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Armando:_______ _________________
Marine:_________ _________________
Hippie:_________ _________________
Carminha:________ ________________
Natureza:________ _________________
Sol:__________
Lua:___________ __________________
Bartolomeu:____ __________________
Verônica:________ ________________
Sofia:__________ __________________
Francisca:________ _______________
CENA 1:
Armando e Marine
CENA 2:
Armando, Hippie, Carminha, Natureza, Sol e Lua
CENA 3:
Hippie, Carminha, Bartolomeu e Verônica
CENA 4:
Sofia, Hippie, Bartolomeu e Maricleuza
CENA 1 (1953) – ARMANDO SENTADO À MESA IMPACIENTE.
ENTRA MARINE COM UMA BANDEIJA COM UM PRATO DE SOPA.
ARMANDO – Mas esse médico é um irresponsável! Será que ele não sabe que se eu
passar um dia fora da empresa eu perco lucros incríveis?
MARINE – Irresponsável é quem não cuida da saúde. Já estavas há três semanas trancado
naquele escritório sem te alimentares e sem te divertires.
MARINE – eu tenho algo pra te contar que, suponho, vai-te deixar mais excitado do que a
valorização do euro.
ARMANDO – Repete...
ARMANDO – Repete...
ARMANDO – Mas como, se faz cinco meses que nós não... tu sabes!
ARMANDO – Lembro, mas nessa mesma noite a televisão do vizinho estava alta e eu
escutei que as bolsas europeias tinham fechado em baixa e aí...
MARINE – E aí?!
MARINE – Não, e agora eu fiquei grávida para te provar isso. Agora me fazes o favor de
soltar essa faca?
MARINE – Que bom, meu amor, porque da última vez que brigámos tive que chamar o
Padre Geraldo.. vou guardar essa faca na cozinha!
ARMANDO – Na verdade isto é muito bom! Eu não consigo aceitar a idéia de não ter um
varão para herdar as minhas empresas, as minhas casas, o meu capital...
ARMANDO – Deus não seria assim tão injusto comigo. Mas temos que contar com essa
probabilidade... ao passo que, se for mulher, estamos na década de cinqüenta e hoje em dia,
as mulheres já estão alcançando cargos que há alguns anos nem sonhariam alcançar. Sendo
assim, se for menina, daremos a ela o cargo de minha secretária e trataremos de fazer um
filho macho para me substituir.
MARINE – Oh, querido... tu és tão liberal, previdente, maravilhoso e … rico... E agora que
sabes que eu não sou interesseira, podemos finalmente nos casar... Afinal, já são SEIS
MESES juntos, as pessoas já estão a começar a comentar...
ARMANDO – Casaremos assim que esse rapaz nascer. Eu quero ver a cara dele e se o
bébé for que nem eu: bonito, simpático, inteligente, trabalhador...
MARINE - ...modesto...
ARMANDO – Isso, modesto também e com cara de quem sabe o que quer..., eu casarei
contigo.
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ARMANDO – Se já não bastasse aquela amostra terrível de poluição sonora, fazes ranger
o soalho?! Faz silêncio que eu quero ler!
HIPPIE – O quê...queres que eu fique nu? Boa, sempre quis andar que nem os índios:!
HIPPIE – Ah, sei lá, que meu cabelo é fixe, que estou na moda?!
ARMANDO – Não, que você é a escória da humanidade, o ser mais abominável, o terror
de todas as culturas! Em suma, um lixo!
HIPPIE – Paizão, mas foi o máximo! Não dá para escreveres tudo isso que falaste pra eu
chatear a malta da escola? Eles vão achar muito baril!
ARMANDO – Eu até gostaria de escrever. Mas eu aposto que nem ler tu sabes... já leste a
Bíblia, meu filho?
HIPPIE – calma aí velhote, também não é assim! Só tenho dificuldade com as letrinhas de
mãos dadas. Se escreveres com letra de máquina, tá tudo nos conformes. Bíblia é aquele
livro muita groooooooooooosso que tem um monte de letras de mãos dadas, bem pequenio
assim...
ARMANDO – Foi pra isso que eu te eduquei? Para meia dúzia de vagabundos te tirar do
teu caminho?
HIPPIE –O meu bando não tem 3 pessoas! tem 12 pessoas! É muito fixe... a gente fica
cantando debaixo da lua amiga e vendo o tempo passar... É tudo tão lindo,... Até tu, ficas
lindo embaixo de uma lua...
ARMANDO – O quê?!
CARMINHA – E aí, bacano, como é que tás? Trouxe uns amigos aí pra conhecer a tua
casa. Oh! Sr Armando, deixa -me apresentar para o SR.. esse é a Natureza, o Sol e esse...
HIPPIE – É que meu velho resolveu ter uma conversa de seca, justamente agora!...
ARMANDO – Mas Carminha, você era tão inteligente... Que desperdício! E agora?
CARMINHA – Calma, peace and love, velho, essa coisa de inteligência é relativo, topas?
Por exemplo, o hippie é o único grupo que consegue conversar somente com vogais!
Queres ver?
HIPPIE – E aí?
CARMINHA – É?!
HIPPIE – É, ô...
CARMINHA – Ah!
HIPPIE – Gostou, paizão? É um clássico, deveria ser publicado no New York Times... já
tem até nome: “Óéaiéah”
ARMANDO – Mas dói-me o coração de saber que tu não pretendes trabalhar, constituir
uma família, ir à igreja...
HIPPIE – Bom, constituir família eu constituo, é fácil... tudo sobre control! (O pai fica
mais aliviado)
ARMANDO – E quanto ao trabalho?! Lembre-se, meu filho: “Deus ajuda quem cedo
madruga”.
SOL – É assim que se fala: “Quem cedo madruga... fica com sono o dia inteiro”!
NATUREZA – Água mole em pedra dura... tanto bate que acaba a água!
LUA – Se Maomé não vai à montanha... então ele vai à praia, ao campo, ao shopping...
CARMINHA – Na verdade, bacano, essa coisa de sociedade é relativa... Como queres que
eu acredite na tua sociedade, se tu vestes essa roupa de marciano?
HIPPIE – “Caretino”, isso sim!Tu és o meu pai, velho, então, deves ter algo de mim!
Aposto que ainda não aprendeste a expandir a mente...
ARMANDO – Claro que aprendi. Eu leio muito e assim expando a minha mente!
CARMINHA –Velho, decididamente tu não estás lá! Estou a falar de expandir a mente...
não forçar a vista! Eu expando a minha mente todo dia... Queres ver o meu exercício de
ioga?
ARMANDO – Ai, poupa-me! Afinal de contas, o que eu posso fazer para vocês saírem da
minha frente?!
HIPPIE – Bom, eu queria a chave do carro para levar a Carminha para dar umas voltas...
ARMANDO (Colocando a mão no bolso) – Está bem. Desde que você não resolva ir até a
Califórnia com o meu carro...
ARMANDO – Espera aí!! Tu não podes conduzir... Tem menos de dezoito anos!
HIPPIE (Com sarcasmo) – E você tem mais de sessenta e cinco... Também não pagas o
autocarro ! Nada de aristocracia, velho! Vamos directos ao assunto. Vais- me dar a chave
ou não?
ARMANDO – Não!!!
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HIPPIE – Hiiii, tá muito quieta esta casa!Que silêncio! Como eu posso ler desta forma?!
HIPPIE – EU ODEIO ESTA MÚSICA! Gostar de música clássica ainda vai, mas “IL
DIVO”, não! Olhem só este jornal... sempre a mesma porcaria: a águia carniceira(USA)
continua a criar estratagemas políticos para dominar o mundo! Não é a toa que meu pai, de
um dia para o outro, largou tudo o que tinha e foi morrer em Paris ao lado da minha mãe. Já
minha mãe é uma verdadeira burguesa... Ao saber que meu pai havia deixado tudo para
mim, só não o matou porque ele já estava com o pé na cova. Ô Carminha!Estás me a ouvir,
Carminha???
CARMINHA (Com um avental de cozinha) – Não escuto nada quando estou a cozinhar...
Já estou de cansada de todos os dias a mesma conversa! Não ser rico, vá lá... mas daí doar
tudo que teu pai deixou para o Partido Comunista foi burrice demais... Agora estamos nós
aqui pobres e mal pagos! Espero que o nosso filho não cometa os teus erros!
HIPPIE – Espera aí, ó meu! Que tipo de roupa é essa? Queres sair dessa maneira?!
BARTOLOMEU – Ai, pai... é que eu estava a mexer nas coisas velhas e achei este fato
que era do Avô. É um Valentino... custa uma fortuna!
HIPPIE (Atônito) – Isto é culpa tua, Carminha!!! Não amamentou o gaiato direito!
CARMINHA – Culpa minha ! Culpa tua que insistis-te no curso de ioga quando estava
grávida. Numa das aulas ele deve ter batido com a cabeça em algum sítio
HIPPIE – É que eu pensei que a ioga fosse ajudar o nosso filho a nascer saudável!
CARMINHA – Pois é, idiota! E o pior é que ele nasceu saudável até demais! Olha só pra
ele... tanta coisa pra ele achar no baú velho, tantas lembranças boas e ele me encontra logo
esse maldito fato! Ele nasceu desmiolado, bacano! Também,ficavas gritando o nome do
Che Guevara no ouvido dele o tempo todo!
HIPPIE – “Bartolomeu”... Isso é nome de gente? Isto foi culpa tua! Foste tu quem lhe deu
o nome . Não me escutaste... os nomes que eu queria eram muito mais interessantes.
HIPPIE – Caso ele não soubesse muito a sua opção sexual e quisesse optar quando
estivesse adulto!
HIPPIE (Cortando) – Eu sei, meu filho... toda gente sabe... ninguém precisa ouvir isso!
BARTOLOMEU – Pai… mãe!!! Fiquem vocês sabendo que eu estou noivo!! E ela já deve
estar a chegar para irmos à ópera.
HIPPIE – NOIVO?!?!? Carminha, este rapaz não pode ser meu filho! Ele perderá os
melhores anos da sua vida!
BARTOLOMEU – Não sei porquê tanta histeria. Afinal, tu também casaste cedo
HIPPIE – Mas o nosso relacionamento sempre foi muito aberto e democrático, sem
nenhuma ditadura!
CARMINHA – O nome “Bartolomeu” também foi a pedido do seu pai, amor... por isso eu
dei esse nome foleiro para ele.
CARMINHA – Claro que sim, Bartinho... Qual é o nome da sua alma gémea?
VERÔNICA – Não, meu senhor eu sou Brasileira, de Recife, mas vivo em Portugau fazem
muitos anos.
CARMINHA (Excitada) –Hiii... ó amor estes dois… é tão excitante! Lembraste da nossa
juventude, nós dois na praia,
HIPPIE – Se me lembro?.Hiii.. a gente com a areia, a areia com a gente... a gente com a
lua, a lua com a gente... a gente com o mar, o mar com a gente... a gente com...
HIPPIE – Mas está-me a faltar inspiração! São vocês que me perturbam, tal e qual o teu
avô fazia!
CARMINHA – Espirituoso?!
HIPPIE – Mas voltando ao assunto, rapaz! O que é que pretendes da vida vestido dessa
maneira?
BARTOLOMEU - ...trabalhar...
HIPPIE – O QUÊ???????
CARMINHA –Queres matar o teu pai de desgosto, meu filho?! trabalhar?! Tu só tens
dezassete anos!
VERÔNICA – Mor, não contou para seus pais sobre emprego na fábrica de caipirinhas de
me papai?
BARTOLOMEU (Aturdido) – Pois é... eu... eu ia deixar para falar com vocês num
momento mais oportuno, mas eu... eu... eu arranjei um emprego!
HIPPIE – Aposto que ele só faz isto para nos contrariar, Carminha, nos punir... deve existir
alguma cura... deve existir... PSICOLOGIA!!! Vamos mandá-lo para os Açores!
CARMINHA – Os tempos mudaram, bacano... antes nós faziamos de tudo para ter um
cantinho escurinho para namorar. Hoje, estão pensando em namoro virtual,... Estamos em
1987 e agora ficam vários imbecis namorando através de computador... Depois, os tolinhos
somos nós!
HIPPIE – E o que fizeram com o rock?! O QUE FIZERAM COM O ROCK???? As nossas
violas tocando em troca de algumas moedas na rua... hoje, a música é produto usa deita
fora, vem uma música, vende e é descartada, até surgir outra mais interessante mais
popular, é Pimba!
BARTOLOMEU – Bom, pai... mãe... não me queiram mal, mas eu vou tomar uma atitude
e eu acho que vou ter que...
HIPPIE – O QUE??? (Esperançoso) vais fugir de casa... partir tudo... mandar-nos à
fava?!
HIPPIE – Espera, filho... toma lá as chaves do carro... e vai à tua vida,... toma conta do
carro também... ele era do teu avô e creio que ele ficaria muito feliz ...
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FRANCISQUINHA – É não é? Está Bem... mas quem vai ter que limpar esta procaria
toda, pra variar, sou eu, não é...?
HIPPIE – Qual é minha filha... Não stresses, deixa tudo assim mesmo.
HIPPIE – Ihhhhhhhhh...
SOFIA – Merda!!!
BARTOLOMEU – CHEGA, PAI!!! Estás a viciar a minha filha com esses hábitos
rebeldes sem causa. Se não fosse o meu sucesso,estarias perdido e se não fosse a minha
gestão, tu pegarias em todo o dinheiro e o doarias para o partido comunista.
HIPPIE – Eu não sou má influência para a menina. Ela sabe discernir qualquer porcaria,
do que é certo e errado! Queres ver?
SOFIA – Treze!
SOFIA – A China!
SOFIA – Cubano!
SOFIA – Preto!
SOFIA – Lisos!
HIPPIE – E amaciador?
SOFIA – Sofia!
SOFIA – Afrodite!
BARTOLOMEU – Afrodite??
HIPPIE – Ihhhhhh.. Afrodite é a deusa da beleza! Que raio de maestro é este que não sabe
mitologia?
BARTOLOMEU –! Eu passo a semana toda fora, a viajar e olha o que tu fazes com a
minha filha... tu sabes muito bem que eu não gosto desses nomes esdrúxulos! Parece coisa
de gente sem família. O nome da minha filha é Sofia! E trata de tirar esse boné horroroso
da cabeça! (ELA TIRA O BONÉ) Sofia tem nome e sobrenome. Sobrenome esse que eu fiz
com que todos conhecessem nos quatro cantos do mundo!
HIPPIE – Se não confias em mim, por que não a levas contigo?
BARTOLOMEU – Ora, pai... Porque ela precisa ficar para tomar conta de ti!!!
HIPPIE – Olha lá, não me venhas com essa! Tu deves achar-me um irresponsável, mas ela
tem que saber que tem cabeça própria e que pode fazer o que quer.Ela é inteligente, sabe
filtrar o que eu digo, e tira o que ela acha que é certo!
BARTOLOMEU – Eu devia fazer como a mãe... Largar -te por aí... mas não, eu cuido de
ti , te ajudo e olha como tu me recompensas...
HIPPIE – Ei, ei! Que conversa é essa de me largar por aí?! Não me venhas dar uma de
importante para cima , bacano! Eu sou um bacano mais vivido que tu, sei mais da vida que
tu e agora tu me abandonas como se fosse um vinil trocado por um CD? Só porque tem
mais brilhosinho, é pequenininho, e “compacto”. Eu posso não ser compatível, meu filho,
mas eu sou real e sincero.
HIPPIE – Obrigado, eu sei... eu acho que tu terias gostado de conhecer a minha velha...
HIPPIE – Não, essa é minha mãe, a sua bisavó. Eu estou a falar da mulher com quem um
dia eu estive casado...
HIPPIE (Com lágrimas nos olhos) – Sim... a que se separou de mim e está completamente
fora do meu alcance...
SOFIA – Aposto que ela está no céu com saudades de ti, avô...
HIPPIE (Querendo sorrir) – É... ou então ela está no limbo fumando um bom charuto
cubano...
HIPPIE – Para mim, ela pediu que eu cuidasse da Sofia, ensinando coisas boas pra ela.
BARTOLOMEU – Ela pediu-me… dramaticamente para que eu nunca mais usasse este
pijama...
HIPPIE (Sorrindo) – Uma vez Carminha, sempre Carminha... Eu teria pedido o mesmo!
Esse pijama é uma porcaria! E porque é que tu não lhe satisfezeste esse ultimo desejo.
BARTOLOMEU – É assim…! Eu odiava –os , mas vocês eram tudo que eu tinha e ao usar
esse ridículo pijama, presente francês da avó, eu sabia que um dia vocês iriam bater na
porta do meu quarto para reclamar da exacerbada falta de vergonha por usar algo de tão
mau gosto. Por incrível que pareça, eu gostava , fazendo de mim o que eu sou hoje...
HIPPIE - ... um bom rapaz, bondoso, que me deixa morar aqui, com vocês...
SOFIA - ... um pai amigo, que é famoso e que me deu uma playstation...
SOFIA – Eu também!
HIPPIE – Agora vai, meu filho, pois eu tenho que ensinar a Sofia a passar de fase neste
jogo .
BARTOLOMEU – Todos nós precisamos passar de fase, meu pai. também precisas passar
a tua...
HIPPIE – Boa... Onde foi que aprendeste a falar em metáforas? Eu acho que vai demorar
ainda um pouco para eu mudar de fase , filho...
HIPPIE – Lembras-te daquele dinheiro que tu me deste depois de nossa última discussão?
BARTOLOMEU – Claro!!!
HIPPIE – Agora será a três: eu, tu e a Sofia, para lembrarmos os velhos tempos!
FIM