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RECENSÃO CRÍTICA

“Entre África e a Europa: A Política Externa


Portuguesa 1890-2000” de Nuno Severiano Teixeira

Unidade Curricular: História das Relações Internacionais Portuguesas


Docente: Bruno Rocha

Maria Miguel Costa e Sousa


Número de aluno: a2022129896
O presente capítulo “Entre a África e a Europa: A Política Externa
Portuguesa,1890-2000”, da autoria do professor catedrático Nuno Severiano Teixeira, é
o quarto capítulo da obra Portugal Contemporâneo, publicado em maio de 2005.

O mesmo sintetiza os vetores principais orientadores da política externa


portuguesa desde o final do século XIX até ao século XX inclusive. Após uma breve
introdução onde é salientada a pequenez de Portugal na época e a sua constante busca de
equilíbrio geopolítico entre a pressão continental e a procura de uma alternativa marítima,
o autor divide o seu trabalho, cronologicamente, em quatro subtemas correspondentes aos
regimes da história de Portugal, dentro dos quais irá proceder à análise das suas constantes
e das suas diferenças no âmbito da política externa portuguesa, e o impacto que estas
tiveram na mesma. Por fim conclui defendendo que, apesar de haver algumas mudanças
ideológicas, as áreas de interesse estratégico de Portugal se mantêm ao longo do tempo,
sendo estas: o Atlântico, a Europa e as relações coloniais.

Começando com a Monarquia Constitucional, este é um período marcado pela


dominância da aliança inglesa, pela questão colonial e pelo perigo de anexação de
Portugal por parte de Espanha. A tentativa de aproximação de Portugal à Alemanha
enquanto potência mundial, conjugada com os conflitos de índole colonial culminaram
no Ultimato Inglês em 1890, que para além das consequências a nível de política externa,
resultou num sentimento nacional ofendido. De uma forma clara é adotada uma perspetiva
neorrealista defensiva, por parte de Portugal que pretende manter os seus impérios
coloniais e de Inglaterra que ambiciona manter a sua hegemonia.

O tema que se segue é a Primeira República, que teve início em 1910. Aqui é
abordada a dificuldade de reconhecimento da República em Portugal numa Europa onde
predominavam as monarquias, bem como as causas que poderiam ter levado o país a
entrar no teatro de guerra europeu ao lado dos aliados. Segundo o autor existem duas
teorias explicativas para esta decisão, a primeira consiste na salvaguarda das colónias, a
segunda está relacionada com a vontade de assegurar o lugar no concerto europeu e
afastar o perigo espanhol. Adiciona ainda uma terceira teoria, relativa à consolidação e
legitimidade democrática para a República. Contudo, citando o professor “a política
externa portuguesa foi traída pelo seu próprio voluntarismo” (p.100). Algo que aprofunda
melhor no artigo História Contemporânea de Portugal: A Crise do Liberalismo 1890-

1
19301, pois Portugal não reúne condições económicas e militares para alcançar os seus
objetivos. Não obstante ter saído historicamente vitorioso, este nem chega sequer a ser
considerado para participar no comité́ executivo da Sociedade das Nações. É também
evidenciada a forma como Inglaterra instrumentaliza Portugal para alcançar os seus
objetivos e manter o status quo quando o autor afirma “Uma coisa, porém, era certa, este
instrumento de estabilização internacional que a política externa inglesa não hesitava em
usar quando se mostra útil aos seus interesses e objetivos, constituía uma ameaça real e
concreta às colónias e ao projeto imperial português” (p. 98).

Pode dizer-se que com a República há uma tentativa (aparentemente falhada) de


dar um salto para a europeização, todavia, como veremos a seguir, tal não se verifica no
regime seguinte.

Com a instauração do Estado Novo, em 1926, é percetível uma mudança da


política externa portuguesa. As opções estratégicas de Salazar resumem-se a um
afastamento das questões europeias e uma maior incidência na questão colonial e num
Portugal virado para o Atlântico. Neste período assistimos a uma estabilização das
relações com Espanha, evidenciada pela assinatura do Pacto Ibérico. Segundo o autor,
este fator juntamente com a aliança inglesa irão potenciar a posição neutral de Portugal
na segunda guerra mundial. Verifica-se novamente a presença de um neorrealismo
defensivo, na medida em que Salazar ao adotar esta neutralidade visa a preservação do
status quo. Afinal, se Portugal tivesse finalmente alcançado um equilíbrio geopolítico e
se encontrava numa fase favorável no que dizia respeito à política externa, a que propósito
se iria envolver numa guerra? Esta visão neorrealista de Salazar é incompatível com a
visão neoliberal que, com o surgimento das primeiras organizações internacionais e a
substituição da luta pelo poder pela cooperação, começa a ganhar forma no contexto
internacional. De acordo com o autor, o ditador “…não compreende que a reconstrução
da Europa não podia fazer-se, já, num quadro nacional, mas que teria que fazer-se,
necessariamente, num quadro de cooperação internacional” (p. 106). Ainda assim, apesar
de toda a desconfiança por parte de Salazar, Portugal entra na NATO (1949) e,
posteriormente, é admitido na ONU (1955).

1
Severiano Teixeira, N. (2014). História Contemporânea de Portugal: A Crise do Liberalismo 1890-1930.
Fundação Mapfre/Editora Objectiva, pp. 87-115

2
É importante acrescentar que Severiano centra a análise da política externa
maioritariamente na questão colonial africana e nas relações diplomáticas com a
Inglaterra, em detrimento de outras colónias portuguesas tais como: Macau, Timor, Goa,
Damão e Diu. Há, portanto, um vazio de conteúdo numa parte fundamental da política
externa portuguesa, lembrando que durante este período estava a ocorrer em simultâneo
uma guerra no pacífico que envolvia Macau2, determinante para as relações luso-
chinesas, Timor que “acabaria por não escapar às devastações da guerra mundial”
(Ramires, 2006, pp.005)3, e a queda do chamado Estado Português da Índia, Goa, Damão
e Diu.

Do mesmo modo é notória, ao longo de todo o capítulo, a exiguidade de


informação acerca da política interna, algo que influencia a política externa e
consequentemente poderia ser benéfico para auxiliar o leitor na compreensão de
determinadas decisões e mesmo na mudança de regimes.

Finalmente, com o 25 de abril de 1974, há uma transição para a democracia,


período onde a política externa portuguesa sofre a mais radical mudança. Esta passa a ser
orientada pelos princípios de democratizar e descolonizar, com a “opção europeia” como
novidade e desafio neste regime. Portugal acaba por adotar a mesma postura que o resto
do mundo que, numa perspetiva construtivista, se baseia na cooperação e socialização,
algo que é comprovado pela sua entrada e participação em organismos internacionais.

Em suma, reconhecemos o valor teórico da contribuição do autor para a


compreensão das estratégias geopolíticas e das ações diplomáticas que vieram a definir a
política externa portuguesa no período de 1890 a 2000. É, portanto, uma leitura
aconselhável para aqueles que ambicionam ter um conhecimento geral sobre esta
temática, apesar da falta de incidência por parte do autor em alguns aspetos fulcrais.

2
Fernandes, M. S. (2010). Após Macau: perspectivas sobre as relações luso-chinesas depois de 1999. IV
Congresso Português de Sociologia, Coimbra, 17-19 de abril, 2000. Associação Portuguesa de Sociologia.
3
Ramires, F. (2006). Objectivo: Timor Portugal, Timor e a guerra no Pacífico (1941-1945), Revista R:I 11,
pp. 005-018.

3
Referências bibliográficas:
Fernandes, M. S. (2010). Após Macau: perspectivas sobre as relações luso-chinesas depois de
1999. IV Congresso Português de Sociologia, Coimbra, 17-19 de abril, 2000. Associação
Portuguesa de Sociologia.

Ramires, F. (2006). Objectivo: Timor Portugal, Timor e a guerra no Pacífico (1941-1945). In


Revista R:I. N.º 11, setembro, pp. 005-018.

Teixeira, N. S. (2014). História Contemporânea de Portugal: A Crise do Liberalismo 1890-1930.


Fundação Mapfre/Editora Objectiva, pp. 87-115

Teixeira, N. S. (2005). Entre África e a Europa: A Política Externa Portuguesa 1890-2000. In


A. Costa Pinto (Ed.), Portugal Contemporâneo, pp.87-116

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