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VERNIZES EM LUTERIA

Prof. Vlamir Devanei Ramos


VERNIZES

1. Verniz e suas funções


2. O “segredo desconhecido”
3. Preparação da madeira
4. Vernizes nos períodos da luteria italiana
5. Tipos básicos de vernizes
6. Classificação dos vernizes à óleo
7. Comportamento dos óleos vegetais
8. Preparação dos vernizes à óleo
9. Cuidados na preparação
10. Receitas de vernizes - a álcool
- à essência
- a óleo
11. A “Vernice Bianca” de Simoni Fernando Sacconi
12. Vernizes com resinas naturais e alquídicas

1 – VERNIZ E SUAS FUNÇÕES

Em luteria, entende-se por verniz, a solução elástica, resistente e não


pigmentada (verniz verdadeiro), à base de resinas e gomas dissolvidas em um
solvente, empregada para proteger, decorar e embelezar o instrumento de
cordas.

Antiqüíssimos documentos citam o emprego e conhecimento de vernizes por


parte dos assírios, caldeus, egípcios, gregos e romanos.
Os egípcios principalmente, fizeram largo uso de verniz dissolvendo resinas em
óleo.

A mais antiga receita de verniz que se conhece, foi escrita na idade média pelo
monge beneditino Teófilo (1100 dC), registrada em seu escrito “Schedula
diversarum artium” e indica com precisão a preparação de um verniz,
cozendo-se sandaraca com óleo de linhaça.

Segundo alguns autores, o verniz também tem a função de influenciar na


sonoridade, modificando algumas características das madeiras empregadas na
construção destes instrumentos, mas este fato, está mais relacionado com o
processo de envernizamento como um todo.

2 – O “SEGREDO DESCONHECIDO”

Simoni Fernando Sacconi, em seu livro “I SEGRETI DI STRADIVARI” – Libreria Del


Convegno – Cremona 1979, no capítulo “ Verniciatura”, narra suas experiências
em relação aos violinos de Antonio Stradivari.
Conforme sua descrição, o verniz que recobre estes instrumentos, por sua
singular beleza, conseqüência de uma transparência e mudança de cor através
dos tempos, tem despertado a fantasia dos luteristas e apaixonados por luteria
em todo o mundo e, a partir do momento em que se pensou em relacionar suas
características à sonoridade, surgiram as mais variadas estranhas e absurdas
hipóteses, desde receitas vendidas como autênticas pela charlatanice da
alquimia até o mito do “segredo desconhecido”, sacramentando a falência
de tantos esforços e estudos.

Como o verniz usado por Stradivari era o mesmo dos mestres cremonenses do
século XVI até meados do século XVIII ( de Amati até Guarneri del Gesù), a
única diferença estava na aplicação estratificada (camadas diferentes), que
além de ser usada também por outros luthiers, em nada alterava acusticamente
o instrumento.
Observou também que, tanto violinos desgastados pelo uso e pelo tempo, às
vezes quase sem verniz, quanto outros muito menos tocados e portanto mais
conservados e com camada de verniz bem espessa possuíam as mesmas
características sonoras e o mesmo rendimento, concluindo que não era o
verniz que influenciava sobre o som, a ponto de modificá-lo positivamente
como se imaginava.
Essa conclusão foi a chave para que as pesquisas tomassem outro rumo.

Muitos pesquisadores erraram em relação ao verniz, por se basearem em


vernizes dos séculos XIX e XX para tentar reconstituir aquele de Cremona.

Não obtendo sucesso nas pesquisas, muitos se voltaram para escritos antigos
sobre vernizes com receitas dos séculos XVI, XVII e XVIII, como os tratados de
Alessio Il Piemontese (1550), Fioravanti (1564), Zahn e Kunckel (por volta de
1685), padre Domenico Auda (1633 – época em que surge a goma-laca),
Christoff Love Morley (l692), Vincenzo Coronelli (1693), Adalberto Tilkowski
(1700), padre Filippo Bonanni (1700 - 1723) e outros.
Acontece que nenhum destes autores escreveram sobre vernizes para
instrumentos musicais e nenhuma de suas receitas para usos diversos, sequer
se aproximavam dos vernizes dos luthiers cremonenses.
Tudo isto não trouxe nenhuma ajuda, ao contrário, complicou ainda mais.

Ainda segundo Sacconi, os tempos modernos trouxeram tecnologia e


progresso científico que permitiram análises químicas dos componentes tanto
qualitativamente quanto quantitativamente, mas não conseguiram revelar quais
eram os componentes (a origem dos elementos químicos) e tampouco, o
procedimento de preparação.

A análise era feita sobre um corpo de substâncias, sem saber que aquela
mistura, o verniz que estava no instrumento e feito especificamente para ele,
era o resultado final de um procedimento complexo, constituído pela
estratificação de diversas composições, aplicadas em tempos e modos
diferentes.

Na verdade, aquele que é chamado de verniz cremonense, constitui-se de


substâncias totalmente diferentes entre si, com características específicas,
aplicadas ao instrumento em tempos diversos e formando estratos
sobrepostos, entre os quais não se forma nenhuma mistura, mesmo que
parcial, por absorção.

Há de se observar, diz Sacconi, que os instrumentos de Guarneri Del Gesù,


mesmo sendo menos cientificamente equilibrado em suas relações, repete a
robustez e vigor do som dos Stradivari, embora com outro timbre.

3 – PREPARAÇÃO DA MADEIRA

Partindo então para outra linha de investigação, Sacconi descobre que além
dos vários cuidados observados durante a construção, antes da aplicação do
verniz, era na preparação da madeira que estava a causa do comportamento
sonoro ou “segredo” dos instrumentos de Stradivari.

Entre a madeira e o verniz, sempre aparece uma substância de bela cor


canela, que mesmo nos pontos onde há desgaste do verniz, a madeira
continua intacta e limpa, sem marcas de deterioração pelo suor e gorduras da
mão. Também onde há desgaste no tampo, provocado pela barba, por não
existir até então a queixeira, a madeira se mantém praticamente sem desgaste,
significando que a substância utilizada produzia impermeabilização,
endurecimento e cristalização das fibras da madeira, conferindo à esta, uma
maior capacidade de vibrar, mediante uma pronta reação do tampo e do fundo,
movimentos estes determinantes para a capacidade sonora do timbre do
instrumento.
Instrumentos com espessuras sutilíssimas possuem capacidade fantástica de
emissão sonora e potência, mesmo após séculos de construção, condição esta
impensável nos instrumentos sem esse tratamento.
Ainda segundo Sacconi, isto é de capital importância, porque com espessuras
grossas, como se impõe à madeira não tratada, o som em relação aos
instrumentos de Stradivari resulta duro, lenhoso e sem qualidade. Com essas
mesmas espessuras grossas, se a madeira receber tratamento, o som fica
ainda mais duro que com madeira ao natural.
Se ao contrário, a espessura for fina e sem tratamento, o som resulta fraco,
sem vida e cavernoso. Já com o tratamento, como já foi dito, o som mesmo
resultando escuro, conserva inalterado seu vigor.
Um exemplo são os violoncelos de Stradivari que possuem tampo harmônico
de apenas 3 mm a 3,5 mm de espessura.

Espessuras sutis fazem com que a madeira perca resistência e coesão das
fibras, mas no caso dos instrumentos de Stradivari, a despeito das condições
de uso através do tempo, intervenções até mal feitas e mudanças climáticas
pela migração por vários países, nunca perderam seu primitivo vigor.

A preparação da madeira antes da aplicação do verniz era um procedimento


conhecido há séculos pelos luthiers, e em cada região, era feita de diversas
maneiras:
. Alemães e alguns italianos – usavam uma aplicação de água de cola
(gelatina).
. Alemães de Mittenwald - desde 1700 e até hoje, alguns utilizam cola diluída
mas a maioria utiliza uma camada de óleo de linhaça (duas no tampo),
deixando-se secar (oxidar) até adquirir coloração dourada.
. Ingleses – aplicavam uma camada de verniz sem cor, mas com leve tom de
amarelo, na tentativa de conseguir o reflexo dourado dos cremonenses.
. Gasparo da Salò, Maggini e italianos de outras regiões - usavam leite de
figo dissolvido em essência de terebintina.
. Franceses – até hoje usam cola (gelatina).

Após a preparação, era e ainda é comum a aplicação de um verniz amarelo


com a intenção de imitar os cremonenses, porém esta prática faz com que a
madeira perca reflexos.

Stradivari preparava a madeira não para embelezá-la, mas seu objetivo era
conseguir um endurecimento das fibras em toda sua estrutura e com isso
promover a cristalização das mesmas e a impermeabilização da superfície.

A análise química indicou importante quantidade de silício e todos os


componentes da potassa (hidróxido de potássio ou também carbonato de
potássio), mostrando ser uma substância vitrosa, o que Sacconi julgou ser
silicato de potássio e de cálcio.
Para conseguir essa substância, os antigos dissolviam silício de solo
vulcânico, carbono (carvão) e potassa (que preparavam com cinza de caule e
ramos de videira), e dissolviam em água em quantidade adequada para
penetrar nos poros da madeira. Era uma solução muito utilizada em fazendas
para conservar ovos. Onde a madeira era mais porosa, havia maior absorção e
maior endurecimento. Onde as fibras eram mais densas, duras e a madeira
menos porosa, a absorção era menor, o que segundo Sacconi, promovia um
nivelamento das condições da madeira.

Após a preparação, ocorria a aplicação do verniz propriamente dito sobre a


superfície da madeira em sutis estratos, que por simples evaporação dos
solventes ou por oxidação (no caso de vernizes à óleo), formava uma película
protetora com características específicas.

As descrições feitas por Sacconi são constantemente questionadas por muitos


luthiers, alguns chegando à total rejeição de suas pesquisas até mesmo na
Itália, mas o fato é que tudo o que foi escrito por ele, é resultado de análise
técnica e não pode ser desprezado.
Suas cuidadosas observações influenciam o mundo da luteria até hoje e por
esse trabalho, mesmo morando nos Estados Unidos e sendo romano, recebeu
do Conselho Comunal de Cremona o título de “ cidadão honorário” no ano
de 1972.
Título de “CIDADÃO HONORÁRIO CREMONENSE” concedido pelo
“CONSIGLIO COMUNALE DI CREMONA” a SIMONI FERNANDO SACCONI
como gratidão e reconhecimento ao trabalho de pesquisa e divulgação dos
segredos de ANTONIO STRADIVARI.
4 – VERNIZES NOS PERÍODOS DA LUTERIA ITALIANA

A luteria italiana pode ser subdividida em três períodos históricos, com base em
certos aspectos de sua evolução, tais como bombatura, forma, “ff”, proporções
e outros que se modificaram através dos tempos a fim de se conseguir mais
funcionalidade e com isso atender às expectativas musicais de cada época.
Essa evolução inclui tipos diferentes de vernizes, com grande evidência de
certas escolas de luteria:

. “antico-classico” - (século XVII até primeira metade do século XVIII)


representado pelas luterias de Bréscia, Cremona, Veneza, Nápoles, Milão,
Toscana e Bolonha.
Predominância de vernizes à óleo e essência de terebintina em relação aos
vernizes com ceras, resinas e álcool etílico ou mistura de alcoóis.

. “ottocento” – (segunda metade do século XVIII até final do século XIX)


representado pelas luterias de Torino, Cremona, Toscana e Veneza.
Predominância de vernizes à óleo e essência de terebintina em relação a
resinas e ceras com mudanças das proporções em relação ao período anterior.

. “moderno” – (final do século XIX até hoje) representado pelas luterias de


Milão, Bolonha, Mântova e Cremona.
Predominância de vernizes com resinas e álcool etílico, ou mistura de alcoóis,
em relação aos óleos secativos e essência de terebintina. As ceras
praticamente não existem.

Estes períodos revelaram luthiers de excelente capacidade operativa, grande


talento e trabalho de altíssimo nível.
Embora os conceitos de preparação da madeira sejam diferentes entre si, são
sempre os mesmos que já eram usados há séculos.

Sobre essas alterações dos vernizes, Gabriele Carletti considera “uma gradual
evolução e continuidade com alterações das proporções de seus componentes, sendo
incorreta a hipótese muito difundida e aceita de que no primeiro período o verniz era
somente à óleo e nos períodos sucessivos passou a ser somente a álcool”.

De acordo com Lauro Malusi, resumidamente as características principais dos


vernizes italianos são:

- Cremonense – transparente e luminoso, amarelo-vermelho, vermelho-


sangue, vermelho-marrom e âmbar.

- Bresciano – transparente e luminoso, em geral marrom ou vermelho


marrom.

- Veneziano - transparente e brilhante, amarelo claro, alaranjado, amarelo-


vermelho e vermelho-marrom pálido.

- Napolitan – transparente, similar ao cremonense e de cor amarelo escuro,


amarelo-marrom, amarelo ambarado e vermelho-marrom.
- Toscanos e milanêses – transparentes e com cores claras.

- Bolonheses – similares aos de Bréscia mas menos transparentes.

- Tiroleses – Steiner e Klotz , são de cores amarelo-claro e amarelo-marrom.


Os Albani são marrom amarelado, marrom-vermelho e marrom escuro,
tendendo para o negro.

As substâncias corantes usadas pelos antigos luthiers, eram geralmente


extraídas de vegetais (madeiras, frutos secos e flores), que adequadamente
tratadas com “mordentes” (alúmens), eram chamadas de “lacas”, cuja
característica era colorir mantendo a transparência e luminosidade dos
vernizes.

5 – TIPOS BÁSICOS DE VERNIZES

Existem três tipos básicos de vernizes em luteria:

- à base de álcool
- à base de essência
- à base de óleo.

Vernizes à álcool

São aqueles em que as resinas naturais são dissolvidas em álcool etílico,


podendo-se agregar pequena quantidade de essência de terebintina.
A película se forma pela evaporação do álcool, resultando num composto de
resinas, cuja quantidade utilizada varia de acordo com os resultados que se
desejam, e nunca é inferior a 20% do volume de álcool.
Pode-se adicionar corantes naturais ou artificiais com certa facilidade.
Normalmente os vernizes à álcool são frágeis e sem consistência, mas existem
boas receitas com resultados excelentes para luteria.
O verniz à álcool mais comum é o de goma-laca, muito utilizado para
finalização ou polimento.

Vernizes à essência

São os que utilizam essência de terebintina como solvente.


È necessário controlar a quantidade de essência a ser utilizada a fim de se
obter sucesso.
Colocando-se um pouco de verniz sobre uma placa de vidro ou mármore e em
pouco tempo tornar-se semi-fuído e sem granulações, a quantidade é
considerada boa. Ao contrário, se estiver com muita fluidez, está com excesso
de solvente . Se ficar compacto e denso, deve-se acrescentar solvente.
Vernizes à óleo

Os vernizes à óleo ou óleoresinosos, conhecidos também como vernizes


graxos, são constituídos de uma solução ou dispersão de uma ou mais resinas
em óleo secativo adicionado de essência de terebintina como solvente.

Os óleos secativos são os que devido à alta porcentagem de ácidos graxos


insaturados, principalmente o ácido linoléico, possuem a propriedade de em
contato com o ar, se polimerizarem, produzindo um produto sólido (linoxina) e o
processo de oxidação, é acelerado pela adição de catalisadores (secantes).
Por essa propriedade, são empregados na preparação de vernizes e tintas,
formando películas finas e resistentes.

Os óleos secativos mais conhecidos são: linhaça, oiticica, rícino (mamona),


tungue (tung) ou óleo chinês de madeira, cânhamo, girassol, semente de
tabaco, de abeto e outros.

O óleo de linhaça é o mais conhecido desde a antiguidade, porém o óleo de


tungue, também é conhecido desde o século XVI como protetor da madeira.

O tungue é uma planta originária do extremo oriente e cresce quase


espontaneamente e muito rapidamente na China, sendo que atualmente, é
produzido na América do Sul também, principalmente no Paraguai e Argentina.
Produz óleo altamente tóxico (venenoso) e obviamente não comestível, de cor
amarelo claro.
Qualitativamente para a produção de vernizes é considerado inferior ao de
linhaça, porém seca mais rápido, podendo ser misturado a ele.

O óleo de tungue é hoje sem dúvida, o maior concorrente do óleo de linhaça.

6 – CLASSIFICAÇÃO DOS VERNIZES À ÓLEO

Os vernizes à óleo são classificados como magros, semi magros e graxos.

Magros – chamados de “curto-óleo”, possuem uma relação óleo-resina de 1:1,


ou seja, a quantidade de resina é igual à quantidade de óleo, resultando numa
película bastante sólida, elástica, mas pouco resistente à umidade e ao calor.
São mais utilizados como verniz de fundo ou de base.

Semi-magros – chamados de “médio-óleo”, possuem relação entre 0,5 e 1:1,


produzindo película de média solidez, transparente e resistente. Podem ser
utilizados como vernizes de fundo, como também de acabamento ou
finalização.

Graxos – chamados “longo-óleo”, possuem relação entre 0,2 e 0,4:1, e


produzem película de elevada resistência e impermeabilidade.
Neste caso especificamente, é importante utilizar um composto de óleo de
linhaça cozido (cotto) com outro óleo mais insaturado como o óleo de tungue,
por exemplo, a fim de acelerar a secagem, aumentar a resistência e o brilho.
Por suas características, são apropriados como vernizes de acabamento.

7 - COMPORTAMENTO DOS ÓLEOS VEGETAIS

Em contato com a atmosfera, os óleos vegetais se modificam pela auto-


oxidação, mas quando aquecidos a altas temperaturas, o processo da oxidação
se acelera, ocorrendo reações de oxipolimerização e decomposição termo-
oxidativa (rancinização), o que também é observado durante a fase de refino
dos óleos vegetais.

Segundo Hellin e Pilar Rueda (1984), as modificações e alterações dos óleos


podem ser classificadas como:

. Auto-oxidação – oxidação que ocorre a temperaturas inferiores a 100ºC,


incluindo a temperatura ambiente.

. Polimerização térmica – oxidação que ocorre a temperaturas que variam


entre 200ºC e 300ºC, na ausência de oxigênio.

. Oxidação térmica – oxidação que ocorre na presença de oxigênio a altas


temperaturas (oxipolimerização).

. Modificações físicas – as ocorridas nas propriedades físicas do óleo.

. Modificações nutricionais – as que ocorrem nos aspectos fisiológicos e


nutricionais dos óleos, o que não é caso dos vernizes.

. Modificações químicas – podem ser de três tipos:

a) hidrólise dos triacilgliceróis – resulta na liberação de ácidos


graxos, glicerina, mono e diglicerídeos.
b) Oxidação – ocorre nos ácidos graxos com ligações duplas
(insaturados).
c) Polimerização – extensa condensação de monômeros de ácidos
graxos polinsaturados a altas temperaturas por períodos prolongados
(caso da preparação de vernizes).

A polimerização ou oxipolimerização e secagem do óleo, tem como


conseqüência a formação de linoxina, resina plastificante do óleo secativo, que
juntamente com outras resinas vegetais duras, são fundamentais para a
preparação do verniz na luteria.
8 – PREPARAÇÃO DOS VERNIZES À ÓLEO

A preparação dos vernizes à óleo é muito complexa porque as resinas naturais


não são solúveis em óleo, sendo necessário recorrer à “pirogenação”, que é a
reação ocorrida em alta temperatura (300ºC), a fim de se conseguir a
solubilidade necessária.

Como regra geral, junta-se o óleo secativo e as resinas num recipiente de aço
inox ou aço esmaltado (ágata), deixando-se a pirogenação ocorrer por um
período de tempo relativamente longo. Deve-se cuidar para que a temperatura
não ultrapasse os 300ºC, a fim de que ocorra a adequada oxipolimerização do
óleo.

Retira-se do calor quando a mistura atingir o ponto de “firm pill stage”, ou seja,
uma pequena porção colocada em uma superfície para resfriar, ao ser
apertada e puxada entre os dedos, estica-se formando o conhecido “ponto de
fio”.

Após resfriamento (+ou-120ºC), acrescenta-se essência de terebintina em


quantidade adequada. Mistura-se bem e filtra-se.

Se durante a aplicação com pincel, o verniz se apresentar muito denso, basta


acrescentar-se mais um pouco de essência de terebintina.

9 – CUIDADOS NA PREPARAÇÃO

Para a preparação dos vernizes à óleo, alguns cuidados são necessários:

a) Usar sempre recipiente de aço inoxidável ou aço esmaltado (ágata).


Nunca de alumínio. Pode ser usado recipiente de ferro, porém o verniz
ficará mais escuro.
b) Nunca usar chama, pois a mistura “explode” em função das reações
químicas e formação de gases, o que se resolve com utilização de
fogareiro elétrico, mesmo assim é necessário ter muito cuidado.
c) Usar máscara especial contra gases tóxicos (não pode ser contra
poeira).
d) Operar ao ar livre ou utilizar “capela” com chaminé adequada, mas
nunca em ambiente interno.
e) Certificar-se de que não há riscos de entornar a mistura.
f) Utilizar termômetro apropriado.
g) Retirar do fogareiro somente quando a mistura estiver “esticando” entre
os dedos (puxa-puxa). Este teste deve ser feito colocando-se uma gota
sobre mármore ou outra superfície e após esfriar, coloca-se entre os
dedos e estica-se, devendo estar “em ponto de fio” ( “firm pill stage”).
10 – FÓRMULAS DE VERNIZES

FÓRMULAS À ÁLCOOL - Para 1 litro de álcool

a) Goma laca 150g, sandaraca 15g, copal de Manila 5g, elemí 15g.

b) Goma laca 150g, sandaraca 20g, mastic 15g.

c) Goma laca 120g, elemi 20g, benjoim 15g.

d) Goma laca 150g, damar 15g, sandaraca 15g.

e) Goma laca 150g, colofônia 25g, mastic 25g.

f) Goma laca 240g, sandaraca 100g, goma guta 50g, sândalo 40g,
terebintina de Veneza 30g.

g) Sandaraca 100g, goma laca 75g, mastic 25g.

h) Goma laca 180g, sandaraca 90g, mastic 45g, terebintina de Veneza 15g.

i) Goma laca 150g, copal de Manila 50g, sangue de dragão 2g, sândalo
vermelho 2g.

j) Goma laca 180g, sandaraca 15g, elemí 15g.

k) Goma laca 200g, colofônia 20g, óleo de rícino 20ml.

l) Goma laca incolor 180g, copal de Manila 40g.

m) Dissolver em banho-maria : 125g de sandaraca, 60g de goma-laca, 60g


de mastic, 30g de elemí, 25g de benjoim. Quando a mistura entrar em
ebulição, junta-se 50g de terebintina de Veneza, deixando ebulir por
mais algum tempo. Deixar esfriar e filtrar.

Nota: O sândalo vermelho, grande árvore das Leguminosas, possui muitos


canais resiníferos, sendo vermelho escuro externamente e vermelho claro
internamente. Entre as substâncias corantes estão a santalina (a mais
importante) e a pterocarpina.

A santalina é um pó de cor achocolatada que se funde a 243ºC e se decompõe


entre 250ºC e 260ºC.
É quase insolúvel em água mas no álcool se dissolve facilmente produzindo
coloração vermelha.
O sândalo vermelho mais apreciado como corante é proveniente da Índia.

Para vernizes de acabamento, pode-se substituir a goma laca por copal de


Manila ou goma laca incolor.
FÓRMULAS À ESSÊNCIA - Para 1 litro de essência de terebintina

a) Mastic 220g, damar 120g, óleo de linhaça cozido 130g.

b) Sandaraca 125 g, laca em grãos ou copal 125g, sangue de dragão 15g,


goma guta 2g, cúrcuma 2g, terebintina de Veneza 65g.

Nota: Praticamente todos os vernizes poliresinosos (formulados com várias


resinas) podem utilizar essência de terebintina como solvente, obviamente com
alteração do tempo de secagem.
A goma laca é praticamente insolúvel em essência de terebintina e por isso não
é utilizada nestas composições.

FÓRMULAS À ÓLEO

a) sandaraca 100g, aloé 100g, óleo de linhaça 400g, essência de


terebintina 400g.
b) Sandaraca 50g, colofônia 50g, óleo de linhaça 150ml, essência de
terebintina 250ml.
c) Copal de Manila 50g, colofônia 50g, óleo de linhaça 150ml, essência de
terebintina 250ml.
d) Âmbar 50g, elemí 50g, sandaraca 50g, óleo de linhaça 200ml, essência
de terebintina 200ml.
e) Colofônia 100g, óleo de linhaça 150ml, essência de terebintina 250ml.

Nota : Lembrar sempre que a essência de terebintina só deve ser adicionada


ao verniz quando este estiver à temperatura igual ou inferior a 120ºC.

Adicionar um pouco de secante de Courtrai ou de cobalto ao verniz a


óleo. O secante de Courtrai promove secagem mais profunda e o de cobalto
superficial.

11 – A “Vernice Bianca” de Simoni Fernando Sacconi

No livro “I SEGRETI DI STRADIVARI”, o autor Simoni Fernando Sacconi afirma


que, antes de envernizar seus instrumentos, Antonio Stradivari aplicava uma
mistura à base de mel, açúcar e albumina, que ele denomina “vernice bianca”.
Tinha a função de isolar a madeira e de ancorar o verniz propriamente dito,
além de, quando absorvido pelas madeiras, imprime um efeito “uniformizador”
de toda a caixa acústica.

Ainda segundo Sacconi, ao penetrar na madeira, essa mistura produz


alterações tonais importantes, e Stradivari se antecipava a essas alterações e à
melhoria potencial do instrumento com a aplicação da “vernice bianca”,
ajustando as placas harmônicas de maneira eficiente.

De acordo com o livro, após aplicar silicato de potássio na madeira, deve-se


cobrir a superfíce completamente com a “vernice bianca” antes da aplicação do
verdadeiro verniz. Aplicam-se duas camadas no interior e no exterior da caixa
harmônica como isolante e, segundo o autor, isto faz aumentar a velocidade de
propagação das ondas e diminuir o amortecimento das vibrações sonoras.

O tom deve ser ajustado antes da aplicação da “vernice bianca” (ajuste tonal
das placas).

Vale observar que não há nenhuma comprovação de que realmente Stradivari


usou esse composto, e também essa mistura não transformará um instrumento
ruim em instrumento de boa qualidade.

Fórmula:

25 g de goma arábica

½ colher (chá) de mel

1/4 colher (chá) de açúcar branco

100 ml de água

1 clara de ovo

Modo de preparo:

- Aquecer a água sem ferver

- Adicionar lentamente a goma arábica, mexendo sempre até dissolver


totalmente

- Adicionar o mel e o açúcar

- Filtrar a mistura em um pano e deixar esfriar

- Enquanto a mistura esfria, bater a clara em neve num prato fundo

- Deixar a clara em neve “abaixar” e retirar o líquido que se separa (albumina).

- Adicionar a albumina, à mistura anterior e mexer bem.


Obs.: Utilizar a mistura imediatamente e descartar a sobra.

Após a “vernice bianca” estar totalmente seca, passar lixa 600 em todo o
instrumento e aplicar verniz a álcool ou a óleo para finalizar o trabalho.

12 – VERNIZES COM RESINAS NATURAIS E ALQUÍDICAS

Atualmente, com a utilização de tecnologias modernas, é possível a produção


de resinas sintéticas com características iguais ou próximas às resinas
naturais, a partir de óleos vegetais secativos ou semi secativos, incluindo o
óleo de soja. Entre as mais utilizadas, estão as resinas alquídicas, que são
polímeros utilizados na indústria de tintas e vernizes e, em virtude, de sua
versatilidade e baixo custo, estão entre os maiores volumes produzidos
atualmente no mundo.
Sua síntese compreende duas etapas:

1. Alcoólise: é a transesterificação do óleo de soja com glicerol, sob


catálise básica com octoato de lítio à temperatura de 230-250ºC.

2. Acidólise: o produto final da etapa anterior é misturado com poliácidos


e polióis na temperatura de 180-250ºC, levando à formação da resina.

Por possuírem homogeneidade em sua estrutura e proporcionarem melhor


secagem e resistência aos vernizes, melhorando suas qualidades físicas e de
proteção, muitas indústrias voltadas à produção de vernizes específicos para
luteria, utilizam-se das resinas alquídicas em seus produtos à base de óleo,
como por exemplo a marca alemã “JOHA”, entre outras, que inclusive
especifica em seus rótulos e catálogos.

Ver: https://www.joha.eu/en/varnishes/oil-varnish/oil-varnish-standard/

JOHA ® Oil Varnish Standard. “Este verniz contém uma mistura de resinas naturais
e sintéticas, dissolvidas em terebintina e óleo de linhaça. É um verniz com ótimas
propriedades e uma superfície resistente. Para um verniz a óleo, seca muito
rapidamente. Aproximadamente entre 1-6 dias”.

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