Você está na página 1de 28

CADERNOS

AFRO
MEMÓRIA
volume 1 * número 1

ACERVO
Milton
Barbosa
volume 1 * número 1

ano 1  *  volume 1  *  número 1


CADERNOS agosto – outubro  *  2022

AFRO
MEMÓRIA

CADERNOS AFRO MEMÓRIA NÚCLEO AFRO CEBRAP

Editor Coordenação geral Núcleo de Pesquisa


e Formação em Raça,
Paulo Cesar Ramos [Doutor em Márcia Lima [professora do Gênero e Justiça Racial
Sociologia pela Universidade Departamento de Sociologia
de São Paulo, Pesquisador de da Faculdade de Filosofia,
Pós-doutorado da Universidade Letras e Ciências Humanas
da Pensilvânia. Pesquisador da Universidade de São Paulo
do Núcleo Afro-CEBRAP] (FFLCH-USP)]

Equipe editorial Coordenação de projetos


Parceria
Gustavo Mesquita [Doutor em Anna Venturini [Pós-doutoranda
História pela Universidade de vinculada ao Programa
São Paulo e pesquisador de pós- Internacional e Interdisciplinar
doutorado do Centro Brasileiro de Pós-Doutorado (IPP) do
de Análise e Planejamento] Centro Brasileiro de Análise
Silvia Aguião [Doutora em e Planejamento (CEBRAP)]
Ciências Sociais (Unicamp),
pesquisadora do Núcleo Afro- Coordenação Institucional
CEBRAP e do CLAM/UERJ] Huri Paz [Mestrando em
Guilherme Lassabia de Godoy Sociologia pela Universidade
Financiamento
[Mestrando em Sociologia pela de São Paulo (USP)]
Universidade de São Paulo
e assistente de pesquisa no Coordenação de Comunicação
Afro-CEBRAP] Poliana Martins [Pós graduada
Maria Júlia Venâncio Ananias em Letras (UFMG)]
[Graduanda em Ciências Sociais Apoio
na Universidade de São Paulo Contato
e assistente de pesquisa no afro@cebrap.org
Afro-CEBRAP]
Gustavo Albuquerque Lima
[Graduando em Ciências Socais
na Universidade Estadual de
Campinas (UNICAMP) e assistente
de pesquisa no Afro-CEBRAP]

Projeto gráfico,
capa e diagramação
Luiza De Carli [Bacharel
em Design pela Faculdade
CENTRO BRASILEIRO DE
de Arquitetura e Urbanismo
da Universidade de São Paulo ANÁLISE E PLANEJAMENTO Esta obra está licenciada com
(FAU-USP) e assistente de uma Licença Creative Commons
R. Morgado de Mateus, 615 Atribuição - CompartilhaIgual 4.0
pesquisa no Afro-CEBRAP] Vila Mariana, São Paulo – SP Internacional.
CEP 04015-051
SUMÁRIO

05 apresentação
06 informativo 01
08 biografia
11 memória negra
Segundo Milton Barbosa

14 história de um documento
Árvore das Palavras

18 articulações & diálogos


19 Os Negros e as Eleições Diretas
20 Nêgo – Boletim Informativo do Movimento Negro Unificado / Bahia
21  fro-Parlamento – Informativo do Núcleo dos Parlamentares Negros
A
do PT no Congresso Nacional
22 Carta Aberta à População
23 Campanha “Mano não morra, não mate”
24 Campanha “Reaja à Violência Racial” do MNU
25 Jornal Nacional do Movimento Negro Unificado
RECADO
AO LEITOR
Para melhor visualização deste
material no formato digital,
habilite a visualização das
páginas duplas. Para fazer
isso no Adobe Acrobat, basta
clicar em Visualizar / Exibição
da Página e depois marcar as
opções Exibição em duas páginas
e Mostrar página de rosto em
exibição em duas páginas.
APRESENTAÇÃO
por Paulo C. Ramos

Este é o primeiro número do Cadernos Afro tornou o MNU, é membro fundador do Partido
Memória, resultado dos trabalhos do Afro dos Trabalhadores, onde ainda se encontra, foi
CEBRAP e das parcerias desenvolvidas com o candidato a deputado federal nas primeiras elei-
Projeto Memory and Identity in the Afro Brazilian ções da redemocratização, participou de todas as
Archives, da Universidade da Pensilvânia, e com campanhas eleitorais desde então, organizou um
o Projeto Memória do Movimento Negro, do sem-número de atos públicos, ajudou a fundar
Arquivo Edgard Leuenroth, da Universidade de várias organizações de base, articulações, fóruns,
Campinas. Trata-se do primeiro número de uma campanhas. São raros os acontecimentos do
produção que se pretende regular para divulgar movimento negro contemporâneo em que Milton
os materiais disponíveis de acervos do movi- não esteve presente. E toda esta trajetória está
mento negro que nós temos captado, digitalizado, ricamente registrada nos acervos que ele gentil-
catalogado e, o mais breve possível, colocaremos mente cedeu a este Projeto.
à disposição de pesquisadores, estudantes, pro- São muitos documentos presentes neste fundo,
fessores, jornalistas e militantes de todo o Brasil, mais de nove mil. Eles registram os momentos
e também do mundo, para que conheçam e divul- mais importantes do movimento negro brasileiro.
guem a historia do movimento negro brasileiro. Neste conjunto é possível notar as redes, alian-
Para o primeiro número, escolhemos traba- ças, conflitos, disputas entre os vários atores do
lhar com o material documental de Milton Bar- movimento negro brasileiro. O mergulho neles
bosa, paulista de Ribeirão Preto, crescido no permite facilmente encontrar estes fatos emble-
bairro paulistano do Bixiga, liderança quaren- máticos do protesto negro, mas também é possí-
tenário do Movimento Negro Unificado. Muitas vel reconstruir os processos que levaram a eles.
pessoas são testemunhas de sua história desde Para dar uma noção da riqueza deste acervo,
o início dos anos 1970, quando atuou junto a estamos publicando este caderno. Escolhemos os
escolas de Samba, grupos culturais, movimen- documentos que consideramos mais eloquentes
tos estudantis, sindicais, passando pela atuação para contar um pouco do que podemos encontrar.
política na clandestinidade imposta pela ditatura Documentos que são ao mesmo tempo emblemá-
militar. Milton fundou o Movimento Unificado ticos dos movimentos negros do Brasil e também
contra a Discriminação Racial, que depois se do próprio acervo e da trajetória de Miltão.

5
INFORMATIVO 01
PROJETO DE PRESERVAÇÃO DA MEMÓRIA
NEGRA CAPTOU 12 ACERVOS EM TRÊS ANOS
por Aldair Rodrigues e Mário Medeiros

Doze acervos das lutas antirracistas estão no cen- ( coordenadora da linha de pesquisa Hip Hop em
tro da parceria para a preservação da memória Trânsito - CEMI/IFCH-UNICAMP), Daniela Vieira
negra estabelecida entre Afro-CEBRAP, Arquivo dos Santos (Universidade Estadual de Londrina e
Edgard Leuenroth (UNICAMP) e linha de pes- coordenadora da linha de pesquisa Hip Hop em
quisa Hip Hop em Trânsito (CEMI/IFCH-UNI- Trânsito). Além desta equipe no Brasil, o projeto
CAMP). O projeto abrange a documentação de conta com o suporte do Programa de Populações
ativistas e intelectuais negros cujas trajetórias Marginalizadas da Universidade da Pensilvânia,
são cruciais para a compreensão do passado, dirigido pelo professor Michael Hanchard, do
presente e futuro do país: Reginaldo Bispo e departamento de Africana Studies.
Margarida Barbosa, Milton Barbosa, Geledés Ins- Os conjuntos documentais estão sendo higie-
tituto da Mulher Negra, Januário Garcia, Soweto nizados, restaurados e catalogados nos laborató-
Organização Negra, King Nino Brown, Alexan- rios do AEL-UNICAMP para, em seguida, serem
dre de Maio, Chico Piauí e Jacira Silva, Estevão digitalizados. Parte da documentação já está dis-
Maya Maya e José Correia Leite, Quilombhoje e ponível para consulta.
o Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Os documentos de Reginaldo Bispo e Marga-
Desigualdade (CEERT), e o acervo da Professora e rida Barbosa e Milton Barbosa foram os primei-
ex-ministra da Igualdade Racial Matilde Ribeiro. ros a chegar ao Arquivo Edgard Leuenroth, entre
Preservar e difundir esse legado é uma estratégia fevereiro e março de 2020, doados pouco antes
contra o apagamento do protagonismo negro na de se iniciarem as políticas restritivas em razão
memória social do país. da pandemia de SARS COVID 19. Ao longo do ano
Esse esforço coletivo, que agora completa três de 2020, o trabalho ocorreu em isolamento e de
anos, é liderado por 7 pesquisadores: Paulo César acordo com as normas de restrição da UNICAMP
Ramos (Linha Cultura e Identidade/Afro-Memó- e do governo de São Paulo. O empenho, portanto,
ria do AFRO-CEBRAP), Márcia Lima (coordena- esteve na produção de projetos, textos de divul-
dora do AFRO-CEBRAP), Aldair Carlos Rodrigues gação e seminários online, contatos pela internet
e Mário Augusto Medeiros da Silva (diretores com intelectuais e militantes negras e negros. Foi
do Arquivo Edgard Leuenroth e professores dos neste contexto virtual que em julho de 2020 ini-
departamentos de História e Sociologia da UNI- ciou-se o diálogo com o fotógrafo negro carioca
CAMP, respectivamente), Jaqueline Lima Santos Januário Garcia (1980-2021), de maneira online,

6
até seu falecimento em julho de 2021. Garcia todos os contatos com os/as intelectuais e organi-
tinha muito interesse na preservação de seu zações mencionados houve a visita dos doadores
acervo de fotos, composto por mais de 65 mil e doadoras ao AEL. Isso faz parte de uma política
negativos. Durante um ano, o projeto o apoiou de preservação e catalogação colaborativa e antir-
na identificação e acondicionamento desse mate- racista, bem como de uma relação de confiança.
rial, dando suporte a uma assistente local, que o Em maio de 2022 foi recebido o acervo de
acompanhava em segurança, e fornecendo mate- Chico Piauí (MNU, DF, 1980-), sendo este o pri-
rial de acondicionamento arquivístico. meiro conjunto documental do projeto referente
Finalmente, quando as condições favoráveis a um militante fora do sudeste. No mesmo mês,
proporcionadas pelo início da vacinação em foi doado ao Arquivo Edgard Leuenroth o acervo
massa no Brasil começaram a permitir certa fle- pessoal de Estevão Maya-Maya, maestro, cantor,
xibilização do isolamento e mobilidade, teve início compositor, escritor e professor, falecido em
o trabalho de recolhimento de acervos. Em junho 2021 com 78 anos devido à Covid-19. Encontra-
de 2021, o acervo de Geledés Instituto da Mulher -se dentro do acervo de Maya-Maya documentos
Negra (1988 -) foi doado ao AEL e firmada uma par- raros de José Correia Leite (1900-1989), histórico
ceria para a disponibilização digital do conjunto militante e intelectual negro, fundador do jornal
no Centro de Memória e Documentação Institu- O Clarim da Alvorada em 1924. Além do Clarim,
cional do Geledés. Em novembro do mesmo ano, destacam-se em seu conjunto outros periódicos
através de parceria e conversas estabelecidas na da imprensa negra e cartas do projeto UNESCO de
pandemia, o AEL recebeu a doação dos documen- pesquisa em relações raciais.
tos da Soweto Organização Negra (1991-). No final de junho, o Ael começou a receber
A parceria construída com as professoras partes do acervo do Quilombhoje Literatura, res-
Jaqueline Lima dos Santos (Unicamp) e Daniela ponsável desde 1982, pela publicação do Cader-
Vieira dos Santos (UEL), coordenadoras da linha nos Negros. Criado em São Paulo em novem-
de pesquisa Hip Hop em Trânsito, interessada na bro de 1978 pelos escritores Cuti, Oswaldo de
preservação do movimento hip hop e na cria- Camargo, Hugo Ferreira e Jorge Lescano, o
ção do I Arquivo Brasileiro de Hip Hop, conferiu Cadernos Negros é uma publicação autofinan-
um sentido ampliado aos interesses do projeto ciada por autoras e autores negros e negras, com
Memória Negra. Dada a compreensão do hip hop o propósito de publicar contos e poemas em anos
como parte da cultura negra e em diálogo com o alternados, o que tem feito de forma ininterrupta
movimento negro, a UNICAMP passou também a há 44 anos. Em junho de 2022, houve avanços
abrigar os acervos de intelectuais e artivistas do também nas tratativas para transferência do
hip hop. O primeiro foi o de King Nino Brown acervo do CEERT (1990-), através do diálogo com
(anos 1962-), recebido em novembro de 2021. Em uma de suas fundadoras, a professora Cida Bento.
fevereiro de 2022, chegaram as coleções de revis- Atualmente o projeto tem sido procurado por
tas sobre a geração hip hop dos anos 1990 e 2000, mais intelectuais negras e negros, interessados
editadas e produzidas por Alexandre de Maio na preservação de sua memória, produção e difu-
(1990-). Essa parte do projeto produziu também, são de conhecimento público. Novas parcerias e
ao longo do primeiro semestre de 2022, um con- novos acervos devem ser anunciados em breve.
junto de oficinas na Unicamp com intelectuais do A execução do projeto tem sido possível graças
hip hop, como Nino Brown, Clodoaldo Arruda e ao apoio da Universidade da Pensilvânia, FAPESP
Sharylaine. Isso possibilitou aos estudantes bol- (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de
sistas, às técnicas e a outros funcionários do AEL, São Paulo), Porticus Foundation, edital Archives
bem como a interessados em geral, incorporarem in Danger da UCLA (University of California Los
outras maneiras de apreensão do conhecimento Angeles) e Open Society Foundation.
por meio do hip hop. É necessário dizer que em

7
1976
Foto: Memorial da Resistência de São Paulo

Deixou a universidade
e a LO para se dedicar
ao Movimento Negro;

1978 - 1979
Milton foi do conselho
fiscal da Associação
dos Funcionários do
Metropolitano de São
Paulo (AEMESMP), que
posteriormente se
transformou no Sindicato
dos Metroviários. Junto com
outros metroviários, criou um
núcleo de negros que iniciou
a discussão sobre as questões
raciais na Central Única
dos Trabalhadores (CUT);

1978
Milton Barbosa coordenou
o ato de fundação do
Movimento Negro Unificado
Contra a Discriminação Racial

BIOGRAFIA
(MNUCDR), depois rebatizado
de MNU, nas escadarias do
Teatro Municipal de São Paulo,
no dia 07 de Julho. O ato
1948 1973 surgiu da indignação contra
Milton Barbosa nasceu no Ingressou como estudante a discriminação sofrida por
dia 12 de maio na cidade do curso de Economia na quatro jovens negros no Clube
de Ribeirão Preto,interior Universidade de São Paulo de Regatas Tietê e a tortura
de São Paulo; (USP), onde foi do Centro e assassinato do trabalhador
Acadêmico Visconde de Cairú, negro Robson Silveira da Luz,
1951 da Faculdade de Economia em uma delegacia de polícia;
Mudou-se para capital e Administração (FEA);
paulista, bairro do Bixiga; Dentro do MNU, ocupou as
No período dentro da posições de Coordenador
1966 universidade, militou Estadual, em SP, membro
Tornou-se chefe da ala em oposição à ditadura da Coordenação Nacional,
do Grêmio Recreativo e militar na Liga Operária Coordenador de Relações
Cultural Escola de Samba (LO) - organização socialista Internacionais e Coordenador
Vai-Vai, elaborando trabalhos e trotskista brasileira; Nacional de Formação
culturais na diretoria Política e Organização;
da Escola até 1980;

8
1979 1995 Em sua militância,
Durante o governo Maluf, Num marco das lutas do Milton Barbosa tem
Milton e outros trabalhadores Movimento Negro, Milton como posicionamento a
foram demitidos por estarem também foi integrante da autonomia e independência
fortemente envolvidos em executiva de organização do Movimento Negro em
atividades sindicais e de da primeira Marcha Zumbi relação a governos e partidos
organização da categoria; Contra o Racismo, pela políticos, também buscando
Cidadania e pela Vida, estimular a articulação do
1982 realizada no dia 20 de MNU com movimentos sociais.
Milton fez parte do Diretório novembro e que reuniu cerca
Regional do Partido dos de 30 mil pessoas em Brasília.
Trabalhadores (PT) do Além de relembrar os 300
Estado de São Paulo; anos da morte de Zumbi
dos Palmares, a Marcha
Juntamente com outros representa um marco na luta
militantes como Clóves Castro, pelo reconhecimento das
Sônia Regina Leite, Flávio injustiças históricas sofridas
Carrança e Fátima Ferreira, pelo povo negro e a inclusão
criou a primeira Comissão de políticas públicas voltadas
de Negros do PT, em SP; para a população negra na
agenda política do governo;
1986
Foi presidente de honra
na Convenção Nacional
do Negro, de onde saíram
as principais propostas Primeiro Protesto do MNU
de criminalização do Ato de lançamento do Movimento
Negro Unificado em 07 de julho
racismo e da Resolução de 1978 nas escadarias do Teatro
68, a qual estabelece que Municipal, São Paulo
“aos remanescentes das
comunidades dos quilombos
que estejam ocupando
suas terras é reconhecida
a propriedade definitiva,
devendo o Estado emitir-
lhes os títulos respectivos”;

1988
No ano do Centenário
da Abolição, Milton
Barbosa participou da
executiva de organização
da marcha em São Paulo;

Foto: Fundo Milton Barbosa, Afro-CEBRAP / AEL Unicamp

9
Imagem: Fundo Milton Barbosa, Afro-CEBRAP / AEL Unicamp

MEMÓRIA NEGRA
SEGUNDO MILTON BARBOSA
Trecho de entrevista concedida a Amauri Mendes
Pereira e Iêdo Ferreira para o vídeo “História de Luta”

Introdução por Paulo C. Ramos

O Golpe Militar de 1964, que suspendeu o pro- gente pensava, inclusive que a gente estava inven-
cesso de democratização brasileiro, também tando o movimento negro, ou qualquer coisa desse
impôs restrições a atuação do associativismo tipo. Quando de repente a gente começou a buscar as
negro. Quando uma geração de estudantes uni- informações, a gente começou a ter contatos e, des-
versitários passou a despertar para a consciência cobrir que já haviam sido feitos trabalhos... a gente
racial, antigos militantes não puderam acompa- ficou sabendo da questão da Frente Negra Brasileira,
nhar o início da formação dos novos militantes trabalhos que foram realizados pela Associação
que chegavam. Contudo, jovens como Milton Bar- Cultural do Negro, né? E nós buscamos as pessoas...
bosa passaram a procurar as pessoas que estive- então conversamos com o senhor José Correia Leite,
ram em atuação 20, 30 e até mesmo 40 anos atrás. com o Senhor Henrique Cunha, então, de repente, a
E, ao conhecer a atuação daqueles velhos militan- gente começou a levantar informações, né? E ficou
tes, Milton descobriu a necessidade da reconsti- claro pra gente que na realidade é que a questão não
tuição da memória do ativismo, e pôs-se ávido por é que não há uma ligação, o que falta é memória...
manter contato com eles. Fica evidente a preocu- da população negra, né, e que de repente é uma
pação de Milton com a memória negra quando grande preocupação do movimento negro, de real-
a conexão entre as gerações e a proximidade da mente levantar essas memórias, de criar formas de
luta foi contestada, como ocorreu em um almoço se ver o que foi feito no passado e ver como ligar isso
em 1985, em Aristocrata Clube, em São Paulo: com o presente. Então, na realidade, há uma ligação
Eu vou retomar um pouco a parte em que o porque a gente aprendeu com eles. A gente começou
senhor José Correia Leite colocou que não há liga- a descobrir formas de intervir, formas de reivindicar,
ção [entre as duas gerações de militantes], não é? ...e justamente em função do processo que eles desenca-
colocar que há essa ligação. E como exemplo eu vou dearam, então realmente há ligação.
citar, no início de 1972, mais ou menos, eu, mais
o companheiro Rafael [Pinto], e o Nininho, a gente
se reuniu para discutir a situação do negro. E aí a Acesse a entrevista completa aqui.

11
12
13
Imagem: Fundo Milton Barbosa, Afro-CEBRAP / AEL Unicamp
14
Imagem: Fundo Milton Barbosa, Afro-CEBRAP / AEL Unicamp
HISTÓRIA DE
UM DOCUMENTO
ÁRVORE DAS PALAVRAS
por Gustavo Mesquita e Gustavo Albuquerque

O clandestino da década de 70: assim ficou mais pioneira, o Árvore das Palavras foi estabelecido
conhecido o jornal Árvore das Palavras entre seus como um jornal-manifesto, ou seja, um veículo
leitores. É que o manto da clandestinidade esti- de comunicação de esquerda e instrumento de
vera presente em toda a trajetória do jornal na ampliação de vozes negras. Sua distribuição
segunda metade da década de 1970. Esses eram tinha como foco leitores negros interessados em
os tempos de ditadura militar e governo Ernesto pensar e agir sobre a questão racial no Brasil e
Geisel, ainda sob forte cerceamento à liberdade no mundo. O jornal era entregue de forma gra-
de imprensa, quando os militantes Milton Bar- tuita por seus próprios redatores nas ruas de São
bosa, Jamu Minka e Rafael Pinto somaram esfor- Paulo, circulando especialmente no viaduto do
ços para criar um jornal dedicado à denúncia do Chá e nos bailes blacks que encontravam pela
racismo existente na sociedade brasileira. Apesar cidade. É por isso que podemos retratá-lo como
das restrições às liberdades civis mantidas pela um jornal redigido por estudantes-militantes
ditadura, o Árvore das Palavras circulou prin- negros, que decidiram levar informação a seu
cipalmente pelas ruas da cidade de São Paulo público-alvo além dos limites da universidade.
entre 1974 e 1979. O nome que um dia carregou Temas considerados fundamentais para a res-
está relacionado ao hábito africano de se reunir surgência do movimento negro e a luta contra o
embaixo de baobás gigantes para a contação de racismo tiveram destaque nas páginas do Árvore
histórias e transmissão de conhecimentos sociais. das Palavras. São alguns desses temas: o apro-
A realização do jornal aconteceu graças ao fundamento da consciência negra num país com
trabalho voluntário de estudantes e militantes racismo velado; alternativas à marginalização
negros. Era produzido em segredo no Centro social do negro; o racismo impregnado nos meios
Acadêmico da Faculdade de Economia da Uni- de comunicação da época; a violência policial
versidade de São Paulo, onde Milton estudava contra pessoas negras nas periferias urbanas; o
Economia naquela época. Segundo ele, a criação autoritarismo e a repressão da ditadura militar;
do jornal foi inspirada na experiência histórica informativos internacionais, como as notícias da
do Clarim d’Alvorada, um jornal criado de forma prisão de um dos líderes dos Panteras Negras,
pioneira em São Paulo, nos anos 1920, sob a lide- Eldridge Cleaver, pelo Federal Bureau of Informa-
rança dos jornalistas José Correia Leite e Jayme tion; as revoluções de libertação de países africa-
de Aguiar.1 Em sintonia com esta experiência nos do colonialismo português; por último mas

15
não menos importante, a beleza do corpo e da nascidos no Brasil, ainda fortemente escravagista,
cultura afro-brasileira. do oitocentos. Assim como esta crítica, encontra-
Não era raro o Árvore das Palavras trazer mos outros artigos no Árvore das Palavras em que
discussões sobre a valorização do ser negro. De se procura desmistificar a benevolência da elite
modo geral, publicava textos provocativos para branca escravagista do passado. Também questio-
que seus leitores tomassem consciência de que nava a retórica governista de Geisel que valorizava
sua beleza não precisaria ser semelhante à dos o mito da democracia racial – um dos pilares ideo-
brancos.2 O jornal também publicava textos que lógicos do regime militar então vigente.
valorizavam a capacidade de trabalho da popu- É preciso não perder de vista o fato de que a
lação negra, a exemplo da atuação daqueles que produção do jornal era feita em tempos ditato-
tiveram muito destaque no campo das artes, riais. Portanto, ficava sob a vigilância do Serviço
como Nair Araújo, Nacional de Informa-
Madalena de Souza ção, assim como outros
e Família Vicente de jornais da imprensa
Paula. Havia entre os negra. Os redatores do
redatores uma preocu- Árvore das Palavras
pação com o respeito foram submetidos à
às produções de pes- lógica da suspeição
soas negras, almejando ditatorial, sendo tra-
que fosse maior. Assim, tados como inimigos
eles buscavam encora- da pátria e constan-
jar aqueles que tives- temente vigiados por
sem talentos artísticos agentes da polícia polí-
e intelectuais a faze- tica. Isso acontecia
rem suas produções porque os artigos do
sem sentimentos de jornal com frequên-
inferioridade. cia questionavam o
Já no que diz respeito discurso apaziguador
à política e ao governo, de unidade nacional e
o jornal trazia relatos harmonia racial esta-
sobre os encarcerados belecido pelos milita-
pela ditadura e fazia for- res no poder. As críticas
tes críticas à política de ao mito da democracia
segurança pública do racial, sobretudo, eram
governo Geisel, pois estaria resultando na repres- vistas como atos de subversão da ordem política
são não raro violenta da população negra, pobre e social. Na visão dos ditadores, tais críticas eram
e periférica do País. Na mesma linha de contesta- formuladas por representantes do comunismo
ções sociais feitas através do jornal, mas mirando internacional para que houvesse crescente infil-
na interpretação do passado da nação, estavam tração desta ideologia no Brasil.3
reivindicações pela releitura do processo aboli- Entretanto, o Árvore das Palavras é conside-
cionista do século XIX a partir de novos estudos rado uma iniciativa importante para o avanço da
históricos. Exemplo de tais reivindicações encon- luta contra o racismo em fins da década de 70.
tra-se em uma das edições do jornal em que se Segundo Milton, o jornal contribuiu para a for-
questionava a efetividade da Lei do Ventre Livre. mação, em 1978, do Movimento Negro Unificado
É que essa lei, segundo os redatores, gerou uma (MNU).4 Naquele momento, os redatores do jor-
falsa ideia de liberdade aos filhos de mães escravas nal e outros militantes buscavam construir uma

16 Imagem: Fundo Milton Barbosa, Afro-CEBRAP / AEL Unicamp


Imagens: Fundo Milton Barbosa, Afro-CEBRAP / AEL Unicamp

unidade para as ações do movimento negro em REFERÊNCIAS


âmbito nacional. A contribuição do jornal a este
1 O depoimento está disponível no
objetivo se deu pelo alcance ampliado da discus-
jornal Opera Mundi. Cf. Estanislau,
são de temas então candentes. Um dos principais Lucas & Angelo, Tiago. Árvore
avanços obtidos foi a formação de consenso em das Palavras: um jornal negro
torno do simbolismo do dia 20 de novembro, em contra a ditadura. Disponível
referência à morte de Zumbi dos Palmares, como em: https://operamundi.uol.com.
br/memoria/48394/arvore-das-
data de promoção da consciência negra no Bra-
palavras-um-jornal-negro-contra-a-
sil. O jornal propunha que a data de 13 de maio, ditadura. Acesso em: 08 nov. 2021.
relativa à abolição da escravidão, fosse dedicada à
2 Esses textos eram especialmente
denúncia do racismo dos brancos. Nesse sentido, dedicados às mulheres negras.
destacava a organização de quilombos e outras
3 Kössling, Karin Sant’Anna.
formas de resistência escrava na história do Bra- As lutas antirracistas de afro-
sil, a despeito da imagem que muitos tinham de descendentes sob vigilância do
benevolência das elites brancas. DEOPS/SP (1964-1983). Dissertação
(Mestrado em História Social).
Por ter contribuído para a formação de consen-
Faculdade de Filosofia, Letras e
sos entre militantes, o Árvore das Palavras termi- Ciências Humanas da Universidade
nou seus dias, em 1979, saindo da clandestinidade de São Paulo, São Paulo, 2007.
para compor repertórios e formas de luta política 4 Estanislau, Lucas &
do MNU em pleno espaço público brasileiro. Angelo, Tiago. Op. cit.

17
ARTICULAÇÕES
& DIÁLOGOS

Cada acervo pode contar uma história que pos- mostra como o debate entre raça e classe foi feito
sui várias histórias dentro dela. É assim com o no Brasil a partir de sua atuação no Sindicato dos
Acervo de Milton Barbosa. A partir da reunião de Metroviários de São Paulo; também conseguimos
documentos de uma vida toda, é possível contar observar a concretização de articulações interna-
a história de atuação política de Milton Barbosa cionais com os povos africanos da diáspora, entre
e ao mesmo notar as histórias das organizações outras tantas lutas.
às quais Milton esteve vinculado, das quais ele Assim, este acervo tem muitas vozes por meio
participou e com as quais contribuiu. de um ator e a memória negra vai contando a
Desta forma, emergem pequenas historias ou história de forma plural, mostrando conflitos e
grandes tendências que se entrelaçam com pes- consensos, ideias, ações, reações, eventos supos-
soas, entidades e temas do associativismo negro. tamente independentes e os processos políticos
Temas como sindicalismo, socialismo, o engaja- que os produziram.
mento na luta de classes e a luta anti-imperialista
se fazem presentes neste arquivo. Embora umbi-
licalmente ligado ao Movimento Negro Unifi-
cado, o acervo mostra as alianças do movimento
negro com organizações ligadas aos direitos
humanos, a interlocuçao entre a imprensa negra
e os movimentos culturais negros. Como Mil-
ton liderou a denúncia da violência policial, foi
fundador e filiado ao Partido dos Trabalhadores,

18
TEMA

REPRESENTAÇÃO POLÍTICA

Imagens: Fundo Milton Barbosa, Afro-CEBRAP / AEL Unicamp

OS NEGROS E AS ELEIÇÕES DIRETAS [c. 1984-85]


por Gustavo Mesquita

Temos aqui uma análise política da situação do aumentava a cada dia. A conclusão do texto é a de
negro nos momentos finais da ditadura militar que a eleição direta para presidente da República
brasileira. Embora o documento não apresente seria fundamental ao negro naqueles momentos.
uma data, é provável que tenha sido escrito O livre exercício do voto em candidatos e partidos
durante os anos do governo João Figueiredo, legítimos fortaleceria a volta à democracia, assim
o último governo da ditadura militar. Nesses como a representação de interesses organizados
tempos, o processo de abertura política avan- da população negra na arena política nacional
çava com força e a esperança das oposições se tornaria possível pela via do voto, a princípio,
pela implantação de um novo sistema político para presidente.

19
TEMA

REPRESENTAÇÃO POLÍTICA

Imagens: Fundo Milton Barbosa, Afro-CEBRAP / AEL Unicamp

NÊGO – BOLETIM INFORMATIVO DO MOVIMENTO NEGRO UNIFICADO / BAHIA [1984]


por Gustavo Mesquita

O editorial de 1984 do informativo do MNU, seção abertura polítca, da redemocratização e da luta


Bahia, também saiu em defesa das eleições dire- popular pela Assembleia Nacional Constituinte.
tas para presidente da República. Porém, mais O editorial trouxe a posição do MNU quanto à
do que uma tomada de posição em assunto construção da democracia brasileira: “A conti-
eleitoral, o MNU colocou-se neste documento nuidade da luta por eleições livres e diretas já
como representante plenamente constituído dos através da mobilização popular nas ruas é funda-
interesses da população negra em face de um mental no processo de conquista da democracia
novo tempo que se anunciava com o avanço da que o povo exige”.

20
Imagens: Fundo Milton Barbosa, Afro-CEBRAP / AEL Unicamp

AFRO-PARLAMENTO – INFORMATIVO DO NÚCLEO DOS PARLAMENTARES


NEGROS DO PT NO CONGRESSO NACIONAL [2005]
por Gustavo Mesquita

Deputados e senadores negros em atuação pelo a divulgação de ações realizadas no sentido do


Partido dos Trabalhadores criaram o Núcleo projeto da bancada. O informativo também
de Parlamentares Negros do PT no Congresso divulgava o processo de tramitação de projetos
Nacional (NUPAN) depois da posse de Luiz Iná- de lei nas duas casas legislativas, bem como os
cio Lula da Silva na presidência da República, resultados alcançados pelos parlamentares do
visando ao projeto de criação de uma bancada NUPAN com foco na proposta de um Brasil-nação
parlamentar negra unificada. O Afro-Parlamento com igualdade racial.
era um informativo congressista que servia para

21
TEMA

VIOLÊNCIA POLICIAL

Imagens: Fundo Milton Barbosa, Afro-CEBRAP / AEL Unicamp

CARTA ABERTA À POPULAÇÃO [26/jun/1980]


por Silvia Aguião

Retrata momento de reação conjunta de movi- Movimento Negro Unificado, organizações do


mentos sociais organizados em torno de diferen- então chamado Movimento Homossexual Brasi-
tes pautas frente à violência policial. No contexto leiro, movimentos feministas, de mulheres e de
da cidade de São Paulo no início dos anos 1980, prostitutas. As palavras de ordem que encerram
operações policiais espancavam e prendiam, a carta reúnem pautas em torno de raça, classe,
sob a acusação de vadiagem, especialmente sexualidade, sexo/gênero, liberdade de expressão
negros, homossexuais, travestis e prostitutas. A e direito de ir e vir.
Carta Aberta trata de um abaixo-assinado exi-
gindo a destituição dos delegados responsáveis
e o fim das “batidas” policiais e menciona o ato
público que havia sido realizado em frente ao
Teatro Municipal em 13 de junho de 1980 pelo

22
Imagens: Fundo Milton Barbosa, Afro-CEBRAP / AEL Unicamp

CAMPANHA “MANO NÃO MORRA, NÃO MATE” [2003–2005]


por Fillipe Alves

A Campanha com foco na juventude negra, mas recuperação da autoestima, formas de enfrenta-
que se estende para todos que “sofrem discri- mento à violência racial, promoção da saúde e
minações”, busca subverter a ordem narrativa busca por empregos. Os boletins produzidos para
imposta sobre jovens negros colocando os mes- a campanha, ao noticiar as mortes de pessoas
mos como vitimas e não agentes promotores da negras pela polícia, o fazem sob uma perspectiva
violência. Obteve adesão e apoio de artistas da crítica e humanizada ao nomear e racializar as
cena hip hop como Racionais MC’s, Fato expres- vítimas. Contavam também com chamada para
sivo e do grupo Cultural Força Ativa. “Mano, não marchas, palavras de ordem, empoderamento
morra. Mano, não mate” surge com o objetivo de e protesto, além de abordar questões econômi-
conscientizar a juventude negra e periférica de cas, políticas e trazer artigos de opinião, poesias
sua condição racial e social, e instrumentalizar e divulgação de eventos voltados para a popula-
esses jovens para o enfrentamento do genocídio ção negra.
negro em curso. A campanha atua por meio da

23
TEMA

VIOLÊNCIA POLICIAL

Imagens: Fundo Milton Barbosa, Afro-CEBRAP / AEL Unicamp

CAMPANHA “REAJA À VIOLÊNCIA RACIAL” DO MNU [1978]


por Paulo César Ramos

Quase como um sinônimo, a violência racial é Nela, a violência policial aparecia como um dos
entendida como a ação brutal e letal da polícia problemas ligados à violência racial, ao lado
contra pessoas negras, ou seja, como violência da representatividade política, hiperencarcera-
policial, a violência que sempre esteve na agenda mento, desemprego, evasão escolar, controle de
do movimento negro contemporâneo desde a natalidade etc. Assim, a pauta da violência poli-
sua fundação. Muitas vezes, o movimento negro cial ganha contornos estruturantes da sociedade,
atuou nesta pauta de modo reativo, isto é, rea- segundo o diagnóstico do movimento negro, por
gindo a casos em que a polícia violentou ou um lado, e por outro, a ideia de violência passa
matou algum jovem negro. O caso mais simbó- a ser associada diretamente ao racismo, assu-
lico é o de Robson Silveira da Luz, morto em 1978 mindo, assim, um significado aberto e inclusivo,
por consequências de torturas sofridas numa para acolher todas as experiencias de violação da
delegacia na cidade de São Paulo. Contudo, mui- população negra no Brasil. Foi assim que o MNU
tas vítimas foram se somando a este processo abordou, nos anos 1990, com centralidade na
político. Para sair da forma reativa de protesto, o agenda da organização e estratégia para enfren-
Movimento Negro Unificado desenvolveu, a par- tamento do tema da violência racial.
tir de 1991, a campanha Reaja à Violência Racial.

24
TEMA

MULHERES NEGRAS

Imagens: Fundo Milton Barbosa, Afro-CEBRAP / AEL Unicamp

JORNAL NACIONAL DO MOVIMENTO NEGRO UNIFICADO [1993]


por Maria Júlia Ananias

O documento reproduz o depoimento de Luiza famílias pobres, majoritariamente chefiadas


Bairros, então Coordenadora Nacional do MNU por mulheres negras que, por sua vez, têm seus
e do Grupo de Mulheres do MNU - Salvador, na direitos reprodutivos violados por uma política
Comissão Parlamentar de Inquérito proposta de controle de natalidade compulsória. A então
pela Deputada Federal Benedita da Silva para Coordenadora Nacional do MNU reflete sobre
investigar a esterilização de mulheres no Brasil, a necessidade de criar políticas públicas mais
em 1992. O texto expõe a esterilização em massa humanas e efetivas, que considerem o quadro
como uma expressão da violência racial e de nacional mais amplo de desigualdades sociais e
gênero no Brasil, uma vez que a prática incide, raciais, no qual o racismo é um fator fundamen-
em sua maioria, sobre mulheres negras e pobres. tal de (re)produção da pobreza.
Bairros aborda a necessidade de refutar o mito da
democracia racial, reforçado sobretudo durante
a ditadura militar como tentativa de esconder as
tensões raciais e promover uma suposta unidade
nacional. Resgata a luta do movimento negro
contra discursos e práticas que responsabilizam

25
Imagem: Fundo Milton Barbosa, Afro-CEBRAP / AEL Unicamp
Esta publicação foi composta com as
fontes Source Serif, Chaney e VTC
Du Bois. Esta última é o resultado do
trabalho realizado pelo designer afro-
-estadunidense Tré Seals, fundador
da foundry independente Vocal Type,
especializada em trabalhos de res-
gate tipográfico a partir da Memória
Gráfica dos movimentos negros esta-
dunidenses. A família VTC Du Bois
homenageia o trabalho pioneiro de
visualização de dados e ativismo rea-
lizado pelo sociólogo W.E.B. Du Bois
nos estudos The Georgia Negro: A Social
Study e A Series of Statistical Charts
Illustrating the Condition of the Descen-
dants of Former African Slaves Now Resi-
dent in the United States of America.

Você também pode gostar