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Velejar, velejei
No mar do Senhor
Lá eu vi a fé e a paixão
Lá eu vi a agonia da barca dos homens
TEXTO PÁGINA 4
Ana Lúcia de Abreu Gomes V ISTA PA RC IA L DE S ÃO JOÃO D EL-R EI CO M
DE STAQU E DA S IGRE JA S DE NO S S A S EN H O R A D O
PIL A R E NO S S A S E NH O RA DA S MER CÊS .
FOTO : RIC A RDO DO S S A NTO S G O NÇA LV ES , 2 0 1 4 .
PÁGINA 8
IGRE JA DE S A NTA QU IT É RI A , CATA S A LTA S .
FOTO : PE DRO DAV ID, 20 0 4 .
Sumário
10 apresentação 50 Os sinos 116 NOTAS
52 O processo de
12 introdução produção dos sinos 128 FONTES BIBLIOGRÁFICAS
63 Recorte territorial da
30 IDENTIFICAÇÃO pesquisa: do sertão dos ANEXOS
31 O sineiro, o sino e o Cataguases às cidades de Minas 132 Anexo 1 - Parecer do Relator
toque: trindade mediadora 69 O surgimento das 140 Anexo 2 - Certidão de
entre o humano e o divino irmandades religiosas Registro do Toque dos Sinos
35 O sineiro e seu ofício 142 Anexo 3 - Certidão de
45 Os toques, seus segredos 76 OS BENS CULTURAIS COMO Registro do Ofício de Sineiro
e suas mensagens OBJETO DE REGISTRO 144 Anexo 4 - Modalidades de
46 Toques com o sino paralisado Toques em São João del-Rei
48 Toques com o sino 106 RECOMENDAÇÕES 148 Anexo 5 - Afinação do Sino
em movimento DE SALVAGUARDA
Apresentação
dossiê iphan 16 { Toque dos Sinos e o Ofício de Sineiro em Minas Gerais } 11
tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
B AI XO
TA P ETE DA P R OCI S SÃO DA SE M ANA SANTA,
S ÃO J OÃO DEL-R EI .
FOTO: J OÃO R AMA LHO NE TO, 2009.
Cultural do Iphan, Ângelo Oswaldo sob a responsabilidade de Jairo Braga produto parcial – reúne textos
de Araújo Santos. A formalização Machado, historiador do quadro do basilares sobre o tema: o artigo
do pedido foi encaminhada pela Iphan, lotado no Museu Regional de Maria do Carmo Vendramini,
Secretaria de Cultura do Estado de São João del-Rei à época. “Sobre o sino nas igrejas brasileiras”,
de Minas Gerais2 ao Instituto do A pesquisa teve início em 2002, publicado em 1981 no anuário
Patrimônio Histórico e Artístico com pesquisadores e consultor alemão Musices Aptatio8; o texto do
Nacional (Iphan), em 13 de agosto especialmente contratados com arquiteto, estudioso do toque
de 2001 e, naquela ocasião, dizia o apoio da Fundação de Pesquisa dos sinos e consultor do projeto
respeito ao registro dessa forma da Universidade Federal de São de pesquisa, André Guilherme
de expressão na cidade de São João del-Rei (Funrei)5, mas, Dornelles Dangelo, “Os sinos da
João del-Rei exclusivamente. em virtude de várias mudanças Quaresma, mensageiros da alma
Em 12 de novembro de institucionais, foi interrompida; barroca mineira”9; o texto de Aluízio
2001, o então Departamento de a equipe constituída e treinada na José Viegas, “A linguagem dos sinos
Identificação e Documentação do metodologia do Inventário Nacional de São João del-Rei”, transcrição de
Iphan informou à Secretaria de de Referências Culturais – INRC6 foi uma palestra proferida pelo autor
Cultura do Estado de Minas Gerais desmobilizada no final daquele ano. em 1990 na Escola de Farmácia da
e à Superintendência do Iphan3 em A despeito de sua interrupção, Universidade Federal de Ouro Preto,
Minas Gerais sobre o acolhimento o trabalho iniciado em São João mas nunca publicado;
do pedido e a abertura do Dossiê del-Rei permitiu que se reunissem e o texto do Sr. Alfredo Pereira de
de Estudos R-054, dando início à referências bibliográficas e Carvalho, membro do Instituto
instrução técnica do processo do documentais fundamentais para Histórico e Geográfico de São João
toque dos sinos naquela localidade. a pesquisa sobre a linguagem dos del-Rei, também intitulado
A coordenação do processo foi sinos de São João del-Rei, que até “A linguagem dos sinos de São João
assumida pela Superintendência então se encontravam dispersas7. del-Rei”, que apresenta uma codificação
Regional do Iphan em Minas Gerais O material – entregue a título de preciosa dos toques de sinos10.
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
V I STA G ER AL DE CONGONHAS.
FOTO: CR I STI NA LEME , 2007.
D I REI TA
V I STA G ER AL DE OURO PRE TO.
FOTO: J A SON B A RROSO SANTA ROSA, 2006.
PÁG I NA AO LADO
V I STA PARCI AL DE DI AM ANTINA.
FOTO: DJ ALMA CORRÊ A, 2009.
sejam: Ouro Preto, Mariana, é o (3) estabelecimento de associações vilas coloniais da América portuguesa
Catas Altas, Congonhas do religiosas formadas por leigos nessas tinha uma intensa vida cultural e
Campo, Diamantina, Sabará, vilas, que se responsabilizaram musical, especialmente se levarmos
Serro e Tiradentes. Dessas, apenas pelos ofícios litúrgicos oferecidos em consideração a atuação dos
Catas Altas não tem o seu sítio à população e, dentre esses ofícios, mestres de capela, responsáveis
urbano tombado pelo Iphan, o de tocar os sinos; esses sodalícios pela elaboração de composições
mas é detentora de monumentos foram e permanecem hoje, em musicais e pelo seu ensino15. André
isolados reconhecidos como algumas dessas cidades, como os Dangelo assevera, entretanto,
patrimônio nacional: a Igreja responsáveis pela manutenção da que na teatralidade barroca a
de Nossa Senhora da Conceição prática sineira14. O barroco (4) música teve papel fundamental.
e o Conjunto Arquitetônico é igualmente um elemento comum e A monarquia portuguesa e,
do Colégio do Caraça12. marcante nas cidades selecionadas, posteriormente, a brasileira, por
Em comum a essas nove não apenas como estilo artístico, meio do padroado16, mantinha uma
cidades, temos (1) seu processo litúrgico e paralitúrgico, mas estrutura que viabilizava a prática
de constituição que remonta à como visão de mundo. Um último musical nas igrejas de maneira
atividade mineradora desenvolvida elemento (5) a ser acrescentado geral e, mais especificamente,
durante o período colonial naquela é o destaque dado à música nas nas catedrais. Essa estrutura era
região, associada à forte presença, cidades inventariadas como em formada pelos cargos de subchantre
nesse mesmo período histórico, tantas outras cidades mineiras. (responsável por dirigir o coro de
(2) da mão de obra escrava o que Desnecessário dizer, mas está aqui cantochão dos capelães-cantores),
se constitui num dos elementos destacado, que a presença da música capelães-cantores (responsáveis
conformadores daquela sociedade e nas cidades e vilas coloniais não é pelo coro), o mestre de capela
da expressão dos toques dos sinos13. um traço característico e específico (responsável pela música polifônica
Outro elemento comum às cidades das regiões mineradoras mineiras. cuja execução era feita por músicos
inventariadas, mas não exclusivo, Parcela significativa das cidades e não eclesiásticos que, muito
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
S A NT UÁ RIO DE BO M JE S U S DE MATO ZI N H O S ,
C O NGO NH A S DO C A M PO .
FOTO : C RIST INA L E M E , 20 0 7.
comumente, ele mesmo contratava) dessas corporações desapareceram do Iphan em Minas Gerais acerca
e o organista17. Os mestres de capela com o tempo, outras se mantêm até da ampliação do território a ser
compunham com exclusividade hoje como é o caso da Orquestra inventariado, tratou-se de dar
para cada sodalício. O viajante Ribeiro Bastos, Lira Sanjoanense e continuidade à instrução técnica
Curt Lange nos informa: a banda Theodoro de Faria em São do processo, procedendo-se à
João del-Rei; a Lira Cecilia na cidade pesquisa e documentação sobre
[...] cada festa religiosa tinha sua de Prados; a Orquestra Ramalho em o toque dos sinos em Mariana,
música própria, tocada por um grupo Tiradentes; a Banda Santa Cecília Ouro Preto e Catas Altas, sob
musical dirigido por um mestre ligado à e a Orquestra Sacra Santa Cecília, a responsabilidade da empresa
Irmandade ou Ordem Terceira por contrato ambas de Sabará. Em Diamantina, Santa Rosa Bureau Cultural.
de serviço que valia por determinada temos a centenária Banda de Em 2007 e 2008, o inventário
temporada, em geral correspondente Música do 3º Batalhão da Polícia se estendeu até as cidades de
ao ano fiscal da Mesa diretiva.18 Militar de Minas Gerais, a Banda Congonhas do Campo, Sabará,
Euterpe Diamantinense, fundada Serro e Diamantina, agora a cargo
Havia, portanto, nas vilas e em 1927, a Banda Sinfônica Mirim da organização não governamental
cidades mineiras, uma estrutura Prefeito Antônio de Carvalho Cruz, Núcleo Brasileiro de Percussão.
que se responsabilizava também pela fundada em 1985, e o Conservatório No mesmo período, o inventário
programação musical tanto religiosa Estadual Lobo de Mesquita, criado na cidade de Tiradentes foi
quanto profana. Assim, não é de em 1994. Há também o coral realizado pela Superintendência
se estranhar que a maior parte da Regina Pacis, fundado em 1983. do Iphan em Minas Gerais.
documentação musical de que se Tendo em vista todas essas O material produzido ao longo
tem notícia se refira ao repertório circunstâncias e estabelecidos, do inventário nessas cinco cidades,
litúrgico e paralitúrgico, tendo assim, os entendimentos entre como também o conhecimento
sido guardada pelas corporações de o Departamento de Patrimônio sistematizado a partir dos dados
músicos dessas cidades. Algumas Imaterial (DPI) e a Superintendência produzidos nas pesquisas anteriores
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
foram consolidados nas fichas do Confederação Nacional dos Bispos uma ou mais pessoas para tocá-los,
INRC, tudo sendo igualmente do Brasil (CNBB). Essa opção sempre que necessário. Além disso,
incorporado ao processo. se sustenta nas dificuldades para há os casos (e são numericamente
O Núcleo Brasileiro de Percussão a manutenção de uma estrutura significativos) de sinos rachados,
(NBP) produziu também um texto que viabilize o toque dos sinos em sem badalo ou, ainda, sem local
multimídia sobre o toque dos sinos, diferentes momentos da liturgia apropriado para serem instalados.
igualmente anexado aos autos. católica. Segundo a CNBB, Os novos equipamentos
É importante observar hoje a manutenção dos sinos e de seus eletrônicos possuem uma praticidade
que, paulatinamente, os sinos toques não é mais condizente mais adequada aos dias atuais,
vêm sendo substituídos por com os tempos atuais; o custo de justificam aqueles que optam por sua
instrumentos eletrônicos, com sua manutenção é elevado, pois substituição: podem ser instalados
o aval e aquiescência da própria demanda a disponibilidade de em qualquer lugar, acionados por
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
DA E S QU E RDA PA RA A DIREI TA
S INE IRO W E L L INTO N, S A BAR Á .
FOTO : C RIST INA L E M E , 20 0 7 .
S INE IRO RO NA L DO , S A BA R Á .
FOTO : C RIST INA L E M E , 20 0 9 .
recente, como poderia parecer a tiveram, como aqui, maior função, Uma crônica de Machado de
uma análise mais apressada como um maior violência e maior prestígio.21 Assis sobre a proibição dessa prática,
resultado automático do processo de publicada na Semana Ilustrada de
secularização do mundo ocidental Recuando quase um século 20 de outubro de 1872, mostra
e de homogeneização cultural20 dessa notícia de Luiz Edmundo, que tal regulamentação nunca
característico da pós-modernidade. há relatório da Comissão de havia ocorrido efetivamente.
O cronista Luiz Edmundo Salubridade da Sociedade de Felipe Augusto Bernardi cita a
comparava o incômodo causado pelas Medicina sobre os toques de solicitação feita por vereadores ao
modernidades que chegavam ao Rio sinos e os malefícios à saúde Bispado de Diamantina, em 1878,
de Janeiro no início do século XX deles decorrentes. Tal relatório, para que se tomassem providências
(buzinas de automóvel, apitos de datado de 1833, informava: em relação ao sineiro da Sé que não
locomotivas ou de fábricas, rádios, controlava os abusos cometidos pelos
vitrolas, dentre outros) ao produzido No dia de finados, é melhor deixar-se a meninos da cidade, que tocavam os
pelos sinos que, segundo ele cidade aos defuntos que sofrer a tormenta sinos “sem regra e sem método”23.
dos sinos desde o meio dia da véspera até Pode-se observar aqui que as
[...] durante três longos e impassíveis o tardanho momento dos últimos ofícios. questões recorrentes contra os
séculos sobre os [...] ouvidos, como sobre os toques dos sinos na sociedade carioca
[...] nervos, malharam incansavelmente, De tal abuso decorriam doenças ou mineira dos séculos XIX e XX
desapiedadamente, falando-lhes num nervosas e auditivas, uma vez que não tratavam da sua proibição,
verdadeiro delírio de impertinência e a população era submetida a mais mas, sim, de sua moderação.
constância, ora de Deus, ora dos próprios de cinco minutos ininterruptos Atualmente, entretanto, passados
homens. O Rio era uma feira barulhenta de toques.22 Naquela ocasião, praticamente 700 anos desde as
de badalos. E que badalos! Nem sequer entretanto, o relatório e parecer da primeiras notícias da ascensão dos
em Lisboa, onde eles à solta, viviam Comissão sugeriam a regulamentação sinos aos campanários das igrejas
pelas sineiras quais cabras a dançar, dos toques e não a sua supressão. europeias, os bronzes não perderam
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
suas funções originais segundo a exclusivamente, uma relação de determinada referência cultural
bibliografia especializada, ou seja, comunicação ou de controle do como patrimônio cultural.
a comunicação com Deus, com os homens tempo, como também não o era, Importa avaliar como o toque
e o controle do tempo. E é justamente de maneira exclusiva, no mundo dos sinos agencia processos
por isso que o pedido para a de outrora. Se considerada uma de construção de identidades
salvaguarda dessa tradição chama questão de comunicação tout court, legitimadas socioculturalmente.
a atenção. Se suas funções originais como explicar que em São João Assim posta, essa questão aponta
não são mais fundamentais, por del-Rei se verifique um repertório para outra, qual seja, a da
que os sinos continuam a tocar? de aproximadamente 10 toques possibilidade de reconhecimento
Sabemos que é próprio da diferentes para um mesmo desse bem como patrimônio.
dinâmica social que algumas práticas objetivo como, por exemplo, o de Como se verá neste dossiê
se atualizem e permaneçam e que comunicar a celebração de uma descritivo, e em toda a documentação
outras desapareçam, justamente missa? Esse e outros elementos reunida no processo e arquivada no
porque perdem seu lugar social e apontam para a conclusão de DPI, a pesquisa demonstrou que o
seus significados. Em São João que a função comunicativa e toque dos sinos constitui elemento
del-Rei, contudo, essa prática está também a de controle do tempo24 capaz de revelar a diversidade e
viva e presente, longe de desaparecer. persistem; contudo, a relação a especificidade sociocultural,
Nas outras cidades inventariadas entre essa prática e a comunidade característica e presente nas
encontramos também, em maior de indivíduos não é de mera comunidades inventariadas.
ou menor grau, reverberações e funcionalidade, ou melhor, não Seus habitantes se reconhecem e
ressonâncias muito significativas se trata de investigar a função ou se distinguem dos habitantes de
das expressões sineiras. ainda a serventia dos toques nas outras cidades porque atribuem um
O toque dos sinos está presente cidades inventariadas. Não é essa significado particular ao toque dos
e sua relação com a população a questão que se coloca quando o sinos, ao repertório dos toques,
das cidades inventariadas não é, tema é o reconhecimento de uma ao som diferenciado que plange de
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
D I REI TA
V I STA PARCI AL DE TI RAD E NTE S C OM DE STAQUE À
MATR I Z DE SANTO ANTÔNIO.
FOTO: RI CARDO DOS SANTOS GONÇ ALVE S, 2008.
I GR E J A DO R OSÁRI O NO DISTRITO DE M IL HO
V E R D E, SERRO.
FOTO: CRI STI NA LEME, 2007.
a religiosidade católica no dar significação ou importância moral. A missa dominical era local de expressão
Brasil. Caio Boschi, fornecendo Muita devoção e muita devassidão; eis aí cotidiana da fé católica, por isso, segundo
informações que reiteram os aspectos concomitância resultante e universalmente o gosto da época, o culto deveria ser
de representação da religiosidade provada pelos costumes das nações uma experiência absorvida por todos os
mineira, cita Oliveira Martins: católicas depois da Renascença.25 sentidos e para isso seus aspectos exteriores
eram extremamente valorizados.27
[...] o catolicismo não era então – como Portanto, pode-se concluir que
o era a religião protestante – uma fé a religiosidade que se conformou na Acrescente-se a isso, o fato
íntima e absorvente: era uma convicção região (e quiçá em todo o território de a estrutura religiosa na região
para uns, uma convenção para outros, português na América) era enunciada mineradora estar fortemente
uma conveniência para muitos, e um por signos externos como o gestual, marcada pela presença dos
desvairamento para os defensores o culto e a devoção aos santos acrescida sodalícios. Segundo determinavam
intolerantes da fé. Havia decerto uma no conhecimento da doutrina e os compromissos dessas associações
afirmação religiosa unânime e violenta; no aprofundamento da fé. Enfim, religiosas, a realização de
mas desapareceu a unanimidade ingênua uma religiosidade introspectiva, mas eventos religiosos era uma
e espontânea da crença, que radica as também e, sobretudo, expressiva. determinação cujo objetivo era
religiões. O catolicismo atravessava uma Expressão essa que se externalizava na o de divulgar a fé católica. Para
crise, de que saíra malferido; e a violência participação em procissões e demais tal, no calendário litúrgico e
com que se impunha estava denunciando rituais católicos. Nesse sentido, paralitúrgico, essas associações
que ficara sendo, antes uma expressão essa forma de vivenciar a religião vai mobilizavam músicos, oradores,
da autoridade, do que uma expansão ao encontro do estilo barroco de pintores, enfim todo um conjunto
do sentimento popular. Isto fazia com viver a religiosidade no campo e no de profissionais responsáveis
que o povo, sem renegar o catolicismo, tempo da “representação”26 naquilo por viabilizar tais rituais
fosse caindo num relaxamento; e que, que se interpreta como pompa comemorativos que valorizam
ficando com a religião, deixasse de lhe barroca. Junia Furtado reitera: os aspectos visíveis da fé. No
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
sem a necessidade de aplicação dentre outras práticas, do toque arquiconfraria, associações religiosas,
de ritualística solene, como as dos sinos como a cidade o o sentido de partidarismo. A cada
missas rezadas em latim, o canto mantém. O primeiro relatório de solenidade ou festa promovida por uma
gregoriano ou, ainda, a celebração pesquisa da equipe responsável irmandade, etc. e lá estava toda a família
do Ofício de Trevas29. A cidade pelo inventário em São João a se dedicar em limpar, organizar e
de São João del-Rei os manteve, del-Rei afirma que o barroco ornamentar a igreja e as imagens,
sendo, inclusive até há bem pouco faz parte da “[...] alma do são- e custeando muitas vezes o aparato que
tempo, a única cidade que o joanense, que de geração em estas festas se revestiam. É só percorrer
celebrava. A Orquestra Ribeiro geração tem procurado manter os livros manuscritos das irmandades e
Bastos e a Lira Sanjoanense são vivo esse complexo mundo veremos famílias em diversas gerações
contratadas pelas irmandades sagrado”. Essa afirmação é seguidas participando como irmãos e
para a composição de peças, endossada por Aluízio Viegas que prestando os seus serviços, nas mais
sendo instituições fundamentais assevera que a religiosidade de diversificadas ações. Isso influenciava a
para a formação de músicos São João del-Rei é famosa desde história e o dia a dia da comunidade.
e reprodução das tradições os tempos coloniais. Ele explica:
artísticas e culturais da cidade. André Dangelo, são-joanense
O historiador e coordenador O modo de ser e viver das pessoas estudioso dos sinos e do seu
da pesquisa em São João del-Rei, influencia as pessoas próximas e se toda toque, já mencionado, também
Jairo Braga Machado, reitera que uma comunidade é unânime em certas destaca a existência de uma alma
um dos elementos fundamentais práticas, elas passam a constituir o modus barroca em São João del-Rei ao
para a manutenção dessa prática vivendi de todos. E isso aconteceu em fazer referência à Semana Santa:
cultural na cidade é que seus São João del-Rei. As famílias se filiavam
habitantes vivem imersos em uma às irmandades e, como não podia ser [...] Nestes momentos, podemos sentir
cosmogonia barroca, responsável, de outra maneira, criou-se em cada a alma barroca da cidade revigorada e
segundo ele, pela permanência, irmandade, confraria, ordem terceira, presente, e descobrimos a cada instante
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
de observação que, paralelamente a cidades históricas, como já disse uma segue, associado à documentação
toda a modernidade que envolve o vez um poeta, podemos sentir “nossos audiovisual e bibliográfica
nosso tempo, a tradição ritualística da mortos mais vivos”, e nos sentimos levantada e produzida durante
alma barroca resiste nas nossas cidades mais perto das nossas raízes.30 a pesquisa, deixa claro que os
históricas. Assim, quando vemos o toques dos sinos comunicam
som dos sinos das igrejas de Minas se A última observação sobre a uma série de mensagens que
propagando por nossas montanhas pesquisa diz respeito ao uso da são decodificadas não só pelos
durante a Quaresma, parece-nos que palavra “linguagem”, recorrente moradores das cidades, mas,
eles têm o poder mágico de diminuir o em muitos textos e depoimentos. como reza a tradição, pelo
espaço de tempo que separa a Minas de Seu emprego aqui deriva de próprio Deus, pois quando
hoje e a do passado. Nestas ocasiões, uma abordagem semiótica e um sino toca, Deus escuta a
então, quando chegamos nas nossas não linguística. O texto que se prece com mais atenção.
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
Bahia
Bahia
Distrito
Federal
Distrito
Federal
Goiás
Goiás
Espírito Santo
Espírito Santo
São Paulo
Rio de Janeiro
São Paulo
Rio de Janeiro
Identificação
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
D I REI TA
S I NEI RO CARLOS NA I GRE JA M ATRIZ DE NOS SA
S E N HOR A DA CONCEI Ç ÃO, C ATAS ALTAS.
R etomando as orientações
e preocupações de Mário
de Andrade ao ponderar que
forma que os moradores da cidade
pudessem se juntar, em oração,
para chamar a intervenção divina.
da cidade não é divulgado
por meio dos toques, ele só
vem a saber da notícia depois,
o patrimônio cultural não está Guerras, incêndios32 e calamidades quando o enterro já ocorreu.
exclusivamente nos monumentos eram igualmente veiculados pelos De sua argumentação, podemos
de pedra e cal, o toque dos sinos bronzes. Enfim, alegria e dor. inferir duas conclusões: os sinos
constitui referência cultural Atualmente, esses e outros toques33 divulgam as notícias no “calor
representativa da síntese entre a silenciaram por terem perdido dos acontecimentos”; nesse
materialidade e a imaterialidade do função diante de novas práticas e sentido, ainda são veículos de
patrimônio. Nesse caso, a “pedra de novos meios de comunicação. comunicação muito eficientes no
e cal” das torres e campanários e O senhor Antônio Pacheco plano local. A outra conclusão
o bronze dos sinos são elementos Filho, da cidade de Mariana, se refere à dimensão do toque
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
dos sinos para as pessoas dessas detentores desse saber; (3) afirma que para alcançar
cidades: pois se eles não são mais e outro conjunto de práticas tal nível de conhecimento,
tão necessários, como as pessoas sociais – com destaque para o comum entre os mais velhos
normalmente constatam, por que a agrupamento em irmandades e parcelas da população nas
preocupação em salvaguardá-los? religiosas – referentes à sociedade cidades inventariadas, há que
A resposta, com certeza, que se apropria de seus sentidos se distinguir e identificar
tem relação com o valor que aquela e significados. É muito comum os timbres. Identificados os
população atribui aos sinos, ouvirmos, nessas cidades, que timbres, se distinguem sinos,
ao sineiro e a seus toques. “só não se bebe no sino porque torres e, consequentemente,
Da mesma forma que a identidade ele está com a boca pra baixo”35. as irmandades locais. É ele que
de uma pessoa ou de uma família Acrescente-se a essa afirma em entrevista concedida
pode ser definida pela posse dimensão de entendimento e aos pesquisadores em 2002:
de determinados objetos que apropriação de significados o
foram herdados e permanecem fato de os moradores das cidades [...] se você não identificar timbres, não
ali por gerações constituindo seu inventariadas diferenciarem as resolve para você, mesmo que você saiba o
patrimônio34, a população dessas vozes dos “bronzes”; eles sabem, ritmo dele, você não vai saber onde é que
cidades inventariadas se reconhece, de forma clara, qual sino está está tocando o sino. Então você tem que
se identifica, se diferencia de tocando. Dessa identificação criar essa relação com o timbre. Depois
outras também a partir da prática decorrem outros conhecimentos que você consegue criar a relação de
sineira, dando importância a que atingem níveis altos de timbre, aí você já identifica onde é que o
cada um dos elementos que a sofisticação sobre os vínculos sino, porque se você escutar o sino batendo
estruturam, quais sejam: (1) os entre a igreja e a irmandade aqui você não vai saber de onde que ele é.
sinos como objetos materiais; (2) religiosa dona do sino, por Então você tem que identificar pelo timbre.
as práticas sociais desenvolvidas exemplo. Falando a partir de São Com o timbre identificado, rapidinho
pelos sineiros, portadores e João del-Rei, André Dangelo, você começa a identificar os toques.36
dossiê iphan 16 { Toque dos Sinos e o Ofício de Sineiro em Minas Gerais } 33
tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
B AI XO
S I NO V I R ADO NA I G R E JA NOS SA SE NHORA DAS
MERCÊS, OU R O P R ETO.
FOTO: P EDRO DAV I D, 2004.
prática que leva os jovens às torres [...] tanger os sinos para missas e
sineiras para a aprendizagem dos ofícios às horas competentes; e todos os
toques. Em outras cidades, há, dias depois do sol posto tangerão as
sem dúvida, maior dificuldade em Aves Marias, em memória da
manter ou restabelecer a cadeia Anunciação da Virgem Maria Nossa
O sineiro e de transmissão desse saber. Senhora. E tudo o mais pertencente
Mas quem foram e quem são aos sinos; como quando se houverem
seu ofício os detentores desse saber? de fazer sinais por defuntos, repicar,
Segundo Aluízio Viegas, há um dar sinal para se lembrarem das
preceito do século XVI, de São almas que estão no Purgatório,
Carlos Barromeu39, orientando correrá por sua obrigação.
que cabia aos clérigos a tarefa
de tanger os sinos. Para tal, eles Em relação aos enterros,
para os diversos toques de sinos, à batina) e rezar orações E, para que se ponham algum termo
pode-se afirmar, pelos resultados antes e depois dos toques. certo, mandamos que tanto que
da pesquisa de campo nas cidades O documento Constituições falecer algum homem, se fação (sic)
inventariadas, que a maior parte Primeiras do Arcebispado da Bahia, datado três sinais breves, e distintos; e, por
desse conhecimento está na memória de 1707, faz referência à prática mulheres dous; e se forem menores
dos sineiros de Minas Gerais. sineira em três de seus cinco de sete e quatorze anos de idade,
Em São João del-Rei, Ouro livros. No Livro III, em relação se fará um sinal somente, ou seja
Preto e Diamantina há todo às funções dos sacristãos, consta macho ou fêmea: e por estes sinais de
um movimento em torno dessa que uma de suas obrigações era falecimento se não pedirá salário.
dossiê iphan 16 { Toque dos Sinos e o Ofício de Sineiro em Minas Gerais } 36
tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
dossiê iphan 16 { Toque dos Sinos e o Ofício de Sineiro em Minas Gerais } 37
tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
dossiê iphan 16 { Toque dos Sinos e o Ofício de Sineiro em Minas Gerais } 38
tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
Esse livro também normatiza o que se cometiam, especialmente Janeiro escravos africanos e mestiços
número de sinais para as ocorrências por parte daqueles homens de também tangiam os sinos40.
de morte de autoridades eclesiásticas. maior projeção social, econômica Se é verdade que no período
Sobre os toques fúnebres, as e política, cujas famílias mandavam colonial o toque de sinos ficava
Constituições Primeiras do Arcebispado tocar abundantemente para os a cargo da escravaria, essa forma
da Bahia procuram normatizar seus mortos a fim de distingui-los de expressão sofreu significativa
seu uso, justificando: daqueles pertencentes às camadas influência de ritmos diversos,
econômicas mais desfavorecidas. especialmente, de matriz africana.
[...] Justamente se introduziu na Igreja Embora fosse atribuído ao Podemos atestar a veracidade
Católica o uso e sinais pelos defuntos. Assim sacristão o ofício de tocar os dessa ilação nos remetendo às
para que os fiéis se lembrem de encomendar sinos, sabemos que o trabalho denominações de alguns dos toques
suas almas a Deus nosso Senhor, como manual na América portuguesa de sinos encontrados nas cidades
para que se incite e avive neles a memória ficava, na maioria dos casos, pesquisadas: Barravento – nome
da morte, com a qual nos reprimimos e a cargo da escravaria. Desse homônimo de toques ou ritmos de
abatemos dos pecados. Porém porque a modo, as associações leigas muito terreiros de candomblé e capoeira
vaidade humana, e outros menos piedosos provavelmente utilizavam a mão –, Batucada e Batuquinho, por
respeitos, tem introduzido neste particular de obra escrava para tanger os exemplo. No material audiovisual,
alguns excessos; para que daqui a diante sinos. A bibliografia especializada o consultor Djalma Corrêa,
os não haja, ordenamos e mandamos consultada confirma essa inferência em entrevista com sineiros de
que nisso haja alguma moderação, que e informa que em Recife, até o Diamantina, conclui que muitos
a prudência Cristã e religiosa pede. Oitocentos, a maior parte dos repiques têm marcação similar
sineiros eram escravos. Na Bahia, à síncope do samba de roda.
Pelo que nos indica essa há referência ao escravo Mestre Igualmente, Mário de
passagem, a normatização dos Florêncio, sineiro também. Andrade faz referência a
toques se deu devido aos excessos Há notícias de que no Rio de inúmeros toques de sinos que
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
podem ser comprobatórios na Matriz do Pilar em São João de Eli Evangelista da Cruz, o que
dessa circularidade: além do del-Rei. Segundo ele, depois da pode confirmar as inferências feitas
Barravento, ele acrescenta outros abolição, o trabalho de tanger os de que os toques, na forma como
cujos nomes são de inspiração sinos ficou a cargo das pessoas mais se encontram hoje, tenham sido
popular: chorão, feijão com molho, simples que se subordinavam às criados pelos próprios sineiros,
mocotó sem sal. Também no seu mesas administrativas dos sodalícios ao longo dos tempos. Ainda há a
Dicionário Musical Brasileiro, há um da região. Ainda segundo Aluízio questão de que certos toques têm
verbete denominado Repique de Viegas, o fato desse ofício ser funções semelhantes, permitindo
cabeça em que explica: “como desempenhado por pessoas das ao sineiro escolher dentre um
são conhecidos os repiques camadas mais pobres da população repertório de toques. Para tal
criados por sineiros baianos que não significa que as torres não escolha, leva-se em consideração
acabaram sendo incorporados ao fossem frequentadas por pessoas de não só seu gosto pessoal, mas,
repertório tradicional de toques todas as camadas sociais. também, quem são os outros
de sinos. Silva Campos cita os Há referência também que sineiros na torre naquele momento
seguintes repiques de cabeça: capoeiras e escravos se escondiam e quais são os toques que eles
Joaquim do colégio, Joaquim nas torres das igrejas onde executam com maior habilidade,
de quatro, Felipe e Xavier”41. ninguém ousava subir. Tanto hoje pois os sineiros tocam muitas vezes
Aluízio Viegas reitera a como outrora, os espaços das em duplas, trios ou quartetos,
existência de muitos negros, torres são espaços de liberdade. dada a necessidade de manipulação
mulatos, pardos e alguns escravos Liberdade de criação, inclusive. de vários sinos. Os sineiros
alugados para os serviços do toque A pesquisa registrou a referência experientes são capazes de tocar três
dos sinos. Ele citou o caso de à criação de um dos repiques, ou quatro sinos ao mesmo tempo
Ana Romeira do Sacramento, denominado tencão atravessado, por sozinhos. Sobre a possibilidade
que alugava um escravo de nome um sineiro de São João del-Rei de apropriação dos toques, Fabio
Francisco para tocar os sinos de uma geração anterior. Trata-se César Montanheiro afirma:
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
Embora observando aquilo que lhe foi Na entrevista concedida lembremo-nos, cuja execução
transmitido, cada sineiro imprime em seu por André Dornelles Dangelo requer que se acorde cedo.
toque uma marca pessoal, sendo possível aos à equipe de pesquisa que em André Dangelo acrescenta que
colegas identificarem, pelo toque, quem está 2002 inventariou o toque dos não se trata do uso de força bruta.
na torre a repicar os sinos. Isso não significa sinos em São João del-Rei, há Ele afirma, inclusive, que quanto
que o toque mude de sineiro para sineiro: uma observação pertinente: se é melhor a manutenção dos sinos,
essas pequenas mudanças equivaleriam a verdade que o toque dos sinos é maior a facilidade e segurança de
diferentes sotaques de falantes de uma mesma uma atividade manual, isso não tangê-los: se não há manutenção,
língua ou, por tão sutis que são, às vozes significa que seja vista como algo os sineiros têm receio em tocá-los
de cada falante de uma mesma localidade. penoso. Se o fosse, não atrairia, e a sua sonoridade fica igualmente
Contudo, às vezes os jovens sineiros tentam como o faz até hoje, muitos prejudicada. André Dangelo
alguma inovação, o que não é bem-vindo.42 jovens para essa tarefa. Tarefa, ressalta que a boa manutenção
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
dos sinos em São João del-Rei do bronze, a musicalidade. Todas área quando há necessidade
é um elemento facilitador para essas dimensões se concretizam de se tocar em solenidade não
que a prática sineira se mantenha naquilo que os próprios sineiros rotineira. Jovens sineiros são
da forma como é hoje na cidade. denominam de via-sacra: os aqueles que exercem a atividade
As irmandades cuidam dos sinos aprendizes percorrem todas cotidianamente. Zeladores
porque sabem que sua sonoridade as torres à espera de uma sineiros devem dar condição
e leveza são fundamentais para a oportunidade de tocar os sinos e aos jovens sineiros de executar
beleza de seus toques.43 isso desde as sete horas da manhã a sua tarefa. Eventualmente
André Dangelo apresenta ainda de um domingo, quando não mais podem tocar os sinos. Mestres
três elementos que favorecem cedo. As festas religiosas também sineiros são sineiros já falecidos
a beleza do toque dos sinos em são momentos muito aguardados que se tornaram uma referência
São João del-Rei: os sinos bem para a prática ou o aprendizado. desse saber e desse ofício.
contrapesados, a existência de um Os sineiros entrevistados A memória dos antigos mestres
único garfo para sua manipulação têm entre 20 e 60 anos e são, permanece viva, pois eles também
e a colocação do gancho em em sua maioria, pessoas do sexo fazem parte da história das
forma de “S” no badalo, que masculino. Os próprios sineiros localidades. Em Mariana, houve
permite a produção de ritmos estabelecem uma categorização o José Chiringa, ex-sineiro da
mais complexos e estruturados. para aqueles que exercem esse Sé que, segundo contam, tocou
Poder-se-á observar na ofício: antigos sineiros, jovens até morrer, porque era o único
documentação audiovisual que sineiros (praticantes e praticantes que sabia todos os toques; os das
acompanha o processo de Registro usuais), zeladores sineiros e várias festas e os das cerimônias
no Iphan, que há um enorme mestres sineiros. Antigos sineiros do Breviário Romano, para as
prazer por parte daqueles que são aqueles que tocam os sinos quais se reunia todos os dias o
assumem a atividade: há o lúdico, esporadicamente. Atuam como Cabido Metropolitano. O Franci
o desafio, a beleza da sonoridade uma espécie de consultor na Caiau, único sineiro que tocava
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
os quatro sinos da Igreja de São bandas das cidades, espaços onde Se alguém toca bem os sinos, toca
Francisco, sozinho: usava as mãos tradicionalmente a música erudita bem uma bateria. José Geovani da
e os pés; o Francisco Lessa, que foi está mais presente, assim como Silva, sineiro da Igreja de Nossa
sineiro da Igreja de Nossa Senhora há muitos sineiros que tocam Senhora das Mercês também em
do Rosário; o Raul, ex-sineiro caixa nas Guardas de Marujo São João del-Rei, vaticina: “[...]
da Igreja da Arquiconfraria; que se apresentam por ocasião repique é uma música”. Ou seja,
Agostinho Batista – sineiro da de folias e congadas, para não a música está presente em outras
Igreja das Mercês; Lauro Morais, falar do Carnaval, momento de ocasiões e oportunidades na
que também tocava com as mãos e espontaneidade, brincadeiras paisagem sonora desse território,
o pé; Zé Godoi, que era sacristão e muita música em todas essas demonstrando que, a exemplo do
da igreja em Monsenhor Horta cidades. Deve-se dar um destaque toque dos sinos, não há fronteiras
(Igreja Matriz de São Caetano), às serestas de Diamantina, outra preestabelecidas ou delimitadas
e levava uma garrafa de café e tradicional manifestação musical. entre uma cultura erudita e outra
bolo de fubá para a torre, quando Nas palavras de Ângelo Prazeres popular, clivagem essa estabelecida
tinha de tocar sinos por muito “Todo mineiro tem um trem de quando ainda se analisavam as
tempo; e o Chico Cidade, que ferro apitando nas veias, uma sociedades e seus processos a
subiu embriagado para tocar a montanha brilhando nos olhos e partir de divisões outras, tais
Quarenta Horas de Carnaval, uma banda tocando nos ouvidos”44. como, classes subalternas e classes
levou um golpe do sino e morreu. Nilson José dos Santos, sacristão e dominantes. E quando se acreditava
Há que se destacar também sineiro da Igreja de São Francisco que as manifestações da cultura
que a maior parte daqueles que se em São João del-Rei, conta que ficavam restritas às chamadas
dedicam a tocar sinos, não só em ouvia seu pai, Hélio Conceição dos camadas dominantes da população.
São João del-Rei, mas em todas as Santos, sineiro também e diretor Como orienta Carlo Ginzburg,
cidades inventariadas, tem alguma da escola de samba Largo da Cruz, [...] Pode-se ligar essa hipótese
relação com as orquestras, liras e afirmar que sineiro é como músico. àquilo que já foi proposto, em
dossiê iphan 16 { Toque dos Sinos e o Ofício de Sineiro em Minas Gerais } 43
tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
PÁGINA AO L A DO , DA E S QUER DA PA R A A D I R EI TA
A PRE S E NTAÇ ÃO DE BA NDA EM ES PAÇO PÚB LI CO D E
S ÃO JOÃO DE L - RE I.
FOTO : JOÃO RA M A L H O NE TO , 2 0 0 9 .
E S QU E RDA
TO RRE DA IGRE JA DE S ÃO F R A NCI S CO D E A S S I S ,
S ÃO JOÃO DE L - RE I.
FOTO : RIC A RDO DO S S A NTO S G O NÇA LV ES , 2 0 1 4 .
A LTO
TORRES DA I G R EJ A DE SÃO FRANCISCO D E PAUL A,
OUR O P R ETO.
FOTO: P EDRO DAV I D, 2004.
B AI XO
TOQU E DO SI NO NA I GRE JA SÃO JOSÉ ,
C O NG ON HA S DO CAM PO.
FOTO: CR I STI NA LEME , 2007.
Considerando o grau de
complexidade que envolve a
forma de execução dos toques,
dedicamo-nos a uma melhor
Os toques, descrição deles, uma vez que
a classificação em festivos ou
seus segredos e fúnebres está relacionada à maior
suas mensagens ou menor aceleração de ritmo,
não envolvendo outros elementos.
Há outra possibilidade de
classificação dos toques que
muitos sineiros utilizam:
além de classificá-los em
S INO DA IGRE JA DE NO S S A S E N H O R A D O
A M PA RO C O M V ISTA DO S T E L H A D O S AO F UN D O ,
DIA M A NT INA .
FOTO : C RIST INA L E M E , 20 0 7.
18 e 20 horas durante o ano todo, É no interior dessa forma A terentena é outro repique utilizado
exceto na Sexta-Feira Santa e no de execução do toque dos sinos para finalizar um conjunto de
Sábado de Aleluia. As pausas entre que podemos encontrar maior repiques e por isso também é
as séries permitem que se rezem, possibilidade de apropriação e designado como repique conclusivo.
no intervalo entre cada uma, as três interpretação por parte dos sineiros. Há casos de repiques em
partes da oração do Ângelus (Anjo): Há vários repiques com o mesmo desuso: o Clens, o Tens-Tens e a
a Anunciação feita a Maria, a objetivo: anunciar novenas e missas, Terentena fúnebre. Eles devem ser
Aceitação e a Encarnação de além de exprimir contentamento acionados por ocasião da morte
Cristo. Cada uma dessas partes em ocasiões de festas religiosas de uma criança. Atribui-se a sua
é seguida da Ave-Maria. ou até mesmo de celebrações civis rara execução a diminuição da taxa
Repiques – há, igualmente, um importantes. Há repiques tocados de mortalidade infantil em todo o
vasto repertório de repiques, uma por ocasião de missas comuns e país. Esses são casos raros de repiques
vez que eles podem ser percutidos novenas cuja escolha fica a critério fúnebres (em geral, como o repique é
utilizando-se dois ou mais sinos. dos sineiros. São eles: Tencão do mais rápido, é comum associá-lo
Os repiques são frases rítmicas Rosário, Tencão da Boa Morte, a um momento festivo). Tem a
dançantes, tocadas na maioria das Tanquins, Tens-Tens, Tens-Tolins, mesma sequência dos repiques
vezes em três sinos de maneira Batucada, Batuquinho. Geralmente, só que sua execução é em ritmo
articulada. Segundo os sineiros, o sineiro combina o repique com lento e pianíssimo. Há sineiros
o sino pequeno (mais agudo) faz a outros toques, por exemplo, que afirmam que o toque pode ser
marcação, o médio (denominado o principiada que, como o próprio traduzido na parlenda: “Não chora
pelos sineiros de meião) pergunta, nome diz, tem a função de não, que eu vou pro céu, não chora
e o grande (mais grave) responde. introduzir um conjunto de repiques. não que eu vou pro céu...” ou “Pode
Essa explicação, que define a Constitui-se de pancadinhas iguais vir que é muito bom, pode vir que
estrutura musical dos repiques, dadas no sino pequeno, em seguida é muito bom” ou, então, “Vem,
é de autoria dos próprios sineiros. no médio e, por último, no grande. vem, sozinho sem mais ninguém”.
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
D I R E I TA
TO R RE DA I G R EJ A DE SÃO FRANCISCO D E AS SIS,
M A R I ANA .
FOTO: P EDR O DAV I D, 20 04.
PÁG I NA AO LADO
S E QU ÊNCI A DO TOQU E DO SINO DA IGRE JA DE SÃO
F R A NCI SCO DE A S SI S, MARIANA.
FOTOS: P EDR O DAV I D, 2004.
Toques com
o sino em
movimento
Para que eles ocorram é necessário que o sineiro não enrole a toques e pancadas assim
“catar” o sino, ou seja, corda na mão. Se ele o fizer, como por um conjunto de
colocá-lo a pique, com a boca o movimento e o peso do sino dobres ou pancadas regulares
para cima, ou ainda, de cabeça podem içá-lo para fora da torre. na bacia interna do sino.
para baixo. É uma habilidade Segundo os depoimentos
conquistada pelos sineiros e A equipe de pesquisa responsável pela recolhidos ao longo da pesquisa
motivo de desafio entre eles. sistematização dos dados de toda a de campo, para uma boa expressão
Para se catar o sino é preciso ter informação produzida concluiu: dos toques é necessário que
prática: fica-se de pé na sineira da É notório que em São João del-Rei os haja em cada torre um mínimo
torre e leva-se o sino, com uma toques de sinos compõem um conjunto de três sinos, o mais grave
das mãos para fora, até que ele, muito mais numeroso e complexo (maior), o médio (designado
pelo próprio balanço e impulso, se comparado às demais cidades meião) e o agudo (o menor).
fique de boca para cima. Não consideradas no inventário. Além disso, Só assim é possível executar os
há proteção alguma enquanto o em São João del-Rei, os toques têm repiques de forma completa.
sineiro executa a “catada”. estrutura bem determinada e, ainda Portanto, há a imaterialidade
A alternativa mais segura é que se permitam pequenas variações dessa forma de expressão, sonora
colocá-lo a pique por meio do ou ornamentos em sua execução, a sua e etérea; e há a imaterialidade
garfo, mas fazê-lo não constitui estrutura permanece perfeitamente do “saber tocar” que é o
desafio para os sineiros. reconhecível. Assim, em São João conhecimento dos sineiros, mas
Amarra-se uma corda ao garfo, del-Rei, há de fato um repertório há a materialidade das torres,
preso ao cabeçote, e puxa-se o vasto de toques de sinos, campanários e sinos.
sino até que, pelo seu próprio constituídos e mantidos. Por isso, algumas observações
movimento, ele vire de cabeça acerca do espaço – torres –,
para baixo. Apesar de mais Outros toques são formados e do bem material – os sinos –,
segura, essa alternativa requer por agrupamento de repiques, se fazem necessárias.
dossiê iphan 16 { Toque dos Sinos e o Ofício de Sineiro em Minas Gerais } 50
tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
PAGINA AO L A DO , DA E S QU E R DA PA R A A D I R EI TA
C A PA DA PU BL IC AÇ ÃO C O NST I T UI ÇÕ ES P R I MEI R A S
DO A RC E BIS PA DO DA BA H IA .
FOTO : AC E RVO S E - M G IPH A N .
V ISTA PA RC IA L DO C O NJUNTO UR B A NO D E
DIA M A NT INA , C O M A TO RRE DA I G R EJ A D E NO S S A
S E NH O RA DO RO S Á RIO E M DE STAQUE E AO F UN D O
S E RRA DO E S PINH AÇ O .
FOTO : C RIST INA L E M E , 20 0 7.
E ncontram-se envolvidos no
processo de produção de sinos
cerca de uma dezena de artesãos e sua
viabilidade da encomenda, as etapas
de fabricação são praticamente as
mesmas desde o século VII da Era
de clara de ovo, manteiga, pelo
de cavalo e argila. Sobre um ou
outro serão fixados os elementos
fabricação dura, em média, de 30 a 50 Cristã. Constitui um processo de ornamentação do sino.
dias. A fundição de sinos só ocorre por que se reproduz há 1.400 anos. Nesse momento, o mestre
encomenda, que pode ser da própria As etapas de fabricação são: fundidor prende, na superfície,
Igreja, das associações religiosas laicas primeiro, faz-se o cálculo da os frisos, desenhos, frases,
ou ainda de um doador52. “costela” do sino. Faz-se uma textos e demais elementos
dossiê iphan 16 { Toque dos Sinos e o Ofício de Sineiro em Minas Gerais } 53
tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
PÁG I NA AO LADO
C E R I MÔN I A DE B ENÇÃO D O SINO DA IGRE JA DE
S ÃO F RANCI SCO DE AS SIS, SÃO JOÃO D E L - RE I.
FOTO: RI CARDO DOS SANTOS GONÇ ALVE S, 2014.
presságios e demônios da região até sino é batizado: “Esse sino está a boca do sino, preenchendo-o
onde o som do sino alcançasse; o seu sendo consagrado ao profeta Elias com uma nuvem de perfume.
batismo também era uma garantia Carmelo”. Então o nome dele será Além da presença do bispo e de
à sua integridade física, sendo Elias. “Elias que a tua voz chame outros membros da Igreja, havia o
afastados os raios e as tempestades. a todos à oração”. Outra cruz. padrinho e a madrinha do sino a
Após a bênção com a água benta, “Elias que a tua voz chame nas quem se atribuía a tarefa de escolher
eram utilizados os Santos Óleos tempestades ou nas calamidades”. o seu nome. Esses procedimentos e
(dos enfermos e de Crisma) para “Elias que a tua voz chame pelos diretrizes se encontram estabelecidas
fazer sete cruzes no exterior e moribundos” e faz depois as cruzes no Pontifical Romano. Depois
quatro cruzes no interior.55 Aluízio internas56. Na sequência, incenso e desse processo de consagração,
Viegas ressalta que, entre cada um mirra eram queimados no turíbulo os sinos são instalados nas torres,
dos sinais feitos com as cruzes, o aceso para esse fim e colocado sob como veremos a seguir.
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
A MONTAGEM DOS SINOS de ferro para dar segurança faz-se um corte reproduzindo o
E SUA COLOCAÇÃO NAS e sustentação aos giros feitos formato de uma canaleta por onde
TORRES SINEIRAS pelo sino quando dobra57. são encaixadas as pontas do eixo que
O eixo é, em geral, uma vara de sustenta o sino.
O cabeçote (A) é uma peça ferro passada por entre as alças ou O eixo deve ser preso numa altura
fundamental na engenharia hastes da coroa e do cabeçote. suficiente que permita que o
e percussão do sino. Dentre Essa vara é presa nas laterais das sino faça sua rotação completa.
suas funções, o cabeçote deve torres sineiras por meio de mancais58. Ainda preso ao cabeçote, temos
servir de contrapeso do sino Para o encaixe dos mancais nas torres o garfo (B) que auxilia na
durante os dobres. Em sua sineiras é feita uma cavidade na pedra movimentação do sino para os
extremidade superior é encaixado no formato exato do mancal, dobres. Amarra-se uma corda
um contrapeso que pode ser e imediatamente acima desse mancal em sua extremidade que, quando
dossiê iphan 16 { Toque dos Sinos e o Ofício de Sineiro em Minas Gerais } 57
tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
E SQU ERDA
C O LOCAÇÃO DO SI NO NA IGRE JA M ATRIZ D E NOS SA
S E N HOR A DA CONCEI Ç ÃO, C ATAS ALTAS.
FOTO: P EDRO DAV I D, 2004.
D I REI TA
I N SCR I ÇÃO DO SI NO DA FUNDIÇ ÃO JOSÉ VAL E NTIM
O NOF R E, EM 1883, I G RE JA M ATRIZ DE NOS SA
S E N HOR A DA CONCEI Ç ÃO, C ATAS ALTAS.
FOTO: P EDRO DAV I D, 2004.
acionada dá início ao movimento censurar os das outras pessoas. O elo proibidas, especialmente,
dos sinos, obrigando o badalo pelo qual o badalo está ligado ou unido as relacionadas à fundição de
(C) a tocar no interior do sino. ao sino é a meditação; a mão que ata o materiais auríferos passíveis
Cabe ressaltar um interessante badalo denota a moderação da língua. A de serem contrabandeados.
registro, datado do século XIII, madeira da estrutura na qual o sino está Quando havia alguma demanda,
indicativo de como a Igreja pendurado significa o madeiro da Cruz geralmente motivada por
carregava os sinos de simbolismo. de Nosso Senhor. O ferro que o liga à necessidades de defesa – como a
Segundo consta, Durandus, bispo madeira denota a caridade do pregador fabricação de canhões –,
de Mende, teria afirmado em 1286: que, estando inseparavelmente ligado a Coroa Portuguesa controlava
à cruz, exclama: “Longe esteja ela de essas atividades de perto. Não
O sino denota a fala do pregador, de mim para a glória, excepto na Cruz do foi outro o caso da metalurgia
acordo com as palavras de São Paulo: Senhor”. que se desenvolveu no Morro de
“Eu me tornei como um metal sonante Os pinos que ligam a estrutura de Araçoyaba, atual município de
ou um címbalo tilintante”. A dureza do madeira são os oráculos dos profetas. Iperó, na região de Sorocaba,
metal significa a fortaleza da mente do O martelo fixado à estrutura pela interior de São Paulo60.
pregador, de acordo com essa passagem: qual o sino é tangido significa a mente A historiografia que trata do
“Dei a ele uma testa mais dura que a sua recta do pregador, por meio da qual tema afirma que o português
própria testa”. O entrechocar do ferro ele atende rapidamente ao Divino Afonso Sardinha descobriu
que, ao bater em ambos os lados, produz comando e, pelas frequentes batidas, minério de ferro na região e
o som denota a língua do pregador o inculca nos ouvidos dos fiéis.59 que, com a devida autorização
que, com o ornamento da sabedoria, da Coroa Portuguesa, sempre
faz ressoar ambos os Testamentos. A FUNDIÇÃO que necessário, fazia funcionar o
batida dos sinos denota que o pregador que viria a ser conhecida como a
deveria, antes de tudo, combater os seus À época colonial, quaisquer primeira metalurgia da América
próprios vícios e corrigi-los para depois atividades industriais eram portuguesa no século XVI.
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
BA IXO
IGRE JA DE NO S S A S E NH O RA D O R O S Á R I O D E S ÃO
GO NÇ A LO , S E RRO .
FOTO : DJA L M A C O RRÊ A , 20 0 5 .
Há documentos que comprovam instalaram no país, todas, salvo [...] Publicou um folheto intitulado
que o então governador das Minas engano, de origem familiar e De Campanis et Precipuis Usibus.
das Capitanias do Sul, Francisco que faziam questão de manter Dava consultas sobre o assunto
de Souza, encaminhou Afonso a transmissão dessa prática no de sua especialidade, orientava
Sardinha e seu filho para proceder interior da própria família, quase gratuitamente os fregueses, e, através
à análise do minério encontrado como um segredo61. Aluízio Viegas de um impresso anexo aos sinos a serem
na região. Cerca de 200 anos mais destaca o fundidor Alberto de entregues aos compradores, tentava
tarde, em 1810, essa metalurgia Samassa vindo da Itália com sua controlar a qualidade de seus produtos
passa a ser a Real Fábrica de família para o Brasil em 1937 e pedindo informações sobre o sino que
Ferro de Ypanema, controlada se fixando em Sorocaba, interior fundira e que estaria em uso (mas
pelo governo português recém- de São Paulo, onde estabeleceu quase ninguém as mandava).63
instalado na América. A data a fundição Pró-Arte Sacra que
mais antiga que se tem registro da passou a se denominar, anos Em 1959, a família Crespi se
fundição de sinos é a do ano de mais tarde, de Sinos Samassa fixou em São Paulo, onde mantém
1589: o sino foi confeccionado Ltda. Ao longo dos anos em que sua fundição até os dias atuais64.
por essa metalúrgica na região de permaneceu no Brasil, editou a Desde 1918, a família Angeli
Sorocaba. Também há notícias de revista Música Sacra. Nela, publicava já desenvolvia suas atividades
um fundidor chamado Francisco artigos sobre a arte e a ciência de fundição em São Paulo.
Bernardes de Souza, responsável da campanologia defendendo Conseguimos identificar hoje,
pela fundição dos sinos das Igrejas que os sinos fossem afinados de além da Indústria de Sinos Crespi,
do Carmo e de São Francisco acordo com as leis da física e da a fundição Cláudio & Manuel do
no início do século XIX em São harmonia.62 Maria do Carmo Sino atuando no Rio de Janeiro65,
João del-Rei. Ao longo dos anos Vendramini destaca o esmero e a RSR Sinos no interior do Estado
e, principalmente, a partir do cuidado de Alberto Samassa com de São Paulo66 e a Fundição
século XX outras fundições se a fundição de sinos. Ela afirma: Artística Sinos Uberaba67.
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
AS TORRES SINEIRAS
Os peitoris têm altura variada e são onde a torre passa a ser um elemento a arquitetura é a escrita principal,
chamados de sineiras. essencialmente vertical, de modo a a escrita universal69. Portanto,
Quando esses vãos são fechados por propagar melhor a mensagem sonora. dedicar uma parte deste capítulo
madeira, denomina-se A partir desse momento, a torre sineira às torres é reconhecer que a
janela-sineira. Sobre a história das torna-se um referencial urbano e espacial existência humana produz espaços
torres, André Dangelo afirma: ao qual aliam-se ora a força da fé cristã, físicos e de sociabilidade. Nas
ora a representação do poder comunal.68 palavras de Leonardo Benévolo:
[...] Carlos Magno, no século VI,
fez anexar ao programa das igrejas O escritor Victor Hugo já Os edifícios religiosos [...]
as torres com funções de defesa e sinalizava no século XIX em sua desenvolvem, no organismo da
comunicação [...], [desenvolvendo] obra Notre-Dame de Paris que até a cidade, uma função singular [...].
[...] um novo partido arquitetônico invenção da imprensa, Como se sabe, as igrejas e os espaços
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
abertos adjacentes atendem a muitas homens é capaz de comunicar o céu e a terra e são, portanto,
necessidades da vida pública, além dos inúmeras relações que não são o ponto de comunicação entre
estritamente religiosos: assembleias, meramente arquitetônicas, mas ambos. Para muitos, a voz do
festas, espetáculos teatrais adquirem que são sociais e culturais e, sino é um chamado de Deus e as
um valor alegórico ao qual corresponde portanto, passíveis de leitura e torres são as portas do céu, por
um especial empenho arquitetônico.70 compreensão72. Entre elementos onde se passa das trevas à luz.
da arquitetura, pode-se destacar Diferentemente de outras
Sobre esse aspecto é Victor Hugo a cor, a simetria, a proporção e, cidades brasileiras, onde
que ainda nos esclarece, por meio no caso especificamente de nossas a verticalização de muitas
do diálogo protagonizado pelo torres, sua estrutura. As torres construções obliteraram as
arcediago, que, ao ser inquirido que se projetam verticalmente torres das igrejas, antigos marcos
sobre o que são os livros, abre uma no espaço e abrigam os sinos de referência na paisagem
das janelas do recinto e aponta para são capazes de nos levar ao rés urbana, como o sítio pesquisado
igreja de Notre-Dame dizendo do céu. Ao abrigar os sinos, é tombado, as nove cidades
“Aqui tendes um”71, fazendo as torres fazem a conexão com inventariadas ainda mantêm
referência a um momento em que a espiritualidade numa clara suas igrejas e torres como
o fazer humano era registrado não representação da opulência referenciais urbanos, compondo
pela palavra impressa, mas pela do Divino. Os sinos em suas com as montanhas de Minas,
palavra construída em pedra, numa torres expressam, através da uma belíssima paisagem.
clara alusão de que a arquitetura materialidade de seu bronze, Além da referência espacial,
também é capaz de informar sobre a imaterialidade do chamado como a população nessas cidades
as representações, práticas e ideias Divino. Quando presos nos reconhece a sonoridade de cada
de uma determinada época. campanários de nossas numerosas sino, essa paisagem que é sonora
Amos Rapoport já sinalizava igrejas, os sinos evocam tudo traz referências de proximidade
que o espaço construído pelos aquilo que está suspenso entre ou distanciamento espacial.
dossiê iphan 16 { Toque dos Sinos e o Ofício de Sineiro em Minas Gerais } 62
tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
[...] Imediatamente, o bispo mandou inventariadas nessa pesquisa, Destacamos, igualmente, que
tirar devassa para averiguar os culpados compondo uma paisagem visual e o toque dos sinos tem uma base
e o processo começou a tramitar sonora toda própria. Os sineiros territorial inventariada, mas
no Conselho Ultramarino.77 Eliseu e Rodrigo Hora, de Ouro não exclusiva. O território em
Preto, fazem questão de frisar questão é resultado de processos
O silêncio dos sinos das igrejas que só reclama do toque dos sinos que se desenvolveram em
da cidade de Mariana, quando da aquele que não é da cidade. diferentes conjunturas históricas
partida do bispo do Rio de Janeiro, Essa referência – o toque dos e que foram protagonizados
Dom João da Cruz, sinos – é reconhecida e apropriada por diferentes agentes.
nos conta muito do significado pela população sendo vetor e Nas nove cidades inventariadas,
dessa prática desde os Setecentos. produto de identidades que podem o toque dos sinos apresenta uma
Dom Paulo, em entrevista concedida ser definidas a partir de uma estreita relação com a história da
à equipe de pesquisa, afirma: determinada territorialidade. ocupação do território do sertão
“Eu diria que até o silêncio do O território inventariado durante a dos Cataguases. Essa trajetória
sino fala”. Moradores das cidades pesquisa não é um cenário onde pessoas, diz respeito ao desbravamento
inventariadas reiteram, repetidas coisas, construções estão alocadas dos sertões para o apresamento
vezes, que é possível não entender ou dispostas. É lugar de referência de índios, à descoberta de veios
determinado toque de sino, porque nele se constituíram, há muito, auríferos, ao estabelecimento
mas se eles não tocam no momento relações que nos falam sobre os modos de de muitos sodalícios nessa
esperado ou se tocam fora de vida de uma determinada comunidade. região em uma época em que
hora, algo está muito errado. É, assim, território cultural que não se o reino português vivenciava
Trata-se, portanto, de sons circunscreve a fronteiras o auge da cultura barroca,
e silêncios que são referências e limites estabelecidos exemplarmente representada no
plenas de significado para aquelas político-administrativamente governo de D. João V. Segundo
pessoas que vivem nas nove cidades pelos homens. Laura de Mello e Souza:
dossiê iphan 16 { Toque dos Sinos e o Ofício de Sineiro em Minas Gerais } 65
tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
O que no litoral ou em velhos centros como mais recentemente os estudiosos, aluvional. social. Nesse sentido, se os primeiros anos
São Paulo de Piratininga se processara ao Carente de tradições e de memória, teve de pareciam indicar uma sociedade aberta à
longo de dois séculos – o devassamento, inventá-las a sua maneira. Num primeiro promoção social e ao talento individual, à
a ocupação, a sedimentação das gentes, momento, as normas e as regras foram maneira das sociedades de classes, os anos
o surgimento dos núcleos urbanos, das deixadas de lado, e, assim, homens de cor subsequentes retomaram princípios próprios
câmaras, da justiça real – não tomaria e mestiços puderam integrar instituições à sociedade de estados, características
nas Minas, mais do que algumas décadas. que, em princípio, impunham restrições do mundo do Antigo Regime.78
A sociedade que aí se formou teve as racistas ao seu ingresso como as câmaras, as
características de suas congêneres originadas irmandades de homens ricos e as santas casas Essas e outras características e
em frentes pioneiras e em regiões fronteiriças de misericórdia. Num segundo momento, circunstâncias forneceram as condições
ocupadas do dia para a noite: tensa, violenta, contudo, foi preciso recorrer a mecanismos para o desenvolvimento do toque dos
arrivista, movediça ou, como têm preferido que reforçassem as hierarquias e a estima sinos como uma referência cultural
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
Para lidar com tal situação, além assim como se responsabilizavam pela
de procurar controlar a emigração construção dos templos religiosos.
do Reino em direção às capitanias Sua institucionalização ocorria a
do Brasil,86 a Coroa estabeleceu uma partir da aprovação de seus estatutos
política tributária rigorosa associada O surgimento e compromissos pela Mesa de
ao controle de acesso à região. Um dos Consciência e Ordens ou pelo Bispado
braços dessa política foi a proibição da das irmandades local mais próximo. A população
instalação do clero regular na região. religiosas dessas vilas e arraiais se organizou
A Coroa portuguesa alegava que o clero com o objetivo de construir e adornar
era responsável pelo extravio do ouro e as igrejas para os cultos, assistir
por fomentar na população um clima mutuamente seus irmãos, preparar
de insatisfação em relação aos impostos uma boa morte, providenciar sepultura
cobrados por ela. Não havia, assim, em local digno, auxiliar enfermos,
a presença da Igreja Católica para Nessas circunstâncias, não dentre outros, pois “[...] naturalmente
prestar o auxílio espiritual necessário houve outra alternativa para a eram todos bons católicos, embora
àqueles tempos. Nas palavras de um população senão a de se organizar muito pecadores e, logo a capelinha
cronista anônimo do período: em irmandades, confrarias, fixava o local de origem”89.
arquiconfrarias ou ainda ordens Caio César Boschi acrescenta:
O País das Minas, que é o mais útil à terceiras – associações leigas ou
Lusitânia entre os vastos domínios da sodalícios seculares. Conforme Nas Minas, as irmandades precederam
Coroa, não só se achava falto das utilidades as Ordenações do Reino, esses aos poderes burocrático e militar,
temporais, que convidavam aos portugueses sodalícios ficavam subordinados constituindo-se nas primeiras instituições
a sofrer desterro voluntário naqueles sertões, às autoridades civis88, passando a das terras auríferas. Além disso, tiveram
mas não tinha ainda toda a cultura espiritual contratar religiosos para exercerem as destacado papel na ordenação da
necessária para a salvação das almas [...]87 funções eclesiásticas, dentre outras, sociedade na medida em que, ao prestar
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
assistência aos vassalos, aliviavam na contratação dos partidos musicais, Essa informação é reiterada no
as tensões provenientes do modo de na motivação aos músicos compositores livro de Fritz Teixeira Salles92 que
vida precário de então, promovendo em escrever novas obras musicais e acrescenta que havia sodalícios que
a coesão social, a disciplinarização e a mesmo encomendando obras específicas detinham recursos econômicos
hierarquização da sociedade por meio da e privativas para suas festas [...] significativos e funcionavam como
incorporação de valores morais. Dessa casas bancárias, emprestando
forma, e para a coroa, as irmandades Para o cumprimento de algumas dinheiro a juros ao Governo da
tiveram proeminente papel como auxiliar dessas funções, deve-se esclarecer Capitania. As Ordens Terceiras,
no processo de colonização ao tentar que a circulação monetária nas áreas especialmente, eram compostas
reproduzir, nas possessões do além- coloniais do império português em geral por pessoas brancas e
mar, os padrões da Metrópole.90 na América era bastante reduzida muito poderosas. Uma das fontes
devido ao trabalho escravo que não de recursos dessas Ordens, ainda
Ainda sobre o papel desempenhado favorecia o desenvolvimento do segundo Fritz Teixeira Salles, eram
pelas irmandades e associações nas meio circulante. Sendo assim, essas as esmolas pagas por seus irmãos
vilas e arraiais da Capitania das Minas, associações leigas, por seu sistema para que pudessem ser eleitos como
Aluízio Viegas, reitera que elas de compromissos e contribuições, mesários, síndicos, secretários dentre
possuíam numerário que outras outras funções. Esse autor afirma:
[...] tiveram um papel importantíssimo instituições não detinham. Adhemar
na vida da comunidade. Como meio de Campos Filho afirma que os Concluímos, portanto, que somente uma
de ascensão social, como promotora de sodalícios do Carmo e de São pessoa de vasto cabedal econômico poderia
benefícios temporais e [...] espirituais, Francisco em Ouro Preto eram não ser eleita para qualquer cargo desta Ordem
na criação de empregos, na construção só ricos, mas detinham, em seus Terceira. As quantias citadas [...]
de igrejas, na contratação de artistas cofres, o numerário necessário para eram altíssimas para a época, 1760-1770.
plásticos, na promoção das festas e conceder empréstimo ao Governo Para se avaliar a imensa diferença de posses
solenidades religiosas de seus patronos, da Capitania das Minas Gerais91. entre os irmãos dessa irmandade e os filiados
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
E SQU ERDA
P ROCI S SÃO NA SEMA NA SANTA, SÃO JOÃO DE L - RE I.
FOTO: J OÃO R AMA LHO NE TO, 2009.
D I REI TA
R E TORNO À I G R EJ A DA PROC IS SÃO D E DOM INGO
D E R AMOS NA SEMA NA SANTA, SÃO JOÃO D E L - RE I.
FOTO: J OÃO R AMA LHO NE TO, 2009.
C E L E BRAÇ ÃO DE M IS S A AO A R LI V R E NA S EMA NA
S A NTA , S ÃO JOÃO DE L - RE I .
FOTO : JOÃO RA M A L H O NE TO , 2 0 0 9 .
diferentes. As cidades históricas herdaram para narrar a decoração das ruas cobertas de efeito e recurso muito utilizado nas
esse traço setecentista e estamos, ainda flores primaveris, trazendo para a cidade ocasiões de festas e procissões, como
hoje, atavicamente presos ao fascínio do “a verde amenidade dos campos”, ou sonoros podemos continuar observando pelo
ritual. Somos um povo festeiro, cheio de ao relatar a evolução de um gaiteiro, “[...] texto da professora Junia Furtado:
fé quando os sinos chamam para o Ofício que por singular fábrica do instrumento e
das Trevas e cheio de ardor quando as boa agilidade da arte fazia uma agradável [...] A estética barroca criava todo um
baterias convocam para o ensaio das consonância [...]”; ou visuais ao falar das cenário audiovisual, onde o ilusório e o
escolas e blocos carnavalescos. É que, janelas, onde “[...] correu por conta das inesperado estavam sempre presentes, isto
apesar de tudo, de toda a demolição sedas e damascos, uma varia e agradável explica o uso constante de estampidos,
que durante anos vem sendo praticada, perspectiva para a vista, empenhada tambores, apitos, clarins, trombetas, tiros
consciente ou inconscientemente, competência de preciosidade e artifício [...]” de mosquete. No Triunfo Eucarístico,
nesta cidade, somos barrocos. O rito é [...] Ao tentar colocar em palavras aquilo um grupo de músicos abria o desfile e
nossa maneira de ser. Ainda bem.99 que viu, o autor foi forçado a reconhecer que no meio iam um gaiteiro, um moleque
a percepção da realidade era uma experiência tocando tambor e quatro negros tocando
Portanto, resultado dessa visão de individual e dificultava a universalização trombetas. Na missa de exéquias de D.
mundo que se traduziu nesse território das impressões. [...] A estética barroca João V em São João del-Rei, o clima
em uma estética da representação, presidia os eventos: jogo do ilusório; dos fúnebre e algo etéreo, num tempo suspenso
o barroco se concretizou em experiências contrastes entre a luz e a sombra, entre o entre a vida e a morte, foi criado na Igreja,
de sentidos visuais, sonoros, olfativos: céu e a terra, o profano e o religioso.100 por dois coros, dois rabecões e um cravo.
Outro aspecto fundamental destas
Em vários momentos do texto, Simão É comum dar destaque às festas eram os dias de iluminação
Ferreira Machado se viu impossibilitado representações visuais numa que precediam o evento, quando as
de descrever em palavras efeitos que eram sociedade iletrada. Mas, como casas e os prédios públicos se cobriam
olfativos, como “[...] sentia-se nos ares a pudemos observar, há também de lamparinas de azeites e balões
fragrância de aromas”, expressão utilizada muitas referências à sonoridade, colocados nas fachadas, clareando
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
DIREITA
TORRE DA MATRIZ DE SANTO ANTÔNIO, TIRADENTES.
FOTO: RICARDO DOS SANTOS GONÇALVES, 2008.
A LTO
SINE IRO C H A RRUA .
FOTO: AC E RVO T É C NIC O IPH A N.
BAIXO
SINE IRO JO S É O L ÍM PIO .
FOTO: AC E RVO T É C NIC O IPH A N, 20 0 9 .
V ISTA PA RC IA L DA IGRE JA NO S S A S EN H O R A D O
C A RM O , S A BA RÁ .
FOTO : C RIST INA L E M E , 20 0 7 .
DA E S QU E RDA PA RA A DIREI TA
S E NH O R NE L S O N, C ATO PÉ S EM S ER R O .
FOTO : C RIST INA L E M E , 20 0 9 .
DE TA L H E DE M ÃO S E GU RA N D O A CO R DA PA R A O
TO QU E DO S INO , NA IGRE J A D E S A NTA EF I G ÊN I A ,
OU RO PRE TO .
FOTO : PE DRO DAV ID, 20 0 4 .
cidade do Serro deve considerar do Carmo, mantida pela Ordem Sousa, então sacristão das igrejas
essas localidades. As trocas Terceira de Nossa Senhora do do Rosário e do Carmo, e o
entre elas devem ser analisadas. Carmo, um funcionário responsável reconhecem como o grande mestre
Lembremos, por exemplo, que a pelos serviços de atendimento ao sineiro da cidade, que conhece
Festa do Rosário do Serro recebe as público, o estudante de história os toques da abundante geração
Guardas de Marujos e Catopês de Flávio Rodrigues Leite, que de sineiros do passado e opera
Milho Verde, há anos. Observe-se também desempenhava a tarefa com maestria os sinos de hoje.
que há no Serro sineiros que tocam de sacristão, vem se ocupando Preocupados com a preservação
os sinos usando diretamente as dos sinos regularmente há sete da tradição, eles se movimentam
mãos para puxar os badalos, anos. Da mesma forma, vem para incentivar e ensinar os
da mesma forma que em São Gonçalo tomando lições do ex-sacristão toques aos jovens interessados.
e Milho Verde – e diferentemente e mestre sineiro Antônio Maria Para Erildo, Erivaldo e Takim,
de Diamantina, por exemplo, onde de Sousa, a quem substituiu. Antônio Maria representa o elo
os badalos são puxados por cordas. Há também os sineiros de entre eles, mais jovens, e os sineiros
Em Diamantina, há um caso ocasião. Esses comparecem das gerações passadas. Havia muitos:
especialmente interessante. empenhadamente nas festas de Isolino, da Catedral, que batia sino
Lá, a atividade sineira está em santos ou outros eventos especiais. muito bem; antes dele, o Zé da Sé;
movimento ascendente, depois de Os mais frequentes são Erildo e e antes do Zé da Sé, o Zé Rolim.
um período de declínio. Em todas Erivaldo do Nascimento, filhos Houve também o Zé Ângelo, o Zé
as igrejas do centro histórico, de Geraldo Ribeiro de Jesus, e o Boi, o Júlio de Paula Jorge, sacristão
com exceção da de Nossa Senhora companheiro de infância, Takim da Igreja de São Francisco por 60
das Mercês, há tocadores de sinos Papaspyrou, filho de gregos, anos (como comprovam os livros da
habituais para os toques cotidianos, nascido em Diamantina. Os três Ordem Terceira de São Francisco),
mas a condição desses sineiros é aprenderam a tocar sinos quando Gil Neves e Henrique Neves
diversa. Na Igreja de Nossa Senhora crianças com Antônio Maria de (a família Neves tinha muitos
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
DIRE ITA
SINE IRO E RIL DO , DIA M A NT INA .
FOTO: DJA L M A C O RRÊ A , 20 0 7.
PÁGINA AO L A DO
C AM PAN H A “ S INO C IDA DÃO ” , PU BL IC A DA NO
JORNAL VO Z DE DIA M A NT INA , DIA M A NT INA .
FOTO: C RIST INA L E M E , 20 0 8.
sineiros), que tomavam conta da Erildo e Takim, são professores Metropolitana de Santo Antônio,
Igreja do Bonfim. José Paulo, da de história. Também seu aprendiz que está rachado, e “promover
Igreja de São Francisco, lembra-se Flávio, que o substituiu como ações para a dinamização da
que “havia uma plêiade de rapazes sacristão na Igreja do Carmo, é cultura sineira de Diamantina”104.
que queriam tocar sinos e faziam estudante de história. Erildo, além Dentre outros objetivos listados
disputas para ver quem tocava de professor, é diretor do Centro no projeto da campanha, pode-
melhor, mais bonito”. Mas se de Educação Integrada, membro se ler também: “Conscientizar a
lembra, especialmente, da Academia de Letras e Artes de população diamantinense para
de Raimundo Cego (morto há cerca Diamantina, funcionário licenciado que se torne a principal guardiã de
de 40 anos), sineiro do Seminário, do Iphan e forte liderança na sua cultura”; “Resgatar a história
que ouvia da casa de seu avô, cidade. Junto do editor do jornal da cultura sineira de Diamantina
durante as férias em Diamantina: Voz de Diamantina, da Academia de [...]”, “Promover apresentações
“toda a cidade reconhecia seus Letras e Artes, e da Associação dos toques de sinos em concertos
toques, tão luminosos que eram dos Diamantinenses Residentes musicais, agregando as demais
[...]. Ele tocava os sinos como um em Belo Horizonte, ele lançou a artes a eles inerentes”. O interesse
pianista toca um piano.” Raimundo campanha Sino Cidadão, que conta da população pelo assunto se
era cego e subia uma escada de com o apoio da Arquidiocese de fez perceber no fato de já se
mais de 70 degraus para tocar os Diamantina, da Paróquia de Santo terem levantado, sob a forma de
sinos. José Paulo diz que os toques Antônio, das Ordens Terceiras, contribuições espontâneas dos
desses sineiros são preservados das comissões de zeladores das diamantinenses, quase 70 mil
ainda hoje, não com tanta beleza, igrejas e da Associação do Pão de reais – o que, segundo Erildo, já
tanto detalhe como faziam, mas Santo Antônio. A campanha tem é suficiente para a substituição
“o básico ainda se mantém”103. como objetivo principal arrecadar de todos os sinos rachados na
Dos três sineiros de ocasião, recursos para a fundição de uma cidade – alternativa, em princípio,
ex-alunos de Antônio Maria, dois, réplica do sino maior da Catedral preferida à sua refundição.
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
É curioso que os sinos tenham turismo no Centro de Educação Entoados, sobre os sinos em Minas
suscitado interesse renovado em Integrada, prepara também Gerais, do qual, aliás, todos os
Diamantina, em grande parte, trabalho acadêmico sobre os toques sineiros identificados têm uma
em torno de seu valor como de sinos na cidade. José Paulo cópia. A influência incontestável
patrimônio cultural, histórico (que foi funcionário do Iphan por da movimentação em torno do
e artístico. Vale destacar que o alguns anos) fala da importância patrimônio histórico e artístico,
funcionário da Igreja do Carmo, das ações do Patrimônio em já há algumas décadas, e
Flávio, estudante de história, torno dos toques de sinos como da valorização crescente da
preparou sua monografia de final complementação das políticas de diversidade cultural no mundo
de curso sobre os toques de sinos na preservação das igrejas. O interesse contemporâneo, bem como das
Diamantina do início do século XX, pelos sinos ganhou força após a políticas públicas em torno disso
e Antônio Maria, hoje cursando pesquisa e exibição do documentário é pronunciadamente forte em
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
S ÃO JOÃO DE L RE I: S E M A NA S A NTA , D O MI NG O D E
RA M O S . BE NÇ ÃO DO S RA M O S NA I G . R O S Á R I O .
FOTO : C RIST INA L E M E
Diamantina e determinante na sinos e as baterias de escolas de sacadas dos sobrados e são regidos
trajetória dessa comunidade. samba. É importante lembrar que por um maestro que fica no centro,
Há que se considerar esse aspecto Diamantina (assim como São João embaixo, ao ar livre. Talvez o
na valorização dos toques dos del-Rei, que veremos a seguir) é apelo musical dos sinos possa se
sinos por parte da população. uma cidade especialmente musical, equiparar, quem sabe, ao religioso.
O vínculo entre sinos e música de reconhecida fama seresteira, As festas de santos,
explicita bem o entendimento tem várias bandas e instituições em Diamantina, são o lugar
da população de que os toques de ensino da música. Um dos privilegiado dos repiques.
guardam um aspecto musical. eventos mais importantes da cidade A movimentação em torno delas
São comuns entre os sineiros da é a Vesperata, um concerto para é intensa. Os sinos são esperados.
cidade (assim como em São João ser ouvido das ruas, em que os O entusiasmo dos sineiros de
del-Rei) as analogias entre os instrumentistas se organizam nas ocasião se junta ao entusiasmo dos
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
PAGINA AO L A DO
BA NDA DE M Ú S IC A NA PRO CI S S ÃO D E CO R PUS
C H RIST IE , S ÃO JOÃO DE L - R EI .
FOTO : JOÃO RA M A L H O NE TO , 2 0 0 9 .
AO L A DO , DA E S QU E RDA PAR A A D I R EI TA
BE NÇ ÃO DO S RA M O S NA S EMA NA S A NTA , EM
FRE NT E À IGRE JA NO S S A S EN H O R A D O R O S Á R I O ,
S ÃO JOÃO DE L - RE I.
FOTO : C RIST INA L E M E , 20 0 7 .
E SQUE R DA
SINE IRO JOV E L INO , OU RO PRE TO .
FOTO: PE DRO DAV ID, 20 0 4.
BAIXO
SINE IRO RE PIC A NDO O S S INO S NA IGRE JA NO S S A
SE NHORA DA S M E RC Ê S , OU RO PRE TO .
FOTO: PE DRO DAV ID, 20 0 4.
E SQUE R DA
PAD RE S IM Õ E S , PÁ RO C O DA IGRE JA M AT RIZ DE
NOS SA S E NH O RA DO PIL A R, OU RO PRE TO .
FOTO: PE DRO DAV ID, 20 0 4.
BAIXO
SINO DA IGREJA MATRIZ NOSSA SENHORA DO PILAR,
COM VISTA DO CASARIO AO FUNDO, OURO PRETO.
FOTO: PE DRO DAV ID, 20 0 4.
porque se vocês ficam do lado de fora da eu desço rezando”110 , diz Marcelo comunicativa e ao lado de sua
igreja, isso aí não está agradando a Deus. Eduardo Soares. Sua mãe, expressão religiosa, os sinos
Deus quer também uma criança que também toca sino, explica que têm outros sentidos bastante
interessada em rezar, em crescer o sino “é a alma da igreja”111. relevantes para a população
espiritualmente”. E essa deve ser a nossa Ouve-se que os sinos são a voz de Ouro Preto. Como em
preocupação como padres. As famílias de Deus. E efetivamente os sinos Diamantina, as dimensões
também, de mostrar que os sinos existem tocam quase sempre apenas para lúdica, estética e musical são
para comunicar uma realidade maior. os eventos religiosos. De qualquer fortes na antiga capital de Minas
E não ficar simplesmente como um forma, há também os sinos Gerais. Para os ouro-pretanos,
entretenimento, como uma curiosidade. para eventos extrarreligiosos. o peso das questões relativas ao
Talvez aproveitar a curiosidade da Conta-se que, no passado, patrimônio histórico e artístico,
criança, do adolescente, mas para os sinos tocavam para a posse na cidade, é considerável.
desenvolver um valor maior.109 de governadores. Houve dobres Em Mariana, os toques dos
tristes na mudança da capital para sinos se restringem a apenas uma
As famílias ouro-pretanas são Belo Horizonte. Os sinos tocavam ou outra igreja e a algumas ocasiões
muito religiosas. A existência quando havia incêndio e também especiais, sendo a referência mais
de várias irmandades na cidade para anunciar as horas forte, segundo entrevistados,
confirma isso. Grande parte dos do dia. Há alguns anos, quando a o Toque de Entrada para as missas.
meninos sineiros da atualidade já Igreja do Pilar foi roubada, É um toque simples, composto de
foi, ao contrário de Diamantina, o padre Simões mandou que se badaladas espaçadas a intervalos
coroinha e, nos depoimentos dos tocassem os sinos. Desde então, regulares, tocado em geral ao pé
jovens sineiros, está presente a todos os anos, os sinos dobram no das escadas que levam às torres,
associação dos sinos à fé católica. aniversário do roubo do Pilar. por meio de uma corda que
“Do mesmo jeito que eu subo Assim, é pertinente afirmar desce até o piso das igrejas. O
[à torre para tocar os sinos] rezando, que, para além de sua função Toque de Entrada praticamente
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
IGRE JA NO S S A S E NH O RA DO R O S Á R I O , MA R I A NA .
FOTO : PE DRO DAV ID, 20 0 4.
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I G REJ A B ASÍ LI CA DO S E NHOR D O BOM JE SUS D E
MATOZI N HOS, CONG O NHAS D O C AM PO.
FOTO: CR I STI NA LEME , 2009.
toques para que a comunidade devotos e da comunidade, mais que regulares de todas as igrejas,
possa diferenciar os sinais e dos padres contratantes. pelo menos as do centro histórico.
entender o que se passa na igreja. O pároco João Afonso Chagas Em todas elas, há um funcionário,
Apesar das zeladoras da Igreja do disse que sinos não têm nenhuma auxiliar de serviços gerais ou
Rosário, Ifigênia, e da Igreja Matriz, importância para os rituais sacristão, com carteira assinada,
Conceição – como também católicos, são importantes para a cujo contrato inclui, como uma
o sacristão e mestre sineiro população, como tradição popular. das tarefas mais relevantes,
Antônio –, cuidarem dos templos Após estudar o tema dos sinos tocar, regularmente, os sinos.
como funcionários, a relação é em todas essas cidades, São João Para exercer profissionalmente
fundamentalmente de afeto. del-Rei e destaca de fato como um tal ofício, o sineiro deve conhecer
O empenho e o gosto pelos sons caso à parte. O ofício de sineiro bem cada um dos toques e cada
dos sinos vêm desses servidores é previsto dentre as atividades uma das ocasiões em que devem
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
PÁG I NA AO LADO
C RI A NÇAS EM P ROCI S SÃO AO LONGO DOS TAPE TE S
D ECOR ADOS DURANTE A SE M ANA SANTA, SÃO JOÃO
D EL-REI .
FOTO: J OÃO R AMA LHO NE TO, 2009.
ser realizados, pois é essencial marcação, o sino médio pergunta rítmicas e sonoridades que
realizar o toque certo na ocasião e o grande responde”, nas palavras compõem nada menos que um
adequada. Há mais de 40 toques, dos sineiros. Os diferentes toques verdadeiro repertório de peças
todos muito bem definidos em sua são formados por agrupamentos de para sinos – assim como há
forma sonora, não sendo permitido dobres ou pancadas regulares, que repertórios de peças para piano
realizar toques diferentes dos já se distinguem entre si conforme o ou para violão – e constituem,
estabelecidos. Muito raramente, seu número, dinâmica e andamento de modo muito peculiar, a
algum sineiro, e somente um e são, na maior parte dos casos, paisagem sonora da cidade.
sineiro já consagrado como tal, acompanhados dos repiques. Antes de se tornarem
pode sair com um toque novo, Os diversos toques são articulados profissionais, os sineiros passam
que é acolhido pela comunidade e de tal forma que uns adjetivem os por um longo aprendizado, que
integrado ao conjunto de toques da outros. Por exemplo, um conjunto geralmente se inicia na infância
cidade. Dentre os quarenta toques de repiques significa: “missa”; ou adolescência, com a observação
de São João del-Rei, e pancadas a seguir podem significar: e a prática. Muitos meninos da
há um conjunto de cerca de “que será celebrada pelo pároco”, cidade se interessam pelos sinos
quatorze repiques, diferentes entre ou: “que será celebrada por padre e frequentam, regularmente, as
si, e cada qual com configuração visitante”. Os toques e combinações torres para ouvir e ver os sineiros
rítmica singular, bem determinada possíveis prestam-se à transmissão já experientes tocarem, com a
e invariável, ainda que se de mensagens mais complexas e esperança de obterem permissão
permitam pequenas variações ou variadas que nas demais cidades – para ajudar na tarefa. Muitos se
ornamentos em sua execução – embora apenas uma parte levantam mesmo aos domingos,
como peculiaridades do intérprete da população, geralmente os muito cedo, para correrem às torres
(sineiro). A função de cada sino moradores mais velhos, consiga com esse intuito. Eles costumam
na execução dos repiques é bem decifrá-las perfeitamente. fazer o que na cidade se apelida
definida: “o sino pequeno faz a Formam um conjunto de peças por “via-sacra”: percorrer as várias
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
NO S S A S E NH O RA DA S DO RE S EM P R O CI S S ÃO
DU RA NT E A S E M A NA S A NTA , S ÃO J OÃO D EL-R EI .
JOÃO RA M A L H O NE TO , 20 0 9
NOS S A S E NH O RA DA C O NC E IÇ ÃO E M PRO C IS S ÃO ,
COM IGRE JA DE S ÃO FRA NC IS C O DE A S S IS AO
FUNDO , S ÃO JOÃO DE L - RE I.
FOTO : JOÃO RA M A L H O NE TO , 20 0 9 .
se organizarem para tocar os sinos todo o dia; atualmente está Garcia. São eles que coordenam
só por gosto, às vezes até como limitada, por ordem do bispo, as atividades religiosas, cuidam
campeonatos de sineiros, formando ao máximo de 30 minutos. da limpeza, dos reparos e todas as
grupos, por exemplo, de mais As igrejas do centro histórico de tarefas administrativas. São eles
velhos contra mais jovens ou duplas São João del-Rei são mantidas por também, a instância responsável
e trios que gostam de tocar juntos e sodalícios religiosos, todos muito pela contratação dos sineiros.
que se afinam melhor. bem organizados: Irmandade do Mas os sineiros desempenham
Há já instituídos os “combates”, Santíssimo Sacramento, Irmandade sua função de acordo com os
entre as Igrejas Carmo, São de São Miguel e Almas, Irmandade conhecimentos adquiridos com
Francisco e Catedral, no quarto do Senhor Bom Jesus dos Passos, os sineiros antigos, geralmente
domingo da Quaresma, durante Confraria de Nossa Senhora da sem interferências ou correções
a procissão de Nosso Senhor dos Boa Morte, na Catedral Basílica de terceiros, sejam os membros
Passos: disputas entre grupos que do Pilar; Confraria de Nossa da direção dos sodalícios, sejam os
se distribuem nas torres para medir Senhora do Rosário, na Igreja clérigos. É verdade que o pároco,
qual deles permanece girando de Nossa Senhora do Rosário; muito antigo na cidade, Monsenhor
mais rápido e por mais tempo os Arquiconfraria de Nossa Senhora Paiva, que conhece bem os toques de
sinos, com blefes, inclusive. das Mercês, na Igreja de Nossa sinos, é capaz de perceber se ocorre
Os grupos usam bandeiras Senhora das Mercês; Ordem qualquer erro do sineiro.
vermelha e branca para sinalizar Terceira de Nossa Senhora Há também um vigário da Paróquia,
aos rivais a sua disposição. É do Carmo, na Igreja de Nossa Padre Ramiro, que gosta dos sinos,
obrigatório que a Igreja de São Senhora do Carmo; Ordem procura aprender sobre eles,
Francisco saia na frente, porque Terceira de São Francisco de Assis, pergunta sobre toques que ouve
é nela que está o sino de Nosso na Igreja de São Francisco de pela primeira vez e, às vezes, é até
Senhor dos Passos. Houve tempo Assis; Confraria de São Gonçalo capaz de notar qualquer imprecisão
em que essa brincadeira durava Garcia, na Igreja de São Gonçalo nos toques. No entanto, eles não
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Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
chegam a interferir na atividade dobres fúnebres. Existe, no entanto, é irrefutável o aspecto lúdico
dos sineiros. Outros clérigos, em a possibilidade, para aquele que não nas torres. Mas há também, com
geral, não conhecem os toques é filiado, de comprar uma sepultura os meninos, a preocupação e a
de sinos. Os membros das mesas no cemitério de uma igreja; esse tem vigilância por parte dos sineiros
das irmandades, confrarias e também direito aos dobres fúnebres, responsáveis, por causa dos
Ordens Terceiras, muitos deles mas parcimoniosamente. Além do riscos de acidentes. Os sineiros
foram aprendizes de sineiros salário fixo mensal, é tradição na profissionais têm por obrigação
quando jovens e conhecem bem os cidade, nas ocasiões de velórios e se responsabilizar por tudo o que
toques. Ainda assim, os sineiros enterros, os sineiros receberem uma ocorre nas torres, além de cuidar
profissionais é que são reconhecidos quantia extra das famílias dos mortos da manutenção de todos os sinos
como os grandes conhecedores do quando se tocam os sinos fúnebres. na igreja em que trabalham.
tema e têm legitimidade para exercer As igrejas têm geralmente uma Já há algum tempo, cada igreja
suas funções com autonomia, de suas torres equipadas com tem sua torre equipada com
decidindo por si mesmos casos três ou quatro sinos. Além dessa, caixas de som, para orientar os
particulares acerca dos toques. há outra com mais um, dois ou sineiros quanto ao desenrolar das
As irmandades em São João três sinos, sendo grandes para missas, de modo a tocá-los nos
del-Rei são muito fortes. Uma comportar muitos sineiros de momentos certos. No passado,
parte considerável da população é uma só vez. Em certas ocasiões, os sineiros com seus ajudantes
filiada a, pelo menos, uma delas. principalmente nas festas, elas improvisavam recursos para acertar
Todos os sineiros participam de ficam lotadas de sineiros que a hora dos toques. Muitas vezes, os
alguma irmandade. Há os que sejam se alternam em cada sino, além dispositivos imaginados falhavam,
filiados a todas elas. Curioso é daqueles que vêm ver, ouvir, os toques vinham fora de hora
que o privilégio do filiado consiste aprender e comentar as habilidades e há caso de sineiro demitido
em ter um lugar no cemitério de uns e outros. Apesar da por fazer soar os sinos na hora
correspondente e ter direito aos seriedade e do respeito religiosos, errada. Trapalhadas antológicas.
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
D I REI TA
A PRESENTAÇÃO DE CO RAL D E FIÉ IS D URANTE A
S E MA NA SA NTA, SÃO JOÃO D E L - RE I.
FOTO: J OÃO R AMA LHO NE TO, 2009.
E S QU E RDA
C E L E BRAÇ ÃO DE M IS S A DU RANT E A S EMA NA
S A NTA , S ÃO JOÃO DE L - RE I.
FOTO : JOÃO RA M A L H O NE TO , 2 0 0 9 .
DIRE ITA
NO S S A S E NH O RA DO PIL A R E M P R O CI S S ÃO ,
DU RA NT E A S E M A NA S A NTA , CO M A CAT ED R A L
BA S ÍL IC A DE NO S S A S E NH O RA D O P I LA R AO
FUNDO , S ÃO JOÃO DE L - RE I.
FOTO : JOÃO RA M A L H O NE TO , 2 0 0 9 .
Os toques para as missas comuns complexa, com possibilidades de tenha testemunhado a criação, por
são compostos de muitas partes. escolha inclusive, entre uma coleção um sineiro da geração passada (já
Depois da Chamada de Irmãos – 40 de repiques, do que mais merece a falecido), de um dos repiques que
badaladas espaçadas a intervalo atenção dos sineiros. Para eles, os hoje integra o repertório de toques:
regular, no sino médio – toca- repiques “são a alma dos sinos”112. é o Tencão Atravessado, criado por
se um toque dividido em três Segundo o maestro Aluízio Eli Evangelista da Cruz. Aluízio
partes: primeiro a Principiada – uma Viegas, os repiques de São João Viegas, que recorda o feito, explica
espécie de introdução, em que del-Rei são peças rítmicas criadas como o toque foi criado, a partir de
se experimentam os sons de cada pelos sineiros, muito próximas variações de elementos de um toque
um dos três sinos, o pequeno, o de nossas danças populares. Os já existente, o Tencão Festivo. Aluízio
médio e o grande. Em seguida, o sineiros hoje atuantes na cidade afirma ainda que o repique Senhora
sineiro pode escolher, conforme são acordes em dizer que os sinos é Morta – usado com exclusividade
seu desejo, um dos oito repiques são como uma bateria de escola de em uma das festas mais importantes
disponíveis para essas ocasiões. samba. E o percussionista Djalma da cidade, a de Nossa Senhora da
Por último, o repique conclusivo, Corrêa compara a função de cada Boa Morte, e apreciadíssimo pelos
chamado Terentena. Depois de um dos sinos – os mais agudos e sineiros e pela comunidade –,
tudo isso, ainda se toca um os mais graves – com a função dos teria sido criado por um escravo,
toque, chamado Entradinha, para instrumentos em uma bateria. Há cedido às torres da Catedral
comunicar se o celebrante será o repiques em São João del-Rei que do Pilar por seus senhores. Tal
vigário, o pároco, padre visitante já no nome confirmam o vínculo afirmação se baseia em documentos
ou bispo. Curioso é imaginar que, com a tradição musical brasileira da Confraria de Nossa Senhora
para anunciar a missa e quem a de matriz africana: Batucada, da Boa Morte, bem como em
celebrará, bastariam a Chamada de um, e outro, Batuquinho. depoimentos de um antigo sineiro,
Irmãos e a Entradinha. No entanto, Dentre os moradores mais velhos já falecido, descendente do criador
há o toque do meio, de estrutura de São João del-Rei, há quem do ilustríssimo toque. O maestro
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
explica as relações entre os vários Há também os sineiros que com palavras. Ele conseguia fazer
toques, mostrando as variações se tornam inesquecíveis por sua uns repiques calmos, dolentes, de
nos modos de articular elementos habilidade singular no tocar: baixa intensidade de som e que ele
semelhantes, chamando atenção não ensinou a outros como fazer.114
para o fato de que, na criação de Algumas pessoas, ainda vivas, que
toques novos, os sineiros levaram ouviram o sineiro João Resinga são Assim, em São João del-Rei,
em conta os toques já existentes. Ele acordes em dizer que os atuais sineiros o sineiro se apresenta como um
diz que a cidade não aceita qualquer não conseguem o que ele conseguia verdadeiro instrumentista; alguns,
novidade nos sinos – “tem que fazer fazer nos toques diários na torre da intérpretes memoráveis dos toques
sentido pra nós”113. E só mesmo Matriz do Pilar. O toque do Ângelus de sinos, que por vezes, com
um sineiro experiente, respeitado, das 18 horas no mês de maio era experiência e maestria na matéria,
pode sair com um toque novo. algo que não se consegue descrever chegam à criação de novos repiques.
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
FIE L D U RA NT E A C E L E BRAÇ ÃO DE M IS S A NA
SE M ANA S A NTA , S ÃO JOÃO DE L - RE I.
FOTO: JOÃO RA M A L H O NE TO , 20 0 9 .
E S QU E RDA
BA L C ÃO DE C O RA DO DU RA NT E A S EMA NA S A NTA ,
S ÃO JOÃO DE L - RE I.
JOÃO RA M A L H O NE TO , 20 0 9 .
DIRE ITA
V ISTA GE RA L DA IGRE JA DE S ÃO F R A NCI S CO D E
A S S IS , S ÃO JOÃO DE L - RE I.
FOTO : DJA L M A C O RRÊ A , 20 0 9.
o repertório e a expressão dos pancadas, repiques e dobres, [...] nas cidades inventariadas, o toque
toques testemunham a riqueza mas, também, apresentam um dos sinos continua presente, em maior
e a opulência do ciclo do ouro, grau de sofisticação ímpar em ou menor grau, seja vigente e íntegro no
a contribuição da mão de obra sua forma de execução: não há cotidiano, como em São João del-Rei e
escrava à produção do ouro, repique que não seja executado Ouro Preto, ou com menor intensidade
das igrejas, dos sinos e dos seus com um conjunto mínimo de e aténa memória de seus moradores, nas
toques, e de todas as demais três sinos que, como já visto, cidades citadas, que buscam revitalizar
condições necessárias à vida e segundo a explicação dos próprios essa prática. No caso dessas cidades, a
à morte dos homens daqueles sineiros, “conversam” entre si. perspectiva de registrar o Toque dos Sinos
tempos; dão conta das associações Em Ouro Preto, é possível como um patrimônio cultural brasileiro, é
religiosas leigas, de sua função identificar situações bastante tida como um elemento a mais no processo
social, do papel que desempenham similares a São João del-Rei, de coesão das suas comunidades.116
na promoção das artes e da música, apesar de não haver denominações
e de sua importância política. específicas para os toques. Fica ainda evidente que o toque
Em relação à sua função Em Mariana, como já dito, dos sinos e o ofício de sineiro
comunicativa, o toque dos sinos houve uma interrupção na cadeia se constituem como referências
em São João del-Rei se destaca de transmissão do toque dos culturais das cidades inventariadas,
diante das demais cidades: lá sinos que vem sendo retomada com destaque para São João
são reconhecidos cerca de 40 agora. O mesmo acontece em del-Rei, onde mais intensamente
toques, dentre repiques e dobres, Diamantina, onde há uma se associam os sineiros, os
todos nomeados e com uma intensa movimentação de sinos, as torres das igrejas, sua
estrutura formal precisa. Na retomada da atividade sineira. comunidade de ouvintes e os
verdade, os toques em São João O parecer técnico do DPI ainda rituais de celebrações religiosas que
del-Rei compõem um conjunto conclui que, por tudo o que motivam essa forma de expressão
complexo não só de badaladas, foi exposto, e o ofício que a executa. ¢
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
Recomendações de Salvaguarda
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
representantes do clero, pode-se que ainda está implicada aí a sua ela é mais vigorosa – São João
concluir precipitadamente que os função comunicativa, mas já não del-Rei –, é a permanência de
sineiros têm ampla autonomia para é necessário decodificar minúcias irmandades fortes. As igrejas
a execução dos toques. O controle, nos toques. Apenas uma parte da têm sineiros contratados e pagos
entretanto, é social e exercido por população em cada uma dessas por essas associações. Todos os
outros mecanismos: há os outros cidades reconhece as mensagens sineiros oficiais são filiados a uma
sineiros e a comunidade que escuta transmitidas pelos toques de ou mais irmandades. Mas dentre
atentamente e reclama quando sinos. Dessa parte, somente os sineiros aprendizes e outros
os toques estão sendo executados uma pequena parcela é capaz de frequentadores das torres das
de maneira inapropriada. decifrar matizes nas mensagens. igrejas nem sempre a intenção
Nas nove cidades focalizadas, As ocasiões em que mais se tocam religiosa é predominante. Mesmo
os entrevistados mencionaram sinos são justamente as festas de a motivação dos sineiros oficiais
o fato de que, hoje em dia, não santos – eventos que concedem para tocar sinos parece ultrapassar
há mais a necessidade de se espaço largo à alegria, ao prazer, a devoção religiosa. Brincando com
comunicarem os eventos através ao lúdico –, quando a função as palavras, poderíamos dizer que
dos sinos. Vários toques praticados comunicativa dos toques é menos a devoção dos são-joanenses aos
no passado caíram em desuso por relevante. Parte da população sinos é quase religiosa. E que os
causa disso. Em muitas igrejas, aprecia simplesmente a beleza dos sineiros tocam seus instrumentos,
são usados alto-falantes para sons dos sinos, misturados aos religiosamente, todos os dias.
comunicar com mais detalhe foguetes e ao som das bandas. É verdade que em todas as
notícias corriqueiras à comunidade. Quanto às relações com a cidades abordadas, os sinos tocam
Acontece muito de a população religiosidade, é importante quase exclusivamente para os
telefonar para as paróquias, para sublinhar que o que garante a eventos da Igreja católica. Boa parte
as igrejas ou responsáveis para atividade em torno dos sinos, da população, principalmente a
saber por que o sino tocou. Claro justamente na cidade em que mais velha, empresta a eles uma
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
E S QU E RDA
PRO C IS S ÃO DE C O RPU S C H RI ST I , S A B A R Á .
FOTO : C RIST INA L E M E , 20 0 7.
PÁGINA AO L A DO , DA E S QU E R DA PA R A D I R EI TA
S INE IRO C A RLO S DE S C E NDO A S ES CA DA S DA TO R R E
DA IGRE JA DE S A NTA QU IT É RI A , CATA S A LTA S .
FOTO : PE DRO DAV ID, 20 0 4.
criação de novos eventos como patrimônio promovidos pelos órgãos Isso [os toques de sinos] não só é filosofia
concertos de sinos que vão além públicos. É interessante ressaltar do povo, o folclore, mas também é uma
de sua função comunicativa e de que parte da comunidade considera arte que está se perdendo. Isso na Europa
sua dimensão religiosa. Os sinos que a tradição dos sinos pode, hoje, hoje é espetacular! [...] O toque de sinos
não são mais tão importantes como se descolar das tradições religiosas de Notre Dame de Paris! É coisa incrível!
meios de comunicação e, por isso, e seguir apenas como tradição É coisa inexplicável! Eles puseram aquilo
estão sendo menos tocados, mas musical, embora religião e música com captação para dentro da igreja e,
as comunidades se interessam pela sempre tenham andado fundidas fora, eles tocando o sino. O bimbalhar
preservação dos toques de sinos uma na outra. Processo semelhante dos sinos de Notre Dame. Se ouvia aquilo
como parte de suas tradições – e ao que ocorreu com toda a música em uma intensidade muito grande. Que
isso está inclusive associado aos sacra. Isso indica, certamente, beleza de sonoridade! Umas notas...
movimentos de valorização do que há uma tendência de valorizar entravam uma dentro da outra [...] Vocês
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
já pensaram um festival de sinos aqui em vem cá e olha as obras do Aleijadinho A atividade sineira é de longe mais
Ouro Preto? Já pensaram conectar a esculpidas à mão, mas ninguém olha pro intensa em São João del-Rei:
Igreja do Carmo, Igreja de São Francisco sino [...] e assim só percebem também lá, são as irmandades que a sustentam
de Paula, Igreja das Mercês, Igreja de São [os sinos] quando estão tocando, e os toques formulam mensagens
Francisco de Assis, do Rosário? O pessoal quando as pessoas estão escutando.118 variadas e de alguma complexidade.
ouvindo lá, e eles aqui tocando o sino... Mas apenas uma parcela mais idosa
bem feito, fazendo um acompanhamento O certo é que o interesse pelos da população é capaz de decifrar
de sinos. Aquele toca, aquele responde, sinos permanece vivo nessas essas mensagens. O mesmo não
aquele toca... Festivais de sinos!117 comunidades mineiras. A ponto se pode dizer de grande parte dos
de se procurar novas funções e meninos que, hoje, correm às torres
Na mesma direção, o sineiro novos sentidos para eles quando que tenham o mesmo interesse dos
Marcelo Eduardo Soares, que sobe e a função e o sentido antigos antigos pelas questões religiosas.
desce as escadas das torres rezando, perdem a sua força. Os toques Cabe notar que são esses jovens
diz que seria muito bonito um dos sinos são ainda valorizados os responsáveis pela perpetuação
evento musical com os sinos, mesmo nas comunidades como meio de da tradição no futuro próximo.
sem quaisquer funções litúrgicas: comunicação que serve à comunhão Enfim, para uns, os toques de
em torno de acontecimentos sinos são agentes de congregação
Se o sino é uma peça tão importante na importantes para a coletividade, dos moradores em torno de
comunidade, na igreja... Que ele acaba carregam ainda um sentido místico acontecimentos importantes de seu
ficando pra trás: uma das últimas coisas a que alimenta os devotos, mas, cotidiano; para outros, elementos
serem lembradas na igreja é o sino. Porque gradativamente, também migram essenciais das celebrações religiosas,
eles são usados só quando precisa mesmo. para outros espaços, em que se para outros ainda, brincadeira
[...] É justamente por causa disso que vislumbram talvez condições mais ou música. De qualquer forma,
ele está diminuindo, porque só quando favoráveis para sua continuidade para grande parte dos moradores
precisam dele é que está ali. O pessoal em tempos atuais e futuros. dessas comunidades eles são
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DO C A RM O , M A RIA NA .
FOTO : PE DRO DAV ID, 20 0 4 .
E S QU E RDA
RE C O LO C AÇ ÃO DO S INO DA I G R EJ A MAT R I Z D E
NO S S A S E NH O RA DA C O NC E IÇÃO , CATA S A LTA S .
FOTO : PE DRO DAV ID, 20 0 4.
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RE PO S IÇ ÃO DE RO L DA NA S E M MA D EI R A DA I G R EJ A
M AT RIZ NO S S A S E NH O RA DA CO NCEI ÇÃO , CATA S
A LTA S .
FOTO S : PE DRO DAV ID, 20 0 4.
RE C O LO C AÇ ÃO DO S INO NA I G R EJ A D E S ÃO
FRA NC IS C O DE PAU L A , OU RO P R ETO .
FOTO : PE DRO DAV ID, 20 0 4.
Notas
com medidas curiais como por secularização do mundo ocidental matutino para se levantar e não,
medidas regalistas, dependendo da afirmando que “[...] O tempo necessariamente, para rezar a
ocasião e da maior ou menor força laiciza-se e um tempo laico, o ave-maria. Em Congonhas do
da Igreja ou do Estado. No caso tempo dos relógios, das torres de Campo, muitos entrevistados
de Portugal, ao longo do século atalaia, afirma-se perante o tempo afirmaram que perdem
XVIII, essas relações penderam clerical dos sinos das igrejas a hora do trabalho se os
para o lado do Estado e eram [...]” num curso inexorável que sinos tocam atrasados.
reguladas, portanto, pelo regalismo ocorre com o desenvolvimento 25. MARTINS (apud
que se estabeleceu por todo o de mecanismos a partir dos BOSCHI, 1986, p. 36).
território do Império português quais se desenvolveram os 26. CARPEAUX (1990).
através dos sistemas do padroado primeiros relógios mecânicos, 27. FURTADO (2008, p. 41).
e do beneplácito. O padroado desde fins do século XIII. Cf. 28. MACHADO
era o direito que o monarca LE GOFF (1983, p. 228). (1901, p. 1.015).
detinha de conceder benefícios 21. EDMUNDO, (2000). 29. O Ofício de Trevas
eclesiásticos. O beneplácito era a 22. O relatório de pesquisa expressa os sentimentos que
permissão dada pelos monarcas de campo nos informa que em animaram Nosso Senhor Jesus
para que a legislação papal fosse São João del-Rei há repiques Cristo na sua Paixão. Orações,
aplicada em seus territórios. que são tocados ao longo de cantos, lamentações, leituras e
17. CASTAGNA (apud 50 minutos ininterruptos. responsórios compõem os salmos,
FURTADO, 2008, p. 93, passim). Os sineiros se revezam na em número de 14. Ao término
18. LANGE (apud execução desses toques. de cada salmo, apaga-se uma vela
DANGELO [S.d.], p. 16). 23. BERNARDI do grande candelabro triangular
19. FIRMINO (2007). (2005, p. 149-151). colocado à direita do altar para
20. Jacques Le Goff já 24. A pesquisa nos informa que o Ofício Divino. Há 15 velas no
sinalizava esse processo de há quem espere o toque do Ângelus total. A do vértice superior não
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
configurando um ostinato que se Anjinho e era executado nos sinos informal na cidade de Prados,
repetiu por 40 minutos. O sineiro pequeno e médio sem distinção Campo das Vertentes (MG), por
Erildo Nascimento de Diamantina do sexo da criança); a chamada ocasião da Semana Santa de 2009.
afirma, entretanto, que o “toque para o catecismo; a chamada de 36. DANGELO op. cit., p. 8).
de incêndio é descompassado, sacristão, a chamada de sineiro; 37. SALLES (2007 p. 64; 119).
não tem ritmo, não tem nada”. o Toque de Consistório; o Toque 38. MONTANHEIRO ([S.d.]).
Ver DVD Entoados (minuto de Recolher (toque de Aragão, 39. São Carlos Barromeu
27:08), anexado ao processo. assim denominado em referência foi um importante cardeal da
33. Em entrevista concedida ao intendente geral da Polícia, Contrarreforma religiosa. Tendo
à equipe de pesquisadores em o desembargador Francisco vivido no século XVI, é muito
2002, Aluízio Viegas afirmou que Teixeira de Aragão que instituiu provável que sua recomendação
os seguintes toques se encontram no Rio de Janeiro para a defesa não tenha conseguido ser aplicada
em desuso: para anunciar o dos bons costumes o toque de no império ultramarino português
nascimento de crianças, o Toque recolher. Ele determinou que e talvez mesmo no próprio reino.
de Parto (uma vez que uma às 10 horas da noite o sino As Constituições do Arcebispado
parturiente com dificuldades de terceiro dobrasse na Igreja de São da Bahia, do início do século
dar a luz é submetida à operação Francisco de Paula) e o Rebate XVIII, também recomendam que
cesariana), o Nosso Pai (toque para calamidades, especialmente os sacristãos assumam essa função
que anunciava que a comunhão os incêndios; nesses casos, o no caso das igrejas paroquiais e
era levada aos enfermos), o número de badaladas indicava o que os tesoureiros o façam no
Toque de Agonia (para anunciar lugar por onde o fogo se alastrava. caso das associações leigas.
a morte iminente de alguém), 34. GONÇALVES 40. VENDRAMINI,
o repique fúnebre para crianças (1998, p. 264-265). op. cit., p. 56-57.
falecidas (em Ouro Preto, é 35. Frase lembrada e citada por 41. ANDRADE (1989,
designado como o Toque de Daniela Pereira durante conversa p. 437-438).
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
42. MONTANHEIRO, op. 44. PRAZERES (1984, p. 32). Artística Sinos Uberaba (Fasu/
cit., p. 6. Em um dos vídeos do 45. GINZBURG MG); Cláudio & Manoel do
Anexo, por exemplo, o sineiro (1987, p. 12-13). Sino, Rio de Janeiro; Indústria
afirma que há um padrão que é 46. CARVALHO, 1975. de Sinos Crespi e a RSR Sinos,
seguido por todos, mas cada um 47. DANGELO ([S.d.]). estas duas últimas em São Paulo.
dá seu toque pessoal, faz “firula”. 48. Nas relações entre Igreja 53. Ver anexo II deste capítulo.
43. A bibliografia nos informa e Estado era comum que uma 54. Batismo ou consagração
que a manutenção dos sinos era interviesse em assuntos do outro, dos sinos, suas regras são
feita pelos próprios sineiros. com mandos e desmandos de orientadas pelo Pontifical
Essa manutenção dizia respeito ambas as partes. Nesse sentido, Romano que congrega todos
à colocação da graxa nos eixos e competia à Igreja o registro dos os livros que contêm todas
mancais, substituição das cordas nascimentos, casamentos e óbitos. as celebrações que devem ser
de couro cru quando necessário Ao Estado, cabiam, de maneira presididas pelo bispo. O nome
e aperto das porcas e parafusos. geral, os processos de inventários, do sino pode estar de acordo
Quando a madeira do cabeçote testamentos, fiscalização, com a devoção da cidade ou
apodrecia ou ainda mancais e concessão de licenças e alvarás. da devoção particular do
parafusos atingiam um alto nível 49. OLIVEIRA doador. Deve-se atentar para
de desgaste, eram chamados (1964, p. 144-145). a especificidade dessa prática.
artesãos para o conserto. Com 50. Grifo nosso. O batismo é “um sacramento,
o estabelecimento da rede 51. CONSTITUIÇÕES ou seja, uma ação de ordem
ferroviária na região, era comum Primeiras do Arcebispado sobrenatural: ‘sinais visíveis de
que os mecânicos prestassem da Bahia (1707). coisas divinas’. [...] [indicava]
serviços para toda a população, 52. No Brasil, atualmente, explicitamente que a consagração
inclusive para a igreja no caso da há pelo menos quatro empresas com os santos óleos provocava
manutenção dos prédios e sinos. de fundição de sinos: Fundição no ser espiritual dos reis uma
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
transformação profunda”. Cf. 62. VIEGAS ([S.d.], p. 4). de Jesus no pão e no vinho, um
BLOCH (1998, p. 154). 63. VENDRAMINI, dos principais dogmas da liturgia
55. Em depoimento durante op. cit., p. 50. católica. Em 1264, o papa Urbano
a pesquisa de campo, D. Hebe 64. Portal da Indústria de IV estabeleceu a festa do Santíssimo
Rola afirma que é o contrário: Sinos Crespi, disponível em: Sacramento, originando-se daí as
são quatro cruzes no interior e <www.sinoscrespi.com.br>. confrarias e irmandades que tinham
sete no exterior. Ver Anexo Os 65. Disponível em: como finalidade comemorar
entoados – minuto 01:03:01. <www.tecnosino.com>. o dia da eucaristia, a primeira
56. Anexo DVD Entoados 66. Disponível em: quinta-feira depois da oitava de
– minuto 1:03:28. <www.rsrsinos.com.br> Pentecostes. Já no século XIV,
57. Também pode ser 67. Disponível em: fundou-se a Ordem dos Religiosos
denominado de castelo. <www.mednet.com.br>. Brancos do Santíssimo Sacramento,
58. Mancal – dispositivo 68. DANGELO, op. cit., p. 2-3. também chamados frades do
de ferro ou de bronze sobre o 69. HUGO (2008, p. 228). Ofício do Santíssimo. O papa
qual se apoia um eixo girante, 70. BENEVOLO (1991, p. 92). Bonifácio IX, em 1393, promoveu
deslizante ou oscilante e que lhe 71. Id., p. 220. a união dessa associação com a
permite movimento com um 72. RAPOPORT (1969). Ordem de Cister. Continuaram,
mínimo de atrito. Também pode 73. Fritz Teixeira de Salles porém, como sendo os frades do
ser chamado de dobradiça. nos informa que o sodalício do Santíssimo Sacramento. Em 1582,
59. MORRIS (1959 apud Santíssimo Sacramento teve sua o papa Gregório XIII concedeu
CORREIA, [S./d.]). Inclui origem associada ao objetivo a essa ordem o privilégio de
CD com registro dos toques. de dar ampla divulgação aos realizar anualmente a procissão do
60. Cf. ZEQUINI (2006). mistérios envoltos no sacramento Santíssimo, assim como de expor
61. Cf. VENDRAMINI, da Eucaristia, afinal trata-se da a Eucaristia no dia de Corpus
op. cit., p. 49-54. consubstanciação do corpo e sangue Christi. No século XV já estava em
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
DE TA L H E S DE S INO S DA IG R EJ A MAT R I Z D E NO S S A
S E NH O RA DA C O NC E IÇ ÃO , CATA S A LTA S .
FOTO S : PE DRO DAV ID, 20 04 .
82. Os cataguases foram Luís Pedroso de Barros (1656), confraternitas, laicorum, congregatio,
identificados como povos Lourenço Castanho Taques pia unio, societas, coetus, consociatio –
ceramistas da tradição Una e sua (1668), Luís Castanho de Almeida torna-se necessário buscar alguma
denominação significa “gente (1671), Manuel de Campos Bicudo forma de distinção entre elas.
boa” (catu-auá). Segundo Ellis (1675), Fernão Dias Paes (1674) e Caio César Boschi afirma que
Júnior, a bandeira de Lourenço Bartolomeu Bueno da Silva (1676). há uma imprecisão característica
Castanho Taques, em meados 84. RESENDE (2007, p. 29). na designação dessas associações.
do século XVII, empreendeu 85. SOUZA, op. cit., p. 183-184. (BOSCHI, op. cit. p. 9).
ataques sucessivos em território 86. O Conselho Ultramarino 89. TORRES (1984, p. 62).
catagua, que se estendia até os em 1732 é claro: “por este 90. BOSCHI, op. cit., p. 36.
limites da atual cidade de Paracatu. modo se despovoará o Reino”. 91. DVD Semana Santa em Prados de
Segundo Capri, essa bandeira (SERRÃO, 1970, p. 601). Adhemar Campos Filho. Projeto
foi especialmente danosa para os 87. ÁUREO Throno Episcopal do Instituto Histórico e Geográfico
cataguases denominados Araxás (apud FURTADO 1997, 251-279). de Prados com o fim de registrar as
que viviam nos territórios entre os 88. Para a Igreja, o “traço manifestações culturais da cidade.
rios das Velhas e o Quebra Anzol. distintivo e dominante é ser uma Depoimento gravado por Átila
Depois dessa incursão, considerada fraternidade, uma fraternidade Alves e Costa e Aureliano Magela de
decisiva para a exploração desses sobrenatural, e não mais artificial, Rezende durante a Semana Santa
sertões, outras bandeiras foram pois que todos os seus membros de 1997 na cidade de Prados (MG).
organizadas com o objetivo de são unidos pelo Cristo: a doutrina 92. Cf. SALLES, op.
atacar e escravizar os cataguases. Cf. do corpo místico já exprime essa cit., p. 24; 97-98.
RIBEIRO (2005, p. 95, passim). unidade profunda”. Como essas 93. Ibid., p. 95.
83. As bandeiras mais associações apresentam uma 94. Ibid., p. 97.
conhecidas que desbravaram os grande variedade de designações 95. Valor pago para
sertões dos Cataguases foram a de – confraternitas, sodalitas, sodalitium, ingressar na associação.
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
A LTO
S I NO DA I G R EJ A MATRIZ D E NOS SA SE NHORA DA
C O NCEI ÇÃO, CATAS ALTAS.
FOTO: P EDRO DAV I D, 2004.
B AI XO
J A NELA DA TOR RE DA IGRE JA M ATRIZ NOS SA
S E N HOR A DA CONCEI Ç ÃO, C ATAS ALTAS.
FOTO: P EDRO DAV I D, 2004.
110. Entrevista com Marcelo del-Rei”, incluída no processo Senhora da Boa Morte, além de
Eduardo Soares (e sua mãe, Délcia de instrução do registro dos uma marcha processional para
Maria do Carmo, Dona Dó), em 2 toques dos sinos nas cidades banda de música para a procissão
de novembro de 2004, na Igreja de históricas mineiras, Iphan. da Boa Morte; 3) Rapsódia
Bom Jesus do Matosinhos, Ouro 115. Parecer Técnico nº são-joanense, para Orquestra
Preto, concedida a Josanne Guerra 27/GR/DPI/Iphan. Brasília, Sinfônica; 4) Suíte das Idades,
Simões e Chiquinho de Assis. 30 de setembro de 2009. em que o ritmo do repique é
111. Idem. 116. Idem. usado como ostinato no quarto
112. Entrevista com Nilson José 117. Entrevista com o movimento. (VIEGAS, Aluízio.
dos Santos, concedida a Cristina padre José Feliciano da Costa Linguagem dos sinos de São João del-
Leme, Juliana Araújo e Pablo Simões, 1º nov 2004, na Casa Rei. Ouro Preto, 1990. Não
Lobato, em 6 de setembro de Paroquial do Pilar, Ouro Preto, publicado. Palestra proferida no
2007, na Igreja de São Francisco concedida a Josanne Guerra Salão da Escola de Farmácia da
de Assis, São João del-Rei. Simões e Chiquinho de Assis. Universidade Federal de Ouro
113. Entrevista com 118. Entrevista com Marcelo Preto, no âmbito do projeto
Aluízio Viegas, concedida Eduardo Soares, 2 nov 2004, Piques e Repiques, promovido pela
a Cristina Leme, Juliana na Igreja de Bom Jesus do mesma universidade. Esse texto
Araújo e Pablo Lobato, em Matosinhos, Ouro Preto, integra o material fornecido pelo
7 de setembro de 2007, na concedida a Josanne Guerra Iphan à equipe de pesquisadores
Catedral de Nossa Senhora Simões e Chiquinho de Assis. responsável por este inventário).
do Pilar, São João del-Rei. 119. Os nomes das peças são, 120. Recomenda-se o estudo
114. Entrevista com Aluízio respectivamente: 1) Abertura da experiência realizada na
José Viegas, transcrita sob o para o dia 14 de agosto; 2) Outra Superintendência do Iphan, no
título “Questionário sobre Abertura para 14 de agosto e uma Ceará, onde a restauração dos
linguagem dos sinos em São João Ladainha para novenas de Nossa sinos (e não sua refundição)
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
garantiu a preservação da
sonoridade original. Na cidade
do Serro, moradores e devotos
aguardam solução para o impasse
relacionado à construção de
um espaço para abrigar o sino
da igreja de Nossa Senhora do
Rosário: Torre sineira acoplada
ao templo, semelhante a outras
que já existiram em diferentes
momentos no passado e como
deseja a irmandade, ou desligada
do corpo da igreja, como propõe
o Iphan, para deixar claro que
se trata de nova construção? Em
Milho Verde, distrito do Serro,
os problemas giram em torno da
segurança dos sinos na Igreja de
Nossa Senhora dos Prazeres, que
ficam desprotegidos, do lado de
fora do templo, bem ao alcance das
mãos. A comunidade solicita uma
providência, temendo que os sinos
sejam roubados, tal como foram
algumas imagens da igreja. ¢
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
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Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
PRO C IS S ÃO DE C O RPU S C H R I ST I E,
S ÃO JOÃO DE L - RE I.
FOTO : JOÃO RA M A L H O NE TO , 2 0 0 9 .
DOCUMENTÁRIOS
VIDEOGRÁFICOS
Anexo 1
Parecer do
relator
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Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
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Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
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Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
Anexo 2
Certidão de
Registro do
Toque dos Sinos
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Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
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tendo como referência as cidades de São João del-Rei, Ouro Preto, Mariana,
Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
Anexo 3
Certidão de
Registro do
Ofício de Sineiro
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Catas Altas, Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes
Anexo 4
Modalidades de
Toques em São
João del-Rei
A BA IXO , DA E S QU E RDA PA RA A D I R EI TA
S IST E M A A NT IGO
S IST E M A M O DE RNO
Anexo 5
Afinação do Sino
NA PUBLICAÇÃO (CIP)
BIBLIOTECA ALOÍSIO MAGALHÃES, IPHAN
I S B N : 978-85-7334-293-2
CDD 390.4