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História e Fundamentos

do Jornalismo

Prof.a Camila Maurer

Indaial – 2021
1a Edição
Copyright © UNIASSELVI 2021

Elaboração:
Prof. Camila Maurer
a

Revisão, Diagramação e Produção:


Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri


UNIASSELVI – Indaial.

M453h

Maurer, Camila

História e fundamentos do jornalismo. / Camila Maurer – Indaial:


UNIASSELVI, 2021.

177 p.; il.

ISBN 978-65-5663-994-9
ISBN Digital 978-65-5663-995-6

1. Origens históricas da atividade jornalística. - Brasil. II. Centro


Universitário Leonardo da Vinci.

CDD 070

Impresso por:
Apresentação
Caro acadêmico, bem-vindo ao livro História e Fundamentos do
Jornalismo! Este material ajudará a compreender as origens históricas da
atividade jornalística e de que maneira ela evoluiu a partir de uma série de
transformações tecnológicas, econômicas, sociais e culturais.

Na Unidade 1, estudaremos as origens e a evolução histórica do


jornalismo ao longo do tempo, desde os fenômenos pré-jornalísticos, na
Roma Antiga, até as tecnologias de comunicação eletrônica que tornaram a
circulação da informação mais veloz. Também, conheceremos as origens dos
valores que orientam a atividade jornalística, como a liberdade de imprensa
e a objetividade.

Em seguida, na Unidade 2, estudaremos a história do jornalismo no


Brasil, abordando aspectos, como o nascimento da imprensa no nosso país, a
chegada do rádio e da televisão, a censura sofrida pelos veículos jornalísticos
durante o regime militar e o papel da imprensa nacional no processo de
redemocratização do território.

Por fim, na Unidade 3, abordaremos as características do jornalismo


contemporâneo e as mudanças pelas quais ele tem passado com o surgimento
e a popularização da internet e das plataformas digitais. Refletiremos,
também, a respeito do futuro da atividade jornalística nesse contexto de
intensas transformações.

Ao longo de cada uma das unidades, você encontrará autoatividades


relativas ao conteúdo estudado. É importante que você as faça, pois elas
foram desenvolvidas com os objetivos de ajudar a fixar o conteúdo e de
contribuir para o seu processo de aprendizado.

Esperamos que este material proporcione, a você, uma visão ampla


e contextualizada da atividade jornalística e dos fundamentos históricos e
culturais dela. Acreditamos que conhecer a história é essencial para que se
possa criar o futuro, e desejamos que você, acadêmico, possa fazer parte
desse momento, munido de muito conhecimento.

Bons estudos!

Prof.a Camila Maurer


NOTA

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para
você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há
novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é


o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um
formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova
diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também
contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente,


apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade
de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.
 
Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto
em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa
continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de


Desempenho de Estudantes – ENADE.
 
Bons estudos!
LEMBRETE

Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma disciplina e com ela


um novo conhecimento.

Com o objetivo de enriquecer seu conhecimento, construímos, além do livro


que está em suas mãos, uma rica trilha de aprendizagem, por meio dela você terá
contato com o vídeo da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complementares,
entre outros, todos pensados e construídos na intenção de auxiliar seu crescimento.

Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

Conte conosco, estaremos juntos nesta caminhada!


Sumário
UNIDADE 1 — ORIGENS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO JORNALISMO............................ 1

TÓPICO 1 — NASCIMENTO E EVOLUÇÃO DA IMPRENSA.................................................... 3


1 INTRODUÇÃO..................................................................................................................................... 3
2 FENÔMENOS PRÉ-JORNALÍSTICOS .......................................................................................... 3
2.1 ANTIGUIDADE: ACTAS DIURNAS............................................................................................. 4
2.2 IDADE MÉDIA: NASCIMENTO DA BURGUESIA E CRESCENTE NECESSIDADE
DE INFORMAÇÃO......................................................................................................................... 4
2.3 RENASCIMENTO: A PRENSA DE GUTENBERG . .................................................................. 5
2.3.1 Folhas volantes e livros noticiosos....................................................................................... 7
3 PRIMEIROS JORNAIS........................................................................................................................ 8
3.1 CARACTERÍSTICAS DOS PRIMEIROS JORNAIS..................................................................... 8
3.2 LIBERDADE E CENSURA............................................................................................................. 9
4 SÉCULO XVIII: CONSOLIDAÇÃO DA IMPRENSA ................................................................ 10
4.1 INFLUÊNCIA ILUMINISTA E NASCIMENTO DO ESPAÇO PÚBLICO MODERNO........ 10
4.2 ESTADOS UNIDOS: JORNALISMO, INDEPENDÊNCIA E LIBERDADE DE
EXPRESSÃO.................................................................................................................................... 11
5 INDUSTRIALIZAÇÃO DA IMPRENSA....................................................................................... 11
5.1 AGÊNCIAS INTERNACIONAIS DE NOTÍCIA....................................................................... 13
5.2 A REVOLUÇÃO DOS PENNY PRESS........................................................................................ 15
5.3 FUNDAMENTOS DO JORNALISMO E VALORES PROFISSIONAIS................................. 18
5.3.1 Origens do ideal da objetividade....................................................................................... 19
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 22
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 23

TÓPICO 2 — ORIGENS DA COMUNICAÇÃO ELETRÔNICA................................................. 25


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 25
2 PRIMÓRDIOS DA COMUNICAÇÃO ELETRÔNICA .............................................................. 25
2.1 TELÉGRAFO SEM FIO ................................................................................................................ 27
3 SURGIMENTO DO RÁDIO E DA TELEVISÃO......................................................................... 29
3.1 NASCE O RÁDIO.......................................................................................................................... 29
3.2 NASCE A TELEVISÃO................................................................................................................. 30
3.3 SATÉLITE DE COMUNICAÇÃO . ............................................................................................. 32
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 33
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 34

TÓPICO 3 — PARADIGMAS JORNALÍSTICOS: AS QUATRO FASES DO


JORNALISMO MUNDIAL.................................................................................................................. 37
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 37
2 PRIMEIRO, SEGUNDO, TERCEIRO E QUARTO JORNALISMOS:
A CLASSIFICAÇÃO DE CIRO MARCONDES FILHO............................................................. 37
3 TRÊS VERTENTES DO JORNALISMO: A CLASSIFICAÇÃO DE NELSON
TRAQUINA ....................................................................................................................................... 39
4 PARADIGMAS JORNALÍSTICOS: CHARRON E BONVILLE ............................................... 40
4.1 JORNALISMO DE TRANSMISSÃO .......................................................................................... 41
4.2 JORNALISMO DE OPINIÃO....................................................................................................... 44
4.3 JORNALISMO DE INFORMAÇÃO . ......................................................................................... 47
4.4 JORNALISMO DE COMUNICAÇÃO........................................................................................ 51
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 54
RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 56
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 57
REFERÊNCIAS....................................................................................................................................... 59

UNIDADE 2 — HISTÓRIA DO JORNALISMO NO BRASIL............................................................ 61

TÓPICO 1 — HISTÓRIA DA MÍDIA IMPRESSA NO BRASIL................................................. 63


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 63
2 CHEGADA DA IMPRENSA AO BRASIL .................................................................................... 63
2.1 PRIMEIROS JORNAIS BRASILEIROS ...................................................................................... 66
2.2 IMPRENSA NA REPÚBLICA...................................................................................................... 67
2.2.1 Publicidade entra em cena.................................................................................................. 67
3 PIONEIRISMO DE ASSIS CHATEAUBRIAND E NOVAS PUBLICAÇÕES........................ 68
3.1 REVISTA O CRUZEIRO .............................................................................................................. 69
3.2 OUTRAS PUBLICAÇÕES............................................................................................................. 71
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 74
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 75

TÓPICO 2 — HISTÓRIA DO RÁDIO E DA TV NO BRASIL..................................................... 77


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 77
2 CHEGADA DO RÁDIO AO BRASIL............................................................................................. 77
2.1 PRIMEIRO JORNAL NO RÁDIO BRASILEIRO....................................................................... 78
2.2 RÁDIO TUPI................................................................................................................................... 79
2.3 RÁDIO NACIONAL .................................................................................................................... 80
2.3.1 Repórter Esso......................................................................................................................... 81
3 HORA DO BRASIL E VOZ DO BRASIL....................................................................................... 81
4 FORÇA DO JORNALISMO NO RÁDIO....................................................................................... 82
4.1 REDES VIA SATÉLITE.................................................................................................................. 82
4.1.1 Jovem Pan Sat........................................................................................................................ 83
4.2 JORNALISMO 24 HORAS NO AR.............................................................................................. 83
5 NASCIMENTO DA TELEVISÃO NO BRASIL............................................................................ 85
5.1 JORNALISMO NÃO TINHA AUDIÊNCIA NA TV................................................................ 86
5.2 QUANDO A TELEVISÃO VIROU FEBRE ENTRE OS BRASILEIROS................................. 87
6 PROGRAMAS JORNALÍSTICOS................................................................................................... 88
6.1 SURGE O JORNAL NACIONAL................................................................................................ 89
6.2 SURGEM NOVOS FORMATOS JORNALÍSTICOS NA TV.................................................... 90
6.3 VÁRIAS FORMAS DE FAZER JORNALISMO NA TV............................................................ 91
6.4 SENSACIONALISMO NA TV..................................................................................................... 92
6.5 JORNALISMO 24 HORAS POR DIA.......................................................................................... 93
6.6 IMPORTÂNCIA DA TELEVISÃO NO ESPAÇO PÚBLICO BRASILEIRO........................... 94
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 96
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 97
TÓPICO 3 — IMPRENSA NA DITADURA..................................................................................... 99
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 99
2 PERÍODOS DE DITADURA NA HISTÓRIA BRASILEIRA: BREVE
CONTEXTUALIZAÇÃO................................................................................................................... 99
3 IMPRENSA BRASILEIRA NO ESTADO NOVO (1937-1945).................................................. 100
3.1 RÁDIO NACIONAL ENCAMPADA POR GETÚLIO VARGAS.......................................... 101
4 IMPRENSA BRASILEIRA NO REGIME MILITAR (1964-1985)............................................. 101
4.1 CENSURA AOS JORNAIS.......................................................................................................... 102
4.2 REVISTA VEJA............................................................................................................................. 104
4.3 PROJETO MINERVA................................................................................................................... 105
4.4 RADIOBRÁS................................................................................................................................. 105
4.5 JORNAL DE INTEGRAÇÃO NACIONAL.............................................................................. 105
4.6 ROBERTO MARINHO: APOIO AO GOLPE E RELAÇÕES COM O PODER.................... 106
4.6.1 Poder da Globo incomoda os militares........................................................................... 107
4.7 SILVIO SANTOS.......................................................................................................................... 108
4.8 VLADIMIR HERZOG................................................................................................................. 109
5 IMPRENSA E RESISTÊNCIA........................................................................................................ 110
LEITURA COMPLEMENTAR........................................................................................................... 112
RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 115
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 116
REFERÊNCIAS..................................................................................................................................... 118

UNIDADE 3 — JORNALISMO CONTEMPORÂNEO................................................................ 119

TÓPICO 1 — CHEGADA DA ERA DIGITAL............................................................................... 121


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 121
2 JORNALISMO E EVOLUÇÃO TECNOLÓGICA...................................................................... 121
2.1 HISTÓRIA DA INTERNET ...................................................................................................... 122
2.2 TRANSFORMAÇÕES DAS COMUNICAÇÕES NA DÉCADA DE 1990........................... 127
3 INTERNET NO BRASIL.................................................................................................................. 128
3.1 PRIMEIROS PASSOS DO JORNALISMO ONLINE............................................................... 130
3.1.1 Pioneiros do jornalismo online no Brasil......................................................................... 131
3.2 PASSAGEM DA WEB 1.0 PARA WEB 2.0................................................................................ 133
3.3 INOVAÇÕES QUE A INTERNET POSSIBILITOU................................................................. 134
3.3.1 Blogs .................................................................................................................................... 134
3.3.2 Rádio via internet............................................................................................................... 135
3.3.3 MP3....................................................................................................................................... 136
3.3.4 Podcast................................................................................................................................. 136
RESUMO DO TÓPICO 1................................................................................................................... 141
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 142

TÓPICO 2 — PANORAMA ATUAL DO JORNALISMO............................................................ 145


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 145
2 CONSUMO DE MÍDIA NO BRASIL........................................................................................... 145
2.1 CONSUMO DE MÍDIA DURANTE A PANDEMIA.............................................................. 147
2.2 NOVAS MÍDIAS SUBSTITUÍRAM MÍDIAS TRADICIONAIS?........................................... 148
3 NOVOS FORMATOS E DISPOSITIVOS AMPLIAM O HORIZONTE DO
JORNALISMO.................................................................................................................................. 148
3.1 SMARTPHONES E TABLETS.................................................................................................... 149
3.2 HIPERJORNALISMO.................................................................................................................. 151
3.3 NEWSGAMES............................................................................................................................... 152
RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 155
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 156
TÓPICO 3 — FUTURO DO JORNALISMO.................................................................................. 159
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 159
2 DESAFIOS DO JORNALISMO NA ERA DA DESINFORMAÇÃO...................................... 159
2.1 FACT CHECKING......................................................................................................................... 161
3 IMPACTO DAS PLATAFORMAS DIGITAIS SOBRE O JORNALISMO ........................... 162
4 NOVOS MODELOS DE NEGÓCIO............................................................................................. 164
4.1 NATIVOS DIGITAIS: CASOS DE SUCESSO........................................................................... 166
LEITURA COMPLEMENTAR........................................................................................................... 169
RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 173
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 174
REFERÊNCIAS..................................................................................................................................... 176
UNIDADE 1 —

ORIGENS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA


DO JORNALISMO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• compreender as origens históricas da atividade jornalística;

• reconhecer a relação entre a evolução das tecnologias de comunicação e a


prática jornalística;

• distinguir as principais características de cada uma das fases do jornalismo


mundial;

• associar os contextos históricos às fases de evolução do jornalismo.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade,
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – NASCIMENTO E EVOLUÇÃO DA IMPRENSA

TÓPICO 2 – ORIGENS DA COMUNICAÇÃO ELETRÔNICA

TÓPICO 3 – PARADIGMAS JORNALÍSTICOS: AS QUATRO FASES DO


JORNALISMO MUNDIAL

CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos


em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá
melhor as informações.

1
2
TÓPICO 1 —
UNIDADE 1

NASCIMENTO E EVOLUÇÃO DA IMPRENSA

1 INTRODUÇÃO
No Tópico 1, veremos que a atividade que, hoje, conhecemos como
jornalismo, teve origem a partir das necessidades de informar e de ser informado.
Essas necessidades fizeram surgir o que chamamos de fenômenos pré-jornalísticos,
os quais já eram registrados desde a Roma Antiga.

Já no século XV, com a invenção da prensa mecânica de tipos móveis, e a


possibilidade de imprimir o que, antes, era escrito à mão, abriram-se os caminhos
para a criação das primeiras publicações noticiosas, as quais, ainda, eram muito
diferentes dos jornais que conhecemos hoje.

Veremos, também, que o surgimento de novas tecnologias de


comunicação, como telégrafo, telefone, rádio, televisão, e, mais recentemente,
internet, permitiu que as notícias circulassem de forma cada vez mais veloz,
mudando, para sempre, os modos de fazer jornalismo e de consumir informação.

2 FENÔMENOS PRÉ-JORNALÍSTICOS
Existem muitas versões que explicam o nascimento do jornalismo.
Alguns estudiosos acreditam que, mesmo antes de conhecer a escrita, os homens
primitivos já faziam jornalismo, pois transmitiam, através de pinturas nas paredes
das cavernas, informações relativas às condições do tempo e aos resultados
da caça, aspectos determinantes para a sobrevivência. Desse modo, é possível
afirmar que nenhuma civilização sobreviveu sem informação, nem mesmo as
mais primitivas.

O surgimento das primeiras civilizações, e a substituição da tradição


oral pela escrita, por volta do ano 3.500 a.C., revolucionaram o modo através
do qual a espécie humana registrava as informações e preservava a história. O
desenvolvimento da escrita, também, foi o marco que permitiu o desenvolvimento
do jornalismo, muito tempo depois. No Império Romano, uma sociedade
complexa e com alto grau de alfabetização, surgiram as primeiras iniciativas que
se assemelham ao que, hoje, chamamos de jornalismo, como veremos a seguir.

3
UNIDADE 1 — ORIGENS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO JORNALISMO

2.1 ANTIGUIDADE: ACTAS DIURNAS


Ainda que existam muitas versões possíveis para o surgimento do
jornalismo, é possível afirmar que as Actas Romanas, ou Actas Diurnas, as quais
surgiram em Roma, por volta do ano 131 a.C., são os antepassados mais antigos
dos jornais. A criação delas é atribuída ao imperador romano Julio Cesar. As actas
eram placas de madeira fixadas nos muros das principais localidades do império,
as quais traziam, escritas, as ações do imperador, as conquistas de guerra e as
novidades da expansão do império.

Elas eram produzidas, diariamente, por magistrados, escravos e


funcionários públicos, encarregados de colher informações e de redigir textos.
Alguns estudiosos consideram que esses funcionários do império foram os
primeiros “jornalistas” da história.

As Actas Diurnas supriam uma necessidade real de informação e


contribuíam para manter a unidade de um império de enorme extensão territorial.
Sousa (2008) explica que elas já apresentavam algumas características semelhantes
aos jornais contemporâneos, como

• Periodicidade.
• Frequência regular.
• Conteúdos de caráter noticioso (novidades do império).
• Conjunto de pessoas destinadas, exclusivamente, à redação das Actas (os
primeiros “jornalistas”).
• Difusão pública da informação.
• Difusão a distância e “massiva”, dentro das possibilidades da época.

As Actas Diurnas chegaram ao fim em 330 a.C., quando a sede do império


foi transferida para Constantinopla.

2.2 IDADE MÉDIA: NASCIMENTO DA BURGUESIA E


CRESCENTE NECESSIDADE DE INFORMAÇÃO
Com a queda do Império Romano, a expansão do poder da Igreja Católica
e o início da Idade Média (entre o século V e o século XV), a Europa entrou em
um período dos declínios cultural e intelectual. A partir de então, ler e escrever
se tornaram privilégios reservados aos religiosos, e a tradição oral voltou a ser
dominante, atrasando, em alguns séculos, a evolução da produção e da difusão
de informações.

Autores, como Sousa (2008), citam as crônicas, as cartas e os relatos de


viagem como fenômenos pré-jornalísticos característicos da Idade Média. No
entanto, como aponta Lage (2001), apenas a partir do desenvolvimento do
comércio e do nascimento da burguesia, no fim do período medieval, criaram-
se as condições para o posterior desenvolvimento da imprensa. A intensificação
4
TÓPICO 1 — NASCIMENTO E EVOLUÇÃO DA IMPRENSA

do comércio exigiu os conhecimentos da leitura e da escrita, pois era preciso


registrar as informações relativas às trocas de mercadorias. Ainda, foram os
grandes comerciantes e banqueiros, desse período, que financiaram a produção de
materiais noticiosos, conhecidos como Avisi, na Itália, e Zeitungem, na Alemanha,
nos séculos XIII e XIV, já no fim da Idade Média.

Lage (2001) explica que os materiais citados eram folhas escritas à mão,
copiadas diversas vezes. As pessoas responsáveis por redigir essas publicações
eram trabalhadores intelectuais, contratados, especialmente, para esse fim, e que
não tinham relação direta com o conteúdo ou com a finalidade da mensagem. Por
esse motivo, o autor considera que esses indivíduos tenham sido os predecessores
mais antigos do jornalista moderno. Esses materiais eram destinados a um público,
relativamente, amplo, e, ao contrário das Actas Diurnas, a respeito das quais já
falamos, não eram publicados pelo governo, mas por financiadores privados com
interesses comerciais.

NOTA

O termo “burguesia” faz referência a uma classe social que surgiu no fim da Idade
Média, com a expansão do comércio e das cidades medievais, chamadas de “burgos”. Na
época, a respeito da qual estamos falando no texto, a burguesia era composta, basicamente,
pelos comerciantes, pessoas que habitavam e trabalhavam nos burgos. O surgimento e a
ascensão da burguesia marcaram a transição da Idade Média para a Idade Moderna.

2.3 RENASCIMENTO: A PRENSA DE GUTENBERG


Até meados do século XV, a produção de livros, de folhetos, ou de
quaisquer outros materiais escritos, era feita de forma manual, ou a partir de
métodos de impressão rudimentares. Por volta de 1450, o alemão Johannes
Gutenberg aperfeiçoou um aparato técnico que provocaria uma verdadeira
revolução na circulação do saber: a prensa mecânica de tipos móveis, ou, como é
mais conhecida, a prensa de Gutenberg.

A partir dessa tecnologia, a impressão de livros e de jornais se tornou


possível. Por esse motivo, a criação da prensa é considerada o marco inicial de
um movimento que levou ao surgimento do jornalismo. Como você já deve ter
associado, também, devido à invenção de Gutenberg, usamos o termo “imprensa”
quando nos referimos aos veículos jornalísticos impressos (jornais). Nas palavras
de Sousa (2008, p. 69), a prensa "deu, ao mundo, um futuro melhor, abrindo
condições para o aparecimento e para o sucesso da indústria jornalística". 

5
UNIDADE 1 — ORIGENS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO JORNALISMO

A máquina criada por Gutenberg possuía uma prancha, na qual eram


colocados os tipos móveis, como letras, números ou símbolos moldados em
chumbo e preenchidos com tinta. Com essa composição, era possível imprimir
várias cópias de uma mesma página em algumas horas, o que acelerou,
enormemente, o processo de impressão de livros, e forneceu as condições para a
circulação das primeiras publicações noticiosas impressas.

FIGURA 1 – PRENSA DE GUTENBERG

FONTE: <https://www.dw.com/pt-br/museu-gutenberg-reconstr%C3%B3i-hist%C3%B3ria-da-
tipografia/a-16747104>. Acesso em: 24 abr. 2021.

É válido ressaltar que os chineses usavam, muito tempo antes da invenção


da prensa, um sistema de impressão com blocos de madeira. Acredita-se que eles
tenham impresso o primeiro livro no ano 868. No entanto, de acordo com Sousa
(2008), os tipos móveis não se popularizaram no Oriente, principalmente, por
conta da complexidade e da quantidade dos símbolos que compõem as línguas
orientais. Por outro lado, o método de impressão, aperfeiçoado por Gutenberg,
adequou-se muito bem ao sistema de escrita europeu, tornou-se popular e
permaneceu em uso até o século XIX.

NOTA

O primeiro livro impresso, o qual usou a técnica tipográfica de Gutenberg, foi


uma Bíblia. A escolha teve a ver com o modo de vida da época, pois a religião desempenhava
um papel central. Ela é considerada uma obra-prima, por conta da tipografia gótica que se
assemelhava à escrita dos monges. Letras maiúsculas e detalhes foram pintados à mão, e
com tinta vermelha. Algumas das Bíblias impressas, no século XV, encontram-se expostas
em museus e em bibliotecas da Europa.

6
TÓPICO 1 — NASCIMENTO E EVOLUÇÃO DA IMPRENSA

Lage (2001) lembra que o conhecimento acerca da produção de papel


e o pioneirismo na utilização de tipos móveis de cerâmica e de metal foram
conquistados, primeiramente, pelos países orientais. Para o autor, “a originalidade
dos inventos atribuídos a Gutenberg é discutível; uma das razões para que esse
debate tenha sido posto de lado é a grande difusão do trabalho excelente da
oficina na famosa edição da Bíblia, de 1450. Se não foi o primeiro, terá sido o
melhor dentre os primeiros” (LAGE, 2001, p. 11).

A invenção da prensa e a posterior revolução iniciada por ela ocorreram


em um período da história da Europa conhecido como Renascimento. Esse
período, compreendido, aproximadamente, entre meados do século XIV, e fim do
século XVI, caracterizou-se por intensas transformações. O feudalismo medieval
deu lugar ao capitalismo, o que levou à ampliação das fronteiras geográficas e
econômicas da Europa através do comércio. O desenvolvimento da atividade
comercial alavancou o aumento da necessidade de informações, e estabeleceu
um terreno fecundo para o surgimento de publicações noticiosas.

2.3.1 Folhas volantes e livros noticiosos


A nova técnica de impressão possibilitou o surgimento das folhas volantes
(também, chamadas de folhas noticiosas, folhas ocasionais ou relações), na Europa,
durante o século XVI. Essas publicações surgiram na Itália e se espalharam por
toda a Europa, sendo consideradas o principal fenômeno pré-jornalístico do
Renascimento.  Sousa (2008) explica que elas eram compostas por uma ou por
duas folhas de papel que, geralmente, traziam apenas um texto, uma "notícia". Os
temas abordados por essas publicações variavam de política, comércio, batalhas
militares a acontecimentos curiosos, crimes e assuntos religiosos.

Ao contrário dos jornais modernos, as folhas volantes circulavam de


forma esporádica, ou seja, não tinham uma periodicidade definida.  Outro
aspecto interessante citado pelo autor é o fato de que elas eram traduzidas
para vários idiomas, pois chegavam a circular entre países da Europa. Muitas
delas eram traduzidas, inclusive, para o latim, a língua dos intelectuais e dos
religiosos da época.

Também, no século XVI, apareceram os livros noticiosos. Além de


um maior número de páginas em comparação às folhas volantes, os livros
noticiosos já apresentavam uma periodicidade definida. Inicialmente, eram
anuais ou semestrais, mas, como fizeram sucesso, as publicações se tornaram
mais frequentes, chegando a ser mensais. Na prática, funcionavam como uma
compilação de notícias que, na visão dos editores, tinham valor histórico.

7
UNIDADE 1 — ORIGENS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO JORNALISMO

A boa aceitação das folhas volantes e dos livros noticiosos, entre a


burguesia e a elite alfabetizada da época, mostrava que as pessoas queriam e
precisavam consumir informação. Para se ter uma ideia, as pessoas que não
sabiam ler (a maior parcela da população) pagavam para ouvir as histórias
trazidas pelas publicações noticiosas.

3 PRIMEIROS JORNAIS
Conforme o relato de Lage (2001), os primeiros jornais dos quais se
tem registro surgiram na Alemanha, entre 1609 e 1610, nas cidades de Bremen,
Estrasburgo e Colônia. Em 1620, já existiam jornais nas cidades europeias de
Frankfurt, Berlim, Basiléia, Hamburgo, Amsterdã e Antuérpia. Em 1621, começou
a circular o primeiro jornal de Londres, na Inglaterra, Current of General
News. Dez anos depois, surgia, em Paris, França, o jornal La Gazette. 

Como ressalta o autor, a proliferação rápida dos jornais, pelas cidades da


Europa, sinaliza que existia uma necessidade social por informação que precisava
ser atendida. O conteúdo dos primeiros jornais destacava as notícias de países
estrangeiros, principalmente, os assuntos comerciais e os problemas políticos que
tinham potencial para afetar o comércio.

3.1 CARACTERÍSTICAS DOS PRIMEIROS JORNAIS


Sousa (2008) lista as principais características dos primeiros jornais, as
quais os diferenciavam de todas as publicações noticiosas anteriores. Note que
muitas delas ainda estão presentes nos jornais atuais:

• Periodicidade definida e frequente (inicialmente, semanal, depois, duas vezes


por semana, três vezes por semana, até chegar à circulação diária).
• Textos simples, precisos, geralmente, datados e, geograficamente, localizados.
• Inclusão de notícias de diferentes assuntos.
• Publicação de notícias do dia anterior, com a noção de atualidade, um valor
muito importante para o jornalismo moderno.
• Existência de profissionais dedicados, exclusivamente, à produção do jornal.
• Inclusão de anúncios pagos a partir de meados do século XVII, com a diminuição
do preço por exemplar, tornando os jornais mais acessíveis à população. 

Ao contrário dos jornais de hoje em dia, os textos dos jornais primitivos


eram escritos em sequência, sem títulos, nem separação entre uma notícia e
outra. Ainda assim, por todas as características citadas, pode-se afirmar que “o
jornalismo noticioso é uma invenção europeia dos séculos XVI e XVII, com raízes
remotas na antiguidade clássica e antecedentes imediatos da Idade Média e do
Renascimento" (SOUSA, 2008, p. 80).

8
TÓPICO 1 — NASCIMENTO E EVOLUÇÃO DA IMPRENSA

NOTA

Os primeiros jornais eram, comumente, chamados de gazetas. Esse nome


fazia referência à moeda que circulava em Veneza, na época. Uma gazeta era o preço que
as pessoas pagavam para ouvir as notícias trazidas pelas folhas volantes e pelos primeiros
jornais em atos de leitura pública (SOUSA, 2008). Essa nomenclatura se tornou popular e é
utilizada, até hoje, por veículos jornalísticos, como pelo jornal Gazeta do Povo, do Paraná.

3.2 LIBERDADE E CENSURA


Já nos primórdios do jornalismo, autoridades civis e religiosas viam, com
preocupação, a livre circulação de informações. Devemos nos lembrar de que,
nesse período da história, valores, como liberdades de pensamento e de expressão,
ainda, eram reprimidos pela Igreja Católica e pelo poder político absolutista.

Lage (2001) explica que a classe burguesa financiou a circulação dos


primeiros jornais, e, através dessas publicações, espalhava, pela Europa, os ideais
liberais (livre comércio e livre produção), o que permitia aumentar as fortunas
dela. O poder político da época se sentiu ameaçado e passou a impor restrições à
atividade jornalística iniciada.

Como resultado, em muitos lugares da Europa, havia censura prévia, ou


seja, os textos precisavam ser aprovados pelas autoridades para que pudessem
ser publicados e distribuídos. Além disso, para exercer os ofícios de tipógrafo e
de editor, era necessário um licenciamento, o qual só era concedido a indivíduos
que mantinham boas relações com as autoridades. Como resposta aos jornais
burgueses, a aristocracia, também, começou a editar os próprios jornais, mas
estes não alcançaram popularidade entre o público leitor.

Nesse cenário de luta ideológica entre a burguesia e a aristocracia, nasceu


o ideal da liberdade de expressão do pensamento, o qual passou a fazer parte do
ideário burguês e acabou se tornando um pilar do jornalismo moderno e das
sociedades democráticas que nasceram mais tarde. No entanto, como aponta
Lage (2001), mesmo depois da queda dos Estados absolutistas (cujo poder era
exercido por reis) e da ascensão dos Estados burgueses, leis que restringiam o
trabalho da imprensa continuaram a ser criadas e abandonadas durante todos os
séculos XVII, XVIII e, até mesmo, parte do século XIX.

9
UNIDADE 1 — ORIGENS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO JORNALISMO

4 SÉCULO XVIII: CONSOLIDAÇÃO DA IMPRENSA


Sousa (2008) nos lembra de que o século  XVIII foi um período de
consolidação e de ampliação do jornalismo, mas, antes de falarmos de como a
prática jornalística assumiu enorme importância durante esse período, precisamos
conhecer o contexto histórico no qual isso aconteceu. 

4.1 INFLUÊNCIA ILUMINISTA E NASCIMENTO DO ESPAÇO


PÚBLICO MODERNO
O século XVIII era, também, conhecido como Século das Luzes, em
referência ao movimento intelectual, filosófico e cultural chamado de Iluminismo,
o qual dominou a Europa durante esse período. Esse movimento foi marcado pela
valorização da razão e da ciência e defendia uma série de ideais burgueses, como
as liberdades política e econômica, os governos constitucionais, e a separação
entre Igreja e Estado, em contraposição ao absolutismo dominante na Europa
até então.  Datam, do século XVIII, alguns fatos históricos importantes para
compreender o mundo moderno, como a Revolução Americana, a qual levou à
independência dos Estados Unidos (1776); a Revolução Francesa (1789-1799); e a
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789).

Também, no século XVIII, a partir da proliferação de ambientes de


encontro, como cafés e clubes, nasceu o que pode ser chamado de espaço
público moderno, ou esfera pública (HABERMAS, 1984). Esse conceito fazia
referência, inicialmente, aos espaços físicos nos quais os cidadãos discutiam,
publicamente, assuntos de interesse geral, e se formavam as opiniões públicas
e as decisões políticas. 

A consolidação da imprensa, no entanto, fez com que esses debates fossem


transportados para as páginas dos jornais. A partir desse momento, o jornalismo
assumiu a função de mediador dos debates públicos, função que constitui, até os
dias de hoje, um dos principais fundamentos da atividade jornalística. 

É importante destacar que a imprensa daquele período era diferente da


que conhecemos hoje. Não havia separação entre informação e opinião, o que
caracteriza os jornais contemporâneos. Durante o século XVIII, e boa parte do
século XIX, os jornais não eram imparciais, ou seja, eles defendiam, abertamente,
partidos ou causas políticas. Guarde essa informação, pois ela será retomada
quando estudarmos as fases da evolução do jornalismo mundial, no Tópico 3,
desta mesma unidade. Além disso, o jornalismo, ainda, não era tão abrangente e
acessível quanto nos dias de hoje, servindo aos interesses de grupos específicos.
Como aponta Sousa (2008, p. 92): 

10
TÓPICO 1 — NASCIMENTO E EVOLUÇÃO DA IMPRENSA

Os jornais do século XVIII eram, na realidade, restritos no acesso, na


utilidade e, mesmo, no interesse à burguesia, a qual os consumia e,
deles, beneficiava-se, podendo usá-los para intervir na vida pública e
nas discussões racionais acerca do governo, dos negócios e do Estado.
No entanto, gradualmente, os jornais conquistavam novos públicos,
dentre os quais, os trabalhadores, os estudantes e as mulheres. 

4.2 ESTADOS UNIDOS: JORNALISMO, INDEPENDÊNCIA E


LIBERDADE DE EXPRESSÃO
Nos Estados Unidos, os quais eram colônias britânicas até 1776, os jornais
foram responsáveis por denunciar as arbitrariedades e os abusos do governo
colonial britânico em terras americanas. Nesse cenário, proliferaram-se os jornais
que se posicionavam a favor da independência, e outros que se alinhavam aos
interesses da coroa britânica. 

Um clima generalizado de apoio à independência se instaurou a partir


do momento em que os britânicos instituíram leis fiscais consideradas abusivas,
sobre as colônias, em 1775. No ano seguinte, foi promulgada a Declaração de
Independência dos Estados Unidos da América, redigida por Thomas Jefferson,
com forte inspiração nos ideais iluministas.

Nos anos seguintes, o Congresso aprovou dez emendas à Constituição,


conhecidas como Bill of Rights. A primeira delas instituiu a liberdade de expressão
e a liberdade de imprensa como direitos fundamentais e invioláveis dos cidadãos.
A partir desse ato, os Estados Unidos se converteram "não apenas no mais forte
produtor de conteúdos culturais, mas, também, no país no qual, primeiramente,
ocorrerão as principais transformações pelas quais o jornalismo atravessará ao longo
dos séculos XIX e XX” (SOUSA, 2008, p. 99).

5 INDUSTRIALIZAÇÃO DA IMPRENSA
A Revolução Industrial, no século XIX, levou à mecanização dos processos
de produção de jornais. Com isso, as tiragens e a circulação dos periódicos se
multiplicaram. Por outro lado, os empresários do ramo precisavam fazer grandes
investimentos para a aquisição das máquinas.

Uma série de evoluções tecnológicas, associadas a contextos históricos


favoráveis, permitiram que o jornalismo se tornasse uma atividade industrial e
crescesse em alcance e importância. Para se ter uma ideia, a técnica de impressão,
criada por Gutenberg, a respeito da qual já falamos, só foi, completamente,
substituída no século XIX, com a impressora mecânica, usada, pela primeira vez,
em 1814, em Londres (LAGE, 2001).

11
UNIDADE 1 — ORIGENS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO JORNALISMO

Décadas depois, adotou-se a prensa de quatro cilindros rotativos (1867),


25 vezes mais rápida do que qualquer outro método de impressão existente na
época. Outra tecnologia que acelerou a composição dos jornais foi a linotipo, uma
máquina criada em 1884, nos Estados Unidos, a qual fundia, em bloco de chumbo,
cada linha de caracteres batida no teclado (semelhante ao teclado de uma máquina
de escrever). Essa nova técnica de impressão, chamada de linotipia, acelerou os
processos de composição das páginas do jornal. Antes dela, era preciso juntar os
tipos móveis (caracteres) um a um, de forma manual (LAGE, 2001).

DICAS

No vídeo a seguir, produzido pelo Diário do Grande ABC, você poderá conhecer
um pouco mais a respeito da linotipo e do funcionamento dela: https://www.youtube.com/
watch?v=7DY63gvSuYI.

Schudson (2010) explica que as invenções tecnológicas que permitiram


a existência de jornais de alta circulação foram impulsionadas pela crescente
demanda social por informação, proveniente de livros e de jornais, e não o
contrário. Nesse sentido, o autor nos lembra de que foram os donos dos jornais
que patrocinaram o trabalho dos inventores, para que estes pudessem aperfeiçoar
as técnicas de impressão e fornecer condições para o crescimento do negócio
jornalístico.

A fotografia, uma das características mais marcantes dos jornais


modernos, foi inventada em 1839, e abriu caminho para novos processos de
impressão, os quais permitiram levá-la às páginas dos jornais. Há divergência a
respeito de qual foi o primeiro jornal do mundo a reproduzir uma fotografia nas
páginas, mas, autores, como Lage (2001), defendem que tenha sido o periódico
de Nova York, Daily Graphic, em 4 março de 1880. A fotografia publicada nessa
data poderá ser vista a seguir:

12
TÓPICO 1 — NASCIMENTO E EVOLUÇÃO DA IMPRENSA

FIGURA 2 – PRIMEIRA FOTOGRAFIA PUBLICADA EM JORNAL

FONTE: <https://historyofinformation.com/detail.php?id=3930>. Acesso em: 24 abr. 2021.

Sousa (2008) considera que a imprensa atingiu a maturidade no século


XIX, impulsionada por uma série de fatores históricos e contextuais associados à
consolidação do capitalismo e da Revolução Industrial. Dentre os fatores citados
pelo autor, estão a melhoria dos níveis educacionais da população, o surgimento
da classe operária e a gradativa transformação dela em classe média, e o aumento
do consumo de bens e de serviços.

5.1 AGÊNCIAS INTERNACIONAIS DE NOTÍCIA


Também, nesse contexto de industrialização da imprensa, durante o século
XIX, surgiram as primeiras agências internacionais de notícia. Como explica
Sousa (2008, p. 128), as agências de notícias são "organizações que se dedicam
a produzir notícias e outras informações para venda aos órgãos jornalísticos e
a outras entidades, potencialmente, interessadas". O nascimento desse tipo de
empreendimento demonstrou que o jornalismo estava se tornando uma atividade
industrial, que precisava produzir notícias em larga escala. Como veremos a
seguir, diversos fatores contribuíram para o surgimento das agências, conforme
a análise de Sousa (2008).

Durante o século XIX, os jornais cresceram em todos os lugares do mundo,


em tiragem, em circulação e em número de páginas. Com isso, as empresas
jornalísticas precisavam de grande quantidade, além de variedade de notícias,
para contemplar um público que se tornava cada vez maior e mais diversificado.
Por isso, fazia sentido comprar "notícias prontas" para aumentar o cardápio
disponível ao leitor.

13
UNIDADE 1 — ORIGENS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO JORNALISMO

Como vimos, novas técnicas de impressão tornaram o jornal um produto


mais rápido a ser feito e mais lucrativo. Assim, os donos das empresas jornalísticas
tinham condições de pagar a fornecedores externos de informação, e, com isso,
conseguiam cobrir uma quantidade maior de acontecimentos do que as equipes
seriam capazes.

O desenvolvimento de novos meios de comunicação, como o telégrafo, e


de novos meios de transporte, como navios a vapor e carros, tornou as atividades
de recolher e de enviar informações mais fáceis e rápidas. Além disso, essas
inovações permitiram que os jornais chegassem cada vez mais longe, aumentando
os públicos e os lucros.

TUROS
ESTUDOS FU

Falaremos mais das inovações tecnológicas, as quais mudaram a história do


jornalismo, como o telégrafo, o rádio e a televisão, no Tópico 2 desta unidade.

O uso crescente de notícias provenientes das agências ajudou a moldar


algumas das características mais marcantes do jornalismo praticado do século XIX
ao início do século XX: a primazia da informação sobre a opinião e a linguagem
clara, breve e simples.

A primeira agência internacional de notícias do mundo, a Havas, nasceu


na França, em 1836. Conforme o relato de Erbolato (2001, p. 199), "as informações
procediam de diversas cidades europeias e, em seguida, eram distribuídas pelo
correio ordinário aos assinantes, os quais foram, inicialmente, não os jornais, mas
alguns financistas, diplomatas e comerciantes".

Nos anos seguintes, foram criadas a Associated Press, em 1844, nos Estados
Unidos, a Wolff, na Alemanha, em 1849, e a Reuters, na Inglaterra, em 1851.
Juntas, essas agências respondiam por, praticamente, todo o fluxo internacional
de notícias da época.  A pioneira Havas foi fechada logo após a Segunda Guerra
Mundial, “sob acusação de ter colaborado com os nazistas, quando os alemães
ocuparam a França” (ERBOLATO, 2001, p. 202). Em seu lugar, foi criada a France
Presse, em 1944, ainda em atividade.

Conforme o relato de Sousa (2008), inicialmente, as agências traduziam


notícias da mídia estrangeira e vendiam aos órgãos jornalísticos dos países nos
quais estavam sediadas. Depois, começaram a produzir notícias de economia para
vender aos jornais, às grandes empresas e aos bancos, que precisavam desse tipo

14
TÓPICO 1 — NASCIMENTO E EVOLUÇÃO DA IMPRENSA

de informação para gerir os negócios. No entanto, devido à demanda crescente


por informação, "as agências, rapidamente, alargaram o negócio à produção
generalista de informações, controlando, em especial, o fluxo de notícias entre as
colônias e as metrópoles" (SOUSA, 2008, p. 130).

Acordos entre as maiores agências europeias do século XIX transformaram


essas organizações em verdadeiros oligopólios da informação e asseguraram, a
cada uma delas, a cobertura de uma parte do mundo. Esse oligopólio durou 60
anos, até a Primeira Guerra Mundial (AGUIAR, 2009).

NOTA

Um oligopólio é uma situação na qual um número limitado de empresas


controla a maior parte de um determinado mercado.

Atualmente, as principais agências de notícia do mundo são a Associated


Press (AP), a France Presse (FP), e a Reuters e United Press International (UPI).
Ainda que grandes jornais e emissoras de televisão mantenham correspondentes
internacionais nos principais países do mundo, as agências permanecem
relevantes, enviando, diariamente, enormes quantidades de informação para
mais de 100 países, e em diversos idiomas.

5.2 A REVOLUÇÃO DOS PENNY PRESS


A década de 1830 marcou uma revolução no jornalismo praticado nos
Estados Unidos, os quais estabeleceram os padrões do jornalismo moderno em
boa parte do mundo, o que representou o triunfo da informação sobre a opinião
nos jornais. Essas transformações aconteceram em um contexto de expansão
da democracia e do mercado, e, como veremos, levou à adoção de uma das
regras mais difundidas e discutidas no jornalismo: o ideal da objetividade
(SCHUDSON, 2010).

De acordo com o relato de Schudson (2010), até a década de 1830, a


imprensa, nos Estados Unidos, era sustentada pelas elites comerciais e políticas.
O conteúdo, também, era, integralmente, voltado a esse público. Um exemplar de
jornal custava seis centavos, um valor alto para os salários da época. Os jornais
não eram vendidos separadamente, apenas por assinaturas anuais. Os maiores
periódicos desse período tinham tiragem de, no máximo, dois mil exemplares.

15
UNIDADE 1 — ORIGENS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO JORNALISMO

A partir da década de 1830, o surgimento dos chamados penny papers deu


início a uma revolução comercial na imprensa norte-americana. Esses jornais
eram populares, vendidos a preço de um centavo, em vez dos seis centavos pagos
pelos jornais tradicionais. Além disso, não era necessário pagar uma assinatura
anual, pois os exemplares eram vendidos por jornaleiros, nas ruas, ou seja, era
possível comprar um único exemplar.

Mindich (1998) explica que o processo de urbanização da sociedade norte-


americana, a partir da década de 1830, levou ao surgimento de classes sociais
urbanas, que não se sentiam representadas pelos partidos políticos e pelos jornais
da época. Os penny papers nasceram nesse contexto. Além de acessíveis, esses
jornais populares abordavam temas que afetavam a vida desses indivíduos, como
a violência urbana, por exemplo.

O primeiro jornal desse tipo foi o New York Sun, que entrou em
circulação em setembro de 1833. No ano seguinte, a tiragem já era de cinco mil
exemplares, e, depois de dois anos da inauguração, atingiu a marca de 15 mil.
Nos anos seguintes, outros jornais do gênero foram criados em Nova York e em
outros grandes centros urbanos do país (SCHUDSON, 2010). A seguir, veremos
a primeira página da primeira edição do New York Sun, que circulou em 3 de
setembro de 1833. No alto da página, lê-se “Price One Penny” (preço um centavo).
O primeiro parágrafo declarou o objetivo do jornal, que instaurava um novo
modelo de jornalismo: “O objetivo deste jornal é colocar, diante do público, a um
preço dentro das possibilidades de todos, todas as notícias do dia, e, ao mesmo
tempo, oferecer um vantajoso meio para a publicidade” (tradução livre).

16
TÓPICO 1 — NASCIMENTO E EVOLUÇÃO DA IMPRENSA

FIGURA 3 – PRIMEIRA PÁGINA DA PRIMEIRA EDIÇÃO DO JORNAL NEW YORK SUN

FONTE: <https://line.17qq.com/articles/oncdcov.html>. Acesso em: 24 abr. 2021.

NOTA

Penny significa “centavo”, em inglês. Por esse motivo, os jornais populares


vendidos a um centavo ficaram conhecidos como penny papers (jornais de um centavo,
em tradução livre). Do mesmo modo, a imprensa que nasceu a partir do surgimento desses
jornais é chamada de penny press, ou imprensa penny.

17
UNIDADE 1 — ORIGENS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO JORNALISMO

Outro aspecto que os diferenciava dos jornais que existiam nos Estados
Unidos, até então, era a forma de financiamento. Ao contrário dos jornais
tradicionais, sustentados, diretamente, pelas elites políticas e comerciais que,
deles, beneficiavam-se, os penny papers eram financiados pela venda de espaço
publicitário e de exemplares. Essa publicidade, por sua vez, era voltada para
públicos diversos, e os jornais não faziam distinções morais entre anunciantes,
aceitando todos os tipos de anúncios e recebendo críticas pelo excesso de anúncios
de medicamentos e de médicos, conforme o relato de Schudson (2010).

Os jornais de um centavo se declaravam, politicamente, independentes, e


eram, relativamente, indiferentes a eventos políticos. Os jornais pioneiros nesse
segmento abordavam pouco os temas políticos, em um primeiro momento da
existência, privilegiando assuntos locais e cotidianos. Como relata Schudson
(2010, p. 34), “pela primeira vez, o jornal considerava não apenas o comércio
ou a política, mas a vida social”. Com isso, para o autor, a imprensa popular
estabeleceu o conceito moderno de notícia.

Até os anos 1830, os jornais forneciam um serviço para partidos políticos


e comerciantes; com a imprensa penny, um jornal vendia um produto
ao leitor, em geral, e vendia, o leitor, ao anunciante. O produto vendido
aos leitores era a ‘notícia’, um produto original, sob vários aspectos.
Primeiro, pretendia representar, realisticamente, mas sem cor partidária,
os acontecimentos no mundo. Assim, o produto ‘notícia’, de um jornal,
poderia ser comparado ao de outro nos critérios exatidão, integridade,
vivacidade e atualidade (SCHUDSON, 2010, p. 37).

Na época dos primeiros penny papers, a imprensa ainda não era uma
indústria nos Estados Unidos, e não havia uma classe profissional de jornalistas
que compartilhasse dos mesmos valores. Conforme o relato de Schudson (2010),
a partir do final do século XIX, estabeleceram-se os valores profissionais que
moldaram o jornalismo moderno e que se fazem presentes até os dias de hoje,
como veremos a seguir.

5.3 FUNDAMENTOS DO JORNALISMO E


VALORES PROFISSIONAIS
Ainda que as origens do jornalismo remontem à Europa do século XVII,
como vimos no início desta unidade, alguns historiadores da mídia defendem
que o jornalismo, como o conhecemos hoje, é uma invenção norte-americana
do século XIX. Essa afirmação se deve ao fato de que, nos Estados Unidos, e,
em menor grau, na Inglaterra, durante o século XIX, “as práticas discursivas e
estratégias que caracterizam o jornalismo foram inventadas. Também, nesses
países, a imprensa se industrializou mais rapidamente, e, logo, tornou-se um
campo autônomo de produção discursiva” (CHALABY, 1996, p. 304).

18
TÓPICO 1 — NASCIMENTO E EVOLUÇÃO DA IMPRENSA

Para Chalaby (1996), a profissão de jornalista e o jornalismo, propriamente


dito, nasceram a partir do momento em que o discurso jornalístico assumiu
características específicas, resultado da adoção de normas e de valores
discursivos próprios, como objetividade, neutralidade e imparcialidade. Com
isso, o jornalismo se tornou independente da literatura e desenvolveu o conceito
moderno de notícia enquanto um relato baseado em fatos.

Conforme o relato de Mindich (1998), antes da Guerra Civil Americana


(1861-1865), não existiam organizações profissionais, cursos universitários
ou manuais voltados para jornalistas nos Estados Unidos. O surgimento
da profissão de jornalista, portanto, coincidiu com a adoção de valores que
diferenciaram o jornalismo de outras formas de produzir narrativas, na
segunda metade do século XIX.

5.3.1 Origens do ideal da objetividade


Quando falamos de objetividade, o que vem na sua mente? Para o senso
comum, ser objetivo significa ir direto ao ponto, sem rodeios, mas quando
falamos da objetividade nos meios acadêmico e científico, estamos nos referindo
à qualidade de algo que dá, ou pretende dar, uma representação fiel de um
determinado objeto ou realidade.

O conceito de objetividade jornalística, a respeito do qual você ouvirá


muito durante a sua formação acadêmica, faz referência à noção de que é possível
fornecer, ao público, uma narrativa noticiosa que corresponda, fielmente, à
realidade dos fatos. Sponholz (2009, p. 17) define a objetividade jornalística como
um "sistema de regras que tem, como objetivo, a produção de uma semelhança
estrutural entre realidade social e realidade midiática".

O termo faz referência ao processo de produção da notícia, a partir do


qual o jornalista se informa para, depois, informar os outros (FIDALGO, 1988
apud SPONHOLZ, 2009). Para Schudson (2010, p. 16), “a crença na objetividade é
uma confiança nos “fatos”, uma desconfiança nos “valores”, e um compromisso
com a segregação de ambos”. Essa é uma noção que estabeleceu raízes profundas
no jornalismo praticado durante o século XX, tornando-se parte de uma ideologia
profissional compartilhada por jornalistas em boa parte do mundo. Faremos a
respeito das origens históricas desse conceito nos próximos parágrafos.

Alguns pesquisadores da história da mídia creditam a instituição da


objetividade jornalística à criação da agência de notícias Associated Press, em
1848, nos Estados Unidos, alguns anos depois da invenção do telégrafo: "uma vez
que a Associated Press buscava notícias para publicação em uma variedade de
jornais, com alianças políticas, amplamente, diversificadas, ela só poderia obter
êxito ao tornar a reportagem “objetiva” o suficiente para ser aceita por todos os
membros e clientes” (SCHUDSON, 2010, p. 14). No entanto, Schudson (2010)
argumenta que essa afirmação não condiz com a realidade. Segundo o autor, no

19
UNIDADE 1 — ORIGENS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO JORNALISMO

final do século XIX, os jornais exploravam conteúdos de cunho sensacionalista


e as reportagens se aproximavam do modo narrativo da literatura. Coube,
ao jornal New York Times, dar início a essa transformação, através da qual o
jornalismo apresentava as notícias ao público, ao adotar um modelo de notícia
que privilegiava a informação e a apuração dos fatos, em vez da narração de uma
história envolvente.

Segundo o autor, apenas nas primeiras décadas do século XX, após a


Primeira Guerra Mundial, a objetividade jornalística se tornou um padrão no
jornalismo, praticado nos Estados Unidos, influenciando jornais do mundo inteiro.
Isso porque, durante a guerra, muitos jornalistas perceberam que os fatos, antes,
relatados por eles, de forma ingênua, eram manipulados pelos instrumentos de
propaganda e pelas relações públicas de governos e de partidos, de acordo com
os próprios interesses.

A noção de objetividade que emergiu desse momento histórico estava


fundamentada no que os pesquisadores chamam de “empirismo ingênuo”, uma
concepção de mundo segundo a qual todo o nosso conhecimento do mundo
provém da observação direta da realidade. Por isso, para conhecer os fatos, o
repórter deveria ir às ruas, testemunhar os fatos e entrevistar pessoas. Essa ideia
de objetividade é, também, chamada de facticidade, pois está centrada nos fatos.
Defende que os fatos revelam a realidade em estado puro (SPONHOLZ, 2004).

Essa concepção de objetividade se materializa nos textos jornalísticos


através da adoção de técnicas, como a pirâmide invertida e o lead. A pirâmide
invertida é um modelo de texto jornalístico que apresenta as informações em
ordem decrescente de importância, ou seja, no início do texto, são dadas as
informações mais importantes do fato. As informações menos importantes são
deixadas para o fim. O lead (do inglês, “conduzir”) é o primeiro parágrafo desse
tipo de texto, no qual devem ser respondidas seis perguntas fundamentais para
um texto jornalístico objetivo: o quê, quem, quando, onde, como e motivo. Como
explica Sponholz (2004), mais do que um modelo de texto, o lead fornece um
roteiro básico para a pesquisa jornalística.

A noção de objetividade se tornou, ao longo do tempo, o principal


mandamento dos manuais de jornalismo norte-americanos, e se estendeu para a
prática jornalística de outros países que adotam o modelo norte-americano, como
o Brasil. Nas palavras de Mindich (1998), se o jornalismo americano fosse uma
religião, a objetividade seria a divindade suprema.

20
TÓPICO 1 — NASCIMENTO E EVOLUÇÃO DA IMPRENSA

DICAS

É válido ressaltar que a objetividade jornalística, enquanto um ideal profissional


a ser buscado ou atingido, é uma questão complexa, que levanta muitas discussões entre
jornalistas profissionais e pesquisadores do jornalismo desde os anos 1960. Se você deseja
se aprofundar no assunto, sugerimos a leitura do livro Descobrindo a Notícia: Uma História
Social dos Jornais nos Estados Unidos, do professor e jornalista norte-americano Michael
Schudson, o qual se encontra nas referências desta unidade.

21
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• Muito antes da existência dos jornais, já existiam fenômenos pré-jornalísticos,


como as Actas Diurnas, os Avisi, as folhas volantes e os livros noticiosos.

• A invenção da prensa mecânica de tipos móveis, e o surgimento do comércio e


da burguesia, foram fatores que impulsionaram o nascimento da imprensa.

• Os primeiros jornais do mundo surgiram na Europa, no início do século XVII, e já


apresentavam algumas características que definem os jornais contemporâneos,
como a periodicidade, a variedade de assuntos, a atualidade das notícias e a
existência de anúncios pagos.

• A partir da Revolução Industrial, no século XIX, a imprensa, também, passou


por um processo de industrialização, o que permitiu, ao jornalismo, aumentar
o alcance e a importância.

• O surgimento de jornais populares, nos Estados Unidos, voltados para a notícia


e sustentados pela publicidade, estabeleceu os padrões do jornalismo moderno e
os valores profissionais presentes até hoje.

22
AUTOATIVIDADE

1 Muito antes da existência dos jornais modernos, a sociedade já havia


desenvolvido maneiras de transmitir informação de fatos. Com base no
que você estudou, quais, a seguir, podem ser considerados fenômenos
pré-jornalísticos?

a) ( ) Jornais de opinião e penny papers.


b) ( ) Gazetas e panfletos de propaganda.
c) ( ) Folhas volantes e livros noticiosos.
d) ( ) Jornais de opinião e jornais de informação.

2 As origens da atividade, propriamente jornalística, remetem ao século XVII,


com o surgimento dos primeiros jornais na Europa, também, chamados
de gazetas. Esses jornais primitivos já exibiam uma série de características
definidoras do jornalismo hoje. Com base nos seus conhecimentos acerca das
características dos primeiros jornais, analise as sentenças a seguir:

I- Os jornais primitivos tinham periodicidade definida, textos simples e


noção de atualidade.
II- As gazetas circulavam esporadicamente, ou seja, não tinham periodicidade
definida.
III- Os primeiros jornais traziam assuntos variados em textos simples,
geralmente, datados, e, geograficamente, localizados.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 As agências internacionais de notícias surgiram a partir da


industrialização da imprensa e da crescente necessidade por notícias
variadas para oferecer aos leitores. Com base nos seus conhecimentos
acerca das agências de notícias, classifique V para as sentenças
verdadeiras e F para as sentenças falsas:

( ) A primeira agência de notícias do mundo foi a Associated Press, a qual


iniciou as atividades na França, em 1836.
( ) Inicialmente, os clientes das agências de notícias não eram os jornais,
mas os grandes comerciantes e banqueiros, os quais precisavam de
informações provenientes de outros países para gerir os negócios.
( ) Um acordo entre as maiores agências de notícias do mundo garantiu, a
cada uma delas, a exclusividade de cobertura de uma parte do mundo,
criando um oligopólio que durou seis décadas.

23
Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:
a) ( ) F – V – V.
b) ( ) V – F – V.
c) ( ) F – V – F.
d) ( ) F – F – V.

4 Os penny papers representaram um capítulo importante da história do


jornalismo. Surgiram nos Estados Unidos, na década de 1830, e eram
jornais populares, vendidos avulsos a preços acessíveis. Com base
nos seus conhecimentos acerca dos penny press, sintetize as principais
características deles e explique por que representaram uma revolução
comercial na imprensa.

5 A objetividade jornalística é um ideal profissional, historicamente,


construído. Uma série de fatores contribuiu para a adoção desse ideal
no interior da comunidade jornalística. Com base no que você estudou,
explique as origens históricas do ideal da objetividade jornalística e de que
maneira se materializa nos textos jornalísticos.

24
TÓPICO 2 —
UNIDADE 1

ORIGENS DA COMUNICAÇÃO ELETRÔNICA

1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, neste tópico, abarcaremos as origens da comunicação
eletrônica, a qual percorreu um longo caminho de pesquisas e de descobertas
para que possamos, hoje, desfrutar de tecnologias instantâneas de transmissão
de informação.

Conheceremos as origens do telégrafo e do telefone, os quais


revolucionaram o modo através do qual as informações chegavam até os jornais
para serem publicadas, tornando as notícias publicadas cada vez mais quentes.

Veremos que a evolução das pesquisas em torno da eletricidade e do


magnetismo tornou possível o surgimento do rádio e, posteriormente, da televisão,
o que encantou o mundo e forneceu, ao jornalismo, infinitas possibilidades de
mostrar os fatos ao público, na hora e no local exatos.

2 PRIMÓRDIOS DA COMUNICAÇÃO ELETRÔNICA


Com as descobertas relacionadas à eletricidade, por Benjamin Franklin,
em 1752, diversas outras invenções contribuíram para o desenvolvimento das
comunicações (PRADO, 2012). O próprio Franklin propôs que a eletricidade fosse
usada para a transmissão de mensagens a distância (FERRARETTO, 2001). Os
cientistas queriam descobrir uma forma mais rápida para enviar informações de
um ponto a outro, para interligar cidades de alguma forma que não dependesse
mais, apenas, dos sistemas de correio.

No final da segunda década do século XIX, de acordo com Ferraretto


(2001), o dinamarquês Hans Christian Oersted observou que a corrente elétrica,
em um condutor, afetava a agulha de uma bússola colocada próxima a ele,
comprovando que a eletricidade e o magnetismo estavam relacionados. Tal ideia
seria comprovada por Joseph Henry e Michael Faraday. Estavam desenvolvidas
as bases para dois meios de comunicação: o telégrafo e o telefone.

No final do século XIX, o telégrafo foi patenteado em Londres, por


William Fothergill Cooke e Charles Wheatstone (FERRARETTO, 2001). Esse
aparelho consistia no aperfeiçoamento dos estudos que envolviam a eletricidade
e o magnetismo, desenvolvidos por outros pesquisadores. A partir de 1830,

25
UNIDADE 1 — ORIGENS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO JORNALISMO

surgiram as primeiras transmissões a distância, com o uso da telegrafia com fios,


um aparelho capaz de transmitir sinais elétricos de um ponto a outro. No entanto,
para que essa comunicação fosse possível, era necessário estabelecer um padrão
de linguagem. Coube, ao norte-americano Samuel Morse, desenvolver, entre 1832
e 1837, o Código Morse, que “intercalava impulsos elétricos breves e longos que
correspondiam, respectivamente, a pontos e traços” (FERRARETTO, 2001, p. 81).

Para Ferraretto (2001), o contexto histórico no qual as novas tecnologias


se desenvolveram foi marcado pelo colonialismo europeu na África e na Ásia. Já
os Estados Unidos enfrentaram, de 1861 a 1865, a Guerra de Secessão. Durante
o conflito, “o telégrafo foi um importante elemento estratégico, e, com a vitória
da União sobre os confederados, transporte e comunicação foram essenciais à
integração e à manutenção da unidade nacional” (FERRARETTO, 2001, p. 80).

No final do século 19, a maior potência mundial seguia sendo a Grã-


Bretanha, mas os EUA já despontavam no cenário internacional. Ao
mesmo tempo, amparado pela Revolução Industrial, praticamente,
consolidada na Europa e na América do Norte, o capitalismo se
expandia. Radiotelegrafia e radiotelefonia eram, portanto, tecnologias
importantes, política e economicamente (FERRARETTO, 2001, p. 80).

NOTA

Você já ouvir falar do Código Morse? Esse código, baseado na transmissão de


sinais sonoros em pontos e traços, virou uma linguagem universal. Independentemente da
língua do país, todos os usuários do sistema conseguiam receber e transmitir uma mensagem
de forma padronizada. O Código Morse se tornou indispensável na comunicação marítima,
por exemplo, quando se precisava emitir um pedido de socorro. Tal código tornou popular
o conhecido “S.O.S.”.

O telefone, de Alexander Graham Bell, em 1876, permitiu a comunicação


entre dois pontos por meio de cabos, mas, isso, ainda não era suficiente para se
comunicar com o grande público ou para difundir informações.

Quatro décadas depois, em 1876, Alexander Graham Bell obtinha uma


carta patente para o telefone, aparelho no qual as vibrações da voz
humana são transformadas em um fluxo de elétrons e recompostas,
na sequência, na forma de som. Assim, ao falar, uma pessoa faz
vibrar uma membrana metálica colocada com um pequeno recipiente,
repleto de carbono granulado, submetido a uma corrente elétrica. Esse
fluxo de elétrons varia, conforme as vibrações. Na outra ponta, a do
receptor, dá-se o processo inverso (FERRARETTO, 2001, p. 81).

26
TÓPICO 2 — ORIGENS DA COMUNICAÇÃO ELETRÔNICA

O físico James Clerk Maxwell conseguiu demonstrar que essa


combinação, entre magnetismo e eletricidade, apresenta-se no espaço, em 1863,
em Cambridge, na Inglaterra (FERRARETTO, 2001), o que gerou a descoberta
das ondas eletromagnéticas. De acordo com Ferraretto (2001, p. 81), Maxwell
conseguiu provar, “[...] por deduções matemáticas, que o efeito combinado da
eletricidade e do magnetismo se manifesta no espaço, originando um campo,
o qual se propaga sob forma de vibração ondulatória com a velocidade da luz
[...]”. Essa descoberta seria o embrião para o desenvolvimento da radiodifusão.
Outros cientistas, como o francês Edouard Branly, e o britânico Oliver Lodge,
conseguiram demonstrar que era possível receber, além de transmitir ondas
eletromagnéticas na década de 1890.

A detecção e o estudo dos campos eletromagnéticos ainda eram


difíceis quando o francês Edouard Branly, em 1890, apresentou, à
Academia de Ciências, em Paris, o coesor, um tubo de vidro cheio
de limalha de ferro, ou seja, partículas do metal que, na presença de
ondas hertzianas, uniam-se fortemente, permitindo a passagem de
energia elétrica (FERRARETTO, 2001, p. 81).

A necessidade de interligar os continentes, encurtar distâncias suscitou o


surgimento de equipamentos, como o telégrafo com fio, utilizando-se o Código
Morse, na década de 1830. A partir de 1858, foram implantados cabos submarinos
para envolver os continentes e reduzir longas distâncias, transmitindo informações
por meio do telégrafo com fio. Nesse cenário, surgiram as agências internacionais
de notícias, um capítulo importante da história do jornalismo, a respeito das
quais você já estudou. Como aponta Traquina (2005, p. 38):

Os avanços na rapidez da transmissão da informação [...] iriam


ser o sinal de uma nova era no jornalismo, cada vez mais global, e
cada vez mais ligada à atualidade, que continua cada vez mais viva
hoje [...]. A identificação do jornalismo, com a atualidade, seria,
irrepreensivelmente, atingida, e a obsessão do jornalista com a
obrigação de fornecer as últimas notícias, de preferência, em primeira
mão, e com exclusividade, tornar-se-á um marco fundamental da
identidade jornalística.

2.1 TELÉGRAFO SEM FIO


Na década de 1870, surgiu o telégrafo sem fio, com a tecnologia das antenas
transmissoras, assim, o aparelho com fio já se tornaria obsoleto. Semelhante à
transmissão atual de rádio e de televisão, o telégrafo sem fio permitia que um
operador de telégrafo, ainda escrevendo em Código Morse, conseguisse transmitir
a mensagem, mas sem estar conectado a qualquer tipo de cabo físico, ou seja, por
sinais eletromagnéticos.

Em 1887, o físico alemão Heinrich Rudolf Hertz conseguiu confirmar os


cálculos da teoria do britânico James Clerk Maxwell, e as ondas eletromagnéticas
passaram a ser conhecidas, no mundo todo, como ondas hertzianas
(FERRARETTO, 2001). Um Hertz significa um giro da onda eletromagnética.
27
UNIDADE 1 — ORIGENS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO JORNALISMO

NOTA

Sinais eletromagnéticos são transmitidos, pelo espectro de radiofrequência, de


um ponto a outro, ou seja, são necessários um emissor e um receptor, mesmo que este
seja o público, em geral, como acontece com a TV e o rádio, ou um público específico,
com o telefone celular e a comunicação entre aviões e navios.

Depois do telégrafo sem fio, foram poucos anos para se conseguir


transmitir a voz humana a distância, também sem fios. No interior do Brasil, no
Rio Grande do Sul, o padre Roberto Landell de Moura conseguiu desenvolver um
sistema transmissor, com microfones primitivos e alto-falantes que transmitiam
a voz a distância. Ele chegou a obter patentes dos inventos nos Estados Unidos,
mas não foi reconhecido no Brasil.

No Canadá, o cientista Reginald Fessenden, também, foi capaz de transmitir


a voz humana a longas distâncias, por volta de 1900, e acabou entrando para os
livros de história. Em 1906, o cientista desenvolveu um processo de transmissão
que ficaria conhecido como amplitude modulada, ou seja, o rádio AM.

A primeira transmissão comprovada e eficiente ocorreu na noite de 24


de dezembro de 1906. Usando um alternador desenvolvido pelo sueco
Ernest Alexanderson, o canadense Reginald A. Fessenden transmitiu o
som de um violino, de trechos da Bíblia e de uma gravação fonográfica.
Da estação em Brant Rock, Massachussetts, as emissões foram ouvidas,
em diversos navios, na costa norte-americana. Fessenden aplicava os
princípios da amplitude modulada (FERRARETTO, 2001, p. 86).

No Brasil, em vez de ser reconhecido como um brilhante cientista, o padre


brasileiro Landell de Moura era tido por bruxo pelas pessoas humildes da época,
espantadas porque pensavam estar diante de um fenômeno sobrenatural. Na
verdade, ele estava experimentando técnicas de transmissão da voz humana,
como fez o canadense Fessenden. Landell de Moura foi o pioneiro na transmissão
a distância, sem fios, da voz humana, por meio das ondas eletromagnéticas,
segundo Prado (2012).

Assim como Landell de Moura e Fessenden, cientistas do mundo inteiro


estavam prestes a desenvolver o rádio, mas não havia como conectá-los, conversar
entre eles, não tinha internet e o telefone, ainda, era algo raro. Por isso, muitos
desses brilhantes cientistas acabaram desconhecidos.

O italiano Guglielmo Marconi se mudou para a Inglaterra e, posteriormente,


para os Estados Unidos. Como era um grande empreendedor, conseguia adquirir
patentes de invenções de outros cientistas. Claro que os méritos de Marconi são
muitos, mas, talvez, seja inadequado conceder, a ele, o título de pai do rádio. Na
realidade, pode-se atribuir, a Marconi, a invenção da radiotelegrafia, ou seja, do
telégrafo sem fio, em Código Morse.
28
TÓPICO 2 — ORIGENS DA COMUNICAÇÃO ELETRÔNICA

Marconi realizou, em 11 de dezembro de 1901, a primeira transmissão


transatlântica de um sinal de rádio, da Inglaterra ao Canadá, e a única coisa
transmitida foi a letra “S”, em Código Morse (SIQUEIRA, 2007 apud PRADO,
2012). Mesmo assim, quando saiu da Europa e montou a própria empresa,
nos Estados Unidos, a então Marconi & Co, acabou se tornando uma das mais
importantes indústrias eletrônicas do mundo, a Radio Corporation of America,
nas primeiras décadas do século XX.

A última década do século XIX foi fundamental para a transmissão da


palavra falada. Nos primeiros quatro anos do século XX, várias patentes foram
registradas com experimentos que eram, na verdade, os primeiros microfones da
história. Entre 1904 e 1906, já se conseguia transmitir a palavra falada e a música,
portanto, deu-se origem ao rádio. Entre 1906 e 1916, o rádio ficou, praticamente,
esquecido, pois havia sido considerado um erro, já que a ideia era produzir um
equipamento semelhante ao que nós temos hoje em dia (telefone sem fio).

NOTA

Dois conceitos são importantes a partir de agora: radiocomunicação e


radiodifusão. Radiocomunicação é a comunicação marítima, aeronáutica, de rádio amador,
sempre entre dois pontos. Já a radiodifusão é a comunicação para as grandes massas, ou
seja, de um ponto emissor para o público, em geral, heterogêneo, amplo e anônimo.

3 SURGIMENTO DO RÁDIO E DA TELEVISÃO


O termo radiodifusão é uma tentativa de aportuguesar a palavra
broadcasting, referência à difusão por meio de ondas eletromagnéticas, pelo rádio
ou pela televisão, para grandes públicos. Em outras palavras, é a consolidação do
que chamamos de comunicação de massa.

3.1 NASCE O RÁDIO


Em 1916, David Sarnoff teve a ideia de transformar o rádio em um meio
de comunicação de massa, disponível em todas as casas. Ele queria produzir
o aparelho receptor em série e espalhar o rádio pelo mundo inteiro. Marconi
acreditou na ideia e concedeu a autorização para a produção em grande escala.
Cada residência norte-americana que, anos antes, havia recebido energia elétrica,
já estava apta a possuir um aparelho de rádio.

29
UNIDADE 1 — ORIGENS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO JORNALISMO

Em 1919, uma emissora, no Oeste dos Estados Unidos, fez as primeiras


transmissões. Em 1920, surgiu a KDKA, de Pittsburgh, nos Estados Unidos,
considerada a primeira rádio em Amplitude Modulada (AM) daquele país
(FERRARETTO, 2001).

Em 1933, foi desenvolvido o sistema de frequência modulada do rádio, o


popular FM, o qual transmite uma qualidade superior de áudio porque a onda
portadora gira um milhão de vezes por segundo, de forma diferente do AM,
amplitude modulada, no qual gira mil vezes por segundo. Essa diferença amplia
a qualidade do áudio que, agora, pode ser transmitido estereofônico, ou seja,
quando há mais de um canal de áudio ao mesmo tempo. No entanto, o FM se
tornou popular, apenas, a partir da década de 1960.

Em 1947, uma revolução aconteceu na indústria radiofônica: o


desenvolvimento do transistor, um equipamento que permitiria, a partir de então,
que o rádio fosse para qualquer lugar. O transistor foi criado por três cientistas
da Bell Telephone Laboratories, em Nova Jersey, nos Estados Unidos, e consistia
em um componente eletrônico que amplificava sinais elétricos (FERRARETTO,
2001). Dessa forma, surgiu o rádio à pilha, sem a necessidade de estar conectado
à energia elétrica.

A mobilidade do rádio, ou seja, a característica dele que possibilita fazermos


qualquer tipo de atividade enquanto ouvimos, somente, foi possível graças à
invenção do transistor. Antes disso, só se conseguia ouvir rádio em casa. Graças ao
transistor, ouve-se rádio no carro, caminhando, praticando atividades físicas.

3.2 NASCE A TELEVISÃO


Em 1926, um escocês chamado John Logie Baird inventou o embrião
daquilo que seria o primeiro aparelho de televisão do mundo, mas que, hoje
em dia, seria considerado uma espécie de scanner. A invenção de Logie não se
popularizou.

Anos mais tarde, em 1933, o russo, naturalizado norte-americano, Vladimir


Zworykin, desenvolveu, na empresa Radio Corporation of America (RCA), de
propriedade de Marconi, o primeiro tubo de imagem do mundo, com 240 linhas
horizontais, o que pode ser considerado o primeiro aparelho de televisão, da
maneira como o conhecemos. Essa invenção foi produzida em série, e o tubo de
imagem dominou os televisores do mundo inteiro até a década de 2000, quando
iniciaram as operações do sistema digital terrestre de televisão.

Na década de 1920, a British Broadcasting Company (BBC) iniciou as


operações através do rádio, em Londres. Em 1932, o serviço de televisão da BBC
começou a transmitir de forma experimental e de forma regular, a partir de 1936,
considerada, portanto, a primeira emissora de televisão do mundo.

30
TÓPICO 2 — ORIGENS DA COMUNICAÇÃO ELETRÔNICA

Diferentemente de outros países, como os Estados Unidos, na Inglaterra,


havia o predomínio da mídia pública sobre a mídia privada (LEAL FILHO, 1997),
ou seja, o rádio e a televisão britânicos não nasceram nas mãos da iniciativa
privada, mas de forma pública, ao contrário de países, como dos Estados Unidos.
Em 1939, a Segunda Guerra acabou por interromper a programação da BBC, e ela
só retornou após a guerra.

Em 1939, a rede de rádios National Broadcasting Company (NBC)


começou a fazer experiências com a televisão, emitindo do alto de um prédio de
Nova York. O diretor da empresa era David Sarnoff, o mesmo que havia sugerido,
para Marconi, a utilização do rádio como meio de comunicação, em 1916. Assim,
surgiu a primeira emissora de televisão norte-americana.

Poucos meses depois, entrou no ar a Columbia Broadcasting System


(CBS), e, cerca de quatro anos após, a American Broadcasting Company (ABC),
todas em Nova Iorque, e consideradas, até hoje, as três maiores redes de televisão
aberta do país.

Sarnoff negociou a venda de equipamentos para vários países da


América Latina e desbancou o predomínio britânico. Na época, houve disputa
judicial, nos tribunais dos Estados Unidos e da Inglaterra, para o domínio da
propriedade intelectual da invenção. Os Estados Unidos ganharam a batalha e se
tornaram exportadores das tecnologias transmissora de televisão (torres, antenas,
transmissores) e receptora (aparelho de TV).

Se, na Europa, a mídia eletrônica nasceu pública, nos Estados Unidos,


surgiu privada. Afinal, a nova invenção se tornaria, rapidamente, uma máquina
de vendas. O país mais capitalista do planeta já havia conseguido disseminar os
produtos das multinacionais norte-americanas aos quatro cantos. Agora, com a
televisão, a publicidade ganhava uma aliada poderosa.

NOTA

Mídia pública é aquela que não possui um proprietário, pertence à nação, é de


todos os cidadãos daquele país. O objetivo principal de uma televisão pública, como a BBC,
por exemplo, é o de levar cultura e entretenimento, além de servir aos cidadãos ingleses.
Esses indivíduos pagam uma taxa chamada de License Fee, responsável por financiar o
canal. A BBC, especificamente, não veicula comerciais. Ela é, totalmente, mantida por
essa taxa que o cidadão paga. Existem sistemas de radiodifusão públicos que veiculam
comerciais, como na Itália e na França, mas eles, também, não possuem proprietários,
diferentemente de alguns países, como os Estados Unidos e o Brasil, nos quais a mídia
privada é dominante. Nesses casos, o governo entrega a concessão pública à iniciativa
privada, a qual pode veicular anúncios comerciais para bancar os custos e obter lucro.

31
UNIDADE 1 — ORIGENS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO JORNALISMO

Na metade da década de 1960, os Estados Unidos desenvolveram um


sistema de transmissão de televisão que consistia em veicular imagens coloridas,
pois, até então, a televisão existente no mundo todo era em preto e branco. O
sistema NTSC (National Television System (s) Committee - Comitê Nacional do
(s) Sistema (s) de Televisão) foi desenvolvido nos Estados Unidos e exportado
para quase todos os países da América, com exceção do Brasil, que optou por um
sistema próprio (PAL-M). Já na Europa, o sistema dominante foi o alemão PAL
(Phase Alternating Line – Linha de Fase Alternada).

Nos Estados Unidos e na Europa, o televisor em cores começou a ser


fabricado e vendido em grande escala.

3.3 SATÉLITE DE COMUNICAÇÃO


Em 1965, o planeta experimentou uma revolução na transmissão de
televisão e, principalmente, de notícias, com a criação do Consórcio Internacional
de Satélite (Intelsat), o qual reunia investimentos das maiores economias
do mundo e do Brasil. A ideia era interligar o planeta pela televisão. Eventos
esportivos, como a Copa do Mundo de Futebol, da Fifa, e o Carnaval carioca, em
1970, passariam a ser transmitidos para o mundo todo.

O satélite aproximou os povos ao redor da televisão. O primeiro grande


evento ao vivo foi a chegada do homem na Lua, em 1969, transmitido para o mundo
todo, via satélite. Grandes eventos mundiais passaram a ser acompanhados, em
tempo real, pela TV. Vale lembrar que, antes do satélite, para assistir a uma partida
da Copa do Mundo de Futebol, por exemplo, era preciso ir ao cinema, dias ou
meses depois do acontecimento, ou seja, ao vivo, mesmo, só ouvindo pelo rádio.

FIGURA 4 – CHEGADA DO HOMEM NA LUA

FONTE: <https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/historia-hoje/historia-rochas-lunares-podem-
derrubar-teorias-da-conspiracao-sobre-chegada-do-homem-lua.phtml>. Acesso em: 24 abr. 2021.

32
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• A mídia eletrônica se tornou realidade graças aos esforços de vários cientistas ao


redor do mundo que, mesmo distantes uns dos outros, e sem poder saber no que
cada um estava trabalhando, conseguiram desenvolver as tecnologias básicas de
transmissão e de recepção que nos serviram durante as décadas seguintes.

• Mesmo sendo, inicialmente, considerado um erro, o rádio foi o principal meio


de comunicação durante a primeira metade do século XX. Um poderoso veículo
de entretenimento e de informação.

• A televisão se tornou, na segunda metade do século XX, uma importante


máquina de vendas e uma vitrine para os principais acontecimentos. Por meio
dela, tivemos acesso ao que acontecia ao redor do planeta.

• Essa integração entre os países, por meio da televisão, só se tornou possível


graças aos satélites de comunicação. O primeiro deles, o Intelsat, começou a
operar em 1965.

33
AUTOATIVIDADE

1 Encurtar distâncias e tornar possível a rápida comunicação entre duas


cidades ou dois países. Esses foram os principais objetivos para os cientistas
revolucionarem o mundo com a criação das mídias eletrônicas. Qual foi
o primeiro invento capaz de ligar grandes distâncias e fazer com que a
informação fosse transmitida de um ponto a outro?

a) ( ) Televisão.
b) ( ) Rádio.
c) ( ) Telégrafo com fio.
d) ( ) Telégrafo sem fio.

2 Sinais eletromagnéticos são a base para a transmissão do telégrafo sem


fio, do rádio e da televisão. Um cientista brasileiro foi responsável por
transmitir a voz humana a distância, sem a utilização de cabos. Quem era
esse cientista?

a) ( ) Gluglielmo Marconi.
b) ( ) Roberto Landell de Moura.
c) ( ) David Sarnoff.
d) ( ) John Logie Baird.

3 A comunicação mundial nunca mais foi a mesma após a revolução


provocada pelos meios de comunicação eletrônicos. Eles foram capazes de
encurtar distâncias e de levar a informação e o entretenimento ao mundo
inteiro. De acordo com as leituras realizadas neste tópico, classifique V para
as sentenças verdadeiras e F para as sentenças falsas:

( ) A primeira emissora de televisão do mundo foi a NBC, de Nova York,


em 1939.
( ) Um dos primeiros eventos mundiais transmitidos para o mundo inteiro,
graças ao primeiro satélite de comunicações, foi a chegada do homem na
Lua, em 1969.
( ) A primeira emissora de rádio em Amplitude Modulada dos Estados
Unidos foi a KDKA, da cidade de Pittsburgh, em 1920.
( ) O sistema de Frequência Modulada começou a ser transmitido, para o
mundo inteiro, a partir de 1933.
( ) O transistor foi inventado em 1947, e a principal função dele foi permitir
que o rádio fosse para qualquer lugar, pois estaria, a partir daquele
momento, livre de fios e de tomadas.
( ) A televisão em cores surgiu na década de 1960, nos Estados Unidos.

34
Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:
a) ( ) V – V – V – F – V – F.
b) ( ) F – V – V – F – F – V.
c) ( ) F – V – V – F – V – V.
d) ( ) V – F – F – V – F – F.

4 Os anos finais do século XIX, e a primeira década do século XX,


presenciaram muitos avanços na tecnologia de comunicação. Com base no
que você estudou, disserte a respeito dos avanços tecnológicos observados
durante esse período e explique por que o rádio foi considerado um erro
pelos criadores.

5 O rádio se tornou, rapidamente, a partir da década de 1920, um veículo ágil


para a difusão das informações e para a venda dos mais variados produtos.
Já a televisão provocou uma revolução maior. Outra invenção, na década
de 1960, possibilitou integrar, ainda mais, o planeta, e trazer as imagens dos
confins da Terra para a tela do televisor. Disserte, brevemente, a respeito da
importância da união entre a TV e essa outra invenção da década de 1960.

35
36
TÓPICO 3 —
UNIDADE 1

PARADIGMAS JORNALÍSTICOS: AS QUATRO FASES DO


JORNALISMO MUNDIAL

1 INTRODUÇÃO
No Tópico 3, estudaremos as fases da evolução do jornalismo no mundo,
a partir do exposto por pesquisadores brasileiros e estrangeiros, como Ciro
Marcondes Filho (2000), Nelson Traquina (2005) e Jean Charron e Jean de Bonville
(2016). A partir do estudo desses autores, você entenderá que o modo de apresentar
as notícias e a própria função do jornalismo, com a sociedade, passaram por
transformações ao longo do tempo, causadas por questões históricas, culturais,
tecnológicas e econômicas. 

Abarcaremos, de forma mais aprofundada, a classificação histórica


desenvolvida pelos autores canadenses Jean Charron e Jean de Bonville (2016),
os quais nos oferecem o conceito de paradigmas jornalísticos para refletirmos a
respeito das transformações estruturais pelas quais a prática jornalística passou
ao longo dos séculos. A classificação histórica, realizada por esses autores, aponta
para a existência de quatro fases, denominadas de jornalismo de transmissão,
jornalismo de opinião, jornalismo de informação e jornalismo de comunicação. 

Traremos, também, a visão de outros pesquisadores, os quais contemplam


as fases de evolução do jornalismo mundial, para que você, acadêmico, tenha
condições de construir um conhecimento amplo e abrangente, que envolva a
história do jornalismo, a partir de visões plurais. Você verá que o jornalismo,
como uma atividade humana, é moldado pelo contexto histórico no qual está
inserido, e vai se adaptando ao longo do tempo, com os objetivos de atender
às demandas sociais por informação e sobreviver em um mundo de intensa
concorrência por atenção.

2 PRIMEIRO, SEGUNDO, TERCEIRO E QUARTO


JORNALISMOS: A CLASSIFICAÇÃO DE CIRO
MARCONDES FILHO
Marcondes Filho (2000) é autor de uma das classificações históricas mais
difundidas nos estudos de jornalismo nas universidades brasileiras. O autor
divide o processo de evolução do jornalismo em quatro fases, sendo que a primeira
delas teve início em 1789. Para o autor, antes dessa data, não havia atividade

37
UNIDADE 1 — ORIGENS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO JORNALISMO

que pudesse ser considerada, efetivamente, jornalística, pois a publicação dos


primeiros panfletos e jornais era, ainda, muito artesanal, e voltada a contemplar
um número restrito de pessoas, sobretudo, de grandes comerciantes.

Para o autor, o primeiro jornalismo compreende o período de 1789 a


1830. Surgiu na esteira da Revolução Francesa, período de intensas agitações
política e social na França, entre 1789 e 1799, cujo lema era "liberdade, igualdade
e fraternidade". Essa primeira fase do jornalismo mundial se caracterizava pelos
conteúdos literário e político. Os empreendimentos jornalísticos ainda não tinham
o objetivo de auferir lucro, mas, apenas, de defender causas políticas. Por conta
disso, os textos do primeiro jornalismo eram repletos de críticas e de opiniões,
pois almejavam aumentar os adeptos a um grupo governante.

Os jornais dessa época eram sustentados por partidos políticos, que


ditavam a linha editorial da publicação, ou seja, decidiam os assuntos a serem
publicados. O autor ressalta que essa prática era padrão. Os jornais eram,
abertamente, favoráveis a um determinado grupo, e o público sabia disso.

O segundo jornalismo, na classificação de Marcondes Filho (2000), faz


referência ao período entre 1830 e 1900. Você deve se lembrar de que a década de
1830 marcou uma revolução comercial na atividade jornalística, pois falamos desse
assunto no Tópico 1 desta unidade. Nessa época, a atividade jornalística estava
se industrializando, motivo pelo qual os donos dos jornais precisavam fazer altos
investimentos em máquinas. Para isso, tinham que aumentar as receitas.

Esse movimento em direção à necessidade de auferir lucro fez com que


o jornal deixasse de ser um instrumento, majoritariamente, político e literário,
e passasse a ser considerado um negócio. Nessa fase, surgiram os penny papers,
já estudados também. Assim, partir desse momento, começaram a nascer a
profissão de jornalista e a divisão das redações entre editorial e comercial, ou seja,
a separação entre repórteres e editores e profissionais que vendiam os anúncios.
Com isso, os jornais se tornaram empresas capitalistas que se sustentavam através
da publicidade, não mais financiados pelos políticos.

A fase descrita por Marcondes Filho (2000), como terceiro jornalismo,


corresponde ao período de 1900 a 1960, aproximadamente. Essa fase se
caracterizava por uma imprensa monopolista, jornais de grandes tiragens e uso
intenso da fotografia. Também, nesse período, desenvolveram-se a publicidade
e as relações públicas, as quais passaram a exercer influência sobre o jornalismo.

A partir da década de 1970, segundo a classificação do autor, foi


evidenciado o quarto jornalismo, uma fase marcada pelo desenvolvimento
tecnológico e pelo progressivo uso das informações eletrônica e interativa. A
velocidade de transmissão da informação, pelos meios eletrônicos, colocou
a imprensa escrita em uma posição de crise. O processo de informatização da
produção jornalística levou à redução do tamanho das redações e a alterações no
trabalho dos jornalistas.

38
TÓPICO 3 — PARADIGMAS JORNALÍSTICOS: AS QUATRO FASES DO JORNALISMO MUNDIAL

Como veremos mais adiante, a classificação proposta por Marcondes Filho


(2000) coincide, em muitos aspectos, com as vertentes descritas por Traquina
(2005) e os paradigmas expostos por Charron e Bonville (2016).

3 TRÊS VERTENTES DO JORNALISMO: A CLASSIFICAÇÃO


DE NELSON TRAQUINA
Nelson Traquina (2005) cita a existência de três vertentes fundamentais
da trajetória histórica do jornalismo. Cada uma delas faz referência a um
período da evolução da atividade jornalística: a expansão, a comercialização e a
profissionalização da imprensa.

A primeira vertente correspondeu ao século XIX, quando os jornais


passaram a objetivar o lucro, aumentaram as tiragens e se voltaram mais para
a informação do que para a opinião e para a propaganda de causas políticas.
Com isso, elevou-se o público e se tornaram mais independentes em relação
aos partidos políticos (TRAQUINA, 2005). Segundo o autor, esse período foi
considerado a “época de ouro” da imprensa, em decorrência de alguns fatores,
como a evolução dos sistemas econômico e político em direção à democracia e os
avanços tecnológicos.

A vertiginosa expansão dos jornais, no século XIX, permitiu a criação


de novos empregos neles; um número crescente de pessoas se
dedicou, integralmente, a uma atividade que, durante as décadas do
século XIX, ganhou um novo objetivo – fornecer informação, e não
propaganda. Esse novo paradigma foi a luz que viu nascerem valores
que, ainda hoje, são identificados com o jornalismo: a notícia, a procura
da verdade, a independência, a objetividade, e uma noção de serviço
ao público – uma constelação de ideias que dá forma a uma nova visão
do ‘polo intelectual’ do campo jornalístico (TRAQUINA, 2005, s.p.).

A segunda vertente foi caracterizada pela comercialização dos jornais


que, na perspectiva do autor, permitiu a profissionalização do jornalista e o
crescimento da chamada "imprensa respeitável", consolidando-se como espaço
para a manifestação do pensamento e a mobilização da opinião pública. 

Para Traquina (2005), a terceira vertente ficou marcada pelos avanços


tecnológicos (como as máquinas rotativas), os quais permitiram aumentar as
tiragens dos jornais, de modo a transformá-los em meios de comunicação de massa. 

39
UNIDADE 1 — ORIGENS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO JORNALISMO

4 PARADIGMAS JORNALÍSTICOS: CHARRON E BONVILLE


A obra dos pesquisadores canadenses Jean Charron e Jean de Bonville
(2016) nos oferece a noção de paradigmas jornalísticos para refletirmos a
respeito das transformações estruturais pelas quais passou o jornalismo desde
os primórdios, no século XVII. Os autores utilizaram um método de pesquisa
sociológica para identificar as mudanças paradigmáticas que caracterizaram
cada uma das fases do jornalismo, identificadas, por eles, como: jornalismo de
transmissão, jornalismo de opinião, jornalismo de informação e jornalismo
de comunicação.

O conceito de paradigma nasceu no campo das Ciências e designa um


conjunto de tradições e de métodos que são compartilhados por uma determinada
comunidade científica. Atualmente, a noção de paradigma se aplica a muitas áreas
de atuação e de conhecimento, não apenas às ciências exatas. O jornalismo é uma
dessas áreas, pois, como já vimos, os jornalistas baseiam a atuação profissional
deles em um conjunto de convenções que são conhecidas e transmitidas pelos
membros da comunidade jornalística, mas que não estão, necessariamente,
registradas por escrito em lugar algum. Para os autores, o paradigma jornalístico
consiste em

um sistema normativo criado por uma prática fundamentada no


exemplo e na imitação, constituído de postulados, de esquemas de
interpretação, de valores e de modelos exemplares com os quais se
identificam e se referem os membros de uma comunidade jornalística
em um dado âmbito espaço-temporal, o que une os integrantes
à comunidade e serve para legitimar a prática (CHARRON; DE
BONVILLE, 1996 apud CHARRON; DE BONVILLE, 2016, p. 68).

Os autores explicam, ainda, que o paradigma compreende, também, um


conjunto de regras de redação e de edição, sendo que estas últimas (as regras de
edição) podem ser verificadas nas coberturas jornalísticas, nos temas abordados,
nos gêneros empregados e no modo através do qual a informação é formatada.

O paradigma jornalístico, no entanto, não explica, por si só, as


transformações do jornalismo. Para isso, é preciso analisar as mudanças profundas
e duradouras na prática jornalística, chamadas, pelos autores, de paradigmáticas.
A análise dessas mudanças levou à identificação de quatro fases do jornalismo.

A partir de agora, estudaremos algumas características específicas de


cada uma dessas fases no que diz respeito a alguns fatores, como financiamento,
periodicidade e relação com o tempo, fontes de informação predominantes e
princípios normativos que regiam a prática jornalística.

40
TÓPICO 3 — PARADIGMAS JORNALÍSTICOS: AS QUATRO FASES DO JORNALISMO MUNDIAL

4.1 JORNALISMO DE TRANSMISSÃO


A primeira fase identificada pelos pesquisadores foi o chamado jornalismo
de transmissão. Essa fase foi marcada no século XVII, quando ainda não havia a
categoria profissional dos jornalistas. Nessa época, o repasse de informações era
realizado através das gazetas, financiadas pelos comerciantes e voltadas para os
interesses desse grupo. Não existia, ainda, um discurso jornalístico característico,
produzido a partir de regras comuns.

Nesse período, os jornais eram financiados por agentes sociais (sobretudo,


comerciantes e políticos). Por esse motivo, os editores eram sensíveis à opinião
de cada um dos patrocinadores, “dançando conforme a música” e atendendo
às pressões de interesses particulares. Os autores dos textos e os patrocinadores
estavam, frequentemente, envolvidos nas ações relatadas. Os leitores e os
anunciantes eram parte das elites sociocultural e política.

Essa forma de jornalismo tinha a periodicidade ampla como característica.


Os jornais eram, normalmente, semanais. Publicavam-se acontecimentos
que não eram recentes, pois os jornais eram quase como registros históricos.
Muitas vezes, inclusive, funcionavam como fascículos de uma coleção que era
reunida no fim de um ano. Os autores faziam longas descrições, pois os leitores
dispunham de tempo para ler o jornal inteiro.

Nesse momento histórico, “o barco à vela, o cavalo e o carro de tração animal


foram os meios mais rápidos de transmissão de informação. A quantidade de
informação pertinente transmitida ao jornal era, geralmente, inferior à superfície
de impressão” (CHARRON; BONVILLE, 2016, p. 193). Para o jornalismo de
transmissão, o tempo não era um fator importante. O jornal publicava o que ficava
sabendo entre uma edição e outra, não importando o momento em que o fato
aconteceu. O fluxo de informações recebido por esses jornais era baixo, motivo
pelo qual os editores consideravam suficiente difundir informações que não eram
mais novidade, mas, ainda, consideradas úteis. O fato jornalístico não era ausente
dos jornais de transmissão, mas, “como é difícil, além de caro, coletar, “detalhar”
as ocorrências de tipo factual, o evento não é objeto de um forte investimento
“discursivo” da parte do jornal: os textos a respeito dos eventos são, também,
curtos e enxutos” (CHARRON; BONVILLE, 2016, p. 203).

No jornalismo de transmissão, as capacidades de coletar, de selecionar e


de relatar as ocorrências no jornal eram compartilhadas por todos os membros da
sociedade que possuíam uma boa bagagem cultural, com base em princípios do
senso comum, não em regras específicas, ou seja, nesse período, ainda, não havia um
conjunto de procedimentos profissionais específicos para a produção jornalística,
assim, qualquer um podia escrever para o jornal. As fontes de informação eram,
principalmente, os informantes ocasionais, leitores e correspondentes habituais
(não profissionais), atores sociais envolvidos nos acontecimentos e outros jornais.

41
UNIDADE 1 — ORIGENS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO JORNALISMO

Nas sociedades caracterizadas pelo jornalismo de transmissão, o poder


se concentrava nas mãos de um pequeno número de pessoas, o qual detinha
mecanismos de controle da opinião pública. A censura prévia era comum. Por
conta disso, a imprensa desse período só podia divulgar ideias e informações que
não prejudicassem os governantes. “As opiniões contrárias às dos detentores do
poder político eram reprimidas. Penas severas reprimiam as violações, e a própria
existência do jornal dependia da docilidade para com as normas” (CHARRON;
BONVILLE, 2016, p. 213).

Os princípios normativos que regiam o jornalismo de transmissão eram


a imparcialidade e a exatidão. Ainda que os meios para coletar informação,
no período, ainda, fossem rudimentares, o editor do jornal de transmissão se
preocupava em publicar depoimentos verídicos e evitar dar preferência às
próprias opiniões.

Nesses jornais, a diagramação se assemelhava à do livro, e os artigos eram


parecidos com correspondências, conversas entre pessoas da alta sociedade ou
relatos de viajantes.

A seguir, veremos um exemplar de um jornal que circulava em Montreal,


no Canadá, em 1797, um verdadeiro exemplo de jornal de transmissão.

42
TÓPICO 3 — PARADIGMAS JORNALÍSTICOS: AS QUATRO FASES DO JORNALISMO MUNDIAL

FIGURA 5 – MODELO DE JORNAL DE TRANSMISSÃO

FONTE: Charron e Bonville (2016, p. 262)

O público desse tipo de jornal era, relativamente, homogêneo e de tamanho


limitado (elites alfabetizadas). Nessa fase do jornalismo, o que conhecemos como
opinião pública não existia, pois não havia a presença de instâncias públicas a
partir das quais se pudesse discutir questões de interesse geral. Assim, “o editor
considera os leitores como interlocutores individuais sem ligações uns com os
outros” (CHARRON; BONVILLE, 2016, p. 227).
43
UNIDADE 1 — ORIGENS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO JORNALISMO

No período caracterizado pelo jornalismo de transmissão, nem o


proprietário e os autores dos textos se identificavam no jornal. Os escritos eram
publicados sob pseudônimos. Existia uma identidade, mas não de quem escrevia
nele ou dos proprietários. Nessa fase, ainda, não existia uma unidade discursiva
que se pudesse chamar de estilo jornalístico.

4.2 JORNALISMO DE OPINIÃO


O jornalismo de opinião fez parte do início do século XIX e tinha, como
característica principal, a defesa explícita de causas ideológicas e político-
partidárias. Nessa época, o acesso ao jornal ainda era restrito, em decorrência dos
altos níveis de analfabetismo da população e da escassez de recursos tecnológicos.

Essa forma de jornalismo tinha, como ideal, a polarização das ideias e das
opiniões, de acordo com os interesses dos patrocinadores, geralmente, políticos.
Ainda, aqui, encontrava-se a maioria dos leitores e dos anunciantes.

O jornalismo de opinião se apresentava em várias periodicidades, do


semanal (mais comum) ao diário (mais raro), passando pelas bissemanais e
trissemanais. O conteúdo do jornal de opinião era formado, principalmente, por
notícias breves, também, chamadas de despachos.

O barco a vapor, a ferrovia e o telégrafo ótico e, depois, o elétrico,


são os meios mais rápidos de transmissão da informação. No entanto,
as limitações e os custos da transmissão telegráfica são tais que uma
parte importante da informação ainda é transportada com o suporte.
A quantidade de informação pertinente, transmitida ao jornal, e a
capacidade física (superfície total de impressão) para reproduzi-
la, equilibram-se. Nesse tipo de jornalismo, o qual institucionaliza
o debate acerca das questões sociais, o tempo, que permanece
tridimensional (passado, presente e futuro), aparece como o meio de
comunicação da mudança (CHARRON; BONVILLE, 2016, p. 194).

Diferentemente do que ocorria no jornalismo de transmissão, o momento


em que um fato acontecia era levado em consideração pelo jornal de opinião. O
jornal publicava o que ficou sabendo entre duas edições, e privilegiava a publicação
de acontecimentos para, no máximo, uma semana. Essa forma de jornalismo se
dava em um contexto no qual as instituições políticas geravam grande fluxo de
atividades a serem relatadas pelos jornais. No entanto, no jornalismo de opinião,
como no de transmissão, ainda, não havia muito destaque para os acontecimentos
factuais. Como o volume de informação disponível tendia a ser maior do que o
espaço para publicá-la, era, visualmente, diferente do jornal de transmissão: tinha
um formato maior de página e fontes com tamanho menor.

No jornalismo de opinião, o peso dos grupos sociopolíticos e


econômicos é preponderante (CHARRON; BONVILLE, 2016). Por isso, quem
escrevia nos jornais de opinião eram apenas alguns grupos específicos, pessoas
cultas provenientes dos meios políticos e jurídicos. As fontes de informação

44
TÓPICO 3 — PARADIGMAS JORNALÍSTICOS: AS QUATRO FASES DO JORNALISMO MUNDIAL

predominantes eram as mesmas utilizadas pelo jornalismo de transmissão,


mas de forma mais intensa, com grandes fluxos de informação: informantes
ocasionais, leitores e correspondentes habituais (não profissionais), atores
sociais envolvidos nos acontecimentos e outros jornais.

No período caracterizado pelo jornalismo de opinião, já existiam leis que


determinavam os limites de controle da imprensa. A cesura prévia não existia
mais. Admitiam-se críticas ao governo, desde que respeitassem a pessoa e a
reputação do governante. No entanto, a imprensa mantinha uma forte relação
de interdependência com o poder político, o qual limitava a capacidade de crítica
dela. “O redator do jornal, frequentemente, faz parte de um aparelho partidário,
ou se destina à carreira política dentro do grupo que apoia o jornal: deve, portanto,
adequar-se às diretrizes dos dirigentes” (CHARRON; BONVILLE, 2016, p. 213).

Nos jornais de opinião, a imparcialidade não era mais um princípio


normativo adotado, pois o que importava era seguir, à risca, as ideias do grupo
sociopolítico que apoiava e sustentava o jornal. A exatidão, no entanto, ainda, era
uma característica desejável.

A partir do jornalismo de opinião, o jornal começou a exibir traços


específicos enquanto mídia impressa. Ele se diferenciava do livro, pois se
apresentava em formato maior, e os textos eram dispostos em diversas colunas. As
páginas tinham espaços específicos para cada tipo de conteúdo (editorial, relato
dos debates parlamentares, publicidade, notícias), mas esses espaços, ainda, não
eram identificados de forma destacada.

Atente-se a um exemplar do jornal The Gazette, o qual circulou em


Montreal, em 1887:

45
UNIDADE 1 — ORIGENS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO JORNALISMO

FIGURA 6 – MODELO DE JORNAL DE OPINIÃO

FONTE: Charron e Bonville (2016, p. 263)

O público do jornal se tornou segmentado. Nessa forma específica de


jornalismo, a segmentação de público era política. Nesse período, os integrantes
da elite esclarecida podiam expressar opiniões a respeito de questões públicas
sem sofrer represálias. No entanto, esse privilégio era reservado somente à elite
socioeconômica. A opinião pública era, portanto, elitista e burguesa.

46
TÓPICO 3 — PARADIGMAS JORNALÍSTICOS: AS QUATRO FASES DO JORNALISMO MUNDIAL

Nessa forma, o jornalista interferia no debate público de forma contundente.


Os textos eram, normalmente, anônimos, por isso, a identidade discursiva do
jornal era mais forte do que a do jornalista. Essa identidade, por sua vez, era a
mesma do grupo político que o veículo representava. Nesse momento, já existia
uma comunidade de escritores, pequena e submissa às instituições políticas que
sustentavam o jornal.

4.3 JORNALISMO DE INFORMAÇÃO


O jornalismo de informação passou a ser o paradigma dominante no
final do século XIX, sobretudo, na América do Norte. Esse período teve a forte
industrialização da imprensa e o aumento da produção e da circulação de bens e
de serviços. A partir dessa fase, a informação, dissociada da opinião, passou a ser
o elemento central do jornalismo, trazendo, com ela, ideais profissionais, como a
objetividade, a respeito da qual falamos no Tópico 1, desta unidade.

Os anunciantes, e não mais os políticos, eram a principal fonte de


financiamento. Como esses anunciantes, normalmente, eram grandes empresas
nacionais e internacionais, não manifestavam interesse pelo conteúdo dos textos
que seriam publicados pelo jornal. Para essas empresas, bastava que o discurso
jornalístico, como um todo, estivesse de acordo com os interesses comerciais deles.

A periodicidade típica era o diário. Assim, diariamente, o jornal de


informação buscava publicar acontecimentos registrados desde a última entrega,
isto é, desde o dia anterior. Um fato ocorrido, há dois ou três dias, já era muito
velho para ser publicado. Em alguns casos, o jornal chegava a publicar várias
edições no mesmo dia, para garantir que estivesse oferecendo, ao público, as
notícias mais recentes, desde a última publicação. “Nesse tipo de jornalismo, o
passado e o futuro são apagados, e só o presente importa, sob a forma de um
passado imediato, constituído de ocorrências recentes” (CHARRON; BONVILLE,
2016, p. 194).

O fator tempo passou a ser muito importante, diferentemente do que


ocorria nos jornalismos de transmissão e de opinião. Como explicam os autores, “o
momento em que se dá a ocorrência é primordial, uma vez que o jornal só publica o
que se passou entre duas edições diárias” (CHARRON; BONVILLE, 2016, p. 195).
Esse tipo de jornalismo se beneficiou do surgimento de técnicas que permitiam
a transmissão, quase instantânea, de grande quantidade de informação (textos e
imagens). Nesse cenário, organizações, como as agências de notícias, especializaram-
se na coleta e na distribuição de informação para abastecer os jornais.

Uma das principais características do jornalismo de informação era


a centralidade dos relatos factuais, sobretudo, dos que representavam um
rompimento do estado normal das coisas, dos acontecimentos inesperados. Os
fatos que, inicialmente, não tinham essa característica, precisavam se revestir

47
UNIDADE 1 — ORIGENS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO JORNALISMO

dela para ser considerados de interesse do jornal. Nesse cenário, surgiram os


chamados pseudoacontecimentos, situações planejadas com o objetivo de atrair a
cobertura da imprensa, como entrevistas coletivas de autoridades públicas.

Ao contrário do que acontecia até o jornalismo de opinião, a quantidade


de informação publicável, que chegava até o jornal, era muito maior do que a
capacidade de publicar, o que o obrigava a “descartar os acontecimentos relativos
à atividade rotineira das instituições sociais e a privilegiar acontecimentos que
oferecessem um coeficiente de novidade maior, com uma grande distância da
norma. A pertinência dessas ocorrências foi sublinhada por procedimentos,
como grandes títulos ou exploração da “manchete”” (CHARRON; BONVILLE,
2016, p. 204).

Visualize, a seguir, um exemplar do jornal The Gazette, o qual circulou


em Montreal, Canadá, em 1953. Perceba que esse jornal faz uso da fotografia e dos
tamanhos de fonte maiores, para destacar algumas manchetes.

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TÓPICO 3 — PARADIGMAS JORNALÍSTICOS: AS QUATRO FASES DO JORNALISMO MUNDIAL

FIGURA 7 – MODELO DE JORNAL DE INFORMAÇÃO

FONTE: Charron e Bonville (2016, p. 264)

A produção do jornal cabia, exclusivamente, aos jornalistas profissionais,


que avaliavam a pertinência dos acontecimentos com base em critérios específicos,
e construíam um relato de tais situações a partir de um discurso específico. Do
mesmo modo, nesse tipo de jornalismo, as informações chegavam até o jornal
através do trabalho dos jornalistas, principalmente, dos repórteres, por meio
das agências de notícias e dos representantes profissionais dos atores sociais,
como publicitários e assessores. Também, havia a contribuição de leitores e de
correspondentes habituais (não profissionais).

49
UNIDADE 1 — ORIGENS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO JORNALISMO

No período no qual o jornalismo de informação  era predominante, a


liberdade de imprensa foi, oficialmente, estabelecida. Além disso, os jornais
não mantinham mais ligações de dependência financeira com grupos políticos.
Mesmo assim, esse jornalismo não se dedicava a tecer grandes críticas às
instituições políticas e, sobretudo, às instituições econômicas, em decorrência
da forma de financiamento (publicidade). Assim, a imprensa mantinha uma
relação de solidariedade com essas instituições, ainda que tivesse liberdade,
legalmente, garantida para questioná-las. No contexto da empresa jornalística,
“o jornalista se beneficiava da proteção de um sindicato, e uma convenção
coletiva de trabalho traçava os limites do poder da direção do jornal. Numerosas
regras profissionais, rigorosamente, aplicadas, reduziam, todavia, a margem de
manobra” (CHARRON; BONVILLE, p. 213).

O princípio normativo (regra profissional) que regia o jornalismo de


informação era a objetividade, isto é, “a independência do jornal em relação ao
real, do jornalista em relação às fontes de informação, e da mídia em relação às
fontes de financiamento” (CHARRON; BONVILLE, p. 220). A exatidão era outro
ponto fundamental, um critério através do qual se podia medir a qualidade
da produção jornalística. A imparcialidade, também, tornava-se um ideal a ser
buscado nos gêneros informativos, mas que estava apta a ser deixada de lado nos
gêneros opinativos, os quais, ainda, sobrevivem, nos jornais de informação, como
uma espécie de herança do jornalismo de opinião.

A segmentação de público era socioeconômica. Os leitores do jornal


eram vistos, pela empresa jornalística, como um conjunto de indivíduos que
possuía características sociais, demográficas e culturais, as quais necessitavam
ser conhecidas pelo editor, para ele adequar o conteúdo a esse público.

A identidade discursiva do jornalista, no jornalismo de informação, era


forte. Os textos eram, frequentemente, assinados pelo autor. Além disso, cabia,
ao profissional, escolher os acontecimentos a serem relatados, além de questionar
as fontes de informação e adaptar o discurso delas para o texto jornalístico. A
entrevista era um gênero típico dessa forma de jornalismo. O jornal, também,
apresentava uma identidade institucional forte. Um exemplo disso eram os
editoriais não assinados, pois representavam a opinião da empresa jornalística a
respeito de determinado assunto.

O jornalismo de informação é caracterizado por recortar a realidade


social em acontecimentos pontuais, bem delimitados. “Ele designava ao titulá-
los, ao dispô-los nas páginas. O jornal desenvolveu um espaço temático,
sistematicamente, organizado, hierarquizado por uma tipografia diversificada, e
que significava: ‘eis o mundo hoje’” (CHARRON; BONVILLE, 2016, p. 260). Nessa
forma de jornalismo, os jornalistas formavam uma comunidade, relativamente,
homogênea de escritores profissionais, a qual utilizava um estilo próprio, o estilo
jornalístico, ausente ou pouco característico nas formas de jornalismo anteriores.

50
TÓPICO 3 — PARADIGMAS JORNALÍSTICOS: AS QUATRO FASES DO JORNALISMO MUNDIAL

Os gêneros presentes no jornal, também, forneciam informações


importantes dessa forma de jornalismo. Publicar um editorial, em vez de uma
notícia, manifestava uma intenção específica: manifestar uma opinião, não somente
relatar fatos. No jornalismo de informação, os gêneros eram, rigorosamente,
delimitados, pois cada um deles se aplicava a um objetivo diferente e demonstrava,
ao público, uma intenção comunicativa distinta.

4.4 JORNALISMO DE COMUNICAÇÃO


O momento atual do jornalismo em escala global é o jornalismo de
comunicação, o qual se tornou predominante a partir dos anos 1970/1980. Essa
forma de jornalismo se dá em um cenário de hiperconcorrência, profundamente
marcado pelos processos de digitalização e de convergência da comunicação
midiática. Nesse cenário, a produção jornalística é caracterizada pela oferta de
conteúdo, supostamente, voltado para as preferências do leitor.

Essa forma de jornalismo se dá em um contexto de concorrência intensa


entre os meios de comunicação, sendo que uma parcela significativa dos veículos é
financiada pelo próprio público, através de assinaturas, por exemplo. No entanto,
o jornalismo de comunicação enfrenta uma crise no modo de financiamento,
necessitando descobrir novos meios de obter recursos para produzir o conteúdo.

A questão da periodicidade não é mais relevante quando se fala do


jornalismo de comunicação, isso porque, agora, no contexto dos meios de
informação eletrônicos e digitais, a informação circula de forma tão veloz e
ininterrupta que os acontecimentos podem ser relatados imediatamente, no
momento em que estão ocorrendo, ou seja, há pouca ou nenhuma distância entre
o instante do acontecimento e o relato jornalístico.

O presente é o tempo do jornalismo de comunicação: presente


do ao vivo, da informação contínua, do comentário a respeito do
acontecimento recente ou em curso. Entretanto, o passado e o futuro
não estão, totalmente, ausentes, pois, no discurso jornalístico, podem
vir a ser uma fonte de referências para o presente, um arsenal de
metáforas e alvo de conotações diversas (CHARRON; BONVILLE,
2016, p. 194-195).

No jornalismo de comunicação, o fluxo de informação é muito alto e


ultrapassa a capacidade de publicação dos veículos jornalísticos. Os atores sociais
que desejam se comunicar com o público, através da mídia, enfrentam grande
concorrência, motivo pelo qual precisam gerar pseudoacontecimentos para atrair
a atenção.

Os jornalistas detêm o domínio da produção do jornal. No entanto,


o código jornalístico já não é mais tão rígido e específico a ponto de excluir os
membros do público. Nesse paradigma, o discurso jornalístico apresenta várias
características em comum com outras formas de comunicação pública.

51
UNIDADE 1 — ORIGENS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO JORNALISMO

Os jornalistas têm acesso à informação, sobretudo, através de agências de


notícias e de representantes profissionais de agentes sociais, como publicitários
e assessores. Permanece importante o trabalho dos repórteres. As demais
modalidades de acesso à informação, também, são utilizadas (informantes
ocasionais, leitores e correspondentes habituais, atores sociais envolvidos nos
acontecimentos e outros meios de comunicação).

Nas sociedades caracterizadas pelo jornalismo de comunicação, os


governantes têm pouca capacidade de conduzir, de maneira significativa, a vida
social. Essa capacidade pertence aos donos do poder econômico. Nesse cenário,
o jornal tem liberdade para criticar a gestão pública e os governantes. Também,
possui liberdade para denunciar abusos das empresas, pois o sistema econômico
é estável e hegemônico.

A objetividade é considerada uma utopia. A exatidão, no entanto,


continua sendo considerada uma qualidade desejável, desde que subordinada
ao princípio da pertinência aos interesses do leitor. Isso se dá de diversas formas
no discurso jornalístico, como através do uso do humor e da linguagem que
se aproxima da utilizada pelo público. “Diferentemente de outras formas de
jornalismo, os jornalistas de informação e de comunicação buscam dar conta
da realidade de maneira exaustiva, ou, ao menos, alimentam a ilusão de que
podem contemplar as necessidades de informação do público” (CHARRON;
BONVILLE, 2016, p. 220).

A segmentação de público é socioeconômica e cultural. Nessa fase, “a


opinião pública é feita de um número indefinido de agrupamentos de opiniões
individuais polarizadas por um objeto de opinião qualquer [...]” (CHARRON;
BONVILLE, 2016, p. 228). As empresas midiáticas utilizam uma variedade de
técnicas de pesquisa de opinião para conhecer, profundamente, o público, e
ajustar os produtos delas às expectativas desses indivíduos.

Não há um estilo único adotado por toda a comunidade de jornalistas.


Os desvios em relação ao estilo jornalístico tradicional são bem tolerados. Cada
jornalista procura se diferenciar dos outros através de um traço próprio. Do mesmo
modo, a fronteira entre os gêneros jornalísticos é, comumente, transgredida.
Nessa forma de jornalismo, a identidade discursiva do jornalista é mais forte do
que a do jornal:

Ele mostra desenvoltura nas declarações; lida, naturalmente, com


a ironia; permite, a si mesmo, desvios para o registro familiar dos
leitores. Os gêneros da informação comentada, também, dão, a ele, a
possibilidade de se expressar pessoalmente, de se exibir. A identidade
do jornal, por outro lado, não é tão forte. A multiplicidade de opiniões
e de estilos diminui a coerência discursiva interna (CHARRON;
BONVILLE, 2016, p. 240).

52
TÓPICO 3 — PARADIGMAS JORNALÍSTICOS: AS QUATRO FASES DO JORNALISMO MUNDIAL

Os jornalistas dão destaque à informação através de desvios frequentes


do estilo jornalístico e da mistura de gêneros. Essas estratégias evidenciam
a intenção de expressar os aspectos subjetivos da realidade e instigar o ponto
de vista subjetivo do leitor. Essa forma de jornalismo se dá em um contexto de
hiperconcorrência, no qual a atenção do leitor é vista como uma mercadoria rara
e negociável. O jornal de comunicação é contemporâneo dos veículos eletrônicos
e digitais. Por conta disso, utiliza uma série de estratégias visuais para atrair
a atenção do cidadão, como veremos no exposto a seguir, de um exemplar do
Montreal Gazette, o qual circulou em Montreal, Canadá, em 2015. Perceba que as
imagens ocupam mais espaço do que os textos na capa do jornal:

FIGURA 8 – MODELO DE JORNAL DE COMUNICAÇÃO

FONTE: Charron e Bonville (2016, p. 165)

Estar à frente da concorrência não consiste mais em apresentar a


informação melhor e mais rápido, como no jornalismo de informação. Nessa
forma de jornalismo (que é o paradigma que estamos vivenciando atualmente), a
maneira de relatar é mais importante do que as próprias informações relatadas,
pois é preciso atrair, seduzir o leitor.

53
UNIDADE 1 — ORIGENS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO JORNALISMO

LEITURA COMPLEMENTAR

ELE NASCEU HÁ 160 ANOS E INVENTOU O RÁDIO,


MAS O BRASIL NÃO O CONHECE
(Folha de S. Paulo, 21 de janeiro de 2021)

Eduardo Ribeiro
Jornalista

Esta quinta-feira (21) merece uma celebração, principalmente, por todos os


que estão envolvidos com o fantástico e dinâmico mundo das telecomunicações.

Há 160 anos, no dia 21 de janeiro de 1861, nascia, em Porto Alegre, Roberto


Landell de Moura, um raro talento científico ainda, não devidamente, reconhecido
no país, a partir do esforço de vários brasileiros em resgatarem a memória dele
na última década. Padre Landell, como ele gostava de ser chamado, realizou a
primeira transmissão “wireless” de voz humana, por ondas de rádio, da história
da humanidade. A proeza aconteceu em 16 de julho de 1899, quando ele era pároco
na capela de Santa Cruz, no bairro de Santana, zona norte da capital paulista.

Nas dependências do Colégio Santana, ao lado da capela, ele reuniu


empresários, o cientista Antônio Francisco de Paula Souza, fundador e diretor
da Escola Politécnica, a tradicional instituição de ensino, hoje, integrada à USP,
incluindo a imprensa.

Em 3 de junho de 1900, repetiu a experiência, ligando o alto de Santana


a toda Avenida Paulista, 8 km em linha reta. O cônsul britânico Percy Charles
Parmenter Lupton testemunhou o evento, como mostrou uma reportagem da
imprensa.

Apesar do êxito científico das experiências públicas e de ter patenteado as


próprias invenções no Brasil (1901) e nos Estados Unidos (1904), Padre Landell
jamais conseguiu concretizar a última etapa do sonho dele: levantar recursos
financeiros para desenvolver e implantar um sistema de rádio no Brasil.

O que ele encontrou pelo caminho foram as pedras da injustiça e da


indiferença. Chegaram, inclusive, a destruir o laboratório dele em Campinas
(SP), no final do século 19, porque, sombriamente, acreditavam que o padre se
comunicava com o demônio...

Na mesma época, o italiano Guglielmo Marconi conquistou fama mundial


com a invenção do telégrafo sem fio. A radiotelegrafia era, no entanto, bem
diferente da invenção do padre-cientista. Marconi fez transmissões de sinais em
código Morse, enquanto o brasileiro colocava a voz em ondas de rádio.

54
TÓPICO 3 — PARADIGMAS JORNALÍSTICOS: AS QUATRO FASES DO JORNALISMO MUNDIAL

Quando morou em Nova York e lutava com dificuldades financeiras para


sobreviver e para patentear o rádio, Landell começou a projetar a televisão e o
telex. Em 1904, antes de outros cientistas, ele já estudava como transmitir imagens
e textos por ondas eletromagnéticas – a mesma “estrada”, a partir da qual ele
transmitira a voz humana e os sons musicais e que seria, nos tempos modernos,
o canal para a criação de diversas invenções “wireless”, como o telefone celular.

Nenhum cientista foi tão abrangente no campo das telecomunicações. O


talento dele transbordou, extravasou o tempo. Todo esse esforço gigantesco de
criação foi interrompido, sufocado, porque, pelas próprias palavras, o forçaram a
abandonar a carreira científica.

O obscurantismo o venceu, mas não conseguiu apagá-lo da memória.


Padre Landell é merecedor, pelo legado dele, de sair da condição de personagem,
à margem da história, para ocupar um lugar de destaque nas histórias do rádio e
das telecomunicações.

FONTE: <https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2021/01/ele-nasceu-ha-160-anos-e-inventou-
o-radio-mas-o-brasil-nao-o-conhece.shtml>. Acesso em: 24 abr. 2021.

55
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• Diversos autores se dedicaram a classificar as fases históricas da evolução


do jornalismo. Independentemente das diferenças entre a classificação
desses autores, elas demonstram que o jornalismo passou por uma série de
transformações ao longo do tempo, adaptando-se às demandas sociais.

• Charron e Bonville (2016) classificaram as transformações do jornalismo em


quatro períodos, denominados de jornalismo de transmissão, jornalismo de
opinião, jornalismo de informação e jornalismo de comunicação.

• No jornalismo de transmissão, século XVII, ainda não havia a categoria


profissional dos jornalistas. Era a época das gazetas financiadas pelos
comerciantes e voltadas para os interesses deles.

• O jornalismo de opinião, característico do início do século XIX, dedicava-se,


abertamente, à defesa de causas político-partidárias.

• A partir do jornalismo de informação, surgido no final do século XIX, na América


do Norte, a informação, dissociada da opinião, passou a ser o elemento central
do jornalismo. Nessa fase, consolidou-se o ideal profissional da objetividade.

• O jornalismo de comunicação, paradigma atual, tem, como características, o


cenário de hiperconcorrência entre os veículos de comunicação e a oferta de
conteúdos voltados às preferências do leitor.

CHAMADA

Ficou alguma dúvida? Construímos uma trilha de aprendizagem


pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao
AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

56
AUTOATIVIDADE

1 Ciro Marcondes Filho (2000) é autor de uma das classificações históricas


mais difundidas nos estudos de jornalismo no Brasil. Ele classifica a trajetória
histórica do jornalismo em quatro fases, a partir de 1789. Para o autor, antes
dessa data, a atividade jornalística ainda não existia, pois a produção dos
jornais primitivos era artesanal e voltada para públicos restritos. Com base no
que você estudou a respeito da classificação histórica de Ciro Marcondes Filho
(2000), assinale V para as sentenças verdadeiras e F para as sentenças falsas:

a) ( ) O primeiro jornalismo se caracterizou pelo uso de técnicas industriais na


fabricação de jornais, com a informação isenta como ideal profissional.
b) ( ) Durante a fase chamada de segundo jornalismo, surgiram os chamados
penny papers, e os jornais populares e as empresas jornalísticas passaram
a almejar o lucro.
c) ( ) O terceiro jornalismo foi um período caracterizado pelos grandes
monopólios de comunicação, jornais de forte circulação e amplo uso
da fotografia.
d) ( ) No quarto jornalismo, houve pouca influência dos meios de comunicação
eletrônica sobre os jornais, e as redações ampliaram a quantidade de
jornalistas trabalhando.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) F – F – V – V.
b) ( ) V – V – F – V.
c) ( ) F – V – V – F.
d) ( ) V – F – F – V.

2 Para Nelson Traquina (2005), a trajetória histórica do jornalismo se resume


a três vertentes. Cada uma delas faz referência a uma fase de evolução
da atividade jornalística. Com base nos seus conhecimentos a respeito da
classificação do autor, analise as sentenças a seguir:

I- A primeira vertente do jornalismo correspondeu ao século XIX, quando os


jornais começaram a objetivar lucro e se voltaram mais para a informação,
em detrimento da opinião.   
II- A segunda vertente do jornalismo foi caracterizada pelos avanços tecnológicos
que transformaram os jornais em meios de comunicação de massa.
III- A terceira vertente ficou marcada pelo aumento das tiragens dos jornais,
após a adoção de técnicas de impressão modernas, como as rotativas.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença I está correta.
c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.
57
3 A classificação histórica, proposta por Jean Charron e Jean de Bonville
(2016), compreende quatro fases, que vão desde o século XVII até os dias
de hoje: jornalismo de transmissão, jornalismo de opinião, jornalismo de
informação e jornalismo de comunicação. A respeito dessas fases, associe
os itens, usando o código a seguir:

I- Jornalismo de transmissão
II- Jornalismo de opinião
III- Jornalismo de informação
IV- Jornalismo de comunicação

( ) Teve início a partir dos anos 1970, em um cenário de hiperconcorrência


e influência dos processos de digitalização da informação e de
convergência midiática.
( ) Tornou-se caracterizado pela valorização da informação nos jornais,
dissociada da opinião.
( ) Ficou marcado pelo uso dos jornais como plataformas de propaganda de
causas políticas.
( ) Tinha, como principal característica, as gazetas patrocinadas pelos
comerciantes, quando, ainda, não existiam jornalistas profissionais.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) III – II – IV – I.
b) ( ) I – II – IV – III.
c) ( ) II – I – III – IV.
d) ( ) IV – III – II – I.

4 Os autores canadenses Jean Charron e Jean de Bonville (2016) utilizaram um


método de pesquisa sócio-histórica para analisar as transformações pelas
quais passou a atividade jornalística desde o surgimento dela, no século
XVII, até os dias de hoje. A partir das características identificadas nos textos
jornalísticos, os autores classificaram a evolução do jornalismo em quatro
fases: jornalismo de transmissão, jornalismo de opinião, jornalismo de
informação e jornalismo de comunicação. Com base no que você estudou,
sintetize as principais características de cada uma dessas fases.

5 O trabalho de pesquisa sócio-histórica de Charron e Bonville (2016) utilizou o


conceito de paradigma para refletir a respeito das transformações da atividade
jornalística ao longo do tempo. Com base no que você estudou, e com relação
à obra desses autores, explique o conceito de paradigma jornalístico.

58
REFERÊNCIAS
AGUIAR, P. Notas para uma história do jornalismo de agências. Fortaleza, 2009.

CHALABY, J. Journalism as an anglo-american invention: a comparison of the


development of french and anglo-american journalism 1830s-1920s. European
Journal of Communication, v. 11, n. 3, p. 303-326, 1996.

CHARRON, J.; BONVILLE, J. Natureza de transformação do jornalismo.


Brasília: FAC Livros; Florianópolis: Insular, 2016.

ERBOLATO, M. Técnicas de codificação em jornalismo: redação, captação e


edição no jornal diário. São Paulo: Ática, 2001.

FERRARETTO, L. A. Rádio: o veículo, a história e a técnica. Porto Alegre:


Editora Sagra Luzzatto, 2001.

HABERMAS, J. Mudança estrutural da esfera pública: investigações quanto a


uma categoria da sociedade burguesa. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1984.

LAGE, N. Ideologia e técnica da notícia. Florianópolis: Insular, 2001.

LEAL FILHO, L. A melhor TV do mundo. São Paulo: Summus, 1997.

MARCONDES FILHO, C. Comunicação e jornalismo: a saga dos cães perdidos.


São Paulo: Hacker, 2000.

MINDICH, D. T. Z. Just the facts: how objectivity came to define american


journalism. Nova Iorque: New York University Press, 1998.

PRADO, M. História do rádio no Brasil. São Paulo: Editora Da Boa Prosa, 2012.

SCHUDSON, M. Descobrindo a notícia: uma história social dos jornais nos


Estados Unidos. Petrópolis: Vozes, 2010.

SOUSA, J. P. Uma história breve do jornalismo no Ocidente. 2008. Disponível


em: http://www.bocc.ubi.pt/pag/sousa-jorge-pedro-uma-historia-breve-do-
jornalismo-no-ocidente.pdf. Acesso em: 24 abr. 2021.

SPONHOLZ, L. Jornalismo, conhecimento e objetividade: além do espelho e


das construções. Florianópolis: Insular, 2009.

59
SPONHOLZ, L. As ideias e seus lugares: objetividade em jornalismo no Brasil e
na Alemanha. Comunicação e Política, v. 11, n. 2, p. 144-166, 2004.

TRAQUINA, N. Teorias do jornalismo: a tribo jornalística, uma comunidade


interpretativa transnacional. Florianópolis: Insular, 2005.

60
UNIDADE 2 —

HISTÓRIA DO JORNALISMO NO BRASIL

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• entender os motivos determinantes para o atraso na implantação da


imprensa brasileira;

• distinguir os objetivos distintos dos primeiros jornais impressos no Brasil


e as fases da imprensa;

• reconhecer a trajetória de implantação das emissoras de rádio e de


televisão brasileiras, os principais grupos de comunicação do país ao
longo do tempo, e os empresários mais influentes do jornalismo;

• perceber a influência da ditadura militar no jornalismo brasileiro durante


o período de 1964-1985.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade,
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – HISTÓRIA DA MÍDIA IMPRESSA NO BRASIL

TÓPICO 2 – HISTÓRIA DO RÁDIO E DA TV NO BRASIL

TÓPICO 3 – IMPRENSA NA DITADURA

CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos


em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá
melhor as informações.

61
62
TÓPICO 1 —
UNIDADE 2

HISTÓRIA DA MÍDIA IMPRESSA NO BRASIL

1 INTRODUÇÃO
Pronto para iniciar a segunda unidade deste livro?! Então, vamos lá!
No Tópico 1 desta segunda unidade, você compreenderá como se deu a
implantação da imprensa no Brasil. Dessa forma, perceberá que a censura à
leitura e à informação, típica em Portugal, estendeu-se ao Brasil-Colônia, e foi,
ainda, intensificada a partir de 1808, quando da chegada da Família Real.

A partir da leitura deste tópico, você entenderá o atraso do Brasil perante


os demais países latino-americanos no processo de implantação da imprensa
tipográfica. Em seguida, terá contato com as primeiras publicações em solo
brasileiro. A Gazeta do Rio de Janeiro representava a imprensa régia, ou seja, só
publicava as notícias oficiais que o rei D. João VI permitia que fossem publicadas.
Em outras palavras, as informações de interesse do reinado português. Ao mesmo
tempo, surgia, em Londres, o jornal Correio Braziliense, o qual, mensalmente,
chegava ao Brasil de forma clandestina, e lido por boa parte daqueles que
almejavam o fim da escravidão, incluindo outras pautas democráticas e liberais.

Por fim, falaremos da implantação de alguns dos jornais mais importantes


da história do país e do império de Assis Chateuabriand e seus Diários Associados,
o qual viria a se tornar o maior grupo de comunicação do Brasil. Destaque para
os jornais, para a revista O Cruzeiro e para a Rádio Tupi, do Rio de Janeiro,
pertencentes ao grupo de Chatô.

2 CHEGADA DA IMPRENSA AO BRASIL


Você já acompanhou que a prensa tipográfica de Gutenberg foi inventada
em 1445, ou seja, em pleno século XV. O interessante é que, 88 anos depois,
a tipografia chegava ao continente americano, no México, em 1533. Em 1584,
chegava à América do Sul, no Peru, considerado, então, o maior centro cultural
sul-americano.

Na Guatemala, a imprensa marcou presença em 1660; no Paraguai, em 1700;


em Cuba, em 1724; na Colômbia, em 1738; no Equador, em 1760; e, na Argentina, em
1780. Essas informações servem para exemplificar o atraso observado no Brasil. Por
aqui, a imprensa tipográfica só chegou em 1808, com o jornal A Gazeta, do Rio de
Janeiro, primeiro impresso do país e, ainda, de caráter oficial.

63
UNIDADE 2 — HISTÓRIA DO JORNALISMO NO BRASIL

Seu perfil é de um órgão criado para informar a vida administrativa e


a movimentação social do Reino, e que, por ser o único, aqui, editado,
absorve a história de forma documental: editais, pequenos anúncios,
leilões, perdidos e achados, atos do governo (BAHIA, 1990, p. 18).

Portanto, em 13 de maio de 1808, segundo Barbosa (2013), D. João VI


oficializou a instalação da Imprensa Régia, com a criação do jornal A Gazeta, com
o intuito de publicar papéis oficiais do governo.

O reflexo do atraso brasileiro não estava apenas estampado na imprensa.


Até 1880, a Coroa Espanhola já havia sido banida em toda a América, mas, no
Brasil, a Coroa Portuguesa resistia. A Igreja Católica permanecia sob a tutela
do Império, e possuía a propriedade dos cemitérios, o controle dos ensinos
primário e secundário. O casamento civil não era permitido. Os não católicos
eram obrigados a esconder o local do templo deles. Depois da abolição da
escravatura, nos Estados Unidos, em 1865, Brasil, Porto Rico e Cuba eram os
únicos que, ainda, sustentavam-na nas Américas, outro reflexo dos atrasos
político e cultural brasileiros.

De acordo com Barbosa (2013), havia uma implacável censura sobre a


leitura de livros. Para serem transportados, dependiam de pedidos prévios de
licença. Aliás, todos os materiais impressos só chegavam ao Brasil de forma
clandestina. O analfabetismo era predominante, ou seja, poucas pessoas sabiam
ler. A leitura era algo que pertencia, sobretudo, às elites. Geralmente, os jovens
ricos eram enviados para estudar na Europa. A censura, que já era praticada em
Portugal, estendeu-se ao Brasil-Colônia.

Também, o inconfidente mineiro Manoel Inácio da Silva Alvarenga


conseguira exemplares do Mercure francês “de um inglês que passava
pela cidade”. Já o bacharel Mariano Pereira da Fonseca, igualmente
acusado de inconfidente, conseguia as leituras, nos idos de 1790, “em
ocasiões nas quais chegavam navios da Europa”, e, “algumas vezes,
na botica do José Luiz, que ficava defronte à capela do Carmo”, que
“trazia o correio da Europa e aí o lia”, mostrando grande satisfação
com os progressos que os franceses faziam, “seguindo, disso, algumas
discussões” (VILLALTA, 1999, p. 211 apud BARBOSA, 2013, p. 27).

Ler, por si só, já era um ato ilegal e, extremamente, perigoso. Qualquer


tipo de leitura, livros, jornais que, em algum momento, viessem da Europa. Tudo
o que havia eram panfletários, como Gregório de Matos, o padre Antônio Vieira.
A poesia de Gregório de Matos foi proibida no Brasil do século XVII. A tipografia
e a imprensa eram proibidas no século XVIII. De acordo com Bahia (1990), o
jornalismo sem tipografia era, praticamente, a única forma de ação persistente para
expressar o conflito entre colonizados e colonizadores. Pela sátira poética, pelo
panfleto, pela carta, pela canção, pelo repente, a colônia reagia às opressões política
e econômica. Dentre os temas em pauta, estavam a luta pela abolição da escravidão,
a Independência do Brasil de Portugal, e, depois, a Proclamação da República.

64
TÓPICO 1 — HISTÓRIA DA MÍDIA IMPRESSA NO BRASIL

A imprensa panfletária de 1808 a 1880 marca um período da história


no qual a influência de um jornal não é medida pelo tamanho, pela
qualidade ou pelo prestígio. O que faz a medida é a força da opinião,
e esta pode aparecer em uma página ou em várias páginas. Não é o
título o que conta. Nem a tradição, o peso econômico. Prevalece a
ideia. O que se imprime é o que vale (BAHIA, 1990, p. 84).

Em 10 de setembro de 1808, um sábado, o primeiro número de A Gazeta,


do Rio de Janeiro, foi publicado. O jornal oficial, que veio na bagagem da
Família Real para o Brasil, e que era editado com a presença marcante do Rei
D. João VI, representaria, finalmente, o início da imprensa tipográfica no Brasil.
A periodicidade semanal aconteceu, apenas, na primeira semana. A partir da
segunda, o jornal passou a circular, também, às quartas-feiras. Conforme Barbosa
(2013), ainda, no primeiro ano de existência, foram 19 edições extraordinárias. A
autora acrescenta que, nos quatorze anos nos quais circulou, A Gazeta, do Rio de
Janeiro, publicou 1763 edições, sendo que 192 destas foram extraordinárias.

A Gazeta, no primeiro ano de existência dela, publicara, entre os temas


mais recorrentes, informações da Guerra da Europa e das ações dos
vassalos do rei, para que houvesse a Restauração em Portugal e a
expulsão do exército de Napoleão, comandado por Junot (BARBOSA,
2013, p. 40).

A seguir, atente-se ao primeiro número do jornal A Gazeta, do Rio de Janeiro

FIGURA 1 – PRIMEIRA EDIÇÃO DE A GAZETA, DO RIO DE JANEIRO

FONTE: <https://www.gov.br/imprensanacional/pt-br/assuntos/noticias/brasil-celebra-206-anos-
da-gazeta-do-rio-de-janeiroprimeiro-jornal-impresso-no-pais>. Acesso em: 24 abr. 2021.

65
UNIDADE 2 — HISTÓRIA DO JORNALISMO NO BRASIL

2.1 PRIMEIROS JORNAIS BRASILEIROS


Em 1808, a Família Real se transferiu para o Brasil. Em 1° de junho de 1808,
Hipólito da Costa, perseguido político no Brasil, fundou o Correio Braziliense, a
partir de Londres. Ele era considerado o primeiro jornal brasileiro, contando os
que não eram impressos no nosso território. O jornal era mensal, e, embora fosse
editado em português e circulasse por aqui, pois vinha de navio, era escrito e
impresso em Londres. O jornal circulou até dezembro de 1822. Várias vezes foi
proibido, apreendido, censurado e processado, não só no Brasil.

Em Portugal, a leitura do Correio Braziliense significava violação de lei.


Hipólito da Costa lutava, no Correio, por princípios liberais e democráticos.
Defendia mudanças substanciais nos sistemas político, administrativo, econômico
e social vigentes no Brasil e em Portugal. Queria a emancipação do país por meios
legais, e isso, obviamente, não era algo bom para a Corte Portuguesa.

DICAS

Para conhecer mais a respeito da história e da importância do Correio Braziliense


para a imprensa, no Brasil, leia a reportagem a seguir, publicada pelo Observatório da
Imprensa: http://www.observatoriodaimprensa.com.br/e-noticias/200_anos_da_imprensa_
brasileira_correio_braziliense_e_hipolito_da_costa/.

A imprensa independente, sem as amarras do Estado brasileiro, surgiu


na década de 1820. Em 1823, nasceu o Diário de Pernambuco, o qual se tornou
o jornal mais antigo em circulação no país e na América Latina. Em 1827, veio o
Jornal do Commercio, do Rio de Janeiro. Esse publicou a primeira caricatura de
um jornal brasileiro, em 14 de dezembro de 1837, de autoria de Manuel de Araújo
Porto Alegre. De acordo com Bahia (1990), a caricatura, ora como charge, ora
como cartum, ora como traço de humor ou de sátira, não perdia o lugar dela nas
páginas principais, e até se incorporava nos grandes jornais em todo o mundo,
à linha editorial. Valorizada como parte da opinião, assumia uma característica
própria, com pesos político e ideológico.

Um marco da imprensa brasileira foi a data de 4 de janeiro de 1875,


quando entrou, em circulação, o jornal A Província de São Paulo, mais tarde,
transformado naquele que é, hoje, o jornal O Estado de São Paulo. O jornal se
apresentava neutro. Propunha o ensino livre e a aprendizagem obrigatória como
formas de combater o atraso intelectual brasileiro. Também, defendia a eleição
direta sob bases democráticas, além de presidentes de províncias eleitos pela
própria província, liberdade e igualdade de cultos, e separação entre Igreja
e Estado. Em 1885, Júlio Mesquita entrou para o jornal. Nunca mais a família
Mesquita deixou de estar vinculada e de ser considerada sinônimo do Jornal O
Estado de São Paulo.
66
TÓPICO 1 — HISTÓRIA DA MÍDIA IMPRESSA NO BRASIL

Na década de 1880, o Brasil tinha 15 milhões de habitantes. Cerca de


5,5 milhões eram lavradores. O café absorveu 75% das exportações.
Um escravo novo, forte, solteiro, valia de 1 mil e 1 mil e 200 dólares
(tráfego negreiro terminou em 1850). Mais de 50% das importações
brasileiras correspondiam à compra de escravos (BAHIA, 1990, s.p.).

2.2 IMPRENSA NA REPÚBLICA


Em 9 de abril de 1891, começou a circular o Jornal do Brasil, no Rio de
Janeiro. Dizia-se ser neutro. Mesmo assim, o presidente Floriano Vieira Peixoto
o acusou de tentar desestabilizar o governo. Em 1901, atingiu 62 mil exemplares
diários e ultrapassou La Prensa, de Buenos Aires, considerado o mais importante
da América do Sul, até então. A eletricidade, o telefone, os transportes e os
correios, com os serviços de cartas e de telegramas, melhoraram os padrões de
difusão da notícia e facilitaram os programas de expansão dos jornais.

Na passagem do século XIX para o século XX, a realidade brasileira,


praticamente, não se alterou. Os jornais foram se popularizando e se proliferando,
principalmente, nos maiores centros do país. Na primeira metade do século XX,
alguns dos principais jornais brasileiros que entraram em circulação foram: O
Estado de Florianópolis (1915), Jornal do Comércio de Recife (1918), Folha da
Noite de São Paulo (1921-1960), O Globo do Rio de Janeiro (1924), Folha da Tarde
de São Paulo (1924), e Folha da Manhã, depois, transformada em Folha de São
Paulo (1925).

Em 1962, Octávio Frias de Oliveira e Carlos Caldeira Filho, empresários


sem nenhuma vinculação anterior com o jornalismo, compraram a empresa Folha
da Manhã, a qual editava os jornais Folha da Manhã, Folha da Tarde e Folha da
Noite, e, somente em 1960, essas três publicações se tornariam a Folha de São
Paulo. Outro jornal que marcou a época foi o Diário de Notícias do Rio de Janeiro
(1930-1976).

2.2.1 Publicidade entra em cena


A expansão da imprensa brasileira tem, na publicidade, a grande baliza.
Até o começo do século XX, porém, só existiam os chamados classificados. No
século anterior, anunciavam-se, principalmente, escravos. No Brasil, antes de
1913, não se conhecia, segundo Bahia (1990), nenhuma organização especializada
em distribuir anúncios para jornais.

A primeira agência, intitulada de A Eclética, surgiu em São Paulo, entre 1913


e 1914, de propriedade da empresa Castaldi e Benaton. O primeiro anúncio a cores
data de 1915. A atividade cresceu, principalmente, após a Primeira Guerra Mundial.
Depois da década de 1930, porém, com a expansão industrial do Brasil, as agências
de publicidade assumiram um perfil próprio e se consolidaram, à proporção que a
produção e o consumo estavam presentes em novas parcelas da sociedade.
67
UNIDADE 2 — HISTÓRIA DO JORNALISMO NO BRASIL

3 PIONEIRISMO DE ASSIS CHATEAUBRIAND E


NOVAS PUBLICAÇÕES
O maior grupo de comunicação, entre as décadas de 1930 e de 1960, foi
o grupo dos Diários Associados, pertencente ao jornalista Francisco de Assis
Chateaubriand Bandeira de Melo, mais conhecido pelo apelido de “Chatô”. O
paraibano Assis Chateaubriand foi editor-chefe do Jornal do Brasil, e fundou, em
1932, O Jornal, do Rio de Janeiro, embrião dos Diários Associados.

Os Diários Associados teriam importância significativa na comunicação


brasileira, com dezenas de jornais espalhados por todo o país, uma cadeia de
rádios e, a partir de 1950, a TV Tupi, a qual teria emissoras em várias regiões do
território nacional. Antes de Chateaubriand, a única tentativa de montar uma
rede de jornais e de rádios foi a de Geraldo Rocha, proprietário do grupo A Noite,
e adversário de Getúlio Vargas. Aqui, no Brasil, porém, as cadeias de rádio só se
tornariam possíveis depois da Segunda Guerra Mundial.

Culto, por falar vários idiomas, Chateaubriand era implacável com os


adversários. Conviveu, diretamente, com o poder. Foi inimigo de boa parte dos
intelectuais brasileiros. Beneficiou-se das relações de confiança com presidentes,
ministros e generais (BAHIA, 1990). A chantagem era a principal arma dele
para conseguir o que queria, semelhante ao magnata norte-americano William
Randolph Hearst, cuja vida baseou o filme Cidadão Kane, de Orson Welles.

Os Diários Associados chegaram a ter 31 jornais diários, três revistas, 23


estações de rádio, 13 canais de televisão e uma agência de notícia. O principal
concorrente de “Chatô” foi o empresário Samuel Wainer, proprietário do Jornal
Última Hora, e amigo do, até então, presidente Getúlio Vargas.

Para muitos, Chateaubriand chegava a ser considerado um gângster,


alguém mal caráter, chantagista, que se valia das próprias influências políticas
para construir a imagem de alguém ou para destruir os adversários. Em 1947,
fundou o Museu de Arte de São Paulo, o MASP, com a própria coleção de artes
adquirida em países da Europa. É nome de município no Estado do Paraná. Foi
membro da Academia Brasileira de Letras. Eleito senador pelo Estado da Paraíba,
em 1951, e, em 1954, pelo Estado do Maranhão. Em 1957, virou embaixador do
Brasil em Londres. Morreu em 1968, vítima de câncer, depois de anos com uma
doença degenerativa.

Observe, a seguir, uma fotografia de Assis Chateaubriand, um homem


à frente do seu tempo, para uns, e alguém que representava o atraso do Brasil,
para outros.

68
TÓPICO 1 — HISTÓRIA DA MÍDIA IMPRESSA NO BRASIL

FIGURA 2 – ASSIS CHATEAUBRIAND

FONTE: <https://acervo.estadao.com.br/noticias/personalidades,assis-chateaubriand,325,0.htm>.
Acesso em: 24 abr. 2021.

3.1 REVISTA O CRUZEIRO


A primeira revista brasileira foi a Semana Ilustrada, editada antes da
primeira República. Em 10 de novembro de 1928, surgiu a Revista O Cruzeiro,
dos Diários Associados, dotada de recursos gráficos que foram se aperfeiçoando.
O Cruzeiro introduziu, também, técnicas inéditas na elaboração do anúncio
e renovou os métodos da propaganda com mensagens mais criativas, bem
impressas e mais dinâmicas.

Atraiu grandes investimentos publicitários. “A publicidade do primeiro


número prenunciava tempos de vacas muito gordas para Chateaubriand. Quase
metade das 64 páginas estava repleta de anúncios” (MORAIS, 1994, p. 188). A
revista introduziu a técnica das promoções semanais para atrair anunciantes e
assinantes. A fotografia era valorizada e assumiu função prioritária.

O cargo de repórter fotográfico era essencial na revista. Em O Cruzeiro,


surgiu a primeira dupla de reportagem, a qual, depois, viraria a ser a mais famosa
do país: o repórter David Nasser e o fotojornalista francês Jean Manzon. Depois
dessa dupla, o conceito de uma grande reportagem mudou, para sempre, no
jornalismo brasileiro. Um dos episódios mais famosos do sucesso editorial da
revista se deu durante o registro de uma tribo de índios na Serra do Roncador,
entre os estados do Pará e do Mato Grosso, a bordo de um avião da Força Aérea
Brasileira (FAB), guiado pelo piloto particular do presidente Getúlio Vargas,
Antônio Basílio. O piloto garantia que havia visto uma tribo, mas os repórteres
não conseguiam ver nada. Manzon pediu para que o piloto, então, fizesse voos
rasantes em círculo.
69
UNIDADE 2 — HISTÓRIA DO JORNALISMO NO BRASIL

Na primeira passagem, o coração do francês bate forte ao ver vinte


ocas alinhadas em semicírculo. Basílio dá uma embicada para o
chão e Manzon vê aparecer, no visor dele, a primeira figura de um
índio nu. Em seguida, mais outro e mais outro, e eles não parecem
se assustar com o aparelho que faz voos rasantes. Estiram os arcos e
uma nuvem de flechas passa a centímetros do rosto do fotógrafo, que
está a ponto de perder o fôlego de tanta emoção. Nova embicada e a
ponta de uma das asas bate no teto de uma das ocas, desmontando-a.
A cada novo voo rasante, os índios começam a atirar mais flechas
e tacapes, em direção ao avião. Manzon aperta o disparador da
máquina dele desesperadamente, até sentir câimbra no indicador e
no polegar. De repente, em plena embicada para baixo, o avião todo
sacode: uma borduna, “magistralmente, lançada por um índio”, diria
Manzon, atinge a cauda do bimotor, provocando um rombo de vinte
centímetros no leme. Rindo do perigo e do pânico sob os quais o
fotógrafo se encontrava, Basílio percebe que está na hora de ir embora
(MORAIS, 1994, p. 419) .

O resultado de tal proeza foi extraordinário. A reportagem ganhou 18


páginas em O Cruzeiro. “A revista esgotou nas bancas e os exemplares eram
disputados no câmbio negro” (MORAIS, 1994, p. 420). A reportagem entrou para
a história, por ter sido considerada a forma através da qual o brasileiro descobriu
os índios.

A mulher, a moda, a música, o teatro e a vida social ganharam espaços


nobres na revista. A revista implantou sucursais em todo o país e contou com
correspondentes em várias partes do mundo. Implantou, também, a grande
reportagem no jornalismo brasileiro. A revista mergulhou em uma crise financeira
sem precedentes na história, e foi, aos poucos, saindo das bancas, na década de
1970. O último número, porém, foi impresso em 15 de novembro de 1982, quando
ela já estava nas mãos do empresário Alexandre von Baumgarten.

Segue a capa da primeira edição da revista O Cruzeiro:

70
TÓPICO 1 — HISTÓRIA DA MÍDIA IMPRESSA NO BRASIL

FIGURA 3 – PRIMEIRA CAPA DA REVISTA O CRUZEIRO

FONTE: <https://pt.m.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Capa_O_Cruzeiro_n%C2%BA_1_de_10_
nov_1928.png>. Acesso em: 24 abr. 2021.

3.2 OUTRAS PUBLICAÇÕES


Outra revista que fez muito sucesso no país foi a Seleções. A constituição
de 1946 proibia que estrangeiros tivessem a propriedade de revistas ou de
quaisquer outros órgãos de informação, mas, em 1951, a revista Seleções do
Reader’s Digest obteve licença para compor, imprimir e editar em São Paulo,
distribuída nacionalmente. Virou mania em todo o país. O formato, menor,
distinguia-a das demais revistas do país.

Confira a primeira edição da versão brasileira da revista Seleções de


Reader’s Digest:

71
UNIDADE 2 — HISTÓRIA DO JORNALISMO NO BRASIL

FIGURA 4 – REVISTA SELEÇÕES

FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Sele%C3%A7%C3%B5es>. Acesso em: 24 abr. 2021.

Em 26 de abril de 1952, a revista Manchete foi lançada por Adolfo Bloch.


Virou um fenômeno editorial. Em 1969, fez história ao ser a primeira revista do
mundo a publicar as fotos coloridas da chegada do homem na Lua, com muito êxito.

Sucesso, também, durante os carnavais, a Manchete tinha o hábito de


publicar as fotos mais aguardadas da maior festa popular brasileira. Desbancou
O Cruzeiro e passou a ser a mais lida do país pouco tempo depois da criação.

Inspirada na revista francesa Paris Match, explorava, principalmente, o


fotojornalismo. O próprio tamanho, maior do que as demais, era uma característica
da publicação. Grandes escritores, como Manuel Bandeira, Fernando Sabido,
Nelson Rodrigues e Carlos Drummond de Andrade, participaram da revista
Manchete durante os melhores anos.

A TV Manchete, criada em 1983, foi outra empresa fundada por Adolfo


Bloch, um russo que chegou ao Brasil em 1922 e que construiu um verdadeiro
império de comunicação. Em 1999, essa TV foi à falência. A revista Manchete foi
editada, semanalmente, até 29 de julho de 2000, com a extinção do Grupo Bloch.

A seguir, você poderá ter uma ideia das capas da revista Manchete,
durante um carnaval. Na figura, em destaque, a atriz Wilza Carla.

72
TÓPICO 1 — HISTÓRIA DA MÍDIA IMPRESSA NO BRASIL

FIGURA 5 – CAPA DA REVISTA MANCHETE 14/02/1959

FONTE: <https://acervo.estadao.com.br/noticias/acervo,carnaval-em-revista,10758,0.htm>.
Acesso em: 24 abr. 2021.

73
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• A imprensa chegou ao Brasil somente com a vinda da Família Real portuguesa,


com a instalação de A Gazeta, em 13 de maio de 1808, a chamada imprensa
régia, ou seja, responsável, apenas, por imprimir as publicações oficiais.

• Em 1° de junho de 1808, Hipólito da Costa, perseguido político no Brasil, fundou


o Correio Braziliense, a partir de Londres. É considerado o primeiro jornal
brasileiro, circulou até 1822, foi proibido, apreendido, censurado e processado.

• O maior grupo de mídia da primeira metade do século XX foi o Diários


Associados, do empresário Assis Chateaubriand, detentor de dezenas de jornais
espalhados pelo Brasil, da Revista O Cruzeiro, sucesso editorial brasileiro, de
várias emissoras de rádio, e o pinheiro na implantação da primeira emissora de
televisão do país, em 1950.

• A revista O Cruzeiro representou um grande avanço no jornalismo brasileiro,


principalmente, com o forte uso das fotografias. A revista lançou a primeira
dupla de repórter/fotojornalista do país: David Nasser e Jean Manzon.

• Depois de O Cruzeiro, vieram a Revista Seleções, do Reader’s Digest, norte-


americana, mas editada no Brasil, em 1946, e a Manchete, em 1952, outros dois
expoentes do jornalismo do século XX.

74
AUTOATIVIDADE

1 A imprensa tipográfica chegou ao Brasil apenas em 1808, muito atrasado


em relação a outros países da América Latina, como Colômbia, Argentina e
Paraguai. Assim, com base nos seus conhecimentos a respeito do nascimento
da imprensa no Brasil, analise as sentenças a seguir:

I- Em maio de 1808, Dom João VI oficializou a chamada Imprensa Régia, no


Brasil, com a criação do jornal A Gazeta, do Rio de Janeiro. 
II- O propósito da Imprensa Régia era publicar comunicados oficiais.
III- Em junho de 1808, Hipólito da Costa fundou o jornal Correio Braziliense,
a partir de Londres. 

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) Apenas a sentença I está correta.
b) ( ) As sentenças I, II e III estão corretas.
c) ( ) As sentenças I e III estão corretas. 
d) ( ) Apenas a sentença II está correta. 

2 O jornal Correio Braziliense, fundado por Hipólito da Costa, em 1808, é


considerado o primeiro jornal brasileiro, apesar de ser impresso fora
do país. Com base no que você estudou, classifique V para as sentenças
verdadeiras e F para as sentenças falsas:

( ) O Correio Braziliense foi um jornal mensal impresso em Londres. Era


editado em língua portuguesa e circulava no Brasil.
( ) Hipólito da Costa mantinha boas relações com a Família Real portuguesa
( ) O Correio Braziliense era um jornal comprometido com os ideais
liberais.  Defendia mudanças substanciais nos sistemas político,
administrativo, econômico e social vigentes no Brasil e em Portugal.
( ) Em Portugal, a leitura desse jornal era considerada crime. 

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) V-F-V-V.
b) ( ) V-F-F-F.
c) ( ) F-F-V-V.
d) ( ) F-V-F-V.

3 Assis Chateaubriand foi uma figura importante no cenário da imprensa


nacional entre as décadas de 1930 e 1960. Com base nos seus conhecimentos
a respeito dessa personalidade, analise as sentenças a seguir:

I- Assis Chateaubriand foi o fundador do Grupo Globo, maior grupo de


comunicação da América Latina até a década de 1960. 
II- Os Diários Associados, grupo de comunicação que pertencia a
Chateaubriand, chegou a possuir dezenas de jornais em todo o país, uma
cadeia de rádios e a TV Tupi, primeira emissora de televisão do Brasil. 

75
III- Chateaubriand era uma figura polêmica. Algumas pessoas o
consideravam uma pessoa de caráter duvidoso,  o qual se valia das
próprias influências políticas para construir a imagem de alguém, ou
para destruir os adversários

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) Apenas a sentença I está correta.
b) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
c) ( ) As sentenças II e III estão corretas.
d) ( ) Apenas a sentença II está correta.

4 A imprensa independente, sem as amarras do Estado brasileiro, surgiu na


década de 1820. Considerando o conteúdo estudado neste tópico, aborde os
jornais que surgiram a partir desse período, ainda no século XIX.

5 A Revista Cruzeiro é considerada um marco na história da mídia impressa


nacional, por introduzir, no país, uma série de características presentes em
publicações do exterior. Com base nos seus conhecimentos, sintetize as
principais características dessa publicação.

76
TÓPICO 2 —
UNIDADE 2

HISTÓRIA DO RÁDIO E DA TV NO BRASIL

1 INTRODUÇÃO
Neste tópico, você entenderá como o rádio e a televisão foram implantados
no Brasil. Também, veremos um panorama completo dos programas jornalísticos
que surgiram com a chegada desses novos meios de comunicação.

É importante destacar que, antes do rádio, não havia qualquer outro


meio eletrônico capaz de informar os brasileiros. Por causa disso, tornou-se,
rapidamente, um sucesso absoluto em todo o país.

Já a televisão, com início marcado pelo improviso e pelos profissionais


que vieram do rádio, encantou os brasileiros nos primeiros anos de existência,
mas se tornou realidade nas casas da maior parte da população apenas na década
de 1970, em razão do alto custo para se obter um aparelho televisor.

2 CHEGADA DO RÁDIO AO BRASIL


Não é exagero dizer que o rádio encantou os brasileiros e veio a se tornar
o principal meio de comunicação para entretenimento e para receber informações,
logo nos primeiros anos de existência no nosso território. Tudo começou em 1919,
em Recife (Pernambuco), quando um grupo de amadores liderados por Augusto
Joaquim Pereira realizou experiências de transmissão por radiotelegrafia. Nascia
a Rádio Club de Recife, emissora pioneira em todo o Brasil, mas que só seria
considerada a primeira rádio do país em 2019, quando um grupo de pesquisadores
reunidos, em Natal, no Rio Grande do Norte, durante o Congresso Nacional da
Associação Nacional de Pesquisadores de História da Mídia (Alcar) Nacional,
considerou rever os livros de história, o qual apontou, definitivamente, o pioneirismo
da Rádio Club de Pernambuco.

Até então, a primeira transmissão oficial de rádio do país ainda era


considerada a realizada em 7 de setembro de 1922, durante a exposição do
centenário da independência do país, no Rio de Janeiro. O discurso do presidente
Epitácio Pessoa, lido do alto do Morro do Corcovado, foi ouvido na Praia
Vermelha, na Urca, por um serviço de alto-falantes, embora os ouvintes não
tenham percebido que se tratasse, exatamente, de uma transmissão por ondas
eletromagnéticas, já que os serviços de alto-falantes com microfones acoplados
nesses aparelhos eram comuns naquela época.

77
UNIDADE 2 — HISTÓRIA DO JORNALISMO NO BRASIL

A Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, prefixo PRA-2, foi criada com o


objetivo de “trabalhar pela cultura dos que vivem em nossa terra e pelo progresso
do Brasil”, em abril de 1923, por Edgard Roquette-Pinto e Henri Morize. Roquette-
Pinto era educador, antropólogo, médico, e Morize era presidente da Academia
Brasileira de Ciências.

2.1 PRIMEIRO JORNAL NO RÁDIO BRASILEIRO


A Rádio Sociedade do Rio de Janeiro tinha uma programação de cunho
educativo, com a inclusão das literaturas brasileira, francesa e inglesa. Para
Ortriwano (1989 apud PRADO, 2012, p. 53), Roquette-Pinto criou o primeiro jornal
de rádio brasileiro, o “Jornal da Manhã”, logo no início das atividades da Rádio
Sociedade, e lembra que ele foi o primeiro locutor e comentarista. “Além disso,
era ele quem verificava os jornais e assinalava as matérias mais interessantes que
seriam transmitidas e comentadas no jornal”.

Com essas técnicas de ler os jornais e de assinalar o que era mais relevante
de ser falado no rádio, Roquette-Pinto, também, pode ser apontado como o
pai da prática chamada de Gillette-Press, ou seja, quando o locutor de rádio lê
as matérias diretamente do jornal. Atualmente, visto como algo ruim, a forma
desenvolvida por Roquette-Pinto, à época, não tinha nada de negativa, já que
era a única oportunidade da maior parte dos ouvintes ficar a par das notícias do
Brasil e do mundo, já que o custo para a aquisição de um jornal era considerado
alto para muitos brasileiros.

A prática de Roquette-Pinto em um momento em que não havia qualquer


outro tipo de meio de informação à disposição da comunidade, uma forma de
democratizar essa informação que se fazia, apenas, presente em meio às elites.
Por outro lado, durante os primeiros vinte anos, o rádio, também, era considerado
um objeto de elite, já que o custo para adquirir um transmissor era elevado.

Aos poucos, outras emissoras foram surgindo ao redor do país,


principalmente, a partir da década de 1930. Em 1932, o governo autorizou a
veiculação da publicidade no rádio. Agora, o novo meio poderia se expandir com
mais facilidade, já que, no início, era mantido por clubes e por associações de
radioamadores ou amantes do rádio.

Na década de 1940, o rádio já estava consolidado e atingia, finalmente,


grandes distâncias e todo o país. Era a época de ouro dele, com programas
musicais de auditório, além do início das radionovelas. O jornalismo se tornava
realidade em boa parte das emissoras.

78
TÓPICO 2 — HISTÓRIA DO RÁDIO E DA TV NO BRASIL

2.2 RÁDIO TUPI


A primeira emissora de rádio de Chateaubriand, a Tupi, do Rio de Janeiro,
foi inaugurada em 25 de setembro de 1935, com a presença de Guglielmo Marconi
que, como você leu na Unidade 1 deste livro, foi considerado o grande inventor
do rádio no mundo. Em 3 de novembro de 1937, surgiu a Tupi de São Paulo.
Outras cinco emissoras de grandes cidades brasileiras foram adquiridas, por
Chateaubriand, na década de 1940.

A Rádio Tupi se tornou uma das emissoras mais sintonizadas do país,


graças ao alcance e à potência dos transmissores. Na década de 1950, os, então,
novos transmissores da emissora, possuíam 100 mil watts de potência, algo
impressionante.

O elenco de artistas da época, de pessoas que faziam parte do quadro


de outras estações, mudou-se para a Tupi. Grande parte das emissoras de
rádio dessa época possuía os próprios auditórios, os quais ficavam lotados
de espectadores ávidos para acompanhar os astros. Cantores, como Dorival
Caymmi, Vicente Celestino e Dalva de Oliveira, eram ídolos da emissora. As
radionovelas se tornaram um grande atrativo, e atores, como Yoná Magalhães,
Orlando Drummond e Paulo Gracindo, integravam o elenco da Rádio Tupi.

Programas de humor, também, passaram a fazer parte da Rádio Tupi. O


primeiro deles foi A Rua da Alegria, na década de 1950. Na década de 1970, A
Turma da Maré Mansa fez um enorme sucesso com artistas que, depois, foram
para a televisão, como a famosa “velha surda”, interpretada por Rony Rios.

Acompanhe uma figura captada do vídeo institucional comemorativo


dos 80 anos da Rádio Tupi, do Rio de Janeiro, a qual mostrará, com detalhes, o
tamanho do auditório utilizado na década de 1950.

FIGURA 6 – AUDITÓRIO DA RÁDIO TUPI

FONTE: <https://www.youtube.com/watch?v=1EACZEDx6eo&ab_channel=TupiEsportes>.
Acesso em: 24 abr. 2021.

79
UNIDADE 2 — HISTÓRIA DO JORNALISMO NO BRASIL

DICAS

Para conhecer um pouco mais a respeito da história dessa emissora pioneira,


assista ao vídeo comemorativo dos 80 anos da emissora, disponível no YouTube: https://
www.youtube.com/watch?v=1EACZEDx6eo&ab_channel=TupiEsportes.

2.3 RÁDIO NACIONAL


O rádio foi se popularizando e surgiram, em cada grande cidade brasileira,
emissoras que se tornaram referência de qualidade em termos de transmissão
esportiva e de jornalismo, como em São Paulo: Rádio Educadora Paulista e Clube
de Ribeirão Preto. No Sul do Brasil, nasceram a Rádio Sociedade Riograndense,
em Porto Alegre, e a Rádio Clube Paranaense, em Curitiba, contudo, a emissora
de maior sucesso da história do rádio brasileiro foi a Rádio Nacional, do Rio de
Janeiro, inaugurada em 12 de setembro de 1936. A estação apareceu de forma
privada, pertencente à empresa jornalística A Noite, a qual editava os jornais A
Manhã e A Noite, mas foi encampada pelo governo de Getúlio Vargas, ou seja,
estatizada à força, em 8 de março de 1940, tornando-se o principal canal de
comunicação do governo com a população brasileira, um órgão de propaganda
do Estado Novo.

Depois de ser encampada pelo governo, a Nacional explodiu na audiência


e recebeu os maiores investimentos publicitários da época.

Os recursos provenientes da publicidade eram reinvestidos,


diretamente, na própria Nacional, garantindo uma programação
atraente. Assim, a partir da encampação, a Nacional desenvolveu uma
forte estratégia de conquista de mercado. Ainda em 1940, por exemplo,
contratou todo o elenco musical da Mayrink Veiga. O faturamento
cresceria ano a ano. De Cr$ 900.000,00 (900 mil cruzeiros), em 1936,
chegou a cem vezes esse valor, em 1956 (FERRARETTO, 2001, p. 113).

Em 1941, a Rádio Nacional emissora lançou a primeira radionovela


brasileira, intitulada de Em Busca da Felicidade. Grandes empresas multinacionais
entraram no Brasil na década de 1940, e, para conquistar mercado, patrocinavam
as novelas da emissora.

Em 1942, a Nacional inaugurou o próprio canal em Ondas Curtas, fato


que possibilitou ser sintonizada, durante o dia, em quase todo o território
nacional, algo que seria impossível somente nas Ondas Médias. A Rádio Nacional
era sintonizada, praticamente, em todo o país, com uma enorme potência de
transmissores, tornando-se um sucesso, mas “não penetrava em capitais, como
São Paulo, Curitiba e Porto Alegre, e não se aproveitou do próprio potencial de
comercialização” (OLIVEIRA SOBRINHO, 2011, p. 189).
80
TÓPICO 2 — HISTÓRIA DO RÁDIO E DA TV NO BRASIL

2.3.1 Repórter Esso


Ainda em 1941, durante a Primeira Guerra Mundial, a Nacional lançou
o Repórter Esso, o programa jornalístico de maior sucesso, patrocinado,
exclusivamente, pela indústria Esso Brasileira de Petróleo e com noticiário da
Agência de Notícias United Press International. Um noticiário semelhante já
existia nas capitais dos outros países, de forma a noticiar as informações mais
atuais a respeito da Segunda Guerra, e a fazer propaganda para os interesses
norte-americanos no confronto.

A estreia do Repórter Esso foi às 12h55, do dia 28 de agosto de 1941, “mas


a maior contribuição do Esso foi a introdução, no Brasil, de um modelo de texto
linear, direto, corrido e sem adjetivações, apresentado em um noticiário ágil e
estruturado” (FERRARETTO, 2001, p. 127). Essa fórmula, segundo Ferraretto
(2001), foi importada dos Estados Unidos e conferiu grande credibilidade, além
de abrangência ao Esso.

3 HORA DO BRASIL E VOZ DO BRASIL


Em 22 de julho de 1935, o presidente Getúlio Vargas criou um importante
meio de propaganda no governo: A Hora do Brasil. Era um programa de rádio
obrigatório com uma hora de duração, com formato jornalístico, mas com
discurso governamental, ou seja, um meio de publicidade estatal. O programa
estreou nas 50 rádios existentes no país. Atualmente, o Brasil possui mais de
nove emissoras de rádio, e é o segundo país do mundo em número de emissoras,
só perdendo para os Estados Unidos.

Durante a ditadura militar, na década de 1960, A Hora do Brasil passou


a se chamar A Voz do Brasil. “A Voz do Brasil é o mais antigo programa
radiofônico no ar. Além disso, é o responsável por pautar outros meios de
comunicação e por procurar ceder informações oficiais da República aos
brasileiros” (PRADO, 2012, p. 99).

É importante deixar claro que, embora fosse um produto de propaganda


do Governo Federal, A Voz do Brasil era um programa jornalístico com
apresentadores, repórteres, redatores e editores que apuravam as informações e
as transmitiam ao vivo, diariamente, pelas ondas do rádio.

81
UNIDADE 2 — HISTÓRIA DO JORNALISMO NO BRASIL

4 FORÇA DO JORNALISMO NO RÁDIO


O rádio é o principal meio de comunicação local. A força dele está,
exatamente, em falar com o público local, retratar os problemas da cidade.
Nisso, a televisão, ainda, fica em desvantagem. Mesmo com as redes de rádio via
satélite, nenhuma emissora de jornalismo consegue fazer sucesso se não tiver,
pelo menos, uma parte da programação destinada ao jornalismo local. Nisso, o
rádio é imbatível.

Nos Estados Unidos, as redes de rádio já eram realidade, e as maiores


eram a NBC e a CBS, as quais, anos mais tarde, transformar-se-iam, também, em
redes de televisão. Lá, cada uma dessas redes funcionava de forma diferenciada.
Enquanto uma operava na costa Leste, a outra era responsável por cobrir a costa
Oeste americana. No Brasil, a empresa Byington & Cia., pioneira da indústria
eletroeletrônica nacional, foi a responsável pela criação da Rede Verde-Amarela,
quando inaugurou a Rádio Cruzeiro do Sul, de São Paulo, e adquiriu outras
emissoras. Segundo Ferraretto (2001, p. 109), a Rede Verde-Amarela não se
consolidou por dois motivos:

De um lado, usava as linhas da Companhia Telefônica Brasileira,


de baixa qualidade e que distorciam as transmissões. De outro,
a Comissão Técnica de Rádio, criada em 1932, pelo governo
revolucionário, negara, às Organizações Byington, a concessão dos
canais de ondas curtas, única maneira disponível, na época, para
estruturar uma rede, verdadeiramente, nacional (SAMPAIO apud
FERRARETTO, 2001, p. 109).

4.1 REDES VIA SATÉLITE


De acordo com Ferraretto (2001), a radiodifusão sonora brasileira entrou
na era das redes, via satélite, em 1982, quando a Bandeirantes AM, de São Paulo,
começou a gerar o radiojornal Primeira Hora, usando o tempo ocioso do subcanal
que a Rede Bandeirantes de Televisão havia alugado no Intelsat 4. As afiliadas
recebiam o sinal em antenas parabólicas. Contudo, em 1985, o Brasil começou a
usar um satélite próprio, o Brasilsat A1. Um ano depois, ainda, de acordo com
Ferraretto (2001), foi lançado o A2, e a oferta de um novo serviço, o Radiosat. Uma
matéria publicada pela revista Imprensa, em março de 1991, transcrita por Luiz
Artur Ferraretto, explicava como o sistema funcionaria.

Com o início da operação do serviço Radiosat, da Embratel – um


sistema de transmissão de rádio via satélite, em estéreo, e com alta
qualidade de áudio –, as grandes emissoras das capitais estão se
unindo a pequenas emissoras do interior para a formação de redes
nacionais de rádio. Além da cobertura nacional, com um custo mais
baixo e um som de melhor qualidade, as novas redes prometem
oferecer, ao público, mais informação, porque as pequenas emissoras
que, ainda, fazem os noticiários à base da radioescuta das grandes,
agora, poderão se dedicar mais ao jornalismo regional (ODRI apud
FERRARETTO, 2001, p. 166).

82
TÓPICO 2 — HISTÓRIA DO RÁDIO E DA TV NO BRASIL

Estava decretado o início das programações via satélite, as quais


reduziram os quadros de pessoal nas emissoras locais, mas proporcionaram que
uma mesma rede de emissoras fosse sintonizada em vários lugares do país, de
forma simultânea. A partir de então, seria possível ouvir as programações, via
satélite, de emissoras, como Antena 1, Jovem Pan 2, Transamérica, Atlântida,
Globo, CBN e muitas outras. A Rádio Bandeirantes passou a operar um canal de
satélite próprio, segundo Ferraretto (2001), a partir de 25 de setembro de 1989.

4.1.1 Jovem Pan Sat


Cerca de 15 milhões de ouvintes (FARIA, 1996) estão sintonizados,
diariamente, na rede Jovem Pan Sat, a maior rede de afiliadas de emissoras de
rádio do Brasil na atualidade. Diariamente, às 6h, o Jornal da Manhã Jovem Pan,
transmitido desde os estúdios da Jovem Pan, na Avenida Paulista, em São Paulo,
atinge, praticamente, todos os cantos do país.

A história desse grupo iniciou com a Rádio Panamericana, de São Paulo,


em 3 de maio de 1944. Até essa data, segundo Faria (1996), funcionavam dez
emissoras de rádio na cidade de São Paulo: Bandeirantes, Cosmos, Cruzeiro
do Sul, Cultura, Difusora, Excelsior, Gazeta, Record, São Paulo e Tupi. A
Panamericana era conhecida como “A emissora dos esportes”, e mantinha uma
grande performance no jornalismo paulistano.

4.2 JORNALISMO 24 HORAS NO AR


A primeira rádio do mundo a transmitir, somente, notícias, o dia todo,
foi a WINGS, de Nova Iorque, em 1965. A esse tipo de emissora, dá-se o nome
de all news. Já as rádios que transmitem jornalismo 24 horas por dia, mas, não
necessariamente, possuem uma programação baseada em noticiários, são
chamadas de, apenas, news.

No Brasil, a primeira emissora a experimentar esse formato de


programação foi a Rádio Jornal, do Brasil FM, ou, simplesmente, JB FM, do Rio
de Janeiro, em 1980. A experiência durou apenas seis anos, segundo Ferraretto
(2001), e a emissora deixou de transmitir, somente, notícias, voltando a abarcar a
programação musical.

A segunda iniciativa de se fazer uma rádio com notícias, durante o dia


inteiro, aconteceu na Rádio Gaúcha, de Porto Alegre, em 1983. Com muito
planejamento e um forte investimento por parte do Grupo RBS, o projeto virou
um grande sucesso de audiência e de faturamento.

83
UNIDADE 2 — HISTÓRIA DO JORNALISMO NO BRASIL

Ao contrário da JB, a Gaúcha investiu em equipamentos modernos,


em geral, oferecendo a melhor estrutura técnica de Porto Alegre,
inovando, também, no planejamento de grandes coberturas esportivas
e jornalísticas. Nesse sentido, 1986 é o ano da consolidação da emissora
como líder do mercado (FERRARETTO, 2001, p. 174).

Seguindo a mesma linha da Gaúcha, o Grupo Globo decidiu transformar


duas emissoras que já possuía, a Excelsior, de São Paulo, e a Eldorado, do Rio de
Janeiro, na Central Brasileira de Notícias (CBN), inaugurada em 1° de outubro
de 1991. “Em seguida, vieram Brasília, Belo Horizonte e Recife. Atualmente, a
rede tem quatro emissoras próprias (São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Belo
Horizonte), e está presente nas principais cidades brasileiras, através das
afiliadas” (TAVARES, 2011, p. 22). O slogan da emissora já diz muito dela: “A
rádio que toca notícia”.

São Paulo é a cabeça-de-rede da CBN, ou seja, a emissora-matriz, na qual


são veiculados quase todos os programas diários da rede de rádios, mas a emissora
do Rio de Janeiro ancora a rede CBN entre meia-noite e seis da manhã. “Entre 6h
e 9h30, vai, ao ar, o Jornal da CBN, carro-chefe da emissora, e é, também, nessa
faixa, que se dá o pico de audiência – diferentemente da TV, pois o horário nobre
do rádio é no começo do dia” (TAVARES, 2011, p. 23).

A segunda maior rede de rádios que só transmite notícias durante todo


o dia é a Rede BandNews FM, do grupo Bandeirantes, criada em 20 de maio
de 2005, já com emissoras em São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Porto
Alegre. Em seguida, vieram as emissoras de Salvador, Curitiba e Brasília. O
canal, hoje, ocupado pela BandNews FM, em São Paulo, era a Rádio Sucesso FM,
vendida para o grupo Bandeirantes em 2004.

O primeiro apresentador da BandNews FM foi o jornalista Carlos


Nascimento. O programa de Nascimento era apresentado entre 7h e 9h da manhã.
Com a saída dele do Grupo Bandeirantes, o horário passou a ser ocupado pelo
jornalista Ricardo Boechat. O slogan da BandNews FM é “Em 20 minutos, tudo
pode mudar”, destacando a programação fatiada em noticiários de 20 minutos de
duração durante todo o dia.

A Rede Jovem Pan de Rádios, surgida no início da década de 1940, com a


criação da Rádio Panamericana de São Paulo, inovou em 1976, quando inaugurou
a Jovem Pan 2, primeira FM do grupo (FARIA, 1996), com o lançamento do próprio
canal de notícias, a Jovem Pan News, em 7 de outubro de 2013, via internet. A
partir de dezembro daquele ano, duas emissoras de rádio passaram a transmitir
esse sinal, em Brasília e em São José do Rio Preto, no interior de São Paulo. Essas
duas emissoras já pertenciam ao grupo Jovem Pan. Aliás, essa rede possui cerca
de 90 afiliadas em todo o Brasil.

84
TÓPICO 2 — HISTÓRIA DO RÁDIO E DA TV NO BRASIL

5 NASCIMENTO DA TELEVISÃO NO BRASIL


Como já vimos, a televisão já era realidade em países da Europa e dos
Estados Unidos desde a década de 1930, porém, na América Latina, o Brasil foi
o pioneiro na implantação dos serviços de televisão, a partir de 18 de setembro
de 1950, com a inauguração da TV Tupi, canal 3, de São Paulo, emissora de
propriedade dos Diários Associados, de Assis Chateaubriand. Em viagem à
Nova York, o magnata das comunicações ficou encantado com o novo meio de
comunicação e não poupou esforços para trazer a TV para o Brasil.

Em visita à NBC, ele adquiriu os equipamentos que chegariam meses


depois, por navio, ao Porto de Santos, no Estado de São Paulo. A ideia de
Chateaubriand era inaugurar a primeira emissora no Rio de Janeiro, mas as obras
do canal, na cidade maravilhosa, atrasaram, o que, então, forçou o empresário a
inaugurar a televisão na capital paulista. A TV Tupi tinha, como símbolo, o índio,
principal marca do canal. Nas vinhetas, o desenho animado de um indiozinho
marcava as passagens entre os programas. Confira:

FIGURA 7 – PRINCIPAL SÍMBOLO DA TV TUPI

FONTE: <https://observatoriodatv.uol.com.br/noticias/68-anos-de-tv-no-brasil-relembre-
curiosidades-da-historia-do-veiculo>. Acesso em: 24 abr. 2021.

Para contextualizar o momento em que isso se deu, é importante enfatizar


que, nos Estados Unidos, a linguagem da televisão veio do cinema. Já no Brasil, a
linguagem inicial foi inspirada no rádio. Foram os artistas e os comunicadores do
rádio que implantaram a televisão no país. Como sempre fez, Chateaubriand usou
a forte persuasão dele para conseguir o investimento necessário para comprar os
equipamentos. Vários patrocinadores do Grupo Diários Associados, sobretudo,
da Rádio Tupi, foram, praticamente, forçados a injetar dinheiro na televisão.
Assim o fizeram, principalmente, o Guaraná Antarctica. Prestes a inaugurar o
canal, Chateaubriand se deu conta de que não existiam receptores de televisão
no país, e teve que importar 200 aparelhos de última hora. Foram instalados em
pontos estratégicos de São Paulo, como teatros e lojas, para que pudessem ser
assistidos pelo maior número de pessoas.

85
UNIDADE 2 — HISTÓRIA DO JORNALISMO NO BRASIL

[...] Até o dia 18 de setembro de 1950, por exemplo, apenas seis


aparelhos de TV tinham sido vendidos no Brasil. Assis Chateaubriand
espalhou 200 aparelhos em pontos estratégicos da cidade de São Paulo
no dia da inauguração, para que a população pudesse ver a novidade
[...]. Um televisor custava, naquela época, 9 mil cruzeiros, três vezes
mais caro do que uma boa vitrola. Só as pessoas mais ricas podiam
comprar um aparelho (ARAÚJO, 2017, p. 28).

Portanto, a televisão demorou para estar presente na casa da maior
parte dos brasileiros, e o nascimento desse meio de comunicação aconteceu de
forma improvisada. Quando o primeiro dia de transmissão terminou, foi aí que
os funcionários se deram conta de que, no dia seguinte, teriam que fazer tudo
novamente. Até então, eles estavam tão empolgados para a grande estreia que
nem se importaram com o dia seguinte.

DICAS

Se quiser conhecer algumas curiosidades da história da televisão no Brasil, leia


a reportagem a seguir, publicada pelo site Aventuras na História: https://aventurasnahistoria.
uol.com.br/noticias/reportagem/historia-rede-tupi-tv.phtml.

5.1 JORNALISMO NÃO TINHA AUDIÊNCIA NA TV


Imagine fazer jornalismo para televisão sem todos os recursos tecnológicos
que temos hoje em dia. Entre a década de 1950 e a metade da década de 1960, não
havia video tape, ou seja, não era possível gravar nenhuma imagem para exibir
depois. Também, não existia satélite de comunicação, ou seja, era impossível
transmitir imagens dos acontecimentos rapidamente. As imagens, em fitas
semelhantes às de cinema, levavam dias para chegar ao Brasil.

Os motivos citados faziam com que os telejornais fossem muito “frios”, ou


seja, não tinha como competir com a velocidade do rádio que, ao contrário da TV,
não precisava de imagem. Portanto, assim como a própria televisão custou a ter o
interesse da maior parte da população, os telejornais, também, eram considerados
atrasados. A melhor forma de se informar era através do rádio. Não fazia sentido
assistir a um programa com um formato de jornalismo no qual havia, apenas, um
locutor sentado em frente a uma mesa, sem qualquer cenário que diferenciasse
essa atração.

86
TÓPICO 2 — HISTÓRIA DO RÁDIO E DA TV NO BRASIL

5.2 QUANDO A TELEVISÃO VIROU FEBRE ENTRE


OS BRASILEIROS
Pode-se dizer que, na década de 1960, os brasileiros passaram a ter
fascínio pela televisão, mas isso se restringia a poucos Estados. A TV nasceu em
São Paulo, em 18 de setembro de 1950, com a inauguração da TV Tupi, de São
Paulo, como já vimos. No início de 1951, chegou ao Rio de Janeiro, com a TV Tupi
do Rio. Em 1952, a segunda emissora de São Paulo foi inaugurada (TV Paulista).
Na sequência, foram inauguradas outras emissoras (Record/TV Rio) nesses dois
Estados, e em Minas Gerais. No final da década de 1950, apareceu no Sul do Brasil,
com a implantação da TV Piratini, de Porto Alegre, e no Nordeste, com emissoras
da Tupi, em Fortaleza e em Recife. Em 1960, duas emissoras foram inauguradas
em Curitiba. Em Santa Catarina, somente em 1969. Em outros Estados, porém, a
televisão só passou a ser realidade já na década de 1970.

O processo de instalação dos canais foi lento, e o principal grupo era os


Diários Associados, de Assis Chateaubriand, mas o interior do país continuava
sem televisão. As notícias a respeito da maravilha de poder assistir a imagens, ou
seja, de um aparelho superior ao rádio (meio de comunicação mais amado do país
à época), correram o Brasil inteiro. Todos queriam poder ter a oportunidade de
assistir à televisão. As lojas, por sua vez, fizeram pressão em todos os municípios,
com as prefeituras, para que as retransmissoras fossem instaladas e levassem as
imagens da TV ao restante do país. Afinal, seria a chance de ampliar o faturamento
com um aparelho que, rapidamente, esgotaria nas prateleiras. Aos poucos, isso,
realmente, aconteceu. Por todo o Brasil, onde se instalava, a televisão causava
impacto. Vizinhos se aglomeravam nas únicas casas das ruas nas quais já havia
um televisor. Foi um sucesso imenso, principalmente, depois de 1965, quando
o governo concedeu subsídio para a implantação da indústria de televisores no
Brasil. A partir daí, não era mais preciso importar os aparelhos. O preço caiu e
mais pessoas puderam ter acesso ao eletroeletrônico mais desejado.

Nos primeiros 15 anos de existência no Brasil, o aparelho televisor, ainda,


possuía um custo muito alto, e que impedia a rápida proliferação por todos os
cantos do país. O Consórcio Internacional de Satélites (Intelsat), do qual o Brasil
fez parte, desde 1965, também, foi o responsável por transmitir a chegada do
homem na Lua, em 1969, primeiro grande evento planetário assistido por milhões
de brasileiros ao vivo.

A Copa do Mundo de Futebol de 1970, também, foi a responsável por


endividar muitas famílias brasileiras, que queriam acompanhar as partidas
da Seleção Brasileira de Futebol no México, outro grande evento, via satélite,
transmitido para o Brasil em tempo real. Um pool de emissoras, ou seja, uma reunião
de emissoras de televisão (para baratear os custos de transmissão) foi montada
para trazer, ao Brasil, as imagens da Seleção Canarinho durante a conquista do
tricampeonato de futebol daquele ano. As imagens, ainda em preto e branco,
ficaram na memória de gerações. Ao contrário, do Brasil para o resto do mundo, foi
possível transmitir as imagens, ao vivo, do Carnaval Carioca, ainda em 1970.

87
UNIDADE 2 — HISTÓRIA DO JORNALISMO NO BRASIL

Os programas, como a Jovem Guarda, com o ídolo Roberto Carlos, na TV


Record, de São Paulo, chegavam ao interior do Brasil por meio da Rede de Emissoras
Unidas (REU), depois transformada em Rede de Emissoras Independentes (REI),
ainda na década de 1960. Faziam o maior sucesso entre os jovens. Novelas da
Tupi, também, começavam a alavancar a audiência. A TV Globo, inaugurada
em abril de 1965, passou cerca de dois anos amargando prejuízo, em terceiro
ou quarto lugar, no Rio de Janeiro. Quando se tornou rede, no final da década
de 1960, a Globo decolou. O Jornal Nacional, às 20h, tornou-se unanimidade em
todo o país. As grandes transmissões esportivas, como a Fórmula 1, ainda na
década de 1970, e as Olimpíadas, a partir de 1972, em Munique, na Alemanha,
também, passaram a ser veiculadas pela televisão.

Em um país com índices de leitura muito baixos, cujo rádio era o grande
companheiro e disseminador de entretenimento e de informações, a televisão
passou a dominar a audiência, encantada com essa nova invenção.

6 PROGRAMAS JORNALÍSTICOS
De acordo com Araújo (2017), o primeiro programa noticioso da televisão
brasileira foi ao ar em 19 de setembro de 1950, um dia após a estreia da TV Tupi,
de São Paulo. O programa era o Imagens do Dia, o qual exibia imagens brutas
(sem edição) dos principais acontecimentos daquele dia. Interessante observar
que não havia satélite, e nenhuma outra emissora de televisão em todo o país, o
que nos faz supor que tais imagens se limitavam à capital paulista. Outro autor
da área, Fernando Morgado, discorda dessa informação, e afirma que o primeiro
programa noticioso foi ao ar, ainda, no dia 18 de setembro de 1950.

O primeiro informativo surgiu dentro do programa inaugural TV


na Taba: foi o boletim Em Dia com a Política, do jornalista Maurício
Loureiro Gama. Ele trabalhava no Diário da Noite, veículo que, assim
como a pioneira TV Tupi, também, pertencia aos Diários Associados,
grupo empresarial de Assis Chateaubriand (MORGADO, 2020, s.p.).

Na década de 1950, surgiram outros telejornais, ainda, sob forte influência


do rádio, ou seja, mais parecidos com a linguagem do rádio do que da televisão,
como conhecemos hoje. A marca registrada desses programas era a impostação
da voz dos apresentadores, como se fazia no rádio. Em janeiro de 1952, a Tupi
lançou o Telenotícias Panair, patrocinado pela companhia de aviação Panair do
Brasil. Segundo Araújo (2017), esse foi o primeiro telejornal diário brasileiro.

De qualquer forma, o mais importante programa jornalístico dos


primórdios da televisão brasileira viria a ser o Repórter Esso, o qual já existia
no rádio. A primeira edição foi ao ar em 1° de abril de 1952, e permaneceu em
exibição até 31 de dezembro de 1970, na TV Tupi. O locutor Heron Domingues
foi o principal apresentador do programa. O Repórter Esso utilizava muitos
materiais internacionais vindos da Agência UPI e da CBS americana.

88
TÓPICO 2 — HISTÓRIA DO RÁDIO E DA TV NO BRASIL

Já a TV Excelsior, inaugurada em 1960, lançou outro telejornal que entrou


para a história da televisão brasileira: o Jornal de Vanguarda. A produção do
programa era feita pelos jornalistas da emissora, uma novidade para a época.
Esse telejornal, também, inovou, ao incluir comentaristas com os apresentadores.
A notícia passava a ser interpretada, e não apenas informada. De acordo com
Araújo (2017), o Jornal de Vanguarda foi premiado, na Espanha, com o prêmio
Ondas, como o melhor telejornal do planeta.

É importante, porém, fazer uma observação importante a respeito desses


primeiros grandes telejornais brasileiros: não existiam redes de televisão, assim,
eles ficaram limitados aos grandes centros do país durante muitos anos.

6.1 SURGE O JORNAL NACIONAL


O Jornal Nacional, da Rede Globo, tornou-se um fenômeno de audiência
em todo o Brasil desde a estreia, em 1° de setembro de 1969, ainda em preto e
branco. Foi o primeiro noticiário transmitido em rede, via satélite. Até hoje, é
o telejornal mais assistido do país. Os primeiros apresentadores, Cid Moreira e
Hilton Gomes, faziam a locução das notícias mais importantes do dia no Brasil
e no exterior. Grandes nomes viriam em seguida, como Sérgio Chapelin, Léo
Batista, Celso Freitas, Eliakim Araújo, William Bonner, Lilian Witte Fibe, Fátima
Bernardes e muitos outros. O Jornal Nacional é uma das maiores audiências
diárias da Globo em todo o Brasil, e só perde, em faturamento, para a novela das
21h. O “Boa Noite”, dito por Cid Moreira, ao fim do jornal, virou marca registrada
do programa, e muitos telespectadores chegavam a responder quando era dito.

Aproveitando-se de todo o poder econômico que a Globo foi conquistando


a partir da década de 1970, e com as exclusividades que o canal possuía em razão
do pioneirismo tecnológico, o Jornal Nacional atingia, cada vez mais, índices
de audiência gigantescos. Não é exagero dizer que o Brasil parava em frente da
televisão para acompanhar os acontecimentos do dia, tamanha importância desse
telejornal produzido no Rio de Janeiro, e, simultaneamente, em várias praças,
com as afiliadas do canal.

Os grandes acontecimentos do Brasil e do mundo chegavam aos


brasileiros ao vivo, durante o JN, como ficou conhecido. Trata-se de um fenômeno
de audiência e sucesso de vendas. Trinta segundos para um anunciante, no
intervalo do Jornal Nacional, custam milhões de reais, graças à força que o
programa, ainda, detém perante a opinião pública. Não foram raras as vezes
que o programa foi criticado por critérios de edição que pudessem prejudicar
esse ou aquele candidato a cargo público.

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UNIDADE 2 — HISTÓRIA DO JORNALISMO NO BRASIL

FIGURA 8 – PRIMEIROS APRESENTADORES DO JORNAL NACIONAL

FONTE: <https://noticiasdatv.uol.com.br/noticia/televisao/antes-de-estrear-jornal-nacional-
quase-foi-substituido-pelo-reporter-esso-na-globo-28444>. Acesso em: 24 abr. 2021.

6.2 SURGEM NOVOS FORMATOS JORNALÍSTICOS NA TV


Atenta ao poder que havia conquistado perante o público brasileiro, a TV
Globo lançou outros três programas jornalísticos que, também, virariam líderes
de audiência. Em 1972, entrou no ar o Jornal Hoje, um programa vespertino no
qual se falava de moda, de comportamento e com entrevistas.

Em 1973, a Globo trouxe o Fantástico, nas noites de domingo, uma revista


eletrônica que reúne entretenimento e jornalismo. No campo do entretenimento,
foi o primeiro programa brasileiro a produzir clipes musicais. No jornalismo,
trazia as informações mais importantes do domingo. Além disso, informava os
resultados esportivos do fim de semana. A receita do Fantástico deu certo e a
fórmula do programa acabou sendo exportada para outros países.

Outro programa presente no mesmo ano foi o Globo Repórter, durante


a semana, o primeiro programa documentário da televisão brasileira, com
linguagem de cinema. A partir de 1983, a linguagem de documentário deu lugar
à grande reportagem. Esses dois programas foram criados pelo publicitário José
Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, considerado o principal cérebro do canal
desde a contratação dele, em 1967, até 1999, quando deixou o cargo de principal
diretor da emissora.

Na década de 1980, vieram os jornais matutinos, com a primeira


experiência trazida pelo Bom dia São Paulo. O Bom dia Brasil veio depois,
apresentado ao vivo, de Brasília, para todo o país, mas não foi só de noticiário
que o jornalismo fez sucesso naquele começo de década. Ainda, em 1980,

90
TÓPICO 2 — HISTÓRIA DO RÁDIO E DA TV NO BRASIL

um programa, chamado de TV Mulher, apresentado por Marília Gabriela,


misturava jornalismo, entrevistas, moda, comportamento, culinária e, até
mesmo, informações de educação sexual, em plena ditadura militar. Marília
Gabriela já era repórter e apresentadora da TV Globo e foi escalada para ancorar
o programa diário, nas manhãs da Globo. Entrevistas célebres, como a de Elis
Regina, marcaram o momento.

6.3 VÁRIAS FORMAS DE FAZER JORNALISMO NA TV


Em 1978, a TV Globo lançou o programa Plantão da Madrugada, com o
jornalista Goulart de Andrade. Fazia uma espécie de cobertura do submundo
das noites das grandes cidades brasileiras, e era exibido, somente, nas praças
nas quais a Globo ficava no ar durante 24 horas por dia, ou seja, em poucas
cidades brasileiras.

No começo da década de 1980, Goulart de Andrade saiu da Globo,


montou a própria produtora, e passou a fazer o mesmo programa, com o
nome de Comando da Madrugada, na TV Bandeirantes. Em 1985, o programa se
mudou para o SBT. O jornalista chegou a fazer matérias trajado como travesti, nas
noites paulistanas, ou como mendigo, nas ruas da maior metrópole do país. Sem
script, pautado pelo improviso, Goulart de Andrade e, apenas, um cinegrafista
apelidado de “capeta”, faziam as reportagens.

A década de 1980, também, foi marcada por importantes experiências,


dentro do jornalismo, nas demais emissoras do país. A Rede Bandeirantes entrou
para a história com a criação de alguns programas que misturavam jornalismo
e entretenimento, como o Show do Esporte, tendo Luciano do Valle como o
principal coordenador.

Durante todo o dia de domingo, o Show do Esporte atingia grande


audiência e conquistava os telespectadores. Iniciou-se, então, a exibição dos
jogos do Campeonato Italiano para o Brasil, e a Fórmula Indy, direto dos Estados
Unidos. A emissora, também, contratou Marília Gabriela, responsável por
encabeçar os memoráveis debates presidenciais da década, com algumas figuras,
como Leonel Brizola e Paulo Maluf, responsável por discussões fervorosas. Na
mesma década, a emissora lançou o programa Canal Livre, um debate de ideias
que entrou para a história da TV brasileira nas noites de domingo.

No começo da década de 1980, a Bandeirantes, também, fez história ao


entregar um novo tipo de programa no formato de entrevista. Nascia o Cara
a Cara, com Marília Gabriela. Nas noites de domingo, o programa de Gabi
conseguiu entrevistar líderes mundiais e algumas das maiores personalidades,
daquela década, do Brasil e do mundo. Anos depois, o formato foi levado para o
SBT e para a televisão paga.

91
UNIDADE 2 — HISTÓRIA DO JORNALISMO NO BRASIL

Em 1987, o SBT estreou o Telejornal Brasil (TJ Brasil), com o jornalista


Boris Casoy como âncora. Surgiu o bordão “isso é uma vergonha”, marca
registrada de Casoy, já um veterano do jornalismo, tendo trabalhado nas
redações de grandes jornais impressos de São Paulo. A intenção do SBT era
atrair grandes anunciantes e se desvencilhar da ideia de uma televisão tão
popular. No mesmo ano, Jô Soares foi contratado pelo canal para fazer um dos
principais talk shows, o Jô Soares Onze e Meia, o qual ficou no ar até 1999, e se
mudou para a Globo em 2000, com o nome de Programa do Jô. A mistura do
jornalismo e do humor de Jô Soares deu certo e virou um sucesso de audiência
nos anos que se seguiram.

A Rede Manchete, lançada em 1983, teve dois programas jornalísticos que


se tornaram sucesso. O primeiro deles foi o Jornal da Manchete, com uma hora
de duração. O segundo foi o Programa de Domingo, inspirado no Fantástico,
com apresentação de Renato Machado e de Carolina Ferraz. A Manchete,
também, revolucionou a linguagem jornalística, com o Documento Especial,
programa no estilo documentário, sem repórter no vídeo, e pautas polêmicas
do submundo, que retratavam a realidade das cidades, da noite das grandes
metrópoles. Outra atração que se destacou foi o Programa Ferreira Netto, com
o jornalista veterano, promovendo entrevistas e debates com personalidades da
política e da economia.

6.4 SENSACIONALISMO NA TV
O Homem do Sapato Branco, apresentado por Jacinto Figueira Júnior,
foi ao ar na TV Globo, em 1968, e na TVS, do Rio, no final da década de 1970,
além da Record, de São Paulo. Em 1981, foi exibido pelo SBT. O formato não
era um noticiário, mas pode ser considerado um dos primeiros programas
sensacionalistas da televisão brasileira. “O Homem do Sapato Branco abordava
temas, como violência urbana, pessoas hermafroditas, marginais, curandeiros e
outros assuntos que faziam parte do denominado mundo cão (expressão criada
pelo próprio apresentador)” (ARAÚJO, 2017, p. 72).

Em 1979, a TV Tupi estreava o Aqui e Agora, com quatro horas de


duração. “Os objetivos eram retratar a vida diária da cidade e produzir notícias
interessantes do Rio de Janeiro para o esclarecimento do público, além de sugerir
soluções para os problemas” (ROXO, 2010 apud ARAÚJO, 2017, p. 73). A Tupi
foi à falência em 1980, e o SBT utilizou a equipe para produzir O Povo na TV,
basicamente, com o mesmo formato, um programa de auditório e informativo.
Ficou no ar até 1984, mas não era transmitido para todo o Brasil.

No dia 20 de maio de 1991, estreou no ar o noticiário Aqui Agora, no SBT,


com um nome quase idêntico à antiga atração da extinta TV Tupi, mas, agora,
com uma formatação dinâmica, com o intuito de obter mais credibilidade ao SBT.
O programa atingiu números expressivos de audiência em todo o Brasil e ficou
disponível até 1997. Lançou comunicadores, como Cesar Tralli e Celso Russomano,
além de introduzir os veteranos do rádio, Gil Gomes e Luiz Lopes Corrêa.
92
TÓPICO 2 — HISTÓRIA DO RÁDIO E DA TV NO BRASIL

No programa, a câmera se movimentava muito mais do que nos noticiários


tradicionais. Havia a intenção de mostrar, com detalhes, que a reportagem,
praticamente, estava presenciando os crimes, a violência, mas o programa
se restringia, principalmente, à grande São Paulo. Também, surgiu o quadro
direcionado a solucionar os problemas relacionados aos direitos do consumidor,
com Celso Russomano.

A partir do Aqui Agora, outros programas policiais tomaram conta das


emissoras brasileiras, ainda, na década de 1990. Em 1995, entrou no ar o Cidade
Alerta, na Rede Record, sob o comando de José Luiz Datena. Em 1997, surgiu o
Brasil Urgente, na Rede Bandeirantes, com alguns apresentadores, como Wilton
Franco e Roberto Cabrini, mas o principal apresentador, ao longo do tempo,
também, foi o Datena.

6.5 JORNALISMO 24 HORAS POR DIA


Em 15 de outubro de 1996, o Grupo Globo lançou a GloboNews, primeiro
canal de notícias da televisão brasileira com 24 horas de jornalismo, na TV paga, via
Globosat. A GloboNews mantinha uma linha editorial elitizada, bem diferente dos
demais jornais da TV Globo, mais popular. Em 19 de março de 2001, entrou no ar a
BandNews, também, através da TV a cabo, e pertencente ao grupo Bandeirantes.

No dia 27 de setembro de 2007, tomou espaço a Record News, do grupo


Record, vinculada ao bispo Edir Macedo, da Igreja Universal, primeira emissora
destinada a oferecer jornalismo 24 horas por dia na TV aberta, com algumas
geradoras espalhadas pelo país. A emissora contratou o jornalista Heródoto
Barbeiro, que trabalhava na TV Cultura de São Paulo e na Rádio CBN, como forma
de ter um grande nome do jornalismo brasileiro no quadro de profissionais.
Anos depois, o canal reduziu o espaço do jornalismo para algumas horas por dia.

Em 15 de março de 2020, marcou presença a CNN Brasil, uma emissora


brasileira pertencente ao empresário Rubens Menin, proprietário de uma grande
construtora e que leva o nome da maior rede de jornalismo do mundo, a Cable
News Network, com sede em Atlanta, nos Estados Unidos. Com transmissão via
televisão por assinatura, o canal conquistou relativa audiência no primeiro ano
de funcionamento, e chegou a disputar alguns números do IBOPE, no segmento
News, com a GloboNews. Vários ex-jornalistas da TV Globo foram contratados,
como William Waack, Carla Vilhena e Márcio Gomes.

93
UNIDADE 2 — HISTÓRIA DO JORNALISMO NO BRASIL

NOTA

O âncora, na TV, não é apenas o jornalista que apresenta o telejornal. Ele é


o responsável por emitir opiniões durante a exibição do programa. No rádio, o âncora,
também, chama os repórteres e os comentaristas.

6.6 IMPORTÂNCIA DA TELEVISÃO NO ESPAÇO


PÚBLICO BRASILEIRO
A televisão, ainda, é o principal meio de comunicação de massa do país. A
internet não chega a atingir 70% da população, no caso daqueles que, pelo menos,
conseguem acessar a rede no trabalho. O acesso à internet, nas residências, é bem
menor. Isso tudo faz, da televisão, muitas vezes, o único meio de comunicação
de parte da população brasileira. A audiência da TV, no Brasil, também, chega a
ser maior do que em outros países do mundo, graças ao fascínio que o brasileiro
possui pelo meio de comunicação. Recentemente, em 2021, um reality show de
sucesso da principal emissora do país chegou a registrar cerca de 35 pontos de
audiência depois da meia-noite.

Desde a década de 1970, mas, sobretudo, a partir da década de 1980, a


televisão brasileira se tornou uma poderosa máquina de vendas, capaz de oferecer
os mais diversos produtos para todos os segmentos de público.

Nos Estados Unidos, o centro do capitalismo mundial, as três principais


redes de televisão abertas – ABC, NBC e CBS – dividem a audiência. Já no Brasil,
há, pelo menos, quatro décadas, a Rede Globo de Televisão obtém a liderança de
audiência e fica com a maior fatia do bolo publicitário destinado à TV. As outras
quatro maiores redes de televisão do país – SBT, Record, Bandeirantes e Rede TV
– não chegam a ameaçar o predomínio da Globo, a não ser em poucos momentos
do dia, como no horário do almoço, quando a Record obtém grande audiência
com programa de fofocas, ou ocasiões especiais, como em partidas de futebol
transmitidas pelo SBT.

Nos lugares mais longínquos, a parabólica, ainda, é indispensável para


se captar o sinal de TV, de forma analógica ou digital. Por outro lado, a televisão
paga nunca conseguiu obter sucesso semelhante ao que consegue obter em alguns
países, como nos Estados Unidos. Lá, cerca de 96% da população assina algum
serviço de televisão a cabo, implantada, ainda, na década de 1960. Na Argentina,
a TV a cabo iniciou as operações na década de 1970, mas, no Brasil, somente no
final da década de 1980, e, apenas, em grandes cidades. O acesso da população
à TV a cabo variou, nos últimos anos, entre 14% e 21% de assinantes, algo muito
modesto para um país com o tamanho e a população do Brasil.

94
TÓPICO 2 — HISTÓRIA DO RÁDIO E DA TV NO BRASIL

É possível dizer que grande parte dos brasileiros pulou essa etapa de
assistir a uma TV a cabo, passando direto para a televisão por streaming, ou para
as plataformas que surgiram já na década passada, com o aumento da velocidade
da internet. A questão do poder aquisitivo foi outro fator determinante para a
baixa audiência da televisão por assinatura brasileira.

Na televisão transmitida por satélite, diretamente, para a casa do assinante,


o chamado sistema Direct to Home (DTH) chegou, rapidamente, ao Brasil, em 1996,
apenas dois anos depois da implantação dele nos Estados Unidos. Os programas
podiam ser gravados de forma automática em modernos conversores acoplados
aos televisores. Em razão do custo de instalação do cabeamento nas cidades
brasileiras, a TV a cabo ficou restrita mais aos maiores municípios brasileiros.

95
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• Depois de ser encampada pelo Governo Federal, em 1940, a Rádio Nacional


lançou o Repórter Esso, em 28 de agosto de 1941, programa de grande sucesso
pelo formato inovador importado dos Estados Unidos. O Repórter Esso migrou
para a TV Tupi e alcançou um enorme sucesso, também, até o início da década
de 1970, quando foi encerrado.

• A Rede Globo estreou os programas jornalísticos de maior sucesso de todos os


tempos na televisão brasileira a partir de 1969, com o Jornal Nacional; em 1972,
com o Jornal Hoje; e, em 1973, com o Fantástico e o Globo Repórter, ícones do
telejornalismo e grandes sucessos de audiência.

• Depois da consolidação da Globo como líder de audiência, ainda, na década


de 1970, outras emissoras experimentaram novos formatos de sucesso no
telejornalismo brasileiro, como o programa Cara a Cara, com Marília Gabriela,
e o Show do Esporte, misturando jornalismo e entretenimento, os dois na
Bandeirantes. Na Manchete, o Documento Especial revelava o submundo das
grandes metrópoles em pautas, sempre, muito polêmicas. Goulart de Andrade
e o Comando da Madrugada, na década de 1980, também, revelavam outras
formas de fazer jornalismo na TV.

• Pode-se dizer que o sensacionalismo, no telejornalismo brasileiro, iniciou


com o Homem do Sapato Branco, apresentado por Jacinto Figueira Júnior,
veiculado a emissoras, como Globo; TVS, do Rio; Record, de São Paulo; e
SBT. Já em 1979, O Povo na TV e o Aqui e Agora, ainda na TV Tupi, depois,
transformado em Aqui Agora, no SBT, também, tiveram participação
importante no quesito sensacionalismo.

96
AUTOATIVIDADE

1 O rádio encantou os brasileiros e se tornou o principal meio de comunicação


da época para entretenimento e para informação. Com base nos seus
conhecimentos a respeito dos primórdios desse meio de comunicação no
Brasil, analise as sentenças a seguir:

I- A história do rádio, no Brasil, começou em 1919, em Recife (PE), quando um


grupo de amadores realizou experiências de transmissão por radiotelegrafia.
Nascia a Rádio Club de Recife, emissora pioneira em todo o Brasil. 
II- Em 1923, foi criada a Rádio Sociedade, do Rio de Janeiro, emissora cujo
conteúdo tinha cunho popularesco. 
III- O primeiro jornal do rádio brasileiro foi criado por  Edgard Roquette-
Pinto, e consistia, basicamente, em notícias lidas pelo locutor, diretamente,
do jornal impresso. 

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As sentenças I, II e III estão corretas.
b) ( ) Apenas a sentença II está correta.
c) ( ) Apenas a sentença I está correta.
d) ( ) As sentenças I e III estão corretas.

2 A Rádio Nacional, inaugurada em 1936, foi um marco da história do


rádio brasileiro. Com base no que você estudou a respeito dessa emissora,
classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as sentenças falsas:

( ) A Rádio Nacional foi encampada pelo governo de Getúlio Vargas, em


1940, e se tornou um órgão de propaganda do Estado Novo, regime
ditatorial liderado por ele. 
( ) Depois de ser encampada pelo regime, a emissora perdeu audiência e
verbas publicitárias.
( ) Em 1941, a Rádio Nacional lançou o jornalístico Repórter Esso, um
noticiário que adquiriu grande credibilidade no cenário nacional. 
( ) Apesar de fazer sucesso nos grandes centros do país, era impossível
sintonizar a Rádio Nacional no interior. 

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) F-F-V-V.
b) ( ) V-F-V-F.
c) ( ) F-V-V-F.
d) ( ) V-V-V-V.

97
3 O Brasil foi o pioneiro na implantação da televisão na América Latina, o
que aconteceu em setembro de 1950. Considerando o que você estudou a
respeito do nascimento da televisão no Brasil, analise as sentenças a seguir:

I- A primeira emissora de televisão do Brasil foi a TV Tupi, canal 3, de São


Paulo, emissora que pertencia ao grupo dos Diários Associados. 
I- A linguagem adotada nos primórdios da televisão brasileira tinha o
cinema como inspiração, assim como aconteceu nos Estados Unidos.
III- Após a inauguração da TV Tupi, a televisão se espalhou, rapidamente,
por todos os cantos do país. 

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) Apenas a sentença I está correta.
b) ( ) As sentenças II e III estão corretas.
c) ( ) As sentenças I, II e III estão corretas.
d) ( ) Apenas a sentença III está correta. 

4 Os números de audiência das principais redes de televisão do Brasil


mostram que o público brasileiro de hoje em dia é apaixonado por esse meio
de comunicação, mas nem sempre foi assim. Nos primórdios, os programas
jornalísticos não tinham audiência na TV. Com base no que você estudou,
explique os motivos do desinteresse inicial dos brasileiros pelo telejornalismo. 

5 A televisão ocupa um espaço de grande importância na sociedade brasileira,


considerando que, a partir dela, a maior parte das pessoas se informa e se
diverte. Com base no conteúdo apresentado, disserte acerca da importância
da televisão no espaço público brasileiro. 

98
TÓPICO 3 —
UNIDADE 2

IMPRENSA NA DITADURA

1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, no Tópico 3, falaremos da atividade jornalística no Brasil
durante os momentos nos quais o país viveu regimes ditatoriais: durante o Estado
Novo (1937-1945) e durante o Regime Militar (1964-1985). Como você sabe, as
atividades de produzir e de difundir informações sofreram duras restrições
nesses momentos históricos.

Veremos que, nesses períodos, a imprensa foi vista, pelos governantes,


como uma ameaça, motivo pelo qual a censura foi imposta. Por outro lado,
também, naquela época, empresários da grande mídia, sobretudo, da televisão,
estabeleceram relações estreitas com o poder, o que nos faz refletir a respeito do
papel ambíguo dos meios de comunicação durante a ditadura militar brasileira.

2 PERÍODOS DE DITADURA NA HISTÓRIA BRASILEIRA:


BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO
Na história brasileira, vivemos dois períodos de ditadura: Estado Novo
(1937-1945) e Regime Militar (1964-1985). Nesses dois momentos da nossa história,
os governantes possuíam amplos poderes e utilizavam esse poder para suprimir
liberdades civis, reprimir opositores por meios violentos e limitar os poderes do
Legislativo e do Judiciário.

A ditadura do Estado Novo é, normalmente, lembrada pelos avanços dos


processos de industrialização do país e da legislação trabalhista. Por conta disso,
o autoritarismo característico desse período foi, muitas vezes, relativizado ou
minimizado, ao longo da história. Cabe lembrar que o governo Getúlio Vargas teve
início em 1930, já com características autoritárias, transformando-se em ditadura,
em 1937. O período ditatorial, conhecido como Estado Novo, durou nove anos, e,
durante essa fase, o poder esteve concentrado nas mãos de Getúlio Vargas, o qual
fechou o Congresso Nacional, mandou prender e torturar opositores e censurou
a imprensa, dentre muitas outras medidas características desse tipo de regime.

99
UNIDADE 2 — HISTÓRIA DO JORNALISMO NO BRASIL

DICAS

Para aprofundar os seus estudos envolvendo a Era Vargas e o Estado Novo,


consulte o livro Getúlio 1930-1945: Do Governo Provisório à Ditadura do Estado Novo,
escrito por Lira Neto e publicado pela editoria Companhia das Letras, em 2013.

O Regime Militar, por sua vez, estendeu-se de 1964 até 1985, oscilando
entre épocas de relativa “abertura” e, outras, de recrudescimento. Ao longo desse
período, cinco militares se sucederam no poder: Humberto de Alencar Castelo
Branco (1964-1967), Artur da Costa e Silva (1967-1969), Emílio Garrastazu Médici
(1969-1974), Ernesto Geisel (1974-1979) e João Baptista de Oliveira Figueiredo
(1979-1985).

O Regime Militar começou em caráter provisório e com apoio civil,


mas alterou as leis vigentes através dos Atos Institucionais, para se manter ao
longo de 21 anos. Durante o regime, o Congresso Nacional foi fechado em três
oportunidades, partidos políticos foram extintos e foi imposto o bipartidarismo.
A oposição ao regime foi reprimida violentamente, com prisões, exílios e torturas.
Mais de 400 pessoas foram mortas ou desapareceram durante a ditadura militar
brasileira, segundo o relatório final da Comissão Nacional da Verdade.

3 IMPRENSA BRASILEIRA NO ESTADO NOVO (1937-1945)


Ao declarar a implantação do Estado Novo, em 1937, Getúlio Vargas
dissolveu o Congresso e outorgou uma nova Constituição, que ficou conhecida
como “constituição polaca”, por conter leis de inspiração fascista, como a
constituição polonesa de 1935. A Constituição brasileira de 1937 aboliu a liberdade
de expressão e estabeleceu censura a todos os meios de comunicação. Atribuiu-
se, à imprensa, o caráter de serviço de utilidade pública, o que obrigava todos
os jornais a publicarem comunicados do governo. O descumprimento dessa
obrigação poderia levar a punições severas, como a prisão do diretor do jornal.

Em 1939, foi criado o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP),


com o objetivo de controlar a opinião pública no âmbito geral, não apenas na
imprensa e no rádio. As ações desse departamento afetaram todas as formas de
expressão do pensamento, como o teatro, o cinema, a música, o livro, o circo e
quaisquer outras expressões de espetáculos públicos.

Jornais e jornalistas precisavam ser registrados pelo DIP. A partir de


1940, o governo passou a exigir que esses jornais se registrassem, anualmente,
no DIP, para que pudessem importar papel para imprimir os exemplares. Com
isso, o governo conseguiu extinguir dezenas de jornais. Um dos periódicos mais
100
TÓPICO 3 — IMPRENSA NA DITADURA

atingidos pela ditadura do Estado Novo foi O Estado de São Paulo, mantido sob
intervenção do governo, enquanto Julio Mesquita Filho, o proprietário, partiu
para o exílio. O jornal só foi devolvido aos proprietários em 1945, com o fim do
período ditatorial. Em 1945, liquidou-se a ditadura, com importante participação
da imprensa. Assim, foram abolidos os instrumentos de repressão e de censura e
a imprensa readquiriu a liberdade.

3.1 RÁDIO NACIONAL ENCAMPADA POR


GETÚLIO VARGAS
A Rádio Nacional do Rio de Janeiro foi o primeiro veículo eletrônico
brasileiro a ganhar status de fenômeno de radiodifusão, pela qualidade da
programação. No entanto, o Decreto n° 2.073, de 8 de março de 1940, encampou,
ou seja, tomou, para si, várias empresas, até então, privadas de sucesso no país: a
rede ferroviária da Companhia Estrada de Ferro São Paulo-Rio Grande; as terras
pertencentes à estrada de ferro, no Paraná e em Santa Catarina; e todo o acervo
das sociedades A Noite, Rio Editora e Rádio Nacional, empresas de propriedade
do grupo que controlava o jornal A Noite, a publicação de maior circulação no Rio
de Janeiro, então, capital federal. Todas essas organizações passaram a constituir
as Empresas Incorporadas ao Patrimônio da União.

O apoio do governo e a consequente posição de liderança, obtida


pela Nacional, permitiam, à emissora, possuir, em meados dos anos 50, uma
infraestrutura invejável. Eram seis grandes estúdios: um especial para radioteatro,
um para o radiojornalismo, um palco-estúdio, um para pequenos conjuntos, um
para grandes orquestras e um auditório com 496 lugares. O quadro de pessoal
contava com 10 maestros, 124 músicos, 33 locutores, 55 radioatores, 39 radioatrizes,
52 cantores, 44 cantoras, 18 produtores, 13 repórteres, 24 redatores, quatro
secretários de redação, e, aproximadamente, 240 funcionários administrativos
(FEDERICO apud FERRARETTO, 2001, p. 114).

Interessante observar que tal medida, de encampação de emissoras


de rádio, também, foi adotada em outros países, como na Espanha, na época
governada pelo ditador Francisco Franco Bahamonde.

4 IMPRENSA BRASILEIRA NO REGIME MILITAR (1964-1985)


Os meios de comunicação sempre foram considerados essenciais para
a formação da opinião pública. Por conta disso, as restrições à livre circulação
de informações e de ideias foram características de governos ditatoriais. O
Regime Militar restringiu, de forma profunda, a atividade jornalística no Brasil.
A imprensa foi alvo de censura através de diversos instrumentos, como a Lei
de Imprensa, de 1967, os atos institucionais, e, até mesmo, a Lei de Segurança
Nacional. O objetivo primordial era impedir que fossem divulgadas informações
que pudessem desestabilizar o governo.
101
UNIDADE 2 — HISTÓRIA DO JORNALISMO NO BRASIL

É necessário dizer, no entanto, que os grandes veículos de imprensa


tiveram papel ambíguo durante o golpe militar e a ditadura, que se estendeu
por mais de 20 anos. Ao mesmo tempo em que os jornalistas tinham a liberdade
reprimida e havia censura ao conteúdo dos jornais, muitos empresários do meio
apoiaram o golpe e o regime militar, durante muitos anos, pois mantinham
relações estreitas com o poder constituído, e, dele, beneficiavam-se.

4.1 CENSURA AOS JORNAIS


A ditadura militar, iniciada em 1964, agravou-se com a emissão do Ato
Institucional n. 5, o AI5, pelo presidente Artur da Costa e Silva, no dia 13 de
dezembro de 1968. O AI5 foi o mais repressivo dos atos institucionais do regime
militar porque institucionalizou a tortura e decretou intervenções nos estados
e nos municípios, além de decretar a perda de mandatos de parlamentares
contrários ao governo. Gerou, também, o exílio de dezenas de artistas e de
políticos brasileiros em vários países. Um lado sombrio do passado brasileiro.

Integrantes dos serviços de inteligência do exército eram destacados para


censurar as peças teatrais, a produção de filmes nacionais, de rádio e de televisão.
Nessa época, era comum ter um representante da censura federal nas redações
da televisão, do rádio, dos jornais e das revistas. Esse censor era responsável por
vetar todas as notícias que pudessem representar algum tipo de crítica ao governo.
Para piorar a situação, a censura ultrapassou todos os limites do bom senso e se
tornou tão arraigada nas redações que, mesmo notícias sem qualquer teor político,
eram vetadas. Para se ter uma ideia, a foto do presidente Emílio Garrastazu Médici,
segurando uma bola de futebol, foi vetada porque ele “parecia humano demais”.

A radicalização saiu do controle de tal forma que as novelas da televisão,


também, passaram a ser vigiadas, e, mesmo, canceladas. Exemplo emblemático
foi a primeira versão de Roque Santeiro, de Dias Gomes, a qual já estava com
dezenas de capítulos gravados e não pôde ir ao ar devido à censura. O interessante
é que a novela contava a história de uma cidade do interior brasileiro na qual o
turismo religioso havia se tornado a principal fonte de arrecadação do município,
mas o “santo” cultuado pelos milhares de romeiros não passava de uma grande
armação, uma mentira. Já a novela O Bem Amado, primeira, totalmente, em cores,
da televisão brasileira, contava a história de um prefeito de uma cidade fictícia,
Sucupira, e utilizava vários expedientes antiéticos para conseguir permanecer no
poder, não sofrendo tanto com a censura como Roque Santeiro.

O jornalismo foi, extremamente, afetado com a ditadura militar. Como


não podiam veicular as notícias, principalmente, relacionadas aos excessos do
governo, às torturas e aos desaparecimentos de jornalistas e de artistas, os jornais
passaram a se comunicar com os leitores de forma a dar pistas a respeito do que
estava acontecendo. Começaram a publicar receitas de bolo no lugar das notícias
censuradas. Dessa forma, pela diagramação da página do jornal, o leitor começou
a entender que, no espaço daquela receita, deveria haver uma informação que foi
vetada pelos censores. Essa prática foi adotada por vários jornais brasileiros.
102
TÓPICO 3 — IMPRENSA NA DITADURA

O jornal Folha de São Paulo apoiou o golpe de 1964, além do O Globo,


de Roberto Marinho, embora todos eles tenham sofrido, também, em seguida,
com a repressão do regime militar. O jornal O Estado de São Paulo teve edições
apreendidas, ou seja, todos os exemplares foram confiscados para não chegar
aos leitores.

Observe, a seguir, as manchetes da capa da edição de 14 de dezembro de


1968, do jornal O Estado de São Paulo, informando, exatamente, a apreensão do
próprio jornal.

FIGURA 9 – JORNAL O ESTADO DE SÃO PAULO 14/12/1968

FONTE: <https://acervo.estadao.com.br/pagina/#!/19681214-28738-nac-0001-999-1-not>.
Acesso em: 24 abr. 2021.

103
UNIDADE 2 — HISTÓRIA DO JORNALISMO NO BRASIL

DICAS

Para saber mais a respeito do período no qual o jornal O Estado de São Paulo
teve edições apreendidas, leia o texto a seguir, da Associação Brasileira de Imprensa (ABI):
http://www.abi.org.br/a-historia-da-censura-no-estadao/.

4.2 REVISTA VEJA


A Editora Abril, empresa gráfica que se tornou um sucesso editorial com
a publicação das histórias em quadrinhos da Disney, ainda nos anos de 1950, foi
um dos maiores grupos jornalísticos até a década de 2000, quando entrou em
declínio. Criada por Roberto Civita, presidente do Grupo Abril, o maior fenômeno
editorial em termos de revista impressa do país, a Veja alcançou a marca de um
milhão de assinantes, em média. A editora Abril já era o maior parque gráfico da
América Latina.

Em 1968, no auge da ditadura militar, foi lançada a Revista Veja, com o


modelo das news magazines, como a Time. Logo no primeiro ano de fundação,
a revista Veja sofreu o episódio mais emblemático de censura da história dela,
segundo Azevedo (2020), após a promulgação do AI-5. Todos os exemplares da
edição de número 15 foram retirados das bancas. A capa trazia uma imagem do
presidente Costa e Silva sentado, sozinho, no Congresso Nacional, o qual ele
havia mandado fechar. Em 1971, outra edição foi apreendida pelo Exército e
tratava de um escândalo de corrupção no Paraná. Até 1974, o governo escrevia
listas de assuntos que poderiam ser abordados pela publicação. “VEJA sofreu
censura prévia – Com um censor lendo tudo o que seria publicado – Com mais
rigor entre 1874 e 1976” (AZEVEDO, 2020).

Nos primeiros anos, a Veja amargou prejuízo em razão dos grandes textos
que espantavam os leitores. Principalmente, na década de 1980, no entanto,
consolidou-se como a mais importante revista de generalidades nacionais e
internacionais, com várias seções, como política, economia, televisão e livros. O
ranking semanal dos livros mais lidos pelos brasileiros e as páginas amarelas,
com entrevistas bombásticas com personalidades dos mundos político e artístico
nacionais, foram outras novidades trazidas pela Veja. Assim como todo veículo
de comunicação de grande porte, a revista, também, cometeu erros históricos,
como a capa com a foto do cantor Cazuza, debilitado pelas complicações do vírus
HIV, o que gerou revolta.

104
TÓPICO 3 — IMPRENSA NA DITADURA

4.3 PROJETO MINERVA


No dia 4 de outubro de 1970, o Serviço de Radiodifusão Educativa
do Ministério da Educação e Cultura começava a operar o Projeto Minerva
(FERRARETO, 2001). Gerado pela Rádio MEC, do Rio de Janeiro, tratava-se de
um programa educativo, mas que lembrava um informativo, pela forma séria,
sisuda de falar com o público. O programa possuía 30 minutos de duração, de
segunda até sexta, com uma hora e meia aos sábados, obrigatório em todas as
emissoras de rádio do país. Ficou no ar até 1989, e, segundo Ferraretto (2001), os
resultados alcançados foram “discutíveis”.

4.4 RADIOBRÁS
A criação da Radiobrás foi outra iniciativa da ditadura militar. Segundo
Ferraretto (2001), o Art. primeiro, da Lei n° 6.301, de 15 de dezembro de 1975,
criou a Radiobrás, e deixou claro que o interesse maior era a integração nacional,
ou seja, foi criada para divulgar as informações que eram de interesse do governo
militar. Ocorre que a rádio da BBC britânica era sintonizada no Brasil e tinha
grande audiência. O serviço em português, dessa rádio britânica, informava as
notícias de tortura e de desaparecimento de presos no Brasil. Isso precisava ser
combatido pelo governo brasileiro, a fim de contar a versão dele a respeito do que
acontecia no país naquela época.

4.5 JORNAL DE INTEGRAÇÃO NACIONAL


Antes da criação da Radiobrás, em 1965, o Governo Federal entregou
a Empresa Brasileira de Telecomunicações, a Embratel. A necessidade da
“integração nacional”, por meio das comunicações, foi o fator que motivou a
fundação dessa estatal. A Embratel montou uma rede de telecomunicações por
meio de micro-ondas terrestres para interligar os Estados brasileiros e o Brasil
com o exterior, segundo Ferraretto (2001).

Essa rede de comunicação terrestre foi o apoio para que a Rádio Jovem
Pan, de São Paulo, criasse o Jornal de Integração Nacional, em 1972, com blocos
informativos gerados em algumas cidades, como Brasília, Porto Alegre, Manaus,
Natal, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Salvador. É importante destacar que tudo
isso ocorreu antes da existência das redes de rádio via satélite, mas representou
um avanço importante nas comunicações do país. A diferença desse noticiário
para os jornais que surgiram anos depois, nas principais rádios brasileiras, era
que, neste, as notícias não eram centralizadas em uma redação em São Paulo,
como acontece na maioria das rádios até hoje.

105
UNIDADE 2 — HISTÓRIA DO JORNALISMO NO BRASIL

4.6 ROBERTO MARINHO: APOIO AO GOLPE E


RELAÇÕES COM O PODER
O empresário e jornalista Roberto Marinho herdou o Jornal O Globo, com a
morte prematura do pai, Irineu Marinho, em 1925. Inaugurou a Rádio Globo do Rio
de Janeiro em 2 de dezembro de 1944. Em 1957, ganhou a concessão para explorar
o canal 4, do Rio de Janeiro, o qual viria a ser a TV Globo, emissora que entrou
no ar em 26 de abril de 1965. Ele já tinha 60 anos de idade quando a televisão foi
inaugurada. No início da década de 1960, Roberto Marinho apoiou o presidente
João Goulart e, em seguida, ajudou a destituí-lo durante o golpe de 1964.

A boa relação com os militares foi bem utilizada por Marinho, o qual
expandiu a Globo, a todo o Brasil, com as condições tecnológicas oferecidas
pelos militares a partir de 1965, na tentativa de integrar o país por meio das
comunicações, tarefa, amplamente, cumprida pela Globo.

Marinho viria a ser, então, ainda mais influente do que Assis Chateaubriand,
tornando-se um dos homens mais ricos e poderosos do Brasil. A partir do final da
década de 1960, a TV Globo conseguiu autorização para virar rede de televisão,
antes mesmo da Tupi e de outras emissoras já existentes, como TV Rio e TV
Record. A Tupi, dos Diários Associados, só se tornou rede de televisão nacional
via satélite na década de 1970, porque as emissoras de São Paulo e do Rio de
Janeiro operavam de forma independente. As emissoras da Tupi, também, já
viviam, praticamente, sucateadas, sem a continuidade dos investimentos iniciais.

A Globo nasceu gigante, em sociedade com o grupo norte-americano


Time Life, com um investimento de seis milhões de dólares. Já no início dos anos
de 1970, em novelas, como Selva de Pedra, a emissora atingiu 100% de audiência.
Tudo isso garantiu, ao empresário Roberto Marinho, um poder absoluto de
conduzir as narrativas perante a opinião pública.

A influência de Roberto Marinho sobre José Sarney, na década de 1980,


ocorreu em vários momentos, como atestado em livros, como A História Secreta da
Rede Globo e Muito Além do Jardim Botânico.

Quando questionado a respeito do porquê de não se candidatar à


presidência, o empresário chegou a afirmar que não precisava, pois tinha mais
poder do que o presidente do Brasil. Embora apoiasse o golpe militar, os veículos
de comunicação do Grupo Globo, também, sofreram com a censura. Outra
afirmação que gerou polêmica foi admitir que eram utilizadas relações de poder
com os políticos. “Sim, eu uso o poder” (O ESTADO DE SÃO PAULO, 1987, p.
9). Em 1993, foi eleito para a Academia Brasileira de Letras. Roberto Marinho
morreu em 6 de agosto de 2003.

Observe o exposto a seguir, de Roberto Marinho no estúdio do Jornal


Nacional, na década de 1980, quando o noticiário, ainda, atingia de 70 a 80 pontos
de audiência e representava o poder.

106
TÓPICO 3 — IMPRENSA NA DITADURA

FIGURA 10 – ROBERTO MARINHO

FONTE: <https://www.terra.com.br/diversao/tv/blog-sala-de-tv/ha-15-anos-morria-roberto-
marinho-o-homem-que-mudou-a-tv,bac9b18b884ab6a6393b4bf60b6e6f49gzofw9yr.html>.
Acesso em: 24 abr. 2021.

DICAS

O documentário Muito Além do Cidadão Kane, exibido em 1993, pelo canal


britânico Channel 4 (emissora pública do Reino Unido), explora, com riqueza de detalhes,
as relações da mídia com o poder no Brasil, com grande enfoque sobre a figura de Roberto
Marinho. Esse documentário é uma referência obrigatória para estudantes de comunicação
que desejam compreender as características peculiares do ecossistema midiático brasileiro.

4.6.1 Poder da Globo incomoda os militares


O interesse do governo militar, o qual tomou posse em 1964, era interligar
o Brasil de Norte a Sul, por meio das comunicações, a fim de impedir qualquer
tentativa de revolta social. Foram investidos milhões de dólares no Consórcio
Internacional de Satélites (Intelsat), já mencionado neste livro, o que permitiria
que o país pudesse receber e transmitir imagens de televisão para o mundo todo,
além de integrar as afiliadas das emissoras de TV de forma simultânea.

Foi constituída a Embratel, Empresa Brasileira de Telecomunicações, com


um parque de antenas parabólicas gigantes no interior do Rio de Janeiro. Os
links de micro-ondas terrestres, também, faziam com que os sinais de TV fossem
transmitidos para as regiões Sul e Sudeste, Norte e Nordeste, sem a necessidade
dos satélites. Aos poucos, o país ficaria, totalmente, integrado.

107
UNIDADE 2 — HISTÓRIA DO JORNALISMO NO BRASIL

Esses investimentos governamentais beneficiaram, principalmente, as


empresas que estavam à frente do processo tecnológico, como a Rede Globo,
porém, antes da década de 1970, o sucesso empresarial da Globo e o poder do
proprietário dela, Roberto Marinho, começaram a incomodar o governo, o qual
temia concorrência com a empresa privada. Para isso, era preciso facilitar as
condições para que alguém pudesse ser capaz de atrair audiência suficiente para
frear a Globo, que não tinha concorrentes até então.

Depois de começar a fazer sucesso no Rio de Janeiro, a Globo comprou


a TV Paulista, das Organizações Victor Costa. Com ela, vieram as concessões de
Recife e de Belo Horizonte. No início da década de 1970, a quinta e última emissora
própria seria adquirida, a TV Globo de Brasília. Atualmente, a Globo possui 126
emissoras de televisão e é a segunda maior rede de televisão do mundo, atrás,
apenas, da ABC, dos Estados Unidos, pertencente ao Grupo Disney.

4.7 SILVIO SANTOS


Para frear o poder da Globo, o governo militar viu, no empresário Senor
Abravanel, mais conhecido pelo nome artístico de Silvio Santos, um importante
trunfo. Silvio nasceu no Rio de Janeiro, em 1930, e chegou a ser camelô nas ruas
da cidade maravilhosa. Trabalhou nas barcas de transporte entre Rio e Niterói
vendendo bebidas e fazendo anúncios nos microfones dessas barcas. Foi para
São Paulo, ainda jovem, e encontrou trabalho na Rádio Nacional, com Manoel de
Nóbrega. Virou sucesso no rádio e no meio empresarial, com o Baú da Felicidade.

Em 1962, estreou um programa de televisão na antiga TV Paulista, canal


5, a qual seria comprada pela Rede Globo, em 1966. O programa de Silvio passou
a ir ao ar para todo o país, pela Globo, o que fez disparar as vendas do Baú
da Felicidade. Em 1976, a Globo não renovou o contrato de Silvio, e ele se viu
obrigado a mudar para a Tupi.

No mesmo ano, tornou-se sócio de Paulo Machado de Carvalho, da


TV Record, de São Paulo, e ganhou a concessão do canal 11, do Rio de Janeiro,
batizado de TV Studios, a TVS. Para o Rio de Janeiro, o programa era, então,
veiculado pela TVS, e, em São Paulo, pela Record. Para todo o país, inclusive,
para essas duas cidades, também, pela Rede Tupi.

Ainda no rádio paulistano, Silvio Santos era líder de audiência. Quando


foi para a TV, levou toda essa audiência com ele. Tornou-se um fenômeno de
IBOPE, principalmente, para o público feminino. Ao decidir não renovar com
Silvio, a Globo passou a ter o principal concorrente durante os domingos.

A Rede Tupi não teve a concessão renovada em 1980, e saiu do ar. A


emissora de São Paulo ficou com Silvio Santos, dando origem ao SBT. A emissora
do Rio de Janeiro foi para as mãos do empresário Adolpho Bloch, o qual viria a
implantar, em 1983, a TV Manchete. Em retribuição às concessões entregues a ele,
Silvio impulsionou a propaganda em torno dos presidentes militares.
108
TÓPICO 3 — IMPRENSA NA DITADURA

4.8 VLADIMIR HERZOG


O capítulo mais triste do jornalismo brasileiro, na década de 1970, durante
a ditadura militar, foi a morte do jornalista Vladimir Herzog, até então, diretor
de telejornalismo da TV Cultura de São Paulo, e professor na Universidade de
São Paulo. Vlado, como era chamado entre os colegas de redação, tinha 38 anos
de idade, em 1975, quando foi torturado e morto. A eleição de Herzog para a
direção de jornalismo da TV Cultura não agradou representantes da política
paulistana. Ele, também, era integrante do Partido Comunista, e, mesmo negando
participar das atividades do partido, sabia que a prisão dele havia sido decretada.
Apresentou-se, espontaneamente, ao Destacamento de Operações de Informação
– Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI).

Foi interrogado, torturado com choques elétricos e espancado. Algum


tempo depois, veio a informação oficial: Herzog havia se enforcado na prisão,
embora todos soubessem que isso não era verdade. A morte de Herzog gerou
revolta, uma enorme comoção nacional e acabou sacudindo os pilares do governo
do presidente Ernesto Geisel. Na figura a seguir, você conhecerá a face do
jornalista Vladimir Herzog, morto pela ditadura militar em 1975.

Em 2009, uma instituição sem fins lucrativos, que leva o nome dele, foi
criada, com os objetivos de preservar a memória do jornalista e de contribuir na
luta pela democracia, pelos direitos humanos e pela liberdade de expressão.

FIGURA 11 – VLADIMIR HERZOG

FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Vladimir_Herzog>. Acesso em: 24 abr. 2021.

109
UNIDADE 2 — HISTÓRIA DO JORNALISMO NO BRASIL

DICAS

O canal do Instituto Vladimir Herzog, no YouTube, oferece um conteúdo muito


rico que abarca a história do caso Herzog. Vale a pena conferir: https://www.youtube.com/
playlist?list=PLbghhBAh03rvzH6IWkzSjYHEEzsTLvd5G.

5 IMPRENSA E RESISTÊNCIA
Durante a ditadura militar, alguns veículos de imprensa, considerados
“alternativos”, surgiram com o corajoso propósito de fazer oposição ao regime.
Entre 1964 e 1980, nasceram e morreram cerca de 150 periódicos que tinham esse
objetivo (KUCINSKI, 2018). Dentre eles, o tabloide Pif-Paf, criado em junho de
1964, por Millôr Fernandes, após ser demitido da revista O Cruzeiro, a respeito
da qual já falamos no Tópico 2. Essa publicação fazia oposição ao regime através
do humor, mas durou apenas oito edições.

DICAS

O livro Jornalistas e Revolucionários: Nos Tempos da Imprensa Alternativa,


escrito pelo jornalista Bernardo Kucinski, e publicado pela Edusp, em 2018, aborda, com
detalhes, a memória de veículos que fizeram resistência ao regime militar.

Em 1969, surgiu O Pasquim, pouco tempo depois do Ato Institucional


n. 5, ou seja, um momento de endurecimento do regime. Esse periódico contou
com o trabalho de alguns dos maiores cartunistas do Brasil. Foi o semanário
alternativo brasileiro mais duradouro desse período, e chegou a ter uma tiragem
de 200 mil exemplares, no seu auge, o que demonstra o sucesso de público que
atingiu. Nasceu como uma publicação a respeito de comportamento, mas, com o
endurecimento da ditadura, adotou uma postura politizada e crítica ao regime.
O Pasquim sofreu censura prévia, chegou a ter a redação invadida e vários dos
jornalistas foram presos. Esse periódico é lembrado, até hoje, como um marco na
imprensa brasileira e um símbolo de resistência à ditadura pelo humor.

A seguir, conheça o cartunista Ziraldo, desenhando na mesa dele, na


redação do Pasquim.

110
TÓPICO 3 — IMPRENSA NA DITADURA

FIGURA 12 – ZIRALDO NO PASQUIM

FONTE: <https://www.hypeness.com.br/2019/12/o-pasquim-a-incrivel-historia-do-jornal-de-
humor-que-desafiou-a-ditadura-e-ganha-exposicao-em-sp-ao-completar-50-anos/>.
Acesso em: 24 abr. 2021.

DICAS

A história do Pasquim e a importância dele para a imprensa brasileira são


repletas de detalhes interessantes. Para aprofundar os seus estudos, recomendamos o
documentário a seguir: http://www.observatoriodaimprensa.com.br/videos/lt-i-gt-o-
pasquim-lt-i-gt-a-revolucao-pelo-cartum/.

111
UNIDADE 2 — HISTÓRIA DO JORNALISMO NO BRASIL

LEITURA COMPLEMENTAR

A HISTÓRIA DA CENSURA NO ESTADÃO

Associação Brasileira de Imprensa (ABI)


131/04/2009

Capítulo nefasto da história do país, a ditadura militar de 64, sob a égide


da censura e o fim dos direitos à liberdade de expressão e ao acesso à informação,
impôs restrições severas à imprensa nacional.

Em 13 de dezembro de 1968, a edição do  Estado de S. Paulo  foi


apreendida a partir da decisão, do diretor e proprietário Júlio de Mesquita
Filho, de não excluir, da seção “Notas e Informações”, o editorial “Instituições
em Frangalhos”. Embora submetido à pressão do regime e à presença constante
de censores na redação, o  Estadão, ao contrário de outros jornais brasileiros,
não adotou a autocensura. 

Nos espaços das matérias censuradas, o  Estadão  passou a publicar versos


de Os Lusíadas, de Luís de Camões, e, o Jornal da Tarde, receitas de doces e de
bolos. A estratégia deu visibilidade mundial à publicação que, em 1974, recebeu
o Prêmio Pena de Ouro da Liberdade, conferido pela Federação Internacional de
Editores de Jornais.

Vencedor de importantes premiações, como o Esso de Jornalismo, o


jornalista e escritor José Maria Mayrink, o qual acumula mais de quarenta anos
de carreira – grande parte dela no  Estadão  –, testemunhou os fatos e decidiu
registrá-los em um livro, ricamente, ilustrado com fotos, charges e reproduções
das matérias censuradas. 

— Escrevi “Mordaça no Estadão” como uma reportagem especial,


cumprindo uma pauta da redação. O editor executivo Ilan Kow perguntou se eu
poderia trabalhar nesse tema, para transformar, em livro, o que o Estadão tinha
nos arquivos. O principal material consistia nos dois volumes de “Relatórios da
Censura”, compilados e organizados por José Alfredo Vidigal Pontes, curador
do Acervo Cultural do jornal. Eles reúnem bilhetes, relatos e transcrições de
documentos feitos pelos secretários gráficos, remetidos, diariamente, ao editor-
chefe e aos diretores do Estado e do Jornal da Tarde. Uma espécie de crônica a
respeito da censura nos dois jornais, com a descrição pormenorizada da ação dos
censores e da reação da direção, especialmente, de Julio de Mesquita Neto e de
Ruy Mesquita, proprietários.

O objetivo da publicação, segundo o autor, era resgatar a história da


censura nos jornais da família Mesquita, além de mostrar como o governo militar
amordaçou a imprensa: 

112
TÓPICO 3 — IMPRENSA NA DITADURA

— Foi um trabalho de reportagem. Ouvi mais de 40 pessoas, a maioria


era feita de jornalistas do Estado e do Jornal da Tarde. Alguns deles continuam
na empresa, mas muitos saíram para outras atividades há mais de 30 anos.
Esses depoimentos, feitos em entrevistas pessoais ou por telefone, foram
importantíssimos para a reconstituição dos fatos. Fiz quatro viagens, a Campinas,
Brasília, Rio de Janeiro e Recife, para ouvir alguns dos principais depoimentos.
Paralelamente, consultei os arquivos do jornal, no Centro de Documentação e
Informação. Dali, saíram as reproduções de páginas censuradas que compõem o
último dos nove capítulos do livro. As fotos, em grande parte, foram localizadas
nos arquivos do jornal, mas recorremos a outras fontes também, como fotos
pessoais, de personagens. Também, trabalhei muito em casa, especialmente, na
fase de redação do texto.

A minuciosa pesquisa foi realizada ao longo de mais de dois meses, entre


3 de maio e 23 de julho de 2008. A ideia inicial, explica José Maria Mayrink, era
lançar o livro na Bienal Internacional do Livro, em agosto do mesmo ano, em
São Paulo: 

— Não deu tempo para isso, mas foi até bom, porque tivemos a
oportunidade de fazer uma revisão mais acurada. Além do jornalista Carmo
Chagas, responsável pela edição do texto, participaram, desse trabalho, a equipe
da editora digital A2, colegas do Centro de Documentação e Informação, o editor
executivo Ilan Kow e outros companheiros aos quais recorri quando necessário. 

Tensão

A obra detalha, dentre outros episódios, os bastidores do  Estadão na


noite da edição do Ato Institucional n. 5, revela o clima de tensão e as posturas
dos repórteres, do redator-chefe Oliveiros S. Ferreira, de Julio de Mesquita Neto
e de Ruy Mesquita: 

— Em seu conjunto, esses personagens, dentre outros que se somaram a


eles na narrativa, constituíram a barreira do Estadão e do Jornal da Tarde contra
a censura. Tiveram destaque, também, as ações das sucursais de Brasília e do Rio
de Janeiro. Quando o Estadão resolveu publicar algo mais marcante e contínuo
para caracterizar a censura, o mérito foi do redator Antônio Carvalho Mendes,
que sugeriu a reprodução de versos de Os Lusíadas, de Camões. O Estado chegou
a publicar poemas de outros autores, mas Camões marcou aquele período.

O testemunho do jornalista pernambucano Carlos Garcia, na opinião de


Mayrink, é um dos trechos mais tocantes do livro. Garcia chefiava a sucursal
do Estadão em Recife (PE), quando foi preso e torturado, em março de 1974, na
véspera da posse do General Ernesto Geisel à Presidente da República: 

— O depoimento que gravei com Garcia, transcrito na íntegra, teve uma


força impressionante. Ele foi detido e interrogado por agentes da repressão
de um quartel do Recife. Na mesma linha, o depoimento de Luiz Paulo Costa,

113
UNIDADE 2 — HISTÓRIA DO JORNALISMO NO BRASIL

correspondente em São José dos Campos (SP), preso na própria cidade e levado
para as dependências do DOI-Codi, em 1975, em São Paulo, onde, na mesma
semana, o jornalista Vladimir Herzog tinha sido torturado e morto. 

Coragem

Com a apresentação de José Alfredo Vidigal Pontes e a introdução de


Marcus Guterman, “Mordaça no Estadão” resgata a participação de dezenas de
jornalistas na luta contra a censura, como Villas-Bôas Corrêa, Teixeira Heizer,
Fernando Gabeira, Mário Cunha e Maurício Azêdo, Presidente da ABI. 

— Conheci Maurício no segundo semestre de 1968, quando ele e eu saímos


do Rio para São Paulo. Trabalhávamos na Editora Abril, que estava lançando a
revista Veja, e tinha, já, a revista Realidade. Mais tarde, Maurício trabalhou na
sucursal do Rio, enquanto eu trabalhava no Jornal da Tarde, em São Paulo.

O período compreendido entre 1968 e 1975, mais focado no livro, embora


as dificuldades da imprensa tenham começado já em 1964, e se estendido até
depois de 1978, quando acabou o AI-5, exigiu muita coragem da imprensa e
muita criatividade dos jornalistas, sublinha Mayrink: 

— A imprensa era, tecnologicamente, menos desenvolvida, o que exigia


uma ginástica tremenda para a transmissão das matérias. Telex era a última
palavra, pois nem fax existia, muito menos computador. O telefone, então, era
uma tragédia. Muita coisa evoluiu nos últimos anos, mas o importante é salientar
a luta da imprensa e dos jornalistas contra a arbitrariedade do regime ditatorial.
Agora, trabalha-se com liberdade, sem medo da polícia e sem o controle da
censura. Se ainda ocorrem arbitrariedades, a imprensa pode denunciá-las. 

Mayrink destaca o resgate histórico da atuação da censura como a grande


lição da obra, que, nas palavras de Ricardo Gandour, Diretor de Conteúdo do
Grupo  Estado, representa uma importante contribuição à memória do país,
especialmente, para as novas gerações e para a preservação dos valores da
liberdade de expressão. 

— Julio de Mesquita Neto previu que isso viria a ocorrer, ao recomendar,


aos editores e aos secretários gráficos, em dezembro de 1972, que todo o material
censurado fosse arquivado, pois as matérias vetadas seriam reaproveitadas no
futuro. Essa recomendação veio de um bilhete do secretário-gráfico Allen Dupré,
reproduzida na última página do livro, conclui o autor. 

FONTE: <http://www.abi.org.br/a-historia-da-censura-no-estadao/>. Acesso em: 24 abr. 2021.

114
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• Nos períodos de ditadura da história brasileira, uma série de restrições foi


imposta ao trabalho da imprensa, como a censura prévia das notícias.

• Durante o Estado Novo, a Constituição de 1937 estabeleceu a censura aos meios


de comunicação. A partir de 1939, o Departamento de Imprensa e propaganda
(DIP) passou a controlar todas as formas de expressão de pensamento, não
apenas a imprensa.

• Durante o Regime Militar, a imprensa teve a atividade restringida através de


vários instrumentos, como a Lei de Imprensa, a Lei de Segurança Nacional, e,
principalmente o Ato Institucional n. 5. A censura se proliferou e atingiu todas
as formas de expressão de pensamento, desde os jornais até as novelas, na TV.

• Jornalistas foram perseguidos, exilados e mortos. O caso mais emblemático da


repressão aos jornalistas, durante o Regime Militar, foi a morte do jornalista
Vladimir Herzog, em 1975.

CHAMADA

Ficou alguma dúvida? Construímos uma trilha de aprendizagem


pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao
AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

115
AUTOATIVIDADE

1 O Estado Novo foi um período ditatorial compreendido entre os anos de


1937 e 1945. Com a instauração desse regime, o Congresso foi dissolvido
e uma nova Constituição foi outorgada por Getúlio Vargas. Com base nos
seus conhecimentos a respeito desse período da história brasileira e dos
reflexos sobre a atividade jornalística, analise as sentenças a seguir:

I- A Constituição de 1937 garantia as liberdades de expressão e de imprensa.


II- Durante o Estado Novo, atribuiu-se, à imprensa,  o caráter de serviço
de utilidade pública, o que obrigava todos os jornais a publicarem
comunicados do governo.
III- As ações do Departamento de Imprensa e Propaganda, criado em 1939,
restringiam-se aos jornais e ao rádio. 

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) Apenas a sentença II está correta.
b) ( ) As sentenças I, II e III estão corretas.
c) ( ) As sentenças II e III estão corretas.
d) ( ) Apenas a sentença III está correta.

2 Os meios de comunicação são essenciais para a formação da opinião


pública. Por conta disso, as restrições à livre circulação de informações
foram uma característica marcante de governos ditatoriais.  Durante o
regime militar brasileiro (1964-1985), a imprensa foi alvo de diversas
restrições. Considerando o que você estudou neste tópico, classifique V
para as sentenças verdadeiras e F para as sentenças falsas:

( ) A imprensa foi alvo de censura através de diversos instrumentos, como


a Lei de Imprensa, de 1967; os atos institucionais; e, até mesmo, a Lei de
Segurança Nacional. 
( ) O principal objetivo da censura à atividade jornalística foi impedir que
fossem divulgadas informações que pudessem desestabilizar o regime. 
( ) Como no Estado Novo, a censura era voltada, apenas, ao conteúdo
jornalístico, não se aplicando a outros modos de expressão, como música
e teatro.
( ) O AI5 foi o ato institucional mais repressivo da ditadura militar,
pois institucionalizou a tortura e decretou intervenções nos Estados e nos
municípios, além de determinar a perda de mandatos de parlamentares
contrários ao governo. 

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) F-F-V-V.
b) ( ) V-F-F-F.
c) ( ) F-V-F-V.
d) ( ) V-V-F-V.
116
3 Durante a ditadura militar, alguns veículos de imprensa, considerados
“alternativos”, surgiram com o corajoso propósito de fazer oposição ao
regime.  Considerando o que você estudou a respeito desses veículos,
analise as sentenças a seguir:

I- Entre 1964 e 1980, nasceram e morreram cerca de 150 periódicos


considerados alternativos. 
II- Em 1969, surgiu O Pasquim, pouco tempo depois do Ato Institucional n.
5, ou seja, um momento de endurecimento do regime
III- Apesar de ter, em seu quadro, alguns dos maiores cartunistas do país,
O Pasquim não atingiu sucesso de público em decorrência da excessiva
irreverência e da ironia dos conteúdos. 

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) Apenas a sentença III está correta.
b) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
c) ( ) As sentenças I, II e III estão corretas.
d) ( ) Apenas a sentença II está correta. 

4 O AI5 inaugurou o período mais sombrio da ditadura militar brasileira. A


partir de então, a censura, que já existia, tornou-se mais intensa. Com base
no conteúdo que você estudou, explique como se dava a censura às formas
de expressão após o AI5.

5 O empresário Roberto Marinho (1904-2003) conseguiu, em 1957, a concessão


para explorar, comercialmente, o canal 4, do Rio de Janeiro, o qual viria a se
tornar a TV Globo, com entrada no ar em 1965. Durante o período militar,
a Globo se expandiu e se tornou um verdadeiro império de comunicação.
Com base no conteúdo deste tópico, disserte a respeito da relação do
empresário Roberto Marinho com os militares.

117
REFERÊNCIAS
ARAÚJO, G. F. Telejornalismo: da história às técnicas. Curitiba: Intersaberes, 2017.

AZEVEDO, R. Veja 7 – Nos tempos da censura. 2020. Disponível em: https://


veja.abril.com.br/blog/reinaldo/veja-7-8211-nos-tempos-da-censura/. Acesso em:
24 abr. 2021.

BAHIA, J. Jornal, história e técnica: história da imprensa brasileira. 4. ed. São


Paulo: Ática, 1990.

BARBOSA, M. História da comunicação no Brasil. Petrópolis: Editora Vozes, 2013.

BRASIL. Lei n° 6.301, de 15 de dezembro de 1975. Institui política de exploração


de serviço de radiodifusão de emissoras oficiais, autoriza o Poder Executivo
a constituir a Empresa Brasileira de Radiodifusão - RADIOBRÁS, e dá outras
providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6301.
htm. Acesso em: 24 abr. 2021.

BRASIL. Decreto-Lei n° 2.073, de 8 de março de 1940. Incorpora, ao patrimônio


da União, a Estrada de Ferro São Paulo-Rio Grande e as empresas a ela filiadas.
Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1940-1949/decreto-lei-
2073-8-marco-1940-412107-publicacaooriginal-1-pe.html. Acesso em: 24 abr. 2021.

FARIA, A. A. Jovem Pan Sat, Ano 2000. São Paulo: Maltese, 1996.

FERRARETTO, L. A. Rádio: o veículo, a história e a técnica. Porto Alegre:


Editora Sagra Luzzatto, 2001.

KUCINSKI, B. Jornalistas e revolucionários: nos tempos da imprensa


alternativa. São Paulo: Edusp, 2018.

MORAIS, F. Chatô: o rei do Brasil, a vida de Assis Chateaubriand. São Paulo:


Companhia das Letras, 1994.

MORGADO, F. Brasil: 70 anos de TV, 70 anos de telejornalismo. 2020.


Disponível em: https://portal.comunique-se.com.br/brasil-70-anos-de-tv-
e-telejornalismo/#:~:text=Filho%20do%20radiojornalismo%2C%20o%20
telejornalismo,do%20jornalista%20Maur%C3%ADcio%20Loureiro%20Gama.
Acesso em: 24 abr. 2021

O ESTADO DE SÃO PAULO. "Globo" e o poder, nos EUA. São Paulo: Op.cit, 1987.

OLIVEIRA SOBRINHO, J. B. O livro do Boni. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2011.

PRADO, M. História do rádio no Brasil. São Paulo: Editora da Boa Prosa, 2012.

TAVARES, M. Manual de redação CBN. São Paulo: Globo, 2011.


118
UNIDADE 3 —

JORNALISMO CONTEMPORÂNEO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• compreender os fatores que levaram à criação da internet;

• distinguir as características da internet primitiva e da internet que


usamos hoje;

• reconhecer os desafios e as oportunidades que se colocam no contexto


atual para a prática jornalística e a sustentabilidade dos negócios
jornalísticos;

• perceber a relevância do jornalismo profissional no atual contexto de


disseminação de desinformação.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade,
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – CHEGADA DA ERA DIGITAL

TÓPICO 2 – PANORAMA ATUAL DO JORNALISMO

TÓPICO 3 – FUTURO DO JORNALISMO

CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos


em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá
melhor as informações.

119
120
TÓPICO 1 —
UNIDADE 3

CHEGADA DA ERA DIGITAL

1 INTRODUÇÃO
No Tópico 1, abordaremos os primeiros passos da internet, uma invenção
que mudou, para sempre, a comunicação, e quebrou paradigmas, anteriormente,
dominantes. Você conhecerá algumas das figuras pioneiras do advento da era
digital e entenderá que a internet primitiva era muito, muito diferente da internet
que você usa hoje.

O jornalismo, também, mudou muito a partir da chegada da internet


comercial. No Brasil, as primeiras iniciativas de jornalismo online surgiram a
partir de 1995, com o pioneiro JB Online (BALDESSAR, 2009), mas não foi só a
forma de distribuir a notícia que mudou, o trabalho dos jornalistas nas redações,
também, transformou-se, pois eles precisaram aprender a usar dispositivos
tecnológicos que, antes, não faziam parte das rotinas produtivas.

Você, também, verá que o advento da era digital possibilitou uma série
de novos formatos de comunicação midiática, os quais foram apropriados pelo
jornalismo, como blogs e podcasts.

2 JORNALISMO E EVOLUÇÃO TECNOLÓGICA


Como você já viu neste livro, de tempos em tempos, o jornalismo
acompanha as transformações sociais, porque é um organismo vivo da sociedade
da qual faz parte. Dentre as mudanças mais sensíveis, como você, também, já
acompanhou aqui, estão aquelas provocadas pela evolução das tecnologias
disponíveis.

No início da primeira unidade deste livro, você pôde acompanhar como


era possível trabalhar com o jornalismo desde o surgimento da imprensa de
Gutenberg. Depois, entendeu as alterações sentidas com o desenvolvimento
da eletricidade nos meios de disseminação da informação, o que possibilitou a
existência das agências de notícia em âmbito global, com o advento dos telégrafos
com fio. Já nas últimas décadas do século XVIII, compreendeu como o telégrafo
sem fio conseguiu atingir distâncias ainda maiores, graças aos avanços no
desenvolvimento das ondas eletromagnéticas.

121
UNIDADE 3 — JORNALISMO CONTEMPORÂNEO

Depois do telégrafo sem fio, embrião do rádio, descobriu como foi possível
transmitir a notícia através do meio de comunicação que transmitia voz e música
a longas distâncias. O rádio revolucionou a forma de receber a informação e se
tornou o primeiro meio de comunicação de massas. O segundo deles, a televisão,
com imagem ao som, causou uma nova revolução a partir das décadas de 1930
e 1940, chegando ao Brasil na década seguinte. Com o advento dos satélites, as
imagens eram capazes de circular pelo globo em poucos minutos.

Nesta unidade, você entenderá como o jornalismo se desenvolveu com o


advento da internet, a partir da década de 1990, em escala planetária. As formas
de produção, de transmissão e de recepção das notícias se tornaram ainda mais
ágeis, trazendo, desta vez, o receptor para o centro do debate e o tornando
partícipe. Agora, o consumidor de notícias não é mais um sujeito passivo. Ele
participa da notícia. Ele informa, interage com os jornalistas, participa através de
modernas ferramentas, como o WhatsApp, e das redes sociais, como Facebook e
Instagram. Há a produção massiva e individual de vídeos que correm o mundo
todo em questão de minutos, de forma independente, pois alguém os posta.

A base tradicional da comunicação não é mais a mesma de antes, na qual


um emissor falava para uma grande audiência, heterogênea e anônima, como
descrito na concepção da indústria cultural da Escola de Frankfurt. Agora, um
sujeito isolado, onde quer que ele esteja, consegue transmitir informação para o
mundo todo, conectado a uma porta, a qual pode ser um dispositivo, como um
smartphone, um tablet ou um microcomputador.

2.1 HISTÓRIA DA INTERNET


A Guerra Fria foi um período histórico que manteve tensões entre os
Estados Unidos da América (EUA) e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
(URSS), entre 1947 e 1991. Iniciou cerca de dois anos depois do término da
Segunda Guerra Mundial e terminou com a dissolução da URSS, precipitada,
também, por outros acontecimentos, como a queda do muro de Berlim, em 1989,
o que reunificou as duas Alemanhas separadas desde o final da guerra: Ocidental,
apoiada pelos Estados Unidos, e Oriental, pelos soviéticos.

Durante a Guerra Fria, houve uma corrida em busca do desenvolvimento


de tecnologias, pois quem tem informação, tem poder. Ambos os lados tiveram
conquistas e fracassos. A maior conquista dos soviéticos foi o lançamento do
primeiro foguete espacial, o Sputnik, em 1957. A dos americanos foi a chegada do
homem na Lua, em 1969.

Em 1958, o Departamento de Defesa dos Estados Unidos montou


a Advanced Research Projects Agency (ARPA), uma agência de pesquisas
avançadas cujo trabalho gerou a criação da internet. Um dos braços da ARPA
foi um escritório denominado de Information Processing Techniques Office
(IPTO), em São Francisco, Califórnia, uma espécie de centro de pesquisas para

122
TÓPICO 1 — CHEGADA DA ERA DIGITAL

processamento de dados, montado em 1962. Em setembro de 1969, a ARPA


conseguiu desenvolver a primeira rede de computadores denominada de
Arpanet. De acordo com Castells (2003), estudantes de pós-graduação tiveram
um papel decisivo no projeto da Arpanet.

Em suma, todos os desenvolvimentos tecnológicos decisivos


que levaram à Internet tiveram lugar em torno de instituições
governamentais e importantes universidades e centros de pesquisa. A
Internet não teve origem no mundo dos negócios. Era uma tecnologia
ousada demais, um projeto caro demais, e uma iniciativa arriscada
demais para ser assumida por organizações voltadas para o lucro
(CASTELLS, 2003, p. 23).

Em 1975, a Arpanet passou a ser usada para as operações militares, embora


todo o início dela se deva à abertura do governo americano para que os institutos
de tecnologia das universidades pudessem trabalhar para encontrar soluções
computacionais conjuntas que fossem compartilhadas pelos pesquisadores para
o próprio avanço da tecnologia.

Outros pesquisadores, espalhados pelo mundo, deram a contribuição


deles para o que veio a se chamar internet, como o físico britânico Timothy John
Berners-Lee, cientista da computação e professor do Instituto de Tecnologia
de Massachusetts, com a inglesa MIT. Conforme Castells (2003), Berners-Lee
desenvolveu o programa Enquire, em 1980, com a utilização da tecnologia
desenvolvida, até então, pela internet. “Ele definiu e implementou o software
que permitia obter e acrescentar informação de e para qualquer computador
conectado, através de HTTP, MTML e URI (mais tarde, chamado de URL)”
(CASTELLS, 2003, p. 18).

Em colaboração com Robert Cailliau, Berners-Lee construiu um


programa navegador/editor em dezembro de 1990, e chamou esse
sistema de hipertexto de World Wide Web, a rede mundial. O software
do navegador da web foi lançado na Net, pelo CERN, em agosto de
1991. Muitos hackers do mundo inteiro passaram a tentar desenvolver
os próprios navegadores a partir do trabalho de Berners-Lee. A
primeira versão modificada foi o Erwise, desenvolvido no Instituto
de Tecnologia de Helsinki, em abril de 1992. Pouco tempo depois,
Viola, na Universidade da Califórnia, Berkeley, produziu a própria
adaptação (CASTELLS, 2003, p. 18).

123
UNIDADE 3 — JORNALISMO CONTEMPORÂNEO

FIGURA 1 – TIMOTHY BERNERS-LEE

FONTE: <https://www.tecmundo.com.br/web/115559-criador-internet-fatura-us-1-milhao-nobel-
da-computacao.htm>. Acesso em: 29 abr. 2021.

DICAS

A matéria a seguir, da revista Galileu, trará algumas curiosidades muito


interessantes a respeito de Timothy Berners-Lee, ou Tim Berners-Lee, como é mais
conhecido: https://revistagalileu.globo.com/Tecnologia/noticia/2019/06/5-curiosidades-
sobre-tim-berners-lee-fundador-da-world-wide-web.html.

Como havia todo um incômodo gerado pelo fato daqueles que criaram
a Arpanet não terem mais o controle sobre a rede, em 1983, houve uma divisão
estratégica e importante. A rede militar passou a se chamar MILNET, enquanto
a Arpanet se tornou uma rede de pesquisa acadêmica entre universidades. A
partir daí, os interesses comerciais entraram em cena, para que a rede pudesse ser
compartilhada entre as mais variadas organizações da sociedade civil. “A história
não pode ser reescrita, mas, com o roteiro que temos hoje, sem a ARPA, não teria
havido nenhuma Arpanet, e, sem a Arpanet, a internet, como a conhecemos hoje,
não existiria” (CASTELLS, 2003, p. 23).

124
TÓPICO 1 — CHEGADA DA ERA DIGITAL

NOTA

A Guerra Fria tinha esse nome porque não ocorreram confrontos armados
entre Estados Unidos e União Soviética durante o período, embora cada um desses dois
países apoiasse outras guerras regionais, além de ser mais uma questão ideológica. Os
Estados Unidos apareciam como uma superpotência que defendia os interesses dos países
ocidentais, enquanto os soviéticos defendiam os orientais.

Ao mesmo tempo em que a internet dava os primeiros passos dela, antes


de se tornar comercial, é importante fazer um comentário a respeito de outras
importantes contribuições que surgiram entre as décadas de 1970 e 1980, do ponto
de vista comunicacional, e que foram primordiais para o desenvolvimento das
tecnologias de informação nos anos seguintes. Também, foram essas tecnologias
as responsáveis por criar condições de navegarmos na internet anos depois.

Em 4 de abril de 1975, Bill Gates e Paul Allen inauguraram a Microsoft,


em Albuquerque, no estado americano do Novo México. O primeiro produto da
empresa foi um interpretador BASIC, criado por dois cientistas, ainda, na década
de 1960. Em 1980, desenvolveu-se o sistema operacional Q-DOS. Já o sistema
operacional Windows (Windows 1.0) estreou em 20 de novembro de 1985.

FIGURA 2 – PAUL ALLEN E BILL GATES

FONTE: <https://www.ebiografia.com/paul_allen/>. Acesso em: 24 abr. 2021.

125
UNIDADE 3 — JORNALISMO CONTEMPORÂNEO

DICAS

Para conhecer mais a respeito da história da Microsoft, recomendamos o vídeo a


seguir, do canal TecMundo, no YouTube: https://www.youtube.com/watch?v=_3ZztePQ3Nc.

Outra companhia de grande relevância no cenário mundial da tecnologia


foi a Apple. A empresa se tornou, com o passar do tempo, uma das marcas
mais valorizadas do mundo, baseada em conceitos avançados de design que
identificam os produtos entre todos os demais do mercado, o que faz, dos clientes
dela, verdadeiros devotos. Fundada por Steve Wozniak, Steve Jobs e Ronald
Wayne, na Califórnia, em 1976, a Apple começou na garagem de Steve Jobs, na
cidade de Los Altos.

FIGURA 3 – STEVE JOBS, RONALD WAYNE E STEVE WOZNIAK

FONTE: <https://link.estadao.com.br/fotos/geral,steve-jobs-e-steve-wozniak,908435>.
Acesso em: 24 abr. 2021.

O primeiro computador pessoal da companhia foi o Apple I, em 1976. O


segundo, o Apple II, atingiu um grande avanço em relação ao primeiro, e chegou
às lojas em 1977. Já a linha de computadores pessoais, intitulada de Macintosh,
lançada em 1984, conquistou a opinião pública e marcou o maior sucesso da
companhia até então. No dia 24 de janeiro de 1984, Steve Jobs lançou o primeiro
Macintosh, um computador que brilharia para sempre e revolucionaria o conceito
de computadores pessoais. Também, nesse mesmo dia, o primeiro sistema
operacional, Mac OS, chegou ao mercado.

126
TÓPICO 1 — CHEGADA DA ERA DIGITAL

FIGURA 4 – PRIMEIRO MACINTOSH

FONTE: <https://www.techtudo.com.br/artigos/noticia/2013/04/apple-faz-37-anos-conheca-
historia-da-empresa-criada-por-steve-jobs.html>. Acesso em: 24 abr. 2021.

Ao longo do tempo, a Microsoft, com os softwares dela encontrados nos


pontos mais remotos do planeta, e a Apple, com os hardwares que viraram objeto
de desejo de milhões de pessoas, entraram para a história, como os principais
expoentes tecnológicos que viriam a usufruir das descobertas da internet.

DICAS

Para ficar mais por dentro da história da Apple, recomendamos o vídeo a seguir,
do canal TecMundo, no YouTube: https://www.youtube.com/watch?v=Fhvp2tQJK3A.

2.2 TRANSFORMAÇÕES DAS COMUNICAÇÕES NA


DÉCADA DE 1990
Até 1995, no Brasil, para poder falar com um amigo, parente ou colega de
trabalho, a distância, era preciso fazer uma ligação telefônica, em um aparelho
fixo. De forma escrita, ainda, era necessário enviar um telegrama ou escrever algo
via Telex, um aparelho de grande porte encontrado somente em empresas ou
em repartições públicas. Grosso modo, era uma espécie de máquina datilográfica
elétrica acoplada a uma linha telefônica, assim, era possível transmitir
documentos impressos a longa distância, mas, na verdade, não era uma linha
telefônica comum. Era uma rede internacional elaborada por meio da comutação
de circuitos, o que substituiu o antigo telégrafo, ou seja, era um avanço em relação
ao antigo telégrafo.

127
UNIDADE 3 — JORNALISMO CONTEMPORÂNEO

Os textos eram escritos e armazenados em uma fita de cor amarela,


perfurada, com uma linguagem própria para o aparelho, para economizar
tempo. Depois, era inserida na máquina, a fim de transmitir a mensagem. As
notícias eram redigidas, dessa forma, pelos repórteres das sucursais dos jornais,
para a sede da empresa. Na redação central do jornal, esse texto precisava ser,
novamente, digitado, agora, com fins à publicação final, o que pressupõe um
retrabalho incrível e uma possibilidade maior de alguém cometer erros.

O mecanismo responsável pelo “backup” do telex consistia na mesma


fita perfurada que deveria ser guardada, de forma segura, para ser introduzida,
novamente, no aparelho, no caso de o documento original se extraviar. Dessa
forma, a máquina, como em um passe de mágica, voltava a datilografar a
mensagem enviada ou recebida anteriormente. Todas as palavras escritas via
Telex eram maiúsculas e não existiam alguns caracteres, como acentos. Um
processo lento e rudimentar, mas que foi utilizado, durante décadas, para efeito
de comunicação, principalmente, entre as empresas. Repórteres de todo o Brasil
usaram o Telex para a transmissão dos textos até o início dos anos de 1990, quando
surgiu um outro extraordinário equipamento: o fac-símile, também, chamado,
apenas, de fax.

O nome do aparelho vem do latim, e significa “Faz Igual”. Com o fax, o


repórter podia datilografar as notícias na própria máquina de escrever, revisar,
corrigir todos os possíveis erros, além de ganhar muito mais tempo no momento
de transmitir a notícia para a sede do jornal, bastando, para isso, fazer uma ligação
telefônica e aguardar o comando, o qual permitia o recebimento do material do
outro lado da linha.

É claro que o aparelho não servia, apenas, aos interesses do jornalismo.


O fac-símile surgiu no Brasil já no início da década de 1990, permitindo que um
documento fosse copiado a uma longa distância. A partir de então, uma assinatura
poderia ser transmitida. Pedidos de vendedores, comprovantes de pagamentos,
históricos escolares, enfim, todo tipo de documento era transmitido a distância,
mas através de um papel especial que não possuía grande sobrevida. A vida útil
dos aparelhos de fac-símile se prolongou por cerca de, apenas, dez anos.

3 INTERNET NO BRASIL
A primeira conexão com a rede mundial de computadores, no Brasil, foi
realizada em 1991, e, a partir de 1994, a Empresa Brasileira de Telecomunicações
(Embratel) já oferecia acesso à internet. Mesmo assim, a data oficial de criação
da internet brasileira se remete, segundo Prata (2012), ao dia 31 de maio de
1995, quando foi criado o Comitê Gestor da Internet no país (CGI). “O comitê
é responsável por administrar os nomes dos domínios no Brasil, a interconexão
de redes nacionais e estrangeiras, além de representar a web em organismos
internacionais relacionadas à internet no mundo” (PRATA, 2012, p. 33).

128
TÓPICO 1 — CHEGADA DA ERA DIGITAL

A partir da metade da década de 1990, a internet revolucionou todo o


complexo comunicacional existente até então. Passadas cerca de duas décadas e
meia, apenas, pode-se afirmar que, naquela época, os usos que fazemos da rede
mundial de computadores seriam inimagináveis, isso porque, quando surgiu,
a internet era, absurdamente, lenta e discada. Levava vários minutos para que
uma fotografia pudesse abrir em sua totalidade na tela daqueles primitivos
computadores de mesa. Transmitir um documento, qualquer que fosse, de apenas
uma página, ainda, era algo descabido. Enviar um arquivo com imagem, nem
pensar. Áudio e imagem, muito menos. Se alguém viesse do futuro e dissesse que,
na década de 2020, haveria a possibilidade de assistir ao filme que quiséssemos,
na hora em que quiséssemos, ou que poderíamos nos conectar, em tempo real,
por áudio e vídeo de alta qualidade, diríamos que a pessoa só poderia estar louca.
Não havia como fazer. O primeiro browser conhecido, por aqui, foi o Netscape.
Muito tempo depois, surgiu o Internet Explorer, da Microsoft.

Para se transportarem arquivos entre máquinas, ainda, eram necessários


os velhos disquetes. Os disquetes mais comuns tinham capacidade de
armazenamento de, apenas, 1.44 MB. Os computadores possuíam pouquíssima
memória. Eram lentos e barulhentos. Os primeiros e-mails enviados e recebidos,
em torno de 1995, eram, apenas, mensagens curtas de texto, sem qualquer tipo
de possibilidade de anexar algo, como um documento em pdf, muito menos um
áudio ou uma imagem. Sabemos que tudo isso pode parecer pré-histórico para
os mais jovens, mas essas situações eram realidade há, apenas, algumas décadas.
Aliás, você sabe o que é um disquete? Já usou essa mídia para transferir arquivos?

FIGURA 5 – DISQUETES

FONTE: <https://www.techtudo.com.br/listas/2019/06/dez-curiosidades-sobre-disquetes-que-
fizeram-sucesso-nos-pcs-dos-anos-90.ghtml>. Acesso em: 24 abr. 2021.

129
UNIDADE 3 — JORNALISMO CONTEMPORÂNEO

DICAS

A matéria a seguir, do site Tech Tudo, abarcará algumas curiosidades dos


disquetes: https://www.techtudo.com.br/listas/2019/06/dez-curiosidades-sobre-disquetes-
que-fizeram-sucesso-nos-pcs-dos-anos-90.ghtml.

3.1 PRIMEIROS PASSOS DO JORNALISMO ONLINE


É importante que você saiba que as primeiras iniciativas de jornalismo
online consistiam em, simplesmente, transpor o conteúdo do jornal impresso
para o ambiente online, com pouco ou nenhum aproveitamento dos recursos que
o ambiente oferecia. Em maio de 1993, o jornal do Massachussetts Institute of
Technology (MIT), The Tech, publicou a primeira edição online. Com esse feito,
tornou-se o primeiro jornal a usar a rede mundial de computadores (World Wide
Web) para publicar algum conteúdo. A edição publicada online era a mesma que
circulava na versão impressa, e consistia, basicamente, em uma lista de 27 links
para notícias e artigos.

DICAS

O conteúdo publicado no jornal The Tech, em 28 de maio de 1993, ainda, está


disponível online, e pode ser acessado em http://tech.mit.edu/V113/N28/.

No entanto, como você já sabe, antes da World Wide Web, já existiam


outras redes que, também, são consideradas parte da internet, e, através delas,
ocorriam alguns serviços de distribuição de notícias. Para se ter uma ideia,
durante a década de 1970, jornais ingleses, como o Financial Times, já publicavam
informações através do Prestel, primeiro serviço de teletexto do mundo: as
notícias eram enviadas por meio digital e visualizadas em um monitor de TV.
Serviços como esse funcionaram em vários países da Europa, nos Estados Unidos
e no Brasil, a partir da década de 1980. Esse tipo de sistema operou até os anos
1990, quando se tornou obsoleto. Considerando essas questões, é, praticamente,
impossível dizer qual foi a primeira notícia publicada na internet.

Nos primórdios do jornalismo online, o consumo de notícias, através da


internet, era muito diferente da experiência com a qual estamos acostumados
hoje em dia. Pesquisadores da área dividem a história do jornalismo online (ou
webjornalismo) em quatro fases ou gerações (MACHADO, 2000):
130
TÓPICO 1 — CHEGADA DA ERA DIGITAL

• Primeira geração: nesta fase, ocorreu a transposição do conteúdo dos jornais


impressos para a internet, sem nenhum tipo de adaptação de linguagem ou
conteúdo. Apenas jornais de grande circulação, no Brasil, tinham condições
de manter uma página na internet. O conteúdo era atualizado a cada 24 horas
(entre 1995 e 1997).
• Segunda geração: esta fase compreendeu, aproximadamente, o período entre
1997 e 1999. A partir de então, os veículos começaram a tentar produzir um
conteúdo específico para o ambiente digital, explorando melhor os recursos
que esse suporte oferecia, como o hipertexto. No entanto, a linguagem e as
rotinas produtivas, ainda, eram muito semelhantes às dos veículos tradicionais.
• Terceira geração: neste período, já se verificava um esforço para produzir algum
conteúdo, especificamente, para a web, o que deu origem ao que chamamos
de webjornalismo, entre 1999 e 2002. Nessa época, os suportes tecnológicos,
também, começaram a se disseminar com mais velocidade, como celulares com
acesso à internet.
• Quarta geração: esta fase se iniciou a partir de 2002, caracterizada pelo
desenvolvimento de produtos digitais baseados em bancos de dados e em
sistemas automatizados, a partir de um processo industrial.

Alguns autores defendem a existência de uma quinta geração do


jornalismo online, caracterizada pela intensa produção de conteúdo voltado às
redes sociais, smartphones e tablets.

3.1.1 Pioneiros do jornalismo online no Brasil


No Brasil, é preciso registrar o pioneirismo do Jornal do Brasil (JB) na
utilização da internet. Em 8 de fevereiro de 1995, entrava, na rede, o JB Online,
sob o comando de Sergio Charlab, criador e fundador do JB Online. Antes dessa
data, o jornal já possuía um serviço de distribuição de notícias chamado de SIN,
Serviço Instantâneo de Notícias, através do qual eram enviadas notas de questões
políticas e econômicas a públicos, diretamente, interessados, como bancos e
corretoras de investimentos. Esse tipo de serviço já era oferecido pelos maiores
jornais do mundo, como pelo New York Times.

O Jornal do Brasil foi o primeiro jornal online da América Latina a ter uma
edição regular diária. Nos anos seguintes, surgiram, também, o Uol, do Grupo
Folha, e o Globo Online. Como as demais iniciativas da época, o JB Online seguia
o modelo transpositivo, ou seja, replicava, no ambiente online, parte do conteúdo
da edição impressa. Para se ter uma ideia do pioneirismo, é válido destacar que
a edição online do New York Times, um dos principais jornais do mundo, só
surgiu em 1996. Em 1999, apareceu, no Brasil, o primeiro veículo com conteúdo
voltado, exclusivamente, para a internet, o site Último Segundo. Ao contrário
das iniciativas de jornalismo online anteriores, esse veículo não estava ligado a
empresas jornalísticas tradicionais, o que representou uma quebra de paradigma
naquele momento.

131
UNIDADE 3 — JORNALISMO CONTEMPORÂNEO

É importante que façamos uma distinção entre sites noticiosos e portais


de notícias. Nos anos 1990, navegar pela internet era uma experiência muito
diferente da que temos atualmente. O acesso à rede era muito caro, e dependia
de provedores de internet, os quais eram discados. Antes do surgimento de
ferramentas, como o Google, era muito difícil encontrar o conteúdo que se estava
procurando. Assim, nesse cenário, surgiram os portais, que eram como portas de
entrada para a internet. Em linhas gerais, o usuário acessava o portal e navegava
nos sites que estavam associados a ele. Os portais ofereciam, também, alguns
serviços, como e-mail, chat e notícias.

O JB Online, pioneiro no jornalismo online do Brasil, era um site de notícias.


Já o Universo Online (UOL), o qual surgiu em 1996, era um portal de notícias
que veio a partir de uma iniciativa do Grupo Folha (proprietário do jornal Folha
de S. Paulo), com acesso pago aos assinantes. Em 2000, deu as caras, no país, o
portal IG (Internet Group), como uma opção de provedor de internet grátis para
o público brasileiro. A distinção entre os sites noticiosos e os portais jornalísticos
se dá a partir de algumas características específicas dos portais, as quais não estão
presentes nos noticiosos: a agregação de serviços não relacionados ao conteúdo
jornalístico, a relação com sites de conteúdo diverso e a convergência, em alguns
casos, do serviço de provedor de internet e do acesso ao conteúdo.

A adaptação do conteúdo jornalístico a esse novo suporte, e da própria


atividade jornalística, foi evoluindo com o tempo, de acordo com a evolução dos
aparatos tecnológicos e do conhecimento dos profissionais envolvidos. O advento
desse novo suporte para a produção e para a distribuição de notícias exigiu
grandes esforços de adaptação por parte dos profissionais da área. Conforme as
práticas de jornalismo online foram se disseminando pelas redações do país, as
rotinas produtivas e os perfis profissionais mudaram significativamente, com a
agregação de novas tarefas e a exigência de recentes habilidades técnicas.

A experiência do público com a notícia, também, transformou-se. Por esse


motivo, mesmo os veículos tradicionais sofreram influência do jornalismo online
e procuraram se adaptar para atrair e manter a atenção de um público cada vez
mais exigente, em um cenário de intensa concorrência. Dentre essas influências do
jornalismo online sobre os veículos impressos, podemos citar o aumento do uso
de recursos visuais, como cores e gráficos; o predomínio dos textos mais curtos; e
a diagramação, que lembra o hipertexto, quando se estabelece uma ligação visual
entre uma palavra e um box com texto explicativo.

132
TÓPICO 1 — CHEGADA DA ERA DIGITAL

3.2 PASSAGEM DA WEB 1.0 PARA WEB 2.0


Esses primeiros passos do jornalismo online, com os sites noticiosos e os
portais de notícias, deram-se em um contexto que, hoje, conhecemos como Web
1.0. As principais características desse momento da internet foram a transposição
de parte do conteúdo proveniente de outros suportes, como do impresso; a baixa
possibilidade de intervenção do usuário; e o predomínio do emissor no controle
do conteúdo. Esse modelo, ainda que primitivo, já representava um avanço
em relação à internet pré-comercial, usada, apenas, para a comunicação entre
pesquisadores. O uso comercial da internet, no entanto, gerou um forte otimismo
entre os investidores de capital e levou a uma bolha especulativa que estourou no
início dos anos 2000.

DICAS

Se você quiser saber mais a respeito do estouro da bolha das empresas de


internet, leia a reportagem a seguir, publicada pelo site InfoMoney: https://www.infomoney.
com.br/mercados/o-estouro-da-bolha-pontocom-que-quebrou-mais-de-500-empresas-
e-e-uma-assombracao-ate-hoje/.

Depois do estouro da bolha, surgiu a chamada Web 2.0, termo cunhado


em uma conferência de 2004 que tinha, como objetivo, reestabelecer a confiança
em torno das empresas de internet. A mudança de viés, majoritariamente,
econômico, trouxe, consigo, novas oportunidades de uso da internet. A principal
delas foi a possibilidade de os usuários publicarem conteúdo online, como no
caso dos blogs e das redes sociais. Primo (2006) explica que esse novo modelo de
internet alterou as formas de publicação, de compartilhamento e de organização
das informações:

Se, na primeira geração da Web, os sites eram trabalhados como


unidades isoladas, passa-se, agora, para uma estrutura integrada de
funcionalidades e de conteúdo. Logo, O’Reilly destaca a passagem
da ênfase à publicação, ou à emissão, conforme o limitado modelo
transmissionista, para a participação: blogs com comentários e
sistema de assinaturas em vez de homepages estáticas e atomizadas;
em vez de álbuns virtuais, prefere-se o Flickr, no qual os internautas,
além de publicar as imagens e organizá-las através de associações
livres, podem buscar fotos em todo o sistema; como alternativas
aos diretórios, enciclopédias e jornais online, surgem sistemas de
organização de informações, del.icio.us e Technorati, por exemplo,
enciclopédias escritas colaborativamente, como a Wikipédia, e sites de
webjornalismo participativo, como é o caso de Ohmy News, além de
Wikinews e Slashdot (PRIMO, 2006, p. 2).

133
UNIDADE 3 — JORNALISMO CONTEMPORÂNEO

Nesse novo cenário, surgiram as redes sociais. Pela primeira vez, desde o
surgimento da comunicação de massa, o público poderia deixar de ser, somente,
receptor das mensagens, e passar a ser emissor, o que significava uma inversão
de um paradigma existente desde o início da prática jornalística. As redes
sociais colocaram a comunicação online em outro patamar, pois permitiram
que muitas pessoas falassem para muitas outras a partir de qualquer lugar do
planeta. Nesse ecossistema, o compartilhamento de informações tende a crescer
de forma exponencial. O relacionamento das pessoas com a informação e as
tecnologias de comunicação mudou muito, e isso trouxe uma série de impactos
para a prática jornalística.

3.3 INOVAÇÕES QUE A INTERNET POSSIBILITOU


Além das redes sociais, o advento da Web 2.0 possibilitou uma série
de inovações nos formatos de comunicação, apropriadas por jornalistas
profissionais e por indivíduos que se encontravam fora dessa área de atuação
profissional. Assim, a seguir, conheceremos algumas dessas inovações que
continuam relevantes até os dias de hoje.

3.3.1 Blogs
Não é exagero afirmar que, no início, quem utilizava a internet chegava
a anotar, no papel, os principais sites nos quais se podia navegar. Fazer listas de
sites interessantes era algo normal diante da falta de buscadores, como o Google.
De acordo com Orduña (2007), o primeiro weblog foi criado por Tim-Berners
Lee, em 1992, intitulado de What’s New in 1992, com o objetivo de divulgar as
informações de pesquisas do projeto World Wide Web, o que acabou gerando a
própria internet que conhecemos hoje. Portanto, pode-se dizer que o primeiro
blog do mundo surgiu antes da internet comercial, a qual só chegaria ao Brasil a
partir de 1995. O advento da Web 2.0, no entanto, deu, ao blog, uma nova vida, ao
incorporar elementos de interatividade, como comentários e compartilhamentos.

O programador norte-americano Jorn Barger é considerado um dos


idealizadores dos blogs como os conhecemos até hoje. Em 1995, ele criou uma
lista de sites de pesquisa e a hospedou na rede.

Dois anos depois, outro norte-americano, Peter Merholz, brincando com a


palavra, separou-a, criando o termo we blog (nós blogamos), e ficou, rapidamente,
reconhecido, em todo o mundo, apenas, pela contração blog. Interessante observar
que log se remetia os diários de bordo da navegação marítima, e passou a ser
incorporado ao mundo digital.

Os blogs se tornaram uma febre mundial e passaram a ser atrativos


para variados públicos, dentre eles, os jornalistas, e, mais especificamente,
os jornalistas independentes. Também, serviram para hospedar textos de

134
TÓPICO 1 — CHEGADA DA ERA DIGITAL

especialistas das mais diversas áreas, como no caso dos professores, ou seja, a
ideia original do diário acabou tendo múltiplas possibilidades. Usam-se blogs
para abrigar conteúdos de áudio e de vídeo e como ponto de apoio para os
podcasts, como veremos mais à frente.

No campo do jornalismo profissional, os blogs viraram uma importante


ferramenta, principalmente, para o jornalismo opinativo, cujos blogs de jornalistas
famosos, como de Juca Kfouri e de Ricardo Noblat, só para citar alguns exemplos,
passaram a ter audiência massiva e acabaram virando atrativos importantes para
as grandes corporações de mídia que agregaram esses conteúdos.

Jornalistas especializados nas mais variadas editorias, como artes, cultura,


gastronomia, viagem, arquitetura, moda e esportes, viram, nos blogs, uma grande
oportunidade para ampliar as audiências. Passou a ser comum o jornalista de
rádio, de TV ou de jornal impresso destacar outras análises, mais aprofundadas,
nos próprios blogs pessoais ou corporativos, estendendo o espectro do jornalismo
da mídia tradicional para a outra esfera, a virtual. Os blogs foram importantes
na primeira década de existência da internet enquanto fenômeno mundial, pois
faziam o trabalho que a grande mídia passou a fazer tempos depois, devido à
variedade lançada, rapidamente, pelos usuários espalhados pelo mundo.

3.3.2 Rádio via internet


O rádio deixou de ser transmitido, apenas, de forma terrestre, por meio
de antenas instaladas nos edifícios ou no alto dos morros desde que a televisão
por assinatura começou a transmitir, paralelamente, o sinal de áudio de algumas
emissoras. Por cabo ou por satélite, no caso das operadoras do sistema Direct to
Home (DTH), a partir de 1996, o rádio conseguia ser sintonizado em qualquer
lugar do país, onde os serviços das operadoras estivessem disponíveis, porém,
ouvi-lo através da internet demorou um pouco mais.

Ouvir música pela internet começou a ser possível no final da década


de 1990, por arquivos baixados para a constituição de listas pessoais nos
computadores, mas a pouca memória disponível nas máquinas era um fator
impeditivo para que os usuários pudessem armazenar dezenas de músicas.

Já no quesito rádio via internet, o primeiro portal a oferecer esse serviço


foi o Timecast, da RealNetworks, ainda em 1999, o qual permitia a experiência de
ouvir 1.222 emissoras de rádio e de TV de todo o mundo. Destas, 39 emissoras
eram rádios brasileiras (KISCHINHEVSKY, 2007). Dois anos antes, em 1997,
já existiam 29 rádios virtuais no país, ainda, segundo Kischinhevsky (2007).
Não é possível, no entanto, afirmar quantas dessas estações eram rádios que,
também, operavam em AM ou em FM, no espectro de radiofrequência, ou se já se
configuravam, apenas, como webradios, ou seja, quando a emissora existe apenas
na internet.

135
UNIDADE 3 — JORNALISMO CONTEMPORÂNEO

De acordo com Kischinhevsky (2007, p. 116), essa realidade da audição


do rádio por meio dos computadores só foi possível depois de um importante
avanço da tecnologia:

[...] O boom atual do internauta do rádio só foi possível graças ao


surgimento da tecnologia RealAudio, um plug-in (incremento) para
o browser (software de navegação na rede) que permitiu a audição de
gravações, via internet, em tempo real – antes, era preciso esperar, às
vezes, horas, até efetuar o download (baixar) de um arquivo sonoro.
Com o RealAudio, o som se tornou digitalizado e convertido para um
formato comprimido, enviado através de modens com velocidade
acima de 14.400bps. Na maioria das rádios virtuais, existiam links para
o site do software, o qual estava apto a ser “baixado” gratuitamente.
Outros concorrentes seguiram o mesmo caminho.

3.3.3 MP3
Uma revolução em termos de áudio foi o surgimento do MPEG Layer 3,
também, conhecido como MP3, em 1998. Trata-se de um sistema de compressão
de áudio por meio de algoritmo. Tornou-se comum gravar CDs no computador
para ouvir nos automóveis ou nos discmans, aparelhos portáteis que rodavam
Compact Disc (CD). Era possível ouvir música digital com qualidade superior,
por meio de um fone de ouvido, em qualquer lugar. Esse aparelho sucedeu os
antigos walkmans, nos quais se podia ouvir música por meio de fones de ouvido
acoplados a um tocador de fita-cassete, totalmente analógico.

A febre que cercava o MP3, na época, já era tamanha que as cinco


grandes gravadoras anunciaram, em dezembro de 1998, a criação
de um consórcio, Secure Digital Music Initiative (SDMI), para
desenvolver uma alternativa, ao MP3, que garantisse o recolhimento
de direitos autorais e royaltis sobre as músicas que circulavam
na Internet. A SDMI era integrada, também, por empresas,
como Microsoft, AT&T, America Online, Toshiba e Matsushita
(KISCHINHEVSKY, 2007, p. 116).

Independentemente do dispositivo utilizado para ouvir música, o formato


MP3 continua sendo muito utilizado em novos sistemas, como os atuais serviços de
streaming digital do tipo Spotify ou Deezer.

3.3.4 Podcast
Podcast é um programa de áudio ou de vídeo que se diferencia dos demais
em virtude do tipo de distribuição, intitulado de podcasting, o que veremos mais
à frente. Nos Estados Unidos, os podcasts são mais comuns por reunir áudio e
vídeo, mas, como no Brasil, os de áudio são maioria, tentaremos nos limitar a
explicar esse fenômeno sob a ótica brasileira (apenas em áudio), como forma de
facilitar a compreensão do que estamos tratando.

136
TÓPICO 1 — CHEGADA DA ERA DIGITAL

Para início de conversa, é importante enfatizar que podcast não é rádio.


Rádio é algo que é produzido de forma temporal, ou não, por meio de ondas
eletromagnéticas, ou não, como já vimos quando estudamos o rádio via internet e
as webradios. Afinal, é possível transmitir rádio, também, via internet, colocando
o áudio de uma emissora na rede, ou produzindo uma webradio, sem ser
sintonizada nos aparelhos receptores de rádio. Ainda, consegue-se transmitir
rádio via satélite, como já vimos na unidade anterior deste livro.

O que diferencia o rádio do podcast é que o segundo tem objetivos


diferentes. Ele não é produzido para ser transmitido como rádio. É feito para ser
distribuído de forma digital, por meio de plataformas de streaming, ou agregado
a blogs e a sites, sejam jornalísticos, ou não, de informação ou de entretenimento.

Ao se ouvir um podcast, percebe-se que a forma de locução dos


comunicadores é diferente da de uma rádio tradicional. Ao contrário das emissoras
de rádio, nas quais os apresentadores se dirigem aos ouvintes com empolgação,
os comunicadores que fazem o podcast costumam utilizar uma linguagem mais
lenta, para facilitar que o ouvinte entenda a história que está sendo contada. Aqui,
está uma diferença primordial em relação às emissoras de rádio.

É preciso deixar claro que o podcast pressupõe atualização, portanto, ele,


também, indica que existe uma série de podcasts que trata do mesmo assunto, ou,
pelo menos, com uma periodicidade, seja semanal ou diária. Quanto às diferenças
entre a tecnologia, em si, vale salientar que o podcast não precisa ser baixado,
pode ser ouvido por streaming.

No podcast, não há pressa, pois a ideia é falar muito, contar histórias


para um ouvinte que está no carro, caminhando, trabalhando, mas que está
prestando atenção no que está sendo dito. Cai por terra a característica da
atenção marginal própria do rádio, como um veículo de fundo. O ouvinte do
podcast está disposto a, realmente, ouvir e entender uma mensagem que, em
sua maioria, é grande, complexa.

Como a internet permitiu, desde o início, o compartilhamento de arquivos,


sejam fotografias e textos, com o passar do tempo, surgiu a possibilidade de
transmissão de arquivos digitais de áudio e de vídeo. As estratégias de compressão
de dados para a transmissão via internet foram aprimoradas, como já vimos no
caso do MP3. Aliás, o MP3 foi essencial para o surgimento do podcast.

Em 2004, a distribuição de arquivos com “programas de áudio”


não era novidade. Eles seguiam a mesma lógica dos programas de
rádio, mas eram distribuídos pela internet, como arquivos MP3 ou
similares. Para um internauta ouvir um desses arquivos, precisava, a
cada nova “edição”, acessar o site que o hospedava, fazer o download
no computador, e, só aí, ouvi-lo [...]. Com a profusão de aparelhos
portáteis reprodutores de arquivos de áudio, notadamente, dos de
formato MP3, surgiram várias novas ideias de como automatizar o
acesso ao conteúdo de audioblogs e de demais programas de áudio.

137
UNIDADE 3 — JORNALISMO CONTEMPORÂNEO

O método que mais teve sucesso foi a possibilidade desse download


ocorrer, automaticamente, através de programas chamados de
“agregadores”, com uma tecnologia já empregada para blogs: o RSS
(Really Simple Syndication) (LUIZ, 2014, p. 9).

O RSS faz um serviço primordial para o consumidor de blogs ou de


podcasts. Ele avisa, ao internauta, que o conteúdo de um podcast ou de um blog
foi atualizado, sem que a pessoa precise entrar, via site, para acompanhar essa
atualização. O RSS faz com que o conteúdo vá até o consumidor, em vez de o
consumidor ir até o conteúdo (LUIZ, 2014). O primeiro agregador oficial do
mundo foi o iTunes, da Apple, responsável por alimentar os recém-criados iPods,
um tocador de mídia da Apple lançado em 23 de outubro de 2001, oito meses
depois do lançamento do iTunes, nos computadores Macintosh. É importante
lembrar que o primeiro smartphone do mundo, o Iphone, também, da Apple,
surgiu, apenas, em 2007.

Rapidamente, diversos equipamentos que tentavam imitar o iPod


surgiram ao redor do mundo, principalmente, vindos da China. Ficaram
conhecidos, apenas, como aparelhos de MP3. A forma de ouvir o conteúdo do
áudio, no entanto, era a mesma adotada pelo iPod, e se estabeleceu para sempre,
ajudando a popularizar a tecnologia e os conteúdos de podcast.

A palavra podcasting surgiu com a junção do prefixo pod, que vem do


aparelho iPod, e da palavra broadcasting, aportuguesada para radiodifusão.
Segundo Luiz (2014), broadcasting consiste em algo como a transmissão pública
e massiva de informações. Portanto, juntando o prefixo pod, de iPod, com o
antigo termo broadcasting, chegou-se ao podcasting. Para que não fique nenhuma
dúvida, podcasting significa fazer podcast e o processo de transmissão dele. O
nome foi sugerido em fevereiro de 2004, por Bem Hammersley, no jornal The
Guardian, para definir a forma de transmissão de uma série de entrevistas do
jornalista Christopher Lyndon. Acabou sendo adotado, posteriormente, para esse
novo sistema de transmissão de dados (LUIZ, 2014).

• O podcast no Brasil

Já existiam blogs que disponibilizavam conteúdo de áudio para download


no Brasil, mas o primeiro podcast brasileiro foi criado em 20 de outubro de 2004
no mesmo ano do surgimento da tecnologia nos Estados Unidos. Esses primeiros
podcasts não possuíam conteúdo jornalístico, ou eram produzidos por jornalistas
profissionais, mas por jovens curiosos e atentos às transformações tecnológicas,
com os objetivos primordiais de exercer a liberdade de expressão por meio de
uma mídia alternativa e chegar a uma audiência diferenciada.

O brasileiro Danilo Medeiros foi o fundador do podcast Digital Minds,


parte de um blog com o mesmo nome (LUIZ, 2014). O autor, ainda, cita outros
pioneiros, como o podcast do Gui Leite, ainda em 2004; Perhappiness, de Rodrigo
Stulzer; e Código Livre, de Ricardo Macari. Em 2005, foi organizada a primeira
Conferência Brasileira de Podcast, a PodCon Brasil, em Curitiba, no Paraná.

138
TÓPICO 1 — CHEGADA DA ERA DIGITAL

Um fenômeno intitulado de podfade ocorreu em 2005, e representou a


baixa e a quase extinção da produção de podcasts no país. A partir de 2006, alguns
produtores voltaram a criar podcasts brasileiros. O blog Jovem Nerd, criado em
2002, por Alexandre Ottoni e Deive Pazos, lançou o podcast Nerdcast, em 2006
(LUIZ, 2014). A conversa informal, apresentada no formato do Nerdcast, acabou
inspirando vários produtores pelo país e disseminando a cultura do podcast.

• Grandes podcasts atuais

As notícias são interpretadas em um podcast. Existem especialistas que


são entrevistados. Há textos mais longos porque esmiúçam todos os detalhes de
uma história, seja ela de algum acontecimento recente, por exemplo, no podcast O
Assunto, apresentado pela jornalista Renata Lo Prete, da TV Globo, ou no podcast
Café da Manhã, do jornal Folha de São Paulo, feito pelos jornalistas Magê Flores e
Bruno Boghossian. Nesses dois de grande prestígio diante da opinião pública
brasileira, os jornalistas debatem as principais notícias do dia, interpretam-nas
e explicam os pormenores desses acontecimentos, geralmente, relacionados aos
mundos político, econômico e social do Brasil.

Já outros podcasts, também, jornalísticos, trabalham de forma diferente,


como o Projeto Humanos, fundado em 2015, pelo jornalista Ivan Mizanzuk, o
qual explora histórias reais de forma jornalística, misturando outros gêneros,
como o documentário, em um incrível trabalho de apuração e de investigação
jornalísticas. Um dos podcasts mais famosos do Projeto Humanos é O Caso
Evandro, que conta a história de um brutal assassinato de uma criança em um
ritual de magia negra, no litoral do Paraná, o que chocou o Brasil em 1992. O
podcast O Caso Evandro narra os acontecimentos com a ajuda de trechos de
entrevistas e de reportagens realizadas na época.

Outro podcast semelhante, de intensa investigação jornalística, é o projeto


Radio Novelo, o qual produziu o podcast Praia dos Ossos, em 2019. Conta a
história do assassinato da socialite mineira Angela Diniz, morta pelo, então
namorado, Doca Street, que confessou o crime, um caso que chocou a sociedade
brasileira em 1976. Praia dos Ossos é narrado e produzido pela jornalista Branca
Viana e alcançou, rapidamente, grande repercussão.

DICAS

O podcast Praia dos Ossos é um trabalho jornalístico primoroso e um excelente


exemplo de como os podcasts têm potencial para aprofundar o horizonte da notícia. Os
oito episódios que compõem a série podem ser ouvidos no link a seguir ou nas plataformas
digitais de áudio: https://www.radionovelo.com.br/praiadosossos/.

139
UNIDADE 3 — JORNALISMO CONTEMPORÂNEO

O júri popular, no final da década de 1970, inocentou Street com a desculpa


de que o crime havia sido realizado por “legítima defesa da honra”, tornando o
julgamento mais famoso do que o próprio crime, por expor o atraso da sociedade
brasileira da época. No segundo julgamento, no início da década de 1980, Doca
Street foi condenado à prisão. Os áudios-ambientes mostrados no podcast, os
áudios do primeiro julgamento (que, na época, havia sido transmitido pela
televisão, para todo o Brasil), os recortes de jornais do momento, as entrevistas
com dezenas de amigos da vítima e do réu, a reconstituição do crime e uma trilha
sonora de tirar o fôlego fazem parte de Praia dos Ossos.

Portanto, como podemos observar, o formato de apresentação de um


podcast pode variar, conforme a intenção dos idealizadores, mesmo em se
tratando de podcasts jornalísticos. Dentre os podcasts brasileiros de jornalismo
de maior audiência, destacamos os da lista a seguir. Procure por eles online ou
na plataforma de áudio preferida, para conhecer um pouco mais a respeito das
possibilidades desse formato:

• Durma com Essa – do Nexo, um nativo digital.


• Foro de Teresina – Revista Piauí.
• Panorama CBN – Rádio CBN.
• Funcionário da Semana – Revista Veja (personalidades políticas).
• Os Pingos nos Is – Jovem Pan.
• Eldorado Expresso – Rádio Eldorado.
• Estadão – Estadão Notícias.
• Guilhotina – Le Monde Diplomatique.
• Baixo Clero – Uol.
• Notícia no Seu Tempo – Estadão.
• Mamilos.
• Café Brasil.
• Direto da Redação – Jovem Pan.
• 15 Minutos – Gazeta do Povo.
• Papo de Política, do programa de mesmo nome – Globonews.
• Desenrola – Rio.
• Ao Ponto – Jornal O Globo.
• Uol Entrevista.

A cada dia, surgem podcasts inovadores que abarcam temas diferentes,


de veículos de comunicação consagrados ou independentes, feitos por jornalistas
das mais variadas partes do Brasil.

140
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• A história da internet teve início no final dos anos 1960 e no início dos anos 1970,
com a criação da Arpanet, uma rede de computadores que, inicialmente, serviu a
propósitos militares, e, mais tarde, passou a ser usada para pesquisa científica.

• No Brasil, a internet chegou em meados dos anos 1990, ainda muito cara, lenta
e de possibilidades muito limitadas, se comparada com as tecnologias que
usamos hoje.

• O Jornal do Brasil foi o pioneiro no jornalismo online do país, assim como o


portal de notícias Uol, que surgiu logo depois e permanece como um dos mais
importantes no cenário nacional atual.

• O advento da internet e a digitalização das redações alteraram o modo através


do qual os jornalistas trabalham, facilitando e agilizando alguns processos,
mas, também, exigindo novas habilidades técnicas que, antes, não faziam parte
da formação da área.

141
AUTOATIVIDADE

1 Durante a Guerra Fria, EUA e URSS travaram intensas disputas em


busca do desenvolvimento de novas tecnologias em áreas diversas. Nesse
contexto, no final dos anos 1950, o Departamento de Defesa dos Estados
Unidos montou uma agência de pesquisas avançadas chamada de ARPA,
cujo trabalho culminou com a criação da internet. Com base no que você
estudou, analise as sentenças a seguir:

I- Uma das ações da ARPA foi a criação de um escritório em São Francisco,


na Califórnia, o qual se dedicava a pesquisar o processamento de dados.
II- Em 1969, a ARPA conseguiu criar a primeira rede de computadores da
história, chamada de Arpanet.
III- O desenvolvimento da Arpanet foi possível graças a grandes investimentos
privados, pois instituições governamentais, universidades e centros de
pesquisa não se envolveram no projeto.
IV- Nos anos 1970, a Arpanet começou a ser utilizada em operações militares.
V- O físico britânico Timothy Berners-Lee é considerado o criador do sistema
World Wide Web, a rede mundial de computadores.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) Apenas a sentença V está correta.
b) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
c) ( ) As sentenças III, IV e V estão corretas.
d) ( ) As sentenças I, II, IV e V estão corretas.

2 O surgimento da internet remete à década de 1970. No entanto, o uso da


rede mundial de computadores não se tornou realidade no Brasil antes
da década de 1990. A respeito da chegada da internet ao Brasil, analise as
sentenças a seguir:

I- A data oficial da criação da internet no Brasil é 31 de maio de 1995, quando


foi estabelecido o Comitê Gestor da Internet (CGI) no país. Esse órgão
era responsável por administrar os domínios, a interconexão de redes
nacionais e estrangeiras e representar a web em órgãos internacionais.
II- Quando começou a ser usada no Brasil, na metade dos anos 1990, a
internet já havia evoluído muito, apresentando boa velocidade de
conexão e permitindo a transmissão de grandes quantidades de dados de
uma só vez.
III- Para passar arquivos de um computador para o outro, eram necessários
disquetes, os quais tinham grande capacidade de armazenamento.
IV- Os primeiros e-mails eram, apenas, mensagens curtas de texto, as quais
não suportavam anexos.

142
Assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) As sentenças I, III e IV estão corretas.
b) ( ) Apenas a sentença III está correta.
c) ( ) As sentenças I e IV estão corretas.
d) ( ) Apenas a sentença II está correta.

3 As primeiras iniciativas de jornalismo online surgiram no Brasil,


praticamente, com a internet comercial. No entanto, as experiências de
publicar e de consumir notícias pela internet, nos primórdios do jornalismo
online, eram muito diferentes das que temos hoje em dia, pois as notícias
chegam a todo momento, diretamente, na tela do nosso celular. Com base
no conteúdo estudado, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para
as sentenças falsas:

( ) As primeiras iniciativas do jornalismo online consistiam em, simplesmente,


transpor o conteúdo do jornal impresso para o ambiente online, com
pouco ou nenhum aproveitamento dos recursos que a internet oferecia.
( ) Em maio de 1993, o jornal do Massachussetts Institute of Technology
(MIT), The Tech, publicou a primeira edição online. A edição publicada
era a mesma que circulava na versão impressa, e consistia, basicamente,
em uma lista de 27 links para notícias e artigos.
( ) Antes da World Wide Web, já existiam serviços de distribuição de notícias
em meio digital, como o teletexto.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) F-V-F.
b) ( ) V-V-V.
c) ( ) F-F-F.
d) ( ) V-F-V.

4 Nos primórdios do jornalismo online, o consumo de notícias, através da


internet, era muito diferente da experiência com a qual estamos acostumados
hoje em dia. Pesquisadores da área dividem a história do jornalismo online
(ou webjornalismo) em quatro gerações. Com base no que você estudou,
cite cada uma delas e explique as características principais.

5 Os podcasts são inovações que a internet possibilitou. Apesar de terem


surgido no início dos anos 2000, adquiriram enorme popularidade no
Brasil, apenas, recentemente. Com base no que você estudou, disserte a
respeito das principais características desse formato jornalístico que tem
ganhado cada vez mais importância no cenário jornalístico brasileiro.

143
144
TÓPICO 2 —
UNIDADE 3

PANORAMA ATUAL DO JORNALISMO

1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, no Tópico 2 desta unidade, abordaremos algumas informações
importantes para compreender o panorama atual do jornalismo. Conheceremos
os hábitos dos brasileiros em relação ao consumo de mídia, importantes para
pensarmos em novos negócios jornalísticos. Você verá que, apesar do aumento do
consumo de internet, a televisão, ainda, é o meio de comunicação mais relevante
para os brasileiros.

Você observará que a ampliação da velocidade da internet, no Brasil, foi


essencial para que os brasileiros pudessem consumir outros tipos de conteúdo,
como vídeos, por streaming ou on demand, em plataformas, como YouTube,
Netflix e outras.

O surgimento e o aprimoramento de dispositivos móveis, como


smartphones e tablets, também, permitiu a ampliação dos formatos a partir dos
quais o jornalismo pode apresentar a informação, como narrativas hipermídia e
newsgames, por exemplo.

2 CONSUMO DE MÍDIA NO BRASIL


Encomendada pela Secretaria de Comunicação Social da Presidência da
República (Secom) em 2015, e publicada em 2016, a Pesquisa Brasileira de Mídia
trouxe informações valiosas para quem estuda o cenário da comunicação. O
estudo encomendado pelo Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística
(Ibope), antes da pandemia da Covid-19, entrevistou mais de 18 mil pessoas.

De acordo com os resultados da pesquisa, a televisão, ainda, era o meio de


comunicação mais consumido do país. Cerca de 95% dos entrevistados afirmaram
assistir à televisão, sendo que 73% deles tinham o hábito de assistir diariamente.
Em média, os brasileiros passam quatro horas e 31 minutos por dia na frente da
TV, de segunda até sexta-feira, e quatro horas e 14 minutos nos fins de semana.
Na pesquisa anterior, em 2014, esses números eram de três horas e 29 minutos
durante a semana e de três horas e 32 minutos nos fins de semana.

145
UNIDADE 3 — JORNALISMO CONTEMPORÂNEO

O rádio, ainda, era o segundo meio de comunicação mais utilizado pelos


brasileiros, mas caiu de 61% de ouvintes, na pesquisa de 2014, para 55%, em 2015.
Em compensação, o número de entrevistados que disseram ouvir rádio todos os
dias aumentou de 21%, em 2014, para 30%, em 2015.

Quase a metade dos brasileiros, 48%, usa internet. O percentual de pessoas


que utilizam todos os dias cresceu de 26%, em 2014, para 37%, em 2015.

O hábito de uso da internet, também, é mais intenso do que o obtido


anteriormente. Os usuários das novas mídias ficam conectados, em
média, 4h59 por dia durante a semana, e 4h24 nos fins de semana –
na PBM 2014, os números eram 3h39 e 3h43 –, valores superiores aos
obtidos pela televisão (BRASIL, 2016, p. 7).

De acordo com a Pesquisa Brasileira de Mídia, a escolaridade e a idade


dos entrevistados são os fatores que aumentam o consumo de internet. Cerca
de 72% dos entrevistados que usam, diariamente, possuem ensino superior,
com intensidade média diária de cinco horas e 41 minutos, de segunda até
sexta-feira. “Entre as pessoas com até a 4ª série, os números caem para 5% e
3h22. 65% dos jovens na faixa de 16 a 25 se conectam todos os dias, em média,
5h51 durante a semana, contra 4% e 2h53 dos usuários com 65 anos ou mais”
(BRASIL, 2016, p. 7).

Já o uso de telefones celulares, para o acesso à internet, é, quase, igual ao


número de usuários que acessam pelos notebooks: 66% e 71%, respectivamente.
“Entre os internautas, 92% deles estão conectados por meio das redes sociais,
sendo, as mais utilizadas, o Facebook (83%), o WhatsApp (58%) e o YouTube
(17%)” (BRASIL, 2016, p. 7).

O número de pessoas que tem acesso aos jornais, pelo menos, uma vez por
semana, permanece igual ao da pesquisa anterior, ou seja, 21%. Somente 7% deles
acompanham diariamente, e o dia da semana que mais leem é a segunda-feira.

O uso de plataformas digitais de leitura de jornais, ainda, é baixo:


79% dos leitores afirmam fazê-lo mais na versão impressa, e 10%
em versões digitais. Piauí, Ceará e Paraná são os estados com maior
adesão às versões on-line dos periódicos [...]. Amapá, Amazonas e Rio
Grande do Sul, os estados com menor adesão [...] (BRASIL, 2016, p. 7).

Com relação às revistas, o consumo é semelhante ao dos jornais. Apenas


13% dos brasileiros leem revistas durante a semana, e as versões impressas (70%)
são mais lidas do que as digitais (12%). Contudo, a mídia impressa guarda uma
informação muito importante para os elaboradores da pesquisa. Segundo o estudo,
a leitura de jornais e de revistas possui um maior nível de atenção por parte dos
leitores. Cerca de 50% dos assinantes de jornal, e 46%, de revista, disseram que
não fazem nenhuma outra atividade enquanto consomem esses produtos.

146
TÓPICO 2 — PANORAMA ATUAL DO JORNALISMO

A respeito do nível de confiança do brasileiro nos meios de comunicação,


o jornal continua sendo o meio de comunicação mais confiável: 58% dos
participantes confiam muito ou sempre, enquanto 40% deles confiam pouco ou
nada. Já a televisão e o rádio estão em empate técnico. No caso da TV, 54% dos
telespectadores confiam muito ou sempre, e 45% dos indivíduos confiam pouco
ou nunca. Com relação ao rádio, 52%, muito ou sempre, e, 46%, pouco ou nunca.
No caso das revistas, o público leitor confia menos: 44% muito ou sempre, e, 52%,
pouco ou nunca.

Importante observar que, com relação às novas mídias, o brasileiro


permanecia desconfiado. “Respectivamente, 71%, 69% e 67% dos entrevistados
disseram confiar pouco ou nada nas notícias veiculadas nas redes sociais, blogs e
sites” (BRASIL, 2016, p. 8).

2.1 CONSUMO DE MÍDIA DURANTE A PANDEMIA


A pandemia do novo coronavírus provocou alterações significativas no
consumo de mídia no mundo inteiro. Em 2020, o brasileiro passou cerca de sete
horas e 9 minutos em frente à TV, cerca de 39 minutos a mais do que em 2019.
Também, aumentou-se o tempo dedicado ao consumo de vídeos.

Para o telejornalismo, os números, durante o primeiro ano de


distanciamento social, foram excelentes, e se mantiveram entre os programas
mais assistidos da TV.

Dentre os telespectadores, 82% deles afirmaram acompanhar o


noticiário na TV. Destes, 52% dos indivíduos mencionaram que o
formato é fácil de entender; 45%, à procura de temas para conversar
a respeito, 43%, em defesa do telejornalismo como forma rápida e
confiável de se informar; e, outros 41%, que o hábito ajuda a desafiar os
próprios pontos de vista. No time de pesquisados, 77% dos presentes
afirmaram que acompanhar as notícias pela tela tem sido importante
em tempos de pandemia (KANTAR IBOPE, 2021, s.p.).

Assim como a mídia tradicional, o uso da internet, durante a pandemia,


no Brasil, em 2020, cresceu entre 40% e 50%, segundo dados da Agência Nacional
de Telecomunicações (Anatel) (LAVADO, 2020).

147
UNIDADE 3 — JORNALISMO CONTEMPORÂNEO

2.2 NOVAS MÍDIAS SUBSTITUÍRAM MÍDIAS TRADICIONAIS?


Os dados apresentados mostram que o acesso dos brasileiros à internet
está aumentando, o que eleva o público com potencial para consumir os
produtos jornalísticos digitais. No entanto, ainda, é preciso considerar o enorme
contingente de pessoas que não têm acesso regular à internet no Brasil. Desse
modo, não se pode dizer que as mídias massivas tradicionais, como o rádio e a
televisão, foram superadas em importância. Esse cenário pode até ser realidade
em países desenvolvidos, mas as características socioeconômicas do Brasil,
associadas às demográficas e culturais, constituem um cenário midiático muito
específico, dotado de pontos peculiares, os quais precisam ser considerados
quando analisamos as perspectivas do jornalismo no Brasil.

Outro aspecto que a Pesquisa Brasileira de Mídia avalia é a confiança


dos indivíduos em cada uma das mídias. Como vimos, os veículos tradicionais
continuam sendo percebidos, pelo público consumidor de notícia, como mais
confiáveis do que as mídias digitais, o que demonstra que, ainda, há muito
trabalho a ser feito no sentido de consolidar a confiança do público em relação ao
jornalismo praticado nos meios online.

3 NOVOS FORMATOS E DISPOSITIVOS AMPLIAM O


HORIZONTE DO JORNALISMO
A popularização dos vídeos se tornou possível, principalmente, com a
criação do Broadcast Yourself (YouTube), em 2005, empresa adquirida pela gigante
Google, em 9 de outubro de 2006. Essas possibilidades de qualquer pessoa, em
qualquer lugar do mundo, produzir e disponibilizar, imediatamente, um vídeo na
internet, modificaram as formas de consumo de entretenimento e de jornalismo.

Vários jornalistas especializados nas mais diversas áreas passaram a


criar canais no YouTube, como forma de fidelizar a audiência e se aproximar
do público, o que favoreceu, sensivelmente, os jornalistas independentes.
Múltiplas fontes de informação começaram a confrontar as mídias tradicionais
e isso incomodou os grandes conglomerados. Grandes emissoras de rádio e de
TV, também, aderiram ao YouTube, com a criação de canais próprios. Outra
grande empresa de mídia norte-americana, o Facebook, também, passou a
oferecer a opção de produção de vídeos alguns anos depois. “Em janeiro de
2016, o Facebook possibilitou a transmissão de vídeos domésticos aos mais de
um bilhão de usuários. Fato semelhante já havia sido desenvolvido anos antes,
por outras redes sociais, como o Twitter” (SANTOS, 2019, p. 45).

A ampliação da velocidade da internet no Brasil, a partir da década de


2000, permitiu novas possibilidades de transmissão e de recepção de conteúdos
de entretenimento e jornalísticos. Anteriormente, discada, a internet passou a
conectar as casas dos brasileiros por meio do sistema DSL, uma tecnologia de
transmissão digital de dados via rede de telefonia. As conexões discadas, as quais

148
TÓPICO 2 — PANORAMA ATUAL DO JORNALISMO

atingiam apenas 56 kpbs (quilobites por segundo) de velocidade, deram lugar ao


sistema Digital Subscriber Line (DSL), criado pelo grupo norte-americano Bell,
em 1998, que já permitia algo próximo a 50 Mpbs (megabites por segundo).

Tal condição revolucionou a forma de se conectar à internet, mas,


obviamente, todo esse processo levou alguns anos para funcionar, de forma
adequada, em todos os municípios, ficando mais acessível, de início, aos grandes
centros, devido aos investimentos necessários para o oferecimento desse tipo
de pacote de dados. Em seguida, o público consumidor de internet das maiores
cidades passou a ter acesso por fibra ótica, principalmente, a partir dos serviços
ofertados em conjunto, com a televisão a cabo.

Agora sim, seria possível ter uma forte estabilidade de conexão, sem as
quedas constantes do DSL, aliada à rapidez do fluxo dos dados, o que propiciou
o surgimento de empresas que, simplesmente, não existiam alguns anos antes.
Aqui, estamos falando, principalmente, dos streamings de áudio e de vídeo,
como Netflix, Fox, HBO Max, Amazon Prime, Globoplay e Disney Plus, só para
citar alguns exemplos. “Em 2002, a, também, norte-americana COMCAST NBC/
Universal, maior conglomerado de mídia do planeta, proprietária dos Estúdios
Universal/NBC, começou a oferecer internet de alta velocidade aos seus clientes
por DSL e por cabo” (WOLF, 2015, p. 125).

Na esteira da tecnologia, agora, propícia à disseminação de quantidade e


de qualidade de conteúdo audiovisual, o jornalismo se voltou para a produção
de programas específicos de entrevistas e de documentários em alta definição.
Programas, também, já assistidos na TV a cabo convencional, migraram ou foram
disponibilizados no ambiente digital, para consumo on demand, ou seja, para que
o assinante desses serviços tivesse a possibilidade de assistir à programação a
qualquer hora e em qualquer lugar. Passou a ser comum uma pessoa assistir a
um filme ou a um documentário jornalístico enquanto estivesse em um saguão
de aeroporto, em uma rodoviária, ou, até mesmo, em uma praça pública. Isso
alterou a forma de acompanhar conteúdos de vídeo, antes, relegados, apenas, a
um aparelho televisor.

3.1 SMARTPHONES E TABLETS


No dia 9 de janeiro de 2007, Steve Jobs apresentou o primeiro
smartphone do mundo, da forma como conhecemos hoje, o iPhone. Não seria
exagero dizer que a criação e a popularização desse dispositivo mudariam a
comunicação. Os dispositivos móveis, como os smartphones e os tablets, que
viriam depois, revolucionaram os rumos da indústria da tecnologia e abriram
novas possibilidades de formatos para a comunicação, de forma geral. Se você,
acadêmico, tiver menos de 20 anos de idade, provavelmente, não se lembrará da
época em que os telefones celulares serviam, apenas, para fazer ligações e receber
mensagens de texto curtas.

149
UNIDADE 3 — JORNALISMO CONTEMPORÂNEO

FIGURA 6 – STEVE JOBS APRESENTA O PRIMEIRO IPHONE

FONTE: <https://epocanegocios.globo.com/Empresa/noticia/2017/01/ha-10-anos-steve-jobs-
apresentava-o-iphone-ao-mundo.html>. Acesso em: 24 abr. 2021.

DICAS

O evento de apresentação do primeiro iPhone é considerado um marco


da história da indústria da tecnologia. O vídeo do evento está disponível online e pode
ser assistido no link a seguir, legendado em português: https://www.youtube.com/
watch?v=2qhftAocuKE.

Na verdade, o primeiro conceito de smartphone surgiu por meio da


empresa IBM, em 1992, mas o iPhone da Apple é considerado o precursor dos
smartphones que usamos hoje. A partir de 2007, o dono de um dispositivo como
esse não precisaria mais “entrar na internet” para ter acesso a algum conteúdo:
o sujeito já estava “dentro” da internet. O aparelho agregou várias mídias e
permitiu ampliar o consumo digital de conteúdo, inclusive, o jornalístico. A
criação dos aplicativos, através de uma espécie de fidelização a um grupo de
empresas ou de serviços, foi crucial para o estabelecimento de uma nova relação
com a tecnologia. Utilizando-se a tecnologia Wi-fi ou as redes 2G, 3G, 4G, e,
mais recentemente, 5G (esta última, ainda, inexistente no Brasil, em 2021), os
smartphones se popularizaram com a criação de vários concorrentes do iPhone
ao redor do mundo.

Os tablets, também, não foram inventados pela Apple. Os primeiros


tablets surgiram, ainda, na década de 1980, mas esse tipo de dispositivo só se
tornou popular e virou desejo de consumo a partir da criação do iPad, em 2010.
O advento desses dispositivos foi importante para possibilitar a criação de novos
formatos e de narrativas jornalísticas, como as reportagens multimídia.

150
TÓPICO 2 — PANORAMA ATUAL DO JORNALISMO

DICAS

A matéria publicada pelo site Tec Mundo conta a história dos tablets na era
pré-iPad: https://www.tecmundo.com.br/internet/3624-a-historia-dos-tablets.htm.

Aplicativos de conteúdo, como os dos jornais Folha de São Paulo, Estadão


e O Globo, rapidamente, passaram a ser disponibilizados, a fim de manter o
público leitor atualizado, em tempo real, com o que acontece no mundo. Os sites,
sejam de notícia, ou não, tiveram que adequar os formatos às telas do celular e
dos tablets, além de pensar na navegabilidade a partir das especificidades dos
dispositivos móveis.

3.2 HIPERJORNALISMO
Toda a revolução do complexo tecnológico, aqui, relatada, gerou novos
processos de produção e de distribuição da informação, como no caso da Realidade
Aumentada, quando um texto de jornal ou de revista pode conter possibilidades
de interação com tablets ou smartphones, através de aplicativos feitos para esse
fim. Trata-se do chamado hiperjornalismo, sendo amplificada a experiência
do leitor, o que o faz se conectar com outras experiências que permitem uma
narrativa da notícia. “Hiper-realidade é a capacidade tecnológica de combinar
realidade virtual, realidade física, inteligência artificial e inteligência humana,
integrando-as, de forma natural, para o acesso do usuário” (KIRNER; TORI, 2006
apud OLIVEIRA, 2017, p. 155).

Novos atributos narrativos emergem a partir da plataforma de RA,


e, ao se transformarem em narrativa jornalística hipermidiática,
ultrapassam uma simples readaptação de modelos tradicionais da
área, para dar origem a um novo gênero jornalístico cuja dinâmica
existe apenas na presença das mídias audiovisuais digitais conectadas
(LIMA; BAZAN, 2013, p.39 apud OLIVEIRA, 2017, p. 155).

Desde a última década, o leitor de um jornal ou de um portal de


notícias pode “mergulhar” em uma notícia com recursos 3D ou de câmeras 360
graus e óculos de realidade virtual. Ainda, é possível apontar o celular para a
página de jornal. Instantaneamente, recursos multimídia de áudio e de vídeo
contavam detalhes impossíveis de serem traduzidos, apenas, no texto escrito, e
transportavam o leitor para dentro da notícia.

Como exemplo de RA aplicada ao jornalismo, em 2009, o jornal Estado


de S. Paulo inovou, ao produzir uma reportagem que ultrapassou o
limite do impresso e tomou forma nas telas de computador. A matéria,
que abordava os 120 anos da “Torre Eiffel”, fez uso da realidade

151
UNIDADE 3 — JORNALISMO CONTEMPORÂNEO

aumentada para criar uma réplica 3D do monumento francês no


monitor. Com o jornal em mãos, o usuário precisava acessar a página
interativa e mostrar o símbolo impresso no papel diante da webcam,
para ver uma “Torre Eiffel 3D” na tela do computador. Era possível,
também, movimentar o símbolo diante da câmera e observar a Torre
por cima ou por baixo (OLIVEIRA, 2017, p. 158).

3.3 NEWSGAMES
Nos últimos anos, o jornalismo, também, apropriou-se de outro tipo de
plataforma que abrange milhões de adeptos em todo o mundo: os games. Foram
criados programas capazes de utilizar um game para explicar uma notícia ou
para contar uma história real, algo que aconteceu, uma notícia, por exemplo, o
que oferece uma experiência imersa e diferenciada a quem está procurando tal
informação. O usuário pode, literalmente, jogar a notícia. São jogos que agregam
forte conteúdo opinativo ou crítico frente a atualidades ou acontecimentos
extremamente recentes. Nesse jogo, o jogador se posiciona conforme os
conhecimentos de mundo em face ao conteúdo de tal informação. O poder de
interação está, exatamente, na construção dos cenários do acontecimento. Existem,
por exemplo, os newsgames de infográficos e os de documentários.

Um dos primeiros newsgames a ganhar repercussão internacional
foi o September 12th. O produto trabalha com o tema “terrorismo” e
foi desenvolvido pelo designer uruguaio Frasca, cujo famoso projeto
Newsgaming.com mistura jornalismo com videogames. Faz parte,
desse projeto, outro exemplo emblemático de newsgame, difundido
na mídia impressa, pelo jornal espanhol El Pais: o Play Madrid, que
aborda os ataques terroristas na cidade espanhola em 2004. Já o
newsgame norte-americano do The New York Times, Food Import
Folly, versa a respeito da falta de fiscalização na importação de
alimentos nos Estados Unidos (OLIVEIRA, 2017, p. 176).

No Brasil, um newsgame desenvolvido pelo jornal Folha de São Paulo, no


formato de infográfico, é citado por Oliveira (2017), o Folhacóptero, o qual possui
trilha sonora e versões para computador e para smartphones.

Outro exemplo citado por Oliveira (2017) é o Presidential Pong, criado


em 2007, pela Rede CNN Americana, durante os debates presidenciais daquele
ano. Uma partida de tênis simulava as habilidades dos candidatos, conforme o
andamento da campanha.

152
TÓPICO 2 — PANORAMA ATUAL DO JORNALISMO

FIGURA 7 – NEWSGAME PRESIDENTIAL PONG

FONTE: <http://persuasivegames.com/game/presidentialpong>. Acesso em: 24 jun. 2021.

A autora cita, ainda, o game criado pela Revista Galileu, para comemorar
os 25 anos da queda do Muro de Berlim. Segundo a autora, a experiência mais bem-
sucedida de newsgame, no Brasil, até hoje, produzida pelo núcleo jovem da Editora
Abril, para a Revista Super Interessante, em 2011, é intitulada de Filosofighters,
jogo premiado internacionalmente. Em 2016, a mesma revista produziu o Science
Kombat, o que reúne cientistas famosos da história (OLIVEIRA, 2017).

FIGURA 8 – NEWSGAME FILOSOFIGHTERS

FONTE: <https://super.abril.com.br/blog/newsgames/filosofighters-conheca-os-bastidores-do-
newsgame-360-lancado-pela-super/>. Acesso em: 24 abr. 2021.

153
UNIDADE 3 — JORNALISMO CONTEMPORÂNEO

Enquanto a notícia tradicional é editada no ciberespaço em apenas duas


dimensões (2D), a notícia, nos newsgames, é produzida, reproduzida e consumida
de forma tridimensional (3D): a chamada NewNews. Para os autores, as notícias
em forma de games podem estimular a mobilização social e extrapolar o conceito
de jogos baseados em notícias. Eles explicam que, para que a informação seja,
realmente, apreendida, os jogos informativos precisam aliar a capacidade lúdica
dos games e o poder orientativo da narrativa textual.

DICAS

O vídeo a seguir, publicado no canal da revista Superinteressante, no


YouTube, falará dos newsgames já produzidos por essa revista: https://www.youtube.com/
watch?v=KRXbOol3L2Q.

154
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• No Brasil, a televisão e o rádio continuam sendo os meios de comunicação mais


consumidos.

• O consumo de internet está aumentando de forma acelerada no país, e o acesso


se dá por dispositivos móveis e por notebooks.

• O surgimento das plataformas de compartilhamento de vídeos pela internet


e a ampliação da velocidade dela no Brasil abriram novos mercados para o
jornalismo.

• Formatos digitais, como as narrativas hipermidiáticas, as quais utilizam


a realidade aumentada, e os newsgames, são exemplos de inovações que o
ambiente digital proporcionou e que podem ser exploradas pelo jornalismo
em busca de novos públicos.

155
AUTOATIVIDADE

1 Os hábitos de consumo de mídia da população brasileira vão se transformando


ao longo do tempo e acompanhando o acesso às novas tecnologias. Esses
dados são importantes para os jornalistas, para que se possa compreender que
meios de comunicação atraem as maiores cotas de atenção e de confiança da
população. Com base no que abordamos neste tópico, a respeito do consumo
de mídia no Brasil, analise as sentenças a seguir:

I- De acordo com a Pesquisa Brasileira de Mídia, divulgada em 2016, a


televisão deixou de ser o meio de comunicação mais consumido do país.
II- O rádio, ainda, é o segundo meio de comunicação mais consumido pelos
brasileiros, mas a importância dele tem caído em relação a pesquisas
anteriores.
III- Quase a metade dos brasileiros utiliza a internet.
IV- O uso de celulares, para acesso à internet, é superior ao uso de notebooks.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As sentenças I, II e III estão corretas.
b) ( ) Apenas a sentença I está correta.
c) ( ) As sentenças II e III estão corretas.
d) ( ) Apenas a sentença IV está correta.

2 A criação de novos formatos, plataformas e dispositivos ampliou o


horizonte da comunicação e abriu as portas para o jornalismo atrair novos
públicos. Com base nos seus conhecimentos a respeito do assunto, analise
as sentenças a seguir:

I- A popularização dos vídeos, na internet, tornou-se possível, principalmente,


a partir da criação da plataforma YouTube, em 2005, posteriormente,
adquirida pela gigante de tecnologia Google, no ano seguinte.
II- Apesar de ser considerada uma ferramenta de comunicação de grande
potencial, os jornalistas não ocuparam a plataforma, por receio de danos
à reputação.
III- Múltiplas fontes de informação passaram a confrontar as mídias
tradicionais, e isso incomodou os grandes conglomerados.
IV- A ampliação da velocidade da internet no Brasil foi essencial para que o
consumo de vídeos, pela internet, pudesse avançar.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As sentenças I, III e IV estão corretas.
b) ( ) As sentenças II e IV estão corretas.
c) ( ) Apenas a sentença I está correta
d) ( ) Apenas a sentença III está correta.

156
3 A ampliação da velocidade da internet, no Brasil, a partir da década de 2000,
permitiu novas possibilidades de transmissão e de recepção de conteúdos
de entretenimento e de jornalismo. Essa melhoria mudou as formas de se
conectar e de se relacionar com a internet. Com base no que você estudou,
classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as sentenças falsas:

( ) O sistema DSL (Digital Subscriber Line) foi um avanço tecnológico que


permitiu uma forte velocidade de conexão com a internet. No entanto, ele
era acessível, inicialmente, apenas, nos grandes centros, tendo demorado
para chegar ao interior do Brasil.
( ) Atualmente, o público consumidor das cidades maiores tem acesso à
internet via fibra ótica, por meio de pacotes, normalmente, ofertados em
conjunto, com telefone fixo e televisão.
( ) Pode-se dizer que a estabilidade de conexão, proporcionada pela fibra
ótica, permitiu que o público brasileiro passasse a consumir streamings
de áudio e de vídeo, como a Netflix.
( ) Programas jornalísticos tradicionais, também, passaram a disponibilizar
conteúdo na internet, para consumo on demand.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) V-V-V-V.
b) ( ) F-F-V-V.
c) ( ) V-F-V-F.
d) ( ) F-F-V-V.

4 Considerando os dados da Pesquisa Brasileira de Mídia e o conteúdo que você


estudou ao longo deste tópico, disserte a respeito do seguinte questionamento:
as novas mídias substituíram as mídias tradicionais no Brasil?

5 Nos últimos anos, o jornalismo, também, apropriou-se de outro tipo de


plataforma que abrange milhões de adeptos em todo o mundo: os games.
Com base no conteúdo deste tópico, mencione as principais características
dos newsgames e cite exemplos.

157
158
TÓPICO 3 —
UNIDADE 3

FUTURO DO JORNALISMO

1 INTRODUÇÃO
Neste tópico, refletiremos a respeito dos desafios do cenário contemporâneo
e do futuro do jornalismo diante de tantas oportunidades. Você verá que o
contexto de disseminação de informações falsas, as famosas fake news, reforça a
importância e a necessidade de oferecer, à sociedade, informações confiáveis, cuja
veracidade tenha sido checada a partir de rígidos padrões profissionais.

Acompanharemos, também, que o advento das plataformas digitais


e a importância que elas assumiram no contexto contemporâneo trouxeram
consequências para as empresas jornalísticas, que viram as receitas publicitárias
despencarem. Nesse cenário, destacaram-se os modelos de negócios que se
baseiam em outras formas de financiamento, como veremos quando falarmos
dos nativos digitais.

2 DESAFIOS DO JORNALISMO NA ERA


DA DESINFORMAÇÃO
A internet quebrou paradigmas da comunicação ao transformar todos os
indivíduos, com acesso à rede, em possíveis produtores e emissores de informação.
Essa característica, no entanto, abriu espaço para uma série de práticas que
são prejudiciais ao exercício do jornalismo e da democracia, como a produção
e a disseminação, em massa, de conteúdos baseados em informações falsas,
produzidos com a intenção de causar danos à sociedade, o que se convencionou
chamar de fake news (notícia falsa, em inglês).

Hoje em dia, é, extremamente, fácil produzir um texto, um áudio ou um


vídeo, além de publicar na internet, mas essa exposição do conteúdo se torna um
problema, pois a internet não tem filtros, todos podem acessar e publicar. O que,
inicialmente, considerávamos a característica mais democrática da rede, tem se
mostrado uma verdadeira ameaça às sociedades democráticas, a respeito da qual
a sociedade precisa, coletivamente, refletir, além de buscar soluções.

Para se ter uma ideia, “fake news” foi eleita a palavra do ano de 2017
pelo prestigiado dicionário britânico Collins. É definida como informações
falsas, muitas vezes, sensacionalistas, divulgadas sob o disfarce de notícias. O
termo tem sido usado de forma intensa, e, muitas vezes, indevida no discurso

159
UNIDADE 3 — JORNALISMO CONTEMPORÂNEO

político contemporâneo, o que contribui para obscurecer, ainda mais, um cenário


que já é complexo. A popularização de aplicativos de mensagens instantâneas,
como o WhatsApp, complica esse cenário, pois as notícias falsas acabam sendo
compartilhadas através desses aplicativos milhares de vezes e em um período
curto de tempo, disseminando a desinformação de forma exponencial.

Nesse cenário, o jornalismo profissional encontra desafios e


oportunidades. Os desafios provêm do fato de que muitas pessoas passam a
duvidar da credibilidade das empresas jornalísticas tradicionais em decorrência
da banalização do termo fake news, usado, de forma excessiva e, frequentemente,
inadequada, por parte de sujeitos que têm interesse em desacreditar da trabalho
da imprensa, como políticos profissionais que se sentem ameaçados pelo livre
exercício da prática jornalística. Para Santos e Maurer (2020, p. 6), essa é uma
estratégia narrativa: “nesse contexto, acredita-se que o uso exagerado dessa
terminologia possa ter efeito danoso sobre a percepção do público em relação à
credibilidade jornalística, ao associar a notícia, uma especificidade do trabalho
jornalístico, ao adjetivo ‘falso’”.

É preciso ter em mente, no entanto, que a disseminação de informações


falsas é um problema alarmante da sociedade atual, cuja solução passa, em
grande medida, pelo trabalho de checagem de informações e pela desmistificação
de boatos feitos pelos jornalistas profissionais. Nesse cenário, surgem as
oportunidades para os jornalistas profissionais.

É válido lembrar, no entanto, que a checagem de informações é parte


fundamental do trabalho de todo e qualquer jornalista, não apenas daqueles
que trabalham em agências de checagem, e está relacionada à busca da verdade
enquanto imperativo ético do jornalismo (BUCCI, 2000). Nesse sentido,
recuperamos o exposto por Bucci (2000, p. 51), que define o jornalismo como uma
“ética baseada no combate à mentira ou, noutra perspectiva, na busca da verdade
dos fatos – não da verdade metafísica, nem da verdade religiosa, muito menos da
verdade científica, mas, simplesmente, da verdade dos fatos”. Assim, é preciso
retomar a disciplina da verificação, nos termos de Kovach e Rosenstiel (2004):

No esclarecimento desses mal-entendidos e na melhora da disciplina


da verificação, reside o passo mais importante que os jornalistas
podem dar para a qualidade da informação e a discussão pública. No
fim, essa disciplina é o que separa o jornalismo de outros campos e
cria uma razão econômica para a sobrevivência. Uma disciplina mais
consciente da verificação é o melhor antídoto para evitar que o velho
jornalismo de verificação seja atropelado pelo jornalismo de afirmação,
o que forneceria, aos cidadãos, uma base para confiarem nos relatos
jornalísticos (KOVACH; ROSENSTIEL, 2004, p. 122).

160
TÓPICO 3 — FUTURO DO JORNALISMO

2.1 FACT CHECKING


As iniciativas de checagem de fatos (fact checking) têm tido notoriedade
nesse contexto de desinformação, pois se apresentam, ao público, como
alternativas para garantir informações cuja veracidade tenha sido, previamente,
checada. Esse tipo de iniciativa já existe desde os anos 1990, mas ganhou força
no cenário de desinformação que encontrou terreno fértil nas redes sociais. A
influência das fake news, sobre os processos eleitorais, é algo, ainda, impossível de
afirmar ou de mensurar, mas causa preocupação em escala global.

No Brasil, o problema se torna ainda mais complexo, pois grande parte do


consumo de informação se dá através de aplicativos de mensagens instantâneas,
como o WhatsApp, que tem mais de 100 milhões de usuários no país. Dessa forma,
o compartilhamento de conteúdo (falso ou verdadeiro) acaba migrando para
ambientes privados, nos quais não é possível controlar o que é recebido. Nesses
ambientes, cabe, ao usuário, identificar se a informação que chega é verdadeira ou
falsa, de modo que os jornalistas precisam pensar em estratégias que permitam
educar a população para o consumo de mídia, ensinando a diferenciar conteúdos
legítimos de fake news.

Atualmente, existem mais de 160 projetos de checagem de fatos ativos


em todo o mundo, nove deles no Brasil, dentre os quais podemos citar a Agência
Lupa e Aos Fatos. As origens históricas dessa prática se remetem aos Estados
Unidos, nos anos 1980, quando Ronald Reagan carregava a fama de cometer
erros e exageros frequentes nas declarações à imprensa. Dobbs (2012) relata que o
jornal Washington Post chegou a publicar reportagens das coletivas de imprensa
do então presidente Reagan acompanhadas de barras laterais que corrigiam as
informações ditas por ele. A iniciativa foi utilizada durante os primeiros dois
anos do mandato dele, mas foi, posteriormente, descontinuada, em decorrência
das reclamações dos leitores.

Ainda, no contexto estadunidense, as eleições presidenciais de 1988 foram


marcadas por intenso uso de informações falsas e foi nesse cenário eleitoral que
surgiram as primeiras iniciativas do gênero AdWatch, que checavam informações
divulgadas na propaganda eleitoral. Esse tipo de iniciativa se proliferou nas
eleições legislativas de 1990 e em 2006 já estavam presentes em 80% dos jornais
dos Estados Unidos (GRAVES, 2016). Um dos principais expoentes dessa prática
jornalística foi o jornalista Brooks Jackson, correspondente de política da CNN,
que começou a adotar o gênero em 1991, passando a checar também declarações
de políticos e não apenas propagandas e usando, para isso, o termo “fact check”.

No Brasil, as primeiras iniciativas do gênero surgiram durante as campanhas


eleitorais de 2010 e 2014, como o blog Preto no Branco, do jornal O Globo, lançado
em 2014, com foco nas eleições presidenciais. O projeto foi descontinuado no
ano seguinte, mas a idealizadora se dedicou à criação da primeira iniciativa,
exclusivamente, voltada ao fact checking no Brasil, a Agência Lupa.

161
UNIDADE 3 — JORNALISMO CONTEMPORÂNEO

DICAS

Conheça outras iniciativas brasileiras de fact checking na matéria a seguir, do


Portal Imprensa: https://portalimprensa.com.br/os10mais/pagina33_10_iniciativas_de_fact_
checking_no_Brasil.asp.

3 IMPACTO DAS PLATAFORMAS DIGITAIS SOBRE


O JORNALISMO
As grandes empresas de tecnologia, como Google e Facebook, encantaram
o mundo com o poder de suas plataformas digitais de conectar pessoas em todo o
globo a partir de interfaces intuitivas e altamente viciantes, mas tiveram um efeito
nefasto sobre os modos de financiamento do jornalismo. Os problemas trazidos
por ela são questões que o jornalismo contemporâneo precisa enfrentar para
construir um futuro sustentável. Muitas são as problemáticas relacionadas ao
domínio que as plataformas digitais exercem sobre a sociedade contemporânea.

Essas plataformas concentram grandes cotas de atenção coletiva e são


responsáveis por uma enorme parcela de toda a informação que circula online.
Elas acabaram dominando muito mais do que suas propostas originais sugeriam.
“Ajudaram a conectar bilhões de pessoas no mundo todo e cresceram tanto
que, em alguns aspectos, passaram a ser sinônimos da própria experiência de
navegar e usufruir da internet” (CHRISTOFOLETTI, 2019, p. 48). Com tamanha
base de usuários, acabaram se transformando nas maiores vitrines publicitárias
do mundo, oferecendo possibilidades mercadológicas que os meios de massa
tradicionais nunca foram capazes de oferecer.

DICAS

O livro Big Tech: A Ascensão dos Dados e a Morte da Política, do crítico de


tecnologia Evgeny Morozov, é uma obra interessante para refletir, criticamente, a respeito
do impacto das plataformas digitais sobre a sociedade contemporânea. Foi publicado no
Brasil, pela Ubu Editora, em 2018.

162
TÓPICO 3 — FUTURO DO JORNALISMO

Os veículos jornalísticos levaram seus conteúdos para as plataformas


digitais acreditando que a exposição traria resultados financeiros. As plataformas
digitais, por sua vez, queriam associar a sua imagem à credibilidade de veículos
consagrados. Os resultados, no entanto, foram insuficientes para os objetivos das
empresas jornalísticas.

Em 2017, os pesquisadores Emily Bell e Taylor Owen produziram um


robusto relatório sobre o pacto sinistro celebrado entre jornalismo
e plataformas. A Imprensa de Plataforma: Como o Vale do Silício
Redesenhou o Jornalismo – numa tradução aproximada – aponta
como empresas de tecnologia, alienígenas no ecossistema informativo,
apossaram-se de uma importante e estratégica etapa do processo
jornalístico – a distribuição –, que, antes, era uma especialidade das
organizações de mídia. Rapidamente, muitas pessoas deixaram de
visitar os portais de notícia, onde podiam escolher o que ler, e passaram
a se informar majoritariamente – quando não exclusivamente – pelo
que as plataformas lhes ofereciam, criando uma situação incomum:
as notícias passaram a ser consumidas não mais apenas onde eram
produzidas e naturalmente deveriam circular, mas no Facebook,
Google, Snapchat, Twitter... (CHRISTOFOLETTI, 2019, p. 49).

Dessa situação, nasceu um dilema com o qual as empresas jornalísticas


estão precisando lidar: investir em estruturas próprias de publicação ou usar as
plataformas para chegar a mais públicos? Nesse cenário, também é importante
citar que os mecanismos através dos quais as plataformas distribuem os
conteúdos para os usuários não são transparentes e são normalmente voltadas
para “agradar” o usuário e viralizar, um elemento que influencia fortemente na
circulação de informações falsas que passam a competir com notícias produzidas
por profissionais.

Nesse cenário, veículos importantes, como o jornal Folha de S. Paulo,


deixaram de publicar conteúdo no Facebook. A Folha parou de publicar seu
conteúdo em 2018, quando a plataforma passou a privilegiar a entrega de conteúdos
pessoais, em detrimento de conteúdos jornalísticos, de modo que o tráfego orgânico
gerado pelo Facebook para o site do jornal diminuiu. É importante, também,
lembrar que as empresas jornalísticas investem para produzir conteúdo para
as plataformas. É preciso pessoal, adaptação de conteúdos e rotinas produtivas
para produzir material para essas plataformas, que não geram remuneração
para as empresas jornalísticas de forma satisfatória, causando um desequilíbrio
que ameaça a sustentabilidade financeira das empresas jornalísticas. Esta é uma
questão que precisa ser considerada nas reflexões sobre o futuro do jornalismo no
atual ecossistema midiático.

163
UNIDADE 3 — JORNALISMO CONTEMPORÂNEO

DICAS

A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) lançou, em 2021, um e-book que


trata do impacto das plataformas digitais no jornalismo. O livro reúne artigos que abarcam
os impactos político, econômico e cultural das grandes empresas de tecnologia sobre o
jornalismo brasileiro, e pode ser baixado, gratuitamente, em https://fenaj.org.br/wp-content/
uploads/2021/05/EBOOK-PLATAFORMAS-Atualizado2.pdf.

4 NOVOS MODELOS DE NEGÓCIO


Historicamente, as formas de financiamento da prática jornalística,
que garantem a sustentabilidade financeira das empresas jornalísticas, são a
publicidade e as assinaturas. Christofoletti (2019, p. 51) lembra que “o público se
acostumou (e se acomodou) a obter notícias a preços baixos tendo que conviver
com propaganda”. O advento das plataformas digitais, no entanto, atraiu boa
parte das verbas publicitárias para esses ambientes, que obtêm perfis precisos de
público através de seus mecanismos de extração e uso de dados. Assim, veículos
tradicionais viram suas verbas publicitárias despencarem e jornalistas e público
sofreram as consequências.

Abundantes em muitas formas, os produtos jornalísticos perderam


valor de mercado ao mesmo tempo em que viam escapar parte da
realidade. Para compensar perdas financeiras (ou manter patamares
de lucratividade), organizações noticiosas cortaram custos, demitindo
profissionais, comprimindo salários, enxugando equipes e extinguindo
produtos. As equipes ficaram menores, afetando diretamente
sua capacidade de cobertura. Emissoras de televisão repatriaram
correspondentes internacionais, jornais cortaram suplementos,
dispensaram os profissionais com salários mais altos e sobrecarregaram
o que restou. Com isso, as empresas sacrificaram diversidade,
experiência, prestígio e qualidade (CHRISTOFOLETTI, 2019, p. 46).

No caso dos jornais tradicionais que publicam conteúdo na internet, a


criação de assinaturas digitais é um modelo que enfrentou resistência inicial, mas
atualmente tem garantido bons resultados às empresas de mídia. Em linhas gerais,
os leitores que querem ter acesso ao conteúdo de um determinado veículo, como
a Folha de S. Paulo, o Estadão ou O Globo, para citar apenas alguns exemplos,
precisam pagar por isso. Normalmente, há um limite mensal de matérias que
podem ser acessadas de forma gratuita e, quando esse limite se esgota, o leitor é
convidado a fazer uma assinatura para ter acesso ilimitado ao conteúdo. A maior
parte dos veículos de mídia tradicionais não se sustenta financeiramente apenas
com essas assinaturas e ainda dependem, em grande medida, da publicidade
para manter suas atividades e colaboradores.

164
TÓPICO 3 — FUTURO DO JORNALISMO

O jornal norte-americano New York Times foi pioneiro na adoção


de assinaturas digitais como forma de financiamento. Em 2020, os recursos
provenientes de assinaturas (entre digital e impresso) superaram, pela primeira
vez na história do veículo, as verbas provenientes da publicidade, o que indica
uma mudança de paradigma importante que vem se desenhando nos modos de
financiamento da mídia tradicional.

DICAS

A matéria a seguir, do site Meio e Mensagem, demonstrará mais detalhes do


sucesso financeiro do modelo de assinaturas digitais do jornal New York Times: https://
www.meioemensagem.com.br/home/midia/2021/02/04/new-york-times-alcanca-75-
milhoes-de-assinaturas.html.

Novos veículos jornalísticos, sobretudo os nativos digitais, já nasceram


com propostas de financiamento que não consideram a venda de espaço
publicitário como opção. Para esses veículos, a ausência de publicidade é uma
forma de manter a independência editorial do veículo. Por esse motivo, esses
projetos buscam novos modelos de receita, tais como financiamentos coletivos e
assinaturas digitais. Desse modo, todo o financiamento provém dos leitores, não
de empresas privadas com objetivos mercadológicos.

Uma das vantagens das iniciativas que operam apenas na internet é que o
investimento inicial para começar a operar é muito menor do que no caso de um
jornal tradicional ou uma emissora de rádio e TV. Mesmo assim, a preocupação
com a sustentabilidade financeira é um elemento central para que a iniciativa
possa prosperar, independentemente do modelo de negócio que se pretenda
adotar, com ou sem publicidade.

Uma preocupação central em qualquer escolha é encontrar um


sistema de rentabilização. Se as despesas são menores para a
manutenção de um site, os custos para anunciar nele também o são, o
que faz com que a rentabilidade do negócio seja baixa. Uma questão
adicional: a facilidade de se criar um site atrai um grande número de
empreendedores e isso aumenta também o contingente daqueles que
disputam anunciantes e suas verbas de publicidade. É grande, então, a
chance de que enormes bolos publicitários se pulverizem em migalhas
para os sites (CHRISTOFOLETTI, 2019, p. 45)

165
UNIDADE 3 — JORNALISMO CONTEMPORÂNEO

4.1 NATIVOS DIGITAIS: CASOS DE SUCESSO


Como você sabe, a internet trouxe muitos desafios para o jornalismo, mas
também algumas oportunidades. Os chamados nativos digitais são veículos que
já nasceram no ambiente digital, nunca estiveram presentes em outras mídias
e, geralmente, não fazem parte de conglomerados de mídia tradicionais. Neste
subtópico, veremos alguns exemplos de projetos nativos digitais que têm se
mostrado bem-sucedidos em oferecer conteúdo de qualidade no ambiente digital
a partir de novas formas de financiamento, como abordamos anteriormente.
Esses casos de sucesso nos ajudam a refletir e projetar o futuro do jornalismo no
meio digital.

O Nexo é um jornal digital que surgiu em 2015 e trabalha com a proposta


de jornalismo explicativo. Esse formato tem, como objetivos, contextualizar e
explicar temas complexos, além de ampliar o acesso do leitor a dados e estatísticas.
Não vendem espaços publicitários e se sustentam a partir de assinaturas pagas
pelos leitores. As reportagens explicativas publicadas online exploram de forma
intensa recursos como infográficos. Além disso, o Nexo também faz uso de
vídeos na plataforma YouTube, através dos quais explicam os principais fatos
para compreender as notícias da semana.

FIGURA 9 – HOME NEXO JORNAL

FONTE: <https://www.nexojornal.com.br>. Acesso em: 24 abr. 2021.

166
TÓPICO 3 — FUTURO DO JORNALISMO

DICAS

O jornalismo explicativo, também, é a aposta da Vox.com, nos Estados Unidos.


Um site com grande apelo visual e repleto de conteúdo para dar contexto às notícias. Vale a
pena dar uma olhada nos vídeos explicativos disponíveis em https://www.vox.com/videos/.

O Jota nasceu em 2014 com foco na cobertura do Poder Judiciário


brasileiro, e a sustentabilidade financeira se baseia em assinaturas individuais
e corporativas. As assinaturas corporativas são um aspecto interessante a ser
verificado no modelo de negócios do Jota, pois eles realizam uma cobertura que
tem como público-alvo “uma audiência altamente qualificada e diversificada,
que vai de advogados, juízes, procuradores e estudantes de Direito, passando
por profissionais dos mercados financeiro, da saúde ou da indústria que
precisam  compreender como o Estado brasileiro afeta seus negócios” (JOTA,
s.d., s.p.). Percebemos, nesse aspecto, uma característica importante dos nativos
digitais, que pode nos dizer muito sobre o futuro do jornalismo no ambiente
digital: a segmentação para um público específico, com objetivos específicos.

FIGURA 10 – HOME JOTA

FONTE: <https://www.jota.info>. Acesso em: 24 abr. 2021.

O canal My News funciona de maneira semelhante a um grande canal


de televisão, com uma programação variada, mas utiliza o YouTube como
plataforma. A operação do negócio é financiada, sobretudo, por patrocinadores,
além de uma pequena parcela de assinaturas e AdSense (serviço de publicidade
do Google). O projeto foi uma das quatro iniciativas brasileiras que receberam
um aporte financeiro do YouTube News Innovation Funding. O canal tem mais
de 400 mil inscritos na plataforma, tem cerca de 30 funcionários e lucrou meio
milhão de reais em 2019.

167
UNIDADE 3 — JORNALISMO CONTEMPORÂNEO

FIGURA 11 – CANAL MY NEWS

FONTE: <https://www.youtube.com/channel/UCUM4-KGZEXC2pk6zRDL9jMQ>.
Acesso em: 24 abr. 2021.

168
TÓPICO 3 — FUTURO DO JORNALISMO

LEITURA COMPLEMENTAR

QUANTO CUSTARÁ AO JORNALISMO ACEITAR


O DINHEIRO DE GOOGLE E FACEBOOK?

Rogério Christofoletti

Têm sido cada vez mais frequentes as ações de  big techs  para “salvar
o jornalismo”. São programas de treinamento e capacitação, impulsos para a
inovação, desenvolvimento de soluções tecnológicas e até incentivo a pequenos e
grandes negócios. Entre as corporações preocupadas com o jornalismo, destacam-
se Google e Facebook que têm feito grande alarde de seus gestos em toda a parte.
Em um cenário de crise catastrófica no setor, esses movimentos deveriam ser
comemorados, mas não podemos nos enganar: há um preço a pagar pela ajuda
dos maiores conglomerados do planeta. Resta saber se jornalistas e organizações
de mídia estão dispostos a arcar com as consequências de receber recursos
daqueles que não são propriamente seus aliados.

Há, pelo menos, duas razões para que o jornalismo olhe com desconfiança
para Google e Facebook: eles contribuíram para tornar mais aguda a sua crise
financeira, e eles ajudam a disseminar notícias falsas e discursos de ódio. Em
menos de duas décadas, as duas big techs sugaram imensos oceanos de verbas
publicitárias que antes irrigavam os negócios jornalísticos. Hoje, estima-se que,
juntas, elas abocanhem dois terços de tudo o que se gasta com publicidade na
internet mundial. Dinheiro é um recurso escasso e inelástico. Quer dizer: para ir a
um lugar, ele tem que sair de outro. Neste sentido, é claro que Google e Facebook
drenaram grande volume daquilo que era a principal forma de sustentar jornais,
revistas, sites e emissoras de rádio e televisão mundo afora. Não é, portanto,
exagerado dizer que Google e Facebook colaboraram com a crise, ajudando a
quebrar muitos negócios no setor. Alguém poderá dizer que os serviços de
anúncios que eles criaram vêm viabilizando também parte do mercado, mas
não vamos tapar o sol com a peneira: depois de Google e Facebook, o mercado
jornalístico encolheu em tamanho e pluralidade, seus ganhos reduziram e as
“oportunidades” criadas não reverteram a crise.

Para além disso, é cada vez mais claro que as big techs são os motores mais
potentes para difusão de notícias falsas, discursos de ódio e teorias conspiratórias. É
nesses ambientes que a polarização das sociedades é intensificada e um rizomático
ecossistema de desinformação floresceu e se estabeleceu. Alguém poderá dizer
que Google e Facebook oferecem apenas as plataformas onde isso acontece e que
a responsabilidade é das pessoas e grupos que se dedicam a isso. De novo: não
podemos fechar os olhos para a realidade. Google e Facebook não fornecem só
os ambientes onde mentira e intolerância se espalham, mas também definem os
termos de uso e têm total controle sobre os algoritmos que regem a distribuição
dos conteúdos. Isto é, poderiam coibir o ódio com mais firmeza e ajudar a frear

169
UNIDADE 3 — JORNALISMO CONTEMPORÂNEO

a desinformação, mas fazem muito menos do que está ao seu alcance por uma
razão simples: isso afetaria o coração de seus negócios. Google e Facebook vivem
à base do uso de suas plataformas e da disseminação de conteúdos viralizantes,
independente se são verdadeiros ou não, se são socialmente inflamatórios ou não.

Porque ajudam a quebrar empresas jornalísticas e porque contribuem


para espalhar desinformação, Facebook e Google não são amigas do jornalismo,
nem estão genuinamente preocupadas com ele. Mas por que eles vêm lhe
estendendo a mão?

O investimento

Vamos pegar o exemplo brasileiro. O país é o principal mercado


consumidor de notícias e entretenimento da América Latina, certamente uma
das mais atraentes vitrines para qualquer fornecedor de produtos ou serviços.
Aqui também o jornalismo enfrenta severas dificuldades para manter empregos
e empresas, mas quantas fundações locais ou poderosos fundos de investimento
incentivam o negócio de notícias no país? Talvez não caibam nos dedos de uma
mão… Quantos muito ricos tentam “salvar o jornalismo” local? Embora o país
tenha dois nomes de peso entre os 100 maiores bilionários do planeta, não se ouve
falar de boas ações de Joseph Safra (56° na lista da Forbes) e Jorge Paulo Lemann
(86°), que juntos acumulam mais de 40 bilhões de dólares. O jornalismo nacional
deveria esperar essa ajuda? Melhor não…

Google e Facebook criaram programas de auxílio ao jornalismo porque


esses gastos cabem em suas planilhas, não custam tanto e causam ótima
impressão social.

A Google News Iniciative alardeia que quer construir “um futuro mais
forte para o jornalismo”. Para isso, atua em três planos: cria produtos “para
atender às necessidades das organizações de notícias e expandir seus negócios
digitais”; firma parcerias “para resolver os desafios mais importantes da indústria
jornalística”; e desenvolve e apoia “programas para impulsionar a inovação”
no setor. É uma estratégia abrangente, robusta e muito atenta às demandas de
profissionais e empresas. Ao mesmo tempo em que oferecem cursos de capacitação
e ações de educação para a mídia, promovem gincanas de inovação, apoiam meios,
como Azmina,  Jota,  Estadão  e  O Globo, e criam projetos, como a Rede Digital
Premium de Jornais e o Impacto.Jor. As soluções apresentadas pelo gigante do Vale
do Silício passam todos por seus canais, como o YouTube, GooglePlay e Google
News. Fora do Brasil, a iniciativa do Google alcança associações empresariais,
como a Global Editors Network, Online News Association e Associação Mundial
de Jornais, passa por centros formativos e escolas de jornalismo, como o Poynter,
e alcança empreendimentos de qualificação profissional, como o Trust Project
(Projeto Credibilidade, no Brasil).

170
TÓPICO 3 — FUTURO DO JORNALISMO

Facebook tem sido menos agressivo nesse mercado, mas está por trás de
iniciativas como o recém-lançado curso da Abraji, Reconstrução do Jornalismo
Local, o Atlas da Notícia, o robô Fátima (de Aos Fatos) e o projeto Vaza Falsiane,
ambos dedicados a combater notícias falsas. Aliás, o projeto Comprova, consórcio
nacional de veículos para checagem de fatos, tem apoio de Facebook e Google. Você
leu certo: Facebook e Google ajudando a combater o ambiente de desinformação
que tanto alimentam e fazem crescer…

É importante dizer que tem muita gente séria, competente e comprometida


com o jornalismo concorrendo nessas frentes e este texto não é um julgamento
ético de suas iniciativas. Sem linhas estatais de financiamento e sem fontes
privadas locais de auxílio, jornalistas e organizações de mídia brilham os olhos
quando Google e Facebook anunciam disposição para ajudar. A situação é tão
dramática que não precisa muito: basta que as big techs criem programas, como
o Inovation Challenge e o Google News Lab, ou, ainda, os aceleradores de Vídeo
Digital e de Notícias Locais, do Facebook. Profissionais, coletivos e até grupos de
mídia bem estabelecidos disputam a cotoveladas as oportunidades oferecidas. A
crise faz com que todos busquem o escasso dinheiro disponível.

Apoiar o jornalismo, mesmo que com recursos muitíssimo limitados,


é um ótimo negócio para Google e Facebook. Primeiro porque adoça seus
balanços sociais, pois investir em jornalismo é apoiar a democracia, fortalecer as
instituições e defender a liberdade de expressão. Segundo porque aumenta o uso
de seus produtos por profissionais e empresas, criando verdadeira dependência
de pequenas redações às suítes de serviços Google/Facebook. Terceiro porque,
ao estender a mão para empresários e jornalistas, ajuda a uniformizar o discurso
social e atenuar eventuais pressões do público. Despejar alguns milhões de
dólares em ações difusas e bem capilarizadas causa uma impressão de que as big
techs estão mesmo ajudando o jornalismo, e que apenas boas intenções liberam
os caixas dessas gigantes da internet. Sejamos francos: it’s just business, baby!

A fatura

Não podemos nos dar ao luxo de sermos ingênuos. Faz tempo que o slogan
“don’t be evil” não faz mais sentido para o Google. Faz tempo que Facebook
deixou de ser só uma rede social de amigos. Os maiores players da internet estão
entre as marcas mais valiosas do capitalismo global, e seus movimentos interferem
no desenvolvimento tecnológico mundial, moldam comportamentos sociais,
definem prioridades econômicas e estremecem alguns pilares da democracia.
Nunca houve empreendimentos privados dessa natureza e alcance, e não é
exagero dizer que Google e Facebook projetem sombras sobre países inteiros com
sua influência e poder. Eles são o mais próximo do que imaginou Dave Eggers, em
seu romance distópico, O Círculo, no qual uma empresa de tecnologia cria tanta
dependência humana que ensaia absorver em sua plataforma digital o próprio
processo político. É de totalitarismo que estamos tratando; de totalitarismo
privado no capitalismo de vigilância e de sedução pelo solucionismo tecnológico.

171
UNIDADE 3 — JORNALISMO CONTEMPORÂNEO

Então, o jornalismo não deve aceitar o dinheiro de Facebook e Google?

Se a questão fosse fácil assim, não teríamos um problema. Na verdade,


estamos diante de um dilema ético que nos obriga a pensar qual o custo disso.
Ao se vincular a Google e Facebook, jornalistas e organizações de mídia colocam
em risco sua liberdade editorial? Projetos apoiados por eles terão autonomia
para criticar e cobrir com rigor os movimentos desses gigantes? Iniciativas de
checagem de fatos vão se sentir à vontade para apontar os dedos às plataformas
que estimulam a mentira e a confusão? Poderão cobrar delas ações mais efetivas
para estrangular um ecossistema de desinformação que corrói as democracias,
esgarça o tecido social e deteriora o jornalismo? Há outros caminhos para salvar
o jornalismo local, que não os sinalizados por Google e Facebook?

Ouso em dizer que a crise do jornalismo não passa necessariamente por


eles, embora não possa também ignorá-los. Um dos grandes problemas do tecno-
solucionismo é minar a nossa imaginação e nos fazer acreditar que todas as saídas
são tecnológicas e precisam pagar pedágio no Vale do Silício. Não são. O mundo,
seus problemas e diversidades são maiores que a Califórnia; a inteligência e
engenho humanos não respeitam geografias, e a internet é muito mais do que os
jardins murados que nos legaram.

As soluções para a crise do jornalismo não precisam necessariamente


passar por Facebook e Google, mas taxar conglomerados como esses ou obrigá-
los a remunerar empresas e jornalistas pela reutilização dos conteúdos que
produzem são saídas possíveis e viáveis. Legisladores também podem apresentar
propostas de financiamento público do jornalismo, tendo em vista que o serviço
que prestam pode ser enquadrado em finalidade social. Governantes podem ter
políticas transparentes, técnicas e equilibradas de distribuição de verbas públicas
ou mesmo de incentivo à mídia, entendendo que é um setor econômico que merece
socorro, como foi feito com bancos e instituições financeiras. A sociedade pode
se organizar para aderir a sistemas de sustentação compartilhada de pequenas e
médias empresas de notícia, se considerar que vale a pena pagar essa conta.

Enfim, não é fácil abrir mão do pouco dinheiro disponível para salvar
o jornalismo, mas a fatura de cobrança virá, e ela pode significar perda de
autonomia, independência, liberdade, senso crítico e credibilidade. O jornalismo
já cometeu erro parecido recentemente, quando relegou às redes sociais e às
plataformas uma etapa de seu processo produtivo: a distribuição das notícias e
conteúdos. Deu de bandeja parte de seu trabalho e, com isso, se distanciou mais
ainda do público. Não aceitar o dinheiro pode não ser a melhor saída, mas recebê-
lo acriticamente pode representar a volta de um pacto parecido como que fez o
Fausto, de Goethe. Quanto custará aceitar ao jornalismo aceitar o dinheiro de
Facebook e Google? Está na hora de falarmos sobre isso.

FONTE: <https://objethos.wordpress.com/2020/08/16/__trashed/>. Acesso em: 24 abr. 2021.

172
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• O contexto de desinformação no qual estamos vivendo impõe desafios e


oportunidades ao jornalismo profissional.

• As iniciativas de fact checking são uma resposta do jornalismo profissional à


disseminação desenfreada de fake news.

• O advento das plataformas digitais trouxe uma série de problemas ao


jornalismo profissional. Dentre eles, a brusca queda das receitas publicitárias
das empresas de mídia tradicionais.

• Nesse cenário, para construir o futuro do jornalismo, é preciso pensar em novos


modelos de negócio, a partir dos quais a publicidade tenha pouca importância,
como as assinaturas digitais.

CHAMADA

Ficou alguma dúvida? Construímos uma trilha de aprendizagem


pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao
AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

173
AUTOATIVIDADE

1 A internet quebrou paradigmas da comunicação ao transformar todos


nos indivíduos com acesso à rede em possíveis produtores e emissores de
informação. Essa característica, no entanto, abriu espaço para uma série de
práticas que são prejudiciais ao exercício do jornalismo e da democracia,
tais como a produção e disseminação em massa de conteúdos baseados em
informações falsas. Com base nos seus conhecimentos sobre os desafios que
o jornalismo está enfrentando nesse contexto, analise as sentenças a seguir:

I- O termo fake news tem sido usado de forma intensa e frequentemente


indevida no discurso político contemporâneo, o que contribuiu para
confundir as pessoas.
II- A popularização de aplicativos de mensagens instantâneas, como o
WhatsApp, complica ainda mais esse cenário, pois as notícias falsas
acabam sendo compartilhadas através desses aplicativos milhares de
vezes em um período curto de tempo, disseminando a desinformação de
forma exponencial.
III- A disseminação de informações falsas é um problema que sempre existiu
e não foi potencializado pela facilidade e velocidade de disseminação que
a internet proporcionou.
IV- A disseminação de informações falsas é um problema alarmante na
sociedade atual, cuja solução passa, em grande medida, pelo trabalho
de checagem de informações e desmistificação de boatos feito pelos
jornalistas profissionais.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As sentenças I, II e IV estão corretas.
b) ( ) As sentenças, II, III e IV estão corretas.
c) ( ) Apenas a sentença III está correta.
d) ( ) Apenas a sentença II está correta.

2 As iniciativas de checagem de fatos têm ganhado notoriedade nesse contexto


de desinformação, pois se apresentam ao público como alternativas para
garantir informações cuja veracidade tenha sido previamente checada.
Com base nos seus conhecimentos sobre fact checking, analise as sentenças
a seguir:

I- Iniciativas de fact checking existem desde os anos 1990, mas ganharam força
no cenário de desinformação que encontrou terreno fértil nas redes sociais.
II- A disseminação de fake news tem influência comprovada em processos
eleitorais em todo o mundo.
III- No Brasil, esse problema se torna ainda mais complexo, pois grande parte
do consumo de informação se dá através de aplicativos de mensagens
instantâneas como o WhatsApp, que tem mais de 100 milhões de usuários
no país.
174
IV- As origens históricas do fact checking remetem aos Estados Unidos, nos
anos 1980, quando Ronald Reagan carregava a fama de cometer erros
e exageros frequentes em suas declarações à imprensa. Jornais, como
o Washington Post, publicavam suas declarações acompanhadas de
destaques e correções.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As alternativas I e II estão corretas.
b) ( ) As alternativas II, III e IV estão corretas.
c) ( ) Apenas a alternativa I está correta.
d) ( ) As alternativas I, III e IV estão corretas.

3 Historicamente, as principais formas de financiamento dos negócios


jornalísticos são a publicidade e as assinaturas. Atualmente, no entanto, há
mudanças nesse cenário. Com base nos seus conhecimentos sobre os modelos
de negócio do jornalismo contemporâneo, analise as sentenças a seguir:

I- O advento das plataformas digitais, no entanto, atraiu boa parte das verbas
publicitárias para esses ambientes, deixando os veículos tradicionais com
uma fatia muito menor do bolo publicitário.
II- Diante desse cenário de queda nas receitas provenientes da publicidade,
muitas empresas fizeram cortes de salário, demissões e extinguiram produtos.
III- A instituição de assinaturas digitais é um modelo de negócio que não
funcionou bem no Brasil, pois as pessoas não estão dispostas a pagar por
um bom conteúdo.
IV- O jornal norte-americano New York Times foi pioneiro na adoção de
assinaturas digitais como forma de financiamento. Em 2020, os recursos
provenientes de assinaturas (entre digital e impresso) superaram, pela
primeira vez na história do veículo, as verbas provenientes da publicidade.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As sentenças I, II e IV estão corretas.
b) ( ) Apenas a sentença III está correta.
c) ( ) As sentenças III e IV estão corretas.
d) ( ) As sentenças I, II, III e IV estão corretas.

4 O advento das plataformas digitais e a centralidade que elas assumiram


no contexto contemporâneo trouxeram consequências ao jornalismo
profissional. Com base no que você estudou, disserte a respeito do impacto
das plataformas digitais sobre as empresas jornalísticas.

5 As iniciativas de fact checking trouxeram à tona a importância da apuração


jornalística como elemento central do jornalismo de qualidade. Com base
no conteúdo deste tópico, explique a importância da checagem no trabalho
de todos os jornalistas, independentemente do veículo e do formato.

175
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