Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
DUAS ABORDAGENS DA FICÇÃO CYBERPUNK NO BRASIL dade Federal de Mato Grosso do Sul,
campus Três Lagoas.
Seja na forma de
comportamento social (visão de
mundo), como de suas
expressões artísticas, o
cyberpunk apresenta-se como
uma rica fonte de pesquisa para
aqueles que pretendem
compreender a cultura
contemporânea, na qual o
imaginário maquínico
apresenta-se como uma
condição sine qua non da
existência humana.
Adriana Amaral, Visões
perigosas
R G L, n. 4, fev. 2007.
119
1
Interessante pensar como as listas ciberespaço, cyborgs e poder mediático, político e econômico dos
de discussão veiculadas na Internet
podem ser úteis para um “estudo das grandes conglomerados multinacionais” (LEMOS, 2002: 200). No
reações concretas dos leitores”. Por Brasil, o cyberpunk aportou no início da década de 1990, com a tra-
exemplo, na comunidade Ficção Ci-
entífica, do website de relaciona- dução de Piratas de Dados (1990), romance escrito em 1988 por
mentos Orkut, há um tópico sobre Bruce Sterling, e Neuromancer (1991), romance escrito em 1984 por
cyberpunk brasileiro, onde encontra-
mos “reações concretas” de diver- William Gibson, sendo a obra que estabeleceu as “regras” do gênero.
sos leitores. Entretanto, não utiliza- Segundo Machado e Pageaux, um dos níveis do estudo literário
remos tal material, pois estenderia
demasiadamente nosso trabalho. comparativo é o “[...] propriamente da ‘recepção crítica’. Quando o
estudo das reações concretas dos leitores não é possível (correspon-
dência de leitores utilizável ou inquérito dirigido ao público alvo),
convém reportarmo-nos às revistas, aos jornais e a todo e qualquer
testemunho que dê uma ‘leitura’ da obra”1 (1981: 63). Entretanto,
além de revisarmos resenhas e posfácios da primeira edição brasilei-
ra das obras citadas anteriormente, também analisaremos as obras
brasileiras que dialogam com o gênero norte-americano, como, por
exemplo, Silicone XXI (1985), de Alfredo Sirkis, Santa Clara
Poltergeist (1991), de Fausto Fawcett, e Piritas siderais (1994), de
Guilherme Kujawski. Para Nitrini, “[...] o produtor é também um
receptor quando começa a escrever” (2000: 171). Ou seja, podemos
afirmar que existem dois tipos de recepção: a crítica, praticada pelos
críticos, e a criativa, executada pelos artistas. Estas serão as duas
abordagens que utilizaremos para compreender a recepção do gênero
cyberpunk na literatura brasileira.
LONDERO, R. R. p. 119-134.
120
2
to cyberpunk. Adaptação do conto “Do androids dream of eletric A paródia-homenagem deste título
originou “Andróides orgânicos terão
sheep”2 (1968), de Philip K. Dick, autor aclamado pelo movimento, cabelos no peito”, de E. R. Corrêa,
o filme também é um dos pontos de partida dos escritores brasileiros. conto cyberpunk da antologia Vinte
anos no hiperespaço (2003), cujo
A primeira obra cyberpunk brasileira, Silicone XXI, de Alfredo Sirkis, estilo lembra amenamente o de
sendo um “romance policial futurista” (como divulgado no website Fawcett, principalmente devido às
referências à cultura de massa e à
do autor), nos remete diretamente ao filme do diretor Ridley Scott, descrição do ambiente. Similar aos
cujo protagonista também é um policial, mas numa Los Angeles de escritores cyberpunk norte-america-
nos, os brasileiros também destacam
2019. a obra de Philip K. Dick como
A respeito do seu contato com a literatura cyberpunk, Fausto referencial. Enfim, como afirma
Manfredi, “não é a toa que os
Fawcett afirma que “independente do noticiário sobre William Gibson, cyberpunks incluem Philip K. Dick
eu acho que comecei a pensar nisso com Philip K. Dick. Aí, enfim, na seleta lista de autores que se sal-
vam da espinafração generalizada
tem Blade Runner”3. Mais adiante, ele afirma que “tinha essa coisa que dirigem à FC tradicional” (1991:
de tecnologia que começou com Philip K. Dick – aí tem Blade Runner, 22).
R G L, n. 4, fev. 2007.
121
6
Na verdade, divergências também Blade Runner), se aproximam da temática cyberpunk: Rollerball –
ocorrem entre escritores de mesma
nacionalidade, pois, para usarmos os Os Gladiadores do Futuro (Rollerball, Norman Jewison, 1975), Fuga
termos de Bhabha (2003), a nação é de Nova Iorque (Escape from New York, John Carpenter, 1982), Tron
um espaço pedagógico onde convi-
vem culturas performáticas. Porém, – Uma Odisséia Eletrônica (Tron, Steven Lisberger, 1982), além dos
tais divergências não são evidentes referidos anteriormente.
como aquelas notadas entre escrito-
res de nacionalidades diferentes. Apesar de pertenceram à cultura de massa norte-americana, tais
filmes formam aquilo que Ortiz (2000) denominou “memória inter-
nacional-popular”. Para ele, “afirmar a existência de uma memória
internacional-popular é reconhecer que no interior da sociedade de
consumo são forjadas referências culturais mundializadas” (ORTIZ,
2000: 126). Entretanto, tais “referências culturais mundializadas” são
assimiladas diferentemente, como nota o próprio Ortiz ao analisar o
faroeste italiano. Assim, o fato de escritores de nacionalidades dife-
rentes (norte-americana e brasileira, no nosso caso) indicarem os
mesmos precursores, mas produzirem obras peculiares, serve como
exemplo da seguinte noção que norteia os estudos literários compa-
rativos: “A idéia de influência em si deve ser relacionada diretamen-
te com a situação geral do país receptor” (MACHADO; PAGEAUX,
1981: 83). Ou seja, apesar de, por exemplo, William Gibson e Fausto
Fawcett indicarem o filme Blade Runner como inspiração, suas res-
postas são diferentes, pois vivem situações culturais, sociais e eco-
nômicas diferentes6.
Mas retornemos ao texto de Alexandre e Fernandes para desta-
car outro trecho, no qual comenta-se a respeito do segundo romance
de Sterling, The Artificial Kid (1980):
LONDERO, R. R. p. 119-134.
122
7
Em entrevista concedida pessoal-
mente ao autor.
Se o mundo globalizado e tecnológico – mas ainda pobre – que
Burgess nos deixa entrever nas páginas de seu livro mais famoso 8
Tradução livre: “[...] é uma histó-
lembra o Sprawl e a Ponte, os cenários mais famosos da literatura ria cyberpunk precoce sobre um
cyberpunk de William Gibson, não é por acaso. Os escritores anti-herói num futuro dominado pela
cyberpunks devem muito de suas temáticas a Laranja Mecânica mídia.”
– a comparação entre a alta tecnologia das classes mais
favorecidas e a dura e suja realidade dos prédios onde a classe
operária se amontoa; a opressão do Estado; o uso de drogas,
tanto para diversão e fuga da realidade quanto para lavagem
cerebral (2004: xiv).
R G L, n. 4, fev. 2007.
123
exploraria 14 anos depois em sua dissertação de mestrado: a ficção
cyberpunk como atualização do conceito mcluhaniano de aldeia glo-
bal. De fato, o termo “aldeia global” é citado duas vezes no texto.
Para Fernandes,
LONDERO, R. R. p. 119-134.
124
nentemente urbano, hoje são as cidades que se organizam como na-
ções. No interior delas algumas etnias aglutinam-se de acordo com a
origem de seus membros” (1996: 191-192).
Após discutir alguns pontos do texto de Alexandre e Fernandes,
analisaremos agora duas resenhas brasileiras do romance de Sterling:
“Cyberpunk – integração de contradições” (1992), de Roberto Cau-
so, e “Dupla cyberpunk” (1995), de Finísia Fideli. Primeiramente,
destacamos o seguinte comentário de Causo a respeito do movimen-
to cyberpunk: “Mas o movimento já está extinto e sua influência exa-
ta ainda não foi medida, embora pareça ter tido o mesmo destino do
movimento anterior, a New Wave dos anos sessenta: foi assimilado
pela ficção científica como mais um conjunto de possibilidades, en-
tre tantos outros” (1992: 20; grifo nosso). Este comentário nos ajuda
a compreender a produção nacional, pois o cyberpunk é explorado
pelos escritores brasileiros como um “conjunto de possibilidades”,
ou seja, sem compromisso com as “regras” do gênero. Isto se deve
em grande parte, como veremos adiante, à chegada tardia do gênero
no país, já extinto e com temas desgastados.
Em Piratas de Dados, a descrição de países do “terceiro mun-
do” é um ponto destacado pelos críticos brasileiros, porém Causo é o
único a formular a seguinte conclusão:
R G L, n. 4, fev. 2007.
125
9
Em entrevista concedida pessoal- o Brasil encarna bem as transfigurações por que passa a nossa
mente ao autor. sociedade contemporânea e a fórmula “informática mais
candomblé” é um bom retrato do país. A diversidade e a
pluralidade cultural, a crise política e econômica, o convívio entre
bolsões de riqueza e de pobreza, de desenvolvimento tecnológico
e de carência básica, só para citar alguns exemplos, nos coloca
diante dessa “transfiguração”.
LONDERO, R. R. p. 119-134.
126
10
que dissemos anteriormente, que “as ‘influências’, as repercussões Tradução livre: “Os anos noventa
não vão pertencer ao cyberpunk.
efetuam-se essencialmente segundo a medida das necessidades do Nós vamos estar aí trabalhando, mas
contexto receptor” (KAISER, 1989: 266-267). Ou seja, se o cyberpunk não somos o movimento, já não so-
mos nem sequer nós mesmos. Os
norte-americano é a “expressão literária paradigmática” daquilo que anos noventa vão pertencer à gera-
se denominou pós-modernidade, isto não significa que a versão bra- ção que está chegando, aqueles que
cresceram nos anos oitenta.”
sileira também o é. Como afirma Causo (s/d), a ficção cyberpunk
11
brasileira “[...] vai oferecer uma resposta própria de um país que vive Entretanto, devemos afirmar que
a própria produção norte-americana,
situação diferenciada de desenvolvimento cultural e científico, onde a partir da década de 1990, realiza
a modernização ainda esbarra em fatores que remetem aos modelos uma releitura crítica da produção
original: o pós-cyberpunk. Segundo
de nossa colonização”. Amaral (2005), as rupturas do pós-
Agora vejamos a resenha de Fideli. Nela, a autora afirma que cyberpunk são: personagens
engajados, ênfase sobre a
Piratas de Dados “[...] já apresenta uma crítica ao movimento biotecnologia e presença de uma
Cyberpunk, como sinal de amadurecimento de seu autor” (FIDELI, tecnocracia. Exemplos de ficção
pós-cyberpunk são os filmes Códi-
1995: 55). Escrito em 1988, quando o movimento encontrava-se pra- go 46 (2004), do diretor Michael
ticamente extinto, o romance de Sterling revisa criticamente a temática Winterbottom, e Aeon Flux (2005),
da diretora Karyn Kusama.
cyberpunk. Por surgirem neste período, final da década de 1980, as
12
obras brasileiras também revisam o movimento, mas ao invés de cri- As linhas gerais deste projeto fo-
ram formuladas inicialmente num
ticarem seriamente, elas criticam parodiando. Num texto sobre o fanzine comandado por Sterling.
movimento no México, Ramírez (2005) cita como epígrafe a seguin- Segundo Alexandre e Fernandes,
“nos meados da década de 80,
te afirmação de Sterling: “Los noventa no van a pertenecer al Sterling lançou um jornalzinho cha-
cyberpunk. Nosotros vamos a estar ahí trabajando, pero no somos el mado Cheap Truth, sob o pseudôni-
mo de Vicent Omniaveritas, e usou
movimiento, ya no somos ni siquiera nosotros. Los noventa van a esse espaço para descarregar todo
pertenecer a la generación que está llegando, aquellos que crecieron seu descontentamento com a FC que
se produzia na época e que, para ele,
en los ochenta”10. Com esta epígrafe, além de reverenciar o principal parecia incapaz de evoluir com as
doutrinador do gênero, o autor mexicano apropria-se da afirmação cada vez maiores e mais rápidas
mudanças na tecnologia e na socie-
para produzir uma interpretação própria, qual seja: o cyberpunk na dade” (apud STERLING, 1990:
década de 1990 é uma releitura do cyberpunk original, norte-ameri- 366).
R G L, n. 4, fev. 2007.
127
13
Expressão inglesa que significa eles dialogavam com a tradição literária do gênero, inclusive e prin-
“domínio do fã”; freqüentemente
denomina a comunidade de aficio- cipalmente com a tradição norte-americana. Para Sterling (1988), os
nados pela ficção científica. escritores cyberpunks foram provavelmente a primeira geração que
cresceu no “seio da tradição literária da ficção científica”. Tal situa-
ção não se verifica entre os escritores cyberpunks brasileiros – exceto
talvez entre aqueles que pertençam ao fandom13, como Bráulio Tavares
e Fábio Fernandes –, pois, apesar de conhecerem (e, mesmo assim,
minimamente) a tradição literária da ficção científica estrangeira, eles
desconhecem a “tradição” brasileira. Segundo Causo, “o que se la-
menta em toda história da ficção científica brasileira é a ausência de
uma evolução formal e temática que nos permitisse ter uma ficção
científica madura, capaz de contribuir para as letras nacionais como
um todo” (1993: 14). É justamente a falta de diálogo com a “tradi-
ção” brasileira que resulta nesta “ausência de uma evolução formal e
temática” e, conseqüentemente, produz obras dependentes. De acor-
do com Candido,
LONDERO, R. R. p. 119-134.
128
14
underground, da atitude dos hackers, da experiência empírica das Segundo o autor de Neuromancer,
“o problema com perguntas sobre as
tribos urbanas ligadas à tecnologia” (AMARAL, 2005: 93), enfim, a ‘influências’ é que elas são usual-
uma cultura de resistência. mente feitas para encorajar você a
falar sobre os seus escritos como se
Como Gibson14, Fawcett também utiliza estilos musicais, o rap15 você tivesse crescido em um mundo
e o funk, para narrar Santa Clara Poltergeist, por exemplo. Talvez circunscrito por livros. Eu fui influ-
enciado por Lou Reed, por exemplo,
cyberfunk seja um termo adequado para denominar as obras brasilei- tanto quanto fui influenciado por
ras, pois, como o punk nos países anglófonos, o funk também repre- qualquer escritor de ‘ficção’” (apud
AMARAL, 2005: 112). Lou Reed
senta, no Brasil, uma cultura resistente à cultura oficial ou dominante foi vocalista e guitarrista da banda
(YÚDICE, 2004). Porém, a denominação cyberfunk, por ser mais punk norte-americana Velvet
Underground.
adequada aos romances e contos de Fawcett, pode excluir os demais
15
romances cyberpunks brasileiros16. No romance-diário Copacabana
lua cheia, já no segundo parágrafo,
Agora vejamos as resenhas de Causo. Em “Cyberpunk – Fawcett afirma que “não adianta,
integração de contradições”, o autor afirma que “o resultado artístico meu pensamento é nervoso rap de
groove” (2001: 8), talvez como jus-
de Neuromancer é forte, inovador, visionário e rico em implicações. tificativa do seu estilo peculiar.
Também como fusão de uma estética pós-moderna com a imagética 16
Causo (s/d) propõe o termo
da FC, o resultado é impressionante — o que reforça a crença de que tupinipunk, também usado pela teó-
a junção da ficção literária à ficção científica pode dar um bom casa- rica norte-americana Elizabeth
Ginway (2005). Entretanto, a deno-
mento”17 (CAUSO, 1992: 26; grifo nosso). Entretanto, tal fusão ocorre minação é infeliz, pois retira do ter-
apenas parcialmente, pois mo original justamente o prefixo
(cyber) que se refere ao universo
tecnológico contemporâneo, tema de
Neuromancer é tradicional quando dá atenção ao argumento, à convergência dos romances
personagem e à narrativa (não é metaficção), mas é pós-moderno cyberpunks brasileiros. A denomina-
no modo como combina e implode os gêneros, misturando ficção ção também mantém o sufixo do ter-
científica com história de detetive, roman noir com aventura high- mo original (punk) que se refere a
tech e western (a principal personagem, Case, é descrita como um movimento musical e cultural de
caubói de computador), trama de negócios, mito e fantasia pouca relevância no cenário brasi-
(KELLNER, 2001: 388). leiro. Por fim, ao referir-se aos
tupiniquins, Causo retorna (e refor-
ça) à ideologia romântico-naciona-
lista que se verifica no projeto lite-
Em “Dupla cyberpunk”, Causo afirma que a literatura pós-mo-
rário de apenas um escritor
derna é “[...] conhecida por não enfatizar as características mais va- cyberpunk brasileiro: Ivan Carlos
Regina, mais notadamente em “O
lorizadas pela literatura tradicional, como profundidade psicológica,
caipora caipira”, conto da coletânea
leveza de estilo e elegância narrativa” (1995: 54). Certamente, Gibson, O fruto maduro da civilização
(1993). Como afirma Lucas, “[...]
em Neuromancer, não valoriza a “leveza de estilo”, porém há preo-
toda vez que a literatura brasileira
cupações com a “profundidade psicológica” das personagens, princi- envereda pelo caminho da auto-afir-
mação, procura nos resíduos
palmente nos questionamentos existenciais de Case, e com a “ele-
indianistas do nosso nativismo a fon-
gância narrativa”, principalmente no modo como os capítulos são te mais próxima” (1976: 23). Enfim,
como cyberfunk, a denominação
arranjados. Assim, Neuromancer não é totalmente pós-modernista,
tupinipunk pode excluir os demais
enquanto algumas obras brasileiras são. No prefácio de Piritas side- romances cyberpunks brasileiros.
rais, por exemplo, Kujawski afirma que o “esteticismo exacerbado 17
Este casamento entre ficção lite-
da conduta narrativa” de sua obra acaba “[...] supervalorizando o es- rária e ficção científica já era espe-
tilo em função do mote da história e transformando a linguagem em rado por Fausto Cunha há 20 anos
atrás. Em “Uma ficção chamada ci-
protagonista” (1994: 13). Isto também é válido para Santa Clara ência”, o autor afirma que o “retor-
no ao literário” é o único meio de
retirar a ficção científica (segue)...
R G L, n. 4, fev. 2007.
129
...(continuação)“[...]do Poltergeist, onde a linguagem se sobressai entre personagens super-
marginalismo cultural a que se lan-
çou com a noção ingênua da ciência ficiais e enredo simples. Enfim, esta valorização da linguagem em
como forma e como filosofia primei- detrimento da narrativa torna as obras de Fawcett e Kujawski verda-
ra” (CUNHA, 1972: 28).
deiramente pós-modernistas, pois apenas a valorização da linguagem
não as diferencia das obras modernistas.
Ainda em “Dupla cyberpunk”, Causo conclui a resenha da se-
guinte maneira:
LONDERO, R. R. p. 119-134.
130
Porque não inovam nem surpreendem, elas tendem a cultivar o
estereótipo [...] (2001: 157; grifos do autor).
Considerações finais
Ao longo do artigo, indicamos aspectos da ficção cyberpunk
valorizados pela crítica brasileira e mostramos como são desenvolvi-
dos pelo artista brasileiro. Para enriquecer o trabalho, poderíamos
comentar detalhadamente as resenhas e críticas das obras brasileiras
– como, por exemplo, “Uma FC sem clichês” (1992), resenha de Santa
Clara Poltergeist por Bráulio Tavares, e “Tupinipunk: cyberpunk
brasileiro” (s/d), crítica à ficção cyberpunk brasileira por Roberto
Causo –, mas isto extrapolaria nossos objetivos, pois se trataria de
um estudo de recepção da recepção, ou melhor, de recepção de se-
R G L, n. 4, fev. 2007.
131
gundo grau. A partir do prefácio da nova edição brasileira de
Neuromancer (2003) e das listas de discussão veiculadas na Internet,
também poderíamos analisar a recepção atual do gênero, mas isto
estenderia demasiadamente nosso trabalho.
Mas como o artista brasileiro porta-se diante do imaginário
tecnológico proposto pela ficção cyberpunk? Formulada no início do
artigo, esta pergunta comporta duas respostas, análogas a dois tipos
de intertextualidade abordados por Sant’Anna (1991): estilização e
paródia. Em alguns casos, a produção cyberpunk brasileira desvia
toleravelmente da produção norte-americana, como no uso da lin-
guagem e na descrição de um mundo dominado pela mídia. Em ou-
tros casos, há um desvio total, como nas paródias dos temas originais
da ficção cyberpunk. Enfim, a recepção do gênero na literatura brasi-
leira parece revelar-se através de divergências temáticas e conver-
gências estéticas e ideológicas.
Referências bibliográficas
LONDERO, R. R. p. 119-134.
132
____________ . Tupinipunk: cyberpunk brasileiro. S/d. Texto
mimeografado.
R G L, n. 4, fev. 2007.
133
KUJAWSKI, G. . Piritas siderais: romance cyberbarroco. Rio de
Janeiro: Francisco Alves, 1994.
LONDERO, R. R. p. 119-134.
134