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A História da Mina
de Morro Velho
1834 - 1957

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"You think you know a story,

but you only know how it ends.

To get to the heart of the story

you have to go back to the beginning" 1

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The Tudors (2007–2010) série de televisão sobre a vida e os romances do jovem rei Henrique VIII.

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A História da Mina de
Morro Velho 1834 - 1957
Nova Lima - MG
Este livro conta a história da mina de Morro Velho, a mais longeva das minas de ouro do Brasil. Ela
foi operada pela Saint John d’el Rey Mining Company, Limited desde 1834 até 1957.

Sumário
Nota do Autor...................................................................................................................................................................... 10

Sinopse ................................................................................................................................................................................... 13

Glossário de mineração.................................................................................................................................................... 16

Conceitos básicos de mineração .................................................................................................................................. 21

Sobre oitavas, £ibras e patacas ..................................................................................................................................... 25

Um pouco de História....................................................................................................................................................... 28

Um austríaco chamado Dr. Süch.............................................................................................................................. 28

O Brasil do Século XVIII e XIX.................................................................................................................................... 29

Nossa Senhora do Pilar de Congonhas de Sabará............................................................................................ 30

Richard Burton has been here................................................................................................................................... 32

Mapa de Nova Lima hoje ............................................................................................................................................ 34

The City of London Tavern, nasce a St. John............................................................................................................ 36

"Carlos" Herring, Jr. ............................................................................................................................................................ 40

Síntese do Diário de Herring ..................................................................................................................................... 62

O Padre Antônio Freitas .............................................................................................................................................. 63

A Fazenda Morro Velho............................................................................................................................................... 63

As Minas da St. John ......................................................................................................................................................... 65

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O Mapa da Mina de Morro Velho ................................................................................................................................ 71

A Mina Velha ........................................................................................................................................................................ 75

Escavações da Mina Velha .......................................................................................................................................... 76

Os primeiros anos .......................................................................................................................................................... 77

O processo de produção............................................................................................................................................. 78

The Mining Journal........................................................................................................................................................ 79

O antigo "Bicame", segundo Burton (1867)......................................................................................................... 83

Charles Herring, Jr., 1837 - 1847 .............................................................................................................................. 85

George D. Keogh, 1847 - 1853 ................................................................................................................................. 87

1857 - Acidente em Bahú ........................................................................................................................................... 87

J. N. Gordon, 1857 - 1876 ........................................................................................................................................... 88

Entrevista de Hockin em 1867 .................................................................................................................................. 89

1867, incêndio na Mina Velha ................................................................................................................................... 93

Dias difíceis em Congonhas ....................................................................................................................................... 95

Os shafts A e B ................................................................................................................................................................ 96

Milking the mine ............................................................................................................................................................ 98

Os anos pós-Gordon ................................................................................................................................................. 101

Organograma da St. John no Século XIX ........................................................................................................... 102

George Chalmers ........................................................................................................................................................ 110

1886 – The mine crush .............................................................................................................................................. 111

O dia seguinte ... .......................................................................................................................................................... 112

A Mina Grande.................................................................................................................................................................. 136

Shafts C e D ................................................................................................................................................................... 136

Aprendendo com os erros pretéritos .................................................................................................................. 141

Remoção de água ....................................................................................................................................................... 142

E la nave va ................................................................................................................................................................... 142

As instalações de superfície .................................................................................................................................... 146

Novos departamentos .............................................................................................................................................. 147

Chalmers, o visionário ............................................................................................................................................... 147

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Morro Velho, segundo Chalmers............................................................................................................................... 150

Fim da narrativa de Chalmers ................................................................................................................................ 158

Cronologia Chalmers ................................................................................................................................................. 158

Visita à mina de Morro Velho ................................................................................................................................ 169

Fatores de produção ...................................................................................................................................................... 179

A planta de refrigeração........................................................................................................................................... 181

Eletrificação ................................................................................................................................................................... 182

Sistema hidrelétrico de Rio de Peixe ................................................................................................................... 189

A ferrovia eletrificada Nova Lima - Raposos .................................................................................................... 208

O teleférico .................................................................................................................................................................... 211

A Primeira Guerra Mundial, 1914 - 1918 ................................................................................................................ 212

Alexander George North, A.G.N. ........................................................................................................................... 212

A. H. Millett, 1930 - 1940 ......................................................................................................................................... 213

Antecedentes do fim da St. John............................................................................................................................... 215

O sindicato dos mineiros, 1934 ............................................................................................................................. 215

Vargas e o nacionalismo econômico................................................................................................................... 216

1940, uma década de greves.................................................................................................................................. 217

Enquanto isso ... nas Florestas de Bretton ......................................................................................................... 218

O Plano Canadense de G. P. Wigle, 1953 - 1954 ............................................................................................ 219

As reservas de ferro ................................................................................................................................................... 220

O inesperado fim da era britânica ........................................................................................................................ 222

O espólio de Morro Velho ........................................................................................................................................... 223

Minerações Brasileiras Reunidas – MBR ............................................................................................................. 223

Mineração Morro Velho S. A. ................................................................................................................................. 223

Anglo American ........................................................................................................................................................... 223

1984, o 150° aniversário de Morro Velho .......................................................................................................... 223

Minorco .......................................................................................................................................................................... 224

AngloGold...................................................................................................................................................................... 224

AngloGold Ashanti ..................................................................................................................................................... 224

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Estatísticas .......................................................................................................................................................................... 225

Presidentes (Chairmen)............................................................................................................................................. 230

A mão de obra em Morro Velho ............................................................................................................................... 233

Pessoas escravizadas ................................................................................................................................................. 233

Nativos ............................................................................................................................................................................ 236

Açorianos ....................................................................................................................................................................... 237

Alemães .......................................................................................................................................................................... 237

Córnicos .......................................................................................................................................................................... 237

Chineses e japoneses ................................................................................................................................................ 239

Espanhóis e Italianos ................................................................................................................................................. 242

O processo de obtenção do ouro ............................................................................................................................. 243

George Gardner ........................................................................................................................................................... 243

The Illustrated London News.................................................................................................................................. 244

Richard Burton ............................................................................................................................................................. 245

Bernard Hollowood .................................................................................................................................................... 251

Comentários finais .......................................................................................................................................................... 263

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Índice de Figuras

Figura 1 - É disso que este livro trata ........................................................................................................... 11


Figura 2 - Período de vida das mineradoras em Minas Gerais ................................................................... 12
Figura 3 - Cerimônia realizada na entrada do ádito da Mina Grande ....................................................... 17
Figura 4 - Entrada do ádito da Mina Velha – 17 de abril de 1884.............................................................. 17
Figura 5 – Laboratório (assay office) de análise de amostras .................................................................... 18
Figura 6 - Headgear no topo dos shafts C e D no Morro do Mingu .......................................................... 18
Figura 7 - Overhand stoping – ataque ao corpo de minério de baixo para cima .................................... 19
Figura 8 - Mesas vibratórias (strakes) utilizadas na separação do ouro da areia ..................................... 19
Figura 9 - Esquema simplificado de uma mina subterrânea ...................................................................... 20
Figura 10 - Antigo organograma da mina de Morro Velho ....................................................................... 23
Figura 11 - Troy e avoirdupois ...................................................................................................................... 25
Figura 12 - Patacas ......................................................................................................................................... 27
Figura 13 - Antigo mapa do Brasil ................................................................................................................ 29
Figura 14 - Nossa Senhora do Pilar de Congonhas de Sabará ................................................................... 31
Figura 15 - Mural dos Garimpeiros – Martha Loutsch – década de 1930 .................................................. 32
Figura 16 - Localização dos shafts e do corpo de minério ......................................................................... 34
Figura 17 - Mapa simplificado de Nova Lima .............................................................................................. 35
Figura 18 - Ata da reunião anual da St. John – 03 de março de 1831 ....................................................... 38
Figura 19 - The City of London Tavern......................................................................................................... 39
Figura 20 - Mapa das Minas da St. John ...................................................................................................... 70
Figura 21 - Mapa da Mina de Morro Velho - 1911...................................................................................... 73
Figura 22 - Seção atual da Mina de Morro Velho........................................................................................ 74
Figura 23 - Linha do tempo da transição da Mina Velha para a Mina Grande ......................................... 75
Figura 24 - As primeiras escavações ............................................................................................................. 76
Figura 25 - Carregadoras de minério de ouro ............................................................................................. 79
Figura 26 - Roda d’água e britador de pilões .............................................................................................. 80
Figura 27 - Pintura mostrando as instalações de superfície da Mina Velha ............................................. 81
Figura 28 - Seção da Mina Velha – outubro de 1867 .................................................................................. 82
Figura 29 - As rodas d’água movimentavam os equipamentos da Mina Velha ....................................... 83
Figura 30 - O antigo e o atual bicame .......................................................................................................... 84
Figura 31 - O Armazém ................................................................................................................................ 100
Figura 32 – Produção de ouro da Morro Velho ......................................................................................... 101
Figura 33 - Organograma da St. John em meados do Século XIX ........................................................... 104
Figura 34 - Instalações de superfície da Mina de Morro Velho - 1868 .................................................... 114
Figura 35 - Cubo representando a quantidade de ouro extraída da Mina Velha até 1883 ................... 115
Figura 36 - Receitas com as vendas (£) e produção de ouro (kg) 1835 - 1885 ...................................... 122
Figura 37 - Produção ouro (kg) e teor aurífero do minério (%) .............................................................. 123
Figura 38 - Dividendos pagos pela St. John 1830 – 1887 ......................................................................... 124
Figura 39 - Produção de ouro (kg) e distribuição de dividendos (£) 1835 – 1885 ................................. 125
Figura 40 - Produção de ouro (kg) e lucros e perdas (£) 1838 – 1885..................................................... 126
Figura 41 - Produção de ouro (kg) e minério extraído (t) 1835 – 1885 .................................................. 127
Figura 42 - Custo unitário, £/t, libra esterlina por tonelada de minério produzido ............................... 128
Figura 43 - Quantidades em toneladas de minério extraído e britado 1837 - 1885 .............................. 129
Figura 44 - Evolução da perfuração dos shafts C e D ................................................................................ 138
Figura 45 - Estruturas no topo dos shafts C e D (headgear) .................................................................... 139
Figura 46 - Vista das instalaçoes mostrando os shafts C e D ................................................................... 140

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Figura 47 - Vista em planta da projeção do corpo de minério ................................................................ 141
Figura 48 -"Overhand stoping" .................................................................................................................. 141
Figura 49 - Shafts verticais (C...H) e inclinados (I, J) ................................................................................. 145
Figura 50 - Motor elétrico de 30 HP de acionamento do ventilador Capell ........................................... 145
Figura 51 - Inauguração da placa na entrada do ádito ............................................................................. 148
Figura 52 - George Chalmers ...................................................................................................................... 149
Figura 53 - George Chalmers, Frederick Tendron e o capitão de mina James Rogers ........................... 149
Figura 54 - Os cubos de Chalmers .............................................................................................................. 160
Figura 55 - Toneladas de minério extraídas e britadas............................................................................. 161
Figura 56 - Custo por tonelada de pedra britada em xelins de 1838 a 1991 ......................................... 162
Figura 57 - Custo de operação da Mina de Morro Velho em libras esterlinas de 1837 a 1911 ............. 163
Figura 58 - Receitas e custos da Mina de Morro Velho em libras esterlinas de 1938 a 1911 ................ 164
Figura 59 - Lucros e perdas em libras esterlinas de 1938 a 1911 ............................................................. 165
Figura 60 - Variação cambial da moeda britânica penny em relação ao mil-réis de 1938 a 1911 ........ 166
Figura 61 - Percentual de extração de 1855 a 1911 .................................................................................. 167
Figura 62 - Temperaturas da rocha (°F) e nos horizontes de trabalho (pés) .......................................... 168
Figura 63 - Entrada do ádito da Mina Grande ........................................................................................... 170
Figura 64 - Secretário do escritório em Londres e o capitão de mina ..................................................... 171
Figura 65 - O capitão de mina e seus assistentes ...................................................................................... 172
Figura 66 - Instalação de bombeamento no corte transversal nº 6......................................................... 173
Figura 67 - Enviando uma perfuratriz de rocha para o interior da mina ................................................ 175
Figura 68 - Instalações de superfície da Mina Grande .............................................................................. 177
Figura 69 - Instalações de superfície: Mina Velha (azul) e Mina Grande (vermelho)............................. 178
Figura 70 - Esquema de uma usina hidrelétrica ........................................................................................ 183
Figura 71 - Localização das quatro primeiras usinas hidrelétricas .......................................................... 184
Figura 72 - Tomada d’água e vertedouro da Usina do Retiro .................................................................. 185
Figura 73 - Gerador elétrico de 97 HP da Usina do Retiro ....................................................................... 185
Figura 74 - Barragem do Rezende .............................................................................................................. 186
Figura 75 - Gerador elétrico de 100 HP da Usina do Rezende ................................................................. 186
Figura 76 - Usina hidrelétrica dos Cristais ................................................................................................. 187
Figura 77 - Gerador elétrico de 150 HP e turbina da Usina dos Cristais ................................................. 187
Figura 78 - Tomada d’água da Usina do Gaia ............................................................................................ 188
Figura 79 - Gerador elétrico de 400 HP da Usina do Gaia ........................................................................ 188
Figura 80 - Mapa de localização das lagoas e das usinas de Rio de Peixe .............................................. 193
Figura 81 - Mapa topográfico da localização das usinas de Rio de Peixe ............................................... 194
Figura 82 - Fluxograma do sistema de Rio de Peixe ................................................................................. 195
Figura 83 - Construção da barragem da Lagoa Grande ............................................................................ 196
Figura 84 - Lagoa do Miguelão (hoje) ........................................................................................................ 196
Figura 85 - Lagoa das Codornas: barragem no canto inferior esquerdo................................................. 197
Figura 86 - Encontro dos ribeirões formadores do Rio de Peixe ............................................................. 197
Figura 87 - Usina A, hoje desativada .......................................................................................................... 198
Figura 88 - Interior da Usina A .................................................................................................................... 198
Figura 89 - Usina B: vista em planta mostrando duas rodas Pelton e um gerador ................................ 199
Figura 90 - Usina B: vista em corte ............................................................................................................. 199
Figura 91 - Usina B e respectiva tubulação de chegada d’água ............................................................... 200
Figura 92 - Usina C, hoje desativada .......................................................................................................... 200
Figura 93 - Usina D: vista aérea .................................................................................................................. 201
Figura 94 - Usina D: vista lateral da chegada da tubulação d’água ......................................................... 201
Figura 95 - Tubulações d’água para as usinas D (foto) e F (não visível) ................................................. 202

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Figura 96 - Geradores no interior da Usina D ............................................................................................ 202
Figura 97 - Vista externa da Usina E de superfície .................................................................................... 203
Figura 98 - Seção da Usina E Extension (subterrânea, 21 metros)........................................................... 204
Figura 99 - Usina F: tubulação de adução d’água à esquerda .................................................................. 204
Figura 100 - Desenho de junho de 1931 da Usina F .................................................................................. 205
Figura 101 - Usina Codorna: descarte da água turbinada no Ribeirão dos Marinhos ........................... 206
Figura 102 - Vista do interior da Usina Codorna ....................................................................................... 206
Figura 103 - Galpão da Usina G em fase de construção ........................................................................... 207
Figura 104 - Interior da Usina G.................................................................................................................. 207
Figura 105 - Transporte da primeira máquina a vapor da ferrovia para a mina .................................... 209
Figura 106 - Ferrovia eletrificada Nova Lima - Raposos ........................................................................... 210
Figura 107 - O teleférico de Morro Velho .................................................................................................. 211
Figura 108 - Organograma na administração Millett ............................................................................... 214
Figura 109 - Lucros e prejuízos da St. John: 1901 - 1956 ......................................................................... 221
Figura 110 - Sucessores da St. John ........................................................................................................... 224
Figura 111 - Produção de minério extraído e britado (t) – 1835 - 1955 ................................................. 228
Figura 112 - Produção de ouro (kg) – 1835 - 1955 ................................................................................... 229
Figura 113 - Presidentes da St. John .......................................................................................................... 230
Figura 114 - Breve história da mina de Morro Velho................................................................................ 231
Figura 115 - Presidentes (Chairmen) e Superintendentes da St. John .................................................... 232
Figura 116 - Carregadoras de resíduos auríferos ...................................................................................... 236
Figura 117 - Revista quinzenal dos escravos africanos na Casa Grande ................................................. 238
Figura 118 - Rapazes córnicos – cerca de 1897 ......................................................................................... 240
Figura 119 - Chineses em Morro Velho ...................................................................................................... 241
Figura 120 - Vagões de minério seguem para os britadores.................................................................... 255
Figura 121 - Ponte de pesagem de minério e virador .............................................................................. 256
Figura 122 - Britador de 10 pilões – 1898 .................................................................................................. 256
Figura 123 - Mesa de seleção de pedras .................................................................................................... 257
Figura 124 - Minério britado sendo descarregado nos silos .................................................................... 257
Figura 125 - Mesas vibratórias e máquinas de lavagem automática ...................................................... 258
Figura 126 - Amostragem e mesas vibratórias de rejeitos ....................................................................... 258
Figura 127 - Caixas de secagem de areia ................................................................................................... 259
Figura 128 - Autoclaves da planta de oxigênio ......................................................................................... 259
Figura 129 - Bombeamento do rejeito ....................................................................................................... 260
Figura 130 - Fornalhas de fundição. Derramando ouro nos moldes do lingote ..................................... 260
Figura 131 - Tropa do ouro a caminho da estação ferroviária ................................................................. 261
Figura 132 - Caixas de ouro sendo entregues ao transportador ............................................................. 261
Figura 133 - Fluxograma do processo de obtenção do ouro ................................................................... 262
Figura 134 – Mingu, desde mi ventana ...................................................................................................... 264

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Índice de Tabelas

Tabela 1 - Tabela de conversão de unidades ............................................................................................... 26


Tabela 2 - Aquisições realizadas pela St. John ............................................................................................ 65
Tabela 3 – Produção de ouro e minério nas minas de Raposos: 1929 - 1955 ........................................... 66
Tabela 4 – Coordenadas geográficas de localização das minas ................................................................. 69
Tabela 5 - Composição química do corpo de minério principal ................................................................ 72
Tabela 6 - Superintendentes da Mina Velha ................................................................................................ 77
Tabela 7 - Produção de minério e de ouro: 1835 - 1860 ............................................................................ 85
Tabela 8 - Rendimento médio de ouro em oitavas por tonelada .............................................................. 90
Tabela 9 - Percentual de killas em relação ao material extraído ............................................................... 91
Tabela 10 - Produção da mina de Morro Velho, Brasil, 1849 - 1854 ......................................................... 92
Tabela 11 - Britadores da Mina Velha .......................................................................................................... 93
Tabela 12 - Superintendentes: 1830 - 1924 ............................................................................................... 103
Tabela 13 - Vendas de ouro (£): 1838 – 1885............................................................................................. 116
Tabela 14 - Preço médio (£/libra troy) das vendas de ouro: 1838 – 1878............................................... 117
Tabela 15 - Produção de minério (t) e ouro (kg): 1835 – 1885 ................................................................ 118
Tabela 16 - Teor aurífero (gramas/tonelada): 1837 -1885 ....................................................................... 119
Tabela 17 - Lucros/Prejuízos (£) e dividendos (£) ..................................................................................... 120
Tabela 18 - Custos operacionais e de mão de obra (£) ............................................................................ 121
Tabela 19 - Composição do capital da St. John ......................................................................................... 132
Tabela 20 - Reservatórios componentes do sistema de Rio de Peixe ..................................................... 192
Tabela 21 - Usinas hidrelétricas de Rio de Peixe ....................................................................................... 192
Tabela 22 - Produção de minério e ouro – 1834 - 1958............................................................................ 226
Tabela 23 - Aluguel anual de pessoas escravizadas .................................................................................. 234

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.... longae ambages, sed summa sequear fastigia rerum. 2

Nota do Autor
Este livro conta a história da mina de Morro Velho, a mais longeva das minas de ouro do Brasil, desde
a criação da companhia mineradora em 1830 até a partida dos britânicos no final da década de 1950.

Ele se baseia na bibliografia listada a seguir em ordem cronológica.

A referência mais antiga é o Diário de Charles Herring, Jr., o primeiro superintendente da Morro
Velho de 1830 a 1846. O diário compreende o período desde a sua chegada ao Brasil com a sua
equipe, em junho 1830, até dezembro de 1830.

Em 1849 George Gardner descreveu suas viagens pelo Brasil entre 1836 e 1841 ao publicar em
Londres "Travels in the Interior of Brazil and the Gold and Diamond Districts".

Richard Francis Burton, cônsul britânico em São Paulo, viajou em 1867 por Minas Gerais e subiu o
Rio São Francisco até a costa. Burton contou sua viagem em dois volumes publicados em 1869:
"Exploration of the Highlands of Brazil; with a full account of the gold and diamond mines". Burton
é famoso por suas viagens pelo Oriente Médio e por ter traduzido do árabe para o inglês "As Mil e
Uma Noites".

O sétimo e um dos mais notáveis superintendentes da companhia mineradora, George Chalmers,


que ocupou o cargo por 40 anos, de 1884 a 1924, escreveu um relatório em 1912: "Brief History of
the Morro Velho Mine" e ilustrou a sua narrativa com gráficos e mapas muito interessantes.

Em 1954 a companhia contratou Bernard Hollowood para escrever "The Story of Morro Velho", uma
breve e informal história da mina e da companhia no período de 1830 a 1954. O livro foi distribuído
em 1955 aos acionistas, empregados e amigos brasileiros em comemoração ao 125° aniversário da
companhia mineradora. Além de escritor, Hollowood era também cartunista de uma revista semanal
de humor e sátira chamada Punch.

É interessante notar que Hollowood usou "story" e Chalmers, "history". Enquanto o termo "history"
está ligado a fatos e evidências acontecidas no passado, "story", por seu turno, tem mais a ver com
uma narrativa ficcional, imaginária ou com rumores. Talvez por não ser um historiador e ter sido
contratado para escrever uma biografia para o biografado, Hollowood tenha passado ao largo de
comentar os acidentes que tiveram vítimas fatais.

Um "paper", muito rico em informações sobre Morro Velho, foi publicado em 1962 pelo geólogo
Jacob Eugene Gair intitulado "Geology and Ore Deposits of the Nova Lima and Rio Acima
Quadrangles, Minas Gerais, Brazil".

Em 1984 foi publicada uma tese de mestrado sobre Morro Velho pela Universidade Federal de Minas
Gerais focando na força de trabalho na mina: "Trabalho escravo e capital estrangeiro no Brasil: o caso
de Morro Velho" de Douglas Cole Libby, abrangendo o período 1830 – 1885.

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... longos circunlóquios; mas farei um resumo dos fatos principais. (Virgílio, A Eneida)

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"British Enterprise in Brazil" é o mais completo de todo esse material. Este livro foi escrito pelo
historiador norte-americano Marshall C. Eakin. Publicado em 1989, o livro conta a história da
companhia e da comunidade que se formou ao seu redor de 1830 a 1960.

A última referência bibliográfica que utilizei foi publicada em 2012: "Nova Lima dos Ingleses", de
Victor Rodrigues, é uma obra ricamente ilustrada e a única em edição bilingue, tendo como seu foco
principal George Chalmers.

Além desse material, deram importantes contribuições para este trabalho: Carlos Allysson Barretto
de Araújo, Célio Fonseca Barbosa, Élcio Aloísio Barbosa, Elmo Lloyd, Flávio Gomes Machado e
Marshall C. Eakin.

Pois bem, depois de ler e reler todo este material, resolvi juntar os melhores momentos de cada um
deles em um só livro. Vejam no que deu!

Décio Hamilton Barbosa Nova Lima, março de 2021

Figura 1 - É disso que este livro trata

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Companhias de Mineração - Ano de Nascimento* e Morte†
São Bento Gold Estates - São Bento
São José D’El Rey Gold Mining Company - Cacula
Ouro Preto Gold Mines Company - Passagem
Brazilian Gold Mines Company - Descoberta
Pitangui Gold Mines Limited - Pitangui
Brazilian Consols Gold Mining Company - Taquara Queimada
Anglo-Brazilian Gold Syndicate - Itabira
Roça Grande Brazilian Gold Mining Company - Roça Grande
Anglo-Brazilian Gold Mining Company - Passagem
Santa Barbara Gold Mining Company - Pari
Don Pedro North Del Rey Gold Mining Company - Morro de Santa Ana e Maquiné
East Del Rey Mining Company - Morro das Almas
Serra da Candonga Gold Mining Company - Serra da Candonga
National Brazilian Mining Association - Cocais
Brazilian Company - Cata Branca
St. John d’el Rey Mining Company - Morro Velho
General Mining Association - São José d’el Rei
Imperial Brazilian Mining Association - Gongo Soco

1800 1820 1840 1860 1880 1900 1920 1940 1960

Figura 2 - Período de vida das mineradoras em Minas Gerais

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Sinopse
Uma breve história de Morro Velho

A mineração de ouro na região das Minas Gerais começou no final do Século XVII, levando à corrida
do ouro brasileiro do Século XVIII. Inicialmente eram aluviões de ouro, onde o garimpeiro coletava
o cascalho dos rios em uma tigela de madeira (bateia), e, girando suavemente a tigela, o material
mais leve era expulso, deixando as partículas de ouro, por serem mais pesadas, nas laterais da bateia.
À medida que o ouro superficial foi-se esgotando, a mineração entrava em declínio a longo prazo.
No entanto, em 1824 o Brasil abriu as atividades de mineração para investimentos estrangeiros e
várias mineradoras britânicas aproveitaram a oportunidade para desenvolver minas em Minas Gerais,
empregando as técnicas de mineração subterrânea utilizadas nas minas de carvão da Cornualha.

A mina de Morro Velho foi operada por cerca de um século antes que um certo Capitão Lyon iniciasse
seu desenvolvimento em 1830, provavelmente em nome da Imperial Brazilian Mining Association,
que operava a mina de Gongo Soco em Barão de Cocais, Minas Gerais.

A St. John d’El Rey Mining Company, Limited (1830* - 1957†) foi fundada em abril de 1830 em
Londres por um grupo de investidores britânicos e operou por cerca de um século e um quarto.

A companhia adquiriu os direitos de lavra em São João del-Rei em Minas Gerais, Brasil, de um médico
austríaco e três comerciantes britânicos. Em junho de 1830, uma equipe de mineiros córnicos viajou
para o Brasil para começar a operar as minas. Todavia, com menos de dois anos a companhia
encerrou as operações em São João del-Rei devido à baixa qualidade do minério e a questões legais
relativas às propriedades.

Não tendo obtido sucesso com seus experimentos na região de São João del-Rei, após pesquisar a
região em busca de propriedades minerais, a St. John primeiro alugou a mina de Morro Velho (cerca
de 1833) e, em seguida, assessorada por seu primeiro superintendente, Charles Herring Jr., comprou-
a juntamente com a propriedade de Morro Velho em 1834.

Inicialmente a mina de Morro Velho consistia de uma série de escavações paralelas umas às outras
que desciam para o mesmo corpo de minério. O corpo de minério tinha cerca de 14 metros de
largura e mergulhava em um ângulo de 45 graus em direção a leste.

O desenvolvimento da mina sob a gestão de Herring absorveu muito capital para melhoria dos
equipamentos e da infraestrutura da mina e a companhia, criada em 1830, somente pagou seus
primeiros dividendos em 1842, ou seja, 12 anos depois.

A Saint John promoveu a imigração de cidadãos britânicos para o Brasil para trabalharem na mina.
Contudo, foi a mão de obra escrava que predominou em Morro Velho até a emancipação da
escravatura no Século XIX.

Quando Herring foi sucedido como superintendente por George Keogh em 1846, a mina estava
funcionando sem problemas. Durante o período de Keogh, os dividendos da empresa subiram de
10% para 46%. Ele foi sucedido como superintendente em 1853 por Thomas Walker e, em seguida,
em 1857, James Gordon assumiu como superintendente.

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Morro Velho sofreu várias catástrofes em meados do Século XIX. As escavações eram escoradas por
toras de madeira nos moldes das minas de carvão da Cornualha. Em 27 de novembro de 1867,
irrompeu um incêndio na madeira durante a noite, causando o colapso da mina. A companhia levou
sete anos levantando capital e trabalhando para reconstruir a mina através da abertura de um par
de shafts denominados A e B.

Durante a década de 1870, descobriu-se que o então superintendente de Morro Velho, James
Gordon, estava envolvido em práticas fraudulentas de negócios, incluindo o desvio de recursos da
companhia e participação em empreendimentos externos. Gordon foi demitido e a companhia partiu
em busca de um novo superintendente para restabelecer a ordem em Morro Velho.

Foram feitas três tentativas com Morrison, Buchanan e Oldham, até que, em 1884, George Chalmers
foi contratado como superintendente e começou a revisar e reestruturar tanto a administração
quanto os processos de trabalho de Morro Velho. Antes que Chalmers fosse capaz de introduzir
melhorias na mina, uma queda de uma rocha em 10 de novembro de 1886 levou ao colapso gradual,
pelo efeito dominó, de toda a mina, incluindo os shafts A e B, nas semanas seguintes.

Com a produção interrompida e a companhia em liquidação, Chalmers fez gestões junto à diretoria
para reabrir a mina através de um novo par de shafts interceptando o corpo de minério a jusante do
desabamento. Apesar de inicialmente cautelosos acerca da profundidade proposta para esses shafts,
os diretores e os acionistas foram gradualmente persuadidos do plano, e Chalmers voltou ao Brasil
em 1887 para recuperar Morro Velho.

A reconstrução da mina começou na década de 1890. Os antigos shafts A e B tinham sido perfurados
diretamente no corpo de minério e isso colocava muita pressão sobre a rocha hospedeira. Já os
novos shafts, denominados C e D, foram perfurados fora do corpo de minério, sendo este acessado
através de galerias horizontais. Passou-se a adotar a técnica de preencher os buracos deixados pelas
escavações com terra trazida da superfície para mitigar a pressão da rocha.

Após o afundamento dos shafts C e D, a mina voltou a ser trabalhada e continuou sendo
aprofundada, alcançando, ao final, 2.435 m na vertical e cerca de 4 km na horizontal.

Além do novo par de shafts, Chalmers construiu uma nova planta de superfície e várias pequenas
usinas hidrelétricas para gerar eletricidade para as operações da mina. Novas usinas foram
construídas na década de 1930 na gestão de seu sucessor, Arthur H. Millett. Como resultado de tais
esforços a produção de ouro em Morro Velho superou os marcos históricos. No início do Século XX,
Chalmers também projetou uma inovadora planta de resfriamento para reduzir as temperaturas no
subsolo e assegurou terras e recursos próximos da mina para uso futuro. Chalmers deixou o cargo
de superintendente em 1924, após 40 anos na companhia, e prestou serviços de consultoria à St.
John até sua morte em 1928.

Em razão dos dois acidentes acima mencionados, a mina de Morro Velho foi dividida em dois blocos
de acordo com a profundidade: a Mina Velha (0 - 550 m) e a Mina Grande (550 – 2.453 m). Cada
mina tinha uma entrada independente, a primeira através de planos inclinados a partir da superfície
e a segunda através dos shafts C e D e de um ádito situado a 100 metros abaixo do topo dos shafts.

A revolução de 1930 no Brasil mudou substancialmente os cenários da mão de obra e do câmbio


para a St. John. A formação de um sindicato de mineiros em Morro Velho resultou em uma mão de

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obra mais estável, porém em contínuo confronto com a administração, ao passo que as restrições
monetárias forçaram a companhia a reinvestir em projetos na mina e na região. Os continuados
conflitos entre os supervisores europeus e os trabalhadores brasileiros resultaram em greves e
reduziram a produção, comprometendo destarte os resultados operacionais.

Na década de 1950, a mina se tornou antieconômica devido ao aumento dos custos de produção e
do teto para o preço do ouro fixado no Acordo de Bretton Woods e ela só sobreviveu através de
subsídios ao preço do ouro proporcionados pelo governo brasileiro.

No entanto, os ativos da St. John incluíam ricas reservas de minério de ferro, propositadamente
adquiridas por Chalmers no início do Século XX, e em 1957 um grupo de investidores norte-
americanos assumiu a empresa com o objetivo de capitalizar essas reservas.

Os ativos da St. John, representados pelas reservas de minério de ferro, foram vendidos à Hanna
Mining Company de Cleveland Ohio em 1960, e as reservas de minério de ouro de Morro Velho
ficaram com investidores brasileiros, que criaram para explorá-las a Mineração Morro Velho S.A.

Com isso os 130 anos da Saint John d’El Rey Mining Company chegaram ao fim.

A operação da mina continuou dependendo do subsídio ao ouro até que os preços do mineral
subiram acentuadamente na década de 1970.

Em 1975, a Anglo American adquiriu uma participação de 49% na sociedade, e, mais tarde, em 1999,
já tendo seus ativos em ouro consolidados na AngloGold, esta última adquiriu uma participação
controladora em Morro Velho.

A Mina Grande foi fechada em 1995 e a Mina Velha em 2003.

No período coberto por essa narrativa (1830 – 1960) a companhia teve 8 presidentes (chairmen of
the board) e 15 superintendentes.

* * *

O texto acima não foi elaborado para ser um "spoiler". Uma visão geral sobre o nosso personagem,
a Mina de Morro Velho, logo no início, ajudará o leitor a compreender melhor os acontecimentos à
medida em que eles forem sendo narrados. Os acontecimentos são relatados em ordem cronológica,
com exceção dos dois últimos capítulos, que foram reservados para tratar de assuntos específicos: a
mão de obra e o processo de obtenção do ouro.

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Glossário de mineração
Adit – Ádito, em português, porém pouco usado. Um nível que vai de um ponto do shaft até o nível
das instalações de superfície.

Assay – Análise química realizada em laboratório para se determinar os componentes químicos de


uma amostra de minério e respectivas quantidades.

Bullion – Ouro ou prata ou ambos com alto grau de pureza sob a forma de barras ou lingotes.

Cornish – Córnico em português. Natural da Cornualha.

Cornwall – Cornualha, condado que fica no sudoeste de uma península da Inglaterra, Reino Unido.

Downcast air – Ar soprado para baixo do shaft.

Headgear ou headframe – Estrutura colocada no topo do shaft, dotada de um guincho, usada para
operar um elevador para transportar pessoas e materiais.

Kibble – Um grande balde na extremidade do cabo de aço de içamento, usado, em geral, para
remover material na perfuração de um shaft.

Killas – Ardósia argilosa. Termo córnico usado para estratos de rochas metamórficas de origem
sedimentária que foram alteradas pelo calor da intrusão de granitos.

Overhand stoping – É o ataque do corpo de minério de baixo para cima. Com o advento dos
explosivos e das ferramentas pneumáticas, tem sido a direção predominante de stoping.

Shaft – Poço, em geral, vertical, que liga a superfície com as instalações subterrâneas. O ar fresco
entra na mina pelo downcast shaft, circula pelas instalações do subsolo, e retorna à superfície pelo
upcast shaft.

Stope – Qualquer escavação subterrânea, que não seja um trabalho de desenvolvimento, com o
objetivo de remover minério. Trabalho de desenvolvimento, por sua vez, são escavações
permanentes para trabalhar a mina como shafts, planos inclinados, galerias etc. Uma tradução para
o português seria realce ou realce auto-portante.

Stoping – É o processo de extrair o minério do subsolo deixando atrás um espaço aberto


denominado stope. Esse processo é usado quando a rocha hospedeira é suficientemente forte para
não entrar em colapso dentro do stope, embora, em muitos casos, seja providenciado um suporte
artificial.

Strake – Mesa vibratória usada no processo de concentração da areia aurífera.

Underhand stoping – É o ataque do corpo de minério de cima para baixo. É empregado quando o
corpo de minério é muito íngreme e tem a vantagem de aliviar o peso da ferramenta. É o oposto de
overhand stoping.

Upcast shaft – Shaft através do qual o ar retorna para a superfície depois de ventilar as instalações
da mina, sendo usado também para içar o minério.

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Figura 3 - Cerimônia realizada na entrada do ádito da Mina Grande

Figura 4 - Entrada do ádito da Mina Velha – 17 de abril de 1884

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Figura 5 – Laboratório (assay office) de análise de amostras

Figura 6 - Headgear no topo dos shafts C e D no Morro do Mingu

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Figura 7 - Overhand stoping – ataque ao corpo de minério de baixo para cima

Figura 8 - Mesas vibratórias (strakes) utilizadas na separação do ouro da areia

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Figura 9 - Esquema simplificado de uma mina subterrânea

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Conceitos básicos de mineração
O texto que segue foi adaptado de uma postagem na rede mundial de computadores de autoria de
David V. Black

O mineral que se procura extrair é o "minério" (ore). Ele vem acompanhado de rochas inúteis
chamadas "estéril" (waste).

Normalmente, o minério encontra-se inserido ao longo de uma falha ou uma fissura na rocha,
situação na qual toda a zona mineralizada é chamada de "corpo de minério" (lode).

Um "afloramento" (outcrop) ocorre quando um corpo de minério atinge a superfície. Pode ocorrer
de partes do afloramento erodirem e serem carregadas para os vales dos rios pela água, por
avalanches e pela gravidade, e se acumularem em áreas paradas de um riacho junto com o cascalho.
Estes depósitos são chamados de aluviões.

Os garimpeiros extraem as aluviões e realizam a mineração exploratória.

Normalmente, as primeiras descobertas são depósitos de aluviões, porque são fáceis de encontrar e
trabalhar usando bateias e eclusas. Uma vez que as aluviões se esgotam, os garimpeiros sobem a
encosta para encontrar as fontes dos afloramentos (source outcroppings), ou a "rocha mãe" (mother
lode).

Assim que encontrarem evidências de minério (como pirita de ferro ou calcopirita, quartzo etc.
associados), eles demarcarão o local, batendo estacas nos cantos do terreno e começando a cavar
poços (shafts) exploratórios ou áditos, usando ferramentas manuais como picaretas e pás. Eles
usarão um molinete para puxar o "material" ou as rochas soltas de um poço (shaft) de
desenvolvimento com um balde.

Amostras do minério são levadas a um laboratório de testes (assay), onde são analisadas
quimicamente para verificar a quantidade de metais preciosos existentes no minério. Se o minério
for rico, ou de "elevado teor", o garimpeiro normalmente venderá o prospecto para uma mineradora
que possui os recursos e o capital necessários para desenvolver a mina.

Depois que uma mineradora compra o prospecto, ela expande a mina e acrescenta a infraestrutura.

Um "túnel" é horizontal e deve ver a luz do dia em ambas as extremidades. Se ele abre para o lado
de fora em uma das extremidades, é chamado de "ádito". Se não se conectar ao exterior de forma
alguma, é um "nível". Os níveis são como os vários andares de um edifício, só que no subsolo de
uma mina, e fornecem acesso ao corpo de minério. Um poço vertical que se conecta com a superfície
é um "shaft". Se se tratar de um poço aberto para baixo a partir de um nível ou de um ádito, é um
"winze", e se aberto para cima, é um "raise".

Uma abertura feita para seguir um corpo de minério horizontalmente longe de um nível ou ádito
chama-se "deriva" (drift) e uma abertura para acessar um grande corpo de minério subindo ou
descendo é um "stope".

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O topo de um shaft é envolto com um "colar" e a entrada de um ádito é escorada e estendida para
fora para evitar que pedras soltas caiam dentro dele. Ele se torna a entrada da mina. No topo de um
shaft, uma "estrutura" (headframe ou headgear) é erguida constituída por grandes vigas de madeira
ou aço com polias na parte superior chamadas "sheave wheels". Um cabo de aço trançado é colocado
sobre a polia e sua extremidade é presa a uma gaiola de metal chamada "skip", que pode carregar
pessoas ou baldes de minério para dentro e para fora do shaft. A outra extremidade do cabo é
enrolada no tambor de um guindaste (hoist), que é um guincho elétrico ou a diesel. À medida que
o skip é levantado e abaixado na mina, uma série de sinos elétricos são usados para sinalizar ao
operador do "guincho" (hoistman) a distância para levantar e abaixar o skip. Uma marca no cabo de
aço informa ao operador do "guincho" quando o skip está em um determinado nível.

À medida que a mina se aprofunda geralmente serão encontrados aquíferos subterrâneos ou lençóis
freáticos que se tornam uma grande dor de cabeça, porquanto começam a inundar os shafts
inferiores da mina. O shaft principal deve ser escavado abaixo do nível mais baixo do lençol freático
e uma bomba deve ser instalada para remover a água. Esse ponto baixo do shaft chama-se "sump".

Em geral, os shafts são muito profundos para conseguir elevar economicamente todos os vagões de
minério, os homens até o topo do shaft ou ao ádito e drenar a água dos sumps.

Os áditos geralmente têm uma ligeira inclinação para o lado externo de modo a facilitar a
movimentação dos vagões carregados de minério.

À medida que a mina se desenvolve, são construídos acessos de drenagem, shafts internos,
britadores de redução, fundições e outras estruturas.

Conforme a mina se expanda, com níveis adicionais a cada, digamos, 100 metros e um conjunto
complexo de drifts, áditos, winzes, raises, shafts internos, stopes etc., torna-se vantajoso para os
proprietários construir seu próprio conjunto de britadores, em vez de enviar seu minério para outro
local para processamento.

Um conjunto de britadores é, em geral, construído na encosta da montanha, abaixo da entrada mais


baixa. Primeiro se classifica, em seguida pulveriza-se o minério reduzindo-o a areia e, em seguida,
concentra-se o minério mecânica e quimicamente. O concentrado é então enviado para uma
fundição para processamento final e purificação. O minério concentrado é aquecido em uma retorta
ou forno e, em seguida, separado em seus metais constituintes finais: ouro, prata e outros metais.
Esses metais são despejados em moldes em forma de barra ou tijolo.

Quando o minério se esgota, ou o shaft se estende além de onde ele possa ser economicamente
drenado das águas subterrâneas, ou o preço do metal final cai a níveis em que a mina não possa
mais ser lucrativa, ela é fechada (às vezes temporariamente).

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O Departamento de Redução

Dos sete nomes de departamentos constantes do organograma abaixo, é fácil depreender a função
de cada um deles, com exceção do Departamento da Redução. Por que redução?

Figura 10 - Antigo organograma da mina de Morro Velho

Os equipamentos utilizados para fracionar o minério, reduzindo seu tamanho, e transformá-lo em


areia, como os britadores e os moinhos, fazem parte do Departamento de Redução. Estes,
juntamente com as mesas vibratórias, promovem o tratamento mecânico do minério. Aqui ocorre
uma redução do tamanho do minério, que passa de rocha para areia.

A segunda parte do tratamento do minério é o tratamento químico.

Em uma reação química diz-se que ocorreu uma redução quando o elemento (no nosso caso, o ouro)
ganha elétrons e seu número de oxidação, isto é, a sua carga elétrica, diminui.

O processo de obtenção do ouro a partir da areia aurífera conhecido como cianetação, utilizado em
Morro Velho, vai ser explicado em detalhes mais adiante em um capítulo à parte. Aqui vai uma
"avant-première".

Os cianetos (CN) são compostos químicos do tipo –C≡N, com uma ligação tríplice entre o átomo de
carbono e o de nitrogênio.

Para explicar a reação química de redução, vamos utilizar as reações químicas que ocorrem no
processo de cianetação. Nas reações químicas mostradas a seguir são utilizados os símbolos
químicos do ouro (Au), do sódio (Na), do hidrogênio (H), do oxigênio (O), do carbono (C), do
nitrogênio (N) e do Zinco (Zn).

4Au + 8NaCN + 2H20 + O2 => 4Na[Au(CN)2] + 4NaOH

2Na[Au(CN)2] + Zn => 2Au + Na2[Zn(CN)4]

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Na primeira reação química, a areia contendo o ouro (Au) é misturada em uma autoclave com uma
solução aquosa (H20) de cianeto de sódio (NaCN) e oxigênio (O2) é soprado sobre essa mistura, que
é agitada para facilitar o contato entre os reagentes. O composto resultante Na[Au(CN)2] que
capturou o ouro é solúvel em água.

Em seguida, adiciona-se zinco (Zn). O composto Na[Au(CN)2] prefere o zinco ao ouro e substitui o
segundo pelo primeiro. No lado esquerdo da segunda reação química, o ouro (Au) tinha uma carga
elétrica de +1, quando fazia parte do composto Na[Au(CN)2], e passou, no outro lado desta mesma
reação, a ter carga elétrica 0 (zero), quando foi expulso do composto pelo zinco e ficou livre, leve e
solto. Portanto, o ouro sofreu uma redução em sua carga elétrica. O papel do zinco foi reduzir o Au+1
para o Au0. O zinco é o agente redutor e o Departamento que cuida de fazer tudo isso acontecer
chama-se Departamento de Redução.

No Departamento de Redução ocorre tanto a redução física do tamanho do minério – de rocha para
areia – quanto a redução química da carga elétrica do ouro.

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Sobre oitavas, £ibras e patacas
O minério era medido em tonelada (long ton), que corresponde à tonelada métrica do Sistema
Internacional com o qual estamos familiarizados.

As unidades usadas em Morro Velho para pesagem do ouro eram diferentes do Sistema
Internacional. No Sistema Imperial Britânico as unidades usuais de pesagem eram libra peso (pound)
e onça (ounce), cujas abreviaturas são lb. e oz, respectivamente.

Aqui é preciso fazer uma diferenciação entre os sistemas de pesagem Troy e Avoirdupois. O sistema
Troy é usado para pesar metais e pedras preciosas, ao passo que o sistema Avoirdupois é usado para
pesar pessoas e produtos.

Figura 11 - Troy e avoirdupois

Feita esta diferenciação, doravante estaremos falando sempre no sistema Troy ao nos referir à onça
(ounce) e à libra peso (pound).

1 Troy pound = 12 Troy ounces = 372, 2 gramas

1 Troy ounce = 31,103 gramas

Em Morro Velho, porém, o peso do ouro, era medido em oitava. Isso também chamou a atenção de
Burton em 1886: "Eu não consigo compreender por que companhias de mineração inglesas no Brasil
persistem em contabilizar em oitavas em vez de onças ou libras".

A utilização da oitava na medição e contabilização da produção do ouro decorreu do fato de as


autoridades brasileiras utilizarem esta unidade de medida para tributar o ouro.

O nome oitava sugere uma oitava parte (1/8) de alguma coisa. De fato, a oitava era a oitava parte da
onça portuguesa, que era diferente da onça (ounce) do Sistema Imperial Britânico.

1 oitava = 3,586 gramas = 0,1153 onça Troy = 0,0096 libra Troy

1 onça Troy = 31,103 gramas = 8,674 oitavas = 1/12 libra Troy

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Libra em Latim significa balança, isto é, um instrumento que serve para pesar as coisas. No horóscopo
o símbolo da Libra (nascidos entre 24/09 a 23/10) é uma balança. A abreviatura "lb." se refere à libra
peso (unidade de massa).

A palavra peso em Latim é "pondus", que deu origem a "pound" em inglês.

Tabela 1 - Tabela de conversão de unidades

Oitava Troy pound Troy ounce Grama


Oitava 1 0,0096 0,1153 3,5860
Troy pound 104 1 12 372,2
Troy ounce 8,674 0,0833 1 31,103
Grama 0,2789 0,0027 0,0322 1

Passemos agora a falar de dinheiro.

A libra moeda, que se abrevia como £, era o valor em dinheiro de uma libra peso de prata. Esta é a
razão pela qual tanto a unidade de massa (libra peso ou lb.) quanto a unidade monetária (libra ou £)
têm o mesmo nome: "pound", pois os britânicos descartaram a palavra libra e passaram a usar
"pound" para ambas unidades, unidade de massa e unidade monetária.

Antes da decimalização ocorrida em 1971, a Grã-Bretanha usava


um sistema monetário hierarquizado em pounds, shillings 3 e
pence, cuja abreviatura era £sd ou LSD. A menor unidade
monetária era o penny, abreviado como a letra “d” – a explicação
vem mais adiante – cujo plural era pence (ou pennies). Havia 12
pence em um shilling e 20 shillings em um pound.

1 pound (1 £) = 20 shillings (20 s) = 240 pence (240 d)

Tal sistema pound/shilling/penny se espelhou no antigo sistema


romano de libra, solidus e denarius. Daí a abreviatura de penny ser
um "d" de denarius.

Com exceção do capítulo em que Chalmers descreve a mina, vamos representar os numerais
monetários em moeda inglesa separando as casas de milhares por ponto (.) em lugar de vírgula (,).
Assim, mil libras esterlinas, que em inglês se escreve £1,000, serão aqui representadas por £1.000.

Passemos agora ao Brasil.

A unidade monetária no Brasil, em Portugal e nas colônias portuguesas no Século XIX era o real, cujo
plural é réis. Conto de réis foi uma expressão adotada para indicar um milhão de réis (escrevia-se
1:000$000). Um conto de réis correspondia a mil vezes a importância de um mil-réis (1$000). O real
correspondia a 1/1.000.000 (um milionésimo) de um conto de réis.

3
Xelins em português.

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As patacas foram as moedas que circularam no Brasil por mais tempo, de 1695 a 1834, ou seja, por
139 anos. Essa série era composta por moedas de prata nos valores de 20, 40, 80, 160, 320 e 640 réis.
O valor de 320 réis – pataca – deu nome à série.

Devido à queda na produção de ouro e ao crescimento dos gastos com a implantação da


administração no Rio de Janeiro, a quantidade de moedas em circulação tornou-se insuficiente.
Assim, em 1808, D. João VI criou o Banco do Brasil, o primeiro banco da América do Sul e o quarto
do mundo. Em 1810, foram emitidos os primeiros bilhetes do Banco, precursores das cédulas atuais.

Em 1834, a Casa da Moeda do Rio de Janeiro cunhou uma nova série de moedas em prata para
substituir as patacas, que circularam durante todo o período colonial. O valor de 400 réis – cruzado
– deu nome à série.

Com o aumento da população e o alto custo dos metais preciosos utilizados na fabricação de
moedas, as cédulas tornaram-se cada vez mais necessárias no decorrer do século XIX.

Contudo, por causa das falsificações, as cédulas não eram aceitas em certos lugares e, nos lugares
onde eram aceitas, a conversão das cédulas (moeda papel) em moedas de cobre eram feitas com
significativo deságio. Herring menciona este fato em seu Diário.

Para uniformizar as cédulas em circulação e acabar com as falsificações, em 1835 as antigas notas
do Banco do Brasil e as cédulas para o troco do cobre foram substituídas por cédulas do Tesouro
Nacional, fabricadas por Perkins, Bacon & Petch (Inglaterra). Essas cédulas possuíam certas
características que dificultavam a falsificação.

Figura 12 - Patacas

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Um pouco de História
No início do Século XIX a França de Napoleão Bonaparte estendia seus tentáculos sobre a maior
parte da Europa, com exceção da Áustria, Inglaterra, Prússia e Rússia.

Em outubro de 1805, os franceses atacaram a Inglaterra, mas foram derrotados pela marinha inglesa,
comandada pelo almirante Nelson, na Batalha de Trafalgar.

Todavia, os franceses foram vencendo, um a um, seus outros inimigos: a Áustria caiu em 1805, a
Prússia em 1806 e a Rússia em 1807.

Em 1806 o Império Francês decretou o bloqueio continental, em que determinava que todos os
países europeus deveriam fechar os portos para o comércio com a Grã-Bretanha, debilitando
destarte as exportações britânicas e causando uma crise industrial. Diga-se, de passagem, que tal
estratégia foi mais tarde adotada pelo governo norte-americano em desfavor de seus inimigos, como
Cuba e Irã.

No início do Século XVIII Portugal esteve sob o domínio econômico e político da crescentemente
poderosa nação inglesa. Portugal cobria seu constante déficit comercial com a Inglaterra com o ouro
brasileiro e Lisboa, no final das contas, se tornara simplesmente uma estação de passagem para os
lingotes sul-americanos em direção ao norte. O ouro brasileiro financiou a expansão comercial da
Inglaterra no início do Século XVIII e, na última metade do Século XIX, sua expansão industrial.

Portugal tinha então a Inglaterra como sua principal parceira de negócios. Pressionados por
Napoleão, como não podiam abdicar dos negócios com a Inglaterra, os portugueses não
participaram do bloqueio continental.

Em represália o exército francês invadiu Portugal. O então príncipe regente português, D. João VI, e
sua corte fugiram para o Brasil, sob a proteção da esquadra inglesa, instalando o governo português
no Rio de Janeiro em 1808, tornando tal cidade a capital do recém criado Reino Unido de Portugal,
Brasil e Algarves (1816-1826).

Até o ano de 1808, o Brasil fora separado do resto do mundo pela rígida política mercantilista e
protecionista do governo português. Mas, com a criação do Reino Unido de Portugal, Brasil e
Algarves, os decretos restritivos foram abolidos, o comércio brasileiro começou a se expandir, os
navios estrangeiros foram autorizados a entrar nos portos brasileiros e a imigração foi permitida.

Mais tarde, em 1824, dois anos após a declaração de independência do Brasil, a Carta Constitucional
do Império introduziu as concessões de mineração e, com tal medida, abriu o caminho para a
primeira corrida do ouro no século XIX.

Um austríaco chamado Dr. Süch


Um dos primeiros a se aproveitar deste novo cenário foi o médico Dr. Geoge Süch. (pronuncia-se
Sur).

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O Século XIX começou no dia 01 de janeiro de 1801 e terminou no dia 31 de dezembro de 1900. A
história da Morro Velho começa neste Século XIX, mais precisamente em 5 de novembro de 1828,
seis anos após a independência do Brasil.

Nesse dia, Dom Pedro I, que em 1822 proclamara a independência e se tornara o Imperador do
Brasil, assinou um Decreto concedendo autorização ao médico austríaco George Süch e a três
cidadãos britânicos para operarem minas na região de São João del-Rei na Província de Minas Gerais.

Figura 13 - Antigo mapa do Brasil

O Brasil do Século XVIII e XIX


O período imperial compreendeu os anos de 1822 a 1889, quando ocorreu a Proclamação da
República. No início do Império o Brasil era, na verdade, uma enorme fazenda. Para administrá-la
seu território fora dividido em 7 (sete) províncias: Grão-Pará, Maranhão, Pernambuco, Bahia, São
Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande de São Pedro.

As Províncias eram divididas em Comarcas, Municípios, Vilas, Distritos, Freguesias, Arraiais e que tais.
Os arraiais eram assentamentos de caráter temporário formados, em geral, em função de atividades

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extrativas, como a lavra de minérios. As freguesias, como eram chamadas as paróquias, tinham por
sede uma igreja que servia também para a administração civil. Os fiéis eram os fregueses do pároco.
O distrito era, e ainda é, uma divisão territorial e administrativa em que certa autoridade
administrativa, judicial ou fiscal exerce sua jurisdição, porém subordinado a um município. Vila e
Município se equivalem, divergindo apenas no tamanho; são unidades político administrativa
autônomas. Comarca, na época do Brasil-colônia, era sinônimo de região, território.

Em 1711 decretos reais elevaram vários dos assentamentos das minas ao status de "villas". Villa Rica
(Ouro Preto), Villa Real (Sabará) e Mariana receberam a sanção real e, na década de 1720, a área das
minas foi oficialmente separada da Província de São Paulo. Por volta da década de 1730 a
correspondência real se referia regularmente à nova capitania como Minas Gerais. Em 1821 Minas
Gerais de capitania tornou-se província.

Nossa Senhora do Pilar de Congonhas de Sabará


"Congonhas doit sa fondation a des mineurs attires par l’or que on trouvait dans les
alentours, et son histoire est celle de tant d'autres bourgades. Le precieux metal s'est
epuise; les travaux sont devenus plus difficiles, et Congonhas n'annonce actuellement
que la decadence et abandon." Voyage dans le District des Diamans, par Auguste de
Saint Hilaire.

"Congonhas deve sua fundação aos mineiros atraídos pelo ouro encontrado nas
redondezas e sua história é a mesma de tantas outras cidades. O metal precioso está
esgotado; os trabalhos se tornaram mais difíceis, e Congonhas atualmente anuncia
apenas decadência e abandono." Viagem ao Distrito dos Diamantes, por Auguste de
Saint Hilaire.

Desde o período colonial garimpeiros vasculhavam os ribeirões do Cardoso e dos Cristais, tributários
do Rio das Velhas, em busca de ouro e um pequeno assentamento se desenvolveu na confluência
desses dois ribeirões, onde hoje está localizado o campo de futebol do Villa Nova Atlético Clube. A
abundância de uma variedade de chá selvagem nos morros circundantes deu ao assentamento seu
nome: Congonhas.

O garimpeiro coletava a areia do cascalho dos ribeirões em uma tigela de madeira denominada
bateia e, em seguida, eliminava o material mais leve rodando suavemente a tigela, deixando as
partículas de ouro, que são mais pesadas, no interior dela.

Hoje a parte urbana dos ribeirões do Cardoso e dos Cristais se encontra canalizada e a maioria das
instalações industriais descritas mais adiante não existe mais. Agora fazem parte da história da mina
de Morro Velho e do assentamento que se formou no seu entorno, que deu origem a Nova Lima.

Seguindo o tradicional padrão ibérico, a comunidade originalmente desenvolveu-se nos primórdios


do Século XVIII ao redor de uma praça central defronte ao ribeirão dos Cristais.

Em 1748 a comunidade tinha crescido o bastante para receber uma paróquia com seu próprio padre
e, uma vez submetida à jurisdição de Sabará, a nova paróquia recebeu destarte o pomposo nome
de Nossa Senhora do Pilar de Congonhas de Sabará, lembrando que paróquia e freguesia são
palavras sinônimas.

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Pela Lei Provincial número 50, de 8 de abril de 1836, a região onde está hoje Nova Lima subiu de
patamar; passou de Freguesia para Distrito de Congonhas de Sabará, continuando subordinada à
Villa Real, atual Sabará.

Aproximadamente 55 anos transcorreram antes que o Distrito de Congonhas de Sabará fosse


emancipado e alcançasse o status de "villa" (1891), adquirindo o nome de uma de suas mais ilustres
famílias. Villa Nova de Lima, como foi então chamada, se tornou a sede administrativa do novo
município de mesmo nome. Em 1923 o nome foi encurtado para simplesmente Nova Lima.

Assim, uma comunidade rural de alguns 1.000 mineiros, comerciantes, escravos e camponeses nos
anos 1820, Nova Lima emergiu por volta dos anos 1930 como uma alvissareira cidade industrial com
uma grande classe operária. No apogeu da era britânica a companhia empregava mais de 8.000
pessoas em uma comunidade de 25.000 habitantes.

Uma interessante descrição do assentamento daquela época consta dos versos do poeta Augusto
de Lima (1860 – 1934), que pertenceu à Família Lima, que empresta seu nome à cidade.

Figura 14 - Nossa Senhora do Pilar de Congonhas de Sabará

“Sons de sinos perdidos no deserto ...

Campanário da quase oculta vila ...

Serros magoados que a distância anila,

Mais formosos de longe que de perto.”

Morro Velho era, com certeza, um desses serros magoados.

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Figura 15 - Mural dos Garimpeiros – Martha Loutsch – década de 1930

As principais famílias da comunidade detinham importantes direitos de lavra e frequentemente


negociavam tais direitos entre si. Os depósitos de minério no final do Século XVIII eram normalmente
operados a céu aberto e empregavam mão de obra escrava e máquinas rudimentares para
esmagamento do minério. A mais rica e maior destas operações pertencia a Anna Corrêa da Silva e
a seus filhos, um deles o Padre Freitas, e estava localizada nas encostas ao sul de um sítio conhecido
localmente como Morro Velho.

Richard Burton has been here


O cônsul britânico no Brasil, Richard Burton, visitou Morro Velho acompanhado de sua mulher, Isabel,
em junho de 1867. Eles vieram desde o Rio de Janeiro e chegaram por Santa Rita subindo até o alto
do Morro Montevideo. Seguem alguns excertos do seu livro.

" Aqui, a três milhas de Morro Velho, começa a propriedade "Fernão Paes", comprada em 1862 pela
Grande Companhia, por £11,583. As minas, em sua maioria piritíferas, são as de Gaia, Guabirobas
(muito valiosa), Samambaia, Serviço Novo, Mato Virgem e outras menores.

...

Galgamos, então, uma subida de argila vermelha, descemos uma ladeira de igual formação, depois
avançamos por outra íngreme elevação, chamada, apropriadamente, Monte Vidéo.

...

Mais perto e em um horizonte mais baixo, fica o Morro Velho, também coroado por uma cruz e
suportando em seus ombros amarronzados Timbuctu e Boa Vista, os bairros negros de casas de
paredes brancas e telhados vermelhos. A nossos pés, a depressão ocupada pela cidadezinha,
Congonhas, cujo terreno é uma mistura irregular de fundos e saliências, pontilhados de igrejas e

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vilas, de jardins e pomares, e embelezada com o curso de um regato prateado. No cume do morro
à direita, a Fazenda Bela Fama, onde a Companhia mantém sua grande tropa de mulas, utilizada para
trazer mantimentos e provisões.

...

Nossa Senhora do Pilar de Congonhas de Sabará – os nomes aqui são compridos, segundo parece
na proporção inversa da importância do lugar ou da pessoa que os leva – embora muito sonolenta,
é toleravelmente bem tratada e aparenta uma certa prosperidade. A praça principal tem algumas
casas de dois pavimentos ornamentadas, e os dignitários da localidade trataram de garantir a
presença de uma necessidade da vida municipal brasileira, o teatro, decrépito, embora tenha apenas
quinze anos. A matriz, restaurada pelo falecido Frade Francisco de Coriolano, tem uma fachada de
três janelas e uma fachada principal com uma cruz amarelada; os campanários possuem telhados
suíços, virados nos cantos, à moda chinesa de Macau; possivelmente é uma derivação inconsciente
da imagem adorada pelos pagãos de Pomeco e Tlascalla. Na porta de correr há uma tela pitoresca,
estranhamente pintada com as cenas da Paixão, enquanto a nave tem quatorze imagens penduradas
nas paredes.

...

Congonhas curou-se da "decadence et abandon" com que St. Hilaire a encontrou há 47 anos.
Construída para a mineração, decaiu com a mineração, e com ela "ressurgiu". Em 1830, tinha 1.390
almas; em 1840, cerca de 2.000, com três igrejas, uma das quais inacabada e em ruína; em 1847, 913,
naturalmente sem incluir Morro Velho; em 1864, 6 eleitores, 211 votantes e 4.000 habitantes, dos
quais 1.000 mineiros. Desde então, o número, certamente, não diminuiu.

Da praça, viramos para a esquerda, subindo uma terrível ladeira de pedra, que se levanta adiante,
quase a prumo, e corta a elevação que separa as bacias de Congonhas e Morro Velho. À margem da
estrada parcialmente pavimentada, há um armazém de bom aspecto, e o Hotel Congonhense, onde
o Sr. Gehrcke, um velho alemão que fala inglês, empregado da Companhia, recebe quem não traz
consigo cartas de apresentação; ali também vive, de sua arte, um pintor retratista italiano. Muito
acima de nós, à direita, fica a igreja do Rosário, repleta, apesar de não ser dia-santo.

...

Embaixo, à direita, fica o armazém de Alexander & Filhos. ... Em frente do estabelecimento dos
Alexander, fica o grande rancho de Melo & Cia., onde os mineiros negros fazem suas compras.

...

À direita, na próxima margem do ribeirão, montões de minério cinzento e pedras esmagadas


denotam a proximidade das "Instalações da Praia". Um trenzinho, que percorre uma linha com 800
jardas de comprimento, furando os morros e atravessando um par de pontes, liga essas instalações
com a sede, e transporta do pátio de armazenagem o minério de baixa qualidade para ser
beneficiado no caso de um acidente fechar as minas superiores. Aqui também, os aquedutos, ou
calhas com grande inclinação, transportam o minério e os rejeitos. A maquinaria que os submete a
um novo tratamento consiste de duas rodas e britadores abrigados sob um comprido galpão.

...

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Ao norte do vale fica o Morro Velho; uma escamação rubro-negra em sua encosta meridional mostra
onde os proprietários brasileiros encontraram seu primeiro ouro, e onde algumas cabanas foram
soterradas por um desmoronamento de terra. A alta cruz de madeira preta foi erguida pelo Sr.
Gordon, para poupar sua gente, que, antes, nos dias determinados pelo padre, peregrinavam por
três árduas milhas até o pico de Curral d’el-Rei. Diante do "Velho Monte" um belo panorama se
descortina, mas no meio do "mato sujo", o Rei dos Carrapatos mantém a sua corte e a conservará
assim até ser expulso pelo capim da Bahama ou por outra vegetação imigrante parecida.

Voltando-se à esquerda, em um lugar de destaque, a grande casa branca do armazém da


Companhia, dirigido pelos Srs. George Morgan e Matthew, encontramos a Casa Grande... Nela fica a
sede da superintendência... Para oeste e em ângulo reto com a Casa Grande, fica o Sobrado, onde
se acomodam os hóspedes..." (Burton, 1867)

Mapa de Nova Lima hoje


A Figura 16 mostra a localização do corpo de minério subterrâneo e a Figura 17 é um mapa
simplificado de Nova Lima contendo alguns pontos relevantes para referência do leitor, como morros
(Cruzeiro e Mingu), campos de futebol (Boa Vista, Retiro, Quintas e Villa Nova), igrejas (Santo Antônio
e Matriz do Pilar) e ribeirões (Cristais e Cardoso).

Figura 16 - Localização dos shafts e do corpo de minério

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Figura 17 - Mapa simplificado de Nova Lima

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The City of London Tavern, nasce a St. John
Um grupo de investidores britânicos se reuniu na City of London Tavern em 5 de abril de 1830 para
organizar a St. John d’El Rey Mining Company, que mais tarde ganhou um apêndice: Limited
precedido de uma vírgula. O capital inicial em libras esterlinas foi de £165.000.

Eles tinham assinado um contrato adquirindo os direitos de pesquisa e lavra das minas de São João
e São José no sul de Minas Gerais perto da cidade de São João del-Rei por um período de até vinte
e cinco anos. Os proprietários de tais direitos com os quais eles negociaram eram três comerciantes
britânicos e um médico austríaco educado em Oxford que aparentemente liderado o grupo.

O médico austríaco, George Süch, tinha conseguido um decreto imperial em novembro de 1828 para
operar essas minas e ele e seus parceiros – Andrew Loughman, o mais velho, Andrew Loughman, o
mais jovem, e Joseph Constantine Carpue – não tardaram em negociar com a recém formada St.
John d’El Rey.

Süch estava provavelmente operando como agente para os diretores fundadores da companhia,
uma vez que, em abril de 1829, ele tinha contratado a transferência das minas com os futuros
diretores da companhia.

Os sete adquirentes foram:

Robert Addison, Escudeiro da Somerset Coffee House, Strand, Condado de Middlesex;

Joseph Constantine Carpue , Escudeiro da Dean Street, Soho, Condado de Middlesex;

Stuart Donaldson, Comerciante da Old Broad Street, Cidade de Londres;

James Mackenzie, Comerciante da LeadenhalI Street, Cidade de Londres;

John Diston Powles, Comerciante da Freemans Court, Cornhill, Cidade de Londres;

John Routh, Comerciante da Austin Friars, Cidade de Londres; e

James Vetch, Escudeiro da Leicester Square, Condado de Middlesex.

O nome original da associação formada por esses sete senhores era Sociedade para minerar as Minas
de São João de El Rey em a Província de Minas Geraes Império do Brazil.

John Diston Powles, o presidente da nova companhia, era um dos mais proeminentes comerciantes
de Londres empenhados em investir nas novas repúblicas da América Latina. Powles fez parte da
diretoria da Anglo-Mexican Mining Association formada em 1824 para operar minas de prata em
Guanajuato e ele foi sócio de Simón Bolívar em um malfadado esquema de mineração colombiano.
Quando a bolha especulativa se rompeu em Londres em 1825-1826, Powles aparentemente foi a
falência, mas rapidamente se recuperou do colapso financeiro e, além de sua companhia de
mineração brasileira, ele continuou a investir nas minas colombianas. Sua forte liderança conduziu a
St. John d’El Rey por quase três décadas e meia (1832 - 1867).

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Charles Herring, Jr., o superintendente que partiria para o Brasil, fez parte da diretoria de companhias
mineradoras no México e no Chile e foi sócio de Powles em um empréstimo ao governo colombiano
em 1822 através de uma parceria – a Herring, Graham and Powles.

James Vetch, outro diretor da companhia, foi o primeiro comissário (superintendente) na mina de
prata Real del Monte no México.

J. Routh veio a ser o primeiro diretor-gerente da St. John de 1849 a 1852.

Conforme se verá mais adiante, as minas de São José e São João, ambas em São João del-Rei,
fracassaram. Mas, aparentemente o Dr. Süch não agiu de má fé para com os compradores ingleses
que criaram a St. John, pois pelo menos um dos seus sócios, Joseph Constantine Carpue, fez parte
da sociedade, sinalizando que ele acreditava no sucesso da empreitada.

Quando os sócios diretores da St. John organizaram a companhia em 1830, eles imediatamente
anunciaram uma oferta de £ 50,000 em ações para financiar as operações de mineração em Minas
Gerais.

Herring contratou um "capitão de mina" córnico que tinha trabalhado na Real del Monte, Capitão
Dalley, e uma equipe de dezoito membros: 1 escriturário, 2 costureiros, 9 mineiros, sendo 1 deles
especializado em shaft, 2 carpinteiros de mina, 2 ferreiros e 2 garotos. Este grupo de mineiros da
Cornuália (Cornwall), sob a direção de Herring, embarcou em Liverpool no navio Columbian para o
Rio de Janeiro, onde chegaram em junho de 1830.

"A longa luta contra Napoleão Bonaparte terminara e as tradições mercantis da Europa Ocidental
haviam sido renovadas por um novo espírito de empresa e aventura. Ouro era uma palavra mágica
e o Brasil era uma terra de mistério e encantamento, uma terra onde tudo era possível." (Hollowood,
1954).

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Figura 18 - Ata da reunião anual da St. John – 03 de março de 1831

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Figura 19 - The City of London Tavern

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"Carlos" Herring, Jr.
Seguem duas dezenas de páginas com trechos do diário de Charles Herring, Jr., o primeiro
superintendente da St. John d’El Rey Mining Company. Ele ocupou o cargo de 1830 a 1846. O diário
foi incluído como parte do livro por se tratar de um documento histórico. Como a leitura de um
diário é, de certa forma, monótona, algumas passagens foram contudo suprimidas para não cansar
o leitor, o que pode ser observado pelo distanciamento entre algumas datas. Se todavia a leitura
desse diário de tornar entediante, sugere-se passar para o capítulo seguinte, deixando para continuar
sua leitura quando se estiver com insônia.

Herring não obteve sucesso na operação das minas na região de São João del-Rei, porém o período
abrangido pelo diário não fala desse insucesso.

Diário das atividades do Superintendente da Mineradora São João del-Rei a partir da data de sua
chegada ao Rio de Janeiro em junho de 1830.

"Junho 1830

18. Chegada ao Forte Villegaignon às 1 P.M. O inspetor do Imperador veio a bordo e levou a meu
pedido um bilhete endereçado aos senhores da William Harrison and Company 4 informando-os de
nossa chegada. Às 5 P.M., recebemos a visita do barco da polícia (que é uma preliminar necessária
para o desembarque), desci do navio e fui até o escritório de nossos agentes onde encontrei um
bilhete a mim destinado informando que, por ser o dia da Festa do Coração de Jesus, eles não
poderiam conseguir alojamentos para os mineiros.

Estive com o Sr. Astley, o gerente do escritório dos nossos agentes, e acertei o desembarque da
minha família e do Capitão Dalley para a manhã seguinte. Voltei a bordo às 9 P.M.

19. Depois das 8:30 A.M. desembarquei com minha família e com o Capitão Dalley. O Sr. Astley e o
Capitão Dalley foram atrás de hospedagem para os homens e conseguiram ao preço de 1$500 a
diária, o que inclui uma garrafa de vinho comum e um copo de bebida para cada um.

Às 10 A.M. enviei o Capitão Dalley com dois botes a bordo do navio Columbian (ainda atracado no
Forte Villegaignon) para trazer para o continente os homens e suas bagagens, porém não foi possível
fazê-lo antes de 5 minutos para as 2 da tarde (que é a hora que a Alfândega fecha); assim não foi
possível passar com a bagagem, que ficou depositada na Alfândega até a segunda-feira.

Acompanhei os homens até o seu alojamento no "Barco a Vapor". Constituí Bray, a bordo, o
responsável e porta-voz da equipe: pedi a ele que mantivesse os homens fora de confusões e brigas
e para reportar a conduta deles ao Capitão Dalley toda manhã.

Tive uma conversa geral com os senhores da Harrison acerca das ideias da Companhia, as
considerações mais específicas ficaram para a segunda-feira.

Escrevi para a Companhia através do Navio Susanna meramente anunciando a nossa chegada – não
retive cópia dessa correspondência.

4
Agentes da St. John no Rio de Janeiro.

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20. Domingo – O pacote enviado pelo navio Lord Melville Falmouth em 10 de maio chegou hoje.

21. Não recebi nenhuma carta através do navio Lord Melville.

Às 11 A.M. consegui passar as bagagens de todos os homens pela Alfândega.

Mantive uma conferência de duas horas com os senhores da Harrison, e apresentei a eles, conforme
fui instruído, os pontos de vista dos diretores a respeito de nossa organização e dos negócios em
São João del-Rei. Os resultados dessa conferência foram os seguintes:

1°- Em razão da ausência de dois tropeiros, que até então têm conduzido os mineiros para Gongo
Soco e outros lugares, será impossível programar a nossa ida a São João para esta semana. Um dos
dois tropeiros deve chegar por estes dias e os preparativos serão feitos assim que ele chegar. Se tal
não ocorrer nesta semana, buscaremos outro tropeiro. Os senhores da Harrison aparentemente têm
uma forte predileção por cada um dos dois mencionados Tropeiros.

2°- Os senhores da Harrison acham que o Sr. Duval não terá dificuldade em obter a posse das minas,
apresentando a autorização do Dr. Süch ao seu agente em São João para transferi-las para a
companhia, uma vez que o Sr. Duval está de posse de uma procuração da diretoria em Londres
outorgando-me poderes para tal fim, acompanhada de uma tradução para o português feita por um
tradutor juramentado e, para tanto, eu entreguei aos senhores da Harrison minha procuração para
ser traduzida.

3° - Os senhores da Harrison me recomendaram enfaticamente um jovem inglês (que mora no


momento na Serra dos Órgãos por questões de saúde) como almoxarife ou escriturário, que fez
durante um tempo a escrituração do negócio deles. Eles falaram muito bem do rapaz. Ele domina
bem a língua portuguesa e seus serviços, pelos padrões do Rio, valeriam 1:200$000 por ano, quantia
esta que, considerando suas qualificações, eu pedi aos senhores da Harrison para oferecer-lhe. Ele
pode estar no Rio na próxima sexta-feira.

4° - Eu entreguei aos senhores da Harrison cópia da parte de minhas Instruções referente à licença
no. 2, cópia do contrato, e cópia da licença no. 3, para eles examinarem e retomarmos o assunto
amanhã. Eles acham que o assunto poderá ser conduzido na ausência do Dr. Süch e não haverá
muita dificuldade em meramente se identificar a companhia com a licença.

Talvez alguma pequena dificuldade poderá ocorrer na recapitulação das cláusulas da licença e
obstáculos podem ser esperados na obtenção da inserção dos acréscimos no documento. Os
senhores da Harrison irão aproveitar a primeira oportunidade que surgir para solicitar à pessoa
qualificada para determinar os meios mais rápidos de corrigir tal situação.

5° - Os senhores da Harrison não acham provável que algum brasileiro venha a ser acionista na St.
John d’El Rey Mining Company.

6° - Os senhores da Harrison têm razões para achar que nós não vamos conseguir operar as minas
sem escravos. Eles me colocaram a par de uma situação da Companhia Espírito Santo, que faliu
porque seus administradores não quiseram, por princípios, empregar escravos. O preço de escravos
sem treinamento é cerca de 600$000 cada.

22. Contatei os senhores da Harrison às 11 A.M. Eles ainda não tinham começar a tratar da questão
da Licença.

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Considerando a opinião dos senhores da Harrison a respeito do trabalho neste país, juntamente com
as informações que eu, o Capitão Dalley e o Sr. Duval pudemos obter sobre o mesmo assunto,
determinei a compra de 10 escravos para a companhia, sendo este o número a que estou limitado
pelas instruções que me foram dadas. Marquei um encontro com o Sr. Astley para me acompanhar
até o Valongo 5 amanhã às 9 horas e 1/4 da manhã. À noite, recebi uma mensagem dos senhores da
Harrison para encontrá-los juntamente com um cavalheiro amanhã às 11 A.M. para retomar o
assunto da licença.

23. Fui com o Capitão Dalley e um dos escriturários dos senhores da Harrison ao Valongo para
procurar alguns escravos. Encontrei apenas cinco, que poderiam atender ao nosso propósito, com
preço não inferior a 600$000. O Sr. Duval depois acompanhou o mesmo escriturário ao Lazareto 6
onde alguns escravos acabavam de desembarcar de um navio que havia chegado ontem de
Moçambique. Nove homens esbeltos e fortes foram selecionados como adequados, mas o preço
exigido por eles era de 700$000 e nada foi fechado.

24. Em consequência de um relatório do Capitão Dalley de que dois dos mineiros foram roubados
em sua pensão na noite passada e tendo, além disso, verificado que a casa não era tão respeitável
quanto eu desejava, enviei o Capitão Dalley e um dos funcionários dos senhores da Harrison para
obter acomodação para eles em outro lugar, mas eles não tiveram sucesso.

Fui hoje acompanhado do agente de escravos dos senhores da Harrison ao Lazareto, onde, vendo a
superioridade da força física dos homens, comprei dez escravos esbeltos, jovens e robustos, com
cerca de 20 anos de idade. Eles pareciam satisfeitos por eu os ter comprado. O preço foi de 700$000
cada. O dono dos escravos não se dispôs a diminuir um único mil-réis. Ele havia vendido vários por
aquele preço e alguns até por 800$000. Esses preços são considerados altos, mas se o contrabando
de escravos não puder ser praticado em larga escala e a mão de obra de brasileiros livres não puder
ser adquirida a um preço razoável em São João del-Rei, a companhia será provavelmente obrigada
a pagar um acréscimo sobre os preços atuais. Os escravos estão sempre à venda no Brasil e se tornam
mais valiosos à medida que aumentam a destreza em qualquer arte específica. De modo que nos
primeiros três ou quatro anos (tempo em que se pode considerar que eles alcançaram proficiência
em sua arte), o valor de uma grande equipe de escravos aumenta, pelo menos, na proporção da
diminuição do valor do quantitativo pela mortalidade.

25. O jovem Sr. John March, recomendado pelos senhores da Harrison, chegou esta manhã da Serra
dos Órgãos. Ele concorda com as condições que lhe foram oferecidas, mas com o acréscimo de um
adicional para alimentação e hospedagem, que é de praxe oferecida para escriturários pelos
comerciantes no Rio. Como desconhecemos o custo de moradia em S. João acordamos mutuamente
que tal subsídio seria fixado após algum tempo de residência em S. João. O contrato será firmado
pelo prazo de um ano, findo o qual expirará, podendo ser renovado por mais quatro anos, se ambas
as partes estiverem de acordo.

5
O cais do Valongo, localizado na zona portuária do Rio de Janeiro, era o local de desembarque e
comércio de escravizados africanos.
6
Para os escravizados africanos acometidos por doenças infecciosas, a quarentena acontecia no
Lazareto da Gamboa, localizado no Monte da Saúde, próximo à região do Valongo.

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O capitão Dalley se encarregou de conseguir alguns dos implementos de mineração no continente,
mas o navio ainda não havia começado a descarregar sua carga; sua vez ainda não havia chegado.

Tomei providências para conseguir os passaportes dos homens amanhã.

Os senhores da Harrison me informaram que Tom, um dos tropeiros, está por perto e chegará
amanhã ou no dia seguinte. Combinei alguns assuntos de menor importância com os senhores da
Harrison.

Disseram-me que, quando o Sr. Duval, da General Mining Company, por aqui esteve, ele calculou
que a alimentação de cada escravo mineiro custaria 62 réis por dia.

26. Os homens estiveram na Delegacia de Polícia para obter os passaportes que devem estar prontos
na segunda-feira. O Sr. Young disse aos senhores da Harrison que não haveria dificuldade em fazer
com que as solicitações dos diretores fossem plenamente atendidas se tivéssemos de fato um
arrendamento, mas o Ministro do Interior expressou algumas dúvidas se o contrato expressaria uma
autorização suficiente do Dr. Süch para permitir que prossigamos.

Nenhuma notícia de Tom, o tropeiro.

Soube pelo Sr. Harper, que esteve em São José no Natal passado, que trabalhadores livres e alguns
escravos pertencentes a terceiros, digamos de 30 a 50, podem ser contratados em S. João del Rey,
por 225 a 300 réis por dia. Ele afirma que a contratação de homens livres e o aluguel de escravos
apresenta alguns problemas, pois, os homens livres trabalham apenas 2 ou 3 dias na semana e
corrompem os escravos de sua propriedade e, quanto aos escravos alugados de terceiros, fica-se
completamente à mercê dos caprichos de seus senhores, que induzem os escravos a roubar seu ouro
em todas as oportunidades que surgirem. O Senhor Milward, de São José, havia empregado alguns
trabalhadores livres, mas desde que recebeu um novo suprimento de escravos no último Natal, ele
parou de fazer isso.

27. Domingo. Cinco dos homens adoeceram repentinamente durante a noite. Enviei um médico para
atendê-los às 9 A.M. Ele me informou que todos estão bem novamente, mas recomendou que fosse
dado a eles um vinho melhor do que aquele que eles receberam na estalagem. Em vista disso, pedi
aos senhores da Harrison que lhes comprasse vinho do Porto por cerca de um xelim a garrafa.

O Sr. March levou os dez escravos ao Posto de Vacinação para serem vacinados.

Nenhuma notícia de Tom, o Tropeiro.

28. Ainda não conseguimos liberar nenhum dos Implementos de Mineração pela Alfândega, cerca
da metade dos quais foram desembarcados, digamos, 44 pacotes.

Convoquei os Srs. Rainsford juntamente com o Sr. William Harrison, agentes da Gongo Soco
Company, para obter várias informações a respeito dos meios de trânsito para as minas.

Parece, pelo relato deles, que existe uma dificuldade considerável para fazer com que peças pesadas
de maquinários sejam transportadas através do país. Qualquer peça pesando mais da metade da
carga de uma mula é considerada pesada.

Uma mula carrega 10 arrobas de 32 libras cada, porém, um único pacote de mais de 160 libras é
veementemente rejeitado pelos tropeiros, pois eles não querem, como o fazem na América

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espanhola, colocar um único e solitário pacote nas costas de uma mula, apesar desse pacote pesar
apenas a metade da carga.

Portanto, para transportar qualquer peso, em uma única embalagem, entre 160 libras e 20 arrobas
ou 640 libras, eles empregam duas mulas e prendem a carga em hastes entre a cauda de uma e a
cabeça da outra. Assim, é difícil convencer um tropeiro a fazer isso mesmo atendendo às condições
por ele impostas. Durante a estação das chuvas, ninguém consegue mesmo. Parece que a pessoa
que leva os homens até as minas não leva a bagagem, e os tropeiros com suas mulas, que
transportam carga e bagagem, não levam homens. Este é o contrário do costume na América
espanhola e tem o inconveniente de os homens subirem para as minas sem qualquer bagagem e
frequentemente por uma estrada diferente daquela pela qual a bagagem é enviada. Os homens têm
chegado a Gongo Soco três meses antes da chegada de suas bagagens. Todas as mercadorias, exceto
vestuário (mas que, mesmo assim, devem ser examinadas), pagam uma taxa de 1$125 em cobre por
arroba de 32 libras na passagem do Registro na entrada para Minas Gerais.

O custo do transporte de uma carga de bagagem de 8 arrobas do Rio para S. João é de 20$000, mais
ou menos, dependendo de cada negociação.

Quando alguém chega para ir a Gongo Soco, os agentes geralmente compram cavalos para seu
transporte; os cavalos são posteriormente empregados no local da mineração. O preço dos cavalos
para esse fim é de cerca de 70$000 cada.

30. Thomas Land, o tropeiro, chegou. Os senhores da Harrison combinaram com ele para levar
dezessete pessoas do nosso grupo por 80$000 cada pessoa e 40$000 cada mula de bagagem, mas
desses dezessete apenas dois ou três deste grupo irão levar dinheiro de cobre e uma muda de roupa.
A partida ocorrerá em 4 ou 6 dias.

Assinado o contrato com John March datado de 25 do corrente mês. A partir desta data ele estará
prestando serviço à companhia.

Os homens ficaram por conta de pesar e equipar as suas bagagens para cargas de 8 arrobas, visto
que as bagagens e os implementos serão levados pelos tropeiros. Pretendo enviar John Moyle e
Matthew Williams para os acompanhar e como confiarei a eles as chaves de todos os baús e a
bagagem, espero passar pelo Registro sem dificuldades ou furtos. Estes dois homens não chegarão
a S. João tão cedo quanto os seus companheiros, mas considerarei que os seus salários começam a
contar no dia da chegada dos seus companheiros.

Os oficiais da Alfândega começaram hoje a examinar os pacotes de implementos da companhia.

Lentidão e paciência são virtudes universais no Rio!

Ninguém me deu informações satisfatórias sobre a estrada de terra do Rio a S. João, sobre a qual
ouvi falar em Londres. Ouvi de várias fontes que tal estrada não existe.

Julho 1830

3. Às 11:00 entreguei ao Sr. Duval as suas instruções e anexei documentos. Forneci-lhe uma carta de
crédito de três contos de réis do Sr. Francisco Magalhães de São João del-Rei e 500$000 em cobre
acomodados em sacos de couro para despesas na estrada. Dei instruções ao Sr. Duval e ao Capitão
Dalley para que as operações metalúrgicas não comecem até receberem instruções minhas para

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fazê-lo. Durante todo o dia de hoje tivemos fortes chuvas, razão pela qual acho que a partida não
começou hoje, pois não vimos T. Land o dia todo.

4. Domingo. Mau tempo. T. Land partirá amanhã às 10h30.

Os senhores da Harrison contrataram um tropeiro para levar a bagagem e algumas das ferramentas.
Ele se recusa a levar os foles e as bigornas, os primeiros por serem muito pesados e desajeitados e
os últimos por serem muito pesados.

Encomendei dois cavalos para serem comprados para Matthew Williams e John Moyle, que vão
acompanhar a bagagem e estarão presentes quando ela for aberta no Registro. Fui informado, no
entanto, que poderia depositar a maior confiança nos tropeiros e confiar-lhes as chaves dos baús.

5. De acordo com as novas informações obtidas, parece que o papel-moeda circula até Barbacena.
Sendo assim, o Sr. Duval leva apenas 200$000 em cobre e 300$000 em papel.

Por volta das 10 e meia da manhã, todo o grupo embarcou em dois barcos e
partiram para Porto d'Estrella, a 27 milhas abaixo da baía, onde se juntarão aos
seus cavalos. Achei conveniente dar-lhes dois barris de biscoito para que não se
jogassem de uma vez só na mandioca. Saíram todos bem humorados.

Realmente tive pouco ou nenhum problema com os homens até agora e eles tiveram bons motivos
para reclamar. Eles não foram tratados com justiça pelo capitão Bryce, do Columbian, que lhes deu
um pão infame e, por pressão minha, consentiu, de má vontade, em trocar por um pão mais novo.
A carne também era de qualidade inferior. E no alojamento daqui os homens estavam realmente
muito desconfortáveis; esta não é de forma alguma uma casa respeitável; nela não há nada além de
brincadeiras, bebidas, jogos e barulho todas as noites. Deveria ter sido providenciado um melhor
alojamento para os homens que acabaram de chegar da Inglaterra.

As bigornas pesam 7 arrobas e 8 libras e os pequenos foles 6 ½ arrobas. Com muita lábia e persuasão
convenci o tropeiro a levar esses artigos por 100$000. Ele disse que colocará cada uma das bigornas
nas costas da mula entre duas meias cargas. Nesse caso, a carga total em arrobas pesará 15 arrobas
e 8 lbs ou 488 libras, que é tanto ou mais do que as mulas carregam no México. Vamos ver então o
que pode ser feito. Deve-se ter em mente que este peso está distribuído em três embalagens. O
tropeiro também havia concordado em levar o fole grande, mas depois recuou. Ele começa amanhã
de manhã.

6. O tropeiro, M. Williams, J. Moyle, os escravos e a bagagem saíram


hoje ao meio dia para Porto d’Estrella.

No envio de caixas de implementos etc. para o Rio, as caixas ou


embalagens devem ser marcadas nos dois lados, porque a alfândega
daqui é tão bagunçada que as tampas das caixas muitas vezes se
perdem e assim a nota fiscal fica praticamente inutilizada. O peso de
cada embalagem individual também deve ser marcado em uma das
extremidades, não na capa, pelo mesmo motivo. Essas pequenas
precauções sempre evitarão uma infinidade de problemas e confusão aqui e frequentemente
permitirão que os agentes desembaracem os materiais muito mais cedo do que de outra forma
fariam.

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10. Comprei uma escrava para uso da minha família por 900$000. Ela foi recomendada como sem
defeito. Sua dona a vendeu por necessidade.

Cada residente no Brasil é dono de seus próprios servos, aliás escravos, e não me sendo conveniente
adquirir o número necessário para o serviço da minha família, digamos cinco escravos, comprei-os
para a companhia e os alugarei para meu uso pagando à companhia em salários de servo. O valor
ainda não pode ser fixado com justiça porque pretendo encontrar roupas para eles e, como dois ou
três dos escravos são bastante inexperientes ou muito novos, terei que ensiná-los. É costume no Rio
de quem possuir escravo mantê-lo vestido.

16. O pessoal em Londres deve pensar que eu posso obter todas as informações no Rio fazendo
perguntas sobre o transporte terrestre, o trabalho livre e os gastos para manter os escravos nas
minas. No entanto, ainda não conheci uma única pessoa que me desse informações confiáveis que
eu pudesse repassar à diretoria.

Tais informações só serão obtidas gradualmente e através de nossa própria experiência. Parece que
o preço do envio de uma carga de 8 arrobas do Rio para S. João em dois pesos separados é de cerca
de 20$000. Com relação a pesos maiores nenhuma informação confiável pôde ser obtida. No que
diz respeito à manutenção de escravos, nenhum paralelo pode ser traçado entre o Rio e S. João,
nem, segundo me disseram, entre os escravos dos ingleses e os dos brasileiros, porque os ingleses
os tratam melhor e obtêm mais trabalho deles.

20. Comprei três escravos para o serviço da minha família. Paguei 600$000 por um menino de cerca
de 20 anos de idade para ser cozinheiro. Ele já esteve trabalhando. Seu dono o vendeu por ter
roubado um relógio de um vizinho, mas seu crime, na minha opinião, deve ser atenuado,
considerando que ele não vendeu o relógio, mas ficou com ele até um mês antes de ter sido
descoberto, usando-o no bolso de relógio, evidenciando assim mais vaidade do que vilania. Ele
possui um bom caráter em outros aspectos.

Os outros dois meninos, com cerca de 13 anos de idade, são novos escravos que eu selecionei entre
outros no Lazareto. Eles são rapazes muito bons, ao preço de 750$000 cada. O proprietário pediu
800$000 e, depois de contornar uma série de problemas para obter a sua posse, eles me foram
entregues hoje.

22. Sete mulas de implementos foram enviadas hoje para S. João, sendo que elas levam ferramentas
de carpinteiros e ferreiros.

23. Vinte mulas estão programadas para segunda-feira próxima, quando usaremos todos os esforços
para enviar os grandes foles.

24. Quatorze cargas foram enviadas hoje, mas não pudemos induzir o tropeiro a levar os grandes
foles – ele olhou para eles por muito tempo e acabou por declinar.

Fará bem a diretoria em observar a seguinte regra geral: sempre que possível faça o peso bruto de
cada pacote ser de 4 arrobas de 32 lbs., ou seja, 128 lbs. Se o pacote for de menor peso, mesmo
assim serão pagos pelo seu transporte o mesmo que 4 arrobas. Se o pacote tiver um peso maior do
que 128 lbs., o tropeiro fará seu próprio preço. Portanto, para pesos incomuns não há preço fixo
para o transporte. Todas as cargas (de 8 arrobas) até então enviadas pagaram 20$000 cada.

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Fixei o dia o dia 28 de julho para sair do Rio de Janeiro.

Agosto 1830

17. Cheguei em S. João del Rey às 2:30 P.M. Encontrei nossos rapazes vivendo em uma casa alugada
do Dr. Süch, que eles me cederam. Visitei nossos Mineiros que estão bem, exceto Stanaway, que tem
um problema com um dos pés. Quatro dos escravos estão na lista de doentes – dois com sarna, um
com disenteria e um com reumatismo.

18. Examinei a mina junto com Bray e Barratt. Vi vários veios de quartzo e encontrei apenas uma
pequena quantidade de ouro em um deles, mas nenhum veio naquela parte da mina marcada no
mapa nº 14. Examinei uma grande casa abandonada em mau estado perto da mina com o objetivo
de utilizá-la para os carpinteiros, ferreiros, escravos etc., para o que ela atendia. Ela não fica tão
embaixo no vale mineral da mina como se poderia desejar. Será vendida em leilão. Minha família
chegou com o Capitão Dalley, que foi encontrá-los em Estiva ontem. Liguei para Francisco de Paula
que havia concedido um crédito para o Sr. Duval.

20. Enviei o Capitão Dalley e o Sr. March para os vários lugares onde o Capitão Dalley acha que a
elevação é suficiente para que a água possa ser obtida e para verificar os nomes de tais lugares.

23. Às 10 A.M. as primeiras operações da companhia foram inauguradas pela Sra. Herring, que abriu
um shaft um pouco acima do nº 14 no mapa. 20 mil-réis e algumas garrafas de vinho foram
distribuídas ao pessoal para que nenhum trabalho fosse feito hoje.

Juntamente com o Sr. March comecei a organizar as contas para a formação do nosso livro diário.
Nós ficamos com muita dúvida se deveríamos manter as contas em papel moeda ou em moeda de
cobre. Cobre é a única forma de dinheiro utilizada agora por aqui; o papel moeda não tem valor e
está com deságio de 40 % em S. João del Rey.7

25. Oito ou dez trabalhadores livres ofereceram seus serviços a um patac ou 320 réis por dia, cerca
de 10d no câmbio de cobre. Aqueles que estão dispostos a trabalhar no subsolo pedem 480 réis por
dia ou cerca de 15d. Ainda não precisamos de mão-de-obra livre, então não posso, por experiência
própria, dizer para qual atividade poderemos contratar nem em qual quantitativo. Assim que o ádito
e a tomada d’água começarem, devemos precisar de 150 mãos.

Depois de uma dificuldade considerável e várias tentativas eu obtive 3:000$000 em notas para
minhas contas no Rio. Parece que nesta comarca as exportações excedem em muito as importações,
pelo que poucas pessoas têm que enviar dinheiro para o Rio e aqueles que o fazem (tão
desacostumados estão com as notas) convertem seu dinheiro em notas do Rio e as enviam por
qualquer amigo de confiança que porventura esteja indo ao Rio. Agora devo converter as notas em
cobre com um desconto de 40 %. Talvez em pouco tempo em que nosso crédito esteja bem
conceituado eu não encontrarei tanta dificuldade.

Nossa chegada aqui como companhia para operar as Minas de São João parece agradar aos
habitantes que estão bastante alvissareiros quanto às vantagens que possam advir para a vizinhança.

7
Por causa das falsificações as pessoas desconfiavam do papel moeda.

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Nossa equipe foi muito bem recebida e por sua boa conduta nossos homens ganharam a boa
vontade da cidade.

27. Contatei o Sr. Heatherly que chegou de Gongo Soco no dia 25. Ele teve uma conversa singular
com dois dos nossos rapazes ontem. Disse-lhes que só descobriu ontem à noite que ele era parceiro
em nosso negócio, que por isso tinha o direito de vir ao nosso terreno e dirigir-se a quaisquer níveis
e afundar quantos shafts quisesse. O homem deve ser um bobalhão, tão certo ele estava quanto às
minas, que ele agora diz possuir. A sua ação na compra delas é indigna de qualquer cavalheiro e
digna de um vigarista.

Fui até o local de trabalho e fiz um rearranjo para melhor alojar os escravos e para organizar os
depósitos. Visitei o shaft de S. João.

28. Depois de muitas negociações, o Coronel Constantino concordou em alugar sua casa para a
companhia por 3 anos a um custo de 300$000 em cobre por ano. A companhia tem o direito de
desistir da casa mediante o pagamento de uma multa de seis meses de aluguel. Para poder
disponibilizar a casa para abrigar o escritório e o armazém terei que fazer algumas alterações na
casa, que imagino custar cerca de 150$000. Assim, a casa vai nos custar durante esses 3 anos 350$000
por ano, o que sai mais em conta do que qualquer outra casa que eu vi até agora. O aluguel de casas
em S. João é alto e a chegada da nossa companhia enlouqueceu algumas pessoas ao pedirem preços
pelas suas casas – o Coronel Constantino, por exemplo, queria 496$000 por ano por sua casa.

29. Domingo. Distribui roupas para os escravos. Dei a cada um deles cerca de 7 polegadas de tabaco
em corda e uma dose de cachaça, o que será feito todos os domingos como faz o Sr. Milward. Todo
domingo cada escravo é passado em revista e questionado sobre vários aspectos de sua conduta,
sendo então elogiado ou repreendido, conforme tenha se comportado durante a semana.

30. Ao amanhecer fui com o Capitão Dalley até o shaft e negociei com os homens para afundar uma
braça (fathom) e fazer o contorno ao redor do shaft ao preço de 100$000. É claro que nossos
primeiros acertos serão apenas experimentais. Os homens contrataram quatro trabalhadores livres
a um patac por dia ou 320 réis em cobre (cerca de 10½ d).

31. Escrevi para a diretoria. Despachei o Capitão Dalley e o Sr. March para colherem informações
relativas à mineração em Gongo Soco. Dei-lhes 3 semanas para ir a Gongo Soco e voltar. Perguntei
F. de Paula sobre pólvora, pois nenhuma é encontrada no momento na cidade. Como agora
começamos a precisar de pólvora, fui aconselhado a enviar alguém a Villa Rica para realizar tal
compra.

Setembro 1830

1. Fui a São José pela manhã falar com Dom Cesário sobre nossas minas em Cuyabá. Como ele disse
que não conhecia as minas, ele ficou de conseguir alguma pessoa familiarizada com a região para
nos acompanhar em qualquer dia que fosse bom para mim. Como domingo parecia conveniente
para ele, combinei com ele tal dia.

Pedi para que fossem compradas ferramentas para o pedreiro. Me empenhei para trocar papel
moeda por cobre, sem sucesso.

2. Confeccionei os seguintes livros, a saber:

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Mineiros e Mecânica; Lista de Pagamentos; Relatórios do Capitão Chefe de Mineração;

Relatórios de Mecânica; Livreto de Gastos do Armazém.

Como estamos à procura de trabalhadores livres desde o dia 22 do mês passado e só conseguimos
seis, eu coloquei um anúncio no Astro de Minas (um jornal publicado aqui) oferecendo empregar
trabalhadores livres e contratar escravos. Até agora conseguimos fixar o preço do trabalho livre em
240 réis por dia para trabalho na superfície e 320 réis por dia para trabalho no shaft. Não creio que
possamos controlar o preço da mão-de-obra, porque os trabalhadores descobriram que somos
dependentes deles.

Tentei novamente obter cobre para trocar por papel moeda, mas não tive sucesso, a menos que
concordasse em pagar um prêmio de 45 %, o que eu recusei. Os comerciantes daqui sabem que
estamos precisando de dinheiro e estão inclinados a tirar vantagem disso.

Solicitei que o “Astro de Minas” fosse enviado regularmente ao nosso escritório; ele circula três vezes
por semana.

3. Parece haver uma combinação entre alguns dos comerciantes daqui contra a companhia, a fim de
elevar o preço do dinheiro em cobre, mas se eu conseguir continuar por cerca de uma quinzena sem
precisar de recorrer a nenhum deles, eu acho provável que o prêmio cairá.

O shaft agora está produzindo uma quantidade de quartzo


manchado e misturado com óxido de ferro. De duas bateladas, ou
lavagens, que foram feitas com ele, acho que produz ouro suficiente
ou mais do que suficiente para pagar as despesas se continuar assim.
Mas é tudo fruto de suposição, pois não tenho meios para
desembaraçar o ouro do ferro que permanece com ele, nem de pesar
o ouro.

5. Domingo. Fui a São José onde, com Dom Cesário, percorri parte
da fazenda onde fica a nossa mina ou nossas minas em Cuyabá. O
corpo de minério, que é tido como muito rico em ouro, está situado
a 50 jardas do Rio das Mortes e o local onde o vi ficava a cerca de 50
pés de altitude acima do leito do rio. Todo o terreno de mineração parece estar elevado de 30 a 100
pés. O terreno é tido como sendo rico em ouro em toda sua extensão e tenho pouca dificuldade em
acreditar nesta afirmação, porque toda a vizinhança está banhada em ouro, gerando lucro para
aqueles empreendedores de menor porte. A maior dificuldade em trabalhar nossas minas em São
José é a necessidade de água na superfície e de sua abundância no subsolo, o que parece provável.

A água para operar a mina ou lavar os minérios era trazida de além de Ilhéus, em um canal a uma
distância de 14 léguas. Ouvi dizer que a manutenção desse canal teria arruinado o proprietário. Não
tenho certeza de que a água que o Sr. Milward emprega na Guarda, do outro lado do rio, possa nos
servir. O Sr. Milward acha que a água da Guarda, quando sai dos britadores, está cerca de 60 pés
acima do nível do rio. Se um volume de água suficiente puder ser obtido para o funcionamento da
mina, seria um negócio muito lucrativo, pela aparência geral da região e pelos numerosos lavadouros
existentes na superfície do corpo de minério até mesmo em nossa propriedade. Todo o solo é
evidentemente aurífero pela decomposição de corpos de minério e veios metálicos.

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Em minha opinião, uma companhia deve ser dona de terras como estas e não arrendá-las por um
curto período de 20 anos Se as minas de S. José forem exploradas, tudo terá que ser construído para
e pela companhia, pois ali não há uma única casa na propriedade, nem um galpão para um escravo,
nenhuma madeira, exceto um pouco de arbusto. Assim, todo um novo estabelecimento deve ser
erguido, juntamente com as casas dos mineiros, pois a mina fica cerca de um quilômetro de S. José,
além dos gastos para trazer água, se isso se fizer necessário. Depois que todo esse dispêndio enorme
tiver sido incorrido e a companhia estiver confortavelmente instalada na propriedade, o
arrendamento expira e o proprietário fica com bens de capital e minas mais que suficientes para
operar por cem anos.

A companhia São José tem minas tão boas quanto as que possuímos em uma extensão de uma
légua de comprimento, incluindo também um mato ou madeira muito útil e abundância de água e
com todas as perspectivas de abundância de ouro (pois eu vi vários e esplêndidos espécimes
extraídos e sendo extraídos de sua mina de Pacu no Beta de Chave), pelas quais pagaram £300 e
desfrutam de todos os lucros do negócio.

Não há dúvida que qualquer um pode fazer o mesmo agora em muitos lugares deste país e achar
minas mais fáceis de trabalhar do que as de S. José ou de S. João, mas deve procurar por novas áreas
e não se aproximar de Cocais, onde os preços têm subido muito.

Há hoje oito trabalhadores livres no ádito e cinco trabalhadores livres no shaft, o que representa
mais do que temos conseguido até agora. Apenas uma pessoa veio em consequência do anúncio e
ele era um escravo enviado por seu dono.

7. São os seguintes os preços das provisões:

Toucinho Arroba 1$800 Pão do tamanho do baguete inglês $40

Sal Alqueire 4$000 Feijão Alqueire $900

Bife Arroba 1$600 Arroz Alqueire 1$400

Carne de porco - Vinho por garrafa (Porto) $640

Milho Alqueire $560 Aves cada $320

Farinha de Alqueire 1$200 Açúcar Arroba 3$200


Mandioca
Farinha de Milho Alqueire $750 Velas de cozinha por dúzia de velas $432

Lenha – o fogo para cozinhar em minha casa custa por dia $320

O minério no shaft continua não só muito bom e promissor, como todos os mineiros das companhias
falam de seus minérios, mas pronto para materializar sua promessa.

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8. Fui a São José falar com Cesário sobre uma preocupação que o Dr. Gomes me causou em relação
às minas de São José e que Cesário me explicou satisfatoriamente, embora, deva confessar
francamente, que não entendi mais da metade do que ele disse.

O minério de quartzo do shaft continua a apresentar uma boa amostragem de ouro na bateia. Este
minério deve ser de nº 14; ele está em veios de 4, 5, 6 polegadas de largura, que mergulham próximos
uns dos outros a 70° da horizontal. É difícil quebrá-lo ao sair do shaft, mas será um material muito
frágil para os britadores.

Acredito que agora, tendo andado muito para trás e para frente, consegui o caminho certo para
obter a certidão. O Dr. Süch deveria ter fornecido à companhia esses documentos, sem os quais é
impossível conhecer a extensão da propriedade.

10. Tive uma conversa com Francisco de Paula sobre a questão da agência. Ele disse que só poderia
ser agente da companhia se adiantássemos para ele, de tempos em tempos, os valores que
precisaríamos sacar e, então, sobre todos os pagamentos desses dinheiros, sob qualquer forma,
cobre ou papel moeda, ele receberia 2½ % de comissão. Disse-lhe que pensaria sobre o assunto
antes de lhe dar uma resposta positiva. O fato é que eu não posso, neste momento, recorrer à William
Harrison & Co. da maneira como ele deseja, pois nossas contas estão quase equilibradas.

13. Fui em companhia do Sr. Milward, do Doutor Silveira, mestre da Casa da Moeda do Rio de Janeiro
e Professor de Química, e do Sr. Harris, um cavalheiro inglês que o acompanhava, até São José e dalí
para Guarda, onde examinamos o terreno mineiro de Esperança. De todas aquelas que eu vi, esta
mina me agradou mais do que qualquer outra, porque é muito rica em ouro, facilmente obtido e
existe nas vizinhanças abundância de água em todas as estações para operar a mina e para britar e
lavar o minério. Duas bateias foram lavadas em nossa presença e ambas produziram uma quantidade
considerável de ouro. A madeira para escorar a mina pode ser obtida dentro de uma milha e meia
do terreno pertencente à companhia. Tivéssemos nós uma mina como essa e as instalações para
operá-la, logo a tornaríamos simplesmente a segunda mina do Brasil 8. A General Mining Company
não sabe ou não saberá o valor de sua propriedade neste país, ou nunca a tratariam da maneira
como ora o fazem, empregando uma mão de obra tão insignificante e mineiros tão ineficientes.
Minha excursão do dia agora me leva a acreditar que a água da Guarda não pode ser levada para o
nosso terreno em Cuyabá a não ser a um custo enorme.

O Sr. Sellow me forneceu agora os cálculos das alturas em pés ingleses. Os últimos que eu lancei
estavam em pés franceses, o que eu não sabia. São elas:

English feet
S. João del Rey (Praia do Ribeirão da Villa) 3076.4’

Tanque do Linheiro (superfície da muralha) 3616.2’

Ponto mais alto da Serra do Linheiro sendo 4288.8’

A terra mais alta perto de S. João del Rey

8
A mina de Gongo Soco, em Caeté, era a referência naquela época.

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Villa de São José (Praia) 3215.’

Ponto mais alto da Serra de S. José 4991.7’

Latitude de São José 21°. 6’. 33”

O Sr. Milward construiu na Guarda um britador para britagem a seco, mas o Dr. Silveira e o Sr. Sellow
dizem que, como os minérios da Esperança contêm piritas de ferro, a britagem a seco vai matar os
homens.

Os homens do shaft afundaram abaixo dos veios de quartzo que contêm o ouro e agora alcançaram
um grande leito de quartzo que é o de No. 14 e que, de dois experimentos feitos hoje, nenhum
contém ouro; os veios acima parecem ser os alimentadores.

14. Hoje temos 3 carrinhos carregando pedras a $240 cada carga e as cargas são muito pequenas.
Achei isso caro.

Cada carga de pedra quebrada da pedreira custa $280

Pólvora digamos $140

Transporte $240

Total $660

sem incluir o desgaste das ferramentas que comprei.

Autorizei o Dr. Fonseca, de São José, a realizar visitas médicas, dia sim, dia não, a S. João, ao preço
de £100 por ano, com pagamentos mensais, por ser ele o único cirurgião atuando em nossas
proximidades. Na verdade, há também um jovem português, que chegou aqui há pouco tempo, e
de quem não se fala muito bem.

17. Contatei o Dr. Gomez hoje sobre as certidões, mas ele me disse que apenas uma ou duas foram
encontradas até agora. Dr. Süch deveria ter dado cópias atestadas delas para a companhia. Se eu
não as conseguir da Guardamoria 9 em um ou dois dias mais, escreverei aos Harrisons sobre o
assunto, pois eles estarão com o Dr. Süch antes de mim.

Hoje, vários dos trabalhadores livres foram dispensados dos serviços do ádito, uma vez que não
havia mais nada a ser cortado e esses trabalhadores não entendiam de construção de muro de pedra.
Eu lhes ofereci emprego no shaft, mas não consegui induzi-los a trabalhar no subsolo. E é neste
aspecto que experimentaremos a maior dificuldade com o trabalhador livre. Pelo que pude ver na
semana passada, acho que S. João tem em sua redondeza mais de 150 trabalhadores livres, todos,
ou quase todos, poderiam ser contratados, por 640 réis por dia para trabalhar na superfície, mas não
para entrar na mina subterrânea.

9
Antiga repartição aduaneira dirigida por um guarda-mor.

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19. Domingo. O Sr. Milward me informou que, em carta recebida ontem, consta a intenção da
diretoria em Ludgate Hill de enviar-lhe 30 mineiros europeus, fundidores, mecânicos etc. e uma
solicitação para comprar mais 50 negros. Assim parece que a companhia está finalmente ciente do
valor de seu negócio aqui; e se eles não se ocuparem muito com as minúcias da mineração prática,
como seu Secretário parece muito propenso a fazê-lo, haverá pouca dúvida de o negócio prosperar
e enriquecer os acionistas. As minas, porém, não tão produtivas como a de Gongo Soco, serão mais
produtivas para a companhia devido às circunstâncias favoráveis que existem neste país.

23. Mudei minha família para a nova casa. Estive ocupado o dia inteiro organizando tudo relativo à
casa, ao escritório e ao depósito: as partes dos depósitos estavam sendo enviadas entre ontem e
hoje.

24. Capitão Dalley, Bray e Clark torceram seus narizes completamente contrários à utilização de
britadores tracionados por cavalo. Os diferentes cálculos de gastos, distância de transporte etc. etc.
ainda estão para ser feitos.

Dois ingleses, que chegaram da mina de Conde de Linhares, me procuraram pedindo emprego. Eles
não têm nem a comunicação de demissão nem as recomendações por escrito. Eu me recusei a
empregar um deles chamado Bawden (outrora capitão de mina em Gongo Soco na época de
Oxenford e desde então empregado do Doutor Gardener, ambos cavalheiros de pouca estima no
Brasil). Eu concordei em empregar o garoto a £3 por mês como tarefeiro na oficina de ferreiros ou
para torná-lo geralmente útil. Ele não veio para este país na qualidade de mineiro e nunca firmou
nenhum contrato por escrito (até onde eu sei).

25. O Sr. March disse que poucas informações puderam ser obtidas em Gongo Soco com relação à
maneira de lançamento de suas contas. Parece que todo o gasto da mina passa por uma conta única
que controla o dinheiro em caixa e o Coronel Const. disse a March que ele era obrigado a autorizar
por escrito todas as semanas os milhares de milréis desembolsados em tal conta e ele não sabia a
razão disso. Eles têm em seus livros três colunas de dinheiro, a saber, uma para Prata, outra para
Cobre e outra para Papel Moeda, cujo plano eu adotarei, embora seja trabalhoso e inconveniente,
mas não vejo meios de manter as contas claras a menos que elas sejam mantidas desta maneira.
Estabeleci com o Sr. March a criação dos Livros de Contabilidade – a saber: dois livros, sendo um
para entradas e um para entregas – ambos em forma de um Livro Razão, que sempre darão uma
visão clara do número de cada tipo de movimentação.

27. O Capitão Dalley é da mesma opinião que expressei há alguns dias acerca de uma visão superficial
da Mina de Cuyabá. Ele ainda não descobriu nenhum meio de trazer água para a mina e diz que uma
mina neste país sem a energia d'água não prospera.

28. Fui cedo à Guardamoria buscar as certidões quando o escrivão me disse que João Rodriguez
poderia pedir por elas até o dia do juízo final e ele não iria consegui-las porque ele não gostava dele.
O escrivão, no entanto, comprometeu-se a procurá-las e eu vi claramente em alguns dos registros
nos cantos das folhas, à medida em que elas iam sendo reviradas, que ele conhecia bem onde
encontrá-las. Eu o fiz saber estar disposto a "engraxar as rodas", mas ele disse não ser o caso.

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Outubro 1830

2. Partí à ½ hora depois das 7 A.M. com o Sr. Duval e a Sra. Charles para São José para estar presente
ao casamento do Sr. Milward com a Senhorita Neves de São João. Passei o dia em São José e retornei.

4. Com Escrivão da Guardamoria obtendo os vários documentos despachados.

Supondo um caso extremo, eu coloquei a seguinte situação perante o Dr. Gomes, a saber:

O Doutor Jorge Süch comprou umas minas n’esta Villa de S. João del Rey, e para as poder lavrar,
conseguiu de S. M. Imperial licença ampla para o fazer em qualquer parte d’esta Província.

Em consequência desta licença formou o Dr. Jorge uma companhia Ingleza para lavrarem e tirarem
ouro somente nos serviços que s’abrissem nesta Villa e na de S. José.

Contratou o mesmo com a dita Companhia de lhes arrendar as mencionadas lavras e do producto
d’ellas ser o mesmo pago a proporção do ouro que se tirasse, com a cláusula q. estes títulos haviam
de ser aceitos, ou rejeitados pela Companhia até o dia 19 de Dezembro do presente anno, 1830.

A Companhia, fiada na boa fé do Doutor Jorge, mandou a estas minas um partido de mineiros, e
estes chegando à Corte do Rio de Janeiro alcançaram de S.M.I. e revestirem-se da mesma licença
conjuntamente com Dr. Jorge.

Chegando os mineiros a esta Villa e passando a examinar os títulos q. Dr. Jorge comprou, acharam
não estarem os mesmos conformes e legaes ; e por consequência não está a Companhia obrigada a
ratificar ou fazer revallidar os mesmos títulos porque todo esse Contrato se considera nullo, e não
estão mais por esse arrendamento.

Pergunta-se - À vista do que fica exposto, perguntam agora os da Companhia, s’elles em virtude da
licença que obtiveram de S.M.I. pela qual se revestiram dos mesmos poderes do Dr. Jorge podem
trabalhar por sua conta quaesquer outras terras q. comprem, consigam ou obtenham
exclusivamente do Dr. Jorge?

Dr. Gomes respondeu que os Diretores da Companhia que estavam sendo considerados no decreto
do Imperador datado de 8 de julho de 1830, como “Sócios em comunhão” com o Dr. Süch, tinham
o mesmo e igual direito de exercer a faculdade de mineração em Minas Geraes com o próprio Dr.
Süch - que eles poderiam minerar onde quisessem, mas devem receber o Dr. Süch como parceiro
em quaisquer minas que eles adquirissem, se o Dr. Süch assim o desejasse, pelo que o Dr. Süch
arcaria com todos os custos na proporção de sua participação, tanto na aquisição quanto na
operação das referidas minas; mas se o Dr. Süch se recusasse a ingressar na Sociedade, ou se ele não
pagasse sua parte proporcional de dinheiro na aquisição, ou dos custos para operar as referidas
recém-adquiridas minas, a Companhia não poderia ser impedida de realizar suas operações por sua
própria conta.

Pergunta-se, em decorrência da resposta anterior:

Se é mister que Dr. Jorge tenha parte n’estas terras mineraes que a companhia conseguir, então
como se deve dividir a parte q. o mesmo há de ter, não sendo a Companhia d'um número certo de
Sócios?

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O Dr. Gomes disse que só poderia responder a esta pergunta após ver os termos do contrato feito
entre os Diretores e o Dr. Süch; mas, não o vi dizer que, para o Dr. Süch ter direito a uma oitava parte,
deveria haver oito pessoas mencionadas no decreto a quem a licença é concedida.

Com efeito, parece provável que a lei no Brasil possa considerar a licença concedida a oito indivíduos,
e não se importa que sete deles possam ter dividido suas proporções em 5.000 ações e o outro
manter sua proporção de 1/8 intacta.

Entendo que uma objeção à mineração sob esta licença é a de que a má conduta de qualquer um
dos supostos sócios no pagamento do quinto etc. possa comprometer todos os outros : isso não
me ocorreu no Rio e não poderia ter sido remediado se tivesse me ocorrido, porque a licença não
poderia ser totalmente transferida do Dr. Süch para a Companhia. Esta objeção se aplica igualmente,
supondo que o contrato de arrendamento permaneça válido, pois, pela licença, o Dr. Süch também
pode minerar onde ele quiser.

Estou agora mais seguro da opinião que manifestei no Rio aos Wm. Harrison & Co. e ao Sr. Young
de que a expressão "Sócios em commum" deveria ter sido excluída da licença estendida à
Companhia.

5. O caso, que submeti a Gomez ontem, submeti hoje ao Ouvidor que é Superintendente de Minas.
Ele disse que é proibido por lei de prestar assessoria jurídica – no entanto, em um caso deste tipo,
ele me daria sua opinião e levaria até amanhã para estudar o assunto. Expliquei a ele a dificuldade
em que me encontrei colocado em relação aos limites das Minas e ao recém-descoberto parceiro de
1/8. Ele respondeu que havia expressado seu espanto outro dia por não ter havido brigas entre os
proprietários das várias áreas de mineração em nossa vizinhança.

6. O Ouvidor me deu sua opinião hoje sobre o caso colocado perante ele. Ele disse que não tinha
dúvidas de que a Licença considerava os Diretores e o Dr. Süch como parceiros; como uma empresa;
e que a maioria dos votos governaria seus processos; e que se um dos sócios optar por minerar por
conta própria, ele deve obter outra licença para esse efeito, pois a presente licença não autoriza os
sócios minoritários a demarcar minas.

Em uma palavra, ele disse que considerava a licença atual, estendida à Companhia, equivalente a
uma nova licença adquirida expressamente por eles. Esta opinião coincide com a de Pereira, Mr.
Young e William Harrison & Co.

O Ouvidor disse que, no caso de um dos sócios resolver operar minas por conta própria, seria sempre
bom que os outros parceiros deixassem claro junto ao Governo que eles não seriam responsáveis
pelos quintos a serem pagos por esse indivíduo operando por conta própria.

8. Cesário virá a S. João no domingo para tomar posse das minas para o Dr. Süch, de acordo com
as certidões que obtive, e posso então, se quiser, aceitar o título como bom, mas vejo muita
probabilidade de fazê-lo no momento. A validade do título, conforme estabelecido no mapa, parece
defeituosa e, pelo que vejo, irá para o Rio para arbitragem.

15. Duas das minhas mulas de liteira, que foram levadas para pastar no pequeno campo anexo à
casa, estão desaparecidas desde esta manhã. Elas foram roubadas. Me custaram 500$000. Eu
também tenho que arcar com metade da perda de uma mula de bagagem, que ficou manca na

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estrada que vem do Rio. A outra metade da perda é a da Companhia, já que era uma das mulas
compradas em conjuntamente entre mim e a Companhia. O custo foi de 150$000.

Como um homem da lei inteligente e honesto é uma "avis rara" em S. João, talvez o plano mais
prudente seja escolher o mais inteligente e mais desonesto como um representante. Assim, através
de F. de Paula, deixei Emmerenciano saber que eu gostaria que ele fosse o advogado da companhia,
caso ele já não fosse o advogado do Sr. Heatherly. Ele respondeu que nunca tinha aceito advogar
para aquele homem (Heatherly) e teria muito prazer em servir a Don Carlos de qualquer maneira
que fosse o serviço.

16. Emmerenciano parecia satisfeito em sua nomeação. Eu acho que será de seu interesse lidar de
forma correta conosco e espero, por seus meios e um par de teatralidades, fazer Heitor ver seu
verdadeiro interesse e, assim, quebrar a trindade de Heatherly em uma unidade apenas.

17. Domingo. Eu e o Capitão Vetch sempre consideramos que as grandes riquezas da nossa mina de
S. João derivavam principalmente dos veios cruzados de quartzo. O Capitão Vetch, entretanto, não
estava ciente de que um corpo regular de minério de ferro e quartzo realmente desce por toda a
extensão do vale mineral e que uma parede do corpo de minério existe parcialmente, mas na maior
parte, o corpo de minério e a região foram completamente exauridos. Eu agora, sabedor da
existência desse corpo de minério, ainda acho que nossas riquezas devam ser extraídas dos veios
cruzados, porquanto nossos experimentos no próprio corpo de minério não deram resultado. O
capitão Dalley, entretanto, tem outra opinião. Segundo ele, a menos que as riquezas da mina estejam
contidas no corpo de minério, a mina tem pouco valor.

Para corroborar a sua opinião, o Capitão Dalley fez o seguinte cálculo, baseado na amostra de
minério de ouro mais rica que já encontramos, ou seja, cerca de 20 libras em peso: um veio com um
pé de largura produz o valor de um shilling de ouro, veio este que Dalley diz que não poderia ser
operado por ingleses por menos de £10 por braça (1 braça = 6 pés): portanto,

6 pés de profundidade por 6 pés de comprimento = 36 pés cúbicos, sendo o veio de 1 pé de largura.

Peso de um pé cúbico de minério 63 libras

Peso de 36 pés cúbicos de minério (36 X 63) 2268 libras

Ao valor de 1 Shilling por 20 libras de peso: 2268 : 20 = 113.8 shillings =

113.8 shillings = £ 5. 13. 4¾

Consequentemente, incorrendo em uma perda muito considerável, e ainda com minério rico.

26. Enviei hoje ao Capt. Dalley a seguinte carta.

São João del-Rei 26 de outubro de 1830

Capt. J. Dalley

Senhor,

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Como você comentou comigo outro dia que você não achava que a Companhia poderia operar
satisfatoriamente a mina do Poço, a menos que possuísse a mina adjacente de J. Roriz e a mina ao
Sul anteriormente pertencente a J. G. Gomes, peço que me diga por escrito as razões que você tem
para formar tal opinião.

Gostaria que, ao mesmo tempo, dissesse se acha que a Companhia agiria com prudência ao colocar
a Mina do Poço em condição de operar caso a Companhia não possa estender suas operações além
dos seus limites atuais em S. João del Rey.

Aguardo sua resposta

etc. etc.

Novembro 1830

5. Cheguei ao Rio de Janeiro à ½ hora após as 10 A.M.

16. Fiz propostas ao Dr. Goodridge, um cavalheiro de muita respeitabilidade, para ir a São João del-
Rei como Médico Assistente da Companhia. Pedi-lhe para apresentar suas condições e ele
mencionou £ 300 por ano. Respondi que não me sentia autorizado a ir tão longe e, depois de alguma
longa conversa, ofereci-lhe honorários de £ 200 por ano, digamos durante seis meses, prazo durante
o qual ele teria tempo suficiente para fazer sua proposta à diretoria e receber uma resposta. Ele disse
que iria consultar seu amigo, Sr. Tully, e me dar uma resposta em breve.

17. Comprei cinco negros a 680$000 cada.

Eu tinha marcado minha partida para o próximo sábado, mas como o Dr. Goodridge não pode estar
pronto antes da quinta-feira, marquei minha partida para tal dia. Comprei um rapaz negro – preço
de 700$000.

18. Assinei um contrato com o Dr. Goodridge pelo qual ele é contratado por exatos 7 meses com
honorários de £ 300 por ano. Comprei um homem e uma mulher negros – 550$000 cada.

21. Domingo. Comprei um garoto negro. Preço 700$000.

26. Parti do Rio para São João acompanhado pelo Dr. Goodridge.

Dezembro 1830

2. Cheguei em São João del-Rei.

3. Visitei as obras com o Capitão Dalley. O nível do ádito ao longo do rio tem se mantido muito
firme, mas achei necessário ter mais estacas cravadas no leito do rio para preservar as margens do
ádito. Pelas correntezas que descem os regos que o Capitão Dalley construiu acima e ao longo do
lado sul da mina, vejo que seria impossível operar esta mina durante a estação das chuvas. Sem um
nível adequado de ádito a mina ficaria constantemente cheia d’água até a superfície, apesar de
utilizarmos todas as bombas para fazer a drenagem. O nível do ádito torna-se, portanto, a pedra
fundamental do funcionamento dessas minas e nenhuma despesa necessária deve ser poupada para
materializar isso. Há muita água no shaft de São João, circunstância não prevista, pois o fundo do
shaft está consideravelmente acima do solo ao norte e a leste.

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6. Clark e Capitão Dalley estimaram em aproximadamente £50 o custo para construir aqui, de
madeira, as duas rodas para o engenho de bombeamento movido a cavalo. Acho que vai valer a
pena pagar algo a mais para ter as rodas de ferro trazidas do Rio, principalmente porque nos
pouparia um mês de trabalho.

7. Enviei John March à Fazenda de Prudente, o tropeiro, próximo a Bertiorga, para entrar em
entendimentos com ele e negociar o transporte das rodas de ferro do Rio.

Encomendei com Francisco de Paula 50 dúzias de pau pique com 24 palmos de comprimento a
2$000 por dúzia; 50 dúzias de nove palmos de comprimento a $600 por dúzia; 25 vigas redondas de
17 palmos de comprimento e 11 a 9 polegadas de espessura a 1$000 cada.

A escritura de venda ainda não ficou pronta e, como amanhã é dia de festa, ela não estará pronta
para ser assinada antes de quinta-feira. Eu gostaria que a escritura de venda fosse feita em meu
nome, porém, quando eu for transferir a mina para a companhia, a sisa 10 teria que ser novamente
paga. A sisa é de 10 % sobre o valor da aquisição. Eu teria, portanto, que pagar 500$000.

8. Como Francisco Joaquim não se dispusesse a vender a sua casa por 1.000$000 em papel moeda,
eu concordei em dar-lhe essa quantia em cobre em três meses. Ele prometeu, portanto, colocar a
casa em leilão na sexta-feira, de acordo com a escritura testamentária, e cuidar para que eu a
arrematasse pelo valor declarado no leilão.

Enviei o Capitão Dalley esta manhã para encomendar madeira para o engenho movido a cavalo e
para as bombas.

9. Assinei a escritura de venda de uma pequena chácara perto da Água Limpa para a companhia ao
preço de 300$000. Esta chácara está situada na confluência de Água Limpa com o Ribeirão da Villa
a cerca de uma milha a nordeste da nossa mina. É o local mais favorável para a colocação dos
britadores, caso decidamos sobre a britagem com a água de Água Limpa. Além disso, uma grande
quantidade de capim para os cavalos da companhia pode ser cultivada lá – a chácara contém cerca
de 1½ acre de terra.

O novo shaft do ádito atingiu o nível do ádito com a descoberta de água - uma circunstância
favorável que nos permitirá cavar para a direita e para a esquerda na continuação deste trabalho
indispensável. O Sr. March retornou esta manhã da Fazenda de Prudente. O tropeiro não concordou
em trazer as rodas, cujos números no inventário são 39, 40, 41, 42, 43, 44 e 58, por preço algum. Ele,
no entanto, concorda em trazer a peça de nº 119, pesando 260 libras, sendo esta uma peça de grande
importância. Parece, portanto, que seremos obrigados a construir as rodas para o engenho movido
a cavalo de madeira.

10. Recebi uma carta de um dos trabalhadores livres dizendo que, se não lhes fossem permitidas 1
hora e meia para o jantar, em vez de 1 hora, eles fariam greve amanhã.

Encomendei vigas para construir o galpão dos ferreiros.

10
SISA do francês, saisini, significando "posse", era o antigo nome do ITBI (Imposto sobre a
Transmissão de Bens Imóveis).

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11. Como aceitar o pedido dos trabalhadores livres desarranjaria consideravelmente nossas horas de
trabalho, eu me recusei a concordar com seu pedido. Além disso, o autor da carta é uma pessoa
muito refratária e rebelde.

Um pequeno veio cruzado de quartzo cortado no ádito do shaft produziu uma boa amostra de ouro.

Comprei cal a $480 o alqueire. Paguei os homens e fiz um balanço do dinheiro.

12. Domingo. A diretoria quer saber como estão fixadas as horas de trabalho dos escravos.

Eles tomam o café da manhã e depois começam o dia às 7 horas. Trabalham até o meio-dia, almoçam
e recomeçam a trabalhar às 1 P.M. Trabalham até ½ hora após as 5 e têm o restante do dia para si
mesmos. No domingo de manhã, eles se vestem com suas melhores roupas – todos uniformizados
– e são trazidos por Pitman Bray para minha casa para prestarem reverência e para eu ver se todos
eles estão limpos e bem vestidos. Se eu não encontrar nenhuma falha, cada preto é servido com
uma taça de vinho de Caixás (destilado) e um pequeno pedaço de tabaco (cabeça de negro).

Em caso de negligência de qualquer um deles, sua mesada de cachaça e tabaco é interrompida.


Ainda não tive nenhuma razão para recorrer a uma punição mais séria.

13. Durante a noite, alguma água penetrou para dentro do ádito do shaft, aparentemente do lado
leste e por causa das fortes chuvas. O Capitão Dalley não percebeu nenhum inconveniente muito
sério.

Estabeleci as seguintes regras a serem observadas pelos Mineiros e Mecânicos ingleses no


Estabelecimento.

1. Um mineiro trabalhando na superfície por mais horas ou fazendo horas extras receberá
acima de seu salário, para fazer um trabalho comum, como telhados, erguer galpões, remover
lixo etc.: 8d Strlg (8 pennies Sterling) por hora.

2. Para trabalho subterrâneo; conserto de bombas; trabalho no Shaft; carregamento de


pedras pesadas de minério; montagem de máquinas; remoção de fezes; reparo de níveis,
Shafts; martelagem na oficina de ferragens: 1 shg Stg (1 shilling Sterling) por hora.

3. O carpinteiro chefe receberá 1/6 Stg (£) por hora para todo o trabalho feito em horas
extras.

4. Subcarpinteiros receberão 1 sh. (shilling) por hora para trabalho extra.

5. O Ferreiro chefe receberá 1/3 Stg (£) por trabalho extraordinário.

6. Subferreiros receberão 1/6 Stg (£) por hora para trabalho extra.

7. Os Carpinteiros e Ferreiros devem estar no Estabelecimento e começar a trabalhar às ½


hora após as seis da manhã. Meia hora é permitida para o café da manhã. O tempo do meio-
dia até uma hora é permitido para o almoço. O dia de trabalho termina às 5 da tarde.

8. A primeira turma de Mineiros deve estar no local às 7 horas da manhã e trabalhar até as 3
horas da tarde. A segunda turma deve substituir a primeira às 3 da tarde e trabalhar até as
11 horas da noite. A terceira turma deve substituir a segunda às 11 horas da noite e trabalhar
até as 7 horas da manhã.

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9. Os Ferreiros devem afiar as ferramentas dos mineiros toda a tarde depois de ½ hora depois
das 3 horas.

---- P E N A L I D A D E S ----

10. Qualquer homem que não chegar ao seu posto no tempo fixado para iniciar o trabalho
será multado em 2/6 Strg (£).

11. Qualquer homem que desejar tirar um dia de folga e não pedir licença ao Superintendente
do Estabelecimento será multado em 10/6 Stg (£).

13. Concordei em sacar de Francisco José da Silva 300$000 em cobre concedendo-lhe 43 % de


prêmio e dar-lhe uma autorização de saque no Rio pelo valor correspondente em notas bancárias.

15. Combinei com Francisco de Paula para empregá-lo como Agente da Companhia nas seguintes
condições. Por todas as compras que ele faria para a Companhia fora da cidade ele receberia 2 ½ %
de comissão; por todas as compras que ele faria para nós na cidade, 1 ½ %.

Dar-lhe preferência na compra de materiais etc., caso ele vendesse a preços tão razoáveis quanto
outras fornecedores. Ficou bem entendido entre nós que, sempre que eu puder comprar dentro ou
fora da cidade tão barato quanto ele, eu o farei e ficarei com a comissão.

De todas as pessoas nesta cidade F. De Paula pode ser a mais útil para nós. Ele é um homem
trabalhador e tem mais influência do que qualquer outro dentro e fora da cidade entre todas as
descrições de operários, fazendeiros, comerciantes de madeira etc.

17. Coloquei o seguinte Aviso no jornal de São João.

Jornadas que a Companhia Ingleza offerece aos trabalhadores, na proporção dos diferentes serviços
e horas de trabalho; a saber:

Das 7 horas da manhã até o meio dia e de uma hora depois do meio dia até as 5 ½ da tarde;
trabalhando em talho aberto 320 réis por dia.

Os que trabalham nas rodas de dia $360

Os que trabalham nas rodas de noite $440

As horas para os trabalhadores das rodas são das 7 horas da manhã até as três da tarde.

As horas de trabalho de noite são as seguintes.

O primeiro turno principia as 3 horas da tarde até as 11 horas da noite.

O segundo turno das 11 horas da Noite até as 7 da manhã.

Os que trabalham nas betas e regos debaixo da terra:

De dia $480; de noite $640.

As horas são as que ficam ditas para os que trabalham nas rodas.

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As pessoas que se quizerem empregar n'estes trabalhos, ou alugarem escravos podem
dirigir-se a fallar com o Director da Sociedade, o Snr. Carlos Herring.

Acho necessário oferecer condições melhores do que as habituais na cidade para conseguir
trabalhadores livres. Ofereci 1$000 por dia para carpinteiros nativos e consegui quatro. $800 é o
preço da cidade.

Recebi despachos do Rio sendo os documentos legais do Dr. Bivar relativos à Arbitragem – carta da
William Harrison & Co. e algumas escritos de 6 de outubro da diretoria.

20. Mudei-me para uma nova casa porque surgiu uma oportunidade de uma casa muito boa e
infinitamente mais conveniente e pelo mesmo preço. Apesar de ter que pagar uma multa de seis
meses de aluguel de 150$000 ao sair da casa atual, eu vou pagar pelo aluguel do primeiro ano
200$000 e pelos outros dois anos, 300$000.

Calculei desembolsar 150$000 por esta casa. Cerca de 45$000 já foram desembolsados. O restante
será economizado.

23. Os 16 escravos chegaram. Providenciei suas acomodações na nova casa. Separei-os dos antigos
escravos por dois ou três dias para prevenir caso haja alguma doença à espreita entre eles.

24. William Morris, o carpinteiro contratado pela Wm. Harrison & Co., chegou hoje.

Hoje, por ser véspera de Natal, fizemos os pagamentos.

26. Domingo. Em consequência da doença de Bray, o Capitão Dalley não tem tido tempo livre para
ir a Água Limpa completar o nivelamento e a medição, pelo que nossas estimativas ainda estão
atrasadas.

27. Água no Shaft nº 3. O pessoal não pode trabalhar nele. Fui hoje ver uma chácara a cerca de uma
milha e um quarto de São João, ao lado da pequena chácara que compramos em Mattozinho, através
da qual vai passar a nossa canalização de água para os britadores. O preço pedido foi de 2:000$000
em papel. É a chácara mais bem conservada que já vi nesta parte da região. Acho que cresceria
grama suficiente para 40 cavalos pastarem durante o ano inteiro.

Sendo a grama tão cara em São João, consegui-la da maneira mais barata possível torna-se matéria
de grande importância. A Chácara agora está plantada com Milho e Mandioca principalmente.

28. Estive com o Capitão Dalley em Água Limpa o dia inteiro. Foi completado o nivelamento até
agora de sorte a nos dar uma queda suficiente para uma roda de 20 pés e o canal d’água a ser
construído não chegaria a uma milha de comprimento e o Capitão Dalley disse que ele pode ser
construído com a maior facilidade e com pouco gasto. O local em que pode ser feita a tomada
d’água fica precisamente na confluência de Água Limpa e Cala Boca.

31. Sendo amanhã feriado, hoje é dia de pagamento.

Um alemão me procurou candidatando-se a um emprego nas Minas. Se ele tiver boas referências,
pode vir a ser Feitor. Escrevi à diretoria e à William Harrison & Co."

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Síntese do Diário de Herring
Conforme vimos, a Companhia St. John d’El Rey foi fundada em 1830, quando um grupo de
investidores londrinos comprou as minas localizadas no Município de São João del-Rei, Província de
Minas Gerais, do austríaco Dr. George Süch e seus sócios ingleses. Com a realização dessa compra e
a transferência da concessão imperial de mineração, a Companhia despachou uma equipe de vinte
mineiros ingleses a São João del-Rei para colocar em funcionamento duas minas que, dois anos mais
tarde, mostraram-se improdutivas.

O grupo chegou no Rio de Janeiro em junho de 1830 e, depois de uma dura jornada em mulas
atravessando as montanhas com seu pesado maquinário, eles chegaram às minas em julho. Em
meados de agosto o trabalho nas minas tinha começado.

Sob estritas instruções do escritório de Londres, Herring enviava de volta detalhados relatórios
descrevendo o progresso dos novos trabalhos.

William Harrison and Company foram os primeiros agentes no Rio de Janeiro. P. S. Nicolson and
Company assumiram os negócios da companhia dos anos 1860 até a década de 1920, quando Wilson
Sons and Company assumiram pelos 40 anos seguintes.

Problemas legais a respeito de direitos de propriedade, a angustiante constatação de que o Dr. Süch
e seus sócios tinham provavelmente dourado a pílula quanto às possibilidades das minas e o baixo
teor aurífero do minério prejudicaram a St. John neste início de operação.

O diário não cobre esta fase, mas o otimismo que permeou as primeiras correspondências deu lugar,
dentro do período de um ano, à desilusão com as perspectivas das minas.

Como o Diário de Charles Herring, Jr. deixa transparecer, a água era um elemento fundamental para
a mineração. Esta mesma água, tão necessária aos trabalhos de mineração, também foi a responsável
por sua desgraça. A Mina de São José foi inundada e se tornou impraticável operá-la e a Mina de
São João del-Rei também não prosperou; produziu um retorno miserável que também teve que ser
abandonada. A companhia incorreu em um prejuízo de £26.287.

Em meados de 1832, aconselhados por Herring, os diretores decidiram pôr fim às operações e
procurar por novas minas.

Alguns da equipe de mineração permaneceram com Herring quando ele passou a inspecionar os
vários depósitos de ouro na região. Outros voltaram para a Inglaterra e uns poucos mineiros córnicos
foram contratados por outras companhias inglesas de mineração em Minas Gerais.

Herring e seu pessoal fizeram uma busca completa das propriedades minerais de ouro na região
central de Minas Gerais, muitas delas em mãos de investidores britânicos.

Em agosto de 1833, todas as operações foram transferidas para uma outra mina localizada em
Aguardente, mas a busca de uma propriedade mais adequada continuou e, nesse mesmo ano,
Herring adquiriu a pequena mina de Feixos perto da Freguesia Congonhas das Minas de Ouro de
Sabará, hoje Nova Lima. Uns poucos ingleses trabalhavam os depósitos no entorno de Congonhas e
vários deles tinham adquirido partes da propriedade mineradora de Morro Velho.

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O Padre Antônio Freitas
A mina de Morro Velho foi explorada pela primeira vez em 1725 pelo pai do Padre Freitas, Coronel
Manuel Pereira de Freitas, que pagou por ela 150.000 cruzados, equivalente a £ 600, mas, naqueles
dias, uma importância muito diferente.

As primeiras explorações foram realizadas por processos bem primitivos, simplesmente tirando o
minério aurífero através de explosões de afloramentos na superfície do morro. O Padre Freitas,
segundo R. Burton, filho do primeiro dono da Mina, reiniciou os trabalhos a sério na década de 1810,
obtendo bons resultados por alguns anos. Estima-se que o Padre Freitas tenha utilizado de 70 a 122
escravos e 34 trabalhadores livres em sua operação efêmera. Não se sabe exatamente quando
terminaram essas operações, mas St. Hilaire assustou-se com o ar de "decadência e abandono" da
Villa de Nossa Senhora do Pilar de Congonhas de Sabará numa visita feita em 1820. A mina deve ter
permanecido adormecida até o final da década de 1830.

A viúva do primeiro proprietário, Anna Corrêa da Silva, tinha morrido em 1829, deixando a
propriedade para seus filhos, incluindo o Padre Freitas, que residiu na Casa Grande construída no
Século XVIII.

Richard Burton cita Alexander Caldcleugh ao se referir com ironia ao Padre Freitas em seu livro:

"A casa-grande é a velha casa do Padre Antônio Freitas, naturalmente modificada e aumentada.
Caldcleugh, falando sobre o velho e seu sobrinho, Padre Joaquim, observa que a mulher do padre
era muito bonita, com olhos negros e "bem gorda". A gordura, entre a raça latina meridional,
inclusive os brasileiros, era sinônimo de beleza. Possivelmente esse gosto seja causado pela mistura
de sangue mourisco. Quem se pode esquecer da viúva Zuma de Clapperton, o "tonel ambulante"?

O padre, depois de ter o cuidado de colocar D. Silvéria na pequena e bonita Fazenda de Santa Ana,
na estrada de Sabará, morreu em Congonhas, mas, na quaresma, ainda visita seu lar mundano, e,
sem constrangimento, tira do armário o que quer. "Seu" Pedro, seu escravo de barba grisalha, com
a simples fé fetichista dos africanos, põe a carne na mesa e muitas vezes vê o "fantasma" passando,
de aposento em aposento. Pessoas sem caridade insinuam que o bom padre foi transferido para
uma localidade onde não lhe eram permitidas caminhadas, mas as opiniões continuarão a ser
diversas sobre tão importante e controvertido assunto." (Burton, 1867)

A Fazenda Morro Velho


Um antigo superintendente da Imperial Brazilian Company em Gongo Soco, George Francis Lyon, e
vários outros ingleses compraram as partes dos herdeiros de Anna Corrêa da Silva por £6.000.

Parece que Herring conhecia bem esses ingleses e tinha visitado Morro Velho em inúmeras ocasiões.
Reconhecendo a riqueza do corpo de minério, ele negociou a operação da mina em base tripartite
e deu início aos procedimentos para comprar toda a propriedade.

De certa forma, as operações da St. John já haviam sido transferidas parcialmente para este novo
local, uma vez que uma boa parcela de seus escravos se encontrava alugada ao Capitão Lyon.

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Após emitir uma chamada por mais capital, os diretores da St. John d’El Rey autorizaram Herring a
comprar a mina e a propriedade ao seu redor. O contrato de compra da Morro Velho de seus
proprietários ingleses foi assinado em 13 de fevereiro de 1834. A concessão imperial original que
Süch transferiu para a St. John em 1830 autorizava a companhia a operar em qualquer lugar na
província de Minas Gerais.

A finalização da compra da Fazenda de Morro Velho pela St. John d’El Rey Mining Company, Limited
efetuou-se em 29 de novembro de 1834, tendo sido paga ao Capitão Lyon e seus sócios a soma de
£ 56,434 12s. 7d (cinquenta e seis mil quatrocentos e trinta e quatro libras esterlinas, doze xelins e
sete pence).

A escritura de compra incluía todos os itens como escravos, gado, provisões, minérios, ferramentas,
implementos, máquinas e depósitos.

"A fazenda denominada Morro Velho consistia da residência, casas e outras construções, maquinário
de quebrar pedras, engenho, terras minerais e aráveis, nascentes, minas, regos e outorgas de água,
pastos nas encostas da Serra do Curral d’el Rey; o sítio chamado Águas Claras, o sítio chamado
Cardozo que pertencia a Rodrigo Carvalho da Costa, a fazenda para criação de gado que consiste
de casas e cercados no terreno que pertencia a José Pinto Saco, denominado Marmeleiro, terras
minerais e aráveis, outorgas de água, pastos, campos e explorações de mineração nas encostas dos
morros de Raposos e Gambá ou do Espirito Santo, Morro Novo e as encostas do córrego Morro
Velho, minas e terras minerais em Garcez, outorgas de água, florestas, e terras minerais em Campo
do Pires e Batatal, finalmente tudo o que constitui e é verdadeiramente conhecido como pertencente
à Fazenda Morro Velho."

Tanto a compra da mina pelo Capitão Lyon e seus sócios ingleses, quanto a formação anterior da St.
John d’El Rey Mining Company, faziam parte de uma virtual febre que afligiu o mercado de ações
londrino durante as décadas de 1820 e 1830. Num curto período de quinze anos, dezenas de
companhias por ações, gozando de todos os benefícios de acesso ao capital social e às possibilidades
de investimento bancário, formaram-se com o objetivo de explorar as riquezas minerais da América
Latina. Esta febre não passou de uma "bolha de investimento", pois a esmagadora maioria das
companhias faliu dentro de poucos anos (vide Figura 2). A Mina de Morro Velho quase teve a mesma
sorte na sua passagem de mãos brasileiras para mãos estrangeiras, quando a tentativa do Capitão
Lyon de colocá-la novamente em produção não foi bem sucedida, aparentemente por falta de capital
suficiente. Nesta tentativa, a força de trabalho era composta por 180 escravos, dos quais 25 eram
alugados da St. John, e 45 trabalhadores livres.

Apesar de seu nome oficial, a St. John d’El Rey Mining Company prosperaria longe da cidade que a
trouxe à existência e deu-lhe o nome.

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As Minas da St. John
As informações deste capítulo foram extraídas da publicação de Jacob E. Gair (1949), "Geology and
ore deposits of the Nova Lima and Rio Acima quadrangles, Minas Gerais, Brazil", Geological Survey
Professional Paper, U.S. Government Printing Office.

Os municípios de Nova Lima e Rio Acima a leste e sudeste de Belo Horizonte, Minas Gerais, foram
importantes fontes de ouro nos séculos XIX e XX. O Rio das Velhas, que atravessa esses municípios
e segue em direção ao norte, foi a principal fonte do garimpo no período colonial. Os principais
assentamentos de garimpeiros localizavam-se em Nova Lima, Sabará, Rio Acima e Raposos.

Além da Morro Velho adquirida em 1834, a Saint John também comprou as minas de Raposos e
outras propriedades, dentre elas a mina de Morro das Bicas ao sul de Raposos, a mina de Bela Fama
a cerca de 2 km a sudeste de Nova Lima, as minas de Gaia, Faria e Gabirobas a sudoeste de Honório
Bicalho, a mina de Bicalho em Honório Bicalho e a mina do Urubu a cerca de 3 km ao sul-sudeste de
Honório Bicalho.

Tabela 2 - Aquisições realizadas pela St. John

1834 Fazenda Morro Velho.

1862 Fazenda Fernão Paes, onde eram exploradas as Minas da Gabirobas e do Gaia, em
atividade até 1871.

1862 Propriedades da Mina de Cata Branca, próxima à Itabira do Campo em Itabirito – MG.

1872 Propriedade na região da Bela Fama para o cultivo de plantações para suprir os escravos
da mineração.

1877 Propriedades da Mina de Cuiabá, próximo à Sabará, incluindo a Mina de Juca Vieira.

1884 Fazenda da Jaguara.

1886 Fazenda da Rocinha.

1898 Propriedades adjacentes à Mina de Raposos.

1899 Fazenda da Mina do Espírito Santo, onde foi construída a usina de arsênico do Galo e a
primeira barragem de rejeitos industriais.

1903 Terrenos contendo minério de ferro, incluindo os localizados na região sul de Nova Lima,
na Serra da Calçada (Brumadinho) ao longo da Serra da Moeda (Moeda).

1905 Fazenda Rio de Peixe e áreas localizadas próximas ao Ribeirão dos Macacos.

1908 Mina do Faria, em Honório Bicalho.

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As minas de Raposos

A exploração sistemática da área ao redor das minas de Raposos a leste de Morro Velho parece ter
começado pouco antes de 1910, mas foi pequena por alguns anos.

Por volta de 1930 os principais corpos de minério que tinham sido descobertos eram os da Mina
Grande e do Espirito Santo, ambos a oeste do Rio das Velhas, e o corpo de minério do Morro das
Bicas a cerca de 1 km ao sul de Raposos a leste do Rio das Velhas.

23.404 toneladas de minério foram extraídas das minas de Raposos entre 1910 e 1928, das quais
8.388 onças (237.800 gramas) de ouro foram extraídas.

A mineração em Morro das Bicas foi suspensa no início dos anos 1930, mas a partir de então
extensivo desenvolvimento foi realizado nas outras minas a oeste do Rio das Velhas, que foram
importantes produtoras.

Tabela 3 – Produção de ouro e minério nas minas de Raposos: 1929 - 1955

Ano Ouro (onças) Minério britado (toneladas)


1929 2.000 -
1930 - -
1931 3.530 -
1932 6.225 -
1933 7.268 -
1934 5.707 29.961
1935 7.878 42.464
1936 10.728 49.481
1937 30.158 106.200
1938 29.085 94.000
1939 35.758 131.900
1940 36.317 146.900
1941 36.050 150.900
1942 - 150.700
1943 - 120.000
1944 - 119.500
1945 27.643 99.100
1946 24.132 83.200
1947 26.799 92.400
1948 30.632 105.100
1949 29.390 105.000
1950 36.114 136.800
1951 37.956 154.200
1952 34.864 145.500
1953 27.568 110.000
1954 28.544 107.000
1955 28.924 112.000

Fonte: Jacob E. Gair (1949)

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Os dados anuais de produção (incompletos) desde 1929 estão listados na Tabela 3.

Em 1955 os principais corpos de minério eram o Espírito Santo, o da Mina Grande e o Espírito Santo
Oeste. Eles foram conectados por instalações subterrâneas e a mineração tinha alcançado a
profundidade de cerca de 640 metros.

No final de 1955 as minas de Raposos tinham uma reserva total de 1.694.080 toneladas métricas de
minério com um teor médio de 9,5 gramas de ouro por tonelada.

Outras minas

Antes de 1925 há evidências de algum desenvolvimento realizado por terceiros que não a Saint John.

Bicalho

A companhia perfurou um ádito de exploração na mina de Bicalho em 1925 e parece ter aberto pelo
menos um corpo de minério. Nada mais parece ter sido feito até 1936, ocasião em que a mina foi
drenada e a exploração retomada. Entre 1936 e 1939 a exploração continuou até 610 metros de
profundidade. 36.800 toneladas de minério produziram 8.238 onças de ouro em 1940 – 1941, e
40.700 toneladas de minério foram britadas em 1942 – 1943, mas a produção de ouro foi registrada
nos anais da companhia juntamente com a produção das outras minas, não sendo possível
individualizar a produção da mina de Bicalho. Não houve produção em 1944-1945. 200 toneladas
foram enviadas para a britagem em 1946, após o que as operações foram interrompidas.

Gaia, Gabirobas e Faria

As minas do Gaia e de Gabirobas, situadas na propriedade de Fernão Paes, foram adquiridas em


1862 ao preço de £11.583 (libras esterlinas). Só foram trabalhadas mais tarde, quando o incêndio em
1867 pôs fim aos trabalhos de Morro Velho.

Em Gaia um britador de 24 pilões, posto em funcionamento em 1868, permitiu tratar minério de


quartzo e piritas, com teor de 13 gramas por tonelada, do qual se recuperaram 7 gramas de ouro
por tonelada. Em 1871, esse minério, tornou-se ainda mais pobre, produzindo 2 gramas por
tonelada. 5.777 onças de ouro foram produzidas entre 1867 e 1873, a maioria proveniente da mina
do Gaia, após o que a mineração foi interrompida. Abandonou-se a explotação e o britador
desmontado foi substituir, em Morro Velho, o antigo britador Cotesworth, desativado.

Em Gabirobas, a jazida é composta por um corpo de minério quase vertical, com quartzo compacto
e piritas finas. O teor médio é de 14 gramas de ouro por tonelada, mas pelo fato de o ouro nele
contido ser extremamente fino, só se podem recuperar 7 gramas por tonelada. A explotação,
interrompida uma primeira vez, foi retomada após o último desabamento de Morro Velho, mas os
resultados foram desencorajadores.

Alguma exploração foi retomada na mina de Gabirobas em 1887, depois da mina de Morro Velho
ter entrado em colapso.

A mina do Faria, cerca de 1 km ao sul da mina de Gabirobas, foi desenvolvida e operada por uma
companhia francesa por um curto período por volta de 1900. A Saint John começou a drenar e
explorar a velha mina do Faria em 1931. Em 1934 a companhia começou a construir um ádito,
conhecido localmente como o túnel do Gaia, do lado oeste do Rio das Velhas em Honório Bicalho,

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percorrendo a direção oeste-sudoeste. O objetivo desse ádito era remover a água da velha mina do
Gaia e eventualmente ser ampliado até a mina do Faria e drená-la também. Durante 1935 o ádito
(túnel do Gaia) partindo da mina do Gaia foi estendido mais ainda para oeste-sudoeste e alcançou
o fundo da mina do Faria em 1936.

Durante as explorações de 1935, 8 toneladas de minério da mina do Gaia e 447 toneladas da do


Faria foram enviadas para britagem em Nova Lima.

A antiga mina de Gabirobas foi drenada em 1936 e explorada por 30 metros abaixo das antigas
instalações e a mina do Gaia foi explorada por 30 metros abaixo do túnel do Gaia. As explorações
foram descontinuadas em ambas em 1937 devido ao baixo preço do ouro.

A companhia continuou a desenvolver a mina do Faria e começou a produzir regularmente em 1940.


A produção na mina do Faria continuou de 1940 até 1947 e 176.286 toneladas de minério foram
britadas. Os valores da produção de ouro para os anos de 1942, 1943 e 1944 foram registrados
juntamente com as produções das outras minas, pelo que não foi possível segregar a produção da
mina do Faria. Contudo, em 1940, 1941, 1945, 1946 e 1947, um total de 96.986 toneladas produziram
32.364 onças de ouro. As operações na mina do Faria foram suspensas em 1947.

A propriedade de Cuiabá, situada na antiga estrada de Sabará para Caeté, foi comprada pela St. John
em 1877, pelo preço de £7.000 (libras esterlinas), com a finalidade de explotar uma jazida cujos
afloramentos são vistos acima da vila de Cuiabá.

Essa jazida compreende uma série de quatro corpos paralelos, com quartzo de granulação fina e
piritas de ferro em cristais, que cortam xistos negros maciços. São conhecidos pelos nomes de Canta
Galo, Fonte Grande, Domingas e Serrote. Além destes, há três corpos de minério de quartzo aurífero
em pequenos veios, encontrados em terreno de argilas vermelhas, provenientes da decomposição
dos xistos. São conhecidos pelos nomes de Terra Vermelha, Pitangueira e Baú.

Essas diversas jazidas, explotadas há mais de sessenta anos por diversos proprietários brasileiros,
principalmente nos afloramentos, foram retomadas por trabalhos de subsolo pela St. John, que abriu
no flanco da montanha, a cerca de trinta metros acima do fundo do vale, uma grande galeria para
atingir as jazidas de Canta Galo, Fonte Grande e Domingas.

Alguns trabalhos, independentes dos precedentes, foram executados na jazida de Pitangueira e não
apresentaram bons resultados. Iniciada em dezembro de 1878, a explotação só alcançou certo
impulso após a montagem de um britador de 40 pilões californianos completado em 1883. Pôde-se,
a partir dessa época, triturar por mês 1.500 toneladas de minério com teor médio de 12,5 gramas
por tonelada, do qual se recuperava cerca de 5,5 gramas de ouro excessivamente fino por tonelada
de minério.

O baixo teor do minério e as dificuldades de tratamento para reter um ouro muito fácil de escapar
fizeram a St. John decidir pela redução da explotação de Cuiabá, a fim de concentrar todos os seus
esforços em Morro Velho.

A produção anual mais elevada foi de 99.255 gramas em 1884. No ano anterior a produção foi apenas
de 15.120 gramas.

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Tabela 4 – Coordenadas geográficas de localização das minas

Mina Coordenadas UTM Coordenadas Geográficas

620.400 E 43° 50’ 57" W


Morro Velho
7.790.600 N 19° 58’ 38" S

623.300 E 43° 49’ 19,8" W


Bicalho
7.785.950 N 20° 1’ 9,2" S

621.750 E 43° 50’ 9,5" W


Gaia
7.785.350 N 20° 1’ 29,05" S

620.000 E 43° 51’ 9,73" W


Gabirobas
7.785.200 N 20° 1’ 34,3" S

619.900 E 43° 51’ 12,95" W


Faria
7.784.250 N 20° 2’ 5,25" S

624.200 E 43° 48’ 44,7" W


Urubu
7.783.050 N 20° 2’ 43,3" S

634.450 E 43° 40’ 37,7" W


Juca Vieira
7.795.750 N 19° 55’ 46,8" S

625.000 E 43° 48’ 18,9" W


Morro das Bicas
7.790.250 N 19° 58’ 48,9" S

Raposos 624.600 E 43° 48’ 32,9" W

Mina Grande 7.791.350 N 19° 58’ 13,2" S

Raposos 623.250 E 43° 49’ 19,4" W

Espírito Santo 7.791.500 N 19° 58’ 8,7" S

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Figura 20 - Mapa das Minas da St. John

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O Mapa da Mina de Morro Velho
A seguir encontram-se dois mapas mostrando uma seção da Mina de Morro Velho. O mais antigo é
um mapa original assinado por George Chalmers, de maio de 1911, e o outro mostra uma seção
recente da mina.

Esses mapas serão úteis para se entender as subdivisões da Mina de Morro Velho em Mina Velha e
Mina Grande, pois ambas se referem ao mesmo corpo de minério.

Em 1911, a mina ia até o nível XVII a 4.926 pés (1.500 metros) de profundidade e cerca dessa mesma
distância na horizontal. Em 1928, a mina já atingia o nível XXV a 7.126 pés (2.172 metros) de
profundidade e cerca de 3,5 quilômetros na horizontal. Quando ela atingiu seu ponto mais profundo
no nível XXIX, ela media 2.453 metros na vertical e cerca de 4 quilômetros na horizontal.

O corpo de minério principal tem a forma de uma fita presa na extremidade que mergulha 85º em
direção ao sul (S 85º E) e cerca de 45º em direção a leste, na parte superior da mina, e 15º na parte
inferior da mina (a partir do nível XIV). Essa "fita" tem cerca de 150 metros de largura, 4,5 metros de
espessura, em média, e um comprimento de mergulho diagonal de mais de 4 quilômetros.

Os mapas nos ajudam a entender melhor a história da mina. A chamada Mina Velha operou de 1834
até 1867 11. Ela era acessada a partir da superfície por escavações. Em 21 de novembro de 1867
ocorreu o primeiro grande acidente em Morro Velho: um incêndio nas madeiras que escoravam as
galerias seguido de desabamentos.

Depois desse primeiro grande acidente, o corpo de minério voltou a ser acessado em 1874 através
dos shafts A e B, mostrados em ambos os mapas, e a mina voltou a operar até 10 de novembro 1886,
quando novo grave acidente aconteceu.

Após esse segundo acidente, o corpo de minério foi novamente acessado em 1892 através dos shafts
C e D e a mina voltou a operar até ser desativada em 1995. Além do par de shafts C e D foi também
construído um ádito a cerca de 100 metros (324 pés) abaixo do topo dos shafts, também mostrado
nos mapas. A entrada deste ádito, na linguagem popular, ficou conhecida como "Boca da Mina".

Esta terceira fase de operação da mina caracteriza a chamada Mina Grande. O período entre os dois
acidentes (21/11/1867 e 10/11/1886) é uma fase intermediária em que o corpo de minério foi
acessado através dos shafts A e B.

Dito isso, a mina de Morro Velho foi dividida em dois blocos de acordo com a profundidade: a Mina
Velha (0 - 550 m), acessada inicialmente a partir da superfície e, mais tarde, através dos shafts A e B,
e a Mina Grande (550 – 2.453 m), acessada através dos shafts C e D e de um ádito situado 100 metros
abaixo do topo desses shafts.

A partir da década de 1920, uma pequena quantidade de minério próximo à superfície da Mina Velha
passou a ser produzida e, no final da década de 1950, foi construída uma rampa inclinada a 48° na

11
A Mina Velha voltou a operar na década de 1920.

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lapa do corpo de minério com 840 metros de extensão equipada com dois skips balanceados para
permitir o acesso superior da Mina Velha. Ela operou até 2003, quando foi desativada.

Assim, a Mina Velha operou de 1834 a 1867; esteve paralisada de 1868 a 1873; voltou a operar
através dos shafts A e B de 1874 a 1886; esteve paralisada de 1887 a meados de 1920; e voltou
novamente a operar de meados de 1920 a 2003, quando suas atividades foram encerradas.

Quanto à Mina Grande, ela operou a partir de 1892 até 1995 através do ádito e dos shafts C e D.

No mapa da Figura 21 existe um desenho do Morro do Corcovado na cidade do Rio de Janeiro para
fins de comparação de tamanhos e mostrar a altitude do local da mina em relação ao nível do mar.
Desse mapa não consta a estátua do Cristo Redentor, pois naquela época (1911) ela não existia ainda.
A estátua foi inaugurada em 1931. Antes dela havia no alto do Morro do Corcovado uma construção
chamada Chapéu do Sol erguida por ordem do Imperador Dom Pedro I, esta sim esquematizada no
topo do morro.

Tabela 5 - Composição química do corpo de minério principal

Óxido ou Percentual (%) em


Distribuição
elemento peso
SiO2 16,27 – 24,10 Aparente decréscimo com a profundidade

Al2O3 0,24 – 1,38 Uniforme

Fe 31,00 – 31,15 Excessivamente uniforme

Aparente ligeiro acréscimo com a


MgO 5,93 – 7,56
profundidade
Aparente ligeiro acréscimo com a
CaO 1,40 – 3,30
profundidade
MnO 0,90 – 1,30 Uniforme

S 13,34 – 15,91

As 1,49 – 3,61 Variação errática

Uma amostra composta representando 1 milhão de toneladas de minério extraídas entre 1902 e
1908 indicou o seguinte: pirrotita, 28,3%; arsenopirita, 7,7%; pirita, 2,3%, e calcopirita, 0,5%. Outra
amostra composta representando a produção para os anos 1922-1923 indicou: pirrotita, 31,5%;
arsenopirita, 7,5%; pirita, 2,5%; e calcopirita, 0,35%.

O ouro encontra-se em grãos muito finos e está bem uniformemente distribuído por todo o minério.
Quase invariavelmente é localizado em fraturas em arsenopirita ou pirrotita.

O ouro encontra-se provavelmente em todos os lugares em contato real com sulfeto, e a arsenopirita
parece ter sido de importância crucial na localização do ouro.

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Até 1955, a média geral do minério produzido a partir da mina de Morro Velho era de 16,45 gramas
por tonelada.

Figura 21 - Mapa da Mina de Morro Velho - 1911

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Figura 22 - Seção atual da Mina de Morro Velho

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A Mina Velha
A Mina Velha operou o corpo de minério de 1834 até 21/11/1867,
quando ocorreu um incêndio nas madeiras das vigas de sustentação
seguido de desabamento. O fogo de 1867 destruiu uma parte
importante da mina. O corpo de minério foi reaberto com a construção
dos shafts A e B, mostrados na Figura 21 e na Figura 22, construídos
de 1868 a 1873. A mina voltou a operar em 1874 utilizando as mesmas
instalações de superfície. Essa operação durou até 10/11/1886, quando
a mina desabou e todas as operações foram interrompidas.

A Mina Velha operou, portanto, de 1834 a 1886. Entre 1887 e 1892 a St. John processou minério de
baixo teor que havia armazenado.

O período de 19 anos entre os dois acidentes (21/11/1867 e 10/11/1886) faz parte da operação da
Mina Velha. Nesse período, em que pese o acesso ao subsolo ter mudado com a construção dos
shafts A e B, as instalações de superfície continuaram sendo as mesmas. O período 1835 - 1886 está
compreendido no período do Brasil Imperial: 1822 – 1889.

Na verdade, a Mina Velha não foi abandonada completamente. A partir da década de 1920, uma
pequena quantidade de minério próximo à superfície passou a ser produzida e, no final da década
de 1950, foi construída uma rampa inclinada a 48° na lapa do corpo de minério com 840 metros de
extensão equipada com dois skips balanceados para permitir o acesso superior da Mina Velha. A
Mina Velha continuou sendo operada pelos sucessores da St. John e somente veio a ser desativada
em 2003.

1867 1874 1889 Início


Acidente Reabertura shafts C e D

1873 Término 1886 1892


shafts A e B Acidente Reabertura

Figura 23 - Linha do tempo da transição da Mina Velha para a Mina Grande

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Escavações da Mina Velha
A mina de Morro Velho, adquirida em 1834, era um pouco mais do que uma operação a céu aberto.
Nos afloramentos sua extensão alcançava cerca de 250 metros. Apresentava dois corpos principais
correspondentes aos centros dos trabalhos: Quebra-Panella e Bahú a oeste e Cachoeira, a leste, com
um trecho secundário que ramificava para o norte, para reencontrar, a leste, um espessamento
designado Gambá.

A profundidade vertical dessas grandes cavernas inclinadas chegando ao mesmo corpo de minério
ficava entre trinta e sessenta metros. A rocha que separava Bahú de Cachoeira servia de pilar de
sustentação.

Segundo Burton (1867), Bahú, em linguagem de minas subterrâneas, é "a porção oca onde a
drenagem se acumula e forma um poço; em oposição a Cachoeira, que é onde a água cai em forma
de cascata e não forma poço. Destarte muitas minas de porte têm um Bahú e uma Cachoeira."

William Jory Henwood, Comissário Chefe das Minas de Ouro de Gongo Soco, descreveu assim as
minas de Morro Velho em 29 de junho de 1844.

Figura 24 - As primeiras escavações

"A mina de ouro de Morro Velho fica a cerca de 48 milhas (77 km) a noroeste da cidade de Ouro
Preto e 10 milhas (16 km) ao sul da cidade de Sabará. Ela tem sido trabalhada por empresas inglesas
há quase dezesseis anos, mas sem sucesso até três anos atrás.

A parte mais ocidental da mina é chamada de Champion Ground e consiste de um conjunto de


pequenos veios; estes se unem à Pequena Quebra Panella, que mergulha 70° - 80° Norte e tem, em
média, cerca de dezoito pés (5,5 m) de largura, embora varie muito neste aspecto nas diferentes
partes. Para o leste, a Pequena Quebra Panella se junta à Grande Quebra Panella, que se inclina para
o Sul 60° - 75°, e, embora de dimensões muito irregulares, sua maior largura não é inferior a quarenta

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e oito pés (15 m). O "Gut" forma o prolongamento para o leste e mergulha S.E., paralelo à clivagem
da rocha de ardósia contígua: as partes mais largas desta não têm mais de oito pés (2,4 m) de largura,
e a porção maior é muito mais estreita. Conectado com a última parte nomeada, à E., está Bahú, que
fica por baixo e ao Sul, e tem, em média, cerca de vinte e quatro pés (7,3 m) de largura. Uma camada
de ardósia quartzosa, levemente carregada de piritas de ferro, separa Bahú de Cachoeira Oeste, que
atualmente não é trabalhada e encontra-se inacessível. Dois veios principais e vários outros menores
se ramificam de Cachoeira Oeste; o mais ao norte é o Gambá, que mergulha ao Sul, e tem de dois a
oito pés (0,60 a 2,40 m) de largura; o outro, chamado Cachoeira Leste ou Luiza, tem
aproximadamente a mesma largura e inclinação, e ainda mais para o leste também se divide em
outros veios menores." (W. J. Henwood, 1844)

Os primeiros anos
No período de operação da Mina Velha (1834 a 1886) a companhia teve oito superintendentes,
sendo que o último deles, George Chalmers, inaugurou a Mina Grande.

Tabela 6 - Superintendentes da Mina Velha

Charles Herring, Jr. 1830 – 1846

George D. Keogh 1846 – 1853

Thomas Walker 1853 – 1857

James Newell Gordon 1857 – 1876

Pearson Morrison 1876 – 1882

Alexander Buchanan março a agosto de 1882

George H. Oldham 1882 – 1884

George Chalmers 1884 – 1924

Os primeiros trabalhos foram executados a céu aberto em três pontos: abriu-se um primeiro campo
de explotação em Quebra Panella e Bahú, um segundo em Cachoeira e um terceiro em Gambá. Os
trabalhos em profundidade foram concentrados nos dois primeiros, abandonando-se a ramificação
de Gambá, por ser o corpo menos rico.

"Os primeiros anos de atividades em Morro Velho foram marcados pelo esforço no sentido de
recuperar as instalações deixadas em mau estado pelos antigos donos e pela tentativa de ampliar e
modernizar estas instalações. Na superfície, os prédios e casas de habitação, os moinhos de pilões e
o sistema de barragens e canaletas, que fornecia a força hidráulica para os moinhos e as bombas
das escavações, encontravam-se parcialmente estragados. O reparo destas instalações de superfície
criou muitos empregos de 1835 a 1840, especialmente para a equipe de carpinteiros – europeus,

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brasileiros livres e escravos. As três principais minas do conjunto também exigiram muito esforço
com a construção de áditos e o alargamento e alongamento dos shafts. Tratava-se de um
melhoramento geral das instalações subterrâneas, visando facilitar o transporte do minério para os
trabalhos de redução." (Libby, 1984)

O processo de produção
O minério era extraído da mina por um plano inclinado a 45°, colocado entre as duas escavações de
Bahú e da Cachoeira. Em seguida ele era submetido a uma seleção para separar as pedras de baixa
qualidade. O material selecionado era enviado aos britadores de pilões para ser moído e, em seguida,
lavado sobre mesas vibratórias. As areias, retidas nas peles, eram em seguida tratadas por amálgama,
em tonéis de Freiberg, enquanto os rejeitos das mesas eram submetidos a uma nova moagem nos
arrastres, para uma nova concentração e amalgamação. O conjunto de britadores era composto de
27 pilões em 1835. Em 1853 havia 6 conjuntos com um total de 135 pilões, pesando cada um 200 kg
e que operavam com 60 a 80 golpes por minuto.

Existiam nas instalações da "Praia" 56 pilões destinados à moagem das


areias a serem retratadas, que operavam conjuntamente com os
arrastres. Enquanto apenas 16.000 toneladas eram britadas em 1838,
com 65 pilões, em 1856 eram britadas 90.000 toneladas com 135 pilões.

Bernard Hollowood descreveu da seguinte maneira o processo de


produção:

"A prática de mineração nos anos 1830 era rudimentar e trabalhosa. A


perfuratriz de percussão movida a ar comprimido ainda não havia sido
inventada. Toda a perfuração era manual e a profundidade de penetração na rocha era de poucos
centímetros por dia.

O mineral cortado da rocha era puxado por um guincho para uma plataforma de madeira dotada de
rodas, sendo então levado para fora da mina sobre essa plataforma através de um curto túnel.
Quando o transporte mecânico ficava impraticável, as pedras eram carregadas para fora da mina na
cabeça de meninas negras. Para isso foram improvisadas algumas passarelas e escadas frágeis.

Da mina, as pedras eram transportadas para o piso de fragmentação onde mulheres armadas com
martelos quebravam os pedaços maiores para tamanhos que pudessem ser manuseados pelos
britadores.

As rodas d’água proporcionavam a força motriz dos britadores, cujos pilões esmagavam as pedras
em partículas mais finas para as eclusas ou os lavadores. Em 1835 havia em operação 27 pilões
gigantes. Já a água para acionar as rodas d’água vinha de longe através de canais abertos chamados
"regos".

As pedras esmagadas pelos britadores formavam uma areia que era direcionada para lonas de couro
de animais ou de lã que capturavam as partículas mais pesadas de ouro e a lavagem desses couros
removia o ouro acumulado." (Hollowood, 1955)

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Figura 25 - Carregadoras de minério de ouro

The Mining Journal


A seguinte descrição da companhia é encontrada em uma antiga edição do Diário de Mineração
(The Mining Journal).

"Esta companhia opera três minas 12 contíguas uma à outra e drenadas pela mesma roda d'água. O
corpo de minério em duas das minas varia de largura entre 2,4 m e 9,6 m, com média de 4,4 m; e na
terceira mina, a Gambá, a largura média é de 1,4 m.

O corpo de minério mergulha nitidamente em um ângulo de 46°, inclinação na qual as bombas são
transportadas e, em um mesmo plano, baldes de aço (kibbles) são rebocados para a superfície a
partir dos espaços deixados pelas escavações (stopes) sob os shafts inclinados.

Há duas rodas d'água para acionar equipamentos: uma para a máquina de serrar e uma no prédio
da redução para revolver os barris de amálgama e outras seis nos engenhos de britagem, operando
96 pilões.

Todo o corpo de minério do depósito entre as paredes contém ouro, rendendo em diferentes seções
de 9 a 18 gramas por tonelada. Na Mina Gambá, veios de quartzo, percorrendo campo afora,
quebrados para facilitar o trabalho, contém de 3,6 a 5,4 gramas por tonelada. Cada seção da mina é
muito regular em seu teor aurífero.

12
Bahú e Quebra Panella eram consideradas uma única mina (United Mines); as outras duas eram
Cachoeira e Gambá.

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Em 1847 a produção média foi de 15 gramas por tonelada, que valia, em Londres (líquidos), 7s. 7d.
(7 xelins, 7 pence) por oitava (por 3,586 gramas), ou £39 16s. por lb. troy (39 libras, 16 xelins por libra
troy de peso).

Uma braça cúbica (cubic fathom) (230 m3) do depósito contém pouco mais de vinte toneladas e cada
braça (fathom) afundada nas três minas gera cerca de 9.000 toneladas de pedras quebradas e os
espaços deixados pelas escavações (stopes) mantidos em devida ordem.

Uma continuação do depósito perto da superfície em direção a oeste foi recentemente identificada
e já está aberta, com 35 m de comprimento por de 2,4 m a 3,6 m de largura, o que acrescenta ainda
mais recursos a esta magnífica mina 13. Este novo terreno fica perto dos britadores e não há dúvida,
estamos certos, de sua continuidade para o oeste, pois há consideráveis escavações realizadas pelos
"antigos" exploradores naquela direção.

A mina está agora dando um lucro efetivo acima de £3,000 (três mil libras esterlinas) por mês; e, em
termos práticos, um grande incremento está por vir, uma vez que um poderoso conjunto de novos
britadores acaba de ser montado."

Figura 26 - Roda d’água e britador de pilões

13
Possivelmente trata-se de Quebra Panella.

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Figura 27 - Pintura mostrando as instalações de superfície da Mina Velha

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Figura 28 - Seção da Mina Velha – outubro de 1867

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Figura 29 - As rodas d’água movimentavam os equipamentos da Mina Velha

O antigo "Bicame", segundo Burton (1867)


O "bicame" – "launders" em inglês, hoje um dos símbolos de Nova Lima – é um aqueduto que
conduzia água para a Mina Grande. Mas a Mina Velha também foi suprida por um aqueduto,
mostrado na Figura 30, semelhante ao atual bicame que Burton registrou conforme segue.

"O único passeio em terreno plano que se pode dar em Morro Velho ou em suas proximidades é ao
longo do rego dos Cristais. Arriscando muita contração – dolorosa – subimos o Morro do Armazém
e chegamos à aldeia do Retiro, construída em uma encosta bem drenada. Ali se erguem, uma fileira
atrás da outra, casas caiadas de aspecto brasileiro, tendo na frente em destaque seu jardim. São as
residências dos mineiros ingleses e suas famílias. O aluguel varia de 0$500 a 1$500 por mês. Outras
casas ficam no Mingu, atrás do hospital; três famílias (agosto de 1867) moram perto do Portão da
Praia, e algumas perto de Congonhas. A Companhia construiu, além da aldeia do Retiro, casas para
os mineiros brasileiros e alemães, mas as acomodações são geralmente pobres e podem ser
melhoradas, com pouco dispêndio e grandes vantagens.

Entrando no portão chegamos ao Rego, ao longo de cuja margem direita o Sr. Gordon construiu
uma boa banqueta. Aqui, nas tardes quentes, jovens córnicos se refrescam tomando banho. A água
nasce no Morro das Cabeceiras, a cerca de quatro milhas de distância ao longo de seu curso, perto
da elevação que conduz ao distrito de Paraopeba. O Rio Paraopeba corre do outro lado da elevação,

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cerca de onze léguas em direção a oeste do Rio das Velhas e lá os percursos dos dois vales são quase
paralelos.

Esta parte da região é elevada. A extremidade sudoeste do Morro das Quintas, ou Morro do Ramos,
fica entre 1200 a 1300 pés acima do rego e, à sudeste, há um bloco ainda mais alto, o Morro do
Pires. Antigamente, o córrego atravessava Congonhas; foi comprado pelo Capitão Lyon e elevado a
um nível suficiente para fornecer energia para a mina. É um dos muitos córregos que recebem as
águas dos regatos adjacentes. A altura manométrica é, assim, compelida a mover as enormes rodas
hidráulicas para levantar o minério, lavá-lo e depositar, através de canais, o rejeito da Praia. O
processo é dispendioso, estendendo-se por mais de 29 milhas, e as barracas são vítimas constantes
de inundações, desabamentos, e o bravo mineiro parvula ... magni formica laboris 14. O córrego dos
Cristais atravessa em um aqueduto sobre a Ravina do Retiro, corre em torno de um morro até uma
cisterna receptora e em seguida passa por cima de uma das melhores obras da companhia, a
profunda garganta chamada "Criminoso". Sifões invertidos de ferro mergulham na água até o fundo
e distribuem 2.000 pés cúbicos por minuto, a cerca de 182 pés acima do Ribeirão, que, finalmente,
recebe a água." (Burton, 1867)

Figura 30 - O antigo e o atual bicame

A nota de rodapé fornece as seguintes dimensões para o aqueduto:

14
Pequena formiga ... (uma criatura de) grande indústria (Horácio cita a formiga como exemplo de
economia).

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"Extensão do encanamento de tubos invertidos dos Cristais: 740 pés 5 polegadas de cisterna
a cisterna;
Altura da estrutura da superfície da água: 81 pés 6 polegadas;
Diferença de nível dos lados opostos: 23 pés 11 polegadas;
Altura das tubulações da parte mais baixa à extremidade superior de descarga: 120 pés 0
polegadas;
O primeiro conjunto de tubulações tem diâmetro interno de 14 polegadas;
O segundo conjunto de tubulações tem diâmetro interno de 12 polegadas;
Espessura do ferro na parte superior: 6/16 polegadas;
Espessura do ferro na parte inferior: 3/8 polegadas.
A pressão da parte mais baixa é de cerca de 45 libras por polegada quadrada. Esse aqueduto
altamente civilizado foi montado pelo mecânico-chefe, Sr. Rouse." (Burton, 1867)

Charles Herring, Jr., 1837 - 1847


"Nos anos iniciais o empreendimento já se mostrava altamente intensivo em mão-de-obra, um fator
de produção que marcaria toda a história de Morro Velho. Eram mais de duas centenas de escravos
próprios, várias dezenas alugadas, e uma centena de trabalhadores livres.

A receita com a produção de ouro do ano de 1835, totalizando 98 kg, foi cerca de £10.555,
importância esta insuficiente para pagar os custos do mesmo ano. Durante os quatro primeiros anos
preponderaram as perdas. Em 1838 a Companhia realizou seu primeiro resultado positivo, ainda que
de pequena monta, porém voltou a registrar prejuízo no ano seguinte. Os prejuízos iniciais foram
superados em 1840 e a partir de 1842 começam quinze anos sequenciais de declaração semianual
de dividendos.

Tabela 7 - Produção de minério e de ouro: 1835 - 1860

Ano Produção Minério (t) Produção Ouro (kg) Ano Produção Minério (t) Produção Ouro (kg)
1835 98 1848 61.672 825
1836 100 1849 67.336 970
1837 9.262 150 1850 67.106 999
1838 15.769 217 1851 79.810 1.163
1839 17.898 229 1852 82.642 1.269
1840 20.809 276 1853 85.698 1.336
1841 21.015 254 1854 86.048 1.307
1842 23.538 333 1855 87.297 1.241
1843 24.580 457 1856 89.877 1.102
1844 27.552 446 1857 86.407 937
1845 29.815 461 1858 88.901 1.024
1846 38.366 554 1859 88.968 1.302
1847 40.859 629 1860 91.361 1.535

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Com a expansão continuada das escavações, a produção de minério aumentou de forma significativa
nos primeiros 25 anos de operação e a produção de ouro aumentou em harmonia. Os quinze anos
entre 1842 e 1857 foram de grande sucesso, com os acionistas recebendo dividendos semestrais
que variavam de cinco xelins a £ 2,0 por ação (£1 = 20 s).

Em 1842 a diretoria em Londres começou a se preocupar com a mão-de-obra. Um projeto de lei que
visava proibir a participação de súditos ingleses no tráfico negreiro começou a transitar na Câmara
Alta britânica naquele ano. A versão original da lei para suprimir eficazmente o tráfico negreiro
proibia ao cidadão inglês possuir ou alugar escravos em qualquer parte do mundo. Isto implicaria
na emancipação, sem indenização, de escravos pertencentes aos ingleses estabelecidos fora do
Império Britânico. Os escravos constituíam a maioria da força de trabalho empregada na Mina. A
diretoria passou então a fazer gestões junto ao Primeiro-Ministro, Robert Peel, às Câmaras Alta e
dos Comuns. Numa apertada síntese argumentava-se assim:

"O volume de capital britânico investido na mineração no Brasil é muito grande. Todo ele está
envolvido nesta questão, não existindo no Brasil um suprimento adequado de mão-de-obra
independente da população negra. Se os meios de trabalhar as Minas forem removidos das
Companhias Britânicas, o valor das Minas será destruído."

Como resultado, conseguiu-se flexibilizar a lei na sua forma final. A lei promulgada em 1843 proibia
a compra de escravos por cidadãos ingleses com efeito "ex-nunc" 15, ou seja, somente se aplicava às
transações futuras. As transações passadas foram destarte preservadas. E mais, a lei passou ao largo
do aluguel de escravos, não fazendo qualquer menção a essas transações, permitindo, com o seu
silêncio, que o aluguel de escravos continuasse.

Alarmada com a repercussão desse projeto de lei para a supressão do tráfico negreiro, a diretoria,
em reunião de 17 de junho de 1842, autorizou o superintendente a utilizar um quinto dos lucros
líquidos na aquisição de novos escravos antes da possível promulgação do ato. Com a aprovação da
lei em setembro de 1843 em sua forma mais branda, o superintendente foi imediatamente instruído
a interromper qualquer negociação que visasse à compra de escravos adicionais e a ampliar o
número de escravos alugados.

É quando se realizam negociações entre a St. John e a Brazilian Company, cuja Mina de Cata Branca
havia sofrido um desmoronamento que pôs fim às suas operações. Dessas negociações resultou um
contrato de compra e venda das propriedades e de aluguel dos escravos assinado em Londres em
27 de junho de 1845. A médio prazo uma grande parte do problema de mão-de-obra foi resolvido
com a transferência dos 385 escravos de Cata Branca para Morro Velho durante 1845 e 1848. Estes
escravos, já treinados no trabalho de mineração, foram extremamente valiosos. Porém este contrato
entre a St. John e a Brazilian Company of Cata Branca vai criar muitos problemas para a St. John 35
anos mais tarde no fim da década de 1870." (Libby, 1984)

15
Nunc = agora. Ex-nunc = a partir de agora; de agora em diante = doravante.

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George D. Keogh, 1847 - 1853
Em 1847 Charles Herring ficou doente e voltou para a Inglaterra. Seu lugar foi ocupado pelo irlandês
George D. Keogh que estava atuando como Secretário da Companhia em Londres.

Quando Herring deixou a Companhia em 1847 a produção de ouro


foi de 629 kg e a tendência era de crescimento. Sob o comando de
George Keogh a produção continuou a subir e atingiu o pico de
1.336 kg em 1853.

De 1839 a 1857 a força de trabalho escrava passou de 398 para


1.166, enquanto o número de trabalhadores livres subiu de 88 para
aproximadamente 600. Houve uma pequena reversão em 1857.

Thomas Walker havia sucedido George D. Keogh em 1853 e


ocupava a superintendência em 1857, quando ocorreu um grave
acidente na Mina Bahú.

1857 - Acidente em Bahú


Em março de 1857, 170 toneladas da parede sul e do teto na Mina Bahú desabaram, bloqueando o
acesso à parte leste dessa mina, a mais rica do conjunto. O pagamento de dividendos foi
interrompido do segundo semestre de 1857 até o primeiro semestre de 1859, embora a companhia
não tivesse incorrido em prejuízos nesse período.

O motivo do desabamento constou do relatório daquele ano: "Em 17 de março, em um local dos
menos esperados pelos capitães da mina, bem como pelo mais antigo e experiente dos mineiros,
caiu um pedaço de rocha pesando cerca de 170 toneladas da parede sul e do teto da Mina Bahú,
que levou, junto com a madeira que suportava o teto, o maquinário de bombeamento, o plano
inclinado e a estrada de acesso, em uma extensão de cerca de 27 metros. Despesa considerável será
incorrida para reparar o estrago provocado por este desabamento."

O acidente ocorreu às onze horas da noite de um sábado depois que os operadores de perfuratrizes
tinham saído da mina e antes que os enchedores de baldes (kibbles) tivessem chegado ao seu local
de trabalho. Caso contrário as perdas de vida teriam sido muito pesadas.

Do ponto de vista do historiador, o acidente de 1857 é interessante porque os relatórios da época


fornecem descrições detalhadas da mina. O depoimento de Treloar é particularmente instrutivo:

"Nós tínhamos então três minas — Cachoeira, Bahú e Gambá. As duas primeiras estão no corpo de
minério principal, a última em uma ramificação. Todas elas mergulham em direção a leste e um
pouco para o sul. A mina Cachoeira fica acima da Bahú; de fato elas são uma única mina, com uma
barra entreposta entre elas.

Suas dimensões em números redondos podem ser descritas assim: "Comprimento 219 m,
profundidade no ponto mais baixo 293 m e largura variando de 2,7 a 17,4 m, largura média
descendente 9 m. Nessa enorme escavação nós construímos nossos shafts de madeira, nosso

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maquinário de bombeamento, nossos planos inclinados, suportes, passarelas para entradas e saídas
e, no fundo, nossos stopes."

O Capitão Treloar estimou que o reparo da mina seria uma longa empreitada de doze meses em
condições favoráveis. Contudo e felizmente sua estimativa mostrou-se, de certa forma, pessimista.
£5,000 (cinco mil libras esterlinas) foram dispendidas durante a primeira metade de 1858 — e o
pagamento de dividendos ficou suspenso até 1860, mas o acidente se mostrou menos ruinoso do
que as pessoas temiam.

Em 1857 e 1858 a produção de ouro caiu para 937 e 1.024 kg, respectivamente, mas em 1859 a
produção já tinha subido para 1.302 kg, pouco abaixo do máximo verificado em 1853 (1.336 kg).

Duas foram as razões pelas quais o custo ficou abaixo do estimado: primeiro, o fato de o colapso
não ter colocado toda a mina fora de operação – a produção continuou de outras fontes: nas
instalações de Cachoeira, parte oeste de Bahú, Leste e Oeste de Quebra Panella, Champion Ground
e Gambá – e segundo, por terem sido utilizados os estoques de minério de baixa qualidade, que até
então não tinham sido considerados ricos o suficiente para serem enviados para os britadores.

Naquele mesmo ano de 1857, Thomas Walker pediu demissão e abriu caminho para o irlandês James
Newell Gordon, que prestaria serviços à companhia por 20 anos e seria demitido após sério
desentendimento com o escritório de Londres. Aparentemente a substituição de Walker decorreu
da queda da produção de ouro durante a sua gestão, pois dos 1.336 kg produzidos no ano em que
ele assumiu (1853) a produção de ouro tinha caído para 937 kg em 1857. O demissionário Walker
foi o terceiro superintendente de Morro Velho e era cunhado do presidente (chairman of the board)
John Diston Powles.

J. N. Gordon, 1857 - 1876


Malgrado o revés, a Companhia entrou na década de 1860, já sob a direção do terceiro, mais
duradouro e polêmico superintendente do período imperial, James Newell Gordon, obtendo os mais
altos lucros até então registrados. A expansão novamente começou a todo vapor e no primeiro
semestre de 1862 o dividendo alcançou o recorde de £4, 10s (4 libras e 10 xelins) por ação.

O experiente capitão Treloar e o novo superintendente, Gordon, estavam fora de sintonia desde o
início e, em 1862, o capitão de mina deixaria o emprego na companhia.

Até o início de uma série de incidentes que começou em fevereiro de 1864, havia toda razão para
supor que o sucesso era infalível. Tanto é assim que a Mina entrou neste ano com uma força de mais
de 2.500 homens e mulheres – a maior que possuiu durante toda a época imperial.

No entanto, durante exatamente um ano, as operações na Mina foram abaladas por cinco acidentes.
Em fevereiro e abril de 1864 aconteceram dois desmoronamentos na Mina de Cachoeira, sendo que
oito mineiros morreram no segundo desmoronamento, e as atividades ficaram paralisadas tanto em
Bahú quanto em Cachoeira.

Em setembro de 1864 e janeiro de 1865 ocorreram dois acidentes envolvendo a queda de vigas do
escoramento da Mina de Cachoeira, tendo o primeiro resultado na morte de mais um mineiro. As
atividades produtivas continuaram praticamente paralisadas, pois as condições de trabalho da Mina
de Cachoeira estavam muito perigosas.

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Finalmente, em fevereiro de 1865, o rebocador de minério da Mina de Cachoeira teve de ser
desativado para reparos, retardando assim os trabalhos de recuperação. Esses cinco acidentes são
do tipo frequente na mineração do Século XIX; o azar foi terem se concentrado no espaço de tempo
de um só ano.

Esses acidentes fizeram a produção despencar de 1.707 kg em 1863 para 888 kg em 1864. O prejuízo
sofrido pela Companhia no ano fiscal de 1864 foi de £14.629 e resultou na interrupção do pagamento
de dividendos no segundo semestre de 1864 e no primeiro semestre de 1865. No entanto, a
Companhia mostrou-se resiliente e capaz de recuperar os estragos rapidamente, prejudicando a
produção o mínimo possível, e já em 1866 os dividendos subiram para £4 por ação, alcançando
£4,10s em 1867.

Entrevista de Hockin em 1867


Detalhes valiosos sobre a Mina de Morro Velho foram
prestados pelo Sr. Hockin, diretor-gerente da empresa, e
foram publicados em 1867 pelo engenheiro de mineração
J. Arthur Phillips, em um trabalho sobre a Mineração e
Metalurgia de Ouro e Prata, em Londres, do qual foram
extraídos os textos que seguem.

"A mina de Morro Velho já havia sido trabalhada


anteriormente por proprietários nativos há mais de um
século, principalmente por cortes abertos, e com
resultados variados.

No momento da compra do imóvel pela Saint John d'El


Rey, a mina de Morro Velho estava obtendo lucro; mas um
gasto considerável foi necessário para ampliar as
operações e aumentar os recursos da mina. Como a
companhia teve que aplicar grandes somas na compra de
bens e construção de edifícios etc., ela operou com prejuízo durante os primeiros quatro anos desde
a posse do imóvel.

Em 1839, as receitas, sob a gestão do falecido Sr. C. Herring, a quem a companhia muito deve pela
escolha do imóvel, excederam os gastos; mas como o capital original tinha se esgotado pelas perdas
incorridas nas minas de São João d'El Rey e pela compra da propriedade de Morro Velho, foi
necessário aplicar a maior parte do produto do ouro extraído na ampliação da planta, e foi somente
em 1842 que o primeiro dividendo foi declarado.

A partir dessa data, com exceção de um intervalo de 18 meses em uma ocasião (1857-1858) e 12
meses em outra (1864-1865,) durante o qual a operação da parte mais produtiva do corpo de minério
foi interrompida pela quebra do equipamento de bombeamento e de outras máquinas, a empresa
tem pago regularmente dividendos a cada seis meses.

O capital original subscrito da companhia era de £135.000

Dos quais foram devolvidos aos proprietários £6.600

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Capital líquido integralizado £128.400

Houve pagamento em dividendos £756.000

Dispendidos em máquinas e construções na propriedade, a partir dos


£140.000
lucros

Oficinas existentes na propriedade no valor de £39.000

Um fundo de reserva e capital de giro foi constituído, a partir dos


£72.249
lucros, no valor de

£1.007.494

O valor total dos metais preciosos produzidos na mina foi de £2.902.480; a quantidade total de
minerais extraídos, 1.769.050 toneladas; o rendimento médio do minério, 4,333 oitavas, ou
aproximadamente meia onça troy, valendo cerca de 32s. 6d. O ouro obtido em Morro Velho é uma
liga que contém usualmente cerca de 20% de prata.

Os minérios a partir dos quais esses resultados foram obtidos, como será visto pelos números
seguintes, têm sido, no geral, pobres; o rendimento tem sido razoavelmente uniforme, as variações
que ocorreram sendo atribuíveis principalmente à proporção do solo de ardósia com o minério do
que a qualquer flutuação na qualidade do corpo de minério.

Melhorias têm sido feitas, de tempos em tempos, no modo de tratamento, e as perdas incorridas
têm sido, ano a ano, constantemente reduzidas. O rendimento médio de ouro por tonelada, em
oitavas, sobre toda a quantidade de rocha anualmente trazida à superfície desde o ano de 1847, tem
sido o seguinte:

Tabela 8 - Rendimento médio de ouro em oitavas por tonelada

Anos Oitavas/tonelada Anos Oitavas/tonelada Anos Oitavas/tonelada

1848 3,77 1854 4,17 1860 4,52

1849 3,89 1855 3,98 1861 5,44

1850 4,07 1856 3,52 1862 5,92

1851 3,89 1857 3,06 1863 5,78

1852 4,25 1858 3,25 1864 4,82

1853 4,34 1859 4,13 1865 5,47

Uma oitava equivale a 0,1153 da Troy ounce.

1 oitava = 0,1153 Troy ounce = 0,0096 Troy pound = 3,586 gramas

Deve-se afirmar, com relação a esses números, que eles não fornecem dados confiáveis para se
formar um julgamento quanto ao aumento ou diminuição da produção da formação aurífera em

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profundidade, na medida em que, até recentemente, não foi mantido nenhum registro da
quantidade de pedra improdutiva retirada das minas.

Durante os últimos seis anos, excluindo 1864, durante o qual grande parte das killas ou ardósias
argilosas foi britada junto com o minério, esta pedra improdutiva tem sido tratada separadamente,
e sua proporção relativa à toda a quantidade de material extraído tem sido a seguinte:

Tabela 9 - Percentual de killas em relação ao material extraído

Anos Percentagem Anos Percentagem

1860 18 1863 22

1861 24 1864 -

1862 24 1865 32

Se, em anos anteriores, a quantidade dessa pedra relativamente improdutiva excedia, ou não, a do
ano seguinte, não há meios de apurar. A formação do ouro é um corpo de minério forte e bem
definido, embora irregular na direção, mergulho e dimensões; sua inclinação ou subjacência também
foi constatada que varia em diferentes profundidades e em diferentes partes de sua extensão.

A pedra do corpo de minério é composta principalmente de quartzo com piritas de ferro,


disseminadas, mais ou menos regularmente, ao longo de sua massa, e o corpo de minério
frequentemente é atravessado por killas e quartzo branco estéril. Quando as piritas estão ausentes
nestas rochas, o ouro raramente está presente.

Em alguns lugares o corpo mineral é cavernoso, e menos próximo em sua textura do que em outros;
mas, onde as cavidades cristalinas são frequentes, o rendimento do ouro diminui. A matriz mais
produtiva para o ouro é uma mistura compacta de quartzo e piritas, com quantidades variadas de
ardósia.

O grande depósito metalúrgico, chamado Cachoeira, Bahú e Quebra Panella, é um corpo mineral
contínuo, muito irregular, variando em largura de 7 a 70 pés, e em um ponto chegando a 100 pés. A
espessura média na profundidade atual, 176 braças perpendiculares em Cachoeira e 165 braças em
Bahú, é de 19 pés. O local de "stoping" se estende por mais de 807 braças quadradas.

Há uma ramificação ao norte, separada do depósito principal pela rocha selante, chamada Gambá,
mas a sua operação, tendo sido considerada pouco rentável, foi descontinuada.

A rocha hospedeira é uma ardósia de textura toleravelmente uniforme. Os shafts, assim chamados,
pois todo o corpo de minério foi escavado da superfície, são direcionados para baixo com uma
inclinação de cerca de 45º, e o mineral é trazido para a superfície por composições de vagões de
uma construção peculiar, carregando grandes baldes (kibbles), contendo uma tonelada cada.

O mineral trazido à superfície é primeiro liberado da ardósia e de outras pedras improdutivas nos
pisos de seleção, e o minério, depois de ser quebrado em um tamanho uniforme, é finamente

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britado. A ardósia rejeitada e o quartzo são removidos por vagões sobre trilhos para outro
estabelecimento, a 800 metros de distância, e lá são utilizados para ajudar na pulverização da areia
do rejeito da primeira britagem, que é novamente britada.

Os britadores, bem como as bombas e outras máquinas, são movidos pela energia da água. O
minério pulverizado sai dos britadores através de peneiras de cobre com malhas muito finas, passa
sobre peles de boi, em primeira instância, e desce sobre as mesas inclinadas, sobre panos de lã. As
peles de boi são removidas e lavadas em tanques de hora em hora, e os panos de lã em intervalos
maiores. A areia concentrada resultante da lavagem das peles de boi é posteriormente amalgamada
em barris.

A tabela seguinte mostra as quantidades de rocha extraída e britada, as quantidades de ouro


produzidas e o lucro líquido anual obtido desde 1849.

Tabela 10 - Produção da mina de Morro Velho, Brasil, 1849 - 1854

Descrição 1849 1850 1851 1852 1853 1854

Pedras extraídas, t 67.336 67.106 79.810 82.642 85.698 86.048

Pedras britadas, t 69.004 64.313 81.629 81.236 86.866 86.433

Ouro produzido, lbs. Troy 2.583 2.517 3.057 3.323 3.623 3.464

Ouro produzido, kg 964 940 1.141 1.240 1.352 1.293

Lucro líquido, £ 38.136 35.880 51.586 55.391 49.273 44.740

1855 1856 1857 1858 1859 1860

Pedras extraídas, t 87.297 89.877 86.407 88.901 88.968 91.361

Pedras britadas, t 86.848 87.424 86.335 87.270 82.880 74.528

Ouro produzido, lbs. Troy 3.325 2.992 2.539 2.733 3.294 3.974

Ouro produzido, kg 1.241 1.117 948 1.020 1.230 1.483

Lucro líquido, £ 34.466 23.233 787 8.545 38.058 60.460

1861 1862 1863 1864 1865 1866

Pedras extraídas, t 96.612 90.896 84.758 65.435 78.883 107.087

Pedras britadas, t 71.902 67.508 65.697 62.147 59.607 60.685

Ouro produzido, lbs. Troy 5.051 5.182 4.713 2.852 4.153 -

Ouro produzido, kg 1.885 1.934 1.759 1.065 1.550 -

Lucro líquido, £ 96.769 87.531 63.285 - 80.438 109.407

Prejuízo, £ - - - 14.6629

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Desde 1860, a ardósia e outras pedras improdutivas têm sido rejeitadas, e somente o minério é
britado. A ardósia argilosa assim separada é triturada em outro departamento das instalações de
superfície.

Na Tabela 10, o lucro para esse ano foi calculado pelos resultados obtidos até o final de fevereiro,
enquanto os demais números mostrados são resultado de operações até o final de dezembro de
cada ano.

Esta companhia emprega mais de 2.400 pessoas, das quais de 120 a 130 são europeus. O número
de pilões operação é de 135 para a redução do minério na britagem primária, e 56 para uma segunda
britagem da areia residual, com ardósia e quartzo; arrastres também são usados para repulverizar a
areia residual, e têm sido muito eficientes para esse fim. O trabalho realizado pelos britadores é
mostrado na tabela a seguir." (J. Hockin, 1867)

Tabela 11 - Britadores da Mina Velha

Libras
Tons de
Dias de por
Britador Pilões Batidas/minuto minério Tons/dia
operação pilão
britadas
por dia

Lyon 30 56 357 12.100,6 33,85 2.527

Cotesworth 12 59 356 4.932,1 13,85 2.585

Susanna 9 60 361 2.897,2 8,02 1.996

Herring 24 77 357 11.495,0 31,89 2.976

Powles 36 64 351 17.562,6 50,00 3.111

Addison 24 67 353 10.619,8 30,04 2.803

Total 135 59.607,3 167,65

Os nomes dos britadores homenageiam figuras importantes da St. John.

1867, incêndio na Mina Velha


Esta passagem e a seguinte contém excertos do trabalho de Libby, 1984, citado na bibliografia.

Em julho de 1867 a profundidade vertical da Mina de Cachoeira era de 415 metros e


a profundidade de mergulho do corpo de minério era de 580 metros. A extensão da
escavação a leste e a oeste do shaft era de 145 metros e a largura da escavação
variava de 1,80 a 13,5 metros.

A profundidade vertical da Mina de Bahú era de 393 metros e a profundidade de


mergulho do corpo de minério era de 455 metros. A extensão da escavação na parte
mais baixa da galeria a oeste do shaft era de 110 metros. A largura da escavação
variava de 3,30 a 27 média, com a média de 13,20 metros.

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A Mina Bahú tinha dado menos dor de cabeça do que Cachoeira e Gambá nas quais as operações
foram prejudicadas por enchentes e deslizamentos.

Mas, no final de 1867, aconteceu uma enorme tragédia e a Mina de Morro Velho quase se juntou à
longa lista de empreendimentos de mineração fracassados em Minas Gerais.

"Tudo indicava que 1868 havia de ser um dos melhores anos da história da Companhia, mas na noite
de 21 de novembro de 1867, um incêndio começou nos níveis mais baixos das galerias da mina de
Cachoeira e em pouco tempo propagou-se rapidamente para as vigas de escoramento, provocando
desmoronamentos em quase toda a Mina, e se espalhou pelas instalações. O mar de madeira
alimentou o inferno e carregou as chamas para todas as áreas da mina. Depois de enfrentar o
incêndio por quatro dias e desviar a água dos aquedutos próximos para dentro da mina, Gordon
ordenou que os shafts fossem selados para cortar todo o oxigênio. Enquanto o fogo consumia a
madeira, as paredes das galerias desmoronavam, tornando as instalações subterrâneas
completamente impraticáveis.

Todos os esforços da companhia no sentido de novamente colocar as operações em base lucrativa


tornaram-se inúteis após este acidente, o maior desastre da história de Morro Velho. O imenso
sistema de escoramento, certa vez descrito como "uma vasta floresta subterrânea", não aguentou as
pressões das milhares de toneladas de terra e pedras e cedeu. O desmoronamento resultante
literalmente destruiu a Mina no seu conjunto, pois não havia nenhuma possibilidade de reabrir as
escavações na mesma região do corpo de minério. Até hoje não se sabe com certeza qual teria sido
o número de fatalidades causadas pelo desastre. A St. John calou-se a respeito e as reportagens
jornalísticas da época divergiram sobre a contagem. Existem lendas que falam de algumas dezenas
de escravos mortos. Na primeira página de A Província de Minas (Ouro Preto, 16 nov. 1886) lê-se a
improvável estimativa de dez mortes. Certamente, vários escravos, trabalhadores livres e talvez
alguns europeus perderam a vida, já que todos participavam dos trabalhos subterrâneos.

O resultado foi a redução pela metade da produção de minério bruto. Ademais, como este minério
teve de ser extraído quase exclusivamente da mina mais pobre do conjunto, a Gambá, a produção
de ouro diminuiu em 75%. Evidentemente, tais circunstâncias acarretaram prejuízos nas operações
da Mina. Entre 1868 e 1872, estes prejuízos totalizaram £32.678, muito embora a força de trabalho
sofresse severas reduções, particularmente entre os trabalhadores livres.

O efeito dos prejuízos foi minimizado pela existência de um fundo de reserva, guardado justamente
para enfrentar situações como a de 1867-1873. Este fundo, em conjunto com empréstimos tomados
dos próprios acionistas, foi utilizado para custear as obras de recuperação. Em 1873, a Companhia
conseguiu superar os prejuízos, mas à custa de despedir pelo menos duzentos trabalhadores livres
e deixar de alugar um número igual de escravos.

O Capitão Eslick descreveu o incêndio que destruiu a mina da seguinte forma: "Cerca da meia-noite
de 21 de novembro um incêndio foi descoberto no interior da Mina de Cachoeira. Um pilar composto
por pelo menos 24 grandes toras de madeira tinha sido colocado acima do mourão de escoramento
Número 9, a leste de Cachoeira, com o objetivo de suportar uma pesada massa de terra. Ao ser
examinado, verificou-se que estava pegando fogo e as chamas o consumiram rapidamente.
Imediatamente mais de 40 pessoas estavam em cena, todas elas trabalhando arduamente e
diligentemente na tentativa de extinguir o fogo, mas como a madeira nesse local estava muito seca,

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tal fato, associado à grande distância que a água tinha que ser transportada, fez a situação se voltar
contra nós ... assim, passamos a trabalhar em situação desvantajosa, e lamento dizer que o fogo
aumentou e subiu mina acima, e antes das seis horas da manhã seguinte fomos obrigados a nos
retirar."

Em apenas quatro dias, três décadas de sucesso financeiro viraram cinzas e esse incêndio
determinou o fim da Mina Velha." (Libby, 1984)

Dias difíceis em Congonhas


"Pela primeira vez em sua existência, o acampamento de mineração conheceu a fome e as agruras a
que estão expostas as pessoas que dependem para viver do trabalho nas entranhas da terra.

Inevitavelmente, houve alguma redução do pessoal da administração e da mão-de-obra durante


esse período de indecisão em continuar ou não com as operações. Vinte e seis europeus foram
mandados de volta para casa em 28 de janeiro de 1868 e mais outros os seguiram. Alguns britânicos
permaneceram no Brasil e se empregaram em outras mineradoras britânicas, principalmente na mina
Passagem, perto de Mariana.

Um grande número de mineiros nativos teve que encontrar novos empregos e muitos dos escravos
foram contratados pelas autoridades brasileiras na construção da estrada Lafayette-Sabará.

Após o colapso da mina e para reduzir custos, a empresa começou a alugar seus próprios escravos
e a devolver aos seus proprietários os escravos contratados.

Durante esse período, o departamento de redução vasculhou a região em busca de material para
alimentar os britadores e o ouro foi obtido a partir de rejeitos com teor de minério aproveitável,
assim como de areias que já haviam sido tratadas e minerais de baixa qualidade provenientes de
novos trabalhos exploratórios, e esses esforços ajudaram a reduzir o desemprego e a manter a planta
em operação." (Eakin, 1989)

"O espanto causado pelo desastre de 1867 nos dá uma ideia da influência econômica das instalações
da Companhia na região em volta da Mina. A dependência em relação à Companhia inglesa por
parte de vários setores da economia da região era muito grande. Essa região era formada pelas
antigas comarcas de Sabará, Ouro Preto e a região sul da Comarca do Rio das Velhas, mas também
incluía municípios em mais cinco comarcas. As elevadas necessidades de suprimento da Mina, em
combinação com uma política de compra que visava manter os custos no mais baixo nível possível,
fizeram com que a influência da St. John se estendesse muito além da circunvizinhança imediata. No
caso das comarcas de Sabará, Ouro Preto e do Rio das Velhas, a Mina aparentemente sustentava
sozinha a economia regional, inclusive estimulando maior integração de agricultores de subsistência
ao mercado monetário. Nos anos em que havia falhas nas colheitas locais, a Companhia nunca
hesitou em abastecer-se em mercados bem mais distantes, ao mesmo tempo evitando altos custos
e estabelecendo novas ligações comerciais. Os lenhadores da área imediata e os agricultores,
pecuaristas, fundidores e mineiros de ferro de regiões mais dispersas dependiam essencialmente da
Mina, como o único comprador capaz de absorver seus variados produtos. Os excertos da imprensa
ouro-pretana apresentados a seguir com a grafia da época mostram a forte inquietação com os
acontecimentos em Morro Velho." (Libby, 1984)

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"Não se sabe ainda qual o resultado d'esta espantosa catastrophe, porem, supõe-se, que se o fogo
tiver estragado todo o estivamento, terminará aquele serviço, o que será de consequências as mais
calamitosas para os habitantes de 5 ou 6 municipios, que mais ou menos todos tem interesse directo
n'aquelle importantíssimo estabelecimento, que ocupara mais de 2.000 pessoas em seu trabalho
diário, e que interessa á muitos agricultores, fabricantes de ferro, tropeiros, carreiros, e á própria
companhia União e Industria, que para este estabelecimento conduz muitas arrobas de ferro, e
objectos que da Inglaterra são remettidos para ele. Será em fim um grave mal, se Morro Velho não
poder prosseguir em seus trabalhos." (O Constitucional, Ouro Preto, 30/11/1867, p.2, c.1)"

"( . . . ) Assim daremos aos accionistas desta companhia, e aos de todas as outras, autentice e
irrecusavel testemunhos de nossas sympathias e do apreço em que temos todos esses grandes
capitaes que entrão em nosso paiz e fecundão o nosso trabalho, maxime nesta provincia, que
collocada no interior entre montanhas e privada de estradas para o litoral, acha nestas grandes
empresas ricos e numerosos consumidores para os produtos de sua industria.

Seria sempre deploravel um desastre, como o que acabamos de mencionar, fosse qual fosse a
importancia do estabelecimento sobre que cahisse, mas em relação á mina do Morro Velho é elle
sobremaneira sensível. ( . . . )

E pois tão elevados interesses foram victimas de um desastre ainda não visto neste paiz; n'elle perde
o estado para mais de 6.000$ annuaes de direitos de exportação, que esta Empresa pagava, e que
de dia em dia se augmentava; n'elle perde a provincia, não achando o mesmo consumo para os
produtos da agricultura, fabricas de ferro, creação &., e nem salarios vantajosos para o grande
numero de operarios que alli se empregavão; e n'elle enfim perde o comercio dentro de um raio de
20 legoas em torno deste estabelecimento. (O Diário de Minas. Ouro Preto, 5 dez 1867, p. 1, c. 1-3."
É interessante notar que este jornal republicou, traduzido para o inglês, o mesmo editorial do qual
estes trechos são citados em sua edição de 12 de dezembro de 1867.)"

Os shafts A e B
Esta passagem e as duas seguintes contém excertos da obra de Eakin, 1989, citada na bibliografia.

"Relutantes em deixar esse investimento outrora lucrativo


morrer, decidiu-se reabrir a mina por meio de um par de
shafts verticais e paralelos, localizados a leste e a jusante
do trecho que fora esmagado das antigas instalações. Um
desses shafts mergulharia diretamente no corpo de
minério e o outro teria acesso a ele por meio de uma
pequena galeria.

O superintendente estimou para esse empreendimento


um custo de £37.000, mas, no final, o custo total dos novos
shafts ultrapassou as £56.434 pagas pela compra da
propriedade de Morro Velho em 1834. A despesa total
alcançou £83.515.

Após o envio de uma equipe especial de perfuradores de rocha, o trabalho de afundamento dos
shafts A e B começou em novembro de 1868.

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Durante catorze meses, o trabalho nos shafts correu razoavelmente bem, mas a partir de 1870 a
empresa enfrentou um mar de problemas. A água da Mina de Cachoeira, abandonada e alagada,
que ficava cerca de 45 m de distância, passou a fluir para dentro do shaft B. Em 1871, as paredes das
antigas Minas de Bahú e Cachoeira desmoronaram e grandes massas de detritos caíram dentro da
água que estava nessas instalações. Em consequência, e de acordo com o conhecido princípio de
Arquimedes, o nível de inundação se elevou e forçou a água a passar através da rocha entreposta e
subir para os shafts A e B da nova mina.

Mas não parou por aí. Logo ficou óbvio que as enormes quedas de rocha em Bahú estavam
colocando em risco as minas de Gambá e Leste de Cachoeira e todos os homens e equipamentos
tiveram que ser retirados às pressas. No final das contas, as duas minas entraram em colapso. Os
mapas da Mina de Morro Velho identificam esta região com a expressão "Mine Crush".

Esses desmoronamentos, as inundações nos shafts, juntamente com as repetidas falhas do


equipamento de bombeamento, atrasaram os trabalhos por quase um ano inteiro e aumentaram os
custos. As rochas eram muito duras e havia escassez de dinamite.

Assim, durante os seis anos de 1867 a 1873, os trabalhos prosseguiram lentamente na escavação
dos dois shafts verticais, cujo objetivo era alcançar o corpo de minério debaixo da ruína das antigas
galerias e escavações. Os problemas causados pela constante entrada de água nestas escavações
foram apenas parcialmente resolvidos com a adaptação de um antigo moinho de trituração para
mover um sistema de bombas e a equipe de perfuração só chegou ao corpo de minério em
novembro de 1873, a 400 m abaixo da superfície.

O superintendente Gordon anunciou: "O corpo de minério foi alcançado no ponto desejado, abaixo
do Stope Nº. 3, a oeste da Mina de Cachoeira, 22 m abaixo do último nível conhecido, a uma
profundidade de 400 m". Foi um feito notável.

Enquanto perfurava os novos shafts, a companhia tentava se manter de pé, ora trabalhando nos
níveis superiores da antiga mina, ora tratando novamente o minério antes rejeitado e operando as
pequenas minas de Gabirobas e Gaia na Fazenda Fernão Paes que a St. John havia comprado no
início dos anos 1860.

Sete magros anos para os acionistas se seguiram, porquanto a St. John suspendeu o pagamento de
dividendos e aumentou o capital para conseguir pagar pelos novos shafts. Os acionistas e a
administração mantiveram a esperança de que a mina recém-aberta continuaria a produzir minério
em qualidade e quantidade comparáveis às da antiga mina.

O sucesso foi alcançado no início de 1874, quando a produção de ouro começou a atingir os níveis
do período pré-1868, mas grande parte da força de trabalho estava desfeita e não seria fácil
recompô-la nos anos que se seguiram.

Uma vez que os dividendos voltaram a ser pagos, em 23 de junho de 1875, a diretoria registrou: "que
os acionistas desejam expressar seu agradecimento pelos valiosos serviços prestados por John
Hockin, Escudeiro, Diretor Administrativo em Londres, e James Newell Gordon, Superintendente de
Morro Velho, ao promoverem a reabertura e o funcionamento bem-sucedidos das minas,
presenteando-os com a soma de mil guinéus cada."

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O Capitão de Mina Jackson, que trabalhava para a companhia há 25 anos, disse que nunca tinha
visto um corpo de minério em condições tão promissoras e assim se manifestou: "Desde a reabertura,
o tamanho (do corpo de minério) variava pouco. No fundo do shaft ele tinha 8,4 m de largura e, a
partir deste ponto, em direção a oeste, cerca de 10,2 m de largura, e quando abrirmos a mina em
direção a oeste, o corpo de minério aumentará, sem dúvida, muito de tamanho, como em Bahú,
antes do incêndio, a parte mais larga media mais de 30 m e sua largura média em toda a mina era
de cerca de 13,2 m." As paredes, disse o capitão Jackson, estavam dando pouco ou nenhum
problema.

Dez anos mais tarde, a mina desabaria em completa ruína e causaria a morte de dezessete
trabalhadores.

Não obstante os problemas recém-sofridos e certas dificuldades relacionadas com o suprimento de


mão-de-obra, o ano de 1874 registrou um razoável sucesso, enquanto 1875 testemunhou os lucros
mais altos de todo o período imperial. A diretoria e muito especialmente o superintendente Gordon
ficaram absolvidos de qualquer dúvida quanto à sua competência durante a fase crítica de 1867 a
1873, quando, no segundo semestre de 1875, o dividendo alcançou a incrível importância de £5,0
por ação.

O maior problema enfrentado na última fase deste período foi simplesmente o empobrecimento
dos corpos de minério trabalhados, que aliás era um problema muito comum na mineração aurífera
antes do século XX, agravado pelos métodos primitivos de redução. A St. John, como todas as
grandes empresas de mineração, não poupou esforços no decorrer do período, numa incessante
tentativa de encontrar métodos de redução mais eficientes.

Depois de 1875, Morro Velho teve de enfrentar uma situação crítica de escassez de mão-de-obra.
Com a falta de braços, devido à dificuldade de alugar escravos e à impossibilidade de a oferta de
mão-de-obra livre compensar a diferença criada, tornou-se difícil manter o nível de produção de
minério bruto e mais ainda aumentá-lo. A St. John recorreu à importação, no nosso entender inédita
no Brasil, de operários chineses, mostrando seu desespero perante a crise no setor servil brasileiro."
(Eakin, 1989)

Milking the mine


O irlandês James Newell Gordon foi superintendente de Morro Velho de 1857 a 1876. Ele foi
demitido depois que o capitão de mina, John Jackson, o denunciou à diretoria por estar "milking the
mine". "To milk something/someone" é uma expressão idiomática que significa tirar vantagem de
alguma coisa ou de alguém de forma desonesta. Seu significado no caso concreto virá mais adiante.

Após o ressurgimento inicial da produção com a abertura dos novos shafts em 1873, a diretoria
decidiu enviar uma equipe de sindicância a Morro Velho, composta pelo secretário da companhia,
Pearson Morrison, e um diretor, Frederick J. Tendron, para fazer um levantamento da situação.

Pearson Morrison tinha sido gerente da Anglo Brazilian Company em Passagem. Frederick J. Tendron,
além de acionista, era contador e havia se tornado auditor em 1873, mais tarde foi diretor e, em
seguida, presidente (chairman of the board) (1890-1910).

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A vinda da comissão de sindicância foi motivada pela
denúncia de John Jackson que chegou a Londres, pois, os
números de Gordon estavam muito bons. Após a
retomada, a produção de ouro atingiu em 1875 um pico
(2.211 kg) só alcançado anteriormente em 1866 (2.231
kg).

A visita por parte dos representantes da St. John, que


aconteceu após esta denúncia, descobriu que Gordon
estava profundamente envolvido em uma série de
negócios na área, inclusive extorquindo os proprietários do armazém local, ou, em uma forma mais
branda, "getting a cut from the owners of the local store".

Para surpresa e desânimo da dupla Morrison e Tendron, eles constataram que, nos seus 20 anos à
frente da companhia, o superintendente Gordon acumulara vários empreendimentos pessoais
paralelos e até participava de outras atividades de mineração, desviando fraudulentamente mão de
obra, materiais e capital das instalações de Morro Velho.

Fato é que Gordon cercara-se de "vacas-de-presépio" – "yes-men" no jargão britânico –


relativamente ineficientes e às vezes desonestos e se envolveu em vários empreendimentos
"paralelos" irregulares, além de se ausentar por longos períodos do dia-a-dia da mina para cuidar
de seus negócios particulares.

O contrato do superintendente continha cláusulas que o proibiam de se envolver em qualquer outro


negócio, que não fosse o da companhia, enquanto estivesse no Brasil. Porém, em um acintoso
conflito de interesses, Gordon havia comprado parte de uma mina próxima. Ele tinha um terço de
participação no principal armazém comercial de Congonhas do Sabará e obrigava todos os
funcionários da companhia a comprarem lá. Gordon também havia utilizado mão-de-obra e
materiais da empresa para seu uso pessoal.

Mais sério ainda, parecia que Gordon estava operando a mina de forma predatória. Sua estratégia
para trabalhar o corpo de minério esteve sob suspeição na década de 1860 e resultou na demissão
do experiente capitão de mineração córnico, Thomas Treloar. John Jackson, o capitão de mina
córnico que substituiu Treloar, disse à diretoria em Londres que não aprovava a forma como Gordon
estava operando a mina após sua reabertura para alcançar altos índices de produção." (Eakin, 1989)

"No final de 1876, Gordon foi chamado de volta a Londres e afastado de seu cargo. Além das
acusações acima mencionadas, ele também foi acusado de que havia encaminhado às operações de
trituração somente minério de elevado teor aurífero, deixando as galerias bloqueadas pelo entulho
do minério mais pobre. De certa maneira, Gordon havia aumentado os lucros falsamente e o novo
superintendente, Pearson Morrison, teve que arcar com as consequências. A produção de ouro caiu
de um terço em 1876, embora os lucros se mantivessem em um nível razoável até 1881. No primeiro
semestre do ano, não houve declaração de dividendos e, no segundo semestre de 1882, estes
terminaram totalmente para o período imperial." (Libby, 1984)

A equipe de sindicância demitiu Gordon e tentou consertar a bagunça administrativa que ele deixara
para trás. Aparentemente Gordon fazia o tipo "rouba-mas-faz". É interessante observar que ele
recuperou a mina em três momentos difíceis: 1857, 1864 e 1867, tendo sido inclusive homenageado

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e premiado com mil guinéus pela abertura dos shafts A e B. Além do mais, o gráfico de produção
depõe favoravelmente a James Newell Gordon. De repente, passou de herói a vilão.

Figura 31 - O Armazém

"A prática, adotada pelo superintendente Gordon, consistia em selecionar, já dentro das galerias, o
minério mais rico em aparência. O problema com tal prática é que, a médio prazo, as colunas de
minério menos rico deixadas pelos broqueiros acabavam por obstruir as novas escavações. Este
tornou-se um sério problema depois que aquele superintendente foi afastado da administração da
mina em 1876." (Libby, 1984)

"Em 1877, após a exoneração de Gordon, o capitão de mina William James explicou o significado da
expressão "milking the mine" da seguinte maneira: "Tivemos que lavrar e transportar, a um custo
considerável, uma grande quantidade de estéril que deveria ter sido enviada para a superfície no
ano anterior ... A pedra retirada da mina nos últimos doze meses totaliza 78.546 vagões e o retorno
em ouro 466.183 oitavas. A produção do período correspondente do ano anterior foi menor em
6.936 vagões, todavia a produção foi maior em 139.063 oitavas. Porém, devo observar que isso não
foi obtido por uma correta e legítima maneira de minerar, porque, quando se atingiu o limite oeste
do corpo de minério, meios incorretos foram usados para inflar os resultados, escavando-se todo o
rico mineral sem o preenchimento dos espaços então abertos, sem qualquer preocupação com os
futuros trabalhos da mina."

Houve um notável mascaramento da realidade durante os últimos anos do mandato de Gordon.

Gordon e sua família permaneceram como grandes acionistas da companhia mesmo depois que ela
foi reorganizada na década de 1880. Gordon tocava outras minas brasileiras e às vezes aparecia nas
reuniões da companhia para o desconforto de Frederick Tendron, o presidente." (Eakin, 1989)

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Os anos pós-Gordon
"Os cinco anos seguintes foram um período de vacas magras, quando superintendentes escolhidos
de dentro das fileiras da empresa tentaram sem sucesso colocar a mina em ordem novamente. O
substituto de Gordon, Pearson Morrison, assumiu em 1876, adoeceu e morreu no Brasil em 1881. O
médico da empresa, Alexander Buchanan, teve uma passagem efêmera pela superintendência
(março a agosto de 1882) e, em seguida, assumiu o posto o engenheiro-chefe do departamento de
Oficinas Mecânicas, G. H. Oldham, que exerceu a superintendência de 1881 a 1884.

A quantidade de minério retirado e triturado foi mantida, mas seu rendimento em ouro deteriorou-
se. Mas os novos superintendentes não poderiam ser responsabilizados por isso. Eles herdaram
imensos problemas deixados por Gordon: a mina estava em péssimas condições; havia muita rocha
improdutiva a ser extraída e havia demandas crescentes por madeiras frescas para suportar a extensa
gama de instalações.

O corpo de minério estreitara-se e tornara-se menos aurífero; houve problemas com as bombas,
repetidas pequenas inundações e um aumento alarmante no número de madeiras robustas que não
resistiram à pressão da rocha do teto.

Pior ainda, o ambiente geral de trabalho da mina mais uma vez começou a se deteriorar. Os boatos
eram preocupantes. E os números falavam por si mesmos refletindo tudo isso ...

Figura 32 – Produção de ouro da Morro Velho

Como a produção não reagia, a diretoria enviou novamente um de seus diretores para examinar a
situação em Morro Velho. S. E. Illingworth encontrou o estabelecimento em desordem e constatou
que, nos 5 últimos anos, a romaria de superintendentes fracassara. Eles não conseguiram assumir o
controle das operações e o moral do pessoal declinara, assim como a produção. Illingworth informou
a Londres que eles deveriam ir atrás de um novo superintendente. E eles contrataram George
Chalmers." (Eakin, 1989)

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Organograma da St. John no Século XIX
A Figura 33 mostra o organograma da companhia em meados do Século XIX. Libby descreveu da
seguinte maneira a estrutura organizacional da St. John.

"No século XIX foi desenvolvida uma nova organização do capital: a empresa por ações. A companhia
por ações consistia tipicamente de uma diretoria pelo menos nominalmente responsável junto ao
corpo de acionistas, mas muitas vezes mais atenta aos interesses dos próprios diretores,
frequentemente os maiores acionistas.

A diretoria era incumbida da escolha e fiscalização do administrador geral da empresa – aquele


representante da empresa por ações que substituía o capitalista individual dirigindo seu próprio
empreendimento. Assim, a organização racional da empresa por ações aproveitou-se de uma nova
classe de "técnicos" – administradores industriais, cuja responsabilidade era a de produzir lucros para
os acionistas sob a tutela de uma diretoria.

O benefício das empresas por ações, além da óbvia vantagem em termos das possibilidades de
levantar o capital social suficiente para iniciar as operações produtivas, era que ela podia dispor de
talento especializado, em termos contemporâneos, no ramo industrial em que pretendia atuar. Uma
vez que a diretoria fosse inteligente na nomeação de um administrador capaz de organizar a
produção racionalmente, seria de se esperar o sucesso.

O administrador, por sua vez, podia concentrar seus esforços na organização racional dos processos
produtivos – os aspectos tecnológicos, a hierarquia de supervisão e a divisão de trabalho em geral,
– sem preocupar-se com o levantamento do capital ou do crédito bancário necessários para a
realização desta organização. A St. John destacou-se mais por sua organização racional dos recursos
humanos utilizados em suas operações do que por avanços da tecnologia implantada nos processos
produtivos."

A primeira coisa que impressiona o pesquisador que tenha acesso ao arquivo da St. John d 'El Rey
Mining Company é simplesmente que ela era muito bem organizada. Este fato evidencia-se pelos
relatórios anuais, cujo volumoso conteúdo proporcionava aos leitores-acionistas até pormenores
sobre as operações em Morro Velho.

Além de prestar contas do desempenho produtivo e financeiro da Companhia, leitura obrigatória


para acionistas de qualquer época, os relatórios noticiavam desde o progresso das escavações em
cada mina até a frequência com que dezenas de doenças afligiam a população escrava de Morro
Velho.

Essa massa de informações dos relatórios indica que o controle administrativo da empresa foi
bastante rígido, na medida em que cada chefe de departamento era obrigado a apresentar um
relatório pormenorizado das atividades da sua área ao superintendente que, por sua parte, havia de
apresentá-lo à diretoria.

Assim, a comparação do desempenho do pessoal administrativo em vários anos foi facilitada. O


escritório londrino se manteve em comunicação constante com a superintendência no Brasil, embora
deva-se notar que a correspondência demorava de dois a três meses para chegar a seu destino."

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Diretoria

"O conselho diretor (board of directors) – ou simplesmente a diretoria – era composto por sete
membros, um dos quais servia como presidente (chairman). Em 1849 criou-se a posição de diretor-
administrador, cuja tarefa consistia em chefiar o escritório-sede e manter contato constante com a
superintendência em Morro Velho. A criação deste posto parece indicar que a diretoria era formada
por acionistas cujos investimentos eram avultados em relação à soma do capital nominal.

O superintendente, nomeado pela diretoria e responsável perante ela, administrava todas as


operações nas propriedades brasileiras da Companhia. Esta hierarquia tem os traços da moderna
empresa capitalista e, de fato, ela não muda até a venda da Mina e a dissolução da Companhia em
1960." (Libby, 1989)

No período de operação da Mina Velha (1834 a 1886), a Companhia teve 2 presidentes (chairmen of
the board), J. D. Powles (1830 – 1867) e John Hockin (1867 – 1890), e 8 superintendentes.

Tabela 12 - Superintendentes: 1830 - 1924

Superintendente Período Superintendente Período


Charles Herring, Jr. 1830 – 1846 Pearson Morrison 1876 – 1882
George D. Keogh 1846 – 1853 Alexander Buchanan Mar-Ago – 1882
Thomas Walker 1853 – 1857 George H. Oldham 1882 – 1884
James Newell Gordon 1857 – 1876 George Chalmers 1884 – 1924

Departamento das Minas

"No período imperial, as operações da Mina eram divididas em sete


departamentos, sob o comando geral da superintendência. A chefia de cada
um dos departamentos era ocupada por um europeu, normalmente um inglês,
embora ocasionalmente houvesse um oficial da Companhia de nacionalidade
alemã ou francesa. O departamento preeminente foi o Departamento de
Minas, cujo oficial era denominado primeiro capitão de minas, derivativo da
linguagem de mineração da Cornualha, origem de praticamente todos os
mineiros ingleses que trabalhavam em Morro Velho. Neste departamento
concentrava­ se o maior grupo de europeus da Mina, todos com uma certa
medida de autoridade sobre os escravos e operários empregados nos
trabalhos subterrâneos.

Além de ser responsável pela produção de minério, o Departamento de Minas


controlava o sistema de canaletes e barragens que fornecia a força hidráulica, incumbindo-se ainda
das explorações em busca de novos veios auríferos.

Quase metade da força total da Mina se encontrava empregada nesse departamento e suas despesas
com mão-de-obra e provisões de todo tipo eram as maiores das operações globais." (Libby, 1989)

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Figura 33 - Organograma da St. John em meados do Século XIX

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Capitães de minas

Os três primeiros capitães de minas eram córnicos: Dalley, Treloar e Jackson.

O primeiro capitão de minas foi o Capitão Dalley, braço direito de Charles Herring Jr. Ele tinha
trabalhado antes na mina de prata da Real del Monte no México.

O capitão Thomas Treloar aparentemente veio para o Brasil na década de 1830 e durante os 40 anos
seguintes trabalhou em pelo menos uma dúzia de companhias de mineração. Ele foi contratado pela
Morro Velho em 1845 após o colapso da mina de Cata Branca. Treloar deixou a Morro Velho após
se desentender com o superintendente Gordon e passou a trabalhar nos anos 1860 e 1870 na mina
de Passagem de Mariana.

O capitão John Jackson, que substituiu Treloar, foi contratado pela companhia em meados de 1860
como mineiro com um salário de £10 por mês. Em poucos meses tinha se tornado assistente de
capitão de mina a £14 por mês. Em meados de 1870 ele se tornou capitão de minas, a posição mais
importante no subsolo e chefe do departamento de mina. Seu salário para esse cargo passou para
meros £15 por mês, subindo para £17 antes de sua aposentadoria em 1876. Foi o capitão John
Jackson que denunciou os malfeitos do superintendente Gordon à diretoria em Londres.

O capitão James Rogers, da época do Chalmers, era o capitão de minas por ocasião do acidente
ocorrido em novembro de 1886.

Apenas um assistente de capitão de mina não pertencia à comunidade inglesa – Janis Karklin, um
estoniano que emigrou para o Brasil na década de 1920, o popular sr. João "Alemão", bastante
conhecido na comunidade de Nova Lima. "Alemão" é o nome dado a pessoas de epiderme clara, em
geral, caucasianos e não necessariamente de origem germânica.

Departamento de Redução

"O departamento de redução normalmente tinha


como chefe um indivíduo com formação em Química
e/ou Geologia. Nos processos de trituração e
amalgamação utilizava-se um grande contingente de
escravas. Uma preocupação constante do
departamento de redução era melhorar o
rendimento do processo de amalgamação, devido às
elevadas perdas de ouro acusadas pelas análises
químicas.

O problema do rendimento de amalgamação era


endêmico na mineração do século XIX e a St. John não poupou esforços na tentativa de diminuir as
perdas, embora sem grande êxito.

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Departamento de Manutenção

O departamento de manutenção, denominado


departamento de "mecânica" nos relatórios do século
passado, também tinha a participação de um grande
número de europeus, todos trabalhadores
especializados – carpinteiros, ferreiros e mestres-de-
obras. Este departamento era encarregado dos
consertos gerais dos equipamentos utilizados nos
demais departamentos e frequentemente se ocupava
da construção de habitações e outras instalações da
Mina. O primeiro-mecânico, como se chamava o chefe
do departamento de manutenção, tinha de manter-se
em contato constante com os demais oficiais para estabelecer prioridades na ordem dos reparos a
serem feitos.

Armazém

O armazém também constituía um departamento, sendo incumbido do suprimento de provisões


tanto alimentícias quanto de equipamentos. Além do armazém em si, o departamento possuía duas
tropas de carga, uma equipe de carreteiros de madeira e, por algum tempo, uma plantação. Uma
das tropas era encarregada do transporte de provisões, principalmente alimentícias, enquanto a
tropa do ouro levava o produto acabado – ouro em barras – para o Rio de Janeiro.

Nas primeiras três décadas do período da Mina Velha, a tropa do ouro, fortemente armada,
transportava em lombo de burros os caixões de ouro por toda a distância de Morro Velho ao Rio,
onde eles eram entregues aos navios que seguiam até Londres ou levados à casa de cunhagem do
Governo Imperial. Com a penetração da ferrovia Dom Pedro II no interior da Província, a St. John
começou a utilizar o novo meio de transporte, e a tropa entregava o ouro no ponto terminal mais
próximo a Morro Velho. No final do período o ponto era Queluz (hoje Conselheiro Lafaiete). Em
época mais recente o ouro era entregue em Honório Bicalho.

A tropa do ouro nunca voltava a Morro Velho sem trazer artigos importados da Inglaterra,
normalmente equipamentos usados no Departamento de Minas. O departamento de armazenagem
revela de maneira expressiva a grande influência da empresa na economia regional.

Departamento Médico

Com o departamento médico, completa-se o grupo de departamentos que apresentavam relatos


individuais nos relatórios anuais. Os relatos médicos formam um conjunto tão rico que possibilitaria
um estudo sobre a saúde da população escrava de Morro Velho inédita na historiografia da
escravidão moderna.

O departamento era composto por um, e mais tarde dois médicos ingleses, enfermeiras inglesas e
vários assistentes escravos, sendo encabeçado pelo chamado cirurgião-chefe (evidentemente um
dos dois médicos). A Mina possuía um hospital de apreciável tamanho que certamente era um dos
mais bem-equipados da Província, senão do país.

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Departamento de Contabilidade

O departamento de contabilidade localizava-se na Casa Grande, junto às salas da superintendência.


Seus relatos obviamente figuravam nos relatórios da contabilidade geral da empresa elaborados
pelo escritório em Londres. Estes relatórios, com balancetes completos, declarações de lucros e
perdas, contas de receitas e despesas para Morro Velho e Londres e relações das remessas de ouro,
demonstram que a Companhia tinha uma contabilidade sistemática e científica.

Departamento de Negros

Finalmente, o departamento de negros consistia de um administrador europeu e alguns feitores


brasileiros. Sob seus cuidados encontravam-se até 1.690 escravos. As responsabilidades do
departamento incluíam a preparação e distribuição de comida, a distribuição de vestimentas, a
inspeção da habitação dos escravos e, é claro, a disciplina geral.

Este resumo da divisão departamental da Mina mostra que a empresa era dotada de uma
organização administrativa lógica e racional, mesmo pelos padrões modernos.

Suprimentos

Em termos de provisões alimentícias, Morro Velho abastecia-se quase totalmente nos mercados
locais. O volume das compras realizadas pela Companhia possibilitava que ela frequentemente
estabelecesse os preços do mercado, já que praticamente controlava a procura regional. O chefe do
armazém negociava contratos aos preços mais convenientes possíveis com os fazendeiros da região.
Quando os fazendeiros tentavam organizar-se, retendo sua produção na esperança de obter preços
melhores, a Companhia simplesmente se recusava a comprar até que os preços alcançassem um
nível mais aceitável. Não poucas vezes a contratação de futuras colheitas forçou os fazendeiros a
vender sua produção a um preço abaixo do preço do mercado.

A flexibilidade monopsônica da Companhia derivava, em primeiro lugar, de sua grande capacidade


de armazenagem, que lhe possibilitava esperar findarem as crises na produção, e, em segundo, da
existência de uma tropa de provisões. Esta tropa normalmente era utilizada no transporte de
mercadorias contratadas na circunvizinhança, assim diminuindo os custos pela eliminação do
pagamento de carreto. Mas em épocas de crise produtiva ou de retenção de produção pelos
fazendeiros locais, a tropa procurava milho, toucinho, arroz, óleo de mamona etc. em regiões cada
vez mais distantes, assim superando a crise ou quebrando a obstinação dos produtores regionais.

A Mina necessitava de grandes quantidades de madeira, principalmente para a extensão do sistema


de escoramento, mas também para a fabricação do carvão utilizado em vários setores. A grande
maioria do suprimento de madeira provinha de lenhadores e carreiros da região. Já em 1846, temos
notícia de contratos para o suprimento fixo de madeira e de carvão vegetal. Tais contratos
multiplicaram-se no decorrer dos anos, e o resultado foi nada menos do que o desflorestamento de
grandes áreas da região.

O péssimo estado das estradas estimulou a St. John a construir estradas particulares e a consertar
várias pontes e estradas públicas por sua própria conta. No fornecimento de outros materiais, como
ferro de broca e cabeças de trituradores, a Companhia teve poucos problemas, já que, a partir da
década de 1850, ela era um dos poucos consumidores de peso da Província. Um dos grandes

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fabricantes das cabeças de trituradores foi a fundição de João Monlevade, embora a St. John não
hesitasse em estimular a concorrência, contratando com produtores menores quando houve ocasião.

As compras eram efetuadas em oito comarcas da Província de Minas Gerais, abrangendo uma área
que, em termos das divisões geográficas vigentes hoje, seria composta por praticamente toda a Zona
Metalúrgica e partes das regiões do Alto São Francisco, dos Campos das Vertentes e da Zona da
Mata. Em relação aos gêneros alimentícios, as ligações comerciais da Mina estavam especialmente
concentradas na própria Comarca de Sabará, nos distritos de Paraopeba e Matozinhos, na Comarca
do Rio das Velhas e nos distritos de Itabirito e Congonhas, na Comarca de Ouro Preto.

Nas épocas de necessidade, no entanto, os tropeiros de Morro Velho frequentemente penetravam


até Juiz de Fora (antigamente Paraibuna), no extremo sul da província, à procura de artigos tão
comuns como feijão e milho. Para o ferro de broca e as cabeças de trituração, a St. John dependia
em grande parte do Distrito de Itabira e da vila onde estava estabelecida a fundição de João
Monlevade, na Comarca de Rio Piracicaba.

Os escravos alugados à Companhia vinham de toda a região acima indicada e possivelmente


também de outras comarcas de Minas Gerais.

Quanto à origem da maioria dos materiais utilizados em Morro Velho, é certo que a maquinaria mais
sofisticada usada nos processos produtivos da Mina veio da Inglaterra. Este seria o caso das
máquinas rebocadoras e provavelmente do sistema de bombas movidas a energia hidráulica
empregadas na drenagem das escavações.

As cabeças de trituradores fabricadas em Minas Gerais com ferro local ganharam a concorrência das
cabeças de aço inglesas, que eram quatro vezes mais caras e menos duráveis. Todo o ferro de broca
e o ferro utilizado na fabricação de pequenas ferramentas era comprado de produtores regionais e
a St. John e as demais companhias de mineração constituíram por muitos anos os únicos
consumidores expressivos do produto, dadas as péssimas condições de transporte para o litoral.

Do processamento final da pólvora utilizada nas explosões das escavações da Mina foi incumbido
um certo Capitão Ribeiro, que misturava enxofre e salitre, recebidos da Inglaterra através da
Companhia, com carvão de madeira local. O contrato com o Capitão Ribeiro durou até 1869, quando
se passou a usar dinamite da Alemanha. A St. John dispendeu cerca de £3.500.000 de 1838 a 1885,
dando uma média de gastos anuais de £75.000. A grande maioria destes recursos foi injetada
diretamente na economia provincial, fatalmente estimulando todos os setores da economia.

Habitações

Numa política típica das company towns da própria Inglaterra e do norte dos Estados Unidos, a St.
John forneceu habitação para os trabalhadores livres empregados na Mina. O superintendente
Keogh opinava em 1847, que seria prudente expandir as instalações habitacionais porque "o
aumento continuado do número de trabalhadores livres é impedido unicamente pela
impossibilidade de os recém-chegados acharem qualquer lugar para ficar, dentro de uma distância
razoável da mina". A proposta de Keogh, de construção de mais casas naquele ano, só foi realizada
nos meados da década de 1850, quando o aumento da força de trabalho livre se mostrou realmente
apreciável.

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Durante o resto do período imperial e mesmo no século XX, a Companhia utilizou essa política
habitacional numa tentativa de fixar a força de trabalho na vizinhança de Morro Velho. A Companhia
aproveitou-se de uma outra prática que visava melhorar as condições da força de trabalho. De 1857
a 1862, os operários, bem como os oficiais e outros empregados europeus, podiam comprar
qualquer mercadoria de necessidade básica diretamente do armazém da Mina. Mas em 1863, a
Companhia estabeleceu um acordo com a firma de Mello & Cia. (mais tarde Borges, Taveira & Cia.),
varejistas na praça da Vila de Congonhas de Sabará. Este acordo teve o efeito duplo de baratear o
custo de bens comprados pela população operária de Morro Velho e de reduzir as despesas do
armazém, pois a St. John e Mello & Cia. realizaram suas compras juntas, aproveitando-se dos preços
mais baixos provenientes de transações feitas em grande volume. Cadernetas de crédito foram
distribuídas aos operários, facilitando suas compras no período entre os pagamentos mensais. É
interessante notar que os empregados europeus continuaram comprando diretamente do armazém;
enquanto um passeio na vila para comprar doces e cachaça se tornou o programa domingueiro dos
escravos da Mina.

Em 1872, o superintendente Gordon informou: "Do sistema seguido pela firma Borges, Taveira &
Cia., no seu modo de conduzir os negócios, e por sua cooperação cordial e fiel com o chefe do
armazém da Companhia, efetuaram-se reduções consideráveis nos preços de provisões e outros
artigos neste distrito durante o ano passado. Este fato é atualmente tão conhecido que pessoas
vindas de distâncias consideráveis procuram suas provisões gerais em Congonhas. Atualmente, a
classe trabalhadora pode viver mais barato aqui do que em qualquer outro distrito nesta parte da
província."

Madeira

A maior parte do abastecimento de madeira provinha, pelo menos desde 1846, de lenhadores locais.
Vinte e quatro anos e milhões de metros de madeira mais tarde, o chefe do armazém nos dá uma
indicação da verdadeira utilidade das matas da Companhia: "Com a exceção daquelas da Companhia,
praticamente todas as matas das quais nossos suprimentos provieram durante os últimos 15 anos
ou mais estão se esgotando e, em consequência, vemos grandes dificuldades para o futuro na

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obtenção de um suprimento suficiente. . . a não ser através da admissão de preços mais altos. (. . .)
Felizmente, há uma abundância de madeira adequada nas propriedades da Companhia, da qual, no
caso de necessidade, podemos lançar mão, não somente com mais regularidade e certeza, mas
também com redução considerável no preço."

Estas matas, então, serviam como reservas florestais, já que dentro da racionalidade capitalista da
empresa, a opção mais cômoda era de concentrar na produção de ouro, deixando para outros o
fornecimento de materiais essenciais, a não ser nas horas de grande necessidade.

Bela Fama

De 1872 a 1878, a Companhia experimentou a produção de gêneros alimentícios, principalmente


milho e feijão, numa plantação localizada na propriedade da Mina e trabalhada por escravos.
Aconteceu que os resultados da produção da plantação Bela Fama foram decepcionantes, se é que
realmente se esperava algo mais. Nos sete anos da sua existência, a Bela Fama conseguiu produzir
uma média de 4,0% do valor de todas as provisões alimentícias compradas pela Mina. O real motivo
deste experimento é revelado no relato do armazém de 1878. "A média de braços empregados lá
[na Bela Fama] durante o ano passado era de 27, isto é, 6 homens e 21 mulheres. Destes, a maior
parte são velhos e alguns deles não são capazes de participar de qualquer outro tipo de trabalho."

Conclusão

Acreditamos que este esboço da história da Companhia St. John serve como um retrato da
capitalização britânica da mineração aurífera brasileira, enquanto nosso exame da empresa em si
revela a racionalidade capitalista que predominava em suas operações. Na sua maneira de atuar,
tanto no plano econômico quanto no político, a St. John mostrou-se bastante capaz de manipular,
a seu favor, as forças da economia liberal em que se encontrava instalada. Ao mesmo tempo, quando
se podem verificar traços aparentemente pré-capitalistas na organização da Companhia, o raciocínio
que os gera é capitalista. Se a empresa St. John deve ser considerada transicional é porque ela não
conseguiu livrar-se de uma elevada dependência da sua mão-de-obra. Ela compensou essa
dependência através da racionalização da sua força de trabalho – inclusive, é claro, o trabalho
escravo. Tratava-se de uma racionalidade em termos de aumento e aperfeiçoamento do ritmo de
produção e da utilização estudada da mão-de-obra." (Libby, 1989)

George Chalmers
Córnico, descendente de escoceses, o jovem engenheiro George Chalmers trabalhava no setor de
mineração na Cornualha quando a diretoria da St. John d'el Rey o contratou em 30 de outubro de
1884, por 6 anos, com salário anual de £1,000 (um mil libras esterlinas), e imediatamente o enviou
para o Brasil. Recém-casado e com pouco mais de 28 anos, acompanhado pela Sra. May Tyacke
Chalmers e uma criada, ele partiu de Southampton no navio R.M.S. Tagus e chegou a Morro Velho
em 4 dezembro de 1884.

Chalmers reestruturou imediatamente a equipe de supervisão e revisou completamente todos os


processos trabalhistas e industriais.

Um problema de grandes proporções surgiu no layout e no sistema de trabalho do corpo de minério


de Morro Velho. Embora os shafts A e B tivessem atingido o corpo de minério a jusante do local de

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desabamento da antiga mina, eles foram perfurados diretamente dentro do corpo de minério,
fazendo com que todo o tráfego e as operações da mina ficassem confinados diretamente dentro
da própria rocha hospedeira.

Além disso, os antigos métodos de abertura de grandes cavernas subterrâneas sustentadas por
grandes toras de madeira foram mantidos na nova mina. À medida que a mina se aprofundava, a
pressão das rochas sobre o madeiramento aumentava, pressionando cada vez mais as escoras de
madeira e aumentando as chances de outro grande esmagamento.

1886 – The mine crush


Antes de completar um ano de Brasil, May Tyacke Chalmers viria a falecer em 07 de agosto de 1885
depois de longo período tratando de uma tuberculose. Um ano depois, em 24 de agosto de 1886,
Chalmers casou-se com Eleanor Josephine Tyacke, irmã de sua primeira esposa, May Tyacke.

Menos de três meses após este segundo casamento, na


noite de 10 de novembro de 1886, o capitão de mina,
James Rogers, foi chamado para dentro da mina. Os
madeireiros haviam medido e cortado um tronco para ser
encaixado no sistema de apoio e descobriram que o
movimento das rochas tinha provocado o abaixamento da
seção para a qual a madeira havia sido cortada e ela não
cabia mais ali. Rogers avaliou a situação e resolveu
remover a perigosa seção rochosa no turno da manhã. Ele
não teve essa oportunidade. Às 5:30 da manhã toda a
seção da rocha se rompeu e derrubou os suportes de
madeira, uma máquina de reboque e as principais
plataformas que se encontravam nessa seção da mina.

Felizmente, isso ocorreu quando os turnos estavam sendo trocados e poucas pessoas estavam na
mina na ocasião. As equipes de resgate rapidamente desceram e libertaram entre duas a três dezenas
de mineiros que ficaram presos. A pedra que caíra enterrara outros dez homens. O desastre, no
entanto, tinha acabado de começar. A queda provocou uma reação em cadeia e, durante as semanas
seguintes, a mina desabou lentamente, seção por seção, em um efeito dominó, enquanto mineiros
e administradores se sentiam impotentes e atônitos ao sentir o chão tremer abaixo deles a cada
novo desabamento.

Fato é que havia sido aberto pela explotação, no lugar da coluna de minério, um imenso realce
inclinado (stope), medindo perto de 200 metros de profundidade, com dimensões horizontais de 15
metros, aproximadamente, entre paredes, e mais de 100 metros no sentido oposto.

Enormes blocos de pedra se soltaram de um pilar de sustentação de teto, na parte alta da escavação,
e as paredes, então insuficientemente apoiadas, ruíram arrastando e quebrando em sua queda as
pilastras maciças que serviam de sustentáculo, bem como o material de extração e de esgotamento
e tudo o que se encontrava em sua passagem. O abalo foi tal que propagou-se para os shafts, onde
os revestimentos e as peças metálicas foram, em parte, demolidas ou deslocadas, e um deles chegou
a desabar a partir da profundidade de 160 metros.

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Assim relatou Chalmers a respeito do acidente: "Em 9 de novembro, novas madeiras foram
necessárias na mina e as medidas de corte foram enviadas à superfície. No dia seguinte, as toras
foram entregues, mas consideradas muito grandes, apesar de terem sido cortadas corretamente de
acordo com as medições. Um novo exame das instalações revelou que o teto e as paredes haviam
rebaixado cerca de seis polegadas durante a noite e que o movimento de esmagamento continuava
ameaçadoramente. Houve rupturas de rocha, estalidos, pequenos desabamentos e rachaduras de
madeira, e as ordens para a evacuação da mina foram imediatamente postas em prática.
Infelizmente, a subsidência foi tão rápida e completa que alguns mineiros ficaram presos e
morreram."

O dia seguinte ...


"O desabamento danificou fortemente a mina. No dia do desabamento a lavra já tinha atingido 569
metros abaixo da superfície. As partes inferiores dos shafts A e B desmoronaram a partir de 160
metros de profundidade e perdeu-se o acesso às frentes em desenvolvimento. Chalmers enviou
Rogers para a Inglaterra para explicar a situação à diretoria. Em seguida, cortou as despesas
operacionais o máximo possível. Ele demitiu a força de trabalho livre, um número de funcionários
britânicos retornou à Inglaterra e as compras caíram ao mínimo.

O tradicional empório local fundado em 1842, mencionado por Gordon no relatório anual de 1872,
à época conhecido como "o armazém" e mais tarde como Casa Aristides, passou a fornecer gêneros
alimentícios aos operários no crediário, correndo o risco de que a reabertura da mina não tivesse
sucesso e seus créditos não fossem pagos.

E assim terminou a segunda fase da história de Morro Velho. O corpo de minério principal havia sido
trabalhado – se incluirmos os anos de reconstrução após o incêndio de 1867 – por 51 anos e havia
produzido nada menos que 48.350 quilogramas de ouro.

Depois de meio século de excepcional sucesso financeiro, a empresa entrava em liquidação e a St.
John d'El Rey parecia ter chegado ao fim do caminho.

No início de dezembro, parecia claro que a mina seria uma perda total e a escavação teria que ser
abandonada. Em Londres, diretores e acionistas começaram a debater o futuro da empresa. Duas
opções foram analisadas. A empresa poderia ser dissolvida e as contas com os credores liquidadas,
ou a administração e os acionistas poderiam se manter firmes como haviam feito na década de 1830,
enquanto encontravam outra mina promissora para trabalhar." (Eakin, 1989)

A Figura 34 mostra uma vista em planta das instalações de superfície da Mina de Morro Velho em
1886, ano do acidente que paralisou as atividades de mineração.

Existem alguns pontos de referência que ajudam o leitor a identificar o antigo local das instalações.
O principal deles é o Ribeirão do Cardoso que corre de oeste para leste e conserva o mesmo traçado
naquele local até hoje. A localização da Casa Grande é a mesma desde o tempo do Padre Freitas.
Além desses dois referenciais temos a localização dos bairros da Boa Vista e do Mingu e do Cemitério
dos Ingleses.

A posição de cada roda d’água é mostrada com um ícone próprio.

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A figura mostra o local do desmoronamento (Mine Crush) e a posição do fundo da mina em
novembro de 1886 (Bottom of Mine). Ela mostra também a localização dos shafts A e B e de um
terceiro shaft na mina de Quebra Panella.

Um túnel liga a saída da mina com o pátio de fragmentação (Spalling Floor).

Os cursos d’água estão na cor verde. Eles movimentam as rodas d’água responsáveis por acionar os
equipamentos de mineração. Essa era a única fonte de energia utilizada naquela época.

Nas instalações da "Praia" é fácil constatar que, após acionar as duas rodas d’água que
movimentavam os britadores, a água segue para o Ribeirão do Cardoso. Isso ocorre em todas as
demais rodas d’água, mas no caso da "Praia" é mais fácil de ser observado.

Há sete rodas d’água movimentando os britadores no enorme galpão denominado "Stamps" e dois
britadores na "Praia". Há uma roda d’água para bombeamento no shaft da Mina de Quebra Panella
(G.P. Pumping Wheel), uma para revolver os barris na Casa de Amalgamação (Amalgamation House),
uma na serralheria (Saw Mill), uma na oficina mecânica de ajustagem (Fitting Store), uma para
bombeamento d’água no Shaft A, uma para abaixar e suspender a gaiola nos Shaft A e B (Hauling
Wheel) e uma roda d’água para suspender e abaixar baldes de grande capacidade denominados
"balers" (Baling Wheel).

A figura mostra também uma ferrovia ligando as instalações da "Praia" ao galpão de britadores (Praia
Tramroad).

O bicame mostrado na planta é o antigo bicame do qual não existem mais vestígios. Ele servia para
levar até as instalações de superfície a água do Rego Grande (Cristais Rego) em um trecho que foi
desativado.

A Figura 35 mostra um cubo representando o volume correspondente às 46,55 toneladas de ouro


extraídas da Mina Velha até 1883, três anos antes do desabamento. Desde o começo das operações
em 1834 até o fim de 1886, durante as duas primeiras fases dos trabalhos, a mina de Morro Velho
produziu 58.344 kg de ouro, correpondentes a um valor de £5.215.000 (libras esterlinas), sendo a
produção média, durante esse período de 52 anos, de 1.115 kg por ano, 93 kg por mês e 3 kg por
dia. Essa produção foi realizada com um minério cuja recuperação ficou na faixa de 10 a 20 gramas
de ouro por tonelada.

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Figura 34 - Instalações de superfície da Mina de Morro Velho - 1868

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Figura 35 - Cubo representando a quantidade de ouro extraída da Mina Velha até 1883

Este cubo representa 46,55 toneladas ou £5,178,657 (libras esterlinas) de ouro extraído da Mina
Velha, dispendendo-se no Brasil com a sua extração £3,502,893 (libras esterlinas).

As tabelas seguintes foram extraídas do trabalho de Douglas Libby e os gráficos utilizaram as


informações destas tabelas.

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Tabela 13 - Vendas de ouro (£): 1838 – 1885

Ano Vendas de ouro, £ Ano Vendas de ouro, £


Londres Rio de Janeiro Total Londres Rio de Janeiro Total
1838 18.039 - 18.039 1862 108.833 106.430 215.263
1839 21.514 - 21.514 1863 - 189.344 189.344
1840 26.042 - 26.042 1864 14.276 83.860 98.136
1841 24.828 - 24.828 1865 204.717 - 204.717
1842 32.622 - 32.622 1866 243.923 - 243.923
1843 45.923 - 45.923 1867 164.751 - 164.751
1844 44.853 - 44.853 1868 52.121 - 52.121
1845 42.201 - 42.201 1869 52.746 - 52.746
1846 57.832 - 57.832 1870 47.821 - 47.821
1847 66.345 - 66.345 1871 51.856 - 51.856
1848 66.403 - 66.403 1872 9.879 - 9.879
1849 98.309 - 98.309 1873 30.590 - 30.590
1850 101.340 - 101.340 1874 144.076 - 144.076
1851 40.486 79.197 119.683 1875 247.820 - 247.820
1852 40.287 88.672 128.959 1876 176.580 - 176.580
1853 - 136.867 136.867 1877 194.538 - 194.538
1854 42.866 90.106 132.972 1878 168.583 - 168.583
1855 - 126.313 126.313 1879 156.802 - 156.802
1856 - 112.717 112.717 1880 103.568 - 103.568
1857 53.354 43.824 97.178 1881 120.984 - 120.984
1858 89.555 17.421 106.976 1882 98.235 - 98.235
1859 119.418 19.231 138.649 1883 90.064 - 90.064
1860 166.321 - 166.321 1884 99.806 - 99.806
1861 212.813 - 212.813 1885 102.853 - 102.853

As vendas de ouro no período 1838 – 1885 totalizaram £5.190.755. Este valor difere ligeiramente do
valor mostrado da Figura 35.

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Tabela 14 - Preço médio (£/libra troy) das vendas de ouro: 1838 – 1878

Ano Preço Médio £/libra troy Ano Preço Médio £/libra troy
Londres Rio de Janeiro Londres Rio de Janeiro
1838 £ 35.15s.10d 1859 t 40. 5s. 3d £ 39. 6s. 6d
1839 £ 38.11s. 0d 1860 £ 40.12s. 5d
1840 £ 38. 9s. 2d 1861 £ 40.18s. 2d
1841 £ 38.12s. 4d 1862 £ 40.19s. 9d £41.15s. 7d
1842 £ 39. 3s.11d 1863 £ 41.11s. 7d
1843 £ 39.15s. 4d 1864 £ 40.19s. 7d £ 41.16s. 6d
1844 £ 39. 0s. 5d 1865 £41. 0s. 1d
1845 £ 39. 1s. 6d 1866 £ 40.19s. 8d
1846 £ 38.12s. 5d 1867 £40.18s. 3d
1847 £ 39. 6s. 4d 1868 £ 40.12s. 7d
1848 £ 39.13s.11d 1869 £ 40.10s. 6d
1849 £ 39.18s. 0d 1870 £42. 0s. 1d
1850 £ 39.16s. 7d 1871 £ 43. 0s. 0d
1851 £ 39.18s. 3d £ 40.14s. 2d 1872 £40.18s. 3d
1852 £ 39.18s. 0d £ 39.18s. 8d 1873 £ 39.17s.11d
1853 £ 40. 4s. 5d 1874 £ 41.15s. 5d
1854 £ 40. 0s. 4d £39.19s. 5d 1875 £42. 1s.10d
1855 £ 39.12s.10d 1876 £ 42. 0s.11d
1856 £40. 4s. 1d 1877 £ 42. 0s. 5d
1857 £ 39.14s. 4d £ 40.10s. 6d 1878 £ 41.15s. 9d
1858 £ 39.17s. 0d £ 39.12s. 0d

20 s = £ 1; 12 d = 1 s

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Tabela 15 - Produção de minério (t) e ouro (kg): 1835 – 1885

Ano Produção Ano Produção


Minério (t) Ouro (kg) Minério (t) Ouro (kg)
1835 - 98 1861 96.612 1.949
1836 - 100 1862 90.869 1.898
1837 9.262 150 1863 84.758 1.707
1838 15.769 217 1864 65.435 888
1839 17.898 229 1865 78.883 1.872
1840 20.809 276 1866 107.087 2.231
1841 21.015 254 1867 98.905 1.501
1842 23.538 333 1868 50.545 471
1843 24.580 457 1869 51.861 484
1844 27.552 446 1870 46.901 426
1845 29.815 461 1871 52.670 450
1846 38.366 554 1872 15.028 88
1847 40.859 629 1873 8.664 276
1848 61.672 825 1874 38.321 1.296
1849 67.336 970 1875 65.103 2.211
1850 67.106 999 1876 65.883 1.577
1851 79.810 1.163 1877 67.915 1.742
1852 82.642 1.269 1878 69.954 1.503
1853 86.866 1.336 1879 62.681 1.368
1854 86.433 1.307 1880 46.164 894
1855 86.848 1.241 1881 67.463 1.071
1856 89.877 1.102 1882 72.496 838
1857 86.407 937 1883 69.254 713
1858 88.901 1.024 1884 61.230 812
1859 88.968 1.302 1885 59.886 868
1860 91.361 1.535

No período 1835 – 1885 a quantidade de minério extraída totalizou 2.928.258 toneladas e a


produção de ouro totalizou 48.351 quilogramas, com um rendimento médio de 16,5 gramas de ouro
por tonelada de minério..

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Tabela 16 - Teor aurífero (gramas/tonelada): 1837 -1885

Teor aurífero Teor aurífero


Ano Ano
g/t g/t
1837 16 1862 20
1838 14 1863 21
1839 14 1864 20
1840 13 1865 14
1841 12 1866 24
1842 14 1867 21
1843 18 1868 9
1844 16 1869 9
1845 15 1870 9
1846 14 1871 8
1847 15 1872 6
1848 13 1873 32
1849 14 1874 34
1850 15 1875 34
1851 14 1876 24
1852 15 1877 26
1853 15 1878 21
1854 15 1879 22
1855 14 1880 19
1856 12 1881 16
1857 11 1882 12
1858 11 1883 10
1859 14 1884 11
1860 17 1885 15
1861 18

O valor médio ponderado do período 1837 – 1885 foi 18 gramas / tonelada.

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Tabela 17 - Lucros/Prejuízos (£) e dividendos (£)

Ano £ Ano £
Resultado Dividendos Resultado Dividendos
1835 0 0 1861 96.796 60.500
1836 0 0 1862 87.531 93.500
1837 0 0 1863 63.285 71.500
1838 2.783 0 1864 -14.629 27.500
1839 -354 0 1865 80.438 11.000
1840 3.104 0 1866 109.407 88.000
1841 82 0 1867 42.243 96.250
1842 11.638 2.750 1868 -10.931 0
1843 19.831 13.750 1869 878 0
1844 14.966 16.500 1870 -5.024 0
1845 11.693 9.652 1871 -8.886 0
1846 13.318 11.000 1872 -7.837 0
1847 20.876 12.375 1873 7.516 0
1848 33.330 16.500 1874 83.241 25.300
1849 38.135 27.500 1875 163.567 113.850
1850 35.879 33.000 1876 95.890 113.850
1851 51.585 33.000 1877 103.574 88.550
1852 55.390 44.000 1878 78.459 82.225
1853 49.273 44.000 1879 63.001 63.250
1854 44.470 44.000 1880 15.734 43.275
1855 34.466 44.000 1881 30.782 12.650
1856 23.233 27.500 1882 2.515 12.650
1857 768 11.000 1883 -7.845 0
1858 8.544 0 1884 9.051 0
1859 38.085 15.125 1885 17.238 0
1860 60.460 44.000

No período 1835 – 1885 a St. John apresentou um lucro líquido acumulado de £1.667.549 e distribuiu
£1.453.502 em dividendos, correspondentes a 87% do lucro líquido.

Página | 120
Tabela 18 - Custos operacionais e de mão de obra (£)

Custos (£) Custos (£)


Ano Ano
Operacionais Mão de obra Operacionais Mão de obra
1838 7.890 5.092 1862 121.781 78.663
1839 10.949 6.914 1863 126.058 87.318
1840 - - 1864 112.765 74.755
1841 24.571 12.998 1865 124.278 85.798
1842 23.598 13.893 1866 134.516 87.917
1843 26.181 16.004 1867 116.607 73.366
1844 30.148 17.569 1868 59.314 43.254
1845 34.666 18.983 1869 45.224 36.334
1846 40.215 24.109 1870 52.846 38.936
1847 41.144 22.065 1871 58.688 41.345
1848 48.333 26.061 1872 16.858 11.708
1849 60.494 28.940 1873 31.166 23.507
1850 65.461 32.089 1874 63.634 38.892
1851 68.098 37.676 1875 84.253 44.918
1852 73.569 39.369 1876 80.690 46.898
1853 87.594 47.006 1877 90.959 54.575
1854 88.232 50.586 1878 88.990 51.924
1855 91.847 55.562 1879 89.717 54.955
1856 89.484 54.974 1880 83.932 53.217
1857 96.391 57.436 1881 88.588 55.083
1858 99.608 54.973 1882 90.032 57.051
1859 100.564 55.652 1883 86.055 56.112
1860 105.861 58.903 1884 79.824 48.934
1861 116.044 70.026 1885 77.821 49.404

No período 1838 – 1885 a St. John incorreu em um custo operacional acumulado de £3.435.538,
dos quais £2.101.744 referem-se à mão de obra, isto é, 61% do total.

Página | 121
2.500 300000
Período de reabertura
após incêndio e desabamento
Produção de ouro, kg da mina em 21 Nov 1867 Vendas de ouro, £
250000
2.000

200000

1.500

150000

1.000

100000

500
50000

- 0
1835
1836
1837
1838
1839
1840
1841
1842
1843
1844
1845
1846
1847
1848
1849
1850
1851
1852
1853
1854
1855
1856
1857
1858
1859
1860
1861
1862
1863
1864
1865
1866
1867
1868
1869
1870
1871
1872
1873
1874
1875
1876
1877
1878
1879
1880
1881
1882
1883
1884
1885
Receitas, £ (escala direita) Produção de Ouro, kg (escala esquerda)

Figura 36 - Receitas com as vendas (£) e produção de ouro (kg) 1835 - 1885

Página | 122
2.500 40

Período de reabertura

Produção de ouro, kg
após incêndio e desabamento Teor aurífero, g/t
da mina em 21 Nov 1867 35

2.000

30

Média do período: 18 gramas/tonelada


25
1.500

20

1.000
15

10

500

0 0
1835
1836
1837
1838
1839
1840
1841
1842
1843
1844
1845
1846
1847
1848
1849
1850
1851
1852
1853
1854
1855
1856
1857
1858
1859
1860
1861
1862
1863
1864
1865
1866
1867
1868
1869
1870
1871
1872
1873
1874
1875
1876
1877
1878
1879
1880
1881
1882
1883
1884
1885
Teor aurífero, g/t (escala direita) Produção de Ouro, kg (escala esquerda)

Figura 37 - Produção ouro (kg) e teor aurífero do minério (%)

Página | 123
Percentagem de retorno sobre a ação
90

80

70
Reabertura após
incêndio e
60
desabamento
em 21 Nov 1867
50

40

30

20

10

0
1830
1831
1832
1833
1834
1835
1836
1837
1838
1839
1840
1841
1842
1843
1844
1845
1846
1847
1848
1849
1850
1851
1852
1853
1854
1855
1856
1857
1858
1859
1860
1861
1862
1863
1864
1865
1866
1867
1868
1869
1870
1871
1872
1873
1874
1875
1876
1877
1878
1879
1880
1881
1882
1883
1884
1885
1886
1887
Figura 38 - Dividendos pagos pela St. John 1830 – 1887

No período 1830 – 1885 os pagamentos de dividendos aos acionistas da St. John foram irregulares, mas os dividendos totalizaram £1.453.502, enquanto o
capital investido nas ações da companhia neste mesmo período totalizava £223.000.

Página | 124
2.500 120.000
Período de reabertura
após incêndio e
Produção de ouro, kg desabamento da mina Dividendos, £
em 21 Nov 1867 100.000
2.000

80.000

1.500

60.000

1.000

40.000

500
20.000

0 -
1835
1836
1837
1838
1839
1840
1841
1842
1843
1844
1845
1846
1847
1848
1849
1850
1851
1852
1853
1854
1855
1856
1857
1858
1859
1860
1861
1862
1863
1864
1865
1866
1867
1868
1869
1870
1871
1872
1873
1874
1875
1876
1877
1878
1879
1880
1881
1882
1883
1884
1885
Dividendos, £ (escala direita) Produção de Ouro, kg (escala esquerda)

Figura 39 - Produção de ouro (kg) e distribuição de dividendos (£) 1835 – 1885

Página | 125
180.000 2.500

160.000

Lucro/Prejuízo, £ Periodo de reabertura Produção de ouro, kg


140.000 após incêndio e
2.000
desabamento da mina
120.000
em 21 Nov 1867

100.000
1.500

80.000

60.000

1.000
40.000

20.000

500
0

-20.000

-40.000 0
1838
1839
1840
1841
1842
1843
1844
1845
1846
1847
1848
1849
1850
1851
1852
1853
1854
1855
1856
1857
1858
1859
1860
1861
1862
1863
1864
1865
1866
1867
1868
1869
1870
1871
1872
1873
1874
1875
1876
1877
1878
1879
1880
1881
1882
1883
1884
1885
Lucro, £ Prejuízo, £ Produção de ouro, kg

Figura 40 - Produção de ouro (kg) e lucros e perdas (£) 1838 – 1885

Página | 126
2500 120.000
Período de reabertura
Produção de ouro, kg após incêndio e desabamento
Minério extraído, toneladas
da mina em 21 Nov 1867

100.000
2000

80.000

1500

60.000

1000

40.000

500
20.000

0 0
1835
1836
1837
1838
1839
1840
1841
1842
1843
1844
1845
1846
1847
1848
1849
1850
1851
1852
1853
1854
1855
1856
1857
1858
1859
1860
1861
1862
1863
1864
1865
1866
1867
1868
1869
1870
1871
1872
1873
1874
1875
1876
1877
1878
1879
1880
1881
1882
1883
1884
1885
Toneladas de minério extraído (escala direita) Produção de Ouro, kg (escala esquerda)

Figura 41 - Produção de ouro (kg) e minério extraído (t) 1835 – 1885

Página | 127
Período de reabertura 1868-1874
Custo unitário, £/t
após incêndio e desabamento
4,00 da mina em 21 Nov 1867

3,50

3,00

2,50

2,00

1,50

1,00

0,50

-
1838
1839
1840
1841
1842
1843
1844
1845
1846
1847
1848
1849
1850
1851
1852
1853
1854
1855
1856
1857
1858
1859
1860
1861
1862
1863
1864
1865
1866
1867
1868
1869
1870
1871
1872
1873
1874
1875
1876
1877
1878
1879
1880
1881
1882
1883
1884
1885
Figura 42 - Custo unitário, £/t, libra esterlina por tonelada de minério produzido

Página | 128
120.000

110.000
Período de reabertura
após incêndio e
desabamento da mina
100.000
em 21 Nov 1867

90.000

80.000

70.000

60.000

50.000

40.000

30.000

20.000

10.000

-
1837 1839 1841 1843 1845 1847 1849 1851 1853 1855 1857 1859 1861 1863 1865 1867 1869 1871 1873 1875 1877 1879 1881 1883 1885

Minério extraído, t Minério britado, t

Figura 43 - Quantidades em toneladas de minério extraído e britado 1837 - 1885

Página | 129
Libby fez os seguintes comentários sobre o desempenho da Mina Velha. O período que ele analisou
vai de 1835 a 1885.

Produção de minério (Figura 41)

"O aumento da produção de minério bruto é quase contínuo de 1837 a 1862, quando começa uma
queda que culmina no desastroso ano de 1864. A queda talvez seja explicada pela prática, instituída
pelo superintendente da época (Gordon), de selecionar, já dentro das galerias, o minério mais rico
em aparência. O problema com tal prática é que, a médio prazo, as colunas de minério menos rico
deixadas pelos broqueiros acabam obstruindo as novas escavações. Este tornou-se um sério
problema depois que aquele superintendente foi afastado da administração da mina em 1876.

No entanto, a instituição da prática é compreensível quando examinamos a produção de ouro de


1855 a 1859. Neste período, a despeito do suprimento mais ou menos estável de minério bruto, a
produção de ouro caiu sensivelmente pela simples razão de que o teor do minério estava diminuindo
(Figura 37). O mesmo fenômeno verifica-se em 1882, quando a produção de minério bruto de fato
aumenta, mas a produção de ouro cai.

De qualquer maneira, recuperando-se dos estragos de 1864, a Mina consegue aumentar


apreciavelmente a produção, tanto de minério bruto quanto de ouro em 1865, e no ano seguinte
atinge-se o auge de todo o período imperial, com a produção de 107.087 toneladas de minério bruto
e 2.231 quilogramas de ouro.

O ano de 1867 é também marcado pelo sucesso, mas os próximos sete anos são de resultados
produtivos péssimos, devido ao desastre daquele ano. A recuperação em 1874 e 1875 é espetacular,
mas um tanto efêmera, já que a produção de ouro entra em declínio em 1877 sem que haja melhora
sensível antes do desastre de 1886.

De modo geral, podemos afirmar, então, que as primeiras duas décadas de operação da Mina são
marcadas por constante melhora do quadro produtivo, enquanto as últimas três décadas, com auges
e colapsos produtivos, testemunham a volatilidade característica da mineração aurífera da época.

Deveria estar claro que as causas das quedas da produtividade da Mina são quase sempre internas.
Os desastres resultam da oposição da natureza às tentativas do homem de explorá-la e da
incapacidade humana de proteger-se contra a natureza. O fenômeno natural da diminuição do teor
de ouro dos filões, embora menos dramático do que os desastres, também teve seus efeitos nocivos
nos balancetes da Companhia.

Teor de ouro do minério (Figura 37)

A média do teor de ouro para os anos 1837-1885 era de 18 gramas por tonelada de minério extraído,
mas vê-se na Figura 37 que o teor flutuava bastante durante o período. Em geral, a produção era
suficiente para declarar dividendos somente quando o teor de ouro se fixava acima de 14,0 gramas
por tonelada. Dentre os anos de em que o teor está acima de 14,0 gramas por tonelada, mas não há
dividendos, destacam-se 1837 e 1873 em que a produção é limitadíssima, e no último (1873) ocorre
ainda uma rigorosa seleção do minério, enquanto que em 1865 e 1881 os dividendos são cancelados
durante apenas um semestre.

Página | 130
No ano de 1885 ter-se-ia iniciado uma recuperação, não fosse o desastre então ocorrido no ano
seguinte. Em 1848 e 1856 há lucros e dividendos, apesar do baixo teor do minério, mostrando que
as operações são suficientemente bem-organizadas para superar o fenômeno, quando ele não é
combinado com outros problemas causados por desastres ou falta de mão-de-obra.

A média de 18 gramas de ouro por tonelada significa que a Mina de Morro Velho operava perto da
sua margem econômica, dado o nível da tecnologia de mineração da época.

É difícil estabelecer a margem operacional das minas brasileiras do século XIX, mas sabe-se que a
Brazilian Company (1832-1844) não contemplou a reabertura da Mina de Cata Branca depois do
desabamento de 1844 porque o teor de ouro havia diminuído de 14,6 a 7,1 gramas por tonelada de
minério extraído.

A Anglo-Brazilian (1863-1873) sofreu prejuízos de £27.167 em nove anos de operação com uma
média de teor de ouro de 7,2 gramas por tonelada, enquanto a Don Pedro North d'El Rey, no final
da sua primeira fase de operação (1862-1878), não conseguiu superar as dificuldades criadas pela
entrada de água nas escavações porque o teor de ouro havia caído para 15,0 gramas por tonelada.

No entanto, a Santa Bárbara Gold Mining Company normalmente realizou bons lucros trabalhando
a Mina de Pari, cujo rendimento por tonelada de minério tratado de 1885 a 1893 era de apenas 10,4
gramas de ouro.

É evidente que a margem operacional de cada mina seria determinada pela facilidade de extração e
tratamento do minério, além de seu teor de ouro. No caso da Mina de Morro Velho, sua grande
profundidade e extensão e as resultantes dificuldades de transportar o minério certamente
tenderiam a elevar a margem operacional em termos do teor aurífero a um nível acima da média
dos empreendimentos de mineração do século XIX.

De qual quer forma, é claro que as operações de extração e redução tiveram de ser extremamente
bem-organizadas para que a St. John realizasse os altos lucros de que desfrutaram seus acionistas.

Lucros e prejuízos

Não é de surpreender que os lucros da St. John acompanhem nitidamente a flutuação da produção
de ouro, como se pode verificar examinando a Figura 41. O que nos parece admirável é que, a
despeito das enormes dificuldades enfrentadas nos períodos de pós-desastre, apenas sete anos são
deficitários de 1837 a 1885.

Que os lucros não são inflacionados por especulação na venda de ouro é demonstrado pelo fato de
que as receitas de venda do produto também seguem nitidamente a flutuação da sua produção,
como se verifica na Figura 36. No caso, os elevados lucros de 1875 são apenas parcialmente
explicados pelo preço relativamente alto (£42.1s.10d), obtido nas vendas em Londres, e será
necessário examinar com atenção os custos operacionais desse ano (£1,29/t).

O que mais impressiona são os dividendos altos e de relativa continuidade. Nota-se que os
dividendos ocasionalmente superam a soma dos lucros durante o ano. O aparente paradoxo é
explicado pelo fato de que a declaração do dividendo do primeiro semestre de cada ano baseava-
se na produção dos últimos seis meses do ano anterior. Quando a produção continuava em declínio
agudo os dividendos eram suspensos no segundo semestre.

Página | 131
Voltando a destacar que a alta rentabilidade da St. John não se deve à especulação na venda de
ouro, verificamos que o ouro produzido no Brasil era vendido todo ano ou no mercado de Londres
ou no mercado do Rio de Janeiro. O preço médio pago por uma libra no período 1841-1885 variou
de £39 a £42,5, registrando uma média para estes 45 anos de aproximadamente £41.

Embora houvesse ligeira tendência à elevação do preço da libra troy, de modo que este preço se fixa
um pouco acima de £42 na última década do nosso período, não se pode discernir qualquer aumento
definitivo dos lucros através de mecanismos da venda no mercado mundial. O peso troy é a medida
usada ao pesar metais e pedras preciosas. A libra troy equivale a aproximadamente 374 gramas.

De fato, as pequenas variações de preço pago pelo ouro proveniente de Morro Velho parecem antes
resultar das variações no teor do próprio ouro, isto é, seu peso em quilates puros, enquanto o preço
mundial se manteve extremamente estável se se observar estarmos examinando um período de 45
anos.

O ouro como mercadoria já se encontrava altamente integrado no mercado mundial e as diferenças


em seu preço de país a país eram geralmente mínimas. Dos oito anos em que o ouro foi vendido
tanto em Londres quanto no Rio de Janeiro, três anos registraram um preço médio pago no Rio
abaixo do preço pago em Londres. Com a exceção de 1864, quando o preço pago no Rio é quase
£0,85 superior ao preço pago em Londres, as diferenças no preço pago por libra troy na Inglaterra e
no Brasil nunca passaram de £0,20.

Esta singular estabilidade do preço mundial de ouro no decorrer dos 45 anos sob consideração é
especialmente surpreendente quando lembramos que a produção aurífera mundial sofre um enorme
aumento a partir do fim da década de 1840.

Se a oferta do metal cresce rapidamente, no entanto, podemos verificar que a procura mundial
efetivamente acompanha o aumento da oferta. Da década de 1830 à década de 1870, quase todas
as grandes potências econômicas abandonaram o padrão-prata para adotar o padrão-ouro (Grã-
Bretanha, Alemanha) ou o padrão bimetal de ouro e prata (França, EUA).

As elevadas cunhagens de ouro realizadas no Brasil na década de 1850 eram decorrentes do


estabelecimento do padrão-ouro pelo governo imperial. As consequências da adoção plena ou
parcial do padrão-ouro pelos países mais avançados economicamente foram a manutenção, ou até
a ligeira alta, do preço do ouro e a queda do preço da prata, cuja produção mundial também sofrera
grandes aumentos na segunda metade do século XIX.

Tabela 19 - Composição do capital da St. John

Data Emissões Total ações nominais Total ações subscritas


1830 - 1831 5.000 ações a £10 cada 50.000 37.387
1834 6.000 ações a £5 cada 80.000 57.500
1834 - 1842 £5 prestações sobre as 11.000 acima 135.000 98.398
1856 - 1871 Ofertas adicionais alcançando £70.812 205.812 176.978
1872 Ofertas adicionais alcançando 220.000 190.000
1874 Ofertas adicionais alcançando 253.000 223.000

Página | 132
Dividendos (Figura 38 e Figura 39)

Para examinar os rendimentos que os dividendos da St. John representavam é preciso rever
detalhadamente a história da montagem do capital nominal da Companhia (Tabela 20).

O capital original da Companhia foi levantado em três parcelas, sendo que a primeira montou, por
subscrições sobre 5.000 ações, a £50.000 em 1831 e 1832.

A segunda parcela de subscrições sobre 6.000 novas ações realizou £30.000 em 1834 e, finalmente,
de 1834 a 1842, subscrições sobre estas 11.000 ações originais levantaram £55.000 adicionais.

Portanto, de 1842 (ano do primeiro dividendo) a 1856, o capital nominal da Companhia totalizava
£135.000. Durante este período, os lucros somaram £458.398 e em 1848 os lucros cumulativos
alcançaram £136.000, ultrapassando os investimentos originais em apenas sete anos.

No mesmo período de 1842 a 1856, são pagos dividendos de £401.500, tendo os dividendos
cumulativos ultrapassado os investimentos originais no segundo semestre de 1850, quando
totalizaram £143.000.

O rendimento médio anual sobre o capital nominal neste período foi de 20%. A partir de 1856, e
seguindo até 1872, várias transferências sucessivas de um fundo de reserva à conta de capital são
realizadas, elevando o capital nominal para £220.000. Essas transferências visavam a aquisição de
novas propriedades e o financiamento das obras exigidas pela recuperação de Morro Velho depois
do desastre de 1867.

O rendimento anual médio variou de 0% a 54% durante o período, com a taxa média do período
fixando-se em 17%, apesar dos nove anos sem dividendos.

Em 1874, 1.650 novas ações são lançadas ao preço de £20,0 cada, aumentando o capital nominal
para £253.000. Nos últimos onze anos de operação, a taxa média de rendimento anual era de 18%,
a mesma de todo o período imperial, o que representa uma notável lucratividade.

Dada a combinação de um teor de ouro relativamente baixo com as dificuldades inerentes à


exploração da profunda e extensa mina de Morro Velho, tais lucros só poderiam ser realizados sob
um regime de rígido controle dos custos operacionais, o que, no caso, implica complexa organização
da força de trabalho.

Custos

Ao examinar a Tabela 18 podemos verificar que a exploração da Mina de Morro Velho envolvia
custos altos, ou seja, o valor destes é quase sempre mais alto do que o valor dos lucros líquidos
realizados. Em outras palavras, o percentual do lucro bruto realizado pela venda do ouro que deve
reverter para cobrir os gastos produtivos é geralmente maior do que o percentual que pode ser
convertido em dividendos ou em investimentos de capital.

Custo por tonelada de minério

A Figura 42 nos mostra os custos por tonelada de minério bruto extraído da Mina. Nota-se a
tendência destes custos a aumentarem a partir de 1856, geralmente fixando-se acima de £1,18,
média do período todo.

Página | 133
A expansão das operações da década de 1850 aumentou a produção de minério, mas é provável
que a escala de operações resultante tenha exigido maiores despesas por tonelada, a não ser nos
anos de crise, quando os custos são propositalmente reduzidos.

O ano de 1873, com sua baixíssima produção de minério, registrou custos de £3,59 por tonelada,
fugindo totalmente dos demais valores mostrados no gráfico e demonstrando que os esforços da
Companhia estavam concentrados nas obras de reabertura da Mina, deixando a produção de lado.

Por outro lado, os baixos custos por tonelada do ano de 1848 revelam, em parte, como a Companhia
foi capaz de realizar lucros extraindo minério bruto de teor aurífero diminuto.

Custos da mão de obra

Especialmente significativas são as extrapolações que podem ser feitas a partir do exame da Tabela
19. Ela demonstra claramente que a St. John d’El Rey era uma empresa altamente intensiva em mão-
de-obra. Em média, 60% das despesas de Morro Velho eram compostas de pagamentos salariais ou
custos de manutenção da força escrava.

Durante apenas dois anos, 1849 e 1850, os custos de mão-de-obra constituíram menos de 50% das
despesas globais (47,8% e 49,0%, respectivamente), enquanto durante cinco anos este percentual
fixa-se acima de 70,0%.

Os custos de mão-de-obra incluem os ordenados dos operários e do pessoal administrativo europeu,


os salários pagos aos trabalhadores livres brasileiros, o aluguel de escravos, recompensas e
pagamento de horas extraordinárias dos escravos e as despesas com as provisões alimentícias
destinadas à manutenção dos escravos alugados e dos escravos da própria Companhia.

Esta comparação com as despesas globais serve para sublinhar a grande dependência da St. John
relativamente à sua força de trabalho. As demais despesas incluíram materiais de produção, carreto
e transporte marítimo de bens importados da Inglaterra, passagens de viagens transatlânticas para
empregados europeus, gastos de compra e de manutenção de animais, impostos e taxas
alfandegárias e seguros.

A implantação de uma via férrea facilitou o transporte do minério para a superfície. A via férrea, com
suas caçambas e uma máquina rebocadora movida a vapor, representou uma considerável economia
nas operações, porque substituiu um sarilho movido a cavalo e as mulas que carregavam o minério
antes.

Este sistema de transporte representou um importante investimento de capital, que seria repetido
várias vezes durante o período de análise (1835 – 1885). É de se supor que a máquina rebocadora
da via férrea tenha sido importada da Inglaterra, enquanto as caçambas e os trilhos tenham sido
fabricados no local, de componentes originários da região e da Inglaterra.

O investimento com a via férrea efetuou uma redução nos gastos com animais, que em 1838
constituíam 3,6% dos custos globais, enquanto em 1842 constituíam apenas 0,7%. Ao mesmo tempo,
a instalação da via férrea liberou para funções mais produtivas vários trabalhadores que antes
manejavam os animais.

A eficiência da organização das operações obtida nos anos de 1847 e 1848 revelou à administração
da Mina a importância cardeal do fator mão­de-obra para o sucesso continuado.

Página | 134
O capitão de minas acaba deduzindo que um aumento na força do trabalho teria o efeito de elevar
a produção, enquanto as despesas não subiriam proporcionalmente, provocando um aumento dos
lucros. "Quanto maior for a força de trabalho, maiores em proporção serão os lucros, pois uma adição
ao número de broqueiros não aumenta as despesas fixas. Cada broqueiro adicional à média dos
existentes em 1847 produzirá um lucro de cerca de £15,0 por mês."

A Tabela 19 também nos mostra a quase total dependência da Companhia relativamente à sua mão-
de-obra nas épocas de crise aguda. No período entre 1868 e 1873, quando a produção estava
praticamente paralisada e as obras de recuperação prosseguindo lentamente, o percentual das
despesas com mão-de-obra em relação aos custos globais registrava-se entre 69,4% e 80,3%.

Podemos afirmar, então, que neste período, mesmo diminuindo drasticamente os custos globais,
inclusive reduzindo substancialmente o número de trabalhadores, a Companhia depende ainda mais
da mão-de-obra para efetuar a retomada da produção lucrativa.

É interessante notar aqui que, de 1872 a 1874, como medida de economia, "um número
considerável" de escravos foi alugado ao governo provincial e utilizado na construção de estradas.
Esta medida teve o duplo efeito de economizar nas despesas, já que o pagamento de aluguel pelo
Tesouro provincial foi creditado à conta de receitas de Morro Velho, e, ao mesmo tempo, de manter
vários escravos sob o controle nominal da Companhia, pois parece certo que alguns dos escravos
alugados à província já eram alugados pela St. John.

Fundo de reserva

A St. John contava com um fundo especial que teve o caráter de uma reserva de emergência, que
visava proteger a empresa contra as crises inerentes à mineração, e de uma reserva de capital, que
poderia ser utilizada para investimentos de capital.

O fundo de reserva foi iniciado em 1849, com uma apropriação especial de £10.000, e
subsequentemente foram adicionados 10% do valor da soma dos dividendos declarados em cada
semestre.

Praticamente o fundo inteiro foi investido no desenvolvimento ferroviário inglês da época, um tipo
de investimento seguro e de razoável rendimento.

O investimento cumulativo neste fundo somou £126.400, sendo que £89.870 foram utilizados para
custear várias obras de recuperação e para a aquisição de duas outras propriedades de mineração,
a Fazenda de Fernão Paes e a Mina de Cuiabá.

O estabelecimento deste fundo de reserva nos parece uma medida muito sensata para um
empreendimento de mineração e uma indicação da racionalidade capitalista que permeava a
empresa St. John, já que ele demonstra uma capacidade de planejamento a médio prazo,
característica de empresas modernas." (Libby, 1984)

Página | 135
A Mina Grande
Este capítulo contém passagens do livro "British Enterprise in Brazil" de Marshall C. Eakin.

A Mina Grande pode ser considerada como a mina de George Chalmers. Ela foi concebida e
materializada por ele.

Após o acidente de 11 de novembro de 1886 a economia na área de influência de Morro Velho


mergulhou em forte recessão. Depois de avaliar cuidadosamente a situação, Chalmers decidiu reabrir
a mina pela segunda vez em menos de 20 anos.

"Chalmers começou a argumentar em suas cartas a Londres que o velho corpo de minério tinha
ainda anos de vida pela frente, apesar de estar sendo trabalhado há 50 anos, de a produção ter
diminuído na década anterior e de ter experimentado 2 esmagamentos em 20 anos.

Chalmers propôs um plano para perfurar dois novos shafts paralelos para alcançar o corpo de
minério a jusante, mais a leste e abaixo da parte desmoronada. Dessa vez, os shafts seriam cavados
ao norte do antigo corpo de minério e todas as principais vias de tráfego ficariam em uma rocha
sólida longe das instalações. Esses shafts, rotulados como C e D, teriam 4 metros de diâmetro e
alcançariam o corpo de minério a uma profundidade de 700 metros abaixo da superfície,
profundidade esta inédita para mineração no Século XIX. A ideia de Chalmers foi achincalhada e
menosprezada na Inglaterra, tanto por parte de especialistas em mineração quanto de acionistas.

Destemido, Chalmers elaborou apressadamente planos para a "terceira" mina e correu para Londres
para apresentar sua ideia perante a diretoria. Ele argumentou que, apesar da profundidade dos
novos shafts, o corpo de minério e as instalações estariam na verdade mais próximos da superfície
do que na antiga mina. As modernas máquinas de transporte reduziriam o tempo de viagem entre
os "stopes" e a entrada da mina para 2½ minutos, em oposição aos 20 minutos que eram necessários
na antiga mina. Para aqueles que argumentavam que a qualidade do minério inevitavelmente
diminuiria com profundidade, ele mostrou criteriosamente que a qualidade do minério era
consistente há mais de 50 anos e que as análises químicas das amostras de minério retiradas dos
níveis mais baixos da antiga mina antes do desabamento eram tão altas em teor de ouro quanto
aquelas retiradas nas décadas anteriores. Uma operação moderna de britagem, combinada com
shafts e túneis mais eficientes, sustentava ele, resultariam em maior produção e maior recuperação
de ouro.

A lógica de Chalmers convenceu o presidente da companhia, Frederick Tendron, e eles dois, juntos,
convenceram os demais diretores e os acionistas a segui-los nesse plano ousado.

Em julho de 1887, a St. John d’El Rey Mining Company, Limited passou por uma reorganização formal
e Chalmers retornou ao Brasil autorizado a pôr em prática seu plano. Estava em curso a reabertura
da mina que ficaria conhecida como a Mina Grande." (Eakin, 1989)

Shafts C e D
"O plano de Chalmers consistia na construção de uma mina e de um sistema de britagem
completamente novos. As antigas instalações nas encostas do Morro Velho seriam abandonadas e

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as operações deslocadas para a leste, no centro da bacia do Ribeirão do Cardoso. Chalmers planejava
afundar os shafts C e D a leste dos antigos shafts A e B, colocando-os no alto do morro do Mingu, a
leste do Morro Velho.

Esses shafts gêmeos desceriam 700 metros com o shaft C sendo utilizado para o bombeamento e o
D para o transporte. Um ádito (túnel de entrada para os shafts) cavado na direção nordeste
interceptaria os shafts na profundidade de pouco mais de 100 metros para servir como entrada e
saída de homens, materiais e minérios. A entrada para os shafts, que ficou conhecida como "boca
da mina" 16, ficaria na base do morro do Mingu, na borda nordeste da bacia, e o Ribeirão do Cardoso
correria entre o morro do Mingu e as futuras instalações de superfície. Ele planejou uma ponte de
aço para atravessar o Ribeirão do Cardoso ligando a mina aos britadores. A bacia do Ribeirão do
Cardoso serviria como o centro do novo parque industrial. O plano previa o desmonte das
instalações da antiga Mina Velha. Esse plano colocava a mina e o sistema de britagem a leste da
Casa Grande e da maioria das casas de campo inglesas. (Figura 68 e Figura 69)" (Eakin, 1989)

Chalmers contou com um grande incentivo para realizar seu plano. Em 7 de maio de 1889 a diretoria
firmou com ele um novo contrato como superintendente por 6 anos com salário anual de £1.200
por 2 anos, £1.500 pelos 2 anos seguintes e £1.800 para os 2 últimos anos, desde que o corpo de
minério fosse alcançado e a produção de ouro fosse retomada em níveis satisfatórios.

A Figura 44 mostra o progresso dos trabalhos de afundamento desses dois shafts.

O shaft C, com 3,66 metros de diâmetro, atingiu a profundidade de 663 metros e levou 2 anos e
meio para ficar pronto. Sua construção começou em 18 de setembro de 1889 e terminou em 22 de
março de 1892.

O shaft D, com 3,96 metros de diâmetro, atingiu a profundidade de 698 metros e levou 3 anos para
ficar pronto. Sua construção começou em 13 de maio de 1889 e terminou em 18 de maio de 1892.

16
A entrada do ádito penetra no morro do Mingu na extremidade norte de Nova Lima no ponto de
coordenadas N. 2.780, E. 2.510 e se estende para nordeste sob o morro do Mingu por cerca de 275
metros.

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Figura 44 - Evolução da perfuração dos shafts C e D

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Figura 45 - Estruturas no topo dos shafts C e D (headgear)

Página | 139
-
Figura 46 - Vista das instalaçoes mostrando os shafts C e D

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Aprendendo com os erros pretéritos
Ao contrário de Gordon, que afundou os shafts A e B diretamente no corpo de minério, Chalmers
perfurou os shafts C e D ao lado norte do corpo de minério, o que pode ser visualizado pela Figura
47, onde as diferentes cores representam os diferentes níveis da mina. Conforme se percebe, os
shafts C e D estão afastados do corpo de minério, ao passo que os shafts A e B mergulham no corpo
de minério. Para chegar ao corpo de minério foi construída uma galeria a partir dos shafts C e D.

Figura 47 - Vista em planta da projeção do corpo de minério

Para evitar os erros incorridos nas duas últimas minas, Chalmers projetou um novo método de
trabalhar o corpo de minério. Em cada horizonte, os mineiros penetrariam no corpo de minério de
baixo para cima (Figura 7 e Figura 48) em vez de acessá-lo de cima para baixo.

Figura 48 -"Overhand stoping"

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O minério então deslizaria para o horizonte imediatamente abaixo para ser carregado em vagões e
estes empurrados para fora da mina. A terra da superfície seria usada para preencher os buracos
feitos nas áreas trabalhadas. Esse tipo de operação "corte e aterro" reduziria a chance de
desmoronamento e evitaria o acúmulo de pressão excessiva nas rochas à medida que a mina fosse
sendo aprofundada, além de prescindir do caro sistema de escoramento usando toras de madeira.

Remoção de água
Para a retirada da água que se acumulara nas escavações superiores, foi tentada a utilização de
caçambas na parte superior não desmoronada dos shafts A e B. Entretanto, esse arranjo não
solucionou o esgotamento da água acumulada na parte inferior da mina e foram iniciadas
perfurações com o emprego, pela primeira vez no Brasil, de brocas diamantadas, a partir do nível VI,
de modo a que a água fosse canalizada para um dos shafts e dali bombeada para a superfície. Com
o esgotamento e a diminuição da pressão da coluna d'água nos níveis superiores, os trabalhos
puderam desenvolver-se de modo seguro.

E la nave va ...
Com o término dos shafts C e D ...

foi feito um corte transversal (crosscut) de 51,5 metros para o sul do shaft C no
nível VII (nível da madeira - 655 metros abaixo da superfície) até o corpo de
minério que mergulha para o leste. O corpo de minério foi então aberto para o
1892
leste e para o oeste a partir desse corte transversal. Um túnel foi então feito para
o sul até o corpo de minério no nível VIII a partir do fundo do shaft D e o corpo
de minério foi aberto neste nível.

Durante os anos seguintes, o minério foi extraído entre os níveis VII e VIII, e a
mineração foi estendida através de "raises" até o nível VI (cerca de 610 metros
abaixo da superfície). Não se extraiu minério entre o nível VI e o fundo da antiga
escavação por receio de provocar outro desastre.

Um túnel foi aberto para o leste do fundo do shaft D no nível VIII,


aproximadamente paralelo e ao norte do corpo de minério. A mineração foi
estendida 91,5 metros para baixo até o nível IX por meio de duas rampas
("winzes"). Os shafts C e D proviam o único acesso a partir da superfície às
operações subterrâneas desenvolvidas desde 1892.

Um novo shaft de transporte vertical (shaft E) foi iniciado na extremidade leste do


1897
túnel do shaft D no nível VIII.

A mineração foi estendida para baixo por meio de rampas ("winzes") aos níveis
XX, XXI e XXII (profundidade 1.042 metros ou 3.424 pés), com a exploração e a
1898 - 1902
mineração em determinados níveis, geralmente um pouco antes da perfuração
do shaft E.

Um túnel com tendência para o leste (túnel E) foi iniciado a partir do fundo do
1903
shaft E no nível XII, em direção ao início de afundamento do shaft F projetado.

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O sistema de uso de túneis de transporte ao norte do corpo de minério foi
finalmente definido após ter-se experimentado com túneis de transporte de
alvenaria através do preenchimento dos stopes nos níveis IX e X.

Os níveis XIII, XIV e XV foram colocados em produção e posteriormente


1903 - 1908
conectados com o shaft F.

1908 - 1909 O shaft F foi iniciado em 1908 e terminou no nível XVI em 1909.

O sistema de atingir com rampas ("winzes") os níveis inferiores e depois conectá-


los com shafts verticais foi continuado no afundamento da mina. Seguiu-se uma
estratégia de testar a continuidade do teor dos corpos de minério nos horizontes
inferiores por meio de rampas, enquanto eram provadas e lavradas reservas
medidas nos horizontes superiores.

Os níveis XVI, XVII e XVIII foram desenvolvidos e o shaft G foi perfurado do nível
1909 - 1915
XVI ao nível XX (profundidade 1.777 metros ou 5.826 pés).

O aprofundamento das operações passou a exigir modificações no sistema de


ventilação, de modo a reduzir a temperatura nos níveis inferiores. No início, a
ventilação natural era suficiente. Com o aprofundamento da mina, um ventilador
1915
Capell foi instalado no topo do Shaft C, no ar de retorno (upcast air), de modo a
assegurar um volume mais constante de ar, e, mais tarde, um ventilador Sirocco,
de maior capacidade, substituiu o Capell.

1916 - 1919 Os níveis XIX, XX e XXI foram desenvolvidos.

1919 O shaft H foi perfurado do nível XX ao nível XXII.

Nesses níveis, o mergulho do corpo de minério é de cerca de 19º e resolveu-se


adotar, abaixo do nível XXII, planos inclinados, em lugar dos shafts verticais, como
vias principais de transporte entre os níveis.

Foi instalado, de forma pioneira, um equipamento de refrigeração para melhorar


1920 as condições ambientais da operação subterrânea. A planta de refrigeração,
instalada na superfície, possibilitou uma melhoria sensível da temperatura.

Os níveis XXIII, XXIV e XXV (profundidade 2.171 metros ou 7.126 pés) foram
abertos por meio de "winzes" inclinados e dos shafts I e J. Um pequeno corpo de
minério (corpo de minério Noroeste – Northwest ore body) de baixo teor foi
1922 - 1929
encontrado a noroeste do corpo de minério principal no nível XXIII, mas durante
os primeiros anos após sua descoberta, foi desenvolvido apenas nos níveis XXIV
e XXV, onde o teor é mais alto.

Um grande corpo de minério foi encontrado no nível XXII, a uma curta distância
ao sul do corpo de minério principal. Em pouco tempo ele foi encontrado em
níveis mais altos também. Este corpo de minério foi denominado corpo de
minério Sul (South ore body), e como este e outros corpos de minério foram
1930
encontrados, o corpo de minério original foi denominado corpo de minério
Principal (Main ore body). No mesmo ano, um pequeno corpo de minério foi
encontrado a oeste dos corpos de minério Principal (Main) e Sul (South) nos níveis
XI, XII e XIII e foi chamado de corpo de minério Preto (Black ore body).

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Os níveis XXVI e XXVII foram atingidos por "winzes" inclinados. Os valores do grau
de minério melhoraram no corpo de minério principal no nível XXVII. Este nível
1930 - 1931 foi o nível de abertura mais profundo alcançado na mina. Os "winzes" e túneis de
exploração abriram os níveis XXVIII e XXIX (profundidade 2.417 metros ou 7.938
pés) em 1932, mas o teor do minério era insatisfatório.

Um corpo de quartzo branco mineralizado, notavelmente diferente de qualquer


outro depósito conhecido na mina, foi encontrado nos níveis X, XI e XII, a sudeste
dos antigos trabalhos. Foi denominado corpo de minério Branco (White ore
1931 body). Esses depósitos foram desenvolvidos extensivamente entre 1930 e 1936.
O desenvolvimento do corpo de minério Sul continuou até 1941, e, em seguida,
no nível XXIV. Em 1956 o corpo de minério Sul estava sendo trabalhado no nível
VIII e em todos os níveis entre XIV e XX.

O corpo de minério Noroeste (Northwest) também foi aberto e trabalhado nos


níveis XX, XXI, XXII, XXVI e XXVII. Pensou-se que o corpo de minério Noroeste
fosse uma extensão do corpo de minério Gambá, que, na antiga mina a céu
1931 - 1938 aberto, ficava ao norte e estava separado do corpo de minério principal por um
estreito septo de xisto estéril. O grau do corpo de minério principal caiu
abruptamente no nível XXV e o corpo de minério do Noroeste ficou sendo a
principal fonte de ouro naquele nível.

O ponto mais profundo da mina foi alcançado em 1934, no fundo de um "winze"


perfurado do nível XXIX ao nível XXX (profundidade 2.453 metros ou 8.051 pés).
As temperaturas das rochas de cerca de 130°F (54,4°C), bem como a má qualidade
1934 dos depósitos, impediram uma mineração mais profunda. Neste mesmo ano
(1934), todo o trabalho de desenvolvimento foi suspenso no corpo de minério
principal abaixo do nível XXIII, mas continuou em níveis mais profundos em
corpos de minério descobertos após 1930.

Depois de 1936, todo o trabalho de desenvolvimento cessou no corpo de minério


1936 principal e, a partir daí, praticamente toda a produção foi proveniente de outros
corpos de minério.

Em 1936, durante a perfuração de um novo shaft (shaft X) entre os níveis XII e XV,
um grande corpo de minério foi descoberto entre os níveis XIII e XIV e
denominado corpo de minério "X" ("X" ore body). Desde então, o corpo de
minério "X" foi extraído no nível VIII e entre os níveis XI e XXVII, mas em 1955
estava sendo extraído apenas no nível VIII e em todos os níveis entre XI e um
subnível entre XX e XXI.

1942 Não houve extração de minério do nível XXVII após 1942.

1947 Não houve extração de minério do nível XXVI após 1947.

1949 Desde 1949, o nível mais profundo trabalhado foi o XXI.

Em 1956, quase toda a produção era dos corpos de minério Sul e "X",
1956
principalmente entre níveis XI e XX.

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Figura 49 - Shafts verticais (C...H) e inclinados (I, J)

Figura 50 - Motor elétrico de 30 HP de acionamento do ventilador Capell

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Em 1907 o motor de 30 H.P. mostrado na Figura 50 foi substituído por um mais potente de 80 H.P.
em virtude da disponibilização de energia de Rio de Peixe.

As instalações de superfície
"Chalmers projetou pessoalmente as novas instalações de superfície, incluindo um novo sistema de
britagem. Na Mina Velha o antigo engenho contava há mais de meio século com britadores de pilões
de madeira com ponteiras de ferro, acionados por enormes rodas d'água, que se encontravam
espalhados aleatoriamente pelas encostas ao sul de Morro Velho. Mais de 60 quilômetros de
aquedutos forneciam energia hidráulica para os britadores, bem como para o restante das máquinas
da mina.

A água alimentava mais de 130 ponteiras de pilões que esmagavam o minério e este era forçado,
através de filtros de peneiras de arame, até compridas mesas vibratórias. Misturado com água, o
cascalho finamente moído se movia através dessas mesas vibratórias e de mantas de lã que
capturavam as partículas de ouro livres. Este método capturava cerca de metade do teor de ouro do
minério. O cascalho era então transportado para o extremo leste da bacia do Ribeirão do Cardoso
para as "Instalações da Praia", onde era novamente britado, e dali transportado para o processo de
amalgamação. Aproximadamente outros 25% do teor de ouro eram recuperados nas "Instalações da
Praia" e os rejeitos ainda ricos eram então armazenados em grandes pilhas para aguardar até o dia
em que fossem desenvolvidos processos mais eficientes capazes de extrair os 25% de ouro restantes.

A nova instalação de britagem, que era chamada de engenho, construída em frente à entrada da
mina, acabaria por dispor de 130 pilões californianos montados em uma longa fileira em um nível
alto acima das instalações de superfície. O minério saía da mina puxado por mulas e, em seguida,
uma corrente transportadora puxava os vagões de minério até o engenho, onde ele era despejado
nos britadores. O cascalho que saía dos britadores passava através das peneiras de arame para as
mesas vibratórias por gravidade. As mesas vibratórias separavam as partículas de ouro do cascalho
e direcionavam o ouro livre para cubas especiais de recuperação.

Chalmers projetou toda a mina e o engenho de britagem com um objetivo em mente: construir uma
mina de alto rendimento. Ele argumentava que a Mina de Morro Velho não era uma mina de minério
com altas características químicas e de qualidade excepcional. Ela produzia minério de qualidade
consistente, mas em uma faixa de qualidade média. Consequentemente, para produzir um lucro
razoável, a companhia teria que contar com uma alta produção.

Esta alta produção tornou-se o objetivo principal. As características químicas constantes e a alta
produção foram fatores chaves para o sucesso e Chalmers projetara a nova mina e o engenho de
britagem para lidar com quantidades recordes de minério em uma faixa de qualidade normal.

O trabalho de montagem do novo conjunto de britadores começou em 1893, mas somente em


meados de 1896 Chalmers pôde dar partida em 70 dos primeiros 100 pilões e a produção começou
a aumentar.

Atrasos provocados por variadas causas atormentaram Chalmers nesse período. Uma revolta naval
no Rio de Janeiro bloqueou o porto e impediu o transporte de materiais vitais; localmente, escassez
de mão-de-obra e de materiais, combinados com fortes chuvas, diminuíram os trabalhos e
aumentaram os custos de construção." (Eakin, 1989)

Página | 146
Novos departamentos
"O crescimento das operações da companhia sob Chalmers aumentou o tamanho e a variedade dos
departamentos. Novas oficinas para eletricistas, ferreiros e mecânicos surgiram ao redor do sistema
de britagem. O tamanho do conjunto de britadores aumentou para 130 pilões, uma nova planta de
redução tomou forma e a companhia construiu uma olaria para fabricar seus próprios tijolos e um
pátio para trabalhar madeiras, bem como sua própria fazenda.

O número de casas construídas para trabalhadores europeus e brasileiros aumentou junto com o
crescimento da força de trabalho. Em 1910, a St. John d’El Rey empregava mais de 2.500 pessoas em
uma comunidade de aproximadamente 10.000 habitantes.

A folha de pagamento europeia listava cerca de 150 funcionários e a comunidade britânica girava
em torno de 400 pessoas.

Para atender às novas demandas desse crescimento, Chalmers promoveu uma reestruturação
organizacional expandindo antigos departamentos e criando novos. Aos antigos departamentos
médico, mina, contabilidade, oficina, redução e mecânica, Chalmers adicionou vários outros. Um
departamento do patrimônio assumiu o controle das agora vastas propriedades imobiliárias da
companhia, um novo departamento elétrico assumiu o comando das novas usinas hidrelétricas e um
departamento de desenho e pesquisa cuidou da crescente montanha de trabalhos de desenhos e
levantamentos.

No final da Primeira Guerra Mundial, Chalmers construiu um anexo de escritórios de dois andares ao
lado da Casa Grande para abrigar, sob um mesmo teto, os departamentos antes dispersos.

Ao longo do século XIX, a companhia comprou florestas para manter a mina abastecida com madeira
e carvão. Chalmers e seus antecessores também compraram cuidadosamente as principais bacias
hidrográficas da região para proteger tanto o abastecimento de água local, quanto a energia da
água que era crucial para a sobrevivência da mina. A carteira imobiliária da St. John foi reforçada por
aquisições estratégicas de pequenas propriedades fronteiriças, para evitar conflitos reivindicatórios,
pela compra de depósitos promissores de ouro nas proximidades e para o desenvolvimento de
propriedades agrícolas da companhia para fornecimento de alimentos." (Eakin, 1989)

Chalmers, o visionário
"Na virada do século, a mina de George Chalmers havia se tornado de fato um sucesso. Quando a
produção decolou no final da década de 1890, os acionistas começaram a receber dividendos
semestrais regulares.

Na antiga mina a produção atingiu o pico de mais de 200.000 toneladas de minério bruto durante
alguns anos em meados do século XIX. Sob a operação moderna de Chalmers, a nova mina atingiu
esse nível recorde 3 anos após a abertura das novas instalações de superfície e, em 1910, ultrapassou
a marca de 400.000 toneladas. Cinco anos após a abertura das instalações de superfície, a produção
de barras de ouro havia ultrapassado os níveis recordes da década de 1860 e continuava a subir.

Na segunda década do Século XX, o plano de George Chalmers tinha se materializado. Entre as ruínas
da antiga mina em 1886, ele sozinho intuitivamente previu o potencial inexplorado do corpo de

Página | 147
minério. Ele sozinho percebeu que uma planta nova, moderna e eficiente, poderia ser construída e
ser um sucesso. Lutando contra o pessimismo e o ceticismo de especialistas em mineração, diretores
e investidores, Chalmers, por iniciativa e esforço próprios, tinha convencido aqueles que duvidavam
de seu plano a apoiá-lo.

Figura 51 - Inauguração da placa na entrada do ádito

Em 1901, o diretor presidente, Frederick J. Tendron, foi a Morro Velho para a inauguração formal da
nova mina. A pedido da diretoria e dos acionistas, ele colocou uma placa com a seguinte inscrição
acima da entrada da mina. A placa ainda permanece sobre a entrada principal da mina até hoje
mesmo depois de desativada.

"Os Diretores da St. John d’El Rey Mining Company, Limited colocaram esta placa para registrar seu
agradecimento pelos imensos serviços prestados por GEORGE CHALMERS, A.M.I.C.E 17, na reabertura
do corpo de minério de Morro Velho e no projeto e construção das Instalações de Superfície."

George Chalmers tinha salvado a Morro Velho e a St. John d’El Rey Mining Company, Limited. Ele
estava com 44 anos e agora podia sentar e em retrospectiva observar os frutos de mais de uma
década de trabalho." (Eakin, 1989)

17
A.M.I.C.E. significa Associate Member of the Institution of Civil Engineers.

Página | 148
Figura 52 - George Chalmers

Figura 53 - George Chalmers, Frederick Tendron e o capitão de mina James Rogers

Página | 149
Morro Velho, segundo Chalmers
Texto elaborado por George Chalmers em 1912, e complementado por A. G. N. Chalmers em 1928.

Breve história da mina de Morro Velho

"A Companhia iniciou suas operações no Brasil perto da cidade de São João del-Rei, no estado de
Minas Gerais, de onde deriva seu nome. Suas operações de mineração naquele local não tiveram
sucesso. Em 1834, ela adquiriu a mina de Morro Velho, situada a cerca de 130 km da antiga capital
de Minas Gerais, Ouro Preto. A compra foi feita por £ 56,434 12s 7d (cinquenta e seis mil quatrocentas
e trinta e quatro libras esterlinas, doze xelins e 7 pence).

O corpo de minério é algo único, como será visto mais adiante. O minério é de difícil tratamento e
sua análise não variava muito como mostra a tabela.

1899 - 1900 1910 - 1911 1917 - 1918

% % %

Ouro 0,00196 0,00218 0,00192

Prata 0,00052 0,00059 0,00051

Sílica 24,10 19,63 22,56

Ferro 31,47 31,10 22,63

Arsênico 2,32 2,65 2,98

Enxofre 13,52 15,48 13,34

Alumínio 3,00 3,26 2,13

Óxido de Manganês 1,30 1,11 1,30

Cal 3,08 4,43 2,13

Magnésio 6,51 4,50 6,29

Cobre 0,21 0,21 0,12

Ácido Carbônico e Oxigênio 14,49 17,63 19,59

Embora tenham ocorrido mudanças no comprimento e na largura do corpo de minério, em geral ele
manteve uma maravilhosa regularidade em tamanho e conteúdo de ouro até alcançar o horizonte
número XXIII.

As flutuações nos resultados econômicos são explicadas, em grande parte, pelas condições
desfavoráveis de mineração no Brasil, onde a escassez de mão de obra se constituiu em uma das
mais sérias dificuldades.

Página | 150
Os gráficos que seguem mostram os resultados das operações da Companhia de 1835 a 1912.
Durante os primeiros 5 anos das operações da companhia praticamente nenhum lucro foi obtido.

A mina foi, nos seus primeiros anos, trabalhada da superfície para baixo em uma enorme escavação,
cujas paredes eram sustentadas por gigantescas estruturas e pilares de madeira. Em 1867 ela foi
destruída por um incêndio seguido do colapso da madeira. Somente 6 anos depois o corpo de
minério foi novamente aberto.

Tal reabertura foi conseguida com grande dispêndio pelo afundamento dos shafts A e B.
Infelizmente, no entanto, o mesmo sistema de trabalho continuou sendo adotado. Como resultado
dessa maneira de operar, a pressão aumentava à medida que a escavação ia se aprofundando e os
gigantescos escoramentos de madeira começavam a ser esmagados, causando frequentes
perturbações às operações de mineração e aumentando as despesas.

Em consequência, os resultados financeiros caíram e em 1883 e 1884 as operações da Companhia


resultaram em prejuízo. Em 1886, a mina finalmente entrou em colapso. Felizmente, apenas alguns
homens perderam a vida, uma vez que a equipe completa não estava na mina, porquanto o acidente
ocorreu durante uma mudança de turno.

A região circunvizinha foi então explorada na esperança de se localizar prospectos importantes, mas
nenhuma descoberta significativa foi registrada.

Finalmente, depois de muitas discussões com a diretoria, foi decidido reabrir o corpo de minério a
partir da superfície. Isso foi feito afundando-se 2 shafts verticais C e D, com 382 braças (700 metros)
de profundidade, e a uma distância segura de 100 pés (30 metros) ao norte do corpo de minério, em
vez de para dentro dele, como fora feito na reabertura anterior, e adotando-se um novo sistema de
trabalhar a mina totalmente diferente daquele utilizado anteriormente. Neste novo método, todas
as principais vias de descida foram construídas ao norte do corpo de minério, inteiramente fora dele.

O corpo de minério foi atacado em vários diferentes níveis (horizontes) de uma só vez e, à medida
que o mineral ia sendo removido, o espaço ia sendo preenchido com terra trazida da superfície e,
quando disponíveis, com sobras de terra da abertura de túneis de desenvolvimento e da abertura
dos shafts etc.

As dificuldades enfrentadas nesta última reabertura foram muito grandes, não apenas devido à
profundidade excepcional, mas também devido a um enorme corpo de água que havia se acumulado
até a superfície na antiga escavação acima dos novos shafts e das instalações.

No entanto, os shafts foram perfurados à velocidade média de 78 pés (24 metros) por mês; a água
foi parcialmente retirada da antiga escavação com o emprego de baldes de grande capacidade que
trabalhavam nos shafts A e B e finalmente drenada por um aparelho hidráulico a partir de um poço
no ponto mais baixo da escavação, onde a pressão era de 649 psi (libras por polegada quadrada).

A água desse poço foi conduzida até umas bombas operadas por um engenho hidráulico projetado
em Morro Velho e fabricado na Inglaterra. Ele ficava situado no nível do Ádito e era operado por
uma coluna d’água de 492 pés; essa água vinha através de um curso de água de 6 milhas de extensão
ao redor das montanhas até um reservatório no topo do shaft.

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O engenho consistiu essencialmente de dois carneiros hidráulicos de 20" e 11 pés de curso, com os
acessórios usuais: válvulas, tubulações, dispositivos de segurança, regulador, carregador de ar etc.
Os carneiros hidráulicos eram conectados por uma cruzeta na qual ficavam suspensas as hastes da
bomba; as hastes da bomba eram feitas de aço forjado e conectadas por cruzetas próprias a 5
elevadores de pistão duplo, colocados a cada 300 pés de profundidade.

A seção mais baixa da via principal e a adução de ar tinham sido construídas sob a forma de shafts
inclinados, seguindo aproximadamente o percurso do corpo de minério. Este método de construir a
via principal não deu certo nas seções superiores da mina, onde o percurso do corpo de minério era
muito íngreme, devido à natureza traiçoeira da rocha hospedeira, e finalmente ficou demonstrado
ser muito mais seguro e econômico prosseguir com shafts verticais e túneis horizontais.

Os shafts C e D foram concluídos em maio de 1892 e os lucros aumentaram, acompanhados por um


rápido aumento nos custos das operações. As flutuações em ambos fatores (lucros e custos)
dependiam fortemente do custo da mão de obra e da taxa de câmbio. A flutuação no custo do
mineral dependia mais das operações de mineração em curso do que das variações ou da
continuidade do corpo de minério.

A Figura 60 mostra as flutuações da taxa de câmbio desde o início da companhia.

Examinando o do mapa da mina (Figura 21), vemos que a profundidade vertical alcançada em 1912
era de 4.926 pés (1.500 metros) a partir da superfície e isso representava a mina de ouro mais
profunda que existia à época, embora a mina de Bendigo na Austrália e algumas das minas de Rand
estivessem se aproximando da profundidade da Mina de Morro Velho. No entanto, a companhia
estava prestes a continuar a aprofundar a rota principal pelo shaft G, o que significava um aumento
de 1.200 pés (366 metros).

Uma das grandes dificuldades que a Companhia enfrentava era a do aumento da temperatura. A
Figura 62 mostra o aumento da temperatura da rocha e do ar à medida que a mina se aprofundava.
A temperatura da rocha, no momento em que ela era penetrada, está representada pela linha
vermelha.

A temperatura da rocha aumentava à razão de 1°F para cada 140 pés na vertical e era 127,3°F no
momento da abertura do último nível mais profundo. Felizmente, contudo, a mina se esfriou
rapidamente após ser submetida a uma ventilação abundante.

Isso foi conseguido pela instalação de ventiladores na superfície movidos à eletricidade, que
sopravam mina adentro um volume de ar fresco de 70.000 pés cúbicos por minuto. Essa planta de
ventilação era capaz de praticamente manter esse volume quando a mina estivesse totalmente
desenvolvida na parte inferior do shaft G projetado e até o horizonte XXII, a 6.500 pés da superfície,
medidos na vertical.

O resfriamento e a secagem do ar de ventilação foram realizados fazendo-se o ar passar através de


grandes tambores de aço giratórios, parcialmente submersos em água. Esses tambores eram
dotados de espaços anulares que apresentavam uma superfície extremamente grande a ser
umedecida pelo ar refrigerado; o ar ao atravessá-los esfriava e liberava uma parte considerável de
sua umidade. O ar esfriado e parcialmente seco passava para o fundo das instalações, daí para os
stopes, fornecendo destarte condições atmosféricas mais satisfatórias em toda parte do subsolo. A

Página | 152
corrente de ar após deixar os stopes passava para o shaft de retorno (upcast shaft) e retornava à
superfície. A água aquecida dos resfriadores de ar giratórios era bombeada, para ser resfriada, para
grandes recipientes nos quais ficavam as serpentinas de evaporação de uma grande planta de
refrigeração a amônia.

A energia no tempo da reabertura da mina era totalmente hidráulica. Por volta de 1912, parte da
energia necessária para operar na mina era a energia hidráulica direta e parte a energia hidráulica
transmitida eletricamente. Dentro da mina usava-se exclusivamente a eletricidade e o ar comprimido.
No caso da energia hidráulica direta, cerca de 28 milhas de pequenos canais eram usados para trazer
pequenos riachos das montanhas até uma altitude adequada na região da Mina.

Em 1912 existiam pelo menos 8 pequenas estações hidrelétricas a distâncias variadas, entre uma e
vinte milhas, da Mina.

Em 1912 a potência total gerada era de 3.258 HP. Motores a vapor d’água e a gás com cerca de 900
HP de potência eram mantidos em reserva. Uma grande parte dessa energia era usada para a
compressão do ar. A capacidade total da planta de compressão de ar era de cerca de 10.000 pés
cúbicos de ar livre por minuto. Cerca de 75% dessa capacidade estava sendo usada e os outros 25%
eram mantidos como reserva.

Em 1928 já estavam operando usinas hidrelétricas de Rio de Peixe situadas a 20 milhas da mina18. A
energia foi sendo acrescentada progressivamente à medida que a Mina se aprofundava.

O ar comprimido a 60 psi (libras por polegada quadrada) de pressão era usado na Mina para
guinchos e perfuratrizes. Cerca de 15.000 pés de tubos de aço de 10" a 12" de diâmetro eram
necessários para a transmissão deste ar comprimido da superfície para o fundo da mina.

O suprimento de ar comprimido para as máquinas e perfuratrizes era retirado dos tubos de 10" e
12" por meio de tubos menores existentes em grandes quantidades.

A produção de minério anual total da mina, desde o início da empresa até a 1912, é apresentada na
Figura 55. A produção para o ano encerrado em fevereiro de 1912 19 foi de 196.310 toneladas, uma
média de 540 toneladas por dia. Para manter esse nível de produção, 14 pequenas perfuratrizes
pneumáticas e 19 grandes perfuratrizes – todas projetadas e fabricadas na mina – estavam
constantemente em operação, além de 100 perfuratrizes manuais.

Para levar as pedras até os shafts E, F e G, de onde elas eram içadas para os níveis superiores, eram
utilizados vagões empurrados à mão nos horizontes e puxados nas vias principais, seja por mulas ou
por locomotivas elétricas. As pedras eram finalmente levadas para a superfície pelo equipamento de
içamento hidráulico do shaft D. Eram mantidos em funcionamento 22 guinchos a ar comprimido.

18
Durante a década de 1930 a St. John d'el Rey construiu seus maiores projetos de hidroeletricidade
no Rio de Peixe. A companhia construiu 3 grandes barragens e a geração de energia cresceu
significativamente. A produção subiu de cerca de 4.000 HP na virada do Século XIX para o XX para
cerca de 12.000 HP por volta de 1950.
19
O período de competência: 1° de março do ano 1911 a 29 de fevereiro de 1912.

Página | 153
Diariamente eram necessárias cerca de 305 libras de dinamite e afiadas 2.097 brocas de aço. Durante
1912 o material de enchimento enviado para a Mina, para repor o mineral retirado, foi em média de
420 toneladas por dia. Para dar uma ideia da extensão do trabalho subterrâneo, cabe mencionar que
um vagão de minério do Horizonte XVII tinha que viajar 1,64 milhas para chegar à superfície.

O comprimento total dos cabos de aço em uso, incluindo os cabos guia, era de 21 milhas.

Embora não houvesse água na nova Mina, o equipamento de bombeamento hidráulico tinha que
ficar operando durante a maior parte do ano para bombear a água das antigas escavações da mina.

As pedras retiradas da Mina eram descarregadas no ádito. Do ádito essas pedras eram rebocadas
em vagões puxados por uma corrente em uma inclinação de 10 graus até o britador, passavam sobre
uma máquina de pesagem, onde o peso da carga mineral era registrado, e seguiam para uma mesa
de seleção, onde todas as pedras consideradas pobres eram descartadas.

Em 1912 a rejeição era de apenas 2% ou 3%, quando anteriormente já tinha sido de até 20%. As
pedras não rejeitadas, ou seja, aquelas selecionadas, depois de passarem por um segundo estágio
de um quebra-pedras, eram levadas por elevadores e por um arranjo especial de distribuição de
minério para dentro dos silos dos britadores.

A quantidade rejeitada a cada ano pode ser vista a partir da Figura 55, sendo a diferença entre a
quantidade extraída e a quantidade britada.

O sistema de britagem compreendia uma bateria de 120 pilões de 750 libras de peso médio por
pilão e uma bateria de 20 pilões de 1.250 libras de peso médio por pilão.

O mineral era esmagado sob água a um tamanho suficientemente fino para passar através de uma
peneira de 50 mesh (ou seja, 2.500 furos por polegada quadrada), mas antes da introdução do
tratamento químico e dos Moinhos de Tubos, a medida usada era de 60 mesh ou 3.600 furos por
polegada quadrada.

A partir dos pilões, o mineral esmagado, ou seja, a areia, passava sobre as mesas de concentração
(strakes). Essas mesas eram dotadas de longas tiras de lona áspera, tendo uma área total de 17.126
pés quadrados, nas quais a areia mais pesada e o ouro livre eram capturados.

A área total dessas mesas (strakes) era lavada automaticamente para remover a areia pesada e o
ouro; o concentrado contendo ouro passava por uma reconcentração onde a pequena quantidade
da areia restante era removida.

De 60 a 70% do conteúdo total de ouro eram extraídos por este método.

A areia separada era novamente moída nos Moinhos de Tubos e tratada com produtos químicos –
cianeto de sódio principalmente – na Planta de Processamento de Oxigênio.

Neste segundo processo cerca de 21% a 22% do ouro era extraído. A recuperação dos 8% ou 9%
restantes, que saíam junto com os rejeitos, não era economicamente viável20.

20
Até 1928.

Página | 154
Para o ano que terminou em fevereiro de 1912, a extração foi de 92,4%, com perda de apenas 7,6%,
resultado satisfatório tendo em vista a alta dos sulfetos (de 35% para 40%).

O ouro do 1º e do 2º processos era refinado por eletrólise e fundido em lingotes. Os lingotes eram
do tamanho de um tijolo comum, cada um valendo cerca de £4,000 (quatro mil libras esterlinas).

A quantidade de ouro em uma tonelada de minério variava de ano para ano, mas em 1912 a média
foi de 6,84 oitavas (24,5 gramas). Em 1927 – 1928, essa média tinha caído para 5,952 oitavas (21,3
gramas) de ouro e 1,160 oitavas de prata.

Uma oitava equivale a 3,586 gramas ou 55,340 grãos; 8,6735 oitavas equivalem a uma onça troy (troy
ounce).

Grande parte das máquinas em uso em Morro Velho foi fabricada na própria Mina e praticamente
todos os consertos necessários eram realizados pelo Departamento das Oficinas. Uma oficina de
padrões para fundição, uma oficina de moldagem e fundição, uma oficina de montagem e uma
oficina de ferraria eram mantidas totalmente ocupadas; durante o ano de 1911 foram trabalhadas
354 toneladas de ferro forjado, foram fabricadas 294 toneladas de ferro fundido e latão e utilizados
56.669 pés cúbicos de madeira.

Este Departamento das Oficinas era também encarregado dos regos ou cursos d'água que traziam
a água para aproveitamento da energia hidráulica diretamente e para fins de tratamento do minério.
O comprimento total desses regos em uso era de 28 milhas. Anteriormente o comprimento era muito
maior, mas, desde à introdução da energia elétrica, alguns dos canais menores foram desativados.

Uma olaria (fábrica de tijolos) também ficava sob a responsabilidade do Departamento das Oficinas,
produzindo anualmente algumas centenas de milhares de tijolos, telhas, tubos etc.

As estações hidrelétricas mencionadas ficavam sob os cuidados do Departamento Hidrelétrico, bem


como todas as outras unidades elétricas da Mina.

Além dos departamentos mencionados, havia o Departamento de Almoxarifado, que comprava de


todos os fornecedores da região e requisitava o que era necessário da Inglaterra, distribuindo os
itens para os demais departamentos conforme fosse o caso. O consumo médio mensal de alguns
poucos itens dá uma ideia aproximada do trabalho deste Departamento.

Ácido sulfúrico 2188 quilogramas

Cianeto de Potássio 13340 quilogramas

Soda Cáustica 1528 quilogramas

Dinamite 4170 quilogramas

Tubos e conexões 8200 quilogramas

Aço Borer 2050 quilogramas

Lingote de Zinco 8401 quilogramas

Página | 155
Cimento 250 barris

Óleo de Máquina 4024 litros

Graxa 928 quilogramas

Ferro Gusa 17300 quilogramas

Madeira 4722 Pés cúbicos

Carvão Vegetal 13.295 Pés cúbicos

Também se deve mencionar que os fretes da Ferrovia Central do Brasil para materiais trazidos para
a Mina, para o ano que termina em fevereiro de 1911, totalizaram £11,964.12.8. (11.964 libras
esterlinas, 12 xelins e 8 pence).

Outros departamentos eram o Médico, Patrimonial, Escritório de Desenho, Sondagem, Financeiro e


de Transportes.

O Departamento Médico era representado por dois competentes cirurgiões e uma equipe
considerável que atendia a todos os acidentes ou casos internados no Hospital da Companhia. Esta
construção foi a mais completa do que se poderia esperar em um acampamento de mineração.
Possuía 7 enfermarias, atualizadas e completamente equipadas, sala de cirurgia, dispensário,
laboratório de pesquisa, aparelhos fotográficos e de Raios X.

A casa do Diretor Médico ficava anexa ao Hospital e o conjunto formava um Departamento muito
útil e compacto. Além do tratamento de todos os funcionários admitidos no Hospital, todos os
trabalhadores tinham a vantagem do tratamento gratuito.

O Departamento Imobiliário cuidava das propriedades da Empresa, totalizando 90.885 acres. Elas
foram sendo adquiridas gradualmente para a exploração de ouro e outros minerais.

Com relação às propriedades, as minas de ouro de Cuiabá e Raposos eram as mais importantes. Em
ambas, uma quantidade considerável de trabalho foi realizada por proprietários anteriores e pela
Companhia. A mais extensivamente trabalhada era a de Cuiabá. As áreas minerais em ambas eram
consideráveis.

As Terras de Ferro eram muito extensas e passavam por uma exploração minuciosa, de modo que,
quando as condições do país fossem mais promissoras em termos de transporte, mão-de-obra etc.,
o minério poderá ser exportado em larga escala ou convertido em ferro e aço localmente.

O Departamento Imobiliário também cuidava das casas da Companhia, representando, em 1912,


2.863 quartos, e de todos os assuntos civis.

A população da cidade que cresceu com a mina era de cerca de 10.000 almas em 1912.

O Departamento de Transporte trazia para dentro do Estabelecimento todas as máquinas, provisões


etc., a partir da Ferrovia a uma distância de 5 milhas.

Página | 156
Por muitos anos, a Companhia propôs fazer uma linha férrea da Mina à Ferrovia Central, mas em
parte devido às flutuações do câmbio, à mão-de-obra insuficiente e ao grande desembolso
necessário para a ferrovia, face à acidentada região a ser atravessada, e ao considerável desembolso
de capital, o investimento foi sendo adiado até março de 1912, quando foi iniciado.

Em 1912, a Companhia empregava cerca de 3.000 pessoas e existiam cerca de 10.000 na Cidade,
direta ou indiretamente, dependentes da Companhia. A força de trabalho estava um pouco acima
do normal, devido à fabricação da linha férrea mencionada acima.

Cerca de £13.000 foram pagos mensalmente em salários aos nativos em 1912.

A Figura 59 apresenta os resultados das operações da Companhia de 1838 a 1911.

Os totais são os seguintes:

Toneladas extraídas .............................. 5.500.526

Toneladas esmagadas ........................... 5.140.028

Rejeição ....................................................... 6,5%

Valor da produção £10,251,534 equivale a £1.19.10½ (1 libra esterlina, 19 xelins e 10½ pence) por
tonelada triturada.

Dividendos e impostos decorrentes da primeira operação 1842 - 1867, ou seja, até o momento do
incêndio, totalizaram £896,500

Idem, após o incêndio até o desabamento da Mina (Mine Crush) £556,600

Idem, da reabertura após o desabamento da Mina (Mine Crush) até 1912 £658,113

Total de dividendos e impostos £2,111,213

Durante os trabalhos atuais (de 29 fevereiro 1911 até 28 de fevereiro 1912):

Toneladas extraídas: .......................................................... 2.541.933

Toneladas esmagadas: ...................................................... 2.396.705

Rejeição: .................................................................................. 5,7%

Valor da Produção: ......................................................... £5,083,942

Dividendos e impostos pagos: ................................. £658,113

Juros dos títulos: ............................................................ £275,800

O capital em 1912 era de £714,215, dos quais £67,950 estavam em títulos hipotecários a serem
resgatados em diferentes datas até 1918.

Desde o início, cerca de £1,000,000 foram levantadas para capital.

Página | 157
A Figura 54 mostra três cubos, o de baixo representa a produção de ouro da mina desde o início da
Companhia até 1912; o cubo do meio, os gastos, a maior parte dos quais foi despendida no Brasil; e
o cubo superior, o lucro realizado.

Os valores em mil-réis foram calculados para um câmbio de 16d (1$000 = 16 pence)."

Fim da narrativa de Chalmers


A parte superior do mapa da mina (Figura 21), que consta da narrativa de George Chalmers, é uma
vista em planta e a parte de baixo é uma seção vertical do corpo de minério.

Repare, pela vista em planta, que o corpo de minério corre em direção a leste, ou seja, em direção à
cidade de Raposos e, pela seção vertical, que o corpo de minério desce terra adentro em uma
inclinação de aproximadamente 45° (quarenta e cinco graus). Em 1911 a mina só ia até o nível XVII
e o shaft G estava projetado, mas ainda não tinha sido construído. Só existiam os shafts A, B, C, D, E
e F.

Como curiosidade, este mapa foi confeccionado em 31 de maio de 1911 e está assinado por George
Chalmers. As unidades estão no sistema imperial britânico e a escala mostrada no mapa é de 1
polegada = 100 braças (1 inch = 100 fathoms). À direita encontra-se desenhado o Morro do
Corcovado da cidade do Rio de Janeiro para fins de comparação e também para mostrar o nível do
mar. Em 1911 a estátua do Cristo Redentor ainda não tinha sido construída. Em seu lugar havia o
Chapéu do Sol, um mirante planejado em 1824 por Dom Pedro I.

Cronologia Chalmers
Em seu livro Victor Rodrigues segue minuciosamente os passos de George Chalmers desde o seu
nascimento em 17/01/1857 até a sua morte em 04/02/1928 aos 71 anos.

1857 Chalmers nasce em Flushing, Mylor Falmouth, Cornwall, Inglaterra, em 17 de


janeiro.

1875 Começa cursar o curso universitário de Engenharia Civil.

1878 Gradua-se como bacharel em Engenharia Civil.

1878/1882 Contratado para trabalhar no projeto Seven Tunnel na Inglaterra.


1882 Contratado como engenheiro projetista e chefe de minas.

1884 O superintendente Oldham é demitido em Morro Velho e Chalmers é contratado


para substituí-lo. Chalmers e esposa embarcam em Southampton no RMS Tagus
em dia 10 de novembro, chegam ao Rio de Janeiro em 28 de novembro e em Morro
Velho ao meio-dia de 4 de dezembro.

1885 May Tyacke Chalmers (primeira mulher de George Chalmers) morre no dia 7 de
agosto depois de estar doente por longo período em decorrência de tuberculose.
Seu funeral foi realizado no dia seguinte, 8 de agosto.

Página | 158
1886 Chalmers se casa com Eleanor Josephine Tyacke (irmã de May) em 24 de agosto.
Em 10 de novembro ocorre o colapso da Mina de Morro Velho.

1887 Em 29 de março, Chalmers chega à Inglaterra para apresentar à diretoria o relatório


sobre a reabertura da mina e embarca de volta ao Brasil em 25 de abril. Em 5 de
julho, a senhora Chalmers dá à luz o primeiro filho de George Chalmers: Alexander
George North Chalmers.

1889 Em 13 de maio, começa o afundamento do shaft D. Em 29 de agosto, nasce o


segundo filho de George Chalmers, William. Em 18 de setembro, começa o
afundamento do shaft C.

1890 Construção do aqueduto "Bicame".

1892 Em 22 de maio, é concluído o shaft C e, em 18 de maio, o D.

1893 Aquisição da Mina de Bicalho.

1894 Instalação da iluminação elétrica na Mina.

1895 Construção da Casa do Dínamo.

1896 Os primeiros 70 pilões Californianos entram em operação. Começam os estudos


para a construção da ferrovia eletrificada ligando Nova Lima a Raposos.

1898 Construção da barragem de Rezende. Aquisição da Mina de Raposos. Construção


da barragem dos Cristais. Morre a segunda esposa de Chalmers, Eleanor.

1901 Chalmers é homenageado pela reabertura da Mina de Morro Velho com a


colocação de uma placa na entrada principal da mina. Inauguração da Usina
Hidrelétrica dos Cristais, da Usina Hidrelétrica do Gaia e da Usina Hidrelétrica A de
Rio de Peixe. Inauguração do Hospital Morro Velho. As novas instalações de
superfície entram em atividade e as antigas instalações são desativadas.

1908 Aquisição da Mina do Faria.

1911 Início da construção da ferrovia eletrificada ligando Nova Lima a Raposos.

1913 Inauguração da fornalha de ustulação "Edward".

1913 Em 5 de abril é inaugurada a linha de bonde eletrificada Nova Lima – Raposos.

1920 Chegada dos equipamentos para a instalação da Planta de Refrigeração (Cooling


Plant) da Mina.

1921 Inauguração da Usina Hidrelétrica E em Rio de Peixe (Lagoa Grande).

1922 As temperaturas no subsolo (interior da mina) são comparáveis às da superfície.

1924 George Chalmers aposenta-se, mas permanece como consultor da Saint John. É
sucedido pelo filho A. G. N. Chalmers.

1928 Em 4 de fevereiro, Chalmers morre de problemas cardíacos em Londres aos 71 anos.

Página | 159
Figura 54 - Os cubos de Chalmers

Página | 160
Long Tons Raised and Stamped
200.000

180.000

160.000
Period of re-opening
after fire and falling in
of mine
140.000

120.000
Period of re-opening
after falling in
100.000 of mine

80.000

60.000

40.000

20.000

-
1830 1840 1850 1860 1870 1880 1890 1900 1910 1920

Raised Stamped

Figura 55 - Toneladas de minério extraídas e britadas

Página | 161
Cost/ton (Shillings)
60
Period of re-opening
after fire and falling in
of mine
50

Period of re-opening
after falling in of mine
40

30

20

10

-
1838 1843 1848 1853 1858 1863 1868 1873 1878 1883 1888 1893 1898 1903 1908

Figura 56 - Custo por tonelada de pedra britada em xelins de 1838 a 1991

Página | 162
Cost (£ - Sterling Pounds)
300.000

250.000

200.000

Period of re-opening Period of re-opening


after fire and falling in after falling in
of mine of mine
150.000

100.000

50.000

-
1838 1843 1848 1853 1858 1863 1868 1873 1878 1883 1888 1893 1898 1903 1908

Figura 57 - Custo de operação da Mina de Morro Velho em libras esterlinas de 1837 a 1911

Página | 163
Revenue and Cost, £
450.000

400.000

350.000

300.000
Period of re-opening
after fire and falling in
250.000 of mine
Period of re-opening
after falling in
200.000 of mine

150.000

100.000

50.000

-
1838 1843 1848 1853 1858 1863 1868 1873 1878 1883 1888 1893 1898 1903 1908

Custo £ Revenue £

Figura 58 - Receitas e custos da Mina de Morro Velho em libras esterlinas de 1938 a 1911

Página | 164
Profit and Loss, £
200.000
190.000
180.000
170.000
160.000
150.000
140.000
130.000
Period of re-opening
after fire and falling in Period of re-opening
120.000
after falling in
110.000
100.000
90.000
80.000
70.000
60.000
50.000
40.000
30.000
20.000
10.000
0
1838 1843 1848 1853 1858 1863 1868 1873 1878 1883 1888 1893 1898 1903 1908
-10.000
-20.000
-30.000

Profit/Loss £

Figura 59 - Lucros e perdas em libras esterlinas de 1938 a 1911

Página | 165
Exchange, pence/mil-réis
45,0

40,0

35,0

30,0

25,0

20,0

15,0

10,0

5,0

-
1835
1838
1841
1844
1847
1850
1853
1856
1859
1862
1865
1868
1871
1874
1877
1880
1883
1886
1889
1892
1895
1898
1901
1904
1907
1910
Figura 60 - Variação cambial da moeda britânica penny em relação ao mil-réis de 1938 a 1911

Página | 166
Percent Extraction (%)
100
Period of re-opening after
fire and falling in
90
of mine

80
Period of re-opening after
falling in of mine
70

60

50

40

30

20

10

-
1855 1860 1865 1870 1875 1880 1885 1890 1895 1900 1905 1910

Figura 61 - Percentual de extração de 1855 a 1911

Página | 167
Rock Temperature (°F) and Horizons (feet)
60 70 80 90 100 110 120
-

1.000

2.000

3.000

4.000

5.000

6.000

7.000
Mean Rock Temperature at the Bottom of 10 ft Holes Mean Temperature of Atmosphere in Levels and Workings
Rock temperature at Time of Opening Horizons

Figura 62 - Temperaturas da rocha (°F) e nos horizontes de trabalho (pés)

Página | 168
Visita à mina de Morro Velho
Em visita a Morro Velho os estudantes do 5º ano do Curso de Minas e Metalurgia da Escola
Politécnica da Universidade de São Paulo, Paulo A. Andery e Próspero C. Paoliello, registraram
interessantes observações sobre a operação e as condições no interior da mina. A data da visita não
consta do relatório, mas pelas informações dele constantes é provável que tenha ocorrido em 1944.
Eles chamam os shafts de poços. As fotografias que seguem não fizeram parte do relatório.

"Entra-se diretamente na denominada Mina Grande, na qual a galeria inicial vai diretamente ao poço
D. Em Nova Lima estão localizadas as minas denominadas Velha e Grande, sendo aquela a primeira
a ser explorada, ambas situadas no flanco leste da Serra do Curral.

A cidade de Nova Lima é servida por um ramal eletrificado de estrada de ferro, de bitola de 60 cm,
de propriedade da companhia, que liga a cidade à estação de Raposos, num percurso de 7 km.

A estação ferroviária mais próxima é a da povoação de Raposos, por onde passa o ramal Lafaiete-
Montes Claros, da E.F.C.B., com bitola de 1 m.

O teor médio do minério tratado é de 11 gramas de ouro e 4 de prata por tonelada. Na Mina Velha
o teor é de 13 gramas de ouro por tonelada. O minério de Raposos e Espírito Santo é do tipo do da
mina Grande, com teor de 9 g/t de ouro e de 1 g/t de prata.

Processo de Lavra.

A - Acesso ao "Ore Body".

É feito utilizando-se os três tipos de vias de acesso: galerias, planos inclinados e poços. O acesso
inicia-se por uma galeria totalmente revestida de alvenaria, com exceção do piso. Seu comprimento
é de cerca de 200 m, por três metros de altura, e largura suficiente para ferrovia dupla, de 60 cm de
bitola.

Segue-se um poço, em nível bastante superior ao nível máximo das águas (poço D), com uma
profundidade de 800 m, servido por um elevador, que faz o trajeto em dois minutos. O elevador é
constituído de duas partes, sendo que inferiormente conduz a caçamba com minério e
superiormente os mineiros. Os elevadores são duplos, movidos por um sistema de compensação, de
modo que, enquanto um sobe, o outro desce.

Os elevadores possuem dupla entrada, o que facilita o carregamento: o carrinho carregado empurra
o vazio e vice-versa, de forma que a operação de carga e descarga é uma única.

A este poço segue-se uma galeria com uns 100 m de comprimento e via simples e desvio no meio
da galeria. Segue-se um outro elevador com cerca de 360 m de percurso (poço E). Este vai ter a uma
galeria de 300 m. Chega-se ao terceiro elevador, que percorre um poço (F) semelhante ao anterior
(mais ou menos 360 m). Ao chegar-se ao fim deste poço, já se nota um aumento de temperatura
bastante sensível. Estamos a 1.410 m de profundidade a uma temperatura de 27,8°C e a 517 m abaixo
do nível do mar. Vem a seguir uma galeria de 400 m, que vai ter ao poço G, com 366 m de
profundidade. No fim deste poço, temos as seguintes condições: 1.776 m de profundidade, 33°C e
993 m abaixo do nível do mar.

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Segue-se uma outra galeria pequena e chega-se ao poço H, com 162 m de profundidade. No fim
deste poço estamos a 1.938 m de profundidade, a uma temperatura de 36°C e a 1.115 m abaixo do
nível do mar. Temos novamente uma galeria com 200 m de comprimento, que vai ter a um plano
inclinado. A inclinação deste plano é de cerca de 30° e seu comprimento de uns 700 m. O percurso
é feito num carro elétrico. Chega-se finalmente ao poço I, que leva a uma profundidade de 2.050 m,
1.207 m abaixo do nível do mar, numa temperatura de 37°C.

Segue-se uma galeria pequena, que vai ter a um poço não servido por elevador. Para descer utiliza-
se uma caçamba presa a um cabo de aço, que passa por uma roldana, indo ter a um guincho motor.
No fim desse poço (que tem uns 150 m de profundidade), seguem-se galerias diversas e planos, com
inclinações variáveis, que vão ter às frentes de trabalho. Do fim deste poço em diante já não há
ventilação, iluminação, transporte mecânico etc. Estamos aqui a uma profundidade de 2.454 m.

Figura 63 - Entrada do ádito da Mina Grande

B - Escoramento.

A natureza da rocha encaixante dispensa em grande parte o escoramento. O filito é de difícil


desmoronamento, permitindo a manutenção da forma dos vazios, quase que sem o emprego de
artifícios. Como material para escoramento, utiliza-se principalmente a madeira e mais raramente
alvenaria. Nota-se alvenaria de tijolos em algumas galerias. A madeira é empregada às vezes como
simples esteio, sendo que o diâmetro dos postes varia de 15 a 60 centímetros. Em pontos

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particulares, como no fim do poço D, notam-se verdadeiras toras engastadas na própria galeria,
contraventadas de modo a não prejudicar o tráfego.

O espaçamento dos esteios é muito variável e de um modo geral se concentram em locais de maior
responsabilidade, visando garantir eventuais acidentes. Quando as paredes das galerias exigem
escoramento, utilizam-se quadros simples de madeira; a distância entre os montantes é muito
variável; às vezes são ligeiramente inclinados no sentido contrário ao de maior esforço do terreno e
sua seção é aproximadamente retangular. Pode-se observar em alguns pontos o emprego de meios
quadros e contraventamento.

Figura 64 - Secretário do escritório em Londres e o capitão de mina

Nos poços, que de um modo geral não são revestidos, notam-se às vezes pequenos trechos
revestidos com madeira e presos por anéis de ferro. Esses anéis estão ligados a ganchos de ferro,
embutidos a chumbo nas paredes do poço. Nas frentes de trabalho notamos escoramento por
fogueira.

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Empregam-se alguns artifícios para reforçar os quadros; assim, no plano inclinado, a intervalos
regulares, empregam-se dormentes de maior comprimento, que se apoiam nos montantes dos
quadros. Nota-se também a existência de esbarros fixos de madeira.

Figura 65 - O capitão de mina e seus assistentes

C - Processo de desmonte – Transporte

O desmonte é feito por meio de explosivo. As brocas são acionadas por marteletes a ar comprimido.
Esses marteletes são simplesmente escorados no solo. O ar comprimido serve aí também para
limpeza dos furos, antes de se colocar as bananas de dinamite e para verificação de algum tiro que
tenha falhado, antes de se utilizar a broca, expelindo-o a ar comprimido. O material é desmontado
por uma série de tiros em escala, seguidos da remoção de blocos que não tenham sido
completamente destacados. Esse deslocamento é feito com alavancas, sendo que esses blocos não
removidos constituem grande perigo nas frentes de trabalho. Essas frentes são diversas e
independentes. O material desmontado é carregado por muares até onde chega o transporte
mecanizado; este é feito em vagonetes ligados a locomotivas elétricas. Nos poços, as caçambas são

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transportadas pelos elevadores. As vias férreas são simples, havendo desvios no meio das galerias;
só há via dupla na galeria ao nível da superfície. Na retirada do minério são utilizados também os
denominados "shoots", vazios de seção aproximadamente circular, no interior dos quais o minério é
transportado por gravidade até pontos de concentração onde há transporte mecanizado.

Figura 66 - Instalação de bombeamento no corte transversal nº 6

D – Ventilação

É feita por ar comprimido, havendo para isso, na superfície, instalações de refrigeração e compressão
de ar. O ar injetado na mina acha-se a uma temperatura de 6ºC. A instalação de refrigeração
compreende o resfriamento de água e ar. O princípio da refrigeração da água está na circulação em
serpentina de amoníaco interiormente e água exteriormente. A água passa em seguida por um disco
gelado e, depois, por seis caixas de refrigeração denominadas vaporetes.

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O ar é coletado à temperatura de 57°F (13,9°C), aspirado e comprimido posteriormente por um
sistema acionado por um motor de 50 HP, 368 R.P.M., 380V, 50 ciclos. A pressão obtida é de 450
libras por polegada quadrada. O ar é comprimido através de tubos de 40 cm de diâmetro, indo ter
a 2 coolers (refrigeradores de ar); nesses, a água é introduzida a 42°F (5,5°C) e o ar sai a 38°F (3,3°C)
com uma pressão de 18 mm Hg. Vai ter então à instalação de compressão, situada entre a de
refrigeração e a mina. Esta instalação possui poderosos ventiladores de indução, que aspiram
aproximadamente 3.250 m3 de ar por minuto.

Desta instalação, o ar é comprimido para a mina, indo servir para a ventilação e para acionar os
marteletes, em condutos independentes. Nas frentes de trabalho, onde ainda não chegou a
ventilação, o ar dos marteletes é que vai contribuir para tornar menos severas as condições de
serviço, sendo o responsável pela aeração. Nessas frentes tem-se uma atmosfera com uma
temperatura oscilando entre 40°C e 50°C, sendo que a rocha ultrapassa 60°C. O ar que entra na mina
a uma temperatura de 6°C, na parte mais profunda ventilada, atinge 37°C (fundo do poço I). Seria
interessante o estudo de uma subestação de refrigeração de ar no interior da mina.

Caminhando-se pelas galerias, há certos pontos em que a velocidade do ar é bastante forte. Os


mineiros, na saída, protegem-se do ar (que arrasta partículas da rocha) colocando um lenço sobre o
nariz e a boca. A variação de temperatura e a corrente de ar podem provocar perturbações no
aparelho respiratório, como pneumonia etc. A silicose torna-se mais perigosa nas frentes de trabalho,
onde o operário permanece 6 horas numa atmosfera saturada de poeira.

E - Iluminação.

A mina possui iluminação elétrica até a galeria que se inicia no fundo do poço I. Daí em diante,
utilizam-se gasômetros, que queimam carbureto. A tensão na linha elétrica é de 250 V, não
apresentando nenhum perigo, por ser completamente isolada. Dispõe-se mais ou menos segundo
o eixo das galerias e planos inclinados, paralelamente ao trolley dos trens elétricos.

F - Esgotamento das águas.

As águas são concentradas num único ponto, por canaletas dispostas lateralmente nas galerias.
Deve-se notar que o lençol freático é atravessado antes de se atingir o fundo do poço D. Do ponto
de concentração a água é bombeada para fora, havendo, para isto, junto à galeria que se inicia no
fim do poço D, uma instalação de aspiração e compressão, constituída por duas possantes bombas
aspirante-prementes.

G - Acidentes - Assistência Médica - Higiene da Mina.

Como medida de ordem higiênica, notamos a existência de instalações sanitárias, colocadas junto
às galerias principais. Estas instalações constam simplesmente de recipientes em que se coloca cal
virgem e que são periodicamente removidos. Instalações desta natureza evitam a propagação de
moléstias endêmicas, que encontram ambiente muito favorável em minas deste tipo.

Quanto à prevenção contra a silicose, pouco ou nada se faz, pois os mineiros negam-se a utilizar as
máscaras contra poeira que a companhia pretendeu pôr em uso. Tais máscaras são de fato
incômodas, num ambiente como o das frentes de trabalho onde há pouco oxigênio, muito calor e
as condições psicológicas do trabalhador são péssimas. Geralmente os operários se protegem com
lenços contra o pó.

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A falta de oxigênio acarreta o chamado "samba" que se inicia com uma tontura, ocasionando logo
após a perda dos sentidos, exigindo a remoção imediata da vítima e emprego de respiração artificial.
O "samba" é comum em Morro Velho.

Em caso de acidentes que exijam a retirada do acidentado imediatamente, esta retirada, até a
superfície, pode ser feita em 40 minutos. Os primeiros socorros são prestados no local por médicos
e companheiros de serviço. Acidentes de maior vulto não são raros em Morro Velho. São comuns
fraturas de braços e de pernas e mesmo a morte causada por queda dos denominados "chocos",
isto é, blocos de rocha abalados pela explosão e que, posteriormente, se destacam do teto por causas
diversas. O uso de capacetes, proposto pela companhia, não foi também aceito pelos operários, que
os consideraram incômodos.

Figura 67 - Enviando uma perfuratriz de rocha para o interior da mina

H - Instalações acessórias.

São muitas estas instalações. Assim, temos depósitos de explosivos, estrebaria, instalações sanitárias,
instalações elétricas etc.

Os muares utilizados no transporte de minério, onde não há transporte mecanizado, habitam


estrebarias iluminadas, ventiladas e desinfetadas. Estes trabalham muitos anos no interior da mina,
saindo de lá geralmente cegos, devido à obscuridade. Quando, por qualquer motivo, os serviços são
interrompidos por um ou dois dias, os muares são retirados para a superfície.

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Os depósitos de explosivos são dentro da mina, o que facilita seu transporte, além de que a
constância de temperatura e outros fatores são favoráveis à manutenção do bom estado da dinamite.
O explosivo é armazenado aproveitando galerias já exploradas e situadas de modo que um eventual
acidente não provoque interrupções de maiores consequências no andamento dos serviços.

I - Mão de obra e energia elétrica.

A usina emprega cerca de 7.300 pessoas, sendo 3.200 operários que trabalham no subsolo e o resto
na superfície. Os operários são quase a totalidade brasileiros. Os dirigentes são todos ingleses,
havendo um único técnico brasileiro.

Os operários que trabalham na superfície percebem vencimentos que variam de 14 a 15 cruzeiros


por dia e os que trabalham no subsolo ganham de 20 a 30. Trabalham 4 turmas em turnos de 6
horas. As condições de trabalho são más e parece não haver nenhum projeto que vise melhorá-las.

A energia elétrica utilizada pela usina provém de 11 estações hidro elétricas, sendo 8 situadas num
raio de 30 km de Morro Velho.

J - Produção e mercado

O ouro produzido é fundido em barras de 5 kg e comprado pelo Banco do Brasil; a prata é destinada
à Casa da Moeda e o arsênico é vendido aos agricultores e pecuaristas do país.

Quanto à produção, pode-se ter uma ideia pela do ano de 1943. Neste ano tratou-se de 363.600
ton. de minério, obtendo-se: 4.356 kg de ouro, no valor de Cr$ 98.400.000,00; 919 kg de prata, no
valor de Cr$ 202.000,00; 816 ton. de arsênico, no valor de Cr$4.100.000,00. Temos assim um total de
Cr$ 102.702.000,00.

Em 1940, a produção foi de Cr$ 94.528.000,00, sendo de 3.945 kg a produção de ouro.

k - Conclusão.

Além das instalações a que nos referimos, a companhia possui ainda oficinas mecânicas, laboratórios
de ensaios, hospital, escolas primárias, 2.600 casas de operários.

Tem-se em Morro Velho a impressão de que existe apenas o necessário e suficiente para uma
exploração como a que realizam, quanto à parte técnica. Quanto ao modo de vida e condições de
trabalho não nos pareceram tão bons." (Paulo A. Andery e Próspero C. Paoliello)

A Figura 68 mostra uma vista em planta das instalações de superfície da Mina Grande com a
identificação das mais relevantes.

A britagem primária ficava localizada na saída da Mina. A maior de todas as construções é a Redução
onde se localizavam os britadores e as mesas vibratórias. Os trilhos das ferrovias estão traçados em
vermelho e o teleférico ligando as minas de Raposos às instalações de Nova Lima está na cor verde.
Os minérios das outras minas que chegavam por caminhão eram descarregados no "shoot". O
Ribeirão do Cardoso corre de oeste (esquerda) para a leste (direita).

A Figura 69 mostra a localização das instalações de superfície da Mina Velha em azul e da Mina
Grande em vermelho. As principais referências para ambas as figuras são o Ribeirão do Cardoso, a
Casa Grande, a Igreja do Rosário e o Morro do Mingu, onde estão localizados os shafts C e D.

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Figura 68 - Instalações de superfície da Mina Grande

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Figura 69 - Instalações de superfície: Mina Velha (azul) e Mina Grande (vermelho)

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Fatores de produção
Autossuficiência em Morro Velho

Localizada em um vale montanhoso coberto por matas nos grotões de Minas Gerais, a Mina de
Morro Velho necessitava de inúmeros recursos para ser operada. A St. John construiu toda uma
infraestrutura de suporte para suas operações, desde suas próprias estradas e seus próprios edifícios
até residências para os funcionários da mina.

É claro que essa construção em larga escala exigia uma quantidade substancial de materiais e
ferramentas de construção. Como era significativamente mais barato produzir os materiais
localmente do que importá-los, a St. John optou por dispor de uma série de oficinas, desde
marcenaria até a fabricação de ferramentas.

Na década de 1890, Morro Velho era quase totalmente autossuficiente, o que foi crucial,
considerando que a linha ferroviária mais próxima estava a mais de cem quilômetros de distância.

Os fatores de produção tradicionais são capital, terra e trabalho.

Capital

A St. John levantou um capital inicial, entre seus sócios, em uma de suas reuniões na City of London
Tavern, para adquirir os direitos de lavra e as minas do Dr. Süch e seus sócios em São João del-Rei e
financiar a expedição de Charles Herring, Jr. ao Brasil. Depois o capital foi aumentado, mediante a
venda de ações, para adquirir a propriedade de Morro Velho. Houve necessidade de novas chamadas
de capital para recuperar a mina de seus acidentes e para financiar os planos auspiciosos de
Chalmers. A remuneração desse capital foi feita através do pagamento de dividendos aos acionistas.
O pagamento de dividendos foi interrompido, por diversas vezes, devido à queda de produção,
algumas delas decorrentes de acidentes na mina.

Terra

A terra, o segundo fator de produção, foi a propriedade de Morro Velho adquirida em 1834 e as
demais minas adquiridas posteriormente e acrescentadas ao patrimônio da companhia, conforme
mostrado na Tabela 2. Dentre essas propriedades é de se destacar aquelas contendo nascentes e
cursos d’água que proveram a energia empregada nos trabalhos de mineração.

Trabalho

A mão de obra, sempre foi um importante fator de produção na atividade de mineração. Sem o
emprego de trabalhadores braçais teria sido impossível romper as pedras no interior da mina e trazê-
las para a superfície, sem falar do trabalho necessário na superfície. A mão de obra foi formada por
diferentes etnias, com os britânicos sempre ocupando as principais posições na hierarquia da
companhia. A mão de obra escrava constituiu a principal componente da força de trabalho no
subsolo e na superfície por um longo período. Os brasileiros livres tinham dificuldades em se
submeter ao comando dos britânicos e se ausentavam com frequência do trabalho.

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Por causa da dificuldade em lidar com os trabalhadores nativos, a companhia trouxe um razoável
contingente de europeus, principalmente espanhóis e italianos. Para agradar seus trabalhadores
estrangeiros, a companhia experimentou usar experientes feitores espanhóis, alemães e italianos
para supervisionar seus recém chegados patrícios. Conquanto os europeus se comportassem melhor
do que os nativos, eles trouxeram ideias novas da Europa, como os movimentos grevistas, e
contaminaram os locais. Assim, as quedas de produção, antes provocadas pela falta de mão de obra
nativa, voltaram a ocorrer por causa das greves.

Tecnologia

As técnicas de mineração utilizadas no Brasil do Século XIX eram rudimentares e se aplicavam à


mineração a céu aberto ou, quando muito, à mineração em cavernas próximas da superfície. Os
britânicos trouxeram da Cornualha mineiros acostumados a trabalhar em minas subterrâneas de
carvão e juntamente com eles a tecnologia de mineração em poço profundo (deep shaft mining) até
então inédita no Brasil.

Madeira

Um item importante na mineração subterrânea foi a madeira utilizada para suportar as galerias e os
espaços deixados pelas escavações. A companhia necessitava contar com um suprimento constante
de madeira para prosseguir com suas atividades. Um dos principais fornecedores de madeira foi a
Fazenda Jaguara, ao norte de Sabará próxima de Pedro Leopoldo. Na década de 1880 a companhia
comprou a propriedade de Jaguara para garantir um adequado suprimento de madeira. Mais tarde
ela foi adquirida por George Chalmers para seu uso particular.

Energia

A energia era necessária nas operações para acionar os britadores, para puxar as pedras no plano
inclinado e nos shafts verticais para fora da mina, para acionar bombas de drenagem da água das
minas etc.

Os altos custos da energia a vapor – em vista da escassez de carvão, o custo de importação do carvão
e o custo da madeira – obrigaram a St. John d’El Rey a procurar água para obter energia.

A água foi a principal fonte de energia da Morro Velho, seja utilizada através das diferenças de nível
(altura manométrica) para, por exemplo, mover rodas d’água, que por seu turno movimentavam
equipamentos de mineração, seja para gerar eletricidade em usinas hidrelétricas utilizando turbinas
Francis e Pelton.

A energia hídrica foi fundamental para o sucesso da antiga mina e Chalmers a considerou a chave
para o futuro da nova mina. Ele imaginou uma mina cada vez mais profunda e um sistema de
britagem aumentando suas operações com a produção crescente de minério.

Esta crescente demanda por energia para operar máquinas à medida que a produção se expandia
não poderia ser atendida pelas antigas rodas d'água de madeira. Uma mina moderna teria que ter
fontes de energia novas e eficientes. As estações secas eram problemáticas pela escassez de água.

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A planta de refrigeração
Em 1912, quando Chalmers produziu seu relatório acima transcrito, a mina encontrava-se no nível
XXVII a 4.926 pés (1.500 metros) de profundidade e a redução da temperatura no subsolo foi
conseguida com a instalação de ventiladores na superfície movidos à eletricidade que sopravam
mina adentro um volume de ar fresco de 70.000 pés cúbicos por minuto. O resfriamento e a secagem
do ar de ventilação ocorriam em resfriadores giratórios parcialmente submersos em água e a água
aquecida era resfriada em recipientes com serpentinas onde circulava um fluido refrigerante à base
de amônia.

Com o aprofundamento da mina abaixo do nível XXVII, a umidade excessiva no


subsolo, decorrente do procedimento de molhar as estradas subterrâneas para
apagar a poeira, do calor do maquinário, da iluminação, da decomposição do
calor mineral e animal, do suor dos corpos dos operários e da respiração de
homens e animais (as mulas de transporte), estava provocando um efeito ruim
sobre a eficiência dos trabalhadores e tinha ficado impossível continuar as
explorações em profundidade com as temperaturas subindo acima de 117°F (47°C).

A solução para este problema estava no fornecimento de ar resfriado e seco para o interior da mina,
induzido da superfície a partir de uma planta especial de resfriamento.

O superintendente relatou: "As condições atmosféricas no final do Túnel H - I para o Shaft de


Passagem 31 tornaram-se tão ruins que a possibilidade de se suspender as operações naquela parte
da mina, onde a temperatura da rocha era de 117,9°F (47,7°C), até que se pudesse dar partida na
Planta de Resfriamento, foi seriamente considerada. Devido ao calor que afeta os motores, ocorriam
inúmeros problemas com os ventiladores e as paralisações se tornaram frequentes."

Juntamente com um jovem engenheiro da companhia, Eric Davies, Chalmers projetou uma planta
para resfriar o ar e soprá-lo a partir do nível do ádito para dentro e para baixo dos shafts.

Como a Inglaterra se encontrava em guerra, a construção dessa planta de resfriamento foi suspensa
temporariamente. Assim que a situação melhorou, o equipamento foi encomendado da Inglaterra,
junto à J. & E. Hall Ltd., e começaram os trabalhos de construção da Usina E do sistema hidrelétrico
de Rio de Peixe destinada a gerar os 700 H.P. necessários para a operação da unidade de refrigeração.

Em 1920 o equipamento chegou ao Brasil e logo o primeiro sopro de ar frio e seco estava circulando
pelas galerias superaquecidas. A planta de refrigeração reduziu gradualmente a limites aceitáveis as
temperaturas nos níveis inferiores da mina, garantindo a contínua descida a maiores profundidades.

Durante seus primeiros três meses de operação, a planta produziu um progressivo resfriamento e
secagem da mina. A queda média da temperatura da rocha para os três primeiros meses foi de 0,8°F
(0,45°C), e na temperatura do ar de 5,3°F (3°C).

A melhora continuou, as temperaturas da rocha e do ar caíram gradualmente, e em 1922 o


superintendente foi capaz de registrar que não havia mais queixas dos homens sobre o calor, que
agora trabalhavam "em uma atmosfera que se compara muito favoravelmente com aquela em que
trabalham seus companheiros na superfície."

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Porém, com a continuação do aprofundamento da mina, a usina de refrigeração instalada em 1920
já não era suficiente para manter condições de confortabilidade aceitáveis. Foi então instalada uma
nova usina de resfriamento, desta vez dentro da mina, no túnel H, nível XX, na corrente de adução.
Entretanto, o calor retirado da corrente de adução era encaminhado para a corrente de retorno que,
nessa mina, atravessa os "stopes" (realces auto-portantes) e, quando a lavra foi retomada acima do
nível XX, a temperatura e a umidade do ar acima dessas profundidades não viabilizaram o trabalho
em condições aceitáveis e a usina de refrigeração teve que ser retirada do subsolo.

A planta de refrigeração de 1920 projetada por George Chalmers e Eric Davies foi melhorada e
expandida por engenheiros e superintendentes que os sucederam. A mina passou a ser ventilada
por meio de poderosos ventiladores de indução soprando aproximadamente 3.250 metros cúbicos
(115.000 pés cúbicos) de ar por minuto, com o ar entrando na mina a uma temperatura de 43°F (6°C).

Eletrificação
Em mineração a água desempenha dois papéis antagônicos. Ela tanto pode ser uma benção, quanto
uma maldição. No primeiro caso, a água fornece a energia para mover os equipamentos de
mineração, como britadores, moinhos, elevadores etc. No segundo caso, a água existente no subsolo
percola por entre as fissuras das rochas e causa desmoronamentos que podem determinar a
interrupção temporária ou permanente dos trabalhos subterrâneos.

Antes de 1890, nem eletricidade nem máquinas movidas a eletricidade eram comuns nas minas,
mesmo em áreas mais desenvolvidas economicamente como a Europa Ocidental. Embora algum
equipamento a vapor estivesse disponível, muitas operações de mineração tinham que ser realizadas
manualmente. A possibilidade de alimentar várias máquinas de uma única fonte, proporcionada pela
construção das usinas de energia, apresentou inúmeras vantagens, não apenas em termos de maior
eficiência, mas também em termos de menor consumo de combustível.

Aparentemente a primeira utilização da eletricidade em Morro Velho ocorreu em 1889, na época em


que estavam sendo perfurados os shafts C e D, quando foi utilizado um dínamo comprado da Cassel
Company que foi adaptado para a iluminação elétrica. Dessa maneira, na superfície os shafts foram
iluminados por lâmpadas de arco voltaico, sendo a força motriz a água.

A precipitação média em Morro Velho é de cerca de 1.650 mm, mas quantidades anuais tão altas
quanto 2.300 mm e tão baixas quanto 1.000 mm não são incomuns.

Os grandes shafts C e D foram perfurados inteiramente pela energia da água, mas George Chalmers
percebeu que, para manter seus planos para um desenvolvimento futuro, novas reservas de energia
deveriam ser disponibilizadas e preparou seu projeto para a eletrificação da planta.

Uma das principais razões para o aumento da produção na década de 1890 foi a decisão de Chalmers
de aumentar de forma significativa a quantidade de energia elétrica fornecida às minas e
transformou o potencial dos córregos e rios locais em eletricidade por meio de uma série de usinas
geradoras. Ele conseguiu esse aumento de energia construindo nada menos do que quatro novas
usinas nas proximidades de Morro Velho.

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Com esse mesmo objetivo, a companhia adquiriu direitos sobre algumas das mais úteis e bem
regadas terras da região ao sul de Nova Lima, onde se encontra uma região montanhosa, drenada
pelo Rio das Velhas e seus afluentes, o Ribeirão dos Cristais, o Ribeirão dos Macacos e o Rio de Peixe.

As primeiras centrais hidrelétricas foram construídas no Retiro (97 HP), no Rezende (100 HP), nos
Cristais (150 HP) e no Córrego do Gaia em Honório Bicalho (400 HP), em 1896, 1898, 1900 e 1902
respectivamente. Essas pequenas usinas estavam todas localizadas em Nova Lima.

As usinas do Retiro e do Rezende geravam energia em corrente contínua e a usina dos Cristais e do
Gaia geravam energia em corrente alternada.

O aqueduto conhecido como Bicame, ponto de referência de Nova Lima, transportava água para uso
nas instalações de superfície da mina. A montante do Bicame, na confluência da rua Chalmers com
a Travessa Abílio Tito Couto, funcionou a Usina Hidrelétrica do Retiro, cuja tomada d’água ficava no
final do Rego Grande, em um local conhecido como "Peneira", onde havia também um vertedouro.
A "Peneira" evitava que galhos e detritos pudessem penetrar na turbina, danificando-a. O Rego
Grande, por seu turno, foi um canal artificial alimentado por uma derivação do Ribeirão dos Cristais.

A partir de 1904 foi construído um sistema de barragens no Rio do Peixe, na bacia do Rio das Velhas,
consideravelmente aumentado nas décadas seguintes. Em 1910, por exemplo, a série de usinas de
geração de energia construídas por Chalmers em Rio de Peixe, ao sul da mina, elevou a geração total
de energia para 2.100 HP, mais de três vezes a energia total gerada na década de 1880.

A energia da água disponível na mina anterior havia produzido cerca de 450 HP. A energia total
gerada pela água, eletricidade e uso ocasional de usinas de gás e vapor d’água chegou a quase 3.400
HP.

As usinas construídas e operadas pela Saint John d'El Rey produziam a eletricidade que abastecia
muitos dos equipamentos de mineração, como as perfuratrizes e os vagões de mineração. A
eletricidade era transmitida das usinas para seus vários destinos ao longo de linhas protegidas por
dutos. O resultado final das operações de mineração energizadas foi o aumento da eficiência da
mineração. Em 1984, Morro Velho gerava cerca de 5,5 milhões de Kwh por mês, o que representava
65% do consumo de energia elétrica da companhia em Minas Gerais.

Figura 70 - Esquema de uma usina hidrelétrica

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Figura 71 - Localização das quatro primeiras usinas hidrelétricas

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Figura 72 - Tomada d’água e vertedouro da Usina do Retiro

Figura 73 - Gerador elétrico de 97 HP da Usina do Retiro

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Figura 74 - Barragem do Rezende

Figura 75 - Gerador elétrico de 100 HP da Usina do Rezende

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Figura 76 - Usina hidrelétrica dos Cristais

Figura 77 - Gerador elétrico de 150 HP e turbina da Usina dos Cristais

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Figura 78 - Tomada d’água da Usina do Gaia

Figura 79 - Gerador elétrico de 400 HP da Usina do Gaia

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Sistema hidrelétrico de Rio de Peixe
A elaboração deste capítulo contou com a colaboração do engenheiro Flávio Gomes Machado e
também teve como referência uma dissertação elaborada pelo engenheiro Carlos Allysson Barretto
de Araújo.

Em 1902, em visita à mina de Morro Velho, H. K. Scott, ao descrevê-la, relatou que a energia para
acionar as máquinas na mina era obtida:

1. Utilizando-se 60 milhas (96,5 km) de cursos de água que traziam água diretamente para a
planta.

2. De motores a vapor semi-portáteis, usando madeira como combustível, e empregados


somente quando faltava água ou o suprimento desta era insuficiente.

3. De 3 usinas de geração e transmissão elétrica, 2 das quais de corrente contínua,


transmitindo 250 H.P. e 1 trifásica de alta tensão, transmitindo cerca de 150 H.P. 21

As três primeiras centrais hidrelétricas construídas no Retiro, no Rezende e nos Cristais em 1896,
1898 e 1900, respectivamente, todas localizadas em Nova Lima, podem ser consideradas precursoras
experimentais do grande sistema de Rio de Peixe, formado por lagos, reservatórios e estações,
construído a partir de 1904.

Em seu artigo, Scott mencionou que a corrente alternada trifásica da estação Cristais havia se
mostrado melhor e mais satisfatória do que a corrente contínua de Retiro e Rezende e que uma
usina trifásica adicional de alta tensão de cerca de 300 H.P. estava, em 1902, em processo de
construção. Escreveu ele: "Estava-se pensando em transmitir em baixa tensão; mas essa ideia teve
que ser abandonada, devido ao alto custo dos cabos de cobre. Outro esquema mais importante,
para transmitir eletricamente cerca de 1.500 H.P., está suspenso, no momento, devido à necessidade
de se dispor, o quanto antes, de um aumento de energia para substituir os motores a vapor. O
superintendente (George Chalmers), no entanto, é de opinião que o esquema deve afinal ser
implementado, se a mina tiver que ser explorada em grande profundidade economicamente e toda
a perfuração manual for substituída por furadeiras elétricas. O custo por H.P. por dia, com madeira
como combustível, é 2s. 3d. (2 xelins e 3 pence), e somente com água, 3d (3 pence)."

Lembrando os infortúnios do passado — o incêndio e o colapso de 1867 e o "desmoronamento" de


1886 — houve quem visse com pessimismo os novos e ousados empreendimentos.

George Chalmers acreditava que não haveria deterioração no corpo de minério com o
aprofundamento da mina e que os novos métodos que ele estava utilizando resultariam em uma
grande melhoria na eficiência e na lucratividade. Mesmo em 1918, quando uma grande usina de
energia, a E, estava em construção, Chalmers mostrava-se insatisfeito com a energia disponível e
polidamente crítico da política conservadora da diretoria: "A importância vital de energia adicional
foi tão exaustivamente mencionada nesses relatórios, com uma descrição também do esquema final

21
Scott se referia às usinas do Retiro, Rezende e Cristais.

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para o desenvolvimento da última geração de energia de importância em Rio de Peixe 22, que é
desnecessário fazer mais comentários, exceto que a necessidade desse acréscimo está se tornando
diariamente mais aparente à medida que vemos a mina se aprofundando e nenhum acréscimo
correspondente de energia sendo realizado ou provável no futuro próximo. Se tivéssemos agora de
recorrer ao vapor, descobriríamos que a falta total de carvão mineral aumentou bastante o preço da
lenha, devido ao grande consumo desta última na ferrovia e, consequentemente, nosso custo seria
enormemente aumentado."

Chalmers empregou um método sagaz e espirituoso para convencer o escritório de Londres a aceitar
seus planos. Quando o esquema para o desenvolvimento de Rio de Peixe foi apresentado, George
Chalmers apresentou duas sugestões — uma série de pequenas usinas hidrelétricas (a serem
construídas com os lucros gerados pela atividade) ou unidades de maior porte com barragens (a ser
financiado com capital a ser levantado). Ele argumentou a favor do plano mais ambicioso, mas sem
muita esperança de que fosse aceito e estava preparado a "se contentar" com as usinas menores.
Mas a decisão da diretoria foi a de recusar as duas sugestões. Chalmers recebeu esta notícia com
espanto. Ele comunicou então à diretoria que estava inclinado a constituir uma empresa à parte, sem
vínculo com a St. John d'el Rey, para construir centrais hidrelétricas e fornecer eletricidade para a
companhia de mineração. Em seguida, perguntou aos diretores qual a quantidade de energia que
eles estariam precisando, pergunta essa que somente ele era capaz de responder. O estratagema
funcionou: a diretoria cedeu e o esquema de Rio de Peixe foi aprovado.

Assim, em 1903, esgotados os aproveitamentos hídricos no entorno de Nova Lima, por iniciativa de
Chalmers, a St. John adquiriu a fazenda de propriedade do Sr. Manoel Inácio do Carmo, ao sul do
município de Nova Lima, banhada pelo Ribeirão Congonhas dos Marinhos e pelo Rio de Peixe.

O Sistema Hidrelétrico de Rio de Peixe é uma admirável obra de engenharia, que impressiona tanto
por sua prodigiosa concepção, quanto pelo surpreendente conjunto formado pelos reservatórios,
tubulações, linhas de transmissão e unidades geradoras, que foram sendo acrescentadas ao longo
do tempo, dentre as quais se destaca uma usina subterrânea construída 20 metros abaixo do nível
do solo.

O Rio do Peixe nasce no encontro do Ribeirão Capitão do Mato, que corre por 5,86 km depois da
Lagoa do Miguelão, com o Ribeirão Congonhas dos Marinhos, que se estende por 4,44 km desde a
Lagoa das Codornas. Os dois córregos chegam em cursos reduzidos, que são acompanhados por
grandes tubulações metálicas, onde um volume expressivo de água é transportado entre as usinas,
sendo que trechos consideráveis do rio correm dentro de tubulações.

O Sistema Hidrelétrico de Rio de Peixe é constituído por três reservatórios de acumulação


principalmente de água pluvial, ou seja, três lagoas criadas artificialmente entre os anos de 1904 e
1933, Lagoa Grande 23, Lagoa das Codornas e Lagoa do Miguelão, cujos níveis máximos de água são
15,9 m, 30 m e 24,6 m, respectivamente.

22
Na verdade a estação E não foi a última "de importância"; a usina F foi concluída em 1933, a
extensão subterrânea da usina E em 1936, a usina Codorna em 1937 e, mais tarde, em 1971, a G2 e
em 1985, a G1.
23
Nos registros da St. John consta o nome Lagoa Grande, porém os meios de comunicação passaram
a se referir a ela como Lagoa dos Ingleses por volta da década de 1960.

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Por possuir uma pequena área de drenagem, além das precipitações atmosféricas a Lagoa Grande é
abastecida também por três canais artificiais construídos no seu entorno. Esses canais realizam a
chamada "transposição de bacia de drenagem" e permitem acrescentar ao reservatório da Lagoa
Grande um volume adicional da água pluvial e das nascentes provenientes de outras bacias.

A Lagoa Grande funciona como a "caixa d’água" principal do sistema e, por estar situada em uma
cota mais alta, ela abastece a Lagoa de Miguelão, através de um extravasor (também conhecido
vulgarmente como "ladrão"), e abastece a Lagoa das Codornas através de um curso d’água.

Essas lagoas estão localizadas nas imediações da BR-040 e da BR-356, cujos leitos se sobrepõem
naquela região. As represas dessas lagoas alimentam atualmente pequenas (para os moldes atuais)
usinas hidrelétricas na seguinte sequência: Codorna, G, B, D, F, E-Superfície e E-Subterrânea, sendo
que as usinas G, D e F possuem duas unidades geradoras de eletricidade cada uma e as demais
apenas uma unidade geradora. No passado operaram também as unidades A e C, hoje desativadas.

Complementando o sistema, existem duas linhas de transmissão, com cerca de 20 km cada uma, que
partem da subestação para onde converge toda a energia gerada pelas usinas e dali seguem para a
planta industrial de Nova Lima. Os principais equipamentos são turbinas hidráulicas tipo Francis e
Pelton, geradores elétricos, transformadores de potência, painéis elétricos, linhas elétricas aéreas,
tubulações, válvulas, disjuntores e sistemas de proteção.

Na década de 1930, quando ocupava a superintendência da St. John o Sr. Arthur H. Millett, foi
construída a maior parte das 9 (nove) usinas hidrelétricas em Rio de Peixe: Usina A, Usina B, Usina C,
Usina D, Usina E de Superfície, Usina E Subterrânea (ou EE = E Extension), Usina F, Usina G e Usina
Codorna. Atualmente 7 (sete) encontram-se em operação: B, D, E de Superfície, E Subterrânea, F, G
e Codorna.

Todas estas usinas operam em um sistema denominado cascata, degrau ou a fio d’água, onde a água
que aciona uma usina é descartada em um canal cujo fluxo vai acionar outra usina a jusante da
primeira e assim por diante.

Por esta razão, a montante de cada usina existe uma "câmara de acumulação" de água, cujo objetivo
é armazenar a água turbinada por uma usina, acumulá-la até formar um pequeno represamento,
objetivando regularizar a vazão para o túnel, canal ou tubulação que segue para a próxima usina. Na
operação de usinas em cascata a garantia de um fluxo contínuo d’água é crucial porquanto eventuais
descontinuidades, ainda que momentâneas, prejudicam o funcionamento das turbinas hidráulicas.

A usina mais a montante é a Codorna e as usinas mais a jusante são as Usinas E de Superfície e
Subterrânea.

A tensão de transmissão da energia gerada em Rio de Peixe é 30 KV e a linha aérea de transmissão


até a área industrial em Nova Lima se estende por 30 km.

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Tabela 20 - Reservatórios componentes do sistema de Rio de Peixe

Represa Volume Área Inundada Bacia de Drenagem Inauguração


(m3) (hectares) (km2)
Lagoa Grande 13.000.000 226,5 17,0 1930

Codorna 5.950.000 96,0 86,0 1937

Miguelão 6.200.000 80,5 31,8 1937

Tabela 21 - Usinas hidrelétricas de Rio de Peixe

Usina Potência kVA Turbina Inauguração


A (desativada) 250 Pelton 1904 24

B 1.175 Francis 1976 25

C (desativada) 770 Pelton 1906

Codorna 2.430 Pelton 1937

D1 851 Pelton 1911

D2 851 Pelton 1912

E (superfície) 1.750 Pelton 1920

E (subterrânea) 3.430 Francis 1936

F1 2.370 Francis 1933

F2 2.370 Francis 1933

G1 26 1.800 Francis 1985

G2 600 Francis 1971

24
A usina A foi desativada em 1974 por obsolescência.
25
A usina B foi construída em 1905, tendo sido destruída por um incêndio em 1974. Ela foi
reconstruída no mesmo local em 1976.
26
As usinas G1 e G2 operam através de um sistema híbrido de captação denominado TS –
Temporary Scheme.

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Figura 80 - Mapa de localização das lagoas e das usinas de Rio de Peixe

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Figura 81 - Mapa topográfico da localização das usinas de Rio de Peixe

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Figura 82 - Fluxograma do sistema de Rio de Peixe

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Figura 83 - Construção da barragem da Lagoa Grande

Figura 84 - Lagoa do Miguelão (hoje)

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Figura 85 - Lagoa das Codornas: barragem no canto inferior esquerdo

Figura 86 - Encontro dos ribeirões formadores do Rio de Peixe

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Figura 87 - Usina A, hoje desativada

Figura 88 - Interior da Usina A

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Figura 89 - Usina B: vista em planta mostrando duas rodas Pelton e um gerador

Figura 90 - Usina B: vista em corte

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Figura 91 - Usina B e respectiva tubulação de chegada d’água

Figura 92 - Usina C, hoje desativada

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Figura 93 - Usina D: vista aérea

Figura 94 - Usina D: vista lateral da chegada da tubulação d’água

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Figura 95 - Tubulações d’água para as usinas D (foto) e F (não visível)

Figura 96 - Geradores no interior da Usina D

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Figura 97 - Vista externa da Usina E de superfície

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Figura 98 - Seção da Usina E Extension (subterrânea, 21 metros)

Figura 99 - Usina F: tubulação de adução d’água à esquerda

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Figura 100 - Desenho de junho de 1931 da Usina F

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Figura 101 - Usina Codorna: descarte da água turbinada no Ribeirão dos Marinhos

Figura 102 - Vista do interior da Usina Codorna

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Figura 103 - Galpão da Usina G em fase de construção

Figura 104 - Interior da Usina G

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A ferrovia eletrificada Nova Lima - Raposos
Ao longo da história da companhia, o principal meio de transporte foram os carros puxados por boi
– verdadeiras carroças – nas estradas estreitas, empoeiradas e montanhosas de Minas Gerais.

No final do século XIX, a Estrada de Ferro Central do Brasil havia se expandido, passando a ligar o
interior de Minas Gerais ao litoral, mas o trajeto da linha férrea passava ao largo de Villa Nova de
Lima, deixando-a sem acesso direto ao modal ferroviário. A ferrovia seguia para o norte, ao longo
do vale do Rio das Velhas, passando por Honório Bicalho e Raposos, a leste da mina.

Em 1894 foi iniciada a construção da Cidade de Minas, que, em 1987, tornou-se a capital de Minas
Gerais, e, somente em 1901, foi denominada Belo Horizonte. Hoje, Nova Lima fica a
aproximadamente 10 km de Belo Horizonte. No início do Século XX, o acesso à capital mineira era
feito de trem até a estação de Raposos, via General Carneiro e Sabará, um trajeto de 34 km, que,
somados aos 8 km que separam Raposos de Nova Lima, totalizam 42 km.

A companhia tinha que enviar as mercadorias que adquiria para a estação em Honório Bicalho e
depois transportá-las em carros de boi nos últimos 8 quilômetros até Morro Velho. Isso
frequentemente resultava em danos às mercadorias e, às vezes, esses poucos quilômetros
demoravam mais para serem atravessados do que toda a viagem por via férrea, especialmente na
estação chuvosa, quando as estradas de terra viravam lama.

Assim que a mina voltou a funcionar no final da década de 1890, Chalmers começou a fazer gestões
junto à diretoria para financiar a construção de uma ferrovia elétrica privada entre a mina e a estação
de Raposos da Ferrovia Central do Brasil, cerca de 8 quilômetros a leste.

A ideia de se construir uma linha férrea entre a estação ferroviária de Raposos e Nova Lima surgiu
da necessidade de facilitar o acesso de máquinas, equipamentos e insumos à mina, que se
encontrava em processo de expansão. Além disso, uma significativa parte dos trabalhadores da mina
residia em Raposos, em função das facilidades que a linha da Central do Brasil proporcionava à
cidade. Chalmers acreditava que uma ferrovia, movida a eletricidade proveniente do sistema
hidrelétrico da companhia e transportando trabalhadores e suprimentos, poderia pagar por si
mesma em serviços e conveniência dentro de poucos anos.

No final da primeira década do Século XX a St. John constituiu uma companhia com o objetivo de
construir uma ferrovia eletrificada ligando Nova Lima a Raposos e obteve essa concessão por 50
anos.

Através de uma subsidiária criada para operar a ferrovia, The Morro Velho Railway Company, a St.
John executou toda a construção da ferrovia atravessando os morros entre Raposos e Villa Nova de
Lima. Em 30 de março de 1911, os trabalhos da ferrovia começaram e dois anos depois, em abril de
1913, a ferrovia elétrica entrava em operação. A bitola era de 0,66 metros e os dormentes da pista
foram feitos de madeira de aroeira, uma das árvores mais comuns do Brasil nos velhos tempos, que
se tornou rara por causa do corte constante.

Ela também foi a segunda ferrovia a usar tração elétrica no Brasil, sendo precedida somente pela
Estrada de Ferro Corcovado.

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As locomotivas elétricas eram alimentadas com corrente contínua de 550 V, geradas através de duas
subestações retificadoras, localizadas nos dois extremos da linha: na estação ferroviária de Raposos
da E.F. Central do Brasil e na Mina de Morro Velho. As duas subestações eram rotativas, do tipo
motor-gerador. As subestações eram alimentadas com tensões primárias de 5,2 kV e 28 kV, que eram
abaixadas para 330 V para alimentar os motores, os quais estavam mecanicamente acoplados ao
gerador de 550 V, corrente contínua. A subestação em Raposos tinha potência total de 140 HP,
fornecida por um grupo de 100 HP e outro de 40 HP. Já a subestação localizada no outro extremo
da linha, na mina, tinha potência de 270 HP. A distância entre elas era de 5 quilômetros.

O material rodante foi fornecido pela General Electric. A companhia adquiriu 7 locomotivas, sendo
quatro de 4 toneladas e três de 3,75 toneladas, 6 carros-reboque abertos e 14 vagões.

O serviço de passageiros entre as duas localidades era público, embora predominasse o transporte
gratuito dos empregados da mina. Uma composição circulava entre elas de 40 em 40 minutos. A
estrada também servia um pequeno povoado no meio do percurso chamado Galo, onde a St. John
tinha uma fábrica de arsênico.

Figura 105 - Transporte da primeira máquina a vapor da ferrovia para a mina

O custo da viagem de 7,9 quilômetros era de 1$000 (um mil réis, isto é, cerca de 16 pence ou 32
centavos de dólar em 1913) e os custos de carga para a companhia caíram para cerca de metade

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daquele incorrido com os carros de boi. Cerca de 4.000 passageiros eram transportados durante os
30 minutos de viagem entre as duas comunidades a cada ano. A movimentação de mercadorias, o
acesso mais rápido ao trabalho e as melhores condições de comunicação fizeram da ferrovia um dos
principais ativos da St. John.

Três vezes por mês o serviço de transporte de passageiros era interrompido. Tropas ocupavam toda
a linha e composições especiais circulavam por ela levando lingotes de ouro que eram baldeados
em Raposos para trens da Central do Brasil e seguiam rumo ao Rio de Janeiro.

A ferrovia foi desmontada no início dos anos 1960 e uma rodovia asfaltada atualmente ocupa a
maior parte do seu antigo leito.

Na parte inferior da Figura 68, identificado com a cor vermelha, está desenhado o trecho inicial desta
ferrovia nas instalações de superfície de Morro Velho. A estação ficava próximo à Praça do Mineiro.

Figura 106 - Ferrovia eletrificada Nova Lima - Raposos

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O teleférico
A Mina do Espírito Santo fica a cerca de 4 quilômetros de Morro Velho e era altamente produtiva.
Para evitar a duplicação da planta de moagem e redução, o minério do Espírito Santo era tratado
em Morro Velho.

Ele era primeiro quebrado em pedaços de aproximadamente 2 cm e depois transportado em


caçambas pelo teleférico aéreo para a usina de tratamento de Morro Velho.

O teleférico entregava 120 caçambas por hora, cada uma carregando cerca de 470 quilogramas de
minério.

Figura 107 - O teleférico de Morro Velho

A Figura 68 mostra na cor verde o trecho de chegada das caçambas do teleférico provenientes de
Raposos nas instalações de superfície da Morro Velho.

Depois de esvaziadas em Nova Lima as caçambas retornavam para Raposos para novo enchimento.

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A Primeira Guerra Mundial, 1914 - 1918
"Em 1914, com o início da guerra na Europa, suprimentos da Inglaterra, que eram críticos para as
operações de mineração, tornaram-se mais difíceis de serem obtidos à medida que a guerra de
submarinos se intensificava através do Atlântico Norte e o racionamento tornou-se essencial na
Inglaterra. Pela primeira vez, a St. John começou a recorrer aos Estados Unidos para comprar peças
e máquinas. O Brasil também sentiu os choques econômicos causados pela guerra e, para estabilizar
o sistema monetário, o governo embargou as remessas de ouro. A companhia começou a vender
seu ouro no Rio de Janeiro. Quando o governo brasileiro suspendeu o embargo, a St. John decidiu
enviar o ouro para Nova York para evitar os riscos de transportá-lo nas águas infestadas de
submarinos do Atlântico Norte Europeu.

A guerra também impactou profundamente a comunidade britânica em Morro Velho. No início das
hostilidades na Europa, a comunidade britânica contava com mais de 300 pessoas, com cerca de
metade desse número empregado pela companhia. Muitos dos funcionários e seus familiares
estavam com a companhia desde meados do Século XIX, resistindo aos tempos difíceis após os dois
grandes acidentes. A entrada da Inglaterra na Grande Guerra reacendeu as chamas do patriotismo
entre os recém-chegados e veteranos e um grande número de jovens ingleses deixou Morro Velho
e se inscreveu como voluntário para o serviço militar, drenando a St. John de pessoal valioso e
altamente treinado.

A diretoria conseguiu convencer o governo britânico a isentar os funcionários da Morro Velho do


serviço de guerra, alegando que a mina e seu ouro eram recursos vitais para o esforço aliado na
Europa. No entanto, os jovens empregados não puderam ser contidos e um bom número deles
partiu para a Grã-Bretanha. No final da guerra, a escassez de mão-de-obra qualificada tornou-se
tão dramática que a diretoria esteve perto de fechar a mina até o fim do conflito. Apesar da escassez
de suprimentos e pessoal, a St. John d’El Rey conseguiu se manter de pé durante os anos de guerra."
(Eakin, 1989)

Alexander George North, A.G.N.


"Em 1917 George Chalmers completou 70 anos de idade e 33 anos como superintendente da mina
de Morro Velho. Ele estava preparando o mais velho de seus dois filhos para substituí-lo.

A. G. N. Chalmers e seu irmão mais novo, J. W. P. Chalmers (Alexander e William), frequentaram


internatos na Inglaterra e, em seguida, seguindo os passos de seu pai, foram treinados como
engenheiros.

J. W. P., com a ajuda de seu pai, tornou-se sócio da Rooper & Chalmers, uma companhia de
engenharia de consultoria da St. John na Inglaterra.

A. G. N. retornou a Morro Velho após a guerra e tornou-se assistente de seu pai com o respaldo da
diretoria. Aos poucos, ele assumiu as operações diárias da mina, enquanto seu pai passava cada vez
mais tempo em sua fazenda da Jaguara.

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Em 1924, o 40º aniversário de sua entrada na companhia, George Chalmers tornou-se gerente geral
nas minas, e seu filho superintendente. Dois anos depois, A. G. N. assumiu o controle total e seu pai
tornou-se engenheiro consultor no Brasil.

Um problema cardíaco enfraqueceu George Chalmers em 1927 e, por recomendação de sua família,
ele partiu para a Inglaterra no início de 1928 para tratamento médico. Pouco depois de chegar à
Inglaterra, em fevereiro, ele desmaiou e morreu de insuficiência cardíaca.

A. G. N. Chalmers assumiu o posto de seu pai, mas não pôde fazer jus às suas notáveis realizações."
(Eakin, 1989).

Aparentemente a diretoria não se sentiu confortável em confrontar George Chalmers que indicou
seu filho para substituí-lo e relevou o nepotismo. Afinal George Chalmers tinha prestado inestimáveis
serviços à companhia por 40 anos, tinha preparado o garoto para substituí-lo, A.G.N. tinha se
graduado em engenharia na Inglaterra e o seu pai continuaria como consultor da companhia e
estaria a orientar o novo superintendente.

"Uma grave escassez de mão-de-obra continuou a conter a produção, o estilo gerencial de A. G. N.


aparentemente produziu conflitos entre os funcionários que compunham a sua equipe e os diretores
da companhia procuraram meios de retirar a mina de seu desânimo operacional.

Amargurado por brigas internas na companhia, críticas crescentes sobre o seu modo de conduzir os
assuntos e confrontado com uma diretoria cada vez mais hostil, A. G. N. renunciou em 1930. A sua
volta para a fazenda de seu pai e para a vida de fazendeiro marcou o fim da era Chalmers." (Eakin,
1989)

A. H. Millett, 1930 - 1940


"Arthur H. Millett tinha vindo para Morro Velho em 1912 e assumira o cargo de gerente de negócios
no final da década de 1920. Em 1930 a diretoria escolheu Millett para substituir A. G. N. Chalmers no
comando da mina e, junto com a nação, a St. John entrava em uma nova e tumultuada era: os anos
1930.

A década de 1920 marcou um período de transição para a St. John, quando ela saiu da era Chalmers
e entrou na tumultuada década de 1930.

As operações da companhia expandiram-se de forma sem precedentes sob a orientação astuta de


Millett. Essa expansão exigiu, em primeiro lugar, uma reorganização fundamental da gestão da
companhia no Brasil.

Dois superintendentes adjuntos cuidavam das operações de mineração: um deles assumiu o


comando dos trabalhos subterrâneos, enquanto o outro cuidava das operações na superfície. Pela
primeira vez desde a década de 1880, o superintendente (Millett) não tinha formação técnica em
mineração e, pela primeira vez na história da companhia, um engenheiro de mineração assumia o
controle da mina." (Eakin, 1989)

Millett continuou a gerenciar os negócios da companhia e contou com seus assistentes para
aconselhamento na parte técnica das operações da companhia. Conforme se percebe pelos eventos
narrados sob o título E la nave va ... as, ocorrências de 1930 em diante ocorreram na era Millett.

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Figura 108 - Organograma na administração Millett

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Antecedentes do fim da St. John
"Os anos 1930 marcaram o 100° aniversário da chegada da St. John ao Brasil ocorrida em 1835. À
medida que a companhia entrava em seu segundo século de operações no Brasil, ocorreram
mudanças fundamentais que alterariam profundamente o futuro da companhia.

Em outubro de 1930, poucos meses após Millett assumir o controle, uma revolta liderada por Getúlio
Vargas derrubou a Primeira República, encerrando quatro décadas de supremacia política dos
Estados de São Paulo e Minas Gerais, que dominavam o sistema político nacional. Políticos mineiros
e paulistas manipulavam o sistema eleitoral, alternando destarte a presidência entre os
representantes dos interesses da aliança "café com leite"." (Eakin, 1989)

O sindicato dos mineiros, 1934


"A revolução de 1930 inaugurou uma era de política de massas personificada pelo carismático
Vargas, que governaria o Brasil pelos próximos 15 anos, os 8 últimos deles como ditador. 27 Como
em várias nações europeias e latino-americanas na década de 1930, a classe trabalhadora emergiu
como uma nova força política. Vargas entendeu o crescente poder da classe trabalhadora e, como
Perón na Argentina e Cárdenas no México, ele habilmente organizou a mão de obra como uma fonte
potente de apoio em massa. Imitando a Carta Del Lavoro, do italiano Mussolini, ele conquistou a
classe trabalhadora proporcionando-lhe benefícios sociais básicos: salário mínimo, carga horária
máxima, previdência social e regulação sanitária. Essa revolução reverberou em todo o Brasil e
transformou a vida em Nova Lima. Para o desespero e o desapontamento da Saint John d'el Rey, o
novo Ministério do Trabalho do governo reconheceu oficialmente o sindicato que os mineiros da
área de Nova Lima formaram em 1934.

Em questão de meses, a companhia viu décadas de esforços antissindicalistas irem por água abaixo.
Os últimos esforços para formar uma oposição ao sindicato, que poderia ser manipulada pela
companhia, formada pelos chamados "pelegos" 28, falharam miseravelmente.

A formação do sindicato dos mineiros e a nova legislação social trouxeram mudanças fundamentais
na comunidade. Em primeiro lugar, o sindicato finalmente proporcionou aos trabalhadores
brasileiros uma voz unificada e poderosa para enfrentar a administração da companhia. Em segundo
lugar, a legislação social completou uma transformação que vinha gradualmente tomando forma na
metade do século anterior. A legislação forneceu aos mineiros fortes incentivos para se tornarem
funcionários da companhia em tempo integral durante todo o ano e abandonar os padrões sazonais
de trabalho. Ao tornar a mineração uma carreira em tempo integral, os trabalhadores tiveram acesso
aos novos benefícios sociais e às vantagens acumuladas da antiguidade. Como resultado, o trabalho
sazonal diminuiu rapidamente e a força de trabalho da mina tornou-se mais estável. Em meados da

27
Vargas voltaria ao poder, eleito pelo voto direto, em 1951, e governaria até 24 de agosto de 1954,
quando se suicidou.
28
Pelego era o líder sindical de confiança do governo ou dos patrões que garantia o atrelamento da
entidade ao Estado ou à companhia. A palavra designa a pele ou o pano que amacia o contato entre
o cavaleiro e a sela e virou sinônimo de traidor dos trabalhadores e aliado do governo e dos patrões.

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década de 1940, a maioria dos funcionários da companhia estava na folha de pagamento há pelo
menos uma década. Ironicamente, a nova legislação social tinha finalmente produzido a exata
situação que a companhia tinha buscado alcançar por tantas décadas em vão: a formação de uma
força de mineração estável, qualificada e adequada." (Eakin, 1989)

Vargas e o nacionalismo econômico


"A Grande Depressão da década de 1930 destruiu a economia de exportação de café da Primeira
República. Vargas também perseguiu uma política de forte nacionalismo econômico. Ele recorreu ao
protecionismo e às restrições fiscais e se afastou das políticas econômicas mais liberais da era
republicana.

Essa mudança determinou a adoção de medidas defensivas radicais. Diante da queda drástica das
exportações de café, da queda das receitas e do esgotamento das reservas de ouro no Tesouro, os
líderes brasileiros formularam políticas voltadas para o corte das importações, a promoção de
indústrias que produziam substitutos locais e buscavam formas de reverter o fluxo de moeda forte
para fora do país.

Projetadas para proteger a economia brasileira, essas políticas puniram severamente as companhias
estrangeiras que, como a St. John, importavam grandes quantidades de materiais essenciais. Tarifas
mais altas sobre suprimentos vitais (produtos químicos, máquinas, peças de reposição) aumentaram
os custos operacionais e obrigaram a companhia a buscar fornecedores nacionais.

As restrições cambiais do novo regime causaram um golpe ainda mais punitivo. A fim de conter o
fluxo de remessa de lucros para investidores estrangeiros, e para deter a saída de moeda forte, o
governo brasileiro passou a limitar as transações cambiais e as remessas de lucros.

O governo começou a comprar o ouro da companhia durante a Primeira Guerra Mundial e continuou
essa prática até a década de 1930. Com o governo controlando as vendas de ouro, as novas restrições
criaram problemas de câmbio para a companhia.

As vendas de ouro representavam praticamente toda a receita da companhia. O governo brasileiro


limitou efetivamente as remessas de lucros pagando pelo ouro com uma mistura de moeda local e
libra esterlina. As novas regulamentações limitaram as remessas de libras esterlinas a um terço do
valor das vendas de ouro e o governo pagava a companhia em moeda local pelos dois terços
restantes do valor do ouro.

Funcionários da companhia fizeram intensa pressão para reverter as novas regulamentações, indo
falar com o próprio Vargas, sem sucesso. O astuto Vargas colocou as necessidades nacionais acima
de sua visão favorável ao trabalho da companhia.

Felizmente, para a St. John, essa nova intervenção ousada do Estado coincidiu com um salto abrupto
no preço mundial do ouro de US$ 20,67 para US$ 35,00 a onça em 1934. As receitas mais altas do
aumento do preço do ouro e um superávit acumulado da moeda brasileira que não poderia ser
convertido em libra esterlina criaram uma situação peculiar em Morro Velho.

A companhia foi capaz de manter os níveis anteriores de lucros e dividendos, mas não conseguiu
elevar a produção a níveis ainda mais altos sem criar superávits ainda maiores e, ao mesmo tempo,
correr o risco de enfrentar novas dificuldades de remessa com as autoridades fiscais do governo.

Página | 216
Os lucros continuaram a fluir para a Inglaterra em um ritmo constante. A moeda excedente, no
entanto, teve que ser colocada em uso, e a companhia embarcou em um programa de
reinvestimento maciço. Esse reinvestimento e o uso de fornecedores nacionais, é claro, foram
exatamente o que as políticas econômicas protecionistas tinham sido projetadas para produzir.

Durante a década de 1930, a companhia iniciou uma série de projetos de construção que consumiam
o excedente cambial e, ao mesmo tempo, tais projetos proporcionavam à companhia e à
comunidade valiosas melhorias de capital.

A companhia começou a reabrir antigas minas no entorno e iniciou uma segunda grande operação
de mineração em Raposos a cerca de 8 quilômetros de Morro Velho. Durante esses anos, a St. John,
capitaneada por A. H. Millett, concluiu a fase final do plano hidrelétrico de George Chalmers,
construindo três grandes barragens no Rio Peixe, ao sul de Nova Lima. Outro grande projeto foi a
construção de duas mil unidades habitacionais para os trabalhadores brasileiros. A administração
esperava que moradias baratas e subsidiadas atraíssem trabalhadores para Nova Lima." (Eakin, 1989)

1940, uma década de greves


"A expansão fenomenal da St. John d’El Rey durante a Grande Depressão mascarou as tensões
domésticas e internacionais que finalmente eclodiram na década de 1940, sacudindo os alicerces da
companhia. A primeira dessas forças foi a ascensão de um movimento operário vocal e militante. O
sindicato sancionado pelo governo ganhou força na década de 1930 e na década de 1940 iniciou
uma série de longas e caras greves que contribuiriam para o fim da companhia britânica.

A inflação desenfreada nos anos pós-guerra aumentou os custos da companhia e fez com que os
trabalhadores passassem a exigir salários cada vez maiores. Enquanto a inflação avançava, a taxa de
câmbio oficial permanecia fixa em relação ao dólar de 1940 a 1945, e novamente de 1947 a 1952. A
desvalorização da libra esterlina em 30% em relação ao dólar — e, portanto, em relação ao cruzeiro
— em 1949 prejudicou ainda mais a St. John ao aumentar seus custos.

O sindicato gradualmente ficou sob a influência de líderes anti-imperialistas, anticapitalistas, muitos


vindos das fileiras do Partido Comunista do Brasil, que vinha construindo uma base em Nova Lima
desde o início da década de 1930. Com a crescente força do nacionalismo brasileiro e a disparidade
entre a administração estrangeira e a classe trabalhadora brasileira, a liderança sindical não teve
dificuldade em conseguir a adesão do operariado. Além disso, funcionários do governo nacionalista
e pró-trabalhista pressionaram a companhia a adotar padrões de segurança mais rigorosos,
melhores condições de trabalho e serviços sociais mais abrangentes.

Em retrospectiva, aparentemente a St. John cometeu dois erros cruciais.

Primeiro, a administração não conseguiu abrasileirar a equipe gerencial, ou seja, seu staff, de forma
significativa. Chalmers havia defendido a necessidade de integrar brasileiros proeminentes em
posições de visibilidade e trazer mais brasileiros para cargos de responsabilidade nas operações da
companhia. No entanto, já na década de 1950, os níveis superiores da administração da companhia
no Brasil, com a exceção dos advogados, eram quase inteiramente formados por britânicos.

A St. John formou um "conselho consultivo" de brasileiros proeminentes, mas fez isso somente em
meados da década de 1950 e com o único objetivo de tentar combater o nacionalismo crescente

Página | 217
por meio de lobby. O fracasso em contratar brasileiros também dificultou o desenvolvimento da
nação. Se a St. John tivesse contratado engenheiros brasileiros – e a Escola de Minas de Ouro Preto
formava muitos deles – e técnicos, a formação prática e a transferência de "know-how" tecnológico
teriam sido inestimáveis no crescimento da economia mineira.

Em segundo lugar, a companhia decidiu lutar contra os regulamentos sindicais e governamentais a


cada novo passo dado ao longo do percurso e o confronto logo se tornou uma rotina. Trabalhadores
e funcionários do governo nacionalista criticavam continuamente a St. John em questões de
segurança, condições de saúde e benefícios sociais, mesmo quando os salários e os custos
operacionais aumentavam drasticamente.

O salário médio diário (incluindo bônus e horas extras) subiu mais de 400% entre 1935 e 1950,
acompanhando o aumento do custo de vida em Nova Lima. Táticas de confronto da companhia
resultaram em prolongadas greves e em uma publicidade desfavorável exacerbada pelo crescente
nacionalismo no Brasil. As greves puniram severamente a companhia, encerrando a produção por
semanas.

A produtividade geral por trabalhador havia iniciado um lento crescimento na década de 1940, mas
a produtividade da força da mina subterrânea vinha diminuindo. A administração poderia reduzir o
pessoal acima do solo, e assim aumentar a produtividade geral, mas o destino da companhia
dependia da capacidade da força subterrânea de tirar o minério do solo e levá-lo para a superfície.
A produtividade subterrânea era, portanto, o coração das operações e da rentabilidade.

De 1915 até o início da Segunda Guerra Mundial, em 1939, o custo da tonelada moída em Morro
Velho variou muito pouco, oscilando entre 47 e 56 s (xelins). Entre 1940 e 1954, esse custo subiu de
51 s (xelins) para 92 s (xelins) por tonelada, um aumento de pouco mais de 80%. Mais impressionante
ainda foi o aumento do custo de mão de obra por tonelada, de 32 s (xelins) em 1940 para 79 s (xelins)
por tonelada em 1954, um aumento de quase 150%! Em suma, os custos de mão de obra por
tonelada superaram o custo da tonelada moída na proporção de quase dois para um de 1940 a
1954." (Eakin, 1989)

Enquanto isso ... nas Florestas de Bretton


Claramente, o tempo e a receita perdidos com greves abalaram a estabilidade financeira da St. John
d’El Rey, produzindo os primeiros meses de déficits do Século XX. Em meados da década de 1950, o
investimento outrora estável havia se tornado um empreendimento arriscado. As forças
internacionais afetaram ainda mais as operações da companhia. A Primeira e a Segunda Guerras
Mundiais criaram problemas de abastecimento e escassez de materiais, mas esses obstáculos foram
temporários. Sublata causa, tollitur effectus.

Em 1944, o Hotel Mount Washington, nas Florestas de Bretton, New Hampshire, Estados Unidos,
abrigou uma conferência monetária e financeira das Nações Unidas que mudaria o curso da história
da St. John. O sistema monetário internacional implantado nessa Conferência de Bretton Woods,
quando a Segunda Guerra Mundial ainda estava em curso, impactou de forma abrangente e
fundamental a indústria mundial de mineração de ouro.

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"Acordos internacionais congelaram o preço do ouro em US$ 35 a onça, nível em que permaneceria
até o final da década de 1960 29. A receita por unidade de produção agora tinha um teto fixo, e
poucas minas de ouro em qualquer lugar do mundo poderiam operar mantendo os custos abaixo
desse nível. O estreitamento da diferença "preço de venda menos custo de produção" fechou minas
de ouro em todo o mundo. Combinado com a inflação, e a onda de longas greves, o congelamento
do preço do ouro marcou o fim da prosperidade britânica em Morro Velho. Em meados da década
de 1950, apenas medidas drásticas poderiam manter a companhia operando com lucro.

Além disso, a planta implementada por Chalmers na virada do Século XIX para o XX tinha se tornado
obsoleta. A companhia precisava desesperadamente de um novo e profundo shaft para os níveis
mais baixos da mina para acelerar o manuseio de minério e reduzir o tempo gasto na viagem até a
superfície ao longo de vários shafts e horizontes. Os trabalhadores gastavam uma hora para ir da
entrada até os níveis mais baixos da mina!" (Eakin, 1989)

O Plano Canadense de G. P. Wigle, 1953 - 1954


"Justamente na hora em que a companhia mais necessitava de recursos para renovar e investir em
novas melhorias de capital, a St. John estava também enfrentado uma severa crise financeira. O
acúmulo de problemas obrigou a diretoria a buscar drásticas mudanças gerenciais na mina. Após
contratar vários consultores externos para estudar a situação, a diretoria contratou um engenheiro
de minas canadense, G. P. Wigle, que tinha revitalizado várias minas de ouro no Canadá antes de vir
para Morro Velho em 1946 como superintendente adjunto. Wigle assumiu como superintendente
em 1953, começou a trabalhar em um novo shaft profundo até o fundo da mina e prontamente
demitiu um grande número de funcionários britânicos do alto escalão. Esse novo shaft foi apelidado
de "Maracanã", em homenagem ao enorme estádio de futebol construído no Brasil em 1950 para
sediar a Copa do Mundo.

Wigle instituiu uma nova política trabalhista que enfatizava a produtividade dos trabalhadores e
propiciava incentivos para o trabalho estável e eficiente. Todavia o chamado "Plano Canadense"
falhou, porquanto os trabalhadores continuavam a lutar contra a administração por benefícios e
salários mais altos e o acúmulo de problemas financeiros forçou a suspensão do novo shaft.

Wigle deixou Morro Velho frustrado e derrotado após um ano como superintendente. Junto com ele
lá se foi a última chance de sobrevivência da St. John. Sem o investimento continuado em novas
tecnologias para aumentar a produtividade diante do aumento dos custos, a empresa estava
condenada ao fracasso." (Eakin, 1989)

Ironicamente o Brasil foi derrotado na final da Copa do Mundo de 1950 pelo Uruguai no recém
construído e lotado Maracanã e o shaft Maracanã de Wigle não foi adiante. Dois "Maracanazos".

29
O Acordo de Bretton Woods durou até 15 de agosto de 1971, quando os Estados Unidos,
unilateralmente, acabaram com a convertibilidade do dólar em ouro, o que efetivamente levou o
sistema de Bretton Woods ao colapso e tornou o dólar uma moeda fiduciária.

Página | 219
No período analisado 1935 – 1960, os seguintes superintendentes assumiram depois de G. Chalmers:

A.G.N. Chalmers 1924 – 1930


A.H. Millet 1930 – 1940
Eric Davies 1940 – 1948
W.R. Russell 1948 – 1953
G.P. Wigle 1953 – 1954
A.L. Yarnell 1954 – 1955
H.C. Watson 1955 – 1956
D. Kochersperger 1957 – 1964

As reservas de ferro
"Na década de 1950, a St. John havia se tornado a maior proprietária de terras da região central de
Minas Gerais. Eram mais de 260 km2 de propriedades. Chalmers vinha estudando há tempos a
situação do minério de ferro no Brasil e esperava utilizar as enormes reservas brasileiras tanto para
exportação quanto para a fabricação de ferro e aço.

A Serra do Curral entre Belo Horizonte e Villa Nova de Lima formava o limite noroeste da propriedade
original de Morro Velho e continha milhões de toneladas de hematita de alto grau com mais de 60%
de teor de ferro. Chalmers explorou esses depósitos, conhecidos como Águas Claras, e adquiriu
terras adicionais de minério de ferro ao sul perto de Itabirito.

Com frequência ele pressionava a diretoria para desenvolver essas terras, mas obteve pouco sucesso.
Embora os diretores da companhia tivessem concedido permissão a Chalmers para começar a
comprar terras de ferro em 1902, eles assistiam às suas compras e planos com pouco entusiasmo.

A diretoria da St. John pouco valorizava a exploração da mineração de minério de ferro, enquanto a
mineração de ouro em Morro Velho florescia. Além disso, os problemas de transporte do minério de
ferro para a costa e os mercados externos dificultavam a exploração dessas enormes reservas até a
década de 1950.

Os sonhos de minério de ferro de Chalmers nunca se materializaram enquanto ele viveu, mas ele se
mantém como um pioneiro nesses esforços. Vários estudos preliminares sobre a viabilidade
econômica da produção de aço, tanto por fundição elétrica quanto usando carvão, foram realizados
pela St. John d’El Rey na primeira década do Século XX. Para desânimo de Chalmers, a companhia
optou por não prosseguir com a produção de ferro e aço." (Eakin, 1989)

Página | 220
-

-400.000
-300.000
-200.000
-100.000
100.000
200.000
300.000
1901 400.000
1902
1903
1904
1905
1906
1907
1908
1909
1910
1911
1912
1913
1914
1915
1916

Figura 109 - Lucros e prejuízos da St. John: 1901 - 1956


1917
1918
1919
1920
1920
1921
1922
1923
1924
1926
1927
1927
1929
1929
1930
1931
Libras Esterlinas (£)

1932
1933
1934
1935
1936
1937
1938
1939
1940
1941
1942
1943
1944
1945
1947
1947
1948
Anos de greves

1949
1950
1944 - Bretton Woods

1951
1952
Ouro tabelado US$35/onça

1954
1954
1956
Página | 221
O inesperado fim da era britânica
"O fim da era britânica em Morro Velho veio de forma rápida e inesperada no final da década de
1950.

A longa década de crise financeira (Figura 109) e problemas trabalhistas erodiu gradualmente o valor
das ações da companhia na Bolsa de Valores de Londres e um grupo de astutos investidores norte-
americanos comprou um volume de ações que lhes deu o controle da companhia em 1957.

Esses investidores, liderados pelo corretor novaiorquino Leo Model, não tinham o menor interesse
em comprar uma mina de ouro. Eles tinham seus olhos nas enormes e ainda não desenvolvidas
reservas de minério de ferro que Chalmers tinha perseguido atentamente 50 anos atrás.

A indústria mundial de ferro e aço tinha emergido nos anos pós guerra e Model esperava encontrar
um comprador para essas imensas reservas. " (Eakin, 1989

Página | 222
O espólio de Morro Velho
Minerações Brasileiras Reunidas – MBR
"Model e seus sócios venderam as terras contendo ferro para a Hanna Mining Company de
Cleveland, Ohio, Estados Unidos, em 1960, e esta última começou uma longa batalha com o governo
brasileiro para extrair e exportar o minério de ferro. A Hanna e um empresário brasileiro do ramo de
mineração, Augusto Azevedo Antunes, usaram os direitos de lavra da St. John d’El Rey para formar
uma empresa multinacional. Em essência, a St. John d’El Rey se tornou uma companhia que existia
apenas no papel, através da qual a subsidiária brasileira da Hanna, Minerações Brasileiras Reunidas
– MBR, explorou as imensas reservas ao sul de Belo Horizonte de Águas Claras, Mutuca e Itabirito. A
Hanna fechou o escritório da St. John em Londres e mudou todas as operações para Cleveland,
encerrando destarte os 130 anos da companhia britânica no Brasil.

Mineração Morro Velho S. A.


No final dos anos 1950 e início dos anos 1960 o governo brasileiro subsidiou a Morro Velho, através
do preço de compra do ouro, pois temia os efeitos sociais e econômicos que a desativação da mina
poderia causar na cidade de Nova Lima. Temerosos de assumir os problemas decorrentes do
fechamento da mina, Model e a Hanna praticamente a deram de presente para um engenheiro de
minas brasileiro, Fernando Mello Viana, filho de um aliado político de George Chalmers na década
de 1920. Mello Viana se associou a um editor de jornal, Horácio de Carvalho, e a um banqueiro,
Walter Moreira Salles, em meados dos anos 1960. A companhia passou a se chamar Mineração Morro
Velho S. A." (Eakin, 1989)

Anglo American
Em 1975, os três venderam 49% de participação na mina para a Anglo American Corporation da
África do Sul, a maior companhia de mineração de ouro do mundo, da qual a famosa mineradora de
diamantes De Beers é uma afiliada. Em 1980 a Siderúrgica Hime S.A., pertencente à Anglo American
e à Bozano, Simonsen de São Paulo, comprou as demais ações de Carvalho e de Moreira Salles.

1984, o 150° aniversário de Morro Velho


Em 1984, ao completar 150 anos, a Mina de Morro Velho estava dividida em duas seções principais,
constituindo-se em duas minas administrativamente distintas: a Mina Velha, até a profundidade de
550 metros, e a Mina Grande, em continuação à primeira, até a profundidade de 2.453 metros, e, em
função de trabalhos desenvolvidos nos últimos anos, as duas seções – Mina Velha e Mina Grande –
estavam interligadas.

O conjunto de minas então lavradas em Minas Gerais era formado pelas minas Grande; Velha;
Raposos, com dois corpos mineralizados principais: Espírito Santo e Mina Grande; Faria, a 5,5 km ao
sul da Mina Grande; Bicalho, a 1 km a leste da Mina do Faria; Cuiabá, no município de Sabará, a 31
km de Nova Lima, e as minas menores de Bela Fama e Esperança.

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Minorco
Em 1996, a Anglo American transferiu seus ativos brasileiros para o seu braço europeu, Minorco. A
Minorco criou a Minorco Gold para controlar seus ativos de ouro.

AngloGold
Em 1999, a AngloGold adquiriu todos os ativos de ouro da Minorco e se instalou no Brasil.

AngloGold Ashanti
Em 2004 ocorreu a fusão entre a AngloGold – Morro Velho e a companhia africana Ashanti Goldfields
e a companhia resultante dessa fusão passou a se chamar AngloGold Ashanti.

Figura 110 - Sucessores da St. John

Página | 224
Estatísticas
Uma primeira dificuldade encontrada na apuração dos dados estatísticos foi o descompasso entre o
período de 12 meses de apuração de resultados utilizado pela Saint John e o ano calendário (1° de
janeiro a 31 de dezembro).

No princípio o período de apuração de resultados utilizado pela St. John ia de março de um ano a
fevereiro do ano seguinte; depois esse período passou a ser de março de um ano a março do ano
seguinte; depois de abril de um ano a abril do ano seguinte. Em nenhum momento houve
coincidência do período de apuração contábil com o ano calendário. Esses dois períodos sempre
estiveram defasados.

Para lidar com isso, uma vez que não se dispunha de todos os relatórios anuais da companhia, os
valores foram alocados ao ano com o maior número de meses. Por exemplo, as estatísticas de março
do ano X a fevereiro do ano X+1 foram alocados no ano X, que compreende o maior número de
meses (10 X 2).

Além do aspecto acima relatado, a St. John utilizava como unidade de medida para o ouro a oitava.
A julgar pelo nome, tratava-se de uma oitava parte (1/8) de uma unidade maior, provavelmente a
onça (ounce). Como existem duas onças, a troy e a avoirdupois, poder-se-ia imaginar que fosse a
onça troy (troy ounce) por ser a unidade utilizada na pesagem de metais preciosos. Mas, não. A
oitava não é 1/8 da onça troy nem da onça avoirdupois. A oitava em questão é um outro tipo de
animal; a oitava portuguesa.

Os fatores de conversão são os seguintes:

1 oitava (portuguesa) = 3,356 gramas = 0,1153 onça troy = 0,0096 libra troy

A oitava era a unidade utilizada pelas autoridades brasileiras para tributar o ouro.

As estatísticas fornecidas pela obra de Douglas C. Libby foram muito valiosas, porém elas só
abrangem o período imperial, ou seja, o período de operação da Mina Velha e vão até 1885.

Marshall Eakin fez a gentileza de me ceder as suas anotações referentes aos dados de produção de
minério e ouro compreendendo todo o período, isto é, até 1958. Os números de Eakin estão
aderentes aos números de Libby.

Os gráficos de George Chalmers apresentam muitas informações estatísticas importantes, mas eles
têm dois inconvenientes: (a) não existem tabelas com valores numéricos e, portanto, a leitura gráfica
dos números não é precisa; (b) ele também não registrou a informação mais importante: a produção
de ouro. Chalmers só tratou da produção de pedras de minério.

Ao longo do texto há várias tabelas com dados estatísticos que ilustram a discussão em curso
naquele momento.

Assim, as informações fornecidas neste capítulo contêm apenas os valores anuais das tonelagens de
minério extraído e britado e da produção de ouro em quilogramas (kg) no período analisado por
este livro.

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Tabela 22 - Produção de minério e ouro – 1834 - 1958

Anos Ouro Minério, t Anos Ouro Minério, t


kg Extraído Britado kg Extraído Britado
1834 1865 1.872,27 78.883 59.607
1835 98,43 1866 2.230,89 107.087 60.685
1836 99,70 1867 1.500,85 98.905 68.886
1837 150,11 9.625 1868 471,10 50.545 61.994
1838 216,85 15.830 1869 484,24 51.861 54.102
1839 228,93 17.898 1870 426,44 46.901 46.582
1840 275,78 20.809 1871 450,07 52.670 52.310
1841 254,40 21.015 1872 87,71 15.028 14.948
1842 332,57 31.133 23.583 1873 276,48 8.664 8.214
1843 458,40 28.244 24.580 1874 1.295,95 38.321 38.941
1844 446,20 27.552 29.267 1875 2.210,78 63.693 62.474
1845 460,84 29.815 32.027 1876 1.577,09 66.127 63.058
1846 554,32 38.366 34.936 1877 1.741,69 67.915 66.976
1847 629,11 40.859 40.238 1878 1.502,67 69.954 69.548
1848 825,24 61.672 58.123 1879 1.368,34 62.681 63.540
1849 969,94 67.336 69.004 1880 893,94 46.169 45.564
1850 999,24 67.106 64.313 1881 1.071,37 67.463 63.939
1851 1.162,83 79.810 81.630 1882 838,47 72.496 70.142
1852 1.268,55 82.642 81.236 1883 712,58 69.254 64.940
1853 1.336,39 85.698 86.866 1884 811,90 61.230 60.065
1854 1.306,80 86.048 86.434 1885 867,91 59.886 58.442
1855 1.240,83 87.297 86.848 1886 -
1856 1.101,81 89.877 87.427 1887 87,51 18.957 18.560
1857 936,81 86.407 86.335 1888 44,76
1858 1.024,19 88.901 87.270 1889 53,10
1859 1.302,45 88.968 82.880 1890 43,60
1860 1.535,36 91.361 74.528 1891 57,37
1861 1.949,43 96.612 71.902 1892 76,19
1862 1.897,63 90.896 67.508 1893 272,36
1863 1.706,91 84.759 65.697 1894 1.090,11
1864 888,09 65.435 62.147 1895 1.219,21 72.894 58.868

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Continuação da Tabela 18 – Produção de minério e ouro – 1834 - 1958

Anos Ouro Minério, t Anos Ouro Minério, t


kg Extraído Britado kg Extraído Britado
1896 1.491,73 1927 2.810,78 153.187 148.900
1897 2.495,79 92.539 82.761 1928 3.034,87 157.237 153.100
1898 2.742,50 122.755 93.231 1929 3.386,42 169.454 164.800
1899 2.854,38 133.530 120.465 1930 3.830,62 210.579 202.500
1900 2.467,10 152.238 140.855 1931 3.591,49 230.572 221.800
1901 2.323,66 158.048 147.742 1932 3.396,46 246.963 237.000
1902 2.481,44 158.923 143.178 1933 3.293,71 241.902 232.000
1903 2.504,39 156.158 148.346 1934 3.012,22 251.458 240.500
1904 2.730,68 160.317 150.156 1935 3.180,78 295.515 288.544
1905 2.294,98 157.743 148.280 1936 3.432,38 293.933 284.404
1906 2.797,00 145.168 139.040 1937 3.527,66 375.333 347.900
1907 2.897,41 156.459 151.426 1938 3.481,82 374.889 353.500
1908 2.983,47 177.807 170.200 1939 3.575,30 407.728 383.000
1909 2.811,35 185.837 181.000 1940 3.526,51 438.586 410.486
1910 2.954,78 193.195 189.600 1941 3.460,50 440.658 413.700
1911 2.676,52 196.310 192.600 1942 3.898,18 471.991 363.600
1912 2.797,00 174.756 172.208 1943 4.072,35 391.397 361.700
1913 3.083,87 175.823 174.000 1944 4.314,50 391.360 345.400
1914 3.332,38 199.234 191.500 1945 4.121,97 368.666 326.100
1915 3.407,71 201.552 192.500 1946 3.596,35 344.991 325.900
1916 3.438,73 198.586 187.400 1947 3.575,40 340.297 316.700
1917 3.418,81 185.274 180.300 1948 3.397,82 320.099 328.900
1918 3.106,35 167.854 165.000 1949 3.052,28 330.077 370.000
1919 3.282,50 170.827 166.000 1950 3.392,47 372.670
1920 3.057,76 151.299 146.800 1951 3.518,52 400.211
1921 3.788,64 169.234 167.200 1952 3.523,00 381.546
1922 3.487,50 160.623 157.500 1953 2.965,97 311.987
1923 3.313,96 162.275 158.200 1954 3.122,97 316.773
1924 2.854,89 142.668 140.200 1955 2.902,26
1925 2.209,45 117.389 115.000 1956 3.353,00
1926 2.790,91 143.392 139.900 1957 3.193,02
1958 1.287,32

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Produção de Minério, t
500.000

450.000

400.000

350.000

300.000

250.000

200.000

150.000

100.000

50.000

-
1835 1855 1875 1895 1915 1935 1955

Extraído Britado

Figura 111 - Produção de minério extraído e britado (t) – 1835 - 1955

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Produção de Ouro, kg
5.000

4.500

4.000

3.500

3.000

2.500

2.000

1.500

1.000

500

-
1835 1855 1875 1895 1915 1935 1955

Figura 112 - Produção de ouro (kg) – 1835 - 1955

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Presidentes (Chairmen)
No período coberto por essa narrativa (1830 – 1960) a companhia teve 8 presidentes (chairmen of
the board). Os 2 últimos (Isidore Kerman (1957-1958) e Leo Model (1958-1960) não constam da
figura abaixo.

Figura 113 - Presidentes da St. John

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Figura 114 - Breve história da mina de Morro Velho

Página | 231
Figura 115 - Presidentes (Chairmen) e Superintendentes da St. John

Página | 232
A mão de obra em Morro Velho
A força de trabalho sempre foi um importante fator de produção na atividade de mineração,
juntamente com a água como fonte de energia e a madeira para escorar as paredes internas da mina.
Sem o emprego de trabalhadores braçais teria sido impossível romper as pedras no interior da mina
e trazê-las para a superfície, sem falar do trabalho executado na superfície.

"Embora George Chalmers tenha revolucionado o sistema tecnológico em Morro Velho, um aspecto
das operações se recusava a se adequar aos seus planos: a mão de obra. Ao longo da história da
companhia, o recrutamento e a manutenção de uma mão de obra adequada e treinada frustrou
continuamente a companhia.

George Chalmers dizia que o minério de Morro Velho era de boa qualidade, mas não era excepcional.
Segundo ele, para ser lucrativa a mina deveria produzir em larga escala. Assim, havia necessidade de
retirar e trazer para a superfície grande quantidade de pedra do subsolo e, em seguida, quebrá-la
em pedaços cada vez menores até reduzi-los à condição de areia para, em seguida, tratar
quimicamente essa areia. Para tanto havia necessidade de um grande contingente de mão de obra
para fazer o trabalho braçal: extrair, transportar e manusear pedras." (Eakin, 1989)

A St. John utilizou mão-de-obra de várias etnias: os ingleses, que ocupavam as posições de
supervisão dos trabalhos, as pessoas escravizadas e os brasileiros livres (nativos), que executavam as
tarefas braçais, e os imigrantes europeus que faziam a intermediação entre esses dois extremos. Na
década de 1850, por exemplo, chegaram a Morro Velho 20 ilhéus portugueses, 90 chineses, 35
mineiros córnicos, além de alemães, franceses e austríacos. Na década de 1920, eram 197 italianos,
125 espanhóis, 187 ingleses e 82 portugueses.

Pessoas escravizadas
Conforme pode-se constatar pela leitura de seu Diário, Charles Herring Jr. contava com o trabalho
escravo, orientado por mineiros ingleses, para fornecer à companhia uma força de trabalho estável
e segura, no que foi seguido por seus sucessores.

A entrada da Mina Velha ficava na parte baixa da encosta do Morro do Cruzeiro e os escravos
residiam em um lugar próximo dali, na parte alta do atual bairro da Boa Vista, conhecida na época
como Timbuctu. Depois, com a abertura dos shafts C e D no alto do morro do Mingu, shafts estes
que inauguraram a Mina Grande, os escravos passaram a morar na região do Mingu, pela mesma
razão, ou seja, para ficarem próximo do local de trabalho: a entrada da mina.

"Na década de 1830 e início da década de 1840, quando a companhia comprou seus primeiros
escravos, o preço de um jovem escravo negro saudável variava de 450 a 600 mil-réis (ou
aproximadamente £44 a £59). Em Congonhas de Sabará, hoje Nova Lima, na década de 1870, o preço
praticamente triplicou para 1.500 a 2.000 mil-réis (£112 a £150).

A maior parte da força de trabalho após 1850 era composta por escravos alugados. A companhia
alugava escravos de duas fontes: grandes grupos de empresas de mineração que fracassaram e
pequenos grupos de indivíduos.

Página | 233
A St. John d’El Rey se beneficiou com o desaparecimento das empresas de mineração britânicas em
Cata Branca, Cocais e Gongo Soco, contratando quase 1.000 escravos dos empreendimentos que
faliram nas décadas de 1840 e 1860: 385 escravos da Brazilian Company of Cata Branca em 1845;
182 escravos da National Brazilian Mining Association of Cocais em 1861; e aproximadamente 400
escravos dos credores da Imperial Brazilian of Gongo Soco na década de 1860.

Várias centenas de escravos vieram de uma rotatividade constante de aluguéis contratados com
indivíduos na região circundante. Em 1861, por exemplo, a companhia alugou ou devolveu 200
escravos de mais de 50 proprietários diferentes, uma média de 3 a 4 escravos por proprietário. Na
década de 1860, a St. John empregava 1.400 escravos em quase todos as atividades de suas
operações e o trabalho em cativeiro formava a grande maioria da força de trabalho.

A companhia era provavelmente a maior empregadora de escravos de Minas Gerais, a província com
a maior população de escravos do Brasil.

A administração desenvolveu um bem elaborado sistema de classificação para avaliar os negros


alugados. Os gerentes classificavam os "negros" como de primeira, segunda ou terceira classe,
dependendo da idade, saúde e comportamento, usando escalas separadas para homens e mulheres.

Os proprietários de escravos firmavam contratos por períodos de 1 a 5 anos, sendo o valor anual um
pouco mais alto quanto menor fosse o prazo contratual. Embora o contrato mais curto
proporcionasse à companhia maior flexibilidade no controle do tamanho da força de trabalho, o
contrato mais longo apresentava mais estabilidade.

Em 1858, por exemplo, um homem negro de primeira classe chegava a custar 240 mil réis em um
contrato de 5 anos e 250 mil réis em um contrato de 1 ano. As mulheres classificadas como de
primeira classe custavam 120 mil réis em ambos os tipos de contrato." (Libby, 1984)

Tabela 23 - Aluguel anual de pessoas escravizadas

Homens 220$000
Aluguel anual de escravos de 1ª categoria
Mulheres 100$000
Homens 230$000
Não pagando em caso de morte ou fuga
Mulheres 110$000
Homens 150$000
Aluguel anual de escravos de 2ª categoria
Mulheres 75$000
Homens 160$000
Não pagando em caso de fuga ou morte
Mulheres 75$000

"Douglas Cole Libby calculou o custo de um escravo alugado e o comparou com o custo de um
trabalhador livre nas décadas de 1860 e 1870. Em 1867, o custo anual combinado de aluguel,
provisões e pagamento de horas extras para escravos alugados mostrava claramente a vantagem
financeira do escravo de primeira classe sobre o mineiro livre: 350 mil-réis versus 465 mil-réis. Em
1879, os valores eram 377 mil-réis versus 682 mil-réis. Embora os cálculos de Libby não levassem em
consideração certos custos "ocultos", como assistência médica, dependentes, moradia, supervisão,
eles mostram que a escravidão industrial não era apenas viável, mas lucrativa, no Brasil do Século
XIX.

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Ao longo do século XIX, o Ministério das Relações Exteriores britânico trabalhou diligentemente para
acabar com a escravidão e o comércio de escravos. Em 1845, o Parlamento britânico aprovou a Lei
de Aberdeen, que, entre outras coisas, proibia a compra de escravos por cidadãos britânicos,
independentemente do seu local de residência.

A diretoria da St. John fez gestões junto ao Parlamento e conseguiu incluir na Lei de Aberdeen uma
cláusula que permitia aos cidadãos britânicos manter os escravos comprados antes da aprovação da
lei, que passou a ter vigência ex-nunc neste particular, ou seja, não se aplicava a fatos pretéritos. Em
sua forma modificada foi excluída da Lei de Aberdeen a cláusula que proibia o aluguel de escravos.

Com sua política de aluguel, a St. John conseguiu contratar escravos no auge de seus anos produtivos
e descartá-los, sem custo algum, quando sua produtividade caía. "Através de remoções criteriosas,
dispensando os serviços daqueles que são ineficientes e a introdução de negros eficazes, a força
geral de trabalho da Companhia está se aprimorando muito" – palavras do superintendente em
relatório à diretoria.

Na perspectiva da empresa, esse procedimento possuía as características mais atraentes dos dois
sistemas de trabalho: escravo e livre; porquanto propiciava uma força de trabalho cativa com
obrigações sociais mínimas." (Eakin, 1989)

Merece registro o caso dos escravos provenientes da Brazilian Company of Cata Branca. Em 1845, a
St. John fechou acordo com a recém liquidada Cata Branca para alugar 385 escravos por 14 anos. O
contrato assinado em Londres detalhando a transação especificava que "todas os mencionados
negros . . . ao final do referido prazo de 14 anos se tornarão absolutamente livres e emancipados."
Naquela época Powles era o presidente e Herring o superintendente.

Mas em 1859, após 14 anos de serviço, a St. John não concedeu aos escravos de Cata Branca a
liberdade que lhes era devida. A violação do contrato e a escravidão ilegal desses indivíduos passou
despercebida por quase 20 anos. O presidente Powles e o superintendente Gordon tomaram
precauções especiais para garantir que os escravos de Cata Branca nunca soubessem dessa cláusula
de liberdade durante o período de 1845-1859 e especialmente após o término do contrato.

Somente em 1879 a flagrante violação do contrato por parte da St. John tornou-se conhecida do
público em geral. O presidente da St. John era então Hockin e Morrison havia sucedido a Gordon na
superintendência. Hockin e Morrison tiveram que responder pelos malfeitos de Powles e Gordon. As
autoridades judiciais, instigadas por abolicionistas brasileiros que se uniram em torno da causa,
libertaram os escravos.

O emprego de escravos pela mineradora britânica e seu compromisso de reter mulheres, homens e
crianças tecnicamente livres como escravos contrastava com a historiografia geral que retrata a Grã-
Bretanha e os britânicos como defensores ferrenhos da cruzada antiescravista mundial. E foi
precisamente esta contradição que enfraqueceu politicamente e isolou a companhia britânica, aliada
à clara violação do contrato, que tornou a St. John vulnerável aos ataques dos abolicionistas para
libertar os escravos.

A escravização ilegal dos negros de Cata Branca pela mineradora serviu desde cedo como catalisador
do movimento abolicionista brasileiro, que proporcionou uma oportunidade especial para se lançar
a campanha antiescravidão no Brasil em 1879. O processo implicou em duras críticas à empresa de

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mineração por parte dos governos da Grã-Bretanha e do Brasil e uniu a causa do abolicionismo nos
dois lados do Atlântico.

Figura 116 - Carregadoras de resíduos auríferos

Nativos
"Desde o início das operações no Brasil, a St. John não conseguiu atrair trabalhadores livres em
número suficiente para operar a mina. Nas épocas dos plantios e das colheitas os trabalhadores livres
trocavam a mina pelos campos da região vizinha e pelas lavouras de São Paulo. A mão de obra para
o trabalho subterrâneo era escassa e a pequena força de trabalhadores livres que a companhia
conseguiu arregimentar se recusava a se ajustar ao ritmo industrial imposto pelos britânicos. Parece
que poucos queriam entrar na mina e menos ainda queriam fazer da mineração uma ocupação em
tempo integral. " (Eakin, 1989)

O absenteísmo deles impedia a continuidade dos esforços para operar a mina em sua plena
capacidade. Houve um choque de culturas. A população nativa aparentemente ainda se encontrava
na primitiva condição de "hunter-gatherers" e os ingleses eram extremamente exigentes na
pontualidade.

"Por décadas a administração da companhia reclamou da natureza sazonal dos trabalhadores livres
e a maior parte da oferta de mão-de-obra local da companhia aparentemente trabalhava para
pequenos proprietários de terras agrícolas e não se dedicava à mineração o ano todo.

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Durante o auge das estações de plantio e colheita, essas pessoas deixavam a mina e iam para as
lavouras, apenas retornando com o fim do plantio e da colheita. Os agricultores locais forneciam à
companhia uma oferta de mão-de-obra sazonal quando seus trabalhadores optavam por
complementar sua renda agrícola.

Com o gradual fim da escravidão nas décadas de 1870 e 1880, os trabalhadores livres tornaram-se
a principal fonte de mão de obra. Após o colapso da mina em 1886, a maioria deles ficou sem
trabalho e muitos migraram para fora da região. Alguns foram contratados por outras minas
menores na província, alguns foram trabalhar nos campos de café de São Paulo e muitos
provavelmente voltaram para o trabalho agrícola. Além disso, a construção da nova capital mineira,
Belo Horizonte, a vinte quilômetros a noroeste, desviou mais trabalhadores com salários mais altos
do que os que a companhia estava disposta a oferecer.

Consequentemente, quando a mina voltou a operar na década de 1890, a crise trabalhista se


intensificara. A mina passou a exigir ainda mais trabalhadores do que antes e o fornecimento tinha
se esgotado. Na década de 1890, a oferta de mão-de-obra foi tão reduzida que Chalmers disse aos
acionistas que "a escassez de mão-de-obra tornou necessário colocar quase todos os homens,
mulheres e crianças capacitados para trabalhar na nova planta de superfície"." (Eakin, 1989)

Chalmers fez o seguinte registro em um de seus relatórios à diretoria: "A mão-de-obra europeia é
mais cara — muitos dos homens ganhando, com horas extras, mais de £20 (20 libras esterlinas) por
mês — e se houver ainda que seja um único europeu, cujo trabalho possa ser igualmente bem feito
por um nativo, o serviço do primeiro deve ser dispensado. Os trabalhadores nativos, na maioria das
vezes, têm comparecimento irregular e tiram muitas férias. A diretoria gostaria que eles recebessem
prêmios em dinheiro por frequência estável e todo incentivo através de casas e jardins confortáveis
para induzi-los a se apegar à mina."

Açorianos
Como resultado de meio século de problemas de recrutamento de mão-de-obra livre e da iminente
abolição da escravidão, a St. John concluiu no último terço do século XIX que a solução para a
escassez de mão-de-obra estava fora do Brasil. Já na década de 1850, a St. John tinha experimentado
a importação de mão-de-obra barata dos Açores.

Alemães
De tempos em tempos, pequenos grupos de alemães tinham sido contratados, mas, como os
portugueses, eles foram embora depois de um curto período de tempo. Quando eclodiram as duas
guerras mundiais a companhia demitiu seus poucos trabalhadores alemães.

Córnicos
O primeiro grupo de mineiros córnicos liderados por Charles Herring Jr. viajou para o Brasil em junho
de 1830 para operar as duas minas de São João del Rei, onde não obtiveram sucesso. Alguns deles
permaneceram com Herring enquanto ele procurava por novos prospectos, busca esta que resultou
na aquisição de Morro Velho.

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Figura 117 - Revista quinzenal dos escravos africanos na Casa Grande

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Depois que a mina de Gongo Soco fechou em 1856 alguns dos mineiros córnicos que lá trabalhavam
encontraram trabalho na mina de Morro Velho operada pela St. John. Eles eram de longe o maior
grupo étnico dentre os imigrantes trabalhadores britânicos. Eram cerca de 350 nos anos 1860 e assim
permaneceram até a década de 1920.

A St. John recrutava mineiros britânicos e os estimulava a trazer suas famílias para Morro Velho. A
crescente população de mineiros e suas famílias de origem britânica resultou na construção de uma
pequena capela na década de 1840.

Uma capela maior dotada de uma sala escolar foi construída na década de 1850 para coincidir com
a chegada de um ministro da Igreja da Inglaterra. Em 1867 o governo britânico aprovou uma lei
legalizando casamentos consagrados pelo clérigo anglicano em Morro Velho.

Os britânicos receberam permissão do Imperador Pedro II para construir seu próprio cemitério
protestante. Mais tarde um completo clube esportivo foi construído no bairro das Quintas, com
campo de futebol, quadras de tênis, cricket e piscina, frequentado apenas por membros da
comunidade britânica.

A Figura 118 mostra um grupo formado por nove rapazes e um mineiro (G. Watts) córnicos que
embarcou para o Brasil em 11 de março de 1897 a partir de Liverpool. Em pé: J. Harvey, J. Barrett,
S.M. Pappin, H. Pollard e J. Wills. Sentados: W. Fonkin, J. Drew, G. Watts, W.J. Munday e E.J. Crocker.

Chineses e japoneses
Depois de 1875, Morro Velho teve de enfrentar uma situação crítica de escassez de mão-de-obra.
Com a falta de braços, devido à dificuldade de alugar escravos e à impossibilidade de a oferta de
mão-de-obra livre compensar a diferença criada, tornou-se difícil manter o nível de produção de
minério bruto e mais ainda aumentá-lo.

A St. John recorreu à importação, inédita no Brasil, de operários chineses, mostrando seu desespero
perante a crise no setor servil brasileiro. Contratou agentes trabalhistas da China e do Japão e, em
1882, uma centena de chineses chegou a Morro Velho.

Para desânimo da administração, pelo menos metade dos chineses se recusou terminantemente a
entrar na mina, outros fugiram, e muitos adoeceram. Quando a mina entrou em colapso em 1886,
poucos permaneciam na folha de pagamento da companhia. George Chalmers, em carta à diretoria,
de 20 abril de 1887, informava que vinte e dois "chineses velhos e enfermos" continuavam em Morro
Velho, com muitos "literalmente passando fome."

Um experimento com trabalhadores japoneses teve resultados semelhantes pouco antes da Primeira
Guerra Mundial. Depois de negociar com uma companhia japonesa de emigração, 107 trabalhadores
chegaram à mina em agosto de 1913. Em outubro todos tinham deixado a área.

Em geral, os esforços da companhia para importar mão-de-obra barata falharam miseravelmente.


Poucos trabalhadores permaneceram e aqueles que o fizeram foram mais problemáticos do que
produtivos.

Até o início da crise econômica mundial da década de 1930, a companhia continuaria a trabalhar a
mina abaixo de sua capacidade por insuficiência de mão-de-obra.

Página | 239
Figura 118 - Rapazes córnicos – cerca de 1897

Página | 240
Figura 119 - Chineses em Morro Velho

Página | 241
Espanhóis e Italianos
Por causa da dificuldade em lidar com os trabalhadores nativos e malogradas as experiências com
os asiáticos, a companhia resolver trazer um razoável contingente de europeus.

Assim, a St. John também recorreu à Espanha e à Itália para conseguir trabalhadores. Um grande
número de espanhóis e italianos começou a imigrar para o Brasil e para o sul da América do Sul no
final do século XIX e a companhia contratou agentes trabalhistas para canalizar esses imigrantes para
Morro Velho.

Os agentes induziram muitos deles a virem para a mina apenas pagando sua passagem através do
Atlântico. Uma vez no Brasil, a maioria fugiu para São Paulo ou rapidamente saiu de Morro Velho,
após tomar conhecimento de salários mais altos nas plantações de café em expansão para o
sudoeste.

Para agradar seus trabalhadores estrangeiros que permaneceram em Morro Velho, a companhia
experimentou usar experientes feitores espanhóis, alemães e italianos para supervisionar seus recém
chegados patrícios.

Os espanhóis e italianos que ficaram na mina provaram ser uma dor de cabeça para a administração.
Conquanto esses europeus se comportassem-se melhor do que os nativos, eles trouxeram ideias
novas da Europa, como os movimentos grevistas, e contaminaram os locais.

Vindos do Mediterrâneo mais avançado economicamente, com seus movimentos trabalhistas bem
desenvolvidos, esses trabalhadores logo se tornaram os líderes das primeiras greves sérias na história
da companhia.

Em pelo menos 5 ocasiões, 1897, 1898, 1900, 1904 e 1925, trabalhadores espanhóis e italianos
lideraram greves e instigaram e organizaram trabalhadores brasileiros.

A produção, antes prejudicada pela carência de mão-de-obra nativa, agora parava de vez por causa
das greves. Os administradores da St. John constataram que definitivamente não foi uma boa ideia
trazer espanhóis e italianos. "Non tutto sono buona persone!"

Por não confiar na finesse para obter relações trabalhistas harmoniosas, Chalmers procurou evitar
que as organizações da classe trabalhadora se desenvolvessem, seja ameaçando seus organizadores,
seja infiltrando seus agentes em movimentos emergentes, seja esmagando efetivamente com mão
de ferro a maioria das greves com a ajuda da milícia local de Sabará. A "milícia" da companhia era
formada por vigias noturnos.

Para agravar a situação, na década de 1920, a concorrência das plantações de São Paulo e o
crescimento de Belo Horizonte combinados provocaram a mais grave escassez de mão-de-obra da
história da St. John.

Os conflitos entre administradores e operários constituíram-se em um dos principais fatores


determinantes do fim do empreendimento britânico em Morro Velho.

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O processo de obtenção do ouro
Este capítulo reproduz o relato de quatro autores diferentes sobre o processo de obtenção do ouro
em Morro Velho: The Illustrated London News (1849), George Gardner (1849), Richard Burton (1867)
e Bernard Hollowood (1954). Conforme se verifica pelas datas, as três primeiras publicações se
referem à Mina Velha e a última à Mina Grande. Assim, sugere-se acompanhar as descrições com
auxílio da Figura 34 no caso da Mina Velha e da Figura 68 no caso da Mina Grande.

Em português as palavras pesquisa e exploração são sinônimas. O mesmo ocorre com lavra e
produção. Os primeiros métodos de exploração e produção de ouro eram muito rudimentares. Os
britânicos os aperfeiçoaram.

George Gardner
Gardner descreve Morro Velho no Capítulo 13 de "Travels in the Interior of Brazil ... during the years
1836 - 1841", 2ª edição, publicada por Reeve, Benham and Reeve em 1849.

"O minério é primeiro retirado de seu leito por detonação e depois quebrado por mulheres escravas
em pequenos pedaços do tamanho das pedras colocadas em estradas macadamizadas, após o que
é transportado para a máquina de britagem para ser reduzido a pó.

Este britador consiste em uma série de hastes perpendiculares colocadas em uma fileira e com
grandes blocos de ferro firmemente presos na sua extremidade inferior. Estas hastes são erguidas
alternadamente até uma certa altura por um cilindro dentado, que gira por ação de uma grande
roda d'água, caem e esmagam as pedras até virarem pó. Uma pequena corrente de água corre de
forma constante através delas e carrega a matéria pulverizada para os chamados "strakes".

Os "strakes" são constituídos por uma plataforma de madeira, ligeiramente inclinada e dividida em
vários compartimentos muito rasos, de quatorze polegadas de largura, sendo o comprimento de
cerca de vinte e seis pés. A superfície de cada um desses compartimentos é coberta com pedaços
de couro curtido com cerca de um metro de comprimento e dezesseis polegadas de largura. As
partículas de ouro são depositadas entre os pelos do couro, enquanto a lama, sendo mais leve, é
lavada.

A maior parte do pó de ouro é coletada nas três películas superiores ou da cabeceira, que são
trocadas a cada quatro horas, enquanto as inferiores são trocadas a cada seis ou oito horas, de
acordo com a riqueza do minério.

A areia, que é lavada nas películas da cabeceira, é recolhida e amalgamada em barris contendo
mercúrio, enquanto a areia das películas inferiores é transportada para um lavadouro e concentrada
sobre "strakes" de construção semelhante às da britagem, até ficar rica o suficiente para ser
amalgamada com a areia que vem das peles da cabeceira.

Os barris nos quais essa areia rica é colocada junto com o mercúrio são revolvidos pela energia da
água, e o processo de amalgamação geralmente se completa ao longo de 48 horas. Quando retirado,
o amálgama é separado do ouro por sublimação. Em todo o processo, a perda de mercúrio chega a

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cerca de trinta e cinco libras por mês, mas até dois meses antes da minha visita, era quase o dobro
dessa quantidade.

Por muito tempo o pó de ouro foi extraído da areia por lavagem à mão em bateias, à maneira
brasileira; mas o processo de amalgamação é considerado superior; exigindo menos trabalho e
extraindo uma proporção maior de ouro.

O zillerthal, ou processo de amalgamação em correnteza, semelhante ao usado no Tirol, também foi


experimentado aqui, mas não correspondeu devido à grande perda de mercúrio. O processo de
ustulação também foi tentado, mas, em que por esse meio o minério render uma porcentagem muito
maior de ouro, os vapores provenientes do arsênico foram considerados muito prejudiciais à saúde
dos trabalhadores e a ustulação foi abandonada.

Uma tonelada de minério produz de três a quatro oitavas portuguesas de ouro; mas a mesma
quantidade frequentemente produziu até sete oitavas. Na época de minha visita, de quinze a
dezesseis centenas de toneladas de minério eram reduzidas a pó todos os meses."

The Illustrated London News


A edição de 20 de janeiro de 1849 do primeiro jornal ilustrado do mundo, The Illustrated London
News, continha um artigo sobre o processo de obtenção de ouro na Mina Velha de Morro Velho.
Seguem alguns excertos.

"As profundidades das minas são de cerca de 110 m, 73 m, 55 m, respectivamente, e os sistemas de


bombeamento e transporte são dos mais completos e eficientes. Há cerca de 1.100 pessoas
empregadas no momento e cerca de 6.000 toneladas de minério são trituradas por 96 cabeças de
pilão movidas por 6 rodas d'água. O minério é esmagado por cabeças de pilão feitas de ferro,
pesando cerca de 91 kg cada uma, cada cabeça dando de 60 a 70 golpes por minuto.

A pedra assim pulverizada é lavada em água corrente e atravessa peneiras de cobre muito finas,
sendo então transportada por gravidade para uma mesa vibratória ligeiramente inclinada, forrada
com veludo ou couro cru, que retém o ouro e as partículas mais pesadas de areia, enquanto a lama
vai embora.

Os veludos ou os couros são retirados a cada 2 horas e lavados em caixas próprias. A areia das 3
unidades de retenção mais próximas das peneiras é enviada diretamente para o local de
amalgamação. A areia das unidades mais distantes das peneiras, sendo mais pobre em minério rico
em ouro, passa novamente sobre a mesa vibratória.

O processo de amalgamação é muito simples. A areia é colocada em barris com mercúrio líquido e
revolvida rapidamente por uma roda d'água por 20 ou 30 horas até que um exame minucioso mostre
que todo o ouro foi absorvido pelo mercúrio. O conteúdo dos barris (minério dissolvido em mercúrio
líquido) é então gradualmente derramado em uma longa caixa invertida que se move
horizontalmente dentro de um cocho, onde o mercúrio, agora amálgama 30, é depositado. A areia é
lavada e descartada em ambas as extremidades do cocho. A cada 10 dias a caixa é aberta e o
mercúrio, ou melhor, a liga metálica mercúrio-ouro ou amálgama, passa através de uma camurça

30
Amálgama é uma liga metálica formada pela reação do mercúrio com outro metal.

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que retém o amálgama e este (amálgama) é destilado em uma fornalha para separar o ouro,
produzindo de 25 a 35 por cento de ouro."

Richard Burton
No Capítulo XXVI de seu livro, Richard Burton descreve o processo de obtenção do ouro, do minério
ao lingote, sob o título O Nascimento da Criança. Naquela época (1867). Segue o capítulo XXVI
completo. Alguns subtítulos foram inseridos para facilitar a compreensão.

"Tínhamos visto a pedra ser enviada para a superfície pelos baldes (kibbles). Todo o processo, do
corpo de minério ao lingote, ficará a partir de agora a cargo do Sr. Dietsch, responsável pelo
Departamento de Redução, que emprega cerca de 550 pessoas. Iremos acompanhar este "parto" e
testemunhar o nascimento da criança.

Britagem

O embrião é colocado nos vagões da pequena linha ferroviária que liga as minas aos pátios de
fragmentação (spalling floor). Esses pátios são formados por 4 compridos galpões bem arejados,
perfeitamente protegidos da chuva e das enchentes.

Aqui começa o primeiro processo de pulverização mecânica. Cada galpão tem um feitor e, sob sua
supervisão, as marreteiras quebram os grandes pedaços de pedras até reduzi-los a pedaços do
tamanho de um punho humano.

As mulheres, em número de quatro para cada homem, em seguida, reduzem esses pedaços ao
tamanho de um saibro médio, com cerca de 1½ polegadas quadradas, pequeno o suficiente para
passar através dos funis de carga (hoppers) que alimentam as caixas de trituração. Seus martelos
possuem cabos compridos, com cabeças de aço em forma de losango, pesando 1½ libra. Uma
mulher de primeira categoria quebra uma tonelada e meia de pedra por dia. Elas aprendem
facilmente a arte de separar o minério rico do pobre: este último não tem brilho metálico nem
iridescência.

Às vezes, um excesso de ardósia e de quartzo acarreta algum atraso e este tempo é aproveitado para
descanso. Cada quebradora deve encher um ou dois funis de madeira com 16 pés cúbicos e durante
os seis dias vai-se acumulando o suprimento para o sétimo.

Os homens trabalham somente enquanto houver claridade; os trabalhadores terminam suas tarefas
ao anoitecer de sexta-feira e podem folgar aos sábados. As mulheres e os novatos são poupados e
podem, habitualmente, se quiserem, parar às duas horas da tarde.

Todos sofrem com a poeira da pedra, mas tal incômodo pode ser mitigado com o emprego dos
ventiladores.

À primeira vista, utilizar 350 trabalhadores para quebrar pedras pode parecer um desperdício de
mão-de-obra. Não é fácil, porém, melhorar esse sistema, que vem desde 1767. As estradas, como se
viu, não suportam a passagem de maquinaria pesada. O emprego de vapor d’água não foi aprovado,
porque não existe água em abundância. O martelete a vapor "Bagg" foi experimentado, mas não
deu certo. Agora, o superintendente está na iminência de montar um outro dispositivo
economizador de mão-de-obra: a máquina de esmagar pedra de "Blake".

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Para a pulverização subsequente, a pedra reduzida a lasca tem de ser triturada (stamps). O total de
material trabalhado na sede da companhia é de 200 a 210 toneladas por dia, mais na estação
chuvosa, menos na estiagem.

Meia onça de ouro por tonelada já é compensador e a média atual de quase uma onça de ouro por
tonelada é altamente lucrativa. Também, como já se disse, para cobrir as despesas (£400), 300
toneladas de material têm de ser retiradas das minas diariamente e, para produzir dividendos, 400.
Isso dá uma boa ideia do trabalho realizado.

O minério pobre, como já vimos, vai no trenzinho (Praia Tramroad) para a Praia. O material rico,
depois de reduzido a pedregulhos, é descarregado em uma fileira de funis de madeira, que, ao serem
abertos por baixo, descarregam os pedregulhos nos vagões, que utilizam um túnel para ficarem
embaixo dos funis.

Esses vagões são movimentados para o Beco dos Britadores (stamps) e são tombados para
descarregar o material em escorregadores de madeira fechados, cada um deles ligados a um
reservatório geral, que, com a ajuda de um "elevador" central, alimenta todos os britadores com uma
carga para um pouco mais de um dia.

No Beco os britadores são regulados por alimentadores (hoppers) dotados de braços e contrapesos
atuando como molas. Os britadores, divididos em seções ou baterias de três pilões cada uma, são
movidos por uma simples e antiga roda hidráulica, e um eixo horizontal, cujos ressaltos ou camos
levantam, 60 a 78 vezes por minuto, hastes verticais dispostas em fila como barras de cabrestante,
ou os pilões de uma dona de casa africana. Cada "pilão tem uma "ponteira" de ferro nacional
pesando, quando novo, seis arrobas; o resto do instrumento dá um peso total de 234 a 288 libras, e
cada ponteira custa de 26$000 a 27$000. Depois de três meses, mais ou menos, essas ponteiras se
desgastam e são transferidas, como as calças curtas do irmão mais velho, para o caçula da "Praia".
O superintendente importou cabeças de aço da Inglaterra; cada uma custou 106$300, e nenhuma
durou tanto quanto as "chapas de ferro" comuns feitas com o ferro de Minas.

O "cofre", dentro do qual trabalham os pilões, é uma caixa retangular de madeira, revestida de ferro,
para receber uma pancada de 380 libras; tem de 26 a 30 polegadas de comprimento por 1 pé a 18
polegadas de largura. Todas são protegidas, na parte da frente e na traseira, por peneiras de cobre,
com 6.000 a 10.000 furos por polegada quadrada e erguidas de 20 a 23 centímetros acima do "cofre",
para impedir a fuga do pó fino. De uma curta distância, pode-se ver a poeira cinzenta e a água
emergindo em torno da cabeça do pilão. Um cocho horizontal goteja, através de um orifício acima
da peneira, a água em quantidade suficiente para manter os pedregulhos úmidos em cada bateria
de pilões; uma vez por semana, as peneiras, que estão sujeitas a entupir, devem ser retiradas e a
areia aurífera é lavada. Os trabalhadores dos britadores são divididos em duas turmas, que trabalham
de dia e de noite, em semanas alternadas.

Esse sistema de britagem acarreta a perda de ouro livre, que, quando finamente laminado, fica leve
demais para mergulhar na água e flutua, saindo com a lama. O Sr. Thomas Treloar, cuja experiência,
em Cocais, Gongo Soco e outros lugares, o credencia a tornar sua opinião respeitável, acha que
desaparecem de 7 a 8 por cento desse ouro finamente laminado. Evidentemente, o único remédio é
tratá-lo novamente até que ocorra a sua deposição.

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Concentração

Começa, agora, o processo de concentração. O cocho que alimenta o "cofre" também fornece água
suficiente para a lavagem do material triturado e pulverizado em direção às mesas vibratórias
(strakes). Essas mesas são pranchas de madeira de 26 pés de comprimento, divididas por meio de
ressaltos em compartimentos rasos, com 3 pés de comprimento por 14 polegadas de largura, com
um ângulo de inclinação de 1 polegada por pé. Cada compartimento é forrado com um alongado
couro de boi parcialmente curtido, ou com um cobertor de pano, quando falta o couro. O curtume
fica perto e ao norte da Ponte do Ribeirão.

O princípio é o de que o ouro pesado, porém invisível, da areia de ardósia adere ao couro, ao passo
que as partículas mais leves são levadas embora pela água. Os pelos retardam o curso da água, mas
as pequenas linhas transversais das ranhuras provocadas na superfície pelo tempo e pelo uso têm
maior importância. Cada tonelada de minério que passa sobre os couros deixa de um terço à metade
de um pé cúbico de areia rica, e cada pé cúbico produz em média duas onças de ouro.

São principalmente as mulheres que supervisionam as mesas vibratórias (strakes) e fazem os


trabalhos leves de olhar a maquinaria, limpar os couros e regular a água; se se descuidar disso, a
areia entope e o ouro flutua. As areias são divididas em: três superiores ou cabeças, três médias e
duas extremidades. As primeiras, sendo as mais ricas, são lavadas de duas em duas horas, em uma
das sete caixas de areia superiores, cujas chaves ficam em poder dos feitores.

A grande arca divide-se em três compartimentos: os couros são primeiro lavados nas duas câmaras
laterais; em seguida são puxados através da "caixa piscina", ou espaço médio; e finalmente voltam a
ser colocados nas mesas vibratórias (strakes). As areias provenientes das partes médias e das
extremidades são lavadas de quatro em quatro horas e estas últimas devem voltar a passar pelas
mesas vibratórias até ficarem bastante ricas para serem amalgamadas com as areias da parte
superior.

Então a areia mais fina está pronta para a amalgamação. Contudo, o material mais grosso que passa
por cima das mesas vibratórias ainda contém cerca de 30 por cento de ouro. Esse material é levado
pelos aquedutos para um engenhoso aparelho automático, chamado separador ou classificador,
adotado há quatro anos e muito superior aos antigos "ligantes de concentração". É um cocho de
madeira de 12 pés de comprimento por 2½ de largura, com quatro funis perfurados embaixo: nestes,
o material a ser lavado é gradualmente depositado; as partículas mais pesadas decantam no primeiro
funil, onde a precipitação é maior; as mais leves se depositam no último, onde ela é menor, e o
resíduo de lama impalpável flui através de um cocho de forma trapezoidal para o dreno comum, o
Ribeirão.

Trituração

Os quatro funis descarregam seus conteúdos em moedores circulares feitos de madeira,


pavimentados com pedra, e cerca de 8 pés de diâmetro. São os "arrastres" ou "trituradores",
protegidos por seus respetivos galpões. Uma roda hidráulica movimenta dois braços horizontais,
que arrastam por meio de fortes correntes quatro pedras, cada uma delas pesando uma tonelada: a
pedra do corpo de minério é preferida para esse fim, porquanto o quartzo não tritura bem. Depois
de uma completa trituração, a areia passa pelas mesas vibratórias dos arrastres, é coletada nas caixas
de rejeitos e em seguida é preparada para o local de amalgamação (Amalgamation House).

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Mas mesmo após esse segundo processamento, foi necessário reduzir ainda mais o conteúdo de
ouro disseminado no rejeito; esse rejeito até 1855 era lançado no ribeirão 31; em 1856, começaram
as instalações da "Praia" e, em 1858, elas estavam em condições de funcionar. Foi feita uma represa
no Ribeirão, para proporcionar uma queda de água. A areia dos arrastres passou a ser transportada
ao longo da margem direita em uma calha de 500 pés de comprimento, 1 pé de largura e cerca de
9 polegadas de profundidade. Ela é então conduzida por uma trincheira que atravessava um túnel
no morro sobre o qual fica o bangalô do Sr. Smyth e finalmente é levada por aquedutos às
instalações mais baixas. Ali ela cai em uma série de conexões de concentração que separam o
material grosso do fino, sendo liberados de 160 a 170 pés cúbicos de água arenosa por minuto. A
areia é agora triturada de novo com uma substância mais áspera para facilitar a moagem.
Antigamente empregava-se o cascalho – que contém quartzo e ferro –, areia e depósitos aluviais do
Ribeirão. Atualmente, são usados quartzo e "killas" em pedaços de cerca de 2 polegadas de
comprimento, tendo-se verificado ser o quartzo não piritífero o melhor.

Amalgamação

Nas instalações principais, a areia da extremidade superior das mesas vibratórias, que vimos
parcialmente desentranhada da pedra matriz, entra em outra fase. Ela é cuidadosamente mantida
úmida e afastada da atmosfera submersa em tanques de lavagem; desse modo, impede-se o
esfarinhamento e a pulverização do mercúrio. Ela é levada das caixas para a casa de amalgamação
em gamelas de madeira; os carregadores são, geralmente, vinte, com um reforço às segundas-feiras.
Esse trabalho é todo feito ao ar livre; mas, nos processos seguintes são empregados os trabalhadores
mais jovens e robustos, pois a "lavagem", sem dúvida alguma, afeta a saúde. Foram sugeridos planos
inclinados para o transporte da areia e outros processos econômicos; o superintendente, contudo,
está mais preocupado com o resultado financeiro e mostra-se pouco inclinado a tentar experiências
dispendiosas e arriscadas.

A areia das partes superiores das mesas vibratórias (strakes) é depositada, primeiro, para a medição,
em caixas com 16 pés cúbicos de capacidade cada uma. Há 16 dessas caixas, e cada uma delas se
conecta através de um funil com seu barril Freyberg ou barril de amalgamação, cuja capacidade é a
mesma. Joga-se água sobre a areia, e uma pequena roda faz o barril girar durante meia hora, à razão
de 13 a 14 rotações por minuto. O "Freyberg" é então aberto: se a pasta estiver muito úmida, o
mercúrio não se mistura bem com a areia; se, ao contrário, a areia estiver muito seca, o mercúrio
ficará excessivamente fino. Quando a massa tiver a consistência adequada, são adicionados de 50 a
60 libras de mercúrio em cada barril, que se espera conter umas 32 onças de ouro.

Antigamente, o processo do barril continuava durante 48 horas, antes que as partículas


desentranhadas da areia concentrada entrassem em contacto com o mercúrio. Hoje, a média é de
24 a 26 horas; o tempo é mais curto quando o clima está quente e o ouro mais rico exige mais
trabalho. Depois de 24 horas, uma amostra do barril é lavada na bateia para se verificar se ainda há
ouro livre. Nas minas brasileiras, a primeira bateada é sempre oferecida a estranhos para dar sorte.

31
As instalações da "Praia" ficavam do lado direito do Ribeirão do Cardoso onde os rejeitos contendo
mercúrio da amalgamação eram jogados. Um pouco mais a jusante o Ribeirão do Cardoso se juntava
ao Ribeirão dos Cristais formando um só ribeirão que ia desaguar no Rio das Velhas. Por estar sempre
sujo por causa dos rejeitos esse ribeirão ganhou o nome de Ribeirão da Água Suja.

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Quando amalgamada, a mistura lamacenta e parcialmente líquida é descarregada do barril para
dentro de um cocho receptor colocado logo abaixo, e ali ela afunda, livrando-se da água. O objetivo
é, agora, separar, pouco a pouco, o mercúrio e o amálgama do resíduo mineral, da areia e de outras
impurezas. A massa escorre para um lavadouro ou "saxe", máquina composta de dez cochos, cada
um de 16 polegadas de comprimento e 17 de profundidade, sobre rodas, alternando seu movimento
horizontal para a frente e para trás. Cada compartimento é carregado com um leito de mercúrio, de
340 a 460 lbs., formando uma camada de cerca de 1 polegada de profundidade. Duas a três
polegadas acima do mercúrio há um cocho de passagem, através do qual a areia residual e a água
são expelidas pelo movimento do "saxe". O mercúrio livre sobe e pode ser retirado para ser utilizado,
ao passo que o amálgama afunda devido ao seu maior peso específico. Cada compartimento
separará em oito horas 16 pés cúbicos.

A quarta separação é a "limpeza", que consiste em separar o ouro do amálgama; isso é feito três
vezes por mês após as "divisões", períodos mais longos ou mais curtos de dez a doze dias. A parte
superior do "saxe" é removida, joga-se água fervendo em cada compartimento, e, assim, o metal é
mais facilmente separado. Em seguida, a superfície do amálgama é coberta com uma camada de
areia grossa, de ¼ a ½ polegada de espessura. Depois de se jogar fora a água quente, a areia é
facilmente desnatada e o mercúrio fica limpo. O amálgama é, então, filtrado por forte torções, através
de cones de lona do mais resistente linho russo, semelhantes a coadores de café, com fortes
armações de ferro ao redor das bocas; os sacos são, posteriormente, submetidos a tratamento para
recuperação de um pouco de ouro. O mercúrio líquido é, desse modo, forçado a passar para um
vaso recém preparado; o metal é considerado puro, mas um exame minucioso pode revelar ainda a
presença de ouro finamente difuso. O que ficou para trás ainda está impuro, contendo areia mineral.
Partes da pasta, pesando de 14 a 15 lbs., são esfregadas, em argamassa Wedgewood, com água
fervendo, que amacia a liga de mercúrio, e com sabão da terra, que remove as impurezas. Adiciona-
se então mercúrio, o amálgama fluido é derramado de uma panela a outra, ambas de ferro aquecido,
e o entulho da superfície ou a escória que sobe à superfície são removidos. Água fervendo e sabão
são novamente aplicados até que as impurezas desapareçam e o metal apresente um brilho
prateado.

Agora bolas do amálgama pastoso, pesando de 15 onças a 2 lbs., são amassadas em forma de ovos
e espremidas, torcidas e batidas em camurça até que não apareça mais o metal livre. O resíduo é um
sólido contendo 42 por cento de ouro argentífero e 57 a 58 por cento de mercúrio, com algumas
impurezas, principalmente areia mineral. Depois disso as bolas, cuidadosamente pesadas, são
trabalhadas na retorta da maneira habitual; a operação fica completa após seis a sete horas.

O ouro, porém, ainda está impuro, contendo ferro e arsênico, e não tem a forma adequada. Será
submetido ao quinto tratamento: o metalúrgico.

Fundição

O precioso minério é agora derretido em cadinhos de material refratário fabricados por M. Payen,
de Paris. Cada um deles é enchido com 12½ lbs. de liga e ¼ lb. de fundente, bórax e bicarbonato de
sódio, em iguais proporções. É, em seguida, colocado em uma fornalha a ar, aquecida com carvão
vegetal, e uma chaminé de 26 pés de altura assegura o grau de temperatura necessário. A fusão
completa é realizada em cerca de 45 minutos. O cadinho é retirado com uma tenaz e o ouro líquido

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é derramado em um molde alongado de ferro fundido previamente aquecido para expulsar a
umidade e ligeiramente engordurado e assume a forma de uma barra de sabão.

Assim a criança nasce e vai para o berço.

Nasce, porém, envolta em uma membrana. A camada superficial é negra, em consequência da


escória dos sais fundidos, que dissolveram o material impuro que acompanhava o ouro. Essa
superfície é removida a marteladas, e constata-se que a barra perdeu, no cadinho e por outras causas,
de 6 a 8 oitavas ou ½ por cento do seu peso original. Os lingotes são fundidos três vezes por mês,
e 14 por dia é um resultado satisfatório. Cada um pesa 1.600 oitavas e, supondo estar a 7 xelins a
oitava, o valor do lingote será de £560.

E, agora, o recém-nascido tem de ir para casa. De dois em dois meses, os lingotes são levados ao
escritório da Companhia e pesados pelo encarregado da Redução na presença do superintendente.
Em seguida eles são colocados em pequenas caixas de madeira sólida amarela bem dura, o vinhático,
que são aparafusadas. Cada caixa contém três barras e elas são seladas com o selo da Companhia.
Os pequenos pacotes são acondicionados em outras tantas "malas postais", e confiadas à "Tropa do
Ouro". Esta tropa é comandada pelo Sr. George Morgan Junior, viajante experimentado, por cuja
atenção com minha esposa, na ocasião de seu regresso, sou muito grato. Ela não teria hesitado em
viajar acompanhada apenas de negros desarmados: há poucos lugares onde isso pode ser feito com
perfeita segurança, mesmo na civilizada América.

O Sr. Morgan anda armado, e é escoltado por dois tropeiros guardas, que têm permissão de usar
pistolas; o resto são tropeiros que não levam outra arma a não ser as suas facas. Nada seria mais
fácil do que dispersar a pequena escolta; alguns tiros disparados de uma encosta espantariam as
mulas e muito ouro poderia ser tomado sem derramamento de sangue. O fato de jamais ter havido
uma tentativa de pilhagem é uma prova eloquente da honestidade do mineiro, especialmente em
um país onde a polícia é puramente nominal. Conta-se que, há muitos anos, foi capturado um
assaltante, depois de curta, mas bem-sucedida carreira de banditismo; ele foi mandado para o Rio
de Janeiro, segundo se anunciou, para julgamento, mas ele foi acidentalmente fuzilado no caminho.
Sua morte produziu um excelente efeito; se ele tivesse chegado ao Rio, teria escapado, de acordo
com o mesmo princípio que leva Grande Alce e Cão Malhado a serem festejados e adulados em
Washington, depois de terem escalpelado algumas dúzias de bancos.

Assim acomodada, a criança embarca para a Inglaterra. Teria sido muito melhor que permanecesse
no Brasil, onde há carência dessa população infantil." (Burton, 1867)

Este é Burton com seu satírico e irreverente humor e suas extravagâncias. Burton tinha um bem
desenvolvido pendor pelo exagero. Hollowood o critica em seu livro dizendo que as grandes
correntezas (the great rapids) do Rio das Velhas, descritas por Burton, não eram, na verdade, mais
do que um curso de água de fluxo rápido que foi confortavelmente percorrido em um barco a remo
por mais de um superintendente da mina. O texto, contudo, dá uma boa e detalhada ideia do
processo de produção de ouro da Mina Velha.

A seguir o último dos textos sobre o beneficiamento do minério de ouro desta feita na Mina Grande
e bem mais simples e direto.

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As operações a seguir descritas foram importadas e adaptadas a partir do livro de Hollowood (1955).
O relatório de Chalmers (1912) é muito sucinto com relação ao tratamento químico e Eakin (1960)
passa ao largo deste tema.

Por ocasião das visitas de Gardner (1949) e Burton (1867), o tratamento químico era o de
amalgamação, que utilizava um produto altamente cancerígeno, o mercúrio. A amalgamação foi
descontinuada e substituída pelo processo que utiliza o cianeto de sódio, desenvolvido na África do
Sul, a seguir descrito.

Bernard Hollowood
Para melhor entender a descrição que segue sugere-se acompanhá-la pelo fluxograma de processo
mostrado Figura 133.

O processo de transformação do minério em ouro compreende dois tratamentos distintos: (1) o


tratamento mecânico e (2) o tratamento químico.

Tratamento mecânico

O tratamento mecânico visa a redução do tamanho do minério até a granulometria adequada para
as etapas posteriores do beneficiamento. Nessa operação encontram-se os estágios de britagem. A
britagem pode ser dividida em três etapas: primária, secundária e terciária.

A pedra recebida da mina é descarregada no ádito. Dali segue para o pátio de britagem dentro de
vagões arrastados por correntes (Figura 120), que trafegam à uma velocidade de 40 a 45 km/h em
um plano inclinado de aproximadamente 10°. Cada vagão carrega cerca de uma tonelada de rocha.
Os vagões de minério passam por uma máquina de pesagem, onde o peso do mineral é registrado
(Figura 121), e seguem até o 1° britador.

Britagem primária

A britagem primária é a fase grosseira da operação de tratamento mecânico. Como ela recebe o
minério desmontado da mina, os britadores primários são de grande porte para suportar a descarga
de material pesado. A rocha é fragmentada em pedaços de cerca de 10 cm de comprimento (Figura
122).

Seleção

O minério fragmentado sai do britador primário e passa por uma peneira vibratória, que remove o
material mais fino, e cai em uma mesa de seleção, onde todas as pedras consideradas pobres são
rejeitadas (Figura 123).

Britagem secundária

As etapas de britagem secundária e terciária são utilizadas na fragmentação do minério no tamanho


ideal para as etapas seguintes do beneficiamento. O minério que vem da britagem primária é britado
novamente para cerca de 5 cm e em seguida levado por correias transportadoras, vagões e
elevadores para os silos de estocagem (Figura 124).

Página | 251
Britagem terciária

No terceiro estágio de britagem a rocha é pulverizada por uma bateria de 150 pilões californianos
gigantes de 550 kg de peso médio cada, que martelam o minério à velocidade de 95 vezes por
minuto. Nesse terceiro estágio de britagem, o mineral é esmagado suficientemente fino para passar
através de uma peneira de 50 mesh, ou seja, 2.500 furos por polegada quadrada. Antes da introdução
do tratamento químico e dos moinhos de tubos, a medida usada era de 60 mesh ou 3.600 furos por
polegada quadrada.

Peneiramento

O circuito é fechado com a utilização de peneiras para o escalpe do material grosseiro, que retorna
aos britadores.

Concentração

Depois de peneirado, o mineral esmagado, ou seja, a areia, passa sobre mesas planas denominadas
"canvas" e sobre outras mesas vibratórias, denominadas "strakes", onde ocorre a concentração. Essas
mesas possuem longas tiras de lona áspera nas quais a areia mais pesada e o ouro livre são
capturados. As lonas são lavadas automaticamente para remover a areia pesada e o ouro. O
concentrado passa por uma reconcentração e uma pequena quantidade da areia restante é removida
(Figura 125 e Figura 126).

Produtos da concentração

Como resultado deste tratamento, o minério é dividido em três produtos principais que ficam
aprisionados nas ranhuras longitudinais, denominadas "riffies", que cobrem as mesas: (1) ouro livre
e sulfetos pesados; (2) um produto "médio" e (3) os rejeitos.

Dois desses grupos de materiais (o "médio" e o rejeito) passam pelo tratamento químico, sendo que
o ouro livre segue direto para a fundição.

Os "médios" contém arsenopirita, material valioso por conter ouro e arsênico, e passam novamente
pelas mesas de concentração.

O ouro que é liberado nas mesas de concentração é coletado e o resíduo, contendo arsênico e um
pouco de ouro, é reservado para o tratamento químico.

Neste ponto todo o ouro recuperável pelos processos mecânicos já foi extraído e representa cerca
de 65% do total de ouro produzido.

Tratamento químico

A partir daqui começa o tratamento químico para recuperar a parcela restante (aproximadamente
25%) do ouro. Os demais 10% ainda não eram, naquela época, economicamente recuperáveis.

Moinho de tubos

Os "médios" provenientes da mesa vibratória são novamente esmagados, desta feita em moinhos
de tubos contendo pequenas esferas de aço.

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Espessamento

Em seguida, eles são espessados em tanques especiais e formam uma borra.

Lixiviação

Esta borra é agitada em um vaso de pressão, denominado autoclave, com adição de cal, cianeto de
sódio e nitrato de chumbo, enquanto ar comprimido é soprado dentro dessa autoclave provocando
uma turbulência no interior da mesma (Figura 128).

Este é o processo de lixiviação química, onde o cianeto de sódio, assistido pelo oxigênio contido no
ar comprimido, dissolve o ouro (e alguma prata presente sob forma solúvel), e a solução contendo
ouro é recuperada pela filtragem a vácuo.

As reações químicas que ocorrem são as seguintes:

2Au + 4KCN + O2 + 2H2O = 2KAu(CN)2 + 2KOH + H2O2

2Au + 4KCN + H2O2 = 2KAu(CN)2 + 2KOH

4Au + 8CN- + O2 + 2H2O → 4Au(CN) - + 4OH-

Filtragem

O produto que sobra da autoclave é então filtrado, onde se extrai mais alguma solução contendo
ouro.

Flotação

O material que ficou retido na filtragem, isto é, o "bolo filtrado", ainda contém um pouco de ouro e
uma alta percentagem de minerais de arsênico. O minério moído é colocado em uma solução que
contém um agente espumante junto com um agente coletor e produtos químicos orgânicos. O
agente espumante transforma a solução em espuma. O agente coletor se liga ao ouro, criando uma
película oleosa que mais tarde se fixará na superfície das bolhas de ar. Os produtos químicos
orgânicos evitam que o ouro se ligue a outro material. O ar passa então pela solução e o filme
carregado de ouro se fixa às bolhas. O ouro e os minerais arsênicos são reduzidos a uma pequena
massa, separada do rejeito; essa massa sobe para o topo de onde o ouro é retirado, sendo o rejeito
descartado.

Ustulação

O concentrado é enviado para fornalhas para um tratamento denominado ustulação ("roasting", em


Inglês), que usa o calor e o ar para queimar o enxofre e expulsá-lo do minério seco. O arsênico é
expelido através das emanações de vapores, que são condensados, sendo coletado e comercializado,
enquanto a areia "calcinada" volta para o moinho de tubos para subsequente tratamento, a fim de
se recuperar uma fração muito pequena de ouro que ela ainda carrega.

Tratamento dos rejeitos

Os rejeitos provenientes dos processos de concentração são tratados de forma similar — agitados
com cal, cianeto de sódio e nitrato de chumbo sob a influência de ar comprimido — e liberam seu
ouro em uma solução de cianeto de sódio (Figura 129).

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Merrill-Crowe

Essas soluções contendo ouro são tratadas pelo processo Merrill-Crowe. Trata-se de uma técnica de
separação para remover o ouro de uma solução de cianeto. A solução é separada do minério por
métodos como filtração e decantação em contracorrente e, em seguida, ocorre a clarificação em
filtros especiais. O oxigênio é removido fazendo-o atravessar uma coluna de desaeração a vácuo. O
pó de zinco finamente dividido é introduzido na solução clarificada e desaerada para precipitar o
ouro, uma vez que o zinco tem maior afinidade pelo íon de cianeto do que o ouro.

O ouro (juntamente com a prata) é então precipitado pelo pó de zinco de acordo com a seguinte
reação:

2KAu(CN)2 + Zn = K2Zn(CN)4 + 2Au

Tanto o ouro livre proveniente da moagem e concentração, quanto o ouro recuperado pelo processo
Merrill-Crowe das soluções dos produtos "médios" e das soluções dos rejeitos, são coletados na
Casa de Fundição.

Fundição

Eles são derretidos em fornalhas e o resultado é um produto, denominado “bullion”, contendo cerca
de 80% de ouro, 17% de prata e 3% de metais básicos (Figura 130).

Eletrólise

Este produto é então refinado em uma série de células eletrolíticas que produzem ouro e prata com
alto grau de pureza.

Lingotes

O ouro é fundido em barras do tamanho de um tijolo comum pesando cerca de 10 quilogramas cada
(22 lb).

Eficiência na recuperação

Aproximadamente 65% do ouro era obtido pelo processo mecânico e 25% pelo processo químico.
A recuperação dos 10% restantes, que são tratados como rejeito, ainda não era economicamente
viável.

1984

Em 1984, quando a mina de Morro Velho completou 150 anos, a unidade de Nova Lima tratava o
minério procedente de todas as minas da companhia localizadas em Minas Gerais. A capacidade de
tratamento era de 2.000 toneladas diárias de minério e a unidade de tratamento utilizava processos
de concentração gravimétrica e cianetação, com uma recuperação média de 91% do metal contido
no minério.

Na concentração gravimétrica, em mesas vibratórias, cerca de 45% da produção total de ouro eram
obtidos. O rejeito dessa concentração era lixiviado por cianeto de sódio, sendo o ouro solubilizado
precipitado mediante a adição de zinco em pó e retido em filtros prensas. O concentrado
gravimétrico e o precipitado obtidos eram retirados periodicamente e, após a adição de fundentes,
eram fundidos em separado, obtendo-se "bullions" com cerca de 78% de ouro, 17% de prata e 5%

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de impurezas. O "bullion" era refundido, com injeção de cloro para separação da prata que passava
por tratamento específico para a obtenção de prata eletrolítica com 99,9% de pureza. O ouro, com
teor aproximado de 95% após a cloração, era fundido sob a forma de anodos e refinado
eletrolíticamente, resultando um ouro com 99,99% de pureza mínima que era finalmente fundido e
moldado em barras.

A proposta inicial era contar os 130 anos da História da Mina de Morro Velho no período 1830 ~
1960 louvando-se na bibliografia disponível. Certamente o processo de beneficiamento do minério
de ouro em Morro Velho experimentou mudanças desde a publicação de Hollowood em 1955 até
os dias atuais.

Figura 120 - Vagões de minério seguem para os britadores

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Figura 121 - Ponte de pesagem de minério e virador

Figura 122 - Britador de 10 pilões – 1898

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Figura 123 - Mesa de seleção de pedras

Figura 124 - Minério britado sendo descarregado nos silos

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Figura 125 - Mesas vibratórias e máquinas de lavagem automática

Figura 126 - Amostragem e mesas vibratórias de rejeitos

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Figura 127 - Caixas de secagem de areia

Figura 128 - Autoclaves da planta de oxigênio

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Figura 129 - Bombeamento do rejeito

Figura 130 - Fornalhas de fundição. Derramando ouro nos moldes do lingote

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Figura 131 - Tropa do ouro a caminho da estação ferroviária

Figura 132 - Caixas de ouro sendo entregues ao transportador

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Figura 133 - Fluxograma do processo de obtenção do ouro

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Comentários finais
O texto contém 33 referências a Eakin, 22 a Burton, 20 a Libby, 9 a Hollowood e 1 para Gardner, Gair
e Rodrigues, o que dá uma dimensão da contribuição de cada um deles.

Enfrentando as dificuldades existentes na época do Brasil Imperial, Morro Velho representou uma
busca épica por ouro, dinheiro e poder.

Alguns relatos chamaram a minha atenção: a organização da mina, a disponibilidade e a facilidade


na obtenção de madeira e água, o (des)controle da mão de obra e o admirável sistema hidrelétrico
de Rio de Peixe.

A notável organização do trabalho em Morro Velho causou espécie em Douglas Libby. Os


estudantes que visitaram a mina comentaram que em Morro Velho havia uma economia espartana.
Nenhum excesso, nenhum desperdício. Tudo na justa medida, nem mais, nem menos.

Cabe destacar a dificuldade enfrentada por Herring para regularizar, perante as autoridades
brasileiras (Guardamoria), a transferência dos direitos de lavra concedidos por decreto imperial ao
Dr. Süch e seus sócios para a St. John. Quando as operações mudaram de São João del-Rei para
Nova Lima, a companhia manteve o mesmo nome para não correr o risco de perder a concessão.

Outro aspecto a destacar é o custo da mão de obra. O capitalismo procura buscar os fatores de
produção onde seus custos são menores. As fábricas norte-americanas de equipamentos eletrônicos
e de calçados esportivos se deslocaram para a Ásia por causa da mão de obra barata. O leitor deste
livro digital provavelmente deve estar usando um tablet ou um computador portátil "made in Asia".
O custo da mão de obra nos Estados Unidos é incomparavelmente maior do que o da asiática e esta
é a razão pela qual a indústria automobilística norte-americana não conseguiu competir com a
japonesa. Há um cinturão de ferrugem ao redor de Detroit.

No caso de Morro Velho, o surgimento do movimento sindical reivindicando maiores salários reduziu
os lucros da St. John e levou a companhia a registrar prejuízos em meados da década de 1950. Não
foi a única causa dos prejuízos, mas uma componente crucial.

Por outro lado, um empreendimento desta envergadura seria inviável com a regulação existente nos
dias de hoje. Para cortar uma árvore no quintal de sua casa, você tem que pedir autorização à
prefeitura. Um alvará para construir uma residência de pequeno porte leva um ano para ser
concedido; outro igual período para se obter um "habite-se".

Num cenário destes, como a administração da mina conseguiria cortar as florestas que cortou para
atender suas necessidades? Para obter outorgas para canalizar os regos e alimentar as rodas d’água?
Sem chance. Chalmers infartaria se tivesse que se submeter à regulação vigente hoje em dia.

Nossos órgãos reguladores deveriam fazer a si próprios duas perguntas: (1) o que regular? e (2) o
que não regular? A segunda pergunta é mais importante do que a primeira.

Empreendimentos como a Standard Oil de John D. Rockfeller e a Saint John de John D. Powles
prosperaram na ausência de regulação. "On my land I’m the king".

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Mas o livro não se resume a esses aspectos. Ele conta mais do que isso. Ele conta também um pouco
da história dos nova-limenses, de suas raízes, a nossa história. Ele nos ajuda a refletir sobre quem
somos, por que estamos e como viemos parar aqui.

Décio H. Barbosa

Figura 134 – Mingu, desde mi ventana

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Sobre o autor

Nasceu em Nova Lima no número 397 da rua Chalmers, em frente à usina do Retiro, primeira usina
hidrelétrica da St. John construída em 1896, cidade em que cresceu e passou a sua infância e a maior
parte da adolescência.

Em seguida, morou no final do Rego Grande ao lado da "peneira", que peneirava a água que
alimentava a referida usina através de uma tubulação de grande diâmetro, sobre cuja geratriz
costumava transitar para cima e para baixo treinando seu equilíbrio.

Orientava seus horários de refeições pelos sons dos apitos que anunciavam a mudança de turno na
"Mina".

Fez o curso primário no Grupo Escolar George Chalmers, título que, contrariado, era obrigado a
escrever repetidas vezes para treinar sua caligrafia. Pronunciava "Xau-mé-ris" e estranhava a ausência
de uma vogal "i", ou quem sabe "e", entre as consoantes "r" e "s".

Voltou a morar no alto da rua Chalmers, desta feita no número 359, de onde ia com frequência de
bicicleta ao início do Rego Grande até a "Máquina" dos Cristais, como era conhecida a usina
hidrelétrica construída naquele local pela St. John em 1900.

Quando as comportas da barragem dos Cristais eram fechadas para a limpeza da canaleta do Rego
Grande e o nível d’água diminuía, entrava no leito lamacento do Rego para pegar com as mãos os
"cascudos", apelido dado aos pequenos bagres que ficavam entocados na lama.

Usando o bondinho, que saia da Praça do Mineiro e fazia escalas nas estações do Rezende e do Galo,
visitava seu avô, tias e primos em Raposos, onde observava as pessoas pescando debruçadas sobre
a ponte que cruza o Rio das Velhas.

Desde meados da década de 2010 mora no Alto das Quintas e, quando abre a janela de seu quarto
pela manhã (Figura 134), depara à sua frente com o imponente Morro do Mingu, sob cuja vegetação
escondem-se as estruturas enferrujadas do que restou dos "headgears" dos antigos "shafts" C e D,
e, ao pé desse morro, com o sítio que abrigava as instalações de superfície da "Mina" antes do
descomissionamento.

Entretanto, as razões que o moveram a escrever este livro permanecem desconhecidas.

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