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MANUAL DE ORIENTAÇÃO PARA ELABORAÇÃO DO

TCC DO CURSO DE FILOSOFIA DA UFRB:


O PROJETO DE PESQUISA

Organização e compilação
Rafael dos Reis Ferreira
Geovana da Paz Monteiro
Cícero Josinaldo da Silva Oliveira
Daniel Rodrigues Ramos
Pablo Enrique Abraham Zunino
Giovana Carmo Temple
José João Neves Barbosa Vicente
Denise Magalhães da Costa
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RECÔNCAVO DA BAHIA - UFRB
CENTRO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES - CFP
CURSO DE LICENCIATURA EM FILOSOFIA

MANUAL DE ORIENTAÇÃO PARA ELABORAÇÃO DO


TCC DO CURSO DE FILOSOFIA DA UFRB:
O PROJETO DE PESQUISA

Volume 2

Organização e compilação
Rafael dos Reis Ferreira
Geovana da Paz Monteiro
Cícero Josinaldo da Silva Oliveira
Daniel Rodrigues Ramos
Pablo Enrique Abraham Zunino
Giovana Carmo Temple
José João Neves Barbosa Vicente
Denise Magalhães da Costa

AMARGOSA
2020
3

Ferreira, Rafael dos Reis; Monteiro, Geovana da Paz; Oliveira, Cícero


Josinaldo da Silva; Ramos, Daniel Rodrigues, Zunino, Pablo Enrique
Abraham; Temple, Giovana Carmo; Vicente, José João Neves Barbosa;
Costa, Denise Magalhães.
Manual de Orientação para Elaboração do TCC do Curso de Filosofia
da UFRB: o Projeto de Pesquisa / Organizado e compilado por Rafael dos
Reis Ferreira; Geovana da Paz Monteiro; Cícero Josinaldo da Silva Oliveira;
Daniel Rodrigues Ramos; Pablo Enrique Abraham Zunino; Giovana Carmo
Temple; José João Neves Barbosa Vicente; Denise Magalhães da Costa –
Amargosa: UFRB/CFP, 2020.
63 f. (Coleção Manual para Elaboração do TCC do Curso de Filosofia da
UFRB)
ISBN da Coleção: 978-65-87743-12-7
ISBN do Volume 2: 978-65-87743-10-3
1. Manual de Orientação. 2. Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). 3.
Projeto de Pesquisa. 4. Curso de Licenciatura em Filosofia da UFRB I.
Título.

Colegiado do Curso de Filosofia


Coordenador: José João Neves Barbosa Vicente
Vice-Coordenador: Rafael dos Reis Ferreira
Núcleo Docente Estruturante (NDE) do Curso de Filosofia
Presidente: Daniel Rodrigues Ramos
Membros: Denise Magalhães da Costa, Cícero Josinaldo da Silva Oliveira,
Geovana da Paz Monteiro, José João Neves Barbosa Vicente,
Marcelo Santana dos Santos, Rafael dos Reis Ferreira,
Ricardo Henrique Resende de Andrade
Administração do Centro de Formação de Professores (CFP)
Diretora: Creuza Souza Silva
Vice-Diretor: Tiago Rodrigues Santos
Gestor de Ensino: Adielson Ramos de Cristo
Gestor de Pesquisa: Leandro do Nascimento Diniz
Gestor de Extensão: Cintia Mota Cardeal
Gestor de Pós-Graduação: Silvio Ruiz Paradizo
Administração Central Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB)
Reitor: Fábio Josué Souza dos Santos
Vice-Reitor: José Pereira Mascarenhas Bisneto
Pró-Reitora de Graduação: Karina de Oliveira Santos Cordeiro
Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação: Maurício Ferreira da Silva
4

SUMÁRIO

1 APRESENTAÇÃO ..................................................................................................... ..5


2 A NATUREZA DO TCC NO CURSO DE FILOSOFIA DA UFRB ....................... 6
3 DIFERENÇA ENTRE TCC, DISSERTAÇÃO E TESE .......................................... 9
4 O QUE É PESQUISA? .............................................................................................. 11
5 PROJETO DE PESQUISA ....................................................................................... 13
5.1 Conceito ...................................................................................................................... 13
5.2 A estrutura de um projeto de pesquisa .................................................................... 14
5.2.1 A formulação de um problema .................................................................................... 14
5.2.2 Elaboração da hipótese ................................................................................................ 21
5.2.3 O objetivo da pesquisa ................................................................................................. 24
5.2.4 Método ......................................................................................................................... 27
5.3 Os itens de um projeto de pesquisa .......................................................................... 29
5.3.1 Título ............................................................................................................................ 30
5.3.2 Introdução .................................................................................................................... 31
5.3.3 Problema de Pesquisa .................................................................................................. 31
5.3.4 Justificativa .................................................................................................................. 31
5.3.5 Hipóteses e objetivos ................................................................................................... 32
5.3.6 Método ......................................................................................................................... 33
5.3.7 Cronograma...................................................................................................................33
5.3.8 Referências ...................................................................................................................34
5.4 Estilo do texto do projeto ...........................................................................................35
5.4.1 Impessoalidade .............................................................................................................35
5.4.2 Objetividade .................................................................................................................36
5.4.3 Clareza .........................................................................................................................36
5.4.4 Precisão ........................................................................................................................36
5.4.5 Coerência .....................................................................................................................36
5.4.6 Concisão .......................................................................................................................37
5.4.7 Simplicidade..................................................................................................................37
5.5 Aspectos gráficos do projeto de pesquisa .................................................................37
5.5.1 A parte externa .............................................................................................................37
5.5.1.1 Capa .............................................................................................................................38
5.5.2 A parte interna ..............................................................................................................40
5.5.2.1 Elementos pré-textuais .................................................................................................40
5.5.2.2 Elementos textuais .......................................................................................................44
5.5.2.3 Elementos pós-textuais ................................................................................................44
5.5.3 Regras gerais (formato, paginação, citações) ................................................................44
REFERÊNCIAS............................................................................................................47
APÊNDICE - UM MANUAL DE PESQUISA, POR QUÊ?.....................................50
5

1 APRESENTAÇÃO

O Manual de Orientação para Elaboração do TCC do Curso de Filosofia da UFRB: o


Projeto de Pesquisa tem por objetivo auxiliar os alunos na confecção do TCC de Licenciatura
em Filosofia da UFRB.
A Monografia do Curso é regida pela Resolução Nº 019/2019, disponível no Site do
Curso de Filosofia (https://www.ufrb.edu.br/filosofia/documentos), que aprova o
Regulamento do TCC de Licenciatura em Filosofia da UFRB. Consta nesta Resolução que “O
Trabalho de Conclusão do Curso de Licenciatura em Filosofia deverá ser elaborado
individualmente [...], deverá ser desenvolvido necessariamente sobre um problema ou tema
relacionados às temáticas pertinentes ao Curso de Filosofia da UFRB [...] [e] deverá ser
desenvolvido sob a forma de Monografia.” (Art. 3º, § 1, § 2, 2019)
Para a elaboração do TCC é necessário que o aluno passe pelas Atividades
Formativas: “As Atividades Formativas que criarão condições para a elaboração do Trabalho
de Conclusão do Curso estão definidas na proposta pedagógica curricular do Curso como
Orientação de TCC I e Orientação de TCC II.” (Art. 4º, 2019). Um dos conteúdos
fundamentais das Atividades Formativas é a elaboração do Projeto de Pesquisa.
O Projeto de Pesquisa “[...] é o planejamento da pesquisa propriamente dito, dele
constando elementos como delimitação, fontes, metodologia, cronograma, entre outros. É
solicitado como a primeira etapa de qualquer pesquisa a ser desenvolvida.” (FONSECA,
2012, p. 15). Já uma pesquisa é “[...] um procedimento reflexivo, sistemático, controlado e
crítico, que permite descobrir novos fatos ou dados, relações ou leis, em qualquer campo do
conhecimento humano.” (ANDER-EGG, 1978, p. 21, itálico do autor, tradução nossa)
Assim, este Manual procura orientar o aluno na construção do seu Projeto de Pesquisa,
que é parte inicial do processo de elaboração do TCC do Curso de Licenciatura em Filosofia
da UFRB.
.
6

2 A NATUREZA DO TCC NO CURSO DE FILOSOFIA DA UFRB

A Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) classifica assim Monografia:

“Inclui livro e/ou folheto (manual, guia, catálogo, enciclopédia, dicionário etc.) e trabalhos
acadêmicos (teses, dissertações, entre outros).” (ABNT, NBR 6023, 2002a, p. 3)

Esse conceito de Monografia é amplo o bastante para incluir diversos tipos de


trabalhos. Tal definição advém do significado etimológico da palavra “monografia”:

“No sentido etimológico, monografia significa: monos (um só) e graphein (escrever),
dissertação a respeito de um único assunto, de modo determinado e específico.” (SABINO,
2003, p. 48- 49, grifo do auto).

“O termo monografia designa um tipo especial de trabalho científico. Considera-se


monografia aquele trabalho que reduz sua abordagem a um único assunto, a um único
problema, com um tratamento especificado.” (SEVERINO, 2014, p. 125, grifo do autor)

Nos cursos de graduação, em nível universitário, tem se aplicado o termo


“Monografia” com uma função específica:

“[...] relato de uma pesquisa, geralmente escrita como tarefa final de uma disciplina, de um
curso de graduação ou de especialização.” (FONSECA, 2012, p. 15)
7

Nesse sentido, o Regulamento do TCC de Licenciatura em Filosofia da UFRB deixa


claro no Art. 3º que o TCC é individual e de natureza monográfica:

“Art. 3º. O Trabalho de Conclusão do Curso de Licenciatura em Filosofia deverá ser


elaborado individualmente.

§ 1º. O Trabalho de Conclusão do Curso deverá ser desenvolvido necessariamente sobre um


problema ou tema relacionados às temáticas pertinentes ao Curso de Filosofia da UFRB.

§ 2º. O Trabalho de Conclusão do Curso deverá ser desenvolvido sob a forma de


Monografia.”

Ainda consta no Regulamento que são objetivos do TCC de Licenciatura em Filosofia:

“Art. 2º. O Trabalho de Conclusão do Curso tem por objetivo proporcionar à/ao estudante
oportunidade de sintetizar seus conhecimentos, competências e habilidades adquiridas ao
longo da trajetória acadêmica, necessária ao bom desempenho profissional, sendo seus
objetivos específicos:

I. Propiciar ao discente um exercício de elaboração de textos de conteúdo filosófico, com


desenvolvimento lógico, domínio conceitual e grau de profundidade compatível com a
graduação;

II. Incentivar o exercício da reflexão filosófica sobre temas e problemas da tradição,


relacionando-os com questões sócio-culturais do contexto de inserção do estudante;

III. Estimular a pesquisa em filosofia e de questões pertinentes ao seu ensino.”


8

O TCC será avaliado pela Banca a partir dos critérios contidos no Barema, disponível
nos anexos do Regulamento.

Obtido
Critérios
Escrita
Elaboração da problematização e dos objetivos
(Elaboração de uma problematização relevante para pesquisa, 2,0
delimitação e cumprimento de objetivos)
Argumentação e sequência lógica
(Apresentar argumentação em uma sequência lógica, clara, 2,0
coerente, coesa e concisa)
Correção e propriedade da linguagem
(Utilização adequada da linguagem conceitual do filósofo ou 2,0
do tema filosófico em questão)
Aspectos formais e linguísticos
(Elaboração de um texto com começo, meio e fim; que 2,0
contemple as Normas da ABNT; e adequação à norma culta da
Língua Portuguesa)

Apresentação Oral
Articulação das ideias
(Articulação conceitual e argumentativa na apresentação oral e 2,0
nas respostas dos examinadores)

TOTAL: 10,0

Consta também no Regulamento que a orientação deverá ser realizada


necessariamente por um professor do Curso de Filosofia ou por professores da UFRB com
pesquisa em Filosofia:

“Art. 12º. Os Professores Orientadores serão, obrigatoriamente, do quadro de docentes


permanentes do Curso de Licenciatura em Filosofia da UFRB ou professores da UFRB com
pesquisa em Filosofia, desde que aprovado em Reunião de Colegiado.”

Assim, o TCC de Filosofia da UFRB é um trabalho individual, desenvolvido


necessariamente sobre um problema ou tema relacionados às temáticas pertinentes ao Curso
de Filosofia da UFRB, que tem por objetivo proporcionar à/ao estudante oportunidade de
sintetizar seus conhecimentos, competências e habilidades adquiridas ao longo da trajetória
acadêmica, necessária ao bom desempenho profissional.
9

3 Diferença entre TCC, Dissertação e Tese

Sobre a diferença entre TCC, Dissertação e Tese, escreve Severino (2014):

“O Trabalho de Conclusão de Curso é parte integrante da atividade curricular de muitos


cursos de graduação, constituindo assim uma iniciativa acertada e da extrema relevância para
o processo de aprendizagem dos alunos. Para a grande maioria, ele representa a primeira
experiência de realização de uma pesquisa. Como vivência de produção, contribui
significativamente para uma boa aprendizagem.” (SEVERINO, 2014, p. 126, negrito nosso)

“Tanto no mestrado como no doutorado, a pós-graduação, stricto sensu como é aqui


considerada, exige além do cumprimento de determinada escolaridade, a realização de uma
pesquisa que se traduza, respectivamente, na dissertação e na tese. Trata-se de concretizar os
objetivos justificadores deste nível de ensino: abordar determinada problemática mediante
exigente trabalho de pesquisa e de reflexão, apoiando num esforço de fundamentação teórica
a ser assegurada através dos instrumentos fornecidos pela escolaridade. A ciência se faz
através de trabalhos de pesquisa especializada, própria das várias ciências; pesquisa que,
além de instrumental epistemológico de alto nível, exige capacidade de manipulação de um
conjunto de métodos e técnicas específico às várias ciências.” (SEVERINO, 2014, p. 133,
negrito nosso)

Ainda sobre essa diferença entre um trabalho acadêmico em nível de graduação como
o TCC e um trabalho em nível de mestrado e doutorado, escreve Severino:

“Esses trabalhos [como o TCC] são exigíveis e exigidos durante os cursos de graduação,
como parte do próprio processo didático, ao contrário das dissertações, teses e ensaios que,
embora possam ser trabalhos acadêmicos, são resultados de uma pesquisa ampla, profunda,
rigorosa, autônoma e pessoal.” (SEVERINO, 2014, p. 125)
10

Assim, uma primeira distinção entre Tese, Dissertação e TCC aponta que Tese e
Dissertação são resultados de uma pesquisa ampla, profunda, rigorosa, autônoma e pessoal; e
o TCC parte do próprio processo didático de aprendizagem, cabendo uma apresentação com
exigências mínimas de um trabalho científico. Para Lakatos e Marconi (1992):

“Alguns autores, apesar de darem o nome genérico de monografia a todos os trabalhos


científicos, diferenciam uns dos outros de acordo com o nível da pesquisa, a profundidade e a
finalidade do estudo, a metodologia utilizada e a originalidade do tema e das conclusões.
Dessa maneira, podem-se distinguir três tipos: monografia, dissertação e tese, que obedecem
a esta ordem crescente, em relação à originalidade, à profundidade e à extensão.”
(LAKATOS; MARCONI, 1992, p. 154)

Podemos dizer, então, que TCC, Dissertação e Tese são trabalhos sobre um tema
específico cuja diferença entre eles é de nível, quanto às características de originalidade,
profundidade e extensão do trabalho.

A ABNT, NBR 14724 de 2005, apresenta as seguintes definições:

Tese: “Documento que representa o resultado de um trabalho experimental ou exposição de


um estudo científico de tema único e bem delimitado. Deve ser elaborado com base em
investigação original, constituindo-se em real contribuição para a especialidade em questão.
É feito sob a coordenação de um orientador (doutor) e visa a obtenção do título de doutor, ou
similar.” (NBR 14724, 2005, p. 3)

Dissertação: “Documento que representa o resultado de um trabalho experimental ou


exposição de um estudo científico retrospectivo, de tema único e bem delimitado em sua
extensão, com o objetivo de reunir, analisar e interpretar informações. Deve evidenciar o
conhecimento de literatura existente sobre o assunto e a capacidade de sistematização do
candidato. É feito sob a coordenação de um orientador (doutor), visando a obtenção do título
de mestre.” (NBR 14724, 2005, p. 2)
11

Trabalhos acadêmicos - similares (trabalho de conclusão de curso – TCC, trabalho de


graduação interdisciplinar - TGI, trabalho de conclusão de curso de especialização e/ou
aperfeiçoamento e outros): “Documento que representa o resultado de estudo, devendo
expressar conhecimento do assunto escolhido, que deve ser obrigatoriamente emanado da
disciplina, módulo, estudo independente, curso, programa e outros ministrados. Deve ser
feito sob a coordenação de um orientador.” (NBR 14724, 2005, p. 2)

Em suma, as características essenciais de cada uma delas são as seguintes: 1) Tese:


trabalho elaborado com base em investigação original, constituindo-se em real contribuição
para a especialidade em questão. 2) Dissertação: trabalho com o objetivo de reunir, analisar e
interpretar informações, mostrando conhecimento de literatura existente sobre o assunto e a
capacidade de sistematização. 3) TCC: trabalho que deve expressar conhecimento mínimo de
um trabalho científico do assunto escolhido.

4 O QUE É PESQUISA?

De modo geral, pode-se definir pesquisa como:

“[...] um procedimento reflexivo, sistemático, controlado e crítico, que permite descobrir


novos fatos ou dados, relações ou leis, em qualquer campo do conhecimento humano.”
(ANDER-EGG, 1978, p. 21, grifo do autor, tradução nossa)

“[...] procedimento racional e sistemático que tem como objetivo proporcionar respostas aos
problemas que são propostos. A pesquisa é requerida quando não se dispões de informação
suficiente para responder ao problema, ou então quando a informação d isponível se encontra
em tal estado de desordem que não possa ser adequadamente relacionada ao problema.”
(GIL, 2002, p. 17)
12

São características gerais de uma pesquisa:

“[...] a formulação e definição de problemas; a formulação de hipóteses; a compilação,


sistematização e elaboração de dados: a formulação de deduções e proposições gerais; e,
finalmente, a análise das conclusões para determinar se elas confirmam as hipóteses
formuladas e se se enquadram no arcabouço teórico do qual se partiu.” (ANDER-EGG, 1978,
p. 21, tradução nossa)

“A pesquisa é desenvolvida mediante o concurso dos conhecimentos disponíveis e a


utilização cuidadosa de métodos, técnicas e outros procedimentos científicos. Na realidade, a
pesquisa desenvolve-se ao longo de um procedimento que envolve inúmeras fases, desde a
adequada formulação do problema até a satisfatória apresentação dos resultados.” (GIL,
2002, p. 17)

A pesquisa deve ser minimamente acessível a outras pessoas:

“Depois disso, ele [o pesquisador] enfrenta um desafio igualmente difícil: apresentá-los [os
dados] de modo que sejam inteligíveis e utilizáveis por outras pessoas” (CORRÊA DE
MORAES, 1998, p. 25)

Por fim, uma pesquisa deve, também, formar o pesquisador para pensar questões de
sua própria atualidade bem como formas de atuação, aliando teoria e prática.

“[...] questionamento sistemático crítico e criativo, mais a intervenção competente na


realidade, ou o diálogo crítico permanente com a realidade em sentido teórico e prático.”
(DEMO, 1996, p. 34)
13

5 PROJETO DE PESQUISA

5.1 Conceito

A ABNT, NBR 15287 de 2011, define os termos “projeto” e “projeto de pesquisa”:

Projeto:

“[...] descrição da estrutura de um empreendimento a ser realizado.” (NBR 15287, 2005, p. 2)

Projeto de pesquisa:

“[...] compreende uma das fases da pesquisa. É a descrição da sua estrutura.” (NBR 15287,
2005, p. 2)

Em manuais de metodologia científica encontramos as seguintes definições (ou


explicações que se aproximam de uma definição) de projeto de pesquisa que auxiliam na
compreensão de seu conceito:

“Antes de ser realizado, um trabalho de pesquisa precisa ser planejado. O Projeto é o registro
deste planejamento.” (SEVERINO, 2014, p. 125)

“[...] é o planejamento da pesquisa propriamente dito, dele constando elementos como


delimitação, fontes, metodologia, cronograma, entre outros. É solicitado como a primeira
etapa de qualquer pesquisa a ser desenvolvida.” (FONSECA, 2012, p. 15)

“O projeto é uma das etapas componentes do processo de elaboração, execução e


apresentação da pesquisa. Esta necessita ser planejada com extremo rigor, caso contrário o
investigador, em determinada altura, encontrar-se-á perdido num emaranhado de dados
colhidos, sem saber como dispor dos mesmos ou até desconhecendo seu significado e
importância.” (LAKATOS; MARCONI, 1992, p. 99)
14

“[...] o planejamento da pesquisa pode ser definido como o processo sistematizado mediante
o qual se pode conferir maior eficiência à investigação para em determinado prazo alcançar o
conjunto das metas estabelecidas. O planejamento da pesquisa concretiza-se mediante a
elaboração de um projeto, que é o documento explicitador das ações a serem desenvolvidas
ao longo do processo de pesquisa.” (GIL, 2002, p. 19)

5.2 A estrutura de um projeto de pesquisa

Em seu livro GIL (2002) observa que não existe uma estrutura fixa de projeto de
pesquisa:

“Não há, evidentemente, regras fixas acerca da elaboração de um projeto. Sua estrutura é
determinada pelo tipo de problema a ser pesquisado e também pelo estilo de seus autores.”
(GIL, 2002, p. 20)

Se não há regras fixas para elaboração de um projeto de pesquisa, a pergunta que


podemos fazer a princípio é: o que um projeto de pesquisa não pode deixar de ter? Quando
fazemos esse tipo de pergunta temos em vista a elaboração de projeto pesquisa na área de
Filosofia; então essa pergunta pode ser reelaborada da seguinte forma: o que um projeto de
pesquisa na área de Filosofia não pode deixar de ter?
Sendo assim, apresentaremos, a seguir, os principais elementos estruturais necessários
para a elaboração de um projeto de pesquisa na área de Filosofia. Os elementos apresentados
a seguir seguem uma ordem de importância.

5.2.1. A formulação de um problema

O primeiro elemento fundamental para iniciar uma pesquisa é partir de um problema


de pesquisa ou de uma questão de investigação:
15

“[...] toda pesquisa se inicia com algum tipo de problema, ou indagação.” (GIL, 2002, p.
2002, p. 23)

“A descoberta científica é, sem dúvida, provocada pela tensão gerada pelo problema. Daí a
necessidade de se estar vivenciando uma situação problema.” (SEVERINO, 2014, p. 125)

“Para elaborar o projeto, o pesquisador precisa ter bem claro o seu objeto de pesquisa, como
ele se coloca, como ele está problematizado, quais as hipóteses que está levantando para
resolver o problema, com que elementos teóricos pode contar, de quais recursos
instrumentais dispõe para levar adiante a pesquisa e quais etapas pretende percorrer. Ora,
para chegar a todos esses elementos, o pesquisador precisa vivenciar uma experiência
problematizadora.” (SEVERINO, 2014, p. 125, grifo do autor)

A vivência de uma situação problema torna a pesquisa envolvente, pois aguça a


curiosidade do aluno pesquisador. É importante que o problema de pesquisa do aluno esteja
vinculado a um problema filosófico de vida, relacionado diretamente as suas questões e
preocupações pessoais. Esse problema filosófico de vida deve sempre lhe causar espanto e
admiração (thaumázein).

Para Platão e Aristóteles a Filosofia começa justamente com o thaumázein:

“A admiração é a verdadeira característica do filósofo. Não tem outra origem a filosofia.”


(PLATÃO, 155d)

“Pelo espanto os homens chegaram agora e chegaram antigamente à origem imperante do


filosofar.” (ARISTÓTELES, A 2, 982b, 12ss, tradução nossa)
16

Nesse sentido, Heidegger em “Que é isto, a Filosofia?” (1956) explora o significado


do thaumázein para a Filosofia:

“[...] o espanto é arché – ele perpassa qualquer passo da filosofia. O espanto é páthos.
Traduzimos habitualmente páthos por paixão, turbilhão afetivo. Mas páthos remonta à
pàschein, sofrer, aguentar, suportar, tolerar, deixar-se levar por, deixar-se con-vocar por. [...]
Somente se compreendermos páthos como dis-posição (dis-position), podemos também
caracterizar melhor o thaumázein, o espanto.” (HEIDEGGER, 2009, p. 30)

Sendo assim, o problema de pesquisa, na medida em que é vinculado a um problema


filosófico de vida que causa espanto e admiração, deve ser apaixonante (páthos), deixar-nos
levar (pàschein), deixando-nos dispostos (dis-position) para investigá-lo.

É fundamental que um problema seja formulado de modo adequado. Há certas regras


de metodologia científica que podem orientar o pesquisador na sua formulação, dentre as
quais destacamos, em nosso entender, as mais adequadas na área de Filosofia:

O problema deve ser formulado como pergunta:


“Esta é a maneira mais fácil e direta de formular um problema. Além disso, facilita sua
identificação por parte de quem consulta o projeto ou o relatório da pesquisa. [...] Este
cuidado é muito importante, sobretudo, nas pesquisas acadêmicas. De modo geral, o
estudante inicia o processo da pesquisa pela escolha do tema, que por si só não constitui o
problema. Ao formular perguntas sobre o tema, provoca-se a problematização.” (GIL, 2002,
p.2002, 27)

O problema deve ser claro:


“Com frequência são apresentados problemas tão desestruturados e formulados de maneira
tão vaga que não é possível imaginar nem mesmo como começar a resolvê-los [o problema
deve ser respondível].” (GIL, 2002, p. 2002, 27)
17

O problema deve ser delimitado:


“Em muitas pesquisas, sobretudo nas acadêmicas, o problema tende a ser formulado em
termos muito mais amplos, requerendo algum tipo de delimitação. [...]” (GIL, 2002, p. 29)

A formulação do problema como pergunta indica como será a abordagem do tema


investigado. Ao se perguntar “o que é?”, pergunta-se pela essência, o sentido, o conteúdo, ou
a significação ou a definição de uma coisa, ideia ou valor. Ao se perguntar “como é?”,
pergunta-se as relações que constituem uma coisa, ideia ou valor, isto é, indaga qual é sua
estrutura. Ao perguntar “por que é?”, pergunta-se pela origem, motivos, razões ou causas de
uma coisa, ideia ou valor. Ao perguntar “para que?”, pergunta-se pela intenção ou a finalidade
de uma coisa, ideia ou valor. (Cf. CHAUÍ, 1995, p. 14-15)

Sobre a relação entre a formulação do problema em forma de questão e o tipo de


resposta relacionada a ela, observa Gentil:

“Como se sabe, uma pergunta bem formulada já é meio caminho andado para se conseguir
responder a ela. Toda pergunta já traz em sua formulação o encaminhamento da resposta. O
que se quer saber? O que precisamente quero saber? Qual é a pergunta que pretendo
responder com meu trabalho de pesquisa? Não se trata, evidentemente, de responder à
pergunta na formulação do projeto, mas no desenvolvimento posterior da pesquisa. O projeto
apresenta a pergunta, esclarece seu sentido e sua importância teórica e/ou social, indica os
caminhos que se pretendem seguir para alcançar a resposta. [...] Formular bem a pergunta
que se quer responder com a pesquisa implica refletir sobre ela, sobre seus termos, sobre as
palavras usadas e sua articulação. [...]” (GENTIL, 2005, 169-170, itálico do autor)

Outros autores pautam também regras metodológicas para a formulação do problema:

“O problema implica: ser dificuldade, ser delimitação, ser expressão de pensamento


interrogativo (dúvida, curiosidade, necessidade, admiração...).” (SALOMON, 2001, p. 218,
itálico do autor)
18

“A formulação do problema prende-se ao tema proposto: ela esclarece a dificuldade


específica com a qual se defronta e que se pretende resolver por intermédio da pesquisa. [...]
um problema deve passar pelo crivo das seguintes questões: pode ser enunciado em forma de
pergunta? [...] pode ser objeto de investigação sistemática [...]?” (LAKATOS; MARCONI,
1992, p. 103-104)

“Indique claramente o problema de pesquisa (por exemplo, dilema, questão) que orienta o
estudo. Os pesquisadores poderiam perguntar a si mesmos: ‘Há uma frase (ou frases)
específica através da qual transmitir o problema de pesquisa?’.” (CRESWELL, 2007, p. 94)

“Uma boa maneira de começar a pensar sobre a pergunta é fazer variações sobre ela, usando
os mesmos termos ou termos próximos. E listar as perguntas relacionadas, aquelas que
aparecem mais ou menos próximas e às vezes se confundem com ela a um primeiro olhar.
Assim vai-se esclarecendo a rede de questões que se liga a ela, a ‘problemática’ da qual ela
faz parte – desenha-se o campo de interrogação no qual a pergunta tem sentido e relevância.
[...] ela [a pergunta] se define como relacionada a uma tradição de pensamento, ela já
pertence a uma certa linhagem teórica.” (GENTI, 2005, 170, itálico do autor)

Se o problema é o primeiro passo para o início de uma pesquisa, pois a investigação é


uma abordagem do problema, como fica o tema? Ocorre algumas vezes que o aluno desperta
seu interesse por temas e não por problemas. Mas, qual é a relação entre o tema e o problema?

Nota Severino que todo tema deve ser problematizado, isto é, deve ser um “tema
problema”. Um tema não conduz a uma investigação, mas a sua problematização.

“[...] com uma exposição mais objetiva e técnica, colocar o problema, ou seja, como o tema
está problematizado e, consequentemente, por que ele precisa ainda ser pesquisado. Trata-se,
portanto, de delimitar, circunscrever o tema problema. O tema deve ser problematizado e é
preciso ter uma ideia muito clara do problema a ser resolvido.” (SEVERINO, 2014, p. 80,
grifo do autor)
19

Destacamos exemplos de problemas formulados em pesquisas na área de Filosofia:

“O objetivo da Dissertação é investigar, na perspectiva da Epistemologia Genética, proposta


por Jean Piaget, uma questão que elaboramos a partir de nossos estudos sobre o Ensaio de
Lógica Operatória escrito por Piaget, a saber: como o sujeito epistêmico usa e se torna capaz
de usar funções proposicionais na estruturação lógico-matemática que ele faz da realidade?
(FERREIRA, Dissertação de Mestrado, 2011, p. 7)

“O interesse pelo tema da pluralidade humana foi deflagrado por um projeto de pesquisa em
que me propunha a investigar a constituição e o significado da ação humana, que no
pensamento de Hannah Arendt é identificada com a liberdade política. O que me interessava
inicialmente era compreender como a liberdade, embora tenha um princípio subjetivo (a
capacidade que cada homem tem de por meio da ação iniciar algo novo), só pode vir a ser no
espaço intra-humano, isto é, nas relações que os homens estabelecem entre si num espaço
público de convivência.” (OLIVEIRA, Dissertação de Mestrado, 2009, p. 12)

“A metafísica do movente depara-se finalmente com o problema definitivo da tradição, qual


seja: o real é uno ou múltiplo? Tratamos enfim de analisar este problema que, além de ser o
grande entrave da metafísica tradicional, é também um dos maiores, senão o maior obstáculo
ao intérprete do pensamento de Bergson.” (MONTEIRO, Tese de Doutorado, 2014, p. 7)

“A questão que direciona a presente reflexão e, portanto, que constitui o sentid o desse
caminho de investigação, é a co-pertinência homem-Ser. A todo tempo, desde o primeiro
passo, empenha-se por deixar vir à tona o sentido da referência mútua entre Ser e homem e o
modo como essa referência se realiza. Por isso, é o tema da reflexão. [...] Ora, o homem
existe, esse é o seu modo de ser. Quem, então, estaria na possibilidade de existir, isto é, por
em obra seu modo de ser, se estivesse excluído do Ser?” (RAMOS, Dissertação de Mestrado,
2009, p. 14-15)

“Por isso para nós ainda é uma questão central no pensamento de Foucault compreender
como os processos de resistência se efetivam ante o exercício de um poder que é, sobretudo,
produtivo. Assim, como evitar que a resistência se torne uma prática assimilada pelas
20

estratégias de poder, já que ela se efetiva, sobretudo, no interior da incitação, da interdição,


da promoção, do poder. Quer dizer, restaria à resistência ser o efeito de uma causa que é o
exercício do poder, ou é possível fazer com que a resistência se mantenha como
acontecimento não assimilado pelas estratégias de poder?” (TEMPLE, Tese de Doutorado,
2011, p. 9)

A formulação de um problema é um processo criativo que depende de leituras prévias


e, no caso do aluno que se inicia na pesquisa, são fundamentais as sugestões do orientador que
tem um conhecimento mais amplo e profundo da literatura adotada.

“Por se vincular estreitamente ao processo criativo, a formulação de problemas não se faz


mediante a observação de procedimentos rígidos e sistemáticos. No entanto, existem algumas
condições que facilitam essa tarefa, tais como: imersão sistemática no objeto, estudo da
literatura existente e discussão com pessoas que acumulam muita experiência prática no
campo.” (GIL, 2002, p. 26)

O auxílio do orientador é, nesse sentido, fundamental, pois o modo como se formula


um problema depende do referencial teórico adotado, isto é, da filosofia ou do sistema
filosófico assumido para a investigação.
Cabe aqui uma distinção entre referencial teórico, bibliografia básica e bibliografia
secundária. O referencial teórico é o sistema teórico adotado para a investigação do
problema. A bibliografia básica é o conjunto dos livros fundamentais (podendo ser o estudo
de uma obra apenas) escolhidos no interior do referencial teórico. Saber escolher a
bibliografia básica é importante, pois muitas vezes o referencial teórico abarca uma extensa
bibliografia e cabe decidir quais são as obras mais relevantes para a abordagem do problema.
Por fim, a bibliografia secundária são livros e artigos de estudiosos sobre o tema que
complementam, auxiliam e dão suporte para a constituição de uma argumentação e análise
mais sólida. Esses estudiosos são especialistas na obra do filósofo, também designados
“comentadores”.
21

“Tanto o problema como a hipótese são formulados dentro do marco teórico de referência
adotado pelo pesquisador. O esboço desse marco teórico já deve existir e ser revelado no
projeto. O processo de pesquisa, particularmente nas fases do levantamento bibliográfico e
da documentação, proporcionará ao pesquisador sua complementação e reformulação.”
(SALOMON, 2001, p. 220, itálico do autor)

5.2.2 Elaboração da hipótese

Hipótese é uma resposta inicial ao problema, elaborada em forma de um enunciado


declarativo que pode ser verdadeiro ou falso.

“O passo seguinte consiste em oferecer uma solução possível, mediante uma proposição, ou
seja, uma expressão verbal suscetível de ser verdadeira ou falsa. A essa proposição dá-se o
nome de hipótese. Assim, a hipótese é a proposição testável que pode vir a ser a solução do
problema.” (GIL, 2002, p. 31)

“Elementar, mas correta, é a definição da hipótese como resposta provisória ao problema.


Como é a ‘solução’ indicada e que precisa ser comprovada pela pesquisa – daí a coleta de
dados e sua análise se fazerem em função da(s) hipótese(s) – sua formulação está
intimamente relacionada com o problema.” (SALOMON, 2001, p. 2019, itálico do autor)

A hipótese é indissociável do problema:

“Hipótese e problema formam um todo indivisível, pense-se no projeto quer metodológica,


quer teoricamente.” (SALOMON, 2001, p. 219, itálico do autor)
22

A hipótese é constituinte de todo trabalho acadêmico:

“[...] todo trabalho científico constitui um raciocínio demonstrativo de alguma hipótese, pois
é essa demonstração que soluciona o problema pesquisado.” (SEVERINO, 2014, p. 80)

São exemplos de hipóteses em projeto de pesquisa:

“A questão que guiará a investigação mais específica é, então, de saber como o sujeito
epistêmico torna-se capaz de usar funções proposicionais, principalmente para a estruturação
lógico-matemática que este sujeito elabora do Real. A nossa hipótese inicial é a de que a
lógica das relações está imbricada com a lógica das classes, a qual está, por sua vez,
estreitamente ligada à função proposicional. Essa inter-relação gera uma complexidade de
operações lógicas que serão de fundamental importância para as atividades do sujeito sobre o
mundo. Vemos, assim, que o conceito de função proposicional contribui para a lógica das
classes de das relações no que se refere a construção que o sujeito faz do Real.”
(FERREIRA, 2008, p. 17-18)

“Seguiremos no rastro da genealogia foucaultiana, acerca das governamentalidades


modernas, para deslindar as matrizes econômicas de subjetivação que estruturam as técnicas
de governo da razão de Estado e do liberalismo clássico. Nosso exame será orientado pela
hipótese de que o conceito de homo oeconomicus (agente de interesses) pode ter diferentes
matizes cujo realce nos permite refinar as distinções e as articulações das formas modernas
de ‘racionalização’ econômica do poder biopolítico.” (OLIVEIRA, 2018, p. 15)

Em um projeto de pesquisa a hipótese é uma primeira resposta que o aluno


pesquisador elabora frente ao problema formulado. Ainda que provisória, o aluno poderá
testar sua hipótese inicial de modo a reformulá-la durante o processo de investigação visando
uma resposta mais precisa e completa para o problema.
23

“[...] uma dificuldade sentida, compreendida e definida, necessita de uma resposta ‘provável,
suposta e provisória’, isto é, uma hipótese.” (LAKATOS; MARCONI, 1992, p. 104)

A elaboração da hipótese inicial e sua verificação e reformulação durante a pesquisa


exige do aluno um prévio conhecimento elementar do referencial teórico e da bibliografia
escolhida no interior do referencial teórico adotado.

“As hipóteses derivadas de teorias são as mais interessantes no sentido de que proporcionam
ligação clara com o conjunto mais amplo de conhecimento [...]” (GIL, 2002, p. 36)

Uma hipótese pode ser elaborada, também, através do exercício da intuição:

“Também há hipóteses derivadas de simples palpites ou intuições. [...] Como, porém, as


intuições, por sua própria natureza, não deixam claro as razões que as determinam, torna-se
difícil avaliar a priori a qualidade dessas hipóteses.” (GIL, 2002, p. 36)

É importante observar que hipótese não é qualquer resposta ao problema. Ela depende
de uma certa intuição, da clareza e da especificidade do enunciado elaborado inicialmente
como resposta ao problema.

“Os conceitos contidos na hipótese [...] precisam estar claramente definidos. Devem-se
preferir as definições operacionais, isto é, aquelas que indicam as operações particulares que
possibilitam o esclarecimento do conceito.” (GIL, 2002, p. 36)

“Muitas hipóteses são conceitualmente claras, mas são expressas em termos tão gerais, e com
objetivos tão pretensiosos, que não podem ser verificadas.” (GIL, 2002, p. 37)
24

5.2.3 O objetivo da pesquisa

O objetivo está relacionado diretamente ao problema formulado, isto é, o objetivo é


responder ou realizar uma análise sobre o problema formulado.

“[...] o objetivo estabelece os propósitos, a intenção e a ideia principal de uma proposta ou de


um estudo. Essa ideia se baseia em uma necessidade (o problema) e é refinada em questões
específicas (as questões de pesquisa).” (CRESWELL, 2007, p. 101)

Exemplos de relação entre problema de pesquisa e objetivo:

“Então, a questão que norteou o desenvolvimento desta Tese é: qual é o significado da


função proposicional de Frege e Russell no Tractatus (1921) de Wittgenstein? O nosso
objetivo consiste, nesse sentido, em investigar o significado do conceito de função
proposicional no Tractatus (1921).” (FERREIRA, 2016, p. 8)

“O projeto que deu origem a esta pesquisa tinha por objetivo responder a seguinte questão: a
ação tem que ter necessariamente um sujeito, isto é, uma pessoa que seja o agente da ação?”
(ZUNINO, 2010, p. 10)

Como o objetivo estabelece um propósito ou intenção de realização de uma proposta,


deve ser expresso sempre iniciado por um verbo de ação no infinitivo:

“Exemplos: analisar..., avaliar..., averiguar..., comparar..., compreender..., conhecer...,


demonstrar..., desenvolver..., distinguir..., empregar..., estudar..., expor..., identificar...,
interpretar..., introduzir..., observar..., propor... etc.” (FONSECA, 2012, p. 46)

Uma sugestão para chamar a atenção no texto para a enunciação do objetivo é utilizar
expressões como, por exemplo: “O propósito do objetivo é investigar o significado...”
25

“Use palavras como ‘propósito’, ‘intenção’ ou ‘objetivo’ para chamar a atenção para a
declaração como a ideia controladora central no estudo. Estabeleça a declaração como uma
sentença ou um parágrafo separado e use a linguagem de pesquisa empregando palavras
como “O propósito (ou intenção ou objetivo) deste estudo é (era) (será)...” (CRESWELL,
2007, p. 101)

É importante observar também que o tempo verbal muda conforme o tipo de trabalho:
em trabalhos concluídos, o tempo verbal usual é o presente ou o passado; e em projetos de
pesquisa, o temo verbal mais adequado é o tempo futuro.

“Os pesquisadores sempre usam o tempo verbal presente ou passado em artigos de periódicos
e teses, e o tempo futuro em propostas, porque eles estão apresentando um plano para
estudo.” (CRESWELL, 2007, p. 101)

Exemplo de enunciação de objetivos em projeto de pesquisa:

“O objetivo do presente projeto de pesquisa consistirá em investigar como o sujeito


epistêmico usa e se torna capaz de usar funções proposicionais, principalmente na
estruturação que faz do Real.” (FERREIRA, 2008, p. 18)

“Com base nas caracterizações das formas modernas de governamentalid ade política
empreendidas por Michel Foucault, procuraremos abstrair, para cada uma das artes modernas
de ‘governo político dos homens na forma da economia’, uma variante correlata do conceito
de homo oeconomicus enquanto matriz de subjetivação e forma de condução da conduta. É
neste sentido que seguiremos à sombra da análise foucaultiana acerca da governamentalidade
neoliberal, quando no Nascimento da biopolítica a imagem do homo oeconomicus que opera
como matriz para produção de subjetividades na ‘sociedade neoliberal’ dos nossos dias é
identificada como o “empresário de si mesmo”; com a massificação da conduta sob o signo
do ideário econômico de ‘autoinvestimento’.” (OLIVEIRA, 2018, p. 9)
26

Exemplos de enunciação de objetivos em uma pesquisa concluída:

“A metafísica do movente depara-se finalmente com o problema definitivo da tradição, qual


seja: o real é uno ou múltiplo? Tratamos enfim de analisar este problema que, além de ser o
grande entrave da metafísica tradicional, é também um dos maiores, senão o maior obstáculo
ao intérprete do pensamento de Bergson. [...]” (MONTEIRO, 2014, p. 7)

“Apesar de Heidegger, nos Seminários de Zollikon, indicar a relação do corporal com o si-
mesmo ele não a explicita, por isto tomamos esta questão como problema central da tese.
Porque a corporeidade, nos Seminários, está relacionada ao ser-no-mundo, constituição
fundamental do ser do Dasein desenvolvida em Ser e Tempo, recorremos à analítica
existencial para tratarmos desta problemática.” (COSTA, 2017, p. 9) “Nosso objetivo é
mostrar como a corporeidade é um existencial constitutivo do ser do Dasein.” (COSTA,
2017, p. 6)

Por fim, pode-se classificar os objetivos em objetivo específico e objetivo geral.

“O objetivo geral: relata onde se quer chegar com a pesquisa apresentada, isto é, qual o
resultado final (geral) que se procura alcançar. Elaborado num único parágrafo e iniciando
sempre com um verbo de ação no infinitivo.” (FONSECA, 2012, p. 46, grifo em negrito do
autor)

“Objetivos específicos: relatam os processos específicos para se alcançar o objetivo geral.


Cada objetivo deve iniciar com um verbo de ação no infinitivo, conforme descrito no item
anterior.” (FONSECA, 2012, p. 47, grifo em negrito do autor)
27

Exemplo de objetivos geral e específico em um mesmo projeto:

Objetivo geral: “[...] estudar o significado mais profundo da definição de Lógica Operatória,
proposta por Piaget, no sentido de procurar a relação da Lógica com a Epistemologia
Genética.” (FERREIRA, 2008, p. 18)
Objetivo específico: “[...] investigar como o sujeito epistêmico usa e se torna capaz de usar
funções proposicionais, principalmente na estruturação que faz do Real.” (FERREIRA, 2008,
p. 18)

Objetivo geral: “Examinar no conceito de homo oeconomicus o potencial de articulação das


diferentes formas de racionalização moderna das práticas de governo.” (OLIVEIRA, 2018, p.
15)
Objetivo específico: “Explorar a inflexão da esfera política em função do nascimento da
economia moderna (a indexação do governo político à fisiocracia e à ciência econômica).”
(OLIVEIRA, 2018, p. 15)

5.2.4 Método

Em uma primeira aproximação, pode-se dizer que método é:

“[...] o caminho a ser seguido através de uma série de operações e regras pré-definidas que
estão aptas a alcançar o resultado proposto.” (ANDER-EGG, 1978, p. 38)

“[a descrição do] [...] tipo de pesquisa a ser utilizado e os elementos necessários para a sua
realização.” (FONSECA, 2012, p. 47)
28

Em Filosofia, de modo geral, a investigação é de natureza bibliográfica:

“Em filosofia, embora se fale muitas vezes em diferentes ‘métodos’ – tais como o ‘dialético’,
o ‘hermenêutico’ ou o ‘estruturalista’, por exemplo –, de modo geral aceita-se que a
metodologia de pesquisa define-se basicamente pela leitura e a reflexão, incluindo o
levantamento bibliográfico e a seleção da bibliografia pertinente como atividades
indispensáveis.” (GENTIL, 2005, p. 173, itálico do autor)

O que é pesquisa bibliográfica?

“A pesquisa bibliográfica é aquela que se realiza a partir do registro disponível, d ecorrente


de pesquisas anteriores, em documentos impressos, como livros, artigos, teses etc. Utiliza-se
de dados ou de categorias teóricas já trabalhados por outros pesquisadores e devidamente
registrados. Os textos tornam-se fontes dos temas a serem pesquisados. O pesquisador
trabalha a partir das contribuições dos autores dos estudos analíticos constantes dos textos.”
(SEVERINO, 2014, p. 76)

Assim, de modo geral, a natureza de investigação em Filosofia inclui levantamento


bibliográfico com a seleção da bibliografia adequada do referencial teórico adotado.

Seguem exemplos de textos sobre a metodologia na área de Filosofia:

“A pesquisa é de natureza bibliográfica, com leitura, análise e fichamento dos escritos e


obras de Jean Piaget no original em francês.” (FERREIRA, 2008, p. 15)

“A prática de leitura será uma atividade constante nesta pesquisa que, sendo de caráter
filosófico, é também eminentemente teórica. Cumpre destacar que em nossa metodologia de
pesquisa assumimos a produção de notas de leitura, dirigida pelo plano de redação (disposto
no item imediatamente abaixo), como componente indispensável ao trabalho de pesquisa.
Tanto mais pelo volume de leituras constante no referencial bibliográfico.” (OLIVEIRA,
2018, p. 10)
29

Em Filosofia não é possível traçar um único método como fundamento para a


investigação filosófica. Existem diversos métodos filosóficos; por exemplo, o método
dialético, hermenêutico, estruturalista, analítico, e o intuitivo.
Sobre a diversidade de métodos em Filosofia, observa Frédéric Cossutta no livro
“Elementos para a leitura dos textos filosóficos” (2001):

“Com efeito, por definição, parece que toda obra filosófica – esta é uma característica do
gênese – elabora ou pretende elaborar as condições de sua própria validade, e portanto
enuncia as próprias regras da leitura que se pode fazer dela.” (COSSUTTA, 2001, p. 3,
itálico do autor)

5.3 Os itens de um projeto de pesquisa

A princípio os itens necessários a um projeto de pesquisa dependem de sua finalidade:

“Os itens que compõem o texto de um projeto dependem de suas finalidades, pois este pode
referir-se a uma pesquisa acadêmica ou profissional, pode destinar-se à qualificação de um
candidato a uma dissertação de mestrado ou doutorado e pode destinar-se também à
solicitação de financiamento para a pesquisa.” (GIL, 2002, p. 162)

O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pauta


como informações obrigatórias a um projeto de pesquisa1 :

“Informações obrigatórias: 1. Título do Projeto; 2. Introdução; 3. Justificativa; 4. Objetivos;


5. Métodos; 6. Resultados esperados a partir da amostra ou da informação a ser acessada; 7.
Cronograma das etapas do projeto, especificando o período das atividades de campo, se
houver; 8. Fontes de financiamento; e 9. Demais informações julgadas pertinentes.

1 Fonte: http://cnpq.br/projeto-de-pesquisa -de-acesso-ao-pg


30

Na ABNT, NBR 15287, consta como elementos textuais de um projeto o seguinte:

“O texto deve ser constituído de uma parte introdutória, na qual devem ser expostos o tema
do projeto, o problema a ser abordado, a(s) hipótese(s), quando couber(em), bem como o(s)
objetivo(s) a ser(em) atingido(s) e a(s) justificativa(s). É necessário que sejam indicados o
referencial teórico que o embasa, a metodologia a ser utilizada, assim como os recursos e o
cronograma necessários à sua consecução.” (ABNT, NBR 15287, 2011)

Nota-se o CNPq apresenta Introdução, Justificativa e Objetivos como itens distintos.


Já a ABNT chama por “parte introdutória” a apresentação do tema, o problema, a hipótese, o
objetivo e a justificativa.
Nos livros de metodologia não há também um consenso. Severino (2014, p. 80), assim
como faz o CNPq, opta por apresentar essas partes em separado, destacando-as em itens; por
outro lado, de acordo com orientações da ABNT, Gil (2002, p. 161-162) inclui no item da
Introdução os seguintes subitens: a Justificativa, a Definição e delimitação do problema, a
Revisão da literatura, e o objetivo e a hipótese.
É importante observar aqui que a decisão sobre o modo de apresentação das partes do
projeto pode atender a um gosto pessoal, de estilo, do aluno ou do orientador. Mas para
atender aos critérios exigidos por uma instituição ou agência de fomento, o projeto deve
cumprir rigorosamente a apresentação exigida.
Para este manual, optamos por apresentar todos os itens supracitados em separado,
cabendo ao aluno, ao orientador ou ao professor, a opção por uni-los ou separá-los em itens
ou subitens em função dos interesses e das necessidades do projeto.

5.3.1 Título

“[...] ainda que provisório, atribui-se um título ao Projeto, o que se prevê dar ao trabalho final
que relatará os resultados da pesquisa. O título deve expressar, o mais fielmente possível, o
conteúdo temático do trabalho. Poderá, eventualmente, ser metafórico, mas, nesses casos,
dever-se-á acrescentar um subtítulo tematicamente expressivo.” (SEVERINO, 2014, p. 80,
itálico do autor)
31

5.3.2 Introdução

A Introdução é chamada também por “Apresentação”; tem as seguintes características:

“[...] inicia-se o Projeto com uma apresentação onde se exporá sinteticamente como se
chegou ao tema de investigação, qual foi a gênese do problema, as circunstâncias que
interferiram nesse processo, por que se faz tal opção, se houve antecedentes. Esta é a parte
mais pessoal da exposição do projeto, único momento em que o pesquisador pode referir-se a
motivos de ordem pessoal”. (SEVERINO, 2014, p. 80, itálico do autor)

Entre o Título e a Introdução, alguns projetos apresentam o item “Resumo”. O


Resumo é uma apresentação sintética do projeto, com apresentação clara e sucinta do tema,
do problema, da hipótese e do objetivo.

5.3.3 Problema de Pesquisa

“[...] colocar o problema, ou seja, como o tema está problematizado e, consequentemente,


por que ele precisa ser ainda pesquisado. Trata-se, portanto, de delimitar, circunscrever o
tema problema. O tema deve ser problematizado e é preciso ter ainda uma ideia muito clara
do problema a ser resolvido.” (SEVERINO, 2014, p. 80, itálico do autor)

5.3.4 Justificativa

“[...] neste tópico do Projeto, cabe adiantar a contribuição que se espera dar com os
resultados da pesquisa, justificando-se assim a relevância e a oportunidade de sua realização,
mediante o desenvolvimento do projeto. Este é o momento de se referir então aos estudos
anteriores já feitos sobre o tema para assinalar suas eventuais limitações e destacar assim a
necessidade de se continuar a pesquisá-lo e as contribuições que o seu trabalho dará,
justificando-o desta maneira. É o que se denomina revisão da literatura, processo necessário
para que se possa avaliar o que já se produziu sobre o assunto em pauta, situando-se, a partir
daí, a contribuição que a pesquisa projetada pode dar ao conhecimento do objeto a ser
pesquisado.” (SEVERINO, 2014, p. 80, itálico do autor)
32

De modo geral, podemos dizer que a justificativa do projeto deve dar conta de três
aspectos fundamentais:
1) Importância: refere-se à importância do tema, como foi destacado no texto acima.
O pesquisador deve procurar responder honestamente a esta exigência, que não só valorizará
o seu próprio trabalho, mas também apontará caminhos ou linhas de investigação de acordo
com o problema / tema principal. A importância de um TCC no contexto de um curso de
Licenciatura em Filosofia pode depender de diversos fatores, como a relevância da História da
Filosofia em uma pesquisa que tem por objetivo debater ou estabelecer um confronto entre
duas obras ou momentos de um mesmo autor; ou da relevância de um diálogo com outras
áreas, como a Pedagogia, seja porque a pesquisa aporta uma reflexão filosófica aplicada à
escola ou mesmo elementos pedagógicos inovadores. Ainda, a pesquisa pode sugerir uma
interpretação diferente das que os comentadores estudados propõem;
2) Carência: mais do que responder à exigência de uma originalidade absoluta (o que
é infrequente no âmbito da filosofia), a justificativa do TCC pode se concentrar em mostrar a
falta de trabalhos sobre o tema / problema específico abordado, precisamente o campo no qual
o pesquisador pretende contribuir com a sua pesquisa. A carência d e estudos ou
aprofundamentos específicos é o que justifica a elaboração do trabalho;
3) Atualidade: na mesma linha de raciocínio anterior, deve-se apontar uma
atualização do problema / tema da pesquisa. Sem embargo, temas filosóficos podem ter
relevância pela sua perenidade e não pela sua atualidade: nesses casos, não adianta procurar
obstinadamente por esta última. Contudo, após a discussão histórico-filosófica dos
argumentos, o pesquisador pode destacar de que modo esse pensamento, tema ou problema se
atualiza ao ser tratado por ele.

5.3.5 Hipóteses e objetivos

“[...] em seguida, o projeto deve explicitar a(s) hipóteses(s) avançadas para a solução do
problema. Lembre-se de que todo trabalho científico constitui um raciocínio demonstrativo
de alguma hipótese, pois é essa demonstração que soluciona o problema pesquisado. À
hipótese se vincula os objetivos, ou seja, os resultados que precisam ser alcançados para que
construa toda a demonstração.” (SEVERINO, 2014, p. 80, itálico do autor)
33

5.3.6 Método

“Nesta parte, descrevem-se os procedimentos a serem seguidos na realização da pesquisa.


Sua organização varia de acordo com as peculiaridades de cada pesquisa. [...] deve-se, ainda,
esclarecer acerca do tipo de delineamento a ser adotado (pesquisa experimental,
levantamento, estudo de caso, pesquisa bibliográfica, etc.); [deve esclarecer também como
será realizada a] [...] análise dos dados: envolve a descrição dos procedimentos a serem
adotados [...] (p. ex.: análise de conteúdo, análise de discurso).” (GIL, 2002, p. 162-163)

5.3.7 Cronograma

“[...] o pesquisador deve indicar no seu projeto as várias etapas, distribuindo-os no tempo
disponível para as atividades previstas pela pesquisa, incluindo a redação final.”
(SEVERINO, 2014, p. 81)

Exemplos de Cronograma
34

5.3.8 Referências

“[...] assinale, sempre de acordo com as normas técnicas pertinentes [as Normas da ABNT]2 ,
os títulos básicos a serem utilizados no desenvolvimento da pesquisa, discriminando, se for o
caso, as fontes, os textos de referência teórica, os documentos legais etc. Ter bem claro que
esta bibliografia poderá se ampliar ao final da pesquisa, já que novos documentos poderão
ser identificados em decorrência e no desenvolvimento do processo de investigação.”
(SEVERINO, 2014, p. 81)

2Sobre as Normas da ABNT consultar o “Manual de Orientação para elaboração TCC do Curso de Filoso f ia d a
UFRB: Citação e Referências – Normas da ABNT.”
35

5.4 Estilo do texto do projeto

“Os projetos de pesquisa são elaborados com a finalidade de serem lidos por professores
pesquisadores incumbidos de analisar suas qualidades e limitações. Espera-se, portanto, que
seu estilo seja adequado a esses propósitos. Embora cada pessoa tenha seu próprio estilo, ao
se redigir o projeto, convém atentar para certas qualidades básicas da redação, que são
apresentadas a seguir.” (GIL, 2001, p. 164)

5.4.1 Impessoalidade

“O relatório deve ser impessoal. Convém, para tanto, que seja redigido na terceira pessoa.
Referências pessoais, como ‘meu projeto’, ‘meu estudo’ e ‘minha tese’ devem ser evitadas.
São preferíveis expressões como ‘este projeto’, ‘o presente projeto’ etc.” (GIL, 2001, p. 164)

Embora seja recomendável em trabalhos científico-acadêmicos a impessoalidade,


principalmente em trabalhos em ciências da natureza em que se procura isolar ao máximo a
influência do observador ou do sujeito da pesquisa, em Filosofia, a análise não pode dispensar
o papel do sujeito que a realiza. Isso quer dizer que, dependendo do contexto, pode ser
importante destacar a pessoa.
Nesse sentido, uma hipótese, uma tese ou uma conclusão pode ser coloca em primeira
pessoa de dois modos: primeira pessoa do plural (“entendemos que”, “pensamos que”,
“concluímos que”), quando a concordância é entre duas ou mais pessoas, por exemplo, entre o
aluno e seu orientador; ou primeira pessoa do singular (“entendo que”, “defendo que”, “penso
que”), quando o pesquisador elabora uma hipótese, chega a uma tese ou uma conclusão mais
pessoal (no sentido divergente de posições mais consensuais).
Mas, é importante notar que essa sua posição mais pessoal não é uma simples opinião,
mas é resultado de intuições sobre o problema a partir de um estudo prévio (no caso da
hipótese) ou resultado de uma longa análise e argumentação (no caso de teses ou conclusão
final de um trabalho).
36

5.4.2 Objetividade

“O texto deve ser escrito em linguagem direta, evitando-se que a sequência seja desviada
com considerações irrelevantes. A argumentação deve apoiar-se em dados e provas e não em
considerações e opiniões pessoais.” (GIL, 2001, p. 164)

5.4.3 Clareza

“As ideias devem ser apresentadas sem ambiguidade para não originar intepretações
diversas. Deve-se utilizar vocabulário adequado, sem verbosidade, sem expressões com
duplo sentido e evitar palavras supérfluas, repetições e detalhes prolixos.” (GIL, 2001, p.
164)

5.4.4 Precisão

“Cada palavra ou expressão deve traduzir com exatidão o que se quer transmitir [...] [Deve-se
utilizar] [...] nomenclatura técnica específica que possibilita conferir precisão ao texto.”
(GIL, 2001, p. 164)

5.4.5 Coerência

“As ideias devem ser apresentadas numa sequência lógica e ordenada. [...] Sua reação,
porém, deverá ser uniforme, iniciando-se ou com verbos ou com substantivos. O texto deve
ser elaborado de maneira harmoniosa. Para tanto, deve-se conferir especial atenção à criação
de parágrafos. Cada parágrafo deve referir-se a um único assunto e iniciar-se de preferência
com uma frase que contenha a ideia-núcleo do parágrafo – o tópico frasal. A essa ideia básica
associa-se pelo sentido outras ideias secundárias, mediante outras frases. Deve-se também
evitar a criação de um texto no qual os parágrafos sucedem-se uns aos outros como
compartimentos estanques, sem nenhuma fluência entre si.” (GIL, 2001, p. 165)
37

5.4.6 Concisão

“O texto deve expressar ideias com poucas palavras. Convém, portanto, que cada período
envolva no máximo duas ou três linhas. Períodos longos, abrangendo várias orações
subordinadas, dificultam a compreensão e tornam pesada a leitura. Não se deve temer a
multiplicação de frases, pois, à medida que isso ocorre, o leitor tem condições de entender o
texto sem maiores dificuldades.” (GIL, 2001, p. 165)

5.4.7 Simplicidade

“A simplicidade, paradoxalmente, constitui uma das qualidades mais difíceis de serem


alcançadas na redação de um relatório ou monografia. É comum as pessoas escreverem mais
para impressionar do que para expressar. [...] Essas posturas são injustificáveis. Devem ser
utilizadas apenas as palavras necessárias. O uso de sinônimos pelo simples prazer da
variedade deve ser evitado. Também se deve evitar o abuso dos jargões técnicos [...]” (GIL,
2001, p. 165)

5.5 Aspectos gráficos do projeto de pesquisa

A Norma da ABNT que normatiza o projeto de pesquisa é a NBR 15287 de 2011


intitulada “Informação e documentação – Projeto de pesquisa – Apresentação”. A NBR 15287
classifica e o projeto de pesquisa em Parte Externa e Parte Interna, e apresenta, também,
Regras Gerais para de formatação.

5.5.1 A parte externa

A Parte Externa é constituída pela capa e a lombada. A lombada é a “Parte da capa que
reúne as margens internas ou dobras das folhas, sejam elas costuradas, grampeadas, coladas
ou mantidas juntas de outra maneira; também chamada de dorso.” (ABNT, NBR 12225, 2004,
p. 1). Isto é, a lombada a encadernação propriamente dita.
38

Entendemos, porém, que para os propósitos deste Manual não é relevante a


apresentação da normatização para a lombada que podem ser consultadas na NBR 12225.
Passaremos, então, a apresentar a capa, que é item importante a ser destacado neste Manual.

5.5.1.1 Capa

Descrição:
Elemento opcional. As informações são apresentadas na seguinte ordem:
a) Nome da entidade para a qual deve ser submetido, quando solicitado;
b) Nome(s) do(s) autor(res);
c) Título;
d) Subtítulo: se houve, deve ser precedido de dois pontos, evidenciando sua
subordinação ao título;
e) Local (cidade) da entidade onde deve ser apresentado;
f) Ano de depósito (da entrega).
(Cf. ANBT, NBR 15287, 2011, p. 4)
39

Modelo de Capa
40

5.5.2 A parte interna

A parte interna do projeto de pesquisa é constituída pelos elementos pré-textuais,


elementos textuais e elementos pós-textuais.

5.5.2.1. Elementos pré-textuais

Folha de rosto

Descrição:
Elemento obrigatório. Apresenta as informações na seguinte ordem:
a) Nome(s) do(s) autor(es);
b) Título;
c) Subtítulo, se houver;
d) Tipo de projeto de pesquisa e nome da entidade a que deve ser submetido;
e) Nome do orientador, coorientador ou coordenador, se houver;
f) Local (cidade) da entidade onde deve ser apresentado;
g) Ano de depósito (da entrega).

(Cf. ANBT, NBR 15287, 2011, p. 4)


41

Modelo de Folha de Rosto


42

Sumário

Descrição:

“Elemento obrigatório. Elaborado conforme a ABNT NBR 6027.” (Cf. ANBT, NBR 15287,
2011, p. 4)

Regras gerais de apresentação:

“O sumário deve ser localizado como último elemento pré-textual [...] A palavra sumário
deve ser centralizada e com a mesma tipologia da fonte utilizada para as seções primárias. A
subordinação dos itens do sumário deve ser destacada pela apresentação tipográfica utilizada
no texto. Os elementos pré-textuais não devem constar no sumário. Os indicativos das seções
que compõem o sumário, se houver, devem ser alinhados à esquerda. Os títulos, e os
subtítulos, se houver, sucedem os indicativos das seções. Recomenda-se que sejam alinhados
pela margem do título do indicativo mais extenso. A paginação deve ser apresentada sob uma
das formas abaixo: a) número da primeira página (exemplo: 27); b) números das páginas
inicial e final, separadas por hífen (exemplo: 91-143); c) números das páginas em que se
distribui o texto (exemplo: 27, 35, 64 ou 27-30, 35-38, 64-70)” (Cf. ABNT, NBR 6027,
2003, p. 2)
43

Modelo de Sumário
44

5.5.2.2 Elementos textuais

Descrição:

“O texto deve ser constituído de uma parte introdutória, na qual devem ser expostos o tema
do projeto, o problema a ser abordado, a(s) hipótese(s), quando couber(em), bem como o(s)
objetivo(s) a ser(em) atingido(s) e a(s) justificativa(s). É necessário que sejam indicados o
referencial teórico que o embasa, a metodologia a ser utilizada, assim como os recursos e o
cronograma necessários à sua consecução.” (ANBT, NBR 15287, 2011, p. 5)

5.5.2.3 Elementos pós-textuais

Descrição:

É elementos pós-textual obrigatório as Referências. São elementos opcionais: Glossário,


Apêndice, Anexo e Índice. (Cf. ANBT, NBR 15287, 2011, p. 6)

Importante: Informações adicionais sobre a Normatização das Referências consultar o


“Manual de Normatização de Trabalhos Acadêmicos do Curso de Licenciatura em Filosofia
da UFRB: Citação e Referência – Normas da ABNT”.

5.5.3 Regras gerais

Formato
Descrição:
“Os textos devem ser digitados ou datilografados em cor preta, podendo utilizar outras cores
somente para as ilustrações. Se impresso, utilizar papel branco ou reciclado, no formato A4
(21 cm × 29,7 cm).

Os elementos pré-textuais devem iniciar no anverso da folha. Recomenda-se que os


elementos textuais e pós-textuais sejam digitados ou datilografados no anverso e verso das
folhas.
45

As margens devem ser: para o anverso, esquerda e superior de 3 cm e direita e inferior de 2


cm; para o verso, direita e superior de 3 cm e esquerda e inferior de 2 cm.

Recomenda-se, quando digitado, fonte tamanho 12 para todo o trabalho, excetuando-se as


citações de mais de três linhas, notas de rodapé, paginação, legendas e fontes das ilustrações
e das tabelas, que devem ser em tamanho menor e uniforme.

Os títulos sem indicativo numérico – errata, lista de ilustrações, lista de abreviaturas e siglas,
lista de símbolos, sumário, referências, glossário, apêndice(s), anexo(s) e índice(s) – devem
ser centralizados.”

(ANBT, NBR 15287, 2011, p. 6)

Paginação
Descrição:
“As folhas ou páginas pré-textuais devem ser contadas, mas não numeradas.

Para trabalhos digitados ou datilografados somente no anverso, todas as folhas, a partir da


folha de rosto, devem ser contadas sequencialmente, considerando somente o anverso. A
numeração deve figurar, a partir da primeira folha da parte textual, em algarismos arábicos,
no canto superior direito da folha, a 2 cm da borda superior, ficando o último algarismo a 2
cm da borda direita da folha.

Quando o trabalho for digitado ou datilografado em anverso e verso, a numeração das


páginas deve ser colocada no anverso da folha, no canto superior direito; e no verso, no canto
superior esquerdo.

Havendo apêndice e anexo, as suas folhas ou páginas devem ser numeradas de maneira
contínua e sua paginação deve dar seguimento à do texto principal.”

(ANBT, NBR 15287, 2011, p. 7)


46

Citações

Consultar o “Manual de Normatização de Trabalhos Acadêmicos do Curso de Licenciatura


em Filosofia da UFRB: Citação e Referência – Normas da ABNT”.
47

REFERÊNCIAS

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tabajadores sociales. 7 ed. Buenos Aires: Humanitas, 1978.

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para diseñar proyectos sociales y culturales. 18 ed. Buenos Aires: LUMEN/HUMANITAS,
2005.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6023: informação e


documentação: referências - elaboração. Rio de Janeiro, 2002.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 14724: informação e


documentação: trabalhos acadêmicos – apresentação. Rio de Janeiro, 2005.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 15287: informação e


documentação: projeto de pesquisa – apresentação. Rio de Janeiro, 2011.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 12225: informação e


documentação: lombada – apresentação. Rio de Janeiro, 2004.

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documentação: sumário – apresentação. Rio de Janeiro, 2003.

CHAUÍ, Marilena de Souza. Convite à filosofia. São Paulo: Ática, 1995.

CORREIA, Wilson Francisco. O TCC em três momentos: planejamento, execução


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segundo a Epistemologia Genética. 2011. 112 f. Dissertação (Mestrado em Filosofia) –
48

Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, Marília, 2009. Disponível


em<https://www.marilia.unesp.br/Home/Pos-
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HEIDEGGER, Martin. Que é isto, a filosofia? Trad. Ernildo Stein. 2 ed. Petrópolis: Vozes;
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científico: procedimentos básicos, pesquisa bibliográfica, projeto e relatório, publicações e
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LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Marina de Andrade. Metodologia do trabalho


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49

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https://repositorio.bc.ufg.br/tede/handle/tde/791. Acesso em: 11 jun. 2018.

ROTHER, Edna Terezinha; BRAGA, Maria Elisa Rangel. Como elaborar sua tese: estrutura
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SABINO, Geni Anastácio. Manual de estruturação de trabalhos científicos: projeto,


monografia, relatório, normas da ABNT. Goiânia: UEG/FUNCER/Diretoria Geral dos Cursos
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ZUNINO, Pablo Enrique Abraham. Bergson: a metafísica da ação. 2010. 307 f. Tese
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em: 11 jun. 2018.

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RECÔNCAVO DA BAHIA. Centro de Formação de


Professores. Regulamento do trabalho de conclusão do curso de licenciatura em filosofia:
anexo único da resolução CONAC Nº 027/2012. Cruz das Almas: Conselho Acadêmico,
2012.

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RECÔNCAVO DA BAHIA. Centro d e Formação de


Professores. regulamento do trabalho de conclusão do curso de licenciatura em filosofia:
anexo único da resolução CONAC Nº 019/2019. Cruz das Almas: Conselho Acadêmico,
2019.
50

APÊNDICE - UM MANUAL DE PESQUISA, POR QUÊ?

Prof. Daniel Rodrigues Ramos

A filosofia tem algo de pueril. Ela possui o desconcertante hábito de fazer a pergunta
pelo porquê de todas as coisas. Isto que é - por quê (é)? E se não é, também: por quê?
Simples na sua forma, esta pergunta recorda a busca das crianças, mas jamais definitivamente
abandona da pelos adultos: a procura de entender o sentido do mundo para nele tomar parte;
entender-se com o sentido do mundo, para junto a ele compreender-se. Sem esta busca do
querer compreender, pela qual o espírito humano amadurece, o pensar não vive, não investiga.
Deste modo, esta pergunta move a história da filosofia, dos pensadores e guia a criação de
suas obras, embora tenha a aparência de uma pergunta ingênua. Pelo contrário, como pergunta
fundamental do filosofar, ela é um poderoso móbil. Só parece ser ingênua, porque é um poder
motivador silencioso, interno, que não alardeia efeitos e nem faz propaganda de resultados
imediatos. Ela exige a disposição de espírito para acolher o que é simples, fundamental e
silencioso. A pergunta move a busca de querer compreender, então, se não for maculada a
inocência que se intriga pelo porquê tudo é ou não é. Em virtude desta pergunta, realiza-se o
empenho do filosofar, cumpre-se aquele esforço no qual o pensador emprega todas as forças
para pôr em obra a essência da filosofia. Porém, se ele guarda em si, de modo límpido, a
atitude da criança.
Assim, quem esqueceu a jovialidade da vida e se transformou em espírito pesado
bloqueou para si mesmo o caminho para o pensamento. A velhice do espírito é, pois, um dos
principais impedimentos para o filosofar. Retirando-nos o vigor da jovialidade, com este
envelhecimento vai-se embora também a inocência da criança que pergunta pela razão de
todas coisas, pelo sentido dos acontecimentos. Mas se esta inocência, bem entendida, não é a
imaturidade do espírito não desenvolvido, mas sua perfeição, é preciso cuidar de nossa
jovialidade, para aprender ir em busca das coisas da filosofia. Por isto, no aprender a
pesquisar e filosofar, o aprendiz – e quem não o é nesta arte? - tem que no começo e sempre
perguntar por que, nos tempos atuais, perdemos o vigor de nossa juventude, de nossa
inocência. Deve perguntar com Nietzsche: “Que temos em comum com o botão de rosa, que
estremece porque sobre seu corpo há uma gota de orvalho?” (2007, p. 59). Talvez, nada mais
tenhamos em comum, pois nos enrijecemos, sem saber mais corresponder com o mínimo
tremor ao apelo que incessantemente nos atinge, já que as gotas de acontecimentos caem
inevitavelmente sobre nós. Esquecemo-nos da virtude do estremecimento, uma vez que
51

deixamos a jovialidade se perder. Substituímo-la, por certo, pela empáfia, supostamente séria,
do conhecimento rigorosamente controlado, sisudo por natureza. Este problematiza, levanta
hipótese, argumenta corretamente, enfim, tudo explica. E se orgulha soberbamente das
certezas alcançadas com as suas explicações, esclarecimentos, justificações, comprovações.
Mas em tudo isto não sabe o sabor de perguntar como a criança: por quê?
O aferro à obviedade como o puro fato constatável, a crença cega em que somente os
fatos matematicamente ou cientificamente demonstráveis são verdadeiros, a obstinação pela
mera formalidade sem cultivo da evidência, o cuidado exacerbado em se acercar previamente
dos corretos instrumentos de pesquisa e assegurar-se por meio de procedimentos científico-
metodológicos para não errar e não se perder nos emaranhados caminhos do pensar, tudo isto
são sintomas de envelhecimento, de uma doença que atinge a humanidade atual, em especial,
o renomado sujeito de conhecimento. São atitudes que carcomem o espírito humano, como se
fossem poderosos venenos mortais. Elas formam um espírito muito pouco jovial e tão pouco
disposto para com a vida; educam-no sem ensina-lo a dançar, em leituras e escritas, a baila do
conhecimento, seguindo o movimento do acontecimento das coisas, dos fatos, de constituição
e transformação do mundo, da história, enfim, o ritmo pela qual soa e ressoa o sentido da
existência dos homens sobre esta terra. Aquele que, no corpo da própria existência, é por
demais inflexível para este baile de palavras, ideias e conceitos, certamente não saberá ir atrás
dos vestígios dos acontecimentos do real, isto é, investigar. Pois, tal inflexibilidade é perda do
vigor do espírito.
E como este risco de desvigoramento e morte progressiva do espírito nos ronda a toda
hora e em toda a parte, precavemo-nos, paradoxalmente, recorrendo aos rigores da ciência,
sem perguntar, em completa ingenuidade, se a “saúde” procurada com tais procedimentos
também não seria um conjunto de sintomas de um longo e contínuo envenenamento. Cremos,
assim, poder educar o espírito com as ferramentas e procedimentos do conhecer rigoroso que
os manuais nos ensinam. Assumimos, então, os manuais como verdadeiras regras de
orientação do espírito. Contra o risco, contudo, os manuais são inócuos. Eles não previnem o
envelhecimento do espírito, nem são verdadeiros antídotos que combatem a ação venenífera
que se instalou no fundo da alma do homem moderno. Pois, os manuais em nada servem para
recobrar a saúde de quem está demasiadamente carrancudo para ver e (a)colher através do
pensamento a novidade das coisas. Para quem está doente do espírito, os manuais são só
placebo, que estes sujeitos enfermos do conhecimento usam indiscriminadamente no estudo,
no ensino e na pesquisa em filosofia.
52

É verdade que nesta tarefa de aprender, ensinar e pesquisar filosofia, os manuais são
úteis. Mas não necessários. Se fossem portadores de uma atitude essencial e, portanto,
necessários, eles nos devolveriam com prontidão a inocência da criança; bastariam para nos
ensinar a pensar. Para aprendizagem do pensamento, porém, eles já chegam bem tarde e são
um auxílio só para aqueles que protegeram o gosto pela interrogação, da investigação, como
alerta Nietzsche (2007, p. 59), contra aquele espírito de gravidade, que ilude com seu ar sério,
meticuloso, solene, profundo. E atenção! Se os manuais são tomados como bulas, é ainda
maior o risco da perda força criativa do espírito, que o faz nascer incessantemente junto com a
transformação de todas as coisas, pois sua decadência permanecerá encoberta sob aparência
de um comportamento nobre e justificado. É que o envelhecimento decadente se apresentará
como vigor do espírito e não se perceberá que, na verdade, suas regras debilitam aquela
criança, sem qual não há conhecimento nem pensamento.
Talvez, hoje, para o reestabelecimento da sanidade do espírito, isto é, para restauração
de seu saber jogar e bailar com o surgimento permanente das coisas (isto é, de conascer),
condição essencial para aprender a pensar e investigar, ler e escrever em filosofia, muito mais
necessária que o rigor da ciência seja o da poesia. E, portanto, não são de manuais que o
aprendiz de pesquisa, de leitura e escrita em filosofia, deveria primeiramente se acercar, mas
de bons livros de poesia ou de obras literárias congêneres. E isto não por causa da arte e
produção cultural chamada poesia. Também a erudição nas Letras ou a posse de um
amaneirado refinamento estilístico em nada ajudam na aprendizagem do pensar, pois criar não
tem nada a ver com sentimentalismo refinado, nem com padrão estético bem-educado. E sim
em razão da fonte mesma da arte do poeta, a qual pode ser evocada com a inocência pueril, a
mesma origem do pensamento:

Sei ter o pasmo comigo


Que tem uma criança se, ao nascer
Reparasse que nascera deveras...
Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do mundo... (PESSOA, 2005, p. 19).

No poetar, experimenta-se as coisas e o mundo nascendo e se instaurando como se


fosse pela primeira vez. Na poesia, então, não se encontra menos rigor que na ciência, como
crê o entendimento vulgar. Pelo contrário, nela ainda é possível imperar uma “superioridade
de espírito vigorosa” (HEIDEGGER, 1999, p. 55), que só quando medida pelos cânones da
ciência se torna sinônimo de ingenuidade e devaneio. A mesma experiência acontece no
53

pensar do filósofo. O poeta e o filósofo possuem a mesma atitude da criança diante do mundo
e das coisas. Tal como o poeta, “um filósofo é um homem que vive, sente, escuta, suspeita e
espera e sonha sempre com coisas extraordinárias” (NIETZSCHE, 2001, p. 221). Ambos
sabem ver e experimentar o extraordinário que habita o ordinário, de tal modo que tudo perde
aquela trivialidade monótona do mero estar-aí. Poetas e filósofos, então, são aqueles que
sabem os mil tons da realidade, são capazes de ver os matizes do mundo e dos
acontecimentos. Pensar e poetar são modos diferentes de acolher o mundo, emergindo e se
constituindo em infinitas tonalidades e tons. Por certo, esta é uma das razões pelas quais um
filósofo reconhece a proximidade de sua arte de pensar com a do poeta e, ao mesmo tempo, a
comum distância das ciências: “a filosofia situa-se num domínio e num plano da existência
espiritual inteiramente diverso [das ciências]. Na mesma dimensão da filosofia e de seu modo
de pensar situa-se apenas a poesia” (HEIDEGGER, 1999, p. 54).
Dito de outro modo, poetas e filósofos são dois modos de trazer à existência, em
singular concreção a figura pueril que a prosa poética de Guimarães Rosa (2001) descreve em
As margens da alegria. Menino é o seu nome; é a condição humana no vigor do espírito,
nomeada com letra maiúscula. Assim, ele é o “o de si” de todo homem. É a unicidade do uni-
versal da humanidade. Mas é o único para qual cada homem tem que versar, conversar,
tergiversar, mas também, seguindo o “inventalínguas” roseano, “diversar”. Isto é, para este
Menino, cada homem converge e, ao mesmo temo, dele diverge. Na oposição que tenciona a
unidade do acontecimento do espírito humano na direção da universalidade e da
singularidade, o Menino nasce na história pessoal de cada homem. Nasce a cada instante da
finitude, jovializa-se. A jovialidade do Menino se lê no seu olhar, que se admira, entusiasma-
se. No seu ver, pois, o Menino tem “tudo de uma vez, e nada ante a mente” (ROSA, 2001, p.
50). Ele só quer “poder ver ainda mais vívido – as novas tantas coisas – o que para os seus
olhos pronunciavam” (ROSA, 2001, p. 50-51). E quando vê o pronunciado na clarividência
do que se mostra, este Menino ri, com todo o seu coração, na profundeza do seu ser. Tal como
acontece no prosaico acontecimento do quintal, onde impera o peru com a sua beleza:

Quando avistou o peru, no centro do terreiro, entre a casa e as árvores da


mata. O peru, imperial, dava-lhe as costas para receber sua admiração.
Estalara a cauda, e se entufou, fazendo roda: o rapar das asas no chão –
brusco, rijo, - se proclamara. Grugulejou, sacudindo o abotoad o grosso de
bagas rubras; e a cabeça possuía laivos de um azul-claro, raro, de céu e
sanhaços; e ele, completo, torneado, redondoso, todo em esferas e planos,
com reflexos de verdes metais em azul-e-preto – o peru para sempre. Belo,
belo! Tinha qualquer coisa de calor, poder e flor, um transbordamento. Sua
ríspida grandeza tonitruante. Sua colorida empáfia. Satisfazia os olhos, era
54

de se tanger trombeta. Colérico, encachiado, andando, gruziou outro gluglo.


O Menino riu, com todo o coração (ROSA, 2001, p. 51).

No sentido da experiência que guia as visões da epifania da verdade das coisas, como
esta do Menino, pesquisar em Filosofia tem uma intimidade com aprender a ver perus nos
terreiros dos campos de pesquisa, das obras dos filósofos, nas velhas questões da tradição.
Contudo, diferentemente da experiência de maravilhar-se com pavões e vagalumes, de doer-se
com a ausência deles, os manuais não tratam de coisas que se pronunciam, proclamam-se e se
transbordam na linguagem do silencioso, espantoso, inesperado. Tratam somente de um
conjunto de informações, preceitos e saberes, enfim, de tudo que foi acumulado e está à mão a
respeito de certa ciência positiva, nada mais. Assim, eles são de grande valia para alguém que
queira adentrar no ramo de uma ciência e nele se tornar um especialista. São, pois, de grande
utilidade para por em operação o que já está de ante-mão pronto, designado como
procedimentos de (re)produção. Manuais, porém, não são apenas compêndios de princípios ou
regras de uma ciência, de uma técnica, nos quais tais princípios e as regras deles decorrentes
também somente estariam dados à mão e, como tais, seriam unicamente dispositivos prontos
para o uso, para a instrumentação. Mas eles também são um convite para fazer com as mãos;
são um apelo para a atividade artesanal penosa, lenta e paciente. Oferecem caminhos e
recursos para conquistar a maestria de um artesão e buscar e investigar com as mãos (no
sentido de um corpo a corpo na aprendizagem do modo de ver e conceber próprios à dada
ciência) o sentido que rege a produção de conhecimento em determinada ciência. São convites
à concreta experiência do saber.
Contudo, nem todo pôr às mãos, colocar em operação, é criação. Os manuais ensinam,
com a maior precisão possível, uma atividade artesanal do conhecimento que é da produção,
mas não conduzem, por si só, à experiência de saber o porquê as coisas nascem, surgem,
mostram-se e imperam diante de nossos olhos. É que dispositivos não ensinam a ver algo
surgindo e se constituindo. Assumidos como dispositivos, meramente como depósitos de
saber pronto e acabado, os manuais servem somente para explicar, instrumentar, dispor para o
domínio do conhecimento certo e seguro. Neste modo de empostar o conhecer, sob a guia dos
manuais, a produção se torna, na maior parte das vezes, mera reprodução. Ao contrário, para
aquela experiência criativa da produção, diante da qual o aprendiz da pesquisa esgueira
sempre voltar para a rapidez e facilidade da reprodução, é necessária a rigorosa disposição
para nascer com aquilo que surge incessantemente, o esforço fatigante para recriar-se
constantemente. Então, conhecer é criar, se quem investiga nasce conjuntamente com aquilo
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que surge diante dos seus olhos, dando a que pensar e poetar. Para radicalmente conhecer,
nascermos cotidianamente junto ao que conhecemos, entretanto, é preciso dar um passo atrás
àquela experiência da inocência que antecede o uso dos manuais, retornar para um lugar onde
a emergência do mundo se faz pensamento e poesia. Portanto, os manuais ainda possuem o
seu porquê se “sujeito de conhecimento” não se volta cego para os fatos de uma realidade
monótona, acabada e objetivada, mas dirige os olhos para o mundo que, no milagre da
cotidianidade da vida humana, continuamente se põe e recompõe.
O lugar deste nascimento é a visão, pois é ela que “suporta e guia toda a explosão da
vida humana na totalidade do real e no universo das realizações” (CARNEIRO LEÃO, 2010,
p. 83). É claro que aqui não se tem em mente a cadeia de reações físico-químicas que a
anatomia e fisiologia dos olhos nos propiciam. É engano crer que a visão que cria e recria
nosso mundo e, junto a ele, a vida humana, fosse questão de fisiologia. Antes, essa visão é a
de nossa existência encarnada no mundo e, como belamente afirmou Merleau-Ponty, é uma
visão devoradora, digestiva, também olfativa, porque inspira e expira o ser de tudo aquilo que
vê. Por ela, o ver humano, por exemplo do pintor, é “nascimento continuado” (MERLEAU-
PONTY, 2004, p. 22). A sua questão, portanto, é a do ser, do nascer de si e das coisas: “essa
visão devoradora, para além dos ‘dados visuais’, dá acesso a uma textura do Ser da qual as
mensagens sensoriais discretas são apenas as pontuações ou as cesuras, textura que o olho
habita como o homem sua casa” (MERLEAU-PONTY, 2004, p. 20). É a visão que, remetendo-
nos num pensar condicionado pela nossa inserção junto às coisas, faz-nos habitantes do
mundo com nosso corpo vivido e da trama do ser, a nossa casa.
Enxergamos com os olhos, portanto, porque já nos foi permitida uma outra visão que
constitui todo nosso ser nas múltiplas remissões que fazemos ao mundo. É que a existência
humana, por ser um ímpeto de transcendência que nos leva junto às coisas, a tomar parte e
permanecer na proximidade delas, já sempre pertenceu ao todo. E nisto sempre já anteviu,
numa compreensão silenciosa e implícita ao nosso ser, cada coisa que faz parte de mundo
humano, antes mesmos de tomá-las à mão, fazer delas uso. Porque já nos implicamos com as
coisas nesta visão essencial, que podemos fazer das coisas dispositivos e criar dispositivos
para explicá-las. Assim, é a visão que doa clarividência a todas as lidas humanas, em suas
múltiplas formas, com as coisas, sejam elas quais forem. Também da lida chamada pesquisa,
investigação, conhecimento. Só que nestas fadigas, a rigor, o primordial não são os produtos e
as suas reproduções segundo as regras e métodos da pesquisa. Mas sim a criação espiritual do
homem, seu nascimento duradouro, conquanto tão somente se aprenda a ver a visão que está
na base de toda e qualquer produção. Então, o primordial é aprender a nascer. Para nascer, por
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sua vez, é preciso reaprender a ver, alargá-la e aprofundá-la tanto quanto possível a cada
passo da emergência da vida e do mundo, porque o homem é o único ente que tem que
renascer a todo instante.
Para a corajosa aprendizagem de desaprender a lidar com as coisas simplesmente
como dispositivos prontos para operacionalização, reprodução, o “essencial é saber ver”
(PESSOA, 2005, p. 49), como alerta o poeta. Não os manuais! Assim, os manuais de pesquisa
precisam ser lidos, compreendidos, usados com boa dose de poesia, se quisermos colocá-los a
serviço do filosofar. Pensar, porém, não é poetar. Do mesmo modo, fazer versos não é recriar
o mundo ao modo dos pensadores. Deste modo, nesta aprendizagem que desaprende para
poder aprender a pensar e pesquisar em filosofia, não vem ao caso a atitude ingênua de virar
as costas para as ciências e, nisto, para os manuais que as facilitam e ensinam aplicá-las. O
lugar vazio alcançado com este repúdio, pretende-se preenchê-lo com poesia. Isto é, submete-
se todo saber e ver aos moldes e possibilidade da “poesia” ou, melhor, a uma ausência de
qualquer regra e método a ser chamada, de modo enganoso, poesia. A poesia tem seus
próprios rigores, de um ver que se aprende, pois ela é inteiramente dependente, como todas as
demais artes e lidas humanas, do dom (de ver) que só se conquista no exercício (da visão
mesma) duradouro.
Cabe, pois, aqui uma advertência. Há muita jovialidade que se passa por livre
pensamento, zombeteiro dos rigores da ciência, sem conceder a ela o âmbito que lhe é devida.
Esta é ainda pobreza de espírito. Espírito velho travestido de jovialidade, pois apenas opõe
aos rigores da ciência a rigidez de uma atitude que admite o saber ser ainda possível se e
somente se ainda for alguma forma de “poesia” em nome de uma radical ruptura com a
tradição do pensar. Alma velha vestida de nova, ainda contaminada pelos venenos que quer
combater com a poesia, porque ainda não desceu às profundezas da visão pela qual a vida
humana explode, mas apenas se fez visão avessa às ciências. Mera aversão é cegueira que
venda os olhos para o mistério do nascer, do criar, que um dia também gerou as ciências. Por
isto, esta postura ainda está subjugada aos poderes do conhecimento técnico-científico, aos
procedimentos da tão afainada produção de conhecimento científico. Vestindo-se de atitude
libertária, na verdade, ainda não está livre para experimentar profundamente a raiz do poetar
no seu vínculo e diferença com o pensar. Neste posicionamento ingênuo não se deve decair,
quando ainda criticamente se pergunta: um manual de pesquisa, por quê?

***
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Se os manuais não são necessários, isto não quer dizer que são inúteis. Para que
servem os manuais? Para auxiliar-nos a nos introduzirmos nos métodos de pesquisa em
Filosofia. Mas para que pesquisar em Filosofia? Para aprender e ensinar filosofia. Certo, se
não sei filosofia, também não posso ensiná-la. E se não aprendo ao ensiná-la, também não
posso ser professor de filosofia. Mas para que ser professor de filosofia? Para ganhar a vida
com o suor de cada dia. E para que serve a vida ganhada com tanto suor? Ora, cada para quê
remete para outro, em um regresso ou progresso infinito, enfadonho. E é justamente nisto que
os manuais e todos os demais recursos facilitadores da árdua aprendizagem de deixar de lidar
com as coisas somente como problemas ou instrumentos se tornam extremamente inúteis. A
pergunta acima - Para que servem os manuais? – não nos levará muito longe, tão somente nos
deixará emaranhados numa rede de perguntas que nos prendem numa postura contrária ao
saber radical. Os para quês, portanto, precisam ser convertidos em por quê. Perguntemos,
então, como crianças: os manuais, por quê? Por causa da filosofia. E a filosofia, por quê? Por
causa dela mesma. Porque ela, como as coisas mais elevadas, é o inútil necessário ou a
necessidade inútil. Se preferirem, já que a ideia de utilidade fere o nosso santo pragmatismo
de cada dia, chamem-na de douta ignorantia. Mas isto também choca a nossa ideia de saber
fino, especializado, complicado, que tem aquele ar de profundidade que herdamos das
profanas ciências. Logo, permanecemos perplexos. Como nomeá-la?
Vamos voltar ao início. Os manuais são úteis como auxílio na introdução no(s)
método(s) de pesquisa em Filosofia. Métodos e pesquisa em Filosofia são, porém, aventuras
da linguagem; são lugares para fazer uma experiência da linguagem e, nelas, descobrir quem
somos nós, os únicos viventes que discursam. Certa feita, disse Heidegger (2003), que para
tanto é necessária uma experiência bem-feita da linguagem, a qual somente é possível na
linguagem mesma, por meio dela e, enfim, se nos conduzir a ela. Na linguagem, porém, já
somos e estamos. Mas “será que somos e estamos na linguagem a ponto de fazermos a
experiência de sua essência, de a pensarmos como linguagem, percebendo, numa escuta, o
próprio da linguagem? (HEIDEGGER, 2003, p. 192). Tudo que se extravia para fora desta
experiência é metalinguística, metadiscurso, metaexperiência e, pode ser, até a meta para além
do próprio método da pesquisa em Filosofia. Um caminhar que quer percorrer o caminho fora
do trajeto tortuoso e cheio de inevitáveis rodeios do caminho. Enfim, metafísica. E as coisas
se complicam nos tempos da metafísica mod erna, a nossa época. Com o tempo do domínio
técnico-científico, as aventuras da linguagem se tornaram descaminhos metafísicos. Basta
lembrar que a linguagem, nesta época, teve que ser primeiro se tornar expressão. Para quê?
Para se tornar instrumento de comunicação, abrindo a estrada para o largo desenvolvimento
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das tecnologias de comunicação. Entretanto, para seguir esta estrada, ela teve que se
transformar em matemática. E sendo transformada em número, reduziu-se em linguagem
binária, a língua dos computadores e da automatização. E, assim, ela facilita a informação,
mas transforma o pensar em combinação, em reprodução, em repetição. É do mal da
reprodução que só combinada tudo sem pensar que vive, atualmente, a pesquisa científica e
filosófica. E, assim, seguimos nos caminhos desventurosos das nossas metafísicas da
linguagem, crentes que quanto mais reproduzimos e informamos, mas sapientes nos tornamos.
Pelo contrário, nos tornamos tolos, cada vez menos sapientes do que sabemos.
E nos desviamos de novo. Voltemos, novamente, ao início. Mas voltemos
transformados pelos nossos desvios. Introdução nos métodos de pesquisa em Filosofia
somente é possível como experiência bem-feita da linguagem. Como se faz bem uma
experiência? Experiência é percurso de caminho cujo sentido se revela somente no caminhar.
Então, é só no envio da via da experiência que sabemos que a fazemos, que a
compreendemos, seu conteúdo bem como o sentido de experimentar. Por isto, façamos aqui
uma tentativa muito desajeitada de experimentar o que, com a linguagem, dizemos
“introdução ao(s) método(s) de pesquisa em Filosofia”. Provemos de fazê-la passo a passo. E
aviso: será uma aventura na linguagem que, pode, subitamente, terminar na desventura de
nada ter dito.

***

Primeiro passo: a introdução. Para fazer um projeto de pesquisa ou TCC é necessário


escrever uma breve introdução. Às vezes, fazemos a introdução ao final, quando já
descobrimos o que procurávamos. Mas não é isso que nos interessa, deixemos isto para as
páginas anteriores. Aqui queremos fazer é uma experiência da linguagem. Um modo de nela
se iniciar é buscar sua etimologia. Introdução é palavra totalmente latina. Introductio vem de
introduco; forma-se com verbo duco, -ere, (levar, conduzir) e o advérbio intro-, que nos
lembra o movimento para dentro, para o interior. Em latim, intro, -are é também o verbo
entrar em, penetrar, ultrapassar, percorrer. A língua germânica conserva o mesmo significado,
embora a mentalidade de seu povo seja tão diferente do povo latino: introdução, em alemão, é
Einführung; vem do verbo einführen, guiar (führen) ou ser guiado num movimento para
dentro (ein-). Por isto, introduzir-se é conduzir-se para dentro, transportar-se para o interior
das coisas que nos im-portam, isto é, que nos cativam e predem ao seu íntimo. Introduções
são, portanto, como um introitus, aquele movimento musical que nos levam para dentro do
espírito de uma obra musical ou aquelas antífonas, primeiras palavras que abrem os ritos
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religiosos e nos jogam, de chofre, dentro do mistério celebrad o. Muitas vezes, na música, o
introito é rompante, majestoso. De qualquer forma ou ritmo, porém, introitos são repentinos,
pois irrompem como que do nada do silêncio da orquestra. São arrombos que ressoam na
proporção da força que no silêncio estava contid o. Todos estes rodeios para dizer que
introduzir-se é como o movimento brusco e corajoso de um salto no escuro, no obscuro de
uma profundeza sem fundo – o salto da filosofia. Por isto, quem muito quer introduzir sem
saltos, jamais saberá o que é conduzir-se para dentro da filosofia. Pois, enquanto a experiência
bem-feita da linguagem, introduzir-se na filosofia só é possível filosofando, nela saltando sem
desvios e sem meios. É o que nos recorda Hegel:

Segundo uma representação natural, a filosofia, ante s de abordar a Coisa


mesma – ou seja, o conhecimento efetivo do que é em verdade – necessita
primeiro pôr-se de acordo com o conhecer, o qual se considera ou um
instrumento com que se domina no absoluto, ou um meio através do qual o
absoluto é contemplado. (...) Nos dois casos, usamos um meio que produz
imediatamente o contrário de seu fim; melhor dito, o contrassenso está antes
em recorrermos em geral a um meio. Sem dúvida, parece possível remediar
este inconveniente pelo conhecimento do modo-de-atuação do instrumento .
(...) Se através do instrumento o absoluto tivesse apenas de achegar-se a nós,
como o passarinho na visgueira, sem que nada nele mudasse, ele zombaria
deste artifício, seja não estivesse e não quisesse estar perto de nós em si e
para si. Pois, nesse caso o conhecimento seria um artificio, porque, com seu
atarefar-se complexo, daria a impressão de reproduzir algo totalmente
diverso do que só a relação imediata – relação que por isto não exige
esforço. Por outra, se o exame do conhecer – aqui representado com meio -
faz-nos conhecer a lei da refração de seus raios, de nada aind a nos serviria
descontar a refração do resultado. Com efeito, o conhecer não é desvio do
raio: é o próprio raio, através do qual, a verdade nos toca. Ao subtraí -lo, só
nos restaria a pura direção ou o lugar vazio (HEGEL, 2016, p. 69-70).

A introdução, então, não exige meios nem instrumentos. Por isto, o introduzir-se no
saber da Filosofia também não é mediação ou passo prévio para a sua aprendizagem.
Pesquisar, então, é o lance audacioso de si mesmo na in-vestigação. É salto na coisa mesma
que se procura por meio de seus vestígios. Ademais, não se corrige o medo de errar
protegendo-se do salto, de um lance imediato com o pensar, controlando-o com a busca em
querer definir de antemão, sem experiência, a essência daquilo em que se salta e em
determinar em minúcias qual será o melhor meio de a ele se achegar. Quem no pensamento
quer introduzir-se com instrumentos e meios prévios, seu erro muito maior aquilo daquele
salta em modo errante. O rigor no planejamento do salto não é zelo pela verdade. Pelo
contrário, tal zelo é um dos sintomas daquela insidiosa doença que atinge o moderno sujeito
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do conhecimento, pois “o medo da verdade poderá se ocultar-se de si e dos outros por trás da
aparência de que é um zelo ardente pela verdade” (HEGEL, 2016, p. 74).

***

2. Segundo passo: a escolha do método, pois a experiência na linguagem é sempre um


salto na filosofia segundo, deixando-nos guiar por um caminho bastante específico. Mas o
método não é aquilo que deve previamente estar determinado no projeto pesquisa, para poder
analisar os textos e as obras dos filósofos que fundamentam a base teórica de minha pesquisa?
Atenção! A ordem cronológica dos para quês não coincidem com a temporalidade originária
do salto; no tempo do pensar, tudo é simultâneo, repetição, eterno retorno do mesmo em
diferentes realizações. Se se abandona no salto, princípio de todo investigar, já se lança no
caminho da pesquisa, cujo realização já é o próprio método. O significado mais originário de
método é percurso, já o sabiam os gregos, homens experimentados nas aventuras da
linguagem. Para eles, o ές (méthodos), como denuncia sua própria língua, é transcorrer
um caminho (ὁός, hodós) do início ao fim (ά, metá), perseguindo os vestígios,
procurando obter aquilo que se vislumbrou no início do percurso. O caminho de que eles
falavam, porém, não são autoestradas dos engenheiros, mas sim como as trilhas que
serpenteiam os montes, os obstáculos, as diversas paisagens, sem a elas imprimir uma rota
planejada e estipulada, passo a passo. Nas trilhas e trilheiros, o passo-a-passo é definido pela
paisagem mesma, pelos seus obstáculos, cuja ultrapassagem solicitam os recursos e os rodeios
por eles mesmos solicitados e que, portanto, só para cada um deles são apropriados.
Trilhas são caminhos que se torcem e se contorcem, obedientes às indicações das
matas e as direções dos vales, como a água que corre humildemente nos leitos dos rios.
Somente os trilheiros, como são chamadas as trilhas em Goiás, respeitam as imposições das
árvores, dos montes, das grotas e, assim, são capazes de superar até as fraturas abertas pelos
córregos com a ponte e as pinguelas construídas pela mão humana com a mesma obediência
dos percursos e aos materiais de construção, normalmente retirados da natureza. É deste modo
que eles revelam os sentidos das paisagens, descrevem cada coisa que nelas habitam,
penetram os mundos. Portanto, eles sabem de cor, cordialmente, os segredos do método. As
trilhas, então, nos ensinam que um dos segredos mais primordiais do método é deixar o
caminho fazer o caminhante. Não o contrário.
Quisera os homens aprender estes segredos e protegê-los nas aventuras da linguagem.
Aqueles que o conseguiram se fizeram contar entre os mais hábeis na pesquisa e louváveis na
61

arte de conhecer. Mas, na maioria das vezes, eles não são os veneráveis da Academia, aqueles
homens de conhecimento apossados por um espírito demoníaco, l’esprit géométrique. Antes,
eles são sábios, homens fortes e destemidos, treinados na arte e na obediência, como um
samurai japonês. São também os homens simples do cotidiano, treinados em viver e nas lidas
que fazem aparecer o mundo por meio da das coisas que só vem à tona mediante a arte ou o
trabalho humano, tal como o lenhador com seu machado, a costureira com sua tesoura e
agulha, o açougueiro com sua faca. Por isto, para bem fazer uma experiência do método é
preciso adquirir o saber do bom cozinheiro, narrado em um texto de Chuang Tzu:

O cozinheiro do Príncipe Wen Hui estava destrinchando u m boi. Lá se f oi


uma pata, pronto, um quarto dianteiro, ele apertou com um dos joelhos, o boi
partiu-se em pedaços. Com um sussurro, a machadinha murmurou como um
vento suave. Ritmo! Tempo! Como uma dança sagrada, como “a floresta de
arbustos”. Como antigas harmonias!
“Bom trabalho”! exclamou o Príncipe. “Seu método é sem falhas”!
“Método”?, disse o cozinheiro, afastando a sua machadinha, “o que eu sigo é
o Tao, acima de todos os métodos! Quando primeiro comecei a destrinchar
bois via diante de mim o boi inteiro, tudo num único bloco. Depois de três
anos nunca mais vi este bloco, via as suas distinções. Mas, agora, nada vejo
com os olhos. Todo o meu ser aprende. Meus sentidos são preguiçosos. O
espírito, livre para operar sem planos, segue o seu próprio instinto, guiado
pela linha natural, pela secreta abertura, pelo espaço oculto, minha
machadinha descobre o seu caminho. Não corto nenhuma articulação, não
esfacelo nenhum osso”.
“Todo bom cozinheiro precisa de um novo f acão, uma vez por ano – ele
corta. Todo cozinheiro medíocre precisa de um novo a cada mês – ele
estraçalha”
“Eu sou a mesma machadinha há dezenove anos. Cortou mil bois. Sua
lâmina é tão fina como se f osse afiada há pouco. Não há espaços nas
articulações; a lâmina é fina e afiada: quando sua espessura encontra aquele
espaço, lá você encontrará todo o espaço de que precisava! Ela corta com o
uma brisa! Por isto tenho esta machadinha há 19 anos como se fora afiada há
pouco!”
“Realmente, há, às vezes, duras articulações. Vejo-as aparecendo, vou
devagar, olho de perto, segundo a machadinha atrás, quase que não mov o a
lâmina, e, vapt! A parte cai como um pedaço de terra. Então retiro a lâmina,
fico de pé, imóvel, e deixo que a alegria do trabalho penetre. Limpo a lâmina
e ponho-a de lado”.
Disse o Príncipe Wan Hui: “É isso mesmo! Meu cozinheiro ensinou-me
como devo viver a minha própria vida!” (MERTON, 2002, p. 75-78).

Introduzir-se no método é como aprender a ciência do trabalho deste cozinheiro.


Seguindo os caminhos das coisas pesquisadas, ora tem-se que seguir as conjunções das juntas,
penetrar nos seus hiatos, para poder separar o que está bem unido. Há vezes, porém que estas
juntas já nos chegam separadas, como um contexto de disjunções que, de início, não terão
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nenhuma ligação uma com a outra. Porém, para entender o boi, será necessário religá-las,
seguindo os sinais dos interstícios que elas preservam consigo. Será como encachar os gonzos
ao fechar uma janela. Outras vezes, será necessário abrir as janelas, libertar-se delas, para ver
a paisagens por elas mesmas. Mas voltando ao boi e o cozinheiro, outras vezes ainda será
necessário desencarnar o boi, preservando toda sua ossatura, para entender a estrutura que
sustenta toda a massa carnal e ligação entre os diferentes músculos. Método analítico,
sintético, fenomenológico, assim, são nomes bonitosos para estes diferentes modos de
trabalho de compreensão do boi, artesanal como a ciência do cozinheiro. Tod os eles, porém,
são inúteis se o todo o nosso ser e viver não está implicado na aprendizagem do perfazer-se e
fazer-se livre nas experiências dos caminhos. E nelas fazer do espírito a coisa mais fina deste
mundo. Também quando se lida com machadinhas e martelos.

***

3. Terceiro passo: pesquisar. Finalmente posso começar meu projeto de pesquisa! -


dirá o leitor desavisado. Seu desaviso não o fará jamais pesquisador, porque no salto e no
percurso do método toda a pesquisa já estava a caminho. É que pesquisar é investigar, tanto
que admitimos as duas palavras como sinônimos. Ambas de origem latina, mas certamente
estas duas palavras portam nuances diferentes sobre a mesma coisa para qual acenam.
Fiquemos somente com a última: investigar. O que é uma investigação. Os medievais bem o
sabiam. Basta olhas as regras dos antigos monges e o vocabulário dos pensadores medievais.
Eles falavam frequentemente de seguir as pegadas, os vestígios, os rastros que a presença
divina deixa em cada coisa e sempre reenviam a ela. Nossa linguagem policialesca ainda
guarda os resquícios desta compreensão: investigar é seguir a pistas, fazendo um caminho que
reconduz ao autor do crime ou à razão do delito. Também isto vale para o filosofar, pois nela
nada se busca se a coisa buscada não deixou seu rastro e lastro junto às coisas e realidades que
questionamos. Assim, bem sabia mesmo o que era investigar era Derzu Uzala, personagem
principal do filme de Akira Kurosawa, cujo título é o próprio nome do personagem. A partir
de uma experiência bem-feita com a natureza, era capaz prever, no interior da floresta, com
exame atento do olhar e com o olfato que quase tateava as pegad as o número dos homens
tinham feito aquele caminho e há quanto tempo teriam ali deixado as suas pegadas. Pelo
movimento dos animais, previa temporais. Os homens da expedição que guiavam, homens de
ciência, dele riam, até verem comprovados os fatos com os próprios olhos. Céticos!

***
63

Tudo isto mostra que os manuais são muito úteis, desde que seja necessário para o
pesquisador aprender a tirar deles o que eles mesmo não podem dar. Não se cria por prazer,
mas por necessidade. E isto é pensar!
Pesar é criar por necessidade, por precisão de ser si mesmo. O grande erro em que vive
a pesquisa atual: criatividade é conectar as coisas.
E quem tem ouvidos, que não me ouça! Mas sim música do logos da vida, da finita
existência dos homens sobre esta terra. E cante e dance, em leituras e escritas, a baila do
conhecimento, seguindo o movimento do acontecimento das coisas, dos fatos, de constituição
e transformação do mundo, da história, enfim, investigando o sentido porque somos ainda os
únicos viventes que sabem discursar.

Referências

CARNEIRO LEÃO, Emmanuel. Filosofia grega. Uma introdução. 1. Ed. Teresópolis:


Daimon, 2010.

HEIDEGGER, Martin. Introdução à metafísica. Trad. Emmanuel Carneiro Leão. 4 ed. Rio
de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1999.

HEIDEGGER, Martin. A caminho da linguagem. Trad. Márcia Sá Cavalcante Schuback. 1


ed. Petrópolis: Vozes; Bragança Paulista: São Francisco, 2003.

HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich. Fenomenologia do espírito. Trad. Paulo Meneses. 9 ed.
Petrópolis: Vozes; Bragança Paulista: São Francisco, 2016.

MERLEAU-PONTY, Maurice. O olho e o espírito. Trad. Paulo Neves. 1 ed. São Paulo:
Cosac & Naif, 2004.

MERTON, Thomas. A via de Chuang Tzu. 10 ed. Petrópolis: Vozes, 2002.

NIETZSCHE, Friedrich. Além do bem e do mal. Trad. Márcio Pugliese. 1 ed. Curitiba:
Hemus, 2001.

NIETZSCHE, Friedrich. Assim falava Zaratustra. Trad. Mário Ferreira dos Santos. 1 ed.
Petrópolis: Vozes, 2007.

PESSOA, Fernando. Poesia completa de Alberto Caeiro. 5 ed. São Paulo: Companhia das
Letras, 2005.

ROSA, Guimarães. Primeiras estórias. 15 ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001.

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