDU R GLVFXUVR GR PDUNHWLQJ WHQGHP D VH DFRVWXPDU FRP WRGD D
se bem que não se tem o direito de dizer tudo, que não se pode falar de tudo em qualquer
169
circunstância [...]” (FOUCAULT, 2000, p. 9), não é qualquer palavra que serve, não é
qualquer discurso que cabe, pois nem tudo contribui para a (re)produção da ideologia
linguagem inadequada, não é uma “ linguagem autorizada” (BOURDIEU, 1996), pois não
constitui a regra do jogo que deve ser disseminada pela coletividade do marketing. Já o
insatisfação.
conhecimento é social, e os resultados da ciência trazem impactos sobre a vida dos cidadãos
comuns, assim eles têm o direito e o dever de discutir os aspectos positivos e negativos do
conhecimento científico.
afeta a vida de todos cidadãos. Como professor de marketing percebo que o discurso da área,
qualificação profissional. É de se convir que tal condição não é nada surpreendente em uma
sociedade que valoriza o sucesso econômico, o consumo, e o VWDWXV do mercado. Mas chama a
atenção, também, que outros tantos quando se referem (ou relacionam) à área, usam
propaganda possam ter algum tipo de conotação negativa, as quatro últimas expressões são
170
entenda justificável tais considerações. No papel de educador, pelo poder de influência e pelas
responsabilidades que tenho, considero relevantes essas manifestações do senso comum, para que eu não aceite
os benefícios da área (e relacionados à gestão) sem que considere os perigos e os riscos que ela oferece à
sociedade.
argumentos descritos nesta subseção, levam-me a propor uma nova (ou outra) interpretação,
FRQVWUXomR GD LQVDWLVIDomR GR FRQVXPLGRU FRPR IRUPD GH PDQWHU R SHUPDQHQWH H
LQFHVVDQWH FRQVXPR H FRP LVVR SURSLFLDU R OXFUR GDV HPSUHVDV H R FUHVFLPHQWR GR
VLVWHPDFDSLWDOLVWDHSDUDWDQWRXWLOL]DVHGHUHFXUVRVGHPDQLSXODomRHSHUVXDVmRO
marketing na verdade como técnica gerencial pode em uma mesma dimensão tempo-espaço
admitir mais de uma interpretação e ser mais de uma coisa, porém é essa condição que tem se
apresento as razões para apresentar e defender tal interpretação. Logo após apresento uma
(67$02612%5$6,/
o desafio da relação entre as questões local e global e o consumo dos ricos (turistas) e dos
2ORFDOHRJOREDORGHVDILRDVHUHQIUHQWDGR
R JOREDO O autor argumenta que para entender a situação do Brasil é preciso considerar a
em outros contextos sociais. Afinal, cada sociedade precisa “ resolver os problemas que têm
perante si. Não há um conjunto natural de problemas, são problemas aquilo que socialmente é
construído como tal numa determinada sociedade” (SANTOS, 2003b, p. 18). Em tempos de
globalização, é preciso encontrar alternativas para tudo aquilo que não é global, e sim, local.
A questão, pois, que se põe a nós [...] [brasileiros] não é apenas de saber se
podemos pensar a pós-modernidade numa sociedade semiperiférica, mas
sobretudo se podemos pensar e agir pós-modernamente. A questão é
complexa. Por um lado, a discussão do moderno e do pós-moderno seria
algo telescópico, discussão à distância, guerra de miniaturas. Por outro lado,
os artefatos da cultura pós-moderna entram diariamente em nossas casas por
múltiplos canais de informação e até se dirá que a nossa capacidade para
gerir ou para atenuar a sua penetração é menor que a dos habitantes das
sociedades centrais por não termos as resistências modernas tão
desenvolvidas quanto eles. (SANTOS, 2000b, p. 93-94).
Mas é dessa forma que penso ser necessário estudarmos o marketing e a cultura de consumo
simplesmente importados. Estamos no Brasil, onde nem mesmo o acesso aos bens e serviços
básicos é uma realidade de toda a população, quanto mais àqueles relativos a um padrão de
através do consumo estão no acesso, se não de todos, pelo menos da esmagadora maioria da
população.
172
Santos (2003b) entende que nossos problemas modernos precisam de uma produção
mundo) somem esforços, misturem seus saberes aos saberes do senso comum para que
apresentem seus conhecimentos e soluções sobre os problemas que enfrentam. Penso que é
marketing e da produção que poderemos contribuir para uma sociedade mais justa, pois, como
diz Santos, precisamos do viés multidisciplinar para resolver nossos problemas sociais
2FRQVXPRGHWXULVWDVHYDJDEXQGRVHVXDVFRQVHTrQFLDV
essa é uma condição que levanta dúvidas e manifestações críticas. Slater (2002) refere que
alguns livros-texto de marketing publicados apenas nos últimos anos no Brasil (KOTLER e
STANTON, 2001), pode dar uma mostra de que a influência dos EUA continua presente no
SODQHWD TXH QmR GLVS}H GH UHFXUVRVQDWXUDLV LOLPLWDGRVHVWDQGR SDUWH GHVVHV Mi LQGLFDQGR
VLQDLVGHHVJRWDPHQWRRXGHVpULRVFRPSURPHWLPHQWRV"$VSUy[LPDVJHUDo}HVSRGHUmRYLYHU
173
VREDFXOWXUDGHFRQVXPRLQGLYLGXDOHLOLPLWDGR"1R%UDVLOpGHVHMiYHODDGRomRGDVPHVPDV
Do}HVGHPDUNHWLQJWHQGRHPYLVWDRVSUREOHPDVGHFRQFHQWUDomRGHUHQGDH[FOXVmRVRFLDO
YLROrQFLDXUEDQD"
Bauman (1999) entende que na globalização os turistas (os ricos) são aqueles que
chegam em qualquer tempo e a qualquer espaço para realizarem seus sonhos, suas fantasias,
suas necessidades de consumo e seu estilo de vida; para isso, viajam física ou virtualmente
pela internet, já os vagabundos (os pobres) movimentam-se porque estão sendo empurrados
qualquer, geralmente tarefas consideradas humilhantes pelos turistas. &DEH DR PDUNHWLQJ
HVWXGDURLPSDFWRGHVXDVLGpLDVHDo}HVVREUHRV³YDJDEXQGRV´"2HVWXGRGHVWH³VHJPHQWR
GHPHUFDGR´QmRGL]UHVSHLWRjVSUHRFXSDo}HVGHDFDGrPLFRVGRPDUNHWLQJ"
econômico excludente, que não assegurou até hoje o direito ao consumo a parcelas
emprego precisam vender seu trabalho como também sua “ personalidade; [...] – realizado por
meio do consumo – de se vestir bem, ter boa aparência, ser atraente, manter-se atualizado em
termos de cultura, notícias e moda” (SLATER, 2002, p. 189). Ou seja, até mesmo para
trabalhar ou conseguir trabalho, o ser humano precisa consumir de forma que se configure em
uma imagem que o torne “ um bom produto” (mesmo que seja apenas visualmente).
conjunto de fatores anteriores à existência do marketing no Brasil, não sendo assim plausível
174
apontá-lo como o responsável pela situação. Mas entendo ser possível dizer que a área é
que devem ser destinados ao segmento de “ turistas” e não aos “ vagabundos” que desejam ser
Nesse mesmo sentido, Turow (1997 DSXG HOLBROOK, 1999) acredita que as reais divisões
sociais configuram abordagens da mídia e que essa reforça diferenças. Entendo que essas
posições constituam elementos significativos para uma reflexão profunda acerca do marketing
brasileiro.
geradas e que os “ vagabundos” (BAUMAN, 1999), muitas vezes, façam um esforço absurdo e
negativo para ter acesso ao consumo. Para uma significativa parcela da população que não
tem poder aquisitivo, a violência é um meio de participar do consumo. Como afirma Misse
(2002), foi-se o tempo em que o pessoal das favelas contentava-se em não participar do jogo
do consumo, hoje eles querem consumir o que o sistema capitalista oferece e, na falta de
Gilberto Nascimento, Presidente da Febem de São Paulo, que diz: “ O excesso de consumismo
vendido todo o dia leva ao roubo de um tênis, de um carro para dar volta na favela ou para
pesquisa com os adolescentes para que com imagens e discursos seja ilustrado esse problema
e um pouco da indiferença.
175
adolescentes, o relato de um morador de um bairro de classe média baixa também ilustra essa
situação.
“ Os guris lá da zona querem ter tudo aquilo que aparece na televisão, que estão na moda: tênis, boné,
bicicleta, moto, camiseta e bermuda de surfista, aparelhos de som, dvd, celular e que eles vêem e
sabem que outros adolescentes têm [...]
Os guris mais velhos que aparecem com tais produtos servem de exemplo para os menores que
passam a valorizá-los, pois são exemplos de ascensão e sucesso no bairro. Passam a ser referência
para os outros porque podem usar grifes famosas e produtos desejados. Além disso, demonstram ser
corajosos, porque conseguem não ter medo para assaltar. Um dia um guri me disse que quase pegou
uma bicicleta de marcha de um cara que tinha entrado numa loja e deixado a bicicleta sem cadeado
na calçada. Ele disse que não roubou porque faltou coragem, mas lamentou porque “ era uma baita
magrela” . É verdade que não são todos que roubam, mas aqueles que não roubam porque não têm
coragem ou não acham certo fazer isso acabam comprando o roubo, também têm aqueles que
ganham alguma bermuda dos pais, mas sei que é f... ter só uma bermuda ou camiseta de marca.”
Por enquanto, aqueles poucos brasileiros que têm muito para gastar circulam de
helicóptero, freqüentam UHVRUWVe locais com fortes esquemas de segurança, fazem compras e
compram em VKRSSLQJ FHQWHUV, andam em carros com vidros escuros. Ambos consomem
Quando as pessoas dizem que não é possível matar por conta de um FGSOD\HU ou de
um celular e que é preciso fazer campanhas contra a violência, entendo que – além de outras
tantas campanhas como para mais educação e mais emprego –são necessárias campanhas para
futebol, atores, marcas de “ idiotização” , etc). Essa é sem dúvida uma grande utopia, mas é
consolidação de máfias, para a evasão de tributos e impostos; são produtos com baixa
bolso, a sua segurança, a sua saúde (como é o caso dos remédios dos laboratórios
clandestinos); ferem o princípio do direito de autoria, são resultados das ações de empresários
aproveitadores e inescrupulosos (mas não custa lembrar que todos esses problemas e
acusações podem ser atribuídos às empresas legalizadas). Porém, quero enfatizar que em um
país onde a comunicação de marketing estimula quem não tem a consumir, essa é uma
condição que tende a permanecer, até mesmo porque é dessa forma que muitas pessoas
Mais uma vez abrindo espaço para o estudo com os adolescentes, é possível perceber
que os produtos piratas são aceitos e constituem alternativas de aquisição dos jovens das
diferentes possibilidades de acesso ao consumo. As roupas são compradas por aqueles com
menos recursos econômicos, já os cds musicais e de vídeo-game são comprados por todos. O
preço alto do produto original aparece como justificativa para a compra de piratas.
“ [....] têm que baixar o preço do original. Acho que eles não têm muito lucro mas fazem cd muito
caro. [...] empresa, tipo a Sony, até tem lucro mais não tem muito por causa do cd pirata e porque eles
gastam muito, no encarte por exemplo.” ()/)
“ [...] dá de compra quatro [cds] se proibirem então tem que baixa o preço do da loja.” (%,)
“ Vai ser difícil acabar com o bagulho [piratas], eu acho.” (/2, comentando a respeito sobre das
campanhas contra os cds piratas].
177
Por outro lado, o consumo no mundo capitalista é tão “ mágico” que até mesmo
aquilo que é tido como pirata beneficia as grandes empresas. Como relata Klein (2002, p. 98),
nos EUA “ [...] grifes como a Nike e a Pólo têm se recusado a dar uma dura na pirataria de
seus logos em camisetas e bonés de beisebol nos bairros pobres da cidade e várias delas têm
claramente evitado tentativas sérias de refrear o exuberante furto em lojas. Agora as grandes
marcas sabem que os lucros de roupas de grife não fluem apenas da compra de roupas, mas
também de pessoas que vêem seu logotipo nas ‘pessoas certas’ ” . Em extensão a essa
SURSDJDomRGHFySLDVSLUDWDVGRVLVWHPDRSHUDFLRQDO:LQGRZV"
Voltando aos “ turistas” , àqueles que possuem renda para consumir no Brasil – que
urbana – em busca do alcance da (in)satisfação estão sendo levados para construir suas vidas e
Como refere Campbell (2001, p. 60) “ os seres humanos também podem [...] obter
apreciação das belezas naturais ou o prazer da amizade” . No entanto, o que percebo é que o
amizade é o “ amigos toda hora 21 da Brasiltelecom” , de amor é uma viagem a Disney World
para o filho querido que o pai não tem tempo de brincar; de cuidado é o telefone celular da
Vivo para saber onde anda o filho que a mãe não tem condições de controlar; de carinho é
perfume do Boticário para substituir os beijos e abraços que a falta de tempo deixou pra trás
pela falta de tempo, de alegria é o Abadá do Araketo porque pular sem gastar o bastante não
haverá muito o que contar; de patriotismo é a nova camisa da seleção de futebol brasileira, e
da Nike! porque é o mais novo símbolo nacional. Defendo que as pessoas possam “ ser” tudo
178
isso sem necessariamente “ ter” ou “ parecer” tudo isso. Com o relato de um pai de dois filhos
apresento mais uma ilustração, dessa vez relacionada a uma pessoa com possibilidades de
vigente.
“ Não sei aonde a gente vai parar. [...] uma coisa que me preocupa bastante são meus dois filhos,
sempre pensei que deveria dar a eles uma boa educação. Não ganho pouco e, também, não me
preocupo com muito luxo. A Fernanda [esposa] também é assim [...] Mas não sei se vou mantê-los
[estudando] em escola particular, até posso pagar a mensalidade, mas o que tá f... é que tem sempre
alguém vendendo um álbum de fotos, um cd rom maravilhoso sobre a história do universo. As festas
na escola sempre são com fantasias compradas.
[...] A febre do celular é uma loucura, porque os pais dão aparelhos caros para crianças. É uma
disputa para ver quem tem o mais moderno, e tu imagina a pressão que é em casa porque os meus
[filhos], apesar de não exigirem muito, querem também. [...]
Já decidimos que, com exceção da mochila, o resto do material escolar quem decidi e vai comprar é
a Fernanda, porque se eles [os filhos] forem junto comprar é um terror. [...] Só que não adianta muita
coisa porque durante o ano eles pedem a caneta com cheiro de laranja, a figurinha do filme de não sei
quem, o tênis igual ao do amiguinho ‘que quando caminha acende uma luzinha tri legal!’ .
[...] não vou nem comentar os pedidos para entrar na escolinha de judô, de querer fazer natação [...]
Tudo é abaixo de grana. Sei que muitos pais têm um padrão de vida muito bom, mas acho que a
maioria deve se ver muito mal pra dar tudo isso [para os filhos].
Ah! Tem a briga da merenda. Levar de casa? Nem pensar, isso é “ pagar mico” . A cantina do colégio
é rica em produtos de tudo quanto é marca, pra mim é quase um supermercado, pois não pensa que é
só comida que tem lá. [...] Lá tem de tudo. Que coisa maluca!!! [falando bastante irritado] [...]
Eu penso como que um aluno [com pais] de renda mais baixa, mesmo que tenha uma bolsa [de
estudos] vai estudar em um colégio particular.
A gente deve fazer tudo pra um filho, mas acho que não é por aí. As vezes penso em colocá-los em
outro colégio, mas será que adianta?
[...] Não vou estar aqui daqui a uns cem anos, mas acho que nem precisa tanto tempo assim, para ver
como os filhos dos meus filhos vão viver. Cercados de tecnologia, com muita coisa pra comprar, mas
com que segurança? [...] E os que estão hoje à margem disso tudo? Pode ser que eu me engane,
tomara, mas alguma coisa vai ter que mudar, não apenas no Brasil [...]”
Relato feito por Paulo, funcionário público, casado e pai de dois filhos, de 9 e 12 anos.
contribuem diretamente para o aumento dos níveis de poluição e esgotamento dos recursos
naturais. Dessa forma, mesmo que tenhamos um crescimento econômico mais distributivo no
futuro, muito provavelmente não será possível pensar em consumo livre e ilimitado como até
hoje o sistema capitalista apostou. Muitos recursos naturais não são renováveis, conforme
George (2002) talvez uma visão diferente fosse possível há mais de cem anos. Segundo a
autora, atualmente, o mundo produz, em menos de duas semanas, o equivalente a tudo o que
179
foi produzido no ano de 1900. A produção econômica (ou a transprodução, que no sentido
causado à ecologia tem sido noticiado e observado há muitos anos. Problemas como a redução
das reservas de água doce, a diminuição da camada de ozônio, a redução dos cardumes de
da ecologia. Ainda segundo George (2002), tão grande é a força do sistema econômico
capitalista que este tem sido considerado como um sistema e a natureza como um subsistema
deste. Examinar o consumo a partir dessa relação é um procedimento artificial e uma receita
para o desastre. Em termos de marketing, embora Kotler (2002) “ prescreva” que a função da
que para atender o modelo capitalista vigente os esforços são voltados e comprometidos com
Tendo apresentado esses argumentos quero dizer que, em uma fase de crise
conceitual e de transição, D SURSRVWD GR PDUNHWLQJ FRPR IXQomR GH FRQVWUXomR GD
LQVDWLVIDomR p XP DOHUWD HP IDYRU GD VRFLHGDGH, GD YLGD PXLWR DQWHV GH VHU XPD
tenham a idéia dos riscos e problemas que hoje enfrentamos e que no futuro, mantidas as
condições atuais de produção de sentidos serão ainda piores. Conforme Santos (2000c, p. 60)
62%5($,16$7,6)$d2$(;3(5,Ç1&,$'2'(%$7((0$8/$
da insatisfação foi ao longo do período de concepção da tese bastante significativa e, por isso,
Administração de Marketing5. com uma vaga noção sobre a área e, normalmente, com as
associações feitas pelo senso comum em que o marketing é: “ vendas!” , “ tem haver com
cursada). Por fim, há aqueles que trazem alguma informação fruto de sua atividade
etc.) possuem vaga noção sobre a área; porém, dentre todos esses profissionais, há os que
trabalham em áreas vinculadas ao marketing (mesmo que nunca tenham realizado qualquer
conceituais comumente defendidas (de atender a necessidades e todas as demais que expus ao
longo deste trabalho) e as posições que defendo (de criação da insatisfação, etc.) e, ao longo
5
Esta disciplina é a primeira disciplina de marketing do curso e é oferecida no quinto
semestre do curso.
6
Esta disciplina é, normalmente, a quarta a ser ministrada no curso que possui doze
disciplinas.
181
das aulas, procurava ilustrar, a cada ferramenta e técnica apresentada, as evidências que
O que ficava evidente era a resistência que muitos daqueles alunos acostumados com
o discurso tradicional e defensores das concepções atuais de gestão de marketing ou, até
mesmo, em busca de soluções específicas como, por exemplo, como vender mais,
verdade que lhes tinha sido passada como algo inabalável, que representava a “ linguagem
autorizada” (BOURDIEU, 1996), por outra linguagem que inclusive não tinha uma “ aplicação
prática” . Soube que um aluno, formado em administração, que estava em busca de “ técnicas
de motivação” para o pessoal de linha de frente de uma empresa de serviços, após ter
em comum: “ Pô! O cara destruiu tudo, marketing não é isso!” . Um outro, crítico das minhas
Por outro lado, aqueles que não tinham um conhecimento prévio e não estavam
“ acostumados” (MATTOS, 2002) a ouvir o conceito dessa forma que não conheciam os
submetidos para consumirem sempre e mais e mais, aceitavam o conceito mais facilmente.
é sacanagem” . Em um certo dia um aluno fez o seguinte comentário a respeito da idéia de que
marketing deveria dizer que o consumidor é Deus, porque se sabe que pelo menos Deus
perdoa!”
182
Uma outra experiência que entendo relevante descrever diz respeito às discussões
apoio a imagem dessas mesmas marcas. Em síntese, aqueles que manifestavam apoio a tais
construções acreditam que a valorização das marcas era justificada por ser uma questão de
diferenciação e de direito. As expressões usadas para defesa de tal posição eram: “ Se a marca
é diferente tem mais é que cobrar mais” ; “ Se os caras batalharam pela marca devem ser
recompensados por isso, pelo esforço que tiveram” . Já as pessoas que entendiam como natural
sua posição dizendo que tais pessoas eram talentosas ou porque eram exemplos de exceção.
Nazário, jogador de futebol]” , “ Todo mundo diz, e não é só no Brasil, que ela [Gisele
Bündchen, modelo] é a melhor modelo do mundo” . Além disso, um outro argumento comum
era “ eles podem ganhar desse jeito porque dão retorno” . Essas posições reforçam o consumo
em função do valor de troca e, em minha opinião, não contribuem para a construção de uma
cultura do consumo mais justa. Além disso, mascaram os talentos e os valores de tantos outros
profissionais, como os professores ou professoras das séries iniciais que lutam para alfabetizar
e dar esperança às crianças que pertencem ao segmento que Bauman (1999) intitula de
“ vagabundos” e que vão à escola na verdade por um prato de comida. Ou, o talento de um
bombeiro que diariamente corre risco de vida em uma profissão fundamental para a
sociedade. No entanto, esses não são valorizados porque não dão retorno para o sistema, pois
maximização da escolha. Esse é um aspecto que os alunos, em sua grande maioria, entendem
como de fundamental importância para que as pessoas exerçam a sua liberdade, sejam
183
diferentes, façam suas opções de escolha. Porém, no momento que se deparam com a noção
de que muitas das diferentes opções não passam de hiper-realidades essa posição se torna
Klein (2001).
$5*80(1726),1$,60$5.(7,1*&202&216758d2'$
,16$7,6)$d2
reflexões ora expostas não foram motivadas por um acontecimento específico, muito menos
recente, uma vez que elas têm relação com minha visão de mundo e são resultado de um
década de 1950, e revisto e ampliado a partir das discussões do final da década de 1960 para
alcançar o lucro. Porém, é possível dizer que a incessante busca por expansão do sistema
capitalista determina que as necessidades não possam ser nunca satisfeitas sob pena de parar o
também, argumentar que o “ observável” é que as empresas têm atendido às suas necessidades
Dessa forma, abre-se o caminho para uma nova interpretação para a área, pois o conceito não
entendo que podemos fazer uma outra análise para essa questão: VHUi TXH D SRVVLELOLGDGH
184
HIHWLYDGHUHDOL]DomRHDGRomRGRFRQFHLWRGHPDUNHWLQJQmRHVWiIRUDGRVHWRUGHQHJyFLRV
proposição de Heller (1998) quanto à necessidade de que é preciso trabalhar valores críticos e
opostos ao valor de troca, dando atenção para o valor de uso como medida efetiva nas
relações de troca. Um exemplo de caminho alternativo a ser seguido, como revelam Silva,
agrícolas e artesanais dos países do Sul. Os autores descrevem que essas lojas são conhecidas
terras, conscientes dos aspectos éticos, trabalhistas e ambientais, presentes em todo processo
produtivo.
Por fim, as argumentações que estão nesta seção, bem como ao longo de toda esta
tese, são realizadas sob a ótica do marketing, mas, como já relatei, os problemas evidenciados
não dizem respeito apenas àquilo que é realizado pela área. É importante ressaltar que o
interesses e poderes de atores internos e externos a uma organização, o que envolve as esferas
$(;3(5,Ç1&,$'(5($/,=$d2(25(6*$7('(,'e,$6
trabalhos que anteriormente havia realizado; desse modo, a tese seria assim a possibilidade de
acontecimentos da vida me fizeram despertar por idéias e concepções até então não
desafios e até problemas, pois não foram poucos os momentos de paradas, crises e incertezas
proposta fizeram com que em muitos momentos do trabalho fosse obrigado, como diz
optado por seguir as regras normais de metodologia, as quais Feyerabend (1989) tanto critica,
Foi em Misoczky (2002) que encontrei a inspiração para a concepção deste trabalho.
Inspiração que começa pelas idéias alternativas de produção de um trabalho acadêmico, passa
crítica ao marketing, uma área da gestão que tem o papel de estimular o consumo do sistema
além de uma força de esperança, assim como foi o comunismo” . Firat, Dholakia e Venkatesh
(1995) mencionam que a economia foi a questão de maior interesse na sociedade moderna e,
se a economia não fosse bem, nada mais iria bem. Tal condição permanece dessa forma na
atual fase de exacerbação capitalista. A coisificação que Marx descreveu no século XIX é
hoje muito mais do que atual – as relações econômicas não são interpretadas como relações
entre pessoas produtivas, mas como relações entre mercadorias e coisas que levarão ao lucro.
Contudo, este novo século clama por transformações sociais e ambientais. Muito
provavelmente, em um futuro não muito distante seremos obrigados a romper com o atual
ilimitado, a extrema valorização das imagens e dos símbolos têm causado inúmeros
problemas para a sociedade. Nesse contexto, o marketing tem sua parcela de culpa e
consumidor), o discurso social (do conceito do marketing para causas sociais), o discurso
democrático (do conceito de troca), e o discurso ambiental (do marketing societal) entre
tantos outros argumentos. Mas o marketing chega ao século XXI impregnado ainda mais da
ideologia capitalista, com um meta-discurso que envolve uma série de princípios, conceitos e
absolutas e universais, mas, sim, em uma base frágil e que pode ser assim questionado. O
poder do discurso do marketing voltado para atender às necessidades dos consumidores tem
desenvolvimento. Porém, penso da mesma forma que Firat, Dholakia e Venkatesh (1995): o
marketing não pode pretender ser uma disciplina instrumental que afeta consumidores e
sociedade, mas deve ser uma disciplina reflexiva e estudada dentro de um processo
sociocultural que tem relação com a perspectiva crítica. Pois a validade e a contribuição de
em manipulação que não servem para qualquer país, muito menos para o Brasil que apresenta
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iUHD GR FRQKHFLPHQWR ± e espero que o mesmo seja incorporado aos demais discursos da
área. Como argumentam Alvesson e Deetz (1999), é possível que diferentes discursos
coexistam, mas que alguns com mais, e outros com menos poder. Nesse sentido, as idéias de
marketing como construção da insatisfação como àquele com menos poder, o discurso
marginal, pois não representa a “ linguagem autorizada” (BOURDIEU, 1996) da gestão das
No entanto, DRGHIHQGHUWHVHVRSRVWDVjTXHODVGDFRUUHQWHGRPLQDQWHpQDWXUDO
muitas profissões. Lembrando Carvalho C. e Vieira M. (2003), até mesmo na área acadêmica,
estamos sendo levados a produzir (reproduzir) textos, pesquisas, projetos que muitas vezes só
servem para que possamos acumular pontos e engrossar currículos. O ensino e a pesquisa são
figuras de autoridade, mas também são espaços propícios para pensar, questionar, debater,
prazo de uma empresa capitalista). Nesse sentido, para que surjam novos caminhos, novas
construções sociais, novas verdades, pode ser preciso desafiar aquilo que existe de “ verdade” .
2000c) em relação às críticas que estão no meu texto, pois este se constitui em mais uma
verdade dentre tantas outras possíveis de serem construídas. Além do que – mesmo com a
incorporação de outros textos, outros discursos, outros atores/autores e mesmo diante das
incompleto, uma vez que a exaustiva tarefa de transformar dados em informações é sempre
189
limitada. 4XDQWDVIRUDPDVOHLWXUDVTXHIDOWDUDP"4XDQWDVIRUDPDVLGpLDVQmRDSURYHLWDGDV
RXQmRSHUFHELGDV"3RUTXHQmRKiUHIHUrQFLDVGHGLVFXUVRVHSUiWLFDVWHyULFDVGDFXOWXUD
RULHQWDO" A busca a essas questões, muito provavelmente, formaria um novo discurso e traria
da tese, sejam suficientes para validar o trabalho, uma vez que, de acordo com os novos
perceber a ciência como poder (DENZIN e LINCOLN, 1998 DSXG MISOCZKY, 2002); ser
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idéias no meio acadêmico, processo esse que foi iniciado durante sua concepção. Ao mesmo
tempo, desejo divulgá-las em outras audiências, como as com estudantes do ensino médio e
fundamental.
Como educador da área de marketing optei por assumir um papel de agente ativo na
questionamentos: TXDOpRPHXSDSHOHOXJDUQRPXQGR"DTXHPTXHURVHUYLU"DTXHPHVWRX
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190
A análise do presente e do passado, por mais profunda que seja, não pode
fornecer mais do que um horizonte de possibilidades, um leque de futuros
possíveis; a conversão de um deles em realidade é fruto da utopia e da
contingência. Mas se é assim, em geral, é-o muito mais num período de
transição paradigmática como o que atravessamos (SANTOS, 2000a, p. 37).
Mas, é preciso adotar uma posição e trabalhar de acordo com aquilo que acreditamos
consumo dos adolescentes, em especial, daqueles com baixo poder de compra. Ao mesmo
ao marketing, em especial: crianças e idosos. Segmentos esses que são alvo de estratégias das
mais variadas empresas. Investigar a forma como tais pessoas lidam com os apelos e
Por outro lado, pretendo dar atenção a outras formas de obtenção de dados a respeito
ao pensamento. Tal preocupação deve-se ao fato de que a grande maioria das ferramentas de
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Espero que esta contribuição crítica conquiste audiências e estimule outras produções
só ter aumentado problemas e dificultado soluções, mas precisamos pensar em resolver pelo
menos alguns, pois não são poucos os exemplos de injustiça, de exclusão, de violência, de
pessoal, diferentemente de alguns outros trabalhos produzidos por mera obrigação acadêmica
de ter que escrever ou produzir algo. Com esta contribuição consolidei idéias, encontrei
deixar claro que HVWDQmR p XPD WHVH DFDEDGD PDVp XP SURMHWR SDUD VHU DSHUIHLoRDGR
GXUDQWHDPLQKDYLGDDFDGrPLFD. eXPSRQWRGHSDUWLGD.
Qual a contribuição das idéias? O tempo e os diferentes atores que lerem o trabalho
dirão, mas o certo, a “ verdade” , é que, como se diz no Rio Grande do Sul, foi legal tchê fazê-
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