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O SABER TEM DONO? Mídia e educação escolar, diálogos necessários
Maria José dos Santos (UFRN)1
RESUMO
Neste trabalho tomo como objeto de discussão e problematização as relações entre
mídia e educação, tendo a mídia como um outro lugar de saber, influenciando
juntamente com a escola e outras instituições, a formação dos indivíduos na
contemporaneidade. Questiono os impactos, desafios e os diálogos travados nos
entrelaçamentos entre esses dois campos. A mídia, suas tecnologias e linguagens se
inserem no cotidiano escolar e ao longo dos anos impõelhe desafios a serem superados.
Na reflexão esboçada aqui, volto meu olhar para as práticas construídas nos usos de
tecnologias móveis e digitais observadas em escolas da rede pública estadual de ensino
em São Luís – MA , por jovens, alunos do Ensino Médio. As tecnologias de
informação e comunicação, impulsionado sua propagação em fins dos anos 1980,
respondem por muitas das transformações ocorridas nos diferentes setores sociais. Os
usos intensificados das tecnologias operam mudanças nas formas de se pensar e viver
em sociedade e, alteram as práticas culturais, os comportamentos das pessoas e as
formas de relacionamento entre os indivíduos e desses, com seus grupos. Os jovens,
usuários potenciais das mídias na atualidade, veem, por meio de suas vivências e
práticas, modificando e atribuindo novos sentidos e significados aos espaços, tempos e
práticas escolares. Nesse bojo, as práticas escolares, em sua maioria sob um viés
tradicional, são questionadas. Novas formas de saber difusas na sociedade constituem
novas formas de aprender e, a escola não é o mais o centro do saber, convive e precisa
dialogar com outros espaços. Essas são questões que emergem no tempo presente,
colocando para a Didática enquanto atividade pedagógica que estrutura o trabalho
docente reflexões no sentido de repensar a relação escolaalunosaber na atualidade.
PALAVRASCHAVE: Mídia; Tecnologias digitais; Educação.
Escola, jovens e tecnologias: o saber circulando, outros lugares, outros tempos
A escola, em todos os tempos, possui particularidades que a situam em seu
contexto histórico e a distingue de outras escolas em temposespaços distintos e
diversificados. É uma totalidade complexa em que objetividades e subjetividades se
misturam. É um fato da cultura, permeado por significados e ações distintas e, pelas
práticas dos sujeitos que a realizam. (MELO e TOSTA, 2008).
Na contemporaneidade, uma das questões que se impõe para a escola, se
vincula às formas e lugares de aquisição do saber, esta, não é tarefa exclusiva da escola.
Outras instâncias, a exemplo da mídia, despontam como lugar do saber, espaço de
formação de indivíduos. Os canais de circulação do saber instaurados pelo mundo da
comunicação e informação transformam os modos de circulação do saber, que passam a
circular por outros canais difusos e descentralizados, propondo desafios ao sistema de
ensino, que precisa encontrar formas de diálogos com esses canais. (MARTÍN
BARBERO, 2006).
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Vem ao encontro da hipótese de que as novas formas de sociabilidades
construídas nas relações de interação dos jovens nos usos das tecnologias digitais são
formas de sociabilidades entre pares, e podem indicar um deslocamento, uma clivagem
no processo socializador escolar tradicional. Do mesmo modo, concordando com Setton
(2011, p. 14) entendo a socialização “[...] como processo educativo, que busca a
transmissão, negociação e apropriação de uma série de saberes que ajudam na
manutenção e ou transformação dos grupos e das sociedades”. Assim, a força da cultura
da mídia, não pode ser excluída do projeto educativo de formação do homem. Constitui
se, portanto, como um diálogo indispensável e prioritário.
Dialogando com a pesquisa: dados e reflexões
No processo de investigação, discussões teóricas e diálogos com os achado
do campo de pesquisa emergem novas reflexões e indagações. Compartilho as que
venho construindo a partir de análise dos dados coletados na aplicação de um
questionário com alunos nas escolas no decurso da pesquisa em foco. Utilizei o
questionário, na fase exploratória da pesquisa, pela necessidade de mapear a realidade
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em estudo. Os dados coletados nessa fase apresentaram resultados significativos para se
pensar a escola e a educação com e para a mídia.
Resguardadas as proporções no tocante às iniciativas e implementações de
programas veiculados e implantados por meio das políticas de governo pelo MEC
(Ministério da Educação) e suas secretarias, no sentido de promover a inclusão digital
no país, reitero, que minhas indagações compreendem pensar a recepção que os alunos
fazem dos produtos produzidos pela mídia e introduzidos por eles no cotidiano escolar,
por meio da linguagem, dos estilos culturais, dos modelos comportamentais, das ações e
práticas, das novas formas de sociabilidade e da apropriação e uso de tecnologias.
(MELO e TOSTA, 2008).
O questionário foi respondido por 437 alunos, nas três escolas, conforme
evidenciado anteriormente. Desses, 235 (duzentos e trinta e cinco) ou 54% respondidos
por alunas do sexo feminino e 202 (duzentos e dois) ou 46% por alunos do sexo
masculino. As questões abordando o aspecto socioeconômico demonstraram que 46%
percebe uma renda familiar variando de 1 a 2 salários mínimos, 14% de 2 a 3 salários,
17% acima de 3 salários e 11% menos de 01 salário mínimo, sendo que 13% dos alunos
optaram por não informar. Os resultados quanto a renda familiar permitem inferir sobre
uma provável equivalência no nível socioeconômico dos alunos das três escolas
pesquisadas, o que pode caracterizalos como pertencentes a grupos populares,
considerando a maioria.
Uma das formas de acesso à linguagem tecnológica é a aquisição do artefato
tecnológico, entendido como elemento constituidor de cultura e, não meramente
ferramenta. Ao serem perguntados sobre possuir ou não celulares, 86% dos alunos
afirmaram possuir o aparelho, desses, 66.59% possuem 01 aparelho e 19.45% tem de 02
a mais aparelhos. Desses, 11.70% aparelhos comuns, 44.41% aparelhos comuns com
internet e 43.88% smartphones, totalizando, portanto, 88.29% com acesso a internet.
Importa destacar que o celular agrega funções diversas e, a miniaturização dessa
tecnologia abre novas possibilidades de comunicação móvel.
Ao se apropriarem das tecnologias, os jovens, intensificam seus usos e
constroem novas formas de expressão e de linguagem. Pretto (2011, p. 105106)
considera a importância das mudanças no ato da escrita “[...] O próprio ato de escrever
modificase, a exemplo do intenso uso do dedo polegar para digitar as mensagens nos
celulares. Os mais antigos ainda olham para o teclado de um celular com a ideia de
"datilografar" ou digitar, usando os dedos indicadores”. Este fato, a meu ver, altera
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significativamente a relação do aluno com os processos de aprendizagem e, coloca
desafios para a escola e sua proposta pedagógica. É preciso pensar novos processos e
formas de aprender.
Outras questões focavam as formas de uso das tecnologias digitais. Nesse
sentido, 60% dos alunos declararam usar o celular com mais frequência para falar com
amigos, 54% para fazer ligações, 62% passar SMS Short Message Service (Serviço de
Mensagem Curta), 52.4% acessar redes sociais e 62% para ouvir musica/MP3. Os usos
menos frequentes foram: 22% enviar emails, 35% para jogos e 30% ouvir rádio. A
presença das mídias digitais nos espaços escolares tem se intensificado nas práticas dos
alunos. Entretanto, é possível inferir que o diálogo entre as práticas escolares e as
práticas culturais dos alunos tem se mostrado tenso, por vezes, conflituoso.
Nesse sentido, Dayrell (2001) chama a atenção para o fato da escola
enquanto instituição gestar uma proposta pedagógica com viés homogeneizante, que,
homogeneíza o aluno e, perde de vista que esses são sujeitos históricos, com vivências,
que não se apagam quando adentram os espaços escolares, mas estão incorporadas em
seus hábitos. Os alunos utilizam os produtos gerados pela mídia e inserem esses
produtos no cotidiano escolar de formas bastante específicas e singulares, são marcas
que traduzem expressões dos sentidos do ser jovem na atualidade.
Essas, imiscuídas às práticas escolares, introduzem outras linguagens,
distintos estilos culturais, modelos comportamentais e de sociabilidade forjados nas
apropriações e usos das tecnologias. Tais ações sinalizam novos saberes, construídos em
espaços para além da sala de aula e, tempos que ultrapassam os tempos pedagógicos.
São novas temporalidades e, parecem indicar formas de anunciação da sua presença no
mundo, de sua necessidade de participação, de ser ouvido. (SCHWERTNER e FISHER,
2012).
As discussões teóricas abordando a problemática mídia e educação, para
além dos limites e encantamentos, apontam caminhos de diálogos, que a meu ver
indicam um novo olhar sobre as práticas didáticopedagógicas. Destaco, então,
concordando com Pretto (PRETTO e PINTO, 2006,) sobre a demanda por novas
“educações”. A qual se inscreve na convivência com uma juventude denominada
geração alt+tab , uma geração com capacidade de processamentos simultâneos,
articulada em tribos diversas, que opera com outras e novas temporalidades.
Algumas considerações: para não concluir
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O debate se encontra aberto, e, os limites deste trabalho não permitem o
aprofundamento da questão. As multiplicidades e complexidades envolvendo os campos
da educação e da mídia ainda precisam ser melhor problematizadas. Muitos estudos
veem sendo desenvolvidos nessa área e permitem a ampliação do olhar sobre a questão,
agregam elementos à discussão e, fornecem pistas para se pensar os diálogos possíveis
entre esses.
As iniciativas e propostas governamentais, por meio de políticas de inclusão
digital, precisam ser absorvidas pelo currículo da escola, a partir do olhar dos
professores e demais agentes educativos. O aluno, sujeito no processo de aquisição e
produção de aprendizagem, precisa ser ouvido, considerado em suas vivências,
historicidade e saberes construídos nas relações estabelecidas em seus grupos. O saber
descentralizado, difuso, fragmentado, sob o domínio de diferentes canais, abre
possibilidades de construções de aprendizagens por diferentes e distintos atores. A
escola tem muito a ganhar no diálogo com a mídia. Um dos diálogos possíveis é pensar
a educação no plural.
Afinal o mundo contemporâneo é plural, dinâmico, fluido. A educação não
pode ser única, visto que os sujeitos são múltiplos e distintos. Há um longo e rico
caminho a ser percorrido, importa caminhar...
REFERENCIAS
DAYRELL, Juarez. Múltiplos olhares sobre educação e cultura. Belo Horizonte:
Editora UFMG, 2001.
DAYRELL, Juarez. A ESCOLA “FAZ” AS JUVENTUDES? reflexões em torno da
socialização juvenil. Educação & Sociedade, Campinas, v. 28, n. 100 Especial, p.
11051128, out. 2007. Disponível em <http://www.cedes.unicamp.br>. Acesso em
outubro de 2012.
MELO, José Marques de e TOSTA, Sandra Pereira. Mídia e Educação. Belo
Horizonte: Autêntica Editora, 2008. (Coleção Temas & Educação).
PRETTO, Nelson de Luca. O desafio de educar na era digital: educações. Revista
Portuguesa de Educação, 2011, 24(1), pp. 95118 © 2011, CIEd Universidade do
Minho.
PRETTO, Nelson de Luca e PINTO, Cláudio da Costa. Tecnologias e novas
educações. Revista Brasileira de Educação v. 11 n. 31 jan./abr. 2006.
SCHWERTNER. Suzana Feldens e FISCHER, Rosa Maria Bueno. JUVENTUDES,
CONECTIVIDADES MÚLTIPLAS E NOVAS TEMPORALIDADES. Educação
em Revista. Belo Horizonte, v.28, n.01, p.395420, mar. 2012. Disponível em:
http://www.scielo.br/pdf/edur/v28n1/a17v28n1.pdf.
SETTON, Maria da Graça. Mídia e Educação. São Paulo: Contexto, 2011.
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Doutoranda em Educação do Programa de Pós Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte, na Linha de pesquisa: Educação, Linguagem e Formação do Leitor. Bolsista Fundação
de Amparo à Pesquisa e Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão (FAPEMA).
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Para a realização da pesquisa, foram selecionadas as três escolas públicas estaduais com melhor
classificação no ranking do Exame Nacional de Ensino Médio (ENEM).
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