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All content following this page was uploaded by Adriano Codato on 23 May 2016.
Vice Reitor
Rogério Andrade Mulinari
Conselho Editorial
Cleverson Ribas Carneiro
Cristina Gonçalves Mendonça
Edson Luiz Almeida Tizzot
Emerson Joucoski
Everton Passos
Ida Chapaval Pimentel
Jane Mendes Ferreira
José Carlos Cifuentes Vasquez
José Eduardo Padilha de Souza
Marcia Santos de Menezes
Como estudar elites
Renato Perissinotto
Adriano Codato (orgs.)
® Renato Perissinotto e Adriano Codato (orgs.)
Coordenação Editorial
Lucas Massimo
Revisão
Lucas Massimo e Fernando Leite
Capa
Indústria Inc.
Foto de capa
Renato Perissinotto
ISBN 978-85-8480-038-4
Inclui referências ao final de cada capítulo
Vários autores
CDD 305.5
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Como estudar elites
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Introdução
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Como estudar elites
Renato Perissinotto
Adriano Codato
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1. Metodologias para
a identificação de elites:
três exemplos clássicos
Adriano Codato
1
Para ilustrar, mencionamos aqui alguns trabalhos em cada domínio. Para backgrounds
sociais, ver (GÖHLMANN; VAUBEL, 2007; MATTHEWS, 1962). Para estudo de padrões de
carreira na política ver (BORCHERT; ZEISS, 2003; SCHLESINGER, 1966). Sobre valores de
elites, ver (CZUDNOWSKI, 1983; POWER; ZUCCO, 2012; PUTNAM, 1973). Sobre conflitos
intra-elite, ver (CODATO, 2015; HOFFMANN-LANGE; NEUMANN; STEINKEMPER, 1985).
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Como estudar elites
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Metodologias para a identificação de elites
Quadro 1. Poder, influência e processo decisório conforme os métodos posicional, reputacional e decisional
2
Dahl fornece uma descrição detalhada do método no apêndice do livro. É preciso calcu-
lar o número de iniciativas ou vetos bem-sucedidos de cada participante em uma decisão
e o número de insucessos. Em seguida deve-se considerar como mais influente o parti-
cipante que tiver a mais alta taxa de sucessos ou tiver a mais alta relação entre os seus
sucessos e o total de suas tentativas. Ver Dahl (1961, p. 331–333).
3
Hunter expõe minuciosamente o procedimento da pesquisa no apêndice. Ver Hunter
(1953 Apêndice).
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Como estudar elites
4
O DIAP faz entrevistas com os próprios deputados federais e senadores, e também
com os assessores da Câmara e do Senado, jornalistas, cientistas políticos e analistas
de conjuntura.
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Metodologias para a identificação de elites
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Para um panorama desse debate, ver a entrada Community Power Debate na Encyclo-
pedia of Power (DOWDING, 2011, p. 122–126).
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Como estudar elites
3. O método posicional
De acordo com Wright Mills (1956), os membros da elite são aqueles que
“ocupam as posições estratégicas de comando da estrutura social”. Essas
posições, por sua vez, são estratégicas porque controlam “as principais hie-
rarquias e organizações da sociedade moderna”: o aparelho do Estado, as
forças armadas e as grandes empresas capitalistas.
Em que pese a tautologia embutida na definição de quem é a elite, di-
zemos que esta é uma definição “posicional”, uma vez que a elite é discri-
minada em função das posições de comando que ela ocupa. Essas posições
são “institucionais”, isto é, para fazer parte da elite não é suficiente ocu-
par posições informais de mando, mas formais, nas principais instituições
econômicas, políticas e militares de uma dada sociedade. Escreve Mills: “A
riqueza não se centraliza na pessoa do rico. A celebridade não é inerente
a toda e qualquer personalidade. Ser célebre, ser rico, ter poder, exige o
acesso às principais instituições, pois [são] as posições institucionais [que]
determinam em grande parte as oportunidades de ter e conservar essas ex-
periências a que se atribui tanto valor” (MILLS, 1956 capítulo 1).
Isso posto – a elite é aquele grupo social que ocupa, controla e comanda
as principais instituições de uma comunidade –, poderíamos formular, a
partir de Mills, seguindo os passos do seu livro, uma lista de procedimentos
“metodológicos” para os estudiosos dos grupos dirigentes.
Em primeiro lugar, é preciso se perguntar: quais são as instituições mais
importantes de uma sociedade determinada? Sociedades são históricas,
isto é, suas características variam ao longo do tempo (e também geografica-
mente, frise-se). Assim, não há “a” instituição ou “a” organização que con-
centra desde sempre todos os meios de poder. Em segundo lugar, uma vez
determinada a ou as instituições principais, é preciso descrever seus traços
fundamentais: seu poder é abrangente ou não, ou seja, afeta muitas áreas
da vida em comum ou da vida de indivíduos?; essas instituições exercem o
poder em regime de monopólio, oligopólio ou são concorrentes?
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Metodologias para a identificação de elites
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Como estudar elites
munidade de interesses afins entre eles que devem ser perseguidos pelo gru-
po; e iii) unidade de “ação”: a proximidade entre os interesses perseguidos
pelas cúpulas das instituições centrais de uma comunidade pode produzir
uma ação coordenada entre elas a fim de atingirem mais facilmente seus
fins (MILLS, 1956 capítulo 1).
Essas etapas aqui descritas resumidamente foram pensadas por Wright Mills
para analisar uma sociedade. Podemos, entretanto, adaptá-las para uma insti-
tuição em particular. Por exemplo, se estudamos o Parlamento de um deter-
minado país, as mesmas questões se colocam. De saída: quem manda?; ou por
outra, quem é a elite do Legislativo nacional? Devemos assim buscar nas insti-
tuições formalmente descritas como sedes do poder essa resposta. Poderíamos
dizer: o presidente e todos os indivíduos que ocupam a mesa diretora da Casa.
A partir daí todos aqueles passos descritos acima precisariam ser dados: qual é
tipo de poder desse grupo e como ele é exercido; saber se esses indivíduos for-
mam um grupo coeso; que recursos eles conseguem mobilizar para chegarem
e se manterem nessa posição de “elite da elite” política; quais são as caracterís-
ticas desses indivíduos; qual o seu tamanho e o que os mantém unidos.
4. O método decisional
O método posicional para identificar qual é o grupo de elite é bastante in-
tuitivo e de fácil operacionalização. A elite é aquela que controla posições
formais de mando numa dada sociedade ou organização.
Mas o método posicional falha em três raciocínios básicos. Primeiro, as-
sume que quem controla as posições formais de mando possui, por isso,
a capacidade efetiva de tomar as decisões mais importantes para uma so-
ciedade ou organização, o que nem sempre é correto. Segundo, não leva
suficientemente em conta aqueles que têm o poder de impedir que certas
iniciativas de determinados grupos sejam transformadas em demandas; ou
impedir que essas demandas se tornem questões políticas e, a partir daí,
objeto de deliberação pelos governos; ou que, uma vez deliberadas, cer-
tas decisões sejam implementadas. E, terceiro, que só é possível saber se
um grupo de elite é elite e manda de fato, tem poder, estudando o ciclo do
processo decisório. É, segundo Robert Dahl, através da análise de decisões
concretas de governo que se pode determinar quem, efetivamente, possui a
capacidade de influenciar as decisões públicas. Este é o método decisional.
Os princípios do método decisional foram sistematizado por Dahl num
célebre artigo publicado na American Political Science Review em fins dos
anos cinquenta (1958). De acordo com ele, para se determinar quem gover-
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Metodologias para a identificação de elites
6
Tradução: “através de um exame de uma série de casos concretos onde são tomadas
decisões importantes: decisões sobre tributação e gastos, subsídios, programas de bem-
-estar social, política militar, e assim por diante”.
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Como estudar elites
5. O método reputacional
O método reputacional, como mencionamos mais acima, foi utilizado por
Floyd Hunter em Community Power Structure: A Study of Decision Makers
(1953). O livro conduziu os estudos sobre governo a um novo patamar ao
tentar compreender o jogo político olhando para grupos sociais específicos
de uma comunidade específica. Community Power Structure é uma pesquisa
monográfica sobre Atlanta, uma cidade média, à época com 500 mil pessoas,
no estado da Georgia, EUA. Hunter recupera e amplia os estudos políticos
de comunidades na tradição de Democracy in Jonesville (1949), de William
Lloyd Warner (STRONG, 1954). Trata-se de uma análise empírica sobre o que
é o poder, os tipos de poder que existem e como ele está distribuído entre os
grupos minoritários. Sua motivação é encontrar onde está, ou quem detém,
melhor dizendo, o “real power” por detrás do “formal power”.
Community Power Structure mostrou que o poder nos Estados Unidos
nos anos 1950 numa “regional city” estava concentrado – e não disperso
em múltiplos grupos de interesse que concorriam entre si. Além disso,
mostrou que se ele era gerido a partir da prefeitura municipal (adminis-
tration), não era ali que era produzido (policy). Esse poder estava reuni-
do nas mãos de uma pequena elite – top leaders –, formada por homens,
brancos, na sua maioria empresários de negócios e bancos, que estavam
interconectados, e as decisões que realmente importavam eram tomadas
no Piedmont Country Club. Nesse sentido, as análises de Hunter irão evi-
denciar que onde se decidem as coisas fundamentais, raramente (ou qua-
se nunca) são os comitês burocráticos, escritórios políticos ou repartições
administrativas formalmente designadas para tanto.
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Metodologias para a identificação de elites
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Hunter também entrevistou 34 líderes da comunidade negra e 14 assistentes sociais e
planejadores urbanos. Fez a eles a maioria das perguntas que ele tinha feito aos princi-
pais líderes da comunidade. A partir desse grupo de controle, ele foi capaz de precisar
as informações que possuía sobre as relações econômicas, políticas e pessoais entre os
poderosos (DOMHOFF, 2005).
8
<http://www.encyclopedia.com/topic/Floyd_Hunter.aspx>. Acesso em: 2 set. 2015.
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Como estudar elites
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Metodologias para a identificação de elites
Conclusões
Todos esses três métodos não se diferenciam entre si em um postulado. O
“poder” é sempre entendido aqui como “capacidade de tomar decisões”
(ou como a competência para influenciar aqueles que têm, formalmen-
te, a função política de tomá-las: prefeitos, burocratas, gestores, etc.). O
objetivo essencial desses três autores foi estabelecer um método onde se
pode provar que um grupo tem poder ou tem mais poder do que outros,
já que essa é uma medida relacional. Nesse sentido, toda a discussão se
concentra em torno da definição dos indicadores empíricos que serão
utilizados para testar se um determinado grupo – que pode ser político,
econômico, social, etc. – detém ou não poder e o quanto poder ele de-
tém. Mas esses procedimentos não permitem identificar quem impede
que decisões públicas sejam tomadas (embora os procedimentos descri-
tos por Floyd Hunter tenham um bom potencial para isso); nem quem
se beneficia das decisões dos governos. Assim, não devemos pedir mais
do que eles podem nos oferecer, por exemplo uma teoria política sobre o
mundo social. No entanto, há uma dificuldade maior e mais importante:
o que esses métodos não discutem é o que poderíamos chamar de os fun-
damentos estruturais do poder.
As condições de acesso a postos de elite, isto é, as colocações privile-
giadas numa comunidade, o controle desigual de recursos (econômicos,
políticos, ideológicos), e o grau variável de influência de certos grupos
sociais estão, conforme o postulado dos marxistas, condicionados funda-
mentalmente, ainda que não exclusivamente, por seu lugar na estrutura
social (OFFE; WIESENTHAL, 1984). Grupos – frações de classe, camadas
9
Ver sobre esse ponto a crítica de Dahl (1960) ao livro de Hunter (1959) sobre os EUA.
O método reputacional se assemelha com a técnica de construção de amostragens
snowball (“cadeia de informantes”). Ela consiste em descobrir, para o caso de popula-
ções pouco acessíveis, quem são os seus integrantes a partir de indicações sucessivas
dos seus membros (‘Discovering new influential individuals by asking others’). Ver para
mais detalhes Goodman (1961).
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Como estudar elites
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Para a expressão, ver Tarrow (1994).
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Metodologias para a identificação de elites
Referências
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em contexto autoritário. Dados, v. 58, n. 2, p. 305–330, jun. 2015.
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DOMHOFF, G. W. Atlanta: Floyd Hunter Was Right. First posted October 2005. Disponível em:
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Como estudar elites
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jul. 2009.
STONE, C. N. Economic Growth and Neighborhood Discontent: System Bias in the Urban
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30
2. O uso do survey no
estudo do recrutamento
político: limites e vantagens
Bruno Bolognesi
Renato Perissinotto
1
São os chamados estudos de aproximação longitudinal (Babbie, 2005).
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Como estudar elites
2
Para os impactos do recrutamento político sobre o funcionamento da Câmara dos De-
putados, ver Power e Mochel (2009) e Marenco dos Santos (1997); para um estudo sobre
filtros seletivos no processo de recrutamento para a mesma instituição, ver Perissinotto e
Bolognesi (2010) e Perissinotto e Miríade (2009); para o problema das motivações subjeti-
vas e sua relação com a profissionalização política, ver Perissinotto e Veiga (2014).
3
Existe um debate sobre em que medida surveys conseguem ou não captar opiniões. Cf.
Johnston, 2009. Nossa intenção aqui, porém, é focar o problema do uso do survey para o
estudo de processos. Ou seja, não estamos preocupados em captar a percepção dos in-
divíduos acerca dos principais problemas sociais de um país ou medir a taxa de intenção
de votos em determinado candidato nas eleições. Interessa-nos operar a reconstrução
mental pelo qual o entrevistado passou ao longo de um processo político.
4
O questionário foi elaborado para a pesquisa Como se faz um Deputado: a seleção
34
O uso do survey no estudo do recrutamento político
dos candidatos a deputado federal nas eleições de 2010. Essa pesquisa é fruto da co-
operação entre a Universidade Federal do Paraná (UFPR), Universidade Federal de São
Carlos (UFSCar), Universidade Federal do Pará (UFPA), Universidade Federal de Sergipe
(UFS) e Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS). A pesquisa foi
coordenada pelos professores Renato Monseff Perissinotto e Luciana Veiga, no Paraná,
Maria do Socorro Sousa Braga e Bruno Bolognesi, em São Paulo, Maria Luzia Álvares, no
Pará, Wilson Oliveira, em Sergipe e Flávio Heinz no Rio Grande do Sul. A discussão sobre
a amostra será retomada em momento oportuno. Por hora, basta saber que foram aplica-
dos 120 questionários distribuídos igualmente entre PT, PMDB, PSDB e DEM.
35
Como estudar elites
5
Spada e Guimarães (2013), é um exemplo desse problema.
6
Como sugere Simões e Pereira (2009) ou Babbie (2005). A sugestão é no sentido de que
temas não explorados ou que contam com parcas fontes possam ter, no uso de survey,
uma ferramenta útil para o acesso aos dados. É o caso, por exemplo, da pesquisa de sele-
ção de candidatos, sempre tratada de modo formalista no Brasil, exigindo de nossa parte
uma ida ao campo para verificar as hipóteses formais dadas pela literatura.
36
O uso do survey no estudo do recrutamento político
Essa vantagem pode ser obtida também com outros métodos, como
entrevistas em profundidade ou grupos focais. No entanto, o uso do
survey traz a vantagem da precisão e clareza das perguntas elaboradas,
assim como das alternativas de respostas apresentadas ao entrevista-
do. Por exemplo, nas pesquisas sobre seleção de candidatos, o tema da
“motivação política”, como variável que determina a disposição do in-
divíduo a se lançar como candidato, é tratado quase sempre de forma
acessória, quando sequer é tratado. Durante a elaboração do questio-
nário, pudemos incluir questões referentes a esse tópico, apontado por
Czudnowski (1975) como um dos pilares para o pleno entendimento do
processo pelo qual alguns indivíduos se candidatam a cargos políticos
e outros não. Assim, para além dos dados sociográficos e institucionais
com os quais a literatura trabalha, pudemos incluir perguntas sobre mo-
7
Outros instrumentos de coleta de dados, é claro, permitem a participação direta do pes-
quisador em sua elaboração, mas são quase sempre muito mais suscetíveis às limitações
das fontes ou do campo do que o survey.
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Como estudar elites
8
Por exemplo, o uso de amostras complexas como uma técnica que reduz custos mone-
tários e de tempo e ainda assim permite uma generalização segura. Outras vantagens
são colocadas quando se aliam teoria e desenho amostral, como no caso de processos
puramente locais (como, por exemplo, as eleições primárias americanas) onde se opta
pela realização de amostras com n reduzido em diversos clusters em contraposição a
uma grande amostra aleatória nacional com grande n.
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O uso do survey no estudo do recrutamento político
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Outro bom exemplo deste tipo de publicação pode ser encontrado em Freire, Viegas
e Seiceira (2009).
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Como estudar elites
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O uso do survey no estudo do recrutamento político
10
Um dos modos mais acertados para uma exploração prévia à realização de uma pes-
quisa de survey é fazer entrevistas em profundidade com uma amostra não representati-
va da população, de modo a ter mais clareza sobre os pontos a serem abordados, sobre
a maneira de formular questões, sobre que tipo de linguagem é a mais adequada para
o contexto em questão etc. A partir de então, pode-se dar início à elaboração de um
questionário de maneira bem mais segura.
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Como estudar elites
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O uso do survey no estudo do recrutamento político
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Para um exemplo, ver a questão V.31 do Apêndice 1, ao final deste livro (p. 287).
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Como estudar elites
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Aparecer para uma entrevista com pessoas de uma posição socioeconômica mais baixa
vestindo, por exemplo, um terno, aumenta muito a probabilidade de intimidação do respon-
dente; usar gírias para entrevistar desembargadores gera uma rejeição imediata e visível ao
entrevistador; o uso de palavras carregadas de sentido para o entrevistado pode produzir
rejeição ou empatia, dependendo das circunstâncias. Por exemplo, ao entrevistarmos, em
outra ocasião, uma série de pessoas de entidades filantrópicas que atuavam em conselhos
de assistência social, percebemos que não podíamos utilizar as palavras “política” e “partido”,
pois ambas consubstanciavam a ameaça de “partidarização” e “politização” da função essen-
cialmente caritativa da assistência social, apesar de todos os representantes das entidades
filantrópicas apoiarem o partido do governo e sua política. Ter um conhecimento prévio e
inicial do objeto de estudo ajuda a evitar esses problemas.
13
A barra de probes é uma referência que o aplicador do questionário tem junto às per-
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O uso do survey no estudo do recrutamento político
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Como estudar elites
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O corte de 5% refere-se aos partidos que, em teoria, desfrutariam dessa proporção
de votos nas eleições nacionais, funcionando como uma cláusula de barreira para que
tivessem acesso aos cargos partidários (como líder de partido e bancada partidária) na
Câmara dos Deputados. Além disso, são os partidos que contam com um patamar míni-
mo (10%) para atuarem como organizações relevantes no sistema partidário brasileiro.
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O uso do survey no estudo do recrutamento político
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Como estudar elites
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Outro exemplo disso é o fenômeno, constatado no Reino Unido nos anos 1990, qualificado
como “The Shy Tory Factor”. Após anos de governos do Partido Conservador, as pesquisas
indicavam que o Partido Trabalhista teria uma pequena maioria no Parlamento. Contudo, o
resultado foi que os conservadores conquistaram mais uma vez a maioria, com quase 10%
a mais de cadeiras. A explicação foi que os eleitores estavam “escondendo” suas intenções
de voto tendo em vista a continuidade do partido por tantos anos. Com a Era Trabalhista de
1997 a 2010, alguns analistas políticos se preocupavam com o fenômeno oposto. Ver “The
Shy Labour Factor”. Fonte: <http://www.mrs.org.uk/>. Acesso em: 15 set. 2015.
18
Para perguntas de verificação lógica ver as diferenças no conteúdo das perguntas V.19,
V.21 e V.31 do Apêndice 1, ao final deste livro (p.284 e p.287, respectivamente).
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O uso do survey no estudo do recrutamento político
Esse problema era particularmente importante para nós por dois moti-
vos muito práticos. Primeiro, com o decorrer da campanha, os candida-
tos poderiam ter diferentes percepções sobre como foram selecionados.
Candidatos que estavam tendo um desempenho mais positivo poderiam
avaliar de maneira artificialmente positiva o processo de seleção e vice-
versa. Além disso, a dinâmica frenética das campanhas eleitorais poderia
afetar a memória sobre fenômenos ocorridos meses atrás, diminuindo
a exatidão da informação e, consequentemente, sua confiabilidade. Em
nosso caso, evitamos os problemas de recall conduzindo as entrevistas
em um momento delimitado no tempo, aplicando todos os questioná-
rios logo após o registro dos candidatos nas listas eleitorais na convenção
partidária de cada sigla, como estabelecido pelo calendário eleitoral bra-
sileiro daquele ano.
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Como estudar elites
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Conforme a Lei Orgânica dos Partidos Políticos de 1997.
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O uso do survey no estudo do recrutamento político
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Como estudar elites
para explicar porque são tão poucos os indivíduos que conseguem dis-
putar uma eleição20.
A literatura aponta que seleções de candidatos conduzidas por primá-
rias abertas a todos os eleitores não são necessariamente mais democrá-
ticas. Nesses casos, a seleção feita por primárias ou por votação com a
participação de muitos membros do partido tende a escolher aqueles
candidatos que representam a média das características desejadas pela
maior parte dos selecionadores, o que pode excluir importantes grupos
minoritários, numa espécie de “tirania da maioria”. O espaço para mino-
rias ou grupos sub-representados fica mais restrito, mesmo que pareça,
à primeira vista, um processo muito mais inclusivo e democrático (HA-
ZAN; RAHAT, 2010). Por outro lado, candidatos escolhidos apenas por um
único líder do partido não estariam dispostos a colaborar com o partido
como instituição, com o grupo, manifestando laços de lealdade apenas
com aquele que o garantiu na lista eleitoral. Questões dessa natureza é
que nortearam a formação das perguntas sobre a seleção de candidatos.
Indagamos se os entrevistados haviam sido escolhidos para estarem ali
por votação ou por indicação, se os filiados do partido participaram da in-
dicação ou não, ou se a escolha foi realizada por delegados partidários. A
articulação dos dados coletados a partir dessas perguntas é que nos levou
a reconstruir peça a peça o processo pelo qual os candidatos a deputado
federal em 2010 foram nomeados.
Num segundo momento, ainda sobre o processo de seleção, tentamos
colher variáveis que pudessem nos dizer não somente algo sobre a se-
leção em si, mas também acerca das consequências desta. Ou seja, ten-
tamos mensurar o comportamento dos candidatos no período eleitoral
e sua relação com as bases políticas. Perguntamos se eles seriam disci-
plinados em relação aos partidos, quem estavam representando eleito-
ralmente (se o partido, se a região geográfica de onde vinham, se sua
categoria profissional etc.).
Desta forma conseguimos construir um questionário capaz de dar con-
ta das complexidades do processo de seleção de candidatos dentro dos
partidos analisados. Com ele, abordamos a dimensão dos recursos sociais
20
Vale dizer que os dados de Gallagher e Marsh (1988), mesmo que bastante defasados,
mostram que apenas 0,04% dos legalmente habilitados conseguem atingir o posto de
candidato por um partido qualquer nas democracias ocidentais.
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O uso do survey no estudo do recrutamento político
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Babbie (2005, p. 253-254) admite que o estabelecimento de valores específicos para
taxas de retorno é rudimentar e bastante arbitrário. Porém, taxas muito abaixo da metade
da amostra oferecem o risco de inviabilizar a amostra em si.
53
Como estudar elites
22
Em tese, isso poderia ser um problema. Porém, não se trata de proibir que o entrevis-
tado diga que não sabe a resposta ou que não quer responder à pergunta, mas sim de
evitar que respondentes utilizem as opções “não sei” ou “não respondeu” como fuga
para agilizar o preenchimento do questionário ou não manifestar uma opinião que julga
comprometedora. Por essa razão, em questionários auto-administrados os pesquisado-
res geralmente preferem retirar essas opções de resposta.
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O uso do survey no estudo do recrutamento político
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Por exemplo, a linguagem que o entrevistador utiliza, se mais ou menos formal; o so-
taque, que pode revelar determinadas origens; acessórios nas roupas e no corpo; ex-
pressões faciais inevitáveis frente a respostas polêmicas etc. Esses exemplos evidenciam
pequenos detalhes que podem fornecer ao entrevistado pistas sobre a condução do
questionário e sobre seu comportamento durante a entrevista. Mesmo entrevistadores
com anos de prática e treinamento podem incorrer nesses pequenos deslizes e revelar
esta ou aquela emoção.
55
Como estudar elites
Conclusões
O capítulo procurou elencar os limites e vantagens da técnica de survey
para a pesquisa em Ciências Sociais em geral e para estudos de recruta-
mento político e seleção de candidatos, em particular.
No caso específico de nossa análise sobre o processo de seleção de can-
didatos em quatro grandes partidos brasileiros, pensamos que o survey
nos auxiliou em duas frentes, uma operacional e outra teórica.
Primeiramente, viabilizou a própria realização da pesquisa. Sua aplica-
ção nos permitiu gerar informações sobre o processo seletivo dentro dos
partidos políticos que não poderiam ser encontradas em qualquer outra
fonte. Em segundo lugar, o modo como estruturamos o questionário nos
possibilitou dar a devida importância ao caráter complexo do processo
de recrutamento político, chamando atenção para as dimensões extra e
intrapartidárias do mesmo. Desse modo pudemos encarar a seleção de
candidatos não como algo estático, localizado no momento da convenção
partidária, mas como um processo de longa duração, que se inicia muito
antes dos embates dentro do partido, mas certamente atinge seu auge no
interior dessa organização.
Em nenhum momento, porém, julgamos que o uso de survey pudesse
esgotar todas as possibilidades de uma pesquisa como essa ou que pudesse
simplesmente dispensar o uso de técnicas distintas. Entrevistas em pro-
fundidade com grupos reduzidos e a etnografia de momentos-chave do
56
O uso do survey no estudo do recrutamento político
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Como estudar elites
Referências
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of Latin American & Caribbean Studies, v. 34, n. 67, p. 5-40, 2009.
59
Como estudar elites
60
3. O desenho e as fontes da
pesquisa com elites parlamentares
brasileiras no século XX
Luiz Domingos Costa
Lucas Massimo
Paula Butture
Ana Paula Lopes
1
Os autores agradecem os comentários à primeira versão feitos por Renato Perissinotto
e Adriano Codato, bem como as sugestões de Bruno Bolognesi e Gabriel Vommaro para
aprimorar o conteúdo final do capítulo. As falhas remanescentes são de exclusiva respon-
sabilidade dos autores.
2
Esse texto se baseia no projeto “As transformações da classe política brasileira no século
63
Como estudar elites
64
O desenho e as fontes da pesquisa
1. O desenho da pesquisa
65
Como estudar elites
4
Ele reúne, desde meados da década de 1980, uma rede de pesquisadores orienta-
dos teórica e empiricamente para a investigação do background social e do padrão
de carreira dos indivíduos eleitos para os principais parlamentos nacionais da Europa
(BEST; EDINGER, 2005).
66
O desenho e as fontes da pesquisa
5
O projeto iniciado em 2011, “As transformações na classe política do Século XXI: um estudo
67
Como estudar elites
68
O desenho e as fontes da pesquisa
• Cargos públicos
eletivos e não eletivos)
ocupados antes do
mandato em análise
69
Como estudar elites
7
Como, por exemplo, a excelente análise sobre as carreiras nacionais dos filhos da elite
política gaúcha do Império elaborada por Vargas (2011). Também fazem uso desse tipo
de dados os trabalhos sobre mobilidade social geracional (VIANNA et al., 1997) e conver-
são de trajetórias familiares (MICELI, 1991).
8
Lawrence Stone identifica nesse tipo de análise uma indiferença à tradição teórica das Ci-
ências Sociais: “A técnica empregada consiste em fazer uma investigação meticulosamente
detalhada sobre a genealogia, os interesses comerciais e as atividades políticas do grupo,
os relacionamentos expostos por meio de detalhados estudos de caso, apoiados apenas
de maneira secundária e em um grau relativamente menor por suportes estatísticos. O
70
O desenho e as fontes da pesquisa
propósito de tal pesquisa é demonstrar a força de coesão do grupo em tela, mantido uni-
do por laços sanguíneos, sociais, educacionais e econômicos, sem falar de preconceitos,
ideais e ideologia. Quando o problema principal é político, argumenta-se que é essa rede
de vínculos puramente sociais e econômicos que dão ao grupo sua unidade e, portanto,
sua força política e, em grande medida, também sua motivação política, visto que a política
é uma questão dos ‘de dentro’ contra os ‘de fora’. Esta escola deve pouco ou nada às Ciên-
cias Sociais, apesar de que poderia ter aprendido muito com elas, e é largamente inocen-
te quanto ao uso consciente de teorias sociológicas ou psicológicas. Seus pressupostos,
entretanto, entendem claramente a política mais como uma questão de interações entre
pequenas elites dirigentes e seus clientes do que como movimentos de massa e esse au-
tointeresse, entendido como uma feroz competição hobbesiana pelo poder, pela riqueza
e pela segurança, é o que faz o mundo girar” (STONE, 2011, p. 116).
9
É possível afirmar que a associação teórica entre origem social, carreira política e chegada
a determinada posição de elite é a perspectiva que confere identidade e alguma unidade
aos trabalhos da Sociologia Política sobre elites parlamentares tal como realizados pelos
pesquisadores de tradição anglo-saxã e nórdica como, por exemplo, Guttsman (1974), Put-
nam (1976), Stanworth e Giddens (1974) e a próprio projeto EurElite citado acima.
71
Como estudar elites
72
O desenho e as fontes da pesquisa
10
Essa decisão foi tomada a posteriori, depois de termos utilizado essas variáveis nas
etapas iniciais da pesquisa. Após constatadas a baixa relevância para os padrões gerais,
essas variáveis foram retiradas da base de dados para economizar tempo de coleta e
minimizar as dificuldades de operacionalização dos dados.
73
Como estudar elites
Quadro 3. Distribuição das fontes utilizadas ao longo do tempo recoberto pela coleta dos dados
Por outro lado, a necessidade de conciliar duas fontes para uma parcela
dos casos acarretou uma série de dificuldades que discutiremos a seguir.
Na pesquisa sobre os senadores, o DHBB foi fonte exclusiva para os in-
divíduos eleitos entre 1946 e 2010. Os eleitos para a 35ª e 36ª legislaturas
(1930 a 1937) também aparecem no Dicionário do CPDOC, mas as infor-
mações obtidas sobre eles combinaram dados obtidos nos verbetes com o
material coletado nas fichas do Prodasen.
2.1. Um panorama das fontes sobre elites políticas no Brasil e algumas soluções
Estudos de elites se baseiam em diversos tipos de fontes para coleta
de dados. Em geral, para a maioria dos casos, as fontes são documentos
oficiais (RODRIGUES, 2006). Há também o uso de surveys (RODRIGUES,
74
O desenho e as fontes da pesquisa
11
Para os portais legislativos estaduais, por exemplo, é possível encontrar muitas informa-
ções sobre os legisladores, mas o problema da irregularidade entre estados e indivíduos
ainda é muito marcado. Para uma excelente comparação de sites legislativos estaduais
em todo o Brasil, conferir Braga e Nicolás (2008).
75
Como estudar elites
12
Registramos aqui nossos agradecimentos à Rosa Maria Gonçalves Vasconcelos e toda a
equipe da Coordenação de Arquivo do Senado Federal (COARQ) pelo envio dos dados
e pela assistência com a manipulação das fontes primárias.
13
A exclusão das Radiografias do Congresso feitas pelo DIAP (Departamento Intersindical
de Assessoria Parlamentar) se deu porque o material está apenas parcialmente organiza-
do para a consulta online e porque representa material mais recente (de 1988 em diante)
e, portanto, se sobrepõe com a fonte do DHBB, que é a mais completa. Entretanto, tra-
ta-se de fonte com valor de pesquisa inegável que já produziu resultados interessantes
(MARCELINO; BRAGA; COSTA, 2009; BUTTURE, 2014) especialmente quando o foco
recai sobre as votações mais emblemáticas da Constituinte de 1987-88.
76
O desenho e as fontes da pesquisa
Quadro 4. Descrição simplificada das variáveis e sua ocorrência nas fontes utilizadas
Background social
1 Nome x x x
2 Foto x
3 Local de nascimento x x x
4 Data de nascimento x x x
5 Ocupação iniciais x x x
7 Nível de escolaridade x x
8 Diploma superior x x
Carreira Política
10 Associativismo x x
13 Migração partidária x x
17 Comissões parlamentares x
77
Como estudar elites
78
O desenho e as fontes da pesquisa
14
Em setembro de 2014 foram publicados os verbetes com os políticos da República
Velha (1889-1930), mas infelizmente aparecem nessa relação apenas biografados que
exerceram mandatos na década de 1920. Esse aspecto será retomado no próximo subi-
tem, que trata da fonte utilizada para os titulares dos mandatos neste período.
79
Como estudar elites
80
O desenho e as fontes da pesquisa
81
Como estudar elites
Quadro 5. Cruzamento entre a extensão dos verbetes e a carreira política dos senadores eleitos entre 1945 e 2010
82
O desenho e as fontes da pesquisa
15
Uma relação mais detalhada com as demais competências desta secretaria pode ser
consultada no seu sítio eletrônico: <http://www.senado.gov.br/senado/prodasen>. Aces-
so em: 16 jul. 2015.
16
Sistema de Informações do Congresso Nacional (SICON) e Sistema Administrativo
Integrado (SAI).
83
Como estudar elites
17
Baaklini afirma que o Prodasen forneceu aos parlamentares as condições técnicas funda-
mentais para os rascunhos da nova Carta. Coube ao Prodasen elaborar o sistema que reunia
dados de 35 constituições (brasileiras e estrangeiras), além do questionário que coletou su-
gestões oriundas de iniciativas populares sobre o texto final. De acordo com o autor, “por
dois anos forneceu o suporte tecnológico e informacional que permitiu à Assembleia Nacio-
nal Constituinte considerar milhares de alterações e produzir milhares de votos em centenas
de horas de debates. Sem a capacidade tecnológica do Prodasen, o trabalho da Constituinte
teria se desacelerado para um ritmo de caracol” (BAAKLINI, 1994, p. 185; tradução livre).
84
O desenho e as fontes da pesquisa
Gráfico 1 – Total de senadores com fichas biográficas elaboradas pelo Prodasen (por legislatura)
83
76 73 75 74
72 71 70 71 72
67 67
58 61
57
44
21° 22° 23° 24° 25° 26° 27° 28° 29° 30° 31° 32° 33° 34° 35° 37°
Legislaturas
85
Como estudar elites
18
Sítio eletrônico: <http://www.senado.gov.br/senadores/periodos/legisAnt.shtm>. Acesso
em: 16 jul. 2015.
19
Em alguns casos consta, inclusive, o número de votos obtidos pelo político em deter-
minado cargo.
20
Além das relações políticas que se estabeleciam pelo matrimônio, esta parte das fichas
relaciona os parentes que tinham cargos políticos eminentes e/ou influência determina-
da por famílias com tradição na política.
86
O desenho e as fontes da pesquisa
21
Assim, não basta categorizar um indivíduo com a ocupação “empresário”. Esse caso
pode representar alguém aclamado como “empresário bem sucedido” no início de sua
trajetória política e, posteriormente, já com carreira consolidada e diante de supostas
realizações políticas, com um “empreendedor” versátil nas várias atividades pelas quais
pode “ajudar” a sociedade. Assim, essa tradução ou reconversão pode ser objeto de
investigação qualitativa para desvendar relações entre dinâmicas individuais e estruturas
sociais de premiação de trajetórias.
87
Como estudar elites
22
Na verdade, esse debate pode ser uma quimera metodológica que opõe o trabalho
quantitativo ao trabalho qualitativo: “Análises narrativas produzem correlações perfei-
tas, algo de que os analistas causais desconfiam, e com razão, dados seus pressupos-
tos e práticas de trabalho. [...] Os pesquisadores sabem que há ruído demais em seus
dados, muitos erros de mensuração e outros, para que ocorram correlações perfeitas.
Esperam correlações imperfeitas, mesmo quando sua teoria prevê uma correlação
perfeita. Mas, embora saibam que há erro em seus dados (os erros que impedem
correlações melhores), não jogam fora os dados imperfeitos, porque não sabem que
casos ou mensurações contêm erros. Para serem honestos, incluem todos os casos e,
assim, asseguram um resultado probabilístico. Isso perturba os analistas narrativos,
que veem a variância não explicada como um problema, não uma característica natural
da paisagem” (BECKER, 2007, p. 84).
88
O desenho e as fontes da pesquisa
89
Como estudar elites
Referências
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90
O desenho e as fontes da pesquisa
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PUTNAM, R. D. The Comparative Study of Political Elites. Englewood Cliffs: Prentice Hall, 1976.
91
Como estudar elites
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Heinz, F. (Ed.). Historia social de elites. São Leopoldo: Oikos, 2011.
92
4. Análise de elites em
perspectiva relacional: a
operacionalização da Análise
de Redes Sociais (ARS)
Emerson Urizzi Cervi
95
Como estudar elites
96
Análise de elites em perspectiva relacional
1
O software foi desenvolvido e é mantido por um consórcio de pesquisadores de cinco
universidades: Cambridge, Maryland, Stanford, Porto e Oxford. Pode ser obtido gratui-
tamente no endereço eletrônico (<http://nodexl.codeplex.com/releases/view/117659>.
Acesso em: 15 set. 2015), assim como manuais para utilização do software.
2
O objetivo aqui não é testar a consistência ideológica dos partidos selecionados em
relação a todo o sistema partidário brasileiro, mas sim as relações entre três partidos
grandes e três pequenos, sendo dois deles em oposição frontal (PT-PSDB) e os demais
em posições intermediárias. Portanto, o posicionamento ideológico dos partidos aqui é
feita ad-hoc por ter a finalidade de servir como exemplo para aplicação da metodologia
de ARS e não para testar a consistência das posições ideológicas dos partidos, o que se-
ria um empreendimento muito mais complexo e não se adequaria ao espírito dessa obra.
97
Como estudar elites
98
Análise de elites em perspectiva relacional
99
Como estudar elites
100
Análise de elites em perspectiva relacional
2
C D
3
B A E
101
Como estudar elites
102
Análise de elites em perspectiva relacional
No Brasil, o campo das Ciências Sociais não foi o primeiro a usar as téc-
nicas de ARS em estudos empíricos. Pesquisas em ciência administrativa,
publicadas na Revista de Administração de Empresas (RAE), da Escola de
Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas, em
1984 foram as primeiras no país a analisarem estruturas organizacionais
de empresas a partir da análise de redes. Na Ciência Política a técnica da
ARS aparece inicialmente em estudos sobre as relações entre institui-
ções estatais e organizações sociais (MARQUES, 1999; 2006; JUNQUEIRA,
2004). Nesse período, i.e., fim da década de 1990 e início dos anos 2000,
os pesquisadores estão preocupados em entender as relações entre orga-
nizações representativas estatais e societais. Em um segundo momento
os estudos começam a dar atenção para as relações individuais na disputa
de poder, como por exemplo Olivieri (2007), que investiga as nomeações
para o cargo de diretor do Banco Central do Brasil usando ARS. Ou a pes-
quisa sobre os resultados de ações de uma ONG ligada à saúde pública
na cidade de São Paulo a partir das redes de amizade (SILVA, 2009). São
vários os exemplos de pesquisas usando ARS para descrever dinâmicas de
políticas públicas, em diferentes áreas.
Ainda no campo das políticas de saúde há a pesquisa de Argiles (2013)
que avalia redes de sociabilidade no atendimento domiciliar terapêutico.
Na área de políticas educacionais, a ARS foi usada para analisar os resulta-
dos de política pública para a educação no município de Icapuí, no estado
do Ceará, por Martins e Lotta (2010). No campo das políticas econômicas
existem vários estudos sobre iniciativas locais, cooperativas, que usam ARS
(FREITAS, 2013). Com o avanço do uso da técnica em estudos empíricos,
pesquisadores começaram a se preocupar com as questões teóricas por trás
na ARS. Algumas contribuições nessa área são de Marques et al. (2007), Car-
los (2011), Martins (2011) e Costa (2011).
Dois recentes desdobramentos no uso da técnica destacam-se na Ci-
ência Política brasileira. O primeiro é a utilização de ARS em pesquisas
sobre elites políticas em disputas eleitorais. Horochovski et al. (2012)
analisam as redes de financiadores eleitorais de candidatos a prefeito
em municípios do litoral do Paraná. Santos (2011) usa as análises de re-
des para estudar formas de acompanhamento do trabalho parlamentar
de políticos eleitos. Outra área em que a ARS tem avançado é o das pes-
quisas sobre política e novas tecnologias de comunicação, em especial
após o advento da web 2.0 e das redes sociais digitais. Cada vez mais os
conceitos de redes sociais são aplicados em estudos sobre as redes for-
103
Como estudar elites
104
Análise de elites em perspectiva relacional
Figura 2. Modelo para teste de hipóteses da formação de redes entre partidos políti-
cos no Brasil conforme o grau de consistência ideológica das coligações eleitorais
PT PSDB
PMDB
PCdoB DEM
PTB
Fonte: Elaboração própria
3
Como descrito no início do texto, o objetivo aqui é usar as siglas como exemplos de
formação de redes em eleições municipais e não discutir a consistência ideológica (ou
existência de ideologia partidária) nas coligações para disputas majoritárias municipais.
105
Como estudar elites
4
Em relação às técnicas de análises de rede, a organização dos gráficos apresentados
aqui se dá pelo método de multiescala de Harel-Koren, que é um algoritmo de proces-
samento que produz gráficos com distribuição uniforme dos nós e dos vértices entre
eles. Com isso é possível verificar que partidos estão mais interconectados entre si. Para
as análises de clusters usou-se o algoritmo de Clauset, Newman e Moore, que é um al-
goritmo aglomerativo com grande qualidade na separação dos clusters. Ele começa
considerando uma partição para cada vértice, que representa uma comunidade, e vai
mesclando cada nova interação na mesma comunidade até que se esgotem as relações
consideradas válidas e formem-se os clusters.
106
Análise de elites em perspectiva relacional
5
Rio Branco, Salvador, Fortaleza, Vitória, Goiânia, São Luís, Cuiabá, Campo Grande, Belo
Horizonte, Belém, João Pessoa, Recife, Teresina, Natal, Porto Alegre e São Paulo.
6
Rio Branco, Salvador, Campo Grande, Belém, João Pessoa, Curitiba, Rio de Janeiro, Na-
tal, Boa Vista, Florianópolis e São Paulo.
7
Rio Branco, Maceió, Macapá, Manaus, Fortaleza, Vitória, São Luís, Cuiabá, Campo Gran-
de, Belém, João Pessoa, Recife, Teresina, Rio de Janeiro, Natal, Porto Alegre e São Paulo.
107
Como estudar elites
8
Macapá, Manaus, Fortaleza, Goiânia, Porto Alegre e Florianópolis.
9
Manaus, Goiânia e Teresina.
10
Maceió, Macapá, Manaus, Salvador, Fortaleza, Recife, Rio de Janeiro e Aracaju.
108
Análise de elites em perspectiva relacional
109
Como estudar elites
sem colig.
PCdoB
PTB
PT
PT
PCdoB PMDB
PMDB
outros
outros
Densidade 0,285
110
Análise de elites em perspectiva relacional
PT
DEM
PTB
PSDB
PMDB
outros PCdoB
sem colig.
outros
PTB
PSDB PMDB
Máximo de limites em um 15
componente conectado
Densidade 0,250
111
Como estudar elites
PTB PSDB
DEM
outros
PSDB
PTB
outros
DEM
PMDB
Densidade 0,333
Fonte: Elaboração própria
112
Análise de elites em perspectiva relacional
Nas redes dos partidos de direita também não há nenhuma surpresa, as co-
nexões ficam próximas do esperado. Ou seja, no que diz respeito às opções
de redes eleitorais, os partidos políticos selecionados aqui demonstraram ter
consistência ideológica. No partido maior, em um total de 17 componentes co-
nectados no PSDB, o mais presente é o DEM. Também há conexões com PTB e
PMDB, além de “outros partidos”. A distância geodésica é relativamente alta
(1,388), resultado do grande número de conexões, e a densidade fica em 0,333.
O partido satélite de direita apresenta uma rede menos complexa, com máxi-
mo de 10 componentes conectados ao DEM. O Democratas coliga-se principal-
mente com “outros partidos”. Dentre os analisados aqui aparecem o PSDB e
PMDB, mantendo a consistência das coligações por proximidade ideológica. A
distância geodésica é relativamente baixa (1,280), e a densidade fica em 0,400.
Dos partidos grandes analisados aqui a rede de coligações mais complexa é
do PT, com 20 conexões máximas, seguido do PSDB, com 17, e do PDMB, com
15. Todos eles ficam acima de seus satélites, que apresentam redes mais sim-
ples: DEM com 10 conexões máximas, PTB com sete e PCdoB com apenas três.
As densidades das redes dos partidos satélites são maiores que a dos grandes
partidos. A maior densidade de rede é do PTB (0,500), seguido do DEM e PC-
doB, com 0,400. Depois vem PSDB com 0,333, PT com 0,285 e PMDB com 0,250.
Os coeficientes das redes individuais indicam duas coisas: a primeira é que
há consistência ideológica das redes dos partidos grandes e satélites de direi-
ta, centro e esquerda. As redes não mostram uma profusão de coligações en-
tre partidos de diferentes posições no espectro ideológico, exceto para os par-
tidos de centro, como esperado. A segunda coisa é que quanto maior a rede
(mais nós), mais difícil é manter a homogeneidade das conexões, levando os
partidos satélites a apresentarem redes menores, porém, mais densas. Isso é
explicado pelo fato de as redes dos partidos nanicos serem mais consistentes
do ponto de vista ideológico do que as redes dos grandes partidos.
Até aqui analisamos as redes dos partidos individualmente. A Figura 6,
a seguir, mostra a rede formada pelo conjunto de todas as coligações nas
disputas pelas prefeituras das capitais em 2012. São duas redes. Uma apre-
senta os resultados para todos os nós (incluindo “outros partidos” e “sem
coligação”) enquanto a outra mostra as conexões entre as coligações forma-
das apenas pelos seis partidos analisados aqui.
O gráfico 6.1 (que considera todos os nós de partidos nas coligações) mos-
tra-se o mais heterogêneo de todos Apresenta cinco subgrupos. O primeiro
formado pelo PT, PMDB, PCdoB e “sem colig.”. Depois, PT, PSDB, DEM e “ou-
tros” apresentam uma independência em relação ao demais, formando cada
113
Como estudar elites
Figura 6. Redes de coligações de partidos nas disputas para prefeituras de capitais de Estado em 2012
6.1. Rede de todas as coligações em capitais de Estado 6.2. Rede formada pelas coligações dos 6 partidos
PMDB PT
DEM PT
PMDB
PCdoB
PTB
outros
PSDB PSDB
PTB
PCdoB
PT 23,0 PT 23,0
Densidade 0,785
Modularidade 0,053
114
Análise de elites em perspectiva relacional
Notas conclusivas
Como primeira conclusão é preciso destacar as limitações do uso de análise
de redes para estudos de elites. A primeira é que não se aplica às tradicionais
análises posicionais de atores. Só se deve usar análise de redes quando não
se pretende uma análise posicional, mas sim relacional dos atores, logo, não
pode ser usado em estudos sobre atores individuais, mas sim para conexões
entre diferentes atores passíveis de serem identificados como pertencentes
a diferentes grupos. Feita a observação sobre os limites do uso da técnica, é
possível afirmar como principal achado que existe consistência ideológica nas
coligações feitas pelos seis partidos analisados em campanhas para prefeitu-
ras de capitais em 2012. No entanto, o número de clusters foi menor do que
imaginávamos inicialmente. Nossa hipótese (representada na figura 2, p.105)
era de que haveria pelo menos três clusters, sendo um à esquerda, um no cen-
tro e outro à direita. O resultado foi que os seis partidos organizaram-se em
apenas dois clusters. Um à esquerda com PCdoB, PT e PMDB e outro à direita
com DEM, PSDB e PTB. Os dois partidos de centro não formaram um cluster.
O PMDB tendeu a se coligar mais com PT e PCdoB, enquanto o PTB coligou-
-se principalmente com DEM e PSDB. Essas composições foram obtidas ao se
115
Como estudar elites
116
Análise de elites em perspectiva relacional
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5. Viagem pela alta hierarquia:
pesquisa de campo e interações
com elites eclesiásticas
Ernesto Seidl
121
Como estudar elites
1
Este texto beneficiou-se de discussões realizadas em duas reuniões do grupo CAPES
Procad/NF, uma ocorrida na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, em
2011, e outra na Universidade Federal do Paraná, em 2012. Agradeço a Adriano Codato
e a Renato Perissinotto por diversas sugestões à versão final do capítulo.
2
Embora escolarmente canônicos, os estudos sobre elites são marginais na hierarquia
dos objetos das Ciências Sociais brasileiras (SEIDL, 2013a, 2013b). Por sua vez, dentro
dos estudos sobre religião – bastante valorizados e desenvolvidos no país – o alto clero
ou os dirigentes religiosos têm recebido pouquíssima atenção dos pesquisadores. Esse
ponto é desenvolvido em Seidl (2008b).
3
Uma primeira e mais intensa etapa desses estudos desenrolou-se entre 2000 e 2003,
seguida de outros momentos entre 2008 e 2014. Os primeiros resultados da pesqui-
sa encontram-se em Seidl (2003). Parte dos resultados posteriores está em Seidl (2007;
2008a; 2008b; 2009a; 2009b; 2012; 2013) e em Seidl e Neris (2011).
4
Gostaria de chamar atenção para o caráter múltiplo dos procedimentos metodológicos
empregados em meus estudos sobre o mundo da Igreja: pesquisa documental e biblio-
gráfica, registro fotográfico, questionários, entrevistas e observações diretas. Isso decorre
de uma perspectiva segundo a qual as Ciências Sociais não devem ser reféns das divisões
acadêmicas e, dessa forma, valer-se unicamente dos respectivos métodos considerados
próprios a cada uma delas: as fontes escritas e os arquivos sendo domínio da história; o
uso de questionários e do tratamento estatístico cabendo à Sociologia e à Ciência Política;
a entrevista e as observações, o dito “trabalho de campo”, constituindo a démarche própria
à Antropologia. Sem ignorar a existência de tipos dominantes de produção de dados cien-
tíficos no interior de cada uma dessas disciplinas, sua unidade epistemológica pode e deve
servir de estímulo ao uso extensivo e criativo de todos os instrumentos postos à disposição
do pesquisador empenhado em compreender alguma dimensão da vida social. Esta pers-
pectiva é mais bem desenvolvida em Seidl e Grill (2013).
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Viagem pela alta hierarquia
5
Em poucas palavras, a reflexividade teórica consiste na aplicação sistemática do racio-
nalismo a todas as operações do fazer científico, muito em especial àquelas mais iniciais
e decisivas, que dizem respeito à escolha da temática e à construção do objeto. Esse
princípio implica que o pesquisador se pergunte, por exemplo, sobre as origens de seu
interesse e do investimento em tal ou qual tema, por que formulou estas e não aquelas
perguntas, por que privilegiou estes e não outros níveis de observação. O uso das ferra-
mentas das Ciências Sociais para a compreensão das condições sociais de construção do
objeto de pesquisa e de realização concreta de suas operações está, assim, na base da
reflexividade como atitude crítica indispensável.
6
Está excluída qualquer intenção de me deter nos detalhes ditos pessoais de condução
da pesquisa e em idiossincrasias do investigador. No entanto, lembrando observações
de Becker (2007), sabe-se que é possível identificar muitos aspectos gerais e recorrentes
em pesquisas sociológicas a partir de casos específicos, isto é, pode-se tomar determina-
da idiossincrasia como uma variante de tal ou qual problema geral.
7
Um esforço recente para expor esse tipo de discussão a partir de experiências de cam-
po vividas por cientistas sociais mulheres no Brasil é encontrado na coletânea organizada
por Bonneti e Fleischer (2007). No mesmo sentido, consultar também o artigo de Leirner
(2009) sobre pesquisa com militares.
8
Minha principal referência inicial na construção da problemática em torno das elites ecle-
123
Como estudar elites
siásticas era então o artigo de Bourdieu e Saint Martin (1982) sobre o episcopado francês.
Embora amplamente apoiada em entrevistas, realizadas por uma assistente, a pesquisa traz
poucos elementos sobre as relações com o espaço investigado. Uma das poucas (porém,
muito úteis) alusões ao universo do alto clero aparece em outro texto de Bourdieu (1996,
p. 189-203). Por outro lado, pude servir-me em alguma medida de trabalhos com elemen-
tos etnográficos dedicados a outros grupos dirigentes, principalmente a alta burguesia e a
nobreza (CHAMBOREDON et al., 1994; COHEN, 1999; COOKSON; PERSELL, 1985; HERTZ;
IMBER, 1995; LE WITA, 1988; OSTRANDER, 1993; PINÇON; PINÇON-CHARLOT, 1997;
1998; 2000; SAINT MARTIN, 1993). O recente artigo Machado (2013) discute dificuldades
de pesquisa com uso de entrevistas com lideranças de várias religiões no Brasil.
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Viagem pela alta hierarquia
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Exemplo disso, quase uma blague acadêmica, foi a grande presteza com a qual um
bispo da arquidiocese de Porto Alegre, presença constante na televisão na condição de
“especialista em artes”, aceitou minha solicitação de entrevista, via contato telefônico. No
dia marcado, ao me encontrar numa ampla sala da Cúria Metropolitana, visivelmente sem
saber que eu era o tal pesquisador (certamente muito mais jovem do que imaginara!),
me informou com certa gravidade que não poderíamos conversar naquele momento
“porque estava aguardando um pesquisador da UFRGS” para entrevistá-lo.
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Como estudar elites
revelou-se acertado. Para ser mais preciso, o estudo não foi apresentado como
uma tese de doutorado em História, mas como um estudo na área de história
da Igreja, sem especificar a disciplina. Nos raros casos em que me foram pe-
didos detalhes quanto ao curso e ao orientador da tese, forneci todas as infor-
mações sempre ressalvando a abordagem “histórica” pretendida, escapando
assim às indagações sobre o que a Ciência Política teria a ver com a Igreja.
Por outro lado, em diversas situações de observação ou de convívio em gru-
po, como durante uma Assembleia Geral dos Bispos do Brasil, me vali de uma
apresentação como sociólogo - outra denominação mais legítima aos olhos da
Igreja –, geralmente permanecendo, no entanto, o termo “pesquisador”, segu-
ramente o melhor passe partout encontrado na elaboração de minha identidade
ao longo do estudo10. Em etapas posteriores de pesquisa sobre a elite da Igreja,
já com o doutorado concluído e na condição de professor universitário, man-
tive as mesmas orientações quanto aos interesses da pesquisa, com esforços
muito menores para justificar encontros e entrevistas, salvo no contato com
bispos no período logo após a divulgação de casos de pedofilia de religiosos11.
Sem entrar em detalhes quanto às muitas e complexas relações entre
Igreja e Ciências Sociais (temos bispos sociólogos!), não deixaria de men-
cionar a familiaridade de parte da hierarquia, para não falar dos religiosos
intelectuais (teólogos, professores-pesquisadores), com pesquisadores ou
especialistas em e da Igreja. Se a Igreja talvez não chegue a registrar sistema-
ticamente o material produzido pela ciência sobre a instituição, a exemplo
do Exército (LEIRNER, 2009), por outro lado, dispõe de leigos e religiosos
com autoridade acadêmica que lhe assessoram em diversos temas, pesqui-
sam em seu nome e divulgam informação através de um robusto aparato
editorial e de comunicação. Dito de outra forma, o próprio mundo acadêmi-
co encarrega-se em parte da apropriação de conhecimento para a institui-
ção através de experts trafegando entre os dois espaços. Certamente, o Cen-
10
Os efeitos das representações correntes sobre os ofícios de sociólogo e de historiador
na relação com outros especialistas e com o público em geral são discutidos por Bour-
dieu e Chartier (2011).
11
O tópico “política” fez parte da maior parte dos roteiros de entrevista utilizados, em
especial com o episcopado, teólogos e dirigentes de pastorais. As questões propostas
buscavam captar não apenas tomadas de posição e visões pessoais, mas também even-
tuais relações com o político – sob registros variados – ao longo de seus trajetos e pos-
síveis efeitos na composição das carreiras. Sobre dificuldades de acesso e de condução
de entrevistas com líderes de diferentes religiões em pesquisas sobre os temas gênero e
sexualidade, consultar Machado (2013).
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Viagem pela alta hierarquia
12
Como informa o sítio do centro, “[...] atendendo uma exigência das ações pastorais e so-
ciais da Igreja Católica no Brasil, o CERIS tem, também, o objetivo de dar suporte técnico e
sociológico aos trabalhos da Igreja e sempre foi uma instituição que tem como marca a ava-
liação de projetos, pesquisa e monitoramento de experiências populares e pastorais, além
de assessoria a movimentos sociais e eclesiais, financiamento e apoio a pequenas iniciativas”.
Disponível em: <http://ceris.org.br/institucional/sobre-o-ceris/>. Acesso em: 26 ago. 2015.
13
Sobre o papel dos assessores na CNBB, ver Seidl (2008a); quanto à apropriação pela
Igreja do conhecimento das Ciências Sociais, consultar Coradini (2012), Montero (2007)
e Seidl (2007).
14
Era especialmente notória a preocupação revelada por muitos bispos, ao serem contata-
dos, em estar preparados para a entrevista e poder, assim, dar “boas respostas”. Esse dado
tem relação com a posição de autoridade dos bispos no sistema de poder da instituição, a
qual implica elevado grau de controle sobre suas falas.
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Como estudar elites
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15
Sobre os elementos da “lógica familiar” invocada pela Igreja, ver Bourdieu (1996, p. 124-135).
16
Para uma discussão sobre as ambiguidades e desconfianças em situações de observa-
ção participante, consultar Oliveira (2010).
129
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17
Para mais detalhes acerca do método reputacional o leitor pode consultar o primeiro
capítulo deste livro, em particular o item 5 (p. 24) e a nota de rodapé nº 9, na p.27 (N.R.).
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Viagem pela alta hierarquia
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Essa intensa experiência de observação e de interação diretas com o conjunto da elite
eclesiástica em carne e osso, reunida num espaço físico de acesso altamente controlado,
é apresentada em Seidl (2003, p. 415-437; 2008a).
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Como estudar elites
19
É sabido que, como regra geral, as informações tendem a ser redundantes a partir
de 30 entrevistas. O número bastante elevado nessa pesquisa sobre a elite eclesiástica
deveu-se a dois motivos principais. A dificuldade em obter dados – em especial quanto a
origens familiares – sobre os dirigentes católicos através de outras fontes e meios (ques-
tionário enviado por correio, e-mail e fontes oficiais); e a própria natureza do objeto da
investigação, que envolvia dimensões como as transformações do papel de sacerdote e
de bispo, a reconstituição das disputas no espaço de formação teológica e as nuanças na
especialização de diferentes ordens, congregações e institutos.
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Viagem pela alta hierarquia
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Como estudar elites
20
Pinçon & Pinçon-Charlot (1997, p. 53) lembram que “não há sociologia possível sem
sociologizar os sociólogos, ou seja, sem situá-los na relação com seu objeto”. A práti-
ca sistemática da “sociologia da sociologia”, o uso do instrumental sociológico pelos
pesquisadores para a compreensão de sua própria prática, constitui um dos pilares do
exercício científico controlado, tal como o concebe a perspectiva de Bourdieu (1994b)
apresentada especialmente em Lições da Aula.
21
Como indica Bourdieu (1990b, p. 108; grifos no original), a questão não é saber, “como
frequentemente se finge acreditar, se as pessoas que fazem sociologia da religião têm
fé ou não, nem mesmo se elas pertencem ou não à Igreja. Deixando de lado o problema
da fé em Deus, na Igreja e em tudo o que a Igreja ensina e garante, trata-se de colocar o
problema do investimento no objeto, da aderência ligada a uma forma de pertencimento,
e de saber em que a crença, tomada nesse sentido, contribui a determinar a relação com
o objeto científico, a determinar os investimentos nesse objeto, a escolha desse objeto.
[...] é a cada sociólogo da religião que cabe interrogar-se, para o interesse de sua própria
pesquisa, se, quando ele fala de religião, ele quer compreender as lutas que têm por
objeto as coisas religiosas, ou tomar partido nessas lutas”.
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Viagem pela alta hierarquia
muito mais intensas nas duas gerações anteriores à minha, por outro lado,
o ambiente familiar e escolar em que realizei parte de minha socialização
continuavam, todavia, bastante marcados por uma forte ética católica.
Meu percurso escolar até a conclusão do Ensino Médio foi todo cumpri-
do em uma escola dirigida por irmãos Maristas, na qual a oração diária no
início das aulas, o ensino religioso e a inculcação dos princípios católicos,
aos mais variados títulos, tiveram consequências óbvias na formação das
percepções sobre uma infinidade de aspectos da vida social e sobre a pró-
pria religião e a instituição católica. Ao mesmo tempo, o envolvimento com
um grupo de jovens ligado à Igreja e coordenado por leigos, na pré-ado-
lescência, além do cumprimento da socialização formal católica (batismo,
primeira eucaristia, crisma), reafirmou esse conjunto de princípios morais
e de visões sociais e configurou um determinado tipo de pertencimento à
religião que ia além da mera prática individual.
Ao longo do percurso escolar esse pertencimento foi gradualmente se mo-
dificando até o abandono total, nos anos iniciais de estudo superior, de cren-
ças e práticas relacionadas ao mundo católico ou a qualquer outra religião,
não se tratando, contudo, de “rupturas”, “desilusões” ou “revoltas” frente
ao catolicismo ou à instituição católica, nem muito menos de uma conversão
a outra religião, seita ou filosofia esotérica. Sublinho esse aspecto pelo fato
de não ser incomum o caso de ex-católicos – leigos fiéis ou clérigos – utili-
zarem as Ciências Sociais como instrumento para acerto de contas pessoais
com a religião, com a hierarquia católica ou mesmo com algum outro religio-
so ou instituição católica em particular. Do mesmo modo, também seria útil
tornar explícito que a relação entre meu trajeto social e a escolha do tema de
investigação para essa pesquisa limita-se, até onde me é possível perceber, a
questões de investimento acadêmico ligadas a meu percurso escolar.
O interesse pelo estudo de elites teve início com uma pesquisa sobre o
alto oficialato do Exército e resultou numa dissertação de Mestrado em
Ciência Política. Uma série de indicações quanto ao peso notável da Igreja
católica na formação de grupos dirigentes no Rio Grande do Sul, combina-
da com a visibilidade numérica e de poder do clero gaúcho na hierarquia
da instituição, orientou a manutenção do investimento no terreno pouco
explorado das elites22.
22
A leitura do trabalho de Miceli (1988) sobre a elite eclesiástica na Primeira República,
rico em pistas de pesquisa e na indicação de fontes, foi central na elaboração do objeto.
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Como estudar elites
23
Ao lado das formas de vestir, a hexis corporal ocupa lugar importante entre as estra-
tégias de apresentação de si e permite localizar rapidamente o espaço social pelo qual
circula o pesquisador e, ao mesmo tempo, seu grau de familiaridade com o universo
que investiga. A título de ilustração, citaria a moderação no tom de voz em conversas
e nos espaços da instituição e a observação de momentos de silêncio e de reverências
ritualísticas, como o sinal da cruz e a genuflexão ao entrar em recintos que o exigiam.
Um exemplo das precauções necessárias com a elaboração da imagem e do controle
de si em situações de observação ou entrevista é fornecido por Pinçon & Pinçon-Char-
lot (1997, p. 37-39). A esse respeito, consultar também Beaud e Weber (2007), Olivier
de Sardan (1995) e Ostrander (1993).
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Como estudar elites
24
Em diversas ocasiões, fui descontraidamente saudado em alemão, em tom de brincadeira.
Também durante as entrevistas eram comuns citações ou referências feitas nesse idioma.
25
Os elementos centrais dessas percepções e o processo de emergência de uma etni-
cidade teuto-brasileira em oposição à “cultura luso-brasileira” no sul do país são ampla-
mente discutidos em Seyferth (1982a; 1982b; 1986; 1999).
138
Viagem pela alta hierarquia
rural”. Esse aspecto tinha efeito especialmente visível durante relatos biográ-
ficos sobre o ambiente familiar e a socialização dos entrevistados, momento
em que a demonstração de alguma familiaridade com o universo descrito dava
muito respaldo aos propósitos da entrevista. Em outras palavras, havia boas
condições para eu ser considerado não somente um “amigo” da Igreja, para
utilizar expressão recorrente no Exército (LEIRNER, 2009), mas uma pessoa
com a qual os religiosos facilmente encontravam pontos de identificação que
levaram a relações de confiança e, mesmo, de cumplicidade.
Ainda na discussão de uma parte central dos encaminhamentos metodo-
lógicos adotados nesse estudo, caberia examinar em maior profundidade as
relações objetivas depreendíveis das situações de entrevista ou de contato in-
formal com grupo bastante extenso de indivíduos em posições variadas na es-
fera católica. Tendo sempre em perspectiva a reflexividade sobre as condições
da prática sociológica, trata-se de tornar mais explícitos os efeitos da interação
entre pesquisador e universo de pesquisa por meio da compreensão das dife-
rentes propriedades sociais detidas pelos indivíduos implicados, bem como de
suas percepções recíprocas, o que inclui aquelas sobre as próprias questões da
pesquisa. Assim, faz parte desse tipo de procedimento a tentativa de compre-
ensão da diferença entre as concepções do investigador e as do investigado so-
bre o objeto da pesquisa, as representações sobre o pesquisador variando em
função das representações que o entrevistado possui sobre o universo da in-
vestigação e da universidade (BOURDIEU, 2008; CHAMBOREDON et al., 1994;
DAMAMME, 1994; LEGAVRE, 1996). Entender as distorções inscritas na estru-
tura da relação de pesquisa, suas assimetrias e as consequências que daí deri-
vam é um passo necessário na tentativa de controlar melhor essas condições.
A interação com os membros da Igreja que compuseram o universo es-
tudado variou não apenas segundo as diferentes composições de capital
que aqueles indivíduos apresentam, mas também de acordo com os dife-
rentes papéis e posições que significam diferentes tipos de poder dentro da
instituição, como recorda Lagroye (2006). Considerando o tipo de recursos
sociais e culturais de que eu dispunha e a posição social que ocupava, nota-
damente fundada num capital cultural representado por extenso percurso
escolar e legitimado pelo pertencimento ao universo acadêmico em nível
elevado (doutorando e posteriormente professor), confirmaram-se em boa
medida as expectativas de estabelecer relações mais equilibradas, do ponto
de vista social, com indivíduos situados perto do polo mais intelectualiza-
do da Igreja, isto é, teólogos, professores e pesquisadores dos institutos de
teologia, principalmente. Ao mesmo tempo, também o esperava com rela-
139
Como estudar elites
26
Sem considerar as particularidades da estrutura pedagógica dos seminários e casas
de formação religiosa, instituições à parte no esquema de ensino, pode-se atribuir essa
percepção ao fato de o Ensino Superior público ser dominante no contexto brasileiro,
redobrada pela baixa posição ocupada por cursos como Filosofia e Teologia na hierar-
quia das carreiras universitárias. Além desses aspectos, seria plausível pensar no próprio
status social em declínio do religioso em sociedades fortemente secularizadas, sem es-
quecer os efeitos de imposição da ideologia meritocrática, defensora do ideal da “escola
libertadora”, na composição de uma imagem desvalorizada dos estudos e do tipo de
relação com o conhecimento oferecido por instituições de ensino religiosas.
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Viagem pela alta hierarquia
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O uso de certo jargão das Ciências Sociais, a referência à Sociologia e à Antropologia
e a adoção de um tom didático são bastante frequentes nos discursos desses indivíduos.
Em alguns casos, após a entrevista, o próprio entrevistado revelava interesse pelo anda-
mento da pesquisa, fazendo perguntas e comentários e até mesmo falando de suas pró-
prias pesquisas, todos eles sinais de que “conhecia exatamente” as etapas da formação
acadêmica e “entendia” o momento pelo qual eu passava. Sobre a facilidade na condu-
141
Como estudar elites
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Viagem pela alta hierarquia
até que, pouco a pouco, foi ficando à vontade com sua própria análise, dimi-
nuindo as pausas para pensar e estendendo as respostas com tranquilidade.
A segunda situação deu-se numa entrevista com um padre secular, em
torno de 65 anos, ocupando alto cargo na administração de uma universi-
dade católica no estado, professor de Filosofia em programa de pós-gradu-
ação, diretor da editora da universidade e detentor de vários títulos acadê-
micos, alguns obtidos no exterior, e com currículo ostentando quantidade
impressionante de publicações nas áreas de Filosofia e Teologia. Sua gentil
acolhida deu-se em seu amplo gabinete administrativo, onde comecei a
entrevista – como de praxe - por questões biográficas e sobre seu grupo fa-
miliar. Toda essa parte, nitidamente percebida como “questões menores”,
foi respondida de forma lacônica e sem entusiasmo, às vezes com certa iro-
nia, causando constrangimento que rapidamente me levou a acelerar em
direção aos pontos sobre os quais previa que meu interlocutor esperava ser
perguntado. Ou seja, sua atitude mostrava insatisfação frente a perguntas
“triviais” (“sigilosas”, para usar seu termo irônico) sobre uma figura “sufi-
cientemente conhecida” no meio intelectual gaúcho (afirmou que “já ha-
viam escrito sobre ele”) e cujo título de colaboração numa pesquisa cientí-
fica não poderia ser menos do que “analítico” ou “crítico”.
Acredito que essas duas experiências forneçam elementos importantes
para refletir quanto à estruturação da relação de entrevista com membros da
Igreja católica – e certamente com outros grupos, dominantes ou não. Antes
de qualquer coisa, chamam atenção para a pluralidade de hierarquias, escalas
de poder e de prestígio dentro das próprias elites. Assim, um ponto que apa-
rece em primeiro plano é a variação no equilíbrio da interação de acordo com
as propriedades sociais e a posição do entrevistado e suas consequências na
condução da relação. Se no primeiro caso a clara dominação pelo pesquisador
demonstrou ser uma vantagem questionável, no caso seguinte, a inversão da
situação em favor do entrevistado reforçou a necessidade de pensar a com-
plexidade das agressões simbólicas constitutivas desse tipo de relação, que
apesar de eufemizada, é uma relação de força (LEGAVRE, 1996, p. 216) entre
agentes sociais dotados de recursos que raramente são iguais29. Nesse sen-
29
Ver também os comentários sobre situações de pesquisa com indivíduos de grupos so-
ciais dominantes feitas por quatro jovens pesquisadoras em Chamboredon et al. (1994),
e o conjunto de discussões sobre a condução de entrevistas junto a grupos dominantes
diversos apresentado em Cohen (1999).
143
Como estudar elites
30
Partilho da visão de Legavre (1996, p. 220), segundo a qual “crer que essas interven-
ções transformam radicalmente a verdade das representações que o entrevistado tem
de sua prática ou trajetória seria um erro. Não há, de um lado, ‘falsas’ imagens mentais
do entrevistado influenciado pelo pesquisador e, de outro lado, as ‘boas’ representações
do entrevistado quando a entrevista proposta é não-diretiva. O que há é simplesmente a
coprodução de uma certa realidade com o pesquisador” (grifos no original).
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Viagem pela alta hierarquia
145
Como estudar elites
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148
6. Pesquisando grupos
profissionais: dilemas clássicos
e contribuições recentes
Fernanda Rios Petrarca
151
Como estudar elites
1
Dentre os lançados recentemente, podemos citar: Champy (2009; 2011); Demazière e
Gadéa (2009); Lallement (2008); Mathieu (2007).
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Pesquisando grupos profissionais
153
Como estudar elites
2
Becker (2007) chama de “truques” a tentativa de “domar as teorias”, encarando-as como
modos de pensar o real que permitem algum avanço nos problemas concretos da pesquisa.
3
Dentre as pesquisas utilizadas neste texto pode-se citar: “O Jornalismo como Profissão:
recursos sociais, titulação acadêmica e inserção profissional dos jornalistas no RS” (2007)
e “Atuação Profissional e Engajamento Militante na Defesa de Causas Sociais no Estado
de Sergipe” (2013). Ambas contaram com o financiamento do CNPq.
154
Pesquisando grupos profissionais
4
Representa o conjunto de deveres profissionais.
155
Como estudar elites
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Pesquisando grupos profissionais
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Como estudar elites
5
Para mais detalhes sobre esse truque ver Becker (2007, p.83).
158
Pesquisando grupos profissionais
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Como estudar elites
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Pesquisando grupos profissionais
escolar se define pelos usos que dele podem ser feitos e seu peso depen-
de do capital social acumulado pelos agentes sociais (BOURDIEU; BOL-
TANSKI, 1975). Os usos que podem ser feitos do diploma dependem de
uma estrutura de capital acumulado, a qual faz com que o valor do título
seja avaliado pelo conjunto de propriedades sociais e econômicas que o
seu portador possui. Contudo, a possibilidade de mobilizar um conjunto
de recursos individuais para a valorização do título acadêmico dependerá
das condições de institucionalização e do estabelecimento de exigências
para ocupar posições, postos e cargos. Uma das maneiras de dar conta,
empiricamente, de tais usos é confrontando o elenco dos títulos que os
agentes ostentam, levando em consideração para isso tanto aqueles estri-
tamente escolares e profissionais como aqueles obtidos pela posição de
origem e pelos vínculos com outras esferas sociais.
Pode-se exemplificar essa asserção com o caso das posições situadas
em “zonas de incerteza” do espaço social: os ofícios pouco profissionali-
zados e fragilmente institucionalizados. Nesses ofícios mal profissionali-
zados no que concerne às condições de acesso e às condições de exercício,
os postos e cargos mal delimitados e, desse modo, ditos “abertos”, dei-
xam aos seus ocupantes a possibilidade de defini-los. A definição desses
postos reside na liberdade dos ocupantes em delimitá-los introduzindo
neles seus princípios e sua definição e o futuro desses cargos estará su-
jeito àquilo que os seus ocupantes definirão como relevantes. O efeito
de “redefinição criadora” pode ser observado em ocupações com grande
dispersão ou em setores mais novos nos quais os cargos e as carreiras não
adquiriram rigidez. Nesses casos, o recrutamento faz-se com base em re-
lações e afinidades, não em nome de títulos escolares (BOURDIEU, 1998).
Dessa forma, o capital escolar só representará um valor para os agentes no
mercado de trabalho se a relação entre o diploma e o cargo for “rigorosa-
mente codificada” (BOURDIEU, 2001).
Dito de outro modo, por tratar-se de espaços sociais com uma institu-
cionalização mais flexível e uma fronteira formal e jurídica mal definida,
as tomadas de posição possíveis estarão mais respaldadas nas trajetórias
dos agentes que ocupam posições e postos nesses espaços, do que nas
normas que se institucionalizaram e que estruturam tais cargos. O mesmo
ocorre no caso das profissões em que a exigência e o valor do diploma não
estão claramente definidos e fixados. Nesses casos, quanto mais fluidas e
incertas forem a definição do diploma e também do cargo, assim como de
sua respectiva institucionalização, mais espaço sobrará para as “estraté-
161
Como estudar elites
gias de blefe” e, com isso, mais possibilidades terão aqueles que acumula-
ram elevado capital social e relacional para obter um rendimento elevado
do seu diploma (BOURDIEU, 1978; 1998; 2001).
Todavia, precisamos ter cuidado com esse tipo de problematização,
uma vez que ela facilmente pode nos afastar das diferentes formas de or-
ganização e institucionalização do espaço profissional. Ao tomar a pro-
fissão como espaço relativamente autônomo, corremos o risco de deixar
passar realidades empíricas nas quais faz sentido para a organização in-
terna a mobilização e a posse de diferentes tipos de recursos sociais. E
isso não significa, a priori, uma falta de autonomia ou fraca diferenciação.
Mas pode representar, em alguns casos, um poder de influência em outras
esferas. Diferentes contextos históricos podem engendrar novas configu-
rações nas quais faz sentido pensar a relação entre exercício profissional
e mobilização de saberes que não se apoiam exclusivamente no espaço
escolar-acadêmico, mas que têm como referência outras esferas, como a
política, por exemplo.
Dentro disso, um aspecto fundamental está relacionado ao fato de que
é preciso problematizar as lógicas históricas e institucionais que permi-
tem dar às profissões privilégios em diferentes países e de que forma os
contingentes históricos contribuem para conservar e estabelecer as con-
dições de controle da profissão sobre a divisão do trabalho e sobre o mer-
cado. Dito de outro modo, não basta fazer uma história social dos objetos,
é preciso, ainda, estar aberto para identificar as configurações e as dinâ-
micas próprias que emergem dessa história e que a compõem.
Essas reflexões permitem compreender as propriedades particulares
que algumas profissões carregam. Em nosso estudo, já citado, demons-
tramos, por exemplo, que diferentes gerações de jornalistas não separa-
vam suas atividades profissionais da intervenção na política e viam seus
ofícios como imbuídos de uma missão política, sobretudo uma missão
voltada à construção e intervenção no Estado. Seus passados históricos
são ainda reveladores do acúmulo de recursos sociais que variavam entre
o exercício profissional e o investimento na política partidária e governa-
mental. Esses recursos facilmente eram mobilizados para promover uma
consagração interna ao ofício. Nessa linha, trata-se de apreender a capaci-
dade do ofício se relacionar com a política como uma questão fundamen-
tal de sua constituição.
O que procuramos demonstrar aqui é que a universalização das parti-
cularidades tende a se tornar um grave problema para a Sociologia, uma
162
Pesquisando grupos profissionais
vez que cria falsos objetos de análise. Há uma série de oposições, como
profissão/ocupação, autonomia/heteronomia, que correspondem à es-
pecificidade de determinadas sociedades e na medida em que se tornam
universais, por meio das teorias generalizantes, contribuem para prejudi-
car o debate científico. Assim criam-se falsos problemas que na verdade
são resultados de categorias de pensamento fruto de uma particularida-
de. Uma das maneiras de evitar isso, como procuramos demonstrar, é por
meio da historicização dessas categorias que se impõem como universais.
163
Como estudar elites
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6
Trata-se de uma dissertação de mestrado do Programa de Pós Graduação em Sociologia
da UFS, ainda em andamento, por mim orientada.
165
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Esse termo é, com freqüência, apresentado para se referir àquelas que investem nesse
tipo de atividade, constituindo, assim, uma categoria da vida cotidiana.
8
Esse momento é importante porque revela a negociação sobre o serviço que será ofe-
recido e o preço de cada um (sexo oral, sexo anal etc.). A habilidade de negociar é fun-
damental para não perder o cliente e obter os melhores lucros possíveis. O cliente não
pode se sentir extorquido ou explorado.
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Essa expressão é utilizada por Collins (2009).
10
Hughes (1981) denomina de “turn point” os momentos de reorientação biográfica que
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12
Podemos citar vários trabalhos que, ao partir dos relatos biográficos, demonstram a
cultural profissional de um grupo, dentre eles, o de Sutherland (1937) sobre o ladrão
profissional e o de Becker (2008) sobre os músicos de jazz.
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Aqui a autora se refere a “outros significativos” como pais, professores, pessoas próximas.
14
No caso dos matadores de aluguel, Barreira (1998) mostra que ter um homicídio ante-
rior é um importante credencial para entrada no sistema de pistolagem.
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Entre esses estudos podemos citar: Petrarca (2007), que destaca os espaços sociais em
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que se inserem os jornalistas e que contribuem para apreensão de saberes que podem
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Pesquisando grupos profissionais
ser mobilizados para o jornalismo; Lochard & Simonet-Cusset (2009) sobre a forma como
a vida associativa e a participação em organizações fornecem condições para uma “ex-
pertise coletiva” e Epstein (1996) que destaca como o ativismo da Aids e a agenda dos
ativistas se tornaram essenciais para a constituição de uma “ciência da Aids”.
16
Esse truque emergiu das pesquisas por mim empreendidas sobre diversos universos
profissionais, a partir dos quais foi possível perceber a importância que assumia os in-
vestimentos em espaços externos à profissão para valorização e ascensão profissional.
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Estamos nos referindo aqui a uma advocacia privada, por isso a característica funda-
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Pesquisando grupos profissionais
estar envolvido com uma clientela pode proporcionar uma relação mais
próxima com os dramas do cliente. Portanto, eles estão mais inclinados a
investir no militantismo humanitário do que aqueles que seguem as car-
reiras jurídicas estatais, por exemplo. Desse modo, a posição ocupada no
mundo profissional se torna uma condição propícia para o engajamento.
O estudo de Epstein (1996) sobre a luta contra a Aids mostra, de maneira
similar, que os médicos que atuam em consultórios e que estão numa rela-
ção direta com a doença são mais inclinados que os pesquisadores a fazer
alianças com os ativistas. Logo, o exercício da atividade profissional pode
se constituir como um facilitador do engajamento.
Portanto, trata-se de advogados recém-formados, que estão investindo
no Direito via escritórios particulares, intensificando suas atuações pro-
fissionais em várias frentes, como assessorias jurídicas e exercício do ma-
gistério. E a defesa dos direitos humanos, manifestada seja pela atuação
nas comissões da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), seja pela partici-
pação em movimentos sociais, representa apenas uma entre as atividades
secundárias com as quais se envolvem. Isso revela um multipertencimen-
to e uma intensa atuação em vários espaços concomitantemente. Essa
diversidade de atuação tem se revelado como uma condição importante
em situação de não emprego, uma vez que contribuem significativamente
para ampliar os contatos e as redes de relações que podem ser mobiliza-
das em determinadas situações.
Bom, isso tudo era bem interessante e já tínhamos uma explicação te-
órica pronta para compreender os dados: agentes com baixos ou fracos
recursos sociais se valem de múltiplas estratégias para evitar a desclassi-
ficação social e profissional. Dito de outro modo, a militância na defesa de
causas sociais constitui uma estratégia importante de investimento pro-
fissional em agentes cujas trajetórias são caracterizadas pela escassez dos
recursos, tais como a ampla rede de contato profissional – muitas vezes
proporcionadas pela posição familiar ou pelas relações de amizades – que
podem dar acesso aos postos mais valorizados.
No momento em que iniciamos nossas entrevistas biográficas com os
casos mais representativos, percebemos que a inserção múltipla, no es-
paço profissional e no espaço da militância na defesa de causas, permitia
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Expressão de difícil tradução que representa, grosso modo, os executivos das empre-
sas. Por tal razão, optamos pela manutenção do termo em francês.
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Referências
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7. Antropologia, política e
etnografia: fronteiras disciplinares
e trabalho de campo
Wilson José F. de Oliveira
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poder (CLASTRES, 1990). Por isso, em vez de nos limitarmos a fazer uma
tipologia dicotômica ou dualista com base numa concepção particular do
poder, o desafio levantado pelos estudos antropológicos da política con-
siste justamente em apreender as concepções próprias ou o pensamen-
to nativo em relação ao fenômeno do poder e da política e os principais
modos sob os quais tais fenômenos se realizam nas diferentes sociedades
com base na investigação das condições sociais, políticas e culturais con-
cretamente relacionadas à configuração de tais fenômenos.
Dando continuidade a esse tipo de crítica e aos problemas e desafios
que ela levantou, os questionamentos posteriores sugeriram tratar de
outra forma a chamada “política moderna” ou “ocidental”. Ou seja, foi o
questionamento da própria clivagem e divisão das sociedades entre “mo-
dernas” e “não modernas” que esteve no centro das discussões e que se
tornou uma das principais fontes para a renovação da agenda de pesqui-
sa sobre os fenômenos políticos. Nesse sentido, Latour (1994) salienta o
quanto tal divisão está diretamente associada à separação entre “Nós” e
“Eles”, ao mesmo tempo em que estabelece uma assimetria entre as so-
ciedades. Em conformidade com isso, o “Nós” moderno, social, político
ou cultural, geralmente é apresentado como algo coerente, distinto e que
tem uma verdade em si e que deve servir de modelo para o conhecimento
e avaliação dos outros povos (“Eles”).
Sem dúvida é essa assimetria que está na base dos impasses recorrentes
nas caracterizações dos diferentes sistemas políticos com base na ideologia
de “modernidade”. Por isso, segundo ele, deve-se evitar cair na “ontologia”
que os “modernos” têm de si mesmos e que acaba limitando nossas pes-
quisas à busca dos “fatos” que comprovem a existência da modernidade
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ela pode ser feita com base em várias técnicas e não apenas na observação
direta. Nesse sentido, a etnografia tem fundamentado um conjunto de es-
tudos que utilizam dados produzidos a partir de documentos, arquivos,
entrevistas, questionários, estatísticas etc., e não apenas aqueles que fa-
zem da observação direta ou participante uma forma exclusiva de acesso
ao objeto (SCHATZ, 2009, p. 5-6; CEFAÏ, 2010).
Tais orientações conduzem à ruptura com as perspectivas fundadas em
clivagens disciplinares e institucionais que reduzem a etnografia a uma
“técnica de pesquisa” própria da Antropologia. Isso porque ela nos reme-
te mais para uma determinada maneira de construir o objeto, que não é
exclusiva de nenhuma disciplina em particular, do que para a sua defesa
como abordagem exclusiva de determinada disciplina na análise de qual-
quer tema ou objeto. Daí a necessidade de enfatizar as concepções e pres-
supostos associados ao uso da “etnografia”, bem como a ruptura com sua
redução a trabalho de campo e observação participante. Isso porque em
seus usos mais corriqueiros o termo “etnografia” ainda parece-nos reen-
viar à antiga divisão disciplinar e institucional, uma vez que ele tem sido
muito particularmente associado à Antropologia. Por isso, a persistência
do que Auyero (2006) designa como relação de dupla ausência entre etno-
grafia e política está vinculada, em grande parte, ao fato das investigações
sobre o poder e a política terem sido, durante muito tempo, realizadas
com base em recortes teóricos e procedimentos metodológicos marcada-
mente disciplinares e institucionais.
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Conclusões
Como procurei demonstrar no decorrer deste capítulo, a incorporação
da etnografia aos estudos dos fenômenos políticos constitui uma prática
ainda pouco usual no âmbito das ciências sociais. A persistência de divi-
sões disciplinares e institucionais na forma de apropriação da prática et-
nográfica pelos cientistas sociais constitui, ainda hoje, um dos principais
fatores que tornam inviável uma maior aproximação entre etnografia e
política. A redução do “olhar” etnográfico a uma técnica “qualitativa” de
coleta e de levantamento de “dados”, própria da Antropologia, constitui
uma das principais fontes dessa dificuldade de apropriação da prática et-
nográfica pela Sociologia e Ciência Política. Por outro lado, a persistência
de uma concepção essencialista da cultura contribui para certo desprezo
dos fenômenos do poder e da política na literatura etnográfica.
Por isso, ainda é muito comum encontrar trabalhos de cientistas políti-
cos que, fundados nessa forma de conceber e praticar a etnografia parte de
uma problemática e de escolhas técnicas totalmente prontas a respeito dos
objetos, sejam eles instituições, partidos, militância, grupos dirigentes etc.
Nesses casos, o que chamam de etnografia serve apenas para amenizar o
forte peso dado de antemão às técnicas quantitativas e às explicações esta-
tísticas com base em teorias “eurocentristas”. Do outro lado, a concepção
essencialista dos antropólogos no tratamento dado aos fenômenos cultu-
rais não contribui nem um pouco para que os fenômenos relacionados ao
poder e à política sejam tratados como objeto de investigação prioritária e
que, portanto, tenham um papel importante no processo de construção e
definição dos objetos de estudo da própria Antropologia.
A incorporação de uma orientação e prática reflexiva nos processos
de investigação dos fenômenos políticos constitui um dos aspectos fun-
damentais para uma maior aproximação entre etnografia e política. Isso
exige uma profunda mudança de atitude a respeito das teorias que são
210
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Antropologia, política e etnografia
Referências
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TILLY, C. Big Structures, Large Processes and Huge Comparisons. New York: Rusell Sage
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214
8. Os empresários enquanto
elite: a pesquisa empírica
Paulo Roberto Neves Costa
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1
Em outro trabalho aprofundamos essa discussão (COSTA, 2013).
2
Em outros trabalhos tivemos a oportunidade de tratar de algumas das questões teóricas
relacionadas ao estudo dos empresários enquanto elite — ver Costa (2012b; 2014).
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3
Embora esse ponto não possa ser explorado aqui, a definição dos mais ricos é algo muito
complexo. O tópico já foi abordado por Michael Gilding, ao tratar das dificuldades metodo-
lógicas para a definição das “rich lists” (GILDING, 1999). Este autor afirma que até o início dos
anos 1980 esse tipo de lista era feita pelos radicais de esquerda como forma de denunciar
as desigualdades inerentes ao capitalismo e só depois passou a ser feita pelas revistas de
negócios, tornando-se não só referência como também um sucesso editorial.
4
Mills busca informações sobre as variáveis relacionadas ao background social (história fami-
liar), religião, idade de ingresso e trajetória na atividade empresarial, trajetória educacional,
renda, hábitos de vida, estilo de gestão e de liderança e até a “sorte" (aspas de Mills). Vale
mencionar também que o autor sugere uma tipologia das carreiras. (MILLS, 1981, p. 160).
5
Sobre a experiência de pesquisa com pequenos e médios empresários, ver Krishna e
Awasthi (1994).
220
Os empresários enquanto elite
grupo de controle com o qual comparar aqueles que seriam a elite econômi-
ca. Entretanto, por uma questão de precisão conceitual, a condição de elite
remete inescapavelmente a uma condição diferenciada, seja em termos de
poder econômico, seja de poder político.
6
Sklair fala de uma “corporate elite” como uma forma de expressão dessa “classe”
(SKLAIR, 2001, p. 295).
221
Como estudar elites
7
Kanter afirma: “O objetivo era encorajar os líderes a concordar com uma perspectiva,
um vocabulário comum, um conjunto de prioridades e de compromissos com a ação”.
Por fim, após a divulgação dos resultados, foram feitos acompanhamentos (“follow-up
actions”) junto a autoridades, associações e órgãos de imprensa. E conclui: “O processo
com um todo era um método não só para compreender o que seria a base de uma cola-
boração entre empresas e autoridades, mas também para ajudar a reforçá-la” (KANTER,
1999, p. 385 e seguintes; tradução livre).
222
Os empresários enquanto elite
8
Em relação à dimensão, foram considerados volume de negócios, depósitos e prêmios,
respectivamente para indústria, bancos e seguradoras. As posições foram definidas em
“níveis”: no primeiro, os altos gerentes e CEOs; no segundo, os membros da diretoria; no
terceiro, gerentes seniors e, no quarto, gerentes setoriais (SANSONETTI, 2004).
9
Na localização das “women business” Samsonetti considerou as 250 maiores corpora-
ções industriais e os 10 maiores bancos e companhias de seguro. Uma das empresas foi
escolhida de forma randômica e nela se procurou uma mulher que estivesse em posição
de relevo. Os homens foram considerados apenas como contrapartida. Em função da
taxa de retorno, apenas 21 países foram considerados (SANSONETTI, 2004).
223
Como estudar elites
10
Assim como Boltanski e Chiapello (2009), essa pesquisa analisa também publicações
especializadas voltadas para o chamado “mundo corporativo”.
224
Os empresários enquanto elite
11
Podemos destacar também a ponderação de Whitley (1974) em relação ao critério de
localização das maiores empresas, ao relativizar a variável “volume de negócios”, pois
não necessariamente isso significa volume de capital. Mas, considerando que poucas
das empresas com grande volume de negócios não possuíam também grande volume
de capital e que as que não estavam nesse segundo grupo tinham diretores comuns com
as do primeiro, Whitley manteve o critério de volume de negócios.
225
Como estudar elites
12
Foram estudadas 19 empresas a partir dos critérios de tamanho, localização e natureza
da atividade industrial (PAHL & WRINKLER, 1974).
13
Joly também usou material de imprensa, geral ou de economia, os quais teriam sido
muito úteis por conterem muitas informações, sendo que a distância cronológica ajudou
a neutralizar as distorções oriundas da forma como a imprensa relata os acontecimentos
(JOLY, 1996, p. 345 e seguintes). Em trabalho mais recente, Joly considera os dirigentes
industriais que aparecem regularmente em edições sucessivas do L’Annuaire Chaix: les
principales sociétés par action, au cours du 20e siècle (JOLY, 2012).
226
Os empresários enquanto elite
Em outro trabalho, Joly (2007) faz também um balanço dos estudos sobre o
recrutamento do “patronat” francês desde os anos 1960 e avalia que os levan-
tamentos sobre não só esse grupo como também as elites políticas têm sido
precários. Isso se passaria também na Alemanha e na Inglaterra. Joly constata
também que o primeiro desafio é selecionar as empresas e que a tendência
tem sido o uso dos levantamentos feitos pela imprensa especializada. O se-
gundo é selecionar as pessoas, os dirigentes dessas empresas, em geral de-
sembocando nos PDG, dado que eles concentrariam os poderes decisórios,
mas Joly levanta a questão da natureza parcial desse recorte e da necessidade
de considerar outros níveis da administração das empresas (JOLY, 2007).
Mayer e Whittington (1999) realizaram um estudo sobre as grandes em-
presas européias nos anos 1980 e 1990, por sua vez apoiado em pesquisa
que considera, do pós-II Guerra até os anos 1990, as 100 maiores empresas
nacionais do Reino Unido, da França e da Alemanha14. Os anos conside-
rados como referência foram 1983 e 1993. As empresas efetivamente con-
templadas na pesquisa variaram entre 60 e 75 em cada país. Foram usadas
fontes documentais e entrevistas com 78 dirigentes de empresa. A pesquisa
contemplou questões relacionadas às estratégias, ao desempenho, à pro-
priedade e liderança, mas o artigo em questão trata apenas das duas úl-
timas questões. Para tratar da propriedade, foram usados relatórios anu-
ais das empresas e levantamentos sobre as empresas de cada país. Sobre
a liderança, foram entrevistados os CEOs e usados material de imprensa e
levantamentos do tipo Who’s Who.
Em pesquisa sobre o perfil “demográfico e psicológico” dos jovens em-
presários na Índia, Kazmi (1999) utiliza uma série de entrevistas realizadas
com altos empresários indianos, feitas pelo jornal The Financial Express.
Kasmi admite que o uso desse tipo de fonte secundária limita as possibi-
lidades de seu uso, mas que não deixariam de ser um material importante
para a realização da pesquisa.
Em trabalho sobre o surgimento de uma “business elite”, definida como
“[...] os empresários do alto escalão que graças aos seus recursos finan-
ceiros e econômicos possuem uma influência significativa na tomada de
decisão nas grandes questões nacionais”, na Rússia dos anos 1990 (KRYSH-
TANOVSKAYA; WHITE, 2005; tradução livre). Os autores também utiliza-
14
O critério de considerar as 100 maiores foi usado também por Scheuch (2003) em seu
estudo sobre as relações entre as elites e os regimes políticos na Alemanha.
227
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15
Pinçon e Pinçon-Charlot (2007) fazem também sugestivas ponderações sobre o pro-
cesso de estudo sociológico de grupos como o que aqui chamamos de elite econômica.
228
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16
Esse grupo foi dividido da seguinte forma: 50% para a indústria, 30% para o comércio
e os serviços e 20% para os bancos e seguradoras. Para a Grã-Bretanha, a ponderação do
setor financeiro foi de 25% em razão da importância financeira das empresas de Londres
(HARTMANN, 2011).
17
A pesquisa de 2006 contemplou 79 “líderes” de empresas com faturamento entre U$
100 milhões e U$ 10 bilhões e de setores como indústria, comércio, serviços de utilidade
pública, energia, telecomunicações etc. (PRICEWATERHOUSE; COOPERS, 2006).
18
O Grupo de Opinião Pública da Universidade de Lima faz trabalho semelhante, embora
com outros objetivos (GRUPO DE OPINIÃO PÚBLICA, 2003).
19
Os levantamentos do tipo Who’s Who são usados também por outros trabalhos, como
de Bond (2007), que analisa a relação entre as doações das empresas a partidos políticos
conservadores e a trajetória dos diretores por escolas e clubes de elite.
229
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Esse é o caso dos trabalhos de Sklair (1996) e Alexander, Nicholas e Walter (1984).
230
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O surpreendente é que os autores mencionam valores entre US$ 0,50 e US$ 1
(BEDNAR; WESTHPAHL, 2006).
231
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Se isso pode ser muito complicado quando se promete o anonimato total dos participan-
tes, o é também no início da pesquisa, embora possa permitir ao pesquisador priorizar os
nomes mais importantes e de grande reputação para criar um círculo virtuoso de sugestões.
A pesquisa International Management Studies acima mencionada adota um procedimento
interessante, ao começar pelos ex-CEOs aposentados que, além de terem maior disponibi-
lidade de tempo, têm certa ascendência ou ao menos contato com os que estão na ativa.
23
Os autores mencionam uma pesquisa feita por eles na qual enviaram questionários
para mais de 2600 top managers que estavam entre os mais importantes em 500 empre-
sas americanas, usando questionários diferentes – variando em extensão ou tamanho;
232
Os empresários enquanto elite
233
Como estudar elites
seus subordinados e assim por diante. O problema é que isso pode implicar
na seleção pelo top manager daqueles que vão participar. Existe também o
método “bola de neve”, que, como o método reputacional, busca saber quais
são os mais importantes portadores de informações relevantes, alguns até
fora da organização (para mais detalhes ver a discussão realizada no primeiro
capítulo deste livro). Segundo Welch et al., o melhor parece ser a combinação
dos dois métodos (WELCH et al., 2002, p. 620)26.
Quanto ao feedback, seu aspecto mais interessante seria aumentar a qua-
lidade das respostas, dado que elas passariam pela revisão do entrevistado,
daí a melhor eficácia do envio de um esboço de relatório (resultados). O en-
vio da transcrição das entrevistas foi a forma menos confiável e o envio de
um rascunho da versão final do relatório foi a mais adequada de feedback,
pois torna o pesquisador mais próximo de um consultor. Em relação à aber-
tura dos entrevistados, os autores sugerem também que os entrevistadores
se coloquem numa posição entre “terapeutas e espiões”, ou seja, enfatizan-
do a neutralidade acadêmica do trabalho e o desejo de ouvir o entrevista-
do27. Porém, não necessariamente alto grau de abertura significa alto grau
de utilidade das informações obtidas. Enfim, todas estas recomendações
estariam sujeitas aos contextos locais da pesquisa e Welch et al. (2002, p.
622 e seguintes) defendem a importância da pesquisa qualitativa e da en-
trevista em profundidade como forma de estudar os empresários enquanto
elite, no caso, da IB, embora reconheçam que a entrevista não é necessaria-
mente a melhor ou a única forma de obter dados28.
Em suma, os problemas levantados por Bednar e Westphal (2006) e Wel-
ch et al. (2002) certamente foram enfrentados por pesquisadores do meio
acadêmico, mas suas sugestões sobre a definição e a aplicação dos ques-
tionários são, além de surpreendentes, úteis. Os problemas levantados po-
dem acontecer mais intensamente nas pesquisas voltadas para as questões
26
Ezequiel Paz (2004), em pesquisa sobre a percepção dos empresários sobre a corrup-
ção, usou tanto a entrevista em profundidade quanto o sistema de indicação de novos
nomes por parte dos que haviam sido entrevistados. Como veremos adiante, procedi-
mento semelhante já foi utilizado por Boschi (1979) no Brasil no final dos anos 1970.
27
Os autores sugerem que, na presença de um intérprete, o entrevistado pode se sentir
menos à vontade para falar o que pensa e, nesse caso, é melhor usar um pesquisador
como intérprete do que uma pessoa local, dado que aquele também vai colaborar com
a tradução (WELCH et al. 2002, p. 622 e seguintes).
28
Outras interessantes ponderações sobre como entrevistar elites podem ser encontra-
das em Ostrander (1993).
234
Os empresários enquanto elite
235
Como estudar elites
29
Sobre essa distinção, ver Costa (2014).
30
Por exemplo, Eli Diniz utiliza a expressão “elites empresariais”, mas sua questão é
sobre a ação de entidades de representação (DINIZ, 2000).
236
Os empresários enquanto elite
31
Boschi complementou a pesquisa com a análise de uma das principais associações da
indústria, “[...] que compreendia o grosso dos interesses de um segmento substancial da elite
empresarial”, a Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (ABDIB). Essa seria
uma forma de “qualificar a hipótese geral”, dada a impossibilidade, segundo Boschi, de um
teste empírico rigoroso (BOSCHI, 1979, p. 9).
32
Em relação a esse último aspecto, os autores partiram dos nomes que apareceram no fó-
rum da Gazeta Mercantil ente 1979 e 1989 e também dos dados do Grupo de Análise de
Conjuntura do Instituto de Pesquisa Social da Escola de Sociologia e Política de São Paulo. A
partir dessas fontes, foram levantados os nomes dos empresários que mais apareceram na
grande imprensa (DINIZ; BOSCHI, 2004).
237
Como estudar elites
33
Essas informações foram obtidas de uma breve nota metodológica contida no texto, o
que nem sempre acontece nos trabalhos.
34
Loureiro e Olivieri (2002) chamam de “elite econômica” os altos dirigentes das agências
econômicas do Estado e das grandes empresas industriais, mas nesse trabalho se dedi-
cam a fazer uma revisão bibliográfica. Martins (1985), ao tratar das interpretações sobre
o Estado no Brasil no pós-1964, analisa a origem social, as carreiras e o status funcio-
nal de 107 indivíduos dos quadros de agências estatais e aplica um survey e entrevistas
238
Os empresários enquanto elite
Pesquisas mais recentes sobre as elites brasileiras também podem ser cita-
das. Lima e Cheibub (1994) estudaram através de um survey os valores e opi-
niões das elites, entre elas 95 empresários de um total de 320 entrevistados,
entre outubro de 1993 e maio de 1994. Segundo os autores, Celso Lafer apre-
sentou os empresários da amostra feita entre as empresas e grupos privados,
industriais, agrícolas e financeiros, nacionais e multinacionais e de empresas
estatais, estratificados por tipo de capital (privado nacional, privado multi-
nacional e estatal) e por patrimônio líquido. Foram considerados também os
nomes mais citados por Gazeta Mercantil, Visão, Exame e Conjuntura Econô-
mica, de 1992. E compunha também a amostra algumas das “principais asso-
ciações e sindicatos empresariais”, também a partir de citações de imprensa.
Lamounier e Souza (2002) também estudaram as percepções da “elite”
brasileira sobre o passado recente. Foram entrevistadas 500 pessoas, dos
quais 71 “grandes empresários” (a partir da lista do “200 maiores grupos”
da Exame, com “acréscimos sugeridos por especialistas”) e considerando
os nomes mais “influentes na vida brasileira”. Foi utilizado um questioná-
rio com alternativas pré-fixadas em função do grande número de partici-
pantes, na grande maioria aplicados pessoalmente e os demais pelo cor-
reio; mais de 80% da amostra total é das regiões Sudeste e Centro-Oeste.
Outros estudos mais recentes, embora não se voltem para a questão dos em-
presários enquanto elite, comportam o trabalho de produção de dados a partir
de metodologias semelhantes às dos trabalhos comentados nos itens anterio-
res. Em sua pesquisa, Mancuso (2007) enviou questionários para 63 entidades
sindicais e associativas da indústria, obtendo 47 respostas. Por sua vez, Minella
(2007; 2013) sugere um procedimento metodológico que pode ser de grande uti-
lidade para o estudo dos empresários enquanto elite, que é a análise de redes.
Há também abordagens com certa perspectiva histórica. Marcovitch
(2006) descreve as trajetórias dos primeiros “empreendedores” brasileiros.
A lista de nomes se pautou pelo “êxito econômico”, pela presença de “carac-
terísticas típicas do empreendedorismo” e por suas “singularidades” frente
à história econômica do Brasil. A obra se caracteriza por uma narrativa his-
tórica da relação entre o indivíduo, sua família e as questões de seu tempo,
em especial as econômicas. Há ainda um trabalho do CPDOC (2011) que con-
239
Como estudar elites
35
Em alguns casos, durante a aplicação dos questionários, da mesma forma que ocorreu na
pesquisa de Diniz e Boschi (2004), também tivemos a presença de profissionais ou técnicos
entre os entrevistados, embora a grande maioria tenha sido de presidentes e alguns direto-
res. Ver Costa (2007); Costa e Engler (2008); Costa (2012a) e Costa, Roks e Santos Filho (2012).
240
Os empresários enquanto elite
241
Como estudar elites
242
Os empresários enquanto elite
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Como estudar elites
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246
9. A prosopografia explicada
para cientistas políticos
Flávio Heinz
Adriano Codato
249
Como estudar elites
1
Sobre esse ponto específico ver Love & Barickman (1986) onde se discute a separação
entre Rulers e Owners.
2
Para uma discussão sobre os múltiplos sentidos do termo “prosopografia” e suas nuan-
ças, ver Bulst (2005). Uma obra em português que traz textos úteis para se entender essa
técnica de pesquisa com elites é a organizada por Heinz (2006b).
3
Sobre isso, ver Offerlé (1999) e Charle (2006b), para a França, e Keats-Rohan para o
Reino Unido (2007).
250
A prosopografia explicada para cientistas políticos
4
A propósito dos limites e vantagens do uso do survey no estudo do recrutamento polí-
tico, ver o capítulo 2 deste livro (p.33).
251
Como estudar elites
5
Ver, por exemplo, Abreu (2014), Abreu et al. (2001) e Monteiro (1994).
252
A prosopografia explicada para cientistas políticos
sobre membros de grupos dirigentes, mas precisam ser analisados à luz das
circunstâncias específicas de sua produção, do formato escolhido para a
apresentação dos dados, da participação do biografado na sua exposição,
enfim, das intencionalidades editoriais presentes em cada um deles, come-
çando da lista de quem merece ser biografado (HEINZ, 2011). Normalmen-
te, a consulta a esses dicionários exige cautela e determinação em depurar
as informações úteis em meio ao emaranhado discursivo que a reveste,
operação semelhante àquela exigida no tratamento de outra fonte de pre-
dileção de prosopógrafos: os necrológios.
Assim, a prosopografia não se resume à produção de tabelas de frequ-
ência com informações sócio-profissionais e de carreira sobre agentes po-
líticos do passado, a partir de dados pré-construídos, mas à produção de
uma base de dados que, em boa medida, reúna um conjunto de evidências
fabricadas pelo pesquisador, isto é, informações que reconheçam o aspecto
lacunar do perfil produzido como estruturado socialmente. E que busque
superar esse aspecto com pesquisa documental minuciosa.
2. Monografias exemplares
Alguns dos melhores resultados obtidos pela aplicação do método proso-
pográfico no Brasil estão na análise de grupos dirigentes. Referimo-nos, por
exemplo, aos trabalhos de Barman & Barman (1978) ou o estudo de José Murilo
de Carvalho (1996) sobre a elite política do Império e à vasta pesquisa compa-
rativa empreendida por Joseph Love (1982), John Wirth (1982) e Robert Levine
(1980) sobre as elites regionais de três estados da federação brasileira, cobrin-
do o período que vai do início da Primeira República, em fins do século XIX, ao
golpe do Estado Novo6. Estas três pesquisas tiveram seus resultados reexami-
nados e submetidos a novo processamento computacional uma década mais
tarde, resultando em um trabalho que, pelo volume e pela riqueza dos dados
ali reunidos, constitui ótimo exemplo das imensas possibilidades da aborda-
gem prosopográfica em estudos de elites (LOVE; BARICKMAN, 1991).
Embora a prosopografia de tradição francesa tenha se imposto paulati-
namente entre os historiadores brasileiros nas últimas duas décadas, nota-
damente através da divulgação dos trabalhos de Christophe Charle, as mais
importantes contribuições para a história dos grupos dirigentes brasileiros
6
Exemplos mais recentes de retomada de uma perspectiva prosopográfica exitosa no
trato da política brasileira do século XIX são (MARTINS, 2007; VARGAS, 2010).
253
Como estudar elites
254
A prosopografia explicada para cientistas políticos
255
Como estudar elites
256
A prosopografia explicada para cientistas políticos
7
A observação é de Schwartzman, (1983, p. 367–368). Para uma explicação do argumen-
to, ver Schwartzman (1982, p. 26; 36–37).
257
Como estudar elites
8
Conforme a observação clássica de Wright Mills, “o poder não pertence a um homem.
A riqueza não se centraliza na pessoa do rico. A celebridade não é inerente a qualquer
personalidade. Ser célebre, ser rico, ter poder, exige o acesso às principais instituições,
pois as posições institucionais determinam em grande parte as oportunidades de ter e
conservar essas experiências a que se atribui tanto valor” (MILLS, 1981, p. 19, grifos meus).
258
A prosopografia explicada para cientistas políticos
9
Sobre o método posicional, veja o capítulo 1 deste livro (p.20).
10
Para maiores detalhes do significado e funcionamento do DAESP, ver Codato (2011; 2014).
11
Havia sete secretarias no estado de São Paulo: Justiça, Fazenda e Tesouro, Viação e
Obras Públicas, Educação e Saúde, Agricultura, Indústria e Comércio, Segurança Pública
e a Secretaria de Governo
259
Como estudar elites
12
São Paulo, ou seja, as relações de suas elites políticas com a ditadura do Estado Novo se
tornaram, assim, um “exemplo dramático” e não um “exemplo paradigmático”, isto é, um
caso único, extraordinário e decisivo para a explicação do problema considerado. Sobre
essa diferença ver Eckstein (1975, p. 79–137).
260
A prosopografia explicada para cientistas políticos
13
A ficha prosopográfica depende do nível de profundidade e do grau de detalhe sobre
as biografias coletivas que o estudo espera alcançar, além, é claro, das características que
se quer relevar do grupo estudado. Aqui não há muitas receitas e os dados podem ser
sistematizados num software mais simples (Excel, por exemplo) ou mais complexo, com
mais recursos e projetado para esse fim (File Maker, por exemplo). Ou serem registrados
em papel e datilografados, se você preferir. Uma sugestão simples e especialmente boa de
Ferrari é elaborar, para aqueles indivíduos mais representativos do grupo em questão, para
os quais se achou muito mais dados ou para aqueles que pretendemos construir um perfil
individual, uma ficha em separado (FERRARI, 2010, p. 543). Discuti as formas concretas do
adesismo da classe política de São Paulo ao Estado Novo e as sucessivas reconversões
ideológicas de três membros do DAESP – Marcondes Filho, Miguel Reale e Marrey Júnior
– num artigo em que a existência de fichas individuais foi muito útil. Ver Codato (2013).
261
Como estudar elites
14
Sobre a lógica de construção do DHBB, veja o capítulo 3 deste livro (ver p.78).
15
Essas “Biografias políticas dos membros do Departamento Administrativo do estado de
São Paulo durante o Estado Novo” estão disponíveis no site Research Gate: <http://bit.
ly/1JNqUl9>. Acesso em: 7 set. 2015.
262
A prosopografia explicada para cientistas políticos
acaso para topar com os dados que mais se precisará, mas alguma imaginação
para cavar evidências onde for possível. Como a grande maioria deles virou
nome de rua, consultei com grande proveito um livro chamado História das
Ruas de São Paulo. No Banco de Dados Folha (da Folha de S. Paulo) consegui
ler alguns necrológios em jornais velhos. Quando um desses atores havia
sido (felizmente, para a pesquisa), secretário de estado, algumas secretárias,
mas não todas, traziam uma curtíssima biografia que, às vezes, continha
uma informação inédita. Refazer o cursus honorum, a sequência de posições
políticas, foi, ao lado do perfil ideológico, uma das tarefas mais complicadas.
Como, nesses casos de poucas pessoas, tudo é muito importante, ou ao
menos nós temos a ilusão de que tudo deve afinal significar algo, foi preciso
começar a estudá-los pelos Annaes da Câmara Municipal de São Paulo, uma
publicação dificílima de se acessar, mas não tanto como o raríssimo livro
manuscrito de assentamentos do Instituto Histórico e Geográfico de São
Paulo, Propostas para admissão de sócios: 1933-1938.
O trabalho de Sérgio Braga, Quem foi quem na Assembleia Constituinte de
1946 (BRAGA, 1998), resolveu muitos problemas, mas apenas para aqueles
integrantes do Departamento que, depois do Estado Novo, tiveram uma
carreira nacional. Alguma coisa eu pude encontrar em O legislativo paulista
(NOUH; CARNEIRO, 1983). Esse é um daqueles títulos que existem somen-
te na Biblioteca da Divisão do Arquivo Histórico da Assembleia Legislativa
do estado de São Paulo, e ele está acessível desde que se saiba da existên-
cia dessa repartição. As relações de conflito entre a elite nacional e a elite
estadual são daqueles quebra-cabeças que exigem juntar muitos e muitos
papéis antes de se tentar dar qualquer ordem a eles. Esses papéis, eu acabei
encontrando-os em dois grandes Arquivos. Mas só se deve visitá-los depois
que se souber muito bem o que irá procurar lá dentro: o Arquivo Getúlio Var-
gas, no Museu da República (isto é, no Palácio do Catete); e os documentos
do Gabinete Civil da Presidência da República (Série: Governos Estaduais)
guardados nas latas do Arquivo Nacional16. Igual lição eu aprendi depois de
ler a primeira vez os dois abundantes volumes dos Diários de Vargas. Desco-
bertos apenas nos anos 1990, eles cobrem o interessantíssimo quotidiano da
Presidência e do presidente entre outubro de 1930 e 1942, quando sua reda-
ção é interrompida (VARGAS, 1995). Embora haja um bom aparato crítico, os
16
Resumi uma parte dos resultados em Codato (2010).
263
Como estudar elites
Ver O Sr. Laffer e sua nomeação para o Departamento Administrativo. Correio da Ma-
17
nhã, 24 jun. 1939, p. 14. Jornal lido no Arquivo Edgard Leuenroth, em Campinas (SP).
264
A prosopografia explicada para cientistas políticos
18
São eles: (1922) 18 do Forte; (1924-1927) Coluna Prestes; (1930) Revolução; (1931)
Clube Três de Outubro; (1932) Levante Constitucionalista; (1932) Lado governista; (1935)
Intentona Comunista; (1937) Golpe que instaura o Estado Novo; (1938) Revolta Integra-
lista; (1932) Ação Integralista Brasileira; (1945) Golpe que põe fim ao Estado Novo.
265
Como estudar elites
266
A prosopografia explicada para cientistas políticos
267
Como estudar elites
O propósito geral da pesquisa era lançar luz sobre as conexões entre pro-
priedade da terra, representação associativa e carreira política num período
de profundas transformações do quadro legal das relações de trabalho e do
direito fundiário no Brasil, período esse com crescente incorporação dos
temas do universo rural à agenda política e parlamentar do País.
268
A prosopografia explicada para cientistas políticos
Conclusões
A importância analítica dada ao estudo das propriedades e das trajetórias
coletivas de um conjunto de agentes pressupõe um esquema interpretativo
do mundo social. Esse esquema deriva, por sua vez, de dois princípios sub-
jacentes: em primeiro lugar, o foco em agregados concretos de indivíduos,
historicamente situados, é central para se entender o funcionamento do
mundo social (no lugar de grandes abstrações teóricas como “classes so-
ciais”, por exemplo); em segundo lugar, seus atributos, enquanto grupo,
são relevantes para explicar tanto seus comportamentos efetivos (opções,
decisões concretas, disposições subjetivas), como a configuração assumida
pelas instituições (“Estado”, “regime político”, etc.).
Dito isso, recordemos então os elementos chave da definição de Stone
(2011), citada no início deste capítulo. A prosopografia é, ao lado de outros
artifícios também estudados nesse livro, uma técnica de pesquisa. Ela está
269
Como estudar elites
19
Esse aspecto também foi discutido no capítulo 3 deste livro. Ver em particular o subi-
tem sobre a seleção das variáveis, na p.68.
270
A prosopografia explicada para cientistas políticos
271
Como estudar elites
272
A prosopografia explicada para cientistas políticos
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275
Apêndices
Apêndice 1 – Como elaborar um survey1
Caminhos para o poder: seleção de candidatos para Deputado Federal no Brasil nas eleições 2010
1
Survey mencionado no capítulo 2 “O uso do survey no estudo do recrutamento político:
limites e vantagens”.
281
Como estudar elites
V.7.a. SE superior completo ou acima, o V.11.a. Se SIM, qual outro partido o senhor
senhor poderia dizer qual curso? já foi filiado?
Partido 1 Ano
V.8. O senhor poderia nos dizer a sua profissão?
Partido 2 Ano
[Se responder político profissional, ir para a V.9.]
Partido 3 Ano
V.8.a. [No caso de profissão NÃO POLÍTICA V.12. O senhor já ocupou cargo político antes
na V.8.] O senhor exerce esta profissão junto desta candidatura?
com sua atividade política?
282
Como elaborar um survey
V.14. O senhor poderia nos dizer, quanto 7. Possibilidade de representar meu partido
tempo em média dedica às atividades político- 8. Possibilidade de desenvolver uma carreira
partidárias no período de um mês? política
88. NS
V.14.a. Políticas 99. NR
283
Como estudar elites
V.18. [ANEXO 05] O senhor poderia dizer V.20.a. [ANEXO 07] Se NÃO, por favor, nos
quais características avalia como as três mais indique dentre as alternativas abaixo, quais
importantes para ser eleito Deputado Federal? fatores o senhor julga limitar as chances de
candidaturas femininas [selecionar 3 opções
1º 2º 3º
de resposta, por ordem de importância].
1. Conhecimento sobre o funcionamento 1º 2º 3º
da “política”
2. Recursos financeiros próprios 1. As mulheres colocam a família acima
3. Domínio de oratória e retórica política de uma carreira política
4. Possuir bom trânsito no partido 2. As mulheres não têm um preparo adequado
5. Possuir densidade eleitoral (bom de voto) para o exercício de cargos políticos
6. Boa reputação pessoal ou prestígio 3. As mulheres encontram dificuldade
profissional fora da vida política em conciliar as funções políticas com as
7. Firmeza ideológica atividades familiares e domésticas
8. Apoio de movimentos sociais e de base 4. Os partidos limitam as oportunidades
9. Disponibilidade (tempo) de as mulheres alçarem cargos e postos
88. NS políticos
99. NR 5. As mulheres têm pouco interesse
por política
V.19. [ANEXO 06] Sobre o processo de seleção 6. A vida política é impraticável para as
de candidatos em seu partido, o senhor diria que mulheres
o mesmo é [selecionar três opções de resposta]. 88. NS
99. NR
284
Como elaborar um survey
285
Como estudar elites
286
Como elaborar um survey
V.29. [ANEXO 09] O senhor poderia nos dizer 5. Votos de lideranças e/ou Executiva do partido
qual tipo de apoio obteve ou espera obter de
Sim Não
seu partido para campanha eleitoral?
6. Indicação de lideranças regionais
Sim Não
1. Recurso Financeiro 7. Indicação da Executiva (regional ou estadual)
2. Material de campanha (panfletos, santinhos)
Sim Não
3. Espaço no horário eleitoral gratuito
4. Apoio da militância 8. Indicação de um único líder do partido
5. Apoio político de parlamentares ou líderes
Sim Não
do partido
6. Desfrutar do programa do partido 88. NS
7. Desfrutar do prestígio do partido 99. NR
8. Não espero obter/Não obtive apoio
88. NS
V.32. Sobre as lideranças do seu partido, o
99. NR
senhor poderia nos dizer as três pessoas que
acredita serem as mais influentes em seu
V.30. O senhor poderia nos dizer quantas
partido no Estado.
vezes foi candidato a Deputado Federal
por seu partido?
1. Posição:
2. Posição:
V.31. [ANEXO 10] Tendo em vista sua 3. Posição:
experiência durante o processo de seleção de
candidatos a deputado federal em seu partido, o V.33. Por favor, o senhor poderia citar três
senhor diria que o processo é feito em sua maior nomes que considera importantes dentro do
parte por (após a respostas, solicitar a indicação partido para o sucesso de sua candidatura.
do processo predominante no partido).
1. Posição:
Opção predominante:
2. Posição:
Sim Não
V.34. Quando o senhor resolveu tornar-se
2. Indicação de filiados candidato, o senhor acreditava que seria de fato
escolhido pelo partido para compor a lista?
Sim Não
3. Indicação por associações ou instituições
ligadas ao partido
1. Sim [Ir para a V.34.a.]
Sim Não 0. Não [Ir para a V.34.b.]
4. Voto por delegados e/ou representantes 88. NS
eleitos do partido 99. NR
Sim Não
287
Como estudar elites
V.34.a [ANEXO 11] Por que o senhor V.35.a. [ANEXO 13] Se SIM, por qual motivo?
acreditava que conseguiria de fato ser
candidato pelo partido?
1º 2º 3º 1. Baixa concorrência dentro do partido
2. Grande montante de recurso financeiro
1. Baixa concorrência dentro do partido 3. Boa inserção dentro do partido
2. Baixa concorrência em meu estado 4. Possibilidade de fazer uma boa votação
3. Sua boa inserção dentro do partido 5. Boa reputação em minha vida pessoal
4. Possibilidade de fazer uma boa votação e/ou profissional
5. Boa reputação em minha vida pessoal e/ 6. Influência de líder partidário importante
ou profissional 7. Possuo boa quantidade de recursos
6. Possibilidade de trazer votos para o financeiros próprios
partido, mesmo se não eleito 88. NS
7. Influência de líder partidário importante 99. NR
8. Possuo boa quantidade de recursos
financeiros próprios V.36. E o senhor acredita que o partido aposta
88. NS em sua vitória?
99. NR
1. Alta concorrência dentro do partido V.36.a. [ANEXO 14] Se SIM, por qual motivo?
2. Alta concorrência em meu estado
3. Pouca inserção dentro do partido
4. Pouca possibilidade de fazer boa votação
1. Baixa concorrência dentro do partido
5. Não tenho apoio de líder partidário
2. Baixa concorrência em meu estado
importante
3. Boa inserção dentro do partido
6. Pouca quantidade de recursos financeiros
4. Possibilidade de fazer uma boa votação
próprios
5. Boa reputação em minha vida pessoal e/
88. NS
ou profissional
99. NR
6. Influência de líder partidário importante
7. Possuo boa quantidade de recursos
V. 35. E o senhor acredita que pode vencer
financeiros próprios
as eleições?
88. NS
99. NR
288
Como elaborar um survey
1 2 3 4 5 6 7
88. NS
99.NR
1 2 3 4 5 6 7
88. NS
99. NR
289
Apêndice 2 - Como formar matrizes de dados biográficos1
1. Contextualização da coleta
OS BANCOS DE DADOS discriminados neste documento fazem parte de
uma pesquisa que está mapeando a carreira política e o background social
da classe política brasileira. Essa expressão se refere a todos os indivíduos
que foram parlamentares na Câmara dos Deputados e no Senado Federal
do Brasil, desde a proclamação da República em 1889. A coleta tem sido
realizada retrospectivamente, e em três etapas, que fazem cortes tempo-
rais a partir das fontes disponíveis em diferentes períodos. Na primeira
etapa coletamos os dados para os senadores eleitos durante a democracia
recente, entre 1986 e 2010, e a fonte foi o DHBB – CPDOC/FGV2. Na segun-
da etapa coletamos os dados dos senadores eleitos entre o primeiro ciclo
pluripartidário (1945-1964) e a Ditadura Militar (1964-1982) e a fonte uti-
lizada foi o Dicionário Histórico Bibliográfico Brasileiro (DHBB – CPDOC/
FGV). Os verbetes do dicionário também foram acessados na internet. A
terceira etapa da coleta se refere aos senadores eleitos entre 1890 e 19343,
e nesta terceira etapa a principal fonte consultada foram as fichas biográ-
291
Como estudar elites
ficas do PRODASEN, que nos foram enviadas por e-mail pela Coordenação
de Arquivo do Senado Federal (COARQ). O documento abaixo é detalha-
damente explicado no capítulo 3 deste livro.
1
Descrição pormenorizada das fases da coleta e das variáveis do banco de dados men-
cionados no capítulo 3 "O desenho e as fontes da pesquisa com elites parlamentares
brasileiras no século XX".
2
Como discutido no capítulo 3 (ver p.78), a publicação "Dados biográficos do Senado Brasi-
leiro" foi consultada apenas de maneira circunstancial na primeira etapa da pesquisa.
3
A 37ª legislatura foi interrompida em 10 de novembro de 1937, com o golpe que ins-
taurou o regime do Estado Novo no Brasil. Entre 1937 e 1945 toda a atividade legislativa
foi suprimida no Brasil.
292
Como formar matrizes de dados biográficos
• Coluna “ID”. Essa coluna faz a lista numérica das entradas no banco.
• Coluna “Nome do digitador”. Quem fez a coleta desta linha.
293
Como estudar elites
Estado de nascimento
Bloco 1 – informações de identificação e
mandato (nome, nascimento, partido e
1 - Acre
mandato foram inseridos por extenso)
2 - Alagoas
Códigos utilizados 3 - Amapá
4 - Amazonas
Sexo 5 - Bahia
6 - Ceará
1 - Homem 7 - Distrito Federal
2 - Mulher 8 - Goiás
294
Como formar matrizes de dados biográficos
295
Como estudar elites
296
Como formar matrizes de dados biográficos
• Coluna “ID”. Essa coluna faz a lista numérica das entradas no banco.
• Coluna “Nome do digitador”. Quem fez a coleta desta linha
• Coluna “Número do arquivo PDF”. Esse número indica de qual arquivo
PDF as informações desta linha foram extraídas.
297
Como estudar elites
298
Como formar matrizes de dados biográficos
7 - Prefeito/ intendente
Bloco 7 – direção partidária
8 - Deputado estadual
9 - Deputado federal Coluna nível
10 - Governador/interventor/presidente
de província 0 - Não foi dirigente partidário
11 - Senador 101 - Foi dirigente partidário em
12 - Presidente nível municipal
102 - Foi dirigente partidário em nível estadual
103 - Foi dirigente partidário em nível federal
Bloco 4 – síntese da carreira
Coluna perfil de carreira
Bloco 8 – vínculos associativos
1 - Sim
0 - Não
1 - Sim
0 - Não
299
Apêndice 3 – Como produzir uma ficha prosopográfica1
301
Como estudar elites
1
Ficha biográfica a partir dos dados prosopográficos mencionada no capítulo 9 “A proso-
pografia explicada para cientistas políticos”.
302
Como produzir uma ficha prosopográfica
2
Cf. notas explicativas a Manoel Luiz Lima Salgado Guimarães et alli (1982, p. 393)
303
Como estudar elites
304
Como produzir uma ficha prosopográfica
305
Como estudar elites
306
Como produzir uma ficha prosopográfica
Referências
GOMES, A. DE C. A invenção do trabalhismo. São Paulo: Vértice, Ed. Revista dos Tribunais;
Rio de Janeiro: IUPERJ, 1988
_____. Revista do Serviço Público, Rio de Janeiro, vol. 77, n. 2/3, nov.-dez. 1957.
MILLIET, G.; GAMA JR., F. I. DA (orgs.), Annaes da Câmara Municipal de São Paulo: 1926
(1o. anno da 12a. Legislatura). São Paulo: Ferrari & Losasso, s.d.
STONE, L. Prosopografia. Revista de Sociologia e Política, v. 19, n. 39, p. 115–137, jun. 2011.
307
Apêndice 4 – Como preparar um questionário com
questões abertas1
Pai
Bloco A - DADOS INICIAIS
Mãe
V.1. Nome:
Avô Materno
0. Feminino Pai
1. Masculino
Mãe
99. NR
Avô Materno
V.5. Estado civil:
Avó Materna
Avô Paterno
0. Não
BLOCO B: Origens Sociais 1. Sim
88. NS
V.6. Qual a profissão dos seguintes 99. NR
ascendentes? (Especificar ao máximo, evitando
categorias genéricas, como, por exemplo,
“militar”, “comerciante”, “funcionário
público” ou “professor”.)
1
Questionário mencionado no capítulo 6 “Pesquisando grupos profissionais: dilemas
clássicos e contribuições recentes”.
309
Como estudar elites
1. Simpatizante 1. Simpatizante
2. Militante 2. Militante
3. Associado 3. Associado
Outros. Qual? 88. NR
99. NS
V.10.a. Se sim, ocupou algum cargo? Outros. Qual?
310
Como preparar um questionário com questões abertas
V.21. Se privado
BLOCO C: Trajeto Escolar
1. Pais
2. Trabalho 1. Bolsa
Outros. Quais? 2. Recursos Próprios
88. NS
V.20. Qual colégio em que concluiu o 2º Grau? 99. NR
V.20.a. Esse colégio era público ( ) V.27. Se recursos próprios, qual a origem:
ou privado ( )?
1. Pais
V.20.b. Em que município estava situado? 2. Trabalho
Outros. Qual?
311
Como estudar elites
V.28. Você realizou vestibular (es) para outro (s) V.33. Se possuir pós-graduação: em que área,
curso (s) além dos acima especificados? qual ano de entrada e de conclusão, em que
universidade e qual o nível (especialização,
mestrado ou doutorado):
0.Não
Curso
1.Sim
88. NS Ano
99. NR
Instituição
0. Não
Curso
1. Sim
Ano 88. NS
Instituição 99. NR
1. Graduação
2. Especialização
3. Mestrado V.37. Qual cargo você ocupa atualmente?
4. Doutorado
5. Pós-doutorado
88. NS V.38. Desde quando ocupa este cargo?
99. NR
312
Como preparar um questionário com questões abertas
1. Efetivo 1. ONG
2. Estagiário 2. Instituição Filantrópica
3. Confiança 3. Movimento Social
4. Comissionado 4. Outro. Qual?
5. Cedido 88. NS
6. Outro. Qual? 99. NR
V.42. Que empregos ou atividades V.46. Quem são os membros e quem incitou
profissionais você desempenha atualmente? você a trabalhar na organização.
Emprego/ocupação 1. Amigos
Instituição 2. Conhecidos, colegas de trabalho
Período 3. Participação em outros grupos e movimentos
Fatores que contaram para ocupação de cada sociais
cargo: 1 (indicação de amigos); 2 (convites de 4. Família
colegas de trabalho); 3 (concurso); 4 (outros) 5. Outro. Qual?
88. NS
V.43. Você faz ou já fez no passado alguma 99. NR
atividade voluntária?
V.47. Seu cargo atual é remunerado:
0. Não
1. Sim 0. Não
88. NS 1. Sim
99. NR 88. NS
99. NR
313
Como estudar elites
V.48. Marque com um “x” dentro dos V.50.a. Se sim, qual a condição abaixo
parênteses abaixo sua renda atual em salários
mínimos
1. Financiado
1. Até 5: ( )
2. Quitado. Se quitado, desde quando:
2.De 5 a 10: ( )
88. NS
3.De 10 a 15: ( )
99. NR
4.De 20 a 25: ( )
5.De 25 a 30: ( )
V.51. Quais outros bens possui?
6.De 30 a 35: ( )
7.De 40 a 45: ( )
8.De 45 a 50: ( )
9. Acima de 50: ( )
BLOCO E. Participação sindical e político
V.49. Possui casa própria? partidária
0. Não
V.53. Já teve oportunidade de exercer cargos
1. Sim
de direção em sindicatos ou associações
88. NS
profissionais?
99. NR
0. Não
1. Sim
88. NS
99. NR
314
Como preparar um questionário com questões abertas
V.53.a. Se sim em que período? V.56.b. Você ocupava algum cargo nesta
instituição?
V.53.b. Qual o cargo?
1. Presidente
0. Não
2. Vice-Presidente
1. Sim
3. Secretário
88. NS
4. Tesoureiro
99. NR
5. Outro. Qual?
315
Como estudar elites
1. Voluntário
2. Funcionário
3. Estagiário
4. Outro. Qual?
88. NS
99. NR
c) concurso
d) outros (especificar)
1. Atualmente
2. De 1-5 anos atrás
3. De 6-10 anos atrás
4. De 11-15 anos atrás
5. De 16-20 anos atrás
88. NS
99. NR
316
Sobre os autores
318
Sobre os autores
319
Este livro foi composto pelas fontes Avenir Next e
Guardian TextEgyp, impresso em offset, nos papeis Polén
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a capa, pela gráfica ICQ - Curitiba (PR) – para a Editora
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