Você está na página 1de 450

Organizadores

Rogério de Melo Grillo


Márcio Moterani Swerts

EDUCAÇÃO FÍSICA E
CIÊNCIAS DO ESPORTE
uma abordagem interdisciplinar
Volume 1

editora científica
Organizadores
Rogério de Melo Grillo
Márcio Moterani Swerts

EDUCAÇÃO FÍSICA E
CIÊNCIAS DO ESPORTE
uma abordagem interdisciplinar
Volume 1

1ª Edição
2020

editora científica
Copyright© 2020 por Editora Científica Digital

Copyright da Edição © 2020 Editora Científica Digital


Copyright do Texto © 2020 Os Autores

Todo o conteúdo deste livro está licenciado sob uma Licença de


Atribuição Creative Commons. Atribuição 4.0 Internacional (CC BY 4.0).

O conteúdo dos artigos e seus dados em sua forma, correção e confiabilidade são de responsabilidade exclusiva dos
autores. Permitido o download e compartilhamento desde que os créditos sejam atribuídos aos autores, mas sem a
possibilidade de alterá-la de nenhuma forma ou utilizá-la para fins comerciais.

EDITORA CIENTÍFICA DIGITAL LTDA


Guarujá - São Paulo - Brasil
www.editoracientifica.org - contato@editoracientifica.org
CONSELHO EDITORIAL
Editor Chefe
Reinaldo Cardoso

Editor Executivo
João Batista Quintela

Editor Científico
Prof. Dr. Robson José de Oliveira

Assistentes Editoriais
Elielson Ramos Jr.
Érica Braga Freire
Erick Braga Freire
Bianca Moreira
Sandra Cardoso

Arte e Diagramação
Andrewick França
Bruno Gogolla

Bibliotecário
Maurício Amormino Júnior - CRB6/2422

Jurídico
Dr. Alandelon Cardoso Lima - OAB/SP-307852
CONSELHO EDITORIAL
Prof. Dr. Robson José de Oliveira - Universidade Federal do Piauí

Prof. Dr. Rogério de Melo Grillo - Universidade Estadual de Campinas

Profª. Drª. Eloisa Rosotti Navarro - Universidade Federal de São Carlos

Prof. Dr. Carlos Alberto Martins Cordeiro - Universidade Federal do Pará

Prof. Me. Ernane Rosa Martins - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás

Prof. Dr. Rossano Sartori Dal Molin - FSG Centro Universitário

Prof. Dr. Carlos Alexandre Oelke - Universidade Federal do Pampa

Prof. Me. Domingos Bombo Damião - Universidade Agostinho Neto, Angola

Prof. Dr. Edilson Coelho Sampaio - Universidade da Amazônia

Prof. Dr. Elson Ferreira Costa - Universidade do Estado Do Pará

Prof. Me. Reinaldo Eduardo da Silva Sale - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará

Prof. Me. Patrício Francisco da Silva - Faculdade Pitágoras de Imperatriz

Prof. Me. Hudson Wallença Oliveira e Sousa - Instituto Nordeste de Educação Superior e Pós-Graduação

Profª. Ma. Auristela Correa Castro - Universidade Federal do Oeste do Pará

Profª. Drª. Dalízia Amaral Cruz - Universidade Federal do Pará

Profª. Ma. Susana Martins Jorge - Ferreira - Universidade de Évora, Portugal

Prof. Dr. Fabricio Gomes Gonçalves - Universidade Federal do Espírito Santo

Prof. Me. Erival Gonçalves Prata - Universidade Federal do Pará

Prof. Me. Gevair Campos - Faculdade CNEC Unaí

Prof. Esp. Flávio Aparecido de Almeida - Faculdade Unida de Vitória

Prof. Me. Mauro Vinicius Dutra Girão - Centro Universitário Inta

Prof. Esp. Clóvis Luciano Giacomet - Universidade Federal do Amapá

Profª. Drª. Giovanna Faria de Moraes - Universidade Federal de Uberlândia

Profª. Drª. Jocasta Lerner - Universidade Estadual do Centro-Oeste

Prof. Dr. André Cutrim Carvalho - Universidade Federal do Pará

Prof. Esp. Dennis Soares Leite - Universidade de São Paulo


Profª. Drª. Silvani Verruck - Universidade Federal de Santa Catarina

Prof. Me. Osvaldo Contador Junior - Faculdade de Tecnologia de Jahu

Profª. Drª. Claudia Maria Rinhel Silva - Universidade Paulista

Profª. Drª. Silvana Lima Vieira - Universidade do Estado da Bahia


Profª. Drª. Cristina Berger Fadel - Universidade Estadual de Ponta Grossa
CONSELHO EDITORIAL
Profª. Ma. Graciete Barros Silva - Universidade Estadual de Roraima

Prof. Dr. Carlos Roberto de Lima - Universidade Federal de Campina Grande

Prof. Dr. Júlio Ribeiro - Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro

Prof. Dr. Wescley Viana Evangelista - Universidade do Estado de Mato Grosso Carlos Alberto Reyes Maldonado

Prof. Dr. Cristiano Souza Marins - Universidade Federal Fluminense

Prof. Me. Marcelo da Fonseca Ferreira da Silva - Escola Superior de Ciências da Santa Casa de Misericórdia de Vitória

Prof. Dr. Daniel Luciano Gevehr - Faculdades Integradas de Taquara

Prof. Me. Silvio Almeida Junior - Universidade de Franca

Profª. Ma. Juliana Campos Pinheiro - Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Prof. Dr. Raimundo Nonato F. do Nascimento - Universidade Federal do Piauí

Prof. Dr. Iramirton Figuerêdo Moreira - Universidade federal de Alagoas

Profª. Dra. Maria Cristina Zago - Faculdade de Ciências Administrativas e Contábeis de Atibaia

Profª. Dra. Gracielle Teodora da Costa Pinto Coelho - Centro Universitário de Sete Lagoas

Profª. Ma. Vera Lúcia Ferreira - Centro Universitário de Sete Lagoas

Profª. Ma. Glória Maria de França - Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Profª. Dra. Carla da Silva Sousa - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Baiano

Prof. Dr. Márcio Moterani Swerts - Universidade de São Francisco


SUMÁRIO
CAPÍTULO 01........................................................................................................................................... 13

A CARREIRA ESPORTIVA SOB O MODELO BIOECOLÓGICO DE BRONFENBRENNER:


CONSTRUÇÃO E VALIDAÇÃO INTERNA DE INSTRUMENTO AVALIATIVO

Valdomiro de Oliveira; Thaynara Szeremeta; Guilherme da Silva Gasparotto; Aguinaldo Souza dos Santos;
Gerson Flores-Gomes; Aline Bichels; Giseli Sikora; Mariana Lacerda Arruda; Gislaine Cristina Vagetti

DOI: 10.37885/201001880

CAPÍTULO 02........................................................................................................................................... 28

A GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA E A EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR

Maria Carolina Oliveira de Sá; João Luiz da Costa Barros; Chang Yen Yin

DOI: 10.37885/201102137

CAPÍTULO 03........................................................................................................................................... 36

A TEORIA GERAL DE JOGO DE F. J. J. BUYTENDIJK: APORTES PARA UMA EDUCAÇÃO FÍSICA


MAIS SENSÍVEL À DISTINÇÃO ENTRE JOGO E LÚDICO

Rogério de Melo Grillo; Eloisa Rosotti Navarro; Gilson Santos Rodrigues; Regina Célia Grando

DOI: 10.37885/201202665

CAPÍTULO 04........................................................................................................................................... 50

A VIDA APÓS O FIM DA CARREIRA ESPORTIVA: UM ESTUDO SOBRE ATIVIDADE FÍSICA NO


LAZER EM EX-ATLETAS CATARINENSES

Valter Cordeiro Barbosa Filho; Deraldo Ferreira Oppa; Jorge Bezerra; Adair da Silva Lopes

DOI: 10.37885/200901392

CAPÍTULO 05........................................................................................................................................... 65

ALTERAÇÕES AUTONÔMICAS CARDÍACAS EM DIFERENTES PERFIS TÁTICOS DO JIU JITSU


BRASILEIRO

Denner Ferreira de Sousa; José Martins Juliano Eustaquio; Moacir Marocolo; Gustavo Ribeiro da Mota;
Octávio Barbosa Neto

DOI: 10.37885/201001832

CAPÍTULO 06........................................................................................................................................... 77

ALTERAÇÕES POSTURAIS DA COLUNA VERTEBRAL E SUA RELAÇÃO COM A MORFOLOGIA


DO JOELHO EM JOGADORES DE FUTEBOL

Wellington Danilo Soares; Amélia Sthefanie Noronha e Silva; Taloanne Lara Durães Chaves; Ludmila
Cotrim Fagundes; André Augusto Dias Silveira; Álvaro Parrela Piris; Daniel Antunes Freitas; Jomar Luiz
Santos de Almeida
DOI: 10.37885/201001866
SUMÁRIO
CAPÍTULO 07........................................................................................................................................... 86

ANALISE DA DISCIPLINA DE PEDAGOGIA DO ESPORTE NA GRADE CURRICULAR DOS CURSOS


DE EDUCAÇÃO FÍSICA NA CIDADE DE SÃO PAULO.

Denis Santos Caro; Antonio Coppi Navarro

DOI: 10.37885/201001892

CAPÍTULO 08........................................................................................................................................... 93

ANÁLISE PEDAGÓGICA DAS VANTAGENS DA PRÁTICA JUDOISTA NA ESCOLA PARA CRIANÇAS


DO PRIMEIRO AO QUINTO ANO

Gabriel Gomes da Rocha; Luis Carlos Feitosa; Ney Evangelista Junior; Marília Alves Moreira Pinto;
Lohayne Soares Viturino

DOI: 10.37885/201102244

CAPÍTULO 09......................................................................................................................................... 109

AS CONTRIBUIÇÕES DA EDUCAÇÃO FÍSICA NO DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA NO ENSINO


INFANTIL

Alcemildo Teixeira Lopes; Graciete Barros Silva

DOI: 10.37885/201001855

CAPÍTULO 10......................................................................................................................................... 124

ATIVIDADE FÍSICA COMO ADJUNTO TERAPÊUTICO PARA PACIENTES PSIQUIÁTRICOS COM


ADOECIMENTO MENTAL SEVERO: REVISÃO DA LITERATURA

Maria Cristina Zago; Bruneide Menegazzo Padilha

DOI: 10.37885/200901390

CAPÍTULO 11......................................................................................................................................... 139

ATIVIDADE FÍSICA E AMBIENTE: A INFLUENCIA DOS PARQUES VERDES URBANOS NA SAÚDE

Alba Regina Azevedo Arana; Maíra Rodrigues Uliana; Marcus Vinicius Pimenta Rodrigues; Claudio Alves
Siqueira; Yasmin Bispo Camara Camara; Higor Maluta Maluta; Amanda Kelly de Cursio Tanus Barreiros;
Juliana Felipe; Fernanda Berguerand Xavier
DOI: 10.37885/201001836

CAPÍTULO 12......................................................................................................................................... 161

AVALIAÇÃO OFTALMOLÓGICA EM JOGADORES PROFISSIONAIS DE FUTEBOL NO BRASIL

Aline Sutili Toledo; Gustavo Gonçalves Arliani; Paulo Henrique Schmidt Lara; Rodrigo Kallas Zogaib;
Moisés Cohen; Benno Ejnisman

DOI: 10.37885/201001845
SUMÁRIO
CAPÍTULO 13......................................................................................................................................... 170

BANDAS DE CONGO E POLÍTICA OFICIAL CENÁRIOS DE TRADIÇÕES E TRANSFORMAÇÕES


ESTÉTICAS CORPORAIS

José Luiz dos Anjos; Otávio Tavares; Juliana Guimarães Saneto

DOI: 10.37885/201001885

CAPÍTULO 14......................................................................................................................................... 185

CAPOEIRA DIALOGIA: O CORPO E O JOGO DE SIGNIFICADOS

Lucas Contador Dourado da Silva; Alexandre Donizete Ferreira

DOI: 10.37885/201101995

CAPÍTULO 15......................................................................................................................................... 201

CORPOS MAIS: UMA PRÁTICA ARTÍSTICA E EDUCACIONAL COM NORMALISTAS DO INSTITUTO


DE EDUCAÇÃO CIEP 179

Massuel dos Reis Bernardi

DOI: 10.37885/201001876

CAPÍTULO 16......................................................................................................................................... 215

CORRELAÇÃO ENTRE POTÊNCIA DE MEMBROS INFERIORES E CARACTERÍSTICAS


ANTROPOMÉTRICAS NA PERFORMANCE DO SALTO LATERAL EM GOLEIROS DE FUTEBOL
DE CAMPO

Rodolfo Machado de Souza Segundo; Ricelli Endrigo Ruppel da Rocha

DOI: 10.37885/201102019

CAPÍTULO 17......................................................................................................................................... 227

O ESTEROIDE ANABÓLICO ANDROGÊNICO DECANOATO DE NANDROLONA É PRÓ-OXIDATIVO


NO MIOCÁRDIO DE RATOS EXERCITADOS OU SEDENTÁRIOS

Julyara Lima Pinheiro; Bernardo Porto Maia; Anderson Bentes de Lima; Robson José de Souza
Domingues; Fabíola Raquel Tenório Oliveira; Jofre Jacob da Silva Freitas; Katia Simone Kietzer

DOI: 10.37885/201102066

CAPÍTULO 18......................................................................................................................................... 239

DISMORFIA MUSCULAR PRATICANTES DE MUSCULAÇÃO: O CASO DE UMA INSTITUIÇÃO


UNIVERSITÁRIA NO TOCANTINS

João Francisco Severo Santos; João Vitor Silveira Santos; Fernanda Alves Silva Severo

DOI: 10.37885/201102209
SUMÁRIO
CAPÍTULO 19......................................................................................................................................... 257

DISTÚRBIOS MUSCULOESQUELÉTICOS EM ESCOLARES PRATICANTES DE ATIVIDADES


ESPORTIVAS: UMA REVISÃO SISTEMÁTICA

Rafael Antonio Bianchi; Ricelli Endrigo Ruppel da Rocha

DOI: 10.37885/201102170

CAPÍTULO 20......................................................................................................................................... 270

EDUCAÇÃO FÍSICA E AS NOVAS PROPOSTAS DO MEC: UMA ANÁLISE NA CIDADE DE PINHEIRO


– MA

Michael Jeferson Pinheiro Pereira; Jandson Christian Pereira Mendes; Gustavo Rachid Mesquita Sauaia;
Elaynne Silva de Oliveira; Itânio da Silva Soares; Tomaz Antônio Sousa Soares; Lucio Carlos Dias Oliveira

DOI: 10.37885/201001912

CAPÍTULO 21......................................................................................................................................... 286

EFEITOS DA VEISALGIA NA PERFORMANCE DE ATLETAS AMADORES DE FUTEBOL DE CAMPO


EM UM MUNICÍPIO DE MINAS GERAIS

Carlos Aurílio Cobra Oliveira; Guilherme Azevedo Camilo; Yvan Fernandes Vilas Boas; Giuliano
Roberto da Silva

DOI: 10.37885/201102146

CAPÍTULO 22......................................................................................................................................... 294

EFEITOS DE UM PROGRAMA HIIT NA APTIDÃO AERÓBIA E BIOMARCADORES


CARDIOVASCULARES DE ESCOLARES

André Luis Messias dos Santos Duque; Grazielle Villas Boas Huguenin; Luiz Fernando Rodrigues Junior

DOI: 10.37885/201102021

CAPÍTULO 23......................................................................................................................................... 306

ESGRIMA E BADMINTON: INOVAÇÃO NAS AULAS

Francinaide Campos Verdolin

DOI: 10.37885/201101956

CAPÍTULO 24......................................................................................................................................... 316

ESPERANÇA E O RELACIONAMENTO TREINADOR-ATLETA DE ATLETAS PARANAENSES DE


NATAÇÃO

Ana Flávia Lopes Freitas-Silva; Andressa Ribeiro Contreira; Guilherme Futoshi Nakashima Amaro;
Lenamar Fiorese; Luciane Cristina Arantes da Costa

DOI: 10.37885/201102183
SUMÁRIO
CAPÍTULO 25......................................................................................................................................... 328

EXERCÍCIO FÍSICO E PREVALÊNCIA DE TRANSTORNOS MENTAIS

Eros de Oliveira Junior; Regina Correa

DOI: 10.37885/201001911

CAPÍTULO 26......................................................................................................................................... 339

IMPACTO DE DIFERENTES ESTRATÉGIAS DE ENSINO NO DESENVOLVIMENTO DO


CONHECIMENTO DECLARATIVO DE INICIANTES NA GINÁSTICA ARTÍSTICA

Ivana Montandon Soares Aleixo; Isabel Mesquita

DOI: 10.37885/201102044

CAPÍTULO 27......................................................................................................................................... 355

INTEGRANDO HABILIDADES PSICOLÓGICAS NAS FASES DE TREINO DA NATAÇÃO: UM ESTUDO


DE CASO

Fernanda Tartalha do Nascimento; Paula Teixeira Fernandes

DOI: 10.37885/201101942

CAPÍTULO 28......................................................................................................................................... 368

INTERVENÇÃO DO KARATÊ COMO FATOR TERAPÊUTICO NA VIDA DO ASMÁTICO

Daniele Fernandes de Almeida; Carlos Alberto Silva; Thomaz Marquez; Bruno Ferreira Gonçalves Silva

DOI: 10.37885/201001796

CAPÍTULO 29......................................................................................................................................... 377

MORTES NA NATAÇÃO DE ÁGUAS ABERTAS, POR QUÊ?

Fabrízio Di Masi; Gabriel Costa e Silva

DOI: 10.37885/201102003

CAPÍTULO 30......................................................................................................................................... 385

O JOGO POR UMA PERSPECTIVA HISTÓRICO-CULTURAL

Gustavo Martins Piccolo

DOI: 10.37885/201001867

CAPÍTULO 31......................................................................................................................................... 400

POR UMA DIDÁTICA DO JOGO/BRINCADEIRA NA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR

Rogério de Melo Grillo; Eloisa Rosotti Navarro; Gilson Santos Rodrigues

DOI: 10.37885/201202640
SUMÁRIO
CAPÍTULO 32......................................................................................................................................... 415

TENDINOSE PATELAR EM ATLETAS DO VÔLEI: CONCEITOS E ATUAÇÃO FISIOTERAPÊUTICA

Daiane dos Santos; Helena Queiroz Morais; Thainá Busato Klosienski; Natália Boneti Moreira

DOI: 10.37885/201001886

CAPÍTULO 33......................................................................................................................................... 424

TOMADA DE DECISÃO NO FUTEBOL SETE: UMA ANÁLISE SOBRE O ÚLTIMO PASSE E A


FINALIZAÇÃO

Guilherme Marinho Alves Duarte

DOI: 10.37885/201001829

CAPÍTULO 34......................................................................................................................................... 437

UMA AVALIAÇÃO DO ÍNDICE DE COMPETÊNCIA MORAL DE ADOLESCENTES PRATICANTES


DE FUTSAL

Davi Perpétuo Assad; Fabrício Bruno Cardoso; Iris Lima e Silva; Énio Dias Júnior; Heron Beresford

DOI: 10.37885/201102242

SOBRE OS ORGANIZADORES............................................................................................................. 445

ÍNDICE REMISSIVO............................................................................................................................... 446


01
“ A carreira esportiva sob o modelo
bioecológico de bronfenbrenner:
construção e validação interna
de instrumento avaliativo

Valdomiro de Oliveira Aline Bichels


UFPR UFPR

Thaynara Szeremeta Giseli Sikora


UFPR UFPR

Guilherme da Silva Gasparotto Mariana Lacerda Arruda


IFPR UNESPAR

Aguinaldo Souza dos Santos Gislaine Cristina Vagetti


UFPR UNESPAR

Gerson Flores-Gomes
UFPR

10.37885/201001880
RESUMO

Este capítulo tem por objetivo apresentar o percurso metodológico adotado na constru-
ção e validação interna de um instrumento avaliativo cujo intuito é investigar a carreira
esportiva de atletas. Método: Para nortear as perguntas foi utilizado o Modelo PPCT
(Pessoa - Processo - Contexto - Tempo) de Bronfenbrenner e todos os aspectos cien-
tíficos necessários para a validação interna de instrumentos de avaliação. Resultados:
em relação às dimensões dos itens do questionário foi encontrado índice Kappa de 0,94
de concordância entre os juízes, o que indicou que os itens foram adequados à respec-
tiva dimensão. A fase seguinte consistiu em um teste piloto para verificar a viabilidade e
confiabilidade do instrumento. Participaram do estudo 118 atletas universitários por meio
do preenchimento do instrumento elaborado Questionário de Avaliação da Trajetória
Esportiva (QATE). Resultados: alpha de Cronbach = 0,92 e em média um coeficiente
de correlação intraclasse = 0,78. Considerações finais: o instrumento foi construído e
validado de acordo com os índices propostos pela literatura e alcançou o objetivo inicial
de sua concepção e validação interna para melhor compreender o papel do esporte na
carreira esportiva e na vida dos indivíduos atletas.

Palavras-chave: Psicometria, Psicologia do Esporte, Estudo de Validação, Questionário.


INTRODUÇÃO

O esporte está presente no cotidiano da sociedade em diferentes ambientes: os for-


mais, os informais e os não formais e tem sido entendido como um fenômeno sociocultural
de múltiplas possibilidades pelos seus aspectos plurais e polissêmicos (Oliveira e Paes,
2020; Santos, Vagetti e Oliveira, 2017; Secco e Oliveira, 2017). Nesse sentido, tanto os
praticantes de esportes, quanto as pessoas que vivenciam o esporte como espetáculo do
entretenimento (indo a estádios, arenas, ginásios ou outros espaços), estão participando
de um ‘processo educativo’, independentemente do tipo de prática esportiva, se esta visa
resultados superiores ou simplesmente para o lazer, para a socialização ou para a promo-
ção da saúde. É perceptível que nas práticas esportivas toda ação pedagógica, é um ato
educativo, tendo em vista as interações psicossociais existentes entre o professor/treinador
e o aluno/atleta.
Bronfenbrenner criou um modelo de desenvolvimento humano nomeado ‘Modelo
Bioecológico’ e propôs que este seja estudado por meio da interação sinergética de
quatro núcleos inter-relacionados: o processo, a pessoa, o contexto e o tempo (PPCT)
(BRONFENBRENNER, 2011). A partir dessa teoria, diversos estudos foram desenvolvidos
no contexto esportivo. Em um destes estudos, Santos, Vagetti e Oliveira (2017) tratam da
trajetória do desenvolvimento de atletas do atletismo; Oliveira (2017, 2020) versa sobre o
desenvolvimento esportivo da luta olímpica em estudantes de escolas públicas no Brasil e
Santos et al., (2020) estudaram a “Percepção de atletas sobre suas trajetórias no atletismo
a partir do Modelo Bioecológico de Bronfenbrenner” e realizaram uma revisão integrativa
sobre a teoria aplicada ao esporte (SANTOS et al., 2019).
Autores como Rother e Mejia (2015), Domingues e Gonçalves (2014) e Santos et. al.,
(2019) apontam que os estudos que abordam a Teoria Bioecológica no contexto esportivo
são majoritariamente qualitativos e, diante disso, um instrumento quantitativo de medição
das dimensões envolvidas no processo de desenvolvimento esportivo pode contribuir de
forma relevante para auxiliar novas pesquisas científicas no esporte. Dessa forma justifica-
-se a criação de um instrumento quando inexiste, ou os existentes são, por algum motivo,
inadequados para medir, do ponto de vista da psicometria, aspectos relacionados ao com-
portamento humano no esporte.

OBJETIVO

Este trabalho tem por objetivo apresentar o percurso metodológico adotado na cons-
trução e validação interna de um instrumento avaliativo, cujo intuito é investigar a carrei-
ra esportiva de atletas, denominado ‘Questionário de Avaliação da Trajetória da Carreira

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 15


Esportiva’, tendo suas interfaces em três áreas principais: Educação, Psicologia e Educação
Física, sob a ótica do modelo Bioecológico de Bronfenbrenner.

MÉTODO

Tipo de estudo

Este estudo tem sua inserção na psicometria, uma vez que busca construir e validar
um questionário de investigação da trajetória esportiva sob a ótica do Modelo Bioecológico
de Bronfenbrenner. Inicialmente fora realizado um levantamento teórico a fim de fornecer
subsídios para compor a matriz analítica que norteou a construção dos itens do instrumento.
Uma vez que foi constatada a adequação dos itens construídos, com base na literatura
de Pasquali (2010), seguiu-se para os procedimentos empíricos e analíticos, que contem-
plaram a análise teórica dos itens, bem como o teste piloto. A construção e validação de
um instrumento são compostas de várias etapas, segundo o mesmo autor, que divide este
processo em procedimentos teóricos, experimentais e analíticos. Nos procedimentos teóricos,
são envolvidas as explicitações da teoria que envolve o construto em questão. Os procedi-
mentos empíricos envolvem a definição de etapas e aplicação de instrumento piloto. Já os
procedimentos analíticos envolvem as análises estatísticas e, quando necessários, processos
de normatização. Neste estudo foram enfatizados os procedimentos empíricos e analíticos.

Procedimentos

Para a construção do instrumento entendeu-se como atleta qualquer indivíduo que


vivencia um programa de treinamento esportivo, que possa ter participado ou não de com-
petições em níveis municipal, estadual, nacional ou internacional. Já o ex-atleta é o indiví-
duo que passou por este processo e ‘não prática mais qualquer modalidade esportiva, com
foco competitivo.
Na ótica do modelo PPCT, a ‘pessoa’, então, é o atleta ou ex-atleta que passou pelo
desenvolvimento (processo) em diversos ‘contextos’ (escola, clube, vizinhança, entre outros),
em um determinado ‘tempo’ (especificamente neste estudo referente à idade cronológica).
Todo esse processo de vivência no esporte foi chamado de ‘trajetória esportiva’.
A criação do instrumento se valeu de três pilares: a) a trajetória esportiva, b) a teoria
do modelo bioecológico de Bronfenbrenner e c) a construção e validação do questionário
de avaliação da carreira esportiva (QAEC).
Para a elaboração dos itens do questionário utilizou-se o modelo de carreira esportiva
conforme a concepção de modelo de Oliveira e Paes (2012), Oliveira, Paes e Vagetti (2020),

16 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


o qual o dividiu em duas grandes etapas: iniciação e especialização esportiva, sendo que
cada etapa possui três fases de desenvolvimento: 1 - etapa de iniciação esportiva que possui:
a) fase de conhecer os esportes, b) fase de aprender diversos esportes e c) fase de auto-
matização da aprendizagem em vários esportes; 2 - etapa de especialização esportiva que
possui: a) fase de aperfeiçoamento esportivo inicial, b) fase de aperfeiçoamento profundo e
c) fase de resultados superiores.
No presente estudo, a trajetória da carreira esportiva é idealizada para a formação
atlética em busca de resultados esportivos ou não. Ela fornece indicadores das possíveis
idades e características de cada etapa, sendo que cada atleta e cada modalidade esportiva
possui sua especificidade que pode configurar em um desenvolvimento diferente do pro-
posto pelos autores.
A partir da literatura, mencionada anteriormente, elaboraram-se questões e categorias
investigativas para serem submetidas ao processo de validação interna, na qual se deu
por meio da validação de conteúdo, contemplando duas perspectivas distintas: análise por
especialistas (juízes) e estudo piloto aplicado em uma amostra da população.

Análise teórica dos itens do questionário

Participaram seis especialistas da área da pedagogia do esporte e do treinamento


esportivo sendo que, em momentos distintos, três especialistas realizaram a análise inicial
das questões e, os outros três, a análise das questões reformuladas.

Instrumentos da análise teórica

Foi enviado aos especialistas um formulário de análise de conteúdo com a intenção de


verificar a semântica das questões, a partir dos seguintes critérios: clareza de linguagem,
pertinência prática, relevância teórica e dimensão teórica. Além destes critérios havia um
campo para opiniões e sugestões dos juízes.
A avaliação da clareza de linguagem, relevância teórica e pertinência prática foi feita
por meio de uma escala Likert de 5 pontos, em que (1) correspondeu a ‘pouquíssima’, (2)
correspondeu a ‘pouca’, (3) correspondeu a ‘média’, (4) correspondeu a ‘muita’ e (5) cor-
respondeu a ‘muitíssima’. Para os itens que receberam uma pontuação menor que 3 foram
solicitadas sugestões de alterações.
A dimensão teórica foi composta, na ‘primeira’ versão, por: pessoa (subdividida em
domínio cognitivo, social, motor e psicológico), processo e contexto, em que os juízes de-
veriam assinalar a qual dimensão o item representa.
Na aplicação da ‘segunda’ versão do formulário de análise de conteúdo, o objetivo
foi verificar a relação entre constructos, no qual as indagações investigativas deveriam

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 17


possibilitar o entendimento de pertencimento às categorias pretendidas. Nesse formulário,
os juízes deveriam assinalar de 1 a 5 representando o quanto o item estava de acordo com
a dimensão proposta. A figura 1 exemplifica o preenchimento da ficha pelos juízes, em um
dos itens do questionário.

Figura 1. Ficha dos juízes

Fonte: Szeremeta (2018)

Procedimentos da análise teórica

Foi estabelecido, inicialmente, o contato via telefone e e-mail com especialistas da


área de estudo mediante o convite e o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).
Após o aceite, foi encaminhado o formulário de análise de conteúdo. Foi estipulado um prazo
de 30 dias para as considerações. No retorno do formulário, foram realizadas correções e
adaptações no instrumento em construção.

Análise dos dados da análise teórica

A análise desta etapa foi realizada com o uso do cálculo do teste de coeficiente de
validade de conteúdo (CVC) (Cassepp-Borges, et al., 2010) para os conceitos de clare-
za de linguagem, pertinência prática e relevância teórica e pelo índice Kappa (k) para a
dimensão teórica.
Os resultados foram interpretados conforme classificação sugerida por Cassepp-Borges,
et al. (2010) com CVC iguais ou maiores a 0,80 e conforme (Fleiss, 1981) que considera
valores do índice Kappa (k): se k < 0,4, ‘pobres’, de k =0,4 ≤ 0,75, ‘satisfatórios’ a ‘bons’, e
k ≥ 0,75, ‘excelentes’.

Procedimentos do estudo piloto

O estudo piloto teve como objetivo verificar a fidedignidade (consistência interna e


estabilidade temporal) e exequibilidade do instrumento.
Para tanto foi realizado um contato prévio com os técnicos esportivos da Universidade
Federal do Paraná (UFPR) a fim de conferir a disponibilidade e estabelecer a data e o horário

18 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


da visita. Posteriormente os pesquisadores foram até o local de treinamento dos atletas, no
campus da UFPR e realizaram o convite aos atletas para participação no estudo.
A ‘estabilidade temporal’ foi verificada por meio do procedimento teste-reteste; para
tal, os pesquisadores retornaram ao local de treinamento dos atletas uma semana após
a primeira aplicação do instrumento (teste) para a reaplicação do questionário (reteste) e
determinação de sua estabilidade.
Foi questionado aos participantes, em ambas as etapas, se possuíam dúvida com rela-
ção a algum dos itens do questionário, a fim de conferir a validade semântica, e quando a res-
posta foi ‘sim’, o item foi revisto posteriormente. Por fim, os dados recolhidos foram analisados.

Participantes do teste piloto

Foram convidados atletas universitários da UFPR, maiores de 18 anos, de diferentes


modalidades (individuais e coletivas), para participar do teste piloto, totalizando 118 atle-
tas participantes, dos quais 30 fizeram teste e reteste, respondendo ao “Questionário de
Avaliação da Trajetória Esportiva” (QATE).

Análise dos dados do teste piloto

Os dados foram analisados estatisticamente por meio do programa Statistical Package


for Social Sciences (SPSS), versão 24.
Para avaliar a consistência interna do instrumento, foi aplicado o Alfa de Cronbrach,
em que o índice varia de uma escala de 0 a 1, considerado aceitável um resultado maior ou
igual a 0,7 (Hutz, et al., 2015).
Para verificar a estabilidade temporal foi utilizado o coeficiente de correlação intraclas-
ses (CCI). Os valores do coeficiente variam de 0 a 1, sendo que quanto mais próximo de 1,
mais verdadeiro é considerado o escore avaliado (Thomas e Nelson, 2002).

Ética no estudo

A presente pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres
Humanos do Setor de Ciências da Saúde da UFPR sob o número de parecer 2.435.250 e
CAAE 79930317.3.0000.0102.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 19


RESULTADOS

Análise teórica dos itens

Em uma primeira análise observou-se que, na maioria dos itens, o CVC estava abaixo
do recomendado pela literatura (0,80) em mais de um dos aspectos propostos (clareza de
linguagem, relevância teórica e pertinência prática). Além disso, foram relatadas dificuldades
na compreensão do instrumento.
Desta maneira, optou-se por uma reformulação geral no instrumento. A princípio, o
‘tempo’ seria avaliado transversalmente em cada dimensão (pessoa, processo e contexto),
entretanto, na versão corrigida o ‘tempo’ foi considerado como uma dimensão.
Além disso, em cada dimensão foi adicionada uma frase que dizia respeito ao conteú-
do da categoria, por exemplo, na dimensão ‘pessoa’ a frase foi: ‘É possível afirmar que o
esporte contribuiu para:’, facilitando assim a compreensão do texto.
A versão corrigida do formulário de análise de conteúdo foi encaminhada para outros
três especialistas da área da pedagogia do esporte. Para verificar a concordância dos juízes
referente às dimensões foi utilizado o índice Kappa generalizado, visto que mais de dois
juízes avaliaram o instrumento (Fleiss, 1981).
Os juízes tiveram um índice de concordância de 0,94, em que os itens apontaram entre
adequados e muito adequados à dimensão proposta. Apesar de não existir um único valor
específico adequado, Fleiss (1981) considera o índice Kappa acima de 0,75 como excelente.
Assim, na segunda análise, averiguou-se que dos 119 itens, 97 obtiveram o CVC
conforme o que Cassepp-Borges, et al. (2010) propõem ser adequado, aproximadamente
82% do questionário. De forma geral, os valores de CVC para o item clareza de linguagem
(0,90), pertinência prática (0,90) e relevância teórica (0,88) se mostraram adequados, todos
acima de 0,80. Da mesma maneira, o CVC médio da escala também foi adequado com
um valor de 0,89.
Dos 22 itens que tiveram o CVC baixo em algum aspecto, apenas seis obtiveram
CVC inferior a 0,80 nos três aspectos. Os itens que obtiveram um CVC inferior a 0,80
receberam sugestões dos juízes que posteriormente foram analisadas e, então, os itens
foram reformulados.

Teste piloto

O tempo médio de aplicação do questionário foi de 15 minutos. Nenhum dos partici-


pantes relatou dúvida ou dificuldade e constatou-se a exequibilidade do instrumento.

20 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Os atletas que participaram do teste piloto tinham idade média de 21,56 ± 2,90, sen-
do 60 (50,84%) do sexo masculino e 58 (49,15%) do sexo feminino. A maioria (90,67%)
com nível superior incompleto e apenas 9,32% com nível superior completo. Os pratican-
tes de futebol, handebol, vôlei, basquete e atletismo compunham média de 9,20 ± 4,17
anos de prática esportiva, sendo que 79,66% praticaram diversas modalidades esportivas
e 20,33% apenas uma.
Na tabela 1 são apresentados os valores de alfa de Cronbach do instrumento de forma
geral e estratificado por dimensão (pessoa, processo, contexto e tempo).

Tabela 1. Valores de Alfa de Cronbach total e estratificado por dimensão.


Categoria Alfa de Cronbach Número de itens
Instrumento 0,920 114
Pessoa 0,865 30
Processo 0,682 15
Contexto 0,760 17
Tempo 0,883 52

A Tabela 2 demonstra a estabilidade temporal do instrumento por meio do cálculo da


média do coeficiente de correlação intraclasse estratificado por dimensão e geral.

Tabela 2. Coeficientes de correlação intraclasse estratificado por dimensão


Coeficiente de correlação intra- Número de
Categoria
classe itens
Instrumento 0,780 114
Pessoa 0,691 30
Processo 0,816 15
Contexto 0,844 17
Tempo 0,799 52

A versão final dos itens do instrumento encontra-se a seguir.

Versão final do Questionário de Avaliação da Trajetória Esportiva (QATE)

1 - Identificação

Nome:______________________________________Idade:____
Modalidade esportiva que praticou pelo maior período de tempo:
Por quanto tempo?
Outros esportes ou atividades que praticou:
Qual o seu grau de instrução?
( ) Analfabeto/ Fundamental incompleto
( ) Fundamental I completo/ Fundamental II incompleto
( ) Fundamental completo/ Médio incompleto

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 21


( ) Médio completo/Superior incompleto
( ) Superior completo

2 - Leia cada item com atenção e assinale com um “X” o quanto concorda com cada
afirmação de acordo com sua trajetória esportiva, considerando:

1 2 3 4 5

Discordo muito Discordo Nem discordo nem concordo Concordo Concordo muito

É possível afirmar que o esporte contribuiu para que eu:

1. Me sentisse autorrealizado (a) e bem-sucedido (a) em minha vida (1) (2) (3) (4) (5)
2. Tivesse autoconfiança (1) (2) (3) (4) (5)
3. Fosse uma pessoa determinada (1) (2) (3) (4) (5)
4. Tivesse controle emocional (1) (2) (3) (4) (5)
5. Tivesse dedicação em minhas tarefas fora do esporte (1) (2) (3) (4) (5)
6. Aprendesse a resolver conflitos (1) (2) (3) (4) (5)
7. Melhorasse minha concentração (1) (2) (3) (4) (5)
8. Tivesse disciplina (1) (2) (3) (4) (5)
9. Desenvolvesse minha inteligência (1) (2) (3) (4) (5)
10. Fosse uma pessoa com iniciativa (1) (2) (3) (4) (5)
11. Fosse uma pessoa mais cooperativa (1) (2) (3) (4) (5)
12. Tivesse mais independência social (1) (2) (3) (4) (5)
13. Praticasse esporte para o resto da vida (1) (2) (3) (4) (5)
14. Tivesse um relacionamento melhor com as pessoas (1) (2) (3) (4) (5)
15. Proporcionasse a mim e a outros momentos alegres e divertidos (1) (2) (3) (4) (5)
16. Aprendesse valores sociais (1) (2) (3) (4) (5)
17. Desenvolvesse espírito ético (1) (2) (3) (4) (5)
18. Adquirisse mais responsabilidade (1) (2) (3) (4) (5)
19. Fizesse amigos (1) (2) (3) (4) (5)
20. Tivesse um relacionamento amoroso (por exemplo, namoro) (1) (2) (3) (4) (5)
21. Tivesse um relacionamento melhor com minha família (1) (2) (3) (4) (5)
22. Conhecesse novos lugares (1) (2) (3) (4) (5)
23. Melhorasse minha coordenação e habilidades motoras (saltar, correr, arremessar, etc.) (1) (2) (3) (4) (5)
24. Melhorasse minha saúde (1) (2) (3) (4) (5)
25. Tivesse uma melhor estética no meu corpo (1) (2) (3) (4) (5)
26. Melhorasse minha resistência física (1) (2) (3) (4) (5)
27. Melhorasse minha velocidade (1) (2) (3) (4) (5)
28. Melhorasse minha flexibilidade física (1) (2) (3) (4) (5)
29. Melhorasse minha força (1) (2) (3) (4) (5)
30. Melhorasse minha agilidade (1) (2) (3) (4) (5)
É possível afirmar que durante a minha trajetória esportiva
31. Conheci diversas modalidades esportivas (1) (2) (3) (4) (5)
32. Aprendi diversas modalidades esportivas (1) (2) (3) (4) (5)
33. Pratiquei diversas modalidades esportivas (1) (2) (3) (4) (5)
34. Me dediquei muito tempo em apenas uma modalidade esportiva (1) (2) (3) (4) (5)
35. A maior parte dos treinos era com exercícios físicos (1) (2) (3) (4) (5)
36. A maior parte dos treinos era com exercícios táticos (1) (2) (3) (4) (5)
37. A maior parte dos treinos era com exercícios técnicos (1) (2) (3) (4) (5)

22 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


38. Tive treinamento psicológico durante os treinos e competições (1) (2) (3) (4) (5)
39. Tive treinamento com pesos (sala de musculação) (1) (2) (3) (4) (5)
40. Tive muitos treinos em forma de jogos e brincadeiras (1) (2) (3) (4) (5)
41. Participei de diversas competições (1) (2) (3) (4) (5)
42. A frequência semanal de treinos era alta (1) (2) (3) (4) (5)
43. Tive alguma lesão que impactou na minha trajetória (ex: fatura, rompimento de ligamento, lesão muscular grave,
(1) (2) (3) (4) (5)
etc.)
44. Gostava de competir (1) (2) (3) (4) (5)
45. As exigências nos treinos e competições eram altas (1) (2) (3) (4) (5)
É possível afirmar que durante a minha trajetória esportiva
46. Pratiquei esporte em clubes e/ou contra turno escolar (1) (2) (3) (4) (5)
47. Pratiquei esporte na rua, em associações, ONGs, projetos sociais, etc. (1) (2) (3) (4) (5)
48. Pratiquei esporte na educação física escolar (1) (2) (3) (4) (5)
49. Tive apoio das minhas relações afetivas (família, amigos, namorado (a)) para praticar esporte (1) (2) (3) (4) (5)
50. Meus pais investiram recursos financeiros na minha prática esportiva (1) (2) (3) (4) (5)
51. Meu professor/técnico me apoiava financeiramente em treinos e competições (1) (2) (3) (4) (5)
Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar 19
52. Tive bolsa financeira do governo municipal (1) (2) (3) (4) (5)
53. Tive bolsa financeira do governo estadual (1) (2) (3) (4) (5)
54. Tive bolsa financeira do governo federal (1) (2) (3) (4) (5)
55. Tive patrocínio de empresas privadas (clubes, clínicas, etc.) (1) (2) (3) (4) (5)
56. Os professores/técnicos exigiam um bom desempenho acadêmico para a prática esportiva (1) (2) (3) (4) (5)
57. Meus pais exigiam um bom desempenho acadêmico para a prática esportiva (1) (2) (3) (4) (5)
58. Os professores/técnicos cobravam resultados esportivos (1) (2) (3) (4) (5)
59. Meus pais cobravam resultados esportivos (1) (2) (3) (4) (5)
60. Tive que mudar de cidade/estado devido a minha prática esportiva (1) (2) (3) (4) (5)
61. Tive oportunidade de estudo (escola ou universidade particular) devido ao esporte (1) (2) (3) (4) (5)
62. Tive oportunidades de emprego devido ao esporte (1) (2) (3) (4) (5)
É possível afirmar que durante a minha INFÂNCIA (6 a 10 anos):
63. Iniciei minha prática esportiva (1) (2) (3) (4) (5)
64. Pratiquei diversas modalidades esportivas (1) (2) (3) (4) (5)
65. Optei por apenas uma modalidade esportiva (1) (2) (3) (4) (5)
66. Comecei a competir em nível municipal (1) (2) (3) (4) (5)
67. Participei de competições estaduais (1) (2) (3) (4) (5)
68. Participei de competições nacionais (1) (2) (3) (4) (5)
69. Participei de competições internacionais (1) (2) (3) (4) (5)
70. Ganhei títulos municipais (1) (2) (3) (4) (5)
71. Ganhei títulos estaduais (1) (2) (3) (4) (5)
72. Ganhei títulos nacionais (1) (2) (3) (4) (5)
73. Ganhei títulos internacionais (1) (2) (3) (4) (5)
74. Encerrei minha trajetória esportiva (1) (2) (3) (4) (5)
75. Considero que tive sucesso esportiva nesta fase (1) (2) (3) (4) (5)
É possível afirmar que durante o ÍNICIO DA MINHA ADOLESCÊNCIA (11 a 14 anos):
76. Iniciei minha prática esportiva (1) (2) (3) (4) (5)
77. Pratiquei diversas modalidades esportivas (1) (2) (3) (4) (5)
78. Optei por apenas uma modalidade esportiva (1) (2) (3) (4) (5)
79. Comecei a competir em nível municipal (1) (2) (3) (4) (5)
80. Participei de competições estaduais (1) (2) (3) (4) (5)
81. Participei de competições nacionais (1) (2) (3) (4) (5)
82. Participei de competições internacionais (1) (2) (3) (4) (5)

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 23


83. Ganhei títulos municipais (1) (2) (3) (4) (5)
84. Ganhei títulos estaduais (1) (2) (3) (4) (5)
85. Ganhei títulos nacionais (1) (2) (3) (4) (5)
86. Ganhei títulos internacionais (1) (2) (3) (4) (5)
87. Encerrei minha trajetória esportiva (1) (2) (3) (4) (5)
88. Considero que tive sucesso esportivo nesta fase (1) (2) (3) (4) (5)
É possível afirmar que durante o FINAL DA MINHA ADOLESCÊNCIA (15 a 18 anos):
89. Iniciei minha prática esportiva (1) (2) (3) (4) (5)
90. Pratiquei diversas modalidades esportivas (1) (2) (3) (4) (5)
91. Optei por apenas uma modalidade esportiva (1) (2) (3) (4) (5)
92. Comecei a competir em nível municipal (1) (2) (3) (4) (5)
93. Participei de competições estaduais (1) (2) (3) (4) (5)
94. Participei de competições nacionais (1) (2) (3) (4) (5)
95. Participei de competições internacionais (1) (2) (3) (4) (5) (1) (2) (3) (4) (5)
96. Ganhei títulos municipais (1) (2) (3) (4) (5) (1) (2) (3) (4) (5)
20 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar (1) (2) (3) (4) (5)
97. Ganhei títulos estaduais (1) (2) (3) (4) (5) (1) (2) (3) (4) (5)
98. Ganhei títulos nacionais (1) (2) (3) (4) (5) (1) (2) (3) (4) (5)
99. Ganhei títulos internacionais (1) (2) (3) (4) (5) (1) (2) (3) (4) (5)
100. Encerrei minha trajetória esportiva (1) (2) (3) (4) (5) (1) (2) (3) (4) (5)
101. Considero que tive sucesso esportivo nesta fase (1) (2) (3) (4) (5) (1) (2) (3) (4) (5)
É possível afirmar que durante a minha IDADE ADULTA (acima de 18 anos):
102. Iniciei minha prática esportiva (1) (2) (3) (4) (5) (1) (2) (3) (4) (5)
103. Pratiquei diversas modalidades esportivas (1) (2) (3) (4) (5) (1) (2) (3) (4) (5)
104. Optei por apenas uma modalidade esportiva (1) (2) (3) (4) (5) (1) (2) (3) (4) (5)
105. Comecei a competir em nível municipal (1) (2) (3) (4) (5) (1) (2) (3) (4) (5)
106. Participei de competições estaduais (1) (2) (3) (4) (5) (1) (2) (3) (4) (5)
107. Participei de competições nacionais (1) (2) (3) (4) (5) (1) (2) (3) (4) (5)
108. Participei de competições internacionais (1) (2) (3) (4) (5) (1) (2) (3) (4) (5)
109. Ganhei títulos municipais (1) (2) (3) (4) (5) (1) (2) (3) (4) (5)
110. Ganhei títulos estaduais (1) (2) (3) (4) (5) (1) (2) (3) (4) (5)
111. Ganhei títulos nacionais (1) (2) (3) (4) (5) (1) (2) (3) (4) (5)
112. Ganhei títulos internacionais (1) (2) (3) (4) (5) (1) (2) (3) (4) (5)
113. Encerrei minha trajetória esportiva (1) (2) (3) (4) (5) (1) (2) (3) (4) (5)
114. Considero que tive sucesso esportivo nesta fase (1) (2) (3) (4) (5) (1) (2) (3) (4) (5)

DISCUSSÃO

Ao analisar os resultados do teste com os parâmetros estabelecidos por Landis e Koch


(1977), observa-se que, de forma geral, o instrumento obteve um alfa de 0,92, considerado
quase perfeito (> 0,80), conferindo boa consistência interna ao instrumento.
Ao analisar o alfa de cada categoria, nota-se que as dimensões pessoa e tempo, res-
pectivamente (α = 0,865) e (α = 0,883) obtiveram valores mais elevados do que as dimensões
processo (α = 0,682) e contexto (α = 0,760), valores considerados substanciais conforme
Landis e Koch (1977).

24 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


De acordo com a literatura (Maroco e Garcia-Marques, 2006; Krus e Helmstadter, 1993),
os valores de alfa encontrados nas dimensões processo e contexto são influenciados pela
quantidade de itens (15 e 17 respectivamente) e que os mesmos também são menores,
quando comparados com as dimensões pessoa e contexto (30 e 52 respectivamente). Essa
diferença pode ser amenizada em uma amostra maior, o que sugere que, em um processo
de validação externa, os valores do alfa seriam ainda mais promissores.
Ainda, segundo Maroco e Garcia-Marques (2006), os valores altos de consistência
interna em um instrumento multidimensional, como é o caso do QATE, indicam que as
dimensões que compõem o instrumento (pessoa, processo, contexto e tempo) estão forte-
mente relacionadas entre si, demonstrando que a concepção do instrumento foi adequada.
Ao relacionar os resultados dos 30 atletas que fizeram o teste e reteste em momentos
distintos, observa-se que, de maneira geral, o instrumento obteve um coeficiente de correla-
ção médio de 0,78, sendo considerado por Hopkins (2000) como uma correlação muito alta.
De igual modo, as dimensões processo e contexto obtiveram uma correlação muito
alta (0,816 e 0,844 respectivamente). Já nas dimensões pessoa e tempo, observa-se um
coeficiente de correlação de 0,691 e 0,799, respectivamente, os quais são considerados por
Hopkins (2000) como altos.
Evidencia-se que o QATE obteve boa estabilidade temporal tanto de forma geral, como
quando estratificada por dimensões. Por tal, não foi retirado qualquer item durante esta etapa
(ZEREMETA, 2018).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A construção e validação do QATE consistiu-se de várias etapas. Este estudo se trata


especificamente do método adotado para a elaboração dos itens que compõem o questionário
e da validação interna do instrumento. Por meio da análise teórica dos itens constatou-se
que o instrumento possuía boa clareza de linguagem, pertinência prática, relevância teórica
além da dimensão dos itens proposta de forma correta.
Por meio do teste piloto foi possível observar valores ótimos tanto referente à consistên-
cia interna, bem como a estabilidade temporal, de forma geral e estratificado por dimensões.
Levando em consideração o exposto, é possível concluir que o instrumento atingiu a
validade de conteúdo, bem como demonstrou ser fidedigno por meio da consistência interna
e estabilidade temporal. Num processo de validade externa, os índices tendem ser ainda
mais promissores.
Destaca-se que, por meio da combinação de métodos quantitativos e qualitativos, foi
possível construir e validar um instrumento que avaliasse a trajetória da carreira esportiva

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 25


com índices de validade e fidedignidade adequados, ressaltando o potencial da combinação
de métodos para pesquisas futuras.

REFERÊNCIAS
1. BRONFENBRENNER, U. Bioecologia do desenvolvimento humano: tornando os seres
humanos mais humanos. Porto Alegre: Artmed, 2011. 310 p. ISBN 978-85-363-2615-3.

2. CASSEPP-BORGES, V. . B. M. A. . T. M. L. T. Tradução e validação de conteúdo: uma pro-


posta para a adaptação de instrumentos. In: PASQUALI, L. Instrumentação psicológica:
Fundamentos e práticas. Porto Alegre: Artmed, 2010. p. 506–520. ISBN 8536322527.

3. DOMINGUES, M.; GONCALVES , C. E. B. Systematic review of the bioecological theory.


BALTIC JOURNAL OF HEALTH AND PHYSICAL ACTIVITY, Coimbra - Portugal, v. Vol. 6,
n. 2, p. 142-153, 2014. DOI: 10.2478/bjha-2014-0014.

4. FLEISS, J. L..; LEVIN, B.; PAIK, M. C. Statistical Methods for Rates and Proportions. 2ª.
ed. Columbia University: Wiley-Interscience, 1981. 223 p. ISBN 0471263702.

5. HUTZ, C. S. . B. D. R. . T. C. M. Psicometria. Porto Alegre: Artmed, 2015.

6. KRUS, D. J.; HELMSTADTER, G. C. The Problem of Negative Reliabilities. Educational and


Psychological Measurement, Tucson, Arizona, v. 53, n. 3, p. 643-650, Setembro 1993. ISSN
0013-1644. DOI 10.1177/0013164493053003005.

7. LANDIS, J. R.; KOCH, G. G. The Measurement of Observer Agreement for Categorical Data.
Biometrics, v. 33, n. 1, p. 159-174, Março 1977. Disponivel em: <https://www.jstor.org/stab-
le/2529310>. DOI: 10.2307/2529310.

8. MAROCO, J.; GARCIA-MARQUES,. Qual a fiabilidade do alfa de Cronbach? Questões anti-


gas e soluções modernas? Laboratório de Psicologia, Lisboa, Portugal, v. 4, n. 1, p. 65-90,
2006. ISSN 1645-7927. Disponivel em: <http://hdl.handle.net/10400.12/133>. Acesso em: 23
outubro 2020.

9. OLIVEIRA, S. R. D. L. Desenvolvimento humano/esportivo: um diálogo educativo com


professores técnicos da modalidade luta olímpica. Curitiba: Repositório Digital Institucional
da UFPR, 2017. Disponivel em: <https://hdl.handle.net/1884/47930>. Acesso em: 23 outubro
2020. Dissertação de Mestrado.

10. ______, S. R. D. L.; OLIVEIRA, V. D.; VAGETTI, G. C. Luta Olímpica A TEORIA BIOECO-
LÓGICA NA FORMAÇÃO ESPORTIVA. Londrina: Sport Training, 2020. ISBN 978- 65-86090-
49-9. DOI: 10.29327/515523.

11. OLIVEIRA, V.; PAES, R. R. CIÊNCIA DO BASQUETEBOL – PEDAGOGIA E METODOLOGIA


DA INICIAÇÃO À ESPECIALIZAÇÃO. 2. ed. Londrina: Sport Training, v. 1, 2012. 173 p. ISBN
978-85-637-9403-1.

12. ______, V.; PAES, R. R.; VAGETTI, G. C. Basquetebol: Pedagogia, Aprendizagem e De-
senvolvimento. 1ª. ed. Londrina: Sport Trainning, v. 1, 2020. 332 p. ISBN 978-65-86090-49-9.
DOI: 10.29327/515523.

26 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


13. PASQUALI, L. Instrumentação psicológica : fundamentos e práticas. Porto Alegre: Artmed,
2010. 560 p. ISBN 8536322527.

14. ROTHER, R. L.; MEJIA, M. R. G. M. Análise da aplicabilidade da teoria bioecológica do desen-


volvimento humano no esporte a partir de uma revisão bibliográfica. Caderno pedagógico,
Lajeado, v. 12, n. 3, p. 210-222, 2015. ISSN 1983-0882. Disponivel em: <http://www.univates.
br/revistas/index.php/cadped/article/view/981/969>. Acesso em: 23 Outubro 2020.

15. SANTOS, A. S. D. et al. Teoria bioecológica aplicada ao esporte: uma revisão integrativa. Re-
vista Brasileira de Psicologia do Esporte, Brasilia, v. 9, n. 3, p. 234-256, Dezembro 2019.
DOI: 10.31501/rbpe.v9i3.11358.

16. ______, A. S. D. et al. Percepción de atletas sobre sus trayectorias en el atletismo a partir del
Modelo Bioecológico de Bronfenbrenner. Lecturas: Educación Física Y Deportes, Buenos
Aires, v. 25 , n. 264, p. 94-111, 2020. DOI: 10.46642/efd.v25i264.1763.

17. ______, A. S. D.; VAGETTI, G. C.; OLIVEIRA, V. D. Atletismo: Desenvolvimento Humano


e Aprendizagem Esportiva. 1ª. ed. Curitiba: Appris Editora, v. 1, 2017. 213 p. ISBN 978-85-
473- 0498-0.

18. SECCO, D. M. E. G.; OLIVEIRA, V. D. Afetividade no esporte escolar: o caso do basquetebol.


1ª. ed. Curitiba: Appris Editora, v. 1, 2017. 229 p. ISBN 978-85-473-0004-3.

19. SZEREMETA, T. D. P. Construção e validação de um instrumento de avaliação da trajetória


esportiva sob a ótica do modelo bioecológico. Curitiba: Repositório Digital Institucional da
UFPR, 2019. Disponivel em: <https://www.acervodigital.ufpr.br/handle/1884/59712>. Acesso
em: 23 Outubro 2020. Dissertação de Mestrado.

20. THOMAS, J. R.; NELSON, J. K. Métodos De Pesquisa Em Atividade Física. 3ª. ed. Porto
Alegre: Artmed Editora, v. 1, 2002. 419 p. ISBN 1000237828070.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 27


02
“ A gravidez na adolescência e a
educação física escolar

Maria Carolina Oliveira de Sá


UFAM

João Luiz da Costa Barros


UFAM

Chang Yen Yin


UFAM

10.37885/201102137
RESUMO

O objetivo deste estudo foi identificar a conduta dos professores de Educação Física
diante de alunas grávidas. Treze professores de Educação Física de cinco escolas da
cidade de Manaus participaram do estudo respondendo ao questionário “Educação Física
Escolar diante da Gravidez na Adolescência”. Verificou-se que: aula exclusiva 15,38%,
liberação total das aulas 23,07%, assistir à aula prática sentada 30,76%, e orientação
à prática externa 30,76%. 46% dos professores de Educação Física tinham noção de
atuação com alunas grávidas, no entanto 54% não tinham noção de como atuar. 30,76 %
dos professores ministrou aula de temas transversais, no entanto 69,24% nunca ministrou
aula de temas transversais. Este estudo demonstrou que os professores de Educação
Física das redes públicas e particulares de Manaus não se sentem seguros em ministrar
aulas para alunas grávidas por conta do despreparo na área específica no currículo da
graduação em licenciatura.

Palavras-chave: Educação Física, Temas Transversais, Gravidez na Adolescência.


INTRODUÇÃO

A Organização Mundial da Saúde (OMS) define adolescência entre as idades de 10


aos 19 anos, adolescentes esses que têm iniciado a vida sexual nesse período nos últimos
anos (SILVA et. al 2013). A Gravidez na Adolescência tem se tornado uma frequência e a
escola por ser o local onde as adolescentes passam grande parte do seu dia, torna-se um
ambiente importantíssimo para realização de ações. A evasão escolar durante a gravidez na
adolescência acontece por conta dos sintomas como: enjoo e principalmente o crescimento
abdominal. A situação financeira e as pressões dos pais são outros fatores que levam à
evasão escolar (SANTOS et. al. 2009). Para Santos, Martins e Souza 2008 o desenvolvi-
mento de uma adolescência “normal” é interrompido com a gravidez, pois a fase é transitória
em etapas sociais, emocionais e principalmente físicas. Por conta dessa fase transitória na
etapa física há muitos filhos de mães adolescentes nascidos com baixo peso, além do que
o sistema reprodutor feminino dessa gestante está em constante mudança.
A Educação Sexual é um tema debatido em demasia na mídia. Para os Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCN) educação sexual é que a escola que deve tratar da sexualidade
como algo fundamental na vida das pessoas” (BRASIL, 1998, p 67). Essa Educação Sexual
pode ser tratada de forma dinâmica, comunicativa e de forma divertida para que os jovens
entendam o real papel daquela nova vertente de aprendizagem. Há uma necessidade de
inter relações entre os Professores atuantes na escola, pois essa temática é considerada
polêmica em casa e em espaços sociais frequentados pelas adolescentes. Segundo os
PCNs os temas transversais pretendem formar cidadãos com opiniões críticas, reflexivas,
participativa e autônoma. A Educação Física como componente curricular deve participar
desse trabalho de forma transversal e interdisciplinar, sendo proposta e integrada no Projeto
Político Pedagógico da Escola que norteiam as ações educativas estabelecidas pela Lei de
Diretrizes e Bases da Educação (BRASIL, 1996).
É escassa a produção de estudos relatando sobre a Gravidez na Adolescência e
Educação Física Escolar. Durante a formação de um Professor de Educação Física não há
um aparato de conteúdos para instruí–lo na realização de aulas para alunas grávidas e com
isso tem se visto grande evasão dessas aulas, sendo principalmente nas aulas de Educação
Física por ser uma disciplina de cunho prática.
No mais, este estudo objetiva identificar a conduta dos Professores de Educação diante
de alunas grávidas.

30 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


MÉTODOS

Estudo observacional sem interferência, com período de seguimento transversal, do


tipo descritivo e de abordagem quantitativa.

Amostra

A amostragem foi não probabilística, ou seja, intencional, composta por treze profes-
sores de Educação Física, com média de idade de 32.4 anos, assim sendo oito do sexo
masculino e cinco do sexo feminino; dez formados em Manaus e três em cidades como:
Campinas, Rio de Janeiro e Fortaleza, sete foram formados por Instituições particulares e
seis formados por Instituições públicas federais ou estaduais, por unanimidade com ensino
presencial, todos participaram de congressos; simpósios; workshops; cursos e oficinas, mas
nenhum ligado à gravidez na adolescência com temas transversais para Educação Física
Escolar. Foi realizado em duas escolas particulares, duas escolas da rede pública estadual
e uma escola de caráter militar do exército. Os professores atuavam na Educação Básica,
doze deles no Ensino Fundamental II e Ensino Médio, e um desses professores também
com atuação na Educação Infantil; as aulas eram duas vezes por semana sendo uma vez
na semana aula prática; esportes coletivos como conteúdo de todas as aulas práticas e
apenas três professores relataram a “NÃO” desistência “FEMININA” das aulas práticas de
Educação Física, dez relataram a desistência acentuada de meninas. Todos os professores
entrevistados tiveram alunas grávidas.
Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal
do Amazonas, segundo a resolução 466/2012 em: 01/07/2015, com o Parecer: 1.134.303 e
CAEE: 44286415.6.0000.5020. Os Professores de Educação Física assinaram o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) autorizando a realização do estudo e indicação
de anonimato para todos os professores e escolas.

Instrumentos/Procedimentos

Questionário “Educação Física Escolar diante da Gravidez na Adolescência”. Dividido


em geral, profissional, aulas de Educação Física e Gravidez e aulas práticas de Educação
Física, dezenove perguntas fechadas sendo quatro delas abertas com um pequeno campo
para resposta: profissão (caso o professor de Educação Física tivesse outra profissão além
dessa), nome da Instituição de Ensino que trabalha, de quantas vezes por semana havia aula
prática e qual o tipo de formação em gravidez na adolescência e educação física escolar.
A escolha do questionário fechado foi dada pelo autor e como há poucos estudos na
literatura se quis ter um quantitativo do fenômeno.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 31


O TCLE e o questionário era entregue à Direção das Escolas após a explicação do
Estudo, os professores respondiam e entregavam os TCLE’s e questionários respondidos
no período de cinco a sete dias úteis.

Análise estatística

Estatística descritiva com medidas de tendência central de média, na verificação tan-


to do perfil dos professores de Educação Física quanto nas conta verificação das formas
de trabalho e formação desse professor de Educação Física. Com utilização do pacote de
dados SPSS for Windows 7.

RESULTADOS

Esse estudo deu ênfase a três variáveis: A conduta utilizada nas aulas pelos professo-
res de Educação Física, Noção de Educação Física Escolar para alunas grávidas e Temas
transversais nas aulas de Educação Física.
Verificou- se que 15.38% dos professores realizou aula exclusiva com alunas grávidas,
no entanto 23.07% liberou as alunas, tanto da prática quanto da teórica, Contudo 30.76%
liberou as alunas da prática, mas das teóricas não, embora 30.76% tenham conduzido as
alunas para práticas externas. 54% dos professores não tiveram noção de Educação Física
Escolar para alunas grávidas, no entanto 46% tiveram noção de Educação Física Escolar
para alunas grávidas. 38.46% tem os temas transversais como conteúdo, porém 61.54%
não tem os temas transversais como conteúdo das aulas.

DISCUSSÃO

A conduta da maioria dos professores de Educação Física foi a de não ministrar aulas
práticas para essas alunas grávidas, onde foi verificado que os professores não tinham
em sua formação conteúdos para o mesmo e acabavam facilitando na evasão das mes-
mas. Os poucos que ministraram aulas utilizaram de conteúdos apreendidos durante a ex-
periência dos mesmos na vida profissional, porém sem curso específico na área, no entanto
foi percebido por eles a preocupação da Prática de Exercícios Físicos nesse período da
vida, diminuindo o volume e a intensidade. O exercício físico durante a gravidez traz benefí-
cios biológicos como: Menor ganho de peso e adiposidade materna; diminuição do risco de
diabetes; diminuição de complicações obstétricas; ausência de diferenças significativas em
idade gestacional, duração do parto, peso ao nascimento, tipo de parto, valores de APGAR
e complicações maternas e fetais; menor risco de parto prematuro; menor duração da fase

32 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


ativa do parto; menor hospitalização; diminuição na incidência de cesárea; altos valores de
APGAR e melhora na capacidade física (MATSUDO & MATSUDO, p. 5, 2000). Os benefí-
cios psicossociais são inúmeros, pois durante a gravidez há inseguranças, no entanto, os
exercícios físicos auxiliam na proteção desse através de atividades coletivas e rodas de
conversa, salvo que garantem auxílio durante o trabalho de parto, pós-parto e prevenindo
a depressão pós-parto (SANTOS & VERPASIANO, 2012)
A maioria dos Professores de Educação Física não teve noção de uma Educação
Física Escolar para alunas grávidas, pois na graduação não há disciplina ou conteúdo que
relate sobre o determinado tema, no entanto a minoria teve uma noção mas não foi durante
a graduação, nem em cursos de aperfeiçoamento, mas a experiência com as alunas os fez
pesquisar na internet o que eles poderiam fazer. Nos cursos de graduação de licenciatura
em Educação Física do estado do Amazonas não há disciplinas que tratam sobre exercícios
físicos durante a gestação. A disciplina de Educação Física na adolescência fala sobre a gra-
videz na adolescência, mas de forma muito teórica, pequena e sem aulas práticas. Ao redor
do Brasil alguns cursos de graduação têm em sua grade saúde coletiva e atividade física e
saúde, mas a ementa não esteve disponível para verificação.
A disciplina de Educação Física na escola trata da corporeidade, do corpo belo em
movimento, estética e gestos, sendo assim o tema de gravidez na adolescência se aproxima
da disciplina (DARIDO, 2012). Não se deve responsabilizar o currículo da Educação Física
Escolar apenas, pois a Educação Sexual é um tema amplo, até porque a Educação Física
sozinha não consegue abranger todos os conteúdos biológicos, sociais, psicológico, cultural
e econômico. Grande parte dos diretores escolares exigem dos Professores de Educação
Física apenas o movimento, mas devem saber que não é só isso (FREITAS, 2013).
Professores de Educação Física muito bem sabem que esportes de contato como:
futsal, futebol, basquetebol, voleibol e handebol, oferecem alto risco de trauma, logo assim
causando abortos e lesões às mães também (PINHEIRO & SALES, 2016)
Os temas transversais ainda foram pouco relatados nas aulas de Educação Física
Escolar e por isso é importante haver a educação sexual na escola como tema transversal
e isso deve ser passado por Projetos Políticos Pedagógicos para que seja interdisciplinar e
planejado. Por isso não apenas cabendo ao Professor de Educação Física, mas a ele cabe
ensinar o corpo como um todo nas suas diferenças, seus questionamentos, suas regras e
o mesmo em sociedade, sendo assim caberá a Gravidez na Adolescência respeitando os
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) (BRASIL, 1998)
O estudo ainda foi iniciante, com uma amostra pequena. Necessita de um aporte
teórico maior, devido à pequena demanda de estudos na literatura relatando sobre o tema,

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 33


sobretudo espera-se que mais pesquisadores procurem estudar Gravidez na Adolescência
e Educação Física Escolar.

CONCLUSÃO

Na formação do Professor de Educação Física Escolar não houve conteúdos neces-


sários para que os mesmos tivessem propriedade da temática e quando se depararam,
após o exposto, não se sentiam seguros e acabavam por se distanciar das alunas grávidas,
havendo assim a evasão das mesmas.
Acredita-se um próximo desafio seria uma ênfase a ser dada dentro de alguma dis-
ciplina na graduação de licenciatura em Educação Física ou até a criação de uma dis-
ciplina que auxilie o Professor de Educação Física na realização de aulas direcionadas
às alunas grávidas, para que futuros Acadêmicos e ou professores de Educação Física
Escolar tenham mais conhecimento para lidar com esse fenômeno denominado “Gravidez
na Adolescência”. Ao entrar na vida profissional utilizar da transdisciplinaridade e propor
mudança Projeto Político Pedagógico da escola para que o tema Gravidez na Adolescência
deixe de ser um tabu, assim sendo realizar a prevenção ou já havendo a gravidez propria-
mente dita, haja conhecimento da fisiologia, das leis, das questões psíquicas, sociais, onde
para os PCNs esse procedimento seria o correto e por fim a realização do exercício físico
por parte do Professor de Educação Física.
Portanto, acredita -se na relevância social desse estudo e espera-se que aumentem
as publicações de estudos que se assemelham no tema.

REFERÊNCIAS
1. Brasil, Ministério da Educação e do Desporto. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
Brasília: MEC, 1996.

2. . Secretaria da Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: terceiro e quarto


ciclos: apresentação dos temas transversais. Secretária de Educação Fundamental. Brasília:
MEC/SEF, 1998.

3. Darido, S.C. Temas transversais e a educação física escolar. In: UNIVERSIDADE ESTADUAL
PAULISTA. Prograd. Caderno de formação: formação de professores didática geral. São Paulo:
Cultura Acadêmica, 2012. p. 76-89, v. 16.

4. Freitas, J.C.R. Jovens grávidas na Educação Física Escolar: A quem compete ensinar? V
Encontro de pesquisas escolares em Pernambuco. 2013.

5. Matsudo, V.K.R; Matsudo, S.C. Atividade Física e Esportiva na Gravidez. Publicado no livro:
A Grávida. TEDESCO JJ (Editor), São Paulo, ATheneu, pp.59-81,2000. Acesso em: 23 de
setembro de 2015.

34 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


6. Oliveira, M.W. Gravidez na Adolescência: dimensões do problema. Cad CEDES 1998;
19(45):4870. Doi: 10.1590/S0101-32621998000200004. Acesso em: 10 de setembro de 2015.

7. Pinheiro, D.C; Sales, I.K. Processo de inclusão da aluna gestante na aula de educação física
de escola pública. Trabalho de conclusão de curso de Educação Física, Universidade Federal
do Vale do Paraíba. 2016, 32 pág.

8. Santos, G.H.N; Martins, M.G; Souza, M.S. Gravidez na adolescência e fatores associados com
o baixo peso ao nascer. Revista Bras. Ginecol. Obstet. 2008. 30 (5): 224-31.

9. Santos, J.O; Silva, C.F.S; Petenão, E.; Soster, F.C.B; Bernard, M.B; Silva, S.R. Perfil das
adolescentes com reincidência de gravidez assistidas no setor público de Indaiatuba. Revista
Inst. Ciênc. Saúde. 2009, 27 (2): 115- 21.

10. Santos, S.C; Verpasiano, B.S. EXERCÍCIO FÍSICO NA GESTAÇÃO. Revista Info. Br. Acesso
em: 01 de setembro de 2015.

11. Silva, A.A.A; Coutinho, I.C, Katz, L.; Souza, A.S.R. Fatores associados à recorrência da gravi-
dez na adolescência em uma maternidade escola: estudo caso-controle. Cad. Saúde Pública,
Rio Janeiro, 29 (3): 496-506, mar, 2013.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 35


03
“ A teoria geral de jogo de F. J. J.
Buytendijk: aportes para uma
educação física mais sensível à
distinção entre jogo e lúdico

Rogério de Melo Grillo


PPGECT/UFSC

Eloisa Rosotti Navarro


UFSCar

Gilson Santos Rodrigues


UNICAMP

Regina Célia Grando


UFSC

10.37885/201202665
RESUMO

O intelectual holandês F. J. J. Buytendijk, ainda que seja referenciado em alguns artigos,


teses ou livros, continua sendo um autor desconhecido na Educação Física brasileira. Seu
livro Wesen und Sinn des Spiels de 1933 (versão alemã), traduzido para o espanhol em
1935, é, indubitavelmente, um clássico das teorias de jogo e lúdico, porém, pouco lido e
analisado no bojo da Educação Física brasileira. Nesses moldes, o objetivo do presente
texto é apresentar e revisar criticamente a obra El Juego y su significado (versão traduzida
de Wesen und Sinn des Spiels, em 1935) de F. J. J. Buytendijk e apontar perspectivas
para uma Educação Física mais sensível à distinção entre jogo e lúdico. De modo aprio-
rístico, foi feita uma análise de sua Teoria Geral de Jogo, arquitetada em 1935, buscando
analisar as contribuições desta teoria à Educação Física. A posteriori, argumentamos
sobre a relevância de se estudar Buytendijk na Educação Física brasileira e, sobretudo,
defendemos que as ideias do pensador holandês precisam ser mais bem analisadas
e contextualizadas nas pesquisas nacionais, posto que a riqueza de suas teorizações
podem colaborar substancialmente com essa área, tanto em investigações temáticas,
quanto no itinerário metodológico de pesquisas nesse mote.

Palavras-chave: Educação Física, Teoria do Jogo, Lúdico.


INTRODUÇÃO

Num estudo recente, indicamos que, embora o jogo seja visto como um conteúdo clás-
sico, como defendem o Coletivo de Autores (1992; 2009), Soares (1996) e outros, o jogo não
é levado à sério na Educação Física escolar (GRILLO; NAVARRO; SANTOS RODRIGUES,
2020). Um dos argumentos levantados naquele texto e que coaduna com autores como
Mauriras-Bousquet (1991), Grillo (2018) e Grillo et al. (2020), dentre outros, é que não há uma
distinção entre jogo e lúdico em diversos documentos e pesquisas na área, mesmo que haja
discussões referentes ao tema e que isso não seja nenhuma novidade no campo acadêmico-
-científico. Possivelmente, um dos textos que melhor colabora com a distinção entre jogo e
lúdico seja o “O jogo humano” de Frederik Jacobus Johannes Buytendijk (1977). Buytendijk
foi um médico, professor, cientista e filósofo holandês que ao longo do século XX teve uma
extensa produção intelectual, embora seja relativamente desconhecido no Brasil.
F. J. J. Buytendijk fez contribuições ímpares aos campos da medicina, psicologia animal
e humana, fisiologia antropológica, antropologia filosófica e, entre outras áreas, a medicina
esportiva e, indiretamente, na Educação Física escolar. Nessa perspectiva, encontramos
autores da Educação Física brasileira (ou autores estrangeiros que tiveram certa influên-
cia nesta área de conhecimento no Brasil) que fizeram menções ao pensador holandês, a
exemplo de Kunz (1991; 1994), Hildebrandt-Stramann (2001), Trebels (2003) e Betti (2017),
os quais discutem a noção de movimento humano a partir da Teoria do Se-Movimentar
Humano (TSMH). Não podemos olvidar de Freire (2005), Scaglia (2003), Grigorowitschs
(2007), Zimmermann (2010) e Carneiro (2015) que, consequentemente, abordam o jogo/
jogar embasado, de certo modo, numa perspectiva da antropologia filosófica construída
pelo intelectual holandês. Apesar destas alusões, ainda é notório que há pouca interlocução
(ou quase nenhuma) com uma das obras propedêuticas de Buytendijk, que é Wesen und
Sinn des Spiels (obra publicada originalmente em 1932 na língua holandesa, e em 1933 na
língua alemã). A dificuldade do idioma e de acesso ao original, quiçá, seja o maior desafio,
contudo, aventamos a proficuidade de se analisar a supracitada obra.
A título de exemplo, há duas noções basilares de Buytendijk referentes ao jogo, que
foram usadas também por Fink, Scheuerl e Gadamer, e que igualmente foram apropriadas por
teóricos da Educação Física que, por seu turno, aproveitaram destas noções para “criarem”
a ideia de “Ser do Jogo”, “Senhor do Jogo” e “Mundo do Jogo” (SCAGLIA, 2003; FREIRE,
2005). Defendemos que esses três termos supracitados (Ser do Jogo, Senhor do Jogo e
Mundo do Jogo) deveriam ser atribuídos a F. J. J. Buytendijk, por ser um dos primeiros a
debater o fenômeno do assenhoramento/arrebatamento e da liberdade do jogador, em 1932;
a Eugen Fink, em 1946, 1957 e 1960, nos seus clássicos Nietzsches Metaphysik des Spiels,
Oase des Glücks Gedanken Zu Einer Ontologie des Spiel e Spiel als Weltsymbol, que, por

38 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


conseguinte, analisou os fenômenos da existência e da essência do jogo, o “rapto” que o
jogo exerce no jogador (Senhor do Jogo) e a ideia de que o jogar é uma espécie de projeção
que estabelece um mundo lúdico (Mundo do Jogo)1; a Hans Scheuerl, que em seu clássico
Das Spiel, publicado em 1954, analisou que o jogo é composto por movimentos variados
de liberdade, infinito interior, aparição, ambivalência, unidade, presença e embevecimento;
e, finalmente, a H.-G. Gadamer, ao analisar o fenômeno do “ser jogado pelo jogo”, em seu
livro Wahrheit und Methode de 1960.
Retomando as duas noções basilares alvitradas por Buytendijk e apropriadas por
Gadamer (e por outros autores), na primeira noção temos a essência do jogo como repre-
sentação ou autorrepresentação, visto que “[o] sujeito do jogo não são os jogadores, porém o
jogo, através dos que jogam, simplesmente ganha representação” (GADAMER, 1997, p. 176).
A segunda noção concerne ao fato de que “[t]odo jogar é um ser jogado” (GADAMER,
1997, p. 181). Podemos depreender que estes autores (Buytendijk e Gadamer) se encon-
tram, em especial, no tocante às noções de figurabilidade e objeto de jogo. Dois temas
que alicerçaram a Teoria Geral de Jogo de Buytendijk (em 1932/1933). De tal modo, foram
retomadas por ele sob o aporte teórico da Fenomenologia Hermenêutica, anos depois, no
texto “Jogo Humano” de 1973.
Ademais, o “assenhoramento do jogador” (Senhor do Jogo) é uma tese defendida em
seu livro “Wesen und Sinn des Spiels” de 1933. Esta noção tem como preceito fundamental a
vontade do humano de um arriscar-se, ou seja, de colocar-se à prova, testar-se a si mesmo,
como afirmação de si no devir (num futuro incerto e misterioso). Assim, ao tornar-se “vassalo”
do Jogo, o “senhor do jogador” representa um colocar-se em risco que pode ter o caráter de
uma probabilidade relativamente elevada, tal qual, uma probabilidade inteiramente misteriosa.
Isto posto, o livro Wesen und Sinn des Spiels de Buytendijk, cujo acesso temos na
versão alemã e espanhola, pode ser vital para um incipiente debate relativo à distinção
entre jogo e lúdico. Portanto, focaremos na versão espanhola, já que essa se encontra em
algumas bibliotecas de universidades brasileiras. A aludida versão foi traduzida por Eugenio
Imaz e publicada em 1935 pela editora Revista de Occidente, sendo intitulada de El Juego
y su significado: el juego en los hombres y en los animales como manifestación de impul-
sos vitales. À vista do preambular debate, da escassez de fontes e da riqueza de ideias
no pensamento do intelectual holandês, principalmente, para os estudos de jogo e lúdico,
parece-nos extremamente precípuo apresentar essa obra e debater seus aportes para o
campo pedagógico da Educação Física escolar.

1 Nas palavras de Fink (2020, p. 522): “o jogar é o esquecer-se de si mesmo [...], é o esconder-se em uma “máscara”, na figura de uma
personagem do mundo do jogo.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 39


Destarte, o escopo do presente texto é apresentar e revisar criticamente a obra El Juego
y su significado: el juego en los hombres y en los animales como manifestación de impulsos
vitais (versão traduzida de Wesen und Sinn des Spiels, em 1935) de F. J. J. Buytendijk e
apontar perspectivas para uma Educação Física mais sensível à distinção entre jogo e lúdi-
co. A proficuidade das ideias do autor, no que tange à distinção entre jogo e lúdico, é o que
justifica esse texto. De igual modo, ideamos que é peremptório endossar o debate atinente
ao que é jogo e ao que é lúdico, como distingui-los e, por fim, quais as potencialidades dessa
distinção para as pedagogias e didáticas da Educação Física no âmbito escolar.

“O JOGO NOS HOMENS E NOS ANIMAIS COMO MANIFESTAÇÃO DE


IMPULSOS VITAIS”: A TEORIA GERAL DE JOGO DE BUYTENDIJK

Como afirma o psicólogo soviético Daniil B. Elkonin (1978/2009), o livro Wesen und Sinn
des Spiels de Buytendijk (1933/1935) não passou despercebido pelos intelectuais de jogo à
época de sua publicação, nos primórdios da década de 1930. As reações ao livro foram de
renomados intelectuais da época, tais como Karl Groos (1934) e Édouard Claparède (1934),
como também, de autores que somente depois passaram a ser reconhecidos nos estudos
de jogo e lúdico, como Johan Huizinga (1938/2012) e o próprio Elkonin (1978/2009). Em re-
lação a Groos e Claparède trata-se, na verdade, de reações às críticas que Buytendijk fez
às suas teorias de jogo como pré-exercício e de jogo como atividade funcional à vida adulta
e compensatória às atividades laborais (escolares ou não). Ambas ancoradas num viés
biologicista, sob a égide da teoria darwinista, e, sobretudo, com diálogos muito estreitos às
teorias da Recapitulação (G. Stanley-Hall) e da Canalização (H. Carr).
Em decorrência disso, Elkonin (2009) afirma que é sintomático o fato de a teoria bio-
logicista de Groos, para quem o jogo é pré-exercício para a vida adulta, ter sido uma teoria
dominante até a década de 1930. Logo, a reação de Groos foi rápida e igualmente con-
testadora quanto às ideias de Buytendijk. Embora haja outras teorias de jogo no período,
Groos logrou de uma soberania até a publicação de Wesen und Sinn des Spiels (essa
primazia se deve à validação dessa teoria por notórios intelectuais da época, em especial,
Claparède, Decroly, Cousinet e o próprio Piaget). Em linhas gerais, Groos (1912) depreende
o jogo (humano e animal) como um pré-exercício para a vida adulta, uma preparação para
as atividades sérias, como a caça, a luta etc., enfim, atividades de sobrevivência (GRILLO;
PRODÓCIMO; GÓIS JR., 2016; GRILLO, 2018).
No ensejo dessa discussão, Groos defende que o jogo emerge na infância com a fun-
ção bio-psicológica e “treinar”, exercitar ou preparar a criança para atividades da adultidade.
Buytendijk, por outro lado, inverte esse raciocínio. Como afirma Elkonin (2009, p.100) “[s]e
para este [K. Groos] o jogo explica a importância da infância, para aquele [Buytendijk], ao

40 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


contrário, a infância explica o jogo: o ser vivo brinca porque ainda é muito jovem”. Nessa
acepção, observa-se que o pensador holandês adota um referencial ou paradigma biopsi-
cológico igual ao de Groos, no entanto, diferencia-se dele ao inverter a lógica de raciocínio
no que corresponde à relação do jogo/jogar com a infância.
Nas palavras do próprio Buytendijk (1935, p.25) “[...] a essência do jogo não se
compreende senão partindo da essência do juvenil, que se desprende necessariamente
dela”. No entanto, reduzir o jogo apenas às crianças seria um equívoco, pois para Buytendijk
(1935, p.25) “[...] a essência do jogar tem conexão com a [essência] do juvenil, de sorte que
onde encontramos marcos de jovialidade num organismo não jovem pela idade, é fácil que
apareça o jogo”. Entendemos, portanto, que a dinâmica juvenil que resulta no jogo/jogar
consiste num espírito de jovialidade que está presente na infância, mas também emerge na
fase adulta e na velhice.
Destarte, é alicerçado na observação do comportamento lúdico infantil, que o autor vai
desvelar a essência do jogo/jogar. Como é de praxe na Fenomenologia – perspectiva filosó-
fica erigida por Edmund Husserl na Alemanha e com grande impacto na França e Holanda,
servindo de base para os estudos de Buytendijk –, os resultados que Buytendijk logra na
pesquisa empírico-filosófica (efetivamente obtida a partir da Psicologia Comparada) é uma
descrição do fenômeno lúdico. Dessa maneira, Buytendijk vai delinear as características do
jogo humano (das crianças), de mamíferos carnívoros e símios. Resumidamente, os atributos
do jogo/jogar são: a ambiguidade de movimentos (essência de jogo), o afã de movimento
ou impulsividade, a atitude pática e a timidez.
Devido à definição do jogo/jogar, concatenado à dinâmica juvenil, diversos autores
tendem a engranzar esta teoria à infância. De fato, Venegas Rubiales, García Ortega e
Venegas Rubiales (2010) a nomeiam como Teoria da Infância. Piaget (1978), Delgado (2004)
e Gallardo-López, García-Lázaro e Gallardo-Vázquez (2019), em contrapartida, a intitula como
Teoria da Dinâmica Infantil. Em todo caso, o que merece ser destacado é que essa teoria,
em termos gerais, é uma descrição do espírito que anima e dar vida aos jogos, mas que
não descreve o jogo como estrutura e atividade sociocultural – como o fizeram Zondervan
(1928) e, a posteriori, Huizinga (1938/2019), Benveniste (1947) e Caillois (1958/1990), den-
tre outros –. Em suma, os traços ou características juvenis que definem a essência de jogo
é condição necessária, mas não suficiente para jogar. É precisamente daí que emerge a
divergência com Groos, pois ao contrário do estudioso alemão, Buytendijk entende que os
traços juvenis per si não levam à conduta lúdica das crianças e animais jovens.
Mediante a noção sobredita, o intelectual neerlandês vai definir a extensão do jogo
recorrendo à Psicologia Comparada. Em outros termos, se a jovialidade não é suficiente
para determinar o jogo/jogar, qual é, então, o horizonte de possibilidade para o fenômeno

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 41


lúdico? Na tentativa de responder essa questão, o autor realizou uma análise comparativa
do humano com os mamíferos carnívoros e com os símios (que são herbívoros, porém, com
características diferenciadas). Para Elkonin (2009, p.101), “[o]s resultados de tal análise
fazem com que Buytendijk estabeleça a primeira delimitação entre o jogo e outras coisas:
‘o jogo é sempre jogo com alguma coisa’”.
Nessa tentativa de delimitar a extensão de jogo, Buytendijk (1935) determina como
análise o contraste das atividades infantis com as do humano adulto, uma vez que o es-
porte, a dança, as festas etc., para Buytendijk, não são propriamente jogos. Pelo contrário,
ele as concebe como atividades que preservam as características de um movimento que
pode engendrar prazer, todavia, não se consolidam por meio de uma relação com o “obje-
to de jogo”. Desse modo, fundamentado na comparação do humano (os infantes) com os
animais e com os próprios humanos adultos, que este autor vai estabelecer os limites ou a
extensão do jogo/jogar.
Em seguida, o autor vai retomar a noção de objeto de jogo, ao afirmar que “[...] a di-
nâmica do jogar se encontra condicionada por impulsos fundamentais da vida e pela forma
de relação com o objeto de jogo” (BUYTENDIJK, 1935, p.82). Atinente aos impulsos que
impelem ao jogar, ele recorre à Teoria do Impulsos primários de Freud, com vistas a explicar
a “força” que leva o indivíduo ao jogo/jogar, afinal, ao contrário de Groos, não é a natureza
biológica que o determina. Nesse entendimento, é a unidade ambivalente dos impulsos de
liberdade e de união (destruição e criação) que mobiliza o humano e os animais ao jogo/
jogar com o objeto de jogo.
Numa aproximação com a Psicanálise freudiana o autor cita que é por causa da unidade
ambivalente dos impulsos que “[a] criança destrói o brinquedo porque nela atuam ambos
os impulsos [isto é, a criança] destrói o brinquedo porque [ele] oferece resistência e porque
[ela, a criança] quer fundir-se com ele [brinquedo]” (BUYTENDIJK, 1935, p.111). Logo, são
os impulsos primários de criar e destruir, de se libertar e de unir-se ao objeto de jogo que
leva as crianças e animais jovens a se dedicarem ao jogo.
Como sinaliza Elkonin (2009, p.102) “[o] jogo surge, na opinião de Buytendijk, quando
os mencionados impulsos primários colidem com as coisas, que são parcialmente conheci-
das graças às peculiaridades do movimento do animal jovem”. Por outro lado, este objeto
de jogo não é qualquer objeto, contudo, algo que possua figurabilidade ou imagem (SILVA,
2019). Parece-nos que a capacidade de se converter em imagem ou figuras consiste, primei-
ramente, em ser um objeto dentro do horizonte de conhecimento. Entrementes, diz respeito
ao fato de ter a capacidade e/ou possibilidade de converter-se em outra figura, metamor-
fosear-se noutra imagem. Portanto, cita Buytendijk (1935, p.132), “[u]m objeto, é objeto de
jogo na medida em que possui figurabilidade [pois a] esfera do jogo é a esfera das figuras e

42 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


com isso a esfera das possibilidades, da fantasia” que, no caso dos animais, complemente
Elkonin (2009), são apenas motoras, mas no humano possui outras propriedades que lhe
são particulares e que deriva da linguagem.
Num livro de 1952, com tradução para o francês de Jean Knapp e cujo título é
“Phénoménologie de la rencontre”, Buytendijk (1952, p.23) cita que “[c]ada jogo é um rela-
cionamento dinâmico recíproco que se desenvolve a partir de um encontro”. Neste encontro
lúdico, há a premissa de um mundo cuja imagem é familiar, já é dada (realidade), porém,
pari passu, esta imagem comporta possibilidades dinâmicas que estão engajadas em outro
projeto, um projeto lúdico da fantasia. É neste sentido que se avulta a relação recíproca
do jogador com o objeto de jogo, na medida em que “[...] jogar não consiste só em que al-
guém jogue com algo, senão que também algo jogue com o jogador” (BUYTENDIJK, 1935,
p.120). Em síntese, o objeto de jogo assim o é somente dentro da fantasia lúdica, visto que
fora dela, na realidade mundana, o objeto perde a paticidade, a significação, e torna-se
gnóstico (racional).
Este encontro lúdico ocorre naquilo que o intelectual neerlandês define como campo
de jogo que é, singularmente, definido pelas regras de jogo. Este campo é o que determina
os limites ou fronteiras do movimento de jogo (passagem da fantasia ao real e vice-versa).
Conforme o autor, “[...] as regras de jogo não são leis do movimento [unidade ambivalente
dos impulsos lúdicos], não determinam o que pode acontecer, senão o que não pode acon-
tecer” (BUYTENDIJK, 1935, p.122). Nesse sentido, no interior da dinâmica lúdica, ainda que
regulada pelas regras de jogo, há a liberdade de ação. É esta liberdade que preserva a im-
previsibilidade ou incerteza do jogo/jogar. Portanto, esta é uma característica do jogo: manter
o incerto dentro de uma margem de certezas, dentro de fronteiras que o delimitam. À guisa
de explanação: nos “jogos primitivos” dos animais, tais limites são demarcações reais, en-
quanto nos “jogos superiores” dos humanos, são regras internas ou autorresponsabilidades.
Após definir o conceito de campo de jogo, o autor vai, novamente, distinguir o jogo de
outras atividades humanas como, por exemplo, os esportes, as ginásticas e os exercícios
físicos. Na visão de Buytendijk (1935), essas atividades, tipicamente do humano adulto, têm
nas regras de jogo sua lógica de ação, ou seja, as regras tornam-se prescrição determinante
do movimento lúdico, enquanto no jogo este movimento é livre, não sujeito à normativas e
prescrições de como agir. A este respeito, o autor cita que “[o] esporte funda todo seu valor e
toda sua avaliação na perseguição de um certo ideal de execução da ação” (BUYTENDIJK,
1935, p.123). Ademais, o jogo, diferente do esporte, ginástica etc., não prevê um planejamen-
to prévio de execução, não tem uma finalidade fora de si (autotelia). Destarte, não tem uma
amplitude, um tempo específico ou propósito a alcançar. Dessa forma, quando determinada
atividade alcança o status esportivo, gímnico, de exercício físico, ela já deixou de ser jogo.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 43


É curioso notar que, mesmo após essa clara diferenciação do jogo em relação a outras
atividades humanas, no capítulo de “desenvolvimento do jogo”, o autor alega que “[p]ropria-
mente falando, só no homem se dá um verdadeiro desenvolvimento do jogo” (BUYTENDIJK,
1935, p.154). Além disso, completa dizendo que “[...] o sentido que compete ao jogo do
homem é superior” (idem, ibidem, p.168), pois é no humano que todas as ambivalências
essenciais do jogo/jogar (ato e estrutura, plenitude e forma, espontaneidade e regra) alcan-
ça seu nível mais elevado. Em contrapartida, nos animais e nas crianças pequenas, essas
características estão em formas elementares, ainda que com a puberdade a figurabilidade
do mundo infantil tende a desaparecer.
Outra discussão que merece destaque, trata-se da análise do início (prelúdio) e do
fim (epílogo) do jogo/jogar. Para Buytendijk (1935), o prelúdio está concatenado ao objeto
de jogo e ao movimento de busca pelo desconhecido deste objeto, de busca por suas leis
gerais. Em contraste, o epílogo (fim do jogo) é o fim da busca, a conquista do desconhecido,
o domínio das leis gerais do objeto de jogo. No entanto, o epílogo é ambivalente, porque ao
mesmo tempo em que é satisfação pela conquista, também é uma afetividade negativa pelo
fim da busca, pela perda da tensão do espírito lúdico. Sendo assim, o jogo/jogar enceta-se
pelo encontro do jogador com o objeto de jogo que, por definição, mostra-se tão-só em parte
ao jogador. Quer dizer, justamente pelo mistério, por este “mostrar-se em parte”, por aquilo
que não é visto, pela possibilidade de ser outra coisa (sua capacidade figurativa), que o jogo
tem início. No polo oposto, quando o objeto de jogo se torna conhecido, domesticado ou
quando perde a sua capacidade metamorfa, o jogo termina, isto é, chega ao seu epílogo.
Outra faceta que necessita ser debatida, no que concerne à teoria de jogo de Buytendijk,
é o movimento lúdico, o ir e vir, traduzido como “vaivém lúdico” (hind und her bewegun-
g)2. Em “Wesen und Sinn des Spiels”, é ideada como a essência do Jogo/Jogar humano e
animal, em virtude de nos animais existir o impulso vital. Em contrapartida, no humano – essa
é uma de suas teses – existe uma distinção entre Jogo e Lúdico e é ela que vai determinar
a distinção do Jogo/Jogar humano.
Nessa conjuntura, para Buytendijk (1935), o jogo é um intermediário entre a fantasia e
a realidade da vida cotidiana. Em termos mais específicos, o lúdico versa sobre a alternância
(movimento) da aparência à realidade. À vista disso, analisamos que o vaivém lúdico dos
animais só permite a entrada num “estado lúdico”, ou melhor dizendo, um “impulso lúdico”,
isto é, na ação vital do movimento físico (fisiológico), o que, entrementes, não lhes permite
a alternância ou a dialética entre a aparência e a realidade (ausência de consciência de
jogo). Abreviadamente, a criação mesma da fantasia com elementos imaginários e ônticos
(reais). Já no humano, o vaivém lúdico decorre quando as crianças, por volta de 4 anos, tor-
nam-se capazes de distinguir a ilusão (aparência ou fantasia) da realidade (razão objetiva).
2 Ver Grillo (2018).

44 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Finalmente, o intelectual holandês finda a sua obra com um capítulo de revisão das
principais teorias de jogo da época. Como ele mesmo frisa, alguns aspectos de sua Teoria
Geral de Jogo são retomados dessas teorias e outros são ideias construídas a partir de suas
próprias pesquisas. Em síntese, declara o autor:

Nosso ponto de partida tem o concreto, a saber: a criança e o animal jovem


jogando. Temos estudado o fenômeno de distintos ângulos, e temos tratado
de encontrar os caracteres fundamentais do juvenil na sua dinâmica e na sua
relação com o mundo circundante. Vimos como se desenvolve a situação de
jogo e a dinâmica própria do jogo, a partir do juvenil, e como esta dinâmica se
oferece aos diversos jogos [...]. Indagamos a relação entre o jogo e os impulsos,
e reduzimos estes a alguns poucos fundamentais [impulso de liberdade e de
união]. [...] nos referimos ao desenvolvimento orgânico do jogo, ao prelúdio
e ao epílogo.
Finalmente, fixamos a esfera do jogo, o campo de jogo e seus limites, tratando
de captar a essência do objeto de jogo com a frase: “jogar é sempre jogar com
algo que, por sua vez, joga com o jogador” (BUYTENDIJK, 1935, p.164-5).

Na conclusão do livro, Buytendijk destaca, de forma um tanto contraditória, que apesar


de os animais jogarem é no humano que o jogo se desenvolve em toda a sua potencialida-
de. Isto ocorre, porque “[a] vida do homem transcende, mediante o espírito, ao finalismo e
a coação do biológico, [...] [desse modo] recebe o jogo uma significação particular para o
homem” (BUYTENDIJK, 1935, p.168). De nosso ponto de vista, essas palavras expressam
o início de um empreendimento pelas particularidades do jogo/jogar humano, em contraste
ao jogo dos animais. Nesse sentido, depreendemos que em Wesen und Sinn des Spiels, o
intelectual holandês já dá indícios de uma ruptura com a Teoria Geral de Jogo rumo a uma
Antropologia Filosófica do Jogo que efetivamente vai ocorrer em “O jogo humano” de 1973
e depois traduzido para o português em 1977.

À GUISE DE SÍNTESE

Talvez, uma das grandes contribuições de F. J. J. Buytendijk para as teorias de Jogo,


seja discutir o comportamento lúdico do ser humano e de animais. Na visão deste intelectual,
mesmo que o impulso lúdico seja biológico e motivado por questões ambientais e organi-
zacionais (característica específica do “jogo dos animais”), ele é influenciado culturalmente
no caso dos seres humanos (GRILLO et al., 2020). Buytendijk (1977, p. 77), indica que “[...]
o jogo humano não é um acontecimento natural como no animal”. Em termos mais especí-
ficos, o jogo humano difere do comportamento lúdico dos animais, porquanto é pelo jogo/
brincadeira que uma pessoa encontra a sua humanidade, porque sabe que executa algo
(tem consciência de que joga com alguma coisa). Dessa forma, esse jogar/brincar é sempre
um ato de assumir uma escolha, ou seja, de tomar decisões (GRILLO, 2018).

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 45


Em referência ao vaivém ou movimento lúdico (outra teorização deste autor que merece
mais atenção da Educação Física escolar), faz-se fulcral partir do preceito de que existem
múltiplas realidades socioculturais e que o jogo/brincadeira é uma dimensão intermediária
entre a fantasia (mundo do jogo) e a vida cotidiana (território do jogo). No jogo/brincadeira
propriamente humano, diferentemente da fantasia vital dos animais quanto aos movimen-
tos físicos (fisiológicos), essa dimensão existencial é composta por elementos subjetivos
(vontade, emoções, sentimentos e facetas imaginárias ou ilusórias) e objetivos/ônticos (da
vida material cotidiana). Em suma, o vaivém lúdico se fundamenta por meio da alternância
ou dialética entre essas duas dimensões. Ora, é esse movimento que confere suporte ao
jogo/brincadeira como “espaço transicional” entre a realidade da fantasia e da vida cotidiana.
Mais uma contribuição do aludido autor se refere ao movimento e objeto de jogo/
brincadeira. Buytendijk (1935) sumariza que é imprescindível alinhavar as fronteiras do
fenômeno lúdico humano. A extensão do jogo/jogar (brincadeira/brincar) é delineada por
duas extremidades: a primeira, trata-se do comportamento lúdico dos animais e de crianças
bem pequenas; a segunda, concerne à intencionalidade das manifestações culturais huma-
nas. No primeiro caso, Buytendijk determina que o jogo/jogar (brincadeira/brincar) humano
são os jogos de ilusão (simbólicos) que aparece nas crianças por volta dos 3 ou 4 anos.
Nesse viés, as fases do crescimento e desenvolvimento infantil constituem estágios que
interferem no processo do jogo/jogar humano (são fases influenciadas culturalmente), ou
dito de outro modo, é a transição do jogo animal ao jogo propriamente humano. Em linhas
gerais, a criança recém-nascida já é provida de uma capacidade de excitação/relaxamento
com o movimento dos objetos (fantasia vital, relação entre comportamento lúdico e as seis
emoções primárias3).
Definida a essência do jogo/jogar (brincadeira/brincar), Buytendijk ainda levanta alguns
significados do jogo/brincadeira na cultura ocidental. Objetivando esboçar alguns exemplos,
lembramos que este autor descreve o tédio, o lazer, o “assenhoramento”, o movimento e a
linguagem como alguns dos significados concatenados ao jogo/jogar (brincadeira/brincar)
humano. Esses significados do jogo/jogar (brincadeira/brincar) podem ser temas de outras
investigações no bojo dos estudos de jogo/brincadeira, especificamente, na Educação Física
escolar. Precisamente, sob este aspecto, subjaz outra contribuição considerável de sua teoria,
que é a indicação de temas de pesquisas, por intermédio de uma descrição de um método
fenomenológico de investigação do jogo/jogar (brincadeira/brincar) humano.

3 Para mais detalhes ver os textos: BERESIN, A.; BROWN, F.; PATTE, M. M. Brian Sutton-Smith’s Views on Play. In: SMITH, P. K.; RO-
OPNARINE, J. L. (Orgs.). The Cambridge Handbook of Play: Developmental and Disciplinary Perspectives. Cambridge: Cambridge
University Press, 2018. SUTTON-SMITH, B. Evolving a consilience of play definitions: Playfully. In: REIFEL, S. (Org.). Play contexts
revisited: Play and Culture Studies 2 (pp. 239-256). Stamford, CT: Ablex, 1999.

46 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


REFERÊNCIAS
1. BENVENISTE, Émile. Le jeu comme structure. Revue Deucalion, n. 2, Paris, 1947.

2. BETTI, Mauro. A teoria do se-movimentar em perspectiva semiótica. In: GOMES-DA-SILVA,


Pierre Normando; CAMINHA, Iraquitan de Oliveira. Movimento humano: Incursões na edu-
cação e na cultura. Curitiba: Ed. Appris, 2017.

3. BUYTENDIJK, Frederik Jacobus Johannes. El juego y su significado: el juego en los hombres


y en los animales como manifestación de impulsos vitales. Madrid, Revista de Occidente, 1935.

4. _______________. Phénoménologie de la rencontre. Paris: D. Brouwer, 1952.

5. _______________. O jogo humano. In: GADAMER, Hans-Georg; VOGLER, Paul. Nova an-
tropologia: antropologia cultural. São Paulo: EPU/Edusp, v. 4, 1977.

6. CAILLOIS, Roger. Os jogos e os homens: a máscara e a vertigem. Lisboa, Portugal: Cotovia,


1990.

7. CARNEIRO, Kleber Tüxen. Por uma memória do jogo: a presença do jogo na infância das
décadas de 20 e 30. Tese (Doutorado em Educação). Faculdade de Ciências e Letras, Uni-
versidade Estadual Paulista, Araraquara, 2015.

8. CLAPARÈDE, Edouard. Sur la nature et la function de jeu. Archives de Psychologie, v.24,


1934.

9. COLETIVO DE AUTORES. Metodologia do ensino de educação física. São Paulo, SP:


Cortez, 1992.

10. ______________. Metodologia do ensino de educação física. 2. Ed. São Paulo, SP: Cortez,
2009.

11. DELGADO, Manuel Gutiérrez. La bondad del juego, pero… Escuela Abierta: revista de In-
vestigación Educativa, n. 7, p.153-182, 2004.

12. ELKONIN, Daniil B. Psicologia do jogo. 2.ed. São Paulo, SP: WMF Martins Fontes, 2009.

13. FINK, Eugen. A metafísica nietzscheana do jogo. Phenomenology, Humanities and Scien-
ces, v. 1-3, p. 518-524, 2020.

14. FREIRE, João Batista. O jogo: entre o riso e o choro. - 2.ed. Campinas, SP: Autores Asso-
ciados, 2005.

15. GALLARDO-LÓPEZ, José Alberto; GARCÍA-LÁZARO, Irene; GALLARDO-VÁZQUEZ, Pedro.


Análisis de las principales teorías del juego en el ámbito educativo. Brazilian Journal of De-
velopment, Curitiba, v.5, n.8, p.12172-12186, 2019.

16. GRIGOROWITSCHS, Tamara. Jogo, processos de socialização e mimese... Uma análise so-
ciológica do jogar infantil coletivo no recreio escolar e suas relações de gênero. Dissertação
(Mestrado em Educação). Universidade de São Paulo, São Paulo, 2007.

17. GRILLO, Rogério de Melo; PRODÓCIMO, Elaine; GOIS JÚNIOR, Edivaldo. O jogo e a “Escola
Nova” no contexto da sala de aula: Maceió, 1927-1931. Educação em revista, v. 32, n. 4, p.
345-364, 2016.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 47


18. GRILLO, Rogério de Melo. Mediação semiótica e jogo na perspectiva histórico-cultural em
educação física escolar. Tese (Doutorado em Educação Física). Universidade Estadual de
Campinas, Faculdade de Educação Física, Campinas, SP, 2018.

19. GRILLO, Rogério de Melo; NAVARRO, Eloisa Rosotti; SANTOS RODRIGUES, Gilson. “Uma
luta contra moinhos de vento”: concepções de jogo em 8 propostas curriculares brasileiras de
educação física pós LDB/1996. Corpoconsciência, v. 24, n. 2, p. 118-132, mai./ ago., 2020.

20. GRILLO, Rogério de Melo; NAVARRO, Eloisa Rosotti; GRANDO, Regina Célia; ANDRADE,
Susimeire V. R. Jogo, Lúdico e Resolução de Problemas: conhecimento matemático em aulas de
Educação Física. In: Flavio José Wirtzbiki de Almeida; Marcos Teodorico Pinheiro de Almeida.
(Org.). A Educação Física e a Transdisciplinaridade: razões práticas. 1ed.Fortaleza - CE:
Instituto NEXOS, 2020. p. 441-477.

21. GROOS, Karl. The Play of Man. Trans. Elizabeth L. Baldwin. New York: Appleton, 1912.

22. GROOS, Karl. Wesen und Sinn des Spiels: bemerkungen im Anschluß an die von FJJ Buy-
tendijk unter obigem Titel veröffentlichte Schrift. Zeitschrift Psychologie, v.133, 1934.

23. HENRIOT, Jacques. Sous couleur de jouer. La Métaphore ludique, Paris, José Corti, 1989.

24. HILDEBRANDT-STRAMANN, Reiner. Textos pedagógicos sobre o ensino da educação


física. Ijuí: Ed. Unijuí, 2001.

25. HUIZINGA, Johan. Homo Ludens: O jogo como elemento da cultura. São Paulo: Perspectiva,
2019.

26. KUNZ, Elenor. Educação Física: ensino & mudanças. Ijuí, RS: Editora Unijuí, 1991.

27. ____________. Transformação didático-pedagógica do esporte. Ed. Unijuí, 1994.

28. MAURIRAS-BOUSQUET, Martine. Un oasis de dicha. In: UNESCO – EL CORREO: el juego.


Mayo, 1991.

29. PIAGET, Jean. La formation du symbole chez l’enfant: imitation, jeu et rêve, image et re-
présentation. Delachaux & Niestlé, 1978.

30. SCAGLIA, Alcides José. O futebol e os jogos/brincadeiras de bola com os pés: todos seme-
lhantes, todos diferentes. Tese (Doutorado em Educação Física). Universidade Estadual de
Campinas, Faculdade de Educação Física, Campinas, 2003.

31. SILVA, Claudinei Aparecido de Freitas da. A figurabilidade do jogo: essência e sentido do lúdico
em F. J. J. Buytendijk. In: Anais… II Congresso Internacional de Fenomenologia e Psicologia
(CIF&P) e IV Congresso Brasileiro de Psicologia e Fenomenologia (CBPF), Curitiba: ITGT, p.
40-41, 2019.

32. SOARES, Carmen Lúcia. Educação física escolar: conhecimento e especificidade. Revista
paulista de educação física, n. supl. 2, p. 6-12, dez., 1996.

33. TREBELS, Andréas H. Uma concepção dialógica e uma teoria do movimento humano. Pers-
pectiva, Florianópolis, v.21, n.1, pp. 249-267, 2003. Disponível em: < https://periodicos.ufsc.
br/index.php/perspectiva/article/view/10234> Acesso em: 25 ago. 2020.

34. VENEGAS RUBIALES, Francisco Manuel; GARCÍA ORTEGA, María del Pilar; VENEGAS
RUBIALES Ana María. El juego infantil y su metodología. IC Editorial, 2010.

48 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


35. ZIMMERMANN, Ana Cristina. Ensaio sobre o movimento humano: Jogo e Expressividade. Tese
(Doutorado em Educação). Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2010.

36. ZONDERVAN, H. Het Spel: bij dieren, kinderen en volwassen mens. Amsterdam: Nederl Bi-
bliotheek, 1928.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 49


04
“ A vida após o fim da carreira
esportiva: um estudo sobre
atividade física no lazer em ex-
atletas catarinenses

Valter Cordeiro Barbosa Filho


IFCE - ARACATI

Deraldo Ferreira Oppa


NUPAF/UFSC

Jorge Bezerra
UPE

Adair da Silva Lopes


NUPAF/UFSC

10.37885/200901392
RESUMO

A interrupção da trajetória esportiva pode ser um processo que de mudança dos modos
de viver do ex-atleta. Os aspectos positivos ou negativos do término da carreira espor-
tiva podem influenciar fortemente na decisão do ex-atleta de continuar ou não adotar
comportamentos relacionados ao estado de saúde do indivíduo, como a prática regular
de atividade física (AF). Este estudo objetivou analisar a AF no lazer (AFL) em ex-atletas
de Atletismo participantes nos Jogos Abertos de Santa Catarina. Foram considerados
elegíveis 362 ex-atletas que foram medalhistas nas provas das competições de Atletismo,
de 1960 a 2006, cadastrados na secretaria de esporte regional, que encerraram a car-
reira esportiva há cinco ou mais anos e que estavam na faixa etária de 40 a 64.9 anos.
Destes, 51.4% (n=186, 64% de homens) responderam a pesquisa. Informações sobre
a AFL foram obtidas por meio do domínio do lazer do International Physical Activity
Questionnaire. Na análise dos dados foram utilizados procedimentos da estatística des-
critiva, Anova one-way com post-hoc de Tukey e o teste do Qui-quadrado. O nível de
significância foi estabelecido em 5%. Embora os ex-atletas atendiam as recomenda-
ções quanto à prática de atividades físicas: tempo médio de 504.40 (± 539.1) minutos
por semana de AF total (72 minutos/dia), 24.7% eram inativos no tempo de lazer. Não
foram observadas diferenças significativas entre os sexos e faixas etárias na AFL (p
> .05). Em conclusão, parece fundamental que estratégias sejam desenvolvidas para
motivar o ex-atleta a dedicar mais tempo na prática de atividade física durante o lazer,
após o término da carreira esportiva.

Palavras-chave: Atividade Motora, Atletismo, Estado de Saúde, Estudo Transversal.


INTRODUÇÃO

A transição da carreira esportiva corresponde ao período entre as fases de desenvolvi-


mento do atleta no esporte até o encerramento da carreira esportiva (BARROS, 2008). Os atle-
tas de competição, desde os níveis mais modestos até os grandes campeões, inevitavelmente
se defrontam com o término de carreira esportiva. Esta carreira apresenta diversas fases,
incluindo longos períodos de formação inicial, treinamento físico e stress psicológico em
competições (BARROS, 2008; FERNANDES; RAPOSO; FERNANDES, 2012), até culminar
no término da carreira e a aposentadoria esportiva (HACKFORT; DUDA; LIDOR, 2005).
A interrupção desta trajetória e o consequente término da carreira esportiva podem
ser causados por inúmeros fatores, como: desmotivação, lesões, falta de apoio e estrutu-
ra, incompatibilidade com atividades profissionais ou o avanço da idade. Entretanto, pode
ser ainda uma decisão pessoal, pensada e planejada, visando projetos futuros no campo
profissional e maior dedicação à vida pessoal ou à família (HACKFORT; DUDA; LIDOR,
2005). Os aspectos positivos ou negativos do término da carreira esportiva podem influenciar
fortemente na decisão do ex-atleta de continuar ou não adotar comportamentos relacionados
ao estado de saúde do indivíduo, como a prática regular de atividade física (AF) (SAMULKI
et al., 2009; ZACCAGNI; ONISTO; GUALDI-RUSSO, 2009).
Contudo, são constantes os casos de esportistas que, ao abandonar subitamente
o treinamento, desenvolvem enfermidades (cardiovasculares, hipertensivas, obesidade e
diabetes, por exemplo) a partir de comportamentos como consumo excessivo de álcool e
inatividade física (CAZÓN, 2008). Portanto, é importante monitorar estes comportamentos
relacionados à saúde (como a prática de AF) entre indivíduos que passaram da condição
de atleta para a condição de aposentado no esporte de alto rendimento.
A AF está associada com diferentes benefícios físicos, mentais e sociais, e a sua prática
regular (as recomendações internacionais sugerem 30 minutos ou mais de AF na maioria
dos dias da semana) tem sido considerada fundamental para promoção da saúde na po-
pulação mundial (WHO, 2010). Quando a prática de recreação, esporte ou exercício físico
está inserida nos momentos de lazer (ou seja, a AF de lazer [AFL]), os benefícios sociais
e psicológicos podem ser facilmente percebidos. Não obstante, a AFL representa um dos
principais domínios que contribuem no tempo semanal de AF em adultos e é um forte preditor
de saúde (AZEVEDO et al., 2009; FLORINDO et al., 2009; NOGUEIRA et al., 2009; WHO,
2010). Portanto, a prática de AF, especialmente no lazer, é peça fundamental na promoção
da saúde e qualidade de vida, mesmo na população que já abandonou a prática esportiva
competitiva, como ex-atletas.
Apesar disso, os poucos estudos que avaliaram a prática de AF na população de ex-
-atletas (CAZÓN, 2008; LOPES et al., 2007; ZACCAGNI; ONISTO; GUALDI-RUSSO, 2009)

52 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


não focaram na AFL. Considerando a importância da AFL, um estudo que preencha esta
lacuna na literatura torna-se relevante por indicar se a AFL representa um fator de saúde
constantemente presente no cotidiano de ex-atletas ou se estratégias de promoção da AF e
saúde devem ser direcionadas a essa população. Portanto, estas evidências de uma investi-
gação nesta direção podem contribuir na atuação de profissionais envolvidos com ex-atletas.
Neste contexto, o presente estudo objetivou analisar a prática de AFL em ex-atletas
que foram medalhistas da modalidade de Atletismo nos Jogos Abertos de Santa Catarina
(JASC), realizados de 1960 a 2006.

MÉTODO

Delineamento e Amostragem

Trata-se de um estudo de delineamento transversal, de abordagem quantitativa. A co-


leta de dados foi realizada de setembro a novembro de 2012. Os procedimentos desta
pesquisa foram aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de
Santa Catarina (parecer n° 167.678). Antes de responderem ao questionário, os ex-atletas
foram informados dos objetivos, métodos da coleta, do caráter voluntário da participação e
da garantia do sigilo das respostas individuais. Aqueles que se dispuseram a participar do
estudo assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido.
O processo de definição da população e seleção da amostra de ex-atletas está detalha-
do na Figura 1. A população do estudo envolveu todos os atletas que foram medalhistas em
pelo menos um dos JASC na modalidade Atletismo. Foram considerados os medalhistas da
primeira edição, realizada em Brusque em 1960, até a 47ª edição, realizada em Jaraguá do
Sul em 2006. Neste período, 1.017 atletas conquistaram medalhas na modalidade Atletismo.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 53


FIGURA 1. Fluxograma do processo de seleção da amostra de ex-atletas medalhistas no Atletismo dos Jogos Abertos de
Santa Catarina (1960-2006).

Um quadro com os medalhistas foi obtida a partir de informações, de caráter público,


disponibilizadas nos acervos físicos e no site da FESPORTE (www.fesporte.sc.gov.br), das
Fundações Municipais de Esportes das cidades sede dos JASC e da Federação Catarinense
de Atletismo. Os seguintes critérios de inclusão foram adotados: 1) ter ganho pelo menos
uma medalha (1º, 2º ou 3º colocados) nos JASC; 2) ter dados pessoais cadastrados nas
intituições regionais (como endereço residencial, endereço eletrônico e telefone) para con-
tato e convite para participar da pesquisa; 3) ter encerrado a carreira esportiva há cinco ou
mais anos (ou seja, ter encerrado até 2006); 4) estar na faixa etária de interesse (idades de
40 a 64,9 anos).
Após aplicar os critérios de seleção, foram considerados elegíveis para a pesquisa
362 ex-atletas. Todos os ex-atletas foram exaustivamente convidados para participar do
presente estudo, por meio de contato pessoal, telefônico e/ou eletrônico. Ao final, 186 ex-
-atletas aceitaram participar do estudo e responderam efetivamente ao questionário, o que

54 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


corresponde a 51,4% dos elegíveis. Esta amostra de medalhistas residia em 31 municípios
catarinenses ou em municípios de outros estados brasileiros. No total, os ex-atletas residiam
em nove diferentes estados do Brasil.

Instrumentos e Procedimentos

Os dados foram obtidos por meio do autopreenchimento de questionário por parte dos
ex-atletas, enviados aos respondentes por documento eletrônico ou impresso. O preenchi-
mento dos questionários, quando necessário, foi acompanhado on-line ou presencialmente
pelo pesquisador a fim de esclarecer eventuais dúvidas que surgissem durante o processo
de preenchimento.
A AFL foi avaliada utilizado o instrumento International Physical Activity Questionnaire
(IPAQ) versão longa, no domínio do lazer. O IPAQ foi desenvolvido com o propósito de
ser um instrumento de medida do nível de AF que pudesse ser usado internacionalmente,
principalmente em levantamentos multinacionais (MATSUDO et al., 2001). Este instrumento
avalia a frequência e o tempo diário (o que permite calcular o volume semanal) em AF em
diferentes domínios, incluindo o lazer, transporte, atividades domésticas e ocupacionais,
considerando a semana prévia à pesquisa (IPAQ GROUP, 2005). Para o presente estudo,
foram consideradas somente as questões do domínio sobre a prática de AFL. Este domí-
nio abrange seis questões que tratam da frequência e tempo de sessões de caminhada e
da AF nos momentos livres e no lazer. As informações sobre a AFL foram tratadas de duas
formas. O tempo semanal de caminhada, AF moderada ou vigorosa no tempo de lazer foi
calculado ao multiplicar a frequência semanal pela duração diária. Em adição, as reco-
mendações internacionais de AF foram utilizadas para classificar o tempo de AFL em três
categorias: inativo, quando não reportou AFL na semana; insuficientemente ativo, quando
reportou até 149 minutos na semana; e suficientemente ativo, quando reportou 150 ou mais
minutos na semana (WHO, 2010).
Algumas variáveis foram consideradas para caracterização sociodemográfica e de
condições de saúde entre os ex-atletas. O questionário elaborado incluiu itens relacionados
ao sexo (masculino, feminino), faixa etária (40-49, 50-59 e 60-<65 anos), escolaridade (até
o ensino médio completo ou superior completo) situação ocupacional (continua trabalhando
ou aposentado/nunca trabalhou). Estes itens foram estruturados considerando o questioná-
rio do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2010). Adicionalmente, algumas
variáveis de saúde foram estudadas. O peso e a estatura foram autorreportados. O índice
de massa corporal (IMC, peso/estatura²) foi calculado e classificado conforme critérios in-
ternacionais para peso normal (IMC <25,0 kg/m²), sobrepeso (IMC entre 25-29,9 kg/m²) e
obesidade (IMC > 30 kg/m²) em adultos (WHO, 2000). Por fim, questões estruturadas para o

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 55


presente estudo foram utilizadas com o intuito de avaliar a presença de problemas de saúde
(sim ou não) e há quanto tempo o indivíduo tinha parado de competir.

Análise Estatística

As características gerais da amostra foram apresentadas por meio da estatística des-


critiva (valores médios, desvios padrões, valores mínimos e/ou valores máximos para as
variáveis contínuas como idade e IMC). A distribuição, em frequência absoluta e relativa foi
utilizada para descrever as variáveis categóricas. O teste de Kolmogorov-Smirnov foi aplicado
para identificar a distribuição dos dados (paramétrica ou não paramétrica). A transformação
logarítmica de dados foi utilizada para as variáveis que não apresentaram distribuição pa-
ramétrica (tempo semanal em AFL).
A Análise de Variância one-way, seguido do teste post-hoc de Tukey foi empregada
para identificar as diferenças entre os sexos e faixas etárias no tempo semanal em AFL
(caminhada, AFL de intensidade moderada e vigorosa). O teste de Qui-quadrado para ten-
dência linear foi utilizado para analisar a associação bivariada entre o nível de AFL e o sexo
e a faixa etária. Foi utilizado o programa estatístico SPSS 16.0®, com o nível de significância
estabelecido em p < 0,05.

RESULTADOS

A descrição sociodemográfica e as condições de saúde dos ex-atletas está apresen-


tada na Tabela 1. A amostra final foi composta de 186 ex-atletas, com média de idade de
50,5 (DP = 6,54) anos. A amostra apresentou maior participação de homens (64,0%) e da
faixa etária de 40 a 49 anos (49,5%). A maioria reportou que ainda trabalhava (84,4%), que
possuía ensino superior completo (86,0%) e que parou de competir há mais de 15 anos
(60,2%). Uma parte da amostra apresentava sobrepeso/obesidade (48,4%) e reportou não
ter problemas de saúde (68,8%).

TABELA 1. Caracterização da amostra de ex-atletas do presente estudo (n=186).


Variáveis N %
Sexo
Homens 119 64,0

Mulheres 67 36,0
Faixa etária (anos)
40 – 49 92 49,5
50 – 59 74 39,8
60 – <65 20 10,8
Ocupação
Continua trabalhando 157 84,4
Não trabalha / Aposentou 29 15,6

56 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Variáveis N %
Escolaridade
Até 2° grau (ensino médio) 26 14,0
Superior completo 160 86,0
Classificação do IMC
Peso normal (IMC < 25,0 kg/m²) 79 42,5
Sobrepeso (IMC de 25,0 a 29,9 kg/m²) 90 48,4
Obesidade (IMC > 25,0 kg/m²) 17 9,1
Apresenta problemas de saúde
Não 128 68,8
Sim 58 31,2
Tempo que parou de competir
5 a 10 anos 49 26,3
11 a 15 anos 25 13,4
Mais de 15 anos 112 60,2

Os valores de média e desvio-padrão do tempo semanal em caminhada no lazer, AFL


moderada, AFL vigorosa e AFL total estão apresentados na Tabela 2, de acordo com o sexo
e a faixa etária. Os ex-atletas apresentaram um tempo semanal médio de 504,4 (± 539,1)
minutos em AF total (72 min/dia). A média do tempo semanal em caminhada foi de 218,9
(±247,8) minutos (31,28 min/dia), em AF moderada foi de 125,0 (±200,3) minutos (17,86 min/
dia) e em AF vigorosa foi de 160,7 (±225,3) minutos (22,86 min/dia). Entretanto, não foram
observadas diferenças significativas entre os sexos e faixas etárias para o tempo semanal
em AFL, independentemente da intensidade (p > 0,05).

TABELA 2. Média (desvio-padrão) do tempo semanal em Atividade Física no Lazer (AFL) de acordo com o sexo e a faixa
etária em ex-atletas
AFL vigorosa AFL total
Variáveis Caminhada (min./sem.)* AFL moderada (min./sem.)*
(min./sem.)* (min./sem.)*
Total 218,9 (247,8) 125,0 (200,3) 160,7 (225,3) 504,4 (539,1)
Sexo p = 0,860 p = 0,267 p = 0,118 p = 0,465
Homens 218,5 (268,6) 135,8 (224,4) 140,1 (217,6) 494,3 (584,1)
Mulheres 219,5 (207,5) 106,0 (147,9) 197,0 (236,0) 522,4 (451,8)
Faixa etária p = 0,195 p = 0,930 p = 0,151 p = 0,580

40-49 anos 215,9 (272,3) 128,9 (197,3) 176,6 (228,6) 521,3 (542,3)

50-59 anos 205,9 (225,6) 116,1 (184,1) 152,7 (209,6) 474,7 (522,1)

60-<65 anos 280,2 (205,8) 140,2 (270,9) 117,0 (268,4) 537,5 (606,4)
Nota: Valor de p obtido através do teste post-hoc de Tukey; min./sem= minutos por semana.
*As variáveis do tempo semanal em atividades físicas no lazer (AFL) foram transformadas para a execução do teste de Anova.

A Figura 2 apresenta o nível de AFL entre os ex-atletas de acordo com o sexo. Mais
da metade (55,4%) dos ex-atletas eram suficientemente ativos. Destaca-se que 24,7% dos
ex-atletas eram inativos. Não houve diferenças significativas entre os sexos para o nível
de AFL (p > 0,05). A Figura 3 apresenta o nível de AFL de acordo com a faixa etária entre
os ex-atletas. Não houve diferenças entre as faixas etárias para o nível de AFL (p > 0,05).

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 57


FIGURA 2. Nível de Atividade Física no Lazer de acordo com o sexo em ex-atletas.

p = 0,923*
100

90

80
52,7
70 59,7
Muito ativo (150+ min/sem)
60
%
50 Pouco ativo (< 149 min/sem)

40 Inativo (0 min/sem)
25,2 10,4
30

20
29,9
10 21,8

0
Homens Mulheres

* Valor de p obtido no teste de Qui-quadrado para tendência linear

FIGURA 3. Nível de Atividade Física no Lazer de acordo com a faixa etária em ex-atletas.

p = 0,305*
100

90

80 40

70 57,6 56,8
Muito ativo (150+ min/sem)
60
% Pouco ativo (< 149 min/sem)
50
30 Inativo (0 min/sem)
40
19,6 17,6
30

20
25,7 30
10 22,8

0
40-49 anos 50-59 anos 60-64.9 anos

* Valor de p obtido no teste de Qui-quadrado para tendência linear.

58 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


DISCUSSÃO

O presente estudo buscou identificar a AFL em ex-atletas da modalidade Atletismo e


que foram medalhistas nos JASC realizados desde a sua criação, em 1960, até o ano de
2006. A escassez de estudos na literatura com amostras de ex-atletas, bem como a ava-
liação de uma importante variável da saúde individual (AFL), tornam relevante a realização
da presente investigação. Em contrapartida, a limitada literatura sobre o assunto dificultou
a discussão dos resultados com outros estudos em diferentes populações de ex-atletas.
Algumas características da amostra do presente estudo se destacaram e merecem ser
discutidas. A faixa etária predominante foi de 40 a 49 anos (49,5%). Entretanto, percebeu-se
que a maioria dos ex-atletas (60,2%) parou de competir há mais de 15 anos. Isso parece
indicar que uma importante parcela destes indivíduos abandonou precocemente a carreira
esportiva em uma idade que ainda poderiam ter obtidos relevantes resultados atléticos.
Estudo realizado por Agresta et al. (2008) indicou que as principais causas para o término
da carreira esportiva são a idade e outros interesses emergentes, como o cuidado familiar
ou atividades ocupacionais para contribuir na renda do indivíduo. Já Samulski et al. (2009)
apontaram como causas principais de abandono da carreira esportiva competitiva as con-
tusões frequentes, queda de rendimento, questões financeiras e redução do prazer para a
prática do esporte.
No que se refere às condições clínicas e de saúde, 48,4% da amostra apresentou
sobrepeso/obesidade. Esse resultado é semelhante ao obtido no estudo de Lopes et al.
(2007), que analisou ex-nadadores por um período de 25 anos, apresentando um aumento
médio de 50,1% do peso corporal. Cazón (2008) também estudou 245 ex-atletas brasileiros,
chilenos e cubanos e apontou que a obesidade é uma das enfermidades de maior preva-
lência nesta população. Contudo, dados da população geral apontam que o sobrepeso/
obesidade não é um problema específico da população de ex-atleta (FINUCANE et al.,
2011; HALLAL et al., 2008).
Segundo a World Health Organization (WHO, 2010), as recomendações atuais de AF são
de 150 minutos ou mais semanais em AF de intensidade moderada a vigorosa para que
sejam alcançados os benefícios à saúde. Somando o tempo semanal em AF moderada
(125,0 minutos) e AF vigorosa (160,7 minutos), percebe-se que a média do tempo semanal
nestas práticas entre ex-atletas foi bem superior ao recomendado à saúde. De fato, grande
parcela da amostra foi suficientemente ativa no lazer (ver Figuras 2 e 3).
Dentre as práticas de AFL avaliadas, a caminhada se destacou como a AFL com
maior tempo semanal médio (ver Tabela 2). Estudos têm mostrado que a estruturação de
espaços de lazer que favorecem a caminhada (clubes, praças ou parques com calçadas e/
ou demarcações de distância no solo, etc.) tem contribuído para a inserção cada vez maior

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 59


de caminhada como opção de AFL, em detrimento até de práticas esportivas como futebol
(FLORINDO et al., 2009; SALVADOR et al., 2009). A divulgação midiática sobre os benefícios
da AF à saúde tem contribuído para o aumento da AFL, e a caminhada tem se apresentado
como uma opção viável dentro dos espaços públicos (FLORINDO et al., 2009; WHO, 2010).
Contudo, os resultados do presente estudo indicaram um inativo (zero minuto por
semana de AFL) para cada quatro ex-atletas. Esta tendência ocorreu de modo semelhante
entre os sexos. Estudos prévios com amostras de não-atletas têm apresentado taxas de
inatividade física no lazer superiores a 50% (FLORINDO et al., 2009; NOGUEIRA et al., 2009;
SALVADOR et al., 2009). Portanto, os resultados obtidos no presente estudo indicaram que a
inatividade física entre ex-atletas parece ser menor do que os obtidos na população em geral.
Contudo, pode-se considerar que estas estimativas são preocupantes, se considerado
que a amostra foi composta por ex-atletas. Após o término da carreira esportiva é fundamen-
tal que o ex-atleta seja motivado a continuar praticando AFL (CAZÓN, 2008; LOPES et al.,
2007; ZACCAGNI; ONISTO; GUALDI-RUSSO, 2009), pois a inatividade física os levará
inevitavelmente aos problemas de saúde relativos ao estilo de vida sedentário. A intervenção
efetiva do profissional de Educação Física neste momento é importante para motivar estes
indivíduos na busca pela prática regular de AF durante o cotidiano e no lazer, de modo a
perceber que a AF como um aspecto da vida saudável e com bem-estar, e não mais sob a
perspectiva de rendimento físico. A prescrição e o acompanhamento podem ser voltadas a
este fim, bem como a orientação para um estilo de vida ativo e saudável são fundamentais
para estimular estes indivíduos a realizar AFL.
Não foram observadas diferenças significativas entre os sexos e faixas etárias para o
tempo semanal em AFL, independentemente do tipo/intensidade de AF (p > 0,05). Esses
resultados foram distintos dos encontrados em outros estudos (AZEVEDO et al., 2009;
FLORINDO et al., 2009; NOGUEIRA et al., 2009), que apontaram o sexo masculino como
mais ativo fisicamente, tanto em adultos mais velhos quanto em adultos jovens. Uma possível
justificativa, no caso de ex-atletas, é que estas distinções de sexo na prática da AFL talvez
fiquem menos evidenciadas devido ao longo tempo dedicado ao treinamento desportivo
e à prática competitiva por parte destes indivíduos. Adicionalmente, segundo estudo de
Dehkordi (2011), ex-atletas do sexo feminino realizavam um volume de AF muito superior
quando comparado às pares não-atletas. Portanto, a participação em AFL após o término
da carreira esportiva parece ocorrer de modo semelhante entre os sexos. Ao se pensar no
planejamento de ações e políticas públicas de estímulo a um estilo de vida ativo no lazer
na população de ex-atletas, deve-se pensar em ações direcionadas para ambos os sexos,
sem o enfoque em um subgrupo específico por sexo.

60 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Não houve diferenças estatisticamente significativas entre as faixas etárias para o
tempo semanal e o nível de AFL (ver Tabela 2 e Figura 3). Não foram encontrados estudos
que tratem especificamente dos níveis de AFL em ex-atletas e comparando-os em diferentes
faixas etárias. Contudo, alguns dados da população em geral obtiveram resultados distintos
ao observado no presente estudo. Por exemplo, Korniloff et al. (2012) estudaram adultos mais
velhos e observaram um maior tempo de AFL nas faixas etárias de 55 a 64 e 65 a 74 anos.
Hallal et al. (2008), ao estudar adultos da cidade de Pelotas, Rio Grande do Sul, observaram
que adultos da faixa etária de 55 a 64 anos eram os mais ativos. Portanto, as evidências do
presente estudo parecem indicar que o estímulo ao envolvimento na prática de AFL deve
ser realizado independentemente se o indivíduo abandonou a carreira precocemente (mais
novo) ou quando atingiu uma idade mais elevada e parou de competir.
Dois aspectos valorizam a realização do presente estudo. Primeiro, a avaliação da AFL
em ex-atletas de atletismo, um importante indicador de saúde mensurado em uma população
pouco explorada na literatura científica. Segunda, a inclusão de uma amostra relativamente
abrangente de ex-atletas, incluindo indivíduos de 31 municípios catarinenses e residentes,
atualmente, em oito diferentes estados brasileiros.
Por outro lado, algumas limitações deste estudo merecem ser destacadas. A taxa
de resposta próxima de 50% pode ter reduzido a participação de ex-atletas em condições
econômicas ou de saúde precárias. Esta taxa de resposta ocorreu pela dificuldade de loca-
lização de muitos ex-atletas elegíveis para a pesquisa, bem como ao desinteresse e falta de
retorno de alguns que foram localizados. Contudo, considerando que o estudo foi realizado
por correio eletrônico e impresso, a taxa de resposta foi aceitável. A segunda limitação se
refere à a avaliação da AFL por métodos subjetivos. No entanto, considerando as dificulda-
des em se avaliar objetivamente a AFL em amostras grandes e de diferentes localidades,
o uso de um instrumento validado como o IPAQ é aceitável. Ainda embora a AFL seja um
dos domínios mais importantes na predição da AF (HALLAL et al., 2010) e com grande
predição das condições de saúde (JURAKIC; PEDISIC; GREBLO, 2010), a avaliação do
tempo total de AF em outros domínios não foi realizada. Ainda, o detalhamento dos dife-
rentes tipos de AF (musculação, esportes, etc.) não foi possível devido ao uso do IPAQ e o
agrupamento de AF pela sua intensidade. Por fim, foram considerados somente atletas que
conquistaram medalhas na modalidade de Atletismo. Isto limita a extrapolação dos resulta-
dos à população de todos os ex-atletas que não obtiveram medalhas na modalidade, bem
como aos das outras modalidades participantes do evento. Contudo, estas características
facilitaram o acesso aos ex-atletas, uma vez que estas informações estavam disponíveis
em uma listagem, permitindo o contato e a seleção dos participantes.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 61


CONCLUSÃO

Os ex-atletas avaliados no presente estudo apresentaram boas estimativas do tempo


semanal e do nível de AFL, considerando os parâmetros populacionais apontados em estudos
prévios. Contudo, é preocupante o fato de que um em cada quatro ex-atletas não realiza-
va AFL. Não foram observadas diferenças significativas entre os sexos e as faixas etárias
na AFL. É fundamental que sejam desenvolvidas estratégias de orientação e intervenção,
principalmente por profissionais de Educação Física, para motivação ao envolvimento em
um lazer ativo (esportes recreacionais, caminhadas em parques, entre outras AFL) entre
atletas que têm risco de abandonar o esporte ou que já encerraram o período esportivamente
produtivo. Essas estratégias podem ser direcionais de modo semelhante para os ex-atletas
em ambos os sexos e de diferentes grupos etários.

Agradecimentos

À Fundação Catarinense de Esportes, Federação Catarinense de Atletismo e Fundação


Municipal de Desportos de Blumenau, pela disponibilização dos seus arquivos dos Jogos
Abertos de Santa Catarina e à todos os ex-atletas de Atletismo que responderam a esta
pesquisa. Este estudo não teve financiamento de entidade pública ou privada.

Contribuições

VCBF participou da concepção do estudo, definição dos instrumentos, análises de


dados e escrita do manuscrito. DFO participou da concepção do estudo, definição dos ins-
trumentos e escrita do manuscrito. JB e ASL participação na concepção e escrita do artigo.
Todos os autores aprovaram a versão final para publicação.

REFERÊNCIAS
1. AGRESTA, M. C.; BRANDÃO, M. R.; BARROS NETO, T.L. Physical and emotional causes and
consequences of career termination in sports. Revista Brasileira de Medicina do Esporte,
São Paulo, v. 14, n. 6, p. 504-508, 2008.

2. AZEVEDO, M. R. et al. Fatores associados ao sedentarismo no lazer de adultos na coorte de


nascimentos de 1982, Pelotas, RS. Revista de Saúde Pública, São Paulo, n.42, Supl. 2, p.
70-77, 2009.

3. BARROS, K. S. Recortes da transição na carreira esportiva. Revista Brasileira de Psicologia


do Esporte, São Paulo, v. 2, n. 1, p. 1-27, 2008.

62 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


4. CAZÓN, R. L. Efeitos do processo de destreinamento sobre a saúde de ex-atletas de
alto rendimento. 2008. Tese (Doutorado em Ciências da Saúde) - Universidade de Brasília,
Brasília, 2008.

5. DEHKORDI, A. G. The comparison between athlete females and non-athlete females regarding
to general health, mental health, and quality of life. Procedia Society and Behavioral Science,
Columbia, v. 15, p. 1737-1741, 2011.

6. FERNANDES, M. G.; VASCONCELOS-RAPOSO, J.; FERNANDES, H. M. Relação entre orien-


tações motivacionais, ansiedade e autoconfiança, e bem-estar subjetivo em atletas brasileiros.
Motricidade, Ribeira de Pena, v. 8, n. 3, p. 4–18, 2012.

7. FINUCANE, M. M. et al. National, regional, and global trends in body-mass index since 1980:
systematic analysis of health examination surveys and epidemiological studies with 960 cou-
ntry-years and 9.1 million participants. Lancet, London, v. 277, n. 9765, p. 557–567, 2011.

8. FLORINDO, A. A. et al. Prática de atividades físicas e fatores associados em adultos. Revista


de Saúde Pública, São Paulo, v. 43, Supl. 2, p. 65–73, 2009.

9. HACKFORT, D.; DUDA. J. L.; LIDOR, R. (editors). Handbook of Research in Applied Sport
and Exercise Psychology: International Perspectives. Morgantown: Fitness Information Te-
chnology; 2005.

10. HALLAL, P. C. et al. Correlates of leisure-time physical activity differ by body-mass-index


status in Brazilian adults. Journal of Physical Activity and Health, Washington, v. 5, n. 4, p.
571-578, 2008.

11. HALLAL, P. C . et al. Lessons learned after 10 years of IPAQ use in Brazil and Colombia. .
Journal of Physical Activity and Health, Washington, v. 7, Supl. 2, p. 259-264, 2010.

12. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Censo 2010; 2010. Dis-
ponível em http://www.censo2010.ibge.gov.br/resultados . Acesso em: 10/03/2012.

13. IPAQ. Guidelines For Data Processing And Analysis Of The International Physical Activity
Questionnaire (IPAQ). Short and Long Forms. Revised November; 2005.

14. JURAKIC, D.; PEDISIC, Z.; GREBLO, Z. Physical activity in different domains and health-re-
lated quality of life: a population-based study. Quality of Life Research, Oxford, v. 19, n. 9,
p.1303-1309, 2010.

15. KORNILOFF, K. et al. Lifetime leisure-time physical activity and the risk of depressive symp-
toms at the ages of 65–74 years: The FIN-D2D survey. Preventive Medicine, New York, v.
54, n. 5, p. 313–315, 2012.

16. LOPES, M. R. et al. 25-year follow-up study and tracking analysis of physical fitness in swimmers
former athletes. Revista Brasileira de Ciência e Movimento, Brasília, v. 15, n. 1, p. 7-14, 2007.

17. MATSUDO, S. et al. Questionário Internacional de Atividade Física (IPAQ): estudo de validade
e reprodutibilidade no Brasil. Revista Brasileira de Atividade Física e Saúde, Florianópolis
,v. 6, n. 2, p. 5-18, 2001.

18. NOGUEIRA, D. et al. Atividade física de lazer no início da vida adulta prediz a atividade física
posterior? Estudo Pró-Saúde. Revista Brasileira de Epidemiologia, São Paulo, v. 12, n. 1,
p. 3-9, 2009.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 63


19. SALVADOR, E. P.; FLORINDO, A. A.; REIS, R. S.; COSTA, E. F. Percepção do ambiente e
prática de atividade física no lazer entre idosos. Revista de Saúde Pública, São Paulo, v. 43,
n. 6, p. 972-80, 2009.

20. SAMULSKI, D. M. et al. Análise das transições das carreiras de ex-atletas de alto nível. Motriz,
Rio Claro, v. 15, n. 2, p. 310-317, 2009.

21. WORLD HEALTH ORGANIZATION (WHO). Global recommendations on physical activity


for health. Geneva: WHO; 2010.

22. WORLD HEALTH ORGANIZATION (WHO). Technical Report Series (894). Obesity: preventing
and managing the global epidemic; Geneva: WHO; 2000.

23. ZACCAGNI, L.; ONISTO, N.; GUALDI-RUSSO. E. Biological characteristics and ageing in
former elite volleyball players. Journal of Science and Medicine in Sport, Victoria, v. 12, n.
6, p. 667–672, 2009.

64 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


05
“ Alterações autonômicas
cardíacas em diferentes perfis
táticos do jiu jitsu brasileiro

Denner Ferreira de Sousa


UFTM

José Martins Juliano Eustaquio


UNIUBE

Moacir Marocolo
UFJF

Gustavo Ribeiro da Mota


UFTM

Octávio Barbosa Neto


UFTM

10.37885/201001832
RESUMO

Introdução: O Jiu Jitsu Brasileiro (JJB) é um esporte individual, caracterizado por movi-
mentos corporais intermitentes cujo objetivo é a submissão (derrota) do oponente. Nesta
modalidade, há dois perfis táticos de lutadores, o guardeiro (GG) e o passador (GP), que
apresentam potenciais diferenças em relação aos padrões antropométricos e à modulação
autonômica cardíaca. Objetivos: Avaliar os efeitos dos diferentes estilos de luta do JJB
sobre a modulação autonômica cardíaca. Métodos: Participaram do estudo 12 atletas
com estilo de luta GP e 12 atletas com estilo de luta GG, ambos do sexo masculino e
com idades médias de 30,4 ± 1,9 e 30,6 ± 1,3 anos, respectivamente. Foram avaliados,
em repouso, o perfil antropométrico, a composição corporal e parâmetros hemodinâmi-
cos (pressão arterial [PA], frequência cardíaca [FC] basal e variabilidade da frequência
cardíaca [VFC], esta última através de análises lineares e não lineares). Resultados:
Lutadores do GP apresentaram maiores diâmetros da circunferência da cintura e do
quadril em comparação ao GG (p<0,05). Não houveram diferenças em relação aos pa-
râmetros hemodinâmicos basais da FC e da PA. A variabilidade total da FC, bem como
os índices da modulação parassimpática tanto no domínio do tempo como no domínio da
frequência, foram significativamente menores nos lutadores do GG quando comparados
aos lutadores do GP (p<0,05). Em contrapartida, os marcadores da modulação simpáti-
ca no domínio da frequência e o índice simpatovagal foram maiores no GG em relação
ao GP (p<0,05). O índice SD1 da análise não linear foi menor nos lutadores do GG quan-
do confrontados ao GP (p<0,05). Conclusão: Lutadores com estilo predominantemente
guardeiro apresentam menor modulação vagal e hiperatividade simpática cardíaca de
repouso em comparação aos lutadores passadores.

Palavras-chave: Esportes, Sistema Nervoso Simpático, Medicina Esportiva, Sistema Car-


diovascular, Frequência Cardíaca.
INTRODUÇÃO

Desde a antiguidade são desenvolvidas técnicas sistematizadas de lutas, sejam no


intuito de combate e defesa pessoal ou como atividades esportivas. Conhecida no meio
esportivo como uma arte suave milenar, o Jiu Jitsu Brasileiro (JJB) é um esporte individual
caracterizado pelo combate entre dois atletas que buscam a submissão do oponente atra-
vés de “estrangulamentos”, “finalizações”, “imobilizações” e “projeções”. Se não ocorrer a
submissão de um dos oponentes, a decisão é designada para a arbitragem, que determina
pontuações de acordo com posições específicas ou punições recebidas durante a luta.1
A característica do JJB é concebida por exercícios corporais intermitentes, de modo
que seus praticantes almejam rapidamente a derrota do seu oponente.2 Nesse sentido, os
praticantes desta modalidade necessitam de um bom condicionamento físico para resistir
(defender) ou atacar com êxito. As variáveis físicas que fazem parte do JJB englobam
flexibilidade, potência, velocidade, força, agilidade, coordenação, equilíbrio e resistências
aeróbica e muscular localizada.3
No JJB existem dois tipos de perfis táticos de combate, o lutador passador de guarda
(PG) e o lutador guardeiro (LG). O PG (em posição ortostática ou de cócoras) visa superar
a guarda do oponente de maneira ofensiva com movimentos de força explosiva. Por outro
lado, o LG (com quadril no solo) cadencia o combate com movimentos isométricos de mem-
bros inferiores e superiores.4 Dessa forma, as cargas agudas de treinamento impostas em
virtude das referidas posições de luta se diferenciam consideravelmente e podem promover
adaptações autonômicas e cardiovasculares distintas, de modo que alguns estudos têm su-
gerido a monitorização de marcadores de ritmo cardíaco para avaliar adaptações aos tipos
de treinamento.5–8 Acredita-se que os LG desenvolvem maiores níveis de produção de força
isométrica em virtude da constante posição de decúbito dorsal a qual cronicamente estão
submetidos, principalmente quando o mesmo tem sua “guarda passada”, o que promove
maior sobrecarga de pressão e aumento da atividade simpática no sistema cardiovascular.
Uma forma de avaliar a modulação autonômica cardiovascular é através da análise da
variabilidade da frequência cardíaca (VFC). Esta é uma ferramenta simples, não invasiva
e com elevada aplicabilidade clínica, na qual quantifica-se de forma indireta a modulação
exercida pelos sistemas nervosos simpático e parassimpático no coração, como um pro-
tocolo auxiliar para a avaliação do estresse cardiovascular.8 De modo geral, o treinamento
que envolve maior componente aeróbico melhora a modulação parassimpática do cora-
ção.9 No entanto, evidencia-se que atletas submetidos a altos volumes de treinamento podem
apresentar redução do componente vagal e aumento do simpático no coração, acarretando

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 67


em diminuição no desempenho atlético. Esses dados sugerem que a modulação simpática
cardíaca pode ser afetada pela carga de treinamento.10
É interessante observar que grande parte dos estudos de modulação autonômica
cardiovascular abordaram principalmente as adaptações relacionadas aos esportes com
demanda aeróbica, de modo que pouco se sabe sobre as adaptações aos esportes com
demanda anaeróbica como, por exemplo, as modalidades de lutas. Em relação às artes
marciais, poucas investigações têm como foco principal o JJB, principalmente no contexto
dos aspectos de saúde e sua influência na qualidade de vida. Atualmente, encontra-se es-
casso na literatura científica estudos que enfatizem os efeitos dos diferentes perfis táticos
de lutadores do JJB sobre os parâmetros autonômicos cardiovasculares.

OBJETIVO

Avaliar a modulação autonômica cardíaca de repouso em atletas de JJB, analisando a


alteração dos índices desta variabilidade em função dos diferentes perfis táticos de combate
desses lutadores.

MATERIAL E MÉTODOS

Participaram voluntariamente do presente estudo 24 atletas do sexo masculino, pra-


ticantes do JJB há no mínimo dois anos, com faixa etária de 30,5 ± 5,4 anos e índice de
massa corporal de 26,4 ± 2,9 m/kg2. Eles foram divididos em dois grupos de acordo com
a tática de luta ao qual adotavam: grupo de atletas com estilo de luta predominantemente
passador de guarda (GP; n=12) e grupo de atletas com estilo de luta predominantemente
guardeiro (GG; n=12). Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre
e Esclarecido, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do
Triângulo Mineiro (nº 1.249.283/2015).
O estudo utilizou delineamento experimental em corte transversal ao acaso. As coletas
aconteceram em dois centros de treinamento esportivo que possuem a modalidade do JJB
no município de Uberaba (MG). No momento inicial da coleta, os voluntários responde-
ram um questionário semiestruturado no processo de seleção da amostra, com critérios de
graduação de faixa, perfil tático, tempo de experiência, frequência de treino, duração dos
treinos, prática de outro exercício físico, uso de suplementação, uso de medicamentos, uso
de esteroides, acompanhamento nutricional e histórico de doenças familiares. Os critérios
de exclusão foram ingestão de cafeína seis horas e alimentação duas horas antes do teste,
prática de exercícios físicos no intervalo de 24 horas e uso de recursos ergogênicos nutri-
cionais e/ou farmacológicos.

68 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


A verificação da composição corporal foi realizada através da análise das dobras cutâ-
neas (DC) por adipômetro científico da marca Lange, com escala de 0 a 60 mm, resolução
de 1 mm e pressão exercida de 10 g/mm². As regiões coletadas foram o segmento peitoral
(na dobra diagonal entre a linha axilar e o mamilo), o abdômen (2 cm da cicatriz umbilical)
e a coxa (ponto médio entre a região inguinal e a borda da patela). A equação para de-
terminar a dobra cutânea foi estabelecida através do protocolo de Jackson e Pollock (DC:
1,1093800 - 0,0008267 [peitoral + abdominal + coxa] + 0,0000016 [peitoral + abdominal +
coxa]² - 0,0002574 [idade]).11 Após o cálculo das dobras cutâneas, é necessário transpor
o valor encontrado para a equação de Siri (%G: [(4,95: DC) – 4,5] x 100), para encontrar o
percentual de gordura estimado.12
A massa corporal e a altura dos lutadores foram coletadas através de balança digital
(Tanita HD-350®). As circunferências antropométricas foram realizadas utilizando-se fita
métrica metálica (Sanny®, Brasil), com mensuração de 0,1 cm e marcação total de 2 m.
A pressão arterial (PA) foi aferida de forma não invasiva após 5 minutos de repouso
na posição supina utilizando-se um manguito automático e oscilométrico (M3 Intellisense
HEM-7051-E; Omron Healthcare, Kyoto, Japão) com visor digital. A frequência cardíaca
(FC) foi monitorada pela derivação II de um eletrocardiograma (Labchart Pro version 7.3.4,
Brasil), batimento por batimento na posição CM5 e analisado pelo software Matlab 6.1.1.450
Release 12.1.2001.
A VFC foi realizada em um trecho estacionário de pelo menos 5 min da série temporal
do intervalo das ondas R (iRR). A estacionariedade foi testada comparando-se a semelhança
dos índices obtidos na metade inicial e final do trecho escolhido. A VFC foi analisada nos
domínios do tempo (DT) e da frequência (DF).
No DT, calcularam-se os índices de desvio-padrão da média de todos os interva-
los RR (SDNN – indicativo da modulação simpática cardíaca), raiz quadrada da média do
quadrado das diferenças entre intervalos RR (RMSSD) e percentagem de intervalos RR ad-
jacentes com diferença de duração superior a 50 milisegundos (pNN50), ambos indicativos
da modulação parassimpática cardíaca.6
No DF, as séries temporais foram decompostas pelo método autorregressivo. Com
esse procedimento, foi calculado o poder espectral total e quantificados os poderes de cada
componente relevante do espectro (baixa frequência [BF = 0,04 a 0,15 Hz] e alta frequên-
cia [AF = 0,15 a 0,4 Hz]). O poder de cada componente foi calculado em termos absoluto
e normalizado (valor de cada componente dividido pelo valor total do espectro subtraído
pelo componente de muito baixa frequência [MBF < 0,04 Hz], multiplicado por 100). Os va-
lores de AF foram considerados como indicativos da modulação parassimpática cardíaca,
enquanto o valor normalizado de BF foi interpretado como decorrente, principalmente, da

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 69


modulação simpática cardíaca. A razão entre BF/AF foi considerada como o balanço sim-
pato-vagal cardíaco.13

Análise estatística

A normalidade da distribuição dos dados foi analisada pelo teste de Shapiro-Wilk. O tes-
te t- Student não pareado ou o teste de Mann-Whitney foi utilizado para a comparação
dos grupos (Guardeiro e Passador). Foram considerados significantes os valores de p <
0,05. Os dados estão apresentados como média ± EPM.

RESULTADOS

Os dois grupos apresentaram características e composições corporais semelhantes


(Tabela 1). Em relação ao perfil antropométrico, os lutadores com o estilo tático de luta
passador apresentaram maiores diâmetros da circunferência da cintura e do quadril em
comparação aos lutadores predominantemente guardeiros (p<0,05).

Tabela 1. Perfil antropométrico e composição corporal nos atletas de jiu-jitsu com diferentes estilos táticos de lutas
avaliados no estudo.
Guardeiro Passador
(n=12) (n=12) p
Idade (anos) 30,4 ± 1,9 30,6 ± 1,3 0,940

Tempo de Prática (anos) 11,8 ± 3,1 9,7 ± 2,5 0,723

Massa Corporal (kg) 84,5 ± 3,9 85,6 ± 1,9 0,798

Altura (cm) 179,0 [177,0-180,0] 175,0 [173,2-179,0] 0,075

IMC (kg/m2) 26,8 ± 0,5 27,1 ± 0,9 0,842

Gordura (%) 22,8 ± 2,2 25,3 ± 1,5 0,357

Massa Magra (kg) 64,6 ± 2,1 63,8 ± 1,5 0,782

Massa Gorda (kg) 19,9 ± 2,7 21,8 ± 1,5 0,548

Pescoço (cm) 40,5 ± 0,8 40,8 ± 0,7 0,761

Peitoral (cm) 100,0 [95,1-105,7] 99,0 [97,1-101,0] 0,761

Braço Dir. (cm) 33,0 [31,8-35,0] 32,7 [31,2-33,7] 0,429

Braço Esq. (cm) 34,0 [31,3-34,7] 30,5 [30,0-31,7] 0,056

Antebraço Dir. (cm) 30,7 ± 0,3 30,2 ± 0,4 0,412

Antebraço Esq. (cm) 29,5 ± 0,8 28,8 ± 0,4 0,681

Coxa Dir. (cm) 55,0 [52,5-58,1] 59,5 [55,6-60,0] 0,146

Coxa Esq. (cm) 56,5 [52,6-58,5] 58,0 [55,2-59,7] 0,525

Perna Dir. (cm) 39,5 [34,5-40,7] 37,0 [34,0-39,1] 0,440

70 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Guardeiro Passador
(n=12) (n=12) p

Perna Esq. (cm) 39,0 [34,1-41,0] 37,0 [37,0-38,7] 0,494

Cintura (cm) 84,1 ± 1,0 91,0 ± 1,3 0,001

Abdome (cm) 87,8 ± 1,5 91,7 ± 1,3 0,105

Quadril (cm) 100,0 [98,2-101,0] 106,0 [102,0-106,0] 0,020

Relação C/Q (cm) 0,85 ± 0,01 0,87 ± 0,01 0,221

Valores estão expressos como média ± erro padrão da média (epm), valores de mediana (25,75 e percentis). IMC: índice
de massa corporal; Dir.: direito; Esq.: esquerdo; C/Q: cintura/quadril.

Quanto aos parâmetros hemodinâmicos, não houveram diferenças significativas quanto


à frequência cardíaca de repouso dos lutadores guardeiros (64,3 ± 1,1 bpm) quando com-
parados aos lutadores passadores (62,4 ± 0,9 bpm; p=0,505) (Figura 1A), assim como os
níveis basais das pressões arteriais sistólica (127,9 ± 1,7 mmHg no GG versus 123,8 ± 2,7
mmHg no GP; p=0,214) (Figura 1B), diastólica (80,7 ± 0,7 mmHg no GG versus 79,7 ± 0,9
mmHg no GP; p=0,418) (Figura 1C) e média (96,4 ± 0,7 mmHg no GG versus 94,4 ± 1,2
mmHg no GP; p=0,170) (Figura 1D).

Figura 1. Parâmetros hemodinâmicos nos atletas de jiu-jitsu com diferentes estilos táticos de lutas, segundo frequência
cardíaca (1A), pressão arterial sistólica (1B), pressão arterial diastólica (1C) e pressão arterial média (1D).

Em relação aos índices de variabilidade da frequência cardíaca (Tabela 2), o índice da


variância total no domínio do tempo foi significativamente maior nos lutadores guardeiros
quando comparados aos lutadores com estilo passador (p<0,05). Em contrapartida, o índice
RMSSD e pNN50 (ambos marcadores da modulação parassimpática cardíaca no domínio

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 71


do tempo), foram consideravelmente inferiores no grupo guardeiro em relação ao grupo pas-
sador (p<0,05). Ao analisar os índices no domínio da frequência, o espectro do componente
da banda de BF (marcador da modulação simpática cardíaca), apresentou-se superior nos
guardeiros em relação passadores (p<0,05). Resultado equivalente foi observado na relação
dos componentes BF/AF (marcador do balanço simpato-vagal sobre o coração), que tam-
bém foi superior nos lutadores de estilo guardeiro (p<0,005). Por outro lado, o espectro do
componente da banda AF (marcador da modulação parassimpática cardíaca), se encontrou
reduzido no grupo guardeiro (p<0,05). O índice SD1, o qual avalia a atividade vagal pelo
método não linear da variabilidade da frequência cardíaca, também apresenta-se reduzido
nos lutadores guardeiros (p<0,05).

Tabela 2. Índices de variabilidade da frequência cardíaca medidos nos atletas de jiu-jitsu nas diferentes táticas de lutas.
Guardeiro Passador
(n=12) (n=12) p
RR médio (ms) 892,8 ± 11,0 891,3 ± 17,6 0,944

Variância Total (ms2) 1961,9 ± 264,2 3112,9 ± 387,6 0,022

SDNN (ms) 56,6 ± 7,2 51,1 ± 3,6 0,579

RMSSD (ms) 30,3 ± 2,7 47,7 ± 4,7 0,003

pNN50 (%) 19,8 [12,5-26,8] 41,2 [33,1-60,3] 0,003

MBF (ms2) 578,3 ± 78,5 589,3 ± 56,1 0,921

BF (ms2) 877,2 ± 44,2 639,9 ± 47,1 0,003

BF (nu) 53,0 ± 2,9 43,6 ± 5,8 0,132

AF (ms2) 464,4 [328,9-571,5] 514,0 [470,4-531,6] 0,469

AF (nu) 43,0 ± 2,5 58,1 ± 3,4 0,002

BF/AF 1,9 [1,6-2,2] 1,1 [1,0-1,4] 0,037

SD1 (ms) 25,9 ± 1,8 34,4 ± 1,2 0,005

SD2 (ms) 57,1 ± 5,6 70,9 ± 4,9 0,108

SD1/SD2 0,48 ± 0,03 0,49 ± 0,03 0,805

Valores estão expressos como média ± erro padrão da média (epm), valores de mediana (25,75 e percentis). SDNN:
Desvio- padrão da média de todos os intervalos RR; RMSSD: Raiz quadrada da média do quadrado das diferenças entre
intervalos RR; pNN50: Percentagem de intervalos RR adjacentes com diferença de duração superior a 50 milissegundos;
MBF: Muito baixa frequência; BF: Baixa frequência; AF: Alta frequência; BF/AF: relação simpatovagal; SD1: desvio-
padrão da variabilidade instantânea batimento-a-batimento; SD2: desvio-padrão a longo prazo dos intervalos R-R
contínuos.

DISCUSSÃO

Os principais achados desse estudo foram que os atletas do JJB com predominância
do perfil tático guardeiro apresentaram, em relação aos lutadores com estilo de luta passa-
dor, alterações cardíacas representadas por reduzida variabilidade da frequência, atenuada
atividade vagal e elevada modulação simpática.

72 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Os exercícios aeróbicos realizados de forma crônica são efetivos no controle e/ou au-
mento da variabilidade da frequência cardíaca, principalmente por provocar um aumento da
modulação vagal cardíaca.14,15 Todavia, esse efeito cardioprotetor do treinamento físico sobre
a função autonômica parece estar associado à modalidade do exercício praticado.15–17 Os lu-
tadores avaliados em nosso estudo praticam o jiu jitsu, que é caracterizado como um es-
porte de luta com predomínio anaeróbio, aliado a um considerável recrutamento de força
e com alto componente isométrico.18 Esse fato poderia explicar em parte nossos achados,
ou seja, o motivo pelo qual os lutadores guardeiros apresentaram atenuada atividade vagal
cardíaca de repouso.
Normalmente os passadores são lutadores mais fortes e/ou pesados, e que se bene-
ficiam deste biotipo para gerar maior sobrecarga mecânica em seu adversário. Os guardei-
ros, por outro lado, são lutadores geralmente maiores e mais flexíveis, com vantagens para
a aplicação de alavancas a partir da força do adversário, e com isso executam por maior
tempo de luta a força isométrica.
A literatura é escassa em relação às mudanças produzidas na modulação autonômica
cardíaca em decorrência da prática habitual do JJB. Estudo prévio não evidenciou nenhuma
mudança nas medidas espectrais da VFC em lutadores de JJB ao ser comparados à indiví-
duos sedentários, e os autores demonstraram que o treinamento do JJB não se associa a
alterações na modulação autonômica cardiovascular em nenhuma das fases de periodização
do treinamento.19
Na prática de exercícios de força com alto componente isométrico, a modulação sim-
pática cardíaca permanece elevada, enquanto que a modulação parassimpática mantém-
-se reduzida,20,21 o que pode aumentar o risco de ocorrência de eventos cardiovasculares
agudos.22 Os exercícios de força (no qual se inclui o JJB) promove aumento da modulação
simpática e atenuação da modulação parassimpática cardíaca, principalmente naqueles
mais intensos.23
Embora seja importante entender como diferentes fatores do treinamento de força
podem alterar as respostas autonômicas, muitos deles não foram documentados. Como
exemplo, o tipo de contração muscular pode alterar a modulação autonômica. Durante o
exercício isométrico, a atividade simpática é impulsionada pela quantidade de massa mus-
cular utilizada. Nesse contexto, pode-se transpor esse fato para a posição de guarda no
JJB, onde esse estilo de luta provoca um alto recrutamento de grupamentos musculares,
que cronicamente pode afetar o controle intrínseco da modulação simpática.24
A disfunção autonômica cardíaca é caracterizada em parte pela diminuição da modula-
ção vagal cardíaca,25,26 o que pode desencadear o início e agravar o prognóstico de doenças
cardiovasculares.27 De fato, o comprometimento vagal cardíaco, detectado pela modulação

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 73


parassimpática reduzida, é um marcador de instabilidade elétrica cardíaca e demonstrou ser
um fator prognóstico independente para arritmias ventriculares e morte súbita. No cenário
clínico, a morte súbita resultante de arritmias cardíacas é uma importante causa de mor-
talidade.28 O aparecimento de grandes arritmias é geralmente considerado um fenômeno
imprevisível, associado muitas vezes à presença de fatores de risco cardiovasculares.
Evidenciou-se também que os lutadores guardeiros possuem uma maior modulação
simpática cardíaca na situação de repouso. Sabe-se que a realização de exercícios de força
(o que inclui o JJB) promovem alterações na modulação autonômica cardíaca, que perma-
necem por um longo período após a finalização da sessão.23,29
Níveis elevados de atividade simpática estão presentes em diversas doenças cardio-
vasculares (como infarto agudo do miocárdio, insuficiência cardíaca congestiva crônica e
hipertensão), e são reforçados pela desregulação das vias de controle e integração central
do equilíbrio autonômico.30 Em adição, diversos relatos acadêmicos demonstram que a hi-
peratividade simpática desempenha um
papel importante na gênese e progressão da hipertensão e danos em órgãos-al-
vo. Os mecanismos envolvidos na resposta pressórica não foram estudados no presente
estudo. Porém, pode-se prever que na sessão de exercícios de força, possivelmente ocorre
maior redução do retorno venoso, desativando os receptores cardiopulmonares.20
É interessante ressaltar que apesar de ter sido observado maior modulação simpática
cardíaca nos lutadores guardeiros (representado pelos maiores índices da banda espec-
tral de BFnu e da relação dos componentes BF/AF), esses valores não são considerados
exacerbados no contexto do aspecto clínico no que tange à saúde cardiovascular. Todavia,
mais pesquisas são necessárias, com evidências consistentes para melhor entendimento
do tema em questão.

CONCLUSÃO

Atletas do JJB com estilo de luta predominantemente guardeiro apresentam menor


modulação vagal e hiperatividade simpática cardíaca de repouso em comparação aos lu-
tadores de estilo passador.

REFERÊNCIAS
1. Takahashi R. Plyometrics: power training for judo - plyometric training with medicine balls.
National Strength Cond Assoc J. 1992;14(2):66-71.

74 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


2. Scarpi MJ, Conte M, Rossin RA, Skubs R, Lenk RE, Brant R. Associação entre dois diferentes
tipos de estrangulamento com a variação da pressão intraocular em atletas de jiu-jitsu. Arq
Bras Oftalmol. 2009;72(3):341-5.

3. Andreato LV, Julio UF, Panissa VL, Esteves JV, Hardt F, Moraes SM, et al. Brazilian Jiu-Jitsu
Simulated Competition Part I. J Strength Cond Res. 2015;29(9):2538-49.

4. Báez E, Franchini E, Ramírez-Campillo R, Cañas-Jamett R, Herrera T, Burgos-Jara C, et al.


Anthropometric characteristics of top-class Brazilian Jiu Jitsu athletes: Role of fighting style.
Int J Morphol. 2014;32(3):1043-50.

5. Garet M, Tournaire N, Roche F, Laurent R, Lacour JR, Barthélémy JC, et al. Individual Inter-
dependence between nocturnal ANS activity and performance in swimmers. Med Sci Sports
Exerc. 2004:36(12):2112-18.

6. Borresen J, Lambert MI. Autonomic control of heart rate during and after exercise: measure-
ments and implications for monitoring training status. Sports Med. 2008;38(8):633-46.

7. Hartwig TB, Naughton G, Searl J. Load, stress, and recovery in adolescent rugby union players
during a competitive season. J Sports Sci. 2009;27(10):1087-94.

8. Mazon J, Gastaldi A, Di Sacco T, Cozza I, Dutra S, Souza H. Effects of training periodization


on cardiac autonomic modulation and endogenous stress markers in volleyball players. Scand
J Med Sci Sports. 2013;23(1):114-20.

9. Borresen J, Lambert MI. Autonomic control of heart rate during and after exercise: measure-
ments and implications for monitoring training status. Sports Med. 2008;38(8):633-46.

10. Lee CM, Mendoza A. Dissociation of heart rate variability and heart rate recovery in well-trained
athletes. Eur J Appl Physiol. 2012;112(7):2757-66.

11. Jackson AS, Pollock ML. Generalized equations for predicting body density of men. Br J Nutr.
1978;40:497-504.

12. Siri WE. Body composition from fluid spaces and density: analysis of methods. In: Brozeck J,
Henschel A. Techniques for measuring body composition. Washington, DC: National Academy
of Science. 1961;233-244.

13. Heart rate variability: standards of measurement, physiological interpretation and clinical use.
Task Force of the European Society of Cardiology and the North American Society of Pacing
and Electrophysiology. Circulation. 1996;93(5):1043-65.

14. Sztajzel J, Jung M, Sievert K, Luna AB. Cardiac autonomic profile in different sports disciplines
during all-day activity. J Sports Med Phys Fitness. 2008;48(4):495-501.

15. Collier SR, Kanaley JA, Carhart R Jr, Frechette V, Tobin MM, Bennett N, et al. Cardiac auto-
nomic function and baroreflex changes following 4 weeks of resistance versus aerobic training
in individuals with pre-hypertension. Acta Physiol (Oxf). 2009;195(3):339-48.

16. Perez-Quilis C, Kingsley JD, Malkani K, Cervellin G, Lippi G, Sanchis-Gomar F. Modulation of


Heart Rate by Acute or Chronic Aerobic Exercise. Potential Effects on Blood Pressure Control.
Curr Pharm Des. 2017;23(31):4650-57.

17. D’Agosto T, Peçanha T, Bartels R, Moreira DN, Silva LP, Nóbrega AC, et al. Cardiac autonomic
responses at onset of exercise: effects of aerobic fitness. Int J Sports Med. 2014;35(10):879-85.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 75


18. Buchheit M, Gindre C. Cardiac parasympathetic regulation: respective associations with car-
diorespiratory fitness and training load. Am J Physiol Heart Circ Physiol. 2006;291(1):451-8.

19. Rezende RA, Santos DA, Silva Jr ND, Forjaz CL, Tinucci T. Fase do treinamento esportivo não
afeta a variabilidade da frequência cardíaca em atletas de jiu-jitsu. Rev Soc Cardiol Estado de
São Paulo. 2013;23(Suppl 3A):21-5.

20. Kingsley JD, Panton LB, McMillan V, Figueroa A. Cardiovascular autonomic modulation after
acute resistance exercise in women with fibromyalgia. Arch Phys Med Rehabil. 2009;90(9):1628-
34.

21. Heffernan KS, Kelly EE, Collier SR, Fernhall B. Cardiac autonomic modulation during re-
covery from acute endurance versus resistance exercise. Eur J Cardiovasc Prev Rehabil.
2006;13(1):80-6.

22. Seiler S, Haugen O, Kuffel E. Autonomic recovery after exercise in trained athletes: intensity
and duration effects. Med Sci Sports Exerc. 2007;39(8):1366-73.

23. Lima AHA, Forjaz CL, Silva GQ, Menêses AL, Silva AJ, Ritti-Dias RM. Acute effect of resis-
tance exercise intensity in cardiac autonomic modulation after exercise. Arq Bras Cardiol.
2011;96(6):498-503.

24. Seals DR. Influence of muscle mass on sympathetic neural activation during isometric exercise.
J Appl Physiol (18985). 1989;67:1801-6.

25. Kleiger RE, Miller JP, Bigger Jr JT, Moss AJ. Decreased heart rate variability and its association
with increased mortality after acute myocardial infarction. Am J Cardiol. 1987;59(4):256-62.

26. Ricardo DR, Almeida MB, Franklin BA, Araújo CG. Initial and final exercise heart rate transients:
influence of gender, aerobic fitness, and clinical status. Chest. 2005;127(1):318-27.

27. Chumaeva N, Hintsanen M, Hintsa T, Ravaja N, Juonala M, Raitakari OT, et al. Early atheros-
clerosis and cardiac autonomic responses to mental stress: a population-based study of the
moderating influence of impaired endothelial function. BMC Cardiovasc Disord. 2010;10:16.

28. Vanberg P, Atar D. Androgenic anabolic steroid abuse and the cardiovascular system. Handb
Exp Pharmacol. 2010;(195):411-57.

29. Holt AC, Plews DJ, Oberlin-Brown KT, Merien F, Kilding AE. Cardiac parasympathetic and
anaerobic performance recovery after high intensity exercise in rowers. Int J Sports Physiol
Perform. 2018;14(3):331-8.

30. Herring N, Paterson DJ. Neuromodulators of peripheral cardiac sympatho-vagal balance. Exp
Physiol. 2009;94(1):46-53.

76 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


06
“ Alterações posturais da coluna
vertebral e sua relação com
a morfologia do joelho em
jogadores de futebol

Wellington Danilo Soares André Augusto Dias Silveira


UNIMONTES UNIMONTES

Amélia Sthefanie Noronha e Silva Álvaro Parrela Piris


FUNORTE FASI

Taloanne Lara Durães Chaves Daniel Antunes Freitas


FUNORTE Unimontes

Ludmila Cotrim Fagundes Jomar Luiz Santos de Almeida


UNIMONTES FUNORTE

10.37885/201001866
RESUMO

Objetivo: Verificar as alterações posturais decorrente às variações do joelho em jogadores


categoria juvenil de futebol de um time profissional da cidade de Montes Claros – MG.
Métodos: Trata-se de uma pesquisa quantitativa, transversal e correlacional. A amostra
foi constituída de 29 jogadores na faixa etária de 15 a 17 anos (15,9 ± 0,7). Para avaliação
postural foi utilizado um simetrógrafo e o fio de prumo. Também foram coletados a idade,
peso, estatura e IMC dos participantes através do protocolo de IMC. Os dados foram
analisados por meio do Software Statistical Package for the Social Sciences – SPSS.
Resultados: Perante as posições dos jogadores, a maior prevalência são de zagueiro e
volante com um percentual de 24,1, já a prevalência das alterações posturais avaliadas
na coluna foi constatado um predomínio de hipercifose torácica em 75,9% e no joelho
foi encontrado o geno recurvatum equivalente a 41,4% dos atletas. Não houve correla-
ção estatisticamente significativa, verificado através do teste de correlação de Pearson,
entre alterações posturais da coluna vertebral com a morfologia do joelho. Conclusão:
Não houve correlação entre alterações posturais da coluna vertebral com a morfologia
do joelho, mas que algumas dessas modificações pode ser devido a posição tática do
jogador abrindo um leque para um nova pesquisa.

Palavras-chave: Postura, Coluna Vertebral, Joelho. Futebol.


INTRODUÇÃO

Os esportes qualificam-se por estabelecer padrões corporais específicos à modalida-


de praticada. A exposição a um cotidiano intenso e específico de exercícios físicos, típicos
de cada esporte, tem como resultado um efeito estético independente dos hábitos de vida.
Estas particularidades também se traduzem em modificações posturais que estão associadas
à eficiência do gesto desportivo, no entanto, em extenso prazo, pode evoluir para proces-
sos permanentes que limitam a pessoa a prática de atividades físicas (JÚNIOR; PASTRE;
MONTEIRO, 2004).
O futebol é um esporte conhecido mundialmente segundo a Confederação Brasileira
de Futebol – CBF, sendo uma das modalidades esportivas mais praticadas no Brasil, no
qual tem chamado a atenção de muitos jovens e adultos de ambos os sexos, por sua
facilidade em encontrar espaço na sua prática, sendo jogado por milhões de brasileiros
(GONÇALVES; AMER, 2012).
Como característica, o futebol tem períodos de alta e baixa intensidade, fazendo com
que seja uma preocupação para o grupo desportivo, podendo ter lesões acometidas durante
o próprio treino, prejudicando a performance da equipe (FORTE et al., 2017). As lesões físi-
cas tem como resultado o afastamento das atividades em campo, pelos traumas ocorridos
em algumas estruturas do corpo (FERREIRA et al., 2017).
As maiores prevalências de lesões causadas no futebol são em membros inferiores,
destacando-se para as entorses e contusões. A entorse é advinda de um movimento anor-
mal, geralmente rotacional, que lesiona ligamentos da articulação causando um estiramento,
ruptura parcial ou total; e a contusão é um trauma direto que danificam tecidos e músculos,
sem causar dano ósseo (FERREIRA et al., 2017).
A origem das lesões ortopédicas é proveniente de fatores extrínsecos que se desta-
cam: número excessivo de jogos, sobrecarga de exercícios, violação da regra do jogo; e
os fatores intrínsecos que são: sexo, idade, estabilidade articular, aptidão física (Almeida e
colaboradores, 2013). Essas condições determinam a necessidade dos aspectos particulares
de cada grupo de eventos que apresentam exigências fisiológicas e características técnicas
semelhantes, para desejar um bom desempenho físico, quanto à manutenção da saúde do
atleta, assim como a junção dessas condições (FERREIRA et al., 2017).
Para diagnosticar problemas posturais é necessário antes, realizar uma boa avaliação
postural, que precisa ser completa e requer do examinador grande habilidade, pois o as-
pecto de várias anormalidades posturais é muitíssimo sutil. O profissional deve ser capaz
de separar as partes do corpo, e logo após, avaliar a soma das partes em relação a toda
estrutura corporal (PALMER; EPLER, 2000).

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 79


Uma boa postura requer um alinhamento corporal com eficácias biomecânicas e fisio-
lógicas máximas, diminuindo os estresses e sobrecargas atribuídos às estruturas de apoio
pelos efeitos da gravidade. Na postura certa, a linha da gravidade passa por entre os eixos de
todas as articulações com os fragmentos corporais ordenado verticalmente, localizado à nível
de S2 (segunda vértebra sacral). Esse é o ponto de menção no qual são avaliadas as reper-
cussões gravitacionais sobre os segmentos corporais do indivíduo (PALMER; EPLER, 2000).

OBJETIVO

Verificar as alterações posturais que podem apresentar decorrente às variações


do joelho em jogadores de futebol da categoria juvenil de um time profissional da cidade
de Montes Claros.

MÉTODOS

Trata-se de uma pesquisa com abordagem quantitativa, transversal e correlacio-


nal. A amostra foi constituída de 29 jogadores do time profissional de futebol da categoria
juvenil de um time profissional da cidade de Montes Claros – MG, onde os integrantes
da pesquisa participaram de uma avaliação postural. Foram incluídos todos aqueles que
aceitarem participar da pesquisa de forma voluntária e que aceitarem assinar o termo de
consentimento livre e esclarecido e excluído os atletas que tiverem algum comprometimento
que impeça a execução do estudo seja ele físico ou psicológico.
A coleta de dados foi dívida em três etapas. A primeira etapa os atletas responderam
o questionário, a segunda etapa foram coletados peso e altura e em seguida foram levados
em uma sala reservada para a realização da avaliação que foi realizada individualmen-
te. A avaliação postural foi efetuada no mês de abril de 2018 no campo de concentração da
equipe de futebol pesquisada.
A avaliação postural foi mensurada através do simetrógrafo e o fio de prumo. Onde o
participante posicionou centralizado e a frente do simetrógrafo que é divido por blocos de 10
cm por 25 cm e possui as seguintes espessuras: 0,31 cm, 0,62 cm, 0,93 cm, 1,25 cm, 1,87
cm e 2,25 cm. O fio de prumo ficou suspenso em uma barra acima da cabeça, e o peso de
chumbo foi fixado em conformidade com o anterior do maléolo lateral na vista lateral, a meio
caminho entre os calcanhares na vista posterior.
Os dados foram analisados por meio do software Statistical Package for the Social
Sciences – SPSS, versão 22.0 para Windows. O presente estudo foi aprovado pelo comitê
de ética em pesquisa da Associação Educativa do Brasil – SOEBRAS, sob o parecer con-
substanciado nº 22669915 – 0049.71.

80 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


RESULTADOS

Os resultados encontrados a partir dos dados coletados estão apresentados nas tabe-
las abaixo. A tabela 1 nos mostra o mínimo, máximo, média e desvio padrão. Com a idade
variando de 15 a 17 anos, o índice de massa corporal apresentando abaixo, normal e acima
do peso frente a estatura e o peso de todos os participantes da pesquisa.Foi possível obser-
var na tabela 3 a prevalência das alterações posturais avaliadas, na coluna foi observado
um predomínio na hipercifose torácica em 22 atletas (75,9%) e no joelho foi encontrado 12
atletas com o geno recurvatum, equivalente a 41,4%.

Tabela 1. Apresenta os dados descritivos do grupo amostral (n=29).


VARIAVEL MINIMO MÁXIMO X DP
Idade 15 17 15,9 ± 0,73
Peso 51,0 82,0 63,6 ± 7,7
Estatura 165 190 177,0 ± 6,3
IMC 16,00 28,00 20,37 ± 2,3
* X = Média/ DP = Desvio Padrão/ IMC= Índice de Massa Corporal

A tabela 2 demonstra que todas as posições dos jogadores, e a maior prevalência


de todos os 29 participantes, são de zagueiro e volante com 7 (sete) atletas, dando um
percentual de 24,1.

Tabela 2. Frequência real e absoluta das variáveis pesquisadas


VARIÁVEL OPÇÕES FREQUÊNCIA PERCENTUAL(%)
Normal 5 17,2
Hiperlordose cervical 1 3,4
Hipercifose torácica 22 75,9
Coluna Hiperlordose lombar 1 3,4
Joelho Normal 6 20,7
Varo 7 24,1
Valgo 4 13,8
Recurvatum 12 41,4

Foi possível observar na tabela 3 a prevalência das alterações posturais avaliadas,


na coluna foi observado um predomínio na hipercifose torácica em 22 atletas (75,9%) e no
joelho foi encontrado 12 atletas com o geno recurvatum, equivalente a 41,4%.

Tabela 3. Relativa às alterações posturais encontradas na vista anterior e lateral.


VARIÁVEL OPÇÕES FREQUÊNCIA PERCENTUAL(%)
Normal 5 17,2
Hiperlordose cervical 1 3,4
Hipercifose torácica 22 75,9
Coluna Hiperlordose lombar 1 3,4
Joelho Normal 6 20,7
Varo 7 24,1
Valgo 4 13,8
Recurvatum 12 41,4

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 81


Do questionário aplicado expôs que, de 29 atletas, 2 possuem distúrbio respiratório
sendo ele a bronquite, 2 realizaram algum tipo de cirurgia recentemente, 4 tiveram alguma
lesão atualmente sendo eles na coxa, tornozelo e joelho, e 1 sente desconforto no joelho.
Não houve correlação estatisticamente significativa, verificado através do teste de corre-
lação de Pearson, entre alterações posturais da coluna vertebral com a morfologia do joelho.

DISCUSSÃO

O estudo mostrou a maior prevalência em hipercifose torácica no total de 75,9%, com


ênfase que todos os laterais esquerdos possuem a alteração, essa postura pode estar re-
lacionada ao direcionamento que o jogador tem em relação ao posicionamento da bola ou
pode também ser pelo fato de ter desequilíbrios musculares como abdominais fortes, flexores
de quadril forte, extensores das costas fracos.
O geno recurvatum do joelho com 41,4% dos participantes e todos os atacantes com a
morfologia citada. (RIBEIRO et al, 2003) em sua pesquisa mostra uma assimetria de joelho
entre 54,7% a 96%. Já Klenipaul, Mann e Santos (2010) em seus dados, relata uma maior
alteração em hiperextensão de joelho, com uma incidência de 33% dos casos.
Um dos motivos para tal alteração pode ser a falta de alinhamento entre a fíbula e o
maléolo, e também com supostas lesões do ligamento cruzado anterior (LCA), que é bem
comum em jogadores de futebol, pode estar ligado também com o conjunto de cargas e pico
de força decorrente das competições semelhante aos achados de Bastos e colaboradores
(2009) os atletas de resistência apresentaram joelhos em recurvatum com 33,33%,seu for-
mato biarticular e o desequilíbrio de forças em relação ao quadríceps femoral, podem ser
causas de importantes retrações musculares, o que poderia explicar alterações na postura,
como joelho em recurvatum, outra hipótese a ser considerada é que pode ser causado por
retração da musculatura estática da perna. O músculo sóleo tensionado, devido a sua ori-
gem na linha solear da tíbia, leva esse segmento no sentido anteroposterior, aumentando o
ângulo tibiotársico e, como consequência, a hiperextensão do joelho.
A apuração realizada na ginástica olímpica relacionada a desvios posturais de atle-
tas amadoras feita por (OSÓRIO; TEIXEIRA, 2007) revela achados de maior prevalência
em hipercifose torácica representando 24,14% das outras alterações e o geno recurvatum
30,77% congênere as morfogias encontradas no estudo presente e o mesmo justifica a des-
coberta pela fraqueza dos músculos paravertebrais torácicos e alongamentos dos músculos
isquiostibiais e poplíteos seguidos de encurtamento do quadríceps pela exigente repetição
e resistência imposta de movimentos .
Júnior, Pastre e Monteiro (2004) apresentaram resultados em que, constatou nos joe-
lhos retração dos extensores em 73% dos casos e dos flexores em 60% em atletas do

82 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


sexo masculino argumentando que estas alterações estão fortemente associadas com a
biomecânica da prova do atleta, os desequilíbrios musculares retracionais, déficit de força
muscular, variação do tônus e trofismo muscular, dominância lateral, entre outros fatores.
A segunda maior prevalência na pesquisa em se tratando de alterações posturais no
joelho foi o varismo com 24,1 % do percentual equiparando com Veiga, Daher e Morais
(2001) onde expõem um percentual de 92,3% e explica que o fato de ser baixo o índice
de alinhamento em valgo nos atletas de futebol, fator também explícito nos resultados do
presente estudo com 13,8% dos casos, pode ser devido a prática do futebol competitivo
favorecer essa varização dos joelhos por causa dos micro traumas de repetição, impostos
por treinamentos exaustivos sobre os côndilos femorais internos, em especial nos atletas
jovens que encontram-se com a placa epifisária ainda aberta e completa afirmando que
além disso, existe uma tendência dos treinadores de futebol em dar preferência aos atletas
candidatos ao esporte competitivo que apresentem alinhamento em varo, devido a uma
filosofia de considerá-los mais habilidosos e com maior índice técnico.
Ferreira e colaboradores (2017) afirmam que as maiores prevalências de lesões cau-
sadas no futebol são em membros inferiores com achado de 82,14% enquanto no estudo
presente obtivemos resultado de 1,16% através do questionário feito no dia da avaliação.
A localização das lesões registradas foi similar à encontrada em outros estudos, afetan-
do predominantemente as articulações do tornozelo e joelho e os músculos da coxa equipa-
rando com Klenipaul, Mann e Santos (2010) e Almeida e colaboradores (2013). Já Ribeiro e
colaboradores (2003) afirmam que os desalinhamentos posturais associados às caracterís-
ticas próprias do esporte (excesso de treino, movimentos repetitivos e o contato direto entre
os atletas) e às características individuais de cada um podem predispor este à ocorrência
de mais lesões em relação ao jogador que não apresenta qualquer alteração postural.
Enquanto a análise de pesquisa feita por Gonçalves e Amer (2012) foi verificado que o
segundo maior segmento com alterações posturais foi a coluna com a hiperlordose lombar,
pois o não alinhamento postural gera sobrecarga e esforço maior sobre a articulação, solici-
tando o segmento de maneira biomecanicamente incorreta, criando estresse e estiramento
de partes moles. E em terceiro o joelho recurvatum e de acordo Ribeiro e colaboradores
(2003) teve o maior resultado de alterações sendo hiperlordose lombar e o valgismo.
Existe uma crescente na produção científica avaliando prevalências das alterações
posturais da coluna vertebral em jogadores de futebol mais pouco se investigou a relação
desses desvios posturais com as variações de joelho, ou seja, o que a morfologia do joelho
poderia influenciar na coluna do atleta seja em treinos ou jogos oficiais observando a posição
tática do mesmo, limitando a pesquisa de um caráter comparativo com outros estudos. Não
encontramos nenhum artigo fazendo essa correlação, o que nos implica fazer um alerta a

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 83


esse assunto, apesar de não haver uma correlação considerável encontrada, os jogadores
possuem uma postura no futebol que os levam a ter alterações posturais.

CONCLUSÃO

A partir dos dados apresentados nesse estudo conclui-se que não houve correlação es-
tatisticamente significativa entre alterações posturais da coluna vertebral com a morfologia do
joelho, mas que algumas dessas modificações podem ser devido a posição tática do jogador.
É considerável que seja realizado mais pesquisas analisando a posição tática dos
jogadores com os desvios neles ponderados, pois a avaliação postural também pode auxi-
liar como uma estratégia diagnóstica para identificação dos desequilíbrios musculares nas
regiões corporais.
Sendo assim sugere- se novas investigações cientificas analisando a rotina de pre-
paração física com os exercícios e alongamentos detalhados para verificar se a sequência
passada possui correlação ou influencia a maior incidência de hipercifose torácica acompa-
nhada do geno recurvatum, pois, o treino desportivo com base em repetições traz consigo o
desenvolvimento de alterações de força, desequilíbrio osteoarticulares, flexibilidade, equilibro
e coordenação motora, sendo estes, alguns fatores para surgimento de problemas posturais.

REFERÊNCIAS
1. ALMEIDA, P. S. M.; SCOTTA, A. P.; PIMENTEL, B. M. Incidência de lesão musculoesque-
lética em jogadores de futebol. Revista Brasileira de Medicina do Esporte, v. 19, n. 2,
p.112-115, 2013. Disponível em: < https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pi-
d=S1517-86922013000200008>.

2. BASTOS, F. N.; PASTRE, C. M.; JÚNIOR, J. N. et al. Correlação entre padrão postural em
jovens praticantes do atletismo. Revista Brasileira de Medicina do Esporte, v. 15, n. 6, p.
432-435, 2009. Disponível em: < https://www.scielo.br/pdf/rbme/v15n6/a06v15n6.pdf>.

3. FERREIRA, M. C.; MENDONÇA, R. H. P.; BATISTA, C. G. et al. Prevalência de lesões no


futsal: estudo de caso com uma equipe masculina adulta. Coleção Pesquisa em Educação
Física, v. 16, n. 1, p. 115-122, 2017. Disponível em: < https://www.researchgate.net/publica-
tion/315471988_Prevalencia_de_lesoes_no_futsal_estudo_de_caso_com_uma_equipe_mas-
culina_adulta>.

4. FORTE, P.; MORAIS, J. E.; BARBOSA, T. M. et al. Prevalência de alterações posturais em


crianças e jovens praticantes de futebol: um estudo descritivo. Revista de Educação Física,
v. 86, n. 2, p. 77-87, 2017. Disponível em: < https://revistadeeducacaofisica.emnuvens.com.
br/revista/article/view/207>.

84 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


5. GONÇALVES, M. A.; AMER, S. A. K. Alterações posturais e lesões do aparelho locomotor em
atletas femininas de futsal de Caçador/SC. Ágora: Revista de Divulgação Científica, v.16,
n. 2, p.292-302, 2012. Disponível em: < http://www.periodicos.unc.br/index.php/agora/article/
view/118>.

6. JÚNIOR, J. N.; PASTRE, C. M.; MONTEIRO, H. L. Alterações posturais em atletas brasileiros


do sexo masculino que participaram de provas de potência muscular em competições internacio-
nais. Revista Brasileira de Medicina do Esporte, v. 10, n. 3, p.195-198, 2004. Disponível em:
< https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-86922004000300009&lng=pt>.

7. KENDAL, F. P.; MCCREARY, E. B.; PROVANCE, P. G. Músculos provas e funções. 4ed. São
Paulo. Manole. 1995.

8. KLENIPAUL, J. F; MANN, L; DOS SANTOS, S. G. Lesões e desvios posturais na prática de


futebol em jogadores jovens. Fisioterapia e Pesquis, v. 17, n. 3, p.236-241, 2010. Disponível
em: < https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-29502010000300009>.

9. MAGEE, D. Avaliação Musculoesquelética. 5ed. São Paulo. Manole. 2005.

10. OSÓRIO, F. C. A.; TEIXEIRA, L. Ginástica olímpica: Principais alterações posturais, radiológicas
e musculares relacionadas a coluna vertebral de atletas amadoras competitivas. Cadernos Ca-
milliani, v. 8, n. 2, p. 53-63, 2007. Disponível em: < https://repositorio.usp.br/item/001632020>.

11. PALMER, M. L.; EPLER, M. E. Fundamentos das Técnicas de Avaliação Musculoesquelética.


2ed. Rio de Janeiro. Guanabara Koogan. 2000.

12. RIBEIRO, C. Z. P.; AKASHI, P. M. H.; SACCO, I. C. N. et al. Relação entre alterações pos-
turais e lesões do aparelho locomotor em atletas de futebol de salão. Revista Brasileira de
Medicina do Esporte, v. 9, n. 2, p. 91-7, 2003. Disponível em: < https://www.scielo.br/pdf/
rbme/v9n2/v9n2a05.pdf>.

13. SANTOS, J. B.; TOLEDO, E; REIS, P. F. et al. Alterações Posturais em atletas de jogadores
de futebol de uma equipe profissional na faixa etária de 14 a 35 anos de idade. Revista Bra-
sileira de Prescrição e Fisiologia do Exercício, v. 9, n. 50, p.772-781, 2014. Disponível em:
< http://www.rbpfex.com.br/index.php/rbpfex/article/view/689>.

14. VEIGA, P. H. A.; DAHER, C. R. M.; MORAIS, M. F. F. Alterações posturais e flexibilidade da


cadeia posterior nas lesões em atletas de futebol de campo. Revista Brasileira de Ciências
do Esporte, v. 33, n. 1, p. 235-248, 2011. Disponível em: < https://www.scielo.br/scielo.php?s-
cript=sci_arttext&pid=S0101-32892011000100016>.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 85


07
“ Analise da disciplina de
pedagogia do esporte na
grade curricular dos cursos de
educação física na cidade de
São Paulo.

Denis Santos Caro


UGF

Antonio Coppi Navarro

10.37885/201001892
RESUMO

Este artigo analisou a grade curricular dos cursos de graduação em Educação Física
da cidade de São Paulo no modo presencial desta nova tendência no campo da peda-
gogia dos esportes. O objetivo foi pesquisar quais cursos já contam com a disciplina
Pedagogia do Esporte na grade curricular ou nomes parecidos, na investigação foram
encontrados os nomes Pedagogia do Esporte, Fundamentos Didáticos Pedagógicos
do Esporte e Processos Pedagógicos do Desporto. A Pedagogia do Esporte no Brasil
teve forte influência de autores portugueses que discutiam o tema dentro dos esportes
coletivos e foram de suma importância para o avanço no campo teórico (BOLONHINI &
PAES, 2009). No estudo o ponto de partida foi o endereço eletrônico http://emec.mec.
gov.br/ que tem cadastrado 26 universidades com o curso de educação física. O próximo
passo e muito importante são as universidades pesquisadas que foram as que forneciam
a grade curricular em seu endereço eletrônico principal. Conclui-se que a Pedagogia do
Esporte está introduzida no ensino superior paulistano de forma inicial, pois ainda as
ideias consideradas tradicionais norteiam as disciplinas do curso.

Palavras-chave: Pedagogia do Esporte, Análise Curricular, Ensino Superior, São Paulo.


INTRODUÇÃO

Os novos estudos na área de Educação Física nos campos da pedagogia do esporte e


dos jogos desportivos coletivos estão trazendo uma nova metodologia para ajudar a acres-
centar na prática de alunos/atletas de colégios, clubes, projetos sociais entre outros do país.
Para um melhor aproveitamento desta nova metodologia é necessário investigar se os
cursos que formam profissionais na área de educação física estão sendo formados também
com as ideias da Pedagogia do Esporte além da proposta que já norteia as grades curricu-
lares na cidade de São Paulo.
O que se observa na Educação Física é que as novas pesquisas vêm sendo pou-
co aproveitadas, não havendo transferência da teoria para a prática, fazendo com que, o
professor de Educação Física não aprenda em toda sua totalidade, os avanços científicos
existentes (GUEDES, GUEDES, 1993 APUD FERREIRA,2009).
Segundo Santana (2003) fica evidentemente que a experiência de vida é relevante,
mas em se tratando de professores, deixa um hiato: professores precisam se orientar, tam-
bém, por teorias.
O presente estudo não buscou comparar metodologias a fim de buscar a melhor pro-
posta para a formação de novos professores, mas investigar quais universidades da cidade
de São Paulo já oferecem os novos estudos em pedagogia do esporte para melhor formar
os futuros profissionais que atuarão no mercado de trabalho.

MATERIAIS E MÉTODOS

Este estudo procurou abordar os cursos de Educação Física que oferecem na grade
curricular a disciplina de Pedagogia do Esporte ou similar na cidade de São Paulo. A pesquisa
se apoiou nos principais autores que estudam a Pedagogia do Esporte no Brasil, que fazem
parte da grade curricular do curso de pós-graduação latu senso da Universidade Gama Filho
em Pedagogia dos Esportes.
O ponto de partida deste estudo foi uma pesquisa documental no endereço eletrônico
http://emec.mec.gov.br que tem cadastrado todas as instituições de ensino superior do país.
Lüdke e André (1986) uma análise documental identifica informações factuais nos textos/
documentos tendo por base questões ou hipóteses levantadas. A análise documental é uma
técnica valiosa, porém pouco utilizada pelos pesquisadores do Brasil.
Em seguida selecionamos o estado de São Paulo, o município de São Paulo e o
curso de Educação Física de forma presencial, o endereço eletrônico forneceu 26 institui-
ções. No cadastro de cada instituição procuramos a informação sítio que fornece o endereço
eletrônico oficial de cada curso de Educação Física da cidade de São Paulo.

88 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Acessando cada endereço eletrônico, pesquisamos as instituições que forneciam matriz
ou grade curricular e se caso essa informação não estivesse disponibilizada, solicitávamos
através dos espaços fale com o coordenador ou fale conosco.
Um questionário contendo oito perguntas fechadas, impressas em folha sulfi-
te A4 para preenchimento a mão foi entregue aos professores do dia 21 de outubro a 06 de
novembro de 2012.
O professor universitário é responsável pela formação aparecendo como o agente pro-
dutor de saberes, de gerações, construindo a futura identidade profissional dos educadores
(KRUGER; KRUG, 2009).
Este questionário teve abordagem quantitativa que segundo Guedes & Guedes (2006)
alcança uma maior objetividade e exatidão quando expresso de forma numérica.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Nos endereços eletrônicos das instituições foi encontrada a primeira dificuldade, pois
10 instituições não apresentaram as grades curriculares que formam o curso. Através dos
espaços fale conosco ou fale com o coordenador tentou-se pedir a matriz curricular com as
10 instituições, mas não se teve resposta.
Buscou-se então das 16 instituições restantes quais tinham a disciplina de Pedagogia
do Esporte ou algum nome similar podendo ser no curso de licenciatura ou bacharelado e
foram encontrados os nomes Pedagogia do Esporte, Fundamentos Didáticos e Pedagógicos
dos Esportes e Processos Pedagógicos do Desporto.
Essas disciplinas foram encontradas em 3 cursos da cidade de São Paulo que nos
mostra aproximadamente 15 por cento das instituições que ofereceram grade curricular. Dos
3 cursos dois professores responderam o questionário por livre e espontânea vontade, pois
um dos cursos estava sem professor no período da pesquisa.
Colocaremos a respostas dos dois questionários da seguinte maneira abaixo.
Apenas uma resposta significa que os dois professores assinalaram a mesma alternativa
enquanto duas respostas significa que cada professor optou por uma resposta.

1. Relevância da disciplina por parte da instituição e corpo docente.

( ) Fraco ( ) Regular ( X ) Bom ( ) Muito Bom

2. Relevância da disciplina por parte dos alunos.

( ) Fraco ( ) Regular ( X ) Bom ( ) Muito Bom

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 89


3. Aplicação de conteúdos abordados nas disciplinas que ensinam esportes coleti-
vos.

( ) Fraco ( ) Regular ( X ) Bom ( ) Muito Bom

4. Aplicação dos conteúdos abordados nos esportes coletivos na Pedagogia do Es-


porte.

( ) Fraco ( ) Regular ( X ) Bom ( X ) Muito Bom

5. Interdisciplinariedade.

( ) Fraco ( ) Regular ( X ) Bom ( X ) Muito Bom

6. Aplicação das abordagens ensinadas no atual mercado de trabalho.

( ) Fraco ( X ) Regular ( ) Bom ( ) Muito Bom

7. Quanto a contribuição da nova proposta na Pedagogia dos Esportes para os alunos


na educação física escolar.

( ) Fraco ( ) Regular ( ) Bom ( X ) Muito Bom

8. Perspectivas para inclusão da disciplina em mais cursos na cidade de São Paulo


que atualmente são três.

( ) Fraco ( X ) Regular ( ) Bom ( X ) Muito Bom

A concepção que até os dias atuais prevalece em muitos cursos, na maioria institui-
ções privadas, é a de um currículo que enfatiza disciplinas práticas esportivas, execução e
demonstração dos movimentos por parte do aluno incluindo provas de habilidades práticas.
Este currículo denominado tradicional-esportivo teve início no final da década de 60 e se
firmou na década de 70 ajudando na esportivização da educação física (BETTI, 1996).
Na prática não se estava atendendo efetivamente ao mercado de trabalho em quantida-
de e qualidade que vivia um momento além das aulas de educação física na escola. Na for-
mação do profissional em Educação Física não havia matérias pedagógicas permitindo que
ex-atletas continuassem a ocupar espaços que necessitavam outro tipo de profissional que
seria formado por escolas superiores (SOUZA NETO, 2004).
Um dos obstáculos em Pedagogia do Esporte está relacionado à concepção que o
professor ou técnico tem sobre o processo de ensino e aprendizagem do esporte, não

90 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


de forma generalizada, mas com a ideia inatista de que o aluno nasce com certo talento.
Logo sua prática seria apenas procurar talentos esportivos (REVERDITO; SCAGLIA; PAES,
2009). Os novos estudos em Pedagogia do Esporte propõem novas tendências que fujam
do modelo tradicional (LEONARDO; SCAGLIA; REVERDITO 2009).
Nos anos 80 surgiu o modelo técnico-científico, que iria se consolidar na década de 90,
que trata a prática de forma diferente. Apesar de limitações, o aluno aprende o ensinar para
ensinar através de sequências pedagógicas que na prática dão ênfase ainda na execução
dos movimentos (BETTI, 1996).
Na Educação Física tradicional, o aluno considerado como o que realiza movimen-
tos errôneos é o que a técnica não se assemelha com o gesto do atleta de alto nível
(DAOLIO; VELOSO, 2008).
Para Souza Neto (2004) o objetivo dessa nova proposta dentro da educação física era
superar um currículo centrado em conteúdos ginásticos esportivos, buscando também um
reconhecimento do curso no campo científico.
A Educação Física passou então a se voltar da prática para a teoria, havendo uma
valorização do conhecimento científico para a tomada de decisões do profissional. Também
foi observada uma mudança com relação a estratégia de aula para a inclusão de todos os
alunos em aulas práticas (DARIDO, 1995).
Segundo Benites; Souza Neto; Hunger (2008) o discurso agora é outro, a formação
está voltada para privilegiar um educador competente, especialista em suas funções, apto
para o mercado de trabalho e imprescindível para a sociedade.
Kruger; Krug (2009) reforçam a necessidade de pensar a docência no ensino superior
sobre o processo de formação, sobre o pensar e agir do professor no âmbito educativo e
reconstruir cada parte das experiências no percurso formativo.
Há uma enorme distância entre o que os professores acreditam que estão ensinando
e o que realmente estão ensinando, a distância entre teoria e a prática fica evidente porque
a experiência fica baseada no esporte que o professor ex-jogador praticou (REVERDITO;
SCAGLIA; PAES, 2009).
A Pedagogia do Esporte precisa refutar este modelo que se baseia na técnica recuperan-
do a dimensão simbólica inerente às práticas tradicionais humanas (DAOLIO; VELOSO, 2008).

CONCLUSÃO

Durante o curso e realizando o presente estudo fica claro o embate entre duas meto-
dologias da Educação Física. A que já existe na maioria dos currículos não só da cidade
de São Paulo e que ainda não sofreu grande alteração desde os anos 70 contra uma nova

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 91


metodologia que por enquanto não está sendo bem utilizada na formação dos professores
de Educação Física.

REFERÊNCIAS
1. BENITES, L. C.; SOUZA NETO, S.; HUNGER, D. O processo de constituição histórica
das diretrizes curriculares na formação de professores de Educação Física. Educação e
Pesquisa, São Paulo, v.34, n.2, p. 343-360, 2008.

2. BETTI, I. C. R.; BETTI, M. Novas perspectivas na formação profissional em educação


física. Motriz, v. 2, n. 1, p. 10-15, 1996.

3. BOLONHINI, S. Z.; PAES, R. R. A proposta pedagógica dos teaching games for unders-
tanding: Reflexões sobre a iniciação esportiva. Pensar a prática, v. 12, n. 2, p. 1-4, 2009.

4. DAOLIO, J.; VELOSO, E. L. A técnica esportiva como construção cultural: Implicações


para a pedagogia do esporte. Pensar a prática, v. 11, n. 1, p. 9-16, 2009.

5. DARIDO, S. C. Teoria, prática e reflexão na formação profissional em educação física.


Motriz, v. 1, n. 2, p. 124-128, 1995.

6. FERREIRA, H. B. Pedagogia do esporte: identificação, discussão e aplicação de proce-


dimentos pedagógicos no processo de ensino-vivência e aprendizagem da modalidade
basquetebol. 2009. 259f. Dissertação (Mestrado em Educação Física)- Faculdade de Educação
Física. Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2009.

7. GUEDES, D. P.; GUEDES, J. E. R. P. Manual Prático Para Educação Física. São Paulo:
Manolé, 2006.

8. KRUGER, L. G.; KRUG, H. N. Licenciatura em Educação Física: Concepções a partir da


Vivência Experienciada dos Professores do Ensino Superior em seu Percurso Formativo.
Movimento, Porto Alegre, v. 15, n. 1, p. 51-70, 2009.

9. LEONARDO, L.; SCAGLIA, A. J.; REVERDITO, R. S. O ensino dos esportes coletivos: me-
todologia pautada na família dos jogos. Motriz, v. 15, n. 2, p. 236-246, 2009.

10. LUDKE, M.; ANDRÉ, M. E. D. A. Pesquisa em Educação: Abordagens Qualitativas. São


Paulo: EPU. 1986.

11. REVERDITO, R. S.; SCAGLIA, A. J.; PAES, R. R. Pedagogia do esporte: panorama e análise
conceitual das principais abordagens. Motriz, v. 15, n. 3, p. 600-610, 2009.

12. SANTANA, W. C. A pedagogia do esporte e a moralidade infantil. 2003. 146f. Dissertação


(Mestrado em Educação Física)- Faculdade de Educação Física. Universidade Estadual de
Campinas, Campinas, 2003.

13. SOUZA NETO, S. A formação do profissional de educação física no Brasil: Uma história
sob a perspectiva da legislação federal no século XX. Revista Brasileira de Ciência do
Esporte, Campinas, v. 25, n. 2, p. 113-128, 2004.

92 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


08
“ Análise pedagógica das
vantagens da prática judoista na
escola para crianças do primeiro
ao quinto ano

Gabriel Gomes da Rocha


UFRRJ

Luis Carlos Feitosa


UFRRJ

Ney Evangelista Junior


UFRRJ

Marília Alves Moreira Pinto


UFRRJ

Lohayne Soares Viturino


UNIVERSO

10.37885/201102244
RESUMO

O presente estudo é uma pesquisa descritiva, que segundo Gil (2006, p.44) “têm como
objetivo primordial a descrição das características de determinada população ou fenô-
meno ou o estabelecimento de relações entre variáveis.” Dessa forma, através de um
questionário fechado e aberto buscou-se verificar análise pedagógica das vantagens
da prática judoista na escola para crianças do primeiro ao quinto ano. Sendo assim,
Identificar o judô promove o desenvolvimento cognitivo, afetivo e motor, verificar se o judô
promove a interdisciplinaridade e verificar se o judô promove inclusão social. Em virtude
das respostas dos professores entrevistados, sendo 100% deles, o desenvolvimento dos
aspectos cognitivo, afetivo e motor nas aulas é de extrema necessidade e fundamental
importância para o desenvolvimento dos alunos nessa faixa etária, em virtude do esporte
(judô) ser considerado um estilo de vida é notório a inserção da criança ao esporte.

Palavras-chave: Judô, Benefícios, Criança, Escola.


INTRODUÇÃO

Esquecemos muitas vezes é que as lutas não se resumem apenas a técnicas, elas
também ensinam aos seus praticantes a disciplina, valores tais como respeito, cidadania
e ainda buscam o autocontrole emocional, o entendimento da história da humanidade, a
filosofia que geralmente acompanha sua prática e acima de tudo, o mais importante, que é
respeito pelo seu próximo. (JÚNIOR E SANTOS, 2014)
Os PCNs dizem o seguinte: “as lutas são disputas em que os oponentes devem ser
subjugados, com técnicas e estratégias de desequilíbrio, contusão, imobilização ou exclusão
de um determinado espaço na combinação de ações de ataque e defesa”. E seus objetivos
nas escolas são de compreensão por parte do educando do ato de lutar (por que lutar, com
quem lutar, contra quem ou contra o que lutar). (BRASIL,1998)
Os efeitos benéficos do judô são admiráveis, sendo ele adaptado a idade e as neces-
sidades do aluno; o mesmo não tendo seu corpo ainda formado irá ser prejudicado se for
exposto a exercícios intensos, mas o judô trabalhado de maneira certa pode trazer muitos
benefícios como: saúde e desenvolvimento. Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais
(PCNs), “A construção do gesto nas lutas: vivência de situações que envolvam perceber,
relacionar e desenvolver as capacidades físicas e habilidades motoras presentes nas lutas
praticadas na atualidade (capoeira, caratê, judô etc.). (BRASIL,1998; p. 97)
O judô foi criado por Jigoro Kano no Japão em 1882, baseado na arte milenar deno-
minada Ju Jutsu, e tem por objetivo fortalecer físico, intelecto e o espírito, além de defesa
pessoal utilizando a força do oponente contra a si próprio. O mesmo pode ser introduzido
em qualquer idade, para a criança é uma atividade educativa bem notável e requer questões
não só no âmbito esportivo como no cultural, social e educacional e assim transformando
de forma positiva a criança e a instituição de ensino. (MESQUITA, 2014)
Para Queiroz (2010) os alunos praticantes de judô na escola tem uma melhoria não só
no âmbito escolar mais em sua vida pessoal, o fato do judô se tratar de uma luta totalmente
disciplinar, é notável nos alunos que há melhorias também nos aspectos sociais, os alunos
passam a ser mais participativos, diminui a agressividade, há melhoria no convívio familiar,
a conscientização dos seus deveres, e assim mostra que o judô praticado na escola vira
uma filosofia de vida levada pelo aluno a todos os lugares em que ele frequenta, formando
assim uma melhoria significativa no desenvolvimento do praticante como cidadão.
O judô ajuda na parte cognitiva da criança, pois segundo Jigoro Kano “O judô não é
só um esporte, é uma filosofia de vida”, onde o respeito e a disciplina são essenciais, com
isso podemos unir a história do judô passada para a criança com a teoria e vivencia na pra-
tica, nessa fase entre 6 á 10 anos a criança passa por mudanças e assim começam a fazer
semelhanças dos fundamentos teóricos coma prática. (SALLES, 2010, p.1)

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 95


O judô ajuda na parte psicomotora das crianças, por ser um esporte de contato e de
movimentação constante com exercícios pré-determinados, o judô é um dos esportes mais
indicados para as crianças do primeiro ao quinto ano escolar, de acordo com Vygotsky, pois
é nessa faixa etária que o aparelho locomotor da criança está em desenvolvimento, com
atividades lúdicas que tem como objetivo reter a atenção e o interesse das crianças para a
modalidade, e estimular a criança para que ela não perca o interesse pela atividade física,
porém mesmo de forma lúdica essas atividades tem como meta obter a melhoria de esta-
bilidade, equilíbrio entre outros fatores que desenvolve o aparelho locomotor e neurológico
das crianças. (VYGOTSKY, 1935).
Fazer a aplicação das valências físicas de forma lúdica, elevando as qualidades de
cada uma de forma individual.
Para que a criança possa ter sucesso na sua vida escolar, é necessário que durante a
infância, no período caracterizado pela organização psicomotora e estruturação da imagem
corporal, sejam realizados trabalhos em torno de seu desenvolvimento motor, proporcionando
a ela situações nas quais possa ter toda a confiança em seu corpo e em suas potencialida-
des. (LE BOULCH, 1976)
De acordo com Franchini (2001) o Judô é uma luta que exige do praticante tomar de-
cisões em pequenos períodos de tempo, devido a grande quantidade de golpes que podem
ser utilizados, situações em que o judoca precisa observar os movimentos do adversário para
agir e não ser surpreendido, a constante oscilação nos movimentos, entre outros. Desde o
inicio da prática do judô, é importante trabalhar o tempo de reação do aluno, proporcionando
esse estímulo desde novo para que o aluno tenha um desenvolvimento do raciocínio cada vez
melhor, e saiba utilizar esses benefícios em situações cotidianas, principalmente nos estudos,
auxiliando o aluno a adquirir novos conhecimentos e aumentando seu rendimento escolar.
Equilíbrio é o estado de um corpo solicitado por duas ou mais forças que se anulam
entre si. Sustentação através da gravidade, tendo a capacidade de manter posturas e con-
trolo do corpo. O equilíbrio geralmente é classificado como estático, quando um corpo se
mantém estabilizado em uma posição estacionária. E dinâmico, Manter-se em uma posição
quando o corpo se encontra em movimento retilíneo uniforme. O principal objetivo do judô
é desequilibrar o adversário, logo, um dos principais fundamentos da prática é o equilíbrio,
sendo necessário trabalha-lo com frequência. A melhora da postura também é essencial
para um bom equilíbrio, o que também é bastante desenvolvido com a prática do judô.
(PERRIN et al., 2002).
O judô na escola tem o papel significativo na educação, por ser um esporte que de-
termina um padrão de vida que é o do Budô (caminho do guerreiro ou caminho marcial).
Segundo Nakamura (2013) isso faz com que o aluno experimente algo que é diferente do

96 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


que estão acostumados. O judô foi criado em cima dos padrões e códigos de conduta do
estilo Budô de vida. De começo o aluno já se apresenta com um choque cultural com as
saudações, aspectos físicos, fisiológicos, morais e espiritual. Esse intercâmbio na disciplina
escolar fará com que o aluno melhore seu comportamento tanto em casa, como na escola,
pois quem pratica a arte marcial tem que ser um exemplo para a sociedade em que vive,
isso rege o código de conduta feito pelos samurais que o qual o judô é inspirado o Bushido
(código de conduta e modo de vida dos samurais).
O esporte é uma das ferramentas importantes para que possamos atingir um equilíbrio
social, tanto no que se diz respeito a camadas mais pobres da sociedade sendo incluída no
esporte e sendo incluída em uma sociedade através do esporte, judô tem a capacidade de
fazer com que pessoal de alta e baixa renda conviva entre si. No judô o aluno irá aprender a
respeitar o seu corpo e ao seu colega, o qual irá emprestar também seu corpo para que os
dois possam desenvolver um aprendizado. Se não houver respeito entre os dois não con-
seguiram evoluir um aprendizado, pois o judô é um esporte individual em que um precisa do
outro para aprender as técnicas. Essa forma de respeito é expressada pela saudação, que
faz com que diferentes alunos de diferentes realidades e contexto social de unam em motivo
do aprendizado e criem um convívio social em que todos os preconceitos são quebrados
assim que entram no tatame. (NAKAMURA, 2013).

OBJETIVO

Verificar a visão da prática pedagógica dos profissionais de educação física do primeiro


segmento do ensino fundamental sobre as vantagens do judô na escola para crianças do
primeiro ao quinto ano.

METODOLOGIA

O presente estudo é uma pesquisa descritiva, que segundo Gil (2006, p.44) “têm como
objetivo primordial a descrição das características de determinada população ou fenômeno
ou o estabelecimento de relações entre variáveis.” Dessa forma, através de um questioná-
rio fechado e aberto buscou-se verificar os benefícios do judô na escola para crianças do
primeiro segmento do ensino fundamental.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 97


População e Amostra

O estudo foi composto por professores de Educação Física escolar da rede pública e
particular de ensino da cidade do Rio de Janeiro. Participaram da pesquisa 56 (cinquenta e
seis) professores de Educação Física escolar de ambos os sexos.

Coleta de Dados

Foi utilizado um questionário fechado e aberto com onze questões, validado por dois
doutores e um mestre do curso de Licenciatura em Educação Física do Centro Universitário
Celso Lisboa, aplicados aos professores de Educação Física de escolas públicas e parti-
culares da cidade do Rio de Janeiro, onde os professores receberam todas as orientações
sobre o preenchimento do mesmo.

Resultados

Após a aplicação dos questionários, observou-se os seguintes resultados: As pergun-


tas 1 – Você trabalha com judô na escola?, 2 – De acordo com suas aulas você desenvolve
o aspecto cognitivo nos alunos?, 3 – A partir dos trabalhos cognitivos em suas aulas você
consegue observar a evolução dos alunos?, 4 - De acordo com suas aulas você desenvolve
os aspectos afetivos nos alunos?, 5 - A partir dos trabalhos afetivos em suas aulas você
consegue observar a evolução dos alunos?, 6- De acordo com suas aulas você desenvolve
o aspecto motor nos alunos?, 56 sujeitos da pesquisa responderam sim, ou seja, 100%.
No primeiro momento investigamos se os profissionais conseguem observar melhorias
dos seus alunos no aspecto motor durante suas aulas.
A partir dos trabalhos motores em suas aulas você consegue observar a evo-
luções dos alunos?

Gráfico 1. Relativo à evolução dos alunos em exercícios motores

98 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Nossa pesquisa aponta que 91,1% disseram que sim e apenas e 8,9%falaram que
não, referente aos profissionais conseguiram observar alguma melhoria dos seus alunos no
aspecto motor durante suas aulas.

Gráfico 2. Durante suas aulas de judô na escola você promove algum momento de interdisciplinaridade?

78,6% disseram que sim e 21,4% disseram que não.


Nossa pesquisa aponta que 78,6% dos profissionais promovem algum momento de
interdisciplinaridade nas suas aulas de judô na escola.

Gráfico 3. Há algum relato significativo dos professores das demais disciplinas em relação ao comportamento dos alunos
a partir do momento em que começaram a prática do judô?

94,7 % disseram que sim e 5,3% disseram que não.


Nossa pesquisa aponta que 94,7% dos profissionais promovem algum momento de
interdisciplinaridade nas suas aulas de judô na escola e veem resultados, uns relatam que

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 99


as matérias que mais usam são matemáticas e ciências, sendo assim auxiliam as crianças
em suas dificuldades e conscientizam sobre o meio ambiente.

Gráfico 4. Há algum relato significativo dos familiares dos alunos referentes a melhoria dos aspectos sociais extra classe
dos mesmos?

91,4% disseram que sim e 8,6% disseram que não.


Podemos constatar segundo 91,4% que o judô é benéfico para a melhoria de aspectos
socais, melhoria no convívio familiar e extraclasse, por ser um esporte em que a disciplina
é cobrada do início ao fim e a quebra dos padrões sociais também segundo nossos relatos
e artigos e relatos de alguns autores nos mostram o embasamento e os resultados para
que isso aconteça.

DISCUSSÃO

Discursão de dados referente às perguntas com 100% respostas positivas.


Em virtude das respostas dos professores entrevistados, sendo 100% deles, o de-
senvolvimento do aspecto cognitivo nas aulas é de extrema necessidade e fundamental
importância para o desenvolvimento dos alunos nessa faixa etária, em virtude do esporte
(judô) ser considerado um estilo de vida é inserido esse aspecto.
O judô ajuda na parte cognitiva da criança pois segundo Jigoro Kano “O judô não é só
um esporte, é uma filosofia de vida”, onde o respeito e a disciplina são essenciais, com isso
podemos unir a história do judô passada para a criança com a teoria e vivencia na pratica,
nessa fase – entre 6 á 10 anos- a criança passa por mudanças e assim começam a fazer
semelhanças dos fundamentos teóricos coma prática. (SALLES, 2010, p.1).

100 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Essa evolução é nítida, é comprovadamente positiva, pois, 100% dos nossos professo-
res entrevistados relatam essa mudança. Realmente a disciplina, o comportamento em grupo,
a relação em casa com seus parentes e o próprio comportamento na instituição escolar.
Ao citarmos a prática do Judô através das lutas nas aulas da Educação Física escolar
podemos entender que esta luta pode sim com grande certeza contribuir para o processo de
ensino-aprendizagem assim favorecendo de uma grandeza enorme para o desenvolvimento
global da criança. E esta vivência deve promover também o aumento da capacidade cogniti-
va, possibilitando o aluno a refletir acerca das ações que farão dele um ser humano provido
de valores que os integra de fato na sociedade contemporânea (GOMES; QUEIROZ, s.d.).
Nossa pesquisa aponta que 100% dos profissionais desenvolve o aspecto afetivo com
os alunos, o que não deixa dúvidas da importância de se trabalhar esse aspecto durante o
processo de aprendizagem, não só para uma melhoria do ambiente da aula, como para que
todos os alunos tenham o melhor convívio possível. Todo ser humano tem a necessidade
de afeto, em uma turma, onde os alunos irão aprender coisas novas e fazer descobertas, o
lado afetivo pode ser determinante para a evolução da turma como um todo.
É relevante considerar que o afetivo pode variar de acordo com o estado atual do ser
humano. Obviamente o afeto já é variável de pessoa para pessoa, mas também pode haver
variações em um único ser, dependendo do estado em que o mesmo se encontra. Esse
é o ponto que o professor precisa estar atento, pois, em determinadas situações, o afeto
pode ser trabalho de forma natural e simples, mas poderá encontrar resistências em outros
momentos, mesmo com os alunos que se demonstram ser mais afetivos.
Como já foi dito, o afetivo é de extrema importância para o desenvolvimento da tur-
ma, a falta do afeto pode prejudicar o interesse pela aula, a falta da sensação de prazer
na criança, e a construção dos laços entre os alunos será bem mais complicada. A falta do
aspecto afetivo é oposta ao aprender, não só em relação as aulas de judô, mas também
no desenvolvimento geral da criança, na forma como ela irá se portar perante o mundo e
qual será o papel dela na sociedade. É dever do professor respeitar seus alunos, entender
o contexto social de cada um e procurar a melhor forma de se aproximar e fazer com que
o aluno se sinta amado, faze-lo entender que cada um dos colegas da turma vai ser impor-
tante para ele aprender algo novo, e que é muito mais fácil caminhar quando não se está
sozinho, ainda mais em uma caminhada de aprendizagem, um “novo caminho a se seguir”.
Segundo ROSSINI, o ser humano pensa, sente, age. Ele pode ter um quociente inte-
lectual (QI) altíssimo, porém se o seu SENTIR estiver comprometido ou bloqueado, a sua
ação não será energizante, forte, eficaz, produtiva. (ROSSINI, 2001, p.15).
Afetividade é à base da vida. Se o ser humano não está bem afetivamente, sua
ação como ser social estará comprometido, sem expressão, sem força, sem vitalidade.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 101


Isto vale para qualquer área da atividade humana, independente de idade, sexo, cultura.
(ROSSINI, 2001, p.16).
Todos os profissionais entrevistados afirmaram haver uma notória evolução no aspecto
afetivo dos alunos, o que já era de se esperar. Quando o lado afetivo é trabalhado constan-
temente, o resultado se torna nítido nas situações do cotidiano. Os alunos se sentem mais
à vontade no ambiente de aprendizagem, se aproximam dos colegas de turma, construindo
laços de confiança que só irão ajudar no processo de ensino e aprendizagem.
É de extrema importância que o professor seja próximo dos alunos, não ser visto apenas
como um transmissor de informações, mas como uma figura de confiança que possa auxiliar
de perto esse processo da construção afetiva da turma. “A educação é um processo que se
dá através do relacionamento e do afeto para que possa frutificar.” (CHALITA, 2001, p.154).
O educador não pode ser aquele indivíduo que fala horas a fio a seu aluno, mas aquele
que estabelece uma relação e um diálogo intimo com ele, bem como uma afetividade que
busca mobilizar sua energia interna. É aquele que acredita que o aluno tem essa capacidade
de gerar ideias e colocá-las ao seu serviço. (SALTINI, 2002, p.60).
O desenvolvimento moral do indivíduo, que resulta das relações entre a afetividade
e a racionalidade, encontra no universo da cultura corporal um contexto bastante peculiar,
no qual a intensidade e a qualidade dos estados afetivos experimentados corporalmente
nas práticas da cultura de movimentos literalmente afetam as atitudes e decisões racionais.
(BRASIL, 1998, p.34).
A modernidade exige que o profissional de educação física compreenda o esporte e
a pedagogia de forma mais ampla, transformando-os em facilitadores no processo de edu-
cação de crianças e de jovens. Nesse contexto, é preciso ir além da técnica e promover
a integração dos personagens, o que só será possível se a proposta pedagógica estiver
embasada também por uma filosofia norteadora por princípios essenciais para a educação
dos alunos. (DANTE, 2002, p.91).
Nossa pesquisa aponta que 100% dos profissionais desenvolvem os aspectos motores
em suas aulas, de maneira diversificada e usando muitas vezes da ludicidade como estraté-
gia de atração para uma maior participação quantitativa dos alunos, para que assim consiga
aplicar as aulas e consequentemente consiga o objetivo final, que é desenvolver os alunos
motoramente, não deixando de seguir a progressão do desenvolvimento e respeitando o
princípio da individualidade biológica.
Segundo MAGILL (2000), o desenvolvimento motor ocorre durante toda nossa vida,
tendo seu início no nascimento, passando pela vida adulta, até o envelhecimento, esses
movimentos motores e capacidades coordenativas são adquiridas através de experiência
em realização de tarefas diárias, já habilidades motoras assim como as capacidades físicas

102 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


condicionantes são movimentos voluntários que desenvolvemos através de treinamento para
objetivos específicos, podendo citar, por exemplo, a velocidade de deslocamento em que
precisamos fazer para uma melhor aplicação de das técnicas do judô.
Deve-se levar em consideração a progressividade do desenvolvimento de cada faixa
etária. Cada etapa tem sua importância e significado relativos biologicamente e fisiologica-
mente e deve ser respeitado, para que não ocorra indeferimento negativo no desenvolvi-
mento do indivíduo.
Não é raro que, ao perceber certa aptidão de seus filhos para determinada modalidade,
pais ansiosos os obrigam a cumprir treinos exaustivos. É um tremendo erro. “Praticar um
único esporte na fase que vai de 7 a 12 anos prejudica o desenvolvimento da criança”. Diz
Oswaldo Luiz Ferraz, professor de educação física da USP. Mesmo se ela demonstrar mais
inclinação para um esporte do que para outros. É sempre bom estimulá-la a variar1.
Relativo ao gráfico 1, a pesar de trabalhar com o primeiro segmento do ensino funda-
mental que abrange em média alunos de 7 a 10 anos de idade, muitos alunos chegam nessa
fase com dificuldades em coordenação motora básica e o trabalho é realizado de modo que
consiga atualizar o aspecto motor do aluno para a sua faixa etária de idade, segundo relatos
feitos pelos participantes da pesquisa.
Segundo GALLAHUE (2002), nessa faixa etária de idade as pessoas encontram-se
em uma fase do desenvolvimento motor chamada de (fase motora especializada) espe-
cificamente em seu primeiro período chamado de (período de transição), esse estágio é
caracterizado pelas primeiras tentativas do indivíduo refinar as suas habilidades motoras,
é uma fase de transição das habilidades básicas para o momento de aplicação, como por
exemplo podemos citar a melhoria na qualidade dos golpes, ou de exercícios específicos
para cada modalidade.
Relativo ao gráfico 2, A interdisciplinaridade é um dos caminhos apontados pelos
PCNs (parâmetros curriculares nacionais) para o desenvolvimento de um aprendizado mais
consistente onde nossos alunos poderão compreender a importância dos conteúdos das
disciplinas na sua interação com o mundo.
De acordo com Nakamura, o pensamento complexo é fundamental na construção de uma
educação que privilegie a interdisciplinaridade, para romper a fronteira do sistema fragmen-
tado em disciplinas cada vez mais isoladas, que não dialogam entre si. (NAKAMURA, 2013).
Relativo ao gráfico 3, de acordo com os entrevistados os professores relatam muito
pontos positivos nas atividades propostas e a melhora na disciplina é notável até para os
pais, que retribuem com elogios, e assim indicando para outros pais de alunos para coloca-
rem seus filhos no judô.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 103


Dando continuidade à nossa pesquisa, a questão 10 - Você procura trabalhar sociabili-
zação dos alunos através do judô? , Em nosso trabalho de pesquisa em campo, observamos
que 100% profissionais de Judô escolar trabalham aspecto socialização de seus alunos o
resultado foi e tem sido expressivo e é isso que faz o número de adeptos ao esporte au-
mentar cada vez mais, por se tratar de um esporte transformador social. Segundo alguns
autores que comprovam o mesmo, o benefício do judô é notório devido à sua influência em
comportamento social.
Um Japonês chamado Jigoro Kano, também praticante de jiu-jitsu, achava que essa
luta tinha como único objetivo a vitória. Por isso, resolveu criar um esporte que não fosse
violento e que pudesse ser eficaz na educação do indivíduo. A nova luta, além de ser útil
para a defesa pessoal, poderia ser importante também para superar as limitações do ser
humano. Assim, ele pegou as melhores técnicas do jiu-jitsu e criou regras para o confronto
esportivo baseado no espirito do Ippon-Shobu (luta pelo ponto completo).
O Judô (em japonês, caminho suave) é uma luta defesa, que utiliza a força do adver-
sário na execução dos golpes.
Estudos têm apontado que crianças que participam de atividades esportivas vêm apre-
sentando melhorias na sua socialização. Segundo Freire e Soares (2000), além de garantir
o desenvolvimento educacional físico e de cooperação entre os colegas, o esporte propor-
ciona desafios físicos e mentais e contribui para o desenvolvimento social, promovendo a
identidade social e grupal.
A relação entre esporte e bem-estar psicológico foi considerada como positiva para
Weinberg e Gould (2001), e sugere que o aumento da sensação de controle, do sentimento
de competência e da autoeficácia, além do lazer, proporciona interações sociais positivas,
o autoconceito e a autoestima.
Para Machado et al (2007), a ação educativa através do esporte pode servir para as
crianças como um ambiente promotor de saúde e das mais diversas habilidades, sendo
que o esporte, principalmente a educação pelo esporte, pode agir transformando potenciais
em competências.
Relativo ao gráfico 4, já no campo da saúde mental, a prática de exercícios ajuda na
regulação das substâncias relacionadas ao sistema nervoso, melhora o fluxo de sangue para
o cérebro, ajuda na capacidade de lidar com problemas e com o estresse. Além disso, auxilia
também na manutenção da abstinência de drogas e na recuperação da autoestima. Há re-
dução da ansiedade e do estresse, ajudando no tratamento da depressão.
A atividade física pode também exercer efeitos no convívio social do indivíduo, tanto
no ambiente de trabalho quanto no familiar.

104 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Para Dell’Aglio, a atividade física em crianças e jovens, além de ser importante na
aquisição de habilidades psicomotoras, a atividade física é importante para o desenvolvi-
mento intelectual, favorecendo um melhor desempenho escolar e também melhor convívio
social. A prática regular de exercícios pode funcionar como uma via de escape para a energia
“extra normal” das crianças, ou seja, sua hiperatividade. (Dell’Aglio, Debora. 2010).
De acordo com Trusz, o desenvolvimento humano acontece através de um conjunto
de relações interdependentes entre o sujeito conhecedor e o objeto a conhecer, envolvendo
aspectos cognitivos, morais e afetivos presentes nas interações. Para Piaget (1932/1994), o
desenvolvimento da moral ocorre por etapas, e acordo com os estágios do desenvolvimento
humano, e abrange três fases: anomia (crianças até cinco anos), em que a moral não se
coloca, ou seja, as regras são seguidas, porém o indivíduo ainda não está mobilizado pelas
relações bem x mal e sim pelo sentido de hábito, de dever; heteronomia (crianças até 9, 10
anos de idade), em que a moral é igual à autoridade, ou seja, as regras não correspondem
a um acordo mútuo firmado entre os indivíduos, mas sim como algo imposto pela tradição
e, portanto, imutável; autonomia, corresponde ao último estágio do desenvolvimento mo-
ral, onde há legitimação das regras e a criança pensa a moral pela reciprocidade, ou seja,
o respeito a regras é entendido como decorrente de acordos mútuos entre os indivíduos,
sendo que cada um consegue conceber a si próprio como possível ‘legislador’ em regime
de cooperação entre todos os membros do grupo. (Trusz, Rodrigo. 2010).
Na medida em que a criança cresce, ela vai percebendo que o mundo tem suas regras.
Ela descobre isso também nas brincadeiras com as crianças maiores, que são úteis para
juda-la a entrar na fase de heteronomia. Segundo (Piaget. 1994), a criança quando vivência
o estágio chamado heterônomo, isto é, onde as regras são estabelecidas e provindas de uma
ordem exterior de maneira determinada e imposta, acaba concebendo a regra como algo
correto que deve ser seguido e obedecido, caso contrário há uma consequência (punição)
que não é agradável.

CONCLUSÃO

Com base na pesquisa realizada observa-se que os benefícios do judô para o primeiro
segmento do ensino fundamental são positivos para a formação motora dos que praticam
o esporte e tendo como elemento validador o nosso questionário em que 100% dos nossos
entrevistados trabalham elementos da motricidade em seus alunos, isto é, o aluno que pratica
judô na escola estará trabalhando elementos da motricidade com esquema corporal, tônus
muscular, lateralidade e equilíbrio.
O judô trabalha também aspectos cognitivos com os alunos que praticam, e de acor-
do com a nossa pesquisa de campo conseguimos comprovar que o judô proporciona essa

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 105


evolução do aspecto cognitivo segundo a totalidade de nossos entrevistados e nesta faixa
etária os alunos não desenvolvem muito a sua linguagem e raciocínio lógico. Ao entrarem
em contato com diversas crianças em um ambiente totalmente diferente com regras e con-
textos diferentes do que há em sala, elas acabam evoluindo a sua comunicação, pois ficam
mais à vontade fora do ambiente formal.
Com base na pesquisa observa-se que em aspectos afetivos e sociais as estatísticas
também são elevadas em quase toda sua totalidade, os alunos ao entrarem em contato com
outras pessoas pelo tato (no toque), a criança aprende que só pode tocar em outra pessoa se
a outra permitir e isso é demonstrado através saudação, o respeito é um dos pilares do judô.
Contudo, afetivamente como em todos os esportes as crianças acabam tendo a pri-
meira relação com o Judô e acabam gostando muito do esporte pela experiência nova, e o
fato de que no judô os alunos acabam tendo contato com crianças diferentes e isto acaba
fornecendo à eles uma afetividade entre si, além de construírem apenas por aspectos lúdicos
os seus primeiros grupos sociais.
Conclui-se que o judô é benéfico para as escolas e para as crianças desta faixa etária,
pois o judô foi projetado em toda a sua origem por seu criador Jigoro Kano, para promo-
ver o bem-estar e saúde dos seus praticantes, desenvolvendo valores como Honestidade,
Respeito, Ética, Disciplina e diversos outros pilares da moralidade infantil.
O Judô (como em japonês se chama caminho suave), para criação de cidadãos com
valores morais e éticos bem fortes e elevados para os nossos padrões da sociedade e é
exatamente o que precisamos hoje em dia, melhorar a nossa sociedade porque se promo-
vemos crianças com esses valores, no futuro serão cidadãos e pessoas exemplares. E é por
isso e outros valores que este trabalho é importante para fortalecimento do caminho suave
(Judô) na educação das crianças do primeiro segmento do ensino fundamental.

REFERÊNCIAS
1. BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: Edu-
cação Física/Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1998. Disponível
em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/fisica.pdf. Acesso em: 14/09/2017.

2. BRASIL, Ministério de Educação e do Desporto. Parâmetros Curriculares Nacionais:


Educação Física. Brasília: Secretaria de Educação Fundamental, MEC/SEF, 1998.

3. CHALITA, Gabriel. EDUCAÇÃO: A solução está no afeto. São Paulo: Editora Gente, 2001.
Copyright © 2005 Bibliomed, Inc. 28 de Julho de 2005. Disponivel em: http://www.boasaude.
com.br/artigos-de-saude/4772/-1/importancia-da-atividade-fisica.html Acesso em: 22/05/2018.

4. DANTE, de Rose. Esporte e atividade física na infância e na adolescência: uma aborda-


gem multidisciplinar.- Porto Alegre: Artmed Editora, 2002.

106 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


5. FRANCHINI. 2001. O efeito da motricidade do judô no equilíbrio de crianças com deficiência
visual. Disponível em:<http://www.deficienciavisual.pt/txt- efeito_motricidade_judo_DV.htm#E-
QUIL%C3%8DBRIO__>. Data da consulta [10/10/2017]

6. FREIRE, J. B. Educação de corpo inteiro: teoria e prática da educação física. São Paulo: ed.
Scipione, 2006.

7. GALLAHUE, D.L.; OZMUN, J.C. Compreendendo o Desenvolvimento Motor: bebês, crianças,


adolescentes e adultos. São Paulo: Phorte, 2002.

8. GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Atlas. 2006

9. JUNIOR, T. P. S; SANTOS, S. L. C. Jogos de oposição: nova metodologia de ensino dos


esportes de combate. Revista Digital http://www.efdeportes.com – Buenos Aires – Nº 141 –
Acesso em 04 ago 2014.

10. L.S. Vygotsky; Michael Cole. Mente na Sociedade: Desenvolvimento de Processos Psicológi-


cos Superiores. p.57.

11. LE BOULCH, Jean. O desenvolvimento psicomotor: do nascimento aos 6 anos. Porto Alegre:
Artes Médicas, 1976/1982 Disponível em: <http://www.efdeportes.com/efd123/a-contribui-
cao-da-educacao-fisica-no-desenvolvimento-psicomotor-na-educacao-infantil.htm >. [Data da
consulta: 06/10/2017]

12. LUNA, Ivan. 2015. Aspectos pedagógicos do ensino das lutas e metodologia do ensino de lutas.

13. MACHADO, Maria de Fátima Antero Sousa et al. Integralidade, formação de saúde, educação
em saúde e as propostas do SUS: uma revisão conceitual. Ciênc. saúde coletiva [online]. 2007,
vol.12, n.2, pp.335-342. ISSN 1413-8123

14. MAGILL, R. A. Aprendizagem motora: Conceitos e aplicações. 5. Ed. São Paulo: Edgard Blu-
cher, 2000.

15. MESQUITA, Chuno Wanderlei. 2014. Judô... da reflexão á competição: o caminho suave/
Chuno Wanderlei Mesquita- 1. Ed. – Rio de Janeiro: Interciência,2014.

16. NAKAMURA, Anderson. 2013. O desenvolvimento infantil através do Judô. Disponível em:
https://caminhodasuavidade.wordpress.com/2013/06/04/o-desenvolvimento-infantil-atraves-
-do-judo/. Data da consulta [ 25/10/2017]

17. PERRIN. 2002. O efeito da motricidade do judô no equilíbrio de crianças com deficiência visual.
Disponível em:<http://www.deficienciavisual.pt/txt-efeito_motricidade_judo_DV.htm#EQUIL%-
C3%8DBRIO__>. Data da consulta [10/10/201 ]

18. PIAGET, Jean. O juízo moral na criança. São Paulo: Summus, 1994.

19. QUEIROZ, Liliane Tobelem da Silva; PINTO, Ricardo Figueiredo. A criança: fatores que in-
fluenciam seu desenvolvimento motor. EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, v. 15,
n. 143, 2010. http://www.efdeportes.com/efd143/a-crianca-seu-desenvolvimento-motor.htm

20. RODRIGUES, Letícia. Livro- Manual do Judo , Editora Areté Editorial S/A, ano 1999. Edição
Lance diário do esporte.

21. ROSSINI, Maria Augusta Sanches. Pedagogia afetiva. 5 ed. Petrópolis: Vozes, 2001

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 107


22. SALLES, Kleber. Judô no Desenvolvimento Cognitivo. Disponível em: http://cev.org.br/comu-
nidade/judo/debate/judo-desenvolvimento-cognitivo/ [data da consulta: 26/10/2018]

23. SALTINI, Cláudio J.P. Afetividade e inteligência. Rio de Janeiro: DPA, 2002.

24. TruszI Rodrigo Augusto; Dell’Aglio, Débora Dalbosco. 2010. Disponível em: http://pepsic.bv-
salud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1981-91452010000200010 [data da consulta:
22/05/2018 ]

25. WEINBERG, R.S.; GOULD, D. Fundamentos da Psicologia do Esporte e do Exercício. 2° Ed.


Porto Alegre: Artmed. 2001

108 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


09
“ As contribuições da educação
física no desenvolvimento da
criança no ensino infantil

Alcemildo Teixeira Lopes


Faculdade Clarentiano

Graciete Barros Silva


UERR/IFRR

10.37885/201001855
RESUMO

Este artigo tem como objetivo analisar de que forma a educação física contribui no
desenvolvimento da criança, visto que, as instituições escolares têm como finalidade
proporcionar aos educandos não somente conhecimento voltado para a leitura, escrita e
raciocínio lógico, mas propiciar práticas esportivas que são essenciais para o desenvolvi-
mento da criança. Desta feita, é nas aulas de educação física que os educandos acabam
interagindo mais com o grupo, aceitando regras e normas, além de proporcionam novas
experiências através do corpo. No desenvolvimento metodológico utilizamos a pesquisa
qualitativa, os procedimentos técnicos utilizados incidem em pesquisa bibliográfica e
aplicação de questionário aos professores de educação física da educação infantil do
Município de Pacaraima. Dialogaremos no decorrer do estudo com autores que eviden-
ciam algumas concepções teóricas que consideram a importância da educação física
no desenvolvimento integral da criança. Portanto, é possível concluir que a educação
física contribui no desenvolvimento dos educandos, uma vez que garante que ambos
possam explorar seus corpos em diferentes atividades motoras, estimula a imaginação,
desenvolve a noção de espaço e tempo, além de tornar a aprendizagem motivadora,
garantindo o desenvolvimento físico, social e, sobretudo, cognitivo.

Palavras-chave: Educação Física, Desenvolvimento da Criança, Educação Infantil.


INTRODUÇÃO

A presente pesquisa buscou analisar de que forma a educação física contribui no


desenvolvimento da criança no ensino infantil, visto que é no ambiente escolar em contato
com outras crianças que educando acompanhado pelos educadores poderá desenvolver-se
adequadamente, não somente socialmente, psicologicamente, mas fisicamente também.
Neste sentido, vale ressaltar que é nas aulas de Educação Física que as crianças se rela-
cionam com o grupo, por meio de movimentos, gestos e ações.
Piaget (1983) adverte que o desenvolvimento das crianças passam por diversas fases
durante a infância, abrangendo os aspectos cognitivo, motor e afetivo, de modo que todas
essas fases estão estreitamente interligada na interação com o meio. Portanto, vários são os
estudiosos que vem estudando a importância da psicomotricidade para o desenvolvimento
do individuo na ampliação de sua aprendizagem e a educação física tem evidenciado que
os jogos, as atividades lúdicas tem contribuído de forma significativa no desenvolvimento
de algumas aptidões perceptivas e no comportamento psicomotor das crianças.
A educação física pode contribuir na formação das crianças da educação infantil por
meio da psicomotricidade, além disso, cabe advertir que é por meio da educação física que
a criança explora seu corpo, interage com outros corpos e desenvolve seu crescimento
cognitivo e motor.
Deste modo, o presente estudo procura descrever o surgimento da Educação Física
e sua contribuição no desenvolvimento das crianças no ensino infantil, uma vez que, a
educação física proporciona práticas esportivas essenciais ao desenvolvimento da criança.
Cabe advertir que a escolha do tema surgiu mediante algumas inquietações na prática
pedagógica, onde muitos colegas sempre ressaltavam os desânimos dos educandos em
suas de aulas e a partir do momento que a educação física começou a atuar junto com ou-
tras disciplinas as crianças começaram a melhorar não somente sua aprendizagem , mas
sobretudo o seu desenvolvimento físico.
Neste sentido, considerando o processo de formação cognitiva da criança na educação
infantil, a presente pesquisa procurou responder a seguinte problemática: Como a disciplina
de educação física contribui no desenvolvimento das crianças no ensino infantil?
Ressalta-se que, como metodologia utilizou-se a pesquisa qualitativa e pesquisa de
campo e para tratar do tema teremos como base teórica alguns autores que falam da im-
portância da educação física no desenvolvimento das crianças, tais como: D’AVILA (2016),
VASCONCELLOS ( 2017), GALLARDO (1998), MATTOS (2006), GALVÃO (2009), NEIRA
(2003), GALLAHUE ( 2005), FREITAS (2007), Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDB),entre outros.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 111


Assim, o presente estudo propõe reflexões a partir da temática apresentada, trazendo a
história e conceitos essenciais acerca da educação física, bem como a importância da mesma
para desenvolvimento cognitivo e motor da criança, além de algumas considerações acerca
educação física na escola e no ensino infantil. Portanto, as atividades físicas vivenciadas na
infância se caracteriza como peça fundamental no desenvolvimento de atitudes e hábitos
que podem auxiliar na escolha de um estilo de vida ativo na idade adulta, além de permitir
que a criança explore o mundo exterior através de experiências concretas.

BREVE HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO FÍSICA

A educação física surge na Europa no final do século XVIII e no início do século XIX
disseminando os exercícios físicos como movimentos passíveis de controle tendo como
artefato uma cultura de jogos, como exemplo: ginástica, dança e equitação com a finalidade
constituir homens fortes e ágeis atendendo a necessidade de formação de uma nova socie-
dade. Cabe advertir que nesse período a educação física era conhecida como Gymnastica.
Diante disso, as primeiras experiências acerca dos exercícios físicos aparecem como
técnicas de ginásticas sendo inserida como componente curricular por causa da motiva-
ção que gera aos indivíduos, além disso, muitos acreditavam que a educação física seria
capaz de higienizar, corrigir e disciplinar os corpos da população, principalmente das insti-
tuições escolares.
Vasconcelos (2017) diz que a base da construção da identidade pedagógica da edu-
cação física esta estreitamente ligada às normas e valores próprios das instituições milita-
res, uma vez que as aulas de educação física eram ministradas por profissionais físicos do
exército, estes por sua vez, adotavam rígidos métodos de disciplina e hierarquias, visando,
sobretudo a construção de um projeto de homem disciplinado e obediente.
Vale ressaltar que, a Educação física no Brasil vem sofrendo inúmeras mudanças,
passando a ser uma disciplina voltada para práticas esportivas englobando uma serie de
manifestações culturais, não somente de caráter instrucional e técnico, mas, sobretudo de
caráter reflexivo. Sendo assim, Guedes (2001) adverte que a Educação Física Escolar atual
vem sofrendo influências no seu processo histórico, pois muitas literaturas apresentam relatos
de profissionais com discursos e teorias excepcionais, contudo as práticas pedagógicas na
maioria das vezes são excludentes.
Nesta premissa, a Educação Física Escolar passou a ser compreendida como campo
responsável pelo estudo e ensino do esporte, ocupando o centro das preocupações, desde
a formação dos professores até a organização do ensino e a partir dos anos de 1970 esta
passou a se fortalecer através da pedagogia tecnicista. Vale mencionar que a educação
física no Brasil inicia-se em 1851 tenho como idealizador Luiz Pereira do Couto Ferraz que

112 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


foi o grande responsável pela reforma de base do ensino primário e secundário no Município
da Corte no Rio de Janeiro, incorporando a ginástica no currículo das escolas.
Desta feita, a educação física enquanto componente curricular traz benefícios para os
educandos, tais como: a psicomotricidade, a recreação, noções de saúde, socialização e a
interdisciplinaridade.

CONCEITUANDO A EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR

A Educação Física na escola é compreendida como um campo que discute a cultura


corporal e que tem como objetivo integrar o aluno nessa cultura, proporcionado sua forma-
ção integral. Assim, o educando passa a ser capacitado para desfrutar de jogos, esporte,
danças, lutas, ginásticas e de todo tipo de atividade para o seu desenvolvimento em busca
de seu bem estar e de um crescimento saudável.
Daólio (2000, p.94) diz que a Educação Física Escolar necessita fazer o aluno conhecer
o seu corpo como um todo, não só como um conjunto de ossos e músculos a serem treinados,
mas, sobretudo, a totalidade do indivíduo que se expressa por meio de sentimentos, movi-
mentos e através de sua atuação na sociedade. A terminologia educação física pressupõe
ideia de controle do corpo, ou ainda controle físico.
Assim sendo, a Educação Física na legislação educacional brasileira é discutida no
parágrafo 3º do artigo 26 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB , sendo
compreendida como um componente curricular obrigatório da educação básica.

Art. 26 –[...] § 3º –A Educação Física, integrada à proposta pedagógica da


escola, é componente curricular da Educação Básica, ajustando-se às faixas
etárias e às condições da população escolar, sendo facultativa nos cursos
noturnos.

Sendo assim, quando falamos em educação física nos referimos a um extenso campo
de ações que tem como finalidade o movimento do corpo, de modo que WILLIAMS (1964) diz
que a Educação Física mesmo trabalhando com atividades físicas para educar as pessoas,
estava preocupada com os resultados educacionais que não eram inteiramente físicos, ou
seja a educação física acaba influenciando todas as áreas do desenvolvimento educacional.
Barrow (1971) diz que a educação física consiste em :

Educação Física pode ser definida como educação através de atividades de


brincadeiras com grandes músculos, tal como esportes, exercícios e dança,
onde os objetivos educacionais podem ser obtidos em parte...Esse produto é
uma pessoa educada fisicamente. Esse valor deve ser um dos muitos valores
de uma pessoa educada liberalmente, e tem significados somente quando é
relacionado com a totalidade da vida de um indivíduo.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 113


Neste viés, a educação física pode ser considerada uma área do conhecimento es-
treitamente ligada a práticas corporais. Sérgio (1989) compreende a educação física como:

Um ramo pedagógico da ciência da motricidade humana, e por isso deveria se


chamar educação motora, e assim, consequentemente não reconhece auto-
nomia, nem como sistema e nem como subsistema. Percorrendo o esporte, a
dança, a educação especial e reabilitação, a ergonomia, a motricidade infantil,
o circo, e tendo como função principal estar presentes com as possibilidades
e os instrumentos que permitam humanizar, transformar em espaço libertador
aquelas atividades (SÉRGIO 1989, p.58).

De acordo com a citação acima o autor evidencia a necessidade de constituir uma


nova teoria acerca da educação física , objetivando transformar a referente numa ciência
independente que nasce das necessidades culturais dos indivíduos.
Neste sentido, a educação física nasce para contribuir com a educação intelectual e
moral nas escolas promovendo e facilitando a compreensão do próprio corpo e, sobretudo,
melhorando a qualidade de vida dos indivíduos. Portanto, a referente é uma disciplina muito
significativa, porém, por diversas vezes, pouco valorizada na grade curricular.
Portanto, a escola é um ambiente propicio para o desenvolvimento de estratégias de
atividade física e de educação para a saúde combate o sedentarismo, melhora o comporta-
mento dos alunos em vários aspectos sociais, além de proporcionar melhores oportunidade
de aproximação para as crianças.

A IMPORTANCIA DA EDUCAÇÃO FÍSICA NO DESENVOLVIMENTO DA


CRIANÇA NO ENSINO INFANTIL

Júnior (2013) diz que os educadores de Educação Física carece tornar a sala de aula
um momento prazeroso para todos os alunos, englobando todos sem discriminação , ou
seja, a escola carece englobar a sua totalidade , como exemplos, alunos com corpo atlé-
ticos ou obeso, promovendo o bem-estar e saúde a todos independente de raça, gênero,
condição social , etc.
A Educação Física deve objetivar o desenvolvimento global dos alunos tornando-os
criativos, dinâmicos, responsáveis e independentes. Portanto na educação infantil o profes-
sor carece de condições metodológicas criativas e lúdicas que de fato chame a atenção das
crianças. Na qual, a criança ao iniciar o processo de escolarização começa a viver e observar
uma nova realidade. Diante disso, o professor não somente de educação física necessita se
relacionar com a criança e principalmente com o seu processo de ensino e aprendizagem.
Para tanto, é preciso que saibamos quais as mudanças que esse processo de escolarização
pode ocasionar tanto no intelecto das crianças, quanto em seu corpo físico.

114 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Portanto, a Educação Física escolar é de grande valia no processo educacio-
nal e deve estar atrelada a proposta pedagógica da escola, como adverte Debortoli ,
Linhales e Vago (2001)

Pensar a presença da Educação Física na escola pressupõe a compreensão


de que ela é construída na e, ao mesmo tempo, construtora da cultura escolar.
Isso exige que seus professores estejam plenamente envolvidos com o pro-
jeto pedagógico da escola em que atuam, sensíveis ao diálogo crítico com a
realidade social e com as crianças, com suas necessidades e seus interesses,
e sempre atentos à dimensão cultural das práticas corporais de movimento.
(DEBORTOLI , LINHALES, VAGO 2001, p.94).

Assim, de acordo com os autores ao pensar a educação física para e com as crian-
ças do ensino infantil é preciso considerar a brincadeira e o lúdico como principal objeto
do conhecimento.
Assim sendo, Medina (1984) diz que o profissional de educação infantil precisa viabilizar
as interações lúdicas como suporte para o reconhecimento das interações sociais, carecendo
evidenciar para as crianças conhecimentos advindos de papéis sociais.
Cabe aos educadores proporcionar as crianças essas vivencias que contribuirão para
sua formação corporal e para seus movimentos. Portanto, é necessário dar prioridades para
essas práticas corporais na educação Infantil, para que as crianças não tenham dificuldades
nas atividades diárias.
Neste viés, Freire (1999) diz que a Educação Física deve ser reconhecida como um
componente curricular, tão importante quanto os outros, visto que, é nas aulas de educação
física que a criança se relacionar com o grupo e através de seus movimentos, gestos e ações
que demonstra suas dificuldades.
Diante disso, é nos momentos de recreação e jogos esportivos que a criança evidencia
ter atitudes de respeito solidariedade para com o ``outro`` , reconhecendo e aceitando as
diferenças da cultura corporal dos diferentes grupos. Diante disso, vários são os benefícios
das aulas de educação física na escola, tais como: incentivo de praticas esportivas e ativida-
des físicas, favorece o desenvolvimento motor, contribui para a integração social , colabora
para que os alunos adquiram autoconfiança, melhora a autoestima, etc.
Portanto, ao praticar atividades físicas as crianças da educação infantil melhoram
sua saúde e diminuir riscos de doenças como obesidade, colesterol, doenças respiratórias,
entre outros, e cabe ressaltar que é nas instituições escolares que as crianças aprendem a
valorizar um estilo de vida saudável.
Desta feita, Mattos (2006) diz que:

A Educação Física é considerada hoje um meio educativo privilegiado, na


medida em que abrange o ser na sua totalidade. O caráter de unidade da

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 115


Educação por meio de atividades físicas é reconhecido universalmente através
dos tempos. (MATTOS, 2006,p.67).

Diante da citação acima , percebe-se que o mundo se modernizou e com ele as mudan-
ças de hábitos dos indivíduos. E podemos dizer que durante as atividades físicas, através de
cada ação que a criança se expressa e o professor observa suas carências e dificuldades.
Neira (2003) relata que:

O movimento é uma importante dimensão do desenvolvimento e da cultura


humana. As crianças se movimentam desde que nascem, adquirindo cada vez
maior controle sobre seu próprio corpo e se aprimorando cada vez mais das
possibilidades de interação com o mundo. Engatinham, caminham, manuseiam
objetos, correm, saltam, brincam sozinhas ou em grupo, experimentando sem-
pre novas maneiras de utilizar seu corpo e seu movimento. Ao movimentar-se,
as crianças expressam sentimentos, emoções e pensamentos, ampliando as
possibilidades do uso significativo de gestos e posturas corporais. (NEIRA,
2003, p. 114).

Como citado anteriormente através das brincadeiras lúdicas e os dos exercícios físi-
cos que a criança desenvolve suas aptidões perceptivas, de modo que, a referente deve
desenvolver-se considerando os níveis de maturação biológica das crianças, para que estas
possam desenvolver seu controle mental (GALLARDO, 2005).
Mello (2009) complementa a fala acima dizendo que através de estímulos corporais,
é possível desenvolver o Sistema Nervoso Central (SNC),

Os componentes de ordem cognitiva, afetiva e social acompanham o ato motor,


e é diante de um quadro com essas dimensões que a psicomotricidade deve
atuar. Surgem dai alguns conceito para essa nova ciência. A psicomotricida-
de é a realização do pensamento através do ato motor preciso, econômico e
harmônico. (MELLO, 2009, p. 31).

De acordo com Mello (2009) os estímulos corporais são fundamentais para o desen-
volvimento de habilidades psicomotoras, além de proporcionar o desenvolvimento completo
do individuo, ou seja, o movimento permite que a criança explore o mundo através de ex-
periências concretas.

METODOLOGIA

Atendendo o propósito deste artigo, o trabalho fundamenta-se numa abordagem qua-


litativa e sua finalidade é de natureza descritiva, que de acordo com Gil (2009, p. 42) tem
como desígnio a exposição das características de um determinado grupo ou fenômeno.
E os procedimentos técnicos que foram utilizados neste estudo consistem em pes-
quisa bibliográfica e aplicação de questionário. Desta feita, vale mencionar que a pesquisa

116 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


bibliográfica foi realizada mediante o levantamento da literatura para compreender as discus-
sões em relação às contribuições da educação física no desenvolvimento das crianças no
ensino infantil. E de acordo com Gil (2009, p. 50) “este tipo de técnica é desenvolvido com
base em materiais já elaborado”, como exemplos livros, artigos científicos e seu principal
benefício residem no fato de permitir pesquisador à cobertura de fenômenos amplos.
O segundo procedimento técnico utilizado na pesquisa foi a aplicação de questionário
aos professores de educação física da educação infantil no município de Pacaraima, com a
finalidade de identificar as contribuições da educação física no desenvolvimento das crianças
do ensino infantil. O questionário de acordo com Gil (2009, p.25) é composto por questões
apresentadas por escrito às pessoas na intenção de identificar o conhecimento de opiniões,
interesses, expectativas, situações vivenciadas e outras.
No que se refere à interpretação dos dados, adotamos como referência a análise de
conteúdo proposto por Bardin (2011, p.27), que se constitui num contíguo de técnicas que
são justapostas para análise das comunicações, como por exemplo : analise de conversa-
ção, documentação, etc.”.
Vale mencionar que o município de Pacaraima possui duas instituições escola-
res que trabalha com a educação infantil, denominadas Escola Municipal de Ensino
Infantil e Fundamental Alcides da Conceição Lima e Creche Municipal Jessyca Christine
Carvalho da Cruz.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Os resultados obtidos através dos instrumentos de coleta de dados aplicados aos pro-
fessores que participaram da pesquisa revelaram os entendimentos dos sujeitos investigados
acerca do problema pesquisado. E para melhor apresentar os resultados, foi analisado o
questionário fazendo conexão quando possível com algumas citações de autores que dis-
cutem esta temática. Desta forma, podemos dizer que os elementos citados abaixo revelam
direta ou indiretamente o que os sujeitos da pesquisa entendem acerca da importância da
educação física no desenvolvimento das crianças no ensino infantil.
Vale mencionar que por uma questão de ética, na análise dos questionários, os nomes
dos participantes da pesquisa não serão expostos, de maneira que se possa preservar o sigilo
da identidade dos mesmos conforme a Resolução do Conselho Nacional de Saúde (CNS/MS)
466/12 que trata da pesquisa envolvendo seres humanos. E para identificar os mesmos foram
utilizadas letras seguidas de números P1, P2, P3. Cabe advertir que quanto à participação
dos sujeitos envolvidos na pesquisa entregamos os questionários a todos os professores
de educação física que trabalham na educação infantil no Município de Pacaraima, contudo
apenas três destes professores aceitaram participar do estudo. Acredita-se que todas as

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 117


perguntas citadas estrategicamente no questionário foram essenciais para a pesquisa, con-
tudo, as questões que mais relevância tiveram para esclarecer o problema de investigação
e encontram-se descritas abaixo.
Vale mencionar que a história do Município de Pacaraima está ligada à demarcação
da fronteira com a Venezuela pelo Exército Brasileiro, originando-se em torno do marco
conhecido como BV-8. Desta forma, de acordo com o Plano Municipal de Educação deste
município Pacaraima atualmente possui 4 escolas na sede do município , sendo 1 da rede
estadual e 3 da rede municipal.
As escolas da rede municipal atendem alunos da Educação Infantil e Ensino
Fundamental serie iniciais até o sétimo ano e educação especial. A rede estadual atende o
Ensino Fundamental séries iniciais e finais, o ensino médio, educação especial e EJA.
As escolas pesquisadas funcionam em dois turnos, matutino 07h30min ás 11h45min
e vespertino 13h30min ás 17h45min. O quantitativo de alunos atendidos neste ano de
2020 equivale a 3.237 alunos, sendo 488 alunos da educação infantil. Ambas as esco-
las são bastaste diversificada composta por alunos indígenas, afro descendente, brancos,
bem como alunos estrangeiros oriundos de outros países, como venezuelano, Guianeses,
Árabes, Colombianos que residem na sede do município e em Santa Helena de Uairén,
cidade venezuelana.
Assim sendo, compreende-se que a educação física tem papel fundamental no desen-
volvimento das crianças, visto que a referente é uma área do conhecimento que utiliza as
atividades físicas para orientar o processo pedagógico e didático possibilitando o desenvol-
vimento integral do individuo. Nesta premissa, foi perguntado aos professores investigados
qual a função da educação física na escola? Eles responderam:

P1: A educação física na escola é importante em todos os seguimentos, pois ela


promove o desenvolvimento integral do aluno, a vida saudável, a socialização,
o espírito de equipe e a prática do desporto. Ela ainda, evidencia a liberdade
cognitiva e emocional dos estudantes para a aprendizagem.
P2: O professore de Educação Física tem como seu principal papel, ser edu-
cador e contribuir com a formação integral do aluno nos aspectos cognitivo,
afetivo e motor.
P3: A educação física na escola tem como finalidade possibilitar o desenvol-
vimento integral da criança.

De acordo com as respostas acima, percebe-se que os educadores têm um entendi-


mento acerca da importância da educação física não somente na educação infantil , mas
na educação como um todo, visto que a mesma promove como citado acima o desenvolvi-
mento integral do educando, uma vida saudável , a socialização em grupo , além de tornar
os educandos mais criativos e críticos como diz Freire (1989).

118 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Posteriormente ambos os professores foram questionados acerca dos benefícios que
a educação física pode proporcionar as crianças, eles responderam:

P1: Qualidade física, técnica, psicológica e de vida, e a socialização entre eles


através de prática esportiva e movimento corporal, e assim ajudando de uma
forma direta uma melhor desempenho física e intelectual, a fim de ter uma
qualidade e o interesse de uma melhoria na aprendizagem na pratica esportiva.
P2: A educação física escolar promove muitos benefícios, começando pelo in-
centivo da prática de esportes e atividades físicas, como por exemplo: Favorece
o desenvolvimento motor, contribui para a integração social da criança e do
adolescente, colabora para que os alunos adquiram autoconfiança, Melhora
a autoestima, etc.
P3: Favorece o desenvolvimento motor; contribui para a integração social da
criança e do adolescente, colabora para que os alunos adquiram autoconfiança
e melhora a autoestima.

Assim sendo, Gallahue (2005) diz que a educação física assume um papel extrema-
mente significativo na Educação Infantil, pois é através do brincar que a criança explora seu
corpo, interage com outros corpos e desenvolve seu crescimento cognitivo e motor e todos
os professores concordam igualmente que a educação física traz benefícios significativos no
desenvolvimento das crianças, contribuindo para a qualidade física, psicológica, socialização,
melhoria na aprendizagem, incentiva a prática de esportes, diminuir riscos de doenças além
de desenvolver a coordenação motora e raciocínio lógico . E todos esses benefícios citados
contribuem no desenvolvimento da criança.
Vale mencionar que apesar de todos os educadores concordarem igualmente que
a educação física traz benefícios no desenvolvimento das crianças na educação infantil,
contudo, os educadores ressaltam que nas escolas que ambos trabalham não possui mate-
riais adequados e disponíveis para a realização das atividades. Assim, podemos dizer que
as instituições escolares do Município de Pacaraima vão ao contrário do que diz a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB em relação a obrigatoriedade da disciplina,
bem como condições necessárias para prática destes exercícios.
Todos os educadores investigados concordam igualmente que a educação física é
importante na educação infantil, e que a mesma ajuda no desenvolvimento do aluno nesta
modalidade de ensino.

P1: A Educação Infantil proporciona o inicio da vida escolar da criança, onde


o aprendizado é importante em suas dimensões, e a Educação Física nesta
fase vem complementar e contribuir para sua formação, melhorando seu co-
nhecimento e sua relação com o mundo e seu ambiente em que fazem parte.
P2: A Educação Física tem papel fundamental na Educação Infantil, uma vez
que proporciona às crianças inúmeras experiências motoras que as possibilitam
descobrir e redescobrir movimentos, elaborar e reelaborar conceitos e ideias
sobre o movimento e suas ações, logo, é impossível educar integralmente sem
levar em conta o ato motor.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 119


P3: A Educação Física no ensino infantil promove por meio de atividades
físicas o desenvolvimento integral do aluno em seus aspectos físico, psicoló-
gico, intelectual e social, em suas atividades não prioriza somente o intelecto
e psicomotor, mas sim o aluno de forma global abrangendo a sua vida afetiva
e social.

De acordo com o PCN (1997) a criança tem o respeito à dignidade e aos seus direitos
de crianças, na qual é necessário que as suas diferenças sejam elas sociais, individuais,
culturais. Diante disso, a educação física pode ser entendida como:

Entende-se a Educação Física como uma área de conhecimento da cultura


corporal de movimento e a Educação Física Escolar como uma disciplina
que introduz e integra o aluno na Cultura Corporal de Movimento, formando
o cidadão que vai produzi-la, produzi-la e transformá-la, instrumentalizando-o
para usufruir dos Jogos, dos Esportes, das Danças, das Lutas e das Ginásticas
em benefício do exercício crítico da cidadania e da melhoria da qualidade de
vida (BRASIL, 1997, p.75).

Deste modo, a educação física na primeira etapa da educação básica tem como fina-
lidade desenvolver a criança em sua totalidade e em seus aspectos sociais, morais, físicos,
psicológicos, intelectual e social e cabe aos educadores trabalhar os esportes durante as
aulas, mas sob o aspecto lúdico, de sociabilização e do conhecimento corporal. E vale
mencionar que os professores investigados relataram que durante as atividades físicas os
alunos mostram-se realizados e no decorrer das atividades as crianças evidenciam melhoras
significativas no processo de ensino e aprendizagem em todas as áreas de conhecimento.
Nesta conjuctura, foi perguntado aos educadores físicos da rede Municipal de Pacaraima,
de que forma as atividades físicas contribui no desempenho das crianças. Estes responderam:

P1: Nota-se que, após as aulas de educação física, as crianças têm melhora
significativa em seu desempenho.
P2: Dentro das metodologias implantadas, os jogos como fator importantíssimo
no desenvolvimento da criança, ampliando a sua capacidade de interagir e de
se comunicar. Estimulando as capacidades de pensamento e criatividade; além
de ser fator de desenvolvimento da força, do controle muscular, do equilíbrio
orgânico, estimular a coordenação motora, a saúde esquelética, à cooperação
social e psicológica da criança, entre outros fatores.
P3. Os alunos que praticam atividade física, além de desenvolver melhor o
raciocínio lógico e a memória, apresentam também reflexos mais apurados e
maior foco na realização das atividades.

Conforme as respostas acima, percebe-se que os educadores tem uma visão acer-
ca da importância da educação física no desempenho das crianças. P2 e P3 dizem ainda
que posteriormente as aulas de educação físicas as crianças ampliam sua capacidade de
interação, tem reflexos mais apurados e maior foco na realização das atividades e que os
jogos são de suma importância nesse processo. Portanto, as atividades físicas vivenciadas

120 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


na educação infantil se distinguem como importantes colaboradores no desenvolvimento de
atitudes e hábitos que auxiliam na escolha de um estilo de vida, contribuindo assim para o
desenvolvimento psicomotor das crianças.
Diante disso, ambos os educadores entendem a importância da educação física,
mas, estes não tem força para lutar pela melhoria da educação infantil , principalmente por
uma politica municipal que atenda as necessidades das crianças, mas mesmo assim estes
tentam oferecer atividades lúdicas e corporais para suprir a faltar de materiais existente
na rede municipal.
Logo, podemos dizer que a educação física cumpre papel importantíssimo na escola e
na sociedade, de modo que Piccoli (2005) diz que a educação física escolar é um elemento
do processo educacional que possibilita o desenvolvimento global das crianças e através
da prática educativa de exercícios ginásticos, jogos, esportes, dança e luta.
Rolim (2004) complementa a citação acima ressaltado que a

Educação Física na educação infantil tem como finalidade instrumentalizar o


aspecto psicomotor das crianças através de atividades que envolvessem a área
motora, o que, supostamente, possibilitaria um maior sucesso na alfabetização,
dando suporte às aprendizagens de cunho “cognitivo”. (ROLIM, 2004, p.124).

Já Basei (2008) diz que educação física infantil

Tem um papel fundamental na Educação Infantil, pela possibilidade de pro-


porcionar às crianças uma diversidade de experiências através de situações
nas quais elas possam criar, inventar, descobrir movimentos novos, reelaborar
conceitos e idéias sobre o movimento e suas ações. Além disso, é um espaço
para que, através de situações de experiências – com o corpo, com materiais
e de interação social – as crianças descubram os próprios limites, enfrentem
desafios, conheçam e valorizem o próprio corpo, relacionem-se com outras
pessoas, percebam a origem do movimento, expressem sentimentos, utilizando
a linguagem corporal, localizem-se no espaço, entre outras situações voltadas
ao desenvolvimento de suas capacidades intelectuais e afetivas, numa atuação
consciente e crítica. ( BASEI, 2008,p. 1).

Assim, podemos constatar que a Educação Física na Educação Infantil é alvo de muitos
debates, questionamentos e reflexões e que a mesma proporciona as crianças diversidades
de experiências, além de auxiliar o desenvolvimento da personalidade do indivíduo como
um ser social contribui para a construção de habilidades.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 121


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Através deste trabalho levantou-se uma discussão acerca das contribuições da educa-
ção física no desenvolvimento da criança na educação infantil, na qual foi possível analisar
a importância no ambiente escolar.
Desta forma, vale mencionar que na maioria das vezes esta é tida como uma discipli-
na fácil que apenas diverte as crianças, contudo de acordo com o levantamento de dados
percebe-se que a educação física promove inúmeros benefícios para a criança.
Portanto, esta é fundamental e obrigatória nos currículos escolares e tem função espe-
cial em relação ao desenvolvimento da criança, uma vez que desenvolve os educandos em
diversos aspectos sejam eles: psicologicamente, socialmente, mentalmente e fisicamente,
ou seja, através da educação física o ser humano desenvolve-se integralmente.
Neste sentido, por meio das aulas de educação física os professores juntamente como
seus alunos exploram uma variedade de experiência em diferentes dimensões. E nas institui-
ções escolares a educação física tem papel importantíssimo, visto que a referente despertar
nos alunos o interesse em envolver-se com as atividades e exercícios corporais reconhecendo
e respeitando as características físicas de si próprias e de outros indivíduos.

REFERÊNCIAS
1. BRASIL. Lei de diretrizes e bases da educação nacional; lei nº. 9.394/96, de 20 de dezem-
bro de 1996. Disponível em: <http://www.mec.gov.br>. Acesso em: 05 abr. 2014.

2. _____. S. de E. F. Parâmetros Curriculares Nacionais. Primeiro e segundo ciclos do ensi-


no fundamental: educação física. Brasília: Ministério da Educação/Secretaria de Educação
Fundamental, 1997.

3. BASEI, A. P. Educação Física na Educação Infantil: a importância do movimentar-se e


suas contribuições no desenvolvimento da criança. Revista Iberoamericana de Educación
n. 75, v. 3 p. 1681-5653 25 de octubre de 2008. Disponível em: < http://www.rieoei.org/delos-
lectores/2563Basei.pdf>. Acesso em: 05 abr. 2020.

4. BARDIN, L.(2011). Análise de conteúdo.São Paulo: Edições 70.

5. DAOLIO, J. A Antropologia social e a Educação Física: Possibilidades de encontro, in:


CARVALHO, Y. M. e RUBIO, K. Educação Física e Ciências Humanas. São Paulo: HUCITEC,
2000.

6. DEBORTOLI, J. A. Com os olhos de crianças: a ludicidade como dimensão fundamen-


tal da construção da linguagem e da formação humana. Licere, Belo Horizonte, v.2, n.1,
p.105-117, 2001.

7. FREIRE, João Batista. Educação de corpo inteiro: teoria e prática da educação física.
São Paulo: Scipione, 1989.

122 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


8. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. Rio
de Janeiro: Paz e Terra, 1999.

9. GALVÃO, Luciene Rodrigues Rochael. A importância da escola no desenvolvimento


psicossocial da criança, 2009. Disponível em: <http://psicologiaeeducacao.wordpress.
com/2009/07/09/a-importancia-da-escola-no-desenvolvimento-psicossocial-da-crianca/> Acesso
em 08 de abril de 2020.

10. GALLARDO, J.S.P. (org.) Educação física escolar: do berçário ao ensino médio. 2. ed. –
Rio de Janeiro: Lucerna, 2005.

11. GALLAHUE, David L. Compreendendo o desenvolvimento motor: bebês, crianças, ado-


lescentes e adultos. São Paulo: Phorte, 2005.

12. GIL, A. C. Como elaborar um projeto de pesquisa. 4ª ed. São Paulo: Atlas, 2010. Disponível
em:< http://www.proppi.uff.br/turismo/sites/default/files/como_elaborar_projeto_de_pesqui-
sa_-_antonio_carlos_gil.pdf>. Acesso em:20 abr. 2020.

13. JUNIOR, S. L. P.S. BIER A. A importância da atividade física na promoção de saúde da


população infanto-juvenil. Revista Digital -Buenos Aires - A 13, n. 119 - Abril de 2013. Dis-
ponível em:< www.cdof.com.br/AF%20na%20Infância.pdf>. Acesso em: 22 abr. 2020.

14. MANUEL, Sérgio Vieira e Cunha. Educação Física, ou, Ciência da motricidade Humana?/.
–Campinas, SP : Papirus, 1989. –(Coleção Corpo e Motricidade).

15. MARCOS , Garcia Niera, MÁRIO Luiz Ferrari Nunes. Pedagogia da cultura corporal: critica
e alternativas/Ed-2. –São Paulo: Phorte, 2003. 296 pg.

16. MATTOS, M. G. de.; NEIRA, M. G. Educação física infantil: construindo o movimento na


escola. São Paulo/ SP, Ed Phorte, 2006, Vl. 7.

17. MELLO, A. M. Psicomotricidade, Educação Física e Jogos infantis. 7. ed. São Paulo:
Ibrasa, 2009.

18. PLANO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO, (2015). Lei nº 230/2015.

19. ROLIM, L.R. O professor de educação física na educação infantil: uma revisão bibliográ-
fica. Dissertação de Mestrado. Centro Universitário Nove de Julho – UNINOVE, 2004.

20. VASCONCELOS, A. T. S. Interdisciplinaridade na educação física: valorizando a práti-


ca pedagógica no ensino fundamental. [Monografia], Porto Velho-RO, 2017. Disponível
em:<http://www.def.unir.br/downloads/1215_interdisciplinaridade_na_educacao_fisica_valo-
rizando_a_prati.pdf>Acesso em: 20 Abr. 2020.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 123


10
“ Atividade física como adjunto
terapêutico para pacientes
psiquiátricos com adoecimento
mental severo: revisão da
literatura

Maria Cristina Zago


UNIFAAT

Bruneide Menegazzo Padilha


CEFAS

10.37885/200901390
RESUMO

Existe a carência de esclarecimentos mais precisos sobre as repercussões psíquicas da


prática de atividade física (AF) nos serviços de saúde mental para pessoas com adoeci-
mento mental severo (severe mental illness; SMI). O objetivo desta revisão foi investigar
a AF como adjunto terapêutico para pacientes com SMI. Foram usadas as bases de
dados EBSCOHost, PsycInfo, SportDiscus, Medline, PsyArticles. Estudos qualitativos e
quantitativos publicados entre 2000 e 2014 foram inclusos e também literatura anterior
considerada relevante. As investigações relatam que a AF pode contribuir para a melhora
de humor, estado de alerta, concentração, padrões de sono e sintomas psicóticos; aliviar
sintomas secundários como baixa autoestima e retraimento social. Há evidência também
de benefícios psicológicos da AF em pacientes depressivos. Os pacientes veem a AF po-
sitivamente e gostariam de ser ativos e melhorar a saúde mental. Barreiras identificadas
pelos pacientes foram: impacto do adoecimento e efeitos de medicação, fadiga, ganho
de peso por medicação, medo de discriminação e questões relativas à segurança e falta
de suporte profissional. O contexto grupal aparece como um ambiente favorecedor da
prática de AF. A literatura considera a AF como uma intervenção que pode ser útil para
a promoção da saúde mental e bem-estar, portanto uma estratégia em reabilitação psi-
cossocial para pessoas com SMI. As conclusões dos estudos se restringem a um âmbito
descritivo, são limitadas, carecem de uma metodologia de pesquisa precisa em alguns
casos, revelando a necessidade de novos estudos.

Palavras-chave: Saúde Mental, Atividade Física, Grupo.


INTRODUÇÃO

Os benefícios da prática de atividade física (AF) vêm sendo largamente discutidos na


mídia e na literatura em diversas áreas do conhecimento (WHO, 2010). Contudo, se nota
um interesse crescente dos pesquisadores das repercussões da prática de AF em pacientes
psiquiátricos na década de 1990 (SKRINAR; UNGER; HUTCHINSON; FAIGENBAUM, 1992;
FAULKNER; BIDDLE, 1999; FAULKNER; SPARKES, 1999; HUTCHINSON; SKRINAR;
CROSS, 1999) e no início do século XXI (MEYER; BROOCKS, 2000; CARTER-MORRIS;
FAULKNER, 2003; GIULIANI; MICACCHI; VALENTI, 2005; MCDEVITT, ROBINSON;
FOREST, 2005; RICHARDISON; FAULKNER; MCDEVITT; SKRINAR; HUTCHINSON;
PIETTE, 2005; FAULKNER; COHN; REMINGTON, 2006; TRIVEDI; GREER; GRANNEMANN;
CHAMBLISS; JORDAN, 2006; USSHER; STANBURY; CHEESEMAN; FAULKNER, 2007;
ADAMOLI; AZEVEDO, 2009).
Alguns estudos discutem os benefícios da prática de exercícios regulares para indiví-
duos submetidos a tratamento psiquiátrico e abordam o impacto da prática de AF do ponto
de vista organicista, no sentido da prevenção de patologias advindas dos efeitos colaterais
do tratamento medicamentoso e do estilo de vida dessa população, por vezes sedentário
(MCDEVITT, et al., 2005; FAULKNER, et al., 2006; LEIBOVICH; IANCU, 2007; SMITH;
YEOMANS; BUSCHE; ERIKSSON; HARRISON; HOLMES; MYNORS-WALLIS; OATWAY;
SULLIVAN, 2007; SCOTT; HAPPELL, 2011). No entanto se observa a carência de escla-
recimentos mais precisos sobre as consequências da prática de AF nos serviços de saúde
mental para pessoas com doença mental severa (severe mental illness, SMI), especialmente
no que se refere às repercussões psíquicas do ponto de vista dinâmico.

Adultos com um adoecimento mental severo são pessoas: (1) idade de 18 anos
ou mais, (2) que atualmente, ou em qualquer momento durante o ano passado,
(3) teve um distúrbio mental, comportamental ou emocional diagnosticável de
duração suficiente para cumprir os critérios de diagnóstico especificadas no
Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM)-III-R, (4) que
resultou em prejuízo funcional que interfere substancialmente com os limites
de uma ou mais atividades principais da vida […] Todos esses transtornos têm
características episódicas, recorrentes ou persistentes, no entanto eles variam
em termos de gravidade e efeitos incapacitantes (FEDERAL REGISTER, 1993,
citado por INSEL, 2013), (tradução nossa).1

Nesse sentido, este estudo investigou a prática de atividade física em saúde mental
como adjunto terapêutico para pacientes psiquiátricos com doença mental severa.
1 “‘Adults with a serious mental illness are persons: (1) age 18 and over, (2) who currently or at any time during the past year, (3) have
a diagnosable mental, behavioral, or emotional disorder of sufficient duration to meet diagnostic criteria specified within the Diagnostic
and Statistical Manual of Mental Disorders (DSM)-III-R, (4) that has resulted in functional impairment which substantially interferes with
or limits one or more major life activities…All of these disorders have episodic, recurrent, or persistent features; however, they vary in
terms of severity and disabling effects.’ Federal Register Volume 58 No. 96 published Thursday May 20, 1993, pages 29422-29425.”

126 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


DESENHO METODOLÓGICO

Neste estudo, AF é considerada como caminhada e exercício estruturado, incluindo


atividade física em grupo ou esporte (SOUNDY; FAULKNER; TAYLOR, 2007). A pesquisa
dos artigos foi conduzida por meio da base de dados EBSCOHost,2 PsycInfo, SPORTDiscus,
Medline, PsyArticles: termos de indexação: mental health (saúde mental), severe mental
illness (doença mental severa), physical activity (atividade física), exercise (exercício), group
psychoterapy (psicoterapia de grupo), group analysis (grupanálise), psychoanalysis (psica-
nálise). Em relação à categoria mental health (saúde mental), usou-se a qualificação severe
(severa) como predecessor. Ao mesmo tempo, os termos schizophrenia (esquizofrenia) e
psychosis (psicose) foram usados na busca. O termo depression (depressão) isolado repre-
senta artigos relativos à depressão leve ou moderada. Assim, apenas os trabalhos referentes
à severe (severa) ou depressão bipolar foram incluídos. Os artigos relativos à doença de
Alzheimer e demência foram excluídos, pois não se enquadravam na proposta desta pes-
quisa. Dessa forma, foram inclusos artigos publicados em periódicos científicos entre 2000 e
2014 e literatura anterior considerada relevante (texto completo). As intervenções pertinentes
a exercício ou atividade física (isoladas ou como parte de um programa que envolvia outras
intervenções) foram selecionadas, o que está de acordo com a definição de atividade física
que norteia este estudo (SOUNDY; FAULKNER; TAYLOR, 2007). Primeiramente, dois in-
vestigadores avaliavam os títulos e resumos das publicações encontradas para verificar se
atendiam ou não aos critérios de inclusão. Apenas quando houve a concordância entre os
dois investigadores sobre a adequação do artigo científico ao objetivo deste estudo é que
as informações pertinentes foram acessadas e anexadas. Procurou-se também fazer uma
busca manual por estudos potencialmente pertinentes localizados nas listas de referência
dos artigos selecionados, notadamente os de revisão sistemática da literatura, os quais talvez
não tivessem sido encontrados na pesquisa às bases de dados. Em seguida, partiu-se para
a procura direcionada dos referidos artigos considerados relevantes a este estudo. No total,
41 artigos foram selecionados para compor esta revisão, segundo os critérios de inclusão
e exclusão descritos anteriormente.

2 Empresa irmã da EBSCO Information Services, a EBSCO Publishing é o fornecedor do EBSCOhost®, o recurso eletrônico pago mais
utilizado por bibliotecas ao redor do mundo. A EBSCO Publishing é o principal agregador de bases de dados do mundo, oferecendo
uma suíte de mais de 200 bases de dados de pesquisa em texto completo e resumo. Recuperado a partir de:http://www2.ebsco.com/
pt br/ProductsServices/ehostdatabases/Pages/index.aspx.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 127


Os artigos encontrados neste período têm uma vinculação às áreas de Psiquiatria,
Saúde Mental, Medicina Esportiva, Enfermagem, Psicologia, Psicologia do Esporte e Ciência
do Esporte. Nota-se que os trabalhos aludidos tendem a usar o termo severe mental illnes
(SMI; adoecimento mental severo), ou seja, uma linguagem própria da nosografia psiquiá-
trica.3 Entende-se que a escolha desse termo (SMI) facilita o diálogo internacional entre
as diferentes áreas do conhecimento científico que transitam no âmbito da saúde mental.
Embora haja o reconhecimento dos benefícios do exercício físico (MEYER; BROOCKS,
2000; CARTER-MORRIS; FAULKNER, 2003; BROOCKS, 2005; BROOCKS; SOMMER,
2005; GIULIANI; MICACCHI; VALENTI, 2005; MCDEVITT, et al., 2005; RICHARDISON,
et al., 2005; FAULKNER, et al., 2006; FAULKNER; CARLESS, 2006; TRIVEDI, et al., 2006;
LEIBOVICH; IANCU, 2007; USSHER, et al., 2007; ADAMOLI; AZEVEDO, 2009), as conclu-
sões dos estudos se restringem a um âmbito descritivo, são limitadas em termos metodoló-
gicos. Existe uma escassez de pesquisas em relação a esse tema, como aponta a literatura.
Notadamente, estudos que norteiem a estruturação de programas específicos de AF para
essa população, a fim de que esta prática figure como tratamento coadjuvante efetivo para
indivíduos com SMI (GIULIANI, et al., 2005; RICHARDISON, et al., 2005; USSHER, et al.,
2007). Uma das explicações apontadas para a carência de publicações refere-se à dificul-
dade em conduzir pesquisa sobre AF no contexto de SMI em termos de acesso a subjeti-
vidade desses pacientes. Ao mesmo tempo, comorbidades e o uso de medicação podem
afetar a resposta à AF o que torna problemático o delineamento das conclusões (CARLESS;
DOUGLAS, 2008). Por outro lado, a heterogeneidade das intervenções e, por vezes, amos-
tras pequenas utilizadas nos estudos limitam conclusões e evidenciam a necessidade de
pesquisas futuras (VANCAMFORT; PROBST; SKJAERVEN; MATAMOROS; GYLLENSTEN;
CONESA; IJNTEMA; HERT, 2012).

DISCUSSÃO

Prática de AF em programas individuais e em situação de grupo

Existem indagações, por exemplo, a respeito da aderência dos pacientes a programas


individuais de AF em relação a outros que são desenvolvidos em grupo. Pontua-se que,
embora o grupo se configure num espaço de baixo custo para o desenvolvimento dessas
atividades, a disponibilidade do coordenador em dar atenção individualizada estaria difi-
cultada, o que, segundo Giuliani, et al. (2005) e Richardison, et al. (2005), desempenha
papel importante nesse processo interventivo. Estudando-se o impacto de um programa

3 Termo usado frequentemente na clínica psiquiátrica e em muitos documentos de políticas governamentais em todo mundo (SMITH,
et al., 2007).

128 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


estruturado de exercícios no bem-estar físico e psíquico de pacientes com esquizofrenia ou
demais psicoses, considerou-se relevante a abordagem grupal na intervenção desenvolvida
em termos de incremento de motivação e prazer em tomar parte (FOGARTY; HAPPELL,
2005). Os benefícios da prática de AF na situação de grupo não foram devidamente explo-
rados pela literatura. Embora esse artigo não seja recente, apresenta um exemplo de uma
proposta de tratamento com orientação psicodinâmica para pacientes psiquiátricos, Evening
Treatment Program, que continha a prática de exercício em dois grupos: (1) uma versão
modificada do voleibol; e (2) exercícios aeróbicos (incluía também a dança). Os autores
apontam, como benefícios potenciais, a redução da tensão e o relaxamento; favorecimento
da descoberta de que os pacientes podem participar e experienciar a prática de AF como
prazerosa e desenvolver habilidades; a exploração dos limites corporais e internalização de
uma imagem corporal saudável; favorecer processos de identificação com os terapeutas;
experienciar fazer parte de um “time” e propiciar um ambiente confiável para a emergência e
elaboração de conflitos (O’KELLY; PIPER; KERBER; FOWLER, 1998). Zago e Terzis (2012)
reportaram a importância da prática de AF em grupo segundo a técnica grupal chamada,
Grupo de Atividades Físicas, no tratamento de pacientes com SMI em uma unidade de inter-
nação (inpatients: pacientes que permanecem no hospital enquanto recebem tratamento) de
um serviço público de saúde mental do Estado de São Paulo, Brasil. Investigou-se a prática
de AF como fator atenuante dos sintomas relativos ao adoecimento mental severo em si-
tuação de tratamento intensivo, segundo abordagem psicanalítica e grupanalítica (psicote-
rapia de grupo de base analítica). O grupo era aberto, heterogêneo quanto ao diagnóstico,
gênero e idade. A técnica grupal, Grupo de Atividades Físicas, compreendia três momentos
principais: (1) caminhada (de ida e volta do serviço ao centro de convivência); (2) atividade
física coletiva; e (3) momento simbólico da sessão (espaço para reflexão, simbolização e
elaboração das vivências do grupo). A técnica utilizada como dispositivo psicoterapêutico,
em seus diversos momentos, direcionou o grupo no sentido da organização psíquica. Gerou
um ambiente que oportunizou a relação com o outro e, ao mesmo tempo, constituiu-se num
espaço elaborativo. O grupo se transformou num espaço para se legitimar afetos, como a
agressividade, que encontrou dentro da prática de AF coletiva com bola uma possibilidade
de expressão culturalmente aceita. Propiciou um cenário para o estabelecimento de pro-
cessos de identificação, ao funcionar como elemento facilitador do contato intersubjetivo no
aqui e agora. Dessa maneira, esse setting não convencional agiu no sentido de atenuar os
sintomas do adoecimento mental severo. Posteriormente, investigou-se a técnica grupal,
Grupo de Atividades Físicas, como dispositivo psicoterapêutico para pacientes psiquiátri-
cos com adoecimento mental severo inseridos num centro de atenção psicossocial (CAPS;
outpatients: pacientes em regime de atendimento ambulatorial) que fazia parte do mesmo

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 129


serviço público de saúde mental. O grupo era aberto, heterogêneo quanto ao diagnóstico,
gênero e idade; 16 pacientes, faixa etária de 27 a 56 anos. Concluiu-se que essa técnica
grupal apresentava uma característica especial no que se refere à comunicação não verbal
desenvolvida no momento da atividade física coletiva; esse contexto propiciava um “jogo” de
possibilidades, em que o reconhecimento pelo “passar da bola” sinalizava para um contato
intersubjetivo. O envolvimento na atividade grupal proposta remeteu a um movimento da libido
em direção à realidade externa, noticiando um afastamento do processo de adoecimento
mental severo (ZAGO; TERZIS; PADILHA, 2014). Um estudo também recente (PRIEBE;
SAVIL; REININGHAUS; WYKES; BENTALL; LAUBER; MCCRONE; RÖHRICHT; ELDRIDGE,
2013) avaliou a eficácia de uma forma de grupoterapia (psicoterapia corporal, em inglês,
body psychoterapy; BPT) em aliviar os sintomas negativos da esquizofrenia. A conclusão
aponta que essa proposta interventiva pode ser útil e atrativa a esses pacientes devido
à sua abordagem não usual e também ao serviço, pois demanda baixo investimento em
termos de custo. Sinalizou que fatores não específicos podem ser responsáveis por pelo
menos parte dos efeitos benéficos advindos da prática de AF, como desenvolver atividades
em grupo. Outro estudo (GOMESA; BASTOS; PROBST; RIBEIRO; SILVA; CORREDEIRA,
2014) verificou os efeitos da prática de atividade física em grupo (duas sessões por semana,
durante 16 semanas) em termos de promoção de qualidade de vida para indivíduos com es-
quizofrenia (outpatients). Concluiu-se que esse programa de atividade física em grupo pode
ser implantado exitosamente para pacientes com esquizofrenia não internados, atuando no
sentido de incrementar sua qualidade de vida.
Sem dúvida, o grupo se constitui em dispositivo terapêutico efetivo para pacientes com
SMI, como ilustra a história do surgimento da psicoterapia de grupo desde o século passa-
do. No entanto a utilização de atividade física como elemento mediador da comunicação
entre os elementos do grupo constitui-se numa nova proposta interventiva para o atendi-
mento desses pacientes, especialmente em situações em que os recursos verbais estão
comprometidos às vezes pelo mutismo ou por processos delirantes.

Aderência dos pacientes com doença mental severa a programas de tratamento que
incluem atividade física

A literatura sugere que pacientes com SMI apresentam baixos níveis de participação
em AF quando comparados a grupos controle de sujeitos que não se enquadram nessa ca-
tegoria (NYBOE; LUND, 2012). Nesse sentido, outro ponto discutido refere-se à importância
de realizar-se a atividade com pacientes com SMI de maneira supervisionada. Embora os
pacientes psiquiátricos demonstrem interesse em exercícios físicos (GIULIANI, et al., 2005;
RICHARDISON, et al., 2005; USSHER, et al., 2007; ZAGO; TERZIS, 2012), a aderência ao

130 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


programa proposto está relacionada a um suporte técnico efetivo (USSHER, et al., 2007;
ZAGO; TERZIS, 2012). Os pacientes relatam que se exercitariam mais se a prática de AF fos-
se aconselhada por seu médico, o que corrobora a importância da participação dos cuidado-
res (médicos, psicólogos, enfermeiros, etc.) na adesão e assiduidade dos pacientes a essa
proposta terapêutica. Por outro lado, embora os feitos terapêuticos sejam cada vez mais
reconhecidos por profissionais da área da saúde mental, poucos recomendam essa prática
a seus pacientes, pois haveria a crença de que essas discussões caberiam a especialistas
em recreação física e fisiologistas (MCENTEE; HALGIN, 1996); aqueles com orientação
psicanalítica têm sido relutantes em utilizar o exercício para fins terapêuticos, ou como ad-
junto às formas tradicionais de psicoterapia (O’KELLY, et al., 1998). Porém um estudo que
contou com a participação de 620 psicólogos sugere que muitos se consideram dispostos e
potencialmente aptos em promover AF como parte do tratamento psicológico e desejariam
participar em desenvolvimento profissional nessa área (BURTON; PAKENHAM; BROWN,
2010). Além do que, a prática de AF em um procedimento estruturado para pacientes psi-
quiátricos apresenta-se como uma alternativa viável em unidades que atendem pacientes
internados (ZAGO; TERZIS, 2012) ou em centros de atenção diária, como os centros de
atenção psicossocial (ADAMOLI; AZEVEDO, 2009; ZAGO, et al., 2014).
A área de enfermagem está cada vez mais ciente do importante papel que exercem no
encorajamento e assistência dos pacientes em relação à prática de AF em saúde mental,
embora não tenham, por vezes, a preparação para desenvolver esse papel eficientemente
(HAPPELL; PHUNG-PLATANIA; SCOTT, 2011). Analisando-se o nível de participação em
atividade física de pacientes com SMI, há a compreensão de que o suporte social adequado
pode atuar no sentido contrário às barreiras relativas à ansiedade e sintomas depressivos
contribuindo, dessa maneira, para o aumento da participação (BONSAKSEN, 2011). Zago
e Terzis (2012) relataram a importância do papel dos cuidadores,4 principalmente, psicote-
rapeuta, técnico em enfermagem e educador físico, no sentido de secretariar os pacientes
em direção ao estabelecimento de vínculo entre si e com a atividade grupal proposta que
continha a prática coletiva de AF. Em estudo recente, discutiu-se a importância da integração
da Educação Física como ciência auxiliar à Psiquiatria, segundo perspectiva interdisciplinar
de tratamento em saúde mental (MELO; OLIVEIRA; VASCONCELOS-RAPOSO, 2014). Faz-
se fundamental a promoção de diálogo e maior aproximação entre as diferentes áreas do
conhecimento que dão suporte à atuação em saúde mental, a fim de que novas propostas
interventivas sejam estruturadas e desenvolvidas numa perspectiva multidisciplinar.

4 Na extensão de toda a obra, usa-se o termo cuidador para designar profissionais da área de saúde (médicos, enfermeiros, psicólo-
gos, assistentes sociais, etc.), (OSÓRIO, 2007).

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 131


Percepção dos pacientes com doença mental severa sobre a prática de atividade física
no programa de tratamento

Em um estudo qualitativo, foram investigadas as experiências de usuários de serviços


de saúde mental que tinham como parte do tratamento a participação em um programa
de exercícios (sports therapy), (CRONE; HELEN, 2008). Os resultados corroboram a con-
sideração de que a terapia esportiva se constitui em um aceitável e benéfico adjunto ao
tratamento convencional. Apontam a necessidade de uma maior compreensão teórica a
esse respeito. Um estudo analisou as barreiras para a captação e aderência de pacientes
com diagnóstico de esquizofrenia a programas de AF locados na comunidade. Os resulta-
dos dessa pesquisa qualitativa obtidos em entrevistas semiestruturadas com 27 pacientes
colocam quatro barreiras: experiência restrita de engajamento em AF, impacto da doença
e da medicação, efeitos da ansiedade e a influência das redes de suporte (JOHNSTONE;
NICOL; DONAGHY; LAWRIE, 2009). Outro estudo realizado por meio de grupos focais e
entrevistas semiestruturadas com 34 pacientes ambulatoriais aponta as seguintes barreiras
em participar de programas de AF: sintomas do adoecimento mental, medicação, ganho de
peso, medo de condições inseguras, medo de discriminação e interpretações sobre o cum-
primento do programa. Contudo os pacientes tinham a prática de AF como algo positivo e
associado à saúde mental (MCDEVITT; SNYDER; MILLER; WILBUR, 2006).
Outro estudo procurou estabelecer um entendimento a respeito do papel do esporte
(futebol) e do exercício na recuperação de homens com adoecimento mental severo; me-
diante uma abordagem interpretativa de entrevistas semiestruturadas e diários de pesquisa
(18 meses), apresentou o estudo de dois casos (dois homens usuários de um serviço de
reabilitação para pessoas com adoecimento mental severo): (1º) tinha experiência pessoal
em participação esportiva e exercícios; (2º) estava disposto a participar da pesquisa. Ambos
relataram benefícios psicológicos positivos em termos de humor e concentração, e sociais
pertinentes à troca de experiências com outros e ao favorecimento de um espaço para acolher
produções verbais. O esporte e o exercício eram centrais na identidade do primeiro partici-
pante e fundamentais para o seu senso de self. Para ele, regressar ao esporte e exercício
após a remissão dos sintomas psicóticos representou o retorno a atividades imbuídas de sen-
tido. No segundo caso, o esporte e o exercício foram usados como ferramentas ou veículos
para resultados desejados que facilitaram atividades pessoais com sentido representando
um começo e uso valoroso do tempo (CARLESS; DOUGLAS, 2008). Um estudo recente
(BATTAGLIA; ALESI; INGUGLIA; ROCCELLA; CARAMAZZA; BELLAFIORE; PALMA, 2013)
investigou os efeitos da prática de futebol na percepção da qualidade de vida e desempenho
esportivo em sujeitos com psicose. A intervenção consistia em duas sessões de treino por
semana (12 semanas). Os resultados apontam que a prática de futebol melhora a saúde

132 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


psíquica e física de indivíduos com diagnóstico de esquizofrenia. Ao mesmo tempo, esse
estudo demonstrou que a prática de AF desenvolvida por esse programa de treinamento de
futebol reduziu a necessidade de medicação antipsicótica e, consequentemente, os efeitos
adversos dessa prescrição para esses sujeitos. Um estudo que investigou a promoção do
bem-estar em serviços de saúde mental, do ponto de vista dos usuários e dos profissionais,
sugere que sejam feitas parcerias com locais da comunidade, como as que oportunizam a
prática de AF (OWENS; CRONE; KILGOUR; ANSARI, 2010).
A prática de AF de maneira coletiva em um centro de convivência, isto é, fora do am-
biente formal de tratamento, traz a possibilidade de aproximação dos participantes com as
pessoas da comunidade. Além disso, a introdução de propostas interventivas deve estar
alinhada à orientação de se inserir ações terapêuticas na base territorial que compõe a rede
de saúde da realidade social em questão.

Integração da prática de AF em programas de tratamento de pacientes com SMI

Richardison, et al. (2005) realizaram uma revisão importante sobre a integração


de AF nos serviços de saúde mental. Dentro dessa revisão, assinala-se que o exercício
pode aliviar sintomas secundários de esquizofrenia, como depressão, baixa autoestima e
retraimento social. Além disso, AF pode reduzir o isolamento social para as pessoas com SMI
e ser uma via de promoção do engajamento dos indivíduos em serviços de saúde mental,
oferecendo oportunidades seguras para interação social (CARTER-MORRIS; FAULKNER,
2003; ZAGO; TERZIS, 2012). Aponta-se que a prática de AF representa um adjunto aceitável
e benéfico ao tratamento usual para indivíduos com SMI (CRONE; HELEN, 2008). Em revi-
são sistemática da literatura (HOLLEY; CRONE; TYSON, 2011), sugeriu-se que AF tem um
efeito benéfico em alguns atributos associados ao bem-estar psicológico em indivíduos com
esquizofrenia. Um dos estudos citados (RACINET; CHEVROLLIER, 1997) baseava-se num
programa relativo à prática de futebol em hospital psiquiátrico. Essa revisão também apontou
a necessidade de maiores pesquisas em relação a esse tema. Em revisão crítica recente que
apresenta trabalhos relativos ao impacto do exercício na saúde mental e qualidade de vida de
pessoas com SMI publicados no período entre 1998 a 2009 (ALEXANDRATOS; BARNETT;
THOMAS, 2012), os autores concluem que o exercício pode contribuir na melhora em termos
de sintomatologia: humor, concentração, padrões de sono e sintomas psicóticos. Ao mes-
mo tempo, também a prática de exercícios pode melhorar a qualidade de vida por meio da
interação social, uso do tempo preenchido por sentido, atividade que apresenta propósito e
empoderamento. Os autores recomendam pesquisas que possam trazer mais subsídios em
relação à prática de exercícios pertinentes às necessidades específicas dessa população.
Enfatizam ainda que os estudos devem direcionar seu foco para avaliações psicológicas

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 133


que pudessem prover maior evidência sobre o uso dessa terapia. Nesse sentido, estudos
(ZAGO; TERZIS, 2012; ZAGO, et al., 2014) apontam que a psicoterapia analítica de grupo
pode contribuir trazendo uma compreensão sobre a maneira como a subjetividade de pa-
cientes com SMI se coloca dentro do “jogo-relacional” mediada por atividade física em grupo
e, mais profundamente, uma leitura da realidade psíquica inconsciente compartilhada que
se desenvolve por meio da comunicação interdiscursiva.

CONCLUSÕES

Conclui-se que a prática de AF pode contribuir para melhora de humor, estado de


alerta, concentração, padrões de sono e sintomas psicóticos; pode aliviar sintomas secun-
dários, como baixa autoestima e retraimento social. Há evidência também de benefícios
psicológicos da prática de AF em pacientes depressivos. Os pacientes veem AF positiva-
mente e gostariam de serem ativos e melhorar a saúde mental. Barreiras apontadas pelos
pacientes foram: sintomas do adoecimento mental, efeitos da medicação, fadiga, ganho de
peso por medicação, medo de discriminação e questões relativas à segurança e falta de
suporte profissional. O contexto grupal aparece como um ambiente favorecedor da prática
de AF. Os profissionais de saúde mental têm sido uma fonte subutilizada na promoção de
AF. A literatura considera AF como uma intervenção que pode ser útil para a promoção da
saúde mental e bem-estar, portanto uma estratégia em reabilitação psicossocial para pes-
soas com SMI. Faz-se importante, dentro da noção de território, estabelecer parcerias com
centros comunitários, de convivência, a fim de ofertar aos pacientes mais espaços possíveis
para a prática de AF.
Há a necessidade da elaboração de mais estudos sobre as repercussões psíqui-
cas da AF como intervenção terapêutica para pacientes com adoecimento mental severo.
Entende-se que programas de tratamento que incluem AF podem ser direta ou indiretamente
terapêuticos para esses pacientes, conforme seu objetivo e delineamento. Além disso, a
prática de AF pode ser um elemento mediador de relações intersubjetivas em dispositivos
estruturados em situação de grupo com finalidade psicoterapêutica. Nesse sentido, a psicote-
rapia de grupo, e mais especificamente a de base analítica, pode contribuir na compreensão
dos fenômenos psíquicos emergentes no desenvolvimento de AF no contexto coletivo.
Destaca-se a importância do papel dos profissionais na utilização da prática de AF como
ferramenta viável, de baixo custo e potencialmente terapêutica no tratamento de pacientes
com doença mental severa, quer em centros de atenção diária ou em situação de cuidado
intensivo. A presença da prática de AF em saúde mental depende da maneira como os ge-
rentes entendem as práticas de atendimento e a elaboração dos programas de tratamento,
da atribuição de valor que os profissionais cuidadores dão a essa prática, como também

134 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


da disponibilidade de todos em dar suporte aos pacientes no processo de adesão a essa
proposta interventiva.

REFERÊNCIAS
1. ADAMOLI, Angélica Nickel; AZEVEDO, Mario Renato. Padrões de atividade física de pessoas
com transtornos mentais e de comportamento. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v.
14, n. 1, p. 243-251, Feb. 2009.

2. ALEXANDRATOS, Kristy; BARNETT, Fiona; THOMAS, Yvonne. The Impact of Exercise on


the Mental Health and Quality of Life of People with Severe Mental Illness: A Critical Review.
British Journal of Occupational Therapy, v. 75, p. 48-60, 2012.

3. BATTAGLIA, Giuseppe; ALESI, Marianna; INGUGLIA, Michele; ROCCELLA, Michele; CARA-


MAZZA, Giovanni; BELLAFIORE, Marianna; PALMA, Antonio. Soccer practice as an add-on
treatment in the management of individuals with a diagnosis of schizophrenia. Neuropsychiatric
Disease and Treatment, v.9, p.595-603. May, 2013

4. BONSAKSEN, Tore. Participation in physical activity among inpatients with severe mental
illness: A Pilot Study. International Journal of Therapy and Rehabilitation, v. 18, n. 2, p.
91-9, Feb. 2011.

5. BROOCKS, Andreas. Physical training in the treatment of psychological disorders. Bundesge-


sundheitsblatt Gesundheitsforschung Gesundheitsschutz, v.48, n.8, p.914- 21, Aug. 2005.

6. BROOCKS, Andreas; SOMMER, Marcel. Psychische sportwirkungen. / psychological effects


of sport. Deutsche Zeitschrift fuer Sportmedizin, v.56, n.11, p.393-94, Nov. 2005.

7. BURTON, Nicola W.; PAKENHAM, Kenneth I.; BROWN, Wendy. J. Are Psychologists Willing
and Able to Promote Physical Activity as Part of Psychological Treatment. International Journal
Behavior Medicine, v. 17, p. 287-97, 2010.

8. CARLESS, David; DOUGLAS, Kitrina. The role of sport and exercise in recovery from serious
mental illness: two case studies. International Journal of Men’s Health, v.7, n.2, p.137-156,
2008.

9. CARTER-MORRIS, Pam; FAULKNER, Guy. A football project for service users: the role of
football in reducing social exclusion. Journal of Mental Health Promotion, v.2, p.24-30, 2003.

10. CRONE, Diane; GUY, Helen. ‘I know it is only exercise, but to me it is something that keeps
me going’: a qualitative approach to understanding mental health service users’ experiences
of sports therapy. International Journal of Mental Health Nursing, v.17, p.197-207, 2008.

11. FAULKNER, Guy; BIDDLE, Stuart. Exercise as an adjunct treatment for schizophrenia: a review
of the literature. Journal of Mental Health, v.8, p.441–57, 1999.

12. FAULKNER, Guy; CARLESS, David. Physical activity in the process of psychiatric rehabili-
tation: theoretical and methodological issues. Psychiatric Rehabilitation Journal, v.29, n.4,
p.258-66, 2006.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 135


13. FAULKNER, Guy; COHN, Tony; REMINGTON, Gary. Validation of a physical activity assess-
ment tool for individuals with schizophrenia. Schizophrenia Research, v.82, n.2-3, p.225-31,
Feb. 2006.

14. FAULKNER, Guy; SPARKES, Andrew. Exercise as therapy for schizophrenia: an ethnographic
study. Journal of Sport and Exercise Psychology, v.21, n.1, p.52–69, 1999.

15. FOGARTY, Margaret; HAPPELL, Brenda. Exploring the benefits of an exercise program for
people with schizophrenia: a qualitative study. Issues in Mental Health Nursing, v.26, n.3,
p.341-51, 2005.

16. GIULIANI, Alessandra; MICACCHI, Gloria; VALENTI, Marco. L’attività motoria nei servizi di
salute mentale: evidenze scienti che e linne guida. Italian Journal of Sport Sciences, v.12,
n.2, p.116-24, 2005.

17. GOMESA, Eluana; BASTOS, Tânia; PROBST, Michel; RIBEIRO, José Carlos; SILVA, Gus-
tavo; CORREDEIRA, Rui. Effects of a group physical activity program on physical fitness and
quality of life in individuals with schizophrenia. Mental Health and Physical Activity, v.7, n.3,
p.155-62, 2014.

18. HAPPELL, Brenda; PHUNG-PLATANIA, Chris.; SCOTT, David. Placing physical activity in
mental health care: A leadership role for mental health nurses. International Journal of Mental
Health Nursing, v.20, p.310-18, 2011.

19. HOLLEY, Jessica; CRONE, Diane; TYSON, Philip; LOVELL, Geoff. The effects of physical
activity on psychological well-being for those with schizophrenia: a systematic review. British
Journal of Clinical Psychology, v.50, n.1, p.80-105, 2011.

20. HUTCHINSON, Dori. S.; SKRINAR, Gari S.; CROSS, Caitlin. The role of improved physical
fitness in rehabilitation and recovery. Psychiatric Rehabilitation Journal, v.22, p.355-59, 1999.

21. INSEL, Thomas. Getting serious about mental illnesses. National Institute of Mental Health,
v.58, n.96, p.29422-29425, July, 2013. Disponível em: <https://sardaa.org/wp-content/uplo-
ads/2013/08/Getting-Serious-About-Mental-Illnesses.pdf> Acesso em: 23/09/2020.

22. JOHNSTONE, Rosalind; NICOL, Kath; DONAGHY, Marie; LAWRIE, Stephen. Barriers to uptake
of physical activity in community-based patients with schizophrenia. Journal of Mental Health,
v.18, n.6, p. 523-32, 2009.

23. LEIBOVICH, Pazit; IANCU, Iulian. Physical exercise among psychiatric patients: physical and
mental effects. Harefuah, v.146, n.12, p. 975-979, Dec. 2007.

24. MCDEVITT, Judith; SNYDER, Marsha; MILLER, Arlene; WILBUR, Joellen. Perceptions of Bar-
riers and Benefits to Physical Activity Among Outpatients in Psychiatric Rehabilitation. Journal
of nursing scholarship, v.38, n.1, p.50-55, February 2006.

25. MCENTEE, Derek J.; HALGIN, Richard P. Therapists’ attitudes about addressing the role of
exercise in psychotherapy. Journal of Clinical Psychology, 52, 48–60, 1996.

26. MELO, Lígia Gizely dos Santos Chaves; OLIVEIRA, Kleber Roberto da Silva Gonçalves de;
VASCONCELOS-RAPOSO, José. A educação física no âmbito do tratamento em saúde mental:
um esforço coletivo e integrado. Revista Latinoamericana de psicopatologia Fundamental,
São Paulo, v. 17, n. 3, p. 501-514, Sept. 2014.

136 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


27. MEYER, Thomas; BROOCKS, Andreas. Therapeutic impact of exercise on psychiatric diseases:
guidelines for exercise testing and prescription. Sports Medicine, v.30, n.4, p.269-79, Out. 2000.

28. NYBOE, Lene; LUND, Hans. Low levels of physical activity in patients with severe mental ill-
ness. Nordic Journal of Psychiatry, v.67, n.1, p. 43-6, May 2012.

29. O’KELLY, John G.; PIPER, Willian E.; KERBER, Rosita; FOWLER, James. Exercise groups in
an insight-oriented, evening treatment program. International Journal of Group Psychothe-
rapy, v.48, n.1, p.85-98, 1998.

30. OSÓRIO, Luiz C. Grupoterapias: abordagens atuais. Porto Alegre: Artmed, 2007.

31. OWENS, Christopher S.; CRONE, Diane; KILGOUR, Lindsey; EL ANSARI, Walid. The place
and promotion of well- being in mental health services: a qualitative investigation. Journal of
Psychiatric and Mental Health Nursing, v.17, p.1-8, 2010.

32. PRIEBE, Stefan; SAVIL, Mark; REININGHAUS, Ulrich; WYKES, Till; BENTALL, Richard; LAU-
BER, Christoph; MCCRONE, Paul; RÖHRICHT, Frank; ELDRIDGE, Sandra. Effectiveness
and cost-effectiveness of body psychotherapy in the treatment of negative symptoms of schi-
zophrenia – a multi-centre randomized controlled trial. BioMedCentral Psychiatry, v.13, n.26,
p.1-8, Jan. 2013.

33. RACINET, G.; CHEVROLLIER, J. P. Football in a psychiatric hospital: Results in schizophre-


nics. Societe Medico-Psychologique, v.155, n.8, p.530-33, 1997.

34. RICHARDISON, Caroline R.; FAULKNER, Guy; MCDEVITT, Judith; SKRINAR Gary S.; HUT-
CHINSON, Dori S.; PIETTE, John D. Integrating physical activity into mental health services
for persons with serious mental illness. Psichiatric Services, v.56, n.3, p.324-31, Mar. 2005.

35. SCOTT, David; HAPPELL, Brenda. The high prevalence of poor physical health and unhealthy
lifestyle behaviours in individuals with severe mental illness. Issues in Mental Health Nursing,
v.32, n.9, p.589–97, 2011.

36. SKRINAR, Gary S.; UNGER, K. V.; HUTCHINSON, Dori S., FAIGENBAUM, Avery D. Effects
of exercise training in young adults with psychiatric disabilities. Canadian Journal of Rehabi-
litation, v.5, n.3, p.151–57, 1992.

37. SMITH, Shubulade; YEOMANS, D.; BUSCHE, C. J. P.; ERIKSSON, C.; HARRISON, T.; HOL-
MES, R.; MYNORS-WALLIS, L.; OATWAY, H.; SULLIVAN, G. A well-being programme in severe
mental illness. Baseline findings in a UK cohort. Clinical Practice, v.61, n.12, p.1971-78, 2007.

38. SOUNDY, Andrew; FAULKNER, Guy; TAYLOR, Adrian H. Exploring variability and perceptions
of lifestyle physical activity among individuals with severe and enduring mental health problems:
a qualitative study. Journal of Mental Health, v.16, n.4, p.493-503, 2007.

39. TRIVEDI, Madhukar H.; GREER, Tracy L.; GRANNEMANN, Bruce D.; CHAMBLISS, Heather
O.; JORDAN, Alexander N. Exercise as an augmentation strategy for treatment of major de-
pression. Journal of Psychiatric Practice, v.12, n.4, p.205-213, Jul. 2006.

40. USSHER, Michael; STANBURY, Liam; CHEESEMAN, Vicky; FAULKNER, Guy. Physical activity
preferences and perceived barriers to activity among persons with severe mental illness in the
United Kingdom. Psychiatric Services, v.58, n.3, p.405-408, 2007.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 137


41. VANCAMFORT, Davy; PROBST, Michel; SKJAERVEN, Liv Helvik; MATAMOROS, Daniel Ca-
talán; GYLLENSTEN, Amanda Lundvik; CONESA, Antonia Gómez; IJNTEMA, Rutger; HERT,
Marc De Systematic review of the benefits of physical therapy within a multidisciplinary care
approach for people with schizophrenia. Research Report, v.92, n.1, p.11-23, 2012.

42. WORLD HEALTH ORGANIZATION (WHO). Global recommendations on physical activity


for health. Geneva: World Health Organization, 2010. Disponível em: http:// whqlibdoc.who.
int/publications/2010/9789241599979_eng.pdf. Acesso em: 16 de março de 2020.

43. ZAGO, Maria Cristina; TERZIS, Antonios. O jogo-relacional de um grupo de pacientes psicóticos
em atividade física: Um estudo psicanalítico. Psicologia, v.16, n.2, p. 67-85, Lisboa, 2012.

44. ZAGO, Maria Cristina; TERZIS, Antonios; PADILHA, Bruneide Menegazzo. Comunicação
inconsciente entre singular e plural: grupo de pacientes psiquiátricos. Revista da Sociedade
de Psicoterapias Analíticas Grupais do Estado de São Paulo, v.15, n.1, p. 04-16, 2014.

138 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


11
“ Atividade física e ambiente: a
influencia dos parques verdes
urbanos na saúde

Alba Regina Azevedo Arana Higor Maluta Maluta


UNOESTE- PPGMADRE UNOESTE

Maíra Rodrigues Uliana Amanda Kelly de Cursio Tanus Barreiros


UNOESTE- PPGMADRE TOLEDO

Marcus Vinicius Pimenta Rodrigues Juliana Felipe


UNOESTE- PPGMADRE FCT- UNESP

Claudio Alves Siqueira Fernanda Berguerand Xavier


UNOESTE UNOESTE

Yasmin Bispo Camara Camara


UNOESTE

10.37885/201001836
RESUMO

A relação homem, meio ambiente e saúde é ampla e se projeta sobre a perspectiva de


uma melhor qualidade de vida. As áreas verdes, em especial as públicas, vêm sendo
destaque pelos benefícios que podem trazer para a saúde pelas práticas de atividade
física e melhoria da vida da população ao desenvolver funções ecológicas, sociais e de
lazer. Objetivo: discutir a importância das áreas verdes na prática de atividade física
em espações urbanos apresentando os benefícios para a saúde e qualidade de vida das
pessoas. Métodos: Trata-se de uma pesquisa básica do tipo bibliográfica de abordagem
qualitativa. Resultados: A pesquisa mostrou que existe uma associação positiva entre
os espaços verdes e saúde da população. Mostrando necessário considerar as funções
ecológicas, sociais, estéticas e educativas destes locais E que as áreas verdes urbanas
são consideradas imprescindíveis para o bem-estar da população, uma vez que sua
presença influencia na saúde física e mental dos habitantes. Conclusão: Os estudos
encontraram uma associação positiva entre a disponibilidade de espaços verdes no
ambiente de vida e saúde da população.

Palavras-chave: Áreas Verdes, Qualidade de Vida, Exercício Físico, Saúde


INTRODUÇÃO

Um espaço urbano adequado às necessidades da população é um fator decisivo para


a melhor qualidade de vida e saúde da mesma. Uma série de estudos tem mostrado que a
vida em ambientes mais naturais influencia positivamente a auto percepção de saúde das
pessoas e leva a um menor risco de mortalidade (MAAS et al., 2008). Díaz (2005) considera
que a vegetação torna o ambiente muito mais atrativo, dá a sensação de refúgio do dia-a-dia,
alivia o stress e estimula as pessoas à prática de atividade física (AF).
O sedentarismo é apontado como problema de saúde púbica no Brasil. Dados do
Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE), em pesquisa divulgada em dezembro
de 2014, apontam que 46% da população com idade superior a 18 anos é sedentária, não
atingindo a recomendação de 150 minutos de AF por semana, seja nos momentos de lazer,
no trabalho ou nos deslocamentos até o trabalho (IBGE, 2014). Esse ranking é liderado pelas
mulheres, com 51,5%, contra 39,8% dos homens (BRASIL, 2015).
O percentual de pessoas que praticam AF de lazer no país diminui de acordo com a
faixa etária: o grupo mais ativo é o de idade de 18 a 24 anos, chegando a 36,7%. Essas taxas
vão caindo para 25,5% (de 25 a 39 anos), 18,3% (de 40 a 59 anos) e 13,6% (de 60 anos ou
mais). Em relação à escolaridade, as pessoas sem instrução ou com ensino fundamental
incompleto, 50,6% são fisicamente inativos, sendo esse o grupo mais representativo entre
os demais (IBGE, 2014).
Intervenções de saúde direcionadas à mudança comportamental do indivíduo para tor-
na-lo fisicamente ativo têm alcançado mudanças positivas, mas os efeitos têm se mostrado
pequenos e de curto prazo, não havendo avanço substancial nos níveis de AF da popula-
ção (BEDIMO-RUNG; MOWEN; COHEN, 2005). De acordo com Branas et al. (2011), uma
estratégia multinível que combine indivíduo e meio ambiente pode atingir metas maiores
e mais sustentáveis, pois influenciam maior número de pessoas por um período de tempo
significativamente superior aos programas individuais de saúde.
Se existe essa relação positiva entre áreas verdes urbanas e encorajamento para a
prática de AF, e sabe-se que uma vida fisicamente ativa traz inúmeros benefícios em muitos
determinantes de saúde, os espaços urbanos de qualidade têm de ser vistos com devida
importância na estratégia de promoção de saúde – direito de todos. A falta de recursos para
participar de atividades ou instalações pagas é uma das principais barreiras na busca de atin-
gir os 150 minutos de AF por semana (HINO et al., 2010), recomendados pela Organização
Mundial de Saúde. A promoção da saúde é, de acordo com as leis federais, a ferramenta
mais importante da Saúde Pública: desde os anos 1970 que se sabe que os serviços de
saúde são insuficientes, por si sós, para obter ganhos satisfatórios (SANTANA et al., 2010).

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 141


As áreas verdes são consideradas um indicador na avaliação da qualidade ambiental
urbana e também obrigatório por lei. Quando não existem ou não são efetivadas no ambiente
urbano interferem na qualidade do mesmo, e também a falta desses espaços adequados
para o lazer prejudica a qualidade de vida da população. São consideradas ainda, áreas de
extrema importância para a qualidade de vida nas cidades. São benéficos os efeitos que o
contato com a natureza pode proporcionar à saúde humana. Esses efeitos provavelmente
são multifatoriais. Diminuição do estresse, aumento do relaxamento e atividade física podem
influenciar diretamente na melhora de doenças como a depressão, doenças cardiovasculares,
obesidade e influenciam também na qualidade do sono (ALMEIDA 2012).
Devemos inserir nesse contexto a saúde, como um fator determinante na avaliação
da qualidade de vida de uma população, sendo o maior recurso de desenvolvimento sócio,
econômico e pessoal numa importante dimensão da qualidade de vida.

OBJETIVO

Discutir a relação das áreas verdes urbanas com a atividade física, enfocando a saúde
e qualidade de vida das pessoas no espaço urbano. Esta contribuição se dá no contexto do
surgimento de novos parâmetros para o conceito de qualidade de vida na cidade e as relações
com as questões ambientais ligada a preservação de espaços verdes em ambientes urbanos.

MÉTODOS

Trata-se de uma pesquisa básica de abordagem qualitativa, cuja opção metodológica


foi a pesquisa bibliográfica, buscando aprofundar a temática por meio de leituras, análises
e reflexões da produção de autores que discutem e problematizam o tema. O artigo visa
fazer um breve levantamento teórico e revisando as concepções acerca dos espaços verdes
urbanos e seu papel na promoção das atividades físicas e na saúde e qualidade de vidas
das pessoas em publicações nacionais e internacionais. Foram consultados materiais dis-
poníveis no Portal de periódicos da Capes, Sielo e no Google Acadêmico.
O propósito geral de uma revisão de literatura de pesquisa é reunir conhecimentos
sobre um tópico, ajudando nas fundamentações de um estudo significativo para a área de
meio ambiente e saúde. Os critérios de inclusão definidos foram: artigos publicados em
português, inglês e espanhol; artigos na íntegra que retratem a temática referente à revisão
integrativa e artigos publicados e indexados nos referidos bancos de dados nos últimos anos.

142 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


RESULTADOS

Atividade Física e Parques Verdes Urbanos

Áreas verdes são locais de relaxamento, recreação, alívio do stress do dia a dia. Estudos
mostram que a vida em ambientes mais naturais influencia positivamente a auto percepção
de saúde das pessoas e leva a um menor risco de mortalidade (MAAS et al., 2008).
A oferta de Espaços Verdes Urbanos (EVU) seguros, limpos e confortáveis exerce
impactos na saúde, medidos de forma direta, por meio do estado de saúde auto avaliado
e da longevidade e, de forma indireta, pela melhoria da qualidade ambiental. A proximi-
dade dos EVU às áreas residenciais contribui para a melhoria da qualidade do ar, atenua
o efeito da poluição atmosférica e da “ilha de calor urbano”, proporcionando aos residen-
tes um ambiente físico que incentiva a prática de atividade física, incluindo a caminhada
(SANTANA et al., 2010).
Macedo e Sakata (2003, p. 24), consideram como parques urbanos

Todo espaço de uso público destinado à recreação de massa, qualquer


que seja o seu tipo, capaz de incorporar intenções de conservação e cuja
estrutura morfológica é autossuficiente, isto é, não é diretamente influenciada
em sua configuração por nenhuma estrutura construída em seu entorno.

Para Barcellos (1999), as áreas de grandes dimensões não representam uma carac-
terística obrigatória para que o espaço livre seja considerado um parque urbano. Paiva e
Gonçalves (2002), por sua vez, vão mais além ao apreciarem o elemento árvore de forma
coletiva, evoluindo para um conceito mais abrangente e ecológico que é o da floresta urbana,
valorizando a árvore como um elemento que melhora o ambiente urbano.
Para Jacobs (1996), a variedade de um parque pode ser importante para que este
local seja frequentado:

Um parque de bairro genérico, que esteja preso a qualquer tipo de inércia


funcional de seu entorno fica inexoravelmente vazio por boa parte do dia. E
aí se estabelece um círculo vicioso. Mesmo que o vazio não seja atingido por
várias espécies de praga, ele exerce pouca atração devido ao número restrito
de frequentadores potenciais. Chega a entediá-los terrivelmente, porque a
agonia é enfadonha. Nas cidades, a animação e a variedade atraem mais
animação; a apatia e a monotonia repelem a vida. E este é um princípio crucial
não apenas para o desempenho social das cidades, mas também para seu
desempenho econômico. (JACOBS, 1996, p. 57).

Os parques urbanos constituem-se elemento deste desenvolvimento da atividade física,


integrando, dentro da cidade, o lazer, a cultura e o esporte de uma forma livre e subjetiva.
Nessa perspectiva, o papel dos municípios é importantíssimo para que este espaço se

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 143


fortaleça, oferecendo oportunidades para que seus munícipes de diferentes grupos etários e
sociais possam praticar atividades físicas, exercendo a democratização da prática esportiva
(BENINI, 2009). A crescente importância do tempo livre e da atividade física, as mudanças
culturais e sociais, são fatores que os governantes devem considerar para as expansões
multidisciplinares (MIRANDA; BAPTISTA, 2009).
Quando as pessoas se exercitam regularmente em parques urbanos, elas têm a opor-
tunidade de promover condições adaptativas para fortalecimento do coração, pulmões e
músculos, melhorando sua performance. Porém, em razão do aumento do volume de ar
necessário para respirar durante a realização de exercícios físicos, os praticantes de exer-
cícios em parques urbanos acabam sendo expostos à inalação de poluentes atmosféricos
(MIRANDA; BAPTISTA, 2009).
Vieira (2004) admite que as áreas verdes tendem a assumir diferentes papéis na so-
ciedade e suas funções devem estar inter-relacionadas no ambiente urbano, de acordo com
o tipo de uso a que se destinam. Para o autor, as funções destas áreas estariam relaciona-
das à Função Social (possibilidade de convívio social e de lazer que essas áreas oferecem
à população), Função Estética (diversificação da paisagem construída e embelezamento
da cidade), Função ecológica (provimento de melhorias no clima da cidade e na qualidade
do ar, água e solo, resultando no bem-estar dos habitantes e na diversificação da fauna),
Função Educativa (possibilidade oferecida por tais espaços como ambiente para o desen-
volvimento de atividades educativas, extraclasse e de programas de educação ambiental) e
Função Psicológica (possibilidade de realização de atividades físicas, de lazer e de recrea-
ção. Os contatos da população com elementos naturais dessas áreas propiciam o alívio das
tensões e o estresse do cotidiano de trabalho por meio do relaxamento e da descontração).
Desse modo, a construção de novas áreas verdes, a revitalização das existentes,
ou mesmo a conservação da vegetação presente no espaço urbano, devem ser consi-
deradas pelos gestores municipais como benefício futuro a toda população citadina
(PEREHOUSKEI; DE ANGELIS, 2012).
A sociedade contemporânea está cada vez mais controlada e monótona. Tal situação
pode fazer do risco e da aventura uma necessidade na vida do cidadão. As atividades ao
ar livre têm um componente de incerteza e imprevisibilidade, tornando-se, assim, particu-
larmente especiais (SOUSA, 2006).
A prática regular de exercício físico traz inúmeros benefícios à saúde da população
e ainda muitos determinantes de saúde física, social e afetiva (ARAÚJO; ARAÚJO, 2000).
Exercício físico é uma atividade física previamente planejada, orientada e proposta
para a manutenção ou melhora dos componentes da aptidão física relacionada à saúde

144 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


(resistência aeróbia, resistência anaeróbia e força muscular, flexibilidade e composição
corporal), realizada repetidamente (MATTOS; NEIRA, 2000).
A American College of Sports Medicine (2010) ressalta, particularizando o exercício
físico como um tipo de atividade física que consiste em movimentos corporais planejados,
estruturados e repetitivos realizados para aprimorar ou preservar um ou mais componentes
da aptidão física.
As pessoas precisam usufruir de condições para praticar exercício físico no seu tempo
livre de maneira autônoma, desprovida de horários. Os parques urbanos oferecem essas
condições para toda e qualquer faixa etária e classe social, e dão condições necessárias
para um desenvolvimento individual (XAVIER, 2016 e XAVIER,, FELIPE, & ARANA, 2018,).
No estudo de Reis (2001), realizado na cidade de Curitiba - PR, a beleza geográfica do
parque e as pistas de caminhada/corrida foram atribuídas como incentivadoras da prática
de exercício físico por mais de 94% dos entrevistados.
Xavier (2016), em seu trabalho sobre o Parque do Povo em Presidente Prudente - SP,
destaca que entre os respondentes da pesquisa, 95% afirmaram que o parque é um local
que os motiva a praticar atividade física, sendo o fator “ambiente verde” o mais valorizado
para escolha do local. A quantidade de vegetação mostrou-se um fator imprescindível e
intimamente relacionado à motivação psicológica dos usuários.
A vegetação torna o ambiente mais atrativo e pode estimular as pessoas a realiza-
rem atividades físicas (DIAZ, 2005). A inexistência de limites é uma característica do novo
terreno desportivo, tomando a natureza como referência e as dimensões do espaço como
padrões. Os limites materiais desse espaço abrem o horizonte e liberam o imaginário no
ritmo de cada segundo (SOUSA, 2006).
Ao analisarmos o caso de um parque urbano, quais seriam as sensações que o usuário
experimenta ao caminhar por este espaço? O que o atrai para ir ao parque? O que ele sente
quando está no parque? Sendo assim, como podemos permitir que as cidades criem espaços
de fácil acesso à prática de exercícios físicos, mas sem prejudicar a saúde das pessoas?
É necessário oferecer às pessoas condições para a prática esportiva e ocupação do
tempo livre de uma forma autônoma, sem horários fixos. Os parques urbanos possibilitam
essa prática, abrangendo todas as faixas etárias e sociais, e oferecem condições necessárias
para um desenvolvimento individual (NUNES, 2000).
A importância de parques urbanos públicos na prática de exercícios físicos, bem como
o lazer ativo necessitam de espaço apropriado. Os parques urbanos, os jardins públicos, as
praias, representam a primeira linha de infraestruturas utilizada para estas práticas. Como
exemplo de parques urbanos, o Parque Barigui em Curitiba - PR (Figura 1), onde os fre-
quentadores realizam algumas práticas corporais, como caminhadas e corridas, atividades

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 145


contemplativas, gerando encontros sociais e familiares entre sujeitos vindos de diferentes
partes da cidade (CURITIBA, 2015).

Figura 1. Atividades recreativas no Parque Barigui na cidade de Curitiba

Fonte: CURITIBA (2015).

Os parques de Curitiba são muito frequentados por sua população, com especial desta-
que para o parque Barigui, onde são realizadas, entre várias outras ações, algumas práticas
corporais como caminhadas e corridas, bem como atividades contemplativas capazes de
gerar encontros sociais e familiares entre sujeitos vindos de diferentes partes da cidade.
Situado na região central da cidade o parque Barigui, com área de 1.400.000 m2, possui
seu nome na origem indígena com significado de “rio do fruto espinhoso”, uma alusão às
pinhas das araucárias nativas. Foi criado em 1972 pelo prefeito Jaime Lerner e é formado
por bosques que trazem um misto de mata nativa primária e secundária que margeiam seu
enorme lago de 230.000 m² (Figura 2). Além disso, o parque apresenta fauna e flora tam-
bém nativas e migratórias, que se mesclam a uma estrutura de antigas construções locais
readequadas (como é o caso do bistrô e da academia de ginástica), além dos equipamentos
propícios às práticas corporais e exercícios físicos como: academia pública de ginástica,
pista de bicicross, canchas esportivas, pista de cooper, ciclovias, trilhas ecológicas, pista de
patinação, equipamentos de ginástica, entre outros (CURITIBA, 2015).

146 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Figura 2. Visão do Parque Barigui

Fonte: CURITIBA (2015).

O local também abriga a sede da Secretaria Municipal do Meio Ambiente e ainda ofe-
rece outras opções de vivências no tempo/espaço de lazer, como, por exemplo, o Museu
do Automóvel, restaurante, salão de atos, churrasqueiras e lanchonetes.
Outro parque urbano é o parque Areião, na cidade de Goiânia - GO (Figura 3), com
área de 215.000 m², localizado na região sul de Goiânia. Possui uma área de preservação
permanente com vegetação de floresta da galeria e vereda, abrigando espécies de fauna
nativa. Delimitado com base no traçado original da cidade, considerado como reserva am-
biental no Plano Original da Cidade de Goiânia e aprovado em 1938. Seu patrimônio natural
inclui três nascentes do Córrego Arreião e um braço do Córrego Botafogo, pertencente à
Bacia do Rio Meia Ponte. Possui uma pista de corrida de 2.400m totalmente iluminada, duas
estações de ginástica, um campo de futebol e parque infantil, além de um lago. Em sua
volta há um grande fluxo de veículos por estar localizado entre importantes avenidas na
cidade de Goiânia.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 147


Figura 3. Parque do Arreião em Goiânia.

Fonte: Prefeitura municipal de Goiânia, 2015.

Jacobs (1996) afirma que os parques urbanos são de extrema importância para o
convívio social e a integração de pessoas para a prática de exercícios físicos. Segundo a
autora, esta “multifuncionalidade” do parque pode ser um fator positivo para “dar vida ao
parque”. Se o parque oferece, por exemplo, apenas as áreas para os fins contemplativos ou
encontros sociais e familiares, como o uso das churrasqueiras, ele estaria fadado a apenas
algumas vivências. No entanto, o fato de conter equipamentos para as práticas de exercícios
físicos oportuniza a sua utilização com outros intentos e finalidades nos interstícios do tempo
de trabalho para a realização de tais práticas.
Neste sentido, Jacobs (1996, p. 111) assevera que a diversidade de vizinhança do
parque é um fator preponderante para sua utilização:

A variação arquitetônica superficial pode parecer diversidade, mas só uma


conjuntura genuína de diversidade econômica e social, que resulta em pes-
soas com horários diferentes, faz sentido para um parque e tem o poder de
conceder-lhe a dádiva da vida.

Essa diversidade citada é vista no Parque Barigui em Curitiba. Localizado na região


central da cidade, ele recebe a visita de pessoas de várias partes da cidade, servindo tanto
para as já mencionadas práticas no âmbito de esporte e lazer, como também por escolares e
trabalhadores da região que o atravessam para se dirigir aos seus locais de estudo/trabalho
e cumprir com seus compromissos.
Há, ainda, os que ali estão para desenvolver o seu tempo de trabalho, como os funcio-
nários da Secretaria do Meio Ambiente ou os próprios funcionários responsáveis pela manu-
tenção e segurança do parque. Há também os que residem no entorno do parque e que o
utilizam como uma extensão de seus quintais ajudando a torná-lo diversificado de atividades.

148 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


De acordo com a literatura, enquanto o exercício físico regular tem importante e positivo
papel na saúde, a piora da qualidade do ar pode ser uma barreira e afetar negativamente
a saúde de quem se exercita ao ar livre (CAMPBELL et al., 2005). Martin e Wade (2000)
evidenciaram que o exercício extenuante associado à exposição de locais com tráfego vei-
cular intenso por 30 minutos causou aumento dos níveis de monóxido de carbono ligado a
hemoglobina, a qual é equivalente ao fumo de dez cigarros.
A prática de exercícios físicos em parques urbanos com muito fluxo de veículos e alto
índice de poluição atmosférica requer algumas estratégias para a prática de exercícios físi-
cos. Com o intuito de lidar com esses poluentes e minimizar a exposição humana, Cooper
(1996) apresenta alguns procedimentos:

• Faça exercícios ao ar livre pela manhã enquanto os níveis de poluição e calor es-
tiverem baixos. A hora do rush à tarde é o momento com maior concentração de
poluentes no ar.
• Evite exercitar-se em lugares de grande tráfego de automóveis, principalmente da-
queles que utilizam óleo diesel, como ônibus e caminhões.
• Dê preferência para as pistas e os locais internos quando for exercitar-se nos bos-
ques e parques da cidade. Evite os exercícios nos anéis externos, sobretudo próxi-
mo às vias de trânsitos de veículos.
• Se eventualmente, durante os exercícios, estiver em meio às emissões gasosas
dos automóveis, diminua a intensidade de seu treinamento para que possa respirar
somente pelo nariz. Este procedimento ajudará a remover o dióxido de enxofre e
alguns outros poluentes atmosféricos que ficam retidos nas mucosas nasais.
• Evite atividades extenuantes ao ar livre durante os períodos de alerta contra o calor
e o smog (fumaça e neblina). O efeito smog é formado quando há a condensação
de vapor d’água, porém em associação com a poeira, fumaça e outros poluentes, o
que dá um aspecto acinzentado ao ar (MIRANDA; BAPTISTA, 2009).

A prática de exercícios físicos em áreas verdes urbanas configurou-se um papel cres-


cente no cotidiano das pessoas, abrangendo todas as faixas etárias e sociais. Os parques
urbanos podem possibilitar as condições necessárias para que o cidadão se desenvolva no
âmbito pessoal. A prática esportiva ao ar livre vem se desvinculando das práticas habituais
em academias de musculação (XAVIER, 2016).
Nos parques urbanos, não há custo de utilização de equipamentos para exercícios
físicos. Observamos, portanto, a necessidade em se promover uma rede de instalações des-
portivas de acesso gratuito pelas cidades, levando em consideração as suas características,

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 149


assim como a diversidade da demanda dos cidadãos, a pluralidade de espaços para a prática
esportiva e acessibilidade (XAVIER, 2016).

Qualidade Urbana Ambiental e Saúde

Enfrentamos grandes problemas urbanos, tais como poluição do ar e da água, enchen-


tes, ruídos em excesso, entre outros, que causam sérios prejuízos à saúde física e mental
da população. Além disso, o aumento populacional e a expansão das cidades, aliados à
falta de políticas públicas eficazes, capazes de ordenar este crescimento com a manutenção
das áreas verdes, têm provocado a redução da vegetação nas urbes, tornando as cidades
cada vez menos acolhedoras ambientalmente para a ocupação humana (MAZZETO, 2000).
Com vias de minimizar este problema, as áreas verdes tem sido tema discuti-
do na comunidade acadêmica por diferentes trabalhos em distintas áreas (MAZZEI;
COLESANTI; SANTOS, 2007).
Em um estudo desenvolvido por Buccheri-Filho e Tonetti (2011), sobre a qualidade
ambiental nas paisagens urbanizadas, os autores abordam que a qualidade ambiental urbana
enquanto componente da qualidade de vida, pode ser definida como a amplitude de condições
favoráveis do ambiente urbano, que suprem as necessidades fisiológicas e psicológicas do
ser humano, como resultado, propicia a melhoria da qualidade de vida da população.
No domínio ambiental, diferentes indicadores podem ser estabelecidos para a avalia-
ção ecológica ou de monitoramento ambiental, o qual, por sua vez, envolve a análise de
aspectos urbanos tais como drenagem de águas pluviais, tratamento de resíduos sólidos,
cobertura vegetal, risco geológico, nível de ruídos, poluição atmosférica, contaminação do
solo, poluição hídrica, áreas verdes, entre outros. Assim, as áreas verdes podem ser um dos
critérios de análise da qualidade ambiental (BUCCHERI-FILHO; TONETTI, 2011).
No contexto da qualidade de vida urbana, as áreas verdes, além de atribuírem me-
lhorias ao meio ambiente e ao equilíbrio ambiental, contribuem para o desenvolvimento
social e trazem benefícios ao bem-estar, à saúde física e psíquica da população ao propor-
cionarem condições de aproximação do homem com o meio natural, e disporem de condi-
ções estruturais que favoreçam a prática de atividades de recreação e de lazer (MAZZEI;
COLESANTI; SANTOS, 2007).
Desse modo, quando dotadas de infraestrutura adequada, segurança, equipamentos e
outros fatores positivos, podem se tornar atrativas à população, que passa a frequentá-las,
para a realização de atividades como caminhada, corrida, práticas desportivas, passeios,
descanso e relaxamento; práticas importantes na restauração da saúde física e mental dos
indivíduos (XAVIER, 2016).

150 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


De acordo com Costa (2010), as áreas verdes, enquanto locais de lazer e recreação,
têm a capacidade de neutralizar, por meio do relaxamento, os fatores urbanos estressantes,
como ruído, calor e poluição do ar. Essa capacidade é exercida sobre os frequentadores ao
entrarem em contato com os elementos naturais destas áreas. Outro aspecto importante
das áreas verdes refere-se aos benefícios proporcionados para a melhoria da habitabilidade
do ambiente urbano. Enquanto espaços públicos, as áreas verdes podem se constituir em
locais para práticas sociais e culturais, encontros ao ar livre e para manifestações de vida
urbana e comunitária, que favorecem o desenvolvimento humano e o relacionamento entre
as pessoas. Além disso, a vegetação que geralmente está presente nessas áreas pode
influenciar no microclima mediante a amenização da temperatura, o aumento da umidade
relativa do ar e a absorção de poluentes (OLIVEIRA; MASCARÓ, 2007).
Tais apontamentos revelam, portanto, os benefícios que as áreas verdes públicas
urbanas podem proporcionar à saúde e ao bem-estar da população. Desse modo, a cons-
trução de novas áreas verdes, a revitalização das existentes, ou mesmo, a conservação da
vegetação presente no espaço urbano, deve ser encarada pelos gestores municipais como
benefício futuro a toda população citadina. A importância destas áreas deve ser considerada
no momento em que se planeja a cidade, de forma a tirar vantagens de todas as possibilida-
des ecológicas (PEREHOUSKEI; DE ANGELIS, 2012), estéticas e sociais que elas podem
oferecer, e assim contribuir, tanto para qualidade ambiental urbana, quanto para a qualidade
de vida da população.
De modo geral, estes estudos trouxeram uma relação positiva entre a qualidade urbana
ambiental trazida pelos ambientes verdes urbanos e a promoção de bem-estar por meio
da prática de exercícios físicos. Para averiguar essa relação, abordamos alguns parques
aqui apresentados, demonstrando os aspectos positivos e negativos das áreas verdes em
centros urbanos. No próximo capítulo promovemos uma breve explanação sobre impactos
ambientais, apresentando sua relação com a poluição atmosférica.
A qualidade ambiental urbana está atrelada a vários fatores de infraestrutura, desen-
volvimento econômico-social e aqueles ligados à questão ambiental das cidades.
A partir do início da década de 90, parece consolidar-se um consenso entre os estu-
diosos quanto a dois aspectos relevantes do conceito de qualidade de vida: subjetividade e
multidimensionalidade. A subjetividade trata-se de considerar a percepção da pessoa sobre
o seu estado de saúde e sobre os aspectos não médicos do seu contexto de vida, ou seja,
uma análise que só pode ser feita pelo próprio indivíduo, ao contrário das tendências ini-
ciais de uso do conceito que direcionavam a avaliação a um profissional de saúde. Quanto
à multidimensionalidade refere-se ao reconhecimento de que o construto é composto por
diferentes dimensões (SEIDL; ZANNON, 2004).

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 151


Um estudo feito pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 1994, que teve como
objetivo a criação de instrumentos medidores de qualidade de vida, classificou-a com um
sentido mais amplo (Fleck MPA et al. 2000). Observou-se uma multidimensionalidade do
conceito, surgindo assim uma estrutura composta por seis domínios:

• domínio I (físico): dor, desconforto, energia, fadiga, sono e repouso;


• domínio II (psicológico): sentimentos positivos, autoestima, aparência, sentimentos
negativos, etc.;
• domínio III (nível de independência): mobilidade, atividades da vida cotidiana, uso
de medicação e tratamentos, capacidade de trabalho/produção, etc.;
• domínio IV (relações sociais): relações interpessoais, apoio social, atividade sexu-
al, etc.;
• domínio V (ambiente): segurança física e proteção, recursos financeiros, lazer, am-
biente físico - poluição, ruído, trânsito, clima - etc.;
• domínio VI (aspectos espirituais, crenças pessoais ou religião): espiritualidade, re-
ligião e crenças pessoais.

Nesse caso, percebe-se claramente que o ambiente - domínio V, com destaque para
lazer, além do ambiente físico propriamente dito - torna-se um elemento relevante para a
avaliação da qualidade de vida, principalmente no contexto urbano, no qual a poluição do
ar, a sonora e a visual podem influenciar diretamente no bem-estar da população (FLECK
MPA et al. 2000).
No entanto, o tema qualidade ambiental é bastante complexo, bem como seus padrões
e seus indicadores. Fatores subjetivos que levam em conta a percepção que o indivíduo tem
em relação ao seu ambiente e ao seu próprio modo de vida estão contidos nesses indica-
dores. Além disso, existem os fatores objetivos: econômicos, sociais, culturais e políticos,
que se manifestam distintamente no espaço possibilitando diversos tipos de interpretações,
e tornando difícil de chegar a uma conclusão (XAVIER, & ARANA,2018).
A despeito dessa dificuldade, há, porém, um consenso quando se relaciona qualida-
de ambiental urbana e vegetação. Considera-se que a qualidade ambiental satisfatória é
determinada por composições paisagísticas que privilegie, sobretudo, mas não somente, a
vegetação; vista desde um simples gramado às mais diversas espécies arbóreas. Nessas
condições, a vegetação constitui componente chave, embora outros componentes tam-
bém sejam necessários para o alcance de um padrão mínimo de qualidade do ambiente
(GOMES; SOARES, 2004).
A manutenção das áreas verdes urbanas sempre foi justificada pelo seu potencial em
propiciar qualidade ambiental à população. Ela interfere diretamente na qualidade de vida

152 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


dos seres por meio das funções sociais, ecológicas, estéticas e educativas que elas exercem
para amenização das consequências negativas da urbanização (CAPORUSSO; MATIAS,
2011). O impacto do espaço verde sobre a saúde é cada vez mais reconhecido.
Para Mazzei; ColesantI; Santos, (2007) a principal função das áreas verdes urbanas
não deve ser apenas a criação de refúgios para que as pessoas possam “escapar” da cidade.
Além disso, estas áreas devem possibilitar à população momentos de lazer e recreação em
contato com a natureza, respeitando sua vivência urbana e contato com outras pessoas.
A oferta de espaços verdes seguros, limpos e confortáveis tem impactos na saúde,
medidos de forma direta através do estado de saúde auto avaliado e, de forma indireta,
através da melhoria da qualidade ambiental. Dado o crescente consenso que o ambiente
é a chave em promover expansão da energia, garantir oportunidades para o aumento da
atividade física é um meio promissor de combate ao comportamento sedentário associado
com uma variedade de doenças crônicas. Mensurar o nível de atividade física (AF) realizada
nestes locais e a relevância dos mesmos na estratégia de promoção de saúde através de
uma população mais ativa torna-se um desafio multidisciplinar (Arana, Xavier, 2017).
Nos Estados Unidos e na Austrália as atividades passivas realizadas nos parques
superam a prática de atividade física (AF) regular (Giles-Corti;et al, 2005). Já no Brasil, um
estudo realizado por Reis (2009) na cidade de Curitiba constatou que a maioria da população
presente no Jardim Botânico encontra-se fisicamente ativa, e, ainda, que 61,85% desses
indivíduos atingem as recomendações para a prática de AF.
Em sua proposta conceitual, Bedimo-Rung; Mowen & Cohen (2005) propõem um mo-
delo para guiar pensamentos e sugerir hipóteses, e define alguns atributos que podem ser
utilizados como padrão para futuras pesquisas. Nesta classificação, a discussão centra-se
sobre as características ambientais do parque que poderiam estar relacionados à AF, sen-
do essas: as características do ambiente, condições, facilidade ou dificuldade de acesso,
estética do local, segurança percebida e políticas voltadas a esse objetivo.
De outra maneira, Tinsley; Tinsley & Croskeys (2002) atribui o uso a fatores como:
proximidade, acessibilidade, aspectos estéticos como a presença de árvores, água (lago) e
existência de pássaros, manutenção do parque, tamanho e a disponibilidade de facilidades
como calçadas ou percursos para pedestres (caminhada).
Em meio à diversidade de variáveis, existe certo consenso encontrado em um número
significativo de pesquisas ao se tratar da relação positiva entre o fácil acesso e/ou proximi-
dade a parques urbanos e o aumento do nível de AF nesses locais (Sugiyam; Leslie, Giles-
Corti e Owen., 2008)
Bargos (2012) admite que as áreas verdes tendam a assumir diferentes papéis na
sociedade e suas funções devem estar inter-relacionadas no ambiente urbano, de acordo

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 153


com o tipo de uso a que se destinam. Apesar disso, a estética e características do parque
também têm sido positivamente associadas à visitação do mesmo para a manutenção da
vida ativa (Reis et al, 2009).
Ao revisar 18 estudos, Owen; Twist; Ford (2004) concluíram que fatores estéticos e
a presença de colinas estavam diretamente associados a atividades físicas auto perce-
bidas, apesar de nenhum desses estudos reportar qual o tipo de AF que ocorreu nesses
locais. Na cidade de Curitiba, a beleza geográfica do parque e as pistas de caminhada/
corrida foram atribuídas como incentivadoras da prática de AF por mais de 94% dos entre-
vistados (Reis, 2009).
Alguns planejamentos urbanos desconsideram o papel multifuncional desses espaços
verdes e muitas decisões são baseadas apenas em estética e custo. O que falta em muitos
casos é uma visão abrangente do papel dos parques urbanos e a compreensão de que eles
formam uma estrutura que pode resultar em qualidade de vida e constituir uma chave na
estratégia de saúde das pessoas. Desta forma, vários estudos (LONDI e MENDES, 2014)
apontam os benefícios trazidos pelas áreas verdes para a saúde e o bem-estar da popu-
lação, partindo-se da premissa torna-se interessante discutir estes benefícios. Os estudos
de Costa e Colesanti (2011) contribuem para afirmar os benefícios do exercício em áreas
naturais, enfocando na melhoria da à saúde mental (humor e autoestima).

DISCUSSÃO

Cada vez mais se fala sobre qualidade de vida. É uma concepção que envolve parâ-
metros das áreas de saúde, arquitetura, urbanismo, lazer, gastronomia, esportes, educação,
meio ambiente, segurança pública e privada, entretenimento, novas tecnologias e tudo o
que se relacione com o ser humano, sua cultura e seu meio. (ALMEIDA, 2011; ALMEIDA,
M., GUTIERREZ, L. E MARQUES, 2009).
Para melhor compreender a área de conhecimento em qualidade de vida é necessário
adotar uma perspectiva, ou um paradigma complexo de mundo, pois se expressa na relação
entre o Homem, a natureza e o ambiente que o cerca (Barbosa, 1998). Embora haja diferença
entre esferas de percepção deste conceito, para compreendê-las melhor é preciso que sejam
associadas, que a influência de uma sobre a outra seja considerada, formando um todo.
A compreensão sobre qualidade de vida lida com inúmeros campos do conhecimento
humano, biológico, social, político, econômico, médico, entre outros, numa constante inter-
-relação (ALMEIDA. 2011) Por ser uma área de pesquisa recente, encontra-se em processo
de afirmação de fronteiras e conceitos; por isso, definições sobre o termo são comuns, mas
nem sempre concordantes. Outro problema de ordem semântica em relação à qualidade de

154 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


vida é que suas definições podem tanto ser amplas, tentando abarcar os inúmeros fatores
que exercem influência, como restritas, delimitando alguma área específica (ALMEIDA. 2012).
O termo Qualidade, num sentido filosófico, refere-se a um caráter do objeto, que a
princípio nada diz sobre ele, suas propriedades ou possibilidades. Significa uma forma
de estabelecer valores. Caracterizar algo pela sua qualidade é estipular um nível bom ou
ruim a ele; porém, essa atribuição é subjetiva, de acordo com o referencial e os elementos
considerados. O que é boa qualidade para alguém não é necessariamente para outra pes-
soa (BETTI, 2002).
De acordo com Minayo et al. (2000), qualidade de vida é uma noção humana, que tem
coligação com a vida familiar, amorosa, social e ambiental. Pressupondo também a relação
com o conforto e bem-estar, termo extremamente subjetivo que refletem conhecimentos,
experiências e valores individuais e coletivos reportando a época, espaço e história indivi-
duais, partindo de uma construção social com a marca da relatividade cultural.
Por fim, qualidade de vida, para a Organização Mundial da Saúde (OMS) (1995, p.20),
é “a percepção do indivíduo de sua inserção na vida no contexto da cultura e sistemas de
valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocu-
pações”. Podemos dizer ainda que, engloba a saúde física, o estado psicológico, o nível de
independência, as relações sociais, as crenças pessoais e a relação com as características
do meio ambiente.
A saúde é fator determinante na avaliação da qualidade de vida de uma população,
sendo o maior recurso de desenvolvimento sócio, econômico e pessoal numa importante
dimensão da qualidade de vida. E de acordo com a Carta da Conferência de Ottawa exis-
tem pré-requisitos básicos para a saúde, são eles: paz, habitação, educação, alimentação,
ecossistema estável, recursos sustentáveis, equidade e justiça social (OMS, 1995).
Para a OMS (2001) saúde é “um estado de completo bem-estar físico, mental e social,
e não apenas a ausência de doenças”, contudo tal definição tem sido alvo de inúmeras
críticas, pois defini-la desta forma faz dela algo ideal, inatingível. Alguns autores sustentam
que a definição teria possibilitado uma medicalização da existência humana, assim como
abusos por parte do Estado a título de promoção de saúde (OMS, 2001; CAPONI, 2003;
CARVALHO, 2005).
A promoção à saúde, portanto, reflete diretamente na qualidade de vida, conferindo a
atenção primária esse poder e todas as demais estratégias de desenvolvimento ambiental, a
Declaração de Adelaide reforça isto assim como a carta de Ottawa (OMS, 1995), e enuncia:
A respeito das políticas públicas saudáveis, enuncia que estas caracterizam-se pelo
interesse e preocupação explícitos de todas as áreas das políticas públicas em relação à
saúde e à equidade, e pelos compromissos com o impacto de tais políticas sobre a saúde

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 155


da população, tendo como principal propósito a criação de um ambiente favorável para que
as pessoas possam viver vidas saudáveis.
A percepção de qualidade de vida dependerá das possibilidades que tenham as pes-
soas de satisfazer adequadamente suas necessidades fundamentais. Isso se liga à capa-
cidade de realização individual, que é dependente das oportunidades reais de ação do ator
social. Ou seja, uma boa ou má percepção sobre a vida é relativa à qualidade do ambiente
em que se encontra o sujeito, ao oferecimento de condições de realização e de satisfação
das necessidades básicas que a própria sociedade estipula como essenciais, e que o inte-
ressado toma e deseja, ou não, como verdade para sua própria vida saudável.
A relação entre saúde e qualidade de vida depende da cultura da sociedade em que
está inserido o sujeito, além de ações pessoais (esfera subjetiva) e programas públicos
ligados à melhoria da condição de vida da população (esfera objetiva). O estado de saúde
é um indicador das possibilidades de ação do sujeito em seu grupo, se apresentando como
um facilitador para a percepção de um bem-estar positivo ou negativo. É influenciado pelo
ambiente, pelo estilo de vida, pela biologia humana e pela organização do sistema de aten-
ção à saúde em que o sujeito está inserido (Gomes e Soares. 2004).
A noção de saúde se coloca como uma resultante social da construção coletiva dos
padrões de conforto e tolerância que determinada sociedade estabelece (Minayo; Hartz;
Buss, 2000). As necessidades de saúde, como uma das vertentes da qualidade de vida, não
podem ser separadas dos movimentos sociais urbanos e nem da dimensão da cidadania
(Barbosa, 1998).
O estado de saúde de um sujeito sofre influências de inúmeras variantes, desde a sub-
jetividade e a relatividade do conceito e dos limites aceitos em determinada sociedade, até
elementos físicos, sociais, ecológicos, de hábitos pessoais, entre outros. Por isso, os esta-
dos de saúde e doença de um indivíduo não podem ser atrelados a somente uma forma de
influência (por exemplo, alimentação), pois se configuram por uma interligação contínua, que
depende tanto das ações individuais quanto das políticas públicas (SEIDL e ZANNON, 2004).

CONCLUSÃO

Muito tem se falado a respeito das doenças crônicas e do poder da AF regular no


combate a elas. No Brasil, muitas intervenções de conscientização popular têm sido feitas
em direção à mudança de comportamentos sedentários para reverter o quadro alarmante
no país. Esse tipo de ação tem alcançado mudanças positivas, porém os efeitos pequenos
e de curto prazo não alcançam o avanço necessário nos níveis de AF de uma população
Evidências encontradas nos estudos esclarecem que à promoção da saúde ligada a
áreas verdes nos ambientes urbanos já tem sua eficácia comprovada no país e revelando

156 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


que o meio ambiente é uma importante chave para atingir grandes metas em saúde, por
ser capaz de influenciar um número maior de pessoas por um período de tempo significati-
vamente superior aos programas individuais de saúde.
Assim, a partir das discussões abordadas é possível inferir que as áreas verdes des-
tinadas ao lazer, recreação e conforto ambiental, devem ser uma preocupação do poder
público assegurando por meio de políticas públicas a qualidade destas áreas, tornando este
ambiente mais atrativo ao uso da comunidade e assim promover a melhoria da qualidade de
vida da população. Planejadores, supervisores e profissionais de saúde precisariam dispensar
especial atenção a esse tipo de programa, no contexto de inversão de prioridades através do
investimento na substituição da cultura da medicalização pela cultura de promoção da saúde.

REFERÊNCIAS
1. ALMEIDA, M. A B.de. Qualidade de vida: definição, conceitos e interfaces com outras áreas,
de pesquisa / Marcos Antonio Bettine de Almeida, Gustavo Luis Gutierrez, Renato Marques:
prefácio do professor Luiz Gonzaga Godoi Trigo. – São Paulo: Escola de Artes, Ciências e
Humanidades – EACH/USP, 142p.: il, 2012.

2. ALMEIDA, M., GUTIERREZ, L. E MARQUES, R. Qualidade de Vida como objeto de estudo


polissêmico: contribuições da Educação Física e do Esporte. In: Revista Brasileira de Qualidade
de Vida. v. 01, n. 01, jan./jun. 2009, p. 15-22

3. ACSM’s Guidelines for Exercise Testing and Prescription. 8. ed. Philadelphia: Lippincott Williams
& Wilkins, 2010.

4. ARANA, A.R.A. & XAVIER, F.B. Qualidade ambiental e promoção de saúde: o que determina
a realização de atividades físicas em parques urbanos? - Geosul, Florianópolis, v. 32, n. 63,
p 201-228, jan./abr, 2017.

5. ARAÚJO, D. S. M. S.; ARAÚJO, C. G. S. Aptidão física, saúde e qualidade de vida relacionada


à saúde em adultos. Revista Brasileira de Medicina do Esporte, Niterói , v. 6, n. 5, p.194-203,
out. 2000.

6. BARCELLOS, V. Q. Os parques como espaços livres públicos de lazer: o caso de Brasília.


FAU/USP. São Paulo, 1999. Tese de Doutorado.

7. BARBOSA, Sônia Regina da Cal Seixas. Qualidade de Vida e ambiente: uma temática em
construção. In: BARBOSA, Sônia Regina da Cal Seixas (org.). A temática ambiental e a plura-
lidade do Ciclo de Seminários do NEPAM. Campinas: UNICAMP, NEPAM, 1998, p. 401-423.

8. BARGOS, M . Mapeamento e análise de áreas verdes urbanas em Paulínia (SP): estudo com
a aplicação de geotecnologias. Soc. & Nat., Uberlândia, ano 24 n. 1, 143-156, jan/abr, 2012.

9. BEDIMO-RUNG, A. L., MOWEN, A. J., & COHEN, D. A. The significance of parks to physical
activity and public health: a conceptual model. American Journal of Preventive Medicine, 28(2,
Suppl 2), 159-168, 2005. http://dx.doi.org/10.1016/j.amepre.2004.10.024. PMid:15694524.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 157


10. BENINI, S.M. Áreas verdes públicas: a construção do conceito e a análise geográfica desses
espaços no ambiente urbano / Sandra Medina Benini. Dissertação (Mestrado em Geografia).
Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências e Tecnologia. Presidente Prudente,
2009

11. BUCCHERI-FILHO, A. T.; TONETTI, E. L. Qualidade ambiental nas paisagens urbanizadas.


Revista Geografar. Curitiba: UFPR, v.6, n.1, p.23-54, jun./2011.

12. BRASIL. Ministério Do Esporte. Diagnóstico nacional do esporte, 2015. Disponível em: <http://
www.esporte.gov.br/diesporte/diesporte_grafica.pdf>. Acesso em: 12 jan. 2019

13. BEDIMO-RUNG, A. L.; MOWEN, A. J.; COHEN, D. A. The significance of parks to physical
activity and public health: a conceptual model. American Journal of Preventive Medicine, New
York, v. 28, n. 2, p. 159-168, 2005

14. BETTI, Mauro . Esporte espetáculo e mídias: implicações para a Qualidade de Vida. In: Moreira,
Wagner Wey; SIMÕES, Regina (orgs). Esporte como fator de Qualidade de Vida. Piracicaba:
Editora UNIMEP, p. 25-36, 2012.

15. CAMPBELL, M. E.; et al 2005) LI, Q.; GINGRICH, S. E. et al. Should people be physically active
outdoors on smog alert days? Canadian Journal of Public Health, v. 96, n. 1, 2005).

16. CAPORUSSO, D. MATIAS, L.F. Áreas Verdes Urbanas: Avaliação e Proposta Conceitual.
Simpósio de Pós-graduação em Geografia de Estado de São Paulo – SIMPGEO-SP. 17 a 19
de dezembro de 2008, Rio Claro/SP, 2011.

17. CAPONI, S. Saúde como abertura ao risco. In Czeresnia, D.; Freitas, C. M. (Orgs.). Promoção
da Saúde: conceitos, reflexões, tendências. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2003

18. CARVALHO, S. R. Saúde coletiva e promoção da saúde: sujeito e mudança. São Paulo: Hu-
citec, 2005

19. COSTA, A. E. Parque do Povo: tribos urbanas e territórios. 2009. Monografia (Bacharelado em
Geografia) – Departamento de Geografia, Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade
Estadual Paulista, Presidente Prudente.

20. COSTA, R. G. S.; COLESANTI, M. M. A Contribuição da Percepção Ambiental nos Estudos


das Áreas Verdes. RA´EGA . Curitiba: UFPR, v.22, p. 238-251 2011.

21. COOPER, K.H. Discovey Health, Revolução Antioxidante, Ed. Record, Rio de Janeiro, 1996.

22. CURITIBA, Site oficial da Prefeitura Municipal de Curitiba, 2015disponível pelo endereço www.
curitiba.org.br, acessado em março de 2019.

23. DÍAZ, G. Vegetacion y calidad ambiental de las ciudades. Arquitectura y Urbanismo,v. 26, n.
1, p. 44-49, 2005.

24. FLECK MPA et al. O instrumento de avaliação de qualidade de vida abreviado da Organização
Mundial da Saúde (WHOQOL-breve): aplicação da versão em português. Revista de Saúde
Pública 22(2), 2000.

25. HINO, A. A. F. et al. Using observational methods to evaluate public open spaces and physical
activity in Brazil. Journal of Physical Activity & Health, Champaign, v. 7, supl. 2, p. S146-S154,
2010.

158 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


26. GOMES MAS, SOARES Br. Reflexões sobre qualidade ambiental urbana. Estudos Geográficos,
Rio Claro, 2(2): 21-30 ,jul-dez. 2004.

27. GILES-CORTI, B. et al. Increasing walking: how important is distance to, attractiveness, and
size of public open space?. American Journal of Preventive Medicine, New York, v. 28, n. 2,
p. 169-176, 2005

28. IBGE. Pesquisa nacional de saúde: 2013: percepção do estado de saúde, estilos de vida e
doenças crônicas: Brasil, grandes regiões e unidades da federação. Rio de Janeiro: IBGE.
2014. Disponível em: <ftp://ftp.ibge.gov.br/PNS/2013/pns2013.pdf>. Acesso em: 10 jan. 2019.

29. LONDI, P.R E MENDES, P.C. A influência das áreas verdes na qualidade de vida urbana
Hygeia 10 (18): 264 - 272, Jun, 2014.

30. JACOBS, Jane. Morte e vida de grandes cidades. São Paulo: M. Fontes, 2000. 1996.

31. MAAS, J. et al. Physical activity as a possible mechanism behind the relationship between green
space and health: a multilevel analysis. BioMed Central Public 95 Health, Londres, v. 8, n. 1, 2008.
Disponível em: <http://bmcpublichealth.biomedcentral.com/articles/10.1186/1471-2458-8-206>.

32. MACEDO, Silvio Soares; SAKATA, Fancine Gramacho. Parques Urbanos no Brasil Brazilian
Urban ParKs. São Paulo: Universidade de São Paulo (EdUSP), 2003.

33. MAZZEI, K; COLESANTI, M. T. M.; SANTOS, D. G. Áreas Verdes Urbanas, Espaços Livres
para o Lazer. Revista Sociedade e Natureza. Uberlândia - MG. 19(1):33-43. 2007.

34. MAZZETO, F.A.P. Qualidade de vida, qualidade ambiental e meio ambiente urbano: breve
comparação de conceitos. In: Sociedade e Natureza (Revista do Instituto de Geografia da
UFU). Uberlândia: EDUFU, Ano 12, n 24 – Jul/dez 2000.

35. MARTIN, J. C.; WADE, T. J. The relationship between physical exercise and distress in a na-
tional sample of Canadians. Can. J. Public Health, v. 91, p. 302- 6, 2000).

36. MATTOS, M.G. NEIRA, M.G. Educação física na adolescência: construindo o conhecimento
na escola. São Paulo, Phorte editora, 2000.

37. MINAYO, M.C.S.; HARTZ, Z.M.A.; BUSS, P.M. Qualidade de vida e saúde: um debate neces-
sário. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v.5, n.1, p.7-18, 2000.

38. MIRANDA M. J.; BAPTISTA T. J. R. A Poluição do ar na cidade de Goiânia - GO e a prática


de exercícios físicos - Educação Física em Revista. 2009

39. NUNES, M. Os grandes desafios da autarquia no âmbito de desporto. Uma proposta de elabo-
ração de um plano de desenvolvimento desportivo municipal. Horizonte Vol. XV n°89.Lisboa,
2000.

40. OLIVEIRA, L. A. de; MASCARÓ, J. J. Análise da qualidade de vida urbana sob a ótica dos es-
paços públicos de lazer. Ambiente Construído, Porto Alegre, v. 7, n. 2, p. 59-69, abr./jun. 2007.

41. OWEN, A; TWIST, C E FORD, P. OWEN. Small-sided games:the physiologicaland technical


effectof altering pitch sizeand player numbers adam owen, craig twist and paul ford. Nsight –
Issue 2, volume 7, Spring.2004.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 159


42. ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE (OMS). Declaração de Caracas. (2011) Recuperado
de URL: http://pfdc.pgr.mpf.gov.br/atuacao-e-conteudos-de-apoio/legislacao/saude-mental/
declaracao_caracas

43. OMS. Promoción de la salud: glosario. Genebra: OMS, 1998

44. PEREHOUSKEI, N. A.; DE ANGELIS, B. L. D. Áreas Verdes e Saúde: paradigmas e experi-


ências. Diálogos & Saberes, Mandaguari, v. 8, n. 1, p. 55-77, 2012.

45. REIS R, HINO A, FLORINDO A, ANEZ C, DOMINGUES M. Association between physical


activity in parks and perceived environment: a study with adolescents. J Phys Act Health
v.9;6:503–9, 2009

46. REIS, R. S. Determinantes ambientais para a realização de atividades físicas nos parques
urbanos de Curitiba: uma abordagem sócio ecológica da percepção dos usuários. 2001. Dis-
sertação – Centro de Desportos, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2001

47. REIS, R. S. et al. Association between physical activity in parks and perceived environment:
a study with adolescents. Journal of Physical Activity & Health, Champaign, v. 6, n. 4, p. 503-
509, 2009.

48. SANTANA, P. et. al. O papel dos espaços verdes urbanos no bem-estar e saúde das popula-
ções. Lisboa: [s.n.], 2010.

49. SEIDL, E. M. F.; ZANNON, C. M. L. da C.. Qualidade de vida e saúde: aspectos conceituais e
metodológicos. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 20, n. 2, Apr, 2004

50. SOUZA, S. L. Doenças Respiratórias em Araucária - Pr (2001-2003). Condicionantes socio-


-ambientais e poluição atmosférica. Curitiba/PR: UFPR, 2006. Dissertação de mestrado em
Geografia

51. SUGIYAMA, Leslie, GILES-CORTI e OWEN Associations of neighbourhood greenness with


physical and mental health:Do walking, social coherence and local social interaction explain
the relationships? Journal of epidemiology and community health · June p. 62e9, 2008

52. TINSLEY, H. E. A., TINSLEY, D. J., & CROSKEYS, C. E. Park usage, social milieu, and psy-
chosocial benefits of park use reported by older urban park users from four ethnic groups.
Leisure Sciences, 24(2), 199-218, 2002

53. VIEIRA, P. B. H. Uma visão geográfica das áreas verdes de Florianópolis, SC: estudo de caso
do Parque Ecológico do Córrego Grande (PECG). Universidade Federal de Santa Catarina.
Trabalho de Conclusão de Curso, Florianópolis, SC, 2004

54. XAVIER, F. B., FELIPE, J., & ARANA, A. R. A. O parque verde urbano: características do uso
através de observação sistemática. URBE. Revista Brasileira de Gestão Urbana (Brazilian
Journal of Urban Management), 2018, 10(Supl. 1), 82-95

55. XAVIER, Fernanda Berguerand. Qualidade Urbana Ambiental e prática de atividades físicas:
um estudo sobre o Parque do Povo de Presidente Prudente. – Dissertação de Mestrado em
Meio Ambiente e Desenvolvimento Regional – Universidade do Oeste Paulista – UNOESTE,
Presidente Prudente, SP, 2016.

160 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


12
“ Avaliação oftalmológica em
jogadores profissionais de
futebol no Brasil

Aline Sutili Toledo Rodrigo Kallas Zogaib


UNIFESP
Moisés Cohen
Gustavo Gonçalves Arliani UNIFESP
UNIFESP
Benno Ejnisman
Paulo Henrique Schmidt Lara UNIFESP
UNIFESP

10.37885/201001845
RESUMO

Objetivo: realizar avaliação oftalmológica de uma amostra significativa de jogadores


profissionais de futebol do Brasil. Métodos: estudo transversal conduzido durante qua-
tro anos consecutivos (2009-2012) em um único clube de futebol no Brasil. A avaliação
oftalmológica foi realizada pelo mesmo médico oftalmologista em cada amostra. Antes
da avaliação oftalmológica, todos os participantes preencheram um questionário que
fornecia os seguintes dados: idade, posição, uso de lentes de contato ou medicamentos
oftalmológicos, sintomas, cirurgia oftalmológica prévia e data da última avaliação oftal-
mológica. Durante o exame oftalmológico, foram avaliados: acuidade visual, pressão
intraocular, fundoscopia, biomicroscopia e visão de cores. Resultados: 120 avaliações
oftalmológicas bilaterais foram realizadas em 84 jogadores profissionais de futebol entre
2009 e 2012. Pinguécula e pterígio foram as condições mais comuns encontradas na
biomicroscopia dos atletas, correspondendo a 63% (38/60) e 17% (10/60) das alterações,
respectivamente. Na avaliação do senso cromático, apenas um atleta era daltônico. Não
houve associações significativas entre posição dos atletas e resultados da biomicrosco-
pia e fundoscopia. Conclusão: apesar da alta prevalência de alterações encontradas
na avaliação oftalmológica, maioria das alterações refrativas não exigiram correção e as
alterações na biomicroscopia eram na maioria da vezes benignas. Nível de evidência
III; Estudo de pacientes não consecutivos.

Palavras-chave: Futebol, Lesão Atlética, Olho, Atleta.


INTRODUÇÃO

O futebol é o esporte mais popular no Brasil e no mundo. Especificamente, existem


mais de 240 milhões de jogadores de futebol amador e pelo menos 200.000 jogadores pro-
fissionais no planeta. Apesar do grande aumento do futebol feminino nos últimos anos, 80%
dos jogadores de futebol ainda são homens.1,2
A morte de vários atletas durante partidas de futebol devido a problemas cardíacos
causou grande preocupação e gerou discussões tanto na FIFA (Fédération Internationale
de Football Association) quanto nas sociedades médicas. De fato, uma pesquisa realizada
pela primeira indicou uma taxa média de uma morte súbita por mês durante jogos de futebol
nos últimos 10 anos.3 Esses dados demonstraram a importância da avaliação física pré-par-
ticipação no futebol. Essas avaliações têm como objetivo principal detectar condições que
podem limitar a participação do atleta ou expor os atletas ao risco de lesões, doenças ou
até mesmo morte durante a prática de esportes. Essas avaliações também visam avaliar a
situação geral de saúde dos atletas, informar o conselho médico e determinar os parâmetros
físicos e de desempenho.4
Mirabelli et al.5 demonstraram que os achados anormais mais comuns durante essas
avaliações foram pressão arterial sistêmica elevada e problemas oftálmológicos. Na grande
maioria dos casos, essas alterações oftalmológicas não impedem ou excluem os atletas da
prática do futebol. No entanto, podem afetar diretamente a qualidade de vida e o desempe-
nho dos jogadores.6,7
Nossa revisão da literatura não encontrou estudos sobre avaliação oftalmológica vol-
tados exclusivamente para o futebol profissional. Quase todos os estudos relevantes estão
relacionados a lesões oculares traumáticas neste esporte e avaliações visuais em outros
esportes.8,9 Portanto, como a saúde oftalmológica dos jogadores de futebol atualmente não
está clara e tendo em vista o potencial impacto no bem-estar dos atletas e desempenho,
o objetivo deste estudo foi realizar a avaliação ocular de uma amostra representativa de
jogadores profissionais de futebol do Brasil.

MATERIAIS E MÉTODOS

This was a cross-sectional study conducted during 4 consecutive years (2009-2012)


in a single professional football club in Brazil. The study was approved by our Ethics and
Research Committee (56723616.3.0000.5505), and all players agreed to participate in the
study by completing an informed consent form. All professional team players who were over
18 years of age agreed to participate in the study.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 163


Estudo transversal realizado durante 4 anos consecutivos (2009-2012) em um único
clube profissional de futebol no Brasil. O estudo foi aprovado por nosso Comitê de Ética
e Pesquisa (56723616.3.0000.5505), e todos os jogadores concordaram em participar do
estudo preenchendo o termo de consentimento livre e esclarecido. Todos os jogadores pro-
fissionais maiores de 18 anos concordaram em participar do estudo.
A avaliação oftalmológica foi realizada pelo mesmo médico especialista em cada amos-
tra. Antes do exame oftalmológico, todos os participantes preencheram um questionário
contendo os seguintes dados: idade, posição, uso de lentes de contato ou medicamentos
oftalmológicos, sintomas, cirurgia oftalmológica anterior e data da última avaliação oftalmo-
lógica. A acuidade visual, pressão intraocular (PIO), fundoscopia, biomicroscopia e visão de
cores foram medidas durante o exame oftalmológico
Embora 25 atletas tenham sIdo submetidos a avaliação oftalmológica anteriormente
durante os quatro anos do período do estudo, as análises descritivas foram realizadas
na amostra de 120 avaliações, pois os resultados podem ter sido diferentes ao longo do
tempo. As características qualitativas dos jogadores foram descritas por meio de frequên-
cias absolutas e relativas, e as características quantitativas por meio de medidas sumárias
(média, desvio padrão, mediana, mínimo e máximo ou quartis). A idade e a acuidade visual
dos atletas foram correlacionadas usando um modelo de equações de estimativa genera-
lizadas (GEEs). As posições dos atletas foram associadas à fundoscopia e biomicroscopia
por meio de comparações múltiplas entre as proporções estimadas. Um valor de p <0,05
foi considerado significativo em todas as análises. A análise estatística foi realizada no
software SPSS 18.0.

RESULTADOS

120 avaliações oftalmológicas bilaterais foram realizadas em 84 jogadores profissionais


de futebol entre 2009 e 2012. Dos 84 atletas, 70% (59) realizaram apenas uma avaliação,
18% (15) compareceram a duas avaliações, 8% (7) realizaram três avaliações e apenas 4%
(3) realizaram quatro avaliações.
A Tabela 1 mostra a análise descritiva de idade, posição e outras variáveis ​​das 120
avaliações oftalmológicas.
Tabela 1. Análise descritiva das avaliações oftalmológicas

Idade (anos)
Média (Desvio padrão) 23.6 (4.2)
mínimo – máximo 18 – 35
Ano de avaliação
2009 26 (21.7)
2010 31 (25.8)

164 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Idade (anos)
Média (Desvio padrão) 23.6 (4.2)
mínimo – máximo 18 – 35
2011 25 (20.8)
2012 38 (31.7)
Posição
Goleiro 14 (11.7)
Lateral 16 (13.3)
Zaguerio 25 (20.8)
Meio-campo 46 (38.3)
Atacante 19 (15.8)
Avaliações (anos)
Menos de 1 63 (52.5)
2 11 (9.2)
Mais de 2 14 (11.6)
Nunca realizou 32 (26.7)
Cirurgia oftalmológica prévia
Não 120 (100.0)
Uso de lentes de contato
Sim 4 (3.3)
Não 116 (96.7)
Uso de medicações oftalmológicas
Sim 4 (3.3)
Não 116 (96.7)
Avaliação refrativa – Olho direito
Normal 84 (70.0)
Alterado 36 (30.0)
Avaliação refrativa – Olho Esquerdo
Normal 84 (70.0)
Alterado 36 (30.0)
Pressão intraocular – Olho Direito
Normal 120 (100.0)
Pressão intraocular – Olho Esquerdo
Normal 119 (99.2)
Alterado 1 (0.8)
Fundoscopia – Olho Direito
Normal 120 (100.0)
Fundoscopia – Olho Esquerdo
Normal 120 (100.0)
Biomicroscopia – Olho Direito
Normal 92 (76.7)
Alterado 28 (23.3)
Biomicroscopia – Olho esquerdo
Normal 88 (73.3)
Alterado 32 (26.7)
Sensibilidade cromática
Normal 119 (99.2)
Alterada 1 (0.8)

Variáveis categóricas apresentadas por frequências absoluta e relativa (%)

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 165


Encontramos alterações em 60 olhos na biomicroscopia. Pinguécula e pterígio foram
as afecções mais comuns, correspondendo a 63% (38/60) e 17% (10/60) das alterações,
respectivamente. Na avaliação da sensibilidade cromática, apenas um atleta era daltônico.
A Tabela 2 mostra a análise descritiva da idade dos atletas quanto aos resultados da
acuidade visual em ambos os olhos. Não foi encontrada relação significativa entre a acuidade
visual e a idade dos atletas (p = 0,752).

Table 2. Idade dos atletas de acordo com os resultados da avaliação da acuidade visual (n=120).
Acuidade visual – Olho Direito Acuidade visual – Olho Esquerdo
Idade
Normal Alterado Normal Alterado
Média (DP) 23.4 (4.4) 24.0 (3.8) 23.6 (4.6) 23.6 (3.2)
Mínimo – Máximo 17 – 35 19 – 31 17 – 35 19 – 31

Por fim, não foram encontradas associações significativas entre a posição do atleta e
os resultados das avaliações da biomicroscopia e fundoscopia. (Tabela 3)

Tabela 3. Fundoscopia e biomicroscopia, de acordo com o olho e posição. (n = 120).


Posição
Goleiro Lateral Zagueiro Meio-campo Atacante
Fundoscopia – Olho direito
Normal 11 (78.6) 11 (68.8) 18 (72.0) 33 (71.7) 18 (94.7)
Alterado 3 (21.4) 5 (31.3) 7 (28.0) 13 (28.3) 1 (5.3)
Fundoscopia
Olho esquerdo
Normal 11 (78.6) 11 (68.8) 18 (72.0) 33 (71.7) 18 (94.7)
Alterado 3 (21.4) 5 (31.3) 7 (28.0) 13 (28.3) 1 (5.3)
24.9% 21.0% 26.6% 28.5% 6.0%
Proporções estimadas (IC95%)
(0-55.1%) (0.7-41.3%) (6.2-46.9%) (12.8-44.2%) (0-17.4%)
Biomicroscopia Olho Direito
Normal 11 (78.6) 11 (68.8) 19 (76.0) 34 (73.9) 17 (89.5)
Alterado 3 (21.4) 5 (31.3) 6 (24.0) 12 (26.1) 2 (10.5)
Biomicroscopia Olho Esquerdo
Normal 10 (71.4) 10 (62.5) 18 (72.0) 33 (71.7) 17 (89.5)
Alterado 4 (28.6) 6 (37.5) 7 (28.0) 13 (28.3) 2 (10.5)
16.2% 31.5% 31.7% 27.3% 12.2%
Proporções estimadas (IC95%)
(0-36.9%) (8.1-54.9%) (12.8-50.5%) (11.9-42.8%) (0-28.0%)

DISCUSSÃO

A avaliação pré-participação é mais comumente realizada anualmente entre jogadores


de futebol, e o melhor momento para essa avaliação é 6 semanas antes da pré-temporada,
o que permite a correção de quaisquer problemas identificados.4,10
Lombardo et al.4 argumentaram que uma avaliação oftalmológica deve ser realizada
durante esta avaliação pré-participação, e que a simetria das pupilas deve ser avaliada, pois
pode ser usada para determinar se o atleta sofreu trauma cranioencefálico. Os mesmos

166 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


pesquisadores reforçaram a importância de avaliar alterações como subluxação do cris-
talino, miopia grave, descolamento de retina e estrabismo, que estão associadas à
síndrome de Marfan.
As deficiências visuais podem colocar os atletas em risco durante a realização de ati-
vidades físicas. Lehmann et al.11 argumentaram que o teste de Snellen deve ser realizado
em todos os atletas antes de participarem de esportes, assim como Miller et al.12 Os testes
devem ser realizados com os óculos ou lentes de contato que o atleta usa durante seu
respectivo esporte, e uma acuidade visual melhor que 20/40 é um pré-requisito para uma
participação esportiva segura. Assim como Lombardo et al.4, esses autores também reforçam
a importância da avaliação da simetria pupilar, que pode indicar lesão cerebral traumática.
Estudo realizado por Needleman et al.13 mostrou que jogadores profissionais de futebol
na Inglaterra apresentam saúde bucal precária, o que interfere na qualidade de vida e no
desempenho esportivo. Esses autores defendem o rastreamento de problemas dentários
em atletas. Acreditamos que isso também valha a pena no caso da triagem oftalmológica,
uma vez que algumas alterações oftalmológicas levam à deterioração da qualidade de vida
e do desempenho esportivo.
As alterações mais frequentes na avaliação pré-participação esportiva são o aumento
da pressão arterial e problemas oftalmológicos.4 Por esse motivo, Mirabelli et al.5 afirmam
que essa avaliação inicial deve avaliar pelo menos os seguintes parâmetros: sinais vitais,
visão, audição e cardiovasculares. e sistemas musculoesqueléticos.
Pereira et al.14 demonstraram que os atletas apresentam melhores habilidades visuais,
principalmente em termos de acuidade visual periférica e percepção do campo visual. Além
disso, os mesmos autores mostraram que as habilidades visuais tendem a melhorar com
a idade, e que diferentes posições esportivas não requerem necessariamente diferentes
níveis de habilidade visual.
Em um estudo de Sapkota et al., 6 jogadores de futebol e críquete foram submetidos a
avaliação oftalmológica; a incidência de pinguécula e pterígio foi de 21%. No presente es-
tudo, pinguécula e pterígio foram as afecções mais comuns encontradas na biomicroscopia
dos atletas, correspondendo a 63% (38/60) e 17% (10/60) das alterações, respectivamen-
te. No mesmo estudo de Sapkota et al. 6, 69% dos atletas nunca haviam feito avaliação
oftalmológica e 3% dos atletas eram daltônicos. No presente estudo, 26,7% dos atletas
nunca haviam feito avaliação oftalmológica e menos de 1% dos atletas eram daltônicos.
Sapkota et al.6 levantaram a hipótese de que a alta incidência de pinguécula e pterígio se
devia à exposição prolongada à luz solar, e acreditamos que essa possa ser a causa da alta
incidência dessas alterações encontrada em nosso estudo.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 167


Apesar da alta prevalência de alterações encontradas na avaliação oftalmológica, a
maioria das alterações refrativas dispensou correção (óculos / lentes de contato) e as alte-
rações biomicroscópicas foram em sua maioria benignas (pinguécula e pterígio).
Uma limitação do estudo foi que alguns dados eram retrospectivos e dependiam da
resposta / memória dos atletas, o que pode ser considerado um viés. Outra limitação é que
a amostra foi composta por jogadores de futebol profissional da primeira divisão do Brasil,
que normalmente têm maior acesso a avaliações médicas e de saúde periódicas.
A avaliação oftalmológica anual é recomendada pelas sociedades de oftalmolo-
gia. No entanto, aproximadamente um quarto dos jogadores avaliados nunca havia feito,
ou não se lembrava de ter feito, um exame oftálmico.

CONCLUSÃO

Apesar da alta prevalência de alterações encontradas na avaliação oftalmológica, a


maioria das alterações refrativas não necessitou de correção (óculos / lentes de contato)
e as alterações biomicroscópicas foram em sua maioria benignas (pinguécula e pterígio).

AGRADECIMENTOS

Não houve assistência financeira para o projeto. Gostaríamos de agradecer


ao Departamento de Esportes do Santos Futebol Clube pelo apoio no desenvolvi-
mento deste estudo.

REFERÊNCIAS
1. Arliani G.G., Lara P.S., Astur D.C., Cohen M., Gonçalves J.P., Ferretti M. Impact of sports on
health of former professional soccer players in Brazil. Acta Ortop Bras. 2014;22(4):188-90.
doi:10.1590/1413-78522014220400954

2. Junge A., Dvorak J. Soccer injuries: a review on incidence and prevention. Sports Med.
2004;34(13):929-38. doi: 10.2165/00007256-200434130-00004

3. Kramer E.B., Dvorak J., Schmied C., Meyer T. F-MARC: promoting the prevention and mana-
gement of sudden cardiac arrest in football. Br J Sports Med. 2015;49(9):597-8. doi: 10.1136/
bjsports-2015-094764

4. Lombardo J.A., Badolato S.K. The preparticipation physical examination. Clin Cornerstone.
2001;3(5):10-25. doi:10.1016/s1098-3597(01)90066-3

5. Mirabelli M.H., Devine M.J., Singh J., Mendoza M. The Preparticipation sports evaluation. Am
Fam Physician. 2015;92(5):371-6.

168 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


6. Sapkota K., Koirala S., Shakya S., Chaudhary M., Paudel P. Visual status of Nepalese national
football and cricket players. Nepal Med Coll J. 2006;8(4):280-3.

7. Wong H.B., Machin D., Tan S.B., Wong T.Y., Saw S.M. Visual impairment and its impact on
health-related quality of life in adolescents. Am J Ophthalmol. 2009;147(3):505-11. doi:10.1016/j.
ajo.2008.09.025

8. Capao Filipe J.A. Soccer (football) ocular injuries: an important eye health problem. Br J Oph-
thalmol. 2004;88(2):159-60. doi: 10.1136/bjo.2003.031518

9. Laby D.M., Kirschen D.G. The refractive error of professional baseball players. Optom Vis Sci.
2017;94(5):564-73. doi:10.1097/OPX.00000000000001067

10. Mick T.M., Dimeff R.J. What kind of physical examination does a young athlete need before
participating in sports? Cleve Clin J Med. 2004;71(7):587-97. doi:10.3949/ccjm.71.7.587

11. Lehman P.J., Carl R.L. The preparticipation physical evaluation. Pediatr Ann. 2017;46(3):e85-e92.
doi: 10.3928/19382359-20170222-01

12. Miller D.J., Blum A.B., Levine W.N., Ahmad C.S., Popkin C.A. Preparticipation evaluation of the
young athlete: what an orthopaedic surgeon needs to know. Am J Sports Med. 2016;44(6):1605-
15. doi:10.1177/0363546515598994

13. Needleman I., Ashley P., Meehan L., Petrie A., Weiler R., McNally S., et al. Poor oral health
including active caries in 187 UK professional male football players: clinical dental examination
performed by dentists. Br J Sports Med. 2016;50(1):41-4. doi:10.1136/bjsports-2015-094953

14. Pereira V.B., Pereira V.B., Pereira R.A., Kasahara N. Comparison of retinal sensitivity be-
tween professional soccer players and non-athletes. Int J Sports Med. 2016;37(4):282-7.
doi:10.1055/s-0035-1564103

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 169


13
“ Bandas de congo e política
oficial cenários de tradições
e transformações estéticas
corporais

José Luiz dos Anjos


Ufes

Otávio Tavares
Ufes

Juliana Guimarães Saneto


Ufes

10.37885/201001885
RESUMO

O objetivo foi analisar os grupos de congo do município de Vitória-ES, quanto aos ele-
mentos que os estruturam, como: expressões corporais, inserção de novos atores e a
relação com o Poder Público. Foram utilizadas entrevistas abertas com três lideranças
de grupos de congo e as análises pautaram-se nas categorias e conceitos identiflcados
nas falas dos entrevistados, conforme minayo (2007). Concluiu-se que há transforma-
ções no processo de expressões cor- porais advindos da entrada de novos atores nos
grupos, entre esses os jovens, que introduziram novas estéticas corporais. A relação com
o Poder Público possibilitou aos grupos se conhecerem e se relacionarem, aderindo a
novos arranjos estéticos. Identiflcou funções e noções de papéis quanto ao gênero dos
atores dos grupos analisados. Coletivamente as expressões corporais não possuem
destinações de papéis, mas revelou que individualmente o congo as reproduz.

Palavras-chave: Congo, Tradição, Transformação Cultural, Expressão Corporal.


INTRODUÇÃO

Ao identificar as diversas matrizes culturais e estéticas, e discutindo como elas se mos-


tram e com quais características se apresentam, recorremos na Antropologia Social e Cultural
para empreender as relações sociais e culturais numa região polvoada por múltiplas faces
culturais, como o Estado do Espírito Santo, neste estudo delimitado pelo município de Vitória.
A perenidade e continuidade dos elementos culturais se tornam difíceis num mundo
globalizado no qual os recursos da comunicação estão em constante desenvolvimento,
tendo a sociedade meios disponíveis e opções variadas de diversão e lazer. O interesse
pelas tradições populares parece não ser um dos elementos capazes de figurar no universo
de entretenimento no mundo urbano. No entanto, não podemos argumentar que esse cam-
po não tem merecido ou não venha a merecer atenção e interesses de diversas áreas do
mundo econômico e do Poder Público. Em efeito, basta analisar como as festas populares
têm ganhado maior visibilidade com a espetacularização de suas performances estéticas,
em que o popular, o tradicional se mistura de forma permanente com elementos modernos
e técnicos (FARlAS, 2005).
Essa espetacularização é parte do problema aqui tratado, portanto diz respeito às
ambivalências ocorridas nas imbricações estéticas e simbólicas das tradições e do moder-
no mundo urbano. lsso quer dizer que, nos espaços tradicionais que reúnem as práticas
lúdicas e simbólicas, justamente no instante em que são inseridas em circuitos urbanos de
massa, por meio das políticas públicas e da atuação da iniciativa privada, há redefinições
dessas práticas, ocorrendo transformações nas instâncias que as legitimaml os significados
simbólicos e as representações que permeiam e perpassam essas práticas.
Mas o que justifica e nos leva a discutir e estudar as manifestações e expressões cor-
porais de grupos tradicionais, sabendo que a Educação Física tem se ocupado de outros
campos e aplicabilidades, tendo o esporte como centro de suas atenções e estudosŞ Ocorre
que, nas manifestações populares de cunho cultural, há fortes e incontáveis expressões
corporais que vêm sendo transformadas e pedagogizadas, segundo Marques (2006), e este
estudo contribuirá para o acúmulo de conhecimento da Educação Física brasileira.
Ainda justificando, por se tratar de um estudo longitudinal, intencionamos que as ex-
pressões corporais identificadas nos grupos de danças populares possam ser aplicadas
transversalmente na prática de ensino da Educação Física escolar e na formação de gra-
duandos dos cursos dessa área, garantindo possibilidades de sua contextualização. Embora
se perceba que os estudos têm um caráter instrumental e embrionário, as conclusões não
finalizam as discussões encontradas.

172 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


DISCUSSÃO PRELIMINAR

Na formação da Região da Grande Vitória (Sec. XlX) por imigrantes italianos, negros
e índios, a convivência, nem sempre pacífica, esteve relacionada com as questões do do-
mínio cultural de um grupo pelo outro. O que queremos enfatizar é que a grande “guerra“
se deu no campo simbólico, ou seja, no campo das esferas culturais que adentravam na
materialidade subjetiva.
Para melhor analisar as características e singularidades das danças populares, é ne-
cessário que conheçamos o locus em que elas estão inseridas. As continuidades dessas
manifestações têm sido pela oralidade e pelos movimentos gestuais. Para Bastide (l978),
oralidade é toda maneira de pensar, sentir e agir que constitui uma expressão de expe-
riência peculiar da vida de qualquer coletividade humana, integrada numa sociedade. Essa
experiência tem sido preservada por meio da tradição oral, e grande parte dos elementos
populares encontra-se retida e acondicionada na memória popular coletiva.
Os elementos tradicionais são complexos e repletos de simbologias, representando
não somente o legado de nações africanas, como também os reinos sagrados e de simbo-
logias indígenas. Nas festas, muitas celebrações, em seus rituais, dramatizam e incluem o
levantamento de mastros, a produção de estandartes, a celebração de novenas, cortejos
solenes, a coroação de reis e rainhas, o cumprimento de promessas, a realização de rela-
ções de parentesco, cantos, danças e banquetes coletivos. Embora esses elementos este-
jam presentes, nem todos os grupos de congo se manifestam apropriadamente com essas
estruturas. Temos que entender que o estudo não pretende analisar se esses elementos
ainda são constitutivos dos grupos a serem analisados, mas, minimamente, discuti-los no
decorrer das análises a serem realizadas.
E o que as festas tradicionais da Região da Grande Vitória, sobre as quais estamos
dissertando, apresentam em suas estruturas estéticas e simbólicasŞ São festas que mantêm
entre si similaridades e diferenças construídas e cravadas em ritos originados de costumes
que se fixaram no âmago de cada uma das manifestações, possibilitando a compreensão
de suas particularidades. A festa em homenagem a São Benedito, na qual se reúnem as
bandas de congo anualmente, no município da Serra-ES, é um exemplo típico da continui-
dade dessa força cultural. Não se trata aqui de falar de festas sagradas e profanas, embora
possa parecer imperceptível ou insignificante, quando se observa de um modo superficial
ou generalizado, porém, em nosso estudo, vimos que essa diferença é visível, primordial e
é também geradora de discussões, portanto, essas festas devem ser tratadas com suporte
metodológico-científico e amparadas por conhecimentos políticos e sociais.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 173


METODOLOGIA E ATORES SOCIAIS

Problematizamos nosso estudo perguntando como se apresentam as faces culturais


e estéticas existentes no município de Vitória, como os grupos de congo se apresentam e
o que promove a continuidade dessas tradições? E, especificamente, qual a relação dos
grupos de congo com o Poder Público? No processo de investigação, utilizamos como ins-
trumento, a entrevista aberta com três líderes de grupos/bandas de congo existentes em
Vitória, tendo um roteiro com temas norteadores para identificar, na fala dos entrevistados,
as relações sociais existentes entre os atores e o papel de cada um no grupo e, também, o
imaginário coletivo e individual que permeia cada ator. Num segundo momento da entrevista,
pretendemos identificar a relação das bandas de congo com o Poder Público local ou com
instituições sociais. Adotamos a entrevista aberta porque essa metodologia pode nos fornecer
elementos objetivos e subjetivos considerando este último, possível de revelar atitudes, va-
lores e visões políticas dos entrevistados e, segundo Minayo (2007), esse tipo de entrevista
é utilizado na descrição e na compreensão de especificidades culturais para determinados
grupos e para comparabilidade de diversos elementos culturais. As entrevistas abertas
apresentam questões norteadoras, mas não são específicas nem fechadas. Apresenta um
roteiro para que o pesquisador possa se dirigir, podendo haver a possibilidade de adição de
novos questionamentos para compreender melhor determinado tema.
Para a análise das informações coletadas, partimos da compreensão de que os sujeitos
informantes figuram de forma indissociável entre o mundo objetivo e o subjetivo (MlNAYO,
2007). A interpretação das informações e a atribuição de significados são preposições da
pesquisa qualitativa. Nesse sentido, dados coletados serão analisados indutivamente pelo
pesquisador, pautando-se nas possíveis cate- gorias e/ou conceitos identificados nas falas
dos entrevistados.

DISCUSSÃO TEÓRICAL OS OBJETOS DE ANÁLISE

Diante dos objetivos propostos, investigamos e analisamos os grupos/bandas de mani-


festações culturais em Vitória–ES e, de acordo com as informações fornecidas pela Secretaria
de Cultura de Vitória, registramos os seguintes grupos/bandas que se constituem na zona
urbana de Vitórial Banda de Congo de Vitória; Banda de Congo Amores da Lua; Banda de
Congo Mirim da llha; Banda de Congo das Paneleiras (denominado Panela de Barro); e
Banda de Congo Mirim Estrelinha. A seleção para pesquisa das bandas de congo e suas
lideranças, adotamos, como critério, a relação institucional das bandas de congo com o
Poder Público e a atuação contínua das lideranças nessas bandas.

174 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Para colher informações, entrevistamos três lideranças, duas pertencentes à Banda
Amores da Lua, que possui organização e atuação contínua, apresentando-se em locais
públicos e em festas culturais e folclóricas, representando o município de Vitória, com forte
presença feminina que a faz distinguir-se de outras bandas de congo. A terceira liderança
pertence à Banda de Congo Panela de Barro, da comunidade de Goiabeiras, região conhe-
cida pela tradição de se fazer panela de barro há mais de 300 anos, e uma das mais velhas
bandas de congo da Grande Vitória. As entrevistas foram realizadas com os coordenado-
res, que são lideranças conquistadas pelo tempo de permanência nas bandas de congo,
conforme infor- mações dos próprios integrantes. Para chegar às lideranças, buscamos
informações que constam na Secretaria de Cultura do Município de Vitória. Após os primei-
ros contatos em dias de ensaios ou nos dirigindo às residências, fomos apresentados aos
coordenadores das bandas.
O primeiro líder, com 8l anos, está no grupo, de forma ininterrupta, desde l98l. A se-
gunda liderança a ser entrevistada foi uma participante feminina de uma banda de congo,
considerada, também, como líder do grupo. A terceira entrevistada está de forma contínua
na banda há 13 anos, desde 1999. Essas lideranças estão participando de forma contínua ou
ininterrupta, embora estejam há mais tempo na banda; no entanto, problemas de doença os
levaram a se ausentar das atividades, como ensaios e viagens, e causaram afastamentos,
principalmente das festas e das principais comemorações.
Para as entrevistas utilizamos câmeras e gravadores para colher as informações, tendo
as seguintes perguntasl quais são os significados simbólicos que permeiam e permitem a
participação dos atores na banda e que relações sociais são criadas nas interações sociais
causadas pela participação na banda de congo? Qual a participação do Poder Público na
continuidade das bandas de congoŞ Para identificar os informantes, eles foram denominados
del Al e A3 (liderança masculina) e A2 (liderança feminina). Realizamos as entrevistas em
três momentos distintos e, em todos eles, os informantes não estavam sozinhos. Com Al e
A3, as entrevistas foram realizadas nos locais de ensaios, e com A2 foi na sua residência,
acompanhada de três vizinhas e um contingente de crianças.
lnicialmente, após apresentação, perguntamos o que faz/leva o sujeito, no caso parti-
cipante/integrante, a participar da banda de congo. Para Al e A3l “É que todo mundo gosta
de participar... Tem gente que está aqui desde muito tempo“ e “É um jeito que as pessoas
encontram pra se viver. Gosta de estar junto com outras pessoas“. Segundo as lideran-
ças, a convivência é o que faz as pessoas participarem das bandas. No entanto, quando
perguntamos sobre a existência de algum motivo “especial“, os mesmos informantes nos
responderaml “Olha... todo mundo acredita... acredita em alguma coisa que faz a gente ficar
junto... Quando é festa, todo mundo dá uma ajuda pra ninguém desanimar [...] mas eu vejo

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 175


que tudo tá relacionado com a fé que a gente tem“. Embora seja a fala das lideranças, a “fé“
é um elemento comum que constitui as relações sociais, pois torna cada ator responsável
pela continuidade do coletivo.
Perguntado o que mudou no grupo, num primeiro momento não obtivemos resposta,
mas, explicando os detalhes, se houve mudanças na indumentária, cores, instrumentos, no
“jeito de dançar“, recebemos como respostasl “A roupa a gente mudou, mudou bastante,
porque antes não tinha roupa fácil assim, hoje tem mais, a gente compra e a gente recebe
dinheiro para comprar... quando vai apresentar fora, a gente recebe roupa nova“, nos diz
Al. Também A3 esclareceu:

Os instrumentos continuam do mesmo jeito. Quando não tem couro, a gente


arruma um couro emprestado de alguém e completa o instrumento, mas tudo
continua o mesmo... Tem alguma música que a gente canta que foi mudando...
A gente num notou, mas, quando viu, já tinha outra coisa cantando.

Considerando que o congo contemporâneo está no entrelugar de dança-costume e


espetáculo ou na fronteira entre cultura popular e cultura para massa, pois, com a expansão
cada vez mais intensa dos meios de comunicação e com a própria dinâmica das relações
sociais, econômicas e culturais no País, a dança popular não só ganha novos elementos–
vestimentas, acessórios, instrumentos – como também novos significados, e passa de uma
produção artesanal para um produto destinado ao consumo de quem se constitui espec-
tador das programações culturais populares. Para Canclini (2008), os “novos significados“
são interessantes para o mercado, pois aponta novas criatividades, constituindo novos
arranjos, pois o popular é o que vende, o que agrada multidões, e não o que é criado pelo
povo. O que importa é o popular como popularidade. Aqui reside a inversão que vemos nas
últimas décadasl o popular, que tinha o próprio povo como consumidor, hoje é elaborado e
reelaborado para um público distinto de seus atores.
Na continuidade das análises, é interessante observar que o ritmo do congo é constituí-
do por uma seção musical (três ou quatro tambores, flautas e canzás, ou casacas) e possui
um conjunto de figurantes, todos eles dançarinos. É justamente esse ordenamento que in-
teressa à Educação Física, que permite identificar a corporalidade dos atores. Perguntamos
qual o ritmo do congo, a música e a coreografia. Para o informante All “Não tem coreografia,
cada um dança do seu jeito, mas todo mundo dança no ritmo da batida do tambor... É um
ritmo forte, uma batida forte [...]. Só quando tem apresentação fora da cidade, é que a gente
faz fila, fica todo mundo do mesmo jeito, mas todo mundo dança do jeito da batida do tam-
bor” e completa argumentando que “também não tem cantigas certas, todo mundo sabe as
cantigas, mas não tem ela (cantiga/letra)“. Essa batida do tambor é que promove o ritmo dos

176 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


movimentos dos dançarinos. Cada qual com seu movimento, mas cadenciado pelo ritmo do
tambor. No entanto, para A3l

Cada um tem seu jeito, mas é na batida do tambor, da casaca, que a gente dá
os pas- sos. Quem pode dar mais passo dá mais. Quando tem muitos jovens
e a gente traz as crianças, daí tem um jeito diferente, cada um tem o seu lugar
e vai andando, dançando atrás da bandeira. Na batida do tambor, você vai pra
frente, pra traz, sozinho ou lado a lado. Tem hora que o ritmo é mais forte (mais
rápido). Os jovens conseguem, eles fazem diferentes dos mais velhos, eles
trazem passos diferentes para dança e fica bonito e a gente vai tentando imitar.

Vale refletir sobre a aprendizagem oral e sua hierarquia na modernidade. Ao revelar


que não há cantigas escritas, especificamente neste estudo, mesmo utilizando uma visão
antropológica de cultura, percebemos que existe uma hierarquia entre os capitais culturais
(CANCLlNl, 2008). A arte vale mais que o artesanato, pois essa tem registro e nominações;
a cultura escrita mais que a transmitida oralmente, pois escrita não sofre mudanças, pois
mesmos os saberes orais se constituindo como expressões simbólicas, têm posição se-
cundária no processo de continuidade ou de transformação pelos seus próprios agentes,
vindo a ser espaço de conflito, pois “[...] daí, quando saímos prá fora (apresentar em outro
município) nem todo mundo gosta de decorar a música com palavras diferentes, informa Al.
Os campos das novas expressões e manifestações, de forma institucional, não podem
ser identificados como únicos “responsáveis“ pelas ressignificações e transformações, pois
cada participante não é um mero espectador passivo de uma tradição secular sobre a qual
não tem nenhum controle e só lhe cabe preservar. Pelo contrário, os participantes, e aqui,
neste caso, os jovens que se constituem nos grupos de congo, também modificam e estão
participando ativamente das relações de força e de transformação.
Santos (20ll), ao analisar as transformações existentes nas expressões da dança Sussa,
na comunidade quilombola de Kalunga – GO, percebeu que houve mudanças rítmicas e es-
téticas, pois observou-se um hibridismo cultural, pois o objeto analisado foi redimensionado.
Isto é, buscou-se a dança Sussa e encontrou-se outra manifestação corporal, o forró. Para
Santos (2011), os jovens foram os prota- gonistas dessa ressignificação; foram os respon-
sáveis por demarcar a relação entre a tradição e a modernidade. Em nosso estudo, parece
que os atores jovens não têm compromissos com as normas e expressões simbólicas, mas
muitos deles possuem conhecimento dos fundamentos do congo, de seus simbolismos e
significados. Canclini (2008), utilizando o conceito de poder de M. Foucault, diz que as rela-
ções não costumam ser igualitárias, mas é evidente que o poder e a construção do aconte-
cimento são resultado de um tecido complexo e descentralizado de tradições reformuladas
e de intercâmbios modernos, de múltiplos agentes que se combinam.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 177


Perguntamos se os ritmos de dançar, as coreografias, os movimentos são diferentes e
recebemos como resposta que “[...] não há diferença de ritmo, do jeito de dançar, cada um
dança do seu jeito, mas sempre com o ritmo do tambor” (A3) e completa All “[...] não existe
um ritmo só... Um ritmo pra todo mundo. É que, quando a pessoa tem idade, seu ritmo é
mais devagar, mas isso não fica feio, todo mundo dança“. Em relação a isso, perguntamos
se existe uma coreografia ou um ritmo diferente de dançar ou de se movimentar para ho-
mens e mulheres, e A2 disse que “[...] não existe, todos os ritmos são iguais. É a roupa que
a gente usa que faz dar diferença“. Para Al:

[...] a dança serve tanto para os homens como para as mulheres, não tem
diferença e também não dança um com o outro. Não existe, como nas danças
que tem por aí onde existe o par. Existe o homem que faz um jeito e a mulher
que faz outro jeito de dançar. Todo mundo dança do seu jeito e o ritmo pra um
é o mesmo que para o outro.

Aqui reside o fato de a dança do congo, na fala dos entrevistados, servir para ambos os
gêneros, pois não caracteriza o que é papel da mulher e do homem quanto aos movimentos
e ao ritmo colocados de acordo com a musicalidade. É interessante abordar essa questão,
pois, com essas práticas, pode-se pensar em outros estilos de dança, mais comumente ca-
racterizados como femininos ou masculinos, para que se faça uma reflexão sobre os motivos
de tal associação, descaracterizando qualquer manifestação de gênero nos movimentos.
Analiticamente falando sobre a indistin- ção de gênero quanto ao movimento corporal, tra-
ta–se do papel de cada ator na coletividade do grupo, contudo, individualmente, embora os
movimentos distintos sejam tributados ao figurino, histórica e socialmente, os movimentos
corporais na dança do congo estão sujeitos às construções sociais de gêneros.
A Antropologia Social vem abordando essa categoria, e entende a sua cons- trução
no interior das estruturas de relações de poder, onde atores sociais ocupam posições que
implicam ordenações hierárquicas, que, embora pequenas nas esferas sociais, contêm a
semente das relações de poder na sociedade (BUTLER, 2003).
Neste estudo, as posições ocupadas compreendem uma série de práticas e significados
que lhes conferem sentido, quando as expressões corporais se convertem em performances
de gênero, ou seja, estilizam o corpo e repercutem na aparência e no comportamento de
quem dança, produzindo e reproduzindo maneiras específicas de se viver a masculinidade
e a feminilidade.
Em se tratando de cântico, musicalidade e coreografia, cada grupo possui sua perfor-
mance estética, como o modo de tocar os tambores (guararás), que pode ser sentado sobre
eles, como se estivessem cavalgando, e assim o fazem quando estão parados. A casaca
e o chocalho, aos quais os negros ajuntaram a cuíca, são complementados por outros

178 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


instrumentosl apito, triângulo (ferrinho), caixas, sanfonas (estas por influência da imigração
italiana, que ocorreu no Espírito Santo), pandeiros e ganzás. Os instrumentos são pintados
nas cores da banda.
Procuramos discutir com os nossos interlocutores acerca da escolha e da função de
cada um no grupo, e eles disseram que “Os homens gostam de tocar... E os instrumentos
são pesados para as mulheres“ (A3). “Tem homem tanto com os instrumentos e também na
dança“ (Al). lsso não é decorrente de uma mentalidade de expressões, mas de papéis e de
apropriações históricas vinculadas ao gênero, análise também consubstanciada por Dias
(2012) que, em seus estudos com 24 ban- das de congo no Espírito Santo, concluiu que só
os homens tocam os instrumentos. Para Al, A2 e A3, consubstanciados na fala de A2l “[...]
os jovens vêm para o grupo quando a gente pede. Quando tem viagem pra fora, os jovens
e as crianças vêm“. Perguntamos quem são essas crianças, e os informantes Al e A3, na
fala de A2, foram enfáticosl “Olha... Geralmente são netos, sobrinhos, filhos [...]“. Pelas res-
postas, observamos que o grupo se constitui de membros de relação muito próxima, mesmo
que não configure membro familiar de descendência, a relação e a proximidade familiar são
notadas, conforme vemos nos depoimentos dos infor- mantesl “Aqui, nesse grupo, tenho
dois afilhados [...], eles já estão com l2 anos“ (Al) e “Minha comadre, quando vem, ela traz
meus afilhados [...] e “Daí, vem ela, o compadre e seus filhos“ (A2).
Análises semelhantes encontraram Anjos e Souza (2006), ao identificarem que grupos
de folia de reis se constituem de familiares ou de agregados próximos que manifestam conti-
nuidade parentesca. Assim, os encontros dos grupos de congo ou seus ensaios conservam
a construção de laços familiares ou a continuidade de relações que perduram por décadas.
Cada qual com sua história, “compadres, comadres, tios, netos, sobrinhos”, constituem um
emaranhado de parentescos permitido pelos encontros sazonais dos ensaios.
Perguntamos se o Poder Público (Prefeituras Municipais) tem colaborado com as ban-
das de congo, e os informantes Al e A3 disseram que “Quando a gente vai pra fora [outros
municípios], as Prefeituras ajudam. Eles se preocupam se está faltando alguma coisa... Se os
instrumentos estão bom... Se todo mundo está com roupa“. Perguntamos porque o Poder
Público tem essa preocupação. Eles responderam enfaticamentel “A gente representa a ci-
dade, é por isso“ e “Eles se preocupam e vai até alguma pessoa para que a gente não fique
`preocupado`“, informa Al. Na continuidade, indagamos sobre as viagens que são realizadas
e, como resposta, obtivemosl “Geralmente são marcadas pela Secretaria da Cultura“, informa
A3, e “No início do ano, a gente tem marcado para onde vamos e os ensaios começam“.
lnformaram-nos que há apresentações realizadas na própria cidade em diferentes
espaços públicos, permitindo que os grupos sejam conhecidos nos municípios como forma
de dar identidade à cidade. Abrimos um recorte, para iniciar uma breve discussão, pois

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 179


as “apresentações“ abrem espaços que demandam uma gama de te- orizações socioló-
gicas. O lugar da cultura pelo Poder Público se justifica e se legitima nas propostas de
revitalização das tradições culturais, discursos latentes nas políticas públicas dos governos
municipais e estaduais. Essas políticas têm ocupado um importante lugar para a com-
preensão da dinâmica urbana contemporânea, pois promovem um fator diferenciador de
preocupação do poder público com a cultura local urbana (BOTELHO, l997). Nesse sentido,
o patrimônio histórico, as tradições locais, a cultura local e outros elementos têm se trans-
formado em mercadoria altamente valorizada no mundo urbano e vêm recebendo atenção
do Poder Público local.
Embora nesta análise não respondamos às questões que envolvem políticas públicas
na área cultural, ao menos problematizamos questões colocadas que permitem, panora-
micamente, entender as relações que motivam o interesse do Poder Público pelos grupos
tradicionais do município.
Diante dos cenários altamente competitivos pela comunicação, os municípios precisam
se destacar por meio de um diferencial. A valorização da tradição e da cultura local tem
sido um dos temas e cenários mais explorados, pois, entendendo que os modelos urbanos
e os cenários não são distintos, constituindo-se cada vez mais um fator global similar, há
necessidade de diferenciá-los, comprometendo-se com o local onde os aspectos culturais
urbanos e os usos e costumes locais estejam no plano dos cenários de apresentação, como
um marco diferenciador do município.
Embora, analiticamente, não é o nosso objetivo, poderíamos questionar se esse espaço
é um campo rico de luta social ou de acomodação e perda do popular, do seu potencial de
oposição ao pensamento “oficial“ de cultura.
Pensamos que não, pois, como vemos nas informações, se analisarmos pela via das
relações sociais, há uma intensa produção de novos arranjos estéticos e sociais que hierar-
quizam e promovem novas configurações de forças. Talvez precisemos de Chartier (1995)
para explicar a colocação desse questionamento, pois no bojo das políticas amparadas pelo
Poder Público, há uma nova força sendo construída, pois o popular não se efetiva nos objetos,
nas coisas, mas nas práticas sociais promovidas pelos agentes que lhe dão novos arranjos.
Os encontros de grupos/bandas parecem ser o ponto principal de todo enredo, de ma-
nifestação e expressão individual de cada membro do grupo, segundo A2, seguido por A3.

A gente revê os colegas de outras cidades que faz tempo que não se vê e
depois você vê se o nosso grupo está bom ou não. Tem grupo usando outros
instrumentos que a gente ainda não usa... Tem grupo que tem até coreógrafo
que ensaiam eles. As viagens são boas por essa causa.

180 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Tal fala denota elementos discursivos subjacentes conscientes e inconscientes. Percebe-
se uma tradição aliada ao espetáculo e à busca da gestualidade performática, porque, acima
de tudo, há uma comercialização e uma publicização do popular, pois é necessário existir
para resistir. O existir converteu-se em estratégias que garantem a performance na entrada
de atores jovens ao grupo, pois a exibição de gestos performáticos e velozes, capazes de
prender o olhar da assistência, despertar seu interesse e, quiçá, possibilitar o entusiasmo
pela agenda cultural implica a performance física, garantida pelos atores que debutam os
espaços nas apresentações públicas. Embora fale por si, participar das agendas culturais,
na perspectiva do patrocínio público, requer, antes de tudo, empreender uma gestualidade
performática objetiva para impressionar o olhar do turista, do urbano, como forma de valida-
ção das transformações estéticas e de seu fazer cultural em frente a outros grupos.
Observa-se também que, atualmente, não só os grupos inseridos no contexto urbano
passam por transformações em suas tradições de se manifestar coletivamente. Nessa linha
de pensar as transformações da cultura popular como produto, sem dúvida, os grupos das
zonas urbanas estão mais propensos a essas transformações. Anjos e Souza (2006), em
seus estudos de grupos populares de danças tradicionais na região norte do Espírito Santo,
viram que, mesmos nos grupos da zona rural, não havia um sequer, no espaço de suas
pesquisas, que fosse “puro”, intocado, como os próprios participantes falam, pois o congo
já “nasce“ híbrido, espaço de uma mistura de etnias, movimentos, expressões, frutos de
suas respectivas culturas. Outra transformação que denota as manifestações populares,
em nosso caso, os grupos de congo do município de Vitória, são os processos de contra-
fluxo cultural. As danças, as expressões e, coletivamente, as manifestações transcendem
a fronteira do local (comunidades) e passam para um contexto globalizado, territorialmente
falando, e são apresentadas em festivais, hotéis, pousadas, órgãos públicos e em outros
locais fora das “fronteiras” da comunidade.
A simbiose de relações territoriais e espaciais é uma preocupação recorrente em de-
bates acerca do que ocorre quando o popular avança e se relaciona com outros meios
sociais, e se vale dos meios técnicos e modernos para ganhar repercussão e difundir sua
“cultura“. Há certo ressentimento disseminado de que o “popular“ deixaria de ser tradicional
e perderia suas raízes com sua disseminação pelos mass media. Entendemos que essas
ideias não deixam de ser um conservadorismo, que nega a circularidade de saberes e retira
do popular seu caráter inovador, uma vez que o popular se apropria dos instrumentos mo-
dernos para se difundir na busca de um regionalismo mais abrangente e nacional.
Como último questionamento da pesquisa, indagamos aos líderes sobre a percepção
que têm das transformações, ou não, quando se encontram com outros grupos conhecidos.
Como respostas sintetizadas, colhemosl “Mudou quase tudo“ (Al, A2, A3), “Modo de cantar“

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 181


(A2), “De roupas“ (A2), “Figurinos (A2)“, “Passos marcados“(A2). E o que não mudoul “[...]
as pessoas continuam as mesmas...“ (Al, A3), “não mudou o jeito da gente pensar... A gen-
te ainda fala das mesmas coisas“ (Al, A2), “fala do passado, como era antes“ (Al), “fala do
jeito da gente viver“ (A3), “não mudou o jeito da gente e os outros de levar a vida, isso não
mudou... isso está mudando muito pouco“(Al,A2. A3)
Podemos compreender, a partir dessa leitura, que é possível pensar e ampliar o con-
ceito de transformação cultural para além de sua materialização, em objetos, estéticas e
tradições. A transformação vamos encontrar nos modos de uso e das apropriações feitas
dos novos arranjos construídos pelos sujeitos sociais. Embora o moderno transforme os ob-
jetos, essa transformação não substituiu a herança do passado e interações que promovem
a continuidade simbólica e de significados.
Aqui cabe essa questão ao nosso estudo, pois devemos refletir sobre a cultura, fazer
experiências com ela, discuti-la e publicar os achados. Com esse argumento, o importante
não é o objeto modificado (as danças, expressões, instrumentos), mas sim as interpretações
e/ou reinterpretações, os novos signos que irão se constituir em novos significados ou que
serão ressignificados.

PARTLNDO PARA A “DANÇA“ FLNAL

Ao final deste trabalho, as considerações conclusivas podem ser apontadas nas espe-
cificidades de cada objeto analisado. Por se tratar de um estudo de matri- zes socioantro-
pológicas, as questões afeitas às relações sociais são as primeiras em que descortinamos
as tradições pelas quais os grupos de congo se constituem. As relações de parentesco
garantem aos atores das bandas de congo, aproximações familiais constituídas no decorrer
das relações sociais. São essas aproximações que, num segundo momento, o das relações
entre os atores, o estudo apontou como a “festa“, aqui identificada com os ensaios e apre-
sentações performáticas. São nas festas que ocorrem os contextos para a continuidade
das relações permeadas pelos elementos do imaginário social. Esse imaginário constitui a
devoção individual dos atores, dado pelo caráter não institucionalizado da fé, garantindo a
reciprocidade e a continuidade do mundo social do grupo (MAUSS, 2003).
O estudo revelou implicitamente que o congo reproduz funções e papéis de gêneros,
pois os instrumentos musicais são pertinentes ao homem, embora as falas dos entrevista-
dos não tenham nitidamente desenhado tal face. Com efeito, a fala da liderança A2 indica
percepções de parentescos nas relações do grupo, e também de elementos estéticos, como
cantos, ritmos e figurinos. Quanto aos gestos e ex- pressões corporais, que, na fala dos
entrevistados foram explicitados como “dança“, eles não revelaram que os gestos e ex-
pressões são desempenhados distintamente pelos atores dos grupos. Contudo, o estudo,

182 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


analiticamente, não descaracterizou que as expressões corporais são elementos constituídos
histórica e socialmente, logo, distinto a cada gênero.
Em uma análise conclusiva, podemos ver que os espaços ocupados pelas tradições
populares, no caso o congo, nas agendas públicas, correspondem a iniciativas destinadas às
políticas públicas com o objetivo de preservar identidades culturais ameaçadas de estagna-
ção, quando situadas em locais de constantes transformações, como é o caso cosmopolitano
em que se encontram esses grupos populares.
De outra forma, essas agendas, pautadas e avalizadas pelas asas do econômico,
funcionam também como alavancas para a renovação dos modos de pensar e sentir de
grupos que, embalados pela conjuntura do mundo moderno e tecnologizado, refluem à in-
corporação de novidades e avanços estéticos. De certa forma, a relação com outros grupos
pode resultar, por exemplo, na transformação, como vem acontecendo com as mudanças,
quando percebemos novos instrumentos e o uso de novas coreografias. Até por conta da
realidade, os atores dos grupos de congo não vêem suas manifestações como uma cultura
estagnada – com ideias de “perda“ da raiz, das tradições – e nem como um produto para
ser vendido, tendo que “transformar“ para agradar.
Contudo, os estudos apontaram que os grupos de congo vêm passando por um proces-
so de interação entre tradição e transformação. Nesse contexto, o congo, como expressão
e manifestação, vem ganhando elementos estéticos, principalmente resultantes de novos
atores que se inserem nos grupos I os jovens e crianças.
Além do deslocamento das apresentações, que permitem novos arranjos e mudanças
na sua composição estética, notamos que existem inserções institucionais que, diante de
políticas de promoção da cultura popular, promovem uma descontinuidade de tradições,
1. 0
permitindo mudanças que imbricam na elaboração e incorporação de novas interpretações
e novas construções simbólicas.
Com referência à tradição e à transformação, finalizamos nossos estudos entendendo
que, por se tratar de uma questão no âmbito da cultura, é preciso refletir sobre a tradição e
a transformação como faces complementares e não excludentes entre si, pois tradição não
implica numa recusa à mudança e ao movimento (BALANDlER, l997), da mesma forma que
a modernidade não exige a extinção das tradições.

REFERÊNCIAS
1. ANJOS, J. L.; SOUZA, R. O. Folia de reisl representações de uma comunidade de pescadores
.lecturas Educación Física y Deportes, Buenos Aires, ano ll, n. 99, ago. 2006.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 183


2. BALANDlER. G. O contornol poder e modernidade. Rio de Janeirol Bertrand Brasil, l997.

3. BASTlDE. R. As religiões africanas no Brasil: contribuição a uma sociologia das interpenetra-


ções das civilizações. São Paulol Edusp, l978.

4. BOTELHO, l. A diversificação das fontes de financiamento para a cultural um desafio para os


poderes públicos. lnl MOlSÉS, J. A.; BOTELHO, l. (Org.). Modelos de flnanciamento da cultura.
Rio de Janeiro, Minc/Funarte, l997.

5. BUTLER, J. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeirol Ci-


vilização Brasileira, 2003.

6. CANCLlNl, N. G. Culturas híbridas: estratégias para entrar e sair da modernidade. São Paulo:
Ed. da USP, 2008.

7. CHARTlER, R. Cultura popularl revisitando um conceito historiográfico. Estudos Históricos,


Rio de Janeiro, v. 8, n. l6, l995.

8. DlAS, S. O. O negro no Espírito Santol histórica do congo. Disponível eml <www.ape.es.gov.


br/espiritosanto_negro/historia_congo.htm.>. Acesso eml l2. fev. 20l2.

9. FARlAS, E. Economia e cultura no circuito das festas populares brasileiras. Educação e Socie-
dade e Estado, Brasília, v. 26, n. 3, p. 647–688, set./dez. 2005. Disponível eml <www.scielo.
br/ scielo.phpŞpid=S>. Acesso eml 4 out. 20l0.

10. MARQUES, l. A. Dançando na escola. São Paulol Cortez, 2006. MAUSS, M. Sociologia e
antropologia. São Paulol Cosac & Naify, 2003.

11. MlNAYO M. C. O desaflo do conhecimentol pesquisa qualitativa. Rio de Janeirol Abrasco, 2007

12. SANTOS, M. P. O. As representações sociais das práticas corporais na comunidade Kalun-


ga – GO. 20ll. l0l f. Dissertação (Mestrado em Educação Física) – Universidade de Brasília,
Brasília, 2011.

184 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


14
“ Capoeira dialogia: o corpo e o
jogo de significados

Lucas Contador Dourado da Silva

Alexandre Donizete Ferreira

10.37885/201101995
RESUMO

Esse estudo tem por objetivo fazer discussões sobre o corpo e suas implicações na
Capoeira, trazendo uma visão sobre ela para a área da Educação Física. A partir de uma
pesquisa bibliográfica, busca-se relacionar a prática da Capoeira com a ideia do jogo
como dialogia corporal, visto que não foi encontrado nenhum trabalho que tivesse uma
análise do jogo da Capoeira enquanto dialogia. Para tanto, tenta-se abordar as relações
dos significados afluentes do corpo social, relacionando-o com o que chamamos de cor-
po capoeira. O corpo capoeira será explicitado a partir da metáfora dos vários corpos,
onde construímos a ideia da dialogia corporal como um processo. Buscamos identificar
a construção dialógica desse corpo capoeira através de processos que permeiam o jogo
dentro da roda. Entendemos que as considerações obtidas no final desse estudo apre-
sentam um ponto de partida para a discussão da Capoeira e, principalmente, de seu jogo.

Palavras-chave: Capoeira, Educação Física, Corpo, Dialogia.


INTRODUÇÃO

Esse estudo tem por objetivo explorar alguns conceitos sobre linguagem e corpo, a
fim de relacioná-los à prática da Capoeira1 como expressão didática e pedagógica, dentro
do processo de aprendizagem. Entendemos a Capoeira como dialogia corporal. Trata-se
de um estudo de pesquisa bibliográfica que procura construir a ideia da Capoeira como
dialogia corporal, associado à sua prática esportivizada.2 Para a revisão da bibliografia, fize-
mos uma procura utilizando como palavra chave Capoeira, na base de dados da biblioteca
da Universidade Estadual de Campinas, bem como na Revista Brasileira de Ciências do
Esporte, onde lemos os artigos encontrados e delineamos ao tema proposto. Nesse senti-
do, buscou-se contribuir com o entendimento do “corpo capoeira”3 e da sua relação com as
diversas áreas da Educação Física.
Identificar a construção do corpo social como um dos vários elementos constitutivos do
corpo capoeira perpassa pelo olhar teórico antropológico, no qual questões são levantadas,
tais como: de que forma condutas são geradas para que se estabeleçam novos caminhos
de tensão4 entre as regras sociais e a postura do capoeirista; quais são os imperativos
dessas condutas; quais significados são “carregados” pelo corpo diante essas condutas?
Como ponto de partida, aproximamos as contribuições de Mauss (1974) sobre “técnicas
corporais” - aspectos da imitação prestigiosa que conduzem a uma especificidade do corpo
em contextos históricos culturais distintos, incorporados tradicionalmente.
Quando falamos sobre Capoeira como dialogia corporal, presume-se um embasa-
mento teórico a partir da dialogicidade da educação escrita por Freire (1983). Para o autor,
o diálogo verdadeiro é o meio pelo qual os seres humanos podem SER MAIS. O indivíduo
consciente, que dialoga sobre sua realidade, consegue, pela opinião dos outros, visualizar
sua realidade por ângulos diferentes, reforçando ou mudando suas opiniões, apropriando-se

1 Utiliza-se do termo Capoeira com “C” maiúsculo para referenciá-la como patrimônio cultural brasileiro (BRASIL, 2008), que engloba
todo o processo histórico cultural. E com “c” minúsculo, representa os jogadores de Capoeira.
2 A Capoeira não foge dos padrões sociais, é vinculada com a ideia do esporte principalmente a partir do século XX. Na verdade,
atualmente, o esporte liga-se com praticamente todas as práticas de exercícios físicos. Esse consentimento é fortalecido quando se
associa o esporte com a saúde, como se fosse a mesma coisa: faça esporte e terá saúde, resultado rápido e fácil. Dentro da Capo-
eira essa vinculação com o esporte aparece historicamente com seu reconhecimento social através de estudos como do “Guia do
capoeira ou gymnastica brasileira” (1907) e Burlamaqui (1928) e na prática com Manoel dos Reis Machado e outros. Conhecido como
Mestre Bimba, foi o primeiro a fazer tal atrelamento visando à construção de uma Capoeira mais digna, aquela aceita socialmente
(esportivizada). Mestre Pastinha (Vicente Joaquim Ferreira Pastinha), que também se valeu desse processo de esportivização para
consolidar a Capoeira Angola. E isso se estende até os dias atuais. Podemos pensar na Capoeira enquanto esporte, sendo uma
faceta dentre várias outras.
3 Esse termo concerne o que chamamos de metáfora dos vários corpos. Essa metáfora identifica a construção do corpo capoeira (po-
lissêmico) como a dialogia dos corpos. Essa dialogia é o que dá forma ao único corpo, o ser humano. A metáfora dos vários corpos
consiste: o corpo sociocultural, o corpo físico, o corpo psíquico e o corpo ético. Um corpo mais que uma simples prática.
4 Essa tensão visualiza o problema não como um limite, mas como uma fronteira de possibilidades. Paulo Freire cita em sua obra
Pedagogia da Esperança: um reencontro com pedagogia do oprimido esclarece outro termo com o mesmo princípio, chamando-o de
“inédito-viável.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 187


de formas variadas de olhar o mundo a fim de solucionar problemas, instigando a práxis e
assim, novas possibilidades de transformações de sua própria realidade.
Dentro do que foi lido, (CAPOEIRA, 2001, 2006; FALCÃO, 2006; ARAÚJO, 2004) não
encontramos nada parecido ao tema do trabalho, apesar de contribuições sobre o entendi-
mento da Capoeira no geral. Foram encontradas obras como do autor Silva (2008) e artigo de
Santos (2009), que vinculam o termo diálogo corporal, Capoeira e linguagem. Esse trabalho
se diferencia, ao propor conjugar a formação de uma dialogia corporal, que é diferente do
diálogo. O termo dialogia presume o entendimento de que o corpo, no jogo da Capoeira,
pergunta por uma via de ida que é linear, porque a intenção dela é única, quer presenciar
uma resposta, entretanto, essa pode se dar por diversos vieses, percorrendo um caminho
não mais linear, mas estabelecendo um outro paradigma inesperado, o espiral. Portanto, um
processo dialógico se dá, necessariamente, de forma multifatorial e processual. Outro ponto
importante é que a dialogia presume a reverberação dos significados corporais dos seres
humanos, por ser um processo social e multifatorial de interação do próprio corpo com o
dos outros. Compreende, assim, a construção do corpo capoeira, que configura a interação
do indivíduo com a forma específica da Capoeira em lidar com o corpo. A Capoeira permite
que o indivíduo utilize de seu corpo e que estabeleça relações com as outras práticas, que
também o ressignificam, de tal modo que tensiona um e vários corpos ao mesmo tempo,
porque a cada atividade ele é representado diferentemente, o que numa dinâmica radical
possibilita várias leituras. Forma-se a corporeidade5 do indivíduo, que passa ser reformulada
pelas experiências corporais vividas em conjunto com as relações da roda de Capoeira, que
é causadora de tensões, criadora de problemas a serem superados, que urge hibridismos:
o corpo ressignificado, re-pensado e criticizado.
Até agora abordamos sobre os caminhos pelos quais o trabalho se propõe discutir,
visto que ele se justifica justamente numa elaboração de entender a Capoeira e, mais pre-
cisamente, o seu jogo em relação ao corpo, colocando ao leitor um conhecimento sobre
essa manifestação cultural. Sabe-se que a Capoeira se forma justamente em seu ritual: a
roda – e é esse ritual o responsável por sua constituição, que permite com que o jogo acon-
teça. O jogo presume relações dos corpos que jogam e por isso tem um direcionamento
próprio. Tais colocações serão melhores abordadas posteriormente. Nessa perspectiva com
finco educacional, torna-se um rico conhecimento para o profissional de Educação Física
discutir criticamente a Capoeira, como conteúdo nos diversos âmbitos da área.

5 Sobre corporeidade, sugerimos ao leitor a seguinte obra de: SANTIN (2003).

188 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


O CORPO E SEUS SIGNOS CULTURAIS

Podemos dizer que a Educação Física surge a partir da existência do próprio corpo,
aonde vem se estabelecendo como área de conhecimento através da utilização do mesmo
nas diversas esferas de conhecimento (biológico, cultural, social, psíquico). Sendo assim,
podemos inferir que há uma apropriação de conceitos, mas não do corpo em si, uma vez
que ela o estuda e busca colocar em prática esses estudos, tornando-se esse o ponto de
partida para todo o restante do texto. Dentro da área, tradicionalmente, esse corpo era visto
apenas “como um conjunto de músculos e ossos e não expressão da cultura” (DAOLIO,
2007 p. 2). Após a predominância da influência biológica, a partir dos anos 80, surgiram
outras formas de discussão sobre o corpo, associadas às questões das ciências humanas,
as quais ampliaram as discussões da área.
Com essa mudança estrutural ideológica, o estudo da cultura propiciou para a Educação
Física, abrangência da visão do corpo como expressão, sendo essa a nossa noção de corpo.
Deixando explícito que “todas as manifestações corporais humanas são geradas na dimensão
cultural [...] expressando-se diversificadamente e com significados próprios no contexto de
grupos culturais específicos” (DAOLIO, 2007, p. 2).
Um dos precursores desse estudo do corpo através da cultura foi Mauss (1974 p. 40),
que identificou e nomeou “as maneiras pelas quais os homens, de sociedade a sociedade,
de forma tradicional, sabem servir-se de seu corpo”. O nome que deu para as formas desse
“servir-se” de seu corpo foi de “técnicas corporais”. Nessa obra, Mauss descreve algumas
situações do “servir-se” de seu corpo, conseguindo esclarecer de forma abrangente essa
relação do corpo com a cultura.
Sendo assim, essas técnicas são formadas a partir de uma imitação prestigiosa, onde
tanto a criança, como o adulto, imita movimentos que foram bem sucedidos por pessoas que
detém alguma autoridade ou confiança sobre ela (MAUSS, 1974). Uma de suas descrições
foi feita a partir de uma observação em Nova York, no hospital, quando verificou uma simi-
laridade do andar das suas enfermeiras com a lembrança do andar das jovens francesas,
sua terra natal. Após refletir, identificou que esse andar característico da cultura americana
foi disseminado pelos filmes americanos, através do cinema, para a cultura francesa.
A Capoeira se apresenta como uma técnica corporal que vem sendo passada de
geração a geração de forma tradicional. E ainda, tal descrição relaciona-se com o próprio
ensinamento da Capoeira, pois ela fora ensinada pela observação, sensação e imitação
dos movimentos e da roda, basicamente os Mestres mais antigos utilizavam essa forma de
ensinamento (ABIB, 2004).
Utilizando a observação de Mauss, permite-se perceber que as técnicas corporais
vão além do espaço de algum momento restrito, passa na realidade a compor os lugares

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 189


que esse corpo ocupa e se movimenta, já que ele é uma forma de expressão. Obviamente
que algumas formas de se comportar são pertinentes apenas em momentos distintos, po-
rém e com certeza, os significados do se movi- mentar permanecem juntos com a pessoa
indissociavelmente.
Como vimos, a imitação se faz a partir de um prestígio. Ela carrega em si alguns signi-
ficados culturais tradicionais hegemônicos, como exemplo, o que é uma postura adequada
ou correta ao se sentar diante da mesa para comer, a forma como se deve apresentar-se a
outra pessoa educadamente, entre outras condições que dão significados.
Todavia, a imitação nos aparece como uma questão preponderante na cons- trução da
corporeidade dos indivíduos. Dentro dessa imitação existem movimentos corporais envol-
vendo-nos tão fortemente que não podemos escapar deles. O andar ereto presume não só
uma imitação de prestígio, mas uma condição característica da evolução humana. Porque
prestígio significa um valor. Com esse andar, o ser humano passou a utilizar as mãos, e o
valor da utilização delas passou a ser pre- servado, desde então, justamente por sua utili-
dade. A imitação conduz a um valor, imitar alguém é um ato de valores.
Geertz (1989) faz uma análise interessante sobre a piscadela, que pode nos ajudar.
Segundo ele, a piscadela tanto pode representar o ato de paquerar uma pessoa, como o
incômodo de um cisco nos olhos, ou então, um tique nervoso. Ou seja, um mesmo movimento
corporal pode representar várias coisas diferentes, pois todos os movimentos estão inseridos
em contextos que os fazem adquirir qualidades de gestos, portanto, imbuídos de significados.
Uma análise que tal descrição nos permite fazer é que o próprio jogo da Capoeira se
faz por interpretações dos movimentos do outro, assim como na colocação feita acima. Se a
interpretação do jogo for feita de forma equivocada, quando menos esperar, a rasteira apa-
rece, mostrando a real intenção do movimento anterior: distrair o jogador. Se fosse possível
que, momentos depois, os mesmos jogadores fizessem o jogo igualmente, quem levou a
rasteira fará outra interpretação, com sentido diferente, partindo do mesmo significado.
Assim, os movimentos corporais trazem consigo significados como expressão da cul-
tura, imaginando-a como uma “máquina de costurar” significados nos corpos (RODRIGUES,
1987). Tal fenômeno cria uma teia de especificidades corporais nos grupos, caracterizando
gestos e ações como, por exemplo, no vôlei, com suas características próprias e, assim,
também na Capoeira. Portanto, as peculiaridades de cada prática engendram significados
ao corpo. Porém, quais significados são esses?
Tornando-se a próxima fase desse trabalho, tentaremos abordar esses significados a
partir da metáfora dos “vários corpos”. “Vários corpos” são um – ser humano - que dialetica-
mente estabelece uma relação de corpos no jogo da Capoeira e que reverbera fora desse,

190 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


como na roda da vida social.6 Cada experiência na Capoeira enriquece a corporeidade do
individuo que assimila significados particulares dela, assim surge o corpo capoeira.

DOS VÁRIOS CORPOS AO CORPO CAPOEIRA

O corpo, diante da cultura, foi concebido por nós carregado de significados e valores,
sendo esses construídos diante das experiências dos indivíduos. Cada criatividade ideológica
pode ser representada como forma de expressão humana, assim, a Capoeira, o Futebol e
outros, tem seu próprio modo de orientação da realidade, englobando seus valores e suas
práticas. Todavia, a ideologia é formadora do discernimento das coisas, é o espaço não
visível onde a consciência recorre ao julgar o mundo. Quando o indivíduo olha a realidade,
toma consciência dela, seu pensamento volta-se para um ideal, acrescentando um modo
individual de interpretar, pensar e agir (como fizemos no capítulo anterior ao abordarmos
sobre o jogo da Capoeira). Favorece, assim, uma atitude fundamentada por um julgamento
intrínseco de coerência do que enxerga.7 Uma cadeia ideológica consiste no aparato das
ideias enquanto realidade do pensamento. É nela onde o indivíduo busca seus horizon-
tes. Se conseguires olhar a realidade, também consegues interpretá-la. Essa interpretação
passa por um ideal. A maneira de diferenciar o bom e o mau, o belo e o feio é, na verdade,
feita por reflexões sobre a ideia de um ideal - naquilo que crê - também influenciado pelo
estado emocional momentâneo.
Basicamente, quando olhamos para o jogo da Capoeira, visualizamos gestos motores
peculiares que, de alguma maneira, movimentam suas condutas ideológicas e também sua
corporeidade. Assim, toda roda de Capoeira é responsável por construir sua corporeidade,
já que faz parte desse processo de valores que existem numa prática corporal. Essas con-
dutas cheias de sentidos e significados interpelam suas regras, deixando claro para aqueles
e aquelas que a conhecem, o discernimento de sua representatividade no mundo. Se os
gestos fossem interpretados, assim como a escrita, encontraríamos algo parecido com
o livro sobre a libertação dos escravos no Brasil. Mesmo não se expressando tal como
as letras, a Capoeira se expressa pelos movimentos corporais, formando seu vocabulário
gestual. Um corpo imbuído de valores e significados, um corpo idealogizado. Esse corpo
idealogizado é o que chamaremos de “corpo capoeira”.

6 Entendemos o corpo em sua magnitude, onde os valores apreendidos dentro da roda da Capoeira acabam por influenciar todas as
aprendizagens futuras e os momentos da vida social do indivíduo.
7 Não estou falando sobre certas pessoas que tem algum tipo de distúrbio que distorce a visão da realidade, exemplo a anorexia: uma
doença onde a pessoa se enxerga gorda, mas que na verdade está magra. Doença que muda a realidade, onde a pessoa enxerga
o que quer e não aquilo que lhe é real. Outro exemplo, quando por vezes, a pessoa tem uma visão dificultada pela própria realidade,
num estado de opressão, o indivíduo está tão mergulhado dentro da situação que não consegue enxergar por novos outros ângulos.
Mas, mesmo quando isso acontece, a ideologia que é formada pelo viver diário, é a fonte de inspirações, superações na busca de
transformações, pelas tomadas de decisões. Pois, ao haver uma reflexão mínima, o indivíduo procura melhorar as suas condições de
vida. A Capoeira surge assim, diante a opressão, da consciência dos subjugados por uma vida mais digna, demonstrando que mesmo
na dificuldade há esperança, forma de enxergar a realidade diferentemente.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 191


No primeiro contato prático que o indivíduo tem com a Capoeira, seus gestos motores
aprendidos em sua história de vida são utilizados e agrupam-se com os gestos motores
peculiares do jogo. O indivíduo troca experiências motoras, ampliando-as. É uma permuta
sem perdas, onde a corporeidade do indivíduo se completa com a corporeidade das práticas
com que ele se envolve.
Entretanto, o indivíduo que apreende e aprende através dos movimentos, não só o
faz nas atividades físicas, mas também na vida e, por isso, no entrelaçamento dos seguin-
tes aspectos: sociocultural, físico, psíquico e ético. Esse entrelaçamento é o que chamarei
de metáfora dos vários corpos, que consiste numa visão sintética, para utilizar o termo de
Geertz (1989), de que o ser humano é composto pelas variáveis biológicas, psicológicas,
social e cultural. Tal explicação se dá pela citação do mesmo autor, utilizando as palavras
de Lévi-Strauss citado por Geertz, 1989, p. 45 da seguinte forma:

[...] a explicação científica não consiste, como fomos levados a imaginar, na re-
dução do complexo ao simples. Ao contrário, ela consiste, diz ele (Strauss), na
substituição de uma complexidade menos inteligível por outra mais inteligível.

A metáfora utilizada contextualiza as diferentes dimensões corporais e as trocas dos va-


lores que estão nesse corpo entre os aspectos supracitados. Como se ela dissesse “Procure
a complexidade e a ordene-a” (GEERTZ, 1989, p. 45). Essa metáfora serviu de base para a
construção de uma lógica de interpretação dos significados expressos pelo corpo na Capoeira:

• Corpo sociocultural: Esse corpo é representado pela dialética do


indivíduo com suas influências socioculturais. Quando o indiví-
duo nasce, ele toma contato com o mundo. A realidade dele (cul-
tura), além de moldar seus movimentos corporais, constrói sua
ideologia diante das relações sociais, que o transforma, estrutu-
ra e dá significados. A Capoeira, enquanto uma prática pela qual
o indivíduo toma contato, faz com que os sentidos e significados
sejam permutados da prática com o indivíduo e vice-versa, pela
própria estrutura ideológica dessa prática e do mesmo;
• Corpo orgânico (físico): Esse corpo é representado pela dialética
do indivíduo com suas necessidades biofisiológicas. Identificar
que precisa tomar líquido interpela a relação com as suas ne-
cessidades e vontades de preservação. Escolher dentre a água
e o refrigerante, por exemplo, demanda para o indivíduo fazer
sua escolha. Contudo, a escolha será pautada no que a água e
o refrigerante, diante sua vontade e o aspecto sociocultural, re-

192 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


presenta. Se o indivíduo decide que quer água, ele atribui não só
os valores de necessidade, contudo, o que pensa sobre o líquido
e o que quer no momento. Além dessa necessidade, podemos
pensar na própria prática da Capoeira, que exige que o indivíduo
esteja capacitado para fazer os movimentos. Assim, saber que
precisa de um bom descanso, para no outro dia conseguir jogar
Capoeira, também é a relação do indivíduo com esse aspecto do
corpo humano;
• Corpo psíquico: Esse corpo é representado pela dialética do in-
divíduo em suas reflexões, no pensar sobre si. A partir da consci-
ência sobre a realidade, o indivíduo faz reflexões sobre o mundo
e toma suas decisões. Como o ser humano é o corpo, pensar em
si é pensar no corpo e suas influências sofridas pelas questões
socioculturais e de necessidades físicas. Na prática da Capoei-
ra, pensar em si é precisamente pensar no outro, visto que eles
se movimentam em conjunto, se há a impossibilidade do outro
se movimentar o jogo é anulado, isso significa que pensar em
si é pensar no outro, para preservação do jogo, há o respeito. A
própria noção do jogo leva-nos a entender a próxima dimensão;
• Corpo Ético: Esse corpo é a conjuntura dos corpos supracitados:
sociocultural, físico e psíquico, que são responsáveis por cons-
truir o valor do corpo para o próprio indivíduo, dentro de um pano
de fundo que são os valores morais. Essas relações montam e
moldam incessantemente uma polissemia corporal. “Ético” re-
presenta a preocupação de preservação dos seres humanos em
sua amplitude, divergindo do individualismo.8 No jogo da Capo-
eira, esse corpo ético surge precisamente na exigência própria
desse jogo. Ambos precisam jogar, estar bem fisicamente e psi-
cologicamente, e em contato com o mesmo meio sociocultural.
O lado de preservação que deve existir. Sem o outro não há jogo
nem roda. Não há canto nem palmas ou coro. O que acontece
muitas vezes, observando rodas, é quando o capoeira não vê a
importância do outro para si e para o jogo, no máximo entende
que deve ser superior ao outro, ocasionando um jogo de proibi-
ção, de opressão e até brigas.

8 Segundo Hall (2006), nessa era da pós-modernidade ou hiper-modernismo a individualidade está realçada, onde o diferente é a razão
do entender e julgar do senso comum. Não escapamos do senso comum, ele está em nós.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 193


A metáfora dos vários corpos se caracteriza como uma polissemia dos corpos. Vimos
apenas uma breve caracterização deles. Identificamos tais dimensões cor- porais, pois os
valores corporais apreendidos dentro da roda são influenciadores desses aspectos e vice-
-versa, e transcendem-se, influenciando todas as etapas de vida do indivíduo nos diferentes
âmbitos que ele percorre. O indivíduo é o mesmo em todos os lugares por onde passa,
carregado de seus valores diante da roda da vida social.9

[...] é possível observar, através de um olhar atento, sinais evidentes do con-


ceito de sermos um corpo como forma de estar-no-mundo sensível e inteli-
gentemente, donde a necessidade do início de um diálogo de aprendizagem
com o corpo próprio e o alheio. (MOREIRA, 2004, p. 100).

É um corpo que não se fecha em si, ele se completa e se expressa inten- cionalmen-
te. Determinando que os valores corporais apreendidos na roda da Capoeira são de suma
importância para o indivíduo, pois são transmitidos. Já que os indivíduos dialogiciam corpo-
ralmente, como isso acontece? Que valores estão atribuídos à dialogia corporal dentro da
Capoeira? E porque chamamos o jogo de capoeira como dialogia corporal? Essas perguntas
serão respondidas no decorrer do texto, não de forma completa, mas como introdução a
esse entendimento.

Figura 1. A vida da roda social: o que se aprende na roda de Capoeira transita pelos caminhos em que o ser humano
percorre, ainda quando, o valor atribuído dentro dessa prática fizer parte da realidade e daquilo que o indivíduo busca
ser como ser humano.

A CONSTRUÇÃO DO CORPO NO JOGO DA CAPOEIRA

9 Esse termo condiciona a ideia da roda da Capoeira com a vida social do indivíduo, como mostrado na figura.

194 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Foi por meio da capoeira que aprendi que o mais importante não é ser o melhor,
é ser feliz, dentro do possível, durante as trajetórias de nossas atuações na
vida, assim como a vida, a natureza da capoeira é cíclica. (SILVA, 2008, p. 13)

Quando os escravos foram trazidos da África ao Brasil dentro dos navios negreiros,
os senhores tinham o costume de dividir os africanos pelas diferentes etnias, dificultando,
assim, a comunicação e possíveis revoltas. Porém, com o convívio social, os escravos logo
encontraram similaridades culturais que, mesmo diante das dificuldades causadas pela se-
paração étnica e exploração, de algum modo, criou elos de identificação entre eles. (ABIB,
2004). Diante da dificuldade, esses elos representaram, através da ânsia pela liberdade,
uma união necessária à vida, que criava condutas de expressões. Uma conduta de lingua-
gem corporal. A favor da vida, essas condutas foram se alastrando pela cultura escrava,
caracterizando-se em um corpo ideologizado, que tomava formas discretas contra um sis-
tema opressor que tentava “calá-lo”. A necessidade de uma expressão compartilhada pelos
escravos impulsionou a criação10 de um dos pilares de sua identidade,11 a Capoeira.
Situamo-nos novamente na ideia do corpo capoeira prevalecendo à questão da dia-
logia dos corpos, por isso constituído pelas experiências da vida. O corpo formado nessa
ideia irriga os valores compreendidos na Capoeira, não só em seu espaço, mas na trans-
cendência desse espaço, atingindo formas de expressão social da realidade. Tal ideia se
remete à Educação Física, pois se sabe que a área utiliza dessa manifestação cultural para
promover práticas corporais. Se pensarmos nessa discussão, por exemplo, na escola que
prevê um direcionamento para tal conteúdo, fazendo emergir formas de atuar dentro da sala
de aula, fazendo parte da realidade do aluno como algo significativo, promoverá mudanças
nas atitudes do mesmo, havendo transformação social, ao passo que esse mesmo aluno se
relacionará com várias outras pessoas que serão beneficiadas com tais atitudes e valores.
Dessa forma, chamarei de dialogia12 o jogo que é feito na roda da Capoeira. Sabe-se
que o jogo presume duas pessoas no centro da roda, tendo como objetivo envolver seu par-
ceiro. Quando se joga não há a necessidade de embate, apenas de uma articulação entre
seus jogadores, feita de forma espiral. É claro que o nível de articulação muda conforme o
desenvolvimento e as capacidades dos indivíduos pelas necessidades que a prática exige,
como também, a reciprocidade existente entre o jogo. Ou seja, quanto mais dispostos e

10 A data da criação ou o surgimento da Capoeira é uma polêmica que “sobrevoa” as teorias que tentam explicá-la. Não existe nenhuma
documentação, apenas alguns fatos que nos ajudam a formular tal ideia. Esse parágrafo foi escrito com base na tese de doutorado
de Pedro Abib, para aqueles que queiram se aprofundar sobre a história da Capoeira.
11 Sobre identidade cultural, ler obra de Hall (2006).
12 O termo dialogia é constituído a partir da ideia central de Paulo Freire, na sua obra Pedagogia do Oprimido, sobre eo diálogo. Segun-
do o autor, a existência humana nunca pode ser mudada, e sim, falada. O diálogo, quando verdadeiro, é um processo crítico e criativo
que problematiza a realidade do indivíduo a buscar na práxis – ação/reflexão – transpor problemas geridos da vida. Sendo assim, o
diálogo não pode ser compreendido isoladamente, mas principalmente com relação aos outros diálogo já vividos por alguém, por isso,
pela formação dadialogia. Não cabe aqui discutir sobre toda proposta do autor, mas sim, tomar brevemente o conceito para aproximar
o leitor do tema. Sugerimos a leitura da Obra citada.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 195


convergentes estiverem os jogadores, mais eles articularão. Esse jogo se demonstra como
uma troca de movimentos corporais.
Devemos saber que Capoeira só acontece quando se forma a roda: seu ritual repre-
sentativo. Quando se treina ou se discute a Capoeira, no máximo o que acontece é um dis-
tanciamento/aproximação para repensar sobre a prática, transformando a aula em uma rota
importante para desenvolver movimentos cor- porais mais expressivos e controlados. A roda
é o espaço que determina o local do jogo, onde acontece a dialogia. A composição da roda
no momento não nos é interessante, visto que cada grupo e capoeiristas defendem a for-
mação dela com ideias diferentes. O intuito é não entrar nessa discussão.
A ideia de dialogia vem de um processo no jogo de Capoeira, onde um faz uma pergunta
corporal e o outro, dentro de suas capacidades e vontades momentâneas, responde, insi-
nuando uma nova pergunta, num processo dinâmico. Isso acontece porque os movimentos
corporais, nesse deslocamento de pergunta e resposta, causam tensões entre os jogado-
res. Essas tensões podem denominar-se fronteiras, porém, não como um limite, mas como
um campo de possibilidades, as quais emergem de um processo rizomático (DELEUZE;
GUATTARI, 2000). Por- tanto, abre-se um leque de novas possibilidades ao se transpor a
barreira corporal causada pela dinâmica pergunta-resposta do jogo.
Tornando-se imprescindível saber que, para essa dialogia acontecer, deve-se ter em
mente que um jogo não pode ser de “A” para “B” ou de “A” sobre “B”, mas de “A” com “B”,
mediados pelo mundo” (FREIRE, 1983 p. 98). Segundo o mesmo autor, a dialogia é o mo-
mento em que se consegue enxergar um problema por vários pontos de vistas, já que cada
um opinará, de forma individual e diferente, como entende um problema a ser solucionado.
Desse jeito, precisa-se ter humildade para aceitar o movimento corporal como ponto de vista
do outro, para aceitar que essas trocas são importantes para causar uma mudança no próprio
jeito de enxergar das coisas. A importância do outro nesse processo, do ser humano, valori-
zando-o. Por isso que, nos momentos em que o indivíduo não transpassa obstáculos, vem a
necessidade de “dialogiciar”, ou seja, olhar um obstáculo por vários ângulos, para que então
possamos decidir entre as várias maneiras de agir, o modo mais apropriado para o momento.
É claro que muitas das dialogias acabam não sendo tão harmoniosas, nos dando a
sensação da conversa ficar um pouco falha. Por isso a importância das aulas para a aprendi-
zagem, onde os gestos motores, cada vez mais, ficam encarnados no indivíduo, em conjunto
com seus valores. É o que Silva (1993) chama de engrama motor. Segundo ele, o indivíduo,
a partir da repetição, se acostuma com o movi- mento, havendo assim, um despêndio menor
de energia na hora do movimento, tornando-o cada vez mais natural e bonito, consistindo
uma criação, e não uma reprodução. São as técnicas, nesse caso, que ajudam a estruturar

196 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


essa dialogia. Do mesmo modo que, quanto maior o vocabulário linguístico, maior são as
possibilidades da construção das ideias para que haja uma conversa verbal mais rica.
Durante a dialogia corporal que se estabelece na roda de Capoeira, os jogadores ten-
sionam-se, abrindo novas possibilidades para o jogo acontecer. Cada possibilidade propor-
ciona ao indivíduo novas tomadas de decisões, dando-lhe vários novos rumos. Esses rumos
são causadores de novas expectativas, anseios, que impulsionam novas transformações.
São rumos de idas e vindas, tensionados por todos os vieses desse ciclo de perguntas e
respostas. Assim, cada vez que o indivíduo transpassa um obstáculo cheio de tensões,
associadamente, lhe vem um sentimento de satisfação de seus atos, que o encoraja em
desafios posteriores. Existem outros sentimentos envolvidos nesse contexto dialógico, como,
por exemplo, o alívio, prazer, etc.
Como vimos, o corpo reverbera na vida social. Sua plenitude de sentimentos, irrigados
pela roda, perpassam todos os âmbitos sociais, já que não há dissociação. Os sentimen-
tos envolventes durante e pela dialogia corporal encorajam o indivíduo, não só a enfrentar
obstáculos da roda de Capoeira, mas na totalidade de sua vida. Quando visualizamos um
jogo de respeito, esse também é repassado diante a vida. O sentimento resguardado é to-
talmente do indivíduo, mas que, pela vontade de repartir diante dos outros, ele é ampliado
indefinidamente para que todos possam sentir.
Dentro dessa ótica da reverberação de sentimentos, a Capoeira, rica de valores des-
de seu surgimento, ainda se faz presente na contemporaneidade. Em um mundo cheio de
tecnologias, onde as mudanças são abruptas, encontramos na Capoeira a resistência de
uma mudança não necessária, encontrada em sua história: luta encorajada em favor da vida
humana. Uma atividade determinantemente cor- poral, que insinua coletividade e o pensar
no outro, como pensar em si; rica pelos valores atribuídos em sua construção, no passado e
no presente, para aqueles e aquelas que pensam no indivíduo coletivo. A capoeira dialogia
corporal dentro da realidade que nos cerca, na Educação Física e no mundo.
Buscamos avançar numa análise do jogo da Capoeira, visto que ele é a expressão
máxima do corpo, e que traz os fatores históricos. Assim, as palavras contidas aqui pre-
sumem olhar para a Capoeira e pensar sobre a prática dela, direcionado para o profis-
sional de Educação Física em seus diversos âmbitos, sem descaracterizá-la como mani-
festação cultural.
Soares et al. (1992) foi o primeiro autor que nos atentou para que devemos entender a
Capoeira enquanto linguagem e manifestação cultural dentro da Educação Física, pensando
num processo educativo, e respeitando seu caráter histórico-cultural.
A Capoeira enquanto dialogia coloca um olhar sobre o ensinamento dessa arte bra-
sileira, como caminho a ser utilizado pelos profissionais da nossa área. Vemos a Capoeira

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 197


enquanto meio e fim educacional, significativo para o povo brasileiro pela sua história. Assim,
até agora, buscamos entender o jogo dela e sua lógica.
Abordamos sobre o jogo da Capoeira e a relação dos corpos nela envolvidos, porque
sabemos bem que a área da Educação Física promove atividades corporais em diversos
âmbitos, participando na formação de pessoas. Propusemos olhar para a Capoeira de for-
ma crítica, trazendo contribuições para nossa área, particularmente sobre o seu jogo. Não
queremos aqui dizer que a Capoeira é a única que possa ser trabalhada dessa maneira,
apenas lançamos algumas ideias sobre uma forma de trabalhá-la.

ÚLTIMAS PALAVRAS

Diante das palavras com as quais, em sua conjuntura, formaram esse estudo, procura-
mos atingir nosso objetivo, entendendo o jogo da Capoeira como uma dialogia corporal. Vimos
que a Capoeira, através de seu jogo, constrói significados corporais. Discutimos e explicamos
como se dá à construção dos significados culturais vinculados ao corpo. Posteriormente, esse
corpo foi dando cara ao que chamamos de corpo capoeira, sendo explicitado pela metáfora
dos vários corpos. Levantamos algumas nuances do jogo da Capoeira como uma dialogia
corporal, com seus aspectos de utilização dentro de uma perspectiva de olhar direcionada
para a Educação Física.
Dialogia em si, de indivíduos que utilizam os movimentos corporais, trans- mitindo
seus sentimentos e ideais, reverberando-os a cada tensão causada pela troca de gestos.
Indivíduos atores, descobrindo sua importância a partir do outro, aprendendo do que são
capazes a partir do que já sabem. Numa dialogia que de- sassocia, pelo menos em instante,
ganhador e perdedor - pódio maçante da vida cotidiana. Que alívio!
Permitimos olhar o corpo através do jogo da Capoeira, para realçá-lo, so- bretudo a
propósito da Educação Física. De certa forma, mudamos nossos olhares sobre ele e sobre
nós, seres humanos. Sendo importante considerar: se o corpo nos “fala”,13 parece que ele
tem mais a dizer do que a Educação Física tem conse- guido “escutar”. Como se ele gritasse:
Veja-me! O que quero lhes dizer? Prestem muita atenção!
Por fim, entendemos que esse estudo não é algo completo, apenas um passo adiante
no entendimento da Capoeira, não nos cabendo a análise do mesmo, mas, obviamente,
como tarefa aos críticos e estudiosos do tema.

13 A fala é uma forma de expressão que é formada pelos signos. A dialogia corporal também. O que muda é o significado e o sentido de
cada signo.

198 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


REFERÊNCIAS
1. ABIB, P. R J. Capoeira angola: cultura popular e o jogo dos saberes na roda. 2004. 171 f. Tese
(Doutorado em Educação Física) – Faculdade de Educação Física, Universidade Estadual de
Campinas, Campinas, 2004.

2. ARAÚJO, P. C. Capoeira: novos estudos: abordagens sócio-antropológicas. Juiz de Fora:


Irmãos Justiniano, 2004.

3. BURLAMAQUI, A. Gymnastica nacional (Capoeiragem): methodisada e regrada. Rio de Ja-


neiro, 1928.

4. BRASIL. Ministério da Cultura. Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Ca- dastro
nacional da capoeira. 15 jul. 2008. Disponível em: <http://portal.iphan.gov.br/portal/montarDe-
talheConteudo.do?id=13983&sigla=Noticia&retorno=detalheNoticia .>Acesso em: 23 set. 2011.

5. CAPOEIRA, N. Capoeira: os fundamentos da malícia. 8. ed. Rio de Janeiro: Record, 2001.


CAPOEIRA, N. Capoeira: pequeno manual do jogador. 8. ed. Rio de Janeiro: Record, 2006.

6. DAOLIO, J. Educação Física e o conceito de cultura. 2. ed. Campinas: Autores Associados,


2007.

7. DELEUZE, G.; GUATTARI, F. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia. 2. ed. São Paulo: Ed.
34, 2000.

8. FALCÃO, J. L. C. O jogo da capoeira em jogo. Revista Brasileira de Ciências do Esporte,


Campinas, v. 27, n. 2, p. 59-74, jan. 2006. Disponível em: http://rbceonline.org.br/revista/index.
php/RBCE/article/dowload/88/95. Acesso em: 15 nov. 2010.

9. FREIRE, P. Pedagogia da esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido. 13. ed.


Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.

10. FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. 14. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983. GEERTZ, C. A
interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1989. HALL, S. A identidade
cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2006.

11. GUIA do capoeira ou gymnastica brazileira. 2. ed. Rio de Janeiro: Livraria Nacional, 1907.
(fac similar).

12. MAUSS, M. Sociologia e antropologia. São Paulo: EPU, 1974.

13. MOREIRA, W. W. Perspectivas da educação motora na escola. In: DE MARCO, A. (Org.).


Pensando a educação motora. Campinas: Papirus, 2004.

14. RODRIGUES, J. C. O corpo liberado? In: STROZENBERG. I. (Org.). De corpo e alma. Rio de
Janeiro: Comunicação Contemporânea, 1987. p. 90-100.

15. SANTIN, S. Educação Física: uma abordagem filosófica da corporeidade. 2. ed. Ijuí: Ed. da
Unijuí, 2003.

16. SANTOS, G. O. Alguns sentidos e significados da capoeira, da linguagem corporal, da Educa-


ção Física... Revista Brasileira de Ciências do Esporte, Campinas, v. 30, n. 2, p.123-136. jan.
2009. Disponível em: http://rbceonline.org.br/revista/index.php/RBCE/aritcle/download/440/356.
Acesso em: 18 set. 2009.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 199


17. SILVA, E. L. Método de ensino integral da dança: um estudo do desenvolvimento dos exercícios
técnicos centrado no aluno. 1993. 170 f. Tese (Doutorado) - Instituto de Artes, Universidade
Estadual de Campinas, Campinas. 1993.

18. SILVA, E. L. O corpo na capoeira: introdução ao estudo do corpo na capoeira. Campinas: Ed.
da Unicamp, 2008.

19. SOARES, C. L. et. al. Metodologia do ensino da Educação Física. São Paulo: Cortez, 1992.

200 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


15
“ Corpos mais: uma prática
artística e educacional com
normalistas do instituto de
educação ciep 179

Massuel dos Reis Bernardi


PUC-Rio

10.37885/201001876
RESUMO

Como parte da pesquisa de toda a pós-graduação do autor, este artigo objetiva apresentar
uma proposta de trabalho de um professor de dança nas disciplinas de Arte e Laboratório
Arte-Educação (LAE) com normalistas do Instituto de Educação CIEP 179 (SEEDUC/RJ)
de São João de Meriti-RJ. Através de uma Pesquisa Narrativa (CLANDININ E CONELLY,
2011), apresentam-se os diálogos entre os corpos mais cada linguagem artística previstas
pelos PCN-Arte (2000): corpos mais artes visuais; corpos mais música; corpos mais teatro;
e corpos mais dança. Dessa forma, a cada bimestre letivo, os diálogos entre os corpos
nos processos de criação artística apresentam resultados na exploração de possibilida-
des pedagógicas quando os/as normalistas estiverem exercendo a profissão docente.

Palavras-chave: Corpos Mais; Normalistas, Ensino de Artes Cênicas, Ensino de Dança.


INTRODUÇÃO

Desde 2015 desenvolvo uma proposta de trabalho intitulada corpos mais, que consiste
na prática corporal em diálogo com as quatro linguagens artísticas previstas pelos PCN-Arte
(2000). Tratam-se de processos artísticos e pedagógicos que se edificam nos corpos dos/
as estudantes e buscam a construção de um corpo cênico (FABIÃO, 2010). Ao entrelaçar
os conceitos da pesquisa, traço um caminho entre “O ensino e o conhecimento do profes-
sor expressos em histórias sociais e individuais corporificadas [...] sob o título de pesquisa
narrativa” (CLANDININ E CONNELLY, 2011, p. 32).
O Instituto de Educação (IE) Centro Integrado de Educação Pública (CIEP) 179 –
Professor Cláudio Gama é uma escola de Ensino Médio vinculada à Secretaria de Estado
de Educação do Rio de Janeiro (SEEDUC) localizada em São João de Meriti, na Baixada
Fluminense, inscrita na modalidade Curso Normal. Isto é, segundo as diretrizes do ensi-
no nos Institutos de Educação (LDB 9.394/96) e da resolução 02/2015 do Ministério da
Educação (MEC) os/as alunos/as concluintes saem com o diploma de professor/a habilita-
do para lecionar na Educação Infantil, Ensino Fundamental I (até o 5º ano) e Educação de
Jovens e Adultos.
O quadro docente da escola é formado por professores/as da rede estadual, em grande
quantidade de professores/as licenciados/as em Pedagogia que lecionam disciplinas peda-
gógicasi. As disciplinas tratadas no estudo se referem à Arte no primeiro e terceiro anos e
Laboratório Arte- Educação (LAE) no segundo ano do Ensino Médio com carga horária de
1h40min e 50min semanais, respectivamente. O concurso prestado para a admissão de
professores/as de Arte e LAE na SEEDUC/RJ aceita quaisquer das quatro formações artís-
ticas previstas nos PCN-Arte (2000). No IE CIEP 179, há três professores/as da disciplina
de Arte: uma com formação em artes visuais; um com formação em dança; e outra com
formação em teatro. E, por sorte, há um professor de disciplinas pedagógicas que possui
formação musical no Conservatório Brasileiro de Música, o que proporciona aos/as alunos/
as um espaço privilegiado de contato com as artes.
Os/as estudantes têm, em maioria, idades entre 14 e 18 anos. Há um pequeno núme-
ro de alunos/as mais velhos/as de até 50 anos, inclusive reingressantes no Ensino Médio,
justamente em busca da formação no Curso Normal.
As relações entre diferentes agentes envolvidos tornam o IE CIEP 179 um lugar que
caracteriza nas palavras da diretora geral “uma grande família”. Essa “família IE CIEP 179”
vislumbra uma relação afetiva e significativa de envolvimento bastante profundo de alunos/
as, professores/as, equipe e comunidade escolar. Uma vez que estão em consonância
com o que é vivenciado lá dentro, as relações da profissão docente amadurecem com o

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 203


passar dos anos, edificam as potencialidades dos corpos e estabelecem redes de produção
de subjetividade.

CORPOS MAIS

Como licenciado em dança, as possibilidades de trabalho artístico vêm se estabelecen-


do a partir das potências dos corpos. Percebo que os corpos carregam em si capacidades
poéticas expansíveis no trabalho artístico. Sob essa ótica, pode-se afirmar que meu trabalho
é um trabalho de dança. Chamo, portanto, de corpos mais as somas vindas do corpo como
ponto de partida, fundamento das reflexões. Não é possível tratar de corpo no singular, pois
as bases do estudo são a educação e as artes, além das interlocuções estabelecidas com
os múltiplos corpos que habitam o IE CIEP 179. Desse modo, é preciso falar de um lugar
múltiplo, habitado por múltiplos atravessamentos. Por isso, uso do plural: corpos mais.
Com base nesses aspectos, comecei a me indagar: se a aula é um lugar de exposi-
ção, de visibilidade para o/a professor/a e/ou para o/a aluno/a, como se dá a experiência
artístico-corporal para estudantes/futuros/as professores/as? Foi então que comecei buscar
ressignificar diversos fatores como o espaço, objetos, sonoridades, ambientes, relações, e os
próprios corpos. Vi que essa ressignificação poderia sugerir propostas não só para a cons-
trução de um corpo cênico que vá fazer diferença para o/a estudante/futuro/a professor/a,
mas poderia refletir em suas próprias práticas pedagógicas. As somas, que tratam os corpos
mais, seguiram, portanto, no sentido de despertar potencialidades muito significativas que
os/as estudantes sequer sabiam que eram capazes de alcançar.
Como ponto de partida, recorri a Lecoq (2010, p. 69) ao dizer: “Quando o aluno sentir
esse estado neutro do início, seu corpo estará disponível”. Foi quando passei a experimen-
tar uma aproximação entre o estado neutro (LECOQ, 2010) e o que Fabião (2010) chama
de latência. Isto é, comecei a agir como provocador desde os primeiros encontros, para
experienciar esse preenchimento energético no corpo ao se colocar em cena. Pontuo que,
por meio do estado neutro (LECOQ, 2010), o corpo não está vazio nem abandonado, mas
potente, latente.
Os primeiros exercícios (de se colocar no espaço e silenciar) apontaram um caminho
libertador no sentido de que os formatos e pré-concepções corporais dão espaço para o
que se apresenta vivo naquele instante. Ali já há um princípio cênico, pois o/a estudante se
coloca a frente dos/as colegas por meio desse estado. Por isso, o que Lecoq (2010) aponta
como o “frescor da primeira vez” dialoga com o que Fabião descreve:

Contra a ideia de corpos autônomos, rígidos e acabados, o corpo cênico se


(in)defi ne como campo e cambiante. Contra a noção de identidades definidas
e definitivas, o corpo-campo é performativo, dialógico, provisório. Contra a

204 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


certeza das formas inteiras e fechadas, o corpo cênico dá a ver “corpo” como
sistema relacional em estado de geração permanente. (FABIÃO, 2010, p. 322)

Assim, no que concerne à receptividade que o corpo exige para se tornar preenchi-
do, vivo, o exercício de voltar a atenção para o seu próprio corpo no espaço, e que age no
instante em que o/a ator/atriz/bailarino/a pode permitir abertura do seu corpo para o novo.
Sob esse pressuposto, Lecoq (2010) apresenta o silêncio e daí “só há dois meio de sair: a
palavra ou a ação.” (p. 58).

Estamos mais habituados a agir do que a distensionar, a ponto de sermos


agidos; somos treinados para criar e executar movimento, não para ressoar
impulso; geralmente sabemos ordenar e dar ordens ao corpo mais e melhor
do que sabemos nos abrir e escutar. A busca por um corpo conectivo, atento e
presente é justamente a busca por um corpo receptivo. (FABIÃO, 2010, p. 323)

Foi então que passei a traçar um diálogo entre o silêncio, o estado de neutralidade
(LECOQ, 2010), a latência, a receptividade (FABIÃO, 2010) e pensei em alguns exercí-
cios introdutórios que pudessem trabalhar esses elementos na prática. Pedi aos/às estu-
dantes durante as aulas que se levantassem e se colocassem se colocassem na postura
inicial (figura 1).

Figura 1. Postura inicial das aulas na base de pés (MOTTA, 2006).

Essa passou a ser a estrutura do corpo – a qual chamei de postura inicial – em todas
as aulas posteriores. A partir dessa base foi possível se pensar o trabalho artístico da ana-
tomia para os desdobramentos dinâmicos usando o ritmo, a voz e a consciência desses
corpos e suas propriedades, em diálogo com a prática docente desenvolvida no decorrer
de todo o ano letivo.
Com base nos conceitos mencionados, os exercícios começaram a ser aplicados supe-
rando diversos desafios. O primeiro deles foi o espaço. Exceto a quadra e o pátio da escola,

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 205


todas as salas contém mesas e cadeiras. Para trabalhar com a ocupação mais proveitosa
do espaço é importante deslocar a turma para os espaços vazios, ou tirar as mesas e ca-
deiras das salas. Porém, torna-se bastante ruidoso e disperso esses deslocamentos. Por
isso, muitas vezes, opto em fazer os exercícios entre os móveis da própria sala. O segundo
desafio é fazer com que o/a estudante perceba que esse corpo está sendo trabalhado sem
achar que ali não há trabalho. Percebo isso, porque quase nenhuma das outras disciplinas
do IE CIEP 179 pedem para levantar da cadeira, tampouco fazer uma roda e se colocar
de pé (na postura supracitada). Só aí já há reações dos/as estudantes de estranhamento,
risadas, comentários da necessidade de um entendimento racional sobre o que estão fa-
zendo, que para muitos/as, aquilo seria “fazer nada” ou “só ficar parado/a”. Porém, sempre
pontuo essa gama de atravessamentos nesse exercício, a fim de criar o estado corporal de
início, silêncio, latência. Esse silêncio que a neutralidade impõe é fundamental para que o
corpo reconheça a si mesmo naquele dia, naquele instante, e que mesmo em um exercício
aparentemente superficial há trabalho.
Em aulas posteriores, sugiro que olhem para o espaço escolar e tentem buscar res-
significar esse espaço, cada detalhe, cores, sinais, marcas, objetos, móveis e tudo que os/
as envolve. Essa experiência gerou o que venho trabalhando junto aos/às estudantes: os
diálogos entre os corpos mais cada uma das linguagens artísticas separadas nos 4 bimes-
tres letivos, e que a partir de agora apresentarei separadamente.

Corpos mais artes visuais

O primeiro diálogo partiu de alguns conceitos fundamentais sobre a problematização do


que é arte e suas possíveis interfaces com a própria vida. Para isso foram usados conceitos
constantes no livro didático de Artes (UTUARI et al., 2013) do Ensino Médio utilizado pela
escola. Nesse livro, os artistas inspiradores foram Marcel Duchamp e Paulo Brusckyii. Como
no livro existe a predominância de textos e fotografias, me dediquei a propor algo voltado
também à fotografia como proposta prática com os/as estudantes. Do ponto de vista da uti-
lização da fotografia, achei que seria possível, pois praticamente todos/as tinham celulares
com câmera fotográfica. Aos/às que não tinham, sugeri pesquisas em duplas, desde que
um/a deles/as tivesse celular com câmera. Foi então que as provocações e reflexões feitas
pelos artistas estudados pressupunham um desdobramento criativo prático de ressignificação
dos corpos na composição fotográfica.
Imbuídos da qualidade corporal a partir da base trabalhada anteriormente, a ideia da
ressignificação dos corpos, de objetos e o espaço escolar cotidianos, iniciaram-se os pro-
cessos. Comecei a perceber que alguns aspectos precisavam ser mais trabalhados para
que as fotografias ganhassem qualidade artística. Ao mesmo tempo, para preservar os/as

206 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


estudantes de possíveis postagens das fotos em redes sociais, orientei que eles/as não
fotografassem seus rostos, sendo possível minimizar a identificação de cada um/a. Pontuei
que haviam muitas maneiras de fotografar outras partes do corpo que não fossem o rosto
de forma bastante interessante e com grande potencial artístico. Assim, o corpo e o espa-
ço passaram a ser explorados de forma muito diferente das primeiras fotos que eram num
formato recorrente ao que se encontra em grande parte das redes sociais dos/as alunos/as.
Aliado a isso, comecei a provocá-los/as a prestarem atenção em alguns pontos que
fariam bastante diferença na composição das fotografias, o que chamei de critérios de com-
posição fotográfica. O enquadramento que diz respeito a tudo que aparece no retângulo
da fotografia. A iluminação que corresponde à incidência (ou ausência) de luz sobre o que
está enquadrado. A perspectiva a partir da profundidade advinda de pinturas renascentistas
(UTUARI et al., 2013). As cores, pois alguns filtros aplicados mexiam muito com a tonalidade
e a saturação. E o contraste como algo marcante de diferença ou oposição entre elementos
enquadrados nas fotografias.
Os critérios de composição fotográfica foram surgindo a partir de cada proposta e ques-
tionamento vindo das pesquisas, como: “essa árvore não era para aparecer”; “está muito
escuro”; “a luz estourou”; “à luz natural do dia”; “ficou muito longe”; “deu ideia que eu estou
segurando o sol”; “isso chamou muita atenção”; “foto só preto e branca” (como se as neutras
não fossem cores); etc. Embora tenham sido critérios chamados por mim dessa forma, só
depois comecei a perceber que era bastante interessante esse caminho em uma formação
de professores/as, pois estava sendo trabalhado um aprimoramento das qualidades esté-
ticas. Essas qualidades partiram de um olhar intuitivo para um olhar mais cuidadoso sobre
as fotografias, assim como o uso da presença do corpo artístico/poético nessa relação entre
a câmera, o corpo e o espaço.

Figura 2. Fotografia de uma aluna no processo de criação dos corpos mais artes visuais/2017.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 207


Ao final do trabalho, os relatos sobre os processos ultrapassaram discursos presos a
“o/a professor/a precisa saber tirar bem fotos da escola e dos/as alunos/as” ou apenas “ter
contato com a linguagem fotográfica”, mas que mesmo em fotografias que não houvesse
um conceito/ideia a se retratar, os critérios faziam diferença em não mais simplesmente tirar
fotos de qualquer maneira. Passaram a ser pensados no quanto cada critério contribuía ou
não para a ideia que se queria expor. Tudo que era visto e percebido pelo/a espectador/a
poderia despertar diversas leituras, mesmo em casos em que o/a fotógrafo/a tivesse deter-
minado propósito de mostrar.

Corpos mais música

Após essa gama de informações sobre o corpo, o espaço, e características de compo-


sições e leituras artísticas, no segundo bimestre o trabalho chega ao corpo com o enfoque
musical. Mas a questão era: de qual forma essa música seria trabalhada? Foi então que
pensei sobre esse corpo que experienciou se colocar no espaço, silenciar (LECOQ, 2010),
se apropriar de aspectos da estaticidade na fotografia, pudesse, agora, ganhar dinâmicas a
partir de células rítmicas. Resgatei alguns conceitos também vistos no livro de Artes (UTUARI
et al., 2013), que podiam compreender a expansão do universo musical não apenas com
instrumentos musicais convencionais. Comecei a falar que o uso do próprio corpo e materiais
cotidianos, que não foram concebidos inicialmente para extrair música, poderiam ser muito
potentes para a criação musical.
Para ampliar esses conceitos, principiamos a trabalhar com um tipo de método que
obrigava o corpo a marcar o ritmo com os pés, palmas e, posteriormente, com outras formas
de percussão corporal utilizando o “O Passo”, que,

é um método de Educação Musical criado por Lucas Ciavatta em 1996 e,


atualmente, utilizado no Brasil e no Exterior. O Passo surge em resposta ao
processo altamente seletivo do acesso à prática musical tanto nos espaços
acadêmicos quanto nos espaços populares. Sua maior inspiração veio da
riqueza do fazer musical popular brasileiro, principalmente no que diz respeito
à relação corpo e música no processo de aquisição do suingue. Baseado num
andar específico e orientado por quatro pilares (corpo, representação, grupo
e cultura). O Passo introduziu no ensino- aprendizagem de ritmo e som novos
conceitos, como posição e espaço musical, e novas ferramentas, como o andar
que dá nome ao método, notações orais e corporais e a Partitura d’O Passo. O
Passo não trabalha visando este ou aquele tipo de realização. Ele trabalha com
a construção de uma base, algo que traz inúmeras possibilidades e abre uma
porta, não apenas para os ritmos e os sons, mas para a rítmica como um todo
e para uma real aproximação com o universo sonoro. (CIAVATTA, 2009, p. 22)

Para Ciavatta (2009), a prática com “O Passo” se dá a partir de movimentos com os


pés à frente e atrás (um passo e seu retorno) com um pé de cada vez, contando até quatro

208 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


a cada pisada no chão. Conforme indicado na figura 3, para cada número entre parênteses
ocorre a marcação de um passo. Começando com o pé direito, marcando os tempos: (1) pé
direito à frente, (2) pé esquerdo alinhando ao anterior, (3) pé direito atrás, (4) pé esquerdo
alinhando ao anterior; para números sem parênteses se bate uma palma; a cada sinal da letra
“e”, bate-se o joelho da perna que se move para o próximo passo, marcando os contratempos.

Figura 3. Páginas editadas da apostila do método “O Passo” de Lucas Ciavatta (2009).

A partir dessas sequências, podem ser compostas as mais variadas frases rítmicas,
utilizando diversos instrumentos, principalmente percussivos e a voz cantada ou falada.
Inclusive iniciar a percepção sobre as noções do que seria pulso, compasso, tempo e con-
tratempo em música, utilizando os próprios corpos.
Os processos práticos de experimentação se deram em grande parte pedindo a todos/
as que levantassem, colocassem-se na postura inicial (figura 1), e iniciássemos o estudo d”O
Passo”. Eu mostrava primeiro cada sequência, depois fazíamos juntos e, por último, só os/
as alunos/as. Na medida em que eu percebia dificuldades, eu tentava fazer na frente do/a
estudante para que a lateralidade fosse visualizada com mais precisão. Pontuava também
que se tratava de um processo que demandava de estudo, e que nem todos/as conseguiriam
executar imediatamente. Sugeri ainda que as composições rítmicas fossem estudadas em
grupos para criar integrações entre quem teve mais facilidade com quem não teve.
A exigência do estudo das sequências fez com que os corpos ganhassem mais atenção
e ampliação das noções musicais a partir das experiências próprias, mas também perceben-
do a experiência nos outros corpos. Uma vez que há diversas formas de se estudar essas
partituras, eles/as poderiam escolher a forma com a qual mais lhe facilitaria o aprendizado.
Observando o/a colega, ouvindo os diferentes sons de cada sequência, gravando ou filmando
a sequência feita por ele/a mesmo/a, etc.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 209


Corpos mais teatro

Dentre as inúmeras formas de se fazer teatro na escola, a escolhida partiu de alguns


aspectos e autores que, na minha visão, pudessem integrar uma experiência interessante
em uma formação de professores/as. Como o terceiro bimestre começa após o recesso do
meio do ano letivo, houve a necessidade de retomar os conceitos e processos trabalhados
anteriormente. Uma vez que já se tinha noção de experiências visuais/fotográficas e musicais/
rítmicas, preferi expor as diferenças e especificidades que as artes cênicas têm.
Partimos, então, das bases que permeiam a teatralidade e suas possibilidades de
criação e composição cênicas, tais como as ideias de catarse, performance, cenografia,
indumentária, visagismo (UTUARI et al., 2013) e suas diferenças, principalmente com o
que é mais familiar ao universo dos/as alunos/as do IE CIEP 179: a linguagem televisiva,
cinematográfica e audiovisual. Todas essas informações foram tratadas de forma sucinta,
até que se chegasse a uma questão que me pareceu bastante significativa, pois quando os/
as estudantes imaginavam e falavam sobre teatro, eles/as recorriam, na maioria das vezes,
ao uso da fala, da voz.
Embora tenha sido explicado sobre as possibilidades de se fazer teatro com a ausên-
cia da voz e/ou da fala, procurei problematizar conceitos que trouxesse mais entendimento,
e que seriam possíveis de articular ao que já vinha sendo trabalhado anteriormente. Foi
então que escolhi unir a esses corpos e suas experiências anteriores uma potencialidade
vocal, pois também era uma grande questão: o quanto o/a professor/a utiliza a sua voz na
prática docente?
A partir de exercícios baseados nas possibilidades da utilização vocal, começaram
os processos práticos. Pedi que todos levantassem, retomassem a qualidade corporal do
início do ano letivo (figura 1), e a partir da postura inicial comecei alguns exercícios vocais
baseados em 3 blocos isolados e combinados: respiração, ressonância e articulação. Quase
todas as aulas do bimestre eram repetidas essas sequências.
Foram pontuadas diferenças entre altura (grave X agudo), intensidade/volume (alto X bai-
xo) e duração (lento X rápido) a partir do controle da voz. Após isso, tivemos uma aula sobre
sotaques de determinadas regiões do Brasil, e de características de pronúncias presentes em
algumas línguas estrangeiras e suas utilizações para composições de personagens e cenas.
Finalizamos essa etapa com improvisações compondo personagens a partir da uti-
lização da voz e da fala, com variações de alguns jogos (SPOLIN, 2000, BOAL, 2007,
SUASSUNA, 1975 apud UTUARI et al., 2013) calcados em um trabalho que fosse integrado/
integrante desses corpos.

210 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Corpos mais dança

Na continuidade da proposta em que os corpos dos/as alunos/as experienciaram in-


terfaces com a visualidade fotográfica, puderam ter noção do que seria um atravessamento
rítmico e suas relações com a voz, chegou o quarto ponto da experimentação. Retornamos
o trabalho com o espaço, mas com o olhar sobre a instrumentalização do conceito de kines-
fera (LABAN, 1978) relacionado ao parâmetro forma (MOTTA, 2006). Para tanto, antes de
explicar como se deu a metodologia de trabalho nas aulas, fez-se necessário apresentar os
conceitos que foram abordados, e como eles estabeleceram essas relações.
Um dos grandes desafios foi contraverter a lógica da dança presa somente a linhas
estéticas ou técnicas específicas. Foi quando apresentei o termo dança livre (FREIRE,
2001) que possibilita emanar uma dança do próprio corpo sem pré-concepções. Isto é, o/a
estudante do IE CIEP 179, que muitas vezes julgava seu comportamento corporal baseado
em comparativos de padrões (bonito X feio, certo X errado, simétrico X assimétrico, profa-
no X sagrado), pudesse começar a ter ideia de que menos importam técnicas e classifica-
ções, mas uma dança que os corpos livremente pudessem propor. A partir disso surgiram
materiais potentes para a criação, desprovidos de pré-julgamentos.
Segundo Vianna (2005), “o corpo é a síntese da vida e a vida é a síntese do corpo”.
Isto é, se o desejo de dançar requisitar uma preocupação exterior, há uma grande chance
da dança ficar refém de raciocínios pessoais, ou baseados na aceitação das pessoas que
estão vendo. A dança livre (FREIRE, 2001) se incorporou ao processo de criação também
com o propósito de explorar a característica que esses/as futuros/as professores/as possam
desenvolver com alunos/as da Educação Infantil: a de movimentar o seu corpo de acordo
com suas vontades. O que a criança quiser mover, ela moverá.

O que vemos, no entanto, é que o domínio da arte da dança, em nossos dias,


obedece a certas regras e convenções em função de um ideal estético ante-
cipadamente suposto e proposto. Mas é possível pensar a dança para além
desses limites, como uma das raras atividades em que o ser humano se engaja
plenamente [...] cada um de nós possui a sua dança e o seu movimento, origi-
nal, singular e diferenciado, e é a partir daí que essa dança e esse movimento
evoluem para uma forma de expressão em que a busca da individualidade
possa ser entendida pela coletividade humana. (VIANNA, 2005, p. 105)

Muitas vezes a dança livre (FREIRE, 2001) se confundia com a livre improvisação e
experimentações sem nenhum propósito. Foi então que ofereci outro material como suporte
para desdobramentos na prática da dança: o conceito de kinesfera (LABAN, 1978) a partir
dos parâmetros espaço e forma (MOTTA, 2006) como inspiração para a criação em dan-
ça. O conceito de kinesfera (LABAN, 1978) representa os limites de ocupação do espaço de

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 211


cada indivíduo baseado na geometria euclidiana, a partir de um ponto de apoio no centro do
corpo, de onde podem emanar várias movimentações, como mostra a figura 4.

Figura 4. kinesfera de Rudolf Laban (1978) representada em formato de cubo para representação do conceito para os/
as estudantes. Ilustração do autor.

A proposta se deu, a princípio, estendendo os membros superiores até alcançar a


cada ponto marcado no cubo e criar movimentações a partir desses pontos. Além disso, o
estudo dos parâmetros espaço e forma (MOTTA, 2006) serem trabalhados conjuntamente
se dá devido à sua afinidade, e não são somente as perspectivas dimensionais e externas
que entram em jogo, mas as suas relações intrínsecas. Com essa base, os/as alunos/as
foram provocados/as a entender como seu corpo se relaciona no espaço de forma uni, bi
e tridimensional. As possibilidades unidimensionais são: cima, baixo, frente, atrás, direita,
esquerda. As bidimendionais (soma de duas unidimensionais) são: cima+frente, cima+atrás,
cima+direita, cima+esquerda, frente+direita, frente+esquerda, atrás+direita, atrás+esquerda,
baixo+frente, baixo+atrás, baixo+direita, baixo+esquerda. E as tridimensionais (soma de
três unidimensionais) são: cima+frente+direita, cima+frente+esquerda, baixo+frente+direi-
ta, baixo+frente+esquerda, atrás+cima+direita, atrás+cima+esquerda, atrás+baixo+direita,
atrás+baixo+esquerda.
Assim, as formas subjetivas deram lugar à experimentação em dança, e trouxeram
um diálogo profundo com os conceitos trabalhados. Foram solicitadas que as experimenta-
ções se dessem de acordo com inspirações espaciais escolares. Por esse motivo, algumas
construções coreográficas surgiram a partir de temas feitos em diferentes lugares da escola,
unindo os conceitos aos movimentos corporais.

212 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir das narrativas consigo visualizar um ciclo, pois principiei com as ideias do que
eu gostaria de propor e como os processos se desencadearam. Como professor de dança,
o olhar sobre os corpos do IE CIEP 179 e as somas dos corpos mais também promoveram
uma exploração artística de forma crescente. Ao passo que alguns conceitos e processos
eram experienciados para um diálogo específico, outros eram aproveitados como desdo-
bramentos por já terem sido experienciados. Isto é, visualizei um corpo que entendeu suas
partes e articulações com o espaço na fotografia (estático), ganhou dinâmica a partir do rimo
com o método “O Passo”, reconheceu suas propriedades vocais em possíveis explorações
cênicas, e finalizou com a tradução poética dos movimentos corporais no espaço.
Passei por indagações que me fizeram analisar esmiuçadamente cada um dos proces-
sos de trabalho e buscar o melhor proveito pelos/as estudantes do que vinha sendo abor-
dado. Exercitei, sobretudo ao ouvir e perceber, o que precisava ser ajustado nos processos
e suas aplicações aliadas a uma formação de professores/as. Portanto, retorno à premissa
que norteia toda a minha pesquisa durante toda a minha pós-gradação: o quanto a prática
dos corpos mais pode propiciar a criação de materiais, vocabulários e repertórios artísticos.
Assim como o despertar de potencialidades criativas no sentido dos corpos carregarem em
si grandes capacidades de exploração com seus/suas futuros/as alunos/as.

REFERÊNCIAS
1. BRASIL. Ministério da Educação. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, nº
9.394/96, de 20/12/1996.

2. _____. Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs). Brasília: MEC/SEF, 2000.

3. CLANDININ, D.; CONNELLY, F. Pesquisa narrativa: experiência e história em pesquisa qua-


litativa. Uberlândia: EDUFU, 2011.

4. CIAVATTA, L. O Passo: um passo sobre as bases de ritmo e som. Rio de Janeiro: 2009. FA-
BIÃO, E. Corpo cênico, estado cênico. Revista Contracorpos, v.10, n.3, set-dez 2010.

5. FREIRE, I. Dança-educação: o corpo e o movimento no espaço do conhecimento. In: Cader-


nos Cedes, ano XXI, n. 53, abr. 2001. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/ccedes/v21n53/
a03v2153.pdf Acessado em 25 mar. 2020

6. LABAN, R. Domínio do Movimento. São Paulo: Summus, 1978. LECOQ, J. O Corpo Poético.
São Paulo: Editora Senac, 2010.

7. MOTTA, M. Teoria Fundamentos da Dança: uma abordagem epistemológica à luz da Teoria


das Estranhezas. Dissertação de Mestrado. Niterói: UFF/IACS, 2006.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 213


8. UTUARI, S.; LIBÂNEO, D.; SARDO, F.; FERRARI, P. Arte Por Toda Parte. Volume único.
São Paulo: FTD, 2013.

9. VIANNA, K. A Dança. 7ª edição. São Paulo: Summus, 2005.

214 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


16
“ Correlação entre potência
de membros inferiores e
características antropométricas
na performance do salto lateral
em goleiros de futebol de campo

Rodolfo Machado de Souza Segundo


PPG-UNIARP

Ricelli Endrigo Ruppel da Rocha


UNIARP

Artigo original publicado em: 2017


Revista Brasileira de Futsal e Futebol - ISSN 1984 - 4956.
Oferecimento de obra científica e/ou literária com autorização do(s) autor(es) conforme Art. 5, inc. I da Lei de Direitos Autorais - Lei 9610/98

10.37885/201102019
RESUMO

O presente estudo teve como objetivo verificar a correlação entre potência de membros
inferiores e características antropométricas em goleiros da base do Caçador Atlético
Clube. A amostra foi de 8 goleiros de futebol de campo, categoria sub - 18, com idade
média de 16 anos. Foram avaliados a estatura, estatura total, envergadura, % de gordu-
ra, e potência de membros inferiores em testes de impulsão horizontal e vertical. Para a
correlação dos dados, utilizou-se o teste de Correlação Múltipla de Pearson com nível
de significância adotado de p<0.05. Os principais resultados foram apresentados por
correlação de estatura total r=0.70 (p<0.009) e de impulsão vertical r=0.73 (p<0.006), se-
guidos de impulsão horizontal r=0.65 (p<0.01) e envergadura r=0.66 (p<0.01). Sugerindo
assim que melhorando os índices de estatura total, envergadura, impulsão horizontal e
impulsão vertical, melhora-se a probabilidade de defesa do goleiro em uma projeção
lateral. Sendo os aspectos de potencial genético principalmente referente à estatura e a
capacidade de evolução no trabalho de potência muscular, fatores determinantes para
um bom desempenho.

Palavras-chave: Futebol, Goleiros, Estatura, Potência.


INTRODUÇÃO

No cenário nacional, não são encontrados estudos caracterizando metodologias de


treinamento para futebolistas das categorias de base.
A maioria dos trabalhos consideram programas de treinamento voltados a preparação
de futebolistas profissionais (Campeiz, 2001; Silva e colaboradores, 2008; Borin e cola-
boradores, 2009).
Pelo fato do número de praticantes crescer a cada ano, aumenta a qualificação e o
nível de rendimento a partir da profissionalização de inúmeros atletas.
Dentre as diferentes posições táticas de jogo se encontram os goleiros que realizam
ações defensivas e no futebol moderno, os goleiros adquiriram características especificas pela
constante evolução do esporte, tendo em vista, as novas especificidades do jogo e da posição.
Para que consiga desempenhar de uma forma adequada suas diversas funções,
esse atleta deverá possuir atributos físicos diferentes dos demais jogadores (Scopel e co-
laboradores, 2006).
Viana (1995) e Santos Filho (2002) destacam que algumas qualidades físicas são im-
portantes para a execução adequada da função de goleiro: estatura entre 1,75 e 1,90m, peso
proporcional à altura, força e potência muscular, elasticidade, velocidade de deslocamento,
agilidade e resistência geral.
O salto lateral é uma variável muito importante na execução de defesas do goleiro, é
a partir da realização dele que existe ou não a possibilidade de execução de uma defesa.
Assim, a realização dos objetivos do treinamento buscando o aperfeiçoamento do salto
lateral só é possível se sistematicamente, treino após treino, período após período, e ao longo
de todo o ciclo de treinamento houver o controle de toda a prática, o que é de suma impor-
tância para o desenvolvimento e o aperfeiçoamento das capacidades bimotoras (Braz, 2010).
O objetivo desta pesquisa foi avaliar a relação de variáveis antropométricas com o
desempenho do salto lateral em goleiros de futebol de campo.

MATERIAIS E MÉTODOS

Amostra

A amostra não probabilística foi composta de 08 goleiros de futebol de campo da


equipe de base do Caçador Atlético Clube das categorias sub-15 e sub-18 anos, da cida-
de de Caçador-SC.
Todos os atletas participavam de treinamentos sistematizados e dos principais cam-
peonatos municipais e estaduais. Os participantes assinaram um termo de consentimento

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 217


livre e esclarecido para participar do estudo, e a pesquisa seguiu as normas vigentes na
Resolução 196/96 do conselho Nacional de Saúde.
Os seguintes critérios de inclusão e exclusão foram utilizados na pesquisa:
Inclusão: todos com uma prática de no mínimo 1 ano na posição, com treinamentos de
3 vezes por semana, ter nascido em 1997 com 15 anos completos até 1994, ou seja, não
mais que 18 anos.
Exclusão: não possuir prática na posição inferior a 1 ano, treinar menos que 3 vezes
por semana, possuir menos que 15 anos completos e mais que 18 anos, ou seja, nascido
em 1993 não poderiam participar do teste.
As avaliações antropométricas foram realizadas no período vespertino no dia 05 de
junho de 2012, antes das atividades diárias de treinamentos dos atletas.
As avaliações de estatura, envergadura, estatura total, %gordura, foram realizadas
na Academia Impacto, por a mesma possuir estrutura física necessária para realização
dessas avaliações.
Já o teste de salto lateral foi realizado no Estádio Municipal Carlos Alberto da Costa
Neves, local específico de treinamento dos atletas.

Avaliação Antropométrica Envergadura

Na avaliação de envergadura foi utilizado o protocolo de Delgado (2004), onde o avalia-


do ficou em pé, em posição ortostática, braços em abdução de 90° com o tronco, cotovelos
estendidos e antebraços supinados. Mediu-se a distância entre o dactylion (dedo médio)
direito e esquerdo.
Foram feitas três medidas considerando a média entre elas, as medidas foram realizadas
com uma fita métrica da marca Vonder e os resultados foram obtidos em centímetros (cm).

Estatura

Na avaliação da estatura foi utilizado o protocolo de Delgado (2004), onde foi medida
a linha reta entre dois pontos, um tangente à planta dos pés e outro tangente ao ponto mais
alto da cabeça, estando o indivíduo em pé, descalços, com o corpo mais alongado o pos-
sível e a cabeça posicionada com o plano Frankfurt. A mensuração foi realizada em uma
balança profissional mecânica com estadiômetro até 150kg, Welmy, e os resultados obtidos
em centímetros (cm).

218 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Estatura Total

Na avaliação da estatura total foi utilizado o protocolo de Delgado (2004), onde foi
mensurada a distância do ponto dactylion (dedo médio) até a região plantar, estando o ava-
liado em posição ortostática, descalços, com o membro superior direito elevado na vertical
a 180° por sobre a cabeça e com o cotovelo estendido.
A mensuração foi realizada com uma fita métrica da marca Vonder e os resultados
foram obtidos em centímetros (cm).

Avaliação de desempenho de membros Inferiores

Protocolo de impulsão horizontal

Nesse teste foi utilizado o protocolo de Johnson e Nelson (1979), onde foi mensurada
indiretamente a potência dos membros inferiores. O avaliado ficou em pé, pernas ligeiramente
afastadas, atrás da linha do ponto zero.
Tomou impulso com ambas as pernas e saltou para frente o mais longe possível.
Marcou-se a distância entre a linha do ponto zero e o calcanhar mais próximo dessa linha.
Foi computado o melhor das três tentativas realizadas e a mensuração foi realizada
com uma fita métrica. Os resultados finais foram obtidos em centímetros (cm).

Protocolo de impulsão vertical

Nesse teste foi utilizado o protocolo de Johnson e Nelson (1979), mediu-se indireta-
mente a força dos membros inferiores. Mediu-se a estatura total do avaliado em pé com o
braço estendido. Posteriormente o avaliado realizou o salto o mais alto possível, fazendo aí
uma marca, usando os braços.
Foi realizada a mensuração da altura total atingida com o salto. Foram realizadas três
tentativas, utilizando a melhor marca entre elas.
A mensuração foi realizada com uma fita métrica da marca Vonder e os resultados
foram obtidos em centímetros (cm).

Protocolo do salto lateral

Para a realização do teste de salto lateral foi utilizado o protocolo de Johnson e Nelson
(1979) de impulsão vertical adaptado para salto lateral, com o cunho de mensurar indireta-
mente a força dos membros inferiores utilizando também a estatura total do avaliado para
medição do resultado final. Este teste serve para realizar a correlação dos dados coletados
com a possibilidade de defesa do goleiro.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 219


Mediu-se a altura total do avaliado em pé com o braço estendido. Posteriormente o
avaliado ficou em pé, pernas ligeiramente afastadas, atrás da linha do ponto zero, tomou
impulso com ambas às pernas, saltou para o lado o mais longe possível, caindo com o corpo
e braços estendidos.
Mensurou-se a distância do ponto zero até o ponto mais longe atingido pelo avaliado,
o ponto do dactylion (dedo médio). Foram feitas três tentativas, utilizando a melhor marca
entre elas. A mensuração foi realizada com uma fita métrica da marca Vonder e os resultados
foram obtidos em centímetros (cm).

Composição Corporal

Para a predição do % de gordura, foi utilizado o protocolo de Boileau, Lohman e


Slaughter (1985), qual estudo é realizado em indivíduos de 8 a 28anos, que fornece a
seguinte equação.
Masculino: %G= 1,35 (TR+SE) -0,012 (TR+SE)² - 4,4
Onde: TR= dobra tricipital, SE= dobra subescapular.
Os avaliados ficaram em posição ortostática e relaxados, foi mensurado a dobra trici-
pital entre o processo acromial da escapula e o processo olecrano da ulna, a dobra tricipital
foi medida no sentido vertical.
A dobra subescapular foi mensurada dois centímetros abaixo do ângulo inferior da
escápula, essa medida foi realizada no sentido oblíquo.

Análise estatística

Inicialmente a análise descritiva de média ± desvio padrão (DP) foi utilizado para ca-
racterizar a amostra e o teste de normalidade de Shapiro-Wilk para determinar estatística
paramétrica ou não paramétrica.
Para verificar a relação entre salto lateral (variável dependente) e as variáveis inde-
pendentes (impulsão horizontal, impulsão vertical, envergadura e estatura total) utilizou-se
o teste de Correlação Múltipla de Pearson com nível de significância adotado de p<0.05.
Todas as avaliações foram feitas pelo programa Graph Pad Prisma 5.0.

RESULTADOS

A tabela 1 apresenta a análise descritiva e as características antropométricas da amos-


tra. Os dados abaixo descrevem as características morfológicas da amostra.
A tabela 2 apresenta a análise descritiva e as características neuromuscu-
lares da amostra.

220 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


O gráfico 1, apresenta o resultado da correlação entre impulsão vertical e salto lateral
em goleiros da categoria sub-15 e sub- 18 do CAC. Houve uma correlação moderada positiva
(0.73) entre a impulsão vertical e o desenvolvimento do salto lateral.

Tabela 1. Características antropométricas da amostra (Média ± DP).

Posição Estatura (cm) Estatura total (cm) Envergadura (cm) %G

Goleiros 171,9 ± 6,5 224,6 ± 4,7 181,6 ± 6,1 16,9 ± 3,7

Tabela 2. Analise descritiva da potência de membros inferiores dos goleiros das categorias sub-15 e sub-18 (média ± DP).

Posição Impulsão Vertical (cm) Impulsão Horizontal (cm) Salto Lateral (cm)

Goleiros 272,1 ± 5,9 204,8 ± 17,4 361,4 ± 34,2

Gráfico 1. Correlação entre impulsão vertical e salto lateral em goleiros da categoria sub-15 e sub- 18 do CAC.

Gráfico 2. Correlação entre impulsão horizontal e salto lateral em goleiros da categoria sub-15 e sub-18 do CAC.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 221


Gráfico 3. Correlação entre envergadura e salto lateral em goleiros da categoria sub-15 e sub-18 do CAC.

O gráfico 2 apresenta o resultado da correlação entre impulsão horizontal e salto lateral


em goleiros da categoria sub-15 e sub- 18 do CAC.
Houve uma correlação moderada positiva (0.65) entre a impulsão horizontal e o de-
senvolvimento do salto lateral.
O gráfico 3 apresenta o resultado da correlação entre envergadura e salto lateral em
goleiros da categoria sub-15 e sub-18 do CAC.
Houve uma correlação moderada positiva (0.66) entre a envergadura e o desenvolvi-
mento do salto lateral.
O gráfico 4 apresenta o resultado da correlação entre estatura total e salto lateral em
goleiros da categoria sub-15 e sub-18 do CAC.
Houve uma correlação moderada positiva (0.70) entre a estatura total e o desenvolvi-
mento do salto lateral.

Gráfico 4. Correlação entre estatura total e salto lateral em goleiros da categoria sub-15 e sub-18 do CAC.

222 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


DISCUSSÃO

A tabela 1 apresentou a análise descritiva e as características antropométricas da


amostra, este método é definido como uma série de técnicas sistematizadas de medidas
que expressam quantitativamente as dimensões do corpo humano (Malina, 1995).
Segundo McArdle e colaboradores (2003) o biotipo é característica determinante no
desempenho de qualquer atleta.
A tabela 2 apresentou a análise descritiva e as características neuromusculares da
amostra, que de acordo com Gallo e colaboradores (2010) as ações decisivas praticadas
pelos goleiros, que se manifestam por intermédio das defesas, saídas do gol e reposição
de bola, são eventos determinados pela capacidade de força explosiva (potência) apoiados
no metabolismo anaeróbio alático.
Essa capacidade de força explosiva pode ser representada pela impulsão horizontal,
vertical e o salto lateral nessa pesquisa.
O gráfico 1, apresentou o resultado da correlação entre impulsão vertical e salto lateral.
A capacidade de força de membros inferiores é considerada por Magalhães e colabo-
radores (2001) como importante fator de prestação no futebol, atuando como base para as
ações especificas do jogo.
Toledo (2006) ressaltam a importância que a potência muscular / força explosiva tem
para o desempenho das modalidades esportivas que envolvem a realização de saltos, ace-
lerações/desacelerações e lançamentos.
No gráfico 1, podemos analisar a correlação dos dados de impulsão vertical e salto
lateral, afirmando que como existiu uma correlação moderada positiva (r=0.73), concluímos
que sempre que houver evolução no teste de potência de membros inferiores, impulsão
vertical, sempre haverá evolução no desempenho do goleiro na realização do salto lateral
aumentado assim suas possibilidades de defesa.
O gráfico 2 apresenta o resultado da correlação entre impulsão horizontal e salto late-
ral. A força explosiva pode ser entendida como sendo a capacidade de superar resistências
que não alcançam as magnitudes limites, porém que ocorrem com a máxima aceleração.
No entanto para Platonov e Bulatova (2003) e Toledo (2006) força explosiva pode ser
entendida como força-velocidade, sendo a capacidade de o sistema neuromuscular superar
uma resistência dentro do menor tempo possível.
No gráfico 2, podemos analisar a correlação dos dados de impulsão horizontal e salto
lateral, afirmando que como existiu uma correlação moderada positiva (r=0.65), concluímos
que sempre que houver evolução no teste de potência de membros inferiores, impulsão ho-
rizontal, sempre haverá evolução no desempenho do goleiro na realização do salto lateral
aumentado assim suas possibilidades de defesa.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 223


O gráfico 3 apresenta o resultado da correlação entre envergadura e salto lateral. Valores
antropométricos são indicativos das características necessárias para alcançar um ótimo de-
sempenho, desta forma auxiliando na seleção de atletas (Arnason e colaboradores, 2004).
No gráfico 3, podemos analisar a correlação dos dados envergadura e salto lateral,
afirmando que como existiu uma correlação moderada positiva (r=0.66), concluímos que
sempre que houver evolução na avaliação antropométrica, envergadura, sempre haverá
evolução no desempenho do goleiro na realização do salto lateral aumentado assim suas
possibilidades de defesa.
O gráfico 4 apresenta o resultado da correlação entre estatura total e salto lateral. Para
que os fundamentos sejam executados com perfeição os goleiros necessitam de um preparo
físico adequado e de qualidades antropométricas apropriadas para a posição.
Kraemer e Hakkinen (2004) afirmam que para defender a bola o goleiro necessita de
alto grau de velocidade de reação, agilidade em diferentes direções a partir de diversas posi-
ções corporais, velocidade para levantamento do solo, capacidade de mergulho, lançamento
corporal em outra direção, altura e velocidade inicial em um tiro para frente ou para trás.
No gráfico 4, podemos analisar a correlação dos dados estatua total e salto lateral,
afirmando que como existiu uma correlação moderada positiva (r=0.70), concluímos que
sempre que houver evolução na avaliação antropométrica, estatura total, sempre haverá
evolução no desempenho do goleiro na realização do salto lateral aumentado assim suas
possibilidades de defesa.

CONCLUSÃO

O goleiro deve ser exclusivamente treinado suprindo suas necessidades e exigências


físicas e técnicas.
Para que a área de preparação de goleiros aprimore-se cada vez mais os profissionais
devem analisar e quantificar as condições específicas de jogo, podendo assim contribuir
com a evolução dos métodos de treino e com informações para pesquisa científica na área
(Gallo e colaboradores, 2010).
Podemos analisar através desse estudo que existem inúmeras qualidades que devem
ser trabalhadas em um goleiro para que se obtenha uma performance melhor.
Afirmando assim, que pelo estudo proposto à evolução no aspecto físico/motor da
valência denominada força explosiva (potência) e da qualidade genética de antropometria
são dois dos fatores mais importantes a se trabalhar e avaliar em um goleiro.
Pelos resultados apresentados, podemos concluir que a variável de impulsão vertical,
estabelecida através do teste de potência de membros inferiores, foi a que apresentou o
resultado mais significante na correlação com o salto lateral (r=0.73), sendo assim quanto

224 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


mais se trabalhar essa qualidade física maior a possibilidade de êxito do goleiro na execu-
ção de uma defesa.
Na análise dos resultados de âmbito antropométrico, o índice de estatura total se mos-
trou o mais importante na correlação com o salto lateral (r=0.70), sendo assim possibilitando
um maior índice de êxito na execução de uma defesa com salto lateral.

REFERÊNCIAS
1. Arnason, A.; Sigurdsson, S.B.; Gudmunssonn, A.; Holme, I.; Engebretsen, L.; Bahr, R. Physical
Fitness, Injuries and Team Performance in Soccer. Medicine & Science in Sports & Exercise.
Vol. 36. p. 278-285. 2004.

2. Braz, T. V. Alteração da velocidade em futebolistas juvenis no período competitivo e sua rela-


ção com o conteúdo de treinamento. 2010. 96 f. Dissertação (Mestrado em Educação Física)
- Faculdade de Ciências da Saúde, Universidade Metodista de Piracicaba, Piracicaba, 2010.

3. Boileau, R.A.; Lohman, T.G.; Slaughter, M.H. Exercise and body composition in children and
youth. Scandinavian Journal of Sports Sciences. Vol. 7. p.17-27. 1985.

4. Borin, J. P.; Gomes, A. C.; Mattar, M.; Vieira, N. A.; Braz, T. V.; Spigolon, L. M. P. Alteração
da capacidade de velocidade de deslocamento em futebolistas profissionais. In: VI Congresso
Internacional de Educação Física e Motricidade Humana. Revista Motriz. Vol. 15. p.8. 2009.

5. Campeiz, J.M. Futebol: estudo da alteração de variáveis anaeróbias e da composição corpo-


ral em atletas profissionais durante um macrociclo de treinamento. Dissertação de Mestrado,
Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2001.

6. Delgado, L. A. Introdução à avaliação da aptidão física. Apostila n.1. 2004.

7. Gallo, C. R.; Zamai, C.A. Vendite, L.; Libardi, C.A. Analises das ações defensivas e ofensivas,
e perfil metabólico da atividade do goleiro de futebol profissional. Campinas: Revista Conexões.
Vol. 8. Núm.1. p.16-37. 2010.

8. Kraemer, W. J.; Häkkinen, K. Treinamento de força para o esporte. Porto Alegre. Artmed. 2004.

9. Johnson, B.L.; Nelson, J.K. Measurement of Physical Performance. Resource Guide with La-
boratory Experiments, Minneapolis, Minnesota, Burgess Publishing Company. 1979.

10. Magalhães, L.; e colaboradores. Avaliação isocinética da força muscular de atletas em função
do desporto praticado, idade, sexo e posição específica. Revista Portuguesa de Ciências do
desporto. Vol. 1. Núm. 2. p.13-21. 2001.

11. Malina, R.M. Anthropometry. In: Maud, P.J.; Foster, C. Physiological assessment on human
fitness. Ed. Human Kinetcs: Illinois. p.205-219. 1995.

12. Mcardle, W. D.; Katch, F. I.; Katch, V. L. Fisiologia do exercício: energia, nutrição e desempe-
nho humano. 5ª edição. Guanabara Koogan. 2003.

13. Platonov, V.N.; Bulatova, M.M. A preparação física. Rio de Janeiro. Sprint. 2003.

14. Santos Filho, J. L. A. Manual de Futebol. São Paulo, Editora Phorte, 2002.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 225


15. Scopel, E.; A. A.; Levandowski, D. C. Evaluation of the personality characteristics of professional
and amateur goalkeepers, Psicologia Ciência e Profissão. Vol. 26. Núm. 2. p.270-279. 2006.

16. Silva, A.R.S.; Santhiago, V.; Papoti, M.; Gobatto, C.A. Psychological, biochemical and physio-
logical responses of Brazilian soccer players during a training program. Science and Sports.
Vol. 23. p.66-72. 2008.

17. Toledo, N. Avaliação da força explosiva de membros inferiores em jovens futebolistas. Pluralis
Multitemática. Revista do Centro Universitário Amparense-UNIFIA. Núm. 4. p.33-43. 2006.

18. Viana, A.R. Treinamento do Goleiro de Futebol. Minas Gerais. Gav. 1995.

226 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


17
“ O esteroide anabólico
androgênico decanoato de
nandrolona é pró-oxidativo no
miocárdio de ratos exercitados
ou sedentários

Julyara Lima Pinheiro Fabíola Raquel Tenório Oliveira


UEPA UEPA

Bernardo Porto Maia Jofre Jacob da Silva Freitas


UEPA UEPA

Anderson Bentes de Lima Katia Simone Kietzer


UEPA UEPA

Robson José de Souza Domingues


UEPA

10.37885/201102066
RESUMO

Este estudo teve como objetivo verificar os possíveis efeitos do uso de esteroide ana-
bólico androgênico (EAA) sobre a morfologia e o metabolismo oxidativo do coração em
ratos exercitados e sedentários. Utilizou-se 24 ratos Wistar distribuídos em grupos que
realizavam exercício de corrida voluntaria (GT) e sedentário (GS), e faziam uso de EAA
(GAT, GAS). Durante os três meses do protocolo de corrida, os animais receberam
injeção intramuscular de 5mg/kg p.c. do EAA. Após o período de treinamento, houve
a eutanásia e remoção do coração dos ratos, para posterior avaliação da peroxidação
lipídica e da capacidade antioxidante, bem como análise morfométrica. Verificou-se que
os grupos anabolizados, GAS (0.3072 ± 0.0531) e GAT (0.2732 ± 0.0413), apresentaram
maior peroxidação lipídica quando comparados aos grupos não anabolizados GS (0.1705
± 0.0224) e GT (0.1785 ± 0.0340). Não houve alteração na capacidade antioxidante to-
tal bem como não houve alteração na espessura do septo interventricular e da parede
ventricular esquerda. Assim, o uso de EAA não provocou alterações morfológicas no
miocárdio, contudo alterou o metabolismo oxidativo. Verificou-se ainda que a prática
de exercício aeróbio não teve efeito protetor contra a peroxidação lipídica no miocárdio
provocada pelo uso de EAA.

Palavras-chave: Exercício, Estresse Oxidativo, Coração, Decanoato de Nandrolona.


INTRODUÇÃO

O decanoato de nandrolona é um análogo sintético de testosterona considerado um


dos esteróides androgênicos anabolizantes (AAS) mais utilizados por adolescentes e atle-
tas1. O abuso de andrógenos, frequentemente chamados de esteroides anabólicos tornou-se
um problema mundial nas últimas décadas. O abuso é prevalente em alguns países, incluindo
o Brasil. Seus efeitos chamaram a atenção de usuários não-atletas que buscam melhorar
o aspecto estético pela resposta hipertrófica nos músculos ao uso de EAA2. A hipertrofia
muscular ocorre pelo aumento da síntese proteica, pela promoção da retenção de nitrogê-
nio, além de promover a inibição do catabolismo proteico e a estimulação da eritropoiese3.
No entanto, pesquisas realizadas nas ultimas 5 décadas documentaram vários efeitos
adversos do EAA em diferentes sistemas orgânicos1. No sistema cardíaco, o abuso de EAA
causa hipertrofia cardíaca, hipertensão e disfunção diastólica4. O consumo crônico de EAA
aumenta a incidência de anormalidades cardiovasculares em atletas, mas o mecanismo que
provoca essas alterações permanece desconhecido. O miocárdio é um tecido particularmente
sensível a esteroides sexuais, na medida em que expressa receptores tanto para androgênios
como para estrogênios5. Além disso, o miocárdio se caracteriza pelo elevado consumo de
oxigênio, que associado a resposta ao exercício pode resultar no aumento da produção de
espécies reativas de oxigênio (EROs) e no desequilíbrio do metabolismo oxidativo 6.
O objetivo do estudo é verificar se o uso do EAA decanoato de nandrolona provoca
alterações na morfologia do coração, e no metabolismo oxidativo do miocárdio de ratos
submetidos a protocolo de exercício aeróbico.

METODOLOGIA

Delineamento do estudo

Estudo transversal com objetivo de avaliar os possíveis efeitos adversos do decanoato


de nandrolona na morfologia e no metabolismo oxidativo do miocárdio de ratos

Casuística

Foram utilizados 24 ratos (Rattus norvergicus albinus) da linhagem Wistar, machos,


adultos, entre 90 e 120 dias, com peso variando entre 200 e 270 gramas, que foram mantidos
em ambiente com fatores controlados como umidade, ruído, temperatura a 22º C, obedecen-
do a um ciclo de foto período claro/escuro de 12 horas, recebendo água e ração ad libitum
durante todo o experimento.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 229


Aspectos Éticos

Os animais da presente pesquisa foram cuidados segundo as normas do Colégio


Brasileiro de Experimentação Animal (COBEA) e da Legislação Nacional para vivissecção
de animais em vigor (Lei federal 6.638 de 08 de maio de 1979), tendo sido o anteprojeto de
pesquisa aprovado pelo Comitê de Ética no Uso de Animais do Centro de Ciências Biológicas
e da Saúde da Universidade do Estado do Pará, sob número de protocolo 14/10 SUB 1.

Modelo Experimental

Os animais foram distribuídos randomicamente em quatro grupos: grupo tratado com


EAA e que realizou exercício (GAT, n=6), grupo tratado com EAA e sedentário (GAS, n=6),
grupo sem tratamento com EAA e que realizou exercício (GT, n=6) e grupo sem tratamento
com EAA e sedentário (GS, n=6).
Os animais dos grupos GAT e GT foram acondicionados em caixa contendo livre aces-
so a roda de corrida voluntária (Insight, Brasil) seis horas por dia, três vezes por semana,
durante doze semanas. Trinta minutos antes do início do treinamento, os animais GAT e
GAS receberam 5 mg/kg p.c. i.m. de Decanoato de Nandrolona no músculo quadríceps
femoral. Os animais GT e GS receberam dose intramuscular de óleo mineral 0.2mL/kg p.c.,
veículo utilizado para solubilizar o EAA, nas mesmas proporções e no mesmo período.
Após o período experimental, os animais foram sacrificados por decapitação, o cora-
ção foi removido e fragmentos coletados e imediatamente congelados em nitrogênio líquido
para posterior processamento bioquímico. Para a morfometria foram coletados fragmentos
cardíacos próximos e excludentes ao ápice, com secção em ângulo perpendicular ao septo
interventricular a fim de garantir a posterior mensuração da espessura da parede ventricular
esquerda e do septo interventricular.
Os fragmentos teciduais foram tratados segundo técnica histológica convencional,
sendo então, fixados, desidratados, diafanizados e incluídos em blocos de parafina. Para
morfometria do ventrículo esquerdo e do septo interventricular, foram confeccionadas laminas
histológicas de secções transversas do coração com cortes de 5μm de espessura coradas
pela técnica hematoxilina-eosina (HE). As lâminas foram analisadas com a utilização de soft-
ware axiovision instalado no microscópio óptico Zeiss®, acoplado a uma filmadora Zeiss®,
onde se obteve microfotografias nas objetivas de aumento 40x, que foram projetadas no
monitor. Com o auxílio do mouse o pesquisador traçou uma linha perpendicular sobre parede
do ventrículo esquerdo e septo interventricular. O sistema quantificava o comprimento da
linha traçada e determinava desta forma as espessuras. Foram mensuradas a espessura
do ventrículo esquerdo e do septo interventricular de vinte secções de cada animal.

230 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Para determinar a peroxidação lipídica foi utilizado o método Winterbourn e col. (1985)7
modificado para análise em espectrofotometria, onde se avalia a concentração de substân-
cias reativas ao ácido tiobarbitúrico (TBARS). O método baseia-se na alteração da coloração
da amostra quando em contato com o ácido tiobarbitúrico. A análise colorimétrica utilizou
espectrofotometria em comprimento de onda de 532 nm.
O potencial anti-oxidante do miocárdio foi determinado segundo a sua equivalência ao
trolox, análogo sintético hidrossolúvel da vitamina E 8. Trata-se de uma técnica colorimétrica
baseada na reação entre o ABTS (2,2’-azinobis-3-etilbenzotiazolina-ácido-6-sulfônico-dia-
mônio) com persulfato de potássio (K2S2O8), produzindo diretamente o radical cátion ABTS•+,
cromóforo de coloração verde/azul. A adição de anti-oxidantes a este radical o reduz nova-
mente a ABTS, na extensão e escala de tempo dependente da capacidade anti-oxidante,
concentração de anti-oxidantes e duração da reação. Isto pode ser mensurado por espec-
trofotometria a 734nm durante um intervalo de tempo de 5 minutos.

Estatística

Em relação à natureza das variáveis, foi aplicada análise estatística comparativa do


tipo quantitativa entre os resultados verificados em cada grupo experimental estudado. Para
tal análise utilizou-se o teste ANOVA com pós-teste de Tukey, através do programa Biostat
5.0. O nível de significância adotado foi de 5% (p≤0,05).

RESULTADOS

A análise morfológica não apresentou diferença significativa na espessura do ventrículo


cardíaco esquerdo entre os ratos treinados e sedentários. Também não houve diferença
entre os animais tratados com EAA e os animais do grupo controle (Tabela 1).

TABELA 1. Espessura do ventrículo cardíaco esquerdo (µm) e do septo interventricular (µm) de ratos Wistar treinados e
sedentários tratados com esteróide anabólico androgênico Decanoato de Nandrolona.
Grupos Espessura Ventrículo Espessura Septo
Esquerdo Interventricular
GS 1781.1 ± 634.4 1468.4 ± 169.8
GT 313.5 ± 798.1 2077.6 ± 744.2
GAS 2436.8 ± 512.6 2011.3 ± 305.4
GAT 2474.2 ± 402.3 1955.6 ± 117.4
Fonte: Protocolo de pesquisa; n=6 por grupo; GS - Grupo sedentário,
GT- Grupo treinado, GAS - Grupo anabolizado sedentário, GAT - Grupo
anabolizado treinado; p ≥ 0,05 Anova-Tukey.

A análise bioquímica evidenciou aumento significativo da peroxidação lipídica no mio-


cárdio dos animais que foram submetidos ao uso do EAA quando comparados aos que não
o utilizaram (Tabela 2, Figura 1).

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 231


FIGURA 1. Concentração de substâncias reativas ao ácido tiobarbitúrico no miocárdio de ratos Wistar treinados e
sedentários tratados com Decanoato de Nandrolona.

Fonte: Protocolo de pesquisa; n=6 por grupo; * p ≤ 0,01 Anova-Tukey.

Ao analisar a atividade antioxidante do miocárdio de ratos não se observou diferença


significativa entre os grupos (tabela 2)

TABELA 2. Concentração de substâncias reativas ao ácido tiobarbitúrico (uMol/mg proteína) e capacidade antioxidante
total equivalente ao Trolox do miocárdio de ratos Wistar treinados e sedentários tratados com decanoato de nandrolona.
Grupos TBARS TEAC
GS 0.3533 ± 0.1260 0.1705 ± 0.0224
GT 0.2851 ± 0.0891 0.1785 ± 0.0340
GAS 0.3932 ± 0.1018 * 0.3072 ± 0.0531
GAT 0.3954 ± 0.0938 * 0.2732 ± 0.0413
Fonte: Protocolo de pesquisa; GS - Grupo sedentário, GT- Grupo treinado,
GAS - Grupo anabolizado sedentário, GAT - Grupo anabolizado treinado;
Anova-Tukey; TBARS - * p≤ 0.01; TEAC - p ≥ 0.05.

DISCUSSÃO

O presente estudo verificou que o uso de EAA promove alterações no metabolismo


oxidativo no miocárdio de ratos sedentários ou exercitados, mas que esse efeito não se
traduz em alterações morfológicas.
A literatura relata o uso de diferentes doses de EAA, sendo mais utilizada as baixas
doses por longos períodos de tempo 8. Este trabalho utilizou a dosagem preferencial entre
humanos usuários de EAA para promover hipertrofia muscular, durante período de treina-
mento. Porém, tanto elevadas quanto baixas doses de nandrolona, aumentam a peroxidação
lipídica no musculo cardíaco 9.
O presente estudo mostrou que a prática regular de exercício aeróbico voluntário nos
animais que não utilizaram EAA, não provocou alteração no metabolismo oxidativo no mio-
cárdio dos animais treinados. Tal fato pode estar relacionado a intensidade e regularidade
do exercício praticado pelos animais estabelecendo assim a diferença na resposta oxidativa.
Exercícios intensos aumentam o consumo de oxigênio e podem produzir o desequilíbrio
entre EROs e antioxidantes, induzindo ao estresse oxidativo como resultado do aumento

232 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


da produção de EROs. O incremento do metabolismo oxidativo eleva o escape de elétrons
do sistema de transporte mitocondrial e perturba a homeostase intracelular pró-oxidante e
antioxidante, levando a dano e desequilíbrio do estado redox 6.
Desta forma, sabe-se que a modulação do equilíbrio redox é altamente dependente do
nível de atividade física. Exercícios agudos ou exaustivos provocam estresse oxidativo pela
incapacidade do organismo em combater a enxurrada de EROs produzidas 10.
O exercício não-exaustivo por sua vez, traz como um dos principais benefícios, a in-
dução de leve estresse oxidativo, o que resulta na estimulação da expressão de enzimas
antioxidantes. Isto é mediado pela ativação de vias de sinalização sensíveis ao estado redox
6. Acredita-se que a moderada exposição a EROs seja necessária para induzir a resposta
adaptativa do corpo, como a ativação dos mecanismos de defesa antioxidantes 11.
A regularidade do exercício desempenha papel crucial, pois promove um mecanismo
compensatório ao estresse oxidativo, resultando em supercompensação contra o aumento da
produção de EROs, através do incremento da capacidade antioxidante 11. Exercícios regulares
estimulam as respostas adaptativas e fortalecem o sistema de defesa de antioxidantes en-
dógenos para combater o excesso de EROs, mantendo assim o equilíbrio redox muscular 10.
Além disto, parece que os efeitos oxidativos relacionados ao exercício são sistêmicos.
Exercício agudo intenso aumenta a produção de EROs e a inflamação, enquanto o treina-
mento regular induz incremento antioxidante e anti-inflamatório no fígado de ratos exercita-
dos 12. O músculo esquelético, o fígado e o cérebro têm taxas metabólicas e funções muito
diferentes durante o exercício, mas a resposta adaptativa é muito semelhante, com aumento
da atividade enzimática, menor dano oxidativo e maior resistência ao estresse oxidativo, de-
vido às mudanças na homeostase redox 11. O coração é caracterizado por uma das maiores
taxas de consumo de oxigênio em repouso entre todos os órgãos do corpo. Este consumo é
elevado ainda mais em resposta ao exercício e pode resultar em aumento da produção de
espécies reativas de oxigênio e prejuízo do equilíbrio oxidante-antioxidante. No entanto, o
incremento na produção de EROs é detectável no miocárdio de ratos durante a realização de
exercício agudo 13. Sabe-se que o efeito do exercício sobre o miocárdio e o sistema vascular
é dependente da frequência, intensidade e duração do exercício 14.
A taquicardia induzida eletricamente, que imita os efeitos cardíacos do exercício, diminui
agudamente as atividades das enzimas antioxidantes no ventrículo esquerdo do coração no
rato 15. No entanto os relatos sobre os efeitos do treinamento físico em sistemas cardíacos
antioxidantes enzimáticos e não enzimáticos são inconclusivos 16.
No exercício voluntário de curta duração realizado em roda de corrida, não houve dife-
rença na capacidade antioxidante e o aumento da duração do exercício também não trouxe
modificações na capacidade antioxidante17. No entanto, Mohaddes e col.18, verificaram que

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 233


o exercício voluntário diminui o estresse oxidativo e a peroxidação lipídica no coração e no
sangue de ratos diabéticos. A diferença entre os protocolos de exercício pode explicar os
resultados discordantes. É difícil comparar os resultados da corrida voluntária com outras
modalidades pois a duração e as intensidades desses tipos de exercícios são tipicamente
muito maiores do que a execução voluntária de roda e geralmente são realizadas em perío-
dos de tempo muito mais curtos.
Desta forma, o exercício praticado voluntariamente pelos animais do presente traba-
lho, promoveu as adaptações necessárias, sem gerar prejuízo no metabolismo oxidativo no
coração desses animais.
No entanto em ambos os grupos nos quais os animais foram tratados com EAA, ob-
servou-se que a concentração de substâncias reativas ao ácido tiobarbitúrico aumentou
significativamente no miocárdio e não promoveu alteração da capacidade antioxidante total.
O abuso de EAA está associado a distúrbios cardiovasculares e o estresse oxidativo é
um dos mais potentes indutores de disfunção endotelial e doença cardiovascular 19, 20. A ad-
ministração prolongada de esteróides pode provocar disfunção do complexo da cadeia res-
piratória mitocondrial e mono-oxigenase levando a maior geração de EROs. No trabalho de
Germanakis e col.21 houve diminuição das enzimas antioxidantes como a catalase e aumento
das substâncias reativas ao ácido tiobarbitúrico. Para Chaves e col.22 o uso de EAA aboliu
a proteção induzida pelo exercício e Fortunato e col.23 verificaram que houve diminuição da
cardioproteção cardíaca através do bloqueio das enzimas antioxidantes superóxido dismu-
tase e glutationa peroxidase nos grupos anabolizados, sendo que no grupo treinado sem
anabolizante tal fato não ocorreu. Resultados semelhantes foram encontrados nas pesquisas
de Tanno e col. 24 e Sadowska-Krepa e col. 15.
Desta forma, verificamos no presente estudo que o uso de EAA aumentou a peroxida-
ção lipídica sem incremento da atividade antioxidante total, e que o exercício não promoveu
nenhum tipo de proteção sobre o coração do ponto de vista oxidativo. No presente trabalho
não houve diferença na espessura da parede ventricular esquerda nem do septo interventri-
cular. Pelo fato do uso de EAA ser mais relacionado a modalidades que envolvem potência
e força muscular, os efeitos da sua associação ao treinamento aeróbio sobre a hipertrofia
cardíaca não são muito estudados 24.
Yeater e col.25 mostraram que não houve aumento da espessura da parede ventricular
esquerda e do septo interventricular em indivíduos praticantes de musculação usuários de
EAA. O treinamento aeróbico de ratos em esteira, associado ao tratamento com EAA não
se observou aumento no peso do coração 26. Soares e col. 27
,
Do Carmo e col. 28
e Koike
29
relataram em seus estudos aumento de peso e da espessura do ventrículo esquerdo,
dos corações dos ratos que praticaram a natação associada ao uso de EAA. No protocolo

234 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


desenvolvido por Germanakis e col. 21, foi utilizado apenas o EAA em coelhas adultas, sem
a prática de exercício físico. A análise do tamanho do coração feita por ecocardiograma de-
monstrou hipertrofia da parede ventricular cardíaca esquerda e aumento da fração de ejeção
do coração das coelhas anabolizadas. Bissoli e col.29 trataram ratos com doses supra-fisio-
lógicas de decanoato de nandronola e observaram hipertrofia ventricular esquerda e direita.
Nos estudos citados onde os animais praticaram exercício aeróbico, verificou-se que o
tipo de treinamento e a intensidade podem ter influenciado no processo hipertrófico, já que a
modalidade de exercício e a frequência semanal de treinamento diferem do presente estudo,
apesar destes estudos terem utilizado o mesmo tipo de EAA. Apesar de muitos trabalhos
mostrarem os efeitos protetores do exercício, os mecanismos associados a esse fenômeno
permanecem controversos, sugerindo que o animal utilizado, o tipo e o volume do exercício
influenciariam no nível de proteção e nos mecanismos cardioprotetores ativados29.

CONCLUSÃO

Nossos resultados mostraram que o consumo de EAA decanoato de nandrolona au-


menta a produção de EROs no miocárdio de ratos observada através de sub-produtos da
peroxidação lipídica.
Não observarmos alterações na atividade antioxidante, provavelmente pela utilização
de técnica que avalia o conjunto de antioxidantes, com relação a peroxidação lipídica.
Os resultados relacionados ao metabolismo oxidativo, também permitiram concluir
que o efeito oxidativo do EAA, no miocárdio de ratos é semelhante, tanto em ratos trei-
nados ou sedentários, mostrando que o exercício aeróbico não teve efeito cardioprotetor
frente ao uso de EAA.
Os resultados da análise morfológica mostraram que o EAA na dosagem, frequência e
período de utilização, associado ou não ao exercício físico aeróbico não promove modifica-
ções significativas na espessura do ventrículo esquerdo e do septo interventricular do coração.
Finalmente, pode-se verificar que o EAA decanoato de nandrolona, sozinho ou em
combinação com o exercício físico, é pró-oxidativo no miocárdio de ratos.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 235


REFERÊNCIAS
1. BARONE R, Pitruzzella A, Marino Gammazza A, F, Salerno M, Barone F, et al. Nandrolone
Rappa

decanoate interferes with testosterone biosynthesis altering blood–testis barrier com-


ponents. J Cell Mol Med. 21(8):1636-47; 2017. doi: 10.1111/jcmm.

2. KANAYAMA G, Pope HG Jr. History and epidemiology of anabolic androgens in athletes


and non­-athletes. Mol Cell Endocrinol. 464:4-13; 2018. doi: 10.1016/j.mce.2017.02.039.

3. RADAK Z, Zhao Z, Koltai E, Ohno H, Atalay M. Oxygen Consumption and Usage During Phy-
sical Exercise: The Balance Between Oxidative Stress and ROS-Dependent Adaptive
Signaling. Antioxid Redox Signal. 18(10):1208-46; 2013. doi: 10.1089/ars.2011.4498.

4. NIKOLIC T, Zivkovic V, Jevdjevic M, Djuric M, Jeremic N, Djuric D, et al. The effects of chro-
nic administration of nandrolone decanoate on redox status in exercised rats. Mol Cell
Biochem., 411(1-2):95-105; 2016. doi: 10.1007/s11010-015-2571-3.

5. MARSH JD, Lehmann MH, Ritchie RH, Gwathmey JK, Green GE, Schiebinger RJ. Androgen
receptors mediate hypertrophy in cardiac myocytes. Circulation. 98(3):256-61, 1998. doi:
10.1161/01.cir.98.3.256.

6. BEJMA J, Ramires P, Ji LL. Free radical generation and oxidative stress with ageing and
exercise: differential effects in the myocardium and liver. Acta Physiol Scand. 169(4):343-
51, 2000. doi: 10.1046/j.1365-201x.2000.00745.x.

7. WINTERBOURN CC, Gutteridge JM, Halliwell B. Doxorubicin-dependent lipid peroxidation


at low partial pressures of O2. J Free Radic Biol Med.;1(1):43-49, 1985. doi: 10.1016/0748-
5514(85)90028-5.

8. RE R, PELLEGRINI N, Proteggente A, Pannala A, Yang M, Rice-Evans C. Antioxidant activi-


ty applying an improved ABTS radical cation decolorization assay. Free Radic Biol Med.
26(9-10):1231-7, 1999. doi: 10.1016/s0891-5849(98)00315-3.

9. BISSOLI NS, Medeiros AR, Santos MC, et al. Long-term treatment with supraphysiological
doses of nandrolone decanoate reduces the sensitivity of Bezold-Jarisch reflex con-
trol of heart rate and blood pressure. Pharmacol Res. 59(6):379-84, 2009. doi: 10.1016/j.
phrs.2009.03.001.

10. NIKOLIC TR, Zivkovic VI, Srejovic IM, Radovanovic DS, Jeremic NS, Jevdjevic MD, et al. Acute
effects of nandrolone decanoate on cardiodynamic parameters in isolated rat heart. Can
J Physiol Pharmacol. 94(10):1048-57, 2016. doi: 10.1139/cjpp-2015-0571.

11. DEBEVEC T, Millet GP, Pialoux V. Hypoxia-Induced Oxidative Stress Modulation with
Physical Activity. Front Physiol. 8:84, 2017. doi: 10.3389/fphys.2017.00084.

12. RADAK Z, Ishihara K, Tekus E, Varga C, Posa A, Balogh I, et al. Exercise, oxidants, and
antioxidants change the shape of the bell-shaped hormesis curve. Redox Biol. 12:285-90,
2017. doi: 10.1016/j.redox.2017.02.015.

13. PILLON Barcelos R, Freire Royes LF, Gonzalez-Gallego J, Bresciani G. Oxidative stress and
inflammation: liver responses and adaptations to acute and regular exercise. Free Radic
Res. 51(2):222-36, 2017. doi: 10.1080/10715762.2017.1291942.

236 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


14. DUNCKER DJ, Bache RJ. Regulation of Coronary Blood Flow During Exercise. Physiol
Rev. 88(3):1009-86, 2008. doi: 10.1152/physrev.00045.2006.

15. BEJMA J, Ramires P, Ji LL. Free radical generation and oxidative stress with ageing and
exercise: Differential effects in the myocardium and liver. Acta Physiol Scand. 169(4):343-
51, 2000. doi: 10.1046/j.1365-201x.2000.00745.x.

16. SADOWSKA-KRĘPA E, Kłapcińska B, Jagsz S, Sobczak A, Chrapusta SJ, Chalimoniuk M,


et al. High-dose testosterone propionate treatment reverses the effects of endurance
training on myocardial antioxidant defenses in adolescent male rats. Cardiovasc Toxicol.
11(2):118-27, 2011.

17. SELMAN C, McLaren JS, Collins AR, Duthie GG, Speakman JR. Antioxidant enzyme activi-
ties, lipid peroxida­tion, and DNA oxidative damage: the effects of short-term voluntary
wheel running. Arch Biochem Biophys. 401(2):255-61, 2002.

18. NADERI R, Mohaddes G, Mohammadi M, Ghaznavi R, Ghyasi R, Vatankhah AM. Voluntary


exercise protects heart from oxidative stress in diabetic rats. Adv Pharm Bull. 5(2):231-6,
2015. doi: 10.1016/S0003-9861(02)00050-4.

19. TOFIGHI A, Shirpoor M, Ansari MH, Shirpoor A, Zerehpoosh M. The effect of nandrolone
treatment with and without enforced swimming on histological and biochemical chan-
ges in the heart and coronary artery of male rats. Anatol J Cardiol. 17(3):176-83, 2017.
doi: 10.14744/AnatolJCardiol.2016.7333.

20. GERMANAKIS I, Tsarouhas K, Fragkiadaki P, Tsitsimpikou C, Goutzourelas N, Champsas


MC, et al. Oxidative stress and myocardial dysfunction in young rabbits after short
term anabolic steroids administration. Food Chem Toxicol. 61:101-5, 2013. doi:10.1016/j.
fct.2013.03.018.

21. CHAVES EA, Fortunato RS, Carvalho DP, Nascimento JH, Oliveira MF. Exercise-induced
cardioprotection is impaired by anabolic steroid treatment through a redox-dependent
mechanism. J Steroid Biochem Mol Biol. 138:267-72, 2013 doi:10.1016/j.jsbmb.2013.06.006,

22. TANNO AP, das Neves VJ, Rosa KT, Cunha TS, Giordano FC, Calil CM, et al. Nandrolone
and resistance training induce heart remodeling: role of fetal genes and implications
for cardiac pathophysiology. Life Sci. 89(17-18):631-7, 2011. doi: 10.1016/j.lfs.2011.08.004.

23. YEATER R, Reed C, Ullrich I, Morise A, Borsch M. Resistance trained athletes using or not
using anabolic steroids compared to runners: effects on cardiorespiratory variables,
body composition, and plasma lipids. Br J Sports Med. 30(1):11-14, 1996. doi: 10.1136/
bjsm.30.1.11.

24. PEREIRA-JUNIOR PP, Chaves EA, Costa e Sousa RH, Masuda MO, de Carvalho AC, Nasci-
mento JH. Cardiac auto­nomic dysfunction in rats chronically treated with anabolic steroid.
Eur J Appl Physiol. 2006;96(5):487-494, 2006. doi: 10.1007/s00421-005-0111-7.

25. SOARES MC, Abreu IC de, Assenço F, Borges MO. Decanoato de nandrolona aumenta
a parede ventricular esquerda, mas atenua o aumento da cavidade provocado pelo
treinamento de natação em ratos. Rev Bras Med Esporte. 17(6):420-4, 2011. doi:10.1590/
S1517-86922011000600011.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 237


26. DO CARMO EC, Fernandes T, Koike D, Da Silva ND Jr, Mattos KC, Rosa KT, et al. Anabolic
Steroid Associated to Physical Training Induces Deleterious Cardiac Effects. Med Sci Sport
Exerc. 2011;43(10):1836-48. doi: 10.1249/MSS.0b013e318217e8b6.

27. KOIKE DC. Efeitos do treinamento físico no balanço autonômico e parâmetros cardio-
vasculares de ratos submetidos ao uso de esteróides anabólicos. [Dissertação de mestra-
do] - Programa de Pós-Graduação em Educação Física. São Paulo: Universidade São Judas
Tadeu. 2009. [access in 2017 July 19]. Available in: https://www.usjt.br/biblioteca/mono_disser/
mono_diss/106.pdf.

28. BISSOLI NS, Medeiros AR, Santos MC, Busato VC, Jarske RD, Abreu GR, et al. Long-term
treatment with supraphysiological doses of nandrolone decanoate reduces the sensi-
tivity of Bezold-Jarisch reflex control of heart rate and blood pressure. Pharmacol Res.
59(6):379-84, 2009. doi: 10.1016/j.phrs.2009.03.001.

29. WILLIAMS CA. The effect of oxidative stress during exercise in the horse. J Anim Sci.
94(10):4067-75, 2016. doi: 10.2527/jas.2015-9988.

238 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


18
“ Dismorfia muscular praticantes
de musculação: O caso de uma
instituição universitária no
Tocantins

João Francisco Severo Santos

João Vitor Silveira Santos

Fernanda Alves Silva Severo

10.37885/201102209
RESUMO

A Dismorfia Muscular (DM) é caracterizada por um conjunto de sintomas comportamentais


que refletem a excessiva preocupação com a aparência corporal, especificamente, com
a massa muscular. Os comportamentos associados à DM são considerados perigosos
a saúde física e mental. O objetivo desse estudo foi verificar a prevalência de sintomas
associados à DM, o nível de insatisfação com a imagem corporal e o padrão de silhueta
corporal desejado por estudantes do ensino superior, praticantes de musculação, em
uma instituição universitária de Palmas-TO. Participaram do estudo 55 universitários,
praticantes de musculação, do sexo masculino, selecionados por conveniência. Utilizou-
se um questionário de três blocos contendo o teste de “complexo de Adônis” e o teste
perceptivo de silhuetas corporais propostos por Pope. Os dados revelaram um elevado
grau de preocupação com a imagem corporal e insatisfação com a mesma. Conclui-se
que a autoimagem distorcida e os graves sintomas de DM parecem ser muito comuns
entre os praticantes de musculação dessa instituição de ensino superior.

Palavras-chave: Dismorfia Muscular, Universitários, Exercício Físico .


INTRODUÇÃO

Anualmente milhares de pessoas ingressam e frequentam academias de musculação


para a prática do treinamento de força visando como resultados a hipertrofia muscular e o
emagrecimento. Segundo Malta et al., (2009), o inquérito nacional por entrevista telefônica
constatou que a musculação é a terceira atividade física de lazer mais praticada por pessoas
do sexo masculino a partir dos 15 anos de idade no Brasil. A prevalência de praticantes
dessa modalidade, entre as pessoas fisicamente ativas do sexo masculino varia de 8,2 % a
18,8% conforme a localização geográfica (unidades da federação) e a faixa etária.
Embora os objetivos estéticos ocupem apenas a terceira colocação entre as razões
para a pratica da musculação (Malta et al, 2009), diversos estudos relatam que praticantes
dessa modalidade apresentam grande exposição ao uso de substancias ilícitas e suplemen-
tos alimentares com o objetivo de alterar a silhueta corporal, quer seja para emagrecer, quer
seja para desenvolver massa muscular. Assim, a busca pelo corpo “ideal” masculino parece
estar relacionada ao desenvolvimento exagerado dos músculos e, por isso, muitos que al-
mejam esse objetivo são atraídos para fazer uso indiscriminado de esteroides anabólicos e
suplementos alimentares (Beilharz et al., 2017; Nogueira et al, 2015; Cardoso & Cardoso,
2014; Ribas Filho et al, 2014).
A excessiva preocupação com a aparência tem aumentado a insatisfação das pessoas
com sua imagem corporal e isso pode estar correlacionado com a procura cada vez maior de
atividades físicas adequadas aos fins estéticos, entre elas, a musculação (Albino & Macedo,
2014; Severo Santos et al, 2014; Iriart et al, 2009). O desenvolvimento acentuado da mas-
sa muscular somado a um reduzido percentual de gordura corporal tem sido associado,
historicamente, ao padrão ideal de beleza masculina e, atualmente, esse padrão estético
tem sido frequentemente veiculado pelos meios de comunicação de massa, promovendo e
reforçando o desejo por um “corpo perfeito”, que é inatingível para a maioria das pessoas
pelas vias “naturais” de treinamento e nutrição (Cardoso & Cardoso, 2014; Ferraz, 2009).
Nesse contexto, a Dismorfia Muscular (DM) configura uma condição específica do
espectro dos Transtornos Dismórficos Corporais cuja principal característica é a obsessão
pela prática de exercícios físicos com o objetivo de aumentar a massa muscular (Nunes
et al., 2007; Malcolm et al., 2018). Assim, o portador desse transtorno se comporta como
uma espécie de viciado em atividades físicas, agindo compulsivamente, a ponto de causar
prejuízos em sua vida profissional e social (Frias et al., 2015; Grace et al., 2017; Kanayama
et al., 2003; Sardinha et al., 2008).
De acordo com Pope et al. (2000), uma das consequências da DM é a percepção
distorcida da real silhueta ou forma corporal. Recente revisão sistemática conduzida por
Dos Santos et al. (2015) revelou que esse transtorno ainda não tem condições de validade

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 241


nosológica para que seja catalogada como doença no compendio internacional de psiquiatria,
embora a APA (2013) reconheça que o mesmo está associado a outros distúrbios que podem
levar a sérios problemas psíquicos como depressão, bulimia, anorexia, entre outros. Nesse
sentido, conforme Talih et al. (2007), a DM merece especial atenção dos profissionais de
educação física que atuam em academias de musculação, pois esse transtorno tem mostrado
frequente relação com o uso de substancias ilegais que podem resultar em sérios prejuízos á
saúde física e mental dos usuários. Além disso, segundo Tod et al. (2016), embora existam
muitos estudos a respeito da frequência de sintomas de DM em populações de não atletas,
ainda há grande carência de estudos epidemiológicos de grande porte e, por isso, estudos
com pequenos escopos se justificam para que haja avanço do conhecimento desse tema
ainda repleto de incertezas.
Nesse contexto, o objetivo desse estudo foi verificar a prevalência de sintomas asso-
ciados à DM, o nível de insatisfação com a imagem corporal e o padrão de silhueta corporal
desejado por estudantes do ensino superior, praticantes de musculação, em uma instituição
universitária de Palmas-TO.

METODOS E TÉCNICAS

A pesquisa teve caráter exploratório e delineamento descritivo correlacional. Participaram


do estudo 55 universitários praticantes de musculação do sexo masculino que atendiam aos
seguintes critérios inclusão: os indivíduos deveriam ter entre 17 e 35 anos de idade, estar
residindo na zona urbana do município de Palmas-TO no período em que foram realizadas
as coletas de dados, estar praticando musculação ininterruptamente há pelo menos seis
meses com frequência às sessões de musculação de, no mínimo, três vezes semanais.
Voluntários que não atenderam a qualquer um dos critérios de inclusão foram excluídos da
coleta de dados.
A coleta de dados ocorreu através de um questionário composto por três blocos: o
primeiro bloco conteve quatro questões solicitando informações antropométricas (peso e
estatura), idade e tempo de prática da modalidade; O segundo bloco foi composto pelo teste
de “complexo de Adônis” proposto por Pope et al. (2000), o qual contém 13 questões de
múltipla escolha com escalas do tipo likert de três pontos. Sua finalidade foi coletar informa-
ções sobre os sintomas comportamentais de DM e os classificar segundo sua frequência,
em conformidade com os quatro escores padronizados expostos no quadro 1.

242 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Quadro 1. - Escores e classificação do somatório de pontos do questionário de Pope et al. (2000) em relação aos sintomas
de DM que configuram o grau de preocupação com a imagem corporal
PONTUAÇÃO GRAU DE PREOCUPAÇÃO
0–9 Preocupação leve
10 – 19 Preocupação moderada

20 – 29 Preocupação grave
30 – 39 Preocupação possivelmente patológica
Fonte: Pope et al., (2000).

Para atender ao objetivo desse estudo, os sujeitos foram classificados em apenas duas
categorias: 1) Potencialmente Dismórficos (PD), os sujeitos cujos sintomas de preocupa-
ção com a imagem corporal são graves ou patológicos; e Não potencialmente Dismórficos
(ND), os sujeitos cujos sintomas de preocupação com a imagem corporal são leves ou
moderados, adotando como ponto de corte o escore de vinte pontos proposto na escala de
Pope et al. (2000).
Por fim, o terceiro bloco apresentou o teste perceptivo de silhuetas corporais (matriz
somatomórfica) proposto por Pope et al. (2009). Conforme De Silva e Viana (2016), esse
teste foi configurado como uma escala de silhuetas corporais composta por 12 figuras que
representam diversas formas de contorno corporal, abrangendo desde uma silhueta muito
magra e com baixíssima hipertrofia muscular (silhueta 1 = Fileira 1 da coluna A), até uma
silhueta grande (obeso) e com extrema hipertrofia muscular (silhueta 12 = Fileira 3 da colu-
na D), simbolizando, assim, um indicador da imagem corporal que pode ser utilizada para
verificação do grau de (in)satisfação dos sujeitos com a sua imagem corporal. Para isso,
cada voluntário respondeu duas questões relativas à matriz somatomórfica: na primeira os
participantes deveriam assinalar a imagem que melhor representava seu corpo; na segunda
questão, a imagem que representava o corpo que o voluntário gostaria de aparentar.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 243


Figura 1. Silhuetas do teste de autoimagem corporal. O grau de hipertrofia do tecido adiposo e representado nas fileiras
e o da massa muscular nas colunas. Fonte: adaptado de Pope et al., (2009).

O grau de satisfação com a silhueta corporal (GSSc) foi obtido pela subtração entre
silhueta corporal desejada (Scd – cuja figura correspondia à silhueta que a pessoa gostaria
de possuir) e silhueta corporal atual (Sca - cuja figura correspondia à silhueta que melhor
representava seu corpo). Esse GSSc demonstra a magnitude da insatisfação com a silhueta
corporal; dessa forma, a magnitude pode ser positiva, caso o indivíduo queira aumentar a
silhueta corporal, ou pode ser negativa, caso o indivíduo queira diminuir a silhueta. Para a
caracterização da insatisfação corporal, sem levar em conta indivíduos que queriam aumentar
ou diminuir, o GSSc foi também utilizado em módulo [GSSc]. Assim, foram considerados: a)
Satisfeitos (Sa) – indivíduos onde não houvesse diferença entre a silhueta desejada a silhueta
autorreferida; b) Ligeiramente insatisfeitos (LI) – indivíduos cuja diferença entre a silhueta
desejada a silhueta autorreferida fosse menor ou igual a dois pontos; c) Substancialmente
insatisfeitos (SI) – indivíduos cuja diferença entre a silhueta desejada a silhueta autorreferida
fosse maior que dois pontos.
A coleta de dados ocorreu no período de três semanas letivas após a autorização da
direção da instituição de ensino superior. O procedimento adotado para acessar os possí-
veis participantes foi solicitar permissão de cada professor, que estava ministrando aulas na
semana de coleta, para ocupar um breve período de sua aula para expor o motivo da visita,
os objetivos da pesquisa e os critérios de inclusão, ressaltando que, não era obrigatória a
participação daqueles que se enquadrassem em tais critérios. Também foi informado que

244 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


os dados seriam usados apenas para fins estatísticos e em conjunto no sentido de garantir
o sigilo das informações prestadas individualmente.
Os dados da pesquisa foram coletados somente após cada voluntário receber e assinar
duas cópias do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), sendo que, uma das
copias do TCLE deveria ser devolvida ao pesquisador a fim de arquivar tal documento confor-
me orientação do comitê de ética em pesquisas com seres humanos do Centro Universitário
Luterano de Palmas (Parecer de aprovação nº 026/2011 do CEP/CEULP).
Os dados foram tabulados e armazenados no programa Excel for Windows para, poste-
riormente, serem analisados à luz da estatística descritiva no pacote Paleontological Statistics-
PAST, Version 2.01. Foram utilizados testes estatísticos não paramétricos de Kendall’s Tau
(τ) correlação entre as variáveis, bem como os Testes U de Mann-Whitney (μ), qui-quadrado
(χ²) e Exato de Fisher para verificar se havia diferenças significativas entre as categorias.

RESULTADOS

O perfil dos praticantes envolvidos no estudo é caracterizado por sujeitos adultos jovens,
com experiência de aproximadamente um ano e meio de treinamento e frequência supe-
rior a quatro treinos por semana (Tabela 1). Constatou-se que nenhum participante relatou
frequência acima de seis treinos semanais, o que pode indicar, segundo as características
comportamentais associadas à DM, a inexistência de um dos principais sintomas patológicos
desse transtorno entre os participantes desse estudo.

Tabela 1. Medidas de tendência central e dispersão de acordo com as características de faixa etária, de experiência e de
frequência nos treinos semanais entre os participantes da pesquisa.
Características Média Desvio Padrão Mínimo Máximo
Idade (anos) 23,2 3,84 17 32
Tempo de treinamento (meses) 17,5 14,26 6 72
Frequência semanal de treino 4,2 0,86 3 6

Na tabela 2 são apresentados os resultados do teste de DM e silhuetas corporais


ajustados as variáveis categóricas. Nesse sentido, os dados revelam que a maioria dos
participantes (83,6%) apresenta elevado grau de preocupação com a imagem corporal. Toda
via, nenhum dos sujeitos foi classificado no grau patológico (escore superior a 29 pontos no
teste de DM). Verificou-se também que todos os participantes apresentam algum grau de
insatisfação com sua silhueta corporal, porém, a maioria dos participantes (56,4%) relatou
ligeira insatisfação. Esse resultado indica que os sintomas comportamentais de DM podem
ser independentes da insatisfação com a silhueta corporal, indício este confirmado pelo fraco
resultado da correlação entre essas variáveis (τ = 0,33; p=0,09).

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 245


Tabela 2. Distribuição dos praticantes potencialmente (PD) e não potencialmente (ND) Dismórficos, ligeiramente (LI)
e substancialmente (SI) insatisfeitos com sua silhueta corporal estratificado por faixa etária, tempo de treinamento e
frequência semanal.
ND PD LI SI
Características
F (%) f (%) F (%) f (%)
Idade
00 00 07 100 04 57,1 03 42,9
Até 19 anos
02 7,6 24 92,3 16 61,5 10 38,5
De 19 a 24 anos
07 31,8 15 68,2 11 50 11 50
Acima de 24 anos
Tempo de treinamento
07 25,9 20 74,1 17 63 10 37
Até 01 ano
01 9,1 10 90,9 10 55,6 08 44,4
De 01 a 02 anos
01 5,9 16 94,1 04 40 06 60
Acima de 02 anos
Freq. semanal de treino
04 28,6 10 71,4 07 50 07 50
Até 03 treinos
05 12,2 36 87,8 24 58,5 17 41,5
Acima de 03 treinos
09 16,4 46 83,6 31 56,4 24 43,6
Total
*Nenhuma diferença estatisticamente significativa foi identificada entre as categorias.

Quando ajustadas às variáveis categóricas, a proporção de sujeitos PD (sintomas


comportamentais graves) não diferiu estatisticamente (µ= 574; p= 0,9) daqueles com pou-
cos sintomas de DM, embora a diferença bruta entre as proporções tenha sido substan-
cial. O mesmo ocorreu com os dados de insatisfação com a silhueta corporal (µ= 79; p= 0,6).
Nesse sentido, também não foram encontradas diferenças e associações estatisticamente
significativas entre os resultados das diferentes variáveis categóricas analisadas.
Percebe-se que a há um equilibro entre aqueles praticantes que desejam reduzir e
aqueles que desejam aumentar a sua silhueta corporal (Tabela 3). Nenhuma influência de
faixa etária, tempo de treinamento ou número de sessões semanais de treinamento foi de-
tectada, uma vez que o teste exato de Fisher (F ≥ 0,43) não constatou nenhuma diferença
estatisticamente significativa entre os grupos.

Tabela 3. Distribuição percentual dos praticantes com desejo de aumentar ou diminuir sua silhueta corporal estratificada
por faixa etária, tempo de treinamento e frequência semanal
Diminuir Aumentar
Características*
f (%) F (%)
Idade
03 42,9 04 57,1
Até 19 anos
11 42,3 15 57,7
De 19 a 24 anos
14 63,6 08 36,4
Acima de 25 anos
Tempo de treinamento
14 51,9 13 48,1
Até 01 ano
08 44,4 10 55,6
De 01 a 02 anos
06 60 04 40
Acima de 02 anos

Frequência semanal de treino


09 64,3 05 35,7
Até 03 treinos
19 46,3 22 53,7
Acima de 03 treinos
28 50,9 27 49,1
Total

*Nenhuma diferença estatisticamente significativa foi identificada.

Com relação à silhueta considerada mais atraente e almejada como objetivo a ser
alcançado no conjunto dos participantes, as silhuetas 3 e 4 (fig. 1) foram as mais votadas
como apresentado na figura 2. Estas, por sua vez, configuram silhuetas com excesso de

246 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


massa muscular e maior definição, ou seja, baixo percentual de gordura corporal. Verifica-
se, portanto, que os entrevistados afirmam que o corpo mais atraente e desejado por eles
seria aquele que mostrasse músculos volumosos com contornos facilmente visíveis e iden-
tificáveis, silhuetas estas que muito comumente são apresentadas pela mídia como padrão
de perfeição corporal masculina.

Figura 2. Frequência de escolha das Silhuetas que representam o tipo de corpo mais desejado como objetivo a ser
alcançado pelos praticantes de musculação participantes do estudo.

14
12
10
Frequência

8
6
4
2
0
2 3 4 6 7 8
Silhueta

Percebe-se que certos comportamentos prejudiciais à saúde apresentam elevada pro-


porção (Tabela 4). Em especial, destacam-se os comportamentos relacionados à ingestão
de substâncias supostamente ergogênicas, uma vez que 24% dos participantes relataram
fazer uso de drogas ilícitas e, no total, 35% admitem usar algum tipo de droga com o objetivo
específico de melhorar a aparência corporal. Outra informação que chama a atenção está
relacionada à ingestão de alimentos especiais e/ou suplementos nutricionais, já que 56%
dos praticantes relatam fazer uso de tal estratégia a fim de melhorar sua aparência corporal.
A adoção de atitudes extremas, além da ingestão de drogas, para mudar a aparência
corporal foi relatada por um em cada quatro participantes do estudo. Essas atitudes incluem
excesso de exercícios, inclusive quando acometido por lesões, práticas de jejum ou outros
métodos purgativos, técnicas não convencionais para o desenvolvimento muscular e/ou
crescimento muscular, além do uso de métodos que supostamente promovem crescimento
do cabelo e/ou aumento do comprimento peniano.
Observou-se também uma relação estatisticamente significativa entre medidas ex-
tremas para mudar/manter a aparência corporal (χ² = 9,99; p= 0,002), ingestão de drogas
e suplementos nutricionais (χ² = 9,97; p= 0,004) e insatisfação substancial com a imagem

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 247


corporal, sugerindo que os sujeitos com substancial insatisfação apresentam, aproximada-
mente, três vezes mais chances de adotar medidas extremas e/ou fazer uso de drogas e
suplementos nutricionais.

Tabela 4. - Frequência e proporção de cada sintoma comportamental relacionado à DM entre os participantes da pesquisa.
Sintomas Comportamentais f %
Tempo gasto com preocupações sobre a aparência maior que 60 min/dia. 27 49
Frequentemente triste, ansioso ou deprimido por causa da aparência. 12 22

Frequentemente evita que outras pessoas vejam seu corpo ou parte dele. 11 20

Tempo gasto com ações para melhorar a aparência maior que 60 min/dia. 37 67

Tempo gasto com atividades físicas para fins estético maior que 120 min/dia. 9 16

Frequentemente ingere alimentos especiais ou suplementos nutricionais. 31 56

Problemas financeiros devido a gastos com produtos e serviços estéticos. 10 18

Frequentemente as atividades estéticas tolhem os relacionamentos sociais 31 56

Ingestão drogas legais (prescrição médica) para melhorar a aparência 06 11

Ingestão drogas ilegais (sem prescrição médica) para melhorar a aparência 13 24

Adoção de medidas extremas (exclusos drogas) para mudar a aparência corporal 14 25

DISCUSSÃO

A imagem corporal pode ser entendida como a figuração na mente, mas ela não está
atrelada somente aos aspectos mentais, sendo, portanto, um constructo multifacetado for-
mado por aspectos fisiológicos, libidinais e sociais (Bégin et al., 2019; Malcolm et al., 2018;
Schilder, 1999). Nesse sentido, o presente estudo constatou que os participantes potencial-
mente dismórficos são cinco vezes mais prevalentes do que os não dismórficos. Contudo, a
maioria dos participantes (56,4%) apresentou ligeira insatisfação com sua imagem corporal
(Tabela 2). Dessa forma, revelou-se uma fraca associação e não significativa (τ = 0,33;
p=0,09) entre as duas variáveis. Isso sugere que os comportamentos relacionados a DM po-
dem resultar em configurações corporais que reduzem a insatisfação com a autoimagem.
Tais constatações não foram observadas em outros estudos sobre DM, com diferentes
populações, mas dentro da faixa etária de inclusão desse estudo (Longobardi et al., 2017;
Schneider et al., 2017; De Mello; Liberali, 2014; Damasceno et al, 2012; Bezarra, 2010;
Boas et al., 2010).
Os estudos sobre insatisfação corporal com praticantes de musculação demonstram que
o grau e a proporção de sujeitos insatisfeitos variam muito em relação aos diferentes ambien-
tes e regiões (Schneider et al., 2017; Floriano & D’Almeida, 2016; Frias et al., 2015). Apesar
das diferenças metodológicas entre os diversos estudos de levantamento sobre sintomas
de DM, os resultados encontrados entre os participantes desse estudo são preocupantes,
uma vez que 43,6% dos sujeitos estavam substancialmente insatisfeitos com sua imagem

248 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


corporal (Tabela 2). Isso é reforçado quando se observa que a totalidade dos participantes
desejam mudar sua silhueta corporal, quer seja para aumentar sua massa muscular, quer
seja para reduzir sua massa adiposa (Tabela 3).
Um estudo realizado, no interior de São Paulo, por Sant Ana e Teixeira-Arroyo (2011),
com 18 praticantes de musculação do sexo masculino, na faixa etária dos 21 aos 40 anos,
relatou que apenas 22,2% dos sujeitos estavam insatisfeitos com sua imagem corporal.
Outro estudo, conduzido por Boas et al., (2010), utilizou diversos instrumentos para medir
a satisfação com a imagem corporal de 50 praticantes de musculação do sexo masculino
com idades entre 18 e 40 anos, da cidade de Maringá-PR, constatou que cerca de 36%
dos sujeitos estavam insatisfeitos com sua imagem corporal. Já no interior do Rio Grande
do Sul, Souza e Ceni (2014) observaram que entre 43 homens praticantes de musculação,
cerca de 40,2% apresentam substancial insatisfação com sua silhueta corporal. Por fim,
Damasceno et al.(2012), no interior de MG, onde 67,5% dos homens frequentadores de
academia apresentavam essa característica, sendo que apenas 22,02% estavam satisfeitos
com sua imagem corporal.
Apesar de não haver nenhum atleta de fisiculturismo entre os participantes do presente
estudo, a proporção de pessoas que admitem uso de drogas lícitas (11%) e ilícitas (24%) é
preocupante (Tabela 4). De acordo com Haliburn (2018), estudos internacionais demonstra-
ram que 4 (quatro) entre 9 (nove) indivíduos com DM desenvolvem esse quadro após o uso
de esteroides anabolizantes, sugerindo que estes possam estar relacionados às alterações
na percepção da imagem corporal. Ademais, a DM acomete cerca de 10% dos praticantes
de exercícios e esportes e, entre os fisiculturistas, essa prevalência chega a 84%. Segundo
Estevão e Bagrichevsky (2004) para compor a construção desses corpos hiperbólicos, lan-
ça-se mão do uso frequente de drogas sintéticas, os esteroides anabolizantes. Esta inges-
tão abusiva de anabolizantes pode trazer prejuízos à massa muscular em longo prazo e os
estimulantes utilizados incluem vários tipos de drogas que aumentam a atividade orgânica
principalmente por seus efeitos no sistema nervoso central, músculos lisos e esqueléticos.
Os resultados descritos acima reforçam a tese de que a aparência física do ser humano
é construída culturalmente e o corpo se adapta de acordo com padrões sociais estabelecidos
por convenção, promovendo modelos padronizados do que é belo e aceitável naquele con-
texto (Summers et al., 2017; Adami et al., 2008; Aguiar, 2003). Essa afirmação ficou muito
visível na silhueta mais escolhida como objetivo a ser alcançado pelos participantes desse
estudo (Fig. 2). Nesse sentido, Damasceno et al. (2005) afirmam que há forte pressão social
para que as mulheres apresentem um corpo alto e magro, ao passo que para os homens, o
padrão da silhueta corporal corresponde a músculos com grande grau de desenvolvimento,
muitas vezes alcançados somente com o uso de substâncias ergogênicas.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 249


Nesse contexto, pode-se afirmar que os dados mais impactantes relativos aos sintomas
comportamentais levantados nessa pesquisa foram os relacionados ao uso de substâncias
ergogênicas, uma vez que 35% dos participantes admitiram o uso de drogas visando a melho-
ria da aparência corporal (Tabela 4). Esse resultado vai de encontro às previsões de Moreno
(2008), bem como de Mota e Aguiar (2011), no sentido de que a crescente preocupação com
a estética e, consequentemente, com a imagem corporal, desperta nos indivíduos o interesse
em obter o “inalcançável” da maneira mais rápida possível. A preocupação se agrava com
a constatação de que 24% dos participantes afirmaram ter utilizado anabolizantes e demais
substâncias ilegais para modificar ou manter o quadro estético em que se encontram (Tabela
4). Considerando que o uso de drogas no Brasil é um tabu, inclusive uma transgressão legal,
supõe-se que o quadro apresentado nesse estudo seja muito subestimado devido ao receio
dos participantes à exposição de seus “segredos” nas respostas.
Segundo Sagoe et al. (2014), a prevalência média de consumo de anabolizantes ao
longo da vida, em escala mundial, esta estimada em 3,3%. Essa taxa apresenta diferenças
significativas entre os sexos: 6,4% para homens e 1,6% para mulheres. Outras categorias
de análise apresentam diferenças menos substanciais como demonstra o ranking a seguir:
esportistas recreacionais (18,4%), atletas (13,4%), prisioneiros e detidos (12,4%), toxicode-
pendentes (8,0%) e estudantes do ensino médio (2,3%). Abrahin et al. (2013) constatou que
31,6% dos estudantes e professores de educação física, que atuavam em academias de
Belém do Pará, já utilizaram ou utilizam essas substâncias. Pope et al.(2014) estimam que
aproximadamente 22% dos usuários de anabolizantes iniciem seu uso antes dos 20 anos.
O uso de drogas pode estar relacionado a outro comportamento inadequado à saúde,
que é a adoção de medidas extremas para mudar a aparência corporal (Toh et al, 2017).
Esse comportamento foi relatado por 25% dos praticantes de musculação envolvidos no
presente estudo e inclui prática excessiva de exercícios mesmo diante de um quadro de
lesão (Tabela 4). Para Alonso (2006), a liberação do hormônio endorfina pode inibir a sen-
sação de dor, cansaço causado pelo exercício intenso e prolongado, podendo levar a uma
dependência, pois quanto mais exercícios esses indivíduos realizam, maior a quantidade de
endorfina liberada na corrente sanguínea aumentando a sensação de prazer.
De acordo com Quadros (2010), a crescente insatisfação com a imagem corporal pro-
move à elevação do tempo dedicado a prática de atividades físicas destinadas a estética
corporal no sentido de reduzir tal insatisfação. Assim, a excessiva prática de exercícios
também pode estar relacionada ao consumo de suplementos e anabolizantes como sugere
o estudo de Ferrarezzi et al.(2010), que constatou elevado uso de recursos ergogênicos em
homens com indícios de dependência de exercícios físicos. Isso não se confirmou no presente

250 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


estudo, uma vez que o uso de suplementos e drogas (Tabela 4) mostrou-se independente
do tempo dedicado aos treinos diários (χ²=0,074; p=0,9).
No presente estudo, o tempo dedicado às práticas de atividades físicas com fins es-
téticos não configurou um risco relevante, uma vez que entre os critérios de inclusão dos
participantes na pesquisa, a prática de exercícios físicos em ambiente de academia (muscu-
lação) era uma exigência. Dessa forma, esperava-se previamente que todos os participantes
computassem tempo substancial nesse quesito. Ainda assim, apenas 16% dos participantes
relataram dedicar mais de 120 minutos diários á prática desses exercícios, o que não con-
figura um quadro típico de dependência ao exercício, mas apenas um sinal de alerta.
Outro dado relevante diz respeito ao uso de suplementos e/ou alimentos especiais,
uma vez que 56% dos sujeitos relataram esse comportamento (Tabela 4). Os indivíduos
que tomam suplemento quase sempre visam o ganho de massa muscular, emagrecimento,
aumento na ingestão de calorias, melhoria da performance, recuperação muscular, reposição
de eletrólitos e outros objetivos, tais como o aumento da testosterona e compensação da
má alimentação (Alves e Navarro, 2010). Essa alta proporção de usuários de suplementos
nutricionais entre praticantes de atividades físicas em ambiente de academia parece ser
frequente nessa população, variando de 26,7% a 80% de acordo com as características
sociodemográficas e de localização geográfica (Bégin et al., 2019; Schneider et al., 2017;
Albuquerque, 2014; Sagoe D.S. et al., 2014; Pope et al., 2014; Ribas Filho et al., 2014,
Severo Santos et al., 2011).
De acordo com Pereira (2014), o hábito de praticar exercício físico aliado à utilização de
ergogênicos nutricionais ou farmacológicos vem crescendo consideravelmente nos últimos
anos. Seja por motivos estéticos ou visando à melhora de algum aspecto do desempenho,
esportistas consomem em grande quantidade estes produtos. Para ilustrar, Ribas Filho et al.
(2014) realizou um estudo no qual foram avaliados 229 praticantes de musculação de sete
cidades do Nordeste e Noroeste paulista. Destes 43,6% utilizavam ergogênicos nutricio-
nais, sendo que os suplementos mais utilizados foram: ricos em proteína, aminoácidos de
cadeia ramificada, ricos em carboidratos e creatina. Outro estudo realizado no interior do
Ceará, por Albuquerque (2014), constatou que o uso de suplementos foi admitido por 76,6%
dos praticantes de atividades físicas de academias, sendo que, a maioria dos entrevista-
dos (93,9%) declararam estar satisfeitos com os resultados dos suplementos alimentares.
Também, Moreira; Rodrigues (2014) constataram que 31,7% dos praticantes de exercícios
em academias, da cidade de Pelotas-RS, utilizavam algum tipo de suplemento alimentar,
sendo em sua maioria homens (78,9%). Os Aminoácidos ou concentrados proteicos foram
os mais consumidos e as fontes de indicação mais citadas foram os instrutores de academia,
os professores de Educação Física e a autoindicação.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 251


Esse contexto de utilização indiscriminada de ergogênicos nutricionais e/ou farmaco-
lógicos pode representar um problema de saúde pública induzido pela insatisfação com a
autoimagem corporal. Para Azevedo et al. (2012), as preocupações com a imagem corporal
geram insegurança social, baixa autoestima e sentimentos de inferioridade, que seriam re-
solvidos se a pessoa tivesse um corpo belo e forte. Para alcançar isso, os sujeitos substan-
cialmente insatisfeitos com sua forma muscular podem ter aumentado o risco de fazer uso
de esteroides anabolizantes e suplementos alimentares indiscriminadamente. Essa hipótese
de associação significativa entre substancial insatisfação com a imagem corporal e o uso de
anabolizantes e suplementos foi confirmada entre os participantes desse estudo (τ = 0,83;
p=0,04), ou seja, um percentual substancial desses praticantes de musculação apresentou
comportamentos de risco à saúde, relacionados aos sintomas de DM.

CONCLUSÃO

O objetivo desse trabalho foi verificar a prevalência de sintomas associados à DM, o


nível de insatisfação com a imagem corporal e o padrão de silhueta corporal desejado por
estudantes do ensino superior, praticantes de musculação, em uma instituição universitária
de Palmas-TO. Nesse sentido, os resultados desse estudo demonstram o padrão desejado
de aparência corporal seria aquele que mostrasse músculos volumosos com contornos facil-
mente visíveis e identificáveis. Como a maioria dos participantes não se auto identificou com
esse padrão, verificou-se insatisfação substancial com a sua silhueta corporal. Além disso,
uma grande proporção de graves sintomas comportamentais de DM foi relatada. Apesar de
não haver dependência entre insatisfação substancial com a imagem corporal e risco grave
de DM no conjunto sintomático dos participantes, a análise isolada de cada item relatado
sugere que essa insatisfação parece influenciar outros comportamentos de risco a saúde
desses praticantes, notadamente, a pratica de atitudes extremas, o uso abusivo de suple-
mentos e a ingestão de drogas com o objetivo de promover mudanças na silhueta corporal.

REFERÊNCIAS
1. Abrahin, O.S.C, Souza, N.S.F., Sousa, E.C., Moreira, J., Rodrigues,K., Nascimento, V. & Cunha,
M. (2013). Prevalência do uso e conhecimento de esteroides anabolizantes androgênicos por
estudantes e professores de educação física que atuam em academias de ginástica. Rev Bras
Med Esporte, 19(1) , 27-30.

2. Adami, F., Freiner, D. E. S., Santos, J. F.S. & De Oliveira, F. R. (2008). Insatisfação corporal
e atividade física em adolescentes da região continental de Florianópolis. Psicologia: Teoria
e Pesquisa, Brasília, DF, 24(2), 143-149.

252 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


3. Aguiar, E. F. (2003). O papel do stress nos processos de comunicação do corpo. (Disser-
tação de Mestrado). Departamento de Pós-Graduação em Comunicação e Semiótica, Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP, São Paulo.

4. Albino, E. B. S., & Macêdo, E. M. C. (2014). Transtornos alimentares na adolescência: uma


revisão de literatura. Veredas Favip, Caruru/PE, 7 (1) , 108-129.

5. Albuquerque, S. C. S., Lopes, R. G. M., Vieira, Y. M., Leal, W. C. & Bueno, M. M. (2014). Pre-
valência de uso de suplementos alimentares em academias nas cidades de Barbalha, Crato
e Juazeiro do Norte-CE. VI Semana de Iniciação Cientifica da Faculdade de Juazeiro do
Norte . Disponivel em: <http://www.fjn.edu.br/iniciacaocientifica/anais-vi-semana/wp-content/
uploads/2015/01/preval%c3%8ancia-de-uso-de-suplementos-alimentares-em-academias-nas-
-cidades-de-barbalha-crato-e-juazeiro-do-norte-ce.pdf>. Acesso em: 17/01/2019.

6. Alonso, C. A. M. (2005). DM: enfermedad o adaptación. Lecturas Educación Física y De-


portes, Buenos Aires, 11 (99).

7. Alves, S. C. R. & Navarro, F. (2010). O uso de suplementos alimentares por frequentadores de


academias de Potim-SP. Revista Brasileira de Nutrição Esportiva, São Paulo, 4 (20),139-
146, Março/Abril.

8. APA - American Psychiatric Association (2013). Diagnostic and Statistical Manual of Mental
Disorders (DSM-5). Washington, DC: APA.

9. Azevedo, A.P., Ferreira, A.C., & Da Silva, P.P., Caminha, I.O., Freitas, C.M. (2012). DM: A
busca pelo corpo hiper musculoso. Motricidade, Santa Fé da Feira, 8(1), 53-66.

10. Beilharz, F., Castle, D.J., & Grace, S.A. (2017). systematic review of visual processing and as-
sociated treatments in body dysmorphic disorder. Acta Psychiatrica Scandinavica, 136,16–36.

11. Bégin, C., Turcotte, O. & Rodrigue, C(2019). Psychosocial factors underlying symptoms of
muscle dysmorphia in a non-clinical sample of men, Psychiatry Research, 272, 319-325.

12. Bezerra, E. L. G. (2010). DM: Uma revisão bibliográfica. (Monografia de graduação). Escola
de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da Universidade Federal de Minas
Gerais. Belo Horizonte.

13. Boas, M. S. V., Coelho, R. W., Ferreira, V. A., & Souza, C. (2010). Nível de satisfação com a
imagem corporal e a aparência muscular de praticantes de musculação. Revista da Educação
Física/UEM. Maringa, 21(3), 493-502.

14. Cardoso, D. S., & Cardozo, M. A. V. (2014). Corpo, contemporaneidade e representações:


academia por que? Omnia Saúde, Adamantina, 11(1), 58-80.

15. Da Silva, R.V., & Viana, H.B. (2016). Relação da imagem corporal e propensão à vigorexia.
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, 21( 215).

16. Damasceno, V. O., Lima, J. R. P.,Vianna, J. M., Silva, A. C., & Silva, S. F. (2012). Insatisfação
com a imagem corporal e variáveis antropométricas de praticantes de atividades em academia.
Lecturas Educación Física y Deportes, Buenos Aires, 17, 1-3.

17. Damasceno, V. O., Lima, J. R. P., Vianna, J. M., Vianna, V. R. A., & Novaes, J. S. (2005) .
Tipo físico ideal e satisfação com a imagem corporal de praticantes de treinamento resistido.
Revista Brasileira de Medicina do Esporte, Niteroi, 11( 3), 181-186.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 253


18. Dos Santos, C.A., Tirico, P.P., Stefano, S.C., & Touyz, S.W., Claudino, S.O.U. (2016). Siste-
mática Revejado diagnostic categoria músculo dismorfia. Aust. Psiquiatria, 50, 322-333.

19. Estevão, A., & Bagrichevsky, M. (2004). Cultura da “corpolatria” e body-building: notas para
reflexão. Revista Mackenzie de Educação Física e Esporte, São Paulo, 3 (3)15-27.

20. Ferrarezzi, R. A., Rocha, P. G. M., & Vieira, J. L. L. (2010). A dependência pela prática de
exercícios físicos e o uso de recursos ergogênicos. Acta Scientiarum Health Sciences. Ma-
ringá, 32( 1), 35-41.

21. Ferraz, A. (2009). Dismorfia Muscular em usuários de esteroides Anabólico-androgênicos.


(Monografia de graduação). Centro de Desportos, Universidade Federal de Santa Catarina.
Florianópolis.

22. Floriano, J. M. & d’Almeida, K. S. M. (2016). Prevalência de transtorno dismórfico muscular em


homens adultos residentes na fronteira oeste do Rio Grande do Sul. RBNE - Revista Brasileira
De Nutrição Esportiva, 10(58), 448-457.

23. Frias, A., Palma, C. & Farriols, N. (2015). Comorbidity between obsessive-compulsive disorder
and body dysmorphic disorder: Prevalence, explanatory theories, and clinical characterization.
Neuropsychiatric Disease and Treatment,11, 2233–2244.

24. Grace, S.A., Labuschagne, I. & Kaplan, R.A. (2017). The neurobiology of body dysmorphic
disorder: A systematic review and theoretical model. Neuroscience & Biobehavioral
Reviews, 83, 83–96.

25. Haliburn, J. (2018). Anorexia nervosa is a body-image disorder. Australian and New Zealand
Journal of Psychiatry, 52, 491–492.

26. Iriart, J. A. B., Chaves, J. C. & Orleans, R. G. (2009). Culto ao corpo e uso de anabolizantes
entre praticantes de musculação. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, 25(4), 773-782.

27. Kanayama, G., Pope, H. G., Cohane, G. & Hudson, J. I. (2003). Risk factors for anabolic-andro-
genic steroid use among weightlifters: a case-control study. Drug and Alcohol Dependence,
Philadelphia,71,77-86.

28. Malcolm, A., Labuschagne, I., Castle, D., Terrett, G., Rendell, P. G. & Rossell, S. L. (2018).
The relationship between body dysmorphic disorder and obsessive-compulsive disorder: A
systematic review of direct comparative studies. Australian & New Zealand Journal of Psy-
chiatry, 52(11), 1030- 1049.

29. Malta, D. (2009). Padrão de atividade física em adultos brasileiros: resultados de um inquérito
por entrevistas telefônicas em 2006. Epidemiologia e Serviços de Saúde, Brasília, 18 (1) 716.

30. Mello, G. T. & Liberali, R. (2012). DM em praticantes de musculação: revisão sistemática.


Revista Brasileira de Nutrição Esportiva, Campinas, 6(36),449-457.

31. Moreira, F. P. & Rodrigues, K. L. (2014). Conhecimento nutricional e suplementação alimentar


por praticantes de exercícios físicos. Revista Brasileira de Medicina do Esporte, Niteroi,
20 (5).

32. Moreno, H. A. (2008). DM: la cárcel en el gimnasio. (Ensayo de maestro), Escuela nacional
de antropología e historia INAH/SEP. Division de posgrado em antropología física, Mexico, D.F.

254 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


33. Mota, C. G. & Aguiar, E. F. (2015). DM: uma nova síndrome em praticantes de musculação.
Revista Brasileira de Ciências da Saúde. João Pessoa, ano 9, n. 27, jan/mar, 2011.

34. Nogueira, F. R. S., Brito, A. F., Vieira, T. I., Oliveira, C. V. C. & Gouveia, R. L. B. (2015). Pre-
valência de uso de recursos ergogênicos em praticantes de musculação na cidade de João
Pessoa, Paraíba. Revista Brasileira de Ciências do Esporte, Campinas, 14 (4)387-392.

35. Nunes, R. T., Lopes, E. C. D., Damasceno, V. O., Miranda, R. & Filho, M. G. B. (2007). De-
pendência do Exercício Físico e Insatisfação com a Imagem Corporal. HU em Revista, Juiz
de Fora, 33(4)113-118.

36. Pereira, L. P. (2014). Utilização de recursos ergogênicos nutricionais e/ou farmacológicos em


uma academia da cidade de Barra do Piraí, RJ. Revista Brasileira de Nutrição Esportiva,
São Paulo, 8 (43)58-64.

37. Pope Junior, H. G., Katharine, A. P. & Olivardia, R. (2000). O Complexo de Adônis: A Ob-
sessão masculina pelo corpo. Tradução de Sérgio Teixeira. Campus: Rio de Janeiro, 2000.

38. Pope, H.G., Kanayama, G., Athey, A., Ryan, E., Hudson J.I. & Baggish, A. (2014). The Lifetime
Prevalence of Anabolic-Androgenic Steroid Use and Dependence in Americans: Current Best
Estimates. Am J Addict, 23(4), 371- 377.

39. Pope, H.G., Wood, R.I., Rogol, A., Nyberg, F., Bowers, L. & Bhasin, S. (2014). Adverse health
consequences of performance-enhancing drugs: an Endocrine Society scientific statement.
Endocr Rev, 35, 341-375.

40. Quadros, T. M. B., Gordia, A. P., Martins, C. R., Silva, D. A. S., Ferrari, E. P. & Petroski, E. L.
(2010) Imagem corporal em universitários: associação com estado nutricional e sexo. Revista
Motriz, Rio Claro, 16(1),78-85.

41. Ribas Filho, D., Silva, F. B. B. & Botura, R. I. (2014). Avaliação do uso de ergogênicos por pra-
ticantes de academia no Noroeste e Nordeste do estado de São Paulo. International Journal
of Nutrology, Catanduva/SP, 7,(2), 05-10.

42. Sagoe, D., Molde, H., Andreassen, C.S., Torsheim, T. & Pallesen, S. (2014). The global epi-
demiology of anabolic-androgenic steroid use: a meta-analysis and meta-regression analysis.
Annals of Epidemiology, 24, 383-398.

43. Santana, A. L. & Teixeira-Arroyo, C. (2012). Incidência da DM em homens praticantes de mus-


culação. Revista de Educação Física da UNIFABIPE, Bebedouro/SP , ano I(1).

44. Sardinha, A., Oliveira, A. J. & Araújo, C. G. S. (2008). Dismorfia muscular: análise comparativa
entre um critério diagnóstico e um instrumento psicológico. Revista Brasileira de Ciências
do Esporte, Campinas, 14 (4)387-392.

45. Schilder, P. (1999). A imagem do corpo: as energias construtivas da psique. (3a ed.).
Martins Fontes: São Paulo.

46. Schneider, S.C., Turner, C.M. & Mond, J. (2017). Prevalence and correlates of body dysmor-
phic disorder in a community sample of adolescents. Australian and New Zealand Journal of
Psychiatry, 51, 595–603.

47. Severo Santos, J. F., Maciel, F. H. S. & Menegetti, D. (2011). Consumo de suplementos pro-
teicos e expressão da raiva em praticantes de musculação. Revista da Educação Física/
UEM. Maringa, 22(4).

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 255


48. Severo Santos, J. F., Oliveira, P., Campos, A. A., Pereira, E. O. & Sousa, E. A. (2014). Rela-
ção entre insatisfação corporal e atividade física em adolescentes da zona urbana de Irati-PR.
Revista da Educação Física/UEM. Maringa, 25(2),193-201.

49. Souza, R. & CENI,G. C. (2014). Uso de suplementos alimentares e autopercepção corporal de
praticantes de musculação em academias de Palmeira das Missões-RS. Revista Brasileira
de Nutrição Esportiva, São Paulo, 8(43)20-29.

50. Summers, B.J., Matheny, N.L. & Cougle, J.R. (2017). ‘Not just right’ experiences and incom-
pleteness in body dysmorphic disorder. Psychiatry Research, 247, 200–207.

51. Talih, M.D. (2007). Anabolic steroid abuse: psychiatric and physical costs. Cleveleland Clinic
Journal Medicine, Cleveland, 74(5),341-52.

52. Tod, D., Edwards, C. & Cranswick, I. (2016). Muscle dysmorphia: current insights. Psychol Res
Behav Manag., 9(3),179-88.

53. Toh, W.L., Castle, D.J. & Rossell, S.L. (2017). Characterisation of body dysmorphic disorder
(BDD) versus obsessive-compulsive disorder (OCD): In light of current DSM-5 nosology. Journal
of Obsessive-Compulsive and Related Disorders, 12,117–126.

256 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


19
“ Distúrbios musculoesqueléticos
em escolares praticantes de
atividades esportivas: uma
revisão sistemática

Rafael Antonio Bianchi


UNIARP

Ricelli Endrigo Ruppel da Rocha


UNIARP

10.37885/201102170
RESUMO

Objetivo: Sintetizar as evidencias disponíveis na literatura sobre a relação da prática


esportiva com o desenvolvimento de Distúrbios Musculoesqueléticos em escolares da
Educação Básica. Métodos: Foi realizada uma busca nas bases de dados da Biblioteca
Virtual de Saúde (BVS) que inclui LILACS, MEDLINE, MEDCARIB, OPAS/OMS, PAHO e
WHOLIS; PubMed, EBSCO e SciELO, no período entre 1994 à 2020. Foram incluídos 25
artigos dos 1.320 estudos encontrados. No total, 38.831 alunos da Educação Básica com
faixas etárias entre 6 a 21 anos foram avaliados nos estudos.. Resultados: Foi demonstra-
do que a prática esportiva por mais de 3 horas semanais, participação em competições de
modalidades coletivas foram relacionados com os Distúrbios Musculoesqueléticos. A pre-
valência geral nos estudos em que a prática esportiva foi relacionada com os Distúrbios
Musculoesqueléticos foi de 20,9% e a região lombar (30,7%), ombros (28,2%), joe-
lhos (25,9%), pescoço (24,8%) foram as mais frequentes. Conclusão: Os Distúrbios
Musculoesqueléticos estão associados com a prática esportiva de competição em alunos
da Educação Básica.

Palavras-chave: Estudantes, Dor Musculoesquelético, Esportes.


INTRODUÇÃO

Os distúrbios musculoesqueléticos se constituem em uma condição inflamatória e


degenerativa que afeta tendões, músculos, ligamentos, nervos periféricos, articulações e
vasos sanguíneos de suporte, podendo surgir de maneira isolada ou de forma simultânea
(EGGERS, PILLAY, GOVENDER, 2018). Tais condições resultam em esforço excessivo de
ossos, ligamentos e músculos, e tipicamente se manifesta como dor musculoesquelética
com subsequente comprometimento funcional (CEBALLOS, SANTOS, 2015).
Os DME têm atingido a população de jovens e crianças que estão em idade escolar
e as pesquisas têm mostrado que aproximadamente 53% dos adolescentes apresentam
algum tipo de DME nesta fase da vida e 15% dor musculoesquelética ao menos uma vez
por semana (DELELE et al., 2018). Estes problemas podem evoluir para a cronicidade com
repercussões graves na idade adulta, prejudicando a qualidade de vida e gerando a perda de
produtividade no trabalho, ocasionando importante impacto econômico para o empregador,
governo e sociedade em geral (SHUAI et al., 2014). Estima-se que o custo associado com
os DME alcançam valores entre 13 à 53 bilhões de dólares anualmente (YUE, LIU, LI, 2012).
Durante a fase da escolarização, os DME causam efeitos negativos aos alunos como
a diminuição na participação das atividades escolares, dificuldade na aprendizagem e o
aumento da evasão escolar (DOCKRELL, SIMMS, BLAKE, 2015). Além disso, podem afetar
aspectos comportamentais, emocionais e sociais, aumentando o risco para doenças psicos-
somáticas e problemas do sono (MALMBORG et al., 2019).
De acordo com Gheysvandi et al., (2019) diversos fatores de risco apontados na litera-
tura estão associados aos DME em crianças e adolescentes, no entanto, não encontramos
nenhuma pesquisa de revisão bibliográfica que sintetizou os achados de estudos que ava-
liaram a relação da prática esportiva com os DME em alunos da Educação Básica. Diante
disso, esta pesquisa trará uma visão atual do problema e contribuíra para uma atualização
científica dentro desse campo, possibilitando aos profissionais de educação física que tra-
balham nas escolas informações relevantes para o planejamento de medidas e ações que
atenuem os DME no ambiente escolar.
O ambiente escolar é considerado o lugar ideal para o desenvolvimento de estratégias
que promovam a saúde das futuras gerações, dada sua capilaridade e abrangência, uma
vez que atitudes e valores são formados nesse ambiente (CASEMIRO, FONSECA, SECCO,
2014). Portanto, o objetivo deste estudo foi sintetizar as evidencias disponíveis na literatura
sobre as características sociodemográficas, estado nutricional e estilo de vida associados
com DME em escolares da Educação Básicas.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 259


OBJETIVO

Sintetizar as evidencias disponíveis na literatura sobre a relação da prática esportiva com


o desenvolvimento de Distúrbios Musculoesqueléticos em escolares da Educação Básica.

MÉTODOS

Esta revisão sistemática utilizou os procedimentos metodológicos estabelecidos pelo


guia Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses – PRISMA
(MOHER et al., 2009). Para a busca sistemática e as definições dos descritores, optou-se
por utilizar os Descritores em Ciências da Saúde (DeCS). Dessa maneira, os termos en-
contrados para a realização desta pesquisa foram testados e por fim chegou-se a seguinte
combinação nos idiomas português e inglês: “dor musculoesquelética” OR “dor osteomus-
cular” OR “sintomas osteomusculares” AND “estudantes” OR “alunos” AND “educação bási-
ca” OR “ensino fundamental” OR “ensino médio“; “musculoskeletal pain” OR “musculoskeletal
symptoms” AND “students” AND “basic education” OR “primary education” OR “secundary
education”. A busca foi realizada em quatro (04) bases de dados: Biblioteca Virtual de
Saúde (BVS) que inclui LILACS, MEDLINE, MEDCARIB, OPAS/OMS, PAHO e WHOLIS;
PubMed, EBSCO e SciELO.

Critérios de inclusão e exclusão

Para a inclusão dos artigos foram estabelecidos os seguintes critérios de inclusão: a)


Estudos originais; b) Considerando como desfecho principal os DME em alunos do ensino
infantil, fundamental e médio; c) Avaliação nos alunos da prática de atividade física e espor-
tiva, estado nutricional e atividades diárias; d) Idiomas: português e inglês; e) Publicados a
partir de janeiro de 1994 a agosto de 2020. Foram excluídos os estudos de revisão (narra-
tivas, sistemáticas e/ou meta análises), dissertações, teses, relatórios e monografias. Dois
pesquisadores realizaram de maneira independente cada etapa do processo de revisão.
Caso houvesse divergência no processo de inclusão e exclusão, foi realizada uma reunião
de consenso entre os pesquisadores.

Seleção dos estudos

Inicialmente, todos os títulos selecionados nas bases de dados (n=1.392) foram trans-
feridos para o software EndNote e, em seguida, foram excluídos os títulos repetidos (n=
72). O processo de revisão sistemática foi composto por quatro fases: A primeira fase
consistiu na leitura dos títulos, dos 1.320 (100%) títulos encontrados, 1.184 artigos (90%)

260 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


foram excluídos por não apresentarem relação com o tema, publicados em outra língua e
outros documentos como monografias e dissertações; Na segunda fase foi realizada a leitura
dos resumos (n= 136; 10%), destes 98 artigos foram excluídos por não apresentar como
desfecho principal os DME em alunos da educação básica ou não avaliarem o a prática
esportiva. Na terceira fase foi realizada a leitura na íntegra dos artigos restantes (n= 38;
2%) e destes, 13 artigos foram excluídos por não apresentar como desfecho os DME em
alunos da educação básica. Ao final, 25 artigos (1,7%) atenderam aos critérios empregados
e foram selecionados para revisão. A Figura 1 apresenta o processo de busca aos artigos,
os resultados e os respectivos motivos de exclusão dos mesmos.

Figura 1. Fluxograma de identificação e seleção dos artigos para a revisão sistemática

Fonte: Os autores (2020).

RESULTADOS

No total, 38.831 alunos da educação básica com faixas etárias entre 6 a 21 anos foram
avaliados nos estudos. Os delineamentos descritivos e transversais foram os mais frequentes
e 60% dos estudos foram publicados nos últimos 10 anos (Tabela 1).
Em relação ao local em que os estudos aconteceram 36% foram realizados em países
da Europa, 24% em países da Ásia e da América, 12% na África e somente 4% na Oceania
(Tabela 1). O Brasil realizou 5 estudos, sendo o país com maior número de pesquisas.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 261


Tabela 1. Características e resultados dos artigos incluídos para a revisão.
Autores Desenho do Estudo Amostra Idade País
Rezapur-Shahkolai et al.
Descritivo Transversal 693 alunos 07 a 12 anos Iran
(2020)
Bazett-Jones et al. (2019) Descritivo Transversal 1.021 alunos 10 a 18 anos Estados Unidos
Ben Ayed et al. (2019) Descritivo Transversal 1.221 alunos 12 a 18 anos Tunísia
Gheysvandi et al. (2019) Descritivo Transversal 693 alunos 07 a 12 anos Iran
Keeratisiroj, Siritaratiwat
Descritivo Transversal 2.750 alunos 10 a 19 anos Tailândia
(2018)
Szita et al. (2018) Coorte Longitudinal 952 alunos 07 a 16 anos Hungria
Dianat et al. (2017) Descritivo Transversal 1.611 alunos 11 a 14 anos Iran
Scarabottolo et al. (2017) Descritivo Transversal 1.011 alunos 10 a 17 anos Brasil
Spiteri et al. (2017) Descritivo Transversal 3.852 alunos 08 a 13 anos Malásia
Fernandes et al. (2015) Descritivo Transversal 1.461 alunos 10 a 14 anos Brasil
Saes et al. (2014) Descritivo Transversal 625 alunos 06 a 18 anos Brasil
Rathleef et al. (2013) Descritivo Transversal 2.953 alunos 12 a 19 anos Dinamarca
Onofrio et al. (2012) Descritivo Transversal 1.233 alunos 13 a 19 anos Brasil
De Vitta et al. (2011) Epidemiológico Transversal 1.263 alunos 11 a 14 anos Brasil
Kaspiris et al. (2010) Descritivo Retrospectivo 692 alunos 07 a 14 anos Grécia
Bejia et al. (2005) Descritivo Transversal 622 alunos 11 a 19 anos Tunísia
Korovessis et al. (2004) Descritivo Transversal 3.441 alunos 09 a 15 anos Grécia
Prista et al. (2004) Descritivo Transversal 204 alunos 11 a 16 anos Moçambique
Shehab et al. (2004) Descritivo Transversal 400 alunos 10 a 18 anos Kuwait
Jones et al. (2003) Coorte Longitudinal 933 alunos 11 a 14 anos Reino Unido
Kovacs et al. (2003) Descritivo Longitudinal 7.048 alunos 13 a 15 anos Espanha
Grimmer, Williams (2000) Descritivo Transversal 1.193 alunos 12 a 18 anos Austrália
Gunzburg et al. (1999) Descritivo Transversal 392 alunos 09 anos Bélgica
Harreby et al. (1999) Descritivo Transversal 1.389 alunos 13 a 16 anos Dinamarca
Troussier et al. (1994) Descritivo Transversal 1.178 alunos 06 a 20 anos França
Fonte: Os autores (2020).

Com relação à prática esportiva estar relacionado com os DME, 60% dos estudos
encontraram algum tipo de associação, enquanto que 40% não encontrou nenhum tipo de
associação com os DME (Tabela 2). Os alunos que realizavam a prática esportiva por mais
de 3 horas semanais, que participavam de competições e de esportes coletivos foram rela-
cionados com os DME.

262 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Tabela 2. Resultados dos estudos incluídos na revisão que avaliaram a relação da prática esportiva com os DME em
escolares da Educação Básica.
Resultados das relações
Autores Prática de esportes Regiões anatômicas com DME
Sim Não
Rezapur-Shahkolai et al.
Pratica semanal de esportes X Lombar 26,6%
(2020)
Joelhos 24,8%
Lombar 19,7%
Pés/Tornozelos 17,8%
Mãos/Punhos 11,5%
Bazett-Jones et al. (2019) Prática semanal de esportes X Pescoço 7,6%
Ombros 6,4%
Coxas/Quadril 5,7%
Dorsal 5,1%
Cotovelos 1,3%
Ombros 43,0%*
Ben Ayed et al. (2019) Pratica esportiva acima de 3 horas semanais X Lombar 35,8%*
Pescoço 32,0%
Pescoço 35,8%
Gheysvandi et al. (2019) Pratica esportiva acima de 3 horas semanais X
Ombros 30,9%
Pescoço 33,9%
Ombros 28,3%
Pés/Tornozelos 26,9%*
Mãos/Punhos 25,5%*
Keeratisiroj, Siritaratiwat
Prática semanal esportiva X Coxas/Quadril 21,5%*
(2018)
Joelhos 19,6%*
Dorsal 19,5%
Lombar 16,8%
Cotovelos 6,3%*
Pescoço 25,0%
Szita et al. (2018) Pratica de algum esporte X Dorsal 24,9%
Lombar 19,4%
Dianat et al. (2017) Pratica esportiva acima de 3 horas semanais X Lombar 34,3%
Lombar 18,0%*
Scarabottolo et al. (2017) Pratica esportiva dentro e fora do ambiente escolar X
Dorsal 17,4%*
Spiteri et al. (2017) Pratica de algum esporte X Dorsal 32,0%
Fernandes et al. (2015) Pratica de algum esporte X Lombar 18,5%*
Mãos/Punhos 12,2%
Dorsal 11,2%
Saes et al. (2014) Prática de esportes de competição X
Lombar 10,9%
Pescoço 10,1%
Joelhos 32,3%
Dorsal 24,1%
Ombros 13,3%
Rathleef et al. (2013) Prática semanal de esportes X
Pés/Tornozelos 11,5%
Coxas/Quadril 5,9%
Mãos/Punhos 4,4%
De Vitta et al. (2011) Prática esportiva fora do ambiente escolar X Lombar 19,5%*
Kaspiris et al. (2010) Prática esportiva no ambiente escolar X Lombar 22,1%
Bejia et al. (2005) Prática esportiva de competição (futebol) X Lombar 28,4%*
Prática de algum esporte
Korovessis et al. (2004) X Lombar 21,6%*
(sexo feminino)
Prista et al. (2004) Prática esportiva acima de 2 horas por semana X Lombar 13,5%
Shehab et al. (2004) Prática esportiva no ambiente escolar X Lombar 57,8%*
Pratica esportiva no ambiente escolar e praticas esportivas
Jones et al. (2003) X Lombar 18,6%
semanais.
Kovacs et al. (2003) Pratica de esportes coletivos de competição X Lombar 60,6%*
Grimmer, Williams (2000) Prática esportiva acima de 10 horas semanais X Lombar 24,6%*
Gunzburg et al. (1999) Prática esportiva dentro e fora do ambiente escolar X Lombar 36,0%*
Harreby et al. (1999) Prática esportiva de alta intensidade X Lombar 50,8%*
Troussier et al. (1994) Prática esportiva (futebol, judô, voleibol e golfe). X Dorsal 51,8%*
Nota: *Região anatômica com DME que estatisticamente (p<0,05) se relacionou com a prática esportiva.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 263


A região lombar (30,7%), ombros (28,2%), joelhos (25,9%), pescoço (24,8%) e dorsal
tiveram a maior prevalência de DME nos alunos em que a prática esportiva foi associado
com DME (Tabela 3). Nos alunos em que a prática esportiva não foi relacionado com DME,
a região dos joelhos (24,0%), lombar (23,3%) e pescoço (22,8%) tiveram a maior prevalência
(Tabela 3). A prevalência geral de DME nos alunos em que a prática esportiva foi relacio-
nada com DME foi de 20,9% enquanto que nos alunos em que a prática esportiva não foi
relacionado com DME foi de 15,6% (Tabela 3).

Tabela 3. Prevalência de DME em cada região anatômica dos estudos que apresentaram relação e não apresentaram
relação com a prática esportiva nos escolares da Educação Básica (Média ± DP)
DME relacionado com a DME não relacionado com a prática
Região Anatômica
prática esportiva esportiva
Pescoço 25,3 ± 13,2 22,8 ± 14,2
Ombros 28,2 ± 14,8 18,6 ± 17,3
Dorsal 24,8 ± 15,8 15,0 ± 14,0
Cotovelos 6,3 ± 0,0 1,3 ± 0,0
Punhos/mãos 14,0 ± 10,7 11,5 ± 0,0
Lombar 30,7 ± 16,4 23,3 ± 7,2
Quadril/coxas 13,7 ± 11,0 5,7 ± 0,0
Joelhos 25,9 ± 9,0 24,8 ± 0,0
Tornozelo/pé 19,2 ± 10,9 17,8 ± 0,0
Geral 20,9 ± 6,8 15,6 ± 8,1
Fonte: Os autores (2020).

DISCUSSÃO

O presente estudo foi à primeira revisão sistemática que sintetizou os resultados de


estudos que investigaram a relação da prática esportiva com os DME em alunos da Educação
Básica. Além disso, esta revisão mostrou a prevalência e as regiões anatômicas com maior
frequência destes problemas. É importante destacar que os DME podem impactar negati-
vamente o processo de aprendizagem dos alunos e desenvolver outros agravos à saúde
como os transtornos mentais e comportamentais (SAES et al., 2014; MARTINS et al., 2020).
A maioria dos estudos foram realizados nos últimos 10 anos que antecederam esta
pesquisa (Tabela 1). Isto mostra que os DME preocupam os pesquisadores, pois os alunos
permanecem boa parte de seu tempo na escola e devido às intensas modificações físicas,
psíquicas, comportamentais e sociais, constituindo a transição entre a infância e a vida
adulta, em que muitas das características ou dos hábitos referentes ao estilo de vida do
adulto são adquiridos e/ou consolidados, é de suma importância acompanhar nos alunos
os possíveis agravos à saúde relacionados aos DME, que podem prejudicar todo o pro-
cesso de desenvolvimento integral (ROEHRS, MAFTUM, ZAGONEL, 2010; BRASIL, 2019;
MARTINS et al., 2020).

264 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Os estudos descritivos e com delineamento transversal foram os mais utilizados nas
pesquisas (Tabela 1). Devido ao baixo custo e a agilidade de se realizar este tipo de pes-
quisa quando comparado a outros delineamentos, são fatores importantes que podem ter
sido considerados pelos autores, principalmente aqueles estudos com amostras grandes.
Nas amostras dos estudos, a maioria eram alunos com idades entre 7 a 14 anos, o
que são características de alunos do ensino fundamental (Tabela 1). Na faixa etária de 7 a
14 anos se concentra a obrigatoriedade dos estudantes estarem no ensino fundamental e
segundo dados do Censo da Educação Básica Brasileira de 2019, a quantidade de matrí-
culas no ensino fundamental ao longo dos anos sempre foi maior comparado às matrículas
do ensino infantil e médio, o que pode explicar estes resultados (WHITTFIELD, LEGG,
HEDDERLEY, 2005; BRASIL, 2019).
Em relação à associação da prática esportiva com os DME encontrado nos estudos
(Tabela 2), podemos inferir que alunos que participam de esportes coletivos de competição
nas modalidades de futebol e voleibol, são os mais acometidos por DME (TROUSSIER et al.,
1994; BEJIA et al., 2005; KASPIRIS et al., 2010; DE VITTA et al., 2011; RATHLEEF et al.,
2013; SAES et al., 2014; KEERATISIROJ, SIRITARATIWAT, 2018). A razão disso, pode estar
relacionado as características das modalidades. O futebol é um esporte de contato físico
e de gestos específicos, como corridas, saltos, aterrissagens, aceleração, desaceleração,
mudanças abruptas de direção, chutes e pivoteios (SENA et al., 2013). Estas caracterís-
ticas podem predispor os seus praticantes a algum tipo de lesão ou DME, principalmente
nos membros inferiores. No voleibol, por ser uma modalidade esportiva com características
intermitentes e movimentos como saltos, ataques e bloqueios serem realizados em alta
intensidade e com grande potência muscular, pode induzir as lesões musculares ou DME,
tanto de membros superiores quanto de membros inferiores (FREITAS et al., 2015).
Na presente pesquisa, alunos que praticam esportes acima de 3 horas semanais foi
relacionado com os DME (Tabela 2). Muitas crianças e adolescentes apresentam baixos
níveis de aptidão física para suportar as sobrecargas físicas decorrentes da alta intensida-
de da prática esportiva, expondo-os a aumentar o risco com problemas de dores e lesões
musculoesquelética (HARREBY et al., 1999; KOROVESSIS et al., 2004; SAES et al., 2014).
A região lombar, ombros, joelhos, pescoço e dorsal tiveram as maiores prevalências
nos alunos em que a prática de esportes foi relacionada com DME nesta pesquisa (Tabela
3). Como citado anteriormente, a prática competitiva das modalidades de futebol e voleibol
podem ser a razão destes resultados. Além disso, demandas físicas específicas, preparo
físico inadequado e alto volume de treinamento também podem estar relacionado com estes
resultados (BAHR; KROSSHAUG, 2005).

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 265


Nos alunos que a prática esportiva não foi relacionado com os DME, a região dos joe-
lhos, lombar e pescoço foram as mais acometidas (Tabela 3). Inferimos que outros fatores
podem estar relacionados, dentre eles, o peso e o tipo das mochilas que os alunos transpor-
tam, o estado nutricional (baixo peso, sobrepeso e/ou obesidade), a postura corporal dentro
e fora do ambiente escolar, tempo excessivo em frente à televisão e ao computador, entre
outros (SPITERI et al., 2017; BEN AYED et al., 2019; REZAPUR-SHAHKOLAI et al., 2020).
Destacamos que 40% dos estudos não encontraram relação significativa entre a prática
de esportes com os DME nos escolares (Tabela 2). A prática esportiva desde que respeite
as limitações físicas demonstra resultados positivos para diminuir os DME na fase de es-
colarização (RATHLEEF et al., 2013; SCARABOTTOLO et al., 2017).Por exemplo, em um
estudo por Ayed et al. (2019), mostrou que a prática esportiva realizada entre 1 a 3 horas
semanais, diminui o risco de dores na região de lombar, ombros e pescoço. Segundo os
autores o surgimento de DME relacionados à prática esportiva tem relação com a inten-
sidade da prática, desta forma, quando a prática esportiva é orientada de acordo com as
fases do crescimento e desenvolvimento, os praticantes terão diversos benefícios à saúde
(SCARABOTTOLO et al., 2017).
A prevalência geral dos estudos que encontraram relação da prática esportiva com
os DME e dos estudos que não encontram relação da prática esportiva com os DME foi de
20,9% e 15,6%, respectivamente (Tabela 3). Estudos nacionais e internacionais mostraram
que a prevalência de DME na população de estudantes pode variar de 4% a 40% (SAES
et al., 2014; MALMBORG et al., 2018). Estes achados permitem inferir quem os DME são
um problema de saúde pública mundial e que merecem toda a atenção, principalmente nesta
fase da escolarização.

CONCLUSÃO

Em resumo, os estudos analisados mostraram que a prática competitiva de esportes


por alunos da Educação Básica está relacionado com os DME na região lombar, ombros,
joelhos, pescoço e dorsal. Contudo, quando a prática esportiva é recreacional e considera
as limitações físicas dos seus praticantes, a prevalência de DME é atenuado.
Com estes resultados, sugerimos que os gestores educacionais desenvolvam políticas
de prevenção e promoção da saúde e qualidade de vida no ambiente escolar para diminuir
os agravos à saúde relacionados aos DME. Recomendamos que mais estudos sejam rea-
lizados com alunos da educação básica, investigando em diferentes momentos do período
escolar outros fatores que poderiam estar relacionados aos DME.

266 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


REFERÊNCIAS
1. BAHR, R; KROSSHAUG, T. Understanding injury mechanisms: a key component of preventing
injuries in sport. Br J Sports Med, v.39, n.6, p.324-329, 2005. DOI: 10.1136/bjsm.2005.018341.

2. BEJIA, I; ABID, N; SALEM, KB; LETAIEF, M; YOUNES, M; TOUZI, M; BERGAOUI, N. Low


back pain in a cohort 622 Tunisian schoolchildren and adolescentes: an epidimiological study.
Eur Spine J, v.14, p.331-336, 2005. DOI: 10.1007/s00586-004-0785-2.

3. BEN AYED, H; YAICH, S; TRIGUI, M; HMIDA, MB; JEMAA, MB; AMMAR, A et al. Prevalence,
risk factors and outcomes of neck, shoulders and low-back pain in secondary-school children.
JRHS, v.19, n.1, 2019.

4. BRASIL. Censo da Educação Básica 2019: notas estatísticas. In: (Inep). INdEePEAT, editor.
Brasília, v.26, 2019.

5. CASEMIRO, JP; FONSECA, ABC; SECCO, FVM. Promover saúde na escola: reflexões a partir
de uma revisão sobre saúde escolar na América Latina. Ciênc Saúde Coletiva, v.19, p.829-
840, 2014. DOI: 10.1590/1413-81232014193.00442013.

6. CEBALLOS, AGC; SANTOS, GB. Factors associated with musculoskeletal pain among teachers:
sociodemographics aspects, general health and well-being at work. Rev Bras Epidomiol, v.18,
p.702-715, 2015. DOI: 10.1590/1980-5497201500030015.

7. DE VITTA, A; MARTINEZ, MG; PIZA, NT; SIMEÃO, SFA; FERREIRA, NP. Prevalence of lower
back pain and associated factors in students. Cadernos de Saúde Pública, v.27, p.1520-1528,
2011. DOI: 10.1590/S0102-311X2011000800007.

8. DELELE, M; JANAKIRAMAN, B; BEKELE ABEBE, A; TAFESE, A; VAN DE WATER, ATM.


Musculoskeletal pain and associated factors among Ethiopian elementary school children. BMC
Musculoskelet Disord, v.19, n.1, p.276, 2018. DOI: 10.1186/s12891-018-2192-6.

9. DOCKRELL, S; SIMMS, C; BLAKE, C. Schoolbag carriage and schoolbag-related muscu-


loskeletal discomfort among primary school children. Appl Ergon, v.51, p.281-290, 2015. DOI:
10.1016/j.apergo.2015.05.009.

10. EGGERS, LS; PILLAY, JD; GOVENDER, N. Musculoskeletal pain among school teachers: are
we underestimating its impact? Occup Health South Africa, v.24, n.2, p.46-50, 2018.

11. FREITAS, VHD et al. Pre-competitive physical training and markers of performance, stress and
recovery in young volleyball athletes. Revista Brasileira de Cineantropometria & Desempe-
nho Humano, v. 17, p. 31-40, 2015. DOI: 10.5007/1980-0037.2015v17n1p31.

12. GHEYSVANDI, E; DIANAT, I; HEIDARIMOGHADAM, R; TAPAK, L; KARIMI-SHAHANJARINI,


A; REZAPUR-SHAHKOLAI, F. Neck and shoulder pain among elementary school students:
prevalence and its risk factors. BMC Public Health, v.19, n.1, p.1299, 2019. DOI: 10.1186/
s12889-019-7706-0.

13. HARREBY, M; NYGAARD, B; JESSEN, T; LARSEN, E; STORR-PAULSEN, A; LINDAHL, A


et al. Risk factors for low back pain in a cohort of 1389 Danish school children: an epimiologic
study. Eur Spine J, v.8, p.444-450, 1999. DOI: 10.1007/s005860050203.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 267


14. KASPIRIS, A; GRIVAS, TB; ZAFIROPOULOU, C; VASILIADIS, E; TSADIRA, O. Nonspecific
low back pain during childhood: a retrospective epidemiological study of risk factors. Clin Rhe-
matol, v.16, n.2, p.55-60, 2010. DOI: 10.1097/RHU.0b013e3181cf3527.

15. KEERATISIROJ, O; SIRITARATIWAT, W. Prevalence of self-reported musculoskeletal pain


symptoms among school-age adolescents: age and sex diferences. Scand J Pain, v.18, n.2,
p.273-280, 2018. DOI: 10.1515/sjpain-2017-0150.

16. KOVACS, FM; GESTOSO, M; DEL REAL, MTG; LOPEZ, J; MUFRAGGI, N; MENDEZ, JI. Risk
factors for non-specific low back pain in schoolchildren and their parents: a population based
study. Pain, v.103, p.259-268, 2003. DOI: 10.1016/S0304-3959(02)00454-2.

17. KOROVESSIS, P; KOUREAS, G; PAPAZISIS, Z. Correlation between backpack weight and


way of carrying, sagittal and frontal spinal curvatures, athletic activity, and dorsal and low back
pain in schoolchildren and adolescents. J Spinal Disord Tech, v.17, n.1, p.33-40, 2004. DOI:
10.1097/00024720-200402000-00008.

18. MALMBORG, JS; BREMANDER, A; OLSSON, MC; BERGMAN, AC; BRORSSON, AS; BERG-
MAN, S. Worse health status, sleeping problems, and anxiety in 16-year-old students are as-
sociated with chronic musculoskeletal pain at three-year follow-up. BMC Public Health, v.19,
n.1, p.1565, 2019. DOI: 10.1186/s12889-019-7955-y.

19. MALMBORG, JS; OLSSON, MC; BERGMAN, S; BREMANDER, A. Musculoskeletal pain and
its association with maturity and sports performance in 14-year-old sport school students. BMJ
Open Sport Exerc Med, v.4, n.1, 2018. DOI: 10.1136/bmjsem-2018-000395.

20. MARTINS, RL; CARVALHO, N; ALBUQUERQUE, C; ANDRADE, A; MARTINS, C; CAMPOS,


S et al. Perturbações músculo-esqueléticas em adolescentes: estudo da prevalência e dos
fatores determinantes. Acta Paul Enferm, v.33, 2020. DOI: 10.37689/acta-ape/2020AO0173.

21. MOHER, D; LIBERATI, A; TETZLAFF, J; ALTMAN, DG. Preferred Reporting Items for Syste-
matic Reviews and Meta-Analyses: The PRISMA Statement. PLOS Medicine, v.6, n.7, 2009.
DOI: 10.1371/journal.pmed.1000097.

22. RATHLEEF, MS; ROOS, EM; OLESEN, JL; RASMUSSEN, S. High prevalence of daily and
multi-site pain: a cross-sectional population-based study among 3000 Danish adolescents.
BMC Pediatr, v.13, n.191, 2013. DOI: 10.1186/1471-2431-13-191.

23. REZAPUR-SHAHKOLAI, F; GHEYSVANDI, E; TAPAK, L; DIANAT, I; KARIMI-SHAHANJA-


RINI, A; HEIDARIMOGHADAM, R. Risk factors for low back pain among elementary school
students in western Iran using penalized logistic regression. Epidimiol Health, v.42, 2020.
DOI: 10.4178/epih.e2020039.

24. ROEHRS, H; MAFTUM, MA; ZAGONEL, IPS. Adolescência na percepção de professores


do ensino fundamental. Rev Escola de Enfermagem da USP, v.44, p.421-428, 2010. DOI:
10.1590/s0080-62342010000200026.

25. SAES, MdO; SOARES, MD; MUCILLO-BAISCH, A; SOARES, MCF. Fatores associados à dor
musculoesquelética em escolares da rede pública municipal no extremo sul do Brasil. Rev
Bras Saude Mater Infant, v.14, p.211-218, 2014. DOI: 10.1590/S1519-38292014000300002.

26. SCARABOTTOLO, CC; PINTO, RZ; OLIVEIRA, CB; ZANUTO, EF; CARDOSO, JR; CHRISTO-
FARO, DGD. Back and neck pain prevalence and their association with physical inactivy domains
in adolescents. Eur Spine J, v.26, p.2274-2280, 2017. DOI: 10.1007/s00586-017-5144-1.

268 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


27. SENA, DAd; FERREIRA, FM; MELO, RHGd; TACIRO, C; CARREGARO, RL; JUNIOR, SAdO;
Análise da flexibilidade segmentar e prevalência de lesões no futebol segundo faixa etária.
Fisioterapia e Pesquisa, v. 20, p. 343-348, 2013. DOI: 10.1590/S1809-29502013000400007.

28. SHUAI, J; YUE, P; LI, L; LIU, F; WANG, S. Assessing the effects of an educational program for
the prevention of work-related musculoskeletal disorders among school teachers. BMC Public
Health, v.14, p.1211, 2014. DOI: 10.1186/1471-2458-14-1211.

29. SPITERI, K; BUSUTTIL, ML; AQUILINA, S; GAUCI, D; CAMILLERI, E; GRECH, V. Schoolbags


and back pain in children between 8 and 13 years: a national study. Br J Pain, v.11, n.2, p.81-
86, 2017. DOI: 10.1177/2049463717695144.

30. TROUSSIER, B; DAVOINE, P; GAUDEMARIS, R; FAUCONNIER, J; PHELIP, X. Back pain in


school children: a study among 1178 pupils. Scand J Rehab Med, v.26, 1994.

31. WHITTFIELD, J; LEGG, SJ; HEDDERLEY, DI. Schoolbag weight and musculoskeletal symptoms
in New Zealand secondary schools. Appl Ergon, v.36, n.2, p.193-198, 2005. DOI: 10.1016/j.
apergo.2004.10.004.

32. YUE, P; LIU, F; LI, L. Neck/shoulder pain and low back pain among school teachers in China,
prevalence and risk factors. BMC Public Health, v.12, p.789, 2012. DOI: 10.1186/1471-2458-
12-789.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 269


20
“ Educação física e as novas
propostas do MEC: uma análise
na cidade de Pinheiro – MA

Michael Jeferson Pinheiro Pereira


GECORP/UFMA

Jandson Christian Pereira Mendes


GECORP/UFMA

Gustavo Rachid Mesquita Sauaia


GECORP/UFMA

Elaynne Silva de Oliveira


SEEL/USP

Itânio da Silva Soares


SEEL/GECORP/UFMA

Tomaz Antônio Sousa Soares


AGAYO SPORTS/GECORP/UFMA

Lucio Carlos Dias Oliveira


GECORP/UFMA

10.37885/201001912
RESUMO

O presente estudo teve como objetivo analisar a compreensão dos professores de


Educação Física do ensino médio de escolas publica e privadas do município de Pinheiro
- MA, sobre as novas propostas do MEC para o componente curricular, e se os mesmos
os mesmos trabalham dentro destas novas propostas, visando compreender sua impor-
tância para a vida dos alunos e para a inclusão no novo sistema de linguagem código e
suas tecnologias. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas, onde 10 professores e
160 alunos, com intuito de obter um parâmetro de comparação para melhor compreensão
dos dados adquiridos. Com a realização da pesquisa percebeu-se que os professores
não conhecem as novas propostas pedagógicas e tão pouco utilizam as mesmas durante
seu processo de ensino aprendizagem. Percebeu-se que os mesmos ainda não estão
adequados e preparados para a nova proposta do MEC.

Palavras-chave: Educação Física Escolar, Proposições, Ensino Médio;


INTRODUÇÃO

Novas transformações em eixos políticos, econômicos, sociais dentre outros, vem


modificando a relação estado e sociedade no Brasil. Diante de tantas mudanças a escola e
o processo educacional também veem sofrendo tais modificações.
Na última década, novos conceitos de educação foram propostos. Em 1996 foi pro-
mulgada uma nova legislação para a educação LDB1, onde há um compromisso da Escola
com a nova realidade social. Entre as novas modificações da LDB, está presente uma nova
estrutura organizacional da Educação Escolar além de novas propostas. Nesse estudo, esta-
remos destacando o Ensino Médio, mas especificamente a Educação Física no Ensino Médio.
Segundo a nova LDB (art. 26 § 3º) a Educação física se tornou componente curricular
obrigatório da Educação Básica passando a ser facultativo ao aluno que: cumpra jornada
de trabalho igual ou superior a 6 horas, que tenha mais de trinta anos de idade, que esteja
prestando serviço militar inicial, ou que em situação similar, estiver obrigada a prática da
educação física, que esteja amparado pelo Decreto Lei nº 1.044, de 21 de outubro 1969 ou
que tenha filhos. Além disso, a lei rege que os conteúdos curriculares da Educação Básica
sigam dentre as diretrizes as seguintes: “promoção do desporto educacional e apoio as
práticas desportivas não formais e á difusão de valores fundamentais ao interesse social,
aos direitos e deveres do cidadão, de respeito ao bem comum e da ordem democrática”.
Com base nessas mudanças, esses estudos e discussões resultaram na elaboração
do projeto de reforma do ensino médio, organizado pela Secretaria de Educação Média
e Tecnológica do Ministério da Educação e do Desporto (BRASIL, 1997), que tem como
proposta formar um aluno capaz de ter conhecimentos básicos das necessidades do dia a
dia, de desenvolverem capacidade de pesquisar, buscar informações, analisá-las e selecio-
ná-las, melhorando assim a capacidade de aprender, criar e formular o tornado capaz de
ser um sujeito produtor de conhecimento e participante do mundo com o desenvolvimento
de pessoa-cidadão.
A Educação Física, como disciplina escolar, deve tratar da cultura corporal, em senti-
do amplo: sua finalidade é introduzir e integrar o aluno a essa esfera, formando o cidadão
que vai produzir e reproduzir, e também transformar essa cultura. Por tanto, trabalhar os
conteúdos de jogos, esportes, danças, lutas e ginásticas em benefício do exercício crítico
da cidadania e da melhoria da qualidade de vida.
No ensino médio, frequentemente as aulas de Educação Física costumam repetir os
programas do ensino fundamental, resumindo-se às práticas dos fundamentos de alguns
esportes e à execução dos gestos técnicos esportivos. É como se a educação física se
restringisse apenas a isto. Onde ocorre uma necessidade de ressignificar tais práticas no
1 Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, 9394/1996

272 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


contexto escolar e de se perceber que há uma variedade enorme de aprendizagens a serem
conquistadas, bem como propostas de reflexão sobre as diferentes formas de atuação do
professor na condução do ensino, tendo em vista uma formação de acordo com as novas
proposições para a Educação Física no Ensino Médio.
Neste sentido Correia (1996 apud GALANDO; ZAGO, s/d) relata que a educação física
deve ser ministrada de forma participativa onde haja integração dos alunos, fazendo com
que ocorra um aumento na participação e motivação destes nas aulas, integrando grupos
que por motivos adversos não as praticam.
Como mencionado por Mattos e Neira (2000 apud SANTOS; ZAFFALON JUNIOR,
2007) as aulas de educação física devem ser divididas em duas partes, a teórica e a prática,
onde na parte teórica o aluno aprenderia os fatores teóricos relevantes daquele conteúdo
para posteriormente vivenciá-lo com a prática.
Segundo Brito (1999 Santos; Zaffalon Junior, 2007), em suas pesquisas verificou-se
grande apreço por parte dos alunos nas aulas teóricas. Santos e Zaffalon Junior (2007) ainda
enfatizam que não há nada de obstáculos quanto ao professor trabalhar com aulas teóricas
e que o objetivo da educação física na escola é o desenvolvimento pessoal do indivíduo.
Assim, observa-se a importância de aulas teóricas participativas que visem à coope-
ração dos alunos, pois a partir daí, os mesmos passam a ter maior interesse na disciplina,
melhorando também o seu desempenho.
A Educação Física no ensino médio tem características próprias, devido a sua inser-
ção na área de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias modificando assim seus conceitos
estruturantes e as suas competências. De acordo com essas modificações existem três
eixos que organizam a disciplina que irá traduzir-se em: Representação e Comunicação,
Investigação e Compreensão e Contextualização Sociocultural.
O primeiro eixo trabalhará diretamente com linguagem corporal, símbolos e signos,
denotação e conotação, gramática, texto, interlocução, significação e dialogismo. Com essas
abordagens a Educação Física propiciará aos alunos que ordenem, de forma articulada, os
dados de experiências comuns aos membros de uma determinada comunidade linguística,
assim como possibilitar a compreensão da linguagem corporal como interação social que
amplia o reconhecimento do outro e de si próprio, instrumento do entendimento mútuo. Já no
segundo eixo trabalhará analise e síntese, correlação, identidade e integração, classificação,
informação e redundância e hipertexto. Objetivando propiciar condições para que o aluno
entenda e analise a realidade das práticas corporais e reflita sobre o seu contexto pois as
aulas de Educação Física têm a difícil missão de superar a perspectiva de simples hora de
lazer ou mera prática esportiva, constituindo-se como um trabalho que tematiza a cultura
corporal, encarada como linguagem.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 273


Com essa nova significação, a Educação Física no contexto escolar deve ultrapassar a
ideia de voltar-se apenas para o ensino do gesto motor correto. Num paralelo com as aulas
de Português, deverá realizar trabalhos escolares voltados para a mera análise gramatical,
morfológica ou sintática o que não garantirá a compreensão dos mecanismos da língua,
tanto quanto o aprendizado exclusivo dos gestos técnicos não garante a compreensão global
da linguagem corporal, porem o papel do professor de Educação Física é problematizar,
interpretar, relacionar, compreender com seus alunos as amplas manifestações da cultura
corporal e, dessa forma, facilitar a aprendizagem de competências que levem o jovem a
analisar e sintetizar temas de suma importância assim como compreendam mais apropria-
damente o discurso da mídia relacionando para o seu cotidiano e ate mesmo para a sua
aprendizagem em âmbito escolar. Esta dimensão cognitiva (crítica) far-se-á sempre sobre
esse substrato corporal, mas só é possível com o recurso da língua.
Por fim o terceiro e último eixo se baseia nos conceitos sobre Cultura, Globalização
versus localização, Arbitrariedade versus motivação dos signos e símbolos, Negociação
de sentidos. O corpo é expressão da cultura. Gestos e movimentos corporais são criados
e recriados pela cultura, passíveis de serem transmitidos através das gerações e imbuídos
de significados. A cultura corporal apresenta amplas possibilidades para discutir com os
alunos a influência e as contribuições da cultura local e da global. Gestos e movimentos
expressam comportamentos por meio de símbolos socialmente validados e são passíveis
de uma retradução pela linguagem oral, os gestos, as posturas e as expressões faciais são
criadas, mantidas ou modificadas em virtude de o homem ser um ser social e viver num
determinado contexto cultural.
A interdisciplinaridade na perspectiva da Educação Física tem grande eficácia, pois
conhecimento não é só aprendido, é, porém algo muito maior, ele é sentido, e a Educação
possibilita a sensação do saber uma vez que a ação interdisciplinar possibilita ao aluno
refletir, analisar e criar alternativas para assimilar dos conteúdos.
Esse contexto interdisciplinar é por essência a interação entre professores e aluno,
onde por consequência constroem o saber, o conhecimento numa ação mútua, e o professor
tendo seus objetivos pré-estabelecidos estimula o aluno a desenvolver suas capacidades
cognitivas, afetivas e sociais.
Segundo FAZENDA (1991:83). “Numa sala interdisciplinar, a obrigação é alternada pela
satisfação, a arrogância pela humildade, a solidão pela cooperação, a especialização pela
generalidade, o grupo homogêneo pelo heterogêneo, a reprodução pelo questionamento
do conhecimento”. Baseada nesse pensamento as disciplinas que propõem ao trabalho
interdisciplinar devem também estabelecer relações em suas possibilidades e limitações,
focando o conhecimento e sua forma de ser assimilado.

274 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Já para TAVARES (1995:54) “A interdisciplinaridade entra diretamente na relação con-
teúdo/método, ampliando e enriquecendo o ensino da Educação Física com qualidade na
escola.” Ela pressupõe uma postura engajada, participante de comprometimento pessoal.
Para CUNHA, (1984:11) citado por CAPARROZ, (1997:58), “... A característica básica
da Educação Física é o movimento. E este é o atributo que a diferencia das demais discipli-
nas. A ginástica, o jogo, o esporte e a dança são os seus elementos. Fazer Educação Física
é relacionar o movimento com a inteligência”.
Diante do exposto chega-se à seguinte problematização: se os professores de Educação
Física do Ensino Médio das redes públicas e privadas da cidade de Pinheiro - MA trabalham
dentro das novas propostas para esta fase da Educação Básica?
Como objetivo geral apresenta-se: Refletir sobre a compreensão de professo-
res de Educação Física do Ensino Médio acerca das novas propostas do Ministério da
Educação e Cultura (MEC)
Como objetivos específicos de avaliar como os professores do Ensino Médio estão
utilizando as novas propostas da Educação Física para esta nova fase.

METODOLOGIA

Tipos de pesquisa

A pesquisa caracterizou-se por um estudo de campo qualitativo e quantitativo, do tipo


exploratório e descritivo, que teve como intuito, analisar se os professores de educação física
do ensino médio conhecem as novas propostas e se as utilizam em suas aulas.

Períodos da pesquisa

A pesquisa foi realizada no mês de setembro de 2018 a maio de 2019, durante o


horário da aula de Educação Física dos professores entrevistados, nos seus respectivos
locais de trabalho.

Local

A pesquisa foi realizada em 4 (quatro) escolas de ensino médio da rede estadual de


ensino, 01 da rede privada de ensino da cidade de Pinheiro – Ma.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 275


População e amostra

A população da pesquisa foi constituída por professores graduados em Educação Física


que lecionam no ensino médio e seus respectivos alunos. A amostra envolveu 10 professore
e 160 alunos das respectivas escolas pesquisadas.

Critérios de inclusão e exclusão

Como critérios de inclusão utilizou-se a participação dos que se encontravam presentes


no dia das realizações das entrevistas e como critério de exclusão, a não realização com os
que não se encontravam presentes nos dias das realizações das entrevistas.

Instrumentos de coleta de dados

O instrumento utilizado para a realização da pesquisa constituiu-se de uma entrevista


semiestruturada com questões do tipo abertas e fechadas e a observação direta para se
constatar o conhecimento que os professores possuem diante das atuais propostas do mi-
nistério da educação para a educação física.

Análises de dados

Pesquisa com base no Parâmetro Curricular Nacional do Ensino Médio e suas refor-
mulações nas áreas de conhecimentos, em especial na educação física. Os dados foram
coletados através da pesquisa de Campo, logo após os dados foram tabulados e compara-
dos os resultados alcançados nos dois grupos avaliados, sendo os mesmos posteriormente
analisados e discutidos para apresentação.

Aspectos Éticos

Foi utilizado um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, contendo as informações


sobre o estudo e as condições de participação, foi apresentado aos participantes para ser
assinado. Os participantes foram informados sobre os objetivos da pesquisa e sobre o as-
pecto voluntário da participação, com preservação do anonimato, e ainda sobre o direito de
se retirarem do estudo em qualquer momento sem sofrerem nenhuma pressão ou prejuízo
social. Assim que os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido,
iniciaram-se os testes.

276 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Conforme os dados coletados encontraram-se algumas diferenças significativas entre as


perguntas realizadas no questionário e as respostas fornecidas pelos entrevistados. Na en-
trevista foram realizadas 13 perguntas de forma aberta e fechada referente aos conheci-
mentos e a metodologia de trabalho de cada professor assim como um questionário paralelo
realizado com seus respectivos alunos que se encontram no terceiro ano do ensino médio.
Apesar de todos os profissionais afirmarem conhecer as novas propostas suas respos-
tas em relação aos conhecimentos das mesmas, percebeu-se diferenças ao discorrer sobre
as Abordagens Pedagógicas e os documentos aqui apresentados.
“...A metodologia é tanto prática como teórica, onde os conteúdos ministrados são
desenvolvidos na sala de aula e na quadra...” (P10)
“...A Educação Física, e em especial a do Ensino Médio, é um componente que ainda
alcançou seu devido respeito, dentro e fora da escola, chegando até por vezes a ser excluído
dos projetos políticos pedagógicos de algumas escolas...”(P07)
Darido (2003) conta-nos que, a mesma, ao longo deste último século, sofreu influência
de várias tendências, das quais foram modificando os seus objetivos e propostas educa-
cionais. Para a autora (2003, p.1), essas questões “ainda hoje influenciam a formação do
profissional e as práticas pedagógicas dos professores de Educação Física”.
Quando questionada qual a importância da inclusão da disciplina no exame nacional
do ensino médio, percebe-se que compreendem que:
“...foi um avanço para o conteúdo e um marco histórico, mas ainda precisamos forta-
lecer na o mesmo...”(P05)
Como menciona Santin (1987, p.46) A Educação Física nem sempre foi considerada
de capital importância, nem mesmo por alguns de seus profissionais, porque não é posta
como uma real educação humana, mas apenas como suporte para atividades esportivas,
acabou sendo uma disciplina dispensável.
Em relação a se trabalhar a educação física de forma multidisciplinar e o desenvolvi-
mento delas em sala de aula os entrevistados demostraram reconhecer o sentido do termo
multidisciplinar, porém com uma leve dificuldade em contextualizá-la.
“... A multidisciplinaridade na educação física proporciona um excelente diálogo com
outras áreas de conhecimentos, buscando uma articulação entre os conhecimentos.” (P08)
“... Pontuando os conhecimentos que são comuns as áreas como, por exemplo, a
biologia, a filosofia e outros.”(P03)

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 277


Segundo Piaget (1972) a multidisciplinaridade se desenvolve na solução de um pro-
blema torna necessário, reunindo conceitos e informações de duas ou mais áreas do co-
nhecimento sem que os saberes próprios de cada área envolvida sejam modificados ou
desconsiderados”.
Em relação aos objetivos baseados nas suas próprias propostas os entrevistados foram
bem objetivos ao afirmarem:
“... Fortalecer conhecimentos da educação física e formar alunos crítico reflexivos.”(P06)
“... As propostas visam não somente os conteúdos do ENEM, mas proporcionar
aperfeiçoamento da cultura corporal, de tal forma que possam gerenciar suas próprias
atividades.”(P04)
O corpo surge soberano, inábil e desproporcional e o adolescente precisa saber lidar e
entender este novo corpo. Assim, “os movimentos do adolescente já não são mais simples-
mente o desabrochar, a manifestação do equilíbrio corporal, são elementos de uma cultura”
(MATTOS & NEIRA, 2000, p.94).
Segundo Piaget (1972), os adolescentes alcançam níveis mais alto do desenvolvi-
mento cognitivo, na fase de operações formais, quando desenvolvem o pensamento abs-
trato ou teórico.
A Educação Física através dos esportes, jogos, danças, ginástica, lutas que fazem
parte da cultura corporal historicamente produzida, pode oferecer aos alunos “experiências
que lhes façam adquirir um código ético, dentro de uma vivência da responsabilidade de
suas ações diante do outro que lhe está próximo, e diante da realidade social como um todo”
(GONÇALVES, 1997, p.93).
O esporte agora atendendo um maior número de pessoas, passa a ser utilizado como
objeto de divertimento e correção dos males surgidos na sociedade, como forma de “educar”,
trazendo bons modos, evitar doenças, ou seja, uma forma de socialização. Ramos (1982)
Em relação à inclusão da educação física no sistema de linguagens, códigos e suas
tecnologias os entrevistados acreditam que ser uma inclusão normal e necessária uma vez
que o processo educacional vem sofrendo ao longo dos anos mudanças e a educação física
por sua vez tem sofrido alterações importantes para a profissão, pois a cada ano tem-se
tornado, mas reconhecida e suas praticas e seus conhecimentos tem sido de grande valia
para a sociedade.
Uma vez que a Educação Física como integrante da escolarização básica, na qual o
Ensino Médio encontra-se inserido, aparece contemplada na atual estrutura curricular da
Educação brasileira, na área de Linguagens e Códigos e suas Tecnologias.
Segundo Mattos & Neira (2000, p.25):

[...] para inserir a Educação Física dentro do currículo escolar e coloca-la no

278 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


mesmo grau de importância das outras áreas conhecimento é através da fun-
damentação teórica, da vinculação das aulas com os objetivos do trabalho, da
não improvisação e, principalmente, da elaboração de um plano que atenda
às necessidades, interesses e motivação dos alunos.

Baseado nessa inclusão o questionamento para os entrevistados é, o que mudou nas


aulas com essas novas exigências dos ministérios da educação para a disciplina? Onde as
respostas, mas uma vez destoam da pergunta em virtude da inexistência de conhecimento
sobre as reais propostas da educação física para o ensino médio notando-se que apenas
um se aproximou da questão aborda.
“... A dinâmica em grupo que facilitou a incorporação de novos conteúdos a serem
trabalhados.”(P01)
“...Os processos de organização e planejamento do conteúdo...”(P02)
Gonçalves (1997, p.135) coloca que:
Ao longo da história, a Educação Física como instituição, do mesmo modo que a
Educação, representaram diferentes papeis, adquiriu diferentes significados, conforme o
momento histórico, e tem sido utilizado, muitas vezes, como instrumento do poder, para
veiculação de ideologias dominantes e preservação do status quo.
Quando foram questionadas quais as ferramentas; materiais de trabalho utilizados pelos
professores entrevistados colocaram como opção os materiais ilustrados na tabela abaixo:

tabela 01
materiais espor-
materiais texto Datashow jogos interativos música videoaulas
tivos
prof. 1 x x x
prof. 2 x x x x x
prof. 3 x x x
prof. 4 x x x x
prof. 5 x x
prof. 6 x x
prof. 7 x x
prof. 8 x x x
prof. 9 x
prof. 10 x x x x

Como se pode analisar todos os professores utilizam-se de materiais esportivos em


suas aulas de educação física; apenas 02 deles faz uso do recurso data show; 05 fazem
uso de textos em suas aulas; 05 utilizam jogos interativos; 06 se utilizam de música; apenas
01 utiliza vido aulas; Um dos professores trabalha com a linha de esporte de rendimento
apenas, não fazendo uso de materiais didáticos.
As aulas de educação física utilizam quase exclusivamente quadras e materiais espor-
tivos como bolas e redes. Acredita-se que tal situação se deva, principalmente aos baixos
recursos disponibilizados pelas respectivas escolas. Na nova concepção da disciplina, as

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 279


atividades e os procedimentos didáticos exigem uma variação muito maior. Por exemplo,
é possível utilizar os espaços vizinhos à escola, praças e parques públicos e, dependendo
do contexto geográfico, praias, rios ou montanhas para o desenvolvimento das ativida-
des. (PCNs, 1998)
Levanta-se as possibilidades de incentivar atividades complementares, como viagens,
excursões e visitas a feiras e aos museus de esporte, passeios ciclísticos em parques ecoló-
gicos, caminhadas em locais apropriados, assistência a campeonatos de diferentes modali-
dades e a espetáculos artísticos etc. A educação física possui uma gama de possibilidades
para o desenvolvimento dos conteúdos.
Por fim, foi questionado se os professores entrevistados tinham plano anual e seguiam
um cronograma para o desenvolvimento das aulas, todos afirmaram ter e fazer uso material.
O cronograma ordena os períodos do ano nos quais devemos executar determinada
ação. E o Plano anual é o planejamento feito para todo o ano letivo. O professor ao planejar o
trabalho deve ter uma familiaridade com o que deseja aplicar de modo que possa selecionar
os recursos, o método e a avaliação mais coerentes com a situação vivenciada.
Segundo Vasconcellos (2000) planejar é antecipar mentalmente um conjunto de ações
a ser realizada e agir de forma como foi previsto. È valido ressaltarmos que o ato de planejar
pode ser uma obra de um grupo bem como de uma só pessoa.
Para melhor compreender e analisar o perfil de atuação desses profissionais foi reali-
zado um questionário com seus respectivos alunos onde buscou-se saber como são minis-
tradas essas aulas e o resultado pode ser observado na figura a seguir:

160 Metod aula;


Prática; 160
140
120
Metod aula;
Teórica
100 Teor/Ptrat;
Prática
80 97
Esportes
60
Metod aula; Metod aula; Teor/Ptrat
40
Teórica; 40 Esportes; 40
20
0

A partir dos dados levantados, pode-se perceber que todos os alunos comentaram ter
aulas de caráter prático, Cerca de 40 alunos comentam que as aulas são baseadas apenas
nas práticas desportivas. Já 40 alunos afirmam ter apenas aulas teóricas e 97 alunos co-
mentam um haver um equilíbrio entre aulas teóricas e práticas.

280 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Data
Texto 20 Show 20 Jogos
Interativ
os 90
Esportiv
o 160 Data Show Video
Jogos Interativos
Video Aula
Aula 20
Esportivo
Texto

Todos os entrevistados afirmaram que os materiais mais usados para as aulas de


educação física são materiais esportivos estavam presentes nas aulas de todos os entre-
vistados, porem analisando a respostas dos alunos cerca de 20 alunos afirmam ter apenas
aulas de cunho teórico o que demonstra que nem todos os professores concentram seus
métodos em aulas práticas.
O componente curricular Educação Física sofreu, por anos, com o distanciamento entre
aulas teóricas e aulas práticas, pois cunhou sua importância na concepção prática e não em
uma relação entre os conteúdos sistematizados e a própria prática, muitas vezes deixando as
aulas no simples ato de “fazer por fazer”. Batista (2001, p.16) afirma que “alguns professores
de Educação Física sentem necessidade do conhecimento teórico, o qual é fundamental,
para assim se fazer uma adaptação dessas ideias para a parte prática”.
Só que, a proposta para o Ensino Médio, objetiva mais do que a memorização por parte
dos alunos, mas visa desenvolver neles mesmos a capacidade de pesquisa, busca análise
e seleção de informações, ou seja, instrumentalizar para que o aluno continue a buscar o
conhecimento e tem caráter de preparação para o trabalho, conforme Brasil (2000). Desse
modo, estaria contribuindo com a função de educar para a vida.
A Educação Física deve ir além de ensinar atividades, sair da dimensão procedimental,
pois deve garantir ao aluno a aproximação com as dimensões conceituais e atitudinais, ou
seja, proporcionar o conhecimento das informações sistematizadas sobre os conteúdos.
Não diminuindo a importância dos procedimentos práticos uma vez que o aprender a fazer
e uma das propostas para esse segmento.
Em relação à sequência metodológica e o domino de conteúdo, todos os alunos afir-
mam que seus professores possuem esses domínios.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 281


O Planejamento é processo de busca de equilíbrio entre meios e fins, entre recursos
e objetivos, visando ao melhor desenvolvimento da atividade. O ato de planejar é sempre
processo de reflexão, de tomada de decisão sobre a ação.

Segundo Libâneo, Planejamento Escolar “é um processo de racionalização,


organização e coordenação da ação docente, articulando a atividade escolar
e a problemática do contexto social” (1992, p. 221)

O planejamento exige do professor constante busca e atualização, já que os conteú-


dos e conhecimentos, e a todo o momento se renovam garantir assim a coerência entre
as atividades desenvolvidas. Enquanto aprendem o significado de signos e símbolos da
linguagem corporal, os alunos passam a construir e ativar a competência de “analisar as
diferentes manifestações da cultura corporal e de interpretar as simbologias específicas de
determinadas culturas” (PCNEM, 1998, p. 162).
Segundo os alunos, os professores não costumam trabalhar dentro da esfera de textuali-
zação ou mesmo com videoaulas, isto demonstra, uma dificuldade no acesso a determinados
materiais e uma baixa disponibilidade de infraestrutura para o desenvolvimento das aulas.
A disciplina de Educação Física deverá propiciar aos alunos que ordenem, de forma
articulada, os dados de experiências comuns aos membros de uma determinada comunidade
linguística, assim como possibilitar a compreensão da linguagem corporal como interação
social que amplia o reconhecimento do outro e de si próprio, instrumento do entendimento
mútuo. (PCNEM, p. 145)
Para concluir foi perguntado se o professor explica a importância da disciplina na in-
clusão do exame nacional do ensino médio e como a mesma vem abordada.

80 80
70
60
50 50

40
30 30
Abordagem ENEM
20
10
0
Não Fala Explica e fala mas
trabalha não
explica

282 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Como pode ser observado os professores sabem da inclusão, conhecem a importância
de deixar os alunos a par dessas novas mudanças porém não se tem um embasamento
teórico valido para dar continuidade na informação , uma vez que apenas 18,75% dos alunos
afirmam que os professores explicam e trabalham dentro dessas novas propostas, 31,25
% dos alunos conhecem essa nova inclusão mas alegam não saber como esse conteúdo
poderá vir a ser cobrado e 50% nem sabiam dessa nova inclusão.
O que comprova que os professores não estão trabalhando em sua totalidade com as
novas propostas estabelecidas pelo Ministério da Educação, onde uma delas e capacitar o
aluno a trabalhar suas multidisciplinariedades fazendo com que esse aluno seja capaz de
estabelecer relação com o contexto social que está inserido e com os fatores relacionados
à sua existência.
“É importante que as pessoas se movimentem tendo consciência de todos os seus
gestos. Precisam estar pensando e sentido o que realizam” (OLIVEIRA 2001, p.96).
No ano de 2009 a Educação Física entra como componente a ser avaliado no Exame
Nacional do Ensino Médio (ENEM) na área de linguagens (BRASIL, 2009). Pensar em um
exame nacional que envolva a educação física significa aceitar que pelo menos alguns
conteúdos são comuns, básicos, necessários e passíveis e de democratização a toda a
população escolar neste nível no Brasil.
A matriz de referência do Enem (BRASIL, 2009) coloca como competência para a
Educação Física “compreender e usar a linguagem corporal como relevante para a própria
vida, integradora social e formadora de identidade”. Neste sentido entender a reversibilidade
de um processo de treinamento é um conhecimento fundamental no sentido de destacar a
importância do caráter cotidiano, da necessidade fisiológica de atividades físicas regulares
para a saúde do indivíduo.

CONCLUSÃO

A pesquisa demonstrou que as mudanças educacionais vêm ocorrendo, mas os profis-


sionais ainda não se ativeram à necessidade de acompanhar essas modificações. A valoriza-
ção do componente curricular, criam uma relação de interdependência com o compromisso
e responsabilidade com tais adaptações.
Percebeu-se um determinado distanciamento, por parte do profissional, em estar pre-
parado para estas novas propostas. A inclusão da disciplina nas linguagens e códigos, além
de vir causando confusão na cabeça de professores, alunos e gestores, demonstra a neces-
sidade de uma maior democratização nos debates e amadurecimento acerca dos mesmos,
bem como uma maior compreensão acerca da necessidade de materiais e infraestrutura
para o desenvolvimento do conteúdo de forma minimamente qualitativa.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 283


REFERÊNCIAS
1. BARNI, Mara Juttel; SCHNEIDER, Ernani José. A Educação Física no ensino médio: Re-
levante ou irrelevante? Disponível em: http://www.posuniasselvi.com.br/artigos/rev03-02.pdf

2. BRASIL, Ministério da educação. Orientações curriculares para o ensino médio: linguagens,


códigos e suas tecnologias. Brasília, 2008.

3. BRASIL, Ministério da educação. Secretaria de educação Média e Tecnológica. Parâmetro


Curricular Nacional: Ensino Médio. Brasília: Ministério da Educação, 2002.

4. DARIDO, Suraya Cristina. Educação Física na escola: questões e reflexões. Rio de Janeiro:


Guanabara Koogan, 2003.

5. GALANTE, Regiane Cristina; ZAGO, Nathalia. Educação Física no ensino médio: concepções


e reflexões. Disponível em: http://www.eefe.ufscar.brup.br. Acesso em: 28 jun 2011.

6. Matta; Dinalba Ferreira da. A Educação Física no Brasil: com uma visão transformadora na
educação básica, transpirando menos e pensando mais. Lato & sensu. Belém, v.II, n.3. jul 2001.

7. SANTOS, Mariel Henrique Teixeira; ZAFFALON JÚNIOR, José Roberto. As perspectivas da


educação física no ensino médio. 2007. 45f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação
em Licenciatura Plena em Educação Física) – Universidade do Estado do Pará, Altamira, 2007.

8. XAVIER, Fabio Pereira. A Educação Física Como Um Componente Interdisciplinar. Disponí-


vel em http://www.educacaofisica.com.br/, Portal Maratimba.com – Artigos, Espirito Santo, 2008.

9. FAZENDA, Ivani (org.). Práticas Interdisciplinares na Escola. 2ª Ed., São Paulo: Cortez, 1993.

10. TAVARES, Marcelo, Uma experiência interdisciplinar nas aulas de Educação Física. Revista
Movimento. Ano 2 – nº 3 – Recife: UFPE, NOVEMBRO, 1995.

11. CAPARROZ, Francisco Eduardo. Entre a Educação Física na escola e a Educação Física
da escola: a Educação Física como componente curricular. Vitória: CEFD-UFES, 1997.

12. MATTOS, Mauro G. & NEIRA, Marcos G. Educação Física na adolescência: construindo o
conhecimento na escola. São Paulo: Phorte Editora, 2000.

13. GONÇALVES, Maria Augusta S. Sentir, pensar, agir: corporeidade e educação. São Paulo:
Papirus, 1997.

14. PAPALIA, Diane E. & OLDS, Sally W. Desenvolvimento humano. Porto Alegre: Artes Médi-
cas, 2000.

15. RAMOS, J. J. Os exercícios físicos na história e na arte. São Paulo: IBRASA, 1982

16. LIBÂNEO, J. C. Organização e gestão escolar: teoria e prática. 4. ed. Goiânia: Alternativa,
2001

17. VASCONCELLOS, Celso S. Planejamento: Projeto de Ensino- Aprendizagem e projeto Politico


Pedagógico. 9 ed. São Paulo: Libertad. 2000.

18. SANTIN, Sikvino. Educação Física: uma abordagem fisiológica de corporeidade. Ijuí: Unijuí,
1987.

284 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


19. BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, n 9394\96 de 20\ 12\ 1996.

20. PIAGET, J. Epistemologie des relations interdisciplinaires. In: CERI (Ed.). L’interdisciplinarité:


problèmes d´enseignement et de recherche dans les Universités. Paris: UNESCO/OCDE,
1972. p. 131-144

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 285


21
“ Efeitos da veisalgia na
performance de atletas
amadores de futebol de campo
em um município de Minas
Gerais

Carlos Aurílio Cobra Oliveira


UNIFENAS

Guilherme Azevedo Camilo


UNIFENAS

Yvan Fernandes Vilas Boas


UNIFENAS

Giuliano Roberto da Silva


UNIFENAS

10.37885/201102146
RESUMO

Objetivo: Verificar os efeitos da ingestão de álcool em jogadores amadores de futebol,


comparando o desempenho físico-motor esportivo com os resultados do consumo má-
ximo de oxigênio - VO2MÁX em jogadores amadores de futebol, com veisalgia, ou popu-
larmente denominada como “ressaca”, mediante a aplicação do Yo-Yo Test. Materiais
e Métodos: A pesquisa foi realizada no Campo Universitário da Universidade José do
Rosário Vellano – UNIFENAS, localizada na cidade de Alfenas - MG. Foram convida-
dos a participar voluntariamente da pesquisa 12 jogadores amadores de futebol. Foram
aplicados dois testes de Yo-Yo Test para a comparação de cada indivíduo, sendo que
um dos testes os jogadores estavam com veisalgia, e calculados o consumo máximo de
oxigênio, VO2MÁX. Resultados: Nos dois testes aplicados, houve queda de rendimento
entre os participantes com veisalgia. Conclusão: Pode-se concluir que a ingestão de
bebidas alcoólicas por jogadores amadores de futebol altera o desempenho físico motor
mediante o Yo-YoTest, diminuindo o consumo máximo de oxigênio- VO2MÁX.

Palavras-chave: Educação Física, Bebida Alcoólica, Esporte Amador.


INTRODUÇÃO

A preparação física de um atleta é de grande importância para sua performance. O edu-


cador físico tem sua participação importante à formação do indivíduo, na preparação física
que visa provocar alterações no organismo principalmente no sistema cardiorrespiratório,
sistema de transporte de oxigênio, força muscular, de forma a propiciar a melhora da resis-
tência dos jogadores de futebol, que estão expostos a um número potencial de estressores
que alteram o desempenho atlético (BALBÉ, 2009).
O futebol envolve exercícios intermitentes e a intensidade do esforço físico. Para su-
portar todas essas exigências, o corpo de um jogador de alta performance deve estar em
plena sintonia e preparo (BARBOSA, 2014; CARVALHO et al., 2014; COSTA et al., 2010).
Segundo Costa et al. (2010), o futebol é o esporte coletivo mais praticado no mundo,
considerado como a principal modalidade esportiva do Brasil, pode ser praticado por pes-
soas de todas as idades e níveis sociais, o que desperta o interesse pelos seus jogadores.
Muitas pessoas almejam ser futebolista, no início ingressam em equipes amadoras, e sua
prática voluntária é constituída de diferentes transições de atletas. Porém, essas fases de
transições apresentam características específicas em relação às interferências existentes
entre a vida social, ambiente e o atleta.
Segundo Carvalho (2014), pode ocorrer problemas que antecipam o final da carreira,
em que entre eles está o abuso excessivo da ingestão de bebidas alcoólicas.
O álcool é uma substância psicoativa e produz alterações no sistema nervoso central,
sendo a droga mais consumida no mundo, onde geralmente é ingerida em eventos sociais,
inclusive esportivos, consequentemente por atletas (SANTOS & TINUCCI, 2004). Quando
a dose ingerida é excessiva, pode provocar redução da coordenação motora, reflexos do
indivíduo, mesmo quando ingerido em pequenas doses pode causar estado de euforia e
desinibição (SUTTER & SCHUTZ, 2008).
Para Sousa (2005), o consumo de álcool por atletas é um assunto muito discutido nos
basti­dores do esporte. Sabe-se que diversos atletas considerados de elite e/ ou amadores,
ingerem álcool frequentemente, tanto em períodos de treinamento quanto em de competição.
A veisalgia mais conhecida como “ressaca” está sempre associada à intoxicação agu-
da por álcool. Inicia-se cerca de 6 a 8 horas após o consumo, o qual é o período em que a
concentração de álcool no sangue diminui, e pode durar até 24 horas, podendo ocasionar
sintomas que atrapalham o desenvolvimento físico como fadiga, tonturas, tremores entre
outros (RODRIGUES, 2008).
Dentre as capacidades motoras requeridas por um atleta de futebol, pode-se destacar
a capacidade de resistência aeróbia, que tem importância fundamental não só durante a

288 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


partida, como também no período destinado à recuperação dos jogadores (LIMA, 2005;
ROSA & ROSA, 2011).

OBJETIVO

Verificar os efeitos da ingestão de álcool em jogadores amadores de futebol do municí-


pio de Alfenas – MG, comparando o desempenho físico-motor esportivo com os resultados
do consumo máximo de oxigênio - VO2MÁX em jogadores amadores de futebol com veisalgia,
mediante a aplicação do Yo-Yo Test.

MÉTODOS

A pesquisa foi realizada no Campo Universitário da Universidade José do Rosário


Vellano – UNIFENAS. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da
Universidade José do Rosário Vellano, com número do parecer: 1.327.179. Foram convi-
dados a participar voluntariamente da pesquisa, 12 indivíduos jogadores amadores de fute-
bol com veisalgia do município de Alfenas - MG, os quais foram orientados sobre o Termo
de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) conforme as recomendações da Resolução
466/12, constando os riscos e benefícios da pesquisa.
Todos os participantes foram submetidos à ficha de avaliação. O teste aplicado foi
o Yo-Yo Test e após, calculado o consumo máximo de oxigênio - VO2MÁX.
Foram aplicados dois testes de Yo-Yo Test para a comparação de cada indivíduo. No pri-
meiro teste realizado, os participantes foram instruídos a não ingerir álcool por sete dias,
chegar ao campo em estado de descanso, hidratado e não terem realizado nenhum tipo de
exercício físico exaustivo. Para o segundo teste os participantes ingeriram 0,5ml de etanol
por kg de peso corporal (SUTER e SCHULTZ, 2008) na forma de cerveja, seis horas antes
do início do teste (ALVES JR., 2012). Os voluntários fizeram um aquecimento e alongamento
leve antes de iniciar a prática.
Para calcular o VO2MÁX, foi utilizada a seguinte fórmula:

VO2MÁX = (- 24,4 + (6,0 . x)


(x = velocidade em km/h (no estágio atingido))

A tabela utilizada para avaliar o Yo-Yo Test, é apresentada abaixo.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 289


Tabela 01. Yo-Yo Test

FONTE: Duarte e Duarte (2001).

RESULTADOS

Os resultados apresentados na Figura 01, referem-se ao Yo-Yo Test, e os valores com-


parativos individuais da capacidade aeróbia dos avaliados são apresentados na Figura 02.
Os resultados da primeira etapa do teste (Figura 01) demonstra os valores de 12 jo-
gadores de futebol amador sem veisalgia, os quais (80%) dos jogadores manteve a média
de 8 pontos no Yo-Yo Test e (20%) obtiveram a média de 7 pontos.
Entretanto na segunda etapa do teste, os quais 12 jogadores estavam com veisalgia
às médias foram diferentes em relação à primeira etapa do Yo-Yo Test (Figura 01):

• 16,6%) dos jogadores no segundo teste se estabilizaram na mesma pontuação que


o primeiro com oito pontos;
• (8,4) obteve uma média de seis pontos;
• (41,6%) manteve uma média de cinco pontos;
• (16,7%) obtiveram a média de quatro pontos;

290 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


• (16,7%) resultaram em três pontos.

Figura 01. Resultados do Yo-Yo Test

No Teste 1 (Figura 02), em que os jogadores estavam em situação normal, não inge-
riram bebida alcoólica, (80%) destes jogadores alcançaram 48mL/kg por minuto de VO2MÁX.
Porém no Teste 2 os 12 jogadores estavam com veisalgia e atingiram a seguinte meta:
(16,6%) dos jogadores no segundo alcançaram 47mL/kg/min de VO2MÁX;
(8,4%) atingiram 43ml/kg/min de VO2MÁX;
(41,6%) conseguiram 39ml/kg/min de VO2MÁX;
(16,7%) obtiveram 35ml/kg/min de VO2MÁX;
(16,7%) resultaram em 33ml/kg/minVO2MÁX.

Figura 02. VO2MÁX expresso em mililitros por kg por minuto

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 291


DISCUSSÃO

A ingestão de bebidas alcoólicas por atletas é um assunto a se discutir, principalmente


por profissionais da área da saúde bem como educadores físicos (Santos e Tinucci, 2004).
De acordo com a ACSM (1997), a ingestão de álcool pode exercer efeito prejudicial
nas habilidades psicomotoras como no tempo de reação, equilíbrio, estabilidade, precisão
e coordenação. Além de influenciar também nas funções metabólicas ou fisiológicas essen-
ciais para as performances físicas, como o metabolismo energético, consumo máximo de
oxigênio (VO2MÁX), batimentos cardíacos, rendimento cardíaco, fluxo sanguíneo muscular,
diferença de oxigenação arteriovenosa ou respiração. Prejudica também a regulação da
temperatura corporal durante o exercício prolongado em ambientes frios, podendo também
diminuir força, resistência muscular, velocidade e resistência cardiovascular. Essas reações
variam de indivíduo para indivíduo, e também de acordo com as circunstâncias em que a
bebida é ingerida.
O’Brien (1991), realizou uma pesquisa onde avaliou o efeito que o álcool consumido
na noite anterior (veisalgia), teria na performance de 15 atletas de rugby. Foram avaliadas
condições aeróbias e anaeróbias em uma sexta-feira à tarde. Os atletas foram orientados a
consumir a quantidade usual de álcool que estavam acostumados a beber às sextas-feiras.
Nenhuma quantidade foi especificada. Todos os sujeitos tiveram uma noite de sono e café
da manhã similares. A fim de que os mesmos testes pudessem ser repetidos, os atletas
retornaram ao campo de treinamento 16 horas depois. Os resultados mostraram que a
veisalgia teve efeito negativo significante na performance aeróbia dos jogadores de rugby,
pois foi observada queda de 11,4%, em média, no rendimento dos atletas com veisalgia, o
que corrobora com os resultados encontrados neste estudo.
Para Lima (2005) e Rosa e Rosa (2011), o VO2MÁX influencia no desempenho físico do
jogador, e quando este reduz indica que também reduz a performance do jogador, sendo
prejudicial não somente a saúde desses atletas como também em uma partida de futebol.
Nos estudos de Burke et al. (2003), a ingestão aguda de álcool por atletas, afetou o
metabolismo dos carboidratos no fígado e no músculo, além de diminuir a captação de glicose
pelo músculo esquelético e prejudicando a utilização da glicose durante o exercício. Logo, o
álcool não é uma substância capaz de melhorar a força, a potência, a endurance muscular
e inclusive pode diminuir o desempenho durante o exercício.

292 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


CONCLUSÃO

Pode-se concluir que a ingestão de bebidas alcoólicas por jogadores amadores de


futebol alterou o desempenho físico motor mediante o Yo-YoTest, diminuindo o consumo
máximo de oxigênio - VO2MÁX, comprovando a redução do rendimento físico destes atletas.

REFERÊNCIAS
1. ALVES JR, D.R. Ressaca ou veisalgia: repercussão na direção veicular. Disponível em: <
http://www.transportabrasil.com.br/2012/06/ressaca-ou-veisalgia-repercussao-na-direcao-vei-
cular/> Acesso em: 03 de jan. 2018.

2. AMERICAN COLLEGE OF SPORTS MEDICINE. O uso do álcool nos esportes. Rev Bras Med
Esp. Vol. 3. Num. 3. 1997. p. 89-91.

3. BALBÉ, G.P. Educação Física e atividades esportivas: qual seu papel na iniciação desportiva,
educar ou jogar? Revista Digital - Buenos Aires. Vol. 13. Num. 128. 2009. p. 1-11.

4. BURKE, L.M. et al. Effect of the alcohol intake on muscle glycogen storage after prolonged
exercise. J Appl Physiol. Vol. 95, Num. 2. 2003. p. 983–990.

5. CARVALHO, A.G.P. Benefícios e dificuldades na carreira futebolística. Disponível em: <


http://www.portaleducacao.com.br/educacao-fisica/artigos/10663/beneficios-e-dificuldades-na-
-carreira-futebolistica#!1#ixzz3C5jOkLU4> Acesso em: 03 de jan. 2018.

6. COSTA, V.T. Fases de transição da carreira esportiva: perspectiva de ex-atletas profissionais


do futebol brasileiro. Revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP. Vol. 8. Num.
3. 2010. p. 84-103.

7. DUARTE, M.F.S.; DUARTE, C.R. Validade do teste aeróbico de corrida de vai-e-vem de 20


metros. Rev. Bras. Ciên. e Mov. Vol. 9. Num. 3. 2001. p. 7-14.

8. LIMA, A.M. J. Correlação entre as medidas direta e indireta do VO2max em atletas de futsal.
Revista Brasileira de Medicina do Esporte. Vol. 11. Num. 3. 2005. P. 119-131.

9. RODRIGUES, J.F.S. Consumos de Álcool nos Estudantes de Enfermagem. Rev Porto. Vol.2.
Num. 3. 2008. p. 15- 48.

10. ROSA, J.C.; ROSA, L.E. Comparação dos resultados de consumo máximo de oxigênio em
atletas de futebol, mediante aplicação de dois teste sindiretos de campo. Revista Brasileira
de Prescrição e Fisiologia do Exercício. Vol. 5. Num. 29. 2011. p. 400-405.

11. SUTTER, P.M.; Schutz, Y. The effect of exercise, alcohol or both combined on healt and phy-
sical performance. International Journal of Obesity. Vol. 32. Num. 6. 2008. p. 48-52.

12. SANTOS, M.B.P. TINUCCI, T. O consumo de álcool e o esporte: Uma visão geral em atletas
universitários. Revista Mackenzie de Educação Física e Esporte. Vol. 3. Num. 3. 2004. p.
27-43.

13. SOUZA, D.P.O. Álcool e alcoolismo entre adolescentes da rede estadual de ensino de Cuiabá,
Mato Grosso. Revista Saúde Pública. Vol. 39. Num. 4. 2005. p. 585-92.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 293


22
“ Efeitos de um programa HIIT na
aptidão aeróbia e biomarcadores
cardiovasculares de escolares

André Luis Messias dos Santos Duque


INC

Grazielle Villas Boas Huguenin


INC

Luiz Fernando Rodrigues Junior


INC

10.37885/201102021
RESUMO

Objetivo: O objetivo desse estudo foi avaliar os efeitos de um programa de exercícios


hiit na aptidão aeróbia e biomarcadores cardiovasculares de escolares Métodos: Ensaio
clínico randomizado realizado com 54 escolares (26 grupo intervenção e 28 grupo contro-
le) de uma escola localizada no Rio de Janeiro. Foram avaliados no momento basal e ao
término do programa: aptidão aeróbia (teste de corrida e caminhada de 6 minutos), estado
nutricional (IMC), composição corporal (dobras cutâneas) e perfil bioquímico (perfíl lipídico
e glicemia). O programa hiit consistiu em 10 estímulos de 15 segundos em velocidade
máxima, com recuperação de 90 segundos, com frequência de 2 vezes na semana, por
4 meses. Resultados: Ao término do programa de exercício HIIT, o grupo intervenção
aumentou a distância percorrida e o VO2max comparado com o grupo controle, passando
a ter diferença estatisticamente significativa (p>0,001) na aptidão aeróbia. Não foram
encontradas diferenças nas demais variáveis analisadas (estado nutricional, composição
corporal e perfil bioquímico). Conclusão: Apesar do programa hiit não ter melhorado os
biomarcadores antropométricos e plasmásticos de escolares, foram responsáveis por
aprimorar os níveis de aptidão aeróbia no grupo intervenção. Os resultados podem servir
de incentivo a programas destinados a promover a saúde cardiovascular de escolares.

Palavras-chave: Atividade Física, Criança, Adolescente, Doença Cardiovascular.


INTRODUÇÃO

As doenças cardiovasculares (DCV), principal causa de morte no mundo (NASCIMENTO


et al., 2018), foram responsáveis por aproximadamente 18 milhões de mortes em 2015
(GBD, 2015). Em relação ao Brasil, as DCV representam aproximadamente 30% do total
de óbitos (SIQUEIRA; SIQUEIRA-FILHO; LAND, 2015), além de gerarem um custo de mais
de 750 milhões de dólares por ano (BAHIA et al., 2012), sendo, portanto um sério problema
de saúde pública.
Não obstante a herança genética exercer forte influência nas DCV, seu desenvolvimento
decorre predominantemente em função de fatores ambientais e hábitos relacionados ao es-
tilo de vida (COELHO; BURINI, 2009), como por exemplo, a inatividade física. A inatividade
física representa um sério fator de risco para o surgimento de muitas doenças crônicas não
transmissíveis (DCNT) como DCV, diabetes tipo 2 e alguns tipos de câncer (WHO, 2018).
Embora as DCV se manifestem predominantemente em adultos, sua origem e evolução
são fortemente influenciadas pela presença de fatores de risco cardiovascular (FRCV) em
crianças e adolescentes (BARBOSA, 2016). Estudos nacionais encontraram alta prevalência
de FRCV em crianças e adolescentes (CUREAU et al., 2016; FARIA-NETO et al., 2016), o
que representa uma ameaça à saúde e qualidade de vida adulta.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que pessoas jovens (entre 5 e
17 anos de idade) devem realizar 60 minutos de exercício físico em intensidade moderada
a vigorosa diariamente para obter benefícios nos sistemas cardiovascular, neuromuscular
e musculo-esquelético (OMS, 2010). Todavia apesar dessa recomendação o estilo de vida
jovem tido sido caracterizado pela inatividade física (CUREAU et al., 2016).
Dentre as várias formas de exercício físico, o HIIT (treinamento intervalado em alta
intensidade), caracterizado por estímulos curtos em intensidade vigorosa alternados com
períodos de recuperação em baixa intensidade, tem sido considerado uma boa alternativa
por promover benefícios à saúde cardiovascular em crianças e adolescentes (COSTIGAN
et al., 2015). Todavia são escassos os estudos que investigaram os efeitos do hiit em crian-
ças e adolescentes saudáveis.
Nesse contexto, o objetivo desse trabalho consistiu em avaliar os efeitos de um pro-
grama hiit com duração de 4 meses na aptidão aeróbia e biomarcadores cardiovascula-
res de escolares.

OBJETIVO

- Verificar os efeitos de um programa de exercício físico HIIT na aptidão aeróbia e


biomarcadores cardiovasculares de escolares.

296 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


MÉTODOS

Desenho do estudo

Tratou-se de um ensaio clínico randomizado controlado que avaliou os efeitos de


um programa de exercício físico HIIT na aptidão aeróbia e biomarcadores cardiovascula-
res em escolares.

Randomização

A randomização foi feita no programa Openepi.com (o Openepi é um programa gratuito


e com código aberto para estatísticas epidemiológicas, desenvolvido nos Estados Unidos da
América) por turmas. No intuito de obter grupos semelhantes, foram randomizados alunos
de turmas do 4º ao 9º ano do ensino fundamental que se encontravam dentro dos critérios
de inclusão. Não houve cegamento.

Critérios éticos

O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), do Instituto
Nacional de Cardiologia (INC) em Agosto de 2017, (CAAE 68067517.0.0000.5272)
(Anexo A) nos termos da Resolução n.º 466/12 do Conselho Nacional de Saúde, expedida
em 12/12/2012. A pesquisa foi autorizada pela direção da instituição escolar e em seguida
houve uma reunião com pais/responsáveis e escolares para que fossem esclarecidos todos
os procedimentos do estudo. Participaram do estudo os escolares que entregaram os termos
de assentimento e de consentimento livre e esclarecido datado e assinado.

Critérios de elegibilidade

Critérios de inclusão:
- Estar regularmente matriculado na instituição escolar;
- Possuir entre 9 e 15 anos;
- Entregar os termos de consentimento e assentimento datado e assinado.
Critérios de exclusão:
- Ser portador de alguma doença (hipertensão, cardiopatia, lesão muscular) que im-
possibilite a prática de exercício físico.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 297


Amostra

A amostra foi composta por 54 escolares de ambos os sexos com faixa etária entre 9
e 15 anos. O grupo controle foi composto por 28 escolares que não realizaram o programa
de exercício físico HIIT, porém assim como o grupo intervenção continuar a ter aulas de
educação física um dia na semana. O grupo intervenção, que realizou o programa de exer-
cício físico HIIT durante 4 meses, foi composto por 26 escolares.

Avaliações

Aptidão aeróbia: A avaliação da aptidão aeróbia consistiu na realização do teste de cor-


rida/caminhada de 6 minutos que foi realizado numa pista plana, com marcação do perímetro
o qual tinha extensão de 490m e demarcada de 100 em 100m, sendo a última marcação
de 90m. Após 5 minutos de aquecimento (1 minuto de caminhada, 3 minutos de trote e um
de caminhada), cada escolar percorreu (podendo alternar caminhada com corrida) a maior
distância possível nos tempo estimado. Os escolares foram alertados para que evitassem
piques e o professor realizou o teste de orientação antes para que eles entendessem per-
feitamente a sua realização. Ao fim de 6 minutos foi soado um apito e cada escolar deveria
permanecer parado para que a medição fosse realizada. O cálculo do VO2máx foi realizado
através da fórmula: VO2 = 41.946 + 0.022(TC6M) – 0.875(IMC) + 2.107(SEXO), onde TC6M:
distância em metros no teste; IMC: índice de massa corporal, considerando zero para me-
ninas e um para meninos.
Estado nutricional: ocorreu dentro da instituição escolar e consistiu na aferição do peso
(kg) e altura (m), para cálculo do IMC (kg/m2) e na medida do perímetro da cintura (PC). Para
tal, os escolares ficaram descalços, com o uniforme escolar (short e camiseta). O peso foi
obtido em balança digital portátil da marca Microlife, com capacidade de 180 kg e escala
de 100g. Para aferir a estatura foi utilizado estadiômetro portátil da marca Alturexata, com
resolução de 1 mm e campo de uso de até 213 cm. As medidas da estatura e peso corpo-
ral foram anotadas em centímetros e quilogramas em uma casa decimal. Para avaliação
do PC foi utilizada uma trena inelástica. A medida do PC foi mensurada no ponto médio
entre a crista ilíaca e a face externa da última costela.
Composição corporal: ocorreu dentro da instituição escolar e consistiu na avaliação
das dobras cutâneas triciptal, subescapular e perímetro do braço. A medida do perímetro do
braço (PB) foi realizada com fita métrica inextensível da marca Cescorf. Para a mensuração
das dobras cutâneas, as meninas permaneceram com top e os meninos foram solicitados
a ficar sem blusa. Foi utilizado adipômetro da marca Lange que exerce pressão de 10 g/
mm2 e tem precisão de 1 mm. Com o polegar e o indicador da mão esquerda elevou-se uma

298 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


dobra da pele e do tecido adiposo subcutâneo cerca de 1 cm acima do local onde foi medida
a dobra cutânea. A leitura do valor das dobras cutâneas foi feita cerca de três segundos
após o relaxamento da pressão do aparelho. Foram realizadas três medidas consecutivas,
calculando-se a média entre elas. Foram avaliadas as dobras cutâneas triciptal (localizada
na parte posterior do braço sobre o músculo do tríceps) e sub-escapular (no ângulo infe-
rior da escápula).
Perfil bioquímico: o perfil bioquímico foi determinado a partir de uma amostra de sangue
coletado por profissional previamente treinado (no ambiente escolar) de cada participante,
após jejum de 12 horas. Após coleta, as amostras foram transportadas em condições ideais
(resfriadas à 0ºC, em recipiente isolante térmico) para o laboratório PRONTOLAB, onde
foram realizadas as análises. Para a determinação das concentrações plasmáticas de CT,
LDL-c, HDL-C, TG e Glicemia, as amostras foram centrifugadas (centrífuga da marca RDE,
Brasil) no mesmo dia e os exames foram realizados no analisador para química clínica (BS-
200/Mindray, China).

Protocolo do programa de exercício HIIT

O programa de exercício físico HIIT, realizado durante quatro meses em quadra po-
liesportiva localizada próxima à escola, ocorreu no contra turno escolar e foi dividido em
dois grupos: escolares entre 9 e 11 anos e 12 e 15 anos. O programa ocorreu 2 vezes por
semana (em dias que não havia aula de educação física), com duração de 30 minutos em
cada sessão e consistiu no seguinte protocolo: 8 minutos de aquecimento (1 minuto de
caminhada, 6 de trote e 1 de caminhada), 10 estímulos de 15 segundos em intensidade
máxima seguidos por 90 segundos de recuperação e 6 minutos de volta à calma. Durante
os estímulos (apito sonoro) de 15 segundos, cada escolar correu em velocidade máxima
(a 100% de sua capacidade), enquanto que a recuperação foi realizada de forma ativa (os
escolares caminharam lentamente durante os 90 segundos). Não foram realizados controle
de pressão arterial e frequência cardíaca. Todos os escolares de cada grupo realizavam o
protocolo ao mesmo tempo. Após o término de protocolo de HIIT, eram realizados exercícios
de alongamento para os principais grupos musculares dos membros superiores, inferiores,
tronco e pescoço.

Análise de dados

As variáveis que apresentaram distribuição paramétrica foram descritas sob forma de


média e desvio-padrão da média. Variáveis que apresentaram distribuição não-paramétrica
foram apresentadas com mediana e percentil 25 e 75. Com o intuito de comparar as vará-
veis entre os grupos na linha de base foram utilizados os teste t de Student (para variáveis

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 299


com distribuição paramétrica) e Mann-Whitney (para variáveis com distribuição não-pa-
ramétrica). O valor de P foi considerado estatisticamente significativo quando menor do que
0,05. Os efeitos longitudinais do exercício nos desfechos primários e secundários foram
avaliados através de modelos lineares mistos, que se correlacionam com medidas repeti-
das ao longo do tempo, ajustadas pelo IMC e pela maturação sexual. A análise longitudinal
foi realizada feita pela interação tratamento × tempo, que estima a taxa de mudanças nos
desfechos. Os resíduos de todos os modelos foram examinados graficamente. O programa
Stata 13.0 (Stata, Estados Unidos) foi utilizado para análise estatística.

RESULTADOS

Na tabela 1 estão apresentadas as características gerais da amostra no momento


basal. Observa-se que não havia diferença estatisticamente significativa entre os grupos
intervenção e controle nas variáveis analisadas.
A tabela 2 apresenta os efeitos do HIIT nas variáveis analisadas após o término do
programa e a comparação entre os grupos intervenção e controle. O valor de β indicação
a variação entre os grupos ao término do programa de exercício físico HIIT. É possível
observar que ao término do programa de exercício HIIT, a distância percorrida durante o
teste de corrida/caminhada de 6 minutos passou a ser estatisticamente significativa entre os
grupos (p=0,001), tendo o grupo intervenção obtido aumento nos níveis da aptidão aeróbia.
Também é possível observar que o VO2 (estimado pelo t6min) passou a ser estatisticamente
significativa entre os grupos (p=0,001), com maiores níveis sendo encontrados no grupo
intervenção (pré: 42,8ml/kg/min±8,18ml/kg/min; pós: 48,1ml/kg/min±6,58ml/kg/min).
Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre os grupos para
as variáveis CT, HDL-c, LDL-c, TG, glicose, IMC, PC, DCT, DCSE e PB entre os grupos ao
término do período de acompanhamento

DISCUSSÃO

O presente estudo teve como objetivo avaliar os efeitos de um programa de intervenção


(programa de exercício físico HIIT) na aptidão aeróbia e biomarcadores cardiovasculares
de escolares. Este estudo corrobora com estudos disponibilizados na literatura que indicam
a escola como um espaço adequado para a implementação de programas destinados a
promover a saúde de crianças e adolescentes e a importância da educação física na saúde
pública. A educação física escolar, componente curricular obrigatório, tem potencial de pro-
porcionar aos alunos oportunidades de realizar exercício físico de forma regular.

300 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


A melhora na aptidão aeróbia, descrita no presente estudo, é relevante para preservar a
saúde cardiovascular dos escolares uma vez que essa variável está diretamente relacionada
com a saúde cardiovascular (ACSM, 2016), sendo considerada um importante marcador de
saúde em crianças e adolescentes (BERGMANN et al.; 2010).
Os achados encontrados neste estudo vão ao encontro de estudos semelhantes que
investigaram os efeitos de um programa HIIT sobre a saúde cardiovascular de crianças e
adolescentes. Weston et al. avaliaram o efeito de um programa de HIIT que consistia em 4 a
7 repetições de 45 segundos em esforço máximo seguidos por 90 segundos de recuperação
e cuja frequência semanal foi de 3 dias e duração de 10 semanas, em 101 escolares de 4
escolas e encontraram benefícios na aptidão aeróbia (WESTON et al., 2016).
Oliveira et al. reforçam tais achados. Verificando os efeitos de um programa de inter-
venção com frequência semanal de dois dias durante um ano letivo em 40 meninos e 48
meninas com média de idade de 14 anos, os autores encontraram benefícios na aptidão
aeróbia dos escolares (OLIVEIRA et al., 2017).
Portanto a literatura aponta fortes evidências que programas de intervenção em es-
colares podem promover a saúde cardiovascular nessa população. Ademais os estudos
de intervenção disponibilizados na literatura indicam a escola e as aulas de educação fí-
sica como ótimas e viáveis possibilidades de promover a saúde cardiovascular de crian-
ças e adolescentes.
Entretanto, não foram observados efeitos do programa de exercícios do HIIT sobre os
biomarcadores antropométricos (IMC, PC, DCT, DCSE e PB) dos escolares. Esses resultados
podem ser explicados pela falta de controle sobre o consumo alimentar de escolares, uma
vez que que crianças e adolescentes brasileiros apresentam hábitos alimentares inadequa-
dos (NEUTZLING et al., 2010) resultando em sobrepeso e obesidade.
As não alterações nos biomarcadores antropométricos podem estar associadas ao
ganho de massa muscular que ocorre durante programas de intervenção. Vizcaíno et al. ao
realizarem estudo de intervenção com frequência semanal de 3 dias e duração de 9 meses
com 72 crianças entre 8 e 10 anos de idade encontraram aumento na massa muscular dos
escolares (VIZCAINO et al., 2014). O ganho de massa muscular resulta em aumento do
peso corporal, não ocasionando alterações no IMC, por exemplo, visto que esta variável é
dependente do peso corporal.
Vale ressaltar que estudos prévios disponíveis na literatura não encontraram mudanças
estatisticamente significantes na composição corporal de escolares (OLIVEIRA et al., 2017;
MURA et al., 2015) , corroborando com os achados do presente estudo. Em programa de
intervenção de duração de 1 ano, Oliveira et al. não encontraram alterações no IMC dos
escolares que participaram do programa.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 301


Entretanto a literatura apresenta fortes evidências sobre a efetividade de programas de
intervenção em escolares mesmo quando não há alterações na composição corporal, o que
corrobora com os achados do presente estudo, uma vez que houve benefícios na aptidão ae-
róbia do grupo intervenção OLIVEIRA et al., 2017; MURA et al., 2015; LONSDALE et al., 2013)
Estudos realizados em crianças e adolescentes obesos têm demonstrado que o HIIT
é uma ferramenta eficaz em promover alterações na composição corporal nesta população.
Floody et al investigaram o efeito de um programa de duração de 28 semanas sobre fato-
res de risco cardiovascular em 197 crianças com sobrepeso e obesidade (FLOODY et al.,
2018). Ao término do programa os autores encontraram benefícios do HIIT nas variáveis
investigadas. Todavia é importante enfatizar que a população do presente estudo não foi
composta por escolares obesos.
Também não foram encontrados efeitos do HIIT sobre os biomarcadores plasmáticos
dos escolares. Tal fato por ser explicado pela falta de controle alimentar sobre as crianças
e adolescentes. Está evidenciado na literatura que crianças e adolescentes brasileiros tem
apresentado hábitos alimentares inadequados (TAVARES et al., 2014), resultando num perfil
bioquímico alterado.
Vale ressaltar que estudos prévios disponíveis na literatura não encontraram mudan-
ças estatisticamente significantes no perfil bioquímico de escolares. Hrafnkelsson et al. ao
avaliarem o efeito de um programa de intervenção em crianças com idade média de 7 anos
com duração de dois anos e que consistiu em exercícios físicos e orientação nutricional, não
encontraram alterações do perfil bioquímico dos escolares (HRAFNKELSSON et al., 2014).
Embora não tenha havido mudanças estatisticamente significativas nas variáveis ​​an-
tropométricas e bioquímicas entre os grupos controle e intervenção no final do programa
HIIT, as melhorias na aptidão aeróbica no grupo de intervenção são de grande importância
para a saúde cardiovascular de crianças e adolescentes.

CONCLUSÃO

O presente estudo demonstrou que programa HIIT realizado duas vezes por semana,
durante quatro meses, foi capaz de aumentar a aptidão aeróbia em crianças e adolescentes
em idade escolar.
Não foram encontradas alterações estatisticamente significativas nas variáveis ​​antro-
pométricas e bioquímicas entre os grupos controle e intervenção no final do programa HIIT,
todavia ao término do programa o grupo intervenção apresentou maiores níveis de aptidão
aeróbia (avaliada pela distância percorrida no t6min e pelo VO2, estimado pelo t6min), pas-
sando a ter diferença estatisticamente significativa (p=0,001) em relação ao grupo controle.

302 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Os achados encontrados neste trabalho podem servir de incentivo a programas de
intervenção destinados a promover a saúde cardiovascular de escolares.

TABELA 01. Características gerais da amostra no momento basal.

Variáveis Controle (n=28) Intervenção (n=26) P-valor

Sex (masc/fem) n 17/11 15/11 0,787


Idade (anos) 11,3 (10,3 – 13,1) 12,0(10,2 – 13,4) 0,949
Distância t6min (m) 795,0 (755,2 – 940,3) 810,0 (750,5 – 950,3) 1,000
VO2 (6 min) (ml/kg/min) 42,8 ± 8,1 44,2 ± 6,4 0,473
Colesterol Total (mg/dl) 155,7 ± 21,4 166,5 ± 25,9 0,102
LDL-c (mg/dl) 86,8 ± 18,6 96,5 ± 21,7 0,082
HDL-c (mg/dl) 52,9 ± 7,7 53,4 ± 9,6 0,824
TG (mg/dl) 60,5 (51,5 – 97,5) 70,0 (60,2 – 94,7) 0,248
Glicose (mg/dl) 83,5 (76,5 – 85,2) 82,0 (78,2 – 85,2) 0,875
IMC (kg/m2) 21,7 ± 5,9 20,7 ± 4,8 0,507
PC (cm) 71,5 ± 13,0 70,3 ± 12,1 0,730
DCT (mm) 21,4 ± 6,3 21,6 ± 7,3 0,939
DCSE (mm) 17,5 (10,5 – 25,5) 14,5 (10,5 – 20,5) 0,526
PB (mm) 25,3 (21,2 – 27,0) 24,3 (21,5 – 27,4) 0,332
Média ± DP ou Mediana (P25 – P75). LDL-c: colesterol de baixa densidade; HDL-c: colesterol de alta densidade; IMC: índice de massa
corporal; PC: perímetro da cintura; DCT: dobra cutânea triciptal; DCSE: dobra cutânea subescapular; PB: perímetro de braço; RML:
resistência muscular localizada. Test T de Student ou Mann-Whitney.

TABELA 02. Efeitos do HIIT nas variáveis analisadas após o término do programa

Variáveis Controle(n=28) Intervenção (n=26) β IC(95%) P- valor

Distância t6min (m) 873,2±210,9 1016,3 ± 202,8 +130,3 +52,1 a 208,6 0,001
VO2 (6min) (ml/kg/min) 44,3 ±6,2 48,1 ± 6,5 +2,9 +1,1 a 4,6 0,001
Colesterol Total (mg/dl) 150,5 ± 24,6 165,4 ± 24,4 -6,3 -17,8 a +5,3 0,287
LDL-c (mg/dl) 60,6 (21,8 -85,0) 80,0 (64,0 – 100,8) -2,2 -22,8 a +18,4 0,832
HDL-c (mg/dl) 59,0 ± 10,1 65,9±10,9 +4,9 -0,2 a +10,0 0,062
Triglicerídeos (mg/dl) 72,0 (57,0 -97,0) 74,0 (61,0 – 92,0) -6,6 -27,0 a +13,7 0,523
Glicose (mg/dl) 79,2 ± 8,5 79,2±5,9 -1,5 -6,8 a +3,7 0,573
IMC (kg/m ) 2
20,7 ± 4,4 20,8±4,5 +1,1 -0,22 a +2,4 0,103
PC (cm) 70,8 ± 10,1 70,4±9,1 -0,8 -3,0 a +1,3 0,447
DCT (mm) 15,1 ± 5,2 14,3±5,7 -1,0 -3,1 a +1,1 0,372
DCSE (mm) 10,0 (6,0 – 14,0) 9,0 (7,0 – 11,5) -0,1 -2,8 a +2,5 0,914
PB (mm) 25,3 (21,5 – 28,0) 24,4 (21,6 – 25,9) -0,7 -1,4 a +0,1 0,085
Média±DP ou mediana (25 - 75). LDL-c: colesterol de baixa densidade; HDL-c: colesterol de alta densidade; IMC: índice de massa
corporal; PC: perímetro da cintura; DCT: dobra cutânea tricipal; DCSE: dobra cutânea subescapular; PB: perímetro de braço; RML:
resistência muscular localizada. β:valor de beta; IC:intervalo de confiança

REFERÊNCIAS
1. BAHIA L.; COUTINHO ES.; BARUFALDI LA.; ABREU GA.; MALHAO TA.; Souza CP; et al.
The costs of overweight and obesity-related diseases in the Brazilian public health system:
cross-sectional study. BMC Public Health 2012; 12:440. doi: 10.1186 / 1471-2458-12-440.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 303


2. BARBOSA, João Paulo Dos Anjos Souza. Risco cardiovascular, atividade física e aptidão
física: associações, agregação familiar e heritabilidade em famílias nucleares de Mu-
zambinho – MG. São Paulo. Tese [Doutorado em Ciências] – Escola de Educação Física e
Esporte da USP; 2016

3. BERGMANN GG et al. Cardiorespiratory fitness cut offs points and cardiovascular risk fac-
tors screening at infancy. Rev Bras Med Esporte. 2010;16(5)339-43. doi: 10.1590/S1517-
86922010000500004

4. COELHO CF.; BURINI RC. Atividade física para prevenção e tratamento das doenças crônicas
não transmissíveis e da incapacidade funcional. Rev. Nutr.; Campinas, 2009; 22(6):937-46.
https://doi.org/10.1590/S1415-52732009000600015.

5. COSTIGAN SA.; EATHER N.; PLOTNIKOFF RC.; TAAFFE DR.; LUBANS DR. High-intensity
interval training for improving health-related fitness in adolescents: a systematic review and
meta-analysis. Br J Sports Med. 2015; 49:1253–61. doi: 10.1136 / bjsports-2014-094490.

6. CUREAU FV.; SILVA TLN.; BLOCH KV.; FUJIMORI E.; BELFORT DR.; CARVALHO KMB et
al. ERICA: inatividade física no lazer em adolescentes brasileiros. Rev Saude Publica. 2016;
50(supl1):4s. doi:10.1590/S01518-8787.2016050006683

7. Diretrizes do ACSM para os testes de esforço e sua prescrição/ American College os Sports
Medicine; Dilza Balteiro Pereira de Campos (trad.). 9.ed. Rio de Janeiro: Guanabara, 2016.

8. FARIA-NETO JR.; BENTO VFR.; BAENA CP.; OLANDOSKI M.; GONÇALVES LGO.; ABREU
GA et al. ERICA: prevalência de dislipidemia em adolescentes brasileiros. Rev Saude Publica.
2016; 50(supl 1):10s. DOI:10.1590/S01518-8787.2016050006723

9. FLOODY DP; SILVA EM; PINILLOS GF; ROMÁN LP. Effects of 28 weeks of high-intensity
interval training during physical education classes on cardiometabolic risk factors in Chilean
schoolchildren: a pilot trial. Eur J Pediatr. 2018; 177(7):1019-27 doi: 10.1007 / s00431-018-
3149-3.

10. GBD 2015 Mortality and causes of death collaborators. Global, regional, and national life expec-
tancy, all-cause mortality, and cause-specific mortality for 249 causes of death, 1980-2015: a sys-
tematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2015. Lancet. 2016;388(10053):1459-
544. doi: 10.1016/S0140-6736(16)31012-1

11. Global Recommendations on Physical Activity for Health. Geneva: WHO. 2010.

12. HRAFNKELSSON H.; MAGNUSSON KTH.; THORSDOTTIR I.; JOHANNSSON E.; Sigurdsson
EL. Result of school-based intervention on cardiovascular risk factors. Scand J Prim Health
Care, 2014; 32: 149–55 doi: 10.3109 / 02813432.2014.982363

13. LONSDALE C.; ROSENKRANZ RR.; PERALTA LR.; BENNIE A.; FAHEY P.; LUBANS DR. A
systematic review and meta-analysis of interventions designed to increase moderate-to-vigo-
rous physical activity in school physical education lessons. Prev Med. 2013; 56(2):152–61.
doi: 10.1016 / j.ypmed.2012.12.004.

14. MURA G et al. Physical Activity Interventions in Schools for Improving Lifestyle in European
Countries. Clin Pract Epidemiol Ment Health. 2015; 11, (Suppl 1: M5): 77-101. doi: 10.2174
/ 1745017901511010077

304 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


15. NASCIMENTO et al. Epidemiologia das Doenças Cardiovasculares em Países de Língua Portu-
guesa: Dados do “Global Burden of Disease”, 1990 a 2016. Arq Bras Cardiol. 2018;110(6):500-
11. doi: http://www.dx.doi.org/10.5935/abc.20180098

16. NEUTZLING MB.; ASSUNÇÃO MCF.; MALCON MC.; HALLAL PC.; MENEZES AMB. Hábitos
alimentares de escolares adolescentes de Pelotas, Brasil. Rev Nutr 2010;23(3):379-88. https://
doi.org/10.1590/S1415-52732010000300006

17. OLIVEIRA LCV et al. Effect of a School Physical Education program on the levels of physical
fitness related to youth health. Rev Bras Ativ Fis Saude. 2017;22(1):46-53 doi: https://doi.
org/10.12820/rbafs.v.22n1p46-53

18. SIQUEIRA ASE.; SIQUEIRA-FILHO AG.; LAND MGP. Analysis of the Economic Impact of
Cardiovascular Diseases in the Last Five Years in Brazil. Arq Bras Cardiol. 2017;109(1):39-
46. doi: 10.5935/abc.20170068

19. TAVARES LF.; CASTRO IRR.; LEVY RB.; CARDOSO LO.; CLARO RM. Padrões alimentares
de adolescentes brasileiros: resultados da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE).
Cad. Saude Publica, 2014; 30(12):1-13. https://doi.org/10.1590/0102-311x00016814

20. VIZCAÍNO VM et al. Gender differences on effectiveness of a school-based physical activity


intervention for reducing cardiometabolic risk: a cluster randomized trial. Int J of Behav Nutr
Phys Act. 2014; 11(154): 2-11. doi: 10.1186 / s12966-014-0154-4.

21. WESTON KL.; AZEVEDO LB.; BOCK S.; WESTON M.; GEORGE KP.; BATTERHAM AM. Ef-
fect of Novel, School-Based High-Intensity Interval Training (HIT) on Cardiometabolic Health in
Adolescents: Project FFAB (Fun Fast Activity Blasts) - An Exploratory Controlled Before-And-
-After Trial. Plos One. 2016;11(8)1-18. doi: 10.1371 / journal.pone.0159116. eCollection 2016.

22. World Health Organization. Global Action Plan on Physical Activity 2018– 2030: More Active
People for a Healthier World. Geneva: World Health Organization (2018).

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 305


23
“ Esgrima e badminton: inovação
nas aulas

Francinaide Campos Verdolin

10.37885/201101956
RESUMO

Este estudo tem como objetivo relatar a experiência de ter nas aulas de Educação Física
o ensino da Esgrima e do Badminton, de uma turma do 4º ano do Ensino Fundamental
da Escola Municipal Juslany de Souza Flores, localizado no bairro Jardim Tropical, ci-
dade de Boa Vista/RR., a qual e atende 942 crianças do Ensino Fundamental. Ambos
esportes, proporcionaram o conhecimento sobre o jogos esportivo, assim como o de-
senvolvimento da capacidade criativa. A prática destes Esportes ficou marcante como
uma forma inovadora na Escola, devido os próprios alunos confeccionarem os materiais
para a prática da Esgrima e Badminton. A pesquisa se caracteriza de campo, natureza
qualitativa e quantitativa . O público alvo são os estudantes e os professores do 4º ano
do Ensino Fundamental, os quais responderam o questionário distintos, as informações
coletadas se apresentam neste estudo, com trato estatístico e interpretativos na forma
de gráficos e quadros.

Palavras-chave: Educação Física, Esgrima, Badminton.


INTRODUÇÃO

A Escola Municipal Juslany de Souza Flores, localizada no Bairro Jardim Tropical


no Município de Boa Vista/RR. Tendo sido criada por meio do Decreto nº 086/E de 25 de
Maio de 2012 e gerenciada pela Prefeitura de Boa Vista por meio da Secretaria Municipal
de Educação, têm em seu corpo discente 942 crianças de 06 a 12 anos matriculadas no
Ensino Fundamental.
Seguindo as normas do Município, a Escola proporciona aos alunos do Ensino
Fundamental aulas de Educação Física com foco na iniciação esportiva da criança em con-
sonância com a Proposta de Conteúdos gerenciada pela Coordenação de Educação Física
– CEFE da Secretaria Municipal de Educação – SMEC. Sendo ministrada pelo Professor
Licenciado em Educação Física, do Quadro efetivo, com registro no Conselho de Classe.
As aulas na rede municipal de ensino tem como órgão responsável Secretaria Municipal
de Educação - SMEC, dando os direcionamentos para a Coordenação de Educação Física
Escolar – CEFE, onde tem o objetivo de buscar melhorias para garantir uma Educação Física
de qualidade nas escolas, num processo histórico de mudanças positivas no decorre das
suas ações. Buscou-se dentro dessa coordenação um currículo da Educação Física dentre
os temas correspondentes ao primeiro ciclo do ensino fundamental (Brincadeira e jogos,
Esporte, Ginástica, Danças, Lutas – SMEC,2008), a criação de uma proposta de conteúdos
com as expectativas de aprendizagem voltadas para o desenvolvimento saudável do alu-
no, o conhecimento histórico dos seus assuntos, vivência das práticas corporais, instigar o
senso crítico, dentre outros elementos importantes no processo de ensino e aprendizagem
essenciais dentro de um currículo. Isso fez com que o professor tivesse um norte de como
proceder dentro da escola nas suas aulas com sua proposta curricular. Dessa forma o CEFE
orienta todos os professores para realização e aplicabilidade dos planos, essa orientação
ocorre uma vez por mês, tendo como dias terças e sábado com carga horária de 4(quatro
horas). Nesses encontros são dados direcionamentos para elaboração das aulas conforme
a proposta. A forma de planejar e executar as atividades dinamizadas pela CEFE promove
uma integração dos criando um ambiente proveitoso para socialização dos conteúdos e dis-
cutindo possibilidades de intervenções nas aulas de Educação Física. Para que momentos
dotados de valores ocorram, surgindo a necessidade de aulas orientadas por planejamentos
delineados com metas a serem alcançadas.
A iniciação esportiva deve possibilitar estímulos diversificados, motivadores e praze-
rosos para os jovens, deve-se tomar cuidado com situações em que o aluno se sinta cons-
trangido ou decepcionado, pois situações desfavoráveis durante a iniciação esportiva podem
acarretar traumas para o resto da vida de um jovem. Moreira (2014).

308 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


A iniciação esportiva na escola contém em si características importantes para o desen-
rolar da vida infantil no mundo esportivo e para compreender esse momento considera-se
importante conhecer sua conceituação e abrangência do termo iniciação esportiva.
Na literatura autores como Blázquez Sánchez, (1999); Moreno et al, (2000);
Contreras, La Torre e Velazquez, (2001) descrevem-no de maneira bastante diversa, divi-
dindo-o em definições que consideram a iniciação esportiva como um o processo, outras
como um produto e as mais amplas como ambas, ou seja, produto e processo.
Moreno et al (2000) definem iniciação esportiva como um processo de ensino- aprendi-
zagem para a aquisição da capacidade de execução prática e conhecimento de um esporte,
considerando este conhecimento o contato com o esporte até a capacidade de praticá-lo
com adequação à sua estrutura funcional.
O homem desde os primórdios apresentou manifestações corporais semelhantes às
lutas, desde lutas corporais ou até mesmo com a utilização de armas. A Esgrima surgiu na
Antiguidade, como afirmam Oliveira e Santos, (2006) nas batalhas, primeiramente contra o
ambiente hostil, depois para caçar e finalmente nas guerras por territórios, e posteriormente
em sua primeira tentativa de tornar-se esporte, em Roma, nas apresentações dos gladiadores,
que na época eram eventos para a diversão da sociedade dominante, no Império Romano.
Existem alguns aspectos que a luta, e principalmente a Esgrima vai desenvolver, a
partir das questões de desenvolvimento motor, social até os aspectos afetivo, cognitivo e
psicológico. Então nota-se que ao desenvolver a prática da luta, os praticantes fazem rela-
ções de movimentos, juntamente com controle de emoções, sentimentos, etc., desenvolve-se
também o pensamento rápido, construção de estratégias e mudança de decisão.
O Badminton é um esporte de origem indiana foi posteriormente levado por oficiais
ingleses à Inglaterra, para uma cidade de nome Badminton, local onde a modalidade foi
adaptada e tomou a forma que apresenta atualmente.
Para BNCC( 2017) o Badminton é um Esporte de Rede/quadra dividida ou parede de
rebote: que se caracterizam por arremessar, lançar ou rebater a bola em direção a setores da
quadra adversária nos quais o rival seja incapaz de devolvê-la da mesma forma ou que leve
o adversário a cometer um erro dentro do período de tempo em que o objeto do jogo está em
movimento. É considerado por muitos como o esporte de raquetes mais rápido do mundo.
Para Gonçalves(2012), considera o Esporte de fácil aprendizagem, ele desenvolve
o raciocínio, a estratégia, o rendimento esportivo, as habilidades psicomotoras, como a
coordenação motora, lateralidade, estruturação espacial e temporal, dentre outras. Permite
que o sujeito desenvolva capacidades físicas, cognitivas, afetivas e sociais, fazendo do seu
corpo um instrumento de percepção da realidade externa e interna, através dos movimentos
praticados durante o jogo.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 309


Com este sentido a Esgrima e Badminton, foi inserido em correspondência a proposta
de iniciação ao esporte, mas também, possibilitando o desenvolvimento da criatividade, da
socialização, da afetividade, da cognição e do aspecto motor.
A confecção de matérias alternativos, didáticos e pedagógicos, entre os estudantes foi
relevante para que de fato ambos os esportes fossem contemplados promovendo o ensino,
aprendizagem , conhecimento e saber.

OBJETIVO

Proporcionar aos alunos de forma inovadora a confeccionarem os materiais para a


prática da Esgrima e Badminton, com materias alternativos.

MÉTODO

Este estudo tem como característica da pesquisa um estudo com análise descritiva e
de campo. Para o alcance das informações, foi aplicado um questionários aos participan-
tes da pesquisa. Caracterizando a iniciação esportiva da Esgrima e Badminton, de forma
inovadora através de recursos alternativos, tendo como foco atividades lúdicas nas suas
características e especificidades.
A natureza da pesquisa é quali-quantitativa. É qualitativa porque “sua preocupação está
centrada num nível de realidade que pode ser ou não quantificado” (GIL, 2010, p.70), ou
seja, trabalha com um universo de significados, motivos, aspirações, crenças, entre outros
aspectos, que não podem ser reduzidos a operacionalizações de variáveis mensuráveis e
com sentido pronto e acabado.
Também é quantitativa porque possibilita, entre outros aspectos, ao pesquisador, reunir,
de forma criteriosa, “técnicas e a confecção de instrumentos adequados de registro e leitura
dos dados colhidos em campo” (CHIZZOTTI, 2003, p.51).
Participaram da pesquisa de campo os alunos da turma de 4º ano da Escola Municipal
Juslany de Souza Flores, e os professores da respectiva turma.
Salientamos que o questionário dos alunos contem uma série de três perguntas fe-
chadas, considerando os esportes praticados no conteúdo de iniciação esportiva nas aulas
de Educação Física.
Dos professores de sala de aula, o questionário possui duas perguntas abertas, relativas
ao tema sendo um procedimento considerado clássico nas ciências sociais para obtenção
e registro de dados como finalidade verificar o grau de satisfação do Esporte que as aulas
de Educação Física trás para aos alunos.

310 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


AMOSTRA

A pesquisa de campo possui como amostra os 25 alunos do 4º ano Ensino Fundamental,


regulamente matriculados na Escola Municipal Juslany de Souza Flores do turno vespertino,
os alunos apresentam a média de idade entre 09 a 10 anos.
E a quantidade de 02 Professores de sala de aula da turma do 4º ano Ensino
Fundamental, da Escola Municipal Juslany de Souza Flores.
Os dados coletados receberam tratamento estatísticos na forma de gráficos, e em qua-
dros seguindo analise qualitativa das justificativas, considerando a quantidade de respostas
iguais e/ou semelhantes.

RESULTADOS

Apresenta-se os resultados a partir das informações obtidas por meio do questionário


aplicado aos alunos e professores.
1. Questionário A: professores.
Pergunta 01: Você considera importante as aulas de educação física para os alunos
do 4º ano da turma E ?

Quandro 1. Apresentação da resposta dos professores do 4º ano da turma E .


Sujeito da pesquisa Respostas

Sim, pois ajuda no desenvolvimento


Professor 1
motor dos alunos.
Professor 2 Sim.

Pergunta 02: Na sala de aula, após as aulas de educação física os alunos tecem co-
mentários sobre a aula de Educação Física?

Quandro 2. Apresentação da resposta do professor relativo aos comentários dos alunos.

Sujeito da pesquisa Respostas

Sim, Sempre contuuam conversando sobre a


Professor 1
aula. Percebe que nos realtos são de satisfação.

Professor 2 Sim

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 311


2. Questionário A: Alunos.

Gráfico 1

Gráfico 02

Gráfico 03

312 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Gráfico 04

DISCUSSÃO

Conforme os quadros 1 e 2 cabe salientar que a visão dos professores perante a apli-
cabilidade das aulas de Educação Física , é uma atitude na vida escolar que deve levar em
conta. Esse processo relacional tem haver não somente com o diálogo, mas também com a
forma de lecionar, os meios usados pela professora, envolvendo admiração, respeito, dentre
outros valores que geram uma convivência harmoniosa.
A ideia em realizar essa aula diferenciada a respeito dos objetos de conhecimento se
deu da necessidade de usar recursos criados pelos os aluno, sendo possível o desenvolvi-
mento da capacidade criativa e motivação para criação dos materiais necessários ao inicio
do conteúdo de iniciação esportiva da Esgrima e do badminton, contribuiu para o enrique-
cimento das aulas de Educação Física.
Soler (2003, p. 89) afirma que “o aluno tem o direito de conhecer toda cultura corporal
de movimento, formar sua bagagem motora, para no futuro escolher o que quer praticar”.
Desse modo, refletindo sobre a importância da aula e no potencial que os alunos pos-
suem, é percebido que é necessário buscar práticas alternativas que promovam a apren-
dizagem dos educandos, com todas essas evidências fica explicito o papel do professor
como agente educacional na formação de seus alunos, proporcionando o desenvolvimento
da formação humana.
Brasil (1997, p. 45)

Cabe à escola trabalhar com o repertório cultural local, partindo de experiên-


cias vividas, mas também garantir o acesso a experiências que não teriam
fora da escola. Essa diversidade de experiências precisa ser considerada pelo
professor quando organiza atividades, toma decisões sobre encaminhamentos
individuais e coletivos e avalia procurando ajustar sua prática às reais neces-
sidades de aprendizagem dos alunos. Brasil (1997, p. 45)

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 313


Contudo, é preciso buscar formas de dinamizar suas atividades em função de seus
alunos interagindo com eles para ter um feedback positivo em relação aos aspectos neces-
sários e trabalho das dimensões de conteúdo (conceitual, atitudinal e procedimental).
Acredita-se que o esporte deve estar presente na escola, uma vez que, enquanto
fenômeno da cultura de movimento de nossa sociedade, necessita de “uma atenção espe-
cial para que possamos oferecer aos alunos condições de entendê-lo e refletir sobre suas
variadas possibilidades”. (BARROSO; DARIDO, 2014, p. 103)
As informações dos alunos indicam que as aulas de Educação física são poucas, que
eles gostariam de ter mais aulas. Ou seja, as duas aulas semanais, são percebidas por eles
com importância e valor, ou seja, mais conhecimento e saber especifico desta área podia
ser gerado em maior proporção.
Dessa forma a iniciação do Esporte se deu de forma lúdica no qual foi explorada de
uma forma diferente, ou seja, na maioria das escolas não temos materiais necessários, uma
realidade em grande parte das escolas, pois os mesmos podem ser confeccionados, em
parceria com os estudantes , podem ser construídos os materiais, é claro que não ficarão
iguais aos oficiais, mas esses alunos terão a vivência do esporte, além deles estarem total-
mente envolvidos com as atividades.

CONCLUSÃO

A partir deste estudo fica evidente que as aulas de educação física realizadas duas
vezes na semana, é pouca e questionada pelos alunos. Quanto aos conteúdos em especifico
de iniciação esportiva da Esgrima e Badminton, é necessário ao professor a dedicação em
pesquisar e buscar aprender para que seja contemplado, visto que, durante a formação no
curso, estes esportes não fizeram parte da Matriz Curricular.
O professore da sala de aula e os alunos reconhecem a aplicabilidade da aula de
Educação Física, através da professora que a ministra, se apresentando favoráveis à
aprendizagem, uma vez que o ensinar e o aprender devem ser conduzidos em um am-
biente de harmonia.
Proporcionar ao aluno o entendimento sobre suas responsabilidades, que a prática
das aulas de Educação Física beneficia, por meio do autoconhecimento e autoconfian-
ça, socialização, desperta o espírito de equipe, melhora a autoestima, favorece o desen-
volvimento motor.
Enfim esse trabalho buscou apresentar uma forma inovadora de inserir a Esgrima e
Badminton, possibilitando o desenvolvimento da criatividade com base na confecção de
materiais alternativos para realização dos Esportes propostos.

314 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


O desenvolvimento da aprendizagem do indivíduo está relacionado aos diversos âmbitos
da vida, que vai desde seu ambiente social, ambiental, o educacional entre outros. Portanto
no tocante ao ensino do Esporte- Esgrima e Badminton de forma inovadora.

REFERÊNCIAS
1. BARROSO, André Luís Ruggiero; DARIDO, Suraya Cristina. Escola, Educação Física e Esporte:
possibilidades pedagógicas. Revista Brasileira de Educação Física, Esporte, Lazer e Dança,
São Paulo, v. 1, n. 4, p.101-114, dez. 2014.

2. BETTI M, Zuliani LR. Educação física escolar: uma proposta de diretrizes pedagógicas. Revista
Mackenzie de Educação Física e Esporte. São Paulo, 2002. Ano 1.

3. BLÁZQUEZ Sánchez, D. (1999) A modo de introduccion. In: D. Blázquez Sánchez (Org.)


La iniciación deportiva y el deporte escolar, p. 19-45. 4ª edição. Barcelona, Espanha: INDE
Publicaciones. Contreras, O.R., LA Torre, E. DE, Velázquez, R. (2001) Iniciación deportiva.
Madrid, Espanha: Ed. Síntesis.

4. BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais : Educação


física. Secretaria de Educação Fundamental. – Brasília : MEC/SEF, 1997.

5. CHIZZOTTI, Antônio. Pesquisa em ciências humanas e sociais. 6. ed. São Paulo: Cortez, 2003.
(Biblioteca da educação. Série 1. Escola; v. 16).

6. GIL, Antônio Carlos. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. 6. ed. 3. reimpr. São Paulo:
Atlas, 2010.

7. GONÇALVES R, Araújo LC, Bellançon A, et al. A importância da tomada de consciência no


jogo badminton. Fiepbulletin. v. 82, p. 1. Paraná, 2012.

8. MORENO, J.H. (2000) La iniciación a los deportes desde su estrutura y dinámica: aplicación
a la educacion física escolar y al entrenamiento deportivo. Barcelona, Espanha: INDE Publi-
cación, 1ª ed.

9. SOLER, R. Educação física escolar. Rio de janeiro: Sprint, 2003.

10. SANTOS, S. L. C. ESGRIMA – O caminho da Espada. Curitiba, UFPR, 2010. Disciplina de


Lutas Aplicadas. Curso de Educação Física, Setor de Ciências Biológicas da Universidade
Federal do Paraná.

11. SMEC – Secretaria Municipal de Educação e Cultura. Prefeitura Municipal de Boa Vista-RR.
Proposta Curricular Municipal do Ensino Fundamental dos anos iniciais. 2008 .

12. VASCONCELOS, C. S. Planejamento: projeto de ensino-aprendizagem e projeto político-


pedagógico – elementos metodológicos para elaboração e realização. 17. ed. São Paulo:
Libertad, 2007.

13. . Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular – BNCC 2ª versão. Brasília, DF,
2016.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 315


24
“ Esperança e o relacionamento
treinador-atleta de atletas
paranaenses de natação

Ana Flávia Lopes Freitas-Silva


UEM

Andressa Ribeiro Contreira


UEM

Guilherme Futoshi Nakashima Amaro


UEM

Lenamar Fiorese
UEM

Luciane Cristina Arantes da Costa


UEM

10.37885/201102183
RESUMO

Objetivo: investigar a esperança e o relacionamento treinador-atleta (RTA) de atletas


paranaenses de natação. Métodos: Participaram 28 atletas, de ambos os sexos, do
56º Jogos Universitários do Paraná de 2016. Foram utilizadas a Escala de Esperança
Disposicional e o Questionário de Relacionamento Treinador-Atleta – Versão atleta. Para
análise dos dados utilizou-se os testes U de Mann Whitney, Kruskall-Wallis e coeficiente
de correlação de Spearman (p<0,05). Resultados: Foram encontrados valores elevados
para o RTA e esperança. O sexo masculino apresentou valores superiores (p<0,05) para
agência (Md=17,0). Ocorreram diferenças (p<0,05) em função do tempo de treinamento
para a dimensão de caminhos, com valores superiores para atletas com menor tempo de
relacionamento com o treinador (Md=17,0). Ocorreu correlação entre agência, comprome-
timento (p=0,55) e complementaridade (p=0,59). Conclusão: Os atletas paranaenses de
natação têm uma percepção positiva do RTA e os atletas do sexo masculino, especifica-
mente, mostram-se mais esperançosos e motivados para o alcance dos seus objetivos.

Palavras-chave: Esperança, Relacionamento Treinador-Atleta, Natação.


INTRODUÇÃO

No Brasil a Psicologia do Esporte é caracterizada como uma ciência originada da


Psicologia, devido ao seu surgimento que se assemelha ao da Psicologia Geral. Porém
para alguns autores é uma subárea da Psicologia, enquanto para outros uma subárea das
Ciências do Esporte (Vieira, 2010). Esta especialidade, a Psicologia do Esporte é definida
como “identificação e compreensão de teorias e técnicas psicológicas que podem ser aplica-
das ao esporte com o objetivo de maximizar o rendimento e o desenvolvimento pessoal do
atleta” (WILLIANS e STRAUB, p. 30, 1991 apud RUBIO, p. 304 ,1999). Quanto a atuação,
Singer (1993) descreve que a Psicologia esportiva abrange consultoria clínica, a educação
e atividades práticas programadas e ocorre tanto no esporte profissional como no recreativo,
no exercício físico, entre outras atividades.
Atualmente a Psicologia do Esporte investiga e atua em contextos que envolvem mo-
tivação, personalidade, liderança, dinâmica de grupo, bem-estar de atletas, entre outros
temas. É comum ser associada ao esporte de rendimento devido à profissionalização do
esporte e a sua divulgação na mídia e, nesse contexto de grande competitividade, há procura
por várias especialidades com o objetivo de obter melhores resultados para o desempenho
dos atletas, sendo assim, a Psicologia esportiva é uma aliada na busca pela melhora da
performance (RUBIO, 1999).
Recentemente nota-se uma tendência de estudos investigando temas da Psicologia
Positiva, tais como a Esperança. A Teoria da Esperança surge com Snyder na década de
1990 e é caracterizada em três tipos de pensamento: o pensamento direcionado a objetivos;
o pensamento baseado em caminhos que levem a estes objetivos e o pensamento baseado
em agência, que seria a motivação necessária para usar tais caminhos (SNYDER, 2009).
Em se tratando da temática relações sociais no contexto esportivo, a maioria dos es-
tudos são referentes à verificação do estilo de liderança do treinador no contexto esportivo,
utilizando principalmente a Escala de Liderança no Desporto (ELD). Quanto ao relaciona-
mento treinador-atleta, especificamente, a maioria das investigações se dão em contexto
internacional. Os estudos de ambas as variáveis no contexto nacional são recentes, uma
vez que a validação do instrumento que avalia a esperança foi realizada no ano de 2015
(MOREIRA, 2015) e o “Coach-Athlete Relationship Questionnaire (CART-Q) – Versão atleta”
foi validado por Vieira et al. (2015) no mesmo ano. O relacionamento treinador atleta ganha
evidência como uma variável importante no desempenho dos atletas, tem papel significativo
no desenvolvimento da carreira dos atletas principalmente em tempos de dificuldades como
lesões, queda de desempenho, transições e crises emocionais. Encontrou-se a partir da
literatura, a necessidade de investigar nas relações sociais os aspectos afetivos e cogniti-
vos, além dos comportamentais, por isso a busca pela utilização do instrumento CART-Q,

318 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


avaliando os pensamentos, sentimentos e comportamentos existentes em tais relações
(VIEIRA ET AL., 2015)
Ambos os temas ainda são pouco investigados devido principalmente a recente vali-
dação dos instrumentos para o contexto esportivo brasileiro, e tanto a Esperança quanto o
Relacionamento Treinador-Atleta são termos recentes da Psicologia Positiva, sendo des-
conhecida a possível relação entre as variáveis e se há diferenças significativas em função
do sexo. Diante dessas considerações, este trabalho buscará responder a seguinte questão
problema: “Existe a relação entre a esperança e o relacionamento treinador- atleta de atletas
paranaenses de Natação?”

OBJETIVO

Investigar a Esperança e o Relacionamento Treinador-Atleta de atletas para-


naenses de Natação.

MÉTODOS

Caracterização do estudo

O presente estudo caracteriza-se como do tipo descritivo correlacional. De acordo com


Thomas e Nelson (2002) a pesquisa descritiva tem como objetivo descrever as característi-
cas de determinada população, através de técnicas padronizadas para a coleta dos dados,
utilizando-se de questionários e entrevistas estruturadas ou semiestruturadas.
População Alvo: fizeram parte do estudo atletas de natação, de ambos os sexos, par-
ticipantes do 59º Jogos Abertos do Paraná.

Instrumentos de Pesquisa

Para avaliação da esperança foi utilizada a Escala de Esperança Disposicional (EED).


Tal instrumento tem como objetivo avaliar a percepção de esperança do sujeito. É uma
adaptação ao contexto esportivo brasileiro realizada por Moreira (2015) do questionário
desenvolvido por Snyder et al (1991) nomeado “Hope Scale”. Constituída por 12 itens dis-
tribuídos em duas subescalas (Pensamentos de Agência, e Pensamentos de Caminho) e
elementos distratores. As respostas são dadas numa escala Likert de cinco pontos, (1=to-
talmente falsa a 5=totalmente verdadeira). O resultado de cada dimensão é dado a partir da
soma da resposta dos quatro itens, no entanto os elementos distratores não são contabiliza-
dos. A escala também fornece uma nota geral da percepção de esperança a partir da soma
total dos itens das duas dimensões. Quanto maior o resultado, maior e melhor a percepção

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 319


de esperança do sujeito, podendo variar de 4 a 20 por dimensão e de 8 a 40 na esperança
global (SNYDER, 2000 apud MOREIRA, p. 58, 2015).
A avaliação do relacionamento treinador-atleta foi realizada pelo Coach-Athlete
Relationship Questionnaire (CART-Q) – Versão atleta que tem como objetivo medir a quali-
dade e o conteúdo do relacionamento treinador-atleta. Desenvolvido por Jowett e Ntoumanis
(2004), adaptado e validado para o contexto brasileiro por Vieira et al (2015). A escala possui
11 itens distribuídos em três aspectos: proximidade (itens 3, 5, 8 e 9), compromisso (itens 1,2
e 6) e complementariedade (itens 4, 7, 10 e 11). As respostas são dadas em uma escala de
Likert de 7 pontos, (1=discordo totalmente a 7=concordo totalmente). A pontuação de cada
sub-escala é calculada a partir da média da soma dos itens que a compõem. Quanto mais
elevados os valores maior a proximidade, compromisso e complementaridade em relação
ao treinador (VIEIRA et al, 2015).

Procedimentos

Para fins de coleta de dados este projeto fez parte do projeto institucional “Processo
de desenvolvimento das variáveis psicológicas positivas no contexto esportivo”, aprovado
no Comitê de Ética em Pesquisa sob parecer nº 1.324.411/2015.
A coleta de dados foi realizada no segundo semestre de 2016, com os atletas de
natação participantes do 59º Jogos Abertos do Paraná, no local de competição. Os atletas
foram convidados a participar da pesquisa, e assinaram o Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido (TCLE) para os fins éticos de pesquisa.
A coleta foi realizada por acadêmicas do curso de Educação Física nos locais de
competição e alojamentos e os questionários foram aplicados de forma coletiva com preen-
chimento individual, sem sofrer influência do técnico ou de qualquer outro.

Análise dos Dados

Os dados foram analisados a partir do software SPSS versão 20.0. Para verificação
da distribuição dos dados será utilizado o teste Kolmogorov Smirnov (n>50).
Foi utilizada a estatística descritiva (média e desvio-padrão ou mediana e intervalo
interquartílico) e estatística inferencial. Para a comparação da esperança e relacionamento
treinador-atleta de atletas paranaenses de natação em função do sexo foi utilizado o teste
t para amostras independentes ou U de Mann Whitney. Para verificar a correlação entre
a esperança e relacionamento treinador-atleta dos atletas paranaenses de natação foi uti-
lizado o coeficiente de correlação de Pearson ou de Spearman, adotando-se p<0,05 em
todas as análises.

320 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


RESULTADOS

Ao verificar o relacionamento treinador-atleta dos atletas paranaenses de natação


(Tabela 1), foram encontrados valores elevados em todas as dimensões, com destaque para
proximidade (Md=6,5). Os valores para esperança geral foram considerados altos (Md=31,0)
e para as dimensões de Agência (Md=16,0) e Caminhos (Md=17,0).

Tabela 1. Relacionamento treinador-atleta e esperança de atletas paranaenses de natação


Dimensões Md (Q1-Q3)
RTA
Proximidade 6,5 (5,25-6,87)
Comprometimento 5,33 (4,16-6,33)
Complementaridade 5,75 (5,25-6,62)
Esperança
Agência 16 (14-17)
Caminhos 17 (15-18)
Esperança 31 (30-35)
Significância adotada p<0,05

Na Tabela 2, o RTA e a esperança foram comparados em função do sexo dos atletas


paranaenses e estes apresentaram níveis semelhantes em todas as dimensões, tanto da
RTA quanto da esperança (p>0,05), demonstrando que tanto os atletas do sexo masculino
quanto os atletas do sexo feminino desenvolvem relacionamentos de boa qualidade com
seus treinadores. Além disso, para a esperança, ambos os grupos apresentaram capacidade
de desenvolver estratégias para alcançar seus objetivos, porém na motivação necessária
para manter-se nessa busca, aspecto da agência, o sexo masculino obteve valores signifi-
cativamente maiores (sexo masculino: Md=17; sexo feminino: Md=15; p=0,046).

Tabela 2. Comparação do relacionamento treinador-atleta e da esperança em função do sexo


Masculino Feminino
Dimensões (n=15) (n14) p
Md (Q1-Q3) Md (Q1-Q3)
RTA
Proximidade 6,50(5,25-7,00) 6,25(4,43-6,81) 0.591
Comprometimento 5,67(4,33-6,33) 4,66(3,33-6,75) 0.425
Complementaridade 6,00(5,50-7,00) 5,75(4,50-6,56) 0.270
Esperança
Agência 17,00(14,00-18,00) 15,00(13,75-16,00) 0.046*
Caminhos 16,00(15,00-17,00) 17,00(14,75-18,00) 0.847
Esperança 32,00(30,00-35,00) 31,00(29,750-33,50) 0.270
* Significância adotada p<0,05.

Quando comparado o RTA em função do tempo de relacionamento com o treinador, os


três grupos apresentaram valores muito próximos (Tabela 3), havendo diferenciação apenas
na dimensão caminhos (esperança), sendo que aqueles que têm mais tempo de relação
com o treinador apresentam valor inferior do que os outros dois grupos que estão em um
relacionamento mais recente (p>0,05).

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 321


Tabela 3. Comparação do relacionamento treinador-atleta e da esperança em função do tempo de relacionamento com
o treinador
2 a 5 anos >5 anos
Tempo de relacionamento/ Até 1 ano (n=9)
(n=11) (n=9) p
Dimensões
Md (Q1-Q3) Md (Q1-Q3) Md (Q1-Q3)
RTA
Proximidade 6,5(5,62-6,87) 5,25(4,5-7) 6(5,62-6,87) 0,497
Comprometimento 5,33(3,83-6,16) 5,67(4-6,33) 5,33(4-7) 0,942
Complementaridade 6,5(5,37-7) 5,5(3,75-6,5) 6(5,37-6,87) 0,238
Esperança
Agência 17(14,5-18,5) 15(14-17) 15(14-16) 0,237
Caminhos 17(16-18,5)a 17(16-18) 15(14-16,5)a 0,048*
Esperança 34(30,5-36,5) 31(30-35) 31(28-32) 0,108
*Diferença significativa p<0,05, a: Diferença significativa entre tempo 1 e tempo 3.

O nível competitivo dos atletas (Tabela 4) apresentou valores próximos para as di-
mensões de RTA, indicando que, independentemente do nível de competição, os atletas de
modalidades individuais percebem de maneira similar o apoio, confiança e correspondência
do comportamento do treinador (p>0,05). Para a esperança os atletas apresentaram valo-
res similares para agência (estadual e nacional: Md=15,5; internacional: Md=16,0), assim
como também na dimensão caminhos (estadual: Md=16,5; nacional: Md=17; internacional:
Md=16), demonstrando que possuem a mesma capacidade para organizar e atingir suas
metas. Na esperança global os atletas os atletas também apresentaram valores similares,
não havendo diferença entre os grupos.

Tabela 4. Comparação do relacionamento treinador-atleta e da esperança em função do nível competitivo dos atletas
paranaenses de modalidades individuais
Estadual Nacional Internacional
Nível competitivo/
Md (Q1-Q3) Md (Q1-Q3) Md (Q1-Q3) p
Dimensões
n=4 n=18 n=7
RTA
Proximidade 6,25(5,18-6,81) 5,62(5,25-6,93) 6,5(6-7) 0,597
Comprometimento 5(3,83-6,33) 5,16(3,83-6,58) 6(4,33-7) 0,682
Complementaridade 5,87(5,06-6,5) 5,62(5,12-6,93) 6(5,25-7) 0,863
Esperança
Agência 15,5(13,75-18) 15,5(14-16,75) 16(14-18) 0,869
Caminhos 16,5(14,75-18) 17(15-18) 16(15-17) 0,838
Esperança 31,5(29,75-35) 31,5(30-34,5) 31(29-35) 0,972
* Significância adotada p<0,05.

Ao analisar as relações entre a RTA e a esperança dos atletas paranaenses de moda-


lidades individuais, foram encontradas correlações positivas em quase todas as dimensões,
exceto pelas correlações entre caminhos com as dimensões comprometimento e comple-
mentaridade (Tabela 5). A dimensão agência apresentou correlações moderadamente altas
e positivas com todas as dimensões do RTA, proximidade (r=0,479), comprometimento
(r=0,555) e complementaridade (r=0,597).

322 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Tabela 5. Correlação entre relacionamento treinador-atleta e a esperança de atletas paranaenses de modalidades
individuais
Agência Caminhos Esperança
Proximidade 0,479* 0,024 0,307*
Comprometimento 0,555* -0,036 0,303*
Complementaridade 0,597* -0,004 0,375*
*Nível de significância p<0,05

DISCUSSÃO

Os resultados do presente estudo apontam qualidade no relacionamento treinador-


-atleta na perspectiva dos atletas paranaenses de modalidades individuais, principalmen-
te na dimensão proximidade. Jowett e Cockerill (2002) afirmam que um bom RTA ocorre
quando os pensamentos, sentimentos e comportamentos dos treinadores e atletas estão
interconectados e baseados na reciprocidade, refletindo sobre o desempenho e bem-estar
de ambos. Com base nessas informações, pode-se entender que os atletas paranaenses
apresentam confiança e respeito, além de comportamentos amigáveis e altamente interli-
gados com seus treinadores. Na perspectiva de Jowett (2005) estas são características do
relacionamento eficaz, contribuindo para a manutenção da saúde psicológica e bem-estar
dos atletas e treinadores.
Quanto aos níveis de esperança, os atletas paranaenses mostraram-se esperançosos,
visto que esperança global atingiu valor elevado (Tabela 1). Indivíduos que apresentam
níveis altos de esperança parecem interpretar situações que causam estresse de forma
diferente dos indivíduos com baixa esperança e conseguem lidar de forma eficaz com fato-
res estressantes, superando estas situações (SNYDER apud GUSTAFSSON et al, 2013).
Dessa forma, atletas com alta esperança são beneficiados, já que o contexto esportivo de
competição é caracterizado por eventos e situações estressantes, que demandam energia
e persistência. Nas dimensões agência e caminhos também foram verificados valores satis-
fatórios, uma vez que os pensamentos de caminhos são fundamentais para que se alcance
com efetividade o pensamento esperançoso e a agência atua como fator motivacional para
que estes caminhos sejam colocados em prática (SNYDER, 2000).
No estudo de Cheuczuk et al., (2016) foi investigada a qualidade do relacionamento
treinador-atleta e da orientação às metas como preditoras para o desempenho de atletas de
voleibol. Quando comparado o RTA em função do sexo não foram encontradas diferenças
significativas, os atletas indicaram altos níveis em todas as dimensões do RTA, com des-
taque para proximidade, semelhantes a estes resultados. Os resultados encontrados neste
estudo permitem a compreensão de que os atletas paranaenses de ambos os sexos são
igualmente capazes de desenvolver um relacionamento eficaz com seus treinadores, além
de desenvolverem os pensamentos de caminhos e agência, contribuindo para o bem estar,

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 323


saúde, ganhos na performance e menor ocorrência de burnout (GUSTAFSSON, HASSMÉN
e PODLOG, 2010).
Quando comparado o RTA em função do tempo de relacionamento com o treinador, os
três grupos apresentaram valores muito próximos (Tabela 3), havendo diferenciação apenas
na dimensão caminhos (esperança), sendo que aqueles que têm mais tempo de relação
com o treinador apresentam valor inferior do que os outros dois grupos que estão em um
relacionamento mais recente (p>0,05). Isso pode ocorrer devido ao treinamento próximo
à data das competições ser muito intenso e por esta razão os atletas podem desenvolver
rapidamente a proximidade com o seu treinador e um maior comprometimento, a fim de
alcançar bons resultados na competição, e aqueles que têm mais tempo de relacionamen-
to podem ter desenvolvido mais dependência do treinador e por esta razão desenvolvido
menos os caminhos e estratégias para alcançar seus objetivos dependendo mais das rotas
determinadas pelo treinador.
Nas outras dimensões não houve diferenças significativas, isto pode ocorrer devido as
características da competição em que a coleta foi realizada (Jogos Universitários) e o perfil
de atletas que dela participam também podem ter influenciado, sendo a população composta
por universitários que de modo geral não tem o esporte como prioridade, mas sim a vida
acadêmica. Nesse sentido, muitos destes participam dos jogos e retomam os treinos com
treinadores que não estavam habituados ou até mesmo retornam a treinar com o antigo
técnico, sendo em ambos os casos uma retomada aos treinos somente para este evento.
Os resultados quanto ao RTA vão de encontro ao estudo de Vieira et. al (2015), em
que os atletas de vôlei que obtiveram as melhores colocações na competição (considerados
em um nível competitivo mais elevado) demonstraram valores superiores nas dimensões
proximidade e comprometimento, indicando que a performance e, assim, o nível de compe-
tições que o atleta participa é influenciada por um melhor relacionamento com o treinador.
Para a esperança não foi encontrado suporte de estudos para justificativa dos achados desta
pesquisa em função do nível competitivo, contudo, de acordo com Gustafsson, Hassmén e
Podlog (2010), os indivíduos que são atletas têm maiores níveis de esperança do que indi-
víduos não atletas, devido às demandas do contexto esportivo de competição que os leva
a desenvolver melhor o pensamento esperançoso.
A dimensão esperança, que representa a esperança global, apresentou correlações
similares com todas as dimensões do RTA (r=0,307; 0,303; r=0,375). Também foi encontrado
que a sintonia de pensamentos entre treinador e atleta esteve correlacionada com a espe-
rança global (r=0,303), assim como os comportamentos correspondentes incentivam bons
índices de esperança de modo geral (r=0,375) e também o aspecto sentimental (r=0,307).

324 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


De acordo com Olympiou, Jowett e Duda (2008), a percepção do atleta sobre o relacio-
namento com o treinador em todas as suas dimensões (afetiva, cognitiva e comportamental)
leva o atleta a focar seus esforços no desenvolvimento de novas estratégias e de habilidades.
Tais aspectos refletem na orientação ao objetivo que é a intensão do pensamento esperanço-
so. Nessa perspectiva, os atletas participantes do presente estudo mostraram-se satisfeitos
com o relacionamento estabelecido com seus treinadores e possuem elevados níveis de
esperança que de acordo com Snyder e Lopez (2009) reflete na percepção cognitiva que
o indivíduo tem de sua capacidade e habilidade para chegar ao objetivo proposto, levando
também a se manter motivado para utilizar destas suas habilidades e rotas desenvolvidas.

CONCLUSÃO

Este estudo objetivou investigar o relacionamento treinador-atleta e a esperança de atle-


tas paranaenses universitários de natação. Observou-se que, em geral, os atletas apresentam
bom relacionamento com seus treinadores, com destaque para a dimensão da proximida-
de, indicando sentimentos altamente interligados com seus treinadores. Para a esperança
também foram encontrados resultados satisfatórios, uma vez que os atletas mostraram-se
esperançosos e conseguem desenvolver rotas para realização dos objetivos determinados.
Ao comparar os resultados em função do sexo foi encontrada diferença significativa
na dimensão da agência, apresentando valor mais elevado para o sexo masculino. Quanto
ao tempo de relacionamento ocorreu diferença na dimensão de caminhos em que os atletas
que tem mais tempo de relacionamento com treinador apresentaram índices mais baixos.
Quanto ao nível competitivo não foram encontradas diferenças significativas para os níveis
de RTA e esperança. Nas correlações encontrou-se relação entre todas as dimensões do
RTA e a esperança global, apresentando valores ainda mais elevados entre as dimensões do
RTA e a dimensão de agência, demonstrando que todos os aspectos da relação favorecem
a motivação necessária para utilizar os caminhos desenvolvidos e manter-se neles, favore-
cendo então o pensamento esperançoso. Apenas na dimensão caminhos houve algumas
correlações negativas, porém de valores baixos, interpretados como não significantes.
As informações obtidas neste estudo contribuem para a atuação do profissional de
Educação Física, principalmente aos que atuam no contexto esportivo de rendimento, de
forma que levem aos treinadores informações quanto à importância das relações sociais
no esporte, com vistas a construir relacionamentos cotidianos com os atletas que tenham
enfoque nos aspectos afetivos, cognitivos e comportamentais e no desenvolvimento de
confiança, respeito, suporte, cooperação, comunicação.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 325


REFERÊNCIAS
1. CHEUCZUK, Francielli et al. Qualidade do Relacionamento Treinador-Atleta e Orientação às
Metas como Preditores de Desempenho Esportivo. Psicologia: Teoria e Pesquisa, v. 32, n. 2,
2016. https://doi.org/10.1590/0102-3772e32229

2. GUSTAFSSON, H., HASSMÉN, P., PODLOG, L. Exploring the relationship between hope and
burnout in competitive sport. Journal of Sports Sciences, v. 28, n. 14, p. 1495-1504, 2010.
https://doi.org/10.1080/02640414.2010.521943

3. GUSTAFSSON, H. et al. Hope and athlete burnout: Stress and affect as mediators. Psycho-
logy of Sport and Exercise, v. 14, n. 5, p. 640-649, 2013. https://doi.org/10.1016/j.psychs-
port.2013.03.008

4. MOREIRA, C. R. Propriedades psicométricas da escala de esperança Disposicional no contexto


esportivo brasileiro. 2015. 89 f. Dissertação (Mestrado em Educação Física) – Universidade
Estadual de Maringá, Maringá. 2015. http://repositorio.uem.br:8080/jspui/handle/1/2234

5. OLYMPIOU, A. et al. The psychological interface between the coach-created motivational


climate and the coach-athlete relationship in team sports. The Sport Psychologist, v. 22, n. 4,
p. 423-438, 2008. DOI: https://doi.org/10.1123/tsp.22.4.423

6. JOWETT, S.; COCKERILL, I. M. Incompatibility in the coach-athlete relationship. Solutions


in sport psychology, p. 16-31, 2002. https://www.researchgate.net/profile/Sophia_Jowett/
publication/234092766_Incompatibility_in_the_coach-athlete_relationship/links/09e4150efff-
c6154ba000000.pdf

7. JOWETT, S. On repairing and enhancing the coach-athlete relationship. The psychology of


coaching, p. 14-26, 2005.

8. JOWETT, S.; NTOUMANIS, N. The coach–athlete relationship questionnaire (CART‐Q): De-


velopment and initial validation. Scandinavian Journal of Medicine & Science in Sports, v. 14,
n. 4, p. 245-257, 2004. https://doi.org/10.1111/j.1600-0838.2003.00338.x

9. SNYDER, C.R.; HARRIS, C.; ANDERSON, J.R.; HOLLERAN, S.A.; IRVING, L.M.; SIGMON,
S.T.; YOSHINOBU, L.; GIBB, J.; LANGELLE, C.; HARNEY, P. The Will and the Ways: Deve-
lopment and Validation of an Individual-Differences Measure of Hope. Journal os Personality
and Social Psychology, v.60, n.4, p.570-585, 1991. https://doi.org/10.1037/0022-3514.60.4.570

10. SINGER, R. (1993). Sport Psychology: an integrated approach. In. Serpa, S.; Alves, J.; Ferreira,
V. e Brito, A. Proceedings of the 8th world congress in sport psychology (pp. 131-146). Lisboa:
SPPD – FMH. https://psycnet.apa.org/record/2001-01061-000

11. SNYDER, C.D. Handbook of hope: Theory, measures, and applications. San Diego, CA: Aca-
demic Press, 2000.

12. SNYDER, C.R.; LOPEZ, S.J. Psicologia positiva: Uma abordagem científica e prática das
qualidades humanas. Porto Alegre: Artmed, 2009.

13. VIEIRA, J. L. L.; FERREIRA, L.; CHEUCZUK, F.; FLORES, P. P.; VISSOCI, J. R.N. ; ROCHA,
F. F.; NASCIMENTO JR, J. R. A.; VIEIRA, L. F. Impact of coach-athlete relationship on the
collective efficacy of young volleyball players. Revista Bras. Cineantropom. Desempenho hu-
mano. Vol. 17, n 6, 2015. https://doi.org/10.5007/1980-0037.2015v17n6p650

326 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


14. VIEIRA, L. F.; NASCIMENTO JUNIOR, J. R. A.; PUJALS, C.; JOWETT, S.; CODONHATO, R.;
VISSOCI, J. R. N. Adaptação transcultural e propriedades psicométricas do questionário de
relacionamento treinador-atleta brasileiro (CART-Q) – Versão atleta. Revista Brasileira Cine-
antropomotria e Desempenho Humano. Florianópolis, vol.17 n.6, p.635-649, Nov./Dec. 2015.
https://doi.org/10.5007/1980-0037.2015v17n6p635.

15. VIEIRA, L. F.; VISSOCI, J. R. N.; OLIVEIRA, L.P. de; VIEIRA, J. L. L. Psicologia do esporte:
uma área emergente da psicologia. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 15, n. 2, p. 391-399,
abr./jun. 2010. https://doi.org/10.1590/S1413-73722010000200018

16. RUBIO, K. A Psicologia do Esporte: Histórico e Áreas de Atuação e Pesquisa. Psicologia:


Ciência e Profissão, Brasília, v. 19, n. 3, p. 60-69, 1999. https://doi.org/10.1590/S1414-
98931999000300007

17. THOMAS, J. R; NELSON, J. K.; SILVERMAN, S. J. Métodos de pesquisa em atividades física;


tradução: Ricardo Demétrio de Souza Petersen. Porto Alegre: Artmed, 2012.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 327


25
“ Exercício físico e prevalência de
transtornos mentais

Eros de Oliveira Junior


Unopar

Regina Correa
Unopar

10.37885/201001911
RESUMO

Os efeitos do exercício físico têm recebido considerável atenção no auxílio ao tratamento


de alguns transtornos mentais, sua prática regular vem sendo tema de vários estudos,
tendo como foco a possível eficácia na melhora de sintomas e causas da depressão,
estresse e ansiedade. Objetivo: Caracterizar a prevalência de indivíduos com depres-
são, estresse e ansiedade no contexto do exercício físico. Métodos: Estudo transversal
composto por 101 participantes de ambos os sexos com idade entre 18 e 65 anos. Os par-
ticipantes foram divididos em dois grupos: 1) Grupo composto por 56 participantes pra-
ticantes de exercício físico regular (GEF) a no mínimo 6 meses sem interrupção e 2)
Grupo composto por 45 participantes insuficientemente ativos (GIA). As avaliações foram
realizadas através da aplicação dos seguintes questionários: Inventário de Depressão de
Beck, Inventário de Ansiedade de Beck e Inventário de Sintomas de Estresse de LIPP.
Resultados: Os grupos GEF e GIA apresentaram respectivamente 9,9% e 15,8% de
participantes com sintomas de depressão, 15,9% e 17,8% com sintomas de ansiedade
e 7,9% e 15,8% com sintomas de estresse. A prevalência da faixa etária dos indivíduos
que apresentaram sintomas está entre 18 e 30 anos, com maior prevalência entre as
mulheres. Conclusão: A incidência de depressão, estresse e ansiedade prevaleceu em
indivíduos jovens do sexo feminino que não praticavam exercício físico regular.

Palavras-chave: Saúde Mental, Depressão, Ansiedade, Estresse, Exercício Físico.


INTRODUÇÃO

Dentre os problemas de saúde a Organização Mundial de Saúde (OMS) relata os


transtornos mentais como grave e destaca entre eles a depressão, com um aumento em
18% dos casos entre 2005 e 2015 e será, nos próximos anos, uma das maiores causas não
só de morte como a mais incapacitante. Estima-se que mais de 320 milhões de pessoas
no mundo sofram com esse transtorno. No Brasil a depressão atinge 5,8% da população,
enquanto distúrbios relacionados à ansiedade afetam 9,3% e a incidência de estresse é ao
redor de 32%. Embora existam tratamentos eficazes conhecidos, menos da metade dos
afetados no mundo (em muitos países, menos de 10%) recebem tratamento. Os obstáculos
incluem falta de recursos e de profissionais capacitados e o estigma social associado aos
transtornos mentais. Outra barreira ao atendimento eficaz é a avaliação imprecisa. Em paí-
ses de todos os níveis de renda, pessoas com transtornos mentais frequentemente não são
diagnosticadas corretamente, e outras, que nem mesmo possuem transtorno, são muitas
vezes diagnosticadas de forma inadequada (WHO, 2017).
A mudança de hábitos inclusive de atividades no dia a dia pode contribuir para a
prevenção dos transtornos mentais. Em 2013 a OMS aprovou o Mental Helth Action Plan
(WHO, 2013). O plano é um compromisso para tomada de medidas para melhorar a saúde
mental e contribuir para a realização de um conjunto de metas globais, para criar condições
de vida e ambiente que apoiem a saúde mental e permita às pessoas adotar e manter um
estilo de vida saudável. Como ação para melhorar a saúde mental é relevante ter o exercício
físico como um instrumento importante, não apenas com papel de reabilitação ou ocupacio-
nal, mas também terapêutico. Estudos demonstram que a psicoterapia e o exercício físico
proporcionam benefícios equivalentes (FREMONT; CRAIGHEAD, 1987; NORTH et al.,
1990). Os efeitos e benefícios que se atribuem ao exercício físico relativo à saúde mental
são entendidos desde uma perspectiva integral, envolvendo todas as potencialidades do
indivíduo, biológicas psicológicas e sociais (RIBEIRO, 1998). Porém, os sentimentos rela-
cionados com o bem-estar e a busca de um corpo perfeito parecem ser mais importantes
para a manutenção do exercício do que as preocupações com a saúde.
Ao observar que indivíduos sedentários estavam associados a uma maior prevalência
de sintomas depressivos em comparação com indivíduos fisicamente ativos e que muitas das
doenças associadas à inatividade física coexistiam em pessoas deprimidas, foi naturalmen-
te levantada à hipótese de que a realização do exercício físico pode ser uma arma para o
melhor controle destas psicopatologias (PEREIRA et al., 2006; SILVA REIS, 2012). Estudos
afirmam que a realização de exercícios físicos resulta numa série de alterações fisiológicas
e bioquímicas envolvidas com a liberação de neurotransmissores e ativação de receptores
específicos, auxiliando na redução de depressão estresse e ansiedade. Estes estudos referem

330 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


que não foram realizadas as dosagens dos neurotransmissores noradrenalina e serotonina,
mas que, a revisão de literatura por eles realizada indica alterações dos mesmos com a
prática do exercício físico (GALLOJr et al., 1995; MEEUSEN;MEIRLEIR, 1995).
Pessoas com transtornos mentais podem encarar a o exercício físico como um enorme
esforço, e mostram dificuldades para agregá-lo as suas atividades cotidianas. Por outro lado,
a não motivação pode estar condicionada aos efeitos secundários dos medicamentos no
sistema cardiovascular (RIBEIRO, 1998). Sendo o exercício físico importante para a saúde
do ser humano, estudos apontam os benefícios sobre os aspetos psicológicos e sociais tais
como: melhora do autoconceito, melhora da autoestima, melhora do humor, melhora da
imagem corporal, desenvolvimento da autoeficácia, diminuição do estresse e da ansiedade,
diminuição da tensão muscular e da insônia, diminuição do consumo de medicamentos,
melhora das funções cognitivas e da sociabilização (CAVALLINI et al., 2011). O exercício
físico poderá ter um impacto mais relevante na regulação da ansiedade e estresse na po-
pulação jovem e adulta, enquanto que, na depressão, os benefícios serão mais relevantes
em pessoas com idades mais avançadas (VEIGAS; GONÇALVES, 2009).
A falta de guidelines em português para exercício físico e transtornos mentais, assim
como, de estudos que correlacionem a exercício físico com estes transtornos no contexto
da saúde, vem incentivando os pesquisadores a buscar maiores informações para entender
melhor esta relação.

OBJETIVO

Caracterizar a prevalência de depressão, estresse e ansiedade em pessoas que pra-


ticam e que não praticam exercício físico.

MÉTODOS

Aspectos Éticos

Este projeto foi conduzido de acordo com as Resoluções 466/12 e 510/16 do Conselho
Nacional de Saúde, com aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da UNOPAR sob o
parecer n° 2.702.968. Depois de convidados a participar do estudo, os participantes fo-
ram esclarecidos sobre os objetivos e metodologia da pesquisa e assinaram o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 331


Amostra

O estudo foi composto por 101 participantes de ambos os sexos com idade entre 18
e 65 anos que foram recrutados por conveniência. Após a inclusão no estudo, os partici-
pantes responderam um questionário sociodemográfico e formaram dois grupos distintos:
1) Grupo composto por praticantes de exercício físico regular (GEF) e 2) Grupo composto
por participantes que não praticavam exercício físico regular (insuficientemente ativos-GIA).

Critérios de Elegibilidade

Os critérios de inclusão no estudo foram: idade entre 18 e 65 anos; aceitar voluntaria-


mente participar do estudo e assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido; para o
grupo de exercício físico o participante deveria estar praticando exercício físico regularmente
a pelo menos 6 meses; para o grupo insuficientemente ativo o participante não deveria ter
praticado exercício físico no mínimo 6 meses que antecedem a avaliação. Os critérios de
exclusão para ambos os grupos foram: ter idade inferior a 18 anos e superior a 65 anos; não
saber ler ou escrever; estar cursando ou possuir curso superior em psicologia.

Instrumentos de Avaliação

Os participantes preencheram uma ficha de identificação onde constavam também


informações sociodemográficas. Para avaliação do nível de atividade física foi utilizado o
questionário de atividade física International Physical Activity Questionaire (IPAQ) versão
curta (MATSUDO et al., 2001). A depressão foi avaliada pelo Inventário de Depressão de
Beck (Beck Depression Inventory- BDI) (GORENSTEIN; ANDRADE, 1996). O Inventário de
Ansiedade de Beck (Beck Anxiety Inventory- BAI) foi utilizado para avaliar o nível de an-
siedade (GORENSTEIN; ANDRADE, 1996). Para identificação de quadros característicos
de estresse foi aplicado o Inventário de Sintomas de Estresse para Adultos de Lipp (ISSL)
(LIPP; GUEVARA, 1994). Devido aos três últimos instrumentos (BDI, BAI e ISSL) serem
de uso restrito a psicólogos, a aplicação e análise dos dados coletados foram realizados
por uma psicóloga, membro da equipe, devidamente credenciada ao Conselho Regional de
Psicologia do Paraná.

Análise dos dados

A caracterização da amostra é apresentada em média e desvio-padrão. Os dados so-


ciodemográficos foram apresentados por meio de frequência absoluta e relativa. As análises
foram feitas utilizando o programa SPSS 21.0.

332 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


RESULTADOS

Fizeram parte do estudo 101 participantes. O grupo GEF (n=56), com idade média de
37,7(±13,9) anos, foi composto por 29 homens e 27 mulheres, enquanto que o grupo GIA
(n=45), de idade média de 37,3(±13,1) foi composto por 24 homens e 21 mulheres. O grupo
GIA apresentou maior quantidade de transtornos e a ansiedade foi o transtorno mais encon-
trado entre os participantes. Os resultados revelaram que 12 participantes do grupo GEF
e 16 do grupo GIA apresentaram mais de um transtorno, dentre estes 11 participantes do
grupo GIA apresentaram sintomas para os três transtornos contra 4 participantes do grupo
GEF. Os resultados para cada grupo são mostrados na tabela 1.

A prevalência de faixa etária dos indivíduos que apresentaram sintomas de transtornos


está entre 18 e 30 anos, o que representa 17,8% da amostra estudada. A tabela 2 mostra
a quantidade dos sintomas por faixa etária. Guardada as devidas proporções de homens
(n=53) e mulheres (n=48) participantes do estudo, a maior incidência de transtornos mentais
ocorreu no sexo feminino com 41,7% dos casos contra 39,6% no sexo masculino (Tabela 3).

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 333


DISCUSSÃO

No presente estudo, a quantidade de indivíduos que apresentaram transtornos men-


tais foi maior no grupo que não praticava exercício físico regular. A prática de exercícios
físicos regulares tem se mostrado eficaz na redução dos riscos de doenças cardiovascu-
lares, obesidade, diabetes e hipertensão arterial, assim como na obtenção de benefícios
psicológicos (VEIGAS; GONÇALVES, 2009), como o controle dos níveis de ansiedade e
estresse e a diminuição de estados depressivos (GODOY, 2002; KESANIEMI et al., 2001;
VEIGAS; GONÇALVES, 2009). Schuch e Fleck (2013) relatam que existem muitos fatores
que compõem a sessão de exercício, não o exercício por si só. Por exemplo, quando uma
pessoa faz exercícios em um ambiente de grupo, facilmente encontrados em espaços como
os centros de condicionamento físico (academias), o apoio social resultante e a atenção,
podem ter um papel importante, especialmente nos casos mais leves.
O estudo de Roeder (1999) mostra que a prática de exercício físico está associada
positivamente a uma elevada disposição, com menos ansiedade e depressão e que, o
estresse, possui menos impacto negativo sobre indivíduos fisicamente ativos. Os maiores
benefícios incluem os mecanismos de autopercepção e autocontrole, com maior domínio
emocional, eficácia nas tarefas, recuperação da imagem positiva do corpo, elevação do es-
tado de humor e interação social. Estas sensações e sentimentos positivos, resultantes do
efeito do exercício físico sobre vários hormônios e químicas corporais, têm sido conhecidos
por durarem, não apenas algumas horas, mas o dia todo (SILVEIRA; DUARTE, 2004).
Estudos mostraram que o exercício físico em pacientes com transtornos mentais sub-
metidos ao tratamento com farmacoterapia, permitiu reduzir a dose administrada de me-
dicamentos e contribuiu para uma redução dos sintomas mais precocemente. Além disso,
pacientes cuja terapia incluía exercício físico, mostraram uma menor propensão para a
recaída do que os que haviam sido tratados apenas com farmacoterapia (BABYAK et al.,
2000; DESLANDESet al., 2010; MOTA-PEREIRAet al., 2011). Meeusen e De Meirleir (1995),
afirmam que a realização de exercícios físicos resulta numa série de alterações fisiológicas
e bioquímicas envolvidas com a liberação de neurotransmissores e ativação de receptores
específicos, auxiliando na redução de depressão, estresse e ansiedade. Os benefícios de-
correntes da prática do exercício físico ocorrem em função da liberação da β-endorfina e da
dopamina pelo organismo, propiciando um efeito tranquilizante e analgésico no praticante
regular que frequentemente se beneficia de um efeito relaxante pós-esforço e, em geral,
consegue manter-se em um estado de equilíbrio psicossocial mais estável frente às ameaças
do meio externo (GALLO Jr et al., 1995).
A maior prevalência de transtornos mentais em mulheres em comparação aos homens,
encontrada no nosso estudo, corrobora com o estudo de Justo e Calil (2006). Os autores

334 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


explicam que essa maior incidência pode ser atribuída ao fato de que a mulher possui uma
forma peculiar de enfrentar as alterações de saúde e sofre mais influências dos aspectos
sociais e psicológicos. O estudo relata que as diferenças biológicas, especialmente as de
caráter endócrino, são sugestivas não só da autenticidade da distinção entre depressões de
homens e de mulheres, mas também levam a pensar que parte da diferença seja devida aos
hormônios sexuais e que a diferença de prevalência para a depressão começa a aparecer na
adolescência, devido justamente à ocorrência de mudanças hormonais. Nolen-Hoeksema e
Girgus (1994)já haviam se referido à menarca como o início das diferenças de prevalência
para a depressão entre os gêneros, prevalência que, até esta fase, se apresenta semelhante
(KESSLER; WALTERS, 1998). Na mulher, quando alterações hormonais ocorrem em ou-
tros momentos de vida, como gravidez, durante o uso de anticoncepcionais e menopausa,
estas não teriam influência significativa nas taxas de prevalência de depressão (KESSLER,
2003). As evidências apontam para o fato de que o estrogênio, que é sintetizado nos ovários,
placenta, tecido adiposo e também no cérebro, afeta o humor e a cognição, atuando não só
no hipotálamo, mas também no hipocampo e cerebelo (JUSTO; CALIL, 2006).
Souza e colaboradores (2017) relatam que a maior prevalência de transtornos se en-
contra em mulheres entre 18 e 29 anos de idade. Segundo os autores, a prevalência pelo
gênero feminino se deve também às desvantagens das mulheres com a dupla jornada de
trabalho, baixos salários e aspectos relacionados à reprodução, pois a mulher que vivencia
o trabalho e o encargo familiar, geralmente renuncia ao próprio cuidado para dedicar-se
ao próximo, culminando em quadros de consternação, ansiedade, frustração, angústia e
adoecimento. Além disso, as mulheres percebem facilmente o adoecimento, expressam
prontamente seus sintomas, informam com maior frequência problemas de saúde e procuram
ajuda rapidamente, quando comparadas aos homens. Vale ressaltar ainda que, até o ano
2000, mulheres entre 18 e 35 anos representam 70% das pessoas que buscam atendimento
para saúde mental em ambulatórios de psicoterapia (ENK et al., 2000).
O estudo de Almeida Filho e colaboradores (1992) revelou que a ansiedade, assim como
as fobias, são, em termos numéricos os principais problemas de saúde mental da população
humana. No presente estudo a ansiedade foi o transtorno mais presente nos participantes,
estes resultados corroboram também com os estudos da Organização Mundial da Saúde
(WHO, 2001), a qual relata que, dos transtornos mentais apresentados no decorrer da vida,
a ansiedade está presente na maioria dos indivíduos, atingindo 17,4% da população.
Nossos resultados mostram que a faixa etária mais acometida com transtornos mentais
se situa entre 18 a 30 anos. Enk e colaboradores (2000) também encontraram os mesmos
resultados. O estudo de Miranda e colaboradores (2008) relatou que a faixa etária de maior
incidência correspondeu ao período entre 30 e 39 anos (26,7% dos participantes), seguido

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 335


da faixa etária entre 19 e 29 anos (20,8%). A prevalência nessas faixas etárias pode ser
explicada pelo fato dos mais jovens sofrerem mais com questões sócias e ambientais, tais
como a estética corporal, trabalho, condições sociais, condição física e relacionamentos
sociais. Essa pressão parece ocorrer principalmente durante a fase de vida mais produtiva
dos indivíduos adultos, entre 18 e 39 anos de idade, etapa esta que se caracteriza pelo
início das responsabilidades, constituição e consolidação da vida familiar e estabilidade
profissional (MIRANDA et al., 2008).

CONCLUSÃO

A ansiedade foi o transtorno mais frequente entre os participantes do estudo. A incidên-


cia de depressão, ansiedade e estresse prevaleceu em indivíduos jovens do sexo feminino
não praticante de exercício físico regular. Espera-se que os resultados deste estudo possam
orientar não somente os trabalhos na área de saúde mental, mas também na saúde geral e
na política social a serem adotadas quando da prevenção e auxilio no tratamento dos trans-
tornos mentais, enfatizando a importância da inclusão do exercício físico para a população,
tornando mais eficaz a luta por uma melhor qualidade de vida.

REFERÊNCIAS
1. ALMEIDA FILHO, N.A; MARI, J.J; COUTINHO, E; FRANÇA, J.F; FERNANDES, G; ANDREO-
LI, S.B; BUSNELLO, ED´A. Estudo multicêntrico de morbidade psiquiátrica em áreas urbanas
brasileiras (Brasília, São Paulo,Porto Alegre). Rev ABP-APAL, v. 3, n. 14, p.93-104, 1992.

2. BABYAK, M; BLUMENTHAL, J.A; HERMAN, S; KHATRI, P; DORAISWAMY, M; MOORE, K;


CRAIGHEAD, W.E; BALDEWICZ, T.T; KRISHNAN, K.R. Exercisetreatment for major depression:
Maintenance of therapeuticbenefit at 10 months. Psychosom Med, v. 62, n. 5, p. 633-638, 2000.

3. CAVALLINI, G.M; FAGUNDES, A.P; MARTINS, A; MIRANDA, J.K; RODRIGUES, M; KRUG,


M.R; MARTINS, E.S; CALLEGARO, C.C; PANDA, M.D.J. A influência de um programa de
exercícios físicos no estado de humor dos indivíduos cadastrados no ESF/Primavera. Anais
do XVI Seminário Interinstitucional de Ensino, Pesquisa e Extensão. Universidade de Cruz
Alta - Unicruz. 2011. Disponível em: ˂https://home.unicruz.edu.br/seminario/anais/anais-2011/
saude˃.

4. DESLANDES, A.C; MORAES, H; ALVES, H; POMPEU, F.A.M.S; SILVEIRA, H; MOUTA, R;


ARCOVERDE, C; RIBEIRO, P; CAGY, M; PIEDADE, R.A.M; LAKS, J; COUTINHO, E.S.F.
Effect of aerobic training on EEG alpha asymmetry and depressivesymptoms in the elderly: a
1-year follow-up study. Braz J Med Biol Res, v. 43, n. 6, p. 585-592, 2010.

5. ENK, I; SILVA, J; PEREIRA Jr, A; SANTOS, M; HOMRICH, P. Perfil dos pacientes atendidos
em um ambulatório de psicoterapia no período de um ano em Porto Alegre. Rev Psiquiatr Rio
Gd Sul, v. 22, n. 3, p 188-198, 2000.

336 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


6. FREMONT, J; CRAIGHEAD, L.W. Aerobicexercise and cognitive therapy in the treatment of
dysphoricmoods. CognitTher Res, v. 11, p. 241-251, 1987.

7. GALLO Jr, L; MARIN-NETO, J.A; MACIEL, B.C; GOLFETTI, R; MARTINS, L.E.B; CHACON-
-MIKAHIL, M.P.T; FORTI, V.A.M; CATAI, A.M. Atividade física: remédio cientificamente com-
provado? A Terceira Idade, n. 10, p. 34-43, 1995.

8. GODOY, R.F. Benefícios do Exercício Físico sobre a Área Emocional. Movimento, v. 8, n. 2,


p. 7-15, 2002.

9. GORENSTEIN, C; ANDRADE, L. Validation of a Portuguese version of the Beck Depression


Inventory and the State-Trait Anxiety Inventory in BrazilianSubjects. Braz J MedBiol Res, v.
29, n. 4, p. 453-457, 1996.

10. JUSTO, L.P; CALIL, H.M. Depressão, o mesmo acometimento para homens e mulheres? Rev
Psiq Clín, v. 33, n. 2, p. 74-79, 2006.

11. KESANIEMI, Y.A; DANFORTH, E.J.R; JENSEN, M.D; KOPELMAN, P.G; LEFEBVRE, P; RE-
EDER, B.A. Dose-response issues concerningphysicalactivity and health: an evidence-based
symposium. Med Sci Sports Exerc, v. 33, n. 6, p. 351-358, 2001.

12. KESSLER, R.C. Epidemioloy of womendepression. J Affect Disord, v. 74, n. 1, p. 5-13, 2003.

13. KESSLER, R.C; WALTERS, E.E. Epidemiology of DSM-III-R major depression and minor
depressionamong adolescents and youngadults in the National Comorbidity Survey. Depres-
sAnxiety, v. 7, n. 1, p. 3-14, 1998.

14. LIPP, M.E.N; Guevara, A.J.H. Validação empírica do Inventário de Sintomas de Stress. Estu-
dPsicol, v. 11, n. 3, p. 43-49, 1994.

15. MATSUDO, S; ARAÚJO, T; MATSUDO, V; ANDRADE, D; ANDRADE, E; BRAGGION, G.


Questinário internacional de atividade física (IPAQ): estudo de validade e reprodutibilidade no
Brasil. RevBrasAtivFís Saúde, v. 6, n. 2, p. 5-18, 2001.

16. MEEUSEN, R; DE MEIRLEIR, K. Exerciseandbrainneurotransmission. Sports Med, v. 20, n.


3, p. 160-188, 1995.

17. MIRANDA, C.A; TARASCONI, C.V; SCORTEGAGNA, A.S. Estudo Epidêmico dos Transtornos
Mentais. Aval Psicol, v. 7, n. 2, p. 249-257, 2008.

18. MOTA-PEREIRA, J; SILVERIO, J; CARVALHO, S; RIBEIRO, J.C; FONTE, D; RAMOS, J.


Moderateexercise improves depressionparameters in treatmentresistantpatientswith major
depressivedisorder. J Psychiatr Res, v. 45, n. 8, p. 1005-1011, 2011.

19. NOLEN-HOEKSEMA, S; GIRGUS, J.S. The emergence of genderdifferences in depression-


during adolescence. Psychol Bull, v. 115, n. 3, p. 424-443, 1994.

20. NORTH, T.C; MCCULLAGH, P; TRAN, Z.V. Effect of Exercise on Depression. Exerc Sport
SciRev, v. 18, p. 379-415, 1990.

21. PEREIRA, L.A; PEREIRA, A.V.S; MORELLI, G.A.S. A importância do lazer da terceira idade:
um estudo de caso em Ribeirão Preto. LectEducFísDeport, ISSN-e 1514-3465, n. 98, 2006.

22. RIBEIRO, S.N.P. Atividade física e sua intervenção junto a depressão. RevBrasAtivFís Saú-
de,v. 3, n. 2, p. 73-79, 1998.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 337


23. ROEDER, M.A. Benefícios da atividade física em pessoas com transtornos mentais. Rev Bras
AtivFisSaúde, v. 4, n. 2, p. 62-76, 1999.

24. SCHUCH, F.B; FLECK, M.P.A. Is Exercise an efficacioustreatment for depression? A comment
uponrecentnegativefindings. Front Psychiatry, v. 4, n. 20, p. 1-3, 2013.

25. SILVA REIS, J.S.M. Atividade Física: Um Complemento a Considerar no Tratamento da


Depressão.Dissertação de Mestrado. Universidade da Beira Interior. Covilhã. 2012.Disponí-
velem:˂https://ubibliorum.ubi.pt/bitstream/10400.6/1158/1/Tese%20Joana%20Reis.pdf˃.

26. SILVEIRA, L.D; DUARTE, M.F.S. Níveis de depressão, hábitos e aderência a programas de
atividades físicas de pessoas diagnosticadas com transtorno depressivo. RevBras Cine Des
Hum, v. 6, n. 2, p. 36-44,2004.

27. SOUZA, L.S; BARBOSA, B; SILVA, C.O; SOUZA, A; FERREIRA, T; SIQUEIRA, L.Prevalência
de transtornos mentais comuns em adultos no contexto da atenção primária à saúde. RevPor-
tEnferm Saúde Mental, v. 18, p. 59-66, 2017.

28. VEIGAS, J; GONÇALVES, M. A influência do exercício físico na ansiedade, depressão e stress.


Psicologia.pt, p. 1-19, 2009. Disponível em: ˂https://www.psicologia.pt/ artigos/ver_artigo.
php?codigo=A0485˃.

29. WHO-World Health Organization. Depression and Other Common Mental Disorders: Global
Health Estimates. WHO/MSD/MER/. 2017. Disponível em: ˂https://www.who.int/mental_health/
management/depression/prevalence_global_health_estimates/en˃.

30. WHO-World HealthOrganization. Mental Health Action Plan 2013-2020. 2013. Disponívelem:
˂https://www.who.int/initiatives/mental-health-action-plan-2013-2030˃.

31. WHO-World HealthOrganization.The World Health Report 2001 - Mental Health: New Un-
derstanding, New Hope. 2001. Disponível em: ˂https://www.who.int/whr/2001/en˃.

338 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


26
“ Impacto de diferentes estratégias
de ensino no desenvolvimento
do conhecimento declarativo de
iniciantes na ginástica artística

Ivana Montandon Soares Aleixo


UFMG

Isabel Mesquita
Universidade do Porto

10.37885/201102044
RESUMO

Objetivo: Verificar o impacto da aplicação de uma abordagem instrucional baseada em


três modelos de ensino (instrução direta, ensino de pares e aprendizagem cooperativa)
no aumento do conhecimento declarativo em praticantes de ginástica artística (GA).
Metodologia: Aplicação de um questionário a 56 praticantes do sexo feminino entre nove
e 12 anos, 28 no grupo experimental e 25 no grupo controle. Resultados: Evidenciaram
que o grupo experimental evoluiu significativamente no conhecimento declarativo, inde-
pendentemente do nível de habilidade das praticantes, enquanto no grupo controle não
houve evolução. Conclusão: O estudo evidencia a importância de aplicação combinada
de diferentes modelos de ensino na eficácia pedagógica do treino da GA.

Palavras-chave: Ginástica, Ensino, Treinamento, Conhecimento Declarativo.


INTRODUÇÃO

O desenvolvimento da sociedade em geral, bem como a pró- pria evolução do esporte,


tem influenciado a forma como as crianças participam nas atividades esportivas. Nesse con-
texto, buscar estratégias de atuação nas quais a criança é considerada como sujeito central
da prática, e não apenas um objeto de atuação, tem sido reconhecido como fundamental
no sentido educativo (Mesquita, 2012). A valorização do envolvimento no esporte passa
por três eixos centrais da formação desportiva: tornar o jovem competente no domínio das
aquisições motoras específicas torná-lo um desportista culto, ou seja, capaz de proteger o
processo evolutivo das culturas desportivas, e ser entusiasta, ou seja, capaz de perpetuar
a sua ligação com o esporte (Siedentop, 1994; Mesquita, 2012). O desafio passa, assim,
pela aplicação de modelos de intervenção pedagógica que possam assegurar rendimento
esportivo, não comprometer o desenvolvimento e os valores fundamentais da saúde-física,
psicológica e social das crianças e proporcionar valores significativos (Gaya e Torres, 2004).
A investigação sobre a eficácia do ensino pode contribuir indiscutivelmente para a
melhoria das práticas de ensino e de aprendizagem principalmente no âmbito da ginástica
artística (GA), foco deste estudo. A GA é uma modalidade usualmente ensinada e treinada
em diferentes contextos de prática, revela-se extremamente rica no processo de formação
educativa (Corte-Real, 1995; Aleixo, 1999; Araújo, 2004).
Para tornar gratificante sua prática é fundamental qualificar o processo de ensino e
aprendizagem, de modo a tornar essa modalidade atrativa e servir aos seus propósitos no
que concerne a ser um meio de formação em geral e de rendimento desportivo.
A GA seria mais bem desenvolvida e apreendida pelas crianças com o recurso a estra-
tégias pedagógicas com enfoques distintos, mas complementares, no processo de ensino-
-aprendizagem. Atendendo à sua especificidade, apresentamos a aplicação combinada de
três modelos de ensino segundo Metzler (2000), o modelo de instrução direta (MID), o ensino
aos pares (MEP) e a aprendizagem cooperativa (MAC), usados em fases elementares de
aprendizagem. Podem assumir elevada pertinência quando aplicados de forma sequenciada
em relação ao processo de ensino-aprendizagem de determinado conteúdo. A aplicação dos
desígnios do MID revela-se particularmente vantajosa numa fase inicial de abordagem de
determinado conteúdo pelo fato de as tarefas serem estruturadas em pequenos passos, o
que permite um domínio elementar dos elementos e possibilita a ascensão posterior a níveis
de desempenho superiores. O MEP por estabelecer o compromisso direto de colaboração
entre praticantes na condução do processo de ensino-aprendizagem em que ambos são
protagonistas em tarefas de ensino. O MAC proporciona o trabalho em grupos, nos quais
os praticantes aprendem a tarefa em colaboração e fomentam o desenvolvimento pessoal
e social dos praticantes (Metzler, 2000).

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 341


Dessa forma, o recurso ao MID aplicado pedagogicamente na GA caracteriza-se por
centrar na ação do professor a tomada de praticamente todas as decisões acerca do pro-
cesso de ensino e aprendizagem e a prescrição do padrão de envolvimento dos alunos nas
tarefas de aprendizagem (Metzler,2000). Em complementaridade, o uso de estratégias MEP,
ao exigir a dupla tarefa de ensinar e aprender, prioriza a relação entre cognição e ação,
apoia os praticantes na representação/compreensão dos movimentos desejados, aspecto
particularmente importante em GA, na qual a correta representação mental da ação motora
é crucial para que seja feita com eficiência (qualidade de realização) e eficácia (resultado
obtido) (Rink, 1993). O recurso a estratégias pedagógicas de cooperação constitui um meio
por excelência de aplicação dos elementos técnicos em contextos que lhes conferem sig-
nificado e apropriação, fomenta simultaneamente a entreajuda e o entusiasmo pela prática,
alicerces da afiliação do esporte para a vida (Mesquita, 2012).
A capacidade esportiva estrutura-se em dois componentes do rendimento, cognitivo
e motor, o que significa que representar e compreender a ação motora pode influenciar
a sua execução (Allard e Burnetti, 1985; Thomas e Thomas, 1994a,b; McPherson, 1994;
Williams et al., 2003; Gonzáles et al., 2007). Nesse contexto, o conhecimento declarativo
(i. e., o que fazer, traduzido por enunciados linguísticos) se torna relevante, pois comporta
estruturas cognitivas de base de determinado conteúdo, essenciais e complementares do
conhecimento procedimental (i.e., o como fazer em contexto de ação motora) (Thomas et al.,
1988a,b). Na GA o conhecimento do ‘‘que fazer’’ se torna necessário na aprendizagem do
‘‘como fazer’’ em virtude de se reconhecer que a capacidade para executar uma técnica está
dependente da capacidade de eleger uma opção de execução (Thomas et al., 1998). O es-
tudo do impacto no recurso a estratégias pedagógicas potenciadoras do desenvolvimento
do conhecimento declarativo específico da GA mostra ser crucial para o aprimoramento do
processo pedagógico no âmbito do treino de crianças e jovens.
O presente estudo objetivou verificar o impacto da aplicação de um modelo de ensino
chamado Modelo integrado de ensino da Ginástica Artística (MIEGA), que integrou estra-
tégias pedagógicas de instrução direta, ensino aos pares e aprendizagem cooperativa no
desenvolvimento do conhecimento declarativo de elementos acrobáticos e ginásticos de
base de GA. Complementarmente, pretendeu-se verificar se o impacto do Miega sobre o
conhecimento declarativo foi extensivo a todas as praticantes independentemente do seu
nível de desempenho.

MATERIAL E MÉTODOS

Este estudo foi de natureza quase experimental, comportou um grupo experimental e


um grupo controle. O propósito foi adequar o delineamento da pesquisa ao ambiente mais

342 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


parecido com o real, no qual os sujeitos pertencem a grupos naturais, escolhidos não aleato-
riamente (Thomas et al., 2007). A GA é trabalhada em especificidade depende fundamental-
mente da performance técnica, o Miega pretende responder às exigências técnicas na fase
inicial de aprendizagem desta modalidade, sem descuidar da formação pessoal e social dos
praticantes, com o intuito de promover ganhos substanciais na aprendizagem e uma relação
entusiástica com o esporte. O Miega teve como suporte teórico de referência três modelos de
ensino: o MID foi construído, originalmente, com base em resultados de pesquisas da linha
de instrução processo/produto (Rink, 1999; Rosenshine, 1979), é caracterizado pela ação do
professor na tomada de decisões e nos padrões de compromisso orientados para os alunos.
Dois modelos de ensino particularmente promotores da participação e da cooperação são o
MAC e o MEP. Os desígnios do MAC contribuem particularmente para o desenvolvimento
pessoal e social dos praticantes e o MEP aperfeiçoa a capacidade de diagnóstico, observação
e correção das habilidades técnicas, responsabiliza os praticantes pelas tarefas de ensino
e de aprendizagem (Metzler, 2000; Buzbee, 2005; Ward e Ah Lee, 2005).
No grupo experimental foi aplicado o Miega, alvo de um programa de atividades
de GA relacionadas com a aquisição dos elementos ginásticos e acrobáticos considera-
dos de base na modalidade (Carrasco, 1982; Corte-Real, 1995; Araújo, 2004; Nunomura e
Tsukamoto, 2009). O grupo controle fez atividades gerais (ginásticas, brincadeiras populares,
danças típicas e jogos pré-desportivos coletivos), aulas de educação física escolar no qual
não houve uma metodologia prática de GA, e sim geral. Ambos os grupos foram sujeitos a
uma frequência semanal de duas aulas de 60 minutos, durante três meses, ou 24 aulas. A op-
ção de usar n = 24 decorreu de evidências de outras pesquisas, as quais sugerem que o
período de instrução quando demasiadamente reduzido pode não interferir positivamente
nos ganhos finais das aprendizagens, (French et al.,1991),é necessário um mínimo de 20
aulas para proporcionar a aprendizagem (Hastie,1998; Hastie et al., 2009; Mesquita, 2012).

Participantes

O presente estudo integrou 53 praticantes de GA e duas treinadoras. O grupo experi-


mental 28, nove e 12 anos, com média de 10 1,10, enquanto o grupo controle per- fez 25,
com média de 10,24 1,09 anos. As praticantes eram todas do sexo feminino. A escolha dessa
faixa etária deve-se ao fato de constituir um período ótimo de aprendizagem, considerado
fase universal (Greco e Benda, 1998). Encontravam-se na fase de iniciação esportiva da
modalidade, sem prática anterior de GA, integrantes do projeto de extensão da Escola de
Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional (EEFFTO) da UFMG.
A treinadora que aplicou o protocolo instrucional no grupo experimental tinha os re-
quisitos necessários para ser considerada perita na área (Abraham et al., 2006; Mesquita

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 343


et al., 2011): formação acadêmica com graduação em educação física e experiência de 10
anos como treinadora de equipes iniciantes de GA, encontrava-se na fase de estabilização,
de acordo com a classificação de Burden (1990) (iniciação, um a dois anos de experiência;
ajustamento, três a quatro anos; e estabilização, cinco ou mais anos de experiência). A treina-
dora do grupo controle tinha experiência profissional (12 anos como professora de educação
física), também na fase de estabilização. Solicitou-se aos pais e treinadoras a autorização
para a participação das crianças no estudo por meio da assinatura do termo de consentimento
livre e esclarecido. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade
Federal de Minas Gerais (ETIC 209/11).

Protocolo instrucional do grupo experimental

No protocolo instrucional a sequência dos elementos ensinados obedeceu à estrutura


de uma série final, da 1a à 14a aula foram abordados separadamente os elementos acrobá-
ticos e ginásticos e as estratégias pedagógicas. A primeira parte da série e as estratégias
pedagógicas na 15a à 18a aula e a série completa na 19a à 24a aula. Essa opção teve como
critério criar condições favoráveis às praticantes na retenção dos componentes críticos de
execução, pela estratégia de foco primeiramente nas exigências técnicas de cada elemen-
to, para em seguida compreenderem a relação entre os elementos na série (Rink, 1993;
Mesquita et al., 2005). O modelo de ensino aplicado (Miega) deu resposta a essa opção
considerando aplicação sequenciada de estratégias adstritas do MID, MEP e MAC durante
as 24 aulas. Ao iniciar um novo conteúdo, foram aplicadas estratégias do MID nos seguintes
passos: (1) apresentação das tarefas - a treinadora indicou especificamente os elementos
da GA a serem executados; (2) as praticantes ouviram as explicações da treinadora e as-
sistiram às demonstrações, que foram sempre usadas quando o exercício era novo ou tinha
uma estrutura técnica que exigia o recurso a essa estratégia; (3) as praticantes executaram
individualmente conforme orientação da treinadora; (4) a treinadora reinstruiu sempre que
necessário, clarificou a informação apresentada previamente; (5) no fim da aula, a treinadora
fez a revisão dos elementos ensinados e perguntou a respeito dos componentes críticos; (6)
no começo da aula seguinte, a treinadora persistiu na revisão dos elementos apresentados,
estabeleceu uma ligação entre elementos aprendidos e novos (Metzler, 2000; Rink,1993).
Após aulas dos elementos ginásticos/acrobáticos, base- adas em estratégias pedagó-
gicas do MID, as praticantes trabalharam aos pares (MEP). Uma praticante assumiu o papel
de aprendiz e a outra de treinadora, de forma a ser cumprido o seguinte postulado: Eu ensi-
no-te, tu ensinas-me e ambas aprendemos coisas diferentes juntas (Metzler, 2000). Foram
fornecidas fichas de observação às praticantes quando exerciam a função de treinadora para
desenvolver a capacidade de observação e de diagnóstico, considerando os componentes

344 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


críticos descritos. Essa estratégia mostrou-se pertinente no momento em que a manipulação
da complexidade das tarefas de aprendizagem necessitava de informações acrescidas de
aspectos críticos dos elementos em execução, para permitir a consolidação e o aperfeiçoa-
mento das habilidades ministradas (Rink, 1996; Rosado e Mesquita, 2009). Neste estudo,
usou-se como referência a estratégia Class-Wide Peer Tutoring (CWPT) (Ward e Ah Lee,
2005),que envolve toda a classe no desempenho de tarefas recíprocas de treinador/prati-
cante e praticante. Estabeleceram-se os seguintes procedimentos: (1) escolha da duplaa
treinadora determinou temporariamente as funções de treinador/praticante e praticante; (2)
escolha da tarefa a treinadora determinou tarefa e escolha dos elementos de GA; (3) foi
feita prática após a divisão da dupla e fixada a quantidade de tempo de exercitação pelas
praticantes; (4) a treinadora determinou a definição das duplas para cada papel e o plano
de rotação para cada tarefa; (5) explicação verbal inicial sobre as decisões relativas ao con-
teúdo; (6) a apresentação da tarefa foi feita pela treinadora, que explicou e demonstrou as
ações às praticantes e o tempo disponível para a tarefa; (7) a treinadora comandou a troca
de tarefas; (8) a dupla funcionou autonomamente, a praticante executou o elemento da GA e
a treinadora/praticante forneceu feedback e registrou na ficha de observação o número de
desempenhos corretos; (9) treinadora/praticante responsabilizou-se pela orientação da co-
lega-praticante para a tarefa.
Posteriormente, no momento de exercitar a 1a parte da série, a 2a parte e a série final,
foram aplicadas estratégias pedagógicas de aprendizagem cooperativa. As praticantes tra-
balharam em grupos pequenos, heterogêneos (isto, é com níveis de habilidade distintos),
para executar as tarefas, na expectativa de que todas contribuíssem para os objetivos co-
muns ao grupo, apoiassem-se mutuamente, de forma a que os aspetos pessoais e sociais
fossem acautelados em concomitância com a performance desportiva (Metzler, 2000; Dyson,
2001; Barrett, 2005; Mesquita, 2012). No presente estudo, o protocolo instrucional aplicado
usou como referência o Performer and Coach Earn Rewards (Pacer) (Barrett, 2005): (1)
treinadora estabeleceu no início das aulas em que se aplicaram estratégias cooperativas as
rotinas diárias de supervisão da equipe e as regras de segurança; (2) os grupos formados
por quatro componentes mantiveram-se durante todo o período de aplicação do protocolo
instrucional; (3) sua formação foi feita pela treinadora, no sentido de se formarem grupos
heterogêneos; (4) em cada grupo havia uma praticante-treinadora que exercia as funções
de coordenação; (5) o recurso a fichas de observação foi mantido e foram entregues à pra-
ticante-treinadora de cada grupo no início da aula. A tabela 1 apresenta as 24 aulas, bem
como as estratégias pedagógicas usadas no Meiga, na aplicação do protocolo instrucional
que estabelecia uma progressão.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 345


Instrumento de avaliação do conhecimento declarativo

Dado não existir questionário que respondesse aos problemas e objetivos em estudo,
foi construída uma nova ferramenta para avaliar o desenvolvimento do conhecimento decla-
rativo das praticantes através da aplicação do Meiga. A validação do referido instrumento
comportou duas fases. As questões foram elaboradas a partir de referências teóricas descritas
na literatura específica da GA (Carrasco, 1982; Corte-Real, 1995;Araújo, 2004; Nunomura
e Tsukamoto, 2009). As questões comportavam componentes críticas dos elementos, foi
indicada para cada uma delas uma escala dicotômica (verdadeiro ou falso, por exemplo: no
rolamento para frente você deve colocar o queixo ao peito?). Seguidamente, procedeu-se
à validação de conteúdo, no sentido de averiguar se as questões consideradas abrangiam
a totalidade dos problemas em estudo. Procedeu-se à validação por peritagem, com a par-
ticipação de dois peritos, doutorados em ciências do esporte, um da área da pedagogia do
esporte com vasta experiência em GA (mais de 20 anos como treinador), outro da área do
treinamento esportivo. Os peritos propuseram ajustes, especificamente na clareza das ques-
tões por faixa etária. Foi feito estudo-piloto, com as 10 praticantes que tinham as mesmas
idades das participantes do estudo e com vivências desportivas semelhantes. Correções
foram feitas na formulação das questões, de forma a torná-las mais explícitas, em confor-
midade com as praticantes. A tabela 2 apresenta os elementos acrobáticos e ginásticos
incluídos no questionário e as principais ações de execução deles.

346 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Tabela 1. Componentes do Miega (número de aulas, conteúdos abordados, número de exercícios e estratégias pedagógicas
aplicadas)

Coleta e análise de dados

O teste para avaliar o desenvolvimento do conhecimento declarativo foi aplicado em


dois momentos (pré-teste, uma semana antes de se iniciar o programa de intervenção,
Meiga e pós-teste, três dias após o fim da aplicação do referido programa ao grupo experi-
mental). No grupo controle também foi aplicado o questionário, no mesmo período temporal
em referência às aulas de educação física e seus conteúdos. A sua aplicação teve lugar
presencialmente numa sala para cada grupo, assegurou-se um ambiente calmo, de forma
a serem criadas condições que favorecessem a concentração das inquiridas. As treinado-
ras explicaram os objetivos do questionário e forneceram tempo para que respondessem
às questões. A aplicação do teste demorou em média 35 minutos. Para a análise de dados
recorreu-se à estatística descritiva e inferencial. A descrição sumária dos dados foi feita
pela aplicação de frequências com valores absolutos e relativos (percentagens), uma vez

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 347


que os dados eram de natureza categórica. As análises comparativas foram feitas entre o
grupo experimental e o controle, dentro do grupo experimental entre três níveis de habilidade
motora. Para estabelecer os três níveis de habilidade das praticantes a série estatística foi
dividida em tercis com base nos resultados de um teste motor aplicado três dias antes da
aplicação do programa de intervenção, considerando-se: um subgrupo de nível inferior (NI),
um subgrupo de nível moderado (NM) e um de nível superior (NS). Foram aplicados testes
não paramétricos (teste de Mcnemar, uma vez que as comparações eram sempre duas a
duas). Sempre que mais.

Tabela 2. Elementos acrobáticos e ginásticos incluídos no questionário usado para a avaliação do desenvolvimento do
conhecimento declarativo em GA, na formação

RESULTADOS

Grupo experimental e grupo controle no pré-teste e no pós-teste

A tabela 3 apresenta as frequências em números de respostas certas e erradas dos


dois grupos (experimental e controle), relativas ao conhecimento declarativo dos elementos
acrobáticos e ginásticos da GA. Existiram diferenças significativas no pré-teste entre grupo

348 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


experimental e controle. Proporcionalmente, o primeiro registrou maior número de respostas
erradas e menor de respostas certas em relação ao segundo (x2 = 936,010; p = 0,002).
A tabela 4 apresenta as frequências em números de respostas certas e erradas dos
dois grupos em relação ao conhecimento declarativo dos elementos acrobáticos e ginásticos
da GA no pós-teste, evidencia que o grupo experimental registrou significativamente maior
número de respostas certas e menor de respostas erradas em relação ao controle, inver-
teu-se a situação em relação ao verificado no pré-teste (x2 = 127,95; p = 0,001).

Subgrupos do grupo experimental

A tabela 5 apresenta os resultados relativos ao conhecimento declarativo dos elementos


acrobáticos/ginásticos no pós-teste dos subgrupos NI, NM e NS experimental. Diferenças
significativas entre o percentual de respostas erradas do pré-teste que foram alteradas para
respostas cer- tas no pós-teste em todos os grupos: para o NI (x2 = 328,003; p = 0,001); para
o NM (x2 = 302,003; p = 0,001); e para o NS (x2 = 302,029; p = 0,001).

DISCUSSÃO

Diversos estudos têm fornecido evidências de que as crianças têm dificuldade de fazer
tarefas específicas de habilidades cognitivas ou perceptivas antes de ter um conhecimento
de base sobre o elemento ou o fundamento técnico em questão (Thomas e Thomas, 1994a,
b; French e McPherson, 2004). Esses estudos sugerem que o conhecimento e as estraté-
gias cognitivas de base subjacentes ao desempenho motor desenvolvem gradualmente a
capacidade de responder eficazmente à prática de tarefas específicas (French et al., 1991;
McPherson, 1994). O presente estudo evidenciou que o grupo experimental aumentou sig-
nificativamente o conhecimento declarativo do pré-teste para o pós-teste, em contraponto
com o grupo controle, que manteve os níveis de resposta. Esses resultados atestam o
impacto significativo da aplicação do Miega na aquisição de conhecimento declarativo dos
elementos gímnicos e acrobáticos. Essa constatação é extensível a todas as pra- ticantes,
independentemente do seu nível de desempenho. Desse modo, o uso combinado de estra-
tégias de instrução direta, ensino de pares e aprendizagem cooperativa mostrou potenciar o
desenvolvimento do conhecimento declarativo das praticantes. O comportamento observado
em ambos os grupos indica que, possivelmente, em um período maior de investigação es-
sas modificações possam ser traduzidas, de forma estatisticamente significativa, como um
efeito positivo do treinamento.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 349


Tabela 3 Frequências de respostas certas e erradas referentes ao conhecimento declarativo no pré-teste dos grupos
controle e experimental

Tabela 4 Frequências de respostas certas e erradas referentes ao conhecimento declarativo no pós-teste dos grupos
controle e experimental

Tabela 5 Frequências de respostas certas e erradas conhecimento declarativo no pós-teste do subgrupo nível inferior,
médio e superior

O elevado aumento do conhecimento declarativo no grupo experimental sugere que o


foco de atenção das praticantes nas componentes críticas nos contextos situados de feitura
das ações motoras, gradativamente com maior referência às exigências da competição, pode
ter contribuído para esses ganhos, reiterado evidências empíricas a partir de outros estudos
(Ward e Ah Lee, 2005; Barrett, 2005; Mesquita et al., 2005; Mesquita,2012). Os estudos
sobre o desenvolvimento das habilidades cognitivas são considera- dos essenciais para a

350 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


excelência da performance desportiva (French et al., 1991, Greco et al., 2002;Greco, 2004;
Mesquita et al., 2005).
A focalização nos aspectos críticos foi aprimorada pelo recurso de fichas de obser-
vação, tanto no trabalho em pares como em grupos maiores. Desse modo, as fichas de
observação revelaram uma ferramenta pedagógica importante no desenvolvimento do co-
nhecimento declarativo das praticantes, embora a sua valência pedagógica alcance outros
âmbitos, como seja o desenvolvimento social dos praticantes (Johnson et al., 2000; Barrett,
2000; Dyson, 2002).
O Miega permitiu o reforçar de metas cognitivas e comportamentais, potenciou a ativa-
ção dos processos cognitivos associados à retenção e à compreensão das ações motoras
e, concomitantemente, à resolução mais eficaz dos problemas na aprendizagem (Mesquita
et al., 2005). Particularmente, o apelo à performance coletiva como fator decidido de ava-
liação da prestação do grupo, pela aplicação de estratégias de cooperação (no trabalho de
pares e em grupos muito alargados), proporcionou um enfoque redobrado nas componentes
críticas dos elementos, evidenciou a importância da relação entre a retenção e compreen-
são dos movimentos e a sua concretização (ação motora) (Mesquita et al., 2008). Wrisberg
(1993) sugeriu que a investigação deve contribuir para um entendimento multidimensional
da performance desportiva, na qual a interação do domínio cognitivo e motor não pode ser
ignorada na explicação dos processos que orientam e potenciam a melhoria da performance
desportiva. Greco et al. (2002) reiteram esse entendimento ao confirmar o impacto signifi-
cativo da aplicação de um proto- colo de treino orientado para a aquisição do conhecimento
declarativo em equipes colegiais de voleibol de seis estados brasileiros.

CONCLUSÃO

Considerando os resultados, pretendeu-se verificar se o impacto do Miega sobre o


conhecimento declarativo é possível destacar a importância de conferir validade ecológica
aos programas de treino/ensino, no sentido de terem alinhamento com o teor da avaliação,
o que reivindica da necessidade do recurso a estratégias pedagógicas potencia- doras do
envolvimento cognitivo dos praticantes.

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.

REFERÊNCIAS

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 351


1. Abraham A, Collins D, Martindale R. The coaching schematic: validation through expert coach
consensus. J Sports Sci 2006;24:549-64. Aleixo IMSO. ensino da ginástica olímpica, no apa-
relho solo, para crianc¸as de 7 a 8 anos. In: Garcia ES, Lemos KLM, Greco PJ.

2. Aleixo IMSO. ensino da ginástica olímpica, no aparelho solo, para crianc¸as de 7 a 8 anos. In:
Garcia ES, Lemos KLM, Greco PJ. (Org.) Temas Atuais IV. Belo Horizonte: MG, 1999. p. 7-86.

3. Allard F, Burnetti N. Skill in Sport. Canadian Journal of School Psychology 1985;39:294-312.

4. Araújo C. Manual de ajudas em ginástica. Porto: Porto Editora; 2004. Barrett T. Effects of two
cooperative learning strategies on academic learning time, student performance, and social
behavior of sixth-grade physical education students. Doctoral dissertation, University of Ne-
braska-Lincoln, 2000. Dissertation Abstracts International 2000;61:1781.

5. Barrett T. Effects of cooperative learning on the performance of sixgrade Physical education


students. Journal of Teaching in Physical Education 2005;24:88-102.

6. Burden P. Teacher development. In: Robert Houston W, editor. Handbook of research on te-
acher education. New York: Mac Milan; 1990. p. 311-28.

7. Buzbee PF. Peer coaching as a support to collaborative teaching. Mentoring and Tutoring
2005;13:83-94.

8. Carrasco R. Pedagogia dos aparelhos. São Paulo: Manole; 1982.

9. Corte-Real A. A ginástica desportiva feminina. Estudo da importância da família na formac¸ão


de jovens atletas. Porto: Faculdade do Desporto, Universidade do Porto; 1995, Tese de dou-
toramento.

10. Dyson B. Cooperative learning in an elementary physical education program. Journal of Tea-
ching in Physical Education 2001;20:264-81.

11. Dyson B. The implementation of cooperative learning in an elementary physical education


program. Journal of Teaching in Physical Education 2002;22:69-85.

12. French K, Rink JE, Rikard L, Mays A, Lynn S, Werner PH. The effects of practice progressions
on learning two volleyball skills. Journal of Teaching in Physical Education 1991;10: 261-74.

13. French KE, McPherson SL. The development of expertise. In: Weiss MR, editor. Developmental
sport and exercise psychology: lifespan perspective. Morgantown: WV; 2004.

14. Gaya A, Torres L. O desporto na infância e adolescência: alguns pontos polêmicos. In: Gaya
A, Marques A, Tani G, editors. Desporto para crianc¸as e jovens: razões e finalidades. Rio
Grande do Sul: UFRGS; 2004. p. 57-74.

15. Gonzáles GL, Gallego DI, Arroyo MPM, Domínguez AM, Álvarez FDV. Estratégias cognitivas
durante el juego por tenistas de diferente nível de pericia. Apunts:Educación Física y Deportes
2007;3:40-7.

16. Greco P, Benda, R. Iniciac¸ão esportiva universal. vol. I. Belo Horizonte: Editora UFMG; 1998.

17. Greco PJ, Canabrava CM, Castro D’ávila RC, Ferreira Filho E, Gomes MVC, Miranda G, et al.
Análise do nível de conhecimento e rendimento técnico-tático. In: Silami Garcia E, Moraes LC,
org. Resultado das avaliac¸ões da Olimpíada Colegial Jogos da Esperanc¸a, 2001. Poc¸os de
Caldas; 2002. p.121-52.

352 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


18. Hastie PA. Skill and tactical development during a sport education season. Res Q Exerc Sport
1998;69:368-79.

19. Hastie P, Sinelnikov O, Guarino A. The development of skill and tactical competencies during
a season of badminton. European Journal of Sport Science 2009;9:133-40.

20. Johnson D, Johnson R, Stanne MB. (2000). Cooperative Learning Methods: A Meta-Analysis.
Retrieved September 12, 2004, from http://www.clcrc.com/pages/cl-methods.html Accessed
September 12, 2004.

21. McPherson S. Development of sport expertise. Quest 1994;46: 223-40.

22. Mesquita I. Fundar o lugar do desporto na escola através do modelo de educação desportiva.
In: Mesquita I, Bento J, editors. Professor de educac¸ão física: fundar e dignificar a profissão.
Belo Horizonte: Casa da Educac¸ão Física; 2012. p. 144-76.

23. Mesquita I, Grac¸a A, Gomes AR, Cruz C. Examining the impact of a step game approach to
teaching volleyball on student tactical decision making and skill execution during game play.
Journal of Human Movement Studies 2005;48:469-92.

24. Mesquita I, Rosado A, Januário N, Barroja E. Athlete’s retentıon of a coach’s ınstructıon before
a judo competıtıon. J Sports Sci Med 2008;7:402-7.

25. Mesquita I, Borges M, Rosado A. Handball coaches’ perceptions about the value of working
competences according to their coaching background. J Sports Sci Med 2011;10:193-202.

26. Metzler M. Instruction Models for Physical Education. Massachusetts, 2000.

27. Nunomura M, Tsukamoto. Fundamentos das ginásticas. São Paulo: Fontoura; 2009.

28. Rink J. Teaching Physical Education for Learning. 2nd ed. St. Louis: Times Mosby College
Publishing; 1993.

29. Rink J. Effective instruction in physical education. In: Silverman S, Ennins C, editors. Student
learning in physical education: applying research to enhance instruction. Champaign, IL: Hu-
man Kinetics; 1996. p. 171-98.

30. Rink JE. Instruction from learning perspective. In: Hardy CA, Mayer, editors. Learning and
teaching physical education. London: Falmer Press; 1999. p. 149-68.

31. Rosado A, Mesquita I. Pedagogia do desporto. Lisboa: Edic¸ões FMH; 2009.

32. Rosenshine B. Content, time and direct instruction. Reviews of Research on Teaching: Con-
cepts, Findings and Implications 1979;123:28-56.

33. Siedentop D. Sport education: quality PE through positive sports experiences. Champaign, IL:
Human Kinetics; 1994.

34. Thomas JR, French KE, Thomas KT, Gallagher JD. Children’s knowledge development and
sport performance. Champaign, IL: Human kinetics; 1988a. p. 179-202.

35. Thomas K, Thomas J. Developing expertise in sport: the relation of knowledge and performance.
Int J Sport Psychol 1994a: 295-312.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 353


36. Thomas JR, French KE, Thomas KT, Cauagher JD. Children’s knowledge development and
sport performance. Champaig, IL: Human kinetics; 1988b. p. 179-202.

37. Thomas JR, Nelson J, Silverman JS. Métodos de pesquisa em atividade física. 5a ed. Porto
Alegre: Artmed; 2007.

38. Thomas KT, Thomas JR. Developing expertise in sport: the relation of knowledge and perfor-
mance. Int J Sport Psychol 1994b;25:295-315.

39. Ward P, Ah Lee M. Peer- assisted learning in physical education: a review of theory and rese-
arch. J Teach Phys Educ 2005;24:205-25.

40. Williams AM, Ward P, Chapman C. Training perceptual skill in field hockey: is there transfer
from the laboratory to the field? Res Q Exerc Sport 2003;74:98---103.

41. Wrisberg CA. Levels of performance skill. In: Singer R, Murphey M, Tennant LK, editors. Han-
dbook of research on sport psychology. NY: Macmillan; 1993. p. 61-72

354 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


27
“ Integrando Habilidades
Psicológicas nas fases de treino
da natação: um estudo de caso

Fernanda Tartalha do Nascimento


Unicamp

Paula Teixeira Fernandes


Unicamp

10.37885/201101942
RESUMO

O rendimento esportivo necessita de periodização e planejamento do treino, incluindo


treinamento físico, técnico, tático e psicológico. A natação enfatiza habilidades psicoló-
gicas para o bom desempenho, tanto no treinamento como nas competições. Assim, o
objetivo desse estudo foi apresentar uma intervenção psicológica realizada com um atleta
de natação, na qual a descrição do próprio atleta sobre seu funcionamento - habilidades
psicológicas de concentração, motivação, ativação, resiliência e confiança - foi organi-
zada, considerando seu período de treinamento e seu momento de competição. O atleta
descreveu estratégias que ele utilizava, como visualização da prova e estabelecimento
de metas e como deveria utilizá-las a cada momento. Ressaltamos que a intervenção
proposta possibilita a percepção mais explícita sobre as estratégias utilizadas pelo atleta
e sua integração a cada momento de treino e competição.

Palavras-chave: Psicologia do Esporte, Atenção, Motivação, Confiança, Resiliência.


INTRODUÇÃO

O rendimento esportivo ideal necessita de treinamento integral, no sentido de que o


desenvolvimento das capacidades físicas e psicológicas dos atletas acontece a partir de
um processo, que pode ser resumido em dois momentos: aplicação da carga de treina-
mento e adaptação posterior, para consequente melhora na performance (Weineck, 2003).
Assim, é necessário que sejam estabelecidos a periodização e o planejamento do programa
de treinamento do atleta, visando desenvolvimento sequencial e lógico de suas habilida-
des (Bompa, 1999).
Assim, o treinamento das habilidades do atleta deve considerar a interação complexa
de fatores fisiológicos, psicológicos, físicos, biomecânicos, táticos, nutricionais, genéticos e
socioculturais (Glazier, 2017).
Nosso estudo enfatiza o treinamento das habilidades psicológicas que, segundo
Weinberg e Gould (2011), fortalece a prática sistemática de: atenção, ativação, confiança
e motivação. Martin (2001), depois da investigação de estudos acerca das características
psicológicas do desempenho máximo, sugere quatro aspectos principais: duas relaciona-
das à concentração (orientação para estímulos adequados e responder adequadamente a
eles) e duas relacionadas a sensações corporais ou sentimentos (confiança e nível ideal de
prontidão/ativação).
Strack, Linden e Wilson (2011) definem como importantes para o bom desempenho as
seguintes habilidades psicológicas: alto nível de autoconfiança e de atenção, preocupação
em relação aos pensamentos e comportamentos relevantes, nível adequado de ansiedade,
habilidade de parar pensamentos irrelevantes e de reagir positivamente às experiências
negativas. Segundo Hagan, Pollmann e Schack (2017a), as evidências atuais mostram
que atletas de maior sucesso apresentam melhor nível de concentração, alto nível de au-
toconfiança, pensamentos positivos e direcionados à tarefa, usam mais a imaginação para
visualizar o sucesso e tem menores níveis de ansiedade.
Podemos notar que os diferentes autores apontam habilidades psicológicas em comum,
que serão utilizadas como base no presente estudo: concentração, motivação, ativação,
confiança e resiliência. Aqui, estas habilidades psicológicas foram estudadas a partir da
natação, uma modalidade de meio aquático e individual onde milésimos de segundo podem
fazer diferença no resultado final.
A competição de natação tem peculiaridades que contribuem para gerar ansiedade nos
atletas, como o contato com os adversários antes da prova e o anúncio dos nomes antes
do início da mesma (Fortes et. al., 2017), além de envolver altas cargas de treinamento (Cid
et. al. 2016). Nesse sentido, a natação tem características únicas que exigem o desenvol-
vimento de habilidades psicológicas para o bom desempenho: intensidade do treinamento,

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 357


necessidade de repetição, atenção aos detalhes, especificidade do momento competitivo e
objetividade do resultado (tempo).
Segundo MacIntyre et al. (2014), o conhecimento e o controle sobre os próprios proces-
sos mentais (metacognição) tem forte relação com o alto desempenho, tanto no treinamento,
quanto em momentos de competição. Na primeira situação, pelo conhecimento sobre as
habilidades que estão sendo adquiridas e na segunda, pela importância da autorregulação
nos momentos de estresse.
Assim, o autoconhecimento do atleta sobre seu próprio funcionamento e sobre suas
habilidades psicológicas pode contribuir com o seu rendimento, uma vez que o leva a ter
maior autocontrole sobre seus estados internos (podendo se aproximar de seu estado ideal
nos treinos e competições) e sobre seus comportamentos (agindo de formas que o levem
ao desempenho que busca).
A partir disso, o objetivo desse estudo foi apresentar uma intervenção psicológica reali-
zada com um atleta de natação, na qual a descrição do próprio atleta sobre seu funcionamen-
to - habilidades psicológicas de concentração, motivação, ativação, resiliência e confiança
- foi organizada, considerando seu período de treinamento e seu momento de competição.

MÉTODO

O participante deste relato de caso é um atleta profissional de natação, do sexo mascu-


lino, com 21 anos de idade, que iniciou no esporte aos sete anos de idade. Suas principais
competições incluem provas de 200 e 400m na modalidade medley e 200 livre. Atualmente,
compete em nível estadual e nacional, tendo experiência de integrar tanto seleções de base
quanto seleção adulta.
O material apresentado no presente artigo foi desenvolvido ao longo de duas sessões,
sendo que o atleta já realizava o acompanhamento psicológico há um ano. Nesse período
prévio, foi realizada a apresentação teórica sobre as habilidades psicológicas e a investiga-
ção do funcionamento do atleta por meio de perguntas e atividades.
O atleta descreveu em relação a cada habilidade psicológica (concentração, motivação,
ativação, resiliência e confiança): (1) seu conceito sobre a habilidade, (2) as estratégias que
ele utilizava, (3) como ele vivenciava cada uma dessas habilidades a cada momento (bloco
1 - força, bloco 2 - específico, polimento e competição) e (4) como ele deveria trabalhar cada
habilidade em cada um desses momentos. Inicialmente foi utilizada a descrição do próprio
atleta sobre os momentos de treinamento e competição e posteriormente esse quadro foi
apresentado ao técnico sendo que o mesmo não realizou nenhuma alteração.
O material produzido com o atleta e seu processo de elaboração foi descrito no pre-
sente artigo e aprovado pelo Comitê de Ética da UNICAMP (CAAE 15065419.2.0000.5404).

358 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


RESULTADOS

Na Tabela 1 está apresentada a conceituação do atleta em relação a cada habilidade


psicológica e as estratégias utilizadas por ele.

Tabela 1.Habilidades psicológicas do atleta: definição e estratégias utilizadas.

Habilidade Psicológica Conceito do atleta Estratégias utilizadas pelo atleta

Ter objetivos, concentrar no que faz, men-


Concentração Ter foco, ter controle
talizar a prova, saber o cronograma
Assistir eventos passados, mentalizar,
Motivação Feliz, determinado
pensar no objetivo
Perceber o nível de ativação.
Conversar, ouvir música e ficar sozinho
Nível de atividade física e psicológica ideal para a
Ativação para diminuir nível de ativação.
atividade
Intensificar o aquecimento e utilizar cafeí-
na para aumentar o nível de ativação.
Entender as dificuldades que tem pelo
caminho e ter estratégias para lidar com
Resiliência Capacidade de enfrentar dificuldades e se recuperar
elas.
Apoio social
Relembrar bons resultados anteriores,
Confiar em si mesmo, em sua capacidade de alcan- valorizar as evoluções e conquistas, lem-
Confiança
çar o que deseja brar das dificuldades, ter consciência das
habilidades e pontos fortes

As Tabelas 2 e 3 ilustram a descrição do atleta sobre suas habilidades psicológicas


em cada fase do treinamento (bloco 1, bloco 2 e polimento) e na competição e sua expec-
tativa de como deveria trabalhar cada uma das habilidades psicológicas para ter o melhor
aproveitamento em cada momento.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 359


Tabela 2.Descrição das habilidades psicológicas reais e das possibilidades de mudança nos Blocos 1 e 2 de treinamento

Bloco 1 Bloco 2
Habilidade Psicológica
(Força) (Específico)

Descrição do atleta
sobre o objetivo prin- Principal consequência: nível de cansaço Principal consequência: Tempo do tiro/técnica
cipal de cada fase
Percepções em relação Plano em relação às Percepções em relação Plano em relação às
às habilidades psico- habilidades psicoló- às habilidades psico- habilidades psicoló-
lógicas gicas lógicas gicas
- Tirar o foco da dor; - Pensar no tempo;
- Focar no processo; - Pensar na estratégia –
- Foco em completar; Mais competitivo – co- tentar aplicar nos tiros;
Cansaço e dor dificul-
Concentração - Visão mais geral dos meçar a dar importân- - Buscar alcançar o que
tam a concentração
erros e acertos no cia pro resultado quer fazer na com-
nado; petição/ reproduzir
- Monitorar o corpo. características.
- Ver os ganhos passa- - Ver os ganhos passa-
dos (desse mesmo blo- dos (desse mesmo blo-
co em ciclos passados); Período de motivação co em ciclos passados);
Período de menor
Motivação - Saber o que quer; crescente pela aproxi- - Avaliação dos resulta-
motivação
- Saber o que motiva mação da competição dos do bloco 1;
– usar isso nos momen- - Aproximação do
tos mais difíceis. objetivo.
O próprio treino/ O próprio treino/
aquecimento já ativa aquecimento já ativa
Ativação o suficiente, sem gerar ____ o suficiente, sem gerar ____
estados excessivos de estados excessivos de
agitação ou ansiedade. agitação ou ansiedade.
Dificuldade: Dor
Estratégias: Pensamen-
to positivo; lembrança
Analisar o que aconte-
do que estou traba- Dificuldade é a frus-
ceu e confirmar com
Dor e estresse apare- lhando; interpretação tração (não conseguir
Resiliência técnicos, ter um plano
cem como dificuldades positiva da dor. fazer o que é ideal para
para melhorar, pensar
Dificuldade: Stress a prova)
no próximo treino.
Estratégia: Se afastar,
relevar mais, fazer as
coisas mais relaxado.
- Confiar no que está
- Confiar no que você
sendo passado (relação
fez antes.
Treinos bons dão do treino com resulta- Treinos bons dão
Confiança - Confiar em sua habili-
confiança dos anteriores); confiança
dade de executar o que
- Confiança no próprio
precisa.
empenho.

Tabela 3.Descrição das habilidades psicológicas reais e das possibilidades de mudança no polimento e na competição
Habilidade Psicológica Polimento Competição
Descrição do atleta
Principal consequência: Principal consequência:
sobre o objetivo prin-
Tempo e forma de execução/sensação do nado Tempo e forma de execução
cipal de cada fase
Percepções em relação Plano em relação às Percepções em relação Plano em relação às
às habilidades psico- habilidades psicoló- às habilidades psico- habilidades psicoló-
lógicas gicas lógicas gicas
- Foco nos detalhes da - Obter todas as infor-
Várias informações
execução; mações adequadas;
importantes! (você,
Período onde é mais - Importância do - Organizá-las e tomar
adversários, clima, cro-
Concentração fácil se manter concen- descanso; as decisões corretas;
nograma competição,
trado - Atenção ao tempo e - Conseguir focar ape-
estratégia, descanso,
a sensação do nado – nas no que é relevante
etc.).
busca do modo ideal. em cada momento;

360 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Habilidade Psicológica Polimento Competição
- Ver os ganhos passa-
dos (desse mesmo blo-
Período de motivação co em ciclos passados);
Período de maior - Buscar tempo/ colo-
Motivação crescente pela aproxi- - Avaliação dos resulta-
motivação cação.
mação da competição dos do bloco 2;
- Aproximação do
objetivo.
Mais aquecimento fora
O próprio treino/ da água na parte da
De manhã é mais
aquecimento já ativa manhã.
difícil ativar; a tarde
Ativação o suficiente, sem gerar ____ Uso de estratégias de
gera mais ansiedade e
estados excessivos de relaxamento se nível
concentração
agitação ou ansiedade. de ansiedade estiver
muito alto a tarde
Analisar o que aconte-
Dificuldade é a frus- Analisar o que aconte-
ceu e confirmar com Dificuldade é a frustra-
tração (não conseguir ceu e confirmar com
Resiliência técnicos, ter um plano ção por um resultado
fazer o que é ideal para técnicos, pensar na
para melhorar, pensar ruim
a prova) próxima prova.
no próximo treino.
- Ter clareza do que
- Confiar no que você tem que fazer;
fez antes. - Ter conseguido fazer
Treinos bons dão Treinos bons dão
Confiança - Confiar em sua habili- nos treinos o que quer
confiança confiança
dade de executar o que executar;
precisa. - Relembrar melhores
desempenhos;

Discussão <T>
O objetivo da intervenção apresentada foi obter a descrição do atleta sobre seu próprio
funcionamento e as estratégias utilizadas em relação às habilidades psicológicas de con-
centração, motivação, ativação, resiliência e confiança. Esse relato foi organizado a partir
da periodização de treinamento do atleta, considerando os diferentes blocos de treinamento
e o momento da competição.
A importância de desenvolver a capacidade de descrição está na relação estabelecida
entre autoconhecimento e ação. O autoconhecimento (descrever o próprio funcionamento)
possibilita ao indivíduo melhores condições para prever e controlar seu próprio comporta-
mento (Skinner, 2006/1974). Neste sentido, desenvolver a descrição sobre si mesmo faz
com que o atleta consiga desenvolver, de forma mais adequada, estratégias que possibilitam
maior controle sobre eventos internos e sobre seu próprio comportamento.
Segundo Rothlin et al. (2016), o treinamento de habilidades psicológicas inclui o uso
de técnicas como autofala, visualização, estabelecimento de metas e regulação da ativa-
ção. O objetivo primordial é modificar estados internos e comportamentos com a finalidade
de colocar o atleta em melhor condição de desempenho.
Em relação aos benefícios das habilidades psicológicas Strack, Linden e Wilson (2011)
afirmam que as mesmas permitem que o atleta alcance o nível de conhecimento e controle
sobre si mesmo que o auxilia a desempenhar-se correspondendo às exigências do esporte,
mesmo nos momentos críticos da competição.
Na intervenção apresentada no presente artigo é possível perceber significativo grau de
conhecimento do atleta sobre seu próprio funcionamento. Esse autoconhecimento foi um dos

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 361


principais objetivos do trabalho psicológico aqui realizado durante o ano e foi estimulado ao
longo das sessões com o atleta, a partir de perguntas que colocaram seus eventos internos
e seu próprio comportamento em seu foco de atenção. Como salientado por Skinner (2006;
1974), o comportamento verbal, ou seja, falar sobre as coisas além de fazê-las, passa a
integrar o comportamento do indivíduo a partir de comunidade verbal que faz perguntas e
gera comportamentos descritivos.
Além disso, o desenvolvimento do autoconhecimento contribui para que as habilida-
des psicológicas sejam utilizadas tanto no período de treinamento – possibilitando maior
aproveitamento deste processo – quanto no período de competição – pela importância da
autorregulação nesse momento. Vale lembrar que principalmente o período competitivo gera
estados emocionais intensos e, para que o atleta consiga gerenciar de forma adequada suas
emoções, ele precisa ter um repertório de respostas de enfrentamento disponíveis para ele
(Hagan, Pollmann e Schack, 2017a).
Ter esse repertório disponível no momento competitivo inclui ter desenvolvido e apri-
morado essas habilidades no período de treinamento e ter consciência de quando e como
usá-las na competição. Em um estudo sobre ansiedade e uso de habilidades psicológicas
em atletas de tênis de mesa Hagan, Pollmann e Schack (2017a), concluíram que a ansie-
dade foi percebida pelos atletas como debilitante em situações críticas do jogo pois eles
foram incapazes de regular suas emoções de forma eficiente revelando uso de estratégias
disfuncionais nas situações de maior estresse.
Alguns pontos interessantes na descrição do atleta podem ser utilizados para demons-
trar o impacto positivo que o autoconhecimento tem sobre o gerenciamento eficaz de eventos
internos e comportamentos no período de treino e competição.
O primeiro ponto que destacamos são as estratégias para lidar com o primeiro bloco
de treinamento, o bloco de força, onde os atletas experimentam alto nível de cansaço e
dor. O próprio atleta descreveu que o objetivo principal desse bloco de treinamento seria
seu nível de cansaço, conseguindo interpretar uma sensação que seria desagradável como
sinal de que está cumprindo seus objetivos. Essa interpretação positiva é justamente uma
das estratégias principais utilizadas a fim de desenvolver sua resiliência.
Em relação a concentração nesse primeiro bloco o atleta descreve dois focos muito
importantes: monitorar o corpo (por ser um período muito intenso o corpo pode necessitar
de mais descanso e cuidados) e focar em completar cada treino (ao invés de focar na dor, o
que geraria desânimo, ou em ficar preocupado aos detalhes da execução do nado). O atleta
se utiliza bem das metas de processo nesse momento.
Segundo Weinberg e Gould (2011) existem três tipos de metas: de resultado (foco
no resultado da competição), de desempenho (foco em índices de desempenho individual,

362 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


independente do oponente) e de processo (foco nas ações que o indivíduo deve executar
para alcançar o desempenho desejado). Segundo os mesmos autores, metas de resultado
geram motivação, mas manter o foco apenas nestas pode gerar níveis significativos de
ansiedade. Portanto, é necessário desenvolver metas de desempenho e de processo que
conduzam ao alcance do resultado desejado e saber quando focar em cada uma das metas.
Justamente por ser um período de sobrecarga o atleta entende que não vai ser uma fase de
ótima execução do nado e focar nesse aspecto, ou seja, na meta de desempenho (forma de
execução ideal), geraria frustração. Focar apenas em completar o treino é o objetivo principal
desse período, e essa é uma meta de processo que se relaciona com suas metas maiores,
as de resultado a longo prazo.
Em relação à resiliência, é interessante notar que quando metas de resultado começam
a aparecer no treinamento, o atleta descreve que a sua maior dificuldade passa a ser a frus-
tração, a mesma dificuldade que enfrenta na competição. A estratégia utilizada – conversar
com o técnico sobre os motivos de não ter atingido o objetivo e traçar um plano pra melhorar
– possibilita mudança de foco de atenção: ao invés de manter o foco no treino ruim, colocar
o foco em ações que pode realizar no próximo treino para ter um resultado melhor. Tirar o
foco do evento que gera a frustração possibilita ao atleta lidar melhor com esse sentimento
e aproveitar melhor os próximos treinamentos. Praticar essa mudança de foco durante o
treinamento torna o atleta mais preparado para executá-la no momento de competição que
precise se recuperar rapidamente de uma prova ruim.
Ainda em relação a concentração enquanto no primeiro bloco a execução do nado não
está no foco de atenção do atleta, nos blocos seguintes ele se concentra cada vez mais nos
detalhes importantes para o alcance do ‘modo ideal’, como descrito por ele. Segundo Fronso
et al. (2017), prestar atenção aos componentes centrais da ação ajudam os atletas a se
recuperarem de estados internos não ideias para o desempenho (por exemplo, emoções dis-
funcionais) além de contribuir para uma execução mais automática das ações, o que aumenta
a experiência de fluxo (ou estado flow, estado ótimo relacionado ao desempenho máximo).
O tempo, a técnica de execução, a sensação do nado e a estratégia de prova são
aspectos que passam a ser cada vez mais importantes com a aproximação da competição
e o atleta deve usar as estratégias para se manter atento ao que é mais relevante a cada
momento para o melhor aproveitamento de cada treino e o melhor desempenho na compe-
tição. Na competição também existem muitas variáveis externas importantes (como o clima,
os adversários e o cronograma da competição) sendo importante que ele obtenha todas as
informações e as organize de forma a não perder nenhum elemento importante e manter
seu nível ideal de concentração em sua prova.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 363


Em relação às estratégias de motivação enfatizamos o uso da visualização, um processo
no qual informações já existentes na memória ou imagens criadas são vívida e delibera-
damente experimentadas pelo atleta através da imaginação (Rothlin et al., 2016). O atleta
usava como estratégia de motivação a visualização tanto dos objetivos futuros sendo al-
cançados, quanto de eventos passados nos quais conseguiu cumprir as metas e a clareza
do atleta sobre essas cenas demonstra mais uma vez seu autoconhecimento. Além disso
o atleta consegue utilizar a divisão do treinamento em blocos para avaliar seus avanços e
aumentar o nível de motivação para o próximo momento através do alcance de objetivo do
momento anterior.
Com a aproximação da competição, o nível de motivação do atleta cresce natural-
mente, sendo a necessidade do uso de estratégias relacionadas a esse aspecto menores
a cada bloco de treinamento. No momento da competição apenas pensar no tempo ou
colocação que ele deseja já o motiva de forma ideal, sem a necessidade do uso de outros
pensamentos e imagens.
Em relação à confiança ao longo do processo de treinamento três elementos – a con-
fiança no processo de treinamento, no próprio empenho e a execução de bons treinos – o
tornam mais confiante. Assim como faz no aspecto motivacional o atleta usa sua experiên-
cia dentro do modelo de treinamento para aumentar sua confiança e, nesse sentido, ele já
começa o treinamento conseguindo trazer de sua história fatores que o tornam confiante.
Além disso, quando executa bons treinos, utiliza esses momentos para aumentar seu nível
de confiança. Devido a esse caminho já bem estabelecido durante o treinamento o atleta
chega a competição ‘bem confiante’, como ele mesmo avalia.
No momento da competição, a preparação adequada para esse dia específico se une
à preparação do processo de treinamento para que o atleta se sinta pronto para se desem-
penhar e, quando necessário, o atleta utiliza memórias de bons desempenhos anteriores
para aumentar seu nível de confiança. Saber exatamente como deve nadar para alcançar
o resultado que busca também contribui com a confiança do atleta além de ser essencial
para o alcance de um bom nível de concentração.
Podemos perceber que para a preparação adequada para a competição foi necessária
a utilização e lapidação das estratégias relacionadas ao desenvolvimento de habilidades
psicológicas ao longo do processo de treinamento. Essa necessidade do trabalho ao longo
do processo de treinamento é corroborada por Hagan, Pollmann e Schack (2017b) que,
ao investigar o uso de estratégias psicológicas de atletas durante a semana que antecede
a competição, concluem sobre a necessidade de integrar o treinamento de habilidades
psicológicas continuamente aos ciclos de treinamento. Os mesmos autores demonstram

364 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


diferenças individuais sobre o uso de estratégias psicológicas, o que reafirma, como defen-
dido no presente artigo, a necessidade do uso das estratégias de acordo com as escolhas
do próprio atleta.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Podemos notar que a intervenção proposta, ou seja, o registro da descrição do atleta


sobre seu funcionamento em relação a algumas habilidades psicológicas, possibilita a per-
cepção mais explícita sobre as estratégias utilizadas pelo atleta e sua adequação a cada
momento de treino e competição. Nesse sentido esse material torna-se útil tanto para o
próprio atleta, a fim de utilizar as estratégias adequadas para regular os aspectos mais rele-
vantes a cada momento, quanto para os profissionais que trabalham com o atleta, a fim de
conhecê-lo melhor. Especialmente para o psicólogo é interessante o mapeamento realizado
para que o mesmo possa direcionar seu trabalho de forma integrada ao planejamento de
treino geral do atleta.
Dada a utilidade da intervenção apresentada, propomos um protocolo para realização
da mesma seguindo os seguintes passos:
1. Educar o atleta sobre o que são habilidades psicológicas e as estratégias que podem
ser utilizadas para ter controle sobre as mesmas.
2. Identificar o funcionamento do atleta em cada uma das habilidades (concentração,
motivação, ativação, resiliência e confiança) nas diferentes fases do treinamento (as
fases do treinamento devem preferencialmente ser explicadas pelo técnico do atleta).

a. Exemplos de perguntas para investigação: No que você se concen-


tra nessa fase? O quanto você está motivado e qual é sua motivação
nessa fase? Existem dificuldades nessa fase? Quais são suas estra-
tégias de enfrentamento e o quanto elas funcionam?
3. Discutir com o atleta e, se possível, também com o técnico (ou comissão técnica) qual
seria o estado ideal para cada uma das habilidades em cada momento de treino e competição.

b. Exemplos de perguntas para investigação: Qual deveria ser seu


maior estímulo motivador nessa fase? Qual deveria ser seu nível de
ativação nessa fase? O que seria ideal nos basearmos para trazer
sua confiança nesse período?

4. Verificar a relação entre o estado que o atleta geralmente está em cada fase de trei-
namento e o estado ideal. Se os estados são parecidos identificar e anotar as estraté-
gias utilizadas para que ele mantenha seu funcionamento ideal. Se houver diferenças,

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 365


discutir as estratégias possíveis para que o atleta se aproxime do estado ideal nos
treinos/competições.
5. Dar ao atleta essa planilha para que ele tenha fácil acesso às estratégias que deve
usar e também pode dividir essa informação com a comissão técnica.
6. Monitorar, tanto o uso das estratégias, quanto o alcance do estado ideal e dos resulta-
dos pretendidos para que possíveis adaptações sejam feitas sempre que necessário.
Importante lembrar que o treinamento das habilidades físicas, técnicas e táticas dos
atletas deve acontecer de forma integrada ao treinamento de habilidades psicológicas uma
vez que o atleta otimizará seu aprendizado de outras habilidades se estiver no estado psi-
cológico ideal para cada momento de treino bem como conseguirá reproduzir de forma mais
eficaz todos os aprendizados para o momento competitivo. A intervenção aqui apresentada
pode facilitar essa integração, trazendo de uma maneira clara e objetiva quais habilidades
psicológicas e quais estratégias deveriam ser ressaltadas a cada momento de treino e com-
petição dentro da individualidade de cada atleta.

REFERÊNCIAS
1. Bompa, T. O. (1999). Periodization: Theory and methodology of training (4ª ed). Human Kinetics.

2. Cid, L., Silva, A., Monteiro, D., Louro, H., & Moutão, J. (2016). Paixão, motivação e rendimento
dos atletas de natação. Revista iberoamericana de psicología del ejercicio y el deporte, 11 (1),
53-58. Disponível em: http://hdl.handle.net/10400.15/1378 acessado em 12/10/2018.

3. Fortes, L. S., da Costa, B. D., Paes, P. P., do Nascimento Júnior, J. R., Fiorese, L., & Ferreira,
M. E. (2017). Influence of competitive-anxiety on heart rate variability in swimmers. Journal of
sports science & medicine, 16(4), 498-504. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/
articles/PMC5721179/ acessado em 14/10/2018.

4. Fronso, S. D., Robazza, C., Bortoli, L., & Bertollo, M. (2017). Performance optimization in
sport: A psychophysiological approach. Motriz: Revista de educação física, 23(4). http://dx.doi.
org/10.1590/S1980-6574201700040001

5. Hagan Jr, J. E., Pollmann, D. & Schack, T. (2017a). Elite athletes’ in-event competitive anxiety
responses and psychological skills usage under differing conditions. Frontiers in psychology, 8
(2280). https://doi.org/10.3389/fpsyg.2017.02280

6. Hagan Jr, J. E., Pollmann, D., & Schack, T. (2017b). Exploring temporal patterning of psycholo-
gical skills usage during the week leading up to competition: Lessons for developing intervention
programmes. PloS one, 12(8): e0181814. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0181814

7. Glazier, P. S. (2017). Towards a grand unified theory of sports performance. Human movement


science, 56, 139-156. https://doi.org/10.1016/j.humov.2015.08.001

8. MacIntyre, T. E., Igou, E. R., Campbell, M. J., Moran, A. P. & Matthews, J. (2014). Metacogni-
tion and action: A new pathway to understanding social and cognitive aspects of expertise in
sport. Frontiers in psychology, 5 (1155). https:// doi: 10.3389/fpsyg.2014.01155

366 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


9. Martin, G.L. (2001). Consultoria em psicologia do esporte: Orientações práticas em análise
do comportamento (N. C. Aguirre, Trad.) Campinas: Instituto de Análise de Comportamento.

10. Samulski, D. (2009). Introdução à psicologia do esporte. In Samulski, D. (Ed.), Psicologia do


esporte: Conceitos e novas perspectivas (2ª ed. pp. 1-20). Barueri: Manole.

11. Skinner, B.F. (2006). Sobre o behaviorismo (10ª ed.) (M. P. Villalobos, Trad.). São Paulo:
Cultrix. (Originalmente publicado em 1974).

12. Strack, B., Linden, M. & Wilson, V. S. (Eds.) (2011). Biofeedback & neurofeedback applications
in sport psychology. Assoc. for applied psychophysiology and biofeedback.

13. Röthlin, P., Birrer, D., Horvath, S. & Grosse Holtforth, M. (2016). Psychological skills training
and a mindfulness-based intervention to enhance functional athletic performance: Design of a
randomized controlled trial using ambulatory assessment. BMC psychology, 4(39). Disponível
em: https://bmcpsychology.biomedcentral.com/articles/10.1186/s40359-016-0147-y Acessado
em 13/10/2018.

14. Weineck, J. (2003). Treinamento ideal (9ª ed.). São Paulo: Manole.

15. Weinberg, R.S. & Gould, D. (2011). Foundations of sport and exercise psychology (5a ed.).
Champaign: Human Kinetics.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 367


28
“ Intervenção do karatê como
fator terapêutico na vida do
asmático

Daniele Fernandes de Almeida


UNIP

Carlos Alberto Silva


UNIP

Thomaz Marquez
UNIP

Bruno Ferreira Gonçalves Silva

10.37885/201001796
RESUMO

A atividade física, além de trazer benefícios indispensáveis, é importante para pessoas


com doenças respiratórias. Asma é uma doença crônica e inflamatória das vias respi-
ratórias. Para ter redução dos sintomas é recomendada a intervenção medicamentosa
e atividade física. Este estudo mostra que quando o tratamento é realizado de forma
adequada, ocorre melhora dos sintomas e que se for conciliado com Karatê, a qualidade
de vida melhora ainda mais. Participou desde estudo um indivíduo do sexo feminino,
com asma desde a infância. Com base no exame de espirometria, que permite aferir
a velocidade e a quantidade de ar que uma pessoa consegue inspirar e expirar, foi
constatado que houve melhora significativa em relação a capacidade vital forçada que
se pode eliminar de volume de ar em manobra expiratória (Capacidade vital forçada) e
os distúrbios que estão obstruindo as vias respiratórias (Volume expiratório forçado) da
paciente. Foram utilizados dois exames, sendo que um foi realizado antes da paciente
praticar Karatê e outro durante os treinamentos. Levando em consideração sexo, peso
e idade, os valores previstos do primeiro exame são 3,66 L (Capacidade vital forçada)
e 3,22 L (Volume expiratório forçado) e obtidos 3,37 L e 2,35 L. Já o segundo exame
apresentou os valores previstos 3,70 L (Capacidade vital forçada) e 3,12 L (Volume ex-
piratório forçado) e obtidos 4,28 L e 3,33 L. Através destes resultados pode-se observar
que a porcentagem foi de 24% a mais no segundo exame, fazendo com que a paciente
conquistasse 16% acima da média nacional de função pulmonar.

Palavras-chave: Atividade Física, Asma, Karatê.


INTRODUÇÃO

Segundo a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), do Ministério da Saúde e Instituto


Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) a asma atinge 6,4 milhões de brasileiros e é
responsável por mais de 100 mil internações no SUS - A Organização Mundial de Saúde
(OMS) calcula que cerca de 300 milhões de pessoas no mundo sofrem com a asma. Os sin-
tomas são, principalmente, dificuldade respiratória, tosse seca, “chiado” ou ruído no peito.
Isso se dá ao fato de os brônquios do asmático serem mais frágeis, e inclinam-se a reagir
de forma mais repentina quando há exposição aos diferentes desencadeadores da doença:
frio ou mudança brusca de temperatura, fumaça, ácaros ou fungos, e até mesmo odores
fortes. A manifestação da doença é mais frequente logo pela manhã ou no período da noite
e até mesmo induzido pelo exercício e que apesar de ser um desencadeante, não se deve
deixar de praticar qualquer atividade física. Modalidades classificadas como exercícios ae-
róbios são os mais indicados para os asmáticos, pois necessitam que os pulmões e coração
absorvam, transportem e distribua oxigênio para os músculos. Esse tipo de treinamento
aumenta a frequência cardíaca e o consumo de oxigênio (VO₂) pelo corpo, que beneficia
o coração, pulmões e melhora a circulação. Durante o treinamento, o corpo controla e
equilibra o consumo de oxigênio, mas, quando se inicia o exercício o sistema de transporte
de oxigênio (respiração e circulação) não supre imediatamente a quantidade necessária
de oxigênio dos músculos ativos, criando um déficit de oxigênio, ou seja, há um aumento
na necessidade de O₂ em um ritmo superior àquele que pode ser sustentado pelo sistema
aeróbio, fazendo com que a via anaeróbia assuma temporariamente a função de sistema
predominante no fornecimento de energia (FOUREAUX et al., 2006). Um esporte que pode
ser feito em qualquer faixa etária, que trabalha todos os sistemas, principalmente muscular
e cardiovascular, utilizando os sistemas aeróbios e anaeróbios é o karatê.
Então porque o karatê intervêm na vida do asmático?
A atividade física é considerada hoje uma aliada muito importante para manter a saú-
de, melhorar a qualidade de vida e promover a longevidade (SABA, 2011). É essencial que
não haja dor e desconforto ao se exercitar, porém os novos estímulos farão o corpo sentir
o esforço muscular e isso não pode ser encarado como dificuldade (REIS, 2013), o karatê
tem níveis de dificuldade que vai aumentando conforme o tempo de treinamento. Com o
incremento da intensidade do esforço existe um correspondente e linear aumento no VO₂.
Eventualmente, a uma dada intensidade, a capacidade máxima de transporte de O₂ para os
músculos ativos é atingida e o VO₂ entra num platô, ainda que por pouco tempo, apesar de
continuar a existir um incremento da carga. O valor de VO₂ obtido nesse platô é considerado
o VO₂máx. (MATHEWS C, HEIL B, FRIEDSON P, PASTIDES H, 1999). É possível melhorar
o VO₂máx, com o incremento de carga e sempre buscar o limiar anaeróbico. Se um indivíduo

370 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


treinar com cargas abaixo do primeiro limiar de lactato (L1), estará fazendo um treino su-
baeróbio, configurando um treino de intensidade insuficiente para gerar qualquer adaptação
do organismo. Se o indivíduo treinar com cargas levemente acima do L1, estará fazendo
um treino aeróbio extenso, de menor intensidade e maior duração, vai obter melhoras no
metabolismo muscular (aumento dos capilares, do número de mitocôndrias e de enzimas de
oxidação). Mas, se o indivíduo treinar além do L1 e mais próximo ao L2 estará fazendo um
treino aeróbio intensivo, de mais intensidade e menor duração. Esse tipo de treino melhora
o sistema cardíaco (diminui frequência cardíaca, aumenta volume sistólico, aumenta pare-
de dos vasos e a capacidade vasodilatadora) (FOX; MATHEUS, 1986). Portanto, o karatê
é uma ótima opção de treinamento para quem deseja não só melhorar suas capacidades
físicas, cardiovasculares, além de aprender e vivenciar uma arte marcial cuja a filosofia é
tão rica. Para este estudo, a metodologia utilizada foi um estudo de caso, onde foram co-
letados dados a partir de exames clínicos de espirometria, que registra volume de ar e a
função pulmonar. O estudo é composto por dois resultados, sendo um realizado no ano de
2007 e o outro em 2013. O protocolo utilizado no treinamento de Karatê foi de três vezes
por semana e com duração de uma hora e meia e dividido por aquecimento, alongamento,
kihon, kata e shiai. Este trabalho é relevante para a sociedade, principalmente pela evolução
do conhecimento cientifico dentro desta área de pesquisa, além de possibilitar uma melhor
compreensão da relação da asma com a atividade física, podendo auxiliar uma melhora da
qualidade de vida, além do legado para a sociedade e não só para um grupo social especi-
fico, pois deve-se levar em consideração que as informações adequadas não devem ser só
para o asmático, mas também seus familiares e amigos.
Pretende-se mostrar que os resultados é a soma de tratamento adequado com ativi-
dade física ou esporte, neste caso o Karatê, e mostra que a qualidade de vida pode chegar
16% acima da média, além de concretizar protocolos de treinamentos específicos para cada
gravidade da asma e analisar através de um estudo de caso, a melhora significativa nos sin-
tomas com exames de espirometria aplicados através da observação e de testes de VO₂máx.

MATERIAL E MÉTODO

Procedimentos metodológicos

A metodologia utilizada é estudo de caso que conta com uma pessoa adulta, do sexo
feminino, de vinte e nove anos. Com diagnóstico de asma desde a infância. Os resultados
são descritos através de construção de gráficos e tabelas fazendo uso da estatística descri-
tiva. A pesquisa não oferece riscos aos participantes e o exame é indolor.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 371


Foram coletados dados a partir de exames clínicos de espirometria, que registra volume
de ar e a função pulmonar. Independente da gravidade da doença.
Este exame permite aferir a velocidade e a quantidade de ar que uma pessoa conse-
gue inspirar e expirar. Tem como objetivo diagnosticar as obstruções que se encontram no
pulmão, ou seja, se o fluxo de ar e volume do pulmão estão normais ou não. Através de um
tubo chamado espirômetro conectado a boca, a paciente segue algumas etapas do exame:

1. Sentada, o espirômetro é conectado a boca;


2. Para não haver desperdícios de ar, uma presilha de borracha fechará
o nariz enquanto a paciente realiza o exame;
3. Respirar normalmente e tranquilamente por algum tempo;
4. Encher completamente o pulmão;
5. Expirar com o máximo de força e rapidez possível;
6. Normalmente o teste é repetido três vezes.

Para definir o tratamento e a dosagem da medicação mais adequada são ana-


lisados os dados:

• FVC (Capacidade vital forçada): É a capacidade vital forçada que se


pode eliminar de volume de ar em manobra expiratória. Mulher tem a
capacidade de 3,2 litros e homem de 4,5 litros;
• FEV1 (Volume expiratório forçado): Avalia, no primeiro segundo e du-
rante a expiração máxima quais são os distúrbios que estão obstruin-
do as vias respiratórias;
• FEV1/FVC (Relação do volume expiratório forçado com a capacidade
vital forçada): É a relação dessas duas medidas que melhor avalia os
distúrbios obstrutivos;
• PFE (Pico de fluxo expiratório): Melhor índice de esforço respiratório;
• EVol (Volume de ventilação máxima): Representa o volume máximo
de ar ventilado em um período de tempo por repetidas manobras
respiratórias forçadas.

O estudo é composto por dois resultados, sendo um realizado no ano de 2007 e


o outro em 2013.
A paciente iniciou a prática do Karatê dois anos após seu primeiro exame. O protocolo
utilizado no treinamento de Karatê foi de três vezes por semana e com duração de uma hora
e meia. É dividido por aquecimento, alongamento, kihon, kata e shiai.

372 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


O aquecimento engloba corrida simples, lateral, elevando os joelhos pra cima, elevando
os pés para trás e tiro. Eventualmente é incluído circuitos com obstáculos. Já o alongamento
é feito através do método passivo, um trabalho em diferentes grupos musculares. Este tipo
de alongamento mantém uma posição alongada por um curto período de tempo, que pode
variar de 3 segundos até 60 segundos. Como continuidade do alongamento, é executado
o Kihon, pois as sequências de movimentos exploram os grupos musculares, fortalecendo-
-os. Os golpes básicos são: Oi zuki, Sambon zuki, Ague uki, Soto uke, Uti uque, Guedan barai,
Shuto uke, Mae gueri, Mawashi gueri. São realizados os katas básicos e alguns avançados
no treinamento. Assim como no kihon os movimentos são sempre os mesmos e seguem
uma ordem. No shiai a movimentação do corpo é maior para ter a dinâmica e agilidade nos
golpes, é necessário saltitar e se movimentar para frente, trás e laterais. O Shiai é realiza-
do em duplas, pode-se ter um parceiro fixo durante o treino ou ir alternando. O objetivo é
aprimorar as técnicas, aumentar a velocidade e a precisão dos golpes. As técnicas sempre
são alternadas entre pernas, braços e queda. Parte do treinamento do shiai é feito apenas
de repetições de um determinado golpe e a outra é a luta completa, mas ambas as partes
com movimentação de luta.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os valores do exame de espirometria têm as variáveis: Idade, peso, sexo, altura e se


é fumante ou não para especificar um valor como parâmetro de volume de ar nos pulmões
considerando normal ou com obstrução. Através da análise, os valores verificados nos anos
em que a pesquisa se desenvolveu, foram altamente positivos, como apresentamos a seguir.
Os resultados são compostos por dois exames, sendo um realizado no ano de 2007 e
o outro, seis anos depois, em 2013.
Em dois mil e nove, dois anos após o primeiro exame submetido, a paciente iniciou
os treinamentos de Karatê.
Em 2007 os valores obtidos foram menores que os valores esperados e significa que
há obstrução nas vias respiratórias como mostram o Quadro 1.

Quadro 1. Valores obtidos no primeiro exame


Previsto Obtido %
FVC (Litros) 3,66 3,37 92
FEV1 (Litros) 3,22 2,35 73
2007
FEV1/FVC (%) 90,2 69,7 77
PEF (L/s) 7,23 3,95 55
Evol (mL) 60 60

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 373


Após o início dos treinamentos da modalidade de Karatê, em 2013 é possível perceber
que os valores obtidos foram maiores que o esperado, como mostra o quadro 2.

Quadro 2. Valores obtidos no segundo exame


Previsto Obtido %
FVC (Litros) 3,7 4,28 116
FEV1 (Litros) 3,12 3,33 107
2013
FEV1/FVC (%) 84,8 77,8 92
PEF (L/s) 7,72 6,81 88
Evol (mL) 100 100

Os resultados apresentados nos quadros demonstram claramente que houve melhora


significativamente no volume de ar e na função pulmonar, através do FEV1 (Volume expira-
tório forçado) pode-se observar que a porcentagem foi de 24% a mais no segundo exame.
Essa melhora está diretamente relacionada à prática de atividade física, através da
modalidade esportiva Karatê, no estudo feito por Reid et al, (2012) confirmaram que os
benefícios do treinamento físico é visto como terapêuticos, também descrevem melhorias
na qualidade de vida, controle de função e ou resultados de prevenção do tratamento de
doença pulmonar obstrutiva crônica.
Salientando que o treinamento de Karatê foi de três vezes por semana e com duração
de uma hora e meia. É dividido por aquecimento, alongamento, kihon, kata e shiai.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os resultados desse estudo que foi realizado ao longo de seis anos, sugerem que a
prática do Karatê consiste em uma atividade física com significativo componente aeróbio,
sendo uma modalidade de alta intensidade, independentemente do sexo, idade e peso cor-
poral da pessoa e demonstra a eficiência dos exercícios.
A espirometria permite medir os volumes de ar inspirado e expirado e os fluxos respi-
ratórios, sendo útil a análise dos dados derivados da manobra expiratória forçada e por isso
os valores obtidos no exame devem ser comparados a valores de referência adequados,
ou seja, os valores previstos.
Sua interpretação deve ser feita a partir dos dados clínicos e levar em consideração:
Idade, peso, sexo, altura e se é fumante ou não.
É importante considerar que o seguinte estudo sugere benefícios através desse método
de treinamento, na saúde e na qualidade de vida do indivíduo com asma. Ao longo deste
trabalho surgiram novas possibilidades que não foram desenvolvidas, pois tornariam este
trabalho muito extenso. As duas principais possibilidades são a analisar resultados de outros
asmáticos e de sedentários.

374 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


REFERÊNCIAS
1. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ASMÁTICOS (ABRA). Asma é uma doença crônica e infla-
matória das vias respiratórias. Disponível em: <http://www.asmaticos.org.br/> Acesso em:
20.mai.2013.

2. ASSOCIAÇÃO KAMAE DE KARATÊ SHOTOKAN (KAMAE). Disponível em: <http://www.


kamae.esp.br/> Acesso em: 20.mai.2013.

3. BENTO O. J. et al. A. Esporte E Atividade Física. 1. ed. Barueri: Manole, 2001. 368 p.

4. BEMSTAR. Doenças provocadas por excesso de gordura. 2013. Disponível em: <http://bems-
tar.globo.com/sa/index.php?tipo=3&sa=materias&t=2&id_mat=366> Acesso em: 24.out.2013.

5. COORPERATIVA DO FITNESS (CDOF). Disponível em: <http://www.cdof.com.br/historia.


htm> Acesso em: 21.out.2013.

6. COLBERG S. Atividade Física e Diabetes. São Paulo: Editora Manole, 2003. 306 p

7. CARVALHO M. A. J; MAREGA M. Manual de Atividades Físicas Para Prevenção de Doenças.


São Paulo: Editora Elsevier, 2003. 304 p

8. DYNAMIC KARATE. Zenkutsu-dachi. 2013. Disponível em: <http://www.dynamickarate.com/


images/basic_karate_moves_stances.jpg> Acesso em: 19.set.2013.

9. DYNAMIC KARATE. Kokutsu-dachi. 2013. Disponível em: <http://www.dynamickarate.com/


images/basic_karate_moves_stances.jpg> Acesso em: 19.set.2013.

10. DYNAMIC KARATE. Kiba-dachi. 2013. Disponível em: <http://www.dynamickarate.


com/images/basic_karate_moves_stances.jpg> Acesso em: 19.set.2013.

11. FILHO, C. L. Educação Física No Brasil: a História Que Não Se Conta. 15. ed. São Paulo:
Papirus, 2010. 228 p.

12. FUNAKOSHI, G. Os Vinte Princípios Fundamentais do Karatê. 1. ed. São Paulo: Cultrix, 2005.
127 p.

13. FUNAKOSHI, G. Karatê-do, meu modo de vida. 7. ed. São Paulo: Cultrix, 2013. 136 p.

14. HENJI, T. T. Karatê: Gojuriu. 1. ed. São Paulo: Hemus, 2004. 112 p.

15. INFOESCOLA NAVEGANDO E APRENDENDO. Brônquios. 2013. Disponível em: < http://www.
infoescola.com/sistema-respiratorio/bronquios/> Acesso em: 17.set.2013.

16. INFOESCOLA NAVEGANDO E APRENDENDO. Árvore Brônquica. 2013. Disponível em:


<http://www.infoescola.com/wp-content/uploads/2010/05/arvore-bronquica.jpg> Acessoem:
18.set.2013.

17. KARATECA. O significado dos Kata do estilo Shotokan. 2009. Disponível em: <http://www.
karateca.net/forum/kata/o-significado-dos-kata-do-estilo-shotokan/> Acesso em: 24.OUT.2013.

18. LEVY, M. et al. Tudo sobre asma. 1. ed. São Paulo: Andrei, 2000. 226 p.

19. MASOLI M. et al. The global burden of asthma: executive summary of the GINA dissemination
committee report. Allergy 2004;59:469-478.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 375


20. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Secretaria Nacional de Ações Básicas de Saúde, (DATASUS), Es-
tatísticas de Mortalidade, 2007.

21. NATHAN L. Asthma and the ADAM33 Protein. Estados Unidos. Disponível em: <http://law-
gen677s11.weebly.com/> Acesso em: 25.mai.2013.

22. NIEMAN C. D. Exercício e saúde. 1. ed. São Paulo: Manole, 1999. 328 p.

23. NETO, C. A. (Org.). Asma em saúde publica. 1. ed. Barueri: Manole, 2007. 296 p.

24. JOVEMPAN. Por que se exercitar?. Disponível em: <http://blogs.jovempan.uol.com.br/melho-


ridade/por-que-se-exercitar//> Acesso em: 24.out.2013.

25. PORTO, F. A. Benefícios da Atividade Física - Em sua vida diária. 2002. Disponível em:<http://
www.saudeemmovimento.com.br/conteudos/conteudo_exibe1.asp?cod_noticia= 640> Acesso
em: 19.set.2013.

26. REID, W.D. et al. Exercise prescription for hospitalized people with chronic obstructive pul-
monary disease and comorbidities: a synthesis of systematic reviews. International journal of
chronic obstructive pulmonary disease. 2012. 7:297-320.

27. RAMOS, J. J. Exercício Físico na História e na Arte: do homem primitivo aos nossos dias. São
Paulo: IBRASA, 1982. 353p

28. REVISTA MINISTÉRIO DA SAÚDE E MUNICÍPIOS. É tempo de diminuir a espera. É tempo


de saúde, 2. ed, 2013. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/php/index.php . Acesso em:
17. set 2013.

29. REIS, M. P. Atividade física tem que dar prazer. 2013. Disponível em: < http://www.cecb.edu.
br/index.php/2009-11-06-13-37-08/1184-atividade-fisica-tem-que-darprazer.html> Acesso em:
19.set.2013.

30. SABA, F. Mexa-se - Atividade Física, Saúde E Bem-estar. 3. ed. São Paulo: Phorte, 2011. 323 p.

31. STIGGER, P. M. Educação Física, Esporte e Diversidade. 1. ed. São Paulo: Autores Associa-
dos, 2005. 125 p.

32. SOLÉ D, CAMELO-NUNES IC. A dimensão do problema da asma e da rinite alérgica no Brasil:
prevalência, hospitalizações e mortalidade. 2 ed. São Paulo: Gazeta Médica da Bahia 2008;78
3-10.

33. UOL BLOG. Alongamentos. 2013. Disponível em: <http://lilieducacaofisica.zip.net/arch2009-


04-12_2009-04-18.html> Acesso em: 18.set.2013.

34. VIEIRA, J. Seja Um Vendedor Faixa Preta. 1. ed. São Paulo: José Ribamar Vieira, 2009. 272 p.

35. WIDMAN. et al. Asma. 2. ed. São Paulo: Senac, 2002. 68 p.

376 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


29
“ Mortes na natação de águas
abertas, por quê?

Fabrízio Di Masi
UFRRJ

Gabriel Costa e Silva

10.37885/201102003
RESUMO

Introdução: Após a divulgação da inclusão da prova de maratonas aquáticas na olimpía-


da de Pequim em 2008, o esporte natação em águas abertas viu seu número de novos
praticantes aumentar muito. A natação em águas abertas é caracterizada por provas
nos mares, lagos, lagoas, represas, rios e outros espelhos d´água. No Brasil com sua
extensa costa e bacias hidrográficas gigantes, fornece locais excelentes para a prática
de tal modalidade, o que se reflete num grande número de adeptos. Faz algum tempo
que o anuncio de incidentes fatais nas provas de águas abertas tem se tornando mais
comum. Com isso alguns autores vêm se debruçando sobre o tema tentando esclarecer
o por quê destas mortes. Objetivo: O objetivo deste capítulo foi descrever as possíveis
causas dos eventos fatais em águas abertas e sugerir ações para tornar mais segura esta
atividade. Método: Foi realizado uma revisão integrativa a partir de estudos relacionados
às mortes em águas abertas e suas respectivas causas. Resultados: Não foi possível
estabelecer precisamente a causa específica destas mortes, uma vez que geralmente a
causa de morte declarada é o afogamento, e não a causa primária. Entretanto diversos
autores levantam alguma hipóteses, como: Síndrome do QTlongo, conflito autonômico,
ataque de pânico, edema pulmonar e problemas referentes a temperatura da água.
Considerações Finais: Apesar da dificuldade de determinar as causas mortis dos parti-
cipantes de provas de águas abertas, é possível levantar hipóteses sobre prováveis cau-
sas, a saber: temperatura elevada da água, síndrome do QT longo, conflito autonômico,
pânico. Como sugestão para evitar essas mortes sugere-se: triagem médica rigorosa,
evitar temperaturas elevadas, evitar temperaturas muito baixas, provas que obedeçam
critérios de segurança (controle do número de participantes, equipe de resgate experiente
e em número adequado, UTI móvel, condições ambientais e climáticas favoráveis).

Palavras-chave: Esportes Aquáticos, Natação e Segurança.


INTRODUÇÃO

Desde outubro de 2005, o Comitê Olímpico Internacional (COI) aprovou a inclusão da


prova de natação de 10 km em águas abertas para o programa dos Jogos Olímpicos a partir
de Pequim 2008. Este fato tornou a modalidade esportiva ainda mais popular. Particularmente,
o Brasil, com sua grande costa banhada pelo oceano Atlântico e suas gigantes bacias hi-
drográficas, tem um cenário perfeito para a prática.
Em análise recente Harris et al. (2017), pesquisaram o período de 1985 até 2016 de
provas de Triathlon, encontrando um total de 122 mortes, sendo que 85 ocorreram no seg-
mento da natação em águas abertas. Tipton (2014) examinou dados do levantamento da
USA Triathlon, entre os anos de 2003 a 2011, e encontrou que não houve diferença quanto
a distância de prova, local, tipo de largada e nível de experiência do atleta, sendo que as
mortes ocorreram tanto em amadores como em experientes.
No Brasil as estatísticas não são precisas. De maneira informal, é possível observar
através do senso comum e notícias de veículos de comunicação que estes eventos infeliz-
mente não são tão raros. As mortes relativamente comuns nos eventos de águas abertas
e a busca de explicações para tais acontecimentos começaram a chamar a atenção dos
competidores, pesquisadores e comunidade médica.

OBJETIVO

Descrever as possíveis causas dos eventos fatais em águas abertas e sugerir ações
para tornar mais segura esta atividade.

MÉTODOS

Este capítulo se caracteriza-se como uma breve revisão de literatura em forma de co-
mentário, que tem por finalidade sintetizar a opinião dos autores acerca das mortes durante
provas de águas abertas e seus respectivos motivos, buscando esclarecimentos e medidas
para redução de óbitos.
Foram realizadas buscas de estudos relacionados às mortes em águas abertas e suas
respectivas causas nas principais bases de dados, tais como PubMed, Google acadêmico,
Lilacs e Periódico Capes.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 379


RESULTADOS

Apesar de diversas pesquisas terem se debruçado sobre o tema e levantado teorias


sobre possíveis causas, como: água quente; água fria (síndrome do QT longo – SQTL, con-
flito autonômico e edema pulmonar); e estado psicológico do nadador (HARRIS et al., 2017;
CHOI et al., 2004; EICHNER, 2011), não foi encontrada causa específica.

DISCUSSÃO

Apesar de não haver uma causa específica definida, os tópicos a seguir abordarão as
possíveis causas ponto a ponto, entretanto, é mister ressaltar que as vantagens da prática
regular de exercícios são muito importantes para combater os efeitos deletérios de uma
vida sedentária. De maneira alguma o assunto deve ser interpretado como um desestímulo
à prática de esportes.

Água Quente

O caso mais emblemático diz respeito ao grande atleta Francis Crippen que faleceu
durante prova do circuito mundial de águas abertas em 2010. O provável gatilho desta
morte foi a água quente, pois nesta prova muitos nadadores passaram mal e/ou ficaram
desidratados (EICHNER, 2011). A água é boa condutora de calor, o que normalmente é
um ponto favorável para a prática de exercícios, uma vez que a água que circunda o corpo
dissipa o calor com mais facilidade (condução e convecção). Entretanto na água quente os
mecanismos de troca de calor ficam praticamente fechados, o que pode levar o indivíduo a
desidratação e hipertermia (EICHNER, 2011; BRASIL; DI MASI, 2006). Após este episódio
fatal as regras da competição foram modificadas, inclusive a temperatura máxima permitida.

Água fria

O ambiente de águas abertas não pode ser controlado como nas piscinas e muitas
vezes a água se apresentará fria para uma competição. O corpo pode experimentar: hiperven-
tilação, suspensão da respiração, aumento na circulação de hormônios ligados ao estresse,
aumento da pressão arterial (PA) e aumento da demanda miocárdica de O2 (HARRIS et al.,
2017; IKÄHEIMO, 2018) e ainda pode induzir a uma alta incidência de arritmias cardíacas
(SHATTOCK; TIPTON, 2012).
Os efeitos da água fria podem ajudar a desencadear alguns efeitos que serão citados
nos próximos tópicos.

380 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Síndrome do QT longo(SQTL)

A síndrome do QT longo (STQL) é caracterizada pela demora na repolarização ventricu-


lar, podendo causar sincope cardíaca e morte súbita (VAN NIEKERK et al., 2017). A síndrome
se manifesta de forma mais comum durante a prática de exercícios ou por carga emocional
intensa, duas situações que ocorrem nas competições de águas abertas (EICHNER, 2011).
A natação em maratonas tem sido particularmente implicada como um gatilho para
episódios de síncope e quase afogamento (LAZAR et al., 2013). O tipo mais frequente de
STQL (42% a 55% dos casos) manifesta-se durante a prática de exercício, especialmente
durante a natação (NOGUEIRA et al., 2011). A água fria demonstrou prolongar o interva-
lo QT e desencadear respostas bradicárdicas, que foram associadas a eventos cardíacos
(LAZAR et al., 2013).

Conflito autonômico

Uma ativação simultânea dos drives simpático e parassimpático tem sido relacionado ao
desenvolvimento de arritmias cardíacas (SHATTOCK; TIPTON, 2012). A provável explicação
é que o esforço, apneia, imersão facial e temperatura da água fria podem causar ativação
dos sistemas nervoso simpático e o parassimpático através do “reflexo de mergulho”. Isso
juntamente com o medo pode causar quantidades aumentadas de extra-sístoles ventriculares
(LAZAR et al., 2013). A ativação simultânea poderia então ser responsável por arritmias em
alguns indivíduos mais vulneráveis.

Edema Pulmonar

Alguns casos de edema pulmonar ao nadar ou durante mergulho são relatados na li-
teratura. Água fria, exercício, elevada pressão inspiratória e estresse emocional são fatores
de risco (GRÜNIG et al., 2017). Um estudo de revisão demonstrou que as ocorrências em
provas de natação de águas abertas pode ser um problema de saúde pública, pois, envolve
a participação de centenas de participantes e, frequentemente são subnotificadas, sendo
necessário um maior conhecimento e controle dos fatores de risco (SPENCER et al., 2018).

Ataques de Pânico

O início de uma prova, os contornos de boias são geralmente um ponto desafiador para
a maioria dos atletas. Competições com um grande número de pessoas, pode representar
um risco para todos os participantes, uma vez que existe o contato, podendo inclusive cau-
sar traumas. A provas em águas abertas per se podem provocar certo receio por parte dos

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 381


nadadores, o que pode induzir a um desespero ao experimentar uma sensação de estar den-
tro de uma “máquina de lavar” que ocorrem em certos trechos do percurso como, por exem-
plo, na largada e no contorno das boias. As mortes durante a natação nas provas de Triatlo
são mais comuns em eventos com maior número de participantes (HARRIS et al., 2017).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Apesar da dificuldade de determinar as causas de morte dos participantes de provas de


águas abertas, alguns autores têm se interessado em desvendar os possíveis motivos. Em ge-
ral, de forma isolada ou combinada, as temperaturas extremas de água quente ou fria, esta
última que pode levar a síndrome do QT longo, conflito autonômico e ataques de pânico,
que por sua vez pode ocorrer em razão do grande número de pessoas disputando o mesmo
espaço para nadar, podem representar gatilhos para a ocorrência de mortes, uma vez que,
mesmo um simples mal súbito pode levar ao afogamento quando se está no meio líquido.
A organização dos eventos deve observar cuidadosamente os seguintes aspectos: con-
trole do número de participantes, presença de guarda-vidas em número adequado, equipe
de resgate experiente, circuito apropriado (percurso), Unidade de Tratamento Intensivo (UTI)
móvel, condições ambientais e climáticas favoráveis. A Sociedade Brasileira de Salvamento
Aquático (SOBRASA) elaborou uma série de recomendações para provas de águas abertas
(SOBRASA, 2019). Sugere-se, ainda, que sejam conduzidos estudos científicos para exa-
minar a adequação no lastro de temperaturas recomendadas, tanto para água fria (gatilho
de fatores cardiovasculares) como para a água quente.
Muita atenção deve ser dada à largada. Alguns organizadores fazem saídas escalona-
das, estratificando por: sexo, idade, ritmo de nado entre outros. Estas atitudes podem ajudar
bastante no controle e diminuir a possibilidade de traumas, ataques de pânico e facilitar o
resgate. Os professores responsáveis pelos atletas podem estabelecer certas condutas que
podem contribuir para evitar incidentes.
O primeiro passo a ser observado é um treino adequado em piscina, preparando o aluno
para as demandas fisiológicas de provas em águas abertas. Após uma boa adaptação as
aulas de piscina, o aluno pode ser conduzido a treinos em equipes em águas abertas sempre
com acompanhamento. Se assim desejar o aluno deverá começar por provas menores (pou-
cos quilômetros e/ou número de participantes reduzido), condições climáticas adequadas,
preferencialmente, com um nadador experiente acompanhando. Algumas provas amadoras
em alguns países só podem ser realizadas com um flutuador específico. Este equipamento
pode auxiliar na flutuação em caso de algum problema, carregar um repositor energético,
sinalizar o local do nadador (facilitando o trabalho do grupo de salvamento e identificação
para embarcações). O mesmo poderia ser adotado no Brasil.

382 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Os atletas participantes devem para sua própria segurança realizar uma triagem médica
rigorosa (preferencialmente com cardiologista e/ou médico do esporte), tendo em vista que
as causas mortis documentadas geralmente são tratáveis e de fácil detecção através de
um exame simples de ECG, análise do histórico familiar, observações de sinais e sintomas.

REFERÊNCIAS
1. HARRIS, K. M. Sudden Death During the Triathlon. JAMA. Vol. 303, n. 13, p. 1255, 2017.
Disponível em: http://jama.jamanetwork.com/article.aspx?doi=10.1001/jama.2010.368

2. TIPTON, M. J. Sudden cardiac death during open water swimming. British Journal of Sports
Medicine. Vol. 48, n. 15, p. 1134-1135, 2014. Disponível em: http://bjsm.bmj.com/lookup/
doi/10.1136/bjsports-2012-092021

3. CHOI, G.; KOPPLIN, L. J.; TESTER, D. J.; WILL, M. L.; HAGLUND, C. M.; et al. Spectrum
and Frequency of Cardiac Channel Defects in Swimming-Triggered Arrhythmia Syndromes.
Circulation. Vol. 110, n. 15, p. 2119-2124, 2004. Disponível em: https://doi.org/10.1161/01.
CIR.0000144471.98080.CA

4. EICHNER, E. R. The mystery of swimming deaths in athletes. Current Sports Medicine Re-
ports. Vol. 10, n. 1, p. 3-4, 2011. Disponível em: https://doi.org/10.1249/JSR.0b013e318205e0f6

5. BRASIL, R.; DI MASI F. A Ciência da Hidroginástica. 1ed ed. Sprint, editor. Rio de Janeiro;
2006.

6. IKÄHEIMO, T. M. Cardiovascular diseases, cold exposure and exercise. Temperature. Vol. 5,


n. 2, 9. 123-146, 2018. Disponível em: https://doi.org/10.1080/23328940.2017.1414014

7. SHATTOCK, M. J.; TIPTON, M. J. “Autonomic conflict”: A different way to die during cold water
immersion? The Journal of Physiology. Vol. 590, n. 14, p. 3219-3230, 2012. Disponível em:
https://doi.org/10.1113/jphysiol.2012.229864

8. VAN NIEKERK, C.; VAN DEVENTER, B. S.; DU TOIT-PRINSLOO, L. Long QT syndrome and
sudden unexpected infant death. Journal of Clinical Pathology. Vol. 70, n. 9, p. 808-813,
2017. Disponível em: http://doi.org/10.1136/jclinpath-2016-204199

9. 9. LAZAR, J. M.; KHANNA, N.; CHESLER, R.; SALCICCIOLI, L. Swimming and the heart. In-
ternational Journal of Cardiology. Vol. 168, n. 1, p. 19–26, 2013. Disponível em: http://dx.doi.
org/10.1016/j.ijcard.2013.03.063

10. NOGUEIRA, R. G. B.; REBELLO, E. S.; REBELLO, A. P. S.; SOTOMAIOR, V. S.; RASKIN, S.
Síndrome do QT Longo. Estudos em Biologia. Vol. 32, n. 76/81, p. 105-10, 2011. Disponível
em: http://dx.doi.org/10.7213/reb.v32i76/81.22875

11. GRÜNIG, H.; NIKOLAIDIS, P. T.; MOON, R. E.; KNECHTLE, B. Diagnosis of swimming induced
pulmonary edema - A review. Frontiers in Physiology. Vol. 8, p. 652, 2017. Disponível em:
http://doi.org/10.3389/fphys.2017.00652

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 383


12. SPENCER, S.; DICKINSON, J.; FORBES, L. Occurrence, Risk Factors, Prognosis and Pre-
vention of Swimming-Induced Pulmonary Oedema: a Systematic Review. Sport Medicine -
Open. Vol. 4, n. 1, p. 43, 2018. Disponível em: https://sportsmedicine-open.springeropen.com/
articles/10.1186/s40798-018-0158-8

13. SOCIEDADE BRASILEIRA DE SALVAMENTO AQUÁTICO (SOBRASA). Recomendação


SOBRASA, segurança em eventos de águas abertas. Disponível em: http://www.sobrasa.org/
recomendacao-sobrasa-seguranca-em-evento-de-aguas-abertas/

384 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


30
“ O jogo por uma perspectiva
histórico-cultural

Gustavo Martins Piccolo


UFSCar

10.37885/201001867
RESUMO

Este artigo versa sobre a explicação da estrutura epistemológica erigida pela teoria his-
tórico- cultural que permite definir o jogo protagonizado como a atividade principal das
crianças pré- escolares. Parte do pressuposto de que a educação física se vem aproprian-
do indevidamente de alguns constructos elaborados por Vygotsky, leontiev e Elkonin, difi-
cultando, assim, a compreensão do arcabouço filosófico que orienta os referidos autores
e o possível estabeleci- mento de intervenções que alavanquem o desenvolvimento dos
mais diversos alunos e alunas para outros patamares qualitativos. Termina ressaltando
a importância do jogo protagonizado, desde que corretamente mediado, na configuração
de relações sociais mais democráticas e na apropriação de diversos conhecimentos.

Palavras-chave: Jogo, Educação Física, Atividade Principal, Teoria Histórico-Cultural.


INTRODUÇÃO

Contemporaneamente os nomes e as ideias de Vygotsky, Leontiev, Luria, Davidov e


Elkonin começaram a ser ouvidos e apropriados em campos teóricos para além das esferas
da psicologia, neurologia e educação, sendo que esse processo de conhecimento, apesar de
gerar grande difusão dos estudos realizados pela chamada Escola de Vygotsky, foi muitas
vezes alavancado sob o preço de deturpações e incompreensões teóricas, banalizando o
complexo arcabouço filosófico fincado no materialismo histórico e dialético.
A educação física não passou incólume a esse processo de apropriação insipiente e
fragmentar dos principais constructos erigidos pela Escola de Vygotsky. Destarte, expressões
como zona de desenvolvimento proximal, internalização e o jogo como atividade principal do
ser humano passaram a fazer parte do vocabulário empregado por professores e alunos dos
cursos de educação física. Em virtude desses elementos, consideramos imprescindível para
a área de educação física a realização de textos que versem sobre o significado que esses
conceitos efetivamente assumem na psicologia histórico-cultural. Nesse universo teórico
este trabalho se insere e sua finalidade reside em aprofundarmos o sentido da expressão:
o jogo como atividade principal.

SOBRE A GÊNESE LÚDICA

Estudar as atividades lúdicas a partir de um referencial teórico metodológico pautado


na psicologia histórico-cultural traz consigo inequivocamente a necessidade de uma busca
sociológica e histórica dos fenômenos investigados. Qualquer acontecimento produzido
pelas mãos humanas, quais sejam, o trabalho, a linguagem, a sociedade, a cultura ou o
jogo possui uma história que se compõe a partir da inter-relação desempenhada entre o
homem e a sociedade. VYGOTSKY (2001, 1999), ELKONIN (1960, 1969, 1987, 1998, 2000),
LEONTIEV (1978, 1988), MUHHINA (1995), Davidov (1988), ZAPORÓZHETS (1987) e
USOVA (1979) teceram importantes considerações sobre a origem histórica dos jogos e o
papel que desempenham na construção social, cultural e psíquica das crianças.
Para Usova (1979), a concretização de qualquer fenômeno social, tal qual o jogo,
possui uma história cujo desvelar permite o entendimento das principais características
que esclarecem sua origem, seu desenvolvimento e a importância social desempenhada
em diferentes contextos históricos. Os jogos praticados pelos homens não possuem uma
existência atemporal, muito pelo contrário. Os caminhos da história edificados pelo gêne-
ro humano não relatam sua presença entre as coletividades sociais como um fenômeno
eterno. Ou seja, nem sempre existiu um tipo de atividade lúdica particular entre os homens
classificada pelo vocábulo jogo.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 387


Assim, de acordo com Plekhanov (1974), nas coletividades que ainda davam seus
primeiros passos rumo à formação de sociedades, as atividades lúdicas não tinham qual-
quer espaço na rotina diária de seus habitantes, posto que a totalidade das horas do dia
era consumida na busca de alimentos para seu sustento e na escolha de um local protegi-
do para servir de abrigo contra as intempéries do tempo e os animais selvagens. Apenas
posteriormente esse problema foi solucionado, para tanto foi necessário o aparecimento e
desenvolvimento do trabalho e de seus mecanismos artificiais. Somente então as atividades
lúdicas tiveram seu ato de nascimento. Em razão desses elementos, a gênese histórica dos
jogos humanos está mediatamente atrelada às atividades laboriosas.
Sobre essa afirmação cabe tecermos alguns comentários. A base teórica de Plekhanov
(1974), ao afirmar que as atividades lúdicas, nas sociedades primievas, não tinham qualquer
espaço na rotina diária de seus habitantes, está ancorada no raciocínio desenvolvido por
Engels (1980) ao analisar a obra de Lewis Morgan. Essa assertiva também é encontrada
na obra de Marx (1987), Gramsci (1981), Elkonin (1998) e Vygotsky (2001). Seu ponto car-
deal está em destacar a protoforma da cultura humana como advinda do trabalho e, como
o lúdico é visto como produto da cultura nesse referencial teórico, este, na maioria das
vezes, é interpretado como inexistente ou subliminar nas sociedades que ainda davam os
primeiros passos em seu processo de existência. Todavia, é importante ressaltar que essa
posição teórica está longe de ser consensual, sendo atacada duramente pelo campo da
antropologia estrutural, cujo maior nome é Claude Lévi-Strauss. Lévi-Strauss (1976, 1986),
em seus estudos antropológicos, demonstra como o lúdico sempre esteve presente nas re-
lações sociais, além disso, reitera que as sociedades indígenas não necessariamente vivem
somente na esfera da subsistência, e quando isso ocorre, não significa a existência de uma
pobre relação de domínio perante a natureza, muito pelo contrário, pois indica que esses
povos dão destaque para outros elementos que não apenas aqueles ligados as esferas de
reprodução de nossa existência, dentre eles, os mitos, a religião, os jogos, as festas etc.
Sobre essas duas posições teóricas desenvolve-se um verdadeiro embate acadêmico entre
as noções de cultura e trabalho como produtoras da própria genericidade do ser humano,
cujo desenvolvimento foge à alçada deste trabalho.
Definida a origem dos jogos, que em nada se assemelha a atividade lúdica manifesta
por alguns animais, é importante ressaltar que quando Elkonin (1998), Leontiev (1988) e
Vygotsky (2001) ressaltam o jogo como a atividade principal dos seres humanos, esses au-
tores não estão se referindo à prática de quaisquer atividades lúdicas, mas à realização de
uma dessas atividades, os jogos dramáticos, em um estágio específico do desenvolvimento
humano, o pré-escolar. Portanto, para a psicologia histórico-cultural nem todo jogo pode ser
considerado a atividade principal do ser humano.

388 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


A ATIVIDADE PRINCIPAL

O conceito de atividade na teoria histórico-cultural, com base na teoria marxista, foi


desenvolvido principalmente por Leontiev (1978, 1988), mas também por Vygotsky (1995,
1996), Davidov (1988) e Elkonin (1987). De forma sucinta, Leontiev (1988, 1978) destaca
que o conceito de atividade pode ser entendido como um tipo de mediação concretizado em
relação à realidade externa. Por intermédio de sua atividade, o homem relaciona-se com o
mundo, satisfazendo suas principais necessidades físicas, materiais, espirituais e culturais.
Para Davidov (1988), a essência do conceito de atividade reside no fato de ele refletir
uma relação entre o homem e a realidade externa, mediatizada por um conjunto de significa-
ções sociais. A atividade cujo desenvolvimento possibilita a inserção na realidade externa e
a apropriação dos principais componentes dessa realidade denomina-se atividade principal.
Atividade essa representada, de acordo com Davidov (1988), pela exploração objetal até
os três anos; pelos jogos protagonizados no estágio de desenvolvimento pré-escolar (3 a
6/7 anos); o estudo sistemático dos 7 aos 12 anos, a comunicação entre coetâneos na ado-
lescência e o trabalho na idade adulta. Contudo, como destaca Usova (1979), esse estádio
psíquico não é fixo, tampouco suas atividades principais, pois estas apenas se definem como
basilares no seio de uma complexa relação entre sujeito e sociedade, que historicamente
se mostra mutável as ações teleológicas e interventivas estabelecidas pelos seres humanos
em seu processo de apropriação, inserção e transformação de seu contexto natural e social.
Leontiev (1988) designa a expressão atividade principal para a atividade frequentemen-
te encontrada em dado nível no desenvolvimento do ser humano que promove as maiores
transformações em seus mecanismos psicológicos, e não aquela praticada durante a maior
parte do tempo, ou seja, a atividade por meio da qual ocorrem as mais importantes mudan-
ças no desenvolvimento psíquico do ser humano e dentro da qual se enriquecem processos
psicológicos e sociais que preparam o caminho de transição do ser humano para um novo e
mais elevado nível de desenvolvimento mediante a criação e recriação constantes de zona
de desenvolvimento proximais.
Tal entendimento da categoria de atividade é fundamental para entendermos o con-
ceito de infância e educação pré-escolar na perspectiva da psicologia histórico-cultural, na
medida em que destaca que apenas mediante o completo da atividade as novas gerações
podem se apropriar dos elementos historicamente acumulados pelas gerações anteriores,
fato que demarca a historicidade e genericidade do ser humano. Logo, a interiorização de
determinado conhecimento ocorre apenas posteriormente à sua assimilação externa. Com
base nesse raciocínio, Elkonin (1969) enfatiza o desenvolvimento humano como dependente
das relações sociais e do processo de aprendizagem que lhe permite a apropriação de sua
humanidade. Sendo assim, a aprendizagem é colocada como fonte do desenvolvimento,

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 389


materializando-se nas atividades realizadas pelos homens, as quais nos possibilitam fazer
das aptidões materiais, culturais e espirituais edificadas ao longo da história órgãos de nossa
individualidade em um processo que, pela sua função humanizadora, também o é um pro-
cesso necessariamente educacional. Consequentemente, rompe-se com qualquer hipótese
naturalista ou cronológica na edificação de uma determinada etapa de desenvolvimento, uma
vez que a sociedade e a atividade são as principais definidoras dessas etapas, as quais se
constituem historicamente, variando em contextos sociais e culturais específicos.
Estádio de desenvolvimento representa, resumidamente, um período histórico que
possui uma determinada atividade humana como a principal, dentre outras atividades; não
é um período fixo, pois se modifica com a alteração do papel ocupado pelos mais diversos
sujeitos em seu processo de inserção à realidade externa, no caso humano, a socieda-
de. No estádio pré-escolar são os jogos protagonizados que possibilitam às crianças se
apropriar das principais ações realizadas pelos adultos na sociedade, daí a expressão o
jogo como atividade principal, sendo que tal atividade se torna ainda mais basilar quando
compreendemos que além desse processo de apropriação supracitado, seja da arte, ciência,
religião etc., os jogos se convertem em um mecanismo facilitador e amplificador das relações
sociais estabelecidas entre as crianças, configurando não apenas formas de pensar, mas
também maneiras de sentir, observar, cheirar, tatear, andar, saltar, rir, chorar, chutar, enfim,
os jogos funcionam como verdadeiras pontes dialéticas na apropriação do conhecimento
acumulado pela humanidade e também na objetivação de relações gnosiológicas, sociais,
culturais, éticas, estéticas e também lúdicas.
Zaporózhets (1987), para quem as influências recebidas pelas crianças durante o perío-
do pré-escolar são fundamentais para a complexificação e ampliação dos movimentos explo-
ratórios realizados pelas crianças, auxilia-nos na compreensão de que essa complexificação
se dirige tanto a aspectos motores (maximizando o crescimento corporal, as habilidades
sensoriais, o equilíbrio, a tonicidade etc.) quanto a aspectos psicológicos relacionados com a
formação de personalidade. Além desses elementos, a prática dos jogos introduz nas crianças
pré-escolares os fundamentos do caráter coletivo das ações realizadas em sociedade. Neles
passa-se a perceber as atitudes individuais como componentes de um corpo coletivo. Essa
forma de conscientização permite que a criança experimente a interdependência das ações
que realiza no seio da sociedade, sentindo-se como parte de um todo, no qual suas ações
interferem sobre a vida de diversas pessoas, favorecendo a construção de um diálogo hori-
zontal fundado em pressupostos éticos e filosóficos. Dentro desse complexo, percebemos a
totalidade desempenhada pela atividade principal em relação ao desenvolvimento omnilateral
dos seres humanos. Essas assertivas baseiam-se no trabalho de quase um século iniciado
pela psicologia histórico-cultural, principalmente pelos estudos de Elkonin (1998) e Vygotsky

390 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


(1996), sendo atualmente enriquecidas pelas contribuições, no mesmo referencial teórico,
de Zinchenko (1984), Petrovski (1984), Davidov (1988), Zaporózhets (1987), dentre outros.
Coerentemente, coloca-se em destaque a proficuidade do papel exercido pelo professor
de educação física desde a educação infantil, além de se estabelecer uma crítica radical ao
que se convencionou chamar de brincadeiras livres, que, apesar de sua importância, não
podem ser transformadas em aspectos que fundam as relações escolares sistematizadas
com o argumento de desenvolver a imaginação das crianças, pois estas se tornam mais
pobres quando se desvinculam de mediações abstratas. Assim, reforça-se a importância da
educação física, mas ao mesmo tempo coloca sua produtividade em estreita relação com o
trabalho interventivo docente, logo, a educação física não é vantajosa e profícua por si só, pre-
cisa ser pensada em termos de desenvolvimento das crianças e de enriquecimento cultural.
Pensar a educação física em termos de desenvolvimento humano significa entender
que os processos de aprendizagem, quando corretamente organizados, alavancam esse
desenvolvimento, em nosso caso, eminentemente social e cultural. Para Zaporózhets (1987,
p. 246-247), esse caráter de desenvolvimento é mate- rializado quando.

[...] os métodos de educação se estruturam em correspondência com as par-


ticularidades psicofisiológicas da idade pré-escolar, se, por exemplo, o ensino
dos pré-escolares não se realiza sob a forma da tradicional lição escolar, mas
sob a forma do jogo, da observação direta e prática, de diferentes tipos de
atividade prática, plástica etc.

Destarte, o professor de educação física deve mediante suas múltiplas atividades criar
novos desejos e despertar a aventura em conhecer o novo, o inusitado, enfim, organizar
sua atividade docente objetivando provocar novas experiências corporais para as crianças,
fato que contribui para a complexificação e o estabelecimento de novas inter-relações psí-
quicas. Para tanto, cabe ao professor de educação física criar um espaço social em suas
aulas que organize as mais distintas manifestações da cultura corporal do movimento, fa-
zendo as crianças assumirem diversos papéis sociais, em diferentes contextos, culturas e
épocas, mas, sem se esquecer de problematizar e contextualizar esses papéis em relação a
sociedade que nos circunscreve, buscando também o desenvolvimento de vínculos afetivos,
amistosos e colaborativos, enfim, vivendo na carne a riqueza da cultura humana, pois como
ressalta Marx (1987), só por meio da riqueza objetivamente desenvolvida do ser humano é
que em parte se cultiva e em parte se cria a riqueza da sensibilidade subjetiva humana, que
o ouvido se torna tonal, que o olho se desenvolve para a beleza das formas, ou seja, que
passamos a perceber a natureza como natureza humanizada. Quando assume esse papel
o jogo efetivamente atua como criador de zonas de desenvolvimento proximais, voltando
nosso desenvolvimento projetivamente para um futuro cada vez mais rico e humanizador.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 391


Os jogos protagonizados impulsionam o desenvolvimento dos pré-escolares para além
dos limites das atividades realizadas de forma individual, por isso, o jogo representa a es-
cola do futuro desenvolvimento social. Quando joga, a criança se insere em um mundo de
relações mais complexas do que aquelas oferecidas a ela pela sociedade concreta e por sua
vida real. Coerentemente, seu comportamento também se altera perante a situação, pois ela
passa a atuar como dominadora de sua realidade. Exerce o papel de um adulto com relativa
precisão, comunica-se em grupo, conhece novos tipos de relações e funções sociais, em
síntese, expe- rimenta/apropria conteúdos inalcançáveis até aquele momento se conside-
rarmos apenas as possibilidades oferecidas por sua inserção efetiva na sociedade. Isso não
significa que a criança para se desenvolver deve agir como adulto, mas, sim, que, para tanto,
necessita se apropriar das funções sociais adultas para compreender e, consequentemente,
se enraizar ativamente na cultura que a cerca. Sendo assim, quando falamos em exercer o
papel do adulto com precisão, não estamos nos referindo a uma possibilidade fictícia de a
criança agir e ter responsabilidades similares aos adultos, mas “apenas” em compreender
os meandros, tramas e significados que demarcam suas funções e possibilitam que esses
exerçam controle sobre a sociedade e sobre elas próprias.

O JOGO PROTAGONIZADO

Para Elkonin (1998), o jogo surgiu historicamente quando a sociedade humana atin-
giu determinado nível de desenvolvimento nas relações de produção, sendo que, na forma
protagonizada, representa a forma cardeal de apropriação das conquistas da humanidade
no período pré-escolar, cuja origem gênica está relacionada ao processo de divisão social
do trabalho que afasta as crianças das esferas produtivas e a superação da fase do ego-
centrismo infantil mediante vínculos colaborativos que configuram o coletivo como elemento
crucial para o transcorrer de tal atividade. Especificamente sobre a estrutura da atividade
lúdica, Elkonin (1998) destaca que os jogos estão relacionados com a diversão, passatempo,
manipulação ou movimentação corpórea, presença de riscos que não podem ser materiali-
zados na vida cotidiana, sendo, destarte, uma atividade livre, pois o jogador não é obrigado
a participar de tal processo; delimitada, já que está circunscrita aos limites de espaço e
tempo; regrada, posto não haver jogos sem regras, inclusive os protagonizados, apesar das
situações fictícias aí criadas; improdutiva em termos materiais (não geram, produzem ou
reproduzem riquezas, quando muito, podem movimentá-las), mas, extremamente produti-
va no que tange ao desenvolvimento do ser humano. O jogo protagonizado caracteriza-se
pela riqueza e predomínio das situações fictícias sobre regras rigidamente estabelecidas,
embora essa relação não seja bem de oposição, pois ao teatralizar as relações sociais a
criança se apropria e assume determinadas regras incorporadas pelos papéis sociais que

392 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


pretende protagonizar. Exatamente nesse momento faz-se de fundamental importância uma
intervenção crítica e criativa do professor de educação física, o qual, ao contextualizar as
regras, pode enriquecer o conteúdo dos próprios jogos e possibilitar que a criança se apro-
prie das funções sociais adultas da forma mais democrática possível. Um exemplo disso
pode ser dado quando em uma dramatização sobre a beleza feminina, muito comum entre
as crianças (popularmente conhecido como brincar de moda, desfile ou passarela), o pro-
fessor destaque as mais variadas formas de beleza ao longo de culturas e épocas distintas,
valorizando, assim, a construção de um padrão democrático de beleza, que certamente
exercerá influência sobre as relações sociais posteriores estabelecidas pelas crianças e na
construção de sua própria personalidade. Em vista disso, para Rubinstein (apud ELKONIN,
1998) no jogo (em especial no protagonizado) há tanto desprendimento como penetração na
realidade. Dessa forma, não há distanciamento nem evasão para um mundo supostamente
irreal, fictício, ou singular. O jogo toma da realidade o que necessita e plasma-o na ação.
Coerentemente, a imaginação não pode ser caracterizada como o motor do jogo, assim
como o é o trabalho para a construção humana. Ela é posterior ao jogo. Assim, para Elkonin
(1998, p.4) “antes do jogo não há imaginação”, já que apenas no desenrolar dessa atividade
ela se manifesta. Logo, não é uma situação fictícia que cria o jogo, mas, sim, o jogo é que
cria uma situação fictícia.
O principal motor para a gênese das brincadeiras está relacionado à necessidade que
a criança sente em intervir no mundo objetivo dos adultos. Para Leontiev (1988) essa ne-
cessidade infantil decorre do fato de qualquer ser humano querer dominar o ambiente que
o cerca e, para a criança, quem domina esse ambiente são os adultos por meio de suas
mais variadas funções, principalmente pelo trabalho. Ainda assim, o jogo não se constitui
como uma atividade preparatória para o trabalho, por exemplo, a criança que, mediante a
construção de um universo lúdico, segura o leme de um navio em sua navegação imaginária
não se prepara para a efetiva execução dessa atividade. Se ocorrer isso, a atividade não
será mais jogo, pois perderá sua própria intencionalidade.
As brincadeiras e os jogos protagonizados, em circunstâncias especiais, podem até
possuir uma relação íntima com um trabalho futuro, mas essa relação não pode estar dada
a priori. O garoto que realiza um drible com uma bola de futebol e diz estar imitando algum
jogador famoso, pois futuramente será um atleta, não está se preparando para o ingresso
nesse campo laborioso, tal como a criança que brinca de médico com um estetoscópio de
brinquedo não se prepara efetivamente para essa profissão. Algo totalmente diferente ocor-
re quando uma criança treina suas flechadas para depois de três meses matar um animal.
Nesse ponto reside a diferença básica entre o jogo protagonizado e a preparação para o
trabalho, ou melhor, entre o jogo e uma atividade pré-laboriosa.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 393


Para Vygotsky (2001), a potencialidade do jogo protagonizado reside no fato de este
ter grande afinidade com a natureza da criança, não a de tipo biológico, mas social, carac-
terizado pela necessidade que ela sente em comunicar-se com os adultos e levar uma vida
em comum com eles. Para a criança, brincar de faz de conta ou jogar dramaticamente não
se configura apenas como passatempo, mas, sim, como uma imersão indireta na complexa
teia de relações sociais edificadas pelo trabalho, cultura e sociedade. Poder dirigir um car-
ro, pilotar um avião ou navio sem estar em seu interior certamente se configura como uma
possibilidade sedutora para as crianças, aliás, as coloca em uma situação social em que a
responsabilidade de seus atos e procedimentos técnicos, mesmo que em um universo imagi-
nário, passa a ser vista como um elemento fundamental para o sucesso da própria atividade
em si. Consequentemente não existe jogo descolado da realidade, mesmo a dramatização
sobre super-heróis, aparentemente tão distantes de nosso universo cotidiano, possui repre-
sentação (que não pode ser encarada como uma cópia) em uma atividade elaborada pelos
adultos, tais como o cinema, a literatura, a televisão etc. Nesse momento, é importante frisar
que não estamos, em hipótese alguma, defendendo uma concepção adultocêntrica de criança
tal como se ela fosse um ser passivo esperando ser modelada pela sociedade, visão essa
que estaria em dissonância a Vygotsky. Assim, quando ressaltamos que toda atividade lúdica
provém de uma situação vivenciada junto ao universo adulto estamos querendo dizer que
qualquer comportamento deve ser entendimento como história do comportamento; enfim, que
no decurso de seu desenvolvimento a criança entra necessariamente com relações especí-
ficas com o mundo que a cerca, as quais foram edificadas pelas gerações anteriores e, aos
seus olhos, fundamentalmente por meio das múltiplas relações estabelecidas pelos adultos.
Além disso, objetivamos demonstrar que sem a organização intencional e teleológica
do ambiente, em nosso caso, o escolar, a criança tende a apresentar dificuldades em seu
processo de inserção e transformação da realidade, pois como frisa Zaporózhets (1987),
as qualidades psíquicas das crianças estão no início de seu processo formativo, sendo que
um meio caótico e desorganizado provavelmente atravancará o processo de compreensão
da criança quanto ao ambiente que a cerca. Ao contrário de interpretar a criança como um
ser frágil e dependente, entendemo-nas como criadoras de cultura, todavia, para tanto, pre-
cisam dominar o universo e as relações sociais que a cercam, as quais são estabelecidas
pelos adultos, ou melhor, por suas funções e papéis sociais. Esse processo de domínio é
fundamental ao objetivo exposto, na medida em que entendemos a criação de cultura como
o estabelecimento de uma nova relação perante a realidade circundante, relação manifesta
em novas práticas e diálogos interpessoais. Logo, cultura infantil não designa para nós a
formação de grupos ou o estabelecimento de amizades e hábitos particulares, pois, embora
importantes e constituintes de tal ethos, por si só, eles não portam conteúdos objetivos e

394 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


subjetivos que nos permitam pensar em uma nova relação da criança com o adulto, com a
sociedade e, consequentemente, consigo mesma.
A relação criativa que denota a construção de uma cultura tal como propomos torna
imperiosa a necessidade de desenvolvimento da imaginação humana para outro patamar
qualitativo, imaginação esta que se nutre do conjunto de fatos objetivos e subjetivos apro-
priados na experiência cotidiana de cada pessoa em particular. Isso posto, a transposição
realizada pelas crianças das atividades adultas para um universo lúdico particular (apro-
priação das significações) recebe a interferência marcante do sentido que cada criança
dá a uma determinada atividade, por isso, em certas dramatizações alguns personagens
ganham contornos para além daqueles tracejados pelos adultos: o pai se transforma em
super-herói; o médico assume funções do bombeiro etc. E é mediante o sentido dado pela
criança a uma determinada atividade que esta realiza o diálogo dialético entre as condições
objetivas e subjetivas da existência de tal atividade. Mediante suas dramatizações os pré-
-escolares se apropriam do conjunto de significações históricas expressas pala sociedade,
o que lhes permite compreender o próprio ambiente no qual estão enraizados, e os mais
diversos condicionamentos a que estão submetidos, o que eleva seu desenvolvimento para
outros níveis qualitativos. Todavia, essa apropriação não é realizada pela criança de forma
espontânea, necessitando de um nexo mediativo para sua realização. No estágio pré-escolar
essa mediação é realizada fundamentalmente pelos adultos, mas também pela atividade
principal e pelas próprias crianças. Essas informações exemplificam o papel enriquecedor
assumido pela intervenção docente, pelo diálogo e pela prática da atividade principal, que
quando bem dimensionados criam uma relação orgânica e dialética entre o significado e o
sentido de determinado conhecimento ou prática social, possibilitando a interiorização de
diversas aprendizagens pelas crianças desde a mais tenra idade. E a aprendizagem, como
ressalta Vygotsky (2001), alavanca favoravelmente nosso desenvolvimento a outros pata-
mares, tanto em aspectos intelectuais, como sociais, culturais e psíquicos.
Por fim, cabe ressaltar três elementos que consideramos como pontos falhos na ex-
plicação dos jogos e dos jogos protagonizados pela psicologia histórico-cultural. O primeiro
deles reside na interpretação dos jogos protagonizados como a atividade principal dos pré-
-escolares, período que compreende as idades de 3 a 6 anos, ou melhor, na manutenção
de um período cronológico específico e de uma atividade determinada por quase cem anos
posteriormente a sua definição. Ora, se os estádios de desenvolvimento e suas respectivas
atividades principais são historicamente construídos e se transformam a partir de condições
econômicas, culturais, políticas e sociais parece minimamente estranho que no período de
um século nada tenha sido alterado bruscamente nessa relação, pois apesar de o sistema

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 395


ainda ser o capitalista, a forma de inserção da criança na sociedade atual não é a mesma
de início do século XX.
O segundo elemento falho reside na pouca importância atribuída tanto por Vygotsky
(2001) como por Elkonin (1998) ao prazer como categoria fundante da atividade lúdica.
Aliás, para Vygotsky (2001) o prazer não possui qualquer relação com a realização ou não
das atividades lúdicas, justificando tal posição com o argumento de que muitas outras ati-
vidades propiciam um nível de prazer significativamente maior a seus participantes, como,
por exemplo, uma mamadeira com leite para uma criança. Todavia, não nos parece uma
boa posição abdicar da importância do prazer e da catarse na realização dos jogos, pois
em diversos momentos as atividades lúdicas funcionam não como uma tentativa de apro-
priação da realidade, mas, sim, de fuga de suas rotinas maçantes e obrigações entediantes.
Outro argumento encontrado em Vygotsky (2001) para explicar a razão por desconsiderar
o prazer como categoria constitutiva da atividade lúdica reside no fato de ele destacar que
nas atividades esportivas as crianças ou adultos competem até mesmo quando sabem que
não irão ganhar a atividade, em razão disso, Vygotsky (2001) considera simplesmente que
os participantes desprezam a questão do prazer. Todavia, tal raciocínio de Vygotsky (2001)
se funda apenas no produto final da atividade lúdica, fato que torna impossível entender
o prazer como componente do processo de participar do lúdico. Ou seja, acreditamos que
os participantes não desconsideram a categoria prazer na realização das atividades lúdi-
cas, muito pelo contrário, pois ainda que os resultados sejam negativos em dado jogo isso
não retira ontologicamente o prazer de atuar, de fazer parte desse contexto, pois o jogo
transcende as esferas produtivas para também se inserir em esferas de emoções, afetos,
sensibilidades, imaginação, enfim, adentra na esfera do lúdico, a qual é parte constituinte
do próprio processo de humanização do ser humano, porém, ainda não foi criteriosamente
investigada pelos estudos fincados na vertente histórico-cultural.
O terceiro elemento que parece ter sido vilipendiado no estudo dos jogos desenvolvidos
pela psicologia histórico-cultural consiste na não análise da questão da alienação nos jogos.
Tanto Elkonin (1998, 2000) como Vygotsky (1995, 2002) e Leontiev (1988) abordam apenas
o caráter humanizador da atividade lúdica, que apesar dos contributos notáveis a área do
desenvolvimento humano, não dão conta de explicar a globalidade dos processos sociais.
Grosso modo, a psicologia histórico- cultural deixou esquivar sua dialética na seguinte análise,
sendo que nesse ponto é importante ressaltar a postura analítica de Marx (1996) em relação
ao trabalho, posto destacar este como atividade libertária e humanizadora, mas também,
nas condições degradantes impostas pelo capitalismo, profundamente alienada e alienante,
na medida em que o trabalho acaba por voltar-se contra o próprio trabalhador, ou seja, seu
produto o domina e engendra o que denominamos de estranhamento das relações sociais.

396 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Dessa forma, soa estranho o argumento de que, ao realizar os jogos protagonizados, as
crianças apenas se apropriem dos elementos humanizadores arquitetados pela sociedade,
ficando, consequentemente, imunes de todas as mazelas e elementos que atravancam
nosso desenvolvimento. Enfim, é como se por meio dos jogos mergulhássemos no interior
da sociedade, mas alguma parte de nosso corpo curiosamente ficasse seca, enxuta e ex-
terna a essa imersão.
Esse é o elemento que consideramos grave no sentido de compreensão do ser hu-
mano como autor e ator de sua história, situando-se no fato de se ignorar que ao repre-
sentar papéis sociais as crianças podem muito bem estar também interiorizando relações
preconceituosas, alienadas, e, diametralmente oposta a qualquer ideia de transformação
social. Assim, não se pode esquecer que muitas vezes as crianças se tornam verdadeiras
escravas de seus papéis sociais, o qual se torna não objeto de apropriação pelas crianças,
mas, sim, de domínio acrítico destas. Esse é mais um dos fatos que demarca a premência
de os jogos protagonizados nas escolas serem mediados rumo a caminhos mais fraternos
e democráticos, sendo esta uma árida tarefa a ser realizada pelos professores de educação
física, pois provavelmente quando não mediadas às crianças tenderão a reproduzir sem
reflexão posterior os papéis alienados expressos e valorizados pela sociedade como algo
natural e até desejável de certo ponto de vista. Essa justificativa encontra eco no próprio
Vygotsky (1995) quando este ressalta que cada coisa pode ser considerada um microcos-
mo de modelo global no qual se reflita o todo, exatamente nesse sentido, o referido autor
enfatiza que cada pessoa reflete em maior ou menor grau a sociedade a que pertence, no
caso do capitalismo, necessariamente uma sociedade alienada e desigual. Essa noção é
abrilhantada pelas seguintes palavras de Wittgenstein (1969, p. 144):

A criança aprende a acreditar em muitas coisas. Isto é, ela aprende a agir de


acordo com essas crenças. Pouco a pouco se forma um sistema daquilo em
que se acredita, e nesse sistema algumas crenças são inabaláveis enquanto
outras são mais ou menos passíveis de mudança. Aquilo que é inabalável o é
não porque seja intrinsecamente óbvio ou convincente; é inabalável por causa
daquilo que está a sua volta.

Após apontar possíveis lacunas na interpretação do jogo pela perspectiva histórico-cul-


tural, acaba tornando-se premente demonstrarmos as fendas analíticas em nosso próprio
trabalho, as quais estão relacionadas na abordagem do tema proposto apenas pelas lentes
de dita perspectiva, faltando a este trabalho uma investigação de maior porte sobre as ati-
vidades lúdicas e seu dialogar, além dos autores já citados na psicologia histórico-cultural,
com ideias exploradas enriquecedoramente em nomes como Huizinga, Piaget, Claparéde,
Brougére, Caillois, Gross, dentre outros, os quais teceram importantes contribuições sobre
o fenômeno definido como jogo.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 397


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esperamos que este artigo possa contribuir para um repensar sobre alguns conceitos
importados da psicologia histórico-cultural para a área da educação física. Encerramos o
texto destacando que a classificação do jogo como atividade principal se aplica apenas ao
jogo protagonizado realizado no estádio pré-escolar de desenvolvimento e não a qualquer
atividade lúdica realizada pelos seres humanos, além de ressaltar que a proficuidade desses
jogos não se dá por sua simples prática, mas por uma mediação que alavanque a possibili-
dade de reflexão sobre a realidade circundante, o que na pré-escola consiste em uma tarefa
a ser realizada principalmente pelos professores e pelas professoras.

REFERÊNCIAS
1. DAVIDOV, V. la enseñanza escolar y el desarrollo psíquico: investigación psicológica teórica
y experimental. moscou: Progresso, 1988.

2. ELKONIN, D. B. Característica general del desarrollo psíquico de nos niños. In: SmIRNOV,

3. A. Psicología. méxico: Grijalbo, 1960.

4. _____. Desarrollo psíquico del niño desde el nacimiento hasta el ingreso en la escuela. méxico:
Editorial Grijalbo, 1969. p. 504-522.

5. _____. Sobre el problema de la periodización del desarrollo psíquico en la infancia. In: DAVI-
DOV, V.; SHUARE, m. (orgs.). la psicología evolutiva y pedagógica en la URSS (anto- logia).
moscou: Progresso, 1987. p. 125-142.

6. _____. Psicologia do jogo. Trad. álvaro Cabral. São Paulo: martins Fontes, 1998.

7. _____. Toward the problem of stages in the mental development of children. 2000. Disponível
em: <www.marxist.org>. Acesso em: 18 jul. 2008.

8. ENGELS, F. A origem da família, da propriedade privada e do Estado. 6 ed. Rio de Janeiro:


Civilização Brasileira, 1980.

9. GRAmSCI, A. Concepção dialética da história. 4. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1981.

10. LEONTIEV, A. N. Caracteristica general del desarrollo psiquico de los niños. méxico: Editora
Grijalbo, 1960.

11. ______. O desenvolvimento do psiquismo. Lisboa: Livros Horizonte, 1978.

12. . Os princípios psicológicos da brincadeira pré-escolar. In: VYGOTSKY. L. S.; LEONTIEV, A.;
LURIA, A. R. linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. 4. ed. São Paulo: Ícone, 1988. p.
119-142.

13. LÉVI-STRAUSS, C. O pensamento selvagem. São Paulo: Ed. Nacional, 1976.

14. _____. O totemismo hoje. Lisboa: Edições 70, 1986.

398 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


15. mARX. K. Manuscritos econômico-filosóficos e outros textos escolhidos. 4. ed. São Paulo:
Nova Cultural, 1987.

16. _____. O Capital: crítica da economia política. São Paulo: Nova Cultural, 1996. v. 1. mUKHINA,
V. Psicologia da idade pré-escolar. São Paulo: martins Fontes, 1995.

17. PETROVSKI, A. V. Personalidad, actividad y colectividad. Buenos Aires: Cartago, 1984.

18. PLEKHANOV, G. V. A concepção materialista da história. 4. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1974.

19. USOVA, A. P. El papel del juego en la educacíon de los niños. Ciudad de la Habana: Editorial
Pueblo y Educación, 1979.

20. VYGOTSKY, L. S. Obras escogidas. madrid: Aprendizaje Visor, 1995. v. 3.

21. _____. Obras escogidas. madrid: Aprendizaje Visor, 1996. v. 4.

22. _____. O desenvolvimento psicológico na infância. São Paulo: martins Fontes, 1998.

23. _____. Psicologia da arte. São Paulo: martins Fontes, 1999.

24. _____. A construção do pensamento e da linguagem. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo: martins
Fontes, 2001.

25. _____. Play and its role in the mental development of the child. Psychology and marxism In-
ternet Archive. 2002. Disponível em: <www.marxist.org>. Acesso em: 18 jul. 2008.

26. WITTGENSTEIN, L. On certainty. New York: Harper Torchbooks, 1969.

27. zAPORÓzHETS, A. Importancia de los períodos iniciales de la vida en la formación de la per-


sonalidad infantil. In: DAVIDOV, V.; SHUARE, m. (orgs.). la psicología evolutiva y pedagógica
en la URSS (antologia). moscou: Progresso, 1987. p. 228-249.

28. zINCHENKO, P. I. The problem of involuntary memory. Soviet Psychology, n. 2, p. 55-111, 1984.

29. Endereço para correspondência Gustavo martins Piccolo Alameda Estevo, 330 – Centro, Ga-
vião Peixoto-SP, CEP 14813-000. Email: gupiccolo@yahoo.com.br

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 399


31
“ Por uma didática do jogo/
brincadeira na educação física
escolar

Rogério de Melo Grillo


PPGECT/UFSC

Eloisa Rosotti Navarro


UFSCar

Gilson Santos Rodrigues


UNICAMP

10.37885/201202640
RESUMO

Embora seja considerado um “conteúdo clássico” no bojo da escola, o Jogo/brincadeira


como área de conhecimento, tema e/ou conteúdo não é levado “a sério” na Educação
Física escolar. Em vista disso, o objetivo deste texto é analisar pesquisas que abordam
ou intentam construir especificamente (ou que se aproximam) uma Didática para o jogo/
brincadeira na qualidade de área de conhecimento explorada pedagogicamente pela
Educação Física escolar). A análise interpretativa se fundamentou nas leituras e nos
insights que consubstanciaram as interpretações. As pesquisas trazem contribuições ao
conceber o Jogo/brincadeira como atividade fundamental ao desenvolvimento e apren-
dizagem de crianças e jovens, elemento de cultura lúdica e/ou estratégia pedagógica,
sendo conteúdo, metodologia e/ou avaliação. Porém, há insuficiências quanto à indis-
tinção entre Jogo e Lúdico e, mormente, existe a ausência de uma didática para o Jogo/
brincadeira, a qual considere a cultura lúdica dos alunos, a historicidade do jogo/brinca-
deira e brinquedo, as relações entre professor-alunos, o meio sociocultural e o nível de
conhecimento dos alunos. Por fim, este capítulo contribui com indícios de uma didática
para o Jogo/brincadeira e reafirmando que é necessário levar esta área de conhecimento
“a sério” na Educação Física escolar.

Palavras-chave: Jogo, Educação Física Escolar, Lúdico.


COMEÇANDO A PARTIDA...

No Brasil há vários documentos oficiais de nível federal e estadual referentes à Educação


Física escolar (PCN - BRASIL, 1997; BNCC, 2017; CBC - SEE/MG, 2007; SEE/SP, 2008;
SEE/RS, 2009, entre outros) que, precipuamente, trazem algumas discussões referentes
ao jogo/brincadeira1 como área de conhecimento, conteúdo, tema, eixo temático e/ou prá-
tica corporal e, tal-qualmente, debatem a respeito de seu valor pedagógico no âmbito da
Educação Física escolar.
Enfatizamos que esses discursos foram naturalizados por intermédio de vários pesqui-
sadores2 de diferentes áreas de conhecimento (Psicologia, Psicomotricidade, Praxiologia,
Sociologia, Antropologia, Pedagogia), os quais, por conseguinte, estabeleceram que o jogo/
brincadeira possui uma importância substancial ao processo de desenvolvimento e apren-
dizagem, tal qual, compreendem-no como uma atividade lúdica, elemento de cultura lúdica
e instrumento pedagógico no cenário escolar, intencionando o desenvolvimento integral de
crianças e jovens-estudantes.
Entrementes, analisamos que esses documentos delineiam superficialmente como o
jogo/brincadeira pode contribuir para o desenvolvimento e aprendizagem das crianças e/ou
jovens-estudantes, ou mesmo, propiciar a construção de conhecimentos por eles. Dessarte,
não é construída uma proposta didático-metodológica para o jogo/brincadeira, que transponha
a simples “prática pela prática” com esse fenômeno histórico-cultural (do jogo pelo jogo e do
jogo/brincadeira livre) ou a sua “prática utilitária” (jogo/brincadeira direcionado para outros
conteúdos, para o treinamento de habilidades).
Outrossim, concebemos que o jogo/brincadeira se naturalizou como sinônimo de lúdico.
Por essa razão, o lúdico foi (e ainda é) incutido nos discursos pedagógicos da Educação
Física (e em diferentes componentes escolares) de forma banalizada. Em outras palavras,
esse processo de “ludicização”3 tem conferido ao lúdico o status de “tábua de salvação” no
1 Quando falarmos do jogo na qualidade de conteúdo, tema e/ou eixo temático Educação Física escolar, usaremos o termo jogo/brin-
cadeira. É precípuo aludir que há uma diferenciação entre jogo e brincadeira conforme os moldes da Psicologia Histórico-Cultural. De
acordo com essa perspectiva, a brincadeira é análoga ao “brincar de faz de conta” e ao “brincar protagonizado” (situação fictícia às
claras e regras latentes). Por seu turno, o jogo é basicamente o “jogo de regras” (regras patentes e situação imaginária oculta). Isso
posto, nesta pesquisa, trataremos exclusivamente dos jogos de regras (jogos que exigem a construção de estratégias de jogo). Cf.
Elkonin (2003), Cutter-Mackenzie et al. (2014), Suits (1967) e Prestes (2014).
2 Pesquisadores no âmbito da: Psicologia (J. Piaget; L. S. Vigotski; J. Chateau; J. Bruner); Pedagogia (A. Michelet; T. M. Kishimoto;
G. Brougère; C. Freinet); Sociologia (R. Caillois; G. Brougère; F. Fernandes; P. S. Oliveira); Filosofia (J. M. Cagigal; L. Wittgenstein;
J. Retondar; W. Benjamin); Praxiologia (P. Parlebas); Psicomotricidade (P. Vayer; J. Le Boulch; B. Aucouturier); Pedagogia e Edu-
cação Física (J. B. Freire; A. Scaglia; H. T. Bruhns; N. C. Marcellino); História e Antropologia (J. Huizinga).
3 A Ludicização é um termo que concerne a um processo discursivo de construção didática ou não, baseada em jogos ou no discurso
de que uma dada atividade (reuniões, resolução de exercícios, dinâmicas, enquetes virtuais etc.) é lúdica, para enriquecer variados
contextos habitualmente não relacionados a jogos. Por exemplo: o uso de jogos, enquetes, dinâmicas ou quizzes para tornar a tecno-
logia de informação e comunicação mais atraente; o emprego de jogos, trilhas ou games para analisar o comportamento humano; o
uso da gamificação para ranquear pessoas, capitalizar suas emoções e/ou treinar técnicas; ou ainda, de jogos didáticos criados para
o ensino de certas disciplinas escolares e classificados como lúdicos etc. Mediante um olhar crítico, Grillo e Grando (2020) analisam
que a ludicização é um processo ludopolítico que visa transformar o jogo ou uma atividade dita lúdica, em outra coisa que não o pró-
prio jogo ou atividade, dado que desconsidera algumas particularidades do jogo e, em função disso, banaliza o lúdico, classificando-o

402 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


que tange à escola. Em termos mais específicos, tem-se utilizado o vocábulo lúdico, mate-
rializado no jogo e no brinquedo, em diversos discursos educacionais como meio exemplar
de desenvolver a aprendizagem dos discentes, ou para tornar o ensino mais auspicioso.
Por outro viés, temos algumas pesquisas realizadas com o jogo no âmbito da Educação
Física escolar (BRUHNS, 1989; TAVARES, 1994; PASSOS, 1995; RETONDAR, 1995;
FREIRE, 2002; CARNEIRO, 2009; COUTO, 2008; BERNARDI, 2017), as quais têm como
cerne (ou deixam subsídios) sugerir possíveis proposituras didático-metodológicas para o
jogo/brincadeira. Subentendemos que essas pesquisas contêm contribuições significativas
à área, porém, deixam em aberto lacunas. Uma delas, em específico, trata-se da falta de
análises com relação às práticas com o jogo/brincadeira a partir do “chão da quadra”.
Dado isso, essas pesquisas, em conjunto com as propostas curriculares supraditas,
deixam poucas evidências respeitantes a um trabalho pedagógico com o jogo/brincadeira,
especificamente, explicitando o papel do professor na organização de situações sociais de
ensino nesse processo. Quer dizer, que busque a exploração das potencialidades e possi-
bilidades pedagógicas que o jogo/brincadeira pode oferecer, tal como, quais conhecimentos
sobre o jogo/brincadeira podem ser desenvolvidos e em que medida essa manifestação his-
tórico-cultural proporciona o desenvolvimento das crianças e jovens-estudantes, na condição
de área de conhecimento explorada pedagogicamente pela Educação Física na escola4.
Em suma, consideramos que, conquanto estes documentos e pesquisas possuam al-
guns aportes teóricos, contrariamente, eles não arquitetam sistematicamente uma proposta
didático-metodológica que fundamente a prática do professor com o jogo/brincadeira, tendo
em consideração a organização de situações de ensino, as problematizações e variações de
jogo, o processo de planejamento, metodologias, estruturação da aula, objetivos, recursos
didáticos e procedimentos de avaliação. Ao que tudo indica, os documentos e pesquisas
expressam principalmente aulas “com” o jogo/brincadeira (sentido utilitário), todavia, não
aulas “de” jogo/brincadeira (jogo/brincadeira como área de conhecimento histórico-cultural),
objetivando a produção de conhecimentos, o desenvolvimento da pessoa e a apropriação
de cultura. Por consequência, não se viabiliza uma reflexão e/ou comprovação de que o
jogo/brincadeira praticado, de acordo com seus preceitos didáticos, engendra a produção
como um objeto externo à pessoa (desprezando o lúdico como forma de expressividade). Enfim, para Grillo e Grando (2020), a ludi-
cização é assumida como um tipo de falácia neoliberal, ancorada num discurso empresarial e de marketing, que, de forma recôndita,
explora o lúdico (livre expressão) visando à produção de maior lucro, além de buscar o controle de dados (Big Data), a capitalização
das emoções e de comportamentos, dentre outras ações nefastas para a liberdade das pessoas.
4 Entendemos que o Jogo é uma área de conhecimento que é estudada por diferentes áreas/ciências como a Sociologia, Antropologia,
História, Matemática, Filosofia, Psicologia, Pedagogia, entre outras. No bojo da Educação Física, o Jogo é assumido como um con-
teúdo/tema/área de conhecimento, assim como outras práticas corporais (esporte, lutas, dança, ginástica, atividades circenses, entre
outras). Para tal, a Educação Física (ideada como uma prática pedagógica intencional que tematiza as práticas corporais) organiza,
tematiza e sistematiza pedagogicamente o Jogo na escola. Sublinhamos também que não descartamos outras formas de se trabalhar
com o jogo. Com isso, ressaltamos que o Jogo igualmente pode ser um “conteúdo” de certa disciplina/componente curricular (na
Matemática: matemática recreativa, jogos lógicos; na Geografia: jogos de guerra; na História: jogos tradicionais e o desenvolvimento
da sociedade etc.); uma “metodologia” (ensinar por meio do jogo, por exemplo, o esporte, a ginástica, a Língua Portuguesa); ou ainda
uma forma de “avalição” (o jogo como tematizador de aprendizagens).

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 403


de conhecimentos históricos e estratégicos de jogo, espaços de diálogo e convivência, o de-
senvolvimento entre as funções psíquicas e motoras nas crianças ou jovens-estudantes etc.
Nesse viés, no presente texto, analisamos pesquisas que abordam especificamente
(ou que se aproximam) a respeito de uma Didática para o jogo/brincadeira na qualidade de
área de conhecimento explorada pedagogicamente pela Educação Física escolar5.
Ressaltamos que estas pesquisas são produtos de teses e dissertações realizadas no
Brasil e que possuem substancial colaboração para a área acadêmica. No entanto, essas
pesquisas também deixaram algumas lacunas e, por isso, exploraremos estas neste texto.
Assinalamos que a escolha dessas pesquisas se deu por conveniência, assim, arrolamos
os estudos que mais se aproximam do escopo do presente texto.

PESQUISAS CONCERNENTES À UMA “POSSÍVEL DIDÁTICA” PARA O


JOGO/BRINCADEIRA NA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR: DÉCADA DE
1990

Um dos estudos pioneiros com o jogo/brincadeira no bojo da Educação Física escolar


foi a dissertação “A Dinâmica Lúdica” de Heloísa T. Bruhns (1989). O objetivo dessa pesquisa
foi diferenciar o jogo do esporte de rendimento, atribuindo, com isso, um caráter de área de
conhecimento ao jogo/brincadeira independente quanto ao esporte. A autora justificou que
o jogo/brincadeira é uma manifestação sócio-histórica, destarte, condiz a um conhecimento
cultural. Nesse sentido, o jogo deve ter “estatuto” próprio no contexto da escola. No mais, a
autora criticou o seu uso numa perspectiva ‘utilitarista’, isto é, como meio para desenvolver
outros conteúdos que não ele próprio.
Ideamos que a contribuição da pesquisa de Bruhns (1989) concerne à concepção de
que é fundamental atribuir ao jogo/brincadeira o caráter de área de conhecimento utilizado
pela Educação Física e, por consequência, ele deve ser trabalhado com um fim em si, bem
como o esporte, a dança ou a ginástica. Ademais, o estudo contribui significativamente para
valorizar o jogo/brincadeira como uma forma de desenvolver nos educandos a imaginação,
a criação, a autonomia, a liberdade e a construção de conhecimentos.
Em contrapartida, a lacuna deixada pela aludida pesquisa diz respeito aos procedi-
mentos didático-metodológicos para se trabalhar com o jogo/brincadeira, de tal maneira que
desenvolva nos educandos suas funções psíquicas, motoras e sociais supraditas. Embora
tenha defendido o jogo/brincadeira como uma área temática da Educação Física, analisamos
que é importante, pari passu, construir todo um arcabouço teórico-prático para desenvolvê-lo
na escola. Dessarte, transpondo uma perspectiva puramente discursiva e teoricista quanto
ao jogo/brincadeira.
5 Utilizamos o Banco de Teses da Capes (2018) como referência. Para isso, usitamos as palavras-chave: Jogo, Educação Física esco-
lar; Didática; Metodologia.

404 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Ulteriormente, a pesquisa de Marcelo Tavares (1994), intitulada “O ensino do jogo na es-
cola: uma abordagem metodológica para a prática pedagógica dos professores de Educação
Física”, objetivou, por meio de uma pesquisa de intervenção, analisar dados da realidade a
respeito do ensino do jogo/brincadeira e suas contradições em aulas de Educação Física,
especificamente, numa turma de 5ª série do Ensino Fundamental (hodiernamente, 6º ano do
Ensino Fundamental). Para tanto, realizou uma análise acerca das ambiguidades ‘alienação’
e ‘emancipação’ no trabalho com o jogo/brincadeira, demonstrando que essa área temática
da Educação Física deve ser trabalhada sob a égide de uma pedagogia crítica, visando à
autonomia e à emancipação dos educandos.
A priori, a contribuição desse estudo corresponde à realização de uma pesquisa de
campo, do tipo intervenção, na qual a prática pedagógica com o jogo/brincadeira em aulas
de Educação Física é o escopo. Nesse período (meados da década de 1990), as pesquisas
com essa temática no tocante à Educação Física ainda eram estritamente teóricas, tal como,
havia estudos em que se utilizava o jogo/brincadeira numa perspectiva utilitária (como meio
para a aplicação de testes psicológicos ou psicomotores, método para outros conteúdos,
forma de desenvolver habilidades motoras etc.). Pode-se depreender que a pesquisa de
Tavares (1994) demonstrou a relevância em se estudar uma metodologia para se trabalhar
com o jogo/brincadeira. De modo símil, o autor defende a essencialidade em tratá-lo como
um fim em si e não como um instrumento para outros conteúdos (perspectiva utilitária).
Outra contribuição de Tavares (1994) foi, mormente, defender que o ensino do jogo/
brincadeira na escola deve ser alicerçado em uma abordagem metodológica e não em uma
espécie de “senso comum pedagógico”. Sublinhamos que para o autor referenciado, o jogo/
brincadeira deve ser trabalhado numa abordagem marxista, posto que esse é o único enfoque
capaz de desenvolver na escola as relações sociais mais humanas e coletivas, engendrando
uma formação crítica e emancipatória. Sendo assim, deve-se focar na atuação do professor
e na participação dos educandos, mediante um processo autoavaliativo e participativo.
Para além dessas contribuições, a lacuna deixada por este estudo é atinente ao fato
de Tavares (1994) não apresentar quais seriam estas possibilidades didático-metodológicas
para o jogo/brincadeira, conforme uma abordagem marxista. Ademais, ainda que tenha dis-
cutido que parte dos conteúdos são os “jogos tradicionais” e os “jogos populares”, Tavares
(1994) não delineou qual é o conhecimento de que trata o jogo/brincadeira e qual é o seu
objetivo no contexto da Educação Física escolar. Por fim, analisamos que uma faceta da
prática pedagógica do autor aludido, fundamenta-se em usá-lo para se debaterem outras
questões importantes, não inerentes a ele, como: violência nos esportes, esportivização na
escola, exclusão no esporte. Pode-se observar que são questões relativas ao tema Esporte

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 405


e que, levadas à área temática jogo/brincadeira, acabam por torná-la utilitária (instrumento
para debater outras áreas).
O estudo de Kátia Passos (1995), intitulado de “O Lúdico Essencial e o Lúdico
Instrumental: o Jogo nas Aulas de Educação Física”, basicamente, tencionou analisar as
atividades desenvolvidas com o jogo/brincadeira em aulas de Educação Física no Ensino
Fundamental I e, subsequentemente, identificar e depreender a conduta pedagógica dos pro-
fessores quanto à sua prática com o mencionado tema. A partir de uma pesquisa descritiva,
a autora trouxe como contribuições: a necessidade de uma formação mais crítica para os
professores trabalharem com o jogo/brincadeira; a importância em não se instrumentalizar o
lúdico (tornar o jogo utilitário); a essencialidade em se organizá-lo na escola como conteúdo
da Educação Física.
Por outro viés, a pesquisa de Passos (1995) deixa como lacuna, precisamente, a orga-
nização didática para o jogo/brincadeira na Educação Física. Em outras palavras, a autora,
apesar de defender tal perspectiva, não apresenta uma possível abordagem didático-me-
todológica, de tal forma que dirima a vertente utilitarista e sistematize conteúdos, objetivos,
procedimentos metodológicos e avaliação para o jogo/brincadeira. Nessa perspectiva, seu
estudo se volta à descrição e à crítica no que corresponde às práticas de professores(as) de
Educação Física relativas ao jogo e ao lúdico. Com isso, deixando eclipsada uma proposta
didática alicerçada em uma Educação Emancipatória (abordagem defendida pela autora).
A pesquisa de Jeferson Retondar (1995), intitulada de “Alguns sentidos do ato de jo-
gar”, empreendeu uma reflexão filosófica em relação ao jogo como prática pedagógica na
Educação Física. Primeiramente, o autor contribui defendendo que o jogo é um fenômeno
social necessário ao ser humano e, apesar de seu caráter elusivo, é fenômeno social e cul-
tural fundado em uma atividade simbólica carregada de representações, intersubjetividades
e formas de expressividade daquilo que é profundamente sentido. Em virtude disso, o autor
enaltece o jogo como uma possível área de conhecimento da Educação Física, uma vez que
é um conhecimento que potencializa a dimensão lúdica da existência humana.
Nesses moldes, a análise de Retondar (1995) favorece uma reflexão referente em
termos metodológicos, ao propor a utilização das quatro grandes categorias de jogo/brinca-
deira criadas por Roger Caillois (Competição, Sorte, Vertigem e Simulacro). Por esta razão,
o autor não intencionou tecer uma classificação pormenorizada, mais do que isso, visou
potencializar cada classificação, com vistas a corroborar para a construção de um paradigma
de Educação pelo jogo, no qual contemple-o como conhecimento em si e meio de educar o
indivíduo em aulas de Educação Física.
O autor supra-aludido estruturou um possível “conteúdo programático” (categorias) para
se organizar, desenvolver e sistematizar os conteúdos de jogo/brincadeira. Paradoxalmente,

406 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


não assinalou qual é o papel do professor nessa proposta e como realizar um trabalho
pedagógico no âmbito de cada conteúdo de jogo/brincadeira (“grande categoria de jogo”).
Resumidamente, o mote deste estudo não oferece uma organização didático-metodológica
para o jogo/brincadeira, no que compete aos objetivos de cada conteúdo, procedimentos
metodológicos e formas avaliação a serem adotados nas aulas.
Depreendemos que esse estudo subsidia uma reflexão teórico-prática respeitante ao
jogo e ao ato de jogar. Todavia, deixa como lacuna justamente uma didática pela qual explicite
caminhos para que esse trabalho pedagógico ideado, em tese, concretize-se no bojo da sala
de aula. Ora, no decorrer do citado estudo, o autor defende que é indispensável uma prática
pedagógica planejada e organizada, porém, ele não explana o arcabouço dessa prática.

DÉCADAS DE 2000 E 2010...

No início da década de 2000, emerge a pesquisa de João Batista Freire, intitulada de


“Investigações Preliminares sobre o Jogo”, tendo certo êxito em meios acadêmicos e escola-
res. Trata-se de uma tese de livre-docência defendida em 2001 (não depositada na biblioteca
da Faculdade de Educação Física) e publicada a posteriori como livro, sob o título de “O
Jogo: entre o riso e o choro” (2002). Foi uma pesquisa no contexto das Teorias do Jogo, a
qual abarcou as áreas da Antropologia, Filosofia, Sociologia, Biologia, Pedagogia, Psicologia
e Física, com a finalidade de analisar o jogo conforme esses múltiplos vieses teóricos.
Conquanto o escopo de Freire (2002) não seja prioritariamente debater uma didática
para o jogo/brincadeira na esfera da Educação Física escolar, seu estudo colabora consi-
deravelmente para essa área, porque deixa em aberto, na última seção (Jogo e Educação),
uma fazível proposta pedagógica, ao considerá-lo: tematizador de aprendizagens; jogo como
um fim em si mesmo (área de conhecimento); formador da ‘inteligência criativa’; e, formador
da personalidade. Compreendemos que, ao passo que essas quatro concepções e usos do
jogo/brincadeira na Educação Física possam servir de direcionamento, estas são, ao mesmo
tempo, uma brecha enorme deixada pela referida pesquisa. Com isso, observamos que, para
se concretizarem as quatro concepções e usos do jogo/brincadeira citados, precisa-se cons-
truir uma abordagem didático-metodológica, tendo em vista nortear um trabalho pedagógico.
Seu estudo é mais provocativo do que propositivo e de intervenção pedagógica, servindo
tão-só como objeto de reflexão acerca de certas correntes teóricas de jogo/brincadeira.
A pesquisa de Hergos Couto (2008), intitulada de “A criança e as manifestações lúdicas
de rua e suas relações com a Educação Física escolar”, teve como objetivo analisar quais
jogos são praticados na rua e, igualmente, vivenciados e sistematizados pedagogicamente
como conteúdo nas aulas de Educação Física.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 407


Em seu estudo, Couto (2008) analisou que o jogo/brincadeira é essencialmente dirigido
pelo professor, especificamente, atinente às regras, tempo, escolha dos jogadores, sepa-
ração de meninos e meninas, e, por fim, a diretividade quanto às ações a serem tomadas,
sem espaço para a fala dos alunos.
Ainda que esse estudo tenha atingido esse resultado, observamos que o autor supra-
mencionado defende o resgate da cultura lúdica das crianças na escola (jogos/brincadeiras
de rua etc.), como um modo de enriquecer a prática pedagógica com o jogo/brincadeira, na
qualidade de manifestação lúdica e componente básico da Educação Física. A lacuna dei-
xada por esse estudo refere-se às seguintes questões em aberto: “como se trabalhar com
o resgate da cultura lúdica dos alunos?”, “qual é o papel do professor nesse processo?”, e,
enfim, “como trabalhar pedagogicamente com esse resgate, sem se voltar tão-apenas para
uma perspectiva do ‘jogo pelo jogo’?”.
Por seu turno, a pesquisa de Kleber Carneiro (2009), intitulada de “O Jogo na Educação
Física escolar: uma análise sobre as concepções atuais dos professores”, analisou as con-
cepções dos professores acerca do papel da Educação Física e sobre o entendimento desses
professores no tocante ao potencial pedagógico existente no Jogo.
Analisamos que a contribuição desse estudo diz respeito ao processo de desvela-
mento das concepções dos professores em relação ao jogo/brincadeira, por intermédio de
narrativas, demonstrando que no contexto da Educação Física escolar ele não é planejado,
quer dizer, é usado para improvisos e sem qualquer espécie de objetivo pedagógico. O au-
tor aludido também averiguou, em seu estudo, que o jogo/brincadeira é um conteúdo da
Educação Física, desse modo, deve-se possuir um planejamento, pois, caso contrário, a
ação pedagógica fica prejudicada. Em síntese, Carneiro (2009) constatou que a prática dos
professores não é norteada por estratégias de ensino, instrumentos avaliativos e se embasa
em objetivos desvinculados e inextrincáveis.
Em contrapartida, essa pesquisa deixa em aberto algumas questões relativas ao jogo
e suas vertentes pedagógicas. À guisa de exemplo, nas considerações finais de sua pes-
quisa, Carneiro (2009) defendeu que o ‘jogo-trabalho’ é, talvez, o único caminho possível
para se construir um planejamento pedagógico para o jogo-brincadeira, uma vez que não
é nem ‘jogo livre’ (atividade voltada ao prazer, segundo o autor), nem ‘jogo funcional’ (ou
jogo utilitário). Enfim, defende que a ideia de ‘jogo-trabalho’, fundamentada nos preceitos
de C. Freinet (1998), é de exploração de situações-problema pelo professor para mobilizar
o jogo/brincadeira.
Analisamos que o papel do professor vai além de apresentar situações-problemas para
mobilizar os alunos quanto ao jogo/brincadeira. Há toda a elaboração de um planejamento

408 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


com objetivos que se quer atingir com ele e, subsequentemente, seus conteúdos, meto-
dologias, conjunto de recursos didáticos, conhecimentos dos alunos, formas de avaliação.
Além disso, esse ideário alvitrado por Carneiro (2009) é propositivo, não sendo aplicado
na presente pesquisa, isto é, faz-se presente nas considerações finais do trabalho e não há
dados de que essa proposição “metodológica” de “jogo-trabalho” tenha sido empregada em
algum momento. O que nos chama à atenção, é que o autor se volta para o “jogo-trabalho”
de Freinet (1998), sem refletir que o cerne da ideia desse autor francês é analisar mais a
questão do “trabalho-lúdico” (tornar as atividades escolares mais divertidas/prazerosas e
significativas) e do “lúdico-trabalho” (explorar o jogo e outras manifestações lúdicas com
fins educacionais), do que planejar o jogo/brincadeira como um conteúdo e/ou manifestação
histórico-cultural a ser explorado pedagogicamente pelo professor no contexto escolar.
Tanto Carneiro (2009), como o próprio Freinet (1998), não consideram o jogo mediante
uma abordagem didático-metodológica que utilize as categorias de jogo/brincadeira como
possíveis conteúdos, que estruture uma metodologia, formas de avaliação e ações peda-
gógicas, em termos de problematização a propósito de quais conhecimentos sobre o jogo/
brincadeira podem ser explorados e produzidos pelas crianças e jovens-estudantes. Ambas
as propostas destes autores são perfunctórias, quando se trata de uma proposta pedagógica
para o jogo/brincadeira na escola, já que não apresentam uma didática que valorize a socia-
lização de ideias como sistematização e problematização dos conhecimentos produzidos e,
por conseguinte, que favoreça às crianças e jovens-estudantes um espaço de legitimação
de suas vozes, autonomia e livre expressão.
A pesquisa de Veridiana Bernadi (2017), sob o título de “Jogos tradicionais nas aulas
de Educação Física Infantil: possibilidades pedagógicas”, intentou tematizar a Educação
Física na Educação Infantil a partir do jogo/brincadeira, tendo como objetivo analisar as
possibilidades pedagógicas para desenvolver o conteúdo/tema Jogos Tradicionais nas aulas
de Educação Física na Educação Infantil.
Concebemos que a contribuição dessa pesquisa é defender o jogo/brincadeira e o
lúdico como eixos norteadores da Educação Física na Educação Infantil. Dessa maneira, a
categoria dos Jogos Tradicionais é vista como conteúdo. Para explorá-lo, pedagogicamente,
a autora organizou as seguintes ações: reconhecimento dos brinquedos e jogos tradicionais
(análise das crianças sobre obras de arte – quadros), experimentação livre (ter contato com
os brinquedos sem mediação), experimentação mediada (a professora ensina a jogar com
os brinquedos) e avaliação (roda de conversa com as crianças – sensações sentidas indi-
vidualmente e coletivamente).
Cabe assinalar que Bernardi (2017) defende essa proposta mais como um projeto
de intervenção, do que especificamente uma propositura metodológica para subsidiar um

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 409


trabalho pedagógico com o jogo/brincadeira em aulas de Educação Física, em quaisquer
níveis de ensino escolar. Percebemos que essa justificativa da autora é, precipuamente,
a lacuna deixada por seu estudo. Por fim, ficou explícito que toda essa organização meto-
dológica se voltou ao processo de “jogo pelo jogo” (familiarização com as regras, espaço
e materiais; jogar para garantir as regras), não havendo indícios de problematizações e/ou
espaços para as crianças construírem novos jogos/brincadeiras ou brinquedos mediante
conhecimentos socializados pela pesquisadora.

ÚLTIMAS JOGADAS...

Avaliamos, num sentido geral, que todas as pesquisas analisadas no presente texto têm
as suas contribuições significativas para a área da Educação Física escolar, proporcionan-
do distintas reflexões sobre o jogo/brincadeira na Educação Física, levando em conta suas
vertentes pedagógicas, seus objetivos, conteúdos e o papel do professor. Por outro lado,
as pesquisas analisadas não apresentam uma proposta pedagógica que use a socialização
de ideias como sistematização e problematização dos conhecimentos produzidos de jogo
e, além disso, que oportunize às crianças e jovens-estudantes um espaço de legitimação
de suas vozes, autonomia e livre expressão. Ora, subentendemos que o “hiato” deixado
por estes estudos, afora o já descrito no desenrolar do texto, diz respeito à ausência de
um conjunto de ações, as quais correspondam à uma metodologia de ensino e formas de
avaliação para o jogo/brincadeira, na qualidade de área de conhecimento explorada pela
Educação Física escolar.
Por outra perspectiva, as pesquisas analisadas deixam várias lacunas para se pesqui-
sarem essas possibilidades didático-metodológicas para o referido tema, tais como o papel
do professor na organização da situação social de ensino (ambiente de aprendizagem), as
formas de mediação semiótica que emergem do jogo/brincadeira, quais objetivos, conteúdos
e conhecimentos de que trata o jogo/brincadeira na Educação Física escolar. As formas de
avaliação e valorização da cultura lúdica das crianças e jovens-estudantes, bem como, de
seu contexto histórico-cultural.
Considerando tudo o que foi debatido no presente capítulo, especificamente, a breve
apresentação a propósito de os documentos curriculares e pesquisas relativas ao jogo/brin-
cadeira na Educação Física escolar, refletimos que estes materiais debatem superficialmente
a respeito de o jogo/brincadeira como uma potencial área de conhecimento que é tematizada
pela Educação Física (ora é tido como “atividade lúdica livre”, ora é ideado como “prática
corporal”, ora é visto como “método de ensino para outros conteúdos”). Além disso, estes
materiais, ao que tudo indica, não consideram o jogo/brincadeira como uma importante
manifestação histórico-cultural, cujo valor educativo, para crianças e jovens-estudantes,

410 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


remete-se à valorização da expressividade (lúdico), da leitura de mundo, da afetividade e
da autonomia; ao reconhecimento da cultura lúdica e da historicidade dos jogos/brincadeiras
e brinquedos no contexto de diferentes culturas; ao desenvolvimento das relações entre as
funções psíquicas e motoras (unidade intelectual-afetiva); à produção de conhecimentos e
possibilidades de emancipação.
Como foi reportado, mesmo que estes materiais (documentos e pesquisas) tenham
algumas contribuições, em contrapartida, não delineiam uma didática para o jogo/brincadeira,
de tal modo que transponha a simples “prática pela prática” (do jogo pelo jogo ou do jogo
livre) ou a “prática utilitária” (jogo voltado para outros conteúdos e finalidades que não ele
próprio). Em outras palavras, não aludem sistematicamente uma didática que fundamente
a práxis do professor com o jogo/brincadeira, tendo em consideração a mediação semió-
tica, as metodologias de ensino, as problematizações e variações de jogo, o processo de
planejamento, a estruturação da aula (tema, objetivos, recursos didáticos) e os procedimen-
tos de avaliação.
Portanto, os materiais referenciados não proporcionam uma reflexão e/ou comprovação
de que o jogo/brincadeira no contexto escolar, conforme seus preceitos didáticos, propicia
a produção de conhecimentos, a valorização da cultura lúdica e/ou o desenvolvimento dos
alunos (crianças e jovens-estudantes). Consequentemente, tais materiais evidenciam que
o jogo/brincadeira é educativo por si só, sem analisar criticamente que, para se ter esta
conotação, é basilar que se tenha uma “intencionalidade pedagógica”. Essa intencionali-
dade, por seu turno, parte da junção entre a relação didática e a reflexão do professor com
o jogo/brincadeira, ou seja, considerando seus conhecimentos, sua organização/planeja-
mento, o contexto de aula (meio), a relação afetiva com os alunos e, de resto, entendendo
que estes alunos são sujeitos históricos, culturais e ativos, portanto, possuidores de uma
leitura de mundo.
Dito isso, defendemos que é fulcral analisar que o jogo/brincadeira precisa ser inten-
cionalmente planejado e organizado para ser utilizado em um contexto educativo. Dessa
maneira, a exploração das possibilidades e potencialidades pedagógicas dos jogos/brinca-
deiras está nas ações intencionais do professor (intervenções, variações de jogo e proble-
matizações) e não somente nas próprias situações de jogo (isso, por exemplo, justificaria
uma “prática pela prática” com o jogo/brincadeira).
Por esta ótica, concebemos que um dos grandes problemas, no que se refere ao jogo/
brincadeira na Educação Física, trata-se dos discursos e práticas que não observam o papel
do professor na organização das situações sociais de ensino. Em outros termos, os próprios
documentos e as pesquisas analisadas não problematizam a atuação do professor com o

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 411


jogo/brincadeira em sala de aula, isto é, colocam o jogo/brincadeira como protagonista e
secundarizam a ação pedagógica do professor6.
Os estudos de Tavares (1994), Passos (1995), Retondar (1995) e Celante (2000),
apesar de não terem se debruçado acerca de tal problemática, criticaram a prática com o
jogo/brincadeira no contexto da Educação Física, denunciando uma falta de organização
da ação educativa em relação ao mesmo. A posteriori, os trabalhos de Grillo (2012), Grillo
(2018), Grillo et al. (2020a), Grillo et al. (2020b), assinalaram que documentos curriculares
da Educação Física escolar e algumas pesquisas com esta temática (como as citadas nesse
capítulo), além de não problematizarem a prática pedagógica com o jogo/brincadeira (ou não
organizarem a ação educativa com ele), deixam hiatos quanto à falta de planejamento de
ensino e à ausência de uma boa estrutura curricular que possibilite a criação de uma didática
para o jogo/brincadeira, concatenada à exiguidade de indicações respeitantes a cursos de
formação continuada mais específicos e menos polarizados aos esportes.
Finalmente, vale frisar que os documentos curriculares e algumas pesquisas anali-
sadas, laconicamente, banalizam o lúdico, engendram objetivos muitas vezes desconexos
da própria proposta curricular erigida e tão-unicamente idealizam o jogo/brincadeira como
método (sentido utilitarista), não considerando a cultura lúdica dos alunos, a historicidade
do jogo/brincadeira e brinquedo, as relações entre professor-alunos, o meio sociocultural e
o nível de conhecimento dos alunos.

REFERÊNCIAS
1. BERNARDI, Veridiana Desordi. Jogos tradicionais nas aulas de educação física infantil: possi-
bilidades pedagógicas. 2017. 60f. Dissertação (Mestrado em Educação Física). Universidade
Federal de Santa Maria, Santa Maria, RS: 2017.

2. BRASIL. Parâmetros curriculares nacionais: Educação Física. Ensino de primeira à quarta


série. MEC, Secretaria de Educação Fundamental. Brasília, 1997.

3. BRASIL. Base Nacional Comum Curricular: Educação é a Base. MEC, Secretaria de Edu-
cação Fundamental. Brasília, 2018.

4. BRUHNS, Heloísa Turini. A dinâmica lúdica. Dissertação (Mestrado em Educação). Univer-


sidade Estadual de Campinas. Campinas, SP: 1989.

5. CARNEIRO, Kleber Tüxen. O jogo na educação física escolar: uma análise sobre as concep-
ções atuais dos professores. Dissertação (Mestrado em Educação Escolar). Universidade
Estadual Paulista, Araraquara, SP, 2009.

6 Em termos gerais, parte dessa problemática se deve ao fato de o jogo/brincadeira ainda ser ideado como uma manifestação cultural
puramente infantil (infantilização do jogo), tanto que o jogo/brincadeira não está presente na maior parte dos documentos de Educa-
ção Física do Ensino Médio (quando se faz presente, é tido como utilitário). Para mais detalhes, ver: Grillo (2018).

412 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


6. COUTO, Hergos. R. F. A criança e as manifestações lúdicas de rua e suas relações com a
Educação Física escolar. Dissertação (Mestrado em Educação Física). Faculdade de Ciên-
cias da Saúde, Universidade Metodista de Piracicaba. Piracicaba-SP: UNIMEP, 2008.

7. FREINET, Célestin. A educação do trabalho. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

8. FREIRE, João Batista. O jogo: entre o riso e o choro. Campinas, SP: Autores Associados, 2002.

9. GRILLO, Rogério de Melo; PRODÓCIMO, Elaine; GOIS JR., Edivaldo. O Jogo e a “Escola
Nova” no contexto da sala de aula: Maceió, 1927-1931. Educação em Revista, v. 32, n. 4,
p. 345-364, 2016.

10. GRILLO, Rogério de Melo. O Xadrez Pedagógico na Perspectiva da Resolução de Problemas


em Matemática no Ensino Fundamental. Dissertação (Mestrado em Educação). Programa
de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação. Itatiba, SP: Universidade São Francisco, 2012.

11. _____________. Mediação semiótica e jogo na perspectiva histórico-cultural em educação


física escolar. Tese (Doutorado em Educação Física) - Universidade Estadual de Campinas,
Faculdade de Educação Física, Campinas, SP, 2018.

12. GRILLO, Rogério de Melo; NAVARRO, Eloisa Rosotti; SANTOS RODRIGUES, Gilson; PRO-
DÓCIMO, Elaine. Repensando o jogo no bojo da teoria histórico-cultural. In: ALMEIDA, Mar-
cos Teodorico Pinheiro et al. Cultura lúdica híbrida: práticas inovadoras. Fortaleza: Instituto
Nexos, 2020a. p. 223-238.

13. GRILLO, Rogério de Melo; NAVARRO, Eloisa Rosotti; GRANDO, Regina Célia; ANDRADE,
Susimeire Vivien Rosotti. Jogo, Lúdico e Resolução de Problemas: conhecimento matemático
em aulas de Educação Física. In: ALMEIDA, Flávio José Wirtzbiki de; ALMEIDA, Marcos Teo-
dorico Pinheiro de. A Educação Física e a Transdisciplinaridade: razões práticas. Fortaleza:
Instituto Nexos, 2020b. p. 441-477.

14. PASSOS, Kátia Cristina Montenegro. O lúdico essencial e o lúdico instrumental: o jogo nas
aulas de educação física escolar. 147f. Dissertação (Mestrado em Educação Física). Uni-
versidade Gama Filho, Rio de Janeiro, 1995.

15. RETONDAR, Jefferson José Moebus. 204f. Alguns sentidos do ato de jogar. Dissertação
(Mestrado em Educação Física). Universidade Gama Filho. Rio de Janeiro, 1995.

16. SECRETARIA DE ESTADO DE EDUCAÇÃO DE MINAS GERAIS. Conteúdo Básico Comum


(CBC) – Educação Física. Educação Básica – Ensino Fundamental e Médio. Belo Horizonte:
SEE/MG, 2007.

17. SECRETARIA DE ESTADO DE EDUCAÇÃO DE PERNAMBUCO. Orientações teórico meto-


dológicas: Educação Física – Ensino Fundamental e Médio. Recife: SEE/PE, 2010.

18. SECRETARIA DE ESTADO DE EDUCAÇÃO DO RIO GRANDE DO SUL. Referenciais Cur-


riculares do Estado do Rio Grande do Sul: Linguagens, Códigos e suas Tecnologias (Lições
do Rio Grande), v. 2. Porto Alegre: SE/DP, 2009.

19. SECRETARIA DA EDUCAÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO. Proposta Curricular do Estado


de São Paulo: Educação Física (Ensino Fundamental e Médio). São Paulo: SEE/SP, 2008.

20. SECRETARIA DE EDUCAÇÃO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. Orientações Curriculares


para o ensino de Educação Física do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: SEE/RJ, 2016.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 413


21. SECRETARIA DE EDUCAÇÃO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO. Currículo Base da Rede
Estadual de Espírito Santo. Vitória: SEDU/ES, 2017.

22. TAVARES, Marcelo Soares. O ensino do jogo na escola: uma abordagem metodológica para
a prática pedagógica dos professores de educação física. 152f. Dissertação (Mestrado em
Educação). Universidade Estadual de Pernambuco. Recife, PE: 1994.

414 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


32
“ Tendinose patelar em atletas
do vôlei: conceitos e atuação
fisioterapêutica

Daiane dos Santos

Helena Queiroz Morais

Thainá Busato Klosienski

Natália Boneti Moreira

10.37885/201001886
RESUMO

Objetivo: Revisar na literatura as informações sobre a tendinose patelar em atletas do


voleibol e a atuação fisioterapêutica no tratamento dessa lesão. Métodos: Este artigo
consiste em uma revisão de literatura, realizada a partir de quatro bancos de dados ele-
trônicos: Google Acadêmico, Scielo, PubMed e Biblioteca Virtual em Saúde. As Palavras-
chave utilizadas na busca dos manuscritos foram tendinose, tendinopatia, voleibol, lesões
esportivas. Os artigos originais relacionados a temática foram pesquisados nas línguas
portuguesa e inglesa, compreendidos entre o período de 2004 a 2014. Resultados: A bus-
ca teve como resultado dezesseis artigos que preencheram os critérios necessários
para a inclusão nesta revisão. Conclusão: O tratamento fisioterapêutico promove bons
resultados na reabilitação da tendinose patelar, muitas vezes em tempos menores do
que o previsto quando houver colaboração dos atletas e da equipe envolvida.

Palavras-Chaves: Tendinopatia, Voleibol, Lesões Esportivas.


INTRODUÇÃO

Este artigo consiste em uma revisão de literatura, com o objetivo de apresentar uma
lesão que acomete muitos atletas de voleibol, a tendinose patelar. Tendinose patelar é uma
lesão que acomete atletas que realizam muitos saltos ou grandes forças de impactos repe-
tidamente, também conhecida como “joelho do saltador” ou “jumper’s knee” é caracterizada
pela tendinite patelar ou do tendão do quadríceps. O tratamento para tendinose patelar pode
ser feito de duas formas: conservador que incluem estratégias de repouso e redução de
carga, crioterapia, massagem transversa profunda, exercícios de fortalecimento excêntrico,
imobilizações funcionais e a eletroterapia, ou cirúrgico.

OBJETIVO

Revisar na literatura as informações sobre a tendinose patelar em atletas do voleibol


e a atuação fisioterapêutica no tratamento dessa lesão.

MÉTODOS

Este artigo consiste em uma revisão de literatura, realizada a partir de quatro bancos
de dados eletrônicos Lilacs, Scielo, Pedro e Pubmed. As palavras-chave utilizadas na bus-
ca dos manuscritos foram tendinose, tendinopatia, voleibol, lesões esportivas. Os artigos
originais relacionados a temática foram pesquisados nas línguas portuguesa e inglesa,
compreendidos entre o período de 2004 a 2014.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Lesões esportivas

As lesões esportivas são consequências de atividades esportivas, sendo consideradas


prejudiciais, pois causam dor, limitam o funcionamento correto, podendo levar a maiores
disfunções, também podem interromper ou limitar a prática esportiva por um determinado
tempo ou permanentemente. Levando em consideração o fator psicológico do atleta, pois
sua rotina e alterada o que afeta seu bem-estar.
Vários fatores de riscos resultam as lesões esportivas, estes fatores são divididos em
intrínsecos: idade, sexo, condição física, alimentação, desenvolvimento motor, e fatores
psicológicos; e extrínsecos: modalidades, cargas, treinos, competições, equipamentos.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 417


Vôlei

O voleibol foi criado nos Estados Unidos em 1895, pelo americano Wilian G. Morgan, dire-
tor de Educação Física da Associação Cristã de Moços na cidade Holyoke, em Massachusetts.
É um esporte praticado em uma quadra retangular, medindo 18x9 metros, dividida por
uma rede. Sua equipe é composta em média por doze jogadores, um técnico, um assis-
tente técnico, um preparador físico e um médico. É um esporte onde não há quase contato
físico entre os jogadores, porém considerado de alto impacto, o que aumenta o risco de
lesão. É de grande importância a compreensão da biomecânica dos movimentos deste es-
porte para que se possam avaliar todas as tensões que essa atividade esportiva impõe a
musculatura, ligamentos e articulações envolvidos no movimento. Esta é uma modalidade
que como todas as outras, requer muito esforço físico, resultando em impactos excessivos
em determinadas partes do corpo, devido há inúmeros saltos realizados pelos atletas durante
as partidas ou treinamentos ocasionando lesões. Na atualidade, as lesões têm sido constan-
tes entre os jogadores principalmente os da linha de ataque devido aos fatores extrínsecos
(saltos, quedas). A exigência que há sobre o atleta hoje é muito maior, principalmente em
relação à estatura e preparo físico. Possivelmente as lesões destes atletas são decorrentes
dessa exigência.
Em sua grande maioria, essas lesões ocorrem por overuse (sobreuso) e overload
(sobrecarga), isso mostra que os atletas estão ultrapassando os seus limites, ocasionando
microtraumas nos músculos e tendões, que levam a tendinites, rupturas ou fraturas por stress.
Vieira et al (2007) e Carvalho et al (2007) citados por Antônio e Santos (2012), apontam
em suas pesquisas que as lesões que mais acometem esses jogadores são as de joelho,
tornozelo, ombros e distensões musculares. Podendo ter origem intrínseca ou extrínseca,
a identificação da causa é necessária para minimiza-las ou eliminá-las.
Durante as partidas os membros mais afetados eram os MMII, ele relata que isso ocorre
porque os saltos causam um grande estresse nos membros inferiores na fase de impulsão
onde gera mais esforço da musculatura do atleta e é neste momento que acontecem os
maiores números de lesões no joelho, frequentemente ocorrem lesões na etapa de queda
do salto, que ocasionam torção de joelho, originada do impacto. (Ribeiro, 2007)
Arena (2005) mencionado por Gomes et al (2014), observou que a lesão mais comum
no voleibol foi a tendinite a qual acomete a região do joelho. Isso se dá devido à demanda
solicitada sobre o mecanismo extensor da articulação, que pode ocasionar desequilíbrios
entre os músculos extensores e flexores, causando sobrecarga das estruturas muscoloten-
díneas em torno da articulação.

418 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Estrutura do tendão

O tendão patelar é formado de tecido conectivo, composto por células e pela matriz
extracelular. A matriz extracelular é composta por densas camadas de fibras de colágeno e
pela substância fundamental. Originando-se ao nível do polo inferior da patela e insere-se
na metade superior da tuberosidade anterior da tíbia.
A vascularização do tendão se dá por três formas: as que dão entrada nos locais de
inserção do tendão, as que entram na interface músculo-tendinosa e as de substância in-
termédia adjacentes aos tecidos moles.

Tendinose em atletas de voleibol

Segundo Cook et al. (2000), tendinose é um termo que caracteriza a degeneração do


tendão sem sinais clínicos ou histológicos de inflamação.
Tendinose patelar é uma lesão que acomete atletas que realizam muitos saltos ou gran-
des forças de impactos repetidamente, também conhecida como “joelho do saltador” ou “jum-
per’s knee” é caracterizada pela tendinite patelar ou do tendão do quadríceps. Etiologicamente
é multifatorial e envolve causas extrínsecas (clima, repetitividade, sobrecarga) e intrínsecas
(idade, sexo, alimentação, frouxidão de tendão, alinhamento patelar, falta de flexibilida-
de). O excesso de carga muitas vezes pode levar a pequenas lesões no tendão. O atleta
tem como um dos primeiros sintomas a dor na região anterior do joelho. A alta incidência da
tendinose do tendão patelar em atletas de voleibol vem de longa data. Uma das hipóteses
para a gênese da lesão é o atrito repetitivo entre o ápice da patela e a face posterior do
tendão patelar relacionado a movimentos com desaceleração e frenagem.
Esta lesão é de início lento e gradual, piorando após a realização do exercício físico que
solicite muitos movimentos repetitivos do joelho, com a evolução da doença esses sintomas
aparecem também na prática da atividade.
A identificação clínica mais coerente é a dor quando se realiza a palpação do polo
inferior da patela. Porém, a posição do joelho influência no resultado do teste se estiver
flexionado a 90º aumenta a tensão e os sintomas diminuem. Sendo assim, a tendinose é
subdividida em três graus pela classificação de Blazina:
Grau I: dor leve após atividade física
Grau II: dor já no início da atividade física
Grau III: dor durante e após a atividade física.
Os exames utilizados para mostrar se há alterações consistentes no tendão, são: ul-
trassonografia (US) e ressonância magnética (RM).

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 419


Tratamento

Há uma unanimidade, onde o tratamento de tendinose patelar pode ser feito de duas
formas: conservador ou cirúrgico.
Segundo Cook & Khan (2000), citados por Jardim (2005, p. 41), não se trata mais
tendinose patelar baseando-se em uma doença inflamatória, mas sim como uma lesão
degenerativa. Independentemente do estágio da lesão o primeiro passo será um procedi-
mento conservador.
A partir de então, várias combinações de intervenções foram propostas, como: estraté-
gias de repouso, redução de carga, crioterapia, massagem ou fricção profunda, fortalecimento
excêntrico, imobilização funcional e eletroterapia.

• Repouso e redução de carga

Devido à dor há uma redução da função músculo-tendínea, sendo de grande importân-


cia a redução da carga sobre o tendão patelar. No entanto será necessário realizar algumas
adaptações nas atividades esportivas, diminuindo a intensidade ou realizar repouso total da
atividade. Esta fase de repouso e controle de carga contribuirá para a produção de colágeno
e para o realinhamento das fibras.

• Crioterapia

A indicação de gelo para lesões no tendão patelar deve-se ao seu efeito analgésico, a
redução na produção metabólica e o retardo do processo inflamatório. Contudo, ainda não
existe um consenso sobre a aplicação da crioterapia. O gelo não deve ser utilizado antes
das práticas esportivas, pois pode camuflar a dor da tendinopatia.

• Massagem Transversal Profunda

A Massagem Transversal Profunda deve ser acompanhada pelo estiramento, para uma
melhora na extensibilidade dos tecidos e na redução das aderências na unidade músculo-
-tendinosa. A mobilização dos tecidos moles é uma técnica de mobilização não invasiva, e
tem sido utilizada com êxito no tratamento das tendinopatias. Alguns autores defendem que
este tipo de procedimento, tanto pode ser prejudicial como benéfico, traduzindo-se por parte
dos clínicos, numa incerteza quanto ao tempo do seu uso no período de tratamento. Sabe-
se que a tendinopatia patelar, pode se beneficiar com os estímulos mecânicos provocados
pelas fricções profundas.
Cyriax (1980), explica que:

420 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


A Massagem Transversal Profunda (MTP) pode ser um procedimento tera-
pêutico muito importante devido aos seus efeitos mecânicos (mobilização) e
químicos (hiperemia, anestesia, estimulação mecanoreceptora e redução da
substância P).
Exercícios excêntricos

A utilização de exercícios excêntricos no tratamento de tendinose patelar favorece


o fortalecimento do tendão por meio da estimulação dos mecanoreceptores acelerando o
metabolismo e produzindo mais colágeno, o que ajuda na recuperação da lesão. Pesquisa
realizada por Purdam et al (2004) obteve bons resultados, apresentando uma redução sig-
nificativa da dor apenas com a utilização dos exercícios excêntricos.

• Imobilização funcional

As imobilizações funcionais são frequentemente utilizadas nas disfunções da articu-


lação do joelho, fornecendo apoio para promover cicatrização e remodelação funcional;
possibilitar que o atleta retorne mais precocemente às atividades; alinhamento biomecânico;
manter o trofismo.

• Eletroterapia

A eletroterapia é modalidade de tratamento comumente utilizada no caso de tendino-


patias, influenciando no aumento da síntese de colágeno. Uma enorme gama de recursos
dentro da eletroterapia pode ser utilizada, entre eles, o ultrassom, laser, estimulação elé-
trica entre outros.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante dos fatos apresentados, pode-se observar que a tendinose patelar é uma lesão
que ocorre com bastante frequência em atletas de alto rendimento devido a intensidade de
treinamento e sobrecarga na articulação do joelho, pois atualmente há uma solicitação muito
alta sobre os atletas em relação a condicionamento físico o que leva muitos a ultrapassarem
seus limites, muitas vezes resultando em lesões.
O tratamento para tendinose patelar é feito de duas formas: conservadora ou cirúr-
gica. A atuação fisioterapêutica contribui muito para a recuperação desta lesão com uma
variedade de modalidades de tratamento.
A Fisioterapia em relação ao tratamento conservador é muito importante para estes
atletas, pois necessitam de um retorno breve aos treinos e jogos. Com isso o trabalho intenso
junto a Fisioterapia traz bons resultados na reabilitação, muitas vezes em tempos menores
do que o previsto se houver colaboração dos atletas e da equipe envolvida.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 421


REFERÊNCIAS
1. ANTÔNIO, V. S.; SANTOS, M.G.N. Prevalência de lesões em atletas de voleibol feminino e
possíveis relações com treinamento inadequado e estresse. Revista Hórus, Ourinhos, v. 6,
n. 1, p. 56-68, jan./mar. 2012.

2. CANAVAN, P. K. Reabilitação em medicina esportiva: um guia abrangente. São Paulo:


Manole, 1ª ed. 2001, p. 322.

3. CYRIAX, J. Manipulation trials. Britishi Journal of Sports Medicine, p.111, jan. 1980.

4. COHEN, M. et al. Tendinopatia patelar. Revista Brasileira de Ortopedia, São Paulo, v. 43,
n. 8, p. 309-318, ago. 2008.

5. CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE VOLEIBOL- CBV. Regras Oficiais do Voleibol 2013-


2016. Disponível em: < http://www.cbv.com.br/v1/cobrav/arquivos/REGRAS%

6. 20DE%20V%C3%94LEI%20INDOOR%202013-2016%20-%20REVISADA.pdf>. Acesso em:


28 set. 2014.

7. COOK, J. et al. Overuse Tendinosis, Not Tendinitis – Part 2: Applying the New Approach to
Pattelar Tendinopathy. The Physician and Sportsmedicine, v. 28, n. 6, 2000.

8. COOK, J. L.; KHAN, K. M. What is the most appropriate treatment for patellar tendinopathy?
Britishi Journal of Sports Medicine, v. 35, p. 290-293. 2001.

9. FARINA, K. G.; NAVARRO, A. C. Análise de atletas de voleibol lesionados referente à posição


exercida em quadra. Revista Brasileira de Prescrição e Fisiologia do Exercício, São Paulo,
v. 2, n. 7, p. 27-35, jan./fev. 2008.

10. GARMS, E. et al. Avaliação da altura patelar em atletas com tendinopatia crônica do aparelho
extensor do joelho. Acta Ortopédica Brasileira, São Paulo, v. 19, n. 1, p. 17-21, 2011.

11. GHIROTOCC, F. M. S.; GONÇALVES, A. Lesões desportivas no voleibol. Revista da Educa-


ção Física, Maringá, v. 8, n. 1, p. 45-49, 1997.

12. GOMES, I. G. A. et al. Análise epidemiológica de lesões durante o 6º campeonato mundial


universitário voleibol de praia. Ciências Biológicas e da Saúde, Maceió, v. 2, n. 1, p. 151-
163, maio. 2014.

13. JARDIM, M. Tendinopatia patelar: revisão de literatura. EssFisiOnline, Setúbal, v. 1, n. 4, p.


31-47, set. 2005.

14. JUNIOR, N. K. M. Principais lesões no atleta de voleibol. Efdeportes.com/ Revista Digital,


Buenos Aires, n. 68, p. 1-7, jan. 2004.

15. LEME, G. P. C.; FUJITA, A. P. Efetividade do treinamento muscular excêntrico no tratamento


da tendinopatia patelar. Ensaio e Ciência: Ciências Biológicas, Agrárias e da Saúde, São
Paulo, v. 13 n. 2, p. 111-124, out. 2009.

16. RIBEIRO, F. Incidência de lesões no voleibol. Acompanhamento de uma época desportiva.


Arquivos de Fisioterapia, v. 1, n. 3, p. 29-34, 2007.

422 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


17. SANTOS, S. G.; PIUCCO, T.; REIS, C. Fatores que interferem nas lesões de atletas amadores
de voleibol. Revista Brasileira de Cineantropometria & Desempenho Humano, v. 9 n. 2,
p. 189-195, 2007.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 423


33
“ Tomada de decisão no futebol
sete: uma análise sobre o último
passe e a finalização

Guilherme Marinho Alves Duarte


ULBRA

Artigo original publicado em: 2019


Revista Brasileira de Futsal e Futebol - ISSN 1984-4956 .
Oferecimento de obra científica e/ou literária com autorização do(s) autor(es) conforme Art. 5, inc. I da Lei de Direitos Autorais - Lei 9610/98

10.37885/201001829
RESUMO

A tomada de decisão vem sendo um aspecto cada vez mais influente nas diversas
situações proporcionadas pelo futebol. Uma melhor percepção situacional antecede a
qualidade de execução dos fundamentos, ou seja, as decisões tomadas interferem conse-
quentemente no desempenho das equipes. O objetivo deste trabalho é analisar a tomada
de decisão e as ações técnicas dos jogadores de futebol sete durante o último passe
(UP) e finalização (F). Foram observadas as videogravações de oito jogos disputados
por duas equipes de futebol sete (A e B) em uma competição no estado do RS. Os dados
foram coletados através de um scout técnico. Os resultados evidenciaram o UP mais uti-
lizado pela equipe A (CB com 64,15%), e equipe B (CB com 66,10%). A F mais utilizada,
equipe A (CD com 86,42%) e equipe B (CD com 76,29%). As F terminadas em gols da
equipe A 16,05%, equipe B 15,46%, e as ações conjuntas que terminaram em gols da
equipe A (último passe CB e finalização com CD 61,54%) e equipe B (último passe CB e
finalização com CD 46,67%). Observa-se ainda uma carência de informações científicas
sobre o futebol sete, contudo estes parâmetros corroboram com os autores de estudos
sobre o futebol onze, contribuindo assim para a conscientização dos atletas sobre a
qualidade das suas decisões. Conclui-se que as variáveis contribuem para identificação,
exposição, e avaliação das decisões técnicas, servindo também como aplicação para
o planejamento técnico-tático dos treinadores e aprimoramento da tomada de decisão
de seus jogadores.

Palavras-chave: Tomada de Decisão, Futebol Sete, Ações Técnicas, Scout. Aprimoramento.


INTRODUÇÃO

A análise da tomada de decisão dos jogadores torna-se importante para a busca de


soluções e conscientização sobre o desempenho das equipes em competições. O último
passe e a finalização são ações repentinas e de extrema importância para alcançar resul-
tados satisfatórios.
Segundo Garganta (1995), recorrer à inteligência no esporte, é ter capacidade de adap-
tação a novas situações e decisões, ou seja, ter potencial para elaborar e operar respostas
adequadas aos problemas colocados pelas situações aleatórias e diversificadas que ocorrem
no jogo (adaptabilidade). Com o propósito de cumprir os objetivos traçados, foi aplicado um
scout técnico, observando uma sequência de jogos através de videgravações, verificando
as ações técnicas e os resultados das decisões tomadas pelos jogadores de futebol sete.
Conforme a análise, podemos expor estes dados e evidenciar sua importância para o de-
senvolvimento da modalidade.
No aspecto de treinamento da tomada de decisão e conhecimento científico no FS atual,
observa-se uma carência de estudos e conscientização sobre o esporte. Em consequência
disto é notória uma resistência em receber e aplicar novos métodos de ensino-aprendizagem,
partindo do entendimento que no futebol tudo já foi inventado.
Para Cassol e Fernandes (2008) o monitoramento das ações técnicas dos atletas
dentro do jogo é imprescindível, já que permite a automatização de um determinado movi-
mento e o planejamento de tipos de treinamentos específicos para uma situação de jogo.
Esse monitoramento se dá pela realização de um scout, tendo como base os fundamentos
exigidos nestas situações.
Para Tavares (1993), realizar com sucesso uma ação de jogo não é apenas executar
corretamente uma técnica, sendo necessário conhecer sobretudo o objectivo da sua própria
ação e o momento indispensável para a sua realização. Estes parâmetros contribuem dire-
tamente para a conscientização dos atletas sobre a qualidade de suas decisões. O último
passe e a finalização no FS sucedem um trabalho específico, o que interfere na melhor
efetividade dos fundamentos.
Sendo assim, o objetivo deste estudo possibilita a identificação das ações técnicas
executadas pelos jogadores, visando agregar conhecimento, apresentando novos resultados,
e incentivando novas pesquisas sobre a tomada de decisão, contribuindo para que o futebol
sete torne-se um esporte cada vez mais dinâmico e extraordinário.

426 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


MATERIAIS E MÉTODOS

Trata-se de um parecer técnico quantitativo, construído através da observação de oito


vide gravações com duração média de 60 minutos, divididos, por sua vez, em dois tempos
de 25 minutos cada. Foram coletadas as informações sobre a tomada de decisão dos jo-
gadores de duas equipes de futebol sete adultas de rendimento durante o último passe e
finalizações. As equipes são filiadas a Federação de Football Society do RS e a CBSS, e
competiram nos jogos da Copa União do Sete no ano de 2015.
O evento foi realizado na cidade de Porto Alegre-RS, disputado nas dependências
da MAP sports (bairro Vila Nova). Dentre os participantes se fizeram presentes jogadores
e ex-jogadores profissionais de futebol de campo e futsal, com faixa etária entre 18 a 35
anos. O instrumento utilizado foi um scout técnico onde foram registrados a quantidade e
variedade das ações sobre os fundamentos do esporte, conforme a sequência das situações:
primeiro, o tipo de passe; segundo o tipo de finalização; terceiro, o resultado das finalizações;
quarto, as assistências e finalizações terminadas em gols. Com esta análise foi possível
apresentar em tabelas e gráficos as variáveis e seus resultados.
Para a realização deste estudo foram necessários os seguintes instrumentos de traba-
lho: notebook (Samsung, processador Intel Celeron 1,5 GHz, 4GB memória RAM, modelo
NP370E4K); conexão de acesso à ferramenta internet (Wi-Fi velocidade 72,2 Mbps); acesso
à plataforma de vídeos Youtube (https://www.youtube.com/?gl=BR&hl=pt); acesso ao canal
Travinha Esportes; scout técnico exclusivo para coleta de dados (Figura 1).
Estas variáveis foram baseadas nas ações realizadas pelos jogadores durante o últi-
mo passe e finalizações, levando em consideração os fundamentos, as características da
modalidade e as decisões tomadas nestas circunstâncias.

Tipo de Passe (TP)

– Curto por baixo (CB): envolve o último passe desferido de curta a média distância
pelo solo (ou mais próximo a ele).
– Curto pelo Alto (CA): envolve o último passe desferido de curta a média distância
pelo alto (nível da cabeça, inclusive arremessos laterais contabilizados como assis-
tências diretas).
– Longo por baixo (LB): envolve o último passe desferido de longa distância pelo solo
(ou mais próximo a ele).
– Longo pelo alto (LA): envolve o último passe desferido de longa distância pelo alto
(nível da cabeça, inclusive arremessos laterais).
– Passe contrário (PC): envolve o passe desferido pelo adversário de forma “involuntária”

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 427


(variável não considerada para análise do último passe, mas para o contexto do jogo).

Tipo de Finalização (TF)

– Com drible (D): envolve a conclusão a gol antecedida por drible.


– Com chute direto (CD): envolve a conclusão a gol com chute direto (inclusive faltas
e shoot out).
– Com cabeceio (C): envolve a conclusão a gol com cabeceio.

Resultado da Finalização (RF)

– Para fora (PF): envolve a conclusão a gol desferida para fora da goleira.
– Defesa do goleiro (DG): envolve a conclusão a gol desferida e defendida pelo go-
leiro (inclusive conclusões na trave e interceptação de bola pela defesa (dentro da
área)).
– Gol (G): envolve a conclusão revertida em gol.

Figura 1. Scout das ações técnicas dos jogadores durante os jogos.

428 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


RESULTADOS

Os resultados foram analisados e apresentados em tabelas e gráficos de acordo com


o número de jogos (equipes A e B, quatro jogos cada, oito jogos no total), os tempos (pri-
meiro e segundo), e as variáveis das situações propostas em sequência. São elas: os “tipos
de passe” (TP): curto por baixo (CB), curto pelo alto (CA), longo por baixo (LB), longo pelo
alto (LA); os “tipos de finalização” (TF): antecedidas por drible (D), com chute direto (CD),
ou cabeceio (C); “resultados da finalização” (RF) e seu desfecho: para fora (PF), defesa do
goleiro (DG), gol (G); e a “efetividade do último passe e finalizações que resultaram em gol”.
As tabelas referem-se a distribuição sequencial de todas as variáveis coletadas no
scout. Os gráficos são os comparativos percentuais das variáveis. A equipe A conquistou
três vitórias e uma derrota (em 4 jogos consecutivamente) sagrando-se vice-campeã da
competição; a equipe B uma derrota e três vitórias (em 4 jogos consecutivamente) sagran-
do-se campeã da competição.

Tabela 1. Distribuição dos tipos de último passe de todos os jogos da equipe A.


Ação CB CA LB LA
1º Tempo 17 9 1 0
2º Tempo 17 7 0 2
Total 34 16 1 2
% 64,15% 30,19% 1,89% 3,77%
Legenda: CB = curto/baixo; CA = curto/alto; LB = longo/baixo; LA = longo/alto.

Tabela 2. Distribuição dos tipos de último passe de todos os jogos da equipe B.


Ação CB CA LB LA
1º Tempo 18 11 1 1
2º Tempo 21 5 1 1
Total 39 16 2 2
% 66,10% 27,12% 3,39% 3,39%
Legenda: CB = curto/baixo; CA = curto/alto; LB = longo/baixo; LA = longo/alto.

Gráfico 1. Comparativo do último passe equipes A e B.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 429


No Gráfico 1 podemos comparar os percentuais dos tipos de assistências. Os dados
foram coletados no decorrer do 1º e 2º tempo, durante os 4 jogos de cada equipe. Foi ve-
rificado que o último passe mais utilizado foi o CB (64,15% equipe A (34x) - 66,10% equi-
pe B (39x)). Seguidos por CA (30,19% equipe A (16x) – 27,12% equipe B (16x)), LA (3,77%
equipe A (2x) – 3,39% equipe B (2x)), e LB (1,89% equipe A (1x) – 3,39% equipe B (2x)).

Tabela 3. Distribuição dos tipos de finalizações de todos os jogos da equipe A.


Ação D CD C
1º Tempo 6 38 1
2º Tempo 3 32 1
Total 9 70 2
% 11,11% 86,42% 2,47%
Legenda: D = com drible; CD = com chute direto; C = com cabeceio.

Tabela 4. Distribuição dos tipos de finalizações de todos os jogos da equipe B.


Ação D CD C
1º Tempo 7 39 3
2º Tempo 12 35 1
Total 19 74 4
% 19,59% 76,29% 4,12%
Legenda: D = com drible; CD = com chute direto; C = com cabeceio.

No Gráfico 2 podemos observar o comparativo dos percentuais de finalizações. Os da-


dos foram coletados no decorrer do 1º e 2º tempo, durante os 4 jogos de cada equipe. Foi
verificado que a finalização mais utilizada foi com CD (86,42% equipe A (70x) – 76,29%
equipe B (74x)). Seguidos por D (11,11% equipe A (9x) – 19,59% equipe B (19x)) e C (2,47%
equipe A (2x) – 4,12% equipe B (4x)).

Tabela 5. Distribuição do resultado das finalizações de todos os jogos da equipe A.


Ação PF DG G
1º Tempo 20 22 3
2º Tempo 12 14 10
Total 32 36 13
% 39,51% 44,44% 16,05%
Legenda: PF = para fora; DG = defesa do goleiro; G = gol.

Tabela 6. Distribuição do resultado das finalizações de todos os jogos da equipe B.


Ação PF DG G
1º Tempo 23 20 6
2º Tempo 11 28 9
Total 34 48 15
% 35,05% 49,48% 15,46%
Legenda: PF = para fora; DG = defesa do goleiro; G = gol.

430 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Gráfico 2. Comparativo de finalizações equipes A e B.

Gráfico 3. Comparativo do resultado das finalizações equipes A e B.

Gráfico 4. Comparativo de assistências e finalizações que resultaram em gol equipes A e B.

No Gráfico 3 podemos observar os percentuais do resultado das finalizações. Os dados


foram coletados no decorrer do 1º e 2º tempo, durante os 4 jogos de cada equipe. Foi veri-
ficado que o RF mais ocorrido foi a DG (44,44% equipe A (36x) – 49,49% equipe B (48x)).
Seguidos por PF (39,51% equipe A (32x) – 35,05% equipe B (34x)) e com G (16,05% equi-
pe A (13x) – 15,46% equipe B (15x).

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 431


Tabela 7. Distribuição das assistências e finalizaçõ

Tipo de passe Tipo de finalização


Ação CB CA LB LA D CD C
1º Tempo 3 0 0 0 1 2 0
2º Tempo 6 2 0 0 2 8 0
Total 9 2 0 0 3 10 0
% 81,81% 18,19% 0% 0% 23,08% 76,92% 0%

Legenda: CB = curto/baixo; CA = curto/alto; LB = longo/baixo; LA = longo/


alto; D = com drible; CD = com chute direto; C = com cabeceio.

Tabela 8. Distribuição das assistências e finalizações que resultaram em gol de todos os jogos da equipe B.
Tipo de passe Tipo de finalização
Ação CB CA LB LA D CD C
1º Tempo 4 1 0 0 0 6 0
2º Tempo 4 2 1 0 1 8 0
Total 8 3 1 0 1 14 0
% 66,66% 25% 8,34% 0% 6,67% 93,33% 0%
Legenda: CB = curto/baixo; CA = curto/alto; LB = longo/baixo; LA = longo/
alto; D = com drible; CD = com chute direto; C = com cabeceio.

No gráfico 4 podemos observar os percentuais de assistências e FG efetivas. Os dados


foram coletados no decorrer do 1º e 2º tempo, durante os 4 jogos de cada equipe. Foi verifica-
do que o resultado mais ocorrido foram os gols por passe CB e finalização com CD (61,54%
equipe A (8x) – 46,67% equipe B (8x)). Seguidos por CB/D (7,69% equipe A (1x)), CA/CD
(20,00% equipe B (3x)), CA/CD (7,69% equipe A (1x)), PC/CD (13,33% equipe B (2x)), CA/D
(7,69% equipe A (1x)), CB/D (6,67% equipe B (1x)), PC/D (7,69% equipe A (1x)), PC/CD
(7,69% equipe A (1x)) LB/CD (6,67% equipe B (1x)), e SO/CD (6,67 % equipe B (1x)). As as-
sistências de passes contrários não foram contabilizadas diretamente, somente as finaliza-
ções por shoot out.
A equipe A conquistou 3 vitórias e 1 derrota (consecutivamente) sagrando-se vice-
campeã da competição, enquanto a equipe B 1 derrota e 3 vitórias (consecutivamente)
sagrando-se campeã da competição.

DISCUSSÃO

Após a análise das respectivas ações, podemos entender a influência das decisões
tomadas pelos jogadores no desempenho técnico das equipes durante a competição.
Devido a momentânea carência de estudos sobre a observação das ações técnicas
no futebol sete, fez-se necessário discutir e equiparar informações com o esporte que deu
origem a esta modalidade, o futebol onze.
Conforme Cassol e Fernandes (2008), sobre uma partida de futebol onde são mui-
tas as valências físicas e técnicas utilizadas pelos atletas, é exigido um ótimo nível de

432 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


desenvolvimento de todas essas características por parte dos indivíduos. Não se pode
esquecer que para isso devemos desenvolver métodos que analisem todos estes aspectos.
Por isso, as análises qualitativa e quantitativa dessas ações tornam-se imprescindíveis
para a planificação correta das metodologias que serão empregadas nas sessões de treina-
mento. Sendo o scout uma maneira relativamente simples de mensuração e quantificação
das ações ocorridas dentro de uma partida de futebol.
No momento do último passe existiu uma incidência maior pelo passe “curto/baixo”
por ambas as equipes (64,15% equipe A (34x) – 66,10% equipe B (39x)). Sendo também o
passe CB aquele que mais antecedeu as finalizações resultantes em gols (em 81,82% dos
gols da equipe A (9x), assim como 66,66% dos gols da equipe B (8x).
Da mesma forma Manarte (2009), verificou que 88,5% dos passes da seleção es-
panhola (638 passes num total de 721) foram do tipo “curto/médio/baixo”, em 6 jogos
da Eurocopa 2008.
No estudo realizado por Redondo (2016), 60,2% dos passes da seleção portuguesa
Sub-19 (80 passes num total de 133) foram do tipo “curto/médio/baixo”, em 5 jogos do
Campeonato da Europa (Hungria/2014).
De acordo com Alves (2016), 69,01% dos passes da seleção Portuguesa Sub-20
(49 passes num total de 71) foram do tipo “curto/médio/baixo”, em 5 jogos da Copa do
Mundo Sub-20 em 2015.
Conforme Moura (2006), no estudo de quatro partidas entre equipes do campeona-
to brasileiro série A, 46,5% (dos passes que precederam as finalizações) foram do tipo
“curto/médio/baixo”.
Em conformidade com os dados podemos observar a preferência pelo tipo de último
passe “curto/baixo” (de curta ou média distância por baixo), bem como a “carência” na
utilização dos outros tipos de passes. São fundamentos que poderão ser importantes em
determinadas situações do jogo.
No momento da finalização existiu uma incidência maior do “chute direto” por ambas as
equipes (86,42% equipe A (70x) - 76,28% equipe B (74x)). Sendo também com CD o TF que
mais resultou em gols (76,92% equipe A (10x) - 93,33% equipe B (14x)).
No mesmo sentido Chaves (2010), verificou que o CD teve uma incidência de 87,80%
(72x em 82 finalizações) em uma análise sobre as finalizações da seleção brasileira de fu-
tebol na copa do mundo 2010.
Conforme Moura (2006), no estudo sobre quatro partidas entre equipes do campeo-
nato brasileiro série A, 44,95% das finalizações foram por CD (49x em 109 oportunidades,
sendo CD o TF mais utilizado dentre os outros).

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 433


Corroborando com os dados destas decisões técnicas, verificamos a preferência de
finalização pelo chute direto, bem como a “carência” na utilização dos outros tipos de con-
clusão a gol. Estes recursos poderão ser utilizados em determinadas situações de jogo e
estão interligados com a capacidade decisional dos jogadores.
No resultado das finalizações, existiu uma incidência maior da “defesa do goleiro” por
ambas as equipes (44,44% equipe A (36x) – 49,48% equipe B (48x)). Seguidos de conclu-
são “para fora” com 39,51% da equipe A (32x) e 35,05% da equipe B (34). Sendo o RF com
término em “gol” apenas 16,05% da equipe A (13x) e 15,46% da equipe B (15x).
De acordo com o estudo realizado por Chaves (2010), constatou-se os resulta-
dos DG com 26,82% (22x/82), PF com 61,76% (51x/82), e G com 10,97% (9x/82). Já Redondo
(2016), verificou 38,23% das finalizações com DG (13x/34), PF com 41,17% (14x/34),
e G com 20,58% (7x/34).
Da mesma forma Alves (2016), verificou a DG em 42,1% das finalizações (32x/76), PF com
42,1% (32x/76), e G com 15,78% (12/76), a amostra consistiu na análise de cinco jogos da
seleção portuguesa, referente a Copa do Mundo Sub-20, no ano de 2015.
Em consonância com os resultados, podemos observar um baixo índice na efetividade
das finalizações, poucas vezes terminando em gols. Estes aspectos interferem diretamente
no desempenho das equipes em competições, evidenciando a necessidade do treinamento
destas capacidades.
Nas situações conjuntas mais satisfatórias, existiu uma incidência maior das ações
terminando em gol pelo último passe “curto/baixo” com finalização por “chute direto” (61,54%
equipe A (8x) – 46,67% equipe B (8x)).
Corroborando com Rodrigues (2009), onde o TP “curto/médio” com 46,6% (29x) foi o
mais satisfatório terminando em gols, na análise das ações sequenciais nos 31 jogos entre
seleções da Eurocopa de 2008.
Estes achados coincidem com o trabalho de Fernandes (1994) apud Campos (2004),
sobre um estudo realizado pelo professor Jairo dos Santos, onde 33% dos gols marca-
dos ocorreram com o menor número de ações envolvidas durante a Copa do Mundo de
1990. Os dados mostram, de maneira indireta, que as situações conjuntas são mais eficazes
quando ocorrem em um pequeno intervalo de tempo, devido ao menor número de ações
envolvidas (Maestri, 2010).
Conforme os resultados podemos observar uma “carência” de ações conjuntas ter-
minadas em gols. Demonstrando a importância do trabalho de aprimoramento das ações
técnicas dos jogadores.

434 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


CONCLUSÃO

Através dos resultados obtidos foi verificado que a análise contribui para conscientiza-
ção e avaliação das ações e decisões técnicas no futebol sete.
Desta forma os treinadores poderiam dar mais atenção a equipe utilizando-se do scout
nestas situações de jogo, aplicando ao planejamento técnico-tático sessões de aprimora-
mento da capacidade decisional de seus jogadores.
Além disso, esta pesquisa demonstra a carência de estudos existente no FS sobre a ob-
servação da capacidade de decisão dos atletas, e o desempenho das equipes em competições.
No entanto, esses dados referem-se a um evento curto entre equipes recém- forma-
das na modalidade.
Portanto, sugere-se novas investigações sobre a tomada de decisão dos jogadores e o
seu universo de possibilidades, oportunizando a identificação das ações técnicas, agregando
conhecimento, apresentando novos resultados, e servindo de incentivo para que o futebol
sete torne-se um esporte cada vez mais dinâmico e extraordinário.

REFERÊNCIAS
1. 1-Alves, C. J. R. Estudo das ações ofensivas que antecedem o golo: análise do campeonato
do mundo de futebol de Sub 20. Dissertação

2. de mestrado. Faculdade de Ciências do Desporto e Educação Física da Universidade de


Coimbra. 2016.

3. Campos, N. M. O. Futebol: Análise quantitativa e qualitativa das ações de recuperação da posse


de bola e uma explanação sobre jogadas de finalização. Monografia. Faculdade de Educação
Física, Universidade Estadual de Campinas. 2004.

4. Cassol, N., Fernandes, M. Como scouts técnico e físico podem ajudar na preparação das
equipes de futebol. Universidade do Futebol. 2008. Disponível em:

5. <https://universidadedofutebol.com.br/como- scouts-tecnico-e-fisico-podem-ajudar-na- prepa-


racao-das-equipes-de-futebol/>

6. Chaves, R. A. H. Análise das finalizações da seleção brasileira de futebol na copa do mundo de


2010. Monografia. Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da UFMG.
Belo Horizonte. 2010.

7. Fernandes, J. L. Futebol: ciência, arte ou...Sorte! Treinamento para profissionais – Alto rendi-
mento: preparação física, técnica, tática e avaliação. São Paulo. EPU. 1994.

8. Garganta, J. Para uma teoria dos jogos desportivos colectivos (Org.). O Ensino Dos Jogos
Desportivos. p. 11-25. Graça, A. 1994.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 435


9. Maestri, S. F. Scout no futebol: Análise de sequências ofensivas terminadas em gols no Cam-
peonato Paulista de Futebol da série A1 de 2009. Monografia. Faculdade de Educação Física
da Universidade Estadual de Campinas. 2010.

10. Manarte, S. T. O processo ofensivo em equipas de futebol de alto rendimento: análise sequen-
cial do processo ofensivo da seleção espanhola no campeonato da Europa Austria/Suiça 2008.
Monografia. Faculdade de Desporto da Universidade do Porto. Portugal. 2009.

11. Moura, A. F. Análise das ações técnicas de jogadores e das estratégias de finalizações no
futebol, a partir do tracking computacional. Dissertação de Mestrado. Universidade Estadual
Paulista. Instituto de Biociências. Departamento de Educação Física. Rio Claro, São Paulo.
2006.

12. Redondo, M. P. J. Análise das transições ofensivas na última etapa de formação no futebol.
Estudo no escalão de Sub-19. Dissertação de Mestrado. Faculdade de Ciências do Desporto
e Educação Física da Universidade de Coimbra. Portugal. 2016.

13. Rodrigues, R. N. J. H. Análise as sequências ofensivas resultantes em golo no Euro 2008 de


futebol. Estudo comparativo entre selecções com níveis de sucesso distintos. Monografia.
Faculdade de Desporto da Universidade do Porto. Portugal. 2009.

14. Tavares, F. A capacidade de decisão tática no Jogador de Basquetebol. Estudo comparativo


dos processos perceptivo- cognitivos em atletas seniores e cadetes. Tese de doutorado. Fa-
culdade de Desporto da Universidade do Porto. Portugal. 1993.

436 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


34
“ Uma avaliação do índice
de competência moral de
adolescentes praticantes de
futsal

Davi Perpétuo Assad


LIEENP/CENSUPEG

Fabrício Bruno Cardoso


LIEENP/CENSUPEG

Iris Lima e Silva


LIEENP/CENSUPEG

Énio Dias Júnior

Heron Beresford

10.37885/201102242
RESUMO

Objetivo: O objetivo do presente estudo foi realizar uma avaliação do índice de


competência moral de adolescentes de 13 a 15 anos de idade praticantes de futsal.
Métodos: Os adolescentes foram submetidos ao instrumento de avaliação, o Moral
Judgment Test extended (MJT_xt), que consiste em avaliar em que medida o grupo é
capaz de avaliar a qualidade de argumentos morais ou fica preso à sua própria opinião,
ou seja, avalia o índice de competência moral. Resultados: O universo do estudo foi
composto por 26 adolescentes, de 13 a 15 anos de idade, 20 do sexo masculino e 6
do sexo feminino. Os praticantes de futsal obtiveram um C Score máximo de 27,40 e
mínimo de 6,20, alcançando a média de 14,43 (erro padrão 1,19) que é considerado um
Índice C médio. Conclusão: Os resultados encontrados não comprovaram todas as hi-
póteses, apenas a hipótese de que não haveria diferença entre o índice de competência
moral de adolescentes de acordo com o sexo. Os resultados comprovaram a teoria de
que o futsal não constrói o caráter automaticamente, que seu efeito depende do contexto,
sendo possível ter efeito neutro ou até mesmo negativo.

Palavras-chave: Índice de Competência Moral, Adolescentes, Futsal.


INTRODUÇÃO

A adolescência é caracterizada por diversas transformações físicas, psicológicas e


sociais que tornam o indivíduo confuso, ambivalente e cheio de conflitos sociais (TARDIVO,
2007). Também se relata que essa é uma fase de emoções intensas, na qual o sujeito busca
consolidar sua própria identidade, sendo uma etapa decisiva no processo de desprendimen-
to da família. Os adolescentes se deparam com várias situações novas, que proporcionam
condições próprias para que apresentem variações do humor e mudanças acentuadas no
comportamento. Estas variações podem incluir sintomas de descontentamento, confusão,
solidão e incompreensão. Em adolescentes mais sensíveis e sentimentais, estas variações
comportamentais podem gerar atitudes de rebeldia, podendo levá-los a comportamentos
agressivos e violentos (CRIVELATTI, DURMAN e HOFSTATTER, 2006). No ambiente escolar
observa-se a prática da violência por meio de variadas expressões. Seja por interferência
dos grupos externos, seja pela depredação escolar, seja pelas brigas e agressões entre os
alunos, ou pela agressão entre alunos e adultos (CANDAU, LUCINDA e NASCIMENTO,
2001). Constata-se que há ocorrência de agressividade no trânsito, nos lares, nos hospitais,
mas também nas escolas e nos esportes (MOCARZEL e colaboradores, 2012), assim com
tendências agressivas, em diversas amostras de desportistas, são inversamente relaciona-
das com a maturidade do raciocínio moral. Da mesma maneira, os níveis mais elevados de
raciocínio moral relacionam-se com menores níveis de agressão (Guivernau, Duda, 2002).
Sendo assim, o esporte pode ser considerado um valioso meio de desenvolvimento moral,
e consequente redução das tendências agressivas expressas pelos jovens. Pois, no esporte
podemos desenvolver alguns aspectos como a amizade, o respeito às regras, a formação
do caráter, o respeito às diferenças, a cooperação social e o autocontrole (GALLAHUE e
OZMUN, 2001). Para que isso ocorra, a prática desportiva, seja ela educacional, comunitária,
recreativa, adaptada ou de alto rendimento, deve sempre considerar a ética e a moral, sendo
orientada para a valorização e respeito da pessoa humana. Para que, dessa maneira, as
pessoas não desacreditem nos valores positivos que podem ser agregados pela prática des-
portiva (SANTOS, 2005). Ao se falar de prática desportiva podemos incluir diversos esportes.
Entre os mais populares, encontra-se o futsal, o esporte mais praticado no Brasil. As quadras
de futsal podem ser encontradas na maioria das escolas, e em muitas praças públicas espa-
lhadas por todas as cidades do país (VOSER e GIUSTTI, 2002). A prática regular do futsal,
devidamente orientada, pode se constituir em um valor na vida dos adolescentes (ASSAD,
2011). Nessa perspectiva, de acordo com Beresford (2008), considera-se valor como “uma
qualidade estrutural de natureza metafísica que corresponde a tudo aquilo que preenche
positivamente (pois do contrário tem-se um contravalor ou desvalor) um complexo estado

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 439


de carência, privação ou vacuidade de um determinado ente do Ser em geral, e de um ente
do Ser do Homem de forma muito particular ou especial”.

OBJETIVO

Realizar uma avaliação do índice de competência moral de adolescentes de 13 a 15


anos de idade praticantes de futsal.

MÉTODOS

Para compor o universo do estudo, adotou-se como critério de inclusão estar na faixa
etária compreendida entre os 13 a 15 anos de idade, completos no dia da pesquisa e estar
matriculado somente no futsal. Além disto, os participantes deviam ter a mínima capacidade
de ler e interpretar o MJT_xt, sendo assim, alunos estrangeiros que não conheciam bem o
idioma português foram afastados pelo critério de exclusão da amostra. Desta maneira, o
universo do estudo foi composto por 26 adolescentes, de 13 a 15 anos de idade, 20 do sexo
masculino e 6 do sexo feminino
Os adolescentes foram submetidos ao instrumento de avaliação utilizado no presente
estudo, que foi o Moral Judgment Test extended (MJT_xt). O MJT foi elaborado em 1977,
por Gerog Lind, professor da Universidade de Konstanz. A tradução e validação do MJT
para o contexto brasileiro foi realizado por Bataglia (2001).
O MJT_xt consiste em avaliar em que medida o grupo (e não o sujeito individualmente)
é capaz de avaliar a qualidade de argumentos morais ou fica preso à sua própria opinião,
ou seja, avalia o índice de competência moral. A tarefa proposta pelo MJT_xt é a avaliação
de contra-argumentos (BATAGLIA et al., 2010).
Isso ocorre através da exposição de 3 dilemas morais. O primeiro dilema é a respeito
de um operário que decide arrombar a empresa em que trabalha e roubar provas de ativi-
dades irregulares da gerência para denunciá-la junto a instâncias superiores. O segundo
é o dilema clássico da eutanásia, em uma situação em que o paciente terminal pede para
que o médico realize algum procedimento que abrevie seu sofrimento. O terceiro dilema é
a respeito da decisão de um juiz, que permite a tortura de uma terrorista visando prevenir
um grande ataque (LIND, 2009).
Em cada uma delas, o personagem principal é colocado em uma situação de dilema.
Qualquer que seja sua decisão estará entrando em conflito com algumas regras de conduta
social e talvez pessoal. O personagem toma uma decisão e o sujeito é solicitado em primeiro
lugar a avaliar a decisão do protagonista. Em seguida, é convidado a avaliar 6 argumentos a
favor da decisão do protagonista e 6 contrários. Tais argumentos representam os diferentes

440 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


níveis de raciocínio moral de acordo com os seis estágios descritos por Kohlberg (1964)
(BATAGLIA, 2010).
Para avaliação dos argumentos, favoráveis e contrários, é utilizada a escala de Likert,
onde o participante da pesquisa atribuirá valores entre -4 (rejeito completamente) e +4 (aceito
completamente) (LIND, 2009).
A partir das respostas emitidas pelos entes, chega-se ao índice C (C Score). Que é o ín-
dice de competência moral, que varia entre 0 e 100. O índice C entre 1 e 9 é considerado bai-
xo, entre 10 e 29 é considerado médio, entre 30 e 49 alto, e acima de 50 é muito alto (Cohen,
1988). O MJT_xt foi concebido como uma experiência variada, com um desenho ortogonal
dependente 6 x 2 x 2, em que os fatores são ortogonais ou não correlacionado. O C-score
é calculado de forma análoga à análise de variância multivariada (MANOVA) (LIND, 2010).

RESULTADOS

Os praticantes de futsal obtiveram um C Score máximo de 27,40 e mínimo de 6,20,


alcançando a média de 14,43 (erro padrão 1,19) que é considerado um Índice C médio.
Uma das variáveis estudadas foi a pretensão que o adolescente tem em, um dia, se pro-
fissionalizar no futsal. Os alunos que não pretendem chegar ao alto rendimento alcançaram
um C Score de 17,75, com um índice máximo de 23,70 e um mínimo de 6,20. Este índice foi
superior ao dos alunos que pretendem se profissionalizar, que alcançaram a média de 13,43,
chegando a um máximo de 27,40 e um mínimo de 6,30. Entretanto, ao realizarmos a análise
de variância, observamos que esta diferença não é estatisticamente significativa (p < 0,05).

DISCUSSÃO

O objetivo deste estudo foi avaliar o índice de competência moral de adolescentes de


13 a 15 anos de idade praticantes de futsal. Este assunto tem sido explorado também por
outros autores. Fernandez et. al. (2017) avaliou e comparou o julgamento moral de jogadores
de futebol das categorias infantil e juvenil. Foram examinados 41 atletas homens, de 15 a
17 anos de idade, pertencentes a um clube esportivo de Porto Alegre/RS. Foi apresentada
aos participantes a estória do dilema da Trapaça do Judgments about Moral Behavior in
Youth Sport Questionnaire (JAMBYSQ), na qual um personagem é levado a fazer escolhas
dilemáticas. Na análise dos dados, não foram apuradas diferenças estatísticas significativas
entre as categorias. Porém, os jogadores apresentaram respostas que indicaram raciocínio
moral no nível pré-convencional, abaixo do esperado para suas idades.
Pinto (2002) utilizou o DIT para avaliar 127 adolescentes portugueses, de 12 a 15 anos
de idade, atletas praticantes de esgrima, ginástica, hóquei em patins, basquetebol, voleibol,

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 441


pólo aquático e natação, e também não encontrou diferença entre as idades. Haddad (2007)
utilizou o MJT_xt para comparar adolescentes, de classe média, estudantes do ensino médio
de duas escolas particulares, de 15 a 17 anos, e também não encontrou diferença entre as
referidas idades. Bredemeier (1994) utilizou dilemas da vida diária e da vida desportiva para
comparar alunos de classe média e classe média alta, do 4º, 5º e 6º ano e não encontrou
diferença dos níveis de moralidade entre estes níveis de escolaridade.
O C Score encontrado neste estudo para os atletas de futsal foi de 14,43, valor muito
próximo ao encontrado por Buzgová & Sikorová (2012) quando estudaram universitários de
enfermagem da República Tcheca, que alcançaram 14,24. Entretanto, os índices do nosso
estudo foram um pouco inferiores ao encontrado entre estudantes de uma escola particular
em Osasco, que cursam o 1º, 2º e 3º ano do ensino médio, no qual obtiveram 17,13; 16,60
e 18,44, respectivamente (Haddad, 2007).
Dias (1999) realizou um trabalho de intervenção com crianças de 10 a 12 anos de ida-
de, estudante do 6º ano da rede de ensino particular, e constatou a evolução dos níveis de
moralidade através do DIT. Outros estudos compararam atletas de desporto coletivo com
atletas de desporto individual e obtiveram resultados que comprovaram a semelhança de
moralidade entre seus praticantes (Ferreira, 2008; Pinto, 2002).
Ferreira (2008) afirma que a existência de fatores como o contato físico pode influenciar
o nível de funcionamento moral, sendo importante analisar não só diferentes modalidades
em termos de atividade individual e coletiva, mas também quanto a características como
o tipo de contato físico. Os resultados obtidos por Assad (2013) aplicando o MJT_xt em
adolescentes de 13 a 15 anos demonstraram a superioridade dos praticantes de desportos
com contato físico (futsal, handebol e muay thai) em relação aos que não tem contato físico
(natação), 16,10 e 14,20, respectivamente.
Esses dados nos mostram que encontramos duas características importantes no des-
porto que podem contribuir para o desenvolvimento moral, ser praticada coletivamente e que
tenha contato físico com os adversários. Este resultado corrobora com a teoria de Piaget
(1994) que vê o relacionamento social com os pares, e a cooperação, como uma maneira
de ajudar o desenvolvimento moral.
Já Lenz et al. (2010), utilizou dilemas da vida diária e dilemas desportivos (Romance,
1984) para estudar adolescentes de 13 a 15 anos. A maioria da amostra se encontrava nos
estágios 2 e 3 para o dilema da vida diária, e nos estágios 2, 3 e 4 para os dilemas da vida
desportiva. Entretanto, não encontrou diferenças entre os grupos. Bredemeier & Shields
(1984) utilizaram o DIT para investigar o nível de raciocínio moral de meninos e meninas jo-
gadores de basquete do ensino fundamental considerados atletas agressivos. Os resultados
demonstraram que os estágios 2 e 4 tiveram uma correlação positiva com níveis de agressão.

442 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


CONCLUSÃO

Os resultados encontrados não comprovaram todas as hipóteses, apenas a hipótese


de que não haveria diferença entre o índice de competência moral de adolescentes de
acordo com o sexo.
Os resultados comprovaram a teoria de que o futsal não constrói o caráter automatica-
mente, que seu efeito depende do contexto, sendo possível ter efeito neutro ou até mesmo
negativo. Desta forma apropriamo-nos do pensamento de Aristóteles (2007) para concluirmos
que o desporto oferece situações nas quais as virtudes morais podem ser construídas, entre-
tanto, as mesmas situações também podem ser oportunas para construir os vícios. É atra-
vés da participação em transações com nossos semelhantes que alguns de nós se tornam
justos e outros injustos. É diante de momentos arriscados que nos mostramos corajosos ou
covardes. Sendo assim, a prática desportiva pode ser um valioso meio de formação de um
Homem de caráter, mas também pode ser meio de formação de um Homem sem caráter.

REFERÊNCIAS
1. Aristóteles. (2007). Ética a Nicômaco. Tradução de Edson Bini. 2 ed. São Paulo: Edipro Arnold,
P. J. (1994) Sport and moral education, Journal of Moral Education, 23(1), 75–89.

2. Assad, D. P. (2011) O valor do futsal como um meio de desenvolvimento das virtudes morais
de adolescentes de 11 a 13 anos com dificuldade de relacionamento social. Rio de Janeiro:
Universidade do Estado do Rio de Janeiro. (Monografia de Licenciatura).

3. Assad, D. P., Cardoso, F. B., Dias Júnior, E., Lima. I., Queirós, P. L., Beresford, H. (2013). O
valor do futsal como um meio de desenvolvimento moral de adolescentes com dificuldade de
relacionamento social. RBFF, 5(16), 146-154. Consult. 3 Jul 2020, disponível em: http://www.
rbff.com.br/index.php/rbff/article/view/201/179.

4. Bataglia, P. U. R. (2001). A Construção da competência moral e a formação do psicólogo. Tese


de doutorado, Universidade de São Paulo, São Paulo.

5. Bataglia, P. U. R. (2010a). A Validação do Teste de Juízo Moral (MJT) para Diferentes Culturas:
O Caso Brasileiro. Psicologia: Reflexão e Crítica, 23(1), 83-91.

6. Bataglia, P. U. R., Morais, A., Lepre, R. M. (2010b). A teoria de Kohlberg sobre o desenvolvi-
mento do raciocínio moral e os instrumentos de avaliação de juízo e competência moral em
uso no Brasil. Estudos de Psicologia, 15(1), 25-32.

7. Beresford, H. (2009) Valor: saiba o que é. 2ª Ed. Rio de Janeiro: Shape. Bredemeier, B. (1994).
Children’s moral reasoning and their assertive, aggressive, and submissive tendencies in sport
and daily life. Journal of Sport & Exercise Psychology, 16 (1), 1-14. Consult. 7 Mar. 2020, dis-
ponível em: http://psycnet.apa.org/psycinfo/1994-32957-001. 133

8. Bredemeier, B.J., Shields, D.L. (1984) The utility of moral stage analysis in the investigation of
athletic aggression. Sociology of Sport Journal, 1, 348–357.

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 443


9. Bredemeier, B., & Shields, D. (1986). Moral growth among athletes and non athletes: A com-
parative analysis. Journal of Genetic Psychology, 147, 7-18.

10. Bužgová, R., Sikorová, L. (2012). Moral judgment competence of nursing students in the Czech
Republic, Nurse Educ. Consult. 08 Jan 2020, disponível em: http://www.sciencedirect.com/
science/article/pii/S0260691712002055

11. Gallahue, D., Ozmun, J. (2001). Compreendendo o desenvolvimento motor: bebês, crianças,
adolescentes e adultos. São Paulo: Phorte.

12. Gesell, A. (1978). O jovem dos 10 aos 16 anos. Lisboa: Dom Quixote.

13. Guivernau, M., Duda, J. L. (2002). Moral Atmosphere and Athletic Aggressive Tendencies in
Young Soccer Players. Journal of Moral Education, 31(1).

14. Haddad, L. A. G. (2007). A construção da competência moral em alunos do ensino médio um


estudo sobre a influência do ambiente escolar. Osasco: Universidade Bandeirante de São
Paulo (Monografia de Graduação).

15. Lind, G. (2009). Defining Issues Test – 2: Spring 2009.

16. Lind, G. (2010). The Nature, Measurement, Development and Education of Moral-Democratic
Competence. Consult 12 Dez. 2019, disponível em: http://www.uni-konstanz.de//ag-moral/
about.htm.

17. Tardivo, L. S. (2007). O adolescente e o sofrimento emocional nos dias de hoje. Vetor.

444 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


SOBRE OS ORGANIZADORES

Prof. Dr. Rogério de Melo Grillo


Doutor em Educação Física pela Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP (2014). Possui
Mestrado em Educação pela Universidade São Francisco (2012), campus Itatiba/SP. Licenciatura
Plena em Educação Física (2005) e Especialização em Educação Física Escolar (2007) pelo Centro
Universitário Claretiano de Batatais/SP. Graduação em Pedagogia pela FAFIBE (MG). É também
pesquisador na UNICAMP, sendo membro do Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação Física
Escolar (EscolaR - UNICAMP), na UFC, sendo membro do Centro de Estudo sobre Ludicidade e
Lazer (CELULA - UFC), na UFSC, sendo membro do GEPROFEM, e, na UFMS, sendo membro do
CLUCIEFE. Foi membro da “The Association for the Study of Play (TASP)”. Fez estágio doutoral
(Edital Cooperação Mundial) na Argentina, sob a orientação da profa. Dra. Carolina Duek (UBA/
Conicet). É membro do Conselho Editorial da Editora Científica. Realiza pesquisas na área de
Educação, com ênfase em Jogo, Brinquedo, Didática, Lúdico e Psicologia Histórico-Cultural.
Realiza Pós-Doutorado no PPGECT da UFSC, sob a supervisão da Dra. Regina Célia Grando.
Lattes: http://lattes.cnpq.br/3406955208027254

Prof. Dr. Márcio Moterani Swerts


Doutor em Educação pela Universidade de São Francisco (2016). Mestrado em
Mestrado em Educação pela Universidade Vale do Rio Verde de Três Corações (2005).
Afastado desde 2004 da Faculdade de Educação e Ciências de Contagem e professor -
SECRETARIA DE ESTADO DE EDUCAÇÃO DE MINAS GERAIS. Tem experiência na área
de Educação, com ênfase em Educação, atuando principalmente nos seguintes temas:
interdisciplinaridade, psicologia, portador de deficiencia, motivação e motivos humanos.
Lattes: http://lattes.cnpq.br/7740008615378408

445 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


ÍNDICE REMISSIVO

Comportamento: 367
A
Confiança: 356, 359, 360, 361
Ações Técnicas: 425
Congo: 171, 174, 175
Adolescência: 29, 30, 31, 33, 34, 35, 268
Conhecimento Declarativo: 340
Adolescente: 295
Coração: 228
Adolescentes: 438
Corpo: 123, 192, 193, 213, 253
Ansiedade: 329, 332
Corpos Mais: 201, 206, 208, 210, 211
Aprendizagem Motora: 107
Criança: 94, 295
Aprimoramento: 425
Crioterapia: 420
Aptidão Física: 157
Cultural: 172, 399, 402, 445
Áreas Verdes: 140, 141, 142, 144, 149, 150,
151, 152, 153, 154, 156, 157, 159, 160 D
Asma: 369, 375, 376 Dança: 202, 213, 214, 315

Atenção: 356, 360 Decanoato de Nandrolona: 228, 237

Atividade Física: 63, 124, 125, 139, 304, 337, Depressão: 329, 332, 337, 338
369, 376
Desempenho: 267, 326, 327, 423
Atividade Motora: 51
Desenvolvimento da Criança: 110
Atleta: 162, 317, 319, 326
Dialogia: 198
Atletas: 74
Dismorfia Muscular: 239, 240
Atletismo: 27, 51, 53, 54, 59, 61, 62
E
Avaliação: 14, 15, 19, 21, 85, 158, 161, 165,
218, 219, 225, 226, 255, 260, 332, 360, 361, 422 Educação Física: 29, 48, 110, 112, 123, 159,
270, 272, 314, 315
B
Educação Física Escolar: 48, 123, 315
Badminton: 307, 309, 310, 314, 315
Educação Infantil: 110
Basquetebol: 26, 436
Ensino: 31, 92, 117, 118, 202, 203, 206, 271,
C 272, 273, 275, 276, 277, 278, 281, 283, 284, 307,
308, 311, 315, 336, 340, 405, 406, 412, 413, 435
Capoeira: 185, 186, 187, 188, 189, 190, 191,
192, 193, 194, 195, 196, 197, 198, 199 Escola: 6, 30, 47, 94, 117, 157, 253, 268, 272,
284, 304, 307, 308, 310, 311, 315, 343, 387,
Coluna Vertebral: 78 413, 435

446 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


Esgrima: 306, 307, 309, 310, 313, 314, 315 Intervenção: 303, 368

Esperança: 187, 316, 317, 318, 319, 321, 322, J


323
Joelho: 78, 81
Esporte: 23, 24, 27, 62, 84, 85, 87, 88, 89, 90,
91, 92, 106, 108, 128, 157, 158, 187, 199, 237, Jogo: 37, 38, 39, 44, 45, 47, 48, 49, 386, 401,
252, 253, 254, 255, 287, 293, 304, 308, 309, 403, 404, 406, 407, 408, 413, 445
310, 314, 315, 318, 327, 375, 376, 405
Jovens: 34, 203
Esportes: 54, 62, 66, 88, 89, 90, 120, 168, 258,
307, 314, 378, 427 Judô: 94, 96, 101, 104, 106, 107, 108

Estatura: 81, 216, 218, 219, 221 K


Estresse: 228, 329, 332 Karatê: 369, 371, 372, 373, 374, 375

Estresse Oxidativo: 228 L


Estudantes: 258, 293 Lazer: 57, 58, 159, 315, 445

Estudo de Validação: 14 Lesão Atlética: 162

Estudo Transversal: 164, 229, 329 Lesões Esportivas: 417

Exercício: 85, 108, 140, 144, 228, 233, 255, Luta: 26


293, 328, 329, 337, 376, 422
M
Exercício Físico: 140, 144, 328, 329
Metas: 326
F
Metodologia: 47, 200, 340, 404
Frequência Cardíaca: 66
Motivação: 356, 359, 360, 361
Futebol: 78, 79, 162, 168, 191, 215, 216, 225,
226, 424, 425, 435, 436 Mulheres: 56, 57

Futsal: 215, 424, 438 Música: 203

G N
Ginástica: 85, 308, 340, 342 Natação: 317, 319, 378

Goleiros: 216, 221 Normalistas: 202

Gordura: 70 O
Gravidez na Adolescência: 29, 35 Obesidade: 57

Grupo: 125, 129, 231, 232, 329, 332, 348, 445 P


I Pedagogia do Esporte: 92

Imagem Corporal: 255 Percepção: 15, 64, 132, 158

Inclusão: 218 Postura: 78, 205

Índice de Competência Moral: 437, 438, 440, Potência: 216


441, 443
Proposições: 271

Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1 447


Psicologia do Esporte: 14, 327, 356, 367

Psicometria: 14, 26

Q
Qualidade de Vida: 157, 159, 160

Questionário: 14, 15, 19, 21, 31, 63, 311, 312,


317

R
Relacionamento Treinador: 317, 321

Representação: 273

Resiliência: 356, 359, 360, 361

S
Saúde: 19, 30, 35, 51, 62, 63, 64, 117, 125, 128,
135, 140, 141, 150, 152, 155, 158, 159, 160,
218, 225, 230, 253, 254, 255, 258, 260, 267,
293, 296, 297, 305, 329, 330, 331, 335, 337,
338, 370, 376, 413, 416, 422

Saúde Mental: 329

Scout: 425, 428, 436

Segurança: 378

Sexo: 56, 57

Sistema Cardiovascular: 66

Sistema Nervoso Simpático: 66

Sobrepeso: 57

T
Temas Transversais: 29, 32, 34

Tendinopatia: 416, 422

Tomada de Decisão: 424, 425

Treinamento: 225, 226, 340, 367, 435

V
Voleibol: 416, 422

448 Educação Física e Ciências do Esporte: Uma Abordagem Interdisciplinar - Volume 1


editora científica

Você também pode gostar