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CONSTITUIÇÃO

E TRIBUTAÇÃO

Melissa de Freitas Duarte


Estados na Federação
brasileira
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Reconhecer as formas de federação e a Federação brasileira.


 Explicar a repartição de competências constitucionais entre as enti-
dades da Federação.
 Identificar as normas constitucionais relativas à organização dos
Estados.

Introdução
Para fins de organização de um Estado, cada entidade dentro do seu
território deve possuir competências para legislar e administrar. Essas
competências podem ser próprias, compartilhadas ou restantes daquelas
que as demais entidades já possuem. No Brasil, essas competências
são distribuídas entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os
municípios, estando previstas na Constituição Federal.
Neste capítulo, você estudará as formas de federação e a Federação
brasileira. Você aprenderá também sobre a repartição das competências
constitucionais entre as entidades da Federação e, por fim, identificará
os dispositivos constitucionais relativos à organização dos Estados.

Formas de federação e a Federação brasileira


Um Estado federado é formado pela aliança entre Estados menores para a
consolidação de um Estado único maior. Esse Estado único mantém a autono-
mia política em cada uma das suas partes menores, mas assume a soberania.
Essa reunião de Estados pode resultar de dois movimentos: o centrípeto,
que agrega, ou o centrífugo, que segrega, subdividindo os membros de uma
federação em entes autônomos.
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Um Estado federado se caracteriza pela coexistência de dois níveis de


poder originário: o central (União) e os periféricos (Estados-membros).
Com isso, pratica-se a descentralização, não apenas administrativa, mas
também política, para controlar o uso do poder.
Assim, a concepção federalista se divide em federalismo integrativo e
federalismo devolutivo.
O federalismo integrativo é formado a partir da procura por uma ordem
unificada em detrimento do enfraquecimento de um regionalismo exacerbado,
objetivando, dessa forma, uma ordem constitucional entre entidades compo-
nentes e anteriormente independentes ou confederadas. Ou seja, pressupõe que
o estabelecimento de um governo central trará unidade territorial desde que
esse governo tenha influência direta nas pessoas de todo o Estado, respeitando
a autonomia das entidades federativas que o compõem.
Já o federalismo devolutivo é constituído por uma ordem constitucional
que redistribui os poderes de um prévio Estado unitário ou regional entre as
suas entidades componentes, atingindo um status autônomo dentro das suas
esferas de competência. Nesse modelo, o poder central abdica de parte do
seu controle em favor das regionalidades, ganhando, com isso, uma maior
autonomia de poder no Estado.
Em uma federação, portanto, existe uma ordem jurídica central e diversas
ordens jurídicas parciais, pois é característica da federação a descentralização
política constitucionalmente assegurada como instrumento de gerência do
próprio Estado. Essa descentralização é a transferência de competências de
um órgão para outro, tanto na esfera política quanto na administrativa.

Na descentralização política, os vários centros de competência têm capacidade para es-


tabelecer normas e executá-las. Na descentralização administrativa, só se capacitam os
centros menores para efeito de execução das decisões do centro de poder. Entretanto,
a simples descentralização política não assegura a existência de uma federação, pois
o poder central pode eventualmente retomar para si as capacidades descentralizadas.

Federação brasileira
Na atual forma de organização do Estado brasileiro, temos as seguintes en-
tidades federativas: a União, os Estados, o Distrito Federal e os municípios.
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A Federação brasileira optou pela existência de uma ordem jurídica central e


outras parciais, todas possuidoras de algum grau de autonomia.
Podemos esquematizar a Federação brasileira da seguinte maneira:

 Forma de governo — republicana.


 Forma de Estado — federação.
 Característica do Estado brasileiro — Estado Democrático de Direito.
 Entes componentes da Federação — União, Estados, Distrito Federal
e municípios.
 Sistema de governo: presidencialista.

Assim, a Constituição Federal (BRASIL, 1988) dispõe, no caput do seu


art. 1º, que a República Federativa do Brasil é formada pela união indissolúvel
dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, constituindo-se em Estado
Democrático de Direito. O caput do art. 18, por sua vez, complementa-o
ao estabelecer que “[...] a organização polít ico-administrativa da República
Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição” (BRASIL, 1988).

Exemplos do federalismo integrativo são os Estados Unidos, a Alemanha e a Suíça. Já


um exemplo de federalismo por desagregação é o próprio Brasil, que assume esse
formato após a Proclamação da República, ocorrida no dia 15 de novembro de 1889.
Naquele período, o poder central era exacerbado, ao passo que as regionalidades
eram relegadas a segundo plano.

Repartição de competências constitucionais


entre os entes da Federação
As repartições de competências previstas na Constituição mostram objeti-
vamente a divisão entre os entes federativos. Eles são autônomos e cons-
tituídos de contribuições e capacidades de auto-organização, autogoverno,
autoadministração e autolegislação. O princípio que norteia essa repartição de
competências é o da predominância do interesse, que dispõe caber à União
as matérias de interesse geral e nacional, cabendo aos Estados os assuntos de
interesse regional e aos municípios os assuntos de interesse local.
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Em relação à sua extensão – isto é, considerando a possibilidade de parti-


cipação de um ou mais entes da federação na criação ou realização da norma
– as competências constitucionais podem ser elencadas da seguinte maneira
(BRASIL, 1988):
1. Exclusivas - São aquelas atribuídas somente a um ente e indelegáveis (art.
21, CF)
2. Privativas – Embora também possuam um caráter exclusivo, são dele-
gáveis (art. 22, § único)
3. Comum - Podem ser exercidas cumulativamente pelos diversos entes da
federação ( art. 23, CF)
4. Concorrente – Mais de um ente pode disciplinar a matéria. Todavia, as
normas gerais são editadas pela União ( art. 24, CF)
5. Suplementar – Competência que deriva da concorrente, e ocorre quando os
entes podem legislar para preencher lacunas de uma norma geral (art. 24, §
2º).

A repartição constitucional de competências, que é a descentralização política, é


um dos elementos imprescindíveis para que exista uma federação, não podendo ser
violada, sob pena de se macular o pacto federativo, com previsão no artigo 60, § 4º,
I, da Constituição Federal (BRASIL, 1988).

O sistema brasileiro se vale da distribuição de competências, utilizando


a técnica de enumerar as atribuições pertencentes à União e aos municí-
pios (arts. 21 e 30), ficando todas as demais não descritas nesses artigos
sob responsabilidade dos estados (art. 25, § 1º) (BRASIL, 1988). A isso se
denomina competência reservada, residual ou remanescente. Exemplifi-
cando, nos §§ 1º a 3º do art. 144, define-se a competência dos órgãos fede-
rais; no § 8º, que se refere aos municípios; e no § 4º, a competência resi-
dual (BRASIL, 1988). Em matéria tributária, todas as competências são ex-
pressas, por força do princípio da legalidade tributária, sendo de compe-
tência da União, como demonstram os artigos 154, I, e 195, § 4º (BRASIL,
1988).
Além disso, a Constituição Federal legisla ainda sobre a competência
concorrente. Ela determina que mais de um ente federativo pode legislar
sobre determinado assunto e disciplina, aplica e define no artigo 24 e seus
parágrafos também a competência plena e suplementar (BRASIL, 1988).
Não se deve confundir essas competências com a de natureza comum, que é
de responsabilidade de todos os entes federativos.
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As demais competências, de matéria administrativa e legislativa, que não


implícitas ou explícitas, são enumeradas para a União ou para os municípios
e são de competência remanescente ou reservada do Estado.
De acordo com o sistema constitucional brasileiro, as competências podem
ser classificadas em dois grandes grupos (BRASIL, 1988):

 as competências materiais (administrativas) e legislativas, subdivididas


em exclusivas (art. 21) e comuns ou paralelas (art. 23);
 as competências legislativas, subdivididas em privativas (art. 22), concor-
rentes (art. 24), suplementares (art. 24, § 2o) e remanescentes (art. 25, § 1o).

De certa forma, elas realizam assim o equilíbrio federativo, fundamentado


na técnica de enumeração dos poderes da União e dos poderes remanescentes
dos estados e municípios.
Essa segmentação de competências permite atribuir juridicamente a uma
entidade ou a um órgão do Poder Público a tomada de decisões, pois as compe-
tências são diversas modalidades de poder que auxiliam os órgãos ou entidades
estatais nas suas funções essenciais. Elas permitem que os conteúdos sejam
agrupados em classes de acordo com a sua natureza, a sua vinculação cumu-
lativa com mais de uma entidade e o seu vínculo com a função governamental.

O poder constituinte é o responsável por instituir a Constituição, que origina e regula


o Estado, assim como organiza e gere a administração. Ele deve respeitar e seguir os
seus superiores: o povo (titular do poder), a Constituição e o Estado.
É na Constituição que o titular do poder determina como deseja que seja o Estado e
a sociedade. Essa é uma decisão de poder, motivo pelo qual se chama a Constituição
de decisão política fundamental suprema. Ela é um contrato da sociedade entre si e
com o Estado, que é por ela criado.

Requisitos para a existência e manutenção


de uma Federação
A mera descentralização não assegura a existência de uma federação, pois
existem Estados unitários fortemente descentralizados e que, no entanto, podem
retomar competências subitamente. Para que exista um Estado federal, é preciso:
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a) distribuição ou repartição constitucional de competências (descentra-


lização política);
b) participação das vontades dos centros parciais na vontade do cen-
tro principal, o que se obtém através do Senado (Câmara Alta) no
bicameralismo;
c) possibilidade de autoconstituição (representada pelas constituições
estaduais).

Eventualmente, ainda que existam os requisitos citados, eles podem ser


abalados e diminuídos a ponto de se exaurir a existência da federação. Por
isso, há também os requisitos para a manutenção de uma federação.
O território federal não integra a federação, senão a União (BRASIL, 1988,
art. 18, § 2º), já que essa predomina como autarquia territorial.

Normas constitucionais de organização


dos Estados
O Estado é composto por uma estrutura administrativo-organizacional que
orienta e executa o cumprimento da vontade constitucional. Assim, a ad-
ministração estatal tem a liberdade de, em maior ou menor grau, cumprir e
fazer cumprir o que lhe for determinado, valendo-se de discricionariedade.
Nesse viés, o Estado exerce o poder conferido pela Constituição, orga-
nizando e criando uma estrutura administrativa para desempenhar as suas
obrigações, já delimitadas pela Constituição. Dessas definições, surgem as
divisões de tarefas por matéria e por sede geográfica, denominadas divisões
orgânica e territorial do poder.
A divisão orgânica do poder é representada pela divisão do poder uno,
que será exercido por meio de três grandes órgãos: o Legislativo, o Executivo
e o Judiciário. Esses poderes exercerão as três funções básicas: criar leis, ad-
ministrar e julgar, cada qual exercendo precipuamente uma dessas funções, já
indicadas na sua denominação. Subsidiariamente, também exercerão as demais
funções. Esse sistema é chamado de freios e contrapesos, sendo distribuído
para evitar o arbítrio ou abuso de poder.
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Já a divisão territorial do poder acontece geograficamente para facilitar


a administração, proteger e incentivar a democracia e objetivar a essência
do sistema federativo. Considerando as questões geográficas ou políticas, o
titular do poder pode optar por um Estado unitário com maior ou menor grau
de descentralização.
No Brasil, há a criação do Estado federal, da União e de várias ordens parciais
ou regionais (os Estados-membros, municípios, etc.). Assim, a Federação brasileira
é uma federação multifacetada que contém três estamentos de poder orgânico
e três estamentos de poder equacionados no espaço geográfico (Quadro 1).

Quadro 1. Poderes da Federação brasileira.

Entes
federados

União Estados Municípios Distrito


Arts. 20 Arts. 25 Arts. 29 Federal
Poderes a 24 a 28 a 31 Art. 32

Poder Congresso Assembleia Câmara Câmara


Legislativo Nacional Legislativa Municipal Legislativa
Arts. 44 a 75 Arts. 44 a 75 Art. 27 Art. 29, IV a Art. 32, § 1º
IX, XI, etc.

Poder Presidência Governadoria Prefeitura Governadoria


Executivo da República do Estado Municipal Distrital
Arts. 76 a 91 Art. 84 Art. 28 Art. 29 Art. 32, § 3º

Poder Tribunais Tribunais Inexistente Não possui


Judiciário Superiores, de Justiça, Poder Judiciário
Arts. 92 a 126 TRFs e alçada e Judiciário autônomo. O
Justiça juízes de Municipal seu Judiciário
Federal Direito é mantido
Arts. 92 a 124 Arts. 125 pela União,
e 126 conforme
arts. 21, XIII,
e 22, XVII.

Fonte: Motta (2016, p. 501).


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BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.


Brasília, DF, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/
constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 26 mar. 2018.
MOTTA, S. Direito Constitucional. 26. ed. Rio de Janeiro: Método, 2016.

Leituras recomendadas
SARLET, I. W.; MARINONI, L. G.; MITIDIERO, D. Curso de Direito Constitucional. 5. ed. São
Paulo: Saraiva, 2016.
SILVA, J. A. Curso de Direito Constitucional Positivo. 25. ed. São Paulo: Malheiros, 2005.

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