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Imperatriz
2022
INTRODUÇÃO
https://portalimprensa.com.br/noticias/ultimas_noticias/84245/fim+da+edicao+impressa+do+diario+do+nordeste+amplia+de
serto+de+noticias+na+regiao
2 http://www.abi.org.br/diario-de-natal-fim-da-versao-impressa/
3 https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2018/11/gazeta-de-alagoas-acaba-com-edicao-diaria-e-vira-semanal.shtml
jornais impressos para o digital e o fluxo de demanda mercadológico do jornal enquanto um
produto econômico.
Ao tomarmos a história do fim do jornal mais tradicional do Maranhão como objeto é
importante ressaltar que os fenômenos não estão totalmente esclarecidos. É neste momento que
se faz necessário ultrapassar o deslumbramento da escrita sobre o passado, não para enterrá-lo,
nem para resgatá-lo, mas para explicar os fenômenos envolvidos; o passado não precisa de
resgate, pois quem sempre precisa é o presente (MUNARO, 2009).
Utilizamos a perspectiva epistemológica e metodológica barberiana, ancorada nas obras
de Jesús Martín-Barbero que introduziu deslocamentos conceituais inovadores dentro dos
estudos de comunicação que possibilitaram novos objetos de estudo e diálogos
interdisciplinares, como o que fizemos com a História. A abordagem empírica se deu em
consonância com a natureza do objeto e com a metodologia proposta por meio da criação de
mapas das mediações.
Embora utilizemos autores canônicos europeus no cruzamento da Historiografia com
campo da Comunicação é importante ressaltar a opção de utilização do modelo barberiano ,pois
além de atender aos principais pontos da pesquisa enquanto material de investigação , é
resultado da possibilidade de em um primeiro momento antecipar, mediar e construir um
panorama do Jornal O Estado enquanto relação de produção e poder, e em outro momento,
mediar as lógicas de ritualidade, tecnicidade e institucionalidade e temporalidade no jornal.
O nosso trabalho de dissertação está dividido em quatro capítulos que percorrem desde
a trajetória e a história do jornal O Estado até o encerramento da sua produção impressa,
abordamos também os aportes teóricos e metodológicos da pesquisa, o contexto sociocultural
e político e a interpretação dos mapas das mediações das relações estabelecidas, e por último
as considerações finais.
O COMEÇO DO FIM
“É com o coração sangrando que eu falo que nós vamos ter que sair da edição impressa
do Estado do Maranhão”. A voz é rouca e reticente, mas encontra gravidade e força ao falar do
jornal que fundou há 62 anos. O sotaque é o mesmo que os brasileiros ouvem desde os
primórdios da redemocratização do país. Sob o crédito concedido ao entrevistado na última
edição impressa do jornal e também na matéria para o site Imirante, letras garrafais remontam
à velha tradição de jornalistas creditarem seus entrevistados com os últimos cargos exercidos
na vida pública; costumeiramente este ritual é mais forte quando se fala do mundo político.
Ex-diretor e fundador do jornal, escritor, governador, senador, de todas as alcunhas,
algumas mais recentes e outras mais antigas, a última edição impressa do jornal O Estado do
Maranhão insere o entrevistado apenas como José Sarney, ex-presidente do Brasil, nome
reconhecido por todos. No Maranhão costuma-se brincar que família ou é Ribamar ou Batista,
disse João do Vale, no icônico show Opinião4, e não por acaso José Ribamar Costa, decidiu
por sugestão de Bandeira Tribuzi, primeiro editor de O Estado do Maranhão, a adotar o
pseudônimo de José Sarney.
O trabalho consistiu em ligar José Ribamar ao espólio popular e político do pai, que
era uma figura de destaque na sociedade maranhense da época. Ao ligar, por meio do seu novo
nome, o filho à imagem do seu pai, José Sarney elegeu-se o segundo deputado mais votado do
Maranhão (D’ELOUX, p.04).
4 https://www.youtube.com/watch?v=A7QDuYVlSYk.
Minha vida tem duas vertentes, a da política e a da literatura. A política foi o
destino, a literatura é a vocação. Escrever é uma compulsão. Tem uma certa
relação com a arte de Deus por causa da arte da Criação. Deus, quando criou
o mundo, o criou com leis físicas. E o escritor viola todas essas leis para criar
um mundo imaginário, que é eterno e não se modifica. É muito difícil ser
político e ser escritor. O político lida com realidades, o escritor lida com
abstrações. Como intelectual e político, vivi a angústia entre o ideal e os
meios. O intelectual é o homem da justiça absoluta; já o político é aquele que
busca a arte do possível, com os instrumentos da contingência. Mas quem
governa vive suas circunstâncias. Não decide sobre abstrações, mas sobre
fatos. Minha opção foi esta: governo de liberdade (FOLHA DE SÃO
PAULO, 1998)
O lead inferior do jornal impresso, mais uma vez recorre a figura de José Sarney em
uma última crônica, chamada “O Tempo e O Vento”, alusão ao romance histórico de Érico
Veríssimo, mas como personagens na versão de Sarney: o jornal e as mudanças tecnológicas,
que nas palavras do autor lograram ao Estado do Maranhão caber apenas na versão online do
site de notícias Imirante:
Fizemos um jornal moderno, colorido, com um texto cuidado e dinâmico.
Assumimos a liderança da imprensa no Maranhão até hoje, sendo uma tribuna
dos problemas do Estado e um seminário permanente do debate de ideias. Por
aqui passaram grandes nomes da literatura do Maranhão. O jornal foi dirigido
por nomes importantes. Para dividir as minhas lágrimas, quero resumir todos
no de Tribuzi, que na eternidade chora conosco neste momento em que
deixamos a edição impressa para ficar somente na digital. Seguimos a
tendência mundial, forçados pela era do virtual, pela transferência da
publicidade para a internet — e, é preciso reconhecer, dos leitores. Não
encontramos vacina para nos salvar. Foi a tecnologia que criou o jornal, desde
seus primeiros ensaios no século XVI ao vigor político do XVII, até ser motor
das revoluções industriais e políticas dos séculos seguintes e tornar-se o
Quarto Poder.”.
Além disso cabe destacar que muitas lutas políticas também foram enfrentadas
discursivamente nos periódicos em várias partes do Brasil e do Nordeste. Este espaço de
enfrentamento e discussão surge no âmbito de uma esfera pública burguesa no contexto de
inovação da criação de uma imprensa nacional como ferramenta de difusão liberal e também
conservadora no cenário de enfrentamento ou admissão da política lusobrasileira do Império.
Mais recentemente, outros aspectos de inovação puderam ser percebidos. Não mais a
inovação da chegada das letras aos grandes centros urbanos, mas a inovação tecnológica
sedimentada pela lógica da tecnicidade, da produção e dos formatos industriais e aparatos
técnicos que compreendem em lastro desde das mudanças gráficas também fruto dos
equipamentos modernos e até os aspectos inovadores da escrita jornalística como movimentos
estilísticos modernos surgidos na imprensa norte americana dos anos 60. É neste sentido que
Martin Barbeiro (2009) percebe as técnicas e tecnicidades na Comunicação:
Isso se dá não só no aspecto das redes informáticas como também na conexão dos
meios com o computador reestabelecendo aceleradamente a relação dos discursos
públicos e relatos midiáticos com os formatos industriais e os textos virtuais. As
perguntas geradas pela tecnicidade indicam então o novo estatuto social da técnica
(2009, p.19).
Neste sentido, faz-se claro que a técnica, a inovação e a modernidade também foram
tardiamente empreendidas por jornais maranhenses no território como um todo. Franciscato
(2010) ao qualificar sua compreensão analítica da inovação no jornalismo na década de 20 dos
anos 2000 defende que a inovação não deve ser pensada apenas a nível técnico, mas em três
categorias: tecnológica, social e organizacional.
Outro aspecto interessante é a questão da tradição enquanto conceito operacionalizado
em dissonância daquilo que é moderno e inovador. É neste contexto que Barbero (2009)
enfatiza as práticas entre tradição e modernidade, sua oposição e às vezes sua mistura. Para o
autor a visão romântica da tradição vem da coexistência entre dois pontos: o rural, muitas vezes
associado a oralidade, as crenças e as arte ingênua e o urbano configurado pela escritura, a
secularização, o refinamento.
A busca pela data exata de criação do jornal revelou a tentativa de criação de “uma
tradição” desde a sua gênese, neste sentido ao levarmos em consideração o catálogo de jornais
maranhenses da Biblioteca Pública Benedito Leite é possível dar margem a leitura da criação
de um jornal tradicional e da manutenção desta tradição por meio da alteração de datas a fim
de fundamentar a historicização do tempo como fator de credibilidade do impresso.
Para o acervo da biblioteca, o jornal do dia foi criado em 1953 em São Luís com o
seguinte slogan: “um órgão a serviço da verdade.” Já o site Imirante que hospedou o Jornal O
Estado do Maranhão na internet, apresenta uma leitura diferente:
Nas últimas cinco décadas, a história do Maranhão foi registrada pelo jornal
O Estado do Maranhão, veículo de comunicação que se tornou divisor de
águas na história da imprensa local. Desde o início, a proposta do jornal foi a
de ser "um órgão a serviço da verdade", como afirma texto publicado em sua
primeira edição. Fundado em 1º de maio de 1959, pelo empresário e político
Alberto Aboud, O Estado é herdeiro do Jornal do Dia. (O Estado do
Maranhão, 2009, p.01)
5 FGV-CPDOC http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-biografico/alberto-wadih-chames-aboud-n)
6 http://melquiadesgomes.blogspot.com/2014/07/morre-o-jornalista-arimathea-athayde.html)
7 http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-biografico/clodomir-teixeira-millet
Em 1969, o deputado federal Arthur Carvalho foi o novo diretor do jornal,
coincidentemente é nesta fase que a ascensão do futuro proprietário do jornal se consolida. De
acordo com Manoel Afonso Ferreira:
Alguns exemplos podem ser tomados desta proximidade mesmo antes da aquisição do
periódico por José Sarney, em 1968 o jornal o dia dedicou três matérias de capa completas
sobre José Sarney: “Sarney está construindo de fato um Maranhão Novo”, “Sarney é uma
esperança para nação” e “Sarney inaugura Nova Era”. (BITTENCOURT, 2019).
Ao adquirir o jornal, Sarney deixou claro a vertente política do jornal O Estado, em
entrevista a Paulo César D’Elboux em 18 de dezembro de 2022, o então senador comenta:
A TEORIA BARBERIANA
PRÓXIMOS PASSOS
ARENDT, H. Sobre a revolução. São Paulo: Editora Ática; Brasília: Editora UnB, 1988.
BRAUDEL, F. História e Sociologia. Revista de História, [S. l.], v. 30, n. 61, p. 11-31, 1965.
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CHARTIER, R. A história ou a leitura do tempo. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2009.
DE LUCA, T. História dos, nos e por meio dos periódicos. in PINSKY, Carla Bassanezi.
Fontes Históricas. São Paulo: Contexto, 2008.
D'ELBOUX, P. A trajetória comunicacional de José Sarney. Dissertação (Mestrado em
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