Você está na página 1de 32

Intoxicações por raticidas

cumarínicos
Dra. Adriana Mello Barotto
cit@hu.ufsc.br
Importância epidemiólogica

• As intoxicações por raticidas, especialmente do grupo do


superwarfarin, têm sido as intoxicações mais frequentes nos
Estados Unidos (95% do total de intoxicações por raticidas),
sendo brodifacoum o mais comum;
• Em 2008 no CIT/SC foram registrados 293 casos de intoxicação
por raticida. Destes, 292 foram por raticidas cumarínicos;
• E no Brasil?
• As duas populações mais afetadas são: faixa etária pediátrica
– exposição acidental e adultos em tentativa de suicídio;
• Não são esperadas intoxicações ocupacionais.
Jimmy Dy Chua et al, 1998
Cumarínicos
• Possuem em comum a estrutura 4-
hidroxicumarina

warfarin

Brodifacoum

Larini L, 1999
Princípios ativos
• Warfarin
• Brodifacoum
• Bromadiolone
• Difenacoum
• Chlorophacinone
• Diphacinone
• Pindone
• Valone
• Coumatetralyl
Nomes comerciais
• Racumim, Ratum, Klerat, Mouser, Ratak, Rodend,
Ratokill e outros.

• São compostos sólidos, em tabletes, granulados


coloridos, iscas e bloco parafinado.
Warfarin x superwarfarins
• Os superwarfarins apresentam meia-vida longa (6 a 8
semanas), quando comparados ao warfarin (meia–vida
de 40h), podendo ser detectados após semanas da
ingestão;

• Altamente distribuídos no tecido subcutâneo;

• Superwarfarin: potência 100 vezes maior.

Kotsaftis P et al, 2007


Mecanismos de ação

• São inibidores competitivos da vitamina K,


interferindo na carboxilação final dos fatores II
(protrombina), VII, IX e X, da qual ela é cofator.

SUPERWARFARIN INTOXIFICATION: HEMATURIA IS A MAJOR CLINICAL MANIFESTATION Wu et al, 2007. J Thromb


Haemost 2007; 5 Supplement 2:218
Forma ativa
(Hidroquinona ou
Vitamina K1)

Forma Inativa
Vitamina K
• K = koagulation (em alemão);
• Meia-vida: 6-10 horas
Absorção: oral é ampla;
• Metabolismo hepático;
• Excreção urinária e fecal;
• Vit K1: encontrada principalmente em
vegetais verdes;
• Vit K2: produzida pelas bactérias do TGI.
• Toxicidade aguda oral dos compostos cumarínicos
em humanos não está estabelecida.

Warfarin (DL 50) em ratos: 325 mg/Kg

Brodifacoum (DL 50) em ratos: 0,3 mg/Kg


Larini L, 1999
DL50 em animais

Turk. J. Vet. Anim. Sci. 2008; 32(4): 237-243 - Anticoagulant Rodenticide Intoxication in Animals - A Review
• Monitorização do TAP por 48h é baseada na
meia-vida dos fatores vitamina K dependentes:

Fator II: 48 a 60h

Fator VII: 5 a 6h

Fator IX: 20 a 24h

Fator X: 24 a 48h
Wintrobe`s Hematology, 2004
Princípio ativo em alguns produtos
comerciais
• KLERAT®: concentração 0,005% de Brodifacum = 0,05 mg por grama;

• Ratokill ® iscas (granulado) de cor avermelhada, envelopes de 25 gramas


(= 1,25 mg de brodifacum);

• BLOCO PARAFINADO de cor azul escura, com 20 gramas (= 1 mg de


brodifacum) ou mini-bloco de 5 gramas (= 0,25 mg de brodifacum).

• RATAK® iscas de cor verde, concentração 0,001% de brodifacum = 0,01


mg por grama, envelopes de 75 gramas ( = 0,75 mg de brodifacum).
Manifestações clínicas

• Hematúria, epistaxe, sangramento gengival,


equimoses, sangramento em sistema nervoso
central, outros sangramentos.

SUPERWARFARIN INTOXIFICATION: HEMATURIA IS A MAJOR CLINICAL MANIFESTATION Wu et al, 2007.


J Thromb Haemost 2007; 5 Supplement 2:218
Intoxicações por cumarínios
• Descontaminação;

• Lavagem gástrica: até 1h após ingestão, se a


quantidade supostamente ingerida é
potencialmente letal(?);

• Carvão Ativado: até 1h após ingestão, se a


quantidade supostamente ingerida é
potencialmente letal.
Unintentional Pediatric Superwarfarin Exposures: Do
We Really Need a Prothrombin Time?
• Estudo retrospectivo de 2 anos avaliando a intoxicação por
superwarfarins em crianças;

• Foram avaliadas 542 crianças através TAPeRNI. Nenhuma criança


desenvolveu eventos hemorrágicos ou alteração de TAP e RNI; ou
seja, nenhuma necessitou de tratamento com vitamina K;

• Conclusões: crianças normais com ingestão aguda não intencional


de raticidas cumarínicos não requerem intervenção médica nem
exames de seguimento.

PEDIATRICS Vol. 105 No. 2 February 2000, pp. 402-404 Jun 18, 1999. Michael E. Mullins, Christina L.
Brands, and Mohamud R. Daya
A Prospective Study of Acute, Unintentional, Pediatric
Superwarfarin Ingestions Managed Without Decontamination
• Avaliação de 463 crianças com intoxicação por superwarfarin;

• Monitorização do TAP até 96 horas após ingestão e


acompanhamento por 16 meses;

• Resultados: nenhum paciente desenvolveu coagulopatia grave.


Dois pacientes apresentaram RNI de 1,5 e 1,8, sem sintomas.
Dois pacientes apresentaram sangramento nasal com RNI
normal;

• Conclusões: crianças com ingestão aguda não intencional de


raticidas cumarínicos podem ser manejados sem medidas de
descontaminação gástrica ou vitamina K profilática.
Annals of emergency medicine JULY 2002 40:1 Marianne Ingels et al
Poisindex - Micromedex
• Vômitos e lavagem gástrica não são recomendados;

• A descontaminação gástrica é desnecessária após ingestões não


intencionais de menos que uma caixa por crianças ou menos que
1 mg de ingrediente ativo. A lavagem pode aumentar o risco de
sangramento após ingestões deliberadas em adultos;

• Carvão ativado: considerar administração de carvão ativado


após uma ingestão potencialmente tóxica e com menos de
1hora;

• BRODIFACOUM – Em um estudo de revisão retrospectivo de


10733 casos de ingestão aguda única não intencional em
crianças com menos de 7 anos, não houve mortes ou efeitos
adversos maiores.
Poisindex
• Vitamina K1: é o antídoto específico e deveria ser administrado em qualquer
paciente com TAP ou RNI prolongados;

• A terapia oral pode ser adequada para coagulopatia leve. Adultos: 15 a 25


mg. Crianças: 5 a 10 mg e titular as próximas doses baseadas no RNI. Doses
de manutenção de mais de 100 mg/dia podem ser requeridas por muitos
meses em casos severos;

• Vitamina K1 subcutânea é apropriado inicialmente para tratar pacientes com


coagulopatia significante sem sangramento ameaçador à vida;

• Vitamina K1 EV é preferível em casos severos quando a rápida correção é


requerida. Dose inicial: Adultos: 10 mg EV;

• Administrar plasma fresco congelado e/ou concentrado de fatores em adição


a conc. Hemácias e vit K1 em pacientes com sangramento ativo ameaçador à
vida.
Toxbase
• O benefício da descontaminação gástrica é incerto;

• A maioria das crianças não requer tratamento e é


desnecessário medir RNI em crianças que tenham ingerido
pequena quantidade de iscas;

• Considerar carvão ativado se o paciente chega até 1 hora


após uma overdose deliberada;

• O RNI deverá ser medido 24 a 48 horas após a ingestão se


houver qualquer dúvida sobre a severidade da intoxicação.
Toxbase
• Se não há sangramento ativo e o RNI ≤4 após 36 a 48 horas
da ingestão o tratamento com Vit K não é necessário;

• Se não há sangramento ativo e o RNI > 4, Dar Vit K1


- Adulto: 10 a 20 mg VO - Crianças: 100 mcg/kg
OU
- Adulto: 10 mg EV - Crianças: 100 mcg/kg EV

• Repetir RNI em 24 horas e considerar novas doses vit. K1.


Doses diárias podem ser necessárias até que o RNI esteja em
faixa nl.
Toxbase
• Se sangramento ativo ou hemorragia importante: dar complexo
protrombínico (30-50 U/kg) ou plasma fresco congelado (15
ml/kg). Dar vitamina K1 EV lento 10 a 20 mg no adulto e
250mcg/kg na criança;

• O tratamento com vitamina K1 pode levar semanas ou meses. O


RNI deveria ser monitorado por 2 semanas após tratamento para
assegurar a não recorrência da anticoagulação;

• Obs - Complexo Protrombínico: consiste em concentrados de


ativadores e precursores dos fatores vitamina K dependentes (II,
VII, IX, X); Permite a infusão de menor volume do que o PFC
(10ml do complexo protrombínico equivalem a 600ml de PFC).
Intoxicação por raticidas cumarínicos
e com sangramento ativo
• Vitamina K: seu efeito leva 12 a 24h, período no qual a
hemorragia pode aumentar;

• Por isso, ao tratamento com vitamina K em


sangramentos graves devem ser acrescentados plasma
fresco congelado ou complexo protrombínico.
Plasma Fresco Congelado
• Contém todos os fatores da coagulação;

• É necessário um volume aumentado para reverter a


anticoagulação (aproximadamente 8U – cada 1U
contém 200 a 250 mL de PFC) ;

• Paciente cardiopatas – cautela;

• Reações alérgicas.
Complexo Protrombínico
• Consiste em concentrados de ativadores e
precursores dos fatores vitamina K dependentes (II,
VII, IX, X);

• Permite a infusão de menor volume do que o PFC


(10ml do complexo protrombínico equivalem a
600ml de PFC).
“Chumbinho”
• Apesar da venda fracionada de Inibidores da Colinesterase
(carbamatos e organosforados) como “raticidas” ser proibida, muitas
pessoas utilizam o produto;
• Podem haver intoxicações acidentais (principalmente em crianças),
por tentativa de suicídio, homicídio, etc;
• O quadro clínico esperado é de Síndrome Colinérgica (sialorréia,
sudorese, vômitos, diarreia, lacrimejamento, bradicardia, miose,
hipersecreção brônquica, fasciculações, mioclonias, convulsões,
alteração do nível de consciência, broncoespasmo, etc);
• O tratamento é voltado para o suporte das funções vitais, além do
uso da atropina por via endovenosa;
Doses - Atropina
• Dose de ataque:

- adultos: 1 - 4 mg/dose EV

- crianças: 0,01 - 0,05 mg/Kg de peso/dose

Repetir a cada 3 a 10 minutos até obter sinais de


atropinização.

• Dose de manutenção: não há esquema rígido.

 Usualmente 1 e 4 mg/hora e 0,01 a 0,05 mg/kg/hora em


crianças (podendo chegar a doses mais elevadas).
Conclusões
• Nas intoxicações acidentais por raticidas cumarínicos em que a
ingestão é de menos de um pacote, não são indicadas medidas
terapêuticas ou de monitorização;

• Nas intoxicações por tentativa de suicídio ou suspeita de tentativa de


homicídio é importante monitorarmos o TAP. Estima-se que 50% dos
pacientes em tentativa de suicídio podem mentir sobre a quantidade
ingerida;

• Não são esperadas intoxicações por via cutânea (ocupacionais);

• Estar atento a possibilidade de ingestão de “chumbinho” (uso


ilegal/clandestino como raticida);

• Importante encaminhar para avaliação psicológica e/ou psiquiátrica os


pacientes que tentaram suicídio.
OBRIGADA!

Você também pode gostar