Você está na página 1de 2

03/04/2021 Anais Digitais - 23º Encontro SOCINE

Anais Digitais - 23º Encontro SOCINE


ISBN: 978-65-86495-01-0

Título Harun Farocki entre a estética dos games e a experiência do cinema

Autor Jamer Guterres de Mello

Resumo Em Parallel (2014), último trabalho realizado pelo cineasta alemão Harun
Expandido Farocki, o artista produz uma arqueologia das imagens digitais explorando as
condições de visibilidade que se alteram no decorrer do tempo, deduzindo
algumas dimensões epistemológicas e histórico-culturais das formas visuais
dos jogos digitais. A intenção de Farocki é examinar as imagens originadas
por novas tecnologias e, sobretudo, a intensa influência estética e política
que produzem em nosso cotidiano.

O objetivo deste trabalho é discutir, a partir do método analítico e


arqueológico desenvolvido por Farocki, algumas questões sobre as
condições de produção, distribuição e consumo das imagens em um
contexto para além do dispositivo cinematográfico. O foco do trabalho se
debruça sobre a reflexão teórica que o próprio artista constrói a partir das
mudanças processuais e perceptivas proporcionadas pelas transformações
técnicas geradas por novas lógicas de criação e circulação das imagens a
partir das tecnologias eletrônicas e digitais. Podemos perceber que o
interesse do cineasta é descrever teoricamente de que maneira as imagens
se repetem em diferentes meios de produção e distribuição técnica, quais
são suas permanências e suas latências, e estabelecer suas regularidades
epistêmicas (FOUCAULT, 2010) em diferentes meios de expressão.

Farocki explora os aspectos visuais das novas tecnologias e as condições de


representação e perspectiva da imagem digital como um dispositivo
performático. Ou seja, uma função estruturante do método arqueológico de
Farocki é justamente apreender momentos de performatividade das imagens.
Essa perspectiva representacional é explorada pelo caráter operacional das
imagens em que a representação nos games ultrapassa um caráter de
mimese, comum ao cinema. Christa Blumlinger (2010) denomina o método
analítico e arqueológico de Farocki como uma pedagogia performática, um
mecanismo teórico e didático interessado na performance e na
operacionalidade das imagens. Em Parallel, Farocki convida o espectador a
seguir um processo de análise comparativa com foco especulativo entre as
imagens dos games e do cinema. Uma questão colocada na obra é: até que
ponto os jogos de computador atuais buscam acompanhar e até mesmo
transcender a experiência estética do cinema? Em uma ampla discussão
sobre a natureza e os limites da superfície plana dos mundos criados por
computador, Farocki identifica uma essência normativa dos possíveis
mundos computadorizados que cria dispositivos de controle exatamente
como em nossa realidade. Os games seriam uma ampliação do mundo real?
Desta forma reproduzem as fronteiras e limites deste mundo? Afinal de
contas, onde este mundo termina? Farocki tenta demonstrar também as
características de operação dos objetos virtuais em função da ação da
câmera, determinada pelo sujeito que a manipula nos games. Há, por
1/2
03/04/2021 Anais Digitais - 23º Encontro SOCINE

exemplo, a possibilidade de fazer crateras em um pedestal, conforme a


realidade, mas há também a possibilidade de atravessar esse pedestal com
a simulação de uma câmera de cinema. Aqui, há uma espécie de
pensamento ontológico sobre as condições de visibilidade do universo dos
games. Como a imagem pode ser criada, definida e processada no interior
particular da linguagem dos games em seus próprios regimes técnicos e
estéticos?

Este trabalho é fruto de uma investigação mais ampla sobre a obra de Harun
Farocki, que tem sido apresentada em processo nos últimos encontros da
Socine, em torno de temas como a montagem de tempos heterogêneos e
descontínuos a partir das imagens de arquivo; os limites do visível e do
enunciável nas diversas camadas da imagem; a relação entre cinema e
videoinstalação; e no uso da imagem como mecanismo fundamental dos
aparatos de guerra. Trata-se de uma investigação que agora se debruça
sobre o caráter teórico e minucioso de análise das imagens digitais, o que
podemos caracterizar como uma arqueologia da cultura visual
contemporânea a partir de seu pensamento moldado pelas teorias do
cinema.

BLÜMLINGER, Christa. Harun Farocki: estratégias críticas. In: MOURÃO et


al. (orgs.). Harun Farocki: por uma politização do olhar. São Paulo:
Cinemateca Brasileira, 2010, pp. 148-161.

DOANE, Mary Ann. La emergencia del tiempo cinemático: la modernidade, la


contingencia y el archivo. Murcia: Cendeac, 2012.

ELSAESSER, Thomas. Cinema como arqueologia das mídias. São Paulo:


Edições Sesc São Paulo, 2018.

FAROCKI, Harun. Desconfiar de las imágenes. Buenos Aires, Argentina:


Caja Negra, 2013.
Bibliografia
FAROCKI, Harun. Influências transversais / montagem flexível. In: YOEL,
Gerardo. Pensar o cinema: imagem, ética e filosofia. São Paulo: Cosac Naify,
2015, pp. 227-234.

FERNÁNDEZ, Diego (Org.). Sobre Harun Farocki: la continuidade de la


guerra a través de las imágenes. Santiago: Metales Pesados, 2014.

FOUCAULT, Michel. A arqueologia do saber. Rio de Janeiro: Forense


Universitária, 2010.

RUBENTISCH, Juliane. Estética de la instalación. Buenos Aires: Caja Negra,


2018.

2/2

Você também pode gostar