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ocê já se perguntou o porquê de as lendas urbanas

fazerem tanto sucesso? Afinal, são apenas simples


histórias, que buscam se validar através de fatos
narrados por indivíduos quase sempre fascinados pelo
extraordinário. Você pode pensar: “bem, é porque as lendas
urbanas são divertidas de se imaginar.” E é por isso que são tão
atrativas. Elas fogem do mundo ordinário e tedioso que vivemos.
Elas trazem consigo a fantasia. O desejo, o medo e o desconhecido.
Toda lenda urbana começa com um desejo, afinal, seria legal se
fosse verdade. Mas, você já parou pra pensar como seria uma lenda
urbana em um mundo de fantasia?
Em um mundo onde a magia é real, e o impossível é só
uma mera questão de opinião, o que seria de fato fantasia? Em um
lugar onde os sonhos mais loucos se tornam parte do dia-a-dia, e
as mais diversas criaturas e raças vivem por todos os lados, o que
seria o desconhecido? Nesse mundo, onde titãs caídos adormecem
sobre o solo, ou voam pelos ares, o que seria uma lenda urbana?
O que poderia ser diferente e extraordinário o bastante
para despertar o sentimento de interesse por histórias únicas e que
seriam legais se fossem verdade?
Primeiramente, precisamos entender os limites do que se
pode acreditar com facilidade e o que já fugiria do senso comum.

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Por exemplo: uma história sobre um aventureiro Rank C
que matou dezenas de harpias não é tão difícil de acreditar.
Entretanto, dizer que ele as matou com as mãos nuas muda
completamente a situação, causando descrença. Mas ainda assim,
não é o bastante para se tornar uma lenda urbana.
Se dissermos que ele as matou de mãos vazias, e também
com muita dificuldade a ponto de custar o seu braço esquerdo, ela
já se torna mais acreditável, porém, ainda não seria considerado
uma lenda urbana, apenas um rumor ou boato.
As lendas urbanas nesse mundo não são tão simples de
serem criadas. Esqueça os fantasmas e espíritos, pois eles vagam
pelas florestas e ruínas. Não fale de armas mágicas amaldiçoadas,
pois elas existem aos milhares.
Ao invés disso, um rumor ou boato deve trazer um fato e
elevá-lo a um nível astronômico, onde até mesmo os olhos dos que
já viram de tudo irão se surpreender. E bem, existem algumas
lendas urbanas que circulam pelas cidades, vilas e vilarejos, capazes
de despertar um real interesse. Dentre elas, existe uma que
ninguém sabe a origem, e nem sequer ousam descobrir.
Começou como um mero boato. Um rumor contado em
bares ou durante expedições e caçadas. Aventureiros, cavaleiros e
caçadores de recompensas a tratavam como mais um mero
assunto.
O rumor era sobre uma dupla de caçadores de
recompensas, de identidades desconhecidas, que eram capazes de
vencer qualquer inimigo. Desde exércitos inteiros até titãs
colossais. Eles eram os responsáveis por inúmeros contratos de
dificuldade SSS concluídos, esses que em outras palavras, são as
missões mais difíceis do mundo.
Poucos detalhes eram fornecidos sobre eles. Cobertos com
vestes negras como a noite, olhos rubros e brilhantes em máscaras
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perturbadoras, repletos de uma sede de sangue e brutalidade
intensas. Eles se autointitulavam: Hollows.
Entretanto, tudo mudou quando a Guarda Real anunciou
que uma recompensa, de um bilhão de moedas de ouro, seria dada
para quem capturasse-os com ou sem vida. Isso é dinheiro o
bastante para qualquer um construir seu próprio reino, o que os
colocou como os caçadores de recompensas mais procurados do
mundo.
Todavia, mesmo com a recompensa da Guarda Real, essa
lenda urbana continuou sendo uma lenda urbana, afinal, ninguém
nunca conseguiu sequer um único rastro de seus paradeiros. E os
mais determinados e preparados jamais retornaram pra suas casas.
E a partir da lenda dos Hollows, diversos rumores
começaram a surgir para tentar explica-la. Alguns diziam que se
tratava de uma pegadinha do Imperador, que apenas queria exibir
a sua riqueza. Outros afirmavam que os Hollows eram reais, mas
que não eram somente dois indivíduos, até porque é simplesmente
impossível realizar tantos feitos e ter tanto poder.
Sim, é um fato que os boatos falam que eles são caçadores
de recompensas. Estes que por sua vez são conhecidos por
cumprirem contratos de dificuldade SSS, os famosos: Contratos
Suicidas. Esses foras-da-lei são os monstros que o mundo chama
de Lenda Urbana Real.
Porém, até mesmo os próprios caçadores têm suas dúvidas
quanto à existência dos Hollows. E não é pra menos. É difícil crer
que dois seres são capazes de fazer o que vários clãs inteiros não
podem nem sequer começar.
De qualquer modo, enquanto o mundo discute sobre uma
lenda urbana, as outras se preparam para sair da escuridão.

◈◈◈
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Em algum lugar, esquecido pelo tempo e pelos deuses,
onde o conceito de tempo não existe e o vazio predomina, há um
rapaz deitado de barriga para baixo, apoiando o queixo com as
mãos.
Essa é a Dimensão dos Caídos. Não existe um fim. Apenas
o chão infinito e a sua escuridão. O piso se mostra sólido, porém,
é apenas água, que reflete o infinito acima. Não existem paredes ou
teto, apenas estrelas, como se o lugar estivesse flutuando no meio
da galáxia. Também é possível ver cadáveres de criaturas abissais
flutuando no horizonte, assim como esqueletos, planetas
destruídos, luas e supernovas se formando.
— Hã? É sério isso? Dez mil abates? Acho que é um novo
recorde! — diz o rapaz entusiasmado, um tanto exagerado, já que
até balançou as pernas para cima e para baixo rapidamente.
Não é possível ter detalhes de sua aparência por conta do
escuro, mas sua voz claramente não pertence a um adulto ou
criança. Masculina, porém leve e amigável.
Em sua frente, um enorme orbe flutuava, lhe mostrando
uma cena em tempo real, como se fosse uma televisão. Lá, um
massacre está acontecendo.
— Mentiraaaaa... como eles fizeram isso?! — claramente, o
guri não sabia empolgar-se sem berrar.
De repente, dezenas de círculos mágicos giratórios
surgiram a vários metros atrás do rapaz. Das águas, de cima e dos
lados, criando um formato retangular de mais de dez metros. Em
seguida, linhas azuis saíam das runas concentrando seu poder no
centro do retângulo, ligando-se umas com as outras em uma ordem
aleatória. No fim, elas brilharam e fundiram-se, criando um portão
sombrio acorrentado. E então, as correntes começaram a se partir.
À medida que o portão se abria, as águas agitavam-se, e
uma energia muito forte emanava dali. Até que enfim, o portão se
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abriu, e da escuridão, um ser caminhou lentamente para fora. As
águas de acalmaram imediatamente, e a energia sessou. Seus passos
na direção do rapaz apenas causavam leves ondulações, junto do
barulho de correntes sendo arrastadas.
Era como se a luz funcionasse melhor somente nele,
possibilitando vê-lo em detalhes. Um homem extremamente alto e
forte, coberto por um manto negro desgastado mais parecido com
sombras. Era possível notar restos de armadura em seu corpo. Já
em suas costas, quatro asas enormes com penas de corvo o
acompanhavam.
Seu rosto estava oculto por uma máscara branca suja,
contendo apenas buracos escuros e borrados onde um líquido
negro escorria. Na testa, um olho rubro esbugalhado repleto de
veias olhava para os cantos. E por fim, três pares de chifres
espalhados pela cabeça, quase alcançando sua auréola negra que
pulsava como um coração.
— Perdoe minha entrada nem um pouco sutil, majestade
— disse a criatura, com voz rouca e penetrante. Imediatamente,
ajoelhou-se.
— Ah! É você... Malphas?! — disse o rapaz, em um tom
relaxado e sério, virando levemente sua cabeça para a esquerda. —
O que te trás aqui? — em seguida, virou a cabeça para o orbe e
voltou a balançar as pernas.
— Vossa majestade havia pedido para que eu o lembrasse
que hoje é o dia de vosso... projeto. Tomei a liberdade de chegar
momentos antes do horário previs... — uma movimentação
estranha vindo das profundezas da água se iniciou. Algo vinha em
altíssima velocidade, até que finalmente colocou seu corpo para
fora.
Era uma criatura colossal. Somente seu tronco para cima
estavam fora da água, e chegava facilmente aos cem metros.
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Sua cabeça lembrava a de um tubarão martelo, com
diversos tentáculos saindo de sua boca. Sua forma era parcialmente
humanoide.
A criatura então rugiu, revelando fileiras enormes de dentes
e espinhos que preencheram os buracos pela sua couraça. Seus
olhos brilharam em vermelho e a criatura preparava-se para atacar.
— Nossa, que barulheira. Eu vim pra cá justamente pra ter
um pouco de silêncio!
— Não se preocupe, eu resolverei isso majestade. —
Malphas levantou-se lentamente.
A criatura rapidamente avançou na direção deles, porém,
ainda mais rápido, o olho da testa de Malphas encarou a criatura,
que imediatamente ficou paralisada. A criatura então começou a se
contorcer lentamente, como se seus ossos estivessem se partindo.
Malphas materializou sua foice e a pegou com a mão direita,
fazendo um breve corte sem sair do lugar na direção do oponente.
Mesmo havendo muita distância, o corte viajou até
encontrar sua presa e a atravessar, a cortando em um milhão de
pedaços e partindo até mesmo algumas luas que se encontravam a
quilômetros dali.
— Está feito, majestade — Malphas soltou sua foice, que
imediatamente desintegrou-se.
— Beleza, beleza. Agora fica xiu aí! — o rapaz ergueu uma
das mãos para o alto e a balançou — Eles tão quase na melhor
parte.
— Entendo. Manterei meu tom de voz menor, majestade
— Malphas dirigiu seu olhar para o enorme orbe após dar alguns
passos — Então esses são os caçadores que o senhor estava
procurando?
— Sim, são eles mesmo!

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— Entendi. Se quiser, eu mesmo me encarrego de ir
imediatamente até lá e...
— Quê?! É lógico que não! Já se esqueceu do motivo pelo
qual eu vim pra cá observá-los? E aliás... você não teria a menor
chance contra eles — terminou o imperador num tom
descontraído.
— ... entendo. Com todo respeito, majestade... mas eu não
sinto um grande poder vindo deles. Parecem apenas caçadores
comuns.
— Exato. É isso que eles querem que pensemos, que estão
fracos justamente para nos atrair... — disse o rapaz ao virar sua
cabeça para o lado novamente — ... pois eles sabem que eu estou
os observando.
— Hã? Mas como?! Eu pensei que as suas magias de
clarividência fossem indetectáveis! — respondeu Malphas
levemente impressionado.
— Pois é, e são... — o rapaz então deu um leve sorriso —
... é que eu dei um pequeno presente para eles, para deixar as coisas
mais divertidas — afirmou com um sorriso maligno e um brilho
vermelho em seus olhos, ainda com o corpo envolto das sombras
do lugar.
Os olhos dos dois se voltaram para o orbe, onde era
possível ver a imagem de uma pilha de corpos de criaturas em meio
as ruínas de uma cidade fantasma. No topo dos corpos, dois seres
repousavam, vestidos de roupas negras e banhados de sangue.
Tudo que ouviam era uma risada. Uma perturbadora risada.

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