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PARTE I

O “CORONELISMO” NO BRASIL E O SURGIMENTO DAS OLIGARQUIAS DO


RIO GRANDE DO NORTE

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CAPITULO I

1 QUADRO DE REFERENCIAS TEÓRICAS: O CORONELISMO E


CORONELISMO DE CADA UM1

A complexidade e o caos aparente em que vive o Estado brasileiro pode ser


bem vislumbrado pela sua estrutura social e política. Pode-se a afirmar que o país vive um
processo de modernização sem que a modernidade tenha acontecido. Isso pode ser melhor
analisado a partir do entendimento da estrutura política do país e em especial da região
nordeste.
Desde a década de noventa, do século passado, que a região nordeste tem sido
alvo de sucessivas políticas de integração do governo central o que deu a região uma nova
feição nos aspectos econômicos, sem que tenha havido grandes mudanças quando se trata de
mudanças sociais e políticas.
Mesmo com os 13 anos de governos petistas, e de suas inúmeras ações,
projetos e políticas sociais voltadas para o nordeste brasileiro, tais como: criação de
universidades, instalação de várias unidades de Institutos Federais, interiorização das
universidades federais, luz para todos, programa de cisternas, transposição do Rio São
Francisco, etc., não foram capazes de modificar profundamente a estrutura política e social da
região.
Desde 1949, em Coronelismo, enxada e voto, que Leal (1986) analisava a
política nordestina através do fenômeno do “coronelismo” caracterizando-o como sendo
resultado da estrutura agrária do país, em que no reduzido espaço rural o coronel exerce o seu
domínio político sobre seus colonos, através de alianças com o poder estadual e central, onde
consegue benfeitorias para sua comuna e essa seria a base de conservação e sustentação de
sua hegemonia política.
O “coronelismo”, na opinião de Victor Nunes Leal, seria a superposição de
formas desenvolvida do regime representativo a uma estrutura econômica social inadequada
ou ainda uma forma peculiar de manifestação do poder privado que consegue coexistir com
um regime político de extensa base representativa. Seria ainda um sistema político
tipicamente da Primeira República e estará intrinsecamente ligado aos grandes senhores de
terras.

1
Título do artigo de Victor Nunes Leal, escrito em 1980, na Revista Dados, volume 23, 1, em que ele rebate as
críticas feitas a sua obra “Coronelismo, enxada e voto”

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Quanto ao vocábulo “Coronel” teria surgido para designar os chefes políticos
locais e das alianças feitas por estes com o poder público. Na visão de Leal (1986) o
“Coronelismo” é um sistema em que o coronel, por ausência ou rarefação do poder público,
assume as funções do Estado e com isso consegue prestigio e apoio dos trabalhadores do
campo. O paternalismo, o filhotismo, o mandonismo seria subcategorias surgidas a partir do
“Coronelismo” e que teria seu fim a partir do momento que o poder público pudesse assumir
as suas funções, fato esse que se daria a partir do crescimento urbano e a superação da
estrutura agrária na economia brasileira.
Em outra obra clássica, que aborda o fenômeno da estrutura social e econômica
e suas implicações na política brasileira, escrita na década de 1950, O Mandonismo na vida
política brasileira e outros ensaios, Maria Isaura Pereira de Queiroz (1976) propõe a análise
da figura do coronel incorporando, além do aspecto político, a evolução histórica-social da
organização coronelística, os seus fundamentos socioeconômicos, que são: 1) a estrutura
coronelística como uma estrutura de clientela política; 2) a origem da estrutura coronelística a
partir dos grupos de parentela; 3) o fundamento da estrutura coronelística a partir da posse de
bens de fortuna e por fim, 4) os fatores de decadência da sociedade coronelística como
advindos a partir do crescimento demográfico, da urbanização e da industrialização.
Para explicar a estrutura coronelística como estrutura de clientela política a
autora afirma que ela se baseia em três níveis: Os coronéis, os cabos eleitorais e os eleitores.
Os primeiros seriam os chefes políticos, o segundo grupo seria formado por sub comandados
que tratariam de organizar os eleitores no dia do pleito e o terceiro grupo, os eleitores já
identificados e contados. Dentro dessa estrutura ainda existiria três tipos de mando: 1) a
Dominação direta ou de mando pessoal – onde o coronel domina através de seus cabos
eleitorais encarregados de transmitir as ordens aos eleitores e enquadrá-los no dia da eleição;
2) a Dominação indireta – que se caracteriza pelo domínio de um chefe político que domina
certo número de indivíduos e estes dominam o eleitorado através dos cabos eleitorais e por
fim, 3) a Dominação colegial – que é aquela que ocorre onde alguns membros de uma família
dominam uma zona. A família permanece unida e isso faz com que a dominação não seja de
apenas um membro da família, mas de pessoas que pertencem ao mesmo grupo familiar
(QUEIROZ, 1976; BLONDEL, 1994)
Com as novas relações de trabalho estabelecidas com a urbanização e a
industrialização, onde o eleitor não é mais dependente economicamente de um coronel, as
relações pessoais assumem importância e o voto passa a ser um sistema de dom e contra

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dom implicando o raciocínio dos pesos e das vantagens que recaem sobre a escolha do
candidato. O voto assume o aspecto de um bem de troca. Votar na pessoa indicada pelo
“coronel” significa que o eleitor recebeu ou receberá algum benefício. Dessa forma, existem
uma multiplicidade de níveis de “coronéis”. Os níveis irão variar a partir da estrutura
econômica do país e se fundamentarão ao mesmo tempo em grupos de parentesco, de sangue
e de suas alianças com os grupos associados econômico e politicamente. Seria o
“coronelismo” um aspecto especifico dentro da forma de mandonismo assumido no Brasil
após a Proclamação da República se apresentando como um conceito mais amplo com relação
aos tipos de poder político e econômico que marcaram o Brasil. (QUEIROZ, 1976)
Neste sentido, a explanação das ideias de Queiroz (1976) é importante para
demonstrar que, como existem vários tipos de “Dominação” é preciso ter em conta qual dos
tipos de chefia é exercido pelo “coronel” e qual o grau de defesa que o eleitorado possui em
relação a esse tipo de chefia. Para a autora os grupos de parentela seriam a principal origem
da estrutura coronelística. Para isso, o “coronel”, além de chefe político, seria chefe de uma
extensa parentela que podia ser formada por um conjunto de indivíduos unidos por parentesco
de sangue, laços de fidelidade (ou solidariedade, formado por várias famílias nucleares,
economicamente independentes, vivendo em moradias diferentes e podendo se dispersar a
grandes distancias, pois a sua característica principal é a complexidade da estrutura interna
que apresenta variadas configurações igualitárias até estratificação em vários níveis.
A solidariedade se dá com base na interdependência entre as diversas partes
que a compunham, pois a estratificação se dava em função das atividades econômicas
exercidas e das posições sociais ocupadas na sociedade:

Se a parentela for exercida por um colegiado é quase inevitável sua fragmentação.


[...] Os chefes políticos; tendo em vista as ambições pessoais, econômicas e
políticas, deixam de lado, ou em segundo plano a lealdade familiar e a amizade. A
fragmentação e a fragilidade formam o reverso necessário aos grupos de parentela
coronelistas, servindo muitas vezes para reforço e solidez à sua existência, sendo o
conflito de parentelas o fator importante para sua continuidade. (QUEIROZ, 1976,
p. 187-189

As brigas entre parentela se constituem como fator de conservação e


manutenção daquele tipo de estrutura e as lutas que se travam, entre as parentelas rivais,
servem para desviar os grupos de lutas inferiores contra os superiores dentro daquela
estrutura, resultando esses conflitos numa nova formação de parentelas, e nunca, na ruptura
ou desaparecimento daquela estrutura. Ainda pensando na formação dos cabos eleitorais pelo
interior do nordeste brasileiro, Queiroz (1976) aponta o comércio como fator decisivo para a

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ascensão sócio-política e econômica do país. Os bens de fortuna, na aquisição de posição
socioeconômica, e consequentemente na influência política são apontados como fator
importante para a integração a uma parentela. Abrindo um pequeno comércio, numa pequena
localidade, o indivíduo teria a sua disposição uma clientela a quem poderia prestar favores e
poderia alçar uma posição chave de cabo eleitoral e, em pouco tempo, ampliar sua fortuna e
alcançar o nível dos coronéis locais.2
Outro ingrediente, também apontado por Queiroz (1976), que contava para a
ascensão socioeconômica, dos que se tornavam chefe político dentro ou fora de uma
parentela, eram as suas qualidades pessoais. A posição de mando do chefe político era
resultado de alguns fatores, quais sejam:
[...] de sua posição econômica que possibilitava o exercício do poder através dos
favores que podia prestar; de uma parentela que lhe desse apoio e pudesse conservar
este poder, e por fim, o chefe por excelência entre os parentes seria aquele que
melhor apresentasse as qualidades indispensáveis, como poder político, poder
econômico e carisma. [...] (QUEIROZ, 1976, p. 200)

Assim como em Leal (1986), Queiroz (1976) também aponta a decadência da


sociedade coronelista com o advento do crescimento demográfico, a urbanização e a
industrialização. Dessa maneira, para que o poder dos chefes não sucumbisse, eles sempre
estiveram atentos a estas características e qualidades do processo de desenvolvimento de uma
cidade e “[...] por isso procuravam desenvolver na região onde dominavam, um centro urbano
que ficasse sob sua dependência e se constituísse o centro de suas atividades. Agiam então
como fundadores ou protetores da cidade” (p. 201, grifei). Eram nesses núcleos o palco de
suas querelas entre as parentelas. A definição do que acontece em Mossoró com a família
Rosado.
Em outro estudo sobre a política na região nordeste, Marcel Burztyn (1990) em
O país das alianças: Elite e continuísmo no Brasil, o autor analisa a hegemonia da política no
nordeste através da ação do Estado na região, onde as oligarquias vinculadas a modos de
produção atrasados conseguem perpetuar sua hegemonia em nível regional. O que tem
acontecido, na perspectiva do autor, é uma acomodação das elites dentro dos espaços já
delimitados. A tônica é continuísmo, ocorrendo sempre uma (re)acomodação tendo em vista a
legitimidade do poder central conservador ou não. A ação do Estado, antes omissa e obscura,
vai aparecendo dentro de políticas públicas que tentam incorporar ou integrar a região ao resto
do país, mas sem perder a relação com as oligarquias já existentes e resistentes as mudanças.

2
Fato ocorrido com Jerônimo Rosado, patriarca da Família Rosado que será retomado em capítulo próprio para
esse fim.

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Agora os grupos oligárquicos aparecem como benfeitores, ele é o próprio Estado
personalizado. Os grupos que antes se resumiam na figura do “coronel”, que exerciam a
função de patrão e senhor de terras, magistrado e cacique político local, agora se apresenta
através do Estado. A omissão estatal aprova essa organização local e vai caber a ele (Estado)
intervir, apenas, quando essa estrutura se encontrar ameaçada, o que Bursztyn denomina de
“pacto social de não agressão entre as elites”.
Para este autor, o desenvolvimento econômico que passa o contexto econômico
brasileiro não se justifica mais pela não integração de algumas áreas. Assim, não poderia
haver regiões atrasadas, é nesse momento que o Estado assume a estratégia de incorporar de
forma mais direta as regiões periféricas. Ocorre uma transformação superficial, que se reflete
nos aspectos econômicos, políticos e sociais, como por exemplo, para ficar no caso da
urbanização das cidades, a transferência dos trabalhadores do campo para as cidades o que
tornaria mais difícil a ação dos “coronéis” sobre esse grupo social. No entanto, para a
preservação da hegemonia política dos grupos existentes na região seria a manipulação de
fundos públicos de acordos com as vantagens políticas que cada município oferece, não é à
toa as verbas parlamentares aprovadas e distribuídas todos os anos aos seus aliados em seus
estados e municípios.
O aumento da população e seus efeitos, tais como, o desemprego, a violência,
que seriam apontados como o início ou o marco das mudanças no jogo político brasileiro, não
tem acontecido. O que se ver é a crescente onda de conservadorismo das elites brasileiras
mesmo com todo o quadro de mudanças econômicas que se tem, a muito custo, se operado no
cenário nacional. As oligarquias regionais se valem da necessidade de legitimação do poder
central e têm conseguido sobreviver persistindo no velho modelo de simbiose entre o poder
público e poder privado, ou seja, o apoio ao governo central resiste e com ele as velhas
formulas politicas como o clientelismo, o apadrinhamento, o mandonismo, etc.
As oligarquias e a recuperação do seu poder político, na longa trajetória de
política de trocas do Brasil, possui duas características principais:

[...] o mimetismo político das elites, que trocam frequentemente de partido de


acordo com os interesses eleitorais, conseguindo assumir nos seus discursos, uma
postura moderna e atual; a outra seria a mídia, com a concessão de rádios e TVs
feitas pelo poder central ais grupos dominantes [...] (BURSZTYN, 1990, p. 123) .

A escolha por Leal (1986) Queiroz (1976) e Burzstyn (1990) foi feita
propositadamente, pois embora existam trabalhos mais recenes sobre a temática, considero-os

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clássicos insuperáveis na análise da política no nordeste brasileiro, com uma postura acertada
e objetiva de como se faz política na região e por isso mesmo escolhidos como principal
enfoque teórico que permeará o estudo que se pretende realizar sobre a política oligárquica na
cidade de Mossoró/RN.
1.1 As Principais Características do “Coronelismo”

Realizando um exame comparativo entre os autores escolhidos para


caracterizar e, de certa forma, definir o que vamos trabalhar como “coronelismo” e
“mandonismo” em nosso estudo, podemos perceber que as diferenças entre eles se dão em
apenas dois aspectos: 1) o período histórico de nascimento e desenvolvimento do fenômeno, e
2) as bases de sustentação em sua formação.

1.1.1 O período histórico do nascimento do “Coronelismo:


Leal (1986) considera o “Coronelismo” um sistema político restrito à Primeira
República. Para Queiroz (1976) o “Coronelismo” seria apenas mais uma forma de poder
político e por isso poderia se adaptar de acordo com as transformações ocorridas na sociedade
e seguir, sobrevivendo, acompanhando as novas regras do jogo político.

1.1.2 As bases de sustentação do “Coronelismo”:


Em Leal (1986) o “coronel” é sempre relacionado ao grande proprietário de
terras. O “coronel” troca favores e benesses para seu município por apoio político aos
candidatos governistas, possui prestigio junto ao seu eleitorado pelas funções públicas que
exerce. Para ele o domínio do “coronel” se faz no pequeno espaço rural e sua influência
raramente ultrapassa o nível estadual.
Para Queiroz (1976) o “coronelismo” é um sistema particular de chefias
políticas. Além da posse de terras, existem outros fundamentos da estrutura coronelística, tais
como, os bens de fortuna, o exercício de certas profissões e o prestigio pessoal. O chefe
político seria o sucessor do grande proprietário de terras e teria conseguido prestigio graças às
funções que exercem (são geralmente médicos, advogados, tabeliães, comerciantes, etc.) Não
percebe o “coronel” como grande proprietário rural e creditam a herança, ao casamento e aos
bens de fortuna, além das qualidades pessoais, as bases de sustentação da estrutura
coronelística.
Em Bursztyn (1990) o mimetismo e a concessão de emissoras de rádio e TVs
seriam os fatores básicos de sustentação das elites. O prestigio dos chefes políticos advém da

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manipulação dos fundos públicos do governo central distribuídos aos seus aliados. Tanto em
Queiroz como em Bursztyn raio de ação do “coronel” pode ser urbano ou rural e pode atingir
o nível federal.
Nos três autores estudados o Estado é visto como incentivador ou favorecedor
do surgimento do “coronelismo”, a ausência ou ineficiência dele (Estado) favoreceu o
desenvolvimento do “coronelismo” que surgiu como necessidade do Estado compor com os
“coronéis” e chefes políticos para que se consolidasse seu poder.

1.1.3 O papel do “coronel”:


Ainda incorporamos, para fins didáticos, as explicações de Raymundo Faoro
(1995, vol 2), em sua obra Os Donos do Poder. Faoro toma como base as várias fases
histórico-políticas e apresenta o “coronelismo” no Brasil-Colônia como um poder
descentralizado. O poder do “coronel” é pessoal, delegado a ele diretamente pela metrópole.
O “coronel”, nesse primeiro momento, o próprio poder na Colônia. No Brasil-Império o poder
será centralizado na figura do Imperador. O poder ainda é pessoal, mas agora a delegação lhe
é concedida pelo poder central. Na República Velha o poder será descentralizado. Os
governantes serão delegados do poder central e os “coronéis” delegados na esfera do
município. Há, na opinião de Faoro (1995), um enfraquecimento do poder dos “coronéis”
junto ao poder central que possui um novo elo com os municípios: os governadores. No pós-
1930 o poder era centralizado na União. Desaparece a figura do delegado e surge a do
intermediador, a sobrevivência dos antigos “coronéis” se dará enquanto chefes políticos das
comunas, que intermediam as relações do município, ora com o poder estadual, ora com o
poder central, Essa intermediação se concretiza através dos benefícios que esses chefes
conseguem trazer aos seus municípios. As relações políticas não são renovadas e o
clientelismo permanece até hoje como prática nessa função de intermediação, o “coronel
desaparece progressivamente e de forma diferenciada segundo as regiões, dando lugar ao
surgimento de outros tipos de chefia política.
Nos autores estudados o “coronel” ou chefe político exerce o papel de
intermediador entre seus dependentes (trabalhadores, agregados, parentes, afilhados, pessoas
que exercem influência) e a classe política. O que se diferencia em um e outro é a forma como
essa intermediação vai tomando a partir do desenvolvimento ou do declínio daquela estrutura.
Admitir que o “coronelismo” é um fenômeno restrito a uma determinada época, depende do
que o autor considera como fundamental e idiossincrático ao “coronelismo”. Quando

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considerado restrito, ele é definido como o poder dos grandes proprietários de terras numa
parceria com o Estado. O fim da República Velha e as novas relações sociais e econômicas,
criadas no seu término, teriam encerrado naquele sistema. O que teria sobrevivido seriam
resíduos, mas sem a força e a presença na vida política do país. (LEAL, 1986)
Para os que não fundamentam o “coronelismo” sobre a posse de terras e
considera-o como um fenômeno de aspecto mais amplo, ele teria sobrevivido ao fim da
República Velha, embora seu auge tenha se dado naquele período. Trata-se, no caso, não em
um sistema a ser desmontado, mas de forma de poder que se metamorfoseiam de acordo com
a nova ordem social e conseguem, dessa forma, sobreviver nos diferentes períodos históricos
brasileiros. O “coronelismo” no Brasil, sob esta perspectiva, passou por diferentes fases, onde
o poder do “coronel” foi, a cada período histórico, sofrendo modificações, embora
permanecendo como figura chave no processo hegemônico de afirmação do poder constituído
(QUEIROZ, 1976; BURSZTYN, 1990). É nesta perspectiva que a pesquisa se baseará.

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CAPITULO II
2 O RIO GRANDE DO NORTE E SUA TRADIÇÃO OLIGÁRQUICA

O Rio Grande do Norte é conhecido pela longa história de dominação com


feição tradicional. Aos analistas e estudiosos que acompanham a política no estado não
escapam a associação da estrutura de poder que aqui impera. Termos como “oligarquia”,
“coronelismo”, “dominação de parentelas”, “mandões”, “donos do lugar”, etc., estão
presentes nos diferentes estudos que tratam da política estadual.
Na literatura que trata do domínio oligárquico no Brasil como Faoro (1984),
Leal (1986), Queiroz (1976) predominam a explicação para esse domínio as relações de
parentesco, o clientelismo, a estrutura fundiária e rural dos municípios brasileiros. Os
estudiosos que se debruçam sobre o domínio oligárquico-tradicional no Rio Grande do Norte
somam a estes fatores a união de forças entre os grandes proprietários rurais e a burguesia
comercial que garantem o domínio sobre o poder administrativo do aparelho burocrático do
Estado criando soluções que consolidam a permanência do domínio tradicional oligárquico,
seja através do uso do espaço urbano como mecanismo de criação de símbolos que geram
identidade com a história política e social local (FELIPE, 2001), ou mesmo pelo controle que
exercem sobre o poder administrativo garantindo em suas gestões a criação de benesses
econômicas (concessão de empréstimo a juros baixos a oligarquia comercial, nomeação de
servidores, criação de repartições, etc.) que fortalecem a dominação oligárquica (SPINELLI,
1992).
Durante a formação territorial do Rio Grande do Norte, no período colonial,
tiveram início dois processos. Um que diz respeito ao uso desigual do território durante o
período colonial e o outro que, complementando o segundo, situa-se no período republicano
“coincidindo” com o surgimento das oligarquias estaduais. (BARBOSA, 2016)

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O capítulo trata do processo de ocupação e povoamento da Capitania do Rio
Grande do Norte e de e sua inter-relação com o processo de urbanização e desenvolvimento
do estado com o intuito de demonstrar o surgimento das oligarquias estaduais e locais.
Será apresentado um quadro geral do desenvolvimento do estado e suas
vocações econômicas nas diferentes regiões, em seguida apresenta-se um breve histórico da
ocupação e povoamento das terras do Rio Grande do Norte, e por fim, a divisão do estado
pelo domínio das oligarquias locais em suas regiões.
Com este fim foram utilizados documentos oficiais elaborados pelo Governo
do estado e seus órgãos, obras que tratam da História do Rio Grande do Norte e trabalhos que
abordam o desenvolvimento e a política partidária no estado na perspectiva das formações das
oligarquias em suas diferentes regiões.

1.1 As Características Gerais do estado do Rio Grande do Norte:

O Rio Grande do Norte (RN) está localizado na “esquina” do continente sul-


americano. Essa localização faz com que ocupe uma posição privilegiada em termos de
localização estratégica, pois se trata do estado brasileiro que fica mais próximo dos
continentes africano e europeu. Possui uma extensão de 53.077,3 km2, ocupando 3,41% da
área da região Nordeste e apenas cerca de 0,62% do território nacional. Tem como limites, ao
oeste, o estado do Ceará, ao sul, o estado da Paraíba, e ao leste e ao norte o Oceano Atlântico.
As principais atividades desenvolvidas no Rio Grande do Norte, além da tradicional
atividade salineira e das condições do seu solo, que armazena grande quantidade de água, e de
seu clima, que propicia, a fruticultura irrigada, são às atividades turísticas, que possuem um
enorme potencial a ser explorado, por conta da extensão de sua faixa litorânea com cerca de
410 km com praias e mares com temperaturas amenas. O estado se localiza entre três capitais
dos estados do Nordeste, Pernambuco, Ceará e Paraíba e possui 167 municípios. (GOVERNO
DO RIO GRANDE DO NORTE/IDEMA, 2013)
Atualmente as principais atividades desenvolvidas no Rio Grande do Norte, além da
tradicional atividade salineira, devido as condições do seu solo que armazena grande
quantidade de água, e de seu clima que propiciam a fruticultura irrigada, são às atividades
turísticas que possuem um enorme potencial a ser explorado por conta da extensa faixa
litorânea com cerca de 410 km com praias e mares com temperaturas amenas e ainda por sua

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posição privilegiada entre três capitais de estados do Nordeste: Recife (PE), Fortaleza (CE) e
João Pessoa (PB). (PERFIL, 2013).
De acordo com a Secretaria de Planejamento (2013), politicamente o estado está
dividido em 167 municípios agrupados em oito Zonas Homogêneas. O estudo considerou,
para a elaboração das zonas, os aspectos físicos, as características econômicas e demográficas
das regiões. No mesmo estudo vemos a divisão do estado em oito regiões por
desenvolvimento, que são: Agreste, Potengi e Trairi; Alto Oeste; Litoral Norte; Médio Oeste;
Mossoroense; Metropolitana; Seridó e Vale do Açu. As regiões foram divididas de acordo
com as características das potencialidades locais. Para fins de planejamento e
desenvolvimento, o estado foi dividido em quatro mesorregiões geográficas, subdivididas em
microrregiões, essa divisão se deu em virtude das semelhanças, apresentadas pelos
municípios, em seus aspectos físicos e humanos.

MAPA 1: REGIÕES DE DESENVOLVIMENTO DO RIO GRANDE DO NORTE

Fonte: copiado de PERFIL DO RIO GRANDE DO NORTE, 2013, p.14

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De acordo com o Perfil do Rio Grande do Norte3, as regiões foram divididas a
partir de suas características e potencialidades locais apresentadas a seguir:
a) I - Região Agreste, Potengi e Trairi, formada por 41 municípios.
Segmentos dinâmicos da economia regional: Turismo (ecoturismo, serrano);
Agropecuária (pecuária leiteira, abacaxi, caprino e ovinocultura, mandioca, avicultura,
cajucultura); Indústria (confecções, agroindústria: mandioca, laticínios, castanha de
caju); Mineral (água marinha); Comercial (varejista);
b) II – Região Alto Oeste, formada por 37 municípios. Segmentos dinâmicos da
economia regional: Turismo (serrano, religioso, ecoturismo; Agropecuária (culturas
alimentares, arroz, feijão, fava e milho, suinocultura, caju cultura, caprinocultura,
apicultura); Indústria (agroindústria: castanhas de caju e doces, torrefação, mel de
abelha, confecções, carrocerias para caminhão); mineral (água marinha); Comercial
(varejista);
c) III - Região Litoral Norte, formada pela união de 19 municípios. Segmentos
dinâmicos da economia regional: Turismo (sol, mar, ecoturismo); Agropecuária
(caprino e ovinocultura, pecuária leiteira, apicultura, abacaxi, sisal); Indústria
(laticínios); Mineral (petróleo, sal, ouro, calcário); Comercial (varejista);
d) IV – Região Médio Oeste, formada pela união de 8 municípios. Segmentos dinâmicos
da economia regional: Turismo (ecoturismo); Agropecuária (culturas alimentares:
milho e feijão; cajucultura, alho, piscicultura, caprino e ovinocultura); Indústria
(agroindústria: castanha de caju, laticínios, frutas, mel de abelha); Mineral (água
mineral, calcário, gipsita, petróleo, água marinha); Comercial (varejista);

e) V – Região Mossoroense, formada pela união de 6 municípios. Segmentos dinâmicos


da economia regional: Turismo (sol e mar, cultura, negócios, eventos); Agropecuária
(fruticultura irrigada: melão, manga e melancia; caju cultura, caprino e ovinocultura,
apicultura; culturas alimentares: milho e feijão; pecuária leiteira e de corte); Indústria
(cimento, minerais metálicos, movelaria, papel e papelão, indústria química, vestuário,
calçados, tecidos, produtos alimentícios: beneficiamento de castanha de caju e frutas;
rações, indústria mecânica, cerâmica fina, indústria salineira, torrefação); Mineral

3
Documento oficial elaborado por um grupo de estudiosos e por técnicos do IDEMA, durante o governo de
Rosalba Ciarlini, que traça o perfil do estado e se divide em três eixos: Eixo físico-ambiental; Eixo Econômico e
Eixo Social. Embora o documento tenha sido elaborado no ano de 2013 ele ainda serve de referência para a
elaboração das políticas públicas atualmente.

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(petróleo, gás, calcário, água mineral); Comercial (atacadista, varejista,
supermercados).
f) VI - Região Metropolitana de Natal, formada pela união de 10 municípios.
Segmentos dinâmicos da economia regional: Turismo (sol e mar, eventos religiosos,
esporte radical); Agropecuária (cana de açúcar, carcinicultura, floricultura, pecuária
leiteira, mandioca, avicultura, fruticultura irrigada, culturas de vazante, caju cultura);
Indústria (têxtil, confecções, bebidas, álcool, açúcar, movelaria, construção civil,
cerâmica, casa de farinha); Mineral (água mineral, argila); Comercial (atacadista,
varejista, supermercados);
g) VII – Região do Seridó, formada por 28 municípios. Segmentos dinâmicos da
economia regional: Turismo (ecoturismo, serrano rural, negócios, eventos, caverna);
Agropecuária (pecuária leiteira e de corte, piscicultura, mandioca, caju cultura,
caprinocultura, culturas de vazante); Indústria (confecções, cerâmica, laticínios,
sapatos, indústria artesanal, pedra, couro, madeira); Mineral (feldspato, caulim, ferro,
tungstênio); Comercial (atacadista, varejista, supermercados);
VIII – Região do Vale do Assú, formada por 11 municípios. Segmentos dinâmicos da
economia regional: Turismo (sol e mar, ecoturismo); Agropecuária (fruticultura
irrigada: melão, manga, melancia e banana; piscicultura e carcinicultura); Indústria
(cerâmica agroindústria: frutas e laticínios; mármore, salineira, petrolífera,
termoelétrica); Mineral (petróleo, gás, calcário, sal, argila); Comercial (varejista)
(PERFIL, 2013, p. 14-24).

Para entender a forma como se estrutura a economia do estado do Rio Grande


do Norte, a partir das características apresentadas acima, se faz necessário entender como se
deu o processo de povoamento do estado e suas primeiras “vocações” econômicas.

1.2 O Processo de Povoamento (da Capitania) e a Consolidação da Expansão


Territorial do Rio Grande do Norte:

Durante a formação territorial do Rio Grande do Norte, no período colonial,


tiveram início dois processos. Um que diz respeito ao uso desigual do território durante o
período colonial e o outro que, complementando o segundo, situa-se no período republicano
“coincidindo” com o surgimento das oligarquias estaduais. (BARBOSA, 2016)

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O processo de ocupação do Rio Grande do Norte foi iniciado no final do
século XVI. Até 1561 nenhum donatário havia tomado posse da Capitania. As tentativas de
ocupação haviam sido todas frustradas pela ação dos franceses, que aqui buscavam pau-brasil,
e se aliavam aos índios potiguares conseguindo retardar a colonização da capitania. Além
deste fato havia ainda o desinteresse da Coroa Portuguesa pelas terras potiguares. As terras da
Capitania eram consideradas “fracas4”, serviam mais para gados e criações do que para
canaviais e roças não representando grande vantagem econômica ocupá-las. Mas, as
constantes invasões realizadas por estrangeiros ao litoral nordestino em busca de pau-brasil
vinha preocupando os portugueses que resolveram buscar soluções para conter as invasões,
uma delas era o povoamento dessas áreas (CLEMENTINO, 1995).

Diferente das demais possessões portuguesas no Brasil, não houve quase nenhuma
política de povoamento inicial, no entanto algumas iniciativas podem ser destacadas.
Em 1601, o Capitão-Mor João Rodrigues Colaço deu início a uma política de
concessão de sesmarias visando o povoamento e o desenvolvimento econômico da
capitania do Rio Grande, uma vez que nela, havia apenas a prática de agricultura de
subsistência (roças, pescas, cultura de legumes, frutas, hortaliças), coexistindo com
uma incipiente atividade canavieira. (BARBOSA, 2016, p. 36)

Desta forma, embora a Pecuária tenha sido uma atividade secundaria no


cenário econômico do Período Colonial, foi ela a responsável pela colonização do Rio Grande
do Norte e uma das suas principais atividades. Trindade (2010) ressalta o espirito
mercantilista e colonialista da coroa portuguesa, presentes nas ações dos principais agente
econômicos que aqui atuavam: “[...] no sentido de aproveitarem a Colônia como oportunidade
de operações comerciais (e não para uma verdadeira colonização, com raízes profundas) e de
transportarem as rendas para a Metrópole.” (BUESCU apud TRINDADE, 2007, p. 29)

Apesar de o sistema de Capitanias Hereditárias trazer alguns benefícios para a


colonização do Brasil, somente duas capitanias tiveram sucesso: a de São Vicente,
que pertencia a Martim Afonso de Sousa, e a de Pernambuco, cujo donatário era
Duarte Coelho. As duas foram as únicas que tiveram um relativo crescimento
populacional e econômico. Os constantes ataques dos índios, as adversidades
geográficas, que dificultavam a comunicação entre as capitanias, o desinteresse
dos donatários, entre outros, levaram essa tentativa de experiência colonizadora ao
fracasso. A coroa portuguesa não contribuía com praticamente nada

A Capitania do Rio Grande do Norte se localizava em um ponto militarmente


estratégico que podia fazer as vezes e fortaleza, ao mesmo tempo que serviria como base para
a conquista de novas terras no interior da Colônia. Para isso os portugueses construíram uma
4
Durante o período colonial a atividade econômica mais rentável era a produção açucareira. O Rio Grande do
Norte não possui faixa extensa de Zona da Mata, o que por si só explicaria a falta de interesse da Coroa
Portuguesa por suas terras (HOLANDA apud CLEMENTINO, 1995)

23
fortaleza – a Fortaleza dos Reis Magos – e pouco mais acima do forte, com a distância de
meia légua, fundaram um povoado que mais tarde seria a cidade de Natal. Exercendo a função
militar a Capitania passou a servir de passagem para a conquista do Ceará e do Maranhão,
bem como, exercer as vezes de uma fortaleza para a defesa do território e a conquista de
novos espaços.

A cidade de Natal foi fundada a 25 de dezembro de 1599. O Brasil estava sob


domínio
espanhol. Porém, antes da fundação de Natal, os colonos agruparam-se próximos à
“Fortaleza dos Santos Reis” para melhor se defenderem dos índios, originando uma
pequena povoação, posteriormente chamada de “Cidade dos Reis”. Os nativos
resistiram ao invasor português, ainda mais por verem tomadas suas terras. Os
portugueses levavam vantagem nesse conflito, devido ao seu maior poderio militar
(armas de fogo, cavalaria, etc) e por receberem constantes reforços das capitanias da
Paraíba e de Pernambuco. Somente após a pacificação dos índios é que seria
possível
aventurar-se fora das muralhas do forte e completar a segunda parte da missão – a
fundação de uma cidade. [...] Após a pacificação dos índios, as autoridades da
capitania construíram uma igreja (antiga catedral de Natal), inaugurada no dia 25
de dezembro de 1599, e demarcaram o espaço para a nova cidade. A população,
sentindo-se segura pelo recém assinado tratado de paz, começou a ocupar
lentamente as imediações do templo religioso. Assim, a inauguração da igreja
representa o marco
cronológico inicial de Natal, quarta cidade fundada no Brasil. (TRINDADE, 2007,
p. 42; 43)

O Movimento Expansionista do criatório atingiu a Capitania do Rio Grande


do Norte na segunda metade do século XVII após a expulsão dos holandeses. O movimento
toma duas direções gerais: a primeira direção segue ocupando o litoral, alcança o agreste até a
ribeira do rio açu5; a segunda direção originou-se no vale do rio Jaguaribe e estendia-se até a
várzea do Apodi.
As estradas de bois, utilizadas pelos tropeiros para o deslocamento do gado,
de uma área para outra, contribuiu para que surgissem pequenas povoações e servissem como
ponto de parada para o descanso do gado e dos tropeiros que conduziam os rebanhos6.
A ocupação do hinteland7 nordestino pelos currais provoca acirrados atritos
entre indígenas e criadores que culminaram com a Guerra dos Bárbaros ou Confederação

5
Era o Movimento Expansionista dos criadores baianos e paulistas originários do cale do São Francisco e que
provocou o estabelecimento das primeira fazendas de gado na região do Seridó. (CLEMENTINO, 1995)
6
Uma dessas povoações era a de Santa Luzia, mais tarde denominada Mossoró.
7
Em geografia urbana, hinterlândia corresponde a uma área geográfica servida por um porto e a este conectada
por uma rede de transportes, através da qual recebe e envia mercadorias ou passageiros. Trata-se, portanto, da
área de influência de uma cidade portuária que, por concentrar significativa atividade econômica, pode
engendrar uma rede urbana, constituída por centros urbanos menores. Dicionário português. Disponível em:
<http://dicionarioportugues.org/pt/hinterland>

24
do Cariris8 (1683-1713). A guerra foi vencida com a ajuda dos bandeirantes paulistas e teve
como resultado o aniquilamento de muitas tribos que dominavam o sertão e a incorporação de
suas terras à Colônia. No Rio Grande do Norte a guerra provocou a ocupação do sertão,
efetivada pelo aldeamento dos indígenas no litoral da lagoa do apodí em 1700, e a fixação das
fazendas de gado nas ribeiras dos rios açu e apodí nas três décadas subsequentes, bem como,
que essa ocupação se estendesse até as ribeiras dos rios Upanema e Mossoró.
No nordeste oriental existiam dois principais caminhos de gado ligando o
sertão a Olinda: um se dava pelo interior da Paraíba, atendendo a cidade de Crateús, escoando
o gado do Piauí e o outro acompanhava o litoral, escoava parte do gado do Ceará e do Rio
Grande do Norte, cortando as ribeiras dos rios Mossoró e Açú e seguindo em busca do vale do
rio Ceará-mirim onde alcançava o litoral oriental.
A atividade criatória, neste período, desenvolvia-se no sertão, longe do litoral,
possibilitando a povoação no interior da Colônia. Antes disto, o povoamento era restrito à
faixa litorânea (zona preferencial para o cultivo da cana-de-açúcar). A criação de gado era do
tipo extensivo, ocupava grandes áreas e o gado era deixado solto dispensando grandes
cuidados especiais ao rebanho. Esta atividade caracterizou a economia colonial da capitania
do Rio Grande 9, inclusive abastecendo as capitanias vizinhas através do fornecimento de
carne e couro (TRINDADE, 2007).
A criação de gado bovino foi de grande relevância para a expansão da população em
direção ao interior da capitania do Rio Grande, uma vez que havia um mercado para
o consumo de carne formado pelos engenhos de cana-de-açúcar e pela população
que residia em seu entorno [...]. Todavia, a convivência entre o gado e a cana-de-
açúcar não era boa. Para que a criação extensiva do gado pudesse se desenvolver
eram necessárias grandes faixas de terras. O mesmo também se aplicava ao cultivo
da cana. O gado foi sendo transferido para os sertões nordestinos, dando início a
uma marcha de povoamento para além do litoral. [...] Isso demandou o surgimento e
o uso de novas técnicas de produção, as quais contribuíram para a constituição de
um novo meio geográfico. (BARBOSA, 2010, p. 37)

Os longos caminhos percorridos prejudicavam os criadores e elevavam o


preço final do gado. Os criadores cearenses eram os mais prejudicados quando comparavam

8
Para informações mais detalhadas do que foi o extermínio dos portugueses aos indígenas que habitavam os
sertões nordestinos da Bahia ao Maranhão consultar: BITTENCOURT, Circe (org.). Dicionário de datas da
História do Brasil, Editora Contexto, 2007; ABREU, Jose Capistrano. Caminhos antigos e povoamento do
Brasil in: Descobrimento do Brasil e povoamento. Editora Itatiaia. Disponível em: <
www.cdpb.org.br/capistrano_de_abreu[1].pdf>
9
A atividade criatória foi a principal atividade econômica do Rio Grande do Norte até meados do século XIX
quando foi substituída pela cotonicultura. Estados como Alagoas, Bahia, Pernambuco e Sergipe tiveram, durante
o Período Colonial, a atividade açucareira sua principal atividade econômica. Ao lado da atividade criatória
existiam outras atividades agrícolas como açúcar, algodão, e extrativas como o sal, mas somente na transição do
século XVIII para o século XIX essas atividades vão ganhar alguma expressão (CLEMENTINO, 1995)

25
os seus custos com os dos criadores do Rio Grande do Norte e da Paraíba. Em meados do
século XIX os cearenses resolveram exportar suas reses já abatidas (transformadas em carne
seca salgada e em couros) o que lhes permitiam uma maior concorrência em relação aos
criadores dos estados vizinhos. Para a salga de suas reses, os cearenses utilizavam as salinas
naturais do Aracati. Foi o surgimento das oficinas para a fabricação de charque que logo se
desenvolveram também ao longo da foz dos rios Parnaíba, Acaraú, Camocim, Mossoró e
Açú10.
Os caminhos do gado e as exploração das salinas dão nova feição ao Rio
Grande. Pequenas povoações, no interior, como Mossoró, Açu, Macau, Areia Branca e Apodí
vão surgindo e com isso processa-se um reformulação na hierarquia das relações dos núcleos
urbanos situados nas ribeiras do Jaguaribe, Mossoró-Apodí e Açú-Piranhas. Nos caminhos do
gado surgiam pequenas povoações que se dedicavam, conforme a área geográfica em que
estivessem localizadas, à pequenas atividades econômicas11.
O processo de povoamento e colonização da capitania do Rio Grande do Norte
irá provocar os primeiros conflitos de jurisdição. (ALVEAL apud BARBOSA, 2010). Os
conflitos entre os povos indígenas, os holandeses e os portugueses eram as principais
dificuldades enfrentadas para o povoamento da capitania do Rio Grande que “também estava
submetida a um contexto de opressão e conflitos políticos, os quais possuíam relação com a
sua subordinação política às capitanias da Bahia e, posteriormente, à Pernambuco”. (LYRA
apud BARBOSA, 2010, p. 37)
O século XVIII é a época do povoamento no interior norte-riograndense. A
repressão contra os indígenas fizera o conhecimento quase total. Por todo o correr da
centúria a concessão de sesmarias fixa a população no ciclo do gado. É a era das
fazendas de criar, o nascimento da gesta dos vaqueiros [...]. O Rei, na carta régia de
11 de janeiro de 1701, desligara a Capitania do Govêrno [sic] Geral da Bahia e a
subordinara ao de Pernambuco. Durante mais de cem anos o Senado da Câmara de
Natal e as Capitães-Mores protestaram contra o desacerto dessa medida, corrigida
em 1817, por um pernambucano, José Inácio Borges [...]. Essa subalternidade
retardou o desenvolvimento do Rio Grande. Setenta por cento das sugestões
enviadas ao Rei e mandadas informar pelo Governador de Pernambuco mereceram
contrariedade formal. Escolas, fortins, melhorias administrativas, medidas militares,
disciplina dos indígenas, provimento de cargos, foram anulados pelos pareceres dos
Governadores de Pernambuco. O século XVIII constou dessa luta, diária e surda, de
forte e fraco, defendendo uma autoridade que existiu num plano injustificável de

10
A instalação das oficinas de carnes nos rios Açú e Mossoró representou o início da exploração, de forma
intensiva, das salinas norte-rio-grandenses e impulsionou a economia norte-rio-grandense que até então era tida
como de subsistência. O comércio da carne de charque alcançou patamares significativos para a economia do rio
Grande do Norte e nordestina. Esta importância foi mantida até o final do século XVIII quando o nordeste vai
perder esse mercado para o Rio Grande do sul por estar mais próximo do maior mercado consumidor, à época,
Minas Gerais.
11
É o caso da coleta de cera de carnaúba na várzea do Açú, do algodão em Mossoró, do sal em Grossos, Areia
Branca e Macau.

26
atraso para a Capitania. A História pouco aproveitará de essencial nesses cem anos.
Correspondências, brigas de indígenas, violências de autoridades, sugestões
recusadas e planos dispensáveis, foram as características. Mas o Rio Grande tornou
sua fisionomia territorial e sociedade formou-se realmente, com os elementos reais,
sobre as bases da pecuária que resistiria até o século XIX, vitoriosamente.
(CASCUDO, 1980, s/p)

A dominação da Capitania de Pernambuco sobre a Capitania do Rio Grande era


realizada com o respaldo da Coroa Portuguesa. A capitania de Pernambuco comandava, sem
pressa, os destinos e os projetos de colonização do Rio Grande. Tão pouco se apressava para
garantir que houvesse na capitania desenvolvimento econômico, autonomia administrativa
e/ou jurídica. Para a Coroa Portuguesa o Rio Grande não passava de um grande curral e uma
extensa lavoura voltada a atender as demandas dos governos português. A ênfase nos
investimentos e atenções estava direcionada à Pernambuco e à Bahia, cuja ocupação territorial
e processo de colonização já estavam consolidados (CASCUDO, 1980). Assim, “[...] Natal,
era mais reduto do domínio e exercício do poder de uma elite pernambucana em formação que
uma cidade na qual houvesse o interesse de creditar-lhe a possibilidade de se tornar menos
dependente do governo de Pernambuco. (BARBOSA, 2010, p. 38)
Cascudo (1989) demonstra essa situação quando demonstra por meio de
cronologia o número dos capitães-mores, presidentes provinciais, governadores republicanos
e interventores federais feita por Cascudo. Durante o período de 1597 a 1939 passaram 203
governantes pelo comando, seja da capitania ou do Governo do Estado, destes, apenas 39
eram nativos da capitania. No começo do século XIX a capitania do Rio Grande ganhou
autonomia administrativa, em 20 de março de 1817 já não mais dependia administrativamente
da capitania de Pernambuco e, em 18 de março de 1818, obteve independência jurídica da
Capitania da Paraíba.
A economia no Brasil colonial era dada a partir da estrutura da economia que
tinha como núcleo interdependência interna do pais a partir de dois setores: o mercado
externo e o mercado de alimentos. Para o mercado externo se produzia em larga escala
(açúcar) para atendimento do mercado mundial. A produção era organizada, nos séculos XVI,
XVII e XVIII pelos proprietários dos meios de produção (terra) e a mão de obra escrava.
Sendo a economia colonial altamente especializada, pois apenas um produto era cultivado por
área ou região. Se exportava os produtos coloniais (açúcar, tabaco, metais preciosos) e se
importava manufaturas (seda, produtos industrializados, etc)

27
Como a economia era colonial, os produtos da Colônia “completavam” os produtos
da metrópole, estando inclusive, os comerciantes da Colônia impedidos de negocias
livremente e se submetiam aos comerciantes portugueses e ingleses.
Furtado (2007) em sua clássica obra Formação Econômica do Brasil, apresenta que a
estrutura produtiva do Brasil se deu a partir da inserção, dessa estrutura, à ordem internacional
implementadas desde a época que o pais era ainda colônia de Portugal, ou seja, exportação de
cana de açúcar para atender aos interesses econômicos da metrópole sem levar em conta as
necessidades da população que aqui residia.
A economia nordestina, naquilo que se denomina Complexo Nordestino é resultante
das formas que assumem o sistema criatório e açucareiro após a entrada de outros países nas
exportações do açúcar, concorrendo com o açúcar brasileiro.

Durante séculos [a estrutura econômica nordestina resistiu], manteve-se uma base


produtiva pouco inovadora quanto à introjeção de novas tecnologias, além de
perpetuar a concentração da propriedade e da renda, contribuindo assim como
fatores que criaram – no século XX – frágeis bases de articulação voltadas para o
mercado interno regional e nacional. Essa situação fora mantida com uma queda
vertiginosa nos preços internacionais de seu principal produto colonial, com a
concorrência internacional do açúcar de beterraba (europeu) e com a concorrência
do açúcar produzido no Sul do país. (ARAÚJO, 2010, p. 25)

Dessa maneira o Rio Grande do Norte, assim como os demais estados nordestinos,
“herdou” do Complexo Nordestino, uma dinâmica especifica de acumulação que tinha a
demanda externa como o principal determinante da economia regional. Essa herança se
reproduziu nos séculos subsequentes e reafirmava uma estrutura produtiva montada a partir
do século XVI com as seguintes características:

[...] concentração da propriedade da terra e da renda, prioridade à agricultura de


exportação, manutenção marginal/funcional da agricultura de subsistência e
imposição de um sistema político regional que se assemelhava a um tipo
plutocrático – que contribuiu para uma baixa divisão social do trabalho e uma
organização territorial marcada por baixa urbanização. (ARAUJO, 2010, p. 14)

Esses fatos, concentração da propriedade e de renda, são até hoje, os


sustentáculos que contribuem para a dominação das elites no Nordeste. Não é à toa que os
estados nordestinos são os que mais concentram oligarquias e grupos políticos locais que
fazem dos seus respectivos estados verdadeiros feudos. No Rio Grande do Norte não é
diferente.
O processo de povoamento no Rio Grande do Norte que tinha como
características, em seu início, uma concentração populacional no litoral vai se estendendo

28
para o interior a partir do final do século XXVIII em virtude da pecuária extensiva e das
oficinas de carne. A fixação das fazendas de gado no interior possibilitou que houvesse uma
extensão territorial que ligou o sertão pastoril com o litoral agrícola e facilitou o escoamento
dos rebanhos das diversas ribeiras para o mercado consumidor através dos caminhos do gado
contribuindo na formação de novos e pequenos povoados.
No final do século XIX a economia do Rio Grande do Norte possuía um caráter
agroexportador especializada na produção de matérias como algodão, sal e açúcar. Em
decorrência de uma grande seca no nordeste (1845) em que parte do rebanho bovino norte-
rio-grandense foi dizimado, a Província se vê obrigada a voltar-se para a produção de
açúcar12. É a partir deste momento que o Rio Grande do Norte se integra ao mercado
internacional.
A crescente demanda surgida com a exportação para o mercado internacional
faz que se passe a utilizar novas técnicas com vistas a intensificar o processo de produção que
rebaterá sobre os territórios norte-rio-grandenses. A seca de 1845 leva a intensificação do
cultivo do algodão na Província facilitada pela introdução de maquinas descaroçadoras e do
cultivo de um outro tipo de algodão – o algodão herbáceo. A Guerra de Secessão Americana
também contribuiu com este fato e o algodão passou a ser a principal matéria prima de
exportação do Rio Grande do Norte.
Na segunda metade do século XIX além da construção das primeiras estradas de
ferro (1875 – 1883), ocorreu a oferta de infraestrutura e serviços urbanos na capital
(água encanada, hospitais, instalação de trilhos urbanos, iluminação pública,
telégrafos, criação do porto de Natal, por exemplo), que ajudaram a compor uma
nova configuração territorial [...]. Não era mais o tempo da natureza que imperava,
mas o tempo da técnica, a qual se tornava uma forte e definitiva aliada na superação
das distâncias geográficas. É importante ressaltar que a construção de infraestruturas
rodoviária, elétrica e de comunicação já estava ocorrendo em outros locais do
território brasileiro, iniciando com a oferta de energia elétrica, telefones e
posteriormente com bases rodoviárias e ferroviárias. Essas infraestruturas eram
fatores determinantes ao processo de modernização dos centros urbanos.
(BARBOSA, 2016, p. 39)

Nas últimas décadas do século XX o Rio Grande do Norte passou por diversas
transformações na estrutura produtiva reconfigurando o seu território a partir da
reestruturação do capital em escala global. Até o final do século XX é possível notar o
desaparecimento de determinadas atividades produtivas e o surgimento, redefinição e

12
Quando o açúcar começou a ser produzido no Rio Grande do Norte, o nordeste já se encontrava como
fornecedor secundário no mercado internacional. O açúcar produzido no Rio Grande do Norte era voltada para o
mercado nacional. Mesmo assim, essa produção perdurou até o ano de 1870. A partir deste ano vai perder espaço
para o algodão que será o principal produto da economia norte-rio-grandense. Concomitante a isso o algodão é o
principal produto de exportação do Rio Grande do Norte mantendo essa liderança até o início da década de 1970.

29
dinamização de outras com novas formas e materialidades, bem como, novos objetos e
conteúdos técnicos, políticos e sociais no território. Até a metade do século XX a economia
norte-rio-grandense tinha características rurais com destaque para a produção de cana-de-
açúcar na Zona da Mata e parte do Agreste, a cotonicultura nas demais regiões, associando-se
às culturas alimentares de subsistência como o milho, o feijão e a mandioca; a pecuária no
sertão, interpondo-se à cotonicultura e à policultura de subsistência; além da atividade
salineira no litoral centro-norte e oeste do estado. (AZEVEDO, 2013)
Essas atividades tinham uma importância no contexto da economia local e
regional, repercutindo diretamente na configuração sociocultural e política e na constituição
de uma cultura política traças fortes do coronelismo nordestino.
Essas características são fruto da forma como estava organizado o sistema
produtivo no estado que tinha como sede, para o beneficiamento da produção agropecuária, os
núcleos urbanos, caso dos engenhos de açúcar, das algodoeiras, das fábricas de óleos (oiticica
e algodão), das oficinas de carne seca ou de sol, os curtumes e as casas de farinha, comum no
interior do estado, principalmente no espaço rural, mas também no urbano. As cidades tinham
as funções de comercialização da produção agrícola rural, e de beneficiamento de parte da
produção gerada no campo. Não é à toa que os principais núcleos urbanos no nordeste do
Brasil surgiram a partir das atividades econômicas, tais como, pecuária, cotonicultura e
diversas outras atividades agrícolas. (FELIPE, 1986, AZEVEDO, 2013). “[...] as cidades
sertanejas, criadas por essa divisão territorial do trabalho, têm suas funções e formas
determinadas pela sua maior ou menor proximidade dos espaços de produção (o Sertão) e dos
espaços de consumo e escoamento (o litoral)” (FELIPE, 1986, p.11).

Desse modo, a distribuição populacional também esteve (e continua) diretamente


ligada à dinâmica econômica, pautada no desenvolvimento de determinadas
atividades produtivas. No Rio Grande do Norte, a industrialização do algodão foi
responsável pelo avanço do processo de urbanização em vários municípios, assim
como a atividade mineradora, o comércio e o setor de serviços. (Azevedo, 2013, p.
116)

A partir dos anos de 1960 a população do Rio Grande do Norte se concentrava


no espaço rural. Aproximadamente 70% da população economicamente ativa do estado
trabalhava na agropecuária, percentual equivalente à população que vivia no espaço rural. A
indústria empregava apenas 8% da população economicamente ativa, sendo que 30% da
população residia no espaço urbano. (AZEVEDO, 2013)

30
Dos anos de 1960 em diante vai ocorrer uma diminuição no percentual da
população economicamente ativa do estado. Dois fatores podem ser apontados para esse fato:
a incapacidade de absorção de mão de obra no setor agrícola, que acabava “empurrando” a
população para as cidades, gerando o aumento do desempregou e do subemprego e, a não
absorção dos trabalhadores no setor terciário que estava se formando.

[...] excetuando-se as atividades salineira, mineradora e a incipiente indústria têxtil,


o sistema econômico do estado passou por forte crise nos anos 1970/1980, apesar de
a Petrobras S.A. sinalizar para uma fase por vir promissora, tendo em vista a
descoberta de uma importante reserva de petróleo no litoral potiguar em 1974. Esse
período de crise foi agravado por um longo período de estiagem, comprometendo
uma das bases econômicas principais da região, a agropecuária, o que se fez refletir
também na capital, tendo em vista o volume expressivo de migrantes que esta
passou a receber. As intervenções pontuais da Superintendência de
Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE) não foram suficientes para evitar a
instauração e agravamento da crise econômica e social. Em meados da década de
1970 disseminaram-se no estado as tradicionais frentes de emergência, medida
paliativa adotada pelo governo com o intuito de amenizar os efeitos da seca e da
catástrofe social que assolou a maior parte da região Nordeste naquele período,
perdurando até meados dos anos 1980. Obviamente essa política de governo
beneficiou principalmente as oligarquias regionais formadas pelos tradicionais
coronéis, muitos deles políticos, além de seus aliados e parentelas, criando o que se
consagrou denominar “indústria da seca”. A população abrangida por essa medida
era facilmente manipulada e controlada quanto ao exercício dos direitos civis e
políticos, a exemplo do ato de votar, referendando, assim, o poder coronelista e
oligárquico até hoje hegemônico no estado e em boa parte da região. A partir dos
anos 1980, várias mudanças passaram a ser observadas no processo de produção do
espaço potiguar, principalmente como resultado dos incentivos estatais, em
consonância com o movimento do capital privado, sobretudo, no processo de
fomento e/ou (re)estruturação das atividades: agropecuária, pesca, turismo,
mineração, construção civil, carcinicultura, indústria têxtil, comércio e serviços. Nos
anos 1990, os investimentos públicos e privados convergiram, sobretudo, para uma
política de modernização econômica do estado, especialmente com base nas
principais atividades: agricultura irrigada no Vale do Açu, o turismo no litoral leste,
principalmente na capital e adjacências, petróleo e gás no litoral norte, parte do
noroeste e Vale do Açu, sal também no litoral norte e parte do oeste, a pecuária
leiteira no Seridó e parte do Agreste, comércio e serviços na capital e nas principais
cidades que se constituem como centros regionais, construção civil em Natal e
Mossoró, dentre outros vetores representativos local ou regionalmente. [...]. A maior
parte dessas atividades evidencia uma notável capacidade de abertura da economia
do Rio Grande do Norte, em relação aos investimentos privados de agentes
nacionais e/ou mundiais do capital, ditos globalizados. Nota-se forte capacidade
técnica no interior desse processo, com a introdução no território potiguar de ações e
objetos técnicos marcados por conteúdos nunca antes vistos. Exemplo disso
observa-se na agricultura irrigada, na atividade petrolífera, no comércio e no setor de
serviços, incluindo o turismo, vetores esses que passaram a receber fortes
investimentos de grupos econômicos estrangeiros, bem como vários incentivos
governamentais, fortemente imbuídos de conteúdos técnicos, financeiros, portanto
econômicos e políticos. Novas materialidades surgiram ou foram redimensionadas
no território como forma de assegurar os fixos para garantirem os fluxos materiais e
imateriais, dinheiro, informação, tecnologia, mão-de-obra, etc . (AZEVEDO, 2013,
p.117-118 )

31
Nessa fase, o Estado passa a se voltar prioritariamente para o setor produtivo,
mesmo que através da tomada de empréstimos junto aos organismos internacionais, como o
Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento, buscando modernizar a
economia local, estimulando o crescimento econômico a partir das atividades citadas, o que
não representou necessariamente melhorias no estado de bem-estar-social, pois às vezes o
processo é exatamente inverso, isto é, o crescimento econômico se deu em detrimento de
melhorias nas condições sociais da população do estado, a exemplo do que ocorre nas áreas
produtoras de petróleo, fruticultura irrigada e/ou turísticas.

1.3 O Rio Grande do Norte e as Suas Oligarquias:

Ao que se foi possível apurar por meio da historiografia potiguar, coube ao fundador
do Partido Republicano, Pedro Velho de Albuquerque Maranhão inaugurar o
sistema oligárquico no Estado. A força política que a família Albuquerque-
Maranhão representava no Rio Grande do Norte durante o século XIX está em
consonância com a definição de oligarquia exibida por Carone (1972, p. 83). Para
ele “um oligarca é igual a um coronel, mas entre eles, a diferença é de escala
política. O coronel é o chefe local, o oligarca transpõe o seu poder para o estado”.
(BARBOSA, 2016, p. 41)

A base econômica da primeira oligarquia pedrovelhista foi o açúcar e tinha


como marca de seu governo a manutenção dos seus interesses pessoais em detrimento dos
interesses do seu partido político. Para Spinelli (1992, p. 21), “os remanescentes da velha
oligarquia pedrovelhista foram perdendo progressivamente o controle da máquina política,
embora tenham conservado até o final da Primeira República, postos eletivos, cargos e
influência na política federal”. Essa relativa perda de força no poder político estadual
forneceu abertura para formação e fortalecimento de outros centros de comando, à exemplo
da região do litoral, predominando as oligarquias açucareiro-têxtil e no Seridó, algodoeiro-
pecuária. (SPINELLI, 1992)

FIGURA 1: OLIGARQUIA ALBUQUERQUE MARANHÃO – SIMPLIFICADA

32
Fonte: Copiado com adaptações de BARBOSA, 2015, p. 112.

Nos idos dos anos de 1920 surge outra oligarquia no Rio Grande do Norte, a
base de suas atividades era a exportação de algodão e pecuária e era comandada a partir da
influência dos grandes proprietários de terra e dos comerciantes da região do Seridó e do
Oeste potiguar. Era representada por José Augusto Bezerra de Medeiros, que exerceu os
mandatos de deputado estadual (1931-1915), governador (1924-1927) e senador (1928-1930)
e ainda conseguiu eleger seu sucessor no governo do estado a pessoa de seu primo, Juvenal
Lamartine. Figuras emblemáticas da oligarquia norte-rio-grandense tem-se ainda Dinarte
Mariz que presidia a UDN (União Democrática Nacional), juntamente com José Augusto
Bezerra de Medeiros e Juvenal Lamartine. Além destes, ainda tivemos Aluízio Alves que,
juntamente com Dinarte Mariz e Juvenal Lamartine, foram aliados políticos até 1960, quando
romperam a amizade devido à disputa pelo governo do estado. (SPINELLI, 1992)
Nesta disputa, Dinarte Mariz conseguiu se eleger governador do estado (1956-
1960), e fez um governo pautado “[...]essencialmente, em contemplar amigos e
correligionários com empregos e aposentadorias em bons cargos públicos”. (GERMANO
apud BARBOSA, 2015, p. 115). Dinarte Mariz protagonizou uma das mais “folclóricas”
gestão do Rio Grande do Norte: outorgou 306 leis para a criação de cargos públicos,
totalizando 835 cargos e criou 135 novas funções gratificadas, 15 novos postos militares e 120
aposentadorias ilícitas. Além disto ainda nomeou Luís da Câmara Cascudo como consultor
geral do estado sem este possuir nenhum trabalho ou estudo na área jurídica. (GERMANO;
MORAIS & CAVIGNAC apud BARBOSA, 2015)

33
A forma que Dinarte Mariz conduziu o Governo do Rio Grande do Norte
levou-o ao descrédito popular e possibilitou que seu antigo amigo e aliado – Aluízio Alves –
se fortalecesse e se tornasse seu principal opositor e crítico e ferrenho nos anos que se
seguiram. (BARBOSA, 2015)
Aluízio Alves ingressou na política a partir de sua atuação na atividade
jornalística.  Advogado com Bacharelado em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de
Direito de Maceió com especialização em Serviço Social, voltou-se às atividades jornalísticas
após a graduação. Foi funcionário dos jornais A Razão e A República, ambos em Natal tendo
se dirigido em 1949 ao Rio de Janeiro onde foi redator-chefe da Tribuna da Imprensa, que
pertencia a Carlos Lacerda. De volta ao Rio Grande do Norte, fundou e dirigiu a Tribuna do
Norte. Ainda no ramo de comunicação foi diretor da Rádio Cabugi, da TV Cabugi e da Rádio
Difusora de Mossoró. Antes foi Oficial de Gabinete da Interventoria potiguar chefe do
Serviço Estadual de Reeducação e Assistência Social (SERAS) e diretor estadual da Legião
Brasileira de Assistência.
Tinha como aliados políticos José Augusto Bezerra de Medeiros e Dinarte
Mariz. Pela UDN Aluízio Alves foi eleito deputado federal  em 1945 e participou da
Assembleia Nacional Constituinte que promulgaria a nova Constituição em 18 de
setembro de 1946. Foi reeleito em 1950, 1954 e 1958, chegou aos postos de secretário-geral
da UDN e vice-líder da bancada.
Em 1960 foi eleito governador do Rio Grande do Norte (1961-1966) pelo
Partido Social Democrático (PSD) derrotando o Djalma Marinho, que era o candidato de
Dinarte Mariz - seu antigo amigo e ex aliado -. Após a instalação da Ditadura Militar (1964-
1985) a animosidade entre Dinarte Mariz e Aluizio Alves se acentuou. Todavia, quem
retomou a cena política do Estado foi Dinarte Mariz.
Mesmo assim, Aluizio Alves ingressou na ARENA e foi eleito para o quinto
mandato de deputado federal em 1966 após Dinarte veta sua candidatura ao Senado Federal.
No ano de 1965 Aluizio Alves ajudou a eleger Monsenhor Walfredo Gurgel para
Governador do Rio Grande do Norte derrotando Dinarte Mariz. Em 1969 teve seu mandato
de deputado cassado, fora acusado de corrupção em processo que viria a ser arquivado em
1973. Mesmo sem poder atuar diretamente na política soube usar de sua influência e
conseguiu levar vários correligionários para o Movimento Democrático Nacional (MDB) nos
anos de 1970. Após a redemocratização do Brasil ingressou no Partido Popular (PP – atual
Partido Progressista) e, logo em seguida, no Partido do Movimento Democrático do Brasil

34
(PMDB). Na eleição de 1982, foi derrotado por José Agripino na disputa pelo Governo do
Rio Grande do Norte.
Apoiou Tancredo Neves à Presidência da República tendo seu nome indicado
para Ministro da Administração e depois confirmado, após a morte de Tancredo, por José
Sarney, para o mesmo Ministério (1985-1989). Em 1990 foi eleito para o sexto mandato de
deputado Federal e quando do Governo Itamar Franco foi Ministro da Integração Regional
(1994-1995).
Tendo sua origem em Angicos-RN, ele conseguiu forjar sua campanha para governo
do Estado com os argumentos da novidade, pois se apresentava como porta voz da
esperança para o Rio Grande do Norte. Sendo aquele que romperia com os interesses
oligárquicos do Seridó (representado por Dinarte Mariz) e conseguiria proporcionar
desenvolvimento econômico e social para tirar o Estado do atraso transformando-o
em um território moderno. Com esse discurso, Aluízio Alves deu origem a uma
nova oligarquia. [...]A oligarquia Alves construiu no Rio Grande do Norte um
império na comunicação. Detém o controle das seguintes empresas: TV Cabugi;
Rádio Cabugi (AM e FM); Rádio difusora de Mossoró; Rádio Cabugi Seridó; Rádio
Cabugi de Jardim do Seridó; FM Líder (atual 104 de Paranamirim). Todavia não é
um privilégio dessa família, pois outras famílias oligarcas potiguares também
construíram seus impérios empresariais, é o caso dos Maia, cuja origem está em
Tarcísio Maia, e se destaca não apenas no setor de comunicações, mas no de
combustível. A representação simplificada da família oligarca Alves é emblemática
no que diz respeito a construção de uma teia política que não é fruto do acaso. A
irmã do patriarca da oligarquia, Diúda Alves, por exemplo, é casada com o
Deputado Estadual José Dias (PSD). A esposa do atual Prefeito de Natal, Carlos
Eduardo – sobrinho de Aluízio Alves – é neta do ex-governador Cortez Pereira. O
Deputado Federal, Henrique Alves, atualmente está casado com Laurita Arruda,
filha do Jornalista Cassiano Arruda Câmara, que foi marqueteiro da campanha para
o Governo do Estado de Rosalba Ciarlini Rosado. A família Arruda Câmara tem
presença destacada não apenas no jornalismo que se faz em terras potiguares, como
também na vida política do Estado. Inclusive, após a eleição de Rosalba Rosado em
2010, foi nomeado como Secretário de Saúde Pública do Estado do Rio Grande do
Norte o Sr. Dr. Domício de Arruda Câmara (exonerado no ano seguinte), irmão de
Cassiano de Arruda Câmara e tio de Laurita Arruda, esposa de Henrique Eduardo
Alves. (BARBOSA, 2015, p. 116-117)

Aluízio Alves é tio de Garibaldi Alves e pai de Henrique Alves 13. Este último
foi eleito por dez mandatos consecutivos para Deputado Federal (1971-2015), Presidente da
Câmara dos Deputados do Brasil (2013-2015), Ministro do Turismo nos governos de Dilma
Roussef (16/04/15 -28/03/2016) e Michel Temer (12/05/16-16/06/16).

FIGURA 2 - OLIGARQUIA ALVES

13
Encontra-se preso, desde 6 de junho de 2017, pela Polícia Federal na Operação Manus, que investiga
corrupção ativa e passiva e lavagem de dinheiro na construção da Arena das Dunas.

35
Outro nome da oligarquia norte-rio-grandense é a família Maia. O seu
patriarca, Tarcisio Maia14 teve origem como grande proprietário de terras no município de

14
A história política do Rio Grande do Norte é recheada de aspectos do patrimonialismo apresentado em Faoro
em sua clássica obra “Os donos do Poder”. Após o rompimento entre Aluízio Alves e Dinarte Mariz, dada no
final da década de 1960, o estado passa por enormes turbulências e radicalização na política. Em 1978 os
principais adversários políticos do estado, após a implantação da Ditadura Militar, mais precisamente ao final
dos anos de 1970, Aluizistas e Dinartistas. O Pacto da Paz teve início com a escolha do nome de Tarcísio Maia
para governador do Rio Grande do Norte indicado pelos militares. A época a ARENA se dividiu em dois grupos:
um apoiava o nome de Dix-Huit – grupo de Dinarte, e o segundo apoiava o nome de Osmundo Faria. O nome de
Osmundo tinha o apoio do Ministro do Exército Dayle Coutinho. O então presidente militar, General Ernesto
Geisel, opta pelo nome de Osmundo e envia o senador Petrônio Portela para comunicar oficialmente a notícia.
Contudo, Osmundo falece de maneira súbita e em seu velório, o general Golbery do couto e Silva, entrega ao
senador Petrônio um novo nome – o de Tarcísio Maia - Aluízio Alves recebe uma ligação de João Agripino
Maia (irmão de Tarcísio), e pede que não faça nenhuma oposição ao nome de seu irmão. O pedido fora feito

36
Mossoró. Ocupou os cargos de secretário de educação (1955-1960) no governo de Dinarte
Mariz, e também foi deputado federal pela UDN (1959-1963). De 1975 a 1979 foi designado
governador do Rio Grande do Norte pela Aliança Renovadora Nacional (ARENA) com o
apoio de Dinarte Mariz sendo sucedido por seu primo Lavoisier Maia (1979-1982). Lavoisier
havia ocupado a Secretaria Estadual de Saúde no governo de Tarcisio Maia, cargo que
exerceu simultaneamente com o de presidente da Comissão de Fiscalização Estadual de
Entorpecentes do Ministério da Saúde. Nesse mesmo período foi ainda Secretário de Justiça.
Em 1979 nomeia seu primo José Agripino Maia prefeito (1979-1982) “biônico 15” da cidade de
Natal. Após deixar o governo foi nomeado assessor do Ministério da Saúde no estado do Rio
Grande do Norte e apoiou Paulo Maluf na sucessão presidencial indireta de 1985. Com a
extinção da ARENA ingressou no Partido Democrático Social (PDS) sendo presidente da
executiva regional e também membro do diretório nacional da legenda.  Nesse mesmo ano sua
esposa (de quem se separaria no início de 1992) Wilma Maia perdeu a eleição para a
Prefeitura de Natal em disputa contra Garibaldi Alves Filho, contudo em 1986 o casal foi
vitorioso nas urnas: ele foi eleito senador e ela deputada federal, tendo ambos ingressado
no PDT, logo após a posse sendo que Wilma foi eleita prefeita de Natal em 1988. Nos anos
seguintes Lavoisier Maia tentou voltar ao governo pelo voto popular sendo derrotado por José
Agripino Maia no segundo turno das eleições de 1990
José Agripino Maia, primo de Lavoisier, filho de Tarcísio Maia, em 1982, se
elegeu governador do Rio Grande do Norte, pelo PDS, em disputa contra Aluízio Alves. Foi
eleito com 57% dos votos e seu governo foi marcado pelo “Escândalo do Rabo de Palha”16.
Em 1984, apoiou o candidato do PDS Ministro Mário Andreazza17. Em 1985, foi o primeiro
dos governadores eleitos pelo PDS a romper com o partido, ao apoiar Tancredo Neves no
Colégio Eleitoral, contra Paulo Maluf, que era do PDS. Foi um dos fundadores da Frente

tendo em vista o poder midiático que já possui Aluízio a época. E assim nasce o Pacto da Paz em que Aluízio
não faz uso de suas emissoras de rádio e de seu jornal para fazer oposição ao governo de Tarcísio Maia.
15
Cargo nomeado pelo regime militar, sem eleição, para comandar as capitais dos estados e manter os objetivos
do golpe militar de 1964.
16
O escândalo trata da compra de votos em favor da candidata à Prefeitura de Natal, Wilma Maia (depois
conhecida como Wilma de Faria). No caso se acusa José Agripino de ter instruído seus assessores a compra de
votos a partir da retenção de títulos eleitorais, distribuição de dinheiro, feira, etc., além do uso de veículos
oficiais, com placas frias, para transportar eleitores do interior para a capital do estado no dia da eleição. A
disputa era entre Wilma e Garibaldi, sendo este último, o vencedor do pleito.
17
Foi candidato à sucessão de Figueiredo à Presidência da República, tendo indicado por este último para
sucedê-lo. Como Paulo Maluf também se candidatou, foi obrigado a concorrer na convenção nacional do PDS.
Foi derrotado na convenção nacional do PDS em 11 de agosto de 1984, pelo deputado Paulo Maluf por 493
votos a 350, fato esse que motivou a cisão do partido, dando origem à chamada Frente Liberal (depois PFL –
Partido da Frente Liberal - atual Democratas) que apoiou o candidato da oposição Tancredo Neves, vencedor
das eleições.

37
Liberal, pela qual disputou todas as eleições seguintes, a exceção de 2010, quando o PFL
mudou de nome para DEM (DEMOCRATAS). Antes da conclusão do mandato,
desincompatibilizou-se para disputar uma vaga ao Senado nas eleições de 1986, obtendo
êxito, ao lado de Lavoisier Maia (PDS). 
[...] é importante lembrar que José Agripino Maia (filho de Tarcísio Maia) atuou
como engenheiro civil na Empresa Industrial Técnica – EIT no período de 1969 a
1975 [...]. Mesmo após a sua saída do quadro de funcionários da empresa para
assumir a Prefeitura de Natal, Agripino, tornou-se sócio da EIT mantendo esta
condição até 2008. Ressalte-se ainda que duas grandes obras de sua administração:
construção da via costeira e da rota do sol, voltadas a dinamizar a atividade turística
em Natal, tiveram a EIT como ganhadora do certame e, por conseguinte, executora
dessas obras. Pode-se então refletir acerca da existência de uma solidariedade
político organizacional para a modernização do território norte-rio-grandense através
de uma ação burocrática que privilegia as oligarquias potiguares e as empresas a elas
solidárias. (BARBOSA, 2015, p. 122)

Atualmente ocupa o cargo de Senador do Rio Grande do Norte. É proprietário


da TV Tropical, afiliada da Record TV no estado do Rio Grande do Norte, além da rede de
emissoras de rádios vinculadas à Rede Tropical. Sua influência política no estado do Rio
Grande do Norte ajudou a inserir na política estadual o seu filho, Felipe Maia (Deputado
Federal). É primo do ex-prefeito da cidade do Rio de Janeiro, César Maia e primo de segundo
grau do atual presidente da Câmara dos Deputados Rodrigo Maia.

FIGURA 3 - OLIGARQUIA MAIA - SIMPLIFICADA

38
Por fim, temos a oligarquia da família Rosado, objeto desta tese, e que será
tratada no capitulo 2.

MAPA 2: AS OLIGARQUIAS DO RIO GRANDE DO NORTE

Fonte: Copiado de BARBOSA, 2013, p. 114

39
É perceptível, nesse breve histórico do surgimento das oligarquias no Rio
Grande do Norte o caráter patrimonialista de todas elas. Para Faoro (2000) as oligarquias no
Brasil se dividem em estamentos e a partir disso exercem o controle do Estado, tornando-o
centralizador e administrado em prol de uma camada político-social que lhes dá vida.
As oligarquias potiguares são essencialmente personalistas, possuem uma
mentalidade pré-moderna, desprezam a distinção entre as esferas pública e privada. Dividem
o estado como se fossem de sua propriedade, predominando o particularismo, o poder pessoal
e o favoritismo, pelo qual conseguem ascensão social, cooptam com o sistema jurídico
fazendo prevalecer o poder particular e os privilégios em detrimento da universalidade e da
igualdade formal e jurídica, pregada pelo liberalismo. Faz do território onde exercem seus
poderes um loca de total distanciamento dos interesses do restante da sociedade, usando os
recurso públicos, e até mesmo, toda a estrutura estatal em proveito dos seus interesses
pessoais.

40
CAPITULO III
3 A OLIGARQUIA ROSADO E A CIDADE DE MOSSORÓ

Para que possamos entender a formação da oligarquia Rosado no Oeste do Rio


Grande do Norte e fazendo a trajetória que traçamos para a apresentação das demais
oligarquias no estado, optou-se por uma breve descrição das características econômicas da
cidade, bem como a origem de suas atividades econômica.

2.1 Breve Histórico da Fases Econômicas da Cidade de Mossoró:

A cidade de Mossoró, durante o primeiro ciclo do algodão no Brasil tinha a


atividade pastoril como principal atividade econômica. O desenvolvimento da cotonicultura
vinda dando novas feições aos empórios comerciais surgidos com a produção de sal da
metade do século XVIII. Como exemplo tinha-se a cidade de Aracati na foz do Jaguaribe e
Açú a produção de oficinas de carne na foz o rio Açu.
A disseminação da cotonicultura dada a partir do vale do Jaguaribe favoreceu o
desenvolvimento do Porto de Aracati. No início do século XIX a cidade de Aracati era uma
das mais opulentas do Ceará. Essa projeção se dava pela localização do seu porto, utilizado
como ponto de embarque dos fardos de algodão e couros produzidos pelas vilas vizinhas e até
de outras províncias.
Na cidade de Mossoró ainda não havia se desenvolvido a cotonicultura de
maneira mais intensa. Até meados do século XIX era um pequeno povoado pobre, com um
comércio insignificante e que dependia de Aracati para abastecer a população de gêneros
alimentícios, tecidos, etc. Suas relações comerciais se resumiam ao comércio de sal que as
canoas levavam de Grossos18 até o porto de Santo Antônio19 e de lá as tropas se encarregavam
de distribuir pelos povoados circunvizinhos.
A partir da metade do século XIX vai se processar uma reformulação na
hierarquia e nas relações dos núcleos urbanos situado nas ribeiras dos rios Jaguaribe,
Mossoró-Apodí e Açú-Piranhas. O assoreamento no estuário do rio Jaguaribe vai refletir na

18
Nas salinas naturais do córrego.
19
Na jusante com o rio Mossoró

41
progressiva decadência do porto de Aracati o que vai favorecer as comunicações por terra
para Recife, cujo a cidade de Icó se encontra em melhor posição.

[...] Os comerciantes de Aracati viram-se forçados a recorrer a rota terrestre que por
Mossoró, no Rio Grande do Norte, levava a Recife. A aceleração da atividade
comercial correlata ao surto algodoeiro (1860-1872) se refletirá nos núcleos urbanos
melhor situados para o fluxo exportador – como Fortaleza e Mossoró. Aracati
mantinha o domínio do baixo vale do Jaguaribe, Fortaleza conseguiu ampliar seu
raio de ação, para além das zonas produtoras de algodão. As cidades do médio e do
alto vale como Icó e Crato passaram a depender de Mossoró, um novo centro
exportador que se projetava graças ao comércio do algodão20.
(RELATÓRIO/DISSERTAÇÃO)

Com o comércio exportador do algodão a cidade se transforma. De centro


comercial sem nenhuma expressão em 1841 consegue, a partir de 1860, apresentar-se como
Empório comercial do nordeste onde atrai as primeiras firmas exportadoras que chegam à
cidade a partir das décadas de 1850 e 1860. A partir de 1866, com a regulação da navegação
marítima, Mossoró passa a ser escala regular dos vapores da Companhia Pernambucana de
Navegação Costeira. Isto significa a exportação diretamente para a Europa através de firmas
exportadoras instaladas na cidade como a Casa Graff21, de Jonh Ulrich Graf, e a Casa
Mossoró, do barão de Ibiapaba. Ao lado das atividades de exportação e importação comercial
também se desenvolveu a extração de sal22. As firmas exportadoras e importadoras com sede
na capital da província e em outros centros comerciais do país demandavam, para o seu pleno
funcionamento e transportes das suas mercadorias, de um conjunto de infraestruturas, que

20
Na perspectiva da abordagem do desenvolvimento local é necessário levar em contar os aspectos das
determinações estruturais para se pensar a dimensão espacial no processo de desenvolvimento capitalista, neste
sentido faço uso das ideias presentes no pensamento de Carlos Brandão, (2007) que entende que as concepções
hegemônicas negam a importância do ambiente macroeconômico, dos conflitos sociais, das estruturação das
classes sociais e da noção e do papel de espaço social nessas explicações. Muitas vezes, esses aspectos são
ignorados criando-se a falsa impressão que basta o voluntarismo, o empreendedorismo para que possa acontecer
o chamado desenvolvimento de uma região, de um pais ou mesmo de uma cidade, bastando apenas que se
desenvolva as potencialidades endógenas daquele espaço. Com este intuito, as ideias de Carlos Brandão serão
usadas para explicar o desenvolvimento da cidade de Mossoró que sempre esteve à mercê dos interesses pessoais
dos grupos que possuem o poder político local na criação de suas vocações “[...] a coesão é criada
simbolicamente, com a elite local, articulando o discurso em prol dos interesses legítimos da região: os donos do
poder local instrumentalizam-se contra os valores universais e reacendem toda sorte de particularismo”.
(BRANDÃO, 2007, p. 26)
21
Composta por capital suíço e inglês.
22
A criação das tarifas aduaneiras, cada vez mais elevadas, vai oferecer condições para o desenvolvimento das
salinas norte-rio-grandenses. A coleta do produto, quase de maneira artesanal, nas salinas naturais, que havia
sido iniciada e a partir de 1858, vai sendo substituída, paulatinamente, pela construção de salinas ao longo dos
rios (Açú e Mossoró), o capital financeiro, empregado para este fim, era o excedente da atividade comercial e a
mão de obra utilizada era os migrantes expulsos do sertão pelas constantes secas. (FELIPE, 1982). Sendo
Mossoró grande centro comercial para lá convergiam as populações flageladas vítimas das sucessivas e
constantes secas nordestinas. Foi o que ocorreu durante as secas de 1877-1879, 1888-1889, 1891-1892, 1898,
1900, 1902-1904, 1908 (RELATÓRIO, s/p)

42
configurava a base material do território nesse período a exemplo de estradas de ferro e
transporte marítimo. Preocupados em manter a hegemonia comercial no nordeste, a burguesia
comercial, instalada em Mossoró, possuía diversos projetos de desenvolvimento local, dentre
eles se destaca a construção de uma estrada de ferro partindo de Areia Branca, cruzando
Mossoró, Apodí e Pau dos Ferros23. (FELIPE, 1982, 2001; SOUZA, 1999, LIMA, 1997;
BARBOSA, 2010)
Passando a ideia de cidade desenvolvida, Mossoró também atraia jovens
profissionais liberais, recém formados – médicos, advogados, farmacêuticos, empresários e
outros profissionais -, dos vizinhos estados do Ceará, Paraíba e Pernambuco que para lá
convergiam na esperança de uma vida nova numa terra em ascensão 24. Apesar de cidade
empório, Mossoró não possuía infraestrutura que pudesse sustentar o título por muito tempo.
O que levou a cidade a perder sua posição de empório comercial para as cidades de Fortaleza
e Campina Grande ainda nas primeiras décadas do século XX.
Mesmo assim, os discursos de grandes projetos para o desenvolvimento local
se mantinha nas falas dos chefes locais que usavam como sinônimo de modernidade e
pioneirismo mesmo quando sua execução já não condizia com os propósitos de quando foram
elaborados25. A lentidão de uma rede ferroviária e viária determinou a derrocada do comércio
de Mossoró nos anos de 1924-1926, bem como, o não emprego de métodos modernos de
purificação do sal pela indústria salineira financiada com capital local, levaram a cidade a um
declínio econômico, pois não se tinha mais a pujança do comércio local e não se substituía
essa atividade pela extração de sal, que era rejeitado pelo mercado nacional do sul e sudeste
do país. (FELIPE, 1982, 2001; ELIAS, PEQUENO, ROMCY, 2016)
Mesmo perdendo o título de cidade empório, Mossoró possuía outros atrativos:
bandas de músicas, teatros, cinemas, lojas maçônicas que promoviam grandes festas, boticas
23
Essa estrada de ferro nunca foi construída, mas o seu projeto nos dar a dimensão do volume comercial de
Mossoró nesta época e demonstra os reais interesses da burguesia com o desenvolvimento local. A partir de 1910
a cidade de Fortaleza passa a influenciar todo o sudeste cearense, incluindo o Cariri e o Vale do Salgado fruto da
construção da Estrada de Ferro de Baturité que teve início em 1877 e alcançou o Quixadá em 1891,
Quixeramobim em 1894, Iguatu em 1910, Cedro em 1916, penetrando a Paraíba pelo Baixio em 1923. Essa
Estrada de Ferro atinge ainda as cidades do interior da Paraíba na seguinte ordem: São José do Rio do Peixe
(1923), Cajazeiras e Souza (1926), Pombal (1932). Mossoró só teve a sua estrada de ferro na segunda metade da
década de 1920 e sua extensão atinge as cidades de São Sebastião (atual Governador Dix-Sept Rosado) em 1926
e Caraúbas (1929). A época não havia mais meios de Mossoró concorrer com Fortaleza. Quando a Estrada de
Ferro Mossoró-Souza veio a alcançar a região do Rio do Peixe, que era influenciada tradicionalmente por
Mossoró, ela já estava se constituindo em região influenciada por Campina Grande, que conseguiu, através da
construção da Rodovia Campina Grande-Cajazeiras (1915) penetrar o interior da Paraíba e concorrer com
Fortaleza. (LIMA, 1997; RELATÓRIO, s/p)
24
Até hoje essa ideia é vendida através de matérias pagas nos veículos de mídia nacional pelos governantes da
cidade.
25
É o caso da demora da construção da Estrada de Ferro.

43
sortidas, telégrafos, escolas, jornais de circulação semanal. A cidade ingressa no século XX
sendo ainda local para onde convergiam muitos migrantes sertanejos em busca de trabalho.
Com casas comerciais e firmas exportadoras de estrangeiros, único banco privado do estado
com capital local (Banco Mossoró – 1937- 1995), agua mineral que abastecia as casas, se
apresentando como a primeira cidade a libertar seus escravos, possuir a maior fazenda de caju
do mundo (MAISA – 1980-2000), sede de duas universidades públicas (estadual e federal),
dois jornais de circulação diária, emissoras de rádio.

2.2 O Surgimento e a Consolidação do Mandonismo dos Rosados na cidade de


Mossoró – 1917-198826:

Os Rosados sempre são apontados tendo como marco diferencial do seu poder
político o fato de não serem grandes proprietários de terras rurais. Assim, o surgimento da
liderança do patriarca - Jerônimo Rosado 27 - o desenvolvimento e a consolidação do poder
dessa família estão vinculados às alianças que seu patriarca fez, no final do século XIX e
início do século XX, com as elites locais. As alianças são explicadas pela atividade que
exercia- boticário - na cidade de Mossoró no início do século XX. A atividade fez com que
prestasse vários “favores” às populações rurais do estado, bem como, dos municípios vizinhos
pertencentes aos estados da Paraíba e do Ceará.
O patriarca dos Rosados chegou em Mossoró quando a cidade se encontrava sob o
domínio dos partidários do Partido Liberal que tinha como seu principal chefe o médico
Almeida Castro. Ao mesmo tempo que instala sua farmácia em Mossoró, Seu Rosado se volta
26
Minha dissertação de mestrado foi intitulada O Mandonismo da família Rosado em Mossoró – 1917-1988,
defendida em 1998 na Universidade Federal da Paraíba. Nela apresentei a origem, desenvolvimento e
consolidação do mandonismo dos Rosados em Mossoró. O ano de 1917 foi escolhido por ser a data da chegada
do patriarca da família – Jerônimo Rosado – a chefia da intendência municipal, cargo equivalente atualmente ao
de prefeito. O ano de 1988 foi escolhido por ser o ano da cisão da família em alas. Defendi a época que a cisão
se deu para a manutenção do poder que estava em desgaste fase a recente urbanização da cidade e pela
reconfiguração de novos sujeitos políticos, como os professores universitários da UERN, bem como a tentativa
de ampliação do poder dos Alves e Maias na cidade, fato verificado pelas alianças das alas aos Alves –
Sandrismo - e aos Maias – Rosalbismo.
27
Nasceu em Catolé do Rocha, filho de uma extensa prole (tinha mais de 9 irmãos), ficou órfão de pai aos 10
anos de idade. O pai fora criador de gado e devido a doença que o acometeu, teve que vender os bens da família
e o que sobrou foi usado para o sustento da família após sua morte. Jerônimo Rosado foi caixeiro viajante e era
tido como uma criança esperta que chamou a atenção de Venâncio Veiga (juiz e mais tarde presidente
(governador) e senador pela Paraíba – amigo de Epitácio Pessoa) que custeou seus estudos em Farmácia no Rio
de Janeiro. Casou-se em 1889, em Catolé do Rocha, com Sinhazinha – Maria Amélia Henriques Maia, com
quem teve três filhos. Sinhazinha morre em 1892. Casa-se com sua cunhada, irmã de Sinhazinha – Isaura Amélia
Henriques Maia, com quem teve 18 filhos, chamando a atenção para excentricidade de nominar os filhos com os
números em francês. Jerônimo Rosado recebe carta, no início de 1890, do médico Francisco Pinheiro de
Almeida Castro. A carta era um convite para que ele montasse uma farmácia na cidade de Mossoró.
(CASCUDO, 1967)

44
para outras atividades, tais como, experimentos agrícolas28, leciona física e química no
Colégio 07 de setembro e assim vai se tornando cada vez mais expoente da elite local.
Todavia sempre foi muito mais um bom “cabo eleitoral” do que qualquer outra coisa, mas
sempre ligado as figuras políticas importantes da cidade como o médico Almeida Castro e
sempre tendo como “guia” o amor e a devoção de Mossoró conforme se verificam nessa
passagem de Cascudo (1991, p. 53):

Em 1890, os quadros partidários eram fechados e resistentes [...] Seu Jeronimo foi o
menos político dos homens. Apenas como ele dizia “acompanhava Almeida Castro”
sem requerer justificações maiores de atitudes [...] o que realmente lhe interessava
era Mossoró. (CASCUDO, 1991, p. 53 – grifos do autor)

Além do exercício do oficio de boticário o desenvolvimento do mando dessa


família é também associado pela sua força econômica advinda da extração de gipsita e pelas
relações com as famílias que detinham o poder econômico e político na cidade no início do
século passado. As relações para além de serem políticas, eram também afetivas, visto que
extrapolaram as alianças políticas e se firmaram através do casamento.
Jerônimo Rosado era pai de uma extensa prole 29, muitos desses filhos se uniram
em matrimônio aos filhos de famílias com expressão política e econômica na cidade e estado,
tais como: Fernandes, Escóssia, Ciarlini, Cantídio. (PAIVA NETO, 1997; LUCAS, 1998;
FELIPE, 1982, 2001). A partir da união através do casamento com os membros das famílias
influentes na região, dos arranjos institucionais quando estavam a frente dos cargos públicos
municipais, os descendentes de Jerônimo, foram capazes de criar uma imagem mítica de sua
família que perpassa gerações e fica marcado na memória afetiva e social de todos os
mossoroenses e dos que ali vivem. Os Rosados sempre são apresentados como protetores da
cidade, seja nos seus aspectos políticos e econômicos, seja em aspectos culturais: “[...] se
colocam como os guardiões da memória da cidade, os “animadores culturais” que, através das
festas cívicas, solenidades e outros rituais mantêm o culto aos heróis do passado e ajudam no
nascimento dos novos mitos que fazem a luta do tempo presente.” (FELIPE, 2001, p.25)

28
Em sua Fazenda Canto, que era considerada a época como um laboratório experimental na área de agricultura.
Está localizado na área urbana de Mossoró (margem esquerda do rio Mossoró), próximo a UFERSA, é imóvel
com perfil rural. Atualmente é utilizada como residência de Rosalba. É chamada a casa do Rosalbismo por ser
utilizado, em épocas de disputas eleitorais, para reuniões e mobilização da militância Rosalbista. Foi eleito
intendente no triênio 1908-1910. (Cargo que corresponde, hoje, o de vereador) e esteve à frente da Chefia da
intendência entre 1917 a 1919, sendo reeleito para o período de 1920 a 1922. A chefia da intendência
corresponde, atualmente, a função de prefeito. Os seus feitos, durante o período em que esteve na cidade, de
1890 até sua morte em 1930, estão contados em livros, biografias, todos publicados pela Coleção Mossoroense.
29
De dois casamentos, com duas irmãs, o patriarca teve vinte e um filhos. A maioria deles foi batizado de acordo
com a ordem de nascimento pelo seu número correspondente em francês.

45
Na criação da imagem do patriarca dos Rosados, bem como, na divulgação da
devoção e da dedicação dos seus filhos à cidade: Dix-sept, Dix-huit e Vingt - a Coleção
Mossoroense30 teve um papel fundamental. Nela, eles são apresentados como homens que
nasceram para construir Mossoró, vinculando a cidade à ação deles e apontado que a cidade
não teria se desenvolvido sem a participação da família. Nisso surge a característica do
patrimonialismo na forma de fazer política da família, onde fica difícil distinguir as
interpelações entre o público e o privado.

[...] chegamos a hipótese de que a ação política tem auxiliado a elaboração da escrita
de vários títulos, bem como a edição dos textos auxilia a ação política da oligarquia.
[...] alguns dos memorialistas e dos historiadores da Coleção Mossoroense
exerceram atividades públicas junto as administrações dos Rosado. [...] Raimundo
Nonato, historiador e memorialista da Coleção Mossoroense, ao ser indagado sobre
o fisiologismo e nepotismo como meio de conservação da política dos Rosado assim
respondeu: Se é de dar ao rato, dá ao gato que é de casa. (PAIVA NETO, 1995,
p. 52, grifos no original)

Através dos escritos dos seus apologistas - Brito, 1985; Bruening, 1989; Cascudo,
1980, 1991 e 1996; Freire, 1954; Galvão, 1982; Lira (Coord.) 1986; Nunes, 1981;
Vasconcelos, 1990 - e pela inserção deles na política local, as suas ações são apontadas como
a propulsora do desenvolvimento local. Assim, os Rosado foram se consolidando como
lideranças políticas locais através do uso dos mitos31 e histórias da cidade. Não é à toa que a
maioria dos trabalhos acadêmicos que versam sobre a família sempre se atêm aos aspectos
simbólicos que ela representa no imaginário local.

30
A ideia da Coleção Mossoroense foi de Vingt-un Rosado, embora nunca tenha exercido cargo público eletivo,
foi diretor da ESAM, fundador e mantenedor da Coleção Mossoroense, responsável em organizar e propagar o
amor de seu pai e de seus irmãos pelo “país de Mossoró” até sua morte em 2005. Apresentado como o intelectual
da família, utilizou a Coleção Mossoroense como o principal instrumento de publicação dos feitos e “glórias” da
família. A Coleção Mossoroense que reúne textos apologéticos à família e a seus aliados. (FELIPE, 2001). É de
Vingt-un Rosado a autoria da criação do termo “país de Mossoró” quando perguntado o porquê do termo,
respondia: “[... ] numa cidade em que as mulheres se insurgem contra a ordem de alistamento de seus maridos
para a Guerra do Paraguai, num protesto conhecido como Motim das Mulheres; em que o povo resistiu
bravamente contra o bando de Lampião; libertam seus escravos, pioneiramente, então, esta não é uma cidade,
mas um país. Por isso, ‘país de Mossoró’”. (Entrevista concedida por Vingt-un, In: LIMA, 2006, p. 4). Mesmo
com a morte de Vingt-Un Rosado ocorrida em 2005 e das constantes “brigas” entre os Rosados, a família ainda
detém forte domínio do aparato midiático local. A família é ainda detentora de concessão de emissoras de rádio
FM (FM Resistencia – desde a década de 90) canal de TV (TV Mossoró), jornal impresso (O Mossoroense
atualmente apenas com circulação digital), e contou, durante toda a década de 1980 em diante, com a Gazeta do
Oeste (cujo proprietário era aliado político de Carlos Augusto), Fundação Vingt-un Rosado (atualmente
mantenedora da Coleção Mossoroense).
31
Quando falo de mito me refiro ao modo como a ação desses homens foram contadas na Coleção Mossoroense.
Para melhor entendimento da forma como atos comuns, do cotidiano ou ações que faziam parte do exercício de
algum cargo que exerciam, foram contados como heroicos ver as obras: A construção do herói-civilizador:
Macondo-Mossoró - Paiva Neto (1997) e A reinvenção do lugar: os Rosados e o “país de Mossoró” – Felipe
(2001)

46
Os Rosados se apropriam dessa memória da cidade, reforçam os heróis e os mitos;
criam outros e, através de cultos, rituais e datas comemorativas colocam-se nessa
história e denominam suas ações de tarefas sagradas. A política é o caminho para a
realização dos sonhos dos antepassados. Apropriando-se politicamente do discurso
dos heróis, renovam a tradição, a linguagem do sagrado e a idéia [sic] de que todos
estão em conformidade para elegê-los os guardiões da cidade permanecem nesse
imaginário como uma fortaleza inviolável a expulsar as ameaças que vêm do seu
exterior. (FELIPE, 2001, p. 16)

Fica assim, pelas mãos dos escritos apologistas, todos publicados pela Coleção
Mossoroense, marcados no imaginário local, como desinteressados por questões políticas
partidárias, sua devoção é enaltecida pelo amor que sente por Mossoró. É, nesse contexto, que
se insere no campo político, primeiro o patriarca, como por exemplo na época da denominada
batalha pela água32, depois os seus filhos que ingressaram na política: Dix-Huit Rosado 33,
Dix-Sept Rosado34, Vingt Rosado35, que se apresentavam como herdeiros de uma vocação
herdada de seu pai - o amor por Mossoró - uma vocação que daria continuidade aquilo que o
pai não pôde fazer. (FELIPE, 2001).
Todavia, basta uma rápida pesquisa a vida do Seu Rosado e de seus filhos para que
se perceba que o patriarca e os seus descendentes logo se interessaram pela política
partidária36. Mas o que fica no imaginário local é que foi esse homem “desinteressado”,
“cheio de amor” por Mossoró, que “abriu37” o caminho e, possibilitou, aos seus descendentes

32
Consistia em uma frente pública federal e outra a partir de recursos de agentes locais, enquanto não chegava
ajuda federal. (CASCUDO, 1991)
33
Primeiro filho de Jerônimo Rosado a entrar na política. Seu primeiro mandato foi como deputado estadual
(1947 a 1951), dois mandatos como deputado federal (1951 a 1955 - 1955 a 1959), um mandato como Senador
(1959 a 1967) e três como prefeito de Mossoró (1973 a 1977, 1983 a 1988, 1993 a 1996). Dix-huit em 1966
renuncia ao mandato de senador, pois é nomeado pelo presidente Costa e Silva para ocupar a presidência do
INDA (Instituto Nacional de Desenvolvimento Agrário), nesse período implantou em Mossoró a ESAM (Escola
Superior de Agronomia de Mossoró), atual UFERSA (Universidade Federal Rural do Semiárido). Dix-huit tinha
formação em medicina e era empresário da área de comunicação, possuía a Radio Tapuyo e o Cine Teatro Cid,
no centro de Mossoró.
34
Governador do Rio Grande do Norte entre 31 de janeiro de 1951 e 12 de julho de 1951. Faleceu de um
acidente de avião em uma viagem ao Rio de Janeiro (a época capital federal) como governador. Antes havia
sido eleito prefeito de Mossoró, no ano de 1948 onde renunciou, em 1951, para se candidatar a governador.
35
Ingressa na política no mesmo ano que Dix-sept onde se elege como vereador do município de Mossoró. Teve
ainda mais um mandato como vereador em 1951, onde renunciou para se candidatar a prefeito que exerceu o
mandato de 1953 a 1956. Foi eleito deputado estadual em 1958 e exerceu sete mandatos como deputado federal
(1962 a 1965, 1966 a 1969, 1970 a 1973, 1974 a 1977, 1978 a 1981, 1982 a 1985 e 1986 a 1989). Ao todo teve
11 mandatos, um recorde na história política. Morreu em 1995 sem mandato.
36
Foi eleito intendente no triênio 1908-1910. O cargo de intendente corresponde ao que hoje seria vereador.
Esteve à frente da Chefia da intendência entre 1917 a 1919, sendo reeleito para o período de 1920 a 1922 . A
chefia da intendência corresponde, atualmente, a função de prefeito.
37
Jerônimo, patriarca dos Rosados por Mossoró, vai ser apresentado como o responsável pela entrada dos seus
filhos na política. “O que eu não fizer, um filho meu fará” é uma das frases preferidas para explicar o amor que
essa família tem à cidade. (CASCUDO, 1996)

47
o exemplo a ser seguido, “tudo pelo bem de Mossoró” e em prol de seu crescimento e
desenvolvimento38. (LUCAS, 1998).
Durante 15 anos – no período de 1930 a 1945 - os Rosado se farão presentes na
política, sem uma participação direta em cargos públicos eletivos, mas dando apoio à família
Fernandes. Todavia, para seus apologistas, eles estavam ocupando em administrar os negócios
da família, a Mineração Jerônimo Rosado Ltda., especialmente, Dix-Sept, o mais velho dos
três, que dirigia a empresa e assumiu o comando econômico do grupo até a sua morte e só
entraram para a vida pública pelo amor à cidade que precisava de seus sacrifícios.
É nesse clima de devoção e sacrifícios pessoais que em 1948 Dix-sept Rosado foi
eleito prefeito de Mossoró e em 1950 se elege governador do Rio Grande do Norte 39
governando de 31 de janeiro de 1951 a 12 de julho de 1951. Na obra de Hélio Galvão Dix-
sept Rosado, esta eleição é apresentada como resultado do excelente desempenho que tivera à
frente da prefeitura de Mossoró. Tido como excelente administrador das empresas da família,
articulador político e “homem do povo”, elege-se com uma maioria superior a 30 mil votos do
seu opositor, Manuel Varela, que era apoiado pelo governador José Varela.
O primeiro governo do estado comandando por um Rosado, embora tenha durado
apenas 4 meses, foi marcado por perseguições aos adversários e tragédias. Logo que tomou
posse como governador, Dix-sept tratou de exonerar todos os adversários políticos ligados à
UDN, uma vez que precisaria abrigar os cafeístas, pessedistas e petebistas que haviam dado
apoio a sua campanha e eleição 40, em maio de 1951, um a acidente de automóvel, ceifa a vida
de Mário Negócio, um dos secretários e Dix-sept e forte articulador de sua campanha. Quatro
meses depois, em julho do mesmo ano, se dá “a verdadeira catástrofe que encheu de luta e dor
38
Após a morte de Jeronimo Rosado, em 1930, o comando político da cidade fica nas mãos de Rafael Fernandes,
que permaneceu líder local até 1935, quando se elegeu governador (1935-1937) e interventor de 1937 a 1943.
(LUCAS, 1998)
39
Renunciou em 1950 para ser candidato a governador.
40
A coligação que elegeu Dix-sept, denominada Aliança Democrática (Partido Republicano - PR, Partido Social
Democrático - PSD e Partido Social Progressista -PSP) tinha a seguinte composição: Dix-sept (PR), Silvio
Pedrosa (vice – PSD - prefeito de Natal), Kerginaldo Cavalvanti (senado - PSP) e na disputa de oposição a
coligação denominada União Popular (Partido Social Trabalhista - PST e União Democrática Nacional - UDN)
com a composição: Manuel Varela (candidato a governador – PST), Duarte Filho (Vice, UDN), Dinarte Mariz
(senado - UDN). Nessas escolhas foram levadas em conta as regiões do Rio Grande do Norte com as seguintes
“representações” – Na coligação Aliança Democrática, Dix-sept representava o Oeste, Silvio Pedrosa o litoral e
Kerginaldo o Agreste e Seridó. Na coligação União Popular, Duarte Filho representava o Oeste, Dinarte Mariz,
o Agreste e Seridó e Manuel Varela, o litoral. Café Filho, à época, deu uma entrevista ao Jornal O
mossoroenseem que endossava a família Rosado como liderança política no oeste potiguar. “[...] Quanto a
política do oeste não tenho dúvidas em afirmar que se trata de um setor magnifico de resistência à política de
cambalachos, de soluções estreitas, no campo dos interesses puramente pessoais ou de grupo. Estou convencido
de que o oeste, sob a liderança de Mossoró, terá uma influência decisiva no panorama estadual. É um erro – já
afirmei em Natal – pretender-se à sua revelia qualquer solução do problema sucessório no Estado .” (O
Mossoroense, 20 de novembro de 1949 In: LUCAS, 1998, p. 62)

48
a nação brasileira41”, Dix-sept e mais três de seus secretários morrem em acidente de avião
sobre o rio do Sal em Sergipe. (LUCAS, 1998)
Nas palavras de José Lacerda Alves Felipe o mais desejado sonho dos Rosados seria
governar o Rio Grande do Norte e tornar o grupo familiar a maior força política do Estado. O
acidente que matou Dix-sept deu fim a esse sonho. Com a morte de Dix-sept, a família tem
frustrada a primeira tentativa de ampliar o mando dos Rosados para fora do âmbito de
Mossoró. Morre o homem, mas fica um segundo mito, e, é a partir o nome de Dix-sept 42 que a
família vai se reorganizar43 e consolidar o mando Rosadista em Mossoró.

[...] foi uma verdadeira catástrofe, vitimando 35 pessoas [...] modificando os rumos
do processo político estadual. Os Rosados perdem o líder e a excelência maior da
família [...]. E perderam também o rumo estabelecido por Dix-sept que visava tornar
o grupo familiar a maior força política do Estado [sic]. (FELIPE, 2001, p. 100)

De 1951 a 198844, a família permaneceu unida em torno do projeto político que era a
ampliação do poder político para fora de Mossoró. O grande projeto político era o retorno ao
governo do estado para concluir as tarefas e os projetos que não foram possíveis serem
cumpridos por Dix-sept. Para melhor compreensão de como atuavam os Rosados na cidade de
Mossoró durante a Ditadura Militar é importante enfatizar que a época as disputas políticas

41
Era esse o título da matéria que noticiava a morte de Dix-sept no Jornal O mossoroensee reproduzida no livro
Presença de Dix-sept Rosado, livro apologético, publicado pela Coleção Mossoroense.
42
Com sua morte passa a ser o mártir, herói imolado, que “tombou cumprindo o dever e defendendo seu povo.”
[...] Dix-huit, em seu segundo mandato de prefeito, passa a ser “o grande alcaide” de Mossoró, sem perder as
prerrogativas de grande orador da família. Vingt vai ser o “comandante” após a morte de Dix-sept. (FELIPE,
2001, p. 96. Grifos do autor)
43
Quando falamos em reorganização da família, após a morte de Dix-sept, estamos nos referindo a única
alternativa viável que tinha a família para continuar atuando com alguma força de representação. O seu raio de
ação precisava ser modificado e a solução era voltar para casa, retornar ao seu espaço anterior de ação, ou seja,
se concentrar em Mossoró em buscar de criar mais um líder para retornar ao sonho que fora interrompido com a
morte de Dix-sept, que já não estaria mais presente, mas ficará seu modelo para se moldar outro líder dentro da
família e na política. (LUCAS, 1998, p. 71)
44
De 1930-1988, a família esteve unida em torno dos ideais de “construção de Mossoró capitaneados por um
líder dentro da família. Com a morte de Jerônimo Rosado, ocorrida em 1930, Dix-sept assumiu o comando dos
negócios, a liderança familiar e a liderança política da família Rosado. Após a morte de Dix-sept, em 1951, no
período de 1951- 1953 tentou-se, dentro da família, identificar quem seria o novo “chefe” político da família na
cidade. Para termos uma ideia dessa disputa em 1953 havia a ideia de manutenção de uma candidatura única para
eleições majoritárias em Mossoró, posição partilhada pelo PR, que abrigava os Rosados, mas também pelo PSP e
UDN, a única ressalva era que não se lançasse o nome de Vingt Rosado, tido como radical e que não conseguia
fechar acordos políticos. O PSP preferia o nome de Lavoisier Maia (cunhado de Vingt e Dix-neuf - 19º filho de
seu Jerônimo, irmão de Dix-huit e Vingt) e a UDN preferia o nome de Dix-neuf, Dix-huit ou Lahyre (filho do
primeiro casamento de Jerônimo) ou de Abel Coelho (cunhado de Vingt e de Dix-neuf). O PR não aceitou
nenhuma das indicações e, juntamente com o PSD, forma a coligação Aliança Democrática com os nomes de
Vingt (prefeito) e Joaquim Felício de Moura (vice) e o PSP, UDN e PST formam a chapa Oposições Coligadas,
com Raimundo Soares de Souza (prefeito) e Joel Leite (vice). Nesta campanha, os Rosados procuram associar
Vingt à imagem de seu irmão Dix-sept. Vingt vence a eleição e a partir de então, passa a ser considerado dentro
da família e na cidade como o chefe político dos Rosados. (LUCAS, 1998, FELIPE, 2001; LIMA, 2006)

49
dos Rosados ficaram restritas ao âmbito municipal. Os Rosados enfrentavam os candidatos
apoiados por Aluízio Alves45. Foi nesse período que ocorreu a primeira derrota dos Rosado no
ano de 1968 quando Vingt-Un Rosado foi derrotado por Antônio Rodrigues de Carvalho.
Todavia, na eleição seguinte retomam a prefeitura de Mossoró na eleição de 1972 com a
vitória de Dix-huit Rosado e permaneceram sem derrotas até o ano de 2014.
Esta derrota marcou a família Rosado. Com receio do aumento do poder político das
lideranças locais ligadas à família Alves ocorre uma cisão no grupo familiar. Em 1982, Carlos
Augusto Rosado (filho de Dix-sept a época deputado estadual) rompe com os tios, Dix-huit e
Vingt, depois que os mesmos resolveram firmar uma aliança política com Aluízio Alves. A
aliança com Aluízio tinha o propósito de evitar a sua maior interferência no domínio que os
Rosado exerciam em Mossoró. Como resposta, Carlos Augusto faz uma aliança com José
Agripino Maia46. Foi essa divisão da família em alas possibilitou a ascensão de Rosalba
Ciarlini47 ao executivo municipal. Seu primeiro mandato como prefeita da cidade se deu no
período de 1989 a 1992. A partir de então Rosalba Ciarlini é apresentada como representante
do grupo de Carlos Augusto Rosado no poder executivo e o grupo, ligado a Carlos Augusto,
como verdadeiro herdeiro de Dix-sept Rosado. Com a dissidência de Carlos Augusto, Dix-
huit e Vingt, passaram a investir em Laíre Rosado – genro de Vingt - como nova liderança do
grupo. No entanto, o consenso em nome de Laíre não seria longo. Mário Rosado, filho de
Dix-huit, seria responsável por mais uma cisão no seio da família. Herdeiro do comando das
indústrias mineradoras da família, decide afastar Vingt Rosado dos negócios da empresa, o
que provocou irritação e insatisfação do vigésimo filho de Jerônimo Rosado, provocando um
rompimento entre Vingt e Dix-huit48. Os Rosado dividiram, desta maneira, em três alas:
45
Eleito governador entre 1961 e 1966, depois cassado pelo Ato Institucional nº 05, torna-se o principal
adversário dos Maias, em nível estadual, e dos Rosados, em Mossoró. Nas décadas de 1970 e 1980 em Mossoró
e no estado do RN, com a implantação do bipartidarismo, duas cores passaram a representar os interesses
ideológicos e partidários da política estadual. A cor vermelha, representava a ARENA (Aliança Renovadora
Nacional) e, por incrível que pareça, uma vez que hoje a cor vermelha é ligada aos partidos de esquerda, ligada
ao conservadorismo dos militares. A cor verde representava os ideais progressistas e democráticos uma vez que
seria a cor dos partidários do Movimento Democrático Brasileiro, o MDB. (LUCAS, 1988)
46
Os Rosados haviam rompido com os parentes da família Maia na década de 1960 por creditarem a Tarcísio
Maia a não nomeação de Dix-huit para governador do estado durante o Regime ditatorial militar.
47
Rosalba saiu vitoriosa nas urnas, nas eleições de 1988, representando o grupo descendente de Dix-sept
Rosado. Rosalba, juntamente com seu marido, buscava uma liderança própria dentro do grupo que tornasse
desnecessária a vinculação a Vingt ou Dix-huit e apresentavam Dix-sept como o único e verdadeiro líder da
família após a morte de Jerônimo Rosado. Carlos Augusto, o marido de Rosalba, afastado da política por
motivos de saúde e substituído por seu irmão Carlos Alberto – Betinho, e a irmã de Rosalba, Ruth Ciarlini
definem a nova liderança política local: ela é uma mulher, Rosalba Ciarlini. (LUCAS, 1998).
48
As confusões e disputas internas parecem não ter fim. Mário Rosado, na segunda metade da década de 1980, é
responsável por mais uma crise política na família. Enfrentando problemas na administração das indústrias
mineradoras de gipsita, Mário Rosado solicita ao pai a intervenção de Aluízio Alves, então Ministro da
Administração, para que o problema de sua empresa fosse equacionado (a querela girava em torno de uma mina,

50
Carlos Augusto Rosado, apoiado por Tarcísio Maia e José Agripino; Vingt, Laíre e Sandra
Rosado; Dix-huit e Mário Rosado, ainda apoiados por Aluízio Alves. Diante desse arranjo
político realizado por Carlos Augusto, Dix-Huit retomou aliança com Vingt, Laíre e Sandra
Rosado49.
A cisão, além dos fatos familiares relatados, era também parte da estratégia para
manter o controle político dentro da família e fazer frente à ameaça de surgimento de outras
forças políticas locais, como acontecia na FURRN (Fundação Regional do Rio Grande do
Norte – atual UERN – Universidade do Estado do Rio Grande do Norte). (FILGUEIRA,
2001). A época, tomava força, um movimento contra os Rosado dentro da FURRN, a
associação de professores consegue a estadualização da universidade, que significou uma
vitória contra a dominação política dos Rosado dentro da instituição. A estadualização
enfraquecia os Rosados na cidade, mas além disso ou ao lado disso e talvez até resultado
dessa “vitória” da estadualização da UERN, havia ainda a disputa de lideranças estaduais, das

que integrava as empresas de mineração do grupo, situada em Pernambuco, arrendada há trinta anos e tendo um
contrato que previa o fim do arrendamento em 1988. A renovação do arrendamento das terras não foi
viabilizada, em razão de desavenças entre Mário Rosado e os seus proprietários). O Ministro atende ao pedido de
Dix-huit e encaminha a solução aos dirigentes do Departamento Nacional de Produção Mineral. Diante de um
novo desentendimento entre Mário Rosado e os dirigentes do órgão federal competente, colocado à disposição
por Aluízio Alves, o Ministro, então, decide afastar-se da contenda. Com a saída de Aluízio Alves da querela,
Mário Rosado provoca um deslocamento de sua facção para os Maia, a fim de que solucionassem o seu
problema. Tarcísio e José Agripino intervieram junto ao Governo Federal e obtiveram êxito na solução do
problema, conseguindo, em troca, apoio de Dix-Huit e Mário Rosado à candidatura de Rosalba Ciarlini, médica,
esposa de Carlos Augusto Rosado, para prefeita de Mossoró, em 1988 contra Laíre Rosado. Com esta aliança
Dix-huit anunciava, assim, o rompimento com o seu irmão, Vingt e sua família. (LUCAS, 1998).
49
O retorno ao grupo de Laíre era parte de um acordo para o apoio do grupo para a eleição à prefeitura de
Mossoró em 1992, numa chapa que seria formada por Dix-huit e Sandra Rosado, com uma subsequente renúncia
de Dix-huit em favor da sobrinha. Em troca, e como parte final do acordo, seria dado o apoio da ala de Vingt à
candidatura de Mário Rosado para o Senado Federal. A chapa Sandra-Dix-huit saiu vitoriosa das eleições de
1992, mas o acordo previamente estabelecido foi quebrado, originando uma nova desavença na família, pois em
contrapartida ao descumprimento do acordo firmado entre as duas facções, Sandra e Laíre não apoiaram a
candidatura de Mário Rosado para o Senado. As divergências entre as duas facções resultaram em uma gestão, a
última de Dix-huit (visto que ele faleceu em 1996) bastante tumultuada, com sucessivas trocas de acusações,
ofensas mútuas nas rádios e jornais locais e a expulsão da vice-prefeita, Sandra Rosado do gabinete da vice-
prefeitura. Com a morte de Dix-Huit Rosado, Sandra assumiu a prefeitura por 70 dias e fez uma gestão, tendo
em vista a sua candidatura para a prefeitura diante das eleições municipais que se avizinhavam. Concorrendo
com Rosalba Ciarlini e Valtércio Anunciato – engenheiro, apoiado por Mário Rosado – Sandra perdeu a eleição
para ex-prefeita. A partir de então se consolida o rosalbismo em Mossoró. Rosalba é reeleita prefeita de
Mossoró para o período de 2001 a 2004 e elege ainda sua prima, a enfermeira Fátima Rosado (filha de Dix-neuf
Rosado) por dois mandatos consecutivos para a PMM - 2005 a 2008 e 2009 a 2012 –e ainda se elege senadora
em 2007 e governadora em 2010. (LUCAS, 1998; LIMA, 2006)

51
famílias Alves e Maia, que buscavam inserção na disputa política na cidade de Mossoró 50.
(LUCAS, 1998)

FIGURA 4 – OLIGARQUIA ROSADO

2.3 Os Estudos Atuais que tratam sobre Poder Local em Mossoró e a Necessidade do
Entendimento e Explicação do Fenômeno Rosadista:

50
A partir do final da década de 1980 é possível verificar que a disputa pelo cargo do chefe do poder executivo
local passa a ser polarizada por candidatos pertencentes à mesma família, situação e oposição pertencem aos
Rosado. Uma ala Rosalbista (apoiada em nível estadual por José Agripino) e outra ala Lairista, que após a
década de 1990, passou a se denominar Sandrista (apoiada em nível estadual por Aluízio Alves), disputa essa
que era réplica das disputas em nível estadual. (LUCAS, 1998; FELIPE, 2001; LIMA, 2006)

52
Os atuais estudos sobre política na cidade de Mossoró, a partir dos anos 2000
ganham mais uma nova vertente. Tratam agora, não de analisar o poder político da família
Rosado, mas em analisar, em especifico, algumas das políticas públicas implementadas nas
gestões de Rosalba Ciarlini a frente da Prefeitura da cidade. Isto se deu pelas sucessivas
gestões dela a frente da Prefeitura Municipal de Mossoró e pelo entendimento de vários
segmentos da cidade, principalmente empresários, que ela trouxera modernidade as suas
gestões.
Para esta afirmação realizei uma pesquisa51 em que foram levantadas todas as
produções acadêmicas que envolviam o nome de Mossoró e a forma como a política era
praticada na cidade através de seus gestores municipais.
Neste contexto, embora o poder político dos Rosados ainda esteja presente nas
discussões, ele é apenas cenário onde se inserem as políticas, a ausência ou ineficácia delas,
sem, contudo, considerar que a implementação, ineficácia ou ausência são frutos da forma
como essa família faz política na cidade.
Sem desconsiderar os trabalhos encontrado na pesquisa, que apresentam a
forma de gestão da cidade, a partir do ano de 2000. A escolha da temática que optaram os
autores encontrados no levantamento realizado, deve ser levada em conta a partir do contexto
político e social brasileiro vivido a partir da década de 1980.
A partir dos anos de 1980, significativas mudanças ocorreram em nível
nacional que nos levava a crer que teríamos amenizadas as influências das oligarquias e das
famílias a frente do poder político local. A C ampanha pelas Diretas já! que culminou nas eleições
gerais de 1986, onde elegemos deputados e senadores, que compôs a Assembleia Nacional
Constituinte, que tinha a tarefa de elaborar a nova Constituição do pais após o período da Ditadura
Militar. A época aconteceram inúmeras mobilizações populares para inserir na Nova Carta
Magna as diferentes vozes de segmentos sociais, que estavam, por mais de duas décadas

51
A pesquisa foi realizada em sites das Universidades Federais dos estados de Pernambuco, Paraíba, Ceará e na
biblioteca central da UFRN. Dediquei a atenção aos trabalhos, mestrado ou doutorado, que versassem sobre
política em Mossoró. Realizei a busca de duas formas, primeiro pela palavra Mossoró, depois pela palavra
Rosado. Em seguida li o sumário de todos que apareceram (dezenas deles), me detendo naqueles que tratavam
em especifico da cidade no aspecto político. Do total encontrado, cinco atendiam ao que procurava, ou seja,
abordavam aspectos de poder local em Mossoró. São eles: A Polis Circense: poder local e espetacularização do
político em Mossoró/RN, (LIMA, 2006); Reformas Administrativa e gestão de política social em Mossoró: a
falácia dos atores institucionais e sociais, (MENEZES, 2009); A Implementação do Programa “Gestão Nota
10” no Sistema de educação municipal em Mossoró/RN - 2005 a 2009, (ALBUQUERQUE, 2010); Práticas
Clientelistas e Dádivas como Estratégias de Hegemonia: uma análise sobre o campo da saúde em Mossoró ,
(SILVA FILHO, 2011); O público e o privado no sistema de saúde em Mossoró-RN: as contradições para a
efetivação da universalidade, (SOUSA, 2013)

53
silenciado por força da opressão da Ditadura Militar 52, essa mobilização resultou um amplo
processo de participação popular, onde foram recolhidas experiências e iniciativas por todo o
território nacional. Os movimentos sociais pautavam à afirmação de direitos e a ampliação
das garantias de cidadania se organizavam e sugeriam as diretrizes para a nova Constituição.
Nesse clima foi promulgada a Constituição Federal de 1988, também
denominada de “Constituição Cidadã”, pois trazia, em seu interior, princípios, tais como: a
instalação de um Estado de direito pautado no exercício da cidadania; o respeito às diferenças
e a dignidade da pessoa humana e ainda a possibilidade de uma maior participação popular,
visando, sobretudo, assegurar a participação e controle social sobre a Administração Pública,
como meios do exercício legal da cidadania e como forma de extirpar todos os resquícios do
período ditatorial militar.
Além de todo o clamor por um Brasil Novo, a Nova Constituição ainda
continha
vários dispositivos que faziam menção expressa à participação da comunidade na gestão
pública, notadamente na área da saúde (CF, art. 198, III), da seguridade social (CF, art. 194,
VIII), da política agrícola, envolvendo produtores e trabalhadores rurais no seu planejamento
e execução (CF, art. 187, caput), e da assistência social, onde se estabelece, de forma
específica, a participação da população por meio de organizações representativas na
formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis (CF, art. 204, II).Em
especial os artigos 198, 204 e 206 da CF/88 deram origem a criação dos Conselhos de
Políticas Públicas nas áreas da Saúde, da Assistência Social e da Educação, nas três esferas de
governo. O que se acreditava que poderia trazer a efetivação da transparência do setor público
e da maior participação popular nas gestões de governo, nas três esferas de poder, em 1998,
ocorre a publicação da Lei nº 9.755, que dispõe sobre a criação de sites na internet pelo
Tribunal de Contas da União, como forma de divulgação dos dados e informações à
população. Ainda nesse mesmo caminho, temos, em 2000, a publicação da Lei Complementar
nº 101, (conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF), e em 2009, a Lei
complementar n° 131, (conhecida como Lei da Transparência), que possibilita a criação de
mecanismos legais que viabilizem a fiscalização popular aos atos administrativos e
financeiros e, no ano de 2011 é publicada a Lei nº 12.527, (conhecida como Lei de Acesso à

52
A Ditadura Militar no Brasil se instaurou em 1º de abril de 1964 e teve duração até 15 de março de 1985. Teve
como principais características a falta de democracia, supressão de direitos constitucionais, censura, perseguição
política e repressão aos que eram contra o regime militar.

54
Informação), que busca tornar menos obscuro o conhecimento da informação por parte dos
cidadãos, no que se refere à forma como os nossos recursos públicos são administrados. Essas
mudanças legislativas no cenário nacional provocaram profundas modificações na forma de
gerir os bens públicos e trouxeram novo alento a população brasileira tão cansada do
desmando da classe política à frente da gestão dos poderes executivo e legislativo.
Neste sentido, não é de se estranhar que as pesquisas sobre poder local em
Mossoró fossem pautadas na forma como era conduzida a administração púbica municipal,
sendo as relações políticas partidárias usadas apenas como pano de fundo nas discussões dos
trabalhos acadêmicos. Para melhor entendimento do que quero afirmar, e, sem crítica alguma
ou julgamento valorativo acerca dos trabalhos realizados sobre Mossoró a partir dos anos
200053, serão apresentados uma pequena síntese do que eles abordam para que, em cima dos
que eles trataram apresentar o objeto central desta tese.
Em Lima (2006) foi feita uma análise sobre as mudanças políticas e urbanas,
entre os anos de 2002 a 2005. Essa análise, buscava conhecer as estruturas de poder político
face as mudanças institucionais num contexto de modernização e como resultado do processo
de transformações econômicas e reforma do Estado. No trabalho, a cidade foi analisada a
partir da reestruturação urbana, calcada nas gestões (terceiro mandato como prefeita de
Rosalba) que privilegiaram as chamadas políticas de marketing do lugar. Nessa direção, o
texto buscou analisar o comportamento de um governo oligárquico diante da confiança ativa e
conquistada, cotidianamente alimentada, a partir da reconfiguração do lugar, que se dava
numa gestão baseada em “festas” como atividades econômicas e estratégias (institucionais ou
simbólicas) de permanência no poder, na opinião do autor, sendo assim uma
“espetacularização permanente do político”. Ao longo da pesquisa, o autor faz menção aos
trabalhos que abordam as duas vertentes de estudo da família e centra sua análise na gestão de
Rosalba Ciarlini que é apontada como a gestão que “vende” a cidade como um produto a ser
consumido, se inserindo dentro da nova lógica econômica da globalização, a partir do uso das
festas cívicas locais como: a libertação dos escravos, a expulsão do bando de lampião da
cidade e o primeiro voto feminino. Embora analise o papel da gestão municipal no incentivo e
incremento do turismo na cidade. O período investigado se detém em um curto espaço
temporal e se limita na relação da gestão com os movimentos culturais da cidade, que são os
que participam dos espetáculos encenados a céu abertos, tais como: Chuva de bala no pais de
Mossoró (encenado em junho) e Auto da liberdade (encenado em setembro).

53
A apresentação das pesquisas se dará na ordem cronológica de sua conclusão.

55
Já na pesquisa de Menezes (2009) tem se a análise da reforma administrativa
do município de Mossoró entre os anos de 2001 a 2004 (mais uma vez a terceira gestão de
Rosalba Ciarlini) onde se buscou perceber os impactos dessa reforma nas políticas sociais
implementadas na cidade. A pesquisa se baseou no Plano Diretor de Reforma do Aparelho de
Estado (PDRAE) e na Lei nº 001/2000 GP/PMM, que tratou de regulamentar as mudanças em
nível municipal e se baseou na adequação do município em função da Reforma do Estado
proposta pelo governo de Fernando Henrique Cardoso – FHC nos anos de 1995-1998 e que
são revitalizadas no primeiro governo de Luís Inácio da Silva Lula. A autora afirma que
apesar das “falácias” da reforma, a Secretaria Municipal de Cidadania dava uma “feição”
nova a gestão de Rosalba, pois conseguia implementar programas nacionais, de política da
assistência social, em parceria com o governo federal. No capítulo 4, a autora trata das
falácias da reforma, a partir de seus resultados práticos, apresentando as falas dos atores
institucionais (gestores da política) dos membros dos conselhos municipais das áreas que
faziam parte a Secretaria Municipal de Cidadania. O objetivo era conhecer como se deu a
implementação da reforma na ótica desses atores e da relação deles com a prefeita e seus
aliados. Os aspectos considerados pela autora na análise da gestão de Rosalba, foram: os
aspectos administrativos e legais, com uma abordagem mediada pelas relações políticas
estabelecidas entre a gestão municipal, através da prefeita Rosalba, e seus aliados na Câmara
Municipal ou em outros cargos eletivos. Entretanto, sua pesquisa não esclarece ou elucida
como as formas de alianças e nem como estavam organizados os segmentos sociais que por
ventura pudessem pressionar o poder público municipal para uma reforma que levasse em
conta os anseios da população Mossoroense no acesso aos serviços ofertados pela Secretaria
Municipal de Cidadania.
A pesquisa realizada por Albuquerque (2010) teve por objetivo situar a política
de educação básica (ensino fundamental) no município de Mossoró nos anos de 2005 a 2009
(primeira gestão de Fátima Rosado – Fafá) seu intuito é demonstrar a implantação do
Programa Gestão Nota 10, em parceria com o Instituto Ayrton Senna. O programa era
apontado pela gestão como parte da modernização dos processos gerenciais e pedagógicos do
sistema escolar que trabalhava metas para alcançar bons resultados e modernização do
sistema educacional. A conclusão da autora é a de que na verdade o programa fazia parte da
minimização da presença do Estado e emperrava a gestão democrática na educação, a
autonomia institucional e a participação da comunidade, pois pregava uma gestão gerencial
em detrimento de uma gestão democrática apontando que a união entre o setor público e

56
privado não trouxe grandes ganhos ao sistema educacional, apesar da diminuição da evasão
escolar, a autora chegou a apurar que houveram várias falhas e irregularidades na construção
dos índices escolares como forma de atender as exigências e metas do IAS.

Já o estudo de Silva Filho (2011) fez a análise das gestões dos governos de
Rosalba e Fátima Rosado, no período de 1991 a 201054. A análise se propôs a investigar
profissionais da saúde a frente do poder executivo local 55 e em cargos do legislativo
municipal. A pesquisa centrou seu estudo na implantação do Programa de Agente de Saúde
Comunitário (PACS) e Programa da Saúde da Família (PSF), com o intuito de demonstrar que
a implantação desses programas reforçou as práticas clientelísticas, bem como a consolidação
de um grupo empresarial local a frente dos serviços de saúde na cidade de Mossoró.

Na tese de Souza (2013) acontece a abordagem da relação entre o público e o


privado na saúde em Mossoró, com ênfase nos empecilhos dessa relação para a concretização
da universalização do Sistema Único de Saúde (SUS). A pesquisa foi realizada entre os anos
2004 e 2010, numa perspectiva marxista, com as seguintes questões: como se dava a
organização dos serviços de saúde (público e privado) em Mossoró; que forças ou grupos
políticos têm assumido o controle ou o comando dos serviços de saúde e quais as alianças que
predominam na estrutura de saúde em Mossoró. A autora atuou como assistente social (1988 a
2002) na área da saúde em Mossoró, participando do processo de institucionalização do SUS
no RN, através das primeiras conferencias municipais e estadual, além de ter atuado na
diretoria do SINDSAUDE (Sindicato dos Trabalhadores na Saúde), participou da primeira
gestão do Conselho Municipal da Saúde (CMS) em Mossoró. Ainda em seu trabalho situa
toda a cronologia do serviço de saúde no Brasil, a partir da implantação do SUS com a
redemocratização do Brasil. Além disso, apresenta a estrutura do sistema de saúde em
Mossoró, demonstrando que a saúde, é utilizado como moeda de troca, reforçando as práticas
patrimonialistas e o clientelismo. Embora aponte que existem resistências, por parte dos
movimentos sociais organizados, quanto a essa estrutura, ela tem enfraquecido pela forma
como tem se dado a composição dos conselhos municipais e também pela atuação dúbia do
SINDSAUDE, onde a diretoria se cinde em duas alas, uma que é contra a privatização da
saúde e mobiliza os trabalhadores e demais movimentos na luta contra a privatização e outra
que faz acordos com planos de saúde e arrefece os mecanismos de resistência a essa estrutura.
O arrefecimento é apontado, pela pesquisadora, como consequência das práticas
54
Os três mandatos de Rosalba a frente da prefeitura e o primeiro e metade do segundo de Fátima Rosado
55
Rosalba Ciarlini é medica pediátrica e Fatima Rosado é enfermeira.

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clientelísticas, advindas do grupo oligárquico local, que consegue se manter no poder e detém
parte da estrutura do sistema de saúde, onde através do empreguismo em suas clinicas e
hospitais consegue manter a hegemonia da oligarquia que domina a cidade desde a década de
1940.
O que se percebe nesses estudos mais recentes sobre o poder local em Mossoró é que
mesmo com a redemocratização do país, a promulgação da Constituição Federal de 1988
(CF/88) que trouxe significativas mudanças institucionais e administrativas locais (que incluía
maior fiscalização dos recursos públicos, criação de conselhos, associações, etc.) que foram
iniciadas a partir da década de 90 (impulsionadas por pressões do governo federal), e, mesmo,
com a crescente urbanização de Mossoró56, nos aspectos da forma de se “fazer política” na
cidade não ocorreram mudanças significativas nos aspectos políticos e sociais, ou seja, todas
as mudanças, implementada no Estado brasileiro, em nível institucional, que reformularas
algumas das práticas arraigadas na política (fiscalização dos recursos públicos, atuação do
Ministério Público, Lei de Responsabilidade fiscal) não foram capazes de provocar grandes
alterações a ponto de colocar em perigo o mando da família Rosado na cidade. (LIMA, 2006).
Tentando ampliar a discussão e trazer à tona novos elementos, nos quais se
estruturam o poder dos Rosados em Mossoró, se faz necessário, apresentar as principais
questões que tratará esta pesquisa. Nesse sentido, a partir daqui, apresentaremos as principais
questões levantadas nesses estudos, para que, a partir delas, possamos avançar no
entendimento das características do poder político dos Rosados na cidade no recorte temporal
escolhido.

56
No início do século XXI a cidade de Mossoró tinha 93,1% de urbanização (ROCHA, 2005)

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PARTE II: A CISÃO DA FAMILIA ROSADO A PARTIR DE 1988 (para escrever)

Capitulo 1: AS VÁRIAS NUANCES DOS ROSADOS OU OS “ROSADISMOS”.

Capitulo 2: A ASCENSÃO DE ROSALBA CIARLINI ALÉM DOS LIMITES DA CIDADE


DE MOSSORÓ E SUA CHEGADA AO COMANDO GOVERNO DO RIO GRANDE DO
NORTE

PARTE III: A CIDADE DE MOSSORÓ E A OLIGARQUIA ROSADO (relato das


entrevistas realizadas com Laire, Sandra, Rosalba, Capistrano, Elviro Rebouças e
pesquisa de campo feita com alunos universitários sobre as ações da família na cidade de
Mossoró)

Capitulo 1: AS PERSPECTIVAS DA OLIGARQUIA ROSADO FRENTE A POLÍTICA


LOCAL: A VOLTA PARA “CASA” (MOSSORÓ) DAS FIGURAS POLÍTICAS DOS
ROSADOS.

Capitulo 2: O FIM DO ROSADISMO E A CONSOLIDAÇÃO DO ROSALBISMO: PARA


ONDE CAMINHA A OLIGARQUIA ROSADO?

CONCLUSÃO
BIBLIOGRAFIA
ANEXOS (transcrição das entrevistas e compilação dos dados coletados na pesquisa com
estudantes)

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