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PUBLICIDADE INFANTIL E REGULAMENTAÇÃO PUBLICITÁRIA:

DA TV A ERA DO PÓS-DIGITAL

BEZERRA, Eduardo de Souza.1


SILVA, Adelino Pereira da.2

RESUMO EXPANDIDO

INTRODUÇÃO: A publicidade infantil é uma comunicação mercadológica


voltada para as crianças. A constituição federal de 1988 no seu artigo 227 3
expõe que é dever de toda sociedade assegurar os direitos das crianças como
prioridade. O Código de Defesa ao Consumidor 4, no que se refere a
propaganda dirigida à criança, estabelece que esse tipo de conteúdo se
aproveita da inocência e falta de experiencia desse público e, portanto, é
abusiva e ilegal. A resolução 163 de 2014 do Conanda 5 (Conselho Nacional
dos Direitos da Criança e do Adolescente), assegura que é proibida qualquer
tipo de propaganda que use de personagens, personalidades, apresentadores,
que tem apelo voltado para o público infantil. Conjunturalmente, produções com
distribuição de prêmios ou de brindes colecionáveis, promoção com
competições com o apelo para o público infantil seguem proibidas. A priori, é
imperioso destacar para os profissionais de publicidade ter o conhecimento dos
desejos e necessidades do público infantil, pois, como afirma McNeal (1992), a
importância deste público se intensifica quando são levados em conta os
diferentes papéis que a criança-consumidora assume: a) mercado primário (a
criança pode ser um consumidor); b) mercado influenciador (a criança pode
influenciar o consumo); e c) mercado futuro (a criança constitui um mercado
potencial). Contudo, trazendo para o contexto da comunicação na era pós-
moderna, esta pesquisa visa expor a problemática da publicidade de maneira
1
Graduando do curso de Publicidade e Propaganda da Faculdade Cesrei. E-mail:
eduardocc29.es@gmail.com
2
Orientador. Professor do curso de Publicidade e Propaganda da Faculdade Cesrei. E-mail:
ade.lino@yahoo.com.br
3
Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/escolaqueprotege_art227.pdf>.
Acesso em: 10 de março de 2022.
4
Disponível em: <https://presrepublica.jusbrasil.com.br/legislacao/91585/codigo-de-defesa-do-
consumidor-lei-8078-90>. Acesso em: 10 de março de 2022.
5
Disponível em: <https://crianca.mppr.mp.br/pagina-1635.html>. Acesso em: Acesso em: 10 de
março de 2022.

1
prematura na internet. Portanto, o objetivo deste estudo é pontuar questões
acerca da publicidade infantil, estabelecendo como fio condutor os tradicionais
comerciais e programas de televisão aberta até as configurações pós-
modernas, com a personificação de influencers, e seus respectivos canais,
voltados para esse público, e como se posicionam os órgãos regulamentadores
nesse âmbito. Esse trabalho tem sua importância no fazer publicitário e sobre
os limites legais que os profissionais devem seguir nesse âmbito.
METODOLOGIA: A proposta da pesquisa é buscar compreender o processo da
publicidade infantil, desde os tradicionais meios de comunicação até as
configurações pós-modernas. Para a sua realização, serão analisados
exemplos de publicidades infantis e como os órgãos regulamentadores se
posicionam diante dessa problemática. Para tanto, utilizamos como método de
pesquisa bibliográfica o Estado da Arte, que, conforme Ferreira (2002, p. 258),
irá nos auxiliar a “[...] mapear e discutir certa produção acadêmica em
diferentes campos do conhecimento, tentando responder que aspectos e
dimensões vêm sendo destacados e privilegiados em diferentes épocas e
lugares,” e, ainda, “de que formas e em que condições têm sido produzidas
certas dissertações de mestrado, teses de doutorado, publicações em
periódicos e comunicações em anais de congressos e de seminários”. Esse
levantamento bibliográfico nos deu suporte necessário na discussão, de forma
que foi possível nos aprofundar na questão e responder aos objetivos da
pesquisa. No tratamento dos dados, análise do(s) objeto(s) de estudo,
utilizamos a análise do conteúdo de produções selecionadas – com foco
publicitárias –, que, conforme Bardin (2009), é um conjunto de técnicas que
pode ser utilizada na análise de comunicações que possuem procedimentos
sistemáticos e objetivos descrição do conteúdo das mensagens.
RESULTADOS E DISCUSSÕES: No início dos anos 80 com os programas
infantis em alta, surgiram grandes personalidades voltadas para esse público.
Xuxa Meneghel, com o tradicional programa “Xou da Xuxa” 6, fez sucesso na
época emplacando diversos produtos para o público infantil, como a botinha da
Xuxa, que a peça expressava a seguinte mensagem: “Convença seu pai a te
dar esse presentinho”7. Propagandas apelativas eram comuns na época, como,
6
Disponível em: https://memoriaglobo.globo.com/entretenimento/infantojuvenil/xou-da-xuxa/
noticia/formato.ghtml.
7
Fonte: https://youtu.be/yx2oanqFnns

2
por exemplo, a propaganda criada pela W/Brasil em 1992 para a “garoto” 8 com
uma criança passando a mensagem de “compre batom, seu filho merece
batom”. Outro exemplo foi o comercial produzido para a “Mundial” com a
tesoura Disney, que passava a mensagem apelativa e despertava o
individualismo infantil com o “eu tenho, você não tem”9, sendo repetido durante
todo o comercial, instigando o público infantil a um desejo de compra
precocemente. Esses comerciais citados na época foram censurados pelo
CONAR (Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária), mesmo
assim ainda repercute quando o assunto é propagandas direcionadas para o
público infantil. Ainda no contexto televisivo, o programa “Bom dia e
Companhia”, uma das maiores atrações infantis da televisão Brasileira que
durou mais de 20 anos no ar, marcando gerações, fazia uso recorrente de
publicidade infantil durante suas exibições, onde brinquedos eram
mencionados durante o programa. Produtos com a marca de apresentadores
como shampoos, condicionador, sabonete, brinquedos dos palhaços Patati e
Patatá, que eram também apresentadores do matinal infantil.
Desde 2014, após mais uma regulamentação por parte do Conanda, a de
número 163 programas infantis perderam espaço na televisão aberta do nosso
país, como exposto pela colunista e jornalista Cristina Padiglione 10, após as
restrições impostas à publicidade dirigida à criança, os programas infantis
deixaram de ser um bom negócio para a TV aberta. Ela ainda faz o alerta sobre
peças infantis nos canais por assinatura que apesar de “cautelosas” ainda
incentivam o consumo pregresso infantil. Como a popularização das redes
sociais, o público infantil está cada vez mais integrado ao mundo virtual,
conforme pesquisa divulgada pela (TIC Kids Online 2017) 11, 74% das crianças
de 9 a 10 anos e 82% entre crianças de 11 a 12 são usuárias de internet no
Brasil. Sobre o uso, 84% das crianças de 9 a 10 anos assistem a vídeos,
programas, filmes ou séries. No YouTube, a audiência de conteúdo para o
público infantil já ultrapassou 115 bilhões de visualizações. Segundo estudo do
instituto americano Pew Research Center12, os vídeos do YouTube com

8
Fonte: https://youtu.be/fzKKpUwJ2Fw
9
Fonte: https://youtu.be/zMFqTzH_dn0
10
Fonte: https://telepadi.folha.uol.com.br/sbt-demorou-a-abandonar-a-faixa-infantil-na-tv-aberta/
11
Fonte: https://cetic.br/media/analises/tic_kids_online_brasil_2017_coletiva_de_imprensa.pdf
12
Fonte: https://gizmodo.uol.com.br/youtube-criancas-estudo-sugere-contrario/

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crianças recebem, em média, três vezes mais visualizações do que outros tipos
de canais com maior número de inscritos. Com isso, não é obra do acaso que
atualmente as marcas de produtos infantis busquem canais famosos para
fazerem seus anúncios em forma de unboxing13, que na teoria é o consumidor
abrindo a embalagem mostrando os produtos e suas funcionalidades, tornou-se
algo bem lucrativo para as marcas. Empresas enviam “presentes” para
youtubers mirins que, de forma velada, fazem propaganda dentro de seus
vídeos ou nas redes sociais. Um dos principais nomes desse meio é o
youtuber mirim Ryan, do canal Ryan's World (Mundo de Ryan) 14, de apenas 6
anos que já faturou cerca de R$ 105 milhões, de acordo com o ranking anual
divulgado pela revista Forbes 15, apresentando unboxing de produtos de forma
lúdica e divertida, confundindo conteúdo com a publicidade velada, seus vídeos
ultrapassam 50 bilhões de visualizações na plataforma. No contexto nacional, a
Mattel do Brasil Ltda foi condenada pelo TJ-SP por dano moral coletivo, pela
publicidade infantil nos canais de influenciadores mirins com multa de 200 mil
reais, em razão da campanha “Você Youtuber Escola Monster High” 16, que
constava na promoção da linha Monster High direcionada para meninas
trazendo o desafio de gravar vídeos e postar nas redes sociais, cumprindo
algumas tarefas indicadas pela youtuber. A cada semana uma participante era
indicada para ganhar uma boneca Monster High e ganhavam ingressos para o
evento da marca. A decisão histórica dada pelo Tribunal de Justiça de São
Paulo transmite um alerta a toda a sociedade, especialmente às empresas que
insistem em explorar comercialmente a vulnerabilidade do público infantil para
promover seus produtos e serviços, muitas vezes de forma velada, e por meio
de redes sociais protagonizadas por crianças: “não se pode mais desprezar as
restrições legais que proíbem a publicidade infantil” 17, afirma Livia Cattaruzzi,
advogada do Criança e Consumo. Ela acrescenta ainda que, “é inadmissível
que os direitos de crianças continuem sendo desrespeitados em nome de
interesses estritamente comerciais. Assim, essa decisão é paradigmática e

13
https://journals.sagepub.com/doi/full/10.1177/2056305118790761
14
https://www.youtube.com/c/RyanToysReview
15
Fonte: https://forbes.com.br/listas/2019/12/os-youtubers-mais-bem-pagos-de-2019/
16
https://livredetrabalhoinfantil.org.br/noticias/reportagens/mattel-e-denunciada-por-explorar-
audiencia-de-canal-de-youtuber-mirim-para-anunciar-produtos/
17
Disponível em: <https://criancaeconsumo.org.br/noticias/unboxing-criancas-fora-da-caixa />.
Acesso em: 10 de maio de 2022.

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reforça a proteção legal já existente, também no ambiente digital”. Percebe-se,
ainda, que “a indústria se vale de um espaço de comunicação e entretenimento
para promover suas marcas e produtos. Ela se aproveita da relação de
confiança que se estabelece entre a criança produtora de conteúdo e a
espectadora”. Por fim, percebe-se ainda que os Youtubers mirins, dentro dessa
nova dinâmica de comunicação estabelecida por meio da internet, acabam
veiculando publicidade abusiva e ilegal dirigida ao público infantil.
CONSIDERAÇÕES FINAIS: Em virtude dos fatos mencionados, é
imprescindível que todos os profissionais de publicidade se conscientizem
sobre o limite da propaganda em conteúdos infantis na internet e como isso
pode afetar o desenvolvimento das crianças despertando desejos consumistas
de forma precoce. O Código de Defesa ao Consumidor já exclama que é
abusivo e ilegal se aproveitar da inocência e da falta de entendimento desse
público. A resolução 163 de 2014 do Conanda assegura a proibição de
qualquer tipo de propaganda que use de personagens, personalidades,
apresentadores, que tem apelo voltado para o público infantil. Empresas devem
receber punições brandas pelas campanhas claramente abusivas e os órgãos
regulamentadores fiscalizar a coleta de dados no mundo virtual para finalidades
comerciais. Espaços digitais voltados para esse público seria uma solução
viável, espaços livres de aplicação abusiva comercial, redes sociais
programadas e voltadas para o público infantil. Os familiares têm a
necessidade de se conscientizar sobre horários, e buscar outras atividades
que não envolvam o mundo digital. Ademais, fica o desafio para esses órgãos
criarem uma legislação que regule, da melhor forma possível, as possibilidades
de publicidade infantil dentro da internet.

PALAVRAS-CHAVES: Publicidade infantil. CDC. CONAR. Unboxing. Internet.

REFERÊNCIAS
BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo: Laurence Bardin. Tradução Luís
Antero Reto e Augusto Pinheiro. Lisboa: Edições 70, 2009.

FERREIRA, Norma Sandra de Almeida. As pesquisas denominadas “Estado da


Arte”. Educação e Sociedade, Campinas, v. 23, n. 79, p. 257-272, ago. 2002.

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