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Bom, nem sei por onde começar nem o que vou dizer aqui mas vou pensando em algumas

coisas que não saibas i guess.


Vou te contar alguns dos meus tópicos mais sensíveis que são a razão de eu estar triste
grande parte das vezes. O primeiro parece um bocado fútil e expectável mas a morte da
minha avó é algo que me faz muita confusão ainda. Não tenho praticamente memórias
nenhumas antes do 12 anos pelo menos, mas algumas das que tenho são dela. Ela morreu
tinha eu 7 anos, mas por incrivel que pareça nessa altura eu já tinha noção de muita coisa e
o quão feliz eu era quando estava com ela é uma delas. Ela vivia em Monchique com este
meu avô que tu conheces e no dia 28/11/12 tiveram um acidente gigante de carro e ambos
ficaram gravemente feridos. Lembro-me de ir ve-los ao hospital e ter desatado a chorar
quando vi o meu avô todo engessado e com a perna e o braço partidos. A minha avó nem
se fala, estava pior ainda e mesmo passados estes anos todos ainda tenho a imagem do
estado da cara dela na minha cabeça. O irónico foi que ela não morreu estritamente por
causa do acidente, o motivo foi que um enfermeiro do hospital tinha dado um iogurte de
colher para a minha avó comer e ela engasgou-se a comê-lo ( o que era de esperar porque
ela estava extremamente debilitada) e por conta disso teve uma paragem respiratória e
morreu. Uma das minhas coisas favoritas até hoje sempre foi andar de carro, seja durante o
dia ou noite, e ouvir música. Era um costume nosso ouvir as cassetes do meu avô de
musica espanhola e/ou portuguesa durante as viagens para Monchique e eu dava tudo para
o voltar a fazer seja com ambos os meus avós ou só o meu avô , que continuou a fazer isso
até aos ultimos 2 anos começar a passar mais dificuldades. Ganhei um vínculo ainda maior
pelo meu avô e perdê-lo é o meu maior medo da vida sem dúvida. Falando de avós, não
que isto seja sobre mim ou algo do género mas tu provavelmente pensas que eu falo coiso
da minha outra avó (a que estava cá quando vieste dormir) mas não é atoa. A minha mãe
contou-me o quão mal a minha avó lhe fez, tanto a ela como aos meus outros avós e o
quão ela tentou separar o meu pai da minha mãe. Para teres um pouco de noção do que
falo, um exemplo de uma situação que aconteceu foi a minha avó ter tentado envenenar a
minha mãe com um chá chamado espirradeira que é conhecido por causar paragens
cardíacas e até mesmo morte tudo porque o meu pai ia sair de casa da minha avó e viver
com a minha mãe e O FILHO.
Ainda relacionados a acidentes de carro, em 2018 aconteceu algo parecido. Nós e a familia
Alves eram extremamente chegados por causa das nossas mães, que eram ambas de
Monchique e tiraram a especialidade juntas. Posto isto, eu e o meu irmão éramos bastante
amigos de um dos filhos deles, o Pedro. Nós passavamos dias juntos, as nossas familias
estavam sempre umas com as outras e saiamos imenso, isto desde que eu e o meu irmao
eramos ambos putos. O meu irmão e ele entraram juntos para o futebol quando tinham uns
12/13 anos se nao me engano o que nos tornou a todos ainda mais próximos do que já
eramos. No dia 2/8/18, tinha o Pedro 17 anos e o meu irmao 18, o Pedro teve um acidente
de mota e veio a falecer. Foi algo que sem dúvida mudou a dinamica da minha familia de
um modo brutal. Lembro-me como se fosse ontem de ir a Teixeira a uma homenagem feita
a ele e ver o meu irmão em prantos. Custou-me imenso tanto a morte dele como a maneira
que o meu irmão reagiu à situação. A minha familia literalmente parou e as coisas
mudaram. O meu irmão adquiriu comportamentos preocupantes para tentar assimilar a
situação. Começou-se a cortar as pernas e braços e tentou tirar a sua vida pelo menos 2
vezes (que eu saiba). Uma no próprio dia da homenagem e outra em 2019, no dia 21 de
maio. Tenho melhor memória da segunda vez porque cheguei a ver. Lembro-me de querer
ir à casa de banho e bater a porta porque alguém estava lá dentro fazia um bocado e
lembro-me de empurrar a porta para entrar e sentir um peso contra a porta e quando vi,
estava o meu irmão deitado esvairado em sangue pernas abaixo. Ele chorava que se
fartava e estava quase deitado no chão com uma daquelas navalhas que se usavam para
fazer a barba na mão. Quando o vi neste estado entrei em completo desespero e ele só´me
pedia desculpa e para eu não contar ao pai e a mãe que o vi (não sei muito bem como era
suposto fazer isso mas ok). Chamei os meus pais (que estavam a dormir, porque isto foi a
meio da noite) e por incrivel que pareça eles não me pareciam muito surpresos com a
situação, o que me leva a acreditar que isto já tenha acontecido mais vezes do que eu sei.
Eles não o levaram ao hospital e cuidaram dele durante a noite por casa mesmo, e eu fiquei
extremamente traumatizada com o que vi porque epa afinal de conta eu tinha 13 anos e ver
o meu irmão daquela forma não é algo que se veja no dia a dia. A minha mãe ficou
“preocupada” que eu tivesse ficado marcada com aquilo ( e com razão) e quis-me por num
psicólogo em conjunto com ele, que já andava desde o falecimento do Pedro. Sinceramente
era preferível não ter ido, porque falei de coisas com a psicologa que pararam aos ouvidos
da minha mae (o que também era de esperar pq ne) o que levou a minha mae a olhar para
mim como se fosse uma doida, literalmente. A psicologa disse-lhe que eu falava muito em
por em pratica o que o meu irmão fez e o quao eu passava a imagem do meu irmao na casa
de banho pela cabeça, o que não era mentira.
A minha mae discutiu comigo e repreendeu me por “estar a fazer tudo sobre mim” tendo em
conta que era o meu irmao que estava mal, e que eu nao tinha motivos para agir assim.
Comecei a pensar que eu era um problema e que era egoista ao me comportar desta
maneira e que eu nao precisava de ajuda, pelo que comecei a controlar tudo o que dizia e
sofria à parte, para não causar alarido. Foi horrivel engolir tudo o que se passava comigo e
ouvir o que a minha mae pensava sobre a situacao e parei de querer ir a psicologa, pelo
que tambem senti uma quebra de confiança da parte dela. Desde ai que estou habituada a
ouvir os outros e ter me exclusivamente a mim para falar sobre os meus problemas e nao
considero isso mau de todo.
Prosseguindo eu revoltei me com a minha mãe por se intrometer na minha vida e comecei a
isolar-me de tudo e a privar-me de tudo o que gostava, nomeadamente, comer. Comecei a
odiar a textura, o sabor, o que a comida causaria depois no meu corpo por isso obriguei o
meu corpo a rejeitar tudo o que era refeicoes compostas (almoco, jantar, pequeno almoco).
Fingia que comia e depois ia a casa de banho deitar tudo para fora, nos almoços na escola
dizia que ia almoçar a casa e punha me a dar voltas pelo matozinho na estrada debaixo da
escola à espera que o tempo passe para supostamente “voltar” de casa. Nessa altura
também comecei a ouvir mais comentarios sobre a minha aparencia e o meu formato de
corpo e pensei que parra de comer fosse ajudar, guess what, nao ajudou. A minha mãe
acabou por topar o que eu estava a fazer porque a mãe da Catarina Ramos falou com a
minha e contou lhe que a Catarina tinha percebido o que eu fazia, pelo menos na escola. A
minha relação com a comida melhorou mas até hoje tenho uma distorção gigante com o
meu corpo e não há nada que tenha ajudado as gostar dele. Pelo contrário, começei a
detestar ainda mais o meu corpo e até hoje há vezes que não consigo continuar a comer
por pensar em vomitar enquanto como. Posto isto, como resposta à minha infelicidade com
o meu corpo, achei que cortar as partes que não gostasse ia ajudar. Em 2020 comecei a
usar as navalhas que usava na cara para fazer “arranhões” mais fundos porque nao eram
bem cortes, tanto que nao tenho cicatrizes na parte de tras das minhas coxas, que eram e
são das minhas maiores inseguranças relacionadas ao meu corpo. Parei de o fazer mais ou
menos quando o 10 ano começou e parei de ligar tanto a isso e a arranjar outras formas de
me distrair e não focar a minha atencao no que gostava em mim ou nao. Confesso que ja
pensei muitas vezes em voltar a faze-lo e epa sinceramente a hipótese de o fazer nao vai
desaparecer. Passa muito pela minha cabeça simplesmente por um fim a tudo e calar a
cabeça de tanto que fala mas não tenho coragem de o fazer sinceramente.
Também tenho um vínculo muito grande ao meu irmao por conta disto, porque querendo ou
nao, isto ligou nos de uma forma diferente.
Outro aspeto que também afeta a minha percepçao das coisas é a relaçao do meu pai e da
minha mae, que ja te expliquei um pouco recentemente. É algo que tenho medo de passar
aos meus filhos, nao no sentido de ser abusiva mas no sentido de nao saber demonstrar
amor e carinho porque nao foi isso que vi. Tenho medo de marcar os meus filhos nao
intencionalmente e querer tanto ser diferente dos meus pais que acabo por ser igual.
Desde ver o meu pai bater imenso no meu irmao a ponto de ter de ir ao hospital a ver ele
levantar a mao a minha mae faz me perder a vontade de querer ter alguem do meu lado e
ter filhos. Pensar que um pai e marido possa fazer algo do genero nao me cabe na cabeça.
Odeio estar em casa por isso mesmo, estar em casa era sinonimo de preocupaçao e
desassossego porque nunca sabia qual dos dois ia comecar a discutir e sair de casa
primeiro. Refugiu-me muito nos meus amigos e em sair em si porque é a unica forma que
consigo distrair a minha cabeça de pensar no que quer que seja. Nao me considero uma
pessoa feliz e completa pelo simples motivo de considerar que estar sozinha comigo propria
significar tortura, porque é isso mesmo que é. Eu propria nao me permito estar 5min bem
sem ter de me deitar abaixo.
Há muito mais para falar mas o resto desta carta vai ser direcionado a outro assunto.
O “amor da tua vida” não é boa pessoa. Tenho uma particular habilidade em procurar
defeitos em tudo e não parar até os achar e arruinar algo bom. É algo muito comum em
toda a gente, mas no meu caso já chegou ao extremo. Tu és algo bom para mim e cá estou
eu a fazê-lo outra vez. A parte pior é que agora parece certo. Parece certo acabar e de uma
vez por todas acabar com a procura de defeitos que me consome a mim e a eventualmente,
a ti. Sou eu o problema e eu reconheço isso. Não sei como fui sequer capaz de te julgar por
quereres acabar comigo porque de coração eu percebo. Não concordo com a política de se
não te amares a ti próprio não vais conseguir ninguém, mas sim que se não resolveres os
teus conflitos interiores aí sim não serás capaz. E já sei o que estás a pensar, tu podes
estar lá para mim e me ajudares e que isto é uma fase que conseguimos superar. Exceto
que não é, é assim que sou passe o tempo que passar. Eu juro-te que tentei e tento mudar,
mas parece inútil. Quando te disse que não me via numa relação não era porque preferia
estar solteira e fazer o que quisesse, era porque sabia que isto ia acontecer e magoar-te-ia
muito mais do que se tivesse simplesmente recusado o pedido. Mas fi-lo, e tenho de
assumir a responsabilidade por isso. Já nem sei se isto se trata de um conflito interior ou se
simplesmente estou a ser impulsiva, mas sei que não consigo reter todos os meus
pensamentos e impedi-los e destruir algo tão genuíno como nós.
O “amor da tua vida” não te vai fazer bem a longo prazo. Vou ficar estranha, chateada, falar
mal, triste com tudo e nada e feliz quando calha. E se há algo que prefiro poupar a passar
por isso comigo és tu. Aqui não falta sentimento e amor, falto eu. E isso é motivo suficiente
para não nos mantermos juntas. Eu não sou como tu e não consigo ser por mais que tente.
Não sei o que procuro encontrar sequer noutra pessoa porque tudo o que procuro nos
outros pertence-te a ti. Perder-te seria perder-me mesmo já estando perdida. Não te quero
dificultar a vida nem te colocar num lugar fundo com o que quer que faça, mas sei que o vou
fazer.
O “amor da tua vida” não sabe o que fazer com a sua. Sei estragá-la e embora esteja a
fazer pior em colocar em hipótese me separar de ti por momentos parece-me correto. Não
deixo o meu lado fraco ceder e não deixo a relação fluir e não facilito nada. Mas vou estar a
facilitar-te nisto. Estou a pensar nesta situação tão rápido que não sei se estou a pensar
com clareza. Claro que tenho medo de me arrepender do que quer que faça mas vou ter de
tomar uma decisão porque a sofrer já tu estás, e para variar fui eu o motivo.
Independemente do que aconteça eu amo-te para sempre e vou para sempre ter em
consideração a nova perspetiva de amor que me mostraste.

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